Reflexões sobre o Fracasso Escolar - Pedagogia

Transcrição

Reflexões sobre o Fracasso Escolar - Pedagogia
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
Departamento de Psicologia
Trabalho de Conclusão de Curso
Reflexões sobre o Fracasso Escolar: a Escola como um mundo afastado
da vida
Aluna: Rose Mary de Oliveira Hudson
Orientador: João dos Santos Carmo
São Carlos/SP
2009
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
Departamento de Psicologia
Trabalho de Conclusão de Curso
Reflexões sobre o Fracasso Escolar: a Escola como um mundo afastado
da vida
Aluna: Rose Mary de Oliveira Hudson
Trabalho de Conclusão de Curso de
Licenciatura
em
Pedagogia
da
Universidade Federal de São Carlos.
Orientado pelo Prof. Dr. João dos Santos
Carmo, do Departamento de Psicologia,
Centro de Educação e Ciência Humanas.
São Carlos/SP
Aos meus pais, e ao meu irmão, pela força e apoio, durante todo o processo desta
conquista.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus pela oportunidade de poder concluir um curso superior.
À minha família por ser meu porto seguro.
Ao professor e amigo João, pela sua competência em me orientar e por acreditar
no meu trabalho.
Aos amigos que fiz na faculdade, e aos professores dos quais tive o privilégio de
ser aluna.
A árvore que não dá fruto
É xingada de estéril. Quem
Examina o solo?
O galho que quebra
É xingado de podre, mas
Não havia neve sobre ele?
Do rio que tudo arrasta
Se diz que é violento,
Ninguém diz violentas
As margens que o cerceiam
Bertold Brecht
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ....................................................................................................... 6
METODOLOGIA ......................................................................................................... 8
CAPÍTULO 1: A ESCOLA E SEU DISTANCIAMENTO DA VIDA ......................... 10
CAPÍTULO 2: ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O FRACASSO ESCOLAR ......... 17
CAPÍTULO 3: APONTANDO RUMOS ..................................................................... 28
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 37
REFERÊNCIAS: ........................................................................................................ 40
RESUMO
O fracasso escolar já é um assunto conhecido, recorrente de inúmeras discussões sobre o
ensino, isto é, um discurso no âmbito social que por seu grau de importância e
complexidade, é abordado como uma realidade social a ser encarada. Apesar do
reconhecimento deste fato evidente nas escolas, o desafio não está na abordagem e
discussão do fracasso em si, mas na forma de abordá-lo, ou seja, o que continua
preocupante é a insistência nas mesmas análises superficiais e generalizadas que
conceituam o fracasso como algo externo ao processo de ensino e à sua organização.
Esta pesquisa procurou fazer um panorama histórico sobre o fracasso escolar, assim
como as explicações dadas e as ideologias presentes nestas explicações, e diante disso,
entender qual o processo que conduz os alunos a viver histórias escolares de fracasso.
Com o caráter de pesquisa histórico-bibliográfica, buscamos apresentar sob a ótica dos
autores abordados, que duas visões coexistem: a primeira que trata do fracasso escolar
como algo inerente ao aluno e/ou família, a segunda, que entende o fracasso escolar
como produto de relações historicamente determinadas. Observou-se no decorrer dessa
pesquisa, que embora as situações de fracasso sejam reais e presentes no quadro escolar,
existem propostas educacionais bem sucedidas que nos fazem crer nas possibilidades de
ação, de uma escola dos sonhos possível.
Palavras-chave: Fracasso Escolar, Realidade Social, Mecanismos de Seletividade,
Cultura Escolar, Carência Cultural.
ABSTRACT
The school failure has already been a known subject, resulting from countless
discussions about education. It means people approach this issue as a social reality to be
faced for its complexity. The school has knowledge about this issue, but the challenge is
not to discuss this issue, it’s how we discuss. It’s still a problem because they keep
fixating on the same superficial opinions which make the issue something out of the
education process. Analyzing this aspect, this research aims to look for a historical
reason for this issue, explanations and the ideology used on each explanation. As a
bibliographic-historical research and based on the researcher’s view, we look for
showing two opinions coexist: the first one is about the school failure and the student
and/or the family; the second one is about a historical aspect. We observe on this
research the school failure is something real, but there are projects, which have been
successful, and they make us believe there are possibilities we can have the school we
have dreamed for.
Key-words: School Failure, Social Reality, Selectivity Mecanisms, Education Culture,
Culture Lack.
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APRESENTAÇÃO
O que se reconhece por um ambiente de aprendizagens? Salas de aula? Carteiras?
Quadro negro? Algumas janelas? Para a sociedade, a escola é o âmbito cuja aprendizagem
encontra seu lugar; e para a criança? O que ela entende por ambiente de aprendizagens? Para
ela, qualquer lugar e horário são oportunos para se aprender algo novo, o mundo toma a forma
de um mapa a ser explorado, sensações e descobertas fascinantes batem à porta; seja na
relação com as pessoas, com o meio ambiente ou com outras culturas; tudo pode ser sentido,
internalizado, vivido, porém, ao chegar à escola, esse mundo de explorações torna-se limitado
e restrito.
Na sala de aula, regras e normas são formuladas de maneira a domesticar os corpos
vividos nas cadeiras, as carteiras em fileiras exigem uma postura alinhada e imóvel, e do
professor uma única recomendação, “silêncio e atenção”. No interior das paredes da escola, o
comportamento é vigiado, apenas certas atitudes, palavras, pensamentos e expressões são
permitidos, ou seja, tudo que fuja à norma padrão, aos “ritos”, é julgado e condenado.
Ao entrar na escola, a criança deixa do lado de fora, grande parte da sua criatividade,
sagacidade, questionamento e vivências do cotidiano; ao adentrar os portões, a descoberta e o
aprendizado tornam-se princípios desconexos, que só tornam a ter sentido no fim do dia, com
o tocar do sinal.
Esse contexto de educação nos permite refletir que o currículo formal com suas
inúmeras limitações, a sala de aula, e o âmbito escolar com seus ritos aparentemente
imutáveis contribuem de forma significativa para o fracasso escolar, pois "castram" a
imaginação, curiosidade, criatividade e vivacidade que a criança possui; mas que dentro das
paredes da escola perdem o sentido, escola e vida passam a ser realidades totalmente distintas
e sem relação, ao invés de serem correlacionadas e interdependentes.
Diante desses argumentos, essa pesquisa bibliográfica terá como linha norteadora, o
posicionamento de refletir e discutir criticamente sobre as causas e possíveis soluções do
fracasso escolar.
Esse trabalho pretende apontar a necessidade que existe na identificação da criança
com a escola, isto é, a importância do aluno encontrar significado em seus aprendizados, e
que os mesmos façam sentido para ele e para a realidade em que vive; ou seja, de que maneira
enxergar a criança como ela realmente é sem transformá-la em mais um número estatístico,
mais um caso a ser analisado.
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O intuito é procurar através de abordagens críticas e realistas aqui analisadas, refletir
sobre as condições necessárias, para que haja uma reelaboração de conceitos, diante da escola
que temos e daquela que gostaríamos de ter.
Longe de apontar soluções milagrosas ou concepções que não passam de um discurso
de boas intenções; o objetivo deste TCC (Trabalho de Conclusão de Curso) é de fazer uma
reflexão crítica acerca do fracasso escolar, ao abordar suas causas e consequências em
diferentes perspectivas e âmbitos; sendo do ponto de vista político-social, fruto das
contingências educacionais, sociais e econômicas; e do ponto de vista da exclusão, de
crianças, famílias, professores e escolas, serem em grande parte, excluídos da oferta de
condições minimamente desejáveis de ensino-aprendizagem.
Um esboço dos capítulos a serem abordados, nos dará um panorama da proposta
presente neste TCC.
Capítulo 1: A escola e seu distanciamento da vida. Neste capítulo procuraremos
refletir e ampliar as discussões acerca do tema do TCC.
Capítulo 2: Algumas reflexões sobre o fracasso escolar. Neste capítulo procuraremos
levantar algumas reflexões a respeito das causas do fracasso escolar, as condições que
implicam sua manifestação, assim como as diversas explicações dadas ao fracasso escolar, e
as ideologias presentes nessas explicações.
Capítulo 3: Apontando rumos. Aqui serão discutidas as possibilidades de ação e o
sonho de uma escola possível. Pensamos em relatar algumas experiências, como a escola
aberta e a escola da ponte.
Considerações Finais: Aqui faremos um remate das teorias, ideologias e conceitos
abordados, assim como sugerir novas abordagens a serem consideradas em trabalhos
semelhantes.
O fracasso escolar apresenta-se por uma problemática que, não é de hoje abordada,
questionada, estudada. O tema mostra-se intrigante, justamente por se tratar da instituição
escolar, âmbito de múltiplas culturas e histórias de vida.
Como característica, o fracasso escolar possui a presença da diversidade de histórias
escolares mal sucedidas, únicas e peculiares entre si. Foram justamente essas particularidades
que me intrigaram ao ponto de querer pesquisar e discorrer sobre o fracasso escolar. O que se
considera por fracasso escolar? Quais são as causas do fracasso escolar, as condições que
implicam sua manifestação? Foram os questionamentos que me instigaram e desafiaram a
desenvolver este TCC (Trabalho de Conclusão de Curso).
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Outro questionamento que me acompanhou no decorrer dos meus estágios, foi a falta
de identificação que a criança tem com a escola, muitas vezes, o aluno não se identifica com o
conteúdo escolar, com a cultura da escola, com a maneira que a relação ensino-aprendizagem
se desenvolve dentro da sala de aula, o que contribui para a formação do fracasso escolar.
Diante dessas interrogações, o questionamento maior gira em torno de: será possível
conceber um âmbito escolar onde os alunos sintam prazer em aprender os conceitos exigidos
no currículo? Há maneiras de se tornar mais significativo e “identificatório” o aprendizado
para a criança dentro da sala de aula? Existem experiências bem sucedidas nessa perspectiva
de ensino? Descobriremos juntos no desenvolver da leitura.
METODOLOGIA
O trabalho aqui apresentado é de caráter bibliográfico. O intuito é obter através da
literatura, informações sobre os aspectos políticos e pedagógicos que contribuíram e
contribuem para a formação do fracasso escolar, e como a falta de identidade que o aluno tem
para com a escola, pode resultar em desmotivação, desinteresse e evasão escolar. A reflexão
proposta por essa pesquisa tem por objetivo, propiciar base e referência para uma posição
critica diante do que temos condições de melhorar, transformar na escola e o que não passa de
utopia.
Este trabalho foi desenvolvido a partir do estudo de obras voltadas para a Educação,
mais especificamente na vertente do fracasso escolar, dando ênfase para as obras de
fundamento teórico e trabalhos acadêmicos, que tratam as causas, consequências,
justificativas e possibilidades para a superação do fracasso escolar.
Foram analisados artigos e obras que tratam dessa temática, ao questionar conceitos
como fracasso escolar, cultura escolar, relações de poder, mecanismos de seletividade, a
escola que reproduz o sistema através da padronização e a escola reflexiva que se constitui
como âmbito de relações e aprendizagens multiculturais.
Nessa perspectiva, é importante dizer que a presente pesquisa contou como suporte
textos disponíveis na internet, especificamente, no site do SCIELO (Scientific Eletronic
Library Online).
As pesquisas encontradas reportam-se, à realidade do fracasso escolar, suas causas,
consequência e justificativas dadas, assim como, do sucesso escolar, experiências bem
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sucedidas e abordagens reflexivas que se apresentam como possibilidades de superação desse
fenômeno social.
Para a seleção das obras e trabalhos a serem analisados, foi usado como critério, a
leitura de textos referentes ao fracasso escolar. Caso a primeira análise não contemplasse a
pesquisa, novas leituras de outros trabalhos eram feitas, a fim de buscar os mesmos ou outros
elementos relacionados ao tema.
Em seguida, fizemos a leitura dos artigos e das obras que foram escolhidas por
contemplar o tema e neste sentido, buscamos identificar os argumentos e/ou as perspectivas
voltadas para o fracasso escolar, bem como a importância do questionamento crítico e
reflexivo dessa temática.
Os autores que serão utilizados como aportes teóricos para esse trabalho são,
Vygotsky (1991), Vygotsky (2006), Patto (1993), Harper et al (1986), Freire (2005), Mercês e
Sampaio (2004), Paro (2001), Alves (2009).
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CAPÍTULO 1
A ESCOLA E SEU DISTANCIAMENTO DA VIDA
Com o desenvolvimento do capitalismo industrial, o mundo passa por significativas
transformações, a invenção da máquina e a revolução tecnológica tornam-se o ponto de
partida para um processo de grandes transformações, voltado para novas tecnologias e centros
de produção. No entanto, diante desse cenário revolucionador, a escola permanece reservada
às elites.
Segundo Harper et al (1986), com o desenvolvimento industrial, passa-se a exigir uma
mão de obra especializada, no intuito de corresponder ao avanço científico e tecnológico pelo
qual o mundo estava passando; assim, no que diz respeito ao ensino, isto é, em relação aos
conteúdos escolares, um número maior de quadros técnicos ganha espaço no lugar das antigas
disciplinas de fundo clássico e literário, ou seja, diante da mudança radical da sociedade, a
escola é forçada a se modernizar.
Diante desse quadro de inovações, há a necessidade de uma melhor instrução para a
classe operária, isto é, um ensino mais consistente, de modo que os operários tivessem um
mínimo de conhecimento, para sua inserção como mão de obra especializada na sociedade
industrial e dessa maneira, nascem paralelamente, a escola dos ricos e a escola dos pobres.
De acordo com Harper et al (1986), a coexistência desses dois conceitos de escola gera
uma verdadeira segregação social, ou seja, o ensino das crianças provindas das classes
populares é estruturado de forma que os alunos tenham condições de apenas cumprir a escola
primária. Por outro lado, as crianças de classes abastadas seguem um caminho diferenciado,
com um ensino estruturado, de qualidade, na qual são encaminhadas para acesso ao nível
superior.
Nessa perspectiva, o direito de acesso à educação, no que diz respeito à igualdade de
oportunidades e frequentar uma mesma escola, torna-se gradativamente uma reivindicação de
prioridade da população. Dessa maneira, o ensino público gratuito e obrigatório, diante desse
quadro educacional, mostra-se como a melhor maneira de se alcançar uma verdadeira
democratização no ensino.
Segundo Harper et all, a expectativa da classe trabalhadora diante da democratização
consistia no nascimento de uma escola transformadora, de um serviço público de acesso a
todos; que fosse estabelecida como um instrumento de emancipação e de educação das classes
menos favorecidas. Assim, diante das reivindicações da população, de forma gradual vai
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sendo eliminado o sistema de duas escolas separadas, isto é, uma destinada aos ricos, e a outra
para os pobres.
Ainda de acordo com Harper et al (1986), a partir de então, os alunos partem da
“largada” juntos, ou seja, começam seus estudos num mesmo tipo de escola, até o momento
de passarem por uma seleção que os repartirão em dois grupos: de um lado os que alcançarão
as universidades, e de outro, os que ingressarão em escolas técnicas e profissionais, ou seja,
cursos mais curtos e menos valorizados.
Harper et al nos leva a refletir perante os fatos apresentados, se de fato houve
democratização na escola. E se houve? O que entendemos por democratização no ensino? De
acordo com Harper, se entendermos democratização, como sendo a possibilidade de um maior
número de alunos permanecerem na escola, e com isso consequentemente obter uma maior
quantidade de diplomas, sim, houve democratização.
No entanto, se entendermos democratização da escola, como a possibilidade de que
alunos provindos de meios culturais e sociais diferentes tenham as mesmas chances de atingir
o sucesso escolar, então, ainda há um longo percurso a seguir.
A escola não é algo acabado, estático, mas sim um movimento constante de idéias,
conflitos, culturas, transformações e relações sociais que interagem e se modificam dia a dia.
Porém, o que muitas vezes sua cultura transparece, é a visão de um mundo à parte,
padronizado e fechado em si, repleto de ritos e normas que grande parte das vezes, se
mostram imutáveis.
O âmbito escolar, com suas regras e especificidades acabam por adestrar o corpo dos
alunos em prol de uma disciplina excessiva, e consequentemente adestram a imaginação e a
criatividade da criança, ao impedí-la de responder suas indagações através da exploração
física e intelectual.
Diante do aluno, a escola se apresenta como um mundo imóvel e silencioso, onde
muitas vezes é proibido trazer para a realidade da aula abordagens do dia a dia, isto é, o que
não está incluído no currículo padrão da escola.
A sala de aula, segundo Morais (1986), ocupa em nossa tradição escolar um lugar
propício para o desenvolvimento da escolaridade. Para esse autor, ao longo da vida escolar do
educando sua frequência em uma série de salas de aula, permite que ele seja considerado
escolarizado; sendo assim, a sala de aula tem sido considerada um sinônimo de instrução.
A sala de aula se constitui como um âmbito educacional na qual a interação entre
pessoas, objetos e símbolos se faz presente, porém, esses contextos na maioria das vezes, não
são abordados interdisciplinarmente ou relacionados de forma significativa com a realidade
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dos alunos. “Não se aprende a fazer samba no colégio, disse o Noel Rosa, tendo suas razões, e
nem nunca se viu a Didática lecionar matemática (ou geografia) no Mercado Modelo ou na
Folia dos Santos Reis” (MORAIS, 1986. p.52).
Na escola, dificilmente a cultura popular e as experiências sociais são requisitos na
formulação de planejamentos ou currículos1, pois a escola tem sua cultura alicerçada em uma
tradição metódica, regida por ritos e leis que se apresentam desconexos com o cotidiano do
aluno, e com o que realmente lhe traz sentido e significância. “A Cultura Popular, ela não vai
à escola, ou vai à escola da vida, cujas metas e projetos – sendo a vida mesma – nem confere
diplomas, nem repete de ano a nenhum desses que têm sobrevivido” (MORAIS, 1986. p.52).
A cultura popular e a sala de aula, de acordo com Morais, relacionam-se de forma
desarmônica, tendo se excluído de forma mútua ao longo da nossa tradição educativa.
A instituição escolar através das suas regras e leis interfere na relação de descoberta
entre o aluno e o aprendizado, uma vez que impossibilita o desenvolver de experiências a
serem adquiridas por meio das relações sociais, brincadeiras, contato com o meio ambiente,
curiosidade, conhecimento, sentimentos, política, etc.
Na escola, os papéis entre professor e aluno estão previamente determinados, o
professor fala, o aluno ouve, o professor se movimenta pela sala, o aluno permanece sentado
em silêncio, o professor sabe, o aluno está em constante processo de aprendizagem. Nessa
perspectiva, quando voltamos nossa reflexão e análise para as relações entre professor-aluno e
ensino-aprendizagem, mais nos convencemos de que, conforme Freire (2005), essas relações
caracterizam-se como sendo fundamentalmente “narradoras, dissertadoras (...) Narração e
dissertação que implica um sujeito – o narrador – e objetos pacientes, ouvintes – os
educandos” (FREIRE, 2005. p. 65).
A partir do momento em que o conhecimento é abordado como algo narrado e
estático, ele perde sua natureza existencial, isto é, sua essência da prática, de experiências
vividas. No processo de ensino-aprendizagem, esse contexto torna-se ainda mais verdadeiro
quando o conhecimento se apresenta de forma alheia à realidade do aluno. De acordo com
Freire (2005), quando o professor se coloca como o sujeito/narrador no processo de
aprendizagem e conduz o aluno para a condição de ouvinte, faz com que o conhecimento seja
assimilado de forma mecânica. Dessa maneira, o aluno apenas recebe e memoriza o conteúdo,
não havendo espaço para suas hipóteses ou questionamentos, posicionando-se assim, no que
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É o conjunto de disciplinas propostas por uma grade curricular, onde estão presentes os conteúdos a serem
ensinados na escola, juntamente com a definição dos objetivos a serem perseguidos no ensino.
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Freire chama de “vasilhas” de depósito de conhecimento, na qual o educador “enche” com
conteúdos.
Segundo Harper et al (1986), dentro do currículo, a escola tende a tratar/ensinar todos
de uma mesma maneira, e diante disso, espera-se uma resposta recíproca, isto é, que todos
reajam/aprendam da mesma maneira, pois não só a metodologia é aplicada igual a todos, mas
a explicação, os exemplos, o ritmo, o livro, e diante disso, espera-se que os alunos
correspondam ao estímulo com uma atitude padrão, ou seja, que todos aprendam com os
mesmos exemplos, que reajam aos mesmos estímulos, e adquiram o mesmo conhecimento.
Ao invés do educador discutir o conteúdo com os alunos, ele repassa o conhecimento
fazendo com que os mesmos memorizem e reproduzam. A essa concepção, Paulo Freire
denomina de “educação bancária”.
Na educação bancária, o aluno passa a assumir o papel de reprodutor do conhecimento
e não o de criador do seu aprendizado, como diria Freire “expectador do mundo”. Perante
isso, o educador deve buscar propiciar a “comunicação” entre o saber e o aluno, tendo como
prerrogativa o conceito de que segundo Freire (2005), sua atuação como professor só se torna
autentica quando este reconhece autenticidade no pensar do educando, direcionando-o a todo
momento para a reflexão da realidade.
Já quando o conhecimento é assimilado como uma via de mão única, isto é, o
professor fala e o aluno apenas recebe o conteúdo, não há reciprocidade de aprendizagem,
mas apenas um “depósito”, o educador “deposita” o conteúdo no educando e concebe a
reprodução mecânica do mesmo como prova de aprendizagem, que muitas vezes não é
adquirida de forma significativa.
Nessa postura “bancária” de educação, segundo Paulo Freire, o conhecimento é visto
como uma doação daqueles que julgam ter mais conhecimento intelectual que outros. No caso
da relação professor-aluno, o professor sempre será aquele que irá ensinar, e o aluno o que irá
aprender. Diante desse contexto, o conhecimento deixa de ser algo elaborado, construído, e
passa a ser concebido e praticado como algo estático, comprometendo até mesmo a
criatividade dos alunos. Na verdade, essa relação ensino-aprendizagem que se apresenta
grande parte das vezes de maneira mecânica, constitui-se, segundo Freire, como “uma visão
distorcida da educação, onde não há criatividade, não há transformação, não há saber”
(FREIRE 2005, p.67).
Em oposição à educação bancaria, Freire nos apresenta a educação problematizadora;
nesta concepção, já não prevalece o ato de depositar, narrar ou transmitir conhecimentos e
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valores, mas se coloca como exigência crucial no desenrolar da aprendizagem, a superação da
relação autoritária educador-educando.
É através da superação da educação bancária, que se é concebida uma nova relação
educador-educando, isto é, na educação libertadora, uma nova concepção de educação entra
em “cena”; a de um professor que não apenas educa, mas no processo de ensino é educado, e
de um educando que não só aprende, mas no processo de aprendizagem educa. Dessa
maneira, ambos se tornam parte de um processo de desenvolvimento e enriquecimento
intelectual, pessoal e cultural.
Freire resume da seguinte forma as reflexões apresentadas: “Já agora ninguém educa
ninguém, como tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em
comunhão, mediatizados pelo mundo” (FREIRE, 2005 p.79).
Assim, diante do conceito de educação problematizadora, a postura do educador deve
ser a de renovar, e trazer constantemente para a discussão crítica a relação ensinoaprendizagem. Ao assumir a postura de investigador crítico, o educador deve buscar, por meio
do ensino, problematizar a realidade de forma que o aluno adquira subsídio para superar a
alienação presente na sociedade, e assim libertar-se da anestesia que, segundo Freire, inibe
seu poder criador, constituindo-se também como um investigador crítico, problematizador que
desafia o mundo, e é desafiado a responder aos desafios da realidade.
No âmbito escolar, dificilmente é feita essa busca pela reflexão crítica; pelo contrário,
a escola se abstém muitas vezes do questionamento e reproduz a alienação, pois deixa de
abordar o discurso político de forma libertadora e conscientizadora. Este quadro se faz
presente na rotina da escola, onde é rara a comunicação do conteúdo escolar com a realidade
cotidiana, tornando assim o ensino superficial e desconexo.
Essa capacidade de desafiar e ser desafiado pela problemática da realidade é adquirida
através da reflexão simultânea do individuo em relação a si e ao mundo, permitindo que o
sujeito aumente seu campo de percepção, ao refletir sobre a forma de como percebe a si
mesmo no mundo.
A concepção e a prática “bancária” desconhecem o homem como um ser histórico,
criador e contribuidor da sua história, cultura e, consequentemente, identidade. No entanto, a
educação problematizadora, toma a historicidade dos homens como premissa, ao conceber a
partir do caráter histórico, de que o homem não é, mas está sendo; isto é, são seres inacabados
em constante aprendizagem e metamorfose de idéias, fazendo parte de uma realidade que
sendo histórica, é igualmente inacabada.
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Quando a criança insere-se no âmbito escolar ela traz consigo uma história, constituída
de experiências de vida, atitudes, valores, princípios, ideais, hábitos de linguagem que
constituem e refletem a cultura da sua família, ou seja, do meio social em que está inserida.
O aluno deve ser valorizado diante das suas peculiaridades, experiências e
conhecimento resultante de suas vivencias; porém, a escola não considera relevantes essas
diferenças, e não leva em consideração histórias de vida, ritmos de aprendizagem,
concepções; ou seja, ao invés da escola exaltar a bagagem cultural do aluno, e estipular como
sendo este o ponto de partida para o desenvolver da relação ensino/aprendizagem, a escola
anula as particularidades e padroniza.
Harper et al (1986) aborda essa perspectiva, ao relatar que na escola, a vontade da
criança e o seu conhecimento próprio são negligenciados, pois no que diz respeito à sua
bagagem cultural, esta não é valorizada ou requisitada no seu processo de aprendizagem, no
entanto, do portão para fora a criança se reencontra; pois, o que ela considera significativo,
toma de volta seu sentido, ou seja, sua imaginação, criatividade, sagacidade, curiosidade e
disposição têm seu espaço.
A cultura escolar que em sua ideologia é elitista, isto é, eleva a cultura das classes
privilegiadas, sendo que as crianças das classes mais favorecidas estão acostumadas desde
pequenas com a linguagem que a escola exige.
Já as crianças dos meios populares, sentem grande estranheza diante da linguagem e
dos valores da escola, pois o ritmo escolar se apresenta quase ou totalmente diferente daquilo
que são habituadas; sentindo-se ainda mais deslocadas pelo fato de não poderem trazer para a
escola sua maneira de falar e suas experiências de vida dentro do seu contexto familiar,
cultural e social.
Esse sentimento de mal-estar experimentado pelas crianças das classes populares
muitas vezes resulta em uma recusa pela escola, personificada em erros constantes,
desatenção e descaso, que se mostram como os primeiros passos rumo ao fracasso escolar.
A falta de motivação e incentivo ao aluno para com a construção do seu aprendizado o
impulsiona a fazer por si só as relações entre a teoria e a prática, entre a escola e a vida. O
aluno que ao adentrar a escola pensa em carros, motores, sexo, recordes, acontecimentos
históricos, muitas vezes fica calado e desinteressado, pois não consegue fazer relações entre o
que vivencia dia a dia e o conteúdo abordado nas disciplinas escolares. A atitude dos alunos
passa então a ser mecânica e passiva, pois evita ao máximo a exposição, por receio da sua
opinião ser considerada contrária ou errada no ponto de vista do professor.
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A escola que deveria dar a mesma oportunidade a todos, e ser reconhecida como
âmbito de aprendizagens para a vida, geradora de cidadãos críticos e reflexivos, atuantes
ativos na sociedade, e que continuamente transformam e são transformados pelo mundo; age
de forma contraditória ao reproduzir a desigualdade entre diferentes classes sociais.
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CAPÍTULO 2
ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE O FRACASSO ESCOLAR
Neste capítulo, buscaremos com base em fundamentação teórica levantar algumas
reflexões a respeito das causas do fracasso escolar, as condições que implicam sua
manifestação e as diversas explicações dadas como justificativas para o insucesso do aluno na
escola. Sem a pretensão de apresentar soluções definitivas, pretendemos abordar o assunto a
partir de uma perspectiva crítico-reflexiva; no objetivo de buscar entender as ideologias
presentes nessas explicações.
Apesar de toda a boa vontade e de todo o esforço de alguns professores, a realidade é
que o próprio funcionamento da escola é quem determina através dos resultados escolares, o
lugar de cada aluno na escola, selecionando e eliminando os que não se adaptam. Diante desse
contexto, diversas medidas são tomadas em termos de políticas públicas, porém tais políticas
não sofrem continuidade, o que torna o abandono da escola algo crônico.
Segundo Paro (2001), a reprovação escolar é parte integrante da realidade escolar,
manifestando-se não só nos alunos retidos e “desistentes” que a escola produz, mas também
no modo de agir e de pensar que perpassa as atividades escolares. Exemplo disso são as
relações presentes em sala de aula, que são direcionadas para o cumprimento de seu papel de
escola, isto é, possibilitar a passagem do aluno para a próxima série correspondente.
No processo avaliatório, na grande maioria das vezes, o que a escola julga como
necessário para que o aluno passe para o próximo nível de ensino, baseia-se no domínio do
conhecimento exigido pelas disciplinas escolares, o gosto pelo saber e a apropriação da
cultura como valor fundamental, são concebidos como complemento, pois o que vale
realmente é o aprendizado do conteúdo estipulado no currículo.
Paro (2001) faz uma análise crítica, ao dizer que em termos psicológicos e
pedagógicos, a repercussão de uma reprovação escolar tem seus efeitos mais
comprometedores na auto-estima e construção do saber de uma criança ou adolescente que
está em seu processo de formação, do que para um estudante que apresenta um razoável
desenvolvimento psicológico e social.
A reprovação escolar, segundo Paro, acaba servindo como álibi para a incompetência
da escola:
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“(...) primeiro como cautela, para que não haja no próximo ciclo um aluno que não
tenha competência para ai estar, segundo, como justiça feita ao aluno que não quis
estudar, e finalmente, como garantia de qualidade para a escola que não terá para a
próxima série um aluno que não consiga acompanhá-la”(PARO, 2001p. 68).
Como solução imediata, a escola opta por reprovar, tendo por justificativa, o aluno
como o único responsável pelo seu fracasso. Ora por não conseguir acompanhar o ritmo da
sala, ora em forma de punição por um comportamento que foge aos padrões que escola exige.
Na sua insuficiência em conseguir cativar a curiosidade do aluno, a instituição escolar acaba
por não questionar as razões que a fazem não conseguir dar informações, cultura2,
conhecimentos, para além do que o aluno já sabe.
O fracasso escolar, de acordo com Paro (2001), não é proveniente de uma causa
isolada, mas é produto de um conjunto de determinantes provindos de diversas naturezas.
No que se refere às condições de trabalho do docente na escola, estas influenciam de
forma direta no desencadeamento do fracasso escolar; pois as más condições de trabalho, o
grande número de alunos para atender, o baixo salário, entre outros, contribui para que os
educadores não possuam condições de realizar satisfatoriamente seu trabalho, tomando por
medida a reprovação; impedindo dessa maneira, de passarem pela vergonha de serem
chamados de incompetentes. Segundo Paro (2001), somente uma abordagem global do
contexto da escola, poderá desvelar as circunstancias que determinam o fracasso escolar.
Segundo Mercês e Sampaio (2004), o fracasso escolar não se explica apenas pela
reprovação, acontece uma perda ainda mais relevante, caracterizada pela dissociação da
relação ensino-aprendizagem, isto é, no distanciamento cada vez maior entre os alunos e o
conhecimento que a escola pretende transmitir.
Ainda segundo os autores, a escola tem por expectativa, que os alunos venham
prontos, com pré-requisitos; como boas maneiras, disciplina para assistir e participar das
aulas, hábitos de estudo, competência para ler e escrever bem; além de resolver seus
problemas fora da escola (MERCÊS e SAMPAIO, 2004).
Dessa maneira, quando a criança não atinge tais expectativas, o fracasso é tido como já
esperado, pois o aluno foi pré-conceituado como difícil, desatento e despreparado para o
desenvolvimento do trabalho escolar. Essas explicações de acordo com Mercês e Sampaio
(2004) repetem-se em muitos casos; sendo a maneira genérica como esses casos são
2
Do latim cultura, cultivar o solo, cuidar. São as práticas e ações sociais que seguem um padrão determinado no
espaço. Refere-se a crenças, comportamentos, valores, instituições, regras morais que permeiam e identificam
uma sociedade. É a identidade própria de um grupo humano em um território e num determinado período.
19
abordados, demonstram que muitos alunos não conseguem acompanhar a concepção
particularizada que o professor tem de bom aluno.
A concepção de caráter homogêneo que o sistema escolar tem para com os alunos, ao
concebê-los como um grupo de pessoas indiferenciadas, segundo os autores, não deixa
margem para conhecer e acompanhar os alunos de forma personalizada e particularizada.
Uma vez que se percebe uma recusa, ou uma impossibilidade criada na escola, para
lidar com os fatores que prejudicam o avanço dos alunos na aquisição dos conteúdos
propostos, ou o desinteresse e as dificuldades fazem parte da reação dos alunos; a escola
posiciona-se de maneira que não há nada a ser feito, pois a qualidade do serviço oferecido não
está em discussão (MERCÊS e SAMPAIO, 2004).
Os autores citados determinantemente fazem uma crítica em relação ao discurso
irrepreensível e inquestionável que a escola procura apresentar; que, de acordo com Mercês e
Sampaio (2004) faz parte de um modelo de ensino-aprendizagem formulado para quase
ninguém se encaixar, desenvolvendo o seguinte questionamento: Como incluir todos em um
processo de ensino-aprendizagem eficiente e significativo, se neste só há espaço para o aluno
idealizado e abstrato?
“(...) É flagrante que se justifiquem altos índices de reprovação usando argumentos
soltos, desligados das condições de realização do currículo, que incluem alunos
reais. E ainda que sejam argumentos em torno de um modelo de excelência nas
questões de raciocínio, tão valorizadas no conjunto das escolas, não garantem um
trabalho efetivamente realizado nessa direção. Não garantem tampouco que os
aprovadores estejam incluídos num grupo que efetiva o modelo, uma vez que a
formação dos parâmetros não revela sua relação com o trabalho realizado com todos
os alunos, mas com razões para reprovar esse grupo numeroso” (MERCÊS e
SAMPAIO, p. 127, 2004).
A escola faz a não adaptação do aluno às suas normas e regras como justificativa para
o fracasso escolar. A excelência exigida pelos currículos desconsidera as particularidades,
características, ao almejar um aluno platônico, irreal.
O que se vê na escola segundo Mercês e Sampaio (2004) é uma perda de vínculos:
“entre ensino e aprendizado, entre conteúdos e realidade circundante, entre alunos e proposta
escolar” (p.138). Por essa razão, a falta de vínculos entre o aprendizado significativo na
prática e o conteúdo escolar, torna-se um fator contribuinte para o surgimento do fracasso
escolar, pelo fato do aluno não se identificar com o conteúdo lecionado, promovendo um
20
atendimento insatisfatório não só na relação ensino-aprendizagem, mas à comunidade escolar
como um todo.
O processo de aprendizagem nunca está por acabado, o conhecimento é múltiplo,
evolui e enriquece a partir de novas experiências, por isso a aprendizagem adquirida no
cotidiano do aluno, deve ser considerada e reconhecida como relevante para a formação do
mesmo, pois através das relações do conhecimento científico com cotidiano, o educando
passa a compreender melhor os fenômenos que os rodeia.
Na escola, o progresso e o enriquecimento da aprendizagem acontecem de forma
singular, de maneira que o aluno no decorrer de sua formação vivência experiências
significativas para a construção de seus conceitos e princípios. O aluno adquire através da
experiência escolar, o melhor do ambiente educativo, que assim como ele está em constante
ampliação e desenvolvimento.
No entanto, à medida que os alunos avançam nas séries escolares, o processo de
ensino-aprendizagem, mostra-se cada vez mais monótono, o lúdico perde seu espaço para o
conhecimento sistemático, e a sala de aula, cada vez mais se estabelece como um local pouco
prazeroso e autoritário. Os alunos em meio a essa realidade são considerados pelos
professores e pelo sistema escolar, como responsáveis pelo seu próprio “fracasso”, e pela falta
de interesse, no que diz respeito à escola e o ensino que ela tem a oferecer.
Alves e Pretto (2008) fazem uma reflexão crítica acerca desse contexto, quando se
referem a esses aspectos que fazem parte do cotidiano da escola, como sendo sintomas que na
verdade denunciam uma realidade explícita de que a escola passa por um processo de crise, e
nesse contexto, vem à tona a denúncia de um sistema onde sua estrutura necessita ser
repensada, isto é, é preciso repensar a escola como um todo, desde sua arquitetura ao
currículo (ALVES E PRETTO, 2008).
Segundo Caldas e Hubner (2001), à medida que os alunos crescem e avançam os anos
escolares, parece haver uma considerável perda de interesse, pois para o aluno, a relação com
a escola aos poucos deixa de ser interessante e prazerosa. Nessas condições, com os passar
dos anos, o desânimo por parte dos alunos toma proporções preocupantes, no que diz respeito
a se sentirem estimulados no decorrer de sua vida estudantil a explorar e construir novos
conhecimentos.
A falta de motivação e prazer do aluno em relação à escola, não ocorre de maneira
repentina, mas em longo prazo comprometendo o desenvolvimento da aprendizagem escolar.
De acordo com Caldas e Hubner (2001), a motivação está diretamente relacionada ao
21
ambiente, e isso traz a necessidade de prever e planejar situações antecedentes e conseqüentes
ao processo de aprendizagem em sala de aula.
A alegria em aprender, de acordo com Caldas e Hubner (2001), está associada à escola
pelos alunos das séries inicias, sendo a partir disso, compreendido que à medida que as
crianças crescem, a escola vai tendo menos desenvoltura em tornar o conhecimento agradável
e interessante. A ausência da alegria nas séries mais adiantadas pode estar relacionada à
concepção de que crescer envolve certa postura, de que trabalho só tem realmente seriedade
se for “sério”, sem riso ou humor.
Partindo das palavras de Oliveira (2005), para muitos professores, a dimensão afetivoemocional está intimamente relacionada ao sucesso ou fracasso escolar, que é frequentemente
utilizada para explicar o não aprender, interpretando como carência, as diferenças culturais e
problemas provindos de desigualdades socioeconômicas. Ao relacionar o fracasso escolar
com problemas afetivos, a sua origem é detectada pelo professor na vida familiar das crianças.
(OLIVEIRA, 2005)
Entre esses problemas afetivos, destacam-se:
“(...) Por um lado os maus-tratos em relação à criança, a rejeição e o desamparo por
parte dos pais e o desentendimento entre os pais e, por outro lado, por decorrência
dessa vida familiar precária, ressaltam a carência emocional, o medo, a
agressividade, auto-imagem negativa e a falta de motivação” (OLIVEIRA, 2005, p.
190).
Para Casali (2005), todo processo de conhecimento está vinculado às emoções,
sensações, disposições, expectativas, interesses do aluno, mas a escola não tem dado a essa
questão o valor proporcional da sua importância.
Tudo é conhecimento, seja ele adquirido dentro ou fora da sala de aula, porém nós
como educadores muitas vezes não consideramos essas aprendizagens relevantes para o
processo educacional do aluno, ficamos presos às “receitas prontas” do ensino tradicional, e
com isso “podamos” a possibilidade dos educandos de fazerem relações entre seu
conhecimento prévio e o conhecimento cientifico adquirido na escola.
O conhecimento só é adquirido e internalizado pelo aluno, quando faz sentido para o
mesmo e apresenta significância, ou seja, quando o conteúdo a ser ensinado é estruturado e
exposto de forma que o educando questiona sua teoria, expõe suas hipóteses e através da
22
experiência prática comprova por si mesmo a legalidade do conhecimento científico
apresentado a ele.
O ensino deve proporcionar ao aluno compreender o mundo que o rodeia, pois se
apresenta como instrumento norteador que o situa como indivíduo, cidadão, ser histórico, ao
descobrir através da educação o prazer de aprender, conhecer, descobrir o que está ao redor.
Segundo Casali (2005, p.308), “a escola se mostra insensível aos corpos vivos dos
estudantes que estão ali diante dela e dentro dela, todos os dias com suas emoções, vibrações
sofrimentos ansiedades, euforias agressividades, depressões, sexualidade”.
De acordo com Patto (1993) o fracasso escolar constitui-se por um processo psicosocial complexo. Segundo a autora, a explicação das dificuldades de aprendizagem escolar,
articula-se com duas vertentes: das ciências biológicas e da medicina do século XIX, vista
como organicista das aptidões humanas e carregada de racismo e elitismo; na qual repercutiu
na elaboração de um discurso sobre os problemas de aprendizagem escolar e da própria
política educacional.
De acordo com a autora, os primeiros especialistas que trabalharam nos casos de
dificuldade de aprendizagem escolar foram os médicos. O final do século XVIII e o século
XIX, segundo Patto (1993), foram de grande desenvolvimento das ciências médicas e
biológicas, especialmente na psiquiatria. Nesta época são datados rígidos diagnósticos com
classificações de anormalidade; assim, quando os problemas de ensino e aprendizagem
começaram a apresentar maior frequência, os alunos considerados anormais passaram a ser
encaminhados para pavilhões especiais, destinados para os “duros de cabeça”, ou idiotas,
anteriormente confundidos como loucos (PATTO, 1993).
Ainda segundo a autora, a criação dessa categoria, possibilitou a condução do conceito
de anormalidade dos hospitais para as escolas, isto é, os alunos que não conseguiam
acompanhar o ritmo de aprendizagem dos demais colegas, passavam a ser diagnosticados
como anormais, sendo a causa do seu fracasso procurada em alguma anormalidade orgânica.
Muitas vezes, a explicação do rendimento escolar desigual recebeu principal
contribuição dos instrumentos de avaliação das aptidões. De acordo com Patto, medir as
aptidões naturais, isto é, medir o rendimento decorrente de uma disposição natural, tornou-se
o grande desafio dos psicólogos na virada do século.
Inicialmente, o quadro de avaliações médicas, feito pelos clínicos da época, onde
apontava as características dos “anormais escolares” tornou-se durante os trinta primeiros
anos do século XX, segundo a autora, praticamente sinônimo de avaliação intelectual; “nessa
23
época, os testes de QI adquiriram um grande peso nas decisões dos educadores a respeito do
destino escolar de grandes contingentes de crianças” (PATTO, 1993 p.43).
No entanto, no início do século XX, a incorporação de alguns conceitos psicanalíticos
veio mudar a concepção decorrente das causas das dificuldades de aprendizagem. Com a
influência da psicologia educacional, de anormal, a criança que apresentava problemas de
aprendizagem escolar, passou a ser diagnosticada como criança problema (PATTO, 1993 p.
43).
Os diagnósticos precocemente deferidos geram a naturalização de deficiências e
déficits, ou seja, passa-se a introduzir no discurso escolar, que as causas das dificuldades em
aprendizagem e insucesso escolar, são de responsabilidade do aluno e sua família. Por sua
vez, a escola e os professores no intuito de se eximir da responsabilidade, se armam com
discursos recheados de termos técnicos e científicos para explicar o fracasso do aluno
(TDAH; DDA; dislexia; etc.), e como consequência geral, dentro do quadro escolar o
problema se torna crônico.
Amplia-se assim, a presença de possíveis problemas presentes no aluno, que
supostamente explicariam seu fracasso, “as causas agora, vão desde as físicas até as
emocionais e de personalidade, passando pelas intelectuais” (PATTO, 1993 p.45), sendo
herdado das décadas de vinte e trinta, a prática de submeter a um diagnóstico médico, as
crianças que não correspondessem às exigências da escola.
Segundo a autora, os mais prováveis destinatários desses diagnósticos foram as
crianças oriundas das classes trabalhadoras, que formaram o quadro de maior incidência do
fracasso escolar. Assim, para explicar o menor rendimento, a psicologia utilizou-se da cultura
para explicar as desigualdades sociais; passou-se assim, à afirmação da existência de culturas
inferiores ou diferentes, isto é, ambientes culturais e sociais atrasados responsáveis por
crianças desajustadas e problemáticas.
Harper et al (1986), também aborda essa questão ao dizer que, a sociedade reproduz
uma concepção de cultura na qual se é inculcado que a família com poucos recursos, tem sua
cultura e os meios de expressão pobres, diante disso, é encarado com certa naturalidade o fato
de não conseguirem acompanhar o ritmo da escola. Porém, essa alegação reforça o
preconceito de que existe um déficit cultural intrínseco a toda uma classe social
desprivilegiada, sendo, sua linguagem subjugada, aos alunos lhe são atribuídos incapacidade
de raciocínio, e à família ou até mesmo à própria criança, a responsabilidade pelo fracasso
escolar, sendo a escola e a sociedade isentos de qualquer encargo.
24
De acordo com Patto (1993), foi na convergência entre concepções racistas e
biológicas sobre o comportamento humano, desigualdades sociais e um ideário político
liberal, que foram geradas idéias que interferiram nos rumos da política, das pesquisas e das
práticas educacionais.
Segundo a autora, para entender o fracasso escolar, é preciso atentar para o fato de que
o mesmo contém contradições presentes no centro do discurso educacional; dessa maneira,
verificar como se manifestam nos dá elementos para desvendar não só a essência desse
discurso, como para encaminhar hipóteses a respeito de seu papel na política educacional.
“(...) Somente um ensino de boa qualidade - no qual um professor interessado
e bem formado maneje o conteúdo do ensino levando em conta as
especificidades do alunado, tanto no que se refere às características de sua
faixa etária quanto às suas experiências culturais – pode garantir a eficiência”
(PATTO 1993 p.121).
Segundo Charlot (2000), o fracasso escolar, constitui-se como realidade social, porém
não deve ser abordado como um objeto analisável, pois o fracasso escolar em si, de acordo
com o autor não existe, o que existe são situações de fracasso, histórias escolares que
terminam mal. Esses alunos, essas situações, histórias é que devem ser analisados
(CHARLOT, 2000).
Ainda segundo o autor, o fracasso escolar:
“(...) é uma diferença: entre alunos, entre currículos, entre estabelecimentos (...) O
aluno em situação de fracasso, ocupa no espaço escolar uma situação diferente da do
aluno em situação de êxito – sendo essas posições avaliadas em termos de notas,
indicadores de sucesso, anos de atraso, lugar em um sistema escolar hierarquizado
etc.” (CHARLOT, 2000, p.17).
O fracasso escolar além de ser analisado pelas situações entendidas como posição de
fracasso é justificado muitas vezes pela origem social, ao alegar que o aluno nessas condições
padece de deficiências socioculturais.
Porém, de acordo com Charlot (2000), é necessário ressaltar que, o fracasso escolar
pode sim ter “alguma coisa a ver” com as desigualdades sociais, mas esse não pode ser
colocado como fator determinante do fracasso, essa visão generalista deixa de considerar que
as causas para isso são múltiplas. Assim, crianças oriundas de famílias pobres e com baixo
capital cultural, muitas vezes, já são consideradas como futuras fracassadas. Deve-se lembrar
25
então que o desempenho escolar não depende, somente, das características familiares, sendo
que duas crianças pertencentes à mesma família, sendo os pais pertencentes a mesma posição
social, podem obter resultados escolares muito diferentes.
Portanto, além de analisar a posição dos pais do aluno, para a explicação do seu
sucesso ou do seu fracasso escolar, é importante compreender a singularidade de cada um,
sendo que os mesmos fatores podem influenciar de maneira diferente em cada criança.
De acordo com Angelucci et al (2004), é possível abordar o fracasso escolar através de
vertentes que compreendem tal realidade social das seguintes formas: como problema
essencialmente psíquico, como problema meramente técnico; como questão institucional;
como questão meramente política (ALGELLUCCI et al, 2004).
Na vertente que concebe o fracasso escolar como problema psíquico, parte do
princípio que o fracasso se deve a prejuízos da capacidade intelectual do aluno, decorrentes de
“problemas emocionais”; Culpabilizando o aluno e sua família.
“(...) Entende-se que a criança é portadora de uma organização psíquica imatura,
que resulta em ansiedade, dificuldade de atenção, dependência, agressividade, etc.,
que causam, por sua vez, problemas psicomotores e inibição intelectual que
prejudicam a aprendizagem escolar. Não se trata da tese tradicional de que as
crianças das classes populares têm rendimento intelectual baixo por carência
cultural, mas de afirmar uma inibição intelectual causada por dificuldades
emocionais adquiridas em relações familiares patologizantes” (ALGELUCCI et al,
2004).
Nessa perspectiva, de acordo com Angelucci (2004), os culpados pelo fracasso escolar
são o aluno por apresentar comportamentos entendidos pela escola como deficiências
cognitivas e emocionais e a família do mesmo, que é tida como a responsável por propiciar
vínculos sociais e emocionais desestruturados, influenciando nas atitudes do aluno e levandoo ao fracasso.
Outra vertente apontada por Angelucci et al (2004), se refere à perspectiva que
concebe o fracasso escolar como efeitos de técnicas de ensino inadequadas, ou da falta de
domínio da técnica correta pelo professor. Permanece presente nessa idéia:
“(...) o pressuposto de que as crianças das classes populares trazem para a escola
dificuldades de aprendizagem, mas o foco muda de lugar: não se localiza nos
problemas individuais dos alunos, mas na técnica de ensino do professor. Nesse
26
sentido, leva-se em conta a escola na produção dos reveses da aprendizagem, mas
reduzida a uma relação dual abstrata em uma escola abstrata, ou seja, desvinculadas
da sociedade que as inclui” (ANGELUCCI et al, 2004 p. 60).
Aqui a capacidade profissional é posta em dúvida, sendo revertida para o professor
toda a responsabilidade do insucesso escolar. É um erro afirmar que a não aprendizagem do
aluno ou as complicações em seu processo, deve-se única e exclusivamente à formação
técnica dos professores, considerando que as causas do fracasso escolar, não provêm de
individualidades, mas de diversos fatores, relacionados às políticas públicas, estrutura escolar
e currículo.
Ainda segundo Angelucci, diante da análise dos processos institucionais que levam à
produção do fracasso escolar, deve-se considerar a escola como uma instituição social, que
inserida em uma sociedade de classes regida pelo capital e interesses privatizantes, tem a
própria política pública entre os determinantes do fracasso escolar, pelo fato de tais políticas
assumirem reformas e projetos educacionais que sem continuidade fazem do fracasso escolar
um problema crônico.
Para que esse quadro seja revertido, é preciso que as políticas públicas assumam o
compromisso de construir uma escola pública capaz de distribuir com mais igualdade,
conhecimentos e habilidades que lhe cabem transmitir, assim como dar continuidade e
profundidade às propostas governamentais na área da educação, por meio da adequada
implementação de políticas educacionais “progressistas”, com especial ênfase na política de
centros de aprendizagens, garantindo assim, a realização do objetivo final das reformas e
projetos oficiais, que se constitui na reversão do fracasso escolar (ANGELUCCI et al, 2004).
Por fim, há uma vertente que enfatiza a dimensão política da escola, ao abordar o
fracasso escolar como questão política considerando a cultura escolar, cultura popular e
relações de poder. Segundo Angelucci et al (2004),
“(...) assim como as pesquisas que se debruçam sobre a lógica excludente da
educação escolar, analisadas no item anterior, aqui também se compreende a escola
como uma instituição social regida pela mesma lógica constitutiva da sociedade de
classes. O foco, entretanto, incide nas relações de poder estabelecidas no interior da
instituição escolar, mais especificamente na violência praticada pela escola ao
estruturar-se com base na cultura dominante e não reconhecer - e, portanto,
desvalorizar - a cultura popular” (ANGELUCCI et al, 2004 p. 62).
27
A escola é uma instituição social conduzida por uma lógica fundamentada na
concepção de uma sociedade dividida em classes, tendo presente em seu interior, relações de
poder estabelecidas na maneira que a escola é estruturada com base na cultura dominante em
detrimento e desvalorização da cultura popular. Sendo assim, a cultura escolar nessa
perspectiva de “seleção social”, contribui para o fracasso escolar ao conceber a idéia de que o
aluno provindo das classes menos favorecidas chega à escola como portador de carência
cultural.
Diante disso, podemos dizer que em nossa sociedade, se vê a necessidade de um
resgate da escola em todos os âmbitos e para isso, é fundamental propor um espaço reflexivo
sobre a eficiência e o papel da escola na educação, e como isso reflete na formação do aluno
como sujeito autônomo, crítico, atuante e transformador não só da realidade do seu meio
social, mas do mundo.
Para isso, a escola precisa romper com os mecanismos de seletividade, que ao julgar a
cultura das classes dominantes como superior, contribuem para o fracasso escolar dos alunos
das classes menos favorecidas, reconhecendo assim, que o fracasso não se deve tanto ao
método, mas ao fato dos conteúdos estarem desconexos e distantes do meio social, cultural,
isto é, da realidade do aluno concreto, real.
28
CAPÍTULO 3
APONTANDO RUMOS
No capítulo anterior, procurou-se problematizar o conceito de fracasso escolar,
questionando a noção de fracasso e oferecendo uma visão alternativa ao entendimento da
questão. No presente capítulo, buscaremos como o próprio título sugere apontar rumos, ao
discutir possibilidades de ação. Como objetivo norteador do capítulo, apresentaremos algumas
teorias e políticas públicas, no objetivo de apontar possíveis intervenções promissoras, como
também, relatar experiências bem sucedidas de ensino, no objetivo de desenvolver estratégias
para conciliar nossa realidade com o sonho de uma escola possível.
As condições em que o ser humano se desenvolve estão diretamente relacionadas ao
contexto histórico e cultural que está inserido. O homem nasce e se desenvolve em meio a um
ambiente histórico-cultural. Nessas condições, a construção do conhecimento desenvolve-se
através da interação do sujeito historicamente situado com o ambiente sócio-cultural onde
vive. A educação nessa perspectiva, durante o processo de ensino-aprendizagem deve tomar
como referência toda a experiência de vida do aluno. (MARQUES e OLIVEIRA, 2005)
Para Vygotsky (1991), o conhecimento constitui-se como linguagem na qual se
apresenta como principal instrumento mediador no processo educacional, explicitando
estreitas relações que ligam o pensamento humano à linguagem. Assim, à medida que os
significados das palavras são estabelecidos socialmente, essa construção permite troca e
comunicação da experiência individual e coletiva.
A abordagem Vygotskyana, entende cultura como parte integrante da natureza do
homem, sendo o conteúdo dessa experiência cultural-histórica, estruturado não somente nas
coisas materiais, mas, principalmente, nas formas verbais de comunicação produzidas entre os
homens. É através da linguagem que se dá a interiorização dos conteúdos, pois ela faz com
que a natureza social das pessoas se torne também sua natureza psicológica (MARQUES e
OLIVERA, 2005).
De acordo com Vygotsky (1991), “um conceito não é uma formação isolada,
fossilizada e imutável, mas sim uma parte ativa do processo intelectual, constantemente a
serviço da comunicação, do entendimento, e da solução de problemas” (VYGOTSKY, 1991
p.46).
29
O desenvolver da aprendizagem de um conceito, não ocorre em um único momento,
pelo contrário, sua construção baseia-se em interações e situações consideradas significativas
para o aluno.
De acordo com Vygotsky (1991), no processo de ensino-aprendizagem, a aquisição de
novos conceitos deve acontecer de maneira criativa e não mecanizada, pois segundo o autor, a
memorização de palavras não leva por si só à formação de conceitos; para que o processo se
inicie, é preciso que haja uma problemática que desafie o aluno a investigar e formular novos
conceitos no intuito de superar tal problema (VYGOTSKY, 1991).
De acordo com Gehlen, Auth e Auler (2008), partindo da significação conceitual com
base na teoria de Vygotsky, existe a importância de que dentro de um processo de ensinoaprendizagem haja a retomada de conceitos, para que dessa forma, o conteúdo se faça
significativo para os alunos e estes consigam expressar-se utilizando conceitos através da
capacidade de compreensão.
Nessa mesma linha de pensamento, Gehlen, Auth e Auler referem-se aos PCNs
(Parâmetros Curriculares Nacionais) como ponto de partida no processo de ensino e
aprendizagem; que consiste em valorizar os aspectos de domínio vivencial dos educandos, da
escola e de sua comunidade imediata. Nos parâmetros curriculares faz-se referência à
vivência, como o ponto de partida para a discussão de questões mais amplas, como problemas
ambientais, globais, econômicos ou continentais (GEHLEN, AUTH e AULER, 2008).
De acordo com Vygotsky (2006), o papel do professor consiste em fazer com que os
alunos diante de uma situação, desenvolvam não uma única maneira de pensar, abordar,
refletir, mas muitas maneiras particulares de pensar em campos, situações diferentes, pois o
conhecimento de acordo com Vygotsky, não é necessariamente o conjunto de um determinado
número de capacidades gerais, como observação, atenção, memória, etc., mas sim a soma de
muitas capacidades diferentes (VYGOTSKY, 2006).
Segundo Vygotsky (2006), no processo de aprendizagem, o que a criança é capaz de
fazer com o acompanhamento dos adultos, chama-se Zona de Desenvolvimento Potencial
(ZDP), sendo o que a criança no primeiro momento só faz com a ajuda dos adultos, ao
avançar do seu processo de maturação poderá realizar sozinha.
Nessa perspectiva, exercer a profissão de professor implica em assistir o aluno,
proporcionando-lhe apoio e recursos, de modo que ele seja capaz de chegar a um nível mais
elevado do que lhe seria possível sem ajuda. Não é, portanto, a instrução propriamente dita,
mas a assistência; o que permite ao aprendiz manifestar seu potencial de forma completa.
(FINO, 2001).
30
A escola tem por função educar para propiciar a realização de transformações em si
mesma e na sociedade. Diante do atual contexto social da educação, para que alcance seu
objetivo de formar um cidadão autônomo, competente e crítico, a formação educacional não
deve limitar-se a uma simples relação de ensino-aprendizagem, mas diante da aprendizagem
do aluno, procurar desenvolver todo um processo educativo desde a elaboração do currículo
até as práticas de cunho pedagógico em sala de aula.
Dessa maneira, de acordo com Marques e Oliveira (2005), a atividade a partir do
processo de ensino-aprendizagem, passa a ser concebida como conjunta, articulada e
determinada pela interação entre os envolvidos a partir do social.
A escola como âmbito de relações e aprendizagens multiculturais, deve ter por
princípio valorizar e reconhecer todas as culturas que se mostram presentes em seu espaço e o
aluno ao adentrar na instituição traz consigo sua história de vida. Isto inclui seus princípios,
crenças, aspirações, criação e bagagem cultural, ou seja, traz consigo todas as experiências e
vivências, resultando em aprendizagens que se apresentam úteis e significativas em seu meio
cultural e social.
Segundo Vygotsky (2006), o processo de aprendizagem da criança inicia-se muito
antes dela começar a freqüentar a escola; sendo suas experiências e vivências concebidas
como bagagem de cultura e conhecimento.
Diante dessa perspectiva, no processo de ensino-aprendizagem, mostra-se como
fundamental articular as atividades pedagógicas à realidade sociocultural dos alunos, ao trazer
para dentro da escola, o que o aluno considera significativo, para que diante disso seus
interesses sejam adaptados às atividades pedagógicas, e assim perante um processo de
aprendizagem coletiva, seja propiciada a construção de novos conhecimentos.
Isso se torna possível, à medida que tomamos por ponto inicial as vivências do aluno
dentro do contexto do seu desenvolvimento. Ao possibilitar que no desenvolver do processo
de ensino-aprendizagem, ele se sinta seguro para manifestar sua curiosidade, levantar suas
hipóteses e desenvolver sua criatividade, propiciando através dessa relação, a interação social
e a articulação entre diferentes áreas do conhecimento.
Nessa perspectiva, o professor pode contribuir, estabelecendo situações que valorizem
as habilidades que os alunos possuem, pois quando apresentarem dificuldades no processo de
aprendizagem, o professor poderá acreditar em sua capacidade, incentivando e auxiliando a
superar o problema.
Diante dessa construção de conhecimento, é fundamental que todo o contexto de
atividade escolar esteja voltado à articulação pedagógica, no objetivo de contribuir para uma
31
reflexão prática, crítica e transformadora, isto é, uma oportunidade para que o aluno reflita
sobre sua aprendizagem e a partir disso, possa fazer relações do conteúdo aprendido com sua
vivência, gerando assim, a construção de novos conhecimentos e reflexões, servindo também
para os professores como ferramenta pedagógica para futuros planejamentos.
Diante disso, a partir da vivência dos alunos, o professor tem a ferramenta para
desenvolver diferentes metodologias na explicação de um mesmo conteúdo, tomando por
instrumento de ensino a cultura produzida historicamente, as situações problematizadas, para
uma maior participação e engajamento no processo de aprendizagem, despertando através
dessa relação, o interesse do educando em adquirir novos conhecimentos, e consciência sobre
a realidade que vive, gerando através da sua ação, gerar a transformação.
Porém, algo peculiar da curiosidade e do desejo de aprender presentes no aluno parece
desaparecer das salas de aula, com o passar do tempo o encanto pela aprendizagem cede lugar
para a obrigação de ser aprovado. Diante deste contexto, o papel do educador se faz
imprescindível no planejamento de estratégias de ensino, que proporcione um ambiente
positivo e agradável para a aprendizagem, contribuindo assim, para a permanência do
interesse e motivação do aluno em relação ao ensino.
A autora Oliveira (2005), faz menção da zona de desenvolvimento proximal proposto
por Vygotsky (2006), na qual traz relevantes implicações para o trabalho do professor e
aponta procedimentos e estratégias, como:
“(...)*fazer junto com o aluno o que ele ainda não é capaz de fazer sozinho;
*funcionar como a sua memória quando ele, por exemplo, alfabetizando, ainda não é
capaz de se lembrar do som a que uma determinada letra corresponde;
*recuperar para a criança, passo a passo, o sentido do texto lido quando ela, ainda
muito presa ao trabalho de decodificação, tem dificuldade de relacionar o que é
decodificado com o seu sentido;
*indicar a ela quantas vezes forem necessárias e de formas variadas, o passos de um
determinado calculo matemático, enquanto ela não é capaz de segui-los sozinha;
*finalmente acreditar na criança, fazer para ela enquanto ela não sabe fazer; fazer
junto com ela, enquanto o seu domínio da atividade ainda é instável; aos poucos ir
criando as condições para que ela possa realizar a atividade de forma independente”
(OLIVEIRA, 2005, p. 198).
Ainda segundo Oliveira (2005), o trabalho com a zona de desenvolvimento proximal
não influencia somente a esfera cognitiva. Compreende também o universo afetivoemocional, na medida que possibilita que, na relação, a criança:
“(...)*seja olhada pelo outro, seja considerada por ele, seja foco de sua atenção;
* possa sentir-se segura ao ter alguém que oriente os seus passos;
32
* possa estar acompanhada no enfrentamento dos medos e ansiedades que podem
decorrer do não saber;
* possa experimentar a satisfação e o prazer da realização adequada da atividade –
ainda que, a principio, com ajuda;
* enfim, possa ocupar, ela também o lugar de quem sabe” (OLIVEIRA, 2005, p.
199).
.
De acordo com Fino (2001), o aprendiz deve ser capaz de identificar o conhecimento,
habilidades e valores que foram interiorizados, completando assim, a atividade de
identificação que começou através do processo de interiorização, que não apenas o
conhecimento e as habilidades cognitivas são interiorizados, mas também os valores
interiorizados que lhe estão associados, ficando o estudante habilitado a iniciar um novo ciclo
de aprendizagem a um nível cognitivo mais elevado. Ainda segundo o autor, todo processo
envolve a tomada de consciência do aprendiz sobre o próprio conhecimento, e pode ser
guiado pelo professor que confronta o aprendiz com as tarefas de reconhecimento
apropriadas.
Para que a escola se situe como um ambiente educacional contemporâneo e
participativo, a integração sociedade e escola se faz necessária. Nesse propósito, experiências
bem sucedidas na área educacional formam este quadro, exemplo disso está na proposta da
EFA – Escola Família Agrícola, que se apresenta por um programa formado pela associação
de famílias, pessoas e entidades que se unem para promover a formação integral e cidadã de
adolescentes, jovens e adultos, juntamente com o desenvolvimento sustentável e solidário por
meio da educação.
•
A EFA tem objetivo promover uma educação gratuita e de qualidade e
diferenciada, de ensino médio integrado à formação profissional técnico em
Agropecuária, e/ou outra área profissional.
•
Busca a promoção e o desenvolvimento sustentável, através da educação –
formação de jovens, valorizando o espírito de solidariedade, respeitando o
meio ambiente.
•
Tem por objetivo implementar uma formação global dos jovens, visando
integrar uma educação com valores humanos, ambientais, técnico-científicos e
artístico-culturais, visando garantir o futuro dos jovens com qualidade de vida.
A EFA tem por princípio, a formação integral do ser humano, onde o jovem educando
é colocado como sujeito de responsabilidades, comprometido com a participação social, os
33
valores da família e comunidade e é motivado e orientado a construir um Projeto Profissional
para gerar trabalho e renda.
A escola que sonhamos está no campo das experiências bem sucedidas; não sucedidas
no sentido de perfeitas, mas bem sucedidas na idéia de propostas educacionais pautadas no
objetivo de desestabilizar os ritos imutáveis da instituição escolar.
Exemplo disso é a instituição portuguesa Escola da Ponte. Caracterizada por ser um
espaço de peculiares características e partilhado por todos, a Escola da Ponte foge dos padrões
tradicionais da escola. Sem separação de turmas ou campainhas que anunciem o fim de uma
disciplina e o início da outra, sua proposta educacional não segue programas fechados ou
padronizados, pelo contrário, todos contribuem e constroem o currículo através do coletivo,
ajudando uns aos outros em um processo mútuo de aprendizagens.
A metodologia de ensino adotada pela Escola da Ponte, segundo Alves (2001),
caracteriza-se por um método onde os próprios estudantes são usados como recurso de
instrução, ou seja, os alunos “ensinam” uns aos outros promovendo ciclos de aprendizagens.
Esse compartilhamento de conhecimento mútuo propicia para o âmbito escolar, uma peculiar
troca de experiências, culturas e idéias, enriquecendo assim, as relações sociais entre os
alunos, e proporcionando uma reciprocidade maior de aprendizagens.
Na Escola da Ponte, de acordo com Alves (2001), não há classes separadas por séries,
ou professores específicos para cada matéria, ao invés disso, pequenos grupos são formados
com interesse em comum por um assunto, em seguida, reúnem-se com uma professora, e ela
estabelece juntamente com os alunos, um programa de trabalho de 15 dias, dando orientações
sobre o que pesquisar e os locais onde pesquisarem.
Assim, ao final de 15 dias, a professora e os alunos se reúnem novamente e avaliam o
que aprenderam. Se o conteúdo que aprenderam satisfez a necessidade do grupo, este se
dissolve, formando-se outro para estudar outro assunto. Todos se ajudam (ALVES, 2001).
De acordo com Alves, “a aprendizagem e o ensino são um empreendimento
comunitário, uma expressão de solidariedade. Mais que aprender saberes as crianças estão
aprendendo valores” (ALVES, 2001 p.43).
A relação ensino-aprendizagem, quando verdadeiramente eficaz, acontece de forma a
satisfazer a experiência que está acontecendo no presente, somente aquilo que é extremamente
importante é aprendido, ou seja, aquilo que é imprescindível no meio social do aluno, vital à
experiência de vida da criança. Diante dessa perspectiva, questionamentos são levantados: Por
que as crianças têm dificuldade de aprender na escola? Alves nos responde, “porque nas
escolas o ensinado não vai colado à vida” (p.48).
34
O conteúdo proposto pelo currículo é composto de programas fechados, prontos,
ordenadamente padronizados em si, que negligenciam a experiência vivenciada pela criança,
isto é, não reconhece o seu meio social como canal de construção de conhecimentos,
relevantes para o processo de aprendizagem. A criança deve apropriar-se do conhecimento
como algo útil para sua realidade cotidiana, descobrindo através da aprendizagem, sua
relevância e necessidade.
A proposta se baseia em gerar “uma escola em que o ponto de referência não seja o
programa oficial a ser cumprido (inutilmente!), mas o corpo da criança que vive, admira,
encanta-se, espanta-se, pergunta, enfia o dedo, prova com a boca, erra, machuca-se, brinca.
Uma escola que seja iluminada pelo brilho dos inícios” (ALVES, 2001 p.55).
A escola deve ser concebida como um ambiente educativo, cujo processo de ensino é
continuamente enriquecido pelas manifestações de diferentes culturas, vivências e
conhecimentos, tão presentes no ambiente escolar. Sendo assim, é preciso elaborar estratégias,
no intuito de criar um ambiente educativo, um espaço permissivo para que o aluno levante
suas hipóteses, exponha suas curiosidades e a partir das experiências adquiridas construa
conhecimentos.
Para que a escola seja eficaz em sua prática educacional, é preciso que se estabeleça
como uma unidade multicultural, onde as idéias, perspectivas, experiências de vida não só dos
alunos, mas como de toda comunidade escolar, sejam compartilhadas no intuito de melhorar a
qualidade da escola e ampliar as possibilidades de aquisição de diferentes saberes.
É preciso buscar, através de medidas educacionais conscientes, um ensino libertador,
que permita o aluno romper do ensino mecânico, conteudista, fazendo do insucesso, sucesso
escolar; ao procurar questionar e argumentar de forma crítica as causas que levaram a relação
ensino-aprendizagem a não atingir seu objetivo, e não apontar culpados, ao se tentar justificar
muitas vezes de maneira preconceituosa, superficial e simplista as causas do fracasso escolar.
A escola como um todo precisa passar por mudanças, desde sua estrutura até o
currículo, e para isso, é preciso abordar a educação a partir de uma perspectiva crítica e
desenvolver políticas educacionais eficazes e de continuidade.
Propostas do governo voltadas para a educação mostram que as políticas educacionais
sob o critério de continuidade, são medidas eficazes para o desenvolvimento promissor da
educação:
35
Alguns exemplos de Políticas Educacionais:
•
PROFA: Programa de Formação de Alfabetizadores.
O Programa de Formação de Professores Alfabetizadores (PROFA) constitui-se por
um projeto da política de formação continuada da Secretaria de Ensino Fundamental do MEC,
em decorrência da reforma do ensino implantada no Governo Fernando Henrique Cardoso. O
Programa consta de um curso voltado para o desenvolvimento de competências dos
professores alfabetizadores na formulação de objetivos, conteúdos e metodologias de
alfabetização, de acordo com a concepção construtivista de Emília Ferreiro, sob a
coordenação de Telma Weisz; na qual visa, particularmente, o aprimoramento dos processos
de ensino/aprendizagem da leitura e escrita dos alunos.
O PROFA apresenta-se por um programa voltado para uma melhor formação dos
professores alfabetizadores, visto que as primeiras séries do ensino fundamental apresentam
as maiores incidência de repetição e evasão escolar. Sendo assim, apresenta-se por extrema
importância, um corpo docente preparado para conduzir os alunos nessa e nas fases
posteriores do ensino.
•
Parâmetros Curriculares Nacionais.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais constituem um referencial de qualidade para a
educação no Ensino Fundamental em todo o País. Sua função é orientar e garantir a coerência
dos
investimentos
no sistema
educacional,
socializando discussões,
pesquisas e
recomendações, subsidiando a participação de técnicos e professores brasileiros,
principalmente daqueles que se encontram mais isolados, com menor contato com a produção
pedagógica atual.
Por sua natureza aberta, os PCNs, configuram uma proposta flexível, a ser
concretizada nas decisões regionais e locais sobre currículos e sobre programas de
transformação da realidade educacional empreendidos pelas autoridades governamentais,
pelas escolas e pelos professores. Não configuram, portanto, um modelo curricular
homogêneo e impositivo, que se sobreporia à competência político-executiva dos Estados e
Municípios, à diversidade sociocultural das diferentes regiões do país ou à autonomia de
professores e equipes pedagógicas.
Por ter esta face flexível, o documento em questão permite uma maior inclusão de
temas transversais, como meio ambiente sexo e cultura, possibilitando a relação do conteúdo
escolar com o contexto social e cultural que o aluno vive, permitindo assim, uma maior
identificação com o ensino.
36
A educação é um direito fundamental, universal e é dever do Estado programar
políticas públicas que são as ferramentas para que se torne capaz de garantir sua qualidade
social, bem como o acesso e permanência de todos; construir espaços de participação direta,
indireta e representativa, nos quais a sociedade civil possa atuar efetivamente na definição,
gestão, execução e avaliação dessas políticas públicas educacionais.
É claro que como em toda proposta educacional, há a possibilidade de possíveis
falhas, no entanto, estamos considerando aqui sua concepção de educação transformadora da
realidade; isto é, o conceito de que a escola é o reflexo da vida e o aluno, seu protagonista.
37
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar da metodologia pedagógica presente nas escolas, a articulação entre as
atividades escolares e a realidade sociocultural do aluno muitas vezes é negligenciada. O
motivo dessa realidade está relacionado ao fato de que a escola em sua concepção de ensino,
não apresenta vínculos com a vida.
Ao longo do trabalho, várias perspectivas, concepções e abordagens foram feitas a
respeito do fracasso escolar e suas implicações.
Vimos que a falta de identificação do aluno para com a escola repercute de várias
maneiras em sua aprendizagem, entre elas, a falta de vinculo entre o currículo e a experiência
prática, onde o aluno não constrói ou elabora o conhecimento, mas o absorve de forma
mecânica.
Na sala de aula, a relação de ensino-aprendizagem, apresenta-se como uma via de mão
única, em que o professor é visto como o portador do conhecimento e o aluno como um
eterno aprendiz. Segundo Freire (2005), essa relação autoritária deve ser superada dando lugar
a uma nova concepção de aprendizagem, onde o professor não apenas educa, mas aprende e o
aluno não só aprende, mas também educa.
Para que a aprendizagem se desenvolva de maneira significativa, vimos a importância
fundamental que existe no fato do professor tomar as experiências do aluno, sua bagagem
cultural como ponto de partida no processo de ensino-aprendizagem.
Retomando as palavras de Rubem Alves (2001), no processo de ensino-aprendizagem,
o aluno aprende aquilo que é vital para sua vida, isto é, o necessário para seu desenvolvimento
social, cultural e intelectual, no entanto, tal processo de internalização, só acontece de forma
significativa quando a vida escolar e quotidiana do aluno é articulada entre si, de modo que o
conhecimento passa a ser algo não apenas transmitido, mas construído através das interações
vividas no meio social.
A ideologia da escola deve ser concebida, na idéia de construção de um saber que
satisfaça as necessidades do viver cotidiano do aluno, ou seja, o que ele aprende e sabe faz
sentido em seu contexto social; mas para isso, é preciso uma escola que busque através do seu
programa curricular, desenvolver aprendizagens a partir da raiz do saber, ou seja, utilizar do
questionamento crítico para construir o conhecimento a partir dos fatores que induziram a
criação ou a realização de um determinado, objeto, fenômeno ou acontecimento histórico.
Os programas escolares pelo quais os alunos são submetidos, muitas vezes são
conteúdos dissociados da realidade do aluno, diante disso são logo esquecidos, não por
38
negligencia, mas por não encontrar sentido naquele aprendizado, o mesmo cai no
esquecimento.
O espaço da escola deve ser caracterizado como um ambiente lúdico, onde o saber
nasce das experiências, do contado com o conhecimento a partir da vida. No entanto, temos
plena consciência que isso é um processo educacional a longo prazo, estruturas precisam ser
mexidas e conceitos revistos; contudo, pouco a pouco as coisas se movem, evoluem, se
transformam.
A escola de hoje, apesar de seus defeitos e precariedades, não é a mesma de dez anos
atrás. Ela não está estática nem é imutável, pelo contrário, as transformações que a escola
passa, são continuamente impulsionadas por conflitos, esperanças e tentativas alternativas de
se melhorar o ensino.
Ao longo desse trabalho, vimos os diferentes pontos de vista acerca do fracasso
escolar, e as visões atreladas a essas perspectivas, buscamos também, apontar uma visão
alternativa sobre a questão, apontando possíveis soluções e experiências bem sucedidas, que
resultaram na realização de um sonho escolar que só era possível no mundo das idéias.
Há muito ainda para se trilhar e conquistar, mas o imprescindível e fundamental já
começou a ser feito, a consciência de que precisamos de mudança, a visão crítica e
responsável frente ao que se é possível ser feito, e acima de tudo, o desejo e a ação de fazer e
refazer diferente.
Ao longo da reflexão presente neste trabalho, pudemos compreender que o fracasso
escolar não é consequência de uma causa isolada, mas de diversos fatores que, associados a
uma sociedade centralizada e hierarquizada, fazem da escola e seu sistema educacional, mais
uma peça de um complexo mecanismo.
O objetivo não é apontar culpados, mas sim analisar a questão de forma crítica, ao
refletir que toda sociedade é co-responsável pela aprendizagem e desenvolvimento de suas
novas gerações, e que para isso, estruturas educacionais e eficientes precisam ser elaboradas,
com o objetivo de trazer para o sistema escolar, e consequentimente para o processo de
ensino-aprendizagem, inovação e autonomia.
Nosso intuito de abordar criticamente os conceitos aqui relatados foram de ampliar a
reflexão e educar o nosso olhar perante a realidade do fracasso escolar. Reconhecemos que
por se tratar de um assunto de grande amplitude e discussão social, merece ser aprofundado e
questionado, por isso, deixamos nossa pequena contribuição, no propósito de inspirar futuros
trabalhos nessa linha de pesquisa.
39
Diante das múltiplas perspectivas que podem contemplar esse tema, deixamos como
sugestão de análise, o aprofundamento do conceito de fracasso escolar, no ponto de vista das
relações sociais.
Por exemplo, o que a escola, mais precisamente a aprendizagem desenvolvida dentro
da sala de aula, precisa adquirir para fazer do fracasso, sucesso escolar? Como conquistar,
cativar o aluno, da maneira como o âmbito escolar fora da sala de aula o faz? É sobre esses
questionamentos que devemos refletir, ou seja, o que falta ser feito no objetivo de levar para
dentro da sala de aula, a criatividade, a disposição e a sagacidade tão presentes no pátio na
hora do recreio.
Esperamos com o desenvolver dessa pesquisa, que novas aprendizagens e reflexões
sejam concebidas, no intuito de contribuir para a prática docente, a construção de um novo
olhar sobre o fracasso escolar.
40
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http://biblioteca.universia.net/html_bura/ficha/params/id/29495066.html
EFA – Escola Família Agrícola
http://www.efabontempo.org.br/historico.htm
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Diretório:
Modelo:
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s\Normal.dotm
Título:
A escola não é algo acabado, estático, mas sim um
movimento constante de idéias, conflitos, culturas, transformações e relações
sociais que se interagem e modificam dia a dia
Assunto:
Autor:
Eder
Palavras-chave:
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15/12/2009 13:04:00
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