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Cruz Azul
Uma publicação da Cruz Azul no Brasil
Comunidades
Terapêuticas:
O desafio de ser eficaz ...
Pg 05
Prevenção
às Substâncias
Psicoativas
Pg 13
Aprendizagem
Mediada no Tratamento
de Dependentes Químicos ...
Pg 19
A Escuta
Que Humaniza
Pg 19
ANO IV - 2014
Nº 13
Uma publicação da Cruz Azul no Brasil
Sumário
Ano: 2º Semestre 2014
02
03 04
05
13
19
29
33
O que é Cruz Azul no Brasil
Editorial
Normas
Gerais
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS:
O Desafio de Ser Eficaz
no Tratamento de Dependentes Químicos
PREVENÇÃO ÀS SUBSTÂNCIAS
PSICOATIVAS A PARTIR DA
VISÃO INTEGRAL DO SER HUMANO
APRENDIZAGEM MEDIADA
NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES
QUÍMICOS EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
A ESCUTA QUE HUMANIZA
3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS
E AFINS
O que é Cruz Azul no Brasil
Filiada à IFBC, a Cruz Azul no Brasil (CAB) foi fundada em 23 de junho de 1995.
É um trabalho diacônico, cujo serviço é de assistência social e destina-se a todos quantos
necessitarem, sem distinção de cor, raça, sexo, nacionalidade, estado civil, profissão, credo religioso ou
político.
Objetiva: (a) filiação de Comunidades Terapêuticas (CTs) e/ou outras Entidades do terceiro setor que
exerçam atividades de aconselhamento, tratamento psicossocial, ambulatorial, médico ou de enfermagem,
tratamento em regime de internação (residencial), reabilitação e/ou reinserção social; (b) fornece orientações
e formação aos colaboradores e voluntários das CTs e entidades, através de suas publicações e cursos de
aperfeiçoamento, atualização e qualificação em dependência química, realizados por pessoal especializado;
(c) formação e filiação de Grupos de Mútua-Ajuda que ofereçam espaço para que pessoas dependentes do
álcool e de outras drogas, seus familiares e amigos, encontrem oportunidade para o diálogo franco, a troca de
experiências e a integração entre os pares; (d) desenvolve ações de Prevenção baseadas na mediação de
conhecimentos pertinentes a promoção da vida.
Missão:
Promover a vida sem drogas, visando à saúde física, psicológica e espiritual para o bem estar
individual, familiar e social, sendo um movimento de inclusão, mútua-ajuda e abstinência, mediante ações de
prevenção, tratamento, reinserção social, apoio e educação continuada, fundamentado no poder salvífico e
transformador de Jesus Cristo e acreditando na capacidade de mudança do ser humano.
Visão:
Ser referência em rede de grupos de apoio, de tratamento em comunidade terapêutica, prevenção,
capacitação, conhecimento, atuação em políticas públicas na área de substâncias psicoativas e movimento de
inclusão, mútua-ajuda e de abstinência, conhecido e reconhecido por sua visão de ser humano integral no sul e
sudeste do Brasil até o ano de 2012 e nacionalmente até 2015.
Valores:
 Crença no poder salvífico e transformador de Jesus Cristo e na capacidade de mudança do ser humano.
 Abstinência como sinal de apreço e solidariedade, instrumento efetivo de prevenção e qualidade de
vida, e condição de tratamento.
 Movimento em rede de inclusão e mútua-ajuda.
 Educação Continuada
 Ética e transparência.
Proposta:
Promover uma vida sem drogas, visando à saúde física, psicológica e espiritual do ser humano para o
bem-estar individual, familiar e social.
Nome da Entidade: CRUZ AZUL NO BRASIL
CNPJ: 01.127.311/0001-89
Inscrição Estadual: 253.819.482
Personalidade Jurídica e Duração: Associação sem fins lucrativos, constituída por tempo indeterminado.
Sede e Endereço da Secretaria Executiva: Rua São Paulo, n. 3424, Bairro Itoupava Seca, Blumenau, Santa
Catarina, CEP 89.030-000.
Caixa Postal: 5033
CEP: 89.030-970
Telefone/fax: +55 47 3337-4200
Site: www.cruzazul.org.br
E-mail: [email protected]
02
Editorial
“A hibernação é um estado letárgico pelo qual muitos animais homeotérmicos, em grande maioria de
pequeno porte, passam durante o inverno, principalmente em regiões temperadas e árticas. Os animais
mergulham num estado de sonolência e inatividade em que as funções vitais do organismo são reduzidas ao
absolutamente necessário à sobrevivência.
A respiração quase cessa, o número de batimentos cardíacos diminui, o metabolismo, ou seja, todo o
conjunto de processos bioquímicos que ocorrem no organismo, restringe-se ao mínimo. Pode-se dizer que
qualquer animal que permanece inativo durante muitas semanas, com temperatura corporal inferior à normal,
está em hibernação, embora as mudanças fisiológicas que acontecem durante o letargo sejam muito
diferentes, de acordo com as diferentes espécies.
As plantas desenvolveram um sistema semelhante, mas, que não é classificado como hibernação,
estivação ou torpor. Por exemplo: as plantas decíduas vivem em locais frios. Elas perdem as folhas como uma
estratégia de sobrevivência nos invernos rigorosos de regiões muito frias. O objetivo desta perda não é a
conservação de calor, mas sim da umidade”.
Enfim, para saber mais sobre o processo de hibernação há muita informação na internet... fique à
vontade....!
O texto (do site Wikipédia) serve como ilustração para explicar aos leitores da revista da Cruz Azul no
Brasil "Comunidade Terapêutica & Dependência Química em Pauta", o motivo de não termos publicado
regularmente a revista. O último número publicado foi em dezembro de 2011.
Após esse longo tempo "adormecidos/hibernando" voltamos a editá-la com toda força e energia, para ser um
instrumento de divulgação/pesquisa de conhecimento científico nas áreas da dependência química,
comunidade terapêutica e grupos de apoio mútua ajuda.
Depois de publicarmos periodicamente desde 2004, na forma impressa (doze edições da revista),
tamanho 14x21 cm, diante dos novos tempos de internet e outras mídias sociais, a Comissão Editorial da
revista (em consonância com a diretoria da Cruz Azul), aprovou grandes mudanças e um novo projeto
editorial para a mesma. Assim, apresentamos a nova versão da revista "Comunidade Terapêutica e
Dependência em Pauta". Ela cresceu em tamanho, para o formato A-4. No momento terá apenas edições em
PDF e virtuais, disponíveis no site da Cruz Azul. Suas páginas - com uma nova e moderna diagramação - serão
coloridas quando impressa. Objetivando personificar e identificar institucionalmente a Entidade, ela recebeu
também um novo nome: "Cruz Azul", em destaque e abaixo como subtítulo: "Prevenir, Capacitar, Reabilitar e
Apoiar!".
Para este primeiro número em nova versão, preparamos os seguintes artigos:
a) Aprendizagem mediada no tratamento de dependentes químicos em comunidades terapêuticas;
b) Comunidades terapêuticas: O desafio de ser eficaz no tratamento de dependentes químicos;
c) Prevenção às substâncias psicoativas a partir da visão integral do ser humano;
d) A escuta que humaniza.
e) A Carta de "Blumenau"! Documento do III Fórum Sul Brasileiro de Comunidades Terapêuticas e Afins
realizado em 2012.
Tenha uma excelente leitura!
Cruz Azul no Brasil
Luis Carlos Ávila
Editor
03
Normas Gerais
São de interesse de publicação desta Revista:
a) Artigos técnicos e científicos originais sobre dependência química em substâncias psicoativas e, em
especial, sobre o trabalho das Comunidades Terapêuticas;
b) Partes ou resumos de monografias, palestras e trabalhos acadêmicos que versem sobre a linha editorial e
conteúdo da Revista;
c) Relatos de pesquisas ou experiências profissionais;
d) Informes científicos, cursos, eventos, ações de ONG´s que atuam na área da dependência química, em
especial com Comunidades Terapêuticas;
e) Resenhas críticas de livros científicos sobre dependência química.
Questões técnicas e de redação:
1. ENCAMINHAMENTO: O autor encaminha seu texto revisado e corrigido, via e-mail, ou postal (em CD,
com cópia em papel) para a Secretaria Geral da Cruz Azul, conforme o endereço mencionado no Expediente,
dois meses antes da edição pretendida. Através de carta expressará sua disposição em ceder os direitos
autorais de publicação do artigo gratuitamente para a Cruz Azul no Brasil. Nestas condições, os trabalhos
serão aceitos para apreciação do Conselho Editorial, na expectativa de que sejam trabalhos inéditos e não
encaminhados a outros periódicos.
- Obs.: Os originais, mesmo quando não aprovados para publicação imediata, permanecerão de posse da
Revista para possível aproveitamento em edições futuras, ou para qualquer outra forma de divulgação,
condicionada à expressa autorização do autor.
2. A CRUZ AZUL: reserva-se o direito de não publicar artigos enviados para publicação.
3. APRESENTAÇÃO E EXTENSÃO: Os trabalhos devem ser redigidos em folhas de papel tamanho A4,
numa única face e em espaço duplo. Os artigos devem ter no máximo sete páginas, incluindo as referências
bibliográficas. O arquivo deverá estar editado em Word for Windows, fonte Times New Roman ou Ariel,
tamanho 12, e tamanho 10 para notas.
Preferencialmente, os artigos devem estar em língua portuguesa e possuírem no início um pequeno resumo
do trabalho apresentado e principais palavras-chave. (Alguns tipos de colaborações dispensam resumo). O
autor deverá deixar seu endereço de contato para receber comentários da parte dos leitores.
Pequenas alterações no texto, que não alterem seu conteúdo ou apresentação, poderão ser feitas pela
Comissão Editorial, de acordo com critérios e normas operacionais da revista.
4. ILUSTRAÇÕES, FOTOGRAFIAS, FIGURAS e TABELAS: Somente deverão ser incluídas no corpo
do trabalho se forem essenciais à compreensão do texto. Devem ser enumeradas com algarismos arábicos na
ordem em que serão inseridas no texto e apresentados em folhas separadas no final do artigo. O texto indicará
o lugar aproximado de inserção de cada elemento.
5.ANEXOS ouAPÊNDICES: Somente devem ser incluídos quando forem imprescindíveis à compreensão do texto.
6. CITAÇÕES: Os autores devem evitar citações muito grandes extraídas de publicações de outros autores.
Recomenda-se evitar a reprodução de tabelas, quadros ou desenhos. Quando isso acontecer, estes devem vir
acompanhados de permissão dos autores originais ou, no mínimo, a citação da fonte original de onde foi
extraída.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: Todos os artigos devem ter referências bibliográficas
relacionadas em ordem alfabética no final e dentro das normas da NBR 6023 da ABNT.
8. DIREITO DE RESPOSTA: Comentários de artigos ou réplica estão sujeitos à mesma regra de publicação
e podem aparecer na mesma edição ou em número subsequente.
9. RESPONSABILIDADE IDEOLÓGICA: Os artigos, cujos autores são identificados, representam o
ponto de vista destes e não a posição oficial da Revista ou da Cruz Azul no Brasil.
10. PERMUTA: A Cruz Azul no Brasil interessa-se em estabelecer permuta de sua publicação com outras
revistas congêneres nacionais ou estrangeiras.
Cruz Azul no Brasil
Comissão Editorial
04
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS:
O Desafio de Ser Eficaz
no Tratamento de Dependentes Químicos
Foto
Roseli Aparecida Consolaro Nabozny
Coordenadora Técnica Administrativa da Comunidade Terapêutica
Essência de Vida de Joinville/SC. Especialista em Dependência
Química – UNIFESP. Graduanda em Serviço Social.
autoajuda para uma modalidade de
atenção humana integral.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem o objetivo de
apresentar as Comunidades Terapêuticas
como um modelo eficaz no tratamento de
dependentes químicos, através da revisão
literária dos modelos de intervenções que
deram origem as Comunidades Terapêuticas,
objetivando notar as mudanças que
assinalam a evolução de uma abordagem de
05
Aponta algumas características,
elegidas como essenciais, que devem ser
primeiramente conhecidas e/ou melhor,
entendidas, visando ampliar as possibilidades
de aumentar os índices de adesão do paciente
ao tratamento e consequentemente chegar a
uma maior eficácia da proposta terapêutica.
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS: O Desafio de Ser Eficaz no Tratamento de Dependentes Químicos
Considera fundamental o
cumprimento das exigências legais
contidas na RDC nº 101 e demais
orientações práticas inerentes a esta
modalidade de tratamento.
Evidencia a necessidade de se
criar e manter o planejamento das
atividades e a avaliação sistemática e
contínua dos resultados obtidos, como
uma das formas de mensurar a efetividade
no desempenho individual do dependente
químico em tratamento e aumentar a
eficácia dos serviços prestados pelas
comunidades terapêuticas.
1. COMUNIDADES TERAPÊUTICAS:
CONCEITUAÇÃO
Em sua forma contemporânea, a
CT de tratamento da dependência química
desenvolveu-se a partir de movimentos
registrados na Inglaterra e nos EUA como
Synanon (1958) e Day top Village (1963)
que se disseminaram com rapidez dos anos
sessenta em diante. Embora seja possível
identificar alguns elementos essenciais no
AA e no movimento Oxford, que é anterior.
Todos apresentavam uma clara motivação
ética e espiritual e até hoje, influenciam
consideravelmente as Comunidades
Terapêuticas em todo o mundo.
De acordo com De Leon (2003, p.
17) as CTs norte-americanas da primeira
geração foram literalmente implantadas ou
projetadas por membros de algum programa,
transmitindo diretamente elementos comuns
em termos de filosofia, de organização social
e de prática de programas originais para as
modernas CTs. Mas as fontes diretas de
muitos dos elementos essenciais são atribuíveis
a três notáveis precursores: o grupo de Oxford, a
AssociaçãoAlcoólicosAnônimos e a Synanon.
A seguir vejamos um breve relato das
contribuições de cada um deles.
1.1
Modelos que deram origem as
Comunidades Terapêuticas
06
O grupo de Oxford, segundo De
Leon (2003, p. 18), parte das idéias e
práticas comumente sustentadas que
incluía a ética do trabalho, o cuidado
mútuo, a orientação partilhada e os valores
evangélicos da honestidade, da pureza, do
altruísmo e do amor, o autoexame, o
reconhecimento dos defeitos de caráter, a
reparação por danos causados e o trabalho
conjunto.
Se notarmos, persiste ainda hoje a
influência do movimento Oxford sobre as
pessoas em recuperação por meio de uma
iniciativa de acolhimento, praticada
principalmente pelos membros de grupos
de AA.
O modelo de tratamento indicado
pelos Alcoólicos Anônimos (AA) surgiu em
1935, por dois alcoólicos em recuperação,
Bill Wilson, corretor de Nova York, e o
doutor Bob Smith, médico em Akron, que
tinha como base a ajuda mútua.
Segundo De Leon (2003, p. 19), dos
princípios dosAAoriginários do grupo Oxford
está à noção de confessar-se aos outros, de
reparar males feitos e a convicção de que a
mudança individual envolve a conversão à
crença do grupo. Mas se contrapõe a
orientação de Oxford com respeito a um
deus religioso como fonte espiritual do
poder superior. A essência do AA é o
modelo espiritual.
Com o passar dos anos, se tornou o
maior grupo de autoajuda do mundo e
chegou às clínicas de tratamento numa
versão institucional do AA, que ficou
conhecida como Modelo de Minnesota. Na
fase residencial o programa é aplicado por
uma equipe composta principalmente de
alcoolistas em recuperação ou dependentes
químicos que tenham passado pelos 12
passos e se mantiveram abstinentes. Após
esta fase, o alcoolista recebe apoio dos
grupos de autoajuda do AA. Nenhum
outro modelo de tratamento de alcoolismo
pode orgulhar-se de possuir uma rede
internacional de grupos de apoio nesta
escala. Esse modelo também está presente
Roseli Aparecida Consolaro Nabozny
em grande parte das comunidades
terapêuticas em todo o mundo, e no Brasil.
(Edwards, 2005, p. 251)
O Modelo Synanon surgiu em
1958 da iniciativa de um pequeno grupo
de alcoolistas em recuperação, liderado
por Charles Dederich, que decidiram
viver juntos, além de ficar em abstinência
e buscar um estilo alternativo de vida. O
método Synanon está fundamentado no
modelo de ajuda mútua do AA, porém
difere em pontos fundamentais: enquanto
os AA praticam a entrega e a confiança em
um poder superior, o Synanon acredita na
autoconfiança como preceito essencial.
Das principais características do
Modelo Synanon que influencia o
funcionamento das CTs, estão os aspectos
relativos ao ambiente residencial do
programa, à sua estrutura organizacional,
ao perfil dos participantes, bem como às
suas metas, à sua filosofia e à sua orientação
ideológica (De Leon, 2003, p.20). Cabe
ainda citar o aconselhamento confrontativo,
comumente chamado de “confronto” e o
trabalho, que eram pilares do Modelo
Synanon.
Este tipo de modelo terapêutico se
consolidou e deu origem a outras CTs que,
conservando os conceitos básicos,
aperfeiçoaram o Modelo Synanon. E o
exemplo mais significativo desse tipo de
abordagem foi a Comunidade Terapêutica
Day top Village, fundada em 1963.
(Fracasso, 2001, p. 273)
Finalizo com a contribuição de
Maxwell Jones (1953), psiquiatra
escocês, que provocou uma revolução no
campo psiquiátrico: a experiência de
comunidade terapêutica para distúrbios
mentais. Os fundamentos da proposta de
Maxwell Jones estão na idéia da
democratização do atendimento que era
feito nos hospitais psiquiátricos, a
diminuição da distância entre a direção e a
equipe de tratamento e os internos, as
assembléias reunindo todos os
participantes da comunidade.
A partir da definição de CT de
Maxwell Jones: “[...] grupo de pessoas que
se unem com um objetivo comum e que
possui uma forte motivação para provocar
mudanças”, entendemos que há uma
mudança no modo de ser comum dos
pacientes que, em colaboração com a
equipe tornam-se participantes ativos em
sua própria recuperação, na de outros e,
das atividades gerais da comunidade. Este
modelo de tratamento reconhece e
promove a capacidade terapêutica do
ambiente e dos próprios pacientes,
estabelecendo um relacionamento
democrático e socializador.
As gerações subseqüentes de CTs
conservaram muito dos aspectos de seus
predecessores e ainda sofreram várias
influências intervenientes que levaram a
profundas diferenças de organização, de
filosofia e de práticas. Essas mudanças
assinalam a evolução de uma abordagem
de autoajuda mística e alternativa para
uma modalidade de atenção humana
integral.
No Brasil as CTs foram introduzidas
pela Igreja Católica através de Padre Harold
J. Hahm, na cidade de Campinas, São
Paulo a partir do ano de 1977. Cresceram
desordenadamente sob a tutela de diversos
interesses e segmentos da sociedade,
principalmente de origem religiosa e com
isto perderam e/ou modificaram muito dos
elementos essenciais da abordagem das
CTs. Até que em 30 de maio de 2001 a
ANVISA estabeleceu o Regulamento
Técnico para o Funcionamento de
Comunidades Terapêuticas por meio da
RDC 101 criada pela SENAD em
conjunto com a FEBRACT.
Mesmo com a implantação da
RDC 101/2001, atualmente substituída
pela RDC 29/2011, específica para as CTs
e outras políticas públicas de saúde
voltadas para o consumo abusivo de
álcool e outras drogas, a diversidade na
interpretação dos conceitos, a falta de
conhecimento teórico e técnico de
07
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS: O Desafio de Ser Eficaz no Tratamento de Dependentes Químicos
profissionais que atuam na área, os interesses
particulares de pessoas leigas “de boa
vontade”, a falta de fiscalização dos órgãos
competentes, continuam contribuindo para
que as Comunidades Terapêuticas não sejam
reconhecidas pelos serviços prestados,
principalmente pelo Poder Público.
2. O QUE TORNA O MODELO DE
COMUNIDADE TERAPEUTICA
EFICAZ NO TRATAMENTO DE
DEPENDENTES QUÍMICOS?
Apesar de ser um ambiente de
tratamento bastante difundido no Brasil
ainda há muito que se fazer para que as
Comunidades Terapêuticas disponibilizem
e mantenham um serviço eficaz e que atenda
as exigências mínimas estabelecidas para o
funcionamento dos serviços de atenção a
pessoas com problemas decorrentes do uso
ou abuso de substâncias psicoativas,
segundo o modelo psicossocial. Cabe aqui
destacar uma das melhores definição de
Comunidade Terapêutica citada na RDC
nº 101- ANVISA de 30 de maio de 2001:
“Serviços de atenção a pessoas com
transtornos decorrentes do uso ou abuso de
substâncias psicoativas (SPA), em regime
de residência ou outros vínculos de um ou
dois turnos, segundo modelo psicossocial,
são unidades que têm por função a oferta de
um ambiente protegido, técnica e
eticamente orientados, que forneça suporte
e tratamento aos usuários abusivos e/ou
dependentes de substâncias psicoativas,
durante período estabelecido de acordo
com programa terapêutico adaptado às
necessidades de cada caso. É um lugar cujo
principal instrumento terapêutico é a
convivência entre os pares. Oferece uma
rede de ajuda no processo de recuperação
das pessoas, resgatando a cidadania,
buscando encontrar novas possibilidades
de reabilitação física e psicológica, e de
reinserção social. Tais serviços, urbanos ou
rurais, são também conhecidos como
Comunidades Terapêuticas”.
Segundo Fracasso (2001, p.279) “O
programa terapêutico-educativo
desenvolvido no período de tratamento na
Comunidade Terapêutica tem como objetivo
ajudar o dependente químico a se tornar uma
08
pessoa livre através da mudança do seu
estilo de vida”. A partir desses conceitos
quero destacar dentre muitas outras,
características a serem conhecidas e/ou
melhor, entendidas, com o objetivo de
ampliar as possibilidades de aumentar os
índices de adesão do paciente ao tratamento
e conseqüentemente chegar a uma maior
eficácia da proposta terapêutica
2.1 Diversidade e abrangência – nenhuma
abordagem terapêutica é eficaz
para
todas as pessoas
Segundo NIDA - 1º princípio:
“Não há tratamento único, que seja
apropriado para todos”. É fundamental
olharmos para o indivíduo como um ser
único, com necessidades singulares. Hoje
a dependência é tratada como um processo
complexo, multifatorial e não há mais
como considerar o dependente químico
com características e necessidades
terapêuticas semelhantes. É importante
usar diferentes estratégias terapêuticas
como instrumentos, que podem ser
combinados entre si, para tratar um
paciente, ou um determinado grupo de
pacientes.
Na Comunidade Terapêutica é
imprescindível atender a critérios mínimos de
elegibilidade evitando as pessoas que
apresentarem grau de comprometimento
grave no âmbito orgânico e/ou psicológico
para tratamentos nestes serviços, devendo
ser encaminhadas a outras modalidades de
atenção.
2.2 Desintoxicação – é apenas a primeira
etapa do tratamento
A legislação atual não contempla
nenhum item específico para esta etapa,
apenas indica avaliação médica por
clínico geral e psiquiatra. Mas se
pretendemos focar num novo estilo de
vida para o dependente químico, livre das
drogas, é importante entender que a
desintoxicação médica trata de sintomas
físicos agudos da síndrome de abstinência.
Ainda que, “A desintoxicação
Roseli Aparecida Consolaro Nabozny
médica é apenas a primeira etapa do
tratamento para a dependência e, por si só,
pouco faz para modificar o uso de drogas
em longo prazo” (NIDA-9º princípio),
quando acontece antes da internação na
Comunidade Terapêutica, favorece a
aderência do paciente na fase inicial do
tratamento, que geralmente é o período de
maior desistência.
2.3 Técnicas de Intervenção - possuir uma
grande variedade de elementos
Segundo NIDA – 3º princípio: “O
tratamento efetivo deve contemplar as
várias necessidades da pessoa, não
somente o seu uso de drogas.” A grande
maioria das comunidades terapêuticas
está focada apenas na abstinência
completa de qualquer tipo de substância
(Figlie, 2004), no trabalho e na espiritualidade,
porém, o tratamento deve oferecer
oportunidade para o desenvolvimento integral
do paciente: físico, mental, social, familiar e
espiritual.
A utilização da Entrevista
Motivacional, Terapia Cognitivocomportamental e Prevenção de Recaída,
aplicada com conhecimento técnico pode
auxiliar no processo de recuperação e
aumentar a efetividade, além de outras
intervenções como:
a)Grupos de acolhimento, psicoterapia
individual e de grupo (NIDA – 6º princípio:
“O aconselhamento individual e/ou em
grupo e outros tipos de psicoterapia
comportamentais são componentes
indispensáveis do tratamento efetivo da
dependência”);
b)Atendimento clínico, incluindo
farmacoterapia, se necessário (NIDA – 7º
princípio: “Para muitos pacientes os
medicamentos formam um elemento
importante do tratamento, especialmente
se combinados com os diferentes tipos de
terapia.”
2.4 Interdisciplinaridade da equipe
Atualmente já é mais comum a
presença de profissionais especializados
nas CTs, entre eles médicos, enfermeiros,
psicólogos, assistentes sociais e terapeutas
ocupacionais. É importante que a equipe
tenha conhecimentos sobre as drogas,
dependência química e tratamento, além
dos específicos de sua área. O trabalho
com dependentes químicos exige
capacitação e treinamento permanentes,
principalmente dos agentes comunitários
de saúde. Na maioria das vezes esta
função é exercida por dependentes em
recuperação que já fizeram um tratamento
em CT. Atualmente a capacitação mínima
para a função de “monitor de dependente
químico” é ministrada pela FEBRACT e
Cruz Azul no Brasil.
A formação e a vivência entre os
vários profissionais envolvidos no
tratamento podem ser fortalecidas através
de reuniões periódicas e contínuas,
visando sempre o que está previsto no 4º
princípio – NIDA: “O plano de tratamento
dever ser continuamente avaliado e, se for
o caso, modificado para assegurar que se
mantenha atualizado com as mudanças
nas necessidades da pessoa”.
Os diferentes fatores que
envolvem a dependência química não
podem ser vistos de uma forma linear e
estática, pelo contrário, são dinâmicos e se
relacionam entre si. Segundo Sudbrack
(2002, pag.202) “Se os profissionais
conseguirem trabalhar realmente em uma
equipe interdisciplinar terão mais recursos
para atender cada paciente em suas
necessidades especiais e, conseqüentemente,
o tratamento terá muito mais chances de
ser bem sucedido”.
2.5 Duração do tratamento e continuidade
de apoio
As investigações indicam que, na
maioria das vezes, começa-se a se
verificar uma melhora significativa
depois de três meses de tratamento.
Conforme o 5º princípio – NIDA: “É
importante que o paciente permaneça
09
COMUNIDADES TERAPÊUTICAS: O Desafio de Ser Eficaz no Tratamento de Dependentes Químicos
durante um período adequado de tempo no
tratamento.” Na maioria das CTs a
duração do tratamento varia entre três e
nove meses. Considerando que muitos
pacientes abandonam a CT antes deste
período, deve-se pensar em estratégias que
aumentem o comprometimento e
mantenham os pacientes no programa
terapêutico, porém com a preocupação de
evitar a cronificação do tratamento e a
perda dos vínculos familiares e sociais.
Quanto à continuidade de apoio,
como o tratamento não é algo rápido e exige
tempo e etapas a serem superadas, é possível
afirmar que de nada adianta uma longa
internação caso não haja continuidade de
atenção biopsicossocial após a alta. Observase, assim, que uma proposta terapêutica
eficaz deve visar à inserção social do
indivíduo e ser percebida num contexto
mais amplo, levando em conta: saúde,
educação, moradia, trabalho e outros. Daí a
importância da conexão e integração com
outros serviços. Promovendo um trabalho em
rede para somar esforços diante da
complexidade da causa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partindo desta revisão literária e da
complexidade que é o tratamento da
dependência química é inegável a eficácia
dos serviços prestados pelas Comunidades
Terapêuticas.
A abrangência fica comprovada
segundo o Mapeamento das instituições
governamentais e não governamentais de
atenção às questões relacionadas ao consumo
de álcool e outras drogas no Brasil 2006/2007. Quanto à classificação das
instituições que realizam tratamento:
A maioria das instituições de tratamento
brasileiras é definida por seus dirigentes
como comunidades terapêuticas. Das 1.256
instituições de tratamento, 483, ou 38,5%
da amostra, classificam-se nessa categoria.
(pág.86)
“Das instituições não governamentais os
tipos de tratamento mais oferecidos foram:
internação em comunidade terapêutica, 535
10
(62,9%). (pág.94)
De um lado as Comunidades
Terapêuticas têm dado uma expressiva
contribuição à sociedade, mesmo que seu
estilo de trabalho tenha sido alvo de
críticas e não tenha recebido o apoio e
reconhecimento das políticas públicas que
regem as questões de saúde do país.
De outro, a exemplo de modelos
bem sucedidos sugere-se o planejamento
das atividades com a criação de métodos
próprios e ou a utilização dos já existentes.
E a avaliação sistemática e contínua dos
resultados obtidos, como uma das formas
de mensurar a efetividade no desempenho
individual e aumentar a eficácia dos
serviços prestados pelas comunidades
terapêuticas.
Diante da impossibilidade de
esgotar o assunto finaliza-se com o
desafio, proposto por De Leon (2003 pág.
420): “Se não for possível estabelecer
ligações explícitas entre as intervenções
do programa, o curso de mudança do
cliente e os resultados obtidos, a
efetividade de qualquer modelo com
orientação de CT permanecerá obscura e
não comprovada.”
REFERÊNCIAS
BRASIL. ANVISA – Agência Nacional de
Vigilância Sanitária. Regulamento Técnico
disciplinando as exigências mínimas para o
funcionamento de serviços de atenção a pessoas
com transtornos decorrentes do uso ou abuso de
substâncias psicoativas. Disponível em: <
http://www.anvisa.gov.br/e-legis.htm>.
BRASIL. FEBRACT – Federação Brasileira de
Comunidades Terapêuticas. Comunidades
Te r a p ê u t i c a s . D i s p o n í v e l e m :
<http://www.febract.org.br/comunidades.htm>.
BRASIL. SENAD – Secretaria Nacional Antidrogas.
Relatório de Mapeamento das instituições
governamentais e não-governamentais de
atenção às questões relacionadas ao consumo de
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Químicas – Aspectos Básicos, SENAD.
Brasília/DF, 2002, p. 197.
11
PREVENÇÃO ÀS SUBSTÂNCIAS
PSICOATIVAS A PARTIR DA
VISÃO INTEGRAL DO SER HUMANO
Foto
Marciano Tribess
Coordenador de Prevenção da Cruz Azul no Brasil, Pedagogo,
Especialista em Dependência Química e Comunidade Terapêutica e
Mestrando em Teologia na área da Prevenção às Substâncias
Psicoativas. E-mail: [email protected]
Resumo: Neste Artigo aborda-se a
temática prevenção ao uso e abuso de
substâncias psicoativas, com um olhar para
o ser humano de forma integral. O
indivíduo composto de corpo, alma e
espírito, inserido num contexto holístico. E
não apenas um ser isolado inerte do meio
sócio familiar e de sua realidade biológica,
psicológica, social e espiritual. Apontam-se
as diversas formas de abordagens preventivas
13
possíveis a serem aplicadas. E a necessidade
de detectar fatores de risco e de proteção
numa determinada comunidade ou grupo
de pessoas, buscando intervenções
adequadas para cada contexto, que
enfraqueça os fatores de risco destas pessoas
e potencialize os fatores de proteção.
PALAVRAS CHAVES: P r e v e n ç ã o .
Substâncias Psicoativas. Visão integral.
PREVENÇÃO ÀS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS A PARTIR DA VISÃO INTEGRAL DO SER HUMANO
Holístico. Fatores de risco. Fatores de
proteção.
A palavra prevenção (1) pode e é
usada em várias situações em que o ser
humano é colocado sob uma vulnerabilidade
que possa vir a lhe causar dano. A prevenção
tem a finalidade de preservar a vida. Vários
movimentos religiosos, que com suas
doutrinas de amar um ao outro, de respeitar
o outro, podem ser considerados pioneiros
no que tange a prevenção.
Poderíamos dizer que, em geral, a
prevenção refere-se a toda iniciativa
coletiva visando à sobrevivência da
espécie. Na realidade é um conceito recente
e poderíamos dizer que as primeiras
instituições na história que estiveram na sua
vanguarda foram as religiosas. (ZEMEL,
2008, p. 94)
Quando se fala de prevenção às
substâncias psicoativas - SPAs (2),
conceitualmente entendia-se o tema
dividido inicialmente em três grandes
categorias: prevenção primária, secundária e terciária. Porém, além das três
categorias principais já acima mencionadas,
vive-se o advento de alguns novos conceitos:
Intervenção global ou universal, Intervenção
específica, Intervenção indicada.
Neste artigo aborda-se uma visão
holística do tema, por se tratar de uma
problemática que deve ser analisada a partir
da visão do ser humano integral, que se
constitui bio, psico, social e espiritualmente.
Portanto, como pano de fundo deve-se ler as
concepções aqui exposta a partir deste
principio. O ser humano não é uma “máquina
sem vida” mas sim, um indivíduo
extremamente complexo que influencia e é
influenciado na medida em que se
comunica com o outro e o meio ambiente
físico e social no qual está inserido.
Antes de abordarmos as diversas
modalidades de prevenção, e com o
objetivo de explicitar a importância do
olhar holístico e crítico da temática em
questão. Aponta-se uma frase registrada em
1959 pelo intelectual Aldous Huxley, no
14
seu livro: “Regresso ao Admirável Mundo
Novo”.
Assim escreve um conhecido ator de um
dos muitos programas infanto-juvenis. “As
crianças”, diz o ator, “são registros vivos e
falantes daquilo que lhes narramos todos os
dias”. E no devido tempo, esse registros
vivos e falantes dos comerciais de televisão
crescerão, e ganharão dinheiro e adquirirão
os produtos da indústria. “Pensem”,
escreve o Sr. Clyde Miller, admirado,
“pensem no que pode representar de lucro
para a sua firma se conseguirem aliciar um
milhão, ou dez milhões de crianças, que se
tornarão adultos treinados para a aquisição
dos seus produtos, como soldados são
antecipadamente treinados para avançar
quando ouvem as palavras - estimulo:
'enfrente, marche'”. (HUXLEY, 1989, p. 82)
Percebe-se que a partir de uma
frase como esta, que pessoas poderão ter
seu primeiro contato visual e virtual com o
“produto” substância psicoativa, antes
mesmo de sua primeira experiência física
com a mesma, o que exige uma
intervenção preventiva ainda mais
elaborada e complexa.
Prevenção Primária: Intervenção
junto à pessoa antes do primeiro contato
com SPAs. Seu objetivo é impedir ou
retardar o início do consumo. Esta prevenção
deve acontecer permanentemente, em todos
os segmentos da sociedade, com intervenções
que promovam: capacitação, sensibilização,
atualização e acompanhamento.
Prevenção Secundária: Intervenção
que ocorre após o primeiro contato da
pessoa com a SPAs. Seu objetivo é evitar
progressão do consumo e minimizar os
prejuízos relacionados ao uso. Esta deve
acontecer permanentemente com públicos
expostos e/ou que já tiveram contato com estás
substâncias. As intervenções secundárias
necessariamente devem ser realizadas em
segmentos específicos da sociedade, que
possuam maior vulnerabilidade para o uso
exagerado de SPAs. Estas intervenções
devem ter o intuito de sensibilizar,
capacitar, atualizar e acompanhar.
Marciano Tribess
Prevenção Terciária: Intervenção
realizada após a instalação de transtornos
relacionados ao uso de SPAs. Seu objetivo
é evitar ou minimizar as complicações
decorrentes do uso abusivo destas
substâncias. A intervenção terciária deve
acontecer durante e após o tratamento.
Diferente da prevenção primária e
secundária, esta deve ser realizada em
segmentos muito específicos da sociedade,
como em Psiquiatrias, Comunidades
Terapêuticas, Grupos de Apoio, CAPS-ad
(Centro de Atendimento Psicossocial
Álcool e Drogas). E tem como objetivo
sensibilizar, capacitar (habilidades bio,
psico, social e espiritual), atualizar e
acompanhar. O indivíduo e sua família.
A partir da contextualização
destas três categorias sobre prevenção,
torna-se mais fácil a compreensão de que
prevenir alguém com relação às SPAs, não
significa necessariamente prever (ver com
antecedência) que um indivíduo, grupo
social, ou até mesmo uma determinada
cultura, não tenha contato com substâncias
psicoativas. Mas sim, independentemente
do estágio que se encontra a pessoa
envolvida, ela possa receber uma atenção
preventiva. Com intervenções que possam
ser aplicadas para evitar um estágio mais
avançado, da problemática dependência
química, ou seja, antes, durante ou depois
do contato com as substâncias, as
intervenções devem objetivar atender a
pessoa, com a finalidade de amenizar ou
até mesmo sanar a vulnerabilidade frente
às substâncias psicoativas que está ou foi
exposta.
prevenção apenas a partir destas três
categorias. Segundo Zemel (2008, p. 102),
“as categorias de prevenção primária,
secundária e terciária que herdamos dos
modelos médicos não dão mais conta do
nosso problema” . Dessa forma surgem
novos modelos de medir e analisar a
problemática em questão, como por
exemplo:
Intervenção global ou universal:
Que visa atingir a população em geral, com
programas que não se destinam
necessariamente às pessoas em situação de
vulnerabilidade, mas sim, a toda sociedade.
Podendo acontecer na comunidade, na
escola, por meios midiáticos ou em
qualquer outro espaço.
Intervenção específica: Esta visa
atuar onde já existe um ou mais fatores
associados ao uso de substância psicoativa
que indique risco. Exemplo: crianças
expostas a adultos dependentes químicos.
Intervenção indicada: Tem por
objetivo atingir as pessoas já usuárias de
substâncias psicoativas, e que não
necessariamente sejam dependentes, mas,
que devido o uso colocam em risco a suas
vidas ou a do próximo. É o caso da
prevenção a acidentes de trânsito, ou
violência doméstica relacionados ao
consumo de alguma substância psicoativa,
por exemplo: A intervenção indicada é a
iniciativa de diminuir ou encerrar o uso de
álcool e outras drogas, e inserir ou reinserir
esta população a um convívio social
saudável.
A prevenção do uso indevido de drogas tem
como objetivo mudar os fatores pessoais,
sociais ou ambientais, a fim de auxiliar
retardar ou evitar o início do uso de drogas e
ao uso indevido de progressão nociva ou
problemática. As estratégias de prevenção
visam aumentar a capacidade dos
indivíduos e das comunidades, para ter os
recursos de que precisam para serem
protegidos dos danos que as drogas podem
causar. (Mentor International Apud Eric
Carlin ET AL, 2011, tradução nossa). (3)
O uso indevido de álcool e outras drogas é
fruto de uma multiplicidade de fatores.
Nenhuma pessoa nasce predestinada a usar
álcool e outras drogas ou se tornar
dependente apenas por influência de
amigos ou pela grande oferta do tráfico.
Nós, seres humanos, por nossa humanidade
e incompletude, buscamos elementos para
aliviar dores e acirrar prazeres. Assim,
encontramos as drogas. Algumas vezes
experimentamos, outras usamos sem nos
comprometermos, e outras ainda abusamos.
(ZEMEL, 2008, p. 98).
Contudo não é mais possível pensar em
15
PREVENÇÃO ÀS SUBSTÂNCIAS PSICOATIVAS A PARTIR DA VISÃO INTEGRAL DO SER HUMANO
Quando se fala em prevenção a
substâncias psicoativas é importante saber
que tudo que já se estudou a respeito,
ainda é muito pouco, pois é notório, a
partir das evidências que o consumo das
mesmas tem aumentado. Talvez um dos
fatores seja o “fantástico” mercado econômico
que estas substâncias movimentam. E isto não
é um acontecimento isolado da pósmodernidade. No livro, O Mundo de Sofia,
Jonstein Gaarder fala sobre a indignação de
Marx, com relação ao rumo que a sociedade
industrializada estava tomando. Relata que
por volta de 1850 os trabalhadores eram
desumanizados a ponto de serem tratados
como animais, onde parte do salário de um
colaborador da época era pago, com álcool.
Na grande maioria dos casos, os
trabalhadores cumpriam jornadas de
trabalho de catorze horas dentro de fábricas
geladas. E o que ganhavam era tão pouco,
que até as crianças e mulheres grávidas
tinham de trabalhar. Tudo isto levou a
condições sociais indescritíveis. Muitas
vezes, parte do salário era paga em forma de
aguardente barata e muitas mulheres
tinham de se prostituir. (GAARDER, 1998,
p. 424)
Neste ponto especificamente
trata-se o tema álcool e outras drogas, e o
ser humano como parte do sistema
mercadológico, uma “coisa” pela qual se
obtêm lucro. Tendo esta visão como pano
de fundo, entende-se que a problemática
envolvida na questão, exige uma
insistente busca de intervenções que
permitam o ser humano, pensar e agir com
autonomia e liberdade de escolha, o que
não tem sido fácil por estarmos inseridos
num sistema em que o “poder do
mercado”, exerce uma força muito intensa
sobres às decisões do indivíduo.
Fatores de Risco: Para facilitar a
compreensão do que abrange a questão
prevenção a sustâncias psicoativas,
também é importante olhar para o aspecto
dos fatores de risco e de proteção
envolvidos nesta temática. Importante
avaliar que numa: família, sociedade,
economia, comunidade, escola, etc.
Podem coexistir fatores de riscos, que
16
proporcionam uma vulnerabilidade e
podem facilitar a aproximação da pessoa
com a problemática da dependência
química. Por exemplo, uma pessoa com
sintomas de depressão, ou que se sente
constantemente insegura, ou ainda que
possua pais que fazem uso abusivo de
drogas, ou são excessivamente autoritários,
é uma pessoa que vive constantemente
oprimida por estes sintomas, vive sobre
fortes fatores de risco. Isto não quer dizer
que ela vá usar alguma substância, mas é
inegável que uma pessoa exposta sob estes
fatores está mais vulnerável à problemática
da dependência química. Segundo
Eduardo Kalina um fator de risco
detectado no atendimento a jovens
dependentes químicos é seu constante
contato com o meio familiar, que tolera o
uso de SPAs.
Recorrendo à experiência terapêutica, é
difícil encontrar algum jovem paciente
dependente de drogas que não tenha
chegado a esse estado depois de uma longa
convivência com exemplos dos pais, que
são “alcoólatras sociais”, e mães que são
“viciadas em farmacopeia”, consumidores
de todas as espécies de pílulas “calmantes
de suas dores e tranquilizante de suas
angustias e preocupações” (CRYNBERG,
2002, p. 135)
Existem ainda outros fatores como
desemprego, violência, exclusão social,
ou ainda fatores relacionados à própria
biologia interna de cada indivíduo, que
eventualmente pode se adaptar a uma
droga que lhe proporcione um prazer
intenso, o qual queira repetir inúmeras
vezes, e que poderá induzi-lo à dependência
da mesma.
Fatores de Proteção: Existem
também os fatores de proteção, que nos
permitem perceber que nem tudo está perdido.
A questão da prevenção até aqui abordada pode
parecer um tanto desestimulante, porém,
deseja-se olhar positivamente e constatar que
existem intervenções que podem amenizar
ou até mesmo sanar problemas relacionados
ao uso e abuso de substâncias psicoativas.
Se o jovem vem de família desorganizada,
Marciano Tribess
mas encontra em sua vida um grupo
comunitário que faz seu asseguramento,
oferecendo-lhe alternativas de lazer e de
desenvolvimento de habilidades pessoais,
pode vir a ter sua formação garantida,
aprendendo a criticar e se responsabilizar
por si próprio e pelo seu grupo social
(ZEMEL, p. 98, 2008).
Os fatores de proteção em suma
são o oposto dos fatores de risco. Ou seja,
uma pessoa, que aprendeu a gostar de si,
do outro, que tem prazer em aprender, que
tem a possibilidade de participar das
decisões que envolvem a família e a
sociedade em que vive que gosta de estar
vivo por ter aprendido a gostar de viver,
esta será uma pessoa com maiores chances
de não ser acometido do contato nocivo às
SPAs. Podendo ela vir a experimentar
alguma substância psicoativa, todavia não
necessariamente se tornará dependente da
mesma.
Um forte fator de proteção está
relacionado a pessoas que aprenderam a
superar positivamente fatores potencialmente
estressores. “A esta característica dá-se o
nome de resiliência”(DIEHL, 2011, p. 483).
Mentor International. Guide to Drug Prevention.
D i s p o n i v e l
e m :
<http://www.mentorfoundation.org/about_preven
tion.php?nav=4-43>. Acesso em: 11 de fevereiro,
2013.
ZEMEL, Maria de Lurdes S. Prevenção ao uso
indevido de droga: Curso de Capacitação Para
Conselheiros Municipais. Brasília: Presidência da
República, Secretaria Nacional Antidrogas, 2008.
NOTAS
(1) Prevenção. Ela vem do Latim PRAEVENIRE,
“antecipar, perceber previamente”, literalmente
“chegar antes”, de PRAE-, “antes”, mais
VENIRE, “vir”. Disponível em:
<http://origemdapalavra.com.br/palavras/prevencao/>.
Acesso em: 08 de fevereiro, 2013.
(2) Sempre que aparecer SPAs está-se falando das
Substâncias Psicoativas.
(3) Mentor international. Site da Organização
não Governamental. Disponível em:
<http://www.mentorfoundation.org/about_preventio
n.php?nav=4-43>. Acesso em: 11 de fevereiro, 2013.
E assim inúmeros outros fatores de
proteção existem e precisam ser estimulados
e ensinados nas escolas, nos clubes, nas
igrejas, nas indústrias e na sociedade, e
quando possível vivenciada no seio familiar,
a instituição mais importante e mais atingida
dentro desta temática.
REFERÊNCIAS
CRYNBERG, Halina. KALINA, Eduardo. Aos
Pais de Adolescentes Viver sem Drogas. 2ª
edição. Rio de Janeiro Ed. Rosa dos Tempos, 2002.
DIEHL, Alessandra. CORDEIRO, Daniel Cruz.
LARANJEIRA, Ronaldo. Dependência
Química. Porto Alegre. Artmed, 2011
GAARDER, Jostein. O Mundo de Sofia. 32ª
Reimpressão. São Paulo: Sia.Das Letra, 1998.
HUXLEY, Aldous. Regresso ao Admirável
Mundo Novo. São Paulo: Ed. Circulo do livro
S.A, 1989.
17
APRENDIZAGEM MEDIADA
NO TRATAMENTO DE
DEPENDENTES QUÍMICOS
EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
Foto
Este artigo tem por objetivo apresentar os Critérios da Experiência
de Aprendizagem Mediada – EAM, de Reuven Feuerstein, como
suporte pedagógico ao profissional e colaborador no tratamento de
dependentes químicos em comunidade terapêutica.
Palavras-chave: dependente químico, comunidade terapêutica, mediação,
aprendizagem mediada.
Osvaldo Christen Filho
Psicólogo clínico, especialista em Dependência Química e Comunidade
Terapêutica pela Faculdade Luterana de Teologia e Cruz Azul no Brasil. Formado
no curso de "Intervenção Cognitiva" de Reuven Feuerstein:
"Programa de Enriquecimento Instrumental – PEI".
INTRODUÇÃO
Drogas desorganizadoras
denunciam um tema angustiante para as
pessoas, atingindo não somente seus
usuários, mas, a sociedade como um todo.
Os meios de comunicação trazem
diariamente ocorrências nocivas do álcool
e drogas no trânsito, na vida familiar e
comunitária. Medo e inse gurança
19
ameaçam a população. Poderes públicos
aparecem frequentemente realizando
prisões de traficantes. Pior, o que se via em
noticiários, com aparência distante, atinge
um círculo cada vez menor e próximo a
todos, tornando-se uma realidade
assustadora.
Entre os diversos tipos de
tratamento oferecidos, destaca-se, como
APRENDIZAGEM MEDIADA NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES QUÍMICOS EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
descrito
mais adiante, um forte aliado aos serviços
de atendimento - as Organizações Não
Governamentais – ONGs. Sua participação no tratamento de dependentes
químicos diferencia-se de outros modelos
pela atenção psicossocial em comunidade
terapêutica. Para dentro deste contexto
serão analisados e articulados os Critérios
da Aprendizagem Mediada – EAM de
Reuven Feuerstein.
DEPENDÊNCIA QUÍMICA E SUAS
PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS
A dependência de substâncias
p s i c o a t i v a s ( S PA s ) e n c o n t r a - s e
classificada no Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais DSM-IV (2000, p.171-262) no capítulo de
Transtornos Relacionados a Substâncias.
Segundo este manual, (p.172):
A característica essencial da Dependência
de Substâncias é a presença de um
agrupamento de sintomas cognitivos,
comportamentais e fisiológicos indicando
que o indivíduo continua utilizando uma
substância, apesar de problemas
significativos relacionados a ela.
Psicologicamente, é o resultado de
um tipo de relação que o usuário
estabelece com as drogas de sua
preferência. É uma interação que ganha
um espaço e prioridade significativos
sobre os demais aspectos de vida
humanos. De alguma maneira, SPAs
trazem algum retorno ao indivíduo, assim
entendidos ‘‘suportes’’ ou ‘‘auxílios’’ na
realização de certas funções. Ex.:
desinibição; ser alguém. É uma relação
cons truída ao longo do tempo,
inespecífica quanto ao biotipo,
personalidade, sexo, status social, idade
ou raça. Uma vez satisfeita uma necessidade, associada com o uso da drogas, o
indivíduo passa a acreditar na lógica: "se
usar – então me sairei bem (melhor)".
Decorrentes desse estado psicológico,
alterações comportamentais são observáveis,
especialmente quando a preocupação
20
central do indivíduo se resumir em: qual
droga usar, onde e como obtê-la. Esse é o
meio tempo em que relacionamentos sociais afetivos, de trabalho, estudo e lazer
ficam prejudicados. O usuário dependente
experimenta ansiedade, raiva, insônia e
outros sintomas enquanto busca novas
doses. A capacidade de raciocínio fica
como que refém da busca exclusiva da
droga. O indivíduo experimenta o que se
denomina de fissura (um forte impulso
subjetivo para usar uma substância).
Riscos pessoais e de outras pessoas nesses
momentos de crise ficam suspensos; a
antecipação de consequências fica
anulada; valores morais e éticos perdem
seu poder.
A dependência fisiológica que
pode ou não acompanhar a psicológica,
caracteriza-se pela presença de dois
componentes: a tolerância e a abstinência,
descritos pelo DSM-IV (2000, p. 172173).
Várias serão as tentativas individuais, de
suporte leigo ou profissional, de deixar uma
ou mais drogas. Dentre todas, uma opção
que requer internamento em comunidade
terapêutica, passa a ser apresentada.
COMUNIDADE TERAPÊUTICA
A Prefeitura Municipal de São
Paulo (2006, p. 25) relaciona uma série de
possibilidades de tratamento, agrupandoas em uma pirâmide. Nela encontram-se
hospitais, ambulatórios, hospitais-dia,
enfermarias e centros de internação,
clínicas de tratamento e comunidades
terapêuticas.
Segundo Leon (2003, p.14-21), o
termo "comuni dade terapêutica",
doravante também denominada de CT, é
um termo moderno, atribuindo-se sua origem a tratamentos psiquiátricos na Grã
Bretanha no curso dos anos de 1940.
Maxwell Jones (1953), um psiquiatra no
Reino Unido, foi um dos pioneiros a
utilizar o modelo de comunidade
terapêutica psiquiátrica em torno de 15
Osvaldo Christen Filho
anos antes das CTs surgirem como tal na
América do Norte. Trata-se de uma
possibilidade de abordagem grupal
do paciente. O modelo de Jones difundiuse para outras partes da Europa. Nos
Estados Unidos versões modificadas da
CT psiquiátrica foram adaptadas para o
tratamento de dependentes de SPAs.
Leon relata que nos anos de 1960 e
1970 proliferaram na Europa e América
do Norte programas de tratamento que
remetiam seu programa conceitual ao
grupo de Oxford, na Inglaterra (1921).
Este grupo foi fundado por Frank
Buchman, ministro evangélico luterano,
objetivando um renascimento espiritual
dos cristãos não comprometidos com sua
fé. Transtornos mentais e alcoolismo
foram contemplados pelas preocupações
do movimento, pois constituíam sinais de
uma situação espiritual deteriorada.
Segundo Leon, ibid., p. 18:
[...] parte das ideias e práticas comumente
sustentadas incluía a ética do trabalho, o
cuidado mútuo, a orientação partilhada e os
valores evangélicos da honestidade, da
pureza, do altruísmo e do amor, o
autoexame, o reconhecimento dos defeitos
de caráter, a reparação por danos causados e
o trabalho conjunto.
Ta i s e l e m e n t o s a j u d a m a
compreender o componente espiritual
religioso presente na maioria das CTs. A
introdução de conceitos técnicocientíficos advém, no Brasil, com a
Resolução de Diretoria Colegiada – RDC
101, (2001, Anexo I, Item 2).
EQUIPE DE COLABORADORES E
PROGRAMA DE TRATAMENTO
O transtorno da dependência
química atinge o indivíduo na totalidade
de seus aspectos de vida. A execução do
programa terapêutico nas CTs é realizada
por pessoas que articulam suas áreas de
conhecimento com a realidade do
dependente químico em tratamento com o
objetivo de oferecer-lhe apoio e
desenvolvimento bio-psico-sócio-
espirituais. Por isso, são bem-vindos
conhecimentos de diversas áreas,
destacando-se: ciências da saúde, sociais,
econômicas, direito, educação,
administração, agricultura e teologia.
Leon, op.cit., p.165, refere-se ao corpo de
funcionários como "uma combinação de
profissionais tradicionais e não
tradicionais que ocupam uma variedade
de posições clínicas", ou seja, remunerados ou não remunerados,
respectivamente. Podem incluir pessoas
dependentes de SPAs que já concluíram o
tratamento. Esta equipe de colaboradores
em CT é objeto de análise no processo de
ensino-aprendizagem abordado neste
artigo na qualidade de mediadores.
O DEPENDENTE QUÍMICO
INTERNADO EM COMUNIDADE
TERAPÊUTICA
Possivelmente, qualquer
dependente de SPAs apresente um perfil
semelhante ao descrito neste artigo, sem
necessariamente frequentar uma CT para
tratar-se. Os aspectos que definem o perfil
do dependente químico internado em CTs
a seguir relacionados, são os de ordem
psicológica.
Leon, op.cit., p.40, nomeia como
"áreas e indicadores da manifestação
concreta do transtorno": uma vida em
crise, incapacidade de manter a
abstinência, disfunção social e
interpessoal e um estilo de vida
antissocial. Como "características
cognitivas típicas dos usuários abusivos
em CTs" o mesmo autor, ibid., p.54,
relaciona: carências de percepção,
deficiência de julgamento, carência na
identificação de relações, carências na
compreensão da realidade [prova de
realidade], capacidades pessoais.
Focando os dependentes de álcool,
Rigoni et al. (2009, p. 740, apud CUNHA &
NOVAES), citam o compromentimento
cognitivo correspondente:
21
APRENDIZAGEM MEDIADA NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES QUÍMICOS EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
O uso agudo do álcool tende a comprometer
a capacidade de atenção, memória, funções
executivas e visoespaciais, enquanto o uso
crônico altera a memória, a aprendizagem,
a análise e síntese visoespacial, a
velocidade psicomotora, funções
executivas e tomada de decisões, podendo
chegar a transtornos persistentes de
memória e demência alcoólica.
A experiência no tratamento de
dependentes de SPAs em CT permite
acrescentar: comportamen tos de
impulsividade, intolerância, dificuldades
em resolver problemas e antecipar
consequências, deficiências de repertório
verbal, egocentrismo e predominância do
afetivo em detrimento ao racional. Talvez
‘‘comportamento disfuncional’’ resuma
essas características.
Cumpre esclarecer que adictos ou
portadores de necessidades especiais não
apresentam déficits cognitivos de maneira
exclusiva. Em geral, qualquer pessoa tem
funções cognitivas mais desenvolvidas do
que outras. Conforme as teorias de aprendizagem Construtivistas, em especial a
Teoria de Aprendizagem Mediada de
Reuven Feuerstein, o funcionamento
mental de qualquer pessoa emerge das
interações do indivíduo com o meio,
podendo ser desenvolvido ao longo da
vida, especialmente através de mediações
qualitativas. Isto quer dizer que é possível
aprender sempre, em qualquer época da
vida, abrindo oportunidades de
desenvolvimento para qualquer ser
humano.
REUVEN FEUERSTEIN E A TEORIA
DE APRENDIZAGEM MEDIADA
Reuven Feuerstein nasceu em
Botosan, Romênia, no dia 21 de agosto de
1921. Meier e Garcia (2008, p.25-27),
relatam de sua descendência judaica e
residência em Israel desde 1944, ano em
que se formou em Psicologia no "Onesco
College" em Bucareste. Completou sua
graduação em Psicologia Clínica e Geral
sob orientação de Andre Rey e Jean Piaget,
com quem trabalhou a partir de 1952. Sua
22
biografia inclui a tese de doutorado em
1970 na área da Psicologia do
Desenvolvimento; cargos de direção em
escolas, institutos de psicologia, redação de
artigos e livros, conferências internacionais, e presidência do "International Center
for the Enhancement of Learning Potential ICELP".
Sua proposta educacional surgiu a
partir de observações, experiências
vivenciais e reflexões no Serviço
Psicológico do Departamento de Youth
Aliya, "uma instituição dedicada à tarefa
de receber e integrar as crianças judias que
chegavam a Israel" (p.27), que presidiu até
sua aposentadoria, em 1983. As crianças
citadas apresentavam defasagens de três a
seis anos em relação a um padrão de
aprendizagem quanto a operações mentais
da aritmética, abstração, simbolização,
falta de curiosidade, de interação e
exploração. Em Israel tornou -se
necessária uma revisão de conceitos de
aprendizagem, de avaliação e programas
pedagógicos.
Fortemente influenciado por
Piaget, Feuerstein contrariou conceitos
estáticos e imutáveis de desenvolvimento
humano como testes psicométricos, a
psicanálise, e o comportamentismo (GOMES, 2002, p. 64-65). O fator de
modificabilidade (p.66) constituiu-se
essencial como contrapropos ta às
concepções reinantes:
A Teoria da Modificabilidade
Cognitiva Estrutural (TMCE), conforme
indica o próprio nome, baseia-se na
modificabilidade, na flexibilidade da estrutura cognitiva, e tem como um dos aportes
conceituais centrais o pressuposto de que
o ser humano é dotado de uma mente
plástica, flexível, aberta a mudanças,
assim como dotado de um potencial e de
uma propensão natural para a
aprendizagem.
Essa concepção traz esperança por
investir no potencial humano em poder
superar condições limitantes (que se
Osvaldo Christen Filho
constituem desafios especiais para
dependentes químicos em tratamento).
Surge, entre 1950 e 1963, o conceito de
Experiência de Aprendizagem Mediada
(EAM). Aqui é apropriada a conceituação
da EAM por Feuerstein, citada por
Gomes, ibid., p.80:
A teoria de EAM – definida como a
qualidade de interação entre o organismo e
o meio – produz-se pela interposição de um
ser humano iniciado e intencionado, que
medeia o mundo e o organismo, criando no
indivíduo a propensão ou tendência à
mudança pela interação direta com os
estímulos. A EAM é a única que produz a
flexibilidade, a autoplasticidade na
existência humana e, em última instância,
oferece-lhe a opção de modificabilidade...
(Feuerstein, 1997, p.15).
que vive, com maior eficiência intelectual.
Reflexos da EAM também serão
observados na autoimagem e autonomia.
O PARADIGMA HOLÍSTICO DE
APRENDIZAGEM MEDIADA
Segundo Sasson (2001, p.21), los
componentes del proceso holístico del
aprendizaje mediado, os quais denomina
de polos, são: ambiente (entorno);
mediador; aprendiz (el alumno) e
conteúdo (el contenido o los materiales).
O mediador é responsável pela articulação
desses quatro polos.
Ambiente
A EAM de Feuerstein, ao lado da
aprendizagem direta do indivíduo em seu
meio ambiente, distingue o papel decisivo
do mediador no processo de ensinoaprendizagem, tornando-se uma
modalidade diferenciada e complementar
de aprendizado. Os aspectos básicos desta
teoria incluem: a) o con ceito de
modificabilidade; b) a observação do potencial de aprendizagem na utilização de
experiências prévias para o enfrentamento e/ou
adaptação a situações novas; c) a diferenciação
do conceito de modificabilidade em
comparação com fases de desenvolvimento; d)
conceito de modificabilidade segundo ato
volitivo, imprevisível, pelo qual o indivíduo pode
evoluir, tomando rumos totalmente diferentes
de trajetórias pré-determinadas; e) não
dispensa de aspectos afetivos, emocionais e
motivacionais do comportamento humano
nos processos de aprendizagem; (SASSON,
1998, p.177 – 179).
Todo ser humano é, pois,
modificável. A modificabilidade de um
indivíduo é consequência de sua
capacidade de aprender. A EAM não
prescinde da interação humana. Mas nem
toda interação humana atende os aspectos
da EAM formulada por Feuerstein. O
resultado final desenvolve no indivíduo a
capacidade de articular de forma
autônoma suas interações com o meio em
O ambiente pode favorecer ou não
a aprendizagem mediada. Em uma CT,
pode perpassar as intensas relações
humanas que ocorrem como um todo, seja
do ponto de vista clínico, laborativo,
cultural, espiritual, profissional ou outra
categoria. Por isso a CT não se reduz a um
ambiente escolar.
Segundo Feuerstein, citado por
Sasson e Macionk (2010), um ambiente
favorável à aprendizagem é: a) dinâmico;
b) flexível; c) individualizado; d) exigente; e) confiante; e f) valorizante.
Mediador
Sasson (2009), apresenta
requisitos necessários ao mediador que
qualificam o ato de mediar: a) a necessidade de conhecer e refletir os vários
Critérios da EAM (citados mais adiante
neste artigo); b) o conhecimento das
várias habilidades cognitivas, metacognitivas, afetivas e sociais que formam
a base intelectual do aprendiz e que afetam
o aprendizado; c) a auto percepção de
papel transitório que desempenha na vida
do aprendiz; d) a noção de que pais,
cuidadores, educadores, terapeutas e outros
profissionais também são mediadores no
23
APRENDIZAGEM MEDIADA NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES QUÍMICOS EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
processo de aprendizagem mediada; e) a
conscientização de que seu papel no
processo educativo é extremamente
importante por ser ele o articulador de
todos os polos do paradigma holístico de
aprendizagem mediada.
mediador, em forma de feedback, após
serem, por este, avaliadas. Ao colaborador
em CT se abre a possibilidade de deixar-se
provocar pelo conceito de mediador.
Aprendiz
O próprio mediador deve se
modificar frente aos requisitos
apresentados. Não basta um treinamento
com respostas passageiras. Há que se
conscientizar do papel permanente de
mediar, vivendo-o nas atividades
relacionais, enxergando e aproveitando
oportunidades, sendo criativo. A
motivação do mediador será
sentida pelo aprendiz e trará diferença
entre valor transmitido e valor mediado,
quanto a marca e impacto deixados pela
EAM na vida do mediado.
Sasson (2001, p.58) e Gomes,
op.cit., p. 80-81, reproduzem um esquema
desenvolvido por Feuerstein para ilustrar
a Experiência da Aprendizagem Mediada
da seguinte maneira:
O aprendiz é o alvo, objeto de todo
investimento dispendido no ato de mediar.
De acordo com Sasson, ibid., p.23, são três
os conjuntos de pré-requisitos necessários
do aprendiz: "1. Las habilidades
psicomotrices; 2. Las funciones cognitivas;
3. Las habilidades afectivas y también los
prerrequisitos sociales." No primeiro
deles, o aprendiz pode ser portador de
transtornos de ordem biológica, endógena, motora, para captar informações ou
executar tarefas. No segundo, o aprendiz
pode apresentar dificuldades nas funções
de entrada, elaboração e/ ou respostas
necessárias a um ato mental. Finalmente,
nas habilidades afetivas e sociais, o aprendiz pode ter sua auto imagem afetada pelo
modo de relacionar-se com os outros. Um ou
mais desses aspectos podem ser responsáveis
pelo bloqueio ao desenvolvimento do
potencial de aprendizagem (SASSON, ibid.,
p.37). O aprendiz na CT, neste artigo, é o
dependente químico internado.
Conteúdo
Figura 1 - Experiência da Aprendizagem Mediada, por
Feuerstein
A letra "H" representa
necessariamente uma presença humana
como mediador. A letra "S" representa os
estímulos aos quais um indivíduo está
exposto; a letra "O", representa esse
indivíduo. Observe-se que existem
estímulos que chegam ao indivíduo sem a
mediação. Este esquema apresenta, pois, a
existência de dois modos de aprendizagem: um pela exposição direta aos
estímulos, e outro pela mediação humana.
A letra "R" representa a resposta que o
indivíduo dará após elaborar estímulos
recebidos. As respostas também podem
tornar-se objetos de mediação do
24
O conteúdo é uma ferramenta, um
meio pelo qual se deseja transmitir uma
ideia ao aprendiz, ou ajudá-lo a adquirir
um valor ou um significado. Sasson, ibid.,
p.24, apresenta dois tipos de conteúdo: os
pertencentes a determinada disciplinaciência, ou conhecimento, geralmente
relacionados em um plano de estudo,
currículo escolar e, os livres de conteúdos
de uma determinada área de conhecimento. Diz ele:
Los otros materiales libres de contenido,
como el de Feuerstein, representam una
lección distinta. Estos programas tienen y
han desarrollado, para lograr los mismos
objetivos, una serie de actividades que no
están diretamente relacionadas con temas
especificos que se enseñan en cualquier
Osvaldo Christen Filho
otro contexto.
Para ilustrar referidos los otros
materiales libres de contenido, Sasson,
ibid., p.38 e Gomes, op.cit., p.191,
apresentam o Programa de Enriquecimento Instrumental – PEI de Reuven
Feuerstein. Os instrumentos formam uma
série de exercícios preparados para
despertar a motivação do aprendiz e
mobilizam as funções cognitivas de input,
elaboração e output, exercitando, assim,
as funções cognitivas envolvidas na
percepção, elaboração e formulação de
respostas do indivíduo.
Contudo, materiais livres de
conteúdo também podem ser encontrados
em contextos de aprendizagem informal.
Sasson e Macionk (2010) exemplifica o
ambiente familiar, o contexto escolar,
social e profissional, onde outros serão os
mediadores, outras as experiências e
relacionamentos, e outros materiais
Figura 2 - Aprendizagem Mediada - Paradigma Holístico
estarão disponíveis. Em uma CT podem
ser citados os momentos de convívio, as
regras, o ócio produtivo, atividades
culturais, as palestras, as terapias
individuais e de grupo, o lazer. Enfim,
ocasiões e materiais disponíveis na CT
tornam-se fortes aliados à EAM.
APRENDIZAGEM MEDIADA– EAM
OS CRITÉRIOS DA EXPERIÊNCIA DE
25
APRENDIZAGEM MEDIADA NO TRATAMENTO DE DEPENDENTES QUÍMICOS EM COMUNIDADE TERAPÊUTICA
Figura 3 - Critérios da Experiência da Aprendizagem Mediada - EAM
não estabelece a priori quaisquer impedimentos à possibilidade do aprendiz em
modificar-se.
Os três primeiros critérios:
intencionalidade e re ciprocidade;
transcendência; e mediação de significado
são imprescindíveis à ocorrência de uma
EAM, explica Sasson (2001, p.59). Os
outros nove critérios, embora tenham uma
função estruturante e determinante na
mediação - dependem mais de situações
específicas e do contexto cultural.
de dependentes químicos na modalidade
de comunidade terapêutica: 1. A reunião
em um só lugar dos quatro polos da visão
holística de aprendizagem mediada; 2. A
teoria da experiência de aprendizagem
mediada – EAM de Reuven Feuerstein
pode servir de suporte teórico às práticas
de ensino-aprendizagem aplicadas no
contexto clínico de tratamento de
dependentes químicos em comunidade
terapêutica; 3. Os critérios de aprendizagem
mediada de Reuven Feuerstein podem
servir de suporte pedagógico técnico e
motivacional aos colaboradores no
tratamento de dependentes químicos em
CT. A observação dos citados critérios
trará repercussões na qualificação dos
mediadores e efetividade do tratamento.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
Diante do exposto, três conclusões
apresentam-se em relação ao tratamento
ANVISA. Resolução – RDC n. 101 de 30/05/2001.
Brasília, DF: D.O. de 31/05/2001.
Segundo Sasson e Macionk
(2010), Reuven Feuerstein conceitualizou
12 critérios que orientam uma EAM, quais
sejam:
26
Osvaldo Christen Filho
CHRISTEN FILHO, O. Aprendizagem Mediada
no Tratamento de Dependentes Quimicos em
Comunidade Terapêutica. 2011, 41 f. Monografia
(Pós-Graduação em Intervenção Cognitiva e
Aprendizagem Mediada) - Instituto Superior de
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2003. 479 p.
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Disponível em: <http://www.magisterio.com.
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Maringá: Psicologia em Estudo, 2009, vol.14, n.4,
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em 04/11/2010.
SASSON, D. Del cambio estructural a la
autoimagem positiva. In: MARTINEZ, J.M.; &
27
A ESCUTA QUE HUMANIZA
Foto
Therezinha Moura Jorge
Psicóloga pós-graduada em DQ & CT – FLT e Adm. de Recursos Humanos – PUC.
Responsável técnica da Associação CSS Regional Curitiba/PR.
E-mail: [email protected]
RESUMO
A sugestão deste estudo é abordar
a possibilidade de humanização por meio
de procedimentos científicos que se
demonstram simples em sua efetivação.
Recorre à Psicologia Humanista citando
alguns autores que demonstram a riqueza
e a credibilidade dessa reconhecida
abordagem. Na sequência, procura
29
ilustrar tais conhecimentos por meio do
exemplo de uma instituição que revela em
sua prática atual bem-sucedida,
abordagens que vem se identificando
como importantes ferramentas no
tratamento da Dependência Química.
PALAVRAS-CHAVE: Psicologia humanista.
Espiritualidade. Comunidade terapêutica.
Dependência química.
A ESCUTA QUE HUMANIZA
mesmo.
PALAVRAS E VISÕES
RECONHECIDAS PELA CIÊNCIA
Para exemplificar esses pressupostos,
Rogers (1978, p.264) esclarece da seguinte
forma:
Felizes, antes, os que escutam
a palavra de Deus e a cumprem.
(Lucas 11:28)
As questões que envolvem o
comportamento humano, suas razões e as
maneiras de agir sobre intrigantes
condutas fizeram com que se gerasse, ao
longo da história, três grandes grupos da
Psicologia (FALCÃO, 2010) que são
assim denominados:
 Comportamentalismo – considera as
influências ambientais ou do meio.
 Psicanalismo – enfatiza fatores internos:
inconsciente e instinto.
 Humanismo e Existencialismo –
destacam o homem e o que lhe é essencial.
O Humanismo, chamado também
de Terceira Força, tem a sugestão de
valorizar o sentido da existência. Prefere o
estudo do ser humano em seu potencial
positivo e trabalha a psicologia a partir da
saúde e do crescimento. O presente estudo
discorre sobre esta abordagem, a qual
oferece a possibilidade de impulsionar o
desenvolvimento e a restauração de vidas
humanas.
Um subsídio apropriado no
sentido de esclarecer a visão humanística
vem de Crema (1985), quando afirma que
a proposta junto à pessoa é “...que não vise
ao poder de curar e, sim, facilite apenas
que a pessoa atualize seu potencial de
saúde e sua vocação para a vida,
devolvendo a ela seu poder” (CREMA,
1985, p. 14). Para isso, coloca-se a
necessidade de escutar a pessoa e
conhecer a sua vida. Este princípio revelase como um denominador comum em Carl
Rogers (1978), Eric Berne (1988) Viktor
Frankl (2006) e demais autores
humanistas consagrados: Escutar! De
forma autônoma, inclinar-se para que essa
escuta tenha como principal foco o ser
humano, o qual se iguala ao terapeuta em
sua essência, mas que se distingue
enquanto pessoa que precisa escutar a si
30
O ser humano, como todos os organismos,
tende a crescer e a se atualizar. É claro que
todos os fatores sociais, econômicos e
familiares podem interromper esse
crescimento, mas a tendência fundamental
é em direção ao crescimento, ao seu próprio
preenchimento ou satisfação. Costumo
exemplificar esse processo lembrando
batatas que guardávamos no porão da nossa
casa na fazenda. Elas criavam brotos
porque havia uma janelinha no quarto. Era
uma tentativa inútil, mas parte da tentativa
do organismo de se satisfazer. Você
consegue um produto muito diferente
quando planta uma batata na terra, e
comparo esse processo ao que pode ser
encontrado em delinquentes e em pessoas
que são tidas como doentes mentais: o
modo como suas vidas se desenvolveram
pode ser muito bizarro, anormal; no
entanto, tudo o que elas estão fazendo é
uma tentativa para crescer, para atualizar
seus potenciais. O fato de essa tentativa
causar maus resultados situa-se mais no
meio ambiente do que na tendência básica
do indivíduo. A pedra fundamental da
psicologia humanista, pelo menos como eu
vejo, é, portanto, essa crença de que o ser
humano tem um organismo positivo e
construtivo.
Nesse contexto, entende-se que o
papel do terapeuta é ser o facilitador do
crescimento humano, acolhendo seu
cliente em todos os seus aspectos, quer
sejam positivos, negativos ou ambíguos,
de maneira a captar as emoções e
vivências ainda não explicitadas.
Assim ocorre a ajuda terapêutica
que pode amadurecer o conceito que a
pessoa tem de si e reavaliar suas
estratégias de vida e visão de mundo,
facilitando a conquista de sua liberdade.
O que fornece crédito a essa visão
é a conquista de inúmeros adeptos e
significativos resultados que ganharam
espaços em diversos ambientes.
Atualmente se vê exemplos na Educação,
nas Organizações, assim como, em
Therezinha Moura Jorge
Comunidades Terapêuticas, integrando o
programa de tratamento em dependência
química.
PALAVRAS QUE APROXIMAM E
TRANSFORMAM PESSOAS
reside em São Paulo, por meio de seus
relevantes estudos e vivência em
comunidade terapêutica lembra que “é
conversando que as pessoas se
convencem, se convertem. A conversa
produz conversão e se torna fonte de
felicidade para muita gente!”. Na
continuidade, expõe que:
Bem-aventurado quem for capaz de
uma boa conversa; ele vai encontrar
alívio para sua dor! (Frei Carlos Mesters)
A mesma razão que moveu os
autores humanistas, também mobiliza
profissionais que estão próximos do nosso
cotidiano. Um exemplo vem de Márcio
Lúcio de Miranda - discípulo brasileiro de
Carl Rogers, médico e terapeuta de Minas
Gerais - que trabalha no que denominou
de Relação de Ajuda. Partindo do
princípio de que “ninguém sai ileso de um
encontro com outra pessoa”, Feldman e
Miranda (2001, p.45) apresentam a
necessidade de escutar e conhecer a vida
daquele que precisa se expressar e
valorizar sua voz no ambiente onde está.
Os que exercem a escuta são
denominados por Feldman e Miranda (2001,
p. 28) como pessoas significativas por serem
aquelas que “tem internalizadas as
dimensões: aceitação incondicional,
empatia, transparência, imediaticidade,
confrontação para melhor e concreticidade”.
Tal intervenção, que busca o bemestar do ser humano, também pode ser
encontrada em demais estudos elaborados
em diferentes localidades de nosso país.
Estudos esses, que se apresentam muitas
vezes como subsídios e ferramentas no
tratamento da dependência química em
comunidades terapêuticas. Ao discorrer
sobre esse assunto, Kuchenbecker, (2011,
p. 24) profissional especialista na área,
atuante em Santa Catarina, afirma que “os
terapeutas precisam, inicialmente, ouvir
atentamente aquele que busca a sua ajuda.
Essa ajuda também é repassada através da
conversação”.
Estes sofrimentos do dia a dia são os que
provocam a maior parte das conversas entre
as pessoas, pois é neste ponto de sofrimento
que todos nós temos alguma experiência,
descobrimos algum remédio ou consolo
para partilhar com os outros, mesmo sem
nunca ter lido a bula. (MESTERS, 2010,
p.17)
Ao mencionar “remédio ou
consolo”, Mesters (2010) traduz de
maneira singela o objetivo da Relação de
Ajuda. Comparação semelhante encontrase na visão de Kuchenbecker (2011, p. 25)
ao relatar que “na relação terapêutica,
tanto o ouvir quanto o falar do terapeuta
são a 'prescrição do remédio' e o ouvir e o
falar do aconselhando são o tomar o
remédio”.
Dessa forma, verifica-se que
visões provindas de distintos lugares,
convergem para caminhos que levam ao
mesmo propósito, ao mesmo remédio,
aqui entendido como o encontro entre
duas pessoas que pode propiciar o bemestar e a saúde para ambos. Visões como
estas se evidenciam como eficazes
soluções em comunidades terapêuticas
que buscam aprimorar suas abordagens de
tratamento. Somar forças nesses
ambientes, significa a abertura para
diferentes áreas do conhecimento e
múltiplas experiências que procuram
cuidar do precioso bem que é a vida. Ponto
esse também abordado por Kuchenbecker
(2010, p. 21) ao comentar que
[...] é um espírito interdisciplinar que move
as ações e ideais das comunidades
terapêuticas. O ser humano é por demais
complexo para ser tratado integralmente
por apenas uma espécie de especialista.
Quem quer ajudar outro ser humano precisa
ser humilde para assumir suas próprias
limitações e aceitar a ajuda de outras áreas
Já Mesters (2010, p. 15), que
31
A ESCUTA QUE HUMANIZA
do conhecimento.
Acreditando nessa forma de ver e de agir,
uma comunidade terapêutica com sede
administrativa em Curitiba, no estado do
Paraná, acolhe e incorpora vários saberes
profissionais em sua proposta de
tratamento.
Já em 2004, a Associação CSS Casas do Servo Sofredor, como é legalmente
denominada, abriu suas portas para acolher
os conhecimentos de Márcio de Miranda. A
partir de uma formação voltada para a equipe
de colaboradores e voluntários da instituição
ministrada por esse discípulo humanista,
efetivou-se o trabalho denominado de Escuta
Terapêutica.
Esta abordagem desde então vem
ampliando sua voz junto às demais
intervenções terapêuticas oportunizadas
pela instituição. Atualmente são realizados
atendimentos individuais com frequência
semanal para cada um dos residentes.
Quinzenalmente acontece o encontro dos
terapeutas que se dedicam a estudos e trocas
de experiências para desenvolver esta
abordagem. Por meio da consciência de que
todos que ali se encontram, em razão de
suas experiências pessoais, profissionais e
espirituais, são considerados aptos para
estarem à frente de pessoas que também
buscam recuperar sua integridade, foi gerado
um fértil ambiente de aprendizado em
humanização.
Relatório oficial (2012, p.10), que
demonstra o trabalho desenvolvido pelas
unidades que compõem essa Associação,
aponta que em 2012 foram realizados 1.590
atendimentos de Escuta Terapêutica.
A importância que as pessoas
envolvidas agregam a esse trabalho é um
fato que se destaca na instituição. A Escuta
se revela como um procedimento que gera
confiabilidade e visíveis resultados
positivos nas pessoas em tratamento, as
quais facilmente se adaptam a essa terapia
que passa a fazer parte de sua rotina
semanal e de seus novos hábitos saudáveis
de vida.
32
Neste sentido, a possibilidade de
humanizar se torna caminho, verdade e
vida na prática da Escuta Terapêutica que
é vista atualmente na Associação CSS
como um dos pilares que sustentam a
recuperação das pessoas dependentes de
substâncias psicoativas.
REFERÊNCIAS
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publicado.
BERNE, Eric. O Que Você Diz Depois De Dizer
Olá? São Paulo: Nova Ed. Nobel, 1988.
CREMA, Roberto. Análise Transacional
centrada na pessoa... e mais além – 2ª ed. – São
Paulo: Ágora, 1985.
FALCÃO, Guilherme. Disciplina: Teorias
Humanas e Existencialistas ministrada no curso
de Pós Graduação em Dependência Química da
FLT. 24 de abril de 2010.
FELDMAN, Clara; MIRANDA, Márcio Lúcio de.
Construindo a relação de ajuda – 12ª ed. – Belo
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FRANKL, Victor E. Em busca de sentido: um
psicólogo no campo de concentração. 22ª ed. São
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Ano IV; Número 10, p. 19 - 23. 2010. 42p.
KUCHENBECKER, Luís C. Interfaces e
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Número 12, p. 21 – 28. 2011. 66p.
MESTERS, Carlos. Jesus da escuta amorosa - As
bem aventuranças de ontem e hoje - Belo
Horizonte: O Lutador: CEAP – editora; São
Leopoldo; CEBI; São Paulo: Paulus, 2010.
ROGERS, Carl Ransom. Tornar-se Pessoa. 3ª ed.
São Paulo, Martins Fontes, 1978.
3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE COMUNIDADES TERAPÊUTICAS E AFINS
Realização: Cruz Azul no Brasil – Blumenau, SC, 27 e 28 de setembro de 2012.
Tema geral:“Avanços e contribuições da RDC 029 sobre a RDC 101”
III Carta de Blumenau
Saudação do Sr. Rolf Hartmann Diretor Presidente da Cruz Azul no Brasil aos presentes...
 Adalberto Calmon Barbosa – Guaratinguetá – SP. Gerente de Projetos e Captação de Recursos da Fazendo
Esperança.
 Adelcio Bernardin – Balneário Camboriú, SC, Diretor da Guarda Municipal de Balneário Camboriú.
 Antonio Fernando das Neves Filho – Blumenau, SC. Coordenador Regional da Polícia Cívil.
 Arsanjo Paul Colaço – Jaraguá do Sul, SC. Presidente da Associação Catarinense de Comunidades
Terapêuticas ACCTE.
 Célio Barbosa – Teresina, PI. Presidente da Confederação Brasileira de Comunidades Terapêuticas CONFENACT e da Federação Norte/Nordeste de Comunidades Terapêuticas - FENNOCT.
 Cássio Slonczewski – Blumenau, SC. Presidente COMEN.
 Chiara Chaves Cruz da Silva – Brasília, DF. Representando a Agência Nacional de Vigilância Sanitária –
ANVISA.
 Edmundo Muniz Chaves – Bauru, SP. Administrador da Comunidade Terapêutica Esquadrão da Vida.
 Hélio Ferreira das Chagas – Brasília, DF. Representante do Dep. Distrital de Brasília Wellington Luiz
(Presidente da Frente Parlamentar contra o Crack da Câmara legislativa do Distrito Federal).
 Ismael dos Santos – Blumenau, SC. Deputado Estadual e Presidente do Fórum Parlamentar de Combate e
Prevenção às Drogas de Santa Catarina, SC -Blumenau –SC.
 Dra. Maika Arno Roeder - Florianópolis – SC. Dra. em Ciências Humanas. Coordenadora da área de
Comunidades Terapêuticas no estado de Santa Catarina, pela Diretoria de Vigilância Sanitária de SC.
 Marcos Mey – Blumenau, SC. Presidente do Centro de Recuperação Nova Esperança – CERENE.
 Maurício Landre – Campinas SP. Coordenador Comunidade Terapêutica Santa Carlota – FEBRACT.
 Mauro Luis de Medeiros – Blumenau, SC. Gerente do COMEN de Blumenau.
 Padre Vitor Hugo Gerhard – Porto Alegre, RS. Assessor de Comunidades Terapêuticas do RS.
 Paulo Roberto de Souza – Bal. Camboriú, SC. Presidente do COMAD e diretor do Resgate Social do
Município.
 Rolf Hartmann – Blumenau, SC Diretor Presidente da Cruz Azul no Brasil.
 Dr. Robson Robin – Brasília – DF. Coordenador-Geral de Políticas de Redução da Oferta da Secretaria
Nacional de Políticas sobre Drogas (SENAD).
 Rosangela Scurssel – Novo Hamburgo, RS. Representante do Padre Haroldo, delegada FEBRACT, RS.
 Cel. Valmor Raimundo Machado – Florianópolis, SC. Presidente da Federação de Comunidades
Terapêuticas de Santa Catarina – FECOTESC.
1. Palestra: Edmundo Muniz Chaves: “História e avanços da regulamentação das Comunidades
Terapêuticas no Brasil”. Salientou que:
 Precisamos de representatividade juntos aos órgãos públicos (Febract, Feteb, Cruz Azul, etc.).
 Precisamos melhorar nossos serviços para podermos ser vistos como uma verdadeira Comunidade
Terapêutica.
 Enquadrar-nos às Legislações vigentes.
 Trabalhar para a efetivação da rede de atenção ao dependente: Comunidades Terapêuticas, CAPSaD,
CRAS/CREAS, Hospitais, Casas de Acolhimento/Passagem, Repúblicas Assistidas, Pós tratamento, etc..
 Articulação das Políticas de Saúde, Assistência Social, Educação, etc..
2. Painel de Debates: “O papel das Comunidades Terapêuticas no tratamento dos Dependentes de
Substâncias Psi-coativas dentro da Rede de Saúde Mental do Brasil”.
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3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE COMUNIDADES TERAPÊUTICAS E AFINS
 Célio Barbosa: Explanou a formação da Confederação Nacional de Comunidades Terapêuticas –
CONFENACT. Toda a atuação e encaminhamentos durante o período de dois anos. Colocou a pauta e
objetivos de todos os encontros realizados:
1) União das Federações e Construção de um Consenso Sobre a Modalidade de CT;
2) Reconhecimento das CTs como modalidade de tratamento pelo Governo Federal;
3) Financiamento de vagas para Tratamento em CT pelo Governo Federal;
4) Análise das alterações entre a RDC-101 e a RDC-029.
Durante este processo foi aprovada a carta de Piauí, disponível para “download” no site da Cruz Azul:
www.cruzazul.org.br. Salientou também que todas as demais Federações e Associações necessitam se
filiarem à CONFENACT. Igualmente todas as CT´s precisam filiar-se à Associações ou Federações
Estaduais, e mostrar resultados de seu trabalho.
Destacou que 90% das internações de dependentes químicos de substâncias psicoativas no Brasil estão
internados em comunidades terapêuticas. E, que das 50 mil vagas oferecidas em CT´s, cerca de 32 mil estão
ocupadas, havendo portanto disponibilidade de vagas.
Nos encontros foi eleita também a primeira diretoria da CONFENACT, que está assim constituída:
1-Presidente: Célio Luis Barbosa – Representando a FENNOCT
2-Vice-Presidente: Pastor Wellington Vieira – Representando a FETEB
3-Secretário: Egon Schluter – Representando CRUZ AZUL NO BRASIL
4-Tesoureiro: Juliano da Silva Marfim – Representando FEBRACT.
 Chiara Chaves Cruz da Silva: Abordou os seguintes assuntos:
- Uso de drogas: problema de saúde pública;
- Estudos sobre o consumo de drogas/crack;
- Plano Integrado de Enfrentamento ao Crack e Outras Drogas;
- Criação da Rede de Atenção Psicossocial;
- Perspectiva de integração das comunidades terapêuticas à rede pública de tratamento;
- Iniciativa de retomar o debate sobre o tema;
- Articulação com Ministério da Saúde, Senad, Fórum Nacional de Conselhos e Vigilâncias Sanitárias;
- Articulação e orientação ao SNVS, para Gerenciamento de Riscos;
- Monitoramento de denúncias por meio de canais como Ouvidoria e SAT;
- Promover ações de incentivo à regularização das instituições, com destaque para a obtenção da licença junto
ao órgão de vigilância sanitária local competente;
- Orientar as instituições por meio de reuniões, oficinas ou seminários, com o objetivo de adequação à norma
dentro do prazo estabelecido;
- Desenvolver ações de comunicação para que a sociedade possa identificar eventuais riscos na prestação dos
serviços e colaborar com a melhoria das instituições;
- Colocou a ANVISA a disposição para as necessidades das CTs, e irão nos próximas semana agendar uma
audiência das lideranças via CONFENACT para discutir a atual legislação que regulamenta o segmento.
 Deputado Ismael dos Santos: Informou que na Assembléia Legislativa de Santa Catarina são 10
Deputados que fomentam debates sobre as Comunidades Terapêuticas e realizam visitas as mesmas. O
deputado Ismael apresentou aos participantes do Fórum uma pesquisa da Universidade de São Paulo - USP na
qual fica visível a necessidade de tratamento aos dependentes em substâncias psicoativas - SPA.
Comentou também sobre a Proposta da Frente Parlamentar Sobre Drogas a qual irá destinar 0,6%
orçamento da Secretaria da Saúde (R$ 1.000.000,00 p/mês) para o tratamento de dependentes químicos.
Serão contratadas 10 vagas por Comunidade Terapêutica, totalizando parceria com 100 Entidades do Estado.
O valor a ser pago por vaga/mensal será de R$ 1.000,00. Do valor recebido a Entidade poderá usar 60% para
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3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE COMUNIDADES TERAPÊUTICAS E AFINS
pagamento de profissionais e 40% para manutenção. O início deste projeto de parte do Governo Estadual está
previsto a partir de janeiro 2013. Salientou, ainda que as Comunidades Terapêuticas que participaram dessa
parceria deverão ter também atendimento a adolescentes; estarem já conveniadas com o Estado e
credenciadas na Secretaria de Assistência Social de SC; terem uma proposta terapêutica (Programa
Terapêutico). O Estado de SC financiará a vaga para tratamento pelo período de 06 meses somente.
Destacou, também, a importância e realização do “1º Encontro Catarinense de Políticas Públicas sobre
Álcool e outras Drogas - Drogas é Possível Vencer?”, que será realizado no dia 27 a 29 de novembro de 2012,
em Florianópolis com a participação de todos os setores públicos e representações das comunidades
terapêuticas, associações e federações.
 Maurício Landre: Atualmente trabalhando como Diretor da Comunidade Terapêutica Rural Santa
Carlota (Itapira/SP). Falou de sua experiência na formação de uma Comunidade Terapêutica privada com o
apoio e investimento público.
 Adalberto Calmon Barbosa: Apresentou o trabalho da Fazenda da Esperança, iniciado em
Guaratinguetá, SP, e que hoje possuí mais de 60 no Brasil e no exterior, com milhares de resultados positivos
na recuperação de milhares de pessoas e famílias.
 Padre Vitor Hugo Gerhard: Trouxe uma visão panorâmica do trabalho das Comunidades Terapêuticas
do Rio Grande do Sul.
3. Palestra: Dr. Robson Robin: “Reconhecimento das Comunidades Terapêuticas pelo Governo Federal”.
Dr. Robson falou sobre o reconhecimento das CT´s como instrumento para receber os dependentes químicos
de substâncias psicoativas – DQSPA. Acolher e dar condições de retorno à sociedade. Frisou que o Governo
Federal atual reconhece o trabalho das comunidades terapêuticas, mas também exigirá seriedade e
configurações de ação de parte delas e de estarem dentro das normas mínimas exigidas pelos órgãos
governamentais.
Informou que no início do mês de outubro/2012 deverá ser publicado pelo Governo Federal o Edital de
Habilitação das Comunidades Terapêuticas para o financiamento de vagas de tratamento. Para que as CT´s
possam participar do Edital elas devem preencher alguns requisitos mínimos:
a. Necessidade de Programa Terapêutico;
b. Seriedade Fiscal;
c. Documentação em dia;
d. Configurado com as normas da ANVISA/SENAD.
e. Colaboradores capacitados, através do sistema de Ensino a Distância, a ser oferecido pela SENAD.
Sublinhou também que dentro da regulamentação das CT´s os CONEN e COMEN serão os “fiscais” a
serviço da SENAD. E que o simples fato de participarem do recente Censo das CT´s não credencia
automaticamente as mesmas para financiamento da SENAD.
Outro item amplamente discutido entre os presentes e colocado para o representante da SENAD foi a questão
da capacitação de obreiros de CT´s. Ou seja, já existem – há muitos anos – diversos cursos de capacitação
feito pelas Federações de CT´s, e estes precisam também serem valorizados e reconhecidos pela SENAD.
Não podem agora serem simplesmente ignorados. Este assunto, ainda está em aberto, e deverá ser levado
pela CONFENACT para ser melhor analisado e discutido junto a SENAD.
3.
Palestra: Dra. Maika Arno Roeder: “O Impacto da RDC-029 sobre nas Comunidades
Terapêuticas de Santa Catarina”. Assuntos trabalhados:
- Necessidade de se observar os alvarás que a grande maioria das CT's não possui;
- Ter um padrão de registro de limpeza das caixas d'água;
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3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE COMUNIDADES TERAPÊUTICAS E AFINS
- A partir da RDC-029 houve uma redução de exigências de profissionais muito grande. Atualmente só é
necessário um titular como responsável técnico – RT pela CT e um substituto, com formação que qualquer
área. É necessário também que eles estejam sempre alguém a disposição e atendendo na comunidade.
Destacou a necessidade de uma capacitação/formação para os RT´s
- Redução de danos é uma etapa/estratégia para se alcançar a abstinência, e não um objetivo em si.
- Preocupação da territorialização por parte de algumas CT´s, onde a grande maioria está localizada no litoral.
- Parabenizou que em vários aspectos as CT's têm melhorado significativamente a partir de pesquisas feitas
pela Vigilância Sanitária Estadual.
Dados atuais da ANVISA:
- Total de Comunidades Terapêuticas em Funcionamento: 101
- Total de Comunidades Terapêuticas não Encaminhadas: 7
- Total de Comunidades Terapêuticas com Alvará Sanitário: 60
- Total de Comunidades Terapêuticas fechadas, interditadas ou que mudaram de ramo: 27.
4.
Painel de debates: “Futuro e desafios para as Comunidades Terapêuticas: Financiamento x
Inclusão na Rede de Saúde Mental”.
 Arsanjo Paul Colaço: Organização das comunidades terapêuticas. Importância do associativismo das
CT´s. Cursos de Capacitação através da Cruz Azul e outras Federações. Criação de um selo que destaca o
apoio às CT´s. Padronização da nomenclatura das funções dos colaboradores das Ct´s.
 Adalberto Calmon Barbosa: Mudança de consciência – buscar associativismo entre as CT´s. Não
depender exclusivamente dos poderes públicos para sua manutenção, mas buscar recursos também junto à
sociedade. Utilização dos recursos públicos para aumentar a capacidade de atendimento; Importância da ação
dos recuperandos na indicação/recomendação das CT´s.
 Marcos Edwin Mey: Continuar vencendo as drogas; Aumentar o percentual de recuperação, capacitando
e investindo no treinamento e capacitação dos colaboradores/profissionais da CT, as quais em sua maioria são
pessoas que amam pessoas, centrados no Evangelho de Jesus Cristo. A Confederação manter e ampliar cada
vez mais a luta pelas CT´s; Reconhecimento das CT´s junto aos órgãos governamentais e comunidade em
geral.
 Pe Vitor Hugo Gerhard: Proposição de um novo modelo/estilo de vida, como por exemplo eliminar a
venda de bebidas alcoólicas nas igrejas; trabalho voluntário; Associativismo; qualificação dos
colaboradores; Promover a multiplicação dos Grupos de Apoio às famílias e egressos das CT´s.
 Cel. Valmor R. Machado: Investir e ampliar cada vez mais na prevenção primária. Reconhecimento das
CT´s. Associativismo.
 Célio Barbosa: Incentivar e ampliar a formação de associações e federações Estaduais de CT´s, e
automaticamente se filiarem a CONFENACT; Não utilizar os benefícios públicos (como auxílio doença do
INSS) para manter a CT´s; Fiscalizar as CT´s quanto à forma de tratamento dos residentes; Cuidados com
intervenção da Saúde Mental na forma de atuação das CT´s em decorrência dos financiamentos públicos às
mesmas.
Além das temáticas abordadas acima, houve durante a solenidade de abertura, na quinta-feira a noite, dia 27, a
apresentação do trabalho da Cruz Azul no Brasil, apresentado pelo Diretor-Presidente Rolf Hartmann. Sob o
título: “Raízes e contribuições da Cruz Azul para uma vida sem drogas!”.
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3º FÓRUM SUL BRASILEIRO DE COMUNIDADES TERAPÊUTICAS E AFINS
O III Fórum Sul Brasileiro de Comunidades Terapêuticas e Afins teve seu encerramento às 17h00min do
dia 28 de setembro de 2012, após a saudação final e agradecimentos feitos pelo Diretor-Presidente da Cruz
Azul no Brasil Rolf Hartmann.
Otto Müller, Diretor da Comunidade Terapêutica do CERENE em São Bento do Sul, SC, fez a oração final de
agradecimento e pelo trabalho das Comunidades Terapêuticas no Brasil e no exterior.
Blumenau, SC, 27 de setembro de 2012.
Rolf Hartmann
Diretor-Presidente da Cruz Azul no Brasil
Egon Schlüter
Coordenador Administrativo e de Projetos
Luis Carlos Ávila
Coordenador da Área de Educação Continuada e
do III Fórum Sul Brasileiro de Comunidades Terapêuticas e Afins
Relatores:
Marilei Tribess
Cássio Slonczewski
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