água, agricultura e as alterações climáticas globais
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água, agricultura e as alterações climáticas globais
Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária ÁGUA, Junho de 2008 AGRICULTURA E AS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS GLOBAIS Zuleika Beyruth1 1 Bióloga, Doutora, Pesquisadora Científica, Pólo APTA Leste Paulista, Estrada Municipal Monte Alegre - Pinhalzinho, km 3, Caixa Postal 01, CEP: 13910-000Monte Alegre do Sul - SP, [email protected]. RESUMO As atividades humanas alteraram profundamente os ciclos biogeoquímicos do planeta, e as alterações climáticas globais podem afetar consideravelmente sua biosfera. Este artigo tem o objetivo de alertar sobre o panorama geral das causas e conseqüências das alterações globais em andamento, com ênfase nas águas e na agricultura, sem, no entanto, exaurir este tema tão amplo. A temperatura média global subiu 0,6 °C no século 20 e pode elevar-se em mais 1 °C até 2030, segundo o Painel Internacional de Alterações Climáticas. A projeção para 2090 indica aumento de até 4 °C, caso medidas de prevenção não sejam adotadas. Como grande parte do planeta Terra é água e toda a vida no planeta depende da água, a relação entre as mudanças globais e a água é direta, imediata, progressiva e em cadeia e essas mudanças podem trazer graves conseqüências ambientais. A fusão das camadas de gelo polar, em andamento, é importante nas regiões costeiras, onde a água do degelo altera o nível do mar, causando inundações e submersão de ilhas e terras baixas, reduzindo as áreas disponíveis para ocupação e atividade humana. Nas regiões equatoriais, o aquecimento pode provocar desertificação e afetar áreas produtoras de alimentos. Alternativas de ação para a redução dos problemas causados pelo efeito estufa estão sendo propostas por cientistas e organizações ambientais: a) ações globais de limitação do crescimento da indústria, do consumo e da população; b) ações locais para reduzir a emissão de poluentes industriais, sistemas de escoamento de águas, etc.; c) ações individuais, constantes, de redução de consumo e economia de matéria e energia, com consumo local. A adoção deste conjunto de medidas pelos diversos países seria a melhor forma de se tentar controlar este processo deletério ao ambiente e à vida como é conhecida em nosso planeta. Palavras-chave: água, agricultura, aquecimento global, efeito estufa, cidadania. 74 www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária ÁGUA NA TERRA Aproximadamente 71% da superfície da Terra é ocupada pelos oceanos, que constituem 97% da água do planeta, sendo responsáveis pelos seguintes serviços ambientais relacionados ao clima: estocar e redistribuir calor e água em todo o globo através das correntes, moderando eventos extremos, e facilitar a circulação e distribuição da matéria e da energia para pontos distantes da origem. Os rios exercem estas funções num âmbito mais reduzido e com maior interatividade com a terra. A distribuição de calor e água nos oceanos é função de forçantes externas, como ventos, rotação da Terra, topografia oceânica, e dos fatores salinidade, temperatura, pressão e densidade da água, com importância crucial nas trocas entre a atmosfera, a superfície da água e o fundo dos oceanos. No ar e nas águas, estes processos são mais intensos, fazendo com que estes meios tenham maior capacidade de influir no clima. A evolução tecnológica, com as imagens de satélite, medições da radiação e análises de partículas, ampliou o conhecimento sobre os mecanismos naturais globais, permitindo saber que os ventos são capazes de carregar nutrientes de desertos distantes para os mares; o ferro do continente africano pode alcançar os mares do Caribe, transportado na poeira pelos ventos, fertilizando suas águas, promovendo o crescimento de algas sobre os recifes de coral; a poeira do Deserto de Gobi pode alcançar as Ilhas Havaianas, a 6.000 km de distância, fornecendo fósforo para o sustento das florestas. Os fluxos dos rios ligam terra e mar, a maior via de transferência do carbono e outros materiais no planeta (Meskhidze e col. 2005). Entre as conexões oceano-atmosfera há os fenômenos ENOS (El Niño Oscilação Sul), relacionando inundações, queima de florestas na África, Austrália e América do Sul: mudanças no comportamento dos ventos no Oceano Pacífico equatorial causam alterações na temperatura da superfície oceânica, promovendo mudanças no comportamento dos ventos e aquecendo as águas do Pacífico (2 a 4 0C), bem como movimento das massas de ar para a América do Sul (INPE e CPTEC, 2008). Em conseqüência destas alterações, a circulação global dos ventos sofre reajustes, ocasionando chuvas torrenciais na costa do Equador e do Peru; chuva no oeste americano e seca no leste; secas no nordeste/norte do Brasil, Austrália, Indonésia e sul da África (NOAA, 2008). O Relatório do IPCC (2007) afirma que: "Até 2080, é possível que 1,1 a 3,2 bilhões de pessoas sofram de falta de água; 200 a 600 milhões, fome; 2 a 7 milhões de www.apta.sp.gov.br Junho de 2008 pessoas por ano padecerão dos efeitos das enchentes". Pode-se esperar, portanto, êxodo, aumento do preço da água e dos alimentos e redução da segurança alimentar. HISTÓRICO O crescimento da população humana mundial foi explosivo no último século. Agora há cerca de seis bilhões e meio de seres humanos (IPC, 2008), ou seja, quatro vezes mais do que há um século (Cotton & Pielke, 1995), e as estimativas de crescimento indicam uma população de nove bilhões de pessoas na Terra em 2050 (US Census, 2008). Nos últimos dez anos, a população aumentou em um bilhão de pessoas, desta forma, recursos ambientais antes considerados inesgotáveis estão num processo de aumento progressivo de demanda e disputa pelo uso. A água está sendo utilizada em muito maior quantidade, passandose a captar água superficial e subterrânea de forma massiva para atender às demandas. A captação subterrânea contribui para aumentar a disponibilidade atmosférica de água, ampliando o efeito estufa. Visando à sustentabilidade desses recursos, toda uma legislação ambiental, e especialmente quanto aos recursos hídricos, foi implantada no mundo todo. O cenário de futuro, mantidos o consumo e o aumento numérico da população humana nas mesmas proporções das últimas décadas, será de disputa não apenas por espaço para produção de alimento e energia, mas principalmente por água, que deverá ser o principal fator limitante do desenvolvimento nas próximas décadas (Margalef, 1994). Desta forma, um número crescente de pessoas passa a depender de um volume cada vez menor de água, sendo que a diminuição da biodiversidade também é esperada nestas condições, uma vez que a perda da quantidade e qualidade de água afeta a todas as formas de vida do planeta (Neiff, 1996). Além disto, há efeitos em cadeia, de espécies dependentes de outras, que, uma vez extintas, propiciam sua extinção. O processo ocorre em cadeia, é radiativo e cumulativo. A alta concentração de alguns gases na atmosfera provoca o Efeito Estufa. Os raios solares que chegam à Terra têm mais dificuldade para serem refletidos de volta ao espaço sideral e o calor fica retido na atmosfera, causando o aquecimento da superfície terrestre e da atmosfera, ou seja, toda a biosfera pode ter sua temperatura alterada. O Efeito Estufa pode causar vários danos ambientais, como enchentes (devido ao derretimento das calotas polares) e sérios prejuízos às atividades agrícolas e ao desenvolvimento econômico. 75 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária O assunto começou a ser discutido no início dos anos 1990, com a produção do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, o IPCC. Esteve na pauta do Rio-92, quando foi aprovada a Convenção sobre Mudança Climática, que estabelece estratégias de combate ao efeito estufa, com o comprometimento de mais de 150 países. A convenção deu origem ao Protocolo, assinado na cidade de Kyoto, Japão, em 1997, por representantes de 84 nações, que é o acordo global, no qual se prevê a redução de 5,2% das emissões dos principais gases poluentes, tendo como referência o nível registrado em 1990. O objetivo era fazer com que os países industrializados, principais responsáveis pelo efeito estufa, reduzissem e controlassem suas emissões de gases a partir de 2005 para atingir a meta até 2008-2012. Nas negociações subseqüentes, os países assumiram diferentes metas percentuais e a possibilidade de utilizar mecanismos flexíveis, trocando cotas de emissão por cotas de absorção de carbono pelos chamados "sorvedouros", as florestas e as terras agrícolas. Estão previstas condições e penalidades para os países que não conseguirem cumprir a sua parte. Uma das medidas mais discutidas é investir em produção de energias alternativas, outra é aumentar os mecanismos de seqüestro de carbono, ou seja, de remoção do excesso de carbono da atmosfera, nas trocas de cotas entre áreas ou países. Para entrar em vigor e adquirir o status de lei internacional, o documento precisaria ser ratificado pelos governos de diversos países. Durante as negociações, vários obstáculos impediram sua aprovação global. Os EUA respondem por 25% da emissão de gases poluentes do mundo e seu governo, alegando que está em busca de medidas alternativas, não ratificou o tratado. Entretanto, nos últimos anos, alguns estados, como a Califórnia, se comprometeram a cumprir as metas do protocolo. O Brasil ratificou o acordo, com aprovação, no primeiro semestre de 2002, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, e, em julho de 2002, o presidente Fernando Henrique Cardoso assinou a adesão do Brasil, oficializando a ratificação. O QUE É O EFEITO ESTUFA Causas possíveis Há evidências expressivas, segundo os documentos do IPCC, de que a maior parte do aquecimento seja resultado de atividades humanas, podendo ser mencionadas aquelas que propiciam: 76 Junho de 2008 aumento de gases de efeito estufa; maior uso de águas subterrâneas; maior uso do solo para pasto e agroindústria; maior consumo de energias produtoras de gases, por exemplo, combustíveis fósseis e gasosos; e aumento geral da poluição. Evidências: medidas de temperatura de estações meteorológicas em todo o globo desde 1860; aumento médio da temperatura: 0,6 ± 0,2 ºC, durante o séc. XX; aumento do nível global dos mares; aumento das precipitações; aumento da cobertura de nuvens; aumento dos efeitos das Oscilações Sul: El Niño e La Niña; aumento de outros eventos climáticos extremos; variações da cobertura de neve das montanhas e de áreas geladas; diminuição de mais que 10% da área coberta por neve desde os anos 1960; diminuição da área da cobertura de gelo no hemisfério norte na primavera e verão; retração dos glaciares e da cobertura de neve das montanhas de regiões não polares em todo o séc. 20. Efeitos: aumentos de temperaturas e de concentrações atmosféricas de CO2, contribuindo para o aumento expressivo da produtividade primária dos ecossistemas e do nível médio das águas do mar. O aquecimento global provoca elevação do nível das águas dos mares principalmente devido à expansão térmica da água dos oceanos e à fusão das calotas polares e camadas de gelo das montanhas, que são muito mais afetados pelas mudanças climáticas do que as camadas de gelo da Groenlândia e Antártica. A previsão para a soma dos fatores é um aumento entre 14 e 43 cm do nível das águas até o fim do século, o que pode promover a submersão de ilhas e terras baixas litorâneas. Alterações nos eventos climáticos devem ser consideradas nos contextos de ciclos temporais e de sua distribuição espacial. Estas mudanças são globais pela amplitude geográfica das alterações na composição atmosférica e seus reflexos na biota, mas só podem ser consideradas como decorrentes das atividades humanas, comparando resultados das variáveis pertinentes, dos períodos pré e pós-revolução industrial. As mudanças climáticas se expressam, também, pelo aumento de perturbações naturais, tais como as grandes inundações, secas de longa duração, tufões em maior quantidade e intensidade, aparecendo com mais freqüência em regiões extratropicais, bem como pelo recrudescimento dos fenômenos oceânico-atmosféricos E N O S ( a n i m a ç ã o e m http://www.pmel.noaa.gov/tao/elnino/ninohome.html), evento global de grande escala, forte modulador para outros sistemas atmosféricos, podendo atuar estimulando ou enfraquecendo os mesmos. www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Junho de 2008 A fase quente é o El Niño, quando a pressão ao nível do mar fica mais elevada que o normal no Pacífico tropical oeste e mais baixa que o normal no Pacífico tropical sudeste; as anomalias de temperatura da superfície do mar são positivas e os ventos alísios ficam enfraquecidos no Pacífico equatorial central e leste, a termoclina fica mais rasa no lado oeste e mais profunda no lado leste do Pacífico tropical; a convecção enfraquece no Pacífico oeste, aumentando no lado oposto. A fase fria é La Niña, com características inversas às do El Niño. As conseqüências sociais e econômicas são sentidas na agricultura, pesca, engenharia, produção de energia, indústrias, etc. (Garcia, 2006). Os agentes causadores do efeito estufa são: as forçantes naturais, os gases de efeito estufa (GEE) e as demais forçantes antropogênicas, isto é, as geradas pelo homem quando suas atividades passaram a promover alterações em larga escala, após a revolução industrial e após o início do uso dos combustíveis fósseis. As naturais incluem: alterações da energia solar e das quantidades de aerossóis provenientes de erupções vulcânicas. Os principais gases do efeito estufa são: 1) CO2 - Dióxido de carbono ou gás carbônico (gás incolor); 2) CH4 - Metano (gás incolor); 3) N2O - óxido nitroso (gás incolor mais pesado que o ar); 4) CFCs clorofluorcarbonetos - os gases dos frascos vaporizadores (desodorantes, etc.), gases esses aos quais se atribui a diminuição da camada de ozônio; 5) vapor d´água. As forçantes totais do clima pósrevolução industrial incluem a soma progressiva do efeito de todos os GEE, que combinados resultam no efeito do aquecimento ou resfriamento. Das forças naturais, o aumento do brilho do sol pode causar variações positivas da temperatura, enquanto variações da quantidade de aerossóis vulcânicos podem causar tanto aquecimento quanto resfriamento, dependendo das condições locais. A soma dos efeitos de todas estas forçantes é semelhante ao efeito do dióxido de carbono sozinho, e o conhecimento de cada uma torna-se necessário para o desenvolvimento de políticas efetivas de combate ao aquecimento. As outras forçantes, as antropogênicas são: fuligem, ou carbono negro, que é o pó negro formado durante a combustão incompleta da matéria orgânica; aerossóis refletivos, que são partículas muito pequenas em suspensão no ar, que refletem a luz do sol de volta para o espaço; solo; poeira; mudanças na cobertura vegetal; mudanças forçadas nas nuvens. O carbono negro também promove o aumento da temperatura, enquanto outras forçantes antropogênicas, tais como aerossóis, poeiras, mudanças nas nuvens e alterações na cobertura do solo, têm efeito negativo na temperatura, promovendo o resfriamento da superfície da terra. Tabela 1. Gases traço atmosféricos significantes para o aumento do efeito estufa (Krupa, 1997). Gás Carbônico (Co2) Metano (Ch4) Óxido Nitroso (N2O) Clorofluorcarbonetos (CFCs) Ozônio (O3) Monóxido de Carbono (CO) Vapor d´água (H2O) Principal fonte antrópica Combustíveis fósseis, desmatamento Cultivo de arroz inundado, pântanos, pecuária, combustíveis fósseis, queima de biomassa Fertilizantes e conversão do uso da terra Refrigeradores aerossóis, processos industriais Hidrocarbonetos (com NOx), queima de biomassa Combustíveis fósseis, queima de biomassa Conversão de uso da terra, irrigação Tempo de vida na atmosfera 50-200 anos 10 anos 150 anos 60-100 anos semanas a meses meses dias Taxa anual atual de aumento 0,5% 0,9% 0,3% 4% 0,5-2,0% 0,7-1,05 desconhecido Contribuição relativa ao efeito estufa antrópico 60% 15% 5% 12% 8% - desconhecido www.apta.sp.gov.br 77 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária A Tabela 1 mostra que a agricultura tem papel importante no balanço da quantidade da maior parte dos gases do efeito estufa. Riscos do desconhecimento Algumas indústrias estão propondo medidas de fertilização das águas para promoção da produção primária, o que levaria ao seqüestro de quantidade considerável de carbono num primeiro momento. Entretanto a conseqüência da fertilização das águas já é suficientemente conhecida para permitir afirmar que esta seria uma alternativa indesejável, pois os aportes promoveriam a simplificação extrema e a ruptura das cadeias tróficas existentes, com a redução da biodiversidade em todos os níveis tróficos, e o conseqüente empobrecimento das cadeias produtivas que culminam nas espécies úteis para a alimentação humana. No ambiente aquático, as espécies vegetais com estratégia r, oportunistas de mais rápido crescimento e multiplicação quando há abundância súbita e massiva de nutrientes, ao se tornarem dominantes, promovem o desenvolvimento de cadeias tróficas com diversidade extremamente reduzida, em detrimento das cadeias mais elaboradas e diversificadas, como é o caso do crescimento massivo das microalgas tóxicas em represas poluídas da cidade de São Paulo (Beyruth, 2000; 2006). Prevenir é melhor que remediar, pois inclui menor a nenhum custo financeiro e ambiental, além de ser mais eficiente que as possíveis ações de recuperação. Ações deste tipo devem, portanto, ser controladas por legislação específica, para proteção da biodiversidade e das cadeias produtivas de interesse econômico. Quais as globais? causas das alterações Segundo o IPCC, a liberação continuada dos GEE está aumentando a temperatura terrestre, alterando o clima no qual as espécies existentes evoluíram e ao qual estão plenamente adaptadas e do qual os seres humanos e os sistemas agrícolas dependem. Além disto, esse aumento da temperatura global está causando elevação do nível do mar. A concentração de dióxido de carbono na atmosfera já aumentou cerca de 30% desde o início da revolução industrial e, se o processo não for revertido, deverá continuar a aumentar. A maior parte desse aumento provém da queima de combustíveis fósseis, como o carvão, óleo e gás natural utilizados para aproveitamento energético, mas cerca de 25% do aumento nos últimos 150 anos se deve às mudanças de uso da terra, como desmatamento 78 Junho de 2008 e novas formas de tratamento de solos para produção de alimentos, que, além disso, reduzem sua biota. Com estas alterações de uso perdem-se dois dos compartimentos mais importantes de retenção de Carbono: as florestas e os organismos do solo. Se os totais mundiais de fotossíntese e respiração não se equilibram, o Carbono se acumula em algum dos compartimentos: no solo ou sobre ele, retido na biomassa viva, quando a taxa de fotossíntese é maior, ou na atmosfera, quando liberado pela respiração, queima ou decomposição. As taxas globais de fotossíntese e respiração não são conhecidas, nem são medidas com precisão suficiente para determinar os estoques e suas alterações anuais. Entretanto, a utilização humana da terra, como o desmatamento para cultivo, é bem documentada na história dos cultivos e atualmente nos registros de imagens, o que permite utilizar estes dados para avaliar os reservatórios de Carbono e suas alterações. Grande parte do Carbono armazenado nas árvores e solos é liberado para a atmosfera quando as florestas são substituídas por cultivos, em razão da redução tanto da diversidade de espécies como da diversidade espacial e da possibilidade do Carbono ser assimilado nos diferentes estratos e em diferentes intensidades luminosas pelas diferentes espécies da floresta, nas diferentes alturas das plantas. A biomassa é muito maior quando se consideram a área, a profundidade e o volume atingido pelas raízes no solo até todo o aproveitamento do espaço sobre o solo até a maior altura das árvores. Em termos de produção, o aproveitamento da radiação e do dióxido de carbono na fotossíntese é consideravelmente maior nas florestas diversificadas tropicais, onde o aproveitamento da luz se dá em todos os estratos da vegetação. A diminuição da diversidade vegetal também pode determinar a redução da diversidade dos organismos do solo, em termos tanto do número de espécies como da diversidade espacial, pois há redução da área de enraizamento e de cobertura do solo. Após o plantio, durante a fase de crescimento das plantas cultivadas, o Carbono passa a ser absorvido apenas na altura das plantas cultivadas. A floresta morta se decompõe, liberando o Carbono através da respiração dos organismos que a consomem. Se o terreno é queimado, queimam-se, além da floresta, os microrganismos do solo, que passam a ser decompostos e a contribuir para as emissões de Carbono para a atmosfera. Os herbicidas, em sua maioria, também agem destruindo, com outros biocidas, a fauna e a flora naturais do solo. Parte desta libertação ocorre rapidamente através da queima em incêndios florestais e parte ocorre lentamente com a decomposição natural do material morto. www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Junho de 2008 Enquanto crescem, as florestas retiram Carbono da atmosfera em quantidades consideráveis, armazenando-o novamente nos vegetais e nos solos. A diferença entre o total de carbono liberado para a atmosfera e o total dela retirado determina se a terra é uma fonte ou um sumidouro de carbono atmosférico. Portanto, é necessário o registro das taxas de mudança de uso da terra, utilizando-se bons indicadores, como, por exemplo, as taxas anuais de desmatamento e as alterações da quantidade de Carbono que se seguem às alterações da utilização do solo. Estima-se que entre 1850 e 2000 perto de 155 Pg de Carbono foram liberados para a atmosfera a partir de mudanças na utilização do solo, no mundo inteiro (1 Pg (Petagrama) = 1 Gt (Gigatonelada) = 1.000 milhões de toneladas). O montante liberado a cada ano aumentou em geral ao longo do período, e até os anos de 1990 a taxa de liberação média foi de cerca de 2 Pg de Carbono por ano (IPCC, 2008). A Figura 1 mostra a variação da temperatura entre o ano 1850, quando se iniciou o registro constante da temperatura atmosférica, e o ano 2000. meteorológicas, balões meteorológicos, satélites, radares, e muitos outros tipos de registros indicadores de variáveis climáticas também são utilizados atualmente: alterações nos anéis das árvores antigas, como as sequóias, e a composição gasosa dos núcleos de gelo da Antártida (NOAA, 2008). Tais resultados permitiram construir o gráfico a seguir. Taxa de aumento dos GEE Figura 2. Variações da temperatura global entre 1880 e 2000. “CFCs” Mundança nas forçantes (Watts/metro quadrado /século) N2O CH4 CO2 Noções básicas sobre energia - calor Figura 1. Taxa de aumento dos GEE na atmosfera. Como se global? mede o aquecimento Os primeiros registros de temperatura iniciaramse na Europa ocidental no final do século 17 e início do 18. A rede de estações aumentou ao longo do tempo, e com o início do século 20 os equipamentos foram permitindo registro em quase todas as regiões, exceto nas polares, onde as coletas começaram nas décadas de 1940 e 1950. Registros de temperatura de mais de 7.000 estações de todo o mundo foram compilados pelo NOAA-NCDC (National Oceanic and Atmospheric Administration - National Climate Data Center) para a criação da Rede Global Histórica de Climatologia (GHCN Versão 2 conjunto de dados; Peterson e Vose 1997). Dentre os diversos tipos de plataformas que contribuem para os centros de dados que a NOAA utiliza atualmente estão: navios, bóias, estações www.apta.sp.gov.br A propagação térmica é a troca de energia sob a forma de calor entre dois corpos de temperaturas diferentes e segue sempre do corpo de maior para o de menor energia (calor). O calor se propaga por: 1. Condução: de uma partícula para outra, entre sólidos. Uma molécula começa a vibrar em maior intensidade e esta vibração vai passando de molécula para molécula, por exemplo, quando se aquece metal. 2. Convecção: as moléculas se movem, aumentando a temperatura por onde passam e distribuindo calor. Ocorre nos fluidos, gases e líquidos. 3. Irradiação ou radiação: é a distribuição do calor por meio de ondas eletromagnéticas. Não precisa de partículas e se propaga no vácuo. É importante lembrar as formas de propagação do calor, pois cada uma representa um papel diferente no clima. O calor do sol chega à superfície do planeta através da Radiação, atravessando o vácuo no espaço sideral. Da luz incidente total, 50% alcança a superfície terrestre, onde parte do calor é absorvido pelos líquidos e gases, nos quais passa a se propagar por convecção. 79 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária O restante, atingindo a parte sólida da Terra, passa a se propagar por condução; deste, 20% é absorvido pelos gases, nas faixas correspondentes do espectro eletromagnético, a saber, O 3 ozônio estratosférico e O2 oxigênio molecular, na faixa de radiação ultravioleta (< 400 nm), enquanto que o CO2 dióxido de carbono e o H2O vapor d´água absorvem nas faixas do infravermelho: 800 nm e 3 nm, respectivamente. Os 30% restantes são refletidos para o espaço sideral, pelo albedo, que é a capacidade reflectiva das superfícies das nuvens, gelo, neve, areia e vapor d´água, sem ocorrer absorção. Conforme a intensidade ou período de ação, estas forçantes podem ou promover a reflexão da luz do sol de volta para o espaço sideral, ou formar uma barreira, impedindo que a luz do sol atinja a superfície terrestre. No caso de contenção da radiação na atmosfera e superfície do solo, Junho de 2008 a tendência é o aumento gradativo e progressivo da temperatura. No caso inverso, quando a luz do sol é impedida de atingir a superfície da terra pode ocorrer o resfriamento e o impedimento gradativo e progressivo da produção primária, como verificado durante e logo após a queima de poços de petróleo iraquianos em 1991 (Ralloff e Monastersky, 1991). O vapor d´água é responsável por 80% do efeito estufa natural. Portanto, a água é um fator extremamente importante na conservação dos padrões de regulação térmica do planeta, tanto por refletir calor como por participar da propagação por convecção e fazer parte dos ciclos biológicos envolvidos. A alteração da distribuição do calor na superfície do planeta promove alterações das correntes de ar e das taxas de evaporação e evapotranspiração, em nível global, mas também das reações dos seres vivos. Tabela 2. Conseqüências da variação da Temperatura Efeitos Motivos de preocupação Maior taxa de evaporação Sob temperaturas mais altas uma maior quantidade de água evapora. Os efeitos serão diferentes em cada região. Algumas regiões ficarão mais secas e outras, mais úmidas e a distribuição da pluviosidade tende a se alterar. Isto pode causar graves problemas para ecossistemas sensíveis a excesso e escassez de água. Também afeta a agricultura e a pecuária. Secas e enchentes serão mais freqüentes e intensas. No Brasil, com a dependência dos rios para produzir energia elétrica (mais de 90%), a falta de água, podem ser crítica. Alterações nos regimes dos ventos e das chuvas A alteração na distribuição de calor causando modificações nas correntes de ar na atmosfera, aliam-se a diferentes distribuições das chuvas podendo causar alterações ambientais locais e alterações temporais dos fenômenos climáticos, para as quais as espécies de plantas e animais não estão adaptados. P.ex. a polinização pelo vento, as migrações dos pássaros e outros ciclos biológicos podem ser perturbados. Degelo das calotas polares O recuo de geleiras, causando a redução de áreas emersas em arquipélagos, a diminuição no número de lagos, a perda da água doce, a possibilidade do permafrost passar a emitir o metano nele estocado, são danos nos sistemas biológicos, que em cadeia passam a causar outros danos ambientais consideráveis. Alteração nas estações do ano O aumento de temperatura poderá estender o verão e encurtar o inverno, o que afetará os ecossistemas regulados pelas estações do ano, a migração dos pássaros, a produção de frutas e flores e o acasalamento dos animais. Há risco de muitos ecossistemas ficarem permanentemente danificados. Expansão térmica dos oceanos A água aumenta de volume com o aumento de temperatura. O nível dos oceanos, portanto, pode aumentar significativamente, submergindo praias, ilhas e cidades costeiras em água salgada. A água do mar poderá contaminar a água doce superficial e subterrânea que abastece a população, afetando a qualidade de vida, mesmo nas regiões litorâneas não submersas. Aumento da temperatura dos oceanos O aumento da temperatura dos oceanos pode causar a morte de corais e de outras fontes de alimento para a vida marinha. Desta forma, as populações de peixes e outros animais marinhos poderão diminuir ainda mais e algumas espécies poderão ser extintas. 80 www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Agricultura e alterações climáticas A agricultura e a natureza exercem profunda influência recíproca. A agricultura tem contribuído durante séculos para a criação, manutenção e disponibilidade de uma variedade de hábitats seminaturais, moldando a maior parte das paisagens do Hemisfério Norte e grande parte do Hemisfério Sul, algumas delas constituindo o refúgio de uma vida selvagem rica e diversificada. A agricultura também sustenta uma comunidade rural diversa que, além de constituir a base cultural fundamental de cada povo, desempenha um papel importante na manutenção do equilíbrio e da saúde ambiental (AEA, 2008; Lacroix, 2007). A agricultura tem sido considerada vilã nos problemas do efeito estufa. A contribuição global total da agricultura, considerando-se todas as emissões diretas e indiretas, varia de 8,5 a 16,5 Pg de CO2 equivalentes. As emissões dos gases óxido nitroso (N2O) e metano (CH4) geralmente são expressas em CO2 equivalentes, relativamente ao seu potencial de aquecimento em 100 anos: N2O tem 296 vezes mais potencial de aquecimento que o CO2, e o CH4 tem um potencial 23 vezes maior, o que representa 17 a 32% de todas as emissões globais de GEEs induzidas pelo homem, incluindo as mudanças no uso da terra (Greenpeace, 2008). Entretanto, a agricultura também pode prover inúmeras soluções para os desafios climáticos. Um programa de mudanças climáticas, contendo um plano de ação para cumprimento do compromisso estabelecido no Protocolo de Kyoto, de redução de 8% dos GEEs até 2012, foi elaborado pela Comissão Européia e tem servido de guia para os trabalhos de construção da sustentabilidade e da integração agroambiental no Brasil. Há três grandes fontes de emissão destes gases pelas atividades agrícolas (AEA, 2008): N2O (óxido nitroso) das emissões provenientes dos solos, devido principalmente à fertilização; CH4 (metano) das emissões da fermentação na Junho de 2008 digestão dos ruminantes, responsável por 41% de todas as emissões agrícolas de CH4 na comunidade européia; CH4 e N2O das emissões resultantes do manejo das pastagens. A questão é encontrar formas de tratar estes problemas na agricultura e verificar como a agricultura pode contribuir para a solução. Tais medidas envolvem: o encorajamento da aplicação de métodos de fertilização mais eficientes e a redução das quantidades utilizadas e do desperdício. O processo europeu foi iniciado pela revisão da orientação e da legislação referentes à aplicação de nitratos, uma fonte de preocupações significativa no panorama europeu, que também pode se tornar para o Brasil; a compostagem e o melhoramento dos sistemas de digestão anaeróbicos, como a produção de biogás, seriam formas de lidar com os subprodutos biodegradáveis e o esgoto; há ainda ênfase especial na produção de biomassa, na conservação da lavoura e na produção orgânica. Um maior desenvolvimento de biomassa agrícola renovável contribui muito para reduzir emissões provenientes de uso energético e do transporte, beneficiando o setor agrícola. Colheitas energéticas podem ser produzidas em locais retirados. O sistema de crédito de Carbono oferece incentivo aos produtores para produção de biomassa. A relação entre ambiente e agricultura é específica e a natureza dos seus efeitos é distinta daquela dos demais setores econômicos. A agricultura é sem dúvida o maior utilizador de terras. Por um lado, certos sistemas agrícolas exercem pressões prejudiciais para o ambiente e a segurança alimentar, através, por exemplo, do acúmulo de nutrientes e pesticidas no solo e na água, da compactação e erosão dos solos e da utilização excessiva de água para irrigação. No entanto, grande parte do meio rural valorizado é produto da agricultura e dela depende: sistemas de produção adequados ajudam a preservar as paisagens e os hábitats, bem como uma gama de condições favoráveis a processos ambientais benéficos. Alguns processos resultantes das atividades agrícolas podem ser assim sumarizados: Poluição ambiental Acumulação de nitratos e outros resíduos minerais, resíduos de pesticidas, salinização, emissões de amoníaco e de metano Esgotamento de recursos ambientais Utilização inadequada da água e do solo, destruição da cobertura vegetal natural e semi-natural Preservação e melhoramento ambiental Criação/preservação de paisagens, habitats, cobertura do solo, preservação da diversidade genética na agricultura, produção de fontes de energia renováveis O potencial de certos tipos de atividade agrícola para contribuir significativamente para objetivos ambientais não deve ser subestimado, sobretudo num contexto político favorável. A produção de biocombustíveis pode contribuir de forma importante para ombater as mudanças climáticas. O desenvolvimento de indicadores que reflitam tanto os efeitos benéficos como os efeitos prejudiciais da agricultura constitui um elemento-chave na definição de um quadro operacional para uma agricultura sustentável. www.apta.sp.gov.br 81 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Nitratos No cenário das alterações climáticas, a redução das emissões de óxido nitroso passa pela redução da poluição da água pelas fontes agrícolas de nitrato. A prevenção de poluição adicional envolve: monitoramento da qualidade da água proveniente da agricultura, determinação das zonas de vulnerabilidade a nitratos; estabelecimento de códigos de conduta voluntária para as boas práticas agrícolas e de medidas obrigatórias a serem implantadas por programas de ação nas zonas vulneráveis à poluição por nitrato. A Comunidade Européia estabeleceu o limite máximo de nitrogênio proveniente de pastoreio, que pode ser aplicado por hectare, em 170 kg.ha-1.ano-1. No Brasil ainda não há limite definido para nitrogênio proveniente de pastoreio, porém com o aumento da suinocultura e da criação de ruminantes em confinamento há necessidade de normatização. Os códigos de boas práticas agrícolas cobrem a regulamentação dos períodos de aplicação, uso de fertilizantes próximo a corpos d´água e em áreas inclinadas, métodos de estoque e dispersão de esterco, rotação das culturas, gestão do solo e outras medidas. Os programas de ação devem incluir medidas obrigatórias, concernentes a períodos de proibição de aplicação de certos tipos de fertilizantes, capacidade de armazenamento do estrume, restrições à aplicação de fertilizantes (nas encostas íngremes; em terrenos saturados de água, inundados, gelados ou cobertos por neve; perto de cursos d'água) e outras. Defensivos e herbicidas No cenário das alterações climáticas, a importância dos biocidas não deve ser subestimada, pela necessidade de manter o carbono imobilizado na biomassa preferencialmente viva. Os herbicidas destinados ao controle de ervas daninhas e os fitofarmacêuticos destinados a proteger vegetais e seus produtos contra os animais são amplamente utilizados na agricultura, por seus benefícios econômicos no combate a pragas das culturas e redução da competição dos infestantes, melhorando os rendimentos, protegendo a qualidade, confiabilidade e preço dos produtos. No entanto, essa utilização envolve riscos, pois a maioria possui propriedades intrínsecas que os tornam perigosos para a saúde e para o ambiente, se não forem utilizados corretamente e com parcimônia, podendo agredir a biota natural do solo e contaminar as águas, diminuindo a produtividade primária e secundária. Tanto a saúde humana como a animal 82 Junho de 2008 podem ser negativamente afetadas, devido à exposição direta, p.ex., dos trabalhadores da indústria produtora de fitossanitários e operadores da aplicação, e à exposição indireta, p.ex., através dos resíduos ou produtos agrícolas carreados para as águas, ou ainda pela exposição de animais ou pessoas à deriva dos sprays tóxicos (Stopelli e Magalhães, 2005). O solo e a água podem ser poluídos através de spray de deriva, da dispersão dos pesticidas no solo, do escoamento durante ou após a limpeza do equipamento de aplicação ou da eliminação não controlada dos resíduos e das embalagens vazias. É preciso investir na educação para a utilização correta e na regulamentação do uso, a fim de minimizar os impactos prejudiciais ao ambiente e à saúde humana, além de informar o público sobre as questões relativas ao seu uso e à gerência e destinação adequadas dos resíduos e embalagens vazias. O Brasil tem regulamentação que abrange a colocação dos produtos fitofarmacêuticos e biocidas no mercado e que fixa os teores máximos de resíduos nos gêneros alimentícios (Brasil, 1998), mas há necessidade de investimento nesta área. A proteção da qualidade da água em relação aos pesticidas está regulamentada (CONAMA, 2005; Tomita e col., 2002 a e b). Nas diretrizes sobre água, a legislação brasileira integra avaliação, controle e gestão das águas superficiais e subterrâneas, com base no seu estado ecológico e químico, e exige ações para redução ou eliminação das emissões, descargas e perdas de substâncias perigosas, para a proteção das águas superficiais (Carvalho e col., 2008). Medidas agroambientais podem oferecer subsídios para autorizações, ao manter registros da utilização efetiva de pesticidas, para a redução da quantidade utilizada, de forma a proteger o solo, água, ar e a biodiversidade, com a utilização de técnicas e de gestão integradas das pragas e a conversão gradativa para a agricultura biológica. Como na Europa, há necessidade de estabelecer estratégias temáticas sobre a utilização sustentável dos biocidas e sugerir várias medidas possíveis, dentre elas, estabelecer planos nacionais para reduzir os riscos e a dependência do controle químico, assim como reforçar a condicionalidade, ou seja, condicionar serviços ao prévio atendimento de requisitos legais de proteção à saúde humana e ambiental, decorrentes da prática da regulamentação que abrange a colocação dos produtos fitofarmacêuticos no mercado. No final dos anos 1980, parlamentares e a sociedade em geral decidiram criar uma nova lei para regulamentar uma série de itens relacionados aos agrotóxicos comercializados no Brasil. Uma das intenções era modificar o perfil toxicológico desses produtos. A lei foi promulgada em 1989 (Brasil, 1989). www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária A legislação brasileira de qualidade da água é eficiente (Menezes, 2002; Carvalho 2008 nesta revista), mas o maior obstáculo é a dificuldade de implementar e garantir seu cumprimento (Beyruth, 2006), porque, sendo fonte de poluição difusa, o controle é extremamente difícil. Além disto, o controle dos princípios ativos é trabalhoso e muito dispendioso. A CETESB tem demonstrado interesse em trabalhar com a agricultura, pois é preciso trabalhar nesta interface do conhecimento/ação para monitorar águas e solo de forma eficiente com relação a esta contaminação química. Proteção do solo Num cenário de alterações climáticas, a proteção do solo contra a erosão promovida pelas intempéries é fundamental para garantir a manutenção das áreas de captação hídrica e a qualidade das águas. Os processos de degradação do solo incluem desertificação, erosão, declínio no conteúdo de matéria orgânica, contaminação do solo por xenobiontes (substâncias desconhecidas dos seres vivos, agroquímicos, p.e.), impermeabilização e compactação do solo, declínio da biodiversidade, salinização, fatores que podem causar perdas de solo e/ou da capacidade de carga e funcionalidade. Estes processos podem resultar do uso inadequado do solo, práticas agrícolas inadequadas, como fertilização descontrolada, superexploração dos reservatórios de água subterrânea para irrigação, uso impróprio de pesticidas, uso de máquinas pesadas, sobrepastoreio e outros. A degradação do solo pode também resultar do abandono de certas práticas agrícolas. Uma maior especialização para as culturas aráveis é frequentemente acompanhada pelo abandono dos tradicionais sistemas de rotação de culturas e da incorporação de fitomassa das leguminosas, práticas que contribuem para restabelecer o conteúdo de matéria orgânica do solo. Programas de ação ambiental devem enfatizar a necessidade de proteção do solo. Um programa nacional viria completar diversos programas regionais de proteção do solo que abordam necessidades específicas das condições topográficas e climáticas. O modelo de gestão por bacia hidrográfica é amplo o suficiente para cobrir esta necessidade de atuação. As medidas agroambientais podem oferecer oportunidades favoráveis ao acúmulo de matéria orgânica, aumento da biodiversidade e diminuição da erosão, da contaminação e da compactação do solo. www.apta.sp.gov.br Junho de 2008 Estas medidas incluem o apoio à agricultura biológica, a conservação da lavoura, a proteção e manutenção de terraços, utilização mais segura dos biocidas, gestão integrada das culturas, gestão de sistemas de pastagem de baixa intensidade e impacto do pastoreio e incentivo à utilização de composto certificado. Na estratégia de condicionalidade interessa incluir o respeito às normas de boas condições agrícolas e ambientais referentes à proteção contra a erosão e à manutenção da matéria orgânica e da estrutura do solo. Gestão dos recursos hídricos A agricultura utiliza de forma significativa os recursos hídricos, consumindo o correspondente a cerca de 30% (EU, 2008) do total da água usada na Europa. Por exemplo, no sul da Europa, onde é um fator de produção fundamental, a irrigação representa mais de 60% da utilização da água e na maior parte das outras regiões varia de zero a mais de 30%. A quantidade de água utilizada para irrigação depende de fatores como o clima, o tipo de cultura, as características do solo, a qualidade da água, as práticas de cultivo e os métodos de irrigação. Atua tanto como uma adição artificial que complementa a disponibilidade natural de água como uma compensação à variabilidade sazonal das chuvas. A irrigação permite a melhoria da produtividade das culturas e a redução dos riscos associados com períodos de seca, possibilitando culturas mais rentáveis. No entanto, a irrigação também é uma fonte importante de preocupações ambientais, por promover a captação excessiva de água dos aqüíferos subterrâneos, sistemas de irrigação impulsionadores de erosão, salinização do solo, alteração dos hábitats seminaturais pré-existentes e impactos secundários, decorrentes da intensificação da produção agrícola que a irrigação permite. No Brasil, o sistema de tarifação adotado como modo de reforçar a sustentabilidade dos recursos hídricos tem sido eficiente, ao possibilitar a disponibilização de recursos para obras de saneamento, educação ambiental e ações de recuperação da qualidade ambiental destinadas a aumentar a qualidade e a quantidade de água disponível. É uma política que visa promover a utilização sustentável dos recursos hídricos, envolvendo o usuário no controle. As políticas de cobrança pelo uso da água envolvem os diferentes tipos de custos associados ao fornecimento e utilização da água e à responsabilização dos diferentes setores econômicos para a recuperação dos custos dos serviços hídricos, incluindo os relativos ao meio ambiente e aos recursos e serviços ambientais. 83 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária As medidas de desenvolvimento rural devem prever o apoio a investimentos destinados à melhoria da infra-estrutura de irrigação e permitir que os agricultores melhorem as técnicas, passando a utilizar aquelas mais econômicas, que exigem a captação de menores volumes de água. Em regimes agroambientais, o compromisso de reduzir os volumes de irrigação e de adotar técnicas de irrigação melhoradas é indispensável. Conservação da biodiversidade A taxa de declínio da biodiversidade de espécies e em consequência da heterogeneidade espacial tem aumentado de forma progressiva nas últimas décadas. A manutenção da biodiversidade é essencial para a sustentabilidade da agricultura. Um plano de ação para a biodiversidade agrícola foi aprovado pela Comissão Européia em 2001 e lançado em 2002. Este plano, que pode servir de modelo, identifica as prioridades concretas para a conservação e utilização sustentável da biodiversidade, em matéria de: apoio aos métodos de produção extensivos, desenvolvimento de práticas agrícolas que consideram biodiversidade, gestão sustentável dos recursos naturais, incluindo manutenção dos elementos lineares (como matas ciliares, cercas vivas, corredores de fauna silvestre); manutenção de hábitats; medidas para conservar espécies e raças ou variedades locais ameaçadas; ações específicas destinadas a preservar a agrobiodiversidade nas áreas de expansão agrícola ou de substituição de plantios de subsistência por espécies de cana e pela soja. Todos estes passos devem ser apoiados por investigação, formação e educação, integrando ciência, tecnologia inovadora e transferência do conhecimento, fundamentais em todo o processo. A ampliação ambiental e reestruturação do espaço agrícola É preciso concentrar esforços no reforço da capacidade administrativa global, em particular na área da gestão dos resíduos, no acelerar a evolução das práticas agrícolas sustentáveis, na prevenção de impactos e perdas de hábitats e espécies. As medidas de desenvolvimento rural precisam ser aptas a refletir melhor as necessidades atuais do mundo em transição e destinar fundos para programas de desenvolvimento rural que contribuam para a reestruturação do setor rural, por exemplo, dando suporte para explorações de semi-subsistência nesta fase de reestruturação, bem como a medidas específicas para auxiliar os agricultores 84 Junho de 2008 no cumprimento das normas e da legislação ambiental. Regimes-piloto agroambientais podem fazer parte desses programas. A gestão de áreas destinadas a conservação da natureza, ao desenvolvimento e promoção da agricultura biológica, a prevenção da erosão e a poluição e manutenção da pecuária extensiva, áreas com elevado valor natural, tem especial interesse ambiental. Medindo o desempenho ambiental Para corrigir os desvios de rumo e nortear as iniciativas agroambientais, verificar seus impactos e medir o seu sucesso, é fundamental desenvolver os meios (indicadores) para avaliá-las, especialmente nos níveis regional/local. O desenvolvimento de indicadores agroambientais é essencial para a integração das preocupações ambientais na política agrícola comum e para melhorar a compreensão e o acompanhamento do impacto das políticas sobre o meio ambiente e a biodiversidade em áreas agrícolas. Gestão planejada e compartilhada dos recursos agroambientais A integridade da sustentabilidade dos recursos naturais e dos serviços ambientais deve ser garantida na gestão moderna das propriedades rurais produtivas. A gestão deve buscar o equilíbrio na contenção do desperdício de matéria-prima e de energia, com a utilização e otimização da matéria, da energia e do tempo de trabalho em cada propriedade. Programas educativos, participativos, construtivistas, com a socialização das experiências dos agricultores e técnicos, bem como das inovações para cada situação/região, dos agrupamentos de regiões, dos agrupamentos em macro regiões até em nações, poderiam estar promovendo este movimento em direção à sustentabilidade global, estabelecendo orientação, diretrizes e a política necessárias à condução das devidas ações diante das ameaças climáticas globais. Agricultura, alimentar água e segurança A água e a segurança alimentar estão estreitamente relacionadas (FAO, 2002). Aproximadamente 800 milhões de pessoas passam fome no mundo e a maioria vive em regiões com deficiência de abastecimento. www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Em 1994, a FAO iniciou seu Programa Especial de Segurança Alimentar, consciente de que a falta de acesso à água é um dos principais fatores limitantes da produção de alimentos, pois na maior parte dos casos a água é o principal limitante para a produção primária. As reservas naturais de água do planeta são renováveis, mas finitas, e não podem ser ampliadas. Desta forma, os recursos hídricos per capita diminuem com o aumento da população e de suas necessidades e a qualidade diminui em função do nível social e cultural da população. Grande parte da água do planeta é desperdiçada em sistemas de irrigação sem controle, muitos dos quais com extrações insustentáveis de águas subterrâneas. Ainda segundo a FAO, as áreas irrigadas dos países em desenvolvimento poderiam ser ampliadas em 34% nos próximos 30 anos, com um acréscimo de apenas 14% de água. Em alguns países em desenvolvimento, a mudança da dieta da população está contribuindo para a melhoria da eficiência da irrigação. Por exemplo, o arroz é um cultivo que consome muita água, aproximadamente o dobro da consumida pelo trigo. Um estudo da FAO realizado em 93 países em desenvolvimento mostrou que em 1998 a extração de água para a agricultura foi de aproximadamente 2.128 km3. Pode-se aumentar a eficiência da irrigação em 42%, através de esforços conjuntos e aplicando-se tecnologias já disponíveis atualmente. Estima-se que em 2030 será possível irrigar uma superfície cultivada um terço maior que a atual com apenas 2.420 km3 de água. Outra frente a batalhar em relação à água é a ampliação da eficiência da irrigação, aumentando-se a produção por metro quadrado de área empregada. Pesquisas experimentais mostram que as respostas da produtividade agrícola às alterações climáticas variam muito, dependendo da espécie, da cultivar, das propriedades do solo, de pragas e agentes patogênicos, dos efeitos diretos de dióxido de carbono (CO2) em plantas e das interações entre as emissões de CO2, temperatura do ar, estresse hídrico, nutrição mineral, qualidade do ar, e das respostas adaptativas. A crescente concentração de CO2 pode estimular o crescimento e a produtividade das culturas, sempre que o benefício não ultrapassar os efeitos negativos do excesso de CO2 e da seca. Os avanços das pesquisas sobre adaptação agrícola foram incorporados em modelos utilizados para avaliar os efeitos das alterações climáticas sobre o rendimento das culturas, abastecimento alimentar, produtividade agrícola e preços. Há custos envolvidos, pois as alterações climáticas induzem perdas de rendimento e adaptação www.apta.sp.gov.br Junho de 2008 dos sistemas de produção pecuária, mudanças nas produções de cada região, em termos tanto de período como de escolha das cultivares, influindo também na quantidade que se conseguirá produzir. As opções de adaptações agronômicas e pecuárias poderão incluir, por exemplo, ajustes da época de plantio, taxa de fertilização, aplicação da irrigação, características das cultivares, bem como a seleção das espécies vegetais e animais. Quando ocorre adaptação agronômica expontânea, as avaliações e modelagem da cultura indicam que o rendimento das culturas, ao ser afetado pelas alterações climáticas, geralmente anuncia respostas positivas para aquecimento menor que alguns °C e reações negativas para aquecimento superior a alguns °C. Avaliações semelhantes indicam que o rendimento de algumas culturas tropicais em certos locais pode decrescer, mesmo com a temperatura mínima aumentando, pois essas culturas estão próximas de sua temperatura máxima de tolerância, na qual predominam culturas de seca. Sempre que há um grande decréscimo da pluviosidade, o rendimento das culturas tropicais é ainda mais prejudicado. Como para a adaptação expontânea, o rendimento nos trópicos tende a ser menos negativamente afetado pelas alterações climáticas do que sem esta adaptação, mas ainda tende a permanecer abaixo dos níveis estimados para as condições atuais. A maior parte dos estudos econômicos globais e regionais não incorpora as alterações climáticas, indicando que a tendência decrescente dos preços mundiais destas mercadorias que houve no século 20 continuará a existir no século 21. No Brasil há necessidade de se estabelecerem políticas institucionais a respeito das pesquisas nestas áreas, com a geração de plataformas para troca de conhecimentos e definição de complementariedades intra e interinstitucionais. EMBRAPA e Apta desenvolvem alguns trabalhos, mas ainda de forma isolada. Modelagem econômica A maior parte dos estudos disponíveis indica que globalmente uma temperatura anual crescente, de alguns °C ou mais, pode elevar os preços dos produtos alimentares devido a uma desaceleração inicial da expansão do abastecimento, em relação ao crescimento da demanda mundial. Para um aquecimento menor do que alguns °C, os modelos econômicos não distinguem claramente as alterações climáticas a partir de outras fontes indicativas de mudança. 85 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Alguns estudos recentes têm agregado estimativas dos impactos econômicos sobre as populações vulneráveis, tais como de pequenos produtores e de consumidores urbanos pobres. Estes estudos indicam que a mudança climática traria queda dos rendimentos das populações vulneráveis e em crescimento e que um número absoluto maior de pessoas correria risco de fome, embora isto ainda seja incerto e exija um esforço adicional de pesquisa. O mapa dos sinais de alarme ilustra a natureza g l o b a l d a m u d a n ç a c l i m á t i c a (http://www.climatehotmap.org) e reflete a atualização de conhecimentos emergentes em todas as partes do mundo. Na sua avaliação de 2007, o IPCC concluiu que uma massa crescente de observações dá a imagem do aquecimento global, coletivo, bem como de outras mudanças no sistema climático. Enquanto a América do Norte e Europa apresentam a mais alta densidade de dados dos indicadores, pela maior abundância de recursos financeiros e humanos envolvidos, um grande esforço tem sido feito pelos demais países, nos últimos anos, para documentar os impactos do aquecimento global nos outros continentes. Vários povos da América do Sul são muito dependentes dos recursos naturais dos ecossistemas do continente, desde os sopés da Cordilheira dos Andes, até as plantas e os animais da floresta amazônica e a pesca ao largo da costa do Peru. Os ecossistemas regionais são particularmente vulneráveis às mudanças da disponibilidade hídrica esperadas com as mudanças climáticas. Temperaturas globais superiores, aliadas a maior freqüência do El Niño e La Niña, poderão provocar aumento das secas e da taxa de derretimento das geleiras andinas, ameaçando o futuro do abastecimento de água para as comunidades das montanhas. Sinais de aquecimento já apareceram tanto em altas altitudes - na retração dos glaciais, como na alteração do padrão de propagação das doenças veiculadas por mosquitos ao longo da costa e, ainda, no aumento do nível do mar e despigmentação ou branqueamento de corais. Indicadores da tendência de longo prazo de aumento da temperatura global. Há eventos climáticos e não climáticos que podem ter intensificado sua gravidade, podendo contribuir para aumento das emissões de GEE, embora seu registro não esteja controlado. Ondas de calor e períodos não usuais de clima quente: locais que foram cenário recente de recorde de 86 Junho de 2008 calor, com medições realizadas no último século, mostram a tendência de aquecimento (1901-1996). Ondas freqüentes e graves anunciam aumento da ocorrência das doenças relacionadas ao calor, especialmente graves nas zonas urbanas e entre idosos, crianças, doentes e pobres; Aquecimento dos oceanos, aumento do nível do mar e das enchentes litorâneas, causando inundação/submersão e/ou elevação de terras, devido à dinâmica tectônica e desenvolvimento costeiro alterando a taxa de perda dos terrenos litorâneos. Temperaturas maiores, causando derretimento de neve e de glaciares, promovendo aumento do nível mundial dos oceanos, que aumentou de 10 a 25 cm nos últimos 100 anos do século 20. Com o aquecimento adicional é previsto aumento de 15 a 92 cm nos 100 anos seguintes século 21. Uma média de 15 a 30 m de praia são perdidos para cada 0,3 m de aumento do nível do mar. A submersão e/ou a emersão de terras devido às forças tectônicas e ao desenvolvimento costeiro também afetará a taxa de perda das terras litorâneas; Degelo dos glaciares: nos últimos 150 anos, na maioria dos glaciais de montanha monitorados ocorreu degelo. Muitos glaciais nas latitudes baixas já estão desaparecendo, prevendo-se que nos cenários plausíveis de aumento global de temperatura a maioria terá derretido até 2100. Com a continuidade do processo, as corredeiras formadas pelo degelo irão diminuir abruptamente, extinguindo uma importante fonte de água para irrigação e energia em muitas áreas situadas nas planícies de inundação nas regiões em que ocorrem; Aquecimento do Ártico e da Antártida: algumas partes do Canadá, Alasca, Sibéria e Antártida estão sob aquecimento bem acima da média mundial, nas últimas décadas. Esta tendência se encaixa no modelo de previsões climáticas de um cenário mundial com níveis crescentes de GEE. A fusão da camada congelada de solo que ocorre nas latitudes elevadas, próximas dos Pólos, está forçando a reconstrução de estradas, aeroportos e edifícios e aumentando a freqüência de erosão e deslizamentos, constituindo uma reação em cadeia. A redução do gelo no mar e nos planaltos, mudanças na queda de neve e infestações por pragas têm afetado plantas e animais nativos que fornecem alimentos e recursos para muitas pessoas. Uma única região costeira brasileira está relacionada no mapa dos “hotspots” (alarmes) para aquecimento global na América do Sul e se deve ao aumento significativo do nível do mar registrado no Recife, onde a linha costeira remontou mais de 1,8 m por ano, de 1915 a 1950, e mais de 2,4 m por ano, de 1985 a 1995. www.apta.sp.gov.br Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária Esta perda dramática de terra deve-se a à combinação do aumento do nível do mar com a descarga de sedimentos carreados da construção de barragens e ainda de dragagens e outras resultantes das atividades de engenharia costeira. Eventos associados que antecipam os impactos São eventos que tendem a se tornar mais freqüentes e generalizados com a continuidade do aquecimento, mas para os quais ainda não se tem certeza sobre a previsibilidade: Aumento da disseminação de doenças: temperaturas mais elevadas facilitam a transmissão de doenças, como malária e dengue, transmitidas por mosquitos que devem ampliar sua área de ocorrência, bem como a taxa de picadas e a habilidade de infestar seres humanos. Há registros recentes da ocorrência destas doenças em áreas elevadas, previamente não expostas, onde as temperaturas se elevaram durante o último século. A primavera chegando mais cedo: as evidências dos dados antigos e atuais de degelo de rios e lagos, floração e brotamento das plantas, ovoposição, desova e migração de animais. Uma primavera precoce pode perturbar a migração de animais e alterar o balanço competitivo entre as espécies, causando problemas imprevistos e em cadeia, por alterar as cadeias tróficas; Mudanças nos espectros de tendências e nas populações animais e vegetais: as plantas e os animais geralmente reagem a aumentos consistentes de temperatura, deslocando-se para áreas de maior altitude e latitude. Estudos recentes revelam que algumas espécies já começaram a alterar sua área de distribuição de forma consistente, com a tendência de aumento da temperatura. Muitas populações e espécies podem tornar-se mais vulneráveis ao declínio numérico ou à extinção, se o aquecimento ocorrer mais rapidamente do que podem responder ou se houver barreiras naturais ou decorrentes do desenvolvimento humano, intransponíveis à sua migração; Despigmentação dos recifes de corais: os recifes de corais de 32 países apresentaram dramática descoloração entre 1997-98, resultante da perda de algas microscópicas que provêm alimento e cor para os corais vivos. Houve correlação significativa entre a água mais quente que o usual, de 1,1 a 1,6 0C a mais, e a descoloração. Outros fatores também contribuem para esta alteração, incluindo nutrientes, carreamento de sedimentos, poluição, desenvolvimento costeiro, dinamitação de recifes e tormentas naturais. www.apta.sp.gov.br Junho de 2008 5. Tempestades, tormentas, nevascas, inundações: um clima mais quente aumenta a taxa de precipitação no mundo todo, mas especialmente durante o inverno nas latitudes médias e altas, de acordo com as projeções dos modelos climáticos. Além disto, espera-se mais precipitação na forma de tempestades e nevascas pesadas, levando ao aumento do fluxo e dos danos. As áreas afetadas por chuvas extremas nos EUA, Japão, Europa Central e Leste, China e Austrália também aumentaram. Estas alterações aumentam o risco de inundações, mudanças antrópicas do uso da terra e da cobertura vegetal, que podem se somar, aumentando os riscos de inundações; 6. Aumento do número de ocorrências e da intensidade das secas e incêndios: com o aumento das temperaturas espera-se aumento da intensidade e freqüência das secas em algumas regiões. Secas prolongadas facilitam incêndios, e os cultivos e matas ficam mais vulneráveis a infestações por pragas e doenças. Geralmente, mudanças no uso local e na cobertura vegetal da terra podem exacerbar a mudança climática, aumentando os riscos de seca; por exemplo, nos trópicos, as práticas de corte e queima podem ser o gatilho para incêndios vultosos durante as secas prolongadas. Alternativas para conter o avanço do aquecimento global Várias alternativas de ação para a redução dos problemas causados pelo efeito estufa vêm sendo propostas por cientistas e organizações ambientais com ações: a) globais, de limitação do crescimento da indústria poluente, do consumo e da população; b) locais, como a instalação de filtros para reduzir a emissão de poluentes industriais, plantio de árvores, sistemas de escoamento de águas, etc.; c) individuais, constantes, de exercício da cidadania, como a redução do consumo, economia de matéria e energia, com incentivo ao consumo local, que tem menor custo ambiental, o plantio de vegetais, a preservação das praias e rios, a redução da produção de rejeitos sólidos, líquidos ou gasosos. As pequenas atitudes individuais e somadas fazem uma enorme diferença, principalmente porque os consumidores são os responsáveis e usuários dos serviços ambientais globais e, como tal, podem determinar as tendências de investimento das indústrias, das ações comunitárias e globais. 87 Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária A ação global organizada, solidária e informada, com aplicação de políticas públicas adequadas, pode impulsionar a mudança de valores e comportamentos. As políticas públicas devem contemplar o desenvolvimento da ciência, da inovação tecnológica e da transferência do conhecimento para toda a sociedade, trazendo uma nova onda de desenvolvimento dos agronegócios. A adoção deste conjunto de medidas pelos diversos países seria a melhor forma de minimizar, e até reverter, este processo deletério ao meio ambiente e à vida como é conhecida em nosso planeta. REFERÊNCIAS AEA. 2008. Adaptation to Climate Change in the Agricultural Sector AGRI-2006-G4-05 AEA Energy & Environment/Univ Politécnica Madrid.245p: http://ec.europa.eu/agriculture/analysis/external/c limate/final_en.pdf Beyruth, Z. 2000. Periodic disturbances, trophic gradient and phytoplankton characteristics related to Cyanobacterial growth in Guarapiranga Reservoir, S.P.State, Brazil. Hydrobiologia, 424:51-65. Beyruth, Z. 2006. Aprendendo sobre qualidade de vida com as águas poluídas da Cidade de São Paulo. P.44 a 63. In: Água. Revista USP 70. 182p. Public. Coord. de Comunicação Social da USP. Brasil, 1998. Portaria SVS/MS nº. 685, de 27 de agosto de 1998. Regulamento técnico de princípios gerais para o estabelecimento de níveis máximos de contaminantes químicos em alimentos e seu anexo: limites máximos de tolerância para contaminantes inorgânicos. Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, 28 ago. Seção 1. BRASIL. Lei nº 7.802, de 11 de julho de 1989. Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização,a propaganda comercial, a utilização, a exportação, o destino final dos resíduos, o controle, a inspeção e a fiscalização e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, 12 jul. Seção 1. Carvalho, Y.M.C.; Moraes, J.F.L.; Menezes, L.B.; Martins, S.S. 2008. A Legislação brasileira de recursos hídricos como instrumentalização à gestão compartilhada. Revista Tecnologia & Inovação Agropecuária, Junho de 2008: 112 a 134. 88 Junho de 2008 CONAMA, 2005. Resolução 307/2005. http://www.mma.gov.br/port/conama/res/res05/r es35705.pdf Cotton, W. R., Pielke, R. A. 1995. Human impacts on weather and climate. Cambridge: Cambridge University Press, 288p. European Comission. 1997. Climate change and agriculture in Europe - assessment of impacts and adaptations: Summary report. Luxembourg, 37p. (EUR 1 7 4 7 0 E N ) . 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