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A EDUCAÇÃO INFANTIL EM CONTEXTOS DIFERENTES: CIDADE DE
MARINGÁ/Br E EM GUADALAJARA/Es1
EIXO I - Políticas públicas para a Infância
Autoria: Maria de Jesus Cano Miranda (UEM)
Modalidade: Relato de pesquisa
Resumo: Este trabalho teve por objetivo realizar um estudo comparativo sobre o
percurso da Educação Infantil na cidade de Maringá/Brasil e em Guadalajara/Espanha.
Os procedimentos metodológicos utilizados foram pesquisa na literatura e análise
documental em instituições de Educação Infantil visitadas, na cidade de Maringá /Brasil
e em Guadalajara/Espanha. Os resultados mostraram que o percurso histórico da
Educação Infantil, o modo de se organizar e atender as crianças nesta faixa etária
apresentam semelhanças e diferenças, nas duas realidades estudadas, bem como quanto
à operacionalização das normas legais existentes em cada contexto, aos princípios que
movem o fazer docente e quanto aos recursos humanos e materiais existentes.
Evidenciaram-se as peculiaridades de cada contexto decorrentes da cultura e formação
histórica de cada realidade estudada.
Palavras-chave: Educação infantil, Organização e Funcionamento; Estudo
Comparativo
A EDUCAÇÃO INFANTIL EM CONTEXTOS DIFERENTES: CIDADE DE
MARINGÁ/BR E EM GUADALAJARA/ES
EIXO I - Políticas públicas para a Infância
Autoria: Maria de Jesus Cano Miranda
Modalidade: Relato de Pesquisa
1-Introdução:
É possível perceber que na história da humanidade diferentes concepções e abordagens
dos estudos desenvolvidos sobre a infância e também, como as diferentes culturas
trataram a questão da criança pequena ao longo dos tempos. Embora seja esta uma
história contada pelos adultos em termos de valores, aprendizagens e experiências, ela
está constituída em diferentes matizes. Dessa forma o presente texto apresenta uma
análise de dois contextos, Brasil e Espanha.
No Brasil, a Educação Infantil, embora tenha sido considerado pela Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDBEN) nº 9394/96, (BRASIL, 2001a), como primeira etapa da
educação básica, apresenta um percurso de mudanças consideráveis na concepção desse
nível de ensino. São muitos os debates entre os profissionais e pesquisadores desta área
no sentido de ressaltar a importância de se atentar para a especificidade da área.
Em relação ao sistema educacional espanhol desenvolvido nas Comunidades
Autônomas2, Tiana Ferrer (2004), afirma que o atendimento das crianças da Educação
Infantil, vem se ampliando, sobretudo em seu segundo ciclo (dos três aos seis anos de
idade), há vagas para todas as crianças dessa faixa etária.
Com o propósito de conhecer as particularidades da Educação Infantil no contexto
brasileiro e espanhol este texto teve por objetivo realizar um estudo comparativo sobre o
percurso da Educação Infantil na cidade de Maringá/Br e em Guadalajara/Es. Como
1
O presente texto, com algumas adequações, foi extraído da Tese de Doutorado intitulada “Educação
Infantil: Percepção de Profissionais e familiares sobre inclusão, aprendizagem e desenvolvimento de
crianças com deficiências, em Maringá/Br e em Guadalajara /Es”. Defendida em julho de 2011 –
UNESP de Araraquara-SP, orientada pela Profª Drª Maria Júlia Canazza Dall ´Ácqua(UNESP) e Prof.
Dr. Eladio Sebatián Heredero (UAH).
2
Comunidade Autônoma, na Espanha, corresponde à divisão dos estados brasileiros.
2
objetivos específicos procurou-se analisar as bases que fundamentam a organização,
estrutura e o funcionamento desse nível de ensino nos dois contextos e refletir a respeito
das inter relações existentes nos processos em pauta.
Dessa maneira, o estudo se justifica pela oportunidade de conhecer, analisar e comparar
os movimentos que permearam este nível de ensino entre dois contextos diferentes e
suas especificidades. O questionamento que impulsionou a realização desta investigação
está assim formulado: Em que medida as instituições de Educação Infantil no Brasil e
na Espanha apresentam semelhanças e diferenças no que toca a sua organização,
estrutura e funcionamento tendo como ponto de partida os pressupostos de um nível de
ensino voltado para o desenvolvimento integral da criança e expressões das diferentes
linguagens das mesmas?
Por uma questão de sistematização este texto está organizado da seguinte maneira. Na
introdução faz-se a abertura da discussão da temática, bem como os objetivos, a
justificativa e sua problematização. Na segunda parte apresenta-se a metodologia, os
pressupostos teóricos e os procedimentos do estudo. Na terceira mostra-se um panorama
sobre a retrospectiva e organização da Educação Infantil em nível nacional e na cidade
de Maringá/Br. Na quarta parte, apresenta-se percurso da Educação Infantil na Espanha
e em Guadalajara/Es. Na quinta parte são analisados e discutidos brevemente os dados
coletados no decorrer da investigação e por fim, são apresentadas as considerações
finais.
2- Pressupostos e procedimentos metodológicos:
Os pressupostos que embasaram este trabalho fundamentam-se na concepção Histórico
Cultural estudada por Vygotski (1997) e seus colaboradores que defendem a premissa
de entender o ser humano como resultado das condições históricas, as quais determinam
sua formação, ao mesmo tempo em que o próprio homem também por sua ação e
interação contribui para a transformação de seu meio. Portanto, trata-se de uma pesquisa
realizada por meio de consultas na literatura e análise documental em instituições de
Educação Infantil visitadas, na cidade de Maringá/ Br e em Guadalajara/Es.
3- Educação Infantil: origem, percurso, organização e
funcionamento no Brasil e em Maringá/Br
O atendimento institucional da criança pequena no Brasil surge como em grande parte
dos países, de uma necessidade determinada pelas transformações do momento
histórico. De acordo com Assis (1982), a pré-escola, no Brasil, sempre foi considerada
um “luxo” para as crianças de classes abastadas e filantropia para as crianças pobres.
Nessa perspectiva, conforme Kramer (1984), o atendimento da criança brasileira de zero
a seis anos é marcado por duas etapas distintas: de 1500 até 1930 e 1930 a 1980. Nos
primeiros tempos, não havia interesse de atendimento à criança pequena, contudo, podese dizer que aos poucos essa primeira fase foi marcada pela gradativa valorização da
infância e o reconhecimento do atendimento de suas necessidades básicas,
caracterizando-se pelo progresso no campo da higiene infantil, tanto da área médica
como escolar, registrando-se, então, algumas iniciativas de caráter privado e
filantrópico.
No que diz respeito à área educacional, como relata Kramer (1984), destaca-se a
existência de duas instituições que se dedicaram a sustentar o trabalho organizativo no
atendimento do pré-escolar. Uma delas é Organização Mundial de Educação PréEscolar (OMEP), fundada em 1948 pela Unesco, de caráter privado e beneficente. E a
outra foi a Coordenação de Educação Pré-Escolar (Coepre), de caráter público federal,
ligada ao Ministério da Educação e Cultura, criada em 1975. Atualmente, esse órgão é
denominado Coordenação Geral de Educação Infantil (Coedi) e faz parte da Secretaria
de Educação Básica do Ministério da Educação e Cultura, tendo como finalidade
3
fornecer orientações metodológicas que subsidiem as ações executoras das instituições
que atendem crianças nos primeiros anos de vida no país, constituindo-se em avanços e
conquistas para esta modalidade de ensino. Essa expansão dos direitos à educação da
criança pequena representa conquistas importantes para a sociedade brasileira.
O movimento de institucionalização da Educação Infantil não ocorre desvinculado da
luta por uma concepção que entenda a criança como um sujeito de direitos que possui
potencialidades que devem ser desenvolvidas.
Impulsionado pela legislação vigente, o MEC se propôs, de 1994 a 1998, à formulação
de uma Política Nacional de Educação Infantil, publicando documentos orientadores
para a prática pedagógica da Educação Infantil e instituindo uma Comissão Nacional de
Educação Infantil (CNEI) para participar da elaboração das propostas e diretrizes
nacionais, (BRASIL, 1998).
As políticas do estado do Paraná, no decorrer da metade do século XX em diante
estiveram alinhadas com as políticas do governo federal no que diz respeito ao
atendimento das crianças pequenas, sempre direcionadas pelos diferentes órgãos
públicos, como Ministério da Saúde, Ministério da Justiça, Ministério da Educação, ou
ainda, organizações da iniciativa privada.
No que diz respeito à implantação da Educação Infantil na rede municipal de ensino na
cidade de Maringá/Br, ocorreu por volta dos anos 1978 e 1979, conforme dados do
documento Proposta Curricular para a Educação Infantil da Rede Municipal de Ensino
(MARINGÁ, 2000, p.14).
Essa implantação é resultante de um processo histórico que envolveu pessoas da
comunidade, líderes naturais, e vontade política do governo municipal. Antes desse
período, essa modalidade de ensino era desenvolvida prioritariamente por membros de
congregações, ou instituições religiosas, poucas escolas da rede estadual, ou mesmo
pela iniciativa privada. Em qualquer uma dessas instâncias, o trabalho tinha caráter
assistencialista.
Em Maringá, a partir da implantação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação nº
9394/96 (BRASIL, 2001a), considerando a Educação Infantil como parte da Educação
Básica, foram tomadas as iniciativas para operacionalização das mudanças exigidas pela
lei. O Governo Popular traz consigo um plano de educação para essa modalidade de
ensino que difere da linha assistencialista até então estabelecida, o qual apresenta ações
voltadas a preocupações reais e concretas da construção de uma educação de qualidade
social, como um dos instrumentos fundamentais para as condições de busca da
cidadania. Combinando a ação de cuidar e educar, o programa da Secretaria Municipal
da Educação (SEDUC) fundamenta sua proposta nas Diretrizes Curriculares Nacionais
para a Educação Infantil, pautando-se nos princípios de uma educação de qualidade
social.
Para complementar esse processo, em 2001, a Secretaria de Educação, em cumprimento
às leis e por vontade política do Governo Popular de Maringá, adota a medida de
assumir sob sua responsabilidade a manutenção total da Educação Infantil na rede
municipal, incorporando as instituições municipais, já existentes e as de caráter
filantrópico.
Assim, todo trabalho sofre uma reestruturação, em que os princípios pedagógicos são
fundamentados na concepção de creches e pré-escolas de caráter educacional,
articulando as ações de cuidar/educar de forma a proporcionar um atendimento de
qualidade aos alunos. Nesse período, foi necessária a reestruturação das instituições
existentes e a construção de outras unidades para ampliar a oferta de vagas. A gestão
democrática também foi implantada na Educação Infantil, bem como ações e
mecanismos para sua implementação.
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A fundamentação teórica, das propostas dos centros de Educação Infantil, em Maringá,
apresenta uma unidade de ideias e princípios, as quais são redigidas com base nas obras
de Vygotski e seus colaboradores, que pesquisaram vários temas do desenvolvimento
humano, dentre eles o papel da aprendizagem escolar, a mediação, a interação entre os
pares, a linguagem, o desenvolvimento das funções psíquicas superiores, o papel do
brinquedo, o processo de avaliação, entre outros.
Conforme a Deliberação 016/99 do Conselho Estadual de Educação, Paraná (1999), a
Gestão Democrática dos estabelecimentos de ensino tem como órgão máximo da
direção o Conselho Escolar. Dessa forma a estrutura organizacional dos
estabelecimentos de ensino deve seguir uma composição que contemple os seguintes
elementos: Conselho Escolar; Direção; Equipe pedagógica: Supervisão Educacional;
Professores; Conselho de Classe e a Equipe Administrativa: Auxiliar Administrativo;
Serviços Gerais; Merendeiras; Atendentes; Auxiliares de Creche.
O ingresso dos profissionais da rede municipal de Maringá se dá por concurso público.
A carga horária e o nível salarial dependem do grau de formação exigida de cada
categoria. Assim os profissionais com nível superior completo na área do magistério,
que são os membros de equipes, professores de sala e professores auxiliares são
exigidas quatro horas diárias, correspondendo a 20 horas semanais de trabalho, sendo
que podem dobrar essa carga horária. Aos profissionais com nível médio de formação,
são exigidas seis horas diárias, o que corresponde a 30 horas semanais. Aos
profissionais com formação de Ensino Fundamental, os Auxiliares de Creche, são
exigidas oito horas diárias, em um total de 40 horas semanais.
4- Educação Infantil: origem, percurso, organização e
funcionamento na Espanha e em Guadalajara/Es
De acordo com Ruíz Berrio (1992), a Educação Infantil, na Espanha, é uma conquista
da segunda metade do século XX. Nos cem anos anteriores não se pode dizer que houve
um movimento unificador no sentido de se consolidar a Educação Infantil. Segundo o
autor o que existiu foi a criação de escolas para crianças, as quais, na maioria das vezes,
eram iniciativas particulares.
Dessa forma, segundo o mesmo autor, a expansão da educação infantil está diretamente
vinculada ao desenvolvimento do processo de industrialização que ocorreu ao longo dos
séculos XVIII e XIX. Por conseqüência desse processo a família sofre significativas
alterações em sua organização, sua estrutura, seu modo de viver o cotidiano, muito
diferente da maneira como vivia nos modos de produção rural e artesanal dos tempos
anteriores.
As mudanças fazem parte de um processo lento e cheio de contradições. As primeiras
preocupações que surgiram para atender ao grave problema do abandono das crianças
decorrente da incorporação da mulher no trabalho fabril estiveram desvinculadas do
sistema escolar. As primeiras ações nesse sentido foram movidas pela urgência de
atender aos pequenos durante as longas e desumanas jornadas de trabalho dos pais e
protegê-los da provável influência negativa do ambiente do bairro operário em que
viviam.
Nessa perspectiva segundo Baena (1997), nos últimos anos se observa um fenômeno,
em escala mundial, que evidencia em todas as reformas dos sistemas educacionais
nacionais, a progressiva atenção ao período da educação infantil. Isto se deve pelas
continuadas pesquisas de cunho científico e social, nas áreas da psicologia,
antropologia, sociologia, biologia e pedagogia, reconhecendo a importância desse
período no processo de desenvolvimento humano.
Cumpre evidenciar que de acordo com Pujol Maura (1997) a Educação Infantil fica
constituída, na Espanha, como etapa educativa e não apenas de guarda, com a aprovação
5
da LOGSE (Ley de Ordenación do Sistema Educativo, 1990.) que estabelece o pleno
direito enquanto instituição educativa e deve atuar de forma sistemática e intencionada
com outras instâncias da sociedade, para atender as crianças de zero a seis anos.
A autora defende a ideia de que os centros devem eleger um modelo educativo para
Elaboração do Projeto Educativo do Centro que seja representativo para a comunidade
escolar afim de que tais princípios respondam e facilitem as práticas educativas,
fundamentando as estratégias e os métodos que precisam se ter em conta para atender as
necessidades dos alunos dessa escola (PUJOL MAURA, 1997). O que permitirá a
estruturação e organização dos principais elementos que constituem o processo de
aprendizagem das crianças.
Em Castilla La Mancha a legislação que normatiza a Educação Infantil é o Decreto nº
67/2007, de 29.05. Este decreto estabelece o currículo do segundo ciclo da Educação
infantil de três a seis anos e determina a responsabilidade dos centros docentes no
exercício de sua autonomia pedagógica em conformidade ao que prevê a Lei Orgânica
da Educação 2/2006, (ESPANHA, 2006). O Decreto em referência preconiza que o
desenvolvimento da criança deve se dar dentro dos princípios de igualdade de
oportunidade e inclusão social, a educação de valores de igualdade, interculturalidade,
saúde e respeito pelo meio que o cerca (ESPANHA, 2007a). Este nível de ensino
compreende dois ciclos, ou seja, o primeiro até aos três anos e o segundo dos três aos
seis anos Segundo o mesmo documento, a Lei Orgânica da Educação (LOE), 2/2006,
fixa em oito as competências3 básicas que devem ser desenvolvidas ao final da
educação básica e obrigatória, segundo os critérios da União Européia.
Em Guadalajara, a situação do atendimento das crianças pequenas toma uma nova
direção. As classes da escola Primária eram, normalmente, dirigidas por um professor
do sexo masculino, o qual nem sempre tinha adequada habilidade para trabalhar com os
pequenos. O ensino também era livre, sem regras e sem normas a seguir, dependendo
totalmente da criatividade da pessoa que assumisse essa tarefa. Esse atendimento era
para as crianças até os seis anos.
Com a inauguração da Escola de Magistério da Universidade de Alcalá de Henares, em
Guadalajara, em torno do ano de 1974, os rumos desse nível de ensino começam a
tomar outros caminhos, por vários motivos. Um deles é a contribuição acadêmica dos
trabalhos da Universidade e a própria formação de professores até então escassa.
Os princípios educativos que movem e orientam as ações da escola se pautam em:
responsabilidade, profissionalismo, solidariedade, liberdade, aceitação da diversidade e
respeito pelo meio ambiente. O documento Guadalajara (2008-2009, p.6) enfatiza
também, o princípio do respeito e tolerância a si mesmo, aos demais, às coisas e às
normas; a formação de pessoas que saibam valer-se por si mesmas, que saibam defender
seus pensamentos e cumprir suas responsabilidades e também, o fomento às
capacidades artísticas e criativas; a defesa de hábitos saudáveis e de bem estar; o
respeito pelas normas que organizam a vida.
A Constituição Espanhola e a legislação vigente sobre educação garantem, aos
professores, plena liberdade de ensinamento. A prática desta liberdade orienta-se a
promover formação integral dos alunos, adequada a seu desenvolvimento evolutivo e
suas necessidades, e que contribua a uma educação dentro do respeito aos valores
humanos emanados da Declaração Universal dos Direitos Humanos e da Constituição
Espanhola. Partem do pressuposto de que não existe método único e universal que se
3
O termo competência é definido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) como a combinação de destrezas, conhecimentos e atitudes que uma pessoa possui, nas
diferentes áreas: Linguística, matemática, conhecimento e interação com o mundo físico, digital, social,
emocional e artístico, (ESPANHA, 2006).
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pode aplicar a todas as crianças, em qualquer situação de ensino nos diferentes
conteúdos, que garanta êxitos. (ESPANHA, 1978 e 2006).
O processo de avaliação nessa etapa de ensino estabelece critérios que servem para
averiguar o nível de desenvolvimento alcançado pela criança, no processo de
aprendizado. Apresenta as mesmas características da avaliação das demais etapas.
Assim, segundo os pressupostos do documento a Lei Orgânica da Educação 2/2006
avaliação nessa etapa deve ser “global, contínua e formativa para propiciar ajuda às
características individuais das crianças”. (ESPANHA, 2007a, p.14745).
Com relação aos recursos humanos na Educação Infantil os centros contam com o
pessoal que formam as equipes diretivas, compostas pelo/a diretor/a, Chefe/a de Estudos
e Secretário/a, Orientador/a. Neste nível de ensino para cada três turmas de alunos, a
escola tem direito a um Professor de Apoio. Entre os demais profissionais que integram
o corpo docente dos centros, estão: Professor Tutor; Professor de Música; Professor de
Inglês (dois professores nas escolas bilingües num total de nove aulas semanais);
Professor de Religião; Professor de Informática; Professor de Educação Física;
Professor de Psicomotricidade.
A jornada de trabalho do pessoal docente é a estabelecida por lei para todos os
funcionários públicos do estado4 no documento Espanha (2007b) com adequação às
características das funções que vão desempenhar. Assim a carga horária total do
professor é de 35 horas semanais, sendo que dessas, 29 horas devem ser dedicadas às
atividades letivas e complementares, obrigatoriamente, dentro do centro, ou seja, 23
horas com docência e seis com atividades complementares. As seis horas restantes os
professores podem preparar suas atividades docentes e acadêmicas dentro ou fora da
escola.
5- Aproximando as duas realidades
Ao retomar à questão norteadora inicial que consistiu indagar em que medida as
instituições de educação infantil no Brasil e na Espanha apresentam semelhanças e
diferenças no que toca a sua organização, estrutura e funcionamento tendo como ponto
de partida os pressupostos de um nível de ensino voltado para o desenvolvimento
integral da criança e expressões das diferentes linguagens das mesmas?
Foi possível perceber, pelo exposto, que a Educação Infantil, no Brasil, tem registrado
alguns avanços. Com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 e a Constituição
Federal de 1988 (BRASIL 2001a; 2001b) passou a ser considerada como primeira etapa
da Educação Básica. Essa expansão dos direitos à educação da criança pequena
representa conquistas importantes para a sociedade brasileira, embora a questão da
acessibilidade ainda não esteja resolvida na maioria dos municípios. Não há vagas para
todas as crianças, como é o caso do município de Maringá, que empreende esforços para
atender o maior número de crianças dessa faixa etária. Todavia, é possível observar
avanço em relação ao caráter educativo extensivo às crianças de zero a cinco anos nos
Centros de Educação Infantil envolvendo o atendimento às crianças de zero a três anos,
atendidos na modalidade de Infantil I, II, III e as crianças de quatro e cinco anos
atendidos na modalidade de Infantil IV, V.
Em Maringá, a Secretaria de Educação mantém uma equipe de coordenação pedagógica
que atua junto às instituições de Educação Infantil visando à reflexão da prática e ao
aprofundamento de fundamentos teóricos e metodológicos, com a finalidade de garantir
a qualidade pedagógica e a efetivação das funções educar e cuidar e com a preocupação
de oferecer uma educação de qualidade a todos. Nesse documento, estabelecem-se os
princípios norteadores da Proposta Pedagógica para o funcionamento dos centros da
4
Cf. Ley 7/2007, 12 de abril, (ESPANHA, 2007b).
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rede municipal, cujos princípios estão em consonância com as diretrizes das esferas
federal e estadual.
Os dados obtidos mostraram uma situação diferente na Espanha, que é um país milenar,
cuja história de formação de seu povo não é diferente de qualquer outra nação europeia,
que compreende o período da pré-história, medieval, passando pela formação e queda
do primeiro Império Espanhol, com guerras, derrotas e conquistas. Chega à época atual,
buscando uma nova forma contemporânea de viver.
Conforme as palavras de Baena (1997), a concepção de Educação Infantil está
evoluindo muito rapidamente, com base nas pesquisas e nas políticas sociais dos países,
a ponto de serem redefinidas com vistas a oferecer uma gama de atividades que
contribuam para o desenvolvimento global da criança, no que se refere ao cuidar e
educar, desde o nascimento até o ingresso no ensino formal. A Espanha tem
desenvolvido esforços nesse sentido, contemplando o tema no capítulo I da Lei
Orgânica da Educação (LOE), (ESPANHA, 2006), o qual trata dos princípios gerais,
dos objetivos, dos princípios pedagógicos, da oferta de vagas e gratuidade nesse nível
de ensino.
Em cada Comunidade Autônoma, a legislação nacional é adequada e operacionalizada
conforme as necessidades e demandas da realidade local. Em Castilla La Mancha, a
legislação que normatiza a Educação Infantil é o Decreto nº 67/2007, de 29.05. Esse
decreto estabelece o currículo do segundo ciclo da Educação Infantil de três a seis anos
e determina a responsabilidade dos centros educativos no exercício de sua autonomia
pedagógica em conformidade ao que prevê a Lei Orgânica da Educação (LOE),
(ESPANHA, 2007a, 2007b).
Nesse sentido pôde-se observar que em Maringá/Br, as propostas pedagógicas dos
centros municipais de Educação Infantil possuem um eixo norteador que se fundamenta
nos pressupostos da Teoria Histórico Cultural desenvolvida por Vygotski e seus
colaboradores. Desta premissa se extrai todos os princípios que fundamentam o trabalho
pedagógico dos profissionais que trabalham com a criança levando em conta os aspectos
de cuidar e educar, inclusive as bases do processo de avaliação. Já em Guadalajara/Es
como em todo país, a legislação faculta aos centros escolares, bem como aos
professores a liberdade de escolha dos princípios metodológicos para atuarem com seus
alunos. Os princípios filosóficos da escola são delineados em linhas gerais e o professor
em sala de aula pode eleger a concepção metodológica que mais lhe convença desde que
apresente resultados efetivos para a aprendizagem e desenvolvimento da criança.
Os dados obtidos mostraram diferenças no que toca aos recursos humanos disponíveis
em um e outro contexto. Em Maringá, o centro dispõe de um professor de sala ou
atendente por turma, contando com poucos auxiliares na tarefa do cuidar. Em
Guadalajara, além do professor responsável pelas crianças, o centro conta com
diferentes profissionais que ajudam nas tarefas de cuidar/educar, tal como mencionado
anteriormente.
A jornada de trabalho também é diferente nos contextos analisados. Em Maringá, todos
os profissionais ingressam na carreira por concurso público e a jornada de trabalho é
definida pelo nível de escolaridade de cada categoria. Em Guadalajara, o ingresso
também é por concurso público, no entanto, é exigida para todos os profissionais a
formação de nível superior. A jornada de trabalho é igual para todos, 35 horas semanais.
6- Considerações finais....
Ao retomar o objetivo inicial do presente texto que foi o de realizar um estudo
comparativo sobre o percurso da Educação Infantil na cidade de Maringá/Brasil e em
Guadalajara/Espanha em que se procurou analisar as bases que fundamentam a
organização, estrutura e o funcionamento desse nível de ensino nos dois contextos e
8
refletir a respeito das inter relações existentes nos processos analisados, foi possível
perceber semelhanças e diferenças nos dois contextos, quanto à operacionalização das
normas legais existentes em cada realidade, quanto aos princípios que movem o fazer
docente e quanto aos recursos humanos e materiais.
Contudo, o que se pode perceber é que não se trata de um processo que ocorre de forma
linear, mas se trata de uma dinâmica que envolve avanços, retrocessos e contradições.
Levando em conta as considerações dos fatores sociais, culturais, econômicos e
políticos, bem como a participação não apenas dos agentes envolvidos, e também de
todos os membros de cada comunidade e os avanços dos direitos da criança.
7- Referências
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