Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados
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Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados
Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Ismael Mattos Andrade Ávila*, Rosely Gomes Costa** O nível de alfabetização de grande parte da população brasileira é insuficiente para um uso proficiente de computadores e para um acesso eficaz a conteúdos digitais como os disponíveis hoje na Internet. Esse problema não é exclusivo do Brasil e suas características dependem de muitos fatores socioculturais e educacionais próprios de cada país. Assim, a maior parte dos estudos sobre inclusão digital de analfabetos feitos no exterior mostra-se inadequada ao contexto brasileiro, que é caracterizado por uma maior prevalência do analfabetismo funcional em relação ao analfabetismo pleno, e no qual o multilinguismo é marginal. Por isso, além do uso de ícones como facilitadores da interação desse público com os computadores, a exemplo do que tem sido relatado para países como a Índia, nós investigamos como os ícones interagem com as habilidades leitoras de usuários semialfabetizados. O analfabetismo é uma das questões mais importantes a serem tratadas no Brasil, dado o nível educacional de sua população. Assim, o estudo trata do emprego de ícones tanto como apoio à compreensão de ideias e informações mediadas pela interface computacional quanto como à compensação de habilidades leitoras limitadas. Palavras-chave: Iconicidade. Inclusão digital. Fatores humanos em IHC. Analfabetismo. Idosos. Introdução Este estudo faz parte do projeto Soluções de Telecomunicações para Inclusão Digital (STID), da Diretoria de Tecnologias de Serviços (DTS), do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Telecomunicações (CPqD). O objetivo do projeto STID foi identificar, propor, integrar e adaptar novas soluções de interface humano-computador e modelos de interação a fim de facilitar o uso dos computadores por pessoas iletradas e/ou com alguma deficiência sensorial (ÁVILA et al., 2007; HOLANDA; DALL'ANTONIA, 2006). Dentro desse objetivo mais amplo, se inseriu o estudo aqui descrito, que aborda o uso de ícones como facilitadores da interação de pessoas iletradas ou semiletradas com interfaces computacionais e com serviços de governo eletrônico oferecidos via Internet. Nesse âmbito, surgiu a necessidade de um estudo que investigasse o possível uso de ícones como facilitadores dessa interação. Essa facilitação refere-se não somente ao uso de ícones para veicular ideias e informações, mas também a situações em que ocorre uma interação entre ícones e símbolos, isto é, o uso concomitante de ícones (como imagens de apoio) e textos (simplificados). Este artigo oferece uma descrição do estudo por nós realizado, que contou com três ensaios. Partindo de resultados de estudos realizados no exterior, este estudo se vale de dados colhidos de representantes do público-alvo no Brasil para testar algumas hipóteses, buscando conceber e implementar soluções adequadas ao contexto e à população brasileira. 1 Definição do problema e suas soluções Os perfis de usuários que delimitam o público-alvo do STID representam atualmente entre um terço e metade da população brasileira, com predominância de idosos e habitantes de zonas rurais. Esse público enfrenta inúmeras barreiras no exercício de seus direitos e grandes dificuldades no acesso às oportunidades criadas pela sociedade informacional. Embora numeroso, esse público parece ser negligenciado ou ter suas necessidades específicas subestimadas por várias iniciativas de inclusão digital existentes no Brasil. Assim, o foco no baixo letramento como fator de exclusão digital se justifica pela natureza eminentemente textual de grande parte dos conteúdos e serviços digitais hoje disponíveis. Numa comparação entre diversos países (CHINN; FAIRLIE, 2006), a “baixa escolaridade” apareceu diretamente correlacionada com a penetração menor dos computadores e da Internet, ainda que outros fatores também tenham se mostrado relevantes. Como discutido por Ávila e Holanda (2006), a iliteracia cria “círculos viciosos” em que a falta de acesso à sociedade informacional, que em grande medida resulta dessas deficiências de letramento, recrudesce as desigualdades de oportunidade já *Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected]. **Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO). Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais enfrentadas por essa população. Em face disso, o projeto STID buscou, desde sua concepção, enfocar e compreender esse público, suas necessidades e seus bloqueios em relação às tecnologias de informação e comunicação (TICs), para, com base nesse entendimento, direcionar recursos, soluções e ferramentas que facilitem a travessia desses cidadãos rumo à sociedade informacional. 2 Antecedentes na literatura O estudo iniciou-se pelo levantamento de trabalhos correlatos já realizados no Brasil e no exterior, avaliando sua possível adaptação ou extensão aos propósitos do STID. Embora tenham sido identificados vários estudos voltados a deficientes visuais (BREWSTER, 1998; SCHNELLE; LYARDET, 2006; TAKAGI et al., 2004) e auditivos (AHMED; SEONG, 2006; CAVENDER et al., 2006; FAJARDO et al., 2003; KENNAWAY et al., 2007; PETRIE et al., 2004; ZAJICEK; HALL, 2000), alguns dos trabalhos disponíveis se mostraram, no que diz respeito à inclusão digital de pessoas pouco escolarizadas, mais incipientes e com poucas implementações práticas (ver, por exemplo, GOETZE; STROTHOTTE, 2001). Alguns eram voltados à interação com outros tipos de interface, como as de telefones celulares (AHMED; SEONG, 2006; EIRIKSDOTTIR et al., 2006). Apesar de já terem sido empreendidos estudos sobre o acesso de cidadãos iletrados a sítios e serviços de governo eletrônico, inclusive em países desenvolvidos como a Itália (BIASIOTTI; NANNUCCI, 2006) e os EUA (AKAN et al., 2006; PILLING; BOELTZIG, 2007), são mais recorrentes na literatura estudos de caso para a Índia, com implementações ou propostas geralmente mais voltadas ao acesso a oportunidades de emprego (MEDHI et al., 2007a), a informações de saúde (HUENERFAUTH, 2002), agrícolas (PLAUCHÉ et al., 2006), ou ainda ao letramento digital (CHAND; DEY, 2006). Entre tais abordagens do problema, observa-se a ênfase no uso de interfaces baseadas em ícones, que prescindem da linguagem escrita. Isso pode ser explicado pela realidade indiana, marcada pela particular combinação de altos níveis de analfabetismo pleno e elevado multilinguismo, o que torna demasiado complexa a tarefa de implantar, em âmbito nacional, interfaces computacionais baseadas em texto. Isso também explica por que muitos dos estudos citados buscam conceber ícones (signos com efetiva semelhança com os objetos representados) que sejam capazes não só de facilitar a comunicação entre os usuários e o computador, mas também de substituir por completo o uso da escrita. Apesar de a Índia ser um país que apresenta semelhanças com o Brasil e de ambos serem países emergentes e com altos índices de 16 analfabetismo, adotar para o Brasil as soluções especificamente concebidas para o cenário indiano parece-nos algo questionável, sobretudo em face das consideráveis diferenças do contexto brasileiro, que é muito caracterizado pelos elevados níveis de analfabetismo funcional e por um monolinguismo marcado pela desigualdade no domínio da norma culta da língua oficial – aquela de que o Estado se vale ao comunicar-se com seus cidadãos (MARTINS; FILGUEIRAS, 2007). Assim, no âmbito do projeto STID, cujo público-alvo é formado por pessoas com níveis variados de letramento e de domínio da língua do Estado, e para as quais o computador é pouco ou nada familiar, as soluções de interação tiveram de ser investigadas no devido contexto. Isso demandou estudos que investigassem não só aspectos de iconicidade isolada, mas também situações de interação entre ícones e símbolos, isto é, de uso concomitante de imagens (na forma de ícones de apoio) e textos (simplificados). Ademais, diante da carência de trabalhos semelhantes voltados para o cenário brasileiro, este estudo trilha uma linha investigativa que busca contextualizar resultados de estudos existentes no exterior e aplicá-los às circunstâncias verificadas no Brasil, a fim de conceber e implementar soluções adequadas à nossa população. 3 Ícones na promoção da inteligibilidade Na área da Antropologia, alguns estudos já se valeram da análise de desenhos para obter informações e dados não explicitados pelos sujeitos do estudo. Esse foi, por exemplo, o caso dos trabalhos de Lévi-Strauss (1975) e Matta (1976) que, com o objetivo de atingir dados subjacentes sobre dimensões do espaço, difíceis de serem alcançados com outras metodologias, analisaram desenhos de aldeias indígenas feitos pelos próprios índios. Esse foi também o objetivo do estudo de Niemeyer (1985), conduzido com base em desenhos e mapas elaborados por moradores de favelas na cidade de São Paulo. Facchini et al. (1997) utilizaram essa metodologia para elaborar mapas de risco para uma indústria alimentícia na cidade de Pelotas (RS). Ao notarem que o uso de figuras geométricas, com graduação de tamanho para caracterizar a intensidade do risco, tinha pouco significado para os trabalhadores, propuseram uma pesquisa na qual os próprios trabalhadores sugerissem os ícones. Waichman et al. (2007) estudaram a eficácia de pictogramas autoexplicativos das embalagens de pesticidas utilizados por trabalhadores rurais na Amazônia brasileira. O estudo avaliou em que medida as ilustrações, criadas pelos fabricantes, ajudam efetivamente na compreensão, por pessoas com habilidades de leitura limitadas, dos Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais riscos do uso dos pesticidas. O estudo de caso investigou como os trabalhadores interpretavam textos e símbolos nas etiquetas das embalagens e de que modo essa leitura dependia de fatores como idade, escolaridade e tempo de uso. Os autores deram indicações sobre a importância do uso de cores, símbolos, léxico e linguagem adequados àquele público-alvo (trabalhadores rurais e pequenos agricultores). Porém, o levantamento inicial não identificou, na área das interfaces computacionais no Brasil, soluções baseadas em ícones para o baixo letramento que pudessem ser integralmente reproduzidas no STID. Muito embora, como já discutido, as experiências estrangeiras relatadas não possam ser totalmente transpostas para o cenário brasileiro, elas sustentam algumas das hipóteses iniciais deste estudo. Uma dessas hipóteses, a de que o uso de apoios icônicos é necessário em interfaces para pessoas com baixo letramento, foi descrita em Medhi et al. (2007a), na forma de implementação de interface sem textos (baseada em ícones) voltada a facilitar a busca, por parte de mulheres analfabetas da Índia rural, de empregos adequados às suas habilidades profissionais e expectativas de remuneração. Já em Medhi et al. (2007b), os autores discutiram a melhor forma de representar diferentes conceitos para usuários analfabetos ou semianalfabetos, fazendo uso de elementos audiovisuais. Esse último artigo compara a inteligibilidade de dez tipos diferentes de representações – desenho estático, texto, foto, animações feitas à mão e vídeo, cada uma também com descrição por voz. As conclusões foram de que descrições por voz em geral ajudam na compreensão e que, embora as representações com áudio tenham sido bem mais inteligíveis do que as sem áudio, pode também ocorrer de essas informações bimodais (audiovisuais) serem confusas para esse público. Por outro lado, informação visualmente mais rica não implica necessariamente melhor compreensão, e quadrinhos podem se mostrar mais efetivos que representações fotorrealistas. Finalmente, os resultados foram inconclusivos a respeito das vantagens/desvantagens das imagens dinâmicas com relação às estáticas, isto é, movimento não implica necessariamente melhor compreensão, e, numa comparação entre a compreensão produzida por informação estática e aquela produzida por informação dinâmica, vários fatores devem ser considerados. Em tese, ícones podem se tornar um recurso efetivo na redução da carga simbólica imposta aos usuários, pois não pressupõem, para sua interpretação, escolarização ou proficiência em uma linguagem (código adquirido), mas sim experiência com o mundo concreto, algo que, em grande medida, prescinde de escolarização. Todavia, nem sempre as vivências concretas bastam para a apreensão de conceitos muito abstratos ou técnicos, bastante frequentes em serviços de governo, como os que são objeto do projeto STID. Por outro lado, nada garante que todos os usuários de uma interface compartilhem de um mesmo conjunto de experiências do mundo concreto, tais como as necessárias à interpretação dos ícones utilizados. Em outras palavras, o uso de imagens (ícones) pode elevar a inteligibilidade dos conteúdos e facilitar sua compreensão pelos usuários iletrados, mas a busca por ícones perfeitos será uma empreitada inócua, visto que a inteligibilidade dos ícones depende fundamentalmente das experiências anteriores de cada indivíduo, e o que é “perfeito” para um pode ser inadequado ou insuficiente para outro. A despeito desse caráter estritamente individual da interpretação icônica, nos pareceu válida uma busca por ícones cuja interpretação dependesse de vivências mais ordinárias e cotidianas (menos particularizadas) por parte do público-alvo. Nesse sentido, e a exemplo dos trabalhos apresentados em Medhi et al. (2007a; 2007b), a identificação das imagens mais adequadas ao contexto ou ao domínio específico de serviços de governo foi, sempre que possível, fundamentada em dados colhidos em campo, como resultado de estudos etnográficos, que embasaram o primeiro e o terceiro ensaios deste estudo (descritos nas Seções 5 e 7), e de uma dinâmica participativa com a população-alvo, que norteou o segundo ensaio (Seção 6). Por fim, tendo em vista o perfil de alfabetização atual da população brasileira, o presente estudo buscou ainda avaliar de que modo os ícones construídos ou escolhidos poderiam interagir com conteúdos textuais presentes na interface. Para isso, o estudo buscou entender como, no processo de interpretação de elementos em uma interface computacional, as habilidades de leitura e de interpretação icônica retroalimentam-se, reforçam-se e concorrem entre si. No terceiro ensaio deste estudo, descrito na Seção 7, esse tema é aprofundado. Para a realização dos ensaios e das dinâmicas de iconicidade com representantes do público-alvo, os autores contaram com o apoio de núcleos acadêmicos das áreas de computação (POLI-USP e NIED-Unicamp) e de linguística (IEL-Unicamp), todos com larga experiência em interação humano-computador e em avaliação de usabilidade e inteligibilidade de mídias digitais. Foram assim criados e realizados três ensaios de reconhecimento e de design participativo de ícones, escalonados nas três etapas acima mencionadas, e cujos objetivos e resultados são discutidos a seguir. 4 Descrição dos experimentos A fim de entender os processos envolvidos na Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 17 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais 1 interpretação icônica, sobretudo pela população-alvo do projeto, foram realizados três ensaios com sujeitos representativos dessa população, buscando cumprir os seguintes objetivos: • comparar a efetividade de desenhos e fotografias e as implicações de cada tipo de imagem para os diversos segmentos do público-alvo; • desenhar ícones que aumentassem a inteligibilidade geral dos conteúdos de serviços de governo eletrônico mediados pela interface; • avaliar a interação entre ícones e textos, buscando encontrar os melhores arranjos para o perfil de letramento do público-alvo. Esses ensaios são, assim, parte de um estudo diacrônico, realizado em diferentes localidades brasileiras, conforme a descrição abaixo. Dada a dificuldade de recrutamento de analfabetos, por um lado em função de sua invisibilidade social e, por outro lado, em razão de uma certa aversão desse público às TICs, os recrutamentos foram feitos com o apoio de parceiros locais. Embora o total de participantes, cerca de 40 pessoas, não ofereça base para generalizações estatísticas, os ensaios tiveram um caráter exploratório, e os resultados obtidos (que aparecem tabulados em termos percentuais para facilitar comparações) trouxeram à tona aspectos relevantes para os objetivos do projeto STID. Os testes foram aplicados aos participantes que aceitaram, de antemão, as condições do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), lido, quando necessário, na presença de uma testemunha de confiança. 5 Primeiro ensaio Os experimentos foram realizados nas cidades de Bastos (SP) e João Alfredo (PE), entre julho e agosto de 2007. Os participantes selecionados eram idosos, de ambos os sexos, aposentados da área rural, com baixo nível de escolaridade, baixa renda familiar e sem qualquer familiaridade com computadores. Em Bastos, participaram doze pessoas (dez homens e duas mulheres), com idade média de 65 anos. Em João Alfredo, participaram oito pessoas (cinco homens e três mulheres), com idade média de 57 anos. Antes do primeiro ensaio, o nível de alfabetização de cada participante foi avaliado por meio da aplicação de um teste específico, que gerou a seguinte classificação: em Bastos havia quatro analfabetos plenos, sete indivíduos com nível rudimentar de alfabetização e um com nível básico. Em João Alfredo, três dos sujeitos eram analfabetos plenos, dois tinham nível rudimentar, dois tinham nível básico e um não foi classificado. O primeiro ensaio teve o objetivo de averiguar a compreensão e a afinidade que alguns tipos de imagem produzem em indivíduos representativos da população-alvo do projeto. Nesse ensaio as imagens foram avaliadas em termos de: • grau de afinidade, isto é, o nível de empatia manifestado pelos sujeitos em relação aos diferentes tipos de imagem; • grau de iconicidade, isto é, o grau de inteligibilidade da imagem para os vários segmentos do público-alvo; • seus efeitos na facilitação da leitura entre os usuários semianalfabetos. Entre as questões a serem respondidas, a principal investigou se fatores socioculturais ou etários influenciam na preferência dos sujeitos por um tipo de imagem (fotografia ou desenho) ou na sua capacidade de inferir corretamente o significado dessas imagens. No ensaio foram utilizadas imagens de objetos ou de temas cotidianos. Visto que os primeiros serviços oferecidos pelo projeto STID cobrem as áreas de previdência social e de saúde, as imagens selecionadas para o protocolo de teste referiam-se a tais temas. Foram usadas imagens de especialidades médicas, de objetos da vida diária e de documentos. As fotos de documentos foram produzidas por nossa equipe com base em documentos reais, alterando-se, todavia, as informações pessoais presentes neles para preservar as informações dos portadores1. As fotografias da área médica e as de cenas cotidianas foram selecionadas em repositórios da Web, adotando-se os critérios de pertinência aos temas de interesse, de semelhança com a realidade brasileira e de ausência de restrições de direito autoral. Os ícones necessários ao ensaio, por sua vez, foram elaborados por nossa equipe, ou, quando necessário, adaptados de clip-arts disponíveis no pacote Office. A lista de imagens utilizadas no protocolo de testes incluiu: • CIC/CPF; • RG/carteira de identidade; • certidão de nascimento; • clínico geral; • ginecologista-obstetra; • oculista; • pediatra; • dentista; • serviços. Assim, esperava-se que essas etapas de teste permitissem avaliar implicações e possibilidades do uso de ícones na interface computacional por meio da qual esses usuários acessariam serviços de governo eletrônico e correlacionar seu efeito com os diversos perfis etários e de letramento da 1 Algumas fotos, de caráter mais pessoal, inclusive as contidas em documentos, foram retocadas neste artigo para preservar o sigilo da identidade dos retratados. Todavia, nos ensaios em ambiente controlado, elas foram usadas sem retoque para não distorcer os resultados. 18 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais população-alvo. 5.1 Procedimentos e preparativos iniciais De início, perguntava-se ao entrevistado se ele preferia fazer o teste acompanhando as telas na forma de cartões impressos ou olhando-as diretamente no monitor do computador. Foi enfatizado que, em qualquer dos casos, seria o mesmo teste, e que em nenhum dos casos o entrevistado teria que interagir diretamente com o material, função essa que caberia sempre ao condutor. Essa foi uma estratégia para tentar eliminar/amenizar possíveis influências negativas causadas pela tecnofobia desses sujeitos, pouco afeitos a computadores. Acreditamos que, ao deixarmos para os sujeitos a escolha do suporte do teste, reduziríamos eventuais resistências iniciais causadas pelo estranhamento frente ao equipamento (um computador portátil, pouco comum naquelas comunidades). Uma vez feita a escolha, prosseguia-se com o teste propriamente dito, conforme descrito abaixo. As respostas obtidas foram anotadas. 5.2 Teste de afinidade A primeira etapa do ensaio visou avaliar a afinidade criada por diferentes tipos de imagens (desenho ou foto) de objetos/temas concretos (“cachorro”, “televisor” e “casal”) que fazem parte do cotidiano da grande maioria dos brasileiros. Como fotos têm, por um lado, maior fidelidade às características físicas do objeto representado e, por outro lado, um valor indicial que pode se sobrepor a seu valor icônico, remetendo a indivíduos específicos e afastando-se em certa medida do conceito geral, nessa etapa buscou-se verificar se tais atributos facilitam ou dificultam a interpretação da ideia geral. Buscou-se verificar também se isso depende da idade dos sujeitos, visto que, em tese, os desenhos poderiam ter mais apelo para indivíduos jovens e as fotos para os mais velhos. Foram mostrados a cada sujeito um desenho e uma foto de um cachorro (conforme Figura 1) e feitas as seguintes perguntas: Pergunta 1 – Qual destas duas imagens é melhor para aparecer em um computador quando o assunto é saúde de cachorro? O condutor aguardava a escolha e anotava a resposta (foto ou desenho) em um formulário. O mesmo processo foi repetido para imagens (desenho e foto) de um televisor. Pergunta 2 – Qual destas duas imagens é melhor para aparecer em um computador quando o assunto é um programa sobre saúde na TV? O condutor aguardava a identificação e anotava a resposta (foto ou desenho) em um formulário. Por fim, o processo foi repetido para imagens (desenho e foto) de um casal. Pergunta 3 – Qual destas duas imagens é melhor para aparecer em um computador quando o assunto é planejamento familiar? Os resultados obtidos indicaram uma preferência pelas fotos, mas essa variava conforme a localidade e o tema da imagem, conforme Tabela 1. 5.3 Teste de inteligibilidade Na segunda parte do ensaio, foi narrada aos sujeitos uma história na qual uma pessoa (Maria) precisava marcar hora em um centro de saúde. Em seguida, foi mostrada aos sujeitos uma tela com imagens (desenhos ou fotos) de cinco especialidades médicas existentes em centros de saúde (obstetra, oculista, dentista, clínico geral e pediatra). Para reduzir a possibilidade de a última escolha ser feita por mera exclusão, às cinco imagens citadas incluiu-se uma sexta (enfermeira) que, embora pertinente ao contexto, não fazia parte dos temas avaliados. Cada conjunto de seis imagens foi arranjado para formar um tipo de tela: o primeiro (tipo 1) contendo as fotos das especialidades médicas e o segundo (tipo 2) com desenhos dessas mesmas especialidades, com proporções e características semelhantes às das fotos, conforme ilustrado nas Figuras 2 e 3. A ordem de apresentação das telas tipo 1 e 2 foi alternada entre os entrevistados subsequentes, de forma que para o primeiro entrevistado a primeira tela fosse a com desenhos e para o entrevistado seguinte a primeira tela fosse a com fotografias, e assim sucessivamente. Em seguida, solicitou-se que o sujeito apontasse, uma por vez, as especialidades seguindo o roteiro: Pergunta 1 – Se Maria está com dor de dente e precisa marcar hora com um dentista, qual imagem ela deve escolher? Pergunta 2 – Se Maria está esperando um bebê e precisa marcar hora com um obstetra, qual imagem ela deve escolher? Pergunta 3 – Se Maria tem um filho pequeno e precisa marcar hora com um pediatra, qual imagem ela deve escolher? Pergunta 4 – Se Maria tem um problema nos olhos e precisa marcar hora com um oculista, qual imagem ela deve escolher? Pergunta 5 – Se Maria está com uma dor que não sabe o que é e precisa marcar hora com um clínico geral, que imagem ela deve escolher? O condutor aguardava a identificação e, para cada especialidade, anotava o resultado: identificado ou não identificado. Perguntava-se então ao sujeito qual das telas havia lhe agradado mais, e por quê: Pergunta 1 – De qual das duas telas o/a Sr./Sra. gostou mais? Pergunta 2 – Por quê? Os resultados obtidos são mostrados na Tabela 3, em contraste com a média de inteligibilidade indicada na Tabela 2. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 19 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Fonte: fotos 1 e 3 – Creative Commons. Figura 1 Imagens do primeiro teste do primeiro ensaio2 Tabela 1 Percentuais de preferência por tipo de imagem e localidade Bastos João Alfredo Tema Foto Desenho Foto Desenho Cachorro 58% 42% 75% 25% Televisor 58% 42% 75% 25% Casal 67% 33% 75% 25% Figura 2 Desenhos das especialidades médicas 2 As citações de autoria de fotos publicadas segundo licença de Creative Commons que tenham sido usadas nos ensaios aparecem nos documentos de condução dos testes, mas são omitidas neste artigo para preservar as identidades dos autores. 20 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Fonte: fotos 1, 3, 4, 5 e 6 – Creative Commons, foto 2 – www.photo.com. Figura 3 Fotos das especialidades médicas Tabela 2 Percentuais de reconhecimento por tipo de imagem e localidade Bastos João Alfredo Tema Foto Desenho Foto Desenho Dentista 50% 75% 25% 75% Obstetra 67% 58% 25% 62% Pediatra 64% 42% 38% 25% Oculista 82% 42% 62% 50% Clínico geral 55% 42% 25% 25% Tabela 3 Percentuais de preferência e inteligibilidade por tipo de imagem e localidade Bastos João Alfredo Tema Foto Desenho Foto Desenho Preferência 92% 8% 87% 13% Inteligibilidade 63% 52% 35% 48% Esses resultados mostram que, embora seja predominante a preferência por fotos, isso não se reflete proporcionalmente em mais inteligibilidade desse tipo de imagem. No que se refere à inteligibilidade das imagens em geral, observou-se um melhor resultado em Bastos do que em João Alfredo, sobretudo com relação às fotos. Esse resultado pode, em princípio, ser atribuído à diferença de nível de desenvolvimento nos dois municípios, mas a dimensão da amostra não nos permite fazer esse tipo de análise. Em seguida, foi narrada uma história na qual um conhecido (chamado José, no caso dos entrevistados homens) ou uma conhecida (chamada Maria, no caso das mulheres) precisava entrar com um pedido de aposentadoria. Explicou-se que para isso era necessário apresentar três documentos: o CIC/CPF, a carteira de identidade ou RG e a certidão (ou registro) de nascimento. Foi apresentada ao sujeito uma tela contendo imagens desses três documentos, como ilustrado nas Figuras 4 e 5. Em seguida, solicitou-se ao sujeito que identificasse cada um deles. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 21 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Figura 4 Desenhos de documentos Figura 5 Fotografias de documentos Tabela 4 Inteligibilidade de documentos por tipo de imagem e localidade Bastos 22 João Alfredo Tema Foto Desenho Foto Desenho CIC/CPF 92% 92% 87% 87% Identidade/RG 92% 92% 75% 100% Certidão de nascimento 83% 83% 100% 87% Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais A exemplo do caso anterior, as imagens foram arranjadas para configurar dois tipos de tela: uma contendo fotografias dos documentos (tipo 1), e outra contendo desenhos (tipo 2) com as mesmas proporções, características e cores das imagens fotográficas. As telas tipo 1 e tipo 2 foram alternadamente apresentadas para cada sujeito subsequente. O condutor aguardava a identificação e anotava os resultados conforme as alternativas: “identificado” ou “não identificado”, para cada um dos três documentos e, no caso de identificação incorreta, anotava o nome pelo qual foi identificado o documento em questão. Em seguida, o condutor voltava a mostrar as duas telas (com desenhos e com fotos) e perguntava ao sujeito qual era a de sua preferência, e anotava a resposta obtida. Os resultados, mostrados na Tabela 4, não apresentaram diferenças significativas em termos de inteligibilidade dos documentos em função do tipo de imagem apresentada, nem tampouco em função das localidades estudadas. 5.4 Teste de interação com a leitura A parte final do teste era dirigida especificamente aos analfabetos funcionais e tinha por objetivo verificar se ícones contribuem para a leitura de palavras. No teste, eram exibidas quatro palavras, substantivos concretos de uso corrente, que de alguma forma pudessem se relacionar a serviços de cidadania. Na primeira tela, as palavras apareciam sem qualquer apoio icônico, conforme Figura 6. Solicitava-se ao sujeito que as lesse e anotavam-se os casos de erro ou de incapacidade de leitura. No teste de leitura sem apoio icônico, 14 dos 18 sujeitos que fizeram essa etapa do ensaio foram capazes de ler todas as palavras e 4 não conseguiram ler nenhuma, número compatível com o percentual de analfabetos plenos na amostra. O teste terminava para aqueles que haviam lido todas as palavras. Para os demais, era exibida alternadamente uma tela para cada palavra que o sujeito não conseguira ler, só que desta vez, junto à palavra em questão, aparecia o respectivo ícone. A síntese dos quatro ícones com as quatro palavras correspondentes é mostrada na Figura 7. O objetivo dessa etapa era verificar se o ícone afetaria de algum modo a capacidade de apreensão da ideia, seja pela facilitação da leitura, seja por mera interpretação icônica, contanto que o termo enunciado pelo sujeito correspondesse exatamente à palavra escrita, e não a um sinônimo ou conceito aproximado (por exemplo, medicamento em lugar de remédio). Figura 6 Tela exibindo palavras sem apoio icônico Figura 7 Tela exibindo palavras com apoio icônico Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 23 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Observou-se que, das quatro pessoas que não haviam lido nenhuma palavra, uma pessoa (69 anos, sem estudo e analfabeta) identificou uma palavra com o apoio icônico e três pessoas (62 anos, analfabeta; 68 anos, analfabeta; 58 anos, 1ª série) identificaram três palavras nessas condições. Em razão da configuração dessa última etapa do ensaio, de cunho estritamente exploratório, os resultados obtidos não permitem qualquer conclusão segura sobre os reais efeitos dos ícones sobre o processo de leitura de indivíduos com alfabetização rudimentar. No entanto, eles sugerem haver um efeito de reforço mútuo e, por isso, motivaram a realização de um ensaio específico sobre esse tema, conforme descrito na Seção 6. 5.5 Conclusões do primeiro ensaio Tanto em Bastos quanto em João Alfredo, a maioria dos participantes disse preferir fotos e alegou que elas são mais claras e “declaradas” que os desenhos. Isso se aplica tanto aos temas cotidianos quanto às especialidades médicas e aos documentos. Por outro lado, essa preferência não se correlaciona integralmente com a inteligibilidade das imagens, pois os percentuais de reconhecimento desses dois tipos de imagem em ambas as localidades foram bem mais equilibrados que os níveis de afinidade com eles. Isso pode indicar que a preferência por fotos esteja mais correlacionada com sua maior proximidade do mundo real e com o fato de elas terem um vínculo mais claro e direto com o cotidiano, o que talvez confira ao tema mais credibilidade, dando aos usuários uma sensação maior de confiança, ainda que sem implicar maior inteligibilidade. Isso não significa que o uso de desenhos precisa ser evitado, pois, do ponto de vista da implementação dos serviços, eles permitem maior flexibilidade na criação de personagens e na realização das animações necessárias à orientação do usuário na interface. Os resultados do ensaio sugerem como possibilidade o uso de fotos sempre que a intenção for mostrar o contexto dos serviços, os locais em que eles são prestados na localidade do usuário e os profissionais envolvidos, porque isso cria uma conexão com o cotidiano do usuário e reforça a sensação de que os serviços mediados pelo computador são reais. Por outro lado, uma vez que trazem maior flexibilidade de criação de conteúdos, os desenhos e as animações poderiam ser usados para passar informações mais gerais, como dicas de saúde, prevenção de doenças etc., que aparentemente não dependem de vínculos tão diretos com a realidade concreta de cada usuário em particular. Por fim, o teste sugeriu que o uso de ícones pode reforçar as habilidades de leitura das 24 pessoas com baixo letramento. Porém, essa hipótese ainda precisa ser mais estudada. Nesse sentido, foi concebido um novo teste a ser aplicado a usuários que lidam diretamente com páginas da Internet. 6 Segundo ensaio Dando continuidade ao estudo iniciado no primeiro ensaio, o segundo ensaio teve como objetivo específico envolver representantes da população-alvo em uma dinâmica participativa de desenho de ícones para os temas de interesse do STID. Isso se insere dentro do objetivo final de reunir dados que permitam a elaboração de uma interface acessível, utilizável e inteligível para esse público-alvo. Como discutido, os ícones destacam-se como um importante recurso na orientação contextual e temática de usuários pouco letrados durante a interação com interfaces computacionais. Para cumprir essa tarefa, todavia, os ícones precisam ser inteligíveis, isto é, de fato representativos dos objetos e conceitos que se propõem a mediar (no caso do projeto STID, temas relativos a serviços de governo eletrônico). Entretanto, a iconicidade depende das experiências visuais que cada pessoa acumulou ao longo de sua vida. Por essa razão, ela varia de indivíduo para indivíduo, sobretudo em uma população muito heterogênea (parte rural, parte urbana, e com diferentes idades, condições sociais e localidades de origem). Assim, essa busca deve ser empreendida com a consciência de que não existirão ícones perfeitos nem universalmente inteligíveis, impossibilidade inerente à própria definição de ícone. Em outras palavras, o ícone, por mais bem desenhado que esteja, não será reconhecido se o observador não conhecer o objeto representado, se o objeto não fizer (ou tiver feito) parte de seu contexto, se não possuir um significado para ele ou ainda se o ícone não estiver bem contextualizado. Apesar dessas dificuldades, a inteligibilidade de cada ícone usado na interface aumentará à medida que sua representação estiver mais próxima do objeto real. Para isso, sujeitos representativos do público-alvo foram engajados na concepção de um conjunto de ícones. Embora não assegure um resultado universalmente inteligível, essa dinâmica representa ao menos um passo na direção de produzir imagens que, apoiadas nas experiências individuais dos vários envolvidos nesse design participativo, sintetizem características icônicas, cuja interpretação esteja menos sujeita e ligada às idiossincrasias de cada participante individual. 6.1 Antecedentes na literatura Várias obras de referência da área de design de interação e de interfaces dedicam espaço ao Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais problema da produção de ícones. Preece et al. (2005, p. 23), por exemplo, comentam que: “[...] ícones são culturais e específicos do contexto e que, portanto, projetar um bom ícone exige tempo”. Segundo essas autoras, os projetistas deveriam sempre lançar mão de tradições e padrões existentes, em lugar de contrariá-los. Elas salientam ainda que é mais fácil representar iconicamente objetos e coisas concretas, ao contrário da representação de ações, que, embora não seja impossível, é certamente mais difícil. Outra característica importante apontada pelas autoras é que os ícones devem ser distinguíveis uns dos outros na interface. Rocha e Baranauskas (2000), por sua vez, descrevem algumas técnicas participativas de desenho de ícones. Uma técnica de projeto de interface, chamada BrainDraw, é conduzida na forma de chuva de ideias (brainstorming) cíclica e gráfica, em que uma série de estações de desenho são arranjadas em círculo, de forma a permitir que cada participante faça um desenho inicial sobre um tema e, ao final de um intervalo de tempo, deixe seu desenho, passe à estação seguinte e continue o desenho lá encontrado. O processo prossegue até que todos tenham colaborado na criação iniciada por um dos participantes e diferentes desenhos tenham assim sido produzidos, sendo cada um constituído pela fusão de ideias e contribuições de todos, mas sempre com um início diferente. Mais especificamente em relação ao desenho de ícones, Rocha e Baranauskas (2000) descrevem um jogo participativo em que um dos participantes atua como desenhista (sketcher), elaborando ícones enquanto os demais tentam “adivinhar” o conceito que ele tenta expressar. Um observador acompanha a interação dos envolvidos e toma nota daqueles desenhos que se mostram mais confusos e também daqueles que parecem mais efetivos, os quais são selecionados posteriormente para a produção gráfica dos ícones. Dependendo do número de pessoas envolvidas, a dinâmica pode funcionar no estilo cooperativo ou ser dividida em grupos para a produção competitiva de desenhos. 6.2 Procedimentos Em uma atividade de design participativo, como o caso aqui descrito, que envolveu um grupo heterogêneo de sujeitos, considerou-se mais adequada uma dinâmica dividida em três fases: • individual, em que cada participante propôs representações icônicas para os temas; • em grupo, em que os participantes foram agrupados por proximidade etária em três equipes distintas para consolidar as propostas icônicas individuais em uma mais sintética; • finalização dos ícones, fase em que os pesquisadores identificaram os elementos e as ideias principais e os utilizaram para orientar um desenhista na produção dos ícones. As sequências de uma etapa individual e de uma com divisão etária dos grupos foram adotadas para que as pessoas idosas não se sentissem intimidadas e manifestassem suas preferências e opiniões sobre os temas solicitados. Além disso, considerou-se que a técnica em que um desenhista propõe ícones desde o início, como descrita em Rocha e Baranauskas (2000), poderia ter um efeito indesejável de influência ou sugestão, reduzindo ou até mesmo tolhendo a espontaneidade de algumas propostas que poderiam surgir caso cada participante fizesse seus próprios desenhos inicialmente. Assim, acreditou-se que, na forma como foi organizada, a atividade participativa preservaria as propostas individuais, para posterior síntese em uma proposta coletiva. Por essa razão, a dinâmica adotou o procedimento em três etapas, partindo do individual e convergindo gradualmente para o coletivo, preservando-se todos os passos que levaram à versão final de cada ícone. Esses resultados intermediários enriqueceriam o estudo, uma vez que permitiriam a identificação do efeito das experiências pessoais de cada sujeito na proposição dos ícones. Com isso, seria mais fácil rastrear as diversas sugestões e correlacioná-las com o perfil de cada proponente. Dessa maneira, o resultado final partiria do próprio público-alvo e não de uma ideia icônica preconcebida pelos pesquisadores. Ainda que essa metodologia não seja exaustiva nem abranja inteiramente o público-alvo, ela tem o mérito de se valer de uma amostra representativa dos usuários a serem atendidos pelos serviços. 6.3 Descrição da atividade participativa Foram recrutadas pessoas que representam o público-alvo do projeto: analfabetos plenos e funcionais, de diferentes faixas etárias, incluindo idosos. A dinâmica contou com a participação de uma deficiente auditiva e de uma intérprete da Língua Brasileira de Sinais (Libras). A atividade envolveu um grupo de 14 pessoas, parte delas oriunda da zona rural, com idades variando de 16 a 73 anos, pertencentes às classes socioeconômicas C, D e E, moradoras da periferia da cidade de Campinas. No início da dinâmica, cada participante foi orientado a fazer suas atividades sem interagir com os outros sujeitos. Na segunda etapa, os 14 participantes foram divididos por faixas etárias em três grupos: de 16 a 30 anos; de 31 a 50 anos; de 51 a 73 anos. A alocação dos sujeitos em cada um dos grupos visava, na medida do possível, produzir grupos cujas médias de idade divergissem bastante. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 25 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais 6.4 Etapas da atividade Na primeira etapa, os condutores propuseram um tema (relacionado aos serviços de e-gov) e solicitaram aos sujeitos que desenhassem ou descrevessem como deveria ser desenhado o tema, sem interagir com os demais participantes. No caso de analfabetos plenos, os condutores anotaram cada descrição verbalizada pelos sujeitos. O procedimento foi repetido para os cinco temas: “aposentadoria”, “dentista”, “pediatra”, “clínico geral” e “lugar onde se pede informação”. Na segunda etapa, reagrupados os 14 sujeitos segundo o critério etário, os membros de cada grupo interagiram discutindo os desenhos que haviam elaborado na primeira etapa, a fim de que o grupo avaliasse contribuições individuais e propusesse, para cada um dos cinco temas, um ícone-síntese que combinasse as características consideradas mais adequadas entre as diversas contribuições individuais dos membros do grupo. Ao final da segunda etapa, cada grupo havia produzido, de forma consensual, cinco ícones. Ao longo de todas as interações, os condutores anotaram as dúvidas e os comentários manifestados pelos participantes, e buscaram extrair daqueles participantes incapazes de escrever ou desenhar – sobretudo os idosos analfabetos – ideias sobre como os ícones deveriam ser, incluindo idade, aparência e sexo dos personagens desenhados. Foram também sondadas as preferências com relação às cores usadas e à presença ou ausência de elementos específicos com vista a facilitar o entendimento da imagem, como, por exemplo, uma cruz vermelha em todos os ícones referentes à área de saúde ou um estetoscópio e um medidor de pressão no ícone “clínico geral”. Alguns desenhos criados pelos participantes para temas propostos, além das anotações feitas (inclusive pelos condutores), são ilustrados nas Figuras 8, 9 e 10. Como os sujeitos tinham níveis de letramento que iam do analfabetismo pleno ao funcional, alguns deles fizeram anotações nos desenhos, sobretudo para indicar cores. Também foram necessárias, como indicado no retângulo na Figura 9a, anotações dos condutores sobre ideias verbalizadas pelos analfabetos plenos. Com base nos desenhos e nas anotações, foram identificados temas, elementos e padrões recorrentes e posteriormente propostos a um desenhista para que fossem consideradas as características que deveriam constar nos ícones. Na Figura 11 estão ilustrados alguns ícones resultantes desse processo. É importante salientar que, além da já esperada limitada capacidade de escrita, os participantes com menos escolaridade tiveram grande dificuldade de desenhar. Isso demandou maior atenção dos condutores para aquilo que eles 26 verbalizavam durante a dinâmica, mais até do que para aquilo que eles desenhavam. Foram os participantes que sugeriram, por exemplo, a presença de uma cuspideira ao lado da cadeira do dentista, como acabou sendo usado na versão final do ícone (Figura 11a). Alguns elementos, como a bengala no caso do tema “aposentado” e o estetoscópio para ícones médicos, foram sugeridos por vários sujeitos. Quando indagados a respeito, os participantes em geral afirmavam que se baseavam em suas vivências, isto é, na imagem que eles tinham de um aposentado ou de um médico clínico geral. Isso sugere, portanto, que um ícone para esses conceitos se tornaria mais inteligível (fácil de reconhecer) se contivesse esses elementos. Como o estetoscópio pode estar associado a várias especialidades médicas, outros elementos gráficos sugeridos, como o medidor de pressão, foram usados por estar mais associados à atividade do clínico geral, ou a uma visita a esse tipo de médico, ainda que a medição da pressão possa ser feita por uma enfermeira. Assim, o ícone final incluiu os dois elementos (Figura 11b). Alguns resultados obtidos no segundo ensaio possibilitaram melhorar os ícones cuja interpretação havia dado margem a equívocos no primeiro ensaio, como é o caso do ícone referente ao tema “remédio” ou “medicamento”, que, dadas suas características originais (Figura 12a), chegou a ser confundido por um dos sujeitos (uma mulher idosa) com um tanquinho de lavar roupa, possivelmente por conta das proporções do desenho e sua semelhança com aquele objeto do cotidiano da entrevistada. Uma primeira correção no ícone, em razão do primeiro ensaio, foi a modificação de suas dimensões a fim de torná-lo mais retangular (Figura 12b). A nova alteração, que decorreu do segundo ensaio, foi a inclusão de elementos sugeridos por vários participantes, tais como cartelas de comprimidos e vidro de xarope. Com base nessas sugestões, o ícone foi refeito (Figura 12c) e sua evolução concluída. Alguns elementos que surgiram na dinâmica já eram em certa medida esperados, como o uso de jaleco branco pelos profissionais médicos desenhados e a sugestão do uso de uma cruz vermelha nos ícones relacionados à saúde. Outros foram inesperados, como a sugestão de que a especialidade de pediatria tivesse como personagem uma mulher (algo talvez justificável se for essa a experiência mais frequente entre os participantes e o público que eles representam), ou ainda a sugestão de que os médicos tivessem semblantes amistosos e sorridentes, para tornar os ícones mais atraentes. Por fim, um dos participantes utilizou mímica para ilustrar a expressão de dúvida que, segundo ele, deveria aparecer no ícone “lugar onde se obtém informação”. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Figura 8 Desenhos para o tema “aposentado” feitos por sujeitos de diferentes idades a b Figura 9 Desenhos para os temas – a) “clínico geral” (com notas do condutor em destaque); b) “pediatra” a b Figura 10 Desenhos para o tema “remédio” – a) sujeito jovem; b) sujeito jovem e surdo Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 27 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais a b c d Figura 11 Exemplos de ícones produzidos com elementos capturados na dinâmica – a) dentista; b) clínico geral; c) aposentado; d) pediatra a b c Figura 12 Evolução do ícone para o tema “medicamento” 6.5 Conclusões do segundo ensaio A dinâmica de design participativo de ícones permitiu identificar com bastante clareza alguns elementos-chave para a composição de ícones adequados aos temas “previdência” e “saúde”. As observações realizadas durante a atividade deram aos pesquisadores inúmeros elementos e pistas dos processos interpretativos envolvidos na criação de ícones com os temas propostos. Foi possível observar como a vivência de cada um dos participantes é determinante dos tipos de desenhos e dos elementos neles presentes. Os pesquisadores observaram também que os participantes demonstraram satisfação em contribuir para o projeto com ideias e esboços. Além disso, a metodologia empregada permitiu distinguir tendências de interpretação icônica dos participantes, por faixa etária e por presença de deficiência auditiva. Os resultados corroboraram 28 algumas conclusões do primeiro ensaio, como, por exemplo, a importância de considerar a vivência do público-alvo a fim de criar ícones efetivamente inteligíveis, e deram uma direção para a atividade de produção de ícones para os serviços citados. 7 Terceiro ensaio Conforme tratado nas seções anteriores, no primeiro ensaio, imagens pictóricas (desenhos) e fotográficas foram comparadas em termos de inteligibilidade e empatia dos representantes da população-alvo do projeto STID. No segundo ensaio, outros sujeitos foram engajados em uma dinâmica participativa de desenho de ícones em torno de temas relacionados aos serviços do STID. Os resultados desses dois ensaios iniciais fundamentaram a criação de um conjunto de ícones com as características e os elementos Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais identificados. Todavia, como visto na Seção 4, a questão da interação entre ícones e textos, que no primeiro ensaio foi apenas tangenciada, necessitaria de um estudo mais específico, tendo em conta o perfil de letramento da população brasileira, como discutido na introdução deste trabalho. Assim, o terceiro ensaio pretendeu dar continuidade ao estudo de ícones, avaliando a inteligibilidade específica de algumas imagens e sua interação com palavras. Cabe lembrar que a interação entre imagens e textos ocorre com frequência em interfaces computacionais, e, em função do contexto, pode criar situações de ancoragem, de revezamento ou ainda de etiquetamento. Segundo Bardin (1975, p. 111 apud SANTAELLA; NÖTH, 2005, p. 55), quando dispostos lado a lado, um texto e uma imagem permitem a interpretação holística da mensagem, não se tratando nesse caso da mera adição de duas mensagens informativas diferentes. Barthes (1964, p. 40-51 apud SANTAELLA; NÖTH, 2005, p. 55) propôs duas possibilidades no que se refere a possíveis modos de inter-relação de texto e imagem: ancoragem e revezamento. Na ancoragem, o texto orienta a interpretação da imagem, ressaltando alguns aspectos e ignorando outros. No revezamento, texto e imagem encontram-se numa relação complementar em que “a unidade da mensagem se realiza em um nível mais avançado”. Os autores acrescentam que, embora em ambos os casos haja referências indiciais entre palavra e imagem, no primeiro a referência se dá do texto para a imagem, enquanto no segundo, a atenção do observador é dirigida do texto para a imagem e vice-versa. Há ainda uma terceira modalidade de referência indicial entre palavra e imagem, chamada de “denominação” ou “etiquetamento” (GOODMAN, 1968 apud SANTAELLA; NÖTH, 2005; MUCKENHAUPT, 1986), que corresponde a situações em que a palavra designa coisa ou pessoa mostrada na imagem (SANTAELLA; NÖTH, 2005). No campo de interesse deste estudo estão as situações em que ícone e palavra justapostos referenciam um mesmo tema e criam, via revezamento, uma redundância cujo objetivo é facilitar aos usuários iletrados a compreensão de um elemento na interface e das alternativas de interação que ele oferece ou implica. Em serviços de e-gov, uma segunda combinação possível apresenta claramente uma natureza de etiquetamento, como nos casos em que os nomes de postos de saúde ou de médicos são acompanhados das respectivas fotos, de modo a facilitar sua identificação pelos usuários e trazer maior fiabilidade à informação. Desse modo, cria-se uma associação direta com o particular, e não mais com a ideia genérica, como comentado no primeiro ensaio. Em razão de todas essas dimensões da interação entre imagens e textos, buscou-se no terceiro ensaio testar o efeito, na inteligibilidade geral de cada tema, da combinação de elementos imagéticos e textuais e, por extensão, no desempenho esperado no uso dos serviços pelo público-alvo. Com base em resultados de outros estudos realizados no âmbito do projeto STID (BRAGA et al., 2008), relacionados à inteligibilidade de diversas modalidades de registro escrito da língua, o terceiro ensaio buscou também avaliar o efeito do tipo de vocabulário sobre a compreensão dos conteúdos apresentados na interface. Em suma, o terceiro ensaio objetivou, portanto, abordar as seguintes questões: a) interpretação de ícones; b) interpretação de palavras formais isoladas (só para analfabetos funcionais); c) relação simbiótica entre ícones e símbolos menos conhecidos, isto é, como ícones podem ajudar na leitura e interpretação de palavras desconhecidas; d) relação simbiótica entre ícones e símbolos mais conhecidos, isto é, como a junção dos ícones com palavras de uso cotidiano e menos formais ajuda na leitura e interpretação dessas palavras; em que medida essa combinação produz resultados superiores aos casos anteriores (só para analfabetos funcionais). O terceiro ensaio foi realizado no município de Francisco Morato (SP), e dele participaram cinco pessoas, as quais concordaram com as condições do TCLE. O ensaio ocorreu em local frequentado pela comunidade. No início do procedimento, cada sujeito foi submetido a um teste de letramento. Verificou-se que três sujeitos eram analfabetos plenos, um havia sido alfabetizado rudimentarmente e um tinha nível básico de letramento. Todos eram provenientes da zona rural do Nordeste. 7.1 Descrição do ensaio e procedimento Na preparação do ensaio, utilizou-se um aplicativo de apresentação para encadear uma sequência de imagens e palavras, conforme descrito abaixo. Foi utilizado um computador portátil para exibir esses elementos a cada participante. Como não se tratava de um teste de letramento digital, a tarefa de interagir com o teclado ou com o mouse coube aos condutores do ensaio. Cabia a cada participante, sentado junto aos condutores, a tarefa de olhar para a tela e tentar interpretar os elementos exibidos. Cada participante foi estimulado a verbalizar sua interpretação dos elementos exibidos. As observações consideradas mais relevantes foram anotadas. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 29 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais O ensaio teve quatro etapas: na primeira, seis ícones foram sequencialmente apresentados a cada sujeito. Os condutores perguntaram o significado de cada imagem exibida, anotaram e classificaram a resposta do sujeito (correta, parcialmente correta ou incorreta). Na segunda etapa, a cada sujeito foram sequencialmente mostradas (sem apoio icônico) palavras relacionadas aos ícones vistos anteriormente. Essas palavras estavam representadas através de um registro mais formal de linguagem, conforme a primeira coluna da Tabela 5. Para os sujeitos avaliados como analfabetos plenos, as palavras foram lidas em voz alta pelos condutores, que, em seguida, perguntaram o significado da palavra exibida ou lida. As respostas foram anotadas e classificadas como corretas, parcialmente corretas ou incorretas. Na terceira etapa, foi sequencialmente exibido cada ícone, lado a lado com a respectiva palavra formal, para verificar se a compreensão de um apoiava a do outro. Por fim, na quarta etapa, foram reapresentados os mesmos ícones, desta vez, junto a palavras ou expressões equivalentes às do segundo ensaio, mas supostamente pertencentes a um registro de linguagem menos formal, como visto na segunda coluna da Tabela 5. 7.2 Lista de palavras/ideias Como citado anteriormente, os serviços iniciais oferecidos pelo projeto STID cobrirão as áreas de previdência social e de saúde. Assim, as palavras selecionadas para o terceiro ensaio foram escolhidas por serem recorrentemente usadas em textos/conteúdos de interesse da população (inclusive nos sítios de governo eletrônico em serviço daquelas áreas), embora alguns desses vocábulos não pertençam ao léxico cotidiano do público-alvo. O critério inicial para a proposição dessas duas listas foi criar alternativas para os termos técnicos, na suposição de que esses seriam necessariamente mais difíceis de serem entendidos pela população-alvo. A interação com os sujeitos, todavia, mostrou que, independentemente do fato de a palavra pertencer à linguagem técnica, a facilidade ou dificuldade dos entrevistados em compreendê-la decorre essencialmente de suas experiências cotidianas. Assim, os termos “pré-natal”, “diabetes” e “cardiologista” foram todos facilmente entendidos, pois já eram conhecidos pelos sujeitos, enquanto algumas expressões alternativas propostas causaram dúvidas ou, ainda que entendidas, soaram estranhas. Por outro lado, alguns termos formais, como “aleitamento”, “tabagismo” e “hipertensão” mostraram-se de fato bem menos inteligíveis para os sujeitos que as alternativas propostas: 30 “amamentação”, “vício de fumar” e “pressão alta”, que foram mais facilmente entendidas por serem formadas por termos de uso corrente em registros não técnicos da língua. Na Tabela 5, as palavras ou expressões mais inteligíveis estão destacadas em negrito. Tabela 5 Lista de palavras usadas no ensaio Palavras formais Expressões informais médico de coração cardiologista exame de grávida pré-natal hipertensão pressão alta tabagismo vício de fumar aleitamento amamentação açúcar no sangue diabetes 7.3 Lista dos temas na forma icônica Os ícones selecionados para o tema “saúde” estão ilustrados na Figura 13. Eles foram criados especificamente para este ensaio, e, por não terem sido objeto dos ensaios anteriores, seus graus efetivos de iconicidade ainda não haviam sido validados. O uso de ícones “não otimizados” foi intencional na medida em que permitiria testar de que modo as deficiências de um ícone poderiam ser compensadas pelos textos a ele associados (efeito de ancoragem). Cabe ainda ressaltar que, nas etapas do ensaio referentes à exibição de ícones sem apoio textual, não foram mostrados aos sujeitos os títulos de cada ícone (Figura 13). A tabulação das respostas obtidas foi feita separando os dois sujeitos com alfabetização básica dos três sujeitos identificados como analfabetos plenos. A primeira coluna das Tabelas 6 a 9 indica a que elemento ou combinação de elementos (ícone e/ou texto) se referem os resultados. A segunda coluna soma as respostas corretas para cada tema. A terceira coluna contabiliza as respostas tidas como parcialmente corretas, enquanto a quarta coluna refere-se às respostas totalmente incorretas. Para quantificar a pontuação média obtida por grupo foi adotado o seguinte critério, em cada situação: cada resposta correta valia dois pontos, cada resposta parcialmente correta valia um ponto, e as respostas incorretas valiam zero. Para compensar o menor número de integrantes do primeiro grupo, a pontuação final de cada tabela é dividida pelo número de membros do grupo. A pontuação média obtida por participante está indicada após cada tabela. A pontuação média máxima (que corresponde à interpretação correta de todos os elementos) seria de 12 pontos. As Tabelas 6 a 9 separam as respostas dos sujeitos semianalfabetos e dos sujeitos analfabetos. É importante ressaltar que, dada a incapacidade de leitura de alguns sujeitos, em todos os testes os condutores pronunciavam cada palavra ou expressão presente na imagem. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais Figura 13 Ícones utilizados no terceiro ensaio Tema 1o ícone 2o ícone 3o ícone 4o ícone 5o ícone 6o ícone Tema 1a palavra 2a palavra 3a palavra 4a palavra 5a palavra 6a palavra Tabela 6 Ícones exibidos sem apoio textual Indivíduos semianalfabetos Indivíduos analfabetos Correto Parc. Corr. Incorreto Correto Parc. Corr. Incorreto 1 1 1 2 1 1 1 2 2 2 1 1 1 1 2 2 1 2 2 1 2 Resultado médio individual: 6,5 Resultado médio individual: 5,3 Tabela 7 Palavras formais exibidas sem apoio icônico Indivíduos semianalfabetos Indivíduos analfabetos Correto Parc. Corr. Incorreto Correto Parc. Corr. Incorreto 2 3 2 1 2 1 1 2 1 1 1 1 2 1 1 3 2 3 Resultado médio individual: 5 Resultado médio individual: 5 Tabela 8 Ícones exibidos com apoio de palavras formais Indivíduos semianalfabetos Indivíduos analfabetos Tema Correto Parc. Corr. Incorreto Correto Parc. Corr. Incorreto 1o ícone + 1a palavra 2 3 2o ícone + 2a palavra 2 3 2 3 3o ícone + 3a palavra 4o ícone + 4a palavra 2 1 2 1 5o ícone + 5a palavra 1 2 1 2 3 6o ícone + 6a palavra Resultado médio individual: 11,5 Resultado médio individual: 10 Tabela 9 Ícones exibidos com apoio de palavras informais Indivíduos semianalfabetos Indivíduos analfabetos Tema Correto Parc. Corr. Incorreto Correto Parc. Corr. Incorreto 1o ícone + 1a palavra 1 1 2 1 2o ícone + 2a palavra 2 3 2 2 1 3o ícone + 3a palavra 4o ícone + 4a palavra 2 1 2 5o ícone + 5a palavra 2 2 1 1 1 2 1 6o ícone + 6a palavra Resultado médio individual: 10,5 Resultado médio individual: 8 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 31 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais 7.4 Conclusões do terceiro ensaio Os resultados indicados na Tabela 6 mostram que três dos seis ícones (1º, 4º e 6º) foram pouco efetivos (os condutores observaram que eles geraram hesitação e dúvida nos sujeitos de ambos os grupos). As razões para isso variaram de ícone para ícone: no primeiro caso, a figura do cardiologista não foi reconhecida porque, segundo os próprios entrevistados, o tipo físico e a postura diferiam daquilo que, na experiência dos sujeitos, tal especialista tem (ou costuma ter); no quarto ícone, a imagem foi confundida por alguns como sendo um aviso de não fumar, enquanto outros sujeitos sequer reconheceram o símbolo de proibição, e um sujeito (idoso) nem mesmo reconheceu a embalagem de cigarros; por fim, o sexto ícone mostrou-se complexo (em razão do tema), problema esse agravado, em certa medida, pela dificuldade que alguns sujeitos tiveram em reconhecer os desenhos de doces e também o símbolo de proibição. Entretanto, é importante ressaltar que a baixa iconicidade de parte das imagens era uma condição necessária ao ensaio, pois um dos objetivos era testar em que medida os textos de apoio poderiam favorecer a interpretação dessas imagens. Além disso, era necessário que fosse possível e desejável melhorar os três ícones citados para aumentar sua inteligibilidade na interface final do serviço. Isso não invalidaria o teste das interações entre palavras e ícones que não fossem tão adequados, pois, como já foi discutido, não é possível encontrar ícones que sejam adequados a todos os usuários, nem tampouco conceber ícones que se adaptem perfeitamente a todos os temas necessários às áreas de conhecimento envolvidas (por exemplo, não existe um ícone simples para o conceito “aposentadoria proporcional”). É necessário ter um bom entendimento de como a interação entre ícones e textos pode maximizar a eficácia da interface no atendimento do público-alvo. Por sua vez, os resultados indicados na Tabela 7 mostram que três das seis palavras propostas (1ª, 2ª e 3ª) mostram-se pouco inteligíveis para os sujeitos, e só duas (5ª e 6ª) foram total ou parcialmente entendidas por todos os sujeitos. Esse resultado também era esperado, pois foram escolhidas palavras supostamente fora do léxico conhecido pelos sujeitos testados. De modo complementar ao discutido para os ícones, o objetivo foi avaliar em que medida o apoio icônico favorece o entendimento desses termos. Assim, a principal questão a ser respondida por este ensaio era se a justaposição de ícones e textos (tratando-se de um mesmo tema) aumentaria a inteligibilidade do grupo em comparação ao uso isolado do ícone ou do texto. Como já discutido, essa pergunta é pertinente para o cenário brasileiro, dado o grande número de pessoas, em nossa população, com alguma 32 habilidade de leitura, ainda que rudimentar. A questão se estende até mesmo aos analfabetos plenos, em situações em que eles podem contar com um recurso de conversão texto-fala, a exemplo da solução adotada no projeto STID. Embora o número de sujeitos que participaram do ensaio (cinco pessoas) não tenha possibilitado uma validação dos resultados pela comparação dos dados obtidos no grupo de teste com os obtidos em um grupo de controle (com as mesmas características) − o que permitiria isolar melhor as variáveis envolvidas –, o ensaio mostrou-se rico na coleta de dados. Os resultados fortaleceram a hipótese inicial de que a interpretação conjunta dos elementos sígnicos presentes na interface eleva a inteligibilidade geral. Isso se observa, por exemplo, na pontuação média geral das tabelas referentes ao uso combinado, que foi em torno do dobro da pontuação das tabelas anteriores. Entretanto, o aspecto mais interessante aparece quando comparamos a primeira linha das Tabelas 6, 7 e 8. Esse caso mostra que, apesar de o ícone (Tabela 6) e a palavra (Tabela 7) não terem sido bem entendidos isoladamente, todos os sujeitos reconheceram com êxito a combinação dos dois (Tabela 8), o que mostra o efeito de apoio mútuo. Esses resultados parecem assim confirmar a hipótese de que o efeito combinado de ícones e textos pode ser maior do que a soma dos efeitos isolados de cada um de seus elementos. Conclusão A pesquisa sobre iconicidade aqui descrita buscou criar o conhecimento de como ícones podem facilitar ou tornar possível o acesso de pessoas com baixo letramento aos serviços de cidadania oferecidos pelo STID. O primeiro ensaio mostrou que o uso de fotografias, embora não implique necessariamente maior inteligibilidade, parece causar mais empatia entre os usuários, o que pode se dar em razão de sua conexão mais direta com o mundo real. Diante disso, no âmbito do projeto STID, o uso de fotos foi adotado nos casos em que se quis ilustrar o contexto de um serviço, os locais em que ele é prestado (na localidade do usuário) e os rostos dos profissionais envolvidos. Nesses casos, as fotos trazem um vínculo mais direto com a realidade imediata dos usuários. Já o uso de desenhos mostra um nível de inteligibilidade praticamente igual ao das fotos, porém sem criar um elo direto com o indivíduo, evento ou local específico, portanto, mais adequado à veiculação de informações gerais, como dicas de saúde, prevenção de doenças etc., que são noções mais abstratas ou gerais. Do ponto de vista de esforço necessário à implementação, desenhos dão mais flexibilidade à produção dos temas necessários para guiar a interface ou apoiar os conteúdos. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 Ícones como facilitadores da interação de usuários iletrados com interfaces computacionais O segundo ensaio evidenciou a importância de envolver representantes do público-alvo na busca por elementos que fortaleçam as representações icônicas de uma dada área de conhecimento. Isso enriqueceu os ícones com elementos que reduziram sua ambiguidade e aumentaram sua efetividade. As informações colhidas mostraram a importância da participação de diversas faixas etárias, pois permitiu identificar necessidades e ideias diferentes para a elaboração dos ícones. O terceiro ensaio mostrou que o uso de ícones pode reforçar e complementar as habilidades de linguagem das pessoas com baixo letramento. Viu-se que o efeito combinado de ícones e textos foi, em alguns casos, maior do que a soma dos efeitos isolados de cada um desses elementos. Em contrapartida, os casos em que a soma das partes é maior que o efeito combinado indicam a ocorrência de redundâncias, as quais, para esse público-alvo, são oportunas pois dão aos usuários mais base para hipóteses corretas. No que se refere à adoção de expressões ou palavras mais simples, ficou claro que é preciso sempre respeitar as experiências do público-alvo, pelo qual até mesmo termos técnicos podem já ser conhecidos se constantemente usados: se ao marcar hora no posto de saúde os atendentes falam de “cardiologista” e não de “médico do coração”, é a palavra “cardiologista” que passa a integrar o vocabulário dos usuários. Porém, essa questão não foi o foco principal deste estudo, e é tema para uma pesquisa específica. Por fim, é importante salientar que os ícones foram construídos e aperfeiçoados por meio dos ensaios. A participação do público foi fundamental, assim como o emprego de diferentes metodologias de pesquisa para estudar problemas distintos. Os ícones resultantes foram testados em campo, no contexto das interfaces finais dos serviços de governo eletrônico. Os ícones usados eram grandes o bastante para facilitar a identificação de seus elementos, e estavam, além disso, associados a rótulos textuais explicativos. Indicando botões de opções de navegação ou de ação (escolha de uma especialidade médica, por exemplo), eles foram compreendidos por usuários com variados níveis de escolaridade. Confirmou-se que, conforme discutido, a redundância da associação de textos e ícones produz um efeito de reforço. Do ponto de vista dos usuários com pouca habilidade de leitura, os ícones cumpriram a função de facilitar a navegação e a compreensão, sem eliminar os conteúdos textuais. Os resultados atestam a importância dos ensaios de campo com o público-alvo para compreender como criar ícones mais adequados aos usuários. O trabalho de campo permitiu extrair muitas informações para a elaboração de ícones inteligíveis para esses usuários. Agradecimentos Este estudo foi empreendido com o apoio do Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações (FUNTTEL), do Ministério das Comunicações. Agradecemos às professoras Cecília Baranauskas (Unicamp) e Lucia Filgueiras (USP) e a suas equipes pela ajuda na realização dos ensaios. Somos gratos também a Rafael Faria Carvalho, pela elaboração dos ícones, a Lara S. Godoy Piccolo, pela colaboração na condução dos ensaios, e a José Carlos Lima Pinto, pela ajuda na tabulação dos resultados. Referências AHMED, A. S.; SEONG, D. S. K. SignWriting on mobile phones for the deaf. In: THE ACM INTERNATIONAL CONFERENCE PROCEEDING SERIES, Bangkog. Proceedings... ACM Press, 2006. v. 270, n. 28. ISBN:1-59593-519-3. AKAN, K. D. et al. eScreening: Developing an Electronic Screening Tool for Rural Primary Care. In: SYSTEMS AND INFORMATION ENGINEERING DESIGN SYMPOSIUM, 2006. Proceedings... IEEE, 2006. p. 212-215. ÁVILA, I.; HOLANDA, G. M. 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Although the problem of digital inclusion of illiterates is not restricted to Brazil, its characteristics strongly depend on many educational and sociocultural factors of each country. Thus, most of the related research done in other countries does not adequately match the Brazilian context, which is characterized by a higher prevalence of functional illiteracy, rather than total illiteracy, and where multilingualism is marginal. Therefore, besides the use of icons as facilitators of the interaction of low-literacy users with computers, similar to what has been reported in places such as India, we investigated how icons interact with the reading skills of semiliterate users. The latter is one of the main issues that needs to be addressed in Brazil, given the educational level of its population. Thus, this research addresses the use of icons both as support in the understanding of computer interface-mediated ideas and information, and as a reinforcement of unfledged reading skills. Key words: Icons. Digital inclusion. Human factors in HCI. Low-literacy. Older users. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 5, n. 2, p. 15-36, jul./dez. 2009 35