responsabilidade social empresarial - rse2
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RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL Gestão de Responsabilidade Social II Notas de aula Arnaldo A Rezende Luciel Henrique de Oliveira 2014 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 2 >> ÍNDICE PREFÁCIO 3 INTRODUÇÃO – O PAPEL DAS EMPRESAS ALÉM DO LUCRO 5 1. ASPECTOS GERAIS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL 2. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL 3. IMPLANTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL 4. INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL 5. CLASSIFICAÇÃO DO INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL 6. MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PRÁTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL 7. PACTO GLOBAL (GLOBAL COMPACT) E OS OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO (METAS DO MILÊNIO) 8. BALANÇO SOCIAL e ou RELATÓRIO de SUSTENTABILIDADE 9. GLOBAL REPORTING INITIATIVE – GRI - DIRETRIZES PARA RELATÓRIOS DE SUSTENTABILIDADE 10. COMENTÁRIOS FINAIS 11. REFERÊNCIAS ANEXOS A. GLOSSÁRIO DO INVESTIMENTO SOCIAL B. RESPONSABILIDADE SOCIAL OU FILANTROPIA? C. ONDE OBTER DINHEIRO PARA FINANCIAR PROJETOS D. ISO AND SOCIAL RESPONSIBILITY E. GRUPO DE TRABALHO GVces SOBRE A ISO 26000: UMA PERSPECTIVA GERENCIAL E INTEGRADA DA RESPONSABILIDADE SOCIAL. F. RESPONSABILIDADE SOCIAL EM PEQUENAS E MÉDIAS EMPRESAS: UMA ANÁLISE A LUZ DA TEORIA DOS STAKEHOLDERS OLIVEIRA, L. H.de; REZENDE, A. A. Responsabilidade Social Empresarial. Notas de aula para o curso de Administração. Gestão de Responsabilidade Social. FACAMP: Campinas, 2012. 1. Empresas – Gestão. 2. Responsabilidade Social – Brasil. 3. Investimento Social Privado Empresarial. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II 7 10 14 16 18 25 35 40 43 44 45 46 51 61 64 68 74 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 3 >> PREFÁCIO Embora seja possível detectar sinais de práticas de "Responsabilidade Social Empresarial" - RSE (ou Corporativa - RSC) desde o século XIX, o ponto de partida para o atual debate a respeito do papel social das empresas começou com o fim da II Guerra Mundial para ganhar seus contornos definitivos na década de 1960. Os movimentos sociais organizados, independentemente de partidos e/ou sindicatos, trouxeram para a cena novos atores que fizeram (e fazem) pressão sobre as empresas a respeito de uma série de temas agregados no conceito de cidadania. Esses movimentos passaram a lutar por direitos até então ausentes das pautas de reivindicações sociais. Reivindicações como eqüidade de gênero, de raça e de religião, qualidade de vida, preservação ambiental, inclusão social, e muitos outros assuntos tiveram que integrar as demandas com as quais uma empresa precisa lidar para continuar no mercado. Embora as décadas de 1980 e 1990 tenham sido marcadas pela supremacia do mercado, foi nesse período que o movimento da responsabilidade social espalhou-se pelo mundo, pondo em cheque a globalização como universalização de capitais especulativos e apontando para uma nova maneira de fazer negócios, tornando as empresas parceiras na construção de uma sociedade sustentável e justa. Aliar os lucros aos acionistas com desenvolvimento ao exercício da cidadania e à preservação ambiental é um modelo de gestão que vai progressivamente se impondo às empresas de todos os setores, portes ou atividades. Adotar a gestão socialmente responsável e sustentável já é uma exigência do mercado, bem como uma prerrogativa para o lucro, porque é garantia de longevidade do negócio. No Brasil, o movimento ganhou força a partir do final da década de 1990 e vem mudando de fato o papel das empresas na sociedade. Com base nos princípios e valores da gestão socialmente responsável, as empresas que atuam no país vêm se constituindo nos verdadeiros agentes da transformação social, contribuindo decisivamente para potencializar as habilidades e competências dos atores sociais no sentido do desenvolvimento sustentável. Assim, a gestão empresarial socialmente responsável está diante de uma perspectiva mais complexa, pois vem se configurando como instância renovadora sem precedentes. A partir do diálogo com as partes interessadas, como uma nova forma de estabelecer prioridades e metas, aspectos como igualdade de oportunidades, cuidados ambientais, capacitação de fornecedores, apoio a comunidades do entorno e muitos outros passam a ser tratados de maneira sistêmica, ou seja, integrada em uma linha ética cujos princípios são aceitos em nível mundial. Como parte desse processo, é indispensável reestruturar não só o planejamento estratégico, como a Missão e Visão empresariais, incorporando em todas as etapas o compromisso com a responsabilidade social e ambiental. Além disso, os resultados das ações desta nova ética de negócios devem ser comunicados à sociedade, assegurando a transparência da atuação empresarial. A credibilidade e a legitimidade de uma empresa passa a ser, então, o resultado da capacidade de responder às demandas da sociedade, tanto no que concerne ao seu comportamento sócio-empresarial, quanto na implementação e comunicação de suas políticas. Esse processo, portanto, implica a criação de balanços sociais e relatórios de sustentabilidade, que dêem visibilidade aos impactos causados pela atividade num dado espaço geográfico e temporal. Além de prestar contas à sociedade, essas avaliações sistemáticas são instrumentos de gestão que facilitam a observação de possíveis vulnerabilidades e oportunidades no macro-ambiente da empresa, contribuindo para o aprimoramento da organização. Novos princípios, transparência, diálogo constante com diversos públicos estes e outros fatores exigem um novo paradigma de gestão e um novo tipo de liderança - que saiba antecipar tendências e dialogar com as partes interessadas constantemente. Poderíamos chamá-la de liderança socialmente responsável. Ela ainda não existe de fato, uma vez que as escolas de administração ainda não sabem GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 4 >> como formá-la. A própria teoria clássica da administração também não sabe como tratar os temas postos em pauta pelo advento desse novo paradigma. Pelo raciocínio cartesiano até agora vigente, as empresas possuem passivos e ativos e estarão bem se os ativos forem maiores que os passivos. Não faz parte deste arcabouço teórico contabilizar os ativos e passivos ocultos, como ganhos ou perdas com imagem por conta de ações socialmente responsáveis ou irresponsáveis. Desta forma, chegamos ao século XXI com mais um desafio: como fazer a transição de um paradigma cartesiano para outro sistêmico e holístico, mudando a maneira de agir dos líderes? Ainda não existe um exemplo que tenha toda esta abrangência. Mas existem alguns projetos em andamento apontando para uma mudança consistente de mentalidade, com a decisiva participação de empresas brasileiras. Um deles é o Grupo de Trabalho da ISO 26000, a norma que vai estabelecer diretrizes internacionais para orientar a gestão nas empresas socialmente responsáveis. A construção dessas diretrizes vem ocorrendo de maneira democrática, com a participação de representantes dos diversos segmentos da sociedade civil organizada de vários países do mundo. Durante o ano de 2010, o Instituto Ethos foi o coordenador do Grupo de Trabalho no Brasil para a ISO 26000, que contou com o patrocínio de 17 empresas e a participação de mais outras cinqüenta. Unimed, Construtora Takaoka, Suzano e Petrobras estão entre os patrocinadores e participantes. Esforços semelhantes também tem foram desenvolvidos pelo GVces – Centro de Estudos em Sustentabilidade da EAESP/FGV, cujo material de trabalho está no anexo deste volume. A preocupação com a ampliação de uma nova consciência empresarial está presente também em outros projetos do Instituto Ethos, como o Programa Tear, implementado em parceria com o BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento, que visa disseminar o conhecimento sobre o conceito de responsabilidade social empresarial e ampliar as oportunidades de mercado das Pequenas e Médias Empresas (PMEs) em até três anos. Para atingir este objetivo, o Programa Tear incentiva a adoção da gestão socialmente responsável nas PMEs que atuem na cadeia de valor de empresas estratégicas em sete setores da economia: petróleo e gás; energia elétrica; varejo; construção civil; mineração; siderurgia; e açúcar e álcool. Em cada um destes segmentos, foi identificada uma "empresa-âncora", com experiências avançadas em responsabilidade social empresarial, que seleciona 15 PMEs da sua cadeia de valor, e com as quais se compromete a trabalhar para a incorporação / ampliação da gestão socialmente responsável nos processos internos destas PMEs e no relacionamento entre as partes. Como instrumento de avaliação e monitoramento dos progressos, as empresas participantes respondem os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial. Houve um tempo em que se acreditava que a finalidade da empresa era garantir a sua própria sobrevivência, como se ela não pertencesse à mesma sociedade que recebe os impactos (negativos e positivos) dos processos, produtos e serviços que gera. Com as crescentes demandas dos cidadãos, mais organizados e informados, as empresas vêm buscando uma outra maneira de fazer negócios, reconhecendo que há múltiplas partes interessadas além dos acionistas. Para competir neste novo cenário, as empresas necessitam de uma gestão baseada em princípios e práticas que, ao produzirem sólida reputação e inteligência empresarial, conduzirão a oportunidades de negócio e a uma competitividade poucas vezes experimentada. A partir do desenvolvimento dessas habilidades estamos presenciando o nascimento de uma nova cultura de negócios. Prof. Luciel Henrique de Oliveira Professor, Pesquisador e Consultor [email protected] FACAMP e EAESP/FGV GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 5 >> INTRODUÇÃO – O PAPEL DAS EMPRESAS ALÉM DO LUCRO Discussões sobre Responsabilidade Social Empresarial (SER) são tão antigas quanto às próprias noções de empresa e negócios, ainda que com outros nomes. Ao longo da história, a responsabilidade social vem assumindo aspectos diferentes, a mesma medida em que o papel e a influência das empresas na sociedade vêm se transformando no decorrer das últimas décadas. Essas mudanças também vêm ocorrendo simultaneamente com as conquistas da humanidade no campo social. Da segunda metade do século XX até hoje os países com regime econômico capitalista obtiveram êxito na formação e supremacia de riquezas se comparados com as nações sem ou com pouca iniciativa privada, os chamados países socialistas com destaque a linha mais radical, conhecidos como comunistas, nos quais a produção é parcial ou totalmente estatizada. Assim, verifica-se que as empresas privadas com fins lucrativos possuem um papel de suma importância na formação bruta do capital econômico de uma nação, gerando com isso uma questão intrigante, que é identificar à participação ou não, das empresas privadas na formação de outras formas de capital, como por exemplo, o capital social, incluindo neste termo, tudo que se refere à melhoria das condições de vida a todos os habitantes deste planeta, bem como a garantia de que os recursos naturais e culturais de hoje, serão preservados para as futuras gerações. Esta questão a cada dia ganha mais espaço para análise, pois não é difícil percebermos o grande hiato ainda existente entre a capacidade e habilidade de gerar lucro econômico, versus a melhoria socioambiental fruto da ação corporativa. Infelizmente, inúmeros indicadores socioambientais não guardam nenhuma proporcionalidade com os superávits financeiros das empresas privadas e até mesmo há deterioração em determinados itens de estudo, tais como: acesso a água, distribuição de renda, violência urbana, fome e corrupção dentre muitos outros. Mas, qual seria a influência das práticas empresariais neste amplo cenário? As nações “capitalistas”, até poucos anos atrás, legitimavam uma boa empresa como aquela que pagava seus tributos, gerava empregos aos seus cidadãos e fornecia produtos e serviços com qualidade a sua sociedade. Assim sendo, e até então, a empresa deixava os possíveis conflitos da relação capital trabalho a cargo dos sindicatos patronais e de empregados, a questão dos tributos como problema exclusivo dos agentes de fiscalização do governo, enfim, temas como poluição ambiental, condições de trabalho, corrupção ativa e demais formas éticas na GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 6 >> prestação de contas e relacionamento da empresa com a comunidade ao seu entorno não eram temas pautados de forma abrangente, nem faziam parte da estratégia da maioria das empresas. Tais pontos permaneciam se muito, como temas marginais ao objetivo maior, e porque não dizer único, que era simplesmente a geração do lucro econômico, resumindo: satisfazer o interesse do acionista (“dono do capital”) e mais nada. Estas questões que limitam o papel da empresa vieram à tona há poucos anos, trazendo consigo uma nova dimensão estratégica para dentro destas companhias, com reflexos para toda a sociedade, através de um novo paradigma, que embora simples, possui uma amplitude quase que incomensurável. Este paradigma chama-se Responsabilidade Social Empresarial e constitui-se, ao lado das boas práticas de Governança Corporativa, como o mais novo desafio das corporações empresariais, sejam elas nacionais ou transnacionais. O ponto positivo deste processo é que através da implementação estratégica da Responsabilidade Social Empresarial, junto com boas práticas de Governança Corporativa, a sustentabilidade e perenidade das organizações estarão mais seguras, garantindo não só e apenas resultados financeiros positivos, mas também e de forma concomitante, resultados sociais e ambientais relevantes. Com este novo quadro no mundo empresarial é que iremos avançar nos conteúdos, ainda em formatação, visto ser este, um tema muito recente como área de conhecimento. Pelo novo Código Civil em vigor desde 11 de janeiro de 2003, em seu art. 981, temos a personalidade jurídica chamada Sociedade definida como: • Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados. Como podemos observar, a partir da entrada em vigor do novo Código Civil, a forma jurídica SOCIEDADE não mais pode ser utilizada para organizações sem fim lucrativo, e sim com finalidades econômicas, ou seja, com fins lucrativos. Estas personalidades jurídicas são popularmente chamadas de Empresas ou Companhias. Tecnicamente o termo companhia deve ser usado para organizações com capital social formado por ações e estas negociadas em bolsa de valores. Estas organizações empresariais podem estar no primeiro ou segundo setor, sendo públicas ou privadas respectivamente. No caso de capital misto, público e privado, caracteriza-se pelo seu controle acionário. Esta definição abrange todo o universo empresarial, independente GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 7 >> do porte econômico da organização, ou seja, as pequenas, médias e grandes empresas, indiferente ao seu segmento de atuação: extrativista, agrícola, industrial, prestadora de serviço e etc. Encontram-se também dentro deste universo as empresas de capital limitado, sociedades anônimas fechadas e sociedades anônimas abertas. A peculiaridade importante da classificação como empresa está no retorno do capital, através do lucro gerado pela sua operação, aos seus acionistas. 1. ASPECTOS GERAIS DA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL O termo “Responsabilidade Social” no Brasil é bastante recente, tendo sido utilizado de uma forma mais intensa a partir da segunda metade da década de noventa, onde o desenho político para área social do então presidente Fernando Henrique Cardoso contemplava de uma maneira direta, através da Comunidade Solidária, parcerias com a iniciativa privada, tanto como operadores, neste caso em especial as organizações do terceiro setor popularmente chamadas de ONG’s, quanto com os investidores sociais privados e patrocinadores, aí em especial as organizações do segundo setor, ou seja, empresas com fins lucrativos. Numa análise contextual abrangente, ao longo do tempo, inúmeros fatores históricos passam a influenciar direta e indiretamente na necessidade da empresa assumir outras funções além da geração de lucro ao seu acionista, ou seja, construir seu papel social. Este fato, por meio de vários caminhos, fomentou o surgimento da responsabilidade social empresarial de forma lenta, porém em evolução gradual. Dentre inúmeros fatores destacamos: • Os novos enfoques na ação empresarial iniciados ao longo das décadas de 80 e 90, impelidos pela globalização, via abertura dos mercados às exportações e importações, desenvolvimento extraordinário dos meios de comunicação rápida, novas tecnologias de informática aplicadas aos processos de produção, pressão da competição, necessidade de melhoria da qualidade e busca desenfreada pela diferenciação, ou seja, criação de valor além dos tangíveis até então conhecidos; • Marcos regulatórios públicos e privados que passam a pressionar para que empresas assumam as responsabilidades pelos seus impactos sociais e ambientais resultantes de suas atividades: – Setor público (governo): legislação ambiental e trabalhista mais rigorosa e autuações com multas, interdições, etc.; – Clientes: estabelecimento de códigos de defesa com a criação de entidades especializadas na garantia dos direitos do consumidor; – Comunidade: surgimento de movimentos sociais com posições de negociação e enfrentamento com diversos questionamentos, além da esfera sindical; – Terceiro setor: forte expansão nos anos 90, com a criação de inúmeras entidades da sociedade civil com projetos de melhoria educacional e GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 8 >> socioambiental, que forçam as empresas a formarem parcerias e realizarem investimento social privado empresarial; – Acionistas: mais conscientes das estruturas de respeito à declaração universal dos direitos humanos, trabalhistas e ambientais; – Agências de financiamento: com padrões de accountability acentuados (sistema de prestação de contas responsáveis)e aprovação crédito por meio de analise de dados além dos econômicos; – Certificações: em muitos casos como fator de entrada em mercados restritos. Houve primeiramente as normas de qualidade ISO 9000, e depois vieram normas certificadoras com escopo superior ao da elaboração e rastreabilidade do serviço ou produto, atingindo questões de impactos ambientais como a ISO 14000 e também de condições de trabalho através da SA 8000, segurança e saúde no ambiente empresarial pela OHSAS 18000 e até a análise da forma de relacionamento com as partes interessadas por meio da AA 1000. O Brasil têm até uma norma especifica que é a NBR 16.000. • Mudança na forma da força de trabalho, passando do repetitivo para o intelectual, ou seja, a era do conhecimento. Exemplo, o surgimento de empresas sem ativos de bens de produção elevados, e com faturamento maior do que empresas de petróleo (Microsoft). Sob o holofote destes fatores, somado a vários outros estímulos, a introdução da pauta responsabilidade social empresarial começa a permear os planos das corporações mundo afora, despertando o interesse de pesquisadores e demais estudiosos das ciências da administração corporativa. Assim sendo, mesmo sendo considerado um tema recente em termos acadêmicos, já em meados dos anos 70 surgem publicações com conteúdos relevantes. Cabe destaque a um dos primeiros estudiosos do assunto, Archie Carroll, que em 1979 apresenta uma sugestão de subdivisão da responsabilidade social empresarial nas dimensões ética, legal, econômica e filantrópica (discricionária). • Responsabilidade Econômica: – Sobrevivência e crescimento através da geração de superávit econômico; • Responsabilidade Legal: – Obedecer e cumprir as leis, normas, códigos, etc.; • Responsabilidade Ética: – Comportamento segundo princípios éticos e morais (honestidade, justiça, eqüidade, etc.) • Responsabilidade Discricionária: – Ações voluntárias de extensão à comunidade e ao meio ambiente, independente das práticas diretas da empresa. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 9 >> Tal proposta pode ser analisada pela famosa e didática pirâmide de Carroll, demonstrada a seguir: Carroll, 1979 Empresa Ser boa Responsabilidade Discricionária cidadã Responsabilidade Ser ética Ser Terética valores Ética Responsabilidade Respeitar Obedecer à lei Legal Ser Ser Responsabilidade • lucrativa lucrativa Econômica Responsabilidade Econômica: PIRÂMIDE DE CAROLL Embora esta subdivisão tenha contribuído para uma visão mais ampliada dos diferentes contextos em que a empresa atua e desenvolve suas práticas, ainda não foi suficiente para substanciar os conceitos mais estruturados sobre o tema, não obstante seu incrível papel no fomento das reflexões intrínsecas ao assunto. Com o aumento das discussões sobre responsabilidade social empresarial e ampliação da participação das empresas brasileiras, nosso país sentiu falta de um ordenamento geral para alinhamento, aglutinação e racionalização dos investimentos sociais privados empresariais, que começam a emergir como núcleo importante dentro das práticas de gestão de responsabilidade social empresarial. A busca deste ordenamento e alinhamento conceitual culmina com a criação de algumas instituições nacionais de extrema relevância para o cenário nacional e porque não dizer mundial de debate, estudo e geração de conteúdos sobre o tema. No campo do investimento social privado empresarial o grande destaque foi à criação em meados dos anos noventa do GIFE (Grupo de Institutos, Fundações Empresariais), que aglutina as maiores e mais importantes organizações do terceiro setor que tenham como mantenedor uma empresa privada com fins lucrativos, na maioria das vezes com o mesmo nome. Exemplos: Instituto Votorantim, Instituto Bradesco, GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 10 >> Fundação Educar Dpaschoal, dentre outras. Outra organização que surge no Brasil é o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, este último, sem dúvida um marco na história deste tema no Brasil. O Instituto Ethos atua desde 1998 no fomento a gestão empresarial socialmente responsável baseada em princípios éticos e nos valores da solidariedade e da transparência. Esta instituição certamente é uma base para muito dos conceitos e conhecimentos gerados na área da responsabilidade social empresarial. Além disto, o Instituto Ethos declara que procura contribuir para que as empresas alcancem excelência e sustentabilidade em seus negócios através da ética nas práticas de mercado. Cabe ressaltar que o idealizador e principal líder desta organização foi o Engenheiro Oded Grajew. 2. CONCEITO DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL Inúmeros autores em diversas publicações já registraram suas concepções conceituais sobre o tema. O que ocorre na maioria das vezes é que tais conceitos são excessivamente discursivos atingindo um grau de abstração elevado, sem refletir de forma objetiva e direta o entendimento claro da sua definição. Felizmente, temos aqui no Brasil um registro conceitual desenvolvido e elaborado pelo Instituto Ethos e aceito pelo meio acadêmico do termo responsabilidade social empresarial de forma clara e objetiva, permitindo uma concretude e alinhamento do entendimento. Tal conceito diz que Responsabilidade Social Empresarial – RSE - é: Somatória da conduta ética e responsável adotada por uma empresa em toda sua rede de relações, necessariamente incluindo: clientes, consumidores, fornecedores, funcionários, acionistas, governo, comunidade e meio ambiente (todos os “stakeholders” ou todos os indivíduos e grupos que têm interesses legítimos em relação às atividades da empresa e/ou afetam ou podem ser afetados pelas atividades de uma organização). Assim sendo, podemos ver na representação acima que a empresa em sua dinâmica do dia-a-dia tem interface com diversos e diferentes públicos, os quais podemos denominá-los de partes interessadas, ou utilizarmos o termo em inglês stakeholders, cuja presença nas publicações em diversos idiomas já esta consagrada. A partir deste conceito, o Instituto Ethos desenvolveu o enunciado do que venha a ser para as empresas sua Gestão de Responsabilidade Social Empresarial – GRSE -, ou seja, o que a caracteriza em termos de forma (meios) e seus objetivos (resultados) almejados. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 11 >> GOVERNO CONSUMIDORES MEIO AMBIENTE EMPRESA ÉTICA QUALIDADE COMUNIDADE ACIONISTAS FUNCIONÁRIOS FORNECEDORES TRANSPARÊNCIA Sendo assim, o conceito de Gestão de Responsabilidade Social Empresarial pode ser definido como: A forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. Instituto Ethos O entendimento deste conceito permite concluir que não existem situações intermediárias ou parciais de responsabilidade social empresarial, ou seja, uma organização não poderá proclamar-se responsável socialmente por ter uma conduta ética e transparente apenas nas práticas de relacionamento com um ou outro stakeholder, tal postura deverá abranger todos os públicos com os quais a empresa interage. Portanto, a responsabilidade social empresarial se dá através da boa conduta nas práticas realizadas em relação ao conjunto dos stakeholders de forma contínua e perene. Infelizmente são comuns situações onde algumas empresas realizam uma prática de ação social pontual com determinado público e saem divulgando “pseudo” balanços sociais e ou relatórios de sustentabilidade, denotando uma postura de responsabilidade social empresarial, que na verdade não existe. É necessário, portanto, que a responsabilidade social empresarial esteja no cerne da estratégia de negócios da organização, reconhecendo que objetivos sociais não são antagônicos aos econômicos, ao contrário, eles podem se transformar em oportunidades econômicas. A responsabilidade social empresarial não pode ser um GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 12 >> apêndice a ser cortado ao primeiro sinal de problema financeiro ou se basear em projetos pontuais focados em um único stakeholder. A estratégia de responsabilidade social empresarial precisa ser definida de acordo com as competências especificas da organização e enriquecer seus objetivos, metas, diretrizes e grandes políticas corporativas, chegando de preferência aos seus produtos e serviços. Um diagnóstico sincero da necessidade de ampliação do papel das organizações com fins lucrativos é fundamental antes de qualquer movimentação em busca da estruturação de uma gestão de responsabilidade social empresarial. Para tanto é de suma importância o entendimento de que a responsabilidade social empresarial estrutura-se no binômio tempo e espaço, pautando-se pelos desafios socioambientais e de conduta atuais e suas localidades de intervenção respectivamente. O impacto deste conceito na sociedade em geral, e principalmente no mundo globalizado em que vivemos é incomensurável. As práticas do dia-a-dia das empresas, em sendo balizadas por uma política de responsabilidade social forte, poderão alterar todo o cenário de uma cidade, de um estado e até mesmo de um país. Imaginemos hipoteticamente um país onde todas as empresas realizem um pacto de conduta onde os tributos são pagos – não há sonegação -, o meio ambiente além de preservado é recuperado, todos os fornecedores são rastreados de forma a não permitir a utilização de mão de obra infantil, escrava, etc, cujos funcionários acessem a todos os direitos contemplados nos contratos de trabalho e dissídios coletivos e que, além disto, participem dos lucros, que os seus clientes e consumidores tenham facilidade de comunicação com a empresa e de forma espontânea sejam respeitados na abrangência do Código de Defesa do Consumidor, aonde os sócios tenham tratamentos adequados e similares, independente de serem minoritários ou majoritários, que a comunidade sinta-se integrada com as empresas e vice-versa; pois bem, certamente esta seria uma nação com uma qualidade de vida, um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) altíssimo. O fato é que nosso mundo contemporâneo atingiu todos os limites de aceitação e acomodação em relação aos males sociais e ambientais oriundos de problemas com variáveis múltiplas, as quais acessíveis graças aos avanços tecnológicos de transmissão de dados e imagens penetram na individualidade, no micro-espaço de cada ser humano. Tudo isto associado ao fato dos recursos naturais estarem cada vez mais escassos. Urge então, não necessariamente por altruísmo coletivo, mas sim por sobrevivência, ou ambos, uma nova ordem, aonde o desenvolvimento econômico só fará sentido se for aliado ao desenvolvimento social e estes só farão sentido, se forem aliados ao manejo sustentável dos recursos naturais. As empresas não são as únicas protagonistas destas mudanças, mas em sendo os principais centros geradores e consumidores de produtos e serviços do nosso planeta, GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 13 >> certamente serão agentes impactantes na busca de um mundo melhor, sem deixar de lembrar que nenhuma empresa é 100% virtual, elas só existem com e para seres humanos. Complementando os conceitos pertinentes e envolvidos com o tema, é importante o entendimento correto do que se traduz a expressão Ação Social. As ações sociais que são uma parte das práticas presentes na responsabilidade social empresarial podem ser definidas como: Qualquer atividade planejada, fomentada, operacionalizada ou parceirizada pelas empresas, de forma voluntária, para atenderem aos seus colaboradores e familiares – ação social interna -, ou a comunidade em geral localizada em qualquer parte do mundo – ação social externa -. Estas ações sociais poderão ser implementadas na área de assistência social, educação, saúde, meio-ambiente, cultura, defesa de direitos entre outras. Ou seja, não se limitam a esfera de assistência e serviço social. As últimas pesquisas, realizadas pelo IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), mostram que o maior número de ações é na área de assistência social, seguida de perto pela segurança alimentar, estando um pouco distante, em terceiro lugar, a área de educação e em quarto a saúde. O entendimento da palavra colaborador, utilizada no conceito de ação social deve ser: Todas as pessoas que participam de qualquer atividade ou evento de uma empresa, sendo funcionários/empregados da mesma ou de empresas terceirizadas. As ações sociais, principalmente as externas, são na maioria das vezes realizadas em parceria com outras organizações. As parcerias mais comuns são com organizações do Terceiro Setor, em segundo lugar com órgãos públicos e por último com outras empresas privadas. Não raro, principalmente em ações sociais de grande porte, haver uma parceria tripartite entre a empresa, uma organização do Terceiro Setor (ONG) e o setor público. Para o melhor entendimento possível do conceito de responsabilidade social empresarial é importante evidenciar também, o porquê da utilização dos dois termos: consumidor e cliente. Sendo assim, o conceito destes é: Ambos podem ser pessoas jurídicas ou pessoas físicas. A diferenciação se dá pelo ato de comprar e consumir, ou seja, quem compra é cliente, quem utiliza o produto ou serviço é consumidor. Nada impede que seja o mesmo ente, ou seja, quem compra é quem consome. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 14 >> 3. IMPLANTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL Para a implantação de uma gestão eficaz de responsabilidade social empresarial é imprescindível uma visão geral, porque não dizer holística, da empresa perante todos os públicos com quem suas atividades impactem ou possam impactar em seu cotidiano, seja em maior ou menor intensidade. Assim sendo, de forma sucinta, a implementação estratégica da responsabilidade social empresarial requer o desenvolvimento de: – Estrutura organizacional para este fim, podendo estar dentro de outra área; – Elaboração de processos e procedimentos; – Identificação e resolução de possíveis conflitos com outras metas e objetivos; – Sistema formal e especifico de comunicação e treinamento integrado com os existentes na empresa; – Previsão de processos e sistemas de avaliação interna e externa atingindo a percepção do número máximo de stakeholders; – Estabelecimento de indicadores; – Acompanhamento de performance global e retroalimentação (feedback). No decorrer da implantação de uma política de responsabilidade social corporativa, inúmeros desafios surgirão principalmente no início do projeto, até que se estruture de forma capilar atingindo toda a organização. O alinhamento das metas financeiras e ou mercadológicas com as socioambientais e demais práticas é a chave do sucesso para um início com base sólida. Para mitigarmos os riscos de insucesso é fundamental a absorção mais rápida possível do significado dos seguintes termos e ou nomenclaturas: • Investimento Social Privado Empresarial; • Balanço Social e ou relatório de Sustentabilidade; • Marketing Social. Estes itens certamente passarão a fazer parte do plano global, resultante da determinação da empresa em implantar de forma correta seu projeto de gestão de responsabilidade social. O investimento social privado empresarial é o elemento de viabilização concreta das práticas em ações sociais oriundas da política estratégica de responsabilidade social empresarial, ou seja, sem investimento não há, na concretude, a realização de uma ação social. É óbvio que podemos ter, e infelizmente é bastante comum, uma ou várias ações sociais empresariais, sem haver uma estratégia de investimento social privado empresarial nem muito menos gestão de responsabilidade social empresarial definida. Não incomum, são ações pontuais, como por exemplo, as campanhas de arrecadação disto ou daquilo para distribuição em comunidades GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 15 >> carentes, sem nenhum planejamento estruturado, pois sequer há uma pesquisa para saber se os produtos arrecadados são mesmo, itens de necessidade do público alvo a ser beneficiado. Há também situações que deveriam ser limites, porém são relativamente freqüentes em que a empresa possui uma estratégia razoável de investimento social privado empresarial, mas não implantou uma gestão de responsabilidade social condizente. Por outro lado, o conjunto de práticas possíveis dentro de um planejamento de responsabilidade social empresarial, não se resume em atividades exclusivamente originárias de investimento social privado empresarial, como por exemplo, a decisão de tratamento igualitário entre sócios majoritários e minoritários, abolição de qualquer ato de sonegação e corrupção, entre outros. É comum que as organizações façam a divulgação dos seus investimentos sociais privados empresariais realizados, utilizando-os inclusive, como meios para melhoria de sua imagem corporativa. O Balanço Social e ou Relatório de Sustentabilidade somado ao Marketing Social devem, portanto, se constituírem em elementos de registro, controle e divulgação das práticas de responsabilidade social e investimento social privado empresarial respectivamente. Cabe deixar claro mais uma vez que o termo social, não é restritivo ao campo de assistência e serviço social, muito pelo contrário, sua interpretação deve contemplar a mais ampla gama de atividades em prol do bem comum. Portanto, atividades de preservação e recuperação ambiental, de fomento e preservação de cultura, arte, etnia, defesa de direitos, educação, saúde, entre outras, estão todas atingidas sob o “guarda-chuva” ação social. Outro ponto importante, é que, embora recente o termo balanço social já esta em desuso, sendo substituído em muitos casos pelo documento amplo da empresa, chamado relatório de sustentabilidade, no qual a empresa apresenta seus dados econômicos, sociais e ambientais, o popular: triplle botton line, termo criado por John Elkington em 1994. Elkington é fundador do Sustain Ability e autor de 17 livros sobre responsabilidade social empresarial. A linha sequencial ideal de visualização deste processo está descrita a seguir. Ao observarmos esta representação, vemos que o marketing referente às práticas e ações sociais da empresa seria conseqüência de uma estratégia empresarial de responsabilidade social e não a única meta, ou seja, a empresa ter a priori como intuito apenas um posicionamento de marketing social não seria o caminho mais salutar. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 16 >> Planejamento Estratégico da Responsabilidade Social Empresarial Planos de Implementação do Investimento Social privado Empresarial Balanço Social / Relatório de Sustentabilidade Marketing Social Sem entrarmos no mérito se é ou não ético, o fato é que na maioria das vezes o marketing esta puxando o processo, ou seja, há uma inversão da sequência natural indicada, para um fluxo baseado exclusivamente num posicionamento melhor de marca e imagem da empresa. Independente do caminho escolhido pela empresa cabe ressaltar que em ambas as situações é muito provável que haja investimento social privado para realização de ações sociais, permitindo a elaboração de um balanço social e ou relatório de sustentabilidade que, costumeiramente, infelizmente, procura mais “enfeitar” do que realmente servir de análise e retro-alimentação das estratégias de responsabilidade social e ou investimento social privado empresarial. Mesmo assim servirá de base para o marketing social. Incorporar a responsabilidade social é administrar as relações contratuais e institucionais das corporações para atender as demandas e expectativas das partes interessadas, as quais definem a arquitetura organizacional das firmas – o poder de decisão, a avaliação de desempenho e o sistema de compensação. 4. INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL Como já esclarecido, podemos afirmar que fora as práticas de conduta com alguns stakeholders, demais atividades oriundas da responsabilidade social empresarial só ocorrem com investimento por parte da empresa, o contrário é fácil de deduzir que é GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 17 >> possível, ou seja, a empresa realizar investimento social privado sem gestão estruturada de responsabilidade social empresarial. Este investimento pode ser realizado através de diferentes formas de recursos: humanos, financeiros e até serviços e produtos elaborados pelas empresas, sendo na maioria das vezes a combinação dos mesmos. Para chegarmos ao melhor entendimento do que seja o investimento social privado empresarial, vamos conhecer primeiro o conceito de investimento social privado, estabelecido pelo GIFE – Grupo de Instituições e Fundações Empresariais -. O uso planejado, monitorado e voluntário de recursos privados, provenientes de pessoas físicas ou jurídicas, em projetos sociais de interesse público. Ao analisarmos o este conceito, dentre várias observações importantes, vale destacar: 1) Não é uma mera doação. O investimento se difere da doação pelo fato de que o ato de investir implica em buscar retorno, qualificar o local onde vamos alocar os recursos sob aspectos de confiança, transparência, capacidade de gerar resultados e utilização eficaz, etc. Já o ato de doar encerrá-se em si mesmo; 2) Este investimento pode ser realizado por indivíduos, famílias, grupos de interesse comum, empresas diretamente ou por fundações e institutos mantidos por elas; 3) A expressão: “projeto social de interesse público”, não se limita nas ações exclusivamente da área social. O campo de investimento é bastante abrangente atingindo as áreas de saúde, educação, cultura, meio-ambiente, segurança alimentar e defesa de direitos, entre outras, conforme já evidenciado anteriormente na abrangência máxima do termo social. A partir do conceito estabelecido, podemos concluir que Investimento Social Privado Empresarial, segundo o próprio GIFE é: Investimento planejado, monitorado e voluntário em projeto social de interesse público, de recursos provenientes de pessoas jurídicas (empresas), independe do tipo de capital e forma de atuação econômica, ou seja, oriundos de empresas de serviço, comércio ou indústria com capital nacional ou estrangeiro, de controle privado, público ou misto. Analisando o conceito acima, surge uma questão muito interessante, que chamo de “PARADOXO” do investimento social privado empresarial, que se traduz no fato de empresas nacionais cujo seu controle acionário é de Capital Público poder realizar investimento social Privado. Não raro, vemos Petrobrás, Banco do Brasil e outras empresas com controle de capital público, patrocinando ações de cunho social, cultural, ambiental e etc. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 18 >> 5) CLASSIFICAÇÃO DO INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL Para elaboração de um bom plano de investimento social privado empresarial se faz necessário separar as práticas e ou ações que tenham como objetivo e público alvo exclusivamente os funcionários (colaboradores) e seus familiares, de práticas e ou ações que atinjam a comunidade de forma aberta e geral, muitas vezes até distante fisicamente da empresa ou do local de residência de seus funcionários (colaboradores). Assim sendo, podemos classificar o Investimento Social Privado Empresarial em dois grandes grupos: Investimento Social Privado Empresarial Interno; Investimento Social Privado Empresarial Externo. Antes de evidenciarmos os dois tipos de investimento social privado empresarial, cabe registrar que temos utilizado tanto a palavra prática como ação para caracterizar atividades desenvolvidas pela empresa, fruto de sua gestão de responsabilidade social empresarial e ou investimento social privado empresarial. Na verdade não há uma diferença literal contundente entre ambas, ocorre que o termo práticas com relação a este ao aquele stakeholder é usada de forma mais ampla, e quando usamos o termo ação, via de regra, focamos alguma atividade definida, por exemplo: ação ambiental, ação social, ação cultural entre outras, já com relação à palavra prática, ou melhor, sempre utilizada no plural práticas, temos, por exemplo: práticas com seus colaboradores, práticas com relação ao governo, práticas com relação ao meioambiente, etc.. Enfim, é também comum a utilização alternada das duas palavras, consubstanciando conforme o texto, numa forma de sinônimos. 5.1) INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL INTERNO Este investimento se caracteriza por sua aplicação em práticas que beneficiam unicamente o público interno, ou seja, os funcionários (colaboradores) e seus familiares. Estas ações são aquelas realizadas exclusivamente de forma espontânea pela empresa. Portanto, não fazem parte destas práticas, possíveis benefícios contidos nas obrigações legais, contribuições compulsórias, contribuições para entidades de classe, cumprimento de normas trabalhistas, conquistas por categorias, dissídios coletivos e etc., ou seja, tudo aquilo que for obrigação de fazer, não deve ser computado como práticas de responsabilidade social nem investimento social privado empresarial, pelo contrário, o não cumprimento de seus deveres empresariais, GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 19 >> descaracteriza qualquer intenção de uma gestão estruturada de responsabilidade social empresarial. Faz-se necessária uma importante reflexão quanto à presença ou não de ações sociais exclusivas aos funcionários (colaboradores) e seus familiares, dentro de um contexto geral do plano de responsabilidade social empresarial, em especial das estratégias balizadoras do investimento social privado empresarial. Antes de a empresa partir para ações de investimento social privado externo, deverá avaliar possíveis impactos negativo aos colaboradores, que poderão sentir-se menosprezados e até mesmo renegados. Isso vale, principalmente, para grandes empresas que costumam voltar seus olhos para ações externas antes das internas, por julgarem que seus “pacotes” de benefícios em suas políticas de recursos humanos são amplos e atendem as expectativas de seus colaboradores. O fato é que, infelizmente, na maioria das vezes isto não é verdade, ou seja, o clima organizacional interno não é monitorado e pior, quando busca conhecê-lo percebe-se que esta abaixo do aceitável. Face ao exposto, um dos primeiros passos a se dar em questão de investimento social privado empresarial é checar o clima organizacional interno visando descobrir se há demandas por parte dos colaboradores ainda sem atendimento ou sem justificativa da não aceitação. Este trabalho é muito delicado, porém imprescindível, sendo responsabilidade do departamento de recursos humanos tal monitoramento para geração de um plano de ajuste, resultando parte do plano de práticas e ações sociais voltadas ao público interno, contando sempre de forma indispensável com a participação dos colaboradores e funcionários terceirizados. As ações sociais internas, fruto do Investimento Social Empresarial Interno, trazem uma série de benefícios para a empresa, os mais comuns são: • Gerar satisfações pessoais ao empresário, colaborador e familiares; • Melhora o ambiente de trabalho e a motivação, aumentando a produtividade pela redução do absenteísmo e melhoria nos indicadores de qualidade; • Ajuda a empresa a atrair e manter bons colaboradores (talentos); • Quando os funcionários colaboradores residem de forma concentrada num mesmo bairro, a empresa desenvolve uma imagem muito positiva naquela comunidade; • Ganhos na imagem institucional da empresa junto aos demais stakeholders. Como podemos observar, estes benefícios são perfeitamente alinhados às principais e mais comuns metas empresariais, tais como: aumento de market share, elevação do retorno do capital, crescimento do lucro, etc. Os principais pontos que pautam ações sociais internas são pertinentes às relações diretas entre o capital e o trabalho, ou seja, empregado e empregador contemplando: GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << • 20 >> Benefícios na área de saúde: ginástica laboral, assistência médica, odontológica e psicológica; • Segurança e conforto no ambiente de trabalho: ergonometria, luminosidade, ventilação, climatização, controle de barulho, análise de risco, constituição de CIPA (comissão interna de prevenção de acidentes), fornecimento de equipamentos de proteção, brigadas de incêndio, rampas para deficientes físicos, banheiros adequados, etc; • Benefícios previdenciários: seguro de vida, aposentadoria complementar, seguro educação para os filhos, etc; • Benefícios na área de lazer: espaços físicos para confraternizações, quadras poliesportivas, academias de ginástica, salas de relaxamento, salas de leitura, etc; • Benefícios para o desenvolvimento profissional: auxílio financeiro para cursos, seminários, etc.; • Prioridade aos colaboradores já existente para ocupação de vagas em nível gerencial e diretoria; • Benefícios para a família: auxílio creche, auxílio nas despesas de educação dos filhos, fornecimento de auxílio alimentação como cestas básicas, etc; • Distribuição de parte dos lucros aos colaboradores; • Respeito à privacidade das pessoas. Para concluirmos o estudo sobre o Investimento Social Privado Empresarial Interno – I.S.P.E.I. - cabe registrar algumas precauções que se deve ter durante a sua implantação, para garantir os resultados positivos almejados e minimizar possíveis riscos que podem prejudicar, ou até mesmo inviabilizar o sucesso das iniciativas. As preocupações mais importantes são: • Implantar o I.S.P.E.I sem contemplar todos os direitos legais dos funcionários; • Exclusões Sociais na estrutura organizacional (raça, sexo...); • Não possuir vagas para deficientes (PPD); • Política salarial “desajustada” do mercado; • Falta de participação dos colaboradores nas decisões; • Não ter processos de análises de resultados (indicadores); • Não haver monitoramento do grau de motivação interna; • Clareza na condução de “crises” internas ou externas; • Ter no “mínimo” um pequeno código de ética para a organização. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 21 >> 5.2) INVESTIMENTO SOCIAL PRIVADO EMPRESARIAL EXTERNO Este investimento se caracteriza por sua aplicação em práticas e ações sociais que beneficiam o público externo, ou seja, comunidades onde não residem os colaboradores e ou seus familiares. O processo de realização deste investimento se dá através de ações sociais externas, ou seja, ações voltadas para o público além dos muros da empresa, beneficiando a comunidade de forma aberta e geral. As mais comuns são ações filantrópicas pontuais, projetos comunitários em recursos sociais já existentes, e vários tipos de apoio a projetos e programas de organizações sociais sem fim lucrativo (Terceiro Setor). Não obstante ao caráter difuso de uma ação ou práticas de respeito ao meio ambiente que indiretamente afetam todos os seres deste planeta. As ações sociais externas são as mais comuns e presentes no dia a dia das empresas, algumas pontuais tais como: campanha do agasalho, arrecadação de alimentos, etc, são muito simples do ponto de vista executivo e são praticadas por todas as empresas: pequenas, médias e grandes. As alterações nos tipos de práticas e ações sociais externas, relativas ao porte das empresas, acompanham o grau de dificuldade executiva e o volume de recurso necessário a ser investido, na proporção direta do tamanho da empresa. Ou seja, dificilmente veremos ações sociais de proporções muito grandes realizadas por empresas pequenas, mas o inverso, infelizmente é verdadeiro. Não raro encontramos ações sociais externas relevantes, executadas por uma rede de investidores, bem como parcerias com agentes operadores, via de regra, organizações do terceiro setor e em certos casos parcerias tripartites entre os três setores: segundo, terceiro e primeiro, ou seja, empresas, organizações sem fim lucrativo e governo, juntos em uma mesma ação social de interesse público. Para efeito de imagem e posicionamento da empresa junto aos públicos com que interage e ou impacta de forma mais distante, as ações geradas por Investimento Social Privado Empresarial Externo são as que mais retornos proporcionam. Isto se dá porque por cultura e costume as ações internas possuem a conotação de obrigação, enquanto as externas livram-se deste estereótipo, se caracterizando como uma espécie de altruísmo empresarial. As ações sociais externas mais comuns são: • Investimento de recursos financeiros de forma direta ou através de destinação de tributos a instituições do terceiro setor, este último é o que chamamos de uma prática de usar incentivo fiscal; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << • 22 >> Investimento através de fornecimento gratuito de produtos e ou serviços produzidos pela empresa as instituições do terceiro setor; • Sensibilização dos colaboradores para o trabalho voluntário; • Dispensa dos colaboradores para o trabalho voluntário; • Realização de campanhas de arrecadação (alimentos, roupas, etc.); • Desenvolvimento, implantação e operação de projetos e programas próprios nas áreas: social, educação, cultura, saúde, meio-ambiente, defesa de direitos entre outras. O universo de programas e projetos sociais, culturais, ambientais, de defesa de direitos, etc., é infinito. Assim sendo, independente de ser próprio ou apoiando outra organização, geralmente do terceiro setor, há incalculáveis tipos de ações, desde a contribuição pontual ou contínua a uma creche – educação infantil – por exemplo, até a construção e manutenção da operação de um equipamento social de interesse público em uma comunidade carente. As ações externas ainda são, na imensa maioria das vezes, assistencialistas, e com isso causam pulverização dos investimentos e perda de foco. Infelizmente, os projetos e programas para o desenvolvimento humano e da cidadania ainda são poucos conhecidos e praticados pelas empresas, havendo dificuldade na obtenção de um resultado com alto grau de impacto que altere cenários com baixo índice de desenvolvimento humano. Face às políticas de fomento através da permissão de destinações de tributos, os investimentos sociais externos possuem motivações diversas conforme a existência ou não de incentivo fiscal. Programas e projetos de arte e cultura são motivados pelo incentivo fiscal, já os socioambientais e sócio-educativos muito pouco, pois além de serem com percentuais do imposto de renda bem menor do que para cultura, são exclusivos para serviços sociais voltados ao atendimento de crianças e adolescentes. Uma prática comum mantenedoras de atualmente é grandes empresas criarem instituições, com personalidades jurídicas e tornarem-se de associação ou fundação, muitas vezes chamadas de instituto, inclusive com o mesmo nome da empresa mantenedora, para serem seus agentes operadores dos Investimentos Sociais Privados Empresariais Externos. Exemplo: Fundação Boticário, Fundação Educar D’paschoal, Instituto Camargo Correa, Fundação Telefônica, dentre outros. As ações sociais externas, como falamos anteriormente, são as que mais retornos proporcionam em termos de marketing, por gerarem grande mídia espontânea. A exposição perante a mídia pode ocorrer de forma direta, pois é comum colocar no nome do projeto e ou programa alguma menção ao nome da empresa, ou até mesmo combinar o nome da empresa com a ação social. Há também caminhos alternativos, GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 23 >> como associar o nome da empresa ao de organizações do terceiro setor que possuem marcas fortes, de reconhecimento nacional. Um bom exemplo é o Instituto Ayrton Senna. Muitas empresas tomam a decisão de apoiar programas deste instituto, não só pela competência, diga-se de passagem, altamente reconhecida e verdadeira, mas também pela associação com o nome de um ídolo do esporte mundial. Outro fator importante é a questão da concorrência, ou seja, meu concorrente está fazendo ações sociais externas, então a empresa toma a decisão por cópia, visto que o mercado consumidor começa cada dia mais identificar na hora da compra empresas socialmente responsáveis. Este dado a respeito do consumidor selecionar as empresas “Socialmente Responsáveis” é uma tendência mundial irreversível. Há também demandas pontuais das comunidades, geralmente localizadas próximas às plantas destas empresas, que propiciam uma ótima oportunidade para a empresa realizar ações sociais externas através do apoio à mitigação destas carências, na maioria das vezes de caráter social, caracterizado pela ausência de serviços sociais básicos. Bastante similar a esta última ocorrência de decisão para realização de ações sociais externas é o engajamento da empresa junto ao setor público. Via de regra, por solicitação quase que ameaçadora dos representantes do poder público municipal para que a empresa apóie projetos e programas sociais de interesse do município já que o mesmo não tem recursos para realizar. Não podemos deixar de registrar que há empresas que, independente dos pontos de motivação colocados acima, realizam ações sociais externas por puro sentido de altruísmo de seus acionistas. Comumente, estas empresas são as que possuem as melhores performances em seus projetos e programas de investimento social privado empresarial. Assim sendo, podemos resumir os fatores de decisão para realização de Investimento Social Privado Empresarial Externo em: • Melhorar a imagem institucional da empresa perante seus stakeholders; • Possuir diferencial relativo ao mercado, ou não permitir que seu concorrente tenha, em relação à responsabilidade social empresarial; • Melhorar e manter um relacionamento saudável com a comunidade de seu entorno; • Melhorar e manter um relacionamento saudável com o poder público local; • Atrair e manter talentos em seus quadros de colaboradores; • Redução dos custos financeiros na tomada de capital externo; • Altruísmo dos sócios. Com relação aos benefícios gerados, através de ações sociais externas, podemos dizer que são semelhantes aos já citados para ações sociais internas, acrescendo aqueles GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 24 >> oriundos da melhoria substancial na relação com as comunidades externas que a princípio não possuem nenhum vínculo direto com a empresa. Portanto, os principais benefícios são: • Gerar satisfações pessoais ao empresário, colaboradores, familiares e a comunidade do local da ação social externa; • Melhorar o ambiente de trabalho e a motivação, aumentando a produtividade através da melhoria nos indicadores de qualidade; • Torna-se mais saudável a relação da empresa com os colaboradores, fornecedores, clientes, consumidores, a comunidade e o poder público; • Ajudar a empresa a atrair e manter bons colaboradores (talentos); • Auxiliar na redução do absenteísmo; • Servir como exemplo de uma empresa socialmente responsável, fomentando outras iniciativas, por parte das demais empresas concorrentes, vizinhas, ou ambas; • Agregar valor a imagem institucional da empresa. Para uma empresa realizar uma ação social externa, através do Investimento Social Privado Empresarial Externo – I.S.P.E.E., é recomendável tomar alguns cuidados antes e durante sua implantação. Os mais importantes são: • Implantar o I.S.P.E.E. sem contemplar todos os direitos legais dos colaboradores; • Implantar o I.S.P.E.E. sem possuir nenhuma ação social interna, ou seja, sem ter o I.S.P.E. Interno; • Não haver monitoramento do grau de motivação interna, pois o clima organizacional deve estar de bom a ótimo, para que se tenha sucesso nas ações sociais externas; • Exclusões sociais na estrutura organizacional (raça, sexo...); • Não possuir vagas para deficientes (PPD); • Política salarial “desajustada”; • Ter lisura nas questões trabalhistas e tributárias; • Falta de participação dos colaboradores; • Ter um bom comportamento em relação ao meio ambiente; • Não ter uma estrutura de analise e registro (monitoramento) dos resultados; • Não ter previamente contemplado no orçamento e no planejamento estratégico da organização possíveis ações sociais externas; • Clareza na condução de “crises” internas ou externas; • Ter no “mínimo” um pequeno código de ética para a organização. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 25 >> Ao analisarmos dezenas de projetos e programas de Investimento Social Privado Empresarial constatamos que nem tudo são flores. O desafio não é tão simples e surgem muitos problemas durante a execução do projeto. Buscando uma orientação geral e abrangente, apresentamos as principais causas, que via de regra, geram as não-conformidades que impedem o sucesso de tais iniciativas. Os principais pontos a serem destacados são: • Falta de alinhamento estratégico para determinar os objetivos do Investimento Social Privado Empresarial; • Falta definição clara de foco do Investimento Social Privado Empresarial; • Não há prévia definição de quem decide /aprova; • Falta planejamento / definição da origem dos recursos; • Falta definição do tempo de duração do I.S.P.E.; • Falta definição orçamentária; • Falta de indicadores de retorno, bem como a não existência de um plano de avaliação / monitoramento; • Falta definição do responsável pela gestão deste investimento; • Falha de comunicação na divulgação dos I.S.P.E.. Este último item é no mínimo intrigante e curioso, visto que um dos motivos das ações sociais externas é a melhoria da imagem através do marketing social. No dia-a-dia presenciamos de forma bastante comum a ocorrência de uma comunicação deficiente e em muitos casos a ausência de qualquer divulgação. 6) MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE PRÁTICAS DE RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL A história sobre as práticas de responsabilidade social empresarial ainda é pouco conhecida. Houve alguns registros do termo por volta dos anos 50 nos Estados Unidos, porém muito restrito. Nas décadas de 60 e 70 começa surgir com um pouco mais de intensidade na Europa Ocidental, num crescente até os anos 80, consolidando-se nos anos 90 em amplitude mundial. No Brasil, as práticas eram praticamente desconhecidas até meados da década de 1990, sendo a partir da segunda metade, ou seja, após 1995 que começaram a surgir evidências sistêmicas de ações de responsabilidade social empresarial. Um dos fatores restritivos para registro destas práticas era a falta de estruturação, padronização e sistematização de conceitos que pudessem evidenciar, ou não, uma prática de responsabilidade social empresarial. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 26 >> 6.1) SA 8000 Em 1997, a Council on Economic Priorities Accreditation Agency (Cepaa), atual Social Accountability International (SAI), organização não governamental sediada nos Estados Unidos criou a norma certificadora SA 8000, que se traduziu numa primeira referência mundial para avaliação. Trata-se de um sistema bastante similar à ISO 9000, porém norteada pelas diretrizes das Nações Unidas sobre Direitos Humanos somadas às convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Infelizmente, muitas empresas e a própria mídia em geral tratam a SA 8000 como sinônimo de certificação da gestão de responsabilidade social da empresa, o que é um grande equívoco. Pois, se atentarmos as suas diretrizes, observaremos a sua limitação ao universo de stakeholders atingidos pela SA 8000. Obviamente, este fato não desmerece os pontos positivos da mesma e a relevância em seu campo de aplicação, bem como sua importância estratégica dentro do processo global da gestão de responsabilidade empresarial. Podemos, de forma sucinta, conceituar a SA 8000 como um sistema de avaliação das condições saudáveis, éticas e dignas de trabalho. Tratase de uma norma uniforme e possível de auditoria, que permite uma verificação de sistema por terceira parte. O campo de verificação da norma SA 8000 abrange: • Trabalho Infantil; • Trabalho Forçado; • Saúde e Segurança; • Liberdade de Associação e Direito à Negociação Coletiva; • Discriminação; • Práticas Disciplinares; • Horário / Jornada de Trabalho; • Remuneração; • Sistema de Gestão das Pessoas. Dados de 2008 colocam o Brasil como o quinto colocado entre os países com maior número de certificações, ao atingir 94 empresas. Em 31 de março de 2008 existiam cerca de 1690 empresas certificadas com a norma SA 8000 em 64 países, incluindo, entre outros: Estados Unidos, China, Índia, Paquistão, republica Tcheca, Inglaterra, Espanha, Itália e Brasil. O Brasil representa na história da SA 8000 perto de cinco e meio por cento do total de certificações. A título de curiosidade a primeira empresa a possuir o certificado SA 8000, foi a norte-americana Avon em 1998. Certamente esta iniciativa tem um marco pioneiro em escala internacional, no que tange ao registro e comparação de práticas de responsabilidade social empresarial, mesmo que focada na relação com os colaboradores e seu derivado para com os GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 27 >> fornecedores. Também podemos observar o desenvolvimento da SA 8000 desde 1998 até 2008, no que concerne tanto ao número de empresas certificadas e a distribuição das certificações mundo afora, quanto ao número de empresas certificadas por país. Destaca-se a marca de quase 1.700 empresas, distribuídas em mais de 60 países, sendo a Itália o país com maior número de empresas certificadas. Número de certificações por ano % crescimento anual 2008 1693 7% 2007 1580 32% 2006 1200 36% 2005 881 54% 2004 572 67% 2003 342 79% 2002 191 68% 2001 114 54% 2000 74 95% 1999 38 375% 1998 8 Número de países com empresas certificadas % crescimento anual 2008 64 3% 2007 62 5% 2006 59 18% 2005 50 11% 2004 45 15% 2003 39 22% 2002 32 19% 2001 27 50% 2000 18 157% 1999 7 133% 1998 3 País Nº de Certificações Itália 795 Índia 267 China 214 GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 28 >> 6.2) AA 1000 Cerca de dois anos depois, em 1999 o Institute of Social and Ethical Accountability (ISEA) de Londres, fundado por Simon Zadek, idealizou e lançou a norma certificadora AA 1000 que ampliaria sobremaneira a questão da avaliação e monitoramento da relação entre a empresa e seus diversos públicos. A norma certificadora AA 1000 é composta por princípios e padrões de processo focados no engajamento com as partes com as quais a empresa interage. Esta norma contempla o processo de levantamento de informações, relatos: social e ético, bem como auditoria com enfoque no diálogo das e com as partes interessadas – stakeholders -. A implantação da norma AA 1000 como metodologia de trabalho permite o desenvolvimento e aprendizagem organizacional na busca da melhoria contínua do processo de gestão. Em suma, podemos dizer que esta norma visa orientar e gerenciar o diálogo entre a empresa e os diversos públicos interessados, na busca pela transparência dos negócios. A série de normas AA 1000 tem como objetivo definir as melhores práticas para a prestação de contas assegurando a qualidade da contabilidade, auditoria e relato social e ético da empresa. Por meio desse processo, focado no engajamento da organização com as partes interessadas, vincula questões sociais e éticas à gestão estratégica e operações do negócio. A participação das partes interessadas é o núcleo central do padrão AA 1000. Será através dela que a organização priorizará as não conformidades para ajuste e melhoria, bem como evidenciará indicadores e metas que comporão os relatórios mais adequados a cada empresa. Embora passível de certificação, a norma não define padrões de desempenho. Seu escopo a leva na determinação e desenho dos processos a serem implantados na elaboração do relatório de desempenho sem parâmetros fixos (padrões). Portanto, a AA 1000 não pode confirmar nenhum comportamento ético e socialmente responsável para uma empresa, permitindo apenas que seu diálogo com os stakeholders esteja rastreado e alinhado com suas metas e missão. As mais importantes contribuições da AA 1000 são os processos e definições propostos que dão suporte à prática da responsabilidade social empresarial. A estrutura da AA 1000 contém processos e princípios para relatórios, prestação de contas e auditoria. A implementação dos processos da AA 1000 se dá em cinco fases: • Fase 1 – Planejamento; • Fase 2 – Contabilidade; • Fase 3 – Auditoria e relatório; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << • Fase 4 – Implementação; • Fase 5 – Engajamento das Partes Interessadas. 29 >> Enfatiza-se a inovação na forma de adotar as regras, permitindo que cada empresa defina seu próprio caminho. Isso, certamente, confere às companhias maior engajamento e responsabilidade para com o tema. Seguir esse padrão tem sido visto como uma garantia para os acionistas e demais partes interessadas de que há consistência nas ações da empresa. A norma AA 1000 apresenta quatro grandes partes ou itens, que derivam um total de onze princípios que devem ser seguidos pela organização, a saber: Parte I – Escopo e natureza geral dos processos da organização, subdividido em três princípios: 1) Completude – imparcialidade na inclusão das áreas e atividades relacionadas com o desempenho social e ético nos sistemas de prestação de contas, em especial na contabilidade; 2) Materialidade – substanciar com registros das informações sobre atitudes e fatos derivados que afetam os stakeholders, bem como as avaliações do desempenho social e ético; 3) Regularidade e conveniência – sistematização ágil e segura das informações contábeis e de desempenho social, preferencialmente auditadas, para tomada de decisão tanto interna, quanto pelos stakeholders. Parte II – Significância da informação, subdividido em dois princípios: 1) Garantia da qualidade – existência de auditoria externa independente; 2) Disponibilidade e facilidade de acesso – comunicação eficiente aos stakeholders sobre os processos de: contabilidade, auditoria e relatos social e ético da organização; Parte III – Qualidade da informação gerada e divulgada, subdividida em quatro princípios: 1) Comparabilidade – facilidade de comparação dos indicadores atuais, com o desempenho de períodos anteriores da própria organização, bem como com suas metas estabelecidas, do ponto de vista interno. A análise relativa com outras organizações (benchmark) e padrões normativos também são conferidos; 2) Confiabilidade - informação íntegra e imparcial proveniente da contabilidade, auditoria e relato social e ético; 3) Relevância – garantir que tal registro é útil tanto para a própria organização, quanto para os stakeholders em suas tomadas de decisão; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 4) 30 >> Clareza – facilidade de compreensão da informação pela própria organização, e por todos os seus stakeholders. Parte IV – Gerenciamento global do sistema continuadamente, subdividido em dois princípios: 1) Integração – correlação sistematizada e auditada entre os processos de geração de informações contábeis e de relato social e ético, que garantam a visão da performance global da organização perante os seus stakeholders; 2) Melhoria contínua – sistematização de ajustes baseados nas não conformidades evidenciadas. No Brasil, a adoção da AA 1000 além de recente é ainda pouco expressiva. 6.3) OHSAS 18001 Também em 1999, um grupo de organizações certificadoras e de normalização da Austrália, Espanha, Irlanda, Malásia e África do Sul focam seus estudos no desenvolvimento de uma norma para garantir a segurança e saúde no trabalho, dando origem a OHSAS 18001. Sem determinação explícita de requisitos concretos para a garantia da segurança e saúde no trabalho, a norma obriga a empresa a seguir rigorosamente leis e procedimentos aplicáveis, bem como um sistema de gestão de melhoria contínua em seus processos atrelados direta ou indiretamente com a segurança e saúde no trabalho. Seu conteúdo tem a ênfase na análise, mapeamento e gestão de riscos, derivando os programas de capacitação e treinamento, bem como a implantação de sistemas formais de prevenção de acidentes. 6.4) INDICADORES ETHOS de RESPONSABILIDADE SOCIAL EMPRESARIAL No ano de 2000 o Instituto Ethos, organização brasileira do terceiro setor, concebeu uma ferramenta para auto-avaliação, planejamento e mensuração das práticas de responsabilidade social empresarial denominado Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial. Atenção especial para o fato de que não se trata de norma certificadora, e sim de um conjunto de indicadores e diretrizes devidamente estruturados e sistematizados. Esta ferramenta de gestão de práticas de responsabilidade social empresarial já evoluiu com várias versões ao longo dos anos, e constitui-se hoje no melhor instrumento de análise inicial e situacional da empresa frente aos seus públicos interessados – stakeholders -. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 31 >> Além da avaliação situacional da empresa – auto-diagnóstico -, esta ferramenta permite fácil planejamento para adequação, melhoria, implantação e consolidação das melhores práticas de responsabilidade social empresarial. Outro ponto importantíssimo no que diz respeito à utilização dos Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial é quanto a fácil matriz de correlação que pode ser feita tanto com o relatório GRI – Global Reporting Initiative – quanto com o Pacto Global, ambos princípios e diretrizes internacionais na área da sustentabilidade e responsabilidade social empresarial. O Instituto Ethos além de possuir os “indicadores gerais”, desenvolveu os chamados Indicadores Ethos Setoriais, que permitem um aprofundamento mais consistente e focado por segmento de atividade empresarial, garantindo uma analise comparativa segmentada de alto nível. Cabe constar também, o indicador criado exclusivamente para micros e pequenas empresas, cujo próprio nome já caracteriza o parceiro do Instituto Ethos neste projeto chamado Indicadores Ethos-Sebrae de Responsabilidade Social Empresarial para micro e pequenas empresas. Os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial estão arquitetados em sete grandes temas, que são uma espécie de macro-pontos de análise e verificação das práticas implantadas. Os temas são: • Valores, Transparência e Governança; • Público Interno; • Meio Ambiente; • Fornecedores; • Consumidores e Clientes; • Comunidade; • Governo e Sociedade. A formatação geral da ferramenta é baseada em três tipos de indicadores: • Indicadores de Profundidade; • Indicadores Binários; • Indicadores Quantitativos. O primeiro – Indicador de Profundidade – caracteriza-se por uma reflexão situacional onde a empresa optará pela mais próxima de uma das quatro alternativas oferecidas. O segundo – Indicador Binário - como próprio nome diz, apresenta premissas contextualizadas de forma clara e direta sobre o tema em avaliação, permitindo que a empresa escolha de forma contundente a resposta sim ou a resposta não, referente ao conteúdo do texto. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 32 >> Por último os Indicadores Quantitativos que são desenvolvidos para monitoramento das práticas pelos gestores de cada empresa. A somatória dos três permite que as empresas analisem a situação atual, geração de metas e diretrizes necessárias a uma evolução de suas práticas, bem como o desenvolvimento contínuo na gestão de responsabilidade social. Os indicadores do Instituto Ethos estão disponíveis para download gratuito no site: www.ethos.org.br. Os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social constituem uma ferramenta de autodiagnóstico cuja principal finalidade é auxiliar as empresas a gerenciarem os impactos sociais e ambientais decorrentes de suas atividades. Os Indicadores Ethos funcionam como um instrumento para uma auto-avaliação das práticas empresariais além de constituir-se de uma ferramenta de gestão e planejamento, sugerindo parâmetros de políticas e ações que a empresa pode desenvolver para aprofundar seu comprometimento com a Responsabilidade Social Empresarial. Os objetivos do Instituto Ethos com a criação dos Indicadores Ethos foram mobilizar as empresas para a causa da responsabilidade social empresarial por meio de uma ferramenta de gestão abrangente e melhorar a qualidade dos relatórios e balanços sociais. Não existe algum custo para responder os Indicadores Ethos e receber o relatório, e o desempenho das empresas não é divulgado publicamente. As informações são tratadas com a máxima confidencialidade. Não há uma receita básica e inflexível para o processo de resposta dos Indicadores Ethos pois cada empresa representa um universo diferente. Mas O Instituto Ethos recomenda: 1 - que cada unidade de negócios responda seu próprio questionário; 2 - que seja indicado um coordenador que centralize e sistematize as informações e facilite o diálogo interno; 3 - promover a participação de várias áreas da empresa. Quanto mais empresas estiverem envolvidas no processo de preenchimento, provenientes de departamentos e níveis hierárquicos diversificados, maior será a reflexão interna e a representatividade das respostas, garantindo um melhor autodiagnóstico. A empresa participante após ter respondido e enviado o questionário ao Ethos recebe como retorno um relatório de diagnóstico das práticas de Responsabilidade Social Empresarial personalizado, que é alocado na área restrita no sistema dos Indicadores GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 33 >> Ethos. Essa área restrita é criada quando a empresa se cadastra para envio das respostas dos indicadores. O Instituto Ethos não confere nenhum tipo de prêmio ou certificado para as empresas que respondem o questionário. Os Indicadores Ethos são uma ferramenta de autoavaliação. As empresas a aplicam voluntariamente e não há nenhum prêmio, selo ou certificado. 6.5) ABNT 16001 Não podemos deixar de citar que temos no âmbito da ABNT – Associação Brasileira de Normas Técnicas –, organização normativa técnica de maior abrangência em nosso país, a ABNT NBR 16001 publicada em dezembro de 2004. Tal norma definiu requisitos mínimos de um sistema de gestão de responsabilidade social empresarial, caracterizando três relevantes aspectos de observação: • Promoção da cidadania corporativa; • Promoção do desenvolvimento sustentável; • Promoção da transparência de todas as atividades empresariais. Fundamentada no conceito do triplle botton line e apoiada na ferramenta conhecida como PDCA – plan;do;check;act – a NBR 16001 estabelece a análise dos seguintes objetivos, não se limitando ao mesmos: • Existência de boas práticas de governança; • Não existência de falsificação (pirataria), corrupção e sonegação fiscal; • Respeito com os concorrentes; • Respeito e conformidade ao estatuto dos direitos da criança e adolescente (ECA); • Respeito e conformidade ao direito dos trabalhadores, por meio das convenções e acordos sindicais ou mesmo de dissídio coletivo; • Cuidado com a saúde e segurança; • Fomento da diversidade e combate a qualquer tipo de discriminação e exclusão; • Fomento ao desenvolvimento profissional; • Fomento as práticas de produção sustentáveis; • Fomento de ações sociais de interesse público. 6.6) ISO 14000 A série de normas ISO 14000 existentes desde meados dos anos noventa, a princípio não eram percebidas como instrumentos normativos dentro do universo da responsabilidade social empresarial, e sim como parte de questões referentes à normatização dos processos empresariais que consumiam recursos naturais e ou danificavam o meio ambiente pelas suas atividades. Somente após a sedimentação do GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 34 >> conceito de que o meio ambiente é um dos stakeholders, ou seja, parte interessada por ser afetada pelas atividades empresariais é que a mesma passa a ser vista sob a ótica de certificação e normatização da responsabilidade social empresarial. Dentre as inúmeras normas da serie ISO 14000, a mais conhecida atualmente é a ISO 14001, que estabelece as diretrizes básicas para o desenvolvimento de um sistema de gestão ambiental dentro da empresa. Seu foco principal é a proteção ao meio ambiente e a redução da poluição, num contexto de busca de equilíbrio com as demandas sócio-econômicas de cada comunidade onde a atividade empresarial impacta em seu meio ambiente. Dentre as inúmeras normas da série ISO 14000 destacamos: • ISO 14020: Estabelece os princípios para as declarações ambientais; • ISO 14031: Estabelece diretrizes para a avaliação do desempenho ambiental; • ISO 14032: Exemplos de avaliação do desempenho ambiental; • ISO 14040: Estabelece as diretrizes e estrutura para a análise do ciclo de vida, que compreende a extração da matéria-prima, processamento e produção, distribuição, uso, reciclagem e descarte; • ISO 14064: Estabelece diretrizes para quantificar, monitorar e comunicar as emissões e absorções de gases relativos ao efeito estufa. 6.7) OUTRAS NORMAS E INDICADORES As normas, certificadoras ou não, e o Indicador Ethos apresentados até aqui se constituem nos documentos mais utilizados em nosso país, porém há uma vasta relação de outras normas e indicadores existentes em diversos países, dentre os quais destacamos para ciência de sua existência: • Indicadores GIFE de Gestão do Investimento Social Privado – Brasil; • Escala Akatu de Responsabilidade Social Empresarial – Brasil; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – IARSE - Argentina; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – COBORSE – Bolívia; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – ACCIÓN – Chile; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – SGRI – Colômbia; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – CERES – Equador; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – AED – Costa Rica; • Indicadores de Responsabilidade Social Empresarial – FUNDEMAS – El Salvador; • Canadian Business for Social Responsibility – CBSR – Canadá; • Global Environmental Management Initiative –GEMI – Estados Unidos; • Integrated Management Systems – IMS – Áustria; • Vastuun Askeleita – FIBSRY – Finlândia; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 35 >> • Business in the Communit – BITC – Reino Unido; • Forest Stewardship Council – FSC – Alemanha; • Australian Standards Corporate Social Responsibility – SAI – Austrália; • Standards Institution of Israel – SII – Israel; • Det Sociale Indeks – DET – Dinamarca; • Japan Society for Business Ethics Study – ECS 2000 – Japão; • Occupational Health and Safety Assesment – OHSAS 18001 – Estados Unidos; • Association Française de Normalisation – AFNOR – SD 21000 – França. 6.8) ISO 26000 Um importante registro que não pode ficar de fora em qualquer discussão atual sobre normas no campo da responsabilidade social empresarial é o desenvolvimento da ISO 26000. Em discussão sistematizada desde abril de 2001, tem sua conclusão prevista para setembro de 2010. Construída de forma coletiva, possui o Brasil como um dos seus principais líderes juntamente com a Suécia num cenário onde participam mais de setenta países com quase 400 representantes ao todo, os chamados experts, cuja experiência e qualificação os permitem opinar. Seu grande mérito será seu caráter não certificador, bem como ausência de sistema de gestão. Através das diretrizes da ISO 26000, qualquer tipo de organização terá tanto os conceitos como princípios e práticas de responsabilidade social alinhados de forma objetiva. Um caráter intrínseco muito importante da ISO 26000 é o estimulo para que as organizações avancem suas práticas além dos exigidos por lei promovendo o respeito aos diversos contextos sócio-culturais existentes num ambiente globalizado. 7) PACTO GLOBAL (GLOBAL COMPACT) E OS OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO (METAS DO MILÊNIO) Além das normas certificadoras ou não apresentadas, há também um conjunto de dez princípios que constituem um programa da ONU (Organização das Nações Unidas), chamado de Global Compact que busca uma distribuição e acesso dos benefícios da economia global de forma mais equânime para toda população do planeta. Embora não se constitua responsabilidade numa social norma nem empresarial, num este tipo de programa aferição pode de nortear práticas os de planos estratégicos das empresas na gestão de suas práticas de responsabilidade social. Operacionalizado dentro do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD -o Global Compact teve como líder em sua concepção e implantação o então secretário geral da ONU, Kofi Annan. Lançado oficialmente no primeiro semestre de 2000, inicialmente possuía nove princípios universais, sendo adicionado um décimo princípio em 2004 que trata da luta contra a corrupção. Todos os princípios, em GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 36 >> especial os nove primeiros, foram baseados em três grandes documentos que são: a Declaração Universal de Direitos Humanos, a Declaração da Organização Internacional sobre os Direitos Fundamentais no Trabalho e as Declarações sobre meio ambiente originadas no encontro do Rio de Janeiro em 1992 e Copenhague em 1995. O Global Compact tem o intuito de articular o maior número de empresas no mundo, com destaque para companhias internacionais e transnacionais, visando um alinhamento das práticas empresariais com a promoção de valores universais e sedimentação de estruturas socioambientais nas áreas de: • Direitos Humanos; • Relações de Trabalho; • Meio Ambiente. Para cada uma destas áreas foram desenvolvidos princípios aceitos pela maioria dos países, portanto de caráter universal. Tais princípios, como já explicado, têm por base a Declaração Universal de Direitos Humanos, Declaração da OIT - Organização Internacional do Trabalho -, a Agenda do Rio 92 - Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável e o encontro de Copenhague em 1995. Os dez princípios do Global Compact são: 1. A empresa para si e junto aos seus públicos de interesse e influência deve respeitar e fomentar plenamente os direitos humanos internacionais; 2. A empresa deve ter garantia que nenhum direito humano é violado por ação direta ou indireta da empresa; 3. A empresa deve reconhecer de forma cabal e indelével o direito à negociação coletiva e a liberdade de associação; 4. A empresa deve erradicar em toda sua estrutura interna e externa de influência o trabalho escravo (forçado ou compulsório); 5. A empresa deve erradicar em toda sua estrutura interna e externa de influência qualquer modalidade de trabalho infantil; 6. A empresa deve erradicar todos os tipos de discriminação no ambiente de trabalho, bem como promover a igualdade em todas as políticas de recursos humanos; 7. A empresa deve ter sempre associada aos seus planos e metas, diretrizes de proteção preventiva em relação ao meio ambiente; 8. A empresa deve fomentar programas e iniciativas de respeito ao meio ambiente; 9. A empresa deve socializar ao máximo possível tecnologias de recuperação, preservação e sustentabilidade do meio ambiente; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 37 >> 10. A empresa deve expurgar de suas ações as práticas de corrupção tanto ativa, quanto passiva em todos os relacionamentos decorrentes de sua atividade empresarial. A adesão oficial das organizações se dá por meio de uma carta de interesse a ser encaminhada ao escritório das Nações Unidas em Nova Iorque, que homologará a signatária da intenção, que a partir de então deverá cumprir com a divulgação, fomento e prática dos princípios em todas as atividades empresariais desenvolvidas junto a todos os seus stakeholders. Atualmente mais de 5.200 organizações em quase 100 países já assinaram o pacto, desde número temos aqui no Brasil mais de 300 companhias públicas e privadas, bem como organizações sem fim lucrativo que fazem parte do grupo. Outro documento muito importante dentro do cenário mundial de esforços em prol do bem comum e redução da pobreza são as chamadas Metas do Milênio da ONU Organização das Nações Unidas – fruto da Declaração do Milênio, que evidenciou a existência de meios – tecnologia e conhecimento – e falta de ações concretas para melhorar as condições de vida nos países pobres, por parte de uma ação articulada de todos os países, inclusive os ricos. Oriunda de metas pensadas durante várias conferencias mundiais nos anos 90, culminou em setembro de 2000, durante a Assembleia do Milênio em Nova Iorque, a maior reunião de chefes de estado e de governo da história da ONU – Organização das Nações Unidas – onde foram aprovadas as oito Metas de Desenvolvimento do Milênio propostas pela ONU e aceitas por 191 países. As oito metas são desdobradas em 18 objetivos, associados aos diversos indicadores sócio-econômicos acordados pelos países membros. Os países signatários se comprometem a atingir tais metas até 2015. As oito Metas do Milênio são: 1. Erradicar a extrema pobreza e a fome; 2. Atingir a universalização do ensino fundamental; 3. Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia da mulher; 4. Reduzir a mortalidade infantil; 5. Melhorar a saúde materna; 6. Combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças; 7. Garantir a sustentabilidade ambiental; 8. Promover uma parceria mundial para o desenvolvimento. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 38 >> As áreas de abrangência das Metas do Milênio são oriundas do Pacto Global (Global Compact) que são: • Direitos Humanos; • Relações / Direitos do Trabalho; • Meio Ambiente. Os dezoito objetivos derivados das oito Metas do Milênio são agrupados por meta, tendo como base de indicadores e índices de controle e aferição os dados de 1990. Tais objetivos estão descritos abaixo de acordo com a meta a que se referem: 1. Erradicar a extrema pobreza e a fome. • Até 2015 diminuir pela metade o número proporcional de pessoas no mundo, com renda inferior a um dólar por dia; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 39 >> • Até 2015 diminuir pela metade o número proporcional de pessoas no mundo, que passam fome. 2. Atingir a universalização do ensino fundamental. • Permitir de forma consistente que em todo o mundo, até o ano de 2015, que todas as crianças concluam um ciclo inteiro de ensino básico / fundamental. 3. Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia da mulher. • Eliminar a assimetria entre os sexos no ensino fundamental e médio até 2005, e em todos os níveis até 2015. 4. Reduzir a mortalidade infantil. • Até 2015, diminuir dois terços dos índices percentuais de mortalidade infantil – crianças até 5 anos. 5. Melhorar a saúde materna. • Até 2015, diminuir três quartos dos índices percentuais da taxa de mortalidade materna por ação ou decorrência do parto. 6. Combater o HIV/Aids, a malária e outras doenças. • Até 2015, reverter a tendência de crescimento do número de infectados com HIV/Aids, tornando a propagação com crescimento relativo negativo; • Até 2015, reverter a tendência de crescimento do número de afetados por malária e outras doenças graves, tornando a incidência com crescimento relativo negativo. 7. Garantir a sustentabilidade ambiental. • Na concepção de políticas e programas nacionais integrar princípios do desenvolvimento sustentável para eliminar as perdas dos recursos ambientais, com ações de recuperação do mesmo; • Até 2015, reduzir pela metade a população sem acesso contínuo à água potável segura, de forma sustentável; • Até 2020, garantir uma melhoria da qualidade de vida de pelo menos 100 milhões de pessoas que vivem em bairros altamente degradados. 8. Promover uma Parceria Mundial para o desenvolvimento. • Fomentar o desenvolvimento de sistemas tanto comerciais como financeiros abertos, previsíveis, não discriminatórios, com regras institucionais fortes e estáveis; • Dar suporte as necessidades especiais dos países pouco desenvolvidos; • Dar suporte as necessidades especiais dos países sem acesso ao mar, bem como aos Estados insulares em desenvolvimento; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 40 >> • Criar mecanismos globais de tratamento da dívida dos países em desenvolvimento, através de diretrizes nacionais e internacionais buscando fazer com que a dívida seja sustentável no longo prazo; • De forma cooperada com os países em desenvolvimento, desenvolver e implantar estratégias que gerem trabalho digno e produtivo aos jovens; • De forma cooperada com as empresas farmacêuticas, permitir o acesso a medicamentos essenciais com preços acessíveis aos países em via de desenvolvimento; • De forma cooperada com as empresas, em especial as do setor privado, socializar os benefícios de todas as novas tecnologias, principalmente das tecnologias de informação e comunicação. Em 2006 o governo brasileiro negociou e conseguiu junto a ONU - Organização das Nações Unidas – a inclusão de uma nona meta, a qual é exclusiva para o nosso país, que tem sua redação: 9. Os objetivos do milênio sem o racismo. Tal meta busca garantir que os índices estabelecidos nas oito metas anteriores sejam atingidos tanto no universo de pessoas brancas quando dos negros, para que haja igualdade de oportunidades a todos os brasileiros. 8) BALANÇO SOCIAL e ou RELATÓRIO de SUSTENTABILIDADE Após todas as etapas anteriormente descritas, que foram a compreensão plena do que seja responsabilidade social empresarial, a implantação da gestão das práticas de responsabilidade social empresarial, o entendimento e utilização do conceito de investimento social privado empresarial na realização das práticas e ações sociais, bem como a aplicação de alguma forma de mensuração e avaliação através de normas e, ou indicadores, a empresa pode elaborar o que chamamos de Balanço Social ou Relatório de Sustentabilidade. Vale destacar que a adesão da organização a alguns princípios globais, como por exemplo, o Global Compact, implica na assunção da obrigação de divulgar os avanços inerentes ao conjunto de princípios assumidos pela empresa. Tal divulgação é preferencialmente fomentada através do Balanço Social e ou Relatórios de Sustentabilidade confeccionados pela empresa. Tal documento será um instrumento de divulgação interna e externa de suas práticas de responsabilidade social empresarial naquele momento, referente a um determinado período, geralmente com a mesma freqüência do balanço patrimonial, ou seja, de um ano, o popularmente chamado exercício fiscal com duração de 12 meses, embora isto GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 41 >> não seja uma regra fixa, a empresa é livre para determinar tanto a periodicidade como tempo de abrangência de seus relatórios e ou balanços socioambientais. Segundo o instituto Ethos temos: O Balanço Social, ou Relatório de Sustentabilidade, é um instrumento que visa dar maior transparência às atividades empresariais e ampliar o diálogo da organização com a sociedade, tendo em vista a necessidade que as empresas e organizações têm de comunicar o sucesso e os desafios de suas estratégias socioambientais e a coerência ética das suas operações. Ele pode ser definido como um documento anual produzido voluntariamente pela empresa após um esforço de “auditoria interna” para mapear seu grau de responsabilidade social. Essa “auditoria” busca entender a gestão do empreendimento e avaliá-la, segundo critérios ambientais, sociais e econômicos, nos diversos níveis: políticas de boa governança corporativa, valores, visão de futuro, avaliação de desempenho e desafios propostos. O relatório de sustentabilidade, ou balanço social, traz dados quantitativos e qualitativos que, além de demonstrar o andamento das atividades da empresa no ano anterior, podem orientar o planejamento para o ano seguinte. É um documento em que a empresa mostra, para o conjunto da sociedade, como ela se relaciona com seus profissionais (colaboradores) e com a comunidade em que atua o que faz em relação aos impactos causados por suas atividades nessa mesma comunidade e no meio ambiente, quais são suas diretrizes para relacionamento com seus fornecedores etc. O Balanço Social, ou Relatório de Sustentabilidade de uma empresa constitui-se, portanto, num relatório anual facultativo, elaborado após uma avaliação detalhada de suas ações e práticas de responsabilidade social empresarial, devidamente mensuradas para garantir total transparência. Este registro permitirá uma análise do realizado versus o previsto, configurando-se numa ferramenta de orientação para tomada de decisão, bem como um forte instrumento de marketing para divulgação e promoção da empresa junto aos seus públicos interessados (stakeholders). Embora o assunto tenha tomado vulto e importância que lhe é pertinente muito recentemente, a elaboração do primeiro Balanço Social por uma empresa que se tem registro, data de 1972 quando a Singer publicou nos EUA seu Balanço Social. No Brasil o primeiro Balanço Social foi publicado em 1984 pela empresa Nitrofértil. Treze anos depois, em 1997, o sociólogo Herbert de Souza, junto com o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBase) do qual foi o fundador, fomentou através de várias iniciativas a publicação de balanços sociais pelas empresas. O IBase desenvolveu um modelo bem simples de balanço que fornece, a partir de 1998 um selo chamado: Selo Balanço Social IBase / Betinho, para as empresas que seguem seus critérios e metodologia, com exceção de fabricantes de armas, cigarros e bebidas alcoólicas, que por princípios do IBase estão excluídas, qualquer outra organização GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 42 >> pode publicar e seguir o modelo. No inicio deste século, por volta de 2003 e 2004, mais de 220 empresas publicaram seus balanços sociais segundo esta metodologia, atualmente esta em desuso, não atingindo 100 publicações em 2008. Cabe destacar, como curiosidade, a cidade de Porto Alegre que em 1998 sancionou a lei nº 8.116/98 determinando um modelo de balanço social para as empresas sediadas no município. Analisando as informações existentes sobre o tema em nível mundial, vemos que Portugal através da lei nº 141/85, determinou a obrigatoriedade da elaboração do balanço social pelas empresas com mais de 100 empregados, ampliando uma ação tomada pelo governo Francês em 1977 que tornava obrigatório o balanço social com foco e bem restrito às interfaces das relações trabalhista. O Instituto Ethos em 2001 lança a melhor e mais completa ferramenta para elaboração do Balanço Social, que leva a denominação de: Guia de Elaboração de Relatório Anual de Responsabilidade Social Empresarial. Tal guia foi revisado em 2004 pelo Instituto Ethos, recebendo o nome de: Guia de Elaboração do Balanço Social e sua última versão disponível no site do Ethos é a 2007. A estrutura macro do Balanço Social é composta por dez itens, a saber: 1. Missão e Visão da empresa; 2. Mensagem do Presidente da empresa; 3. Perfil do Empreendimento realizado pela empresa; 4. Setor Econômico da empresa; 5. Breve Histórico da empresa; 6. Princípios e Valores empresariais; 7. A estrutura e operação / funcionamento da empresa; 8. Práticas de Governança Corporativa; 9. Relacionamento / comunicação / interação da empresa com todas as partes interessadas (stakeholders); 10. Indicadores de desempenho: Econômico, Social e Ambiental, sob aspectos qualitativos e quantitativos. Todos os dez Sustentabilidade, pontos e que outros estruturam que por o Balanço ventura Social estejam e o Relatório compondo de de forma complementar o documento, devem ser preparados sob alguns princípios que o Instituto Ethos faz questão de frisar. Estes são: • Relevância; • Veracidade; • Clareza; GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << • Comparabilidade; • Regularidade; • Verificabilidade (Rastreabilidade). 43 >> 9) GLOBAL REPORTING INITIATIVE – GRI - DIRETRIZES PARA RELATÓRIOS DE SUSTENTABILIDADE Quando pensamos na elaboração de um relatório, dentre vários desafios, talvez o maior seja desenvolver um modelo com capacidade de interpretação e forma de registro única em que, qualquer empresa situada nos mais diferentes países possa realizá-lo da mesma maneira. O grande mérito do GLOBAL REPORTING INITIATIVE, conhecido como GRI, foi justamente esta percepção de que através do seu modelo, alcancemos um nivelamento mundial no que tange as diretrizes de análise, registro e divulgação sobre responsabilidade social, econômica e ambiental da empresa. O Global Reporting Initiative – GRI –, criado na Holanda, foi apresentado em 1997, por parceria e fomento de uma organização não-governamental americana chamada CERES (Caolition for Environmentally Responsible Economies) e um programa das Nações Unidas para o meio ambiente, chamado PNUMA, visando aumento de rigor, qualidade e aplicabilidade dos relatórios de sustentabilidade. Os primeiros rascunhos sobre as Diretrizes para Relatórios de Sustentabilidade foram apresentados para análises e críticas em 1999, sendo oficialmente lançado em primeira versão em junho de 2000, após sua construção de forma voluntária por diveras partes interessadas. Após dois anos sob forte revisão o Conselho da GRI, publicou-se uma nova versão conhecida como: Diretrizes para Relatórios de Sustentabilidade 2002, e atualmente já temos a terceira versão conhecida como G3, lançada em outubro de 2006. Neste ponto é importante esclarecermos o conceito estabelecido internacionalmente de Relatório de Sustentabilidade, a saber: • Conjunto de informações baseadas em diretrizes padronizadas, que permitem uma análise simultânea do desempenho econômico, ambiental e social (triple bottom line), referente a um determinado período. A estrutura para elaboração de um Relatório de Sustentabilidade é composta por onze princípios que buscam garantir uma apresentação abrangente do desempenho econômico, ambiental e social da organização, focando de forma prioritária a contribuição da mesma ao desenvolvimento sustentável, assegurando a comparação entre organizações distintas, bem como a competência de gerar credibilidade junto às partes interessadas. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 44 >> Os onze princípios são: • Transparência; • Inclusão; • Rastreabilidade / Verificabilidade; • Abrangência; • Relevância; • Contexto de Sustentabilidade; • Exatidão; • Neutralidade; • Comparabilidade; • Clareza; • Periodicidade. Sucintamente podemos afirmar que a essência do GLOBAL REPORTING INITIATIVE – GRI, além da questão de buscar uma padronização e globalização dos relatórios de sustentabilidade, seja a amarração do sistema de gestão da empresa através da evidência de todo o processo econômico, social e ambiental, ou seja, desde a implantação das diretrizes e princípios, fixação das metas, análise dos avanços, bem como a divulgação destas informações, num cenário que permita o cruzamento entre as intenções e as realizações concretas. Felizmente temos observado um ótimo crescimento no número de empresas que fazem uso de tal ferramenta, com mais de mil adesões oficiais até meados de 2008. Aqui no Brasil o último dado aponta cerca de quarenta organizações, todas empresas de grande porte. 10) COMENTÁRIOS FINAIS Embora registremos avanços significativos no desenvolvimento das práticas de responsabilidade social empresarial ao longo dos últimos anos, não podemos afirmar que temos uma situação consolidada ou em fase satisfatória. Pesquisas recentes, divulgadas pelo Instituto Ethos e pelo Instituto Akatu, mostram que num universo de 56 práticas avaliadas na pesquisa, somente 22 delas são atividades presentes em metade das empresas. Soma-se a este dado, o fato de que as práticas mais presentes são aquelas atreladas ao interesse dos clientes e consumidores, portanto, pressionadas pelo mercado, bem como as de fruto das relações trabalhistas impostas por normas e acordos coletivos. Assim, cabe uma continua atenção aos relatórios emitidos pelas empresas, bem como um maior fomento por parte da sociedade em prol da incorporação em maior escala das práticas de responsabilidade empresarial em nossas companhias. GESTÃO de RESPONSABILIDADE SOCIAL II Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 45 >> 11) REFERÊNCIAS • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • ANDRADE, Adriana; ROSSETTI, José Paschoal. Governança Corporativa: Fundamentos, Desenvolvimento e Tendências. São Paulo: Atlas, 2005. ASHLEY, Patrícia A (coord). Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Saraiva, 2002. BERNHOEFT, Renato. Governança na empresa familiar. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. BORNHOLDT, Werner. Governança na empresa familiar: implementação e prática. Porto Alegre: Bookman, 2005. CHARAM, Ram. Governança Corporativa que Produz Resultados. Rio de Janeiro: Campus, 2005. FISCHER, Rosa Maria. 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Alguns conceitos foram criados especialmente para caracterizar as ações e os protagonistas do chamado terceiro setor e seus afiliados. Outros já eram velhos conhecidos, mas ganharam uma nova roupagem. No universo das empresas, essas palavras misturam-se aos termos da linguagem empresarial e econômica. Para ajudar no entendimento da área, apresentamos abaixo um glossário com alguns dos mais importantes conceitos envolvidos com a responsabilidade social empresarial. Ação Social – É toda atividade realizada por empresas, em caráter voluntário, para atender à sociedade em áreas como assistência social, alimentação, saúde, educação e cultura. O termo abrange desde pequenas doações eventuais a pessoas ou instituições até projetos mais estruturados, como o uso planejado de recursos. Ativos – Talentos e recursos humanos, materiais, financeiros, físicos e sociais de pessoas, organizações e comunidades, que podem ser adicionados para potencializar a capacidade de uma comunidade provocar desenvolvimento social. *Baseado no livro “A empresa na Comunidade: Um Passo-a-Passo para Estimular Sua Participação Social”, de Carla Cordery Duprat, Editora Global, São Paulo, 2005; em reportagem do jornal Folha de São Paulo, Sinapse, de 25 de janeiro de 2005, e em informações do Instituto Ethos de Responsabilidade Social (http://www.uniethos.org.br/docs/conceitos_praticas/indicadores/glossario). Compilado e adaptado por: Helena Monteiro. Publicada em setembro de 2006. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 47 >> Assistencialismo – Doutrina, sistema ou prática que organiza e presta assistência às comunidades socialmente excluídas, sem uma política para tirá-las das condições de necessitadas. É um conceito associado à noção de “caridade” ou “filantropia”, já que não prevê o envolvimento da comunidade nem ambiciona transformações estruturais significativas. Atores Sociais – Indivíduos, organizações ou grupos envolvidos em projetos sociais e que possam influir na obtenção dos resultados desse trabalho. Espera-se que o ator social tenha múltiplos conhecimentos, condições de atuar em equipe, representatividade, influência social e, principalmente, identificação pela causa em qual trabalha. Balanço Social – Publicado anualmente, é um demonstrativo não-obrigatório, que reúne um conjunto de informações sobre projeto, benefícios e ações sociais das empresas. No balanço social, a companhia mostra o que faz por seus profissionais, dependentes, colaboradores e comunidade, dando transparência a suas atividades. Ganhou visibilidade nacional quando o sociólogo Herbert de Souza lançou, em junho de 1997, uma campanha pela divulgação voluntária do balanço social. Benchmarking – processo de comparação entre organizações consideradas referência na área. Código de ética – O código de ética ou de compromisso social é um instrumento de realização da visão e da missão da empresa, que orienta suas ações e explicita sua postura social a todos com quem mantém relações. Colaboradores – Todos aqueles que estão envolvidos na execução das atividades de uma organização como empregados, prestadores de serviço e funcionários terceirizados. Capacidade comunitária – é a capacidade da comunidade de identificar problemas e gerenciar recursos de todas as naturezas na busca e implantação de soluções. Captação de recursos – Não se restringe à obtenção de recursos exclusivamente financeiros. Envolve também a busca por produtos e serviços que auxiliem uma determinada entidade a realizar sua missão. No Brasil, a ABCR (Associação Brasileira de Captadores de Recursos) criou um código de ética para os profissionais que assumirem tal compromisso. Uma das determinações é que o captador não receba comissão pelos recursos obtidos. Desenvolvimento Sustentável – Prevê a criação de um modelo econômico e social que atenda às necessidades presentes, sem comprometer a possibilidade das gerações futuras atenderem as suas próprias necessidades. A proposta é defender o equilíbrio do planeta e alertar para os perigos da explosão irracional dos recursos naturais. Apesar de inicialmente enfatizar a prevenção ambiental, o conceito reflete hoje uma preocupação também com os diretos humanos, o resgate da cidadania e o acesso ao consumo de bens e serviços. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 48 >> Direitos Humanos – Prerrogativas universais aprovadas pela Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU), em 10 de dezembro de 1948, que estabelecem os direitos fundamentais da pessoa humana. Diversidade – Princípio básico de cidadania, visa assegurar a cada pessoa condições de pleno desenvolvimento de seus talentos e potencialidades, considerando a busca por oportunidades iguais e respeito à dignidade. Representa a efetivação do direito, criando condições para que as pessoas possam agir em conformidade com seus valores individuais. Fundação – Pessoa jurídica composta pela organização de um patrimônio destacado pelo seu instituidor para servir a uma causa de interesse público, sem visar lucro. Não permite proprietário, titular ou sócios. O patrimônio é freqüentemente fiscalizado pelo Ministério Público. Geração de renda – Ações sociais que visam a geração de renda têm como objetivo estimular e facilitar a criação de postos de trabalho para a população beneficiada. Também contribuem para a geração de renda algumas iniciativas de empreendedorismo comunitário, como a comercialização de produtos artesanais e a profissionalização de atividades culturais. Governança Corporativa – “Governança corporativa é o sistema pelo qual as sociedades são dirigidas e monitoradas, envolvendo os relacionamentos entre Acionistas/Cotistas, Conselho de Administração, Diretoria, Auditoria Independente e Conselho Fiscal. As boas práticas de governança corporativa têm a finalidade de aumentar o valor da sociedade, facilitar seu acesso ao capital e contribuir para a sua perenidade.” 1 Impacto Social – É a transformação da realidade de uma comunidade ou região a partir de uma ação planejada, monitorada e avaliada. Só é possível dimensionar o impacto social se a avaliação de resultados detectar que o projeto efetivamente produziu os resultados que pretendia alcançar e afetou a característica da realidade que queria transformar. Instituto – Estabelecimento dedicado a estudo, pesquisa ou produção científica. Existe apenas como nome fantasia (sua personalidade jurídica é a das associações sem fins lucrativos). Não requer dotação inicial de patrimônio e sua finalidade pode ser alterada ao longo do tempo, conforme decisão da maioria dos sócios. Investimento Social Privado – alocação voluntária e estratégica de recursos privados, sejam financeiros, em espécie, humanos, técnicos ou gerenciais, para o benefício público. Estão incluídas nesse universo as ações sociais de empresas, fundações e institutos de origem empresarial ou instituídos por famílias e indivíduos. 1 Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC (www.ibgc.org.br) Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 49 >> Marketing Social – Tem como função aumentar o potencial de arrecadação das entidades do terceiro setor, reforçar sua imagem institucional e conseguir respostas mais rápidas e eficientes para suas ações. Utiliza diversas técnicas tradicionais de marketing, como a identificação de audiência e o desenvolvimento de produtos. Pressupõe análise, planejamento, instrumentação e controle de programas sociais. Mobilização Social – Prática estratégica que envolve a sociedade civil no processo de desenho, planejamento, execução, avaliação e sustentabilidade de programas que melhoram a sua qualidade de vida. O Unicef definiu o termo como um “movimento de larga escala para engajar a participação das pessoas na conquista de uma meta específica de desenvolvimento por meio de esforços próprios”. OSCIP – Sigla para “organização da sociedade civil de interesse público”, qualificação concedida pelo Poder Executivo, a partir de 1999, às entidades privadas sem fins lucrativos. Entre as principais inovações está a possibilidade de remunerar os diretores da entidade. Outro diferencial é o estabelecimento de parcerias entre o poder público e as OSCIPs, possibilitando que estas recebam recursos de órgãos ligados as três esferas de governo para a realização de projetos sociais. Parcerias/parceiros – O trabalho em regime de parceria ocorre quando uma organização sai em busca de outras instituições que compartilhem com ela um objetivo e estejam dispostas a conquistá-lo por meio de um esforço coletivo. Os envolvidos interagem na etapa de concepção e planejamento e estabelecem uma relação de reciprocidade para suprir suas limitações. Projeto Social – É um empreendimento planejado que consiste num conjunto de atividades interrelacionadas e coordenadas, com fim de alcançar objetivos específicos dentro de um limite de tempo e orçamento específicos. Responsabilidade Social Empresarial – Define o grau de amadurecimento de uma empresa privada em relação ao impacto social de suas atividades. Abrange aspectos como desenvolvimento comunitário, equilíbrio ambiental, tratamento justo aos funcionários, retorno aos investidores e satisfação do consumidor. A empresa socialmente responsável é aquela que ouve os interesses das diferentes partes e consegue incorporá-los ao planejamento de suas atividades. Stakeholders – Termo em inglês amplamente utilizado para designar as partes interessadas. Representa qualquer indivíduo ou grupo que possa afetar a empresa por meio de suas opiniões ou ações, ou ser por ela afetado. Inclui público interno, fornecedores, consumidores, comunidades, governo, acionistas etc. Selo "Empresa Amiga da Criança" – Concedido pelo "Programa Empresa Amiga da Criança", criado pela Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança, certifica empresas nas quais existe atuação social com foco na infância e na adolescência, desde que a empresa também se comprometa oficialmente a não usar mão de obra infantil, a difundir esta prática entre seus fornecedores e a Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 50 >> apoiar ou desenvolver projetos ou programas em prol da infância e da juventude. A empresa pode passar a usar este selo em seu merchandising, o que estimula os consumidores a agregar às suas compras a escolha de consciência, o ato solidário em defesa das novas gerações. Sustentabilidade – Ter sustentabilidade significa assegurar o sucesso do negócio a longo prazo e contribuir para o desenvolvimento econômico e social da comunidade, para um ambiente saudável e para uma sociedade estável. Garantir a sustentabilidade financeira é um dos maiores desafios das organizações do terceiro setor no Brasil e no mundo. Captação de recursos, venda e produtos, prestação de serviços e campanhas de incentivo a doações são algumas das estratégias utilizadas para manter projetos sociais. Tema transversal – Quando o tema é tratado globalmente pela empresa e não como assunto de uma área específica. Terceiro Setor – É o conjunto de organizações da sociedade civil de direito privado e sem fins lucrativos que realizam atividades em prol do bem comum. Integram o terceiro setor as fundações e associações. Transparência – Divulgação ampla, aberta e acessível a todas as partes interessadas de todos os dados e indicadores da empresa referentes a seu desempenho econômico-financeiro, social e ambiental. Triple Bottom Line – Termo em inglês utilizado para refletir todo um conjunto de valores, objetivos e processos que uma companhia deve focar, com o objetivo de criar valor econômico, social e ambiental e, por meio desse conjunto, minimizar qualquer dano resultante de sua atuação. Este é um termo ainda em construção, não só no Brasil como no mundo. Por ser uma expressão idiomática, não existe ainda tradução adequada. Na maioria das vezes o conceito continua sendo utilizado em inglês ou abordado como "os três pilares da sustentabilidade". Voluntariado Corporativo – É a forma organizada de canalizar o tempo e o talento dos colaboradores da empresa em prol de uma causa social. CONHEÇA O IDIS O IDIS – Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social é uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), criada por empreendedores sociais brasileiros com a finalidade de promover e estruturar o investimento social privado de indivíduos, famílias, empresas e comunidades. Rua São Tomé, 119, cj. 44, São Paulo, SP, CEP 04551-080 – Tel.: (11) 3044-4686 – Fax.: (11) 3044-4685 – www.idis.org.br Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 51 >> Responsabilidade social ou filantropia? Elenice C. Roginski M. Santos Resumo responsabilidade social não é sinônimo de filantropia, mas representa a sua evolução ao longo do tempo Este artigo traz conceitos relacionados à ética e ética empresarial, responsabilidade social corporativa e filantropia, da maneira como estão sendo compreendidos e aplicados por empresários, especialistas, e pelo mundo acadêmico. Apresenta algumas ferramentas para avaliar o grau de responsabilidade social das empresas, e, com maior destaque, o balanço social. Discorre sobre a Certificação Social, que está começando a ser utilizada pelas organizações brasileiras. Responsabilidade social é a maneira de conduzir os negócios na forma de uma parceria empresa-comunidade onde a empresa é co-responsável pelo desenvolvimento social da comunidade. Responsabilidade social não é sinônimo de filantropia, mas representa a sua evolução ao longo do tempo. Enquanto a filantropia trata das ações de benemerência da empresa por meio de participações em campanhas isoladas ou doações aleatórias que faz a instituições sociais, o conceito de responsabilidade social possui uma amplitude muito maior. Ao exercer a responsabilidade social corporativa, a empresa coloca todos os seus produtos, serviços e seus recursos financeiros a serviço da comunidade, tornandose co-responsável, juntamente com o poder público, por seu desenvolvimento. Serão utilizados, neste artigo, os termos responsabilidade social empresarial, responsabilidade social corporativa ou responsabilidade social nos negócios, querendo sempre significar a responsabilidade social das empresas ou organizações. Palavras-chave: responsabilidade social, filantropia, balanço social. Abstract This article deals with concepts regarding 18 Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 corporate social responsibility and philantropy, as they are being understood and practiced by entrepreuneurs, specialists, and the academy. Herein are presented some tools used to evaluate corporate social responsibility, especially underlining the so-called “Social Balance Sheet”. This article also presents the “Social Certification”, which is a new concept within Brazilian organizations. Social responsibility means running business aiming at building partnerships between organization and community so that the organization is partly responsible for the development of the community. Philanthropic actions were the first step towards corporate social responsibility. Philanthropy and social responsibility have different meanings. Whilst philantropy deals with charity actions promoted by the company, such as participating in isolated campaigns or random donations to charity organizations, the concept of social responsibility is broader. In performing its social responsibility, an organization uses all its products, services and financial resources to promote the community’s well-being. The company, jointly with the Government, becomes co-responsible for the development of the community. In the article, the terms “social responsibility in business” and “corporate social responsibility” shall be used in the sense of “an organization’s social responsibility for the community”. Key words: social responsibility, philanthropy, “social balance sheet”. Introdução É possível que, no futuro, os nossos tempos sejam lembrados como a época em que o homem definitivamente reconheceu a limitada Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 52 >> capacidade de recuperação do meio ambiente, e entendeu que o progresso tecnológico e a existência de empresas eficientes e lucrativas não representam o desenvolvimento sustentável de uma sociedade. Hoje, o lucro como indicativo de empresa de sucesso não é mais uma verdade absoluta, a menos que venha acompanhado do fortalecimento dos vínculos comerciais e sociais da empresa. No cenário econômico nacional e mundial o quadro social atual é preocupante. Particularmente no Brasil, a estrutura social se caracteriza por uma série de iniqüidades distributivas. Junta-se a pobreza estrutural, que se caracteriza por déficits de infra-estrutura, com a pobreza de capacidade de geração de recursos e produção de riqueza. Além da distância entre o desempenho econômico e a situação social, tem-se um grande contraste interno: o IDH1 do Brasil, igual a 0,777, está em 65.o lugar dentre os 175 países da ONU, conforme o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (2003); no entanto, o IDH do estado de Santa Catarina é equivalente ao 45.o mundial, próximo de países como o Chile, enquanto que o IDH do Maranhão é bastante inferior à média nacional e equivale à 123.a posição na escala mundial (FRIGOLETTO, 2003). Para mudar esse quadro de déficits e desigualdades será necessário um elevado grau de maturidade social, formado por pessoas engajadas em ações sociais e por empresas socialmente responsáveis. Para ASHLEY (2002), a responsabilidade para com o próximo é também um valor cultural. No Brasil, é bastante difundida a lei de Gerson, que estimula as pessoas a levar vantagem em tudo. Assim, no país do jeitinho, existe um conflito entre os valores culturais da integridade e o oportunismo. Entretanto, cultura é algo dinâmico e as sociedades se transformam. Pode-se estar presenciando o crescimento de uma nova cultura no Brasil: a cultura da responsabilidade social empresarial e da responsabilidade social dos cidadãos. Isto significa, segundo a autora, que novos padrões éticos e novos valores culturais estão sendo assimilados pela sociedade e no mundo dos negócios. O Brasil passou por uma série de crises de identidade no século passado e a lei de Gérson fez parte de uma época em que se acreditou que: herdamos dos escravos a aversão ao trabalho, dos índios a preguiça, e que os imigrantes recém-chegados eram uma mão-de-obra muito melhor do que a nacional. A lei de Gérson simbolizou a falta de ética do povo brasileiro. Segundo a lei de Gerson, o mundo é dos espertos, e o malandro brasileiro era aquele que sempre se dava bem com pouco esforço. Hoje, a idéia de que somos um povo trabalhador, que produz, que ajuda, respeita e confia no próximo, parece estar sendo absorvida pela população brasileira. Dirigentes, clientes, e a sociedade em geral, já estão se preocupando em avaliar o grau com que a responsabilidade social está sendo exercida por uma empresa, e a sociedade começa a ter expectativas com relação à responsabilidade das empresas com quem se relacionam. As empresas estão cada vez sendo mais cobradas para que deixem transparente aos consumidores a sua preocupação com a comunidade e o que estão fazendo de concreto. Para medir o grau de desenvolvimento econômico de uma nação existe um grande número de indicadores. Pode-se conhecer o grau de maturidade política de um país pela forma com que são realizadas eleições e pela liberdade de expressão existente. Para avaliar o grau de maturidade social de uma nação também existem indicadores, dentre eles o índice de alfabetização da população, renda média, e o próprio IDH, dentre outros. Mas, como avaliar o nível de maturidade social das empresas? Revisão bibliográfica o lucro como indicativo de empresa de sucesso não é mais uma verdade absoluta Ética A questão da ética empresarial é importante e delicada, e já existe o profissional encarregado de cuidar da ética da empresa, o deontologista (MAIA, 2002). Isto porque os O IDH é um indicador rápido do estado de desenvolvimento humano. Foi introduzido pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD, ou UNDP em inglês), em 1990, a partir de indicadores de educação: alfabetização e taxa de matrícula, longevidade: esperança de vida ao nascer, e renda: PIB per capita. (United Nations Development Programme, 2003) 1 Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 19 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 53 >> a declaração dos valores éticos da organização dá o suporte necessário para que os empregados tomem decisões alinhadas com os valores com que estão comprometidos 20 conceitos de ética e ética nos negócios são o fundamento da atuação responsável de uma empresa. São a base do comportamento moral, do julgamento do que é certo e o que é errado, e dos padrões de conduta em uma sociedade. Uma definição de ética, segundo MANKKALATHIL e RUDOLF (1995), poderia ser o perfeito entendimento do que é o bem comum e quais os padrões de conduta necessários para alcançá-lo. O termo “padrões éticos” é usado pelos autores para estabelecer a conformidade com padrões aceitáveis de conduta. Deve-se ter em mente que os padrões aceitáveis de conduta são diferentes em cada sociedade, em função principalmente dos valores e costumes adotados por essa sociedade, e seria impossível criar um único padrão de procedimento ético para as empresas em todo o mundo. No entanto, algumas normas de ética são comuns à grande maioria, como honestidade, integridade e lealdade. Sobre a ética, escreveu HUMBERTO ECO “que o fundamento para o comportamento ético, produto de crescimento milenar, é o reconhecimento do papel das outras pessoas e da necessidade de respeitar nelas aquelas exigências que para nós são inabdicáveis”. (INSTITUTO ETHOS, 2002b). Por outro lado, para DUBRIN (1998, p. 34) ética nos negócios é um conceito estrito, relativo a comportamento e moralidade. Define ético como “o resultado da obrigação moral, ou da separação do que é certo e do que é errado”. Cita como exemplo de atitude antiética uma empresa usar de suborno para obter um contrato junto ao governo. As discussões sobre a ética das corporações traz aos executivos em todo o mundo a antiga pergunta: “Se é legal, isso quer dizer que é ético?” O foco acaba caindo no julgamento do que é certo ou moral e o que é errado e imoral. No entanto, o aspecto legal, segundo MANKKALATHIL e RUDOLF (1995), é apenas uma subcategoria da questão ética, e, uma das mais inferiores no contexto das teorias de ética predominantes no ocidente nos dias de hoje. Afirmam que a dificuldade de se discutir padrões de ética vem da falta de um padrão universal para definir uma ação social. Segundo ASHLEY (2002) os argumen- Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 tos a favor da responsabilidade social corporativa dividem-se em conceitos éticos e instrumentais. Os conceitos éticos se referem ao comportamento segundo normas existentes e preceitos religiosos, sobre o que é uma ação correta e moral. Na linha instrumental, os argumentos a favor da responsabilidade social da empresa se baseiam na avaliação positiva que existe do desempenho econômico da empresa como conseqüência de sua atuação social. Para a autora, são muitas as interpretações da expressão responsabilidade social, e para alguns o aspecto legal é o mais relevante e representa um dever fiduciário; para outros é uma função social da empresa, e há quem considere responsabilidade social um comportamento eticamente responsável. Estabelecer os valores éticos de uma empresa pode ajudá-la a criar relações sólidas com os seus acionistas, fornecedores, clientes, enfim, todos os seus parceiros, além de ajudá-la a cumprir a lei, a reduzir os conflitos internos e o número de processos legais. A declaração dos valores éticos da organização dá o suporte necessário para que os empregados tomem decisões alinhadas com os valores com que estão comprometidos. Filantropia e Responsabilidade Social Filantropia é uma ação de caridade dirigida à comunidade, desvinculada do planejamento estratégico da empresa. Para MAIA (2002), a filantropia difere de responsabilidade social basicamente porque filantropia é uma ação social, seja praticada isoladamente ou sistematicamente, e nada diz sobre a visão da empresa e sobre o planejamento estratégico de sua atuação social. MAIA enfatiza o que não é responsabilidade social: ações esporádicas, doações e outros gestos de caridade não vinculados à estratégia empresarial. Diferem também quanto à divulgação, porque na filantropia não se procura associar a imagem da empresa com a ação social, e nos compromissos de responsabilidade social existe transparência na atuação da empresa para multiplicar as iniciativas sociais. (MOROSINI; ARAUJO, 2002) Segundo GRAJEW (2001), o conceito de Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 54 >> responsabilidade social está se ampliando, passando de filantropia, a relação socialmente compromissada da empresa com a comunidade, para abranger todas as relações da empresa: com seus funcionários, clientes, fornecedores, acionistas, concorrentes, meio ambiente e organizações públicas e estatais. Da mesma forma ASHLEY (2002) acredita que responsabilidade social é um conceito ainda em construção. O Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social (2002a), reconhecida instituição brasileira que se dedica à disseminação da prática da responsabilidade social empresarial, explica a diferença entre responsabilidade social e filantropia: “A filantropia trata basicamente da ação social externa da empresa, tendo como beneficiário principal a comunidade em suas diversas formas (conselhos comunitários, organizações não-governamentais, associações comunitárias etc.)”. Sobre a responsabilidade social, explica, esta faz parte do planejamento estratégico da empresa, é instrumento de gestão: “A responsabilidade social foca a cadeia de negócios da empresa e engloba preocupações com o público maior (acionistas, funcionários, prestadores de serviço, fornecedores, consumidores, comunidade, governo e meio ambiente), cujas demandas e necessidades a empresa deve buscar entender e incorporar em seu negócio. Assim, a responsabilidade social trata diretamente dos negócios da empresa e como ela os conduz”. Segundo DUBRIN (1998), está surgindo uma nova concepção de empresa, a empresa socialmente responsável, que tem como objetivo atender a uma demanda da sociedade, e a atuação social das organizações torna-se o elemento propulsor do desenvolvimento sustentável da nação. Para o autor, a responsabilidade social é um conceito mais amplo, que vai além da ética e se refere a todo o impacto que a atuação da empresa tem sobre a sociedade e o meio ambiente. A responsabilidade social preconiza que as empresas possuem deveres para com a sociedade, além de suas obrigações econômicas junto aos proprietários e acionistas, e também além das obrigações legais ou contratuais. Para CERTO E PETER (1993, p. 21) “responsabilidade social é a obrigação administrativa de tomar atitudes que protejam e promovam os interesses da organização juntamente com o bem-estar da sociedade como um todo”, e complementam: “reconhecer que tais obrigações existem, tem necessariamente, um impacto sobre o processo de administração estratégica”. REA e KERZNER (1997) afirmam que a responsabilidade social é um ativo intangível, embora seja considerada um ativo tangível por alguns, e que pode incluir temas desde a proteção ambiental até a defesa do consumidor. Fazendo uma alusão aos impactos que a responsabilidade social traz a uma empresa, afirmam que a responsabilidade social pode transformar um desastre em uma vantagem competitiva para a organização. Entretanto, a imagem da empresa pode ficar arranhada se não souber agir com responsabilidade social. MELO NETO e FROES (2001), por sua vez, sugerem que a responsabilidade social pode ser vista como uma prestação de contas da empresa para com a sociedade, uma vez que os recursos que a organização consome fazem parte do “patrimônio da humanidade”, ao utilizá-los, a empresa contrai uma dívida para com a sociedade. CERTO e PETER (1993) descrevem as partes interessadas em um negócio, para quem a empresa tem obrigações e responsabilidades: - os acionistas ou proprietários, para quem devem aumentar o valor da empresa; - os fornecedores de materiais e revendedores de produtos; - os emprestadores de capital, para reembolsá-los; - as agências do governo e a sociedades, para obedecer as leis; - os grupos políticos, para considerar seus argumentos; - os empregados e sindicatos, para garantir ambientes seguros de trabalho e reconhecer seus direitos; - os consumidores, para fornecer e comercializar eficientemente produtos seguros; - os concorrentes, para evitar práticas que desvirtuem o comércio; - a comunidade local e a sociedade como um todo, para evitar práticas que prejudiquem o ambiente. MELO NETO e FROES (2001, p.100) pro- a responsabilidade social preconiza que as empresas possuem deveres para com a sociedade Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 21 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 55 >> a responsabilidade social utilizada como ferramenta de gestão pode ser ainda um elemento motivador do corpo funcional 22 puseram o seguinte conceito de empresa- cidadã: “Uma empresa-cidadã tem no seu compromisso com a promoção da cidadania e o desenvolvimento da comunidade os seus diferenciais competitivos. Busca, desta forma, diferenciar-se dos seus concorrentes assumindo uma nova postura empresarial – uma empresa que investe recursos financeiros, tecnológicos e de mão-de-obra em projetos comunitários de interesse público”. A empresa-cidadã cria uma imagem de excelência por sua atuação junto à sociedade, que se reflete em aumento da confiança, do respeito e da admiração de seus consumidores. Segundo a Business for Social Responsibility (BSR), organização sediada nos Estados Unidos que forma parcerias com empresas para o sucesso comercial com responsabilidade social, a responsabilidade corporativa ajuda empresas nos seguintes aspectos: - facilita o acesso ao capital de investidores; - aumenta as vendas e reforça a visibilidade da marca; - atrai e mantém uma força de trabalho produtiva; - ajuda a gerenciar riscos; - facilita a tomada de decisões. A gestão da responsabilidade social ocorre em duas dimensões, basicamente, segundo MELO NETO e FROES (2001): a responsabilidade social interna e a responsabilidade social externa à empresa. Enquanto a responsabilidade interna tem como foco os funcionários da empresa e suas famílias, a dimensão externa está relacionada com a responsabilidade da empresa para com a comunidade onde está inserida e a sociedade como um todo. Atuando em ambas as dimensões a empresa exerce a sua cidadania empresarial e torna-se uma empresa-cidadã. Todas as partes interessadas no negócio, que são a interface da empresa com a sociedade, estão presentes em uma das dimensões. A responsabilidade social interna é considerada por MELO NETO e FROES (id.) como uma prioridade inquestionável sobre a atuação de responsabilidade externa. Justificam sua posição afirmando que ao privilegiar ações externas em detrimento de benefícios ao quadro funcional cria-se descontentamento, ansiedade e desmotivação. Da mesma forma, a professora MARIA Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 CECÍLIA COUTINHO ARRUDA, citada por ASHLEY (2002), acredita que é incoerente a empresa desenvolver grandes projetos assistenciais para a comunidade e não tratar bem seus funcionários. Uma empresa responsável é aquela que ouve os interesses de todos o segmentos da sociedade, como acionistas, funcionários, fornecedores, prestadores de serviços, consumidores, comunidade, governo e meio ambiente, e busca atendê-los. A empresa socialmente responsável não atende somente as demandas de seus acionistas ou proprietários, mas de todos os agentes com quem interage. A responsabilidade social utilizada como ferramenta de gestão pode ser ainda um elemento motivador do corpo funcional. A imagem de empresa-cidadã está sendo cada vez mais percebida e valorizada pelos clientes e consumidores, e ainda está sendo importante para atrair e manter uma força de trabalho produtiva. ROCHA, no artigo Por uma boa causa: Quer trabalhar bem e ainda cuidar de sua carreira? O caminho é trabalhar em uma empresa socialmente responsável, aborda o aspecto de motivação dos próprios funcionários em conseqüência da atuação responsável da empresa. Rocha afirma que muitos profissionais hoje buscam fazer alguma diferença na vida das pessoas, além de obter o sucesso na carreira (ROCHA, 2001). Como medir a Responsabilidade Social Corporativa Segundo CERTO e PETER (1993) não existe consenso sobre o significado exato de responsabilidade social e do grau ideal, ou mínimo, da responsabilidade de uma empresa. Para ASHLEY (2002), as empresas estão sentindo a necessidade de utilizar um modelo conceitual e analítico para avaliar a sua responsabilidade social, e evidentemente, diversas abordagens conceituais levam a um grande número de metodologias operacionais. Dentre elas, MELO NETO e FROES (2001) propõem uma matriz para avaliar o nível de responsabilidade social de uma empresa. Utiliza-se uma escala de 0 a 3 para avaliar cada Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 56 >> um dos seguintes vetores de responsabilidade social: - grau de apoio ao desenvolvimento da comunidade; - grau de investimento na preservação do meio ambiente; - grau de investimento no bem-estar dos funcionários e de seus dependentes; - grau de investimento na criação de um ambiente de trabalho agradável; - grau de transparência das comunicações dentro e fora da empresa; - grau de retorno aos acionistas; - grau de sinergia com os parceiros, grau de satisfação dos clientes e/ou consumidores. Com referência à gestão de uma organização que cumpre todos os requisitos legais, é oportuno lembrar que segundo ARRUDA, citada por ASHLEY (id.), a lei tem brechas que permitem injustiças sociais. ASHLEY (2002) apresenta ainda outros modelos existentes para analisar a responsabilidade social corporativa. Entre eles, o modelo proposto por Ederle e Tavis propõe três níveis de desafios éticos a serem enfrentados pela empresa: - nível 1, a empresa atende aos requisitos éticos mínimos; - nível 2, a organização atende além do nível ético mínimo; - nível 3, a empresa tem aspirações de atender a ideais éticos. MARTIN (2002) traz mais uma proposta para medir o grau de responsabilidade social de uma empresa. Trata dos obstáculos que os executivos que desejam transformar suas empresas em empresas-cidadãs enfrentam. Se investem pesado em iniciativas que seus rivais não adotam, podem ser derrotados pela concorrência; caso adotem uma política de recursos humanos digna de uma democracia, podem estar dirigindo empregos para países com leis trabalhistas menos rígidas e custos de produção inferiores. Com o nome de “A Matriz da Virtude: Calculando o Retorno da Responsabilidade Corporativa”, o autor apresenta uma ferramenta para ajudar os executivos nessa difícil tarefa (MARTIN, 2002). Para avaliar as atividades sociais com relação ao custo e ao valor social agregado, MELO NETO e FROES (2001) estabelecem uma metodologia que permite medir o valor do benefício social gerado e o custo/benefício de um determinado projeto ou atividade. Sugerem que sejam avaliados os valores sociais agregados em todas as etapas do projeto, com a utilização da “cadeia de valor” que propõem. Realizada a análise, a empresa pode definir sua estratégia de atuação privilegiando as atividades de maior nível de agregação de valor social e eliminando aquelas de maior custo/ benefício e que geram menor valor social. Dentre as ferramentas anteriormente citadas, e outras tantas existentes, para medir o grau de responsabilidade social de uma organização, destaca-se o balanço social. O balanço social surgiu nos anos 60, quando parte da população da Europa e Estados Unidos realizou um movimento de boicote às empresas ligadas à guerra do Vietnã. A sociedade estava exigindo uma prestação de contas por parte dessa empresas. Muitas organizações em diversos países passaram então a divulgar suas ações no campo social, o que resultou na criação de um instrumento chamado balanço social (IBASE, 2002). No Brasil, a Revista de Estudos de Administração n.º 10, da FAAP (1978), apresentou na década de 70 um artigo sobre o balanço social e sua iminente utilização no Brasil. Entretanto, a idéia do balanço social foi se consolidar somente no início da década de 80 em nosso País. Um de seus defensores foi o sociólogo Herbert de Souza, através do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), que presidia. O Ibase, desde a sua criação, incentiva as empresas a se tornarem empresas responsáveis, comprometidas com a qualidade de vida da comunidade, com o meio ambiente e com o bem-estar da população em geral, e também a divulgarem seus investimentos em ações sociais através da publicação anual do balanço social. Segundo NEVES (1998), o balanço social é o conjunto de despesas feitas pela empresa, exigidas ou não por lei, que afetam positivamente a qualidade de vida da comunidade e da sociedade em geral. Exemplifica as ações: saúde, alimentação, transporte, creches, ecologia, a empresa pode definir sua estratégia de atuação privilegiando as atividades de maior nível de agregação de valor social Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 23 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 57 >> o balanço social fornece dados importantes para tomada de decisões estratégicas pelos dirigentes educação, treinamento, etc. O balanço social reúne informações sobre ações, projetos e benefícios voltados ao público interno, seus empregados e colaboradores, investidores, acionistas, analistas financeiros de mercado e a própria comunidade. Representa um grande passo em direção à transparência de gestão e à valorização da atuação social de uma empresa, conciliada com seus objetivos econômicos. Como fundamento desse movimento estão a ética corporativa, o conceito de desenvolvimento sustentável e a expectativa de que as empresas possam atender as necessidades da sociedade, no exercício de sua responsabilidade social. O balanço social fornece dados importantes para tomada de decisões estratégicas pelos dirigentes, estimula e motiva os funcionários a se integrarem no esforço pelo bem-estar e desenvolvimento da comunidade, e mostra aos clientes, fornecedores e investidores a maneira como a empresa é administrada. Existem, basicamente, duas correntes quanto à elaboração do balanço social empresarial. A primeira é a corrente francesa, que surgiu com a “Le Bilan Social” de 1977, voltada para o bem-estar do empregado, sua família e o ambiente de trabalho. A segunda corrente, que prevalece em nosso País, é a corrente americana. Esta defende uma abordagem mais ampla quanto à atuação da empresa em todos os aspectos e atores envolvidos em seu negócio: geração de emprego e renda, meio ambiente, investimentos em tecnologia, ambiente de trabalho, bem-estar dos funcionários, apoio ao desenvolvimento tecnológico e também quanto ao ambiente de trabalho e assistência médica. (MELO NETO e FROES, 2001). O Global Reporting Initiative (GRI), empreendimento de abrangência internacional que se propõe a desenvolver e disseminar diretrizes para o desenvolvimento do relatório social, elaborou um modelo de balanço social baseado no conceito de sustentabilidade de gestão. Enfoca os aspectos econômicos e social do negócio. A Natura, empresa brasileira de perfumaria de cosmética, foi a primeira em- presa brasileira a publicar seu balanço social do ano 2000, no modelo GRI, composto por 95 indicadores econômicos, sociais e ambientais. (INSTITUTO ETHOS, 2001) O modelo sugerido por SOUZA em 1977, citado por HERZOG (2001), para as empresas brasileiras, conhecido como o balanço social modelo Ibase, é quantitativo e é composto por dados de investimentos em creches, alimentação, salários, capacitação dos funcionários, participação nos lucros, entre outros. O Instituto Ethos criou um modelo baseado nos modelos existentes: Ibase, GRI, e nos preceitos do Institute of Social and Ethical Accountability – ISEA2 . O relatório de responsabilidade social do Instituto Ethos possibilita a todas as empresas a busca das melhores práticas sociais, exercidas pelas empresas com os melhores indicadores. Este relatório enfoca a gestão de uma empresa sob os seguintes aspectos: • Econômico: valor adicionado, produtividade, investimento • Social: bem-estar da força de trabalho, direitos do trabalhador e direitos humanos, promoção da diversidade, investimentos na comunidade, entre outros • Ambiental: impactos dos processos, produtos e serviços no ar, água, terra, biodiversidade e saúde. (INSTITUTO ETHOS, 2001, p.15) Herbert de Souza dizia que o balanço social não tem donos, mas tem muitos beneficiários, pois todos os grupos que interagem com a empresa são beneficiados com sua publicação. Seja qual for o modelo utilizado, o importante é que o balanço social seja utilizado para mostrar à sociedade quais são as empresa responsáveis, e para conscientizar as empresas do quanto elas ainda podem fazer pela comunidade. A Certificação Social A primeira norma de certificação social, a “Social Accountability 8000” (SA 8000) foi criada em 1977 pelo Council on Economic O ISEA é responsável pela Accountability 1000 (AA 1000), uma norma básica em responsabilidade social e ética, com enfoque de auditoria e relato. 2 24 Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 58 >> Priorities Accreditation Agency (CEPAA), fundamentada nas normas da Organização Internacional do Trabalho, na Declaração Universal dos Direitos Humanos e na Declaração Universal dos Direitos da Criança. A SA 8000 funciona como um verificador dos princípios éticos das relações da empresa com todos os agentes com quem interage. São avaliados os processos produtivos, relações com a comunidade e relações com os empregados e seus dependentes. Seus principais pontos de análise são o trabalho infantil, constrangimento no trabalho, saúde e segurança, liberdade de associação e direito de negociação coletiva, discriminação, práticas disciplinares, horas de trabalho, remuneração justa e a administração de sua aplicação (PACHECO, 2001). A SA 8000 segue os moldes dos esquemas internacionais de avaliação de conformidade da International Organization for Standardization (ISO)3 , e, da mesma forma, tem a validade de um ano, com auditorias semestrais, e também prevê ações corretivas e preventivas. O processo de certificação é igualmente lento e trabalhoso, mas hoje já tem-se dezenas de projetos de certificação sendo realizados no Brasil. Avon do Brasil, ALF do Brasil, BRINOX, De Nadai são algumas empresas que já possuem a certificação SA 8000. (BALANÇO SOCIAL, 2003) Outra norma que busca assegurar padrões de conduta éticos das empresas, a AA 1000, que foi criada em 1999 pelo ISEA, é uma norma de contabilidade e auditoria baseada em princípios éticos e sociais, que enfatiza o diálogo entre empresas e partes interessadas e o engajamento dos stakeholderes 4 . (MELO NETO; FROES, 2001). Conclusão A filantropia foi o passo inicial em direção à responsabilidade social. Estudiosos, especialistas e empresários têm proposto definições para o conceito responsabilidade social, com diferentes abordagens, diferentes enfoques, mas que se complementam. Pode-se entender a responsabilidade social corporativa como a capacidade desenvolvida pelas organizações de ouvir, compreender e satisfazer expectativas e interesses legítimos de seus diversos públicos. Ações de filantropia são motivadas por razões humanitárias, e na responsabilidade social impera o sentimento de responsabilidade. As ações de filantropia são isoladas e reativas, e na maioria das vezes trata-se de opção pessoal do dirigente, enquanto os compromissos de responsabilidade social compreendem ações pró-ativas, integradas, inseridas no planejamento estratégico e na cultura da organização e envolvem todos os colaboradores. O conceito de responsabilidade social é bastante amplo, e como conseqüência, a avaliação do grau de responsabilidade social de uma organização não é uma tarefa simples. O balanço social é hoje uma ferramenta de gestão utilizada por empresas, em todos os países, para avaliar o nível da responsabilidade corporativa. É o instrumento que permite à empresa demonstrar todas as ações sociais de cidadania desenvolvidas em um determinado período. Já existem, e estão começando a ser utilizadas pelas empresas brasileiras, normas de Certificação quanto à sua atuação socialmente responsável. A SA 8000 e a AA 1000 certificam que uma empresa possui produtos ou serviços executados de forma socialmente correta. Podem ser comparadas à ISO 9000, de certificação de qualidade, e à ISO 14000, de certificação ambiental. Ao assumir um efetivo compromisso com a ética e a sustentabilidade social e ambiental do planeta, as empresas estão exercendo plenamente sua responsabilidade social e ajudando a construir um mundo melhor para todos. E estão lucrando com isso! ações de filantropia são motivadas por razões humanitárias, e na responsabilidade social impera o sentimento de responsabilidade Rede de institutos de padronização de 145 países, que trabalham em parceria com organizações internacionais, governos, indústrias e representantes de consumidores. A SA 8000 pode ser vista como um sistema de verificação de condições dignas de trabalho. Também pode ser utilizada pela comunidade e pela sociedade em geral para monitorar esse aspecto da gestão da empresa. 4 Stakeholders são os públicos interno e externo da empresa; representam todos os envolvidos e interessados no negócio. 3 Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 25 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 59 >> Referências ASHLEY, P. A. (Coord.). Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo: Saraiva, 2002. 205 p. _____. Reflexão: diálogo sobre a ética. São Paulo, v.3, n. 6, fev. 2002b. BALANÇO SOCIAL. Social accountability 8000 (SA 8000). Disponível em: <http:// www.balancosocial.org/cgi/cgilua.exe/sys/ start.htm?sid=21> Acesso em: 01 dez 2003. INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Atlas de desenvolvimento humano no Brasil. Disponível em: <www. ipea.gov.br> Acesso em: 28 de nov. de 2003. BUSINESS FOR SOCIAL RESPONSIBILITY. Partners in building responsible business practices. Disponível em: <http:// www.bsr.org/Meta/About?index.cfm> Acesso em: 10 maio 2002. MAIA, R. [Palestra proferida na Fundação Getulio Vargas]. São Paulo, 23 abr. 2002. CERTO, S. C.; PETER, J. P. Administração estratégica: planejamento e implantação. 2. ed. São Paulo: Makron Books, 1993. DUBRIN, A. J. Princípios da administração. 4. ed., Rio de Janeiro: LTC, 1998 o balanço social é hoje uma ferramenta de gestão utilizada por empresas, em todos os países, para avaliar o nível de responsabilidade corporativa FRIGOLETTO. Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – Ano 2001. Disponível em:<www.frigoletto.com.br/GeoEcon/ idh2001.htm >Acesso em: 25 novembro 2003. GRAJEW, O. Por um mundo mais seguro: a crise mundial coloca em evidência a responsabilidade das empresas na busca e na construção de uma sociedade mais justa. GUIA EXAME DE BOA CIDADANIA CORPORATIVA, São Paulo, v. 35, n. 24, p. 20-21, nov. 2001. IBASE. O Ibase e o balanço social. Disponível em: <http://www.balancosocial. org.br/ibase.html> Acesso em: 30 abr. 2002. INSTITUTO ETHOS. Guia de elaboração de relatório e balanço anual de Responsabilidade Social empresarial. São Paulo: jun. 2001. _____. Perguntas e respostas. Disponível em: <http://www.ethos.org.br/pri/princ/ 26 prespostas/index.asp> Acesso em: 21 mar. 2002a. Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 MANAKKALATHIL, J.; RUDOLF, E. Corporate social responsibility in a globalizing market. SAM Advanced Management Journal, S.l., v. 60, n. 1, p. 29-33, 1995. MARTIN, R. L. The virtue matrix: calculating the return on corporate responsability. Disponível em: <http:// w w w. h b s p . h a r v a r d . e d u / i d e a s a t w o r k / matrix_0302.html> Acesso em: 25 mar. 2002. Resumo. MELO NETO, F. P.; FROES, C. Responsabilidade social e cidadania empresarial: a administração do terceiro setor. 2. ed. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001. MOROSINI, L.; ARAUJO, E. Um paralelo entre filantropia e compromisso social. Boletim da Pesquisa Ação Social das Empresas, Brasília, maio. 2002. PACHECO, O. O Selo da Cidadania: Conheça a AS 8000, a norma internacional de Responsabilidade social que pode virar um novo passaporte na era da globalização. GUIA EXAME DE BOA CIDADANIA CORPORATIVA, São Paulo, v. 35, n. 24, p. 36-38, nov. 2001. REA, P.; KERZNER, H. Strategic planning: a practical guide. S.l: John Wiley & Sons, 1997. 326p. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 60 >> ROCHA, M. Por uma boa causa: quer fazer o bem e ainda cuidar de sua carreira? O caminho é trabalhar em uma empresa socialmente responsável. VOCÊ s.a., São Paulo, v. 4, n. 39, p.38-39, set. 2001. UNITED NATIONS DEVELOPMENT PROGRAMME. Timor Leste: o caminho à nossa frente. Relatório Nacional do Desenvolvimento Humano 2002. Indice de Desenvolvimento Humano (IDH). Dili, Timor Leste, 2002. a SA 8000 e a AA 1000 certificam que uma empresa possui produtos ou serviços executados de forma socialmente correta Autora Elenice C. Roginski M. Santos, engenheira civil, pós-graduada em Finanças, Master in Business Administration pela Baldwin-Wallace College/ OHIO-USA, e dissertação de mestrado defendida e aprovada na área de Responsabilidade Social pela BW-FAE/CDE. Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v.20, n.20, p. 18-27, jul./dez. 2003 27 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 61 >> Onde Obter Dinheiro Para Financiar Projetos Financiamento para ONG's As ONGs brasileiras cresceram e se multiplicaram com forte apoio da cooperação internacional. Agências privadas de desenvolvimento, muitas das quais ligadas às igrejas dos países da Europa Ocidental e América do Norte, apoiaram, desde os anos 70, projetos de educação popular, defesa de direitos e melhoria da qualidade de vida comunitária. Na década de 90 este padrão de financiamento entrou em crise em função de um conjunto de fatores: explosão do número de ONGs brasileiras e ampliação de seus orçamentos, realocação de recursos das agências européias para a Europa do Leste, prioridade crescente atribuída à África, aumento do desemprego e das carências sociais no interior das sociedades européias, certo desencanto com a persistência da pobreza e da desigualdade no Brasil. A instabilidade institucional gerada por esta crise nos padrões tradicionais de financiamento de seus projetos obrigou as ONGs a um esforço determinado de diversificação de fontes de financiamento, ampliando o esforço interno de captação de recursos. Esta opção coloca o desafio de um novo relacionamento com o Estado e com o setor privado empresarial. Aos poucos as ONGs foram incluindo em sua pauta de trabalho a preocupação com seu fortalecimento institucional e com a construção das condições de sua sustentabilidade a longo prazo. O Problema O acesso de organizações da sociedade civil a recursos públicos esbarra em múltiplos problemas que vão da desconfiança da burocracia governamental à descontinuidade das políticas públicas, passando pela ausência de mecanismos claros e transparentes de contratação pelo Estado de entidades não-governamentais. É fenômeno recente o reconhecimento pelo governo da legitimidade e competência da atuação das ONGs enquanto promotoras do desenvolvimento sustentável e com equidade. Por outro lado, não se pode esperar de órgãos governamentais que financiem o trabalho de ONGs via doações e sim via contratação de serviços, o que levanta exigências novas de transparência e capacidade executiva para ambas as partes. A captação de recursos junto ao setor privado, por sua vez, é dificultada pela ausência de uma tradição brasileira de investimento social da empresa. Até bem pouco tempo as ONGs ignoravam o mundo empresarial enquanto as empresas sentiam-se desobrigadas de qualquer responsabilidade pela melhoria da vida comunitária. A redução deste distanciamento entre Mercado e Sociedade Civil passa pela superação de preconceitos e pela exploração de formas novas de colaboração no enfrentamento de questões que interessam a todos, como a melhoria da educação e da saúde, combate à violência e à pobreza, promoção da cultura, defesa do meio ambiente, etc. Mais difícil ainda é para as ONGs explorar uma terceira possibilidade interna de captação de recursos que são as doações feitas por pessoas físicas e jurídicas. Esta captação de recursos junto ao público, junto à sociedade brasileira, que é feita há décadas pelas organizações filantrópicas e beneficentes, requer uma linguagem que não faz parte da trajetória das organizações da sociedade civil e uma política de fomento via incentivos fiscais à doação de recursos por parte de pessoas físicas e jurídicas. Novas Tendências Multiplicam-se em todos os níveis de governo as ações em parceria com ONGs o que implica um crescente reconhecimento pelo Estado de seu acervo de experiências e competências no enfrentamento da pobreza e exclusão social. A expansão destas ações em parceria é facilitada pelo processo em curso de descentralização de poderes e recursos para o âmbito municipal, plano no qual a interação com órgãos da sociedade se dá de modo mais flexível e operacional. O Programa Nacional de Combate à AIDs do Ministério da Saúde e o Programa de Formação de Jovens do Conselho da Comunidade Solidária são exemplos de formas transparentes de contratação de ONGs para ações focalizadas junto a populações em situação de risco mediante concursos públicos. A tomada de consciência por parte das empresas de sua responsabilidade social é um fenômeno recente porém em rápido crescimento no Brasil. Nos últimos tem se ampliado o volume de recursos canalizado para investimentos sociais por parte de Institutos e fundações empresariais. Vale lembrar que recursos não se limitam a dinheiro. O empresário pode também contribuir com doações em espécie e com a disponibilização de sua competência para a melhoria da qualidade dos projetos sociais. Algumas ONGs têm explorado formas inovadoras de captação de recursos via comercialização de produtos e serviços, associação com administradoras de cartões de crédito para emissão de cartões de afinidade e campanhas de arrecadação de recursos junto ao público em geral. A potencialização destas iniciativas passa, no entanto, por mudanças legais ainda por realizar com vistas a estimular, via incentivos fiscais, a doação de recursos por pessoas físicas e jurídicas. Links Recursos e Sustentabilidade Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 62 >> No Brasil 1. Ministério da Saúde - Oferece informações sobre as principais ações desenvolvidas pelo Ministério, a utilização dos recursos disponíveis e as normas setoriais vigentes. http://www.saude.gov.br/ 2. GIFE - Grupo de Institutos, Fundações e Empresas que congrega cerca de 40 instituições que voluntariamente aportam recursos técnicos, humanos e financeiros para projetos no setor social, nas áreas de educação, saúde, meio ambiente, assistência social e cultura. O site contém uma Agenda de eventos e várias listas com discussões sobre o Balanço Social. http://www.gife.org.br/ 3. BOLSA DE NEGÓCIOS - SEBRAE - Serviço de promoção de negócios, cujo objetivo é identificar e aproximar compradores e fornecedores de produtos, serviços, resíduos e oportunidades de negócios. http://www.bolsa.sebrae.com.br/ 4. UNICEF - Organismo da Organização das Nações Unidas responsável pela gestão dos programas e campanhas de assistência à infância. Direitos da criança, publicações, catálogos, estatísticas sobre mulhres e crianças, lista de vídeos, pesquisa. Endereço eletrônico para requisitar informações complementares e enviar sugestões. http://www.unicef.org.br/ 5. Abrinq - Entidade sem fins lucrativos de Utilidade Pública Federal, que tem por objetivo promover os direitos elementares da cidadania das crianças. O site contém informações genéricas sobre a instituição, uma ficha cadastral, um link para mensagens e um Base de Conhecimento sobre o Trabalho Infantil. Há, ainda, uma bibliografia sobre o Trabalho de Crianças e Adolescentes no Brasil; legislação; séries estatísticas; publicações. http://www.fundabrinq.org.br 6. OAB - ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - Página da instituição com informações sobre legislação, jurisprudência, direitos humanos. Diversos endereços eletrônicos e páginas de advogados e das regionais. http://www.oab.com.br/ 7. Ministério da Cultura - Minc - Apresentação do Ministério; calendário de eventos 1997/1998; concursos; legislação; economia da cultura; banco de dados sobre a produção cultural no país; verbas oficiais. http://www.minc.gov.br/ 8. BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - Informações sobre os produtos e serviços do Banco; financiamentos; privatizações; apoio à cultura; editais. http://www.bndes.gov.br/ V. especialmente o site http://www.bndes.gov.br/social 9. Fundação Roberto Marinho - Oferece uma visão panorâmica das ações realizadas pela fundação, especialmente nas áreas de educação, cultura e restauração do patrimônio histórico. http://www.frm.org.br/ 10. Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal - MMA - Informações sobre a fauna e flora brasileiras, educação ambiental, Agenda 21, consulta ao sistema de protocolo do Ministério, competências e biblioteca virtual. http://www.mma.gov.br/ 11. PROGER - Programa de Geração de Trabalho e Renda. Programa de governo financiado com recursos do FAT. http://www.bancobrasil.com.br/proger 12. Fundação Banco do Brasil - Informações sobre os programas e as ações promovidas pela Fundação, que tem como público alvo os membros das comunidades carentes do país. Combate ao desemprego; ajuda aos atingidos pela seca, culturais. http://www.fbb.org.br/ 13. COMUNIDADE SOLIDÁRIA / VOLUNTÁRIOS - Programa Voluntários: Programa criado pelo Comunidade Solidária, visando a promoção, valorização e qualificação do trabalho voluntário no Brasil. http://www.uol.com.br/voluntarios/ 14. CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil - Informações sobre as atividades da entidade, links, campanhas. http://www.cnbb.org.br/ No Exterior 15. Fundação Interamericana - IAF. Instituição que promove diversos tipos de ajuda para pessoas de baixa renda da América Latina e do Caribe. Oferece gratuitamente a assinatura da revista Desenvolvimento de Base que contém Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 63 >> estudos e análises sobre estes tipos de experiência. http://www.iaf.gov 16. Council on Foundations - Instituição com mais de 100 anos de atuação nas áreas de saúde e assistência social, e cujo principal objetivo é promover a filantropia através do apoio aos atuais e futuros filantropos. http://www.cof.org/index 17. Philanthropic Advisory Service - Organização vinculada ao ao Council of Better Business Bureau. Contém formulários para solicitação de auxílio caritativo, recomendações para doadores e relatórios sobre ações sem fins lucrativos http://www.bbb.org/pas.html 18. Civicus - O objetivo principal desta instituição é promover uma aliança internacional dedicada à fortalecer a cidadania e a sociedade civil no mundo. http://www.civicus.org/ 19 . Charity Village (Canada) - Oferece notícias, informações, recursos, discussões e links relacionados à comunidade canadense de filantropos. http://www.charityvillage.com/cvhome.html 20. Charities Aid Foundation (United Kingdom) - Incentiva e apoia ações caritativas no Reino Unido e internacionais. http://www.charitynet.org/ 21. German Charities Institute - 28.000 páginas na internet sobre o universo das iniciativas de caridade, filantropia e voluntariado na Alemanha. http://www.dsk.de/ 22. Independent Sector - Coalizão de mais de 850 grupos, fundações e organizações voluntárias, cuja missão é criar um fórum nacional para encorajar a doação e a ação voluntária de indivíduos e organizações. http://www.indepsect.org/ 23. Guide Star - Contém informações sobre programas e finanças de mais de 600.000 instituições de caridade e organizações sem fins lucrativos dos EUA, notícias sobre filantropia e orientações para doadores e voluntários. http://www.guidestar.org/ 24. European Foundation Centre (EFC) - A EFC foi criada para promover e dar suporte ao trabalho de fundações e instituições européias e associadas dedicadas à filantropia. http://www.efc.be/about/ 25. OXFAM - Com mais de 50 anos de experiência no combate à pobreza e com atuação em cerca de 70 países, a OXFAM é uma organização do Reino Unido e da Irlanda dedicada a incentivar e incrementar as ações de desenvolvimento e de combate à pobreza. O site traz informações sobre as diversas campanhas da organização, publicações, pesquisas, projetos de desenvolvimento, notícias, documentos, etc. http://oneworld.org/oxfam/ 26. Ford Foundation (THE) - Fundada em 1936 a Fundação Ford tem como objetivos gerais fortalecer os valores democráticos, combater a pobreza e a injustiça, promover a cooperação internacional e avançar o progresso humano. Suas principais atividades são o financiamento de projetos de desenvolvimento, bolsas, educação, direitos civis, relações internacionais, financiamento de projetos de combate à pobreza. http://fordfound.org 27. ICCO - Interkerklijke Coordinatie Commissie Ontwikkelings Projecten - A missão da ICCO se refere ao combate à pobreza e à miséria e à promoção da dignidade humana. Atua através do financiamento de projetos de desenvolvimento, projetos de emergência, e lobby junto a atores políticos. http://www.antenna.nl/icco/ 28. NOVIB (Netherlands Organisation for International Development Cooperation - A NOVIB é partidária do combate estrutural à pobreza e pretende deste modo participar no desenvolvimento sustentável de determinados grupos do hemisfério sul. Entre as suas atividades estão o financiamento de projetos de desenvolvimento, assessorias técnicas, educação para o desenvolvimento, lobby frente a atores políticos e mobilização da opinião pública, http://antenna.nl/novib FONTE: RITS Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 64 >> ISO and social responsibility • ISO has launched the development of the future ISO 26000 standard providing voluntary guidance on social responsibility (SR). • ISO 26000 will be for organizations of all types in both public and private sectors, in developed and developing countries. • ISO 26000 will add value to existing SR work by : – developing an international consensus on what SR means and the SR issues that organizations need to address, – providing guidance on translating principles into effective actions, and – refining best practices that have already evolved and disseminating the information worldwide for the good of the international community. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 65 >> ISO 26000 will add value to existing initiatives for social responsibility by providing harmonized, globally relevant guidance based on international consensus among expert representatives of the main stakeholder groups and so encourage the implementation of best practice in social responsibility worldwide. On the one hand, there has been a number of highlevel declarations of principle related to SR and, on the other, there are many individual SR programmes and initiatives. The challenge is how to put the principles into practice and how to implement SR effectively and efficiently when even the understanding of what “ social responsibility ” means may vary from one programme to another. ISO’s expertise is in developing harmonized international agreements based on double levels of consensus : among the principal categories of stakeholder, and among countries (ISO is a network of the national standards bodies of 157* countries). What is ISO 26000 ? The future ISO 26000 will distil a globally relevant understanding of what social responsibility is and ISO 26000 is the designation of the future Interna- what organizations need to do to operate in a tional Standard giving guidance on social responsi- socially responsible way. bility (SR). It is intended for use by organizations of all types, in both public and private sectors, in developed and developing countries. It will assist them in their efforts to operate in the socially responsible manner that society increasingly demands. ISO 26000 contains guidance, not requirements, and therefore will not be for use as a certification standard like ISO 9001:2000 and ISO 14001:2004. Why is ISO 26000 important ? Sustainable business for organizations means not only providing products and services that satisfy the customer, and doing so without jeopardizing the environment, but also operating in a socially What will ISO 26000 contain ? The detailed content of ISO 26000 will evolve throughout its development process. The current* working document covers the following : Foreword Introduction 1 Scope 2 Terms and definitions 3 Understanding social responsibility 4 Principles of social responsibility 5 Recognizing social responsibility and engaging stakehoders responsible manner. Pressure to do so comes from 6 Guidance on social responsibility core subjects customers, consumers, governments, associations 7 Guidance on implementing practices of social and the public at large. At the same time, far-sighted responsibility organizational leaders recognize that lasting suc- Annex A – Social responsibility initiatives cess must be built on credible business practices Bibliography and the prevention of activities such as fraudulent accounting and labour exploitation. Index * At 1 July 2008 ISO and social responsibility, 2008 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 66 >> Group on Social Responsibility (WG SR) to d evelop the future ISO 26000 standard. Who is developing ISO 26000 ? Eighty* countries and 39* organizations with liaison status are participating in the WG SR under the joint leadership of the ISO members for Brazil (ABNT) and Sweden (SIS). The main stakeholder groups are represented : industry, government, labour, consumers, nongovernmental organizaThe guidance in ISO 26000 is intended to be clear and understandable, even to non-specialists, objective, and applicable to all types of organization, in both private and public sectors. How will ISO 26000 relate to existing good work ? The guidance in ISO 26000 will draw on best practice developed by existing public and private tions, service, support, research and others, as well as a geographical and gender-based balance of participants. When will ISO 26000 be ready ? ISO 26000 is currently targeted for publication in late 2010. What will ISO 26000 achieve ? sector SR initiatives. It will be consistent with and ISO 26000 will integrate international expertise on complement relevant declarations and conventions social responsibility – what it means, what issues by the United Nations and its constituents, notably an organization needs to address in order to oper- the International Labour Organization (ILO), with ate in a socially responsible manner, and what is whom ISO has established a Memorandum of Under- best practice in implementing SR. ISO 26000 will standing (MoU) to ensure consistency with ILO labour be a powerful SR tool to assist organizations to standards. ISO has also signed an MoU with the move from good intentions to good actions. United Nations Global Compact Office (UNGCO) to enhance their cooperation on the development of ISO 26000 and with the Organisation for Economic Co-operation and Development (OECD) to ensure consistency with OECD guidelines. How did the ISO 26000 initiative come about ? The need for ISO to work on an SR standard was first identified in 2001 by ISO/COPOLCO, Committee on consumer policy. In 2003, the multi-stakeholder ISO Ad Hoc Group on SR which had been set up by ISO’s Technical Management Board (TMB) completed an extensive overview of SR initiatives and issues worldwide. In 2004, ISO held an international, multi-stakeholder conference on whether or not it should launch SR work. The positive recommendation of this conference led to the establishment in late 2004 of the ISO Working ISO and social responsibility, 2008 © Grace Nielsen For more information on ISO 26000 and the ISO Working Group on Social Responsibility : www.iso.org/sr Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 67 >> This Web site includes documents giving the background to ISO’s SR initiative, documents and press releases on the progress of the work and how it is being carried out, the membership and structure of the WG SR, how to participate in the development of ISO 26000, a newsletter, development timeframe, FAQs, contacts and other information. A number are available in several languages. Working documents including the latest draft of the standard can be accessed at : www.iso.org/wgsr Two magazines to read : ISO Focus, a panoramic view of standards and related issues : what is being done, why it is being done, what will be done and how it affects you. Published in English. www.iso.org/isofocus Focus 6-2008.indd 1 30.05.2008 15:53:49 • ISO is the world’s leading developer of International Standards. • ISO standards specify the requirements for state-of-the-art products, services, processes, materials and systems, and for good conformity assessment, managerial and organizational practice. ISO Management Systems, Worldwide coverage of ISO 9000 and ISO 14000 • ISO standards are designed to be developments. Plus new standards implemented worldwide. initiatives for important business and societal issues such as social responsibility, sustainability, food safety, information security, supply chain security, occupational health and safety, services and conformity assessment. Plus sector developments and national initiatives. :12 .2008 12:10 26.02 d 1 8 F.ind IMS About ISO 2-200 Published in English, French and Spanish. IMS 3-2008 E.indd C1 20.05.2008 13:03:40 www.iso.org/ims Contacting ISO : the ISO member in your country www.iso.org/isomembers or ISO Central Secretariat International Organization for Standardization 1, ch. de la Voie-Creuse, Case postale 56 CH-1211 Genève 20, Switzerland Tel. + 41 22 749 01 11 Fax + 41 22 733 34 30 E-mail [email protected] Web www.iso.org ISBN 978-92-67-10471-3 • © ISO, 2008-07/ 3 000 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 68 >> GRUPO DE TRABALHO GVces SOBRE A ISO 26000: UMA PERSPECTIVA GERENCIAL E INTEGRADA DA RESPONSABILIDADE SOCIAL Em dezembro próximo será publicada a ISO 26000: a norma internacional de responsabilidade social. É o produto final das atividades de um grupo de trabalho mundial formado por mais de 400 especialistas de 91 países e 45 entidades globais, que desde 2005 se dedicam a elaborá‐la. Representando o consenso entre integrantes dos mais variados segmentos sociais (setor privado, governo, ONGs, trabalhadores e consumidores, além de normalizadores, consultores e acadêmicos), a ISO 26000 se destaca por trazer uma abordagem inédita, traduzindo e integrando, por uma perspectiva gerencial, os temas e as práticas centrais da responsabilidade social (RS) e da sustentabilidade empresarial, ou organizacional. Em outras palavras, é um guia de diretrizes, que traduz em linguagem prática e objetiva – aplicável a organizações de qualquer porte, área de atividade ou região – as expectativas de responsabilidade e ação decorrentes da RS e da busca pela sustentabilidade, em todos aspectos. A publicação oficial da norma só ocorrerá em dezembro, mas a minuta final, já com todo seu conteúdo objetivo, está disponível para análise. Estudar sua aplicabilidade é uma oportunidade única de antecipar‐se ao que, sem dúvida, será o próximo marco na historia da RS. Quem usará a ISO 26000? Diferentemente de outras normas, a ISO 26000 não será certificável, ou seja, a sua aplicação não dará a quem utilizá‐la o direito de exibir um selo ou declaração de “socialmente responsável” ou “sustentável”. A principal razão disso é o reconhecimento de que se trata de um tema amplo demais para ser reduzido a uma lista de requisitos uniformemente aplicáveis e verificáveis. Então, por que usá‐ la? Qual seu público? Alguns prováveis usos dessa norma serão: - - Alinhar expectativas, servindo como referência, por exemplo, para a alta direção de empresas que visem planejar ou rever suas atividades em RS e/ou sustentabilidade. Apoiar iniciativas, servindo, por exemplo, como embasamento para propostas e atividades de áreas ou profissionais envolvidos com RS e sustentabilidade, que muitas vezes carecem de respaldo sólido. - Alavancar agendas dos stakeholders, que contarão com uma fonte amplamente reconhecida tanto para fundamentar suas demandas específicas quanto para apoiar seu direito a serem ouvidos/considerados. - Inspirar novas iniciativas, pois, ao consolidar um consenso internacional e multistakeholder de RS, a ISO 26000 induzirá medidas como o alinhamento de outras normas/ferramentas de RS existentes e a criação de instrumentos específicos para certos setores/atividades. O GRUPO DE TRABALHO (GT) DO GVces SOBRE APLICAÇÃO DA ISO 26000: Quando: de junho a dezembro de 2010. Perfil Esperado: Profissionais de todas as áreas, que desejem debater os impactos que a publicação da ISO 26000 terá sobre seus negócios e atividades, preparando‐se para maximizar benefícios e reduzir riscos. Áreas de atuação: Responsabilidade social, sustentabilidade, relações institucionais, marketing, planejamento, administração, recursos humanos, meio ambiente, entre outras. Objetivos: Propiciar aos membros do GT o conhecimento sobre a ISO 26000, somado à reflexão sobre seus potenciais e limitações, e sobre sua aplicabilidade prática, mediante o estudo, debate e troca de experiências. Produzir conhecimento atualizado sobre responsabilidade social e sustentabilidade, e compartilhá‐lo com a sociedade em geral. Estratégia: O GT atingirá seus objetivos por meio de uma série de encontros presenciais, focadas na apresentação e debates dos conteúdos da ISO 26000 e na interação entre os membros do GT, complementadas por atividades remotas, de reflexão/pesquisa sobre os conteúdos, face à realidade profissional de cada participante. As conclusões do grupo de trabalho serão compartilhadas com a sociedade em um seminário final e sistematizadas uma publicação. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 69 >> ATIVIDADES Encontros presenciais: o GT realizará 6 encontros, cada um com 2 sessões de 4 horas cada uma, totalizando 48 horas de atividade presencial. Atividades remotas: serão propostas atividades a serem realizadas pelos membros do GT em suas bases, focando suas experiências concretas. Seminário aberto: será realizado em dezembro de 2010, no auditório da EAESP/FGV, com duração de um dia inteiro. Serão apresentadas as principais conclusões do grupo, e debatidas com o público e com especialistas dos temas pertinentes. Publicação: os trabalhos apresentados no seminário e os debates realizados serão registrados na forma de uma publicação, a ser lançada no 1º trimestre de 2011, em evento na EAESP/FGV. Material: O material de referência básico será a minuta mais recente da norma ISO 26000 disponível para consultas. Esse material será complementado por artigos e outras publicações sobre a norma e a RS, e por contribuições dos próprios membros do GT. PROGRAMAÇÃO (para conteúdo das cláusulas, ver em anexo a estrutura da norma) As sessões que compõe os encontros presenciais tratarão dos seguintes conteúdos: Sessão 1: Apresentação dos membros do GT. Programação do trabalho. Introdução à ISO 26000. Sessão 2: Aspectos gerais da ISO 26000 (cláusulas 1, 2, 3 e 4) Sessão 3: Práticas essenciais da RS (cláusulas 5 e 7) Sessão 4: Integração da RS na organização (cláusula 7) Sessão 5: Temas centrais da RS (cl. 6): Governança organizacional e Práticas leais de operação Sessão 6: Temas centrais da RS: Direitos humanos (cl. 6.3) Sessão 7: Temas centrais da RS: Práticas trabalhistas (cl. 6.4) Sessão 8: Temas centrais da RS: Meio ambiente (cl. 6.5) Sessão 9: Temas centrais da RS: Questões relativas ao consumidor (cl. 6.7) Sessão 10: Temas centrais da RS: Engajamento com a comunidade e Desenvolvimento (cl.6.8) Sessão 11: Ferramentas e iniciativas para de apoio à RS (cláusula 7.8; Anexo A; Bibliografia) Sessão 12: Consolidação e balanço das atividades do GT. Preparo para o seminário. Atividades remotas: a serem definidas em conjunto pelo GVces e pelos membros do GT do GT. Em princípio, prevê‐se uma atividade, com duração variável, a cada uma ou duas sessões. O GT ISO 26000 é uma iniciativa do GVces. A facilitação das sessões presenciais e a coordenação geral estão a cargo do secretário executivo do GAO∗ , Aron Belinky, colaborador do GVces e membro destacado do grupo de trabalho internacional que constrói a ISO 26000. Participação: As atividades do GT são destinadas essencialmente a empresas, sem restrições quanto a porte, setor, localização, etc. Sendo relevante para os temas, e em comum acordo com os membros do grupo, convidados de outras áreas e especialidades poderão ser convidados a participar. As sessões presenciais ocorrerão em São Paulo, capital, na EAESP/FGV. Para inscrição ou informações, escreva para [email protected] ou [email protected] Grupo de Articulação das ONGs Brasileiras na ISO 26000 ∗ Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 70 >> CONTEÚDO E ESTRUTURA GERAL DA ISO 26000 (minuta, versão DIS) Índice 1 2 2.1 2.2 3 3.1 3.2 3.3 3.4 4 4.1 4.2 4.3 4.4 4.5 4.6 4.7 4.8 5 5.1 5.2 5.3 6 6.1 6.2 6.3 6.4 6.5 6.6 6.7 6.8 7 7.1 7.2 7.3 7.4 7.5 7.6 7.7 7.8 Escopo Termos, definições e abreviaturas Termos e definições Abreviaturas A compreensão da responsabilidade social A responsabilidade social das organizações: Histórico Tendências atuais da responsabilidade social Características da responsabilidade social O Estado e a responsabilidade social Princípios da responsabilidade social Geral Prestação de contas e responsabilidade Transparência Comportamento ético Respeito pelos interesses das partes interessadas Respeito pelo estado de direito Respeito pelas normas internacionais de comportamento Respeito pelos direitos humanos Reconhecimento da responsabilidade social e engajamento das partes interessadas Geral Reconhecimento da responsabilidade social Identificação e engajamento das partes interessadas Orientações sobre temas centrais da responsabilidade social Geral Governança organizacional Direitos humanos Práticas trabalhistas Meio ambiente Práticas leais de operação Questões relativas ao consumidor Envolvimento com a comunidade e seu desenvolvimento Orientações sobre a integração da responsabilidade social em toda a organização Geral Relação das características da organização com a responsabilidade social Compreensão da responsabilidade social da organização Práticas para integrar a responsabilidade social em toda a organização Comunicação sobre responsabilidade social Fortalecimento da credibilidade em relação à responsabilidade social Análise e aprimoramento das ações e práticas da organização relativas à responsabilidade social Iniciativas voluntárias de responsabilidade social Anexo A (informativo) Exemplos de iniciativas e ferramentas voluntárias relacionadas à responsabilidade social Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 71 >> TABELA 1 – ESTRUTURA DA ISO 26000 Título da Seção Número da Seção Descrição do conteúdo da Seção Escopo Seção 1 Define o conteúdo e escopo dessa Norma Internacional e identifica certas limitações e exclusões. Termos, definições e abreviaturas Seção 2 Identifica e fornece a definição de termos‐chave de importância fundamental para a compreensão da responsabilidade social e o uso dessa Norma Internacional. A compreensão da responsabilidade social Seção 3 Descreve os fatores e condições importantes que influenciaram o desenvolvimento da responsabilidade social e que continuam a afetar sua natureza e prática. Descreve também o próprio conceito de responsabilidade social – seu significado e aplicação em organizações. A seção inclui orientações para organizações de pequeno e médio porte sobre o uso dessa Norma Internacional. Princípios da responsabilidade social Seção 4 Introduz e explica os princípios genéricos de responsabilidade social. Reconhecimento da responsabilidade social e engajamento de partes interessadas Seção 5 Aborda duas práticas de responsabilidade social: o reconhecimento da organização de sua responsabilidade social e a identificação e engajamento de suas partes interessadas. Fornece orientações sobre a relação entre uma organização, suas partes interessadas e a sociedade, introduz os temas e questões centrais de responsabilidade social e analisa a esfera de influência da organização. Orientações sobre temas centrais da responsabilidade social Seção 6 Explica os temas centrais e questões associadas referentes a responsabilidade social (vide Tabela 2). Para cada tema central, são fornecidas informações sobre seu escopo, sua relação com a responsabilidade social, princípios e considerações relevantes e respectivas ações e expectativas. Orientações sobre a integração da responsabilidade social em toda a organização Seção 7 Fornece orientações sobre como colocar a responsabilidade social em prática em uma organização. Isso inclui orientações relacionadas a compreender a responsabilidade social da organização, integrar a responsabilidade social em toda a organização, comunicar sobre responsabilidade social, melhorar a credibilidade da organização em relação à responsabilidade social, analisar o progresso, melhorar o desempenho e avaliar iniciativas voluntárias em responsabilidade social. Exemplos de iniciativas e ferramentas voluntárias relacionadas à responsabilidade social Anexo A Apresenta uma relação não exaustiva de iniciativas e ferramentas voluntárias relacionadas a responsabilidade social que abordam aspectos de um ou mais temas centrais ou a integração da responsabilidade social em toda a organização. Bibliografia Inclui referências a instrumentos internacionais relevantes e Normas ISO mencionadas no corpo dessa Norma Internacional como fonte. Índice Faz referência a tópicos, conceitos e termos contidos nessa Norma Internacional. Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 72 >> TABELA 2 — TEMAS CENTRAIS E QUESTÕES DE RESPONSABILIDADE SOCIAL Temas centrais e questões subseção Tema central: Governança organizacional 6.2 Tema central: Direitos humanos Questão 1: Diligência 6.3 6.3.3 Questão 2: Situações de risco para os direitos humanos 6.3.4 Questão 3: Evitar cumplicidade 6.3.5 Questão 4: Resolução de queixas 6.3.6 Questão 5: Discriminação e grupos vulneráveis 6.3.7 Questão 6: Direitos civis e políticos 6.3.8 Questão 7: Direitos econômicos, sociais e culturais 6.3.9 Questão 8: Direitos fundamentais do trabalho 6.3.10 Tema central: Práticas Trabalhistas Questão 1: Emprego e relações de trabalho 6.4 6.4.3 Questão 2: Condições de trabalho e proteção social 6.4.4 Questão 3: Diálogo social 6.4.5 Questão 4: Saúde e segurança no trabalho 6.4.6 Questão 5: Desenvolvimento humano e treinamento no local de trabalho 6.4.7 Tema central: Meio ambiente Questão 1: Prevenção da poluição 6.5 6.5.3 Questão 2: Uso sustentável de recursos 6.5.4 Questão 3: Mitigação e adaptação às mudanças climáticas 6.5.5 Questão 4: Proteção e restauração de habitats naturais 6.5.6 Tema central: Práticas leais de operação Questão 1: Práticas anticorrupção 6.6 6.6.3 Questão 2: Envolvimento político responsável 6.6.4 Questão 3: Concorrência leal 6.6.5 Questão 4: Promoção da responsabilidade social na esfera de influência 6.6.6 Questão 5: Respeito ao direito de propriedade 6.6.7 Tema central: Questões relativas ao consumidor Questão 1: Marketing justo, informações factuais e não tendenciosas e práticas contratuais justas 6.7 6.7.3 Questão 2: Proteção à saúde e segurança do consumidor 6.7.4 Questão 3: Consumo sustentável 6.7.5 Questão 4: Atendimento e suporte ao consumidor e solução de reclamações e controvérsias 6.7.6 Questão 5: Proteção e privacidade dos dados do consumidor 6.7.7 Questão 6: Acesso a serviços essenciais 6.7.8 Questão 7: Educação e conscientização 6.7.9 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 73 >> Temas centrais e questões subseção Tema central: Envolvimento com a comunidade e seu desenvolvimento Questão 1: Envolvimento da comunidade 6.8 6.8.3 Questão 2: Educação e cultura 6.8.4 Questão 3: Geração de emprego e capacitação 6.8.5 Questão 4: Desenvolvimento tecnológico e acesso às tecnologias Questão 5: Geração de riqueza e renda Questão 5: Geração de riqueza e renda 6.8.6 Questão 6: Saúde 6.8.8 Questão 7: Investimento social 6.8.9 6.8.7 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 74 >> Responsabilidade Social em Pequenas e Médias Empresas: Uma Análise a Luz da Teoria dos Stakeholders Autoria: José Edson Moyses Filho, Andrea Leite Rodrigues Resumo: O Programa Tear foi uma iniciativa conjunta do Instituto Ethos e do BID, cujo objetivo era mobilizar grandes empresas (ou âncoras) no sentido de viabilizar PME fornecedoras a conhecerem e adotarem práticas de gestão socialmente responsáveis. Acompanhamos três ancoras e seis PME com o objetivo de descobrir como as âncoras influenciaram as PME fornecedoras, como se deu o processo de trabalho entre âncora, PME e Instituto Ethos e quais os resultados alcançados em termos de adoção de práticas de responsabilidade social empresarial (RSE) nas PME. Utilizamos o estudo de caso qualitativo, tendo a teoria dos stakeholders como arcabouço teórico básico para coleta de dados, análise, discussão e conclusão. Os resultados estão de acordo com o colocado por Vogel (2005), segundo o qual a adoção de práticas de gestão socialmente responsáveis, raramente gera impactos na performance econômica dos negócios ou nas oportunidades de mercado para as empresas. Outrossim, iniciativas como esta modificam as relações sociais internas nas organizações, disseminam novos comportamentos e geram ações pontuais e restritas nos processos de produção e gestão. A influência dos stakeholders acentua a importância e acelera a adoção das práticas de RSE, mas não é suficiente para garantir incremento na performance e aumento na competitividade e nas oportunidades de mercado, como foi colocado inicialmente às PME pelos organizadores do Programa Tear. 1. Introdução Jeffrey Harrison e Edward Freeman escreveram no texto de abertura do Academy of Management Journal Special Forum on Stakeholders, Social Responsability and Performance que o fato de ter-se cada vez maior sensibilidade às questões éticas envolvidas nos negócios, juntamente com o aumento da competição e a atuação contundente da mídia, gera um cenário bastante difícil para qualquer gestor organizacional. Por um lado, gestores estão comprometidos com interesses de acionistas e proprietários, o que lhes rege para definir estratégias de competitividade do negócio na indústria. Por outro, várias destas estratégias podem ter conseqüências ruins para outros públicos parceiros ou relevantes (stakeholders), considerando o amplo espectro de organizações e indivíduos que também têm interesses e direitos a partir das operações desta mesma empresa, ainda que não sejam dela proprietários. A gestão voltada para stakeholders (ou stakeholder management, no original em inglês) poderia constituir, antes de tudo, uma alternativa que encarasse a empresa como um conjunto de contratos entre vários públicos, cada um com interesses próprios e nem sempre harmonizáveis. Gerenciar interesses conflitantes entre stakeholders poderia, portanto, ser considerada a primeira e mais difícil tarefa de um gestor organizacional (HARRISON e FREEMAN, 1999). Esta forma de pensar a gestão como conflitos entre interesses impulsionou a aceitação da Teoria dos Stakeholders como perspectiva teórica relevante para a análise dos dilemas éticos em gestão, uma vez que trata de impactos que a atividade empresarial gera a uma gama de públicos relevantes envolvidos com as organizações e não apenas aos acionistas ou proprietários (FreemanN, 1984). Não é à toa que se tornou uma teoria bastante utilizada em trabalhos envolvendo responsabilidade social corporativa, ética em negócios, entre outros temas inseridos no campo dos estudos sobre as relações entre empresas e sociedade (DONALDSON e PRESTON, 1995; JONES, 1995). Ao definir responsabilidade social empresarial, Jones já havia considerado que a noção de que as empresas têm uma obrigação com grupos constituídos na sociedade que não sejam [apenas] os acionistas e para além dos prescritos em lei ou contrato 1 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 75 >> sindical, indicando que um interesse (stake) pode ir além do que a mera propriedade (Jones 1980, p. 59-60). Há, porém, quantidade reduzida de trabalhos que abordam a gestão voltada para stakeholders no âmbito das pequenas e/ou médias empresas (PME). Menos ainda, que tratam dos desafios e dilemas da responsabilidade social empresarial em PME considerando a influência de stakeholders externos. Este trabalho se insere nos estudos sobre responsabilidade social empresarial, com vistas a entender como ela acontece (ou não!) no âmbito de empresas de porte reduzido a partir da influência de públicos relevantes externos. Utilizamos como arcabouço teórico de análise a Teoria dos Stakeholders e como estratégia de pesquisa três estudos de caso, composto cada caso da análise das relações entre uma grande empresa (âncora) membro do Instituto Ethos e dois de seus fornecedores considerados empresas pequenas ou médias, totalizando nove empresas estudadas. O propósito dos estudos dos casos foi analisar como as âncoras influenciaram seus fornecedores em prol da adoção de práticas de gestão socialmente responsáveis. Trata-se de pesquisa qualitativa e exploratória cujo objetivo foi descobrir quais os desafios, barreiras ou acessos para uma PME adotar práticas de responsabilidade social e como uma grande empresa cliente pode contribuir neste processo. Os três estudos de caso foram escolhidos a partir do Programa Tear – Tecendo Redes Sustentáveis, desenvolvido pelo Instituto Ethos com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O Programa nasceu em 2005, com o objetivo de atingir pequenas e médias empresas com o auxílio de empresas âncoras, que possuíssem ascensão sobre as PME em suas cadeias de suprimentos. O estudo que aqui apresentamos pretendeu investigar qual o papel de três empresas âncoras como stakeholders de seis PME para auxiliá-las a adotarem práticas de gestão socialmente responsáveis, com apoio do Instituto Ethos. A lógica do Programa Tear residiu em fazer com que grandes empresas – ou âncoras – influenciassem fornecedores com perfil de PME estimulando-as a aderir a práticas de gestão referenciadas nos Indicadores Ethos de Responsabilidade Social. O Programa Tear terminou em 2008 e envolveu nove empresas âncoras e cento e oito PME em todo Brasil. 1. Responsabilidade Social Corporativa em PME: Abordagem pela Teoria dos Stakeholders Ainda que o estudo sobre problemas sociais seja algo antigo, apenas recentemente eles se tornaram de forma efetiva um tema relevante na literatura sobre negócios e gestão empresarial. Nas últimas três décadas houve aumento significativo na quantidade de trabalhos voltados a relação entre empresas e sociedade; abundam idéias e debates sobre o papel social cabido às organizações economicamente ativas, considerando os impactos que suas operações geram à sociedade, tais como danos ao meio ambiente, tratamento impróprio a trabalhadores, consumo irresponsável, entre outras questões importantes que se colocam sob o que se chama na América de Social Issues in Management (ver a definição desta Divisão na Academy of Management). Em um artigo no início da década de 1990, Thompson e Smith (1991) já chamavam a atenção para o fato de que mesmo havendo crescente quantidade e interesse por estudos sobre o impacto da responsabilidade social corporativa na performance de empresas, poucos eram os realizados ou dedicados aos desafios ou dificuldades em PME. Os trabalhos de Longo, Mura e Bonoli (2005), Fuller e Tian (2006), Roberts, Lawson e Nicholls (2006), Spence (2007), Uhlaner, Goor-balk e Masurel (2004) e Williamson, Lynch-Wood e Ramsay (2006) e mais recentemente 2 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 76 >> Avram (2008), Fassin (2008), Mankelow (2008) são exemplos de estudos sobre os desafios e dilemas da RSE nas PME; porém, apenas Perrini (2006), Spence (2007), e Jenkins (2006) utilizaram a Teoria dos Stakeholders como perspectiva teórica de estudo para tratar do assunto. Temos, portanto, que os resultados da pesquisa que aqui expomos intenta ser uma contribuição aos estudos sobre responsabilidade social corporativa em pequenas e médias empresas considerando a influência da ação de stakeholders externos. 2. Método 2.1 O Desenho de Pesquisa Nosso foco de interesse residiu em entender uma situação específica na qual uma empresa se propunha a influenciar e auxiliar outra no processo de assimilação de práticas de gestão socialmente responsáveis. Durante a pesquisa, foi absolutamente relevante considerar que a relação entre as duas empresas não era apenas cliente-fornecedor, mas atentar para o fato de que a empresa cliente exercia um grande poder de influência sobre a fornecedora, sendo de grande porte, reconhecida como uma das maiores de sua indústria. Daí a denominação “empresa âncora”. Tomando as idéias de Porter (1980), podemos afirmar que a âncora detinha forte poder de barganha sobre os fornecedores, ainda mais considerando que estas eram PME. A idéia inicial do Programa Tear residiu em considerar o poder da âncora para influenciar a PME sob o argumento de que a responsabilidade social empresarial impacta positivamente na performance da empresa, uma vez que incrementa condições de competitividade e sustentabilidade. Tínhamos, portanto, as seguintes premissas ao iniciar as análises dos três casos: 1) a gestão orientada por interesses de stakeholders impacta na performance das empresas (FASSIN, 2009; FREEMAN, 1984 e 1994; GREENLEY e FOXALL, 1997; MITCHELL, AGLE e WOOD, 1997); 2) há uma relação positiva entre gestão orientada por interesses de stakeholders, adoção de práticas de gestão socialmente responsáveis e performance competitiva nas organizações (GRIFIN e MAHON, 1997; HARRISON e FREEMAN, 1999; McGUIRE et al. 1988; PUNCHEVA, 2008; SPENCE, COLES e HARRIS, 2001; RUF et al, 2001; WADDOCK e GRAVES, 1997; WOOD, 1991); 3) a responsabilidade social empresarial não está restrita a empresas grandes, que detem recursos suficientes para influenciar o ambiente e impor regras para a realização dos negócios de acordo com princípios da RSE. As PME também podem assimilar a RSE e usufruir de impactos positivos em termos de competitividade e sustentabilidade (AVRAM e KÜHNE, 2008; FULLER e TIAN, 2006; JENKINS, 2009; LONGO, MURA e BONOLI , 2004; MANKELOW, 2008; ROBERTS et al. 2006; SPENCE 2007; WILLIAMSON, LYNCH_WOOD e RAMSAY,. 2006); 4) os Indicadores de Responsabilidade Social do Instituto Ethos constituem fonte suficiente e legítima para acompanhar a performance da empresa em termos de responsabilidade social corporativa. O papel da âncora era viabilizar o conhecimento servir como ente facilitador para que a PME adotasse as práticas seguindo as orientações do Instituto Ethos (INSTITUTO ETHOS, 2007). Considerando o interesse por entender mais profundamente como uma empresa influencia seus fornecedores a assimilarem práticas de gestão socialmente responsáveis, a opção pelo estudo de caso qualitativo nos pareceu pertinente. Godoy (2006) apóia-se em Stake (1988 e 2000) e em 3 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 77 >> Merriam (1988 e 1998) para explicar que quando falamos de estudo de caso qualitativo estamos nos referindo à escolha de um determinado objeto e realizando uma descrição holística e intensiva de um fenômeno bem delimitado. Pode ser uma pessoa, um programa, uma empresa ou um grupo de pessoas que compartilham o mesmo ambiente de trabalho. Merriam (1988) acentua que a escolha pelo estudo de caso denota que o interesse do pesquisador está mais voltado à compreensão dos processos sociais que ocorrem num determinado contexto do que às relações estabelecidas entre variáveis. É a estratégia de pesquisa adequada para compreender uma situação em profundidade, enfatizando seu significado para os vários envolvidos. Constitui uma estratégia de pesquisa interessante quando se deseja entender um fenômeno social complexo, pois pressupõe um maior nível de detalhamento das relações entre os indivíduos e as organizações, bem como dos intercâmbios que se processam com o meio ambiente nos quais estão inseridos (YIN, 2005). Na mesma linha de raciocínio, Yin (2005) afirma que o estudo de caso é uma estratégia de pesquisa interessante quando as perguntas de pesquisa incluem “como” e “porque”, e “quando o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos” (Yin, 2005, p. 19). O método de estudos de casos múltiplos permite a observação de evidências em diferentes contextos, pela replicação do fenômeno, sem necessariamente se considerar a lógica de amostragem. Yin (2005) propõe cinco componentes para desenvolver um estudo empírico, de forma a construir uma lógica ou conexão entre os dados colhidos, as questões de pesquisa e as conclusões finais, a saber: 1. As questões do estudo: Como as âncoras influenciaram as PME fornecedoras?Como se deu o processo de trabalho entre âncora, PME e Instituto Ethos? Quais os resultados alcançados em termos de adoção de práticas de responsabilidade social corporativa na PME? 2. As proposições: O propósito do estudo é descrever as relações entre Instituto Ethos, empresas âncoras e membros das empresas PME de modo a identificar como se deu o processo de assimilação da RSE e da incorporação dos Indicadores Ethos de Responsabilidade Social. Em termos da gestão das PME,buscamos levantar quais os fatores facilitadores e dificultadores dos trabalho. A priori, supusemos que a âncora favoreceu o processo, as PME assimilaram práticas de RSE, passaram a acompanhá-las com base nos Indicadores Ethos e obtiveram oportunidades de mercado por se alinharem com princípios de responsabilidade empresarial e sustentabilidade. 3. As unidades de análise: O estudo foi feito em multiníveis. Os dados foram coletados tendo atenção às relações entre organizações, entre indivíduos e organizações e entre indivíduos entre si. Adicionalmente, foram analisados dados da performance de cada PME antes e depois da participação no Programa Tear. 4. A lógica que une os dados às proposições: A coleta aconteceu em etapas, a medida que os pesquisadores se familiarizavam com os processos que aconteceram na relação entre âncoras e seus fornecedores. Este procedimento permitiu a identificação de padrões. 5. Os critérios para interpretar as constatações: as interpretações foram realizadas de modo a considerar todas as evidências, tomando o cuidado de apresentar as evidências separadamente de qualquer interpretação e procurar explorar interpretações alternativas. 2.2 Coleta de Dados A fonte primária de dados foram entrevistas, apresentadas no quadro abaixo. Inicialmente, demos atenção a indivíduos que haviam participado diretamente como responsáveis pelo Programa 4 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 78 >> nas empresas âncoras, no Instituto Ethos e nas PME. Com o andamento das investigações, tivemos o cuidado de entrevistar nas PME pessoas que não haviam sido responsáveis diretamente, mas que participaram das ações implantadas pelo Tear em cada PME. Além disso, entrevistamos pessoas chaves para a implantação do Programa como representantes do Instituto Ethos, denominadas “indutoras”, assim como a Coordenadora do Programa Tear e o Presidente do Instituto. EMPRESA Arcellor Mittal Bugue Reciclagem Leili Eletrofrigeração Camargo Corrêa Metax Roca Vale Degraus Unidata Automação Instituto Ethos ENTREVISTADOS (cargo ou posição na hierarquia) Analista de Recursos Humanos, responsável pelo desenvolvimento do Programa Tear Gerente Administrativo Coordenadora da Qualidade Auxiliar administrativo Analista de Desenvolvimento Organizacional Coordenadora do Sistema de Gestão da Qualidade Gerente Comercial Sócio-diretor comercial Engenheiro Civil Supervisor Coordenador da Qualidade Técnica em Segurança do Trabalho Gerente de operações Encarregada de Operações Presidente do Ethos Coordenador do Programa Tear Indutora A (Arcellor e Vale) Indutora B (Camargo Correa) Quadro 1: Relação de entrevistados nas empresas âncoras, PME e Instituto Ethos Além das entrevistas, houve ampla coleta documentos, incluindo: a) Metodologia Tear de Trabalho em Cadeia de Valor: publicação do Instituto Ethos corealizada com o fundo multilateral de investimentos (FUMIN) do BID, distribuída gratuitamente a todos os associados. b) Relatórios de gestão das empresas âncoras e das PME: documentos disponíveis nos websites de cada empresa ou no Instituto Ethos. Nestes, pudemos obter o Balanço Social e os enunciados sobre visão, missão, princípios e valores corporativos, análise SWOT e análise dos stakeholders. c) Linha de Base: documento desenvolvido pelo Instituto Ethos para garantir a consolidação do Programa Tear. Uma vez que este documento não é público, solicitamos às PME que permitissem acesso a seus respectivos documentos. Referem-se à análise de sustentabilidade do negócio, diagnósticos, planos de ação em relação aos níveis de responsabilidade social aplicada na empresa e resultados econômicos obtidos a partir do Programa Tear. Além disso, cada PME podia desenvolver uma avaliação dos impactos do Programa em relação a sua cadeia de valor. É importante destacar que este documento também contempla itens presentes no Relatório de Gestão, quais sejam visão, missão, valores; porém, aqui cada PME deve elaborar uma análise sobre alinhamento destes pontos com os princípios de sustentabilidade e responsabilidade social. Finalmente, é neste documento que cada PME escolheu indicadores relevantes entre os 5 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 79 >> Indicadores Ethos de Responsabilidade Social e os Indicadores Ethos/SEBRAE de responsabilidade social. Desta maneira, os relatórios Linha de Base constituem peça chave para que cada PME priorize um conjunto de indicadores, defina ações para implantá-los e as acompanhe. Adicionalmente, um dos autores participou como convidado em vários encontros de trabalho e esteve presente em discussões plenárias e eventos promovidos pelo Instituto Ethos e por empresas âncoras. 3.3 Análise dos Dados A análise dos dados foi elaborada em quatro fases, inspirados por Maguire, Hardy e Lawrence (2004). Na primeira fase, elaboramos uma narrativa geral que nos permitiu vislumbrar como se deu a relação entre as organizações envolvidas no Projeto Tear e quais foram os procedimentos, eventos e fatos relevantes ao longo do processo de assimilação de práticas de RSE nas PME. Inicialmente, as ações e os processos do período 2005-2008 foram reportados como positivos e frutíferos, principalmente pelos entrevistados que participaram diretamente dos encontros e plenárias. Ficou claro que, para fugir do discurso oficial padrão, seria necessária investigação bem mais profunda. Outros pontos importantes tinham que ser levantados, por exemplo: quais as dificuldades encontradas pelas PME para adotarem práticas de RSE? Evidentemente, não rejeitariam um convite para participar de um Programa ligado a seu principal cliente e ao Instituto Ethos; interessava-nos, porém, descobrir quais os desafios, problemas e como se deu a relação com a âncora e o processo de assimilação da RSE em seu modo de gestão. Passamos, então, à segunda fase de análise, muitas vezes recorrendo a novas coletas ou validação dos dados já levantados em entrevistas e documentos. Procedemos a uma avaliação de quais indicadores foram escolhidos por cada PME e como efetivamente traduziram cada um em ações. Destacamos nesta fase os resultados em termos de “antes do Tear” e “depois do Tear”. Vale ressaltar que além das ações de RSE, acompanhamos resultados que nos permitissem discutir questões relacionadas a oportunidades de mercado e competitividade, posto que estes haviam sido argumentos relevantes utilizados pelas âncoras para incentivar as PME a participarem do Programa. Na terceira fase, identificamos os principais pontos em comum que emergiram das análises dos casos e que se referiam a como as PME lidaram com a participação no Tear, a assimilação de práticas de RSE e a natureza da relação com a âncora e com o Instituto Ethos. Nesta fase, elegemos categorias para explicar em grandes linhas as evidências de resultados na gestão das PME após a participação no Tear. Por fim, na quarta fase de análise tratamos diretamente das perguntas de pesquisa em relação às categorias que emergiram das outras três fases. 3. O Programa Tear O Programa Tear - Tecendo Redes Sustentáveis, buscou aumentar a competitividade e sustentabilidade de pequenas e médias empresas por meio da adoção de medidas de responsabilidade social e empresarial. Aconteceu como resultado de uma parceria do Instituto Ethos com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Do orçamento de R$ 2,6 milhões, metade foi viabilizada por recursos do Fundo Multilateral de Investimento (FUMIN) do BID. A outra metade, pelo Instituto Ethos e pelas empresas âncoras participantes. No total, houve nove empresas 6 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 80 >> de grande porte, ou âncoras, e cento e oito pequenas e médias empresas participantes, com atuação em sete setores da economia: açúcar e álcool, construção civil, energia elétrica, mineração, petróleo e gás, siderurgia e varejo. As âncoras foram escolhidas entre os membros do Instituto Ethos, com participação do BID, entre empresas com experiências avançadas em gestão socialmente responsável, atentando para escolher uma âncora por setor. Cada âncora participante selecionou em torno de quinze pequenas e médias empresas integrantes de sua cadeia de valor, fornecedoras ou clientes, com as quais assumiu o compromisso de ajudar a incorporar princípios de RSE nos respectivos processos internos, bem como no relacionamento com as partes interessadas das suas respectivas cadeias de valor. Considerou-se como PME empresas com faturamento até US$ 5 milhões por ano e escolheu-se organizações consideradas estratégicas para a empresa âncora, detentoras de tecnologia singular , potencial exportadora ou servir como multiplicadora das ações (INSTITUTO ETHOS, 2007). Para fins deste artigo, selecionamos apenas casos nos quais a âncora estava lidando com fornecedores. O quadro 2 apresenta a estrutura dos três casos compostos por um total de nove empresas, mais o Instituto Ethos. A escolha de empresas de variados tipos de negócios em âncoras diferentes justifica-se no fato de obter uma melhor exploração da disseminação da metodologia do Programa Tear, assim como da comparação dos impactos gerados pelos resultados de ações socialmente responsáveis. Estudo de Caso Empresa Âncora Caso 1 ArcelorMittal Caso 2 Camargo Corrêa Caso 3 Vale PME Forne cedoras Leili Refrigeração Bugue Reciclagem Andaimes Metax Roca Engenharia Degraus Engenharia Unidata Automação Quadro 2: Composição do Estudo de Caso Múltiplo Fonte: Autoria Própria. A metodologia do Programa Tear definiu que cada PME deveria aplicar os Indicadores Ethos e efetuar uma análise qualitativa das práticas de RSE (METODOLOGIA TEAR, 2007). Dado que é extensa a lista de indicadores propostos pelo Instituto Ethos, admitiu-se que cada PME priorizasse temas, elegesse indicadores e estabelecesse um conjunto de ações de maneira a contemplar todos os seus stakeholders, levando em conta fatores críticos do negócio. 3.1 Caso 1 A Arcelor Mittal Aços Longos é um braço da Arcellor Mittal, empresa com sede em Luxemburgo, uma das 50 maiores produtoras de aço no mundo. As PME escolhidas como objeto de estudo foram Leili Refrigeração e Bugue Reciclagem. Seguindo a metodologia do Programa Tear, a Bugue Reciclagem elaborou 33 ações relacionadas a RSE e sustentabilidade e destas implantou 21, no período 2005-2008. Os temas priorizados estavam relacionados a compromissos éticos, compromisso com o desenvolvimento profissional e empregabilidade, educação e conscientização ambiental, seleção e avaliação de 7 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 81 >> fornecedores, compromisso com o desenvolvimento infantil e construção da cidadania. No triênio 2005/ 2007, o faturamento da empresa cresceu em média 17% a.a. A Leilli Refrigeração, a partir do mesmo modelo de diagnóstico, elaborou 44 ações relacionadas a RSE e implantou 38. Os temas priorizados foram: cuidados com saúde, segurança e condições de trabalho, compromisso com o desenvolvimento profissional e empregabilidade, educação e conscientização ambiental, apoio ao desenvolvimento de fornecedores, relações com organizações locais e gestão participativa. No triênio 2005/2007 o faturamento cresceu em média 10% a.a. 3.2 Caso 2 O Grupo Camargo Corrêa atua em 20 países e emprega em torno de 57 mil pessoas. Desenvolve trabalhos nas áreas de engenharia e construção, cimento, calçados, têxteis e siderurgia, concessões e meio ambiente. Na Divisão Engenharia e Construção aconteceu uma das principais iniciativas no campo da sustentabilidade: o desenvolvimento de fornecedores. Mobilizou 20 pequenas empresas fornecedoras entre as quais Andaimes Metax Equipamentos Ltda e Roca Fundações. A Andaimes Metax Equipamentos Ltda tem como principais atividades a fabricação, comercialização e locação de andaimes, elevadores, escoramentos e soluções em acesso e transporte vertical. A partir de um diagnóstico proposto pelo Programa, a Metax elaborou 17 ações relacionadas a RSE e sustentabilidade e destas implantou 9, as quais foram priorizadas em itens relacionados a: compromissos éticos, balanço social, cuidados com saúde, segurança e condições de trabalho, critérios de contratação, compromisso com o desenvolvimento profissional, acesso à informação, comprometimento da empresa com a melhoria, critérios de seleção e avaliação de fornecedores, ações de ouvidoria com consumidores e clientes. No triênio 2005/ 2007, o faturamento cresceu em média 20% a.a A Roca Fundações presta serviços no setor de fundações em todo o Brasil e no exterior. A partir do mesmo modelo de diagnóstico elaborou 21 ações relacionadas a RSE e implantou 20, nos seguintes temas: balanço social, cuidados com saúde, segurança e condições de trabalho, benefícios trabalhistas, desenvolvimento profissional, acesso à informação, gerenciamento de impactos sobre o meio ambiente, compromisso com melhorias, educação e conscientização ambiental, satisfação dos clientes e política de comunicação comercial. No triênio 2005/ 2007, seu faturamento cresceu em média 25%. 3.3 Caso 3 A Vale, maior empresa brasileira do ramo de mineração, é empresa privada de capital aberto e possui mais de 100 mil empregados, entre próprios e terceirizados. Nas diversas regiões em que atua, é incentivado o desenvolvimento de parceiros locais por meio de programas de desenvolvimento de fornecedores. Dentre as 15 empresas fornecedoras, participantes do Tear, encontram-se a Degraus Engenharia e a Unidata Automação. A Degraus Engenharia e Construções Ltda,, fundada em 1993, atua no ramo de construção civil. A partir de um diagnóstico proposto pelo Programa, a Degraus elaborou 21 ações relacionadas a RSE e sustentabilidade e destas implantou 17, escolhidas entre os temas: compromissos éticos, cuidados com saúde, segurança e condições de trabalho, educação e conscientização ambiental, gerenciamento dos impactos sobre o meio ambiente, governança corporativa, balanço social, gestão 8 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 82 >> participativa, política de remuneração e carreira, relações com organizações locais e governança corporativa. No triênio 2005/ 2007, o faturamento cresceu em média 91% a.a. A Unidata Automação Ltda, fundada em 1989, atua na área de gerenciamento de combustíveis, com ênfase em sistemas de controle automatizados de estoques e de abastecimento de equipamentos e veículos, além de disponibilizar serviços de operação por meio de equipe de supervisores, técnicos de segurança e operadores dedicados aos serviços nos postos de abastecimento dos clientes. A partir do mesmo modelo de diagnóstico elaborou 10 ações relacionadas a RSE e implantou 8, escolhidas entre indicadores relacionados aos seguintes temas: balanço social, critérios de seleção e avaliação de fornecedores, satisfação de clientes, valorização da diversidade, práticas antiproprina e gerenciamento dos impactos sobre o meio ambiente. No triênio 2005/ 2007, o faturamento cresceu em média 30% a.a. Ainda que todas as PME hajam reportado resultados econômicos financeiros positivos e crescentes, nosso método não é adequado para correlacionar tal fato à participação no Programa Tear e conseqüente, a implantação de ações de RSE e sustentabilidade. Assim sendo, partimos para o cruzamento de informações entre os dados obtidos nas entrevistas, nos documentos e nas observações. Evidentemente, encontramos muitos pontos de contradição, o que nos impele a continuar a pesquisa, aprofundar as análises e depurar o método. Apresentaremos os resultados preliminares que angariamos no tratamento dos dados de acordo com as quatro fases que expusemos na metodologia. Tomamos as perguntas de pesquisa como tecer as análises. 4. Resultados Como as âncoras influenciaram as PME fornecedoras? As empresas âncoras financiaram e organizaram toda infraestrutura para as reuniões e eventos, tanto as plenárias – com participação das nove âncoras e todas as PME – quanto aquelas nas quais só participavam PME de uma mesma âncora. Não havia nenhum custo para PME participar e conhecer a metodologia de gestão, com promessa de redução de custos e aumento das oportunidades de mercado, por meio da adoção de RSE. Os representantes das PME reportaram que a possibilidade de estreitar laços com a âncora foi importante fator motivador da participação no Programa, trazendo a âncora “para dentro da empresa”. Ser reconhecido como um fornecedor que incorpora práticas de gestão socialmente responsáveis traz proximidade, conhecimento e destaque para cada PME em sua cadeia de valor. As âncoras promoveram a formação de redes entre seus fornecedores e deram grande impulso para que empresas pequenas, familiares, com processos de gestão pouco estruturados participassem efetivamente de um movimento de assimilação de formas de gestão comprometidas com resultados, com métricas de avaliação e acompanhamento específicas. Como se deu o processo de trabalho entre âncora, PME e Instituto Ethos? Passar a ser reconhecida como uma empresa que trabalha de acordo com os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social e Sustentabilidade implicou não só na participação nos eventos e reuniões, mas também em visitas e horas de atividade de consultoria de técnicos (denominadas indutores) do Instituto Ethos a cada um dos fornecedores. Após priorizar um conjunto de Indicadores Ethos, cada PME estabeleceu um conjunto de ações que foram acompanhados durante a implantação. Uma tentativa de resumir o perfil de ações apresentadas nos levou à elaboração da seguinte lista: 9 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 83 >> ¾ Realização de palestras e eventos com ênfase em questões sociais e de sustentabilidade; ¾ Elaboração de Códigos de Conduta Ética para orientar relacionamentos com e entre stakeholders; ¾ Divulgação a colaboradores internos e externos de informações econômicas e financeiras da empresa; ¾ Treinamento e capacitação de empregados sobre questões relacionadas à segurança no trabalho, práticas de cidadania, saúde e qualidade de vida, trabalho em equipe entre outros temas; ¾ Elaboração de material de informação aos clientes sobre características e riscos do produto. Quais os resultados alcançados em termos de adoção de práticas de responsabilidade social corporativa na PME? Conquanto haja evidência de que as PME aumentaram o faturamento, não se pode creditar tal fato a nenhuma ação ou evento específico relacionado ao Tear. Não há menção de que houve mudanças no relacionamento comercial com as âncoras, ainda que ocorressem iniciativas de comunicação e troca de experiências. Também não há referência a desenvolvimento de novos produtos por parte das PME, nem surgimento de novas oportunidades de mercado ou incremento efetivo na capacidade competitiva, relatado com fato ilustrativo. Mesmo assim, todos os entrevistados representantes das PME reportaram que a participação no Programa implicou em melhoria e intensificação dos relacionamentos com stakeholders, tanto internos quanto externos. Há, sobretudo, ênfase nos impactos na relação com os colaboradores, funcionários ou terceirizados, por meio de ações envolvendo eventos, aulas, coleta seletiva de lixo, reaproveitamento de papel para impressão, incentivos a realização de cursos e complementação da instrução formal, combate ao uso de álcool de drogas, patrocínio a atividades na comunidade circunvizinha, doações a hospitais, creches e escolas públicas, patrocínio de atividades esportivas e de lazer nas cidades ou bairros próximos a cada PME. Na avaliação da contribuição do Tear para o negócio, retirada dos Relatórios Linha de Base, a única resposta positiva unânime que encontramos entre as PME estudadas foi “Aprimorar processos produtivos ou de gestão”, como se pode ver no quadro 3. Atribuímos tal resposta aos relatos de iniciativas como a da Degraus que... ...”introduziu técnicas e ferramentas de gerenciamento de obras, com metas de redução do entulho e nas construções de moradias, os apartamentos estão equipados com medidores individuais do consumo de água, de modo a possibilitar que cada morador controle e reduza seus gastos com água1”... ...ou como a Leili Refrigerações que... “elaborou uma Declaração dos Riscos que os clientes estão expostos ao adquirir nossos produtos. Apresentamos este trabalho em várias capitais do Brasil para grupos de clientes e fornecedores da Arcellor Mittal, dando clara demonstração de transparência nas relações comerciais e alinhamento com o Código de Defesa do Consumidor2”... ...como a Roca Fundações que... “ inovou com a modernização de equipamentos de segurança na aquisição de compressores que não oferecem vazamento de óleo, além das melhorias da qualidade do ar nas câmaras de trabalho. Houve também melhoris no escritório, como acesso a 10 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 84 >> internet para todos e melhorias nos alojamentos, como novos beliches, televisores e refrigeradores e apoio jurídico gratuito a todos os funcionários3” A Metax não reportou nenhuma melhoria diretamente ligada aos processos produtivos ou de gestão, apontando resultados da participação no Tear como promoção de treinamentos, cursos de graduação e pós-graduação em áreas específicas para os empregados. Ações foram desenvolvidas em relação ao meio ambiente, entre as quais a criação de um grupo de 13 multiplicadores estratégicos que lideraram o “Programa de Educação Ambiental”, sensibilizando colaboradores e familiares para o tema. Este mesmo grupo desenvolveu um plano de melhorias na fábrica, conscientização de todos e implantação de coleta seletiva e Programa 5S. A Unidata também não mencionou qualquer questão diretamente relacionada ao negócio, concentrando-se em relatar com detalhes a participação em projetos sociais e ambientais como campanhas de alimentos na região de Juvenília, no Vale do Jequitinhonha, MG, além de estímulos a voluntariado empresarial e coleta seletiva de lixo. Contribuição do Tear para o Negócio Desenvolver novos produtos/serviços com caracterísicas de responsabilidade social empresarial Aprimorar processos produtivos ou de gestão Ter acesso a novos mercados Conquistar novos clientes Benefícios pe rcebidos pela empresa na sua cadeia de valor Bugue Leili Metax Roca Degraus Unidata Não Sim Não Não Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Sim Não Não Sim Sim Não Não Não Não Não Não Não Não Melhor diálogo ou resolução de conflitos Sim Sim Não Sim Sim Sim Melhores negociações de vendas Maior compromisso com prazos Não Não Sim Sim Não Sim Não Não Não Não Não Não Maior compromisso com qualidade Ampliação do volume de negócios Não Não Sim Sim Sim Não Sim Não Não Não Sim Não Diminuição de riscos e problemas Não Sim Sim Sim Não Sim Quadro 3. Fonte: Relatório Linha de Base, 2008 (fornecido pelas empresas) 5. Discussão Os resultados dos três estudos de caso do tipo qualitativo (GODOY, 2006) retirados do Programa Tear são, agora, discutidos à luz das premissas que tomamos ao iniciar o projeto de pesquisa. As PME aderiram ao Programa por considerar RSE tema importante e legítimo, mas não há como negar que a adesão foi tremendamente influenciada pelo poder da empresa âncora e do Instituto Ethos (MITCHELL, AGLE e WOOD, 1997) como stakeholders com interesses, com recursos e posição suficientemente fortes para mobilizá-las. A participação trouxe impactos na relação com a âncora, em termos de comunicação e trocas de experiência. Não há evidências de impactos em questões comerciais ou diretamente relacionadas aos negócios entre âncoras e PME. Os dados coletados apresentam melhorias (termo que aparece freqüentemente nas entrevistas) nas relações com funcionários e com empresas clientes. Os estudos de caso realizados nos fazem 11 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 85 >> concluir que a gestão orientada por interesses das empresas âncoras como stakeholders impactaram na performance das empresas em ações voltadas ao relacionamento, informação e educação sócioambiental dos colaboradores e familiares. Houve, também, mudanças nos processos produtivos, mas não há relatos ou evidências suficientes para afirmar que houve impactos na performance em termos econômicos dos negócios. Não houve dados suficientes para evidências de que a adoção de práticas de gestão socialmente responsáveis gerou resultados em termos de performance competitiva nas PME A responsabilidade social empresarial não está restrita a empresas grandes, que detém recursos suficientes para influenciar o ambiente e impor regras para a realização dos negócios de acordo com princípios da RSE. As PME também podem assimilar a RSE, porém fizeram-na em itens não diretamente relacionados ao modelo de negócio. As ações ainda estão no nível da conscientização das pessoas ou em adotar práticas e comportamentos voltados à cidadania, como coleta seletiva de lixo e promoção de atividades filantrópicas e/ou de apoio a comunidades carentes próximas a cada PME. Ainda estão longe de usufruir de impactos positivos em termos de competitividade e sustentabilidade. Os Indicadores Ethos de Responsabilidade Social são aceitos como métrica legítima para processos de desenvolvimento e assimilação de RSE e sustentabilidade nas empresas em geral, independentemente do porte. Não há discussão sobre a pertinência dos indicadores em função do tamanho da empresa. 6. Conclusão Does Virtue Pay? David Vogel coloca tal questão no prefácio de sua obra The Market for Virtue, originalmente publicado em 2005, com segunda edição já em 2006. O autor afirma que apesar da RSE prover benefícios a empresas em algumas áreas – como proteção a sua reputação e apoio à atração, motivação e retenção de pessoal de alta qualidade – tais benefícios são freqüentemente elusive e raramente afetam a performance financeira da empresa . Os resultados dos estudos de casos qualitativos que realizamos com empresas participantes do Programa Tear indicam que a adoção de práticas de RSE não implicam abertamente em resultados positivos em termos de incremento em performance e oportunidades de mercado. A opção por assimilar a RSE está relacionada a mudanças no comportamento de indivíduos, seja isoladamente, seja na vida organizacional. Por meio do Programa, as empresas inserem-se em redes e disseminam idéias e práticas, com alguns reflexos nos processos produtivos e de gestão. A RSE mobiliza pessoas, recursos e ações, mas ainda há muito a e estudar para concluir que há impactos na performance e nas oportunidades de mercado. Principalmente, ao considerarmos os desafios para as PME. 7. Referencias Bibliográficas AVRAM, D. e KÜHNE, S., Implementing Responsible Business Behavior from a Strategic Management Perspective: Developing a Framework for Austrian SMEs. Journal of Business Ethics, v. 82, n. 2, p. 463-475, 2008. BANDEIRA-DE-MELO, R., ALBERTON, A., MARCON, R., GRZEBIELUCKAS, C., KRÜGER, E., Explorin Stakeholder ‘ Contracting’ Effects on Firm Performance. Anais do EnANPAD, 2006. DONALSON, T; PRESTON, L. E. The stakeholder theory of corporation: concepts, evidence and implications. Academy of Management Review, v. 20, n. 1, p. 65-91, Jan. 1995 12 Arnaldo A. Rezende e Luciel H. de Oliveira << 86 >> FASSIN, Y., SMEs and the fallacy of formalising CSR. Business Ethics, v. 17, n.4, p. 364 – 378, 2008. ___________, The Stakeholder Model Refined. Journal of Business Ethics, Jan2009, v. 84, n.1, p.113-135, 2009. FREEMAN, R. E., Strategic management: A stakeholder approach. Editora Pitman, Boston, MA, EUA,1984. 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