Jovens, Juventudes: teorias e debates

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Jovens, Juventudes: teorias e debates
Jovens, Juventudes: teorias e debates.
Profa. Regina Novaes
Antropóloga
Pesquisadora do Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq/Brasil)
Sentimentos, práticas e representações sociais sobre a juventude circulam por toda
sociedade: são (re) produzidas na família, no mercado, nos meios de comunicação, em
diferentes setores governamentais, em movimentos sociais ligados a diferentes interesses e
causas. Tudo isto pode ser pensado como parte de um “campo da juventude” como objeto
de pesquisa e reflexão.
Contudo, o conceito de “campo”, nos termos propostos por Pierre Bourdieu (1980), implica
em delimitar espaços de relações sociais (posições e oposições) que podem ser apreendidos
sincronicamente. Campos são espaços que funcionam por meio de propriedades gerais
(mecanismos invariantes em diferentes campos) e propriedades específicas (mecanismos
particulares a cada campo). Em cada campo se produz a crença no “valor” do que está
sendo disputado. Os campos se formam a partir do reconhecimento de um objeto de disputa
e da existência de pessoas dispostas a disputar o jogo. O que pressupõe um acordo
implícito – entre aliados e entre antagonistas – sobre o que merece ser disputado. Desta
maneira, só participa de um campo quem se auto-inclui nele a partir de determinadas regras
que estabelecem o jogo. Nesta perspectiva sistêmica, é preciso delimitar e definir o que
estamos entendendo por “campo da juventude”.
Uma das possibilidades para circunscrever e compreender a configuração de espaço de
relações sociais, em torno deste segmento populacional, é tomar como objeto o “campo das
políticas públicas de juventude” cuja história, em termos cronológicos, começa a partir dos
meados dos anos de 1980, início dos anos de 1990.
Com efeito, a “invenção” da juventude como particular “sujeito de direitos” - que para si
demanda políticas públicas - só emergiu no momento em que a “exclusão de jovens”
tornou-se parte integrante da questão social. Em termos mundiais, vivia-se então o ápice da
nova divisão internacional do trabalho; aprofundava-se a globalização dos mercados; a
desterritorialização dos processos produtivos, de flexibilização das relações de trabalho e de
transformações tecnológicas. Nos países da América Latina, buscava-se “sair da crise” e
superar a pobreza por meio de enxugamento do Estado e das chamadas políticas
compensatórias.
Tais
mudanças
econômicas,
tecnológicas
e
culturais
afetaram
particularmente a juventude. Foi nesta época que o déficit educacional, o desemprego, a
violência e letalidade juvenil; uso de drogas, gravidez na adolescência, as doenças
sexualmente transmissíveis, como a AIDs, foram socialmente anunciados como “problemas
da juventude”.
De maneira geral, as demandas em relação à inclusão social de jovens foram publicamente
apresentadas por diferentes atores políticos e sociais, direta ou indiretamente, interessados
no tema. Por um lado, envolveram organismos internacionais; gestores e políticos
nacionais, organizações não governamentais, fundações empresariais, setores de Igrejas.
Por outro lado, envolveram também um conjunto de grupos, redes e movimentos juvenis
que se agregavam em torno de atividades religiosas, políticas e culturais. Ou seja, em um
processo de mão dupla (dos governos para a sociedade e da sociedade para os governos),
diferentes atores tomaram para si a iniciativa de anunciar publicamente a existência de
“problemas de juventude”, transformá-los em demandas para as quais buscaram respostas
em termos de políticas públicas.
Hoje as expressões “Jovens como sujeito de direitos” e “políticas públicas de juventude”
pontuam a retórica daqueles que se reconhecem como parte deste campo. Compreendidas e
apropriadas de maneiras diferenciadas, estas expressões funcionam como uma espécie de
“senha” por meio da qual diferentes atores e instituições sociais legitimam as disputas por
recursos materiais e simbólicos para responder “as demandas da juventude”.
Por sua vez, as “demandas da juventude” revelam uma particular conjugação entre dívidas
históricas e novos problemas sociais. Quais seriam estas demandas no que diz respeito à
distribuição de bens e acessos, ao reconhecimento dos jovens como “sujeitos de direitos”e
às suas possibilidades de participação social? Que tipo de políticas (Programas e Ações)
estas demandas suscitam: políticas estruturais com objetivos universais, políticas que
sejam atrativas para os jovens; políticas específicas voltadas apenas para segmentos juvenis
em situações de vulnerabilidade social? Estes pontos geram muitas controvérsias. Em uma
tentativa classificatória poderíamos afirmar o seguinte:
•
As principais demandas de distribuição - ligadas ao direito e ao acesso à educação,
trabalho, saúde, segurança e cultura - revelam dívidas sociais acumuladas. Porém,
ao mesmo tempo, trata-se de produzir novas respostas que levem em conta as
mudanças (que atingem particularmente os jovens de hoje) para as quais não são
suficientes as clássicas políticas setoriais.
•
As demandas por reconhecimento dizem respeito às especificidades da atual
condição juvenil e à sua intrínseca diversidade. Evocam tanto políticas estruturais
quanto emergenciais que deveriam ser (re) desenhadas contemplando as
necessidades
e
aspirações
específicas
de
diferentes
segmentos
juvenis
vulnerabilizados (por ser jovem, pobre, ser negro, ser mulher, ser homossexual,
favelado, etc....)
•
As demandas de participação podem ser vistas de dois ângulos. Em primeiro
ângulo como um meio, isto é canal imprescindível para levar demandas de
distribuição e de reconhecimento ao espaço público democrático. Em um segundo
ângulo,
dizem respeito especificamente aos espaços das Políticas Públicas de
Juventude no qual a participação torna-se ela mesma uma demanda (na medida que
remete às decisões sobre desenho, validação, acompanhamento e avaliação de
Programas e Ações voltados para seu segmento populacional).
Tal classificação pode ajudar a sistematizar as demandas juvenis mas, certamente, não
elimina suas interdependências e convivências em zonas intermediárias e híbridas.
Sombreamentos estão sempre a alimentar o debate entre aqueles - jovens e adultos - que se
reconhecem como parte do campo das políticas públicas de juventude. Recoloca-se neste
ângulo tanto o debate clássico sobre “políticas para, com ou de Juventude”, quanto à
questão da convivência entre jovens e adultos nos espaços institucionais (Secretarias,
Coordenações, Vice- Ministério, Conselhos, etc...).
Por fim, a questão das demandas e das políticas remete aos sujeitos e às suas identidades.
Neste cenário, os jovens convivem e constróem múltiplas (e flexíveis) identidades. Por isto
mesmo, a caracterização da transitoriedade juvenil e a identificação de múltiplas trajetórias
de emancipação tornam-se essenciais para compreender bandeiras, protagonistas,
opositores, aliados e as (di) visões
juventude.
no interior do campo das políticas públicas de
Objetivo
O objetivo deste módulo é oferecer um panorama geral das teorias e dos debates atuais em
torno da categoria Juventude enfatizando, particularmente, as noções e os argumentos que
se fazem presentes no debate sobre demandas juvenis e políticas públicas de juventude.
Tópicos:
1- Juventude: apenas uma palavra ou é mais que uma palavra?
2- Memória, história e projetos nacionais: o legado das juventudes latino americanas.
3- Novas juventudes entram em cena: os movimentos culturais em tempos de desemprego e
violências.
4- Reflexão sobre a história e as características das “institucionalidades” de juventude na
América do Sul.
5- Direitos de cidadania e direitos humanos: confluências para os direitos da juventude.
Metodologia
Aulas expositivas; apresentação de material áudio-visual com perguntas desencadeadoras
de debates; apresentações dos alunos.
Avaliação Trabalho escrito (entre 10-15 páginas):
Escolha um dos temas abaixo identificando pontos polêmicos.
Tema 1: “Juventude como sujeito de direitos”: alcance e limites desta proposição.
Tema 2: Juventude Uruguaia: Existem demandas que justificam políticas públicas de
Juventude?
Tema 3: Qual é o lugar da “participação” nos espaços institucionais de juventude?
Tema 4: Convención Iberoamericana de Derechos de la Juventud (OIJ): uma reflexão.
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