o Código Cultural

Transcrição

o Código Cultural
Nº 24 - Novembro 2012
E!ção de 1º Aniversá"o
“O que fazemos
não é pesquisa
ou estudo de
mercado
tradicionais. O
que fazemos é
diferente e se
chama
Descoberta: nós
descobrimos
algo que se
encontra ali, mas
que não
podemos
enxergar e que é
inconsciente.”
Dr. Clotaire Rapaille
Dr. Clotaire Rapaille
Fundador e CEO da Archetype Discoveries Worldwide
Entrevistado por Fernando Luzio
O vídeo e
áudio desta
entrevista estão
disponíveis em nosso
site: www.luzio.com.br
1
Para celebrar o primeiro
aniversário do nosso Programa,
fomos a Nova Iorque especialmente para entrevistar Dr.
Rapaille, fundador, CEO e
chairman da Archetype Discoveries Worldwide.
Tivemos a oportunidade de
trabalhar com Dr. Rapaille por
dois anos quebrando códigos
estratégicos para empresas nos
Estados Unidos e no Brasil.
Estamos também celebrando
a assinatura de um novo contrato que tornou a Luzio Strategy
Consulting representante da
Archetype Discoveries Worldwide no Brasil.
Dr. (Gilbert) Clotaire Rapaille
é conhecido internacionalmente
como um expert em Arquétipos
Culturais, Criatividade e Inovação. Em 1976, fundou a Archetype Discoveries Worldwide, com
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base em Tuxedo (Nova Iorque) e
com escritórios associados na
Bélgica, China, Turquia, Inglaterra, Paris, México, Itália,
Índia, Coréia do Sul, Sudeste da
Ásia, Rússia e Brasil.
Dr. Rapaille introduziu um
conceito revolucionário no mundo corporativo: o Código Cultural, que provou ser uma metodologia poderosa para mais da
metade das companhias Fortune
500, tais como Boeing, L'Oreal,
General Motors, AT&T, Citibank, Chrysler, Colgate, Fox,
Kraft General Foods.
Sua abordagem singular em
Marketing e Estratégia associa
um estudo profundo do inconsciente humano com questões
práticas do mundo dos negócios.
Considerado um dos autores
mais lidos em Criatividade,
Comunicação e Cultura, Dr.
Rapaille escreveu mais de 14
livros, dentre eles “O Código
Cultural”, que ocupou a 9a
posição no ranking dos mais
vendidos da BusinessWeek, e que
foi traduzido para 12 línguas –
somente na Coréia, “O Código
Cultural” vendeu mais de
250.000 cópias.
Sua técnica e seu trabalho são
uma extensão criativa e inovadora do trabalho de grandes
pensadores do século XX, dentre
eles Jung, na Psicologia Analítica; Laing na Psiquiatria; LéviStrauss e Ruth Benedict na
Antropologia.
Suas viagens ao redor do
mundo e sua pesquisa extensiva
em Marketing sobre arquétipos
de produtos, serviços e marcas
para corporações e governos,
proporcionaram-lhe uma percepção aguçada sobre os
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negócios nas Américas, Europa,
Oriente Médio e Ásia.
Nos últimos 30 anos, Dr. Rapaille
acumulou uma rica base de dados e
desenvolveu um processo poderoso
para entender a pergunta de ouro:
POR QUE as pessoas fazem o que
fazem?
Fernando Luzio. Dr. Rapaille,
muito obrigado por esta oportunidade
única, estamos honrados por entrevistá-lo em sua casa.
Gostaríamos de iniciar nossa
conversa pedindo-lhe que conte uma
breve história de sua vida tão interessante.
Dr. Rapaille. O prazer é meu.
Tudo começou com meu interesse por
crianças autistas e sua dificuldade de
aprender qualquer tipo de língua, e
passei a trabalhar em busca de um
entendimento do processo mental
implicado no aprendizado de qualquer
palavra.
Trabalhei na Suíça com crianças
tentando aprender francês, alemão e
italiano – as três línguas mais faladas
naquele país. E, naquela época, fiz uma
série de pequenas descobertas sobre o
funcionamento do cérebro.
Descobri que toda vez em que
aprendemos uma palavra, há um
momento em que imprimimos pela
primeira vez seu significado – seja café,
amor, trabalho, qualquer coisa. E
quando imprimimos estas palavras,
criamos um sistema mental de referências que continuamos usando para o
resto da vida.
Neste trabalho, compreendi que seja
de origem francesa, suíça, italiana ou
alemã, estas crianças falavam línguas
diferentes, claro, mas ao mesmo tempo,
tudo que experimentavam junto com a
linguagem era diferente, também. De
repente, elas descobriam um mundo
através de uma palavra.
Por exemplo: nas línguas francesa e
alemã, existe uma diferença entre “o
sol” e “a lua”– elementos muito
importantes em qualquer cultura. Na
França, aprende-se que o sol é masculino – le soleil – e le soleil é o Rei Sol Luís
XIV; ele é brilhante e poderoso porque
na cultura francesa os homens devem
ser assim: brilhantes e dominantes. E a
lua é feminina – la lune –, tem um poder
oculto à noite, sobe e desce.
Portanto, quando se é criança,
aprende-se muito mais do que apenas as
palavras “sol” e “lua”; aprende-se todo
um sistema sobre as diferenças entre os
gêneros masculino e feminino. E todas
estas categorias mentais são inconscientes.
Para um alemão, é o oposto: o sol é
feminino – sonne. E qualquer alemão
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Dr. Rapaille introduziu um conceito
revolucionário no mundo
corporativo: o Código Cultural,
que provou ser uma metodologia
poderosa para mais da metade
das companhias Fortune 500.
“O Código Cultural” ocupou
a 9a posição no ranking dos
mais vendidos da
BusinessWeek e foi traduzido
para 12 línguas – somente
na Coréia vendeu mais de
250.000 cópias.
diria “Claro, por que você pergunta, é
óbvio?!”, pois é a mulher que brilha,
que aquece e faz suas crianças crescerem, portanto o sol é feminino. Já a
lua é masculina – mond – porque os
homens alemães estão sempre mergulhados no oculto e nas coisas profundas,
na Filosofia...
Então, naquela época, minha descoberta foi que temos de ter cuidado,
pois a tradução de uma palavra não
significa nada, e se você traduzir “sol”
do francês para o alemão, você perderá
o significado profundo e poderoso por
detrás desta palavra.
E uma consequência banal desta
falta de entendimento é que se eu quiser
vender shampoo na Alemanha e na
França usando o sol como referência,
irei acionar uma resposta completamente diferente em cada cultura, sem
ao menos ter consciência disso.
Portanto, esta é uma questão chave.
Um dia, um dos meus alunos pediu
que seu pai fosse assistir à minha
conferência na Universidade de Genebra. Ele trabalhava para a Nestlé e me
disse “O que você descobriu aqui – o
significado profundo da primeira
impressão de palavras – poderá ser
muito útil para nós, pois queremos
vender café instantâneo no Japão e não
estamos conseguindo mudar o hábito
japonês do chá para o café”, o que
obviamente não era a estratégia correta.
Fizeram-me uma oferta irrecusável,
fui ao Japão e quebrei o Código do café
para os japoneses. Em seguida, a
L’Oreal, associada a Nestlé, iniciou sua
expansão global.
Fui convidado a dar aulas em
diversas escolas de negócio ao redor do
mundo, publiquei vários livros e assim
as coisas foram acontecendo.
Fernando Luzio. Você poderia
explicar o que é Código Cultural?
Dr. Rapaille. Toda cultura préorganiza a maneira como você lida com
os elementos dela. Defino “cultura”
como um kit de sobrevivência herdado
no nascimento, e em determinada
época, deter minado ambiente e
geografia, precisamos deste kit para
sobreviver. Ele é transmitido de uma
geração à outra e, depois de um certo
tempo, nem o questionamos mais.
A primeira vez em que se aprende o
que é café na Itália, por exemplo, é
muito diferente da primeira vez em que
se aprende o que é café nos Estados
Unidos, e é por isso que, nos Estados
Unidos, bebemos litros e litros de café
todo santo dia e sobrevivemos. Mas, se
fosse um café italiano, já estaríamos
mortos ao final do dia. Portanto, há
uma grande diferença entre o significado do café na Itália e na América.
Então, há uma primeira impressão
marcante previamente organizada pela
cultura. E durante este trabalho nos
Estados Unidos, descobrimos que a
primeira impressão profunda para café
não é SABOR e sim AROMA. Isto é
singular para a cultura norte-americana, o cheiro do café é muito forte, e
sua primeira impressão marcante ocorre
aos dois anos de idade, quando a mãe
prepara o café da manhã na cozinha e
provoca emoções do tipo:
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eu vou ser alimentado, ela me ama, estou em casa e protegido – todas estas palavras são poderosas e muito positivas.
Mas, este é o Código Cultural do café para os americanos, não
para os italianos ou alemães.
Como estratégia, decidimos que a Folgers deveria ser
proprietária do aroma e esquecer o sabor. Deixe os
concorrentes lidarem com o sabor porque o Código Cultural
para café nos Estados Unidos é AROMA e tudo deve estar on
code (sintonizado) com ele, ou seja: o design da embalagem
(injetamos o aroma no pacote e quando você o abre, shshsh,
o aroma vem direto em seu rosto) e todos os demais
elementos comerciais devem estar on code com AROMA.
Eu disse a eles que nunca gostaria de ver a marca Folgers
associada a alguém bebendo café – de jeito algum! E eles
ficaram surpresos: “Mas, nós vendemos café” e eu disse
“Não, vocês não vendem café, vocês vendem AROMA.
Deixe os outros venderem o sabor.”.
Assim, defino Código Cultural como um sistema de
referências (como por exemplo mãe, café da manhã, lar,
segurança, etc.) impresso quando somos bem pequenos, por
meio de uma energia emocional associada a ele. O Código
aciona este sistema de referências – o Código do café é
AROMA e AROMA ativa todo o sistema associado a ele.
Fernando Luzio. Você poderia nos dar uma visão geral
do processo da Descoberta do Código e explicar sua
diferença com uma pesquisa de mercado tradicional?
Dr. Rapaille. O que fazemos não é pesquisa ou estudo de
mercado tradicionais. O que fazemos é diferente e se chama
Descoberta: nós descobrimos algo que se encontra ali, mas
que não podemos enxergar e que é inconsciente.
E como fazemos isto? Seguimos o Princípio dos 3
Cérebros: nós temos 3 cérebros. O primeiro é o Córtex; o
segundo é o Límbico; e o terceiro é o Reptiliano – a parte
mais antiga. E minha teoria é que o Reptiliano sempre vence,
não importa o que você faça. Se você tocar o Reptiliano,
boom!
O processo envolve grupos de pessoas que, durante sessões
de 3 horas, são guiadas por nós até o primeiro momento de
suas vidas em que foi profundamente impresso, com a
energia emocional, aquilo que queremos descobrir. Para
alcançarmos isso, devemos eliminar o Córtex durante a
primeira hora, quando deixamos as pessoas falarem. Não nos
importamos com o que é dito porque não acreditamos no
que as pessoas dizem. A primeira hora funciona como uma
lavanderia e, quando termina, todos estão contentes porque
acreditam que deram uma grande contribuição ao trabalho –
mas não há nada relevante e não aprendemos nada de novo
nesta etapa.
A segunda hora é mais emocional e se dá através do
Límbico, onde se encontram nossas contradições e tensões. A
melhor forma de explicar este mundo de tensões é por meio
do meu trabalho ao redor do mundo sobre mães e sua forma
de se relacionarem com seus filhos.
Em qualquer lugar – China, Índia, Itália, França,
Alemanha, Brasil –, as mães me dizem “Quero que meus
filhos cresçam e se tornem independentes”; “Não quero que
eles cresçam e se tornem independentes”; “Ah, eles são tão
bonitinhos quando pequenos...”. Há uma tensão e toda mãe
a sente: ela quer que seus filhos cresçam porque se trata de
um programa, mas ao mesmo tempo não querem que eles
partam.
Quando as empresas me dizem “Queremos que nossos
clientes amem nossos produtos”, pergunto “Por que? Vocês
querem que seus clientes amem seus produtos e nunca os
comprem, ou querem que eles odeiem seus produtos e
sempre os comprem?”. Porque não há nenhuma conexão
imediata entre as duas coisas. O elemento chave que
queremos criar com o Código descoberto é um relaciowww.luzio.com.br
namento intenso, e amor-ódio é algo muito poderoso que cria
relacionamentos longos. Nesta segunda hora, vamos para o
terceiro cérebro. Então as pessoas ficam confusas, não sabem
mais o que estão fazendo ali e isso é bom.
E na terceira hora, elas se deitam no chão e explicamos
que queremos recriar o mesmo estado mental que
experimentamos ao acordarmos pela manhã. Por quê?
Porque logo nos primeiros 5-10 minutos em que acordamos,
nosso Córtex ainda não está lá – normalmente ele se levanta
tarde para o trabalho matutino –, então não há controle,
ainda nos encontramos na conexão entre o Reptiliano e o
Límbico e podemos nos lembrar de nossos sonhos. Mas, se
não os anotarmos ou pensarmos neles imediatamente, 5-10
minutos depois já os perdemos. Portanto, este é o estado
mental singular que queremos recriar na terceira hora.
Depois do relaxamento, ainda deitadas no chão, coisas
surgem na mente das pessoas e elas exclamam “Que incrível,
lembrei de algo esquecido há 30-40 anos!”. Elas anotam suas
primeiras histórias e o documento que temos no final do
processo é manuscrito. Depois, estudamos a estrutura – o
padrão existente em todas estas histórias. Buscamos o
“espaço entre”, digamos assim. Meu professor, Lévi-Strauss,
dizia que a mãe não é a mulher; a mãe é o espaço entre a
mulher e o filho, portanto, sem mãe não há filho, e sem filho
não há mãe. É o “espaço entre” que precisamos entender.
Esta noção de estrutura é muito interessante: a música não
é feita de notas; música é o espaço entre notas. Você pode
tocar diferentes notas com a mão direita ou esquerda, no
piano ou em outros instrumentos, porém a única coisa que
você deve respeitar é o “espaço entre”, e é nisso que consiste
nossas descobertas: qual é o espaço entre os diferentes
elementos daquelas histórias? Qual é o “espaço entre” que
cria o sistema inconsciente de referências, a melodia
inconsciente que as pessoas usam e ativam quando pensam
sobre uma determinada marca, um determinado produto,
uma categoria, um país? E por se tratar de algo inconsciente,
é fundamental seguir todo um processo para revelá-lo, já que
não se pode vê-lo imediatamente.
Algo muito importante desta metodologia é o anonimato. Já
realizei diversas descobertas sobre temas que são verdadeiros
tabus. Meu primeiro trabalho para a P&G (Procter &
Gamble) foi sobre “papel higiênico”. Imagine-se convidado a
participar de um focus group com 20 estranhos para falar
durante duas horas sobre como você usa papel higiênico?!
Não daria para obter muita coisa disso, provavelmente as
pessoas diriam “Quero que ele seja macio e que esteja em
promoção. Muito obrigada. Posso ir embora?”. Mas, quando
realizei este trabalho, graças a todo o processo envolvido, o
que descobrimos foi absolutamente incrível e poderoso, e a
P&G ficou impressionada: “Nunca descobrimos nada igual”
– depois disso, descobrimos mais de 30 Códigos para eles.
Fernando Luzio. Somos fascinados pelos Códigos que
você já quebrou, entretanto, 2 deles são muito provocativos e
inspiradores, tanto para os indivíduos, quanto para as
empresas.
Você poderia compartilhar conosco um pouco de suas
descobertas sobre os Códigos da Beleza e do Luxo?
Dr. Rapaille. Vou compartilhar um pouco mais do que
você poderia encontrar em meus livros porque já realizei
mais trabalhos sobre estes temas.
Beleza é algo muito Reptiliano. Somos programados para
encontrar a Beleza que seja útil ao nosso cérebro Reptiliano –
seja na Música, Arte, Ópera, Pintura e Escultura, sempre
haverá algo ali muito Reptiliano.
Por exemplo: a beleza feminina. Um casal indiano realizou
uma pesquisa sobre o que há de mais belo no formato do
corpo da mulher – toda e qualquer cultura se interessa por
isso! Eles estudaram o corpo da mulher em diferentes culturas
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e séculos, através da cultura propriamente dita e das pinturas dos egípcios,
gregos, romanos, etc..
Espalharam eletrodos pelo corpo de
um grupo de homens e lhes mostraram
algumas imagens de mulheres a fim de
descobrir qual os excitava mais. Estes
homens não precisavam falar nada. Se o
aparelho fizesse o som IHH, significava
que eles estavam excitados; se o som
fosse OHH, significava que não haviam
se excitado.
E com isso, encontraram uma estrutura inconsciente e global, um Código
para a Beleza. Quando o corpo da
mulher é reto, o aparelho faz soar um
OHH, mostrando que ninguém ficou
excitado, como um gatilho, uma
mensagem para o cérebro Reptiliano,
informando que aquele corpo não diz
nada. Mas, se o corpo da mulher tiver a
forma de uma ampulheta, o aparelho
soa um IHH, mostrando que os homens
ficaram excitados. Por quê?
Em primeiro lugar, não somos tão
idiotas assim, já que somos programados a encontrar uma mulher que nos dê
uma chance maior de reproduzir nossos
genes. Quando a mulher tem o corpo
reto, não a desejamos porque isso seria
uma perda de tempo. Mas, quando seu
corpo tem o formato de uma ampulheta, a mensagem é “Uau, ela é a
mulher”.
E eles também descobriram outra
coisa muito interessante: o gatilho é a
relação entre a cintura e o quadril, e
esta relação deve ser de 0,7. Então, se a
razão entre ambos for de 0,7, soará
IHH ao redor do mundo! Impressionante!
E mais: descobriram que mulheres
com 0,7 têm mais filhos, vivem por mais
tempo e têm menos câncer. Novamente,
não somos tão idiotas assim!
Igualmente interessante é que não se
trata de quão gorda a mulher é. Se ela
for bem gorda e tiver 0,7, seu corpo
ainda fará soar o IHH, pois não se trata
da gordura e sim da distribuição da
gordura ou aonde a mulher coloca sua
gordura.
Graças a esta descoberta, podemos
entender a Moda: por que os egípcios
inventaram o espartilho há 5.000 anos?
Porque ele servia para apertar a mulher
e fazer sua cintura ficar menor, até
chegar aos 0,7. E por que os franceses
inventaram aqueles vestidos volumosos?
Novamente, para criar os 0,7.
Então, tudo começa a fazer sentido.
Não se trata de mero acaso ou acidente.
Isto acontece porque, inconscientemente, temos uma percepção de Beleza
que é chave. Existem muito mais
elementos no Código da Beleza...
Da mesma forma, o Luxo varia de
uma cultura para outra. Por exemplo:
na cultura francesa, o Luxo deveria ser
algo sem utilidade; já na cultura
americana, nada é inútil. Nos Estados
Unidos, se você colocar um lenço em
volta do pescoço é porque você não
quer pegar um resfriado, e isso não tem
nada de luxuoso. Mas, na França, se
você jogar um lenço no ombro – não
significa que seu ombro poderá pegar
um resfriado, ele não precisa disso –,
trata-se de algo inútil e, portanto, é a
beleza da elegância. Se você precisar
daquilo por algum motivo, ele deixa de
ser elegante.
“O futuro do LUXO será MÃO, e não
‘feito na França’ ou ‘feito na China’.
Já não se trata apenas de Luxo, mas
da paixão do artista, do artesão que
faz algo à mão com muito cuidado e
sob medida.”
Dr. Clotaire Rapaille
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O mesmo acontece com a gastronomia na França: você não come
porque precisa de alimento. Você come
por prazer. Você não bebe vinho porque
tem sede – se estiver com sede, beba
água. O vinho é para o prazer.
A cultura americana é bastante
oposta: tudo precisa de um propósito.
As percepções aqui são muito diferentes.
A propósito, existem muitas semelhanças entre o Luxo na França e na China.
A aristocracia e o Império chineses têm
uma percepção da Beleza como algo
muito puro, nada mundano.
Recentemente, descobrimos algo
muito interessante para nossos clientes:
existe um Código global para o Luxo, e
este Código se resume a uma simples
palavra que nos leva a compreender o
Luxo de forma global – e é esta a beleza
do trabalho que fazemos. Qual é esta
única palavra? MÃO. O futuro do
LUXO será MÃO, e não “feito na
França” ou “feito na China”. LUXO é
FEITO À MÃO, customizado. Já não se
trata apenas de Luxo, mas da paixão do
artista, do artesão (artisan) que faz algo à
mão com muito cuidado e sob medida.
Hermès é um ótimo exemplo de uma
empresa bem sucedida globalmente – e
eles nem utilizam a palavra Luxo!
Recentemente, conversei com eles em
Paris e eles me disseram “Nós não
estamos no negócio do Luxo, estamos
no negócio do Artesanato”, de volta ao
tempo medieval onde havia o artesão
que ama seu ofício e que precisa
trabalhar duro para se tornar um maître,
um mestre em sua arte e no seu
artesanato. Portanto, coisas feitas à mão:
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impressionante!
Por exemplo, o novo Rolls Royce:
todo o couro por dentro dele é feito
cuidadosamente à mão e sob medida –
algo bastante importante. Algumas
marcas não podem entregar isso de
forma total e completa, mas podem sim
oferecer alguns itens, como faz o Mini
Cooper: você pode escolher algo
especialmente só para você, pode
colocar a bandeira inglesa no teto do
carro, por exemplo.
Esta é a direção do Luxo. Produção
em massa não será, de forma alguma,
Luxo. Apenas o que for feito à mão e de
forma singular.
Acabei de comprar um sofá Hermès
na França e eles me disseram “Você
deve nos pagar adiantado e a entrega
irá levar 6 meses.”, porque criar algo
luxuoso demanda tempo. De vez em
quando eu posso ir lá ver o progresso do
meu sofá – 3 pessoas estão trabalhando
duro nele, fazendo-o à mão, testando
um couro, depois outro... É uma obra
de arte! Eles são artistas.
Na França, “artesão” (artisan) e
“artista” são quase a mesma palavra, o
que eu gosto muito, pois valoriza o
talento e a paixão, a dedicação e o
comprometimento que algumas pessoas
têm ao realizarem um bom trabalho.
Por isso, acredito que a produção em
massa não será mais interessante. Se por
u m l a d o , o p r e ç o d o p ro d u t o
massificado cai o tempo todo, o preço
do Luxo aumenta ilimitadamente. Hoje
em dia, você encontra um carro Bugatti
custando US$ 2,5 milhões. Aonde está o
limite? Isto é muito especial, muito
singular.
Fernando Luzio. E quanto aos
indivíduos, podem ser descobertos? Eu
possuo um Código Pessoal? Você
conhece seu Código Pessoal?
Dr. Rapaille. Claro! Isso é fascinante. Quando trabalhei com crianças,
havia um elemento chave: quando
bebês estão juntos e um começa a
chorar, todos os outros também começam a chorar, pois eles não conhecem a
diferença entre si mesmo e os outros.
Depois, existe um momento na evolução da criança em que ela diz “Não”
pela primeira vez, depois diz “Eu”, “Eu
quero”, “Eu não quero”.
E esta primeira descoberta da própria
identidade é impressionante. Se você
tem irmãos e irmãs ou é filho único,
todo este sistema cria sua identidade, e é
neste momento em que seu Código
começa a ser impresso. Depois, há
repetição e reforço, o ambiente ao seu
redor e seus pais reforçam uma ideia
sobre você mesmo que pode ser
negativa, claro, como no caso dos
neuróticos: “Você nunca será capaz de
fazer nada, você é mau”; mas você
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também pode receber um reforço
interessante em outra direção, e aí você
passa a se sentir mais autoconfiante.
Entretanto, leva tempo para descobrir
seu Código Pessoal. E é muito
importante entendê-lo, pois a partir daí,
provavelmente você não irá se enganar
na escolha de sua profissão e irá
trabalhar em algo on code com você.
Você também poderá escolher o melhor
lugar no mundo para morar, e tudo isso
ajudará a reforçar seu próprio Código.
O grande problema é que muitos
indivíduos ficam confusos, desejam
fazer isso e aquilo também, e o
resultado é confusão e procrastinação –
eles acabam não fazendo nada e nem
tendo sucesso.
Napoleão sabia exatamente quem ele
era, e claro que, às vezes, isso pode ser
perigoso (risos), mas o fato é que ele
conhecia seu próprio Código. As
pessoas lhe diziam “Você é louco, quem
você pensa que é?!”, “Bem, eu sou o
Imperador!”. E quando ele foi feito
prisioneiro em sua ilha pelos Britânicos,
seu grande sofrimento foi a recusa dos
ingleses em lhe chamarem de “Imperador”.
Então, é muito importante descobrir e
conhecer seu próprio Código, e
começar a gerir sua vida on code com ele.
E sua pergunta “Você conhece seu
Código?”, sim, claro que conheço, e
muito bem. Tenho diversos modelos em
minha vida, sendo o primeiro, Champollion, um jovem que foi ao Egito com
Napoleão e que realizou algo que eu
realizo todo dia: ele olhou para os
hieróglifos que já existiam há 400-500
anos (não me recordo exatamente) e que
ninguém era capaz de entender, e foi o
primeiro a decodificá-lo. Passou a ler
coisas que estavam ali e que mais
ninguém enxergava. E assim é minha
vida: olhar para algo que ninguém
entende e decodificá-lo. De repente,
uau, tudo passa a fazer sentido.
Meu nome é Clotaire, que soa muito
parecido com Voltaire – um outro
modelo para mim. O que eu gosto nele
é sua habilidade de ser filósofo, artista,
poeta, cientista e, ao mesmo tempo, um
excelente homem de negócios! Portanto,
meu Código é Voltaire com um pouco
de Champollion, Alexis de Tocqueville e
assim por diante.
Para resumir mais ainda, meu Código
é SÉCULO XVIII FRANCÊS. Eu amo
tudo que se refere ao século XVIII –
não aprecio a forma como ele terminou,
pois a Revolução Francesa foi um
desastre que matou gente sem motivo –
e é entre 1715 (morte de Luís XIV) e
1789 que encontramos as figuras mais
fantásticas: Montesquieu, Voltaire,
Mozart – a meu ver, a melhor música.
Eu amo Mozart. O século XVIII é a
arte de viver, a elegância, o estilo, a
beleza, o prazer da vida. Sei que pode
parecer superficial, mas o propósito
central da cultura francesa daquela
época era elegância e prazer. Isso é
fantástico. Este é meu século e tenho
certeza de que, em uma vida passada,
fui um filósofo ali.
Fernando Luzio. Sempre vi uma
forte conexão entre Estratégia e Código
Cultural.
Definimos Estratégia como um
conjunto de escolhas e renúncias que
uma empresa deve fazer para gerar uma
percepção de Singularidade na mente
do cliente, e uma disposição a pagar,
criando valor econômico.
Atualmente, no ambiente de negócios
em qualquer lugar do mundo, não se
trata mais de uma batalha por produtos,
e sim de uma competição acirrada entre
Modelos de Negócios. É por isso que as
empresas vêm desenvolvendo a capacidade de desafiar sua Estratégia, o que
chamamos de “Inovação do Modelo de
Negócio” (Business Model Innovation), que
começa com um entendimento
profundo das necessidades, aspirações e
comportamento do cliente. Desta
maneira, podemos desafiar a Proposição
de Valor da empresa e desenhar formas
mais convenientes de atingir o cliente,
por meio de formatos alternativos de
canais, estabelecendo relacionamentos
mais apropriados com ele – alguns dos
blocos construtores da Estratégia.
Como podemos utilizar a Descoberta
de um Código para revelar um retrato
mais fidedigno das necessidades do
cliente e, assim, gerar insights poderosos
e vantagens competitivas para a empresa?
Dr. Rapaille. É essencial entender o
que as pessoas realmente desejam, mas
ao mesmo tempo, não podemos acreditar no que elas dizem. Então, é óbvio
que não adianta perguntar a elas sobre
algo de que elas nem têm consciência.
Portanto, toda empresa hoje deve
entender o que não é dito, o que é
inconsciente e as necessidades que ainda
não foram endereçadas – o que os
clientes desejam, sem saber? E se você
quer estar à frente da competição, você
precisa ser o primeiro a descobrir o que
os clientes realmente querem. E é isso
que nós fazemos.
Deixe-me dar um exemplo: trabalhamos juntos na Boeing, um de meus
clientes, que certo dia me disse “Vamos
projetar aeronaves e, para estarmos à
frente na competição com o Airbus
europeu, queremos saber o que as
pessoas realmente desejam em um
avião.”.
Durante o processo de Descoberta do
Código, descobrimos que eles não
faziam ideia alguma do que as pessoas
queriam porque eles as escutaram, e suas
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
respostas foram “Quero espaço para as pernas,
boa comida, bom entretenimento, bom serviço,
todos os filmes e tudo o mais.”, e as companhias
aéreas disseram “Ok, vamos fazer isso.”. Os
europeus acreditaram no que os clientes disseram
e construíram o grande Airbus (A380), no qual
você irá morrer com outras 800 pessoas!
Descobrimos que não era aquilo que os clientes
queriam. Pessoas que têm dinheiro e viajam
constantemente pegam jatos particulares, onde
não existe espaço para as per nas, nem
alimentação, entretenimento ou serviço de bordo,
e pagam 10 vezes mais por isso. Por quê? Porque
quando você usa jato particular, o que você ganha
é NÃO-AEROPORTO. O que as pessoas
realmente desejam é NÃO-AEROPORTO.
Agora, pense na beleza desta descoberta
quando todos estão construindo aeroportos cada
vez maiores, sendo que eu previ que o que as
pessoas querem é NÃO-AEROPORTO. Por quê?
Porque costumo dizer que aeroporto foi algo
projetado por engenheiros retardados, já que este
é o pior lugar onde se deseja ir! A possibilidade de
chegar com seu automóvel próximo ao jato
particular em um único passo – do carro ao jato –
é o ideal. Mas não, veja o absurdo destas
companhias e aeroportos que ficam acrescentando, a cada momento, um passo a mais: agora
você tem de ir lá pegar sua bagagem; depois você
tem de ir ali; depois você tem de passar pelos
seguranças; depois tem de tirar os sapatos... a todo
momento, um passo a mais!
Por isso, projetamos o Boeing 787 (Dreamliner),
um grande sucesso da Boeing que compete com o
Airbus. Se você quiser ir de Paris a Detroit de
Airbus, você deverá fazer uma conexão em
Chicago e trocar de aeronave; aí eles perdem sua
bagagem; o voo está atrasado e tudo o mais. E o
Airbus só pode seguir fazendo conexões porque
precisa de muito mais espaço para pousar e
decolar. O Dreamliner é o oposto, nele você pode
ir de qualquer lugar a outro nonstop (sem paradas).
Não eliminamos totalmente os aeroportos, mas
MENOS AEROPORTOS tem sido a direção
“...se você quer
estar à frente da
competição,
você precisa ser
o primeiro a
descobrir o que
os clientes
realmente
querem. E é isso
que nós
fazemos.”
Dr. Clotaire Rapaille
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correta. Quando tenho de voar a trabalho, digo
“Quero nonstop”, e às vezes eles tentam me
enganar dizendo “É direto”, mas “Não, eu não
quero direto, eu quero nonstop!” – pois eles dizem
que é direto, mas você acaba tendo de trocar de
avião em São Paulo (risos).
E deixe-me dizer o que irá acontecer: a Índia é
muito atrasada em termos de infraestrutura e
começou a investir grandes volumes de dinheiro
na construção de aeroportos tão grandes que,
necessariamente, precisam estar afastados da
cidade. É como o Aeroporto Internacional de
Denver, que chamo de “O mais Débil Aeroporto
Internacional do Mundo”, pois é tão distante de
Denver que você precisa viajar por uma hora de
carro para chegar lá – justamente quando o que
as pessoas desejam é NÃO-AEROPORTO.
E qual será o papel da tecnologia? Primeiro, já
temos tecnologia suficiente para fazermos as
aeronaves decolarem sem aeroportos, portanto
não precisamos mais de aeroportos. Hoje a
utilizamos exclusivamente com propósitos
militares, mas de qualquer forma, podemos
decolar do topo de qualquer edifício; segundo,
temos tecnologia suficiente para construirmos
aviões completamente silenciosos – nenhum ruído.
Claro que isto custa muito dinheiro e ainda não
chegamos lá, mas lembre-se que no início da
história dos automóveis era preciso que alguém
ficasse com uma bandeira e um trompete na
frente do carro para atravessar uma cidade, e
naquela época se dizia “Ah, isso nunca irá se
propagar, não haverá carros em qualquer lugar
porque para isso é preciso bandeiras e
trompetes...”. Hoje, acontece o mesmo com os
aviões: “Nunca teremos aviões assim porque custa
muito caro desenvolvê-los.”.
E, por último, agora estamos desenvolvendo
jatos particulares por US$ 1,5 milhões: mais
barato que um Bugatti! E serão cada vez mais
baratos até se tornarem táxis. Táxis!
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
“...não gosto da palavra ‘Sustentabilidade’
porque não queremos sustentar; queremos
aprimorar, queremos incrementar, queremos
crescer. ‘Sustentar’ é como usar o freio e
parar. Crescimento zero não é Reptiliano e é
por isso que, em termos de slogan e
filosofia, a Sustentabilidade não tem tido
aderência, pois é como se desistíssemos do
Reptiliano.”
Dr. Clotaire Rapaille
Residência do Dr. Rapaille
em Tuxedo (Nova Iorque)
Se eu quiser ir daqui a Detroit – o que não é tão longe –,
levarei uma hora até o aeroporto; mais duas horas de
antecedência para pegar o voo; mais uma média de 30 a 45
minutos de atraso nos voos; mais duas horas de voo, mais
uma hora de espera pela bagagem na chegada, o que já
somam quase 9 horas! Ora, este é o tempo que eu levo para
chegar em Detroit de carro!
Quando eu trabalhava para a GM, eu ia a Detroit de
carro, o que era bem melhor, pois eu parava quando queria,
levava quantas malas quisesse e não era insultado pelos
seguranças.
No futuro, terei um jato me pegando aqui e me levando ali,
e um voo de 2 horas será um voo de 2 horas.
Os clientes não calculam o tempo da mesma forma que as
companhias aéreas – que te informam o tempo do portão do
embarque ao portão de chegada. Não. Meu tempo é aquele
da minha casa até meu encontro em Detroit! Então, o que os
clientes querem? Eles querem que o tempo de viagem seja o
tempo real, e não querem mais perder todo aquele tempo
entre um destino e outro.
E é isso que terá sucesso no futuro. Já podemos ver os
produtores de pequenos jatos particulares fazendo fortuna. E
você poderá me dizer “Ah, mas isso é para uma minoria”,
sim, como os carros foram no início do século XX: só para
uma minoria...
Eu previ que, no futuro, todos estes aeroportos malucos
que estão sendo construídos na Índia e China irão se tornar
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museus do passado porque ninguém irá para lá, ninguém irá
precisar deles. O que aconteceu com os cavalos e as
carruagens irá acontecer com os aeroportos! Novamente: o
que as pessoas querem é NÃO-AEROPORTO. Aeroportos
grandes com mais trânsito não têm razão de ser!
Portanto, isto é evolução, e para se prever o futuro é preciso
entender isso.
Fernando Luzio. Diversos Modelos de Negócios
tradicionais – como as indústrias de Mídia, Publicidade,
Automóvel, Energia e outras – estão sendo desafiados e
ameaçados por tecnologias desruptivas e outros fenômenos
sociais.
Por exemplo, na sua opinião, o livro físico irá desaparecer
nos próximos anos? Como o processo de Descoberta do
Código poderá ajudar estas indústrias a redesenharem seus
Modelos de Negócio e a se readaptarem?
Dr. Rapaille. É muito interessante, fui contatado pela
Pinguin, em Londres. Estamos trabalhando juntos. Eles
querem entender o Código para livros.
O que é um livro? Por que precisamos do livro? Eu
costumo dizer que o Reptiliano sempre vence e o livro é algo
que você pode tocar, sentir, carregar; ele tem um peso e um
som quando você o folheia. Existe toda uma relação sensível
com o livro. Você não tem isso com um e-book ou com um
iPod. Portanto, existe uma dimensão no livro que você não
encontra em outros dispositivos.
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
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Além disso, já realizamos muitos trabalhos sobre Internet e
tecnologia, e é impressionante como se perde tempo nestas
coisas! Se eu quiser ir à página 190 deste livro e você estiver
com um iPod, chegarei lá antes que você. Então, perde-se
tempo para ganhar tempo. Eu não perco tempo quando
quero percorrer meu livro...
Temos realizado inúmeros trabalhos sobre Criatividade e
vimos como nosso cérebro é sensível ao ambiente e às coisas
que se encontram ali, e que conscientemente não
percebemos. Somos influenciados por este entorno. Quando
estou na minha biblioteca com meus livros, sei exatamente
onde eles se encontram, gosto de tocá-los, e isto estimula
minha mente. Se olharmos com maior profundidade, na
realidade, o mundo eletrônico é muito superficial. Rápido,
mas superficial, nunca podemos nos aprofundar ali.
Hoje, algumas pessoas que acessam a “Enciclopédia
Britânica” na Internet querem vê-la na forma de livro, por
isso é um erro mortal acreditar que o eletrônico irá substituir
o físico.
Em termos de cérebro Reptiliano, você até pode ver seus
filhos pelo Skype, conversar com eles, mas isso irá substituir
seu abraço? Beijá-los, tocá-los, comer com eles? Simplesmente nunca irá substituir!
É impressionante assistir à evolução atual do Luxo em
diferentes lugares da Califórnia e Europa, onde há hotéis sem
nenhuma eletricidade e onde você não pode usar nem
celular, nem computador. Só há velas, fogo na lareira e livros.
E você paga US$ 1.000 a diária, apenas para ter o privilégio
de não ser perturbado pelo “pim-pom-bin-bon”.
É aí que vemos a necessidade de coisas reais. Passado um
tempo, você precisa de meditação, precisa de tempo para
pensar, de tempo para estar com seus filhos e fazer coisas
simples, tocar as pessoas. E é por isso que o livro será feito à
mão – por falar nisso, publiquei uma edição especial de
aniversário do meu livro “O Código Cultural” que é
assinada, numerada e que, no final, possui a impressão da
minha mão –, o símbolo do Luxo: um livro feito à mão!
De novo, isto é evolução. Tentamos criar livros de bolso
sem nenhum valor e, ao mesmo tempo, temos encadernações
de couro que são belíssimas. É mais do que conteúdo.
Costumo dizer que “a estrutura é a mensagem”, então o fato
de eu gostar de tocar este livro já é uma mensagem. E eu não
tenho esta mesma sensação com a Internet.
Agora, é ótimo ter acesso a Internet e a todo o sistema de
referências que ela proporciona quando quero pesquisar
coisas para meus livros, porém isto não muda o fato de que
sei onde meus livros se encontram e de que eles são meus
amigos na vida. Existe um ditado francês que diz “Uma casa
sem livros é como um homem sem alma” – não acredito que
a alma eletrônica irá substituir isso.
Fernando Luzio. Como você já mencionou, Sustentabilidade é “a nova moral” das companhias contemporâneas.
Temos testemunhado o desafio de diversas empresas
educarem seus stakeholders e alinhá-los com uma mentalidade
e atitudes sustentáveis.
Como podemos imprimir Sustentabilidade na cultura
corporativa das organizações modernas?
Dr. Rapaille. Em primeiro lugar, não gosto da palavra
“Sustentabilidade” porque não queremos sustentar; queremos aprimorar, queremos incrementar, queremos crescer.
“Sustentar” é como usar o freio e parar. Crescimento zero
não é Reptiliano e é por isso que, em termos de slogan e
filosofia, a Sustentabilidade não tem tido aderência, pois é
como se desistíssemos do Reptiliano.
Para o cérebro Reptiliano, devemos criar relações de
crescimento harmoniosas, e não apenas sustentar. Crescimento e mudança – uma coisa da qual temos certeza é que as
mudanças nunca irão mudar, o mundo muda o tempo todo e
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Sustentabilidade significa ser capaz de antecipar as mudanças
e estabelecer uma relação de harmonia com elas. Prefiro
mais a palavra “Harmonia” do que “Sustentabilidade” – um
tipo de opressão. Eu gosto de movimento, de crescimento,
inovação e progresso.
Por isso, as noções de harmonia no longo prazo e
crescimento recíproco são muito interessantes para mim.
Reciprocidade é algo muito chinês. Quando descobrimos o
Código da China, entendemos porque os chineses não
gostam dos americanos, pois estes só usam aqueles para fazer
uma venda, enquanto os chineses não. Para os chineses te
respeitarem, é preciso falar em Reciprocidade com eles.
Sustentabilidade no longo prazo significa eu cuidar de você
e você cuidar de mim. Isto é Reciprocidade e uma
abordagem Confucionista: devemos cuidar uns dos outros
porque estamos em interrelação. Precisamos uns dos outros,
então de que adianta eu ganhar, se você perder? Não se trata
apenas de ganha-ganha, é mais do que isso: é crescimento
constante, não somente entre pessoas, como também com o
entorno e o Planeta.
E algo muito importante atualmente é nosso antropocentrismo: pela primeira vez, os humanos estão modificando
o Planeta sem prestar a devida atenção a isso.
Buckminster Fuller disse : “O Planeta Terra é uma
espaçonave sem piloto”. Mais do que proteger nosso Planeta,
precisamos de um piloto, alguém que nos diga qual o
caminho a seguir e o que fazer em direção ao crescimento da
Terra.
Fernando Luzio. Estratégia é algo intimamente relacionado a comportamento humano, pois para suportar a
execução da Estratégia, as pessoas devem mudar a maneira
com que habitualmente trabalham. E ao mesmo tempo em
que as pessoas desejam mudar, elas resistem à mudança. Por
quê? Você acredita que as pessoas realmente possam mudar?
Como o processo de Descoberta do Código pode ajudar as
empresas com os desafios da Gestão da Mudança?
Dr. Rapaille. Este é um tema fascinante. Minha primeira
reação é: sim, as pessoas podem mudar. Mas, às vezes é tão
difícil que é bem mais fácil contratar outra pessoa. A piada é
“Não mude as pessoas, mude de pessoas” – ou seja: contrate
outra porque é mais rápido.
Por que é tão difícil assim mudar? Porque normalmente as
empresas querem que as pessoas mudem quando já é tarde
demais – quando chegamos, é tarde...
Voltando para minha experiência com aprendizado de
línguas estrangeiras, eu falo inglês com sotaque porque
aprendi a língua muito tarde. Já meu filho, Dorian, fala
francês, inglês e espanhol sem nenhum sotaque porque
aprendeu estas três línguas antes dos cinco anos de idade.
Quando você aprende cedo, a impressão marcante logo
acontece no seu cérebro e aí passa a ser muito difícil mudar.
Meu paladar para queijos é francês. Já experimentei os
queijos americanos, mas não vou e nem quero mudar de
paladar porque gosto dos franceses. Existem elementos com
os quais nos sentimos mais confortáveis; há uma zona de
conforto na mente e no inconsciente de todos nós que nos faz
não querer mudar.
Então, mudar indivíduos é possível, mas muito difícil. O
que podemos fazer é descobrir nossas tensões. Sempre há
tensões em nós: amamos e odiamos ao mesmo tempo; há
coisas que gostamos e coisas que não gostamos. E podemos
nos mover nestes eixos, indo um pouco mais para um lado ou
outro. Por exemplo: eu nasci na França e tenho diversas
marcas profundas da cultura francesa. E durante a guerra,
tive minha primeira marca profunda dos americanos: um
tanque e os alemães fugindo. Imediatamente, imprimi no
meu cérebro que todos os americanos eram os vencedores, os
fortões e que eu queria ser um deles.
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
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Depois disso, assisti aos filmes com
Gary Cooper, John Wayne, Burt
Lancaster e muitos outros com os quais
me identifiquei. Desta forma, tenho
imprints dos dois lados – francês e
americano.
Eu quero mudar? Bem, se eu quiser
mudar no sentido de trabalhar mais
arduamente, desloco-me para meu
lado americano; se eu quiser curtir
mais o luxo e o prazer, vou para meu
lado francês. Isto não significa que
estou realmente mudando, mas sim
que estou me deslocando dentro do
meu próprio eixo.
Portanto, uma forma de fazer as
pessoas mudarem é descobrir os eixos
de tensão existentes em seu Código
Pessoal, e ajudá-las a se moverem em
uma ou outra direção dentro do eixo.
Não é possível mudar os eixos, pois já
não se imprime mais quando se tem
30, 40 anos – é tarde demais –, porém
é possível descobrir estes eixos e a
direção em que se quer seguir;
descobrir os elementos que já se
encontram ali, torná-los conscientes e
se deslocar para a posição que se deseja.
Aí sim, claro que você irá se mover.
Mas, se alguém tentar lhe impor algo de
fora, nada se moverá.
E as empresas, podem mudar? Sim,
elas podem mudar até mais rápido do
que os governos e os políticos porque
existe um voto diário: vender ou não
vender seu produto.
E uma forma bem sucedida de fazer
as pessoas mudarem nas organizações é
o que chamo de “feedback imediato”:
elas devem conhecer imediatamente o
resultado de suas ações. O problema é
que se atrasa demais o feedback e a
recompensa – experimente treinar um
cavalo dando-lhe feedbacks uma vez por
ano: você nunca irá treinar o cavalo,
pois ele precisa disto imediatamente.
Trabalhei para o Cartão de Crédito
MBNA e disse a eles que, quando as
pessoas estão tentando vender, elas
devem ter uma meta clara diante delas,
por exemplo: hoje, queremos vender
200.000 novos Cartões de Crédito, a
equipe inteira. A partir daí, deve haver
um placar no alto mostrando o quanto
se atingiu naquele dia – 185.000,
190.000... –, assim elas poderiam ver
imediatamente seu desempenho e
alcançar os resultados.
Quando se paga bônus aos funcionários no final do ano, não há incentivo
imediato. Hoje, a tecnologia possibilita
o feedback imediato que, em tempo
real, ajusta o comportamento das pessoas de acordo com o que elas estão
fazendo bem ou não. E nós não
aproveitamos esta tecnologia. Nós
burocratizamos e atrasamos – tudo
errado.
www.luzio.com.br
“O elemento chave que
indica se uma cultura terá
sucesso no futuro é sua
contribuição para o Planeta.
(...) O que os brasileiros
podem trazer ao mundo?
Uma cultura feminina, o lado
da mulher e a noção de
‘mulher guerreira’.”
“Estou completamente convencido
de que, no futuro, os líderes
globais serão mulheres e
precisamos começar a pensar
como mulher.”
Dr. Clotaire Rapaille
Um outro exemplo: anualmente,
100.000 pessoas morrem nos Estados
Unidos por má prática ou erros
hospitalares – duas vezes mais do que
durante a Guerra do Vietnã, anualmente.
Como podemos mudar isso?
Bem, não existe nenhum indicador do
que os médicos estão fazendo. Não há
medição, nem feedback da forma com
que os médicos descartam o lixo; de
como tratam de um paciente seguido do
outro sem higienizar as mãos. Se você
sinalizar toda vez que os médicos lavam
as mãos antes de tratarem dos pacientes,
eles visualizarão a curva de progresso.
Quantos descartam corretamente o lixo
hospitalar? Eles enxergariam isso e
poderiam fazer melhor no dia seguinte.
Afinal, as pessoas querem fazer o
melhor que podem. E sinalizar que elas
estão indo melhor do que ontem é uma
recompensa. É simples. Mas, se você
não mostra, elas ficam sem saber, então
como é que elas irão mudar?
Fernando Luzio. Você já quebrou o
Código de diversas culturas. Qual é a
sua percepção sobre as forças e
fraquezas da cultura brasileira, e como
elas afetam nossa competitividade ao
fazermos negócios em um mundo
globalizado?
Dr. Rapaille. Existe o cliché “O
Brasil é o país do futuro”, e ele tem sido
o país do futuro há o que, 100 anos?
Parece que o futuro nunca chega (risos),
mas eu acredito que já está chegando.
Fui ao Brasil pela primeira vez em
1969 para estudar os índios do Xingu
(participei do Museu do Índio) e, desde
então, tenho assistido à evolução do seu
país. Percebo um potencial absolutamente incrível.
O elemento chave que indica se uma
cultura terá sucesso no futuro é sua
contribuição para o Planeta. Exatamente isto: qual é a sua contribuição?
Gostem ou não, a única coisa que a
cultura francesa pode dar ao resto do
mundo é Luxo – a única coisa que eles
podem fazer: Cartier, Van Cleef, Champagne.
O que os brasileiros podem trazer ao
mundo? Uma cultura feminina, o lado
da mulher e a noção de “mulher
guerreira”, que significa: vou trabalhar
duro todo santo dia para melhorar a
condição de vida da minha família; sei
que a vida é dura, sei que não tenho
dinheiro suficiente, mas mesmo assim
eu não desisto e trabalho um pouco
mais a cada dia – a persistência
combinada com um certo realismo e
otimismo; a consistência com o trabalho
duro e com o aprimoramento são muito
fortes.
Estou completamente convencido de
que, no futuro, os líderes globais serão
mulheres e precisamos começar a
pensar como mulher.
Atualmente, estou trabalhando com
Educação Superior ao redor do mundo
e, na maioria das escolas de negócio,
não existem aulas sobre “como pensar
como uma mulher pensa”. Um grande
erro! Por quê? Porque nós só pensamos
como homens e não entendemos que as
mulheres pensam diferente. Qual é a
grande diferença? Os homens definem
as coisas assim: isto não, fora; isto não,
fora.
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
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Eliminando, eliminando e pronto, agora está definido –
vale dizer que isto vem de uma base de dados e é fruto de
trabalho ao redor do mundo.
A mulher, por outro lado, define por inclusão: isto é também;
isto é também; isto é também... e o que é difícil para o homem
aceitar é que isto não tem fim. Você pode continuar incluindo, incluindo...
O Brasil é uma cultura muito feminina e podemos
aprender com esta dimensão inclusiva. Lembro-me do dia
em que comemos uma feijoada juntos, e algo que aprendi
sobre a feijoada é que você sempre pode adicionar mais água
quando chegam mais pessoas para comer – e elas sempre são
bem vindas. Isto não é exclusivo, é inclusivo. Idem no que se
refere às raças. Lembro-me de uma linda brasileira, meio
japonesa, meio africana e também suíça: ela tinha toda uma
mistura e, uau, o resultado era fantástico!
Neste exato momento, na Europa, existe um enorme
perigo: assistimos à volta do racismo e fascismo. E isto não
faz parte da mentalidade brasileira mais inclusiva e aberta.
Acho interessante vocês terem uma Presidente mulher – e
mesmo o Lula era mais feminino. Esta é uma das coisas que
acho muito bacana na cultura brasileira, e esta
“inclusividade” é a contribuição que o Brasil pode dar ao
mundo.
Fernando Luzio. Você mencionou sua preocupação com
a Europa. Na visão de um Arquetipologista, como os
americanos e europeus podem explorar o poder de seus
Códigos Culturais, a fim de superarem a crise e darem a volta
por cima?
Dr. Rapaille. Hoje, vivemos a crise do domínio do
Córtex. Os americanos foram muito bons durante séculos
porque não são tão Córtex. O cliché é que os Estados Unidos
têm uma forte propensão para a ação – não sabemos muito
bem o que iremos fazer, mas vamos fazer!
Os europeus, ao contrário, querem pensar, organizar, e aí o
resultado é mais leis, mais regulação e lentidão nos processos.
E o problema da administração do Obama nos Estados
Unidos é que ele tem um jeito de pensar europeu, e aí cria
mais leis, mais regulação, lentidão, um governo grande... Ele
deveria olhar para a França, onde 65% do orçamento é do
governo e de onde todo mundo está indo embora, pois
ninguém quer gerar mais nada ali.
A França tem um déficit de 100 bilhões de euros, enquanto
os alemães têm um superávit de 200 bilhões. Qual é a grande
diferença entre os dois? Bem, a rapaziada francesa não quer
trabalhar, quer que o Estado cuide de tudo. E a ideia de
colocar alemães e gregos no mesmo saco é absurda, nunca
irá funcionar. É como tentar aplicar as mesmas leis entre
girafas e elefantes: não tem como!
Os europeus precisam entender e aceitar que estas culturas
são diferentes e, antes de se tornarem uma única grande
cultura – o que irá levar séculos para acontecer –, eles
precisam mudar para uma nova estrutura que respeite as
diferenças culturais. Os britânicos entenderam isso muito
bem, sempre se sentiram diferentes, ainda possuem o pound, e
não o euro.
Um bom exemplo, a meu ver, é a Suíça: um país
formidável e bem sucedido. Eles possuem 4 línguas oficiais e
cada subcultura é respeitada.
Portanto, é absolutamente possível criar algo assim.
O problema dos Estados Unidos é mais sério porque não se
trata apenas de uma questão entre republicanos e
democratas; o problema são os políticos, e não se eles são
democratas ou republicanos. O grande governo que temos
hoje foi criado por republicanos. Os políticos loucos, visando
sua reeleição, gastam, gastam, gastam. E se continuarmos
assim, vamos nos transformar numa França. Já temos um dos
maiores déficits do mundo e ainda teremos mais regulações.
www.luzio.com.br
Então, o que os americanos e franceses deveriam fazer?
Eles deveriam imitar países bem sucedidos – aquilo que
chamamos de “boas práticas” em governo. Já fazemos isso na
indústria, por que não fazemos o mesmo no governo?
E o exemplo número um para mim é Singapura. Escrevi
um artigo em que eu dizia “O senhor Hollande (o novo
Presidente francês) deveria fazer uma imersão em Singapura
para aprender com os caras lá.”. O modelo de Singapura é
único e muito bem sucedido. Eles têm 2% de desemprego,
enquanto a Espanha tem 25%, então é óbvio que a Espanha
deveria aprender algo com eles.
Por que eles são tão bem sucedidos? Porque têm princípios
Reptilianos. Antes de mais nada, eles não possuem gás, nem
petróleo, nem terras, nem recursos naturais, nem nada. Eles
não são como os pequenos e mimados países árabes que
vivem de royalties. Eles não têm nada. Então, qual foi a
primeira coisa que eles fizeram? Em 1965, quando a Malásia
rejeitou Singapura, Lee Kuan Yew – o líder naquele
momento – disse “OK, gente, não temos escolha. Temos de
ser melhores do que os outros porque não temos recursos,
somos pobres e temos de fazer o melhor que pudermos.”.
E qual é a primeira coisa que devemos fazer? Limpar: uma
prioridade Reptiliana. As mães sabem que seus filhos
precisam estar limpos, que a comida deve ser limpa. Então,
em Singapura, queremos as casas limpas, as ruas limpas, a
comida, você e sua roupa limpos. Limpar, limpar e criar uma
mentalidade, um first imprint (uma primeira marca profunda)
de disciplina e exigência. E esta primeira coisa que Lee Kuan
Yew imprimiu na mente de seu povo não está escrito; trata-se
de dever – e uma das polêmicas da cultura americana é que
os criminosos têm mais direito do que suas vítimas.
A segunda coisa foi: você deve trabalhar duro – o que é
muito chinês, uma dimensão Confuciana que diz que você
deve trabalhar e aprender. Aprender, aprender, aprender e
nunca parar de aprender. E depois, há uma noção de
respeito: respeito por sua família, respeito pelo seu pai.
Atualmente, a média da renda anual em Singapura é de
aproximadamente USD 700 mil. Eles têm mais milionários
ali do que em qualquer outro lugar do mundo. Com 5
milhões de pessoas, eles atingem 55 bilhões de superávit
(entre importação e exportação) – 1/4 do que os alemães
conseguem fazer com 80 milhões de pessoas. Você consegue
imaginar isso?
Não existe corrupção em Singapura, sabe por quê? Porque
todos os funcionários públicos têm, em média, uma renda
anual de US$ 1 milhão. Então, se você é Diretor de uma
agência governamental, você não precisa de mais dinheiro
quando já possui 1 milhão! É impressionante! E porque eles
pagam muito bem seus funcionários públicos, os melhores
querem se tornar funcionários públicos – novamente, um
círculo virtuoso. Além disso, Singapura é um lugar seguro. Já
estive lá diversas vezes e as mulheres podem andar à noite nas
ruas sem problema algum. Também, não existe grafite
porque você vai preso.
Realizei muitos trabalhos lá e quando perguntei aos jovens
“Vocês viveriam em outro lugar?”, eles responderam “Não.
Prefiro morar em Singapura porque é muito melhor aqui.”.
Portanto, os jovens amam aquele país, gostam de sua
estrutura e segurança; os transportes são quase gratuitos; o
metrô é muito bonito e seguro.
Meu próximo livro se chama “O Código Global e a
Mentalidade Global”, e nele, digo que os líderes globais
deveriam observar as melhores práticas ao redor do mundo.
E mesmo tendo criticado os franceses o tempo todo, a
Medicina francesa é muito melhor do que a americana, em
média. Na França, eles têm o dobro de bons resultados por
1/3 do preço (por pessoa) do que nos Estados Unidos. Os
americanos vivem um desperdício absurdo. Portanto, eles
deveriam aprender: o que os franceses estão fazendo melhor
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
no campo da Medicina?
Fernando Luzio. Você conhece
minha paixão pelo Japão, e me inquieta
ver o que este país vem enfrentando.
A economia japonesa experimentou
uma enorme expansão depois da
Segunda Guerra Mundial e, até a
década de 90, liderou algumas inovações tecnológicas e algumas das
modernas práticas de gestão – como o
Sistema Toyota de Produção Enxuta, a
Gestão da Qualidade Total, Just in Time
e outras.
Hoje em dia, o país vem enfrentando
dificuldades para superar o blackout
perturbador de criatividade e inovação,
e para adaptar o modelo de negócios de
suas grandes corporações; pois vem perdendo espaço para seus vizinhos asiáticos. Até mesmo a Toyota experimentou recentemente um recall traumático que colocou em dúvida seu legado
de ícone da Qualidade.
A indústria japonesa de cinema
também perdeu espaço nos últimos
anos para os recém-lançados filmes
coreanos e chineses.
Como podemos ajudar as empresas
japonesas a darem a volta por cima e se
readaptarem, recuperando assim seu
papel relevante no cenário global?
Dr. Rapaille. É por isso que o Japão
precisa do Brasil, pois o Código japonês
é quase o seu oposto.
Venho estudando o Japão desde 1964,
quando fui para lá pela primeira vez.
Tive uma empresa durante um tempo e
realizei diversos trabalhos por lá.
A cultura japonesa é fascinante – para
mim, uma das mais interessantes para
estudar e decodificar. Por outro lado, os
japoneses são o problema da cultura
japonesa.
Que problema é esse? Os coreanos
que lá permaneceram por 3 gerações
ainda são coreanos, ou seja, não houve
integração. Os japoneses “japoneizam”,
diferente da feijoada onde as coisas se
misturam. A mentalidade japonesa é a
da pureza da lâmina e da alta densidade
do laser, por isso eles são tão bons em
qualidade e intensidade, é isso que eles
buscam e é por causa disso que, durante
muito tempo, eles foram absolutamente
melhores do que todo o mundo. Mas,
num certo momento, esta alta densidade se tornou egoísta e autocentrada,
fazendo-os esquecer do resto do
Planeta. Hoje, as companhias japonesas
estão tendo de enfrentar diferentes desafios.
A Coréia foi ocupada pelo Japão por
mais de 30 anos, e os coreanos foram
forçados a pensar japonês, falar japonês,
ter nomes japoneses; e quando os
japoneses partiram do país em 1945, os
coreanos voltaram a ser coreanos.
Porém, eles integraram em sua cultura
todas as coisas boas da cultura invasora,
como a qualidade e a densidade. Eles
são fantásticos, ao mesmo tempo
italianos e japoneses – têm a paixão e a
agitação dos italianos, e a densidade dos
japoneses. Estes, por sua vez, não são
nada italianos. Aliás, nunca integraram
a dimensão italiana.
As empresas japonesas ainda têm
uma mentalidade imperialista. Elas
querem impor o Japão e não conseguem
se misturar com outras culturas. Por
isso, vislumbro um futuro melhor para o
Brasil do que para o Japão, infelizmente.
Outra grande questão é o envelhecimento da população. Os japoneses
têm um estilo de vida saudável, então
eles vivem para sempre, nunca morrem,
só que é preciso alimentá-los de
qualquer forma. Por isso, há uma força
tarefa no país para decrescer o envelhecimento da população.
Existem muitas semelhanças entre o
Japão e a Alemanha – a mesma
estrutura inconsciente. Quando os
japoneses precisaram criar uma burocracia, copiaram dos alemães. Hoje, eles
têm em comum a indústria automobilística, bons soldados imperialistas e
foram aliados durante a Guerra,
portanto têm uma porção de similaridades.
Porém, os alemães conseguiram se
manter alemães e se reinventaram.
Novamente, o Japão deveria olhar para
os alemães e aprender com o modelo de
sucesso deles, pois isso não seria off code
(dessintonizado), já que ambos amam a
abordagem sistêmica. Desta forma, o
Japão poderia crescer.
Fernando Luzio. Acho muito
interessante que, sempre no início do
processo da Descoberta do Código,
você pergunta ao cliente “Se eu tivesse
todas as respostas, quais seriam as suas
perguntas?”.
Então, gostaria de saber: se eu tivesse
todas as respostas, quais seriam as suas
perguntas? Que perguntas intrigantes
você tem em mente, hoje em dia?
Dr. Rapaille. Se você tivesse todas
as respostas, minha pergunta número
um seria “Onde se encontra o líder
“Meu próximo livro se chama ‘O
Código Global e a Mentalidade
Global’, e nele, digo que os líderes
globais deveriam observar as
melhores práticas ao redor do
mundo. (...) a Medicina francesa é
muito melhor do que a americana,
em média. Na França, eles têm o
dobro de bons resultados por 1/3
do preço (por pessoa) do que nos
Estados Unidos. Os americanos
vivem um desperdício absurdo.
Portanto, eles deveriam aprender:
o que os franceses estão fazendo
melhor no campo da Medicina?”
Dr. Clotaire Rapaille
11
www.luzio.com.br
CLOTAIRE RAPAILLE Novembro 2012
12
global que poderia ser o piloto deste
Planeta?”.
E ele não pode ser um político.
Talvez seja um rei filósofo, um mago,
um sumo sacerdote, algo assim. O fato
é que precisamos que um outro
Arquétipo surja e nos guie. Neste
momento, estamos seguindo por
direções tão diversas, destruindo nosso
Planeta, o que não é nada bom. Por
isso, meu sonho é descobrir esta
estrutura para além da política, da
economia e das grandes corporações.
Qual será o melhor piloto?
Fernando Luzio. Para encerrar
esta entrevista memorável, se você fosse
escrever uma carta para os nossos
filhos com seus aprendizados chave e
suas recomendações sobre como se
tornar um indivíduo e um profissional
melhores, qual seria seu maior legado?
Dr. Rapaille. Minha mãe era uma
mulher muito especial e ela sempre me
transmitiu uma simples mensagem que
eu gostaria de retransmitir aos meus 2
filhos.
Eu era meio maluco quando jovem –
ainda sou, mas era uma loucura
diferente: um dia eu estava tocando
música e disse “Quero ser músico”;
noutro dia, “Quero ser pintor”; depois,
“Quero curar crianças”; “Vou ser
médico”. E minha mãe sempre me dizia
“Seja lá o que você for fazer, você será
bem sucedido.”.
Esta foi uma das melhores mensagens que alguém poderia ter me dado –
especialmente por este alguém ter sido
minha mãe –, porque isso me fez pensar
“Uau, talvez ela esteja certa, talvez eu
tenha mesmo sucesso no que eu decidir
fazer.”.
Então, gostaria que meus filhos
tivessem esta autoconfiança. Não
queiram fazer o que eu quero que vocês
façam. Não queiram ser o que eu quero
que vocês sejam. Não queiram ser o que
qualquer outra pessoa queira que vocês
sejam. E, seja lá o que vocês escolherem
fazer, vocês terão sucesso. É equivocado
dizer “Ah, quero que meu filho seja
médico ou engenheiro”. Esqueça. Deixe
seus filhos serem o que eles quiserem.
Este é o melhor legado que se pode
deixar para os filhos: “Seja lá o que você
for fazer, você terá sucesso. Apenas
acredite em si mesmo e faça o melhor
que puder.”.
Fernando Luzio. Seu legado da
Descoberta do Código é fascinante e
muito on code com o momento histórico
de globalização que estamos vivendo,
quando o mundo precisa aprender a
reconhecer, respeitar e lidar com as
diferenças.
Sua empresa tem ajudado a educar
grandes organizações ao redor do
www.luzio.com.br
Dr. Rapaille à esquerda; Fernando Luzio à direita
mundo sobre como entender e valorizar
as diferenças, usando-as a seu próprio
favor, e não contra.
E todos nós, da Luzio Strategy
Consulting, estamos profundamente
honrados e orgulhosos de fazermos
parte da família ADW e compartilharmos sua Missão. Dr. Rapaille, muito
obrigado pela entrevista.
Dr. Rapaille. O prazer foi meu,
muito obrigado.
• O vídeo e áudio desta entrevista
podem ser obtidos em nosso site
www.luzio.com.br ou gratuitamente
na iTunes Store
• O PDF desta entrevista também
encontra-se disponível em inglês
PROGRAMA NOVOS INTÉRPRETES
Idealização e Direção: Fernando Luzio e
Renê Guedes
Entrevistador: Fernando Luzio
Tradução: Patrícia Luzio e Christiana Sparks
Supervisão Editorial: Patrícia Luzio
Edição e Fotografia: Robson Crociati e
Henrique Pinto
Produção: Luzio Strategy Consulting
LUZIO STRATEGY CONSULTING
Site: www.luzio.com.br /
E-mail: [email protected]
Tel: +55 (11) 3045-5651
Rua Afonso Braz, 473 - cj. 43
Vila Nova Conceição - São Paulo - SP
04511-011 Brasil

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