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MUSEU DE MARINHA Guia do Vh>itante l\lUSEU DE MARINHr\ Guia do Visitante Capa: Texto: Fotografia: Edição: Composição e Impressão: Obra da auroria de Peter Monamy (c. 1685), discípulo de Willem Van de Velde, representando um combate naval entre um navio português e vários navios de piratas berberes José Picas do Vale, segundo-tenente TSN Reinaldo Carvalho ©MUSEU DE MARINHA, Lisboa, 1997 TOP IMAGE- Comunicação e Imagem , Lda. Praça do Império Lisboa • Portugal )Jv ~ &:(.,0 ~ -~ -~'o-/e~ ~. 'jocl~ &rios r;.}Yo/fo--- KNJFORMAÇÕE§ PRÉVKA§ IBREV EKNTRODUÇÃO ~ N\'1\00 \ 5't'\ HORÁRIO: ENCERRAMENTO: CONDIÇÕES DE ACESSO: DURAÇÃO MÉDIA DA VISITA: Segundas-feiras e Feriados Nacionais Adultos- 1 bilhete Dos 10 aos 17 anos- Preço reduzido Até aos 10 anos- Grátis Mais de 65 anos- Grátis 01.30-02.00 horas VISITAS: Não se efecruam visitas guiadas. O Departamento de Extensão Educativa (telefone 362 00 10) poderá ser contactado tendo em vista a preparação de visitas de estudantes ou de outros grupos organizados. FOTOGRAFIA E FILMAGENS: É permitida a utilização de câmaras desde que não se recorra à utilização de tripés nem a sistemas de iluminação artificial e que os restantes visitantes não sejam incomodados. A utilização de fotografias e filmes obtidos nas nossas instalações com intuitos comerciais carece de autorização prévia da Direcção do Museu de Marinha. AQUISIÇÃO DE FOTOGRAFIAS E PLANOS DE NAVIOS: ENDEREÇO: TELEFONE: 4 Das 10.00 às 17.00 horas (Inverno) Das 10.00 às 18.00 horas (Verão) Os planos de navios encontram-se à disposição do público na loja do Museu. Para outros casos deverá ser contactado o Departamento de Património - Serviço de Arquivos e Reservas (telefone 362 00 19-Ext.113). Museu de Marinha Praça do Império 1400 Lisboa - Portugal 351.1.362 00 1O • Fax: 351.1. 363 19 87 O Museu de Marinha foi fundado pelo Rei D. Luís em 22 de Julho de 1863. Imediatamente após a sua criação, o Museu ficou sediado num edifício da antiga Escola Naval, em Lisboa. Em 1916, após um incêndio de grandes proporções que destruiu, entre inúmeras peças, a quase totalidade da colecção de modelos de navios do início do século XIX, a necessidade de novas instalações tornou-se um objectivo prioritário. Todavia, só em 1948, e em virtude da doação feita por Henrique Maufroy de Seixas, o Estado se viu obrigado a encontrar instalações condignas para albergar todo o acervo então existente. Para o efeito foi escolhido o Palácio do Conde de Farrobo, nas Laranjeiras, onde o Museu permaneceu até 1962. Palácio Farrobo Vista Geral Entretanto, um velho sonho da Marinha permanecia latente: o da instalação do Museu de Marinha no Mosteiro dos Jerônimos, em Belém. Não é difícil entender a importância simbólica de que se reveste este local, onde se situou a ermida de Na. Sa. de Belém, mandada erigir pelo Infame D. Henrique, e onde Vasco da Gama e os seus companheiros ouviram missa antes de partirem para a viagem que os levaria ao descobrimento do caminho marítimo para a Índia. Em Julho de 1959 uma determinação governamental tornou o sonho realidade e no dia 15 de Agosto de 1962 o Museu de Marinha seria finalmente inaugurado no Mosteiro dos Jerônimos. 5 MUSEU DE MARKNHA BR.EVE JNTR.ODUÇÃO O Museu encontra-se instalado nas alas norte e oeste do Mosteiro, junto ao qual foram construídos um amplo pavilhão para exposição das galeotas e um complexo destinado à direcção e serviços a que se juntou, posteriormente, o Planetário Calouste Gulbenkian. LOCALIZAÇÃO E PLANTA DAS INSTALAÇÓES I• ANDAR 3- Sala da Marinha de Recreio 4 - Sala da Marinha Mercante 5 - Sala da Construção Naval Museu de Marinha - Actualidtuk Tendo começado a ser reunido ainda durante o século XVIII , com a recolha de alguns modelos de navios da Armada Real, hoje, mais de um século volvido, o acervo do Museu conta com mais de 17.000 peças, para além dos arquivos de fotografia- aproximadamente 30.000 fotografias -desenho e planos de navios - cerca de 1500 - de entre as quais seleccionámos as 2500 que constituem a nossa exposição permanente. No decorrer da visita iremos tomar contacto com objectos de natureza diversa, originários de culturas também elas diferentes. Esperamos que a sua observação atenta permita uma percepção não só do ambiente que lhes deu origem mas também das influências que os marcaram, e que através de todos esses testemunhos, possamos de algum modo contribuir para a formação de uma perspectiva tão ampla quanto possível de um dos mais fascinantes aspectos da história do Homem: a aventura marítima. 6 lO RÉS DO CHÃO I - Sala de Enrrada 2 - Sala do Oriente 6 - Sala dos Descobrimentos 7 - Sala do Século XVlll 8 - Sala dos Séculos XIX e XX I I I I I ' 9 -Sala Henrique Maufroy de Seixas 10- Sala do Tráfego Fluvial li - Sala da Pesca Longínqua 12- Sala da Pesca Costei ra 13 - Sala das Camarinhas Reais 14-Galeria 15 - Pavilhão das Galeotas 16 - Cafetaria e Loja 7 §ALA DE ENTRADA Sala de Entrada A sala de entrada pode ser considerada um espaço de preparação para a visita. Uma estátua do Infante O. Henrique (1), rodeada pelas dos navegadores portugueses (2) que sob a sua orientação directa iniciaram a aventura atlântica, conferem a esta sala uma atmosfera de sobriedade que deixa adivinhar um convite à contemplação e à aprendizagem. No grande planisfério (3) que ocupa a parede do fundo encontram-se indicadas as principais viagens marítimas efectuadas por portugueses, entre o início do século XV e o final do século XVI, assim como o meridiano acordado entre as Coroas de Portugal e Castela no Tratado de Tordesilhas, situado 370 léguas a Oeste de Cabo Verde, que dividiu o mundo desconhecido em duas áreas de expansão, cabendo o hemisfério ocidental a Castela e o oriental a Portugal. Para além de constituir uma introdução à área temática que se lhe segue - Os Descobrimentos este planisfério permite a compreensão da amplitude da Expansão Portuguesa, um fenómeno de verdadeiro pioneirismo, no decurso do qual se verificou uma implantação efectiva em África, na Ásia, América e Oceania. Uma apetência constante pelo diálogo civilizacional possibilitou aos portugueses grande capacidade de comunicação com povos de diferentes raças e credos, fazendo com que a nossa presença ~esses territórios seja, ainda hoje, uma forte realidade hnguística e cultural. [I] ITI m ~t---9 §ALA DO ORIENT E Ao entrar na Sala dos Descobrimentos, o visitante terá que tomar uma decisão: se o tempo de que dispõe para efectuar a visita for suficiente e a disposição convidar a uma observação completa das nossas colecções, deverá virar imediatamente à sua direita e prosseguir a visita subindo as escadas até ao primeiro andar. Caso escasseie o tempo e deseje uma visita mais rápida, seguirá em .frente e começará a percorrer a Sala dos Descobrimentos, passando neste caso para a página 18 deste Guia. Terá assim deixado de visitar as Salas do Oriente, da Marinha de Recreio, da Marinha Mercante e da Construção Naval. No átrio que antecede a subida para a Sala do Oriente encontramos, à nossa esquerda, alguns exemplares de ânforas romanas e hispânicas dos séculos I e li, assim como vários cepos de âncoras, também de origem romana, recuperados do fundo do mar. Estas peças constituem testemunho da presença activa de outros povos no nosso território e representam uma ínfima amostra do riquíssimo património arqueológico subaquático existente nas águas portuguesas. No lado direito deste átrio poderá ver-se uma ev9cação do Professor Agostinho da Silva, notável pensador português nascido no Porto em 1906. Constituída pela sua máquina de escrever, capa académica, condecorações e livros, esta exposição pretende manter viva na nossa memória colectiva a obra de tão brilhante figura da cultura portuguesa. Poderá à primeira vista parecer deslocada esta mostra, mas a justificação encontra-se na paixão do Professor pelas coisas do mar e, até, por uma ambição que em determinado momento da sua vida alimentou, a de seguir a carreira da Marinha: "Muitas vezes, quando me olho ao espelho me pergunto se sou homem de pensar, de saber, de erudição, numa palavra, de inteligência, ou se, pelo contrário, a minha primeira vocação pela Marinha não seria a mais verdadeira, e, afinal, o que sou é um homem de acção. Pelo menos, há uma coisa para mim insuportável: a rotina. " Evocação ao Professor Agostinho da. Silva 10 Panorâmica geraL da Safa do Oriente Com a viagem de Vasco da Gama, em 1498 os Portugueses atingiram a Índia por mar, antes de qualquer outra nação europeia. Alguns anos depois conquistavam Malaca e em 1513 já comerciavam nas costas da China. Em 1543 chegaram ao Japão e, em 1557 estabeleceram-se em Macau e fundaram uma cidade, beneficiando de autorização chinesa. Durante quase um século foram os únicos europeus a navegar naquelas costas, daí resultando uma relação intensa com a cultura oriental, que permanece no imaginário português e que continua a ter expressão significativa no Extremo-Oriente. Neste núcleo da exposição permanente, situado a meio da escadaria que conduz ao piso superior, encontramos um pequeno mas significativo conjunto de peças que engloba porcelanas, modelos de embarcações orientais, peças de mobiliário, cartografia e estatuária, assim como alguns exemplares de pintura chinesa do século XIX representando navios portugueses ou portos da costa da China. 11 SALA DO ORIENTE SALA DA MARINHA DE RECREIO Modelo do caíque Sírius Guerreiros japoneses (Século XVI) Nesta sala permitimo-nos destacar: duas aguarelas da autoria do Comandante Pinto Basto (1), oficial de Marinha e homem dotado de excepcional sensibilidade artística; uma escrivaninha que foi pertença do escritor Wenceslau de Moraes (2), oficial de Marinha que viveu os últimos anos da sua vida no Japão, seu país de adopção; duas armaduras japonesas do século XVI (3); e um par de ábacos (4), instrumentos bastante curiosos, utilizados durante milénios, que se destinavam a efectuar e registar cálculos aritméticos. Na Europa a sua utilização só foi abandonada após a adopção do sistema numérico indo-árabe por volta do século XIII. Ao longo da escadaria que conduz ao piso superior do Museu, podem ser apreciadas algumas pinturas de grandes dimensões representando os navegadores Bartolomeu Dias, Vasco da Gama, Fernão de Magalhães, Gil Eanes e, ainda, a representação de uma cena das negociações entre Portugal e Castela que conduziram ao Tratado de Tordesilhas. No seu topo encontram-se cinco magníficos exemplares de arte sacra indo-portuguesa do século XVII, representando o padre jesuíta espanhol S. Francisco Xavier, missionário na Índia e no Japão; a rainha Santa Isabel, esposa do rei D. Dinis; Santo Inácio de Loyola, fundador da Companhia de Jesus; São Filipe Neri, fundador da Congregação do Oratório de Goa; e o Padre Luís Fróis, jesuíta missionário na Índia e no Japão. 12 Ao chegar ao piso superior encontra, à sua esquerda, um espaço dedicado às embarcações de recreio. A navegação de recreio em Portugal é uma actividade com séculos de existência, embora, até meados do século XIX, correspondesse a uma modalidade praticada quase exclusivamente pela família real. A primeira organização desportiva náutica do nosso país foi a Real Associação Naval, criada em 1856, que, após a implantação da República, viria a designar-se Associação Naval de Lisboa. Os modelos expostos documentam sobretudo embarcações construídas no século XIX, de entre as quais se destaca o caíque Sírius (1). O original desta embarcação, construído em 1877 para uso do rei D. Luís e que navegou até 1983, poderá ser apreciado no Pavilhão das Galeotas, na parte final da visita ao Museu. Salientamos igualmente o modelo do palhabote Maris Stella (2), embarcação construída em 1901 e adquirida pelo rei D. Carlos em 1905, que a ofereceu, como 11 prenda de aniversário, à rainha D. Amélia. ~~----------- + 13 t §ALA DA MARINHA M ERCA N T E Esta sala, ocupando a maior parte da ala poente do 2° piso, é quase integralmente dedicada à actividade comercial marítima portuguesa. O papel desempenhado por tal actividade na História nacional, com início logo na primeira Dinastia, contribuíu para uma distribuição demográfica equilibrada, tornando possível uma circulação comercial constituída essencialmente por produtos agrícolas. Mais tarde, no período das Descobertas e Expansão, o tráfego comercial marítimo desempenhou um papel preponderante na construção e manutenção do Império Português. Contudo, por essa altura, o navio que comerciava era o mesmo que combatia. A partir de meados do século XVII assiste-se a uma diferenciação crescente entre o navio de guerra e o navio de comércio. Esta divisão progressiva só veio a terminar no século XIX, altura em que o navio mercante desarmado se torna vulgar, e em que o navio de guerra vê as suas missões rigorosamente confinadas a acções militares. Nesse mesmo século nascem em Portugal as primeiras grandes companhias de navegação - Companhia União Mercantil, Empresa Lusitana, Empresa Insulana de Navegação, Empresa Nacional de Navegação e Empresa da Mala Real Portuguesa. Estas empresas, aproveitando já o advento da máquina a vapor, procuraram quebrar os monopólios estabelecidos por rivais estrangeiras, especialmente britânicas, mas o seu sucesso foi muito limitado, terminando quase invariavelmente numa rápida falência. Dos exemplos indicados, destaca-se o caso da Empresa Nacional de Navegação, que conseguiu celebrar uma série de protocolos com o governo português, o que lhe permitiu sobreviver até 1918, data em que se tornou sociedade anónima, passando então a denominar-se Companhia Nacional de Navegação. A entrada de Portugal na I Grande Guerra foi decisiva para a vitalidade do sector. Com o apresamento maciço dos navios alemães e austro-húngaros que se encontravam refugiados nos nossos portos , a frota mercante portuguesa passaria das 73.000 para as 307 .000 toneladas. 14 SALA DA l\1ARINHA M ER CANTE ~--·-[j] - .-. t----- - -- -- - --- ..... -,---~--- . ----=---@] -=-=--=--0--==-----= J... Tais navios foram vendidos em hasta pública às companhias de navegação existentes no fim do conflito: Empresa Insular de Navegação, Sociedade Geral do Comércio, Indústria e Transportes, Companhia Nacional de Navegação e Companhia Colonial de Navegação. O recheio desta sala é em grande parte constituído por modelos de navios que pertenceram a estas empresas, ou ainda a outras, criadas mais recentemente, como é o caso da Soponata. Através da colecção aqui reunida poderá o visitante observar a evolução dos navios mercantes. Logo no início da sala os modelos da barca Mo<klo de palhabote Almira (1), da galera Alpha (2), do brigue Orion (3) e do palhabote mercante, representam um primeiro estágio da actividade marítima exclusivamente mercantil, ainda no século XIX. Entre os modelos expostos destacamos , ainda, os dos paquetes Vera Cruz (4), Santa Maria (5) e Infante D. Henrique (6), da Companhia Colonial de Navegação. Pintura r~pr~~ntando o paqu~u Infante D. Hmriqu~ 15 §ALA DA CONSTRUÇÃO NAVAL SALA IDA MARINHA MlERCANTE Estes navios, construídos na Bélgica, para além da actividade turística e da sua utilização nas ligações marítimas habituais , distinguiram-se na missão de transporte de militares para as ex-colónias em África, motivo pelo qual a sua imagem se mantém ainda na memória de muitos portugueses envolvidos nessas campanhas. ~ Mod<lo do supnp<trokiro N<iva t_OJ_m-======-m-==::::..1 Esta sala apresenta uma exposição essencialmente ligada à actividade do antigo Arsenal da Marinha, um estaleiro cuja construção teve início em 1759 na Ribeira das Naus, local onde, desde o século XV, se situava o maior pólo de construção naval existente em Portugal. O modelo do petroleiro Neiva (7) tem igualmente bastante interesse, pois representa o navio de maior porte que alguma vez esteve ao serviço de uma empresa portuguesa, no caso, a Soponata. O Neiva, tal como os seus gémeos Nisa e Nogueira, foi construído na Suécia, em 1976, por encomenda da empresa portuguesa. As suas características eram deveras impressionantes: Através de um conjunto de peças - a maior parte das quais construída no século XIX- que engloba ferramentas de ferreiro e de fundidor (1); modelos de aparelhos de elevação e força (2) ; cascos seccionados exibindo alguns pormenores de ordem técnica aplicados na construção naval em madeira, em ferro e em aço (3); ou ainda, uma nau portuguesa do século XVIII na carreira (4). - podemos constatar vários aspectos da célere evolução tecnológica venficada neste domínio em que os portugueses, desde muito cedo, assumiram um papel de verdadeiro pioneirismo. Comprimento - 346 metros; Boca (largura) - 57,30 metros; Porte bruto - 323.100 Toneladas métricas. Para além dos muitos modelos que certamente interessarão o visitante, é igualmente de salientar uma importante colecção de pintura, constituída por cerca de sete d~zenas de obras e um painel em esmalte, que fez parte da decoração da sala de jantar da 1a classe do paquete Infante D. Henrique (8). 16 Modelo de nau na Carr~ira 17 SALA DOS DESCOBRKMENTO§ - r ~ - IJJ liHII =- - - [ill[l][2] 0 ~ --------'-- ~ I]] m -= - [81 [!] B2l [j][ill III [2] -= ~ [!] [!] § [i] [!] ~J ~ --- [j] I!Zl [j] Vista geral da Sala dos Descobrimentos Os motivos que levaram Portugal . a assumir o protagonismo inicial da expansão europeia, devem-se a um conjunto de circunstâncias muito específicas. O facto de se situar sobranceiro ao Atlântico, de ter sido um dos primeiros Estados europeus a estabilizar as suas fronteiras, de possuir uma vasta experiência marítima e de, no final do século XIV, se encontrar numa fase de fortes convulsões socio-económicas, criaram condições para a sua primazia nesta empresa. A grande aventura dos Descobrimentos, por ter constituído a época áurea das navegações portuguesas, constitui sem dúvida o principal tema da nossa exposição permanente. O espaço que dedicámos a este período da nossa História engloba objectos de natureza diversa. De entre eles começamos por destacar a réplica das inscrições (1) mandadas gravar nos rochedos de Ielala pelo navegador português Diogo Cão , provavelmente durante a viagem por si realizada em 1483. §AILA DO§ DE§COJBRXMENTO§ Ao atingir a foz do rio Zaire, este navegador terá enviado uma expedição rio acima na tentativa de encontrar a tão desejada ligação entre os oceanos Atlântico e Índico. A expedição percorreu cerca de 150 km até aos rápidos de Ielala, para além dos quais não foi possível progredir. Ficariam, como testemunho da presença portuguesa no local, estas inscrições gravadas num rochedo situado na margem esquerda daquele rio, com a seguinte mensagem: Aqui chegaram os navios do esclarecido rei O . João o segundo de Portugal 0° Cam po Anes po da Costa As viagens de Diogo Cão permitiram o estabelecimento de relações diplomáticas com o rei do Congo e introduziram uma inovação: a colocação de pilares de pedra com uma cruz, gravados com as armas portuguesas e uma inscrição. Esses pilares, destinados a afirmar a soberania portuguesa sobre as terras em que eram erigidos, seriam designados por padrões (2). Digna de especial atenção é igualmente uma pequena escultura em madeira representando o Arcanjo S. Rafael (3), santo patrono do navio com o mesmo nome, capitaneado por Paulo da Gama, que, integrado na Armada de seu irmão Vasco da Gama, partiu em 1497 para a viagem de descobrimento do caminho marítimo para a Índia. Por se tratar do único objecto remanescente daquela célebre viagem, é justamente considerado uma das mais significativas peças existentes no nosso Museu. Imagem <ÚJ Arcanjo S Rafael 18 19 SALA DOS DESCOBIRIMENTOS SALA DOS DESCOBRIMENTOS Ao longo desta sala encontramos um conjunto de vitrinas contendo modelos dos navios utilizados durante a expansão portuguesa. A sua exposição encontra-se ordenada cronologicamente de modo a tornar facilmente perceptível o progresso verificado na construção naval portuguesa durante este período. Esta evolução só foi possível graças ao avolumar da experiência obtida pelos nossos homens do mar que , progressivamente, foram dando resposta às solicitações trazidas por uma nova realidade: as navegações de longo curso. Assim, confrontados com regimes de ventos e correntes que dificultavam a progressão dos navios para Sul, no decurso da exploração da costa ocidental africana, em meados do século XV os portugueses substituíram a barca (4) pela caravela latina (5), a qual, dotada de pano latino- vela triangular-, permitia maior facilidade de manobra, maior segurança e, sobretudo, a capacidade de bolinar, possibilitando a progressão do navio mesmo com ventos contrários. Motklo d, Caravt!la Rdonda (Siculos XV a XVII) 20 A necessidade de diminuir a excessiva duração das viagens ditou o aparecimento da caravela redonda ou caravela da Armada (6) , dotada também de pano redondo vela quadrangular - e bastante mais veloz, enquanto que , em virtude do incremento verificado nas pr á ticas mercantis e do consequente aumento do volume de carga, a necessidade de um navio perfeitamente habilitado a tais tarefas, pre s idiria ao surgimento da nau (7). Como consequência inevitável do domínio alcançado no comércio marítimo internacional, os navios portugueses passaram a constituir alvo preferencial do corso e da pirataria. Surge, então, a necessidade de criar um navio com maior capacidade bélica que, para além de outras eventuais utilizações, pudesse efectuar a escolta das Armadas portuguesas, sobretudo durante a viagem de regresso da Índia. Assim nasceu o galeão português (8). Igualmente reveladora da superioridade técnica patenteada pelos portugueses durante a expansão marítima europeia, é a magnífica colecção de peças de artilharia naval dos séculos XV a XVII, cujos exemplares podem ser apreciados em vários locais desta sala. De entre eles destacamos um falcão pedreiro (9) do século XV; dois berços manuelinos (1 O) e dois falconetes (11) do século XVI. As peças de artilharia utilizadas nos navios portugueses desse período eram mais leves e precisas do que as peças empregues por outras potências marítimas, facto que lhes granjeou grande prestígio e possibilitou, durante muitos anos, a superioridade naval portuguesa. Cáo do Século XV Até ao início do século XV a navegação fazia-se pelo método de rumo e estima, à vista de costa, utilizando-se apenas a bússola, também designada por agulha de marear (12), para seguir determinado rumo, e o prumo de mão, para avaliar a profundidade sob a quilha do navio. Em meados desse século, os pilotos portugueses, ao regressarem da costa africana, verificaram que, tomando partido dos regimes de ventos e correntes, fariam uma viagem mais rápida rumo a Portugal engolfando-se no Oceano Atlântico e descrevendo uma grande volta que passava junto aos Açores. 21 SALA DOS DESCOBRI. 1ENTOS SALA DOS DESCOBRIMENTOS Essa viagem ficaria conhecida por volta da Guiné ou volta da Mina. Este afastamento de terra obrigou a novos métodos de orientação e de determinação da latitude, recorrendo-se inicialmente à observação da Estrela Polar e, posteriormente, do Sol, assim nascendo a navegação astronómica. AB viagens realizadas no âmbito dos Descobrimentos Portugueses, pelo enorme manancial informativo que trouxeram à civilização europeia, possibilitaram um amplo desenvolvimento científico que abrangeu todas as áreas do saber. Os instrumentos utilizados para o efeito foram o quadrante náutico (13) , a balestilha (14) e, sobretudo, o astrolábio náutico (15) , adaptado pelos portugueses a partir do astrolábio planisférico ( 16). No entanto e porque nos seria impossível referir todas essas contribuições, limitar-nos-emas a chamar a atenção para os domínios da cartografia- da qual podemos apreciar as réplicas de alguns magníficos exemplares de origem portuguesa, dos séculos XVI e XVII (1 7) - e das obras realizadas para aplicação no campo da marinharia, que englobavam as tábuas náuticas, os guias náuticos, os livros de marinharia, os diários de navegação, os roteiros e, no limiar teórico deste domínio, as obras de Duarte Pacheco Pereira, O. João de Castro, Pedro Nunes (18) e Fernando Oliveira. Colecção de astrolábios nduticos TratadLJ dd Sphera tk Pedro Nunes (1537) ktrolábio Sacramento B (c. 1650), recuperado em I 977 do galeão portugu;s "Sacramento .. na Bala tk Tod<Js-os-Santos, Brasil O Museu de Marinha orgulha-se de possuir a maior colecção de astrolábios náuticos existente em todo o mundo. 22 Para finalizar a nossa sugestão de peças a não perder durante a visita a esta sala, gostaríamos, ainda, de destacar uma pintura do século XVII, da autoria de Peter Monamy, retratando um combate naval em que é interveniente uma nau portuguesa (19) ; uma pintura japonesa, igualmente do século XVII, representando o bloqueio montado pelos japoneses, entre 15 de Agosto e 4 de Setembro de 1647, no porto de Nagasaqui, para impedir a saída dos galeões portugueses S. João e Santo André que transportavam uma embaixada enviada por O. João IV ao Imperador do Japão, numa tentativa de reatamento das relações diplomáticas iniciadas em 1543 e interrompidas cerca de um século mais tarde (20); dois mosquetes de mecha de fabrico japonês, presumivelmente de finais do século XVI, de modelo idêntico ao dos que foram introduzidos pelos portugueses no Japão em 1543 (21); e, finalmente, dois magníficos globos fabricados no século XVII pelo célebre mestre holandês Willem Jans Blaeu (22). 23 §ALA DO§ SÉCULO§ XXX E XX §ALA DO SÉCULO XVKKK ___..I ___..I m l --·m [I] - =-::. IIJ[IJ [I] [I] - [TI [I] GJ -, ___.. I Neste espaço consagrado à actividade naval portuguesa durante o século XVIII e o início do século XIX são muitas as peças dignas de destaque. De entre as obras de modelismo naval gostaríamos de chamar a atenção para os modelos da nau Príncipe da Beira (l)- um exemplo notável da arquitectura naval típica do século XVIII - , de duas imponentes fragatas do século XIX (2) - que têm a particularidade de terem sido utilizados durante muitos anos no ensino e demonstração de técnicas de marinharia aos cadetes da Escola Naval - , e da fragata D. Fernando 11 e Glória (3) - o último navio português construído nos estaleiros de Damão, na Índia. O desenvolvimento técnico dos instrumentos náuticos verificado desde o século XV, encontra-se documentado através do importante conjunto de peças exposto em três vitrinas situadas a meio desta sala (4) , enquanto que, no respeitante ao campo mais teórico da náutica, podemos apreciar algumas peças bibliográficas de entre as quais destacamos A Arte de Navegar (5) , edição de 1819, da autoria de Manuel Pimentel; e O Piloto Instruído (6), edição de 1830, da autoria de António Lopes da Costa Almeida. Igualmente importante é o conjunto de peças referente ao Almirante Marquês de Nisa (7), um dos mais ilustres oficiais da Marinha Portuguesa, que entre 1798 e 1800 comandou a esquadra portuguesa que no Mediterrâneo, participou com as forças navais inglesas do Almirante Lord Nelson, na guerra contra Napoleão. Motklo tÚl fragata D. hmantÚl/1 t GMria 24 Esta sala encerra uma importante colecção composta por cerca de 60 modelos que documentam a evolução da Marinha de Guerra Portuguesa desde os finais do século XIX até aos nossos dias. No século XIX o navio sofre as maiores transformações até então ocorridas. Com o advento da máquina a vapor verifica-se o aparecimento de um meio de propulsão mecânica que veio adjuvar a vela tradicional. Embora inicialmente o propulsor mecânico tivesse sido a roda de pás, de grandes dimensões e baixo rendimento, cedo se verificaria a adopção do hélice. A propulsão mista, que predominou até ao final do século XIX, entrou em rápido declínio, acabando por ser substituída pela propulsão exclusivamente mecânica. Também no que diz respeito aos materiais de construção se verificaram profundas transformações. A madeira, material preferencialmente utilizado até então, dá lugar ao ferro e, um pouco mais tarde, ao aço. Para além da vertente exclusivamente naval, nesta sala encontramos expostos vários conjuntos de peças alusivos a importantes eventos históricos ocorridos durante este período. Destacamos a vitrina referente ao Ultimato Britânico de 1890 (1). Nesse ano, o Governo português foi confrontado com uma ameaça por parte da Inglaterra, que visava obrigar Portugal a desistir do plano do denominado mapa cor-de-rosa, ou seja, da junção, através do interior africano, das então colónias de Angola e Moçambique. Tal projecto era contrário aos interesses britânicos em África, o que provocaria o famoso Ultimato de 1890. - -- -- --m- - - - - -1 ___.. Lt - -m - - - - - r [IJ ITl j 25 §ALA HENRIQUE MAUJFROY DE §EXXA§ §AJLA DO§ SÉCULOS XIX E XX Por essa altura, ficou claro perante a opinião pública que a Marinha Portuguesa se encontrava desprovida dos mais elementares meios operacionais. Fez-se então uma subscrição pública com vista a angariar fundos para a construção de algumas unidades navais. A verba assim recolhida permitiu a encomenda do cruzador Adamastor e, ainda, da canhoneira Pdtria, esta última fruto das doações efectuadas pela colónia portuguesa no Brasil. Modelo da canhoneira Douro {1 873 - 1897) O cruzador Adamastor participou activamente no movimento revolucionário que conduziu à implantação da República, a 5 de Outubro de 191 O e, ainda, nos com bates travados na I Guerra Mundial, com especial destaque para os confrontos do rio Rovuma norte de Moçambique - onde 11 homens da sua guarnição encontraram a m9rte. Henrique Maufroy de Seixas (1896-1948), foi um homem notável que legou à Marinha Portuguesa as suas valiosíssimas colecções de modelos de navios e embarcações, fotografias , desenhos, planos, assim como parte da sua biblioteca. À doação deste espólio de incontestável valor histórico-documental, que representa uma parte substancial do nosso actual acervo , poder-se-á igualmente atribuir o mérito de ter obrigado a uma série de diligências que culminaram na passagem do Museu de Marinha para o palácio do Conde de Farrobo em 1948. Busto de Henrique Mauftoy de Seixas Nesta sala, à qual intencionalmente se deu o nome de Henrique Maufroy de Seixas, consagrando o reconhecimento deste Museu àquele seu grande benemérito, podemos observar uma colecção única de modelos das galeotas reais e de várias embarcações de recreio, que pertenceram à Casa Real. Modelo da saveira daurada M odelo da cruzador Adamastor (1897- 1932) Modelo da corveta João Coutinho (1970) Existem ainda outras vitrinas respeitantes a temáticas com especial interesse: é o caso das dedicadas às expedições científicas realizadas pelos oficiais de Marinha Hermenegildo Capelo e Roberto Ivens (2), ligando Angola e Moçambique por via terrestre, e ao combate naval ocorrido em 14 de Outubro de 1918 entre o caça-minas Augusto de Castilho e o submersível alemão U-139, ao largo dos Açores (3) . 26 De entre eles destaca-se o modelo do bergantim real , notável trabalho de modelismo que, pelo rigor do detalhe e pela nobreza dos materiais, é considerado unanimemente um dos mais preciosos modelos da colecção Seixas. 27 §A LA DO T R Á FEGO f'LU VKA L I t I t Foram sobretudo as actividades desenvolvidas na faixa costeira, como a pesca e a navegação de cabotagem, aquelas que mais dinamizaram a vivência QJ comercial do nosso país. No entanto, este fenómeno encontra-se intimamente relacionado com a não menos importante actividade mercantil praticada nas nossas águas interiores. Os produtos transportados pela navegação de cabotagem seguiam por via fluvial para o interior do país, nomeadamente através dos rios Douro , Mondego, Tejo, Sacio e Guadiana. Esta articulação entre os tráfegos costeiro e fluvial constituíu, até ao aparecimento das estradas de macadame e do caminho-de-ferro, em meados do século XIX, o meio mais seguro, rápido e económico de transporte de pessoas e mercadorias. Perfeitamente ilustrativa da grande diversidade tipológica das embarcações Modelo de barco moliceiro utilizadas no tráfego fluvial, a sala que dedicámos a esta temática exibe modelos de grande riqueza estética, de entre os quais salientamos o barco moliceiro (1), usado na colheita e transporte do moliço (flora aquática da ria de Aveiro, aplicada como fertilizante agrícola); o barco rabelo (2) que, no rio Douro, assegurou durante séculos o transporte de cascos com vinho do Porto, constituindo hoje um verdadeiro ex-líbris do nosso país; a fragata do Tejo (3) , utilizada no transporte de mercadorias; e o bote cacilheiro (4) , que garantiu até ao início do século XX o transporte de pessoas entre as duas margens do Modá"k fragata do T fjo rio Tejo. 28 §ALA DA PESCA LONGÍN Q UA A pesca do bacalhau remonta ao terceiro quartel do século XV, período em que se efectuaram as primeiras viagens de descobrimento e exploração da Terra Nova protagonizadas por navegadores portugueses, tais como os irmãos Gaspar e Miguel Corre-Real, Diogo de Teive e João Fernandes Lavrador. O incremento imediato desta faina pesqueira é patenteado pelo facto de, logo em 1506, o rei D. Manuel obrigar ao pagamento da dízima sobre o produto da pesca feita na Terra Nova. Embora as actividades piscatórias tenham sofrido um forre decréscimo desde o final do século XVI - por razões intimamente ligadas à perda da independência, ficando o reino sob denominação filipina, e devido às guerras que se seguiram entre a Espanha, França e Inglaterra - a pesca do bacalhau regista o seu ressurgimento em meados do século XIX, para nos dias de hoje se voltar a verificar o seu quase total abandono. t Na sala dedicada a tão árdua gesta dos pe scadores portugueses, não faltam motivos de interesse. De entre os modelos representando veleiros bacalhoeiros destacamos o referente ao lugre Argus (1), protagonista de algumas das mais importantes campanhas da pesca do bacalhau, cujo navio gémeo, o Creou!a, depois de ter sido recuperado, é hoje utilizado como navio auxiliar da Armada, prestando serviço no âmbito do treino de mar dos alunos d a Escola de Pesc a e em cruz eiros da juve ntude, constituindo ainda um testemunho vivo da saudosa época da vela. t QJ I I Pintura repreuntando o lugre Santa Isabel 29 SALA DA PESCA LONGÍNQUA Poderão ser igualmente apreciados os modelos de alguns arrastões bacalhoeiros (2) utilizados em meados deste século e do último navio de apoio à frota bacalhoeira nos mares da Terra Nova e da Gronelândia- o Gil Eanes (3). Digna de interesse é, também, a capela original (4) que se encontrava instalada a bordo do Gil Eanes e que, em 1993, foi transladada para este Museu onde, após ter sido sujeita a trabalhos de conservação e restauro, foi integrada na exposição permanente. SALA DA PESCA COSTE IRA r A actividade piscatória na .-=m=-~m==---- -= m==---====--~1 costa ocidental da Península Ibérica é muito anterior à própria existência de Portugal como Estado independente. Uma série de condições geográficas, climáticas e geomorfológicas extremamente favoráveis, possibilita a existência de uma fauna marinha com grande vitalidade (pois, tanto quanto os documentos nos indicam, as espécies hoje pescadas não diferem muito das que o eram no século XVI), a qual, desde muito cedo, se tornou objecto de exploração, não só por parte da população nativa, mas também por outros povos que se estabeleceram no nosso território. Os Romanos, que associaram à pesca uma outra indústria intimamente relacionada com o mar- a do sal- são disso um bom exemplo. mJ A faina pesqueira portuguesa manteve até aos nossos dias um elevado índice artesanal, característica esta que se reflecte sobretudo nos processos de pesca e no pequeno porte das embarcações que, maioritariamente, nela são utilizadas. Apesar desta relativa homogeneidade de dimensões, verifica-se uma ampla diversidade tipológica, perceptível através dos modelos expostos nesta sala. Cap,/a do navio Gil Eanes A lancha poveira ( 1), o galeão da Nazaré (2), a canoa do Tejo (3), a muleta do Seixal (4), o caíque do Algarve (5) e a baleeira dos Açores (6), são apenas alguns dos cerca de cem modelos patentes ao público nesta temática do nosso Museu. Nela, merecem também destaque várias obras de pintura contemporânea, assim como um conjunto de trajes típicos da Nazaré, exemplo eloquente da riqueza emográfica das comunidades piscatórias (7). \ Motklo tk mukta 30 31 §A LA DA§ C AMARINHA§ REAl§ Camarinha da Rainha D. Amtlia O iate real Amélia, construído na Escócia em 1900, segundo os planos de um cruzador inglês de 2a classe, foi adquirido pelo rei D. Carlos em 1901. Foi o último de cinco iates com o mesmo nome pertencentes à família real entre 1887 e 191 O. O iate Amélia deslocava 1370 toneladas e, graças às suas máquinas de 1800 cavalos, atingia a velocidade de 15 nós. Encontrava-se devidamente apetrechado para a realização de trabalhos oceanográficos, com especial incidência no campo da ictiologia, uma área de estudos à qual o rei D. Carlos muito se dedicou, nela utilizando durante cerca de 15 anos, os quatro últimos iates com aquele nome. Depois do assassinato do rei D. Carlos, em 1 de Fevereiro de 1908, o iate deixou de ser utilizado com tanta frequência. No dia 5 de Outubro de 1910, aquando da implantação da República, o iate Amélia transportou para Gibraltar as rainhas D. Amélia e D. Maria Pia, o rei D. Manuel e alguns elementos da Corte, tendo regressado a Lisboa quatro dias depois. GALERIA Ao longo da galeria que nos conduz do Mosteiro ao Pavilhão das Galeotas, pode observar-se um conjunto de embarcações tradicionais portuguesas. No lado exterior da galeria encontram-se dispostas cerca de uma dezena de peças de artilharia naval dos séculos XVI a XIX, de proveniências diversas. De entre elas merecem destaque dois canhões que pertenceram ao L'Océan, navio-almirante da esquadra francesa afundado por navios ingleses, ao largo da baía de Lagos, em 17 de Agosto de 1759. Junto à entrada do Pavilhão das Galeotas depara-se-nos um conjunto de três âncoras retiradas do fundo da baía do Cura, na ilha de Santa Maria - Açores. Presume-se serem estas as âncoras perdidas naquelas imediações pela caravela Nifía em 1493, durante o regresso de Colombo da célebre viagem em que descobriu as Antilhas. Galeria exterior do Museu de Marinha e entrada para o Planetdrio Gulbenkian No dia 12 de Setembro de 1911, o iate Amélia foi integrado na Armada como Aviso de 2a classe, tendo, nessa condição, prestado serviço até 1930, ano em que foi transformado em navio hidrográfico. Por fim, foi abatido ao efectivo dos navios da Armada no dia 14 de Janeiro de 1938. Nesta sala podemos apreciar as camarinhas utilizadas pelo rei D. Carlos e pela rainha D. Amélia, preservadas após o desmantelamento do navio em 1938, assim como louças, cristais e faqueiros que fizeram parte da palamenta dos iates reais Amélia e Sírius. 32 33 PAVILHÃO DA§ GALEOl'A§ --t [j] m 121 IIl lit [2] [2] Neste amplo espaço materializam-se, nas suas dimensões originais, muitos dos modelos que contemplámos anteriormente: as galeotas reais, algumas embarcações de tráfego fluvial e de pesca. Após a entrada pode-se observar, à direita, o iate real Sírius (1), que durante 106 anos de actividade se distinguiu pela sua elegância e qualidades náuticas. Pela frente, encontram-se seis magníficas galeotas (cinco das quais construídas ainda no século XVIII), embarcações a remos ricamente decoradas, utilizadas por membros da família real e altos dignatários em passeios no rio Tejo. A mais imponente de todas é o bergantim real (2), construído em 1780 por ordem da rainha O. Maria I. Exuberante pelo seu magnífico trabalho em talha dourada e pelas não menos belas pinturas que a ornamentam, esta embarcação, movida por 40 remos ao punho dos quais se distribuíam 78 remadores, transportou no decorrer dos seus 177 anos de vida útil inúmeros monarcas e Chefes de Estado. Bergantim Real 34 P A V1LHÃ O DAS GALEOT AS De entre eles, destacam-se, já neste século, Eduardo VII de Inglaterra, o Kaiser Guilherme II da Alemanha, o presidente francês Emille Loubet, o rei Alberto I da Bélgica e, por fim, a rainha Isabel II de Inglaterra, em 1957, naquela que seria a última viagem desta embarcação antes de, em 1963, ser definitivamente transportada para as instalações do Museu de Marinha. Aqui encontramos, igualmente, vários exemplares de embarcações tradicionais, de entre os quais salientamos o valboeiro (3), utilizado no rio Douro, a netinha (4), embarcação típica da Nazaré, o moliceiro de Aveiro (5), a baleeira (6) - protagonista da multissecular modalidade de pesca da baleia praticada nos Açores- e o pequeno dóri (7), utilizado na pesca do bacalhau. De entre as embarcações de recreio destacamos uma magnífica canoa coquete (8) construída em 1904, utilizada em passeios no Tejo e em regatas fluviais e oceânicas. Encontra-se igualmente um pequeno cruzeiro de regata da classe "Tumelaren" (9), construído em Bilbau em 1947 e oferecido ao conde de Barcelona, O. Juan de Bourbon, então residente em Portugal. Em 1949, tripulado pelo conde de Barcelona e pelo seu filho, o príncipe Juan Carlos futuro rei de Espanha - participou numa regata entre Lisboa e Sesimbra, tendo triunfado na sua classe. Outra área merecedora de especial atenção é aquela em que encontramos um núcleo de peças alusivo à actividade dos socorros a náufragos. Embora a salvaguarda da vida humana no mar fosse uma preocupação já com alguns séculos de existência, as estações de salva-vidas apenas surgem em Portugal no início do século XIX. Esta actividade adquire um carácter permanente em 1892 em virtude da criação do Real Instituto de Socorros a Náufragos, pela rainha D. Amélia. Junto a este espaço encontram-se em exposição três carros fabricados no final do século XIX e utilizados no antigo Serviço de Incêndios do Arsenal de Marinha (10). Estes veículos, que eram deslocados por homens ou por muares, transportavam uma caldeira alimentada a carvão. O vapor que accionava a bomba de água para as mangueiras era fornecido pela caldeira, a qual, em cerca de 1O minutos, produzia a pressão necessária para esse efeito. 35 PAVILHÃO DAS GALEOTAS Por último, resta-nos referir o conjunto de peças dedicado à Aviação Naval Portuguesa, criada em 1917. Em Janeiro desse ano, o Serviço de Aviação da Armada, como então foi designado, recebeu as suas primeiras aeronaves: dois hidroaviões Shreck F.B.A., tipo B (11). No dia 28 de Setembro desse mesmo ano, seria inaugurada em Belém a primeira base aeronaval criada integralmente para este serviço: o Centro de Aviação Marítima do Bom Sucesso. Embora tendo tido uma existência não muito longa (1917 -1952) a Aviação Naval Portuguesa escreveu algumas páginas relevantes da história da aviação mundial. O mais célebre desses feitos foi, sem dúvida, a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, protagonizada em 1922 pelos comandantes Sacadura Cabral e Gago Coutinho. Essa viagem, cuja preparação vinha sendo feita por Sacadura Cabral desde 1919, serviu também para comprovar definitivamente a aplicabilidade de alguns processos e instrumentos de na:vegação marítima à aeronavegação. De facto, como resultado dos trabalhos de reconversão que vinha testando desde 1917, Gago Coutinho criou, dois anos mais tarde, um sextante dotado de um horizonte artificial. Este dispositivo inovador, que consistia num nível de bolha de ar e espelhos conjugados, veio permitir a medição de alturas dos astros, suprimindo a necessidade de se utilizar o horizonte real. O sextante de bolha, como ficaria conhecido, e o corrector de rumos para navegação estimada, desenvolvido pelos dois oficiais, concorreram indubitavelmente para o êxito dessa magnífica empresa. Sacadura Cabral e Gago Coutinho iniciaram a travessia aérea do Atlântico ul no dia 30 de Março de 1922, utilizando para o efeito o hidroavião Fairey 400, ao qual foi dado o nome Lusitânia. No dia 18 de Abril, depois de efectuadas algumas escalas e de percorridas 2650 milhas, o hidroavião sofreu um acidente ao amarar em ondulação cavada, junto aos penedos de S. Pedro e S. Paulo, do qual resultou um rombo no flutuador esquerdo e o consequente afundamento do aparelho. 36 PAVILHÃO DAS GAILEOTAS Hidroavião Santa Cruz Os aviadores foram socorridos pelo cruzador República que ali se encontrava destacado para lhes prestar apoio. O Fairey 16, segundo hidroavião utilizado na viagem e que, entretanto, havia sido enviado de Lisboa, partiu da ilha de Fernando de Noronha com destino aos penedos de S. Pedro e S. Paulo no dia 13 de Maio, para dali reiniciar a travessia até à costa brasileira. No entanto, uma avaria no motor obrigou a uma amaragem de emergência que danificou seriamente 0 aparelho. Os aviadores foram recolhidos pelo vapor inglês Paris City. . Um terceir.o hidroavião, o Fairey 17 (12) foi igualmente transportado de Lisboa para a !lha de Fernando de Noronha de onde partiu rumo ao Brasil no dia 3 de Junho. S~cadura Ca~ral e Gago Coutinho chegaram ao Recife no dia 5 de Junho e ao Rio de Janeiro no dia 17 desse mês, depois de efectuadas escalas em S. Salvador da Baía, Porto Seguro e Vitória. Ao Fairey 17 foi então dado 0 nome de Santa Cruz. Se pensarmos no limitado raio de acção e na fragilidade das ae:ona~es util.izadas, ~ssim. como nos m~todos de navegação aérea em prática ate entao, facilmente Imagmaremos as dificuldades experimentadas e 0 arrojo demonstrado por estes dois pioneiros da aviação transatlântica, ao efectuarem uma viagem que totalizou 4527 milhas, percorridas em 62 horas e 26 minutos. Tanto no capítulo das suas actividades puramente operacionais, como no estabelecimento de novas ligações aéreas, a Aviação Naval Portuguesa continuou a sua história de sucesso até à extinção, em 1952. A reorganização da estrutura mil~tar nacional ditaria a transferência do seu material e de parte do seu pessoal e mfra-estruturas para a Força Aérea Portuguesa. 37