Memórias da Maçonaria Argentina

Transcrição

Memórias da Maçonaria Argentina
A LOJA LAUTARO DE BUENOS AIRES
MEMÓRIAS DA MAÇONARIA ARGENTINA
Irm João Alves da Silva
Lautaro - jovem Guerreiro Araucano
que deu sua vida para defender suas terras
Seu nome é dado a uma das principais
Lojas da Maçonaria Argentina.
É uma verdade demasiada sabida, e mil vezes repetida, que na literatura
de um povo se refletem todas as suas idéias, seus costumes, seu caráter,
sua civilização, enfim. A nenhum outro, porém é este princípio com mais
propriedade aplicável do que ao povo argentino. A Loja Maçônica
"LAUTARO" é, com efeito, uma civilização; é um mundo continuamente
evocado pelo espírito e pela idéia da moralização.
Quando a Maçonaria não perde o caminho do aperfeiçoamento humano,
quando não se arreda de sua primitiva missão, altamente moral e
fraternal, ela se torna uma força, um poder ativo e social. Do cimo
olímpico de sua magnitude, os Maçons descem, como os deuses de
Homero, a tomar parte nos combates humanos e promover a vitória pelo
lado da justiça.
É assim que o exemplo argentino influi nos destinos do Continente sulamericano; quando por cima das nações ingratas (como a Inglaterra)
passavam rugindo, de mistura com os turbilhões do hemisfério sul, as
maldições da Santa e Indivisível Trindade; quando o verbo ardente do
Gênio batia, como uma labareda, na face dos reis, e a séculos de distância
os ancestrais escutavam os gemidos das cidades platinas, cujos ossos
estavam nos apertos da agonia, na garra dos conquistadores. A Argentina
é, pois, um modelo de tudo quanto é belo e bom; e se outras razões não
determinaram um retrospecto de sua história maçônica, bastaria o gosto,
o simples instinto literário para levar-nos a folhear essas páginas eternas,
a colher e admirar as narrativas de sua história, as lavas petrificadas, que
brotaram daquelas bocas abrasadas como crateras do céu.
Segundo relato e inserção na "História General de la Francmasoneria", p.
343,
(...) Como é conhecido, as embarcações inglesas, a um certo tempo de
nossa civilização, eram verdadeiras Lojas Maçônicas flutuantes. Assim
mesmo, foi a Maçonaria oficialmente reconhecida como instituição de
utilidade pública (...)
Por conseguinte, não é de estranhar que, durante as invasões inglesas a
Buenos Aires, entre 1806 e 1807, algumas Lojas foram fundadas a fim de
prestigiar algum movimento de cooperação espiritual entre os homens da
época, bem como tratar sobre a possibilidade da independência do
Virreinato del Río de la Plata (Vice-Reino do Rio da Prata).
O Irmão Antônio R. Zuninga manifesta ou declara que os ingleses
fundaram duas Lojas sendo a primeira denominada de Star of the South
Lodge ou Loja Estrela do Sul, que funcionava na rua Santa Clara (hoje
Alsina), defronte da Igreja de São João; e a segunda Loja denominada de
Loja Maçônica Os Filhos de Hiram, com local à rua Ribas, entre
Reconquista e Villota, ou seja, segundo a nomenclatura atual, na rua
Bernardo Irigoyen entre Victoria e Alsina.
Guarda-se, no Museo Histórico Nacional da cidade de Buenos Aires, um
diploma da Loja Maçônica inglesa daqueles velhos tempos e de cuja
tradução temos o seguinte teor:
En nombre de Santa e indivisa Trindad. Tres personas y un Dios Amén
Nos, el Gran Maestro, Diputado G. M. Capitán General, G.M.D.G.M.S. etc.,
de Ia Magnânima e Invencible Orden de Sublimes Caballeros Templarios,
actuando por sanción de Ia Logia Nº del Registro de Irlanda, por el
presente certificamos que nuestro fiel y amado Hermano y firme amigo
señor há sido regularmente admitido, iniciado y confirmado em todo los
Derechos, Títulos, Cerimonias y Misterios de Ia Muy Noble y Cristiana
Orden de Sublimes Caballeros Templarios de Malta, por Nos, en nuestro
Campamento, y que desde su entrada a ella ha desempeñado las
obligaciones relativas a un Señor Caballero Compañero con afecto e
integridad, habiendo con muy excelente espíritu, Fortaleza y valor,
suportado duras pruebas y resistido varias tentaciones preparatonas a su
admisión. En fé de ello, hemos puesto nuestra firma con el sello de
Nuestro Campamento. Dado em. en el año de la Masoneria y de Gracia
G.M. C.G. G. Sec.
Como dissemos anteriormente, os ingleses que chegaram à Argentina, lá
fundaram Lojas Maçônicas. Daquelas que foram fundadas em Buenos
Aires, nos tempos das invasões, foi formada uma conexão com os
membros da Ordem que residiam na cidade, entre os quais estava o
patriota Don Saturnino Rodrigues Peña de quem o general e historiador
Don Bartolomé Mitre disse que ele "e alguns outros se haviam filiado às
Lojas Maçônicas introduzidas pelos ingleses e tinham esse ponto de
contato com o General Borresford ... Don Saturnino Rodrigues Peña se
consagrou à independência e foi o primeiro argentino que concebeu o
plano de emancipar a sua pátria.
Depois da expulsão dos invasores, as Lojas Maçônicas caíram em sono, ou
melhor, adormeceram; mas a idéia emancipadora havia tomado grande
incremento e a semente libertadora havia se espargido pelas Lojas e o
trabalho incessante de seus componentes se viu coroado com os melhores
êxitos nas históricas jornadas de maio de 1810.
O triunfo relativamente fácil obtido após o primeiro grito de
independência se deveu, sem qualquer dúvida, ao trabalho incessante dos
Irmãos da Augusta Ordem.
A LOJA LAUTARO DE BUENOS AIRES
A Loja Lautaro de Buenos Aires foi fundada pelo General Don Jose de San
Martin, em união de Don Carlos Maria de Alvear e Don Matias Zapiola, tão
logo chegaram à capital do Prata, no ano de 1812.
Até nossos dias são mui poucos os dados oficiais que se conhecem desta
famosa Loja Maçônica e, a fim de divulgar os conhecimentos que se tem a
seu respeito, vamos transcrever, entre outros, os relatos pelo historiador
Don Bartolomé Mitre, em seu livro de História de San Martin, História de
Belgrano e em Novas Comprovações Históricas, baseadas em documentos
confidenciais e íntimos do General de San Martin.
Eis aqui algumas das passagens mais interessantes:
A famosa Loja de Lautaro, que como instituição revolucionária produziu
bens também males, teve sua origem na Europa, sob a inspiração do
célebre Miranda e foi introduzida em Buenos Aires no ano de 1812, por
San Martin e Alvear. Nos primeiros momentos deu a revolução um novo
impulso e ela governou no sentido dos interesses gerais: porém
convertida em instrumento de ambição pessoal de Alvear e alijado dela
San Martin, degenerou e se transformou em uma camarilha e se dissolveu
no ano de 1815 com a caída do primeiro, Alvear.
Em 1816, ao tempo em que se encontrava San Martin organizando o
Exército dos Andes, estabeleceu-se em Mendonza, cidade da Argentina,
uma sucursal daquela Loja, usando da faculdade de que sua instituição
dava a todo membro da Loja Matriz, quando fosse nomeado general do
exército o governador da província.
Com este triplo título organizou o general dos Andes, o Governador de
Cuyo, a Loja de Mendonza, na qual ingressaram os principais chefes do
exército e os emigrantes chilenos partidários de O'Higgins com este à
frente.
Simultaneamente, ao ocupar Pueyrredon a direção suprema, reorganizou
a Loja Matriz em Buenos Aires, de acordo com San Martin, dando-lhe a
forma de um conselho secreto do governo, que sem embargo de deixar
bastante amplitude de ação ao chefe de Estado, o subordinava às suas
deliberações, governando assim o Governo.
A LOJA LAUTARINA DE MENDOZA
O General Don José de San Martin, sendo governador da província de
Mendonza organiza, ao mesmo tempo, o exército de Los Andes. Ainda
mais: na cidade de Mendoza fundou uma filial da Loja Lautaro de Buenos
Aires (ano 1816).
Nesta Loja ingressaram, também, os principais chefes do exército e
emigrantes chilenos que, em face do desastre de Rancagua (Chile), haviam
abandonado o solo pátrio para se associar ao ciclo argentino. O General
O'Higgins e seus mais destacados colaboradores foram, então, os que
ingressaram na Loja Lautarina de Mendonza, a que operava,
independentemente, da Loja de Buenos Aires que, por sua vez, havia sido
reorganizada pelo Diretor Supremo e Irmão, Don Juan Martin de
Pueyrredon.
Mitre, ao referir-se à Loja Lautarina de Mendonza, disse que ela trabalhou
em sua órbita limitada de ação, à maneira do famoso Conselho Secreto do
Regimento de Granadeiros a Cavalo, aplicado por San Martin ao governo
deste corpo e aplicava ao governo político de um exército, adaptando-a à
constituição da primeira Loja de Lautaro. Na correspondência confidencial
de San Martin e Pueyrredon há uma alusão freqüente, tanto à Loja de
Buenos Aires como à de Mendonza, designando-as sob o domínio da
"Academia de Matemática", e assim, quando algum novo membro
ingressava, diziam: "Esta instituição, que governa o governo, governava
também o Exército de Los Andes por meio de seus principais chefes
aliados a ela e ligados por um juramento".
Em um trabalho escrito por Don Benjamin Vicuna Mackenna, que foi
reeditado em Páginas Esquecidas, Vicuna Mackenna, no El Mercurio,
selecionou vários artigos e crônicas escritos por Ricardo Danoso e R. Silva
Castro (Santiago 193 1:pp.280-285, onde se indica que não se conhece
quase documento algum diretamente das Lojas escrito em seu nome e a
verdade, e esses documentos devem ser sumamente raros"), porque tudo
era baseado por cartas simbólicas e de viva voz a fim de não deixar pista
alguma.
No Epistolário de D. Bernardo O'Higgins, Capitão General e Diretor
Supremo do Chile, anotado por Ernesto de Ia Cruz, Santiago de 1916,
encontramos várias cartas confidenciais do prócer, principalmente a San
Martin nas quais se refere a Trabalhos da Loja que aparece
simbolicamente com o signo de 0-0 (dois 0's unidos por um hífen) se uma
delas pode ser considerada como escrita diretamente por ele. É a que leva
a data de Santiago do Chile, 3 de abril de 1819 e dirigida ao General Don
Jose de San Martin. Encontra-se na página 209 do Epistolário e foi citada
por Vicuna Mackenna, de forma por demais incompleta.
Esta carta leva por embelezamento três letras: "U.F.V.", que pode
representar as palavras União, Fé e Valor, segundo Mitre, ou União,
Fraternidade ou Fidelidade e Valor, segundo Cruz, ou ainda União, Força e
Valor segundo nossas investigações. Assinam O'Higgins como P
(presidente) e José Ignacio Zanteno como S (secretário); detalhe de
importância histórica, vez que se indicam os nomes e cargos de duas
pessoas dentro da Loja Lautarina de Santiago ou Santiaguense. Em outra
carta se pede a San Martin, em nome da 0-0 que se ponha a cabeça do
Exército Libertador do Peru, despachando o afeto àquela comunicação
oficial da Loja com o Major Don José Manuel Borgona, membro daquela
Associação.
0 que este trabalho de pesquisa significa, ele mesmo di-lo-á. Não hei
mister de entrar em maiores explicações. Para bem julgá-lo, o leitor não
perca de vista que lê o trabalho de um espírito inquieto, o qual muitas
vêzes, da sua luta jacóbica, na falta de anjos do céu, com demônios da
terra, ainda que vitorioso, todavia teve de sair, não coxo, porém cético.
Revela também ter sempre em mira que os oito anos que passei na
presidência do CEMCRAV (1987-1995) constituem uma fase distinta da
minha vida intelectual, e a essa fase pertencem todos os escritos, ou parte
deles, de data anterior a agosto de 1987.
Como o Brasil, na minha opinião, se acha muitos anos atrás de outros
países do mundo civilizado, ele parecia, sobretudo de apropriar a si a vida
espiritual argentina, que é por San Martin, tão dignamente nesta pesquisa
representada; e eu não tenho outro intuito senão promover o progresso
intelectual de minha pátria, pedindo como peço para ela proteção do
GADU. Mais do que nunca, os brasileiros carecem de conhecer a Argentina
Maçônica.
Se até hoje nos tem faltado um órgão suficiente para nos dar notícia do
grande povo de pensadores e críticos, vós (Loja de Pesquisas Maçônicas
"Brasil") estais nas condições de arredar essa carência, e preencher lacuna
tão sensível. Trata-se somente de provocar entre nós o amor do
argentino, e dirigir nosso espírito por caminhos pelos quais conseguiremos
as vantagens da cultura moderna mais segura e prontamente do que pela
senda, até hoje trilhada, e que muitas vezes perde-se na areia, a velha
senda do brasileirismo.

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