amazonas indígena: um mapeamento das instituições - NEAI

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amazonas indígena: um mapeamento das instituições - NEAI
AMAZONAS INDÍGENA: UM MAPEAMENTO DAS INSTITUIÇÕES E
DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS INDÍGENAS
NO ESTADO
Proponente: Gilton Mendes dos Santos
RELATÓRIO FINAL
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas / FAPEAM
Manaus
2009
EQUIPE
Coordenador
Gilton Mendes dos Santos
Pesquisadores
Carlos Machado Dias Júnior
Deise Lucy Oliveira Montardo
Frantomé Bezerra Pacheco
Maria Helena Ortolan de Matos
Colaborador permanente
José Exequiel Basini Rodriguez
Estagiários bolsistas
Ângela Andrade da Silva
Aquiles Santos Pinheiro
Erick Marcelo Lima de Souza
Inara do Nascimento Tavares
Ivanilson Barbosa da Costa
Márcia Elisa Freire Meneghini
Rogério Marinho Ribeiro
Colaboradores eventuais
Clayton Rodrigues de Souza
Danilo Paiva Ramos
Elione Angelim Benjó
Juan Carlos Peña Marques
Laise Lopes Diniz
Marcelo Pedro Florido
Neon Solimões Paiva Pinheiro
ÍNDICE
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 8
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 12
a) Do contexto indígena na Amazônia ............................................................................... 12
b) Dos objetivos e da metodologia do mapeamento ........................................................... 15
c) Dos resultados do projeto Amazonas indígena .............................................................. 17
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 22
ANÁLISE DA PRODUÇÃO SOBRE AS LÍNGUAS DOS POVOS INDÍGENAS DO
AMAZONAS ........................................................................................................................... 24
Introdução ........................................................................................................................... 24
Situação das línguas indígenas e áreas de grande diversidade linguística no Estado......... 25
Alguns resultados extraídos do Banco bibliográfico - Área temática: Línguas indígenas . 29
Pesquisas vinculadas ao Projeto Amazonas Indígena ........................................................ 30
LEVANTAMENTO DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFIOCA SOBRE AS LÍNGUAS
INDÍGENAS FALADAS AO SUL DO ESTADO DO AMAZONAS ................................ 31
Introdução ........................................................................................................................... 31
Metodologia ........................................................................................................................ 33
Atividades desenvolvidas no decorrer da pesquisa ............................................................ 35
Resultados ........................................................................................................................... 38
Considerações finais ........................................................................................................... 47
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 48
LEVANTAMENTO DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE AS LÍNGUAS
INDÍGENAS FALADAS AO NORTE DO ESTADO DO AMAZONAS .......................... 49
Introdução ........................................................................................................................... 49
Metodologia ........................................................................................................................ 49
As línguas faladas ao Norte do Estado do Amazonas ........................................................ 54
Lista de povos indígenas do Amazonas .............................................................................. 55
Relação das 248 obras sobre línguas indígenas faladas no norte do estado do Amazonas
que se encontram registradas no banco de dados bibliográficos (Dados de 2008): ........... 59
Relação de quantidade de obras que tratavam do tema línguas indígenas da parte Norte do
Estado; listadas por tronco linguístico e suas respectivas famílias (dados de 2008) .......... 61
Considerações finais ........................................................................................................... 62
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 63
O LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO SOBRE ORGANIZAÇÃO SOCIAL E
PARENTESCO ....................................................................................................................... 65
Noroeste da Amazônia........................................................................................................ 66
Juruá – Purus ...................................................................................................................... 67
Amazônia Centro-Meridional ............................................................................................. 68
Alto Amazonas ................................................................................................................... 68
Maciço Guianense Oriental ................................................................................................ 69
Maciço Guianense Ocidental .............................................................................................. 69
Juruá-Ucayali ...................................................................................................................... 69
Considerações finais ........................................................................................................... 70
ÍNDIOS EM CONTEXTOS URBANOS: O QUE SABEMOS EM MANAUS? .............. 71
Do que informa o Banco ..................................................................................................... 71
1. Tipos de obras e ano ....................................................................................................... 71
2. Regiões abordadas .......................................................................................................... 72
3. Povos estudados .............................................................................................................. 72
4. Temas privilegiados ........................................................................................................ 73
Apontamentos preliminares para uma análise do material ................................................. 73
Considerações finais ........................................................................................................... 75
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 78
PRODUÇÃO FONOGRÁFICA E BIBLIOGRÁFICA SOBRE A MÚSICA DOS
POVOS INDÍGENAS DO ESTADO DO AMAZONAS ..................................................... 80
Compact Discs - Cds. ......................................................................................................... 82
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 85
Referências Fonográficas ................................................................................................... 87
ANÁLISE DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS INDÍGENAS NO
RIO NEGRO ........................................................................................................................... 88
Estudos por região .............................................................................................................. 90
Etnologia do Rio Negro ...................................................................................................... 95
Considerações finais ........................................................................................................... 98
Referências Bibliográficas .................................................................................................. 99
A PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS DOS CURSOS MÉDIOS DOS
RIOS JURUÁ E PURUS ...................................................................................................... 103
Relatos do século XIX e início do XX ............................................................................. 103
Linguísticos ...................................................................................................................... 107
Educação ........................................................................................................................... 109
Relatórios de Situação e Demarcação de Terra ................................................................ 109
Etnobotânica ..................................................................................................................... 111
Mitos e Histórias ............................................................................................................... 111
Etnológicos ....................................................................................................................... 111
Outros ............................................................................................................................... 115
Considerações finais ......................................................................................................... 115
A PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS DO VALE DO JAVARI ..... 117
Análise Etnológica ............................................................................................................ 119
Linguística ........................................................................................................................ 123
Educação ........................................................................................................................... 125
Ecologia ............................................................................................................................ 125
Gênero .............................................................................................................................. 126
Cosmologia ....................................................................................................................... 126
Considerações finais ......................................................................................................... 129
MAPEAMENTO DAS INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS E NÃO GOVERNAMENTAIS NA AMAZÔNIA INDÍGENA: C ENÁRIOS A
SEREM REFLETIDOS .................................................................................................. 132
Introdução: A relevância e os limites da pesquisa ............................................................ 132
Desenvolvimento da pesquisa .......................................................................................... 134
Dados coletados: contextos, programas e projetos .......................................................... 136
Organizações governamentais .......................................................................................... 137
Programa Amazonas de Apoio à Pesquisa em Políticas Públicas em Áreas Estratégicas
- PPOPE ...................................................................................................................... 152
Programa Amazonas de Apoio à pesquisa em Políticas Públicas em Áreas
Estratégicas- PPOPE .................................................................................................. 153
Centros Culturais das Comunidades Indígenas urbanas - CCCI‟s ................................... 156
Organizações não-governamentais (ONGs) ..................................................................... 157
Associação Serviço e Cooperação com o povo Yanomami – SECOYA ......................... 158
Operação Amazônia Nativa – OPAN ............................................................................... 159
Centro de Trabalho Indigenista – CTI .............................................................................. 160
Terre dês Hommes- Suíça (TdH)...................................................................................... 161
Equipe de Conservação da Amazônia – ACT Brasil (Amazon Conservation Team) ...... 161
The Nature Conservancy - TNC ....................................................................................... 162
Conselho Indigenista Missionário – CIMI ....................................................................... 163
Agência Norueguesa de Cooperação ao Desenvolvimento – NORAD ............................ 164
Cenários a serem refletidos............................................................................................... 165
Algumas observações sobre as organizações indígenas e ONGs ..................................... 167
Desdobramentos da investigação proposta no projeto ..................................................... 169
Monografia ....................................................................................................................... 170
Projetos de Pesquisa para o Mestrado em Antropologia .................................................. 170
Projeto de extensão ........................................................................................................... 170
Referências Bibliográficas ................................................................................................ 171
REGIME DE ALTERIDADES E DINÂMICA TERRITORIAL NA REGIÃO
AMAZÔNICA....................................................................................................................... 173
Objetivos ........................................................................................................................... 173
Principais pressupostos teórico-metodológicos ................................................................ 174
Agenciamentos ................................................................................................................. 175
Questões chaves ................................................................................................................ 175
Instituições consultadas na pesquisa em andamento ........................................................ 176
Considerações a respeito da base de dados institucionais ................................................ 176
Considerações gerais sobre a base de dados bibliográficos do projeto Amazonas Indígena
.......................................................................................................................................... 179
Referencias Bibliográficas ................................................................................................ 181
Lista de Tabelas
Tabela 1: Total de títulos levantados no banco de dados bibliográficos ................................. 18
Tabela 3: Distribuição da produção monográfica entre as principais bacias hidrográficas .... 21
Principais detentores da produção bibliográfica ....................................................................... 22
Tabela 1: Línguas faladas no Noroeste Amazônico separadas por famílias linguísticas 27
Tabela 2: Percentagem de cognatos entre as línguas Arawá a partir da comparação de
um léxico comum .................................................................................................. 27
Tabela 2: Amostragem das línguas mais investigadas constantes no Banco de Dados
Bibliográficos (BDB) (acima de 5 produções sobre o tema Língua) ................ 29
Tabela 1: Tronco Linguístico Tupi ...................................................................................... 40
Tabela 2: Famílias linguísticas não agrupadas em troncos ................................................ 42
Tabela 5: Resultados da produção bibliográfica refrente aos povos da família linguística
Pano ........................................................................................................................ 46
Tabela 1:
Línguas indígenas do Norte do Estado do Amazonas listadas por família
linguística ............................................................................................................... 60
Tabela 1: Distribuição anual das produções 1854-1980 ...................................................... 105
Tabela 2: Distribuição anual das produções 1971-2009 ...................................................... 106
Tabela 1: Organizações governamentais pesquisadas ...................................................... 138
Tabela 2: Projetos Premiados ............................................................................................... 140
Tabela 3: Projeto, local de atuação e povos indígenas do programa Carteira Indígena MDS/ MMA ......................................................................................................... 143
Tabela 6: Projeto e local de atuação do programa Amazonas de Apoio à pesquisa em
Políticas Públicas em Áreas Estratégicas - PPOPE/FAPEAM ........................ 155
Lista de Quadros e Figuras
Figura 1: Mapa do Estado do Amazonas ................................................................................ 38
Figura 2: Áreas Etnográficas no Estado do Amazonas ........................................................... 39
Figura 3: Mapa da Produção Bibliográfica sobre línguas Indígenas no Estado do Amazonas
.................................................................................................................................. 44
Quadro 1: Obras Monográficas ............................................................................................... 72
Quadro 2: Regiões Abordadas ................................................................................................ 72
Quadro 3: Povos Estudados .................................................................................................... 72
Quadro 4: Temas Privilegiados ............................................................................................... 73
Figura 1: Mapa com indicação dos projetos premiados em 2007 e 2008 com o Prêmio
“Culturas Indígenas”............................................................................................... 142
Figura 2: Mapa com indicação dos locais contemplados com o programa “Carteira Indígena”
(projetos 2008 e 2009) ............................................................................................ 145
Figura 3: Mapa com indicação dos locais de atuação dos Projetos PDPI/MMA (2008/2009)
................................................................................................................................ 151
Figura 4: Mapa infográfico das ações da FAPEAM ............................................................. 153
Lista de Gráficos
Gráfico 1: Distribuição da produção bibliográfica por tipo .................................................... 18
Gráfico 2: Quantidade de obras por décadas entre o período de 1745 a 2009 ........................ 20
Gráfico 1: Percentual da produção bibliográfica sobre as línguas indígenas dos povos
indígenas faladas ao sul do estado do Amazonas ................................................... 43
Gráfico 1: Levantamento da Produção bibliográfica............................................................... 89
Gráfico 2: Produção por Região .............................................................................................. 91
Gráfico 3: Obras por Período e Região ................................................................................... 91
Gráfico 1: Mapeamento das organizações ............................................................................. 136
APRESENTAÇÃO
Apresenta-se aqui o Relatório Final do Projeto Amazonas Indígena: um mapeamento
das instituições e da produção bibliográfica sobre os povos indígenas no Estado, financiado
pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas/FAPEAM (Edital
MCT/CNPq/FAPEAM N.015/2006 Programa de Infra-estrutura para Jovens Pesquisadores
Programa Primeiros Projetos – PPP) através do Termo de Outorga e Aceitação de Auxílio n.
113/2007.
O tempo de execução desse projeto foi de dois anos (agosto de 2007 a julho de 2009),
tendo sido prorrogado por mais quatro meses. Seus objetivos foram: a) agrupar e sistematizar
as informações produzidas sobre os povos indígenas e a atuação recente de instituições junto
aos povos indígenas no Estado do Amazonas e b) promover e subsidiar as pesquisas no
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, área de Etnologia Indígena, da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM) (professores, estudantes e pesquisadores) e
outras instituições de ensino, pesquisa e extensão.
Importante sublinhar que a proposta do projeto Amazonas Indígena surgiu no contexto
da criação do Departamento de Antropologia da UFAM, a partir da contratação de dez
professores doutores em Antropologia Social, dentre os quais seis com formação na área de
Etnologia Indígena. Desse modo, conhecer a Amazônia indígena – tomando como ponto de
partida a presença das instituições e, principalmente, o que se produziu em termos de
conhecimento publicado (bibliográfico e áudio-visual) sobre a região e seus povos – era um
passo importante para se delinear as novas ações que ora se descortinavam no novo contexto
antropológico na UFAM e na Amazônia. A proposta, portanto, era de interesse coletivo dos
etnólogos do novo Departamento. Com isso, o projeto se revelou como uma possibilidade real
de agregar os professores pesquisadores, seus alunos e aqueles interessados no tema. Desse
modo, a proposta permitiu que cada pesquisador envolvido pudesse explorar o material
levantado realizando análises temáticas de acordo com sua área de especialidade.
O projeto Amazonas Indígena estimulou também a criação e incremento do Núcleo de
Estudos da Amazônia Indígena (NEAI), grupo de pesquisa vinculado ao Programa de PósGraduação em Antropologia Social da UFAM, com sede na antiga Faculdade de Direito, onde
montou sua infra-estrutura e contou, por sua vez, com o apoio integral para seu pleno
desenvolvimento.
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No primeiro ano de execução do projeto, cada professor pesquisador recrutou um ou
dois alunos de graduação, com aporte de Bolsa de Iniciação Científica, para juntos levantar o
material para formação dos Bancos de Dados e ensaiar as primeiras análises do que havia sido
coletado naquele período.
Ao longo desse período a equipe realizou dois seminários de pesquisa para debater a
metodologia do levantamento, identificar os principais temas e discutir seus resultados
preliminares (conf. memória dos seminários em Anexo).
Os resultados preliminares do levantamento começaram a aparecer já no final do
primeiro ano – discriminados no relatório técnico parcial encaminhado à FAPEAM, podendo
ser assim resumidos:
Relatórios de Iniciação Científica:
1) Mapeamento das instituições e da bibliografia: a formação do banco de dados.
Bolsista/CNPq: Rogério Marinho Ribeiro (Orientador: Prof. Dr. Gilton Mendes
dos Santos);
2) Produção bibliográfica sobre as línguas indígenas faladas ao Norte do Estado do
Amazonas Bolsista/CNPq: Erick Marcelo Lima de Souza (Orientador: Prof. Dr.
Frantomé Pacheco);
3) Produção bibliográfica sobre as línguas indígenas faladas ao Sul do Estado do
Amazonas. Bolsista/CNPq: Aquiles Santos Pinheiro (Orientador: Prof. Dr.
Frantomé Pacheco);
4) Produção bibliográfica sobre os povos indígenas da Bacia do Rio Solimões.
Bolsista/ CNPq: Márcia Meneghini (Orientador: Prof. Dr. Gilton Mendes dos
Santos);
5) Registro fonográfico de música indígena: estudo sobre a pesquisa, produção e
comercialização. Bolsista/ CNPq: Ivanilson Costa (Orientadora: Profa. Dra. Deise
Lucy Montardo);
6) Índios em contextos urbanos: o que sabemos em Manaus? Voluntária: Ângela
Andrade (Orientador: Prof. Dr. Carlos Dias Jr);
7) Mapeamento das Instituições governamentais e não-governamentais na Amazônia
Indígena: cenários a serem refletidos. Bolsista/CNPq: Inara do Nascimento
(Orientadora: Profª. Dra. Maria Helena Ortolan).
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Viagem de intercâmbio do bolsista Rogério Ribeiro Marinho à cidade de São Paulo
(Universidade de São Paulo/USP e Instituto Socioambiental/ISA) para apresentação
dos resultados preliminares da pesquisa e troca de experiências sobre Banco de
Dados e Sistema de Informações Geográficas.
Artigo de autoria de Rogério Ribeiro Marinho (bolsista CNPq) e Gilton Mendes dos
Santos (orientador) intitulado “Os Índios na escrita: a produção bibliográfica sobre
povos indígenas no Estado do Amazonas”. In: Fronteira, Diálogo e Intervención
Social em el Contexto Pan-Amazônico. In: José Rodríguez et. al. (org.), Universidad
de Guadalajara, Universidade Federal do Amazonas e Editorial Nordan-Comunidad,
Guadalajara, 2009.
Participação na 60ª Reunião Anual da SBPC, de 13 a 18 de julho de 2008, na cidade
de Campinas-SP, com a apresentação do trabalho intitulado Mapeamento da
produção bibliográfica sobre os povos indígenas no Estado do Amazonas,
publicado nos Anais da 60ª Reunião Anual da SBPC, Unicamp: Campinas, 2008.
(Rogério Ribeiro Marinho & Gilton Mendes dos Santos)
Matéria de capa, publicada no site da FAPEAM: http://www.fapeam.am.gov.br em
30 de junho de 2008.
Matéria intitulada Pesquisa sobre a Amazônia será reunida, publicada pela Agência
boletim eletrônico da FAPESP: http://www.agencia.fapesp.br/boletim_dentro
Matéria e entrevista concedida ao Jornal Em Tempo, Manaus, 02 de agosto de 2008.
Quanto aos resultados do levantamento bibliográfico e áudio visual faz-se necessário
registrar algumas limitações ou dificuldades enfrentadas pela pesquisa ao longo desses anos:
primeiro que as informações levantadas referem-se aos povos indígenas localizados num
espaço geográfico definido, isto é, ao Estado do Amazonas; segundo, as fontes primárias
(relatórios, cartas, mapas e outros documentos) não foram levantados e contabilizados no
Banco de Dados, isto é, a produção bibliográfica levantada é constituída, na sua quase
totalidade, de trabalhos publicados ou acessíveis ao público. Terceiro, as obras presentes em
acervos estrangeiros não foram alcançadas pelo levantamento, o qual priorizou as instituições
nacionais, especialmente os arquivos das instituições localizadas na cidade de Manaus.
O levantamento de dados sobre as instituições atuantes junto aos povos indígenas,
sejam elas indígenas e indigenistas, governamentais e não governamentais, foi limitado pelo
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acesso a determinadas informações, muitas delas indisponíveis ao público e/ou ocultadas
propositalmente pelas instituições.
Obstante as dificuldades imanentes a este tipo de levantamento, o que se apresenta
como resultado da pesquisa, tanto sobre a produção bibliográfica quanto sobre as instituições
que atuam junto aos povos indígenas no Estado do Amazonas, é um retrato fiel e “estrutural”
sobre ambos os temas. Isto é, embora os levantamentos não tenham alcançado todas as fontes,
sejam elas bibliográficas ou informativas sobre as organizações, o que conseguimos levantar,
mapear e sistematizar ao longo da pesquisa é algo representativo e indicador da dinâmica de
ambas as questões, a saber, o que existe produzido de textos sobre os povos indígenas no
Estado, e a atual presença institucional junto a estes povos.
Embora o que temos mapeado seja uma mostra bastante representativa, é importante
frisar que os resultados alcançados por esta pesquisa não é algo conclusivo ou acabado. Muito
pelo contrário, trata-se de considerações preliminares, tanto o que foi levantado em termos de
dados quantitativos (formação dos Bancos de Dados) quanto das análises qualitativas
(temáticas e por região etnográfica) efetuadas sobre o material coletado.
O último ano de atividades do projeto foi dedicado particularmente à correção e
padronização dos Bancos de Dados e análises temáticas efetuadas pelos pesquisadores e
colaboradores. Seus resultados estão apresentados nas páginas abaixo. As tabelas de dados
sobre as instituições estão organizadas em Excel, e os dados das fichas bibliográficas em
programa Access. Ambas foram convertidas para a plataforma web e estarão disponíveis para
consulta no site do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI/PPGAS) da
Universidade Federal do Amazonas: www.neai.ufam.edu.br. Este formato permitirá melhor
visualização dos dados, bem como consultas e novas inserções de novos dados.
Este relatório final está composto de duas partes, ou melhor, de dois temas, um sobre a
produção bibliográfica (e áudio-visual) e outro sobre as instituições atuantes junto aos povos
indígenas. A primeira parte, por sua vez, está organizada sob duas diferentes abordagens
debruçadas sobre o material levantado, uma temática, que privilegia assuntos como línguas
indígenas, organização social, índios urbanos e produção áudio-visual e outra que aborda
regiões ou complexos etnográficos, como Rio Negro, Javari e Médios rios Juruá-Purus.
Ambas as abordagens, temáticas e geográficas se justificam pelo interesse, atuação e
especialidade de cada pesquisador envolvido no projeto.
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INTRODUÇÃO
Gilton Mendes dos Santos
Coordenador do projeto Amazonas Indígena, professor do Departamento de Antropologia da
UFAM e pesquisador do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena do Programa de Pós-Graduação
em Antropologia Social da UFAM (NEAI/PPGAS)
a) Do contexto indígena na Amazônia
Embora os estudos de arqueologia, de ecologia histórica e linguística revelem que a
presença humana na Amazônia se deu há mais de oito mil anos (Balée, 1989, 1993;
Roosevelt, 1998; Fausto, 2000), os primeiros registros históricos sobre as sociedades nativas
da Amazônia datam do começo da ocupação do continente pelos europeus, a partir do século
XVI.
As narrativas das viagens de Francisco de Orellana e Pedro Teixeira, registradas,
respectivamente por Gaspar de Carvajal e Cristoban de Acuña trazem informações muito
dispersas e profusas sobre os povos nativos da região, mas atestam a densidade populacional
dos habitantes das margens do grande Rio das Amazonas. Tempos depois ganham
notoriedade as descrições e os mapeamentos elaborados pelos missionários Samuel Fritz e o
padre João Daniel, que viveram na Amazônia colonial entre os séculos XVII e XVIII. Neste
período, vale destacar o resultado das primeiras expedições científicas à Amazônia,
inauguradas pelo astrônomo francês La Condamine e a Viagem Filosófica do luso-brasileiro
Alexandre Rodrigues Ferreira. O século XIX, por sua vez, é fortemente marcado pelas
expedições dos viajantes naturalistas à Amazônia, que tomaram a região como um imenso
laboratório, um lugar para a Ciência, de descobertas e revelações, o lugar cobiçado pelos
cientistas do Velho Mundo, que revelaria e responderia ao intrigante problema da origem das
espécies, que corroboraria suas teses e hipóteses. Para isso, a Amazônia foi a fonte
inesgotável das espécies animais, plantas, insetos e pássaros coletados pelos naturalistas e
remetidos aos montes para os museus de seus países.
Os naturalistas contaram em suas expedições – que tinham as mais diferentes
finalidades, científica, filosofia natural, econômica, geográfica e de história natural – com a
imprescindível presença do “elemento nativo”, trazendo sobre estes importantes relatos e
informações sobre seus costumes. Dentre as tantas expedições científicas que exploraram a
Amazônia, podemos destacar aquelas realizadas pela dupla austríaca Spix & Martius entre os
anos 1817-1820; a dos ingleses Alfred Wallace e Henry Bates, entre os anos 1848 e 1859 e a
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do casal de americanos Luis e Elizabeth Agassiz nos anos 1865-1866. Importante registrar
que é somente no século XIX que a etnologia alcança o status de ciência, ou seja, um campo
especializado da investigação antropológica: na segunda metade deste século é que aparecem
obras de etnólogos propriamente ditos.
No inicio do século XX tem destaque a viagem de exploração de Koch-Grunberg ao
noroeste amazônico, resultando numa das mais expressivas contribuições para a etnologia
indígena do continente sulamericano.
Em 1914, o etnógrafo alemão naturalizado brasileiro, Curt Nimuendajú, publicou sua
primeira obra, um estudo sobre a religião dos Apapocuva-Guarani. Nos anos seguintes entre
1914 e 1932, este autor produziu cerca de vinte e um trabalhos, versando sobre as mais
diferentes áreas do conhecimento: linguística, psicologia, organização social, história etc.
Na segunda metade do século XX, depois das contribuições do Handbook of South
American Indians, editado pelo antropólogo americano Julian Steward (1946-1950), ganham
evidência na Amazônia indígena os trabalhos dos etnólogos Eduardo Galvão, Hebert Baldus e
Charles Wagley, e na década de 1970 têm destaque as pesquisas arqueológicas e
antropológicas de Beth Meggers e Anna Roosevelt. Neste mesmo período aparecem as
primeiras etnografias inauguradas por Roberto Cardoso de Oliveira e João Pacheco de
Oliveira sobre os Ticuna do Alto Solimões, as de Reichel-Dolmatoffe e do casal inglês
Stephen & Christine Hugh-Jones no Alto Rio Negro. Ainda nesta década e início dos anos
1980 surgem os trabalhos de pesquisa de campo de Berta Ribeiro, Janet Chernela, Robin
Wright e Jonatham Hill na bacia do Rio Negro e as de Bruce Albert entre os Yanomami.
Estes autores abriram caminho e iluminaram uma considerável produção
antropológica nos últimos 30 anos sobre as diferentes sociedades amazônicas [cf. Carneiro da
Cunha (org.) 1992; Descola & Taylor (orgs.) 1993; Viveiros de Castro & Carneiro da Cunha
(orgs.) 1993; Viveiros de Castro, 2002]. Isto é, a partir dos anos 1980 assistimos a uma
explosão de trabalhos etnográficos sobre os povos indígenas amazônicos, com centenas de
etnografias produzidas até os dias atuais, destacando-se ainda as sínteses teóricas, baseadas no
corpus etnográfico produzido pelos trabalhos de campo, elaboradas pelo antropólogo francês
Philippe Descola (1992) e o brasileiro Eduardo Viveiros de Castro (1996).
Por outro lado, vale destacar o crescente aumento de instituições de pesquisas,
entidades não-governamentais, religiosas, entre outras, atuantes junto aos povos indígenas na
região. Esta atuação associa-se diretamente com a crescente perda de atribuições do órgão
oficial indigenista (Funai e outros), o que tem levado o poder público a partilhar suas
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responsabilidades com outras agências governamentais, com missões religiosas e com
instituições não-governamentais. Após a promulgação da Constituição Brasileira de 1988 e,
particularmente a partir após a Eco 92, a Amazônia foi palco de atuação de inúmeras
instituições vinculadas aos mais diferentes interesses e linhas de ação. Nesse contexto, os
povos indígenas foram associados à biodiversidade, figurando como promotores da
conservação ambiental e detentores de saídas inteligentes contra as formas predatórias de
exploração dos recursos naturais perpetrado pelo modelo em vigor na Amazônia (cf. Posey,
1984, 1987, e 1992).
Instituições de pesquisa, órgãos do Estado e esferas da Igreja marcaram aí posições, e,
pari passu com as organizações não-governamentais, surgiram ou multiplicaram as
associações e federações indígenas, utilizando-se da imagem, difundida nacional e
nacionalmente, do índio como guardião da diversidade na Amazônia. De modo geral, como
revela uma pesquisa encomendada pela Coordenadoria das Organizações Indígenas da
Amazônia Brasileira (Silva, 2000), as mais de trezentas organizações indígenas existentes na
região surgiram no afã da disputa por um “mercado de projetos”, até então de exclusividade
das agências externas de apoio à “causa indígena”.
O resultado dessa atuação multi-institucional e acadêmica na Amazônia resultou numa
significativa produção, nas mais diferentes áreas, vindo à luz na forma de relatórios técnicos,
dossiês, textos, monografias, mapas, teses, livros e outras publicações. Por outro lado, várias
agências cresceram e expandiram, outras minguaram ou sucumbiram ao longo desse tempo. E
o que se verifica, de modo geral, é uma dispersão e fragmentação dessa produção, bem como
certo desconhecimento do que de fato foi conduzido entre os povos, as atividades e os
resultados de uma atuação ainda em curso na Amazônia.
O quadro atual apresenta-se complexo e diverso quanto às atividades desenvolvidas
por estas agências: a natureza de suas ações e objetivos, seu interesse, o tempo de atuação, a
área de abrangência, etc. A visualização global desse cenário, com sua conseqeente produção,
se encontra na maioria das vezes desconhecida e inacessível ao grande público e aos próprios
grupos indígenas, objetos de investigação ou atuação.
Atualmente, o Estado do Amazonas detém a maior diversidade cultural e maior
contingente populacional indígena do Brasil. De acordo com a Fundação Estadual dos Povos
Indígenas (FEPI, 2007) existe no Estado cerca de 60 povos com uma população estimada em
100 mil indivíduos, distribuída em 178 Terras Indígenas. Estas Terras, por sua vez,
compreendem cerca de 27% da área territorial do Amazonas.
15
b) Dos objetivos e da metodologia do mapeamento
Esta pesquisa teve como objetivo levantar, agrupar, sistematizar e analisar a produção
bibliográfica sobre os povos indígenas, bem como a atuação recente das diferentes instituições
entre estes povos no Estado do Amazonas. Para tanto, propôs reunir em um banco de dados
geográficos, informações que permitiram, de um lado, obter a distribuição espacial da
produção bibliográfica, e de outro verificar a presença das diversas instituições envolvidas
com os povos indígenas no Estado do Amazonas. Para dar cabo à organização do material foi
criado um banco de dados alfanumérico e um banco de dados geográficos através de um
conjunto de softwares denominados de Sistema de Informações Geográficas (SIG), que
possuem atributos sobre a produção bibliográfica e as instituições atuantes entre os povos
indígenas. Este SIG permitiu a elaboração de mapas temáticos com a análise espacial da
presença institucional e da produção bibliográfica1.
No que diz respeito à produção bibliográfica, o levantamento centrou-se sobre os mais
diferentes tipos de referências, a saber: livros, capítulos de livros, artigos, trabalhos
acadêmicos de conclusão de curso (relatórios de iniciação científica, monografias de
graduação, especialização, mestrado e doutorado); mapas, cartilhas, multimídias (CD-ROM,
DVD, CD, VHS, Fitas Cassete), jornais temáticos e os diversos guias de referência para
pesquisas que envolvem povos indígenas.
Para a coleta de dados a pesquisa foi elaborada uma ficha catalográfica com
informações básicas sobre a obra: autor, data, a região estudada, conteúdo da obra, povo alvo,
etc. (cf. Anexo a este relatório).
De igual modo, para o levantamento das instituições foi construída uma ficha de
identificação. As análises dos dados, por sua vez, abordam questões como localização da
sede, tipo de instituição, área de atuação, grupos alvos e locais de atuação. Assim como no
levantamento bibliográfico, foi elaborada uma ficha que permitisse ir além destas questões
norteadora como os programas, projetos, recursos envolvidos (em Anexo).
A primeira etapa da pesquisa consistiu na elaboração das fichas de levantamento de
dados, as quais foram, posteriormente, inseridas no banco de dados. Este primeiro banco foi
1
O referido sistema foi montado pelo estudante de Geografia Rogério Marinho, que participou do primeiro ano
do projeto como bolsista de IC. Seu relatório de Pibic, subsidiário desta pesquisa, é um mapeamento analítico
de toda a produção bibliográfica levantada no primeiro ano do projeto. Rogério Marinho ingressou no ano de
2009, no Mestrado do INPE, seguindo carreira na área de geo-processamento. Infelizmente o projeto não
contou com sua atuação para elaboração dos mapas temáticos nesta fase final.
16
criado na plataforma Microsoft Access contendo todos os campos que constam nas duas
fichas. A principal função desta primeira base foi de armazenar os “dados brutos”. Assim,
com os dados inseridos nesta base, realizamos consultas com critério nos campos de interesse
para espacialização das informações. Os principais campos do Banco são: Região, Povo e
Conteúdo, o que permite a análise espacial. Exemplificando, temos as seguintes questões que
podem ser respondidas com a construção de consultas com critérios: “Quais as publicações
identificada sobre o povo X?” ou mais especificamente “em quais povos se concentram as
pesquisas na região do Alto Rio Negro?”. Para questões como estas, utilizamos os campos
acima mencionados.
A segunda etapa da pesquisa centrou-se na montagem do banco de dados Geográfico
através de um conjunto de softwares que aqui denominamos de SIG, que permitiu a coleta, o
armazenamento, edição e visualização dos dados.
A terceira etapa, que foi o levantamento dos dados propriamente dito, se desenvolveu
ao longo dos dois anos de pesquisa, sendo tal levantamento mais intenso no primeiro ano,
entre setembro de 2007 e maio de 2008. Inicialmente, tomamos como fonte de informações o
livro de Herbert Baldus “Bibliografia Critica da Etnologia Brasileira - Volume I, II e III” e o
levantamento com fichas nas diferentes bibliotecas setoriais da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM), da Universidade Estadual do Amazonas e universidades particulares.
Foram investigadas bibliotecas públicas e particulares, acervos particulares e de núcleos de
pesquisas, bancos de teses e dissertações disponíveis on-line. Foram também explorados os
acervos do Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia (INPA), da Fundação Oswaldo Cruz
(FIOCRUZ-Amazônia), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN),
do Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas (IGHA), do Conselho Indígena Missionário
(CIMI), dentre outros em Manaus e na cidade de Lábrea. Foi também realizado um
levantamento nos arquivos do Museu Paraense Emilio Goeldi, particularmente sobre o tema
Línguas indígenas. Fontes alternativas na web como a Plataforma de Currículo Lattes,
mantida pelo CNPq e a lista de verbetes do site do Instituto Socioambiental (ISA)
contribuíram sobremaneira para o incremento do banco de dados bibliográficos.
Para as informações sobre as instituições indígenas e indigenistas foram utilizados os
dados obtidos junto às instituições atuantes no Estado do Amazonas, bem como de
instituições sediadas em Brasília, a exemplo do Instituto Socioambiental, Conselho
Indigenista Missionário, Ministério da Cultura (Prêmio Culturas Indígenas), Ministério do
17
Meio Ambiente (Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas/PDPI) e Carteira Indígena,
Fundação Nacional do Índio/FUNAI e outros órgãos governamentais. As informações foram
ainda levantadas em sítios e wbsites.
Vale sublinhar que no ano de 1954, o antropólogo alemão Herbert Baldus publicou o
maior e mais completo levantamento bibliográfico até então realizado sobre a temática
indígena no Brasil. Trata-se do primeiro volume de sua obra intitulada “Bibliografia Critica
da Etnologia Brasileira”, com 1.785 trabalhos que fazem referências a povos indígenas no
Brasil desde 1500 até o ano de 1953. Além das informações catalográficas, cada referência
bibliográfica é acompanhada de um comentário crítico do autor. Depois do grande
reconhecimento de sua empreitada, Herbert Baldus apresentou o segundo volume desta obra
em 1967, com mais 1.049 referências, as quais foram publicadas entre os anos de 1954 e
1967.
Dando continuidade a este inventário das publicações sobre o índio no Brasil, a
pesquisadora do Museu Paulista, Thekla Hartmamm organizou o terceiro volume da
“Bibliografia Critica da Etnologia Brasileira”, somando-se assim ao esforço de Herbert
Baldus. Esta autora conseguiu levantar, em um período de 15 anos, mais 1.765 trabalhos
publicados entre 1967 e 1982.
Assim, estes três volumes (Baldus, 1954; Baldus 1967; Hartmamm, 1984)
possibilitaram o avanço do conhecimento sobre a vasta literatura indigenista no Brasil e no
mundo, e um conhecimento específico sobre cada grupo indígena em seus mais variados
temas e abordagens.
Desse modo, consideramos que os resultados do levantamento do projeto Amazonas
Indígena, que ora apresentamos é, de certa forma, uma continuidade da bibliografia crítica
produzida nos anos 1950 pelo antropólogo Herbert Baldus.
c) Dos resultados do projeto Amazonas indígena
O banco de dados bibliográficos conta, até o momento (outubro de 2009), com 1575
registros, distribuídos conforme se tabela abaixo: Importante registrar que, desse total, 79 não
contam com aquelas informações básicas como título e/ou autor, o que faz cair para 1496 o
número de registros completos, isto é, daqueles que possuem informações catalográficas
essenciais2.
2
Em anexo a este relatório segue um catálogo de todos os registros constantes do Banco de Dados.
18
Tabela 1
Total de títulos levantados no banco de dados bibliográficos
TIPO
Livro
Dissertação
Tese
Monografia
Artigo
Mapa
Relatório
Cd-Rom
Video
Outros
PIBIC
Capitulo
QUANTIDADE
415
173
89
43
524
2
74
5
8
17
39
104
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
Gráfico 1
Distribuição da produção bibliográfica por tipo
P roduç ão bibliog ráfic o por tipo
600
500
400
300
200
100
0
Di
ss
Li
v
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ta
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B
C a IC
pi
tu
lo
Quantidade
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
Cronologicamente, podemos classificar as obras em dois grandes períodos: de 1745 à
1930 e de 1931 a 2009. O primeiro tem início com a Relation abrégée d'um voyage dans
l'intérieur de l'Amerique méridionale. Depuis la côte de la mer du Sud, jusqu'aux côtes du
Brésil et la Guiane, em descendant la rivière des Amazones, do astrônomo francês Charles
Marie de La Condamine, que faz menção específica sobre alguns povos da Amazônia
brasileira, trazendo um relato de suas incursões sobre o rio Amazonas e seus principais
tributários, descrevendo as características da flora, da fauna, dos lugares e de seus habitantes,
como os Omágua e os Manaós. À exemplo da obra de La Condamine, este primeiro período é
19
marcado por relatos de viajantes, naturalistas e missionários, em que os povos nativos da
Amazônia aparecem em linhas breves e imiscuídos à paisagem natural, principal alvo das
observações e interesses dos exploradores dos séculos XVIII e XIX.
O segundo período (1930 em diante) tem como referência o início da vasta obra do
alemão naturalizado brasileiro, Curt Nimuendajú, um dos pioneiros e mais importantes
etnólogos das sociedades indígenas do Brasil. Nimuendajú dedicou-se a compreender as
formas de vida social dos povos indígenas observando-os por dentro, revelando dimensões
nunca antes vistas pelos etnólogos: suas estruturas sociais, seus sistemas de parentesco e seus
esquemas cosmológicos de modo amplo e em conexão com a vida social dos grupos.
Nimuendajú colaborou com o Serviço de Proteção ao Índio (SPI) na Amazônia e também com
o Museu Paraense Emilio Goeldi, para quem recolheu importante acervo de bens culturais
para suas coleções museológicas. O conjunto de sua obra inaugura uma nova fase dos estudos
e das abordagens sobre os povos da região, que perdura até os dias atuais.
Vale sublinhar, no entanto, que os escritos do missionário alemão Theodor KochGrünberg, no início do século XX, entre os anos 1903-1905, alguns anos antes de
Nimuendaju, podem ser considerados como a pré-fase etnográfica da Amazônia indígena.
Vejamos abaixo a tabela com a distribuição da produção bibliográfico ao longo de
cada década, bem como o acumulado ao longo de todo o período:
Tabela 2
Distribuição da produção bibliográfica por década
Período
Produção
Acumulado
Até 1900
40
40
1900 a 1909
18
58
1910 a 1919
16
74
1920 a 1929
28
102
1930 a 1939
18
120
1940 a 1949
33
153
1950 a 1959
48
201
1960 a 1969
83
284
1970 a 1979
138
422
1980 a 1989
1990 a 1999
184
448
606
1054
2000 a 2009
478
1532
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
20
O gráfico a seguir mostra como se distribui cronologicamente (por década) a produção
bibliográfica sobre os povos indígenas no Estado do Amazonas.
Gráfico 2
Quantidade de obras por décadas entre o período de 1745 a 2009
P roduç ão bibliog ráfic a por déc ada
P roduç ão
19
at
é
1
00 90 0
a
19
1
10 909
19 a 1
20 919
a
19
1
30 929
a
19
1
40 939
a
19
1
50 949
a
19
1
60 959
a
19
1
70 969
19 a 1
80 979
a
19
1
90 989
a
20
1
00 999
a
20
09
1600
1400
1200
1000
800
600
400
200
0
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
Tomando os números registrados na tabela3 e o gráfico acima, podemos inferir que: a)
a produção bibliográfica anterior ao século XX é bastante baixa, num total de 40 até o ano de
1900; b) há uma escalada crescente da produção bibliográfica ao longo do tempo, desde os
primeiros registros, no século XVIII até o ano 2009; c) a década de 1940 computou um
número (33 registros) quase que o dobro da produção da década anterior (18); d) o número de
registros na década de 1990 (448) é mais que o dobro daquele levantado na década de 1980
(184): certamente este significativo aumento seja consequência da atuação institucional
indígena e indigenista amplamente desencadeada a partir desse momento; e) a década de 1960
é marcada pelo aparecimento das obras monográficas4: o primeiro trabalho identificado nesta
categoria é a dissertação de Homer Firestone (1962), resultado de uma pesquisa lingüística
com os Siriano da região do Rio Negro, desenvolvida na Universidade do Novo
México/EUA; o segundo é a tese do antropólogo Napoleon Chagnon (1966) sobre a
organização social e política dos Yanomami, defendida na Universidade de Michigan.
3
4
Para este cálculo, o número total de registros (1532) foi superior ao número de “registros completos” (1496),
uma vez que contabilizou também algumas fichas com dados incompletos.
Consideramos aqui como obras monográficas as teses (doutorado), dissertações (mestrado), monografias de
Especialização, trabalhos de conclusão de curso e relatórios técnicos e de iniciação científica.
21
Vale destacar que do total de 1575 registros cadastrados, 347 são obras monográficas,
correspondendo a 22% de toda a produção bibliográfica levantada. Os centros de ensino que
mais se destacam na produção da pesquisa etnológica são: Universidade Federal do
Amazonas (UFAM), com 118 trabalhos, a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP),
com 33 obras, a Universidade Federal do Rio de Janeiro/Museu Nacional (UFRJ/MN) com 26
títulos e a Universidade de São Paulo (USP), responsável por 24 trabalhos monográficos.
Se dividirmos toda a produção bibliográfica entre as duas principais bacias que
banham o território do Estado do Amazonas, a do Rio Solimões (com os seus principais
tributários Japurá, Javari, Juruá e Purus) e a do Rio Negro (com os seus afluentes Uaupés,
Içana e Xié), encontraremos um acervo distribuído relativamente igual entre ambas: os povos
do Rio Negro aparecem em 503 títulos e os do Rio Solimões em 562 obras – excetua-se aqui a
região do Baixo Amazonas e seus tributários, isto é, a jusante do encontro das águas dos rios
Negro e Solimões. Mas, se esta produção for alocada entre as regiões ou mosaicos
etnográficos notaremos uma distribuição muito desigual dessa produção. Vejamos a tabela
abaixo:
Tabela 3
Distribuição da produção monográfica entre as principais bacias hidrográficas
Rio Negro
Vale do Javari
Médio Juruá-Purus
Baixo Amazonas
503
70
231
197
(112 monografias)
(19 mon.)
(52 mon.)
(41 mon.)
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
Importante ressaltar que a região do Alto Rio Negro (noroeste amazônico), conhecida
também como “cabeça do cachorro” apresenta uma elevada diversidade cultural, com 23
sociedades, uma das mais expressivas da América do Sul, abarcando quase toda a produção
bibliográfica da Bacia rionegrina (maiores detalhes sobre esta região seguem abaixo em ítem
específico sobre a região). Na região etnográfica do Vale do Javari somam-se cerca de 73
obras sobre os povos indígenas na região, das quais 19 são monografias acadêmicas (maiores
detalhes no ítem sobre a região do Javari, páginas abaixo). Na região dos Médios rios Juruá e
Purus, que conformam um mosaico etnográfico, o total de títulos levantados é de 231, dos
quais 52 são resultados de pesquisas etnológicas (maiores detalhes no ítem sobre o Médio
Purus-Juruá, páginas abaixo).
22
Os principais temas (“conteúdos”) abordados pela massa bibliográfica levantada
encontram-se assim distribuídos:
Cultura
Língua
Mitologia
Política
Saúde
Educação
História
Etnoconhecimento
446
373
133
129
116
115
88
86
O banco de dados traz registros sobre 70 povos (do presente e do passado) habitantes
do atual Estado do Amazonas. Desse conjunto se destacam:
Tabela 4
Principais detentores da produção bibliográfica
Povo
Yanomami
Ticuna
Tukano
Baniwa
Quantidade de referências
Total
Monográfica
157
24
151
35
114
32
92
20
Fonte: NEAI, 2009
Org: Gilton Mendes dos Santos
Dos povos em destaque na tabela acima, com exceção dos Ticuna, todos são
habitantes do Alto Rio Negro, região de maior concentração da literatura bibliográfica.
Se, por um lado, como vimos acima, povos como os Yanomami, os Ticuna e os
Tukano contam com um número de referências na casa dos cem, por outro há povos que não
alcançam mais que um dígito, como é o caso dos Makuna, com duas referências, e dos MiritiTapuya, Kanamanti e Hi-Merimã, dentre outros, com apenas dois títulos.
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23
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24
ANÁLISE DA PRODUÇÃO SOBRE AS LÍNGUAS DOS POVOS INDÍGENAS DO
AMAZONAS
Frantomé Bezerra Pacheco
Professor do Departamento de Antropologia da UFAM e pesquisador associado do Museu Amazônico
e do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI/PPGAS)
Introdução
Há, no Estado do Amazonas, 56 línguas ainda faladas, segundo um levantamento
realizado em Rodrigues (1986; cf. tb. Rodrigues 2000; Queixalós & Lescure, 2000). Mas,
atualmente, podemos sustentar que há, a partir dos levantamentos propostos por Moore (2009)
e Rodrigues (2006), entre 50 e 56 línguas indígenas ainda faladas no Estado. A determinação
do número de línguas depende de fatores como: 1) distinção entre línguas e dialetos, como no
caso Baniwa-Kuripako; 2) o alcance de uma língua, que pode se estender além das fronteiras
étnicas, como o Tukano e o Nheengatu; 3) falta de um levantamento sociolinguístico que
verifique quais línguas indígenas os povos indígenas falam, principalmente em situações que
envolvem línguas indígenas em contato (como é caso da região do Nhamundá-Mapuera); 4) a
mobilidade de famílias e pessoas de uma etnia entre as fronteiras políticas e transnacionais.
A maioria dessas línguas conta com alguma produção acadêmica (teses, dissertações,
artigos em periódicos, livros, capítulos, verbetes em enciclopédias) que versam sobre os mais
diversos aspectos da estrutura e uso da língua (Franchetto, 2000). Grande parte dessa
produção se encontra nas bibliotecas digitais disponibilizadas pelas Universidades nas quais a
pesquisa foi realizada, no caso de teses e dissertações. Há várias bibliotecas virtuais em sites
voltados
para
a
discussão
da
temática
indígena,
como
a
etnolinguística
(cf.
www.etnolinguistica.org). Trata-se aqui, portanto, de uma explanação sobre a área temática
Línguas Indígenas dentro do Projeto, aqui relatado, intitulado “Amazonas indígena: um
mapeamento das instituições e da produção bibliográfica sobre os povos indígenas do
Estado”, que tinha por objetivo um levantamento da produção bibliográfica e das instituições
que trabalham com os povos indígenas do Estado do Amazonas, bem como a disponibilização
dos dados em formato digital, coordenado pelo Prof. Dr. Gilton Mendes do
PPGAS/NEAI/UFAM. Para que os objetivos do subprojeto dedicado às línguas indígenas
fosse alcançado, pelo menos em suas linhas mais gerais, foram realizadas duas pesquisas de
PIBIC, apresentadas adiante, que procuraram fazer um levantamento da produção
bibliográfica realizada sobre as línguas do Estado, agrupadas geograficamente como línguas
ao Norte e ao Sul da calha do Amazonas-Solimões, que é o grande curso de água que corta ao
meio a Amazônia brasileira. Essas pesquisas procuraram pesquisar essas informações de
25
forma a contemplar os seguintes aspectos: língua, região onde é falada, população aproximada
de falantes, tipo de produção e, quando possível, o impacto no meio acadêmico e entre as
organizações indígenas e não indígenas, atentando-se, igualmente, para as eventuais lacunas
referentes a aspectos da estrutura e uso da língua que podem ser abordados em futuras
pesquisas sobre essas línguas.
Pode-se, afirmar, dessa forma, que os objetivos acima traçados foram em grande parte
alcançados e espera-se que as pesquisas realizadas acerca da produção sobre as línguas
indígenas do Amazonas possam contribuir para a realização de novas pesquisas que
considerem, a partir da produção encontrada no banco de dados, os avanços já obtidos ao
longo dos estudos das línguas em foco.
Situação das línguas indígenas e áreas de grande diversidade linguística no Estado
As línguas indígenas são línguas de minorias étnicas e correm o risco de desaparecer,
pois seu uso é restrito, seus falantes são em número bastante reduzido e só recentemente há
uma política do Estado para a sua revitalização e uso como línguas de instrução e ensino nas
escolas indígenas. A urgência da documentação e descrição dessas línguas é grande e
sustenta-se que a produção científica sobre elas contribua para valorizá-las como línguas de
expressão legítimas dos povos que as falam, para criar políticas de proteção da diversidade
lingüística, além de contribuir para as pesquisas sobre o conhecimento tradicional expresso
através delas, sendo elas próprias uma das formas de conhecimento tradicional.
Conforme foi informado, o número de línguas ainda faladas no Estado do Amazonas
varia entre 50 e 56. E estima-se que houvesse, na época da colonização da Amazônia, pelos
portugueses, pelo menos o dobro disso (Rodrigues, 2000). Entre as línguas que desapareceram
diante do contato com os não-indígenas estão o Baré, o Mura, o Torá e o Kokama. Note-se
que há membros dessas etnias que se identificam como pertencentes a elas, mesmo
empregando uma variedade regional/indígena do português. Ao lado das línguas vinculadas
tradicionalmente às etnias, há a Língua Geral Amazônica (o Nheengatu) que deriva,
historicamente, do Tupinambá e foi adotada como língua franca no período colonial,
estabelecendo a comunicação entre indígenas e não-indígenas, até ser proibida pelo Marquês
de Pombal em 1758 através do “Diretório que se deve observar nas povoações dos índios do
Pará e maranhão”. Atualmente, essa língua é falada ainda no Rio Negro, sendo empregada por
muitos povos como língua de identidade étnica, conforme se observa entre os Baré, cuja
língua tradicional já não é mais falada.
26
A seguir, apresentamos um panorama, baseado no levantamento feito por Moore
(2009), da situação das línguas com relação ao número de falantes, a partir do qual podemos
fazer prognósticos do futuro dessas línguas como formas de comunicação entre os membros
de suas respectivas sociedades.
Entre as línguas indígenas com maior número de falantes no Estado do Amazonas
(acima de 4.000 falantes) estão: Sateré [6.219 falantes, Moore, 2009]; Baniwa [5.811 falantes,
Moore, 2009]; Tikuna [35.000 falantes, Moore, 2009]; Tukano (Ye‟pã-masa) [8.000 falantes,
Moore, 2009]; Yanomami [6.000 falantes]; Yanomam [4.000 falantes]; Língua Geral
Amazônica (Nhenngatu) [6.000 falantes, Moore, 2009].
A maioria das línguas conta com poucos falantes (abaixo de 100 falantes), como os
Bará e Barasana, com 21 e 34 falantes, respectivamente; Makúna (Tukano), com 32?
Falantes; Siriano (Tukano) com 71? falantes; Kawahíb, falado pelos Jiahui e Juma,
respectivamente, com 6 falantes; Kawahíb, falado pelos Parintintin, com 10 falantes; Kaixána
com 1 falante; Korubo com 25 falantes; Kulina (20 falantes); Katukina-kanamari com 30?
Falantes; Warekena do Xié, falado por 20 a 40 falantes. Há outras sobre as quais não se tem
informação, como por exemplo, o Yuriti (Tukano)5.
Acima de 100 falantes (até 1.000), temos as línguas: Yuhup (617 fal.);
Kotíria=Wanano (650 falantes); Tuyuka (825? fal.); Kawahíb (Tenharim) (350 fal.); Paumari
(290 fal.); Katukina-kanamari (Katukina do Rio Biá) (450 fal.); Matis (322 fal.); Kubewa
(150-220 fal.); Katukina (Pano) (404 fal.); Jamamadi (884 fal.), Deni (875 fal.) e Jarawara
(180 fal.). E entre 1.000 e 4.000 falantes, destacam-se as línguas Apurinã (2.000-3.000 fal.);
Hup (1.900 fal.); Kanamari (1.654 fal.); Marúbo (1.252 fal.); Wai-wai e subgrupos
relacionados (2.914 fal.); o Waimiri-Atroarí (1.120 fal.).
Há ainda regiões da Amazônia em que se encontra o multilinguismo, como é o caso do
Noroeste Amazônico, no qual, devido aos casamentos orientados pela exogamia linguística,
há várias línguas convivendo numa comunidade. Como consequência, encontram-se falantes
que dominam três ou mais línguas, que são faladas no cotidiano da sua família (além de
compreender outras línguas faladas na comunidade). Nessa região, têm-se o seguinte quadro
de línguas faladas:
5
A interrogação indica que o número de falantes precisa ser confirmado, sendo incerto ou aproximativo.
27
Tabela 1
Línguas faladas no Noroeste Amazônico separadas por famílias linguísticas
Tukano
Aruák
Maku
Tukano
Baniwa
Hupda
Desana
Kuripako
Yuhupde
Kubeo
Warekena
Dow
Wanano
Tariano
Nadöb
Tuyuca
?Baré
Kakwa
Pira-Tapuya
Yanomami
Tupi-Guarani
Yanomami
Nheengatu
Nukak
Arapaso
Karapanã
Bará
Siriano
Makuna
*Tatuyo
*Yuruti
*Barasana
*Taiwano
Obs: Note-se que asterisco indica as línguas faladas além das fronteiras brasileiras.
Investigar essas línguas, numa situação de contato de línguas e poliglotismo, é um dos
desafios da pesquisa acadêmica sobre a cultura e línguas dessa região da Amazônia.
Outras áreas do Amazonas onde se encontra um panorama linguístico bastante
diversificado são:
1) Juruá-Purus: com predominante presença de povos da família Arawá. Vivem
nessa região, igualmente, o povo Apurinã, da família linguística Aruák. As línguas
Arawá apresentam bastante proximidade, conforme se pode ver na comparação lexical
entre elas abaixo esboçada (as setas indicam a direção da leitura/comparação):
Tabela 2
Percentagem de cognatos entre as línguas Arawá a partir da comparação de um léxico
comum
Paumari
50
Madi
34
37
Suruwahá
43
61
34
54
79
53
Fonte: Dixon (2004: 12)
Kulina-Deni
72
Arawá
28
Note-se que o termo Madi inclui o Jarawara, Jamamadi e Banawá. A língua Arawá, do
qual provém o nome da família, está extinta desde século XIX. O contato entre os Jarawara e
os Apurinã influenciou o léxico de ambas as línguas, conforme mostra Dixon (2004: 12-13).
2) Vale da Javari: (Sudoeste do Amazonas): região com numerosos povos da família
Pano (Korubo, Kulina Pano, Marubo, Matis, Matsés), família Katukina (Kanamari,
Tsohom-djapá, Katukina do Biá/Jutaí, Katawixi) e outros 4 povos isolados, possui
uma grande variedade de línguas, sendo algumas bastante próximas, como Matis e
Matsés e outras bem distantes, quando se trata de famílias distintas.
3) Tapajós-Madeira: com concentração elevada de povos do Tronco Tupi (SateréMawé, Munduruku, Diahui, Parintintin, Tenharim), da família Mura (Mura e
Pirahã), Família Txapakura (Torá), família Aruák (Apurinã), família Katukina
(Kanamari). Note-se que os representantes das três últimas famílias não empregam
mais sua língua tradicional, sendo o caso também dos Mura.
4) Nhamundá-Mapuera: essa área tem uma concentração de povos Karíb, que
habitam terras na fronteira do Amazonas com o Pará. São eles: Hixkaryana,
Kaxuyana, Waiwai e seus subgrupos (Wawai karafawyana, Wawai Mawayana,
Wawai Xerewyana). Não se sabe, com certeza, como é quadro etnolinguístico dessa
região, por ser de difícil acesso e por terem ficado os povos dessa área em relativo
isolamento, devido à presença de missões evangélicas. Muitas das descrições
encontradas foram feitas por missionários do SIL, como as da língua Hixkaryana
(Derbyshire, 1986) e Waiwai (Hawkins, 1990).
5) Alto Solimões: apesar de não ser considerada uma área com numerosas línguas,
nela se encontrar uma das línguas com maior população de falantes, o Tikuna. No
entanto, essa área já abrigou grande diversidade cultural e lingüística conforme se
observa nas numerosas citações ao longo dos estudos e relatos realizados desde o
período colonial (cf. Porro, 1996, para um panorama histórico desses estudos).
Além disso, há poucas informações sobre os subgrupos dialetais do Tikuna, sendo
uma área de investigação que precisa ser enfatizada.
29
Alguns resultados extraídos do Banco bibliográfico - Área temática: Línguas indígenas
A partir de um levantamento no Banco de dados bibliográficos, observa-se que há um
grupo de línguas que conta com poucos estudos como Kubeo (2 artigos e 2 livros); BanawaYafi (3 artigos); Baré (1 artigo e 1 dissertação); Desana (2 livros; 1 artigo); Zuruahá (1 artigo
e 1 relatório); Warekena (1 artigo); Siriano (1 dissertação e 1 artigo), bem como as línguas da
família Makú e Pano, faladas no Estado.
Abaixo, apresentamos uma tabela com o número de produções encontradas no banco
de dados que versam sobre o tema língua, acima de 5 entradas:
Tabela 2
Amostragem das línguas mais investigadas constantes no Banco de Dados Bibliográficos
(BDB) (acima de 5 produções sobre o tema Língua)
Língua
Apurinã
BaniwaKuripako
Deni
Tipo de produção
4 livros; 1 tese; 8 artigos; 1
dissertação
7 livros; 3 artigos; 1 tese
5 livros; 2 artigos
Hixkaryana*
4 livros; 1 artigo
Jamamadi
2 livros; 4 artigos
Jarawara
1 livro; 1 tese; 4 artigos; 1
dissertação
2 artigos; 5 livros
Kulina
Matis
Matsé
Sateré-mawé
(Maués)
Munduruku*
Mura-Pirahã
Paumari
Tariana
Tikuna
Tukano
Wai-Wai*
Wanano
Yanomami
2 artigos; 2 dissertações; 2
teses
3 artigos; 1 dissertação; 1 tese
3 dissertações; 2 artigos; 6
livros
4 dissertações; 4 artigos; 3
livros; 1 relatório
3 dissertações; 5 artigos e 1
livro
15 livros; 8 artigos.
3 livros; 2 artigos; 1
dissertação
11 artigos; 7 livros; 2 teses; 1
relatório
13 livros; 6 artigos; 1
relatório; 2 dissertações;
4 livros; 2 artigos; 1 relatório
2 teses; 4 artigos
14 livros; 3 relatórios; 5
artigos
Quantidade
no BDB
14
11
7
5
6
7
7
6
5
11
12
8
23
6
21
22
7
6
22
Nota: *línguas faladas na fronteira do Amazonas com Pará.
Conteúdo das produções
Descrição gramatical; material didático
Léxico, Discurso, Fonética, Escrita,
Bilinguismo
Léxico, Gramática e alfabetização em
língua indígena
Discurso; Gramática; Comparação
Linguística
Discurso; Alfabetização em língua
indígena; Léxico e Gramática
Fonologia; Léxico; Gramática; Discurso
Gramática; Discurso; Léxico;
Alfabetização; Notas linguísticas
Fonologia; Gramática; Léxico; Notas
linguísticas (etnografia)
Gramática; Léxico; Discurso
Fonologia; Discurso; Gramática (escrita na
língua); Alfabetização; Notas linguísticas
Gramática; Léxico; Fonologia;
Sociolinguística
Fonologia; Gramática; notas linguísticas
Léxico; Alfabetização; Gramática
Léxico; Discurso;
Fonologia; Gramática; Discurso; Notas
linguísticas
Gramática; Fonologia; Discurso;
Alfabetização; Notas linguísticas
Fonologia; Morfologia; Léxico; Gramática;
Alfabetização
Fonologia; Gramática; Multilinguismo
Gramática; Fonologia; Léxico;
Alfabetização; Notas linguísticas
30
Será necessário, portanto, continuar alimentando o banco de dados de forma a
adicionar no rol de produções linguísticas aquelas referências que ficaram de fora, bem como
relacionar a produção linguística com a área em que são faladas as línguas. Certamente, o
projeto Amazonas Indígena e sua área temática “Línguas Indígenas”, que resultou no banco
de dados das produções linguísticas e apresentou resultados acadêmicos, como a formação de
quadros de pesquisadores iniciantes nas áreas temáticas com as quais trabalharam, precisará
de continuidade, pois as questões que suscitou precisarão ser aprofundadas através de
pesquisas específicas não apenas sobre a produção, mas acerca dos temas das produções sobre
as línguas amazônicas.
Pesquisas vinculadas ao Projeto Amazonas Indígena
Do ponto de vista da produção que tomou por base o projeto, trabalhando com o tema
língua indígena, houve dois PIBICs, realizados por Aquiles Santos Pinheiro e Erick Marcelo
Lima de Souza, sendo que ambos se encontram no mestrado (o primeiro iniciou seu curso no
PPGAS/UFAM em 2009 e o segundo iniciando seu curso no DL/IEL/UNICAMP em 2010).
Atualmente, há um aluno de PIBIC, André da Silva Leocádio, trabalhando com a produção
sobre os Baniwa, em particular sobre o tema língua, mostrando que o projeto continua a
abrigar novos pesquisadores iniciantes, que contribuem para a alimentação do banco de dados
e são beneficiados pelas informações nele constantes. Assim, cada vez mais as informações
são rediscutidas e aprofundadas através de pesquisadores que se interessam pela temática
indígena e buscam no banco de dados suporte confiável para suas pesquisas. Abaixo, seguem
os relatos acerca do desenvolvimento dos dois projetos de PIBIC já concluídos.
31
LEVANTAMENTO DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFIOCA SOBRE AS LÍNGUAS
INDÍGENAS FALADAS AO SUL DO ESTADO DO AMAZONAS
Aquiles Santos Pinheiro
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFAM
Introdução
O projeto intitulado “Levantamento das Línguas Indígenas faladas ao sul do
Amazonas” teve como objetivo principal, coletar e sistematizar o maior número possível de
informações sobre: a) o número de falantes de cada língua indígena; b) o tipo de produção
bibliográfica existente e; c) o impacto dessas produções no meio acadêmico e nas
organizações indígenas e não-indígenas. Como um desdobramento do objetivo geral,
pretendeu-se ainda expor as eventuais lacunas referentes a aspectos da estrutura e do uso
prático (pragmático) das línguas indígenas, os quais, se preenchidos, poderiam ser
investigados em pesquisas futuras. Os dados obtidos nesta pesquisa estão alocados no banco
de dados do projeto Amazonas Indígena, podendo ser acessados por toda a comunidade
acadêmica no site: www.neai.ufam.edu.br.
A realização desta pesquisa se justifica pelo fato de que a região amazônica apresenta
um grande número de línguas indígenas e que, apesar disso, pouco tem se desenvolvido em
pesquisa científica na área de antropologia linguística. Assim sendo, do ponto de vista da
investigação e produção do conhecimento científico, a realização dessa pesquisa revela-se da
maior importância. Em primeiro lugar, porque o levantamento e a sistematização de dados
bibliográficos são imprescindíveis à realização de qualquer pesquisa, pois a bibliografia é a
fonte de consulta que propicia uma visão geral dos trabalhos desenvolvidos sobre qualquer
tema. Nesse sentido, essa pesquisa se propôs a coletar e reunir o maior número possível de
informações sobre a produção bibliográfica existente sobre as línguas indígenas faladas no
Sul do estado do Amazonas e, em seguida, sistematizá-las e alocá-las num banco de dados
que seja fosse capaz de mostrar a situação atual de cada grupo indígena localizado no estado
do Amazonas.
No que se refere à produção bibliográfica sobre os grupos indígenas do Estado do
Amazonas, ela se reveste de maior importância, quando se constata, na literatura existente,
pelo menos duas dificuldades: a primeira, é que ainda há muitas lacunas sobre aspectos
importantes relativos à língua e a cultura dos povos indígenas do Amazonas; a segunda, é que
grande parte desta produção se encontra dispersa e, não raro, o acesso a ela é dificultado ou
restrito a um público especializado. Por exemplo, quando se procuram informações sobre
32
determinados grupos linguísticos, encontram-se lacunas com relação à pelo menos quatro
aspectos: (i) quantas e quais línguas são faladas; (ii) o número de falantes dessas línguas; (iii)
situação sociolingüística e de bilinguismo da comunidade de falantes e (iv) quais aspectos da
estrutura e uso da língua foram investigados e publicados por pesquisadores ou por programas
de educação escolar indígena e entidades que lidam com a questão indígena, incluindo-se aí,
as organizações e os movimentos indígenas. Nesse sentido, vale ressaltar que para se
estabelecer uma política linguística no Estado ou incrementar programas de educação para os
povos indígenas, é fundamental que se disponha do maior número de informações possíveis,
tendo em vista a orientação das ações do Estado, bem com das organizações indígenas e nãoindígenas.
No que se refere à pesquisa na área das Ciências Humanas, um diagnóstico básico,
contemplando, minimamente, um dos itens acima, é fundamental e estratégico, pois do
contrário, corre-se o risco de propor pesquisas desconectadas da realidade dos grupos étnicos
ou povos investigados. Além disso, mesmo em outras áreas das Ciências, essas informações
básicas são imprescindíveis ao planejamento da pesquisa, bem como à prevenção de seus
impactos sobre os povos desta região.
Portanto, quaisquer iniciativas no sentido de reunir o que existe, em termos de
produção bibliográfica sobre grupos indígenas tendo em vista o estudo científico da língua,
cultura e outras particularidades materiais e simbólicas desses povos, representam, sem
dúvida, um esforço considerável e de grande relevância para pesquisadores em geral, visto
que poupa tempo e esforço empregado na procura pela produção bibliográfica existente.
Nesse sentido, as ações empreendidas nesta pesquisa em conjunto com os alunos e
professores pesquisadores dos outros projetos que cooperam com o projeto “AMAZONAS
INDÍGENA”, do NÚCLEO
DE
ESTUDOS DA AMAZÔNIA INDÍGENA (NEAI) vem facilitar a árdua
primeira tarefa do pesquisador em línguas indígenas brasileiras, bem como em outras áreas
das ciências.
Em sua constituição, o Brasil mostra uma surpreendente sociodiversidade étnica,
cultural e linguística, com aproximadamente 206 etnias e 180 línguas indígenas, das quais
mais de 70% encontram-se na região Amazônica. Mais recentemente, Melatti (2006)
contabiliza um total de 160 línguas a partir dos levantamentos realizados por Rodrigues
(1986). Das cerca de 400 línguas indígenas faladas na América Latina, quase 50% são
próprias aos povos indígenas brasileiros. Entretanto, por apresentarem uma distribuição de
poucos falantes por língua, tais sociedades são definidas como minorias étnicas e linguísticas
(Monte, 2000 Apud Queixalós; Renault-Lescure, 2000).
33
De acordo com Adelaar (2000 apud Queixalós; Renault-Lescure, 2000), a perda da
diversidade linguística tem preocupado não só os linguistas, mas também os próprios
membros das comunidades cujas línguas estão ameaçadas, principalmente porque o
desaparecimento de uma língua acarreta na perda de grande parte da cultura de um povo.
Nesse sentido, Krauss (1992 apud Renault-Lescure, 2000), afirma que aproximadamente 95%
das línguas do mundo estão ameaçadas e considera que a extinção de uma língua é iminente e
inevitável no momento em que a língua deixa de ser ensinada as crianças ou quando estas
deixam de utilizá-la no seu quotidiano.
Diante desse cenário nada promissor, é de vital importância todo e qualquer esforço
que se oriente no sentido de registrar e estudar aspectos das culturas e das línguas ainda
faladas pelos povos indígenas da Amazônia. Inúmeros estudos têm sido realizados e muitos
outros ainda estão em curso, objetivando a compreensão de aspectos importantes sobre o
modo de vida desses povos. Nesse sentido, muitos estudos linguísticos têm sido realizados
junto a estes povos, resultando na produção de um conhecimento que pode e deve ser
revertido em prol dos interesses das comunidades indígenas em suas relações com os nãoindígenas e o Estado brasileiro (cf. Queixalós; Renault-Lescure, 2000).
Metodologia
A metodologia utilizada na execução da pesquisa baseia-se na que foi proposta no
projeto mais amplo, intitulado “Amazonas Indígena: um mapeamento das instituições e da
produção bibliográfica sobre os povos indígenas do estado do Amazonas”, coordenado pelo
Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI). Entretanto, deve-se ressaltar que a
pesquisa mais especifica, ou seja, a que tem a ver mais diretamente com aspectos linguísticos,
adotou, em sua execução - com algumas mudanças e/ou adequações - procedimentos
metodológicos próprios, tendo em vista o alcance dos objetivos predefinidos no projeto mais
específico, intitulado “Levantamento da Produção Bibliográfica sobre as Línguas Indígenas
faladas no sul do estado do Amazonas”, coordenado pelo Prof. Dr. Frantomé Bezerra Pacheco
e executada pelos alunos-bolsistas (CNPq): Aquiles Santos Pinheiro e Erick Marcelo Lima de
Souza.
De acordo com a metodologia indicada no projeto de maior alcance supramencionado,
todas as informações recolhidas deveriam ser compartilhadas nas fases finais da pesquisa com
os outros pesquisadores para busca de interesses afins. Essa busca de dados foi realizada, num
primeiro momento, nas bibliotecas e centro de documentações das universidades públicas e
privadas, bem como em museus, secretaria de cultura, bibliotecas públicas localizadas na
cidade de Manaus. Numa segunda etapa, se pretendia ampliar a pesquisa para outras capitais
34
brasileiras. Além disso, o projeto previa a realização de pesquisa em bancos de teses e
dissertações das bibliotecas virtuais de universidades brasileiras ou disponíveis por qualquer
outro meio eletrônico, como em endereços eletrônicos da rede mundial de computadores.
Para o alcance deste objetivo, elaborou-se uma ficha única, de natureza genérica para
ser utilizada em todos os subprojetos, onde estão sendo registradas todas as informações
referentes aos trabalhos encontrados nas bibliotecas públicas e privadas. Estas informações,
depois de sistematizadas foram inseridas no banco de dados idealizado e construído na
plataforma Acess, especialmente para este projeto. O arranjo ou estrutura do banco foi
construído de modo a permitir o cruzamento de informações e fornecimento de dados
quantitativos, isto é, a matéria-prima para futuras análises etnológicas e linguísticas.
Quanto às informações de interesse de cada projeto em particular, foram registradas
em fichas especialmente elaboradas pelos professores orientadores e seus orientandos, de
acordo os objetivos pré-estabelecidos no projeto maior e os demais projetos abrigados por ele,
bem como para atender o interesse de cada linha de pesquisa nas respectivas áreas e de acordo
com o objeto de investigação científica de interesse dos alunos bolsistas.
Para esse projeto, cujo objeto de estudo é a situação sociolinguística, a ficha mais
específica foi elaborada de modo a que se pudesse registrar nela, informações tais como:
tipo do material; nome do pesquisador; instituição; identidade étnica; localização do grupo
étnico; síntese do trabalho científico; data de publicação; conteúdo do trabalho científico;
bem como, outras informações mais pertinentes e específicas da área de linguística e
etnolinguística.
Note-se ainda que todos os dados recolhidos e inseridos no banco de dados foram
utilizados na formação do Sistema de Informações Geográficas (SIG), possibilitando,
dessa maneira, disponibilizar essas informações com maior praticidade, e com a vantagem
de relacionar cartografia e textos (cartas-imagens). Ou seja, este sistema possibilitou a
produção de um mapa virtual interativo, onde se podem obter informações sobre as
particularidades de cada povo indígena localizado em quaisquer regiões do estado do
Amazonas.
Depois de inseridos no banco de dados, todo esse conjunto de informações estará
disponível (online) ao público acadêmico e não-acadêmico para pesquisas e consultas, e
fazem parte do acervo da UFAM, do NEAI e do Museu Amazônico, e servindo,
principalmente, como fonte de pesquisa para os professores do Departamento de
Antropologia e do Instituto de Ciências Humanas e Letras da Universidade Federal do
Amazonas (ICHL/UFAM). Além de disponibilizar um roteiro das fontes para o estudo das
35
línguas indígenas ao Norte do estado, tais informações poderão servir para subsidiar
trabalhos de pesquisa em outras áreas do conhecimento do referido instituto e demais
unidades educacionais da UFAM.
Durante as etapas de execução do projeto foram realizadas as seguintes atividades:
1.
Elaboração de lista de línguas com informações gerais sobre o povo, seguindo-se
Rodrigues (1986), Ricardo e Ricardo (2006) e outros autores que deverão ser
pesquisados durante o desenvolvimento do projeto.
2.
Levantamento da produção bibliográfica sobre as línguas indígenas disponível nas
bibliotecas e arquivos de Manaus.
3.
Levantamento da produção bibliográfica disponível na Internet, com informações
sobre o lugar onde esse material está localizado.
4.
Organização dos dados obtidos por categoria e relacionados aos obtidos pelos
demais pesquisadores.
A organização dos dados foi orientada, prioritariamente, pelo mapeamento de Terras e
Povos Indígenas apresentado na última edição do livro “Povos Indígenas no Brasil”,
publicado pelo Instituto Socioambiental (cf. RICARDO & RICARDO, 2006) e
disponibilizado no site www.sociambiental.org, que tem atuado como parceiro do Núcleo de
Estudos da Amazônia Indígena (NEAI) num importante intercâmbio de informações e
também por ser uma das principais fontes de informação no que se refere à questão indígena.
Atividades desenvolvidas no decorrer da pesquisa
O desenvolvimento da pesquisa ocorreu de acordo com o estava previsto no
cronograma de atividades. Durante o mês de agosto de 2007 me concentrei na elaboração de
uma lista das línguas ainda faladas pelos povos indígenas localizados no sul do estado do
Amazonas. Para tanto, utilizei como referência, entre outras, as obras de Aryon Rodrigues
(1986; 2000), Ricardo e Ricardo (2006), o banco de dados do ISA. Neste período, participei
ainda de duas reuniões de planejamento e treinamento para uso das fichas, tanto a ficha
genérica como a mais específica, correspondentes, respectivamente ao projeto de maior
alcance do NEAI, bem como ao projeto mais especifico.
A primeira reunião foi coordenada pelo professor doutor Frantomé Bezerra
Pacheco, que elaborou a ficha mais específica utilizada no levantamento bibliográfico
mais específico, isto é, que trata de questões relacionadas à linguística (fonologia,
morfologia, sintaxe, texto-discurso etc.). Nesta reunião, ficou decidido que utilizaríamos
esta ficha em caráter experimental, para verificar a sua funcionalidade e possíveis
36
limitações, e caso fosse necessário, faríamos os ajustes necessários. Entretanto, na prática,
esta ficha não foi utilizada, pois se priorizou o uso da ficha mais genérica.
Fomos orientados ainda a fazer uma revisão bibliográfica nas obras pertinentes às
línguas amazônicas, sendo sugerida a leitura da obra “As Línguas Amazônicas Hoje” de
autoria de F. Queixalós e Renault-Lescure et al., (2000), bem como as obras indicadas na
bibliografia do plano de curso da disciplina: “Tópicos Especiais em Antropologia: relação
língua, cultura e identidade” (IHS 388), da qual havíamos participado no 1 o semestre de
2007. Tais leituras foram indicadas para que pudéssemos ter uma visão mais ampla sobre
o estado da arte na literatura mais atualizada sobre este tema.
A segunda reunião, ainda no mês de agosto de 2007, foi dirigida pelo professor
doutor Gilton Mendes dos Santos, coordenador do projeto mais amplo denominado
“Amazonas Indígena: um mapeamento das instituições e da produção bibliográfica sobre os
povos indígenas do estado do Amazonas” ao qual este projeto está vinculado. Nesta reunião
fomos esclarecidos sobre os objetivos do referido projeto, sobre a sua área de abrangência
e os possíveis desdobramentos da pesquisa, bem como os deveres e responsabilidades de
cada membro da equipe (professores e alunos-bolsistas). Na ocasião, recebemos o modelo
de ficha que seria utilizada no levantamento da produção bibliográfica sobre os povos
indígenas do Amazonas, a qual, segundo o professor Gilton Mendes já havia sido testada e
produzido resultados satisfatórios. Tal ficha foi elaborada tendo em vista o registro das
informações necessárias à identificação e localização institucional da produção
bibliográfica sobre os povos indígenas do Amazonas, contendo informações, tais como
título da obra, autor, tipo de trabalho, local, editora, ano da edição, palavras chave,
localização institucional, resumo do conteúdo, entre outras.
Ainda nesta oportunidade, nos foi entregue uma lista com os nomes e endereços
das instituições que deveriam ser visitadas pelos alunos bolsistas encarregados de realizar
o levantamento bibliográfico. Em seguida, a equipe foi dividida em quatro duplas, sen do
que, para cada dupla foram designados um ou mais setores. Ficou decidido ainda, que
iniciaríamos a pesquisa pela biblioteca setorial norte e salas de documentação da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM), seguida do Museu Amazônico (MUSA),
Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia, Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e
demais instituições públicas e privadas que porventura tivessem em suas bibliotecas, obras
acerca dos povos indígenas do Amazonas.
Ainda no mes de agosto de 2007, iniciei o levantamento bibliográfico na biblioteca
setorial-norte da Ufam, e salas de documentação, onde consegui preencher 48 fichas
37
referentes a teses e monografias sobre os povos indígenas do Amazonas, todos localizados
na biblioteca da Ufam. Participei ainda, de um mutirão de limpeza do local (Pólo
Avançado da Faculdade de Direito da Ufam) que até o presente tem servindo de sede do
Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI), bem como auxiliei na instalação dos
equipamentos (computadores, impressoras, scanners, nobreaks, mesas, armários etc.)
destinados à instalação do banco de dados.
Nos meses de setembro e outubro de 2007, prossegui com o levantamento
bibliográfico e também com as leituras e fichamentos dos textos recomendados pelo
professor orientador, Prof. Dr. Frantomé B. Pacheco, tendo em vista a análise posterior do
material coletado, particularmente os trabalhos pertinentes aos aspectos linguísticos do
complexo linguístico dos povos amazônicos localizados no sul do estado do Amazonas.
No mês de novembro de 2007, participei de duas reuniões para orientação da
apresentação do PIBIC. Uma delas coordenadas pelo Prof. Dr. Gilton Mendes onde tive a
oportunidade de fazer um ensaio prévio da apresentação de slides (ppt) com informações
sobre o andamento da pesquisa, em preparação para a avaliação parcial do PIBIC. A outra
reunião foi coordenada pelo professor orientador, doutor Frantomé B. Pacheco, com o
objetivo de fazer as últimas correções e ajustes finais no conteúdo dos slides para a
apresentação oral dos resultados parciais da pesquisa (PIB - H - 057/2008). No dia 9 de
novembro de 2007, fiz a defesa oral do projeto no auditório Rio Negro do ICHL/UFAM.
De 3 a 7 de dezembro de 2007, participei da conferência “A Estrutura das Línguas
Amazônicas: fonologia e gramática”, onde tive a oportunidade de assistir a apresentação de
vários trabalhos científicos sobre linguística, bem como apresentei um painel (banner) com
um resumo dos resultados parciais do projeto.
No mês de janeiro de 2008, me ocupei em realizar uma busca na Internet; nos bancos
de teses de várias universidades brasileiras, com a finalidade de levantar a produção
bibliográfica sobre as línguas indígenas do Sul do estado do Amazonas.
No mes de fevereiro de 2008, pesquisei a biblioteca da Universidade Luterana (ULBRA),
onde levantei um total de (12) doze trabalhos. Ainda neste mês, participei de duas reuniões de
avaliação do andamento da pesquisa. Nessa reunião, decidiu-se colocar como meta, a finalização
da pesquisa nas universidades privadas até o final de Março de 2008.
Durante todo o mes de Março de 2008, concentrei meus esforços em pesquisar as
universidades particulares: Uniniltonlins, Ciesa, Uninorte e Faculdade Salesiana Dom Bosco.
Entretanto, só consegui realizar a pesquisa na Faculdade Salesiana Dom Bosco, onde
38
consegui levantar (oito) 8 trabalhos. Portanto, não me foi possível concluir a pesquisa nas
demais instituições, conforme ficou estabelecido na última reunião realizada no mes anterior.
No mes de Abril de 2008, conclui a pesquisa na Faculdade Salesiana Dom Bosco e em
seguida fui pesquisar no setor de documentação do Conselho Indigenista Missionário (CIMI),
onde consegui levantar um total de (16) dezesseis trabalhos.
Durante o mes de Maio de 2008, fiz mais duas visitas ao CIMI, catalogando mais
quatro (04) trabalhos sobre linguística. No corrente mês, estive empenhado em separar e
sistematizar os dados obtidos na pesquisa, tendo em vista a elaboração do relatório parcial que
deveria ser entregue ao NEAI.
Resultados
Nesta seção apresentarei os resultados do levantamento da produção bibliográfica das
línguas indígenas faladas no Sul do estado do Amazonas. Objetivando uma melhor divisão do
trabalho de coleta de dados e distribuição dos resultados obtidos, decidimos dividir o estado
do Amazonas em duas grandes áreas tomando como referência o curso do rio Solimões em
toda a sua extensão; ficando uma grande área ao norte e outra ao sul do curso do rio,
conforme exemplificado no mapa da figura seguinte.
Figura 1
Mapa do Estado do Amazonas
39
Essas duas grandes áreas foram ainda subdivididas a partir das “Áreas Etnográficas”
propostas por Melatti (2007), assinaladas pelo tracejado sobreposto ao mapa do estado do
Amazonas, conforme observado na figura seguinte.
Figura 2
Áreas Etnográficas no Estado do Amazonas
Os números dentro do tracejado indicam as “áreas etnográficas” formuladas por
Melatti (2007) enquanto que as letras indicam subáreas ou subdivisões das áreas etnográficas.
Observa-se que na área 3 (Solimões) que corresponde ao Sul do estado do Amazonas, estão
localizadas as subáreas a, onde estão localizados grupos indígenas que falam a língua Tikuna,
considerada “isolada”, ou seja, não classificada em um tronco linguístico específico. Na
subárea b, se encontram os Uitotos, Cambebas (língua mista) e os Miranhas (da família
Bora), bem como os Maiouruna, da família linguística Pano.
Na área 4, estão as subáreas a, b e c, onde predominam os grupos falantes de línguas
da família linguística Pano; matis, matsés, maias, marubos e corubos, bem como outros
grupos que não são da família Pano e são mais numerosos na área. São eles, os canamaris da
família linguística Katukina e culinas, da família linguística Arawá.
Na área 5 (haxuriada), estão as subáreas a, no curso inferior do Juruá, onde
predominam os culinas, da família Arawá, que também estão presentes em outros locais,
como no curso médio do mesmo rio ainda na área 4. Na subárea b, no curso médio do mesmo
rio estão os canamaris, que também vivem na área 4. Na subárea c, vivem os apurinãs que
40
também se fazem presente à jusante, ao longo do curso do rio Purus. Na subárea d, vivem
grupos menos dispersos: denis, zuruahás, jarauaras, canamantis, banauás, todos pertencentes
à família linguística Arawá. Na área e, estão os paumaris também da família linguística
Arawá.
Na área 6, correspondente à Amazônia Centro-Meridional, estão as subáreas d, onde
estão os maués,da família linguística Mawé, na fronteira do Pará com o Amazonas. Na
subárea e, estão localizados os mura da família linguística do mesmo nome. Na subárea f,
encontram-se os cauaíbas, representados por seus ramos: os thenharins e parintitintins
pertencentes ao tronco Tupi-Guarani, situados no estado do Amazonas; e os caripunas e
urueu-uau-uau do tronco Tupi, localizados em Rondônia.
Na subárea g, estão os uáris, da família linguística txapacura. Estão divididos em
vários grupos regionais, agrupados em diferentes postos indígenas. Na subárea h, no baixo
Guaporé, há ainda vários pequenos grupos de distintas famílias do tronco linguístico tupi que
vivem em dois postos da Funai, mas se mantêm como grupos autônomos: tupari, macurap,
uaioró, canoê, mequém, aruá.
Observe-se que, muito embora as áreas etnográficas de Melatti (2007) possam servir
como ferramenta teórico-metodológica importante para se compreender melhor o complexo
cultural e lingüístico dos povos nativos da Amazônia, há, contudo, limitações nessa
proposição, por exemplo, no caso da área 1, que deixa de fora uma grande extensão
geográfica, onde, historicamente, viveram e ainda vivem inúmeros povos indígenas em
intenso intercâmbio cultural tanto com outras etnias como com a sociedade envolvente. Por
essa razão é de se perguntar por que essa grande área não foi contemplada na área etnográfica
nº. 1, de Melatti.
Tabela 1
Tronco Linguístico Tupi
1
Família
Linguística
Língua mista
2
Mawé
3
4
5
Mundurukú
Tupi-Guarani
6
7
Língua
Kokáma (Omágua,
Cambeba)
Mawé (Sateré, Sateré-Mawé)
Mundurukú
Diahói (Diarroi)
Juma
Nheengatú
Parintin
Tenharim
Nº.
de Falantes
0 (BR)
8.378 / N
10.065
88
5
10.000
284
699
Povo
Localização
Kokáma
Sul
(Solimões)
Sul
SateréMawé
Mundurucu
Diahói
Baré
Sul
Sul
Sul
Norte
Sul
Sul
41
Segundo Rodrigues (2002), as línguas do mundo são classificadas em famílias
segundo um critério genético (aqui compreendido no sentido de gênese ou origem). De acordo
com esse critério, uma família linguística é um grupo de línguas para as quais se formula a
hipótese de que tem uma origem comum, no sentido de que todas as línguas da família são
manifestações diversas – modificadas no correr do tempo –, de uma única língua anterior.
O conhecimento dessas línguas é obtido mediante estudos histórico-comparativos, a
partir de correspondências regulares de sons, palavras e formas gramaticais entre duas ou
mais línguas. Tais comparações possibilitam a formulação de hipóteses sobre as propriedades
que deveriam ter a língua ancestral, permitindo explicar, com certo grau de precisão, a
derivação diferenciada das línguas atuais.
Tomando por base esse critério listamos na tabela 2, as famílias linguísticas
classificadas no tronco linguístico Tupi. As línguas Kokáma (Omágua/Cambeba), são
consideradas língua mista, porém, não há mais falantes dessas línguas. Os cambeba,
descendentes dos Omágua, falam o Nheengatu. Temos ainda no tronco linguístico Tupi, as
famílias linguísticas Mawé, Munduruku e Tupi-Guarani. Na tabela seguinte, listamos as
famílias não agrupadas em troncos linguísticos: Aruák, Bora, Karíb, Katukína, Makú, Mura,
Pano, Tikúna, Tukano, Txapakúra e Yanomámi.
42
Tabela 2
Famílias linguísticas não agrupadas em troncos
Família Linguística
Arawá
Língua
Banawá
Dení
Jamamadí (Kanamantí)
Jarawára
Kulína (Madihá)
Paumarí
Zuruahá
Apurinã (Ipurinã)
Baniwa do Içana
Nº. de falantes
101
875
884
175
2.537
892
144
3.256
5.811
Povo
Paumarí
Localização
Sul
Sul
Sul
Sul
Sul
Sul
Sul
Sul
Norte
Kámpa (Axáninka)
Kuripáco
Maxinéri (Manchineri)
969 (BR)
1.332
937
Sul
Norte
Sul
Aruák
Tariána
Warekéna
Norte
Norte
Bora
Miranha
Hixkaryána
55
805 (BR)
836
631
1.120
2.805
1.654
Norte
Norte
Sul
?
550
100
94
Sul
Sul
Sul
Norte
1.431?
300?
400?
Norte
Norte
Norte
Aruák
Karíb
Katukína
Makú
Mura
Pano
Tikúna
Tukano
Txapakúra
Yanomámi
Waimirí (Waimirí-Atroarí)
Waiwái
Kanamarí
Katawixí
Katukína
Txunhuã-djapá (Tsohom-djapá)
Dâw (Kamã)
Húpda
Nadêb
Yuhúp
Mura
Pirahã
Amawáka
Katukína
Kaxarari
Kulíno (Kulína)
Marúbo
Matsés
Tikúna(Tukúna)
Arapáso
Bará
Barasána
Desána
Juriti
Karapanã
Kubéwa (kubéo)
Mirití-Tapúya
Pirá-Tapúya
Siriána
Tukáno (Ye‟pa-masã)
Tuyúka
Wanána
Tora
Yanomámi (Ninám, Sanumá,
Yanomám, Yanomámi)
Norte
Norte
?
389
220?
404
Sul
Sul
Sul
Sul
323
125
1.252
1.592 (BR)
Sul
Sul
Sul
Sul
30.0000 (BR)
569
21
34 (BR)
2.204 (BR)
35?
1 (BR)
381 (BR)
75
1.438 (BR)
71 (BR)
6.241 (BR)
925 (BR)
735 (BR)
51
15.682 (BR)
Arapaso
Tariana,
Tuyuka
Norte/Sul
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Norte
Sul
Norte
43
Tabela 3
Resultados parciais da produção bibliográfica sobre as línguas indígenas dos povos
indígenas faladas ao sul do estado do Amazonas
Tipo de Publicação
Nº de Titulos
%
Artigo
55
35
Livro
71
44
Dissertação
14
9
Tese
Relatório
3
6
2
4
Monografia
2
1
PIBIC
5
3
Cd-Rom
Jornal
1
1
1
1
158
100
Total
Gráfico 1
Percentual da produção bibliográfica sobre as línguas indígenas dos povos indígenas faladas ao
sul do estado do Amazonas
Artigo
1%
3%
1%
4%
1%
Livro
2%
Dissertação
35%
9%
Tese
Relatório
Monografia
PIBIC
44%
Cd-Rom
Jornal
Fonte: Banco de dados bibliográficos (plataforma Acess). Dados acessados até o dia 30/04/2008.
De todo o volume de produção bibliográfica sobre línguas indígenas faladas ao sul do
estado do Amazonas, considerando-se os dados reunidos, até o momento, pelo banco de dados
bibliográficos, a maior incidência recai sobre livros, com um percentual de 44%, seguida de
artigos científicos, com 35% e dissertações com 9%. Os demais índices variam de 1 a 4% e
estão distribuídos entre teses (2%) monografias (1%), relatórios de PIBICs, (3%) jornais e
44
CD-ROM com 1% cada. Note-se, entretanto, que estes números correspondem aos dados
inseridos no banco de dados até o dia 30 de abril de 2008, quando o trabalho de alimentação
do banco de dados foi interrompido para que os alunos bolsistas pudessem se dedicar à
elaboração do presente relatório. Posteriormente a essa data, encontramos, em sites
eletrônicos, um volume muito grande de bibliografias que foram acrescentadas as já existentes
no banco de dados do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI).
Figura 3
Mapa da Produção Bibliográfica sobre línguas Indígenas no Estado do Amazonas
Fonte: ISA, 2007. (Org. Rogério Marinho, 2008)
Os círculos verdes no mapa indicam que há maior incidência de produção
bibliográfica no Purus, com um total de 175 obras, das quais 76 versam sobre aspectos
linguísticos. A segunda maior concentração de produção bibliográfica é na região do rio
madeira, com 115 obras, dos quais 30 tratam do tema “Língua”. E em seguida vêm as regiões
dos vales do Juruá e Javari; a primeira com 73 títulos, onde somente 15 tocam na questão da
língua; a segunda com 71 títulos, dos quais 23 são dedicados a esse tema.
Acrescente-se que para além dos resultados já mencionados, outro resultado indireto
gerado a partir do trabalho de coleta e análise de dados para o banco de dados bibliográficos,
foi que em decorrência de minha participação neste empreendimento e, por sugestão do
comitê de avaliação parcial do PIBIC, resolvi analisar mais especificamente a produção
45
bibliográfica existente sobre a família linguística Pano, com vistas à realização de um estudo
sociolinguístico contemplando os seguintes aspectos: a) organização social e parentesco; b)
população; c) situação de bilinguismo e; d) graus de contato interétnico.
Com base na pesquisa preliminar tomando como base os dados do banco de dados
bibliográficos, avaliou-se que a realização desta pesquisa se fazia necessária e era bastante
oportuna, principalmente porque o grupo indígena em questão (matis) vive em uma região
ainda insuficientemente investigada do ponto de vista da produção do conhecimento
científico, principalmente no tocante a questão etnolinguística. No âmbito dessas questões, os
seguintes objetivos foram estabelecidos: (a) listar vocábulos e terminologias de parentesco
dos matis; (b) analisar os sistemas terminológicos e comparar os termos (ou vocábulos) de
parentesco; (c) identificar no sistema terminológico, o padrão de trocas matrimoniais;
prescrições, interdições e preferências.
A pesquisa foi desenvolvida a partir da leitura e reflexão de dados recolhidos de
etnografias sobre o povo matis referenciados no banco do NEAI, conforme apresentado na
tabela n. 4. Esta pesquisa resultou na elaboração do meu trabalho de conclusão de curso
(TCC) com o qual obtive a graduação em Ciências Sociais em dezembro de 2008, e me
permitiu ingressar no Mestrado em Antropologia Social do Programa de Pós-Graduação em
Antropologia Social (PPGAS/UFAM), onde atualmente estou desenvolvendo uma pesquisa
sobre a Língua Geral Amazônica (Nheengatu) e Identidade Étnica, em Santa Izabel do Rio
Negro.
Tabela 4
Resultados da produção bibliográfica sobre as línguas da família linguística Pano
TIPO
POVO
CONTEUDO
AUTOR
TITULO
DATA
Artigo
Marubo
Língua
Raquel Guimarães
Romankevicius Costa
Case marking in Marubo
(Panoan) : a diachronic
approach
2000
Artigo
Marubo
Língua
Raquel Guimarães
Romankevicius Costa
A expressão da posse em
Marubo e Matsés (Pano)
2005
Artigo
Matis
Língua
Philippe Erikson
La griffe des aieux : marquage
du corps et demarquages
ethniques chez les Matis
d'Amazone
1996
Artigo
Matis
Língua
Centro de Trabalho
Indigenista
Escola Matis
2002
Artigo
Matsé
Língua
Carmen Teresa Dorigo
Ergatividade cincida em
Matsés (Pano)
2002
Artigo
Matsé
Língua
David William Fleck
Under differentiated tax and
sub lexical categorization :an
example from Matses
classification of bats.
2002
46
Continuação da Tabela 4
TIPO
POVO
CONTEUDO
AUTOR
TITULO
DATA
Ensaios da língua dos índios
magironas ou maiorunas do
rio Jandiatuba (Alto
Solimões)
1957
Artigo
Matsé,
Maioruna
Língua
Fidelis de Alviano
Disser.
Marubo
Língua
Raquel Guimarães
Romankevicius Costa
Padrões rítmicos e marcação
de caso em Marubo
1992
`
Disser.
Matis
Língua
Vitória R. Spanhero
Ferreira
Língua Matis (Pano): uma
análise fonológica
2000
Disser.
Matis
Língua
Rogério Vicente
Ferreira
Língua Matis :aspectos
descritivos da morfossintaxe
2001
Disser.
Matsé
Língua
Carmem Tereza Dorigo
de Carvalho
A decodificação da estrutura
frasal em matsés
1992
Disser.
Jaminawa,
Yawanawa,
Kaxarari,
Kaxinawa,
Matsés,
Katukina,
Arara,
Shanenawa
e Poyanawa
Língua
Elder José Lanes
Mudança fonológica em
línguas da família pano
Tese
Matis
Língua
Rogério Vicente
Ferreira
Língua Matis (Pano) :uma
descrição gramatical
2005
Tese
Matis
Língua,
etnohistória
Vitória Regina
Spanhero Ferreira
Estudo lexical da língua Matis
:subsídios para um dicionário
bilíngüe
2005
Tese
Matsé
Língua
David William Fleck
A grammar of Matses
2003
2000
Tabela 5
Resultados da produção bibliográfica refrente aos povos da família linguística Pano
GRUPO ÉTNICO
N.0 DE ARTIGOS N.0 DE DISSERTAÇÕES
N.0 DE TESES
Matsé
02
01
01
Matis
02
02
02
Marubo
02
01
Maiorunas
01
Vários grupos
TOTAL
01
07
05
03
47
Considerações finais
O complexo cultural e sociolinguístico das línguas amazônicas impõe aos
pesquisadores das diversas áreas da ciência, inclusive aos linguistas, um enorme desafio. Isto
porque, se, de um lado a quantidade e variedade de línguas e culturas ainda existentes, de
outro lado, muitas dessas línguas se encontram em um estado anêmico, ou seja, correm o risco
de desaparecerem. E o mais grave é que os estudos histórico-comparativos das línguas
amazônicas estão ainda num estágio muito incipiente, pois aspectos quantitativos e
qualitativos ainda carecem de descrição, análise e explicação científica. Tais deficiências ou
lacunas sobre o conhecimento das línguas amazônicas ficam mais evidentes quando
analisamos a quantidade de trabalhos científicos produzidos sobre elas.
Por exemplo, um aspecto que chama a atenção é a dispersão e fragmentação da
literatura sobre as línguas amazônicas, havendo poucas obras sobre os principais aspectos
linguísticos e sociolinguísticos, tais como, as situações de bilinguismo, a atitude dos falantes
em relação à língua tradicional de suas comunidades linguísticas de origem, o impacto
sociolinguístico devido, entre outros fatores, à expansão das fronteiras agrícolas e do
agronegócio no estado do Amazonas.
Acreditamos que este cenário só irá se modificar mais decididamente quando estudos
descritivos e histórico-comparativos se intensificarem e cobrirem a grande maioria das línguas
na região. Isso requer a formação mais sistemática de linguistas interessados na documentação
análise e interpretação dos dados linguísticos. Para que esse processo se acelere é necessário o
esforço conjunto das universidades, organizações governamentais e não-governamentais, bem
como dos movimentos e organizações indígenas, pois um empreendimento dessa envergadura
não pode ser realizado pelo trabalho de um único pesquisador ou entidade isolada, mas requer
ação coletiva coordenada baseada no projeto político-pedagógico e ideológico de cada etnia.
Portanto, quaisquer iniciativas no sentido de reunir o que existe, em termos de
produção bibliográfica sobre grupos indígenas tendo em vista o estudo científico da língua,
cultura e outras particularidades desses povos, representa um esforço considerável e de grande
relevância para pesquisadores em geral, visto que poupa tempo e esforço na medida em que
disponibiliza antecipa a descrição ou qualquer outro estudo científico. Nesse sentido, o
esforço empreendido nesta pesquisa em conjunto com os alunos e professores pesquisadores
dos outros projetos que cooperam com o projeto “Amazonas Indígena...”, do Núcleo de
Estudos da Amazônia Indígena (NEAI) vem facilitar a árdua primeira tarefa do pesquisador
em línguas indígenas brasileiras, bem como em outras áreas das ciências.
48
É com esse espírito de cooperação, que a equipe do NEAI está determinada e
motivada a dar continuidade à consolidação a esta fonte extraordinária e segura de
informações que é o Banco de dados bibliográficos, que muito tem contribuído para o
desenvolvimento das pesquisas sobre as línguas e culturas indígenas do Estado, bem como
poderão ser empregadas pelas organizações indígenas e não-indígenas na elaboração de
projetos de valorização da lingua e cultura dos povos amazônicos, bem como o
desenvolvimento de programas de educação e auto-sustentação política e econômica das
comunidades indígenas.
Referências Bibliográficas
MELATTI, Julio Cezar. Índios do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo EDUSP, 2007.
______. Por que áreas etnográficas? In: Índios da América do Sul – Áreas Etnográficas.
Disponível em: http://www.geocities.com/RainForest/Jungle/6885 (Página do Melatti).
QUEIXALÓS, F.; RENAULT-LESCURE, O. As línguas amazônicas hoje. São Paulo:
IRD/ISA/MPEG, 2000.
RICARDO, C. A.; RICARDO, F. (org.) Povos indígenas no Brasil - 2001-2005. São Paulo:
Instituto Socioambiental, 2006.
RODRIGUES, Aryon Dall‟Igna. Panorama das línguas indígenas da Amazônia. In:
QUEIXALÓS, F.; RENAULT-LESCURE, O. (org.), p. 15-28. São Paulo: IRD/ISA/MPEG,
2000.
49
LEVANTAMENTO DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE AS LÍNGUAS
INDÍGENAS FALADAS AO NORTE DO ESTADO DO AMAZONAS
Erick Marcelo Lima de Souza
Mestrando do Curos de Letras da Unicamp
Introdução
O presente texto é fruto do relatório de Pibic, orientado pelo professor Dr. Frantomé
Bezerra Pacheco na Universidade Federal do Amazonas. Teve como propósito principal,
contribuir para a criação de um Banco de Dados que contem informações sobre o tipo de
produção, língua estudada e o impacto da produção nos meios acadêmicos e entre as
organizações indígenas e não-indígenas. Além disso, pretendeu divulgar as informações sobre
a diversidade linguística no Estado do Amazonas, bem como disponibilizar informações sobre
as fontes bibliográficas para o seu estudo, obtidas durante a pesquisa. O que se espera é que
isso possa ser realizado por meio da internet com um link na página do Museu Amazônico.
Nesta pesquisa, buscam-se compreender melhor a atual situação das pesquisas relacionadas às
línguas indígenas faladas por povos que habitam a parte norte do Estado do Amazonas tendo
por base, para essa divisão, o curso de rio Solimões-Amazonas e as áreas etnográficas
propostas por Melatti (2007). Para isso, foram realizadas várias pesquisas em bibliotecas
institucionais de Manaus e bibliotecas virtuais de várias instituições que trabalham com
pesquisas voltadas para as línguas indígenas. Foram realizadas também outras pesquisas na
internet para tentar descobrir novas produções como livros, dicionários, gramáticas, artigos,
cartilhas, jornais, CD-ROMs, CDs de áudio, e outros.
Serão apresentadas, aqui, as línguas indígenas do Amazonas, levando-se em
consideração a localização das línguas a partir da localização dos povos, que geralmente
habitam as calhas dos rios, bem como a localização dos povos seguindo o modelo de áreas
etnográficas propostas por Melatti (2007), que são áreas de concentração de povos indígenas,
levando em consideração a articulação social e (não-) similaridade cultural, pois se acredita
que assim pode-se englobar numa mesma área aquelas sociedades que mantém entre si
intercâmbio amistoso ou hostil, pois nem sempre as que se parecem se conhecem ou se
relacionam.
Metodologia
A metodologia utilizada na presente pesquisa foi adotada de acordo com o que foi
proposto pelo projeto “Amazonas Indígena: um mapeamento das instituições e da produção
bibliográfica sobre os povos indígenas do Estado”, uma vez que esse projeto faz parte
50
juntamente com outros desse projeto conjunto. Entretanto, como esse é um projeto
independente, seguiu caminhos próprios.
A busca de dados foi feita nas bibliotecas, virtuais ou físicas, da cidade de Manaus,
para saber o que há aqui e, posteriormente, consultando outras fora da cidade, nesse caso as
virtuais. Entretanto, havia inicialmente uma ficha única para todos os projetos cujas
informações foram passadas para alimentação de um banco de dados do projeto maior que
será construído em plataforma Acces, cujo arranjo ou estrutura permitirá cruzar informações e
fornecer dados quantitativos, matéria prima para análises etnológicas e linguísticas
posteriores.
As informações foram registradas em fichas catalográficas de acordo os interesses de
cada linha de pesquisa em suas devidas áreas. Para esse projeto, que é de caráter linguístico,
foi elaborada também uma ficha atendendo às exigências do presente trabalho. Ela consta de
informações como tipo do material, nome do pesquisador, instituição, etnia, localização da
etnia, síntese da obra, data de publicação, assunto da obra, etc.
Todos os dados recolhidos e inseridos no banco de dados serão trabalhados na
formação de SIG (Sistema de Informações Geográficas), assim, será possível disponibilizar as
informações com maior praticidade, relacionando cartografia e textos. Esse trabalho com SIG
será realizado por um bolsista da área de geografia e conta com o apoio da Fapeam e do
CNPq. Todas essas informações permitirão análises etnológicas e linguísticas a partir de
temas definidos de acordo com temas de interesse pelos outros pesquisadores(as) ao longo do
projeto.
Pretende-se que todas as informações sejam disponibilizadas para o público para
pesquisa e consultas e elas farão parte do acervo da UFAM e do Museu Amazônico e servirá
principalmente como fonte de pesquisa para os professores do Departamento de Antropologia
e do Instituto de Ciências Humanas e Letras da UFAM. Além de disponibilizar um roteiro das
fontes para o estudo das línguas indígenas ao Norte do Estado, esta pesquisa poderá permitir
ou estimular levantamentos quantitativos em outras áreas do conhecimento do ICHL e demais
unidades da UFAM.
Foram previstas para esse projeto de pesquisa as seguintes fases ou atividades:
1. Elaboração de lista de línguas com informações gerais sobre o povo, seguindo-se
Rodrigues (1986), Ricardo e Ricardo (2006) e outros autores que deverão ser
pesquisados durante o desenvolvimento do projeto.
2. Levantamento da produção bibliográfica sobre as línguas indígenas disponível nas
bibliotecas e arquivos de Manaus.
51
3. Levantamento da produção bibliográfica disponível na internet, com informações
sobre o lugar onde esse material se encontra.
4. Organização dos dados obtidos por categoria e relacionados aos obtidos pelos
demais pesquisadores.
A organização dos dados foi orientada, prioritariamente, pelo mapeamento de Terras e
Povos Indígenas apresentado na última edição do livro “Povos Indígenas no Brasil”,
publicado pelo Instituto Socioambiental (RICARDO; RICARDO, 2006) e disponibilizado no
site: www.sociambiental.org, que está atuando como parceiro do nosso núcleo de estudos
indígenas numa importante troca de dados e também por ser uma das principais fontes de
informação no que se refere à questão indígena.
Vale muito ressaltar que esse projeto não trabalhou com dados de fonte primária, mas
sim secundária. Também não trabalha com pesquisa entre os grupos indígenas, mas sim
pesquisa para coleta de materiais bibliográficos e informações sobre o andamento da pesquisa
em línguas indígenas.
A realidade da produção bibliográfica do Estado ainda não é bem conhecida. Um
razoável número de obras têm já sido produzidas principalmente na forma de teses e
dissertações sobre várias áreas dentro da temática indígena. Nesse o projeto de pesquisa para
tentar amenizar um pouco essa situação.
Durante os três primeiros meses, a pesquisa voltou-se para uma busca geral de toda
produção bibliográfica sobre os povos indígenas do Amazonas, independentemente dos seus
objetos de pesquisa. Inicialmente, foi feita uma divisão de setores a serem pesquisados entre
os bolsistas que fazem parte do projeto “Amazonas Indígenas: um mapeamento das
instituições e da produção bibliográfica sobre os povos indígenas do Estado”. Ao autor dessa
pesquisa coube fazer uma busca das teses, dissertações e livros que se encontram na
Biblioteca do INPA e dos relatórios de PIBIC que se encontram na biblioteca setorial do
ICHL - Instituto de Ciências Humanas e Letras da UFAM.
Durante os três meses seguintes, a pesquisa foi conduzida com foco voltado para a
elaboração de uma listagem dos povos indígenas que habitam o norte do estado do Amazonas.
Nesse mesmo período foi também feita uma busca em outras bibliotecas e também algumas
bibliotecas virtuais de outras universidades para tentar fazer outros registros de produção
bibliográfica sobre povos indígenas amazonenses.
Após as investigações, baseado em informações do ISA (2005), pôde-se chegar a uma
tabela sobre povos indígenas que habitam a parte norte do estado do Amazonas que informa o
nome da etnia, língua falada por ela, população, localização e o ano do último levantamento.
52
Esses dados foram recolhidos do site do Instituto Sócio-Ambiental, do livro “Índios do
Brasil” de Melatti (2005) e do livro de Rodrigues (2005).
Para melhor compreender a situação linguística das línguas indígenas no Brasil, no
presente trabalho, vamos seguir a demarcação etnográfica de áreas proposta por Melatti
(2007). Segundo ele, áreas etnográficas são áreas demarcadas levando em conta mais a
articulação social que a similaridade cultural, pois, segundo ele, acredita-se que assim
englobar-se-ia numa mesma área aquelas sociedades que mantém entre si intercâmbio
amistoso ou hostil, pois nem sempre as que se parecem se conhecem. Como exemplo Melatti
(2007) cita o caso dos Canela que têm longa história tanto de choque quanto de convívio
amistoso com seus vizinhos guajajara do mesmo estado do Maranhão, no entanto segundo
Melatti são mais parecidos culturalmente aos Bororo que vivem a mais de mil quilômetros de
distância no Mato Grosso. Assim depende do critério que leva em conta a demarcação dessas
áreas. No caso do norte do estado do Amazonas pode-se observar que existem três grandes
áreas etnográficas, conforme anexo B e C. São elas as áreas etnográficas 1 e 2 e 3. Além
disso, vamos tomar como base o curso do rio Solimões-Amazonas como base para
delimitação geográfica de norte e sul.
Quanto à área etnográfica 1, de acordo com Melatti (2007), percebe-se que somente
suas regiões C e E fazem parte do território do estado do Amazonas. Na área E que
corresponde à fronteira entre o estado do Amazonas com Roraima, a sudoeste deste, encontrase a língua Yanomami da família Yanomami, falada pelo povo de mesmo nome, conforme
anexo A. Na região C, região de fronteira entre Amazonas, Pará e Roraima. Encontram-se aí
línguas da família Karib, a saber Hixkariana, Waimiri-Atroari e Waiwai.
Quanto a área etnográfica 2, a esta corresponde à região do Alto rio Negro, no
noroeste do Amazonas, nessa área encontram-se línguas da família Maku, Tukano e Arawak.
Na área do rio Içana, principalmente, encontram-se as línguas da família arawak, a saber
Baniwa do Içana,, Kuripáco, Tariána e Warekéna, majoritariamnete. Já na área dos rios
Uaupés e Tiquié, encontram-se as línguas da família Tukano, a saber Desána, Juriti,
Karapanã, Kubéwa (kubéo), Bará, Barasána, Mirití-Tapúya, Pira-Tapúya, Siriána, Tukáno
(Ye‟pa-masã), Tuyúka, Wanána e Arapaso. Quanto a família Maku, esta localiza-se numa
diagonal noroeste-sudeste desde as cachoeiras do Guaiana, como é conhecido o alto curso do
Rio Negro na Colômbia, até o japurá, são elas Dâw (Kamã), Húpda, Nadêb e Yuhúp
Quanto a área 3, ela é subdividida em dua regiões a A e a B. A área a corresponde às
famílias, Miranha, Kulina, Karapanã e Tikuna que possui apenas uma língua Tikuna, segundo
o que apresenta Rodrigues (2006, p. 63). Essa língua é falada pela extensão do Alto-Solimões
53
em ambas margens do rio, sendo portanto classificada aqui como pertencente tanto ao sul
quanto ao norte do Estado.
Para avaliar e acompanhar o andamento da pesquisa, foram realizadas várias reuniões
com os outros bolsistas membros do mesmo projeto para traçar novas metas e objetivos a
serem cumpridos. Além dessas reuniões de acompanhamento, foram realizados dois
seminários com o intuito de preparar as apresentações dos projetos junto aos professores
avaliadores do PIBIC.
Durante o decorrer da pesquisa foi recomendado pelo professor Dr. Frantomé Pacheco
a leitura da seguinte bibliografia para dar suporte ao trabalho:
LARAIA, R. de B. (2000). Nessa obra pode-se ter uma visão global dos índios
brasileiros, nele os autos apresenta os povos que sobreviveram ao massacre europeu e lutam
para preservar sua identidade.
RODRIGUES, Aryon Dall‟Igna (1986) - Nessa obra o autor mostra de maneira
bastante didática a realidade das línguas brasileiras, sua variedade e a luta pela defesa e
preservação de tais línguas, além de fazer referência ao estudo de tais línguas no Brasil.
WRIGHT, ROBIN M. (2005) - Nessa obra o autor mostra a história dos povos
indígenas do Alto rio Negro, seus povos, os conflitos internos, as línguas, a cultura, faz uma
descrição de toda a região fazendo um mapeamento da localização geográfica de cada povo,
trata das situações de bilingüismo e substituição de línguas.
INSTITUTO
SOCIOAMBIENTAL
(ISA)
Amazônia
Brasileira,
2004
(www.socioambiental.org) Nessa obra, trata-se a realidade sócio-ambiental e lingüística da
região Amazônica brasileira. Nele pode-se observar a realidade desses povos e sua busca por
manutenção da cultura e suas raízes, além de uma abordagem descritiva dos povos nativos da
Amazônia.
RAMIREZ, H. (2001) - Nessa obra, o autor faz um apanhado histórico e descritivo das
línguas da família Arawak, seu trabalho é enriquecido com ilustrações e descrições
geográficas de localização das línguas. Nele além das descrições dos povos e da situação
histórica e geográfica dos falantes de Arawak, o autor também faz uma descrição linguísticocomparativa das línguas dessa família.
CÂMARA JR, J. M - (1965). Nessa obra, pode-se ter uma boa noção da classificação
das línguas brasileiras. Aqui o autor faz uma separação das línguas em troncos e famílias,
além disso, faz uma descrição dos estudos de línguas indígenas no Brasil.
SEKI, Lucy (1999) - Nessa obra, a autora descreve toda a trajetória da Lingüística
indígena no Brasil, faz um apanhado desde as primeiras gramáticas feitas pelos missionários
54
até os mais arrojados estudos atuais. Descreve ainda as instituições que se dedicam a
pesquisas de línguas nativas brasileiras e também alguns dos principais linguistas dedicados a
tal estudo.
ALMEIDA, Alfredo Wagner B. (2007) - Essa obra é uma reunião de vários artigos
publicados sobre a questão do multilinguismo no Alto rio Negro mais precisamente no
município de São Gabriel da Cachoeira.
MAIA, Marcos. (2006) - Essa obra aborda a questão do multilinguismo no Amazonas,
mais precisamente na região do alto rio negro no município de São Gabriel da cachoeira, é
uma junção de artigos de vários autores diferentes sobre o tema e sobre a aprovação da lei de
oficialização de outras línguas indígenas ao lado do português.
MELLATI, J. C. (2007) - Nessa obra, o autor dedica uma seção para falar das línguas
indígenas. Nela o autor defende a idéia de áreas etnográficas em vez de culturais para definir
áreas de concentração de povos indígenas.
As línguas faladas ao Norte do Estado do Amazonas
O Estado do Amazonas é o maior dos 26 estados brasileiros. Ele está localizado ao
norte do país, bem ao centro da região amazônica. Tradicionalmente, ele é conhecido como
um estado que tem conseguido preservar, quase que em sua totalidade, sua flora e sua fauna,
conseqüentemente, ele também tem conseguido preservar mais que outros estados suas
populações nativas, ainda que o número dessa população tenha se reduzido drasticamente
desde a chegada dos europeus. O Amazonas tem conseguido manter-se como o estado que
apresenta maior diversidade de povos e o maior número de população indígena em todo o
Brasil. De acordo com o ISA, Instituto Sócio-Ambiental, em seu levantamento (1986; cf. tb.
RODRIGUES, 2000; QUEIXALÓS; LESCURE, 2000), no Amazonas há, atualmente, 54
línguas indígenas espalhadas por todo território do estado, faladas por 54 etnias, somando
uma população estimada de 83.996 pessoas, ainda que nem todo esse total continue falando
sua língua de origem. A maioria delas conta com alguma produção acadêmica (teses e
dissertações) que versam sobre os mais diversos aspectos da estrutura e uso da língua
(Franchetto, 2000). De acordo com fontes do ISA – Instituto Sócio-Ambiental, pôde-se
catalogar 28 línguas indígenas faladas por 25 povos na parte note do estado do Amazonas.
Nessa parte do estado encontram-se línguas de diversas famílias linguísticas não classificadas
em tronco, apenas uma do tronco Tupi, e nenhuma língua do tronco Jê é encontrada no estado.
Grande parte dessa produção se encontra nas bibliotecas digitais disponibilizadas pelas
Universidades nas quais a pesquisa foi realizada. Há várias bibliotecas virtuais em sites
voltados para a discussão da temática indígena.
55
Lista de povos indígenas do Amazonas
1- Apurinã . Aruák, AM 4.087, (Funasa, 2003)
2 - Arapaso. Arapaço Tukano AM 328 (2001)
3 - Banawá. Banawá Yafi Arawá AM 100 (1999)
4 - Baniwa. Baniua, Baniva, Walimanai, Wakuenai Aruak AM Colômbia Venezuela. 141 6.790,
3.236, 2.002, (2000/2000)
5 - Bará. Waípinõmakã Tukano AM Colômbia 39 296 (2001 1988)
6 - Barasana. Hanera Tukano AM Colômbia 61 939 (2001, 1988)
7 - Baré. Nheengatu AM Venezuela 2.790, 1.210 (1998, 1992)
8 - Deni. Arawá AM 736 (2002)
9 - Desana. Desano, Dessano, Wira, Umukomasá falta strike no 'u' Tukano AM Colômbia 1.531
(2036) (2001, 1988).
10 - Jamamadi. Yamamadi, Kanamanti Arawá AM 800 2000
11 - Jarawara. Jarauara Arawá AM 180 2006
12 - Jiahui. Djahui, Diarroi Tupi-Guarani AM 50 2000
13 - Juma. Yuma Tupi-Guarani AM 5 2002
14 - Kaixana. Caixana Português AM 224 1997
15 - Kambeba. Cambeba, Omágua Tupi-Guarani AM 156 2000
16 - Kanamari. Tüküná, Canamari Katukina AM 1.327 1999
17 - Karapanã. Carapanã, M*u*teamasa, *U*kopinôpôna Tukano AM Colômbia 42 (412) 2001 1988
18 - Katukina. Pano AC/AM 318 1998
19 - Katukina do Rio Biá. Tüküná Katukina AM 450 2007
20 - Kaxarari. Caxarari Pano AM/RO 269 2001
21 - Kocama. Cocama Tupi-Guarani AM Peru Colômbia 622 (10.705) (236) 1989 1993 1988
22 - Korubo. Pano AM 250 2000
23 - Kubeo. Cubeo, Cobewa, Kubéwa, Pamíwa Tukano AM Colômbia 287 (4.238) 2001 1988
24 - Kulina Madihá. Culina, Madija, Madiha Arawá AC/AM Peru 2.318 (300)1999 1993
25 - Kulina Pano. Culina Pano AM 20 1996
26 - Kuripako. Curipaco, Coripaco Aruak AM Colômbia 1.115? (2002)
27- Maku (subgrupos Yuhupde, Hupdá, Nadöb, Dow, Cacua e Nucak).(4) Macu Maku AM Colômbia
56
2.548 678 1998 1995
28 - Makuna. Macuna, Yeba-masã Tukano AM Colômbia 168 528 2001 1988
29 - Marubo. Pano AM 1.043 2000
30 - Matis. Pano AM 239 2000
31 - Matsé. Mayoruna Pano AM Peru 829 (1.000) 2000 1988
32 - Miranha. Mirãnha, Miraña Bora AM Colômbia 613 (445) 1999 1988
33 - Mirity - Tapuya. Miriti-Tapuia, Buia-Tapuya Tukano AM 95 1998
34 - Mura. Mura AM 5.540 2000
35 - Parintintin. Tupi-Guarani AM 156 2000
36 - Paumari. Palmari Arawá AM 870 2000
37 - Pirahã. Mura Pirahã Mura AM 360 2000
38 - Pira-tapuya. Piratapuia, Piratapuyo, Pira-Tapuia, Waíkana Tukano AM Colômbia 1004 (400)
2001 1988
39 - Sateré-Mawé. Sataré-Maué Mawé AM/PA 7.134 2000
40 Siriano. Siria-Masã Tukano AM Colômbia 17 665 2001 1988
41 Tariana. Tariano, Taliaseri Aruak AM Colômbia 1.914 205 2001 1988
42 Tenharim. Kagwahiva Kagwahiva, da família Tupi-Guarani AM 585 2000
43 Ticuna. Tikuna, Tukuna, Magüa Ticuna AM Peru Colômbia 32.613 (4.200) (4.535) 1998 1988
1988
44 - Torá. Txapakura AM 51 1999
45 - Tsohom Djapá. Tsunhum-Djapá, Tyonhwak Dyapa, Tucano Katukina AM 100, 1985
46 - Tukano. Tucano, Ye'pã-masa, Dasea Tukano AM Colômbia 4.604 6.330 2001 1988
47 - Tuyuka. Tuiuca, Dokapuara, *U*tapinõmakãphõná Tukano AM Colômbia 593 570 2001 1988
48 - Wai Wai (subgrupos Karafawyana, Xereu, Katuena e Mawayana).(4) Waiwai Karib RR/AM/PA
Guiana 2.020 130 2000 2000
49 - Waimiri-Atroari. Kinã, Kinja Karib RR/AM 931 2001
50 - Wanana. Uanano, Wanano Tukano AM Colômbia 447 1.113 2001 1988
51 - Warekena. Uarequena, Werekena Aruak AM Venezuela 491 (409) 1998 1992
52 - Witoto. Uitoto, Huitoto Witoto AM Colômbia Peru ? (5 .939) (2.775) 1988 1988
53 - Yanomami (subgrupos Yanomam, Sanumá e Ninam).(4) Ianomãmi, Ianoama, Xirianá Yanomami
Yanomami Yanomami Yanomami RR/AM Venezuela 11.700 (15.193) 2000 1992
54 - Zuruahã. Sorowaha, Suruwaha Arawá AM 143 1995
Fontes do ISA - Instituto Sócio-Ambiental.
57
A lista acima baseada em fontes do ISA nos ajuda a entender um pouco melhor a
realidade dos povos indígenas do Amazonas, numa demonstração clara da nossa riqueza
étnica. Note-se, no entanto, que os limites entre uma etnia e outra podem ser determinados por
fatores de ordem mais política do que cultural (cf. Melatti, 2006).
Na região do noroesteamazônico, há uma grande concentração de línguas e povos
indígenas, isto gera naturalente intensa troca cultural e linguística por conseguinte um povo
acaba por precisar aprender a língua do outro. Assim alguns povos vão perdendo suas línguas
de origem e adotando a de seus conquistadores ou a de seus inimigos mais fortes. Esse
aspecto acaba por provocar multilingüismo, em que um mesmo indivíduo precisa saber a
língua geral, a língua do pai, a da mãe e dos povos mais fortes.
O presente texto teve como frutos principais a elaboração de uma lista das línguas
indígenas faladas no Amazoas e conseqüentemente uma lista de línguas indígenas faladas ao
norte do estado do Amazonas. Ela foi classificada levando-se em conta o rio do SolimõesAmazonas (cf. informações apresentadas no Projeto 1).
Aqui pode-se ver as línguas do tronco Tupi, bem como um número aproximado de
falantes e seus rerspectivos povos. Entretanto, desse tronco apenas uma encontra-se na parte
norte do Estado como apresentado na próxima lista. Há, ainda, 24 obras que tratam de línguas
da família Tukano, muitas delas versando sobre várias línguas da família e não a uma em
particular.
O total da produção sobre línguas indígenas catalogadas durante a pesquisa foi da
ordem de 248 e são todas referentes ao norte do estado do Amazonas (dados de 04/2008).
Essas informações bibliográficas, que constam no NEAI, estarão disponíveis num site em
elaboração.
Entretanto, apesar de tanta diversidade, percebe-se claramente que ainda não há
suficiente produção bibliográfica e, conseqüentemente, suficientes pesquisas sobre tais
línguas e povos. A atual situação da produção bibliográfica já existente dessas línguas é ainda
pouco conhecida e não se sabe exatamente quais são as línguas mais estudadas e quem são os
pesquisadores responsáveis por alguns estudos. Entretanto, pode-se afirmar seguramente que
o número de pesquisas voltadas para as línguas indígenas no Amazonas é pequeno, apesar da
enorme riqueza linguística encontrada no Estado e do crescimento do interesse de novos
pesquisadores por tais tipos de estudo. Segundo MOORE, Denny & Nilson Gabas JÚNIOR
(2005), um futuro para o estudo científico das línguas indígenas brasileiras deve ser visto com
um otimismo cauteloso, que já está deixando de ser trabalho apenas de missionários. Segundo
58
os mesmos autores, nos últimos quinze anos, 23 teses de doutorado sobre línguas indígenas
brasileiras foram defendidas no país, das quais 16 são análise científica de língua indígena
brasileira. Os mesmos autores ainda acrescentam que 17 teses de doutorado foram defendidas
no exterior, das quais 15 envolvem análise de língua indígena. Isso mostra como a da pesquisa
científica relacionada a línguas brasileiras tem crescido, porém esse número ainda é muito
pequeno se relacionamos a vasta quantidade de línguas indígenas no Amazonas e no país
inteiro.
De acordo com essa pesquisa e analisando os números de obras por língua, levantadas
no projeto de PIBIC, verifica-se que línguas como Tikuna (com 37 obras), Yanomami (com
31), Nheengatu (com 23) e Baniwa do Içana (com 15) são as línguas que contam com maior
produção sobre aspectos da linguagem.
O total de obras que consta no banco de gráficos é de 307 obras sobre línguas
indígenas do estado do Amazonas e de 141 obras de línguas faladas por povos que habitam a
parte norte do curso do rio Solimões-Amazonas. Além dessas obras, serão ainda inseridas no
banco de dados bibliográficos mais 110 obras que foram encontradas após o fechamento dessa
fase da pesquisa (em 30 de abril de 2008), e isso continuará a acontecer porque o banco de
dados será periodicamente realimentado com novas produções sobre povos e línguas
indígenas. Acrescentamos que um dos resultados do Projeto foi a elaboração de uma lista
contendo as línguas indígenas faladas no Estado, sendo ainda necessário associar essas
informações às áreas etnográficas propostas por Melatti (2007), tendo em vista oferecer
informações mais precisas sobre as línguas e os povos que as falam. Esse trabalho pode
contribuir muito para novas pesquisas relacionadas às línguas indígenas uma vez que ele
procura mapear as áreas de pesquisas anteriores sobre as línguas nativas do estado do
Amazonas, mostrando quais línguas, povos ou áreas indígenas do Estado precisam de mais
investimento em pesquisa. Pode-se constatar que tal produção ainda é reduzida comparada à
produção de línguas indo-européias. Tal fato pode ser comprovado pela quantidade de obras
encontradas e também pela dificuldade de encontrar produções sobre línguas de certas regiões
do Estado. Pôde-se constatar que há uma quantidade maior de produção das línguas Geral
(Nheengatu) do tronco Tupi, o Tikuna da família Tikuna, a língua Yanomami da família
Yanomami e que há mais estudos comparativos entre as línguas Tukano, e estudos sobre a
protolíngua Maku. Por outro lado, as línguas menos estudadas são as Bará, Miriti-Tapúya e
Karapanã, da família Tukano.
59
Essa produção ainda em pequena escala abre espaço para que outros pesquisadores
possam dar continuidade e aperfeiçoar vários estudos de línguas que ainda carecem de mais
estudos. Também os pesquisadores amazonenses interessados em investigar as línguas do seu
próprio estado podem no NEAI encontrar um panorama para saber que línguas são essas e
quais são as obras de referências já publicadas sobre cada língua. Isso tem um impacto no
meio acadêmico porque pode auxiliar no desenvolvimento da Linguística no Amazonas e do
Amazonas com um maior número de pesquisas da diversidade linguística do estado, tanto
qualitativos quanto quantitativos.
A partir dessa pesquisa, puderam-se elaborar os seguintes itens:
1. Lista de línguas indígenas do Estado do Amazonas.
2. Classificação das obras encontradas em gêneros (dicionário, gramática, tese ou
dissertação, artigo, revista, cd-rom ou cd de áudio.
3. Lista bibliográfica de obras sobre línguas indígenas faladas ao norte do estado do
Amazonas.
Relação das 248 obras sobre línguas indígenas faladas no norte do estado do Amazonas
que se encontram registradas no banco de dados bibliográficos (Dados de 2008):
• 50 artigos
• 148 livros
• 10 dissertações
• 13 teses
• 6 relatórios
• 2 monografias
• 5 relatório de PIBIC
• 1 CD-Rom
• 12 Dicionários
• 1 revista
60
Tabela 1
Línguas indígenas do Norte do Estado do Amazonas listadas por família linguística
Família Linguística
Língua
Baniwa do Içana
Aruák
Kuripáco
Tariána
Warekéna
Hixkaryána
Karíb
Waimirí (Waimirí-Atroarí)
Dâw (Kamã)
Makú
Húpda
Nadêb
Yuhúp
Tikúna
Tikúna(Tukúna)
Arapáso
Bará
Barasána
Desána
Juriti
Karapanã
Tukáno
Kubéwa (kubéo)
Mirití-Tapúya
Pira-Tapúya
Siriána
Tukáno (Ye‟pa-masã)
Tuyúka
Wanána
Yanomámi
Yanomámi
Tupi-Guarani
Nheengatú
Bora
Miranha
Pano
Kulino (kulina)
61
Relação de quantidade de obras que tratavam do tema línguas indígenas da parte Norte
do Estado; listadas por tronco linguístico e suas respectivas famílias (dados de 2008)
TRONCO TUPI
FAMÍLIA TUPI-GUARANI
• Língua Nheengatú - 23 obras
FAMÍLIA YANOMAMI
• Língua Yanomami - 31 obras
FAMÍLIA TIKUNA
• Língua Tikúna - 37 obras
FAMÍLIA ARAWAK
• Língua Baniwa - 15 obras
• Língua Kuripáco - 10 obras
• Língua Warekena - 6 obras
• Tariano - 12 obras
FAMÍLIA KARIB
• Língua Hixkaryána - 6 obras
• Língua Waimiri-Atroari - 7 obras
• Língua Wai-Wai - 10 obras
FAMÍLIA MAKÚ
• Língua Dâw - 4 obras
• Língua Hupda - 8 obras
• Língua Nadeb - 2 obras
• Língua Yuhúp - 9 obras
FAMÍLIA TUKÁNO - 23 obras
• Língua Bará - 0 obras
• Língua Barasána - 2 obras
• Língua Desána - 5 obras
• Língua Juriti - 1 obra
• Língua Karapanã - 0 obras
• Língua Kubewa - 10 obras
• Língua Tuyúka - 3 obras
• Língua Wanána - 10 obras
• Língua Arapáso - 1 obras
• Língua Píra-Tapúya - 1 obra
• Língua Siriano - 4 obras
• Língua Ye‟pa-masã - 1 obra
• Língua Mirití-tapúya - 0 obras
62
Considerações finais
A real situação sociolinguística das línguas indígenas do Amazonas, que envolve o
número de línguas, quantidade de falantes, grau de vitalidade da língua tradicional em relação
ao português, bem como as atitudes do falante em relação à língua historicamente empregada
por sua etnia, ainda está longe de ser conhecida do ponto de vista acadêmico. Isso pode ser
notado quando analisamos o número da produção sobre elas, que é esparsa e fragmentada,
havendo poucas obras que abrangem os principais aspectos linguísticos e sociolinguísticos
(incluindo-se o bilinguismo e a atitude de seus falantes em relação à língua tradicional de sua
comunidade linguística). Assim, verifica-se, a partir dos dados coletados e analisados que há
ainda muita pesquisa por fazer. Para que isso possa acontecer é preciso o apoio e o trabalho
em conjunto da academia, de órgãos estatais, das organizações e associações indígenas, bem
como de outros envolvidos com a questão indígena. Descobrir quais e quantas pesquisas há
sobre tais línguas é uma tarefa que exige não apenas o trabalho de um pesquisador ou
entidade isolada, mas uma ação coletiva, calcada no projeto político de cada etnia.
Esse trabalho tenta contribuir para um maior conhecimento acerca dos trabalhos sobre
essas línguas, seu papel nas ações desenvolvidas junto a essas comunidades e na legitimação
desse conhecimento diante dos órgãos estatais e da opinião pública, contribuindo para a autoestima linguística de seus falantes e para o fortalecimento político-étnico dos povos que a
empregam milenarmente.
Ao final desse projeto, que deverá ser continuado, na medida em que novas pesquisas
sobre a produção das línguas e de suas famílias forem sendo realizadas, conclui-se que:
Precisa haver um investimento na formação de alunos que se preparem para
enfrentar as pesquisas sobre a diversidade étnica e lingüística encontrada no
Amazonas;
É necessária uma maior divulgação das pesquisas e publicações sobre essa
diversidade lingüística e cultural no Estado;
Novas análises dos dados que estão sendo inseridos no banco de dados
bibliográficos, relacionando a produção sobre as línguas a outros parâmetros como
as áreas etnográficas, tipo de produção e os meios de publicação, verificando o
papel das comunidades de falantes na produção desse material.
Entre os aspectos a serem retomados, destaco: a) re-análise do material bibliográfico
pesquisado, separando-o por tipo de produção lingüística (gramática, fonologia, léxico,
material de alfabetização e outros); b) verificar os impactos dessa produção nas áreas de
63
conhecimento a elas relacionadas, bem como nos meios ligados à política indígena estatal e
dos próprios indígenas. Esses temas, previstos no projeto original, foram parcialmente
discutidos, pois se privilegiou uma pesquisa mais ampla sobre os povos e línguas indígenas,
procurando implementar e testar a viabilidade de organização do banco de dados
bibliográficos, nas bases previamente propostas. O Mapa em anexo, com a distribuição
especial dos resultados das pesquisas encontradas nesse banco de dados, é a demonstração de
que ao serem dispostas espacialmente, temos uma clara noção das lacunas sobre a produção e
de onde é necessário mais investimento.
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Cultura / FAPESP, p. 53-86, 1998.
STEWARD, J. (ed.). Handbook of South American Indians, vol. 1- 6. Washington:
Smithsonian Institution, 1946-1950.
URBAN, G. A história da cultura brasileira segundo as línguas nativas. In: CUNHA, M.
C. (org.) História dos índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras/FAPESP/SMC, p.
87-102, 1992.
65
O LEVANTAMENTO BIBLIOGRÁFICO SOBRE ORGANIZAÇÃO SOCIAL E
PARENTESCO
Marcelo Pedro Florido
Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP
O levantamento sobre a produção bibliográfica a respeito das populações indígenas no
Estado do Amazonas do Núcleo de Estudos da Amazônia Indígena (NEAI) indica a existência
de 66 textos que focalizam a temática do parentesco e/ou organização social. A maior parte
desse conjunto é composta por artigos em um total de 22, os restantes são 3 relatórios, 6
monografias, 15 dissertações, 13 teses e 7 livros. O escrito mais antigo data de 1963 e há certa
regularidade na produção sobre o tema desde então, existindo 3 trabalhos nos anos 1960, 12
nos 1970, 10 nos 1980, 21 nos 1990 e 20 nos 2000. Essa regularidade não se verifica no que
diz respeito à distribuição geográfica e às populações estudadas.
Na distribuição linguísticas, temos 4 trabalhos que abordam populações da família
linguística Pano, sendo 2 textos que consideram os Marubo, 1 os Matsé e 1 os Matis. Do
tronco linguístico Tupi, há 11 estudos, sendo 5 da família Tupi-guarani, 2 que abordam os
Kambeba e 3 os Tenharim; 3 da Munduruku; e 3 da Maués, sobre os Sateré-Mawé. Há 9
trabalhos da família Arawá, 2 que se focalizam os Deni, 1 os Kulina, 3 os Paumari, 2 os
Zuruahá e 1 que considera os Deni, Jamamadi, Kulina e Paumari. Há 10 produções sobre a
família Tukano, a maioria dos quais centrados na população homônima, mas também existem
2 sobre os Tuyuka e 1 dos Karapanã. Há 6 que descrevem as populações de línguas Maku e 6
sobre a Tikuna. Foram levantados 8 estudos sobre a organização social e parentesco dos
Karib, 4 que abordam os Waimiri-Atroari e os outros 4 os Waiwai. Há 4 estudos sobre os
Yanomami e 3 sobre os Pirahã da família lingüística Mura. Só há 1 estudo da família Arawak,
que descreve os Baniwa e um da Bora, que considera os Miranha.
Geograficamente6, a maioria dos trabalhos abarca populações da área do Noroeste da
Amazônia, com um total de 17 trabalhos. Na área do Juruá-Purus foram localizados 12 textos
sobre organização social e parentesco, na Amazônia Centro-Meridional também 12. A
respeito dos povos da área Alto Amazonas, existe 9 referências, da área Maciço Guianense
Oriental há 8, da Maciço Guianense Ocidental há 4, e da área Juruá-Ucayali há também 4.
6
Por conveniência, seguimos aqui a divisão das áreas culturais proposta por Melatti. Disponível em http://egroups.unb.br/ics/dan/juliomelatti/ (12/12/2009)
66
Noroeste da Amazônia
Dentre a produção sobre o Noroeste da Amazônia encontramos alguns artigos que
focalizam a descrição das terminologias de parentesco. Este é o caso de Adélia Engrácia de
Oliveira (1975), autora do único trabalho sobre os Baniwá e; de Marcos Fulop (1965) e P.
Van Eenst (1979), que escrevem sobre terminologias de parentesco Tukano. Excetuando-se
estas três referências, e a monografia de Geraldo Veloso Ferreira (2001) que aborda a relação
do xamanismo e do parto, as outras produções não são facilmente distinguíveis no que diz
respeito à temática. Nessa região o parentesco e a organização social estão entrelaçados de
forma particular formando sistemas que envolvem diversas comunidades unidas por laços de
parentesco.
A descrição do sistema regional e sua relação com domínios do parentesco e da
organização social é o tema de parte significativa da produção apontada pelo levantamento
bibliográfico para essa área. O artigo de Janet Chernela (1983) apresenta as características do
sistema regional do rio Uaupés formado a partir da exogamia de grupo lingüístico, Pedro
Rocha de Almeida Castro (2007) aborda na sua dissertação a questão da transmissão de
nomes e do parentesco para esse mesmo rio. A monografia de Estevão Lemos Barreto (2001)
observa essa organização social multi local no contexto do rio Tiquié. Aloísio Cabalzar Filho
(2000) aborda o sistema em um artigo a partir das idéias de descendência e aliança Tuyuka.
Aloísio Cabalzar Filho (1995) em sua dissertação foca especificamente a organização
social Tuyuka. Este tema entre os Tukano é considerado por Stephen Hugh-Jones (1993) em
um artigo e por Jean Elizabeth Jackson (1983) em seu livro, e entre a população Karapanã por
Carlos Alberto Uribe Clopatofsky (1972) em sua dissertação.
Jorge Pozzobon em sua dissertação (1983), também publicada como livro (1984),
descreve e analisa a forma como se organizam os Maku. Em sua tese (1991), este mesmo
autor focaliza questões relacionadas ao parentesco e a demografia. Elementos da sociologia
Maku podem ser encontrados também na descrição que Peter L. Silverwood (1990) fornece
da população e na análise das narrativas sobre as relações econômicas presentes na
monografia de Elias Coelho de Assis (2001).
O levantamento bibliográfico mostra que apesar da grande quantidade de estudos
dirigidos a organização social e parentesco das populações localizadas na área do Noroeste
Amazônico, há uma concentração nos Tukano e Maku, sendo os povos de línguas Arawak
deixados de lado.
67
Juruá – Purus
A segundo maior conjunto de estudos diz respeito à área compreendida entre os rios
Juruá e Purus, que conta com 12 produções. Os dois livros de Gordon Koop e Sherwood G.
Lingenfelter sobre a organização social e parentesco dos Deni correspondem, na verdade, a
duas versões, uma em inglês (1980) e a outra em português (1993), de um mesmo texto. Este
trabalho fornece algumas informações sobre o parentesco, tal como a terminologia, regra de
casamento, etc., e aborda alguns temas da organização social, como a chefia, ocupação
territorial, divisão do trabalho, entre outros.
O levantamento aponta a existência de uma monografia de Miguel Aparício Suárez
(2008) que fornece informações a respeito dos grupos nomeados que caracterizam a
organização social das populações falantes de línguas da família lingüística arawá localizadas
na região do rio Purus, os Zuruahã, Deni, Jamamadi, Paumari e Kulina. Este mesmo autor
assina uma espécie de diário-relatório (2003) a respeito do seu contato, enquanto atuava como
indigenista, com os Zuruahã, no qual fornece diversas informações sobre a organização desta
população. Existe outro relatório sobre este povo, o de Jonia Teresinha Fank e Edinéia Lacir
Porta (1986), indigenistas ligadas ao Conselho Indígena Missionário (CIMI) e a ONG
Operação Amazônia Nativa (Opan), que informa sobre as atividades econômicas, o ciclo
ritual e o parentesco.
Sobre a população Paumari há um artigo de Mary-Anne Odmark e Rachel M. Landin
(1985) que tem como eixo principal a sua terminologia de parentesco, fornecendo também
informações acerca da regra de residência, e outros costumes relacionados. Os dois outros
trabalhos a respeito dos Paumari devem-se a Oiara Bonilla, um artigo (2005) preocupado com
a análise das relações da cosmologia com a organização social e, sua tese (2008) que dedica
dois capítulos no tratamento de temas ligados ao parentesco.
A última produção a abordar uma das populações Arawá da área é a tese de Claire
Lorrain (1994) que analisa a organização social Kulina. O foco principal da autora são as
relações de gênero. Ela fornece, contudo, dados sobre o parentesco, como terminologias, a
manutenção de relações de parentesco pela realização de casamentos entre agrupamentos que
surgem a partir da cisão de uma aldeia original, onomástica, etc..
Os outros trabalhos levantados para a área são os dedicados a populações falantes de
línguas da família katukina, uma dissertação que aborda questões relacionadas à organização
social Katukina, de Edilene Coffaci de Lima (1994) e a tese de Luiz Antonio Costa (2007)
que investiga o parentesco Kanamari.
68
Embora o levantamento aponte que existem trabalhos para muitas das populações da
área, a maioria só conta com único estudo. Isso aponta que seria produtiva a realização de
novas pesquisas sobre a temática na região.
Amazônia Centro-Meridional
Esta área apresenta a melhor proporção da produção, os trabalhos se dividem em 2 que
investigam os Munduruku, 2 sobre os Sateré-Mawé, 3 a respeito dos Mura-Pirahã e 3 dos
Tenharim. Os escritos sobre organização social Munduruku abordam a questão da mudança
social, no artigo de Alcida Rita Ramos (1978), e da relação sócio-ambiental, na dissertação de
Susy Rodrigues Simonetti (2004).
Os estudos sobre os Sateré-Mawé se focam um no parentesco e o outro na temática da
organização social. O artigo de Seth Leacock (1973) propõe uma análise da terminologia de
parentesco. A monografia de Luiz Boas Maciel (2004) explora as formas de organização dos
Sateré-Mawé entre os anos de 1980 e 1990.
A produção sobre os Mura-Pirahã se concentra no tema do parentesco. O artigo de
Adélia Engrácia de Oliveira (1978) fornece uma descrição da terminologia de parentesco,
explorando principalmente o vocabulário. Marco Antônio Teixeira Gonçalves produziu dois
textos sobre o tema, um artigo (1995) que investiga a maneira como se produz a afinidade
dentro do sistema, e outro (1997) que se dedica a entender o sistema de parentesco e a forma
da aliança.
As bibliografias levantadas sobre o parentesco e organização social Tenharim são
todas de autoria de Edmundo Antônio Peggion. Sua dissertação (1996) descreve o sistema de
parentesco da população, seu artigo (2003) estuda alguns elementos da dinâmica faccional e o
sistema político, já sua tese (2005) se dedica a investigação pormenorizada da organização
social, analisando o sistema dualista Tenharim.
Alto Amazonas
Sobre as populações da área do Alto Amazonas existem 8 trabalhos, sendo 6 sobre os
Tikuna, 1 sobre os Kambeba e 1 que, além dos Kambeba, considera também os Miranha. Este
último corresponde à dissertação de Priscila Faulhaber Barbosa (1983), que aborda os
indígenas na cidade de Tefé, e investiga as formas como identidade, parentesco e aliança se
processam no contexto urbano. Outro estudo que abarca os Kambeba diz respeito também aos
índios em contexto urbano, a dissertação de Raimundo Nonato Pereira da Silva (2001), que
69
explora a forma como se organizam os Sateré-Mawé, Dessano, Tukano, Tariano, Ticuna,
Wanano, Kambeba e Pira-Tapuya, na cidade de Manaus.
Os textos sobre os Tikuna correspondem a um artigo de Roberto Cardoso de Oliveira
(1983) centrado no parentesco, que descreve a forma como se processam as alianças
matrimoniais entre os clãs. Sobre a organização social há a dissertação de João Pacheco de
Oliveira Filho (1977) cujo foco são as facções e o sistema político e um artigo de Guy Desire
(1994) que explora os modelos simbólicos e sociais desta população. A dissertação de
Edmundo Marcelo Mendes Pereira (1999) investiga alguns elementos da reorganização social
Tikuna, mas seu estudo abarca também os Witoto e os Bora.
Maciço Guianense Oriental
Os textos desta área correspondem a 4 escritos que tratam dos Waimiri-Atroari e 4 dos
Waiwai. Sobre os Waimiri-Atroari há um artigo de José Aldemir de Oliveira (1996) que
aborda a questão da organização social e território e três estudos de Marcio Ferreira da Silva
cujo foco é o parentesco. Este autor assina um artigo (1993) que apresenta uma breve análise
do parentesco, outro artigo (1995) que relaciona o sistema Waimiri-Atroari com outros
sistemas dravidianos, e em sua tese (1993) realiza uma descrição e análise pormenorizadas do
parentesco desta população.
Os estudos sobre os Waiwai são mais centrados na organização social, tema abordado
no livro de Niels Fock (1963) e que também é considerado na produção de Carlos Machado
Dias Junior sobre a população: sua dissertação (2001), um artigo (2003) e sua tese (2006).
Maciço Guianense Ocidental
O banco de dados aponta a existência de 4 referências sobre os Yanomami, população
que se localiza nesta área. O texto de Giovanni Saffirio (1985) tem como foco principal o
parentesco, o de Napoleon A.Chagnon (1966) aborda este tema, mas tece também
considerações sobre a organização social. Judith Era Shapiro (1972) e Alcida Rita Ramos
(1972) analisam a organização social Yanomama e Sanumá, respectivamente.
Juruá-Ucayali
A produção sobre a área do Juruá-Ucayali é composta por um artigo de Julio Cezar
Melatti (1977) que investiga o parentesco e a organização social Marubo, abordando temas
como a terminologia de parentesco, etc. Elementos da organização social e parentesco
70
Marubo são também fornecidos em um relatório assinado por Delvair Montagner e Julio
Cezar Melatti (1975).
O levantamento aponta a existência da tese de Philippe Erikson (1990) que investigou
os Matis. Este trabalho fornece informações sobre o parentesco e a organização social desta
população.
Considerações finais
A partir da produção bibliográfica levantada pelo banco de dados é possível afirmar
que existem muitos estudos que focalizam a questão do parentesco e da organização social.
Há estudos de origem variada e que abordam populações distribuídas geograficamente.
Devemos considerar, contudo, que em alguns casos há concentração de trabalhos, como na
região do Noroeste Amazônico, em que a maior parte dos estudos está centrados nos Tukano,
enquanto quase não há trabalhos sobre as populações da família lingüística Arawak. Outros
casos, como o da área do Juruá-Purus, há trabalhos que consideram diferentes populações,
contudo, a produção é rarefeita, existindo apenas uma para cada grupo.
71
ÍNDIOS EM CONTEXTOS URBANOS: O QUE SABEMOS EM MANAUS?
Carlos Machado Dias Júnior
Professor do Departamento de Antropologia da UFAM e pesquisador do Núcleo de Estudos da
Amazônia Indígena
Ângela Andrade
Aluna do Curso de Ciências Sociais da UFAM
Do que informa o Banco
A busca no Banco de dados bibliográficos sobre o tema “coletivos urbanos” revelou
um total de 33 títulos (cf. em anexo). No que segue, proponho reagrupá-los em quatro
categorias para, em seguida, estabelecer algumas considerações menos voltadas para
contribuições analíticas do que em apontar indicadores sugestivos que possam estimular o
debate sobre o tema em tela. Desse modo, visando inspirar novas investigações e abordagens
associadas à questão dos coletivos urbanos no Amazonas, proponho levantar quatro categorias
para este primeiro recorte junto ao material que o banco disponibiliza, a saber:
1. Tipo de obra e ano
2. Região abordada (capital e bacias fluviais)
3. Povos estudados (Baniwa, Tukano, Tikuna, Baré, Sateré, etc.)
4. Temas privilegiados (religião, identidade étnica, cultura, educação, etc.).
Antes de entrar no ponto propriamente dito, vale destacar alguns trabalhos importantes
que abordaram a temática dos coletivos urbanos e ainda não foram cadastrados no banco do
Neai, entre eles, Andrello (2006); Cesarino (2008); Lasmar (2005 e 2006); Eloy & Lasmar,
(2006). Ademais, considerando que o presente levantamento pressupõe apontamentos e novas
perspectivas sobre a temática índios e cidades, é importante destacar outras contribuições
produzidas em outros contextos para alem do estado do Amazonas. Assim, destaco os
trabalhos de Carneiro da Cunha, M. 1998; Heckenberger, M et alii. 2003 e 2008; Iglesias, M.
2008; Saez, O 2006 e 2000; Santos Granero, F. 1986 e Viveiros de Castro, E. 2006. Passemos
aos dados do banco e as categorias sugeridas acima.
1. Tipos de obras e ano
As obras levantadas são teses, dissertações, artigos, monografias e trabalhos de pibics.
O ano correspondente é o que aparece na fonte, não se confundindo com datas de eventuais
publicações que foram lançadas posteriormente. Desse modo, observamos os seguintes
números: 01 (uma) tese de doutorado; 11 (onze) dissertações de mestrados; 10 (dez)
monografias; 6 (seis) artigos; e 5 (cinco) trabalhos de pibics. Olhando para o quadro abaixo
72
veremos que ele estabelece uma relação entre o ano e a quantidade de títulos levantados, onde
podemos notar um expressivo aumento da produção na última década: 04 títulos nos anos
1980; 05 nos anos 1990 e 24 nos anos 2000. Vale notar que os registros do banco, na ocasião
deste levantamento, ficaram limitados à produção até o ano de 2007.
Quadro 1
Obras Monográficas
Década/
ano
Tese
Dissert.
Artigo
Monog.
Pibic
1980
1982 83
02
87
01
96
90
97
99
00
02
01
01
01
2000
02 04 05
06
02
01
01
01
01
ST
01
02
01
03
04
01
Total
07
02
02
03
01
01
11
06
10
05
33
2. Regiões abordadas
A região mais estudada no Amazonas, no que diz respeito ao tema em foco, foi a
cidade de Manaus com 22 dos 33 títulos correspondendo a 66.6% do total produzido. Em
seguida temos os povos do Rio Negro, com 08 títulos totalizando 24.2% e, por fim, os povos
do Rio Solimões com 03 obras relativas a 9.2% da produção.
Quadro 2
Regiões Abordadas
Local
Manaus
Rio Negro
Solimões
Nº Títulos
22
08
03
%
66.6
24.2
9.2
3. Povos estudados
Os Sateré foram os povos mais abordados. Curiosamente, superando até mesmo os
povos do Alto Rio Negro. Em seguida, os povos do Solimões, em especial os Tikuna, e, por
fim, uma pequena produção voltada aos demais povos do Amazonas.
Quadro 3
Povos Estudados
Povo
Sateré
Rio Negro
Solimões
Diversos da AM
Total
Nº Títulos
13
12
05
03
33
%
39.4
36.4
15.1
9.1
100
73
4. Temas privilegiados
Diferente das demais categorias listadas, a que diz respeito aos temas de estudo
privilegiados se nota uma particularidade, pois, podemos enquadrar os trabalhos em mais de
uma temática. Assim, compreende-se que possa haver um número maior de temas (43) sem
com isso alterar o número de títulos (33). Noutros termos, encontramos obras que podem ser
enquadradas em mais de uma temática. A imprecisão neste caso não invalida, nem reduz a
relevância desta categoria uma vez que se nota uma expressiva recorrência associada aos
temas da identidade étnica e da cultura. Vejamos o quadro.
Quadro 4
Temas Privilegiados
Título
Identidade étnica
Cultura
Educação, saúde e
políticas públicas
Migração
Economia e religião
Línguas
Total
Temática
14
13
08
%
32.5
30.2
18.6
04
03
01
43
9.3
6.9
2.3
100
Apontamentos preliminares para uma análise do material
O primeiro ponto que se faz notório é o pequeno número de obras que abordaram a
temática dos coletivos urbanos no estado do Amazonas. Considerando que o número de
cadastros no Banco é de 1575 títulos, os 33 que trataram do tema em foco correspondem tão
somente a 2% do total. Neste contexto, vimos também, a cidade de Manaus é a região de
maior incidência dos estudos com 22 títulos correspondendo a 64.7%. Em seguida os estudos
incidiram sobre os povos do Rio Negro com 09 títulos (05 no alto e 04 no curso médio do
Rio) resultando 25.4% e, por fim, 03 obras que focalizaram os “coletivos urbanos” no Rio
Solimões, totalizando 8.8% do total. Portanto, além da pequena produção associada ao tema,
nota-se ainda uma grande concentração desses estudos em apenas três localidades, fazendo
com que as cidades do interior do estado sigam expressando grandes vazios etnográficos.
Uma das possíveis razões que respondem pela grande concentração dos estudos na
capital pode estar associada aos tipos de trabalhos produzidos. Se olharmos para a tabela tipos
de obras notaremos que as dissertações e monografias respondem por mais da metade da
produção. Somando-se a esse aspecto a maior concentração da produção universitária na
Capital, a falta de recursos para a pesquisa na graduação e os curtos prazos para o mestrado,
de certo modo, ajudam a compreendermos a razão pelo maior número dos títulos abordando o
74
contexto urbano de Manaus em detrimento de qualquer outra cidade do interior.
Nota-se também que as primeiras dissertações foram defendidas no início dos anos de
1980 por alunos da Universidade Nacional de Brasília, com destaque para a tese de doutorado
defendida em 2006 na Universidade Federal do Rio de Janeiro como o trabalho de maior
fôlego. O longo intervalo (16 anos) entre as primeiras dissertações e a primeira tese se faz
notório, sobretudo, quando se sabe que a partir do final dos anos de 1980 os estudos em
antropologia que abordaram a questão (índios e cidades) se fizeram cada vez maiores em
outras regiões do Brasil, e mais intensamente no nordeste. Este fato merece atenção, pois,
como também se nota no quadro 1 acima (Tipos de obras e ano), no estado do Amazonas,
somente nos últimos cinco anos é que esses estudos passaram a ser mais intensos. Vinte
títulos produzidos em apenas três anos, entre 2004 e 2007.
Mais do que atenção, esse fato merece uma investigação mais densa, pois, além de
revelar que enquanto outras regiões do Brasil o ponto (índios e cidades) se fazia “emergente”,
no Amazonas ele estava adormecido ou, de algum modo, silenciado. O fenômeno, se é que
podemos tratar assim da questão, trás mais um indicador importante que nos remete para a
diferença histórica e social não só do estado do Amazonas, mas do Brasil indígena como um
todo. Conforme nos tem anunciado estudos etnológicos recentes, a diferença social, política e
cosmológica dos povos ameríndios se ancoram em bases epistemológicas radicalmente
distintas daquelas que erigiram a vida social, política e cosmológica do Ocidente moderno (cf.
Viveiros de Castro, 2002; Descola, 1986; Dias Jr. & Mendes Santos, no prelo; e outros).
Desse modo, considerando a grande presença indígena nos contextos urbanos da região Norte,
em especial no estado do Amazonas, talvez possamos levantar a hipótese de que a
“emergência” indígena não se deu seguindo o modelo e o momento histórico de outras
regiões, pelo fato dos povos indígenas aqui nunca terem sido sucumbidos a uma ordem outra
ou processo colonizador tal qual nos demais estados brasileiros. Afinal, para “emergir” é
preciso antes estar submerso, ter sido vencido. E este, aparentemente, não parece ser o ponto
de vista dos próprios indígenas no Amazonas.
A hipótese, ainda que pouco elaborada, nos leva um pouco adiante. Olhando para os
quadros 1 e 4 acima (obras e temas privilegiados), nota-se além da particularidade amazônica
anunciada uma expressiva concentração temática associada aos estudos de “identidade étnica”
e “cultura”. Somam mais de 60% dos títulos registrados no banco. O passo adicional que se
faz relevante é buscar na própria temática da etnicidade as razões para o silêncio, o
ocultamento e o baixo rendimento de tais teorias para se pensar a presença indígena nos
contextos urbanos do Amazonas.
75
Podemos mesmo partir do pressuposto de que no Amazonas (e quiçá alhures) os povos
indígenas possuem razões e estratégias para se situarem nos contextos urbanos que as teorias
acadêmicas ainda desconhecem. Sobretudo, aquelas da etnicidade que sustentam a maioria
dos estudos e mesmo quando foram mais ousados, abordando processos de “revitalização
cultural”, trataram pela mesma chave teórica da etnicidade. Ou mais e melhor, como bem
observou Marshal Sahlins (2006), tais teorias mais atrapalham do que ajudam a
compreendermos a questão. A saída, portanto, estaria na busca de outras orientações teóricas
para se tratar do tema. Conforme também anunciei acima, novas abordagens começam a ecoar
no cenário dos estudos etnográficos contemporâneos, tais como propuseram Carneiro da
Cunha, M. 1998; Gow, P. 2003; Heckenberger, M et alii. 2003 e 2008; Iglesias, M. 2008;
Saez, O 2006 e 2000; Santos Granero, F. 1986, Viveiros de Castro, E. 2006 e outros.
Considerações finais
Sabe-se da presença de um expressivo componente indígena nos contextos urbanos da
Amazônia. Fenômeno este que se constata seja pela história das cidades que, no Estado do
Amazonas, emergem sem exceção de uma aldeia indígena (Marcoy 2001); seja pelos sensos
demográficos (Batista 2007); os aspectos linguísticos (Freire 2004), sociais e simbólicos
culturais (Porro 1996); sejam ainda as expressões e comportamentos, as artes, os modos e
vitualhas cotidianos (Cunha 2003, Peres 2002).
Podemos ir adiante e notar a presença desse componente indígena contemplado nas
políticas públicas governamentais, na economia do mercado local de (re)produção tecnológica
e industrial; na expressão literária consagrada no Brasil e internacionalmente de Milton
Hatoum, Marcio Souza, Thiago de Melo e outros. Enfim, pode-se mesmo notar a presença
indígena registrada pela história, refletida no folclore e presente no universo mitológico
constitutivo da vida social manauara. Neste contexto, uma etnografia que busque registrar e
analisar o pensamento, o dito e a interpretação dos povos indígenas sobre os contextos
urbanos na Amazônia seria de suma importância para os estudos etnográficos nas Terras
Baixas.
Não obstante, a despeito deste expressivo componente é quase inexpressivo o que
sabemos em termos antropológicos sobre a presença indígena nos contextos urbanos
amazônicos. Conforme vimos no levantamento acima, limita-se a trinta e três títulos e,
ademais, pautados fortemente pelas teorias da etnicidadade, em especial as formulações de
Frederic Barth (1979); e a noção de fricção interétnica, elaboradas por Roberto Cardoso de
76
Oliveira (1972). O que, de certo modo, explica o inevitável tema da identidade étnica quando
o olhar antropológico fechou o foco sobre a questão.
Considerando o acumulo etnográfico e as construções teóricas elaboradas pela
etnologia sul-americana nas últimas décadas, especialmente a noção de pessoa (Seeger,
DaMatta & Viveiros de Castro, 1979), a afinidade (Overing, 1975, 1977; Rivière, 1979, 1986
e Viveiros de Castro, 1993) e o perspectivismo (Viveiros de Castro, 1996), podemos acreditar
que é hora de analisar a participação indígena nos contextos urbanos amazônicos à luz dessas
ferramentas. Sabe-se que essas teorias muito iluminaram os estudos etnológicos nas Terras
Baixas possibilitando as comparações mais refinadas entre as diferenças sociais e
cosmológicas indígenas.
Tanto as teorias auxiliaram as descrições localizadas quanto o acumulo etnográfico foi
importante para o refinamento das comparações. Hoje, não há quem duvide dos avanços
teóricos dos estudos americanistas que tanto contribuíram para o desenvolvimento da
antropologia em sentido mais amplo, quanto na sua eficácia para o entendimento da
complexidade das sociedades indígenas na América.
Se estivermos de acordo que a noção de pessoa é o princípio que estrutura a vida
social; que a afinidade é o esquema sociológico que pauta a organização do socius; e que a
filosofia desses mundos, de algum modo, estão circunscritas ao perspectivismo, não devemos
descartar essas ferramentas como possibilidade promissora para focarmos os povos indígenas
situados nos contextos urbanos da Amazônia. Elas poderão minimamente nos ajudar a
percebê-los, descrevê-los e analisarmos a participação indígena no arranjo desses coletivos.
Este é um dos desafios que se faz atual e, conforme o levantamento junto ao banco do
Neai revelou, promissor. Noutras palavras, fechar o foco sobre a presença indígena nos
contextos urbanos da Amazônia e suas extensões (cidades, comunidades e aldeias do interior)
à luz das contribuições americanistas anunciadas. Se, por um lado, sabemos que essas teorias
foram cunhadas em aldeias e, portanto, expressam socialidades muito específicas; por outro,
entendemos também que princípios, esquemas e filosofias não são como as roupas que se
trocam todos os dias. Portanto, o componente indígena nas cidades Amazônicas não pode
prescindir das contribuições antropológicas e suas noções e teorias cunhadas nas aldeias.
77
Tabela
Produção Bibliográfica sobre o Tema
TIPO
Dissertação
Monografia
Artigo
Artigo
Monografia
PIBIC
Monografia
Dissertação
Monografia
PIBIC
Monografia
PIBIC
Dissertação
Dissertação
Dissertação
Monografia
Artigo
Monografia
Dissertação
Monografia
Monografia
Dissertação
Tese
Dissertação
Artigo
Artigo
Artigo
Dissertação
Dissertação
Dissertação
PIBIC
Monografia
PIBIC
PIBIC
TITULO
A reinvenção das formas de controle social: um estudo sobre a participação indígena no
Conselho Municipal de Saúde de São Gabriel da Cachoeira
Os índios Baré na cidade de Manaus
Mulheres indígenas e artesãos do Alto Rio Negro em Manaus
Indígenas na cidade de Manaus: os Sateré-Maué no bairro da Redenção
O reflexo da sociedade envolvente na identidade das crianças Sateré-Mawé da aldeia em
contexto urbano - Y'Apyrehyt
Multi e/ou bilingüismo e valor funcional das línguas indígenas em Manaus
A criança indígena na escola regular: os alunos Sateré-Mawé da comunidade Y'Apyrehyt
na escola regular em Manaus
Etnia e urbanização no Alto Rio Negro: São Gabriel da Cachoeira – AM
Os Mediadores do mundo indígena frente a dinâmica do controle social no Distrito
Sanitário Especial Indígena de Manaus
Índios urbanos: um grupo Ticuna na cidade de Manaus
Ritos de passagem: ritual Sateré-Mawé em contexto urbano de Manaus
Quem são os donos do guaraná? representações sociais sobre os índios Sateré-Maué
A identidade com os bravos: política e religião em um núcleo urbano Ticuna
Negociando a identidade com os brancos : política e religião em um núcleo urbano
Ticuna
Índios proletarios em Manaus: el caso de los Sateré-Mawé citaditos
O artefato como instrumento para a preservação e a sobrevivência da etnia Sateré-Mawé
no contexto urbano
Barés, Manaos, Tarumãs: o processo histórico da urbanização de Manaus
Uso de plantas medicinais entre os Sateré-Mawé nos processos saúde/cura/doença
Identidade etnica y regional: trayecto constitutivo de una identidade social
Identidade e tradição: a mulher indígena Sateré-Mawé da comunidade "Yapyrehyt"
Movimento indígena urbano da associação das mulheres indígenas Sateré-Mawé
A criança indígena na escola urbana: um desafio inter-cultural
Estudar e experimentar na cidade: trajetórias sociais, escolarização e experiência urbana
entre “jovens” indígenas ticuna, Amazonas
Metaformofes em Yauareté: em direção ao urbano (1985-2005)
Entre a aldeia e a cidade
De Aldeados a urbanizados: aspectos da identidade étnica indígena na cidade de Manaus
Fazer etnográfico entre as mulheres: o processo social e político das Númia-Kurá no
espaço urbano da cidade de Manaus/AM. In: 23ª Reunião Brasileira de Antropologia
O universo social dos indígenas no espaço: identidade étnica na cidade de Manaus
Movimentos migratórios da população Sateré-Mawé: povo indígena da Amazônia
Situação epidemiológica da tuberculose e condições de vida no município de São Gabriel
da Cachoeira
Universidade e povos indígenas no Amazonas
Ente a educação na aldeia e a escola na cidade: a educação escolar entre os ticunas no
bairro Cidade de Deus
Trajetórias alimentares entre os índios Baniwa urbanizados
Índios em contextos urbanos: o que sabemos em Manaus?
78
Referências Bibliográficas
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80
PRODUÇÃO FONOGRÁFICA E BIBLIOGRÁFICA SOBRE A MÚSICA DOS
POVOS INDÍGENAS DO ESTADO DO AMAZONAS
Deise Lucy Oliveira Montardo
Professora do Departamento de Antropologia da UFAM e pesquisadora do Núcelo de Estudos da
Amazônia Indígena (NEAI/PPGAS)
Este relatório dá ênfase a produção fonográfica e bibliográfica sobre a música dos
povos indígenas do Estado do Amazonas, o qual inicialmente não foi previsto no escopo do
projeto. Destaco como resultados o relatório do aluno de iniciação científica Ivanilson
Barbosa da Costa (2008) intitulado “Registro fonográfico de música indígena: estudo sobre a
pesquisa, produção e comercialização” desenvolvido sob minha orientação, bem como o
artigo “Índios na cidade: Facetas da Arte no encontro intercultural” (Montardo 2009)
publicado no livro “Estigmatização e território” organizado por Almeida e Santos (2009)
As referências a música indígena se espalha em produções tais como as dos viajantes,
em etnografias clássicas, em etnografias especializadas e centradas na questão em foco e em
materiais fonográficos das mais diversas ordens. Não vamos aqui dedicar atenção a
referências esparsas que aparecem geralmente no contexto de descrição dos rituais e vida
cerimonial dos indígenas.
Um dos registros mais recuados no tempo e, por sua vez, também mais detalhados a
cerca da música e dos instrumentos musicais indígenas no Estado do Amazonas, está na obra
de Theodor Koch-Grünberg (2005). O pesquisador tinha um interesse especial na cultura
material e estava coletando peças para o acervo de museus (Montardo 2007). Além disto ele
trazia consigo um fonógrafo, máquina inventada a pouco tempo e que permitia o registro de
sons em cilindros de cera. Abro uma nota aqui para enfatizar que este acervo de cerca de 86
cilindros que encontram-se no arquivo fonográfico de Berlim, foram selecionados 36 que
foram lançados em um cd da viagem que Koch-Grünberg fez entre 1911 e 1913 na Amazônia
brasileira (Koch & Ziegler 2006). Este cd conta com um livreto, em alemão e português, com
textos de etnomusicólogos com análises sobre a gravação e a música dos povos ali
representados, que são Taulipáng, Makuschi, Wapischana, Tukano, Yekuana, Desana e
Baniwa (Mendivil 2006).
Koch-Grünberg não era musicólogo e suas gravações foram analisadas por Erich
Moritz Von Hornbostel, em escritos publicados no terceiro volume de sua obra “De Roraima
ao Orinoco”(1923), ainda não traduzida para o português.
81
Em meados do século XX, o padre salesiano Alcionilio Brüzzi Alves da Silva
publicou vasta pesquisa acompanhada de discos intitulada “Discoteca etno-linguísticomusical das tribos dos rios Uaupés, Içana e Cauaburi (1961).
Trabalhos desenvolvidos por antropólogos sobre a temática musical na região passam
a ocorrer na década de 1990. Citamos a dissertação de mestrado de Domingos Silva (1997)
“Música e pessoalidade: por uma Antropologia da música entre os Kulina do Alto Purus”, no
qual o autor explora a música como central num ciclo de transformações simbólicas entre
cultura e natureza.
Na região do Alto Rio Negro, Acácio Piedade realizou a dissertação de mestrado
”Música Ye´pâ´masa: por uma antropologia da música no Alto Rio Negro”, no qual o autor
faz um levantamento dos instrumentos musicais e analisa gêneros vocais musicais masculinos
e femininos, assim como a música instrumental dos aerofones cariço, flauta de pã e japurutu,
flauta.
No Vale do Javari, Guilherme Werlang (2001) escreveu sua tese de doutorado
“Emerging Peoples: Marubo myth-chants” sobre a relação entre o mito e a música Marubo,
grupo de língua Pano.
Se fossemos considerar aqui a produção de monografias sobre música indígena na
região Amazônica, o número de trabalhos cresceria, porém não muito. Teríamos, entre outros,
Seeger (1997) para os Suyá, Menezes Bastos (1978, 1990) para os Kamayurá, Mello (1999,
2005) e Piedade (2004) para os Wauja, região do Xingu; Beaudet (1983, 1997) para os
Waiãpi, região das Guianas, Hill (1993, 1997) para os Wakuenái, na Venezuela, Lourenço
(2009) para os Javaé, Ilha do Bananal. Teríamos ainda coletâneas como a organizada por
Tugny & Queiroz (2006) “Músicas africanas e indígenas no Brasil, bem como as
enciclopédias editadas por Olsen & Sheehy (2000), “The Garland Handbook of Latin
American Music” e por Kuss (2004) “Music in Latin America and Caribbean, volume 1,
Performing Beliefs Indigenous peoples of South America, Central America and Mexico.
Todos os trabalhos citados neste parágrafo são acompanhados de CDs.
Nos limitamos, no entanto, aqui, para o escopo deste projeto aos trabalhos feitos nos
limites do Estado do Amazonas.
Já no que se refere aos cds de música indígena a maior dificuldade é realizar um
levantamento exaustivo, devido as peculiaridades deste tipo de produção. Não há um lugar
onde se centralizem as informações sobre a produção fonográfica, como ocorre com teses e
dissertações, por exemplo, nos bancos de teses. Esta situação é abordada no Relatório de
Iniciação Científica de Ivanilson Costa (2008), citado acima.
82
Quanto ao material sonoro registrado em campo por pesquisadores e outros atores,
abro um parênteses para ressaltar que no Brasil, não há a prática do depósito destes registros
em instituições o que os torna, o mais das vezes, praticamente inacessíveis. Seeger (2008) tem
ressaltado a importância do cuidado com o material registrado em campo, gravações e diários,
pois estes estão sob suportes perecíveis e, muitas vezes, esquecidos nas casas dos
pesquisadores. Isto ocorre, principalmente quando o tema central da pesquisa não eram as
músicas.
Compact Discs - Cds.
Neste relatório optamos por escolher alguns exemplos de cds e destacar neles aspectos
tais como, agentes da produção, tiragem, conteúdo informativo, entre outros. Vamos inverter
o sentido e iniciar por um trabalho em andamento, que trata-se do Projeto Acalanto, canções
das mulheres indígenas do Rio Negro. Este cd está sendo produzido por Ricardo Franco de Sá
e Andréa Prado com patrocínio da Petrobrás. O projeto aprovado no edital de Patrimônio
Imaterial do Petrobrás cultural de 2004/2005, devido aos trâmites burocráticos comuns nestes
casos pode ser iniciado em 2007. Segundo relato da viagem da equipe do projeto para as
gravações, realizada em agosto de 2008 , o objetivo principal foi o registro das canções das
mulheres indígenas do tronco lingüístico Tukano Oriental residentes em comunidades ao
longo dos rios Balaio, Uaupés e Tiquié. O trabalho encontra-se em fase de finalização, mas,
por comunicação pessoal, podemos adiantar que estão sendo feitas traduções dos letras dos
cantos, o que provavelmente irá constar no encarte.
O Cd duplo Magüta arü wiyaegü, Cantos Tikuna (Pereira & Pacheco 2009) foi
lançado neste ano como parte da Coleção Documentos Sonoros do LACED/Museu Nacional,
Rio de Janeiro. O livreto do encarte vem com a apresentação da Petrobrás, a empresa
patrocinadora e de Nino Fernandes, presidente do Conselho Geral da Tribo Tikuna, CGTT e
diretor do Museu Magüta, o museu indígena que se localiza em Benjamin Constant. Este é um
exemplo de trabalho feito com preocupações acadêmicas o que se demonstra pelo cuidado
com as informações do livreto que trazem mapas, fotografias e textos de João Pacheco de
Oliveira sobre os Tikuna e o seu principal ritual, o ritual da moça nova e de Emundo Pereira e
Gustavo Pacheco sobre a música e os instrumentos musicais deste povo. Muito interessante
também neste trabalho é que ele se propõem a trazer, além da música “tradicional” aprendida
nos tempos primordiais, a música que os tikuna tem feito nos dois últimos séculos e que tem
elementos das músicas de baile, músicas dos países vizinhos, forro, brega, toadas de boi e
músicas feitas para evangelizar.
83
Os produtores Pereira e Pacheco concluem sua apresentação narrando como se deu a
produção do cd e enfatizando que de 13 horas de gravação, foi feita, junto com os
interlocutores indígenas, uma seleção que compõem os dois cds. O conjunto total das
gravações está depositado no Museu Magüta e representam parte da riqueza musical dos mais
de 35 000 tikunas. O telefone e endereço eletrônico do Museu Magüta é fornecido para
contato: (97) 3415 6077 e [email protected], bem como a página do Laced, o
laboratório de pesquisas em etnicidade, cultura e desenvolvimento, www.laced.mn.ufrj.br.
O Cd Reahu He à – Cantos da festa yanomami (Kopenawa Yanomami & Wesley de
Oliveira 2008) foi realizado pela Hutukara Associação Yanomami e o Som das Aldeias, com
apoio da ONG CCPY Pró-Yanomami e Patrocínio do Projeto Demonstrativo dos Povos
Indígenas (PDPI) do Ministério do Ambiente (MDA). O encarte é apresentado e traz
depoimentos da liderança David Kopenawa Yanomami, o qual é presidente da Associação. Os
depoimentos sobre os cantos foram recolhidos, traduzidos e editados pelo antropólogo Bruce
Albert e são entremeados com desenhos de cenas da festa. As gravações tiveram participação
de cantores das comunidades do Watoriki, Toototobi, Catrimani e Baixo Catrimani e foram
feitas na aldeia Watoriki (Serra dos Ventos), estado do Amazonas, em março de 2005.
Destaco a apresentação das letras dos cantos acompanhados de tradução e em especial o texto
de David Kopenawa sobre “As árvores dos cantos” com o qual introduz os Cantos Xamânicos
do qual transcrevo o seguinte trecho:
“Onama plantou as árvores dos cantos nos confins da floresta, onde a terra
se acaba e onde estão fincados os pés do céu. Destes lugares, eles distribuem
sem trégua seus cantos para todos os espíritos que acorrem até eles São
árvores grandes, cobertas de lábios que não param de se mexer, umas encima
das outras. Deixam escapar melodias magníficas que se seguem sem fim, tão
inumeráveis quanto as estrelas no peito do céu. Suas palavras nunca se
repetem e nunca se esgotam. É só um canto acabar que um outro começa,
Eles não param de proliferar em suas bocas sem número. Por isso os
xaripiripë, tão numerosos quanto possam ser, podem adquirir todos os
cantos que desejarem, sem nunca esgotá-los. Eles escutam as árvores
amoahiki com muita atenção. O som dos cantos penetra neles e grava-se em
seu pensamento. Eles os capturam assim como se fossem gravadores dos
Brancos, nos quais Omama também colocou uma imagem de árvores dos
cantos. É desta maneira que eles podem aprendê-los. Sem estes cantos não
poderiam fazer suas danças de apresentação.”
No final do encarte encontra-se o telefone e e-mail da Associação Hutukara para
interessados em adquirir o cd: (95) 3224-6767 e [email protected].
84
Um exemplo bastante diferente dos anteriores encontramos no Cd Cantos Indígenas
(2007). Este trabalho foi uma ação da Secretaria Municipal de Cultura e segundo os agentes
foi uma demanda dos grupos musicais que se apresentavam mensalmente na Feira indígena
Pukaá. A demanda foi acoplada ao projeto Regatão Cultural, que previa gravações de artistas
locais o que resultou no cd. O que ressalto como diferencial deste trabalho é que enquanto os
anteriores mostram uma preocupação em dar os créditos para os músicos apresentando
informações sobre as etnias a qual pertencem, este não traz nenhuma informação neste
sentido. Ou melhor, traz o nome do cantor ou compositor, fotos das apresentações, o nome do
grupo e a tradução das letras das canções, mas sem preocupação em explicar para quem não
conhece os universos ali referenciados. Por exemplo, há canções em tukano, tikuna, ñengatu,
mas não há referências a isto. Os nomes parecem ser dos grupos musicais, mas podem ser
interpretados como sendo o nome da etnia, pois em alguns casos coincidem. A impressão que
tenho é que o trabalho foi feito pensando no próprio público, diferentemente dos anteriores
em que há uma preocupação com um público mais amplo, e uma intenção de tratar da cultura
indígena de etnias específicas. Os grupos são aicünã, bayaroá, inhã-bé, magüta,
wotchimaucü, ikerpy, munduruku, mypynukuri, myryhu.
Outro exemplo de produção é o DVD “Danças Indígenas”, produzido caseiramente
pelo Antônio Sodré (s/d), músico Tariano. Ele reproduziu uma gravação feita para um
programa da TV Cultura para a venda. Tem apenas uma capa com uma foto dos músicos
dançando e cerca de 5 minutos de imagem e som. Na capa consta o título e uma frase que diz:
“Autorizada comercialização de acordo com a portaria n. 177/PRES, de 16 de fevereiro de
2006 – FUNAI.
O CD “Cantigas Tikuna wotchimaucü” foi produzido por Braga & Barroncas (2004).
Traz as letras dos cantos somente em português e não menciona quem patrocinou. Na ficha
técnica agradece a UFAM na pessoa da Profa. Dulce e a OGPTB e a CGTT. Uma diretora da
organização de mulheres indígenas Tikuna em comunicação pessoal me informou que a
primeira edição do cd foi patrocinada e que se esgotou. A partir daí a associação pagou uma
reimpressão, cujos exemplares elas vendem em feiras juntamente com o artesanato.
O livreto do CD “União dos Povos” traz uma apresentação assinada pelos, então
presidente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB),
Jecinaldo Barbosa, gerente técnico do PDPI, Gersem dos Santos Luciano, assessora da GTZ
no PDPI, Sondra Wentzel, na qual o mesmo é considerado o primeiro de música indígena da
cidade de Manaus. O material, conta também, com textos explicativos das faixas que são
apresentadas como uma pequena amostra do universo musical da Amazônia, contemplando
85
quatro etnias de três regiões do Estado do Amazonas (Franco de Sá 2003). O Cd inicia com
uma vinheta instrumental Tariano, seguida de cantos Tikuna, Tukano e Satere-mawé. Os
textos de Gabriel Gentil, Cláudia Tikuna e Wellington Cabral falam do significado da música
e dos instrumentos musicais para cada uma destas etnias. O livreto contempla ainda as letras
das canções na língua em que são cantados e em português e os créditos de todos os
instrumentistas e cantores.
É muito difícil se restringir as fronteiras do Estado do Amazonas quando tratamos de
populações indígenas, que tem configurações muito anteriores as atuais fronteiras sóciopolíticas tanto quando nos referimos as unidades da federação como quando isto acontece em
relação aos Estados-nações atualmente constituídos. Fizemos questão de incorporar neste
relatório o Cd “Caxiri na Cuia: o forró da maloca” produzido por Wesley de Oliveira com os
Macuxi e Wapixana da Terra Indígena Raposa da Serra do Sol, e patrocinado pelo PDPI,
MDA. Considero ser este um exemplo de trabalho que reflete a autonomia dos povos
indígenas em escolher o que gravar em termos dos gêneros musicais de sua preferência. Neste
CD várias das letras falam do processo de reivindicação pela homologação daquela Terra
Indígena e outras lutas deste povo.
Finalizamos ressaltando que o registro das músicas e produção de cds e dvs é uma
demanda dos povos indígenas e que tem sido, em certa medida contemplada por editais de
empresas como a Petrobrás, do Ministério da Cultura e também através do PDPI, com sua
linha de financiamento referente a valorização cultural.
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88
ANÁLISE DA PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS INDÍGENAS NO
RIO NEGRO
Laise Lopes Diniz
Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da UFAM
Danilo Paiva Ramos
Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP
Neste trabalho é apresentada uma revisão da bibliografia sobre a região do médio e
alto Rio Negro, realizada em consulta ao Banco de Dados Bibliográficos do projeto Amazonas
Indígena, que reuniu artigos, livros, dissertações e teses, que abordam a região do médio e
alto rio Negro. A pesquisa concentrou-se em publicações direcionadas ao estado do
Amazonas, no Brasil.
A região do médio e alto rio Negro está ao noroeste do estado do Amazonas, o limite é
o município de Barcelos do Rio Negro, ao sul pelo rio Japurá, a oeste e a norte pela fronteira
do Brasil com a Colômbia e Venezuela. O alto rio Negro faz fronteira com a Colômbia e
Venezuela, e, em 1998, foram homologadas as 5 terras indígenas demarcadas: Alto Rio
Negro, Médio Rio Negro I, Médio Rio Negro II, Apapóris e Tea. Esta região compreende os
municípios de São Gabriel da Cachoeira, Santa Isabel e Barcelos, cidades localizadas na
margem esquerda do rio Negro.
É formada por um sistema complexo de pluralismo étnico, são 23 povos indígenas
falantes de línguas das famílias Tukano Oriental, Aruak e Maku; organizados em suas áreas
tradicionais. Desses povos indígenas se destaca a diversidade lingüística, que é refletida na
organização social, na ocupação de territórios, no papel dentro da cultura material e simbólica
e acesso a recursos naturais.
O grupo Tukano Oriental habita principalmente a bacia do Uaupés e seus afluentes:
Tiquié, Papuri, Querari, Iauaira e Japú. Atualmente existe mais de 200 comunidades e sítios,
com uma população em torno de 6.000 pessoas, sendo que quase a metade vive no distrito de
Iuaretê. A população indígena dessa região é divida em cerca de 15 grupos lingüísticos
exogâmicos e patrilineares, as etnias na bacia do Uaupés são: Arapaço, Barassano, Bara,
Dessano, Cubeo, Karapanã, Makuna, Miriti-Tapuia, Siriano, Tariano, Taiwano, Tatuyo,
Tukano, Tuyuka e Wanano.
Os grupos Aruak são: Baniwa, Coripaco, Baré, Werekena e Tariana. Estes não estão
concentrados majoritariamente em uma única região, os Baniwa e Coripaco habitam o Içana e
seus afluentes Ayari, Cuiari e Cubate; os Baré estão principalmente na região do Rio Negro;
os Werekena no rio Xié e os Tariana na região do Uaupés. Estes últimos vivem há muito
89
tempo na região do Uaupés, onde estabeleceram uma rede matrimonial e sócio-político junto
aos povos Tukano e hoje apenas um pequeno grupo fala a língua tariana.
Os grupos de língua maku são: Hupde, Yuhup,
Nadeb e
Dow (Kamã). Estes
apresentam características que os diferenciam dos outros grupos na região do Rio Negro,
vivem no interior da floresta, nos igarapés ao invés dos grandes rios, característica esta que na
etnologia passou-se a adotar a distinção como os índios do mato, e os grupos Tukano e Aruak
adota-se a oposição dos índios do rio. Os Maku se caracterizam pela mobilidade por terra,
com maior sofisticação nas técnicas de caça, enquanto os Tukano e Aruak tem maior
mobilidade por rio e técnicas mais desenvolvidas na agricultura.
A produção etnográfica do Alto Rio Negro costuma utilizar a subdivisão da região de
acordo com seus principais cursos de rio, os quais equivalem aos sítios ancestrais de moradia
de grupos étnicos específicos.
A divisão geográfica das sociedades locais tem orientado o processo histórico,
principalmente relacionado a política de contato; e ainda é presente, inclusive influenciando a
atuação da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro - FOIRN, atualmente
organizada em cinco regiões políticas: Uaupés, Tiquié e baixo Uaupés, alto rio Negro, médio
rio Negro e Içana. Esta divisão política vai ser assumida como orientação de contagem das
produções encontradas no banco de dados.
O Banco de Dados bibliográficos do projeto Amazonas Indígena reuniu 572 obras, que
para fins deste relatório foram classificados em dez grupos de tipos de produção: artigo,
capítulo, dissertação, livro, monografia, PIBIC, relatório, tese, vídeo e outros.
Gráfico 1
Levantamento da Produção bibliográfica
90
A primeira obra no registro do banco de dados data 1853, na segunda metade do
século XIX, Travels on the Amazon an rio Negro de Alfred Russel Wallace, mas é perceptível
uma irregularidade, com destaque ao fato de não haver registro entre 1854 a 1872. A maioria
das produções levantadas no banco de dados se dá após 1966, onde se verifica maior
constância da produção bibliográfica, que pode ser vista nas tabelas em anexo.
Estudos por região
No rio Negro tendo como base as regiões políticas, podemos dividir as 572 obras de
acordo com as regiões: Uaupés, Tiquié, Içana, alto Negro e médio Negro. Sendo que a maior
produção é encontrada na região do Rio Negro, que inclui estudos de maior amplitude na
região, muitas das vezes envolvendo o rio Negro e os afluentes, são 203 obras escritas.
Os estudos no rio Negro enfatizam características peculiares do ecossistema associado
a etnologia, apontando as determinações ecológicas do ambiente que é formado por escassez
de nutrientes e a vida das populações indígenas. O principal enfoque, se dá em torno das
ações adaptativas das populações nesta região, exaltando o profundo conhecimento indígena
da ecologia e da elaboração de técnicas de manejo e relações sociais adequadas a vivência.
Nesta abordagem destaca-se o trabalho de Berta Ribeiro(1995), “Os índios e águas
preta”, no qual a autora aponta as estratégias e técnicas de manejo do meio ambiente. Um
estudo detalhado das técnicas de pesca, horticultura e botânica do grupo Desana, destacando o
sistema de processo da mandioca brava, como principal fonte de nutrientes na alimentação
dos povos que vivem no rio Negro.
Outra característica dos estudos relacionados ao rio Negro está diretamente ligada a
região do médio Negro, que teve um período de pouca produção de pesquisa etnográfica, um
dos motivos é a linha de estudos de aculturação desenvolvidos por Eduardo Galvão e Adélia
Engrácia de Oliveira, na década de 70. Com o foco no processo de assimilação das sociedades
indígenas a sociedade regional, os estudos apontavam que os grupos do rio Negro podiam ser
considerados “camponeses”, definindo que os índios desta região haviam sido destribalizados
e aculturados. Eduardo Galvão (1955, 1959, 1979) e Oliveira (1971) em seus trabalhos
indicam que os índios da região a partir da integração com a sociedade nacional ou regional
tornaram-se camponeses e perderam os valores da cultura indígena, o que gerou que a
pesquisa etnográfica tivesse menor interesse por parte dos pesquisadores das ciências sociais.
Em relação a Terra Indígena Yanomami, as produções relacionadas no banco de dados
engloba a região do alto e médio rio Negro e a parte ocidental do Estado de Roraima. Foram
124 produções, sendo Bruce Albert o autor que mais se destaca no conjunto das obras, tem 23
91
produções que englobam uma etnografia fina dos povos Yanomami, abordando temas como:
cosmologia, parentesco, saúde e política.
Gráfico 2
Produção por Região
Gráfico 3
Obras por Período e Região
Na região do rio Uaupés e os seus afluentes, foram registrada 107 obras, esta é uma
região importante referente a produção etnográfica, composta majoritariamente por povos
indígenas das famílias lingüísticas Tukano e Maku, e que possuem relações guiadas pela regra
de exogamia lingüística, fundamentada num sistema de troca de mulheres. Os primeiros
trabalhos bibliográficos na região do Uaupés são dos viajantes no século XVI, como
Francisco Orellana e Perez de Quesada, há também os relatos dos missionários, como o padre
espanhol Cristobal de Acun (Companhia de Jesus).
92
Wright (1992), afirma que o contato efetivo se deu no de 1730, quando realmente
ocorreu o comércio de escravos indígenas, que em seguida gerou os descimentos e também a
aproximação dos programas governamentais, como é o caso da catequese. Uma história
marcada pela exploração da mão de obra da população indígena e a inclusão da religião cristã,
o que provocou mudanças na ideologia nativa e na forma tradicional de vida.
Os missionários investiram desde o inicio contra as práticas nativas, os rituais e o
modo de vida comunal nas malocas; tendo esta prática articulada ao sistema educacional
escolar, isto se deu a partir da instalação da Ordem dos Salesianos em 1914. Esta prática
tornou-se mais forte com a chegada das missões evangélicas no final dos anos 40, o que
resultou numa disputa pelos índios de acordo com Jackson (1982). A missão Salesiana teve
maior sofisticação em relação às técnicas de catequese, assumiram as narrativas indígenas
adaptadas as histórias bíblicas e vale ressaltar os importantes trabalhos etnográficos dos
padres Casimiro Béksta (1985), Alcionilio Brüzzi Alves da Silva (1975, 1977, 1979, 1994) e
Eduardo Lagório (1983).
Um dos aspectos importantes tratados na bibliografia rionegrina é o acentuado
enfoque a homogeneidade dos Arawak e Tukano, o que foi tratado por Koch-Grünberg (1909)
do processo de Tukanização dos Arawak e por Nimuendaju (1927) como três camadas de
civilização: a primeira formada pelos Maku que seriam autóctones, a segunda correspondente
aos povos que tiveram movimentos migratórios (primeiro os Arawak e segundo os Tukano) e
a terceira camada o resultado da inter-relação dos Baré (Arawak) e a civilicação européia.
Outro aspecto está relacionado a predominância hierárquica do sistema regional,
tratado nos mitos de origem e em alguns estudos relacionados a evidência arqueológica, é o
caso dos trabalhos de Stephen Hugh-Jones (1993, 1995) que utiliza os trabalhos da
arqueóloga Ana Roosevelt para tratar da complexidade dos sistemas de relações do rio Negro.
O trabalho de Eduardo Neves (2001), também se destaca por relacionar a tradição oral,
pesquisa arqueológica e os dados lingüísticos, para evidenciar que o sistema regional tem
origem pré-colonial.
As descrições etnográficas privilegiam a hierarquia como característica marcante na
região, associada aos mitos de origem, no caso do Uaupés o mito da cobra-canoa, os
primeiros a saírem do lugar mítico na cachoeira de Ipanoré são os mais velhos e a seqüência
vai até os mais novos, definindo a posição hierárquica. Este foi um dos focos da proposta
93
elaborada por C. Hugh-Jones (1979), que caracteriza os grupos do Uaupés como simples ou
compostos, sendo o simples formado por uma série de sibs hierarquizados e os compostos por
duas ou mais séries de sibs. Relação que sofre influência da concentração geográfica, que não
necessariamente segue ao modelo ideal da relação hierárquica, pois a autora aponta que a
relação de sib simples desenvolvendo rituais num território contínuo, na maioria das vezes
está associado a um passado idealizado.
S. Hugh-Jones (1995) utilizou-se dessas formas distintas de sociabilidade para
formular o conceito de “casa” e qualificar a estrutura social do Uaupés, tendo como fonte a
produção de Levi-Strauss. São exemplos de importantes conceitos que a etnografia do rio
Negro deixou de legado para a antropologia.
Referente à região do Içana, no qual tem o registro de 59 obras, destacamos o trabalho
de Journet (1980), que realizou seus estudos com os grupos Coripaco no lado da Colômbia,
mas que é referência aos estudos dos grupos Aruak desta região, seus estudos referente a
organização social, descreve as fratrias que compõem os grupos Baniwa e Coripaco, estes
organizados em sibs ou grupos de descendência patrilinear e patrilocais, estes hierarquizados
de acordo ao mito de origem.
Tema também abordado Jonathan Hill (1983), que destaca a importância das relações
entre fratris e sibs está na produção de modelos cognitivos que orientam a tomada de decisão
no dia-a-dia. A relação entre fratrias é marcada pela afinidade e a relação entre sibs marcada
pela consangüinidade, que de acordo com o trabalho de Hill, tem real influência no
comportamento social e econômico, ou seja, na organização da vida social.
Hill (1983) aponta que aspecto lingüístico não é importante para a diferenciação e a
integração das fratrias e sibs dos povos aruak do noroeste amazônico, sobretudo pelo fato de
que a exogamia lingüística, característica tão marcada entre povos tukano orientais (exceto os
Cubeo, Goldman, 1963), não ser uma regra entre os povos aruak.
Wright (1981, 1992), que também aborda questões referentes a organização social e
hierarquia, tem como o eixo do seu trabalho a mitologia de origem, apontando que as fratrias
são nomeadas de acordo com o nome do sib de maior importância ritual.
Entretanto, as pesquisas de Wright (1981), assume uma perspectiva histórica, na qual
aponta as marcas do terror frente às expedições de captura ficaram marcadas nas memórias
indígenas. Tendo como referência o estudo feito entre os Hohodene do rio Aiari (afluente do
94
Içana), o grupo relata as guerras intertribais e interétnicas, que provocaram a extinção de sibs
inteiros, a morte por epidemias e uma grave desorganização da vida social. Como resultado,
houve uma grande dificuldade da reprodução dos meios materiais e simbólicos de sustentação
à cultura deste povo.
Koch-Grümberg (1995) é a principal fonte de informação da situação dos Baniwa no
início do século XX, relatando o funcionamento do extrativismo sob a ordem de seringalistas
e a disputa com os militares do forte de Cucuí e com outros seringalistas brasileiros e
colombianos o controle das riquezas geradas pela borracha (Wright, 1999).
Outro destaque do trabalho de Wright (1992) é referente surto milenarista conduzido
por Venâncio Kamiko, em meados do século XIX, que demonstra que a cristianização dos
Baniwa já assumia contornos próprios, que iriam se consolidar no século seguinte.
Outro destaque é para a produção de Luiza Garnelo (2003), que em seu trabalho
Poder, hierarquia e reciprocidade: saúde e harmonia entre os Baniwa do Alto Rio Negro,
traz uma importante contribuição a antropologia médica, articulando a uma perspectiva da
antropologia política das relações interétnicas. A autora também aborda a organização social
tendo como foco as organizações políticas de base do movimento indígena, aponta como os
Baniwa estruturam as formas sociais atuais dentro do movimento indígena como resultado da
inter-relação com a sociedade externa, porém a partir de uma leitura própria desses povos.
Trata sobre a importância do equilíbrio da lógica de parentesco e os ideais das instituições
políticas, que tem como preceito a democracia da sociedade dos brancos, apontando as
estratégias desses povos diante de regras externas que não são prioritárias no âmbito da
comunidade.
Na região do rio Tiquié, que reunimos 51 obras, destacamos o trabalho de Renato
Athias (1995, 2000, 2003) sobre os Hupda que tem como eixo central do seu trabalho a
relação hierárquica entre os grupos Tukano e Hupda, reforçando a distinção entre os índios do
mato e os índios do rio.
Outro destaque que daremos aqui é a proposta elaborada por Aloisio Cabalzar (2000),
a noção de nexo regional no noroeste amazônico, na qual afirma que as relações, baseadas na
descendência patrilinear e na aliança, são articuladas e organizadas espacialmente por um
conjunto de subgrupos ou grupos locais próximos.
Apesar do trabalho de Cabalzar ter como foco os Tuyuka, o conceito de nexos
95
regionais passou a ser utilizado por todos os etnólogos que realizam trabalhos na região do
alto rio Negro. O conceito de nexo regional expõe que as micro-regiões formadas por diversos
grupos locais, normalmente uma comunidade, possuem relações políticas, rituais e
econômicas. Determinando deste modo, a regra geográfica para definir proibição ou
permissão de casamento, que deve ocorrer entre comunidades do mesmo trecho de rio.
Cabalzar afirma que a geografia pode definir a identidade da fratria, se um determinado grupo
muda de região, pode não ser mais apontado como da fratria original.
Outro destaque é ao trabalho de Christine Hugh-Jones (1979) com os Barasana, no
qual formula o conceito de nexos sociológicos de comunidades de afins, também abordando a
geografia.
As pesquisas referentes a cidade de São Gabriel da Cachoeira, no banco de dados
foram levantados 14 trabalhos, sendo que 5 desses trabalhos foram desenvolvidos pelo grupo
de pesquisa da UFAM: RASI – Rede Autônoma de Saúde Indígena, que funcionou de 1997 a
2006, sob a coordenação de Luiza Garnelo. Estes trabalhos estão relacionados principalmente
a antropologia médica ou sistema social no contexto da saúde indígena.
O destaque que daremos é ao trabalho de Cristiane Lasmar (2002) um estudo
etnográfico sobre a migração da população indígena do rio Uaupés para a cidade de São
Gabriel da Cachoeira. No qual a autora aborda as concepções dessas populações referentes
aos brancos e o modo de vida da cidade, tendo como foco o discurso e a trajetória das
mulheres.
Etnologia do Rio Negro
Entre os principais trabalhos, estão o de Irving Goldman, Arthur Sorensen, Jean
Jackson, S.Hugh-Jones, C.Hugh-Jones, P.Silverwood-Cope e Kaj Arhem, que são hoje
referência para qualquer pesquisador que procure refletir sobre as sociedades ameríndias do
noroeste amazônico. Propõe-se, dessa forma, uma reconstituição das linhas fundamentais que
marcam os trabalhos desses antropólogos que realizaram pesquisas sobre os povos indígenas
do noroeste amazônico. Para tanto, serão ressaltadas as bases teórico-metodológicas que
orientaram suas abordagens, com o objetivo de traçar um panorama da produção etnológica
sobre essa região. Os distintos contextos institucionais, históricos e nacionais nos quais esses
pesquisadores se inserem serão reconstituídos sempre que tal procedimento se mostrar
revelador com relação a suas perspectivas científicas.
96
Reconstituindo algumas interpretações sobre as organizações sociais do Uaupés e Piraparaná, A. Cabalzar (1995) aponta que as diferenças entre as sistematizações propostas pelos
autores resultam tanto das distintas situações etnográficas pesquisadas quanto das variantes
das estruturas sociais dessa região (p.26). Os modelos elaborados por Irving Goldman, Arthur
Sorensen, Jean Jackson e Christine Hugh-Jones estariam baseados na teoria da descendência.
Distinguem-se dessas abordagens o trabalho de Kaj Arhem, por mesclar a teoria da aliança à
teoria da descendência, a perspectiva ecológica-econômica de Janet Chernela, e o modelo de
„Casa‟ de S.Hugh-Jones.
A pesquisa de campo de I. Goldman foi realizada durante o período de 1938-40 com
os Cubeo do rio Cuduarí, na região do Uaupés. Segundo A. Cabalar (1995), a esse autor pode
ser atribuído o primeiro estudo sistemático da organização social de um grupo indígena dessa
região. O sib seria o segmento básico da estrutura social, sendo nomeado, localizado,
exogâmico, patrilinear, patrilocal e hierarquizado dentro da fratria (1963, p.90).
Além da organização social, seu trabalho enfoca temas como o ciclo de vida, rituais,
religião, e apresenta uma importante definição do que seria comunidade ou “senso de
comunidade” para os Cubeo. I. Goldman (1963) ressalta que “within a community, the only
fully established patterns of behavior are those of fraternity” (p.43). Segundo J. Overing
(1991), I. Goldman mostra como para os Cubeo a organização social e política dependem da
criação cotidiana de moral alto entre os membros, e não de leis, regras e corporações (p.16). A
produção depende da criação de um moral alto através do qual sejam fortalecidas relações de
harmonia e cooperação (p.14).
Os trabalhos de Arthur Sorensen (1967) e de Jean Jackson (1983) são interessantes
pelo contraponto que estabelecem com o estudo de I. Goldman. O primeiro realiza pesquisa
entre vários grupos lingüísticos da região e mostra que o critério lingüístico permite delimitar
esferas exogâmicas, no caso de grupos Tukano (1995, p.36). A. Sorensen (1967) entende o
universo cultural existente entre os diversos grupos como sendo homogêneo e argumenta que
o multilinguismo é que permite as segmentações (p.672). Já Jean Jackson (1983) mantém o
modelo de organização social de I. Goldman para descrever os Bará, habitantes da região do
Caño Inambú, afluente do Alto Papuri. Segundo A.Cabalzar (1995), uma das grandes
contribuições da autora vem a ser o fato de que ela mostra não haver coincidência entre sib e
grupo local. O trabalho mostra também haver uma grande multiplicidade de versões e
interpretações nativas com relação à organização social.
Assim, a sistematização elaborada por J. Jackson (1983) complexifica aquela traçada
por I. Goldman (1983), mas ao mesmo tempo revela uma marcada continuidade com ele.
97
Para K. Arhem (1981), tanto I. Goldman quanto J. Jackson, entretanto, não deixam
claras as diferenças entre ideais e comportamentos reais. Afastando-se de análises como a de
C.Hugh-Jones que, segundo ele, privilegiam os sistemas nativos de classificação, o autor
separa ideais e padrões de comportamento. Enfoca a organização social Makuna, entendendoa como uma variante do sistema social do Uaupés, e buscando tecer comparações com outras
sociedades amazônicas. A aliança prescritiva e simétrica, e a descendência patrilinear são
tomadas como princípios ordenadores, e são descritos a partir dos padrões de comportamento
(p.21).
Em 1968, S. Hugh-Jones e sua esposa C. Hugh-Jones viajam para a região do PiráParana, no Uaupés colombiano, para iniciarem suas pesquisas etnográficas sobre os Barasana,
povo Tukano. No mesmo período, P. Silverwood-Cope inicia sua pesquisa de campo entre os
Bara, povo Makú da mesma região.
Orientados por Edward Leach, o casal Hugh-Jones estabeleceu-se entre os Barasana
com os quais desenvolveram pesquisa de campo entre setembro de 1968 e dezembro de 1970
na região do Pirá-Paraná. Como conta S. Hugh-Jones (1979), dentre os objetivos de seus
trabalhos estava o exame da relação simbiótica entre os povos Tukano e Makú, sendo estes
últimos estudados por P. Silverwood-Cope. Um segundo objetivo era oferecer um teste
empírico às grandes generalizações que Lévi-Strauss estabeleceu ao relacionar a estrutura da
mitologia dos povos ameríndios com a cultura e pensamento desses povos.
O foco da pesquisa de S. Hugh-Jones (1979) incide sobre o complexo ritual do
Yurupary entre os Barasana, povo falante de Tukano que habita a região do Uaupés. De seu
ponto de vista, é através dos rituais que os sistemas mitológicos adquirem significado
enquanto força ativa e princípio de organização do dia a dia desses povos (p.3). O autor
propunha uma abordagem que integrasse a análise estrutural do mito ao estudo da religião e
da cosmologia para construir uma interpretação unificada do pensamento religioso dessa
sociedade (p.4). A pesquisa buscaria tomar como referência outros rituais e o corpo de mitos
para mostrar como o ritual realiza uma mediação entre o pensamento mítico e a ação social
(idem).
Em From the Milk River, C. Hugh-Jones (1979) estabelece também comentários sobre
o projeto em que os três pesquisadores estavam envolvidos sob orientação de E. Leach. Seu
trabalho enfatiza mais a estrutura da vida secular e suas as relações com outras estruturas
como o parentesco, o mito e o ritual. A organização social dos Barasana é enfocada a partir de
sua inter-relação com os conceitos de espaço e tempo, ciclo de vida, vida ritual, dentre outros
98
aspectos que caracterizam o modo peculiar e notável com que a antropóloga compõe sua
interpretação.
P. Silverwood-Cope (1990) inicia seu trabalho contextualizando os povos Maku, e
mais especificamente os Bara Maku (Kákwa), povo sobre o qual realizou sua pesquisa
etnográfica e que habita a região do rio Uaupés colombiano. Para tanto, são descritas as
relações de contato com os seringueiros, comerciantes, colonos, missionários católicos, e
pesquisadores do SIL. Sua pesquisa apresenta uma descrição detalhada do modo de vida dos
Bara Maku e, genericamente, dos Maku, abrangendo as atividades de caça, pesca, coleta e
colheita, os conhecimentos sobre o ecossistema, técnicas produtivas, sistema de clãs, as regras
de casamento e as categorias de parentesco.
Considerações finais
O Banco de Dados Bibliográficos organizado pelo projeto Amazonas Indígena reúne
512 da produção bibliográfica referentes às populações da região do médio e alto rio Negro.
Ganha visibilidade a extensão de estudos realizados por calhas de rios e estudos que buscam
dar conta da complexidade dos 22 povos que habitam a mesma região e destacamos os
trabalhos na terra indígena Yanomami que tratam especificamente desses povos.
Os 22 povos da região do médio e alto rio Negro, divididos usualmente pelos estudos
etnográficos, como povos do rio e povos do mato. Na tentativa de explicar as semelhanças
culturais na região do Alto Rio Negro, destacamos os trabalhos produzidos por Robin Wright
(1981, 1992, 2008), que caracteriza um ponto em comum a todos os povos do Alto Rio
Negro, a hierarquia e os papéis ritualísticos determinam a organização social, ou seja, a ordem
dos sibs (grupos de maior e menor status) e definem territórios e uso de recursos.
Quanto aos estudos que tratam dos motivos das semelhanças culturais, podemos
destacar o trabalho de Dominique Buchillet (1991), que propõe que a semelhança cultural é
um provável resultado da aculturação, do aldeamento forçado por colonos e missionários dos
índios de diferentes grupos lingüísticos, apesar de também reconhecer a importância das
relações intertribais no período pré-contato.
Outros autores abordaram a mesma questão, propiciando a possibilidade de dividir os
trabalhos em dois grupos: um que considera as semelhanças culturais resultado das relações
intertribais e os que consideram que é resultado do contato.
A distribuição das publicações entre as regiões revela o esforço dos pesquisadores de
99
elaborar análises que abrangesse a região do médio e alto rio Negro, estudos que abordassem
a complexa área cultura que engloba 23 povos indígenas.
Quanto aos trabalhos por região vale destacar o maior número de pesquisas
relacionadas a Terra Indígena Yanomami e ao Uaupés. Seguidos pelas regiões do rio Tiquié e
Içana, evidenciando que cada uma dessas regiões possui praticamente a metade de registro
das produções do Uaupés.
Além de trabalhos de antropólogos a região do Uaupés também apresenta as
etnografias realizadas pelos padres da missão, sendo esta a primeira região em que a missão
salesiana fundou o distrito missionário.
Ao fazer uma rápida visita a bibliografia reunida pelo banco de dados do projeto
Amazonas Indígena, torna-se perceptível que a região do médio e alto rio Negro é referência
aos estudos etnológicos ameríndios pelos conceitos formulados pelos etnógrafos que
realizaram pesquisas antropológicas na região. Foi este o enfoque que este relatório buscou
envidenciar.
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101
BACIA/ AN O
Cidade Manaus
Içana
Orinoco
Rio Apaporis
Rio Jauaperi
Rio Negro
São Gabriel da Cachoeira
TI Yanomami
Tiquié
Uaupés
Xié
T ota l
BACIA/ AN O
Cidade Manaus
Içana
Orinoco
Rio Apaporis
Rio Jauaperi
Rio Negro
São Gabriel da Cachoeira
TI Yanomami
Tiquié
Uaupés
Xié
T ota l
1
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2
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2
1
9
3
3
1
9
3
6
1
1
1
1
1
1
3
1
2
1
19
1
1
2
1
1
1
2
1
1
1
1
1
1
2
1
1
2
1
1
1
4
1
1
1
3
1
1
4
2
2
1
1
1
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1
1
1
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2
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1
1
1
9
4
7
1
9
4
8
1
9
4
9
1
9
5
0
1
9
5
1
1
9
5
2
1
9
5
3
1
9
5
4
1
9
5
5
1
9
5
6
1
9
5
7
1
9
5
8
1
9
5
9
1
9
6
0
1
9
6
1
1
1
2
2
2
4
2
2
1
1
1
1
1
1
1
1
9
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8
1
9
3
9
1
9
4
0
1
9
4
4
1
9
4
5
1
9
4
6
1
1
2
2
1
1
1
1
1
1
1
2
2
2
1
1
1
2
1
3
1
1
1
1
1 37
1
9
6
2
1
9
6
3
1
9
6
4
1
9
6
5
2
3
1
2 37
1
2
2
2
2
4
3
2
1
1
2
2
1
1
4
9
1
1
1
T
o
t
a
l
4
3
T
o
t
a
l
3
2
8
1
1
2
4 50
102
BACIA/ AN O
Cidade Manaus
Içana
Orinoco
Rio Apaporis
Rio Jauaperi
Rio Negro
São Gabriel da Cachoeira
TI Yanomami
Tiquié
Uaupés
Xié
T ota l
BACIA/ AN O
Cidade Manaus
Içana
Orinoco
Rio Apaporis
Rio Jauaperi
Rio Negro
São Gabriel da Cachoeira
T I Yanomami
T iquié
Uaupés
Xié
T o ta l
1
9
6
6
1
9
6
7
1
9
6
8
1
9
6
9
1
9
7
0
1
9
7
1
1
9
7
2
1
9
7
3
1
3
4
1
1
2
2
1
2
1
1
4
4
5
1
1
3
2
4
1
2
2
3
3
4 10
9
8
5 13
7
4
4
4
3 12
7
4
2
3
1
9
8
4
1
9
8
5
1
9
8
6
1
9
8
7
1
2
1
2
3
1
2
4
2
1
3
3
1
1
2
2
3
1
2
9
4 10
7
7
5
3
3 11
1
9
9
6
1
9
9
7
1
9
9
8
1
9
9
9
2
0
0
0
2
0
0
1
2
0
0
2
2
0
0
3
2
0
0
4
2
0
0
5
2
0
0
6
2
0
0
7
2
0
0
8
2
0
0
9
3
3
1
2
1
4
5
2
1
1
1
8
3
8
1
1
T
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t
a
l
1
51
5
3
3
1
5
1
6
2
7
7
4
1
1
3
4
7
2
1
2
5
2
1
2
4
1
2
1
5
7
2
1
1
4
7
1
6
3
5
8
1
1
2
8
5
2
2
9
4
7
1
14 14 31 24 19 14 22 20 29
1
1
95
13
60
35
67
3
325
8
3
4
3
1
9
8
9
1
9
9
0
2
1
9
9
5
5
7
6
5
8
1
4
2
2
3
4
2
2
1
1
21 20 16 14 19 18 17
1
9
8
8
1
5
5
4
1
4
5
4
1
9
8
3
1
1
7
1
9
8
2
1
2
6
1
1
9
8
1
4
1
1
1
9
8
0
4
1
4
1
9
7
9
2
1
2
1
9
7
8
1
5
1
1
1
9
9
4
1
1
9
7
7
5
1
1
9
9
3
1
1
9
7
6
2
2
1
9
9
2
1
9
7
5
2
1
1
9
9
1
1
9
7
4
4
8
2
5
1
3
T
o
t
a
l
4
2
1
52
1
60
10
33
9 164
103
A PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS DOS CURSOS MÉDIOS DOS
RIOS JURUÁ E PURUS
Marcelo Pedro Florido
Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP
Apresento aqui uma análise de parte do Banco de Dados Bibliográficos do projeto
Amazonas Indígena. Será considerado o levantamento bibliográfico da região dos cursos
médios dos rios Juruá e Purus, onde se encontram as populações Banawá, Deni, Jamamadi,
Jarawara, Kulina, Paumari, Zuruahá, Hi-Merimã, da família lingüística arawá; Apurinã, da
família Arawak (Aruak) e; Kanamari, Katawixí, Katukina, da família Katukina.
O levantamento evidenciou a existência de 229 produções textuais e 2 videos que
abordam as populações indígenas da região dos médios cursos dos rios Juruá e Purus. As
primeiras informações datam da segunda metade do século XIX, a primeira é de 1854, mas a
maior parte desta produção ocorre após 1971, quando então é possível verificar uma
regularidade maior, aparecendo quase todo ano, exceto 1975, 1979, 1990, novas bibliografias.
A distribuição anual e por população pode ser vista na tabela abaixo.
Tomando como base os temas e tipos de trabalho, podemos dividir as 229 produções
textuais em 8 grupos: Relatos do século XIX e início do XX, com 24 obras que trazem
algumas informações isoladas sobre as populações; Linguísticos, com 61 itens que
correspondem a estudos sobre as línguas faladas na região; Educação, com 37 produções
relacionadas ao ensino e educação indígena; Relatórios de Situação e Demarcação de Terra,
com 34 relatórios e artigos escritos por funcionários da FUNAI ou missionários;
Etnobotânica, com 5 artigos; Mitos e Histórias, com 9 textos; Etnológicos, com 52 e; Outros,
com 7 textos de missionários abrangendo assuntos como tradução da bíblia e trabalho
missionário. A distribuição por essas categorias é algo arbitrária e visa apenas facilitar uma
consideração mais detalhada sobre os resultados do levantamento bibliográfico.
Relatos do século XIX e início do XX
Entre meados do século XIX e as três primeiras décadas do XX, são principalmente os
Naturalistas e Exploradores que fornecem registros sobre a região, embora as publicações não
tenham aparecido apenas durante este período. A primeira informação sobre uma das
populações, os Kulina, deve-se ao naturalista italiano Gaetano Osculati cujas notas de viagem
foram publicadas em 1854. Os outros Naturalistas do século XIX foram Joseph Beal Steere
(1949) e Paul Ehrenreich (1891, 1929 e 1948) que fornecem dados sobre os Apurinã, Paumari
e Jamamadi e; Gustav Wallis (1886) que informa sobre os Paumari.
104
O primeiro explorador a navegar pelos rios Purus e Juruá foi o brasileiro Manuel
Urbano da Encarnação em 1861, fornecendo um relato publicado em 1900. Outro explorador
brasileiro foi o Coronel Antonio Rodrigues Pereira Labre que em 1871 viajou pelo Rio Purus
e que fornece 3 relatos, datados de 1872, 1887 e 1888. Existem ainda relatos do engenheiro
João Martins da Silva Coutinho (1862), de Euclydes da Cunha (1907) e do explorador
britânico William Chandless (1866, 1869 e 1949) que apresentam algumas informações sobre
as populações indígenas. Temos também relatos sobre os Apurinã publicados por Theodor
Koch-Grünberg (1914).
105
Katukina
Total
1
1
1
1
2
1
1
1
1
1966
1
1962
1928
1923
1955
1
1921
1919
1
1920
1914
1
1949
1
1
1948
1
1907
1
1900
1
1929
1
1894
1887
1886
1872
1869
1866
1862
2
1891
População
Apurinã
Família Arawá
Banawá
Deni
Jamamadi
Jarawara
Hi-Merimã
Kulina
Paumari
Zuruahá
Família Katukina
Kanamari
Katawixí
1854
Ano
Tabela 1
Distribuição anual das produções 1854-1980
1
1
1
1
1
2
1
1
5
1
1
1
1
1
3
1
1
1
1
1
1
3
1
1
1
1
1
1
3
1
2
3
1
2
2
5
1
1
1
1
1
1
1
3
3
5
1
1
2
Total
1854 -1980
13
0
0
0
10
1
0
4
8
0
0
7
2
5
50
106
Apurinã
1
3
2
1
2
1
3
1
1
1
1
1
4
1
2
1
1
2
Total
S/d
2009
2008
2007
2006
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
1998
1997
1996
1995
1994
1993
1992
1991
1989
1988
1987
1986
1985
1984
1983
1982
1981
1980
1978
1977
1976
1974
1973
1972
1971
GRUPO
Ano
Tabela 2
Distribuição anual das produções 1971-2009
Total
2009
Geral
30
1
43
3
Família
1
Arawá
1
1
Banawá
Deni
2
1
Jamamadi
3
1
2
1
1
1
1
3
1
Jarawara
1
1
2
1
2
1
1
2
1
1
1
1
1
1
3
1
1
2
1
1
2
1
1
1
1
1
Kulina
1
1
1
Paumari
1
3
1
1
1
2
2
3
2
4
2
1
Zuruahá
2
2
2
2
1
6
1
3
3
1
1
Hi-Merimã
3
2
3
1
1
1
4
6
1
4
2
1
6
1
2
1
1
1
1
18
1
3
1
1
2
2
3
1
27
20
1
3
1
3
1
1
2
1
1
1
2
1
4
41
45
0
1
3
27
30
19
3
45
53
13
0
Família
1
Katukina
1
1
Kanamari
2
3
1
2
1
3
14
1
1
1
Katawixí
1
Katukina
Total
1971
1
9
1
1
1
5
6
2
3
1
4
2
16
5
4
3
2
9
3
15
6
9
18
6
10
5
16
1
2
6
13
5
1
5
7
8
4
7
3
3
5
223
21
3
10
273
107
O levantamento mostra também a existência de uma expressiva produção textual que se
deve ao Padre Constant Tastevin, que sozinho (1920, 1928) ou em colaboração com o etnólogo
Paul Rivet (1919, 1920, 1921), descreveu a língua e alguns costumes das populações do rio Purus
e Juruá. Paul Rivet (1926) também escreveu um artigo a respeito da viagem do Padre Tastevin.
Os dois artigos mais recentes incluídos nessa seção foram publicados em 1955. José
Cândido de Melo Carvalho (1955), um zoólogo que em meados do século XX viajou pela região,
fornece informações sobre os Kanamari. Harald Schultz & Vilma Chiara (1955) apresentam uma
descrição da região do Alto Purus, abordando desde o clima e geografia até informações sobre a
localização de algumas aldeias Apurinã, Jamamadi, Kulina (“Kurina” e “Tukurina”). Dos
Tukurina fornecem informações etnográficas mais detalhadas.
De uma forma geral, toda essa produção é baseada em um breve contato com os grupos.
Os dados fornecidos se limitam, em grande medida, a descrever a localização das aldeias,
aspectos da cultura material, formato das casas, adornos corporais, ferramentas e instrumentos de
trabalho, e algumas listas de vocabulários. É uma produção ocasional e não regular, sem
nenhuma pretensão sistemática, geralmente fornecendo informações sobre mais de uma
população.
Esse período inicial, marcado por menções fragmentárias, é cronologicamente sucedido
por analises das línguas.
Linguísticos
Os 61 trabalhos de natureza linguística, aqui considerados são, na verdade, de natureza
diversa. O fio condutor seria dado em grande medida pela autoria, a maioria deles sendo
publicados por lingüistas ligados ao SIL (Summer Institute of Linguistics) ou a outras instituições
missionárias, poucos são trabalhos de origem estritamente acadêmica, e uma pequena parte diz
respeito a descrições das línguas feitas por não especialistas.
Incluímos nessa categoria a dissertação de Bettiol (2007) sobre educação indígena
Apurinã e a dissertação de Vencio (1996) sobre a apropriação da escrita pelos Jarawara. Embora
não sejam estudos propriamente linguísticos, seu foco se relaciona com a aquisição da língua e da
escrita.
108
O trabalho linguístico mais antigo é o estudo do vocabulário e da gramática do apurinã
realizado por Polak (1894). Entre esses primeiros estudos, mas já nas primeiras décadas do século
XX, está o de Rivet (1920) sobre a língua katukina e os de Nimuendajú que fornecem
informações sobre a língua kulina (1923) e algumas palavras da língua apurinã (1955).
Foram levantadas algumas tentativas de classificação das línguas em famílias e troncos
linguísticos (Rodrigues 1986, Campbell 1997, Aikhenvald & Dixon 1999, Adellar 2007). O
levantamento aponta a existência de dicionários das línguas Deni (Gordon & Koop 1985), Kulina
(Silva & Monserrat 1984), Jarawara (Vogel 2005), Paumari (Chapman & Salzer 1998). Há
também gramáticas das línguas kulina (Tiss 2004) e apurinã (Pickering 1971)
Os outros livros, artigos, dissertações e teses abordam descrições gerais, ou de pontos
específicos das línguas, algumas de suas características. Sobre os Kanamari há apenas um
trabalho, o de Ribeiro & Labiak & Cont & Neves de 1966. Queixalós aborda alguns aspectos do
katukina em 3 artigos (1995, 2002 e 2005). A produção sobre os Banawa, de quem só possuímos
informações linguísticass, deve-se aos missionários Buller (1989), Buller & Buller & Everett
(1993) e Ladefoged (1997).
Sobre os Jarawara os estudos foram realizados por Vogel, que abordou o idioma em sua
dissertação (1989), tese (2003) e um artigo (2007), e por Dixon, que escreveu sete artigos (1995,
1999, 2000a, 2000b, 2002 e 2004), um deles em parceria com Vogel (Dixon & Vogel 1996).
Barbara Campbell (1985 e 1987) e Robert Campbell (1988, e também Campbell & Campbell
1981) descrevem a língua jamamadi, também analisada por Monserrat (2001). Os artigos sobre
aspectos do deni devem-se a Koop (1980 e 1988) e do zuruahã a Suzuki (1995) e Frank & Porta
(1996).
O levantamento mostra que o paumari (Chapman 1976, 1977, 1985; Odmark 1977;
Derbyshire 1983; Chapman & Shire & Desmond 1991 e; Vieira 2006) e o apurinã (Pickering
1977, 1978; Aberdour 1985; Facundes 1994, 2000, 2002 e; Dinelly 2005), apresentam um grande
volume de trabalhos e de fontes variados, mostrando que foram os idiomas mais investigados da
região.
Os trabalhos acima considerados foram desenvolvidos principalmente no âmbito da
atividade missionária. Muitos dos autores considerados estiveram envolvidos na produção do
material ligado a educação.
109
Educação
Os 37 materiais sobre educação correspondem a cartilhas para ensino de língua,
matemática, mitos e histórias no idioma nativo, informações sobre saúde, plantas medicinais,
insetos, etc.
O levantamento bibliográfico apontou a existência de uma grande quantidade de materiais
dedicados ao ensino e aprendizado da língua paumari, são 17 cartilhas que focam o ensino da
escrita, coleção de histórias, estudos sociais, “ciência”, ensino de português, e mesmo dois que se
dedicam à transição de falantes de português para o paumari. Há também uma manual de saúde
na língua nativa.
Existem quatro cartilhas devotadas a alfabetização Deni, sendo uma delas dedicado ao
ensino de português, 3 das quais publicadas nos anos 2000 e uma em 1996. Há 6 cartilhas
apurinã, uma dedicada ao aprendizado da escrita e as outras são coleções de histórias na língua.
Há uma cartilha Jamamadi de 1991 e também uma sobre insetos.
Os Kulina apresentam apenas uma cartilha de alfabetização de 1986, mas há quatro
cartilhas que abordam o tema da saúde, uma delas sendo sobre alcoolismo. Há um trabalho
acadêmico de 1996 sobre a hepatite entre a população. Existe também um livro sobre plantas
medicinais e três revistas escritas no idioma.
Passamos agora a considerar outra categoria de trabalhos, aqueles produzidos para
fundamentar demarcações de terra, ou aqueles patrocinados por agentes diversos, FUNAI, ONGs,
missionários, etc, para verificar a situação das populações.
Relatórios de Situação e Demarcação de Terra
As 34 referências incluídas nessa seção correspondem, em sua maior parte, a relatórios e
artigos relacionados a processos de demarcação de Terras Indígenas. Eles apresentam, embora
com graus de detalhamento variável, informações sobre o território ocupado, histórico de
migrações, atividades econômicas, organização social, demografia, ecologia e geografia.
Os relatórios de demarcação realizados no âmbito da FUNAI foram produzidos em dois
períodos diferentes, alguns em meados dos anos 1980 e os outros no final dos anos 1990 e inícios
dos 2000. Os mais antigos são os de João Dal Poz (1985) sobre a Área Indígena Caitetu, onde
estão representantes das populações Apurinã, Jamamadi e Paumari, e o de Ana Maria da Paixão
110
(1985) sobre os Jarawara. Em 1987 foram escritos três relatórios por Rita de Cássia Felix, um
deles sobre a Área dos Jarawara e dois sobre duas áreas Paumari.
No segundo período, além dos relatórios de demarcação, existem alguns de revisão dos
limites. Luciene Pohl escreveu três, em 1998 ela fornece um de delimitação da Terra Indígena
Paumari do Lago Marahã e outro de acréscimo a Terra Indígena Paumari do Lago Manissuã, em
2000 um sobre a área dos Hi-Merimã. Em 2000, Stela A. Abreu escreveu um relatório sobre as
áreas Paumari do Lago Marahã e do rio Ituxi e sobre a área Jarawara/Jamamadi/Kanamati,
Plácido Costa Junior (2000) fornece um relatório etnoecológico sobre está última área.
Sobre a Terra Deni há um relatório de demarcação de Rodrigo Padua Rodrigues Chaves
(2000) e um ambiental de Juarez Carlos Brito Pezzuti (1999). Há ainda um relatório ambiental
das áreas Paumari escrito por Paulo Labiak Evangelista (1998) e três relatórios “etnoecológico”,
o de Jorge Henrique Bastos (2000) sobre as áreas Paumari, o de Juliana Schiel & Maira Smith
(2001) sobre os Apurinã e o de Deborah de Magalhães Lima e Victor Py-Daniel (2001) sobre as
áreas Kanamari e Katukina.
O levantamento bibliográfico mostra que Martin Merz (1997) publicou um livro sobre a
demarcação da Terra Indígena Kulina, que Sandra A. Ayres (1999) escreveu um artigo sobre a
demarcação da Terra Jamamadi, que Deborah de Magalhães Lima e Victor Py-Daniel assinaram
um artigo (2002) sobre a demarcação Kanamari, Katukina e que Rosa Maria Monteiro publicou
um artigo sobre a demarcação Kulina (1999) e um sobre a Kanamari (2002). Um artigo sobre o
levantamento etnoecológico Apurinã, Jamamadi e Jarawara foi publicado por Peter Schroder
(2002).
Relativo às demarcações há ainda um relatório de acompanhamento da demarcação das
Terras Indígenas Paumari de Izac da Silva Albuquerque (1998) e um da OPAN (2000) sobre a
vigilância dessas Terras. Há também uma publicação sobre conservação e sustentabilidade da
população Deni (2001).
Há um relatório sobre a população Kulina feito por Eduardo Viveiros de Castro (1978) e
dois sobre os Apurinã, um de 1981 escrito por Luiz Otávio Pinheiro da Cunha e o outro de
Raimundo Nonato Felinto de Freitas de 2003. O conselho indígena missionário (CIMI) produziu
em 1995 dois relatórios sobre os Deni, um deles comentando a viagem realizada e o outro
apontando as dificuldades apresentadas por esta população. O missionário Reinaldo Cazão
111
Ribeiro do Jovens com uma Missão (JOCUM) apresentou em 2005 um relatório de suas
atividades junto aos Zuruahã.
Etnobotânica
Os 5 artigos sobre etnobotânica foram escritos na década de 1970 por Ghillean T. Prance.
Em 1972 ele assinou dois artigos sobre o uso de venenos e narcóticos entre os Jamamadi e Deni e
em parceria com Anne Prance publicou outro sobre os Jamamadi. Em 1977 apresentou um artigo
sobre o uso de plantas pelos Paumari e em 1978 publicou um estudo comparativo sobre os Deni,
Paumari, Jarawara e Jamamadi.
Mitos e Histórias
Os textos 9 aqui incluídos são frutos do trabalho dos missionários, seja por serem textos
publicados por eles, ou com a sua ajuda. São coleções de mitos ou de histórias das populações de
línguas da família arawá, abordando temas como a origem da humanidade, os heróis criadores, o
surgimento dos animais, etc.
Os mitos mais antigos publicados são os dos Kulina, compilados por Patsy Adams em
1962. Há dois outros livros sobre a mitologia desta população, um publicado em 1983 por Abel
O. Silva (Kanaú) e outro em 1986 por Itijo Ette Madija. Há dois livros de histórias Paumari
publicados em 1993, um por Izac da Silva Albuquerque e outro por Manuel Paumarí. Alguns
Deni publicaram um livro sobre a história de sua Terra em 1998 e os professores Deni
compilaram um livro de mitos em 2004. As missionárias Jônia Frank & Edinéia Porta reuniram
mitos e histórias Zuruahã em um trabalho de 1996 e o missionário Walter Sass organizou uma
publicação de mitos Kanamari em 2008.
Etnológicos
Nessa seção incluímos livros, dissertações, teses, monografias e artigos que fornecem
dados etnográficos e análises sobre as populações, num total de 52 trabalhos. Esses textos são,
em sua grande maioria, frutos de trabalho de campo prolongado ou revisão bibliográfica
extensiva. Parte dos trabalhos aqui considerados foi escritos por pesquisadores de tradição
acadêmica, alguns outros foram escritos por missionários que atuaram junto aos grupos. Eles são
estudos monográficos que consideram apenas um contexto etnográfico, descrito de maneira mais
sistemática. As únicas exceções são o volume organizado por Marco Antonio Gonçalves (1991)
no qual existem artigos que reúnem e analisam as informações fornecidas pelos viajantes sobre os
112
Apurinã, Katukina, Kulina, Jamamadi, entre outros, e um livro de Günter Kroemer (1985). Este
último tece considerações sobre a história da região do médio rio Purus desde a época colonial
até a atuação do SPI, fornecendo dados etnográficos sobre os Apurinã, Jamamadi, Paumari e
Zuruahã.
Sobre os Apurinã, o levantamento aponta a existência de três dissertações e duas teses. As
dissertações devem-se a Cláudia Netto do Vale Pereira (1986) que foca o cotidiano de uma
aldeia, Marco Antonio Lazarin (1981) que analisa o contato inter-étnico e Juliana Schiel (2000)
que aborda a história da população a partir da documentação existente. Juliana Schiel (2001)
também escreveu uma das teses, que estuda narrativas coletadas junto a diferentes aldeias, sendo
a outra de autoria de Lucine Cristina Risso (2005), com um viés geográfico, que enfatiza os
territórios e paisagens amazônicas e a relação da “cultura” Apurinã com o ambiente.
A produção sobre a população Deni corresponde a duas monografias, uma dissertação e
dois livros, embora estes últimos correspondam ao mesmo livro editado em inglês e português.
As monografias devem-se a Günter Kroemer (1997) e Adriana Maria Huber Azevedo (2007),
cujas informações foram obtidas durante suas atuações junto aos Deni no âmbito do CIMI. A
monografia de Kroemer aborda questões ligadas a ecologia e a relação Deni com a conservação
ambiental e os projetos de desenvolvimento comunitário realizados pelos missionários
protestantes das Novas Tribos e do SIL. A de Maria Huber, realizada em um curso de
antropologia aplicada, aborda principalmente as concepções sobre a Alteridade e a forma como
se desenvolve a relação entre o grupo e os Projetos indigenistas.
A única dissertação é de autoria de Edilevi dos Santos Marques (2004), realizada no
programa de mestrado em ciências de florestas tropicais do Instituto Nacional de Pesquisas da
Amazônia (INPA). O assunto desta dissertação é a atividade extrativista da população Deni e
suas formas de manejo agroflorestal.
Os dois livros apontados pelo levantamento bibliográfico são de autoria de Gordon Koop
& Sherwood G. Lingenfelter, ligados ao SIL, e correspondem a versão em inglês (1980) e
português (1993) do mesmo texto. Os volumes fornecem um estudo sobre a organização social e
o parentesco da população, existindo também um capítulo dedicado a avaliação do projeto de
desenvolvimento comunitário desenvolvido por Gordon Kopp junto aos Deni.
Há apenas uma tese sobre os Jamamadi, a de Lúcia Helena Vitalli Rangel (1994). A
autora analisa a história dessa população e de sua relação com os brancos. Ela discorre também
113
sobre a relação interaldeias, procurando apreender a lógica do xamanismo que pauta as relações
políticas.
A população Kanamari é considerada em uma dissertação, quatro teses, dois artigos e um
livro, embora o último seja a publicação de uma das teses, a de Maria Rosário Gonçalves de
Carvalho (2002). A dissertação é de autoria de Araci Maria Labiak (1997) e realiza uma analise
de alguns aspectos da cosmologia e mitologia.
Os dois artigos foram publicados por pesquisadores que também escreveram teses sobre
este grupo. A tese de Edwin B. Reesink (1993), defendida no programa de pós graduação em
antropologia do Museu Nacional – UFRJ, aborda a cosmologia e as concepções Kanamari sobre
o mundo e sua organização social. Um dos artigos (Reesink 1991) é de autoria deste mesmo autor
e aborda a questão do xamanismo e dos rituais de cura. A tese de Lino João de Oliveira Neves
(1996) aborda o tema da mitologia e da relação e conceituação do meio ambiente, seu artigo,
também de 1996, analisa o histórico do contato com o branco.
Luiz Antonio Costa (1998) escreveu sua tese no âmbito do programa de doutorado em
antropologia social do Museu Nacional. O texto faz um investimento na descrição e análise da
relação entre o contínuo e o descontínuo no pensamento Kanamari, verificando sua conceituação
em campos como o parentesco, xamanismo, mitologia e história. Maria Rosário Gonçalves de
Carvalho (1998) foca a descrição e análise da história Kanamari em sua tese, tendo publicado o
texto em livro em 2002.
Segundo mostra o levantamento bibliográfico os Kulina possuem o maior número de
pesquisadores e quantidade de produções etnográficas da região. São abordados por nove autores
diferentes em 17 textos, correspondendo a três dissertações, duas teses, três livros e nove artigos.
As produções mais antigas são os artigos de Isabelle Rüff (1972) e de Patricia K. Townsend &
Patsy Adams (1973). O primeiro realiza uma descrição do ritual de caça coletiva, já o segundo
relaciona temas como parentesco, estratégias matrimoniais e escatologia.
A dissertação de Domingos Aparecido Bueno da Silva (1997) propõem, com um
embasamento teórico na etnomusicologia, uma análise da música e da pessoa Kulina. Ele aborda,
além da música propriamente dita, rituais de troca, xamanismo e alguns mitos, um deles
disponível nos anexos. A dissertação de Lori Altmann (2000) analisa as concepções e
delimitações da alteridade, partindo de considerações a respeito da visão nativa sobre as
categorias de tempo e espaço. A de Flávio Gordon (2006), defendida no âmbito do Museu
114
Nacional – UFRJ, realiza uma revisão bibliográfica sobre a produção etnográfica sobre as
populações arawá e dá ênfase especial a questão dos grupos nomeados entre os Kulina.
A tese de Claire Lorrain (1994) aborda as relações de gêneros, investigando como estas se
apresentam no parentesco, na vida econômica e política, e as concepções nativas envolvidas.
Donald K. Pollock, responsável pela outra tese é quem escreveu mais sobre esta população,
assinando sete artigos. Em sua tese ele aborda a questão da pessoa e da doença, propondo uma
análise dos papéis sociais que uma pessoa assume durante a vida e a forma como os nativos
concebem estes estágios. As diferentes categorias de doença são interpretadas como diferentes
formas de desarranjos social, relacionados com a fase da vida em que uma pessoa doente se
encontra. Seus dois artigos de 1985 abordam um a relação entre identidade sexual e os alimentos,
cada gênero possuindo um papel diferente na produção e simbologia alimentar, e o outro a
relação entre irmãos e irmãs. Em 1992 publica um artigo que versa sobre a relação entre os
gêneros e o xamanismo, em 1993 um que aborda a questão da conversão ao cristianismo e outro
que lida com o tema da escatologia já analisado em sua tese, em 1994 publica um artigo sobre
doenças e cura e; em 2002 publicou um artigo sobre o conceito de paternidade particionada, no
qual aborda, além das idéias sobre a concepção, a política que estaria envolvida ao se assumir a
paternidade sobre o filho de uma mulher que não a esposa.
Os três livros existentes foram publicados pelos missionários Robert E. Zwetsch(1984,
1992) e Nelson Deicke (1994). Fornecem algumas informações sobre o grupo, alguns aspectos da
sua história e da relação com o mundo do branco.
O Banco de Dados mostra que sobre os Paumari existe uma tese e três artigos. A tese foi
escrita por Oiara Bonilla (2007), no âmbito da EHESS/Collège de France, fornece a visão nativa
sobre a história “mítica” e sobre o tempo dos patrões, quando estavam em relação com a empresa
seringalista. Sua abordagem sobre a pessoa e a cosmologia se pauta pelas idéias de predação e do
perspectivismo. Seu artigo (2005) anterior a tese investiga a cosmologia e a organização social,
com orientação teórica semelhante.
Os outros dois artigos foram publicados por pessoas ligadas ao SIL. Shirley Chapman
(1974) publicou um artigo pautado pela análise de processos de aculturação, que procuraria
avaliar as perdas culturais sofridas pelos Paumari. Mary-Anne Odmark & Rachel M. Landin
(1985) publicaram um artigo que analisa a organização social e o sistema de parentesco,
realizando uma análise componencial da terminologia de parentesco.
115
O levantamento aponta a existência de dois livros, quatro apostilas-descrições e um artigo
sobre os Zuruahã. Os trabalhos aqui incluídos foram escritos em sua maioria por missionários e
indigenistas, somente o artigo é de natureza estritamente acadêmica. O artigo, escrito por João
Dal Poz Neto (2007) propõe um entendimento da prática de suicídio entre a população.
Os dois livros foram escritos por Günter Kroemer do CIMI, em um deles (1991) é descrita
a viagem de encontro e as primeiras impressões sobre os Zuruahã, no outro (1994) há uma
descrição mais sistemática da população. Um das apostilas-descrição deve-se a Jônia Frank &
Edinéia Porta (1996), na qual apresentam uma descrição das atividades econômicas, caça, pesca,
agricultura e da organização social. As outras três apostilas-descrição (2003) são de autoria de
Miguel Aparício, da ONG indigenista OPAN. Duas delas corresponderiam a espécies de diários
de campo, que fornecem informações a respeito das atividades rituais, econômicas, e narrativas
mitológicas, junto com dados sobre a atuação indigenista. O terceiro volume é composto de
algumas tentativas do autor sistematizar os fragmentos etnográficos que coletou.
O levantamento bibliográfico não encontrou uma produção de natureza etnográfica sobre
os Banawá, Hi-Merimã, Katawixí, Katukina e Jarawara.
Outros
Os sete itens aqui incluídos são de autoria exclusivamente missionária. Correspondem a
reflexões sobre a atividade missionária, ou tentativas de aproximar a cosmologia cristã e a
indígena. Há um testamento na língua Paumari de 1995. Tres artigos de Walter Sass (2006, 2009,
s.d.) que procuram mostrar a fusão entre a teologia cristã e indígena entre os Deni e Kulina. Lori
Altmann possui dois trabalhos, um de 1982 que procura discutir o processo de evangelização dos
povos indígenas e outro de 1991 que comenta sua experiencia missionária entre os Kulina. Há
uma dissertação de Robert E. Zwetsch que aborda as missões luteranas entre os indígenas, dentro
os quais os Kulina.
Considerações finais
O levantamento bibliográfico mostrou que existe uma extensa produção textual sobre as
populações da região do médio curso dos rios Juruá e Purus. Os estudos linguísticos e
relacionados ao ensino de língua são a maioria. Todas as populações tiveram suas línguas
investigadas, sendo que para algumas delas essas são as únicas informações existentes.
116
A distribuição das publicações entre os grupos mostra alguns deles apresentam
pouquíssimos trabalhos, como os Banawá, Hi-Merimã, Katawixí, que apresentam três cada, e os
Katukina com 10 textos. Os Paumari, por sua vez, apresentam a maior quantidade de produções,
53 textos, são pouco estudados do ponto de vista etnográfico. Os Kanamari, por outro lado, foram
considerados em apenas 21 produções, mas concentram grande quantidade de trabalhos
acadêmicos fruto de trabalho de campo extensivo.
Da análise dos dados bibliográficos podemos concluir que seria interessante o
desenvolvimento de pesquisas etnográficas junto aos Banawá, Hi-Merimã, Katawixí, Katukina e
Zuruahã, pouco explorados até então. Outras populações, como os Deni, Jamamadi, Jarawara e
Paumari possuem uma defasagem de produções antropológicas, embora possuam uma quantidade
razoável de produções, respectivamente 27 textos, 30, 19 e 53, apenas uma pequena parte
corresponde a descrições sistemáticas dos seus sistemas sociais e simbólicos, sendo interessante o
desenvolvimento de pesquisas junto a eles.
117
A PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA SOBRE OS POVOS DO VALE DO JAVARI
Juan Carlos Peña Márquez
Professor do Curso de Bacharelado em Antropologia do Instituto Natureza e Cultura, UFAM
Benjamin Constant
Neon Solimões Paiva Pinheiro
Estudante do Curso de Bacharelado em Antropologia, Instituto Natureza e Cultura, UFAM
Benjamin Constant
Apresentamos aqui uma análise de 73 referências do Banco de Dados Bibliográficos. Foi
considerado o levantamento da região do Vale do Javari ou Terra Indígena do Vale do Javari, que
compreende os rios Javari - Jaquirana, Ituí, Itacoaí, Quixito, Pardo e Curuça onde habitam
populações indígenas Marubo, Matsés (Mayuruna), Korubo e Matis da família linguística Pano7;
Kanamary da família linguística Katukína; e Kulina da família linguística Arawá (embora
algumas referências consideram a língua Kulina desta região da família linguística Pano). Nos
registros bibliográficos se identifica a presença de pelo menos sete povos indígenas chamados
isolados ou autônomos, preservados por áreas de proteção com limites em frentes de contato.
Alguns destes povos são considerados como pertencentes às mesmas famílias lingüísticas dos
povos em contato como os Korubo e Maya da família lingüística Pano; outros são considerados
das famílias Katukina e Arara, enquanto outros são conhecidos pelas nominações Tsohon Djapá,
Flecheiros, Índios do Quixito ou desconhecidos.
Uma importante base para estas fontes de informação sobre o Vale do Javari deve-se aos
estudos etnográficos de Delvair Montagner e Julio Cezar Melatti que internacionalizaram a
etnografia ao colocar o modelo estrutural dos Marubo em diálogo com o sistema conhecido na
antropologia como o modelo australiano, no artigo: Estrutura social Marubo: um sistema
australiano na Amazônia; suas pesquisas estimularam o aprofundamento no conhecimento sobre
as culturas do Vale do Javari ao tempo em que possibilitaram o reconhecimento destes povos ao
momento da luta pela demarcação da Terra Indígena do Vale do Javari.
Na bibliografia e em estudos recentes8 é relatada a demarcação da terra indígena da
seguinte maneira: O primeiro Grupo de Trabalho para a delimitação da Terra Indígena do Vale do
Javari foi constituído em 1980 sob a coordenação da antropóloga Delvair Montagner Melatti,
7Philippe Erikson, apoiado nas semelhanças lingüísticas e culturais dos Marubo com os Katukína-Pano, Nukiní
(Rêmo) e Poyanáwa, do Brasil, e ainda com os Kapanáwa, do Peru, classifica o conjunto de suas línguas como o
ramo central da família Pano. Melatti, 1998. In: http://www.pegue.com/indio/marubo.htm
8. Levantamento Bibliográfico Etno-Histórico da Cultura Marubo,(Pinheiro, 2009).
118
cuja proposta foi à criação do Parque Indígena do Vale do Javari, com superfície de 5.800.000
hectares. O Parque abrangeria as áreas de ocupação dos principais povos indígenas contatados da
região e a área de alguns dos grupos isolados, sobre os quais já se tinha algum conhecimento. Em
1984, reuniram-se conhecedores da região do Javari em um Grupo de Estudos, criado para
fornecer maiores informações sobre a área indígena. Este Grupo sugeriu a interdição da área do
Javari para impedir a continuidade das invasões enquanto os trabalhos de regularização
prosseguissem.
Foram feitos outros dois levantamentos etnográficos, realizados em 1985 e em 1995/96,
cujas propostas indicaram a demarcação de um território único, abrangendo as áreas de ocupação,
os povos localizados nas bacias dos rios Javari, Jutaí e Jandiatuba. O antropólogo Wálter
Coutinho Jr., coordenador do Grupo Técnico da FUNAI (GT PP 0174/95 e 158/96), foi quem
realizou o último re-estudo da Terra indígena Vale do Javari, no período de 1995 a 1996. O
Relatório de Identificação e Delimitação da Terra Indígena Vale do Javari, apresentado por
Walter no ano de 1998, recuperou os esforços anteriores realizados para delimitar a área, como
por exemplo os trabalhos de pesquisas de Delvair Melatti e Julio Cezar Melatti, iniciados na
década de 70. (RICARDO, 1981).
O Resumo do Relatório foi publicado no Diário Oficial da União em 29 de maio de 1998
e no Diário Oficial do Estado do Amazonas em 08 de junho de 1998. A finalização do processo
de identificação e delimitação da Terra Indígena ocorreu em 11 de dezembro de 1998, por meio
da Portaria Declaratória nº 818, do Ministro da Justiça Renan Calheiros, reconhecendo a área
delimitada de 8.519.800 hectares, (na demarcação física: 8.544.482,2728 hectares) localizadas
nos municípios de Atalaia do Norte, Benjamin Constant, Jutaí e São Paulo de Olivença. A
FUNAI realizou a demarcação física da Terra Indígena Vale do Javari, em 2000, por meio do
Projeto Integrado de Proteção às Populações e Terras Indígenas da Amazônia Legal (PPTAL),
executado pelo próprio órgão indigenista governamental com apoio financeiro do Programa
Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7). A Terra Indígena do Vale do
Javari foi homologada pelo Decreto de Homologação publicado em 02 de maio de 2001 e
registrada no SPU em 31 de julho de 2002, é a segunda maior T. I. do Brasil. Estas são as últimas
etapas do processo de regularização de terras indígenas, cuja execução das ações (homologação e
Registro no SPU) é de competência exclusiva do Governo Federal.
119
Finalmente gostaríamos de destacar que há um número importante de pesquisas recentes
sobre os povos indígenas do Vale do Javari, as quais versam sobre doenças apresentadas na
região especialmente a hepatite e a malária, que não tem tido uma resposta acertada e responsável
por parte dos órgãos pertinentes. Estas doenças vêm causando uma crise na saúde e na
estabilidade emocional e social destes povos; a pesar disto, como o demonstram seus últimos
congressos, eventos e festas tradicionais, há um processo importante de revitalização cultural e de
fortalecimento de suas organizações que reclamam pelo apoio institucional e não governamental.
Análise Etnológica
Os dados bibliográficos desta seção serão considerados inicialmente com as produções
textuais gerais e, porventura, mais antigas que fornecem descrições da região e dos povos
indígenas na sua descrição histórica, e depois será analisada a produção etnológica de cada grupo
étnico. Os dados analisados representam na sua maioria estudos etnográficos fornecidos por
pesquisadores de tradição acadêmica que somam um total de 70 trabalhos divididos entre livros,
capítulos de livros, teses, dissertações, monografias, relatórios, artigos e entre eles três vídeos
sobre os povos indígenas do Vale do Javari.
O relato de viagem do Barão de Teffé (1888) é o registro mais antigo sobre a região do
Javari onde descreve uma minuciosa batalha entre os índios do rio Javari e a comissão
demarcadora dos limites da Colônia. Algot Lange (1912) faz uma narrativa de viagem realizada
em 1910 na bacia do rio Itacoaí e descreve sobre um povo Mangerona que supostamente seria os
Mayuruna. Werner von Hörschelmann (1918) faz uma descrição sistemática das peças recolhidas
por Spix & Maritus. Victor Oppenheim (1936) faz uma analise dos “restos da cultura neolítica
dos índios “Pano” do Alto Solimões”.
José Cândido de Melo Carvalho (1955) escreveu um diário de viagem pelos e sobre os
rios Javari, Itacoaí e Juruá escrito em 1950, onde possui ligeiras referências aos povos Ticuna,
Kanamary e os Indiapás sobre suas línguas. Carlos Alberto Ricardo (1981) no livro Javari vol. 5,
reúne dados etnográficos e notas de viagem dos grupos étnicos Marubo, Mayuruna, Matis, Kulina
e Kanamary fornecendo várias informações a respeito destes povos e da região (CEDI). A obra
Povos Indígenas no Brasil (1984) reúnem fatos publicados na impressa sobre políticas públicas
nas regiões do Noroeste amazônico, Solimões, Javari, Jutaí, Juruá, Purus, Tapajós e Madeira,
apresentando o que ocorreu nas áreas indígenas no âmbito das políticas indigenistas (CIMI,
OPAN, CEDI). Representantes dos povos indígenas do Vale do Javari (Campanha Javari) (1986)
120
confeccionaram uma cartilha cujo conteúdo versa sobre sua história de contato com os brancos,
processo de ocupação, situação de saúde, atividades econômicas. Há aí também um mapa da
região com a localização dos diversos povos.
Walter Coutinho Júnior (1998) realizou o último re-estudo da Terra Indígena Vale do
Javari no período de 1995 a 1996, produzindo o relatório de identificação e delimitação da Terra
Indígena Vale do Javari. Helena Farago (2005) realizou uma analise sobre o xamanismo e poder
entre os povos Pano. Maria Helena Ortolan Matos (2006) discutiu os rumos do movimento
indígena no Vale do Javari numa perspectiva histórica construindo uma rede de relações sociais
sobre os grupos indígenas desta região.
Sobre os Marubo, o levantamento bibliográfico assinala a existência de dois livros, dois
capítulos de livros, três teses de doutorado, uma dissertação de mestrado, quinze artigos e três
vídeos.
O livro de autoria conjunta de Montagner & Melatti (1975) apresenta uma minuciosa
descrição etnográfica onde aborda problemas do conflito inter-étnico, ocupação e aproveitamento
do meio ambiente, organização social, ciclo de vida, cosmologia, magia, ritos, oferecendo ainda
sugestões para uma ação indigenista. Montagner em (1985) descreve e analisa os ritos de cura
Marubo e também sobre etno-conhecimento e farmacologia em sua tese, sendo publicada em
livro (1995) A morada das almas: representações das doenças e das terapêuticas entre os
Marubo.
O capítulo intitulado “Marubo”, do livro Povos Indígenas no Brasil de Júlio Cezar Melatti
(1977) traz importantes informações etnográficas a respeito do povo Marubo; o capítulo “Mani
Oei Rao: remédios do mato dos Marubo de Montagner do livro: medicinas tradicionais e
medicina ocidental na Amazônia” aborda os “remédios do mato” e etno-conhecimento.
Guilherme Werlang da Fonseca Costa Couto (2001) escreveu uma das teses levantadas no Banco,
analisando a organização indígena e os cantos míticos. A outro é de autoria de Pedro de
Niemeyer Cesarino (2008) que discorre sobre a perspectiva da tradução da arte verbal Marubo. A
única dissertação de mestrado produzida até o momento é de autoria de Raquel Guimarães
Romankevicius Costa, que aborda aspectos da fonologia, morfologia e sintaxe da língua Marubo.
Os artigos escritos em conjunto, de Montagner & Melatti (1977), tratam da confecção de
cerâmica e suas técnicas; sobre educação e técnicas de socialização; organização do espaço, onde
analisa a estrutura de edificação, a projeção do espaço, e dimensão espacial do público e do
121
privado. O artigo de Melatti escrito em 1977, trata da organização social e parentesco; os artigo
de 1985 discorrem, respectivamente, sobre uma discussão mitológica da origem do branco e
sobre o contato inter-étnico, aspectos econômicos e os patrões Marubo; o artigo de 1986 trata da
origem mitológica da cultura Marubo. Por fim, numa entrevista (Melatti, 2002) fala de sua
aventura etnográfica entre os Krahó e os Marubo.
O artigo de Montagner (1986) discute sobre simbolismo dos adornos corporais; em artigo
de 1987 Montagner aborda questões sobre etno-conhecimento e cozinha Marubo; em artigo de
1989 o autor discorre sobre a culinária e tecnologia Marubo. O artigo de Edilene Coffaci de Lima
(1994) aborda sobre os desencontros míticos e encontros históricos dos grupos indígenas
Katukina, Yawanawa e Marubo. Os artigos de Raquel Guimarães Romankevicius Costa (2000)
tratam da questão lingüística dos Marubo; e em (2005) aborda a questão lingüística dos Marubo e
Matsés (Mayuruna). O artigo de Guilherme Werlang da Fonseca Costa Couto (2006) enfoca a
discussão sobre as noções de corpo e alma dentro do universo Marubo.
O vídeo de Nilson Araújo (1991) é um documentário nas aldeias Marubo; e outro de
André Luís (1993) que também é um documentário sobre a cultura Marubo. O último registro
áudio-visual é de Delvair Montagner (1995), documentário acerca dos meninos Marubo nas
aldeias. Todos estes vídeos mostram a diversidade ecológica da região, o dia a dia deste povo e as
relações com não indígenas e principalmente sua riqueza de ritos e valores culturais.
Sobre os Marubo há um volume bastante expressivo de dados bibliográficos, sendo o que
mais se destaca na região. A diversidade de temas e analises correspondente a este povo conduz
para uma formação circular da cultura como forma de compreensão a partir da perspectiva do
autor e do interlocutor.
A produção bibliográfica sobre os Matsés – Mayuruna aponta a existência uma tese, duas
dissertações e quatro artigos.
A tese é de autoria de David William Fleck (2003), que discorre sobre a gramática Matsés
numa discussão sobre a família lingüística Pano. A dissertação de Carmem Tereza Dorigo de
Carvalho (1992) trata da análise frasal da língua Matsés. A outra é de autoria de Walter Alves
Coutinho Junior (1993), sobre a história dos Matsés e seus aspectos culturais.
O artigo de Fidelis de Alvino (1957) tece uma analise etnológica sobre ensaios da língua
Mayuruna no rio Jandiatuba. O artigo de Judith E. Vivar (1975) relata referências históricas e
demográficas além de dados econômicos e ecológicos da formação do Javari; o artigo de Carmen
122
Teresa Dorigo (2002) versa sobre aspectos linguísticos. Por fim aparece o artigo de David
William Fleck (2002) também sobre língua Pano.
Sobre os Matis foram encontrados um capítulo de livro, três teses, duas dissertações e
cinco artigos. O capítulo: “uma esperança para os Matis?”, de Philippe Erikson, no livro: Povos
Indígenas no Brasil (1991) apresenta um informativo sobre os aspectos culturais do povo. Este
autor também escreve sua tese no ano de 1990, um estudo sobre a organização indígena e sua
identidade étnica. A tese de Rogério Vicente Ferreira (2005) apresenta uma descrição
morfossintática da língua Matis. Este mesmo autor escreve sua dissertação em 2001 sobre os
aspectos descritivos da morfossintaxe da língua Matis. A última tese é de Vitória Regina
Spanhero Ferreira (2005), que apresenta a etno-história dos Matis, seu modo de vida atual e sua
língua na formação do dicionário bilíngüe. Sua dissertação (Ferreira, 2000) aborda uma descrição
fonética e fonológica da língua Matis.
Os artigos de Philippe Erikson (1993) tratam sobre a descrição e uso da nominação Matis;
e em (1996) uma discussão sobre a língua; em (2000) uma reflexão sobre os aspectos culturais
dos Matis; e em (2002) discorre sobre a questão do contato inter-étnico e identidade; e por fim o
artigo do CTI (2002) sobre escola e educação Matis.
Segundo o levantamento bibliográfico, há sobre os Korubo uma dissertação e um artigo.
A dissertação é de Maria Luiza dos Santos Silveira (2001), que analisa a questão da identidade e
os aspectos culturais. O artigo é de autoria de Philippe Erikson (1997), uma análise sobre o
contato interétnico deste grupo.
O povo Korubo recentemente tem descido uma pequena parte do seu grupamento na
localidade próxima da Frente de Proteção Etno-ambiental na confluência dos rios Ituí e Itacoaí.
Este povo foi marcado na região pelas invasões sangrentas de seus territórios pelos seringueiros e
madeireiros, os Matis é o povo que dialoga com este grupo e troca utensílios e artesanatos.
Sobre os Kulina, o banco de dados levantou um livro, duas teses, três dissertações, uma
monografia e seis artigos. Estas informações, na sua grande maioria, abrangem a região do Vale
Javari, Juruá, Purus interligando varias analises do estudo etnológico desta base de dados.
Os aspectos culturais dos Kulina são expressos no livro de Roberto Ervino Zwetsch
(1992) e nas teses de Donald Pollock (1985) que discorre sobre os aspectos culturais e de saúde; e
de Claire Lorrain (1994) que trabalha os aspectos da organização indígena, simbolismo e
economia.
123
A dissertação de Robert E. Zwetsch (1993) aborda uma discussão histórica da trajetória
missionária luterana nas comunidades indígenas destas regiões, sobretudo no que diz respeito à
sua religião. A dissertação de Lori Altmann (2000) discorre sobre os aspectos da identidade. A
dissertação de Flávio Gordan (2006) é uma análise da história e da cultura do povo Kulina. A
monografia de Lori Altmann (1982) relata o processo de evangelização e a religião deste povo. O
artigo de Isabelle Rüff (1972) discorre sobre os dados da caçada cerimonial. O artigo de Roberto
Ervino Zwetsch (1984) descreve os aspectos culturais dos Kulina; o artigo de Lori Altmann
(1991) analisa a religião e organização indígena. O artigo de Donald Pollock (1992) versa sobre
os aspectos culturais, etno-conhecimento e xamanismo. Nelson Deicke (1994) analisa os aspectos
culturais e a identidade étnica; e o artigo de Carlos Coimbra Jr. e Ricardo V. Santos (1994)
apresenta uma discussão sobre etno-conhecimento.
Sobre os Kanamary foram levantados um livro, um capítulo de livro e uma dissertação. O
livro de Vila Ribeiro, Araci Labiak, Claúdio Cont, Lino Neves e Márcio Silva, de 1996, aborda
sobre os elementos da fonologia Kanamary. O capítulo “ecologia e sociedade: uma breve
introdução aos Kanamary”, (parte do livro Sociedades Indígenas e Transformações Ambientais,
1993) de Maria do Rosário Gonçalves de Carvalho e Edwin B. Reesink, apresenta discussão
ecológica, sobre etno-conhecimento, botânica, tecnologia, etc. A única dissertação é de autoria de
Lino João de Oliveira Neves (1996) que apresenta uma leitura crítica sobre a bibliografia
pertinente aos Kanamary.
Linguística
Os 21 documentos de estudos Linguísticos do Vale do Javari concentram as investigações
sobre as línguas Marubo, Matses (Mayoruna), Korubo e Matis da família lingüística Pano;
Kanamary da família linguística Katukína; e Kulina da família lingüística Arawá (embora
algumas referências consideram a língua Kulina desta região da família lingüística Pano).
A primeira referência ao estudo lingüístico da região corresponde ao geógrafo Willian
Chandless (1869) quem no rio Juruá caracterizou varias línguas (Kamanary, Katukima, Marauá,
Kauixi, Konibo), que confluem na fronteira entre o rio Juruá e as cabeceiras dos rios Ituí e
Curuça, estes últimas do Javari. Em 1984 é editado o Dicionário “Kulina-Português e PortuguêsKulina” de Abel O. Silva e Ruth M. F. Monserrat; no rio Purus são registrados alguns estudos
sobre a língua Kulina. Também no Juruá Maria Suely de Aguiar (2002) desenvolveu uma
gramática da língua Katukina e outros estudos posteriores sobre esta mesma língua são
124
desenvolvidos por Francisco Queixalós (2002, 2005).
A língua Kanamary que também aparece no registro de Chandless (1869) é retomada num
estudo datado de 1996 de Vila Ribeiro Et. al. Elementos de fonologia Kanamary: fundamentos
para uma ortografia; onde os autores sintetizam a fonologia e ortografia base para o estudo da
língua Kanamary, assim como para o desenvolvimento de pesquisas e projetos educativos com
este povo. Também Araci Maria Labiak escreveu na serie Cadernos de Estudos Linguísticos da
UNICAMP os Elementos da fonologia Kanamary (1989).
A Missão Novas Tribos do Brasil tem contato desde 1952 com o povo indígena Marubo9
(Pinheiro, 2009) e no seu banco de dados (Banco de Dados da AMTB/2002) aparecem
empreendimentos para o estudo das línguas Indígenas Matsés, Katukina e Kanamary do Vale do
Javari, com o intuito de traduzir a bíblia e desenvolver o processo de evangelização destes povos.
Recentemente seus estudos têm servido como base para o desenvolvimento de cartilhas ou livros
didáticos para o ensino da língua e a educação indígena reivindicada por eles.
Fidelis de Alviano realizou em 1957 uma pesquisa sobre a língua Matsés ou Mayuruna
com o título: Ensaios da língua dos índios magironas ou maiorunas do rio Jandiatuba considerada
ainda da região do Alto Solimões. Philippe Erikson (1996), classificou o conjunto de línguas
Marubo, Katukína-Pano, Nukiní (Rêmo) e Poyanáwa, do Brasil, os Kapanáwa, do Peru, como a
vertente central da família Pano, à qual pertencem ainda o Matsés, Matis, Korubo e Maya. Entre
as línguas Pano há uma diversa e complexa bibliografia dedicada especialmente aos Matis,
Vitória Regina Spanhero Ferreira 2005 (a) um estudo lexical e outro 2005 (b) fonológico,
Rogério Vicente Ferreira 2001 dissertação e 2005 artigo), Marubo (Raquel Guimarães
Romankevicius Costa 2000 e 2005) e Matsés ou Mayuruna (David William Fleck 2002 artigo e
2003 dissertação, Carmen Teresa Dorigo 1992 dissertação e 2002 artigo).
No emblemático Mapa Etno-Histórico de Curt Nimendajú (1944/1987) se registra a
presença do povo Kocama como parte do Vale do Javari por conta da presença de populações
Peruanas indígenas, mestiças e não indígenas, localizadas na região de fronteira entre Brasil e
Peru, cuja divisória é definida pelo próprio Rio Javari. Referências recentes à fronteira territorial
e cultural demonstram o ressurgimento desta língua na região do Alto Solimões e na beira
peruana do rio Javari.
9 O Pastor John Jansma se dedica ao aprendizado da língua Marúbo desde os anos 60, com o fim de traduzir de
textos bíblicos, pregar o evangelho e elaborar de cartilhas de alfabetização.
125
O Centro de Trabalho Indigenista (CTI) vem desenvolvendo uma importante serie de
estudos linguísticos direcionados especialmente ao trabalho em educação indígena, contexto no
qual tem apresentado um importante número de pesquisas e livros didáticos nas línguas Matis,
Matsés e Kanamary.
Educação
Os documentos que fazem referência ao tema da educação é um grupo extremadamente
reduzido de trabalhos, em número de cinco, iniciando com o artigo produzido para a Revista
Brasileira de Estudos Pedagógicos em 1979 sobre a criança Marubo de Delvair Montagner e Julio
Cezar Melatti, seguido por estudos que podemos caracterizar como importante para o processo de
socialização de conhecimento entre povo Matis e o povo Marubo. Nesta perspectiva se destacam
os escritos sobre pinturas corporais de Philippe Erikson (1996) entre os Matis e sobre o mesmo
tema entre os Marubo de Delvair Montagner (1986).
Os processos de socialização de conhecimento entre os povos indígenas estão associados
ao ensino dos conhecimentos tradicionais em aspectos religiosos, na vida econômica e na maioria
de aspectos simbólicos da vida social; no entanto há um processo de especialização e reflexão
sobre a educação indígena partindo do modelo de educação escolar, neste sentido destacamos a
produção do CTI sobre educação indígena e particularmente o artigo sobre A Escola Matis (2002)
e o Diagnostico Sobre A Educação Escolar Indígena do Vale do Javari publicado no site do CTI
(2008). É necessário sublinhar que mesmo ainda não inseridos no sistema do Banco de Dados, há
uma produção de cartilhas e documentos escolares produzidos pelo CTI e por organizações
religiosas que estão desenvolvendo trabalhos de educação escolar indígena no Javari; isto não
supre a demanda por uma educação escolar indígena estruturada para a região que não conta com
o apoio decidido das instituições competentes para tal fim como a Prefeitura, a SEDUC e o MEC.
Ecologia
Um aspecto que se destaca na bibliografia é a referência a aspectos da vida ecológica e ao
uso dos recursos ambientais, referências que sendo em pequeno número, si somadas aos estudos
etnográficos e etnológicos representa na realidade um aspecto fundamental no conhecimento
sobre os povos indígenas da região do Vale do Javari, ao mesmo tempo em que possibilita a
compreensão e definição de políticas de conservação ambiental associadas ao conhecimento
sobre a cultura e direitos territoriais destes povos. No estudo Fronteiriço sobre os Mayuruna de
126
Judith Vivar (1975) aparece esta problemática associada à delimitação territorial dos Estados Nação do Peru e do Brasil que divide a territorialidade cultural e ambiental do povo Matsés.
Referido ao uso dos recursos naturais esta o Capitulo Remédios do Mato dos Marubo de Delvair
Montagner (1991) e Ecologia e Sociedade de Maria do Rosário Gonçalves de Carvalho e Edwin
B. Reesink (1993), este último referido ao povo Kanamary.
Gênero
Na bibliografia encontramos três documentos sobre gênero, tema de referência recente
nos estudos antropológicos sobre a região. O primeiro é o estudo sobre os Kulina relacionado ao
Xamanismo de Donald Pollock (1992) no qual destaca a questão do gênero como fonte de poder
e conhecimento; em contraste a este trabalho está o estudo Identidade em mulheres índias de
Maria Luiza dos Santos Silveira (2001) sobre as mulheres da sociedade indígena Korubo.
Philippe Erikson também aborda a questão de gênero no artigo: "I", "UUU", "SHHH": gritos,
sexos e metamorfoses entre os Matis (2000) como contribuição etnográfica da constituição da
pessoa entre este povo indígena.
Cosmologia
Temos colocado o titulo de cosmologia a um grupo de 23 referencias bibliográficas que
sendo etnográficas ou etnológicas fazem referencia específica ao tema cosmológico ou
cosmogônico, tendo como base de estudo a relação dos povos indígenas do Vale do Javari com a
história mítica, a composição dos espaços: territorial, da maloca e do corpo; como elementos
constituintes de uma filosofia indígena e a interpretação antropológica realizada por diversos
autores.
É preciso destacar, no entanto, que parte importante desta bibliografia tem base nos
estudos pioneiros de Julio Cesar Melatti e Delvair Montagner, especificamente sobre os Marubo;
o percorrido etnográfico realizado pelos Melatti atinge os mais diversos aspectos da cultura
Marubo, desde a origem mitológica (1986), os mitos de maneira geral (1989), a maloca e suas
interações com o mundo material e imaterial (1986) até O mundo dos espíritos (1985). A
classificação das doenças e dos remédios pelos Marubo e seus ritos de cura foram abordados na
tese de doutorado de Montagner, defendida na Universidade de Brasília, e resumida
posteriormente no livro A Morada das Almas, publicado pelo Museu Goeldi (1995).
127
A conformação da identidade cultural indígena dos Marubo se tece num processo em que
o limite entre a história e a mitologia se integram para dar passo a uma unidade identitária que
posteriormente os coloca como lideranças dos povos indígenas do Vale do Javari, ao mesmo
tempo em que os articula dentre o complexo cultural indígena Pano da mesma região e da região
sub-andina do Peru. A Origem dos Brancos no mito de Shoma Wetsa (1985) é um estudo da
origem mítica Marubo realizada por Julio Cesar Melatti onde se explica a origem do homem
branco desde a estrutura social e cultural Marubo e que serve de base para analise estrutural e
comparativa, com mitos de outros povos da região Amazônica e do planalto brasileiro.
A mitologia Marubo explica a conformação do cosmos, do universo, da terra, desde as
distintas camadas, que no processo histórico-mítico consolidam as distintas formas de vida e de
composição do universo, do território e da sociedade em que se inserem e à qual também
incorporam o surgimento do mundo não indígena. Neste sentido é importante destacar a
reafirmação desta filosofia indígena em rituais que se baseiam no canto como instrumento
prioritário de comunicação entre os distintos mundos que compõem o universo, e como
instrumento de socialização de conhecimento, cura e aprendizagem. Guilherme Werlang, no
artigo De Corpo e Alma (2006) destaca a importância do canto na filosofia e na cosmo-visão
Marubo, que segundo ele mesmo, constitui um particular ethos cognitivo; tema já tratado na tese
de doutorado Emerging peoples (2001).
Outros escritos relacionados à cosmologia Marubo são: O Artigo Katukina, Yawanawa e
Marubo: desencontros míticos e encontros históricos de Edilene Coffaci de Lima (1994); a
dissertação do Helder Farago, Xamanismo e poder entre os povos Pano (2005); e a recente Tese
de doutorado de Pedro de Niemeyer Cesarino: Oniska a poética do mundo e da morte entre os
Marubo da Amazônia ocidental, (2008).
Philippe Erikson quem tem estudado os povos pano de maneira geral (“Uma singular
pluralidade: a etno-história Pano, 1992”), tem gerado uma importante bibliografia sobre a
cosmologia Matis e Matsés ou Mayuruna. Os Mayuruna, Brancos e barbudos da Amazônia como
são nomeados por Walter Alves Coutinho Junior (1993), é um dos povos com mais antiga
referência na região do alto Solimões e no Vale do Javari. Sua mitologia, como todo o seu
complexo cultural e social, estão baseados numa forte exogamia que não lhes impede ser
reconhecidos como uma “unidade cultural” na região do Javari aos dois lados da fronteira de Peru
e Brasil. Os conflitos, guerras e assimilações com outros povos, lhes têm permitido a
128
incorporação de conhecimentos e representações de outros, elementos que não ferem a sua
unidade cultural nem sua identidade, reafirmadas na re-acomodação territorial de aldeias e
territórios aos dois lados da fronteira.
Os Matis, de recente contato, ganharam importância para a antropologia pelos rituais de
passagem que constituem a pessoa a través de marcas de tatuagens ou ornamentos corporais. Sua
particularidade física leva a um interesse destacado pela constituição da pessoa Matis nas que se
destacam os estudos de Philippe Erikson sobre a Onomástica Matis (1993), e fazendo eco ao
titulo Pacificação dos Brancos, Cosmologia do Contato o mesmo autor escreve Reflexos de si,
Ecos de Outrem (2002).
Muito interessante é a produção sobre o Xamanismo Kulina, Culina ou Madiha que têm
presença no Vale do Javari e nos rios Juruá, Purus, além da Amazônia Peruana. Isabelle Rüff
descreveu uma cerimônia Kulina no seu artigo “Le "dutsee tui" chez les indiens Culina du
Pérou” (1972); Donald Pollock (1985) escreveu a tese de doutorado sobre a constituição da
Pessoa e o conceito de Doença entre os Kulina (Personhood and Illness among the Kulina of
Western Brazil) e posteriormente publicou Xamanismo: Gênero, Poder e Conhecimento Culina
(shamanism: gender, power and knowledge) (1992). Lori Altmann defendeu a Dissertação:
“Maittaccadsama: categorias de espaço e tempo como referenciais para a construção da
identidade Kulina (Madija)” (2000) e Roberto E. Zwetsch publicou o Livro “O Cheiro da Terra”
(1992). A música Kulina é considerada de grande relevância e interesse para a antropologia
porquanto a partir dela se desenvolveram estudos importantes sobre música, construção da pessoa
e Xamanismo.
Finalmente temos agrupado neste pequeno capitulo sobre cosmologia um grupo de
estudos que fazem referência a experiências religiosas. Evangelização e povos indígenas (1982)
e, Convivência e solidariedade: uma experiência pastoral entre os Kulina (Madija) (1991) de
Lori Altmann, refletem o grande investimento religioso com o propósito de evangelizar os povos
indígenas. Nesta mesma perspectiva esta o estudo: Com as melhores intenções: trajetórias
missionárias luteranas diante do desafio das comunidades indígenas - 1960-1990, de Robert E.
Zwetsch (1993). Há que se colocar que nesta troca de valores simbólicos entre as culturas
indígenas e os grupos missionários também eles encontraram estratégias de proteção ou de
escolha de um parceiro na relação com o mundo ocidental e seus bens.
129
Considerações finais
A base de dados do NEAI contém um número importante de fontes bibliográficas (setenta
e três, ver tabela síntese) e uma descrição básica de cada livro, tese, dissertação e artigo
abrangendo o conjunto dos povos indígenas do Vale do Javari. Algumas fontes bibliográficas
serão inseridas como produto desta primeira análise, o que consolidará e facilitará ainda mais a
consulta e aproximação de novos pesquisadores aos estudos em todas as áreas na região.
130
1
1
1
1
1
1
2
1
1
Korubo
2
1
Kulina
1
1
1
1
1
2
Kanamary
1
1
1
1
1
1
Total
1
1
1
1
1
1
1
1
2
3
1
1
1
1
2
4
2
1
2
1
4
1
1
3
1
Referências
Gerais
1
2003
1
1
2002
2
2001
1
2000
1
1998
1
1997
2
1996
1
1995
1989
1
1994
1987
3
1993
1986
3
1990
1985
1984
1982
1
1981
1979
3
1992
1
1
1991
Matsés
Mayuruna
Matis
1977
Povo
Marubo
1975
1972
1957
1955
1936
1918
1912
1888
Ano
Tabela 1
Distribuição anual das produções bibliográficas do Vale do Javari de 1888-2008
1
1
1
1
4
4
5
4
2
3
1
1
4
3
5
1
131
Os estudos e documentações até agora analisados, constituem uma base para a
compreensão etnográfica sobre os povos indígenas do Vale do Javari, o que estimula para
uma atualização e aprofundamento de múltiplos aspectos culturais que ainda não foram
abordados, ou que, no desenvolvimento da Antropologia como ciência ou como área de
conhecimento, adotaram novas abordagens e possibilidades de analise. Neste sentido é
importante destacar a relação dos povos indígenas que estão aldeados e legitimamente
possuidores da Terra Indígena do Vale do Javari, com os povos isolados ou autônomos.
As áreas de estudo nesta perspectiva são amplas: a interação lingüística entre esses
povos, a delimitação mais clara e efetiva do território de cada um dos povos que não estão em
contato ou que estão em isolamento voluntário; a análise sobre a fronteira e a separação de
povos que sem as fronteiras nacionais pertencem a uma mesma unidade cultural e social; o
estudo sobre a diferença de políticas públicas a cada lado da fronteira; a qualidade, eficácia,
transparência e pertinência das políticas públicas oferecidas pelo Estado brasileiro a estes
povos; a crise no atendimento de saúde pela FUNASA, o Distrito Sanitário e as Prefeituras e
as implicações na sustentabilidade destes povos.
De outra parte podemos destacar como interessante o desenvolvimento de pesquisas
sobre os processos de migração e de ocupação urbana que muda a relação dos povos
indígenas com seu território e transforma as relações entre suas organizações e o Estado. Por
termos tido a oportunidade de conhecer o Vale do Javari e os povos sobre os quais se
produziram tão prolíficos estudos etnológicos e etnográficos, ressaltamos o descaso do Estado
nas políticas de Educação e Saúde, no estimulo ao aproveitamento sustentável dos recursos
naturais e na proteção de invasores da Terra Indígena do Vale do Javari. A imensidão do
território e o desconhecimento sobre aspectos importantes da vida natural e social estimulam
promover a investigação científica que junto ao conhecimento dos povos indígenas e não
indígenas possibilite a sustentabilidade ambiental e cultural do Território.
132
MAPEAMENTO DAS INSTITUIÇÕES GOVERNAMENTAIS E NÃO GOVERNAMENTAIS NA AMAZÔNIA INDÍGENA: CENÁRIOS A
SEREM REFLETIDOS
Maria Helena Ortolan de Matos
Professora do Departamento de Antropologia da UFAM e pesquisadora do Núcleo de Estudos da
Amazônia Indígena (NEAI/PPGAS)
Inara do Nascimento
Estudante do Curso de Ciências Sociais da UFAM (Bolsista do CNPq)
Introdução: A relevância e os limites da pesquisa
Antropólogos e demais pesquisadores têm se defrontado com um novo perfil de
relações interétnicas na Amazônia, constituído por redes de articulações entre os povos
indígenas e agentes institucionais diversos. Isto tem demandado investigações mais
detalhadas sobre esses agentes e suas linhas de ação, considerando que os indígenas fazem
parte, enquanto sujeitos, de um campo político de dimensões locais, regionais, nacionais e
internacionais (ALMEIDA, 2006).
Esta situação etnográfica suscitou a proposta de pesquisa sobre tais agentes no Estado
do Amazonas no projeto “Amazonas indígena: um mapeamento das instituições e da
produção bibliográfica sobre os povos indígenas do estado”. A Professora Dra. Maria Helena
Ortolan Matos, pesquisadora experiente sobre política indígena e indigenista, foi responsável
por elaborar a proposta da pesquisa e coordenar a investigação. Por ser um tema amplo no que
diz respeito à Amazônia, foi feito o recorte etnográfico definindo o estado do Amazonas como
lócus da pesquisa e o período correspondente à vigência da etapa de levantamento de dados
para o Banco de Dados do projeto citado. Portanto, trata-se de um mapeamento
propositalmente delimitado para não dar margem à expectativa de que a complexidade do
tema pesquisado seja esgotada em esforço investigativo inicial.
A importância do mapeamento proposto, embora limitado, está em proporcionar dados
referenciais para dimensionar, planejar e orientar novas pesquisas na área de etnologia
indígena, considerando a concentração de produção científica e de informações sobre ações e
políticas de projetos institucionais em grupos étnicos específicos. O mapeamento de
organizações não-governamentais, indígenas e não-indígenas, atuantes no Amazonas e a
identificação de suas atividades proporcionam conhecimentos importantes para analisar a
atual política indigenista como, por exemplo, os dados sobre o perfil institucional das ações
indigenistas nos últimos anos, os públicos alvos dessas ações e as agências financiadoras que
formam a rede de relações dos indígenas para execução de projetos.
133
Os dados coletados na pesquisa alimentaram o Banco de Dados criado
especificamente para disponibilizar as investigações do projeto. O levantamento de dados
sobre as instituições10 (organizações governamentais e não-governamentais, indígenas e nãoindígenas) foi realizado por meio de ficha elaborada com campos específicos, que foram
reformulados no transcorrer da pesquisa por necessidade de adequação às informações
relevantes sobre os diversos programas e projetos institucionais pesquisados. Tal
reformulação ocasionou ampliação do tempo previsto para execução da tarefa de coleta de
dados, devido os reajustes necessários ter envolvido definições de conteúdo etnográfico e
operacional do sistema de informação georeferenciado.
Durante a execução das atividades propostas, surgiu a necessidade, não prevista
inicialmente, de elaboração de sínteses do perfil de cada instituição pesquisada, de modo a
situar suas atividades no contexto mais amplo da política pública brasileira para os povos
indígenas. Apesar de ter ampliado o trabalho proposto, essas sínteses produziram resultados
interessantes para análise reflexiva dos dados coletados, por revelarem informações que
passariam despercebidas utilizando apenas as fichas produzidas para o levantamento de
informações.
Deste modo, a pesquisa implicou em refinamentos metodológicos que demandaram
maior aprofundamento das atividades e, por conseguinte, provocaram desdobramentos a
serem investigados por meio de trabalhos de iniciação científica envolvendo alunos de
graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Dois
trabalhos científicos foram realizados no período de 2007 a 2009, pelo Programa de Bolsas
de Iniciação Científica da Universidade Federal do Amazonas (PIBIC): Mapeamento das
instituições governamentais e não-governamentais na Amazônia Indígena: cenários a serem
refletidos (agosto 2007- junho de 2008) e Institucionalização de ações indigenistas:
identificação e análise da atuação de organizações não-governamentais em políticas públicas
no Amazonas (agosto 2008- junho de 2009), orientados pela Professora Dra. Maria Helena
Ortolan Matos.
10
Entre muitos significados sociológicos, nesta pesquisa o termo “instituição” é entendido como “organização
ou grupos dotados de certa estabilidade estrutural assentada em normas e valores dos próprios grupos ou
organizações, ou então em valores da sociedade onde se inserem” (Dicionário de Ciências Sociais. Rio de
Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1986, p.612). O termo também será usado, de forma mais ampla,
para fazer referências às organizações não-governamentais, indígenas e não-indígenas, que estão atuando na
execução de políticas públicas indigenistas (ação que lhes exige maior estabilidade estrutural).
134
A complexidade e a dinamicidade da composição das relações interétnicas, nos
últimos anos, impõem limites à análise, sobretudo se considerarmos a quantidade de
organizações indígenas que “nascem e morrem” todos os dias, principalmente devido aos
desajustes estruturais relacionados à política indigenista. Portanto, é necessário considerar
que, pelo perfil do objeto pesquisado, o levantamento de dados realizado tem um recorte
temporal e, por essa razão, é apresentado como uma espécie de fotografia do novo cenário das
relações interétnicas no Amazonas, constituído por redes de articulações entre os povos
indígenas e agentes institucionais diversos. Mesmo com essas ressalvas, foi possível contatar
na pesquisa que a diversidade de ações das organizações (indígenas e não–indígenas) equivale
à multiplicidade de contextos sociais, culturais, territoriais, políticos, econômicos,
institucionais e históricos em que estão inseridos.
Portanto, ao fazer o mapeamento institucional, compreendeu-se que se tratava de uma
pesquisa não quantitativa, mas muito mais qualitativa, no sentido de ter maior significado
científico para o tema realizar uma investigação representativa da situação etnográfica
estudada do que simplesmente apresentar uma listagem institucional.
Desenvolvimento da pesquisa
Para a pesquisa foram analisados diversos websites de organizações governamentais e
não-governamentais, nos quais se buscaram informações sobre ações ⁄programas ⁄projetos
dessas instituições junto aos povos indígenas. Essa coleta de informações foi orientada por
uma ficha, elaborada com campos específicos referentes a objetivos, financiadores, local de
atuação e povo indígena envolvido. A coleta de informações fora do estado do Amazonas foi
realizada através de consultas aos websites institucionais e por correspondência eletrônica.
Além da pesquisa nos websites, foi realizado um levantamento documental por meio de
diversas fontes como folders, documentos institucionais, relatórios e publicações oficiais.
O procedimento da pesquisa, por muitas vezes, revelou-se um processo de horas de
navegação em websites em busca de pistas e links, que geralmente estavam em constante
construção ou atualização de dados. A indisponibilidade de dados e falta de informações
importantes (como, por exemplo, se os dados publicados estão atualizados, quais ações estão
sendo desenvolvidas e por quanto tempo, a origem e valor de financiamentos) foram
corriqueiros na construção do mapeamento. Nesses casos, os dados não coletados ou
incompletos fazem parte do limite deste trabalho, principalmente no que se refere ao
135
fornecimento de informações por parte das instituições pesquisadas e pelo fato da pesquisa ser
de caráter documental (restrição a relatórios, documentos). Logo, optamos por registrar os
dados tais como se apresentavam, compreendendo que o “não-dado” é um dado para análise.
Por meio do projeto Amazonas indígena: um mapeamento das instituições e da
produção bibliográfica sobre os povos indígenas do estado, foi possível fazer pesquisa de
campo em Brasília - DF junto a órgãos governamentais e organizações não governamentais
que desempenham ações com povos indígenas. A escolha do campo em Brasília, ao invés de
ter sido realizado em qualquer outro município no estado do Amazonas, se deve ao fato de
que as organizações governamentais e não-governamentais (com escritório em Manaus ou em
outros municípios do estado) se dirigiam aos seus secretariados nacionais – quase todos com
sede executiva em Brasília devido à proximidade aos parceiros e ao poder Público Federalpara a obtenção das informações relevantes à pesquisa.
As instituições pesquisadas em Brasília foram: Ministério da Cultura (Prêmio Culturas
Indígenas), Ministério do Meio Ambiente (Projetos Demonstrativos dos Povos IndígenasPDPI) e Carteira Indígena, Fundação Nacional do Índio - FUNAI, Conselho Indigenista
Missionário-CIMI, Centro de Trabalho Indigenista - CTI, Instituto Socioambiental-ISA e The
Nature Conservancy-TNC.
Os entraves do trabalho de campo ― dificuldade de acesso aos arquivos e documentos
públicos ― permitem o questionamento quanto à transparência11 dessas informações e como
as mesmas são tratadas como instrumento de poder de quem as detém: acessá-las pode ser
uma “manobra diplomática”. Por outro lado, o não acesso aos dados ocorre também por essas
informações estarem dispersas. Cada elemento da informação se encontra nas partes
interessadas: valores com os financiadores, projetos com proponentes e os resultados em
relatórios técnicos nem sempre acessíveis.
O mapeamento das organizações governamentais e não-governamentais, indígenas e
não-indígenas consta no banco de dados do projeto “Amazonas indígena: um mapeamento das
instituições e da produção bibliográfica sobre os povos indígenas do estado”.
Foram
mapeadas cento e noventa e oito instituições, sendo:
11
Transparência compreendida no sentido que NEDER (1997) lhe confere de qualidade que orienta os atores na
busca de uma das condições básicas do entendimento com outros agentes, que é ser visível quanto a seus fins e
propósitos e comparecer em publico para assumir o compromisso.
136
Gráfico 1
Mapeamento das organizações
Fonte: Banco de dados da pesquisa, 2009.
Dados coletados: contextos, programas e projetos
O objetivo da pesquisa de mapear as organizações governamentais e não
governamentais, identificando suas formas de atuação, foi atendido na medida em que o
acesso às informações se restringia à pesquisa de caráter documental. Em um primeiro
momento12, a pesquisa se direcionou a levantar informações sobre as organizações
governamentais, para depois investigar de forma mais detalhada as organizações nãogovernamentais. As informações sobre as organizações indígenas perpassaram todos os
momentos da pesquisa, uma vez que os dados levantados nas organizações governamentais e
não-governamentais se direcionavam a organizações indígenas.
A análise dos dados obtidos sobre as organizações governamentais revelou que a
implementação de ações, programas e projetos junto aos povos indígenas no estado do
Amazonas têm envolvido ações conjuntas, embora com papéis distintos, de organizações
governamentais e não-governamentais. Pode-se constatar, a princípio, que o campo político
das relações interétnicas sofreu mudanças significativas quanto à sua configuração de relações
de forças entre agentes indígenas e agentes governamentais e não-governamentais.
12
PIBIC 2007/2008: Mapeamento das instituições governamentais e não-governamentais na Amazônia
Indígena: cenários a serem refletidos.
137
Embora em outros momentos da história das relações interétnicas entre indígenas e
autoridades governamentais no Brasil tenha ocorrido participação de instituições nãogovernamentais na implementação de projetos indigenistas (como, por exemplo, a atuação das
missões católicas com ações civilizatórias), no século XX, a política indigenista do Estado
brasileiro foi executada prioritariamente por órgãos governamentais específicos (SPI, 1910;
FUNAI, 1967). No entanto, a partir da década de 90, organizações não-governamentais, que
até então desempenhavam papel crítico às ações indigenistas oficiais, foram requisitadas para
compor o quadro de agentes executores de políticas públicas junto aos povos indígenas.
Ações governamentais passaram a ser executadas por meio de articulação do Estado com
organizações não–governamentais, indígenas e não-indígenas. Para assumir tal tarefa, as
organizações não-governamentais deixaram seu caráter de militância e passaram a se
configurar como instituições prestadoras de serviço, enquanto órgãos do Estado assumiram
função de fiscalizador da execução das atividades.
Nos dados coletados pela pesquisa é possível vislumbrar o perfil da atuação das
organizações não-governamentais, indígenas e não-indígenas, no Amazonas. Por exemplo,
ainda que os editais de financiamento de projetos permitam a atuação de ONGs como
“proponentes” e/ou “executores” de projetos, a pesquisa nos mostra que esses papéis têm sido
desempenhados, na maior parte das vezes, pelas organizações indígenas. Por sua vez, as
ONGs aparecem nos dados levantados atuando mais como assessores técnicos na gestão
indígena dos projetos. Verifica-se também que o crescimento das organizações indígenas é
resultante do fortalecimento do campo político indígena.
Organizações governamentais
Foram levantadas informações sobre as ações governamentais nas esferas federal,
estadual e municipal, na condição de “em andamento” ou “concluídas”. De algumas
instituições governamentais foi possível alcançar dados específicos sobre sua ação (local de
atuação, povo indígena) no estado do Amazonas. Por sua vez, de outras instituições só
tivemos acesso a suas iniciativas, de um modo geral, sem alcançar sua atuação e resultados. A
seguir, quadro com as instituições pesquisadas:
138
Tabela 1
Organizações governamentais pesquisadas
FEDERAL
ESTADUAL
MUNICIPAL
Ministério da Cultura
Secretaria Estadual de
Educação
Fundação de Amparo a
Pesquisa do Estado do
Amazonas
Secretaria Municipal de
Educação
Secretaria Municipal de
Desenvolvimento
Econômico Local
Secretaria de Estado para os
Povos Indígenas
Secretaria Municipal de
Assistência Social
e Direitos Humanos
Ministério do
Desenvolvimento Agrário
Ministério do
Desenvolvimento Social e
Combate a Fome
Ministério do Meio
Ambiente
Fundação Nacional de
Saúde
Fonte: Banco de dados da pesquisa, 2009.
Optamos por apresentar neste trabalho dados sobre as seguintes instituições:
Ministério da Cultura, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome, Ministério
do Meio Ambiente, Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas e Secretaria
Municipal de Educação. Ressaltam-se dados somente dessas instituições devido à grande
concentração de projetos junto aos povos indígenas.
Ministério da Cultura
Programa: Prêmio Culturas Indígenas
No âmbito do Ministério da Cultura (MinC), a Secretaria da Identidade e da
Diversidade Cultural (SID) tem por objetivo realizar ações voltadas para o resgate e proteção
da cultura brasileira. Para tanto, o SID convocou um GT Indígena (Grupo de Trabalho
Indígena) com a finalidade de discutir e indicar políticas públicas voltadas para a cultura
indígena.
Como uma das demandas desse GT, foi elaborada a “Campanha Nacional de
Valorização da Cultura Indígena” a fim de valorizar e promover a diversidade cultural e a luta
pelo exercício dos direitos constitucionais dos povos indígenas. Essa campanha resultou na
criação do Prêmio Culturas Indígenas13 com objetivo de premiar as iniciativas culturais dos
povos indígenas que sejam relevantes para fortalecer suas expressões culturais.
13
Ação do Ministério da Cultura, por meio da Secretaria da Identidade e da Diversidade Cultural – SID e a
139
O Prêmio Culturas Indígenas teve sua primeira edição em 2006, edição Ângelo
14
Cretã . O edital resultou em quatrocentos e sessenta e sete (467) projetos inscritos, sendo
oitenta e duas (82) iniciativas premiadas. Das oitenta e duas (82) premiadas, vinte e quatro
(24) iniciativas são da Região Norte e nove (9) do estado do Amazonas. Em 2007 foi
elaborada a segunda edição – Xicão Xukuru
15
, resultando em seiscentos e noventa e seis
(696) projetos inscritos, com cento e duas (102) iniciativas premiadas, sendo quinze (15) no
estado do Amazonas.
Para concorrer ao edital Prêmio Culturas Indígenas, os povos indígenas devem
apresentar projetos, realizados ou em andamento, que contemplem expressões das culturas
indígenas (religião, rituais, festas tradicionais, mitos, histórias, narrativas orais, músicas,
cantos, danças, medicina tradicional, pinturas corporais, desenhos, grafismos, língua indígena
etc.). O edital dispõe sobre os requisitos para participar do prêmio. Nesse processo, as
inscrições podiam ser feitas pela Internet, preenchimento manuscrito do formulário ou por
meio oral, gravadas em fitas/cd. Quanto aos critérios para seleção, poderiam ser proponentes
de iniciativas para concorrer o prêmio, aldeias e/ou comunidades indígenas representadas por
suas instituições tradicionais ou organizações indígenas. O edital considera como instituições
tradicionais uma comunidade⁄aldeia, uma liderança indígena, um pajé.
Os projetos premiados constam no quadro dois (2) e três (3) e mapa infográfico16 um
(1).
organização indígena Associação Guarani Tendonde Porá.
Homenagem a Ângelo Cretã, liderança indígena Kaigang, primeiro indígena a ser eleito vereador no Brasil em
1976.
15
Homenagem a Xicão Xukuru, liderança indígena Xukuru de Pernambuco, assassinado em 1998.
16
O mapa infográfico foi feito com base no mapa "Situação Fundiária Indígena 2007" produzido pela Diretoria
de Assuntos Fundiários da FUNAI. O mapa tem por objetivo apontar o local de atuação das ações, sendo deste
modo meramente representativo.
14
140
Tabela 2
Projetos Premiados
Projetos premiados
Local de atuação (Região/ Município/ Terra
Indígena/ Comunidade)
Dança do Tracajá e
Terra Indígena Nhamundá/ Mapuera, Aldeia
do Jacamim
Kassawa, município de Nhamundá-AM
Educação e Manejo
Terra Indígena Alto Rio Negro, Comunidade
do Médio Rio Tiquié
Piro Sekaro – Distrito de Pari Cachoeira,
município de São Gabriel da Cachoeira-AM
Wadenikaa Aakhepa- Comunidades Loiro Poço, Santana, América,
Técnicas Tradicionais Urumutum Lago, São José, Cara Igarapé,
de Cerâmica Baniwa Xibaru, Miriti, São Joaquim, Andoriha, Santa
Isabel, Pirawara, Arari-pira, Vila Nova, Inambu,
Panapana, Apuí Cachoeira, Caju Ponta, Oucuqui
Cachoeira e Jurupari Cachoeira, município de
São Gabriel da Cachoeira
Valorização da
Comunidades Mu Nuhkõ, Khã Nuhkõ, Koama
língua, cultura e
Phoaye, Soma, Nahpima, Botea Wairo, Nihã
danças tradicionais
Phito e Mane Khoana Phito, município de São
dos Kotiria
Gabriel da Cachoeira
Celebração das festas Comunidades Mõopoea, Terra Indígena Alto
Tuyuka
Rio Negro
A proteção da língua Comunidades Ajuricaba, Cachoeira do Araçá e
através da
Komixi, Terra Indígena Yanomami
comunicação
Festival de Músicas
750 comunidades da Terra Indígena Alto Rio
Indígenas
Negro
tradicionais e
adaptadas dos Povos
Indígenas do Rio
Negro
Medicina Indígena
Revitalização da
língua e das práticas
culturais SateréMawé
Organização dos
professores Mura
Yrerua- Festa do
Guerreiro
Amamajo – Saída da
moça
Comunidades de Santa Rosa do Alto Rio Tiquié,
município de São Gabriel da Cachoeira
41 comunidades as margens do Rio Andirá e
Waikurapá, Terra Indígena Andirá Marau,
município de Parintins-AM
Município de Autazes-AM
Comunidades Traíra e Pupunha, Terra Indígena
Nove de Janeiro, município de Humaitá-AM
Terras Indígenas Paumari do Lago Marahã e
Paumari do Rio Ituxi, município de Lábrea- AM
Povo(s)
Hexkaryana
Tukano
Baniwa
Wanano
Tuyuka
Yanomami
Tukano,Karapanã,
Bará, Siriano,
Makuna, Baniwa,
Kuripako, Baré,
Werekena,
Tariano, Hupda,
Yuhupde, Dow,
Nadeb e
Yanomami
Tukano, Tuyuka e
Hupda
Sateré- Mawé
Mura (perto de
Manaus)
Parintintin
Paumari
141
Continuação da Tabela 2
Projetos premiados
Local de atuação (Região/ Município/ Terra
Indígena/ Comunidade)
Mucha Aketkit –
Comunidade Beija Flor, Terra Indígena Vale do
Festa da tatuagem
Javari, município de Tabatinga-AM
Encontro dos Pajés
Aldeias do Alto Rio Curuçá, Terra Indígena
Vale do Javari, município de Atalaia do NorteAM
Arte e Cultura
Comunidades Massapê, Remansinho, Bananeira
Kanamari
e Estirão do Kumaru, Terra Indígena Vale do
Javari, município de Atalaia do Norte-AM
Resgate da Medicina Aldeia Marajaí, Terra Indígena Marajaí,
Tradicional
município de Alvarães-AM
Banda Wiwirutcha
Comunidade Filadélfia, Terra Indígena Santo
Antônio, Estado do Amazonas.
Enu Irine Idakie –
Comunidade Yawisa e Aparecida, Terra
Escola e Língua
Indígena Alto Rio Negro, Estado do Amazonas.
Hekura – A Força dos Aldeias Ariabu,União e Nossa Senhora
Pajés
Auxiliadora, Terra Indígena Yanomami, Estado
do Amazonas
Políticas Linguísticas
Comunidade São Pedro, Terra Indígena Alto Rio
e Gestão de
Negro, Estado do Amazonas
Conhecimentos
Wariró – Casa de
Comunidade em São Gabriel da Cachoeira, 750
Produtos Indígenas
aldeias. Estado do Amazonas.
do Rio Negro
Watyanã – Dança da Comunidade Sateré- Mawé em Manaus,Estado
tucandeira
do Amazonas.
Povo(s)
Matis
Marubo
Kanamari
Mayoruna
Ticuna
Tariana
Yanomami
Tuyuka
22 povos
indígenas do Alto
Rio Negro
Sateré – Mawé
Arapaço
Baniwa
Baré
Desana
Kubeo
Miriti Tapuya
Munduruku
Pira-Tapuya
Siriano
Tariana
Tukano
Tuyuka
Wanano
Werekena
Wayuri “trabalho
coletivo”
Comunidades São Felipe, Ilha de Aparecida,
Ilha de Açaí, Tacira Ponta, Bawary, Yawawira,
Ilha de Flores, Sarapó, São Luís, São Miguel,
Cabarí, São Sebastião e São Joaquim Mirim.
Terra Indígena Alto Rio Negro e Terra Indígena
Médio Rio Negro I, Estado do Amazonas.
Casa de Tradição e
Cultura Kokama
Raízes da Saúde
Terra Indígena Évare I – Comunidade Sapotal
Kokama
Aldeias de Nazaré, Ambaúba,Castelo Branco,
Belém e Tayaçu- Terra Indígena Alto Rio
Negro.
Baniwa
142
Legenda
Prêmio Culturas Indígenas (projetos
premiados em 2007 e 2008)
Figura 1
Mapa com indicação dos projetos premiados em 2007 e 2008 com o Prêmio “Culturas Indígenas”
FONTE: Catálogo Prêmio Culturas Indígenas, 2008.
143
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome
Programa Carteira Indígena
O programa Carteira Indígena é uma ação desenvolvida por meio de parceria entre o
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e o Ministério do Meio Ambiente.
A finalidade desde programa é executar projetos voltados para a segurança alimentar e
nutricional e desenvolvimento sustentável de comunidades indígenas. Os projetos devem
seguir as temáticas propostas pelo programa, que abrangem: práticas sustentáveis de produção
de alimentos; práticas sustentáveis de produção, beneficiamento e comercialização da
produção agroextrativista e do artesanato; revitalização de práticas e saberes tradicionais e
apoio ao fortalecimento da capacidade técnica e operacional das organizações e comunidades
indígenas.
A Carteira Indígena financia projetos em todo o território nacional. Esses projetos
devem ser propostos pelas comunidades indígenas e apresentados, prioritariamente, através de
organizações. O programa também aceita propostas de ONGs, universidades e centros de
pesquisa.
O mapeamento identificou na Carteira Indígena sete (7) projetos no Amazonas, sendo
três (3) projetos em execução. Os projetos financiados pelo programa constam no quadro
quatro (4) e mapa infográfico dois (2).
Tabela 3
Projeto, local de atuação e povos indígenas do programa Carteira Indígena - MDS/ MMA
Projeto
Local de atuação (Região/
Município/ Terra Indígena/
Comunidade)
Povo(s)
Tia Yumaci do Rio Cuieiras
e Adjacências/ em execução
Comunidades São Tomé,
Kuanã, Barreirinha, Boa
Esperança, Nova Esperança
e Barreirinha, área do Rio
Cuieras, município de
Manaus-AM
Baré, Kambeba, Tukano,
Piratapuya, Mura, Yarumare,
Tikuna, Baniwa e Apurinã
Projeto Pajurá Kambeba
Comunidade Três Unidos,
área do Rio Cuieras,
município de Manaus-AM
Kambeba
Kakuri Poranga
Comunidade Terra Preta,
área do Rio Cuieras,
município de Manaus-AM
Baré,Yarumare, Baniwa e
Tucano
144
Continuação da Tabela 3
Projeto
Escoamento da Produção
Agrícola e Artesanal /em
execução
Local de atuação (Região/
Município/ Terra Indígena/
Comunidade)
Povo(s)
Terra Indígena Vale do Javari, Mayoruna e Kanamari
município de Atalaia do NorteAM
Projeto Vida (Comida, Saúde e Vila Batista, Vila da Paz, Nova Sateré-Mawé
Educação) /em execução
Alegria e S.Francisco, Terra
Indígena Andirá Marau,
município de Parintins-AM
Mulheres indígenas
produzindo artesanato e
melhorando alimentação
Comunidade em área urbana
no município de Manaus-AM
Tucano, Dessano,
Piratapuia, Wanano,
Baniwa, Tikuna,
Karapanã, Baré, Cubeo,
Barassana, SatereMawé, Arapasso,
Tariana e Miriti Tapuia.
Melhoria e Qualidade
Alimentar
Aldeias Kona, Raita, Pukina,
Ixina, Pohoroá, Xamatá e
Bicho-Açu, Terra Indígena
Yanomami, município de
Santa Isabel do Rio Negro
Yanomami
FONTE: Listagem dos projetos do programa Carteira Indígena no Amazonas, 2009.
145
Legenda
Carteira Indígena (projetos 2008 e 2009)
Figura 2
Mapa com indicação dos locais contemplados com o programa “Carteira Indígena” (projetos
2008 e 2009)
146
Ministério do Meio Ambiente - MMA
Programa: Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas - PDPI
O PDPI17 (Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas) é uma ação do governo
brasileiro que pretende melhorar a qualidade de vida dos povos indígenas da Amazônia Legal
brasileira, fortalecendo sua sustentabilidade econômica, social e cultural em consonância com
a conservação de seus territórios.
O PDPI tem duas frentes de atuação: 1- Apoio a projetos no nível local; 2- Apoio ao
fortalecimento institucional e a capacitação para gestão do movimento indígena. No que diz
respeito a apoio a projetos no nível local, esse apoio se subdivide em três (3) áreas temáticas:
1- proteção das terras indígenas; 2- atividades econômicas sustentáveis; 3- resgate e
valorização cultural.
O PDPI financia projetos que tenham, prioritariamente, como proponente,
organizações indígenas, mas também ONGs podem ser proponentes de projetos. As propostas
encaminhadas devem se orientar pelas linhas temáticas do PDPI. A idéia de projetos
demonstrativos é que se bem sucedidos, esses projetos possam servir como possibilidade para
a melhoria da situação de outros povos indígenas.
O mapeamento identificou no PDPI, trinta e oito (38) no Amazonas, apresentados no
quadro cinco (5) e mapa infográfico três (3).
17
Trata-se de um componente do Subprograma Projetos Demonstrativos (PDA), do Programa Piloto para a
Proteção das Florestas Tropicais do Brasil (PPG7), vinculado à Secretaria de Coordenação da Amazônia (SCA)
do Ministério do Meio Ambiente. Além do financiamento do governo brasileiro, o projeto conta com apoio
financeiro e técnico de agências de cooperação internacional dos governos alemão (KFW e GTZ) e britânico
(DFID).
147
Tabela 4
Projeto, local de atuação e povos indígenas do programa Projetos Demonstrativos
dos Povos Indígenas – PDPI
Projeto
As mulheres ticuna tecem
sua história com a
matéria-prima
Avicultura da
Comunidade de Santa
Rosa, Alto Uaupés –
Iauaretê.
Avicultura no bairro D.
Pedro Massa, Iauareté
Boas Práticas de Manejo
de Castanha.
Capacitação
Agroflorestal:
Valorização dos Saberes
Tradicionais.
Capacitação em
Atividades Produtivas.
Centro Educacional e
Cultural Tariano
Centro Turístico ÉwareAciu: Casa de Festa da
Moça Nova.
Local de atuação(Região/
Município/ Terra indígena/
comunidade)
Terra Indígena Tikuna de Santo
Antônio, Município de Benjamim
Constant (AM)
Municípios de São Gabriel da
Cachoeira e Japurá,Terra Indígena
Alto Rio Negro, Comunidade Santa
Rosa, Alto Uaupés – Iauaretê.
Municípios de São Gabriel da
Cachoeira e Japurá, Terra Indígena
Alto Rio Negro
Município de Alvarães (Médio Rio
Solimões), Terra Indígena Marajaí.
Terra Indígena Yanomami, que
abrange parte do estado do
Amazonas e Roraima.
Município de Uarini (Médio Rio
Solimões),Terra Indígena Miratu.
Municípios de São Gabriel da
Cachoeira e Japurá, Terra Indígena
Alto Rio Negro
Município de Tabatinga (Alto Rio
Solimões), Terra Indígena Tukuna
Umariaçu, Comunidade de Umuriaçu
II
Comercializando a nossa
produção, organizando a
comunidade.
Região do Alto Rio Solimões,Terra
Indígena Betânia.
Gestão dos conhecimentos
para as futuras gerações
Tuyuka.
Municípios de São Gabriel da
Cachoeira e Japurá, Terra Indígena
Alto Rio Negro.
Kãkytewakory Awine:
Casa do Povo Apurinã
Municípios de Boca do Acre e
Lábrea (Médio Rio Purus), Terra
Indigena Apurinã do Km-124 da BR317, Comunidade Camapã.
Povo(s)
Ticuna
Tariano
Dessana, Pira-tapuya,
Tariano, Tukano e
Wanana
Mayoruna
Yanomami
Miranha
Tariano
Ticuna
Ticuna
Bara, Hupdá, Karapanã,
Tuyuka e Tukano
Apurinã
148
Continuação da Tabela 4
Projeto
Kamaykocuna.
Kootiria ya Bahsa :
Projeto
Wanano
de
registro
das
danças
tradicionais.
Koyanaale:Manejo
de
recursos pesqueiros na
bacia do Içana
Local de atuação(Região/
Município/ Terra indígena/
comunidade)
Região do Médio Rio Solimões,
Terra Indígena Barreira da Missão
(município de Tefé), Cajuhiti
Atravessado (município de
Coari),Cuiu-Cuiu(município de
Maraã), Igarapé Grande(municipio
de Alvarães), Jaraqui(município de
Uarani) Marãa Urubaxi (município
de Marãa e Santa Isabel do Rio
Negro), Marajaí(municipio de
Alvarães),Meria (municipio de
Alvarães), Miratu(município de
Uarini),Porto Praia(municipio de
Uarini),Tupã-Supé(município de
Alvarães e Uarini)
Povo(s)
Kambeba, Kanamari,
Kokama,
Mayoruna,Miranha,Ticuna
Barreira como sede
Cubeo, Desana, PiraMunicípio de Japurá e São Gabriel da
Tapuya, Tukano e Wanana
Cachoeira, Terra Indígena Alto Rio
Negro.
Municípios de São Gabriel da
Cachoeira e Japurá,Terra Indígena
Alto Rio Negro.
Município de Jutaí, Terra Indígena
Macuracu
Estrela da Paz.
Municípios de Japurá e São Gabriel
Madzerukai
da Cachoeira, Terra Indígena Alto
Rio Negro.
Manejo Sustentável no Municípios de Japurá e São Gabriel
Médio Tiquié: Pensando o da Cachoeira, Terra Indígena Alto
Futuro
Rio Negro.
Mapinguarí:
Terra
Terra Indígena Coatá-Laranjal
Indígena Kwatá/ Laranjal.
Melhoria
alimentar,
Terra Indígena Yanomami, que
resgate
cultural
e
abrange parte do estado do
comercialização
de
Amazonas e Roraima.
produtos.
Região do Alto Rio Solimões, nos
municípios de Amaturá, Benjamim
Constant, Jutaí, Santo Antônio do Içá
e Tonantins, Terra Indígena Bom
Intento, Évare I, Évare II, Maraitá,
Museu Magüta: Ticuna
Matintin, Nova Esperança do Rio
Aru Ngemaügu Tchica
Jandiatuba, São Francisco do
Canimari, São Leopoldo, Tikuna de
Feijoal, Tikuna de Santo Antonio,
Tikuna Porto Espiritual, Tukuna
Umariaçu, Vui-Uata-In.
Baniwa
Cambeba,
Ticuna
Baniwa.
Kokama,
Desana, Hupdá, Miriti e
Tukano
Munduruku, Sateré-Mawé
Yanomami
Tikuna
149
Continuação da Tabela 4
Projeto
Palmeira Caranã
Pi „rasem
Piscicultura e Floricultura
Integradas na Aldeia
Umariaçu I.
Pré-projeto para garantir
o uso sustentável dos
recursos
naturais
e
realizar levantamento de
potencial econômico pra
as comunidades do médio
Rio Javari.
Projeto
Bayawi
:
Aprendizado da língua e
da
tradição
Desana
através de uma imersão
espaço
temporal
de
convivência.
Local de atuação(Região/
Município/ Terra indígena/
comunidade)
Povo(s)
Arapaço, Tapuya, Baniwa,
Municípios de São Gabriel da Baré, Cubeo, Dessana,
Cachoeira e Japurá (AM)Terra Miriti, Pira - tapuya,
Indígena Alto Rio Negro,.
Tariano, Tuiuca, Tukano,
Wanana e Warekena
Municípios de Parintins, Maués, Sateré – Mawé
Barreirinha (AM), Itaituba e Aveiro
(PA), Terra Indígena Andirá- Marau.
Região do Alto Rio Solimões, Ticuna
município de Tabatinga, Terra
Indígena Tukuna Umariaçu I, Aldeia
Umariaçu I.
Kanamari, Kulina,Matubo,
Matís, Mayoruna
Município de Atalaia do Norte,Terra
Indígena Vale do Javari
Desana, Hupdá, PiraTapuya, Tariano, Tukano,
Município de Japurá e São Gabriel da
Tuyuka-Tapuya
Cachoeira, Terra Indigena Alto Rio
Negro.
Municípios de Eirunepé,Envira,
Projeto de Atividades
Ipixuna (AM) e Tarauacá (AC),Terra
Econômicas Sustentáveis
Indígena Kulina do Médio Juruá.
Projeto de Estruturação Região do Alto Rio Negro,
da Piscicultura do Alto e municípios de Japurá e São Gabriel
Médio Tiquié e suas da Cachoeira, Terra Indígena Alto
afluentes.
Rio Negro.
Municípios de São Gabriel da
Projeto de Piscicultura do
Cachoeira e Japurá (AM) Terra
Alto Tiquié
Indígena Alto Rio Negro.
Projeto para diferentes Municípios de Pauini, Eirunepé,
atividades
produtivas Itamarati
(AM),Terra
Indígena
sustentáveis - KANAMARI Kanamari do Rio Juruá.
Kulina
Desana, Hupdá, Tuyuca,
Tukano.
Tuyúka,Maku
Tukano
Hupdá,
Kanamari
Arapaço-Tapuya, Baniwa,
Projeto
Wayuri
–
Municípios de São Gabriel da Baré, Cubeo, Dessana,
Reorganizando
e
Cachoeira e Japurá (AM),Terra Miriti,
Pira-tapuya,
fortalecendo os modos
Indígena Alto Rio Negro.
Tariano, Tuiuca, Tukano,
tradicionais de produção.
Wanana, Warekena
150
Continuação da Tabela 4
Local de atuação(Região/
Município/ Terra indígena/
comunidade)
Projeto
Projeto
Yrupema
Etnodesenvolvimento
Parintintim.
de
Município
de
Humaitá,Terra
Indígena Nove de Janeiro.
Povo(s)
Parintintim
Municípios de São Gabriel da Arapaso, Dessana, Pira –
Revitalização Cultural do
Cachoeira e Japurá,Terra Indígena tapuya, Tariano, Tukano,
Distrito de Yauaretê
Alto Rio Negro
Tuyuka, Wanana.
Região de Taracuá,municípios de
Roças Diversificadas de Japurá
de
São
Gabriel
da
Taracuá (RDT).
Cachoeira,Terra Indígena Alto Rio
Negro.
Tiemotina : Valorização
Cultural
e
Terra Indígena Yanomami (AM RR),
Sustentabilidade para as
comunidade Yanomami do Rio
comunidades Yanomami
Cauaburis e afluentes.
do Rio Cauaburis e
afluentes.
Um centro cultural em
Município de Benjamim Constant,
Porto Espiritual: espaço
Terra
Indígena Tikuna Porto
de valorização de nossos
Espiritual
costumes.
Baré, Desana, Hupdá,
Miriti, Tariano, Tukano,
Tuyúka-Tapuya e Wanana
Yanomami
Ticuna
Usucipó: Uso Sustentável Municípios de São Gabriel da Desana, Hupdá, Tukano,
do Cipó Titica do Rio Cachoeira e Japurá, Terra Indígena Tuyúka-Tapuya
Castanha.
Alto Rio Negro.
Arapaso, Baniwa, Bará,
Valorização e pesquisa de
Município de São Gabriel da Barasána, Baré, Cubeo,
artesanato tradicional das
Cachoeira e Japurá,Terra Indígena Desana,
Miriti,Piramulheres indígenas do
Alto Rio Negro
tapuya, Tariano,Tuyuka,
Alto Rio Negro.
Wanana
Waikhana
Koethiaye:
Pira-tapúya
Municípios de São Gabriel da
Revitalização das aldeias
Cachoeira e Japurá,Terra Indígena
Piratapuia com atividades
Alto Rio Negro.
tradicionais.
FONTE: Listagem dos projetos do PDPI no Amazonas, 2008.
151
Legenda
Projetos PDPI/MMA (2008/2009)
Figura 3
Mapa com indicação dos locais de atuação dos Projetos PDPI/MMA (2008/2009)
152
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas – FAPEAM
Programa Amazonas de Apoio à Pesquisa em Políticas Públicas em Áreas
Estratégicas - PPOPE
A Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas – FAPEAM foi criada
pelo governo do estado (lei n°.2743) em 2002, vinculada à Secretaria de Estado do
Desenvolvimento Econômico (SEMDEL). A partir de 2003, a FAPEAM passa a fazer parte
da estrutura da Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia - SECT, criada em janeiro do
mesmo ano.
A instituição tem como objetivo incentivar a produção de conhecimento científico e
tecnológico e sua aplicação, visando o desenvolvimento econômico e social. Para tanto, a
FAPEAM concede bolsas de estudos e apóia a implementação de ações de fomento à
pesquisa, através de programas e projetos.
Segundo o "Relatório de Atividades 2003-2008" da instituição, a FAPEAM investiu
cerca de R$ 6,1 milhões em recursos destinados a temática indígena nos seguintes programas:
1. Programa Jovem Cientista Amazônida (JCA)
2. Programa Primeiros Projetos (PPP-FAPEAM/MCT/CNPq)
3. Programa Integrado de Pesquisa e Inovação Tecnológica –PIPT
4. Programa de Desenvolvimento Científico Regional (DCR-FAPEAM/MCT/CNPq)
5. Programa de Ciência e Tecnologia para o Amazonas Verde –Edital Temático
6. Programa Amazonas de Apoio à pesquisa em Políticas Públicas em Áreas
Estratégicas – PPOPE
7. Programa de Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde (PPSUSFAPEAM/MS/CNPq)
8. Programa Amazonas de Integração da Ciência para os Povos Indígenas- PAICI
Indígenas
153
Figura 4
Mapa infográfico das ações da FAPEAM
Fonte: Relatório 2003-2008 das atividades da FAPEAM, 2009.
Dos programas da FAPEAM com ações juntos aos povos indígenas,o mapeamento
teve acesso aos projetos financiados pelo Programa Jovem Cientista Amazônida – JCA e
Programa Amazonas de Apoio à Pesquisa em Políticas Públicas em Áreas Estratégicas PPOPE. Apresentamos aqui os projetos financiados pelo programa POPPE, devido a sua
constituição: esses projetos são resultado de uma parceria entre o Instituto de Pesquisa da
Amazônia - INPA e Fundação Estadual dos Povos Indígenas – FEPI (Atual Secretaria de
Estado para os Povos Indígenas). Os proponentes dos projetos são pesquisadores vinculados
ao INPA e as propostas de projetos são demandas dos povos indígenas por meio da FEPI.
Programa Amazonas de Apoio à pesquisa em Políticas Públicas em Áreas
154
Estratégicas- PPOPE
O programa financia projetos a serem desenvolvidos por organizações governamentais
das esferas estadual ou municipal do estado do Amazonas, responsáveis pela implementação
de políticas públicas. Os projetos são coordenados por pesquisadores vinculados às
Instituições de Pesquisa e Ensino Superior também sediadas no estado do Amazonas.
O PPOPE financia atividades de pesquisa que possam beneficiar a formulação e a
implementação de produtos, processos e inovações tecnológicas vinculadas às políticas
públicas do governo do estado do Amazonas. Para tal, o programa tem os objetivos de
produzir diagnósticos e estudos aplicados que subsidiem a ação social do poder público, de
modo a permitir a formulação e implementação de políticas que respondam às necessidades
sociais existentes no estado. Uma das suas metas também é descentralizar as ações de
pesquisa (os projetos prioritários são para as fronteiras Sul e Alto Solimões do estado).
O programa prevê três fases para os projetos. A primeira fase contempla o estudo de
viabilidade da ação, consolidação de parcerias e plano de trabalho. Os resultados desse estudo
nortearam a segunda fase do projeto que é o próprio desenvolvimento da ação a ser realizada.
Os projetos POPPE estão nessa fase, que tem previsão de duração de 18 meses. A terceira
fase do projeto é a apresentação de resultados e realização de um fórum com outras
organizações governamentais e não-governamentais para a discussão de mecanismos para a
implementação de políticas públicas provenientes da pesquisa.
155
Tabela 6
Projeto e local de atuação do programa Amazonas de Apoio à pesquisa em Políticas
Públicas em Áreas Estratégicas - PPOPE/FAPEAM
Projeto
Local de atuação (Região/ Município/
Terra indígena/ comunidade)
Educação, Resgate e Revitalização Cultural
- Etnias Indígenas de Humaitá e Manicoré:
Humaitá e Manicoré
Tenharim, Parintintim, Diahoi (Jiahui),
Munduruku, Torá, Apurinã e Mura.
Gestão e Manejo comunitário de recursos
Terra Indígena Éware I e II, São Paulo de
pesqueiros na Terra Indigena Éware I, alto
Olivença e Benjamin Constant
Solimões.
Povos Indígenas situados na margem
Turismo Científico e a Etno-Conservação
esquerda do Baixo Rio Negro, Rio Tarumãna Bacia do Rio Negro
açu, Tarumã-Mirim e Rio Cuieiras
Programa FEPI-INPA: Apoio científicotecnológico para o desenvolvimento de Tabatinga, Benjamin Constant e São Paulo
unidade de beneficiamento de matérias de Olivença
primas de origem natural
Terra Indígena Kulina (comunidade
Macapá,comunidade PIAU), Terra Indígena
Kanamari
(comunidade
Flexeira,
Caracterização
epidemiológica
da
comunidade
Mamori,comunidade
mansonelose em populações indígenas no
Flexal),Terra
Indígena
Umuriaçu
estado do Amazonas
(comunidade Umuriaçu), TI Feijoal
(comunidade Feijoal). TI Ewaré I
(Comunidades Vendaval)
Sustentabilidade da extração de espécies
vegetais para a fabricação de artesanatos Meso-região do Alto Rio Negro
Tikuna na meso-região do Alto Rio Negro
FONTE: Documento institucional da FAPEAM, 2008.
156
Secretaria Municipal de Educação - SEMED
Núcleo de Educação Escolar Indígena - NEEI
Programas: Cotidiano das comunidades indígenas do Rio Negro e Cuieiras
Centros Culturais das Comunidades Indígenas urbanas - CCCI’s
O Núcleo de Educação Escolar Indígena- NEEI começou a se constituir no âmbito da
Secretaria Municipal de Educação - SEMED em 2005, quando a própria Secretaria
manifestou seu apoio à luta dos povos indígenas por uma educação diferenciada. A conjectura
política (pós-eleição municipal) propiciou que a Secretaria se posicionasse de forma prática
para a constituição deste núcleo, providenciando a inserção de profissionais do quadro da
SEMED. Assim, se iniciou o trabalho de diagnóstico, levantamento de dados sobre a situação
escolar dos povos indígenas, estudos de parcerias com organizações governamentais e nãogovernamentais e organizações indígenas a fim de constituir uma proposta de Programa de
Educação Escolar Indígena que correspondesse às expectativas dos povos indígenas no
Amazonas.
Após um ano de trabalho, pesquisas, discussões (ciclos de palestras), consolidação de
uma equipe capacitada para o desempenho do trabalho do núcleo, em 2006, o NEEI começa a
atuar propondo projetos pedagógicos para subsidiar e orientar a implantação da modalidade
educação escolar indígena. O planejamento pedagógico gerou dois projetos: 1 - Cotidiano das
comunidades indígenas do Rio Negro e Cuieiras, 2- Centros Culturais das Comunidades
Indígenas urbanas - CCCI‟s.
Esses projetos começaram a ser desenvolvidos logo após o processo de contratação de
12 professores indígenas, em maio de 2007. Os projetos são as primeiras experiências do
núcleo em relação à educação escolar indígena de fato, pois a mesma ainda era pensada com
os parâmetros da educação rural.
O projeto Cotidiano das comunidades indígenas do Rio Negro e Cuieiras têm por
objetivo desenvolver atividades voltadas à produção e publicação de materiais didáticopedagógicos, elaborados de forma conjunta pelos professores indígenas e a comunidade,
assessorados pelos técnicos do NEEI. As atividades desenvolvidas são registradas em um
diário de campo, fotografadas e discutidas na reunião mensal com todos os professores
indígenas no NEEI.
São oito (8) comunidades no rio Cuieiras, onde estão presentes os professores
indígenas: comunidade Terra Preta, São Tomé, Três Unidos, Boa Esperança, Nova Esperança,
Nova Canaã (Kuanã), Barreirinha e Igarapé Açuzinho. As duas últimas comunidades citadas
157
têm professores indígenas, mas o trabalho de educação escolar não é realizado por conflitos
na comunidade, que é composta por índios e não - índios.
As atividades do projeto, das dificuldades para realização do trabalho (conflitos entre
os professores e a comunidade, entre os professores indígenas e os não-indígenas,
impossibilidade do NEEI acompanhar o trabalho nas comunidades por falta de recursos para
locomoção), têm sido satisfatórias para um primeiro contato com a realidade da educação
indígena no Amazonas. O projeto não tem um tempo estimado de duração, e esta procurando
se estabelecer como prática de ensino obrigatória para a realização da educação escolar
indígena.
Os Centros Culturais das Comunidades Indígenas urbanas - CCCI‟s é o projeto que
tem maior acompanhamento por parte do NEEI (realização de visitas técnicas uma vez na
semana) devido este ser realizado no perímetro urbano da cidade de Manaus. O projeto se
caracteriza como atividade regular da educação formal: as crianças e jovens indígenas
freqüentam a educação formal em um horário e no outro participam das atividades dos centros
culturais, localizados nos lugares onde elas moram. Em Manaus, são quatro os CCCI‟s:
Wotchmaucu (do povo Ticuna,localizado no bairro Cidade de Deus); Associação das
Mulheres Indígenas do Alto Rio Negro – AMARN (localizado na comunidade São João, BR
174),os Kokama (localizados no Ramal do Brasileirinho, bairro Puraquequara) e os SateréMawé (localizados no bairro Santos Dumont).
Os centros culturais buscam trabalhar nas suas atividades a valorização da cultura do
seu povo, ensinar os cantos, danças e principalmente a língua. Contam com o apoio dos mais
velhos, para orientar e ensinar os mais jovens. Reflexos positivos desse projeto, por exemplo,
é que no Centro Cultural Wotchmaucu além das crianças e jovens da comunidade, participam
das atividades sete (7) crianças não-indígenas. Por fim, os Centros Culturais têm
proporcionado espaços interculturais e de fortalecimento da identidade dos povos indígenas.
Organizações não-governamentais (ONGs)
O mapeamento das ONGs18 buscou identificar organizações não-governamentais,
indígenas e não – indígenas, que desempenham ações junto aos povos indígenas no estado do
Amazonas, para compreensão da atual política indigenista e das transformações ocorridas nas
últimas décadas.
18
Realizado na pesquisa PIBIC 2008/2009: Institucionalização de ações indigenistas: identificação e análise da
atuação de organizações não-governamentais em políticas públicas no Amazonas
158
Desse modo, o levantamento pretendido não se caracteriza como trabalho de perfil
apenas quantitativo, mas sim como esforço analítico constante e reflexivo para a compreensão
dessa configuração política da relação entre organizações indígenas – Estado – organizações
governamentais.
Portanto, selecionamos as seguintes organizações: Associação Serviço e Cooperação
com o povo Yanomami – SECOYA, Operação Amazônia Nativa – OPAN, Centro de
Trabalho Indigenista – CTI, Terre dês Hommes- Suíça (TdH), Equipe de Conservação da
Amazônia – ACT Brasil (Amazon Conservation Team), The Nature Conservancy –TNC,
Conselho Indigenista Missionário – CIMI e Agência Norueguesa de Cooperação ao
Desenvolvimento – NORAD. As organizações selecionadas são uma amostra das diferentes
instituições que compõem a rede de relações que atuam sob a forma de projetos/programas
junto aos povos indígenas e suas organizações.
Associação Serviço e Cooperação com o povo Yanomami – SECOYA
A SECOYA é uma ONG que trabalha junto ao Povo Yanomami do Médio Rio Negro
do estado do Amazonas, através de ações nos campos de Educação, Saúde, Desenvolvimento
Sustentável. O trabalho com o povo Yanomami se iniciou em 1991, com ações na área de
saúde. Em 1997, essas ações se oficializaram com a criação da Associação Serviço e
Cooperação com o Povo Yanomami- SECOYA, em Assembléia de constituição, realizada em
Barcelos, com a finalidade de definir as linhas de ação e assumir maior compromisso junto ao
Povo Yanomami.
Em 1999, a SECOYA firmou o convênio com a Funasa (Fundação Nacional de
Saúde), para atender as ações básicas de saúde, no âmbito do Distrito Sanitário Especial
Indígena19 Yanomami – DSEI/Yanomami.
Em 2008, a SECOYA renovou o convênio,
ampliando sua área de atuação, contemplando cerca de 13 mil Yanomami e Ye´kuana
distribuídos em 23 pólos-bases e 188 aldeias localizadas nos estados de Roraima e Amazonas.
Área de atuação: Saúde, Educação e Desenvolvimento Sustentável.
Local de atuação: No rio Marauiá, localizado no município de Santa Isabel do Rio
Negro (1991), Rio Demini (Ajuricaba) no município de Barcelos (1997), nos rios Aracá e
Padauiri, em Barcelos (2003/2004).
19
O processo de implantação do Distrito Sanitário Especial Indígena – DSEI, iniciado em 1999, optou por um
modelo de terceirização dos serviços de saúde, concretizado por meio de convênios com organizações nãogovernamentais, sendo muitas delas, organizações indígenas contratadas para a execução integral das ações de
saúde. Mais informações na cartilha “Política Nacional de Atenção a Saúde dos Povos Indígenas –FUNASA”,
disponível em www.funasa.org.br. Acesso em 10/07/2009.
159
Povo: Yanomami
Programas/ projetos:
Programa de Educação Bilíngüe
Convênio de saúde com a Fundação Nacional de Saúde-FUNASA
Dois projetos pelo PDPI – Projetos Demonstrativos dos Povos Indígenas
“Melhoria Alimentar, Resgate Cultural e Capacitação dos Yanomami”
“Capacitação Agroflorestal: Valorização dos Saberes Tradicionais”
Um projeto pelo Programa da Carteira Indígena do Ministério de Desenvolvimento
Social e Combate a Fome.
“Melhoria e Qualidade Alimentar”
Operação Amazônia Nativa – OPAN
A Operação Amazônia Nativa- OPAN foi fundada em 1969, e desenvolve desde então
projetos junto aos povos indígenas nas regiões Centro-Oeste e Norte do Brasil. O modelo de
atuação da OPAN com os povos indígenas da Amazônia se baseia a partir das demandas
locais, onde se delineiam as propostas de atuação. Cada projeto em curso fica a cargo das
equipes formadas pela OPAN, que ficam diretamente envolvidas com o cotidiano das aldeias.
Em termos de infra-estrutura, a OPAN tem sua sede em Cuiabá, MT. Atualmente, tem
um escritório regional em Manaus, que apóia as ações do Projeto Aldeias – Conservação na
Amazônia Indígena, e bases locais nas cidades de Tefé, Carauari e Lábrea.
Outra vertente de atuação da OPAN é o curso de indigenismo oferecido aos
interessados em desenvolver trabalhos junto aos povos indígenas e integrar-se aos propósitos
e projetos da organização. Desde marco de 2009, a OPAN fez uma parceria com a
Universidade Positivo- Cuiabá, que lançou um curso de especialização em Indigenismo.
A atuação da OPAN no estado do Amazonas se concentra no Projeto Aldeias –
Conservação na Amazônia Indígena, que é um programa gerenciado pelo consórcio
OPAN/Visão Mundial20, com apoio financeiro de USAID. O projeto se desenvolve junto aos
povos Paumari, Deni e Katukina do Bia e inclui também um conjunto de ações de proteção
etno-ambiental das terras indígenas Zuruaha e Hi Merimã, em parceria com a Coordenação
Geral de Índios Isolados da FUNAI e a Frente de Proteção Etno-ambiental do Purus.
20
A Visão Mundial é uma ONG cristã criada em 1950 e presente em aproximadamente 100 países. Os projetos
promovidos pela organização são nas áreas temáticas: saúde, educação, desenvolvimento comunitário,
agroecologia, desenvolvimento econômico, promoção da justiça e direitos humanos. Disponível em <
www.visaomundial.org.br >.Acesso em: 20/04/09.
160
Os objetivos do Projeto Aldeias visam à implementação de um programa integrado
para melhorar a vigilância, a conservação da biodiversidade e o apoio a gestão de recursos
naturais desses povos indígenas. Isto será feito através da capacitação de comunidades
indígenas e de suas organizações representantes para a melhoria das atividades de vigilância,
conservação de biodiversidade e manejo de recursos naturais. Os dois eixos do Projeto
Aldeias são: (texto extraído do projeto)
a) Melhoria da conservação da biodiversidade e do manejo de recursos naturais em
cinco terras indígenas no Amazonas, através de ações de monitoramento territorial e
vigilância, mapeamento etnográfico e avaliação ecológica, desenvolvimento de diagnósticos
sócio-ambientais e de projetos-piloto para o desenvolvimento econômico sustentável,
principalmente na área de pesca sustentável.
b) Fortalecimento da organização indígena, com ações de treinamento em promoção
de direitos indígenas, programas de troca de experiências e intercâmbios entre lideranças
indígenas, construção de capacidade e desenvolvimento organizacional, fortalecimento de
alianças já existentes entre organizações indígenas amazônicas e suporte à criação de novas
alianças, e treinamento em planejamento para conservação e gestão ambiental.
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
O Centro de Trabalho Indigenista- CTI é uma organização não-governamental fundada
em março de 1979, por antropólogos e indigenistas que já trabalhavam com alguns grupos
indígenas do Brasil. Atua através de programas e projetos junto aos povos indígenas,
repassando recursos ou assessorias. O CTI tem por linhas de atuação o monitoramento da
regularização fundiária e programas de controle territorial e ambiental, implantação de
alternativas econômicas sustentáveis, programas de educação, ações e projetos culturais de
reafirmação étnica.
No Amazonas, o CTI atua na Terra Indígena Vale do Javari, estendendo-se nos
municípios de Atalaia do Norte, Benjamin Constant, São Paulo de Olivença e Jutaí, com os
povos Matis, Mayoruna, Marubo e Kanamari. Sua ação nessa área ocorre por meio do
Programa Javari, que assume ações baseadas na demanda desses povos. Junto com a ONG
Terre dês Hommes- Suíça, auxiliou a criação do Conselho Indígena do Vale do Javari
(CIVAJA). Também é parceira da Coordenação Geral de Índios Isolados da FUNAI,
realizando o trabalho de Frente de Proteção Etno-Ambiental do Purus e do Vale do Javari.
161
Terre dês Hommes- Suíça (TdH)
O Terre dês Hommes/Suíça é uma organização não- governamental criada na Suíça em
1960. Em 1972, foi criado um núcleo do TdH em Genebra, que em contato com a
Organização das Nações Unidas- ONU, resolveu estender suas ações em outras partes do
mundo, especialmente na África, América Latina e Ásia.
O TdH foi umas das organizações que deu apoio ao Movimento Indígena na década
de 80, se envolvendo nas mobilizações políticas. No início dos anos 90, uma das ações do
TdH foi o apoio a criação do Conselho Indígena do Vale do Javari (CIVAJA), fruto da
consolidação de uma ampla articulação política entre as lideranças das diversas etnias na
região do Vale do Javari.
A Terre dês Hommes/Suiça apoiou a criação de outras organizações indígenas. Em
1995, foi criada a Organização dos Povos Indígenas do Médio Purus / OPIMP. Em 1999, a
coordenação da OPIMP conseguiu junto à prefeitura a doação de um terreno em Lábrea, e as
comunidades dos povos Paumari e Apurinã uniram-se para construir a sede da organização, com o
apoio da FUNAI e da FUNASA. A partir de 1999 passou a contar com apoio da Terra des
Hommes/Suíça, o que permitiu o fortalecimento e a ampliação da atuação da OPIMP. Esse no vo
fator acabou por incentivar a criação da Associação das Mulheres do Médio Purus (AMIMP).
No ano de 2002, foi implantado o Departamento de Educação da COIAB, numa
parceria com a Terre des Hommes/Suíça. As ações passaram a ser desenvolvidas numa
parceria com o Conselho de Professores Indígenas da Amazônia – COPIAM, organização
indígena dos professores.
Equipe de Conservação da Amazônia – ACT Brasil (Amazon Conservation Team)
A Amazon Conservation Team (Equipe de Conservação da Amazônia) surgiu através
dos trabalhos do etnobotânico Mark Plotkin e a ambientalista Liliana Madrigal que
construíram uma metodologia de trabalho voltado à conservação ambiental para atuar junto
às populações tradicionais. Essa metodologia deu origem a organização Amazon
Conservation Team (Equipe de Conservação da Amazônia) ACT-Brasil, hoje presente em três
países: Brasil, Suriname e Colômbia.
O envolvimento da ACT Brasil com os povos indígenas iniciou-se em 2001, quando
formalizou um convênio com a Fundação Nacional do Índio - FUNAI para realizar o
mapeamento cultural participativo com a comunidade Kamayura, um dos14 povos que vivem
no Parque Indígena do Xingu. Em 2002, as comunidades indígenas do Parque do
162
Tumucumaque acompanharam os trabalhos que foram realizados pela ACT no Suriname e
reivindicaram a FUNAI a elaboração de um mapa cultural, reivindicação que foi atendida.
A atuação da ACT Brasil no estado do Amazonas é em parceria com a organização
Brazil Foundation21. A ação baseia-se na vigilância da região do médio Rio Negro, junto aos
povos Arapasso, Desana, Tukano, Baniwa, Baré, Tariano e Piratapuya. Esse trabalho de
vigilância é uma forma de evitar a ação ilegal de pescadores, madeireiros e garimpeiros. Na
prática, as ações de vigilância e fiscalização são executadas pelas próprias comunidades, com
apoio direto das duas instituições parceiras. O projeto está em andamento, e foi dividido em
três etapas principais: (texto extraído do projeto)
a) conhecimento dos atores locais e órgãos que já atuam na região;
b) realização de oficinas com aulas sobre direito ambiental, noções cartográficas,
técnicas de vigilância territorial e política indigenista;
c) preparação de um mapa de risco (o projeto se encontra nesta fase) que mostrará as
potencialidades e pontos fracos na conservação ambiental desta área e ira
subsidiar a tomada de ações legais junto aos órgãos federais competentes.
The Nature Conservancy - TNC
Criada em 1951, a TNC é uma organização voltada para a conservação da natureza.
Presente em mais de 30 países, a TNC atua no Brasil desde a década de 80 e tornou-se uma
organização brasileira em 1994. Sua linha prioritária de ação está relacionada a questões
ambientais, gestão e proteção de terras indígenas por meio da tecnologia do
etnomapeamento22 .
A TNC realiza suas ações no Amazonas por meio do Programa de Conservação da
Amazônia, onde estão inseridas todas as ações da organização nessa região. Os locais de
atuação do programa são as áreas: Oiapoque-Oiapoque, no extremo nordeste da Amazônia;
Roraima-Roraima, ao longo da divisa com a Venezuela; e Serra do Divisor, ao longo da
fronteira entre Brasil e Peru. Além do apoio para conservação dessas áreas, a TNC presta
assessoria para as organizações locais, com o objetivo de fortalecer as organizações de base.
21
Brazil Foundation é uma organização que concede financiamento a fundo perdido a projetos que contribuam
para a melhoria da realidade social brasileira. Financia projetos de entidades sem fins lucrativos e sem afiliação
política ou religiosa, de qualquer região do país, nas áreas temáticas de educação, saúde, cidadania, cultura e
direitos humanos.Disponível em <www.brazilfoundation.org>. Acesso em: 22/04/09.
22
A TNC define como etnomapeamento o trabalho de identificação dos recursos naturais, áreas de risco e
potencialidades realizados pelos povos indígenas.
163
Em 2006, o programa de Conservação da Amazônia auxiliou na criação do Centro
Amazônico de Formação Indígena (CAFI), juntamente com a Coordenação das Organizações
Indígenas da Amazônia Brasileira- COIAB. O CAFI é voltado para o treinamento de jovens
indígenas de toda a Bacia Amazônia, visando à formação de lideranças indígenas em técnicas
de manejo e conservação ambiental de Terras Indígenas. Atualmente, a TNC colabora com a
gestão técnica e financeira do CAFI, mais planeja entregar completamente a gestão de CAFI à
COIAB ao longo dos próximos anos.
Desde a sua fundação, o CAFI já formou 64 líderes indígenas dos nove estados
Amazônia. Outros vinte alunos estão na turma de 2009 e serão diplomados em dezembro de
2009.
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
O CIMI é um organismo vinculado a CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil) criado em 1972, num período em que o Estado Brasileiro assumia abertamente a
integração dos povos indígenas a sociedade envolvente, e a Igreja Católica, em sua atuação
missionária, começou a prestar apoio à causa dos povos indígenas. O papel do CIMI, segundo
Ramos (1984:283), foi o de transpor uma das grandes barreiras a conscientização indígena,
criando condições para que os índios trocassem experiências e elaborassem estratégias para os
problemas de abusos e espoliações a que vinham sendo submetidos. O CIMI procurou
favorecer a articulação entre aldeias e povos, promovendo as grandes assembléias indígenas,
nas quais se constituiu as primeiras agendas políticas coletivas do movimento dos índios pelo
seu direito a diversidade.
O CIMI esta estruturado em onze escritorios regionais23 e um Secretariado Nacional,
com sede em Brasília. Cada regional tem uma estrutura básica que dá apoio, orienta e
coordena o trabalho das equipes nas áreas indígenas. A ação do CIMI junto aos povos
indígenas se dá através de assessorias as organizações indígenas, intervindo como
aliado/parceiro/apoio aos projetos indígenas, influenciando em questões políticas, sem
abandonar o caráter missionário.
23
Cimi Regional Goiás/Tocantins, Cimi Regional Nordeste (estados da Bahia, Sergipe, Alagoas, Pernambuco,
Paraíba,Rio Grande do Norte, Ceara e Piauí ), Cimi Regional Sul (estados de São Paulo, Paraná, Santa
Catarina, Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro), Cimi Regional Mato Grosso do Sul, Cimi Regional
Rondônia,Cimi Regional Leste (estados de Minas Gerais, Espírito Santo e extremo sul do estado da Bahia ),
Cimi Regional Norte II (estados do Para e Amapá ),Cimi Regional Maranhão e Cimi Regional Norte I (estados
do Amazonas e Roraima).
164
Agência Norueguesa de Cooperação ao Desenvolvimento – NORAD
A Agência Norueguesa de Cooperação ao Desenvolvimento – NORAD desenvolve o
Programa Norueguês para os Povos Indígenas. Este programa foi estabelecido em1983, e foi o
primeiro programa governamental que pretendia fornecer apoio, direitamente, para
organizações indígenas locais. Hoje, o apoio da Noruega para povos indígenas é distribuído,
por meio de vários agentes: organizações indígenas, ONGs, ONGs norueguesas, organizações
internacionais e multilaterais e embaixadas da Noruega. Boa parte do apoio concentra-se
diretamente para organizações indígenas na América Latina. Atualmente, o Brasil conta com
o apoio do programa em 20 projetos [12] com 18 parceiros diferentes – nove organizações
indígenas e oito ONGs. A maioria dos projetos é realizado na região amazônica, embora haja
demanda de organizações indígenas de outras regiões do Brasil.
No mesmo perfil da NORAD, encontram-se também as organizações Deutscher
Entwicklungsdienst -DED e Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento
Internacional- USAID. Essas instituições são organizações governamentais de cooperação
técnica e financeira, que atuam através de contratos, financiamento, doações e acordos de
cooperação
24
com ONGs, organizações locais e com parceiros brasileiros e internacionais.
Essas organizações foram levantadas na pesquisa devido a sua relação com ONGs e
organizações indígenas, por meio de projetos.
A USAID concede financiamentos para consórcios – redes de projetos envolvendo
várias ONGs indígenas e não- indígenas – com os seguintes projetos:
1. Projeto ALDEIAS – Conservação Indígena na Amazônia Brasileira (envolvendo as
organizações Visão Mundial-WV e Operação Amazônia Nativa - OPAN);
2. Consórcio FORTIS (envolvendo as organizações Instituto Internacional de
Educação do Brasil - IEB, Instituto do Homem e Meio Ambiente da AmazôniaIMAZON, Associação de Defesa Etno-Ambiental -Kanindé, Conservation Strategy
Fund -CSF, Amazon Conservation Team -ACT);
3. Paisagens Indígenas Brasileiras -PIB (envolvendo as organizações The Nature
Conservancy TNC/Brasil, InstitutoInternacional de Educação Ambiental do BrasilIEB, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira-
24
O governo brasileiro tem uma experiência de longa data com cooperações financeiras e técnicas entre países.
Tal política orientou diversas ações desenvolvimentistas no país. Para compreender melhor tal temática,
CERVO (1994) e VALENTE (2007).
165
COIAB,Instituto de Pesquisa e Formação em Educação Indígena- IEPÊ e Conselho
Indigenista de Roraima -CIR).
4. Proteção Etno-Ambiental dos Povos Isolados na Amazônia Brasileira (envolvendo
as organizações Centro de Trabalho Indigenista – CTI e Fundação Nacional do
Índio - FUNAI)
Com esses dados, pode-se observar a rede de relações entre essas organizações. As
ações são conjuntas, envolvendo organizações governamentais, ONGs e organizações locais
(indígenas, por exemplo).
O apoio direto a organizações locais é uma exigência dos financiadores internacionais
que influenciou na relação entre organizações indígenas e ONGs. Assim, as ONGS aparecem
nos projetos como assessores técnicos, parceiros/ apoio, e as organizações indígenas assumem
na categoria de proponentes/gestores dos projetos.
Cenários a serem refletidos
Algumas observações sobre as organizações governamentais e ONGs
A configuração da política indigenista com a descentralização de competências da
Fundação Nacional do Índio (FUNAI) modificou o espaço de diálogo entre os povos
indígenas e o estado. As ações indigenistas, outrora concentradas em um único agente de
interlocução, passaram a ser desenvolvidas por outros órgãos governamentais. Por sua vez, os
povos indígenas para alcançar seus direitos garantidos em lei, se agregaram em múltiplas
formas de organização: associações, conselhos, organizações, cooperativas. A diversidade das
formas de associativismo25 indígena é expressa também na especificidade que congrega: um
povo indígena específico, uma determinada localização geográfica, organizações regionais,
por função/ categoria trabalhista. Também neste cenário, os parceiros/aliados conquistados
em outro contexto (ONGs ambientalistas, pró-índio, direitos humanos) também se
reconfiguraram, acrescentando à prática militante a prestação de serviços as organizações
indígenas e ao estado. Tais serviços caracterizam com ações de políticas públicas.
Nos dados coletados sobre ações governamentais, é possível ressaltar alguns aspectos
que constituem esse novo perfil de relações interétnicas. A primeira observação se refere ao
acesso aos recursos. Nos programas no âmbito federal, sobretudo, são os povos indígenas que
25
Associativismo no sentido que SCHERER-WARREN (2006:110) expõe,onde se encontram as associações
civis, os movimentos comunitários e sujeitos sociais envolvidos com causas sociais ou culturais do cotidiano,
ou voltados a essas bases. Essas forças associativistas são expressões locais e/ou comunitárias da sociedade
civil organizada.
166
devem buscar meios para acessar os recursos governamentais. Para tal, devem apresentar
projetos por meio de suas organizações (o MinC também se refere a instituições tradicionais
indígenas). Tanto a linguagem dos projetos quanto a burocracia organizacional são impasses
nessa relação. Desse modo, os espaços efetivos de diálogo não ocorrem, uma vez que o
“diálogo estará comprometido pelas regras do discurso hegemônico".
(CARDOSO DE
OLIVEIRA, 1998:180).
O mapa infográfico quatro (4) reúne as ações governamentais e ações de ONGs. Podese observar que as ações se concentram em determinadas regiões, o que revela um dado
importante: a rede de relações institucionais (organizações indígenas, ONGs, organizações
governamentais) favorece a implementação de projetos em determinadas regiões em
detrimento de outras. Depois de superado os entraves burocráticos (organização indígena
legalizada, com rede de parceiros consolidada), e com a prática e experiência nos projetos,
acessar os recursos se torna um pouco mais fácil.
Outro aspecto relevante se refere à linha de atuação dos projetos. Tanto as
organizações governamentais quanto as ONGs apóiam ações em determinadas áreas
temáticas, o que faz com que os projetos necessitem se adequar aos pré- requisitos para
obterem financiamento. Áreas temáticas como valorização cultural, proteção e fiscalização
de terras indígenas, alternativas econômicas sustentáveis são os caminhos apresentados
aos projetos indígenas. Tais conceitos revelam como as instituições pensam e os projetos, por
sua vez, revelam como as organizações indígenas se apropriam desses conceitos para
efetivação de demandas.
Por exemplo, as ações do Ministério da Cultura, por meio do Prêmio Culturas
Indígenas, se concentram em torno da valorização e resgate das expressões culturais
indígenas. A ação premia projetos em andamento ou realizados pelos povos indígenas que
contemplem essas temáticas. O Prêmio Culturas Indígenas, nos seus documentos
institucionais, justifica o resgate e valorização das culturas indígenas como um modo de
compensar esses povos que por tantos anos foram massacrados e proibidos de viver sua
cultura. Além de uma ação compensatória, entende-se a valorização como um meio de
fortalecer não só a cidadania e diversidade indígena, mas também do povo brasileiro cuja
história tem raízes indígenas.
São maioria os projetos de alternativas econômicas e geração de renda (propostas de
comercialização
de
determinados
produtos,
viabilização
para
a
comercialização,
desenvolvimento de atividades que sejam sustentáveis e ao mesmo tempo gerem renda
(criação de animais, piscicultura, produtos agroextrativistas), totalizando, por exemplo,
167
dezessete (17) projetos no âmbito do PDPI/MMA. Quanto aos projetos de alternativas
econômicas e geração de renda, observa-se que é uma demanda recorrente das comunidades
indígenas: "direitos conquistados e terras demarcadas, questões relativas ao controle territorial
e sustentabilidade tomaram conta da agenda de novas organizações indígenas” (RICARDO
apud INGLEZ DE SOUSA, 2006:41). Esses projetos suscitam outras questões: até que ponto,
é da preocupação do programa⁄projeto que se construa a ação “econômica” de forma a não
criar (efetivamente, e não apenas no discurso da sustentabilidade) dependências (as mesmas
ou novas relações)? Como fazer para que esses projetos não produzam impactos negativos às
comunidades? O que fazer para que os projetos não se tornem “produtivistas” com as mesmas
perspectivas e expectativas da economia de mercado? Essas são questões que ainda
necessitam maior reflexão.
Em relação aos projetos referentes à fiscalização e proteção de terras indígenas
apontam uma problemática comum aos povos indígenas: a invasão das terras e a escassez de
recursos naturais. Tal problema remete a soluções relacionadas à gestão territorial e manejo
de recursos, nem sempre objetivos possíveis de alcançar no âmbito de um projeto.
Ainda em relação à gestão, conservação, fiscalização, manejo das terras indígenas,
encontramos nos projetos indígenas e nas organizações, especialmente as ONGs, o discurso
ambientalista26 que se intensificou na década de 1990, a partir da Eco-9227. Concomitante as
interpretações preservacionistas, a discussão da sustentabilidade social abarcou os povos
indígenas enquanto agentes de ações de proteção ambiental que devem ser fortalecidos pelos
seus saberes tradicionais e práticas sustentáveis, portanto sujeitos importantes na preservação
ambiental (CASTRO, 2000).
Algumas observações sobre as organizações indígenas e ONGs
A grande parte das organizações indígenas está situada na Amazônia Legal e há
dificuldades de se ter um levantamento exaustivo do universo de organizações indígenas no
Brasil.28 Antes de 1988 havia apenas dez organizações indígenas - no Alto e Médio Solimões,
Manaus, Alto Rio Negro, Roraima (Albert 2000), hoje são mais de 347 nos Estados da
Amazônia Brasileira (Silva,2002).
26
Ambientalismo e política indigenista, ver RIBEIRO (2000), BARRETO FILHO (2001) e PARESCHI (2002).
Trata-se da II Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, conhecida como
ECO-92, realizada no Rio de Janeiro, onde se tratou questões referentes as mudanças climáticas e meio
ambiente.
28
Levantamentos de organizações indígenas com dados relativos ao nome, local e ano de fundação, foram
realizados por GRUPIONI (1999) para o INEP, e ALBERT E RICARDO (2000) para o ISA.
27
168
Este crescimento é resultante do fortalecimento do campo político indígena. O
movimento indígena conquistou o reconhecimento social graças à apropriação do universo
ideológico de seus aliados não-governamentais. Para Silva (2002) há dois grandes motivos da
criação dessas organizações: a necessidade de se organizar como instrumento de
representação política para a reivindicação de direitos territoriais e serviços de assistência
(saúde e educação) e a necessidade de instrumento para buscar recursos para o
desenvolvimento de projetos de apoio à produção, geração de renda, recuperação de áreas
degradadas, etc. - acesso ao “'mercado de projetos”.
Já os apoios as organizações indígenas vem de uma pluralidade de organizações: desde
ONGs religiosas até consórcios cooperação internacionais. No âmbito governamental, são
firmados convênios com as administrações municipais, estaduais ou federais, nas áreas de
educação, saúde e meio ambiente. Nesses convênios, ONGs são solicitadas para executar as
ações.
Nesse cenário, as ONGs de apoio/parceria aos povos indígenas – muitas delas surgidas
no contexto das lutas dos povos indígenas na Constituinte (1988) e da mobilização
ambientalista que se intensificou na década de 1990, a partir da Eco-92 – tem perfis distintos
de atuação. Na relação entre ONGs e organizações indígenas, muitas mudanças foram
orientadas acompanhando as lógicas de entendimento que os financiadores têm sobre as
questões indígenas. Se durante certo período houve ênfase em financiar projetos tendo na
categoria de “proponente” as ONGs, hoje não e mais assim. A partir da década de 1990, as
fontes financiadoras direcionaram recursos para as iniciativas locais desenvolvidas
organizações indígenas.
Assim, constata-se que a participação das ONGs nos projetos caracteriza-se como
cooperação técnica das organizações indígenas. Os diferentes níveis de participação dos
agentes envolvidos nos projetos como “proponentes” e “executores” variam de acordo com os
arranjos institucionais. A pesquisa permitiu a possibilidade de observar os variados
mecanismos que são postos em jogo por parte dessa frente variada de agentes nos contextos
específicos (por exemplo, são os consórcios financiados pela USAID).
Sobre “participação”, essa temática perpassa os mais diversos discursos em relação a
projetos sociais, o que inclui os projetos indígenas. No contexto dos diversos grupos sociais
alvos dos programas de desenvolvimento (sobretudo, sustentáveis), a preocupação com a
“participação” apresenta-se tanto no campo acadêmico, como também entre os formuladores e
executores de políticas publicas do setor governamental, os agentes não-governamentais e as
agências de cooperação.
169
Nos projetos indígenas, Schroder (1999) afirma que nem sempre fica claro se a
participação indígena é uma meta dos projetos ou um meio para que as metas sejam atingidas.
Em suas analises, ele argumenta que, embora participação seja um dos conceitos-chave dos
atuais discursos e políticas de desenvolvimento, no que se refere a projetos destinados as
populações indígenas, essa participação deve ser concebida de outra forma:
Não só nas diretrizes de instituições e órgãos de desenvolvimento, mas
também nos textos programáticos de muitas ONG‟s, essa importância é
realçada de forma muito genérica, nem sempre deixando claro se a
participação e uma meta dos projetos ou meio para alcançar as metas. A
participação indígena deve ser realizada em todas as fases dos projetos e ter
sua base no acesso livre a todas as informações que dizem respeito aos
projetos (o Banco Mundial fala de uma “participação informada”). Os planos
de desenvolvimento para as comunidades indígenas devem ser culturalmente
adaptados, sendo consideradas especialmente as organizações políticas,
sejam elas tradicionais ou modernas. No entanto, não se conhece nenhum
método global que garante a participação total no nível das comunidades [...]
Raras vezes sabe-se o que os próprios indígenas entendem por
“participação” [...] Experiências antropológicas mostraram que é difícil
integrar métodos participativos em sociedades que não tem tradição
nenhuma de participação no sentido ocidental e que desenvolveram atitudes
diferentes daquelas desenvolvidas pelas sociedades ocidentais, com relação a
individualidade e a solidariedade (Schroder,1999:234).
Portanto, a participação dos indígenas nos projetos configura-se como pauta de
discussão tanto para reflexão acerca dos povos indígenas quanto para a atuação indigenista, o
que necessita de maior reflexão e maior aprofundamento investigativo.
Desdobramentos da investigação proposta no projeto
Programa de Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Federal do Amazonas
(PIBIC)
Como já foi citado anteriormente, a pesquisa do mapeamento institucional gerou dois
trabalhos científicos feitos por alunos da graduação em Ciências Sociais (Luciano Cardenes
Santos e Inara do Nascimento Tavares), realizados entre 2007 e 2009, pelo Programa de
Bolsas de Iniciação Científica da Universidade Federal do Amazonas (PIBIC): Mapeamento
das instituições governamentais e não-governamentais na Amazônia Indígena: cenários a
serem refletidos (agosto 2007- junho de 2008) e Institucionalização de ações indigenistas:
identificação e análise da atuação de organizações não-governamentais em políticas públicas
no Amazonas (agosto 2008- junho de 2009). Todos os dois PIBIC foram orientados pela
Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos, como pesquisadora responsável pela
investigação do mapeamento.
170
Monografia
A aluna Inara do Nascimento Tavares fez sua pesquisa de monografia de finalização
do Curso de Ciências Sociais a partir de sua participação no mapeamento das organizações
governamentais e não governamentais (indígenas e não-indígenas) com atuação no estado do
Amazonas. Defendida em dezembro de 2009, o título da monografia faz referência direta ao
trabalho desenvolvido com sua orientadora, Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos:
Mapeamento das Instituições Governamentais e Não-Governamentais na Amazônia Indígena:
Cenários a serem refletidos.
Projetos de Pesquisa para o Mestrado em Antropologia
Os mesmos alunos que promoveram seus trabalhos de PIBIC na pesquisa do
mapeamento institucional, Luciano Cardenes Santos e Inara do Nascimento Tavares, sob
orientação da Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos, produziram projetos de pesquisa
para o Mestrado em Antropologia no Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da
UFAM a partir dos resultados do levantamento feito. O discente Luciano está em fase de
campo do Projeto de Pesquisa de Mestrado intitulado Turismo em terras e comunidades
indígenas: tradição e etnicidade na Amazônia. Os sujeitos pesquisados são os Sateré-Mawé da
comunidade de Sahu-Apé (Iranduba/Manacapuru) e o alvo da pesquisa é o projeto de turismo
que os indígenas estão desenvolvendo atualmente em sua área. A discente Inara aprovou o
projeto de pesquisa de Mestrado cujo objeto de pesquisa é a trajetória dos alunos indígenas do
Projeto de Extensão Curso de Formação de Gestores de Projetos Indígenas - Corredor Central
da Amazônia. Os dois discentes mantiveram como orientadora a Professora Dra. Maria
Helena Ortolan Matos.
Projeto de extensão
A pesquisa deu fundamento para a elaboração do Projeto de Extensão Curso de
Formação de Gestores de Projetos Indígenas - Corredor Central da Amazônia, proposto e
coordenado pedagogicamente pela Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos, que está
sendo realizado na UFAM, em cinco Módulos presenciais e de dispersão, no período de
fevereiro de 2009 a fevereiro de 2010. Os discentes do curso são indígenas de diversas etnias
da área do Projeto Corredor Central da Amazônia. O Curso citado é uma iniciativa de
extensão universitária promovida em parceria com organizações indígenas (Centro Indígena
de Estudo e Pesquisa - CINEP e Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia
Brasileira - COIAB) e o órgão do governo federal PDPI/MMA (Projetos Demonstrativos dos
171
Povos Indígenas/Ministério do Meio Ambiente).
Trabalhos Científicos da Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos
2007: ABANNE/REA- X REUNIÃO DE ANTROPÓLOGOS DO NORTE E
NORDESTE (ABANNE) e I REUNIÃO EQUATORIAL DE ANTROPOLOGIA –A
Professora Maria Helena Ortolan Matos foi coordenadora do Grupo de Trabalho Indígenas,
projetos e desenvolvimento, conjuntamente com o Professor Dr. Antonio Carlos de Souza
Lima.
2008: 26ª RBA- Reunião Brasileira de Antropologia (Porto Seguro-BA) –
Coordenadora do GT Agentes de Diálogos e Participação Indígena nas Políticas Públicas,
conjuntamente com a Professora Dra Márcia Maria Gramkow (GTZ). Neste GT, a Professora
Dra. Maria Helena Ortolan Matos apresentou o trabalho Do grupo familiar à associação: o
lugar das mulheres indígenas do Alto Rio Negro nas políticas indígena e indigenista. Este
trabalho apresentou a participação e gestão de mulheres indígenas em projetos financiados por
organizações governamentais e não-governamentais.
2010: 27ª RBA (Belém-PA). Aprovação da Mesa Redonda: Leituras antropológicas
sobre estratégias dos povos indígenas no reconhecimento da pluricidade em diferentes
Estados Nacionais. A Professora Dra. Maria Helena Ortolan Matos foi quem organizou a
mesa redonda em que discutirão as estratégias políticas dos povos indígenas no Estado
brasileiro, entre elas a participação em projetos como execução de política indigenista.
Referências Bibliográficas
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Pan-Amazônia. In: ACEVEDO MARIN, Rosa Elizabeth e ALMEIDA, Alfredo Wagner
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Não-Governamentais na Amazônia Indígena: cenários a serem refletidos. Monografia
defendida no curso de graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal do
Amazonas, 2009.
173
REGIME DE ALTERIDADES E DINÂMICA TERRITORIAL NA REGIÃO
AMAZÔNICA
José Exequiel Basini Rodriguez
Professor do Departamento de Antropologia da UFAM e pesquisador do Núcleo de Estudos da
Amazônia Indígena (NEAI/PPGAS)
Este texto é uma contribuição ao projeto Amazonas indígena: um mapeamento das
instituições e da produção bibliográfica sobre os povos indígenas do Estado PPP FAPEAM, 2007, coordenado pelo Prof. Dr. Gilton Mendes dos Santos, no qual participo
como colaborador. Ele constitui também um avanço do projeto Cartografia de alteridades
cosmológicas indígenas e de estéticas de territorialização no continuum Manaus - Alto Rio
Negro. O caso dos índios tukano, por mim coordenado, ainda dentro do mesmo programa
financiado pela FAPEAM. Insere-se dentro da grande área de conhecimento “Etnologia
Indígena” e inscreve-se dentro de um “Regime de alteridades e dinâmica territorial na Região
Amazônica”.
A relevância deste projeto explica-se pela abertura de um leque de relações sociais e
de situações históricas entre índios e não índios, objetivado através de um mapeamento
completo dos atores sociais, englobados em duas unidades político-administrativas. Em suma,
a relação entre os mesmos (tukano) e os outros (instituições, organizações, Estado, etc.). Isto
é, diversos atores sociais engajados nos processos de negociação política, o trajeto e percurso
de estratégias e estéticas envolvidas no diálogo intercultural. Para isto, mapearemos a estética
espaço-temporal deste povo indígena; as estratégias migratórias que eles desenvolvem. Assim
mesmo, observaremos as redes entre parentes e afins, seu fluxo e densidade, e suas relações
com os outros. Isto é, uma cartografia do tipo de vínculo e a espécie de troca que as
instituições estabelecem com os tukano, lócus privilegiado para a produção de saberes e
conhecimentos.
Objetivos
1. Mapear a morfologia social e a dinâmica territorial dos índios tukano nas cidades
de Manaus e São Gabriel da Cachoeira na atualidade.
2. Identificar e classificar as instituições e atores sociais que interagem com os índios
tukano nas cidades de Manaus e São Gabriel da Cachoeira.
3. Desenvolver um estudo das alteridades cosmológicas produzidas na interação entre
índios tukano e não índios.
174
4. Realizar uma etnografia dos padrões residenciais e das estéticas de ocupação
territorial dos índios tukano nas cidades de Manaus e São Gabriel da Cachoeira.
5. Estabelecer um quadro sinótico e comparativo entre os índios englobados em
diferentes unidades político-administrativas.
Principais pressupostos teórico-metodológicos
Os construtos “Estética territorial” e “Alteridades Cosmológicas” são utilizados como
noções de ordem conceitual que explicam as continuidades e transformações das comunidades
de língua tukano, em contato direto com agências de natureza política, associada e variada
(federais, estatais, municipais, religiosas, ong‟s, etc), e dentro de uma ampla territorialidade
que transcorre de Manaus ao alto rio Negro, com preferência às relações políticas e os
vínculos cosmológicos estabelecidos entre índios e não índios das cidades de Manaus e São
Gabriel da Cachoeira, assim como da região do baixo rio Uaupés (Município de São Gabriel
da Cachoeira).
A estética territorial constitui no presente projeto um recurso de ordem metodológico e
epistemológico que cartografia uma ordem particular, enquanto focaliza o olhar etnográfico
nas relações sócio-espaciais dentro de enclaves geográficos diferenciais. Em outras palavras,
os estilos de vida manifestos pelas famílias tukano, em aldeias, povoados interioranos, e
cidades de médio e grande porte como São Gabriel da Cachoeira e Manaus, respectivamente.
Ainda, as formas de se assentar e definir padrões de residência, assim como de gerar fluxos de
intercâmbio econômico, social e religioso, de articular redes entre parentes e afins, em
consonância com o rio Negro – espaço tempo polissêmico, isto é, meio de circulação, de
transporte multimodal, e de uma grande densidade simbólica, com referências históricas,
míticas e políticas, também consideráveis.
Já a pertinência das alteridades cosmológicas radica na utilização de um conceito
mais amplo que “parceria”, dentro das relações existentes entre as famílias tukano e as
agências que estes se vinculam. Dito em outras palavras, tenta-se exprimir a relação com o
“Outro” – como manifestação ontológica –, incluindo as passagens dialógicas da hostilidade e
a hospitalidade que todo encontro humano suscita (Levinas, 2005; Derrida, 2003; Todorov,
1999); e os “outros”, em sentido político, social, xamânico, com apelo a noção de pessoa, de
gente, de espíritos auxiliares e qualquer outra noção que envolva a qualidade e o tipo de
vínculo produzido dentro de situações históricas de contato, entre sociedades regionais,
populações indígenas, instituições governamentais e não governamentais agências militares,
175
políticas, acadêmicas, religiosas, econômicas, entre outras, dentro de contextos glo-locais e
tradições de conhecimento (Souza Lima, 2002). Em suma, tenta se entender um regime de
alteridades num presente etnográfico, mas, com base em referências históricas registradas na
ampla região amazônica em questão, particularizando nos municípios de São Gabriel da
Cachoeira e no Município de Manaus, Estado do Amazonas, Brasil.
Agenciamentos
O agenciamento das máquinas estatais e as linhas de fuga das sociedades sem estado
ou com outro tipo de lógica territorial (Deleuze, 1987; Foucault, 1971; Clastres, 1990;
Deleuze & Guatari, 1997ª e 1997b), a captura de alteridades ocidentais por parte de nativos
ameríndios (Severi, 2000; Taussig, 1993) ou os englobamentos hierárquicos das sociedades
de castas orientais (Dumond, 1966), e as versões sobre o outro exótico (orientalismo,
indigenismo) (Said, 1990); todas elas constituem expressões culturais que introduzem trocas
de perspectivas, dentro de cosmologias, como as que sustentam o capitalismo (Sahlins, 2001),
e onde se produzem incorporação de modos diversos de vida.
Nesse sentido, e desde o arcabouço teórico-metodológico previamente apresentado,
procedemos a conhecer, por um lado, o ponto de vista das comunidades de língua tukano em
Manaus e São Gabriel, assim como a justificativa das agências colaboradoras que
desenvolvem políticas indigenistas e/ou práticas de intervenção através de programas junto às
populações indígenas.
Questões chaves
Procura-se identificar o tipo de parceria institucional das agências com comunidades
de língua tukano: explorar o tipo de agenciamento (construção do vínculo, alianças), modelo
de atuação, justificativa racional da iniciativa, análise das cosmologias que a parceria
exprime, isto é, as alteridades compreendidas como incorporação do outro para diferentes fins
e não meramente como estratégia política.
Aspectos relevantes levantados na pesquisa participativa
o Natureza da instituição (“razão de estar”, objetivos, metas, metodologia de
trabalho).
o Perfil de seus integrantes.
o Trajetória da instituição na região (histórico, reivindicações, projetos, planos de
gestão, atores sociais, continuidade ou transformações na condução política do
órgão).
o Política indigenista e modelo indigenista.
176
Instituições consultadas na pesquisa em andamento
Para este fim foram consultadas as seguintes instituições: FOIRN (Federação das
Organizações Indígenas do Rio Negro), ISA (Instituto Socioambiental), CIMI (Conselho
Indigenista Missionário), COIAB (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia
Brasileira), SALESIANOS, COMANDO GERAL DA AMAZÔNIA, FUNASA, FUNAI
(Fundação Nacional do Índio), IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente), ICM BIO
(Instituto Chico Mendes), LICENCIATURA INDIGENA, IFAM (Instituto Federal do
Amazonas) ex Escola Agro-Técnica de SGC, SEDUC
(Secretaria Estadual de Educação), Prefeitura Municipal de São Gabriel da Cachoeira,
Secretaria Municipal de Educação, COPIAR (Comissão Professores Indígenas do Alto Rio
Negro), APIARN (Associação de Professores Indígenas do Alto Rio Negro), AETYM
(Associação das Escolas Tukano Yepa Mashã).
Considerações a respeito da base de dados institucionais
Destacamos a relevância da base de dados sobre as instituições, criada no marco do
Projeto Amazonas indígena: um mapeamento das instituições e da produção bibliográfica
sobre os povos, uma vez que ela fornece informações fundamentais sobre as agências de
contato indígena e indigenista.
O “tipo” organizacional define dentro desta base duas classes: 1) indígenas e 2) não
indígenas. Ainda, poderíamos a essa tipologia, acrescentar outro dado, o fato que são
organizações não governamentais dirigidas por indígenas, por exemplo: FOIRN e COIAB; e
outras indigenistas, como, por exemplo, o CIMI. Tanto as indígenas como as indigenistas
podem ser mistas, ou seja, integradas com membros dos povos indígenas e não indígenas. No
entanto, um elemento que define a condução política da organização é o estatuto. Esse
regimenta a conformação do quadro dirigente de primeiro escalão, a coordenação e a
diretoria, assim como a hierarquia que referencia a natureza política de determinada
organização. Por exemplo, CIMI remete-se ao Conselho Nacional de Bispos Brasileiros CNBB para financiar e gerenciar seu organograma.
Outrossim, algumas destas, possuem objetivos específicos que definem sua orientação
profissional, embora não delimitem à priori sua área de atuação e a população alvo. Trata-se
do Instituto Socioambiental – ISA e Fundação Vitória Amazônica – FVA cujo foco não são
os indígenas senão o componente social e ambiental das populações amazônicas, do rio
Negro.
177
Têm também modalidades associativas diferentes, algumas são organizações,
cooperativas
agropecuárias,
fundações,
agências
financiadoras,
organizações
não
29
governamentais internacionais e nacionais, associações de trabalhadores rurais , federações
de povos indígenas de diferentes regiões, coordenadoras de organizações indígenas de uma
ampla região, como a COIAB, que atinge a Amazônia Brasileira. Em outras palavras, estamos
frente a diferentes prerrogativas sociais e representatividades, englobando atores
diferenciados com identidades também diferenciadas: trabalhadores rurais, artesãos,
professores indígenas, comunitários indígenas, pesquisadores, comunitários ribeirinhos,
quadros dirigentes que coordenam ações em regiões, entendidas como terras indígenas,
unidades de conservação, territórios linguísticos etc. Outras instituições têm atuações mais
pontuais, como as casas de estudantes indígenas.
Também as instituições citadas na base de dados representam em certas instâncias
várias organizações, como FOIRN, que é a mais antiga e profissional de todas as entidades
indígenas, e que reúne mais de 50 organizações de base.
As instituições também utilizam diferentes marcos de fronteira e elementos
classificatórios dentro de uma orientação geopolítica que reúne logística, tática e estratégia de
intervenção social diferenciada. Por exemplo, a Fundação Nacional de Saúde orienta-se para o
atendimento da saúde dos povos indígenas a partir da idéia de “distrito”. Os Distritos
Sanitários Especiais Indígenas – DISEI, que têm o comppromisso de atender a saúde das
populações indígenas do Brasil, responsabilizam-se por vários municípios, como o caso do
DISEI do alto rio Negro, que atinge os Municípios de São Gabriel da Cachoeira, Barcelos e
Santa Isabel. Cada distrito é atendido por meio de equipes volantes de saúde indígena. As
aldeias indígenas possuem, à sua vez, um agente indígena de saúde – AIS, que é um
funcionário contratado dentro do convênio entre FUNASA e outra instituição do município.
Mas sua função subordina-se às orientações recebidas pela equipe técnica de saúde indígena.
No entanto, esta instituição tem profissionais que permanecem in situ, em determinados
enclaves chamados Pólo Base, locais que sediam uma região, por exemplo, Taracuá no Baixo
rio Uaupés no Município de São Gabriel da Cachoeira. Esse Pólo Base conta com uma infraestrutura sanitária básica, uma pequena farmácia e uma sala para atender aos pacientes. Achase também uma equipe em área (enfermeiro, auxiliar de enfermagem), ou pelo menos um
auxiliar de enfermagem ou um laboratorista que permanece em cada pólo. O DISEI de SGC
organiza-se em 19 pólos base.
29
Porém, outra categoria mais englobante é o trabalhador rural indígena e também os artesãos indígenas.
178
Já, a FUNAI, tem outro tipo de geopolítica, ela vai organizar seu campo indigenista
baseado numa outra ideia de região, aquela que passa ser oficializada por meio da demarcação
de Terras Indígenas, categoria de ordem jurídica. Por outro lado, a FOIRN correlaciona
coordenadorias com regiões. Um exemplo disso é a divisão política – administrativa no Rio
Negro: 1. Baixo Uaupés e Médio Tiquiê; 2. Médio Uaupés e Papuri (fronteira com
Colômbia); e. Içana – Iaiari; 4. baixo Rio Negro: Santa Isabel e Barcelos; 5. Rio Negro – Ixié.
Já o Exército, na esfera da Amazônia Brasileira, concentra seu centro de operações no
Comando Geral da Amazônia, e dentro de uma cadeia de mando e prioridades operacionais,
organiza e projeta as diretrizes e os objetivos de intervenção: o conceito de soberania
territorial e segurança nacional, através de uma política de fronteiras e de combate ao
narcotráfico na fronteira com a Colômbia. Neste sentido atua a partir dos pelotões de fronteira
e de seus batalhões de infantaria, engenharia e de selva nas sedes municipais.
A partir das agências previamente mencionadas, poderíamos incluir tipos de
referencialidade, ou seja, instituição civil ou militar, religiosa - humanista religiosa
confessional; e, ainda no caso de órgãos públicos, definir sua ingerência e jurisdição:
municipal, estadual, federal.
Também existem instituições de abrangência diferenciada, mas, com universos
populacionais comuns, que realizam “ações coordenadas” e “alianças estratégicas”. Esse tipo
de cooperação interinstitucional acontece atualmente entre órgãos federais indigenistas
(FUNAI) e federações indígenas regionais (FOIRN) no Município de São Gabriel da
Cachoeira. O principal objetivo consiste em articular práticas de “inclusão cidadã” e assegurar
o usufruto dos benefícios sociais constitucionais. Trata-se da implantação do “Balcão dos
Direitos”, um Programa financiado pelo Governo Federal, destinado à efetivação dos direitos
indígenas, e que em alguns municípios o recurso é gerenciado pela prefeitura a partir de um
programa municipal denominado “Balcão da Cidadania Indígena”.
Uma primeira análise da situação, em termos gerais, nos leva a compreender um
contexto multivariável, no nível da distribuição espacial das intervenções sociais realizadas
pelas associações e as agências de cooperação. Também, os englobamentos e hierarquias, que
às iniciativas coletivas empenham, a partir das orientações políticas das instituições. Daí que a
Amazônia Indígena possa ser também apreendida como uma categoria mais ampla que a
territorialidade demarcada constitucionalmente para os povos indígenas; ainda mais, ela
compõe um mosaico de códigos que se reportam na etno-história, na história das tradições
indígenas, na literatura oral e nas narrativas nativas, em contextos de fricção, resistência e
negociação, com as tradições de conhecimento das sociedades regionais (escravista,
179
sertanista, religiosa, positivista, neo-indigenista, etc); os ciclos econômicos e os regimes
socioespaciais estabelecidos a partir do contato com as populações nativas (Albert & Ramos,
2002); tudo isto, dentro de uma área com muitas marcas e traças, produto de contínuas
viagens e mapeamentos desde o século XVII à atualidade, e de consideradas transformações
ambientais e impactos culturais.
Finalmente, cabe destacar, que a maioria das instituições e atores justificam sua
presença in loco no reconhecimento efetivo do estilo de vida das comunidades tradicionais
amazônicas, através de programas de apoio e cooperação, projetos cooperativos e
associacionistas, objetivação de infra-estrutura, referencialidade logística e uso de tecnologias
expansivas ou apropriadas.
A “questão indígena”, nominação dos movimentos sociais na década dos 80 e 90 no
Brasil para identificar as ações de defesa das populações autóctones; e superação heurística do
“problema indígena”, a partir das críticas ao indigenismo mexicano na década dos 60 (Armas,
1979; Marroquin, 1977); vincula demandas históricas de terra, educação e saúde, somando
atualmente o desafio de implantar modelos de economia sustentável para as comunidades
localizadas nas margens das águas pretas, isto é, com limitados recursos naturais.
Considerações gerais sobre a base de dados bibliográficos do projeto Amazonas Indígena
Em primeiro termo consideramos de grande utilidade a estrutura organizacional da
base de Dados Bibliográficos enquanto discrimina itens substanciais30 para identificar,
classificar e selecionar informações sumamente úteis para qualquer pesquisador que deseje
iniciar e/ou aprofundar um estudo da Amazônia e dos povos que nela habitam,
temporalizando e espacializando esse tipo de presença.
Destacamos a existência de 1.863 títulos, quantidade relevante para o projeto
PPP/FAPEAM em andamento. Já para os fins do projeto “Cartografia das alteridades
cosmológicas e as estéticas de territorialização...” é prestadora de uma importante utilidade ao
fornecer uma variedade significativa de títulos, de fácil acesso e rápida identificação no que
diz respeito à localização dos exemplares. Ainda, enquanto expõe de forma breve e concisa
(sinopse) o assunto chave da obra. Também ponderamos a guia de fontes sobre os POVOS
DA AMAZÔNIA que contribuem ao conhecimento da história indígena e do indigenismo,
conteúdo em arquivos brasileiros e acervos das capitanias.
30
Os itens desta base são: Identificação da Base, Identificação Numérica, Tipo, Título, Local, Editora, Data,
Edição, Coleção/Volume, Região, Palavras Chave, Sinopse, Localização Institucional, Povo, Conteúdos, Obra
Indígena.
180
No que diz respeito à nossa pesquisa constitui uma importante contribuição, pelas
referências estabelecidas para o povo e a região de nosso estudo, como para outros assuntos
que podemos reclassificar em novos temas e subtemas. A citar, índios tukano, política
indigenista no Amazonas, etnia e urbanização no alto rio Negro, rio Uaupes, rio Negro,
“cultura de fronteira”, movimentos indígenas, saúde e intervenção social, relatos de viajantes,
etc. Também porque essa sincronia pode se cruzar com aspectos diacrônicos achados nas
próprias fontes, quando apresentam transformações nos regimes ameríndios, relações entre
tradição e modernidade, políticas públicas, entre outras.
Em relação ao item TIPO podemos achar os documentos em diferentes formatos e
suportes, isto é, artigo, livro, dissertação, tese, DVD, CD – Áudio, CD RAM.
A tabela sobre os POVOS DA AMAZÔNIA possui vários indicadores de
identificação, e só acrescentaria a pertinência do uso de identificação mediante etnônimo,
nome genérico e outros nomes. Por exemplo, Ye‟pâ Masha (etnônimo), nome genérico
(tukano), outros nomes (tucano, desea).
Uma última consideração, diz respeito ao critério de construção da base de dados
bibliográficos e suas possibilidades de expansão31, enquanto oferece recursos técnicos para
poder sempre estar se alimentando e aperfeiçoando. Acreditamos que tal estratégia constitui
um aspecto substancial para prever e corrigir as defasagens dos dados coletados por diversos
pesquisadores, diferentes instrumentos e registros realizados, assim como efetuar atualizações
periódicas que em muitas outras bases de dados significa uma importante dificuldade técnica.
No item tukano, estabelecemos uma classificação interna a partir de tópicos
estruturais, e outros de interesse da pesquisa. Observamos como forma prática de
identificação e classificação a própria identificação numérica. Neste sentido temos
estabelecido o seguinte ordenamento para o item supracitado: parentesco (1058, 1602); língua
(316, 385, 1138, 1142, 1493, 1785, 1786); mitologia (100, 317, 381, 732, 1405, 1491, 1505,
1535); rituais (1754); histórias ( 1404, 1508, 1528, 1595,1601, 1806, 1815, 1835); narrativas e
literatura oral (56, 576), mudança cultural e contato no alto rio Negro (319, 320, 321, 404,
718*); patrimônio e arqueologia (133); arquitetura e cultura material (332, 565);
territorialidade (881, 1400); organização social (353); etno-história (622).
Outros itens englobam títulos referidos ao rio Uaupés (268, 280, 287, 351, 1282,
1283, 1792, 1796, 1803, 1807, 1817*); ao rio Negro (387, 399, 446, 526); entretanto os
relatos de viajantes e as notas de viagem referem-se aos rios supracitados e ao rio
31
Recurso e critério que também amplia-se para a Base de Dados de Instituições.
181
Amazonas (194, 209, 214*, 298, 620, 621, 744).
Outros itens foram ponderados em função da área de intervenção social das
agências, que classificamos em: Educação (61, 123, 130*, 175, 1808); Saúde (130, 307, 569,
1197, 1158, 1199, 1203, 1207, 1213, 1521, 1788); e por atores e instituições de intervenção:
movimentos indígenas (79); patrões e fregueses no alto rio Negro (80, 554); agencias de
contato (modelo dos índios Tikuna) (772); política indigenista no Amazonas e o SPI: 1910 –
1932 (173, 260); diretório dos índios (598).
Outros assuntos selecionados foram: sociedade cabocla (85); espaços de terror
(1313), xamanismo (poderes da fala) (570*, 573, 574, 985); cultura de fronteira e geopolítica
(280, 527*, 899, 1817*, 1823); índios em Manaus (87, 1510, 1511, 1821, 1822); povos do
alto rio Negro (1401, 1506); etnia e urbanização no alto rio Negro (91, 1271, 1286, 1287,
1507); diagnóstico socioambiental (1290, 1291, 1841); simpósios Povos alto rio Negro
(104, 993); baixo rio Negro (1804*); georeferenciamento e mapas (1293).
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