Mineração na Amazônia - Piquiá de Baixo

Transcrição

Mineração na Amazônia - Piquiá de Baixo
Mineração na Amazônia:
Estado, Empresas e Movimentos Sociais
www.forumcarajas.org.br
São Luís/Maranhão/Brasil
2010
Centro dos Direitos das Populações da Região de Carajás - Fórum Carajás
Programa: Siderurgia na Amazônia- Projeto “Políticas Públicas e Sustentabilidade da Região de Carajás”.
Coordenação Executiva do Fórum Carajás:
Antonio Gomes de Morais, Edmilson Pinheiro e Jean Carlos Santos
Conselheiros: José Maria Araújo, Izabel Santos Lisboa, José Raimundo Rodrigues, Carlos Augusto Veloso, Maria Carmélia Costa Borges, Fábio Pierre Fontenelle Pacheco, Alberto Cantanhede Lopes, João Fonseca dos Santos, Raimundo José Pereira Ferreira, Josefa Andreza Alves, Maria da Graças Costa Martins,
Saulo Pastor dos Santos, Elton Carlos Araújo Alves e Diarmondes Alves Paixão.
Apoio: Misereor
Textos: Rogério Almeida, Marluze Pastor; Padre Dario Bossi, Padre Edilberto Sena, Gilvandro Santa
Brígida, Raimundo Gomes, Manoel Paiva, Airton Pereira, José Batista Afonso.
Capa: Carlos Latuff (www.latuff2.deviantart.com)
Projeto Gráfico: Linna di Castro
Organização: Rogério Almeida (http://rogerioalmeidafuro.blogspot.com/)
Colaboração: Cristiane Rocha / Edmilson Pinheiro (Secretario Executivo)
Fotos: Rogério Almeida, Nils Vanderbolt, Guto, Murilo Santos, Roberto K-Zau, Gilvandro Santa Brígida,
Arquivo Fórum Carajás
Fórum Carajás
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CEP: 65040-000 São Luís/MA/Brasil
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Mineração na Amazônia: Estado, Empresas e
Movimentos Sociais
04
Contrário me dê licença para contar essa história
07
Impactos e resistências em Açailândia, profundo
interior do Maranhão.
22
Itupanema em meio ao projeto Albras - Alunorte:
o desencantamento do mundo.
33
Energia limpa na ponta e desgraça na fonte,
resultado de mega hidrelétricas na Amazônia.
45
Geração de energia na Amazônia caso de Estreito
em questão.
48
Grandes Projetos na Amazônia: mineração em
Juruti e a produção de energia.
54
Grandes projetos no município de Barcarena:
conflitos sociais e ambientais
59
A exploração mineral e suas consequências na
Amazônia brasileira
63
MINERAÇÃO NA AMAZÔNIA:
ESTADO, EMPRESAS E MOVIMENTOS SOCIAIS
O
extrativismo tem regido a economia na Amazônia. O ciclo mais recente é o mineral, iniciado a partir
da década de 1950 do século passado, no estado do
Amapá, quando o mesmo ainda tinha o status de território.
A exploração do manganês na Serra do Navio
foi ponta pé inicial. A experiência durou apenas cinco décadas. Ficou apenas o buraco, literalmente.
A exploração mineral no Amapá, considerada a primeira na Amazônia, foi ativada pela empresa
estadunidense de Daniel Ludwig, a Bethlehem Steel Company em sociedade com o empresário Augusto Trajano de Azevedo Antunes, dono da Indústria e
Comércio de Mineração S/A (ICOMI).
O ciclo da mineração ganhou maiores proporções na Amazônia a partir da região de Carajás;
com a presença da Vale na extração do minério de
ferro na década de 1980, no sudeste do Pará, é com
as atividades de prospecção inauguradas no regime
militar.
O processo da transição democrática descortinou outros cenários na economia, política e na
sociedade civil brasileira. Ainda que prepondere o
constrangimento econômico e político em processos
de definição de instalação de grandes projetos, há
alguns avanços no campo normativo.
No entanto, tais avanços - se tratados assim
- carecem de aperfeiçoamento ou uma refundação.
Para a instalação de grandes projetos o empreende-
dor é obrigado a atender uma série de exigências.
Como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e o Relatório de Impacto Ambiental (Rima), que devem ser
apresentados em audiências públicas. Sob um grave
problema, a assimetria de forças entre as parte envolvidas: grandes empreendedores versus comunidades tradicionais.
O processo é marcado por uma infinidade
de limites, que passa pela incorreção e manipulação
dos EIA/RIMA, não publicização das informações e
a cobertura da mídia marcada pela parcialidade. O
que denuncia a fragilidade da democracia nacional,
que não universaliza o acesso ao direito. E, que às
vezes, exibe as nuances autoritárias do Estado.
E por falar em Estado, ele ainda é o principal indutor da economia. Se no período da ditadura
o Banco da Amazônia (Basa) e a Superintendência
de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) configuraram-se com as principais instituições, nos dias
atuais o protagonismo recai sobre o Banco Nacional
de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
Ladeado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
A atuação da instituição tem ultrapassado a
fronteira nacional. Advoga-se que a mesma exerce
um papel estratégico em escala continental. E as
agências multilaterais são o centro de gravidade na
definição de políticas de desenvolvimento para o
Brasil e a América Latina.
Observa-se ainda outras diferenças nas políticas para a Amazônia. Na ditadura imperaram os
cobre no município Canaã dos Carajás, e outros minérios em São Félix do Xingu, Xinguara, Ourilândia
do Norte e tantos outros. No município de Barcarena as fábricas de produção de alumina e alumínio da
Vale passam por uma ampliação da produção, que
dialoga com o aumento da produção de energia da
hidrelétrica de Tucuruí e a construção de outras usinas hidrelétricas e mesmo termoelétrica. A energia é
o principal insumo das empresas de eletro-intensivo,
como as de produção de alumínio.
A construção de termoelétrica no município
de Açailândia, oeste do Maranhão, a presença da
empresa Suzano Celulose, a construção da Ferrovia
Norte Sul, bem como a construção da Hidrelétrica
de Estreito constituem elementos recentes que reconfiguram a paisagem física, econômica e humana
da região. Assim como em São Luís, capital do Maranhão, os portos experimentam uma ampliação.
Não se sabe exatamente o que vem ocorrendo na região. Há informações fragmentadas compartilhada nos espaços de encontros e desencontros que
as redes de organizações sociais proporcionam.
É nesse sentido que nasce o projeto em aglutinar neste livro artigos que atualizem as dinâmicas
nos municípios de São Luís, Açailândia e Bacabeira
no estado do Maranhão; e no município de Barcarena e regiões sudeste e sudoeste, Carajás e Tapajós/
Xingu no Pará.
pólos de produção, madeira pecuária e extrativismo
mineral. Enquanto hoje despontam os eixos de integração, transporte multi-modal, comunicação e
infraestrutura.
É creditado a Eliezer Batista, ex-executivo
da Vale, a construção do mapa das riquezas naturais
na América do Sul. Batista é pai de Eike, festejado
como o novo bilionário nacional. Obra do acaso?
Os levantamentos de Batista foram encomendados pela Corporação Andina de Fomento (CAF).
A CAF é um dos agentes do projeto de Integração da
Infra-estrutura Regional Sul-Americana (IIRSA).
Do conjunto de 10 eixos de integração, quatro se destacam, por suas riquezas naturais e possibilidades de conexões: o Amazonas, A Hidrovia
Paraná-Paraguay, o Capricórnio e o Andino. O objetivo central, prima em facilitar a circulação de mercadorias.
O eixo do Amazonas compreende os seguintes países: Colômbia, Peru, Equador e Brasil. Visa
criar uma rede eficiente de transportes entre a bacia
Amazônica e o litoral do Pacífico, com vista à exportação.
No mundo do Brasil, alguns se arriscam em
pontuar que o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) é uma miniatura do IIRSA.
Há algo de novo o ‘front’?
Parece que sim. O aprofundamento da pressão sobre as riquezas naturais, a organização das
grandes empresas em consórcio, em particular para
a construção de hidrelétricas. No Maranhão, Pará e
Tocantins surgiram inúmeras frentes de extrativismo mineral. No Pará há registros da amplificação
do extrativismo que ultrapassa a celebrada mina de
Carajás.
A oeste do estado o município de Juriti acaba
de entrar no clube dos municípios minerários. Em
Juruti a empresa estadunidense, Alcoa explora bauxita. Matéria prima para a produção de alumínio.
Num processo de instalação marcado por capítulos
nebulosos, que exigiu a mediação do Ministério Público Federal (MPF). Dois ex-secretários de meio
ambiente do estado respondem a processos por conta de não atenderem a recomendações do MPF.
Já no sudeste a Vale inicio a exploração de
MINERAÇÃO NA AMAZÔNIA:
ESTADO, EMPRESAS E MOVIMENTOS SOCIAIS reúne sete trabalhos que buscam
pontuar elementos que podem ser considerados novos, e outros nem tanto assim, como a condição colonial. Condição econômica baseado no extrativismo.
Os trabalhos iformam que empresas pressionam sobre a terra e os recursos naturais. Indicam os
impactos dos investimentos para as áreas e populações afetadas, e questionam o papel do Estado e as
ações que as organizações de base promovem para a
ampliação de direitos.
A Engenheira Agrônoma Marluze Pastor recupera a ação do Fórum Carajás no acompanhamento
das frentes de mineração na Amazônia, em particular na região de Carajás. O padre Dario Bossi pontua
as questões que afetam o município de Açailândia, e
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Fórum Carajás outubro de 2010
oeste do Maranhão, em particular sobre o pólo de
gusa, os passivos sociais e ambientais. E as lutas e
mobilizações da comunidade de Pequiá. Além de
explicar o nascimento da iniciativa Justiço nos Trilhos.
Raimundo Gomes, Airton Pereira e José Batista Afonso investigam as recentes tensões no sul e
sudeste do Pará, em particular da Vale e as formas
de resistência das comunidades tradicionais. O padre Edilberto Sena, do município de Santarém, faz
uma leitura que ajuda a entender os novos grandes
projetos a oeste do estado, em diálogo com as macro-políticas. Trata-se de uma peça esclarecedora.
Manoel Paiva e Gilvandro Santa Brígida, ex
dirigentes sindicais no município de Barcarena, esclarecem sobre o embate entre as grandes empresas
que operam na cidade. Entre elas a Alunorte e Albras, controladas pela Norsk Hidro (Noruega). Não
escapam às análises dos autores a Imerys Rio Capim,
Pará Pigmentos e a Rio Campi Caulim. E mesmo os
projetos em andamento, como a construção de uma
termoelétrica e a Companhia de Alumina do Pará
(CAP). Rogério Almeida, jornalista, aborda o polêmico projeto de extração de bauxita no município
de Juruti, no oeste do Pará e a construção da hidrelétrica de Estreito, no município homônimo, no oeste
do Maranhão.
Os autores dos artigos conhecem com proximidade as realidades aqui tratadas. Apesar de serem
realidades ocorridas em estados diferentes estão enlaçadas por questões comuns, como a subordinação
da terra ancestral à lógica do capital, a partir da posse privada em detrimento da coletiva.
A obra denuncia passivos sociais e ambientais, o poder das empresas e a coerção que o capital
acaba provocando para atropelar os marcos legais. E
ainda as mobilizações das comunidades ancestrais e
de assessoria. As tensões registradas e os constrangimentos para a aprovação dos empreendimentos
evidenciam a delicada situação da democracia nacional.
Mesa: O conflito entre a Vale e o Meio Ambiente no Fórum Social Mundial, Belém-PA / 2009 (foto: Fórum Carajás)
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Contrário me dê licença para
contar essa história
Marluze Pastor, Engenheira Agrônoma, MSc em
Agroecologia é consultora do Fórum Carajás1
A
A liberdade é para todos nós
Não tem censura para calar nossa voz 2
história do Fórum Carajás, iniciada em1992, é resultado de iniciativas adotadas pela sociedade civil, para intervir nas políticas, nos projetos e plantas industriais causadores de danos
sociais e ambientais. Na época, Fernando Collor de Melo era presidente do Brasil, Edson
Lobão e Jader Barbalho eram governadores, respectivamente, do Maranhão e do Pará. Os conflitos de terra
nesses estados recrudesciam, entre 1985 e 1995. Neste período foram computadas pela Comissão Pastoral
daTerra( CPT) 45 mortes no campo no Maranhão e 67 no Pará. A concentração fundiária estava no seu
patamar mais alto, conforme Índice de Gini3 , em torno de 0,85 %; os recursos naturais eram utilizados para
acelerar o processo de enriquecimento de grupos econômicos. A região e Carajás era área atrativa para
investimentos. Várias siderúrgicas( convidadas pela CVRD) já estavam instaladas: Companhia Siderúrgica
do Pará (COSIPAR), (1988) em Marabá a Siderúrgica Viena, (1988) e Vale do Pindaré, (1988) Açailandia.
1 Este texto teve a colaboração de Edmilson Pinheiro, Secretario Executivo do Fórum Carajás.
2 Música de Zé Lopes, samba enredo da Favela do Samba em homenagem a César Teixeira.
3 Coeficiente de Gini é uma medida de desigualdade, quanto mais próximo de um maior a desigualdade
Em Barcarena já estavam a Albrás, (1985) Alunorte,
(1978), em São Luís a ALUMAR e a ELETRONORTE, em Tucuruí. Havia também um grande número
de fazendas e madeireiras.
Nesse contexto o Grupo de Trabalho Amazônico (GTA) e outras entidades do Maranhão e do
pesquisadores/as e organizações internacionais
de igrejas e ambientalistas, ONGs, associações de
moradores, grupos de jovens, grupos de mulheres,
organizações de pescadores/as, de professores, seringueiros e quebradeiras de coco entre outras extrativistas.
Fonte: documento do Fórum Carajás
Pará, desencadearam um processo de articulação de
grupos sociais atingidos pelas políticas e projetos. A
partir daí surgiu a proposta de organizar um seminário internacional sobre os grandes projetos na região,
precedido de um conjunto de estudos para permitir
uma intervenção qualificada do Movimento Social.
Esse processo foi nominado de Seminário Consulta
Carajás.
Naquele período eram poucas as organizações ambientalistas na região, que se concentravam
no Sul e Sudeste do Brasil, atuavam na proteção de
ecossistemas naturais, porém havia um distanciamento dessas organizações com outros movimentos,
as ambientalistas ignoravam as questões sociais e as
demais organizações não incorporavam a qualidade ambiental nos discursos. Eram as ambientalistas
compostas por universitários, funcionários/as de órgãos públicos.
O Fórum se estrutura enquanto rede socioambiental envolvendo sindicatos urbanos e rurais,
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A primeira ação foi conhecer os projetos, pois
era necessário possuir conhecimentos para intervir,
discutir o desenvolvimento da região, saber como
eram as relações entre a indústria e meio ambiente, analisar seus impactos. Assim uma série de estudos, pesquisas e treinamentos foram realizados com
a participação de professores e pesquisadores das
Universidades do Pará e do Maranhão e ligados aos
movimentos sociais. A pesquisa precisava ser imediatamente útil, os/as pesquisadores/as participavam
das reuniões com informações e análises dos dados
levantados. Assim, pesquisas científicas tiveram o
propósito apoiar na discussão dos problemas localizados, bem como na promoção da capacidade de
planejar, de tomar decisões, fortalecer o sentimento
de pertencimento e poder de negociação.
A pretensão era intervir nas políticas públicas e privadas, mudar o curso da história, relacionar
justiça social com meio ambiente, mas, era preciso capacitar as organizações e as lideranças. Foram
criados grupos de estudos para a construção de um referencial teórico e alternativas para região. As organizações foram habilitadas para participar de conselhos de gestão, comissões, acordos de negociação;
foram disseminados conhecimentos e informações sobre os impactos na região utilizando inclusive rádios
comunitárias, teatro, música, artes visuais, cursos, oficinas, encontros regionais, nacionais e intencionais.
Foram elaborados livros, mapas, revistas e diversos textos (Verificar em referências bibliográficas).
As relações internacionais
O desafio era grande, foi necessário identificar e conquistar parceiros em órgãos públicos, estimular
o apoio de legislativos, promover audiências públicas. Assim as relações com as organizações internacionais especialmente com organizações da Alemanha foram fundamentais para iniciar o processo de interlocução e reconhecimento do Fórum, por parte do setor público e privado.
Um primeiro projeto foi encaminhado a Pão para o Mundo (BROT FÜR DIE WELT- PPM)4, e
Misereor5 com a interveniência da Coordenadora Ecumênica de Serviços (CESE). Naquela oportunidade,
a Conferência Conjunta Igreja e Desenvolvimento (Gemeinsame Konferenz Entwicklung und KircheGKKE), organização das igrejas alemãs, que já atuava com programa de diálogo iniciou um novo programa, tendo como centro de atividades a Tanzânia e Brasil sobre justiça internacional e de proteção ao meio
ambiente com grupos representativos da sociedade civil da Alemanha, e, no caso do Brasil, com indústrias
siderúrgicas alemãs e entidades populares da região de Carajás. Aqui se buscou estabelecer e ampliar relações com organizações internacionais, avançar nas relações Norte-Sul, nos acordos internacionais e na
responsabilidade global.
Além das organizações da Igreja da Alemanha o Fórum desenvolveu outras relações internacionais
com o GREEPEACE, FIAN, KOBRA, Cooperação Técnica Alemã (GTZ), IG Metal, International Rivers
Network, PARC-FASE 6.
Primeira fase da articulação, o Seminário Consulta Carajás
De 1992 até a realização da Mesa Redonda Internacional, em 1995, foram realizados encontros e
seminários, oficinas, estudos voltados para a realização de um evento que discutisse os projetos e políticas
públicas para região com o Estado, empresas, consumidores internacionais, trabalhadores das empresas,
grupos e comunidades atingidas. Vale destacar que o Projeto Ferro Carajás era o carro chefe dos projetos.
Quadro 01: Principais eventos na primeira fase do Fórum Carajás
4 agência de cooperação da Alemanha
5 agência de desenvolvimento da Igreja Católica da Alemanha
6 O Greenpeace é uma organização global e que atua na defendesa do meio ambiente; a FIAN (“Food First Information & Action Network),
é uma organização internacional de direitos humanos que trabalha pelo direito a alimentação; a KOBRA ( Kooperation Brasilien) é uma rede
de pessoas e grupos de países de língua alemã, de solidariedade ao Brasil; a Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit (GTZ),
é uma empresa pública de direito privado, de cooperação internacional; o IG Metall, é sindicato de metalúrgicos da Alemanha; International
Rivers Network (IRN), é uma rede internacional de guardiões dos rios; o PARC-FASE é um grupo de Pesquisa e intercâmbio com o Japão.
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Fórum Carajás outubro de 2010
A Mesa Redonda Internacional implantação de fábrica de celulose na região tocantina, a exploração de madeira nativa e a expan(MRI)
Na MRI realizada em maio de 1995 em São
Luís/MA, participaram 174 pessoas, autoridades federais e estaduais de órgãos ambientais, do planejamento, e da questão agrária; parlamentares brasileiros e alemães; entidades eclesiásticas brasileiras e
alemães; Banco Mundial; representantes de comunidades indígenas; lideranças de entidades sindicais
rurais e urbanas; organizações não governamentais
brasileiras e alemães. A MRI foi precedida por um
cuidadoso processo de organização no que concerne
a logística do evento (hospedagem, transporte, regimento interno do evento), como na formação dos
participantes do movimento social, coordenação e
mediação dos trabalhos.
A Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) reagiu não participando e incentivando a não participação de empresas e de setores da Igreja Católica.
Carvoeiros 7
A usina converte em aço,
a paisagem e em cinzas,
o coração dos homens
O lingote é o filho aceso
da usina que oculta no seu fogo
a lógica do deserto.
Segunda fase: as cadeias de produção
A partir da avaliação da MRI o Fórum passa se identificar como Fórum Carajás e se empenha
em discutir as políticas a partir de temas regionais,
incentivando a incorporação de aspectos de sustentabilidade ambiental e justiça social nas lutas nas
atividades das entidades. Elencou como prioridades
para atuação as cadeias de produtos identificadas
na primeira fase como as mais impactantes: ferro;
alumínio; madeira nativa/carvão; eucalipto/celulose. Na avaliação do Fórum realizada 1997 e 1998
aponta dois eixos temáticos como unificadores das
diversas lutas e temas que se tornaram programas
de trabalho:
• Agricultura familiar e grandes projetos,
envolve as problemáticas rurais. Os destaques nesse programa foram a questão do eucalipto e a
7 Versos do poema carvoeiro de Pedro Tierra
Fórum Carajás outubro de 2010
são da sojicultura. Aqui se destaca a iniciativa das
organizações do Sul do Maranhão, coordenadas
pela Associação Camponesa (ACA) e o programa
da movimento sindical coordenado pela Federação
dos Trabalhadores(as) na agricultura do Estado do
Maranhão (FETAEMA) sobre os impactos da sojicultura;
• Privatização e desemprego, esse programa
aglutinou problemáticas urbanas, tais como impactos sociais, ambientais e econômicos causados pela
privatização e terceirização, mineração e siderurgia.
A privatização de estatais, terceirização dos serviços
e desemprego nas áreas de produção do alumínio
e ferro motivaram estudos, audiências públicas na
Câmara Federal dos Deputados e Câmara dos Deputados do Pará. Com relação as injustiças ambientais,
o Fórum denunciou os danos ambientais causados
pelo vazamento de óleo no rio Gapara, pela CVRD
e, acompanhou a comunidade São Raimundo do Gapara em maio de 2000. Por outro lado o contínuo
e rápido desmatamento para a produção de carvão
vegetal no corredor Carajás e as relações de trabalho nas carvoarias levou a realização de Encontro de
carvoeiros e carvoeiras em 2002 e acompanhamento
da categoria e dos impactos ambientais.
• Os caminhos do alumínio, programa que
trata sobre a cadeia do alumínio realizou seminários
internacionais no Brasil e na Alemanha, intitulados
“Diálogo Internacional sobre Alumínio: Responsabilidade Global da Extração ao Consumo” sobre impactos no setor do alumínio. O seminário no Brasil
foi realizado no Praia Mar Hotel, São Luis/MA, no
período de 23 a 26 de março de 1999. Teve como
objetivo a discussão, com os setores envolvidos, dos
problemas causados pela exploração da bauxita, geração de energia pela usina hidrelétrica de Tucuruí
e produção de alumina e alumínio, com a intenção
de encontrar soluções para os problemas sócio-ambientais gerados, com a elaboração de um projeto de
desenvolvimento regional sustentável. Nesse grupo
temático o destaque foi a criação sindicato de químicos de Barcarena e participação desse sindicato
no processo.
• Barragens e energia. Estava proposto
construção de 14 barragens no Araguaia Tocantins.
Como ação de resistência, o Fórum juntamente com
outras organizações da região criaram Campanha
10
Contra as Barragens do Araguaia e Tocantins através de reuniões, debates, levantamento e sistematização de estudos sobre as barragens, produção de
material impresso, seminários regionais, seminário
interestadual em Imperatriz/MA e ato público em
Itaguatins/TO.
• A mulher e os grandes projetos. Esse programa “Mulher e os Grandes Projetos: impactos dos
grandes projetos na vida das mulheres’’, objetivava
identificar as condições de vida das mulheres frente
aos grandes projetos, com ênfase para os aspectos
da saúde, trabalho, salário e meio ambiente;bem
como dar visibilidade aos trabalhos desenvolvidos
por essas mulheres nas empresas, nas organizações
e nas comunidades onde vivem; promover a criação de novas organizações de mulheres evidenciando suas atividades. O estudo sobre “Mulher e
os Grandes Projetos: Diálogo sobre Gênero e Meio
Ambiente na Região do Carajás”, realizado junto às
mulheres ao longo de oito meses nas Regiões Ecológicas Litoral/Baixada, Pré-Amazônia Maranhense
e Chapadas do Sul do Maranhão e Sudeste do Pará
participaram 237 mulheres e 10 homens em oito oficinas realizadas nos municípios de São Luís, Imperatriz, Açailândia, São Raimundo das Mangabeiras,
Parauapebas, Presidente Juscelino, Presidente Médici, Rosário e Marabá. Após a realização de oficinas regionais em nove municípios, foi promovido o
Seminário Filhas da Terra, Gênero e Meio Ambien-
te na Região Carajás, em dezembro, em São Luís
onde participaram 131 pessoas, sendo 96 mulheres
e quatro homens trabalhadoras/trabalhadores rurais,
de 32 municípios do Maranhão e do Pará, representantes do poder Executivo e legislativo Municipal,
representantes da MAMA, dos Conselhos Estadual
da Condição Feminina do Pará e do Rio de Janeiro,
bem como representantes de órgãos financiadores
internacionais CESE, DFID, ELO.
• O Programa “BOCA DE FORNO”, jovens rurais, arte e o meio ambiente. O Programa incluiu parcialmente os Estados do Maranhão e Pará
envolvendo diretamente 279 pessoas dos seguintes
municípios: São Luís, comunidades de Taim, Rio
dos Cachorros, Porto Grande, Limoeiro e Vila Maranhão; Itapecuru-mirim; Santa Rita; Morros; Presidente Juscelino; Açailândia; Imperatriz; Cidelândia;
São Pedro da Água Branca; João Lisboa; Senador
La Roque; Eldorado; Marabá; Tucuruí e Parauapebas. Perfazendo um total de nove oficinas, no período de maio a novembro de 2000, com jovens filhos/
as de pescadores/as e agricultores/as. Nas oficinas
buscou, nas expressões, artísticas fazer compreender a Natureza, os impactos ambientais dos grandes
projetos bem como incentivou atitudes promotoras
da sustentabilidade e autolimitação. O Programa
incentivou os projetos Camurim I de formação de
jovens em beneficiamento de pescado em 2000, e, o
Projeto Camurim II de criação agroflorestal de peixes e crustáceos, em 2001.
Quadro 2: Principais eventos na segunda fase do Fórum Carajás
Evento
Audiência Pública da CELMAR, levantamento
cartorial das áreas compradas pela CELMAR
contestação de áreas adquiridas ilegalmente
5° Encontro Interestadual
Audiência com Banco Mundial e IBAMA
Seminário Internacional ”Pequeno Produtor e
Grandes Projetos”
Encontro “Grito de Tucuruí”
Seminário sobre os Grandes Projetos no Baixo
Parnaíba
Audiências com deputados federais e assessores
Diálogo Internacional sobre Alumínio:
Responsabilidade global da extração ao consumo
“Seminário ‘Gênero e meio ambiente”
Seminário Carajás: Mineração e Desemprego
Local
Imperatriz - MA
Data
1997
Parauapebas - PA
Brasília - DF
Balsas - MA
07.e 08.09.96
Dezembro 96
09 a 01.05.97
Tucuruí - PA
Brejo - MA
14.03.97
03.e 04.05.97
Brasília - DF
São Luís - MA
Agosto/Setembro 97
Março de 1999
São Luís - MA
Parauapebas - PA
Dezembro de 1999
14, a 16.04. 2000
Reunião sobre grilagem no Parque do Mirador
Imperatriz - MA
Fevereiro de 2001
Seminário sobre agricultura familiar
Produção de vídeo sobre a expansão da soja em
Vão das Salinas
Oficina alternativas de sobrevivência Escola
11
Sindical de Balsas
Seminário sobre meio Ambiente e Cidadania
Açailândia - MA
Balsas - MA
Dezembro de 2001
Maio de 2001
Balsas - MA
JunhoCarajás
de 2001
Fórum
outubro de 2010
Capinzal - MA
Junho de 2001
Estrutura organizativa
Uma estrutura político-administrativa participativa, as tomada de decisões, desde encontros
estaduais e interestaduais, reuniões da coordenação
e grupos temáticos eram discutidas por todas as entidades-membro.
Os Núcleos facilitavam a socialização das
questões e a realização de atividades:
• Núcleo de Tucuruí participam organizações
de Tucuruí, Novo Repartimento, Tailândia, Breu
Branco,
• Núcleo de Marabá participam organizações
de Marabá, Parauapebas, Eldorado, Paragominas,
Curionópolis,
• Núcleo de Imperatriz participam organizações
de Imperatriz, João Lisboa, Estreito, Cidelândia,
• Núcleo de Açailândia participam organizações de Açailândia, Buriticupu e Santa Luzia.
A Coordenação era representada por todas as
regiões e categorias de organizações integrantes do
Fórum:
• Associação Agroecológica Tijupá;
• Associação de Mulheres do Bico do Papagaio/
TO (ASMUBIP);
• Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (ASSEMA);
• CÁRITAS Regional de São Luís/MA;
• Centro de Educação e Cultura do Trabalhador
Rural (CENTRU) Imperatriz/MA;
• Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria
Sindical e Popular (CEPASP) Marabá/PA;
• Coordenadoria Ecumênica de Serviços
(CESE) Salvador/BA;
• Cooperativa Agroextrativista de Paraupebas/PA ,
Fórum Carajás outubro de 2010
• FASE/MARABÁ;
• Federação do Tocantins Araguaia (FATA)
Marabá/PA;
• Sindicato dos Trabalhadores da Indústria de
Metais Básicos (METABASE) Carajás/PA;
• Movimento Nacional dos Pescadores (MONAPE);
• Movimento Interestadual de Quebradeiras de
Coco Babaçu (MIQCB);
• Sindicato dos Metalúrgicos de Açailândia e
Imperatriz (SIMETAL);
• Sindicato dos Metalúrgicos do Maranhão (SIMETAL);
• Sociedade Maranhense dos Direitos
Humanos;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Açailândia;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Balsas;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Imperatriz/MA;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de João Lisboa;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Novo Repartimento;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Parauapebas;
• Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras
Rurais de Tucuruí.
Intercâmbios
• Viagem de comitiva alemã para a região de
extração do minério de ferro em Carajás, 17 pessoas,
representantes dos sindicatos alemães de mineração,
setor químico e energético (IGBCE); do setor metalúrgico (IG Metall) da Confederação dos Sindicatos
Alemães (DGB), representantes da GKKE e assessores do Fórum Carajás;
12
• Seminário envolvendo delegação alemã e
38 dirigentes sindicais brasileiros do setor mineral
(CNTSM-CUT) e do setor siderúrgico (CNM-CUT),
em Belo Horizonte, Minas Gerais, na sede da Escola
Sindical 7 de Outubro. Participaram 10 representantes do Fórum Carajás;
• Programa EXPO 2000 del proyecto‚ salud,
seguridad y medio ambiente en el local de trabajo’
Alemanha, con la participação de 30 brasileiros, 7
espanhois, 7 suecos e 15 alemãs. Participaram 7 sindicalistas do Fórum Carajás, em outubro de 2000;
• Conferência: “concepção de uma cadeia da
soja sustentável nas relações Brasil/Alemanha”. Em
Loccum na Alemanha, em maio de 2001. Participaram três representantes do Fórum Carajás;
• Intercâmbio internacional para um desenvolvimento sustentável (Arbeits- und Studienaufenthalte in Lateinamerika – ASA) objetiva promover
troca de experiências entre organismos não governamentais do Brasil e da Alemanha. Jovens alemães
participam de algum projeto no Brasil (Fase Sul)
um profissional brasileiro desenvolve uma atividade
complementar na Alemanha (Fase Norte). O tema
principal do intercâmbio é energias renováveis e
aprendizagem global em Alemanha e Brasil. Tema
priorizado para 2010 – alternativas energéticas e
aprendizagem global na Alemanha e Brasil.
Salve a Terra8
Salva, Salvaterra
vives o teu tempo de guerra
não construístes armas
plantastes cupuaçu
Terceira fase
A implantação, ampliação e/ou consolidação
de refinarias de petróleo, termelétricas, aciária, exploração de minas de bauxita e de ouro e outros
empreendimentos que exaurem as riquezas e potencialidades locais, desterritorializa povos e comunidades, entretanto, a oferta de empregos desmobiliza
grupos e movimentos o que tornam esse momento
um desafio maior.
Por outro lado novas organizações se incorporam ao Fórum bem como outros temas, destaca-se
as organizações das regiões de cerrado, da Baixada
Maranhense e de Barcarena no Pará, que por sua
vez passaram a influenciar as prioridades. O Fórum
passa a participar de outras organizações e/ou espaços de discussão como Fórum da Amazônia Oriental,
Conselho Nacional de Recursos Hídricos,Conselho
Estadual de Direitos Humanos , Conselho Estadual
de Desenvolvimento Sustentável, Rede de Intervenção em Polítcas Públicas, Rede Manguemar Brasil,
Redmanglar internacional , Campanha Justiça nos
Trilhos, Fórum do Baixo Parnaiba, Rede de Tecnologia Social, Fórum Estadual de Mulheres, Fórum
em Defesa das Populações do Cerrado Sul Maranhense, Associação Brasileira de Ong`s, Rede de
Agroecologia do Maranhão, Associação Nacional de
Agroecologia, Rede Brasileira de Justiça Ambiental,
Fórum Brasileiro de Ong´s e Movimentos Sociais,
Movimento Reage São Luís, Movimento SalvaTerra
e Comissão Justiça nos Trilhos.
Dentre os principais programas trabalhados
pelo Fórum Carajás,destacamos:
Expansão da sojicultura e a fronteira agrícola. Programa de educação ambiental, monitoramento e alternativas para as comunidades afetadas
pela expansão da sojicultura, seguem os projetos :
• Sonhem: Monitoramento e educação amSalva, Salvaterra biental nos Cerrados Maranhenses, projeto desenQuem salvará tua terra? volvido em comunidades da bacia do Rio Parnaíba,
O que será do teu povo? no município de Loreto/MA;
• Alternativas para o Cerrado, projeto em deSalva Terra, Salva Terra, Salvaterra
senvolvimento pela ACA na região dos Gerais de
Balsas;
• Ciranda Agroecológica, projeto desenvolvi8 Versos da poesia de Zeca Pereira ou Zeca do Sindicato de Rosário sobre a comunidade Salvaterra de Rosário que foi desapropriada do no município de Mata Roma com jovens quipelo governo do Maranhão para implantação de refinaria Premium lombolas;
Salva, Salvaterra
refinaria te ocupou
o teu povo sente dor
pau d’arco cai a flor
da Petrobás
13
Fórum Carajás outubro de 2010
• Chapada Limpa: desdobramento de uma
proposta de conservação ambiental para o Baixo
Parnaíba, em desenvolvimento na Reserva Reserva
Extrativista Chapada Limpa, no município de Chapadinha;
• Comunidade Tradicional e a Sustentabilidade do Extrativismo do Bacuri, projeto em desenvolvimento no município de Urbano Santos;
• Arte e Meio Ambiente: educação ambiental
para comunidades quilombolas, projeto em desenvolvimento no município de Mata Roma;
• O Programa Territórios Livres do Baixo
Parnaíba, em desenvolvimento em toda a região do
Leste Maranhense, parceria com SMDH, CCN e
FDBPM.
Mineração e siderurgia. O aumento das
carvorias para abastecimento do Pólo Siderúrgico
Carajás, acarretou novas mudanças ambientais
tornando os povos e comunidades tradicionais especialmente vulneráveis. A exemplo dos danos causados pelas 13 empresas do Pólo Siderúrgico Carajás
que consomem 7.314.404 ton/ano de carvão e, consequentemente, 13.194.949,46 ton/ano de lenha (IBAMA, 2005). O Fórum acompanha e denuncia essas
atividades e seus danos.
Participou do Movimento Reage São Luís,
contra a implantação de um pólo siderúrgico na Ilha
de São Luís, inclusive, com oficina no Fórum Social
Mundial; participa da coordenação da Campanha
Justiça nos Trilhos; coordena o Movimento Salva
Maranhão, de denúncia de irregularidades e mobilização social sobre os projetos que não oferecem
equilíbrio entre crescimento econômico, equidade
social, diversidade cultural e a proteção ambiental.
Revitalizando os Manguezais, objetiva dar
visibilidade aos ecossistemas manguezais, tornando
os moradores/as e organizações que vivem nos entornos, capazes de manejar, proteger e impedir a
destruição dessas florestas remanescentes. Entre os
projetos destacou -se o de Comunicação e Educação Ambiental que tinha como finalidade elaborar
propostas e fomentar discussões sobre questões
ambientais com comunidades afetadas pelos grandes
projetos no interior no interior da Ilha de São Luís
durante os anos 2004 e 2005. Desenvolve atualmente
o Projeto Bequimão na região da Baixada Maranhense.
Rosa Negra, é um projeto do Programa Mulher e os Grandes Projetos: impactos dos grandes projetos na vida das mulheres, objetiva apoiar as alternativas de renda e de organização de mulheres rurais
possibilitando a manifestações culturais reforçando
e reafirmando a identidade negra e novas relações de
gênero.
Barragens e Energia, o Fórum acompanha
a implantação de barragens na bacia do Araguaia/
Tocantins e Parnaíba denunciando irregularidades e
produzindo materiais de apoio as comunidades atingidas. Tem assento na Câmara Técnica de Análise de
Projeto (CTAP) do Conselho Nacional de Recursos
Hídricos (CNRH) intervindo para a melhoria dos planos das bacias hidrográficas das regiões hidrográficas
Bacia do Araguaia-Tocantins, Parnaíba e Nordeste
Ocidental.
Quadro 3: Principais eventos na terceira fase do Fórum Carajás
Fórum Carajás outubro de 2010
14
15
Fórum Carajás outubro de 2010
Uma conclusão
Foto: Robero K-Zau: Mesa Redonda Internacional -MRI
O Fórum Carajás superou o modelo tradicional de organização política, na abrangência
e diversidade, congrega grupos e organizações
populares e sindicais, entidades eclesiais nacionais
e parceiros internacionais.
A cultura e arte vitalizam todos os processos,
facilitando a compreensão das problemáticas e envolvendo artistas das regiões. Em a Filha da Chuva,
compilação de poesias que mostrava como o desenvolvimento afeta os sentimentos, as emoções e os
valores das pessoas; em Percussão em Movimento,
utilizou-se variados sons através de instrumentos e
dos próprios corpos para mostrar ao público sons
da natureza e dos ambientes em que vivem. Em
outros espetáculos como o Recital dos Carvoeiros, o
Seminário “Rosa Negra” Mulheres Rurais, Danças e
Tambores, homenageava os atingidos e fazedoras de
cultura popular. O espaço Cumbuca de Saber é um
espaço informal de discussão político/cultural onde
foram lançados livros e CDs, no programa Boca de
Forno e no concurso “Artístico e Literário Fórum
Carajás” o Fórum buscou despertar a criatividade
artística nos/as jovens filhos/as de pescadores/as e
agricultores/as.
O Fórum é uma teia sócio-ambientalista de
caráter permanente que assume o enfrentamento
de questões específicas e gerais. Proporciona um
maior entendimento das relações regionais, urbanos
e rurais, integração nas diversas lutas existentes na
região e incorporação da proteção ambiental como
uma dimensão relevante. Causa impacto na opinião
pública, influência organismos estatais de meio
ambiente, legislativos, pesquisadores e o empresariado.
Os materiais específicos como relatórios, cartilhas, vídeos, fotos e mapas são usados como material didático em escolas de ensino fundametal e médio,
como material de apoio a trabalhos de parlamentares
e pesquisa acadêmica.
Fórum Carajás outubro de 2010
16
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
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Fórum Carajás outubro de 2010
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18
Organizações participantes do Fórum Carajás
N.º
01
Nome da organização
ABIPA Axixá/TO
02
03
APOIO - Balsas/MA
Associação Agroecológica Tijupá - São Luís/MA
04
05
Associação de Donas de Casa de Açailândia/MA
Associação de Mulheres do Bico do Papagaio/TO –
ASMUBIP
Associação de Moradores de Boa Vista dos Pinhos/MA
Associação de Moradores de Porto Alegre/MA
Associação de Moradores da Vila Bom Jardim/MA
Associação de Moradores da Vila Tancredo/MA
Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Lago do
Junco/MA
Associação de Mulheres Extrativista de Cidelândia/MA
Associação dos Sindicatos Unidos do Médio Meariam/MA –
ASUMEM
Associação do Trabalhadores Rurais Agroextrativista e
Pescadores Artesanais de Tucuruí/PA
Associação em Áreas de Assentamento no Estado do
Maranhão - ASSEMA/MA
Grupo de mulheres
Grupo de mulheres rurais
Organização de mulheres
Associação de agrcultor@s
41
42
43
44
Associação Nossa Senhora do Rosário em Penalva/MA
Associação dos Pequenos Produtores Projeto de Assentamento
Angelim
Caixa de Ararás - Marabá/PA
Caixa Agrícola dos Pequenos Produtores de São João do
Araguaia/PA
Cáritas Regional de São Luís/MA
Cáritas Diocesana de Brejo/MA
Central Única dos Trabalhadores do Sudeste do Pará
Central Agroambiental do Tocantins - CAT - Marabá/PA
Centro de Educação e Cultura do Trabalhador rural - CENTRU Imperatriz/MA
Centro de Educação, Pesquisa e Assessoria Sindical e Popular CEPASP - Marabá/PA
Centro de Estudos e Ação Social - CEAS - Salvador/BA
Centro de Cultura Negra - São Luís/MA
Colônia de Pescadores de Tucuruí/PA
Comissão Pastoral da Terra de Marabá/PA
Comissão Pastoral da Terra da Palestina/PA
Comissão Pastoral da Terra do Maranhão
Comissão Pastoral da Terra do Bico do Papagaio/To
Comunidade Tucumã - Índios Gavião da Montanha - Área
Indígena Mãe Maria- Marabá/PA
Conselho Indigenista Missionário - CIMI/MA
Conselho Nacional dos Seringueiros - CNS - Marabá/PA
Cooperativa Pequenos Agricultores Agroextrativistas de
Esperantinópolis/MA – COPPAESP
Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de Lago
do Junco/MA
Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de Lima
Campos/MA – COPPELC
Cooperativa de Pequenos Agricultores Agroextrativistas de São
Luís Gonzaga/Ma – COPPAES
Cooperativa de Pequenos Rurais de Parauapebas/PA
Cooperativa de Pequenos Produtores Agroextrativistas de
Imperatriz/MA – COPPAI
Colônia de Pescadores de Abaetetuba/PA
Coordenadoria Ecumênica de Serviços - CESE- Salvador/BA
Equipe de Educação Popular de Parauapebas/PA – EEPP
Federação do Tocantins Araguaia -FATA - Marabá/PA
45
46
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará - FETAGRI
GREENPEACE
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
19
Tipo de organização
Organização de cooperação
agrícola
ONG
ONG
Associação de agricultor@s
Associação de agricultor@s
Associação de bairro
Associação de bairro
Grupo de mulheres rurais
Associação de mulheres
Articulação de STTRs
Organização de cooperação
agrícola
ONG rural
Cooperativa agrícola
Cooperativa agrícola
Entidade da Igreja Católica
Entidades da Igreja Católica
Central Sindical
ONG
ONG
ONG
ONG urbana
Movimento Negro
Sindicato de pescadores
Entidade da Igreja católica
Entidade da Igreja católica
Entidade da Igreja católica
Entidade da Igreja católica
Organização indígena
Entidade indigenista da Igreja
Articulação de Extrativistas
Cooperativa
Cooperativa
Cooperativa
Cooperativa
Cooperativa
Cooperativa
Sindicato de pescadores
ONG ecumênica
ONG
ONG
Fórum Carajás outubro de 2010
Federação de STTTR
ONG ambientalista
40
41
42
43
44
Cooperativa de Pequenos Produtores Agroextrativistas de
Imperatriz/MA – COPPAI
Colônia de Pescadores de Abaetetuba/PA
Coordenadoria Ecumênica de Serviços - CESE- Salvador/BA
Equipe de Educação Popular de Parauapebas/PA – EEPP
Federação do Tocantins Araguaia -FATA - Marabá/PA
Sindicato de pescadores
ONG ecumênica
ONG
ONG
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Pará - FETAGRI
GREENPEACE
Grupo de Mulheres da Ilha - São Luís/MA
Grupo de Trabalho Amazônico Bico do Papagaio/TO - GTA – Bico
Grupo de Trabalho Amazônico do Babaçu/MA - GTA – Babaçu
Grupo de Trabalho Amazônico Nacional - GTA - Nacional
Grupo de Jovens de Oiteiro/MA
Grupo de Jovens de Rosário /MA
Grupo de Jovens de Cajueiro/MA
Grupo de Jovens de Taim /MA
Igreja Evangélica Luterana de Balsas/MA
Federação de STTTR
ONG ambientalista
Organização feminista
Articulação de entidades
Articulação de entidades
Articulação de entidades
Grupo de jovens
Grupo de jovens
Grupo de jovens
Grupo de jovens
Igreja evangélica
56
57
58
59
60
61
62
Movimento Nacional dos Meninos e Meninas de Rua
Movimento dos Sem Terra de Parauapebas/PA
Movimento de Mulheres do Campo e da Cidade/PA
Movimento de Educação de Base - MEB - Imperatriz/MA
Movimento de Educação de Base - MEB - Buriticupu/MA
Movimento de Educação de Base - MEB - Marabá/PA
Movimento de Mulheres do Araguaia -/PA
Movimento
Movimento
Grupo de mulheres
Entidade de Igreja Católica
Entidade de Igreja Católica
Entidade da Igreja Católica
Movimento de mulheres
63
64
65
66
67
68
69
70
71
72
73
74
Movimento de Mulheres do Sudeste do Pará - Marabá/PA
Movimento dos Pescadores do Maranhão - MOPEMA
Movimento dos Pescadores do Pará – MOPEPA
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra Marabá/PA
Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu
Movimento Nacional dos Pescadores – MONAPE
Pastoral da Mulher e da Criança de Buriticupu/MA
Paróquia de Confissão Luterana de Belém/PA
Pastoral Popular de Marabá/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Barcarena/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Buriticupu /MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Fortaleza de
Nogueiras/MA
75
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Açailândia/MA
76
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Altamira/PA
77
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Amarante/MA
78
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Anapurus/MA
79
Sindicato dos Trabalhadores/as Rurais de Balsas/MA
80
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Brejo Grande do
Araguaia /PA
81
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Breu Branco/MA
82
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Carolina/MA
83
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Eldorado dos
Carajás/PA
84
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Esperantinópolis/Ma
85
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Estreito/MA
86
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Imperatriz/MA
87
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Itupiranga/PA
88
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Jacundá/PA
89
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de João Lisboa /MA
90
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Lago da Pedra/MA
91
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de do Junco/MA
92
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Lima Campos/MA
93
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Loreto/MA
94
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Magalhães de Almeida
95
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Marabá/PA
96
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Mata Roma/MA
97
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Novo Repartimento/PA
98
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Palestina/PA
99
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paragominas/PA
100 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Parauapebas/PA
101 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paulo Ramos/MA
102 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pio XII /MA
Fórum103
Carajás
outubro de
20
Sindicato
dos2010
Trabalhadores /as Rurais de Pitinga/MA
104 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Poção de Pedras/MA
105 Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais Riachão/Ma
Cooperativa
Movimento de mulheres
Movimento de pescadores
Movimento pescadores
Movimento
Movimento de mulheres rurais
Movimento de pescadores
Entidade de Igreja Católica
Igreja Evangélica
Entidade da Igreja Católica
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
STTR
97
98
99
100
101
102
103
104
105
106
107
108
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117
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126
127
128
129
130
131
132
133
134
135
136
137
138
139
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Novo Repartimento/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Palestina/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paragominas/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Parauapebas/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Paulo Ramos/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pio XII /MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Pitinga/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Poção de Pedras/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais Riachão/Ma
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Domingos de
Araguaia/PA
Sindicato dos Trabalhadores Rurais de São João do Araguaia/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Luís Gonzaga/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Raimundo das
Mangabeiras/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Tasso Fragoso/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Tucuruí
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Cidelândia/PA
Sindicato dos trabalhadores/as Rurais de Presidente Médici /MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Nova Colina /MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Santa Rita/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de São Luís/MA
Sindicato dos Trabalhadores /as Rurais de Rosário /MA
Sindicato dos Urbanitários do Pará - Marabá/PA
Sindicato dos Comerciários de Parauapebas/PA
Sindicato dos Empregados em Entidades de Assistência Social e
Educacional - SENALBA - Imperatriz/MA
Sindicato dos Ferroviários
Sindicato dos Fotógrafos Açailândia /MA
Sindicato dos Jornalistas de Imperatriz/MA
Sindicato dos Metalúrgicos de Açailândia e Impera triz MA
Sindicato dos Químicos Barcarena/PA
Sindicato dos Metalúrgicos do Maranhão
Sindicato dos Metalúrgicos do Pará - SIMETAL
Sindicato dos Trabalhadores /as da Saúde do Pará -SINTESP Marabá/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as da Indústria de Metais Básicos METABASE- Carajás/PA
Sindicato dos Trabalhadores /as em Educação Pública do Pará SINTEPP- Marabá/PA
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria e construção Civil de
Açailândia/MA
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Alimentação do
Estado do Pará - Marabá/PA
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Madeireiras de
Eldorado/PA
Sindicato dos Trabalhadores na Indústria Madeireiras de
Construção Civil de Açailândia/MA
Sindicato dos Trabalhadores nas Indústria Madeireiras de
Movelaria de Açailândia/Ma
SINTRAFE - Marabá/PA
Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos
Sociedade Paraense de Direitos Humanos
21
STTR
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Sindicato urbano
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Sindicato operário
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Sindicato urbano
ONG
ONG
Fórum Carajás outubro de 2010
Impactos e resistências em Açailândia,
profundo interior do Maranhão
Açailândia: terra do açaí
Dário Bossi1, em abril de 2010
O
osantigos romanos costumavam dizer “nomen omen” (o destino de algo está em seu próprio nome); no caso de Açailândia, cidade do açaí, o ditado foi desmentido e a identidade
do município foi rapidamente alterada em “cidade do ferro”.
Ainda pior o que aconteceu com uma de suas periferias. Piquiá era o nome que os moradores escolheram, valorizando uma das árvores mais elegantes da região. Mas logo que as empresas chegaram, transformaram o mesmo nome no acrônimo “Parque Industrial Químico Açailândia”!
Atrás dessa violação de identidade há uma violência simbólica sobre a vocação de um território e de
um povo. Nesse artigo tentaremos detalhar os passos dessa violência e mostrar os movimentos de resistência e organização popular.
1 Missionário Comboniano, residente no município de Açailândia, oeste do Maranhão e militante da campanha ‘Justiça nos Trilhos’- www.
justicanostrilhos.org
Açailândia tem pouco mais de cem mil habitantes distribuídos numa área de cerca de 5.806 Km².
O Produto Interno Bruto (PIB) é de 1.410.298.000
R$2 . Com o preço do ferro-gusa antes da crise, apenas uma siderúrgica no município exportava por ano,
produtos com valor correspondente a mais de 600
milhões de R$3 .
Por que a siderurgia guseira decidiu investir
nessa cidade?
Açailândia se encontra no eixo de duas importantes rodovias: a BR 010 Belém-Brasília e a BR
222, que liga o município a São Luís. O trânsito de
caminhões e veículos é intenso. O município é ponto de passagem para várias regiões do país, como a
Norte e Nordeste.
Em Açailândia cruzam-se também duas importantes ferrovias: os 892 Km da Estrada de Ferro
Carajás, que une Parauapebas no Pará com o porto
de Itaqui em São Luís; e a Ferrovia Norte-Sul, 720
Km de trilhos, até Palmas no Tocantins (parte ainda
está em construção). Ambas estão cedidas em concessão à mineradora Vale, que garante o escoamento
de mercadorias e recursos e lucra a partir disso.
A abundância de terra livre na região foi desde sempre um grande atrativo para os investimentos no território. A bibliografia de estudos sobre a
região indica que tudo começou no final da década
de 1960. Numa seqüência altamente destrutiva, que
passou pelos ciclos da madeira nobre, das serrarias,
dos pastos e gado, do carvão e do eucalipto.
A região tornou-se interessante também devido à relativa riqueza de água: rios, córregos e lagoas
hoje desfrutados também pelas empresas instaladas
no local. Em razão de tudo isso, a cidade tornou-se
uma etapa obrigatória do dito desenvolvimento, que
infelizmente passa por ela sem deixar amadurecer
muitos frutos no local. Minério e ferro vão e vêm,
mas o retorno econômico e o tal de ‘progresso’ para
em Açailândia somente nas mãos de poucos.
2 IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Contas Nacionais,
2006.
3 www.vienairon.com.br – Exportação anual de 500.000 ton de ferro
gusa, com um preço antes da crise de 750 $ por tonelada.
23
Os atores do “desenvolvimento” e
suas vítimas
a. O Projeto Grande Carajás e a Estrada de Ferro Carajás4
O Programa Grande Carajás (PGC), criado
pelo Governo Federal em 1980, foi o fator que propiciou a instalação do setor siderúrgico na região. O
PGC surge como um incentivo adicional do governo
para os investimentos privados na região amazônica,
juntamente com o Projeto Minério de Ferro Carajás
(PMFC), localizado no município de Marabá (PA)5 e
controlado pela companhia Vale. O projeto controla
10,6% do território nacional. O PGC foi considerado
um dos maiores programas de desenvolvimento integrado numa área de floresta tropical úmida.
A chegada da ferrovia e suas operações crescentes determinaram boa parte dos investimentos
industriais na região. Ao lado da ferrovia, no distrito industrial de Piquiá, instalou-se um grande polo
Petroquímico, estação de redistribuição para Maranhão, Pará e Tocantins do combustível que chega de
navio em São Luís.
No final dos anos 80 instalaram-se também
várias usinas siderúrgicas (atualmente 11 no Pará e
7 no Maranhão). Pelo Projeto Grande Carajás, esse
deveria ser o primeiro passo rumo a “um complexo
industrial metal-mecânico”, tendo como primeiro
estágio as indústrias sídero-metalúrgicas. Foi previsto que “os encadeamentos para frente das atividades siderúrgicas engendrariam a criação de um parque metal-mecânico, cujo porte ensejaria a criação
de pelo menos 44 mil empregos diretos no ano de
2010”6
As promessas desse grande investimento industrial, como quase sempre acontece, nunca se realizaram nessas proporções. Açailândia, segundo
maior pólo de produção siderúrgica, entre os qua-
4 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005 - http://www.carvaocidadao.org.br/ata/relatorio_social.htm
5 CARNEIRO, Marcelo Sampaio. Crítica social e responsabilização
empresarial. Análise das estratégias para a legitimação da produção
siderúrgica na Amazônia Oriental, Cad. CRH v.21 n.53 Salvador
maio/ago. 2008, disponível em www.scielo.br
6 BRASIL. 1989. Secretaria de Planejamento da Presidência da República. Programa Grande Carajás. Secretaria Executiva. Plano-diretor
do Corredor da Estrada de Ferro Carajás. Brasília, NATRON. 536p.
Fórum Carajás outubro de 2010
tro localizados ao longo da EFC, no final do ano de
2007 empregava no setor de transformação (principal mas não unicamente siderúrgico) somente 2.568
pessoas!7 Ao contrário, como veremos logo a seguir,
o impacto sócio-ambiental desses novos empreendimentos na região foi enorme.
A ferrovia influiu pesadamente sobre o desenvolvimento da região e determinou a construção
de uma cadeia completa de extração e elaboração
do ferro. A cadeia é voltada para a exportação, com
agregação de valor muito baixa para o povo maranhense. A economia extrativa é marcada por várias
contradições: por exemplo, o contraste entre os valores que diariamente passam pelos trilhos e a miséria de muitos barracos que há anos permanecem
à beira da ferrovia em condições indignas de seres
humanos.
No ano passado a Vale transportou cerca de
100 milhões de toneladas de minério. Ao preço de
2009, uma tonelada de minério custava R$71,00.
Portanto, a cada dia Vale transporta mediamente
333.000 toneladas, por um valor de R$ 21,3 milhões.
Isto quer dizer que a cada dia passam em frente do
povo de Açailândia cerca de R$50 milhões. Considerando que essa exportação é desonerada de impostos,
por conta da Lei Kandir, pode-se imaginar os níveis
de lucro da grande companhia multinacional.
Vamos conhecer mais de perto os trilhos da
Estrada de Ferro Carajás (EFC), sobre os quais desde abril de 2008 corre o maior trem do mundo: 330
vagões, cerca de 3.500 metros de extensão e capacidade para transportar 40 mil toneladas. Quatro locomotivas para cada trem, uma frota total de 205. A
cada dia passa uma média de 10 trens de minério.
Mais dois ou três de soja; e dois ou três com outros
produtos, como minério para siderúrgicas e combustível para o pólo petroquímico, etc.
Sem falar dos trens vazios que voltam de São
Luís para serem recarregados na mina.
Ao contrário, o trem de passageiros, - uma
obrigação da Vale pela concessão estadual de uso
da ferrovia - é garantido somente uma vez a cada
dois dias. No fim de 2009, antes da representação
escrita do Sindicato dos Ferroviários ao Ministério
Publico do Estado (MPE) e à Agência Nacional de
Transportes Terrestres (ANTT), a rotina da viagem
era marcada pelo atraso. Havia queixas ainda sobre
a postura pouco ética da companhia para com os
passageiros.
Os moradores na beira dos trilhos não conseguem conviver com o barulho provocado pelos trens.
Um incômodo permanente. As casas mais próximas
dos trilhos sofrem com rachaduras. Os acidentes são
freqüentes, com um número significativo de mortes
por atropelamento de pessoas e animais. Até o instante não existe uma política específica da empresa
para lidar com esse problema. Segundo Relatório de
Sustentabilidade da própria empresa, o número de
acidentes de trem nos últimos anos foram 59 (2005),
63 (2006) e 46 (2007). A vida das pessoas, pelo jeito,
é menos importante do que o transporte de minério,
que tem mais ‘peso’.
Uma análise desse tipo é confirmada também
pelo fenômeno dos “Meninos do trem”. Trata-se de
meninos e meninas que viajam de maneira irregular
nos trens de minério da Companhia Vale ao longo da
Estrada de Ferro Carajás. São crianças e adolescentes que têm acesso de maneira clandestina ao trem,
viajando de Marabá ou Parauapebas até São Luís,
ou vice-versa. Quando descobertos pela segurança
da Companhia, são entregues ao Conselho Tutelar
mais próximo, cuja tarefa será de fazer o registro de
ocorrência e devolvê-los (a custo da Vale) às suas
famílias em seus municípios de origem.
O fenômeno tem crescido consideravelmente
a cada ano e tem complicado muito a atuação ordinária dos Conselhos Tutelares da região. O MPE entrou com uma representação a respeito, com o título
“Meninos do Trem da Vale – Situação de Risco”8 .
Os meninos do trem estão expostos a toda sorte de
perigos. Desde a contaminação pelo minério, até as
condições climáticas diversas, além da viagem sem
a proteção ou orientação de um adulto responsável.
“Pelos vagões do trem de ferro, quem leva a
carga são os meninos. Com uma realidade que os expulsa, em péssimas condições socioeconômicas, em
7 Ministério do Trabalho e Emprego/Cadastro Geral de Empregados
e Desempregados.
8 Procedimento n. 116/05 – Ministério Público do Estado do Maranhão
Fórum Carajás outubro de 2010
24
Estados com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), sem a atenção dos órgãos competentes,
sem políticas públicas específicas para a criança e o
adolescente e sem acesso aos bens básicos para uma
vida digna, resta a estes meninos e meninas pegar
carona naquele que parece ter sido um dos motivos
de tamanha desordem social. O trem de carga, que
carrega minérios e meninos, parece anunciar através
do seu apito que esta carga está pesada demais, especialmente para os meninos do trem” 9.
A perspectiva da duplicação dos trilhos, já
planejada e em fase de realização, assusta os moradores de Açailândia e do corredor inteiro, devido à
evidente duplicação de todos os problemas até agora
mencionados.
Desde suas instalações, as guseiras da região de Carajás receberam colaboração financeira
através de recursos públicos oriundos do Fundo de
Investimentos do Nordeste (FINOR) e do Fundo de
Investimentos da Amazônia (FINAM). Uma vez
aprovados os projetos, seus signatários recebiam até
75% do valor total indicado como necessário à implantação do parque industrial e à aquisição de áreas
destinadas ao desenvolvimento de supostos projetos
de “manejo florestal” ou de reflorestamento10.
A aprovação dos projetos exigiu só formalmente uma série de condicionantes ligadas ao licenciamento ambiental. É muito difícil conseguir junto
à Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEMA) os
documentos de licenciamento. Nossa equipe de pesquisa reiterou o pedido à SEMA e a visitou várias
vezes antes de conseguir dados somente de três das
cinco siderúrgicas, recebendo inclusive três processos de licenciamento vencidos e não renovados.
Parece claro que, pela facilidade de instalação e a ausência/cumplicidade do poder público, as
siderúrgicas da região de Carajás acumularam enormes lucros ao longo dos últimos anos. No período
entre 2000 e 2008 o volume de ferro gusa exportado
duplicou, mas o valor dessa exportação quase decuplicou, passando de cerca de US$ 165 milhões em
b. As usinas siderúrgicas
Em Açailândia encontram-se cinco empresas siderúrgicas: Viena Siderúrgica (capital próprio,
em operação desde 1988), Simasa e Pindaré (Grupo Queiróz-Galvão, 1993), Gusa Nordeste (Grupo
Ferroeste, 1993), Fergumar (Grupo Aterpa, 1996).
A tabela seguinte dá as dimensões das usinas, com
dados de 2006 (em itálico os dados de algumas siderúrgicas de Marabá):
Siderúrgica
Nº de alto fornos
Produção média
Nº de
Consumo médio
anual de
Relação
consumo/
funcionários
anual de ferro
próprios
gusa (em ton)
3
carvão(emm )
produção
FERGUMAR
2
234
216.000
480.000
2,22
GUSA NORDESTE
2
218
216.000
540.000
2,50
SIMASA/ PINDARÉ
5
650
564.000
1.440.000
2,55
VIENA
5
560
480.000
900.000
1,88
FERRO GUSA CARAJÁS
2
243
400.000
1.057.000
2,64
USIMAR
2
500
180.000
360.000
2,00
Fonte: Pesquisa de Campo IOS. Elaboração: Instituto Observatório Social.
9 SOUZA, Emilene Leite. “De passagem”. Universidade Federal do
Maranhão/UFMA Imperatriz - CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS,
SAÚDE E TECNOLOGIA/CCSST 2009
25
10 MONTEIRO, Maurílio de Abreu . Siderurgia na Amazônia Oriental brasileira e a pressão sobre a floresta primária. In: II Encontro da
Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ambiente e
Sociedade - ANPPAS, 2004, Indaiatuba-SP. Anais do II Encontro da
Associação Nacional de Pós Graduação e Pesquisa em Ambiente e
Sociedade. Indaiatuba : ANNPAS, 2004. v. 1. p. 1-19
Fórum Carajás outubro de 2010
2000 para US$ 1,5 bilhão em 2008. Este crescimento tornou-se possível pelo salto do preço médio do
ferro gusa exportado, que passou de US$ 99,6/ton
para US$ 445,6/ton no mesmo período”11.
Também em tempos de crise, apesar de um
discurso preocupado e resignado à solução inevitável da demissão dos funcionários, as siderúrgicas
não pararam de vender e lucrar. Carneiro e Ramalho
(2009) sinalizam que, até o final de 2008, uma pequena redução na quantidade exportada, pouco mais
de 67 mil toneladas, foi mais do que compensada
pelo valor exportado, com um aumento de cerca de
498 milhões de dólares quando comparado ao ano
anterior.
Ainda conforme os dados de Carneiro e Ramalho (2009), os dados oficiais das exportações
brasileiras, demonstram de forma inequívoca que as
empresas guseiras do Pará e Maranhão finalizaram o
ano de 2008 com grandes lucros. Sem dúvida, as demissões podiam ser evitadas ou atrasadas, sem que
o peso da crise pesasse somente sobre as costas dos
mais fracos.
Além de desempregada, a população compartilha o pesado impacto sobre o meio ambiente. É ela
nativas – corresponde a um desmatamento de pelo
menos 600 m² de matas primárias.
Em 2005, por exemplo, as empresas siderúrgicas da região de Carajás produziram 4 milhões de
toneladas de ferro-gusa12, o que corresponderia ao
consumo de 240.000 hectares de mata nativa. Naquele ano, conforme dados da Associação das Siderúrgicas de Carajás – ASICA, a percentagem de
origem do carvão vegetal era de 49,6% da mata nativa e 50,4% de reflorestação com espécies exóticas. Portanto, somente em 2005, as siderúrgicas da
região de Carajás queimaram para produzir carvão
cerca de 120.000 hectares de mata nativa.
Vamos fazer um outro exemplo no caso do
eucalipto. Para produzir uma tonelada de ferro gusa
precisa de 3,8 m³ de eucalipto (ou 5,8 m³ de mata
nativa). A siderúrgica Viena atualmente produz
500.000 toneladas de ferro gusa por ano; precisaria
portanto, uma vez que se tornar auto suficiente com
seu parque de monocultura, de 54.000 hectares de
eucalipto ao ano, 1,6% da superfície do Maranhão.
Veja na tabela a seguir as previsões que as
empresas fizeram em 2005 a respeito da interrupção
do corte de mata nativa (fonte: ASICA).
Área
Siderúrgica
adquiri da
Área plantada
para plantio
(em ha)
% de carvão
produzido em
carvoarias próprias
(em ha)
Ano meta para ser
auto-suficiente
FERGUMAR
10.000
6.000
0%
Não há previsão
GUSA NORDESTE
27.000
10.000
0%
2010
SIMASA/ PINDARÉ
56.000
17.500
20%
2012
VIENA
52.000
20.000
55%
2011
FERRO GUSA CARAJÁS
75.000
32.000
100%
Já é
USIMAR
3.000
0
0%
Não há previsão
quem socializa os desastres ambientais ao longo de
mais de duas décadas. Dados tabulados por Monteiro (2004), indicam que para produção de uma
tonelada de ferro-gusa são necessários 875 kg de
carvão vegetal, cuja produção, por sua vez, requer a
utilização de pelo menos 2.600 kg de madeira seca,
que – quando se utiliza lenha originária de matas
11 CARNEIRO, M e RAMALHO, R. A crise econômica mundial e
seu impacto sobre as empresas de ferro-gusa: algumas informações
sobre o desempenho recente das empresas guseiras e o desemprego
no município de Açailândia. 2009.
Fórum Carajás outubro de 2010
Nos últimos anos, com a intensificação da
fiscalização nas fazendas pelo Grupo Especial de
Fiscalização Móvel, as empresas siderúrgicas da região foram acusadas pelo Ministério Público Federal de se beneficiarem da escravidão para produzir o
ferro gusa. Muitas delas tiveram que pagar quantias
elevadas em indenizações para os trabalhadores que
produzem o carvão.
12 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005.
26
Em 1999, visando adequar o trabalho desenvolvido nas carvoarias, as siderúrgicas do estado do
Maranhão firmaram um Termo de Ajustamento de
Conduta (TAC) junto ao Ministério Público do Trabalho (MPT) e à Procuradoria Regional do Trabalho,
envolvendo, também, empreiteiros e fornecedores
.Hoje13, percebe-se uma melhoria efetiva das condições de trabalho nas carvoarias, mesmo assim ainda
existem numerosas carvoarias clandestinas.
Além do desmatamento e do trabalho escravo,
há em Açailândia o grave problema da poluição, que
afeta povoados inteiros, parcialmente preexistentes
à instalação das siderúrgicas. É o caso de Piquiá de
Baixo. Em abril de 2008 a Associação Comunitária
de Pequiá de Baixo procurou o Centro de Defesa
da Vida e dos Direitos Humanos de Açailândia (CDVDH) e a Paróquia São João Batista. A parceria visa
enfrentar o problema da poluição provocada pelas
siderúrgicas no distrito industrial.
A Associação Comunitária há tempo buscava
denunciar a situação, batendo sem sucesso à porta
de diferentes instituições. A aliança dos moradores
de Piquiá de Baixo com o CDVDH e a Paróquia São
João permitiu coordenar melhor as ações, partindo
da oportunidade de um primeiro processo instituído
contra uma das siderúrgicas: a Gusa Nordeste.
De fato, em novembro de 2005, 21 famílias
moradoras de Piquiá de Baixo ( mais próximas fisicamente à empresa) denunciaram por danos a poluição produzida pela a siderúrgica Gusa Nordeste,
exigindo indenização. Depois de quase quatro anos,
apesar da pressão e do apoio popular, repetidas vezes solidário à causa daquelas famílias, os procedimentos legais ainda não se concluíram.
Com o objetivo de verificar a existência de
relação entre os casos denunciados pelas famílias14
com as atividades da empresa, a juíza da segunda
vara da Comarca de Açailândia encomendou uma
perícia ambiental nas dependências da empresa e
nas residências das famílias . Esse estudo somou-se
a um outro, encomendado pelo CDVDH, a respeito
da poluição hídrica pelas siderúrgicas15.
13 Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005.
14 Relatório de Perícia Ambiental apresentado à Segunda Vara Judicial da Comarca de Açailândia, dr. Ulisses Brigatto Albino, Imperatriz 2007. Perícia realizada dia 05 de Dezembro de 2006.
15 Estudo preliminar da situação ambiental da população de Piquiá,
eng. Mariana de la Fuente Gómez, Açailândia 2007.
27
Os estudos demonstram várias formas de poluição geradas pelas usinas. As águas de resfriamento, por exemplo, são bombeadas do ribeirão Piquiá,
escorrem pela superfície externa dos alto fornos e
logo voltam ao rio Piquiá aquecidas e contendo ferro e outros solutos, passando nesse percurso pelos
quintais das casas próximas às siderúrgicas.
Além de problemas ao meio ambiente, o processo pode gerar contaminação para os moradores
por meio da alimentação. O excesso de ferro armazenado e não absorvido pelo organismo pode gerar
graves conseqüências para o fígado e as células cardíacas das pessoas. Pela ausência de uma rede de
captação das águas fluviais internas ao pátio, toda
a escória de ferro e carvão da produção acaba escorrendo também no mesmo riacho logo abaixo dos
empreendimentos.
A escória vitrificada não é devidamente tratada, mas descartada no ambiente, podendo gerar
intoxicação de plantas, animais e pessoas. O vento
levanta a poeira e o “pó de balão”. O pó é uma sobra
da produção amontoada em cúmulos ao lado das casas. O próprio britador que reduz a sobra em partícula do fino levanta muita poeira, que cai em cima das
casas. No fim de 2009, uma das cinco siderúrgicas
encontrou uma maneira de evitar esses depósitos.
Outro aspecto relevante: nenhuma das chaminés dos 14 alto fornos das siderúrgicas possui
filtro de manga. À fumaça acrescenta-se partícula
do fino de carvão que se levanta em grandes nuvens
pretas toda vez que a combustão não é regular e precisa “desentupir” o forno.
Recentemente a Gusa Nordeste instalou uma
termelétrica alimentada pelas próprias emissões de
seus fornos. Isso lhe garante a produção de energia
elétrica para uso interno e, posteriormente, a possibilidade de obter recurso com a venda de créditos de
carbono. Apesar disso, o sistema não consegue conter todas as emissões das chaminés dos alto fornos, e
o povo continua tendo sua dívida de oxigênio.
Em setembro de 2001, mais um acidente terrível humilhou e fez violência sobre o povo. Aconteceu com Gilcivaldo, 7 anos, em busca de alguns
pedaços de carvão para esquentar a comida em seu
barraco. Avançou demais no monte de ‘munha’, uma
escória incandescente depositada pelos caminhões
das siderúrgicas, numa área livre e não protegida, ao
lado do povoado.
Fórum Carajás outubro de 2010
A munha esfria-se em superfície, mas se
mantém muito quente logo abaixo. O amontoado de
escória amoleceu e as pernas do adolescente acabaram se queimando até a bacia. Depois de 20 dias
de agonia, Gilcivaldo faleceu. Acidentes desse tipo
aconteceram também com outras pessoas e animais
que acabaram se queimando e prejudicando a pele e
às vezes parte das pernas.
Por causa de toda essa injustiça, o povo de
Piquiá de Baixo vive revoltado e luta há anos por
direitos e moradia. Quase todos os moradores estão
de acordo em sair do lugar. Negociam com as usinas
e o poder público o deslocamento do povoado para
uma nova região. A mediação é do Ministério Público e a assessoria do CDVDH e da Paróquia São
João Batista.
Sobre a situação ainda ambígua das siderúrgicas na região de Carajás, Monteiro (2004:1) dispara que:
Em que pese a produção siderúrgica ainda hoje
estar presente no discurso de diversos e amplos
segmentos sociais como elemento de modernização regional, ela cumpre um papel distinto,
conquanto amplia a pressão sobre a mata primária, caotiza diversos espaços urbanos; reforça segmentos sociais que articulam a sua lógica
produtiva à exploração predatória dos recursos
naturais, como os madeireiros, ou com grupos
sociais para os quais a grande propriedade fundiária é fonte de poder social, como os fazendeiros; amplia as tensões no campo e os conflitos
fundiários; e intensifica os esquemas de submissão da força de trabalho à baixa remuneração e a
condições de trabalho insalubres.
cessárias aproximadamente 450 mil toneladas/ano
de ferro gusa em estado líquido, transportado por
caminhões especiais que saem da Gusa Nordeste e
das outras siderúrgicas de Açailândia. Para a produção do aço precisará esquentar ulteriormente o ferro
gusa. O processo acontecerá inteiramente (ao dizer
dos empresários) pela queima de oxigênio líquido,
material muito caro que deverá vir do sul do País.
Para o esfriamento do processo de produção,
serão necessários 200 m³ de água por hora. O Relatório de Impacto Ambiental (RIMA) da aciaria garante que toda essa água será mantida em constante
circulação interna e bombeada através de poços artesianos. A construção da usina deve durar três anos
e a estimativa de geração de emprego gira em torno
de 1.000 postos. Existe a promessa de geração de
mais 1.000 empregos entre diretos e indiretos, no
ápice da produção.
Os movimentos populares acolhem com satisfação a aciaria, pois ela traz o tão esperado início da verticalização da produção no contexto local,
permitindo a valorização do trabalho maranhense e
dos recursos de nosso subsolo.
Porém existem inúmeras dúvidas e inquietudes. Uma das maiores recai sobre os investimentos
para a construção desse novo empreendimento. O
Banco do Nordeste irá financiar 300 milhões de reais somente na primeira fase. Por que, perguntam os
movimentos numa carta aberta à cidade - tão grande
investimento sem ter resolvido ainda os graves problemas de poluição e impacto que o resto das atividades está gerando há vinte anos?
Mais uma vez a lógica do lucro incondicional
parece prevalecer acima de qualquer outro direito.
c. A aciaria – um capítulo recente
d. Os fornos de Califórnia
Em maio de 2008 o Estado do Maranhão e
a Gusa nordeste de Açailândia assinaram um protocolo de intenções para a instalação de uma aciaria na cidade. O novo empreendimento prospecta a
produção de 500.000 toneladas anuais de tarugo de
aço (Billet), que tem tanto uso industrial doméstico
como para exportação. O Billet é o semi acabado
utilizado como matéria-prima para a laminação de
aços longos (vergalhões, fio máquina, perfis, barras
mecânicas etc.).
Para produzir a capacidade total, serão ne-
Fórum Carajás outubro de 2010
Ao lado do assentamento Califórnia, com
mais de 1.800 moradores assentados há 13 anos, instalou-se em 2005 o empreendimento da Ferro Gusa
Carajás (FGC). A empresa controlada pela Vale se
dedica à produção de carvão vegetal destinado a alimentar a siderúrgica da Vale em Marabá. O empreendimento é conhecido como Unidade de Produção
de Redutor (UPR), que é o carvão para siderurgia.
A Licença de Instalação foi emitida pelo Processo nº. 2334/03, prevendo um pátio de carbonização composto por 64 fornos retangulares e uma
28
estimativa de produzir 94 ton/
dia de redutor (carvão vegetal) .
Na realidade, foram construídos
72 fornos retangulares e 7 fornos de tamanho menor (fornos a
meia laranja), ocupando ao todo
uma área de 1.185m². Cada forno
retangular tem capacidade para
102m³ de madeira enfornada, ou
83m³ de carvão cada.
Cada queimador de gás é
planejado por oito fornos, portanto deveriam ter sido implementados 9 queimadores de gases. Na
realidade, atualmente existem
somente 2 queimadores. O primeiro começou a funcionar em
novembro de 2008, o segundo
em fevereiro de 2009. Atualmente, ambos estão quebrados e não
funcionam.
Pode-se concluir, então,
que de 2005 até 2009 os moradores do assentamento Califórnia
respiraram a fumaça emitida por
todos os fornos em funcionamento. Recentemente, a FGC fechou
metade dos fornos para diminuir
as emissões. Ao dizer da empresa, isso foi devido à preocupação
pela poluição. Sabe-se porém
que a escolha deve-se à redução
de produção de ferro gusa em decorrência da crise mundial. Atualmente funcionam só 4 das 11
unidades que alimentavam a siderúrgica da Vale em Marabá. A
perspectiva em médio prazo para
a FGC de Marabá é queimar carvão mineral da África.
A medição da qualidade
do ar nem sempre foi efetiva. No
Plano de Gestão da Qualidade, o
artigo previa a execução de um
programa de avaliação da qualidade do ar e de acompanhamento
da operação do queimador. Con-
forme o Relatório de Controle
Ambiental, para a avaliação da
qualidade do ar deveria ser monitorado o parâmetro ‘partículas
totais em suspensão’ (PTS). Para
isso, deveria ser instalado um
equipamento do tipo Hi-Vol a jusante da área do empreendimento,
com relação à direção predominante dos ventos.
Também nesse caso, foi somente em 2008 que dois medidores foram instalados. Até outubro
do mesmo ano, a SEMA nunca
29
recebeu um relatório oficial sobre
a poluição do ar; só chegaram alguns relatórios por e-mail. A própria Secretaria Estadual de Meio
Ambiente não quis levar até o fim
a ação contra a FGC. Apenas notificou a firma novamente em outubro de 2008, mas nunca recebeu
resposta a essa notificação, nem
assumiu nenhuma providência
por isso.
Há exemplos em profusão.
Os assentados entregaram um laudo médico à SEMA dando conta
Fórum Carajás outubro de 2010
de vários problemas respiratórios,
de pele e de vista em função da
fumaça dos fornos, especialmente
para com idosos, bebês e crianças.
No decorrer dos três anos
de difícil convivência com a
carvoaria, a comunidade de Califórnia por diversas vezes encaminhou denúncias ao Instituto
Brasileiro dos Recursos Naturais
Renováveis (IBAMA), ao Ministério Público Estadual e Federal,
à Vigilância Ambiental, às Secretarias Municipais de Saúde e de
Meio Ambiente. Representantes
do assentamento estiveram várias
vezes em audiências com representantes destes órgãos cobrando
providencias, chegando inclusive
a convidar estes para duas assembléias no assentamento. Ninguém
da representação pública compareceu.
O povo de Califórnia é
conhecido pelo histórico de luta.
Em março de 2008 os assentados,
com o apoio do MST, promoveram um ato político de ocupação
simbólica da fazenda Monte Líbano e de interrupção temporária da
BR 010. O ato tornou-se notícia
nacional e facilitou a mobilização
dos órgãos públicos e da fiscalização da área. Infelizmente, ainda
hoje em muitos casos o povo consegue se fazer escutar pelo governo somente engrossando a voz.
e. A Suzano e o deserto verde
No meio de todos esses
conflitos sócio-ambientais, o que
os movimentos temiam se fez
concreto: a Suzano chegou. A empresa logo alcançou certa fama na
região. “No período de 05 a 31 de
Fórum Carajás outubro de 2010
agosto a fábrica paulista Suzano
Celulose estará consolidando o
seu programa de retirada compulsória de comunidades tradicionais
da região dos cocais e do Tocantins. (…) O complexo de plantação do eucalipto envolve, só na
região dos cocais, 21 cidades e
atinge centenas de povoados, comunidades tradicionais: quilombolas e agricultores familiares,
atingindo
principalmente seu
modo de viver, produzir e reproduzir-se socialmente.” .
A própria empresa utilizou
a expressão “bota-fora” em seu
termo de referencia (Projeto SPC
1008). Um dos principais motivos
que leva a Suzano a instalar-se no
Maranhão é o grande volume de
água necessário para atender às
demandas de produção de celulose. O medo dos moradores da região é o que vai acontecer de suas
reservas de água e da esperança
cada vez mais fraca de reflorestamento com espécies nativas.
As florestas vendidas à Suzano eram anteriormente da Vale.
Somam 84.500 hectares de terra,
sendo 34.500 hectares plantados
com eucaliptos. A implantação
de mais esta indústria de celulose
tem como objetivo elevar a capacidade de produção de celulose e
papel, das atuais 4,3 milhões de
toneladas por ano até 7,2 milhões
de toneladas.
Os investimentos da Suzano podem chegar a US$ 700 milhões entre 2008 e 2015 na formação florestal no Maranhão . São
Luiz do Paraitinga (SP), Nazária
(PI), Santa Quitéria (MA), Eunápolis (BA): a lista de municípios
e territórios em conflito com a Suzano é grande. Inquieta imaginar
que talvez mais esse desafio re30
caia sobre Açailândia. Uma terra
marcada por uma distorcida visão
de desenvolvimento.
As respostas organizadas
do povo
Apesar dos conflitos, ou
talvez exatamente em função
deles, o povo de Açailândia, as
comunidades e movimentos não
desanimam e tentam se organizar.
Um primeiro sinal disso é a resistência teimosa dos moradores
de Piquiá de Baixo e de Califórnia. Humildes e iniciantes na luta,
mas corajosos e até agora muito
unidos.
A própria arte se coloca a
serviço dessa resistência e tenta
moldar junto ao povo um sonho
concreto de libertação. Os jovens
do grupo Juventudes pela Paz (Jupaz) montaram uma peça a partir
das histórias e dos contos dos moradores de Piquiá . Ver-se representados no corpo e nas vozes de
outros redobra as energias e esperanças dos lutadores daquele bairro, e multiplica na consciência de
outros uma luta que deve ser de
todos e todas.
Um outro eixo de denúncia
e proposta articulada de alternativas é a campanha “Justiça nos Trilhos”, que tem em Açailândia uma
de suas bases e pontos de divulgação. A campanha visa desmascarar a violência da companhia Vale
e seus impactos sócio-ambientais.
Além disso, propõe mecanismos
concretos de repartição do lucro
ao longo dos trilhos e articula as
vítimas da multinacional em nível
de Brasil e exterior. Nasceu no
final de 2007 sob a coordenação
de Missionários Combonianos,
anos e junta lideranças populares do município.,
onde a construção da cidadania, do controle social e
de todos os mecanismos de participação acontecem
de forma interativa, mediante a pesquisa coletiva e
a troca de saberes. Será desse curso e a partir dessa
rede que Açailândia terá novos conselheiros de direito, mais preparados/as e fortalecidos pelas alianças transversais que deverão se tecer nos próximos
meses.
“Que desenvolvimento é esse?” - perguntava o povo de Piquiá de Baixo com seus cartazes
na manifestação em frente ao Fórum da Comarca
de Açailândia. É a pergunta que ressoa ao longo de
todo esse texto: qual é o mundo que sonhamos e que
gostaríamos de entregar para nossos filhos? E os
moradores, filhos primogênitos desse jovem município de somente 26 anos, que mundo receberam no
começo da cidade? O que sobrou de tanta riqueza
natural? Em que direção queremos trilhar o tal de
‘progresso’?
Voltará o município a ser a “cidade do açaí”,
à sombra dos saudosos piquiás?
foto: Nils Vanderbolt
Fórum Carajás, Sociedade Maranhense de Direitos
Humanos, Fórum Reage São Luís, Cáritas Maranhão, Sindicato dos Ferroviários e CUT. A campanha alcançou em breve tempo os atingidos pela Vale
em MA, MG, PA, RJ, Peru, Argentina, Chile, Equador, Moçambique e Canadá .
Ainda em Açailândia, em tempos de crise e
desemprego, uma aliança entre movimentos sociais
permitiu a criação do “Movimento Popular em favor da Justiça e da Dignidade Humana”. Trata-se de
uma rede de entidades, associações de moradores,
sindicatos, comunidades cristãs em busca de encaminhamentos locais para minimizar o impacto da
crise e buscar alternativas e enriquecimentos para
o modelo produtivo de Açailândia, marcado pela
fragilidade e pouca diversificação. Esse movimento
organizou em maio de 2009 um grande seminário
sobre crise e desemprego. Um marco importante no
município para provocar uma reflexão comum sobre
temas tão delicados.
Último sinal de esperança e de organização
popular é a Rede de Cidadania. Ela existe há dois
31
Fórum Carajás outubro de 2010
Referências
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Contas Nacionais, 2006
www.vienairon.com.br – Exportação anual de
500.000 ton de ferro gusa, com um preço antes da
crise de 750 $ por tonelada
CARNEIRO, M e RAMALHO, R. A crise econômica mundial e seu impacto sobre as empresas de
ferro-gusa: algumas informações sobre o desempenho recente das empresas guseiras e o desemprego
no município de Açailândia. 2009.
Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005
Relatório Social Instituto Carvão Cidadão, 2005 Relatório de Perícia Ambiental apresentado à Se- http://www.carvaocidadao.org.br/ata/relatorio_so- gunda Vara Judicial da Comarca de Açailândia, dr.
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de Açailândia e às autoridades sobre a nova aciaria
BRASIL. 1989. Secretaria de Planejamento da Preem construção no Piquiá - Paróquia São João Basidência da República. Programa Grande Carajás.
tista, Centro de Defesa da Vida e dos Direitos HuSecretaria Executiva. Plano-diretor do Corredor da
manos, Sindicato dos Metalúrgicos, Associação dos
Estrada de Ferro Carajás. Brasília, NATRON. 536p
Moradores de Piquiá, Centro Comunitário Frei Tito,
Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais,
Ministério do Trabalho e Emprego/Cadastro Geral Sintrasema, Sindimotaa, Associação Rádio Comude Empregados e Desempregados.
nitária Açailândia
Procedimento n. 116/05 – Ministério Público do es- Parecer Técnico da Superintendência de Fiscalizatado do Maranhão
ção, Licenciamento e Defesa dos Recursos Naturais
da Secretaria Estadual de Meio Ambiente do MaraSOUZA, Emilene Leite. “De passagem”. Univer- nhão - Antônio Cesar Carneiro de Souza e Cláudia
sidade Federal do Maranhão/UFMA Imperatriz Cristina Ewerton Dominice, abril de 2008
- CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS, SAÚDE E
TECNOLOGIA/CCSST 2009
CARNEIRO, Denilton - Povos, comunidades tradicionais, políticas étnicas e desenvolvimento susMONTEIRO, Maurílio de Abreu . Siderurgia na tentável. http://www.ecodebate.com.br/2009/08/15/
Amazônia Oriental brasileira e a pressão sobre a fabrica-de-celulose-promovera-bota-fora-nas-regiofloresta primária. In: II Encontro da Associação es-dos-cocais-e-tocantins-no-maranhao-artigo-deNacional de Pós Graduação e Pesquisa em Am- denilton-santos-carneiro/. Capturado no dia 15 de
biente e Sociedade - ANPPAS, 2004, Indaiatuba-SP. agosto de 2009.
Anais do II Encontro da Associação Nacional de Pós
Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade. Peça teatral “E ao pó voltaremos” - direção Xico
Indaiatuba : ANNPAS, 2004. v. 1. p. 1-19
Cruz – Açailândia 2009
Fórum Carajás outubro de 2010
32
Itupanema em meio ao projeto
Albras – Alunorte: o desencanto do mundo
Gilvandro Ferreira Santa Brígida
1
A
literatura sobre os grandes projetos na Amazônia sinaliza sobre os passivos sociais e ambientais. Os mais comuns são a pressão sobre os recursos naturais, o deslocamento de populações
consideradas tradicionais, o inchaço das cidades, a elevação do preço da terra e de aluguéis.
Assim o foi a experiência na comunidade conhecida como Itupanema, no município de Barcarena,
norte do Pará. O município abriga as principais indústrias da cadeia produtiva do alumínio do Brasil. O presente artigo tenta fazer o registro sobre o processo da presença das empresas Albrás e Alunorte, vinculadas
a Vale (a Vale Transferiu em Maio/2010 todas as suas participações na Albrás, Alunorte e da Companhia
de Alumina do Pará-CPA para a Norsk Hydro) e a desagregação social e ambiental em Itupanema, numa
peleja marcada pela desigualdade entre as partes envolvidas.
O trabalho coletivo na terra é uma prática social desenvolvida secularmente pelos agricultores/ribeirinhos e extrativistas da Amazônia. Entre as particularidades tem-se a distribuição de tarefas por gêneros
ou por faixa etária. A reprodução das práticas é produto de socialização no meio familiar. A relação de
colaboração permite que os grupos familiares enfrentem as adversidades.
1 Sou bacharel e licenciado pleno em Ciências Sociais, com ênfase em Sociologia. UFPA.
As famílias praticam a agricultura de subsistência, na qual o agricultor procura assegurar para
sua família o alimento necessário. E só depois comercializa o que sobrou. Esse processo de comércio
era realizado de vez em quando através da “marretagem ”.2
O processo de urbanização no município coaduna-se com a chegada do projeto ALBRAS/ALUNORTE, na década de 1980. As empresas integram
o portfólio da Vale, hoje Norsk Hydro. As radicais
transformações consistiram na expulsão de grupos
familiares de seus sítios, na desagregação das famílias camponesas, onde a terra perde a condição de
fornecedor de meio de subsistência, para transformar-se em mercadoria.
Tudo começou antes. Lá nos anos 1970. A
pressão sobre a terra e as riquezas vegetais e minerais, através dos grandes projetos, agrava os embates sociais e a agressão ao meio ambiente na região
amazônica.
Os grandes projetos constituem-se em principal instrumento da política desenvolvimentista
concebida pelo governo militar de 1964. Tal política
ressalta o potencial dos recursos naturais da região,
em particular as riquezas minerais e a hidrográfica.
Aos olhos dos estrategistas, a Amazônia não passava
de vazio demográfico. Indígenas, ribeirinhos, quilombolas e tantas outras variações do campesinato
local nunca existiam na cabeça dos militares.
Os problemas ocasionados por esse modelo de desenvolvimento só serão medidos nos anos
posteriores, a partir do deslocamento das famílias de
suas terras e convívio com questões até então totalmente desconhecidas.
A luta pela terra: grandes corporações
versos comunidades tradicionais
Nos anos 1980 instala-se em Barcarena o
complexo de alumínio ALBRAS/ ALUNORTE,
parte do programa grande Carajás, provocando a
desapropriação de aproximadamente quinhentas famílias. O modelo de projeto instalado em Barcarena
não internaliza riqueza no local. Assim explicam os
tratados das academias.
A Associação dos Desapropriados de Barcarena nasce anos mais tarde. Emerge pela necessi-
2 O processo consistia na mobilização de moradores para otimizar o
transporte de mercadorias até Belém.
Fórum Carajás outubro de 2010
dade de fazer frente ao processo de expansão e de
desenvolvimento econômico das empresas e contra
a pauperização imposta aos antigos moradores do
espaço onde a fábrica se instalou.
O problema da desapropriação volta à cena
nos anos 1990, com a instalação das empresas do
projeto Caulim – Pará Pigmentos S/A e Rio Capim
Caulim S/A, também vinculada ao grupo Vale. Em
1993, a Companhia de Desenvolvimento Industrial
do Pará (CDI) desapropriou famílias que moravam
na localidade de Ponta da Montanha. Os moradores
do local, situado em frente ao rio Pará, foram transferidos para a área do Curuperé, situada nos limites
da Vila do Conde3. A comunidade da Montanha cedeu lugar para a construção do terminal portuário de
exportação do caulim.
Esta ocupação causou profundas transformações na estrutura produtiva, e no modo de vida da
população residente nas áreas atingidas. E principalmente quando estas mudanças não cessaram por
completo, pois a cada dia surgem novos desafios.
Entre eles como as “comunidades” atingidas devem
criar novas estratégias de organização e de sobrevivência, diante da força do capital que se implanta na Amazônia, em particular em Bacarena.
Barcarena registra novas tensões entre moradores tradicionais e empresas do grande capital em fase
de instalação no município, como a refinaria chamada
Companhia de Alumina do Pará (CAP)4. O projeto adota um processo de expulsão mais sofisticado e cruel do
que há trinta anos. A instalação da CAP tem derrubado
casas dos moradores locais. Assim ficam impedidos
de voltar. A expulsão dos moradores assemelha-se a
um regime de exceção.
Há resistências, ainda que débeis. Mas, o isolamento e as técnicas de terror promovidas pela empresa acabam por fazer com que os moradores deixem suas casas em troca de indenizações miseráveis,
que não garantem a compra de outro imóvel com as
mesmas características do anterior. O que assusta
neste modelo é que tudo é feito com a conivência do
estado, ou seja, institucionalizado. Como resultado
deste modelo tem-se a pauperização crescente do trabalhador rural, embora havendo algumas exceções.
3 Considerada conglomerado urbano de Barcarena, onde outras famílias de antigos posseiros já habitavam.
4 O projeto transferido da Vale para a empresa norueguesa Norsk Hidro (20%) e deve produzir 1,9 milhão de tonelada/ano na primeira
fase e 7,4 toneladas no apogeu da produção. U$$2,2 bilhões devem
ser investidos. A previsão é a produção se inicie em 2011.
34
O Município de Barcarena
30 km separam o município de Barcarena de
Belém, em linha reta. Na verdade, encontra-se separado de Belém pelo rio Pará e pela ilha das Onças,
sem os quais poderia ser visualizado a partir de Belém. O município está estruturado para efeito administrativo com a seguinte configuração geopolítica:
Barcarena, sede e Distrito de Murucupi – (Vila dos
Cabanos, Vila do Conde, Vila de São Francisco, Vila
de Itupanema, Vila Nova e Vila do Laranjal).
Segundo ROCQUE (1994), reza a tradição,
que o nome “Barcarena” se originou do fato de ter
existido, naquela localidade, quando ainda era uma
Missão Gibirié, uma barca muito grande denominada Arena. Apesar da deterioração da barca, as pessoas continuavam chamando aquela área de “Barcaarena”; simplificando, então, para a denominação
“Barcarena”. Esta denominação foi usada para batizar o local que ainda existia em uma enseada pedregosa, coberta por uma grande casa chamada “Casa
das Canoas”, do lado esquerdo da Matriz.
Sua elevação à categoria de “Vila” aconteceu
mediante a promulgação da Lei Estadual nº 94, de
10 de maio de 1897, ocorrendo sua instalação em 02
de janeiro de 1898, conforme determinado no Decreto nº 513, de 13 de dezembro de 1897. Somente
em 1956 foi reconhecida sua composição territorial,
formada por dois distritos: Barcarena (sede) e Murucupi, permanecendo esta configuração territorial até
os dias de hoje.
VILA DE ITUPANEMA E A ORGANIZAÇÃO SOCIAL TRADICIONAL
A Vila de Itupanema está situada na região
Noroeste do município de Barcarena, à margem direita do rio Pará. A Vila corresponde a um pequeno núcleo urbano, servindo de área residencial de
população ocupada em atividades agrícolas, pesca
e pequeno comércio. Uma pequena parcela destes
moradores trabalha nas empresas prestadoras de serviços para a ALBRAS – Alumínio Brasileiro S/A, e
a ALUNORTE – Alumina do norte do Brasil entre
outras.
Itupanema constitui uma antiga ocupação,
como a sede de Barcarena e a Vila do Conde. Dife35
rindo das ocupações mais recentes, que surgiram em
função do projeto ALBRAS – ALUNORTE, como:
Laranjal, bairro Pioneiro bairro Novo e Romeu Teixeira (CHAGAS, 2002). Entretanto, não se pode
deixar de frisar que a expansão de Vila de Itupanema, deu-se em função da implantação do projeto Albrás e Alunorte.
A Vila de Itupanema tinha seus mais antigos
registros de moradores vinculados à Freguesia de
Beja, ou São Miguel de Beja, não se sabe ao certo.
Segundo os moradores mais antigos a denominação “Itupanema” deriva do nome de uma praia,
cuja enseada chamava-se Panema. Na frente dessa
praia havia uma grande quantidade de pedras, que
os índios e os moradores chamavam de “Itu” (que
em Tupi Guarani significa grande).
Na época os pescadores e todos os navegantes que seguiam rumo a Belém, paravam na praia
de Panema, usando-a como abrigo, a fim de se protegerem dos temporais e marés fortes, além de reduzir o tempo e agilizar a viagem. Os navegantes
acostumaram-se a dizer: “vamos parar aqui na praia
de Itu-panema”, a partir daí denominou-se a vila
surgida posteriormente, revela Odineide Valente,
líder comunitária.
A origem de Itupanema, em si, não seria relevante, não fosse à insistência do mito de origem, a
demonstrar a existência de uma tradição, que tem o
papel de legitimadora de direito a terra, em oposição
aos invasores recém-chegados.
A partir da década de 80 a população da Vila
de Itupanema cresceu, pois, à vila original foram
agregados dois outros núcleos: Vila Nova e Vila
União. A primeira criada para abrigar as pessoas
que residiam nas terras onde foram instaladas as
empresas Albrás e Alunorte. E posteriormente por
trabalhadores atraídos pelo projeto e, embora não
conseguindo se inserir neste, permaneceram nas
proximidades das fábricas.
O bairro de Vila Nova surgiu em 1982, quando a ALBRAS reservou uma grande área para transferir a população que residia nos sítios onde estão
localizadas as instalações das fábricas e a zona portuária. Assim como a área do núcleo urbano, onde
foram construídas as casas para os trabalhadores da
Albrás e Alunorte. A partir daí o bairro vem tendo
um crescimento totalmente desordenado, sem neFórum Carajás outubro de 2010
nhum planejamento por parte do poder público. O
Centro Comunitário de Vila Nova ficou com a responsabilidade de organizar o loteamento das pessoas que chegavam ao lugar.
O bairro da Vila União é o mais extenso e o
mais densamente ocupado. Na mesma proporção estão os problemas, em virtude do seu acelerado crescimento, não há saneamento básico e infra-estrutura
urbana. Este bairro se tornou uma grande área de
ocupação, que foi muito combatida pelas empresas
Albrás e a Companhia de Desenvolvimento de Barcarena (Codebar), que tentou de todas as maneiras
evitar a ocupação, usando inclusive a força policial.
Vários líderes comunitários foram presos durante a
ocupação, mas as empresas não conseguiram evitar
o assentamento. O que vemos hoje na Vila União é o
retrato do descaso de uma administração avessa aos
interesses da população.
A Vila de Itupanema, durante muito tempo,
teve um povoamento muito lento, constituindo-se,
portanto, em um pequeno vilarejo de sitiantes rurais.
Na década de 80, seu crescimento era ainda relativamente baixo. O aumento da população, assim como
a expansão territorial acontece a partir do início da
década de 90. Momento em que a vila recebe muitas
pessoas excluídas do Projeto ALBRAS, e também
trabalhadores oriundos da construção da Alunorte,
que ajudam a fundar inúmeras áreas periféricas em
Itupanema.
Após o assentamento das pessoas interessadas, e com pouco tempo novas ocupações voltaram
a acontecer. Foram impulsionadas pela migração de
mineiros, maranhenses, gaúchos, entre outros. Para
os antigos moradores de Itupanema é clara a aversão
aos trabalhadores oriundos de outros estados, tratados como “os de fora”. Eles são responsabilizados pelos problemas provocados no lugar após a implantação das Empresas. Entre eles: roubo, prostituição,
formação de gangues, etc, assemelhando-se à situação relatada por Norbert Elias (op. cit.).
Os movimentos migratórios em Itupanema
refletem, como em toda a Amazônia, o que ocorre
no seu espaço, como reflexo do processo de ocupação territorial e de mobilização da força de trabalho.
Esta força de trabalho muitas vezes sem a qualificação exigida para trabalhar diretamente nas empresas, acaba ficando em áreas próximas ao projeto.
Fórum Carajás outubro de 2010
E constituem-se em bolsões de reserva de mão-deobra barata e disponível para qualquer serviço pouco qualificado.
BECKER, B. (1991) destaca o papel desta população flutuante, no sentido de viabilizar as
grandes obras, os grandes projetos. Entretanto, há
outro lado da questão a ser ressaltada. Esta população, que é atraída para área deste tipo, promove,
também, um problema de natureza social pelo fato
de não ser assimilada, em sua maior parte, nestes
empreendimentos. Na medida, também, em que as
atividades econômicas praticadas tradicionalmente nesta área (extrativismo vegetal, pesca, pequena
agricultura) estão em crise, não podendo absorver
outras pessoas.
Boa parte dos moradores mais antigos de
Vila de Itupanema possuía sítios nas áreas ocupadas
pela ALBRAS e pela ALUNORTE. A CODEBAR e
a Companhia de Desenvolvimento Industrial (CDI)
desapropriaram os terrenos localizados à beira do
rio Pará. Nestes sítios eles trabalhavam nas roças,
nas quais plantavam mandioca, milho, arroz, feijão,
melancia, amendoim, como também pescavam, caçavam e coletavam muitas frutas. Entre elas: pupunha, bacuri, uxi, cupuaçu, biriba, piquiá, entre outros, e ainda extraíam carvão.
Estes moradores se referem com muito pesar a estas perdas, pois não perderam simplesmente
seus sítios, mas, como dizem na região, formas de
sobrevivência. Pois de lá tinham como adquirir alimentos básicos importantes, sem estas alternativas,
passaram a comprar estes produtos ou consumi-los
em menor quantidade, e até deixar de consumir os
de menor importância na dieta alimentar. Tem-se assim mais uma questão, a segurança alimentar.
Os moradores destas áreas ocupadas pela ALBRAS – ALUNORTE moveram uma ação na justiça através da Associação em Defesa de Barcarena
(ADEBAR) exigindo indenizações pelos seus sítios,
já que apenas uma parte da população recebeu indenização. Esta ação se estende há quase trinta anos,
sem resultado favorável para os moradores.
Segundo alguns dos antigos moradores, após
a instalação da ALBRAS e da ALUNORTE; ocorreu uma diminuição significativa na quantidade e
tamanho dos peixes, que costumavam pescar nos
“pesqueiros” (locais onde os peixes se concentra-
36
vam), e que também, são encontrados, com freqüência, peixes mortos na orla, mais próximo ao terreno
daquelas empresas.
Entre os anos de 2003 a 2008 aconteceram
vários acidentes ambientais nas praias de Itupanema, com o registro da mortandade de peixes. Fato
registrado nos jornais de grande circulação do Estado, e também através de informações do Sindicato
dos Químicos de Barcarena. A entidade representa
os trabalhadores da Alunorte, empresa responsável
por algumas das contaminações.
O processo de redefinição do território no
município de Barcarena tem inúmeras implicações,
a exemplo do que ocorreu para a construção do núcleo urbano ou Vila dos Cabanos. A expulsão das
populações tradicionais para a implantação do processo industrial inviabilizou a agricultura familiar.
A pequena dimensão dos lotes na Vila Nova, local
de reassentamento dos moradores, onde atualmente se encontra a área do projeto Albrás/Alunorte é
revelador sobre assunto. As áreas foram entregues
totalmente desmatadas, sem as plantas e árvores frutíferas da região e o solo impróprio para o plantio.
Atualmente apenas uma pequena parcela da
população de Itupanema se dedica às atividades
agrícolas, embora morando na área urbana. Exercem
um misto de atividades, pelo que pode ser observado, trabalhando em pequenas roças e também praticando atividade de natureza urbana, como pequenas
vendas, e fazendo “bicos” diversos como estratégia
de sobrevivência. Isso mostra o quanto é importante
o apego a terra. Mesmo com todas as intervenções
praticadas, a pequena agricultura, embora de forma
restrita ainda resiste.
A pesca artesanal também é considerada uma
atividade fundamental para a sobrevivência da população local. Existem poucos pescadores, em torno
de trinta famílias que resistem nesta atividade. Como
já citado, a quantidade de peixe sofreu redução em
função das contaminações e o constante trânsito de
navios que trazem e levam matéria prima para as
empresas.
Na visão capitalista trazida junto com as empresas, vida rural é parte do passado, e por isso há
uma necessidade urgente em urbanizar Barcarena. A
população local, no planejamento dos grandes projetos, aparece como um entrave, como um obstáculo
37
para o desenvolvimento da região, que deve ser removido em nome do progresso.
Hoje na Vila de Itupanema o passado é representado pela igreja católica que esta localizada na
Praça Matriz, a escola Presidente Dutra que data de
1950 e o cemitério da cidade. Fora isso, tudo mudou, o lugar calmo e bucólico está presente apenas
na memória dos antigos moradores.
A realidade de Itupanema é apresentada de
forma mais crua pelos filhos dos agricultores, que no
momento das desapropriações eram crianças. Hoje,
adultos, não encontram terra suficiente para plantar.
Por isso não podem ser agricultores, nem tão pouco
pescadores, já que a pesca ficou inviável com a criação do Porto da Vila do Conde e as contaminações
ambientais ocorridas no rio Pará. Por outro lado,
também não tiveram a oportunidade de estudar para
adquirir uma profissão. A geração de jovens de hoje
não possui, a princípio, as condições adequadas para
pleitear um emprego na região. Restou para estas
duas gerações o direito de assistir ao crescimento espantoso das empresas ALBRAS/ALUNORTE e perceber o quanto o sonho de trabalhar ficou distante.
Durante estes longos anos de projeto não foi
apresentado qualquer projeto de inclusão para os
jovens de Itupanema. Percebemos o crescimento
da violência, prostituição infantil, o alcoolismo e
a mendicância no município, são problemas tipicamente urbanos.
Do outro lado, as empresas da Vale apresentam os melhores índices de crescimento econômico
de sua história, principalmente as apresentadas neste artigo. Hoje as empresas da área de alumínio são
as “meninas de ouro” da Vale, mas as comunidades,
em nenhum momento são lembradas. As empresas
esquecem a divida social, que em três décadas de
projeto em solo Barcarenense se amplifica. Ao longo dos anos de exploração de Alumínio e Alumina
na região, o que tem ficado é o rejeito enterrado na
terra que alimentava os filhos e filhas de Itupanema.
Memória e Desencantamento
A história oral pode fornecer elementos difíceis de serem encontrados em documentos ou livros.
Pode fornecer informações novas, bem como a chave explicativa de fatos. Apesar dos depoimentos que
envolvem a memória, se constituírem em história
construída a posteriori, contém marcos temporais
Fórum Carajás outubro de 2010
pessoais e coletivos que permitem contar a história
de outra maneira. Nos relatos, encontramos certa
idealização do passado e uma construção dramática do passado mais recente, no entanto, trabalhar os
depoimentos relacionalmente (BOURDIEU, 1989)
permite evitar a naturalização dos depoimentos.
Memória de Itupanema - a linha da história
através do olhar de um pescador
O depoimento do pescador aposentado Eurico, que mora na região desde 1928, ajuda a elucidar
o processo de redefinição da realidade de Itupanema.
O pescador rememora que em 1940 o número de
famílias era pequeno, a iluminação garantida através
do querosene, as casas cobertas de palha e o lazer vinha de bandas do vizinho município de Abaetetuba.
Aqui o pescado era farto, não tinha bandidagem. Cada um tinha a sua roça, seu forno de farinha,
lembra Eurico. Conforme o pescador, o quadro começou a ser alterado a partir da década de 1950. E
se agravou com a instalação das empresas da Vale.
Sobre a redução do peixe pondera que: “a Alunorte
despeja aquele licor dela. Com essa soda cáustica,
morre muito peixe. Morreu muito. Hoje tem gente
aqui que passa até fome. Tem apenas alguns pés de
manga”. As transformações se aceleram em 1985,
sublinha o pescador.
Além do processo de reconfiguração do território da região, Eurico salienta o papel coercitivo
da empresa. Segundo Eurico, a Albras tem mandado
até prender quem entra em áreas controladas pela
empresa e proibir a produção de carvão:
Gilvandro - Por que as empresas da Vale proibiram
de fazer carvão?
Eurico - Por que é tudo dela isso aí. Enganaram o
pessoal que está até para Brasília. São 580 famílias
que estão na justiça O dinheiro está lá nós já demos
50 cruzeiros e mais 50 para o advogado, está correndo há mais de dez anos. E nada foi resolvido. Teve
gente que pegou 20 cruzeiros de indenização, o que
dá isso?
Gilvandro - Mas o que foi esses 20 cruzeiros? Para
que?
Eurico - Para pagar a casa e o terreno. Nós lá em
cima trabalhávamos com o japonês, Tako Yamada.
Ele disse: Eu dou 800. O terreno é grande. Mede
Fórum Carajás outubro de 2010
100 por 200 metros que eu vejo para ti. Foi ai que
eles foram na casa do Dr. César...
Gilvandro - César Bentes?
Eurico - Sim, eu fui também. Olha, viram os pés
de planta, os seis fornos, duas tarefas de roça, uma
casa de farinha e a casa. Ele disse : vamos pagar
só o forno, com a casa da farinha e as roças. O sítio
com as casas fica pra depois. Vamos dar 20. Eu disse: não, 60. Aí fiquei com 60. Fiquei com dinheiro.
Eles primeiro davam cheque. Aí peguei os 60, 20 e
depois 40. Aí não pagaram. Fui chamado em Barcarena. Não veio o da casa, só o do forno com a roça
e a casa de farinha. Tem um dinheiro para a gente lá.
Mas nunca mais veio.
Gilvandro - Vocês entraram na justiça?
Eurico - Foi o advogado que botou, mas está lá em
Brasília... O padre está no meio, também.
Gilvandro - Qual padre?
Eurico - Eu me esqueço o nome do padre. Acho
que é o padre Primo.
Gilvandro - Na época ele estava aqui em Itupanema?
Eurico - Sim. Na época ele estava aqui.
Gilvandro - A igreja tinha terra, também?
Eurico - Ele estava a favor da gente.
Gilvandro - Ah, ele ajudou.
Gilvandro - Como foi essa organização de vocês
para entrar na justiça contra a Albras?
Eurico - Eles vieram de Belém, o meu concunhado
tinha também um terreno, deu cincoenta, encheu o
centro paroquial lá de Barcarena. Eles falaram isso
custa muito a justiça talvez uns três ou quatro anos,
já tem mais de 20 anos e nada. Este dinheiro esta lá
em Brasília.
Gilvandro - Quantas famílias na sua época foram
desapropriada?
Eurico - Quinhentas e oitenta, agora já botaram oitocentas, novecentas, mas é mentira é somente quinhentas e oitenta famílias.
Gilvandro - Quinhentas e oitenta famílias foram desapropriadas aqui em Itupanema?
Eurico - Praticamente sem nada, pois deram uma
besteirazinha, compraram terreno aí na Vila Nova
onde estão morando, outros estão lá pro CDI, lá pra
colônia.
Gilvandro - A Vila Nova eram pessoas que moravam lá no núcleo urbano?
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Eurico - Não eram do Murucupi, do centro que chamavam assim.
Gilvandro - Aonde é a Albras e a Alunorte hoje?
Eurico - Não na Albrás e Alunorte era o pessoal do
Conde, era muita gente do Conde. Era a turma que
morava aqui pra trás.
Gilvandro - Onde foram desapropriadas as terras?
Eurico – Foi.
Gilvandro - E ai formou a Vila Nova?
Eurico - Formou a Vila Nova, e aqui pra trás foi a Codebar que desapropriou. Depois invadiram.
Gilvandro - O Jardim cabano era terras de vocês?
Eurico - É todinho invadido.
Gilvandro - Eram terras dos moradores?
Eurico - Pra cá os Valentes, pra lá era de outros moradores.
Gilvandro - Itupanema basicamente era da família
Valente, ou tinham outras famílias?
Eurico - Aqui atrás tinha a família Valente, ali em
baixo os Cruz. Não era muita gente. Era bem dizer
mais ou menos uns quinze. Com os filhos era mais.
Gilvandro - Não se faz mais farinha, carvão, não se
tem mais terra?
Eurico - Tem, mas eles tomaram.
Gilvandro - Tem terra, mas não é mais dos moradores?
Eurico - Ficaram com as terras. Nós tivemos duas
audiências. Uma lá na câmara que foi o pessoal da
Alunorte, deixa estar por ali falou e tal. Ai do Murucupí ganharam. Estão ganhando 15 cestas básicas.
Gilvandro - Da época da contaminação?
Eurico - São agora os daqui de fora não, veio o pessoal da Alunorte ai. Veio pessoal da ação social, as
duas secretárias. A Michelle, que é a presidente ficou de vir mais não veio, pois vinha o presidente da
colônia.
Gilvandro - Mais pra falar com os pescadores?
Eurico - É... que elas ainda disseram: cesta básica
era bom. Amanhã a gente vem aqui pra conversar.
Eu disse não, é o seguinte: por que isso aí, vai ser
todo o tempo, vai chegar um tempo da gente pisar
na praia e encher o pé todo de piche. Vai ter mais
fábrica aqui, já estão fazendo outra pra bando de
Conde de novo.
Gilvandro - Como é a situação dos pescadores
hoje?
Eurico - Ah, é muito difícil com a Alunorte. Disse:
olha pra Alunorte e a Albrás dez ou quinze barcos
com redes é o mesmo que dar um doce pra uma
criança. Não é nada.
- eu vou lhe explicar logo aqui na Albrás e na Alunorte, uma barcada desses com alumínio, paga tudo
e ainda sobra. Dá muito resultado isso.
Gilvandro - Quem falou foi o Funcionário da Alunorte?
Eurico - Sim, ele disse vamos ver como é. Ficaram
de vir e não vieram mais.
Gilvandro - Essa reunião foi com os pescadores?
Eurico - Foi só com os pescadores.
Gilvandro - Existe colônia dos pescadores em Itupanema?
Eurico - Não, tem em Barcarena. Na sede tinha um
rapaz aqui. Mas, só fazia cadastrar os pescadores.
Gilvandro - Quem é o presidente da comunidade?
Eurico - Era o seu Morais e o Pancho. Agora eles
estão fora porque vai ter eleição que é pra ver quem
é fica de novo.
Gilvandro - Existe outro centro comunitário?
Eurico - Tem o outro centro da Vila Nova.
Gilvandro - E como é a relação de Itupanema com
os moradores de Vila Nova? Como é que vocês se
entendem?
Eurico - Isso aí é tudo Itupanema. Lá só botaram o
apelido de Vila Nova, mas é tudo Itupanema. Tem
uma igreja lá. Uma festa do livramento acontece em
maio. A nossa é em setembro, Nossa Senhora das
Dores é a padroeira.
Gilvandro - E a Vila União?
Eurico - Vila União é pra trás da invasão
Gilvandro - Invasão?
Eurico - É invasão. O Moraes falou se ganhasse a
eleição, ele ia fazer um troço muito bacana. Ele me
disse: olhe seu Eurico eu vou fazer minha prestação
de conta aqui então eu falei: vamos ver se ele vai
fazer mesmo. Entra prefeito sai prefeito aqui não faz
nadinha. O Laurival Cunha só botou água.
Gilvandro - As Empresas desenvolvem algum trabalho na comunidade?
Eurico - Se fez alguma coisa foi a Albrás.
Gilvandro - O que ela fez?
Eurico - Há... isso aqui, né?
Gilvandro - Bloquete?
Eurico - Bloquete. Ajeitou a praça. Em Vila Nova
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Fórum Carajás outubro de 2010
fez uma, como é que chama essa coisa de bater
bola?
Gilvandro - Quadra.
Eurico - E a Igreja lá que eles ajudaram a forrar o
telhado ficou bonito. Nós não temos ajuda de nada,
o prefeito não ajuda em nada.
Gilvandro - O senhor passou toda estas mudanças
depois que vieram as empresas, a vida aqui do povo
de Itupenema, como ficou?
Eurico - Em parte piorou. O pessoal daqui não tem
trabalho. Quando aparece ele pedem dois, três anos
de experiência. Daqui não tem quatro pessoas na Albrás.
Gilvandro - Aqui de Itupanema?
Eurico - Da Vila Nova parece que tem dois. Daqui
agora não tem nenhum.
Gilvandro - Tem muito jovem aqui na idade de trabalhar?
Eurico - Tem. O que não tem é emprego.
Gilvandro - Não tem emprego?
Eurico - Se você vai numa firma atrás de emprego,
eles mandam para o Serviço Nacional de Emprego
(SINE). Lá eles distribuem senhas. E mandam voltar
no outro dia. Lá no SINE eles distribuem sopa para
as pessoas desempregadas. Tem gente que vai só pra
beber aquela sopa e volta.
Gilvandro - Há muito desemprego aqui em Itupanema?
Eurico - Muito desemprego. Principalmente o pessoal que mora na beirada que vive da pesca. O prefeito podia nos ajudar.
Gilvandro - Como seu Eurico?
Eurico - Assim, com uma cesta básica para as famílias. Eu não. Eu e a minha mulher já estamos aposentados pela pesca. Hoje tem gente passando fome
aqui.
Gilvandro - Quantos pescadores existem ainda aqui
em Itupanema?
Eurico - Quinze.
Gilvandro - Quinze pescadores ou quinze famílias?
Eurico - Só quinze pessoas.
Gilvandro - Só quinze que pescam, e os outros?
Eurico - Temos pouco pescador aqui.
Gilvandro - Mais antigamente tinha muito pescador?
Eurico - Tinha um bocado de pescador. Uns já morFórum Carajás outubro de 2010
reram, outros já trabalham em outro serviço.
Gilvandro - Trabalham onde?
Eurico - Fazem bico por aí e vão vivendo a vida.
Gilvandro - Bico?
Eurico - Trabalho de carpinteiro e pedreiro. Não
tem emprego pra eles.
Gilvandro - Mudaram de profissão para poder sobreviver?
Eurico - Sim. Agora os quinze que tem aí tem que
ser da pesca mesmo.
Gilvandro - Eles continuam pescando?
Eurico - Sim.
Gilvandro - Eles possuem barco?
Eurico - Não. Só canoa pequena.
Gilvandro - Canoa pequena?
Eurico - Arranjam normalmente da bóia. Então,
esse da Alunorte disse: Olha o barco servia pra vocês. Era bom o barco porque daria pra pegar peixe
mar afora.
Gilvandro - Pra poder pegar peixe maior, seu Eurico, tem que ter um barco maior?
Eurico - Um barco pelo menos para duas toneladas.
Gilvandro - Para poder ir mais fora?
Eurico - Sim, para poder ir lá pra baixo.
Gilvandro - Porque tem que ir mais fora?
Eurico - Porque não tem peixe aqui na beira?
Gilvandro - Não tem mais peixe?
Eurico - É Pra baixo mesmo, daqui mais duas horas
de viagem. Lá pra baixo. Pra gente topar com peixe.
Aqui perto não tem mais. Tem besteira de peixe.
Gilvandro - Antes do projeto Albrás/ Alunorte dava
muito peixe aqui em Itupanema?
Eurico - Dava muito... deixa eu ver... Faz trinta
anos. Foi na década de 70. Tinha dia de 18 geleiras
na boca do arrozal. Enchia duas, três, quatro e ia
embora.
Gilvandro - Pra onde seu Eurico?
Eurico - Tudo pra Belém. Gente de lá do Pacoval.
Gente de Soure, Vigia, Icoaraci, Mosqueiro, Marudá
e até de Bragança. Tudo pescava nesta área. Tinha
muito peixe aqui.
Gilvandro - Qual o peixe que dava?
Eurico - Piramutaba. Muita piramutaba. Dava piraí,
peixe pra 80 quilos. E começou tudo.
Gilvandro - Começou o que?
Eurico - As Empresas... Sumiu o peixe, de uma hora
pra outra. Sumiu pouquinho, a piaba não veio mais.
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Gilvandro - Dava muita piaba?
Gilvandro - O senhor que em sua Itupanema presenciou fartura depois viu também o sumiço dos
peixes. O que o senhor acha que poderia resolver
este problema aqui dos pescadores e suas famílias?
Senhor falou que as empresas vão permanecer em
Barcarena?
Eurico - Sim daí pra frente não vai diminuir mais não.
Gilvandro - O que o senhor acha que pode resolver
a vida desses trabalhadores que estão aí sofrendo
por conta da falta do peixe?
Eurico - Uma coisa eu disse no dia da reunião que
fizeram com a Alunorte. O barco era bom. E depois
do barco era fazer um cadastro dos quinze pescadores para receber um salário mínimo pra ajudar as
famílias.
Gilvandro - Melhoraria a vida deles?
Eurico - É. Cadastrava os quinze pescadores que
tem aí pra pegar aquele salário mínimo todo mês, se
não os barcos.
Gilvandro - O senhor acha que os barcos poderiam
ser comprados pelas empresas?
Eurico - Sim, porque isso cada vez mais vai ficar
pior.
Gilvandro - O senhor costuma conversar com os
outros pescadores ?
Eurico - Sim.
Gilvandro - Tem acontecido contaminação aqui?
Eurico - Teve umas duas vezes no tempo do inverno. Ali tem uma “baciona” , que tem o licor. Vem a
bauxita bota soda caustica e aí vasa pro rio. Mata o
peixe. É tui, é piabinha, doradinha, pescada, arraia.
Deu até na televisão.
Gilvandro - Ocorreram outras contaminações?
Eurico - A primeira vez foi uma balsa que foi pro
fundo. Não sei quantos litros de óleo que derramou
no rio. Apareceu também na televisão. Eles deram
quatrocentos e poucos mil. A presidente da comunidade foi esperta. Ela disse o seguinte: nós estamos
precisando de água em Itupanema. Eles deram em
serviço.
Gilvandro - Não indenizaram os pescadores?
Eurico - Esse dinheiro era pra dar ao menos 1000
para cada um, e ficasse com o resto. Eles fizeram o
serviço na Vila Nova que não prestou.
Gilvandro - Eles fizeram a caixa d’água e não deu
certo?
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Eurico - Não deu certo. Não fizeram a caixa d’agua.
Só as tubulações. Enganaram a gente.
Gilvandro - Tem água em Itupanema?
Eurico - Tem, tem bastante água. Lá é da Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa).
Gilvandro - Quer dizer que lá já foi a prefeitura que
fez no caso e não dá água?
Eurico - Não. É da Cosanpa. Vem direto pra lá
Gilvandro - Funciona o abastecimento?
Eurico - Agora aqui é de poço. Nós pagamos 5,00
para o presidente da comunidade. Agora lá na Vila
Nova eles pagam 7,50 no correio para a Cosanpa.
Gilvandro - E os jovens hoje, o senhor tem filhos?
Eurico - Os meus filhos já têm famílias.
Gilvandro - Como é que você vê os jovens aqui em
Itupanema sem essa oferta de emprego?
Eurico - Já tem muito molecote. Olha outra coisa
que vou dizer os meninos daqui com dez, doze anos
tinham seus fornos, seu carvão, eles pescavam, faziam roças e ajudavam muito os pais. Depois que
Albrás veio. Veio maranhense, piauiense, vem de
tudo e a maconha veio no meio. Muitos desses é da
maconha.
Gilvandro - Muita droga?
Eurico - Gangue no meio. São poucas as famílias
que tem filhos legais. Alguns estudam, quando tem
uma folga metem um pererê.
Gilvandro - O que o senhor acha que seria necessário para melhorar a vida desses jovens?
Eurico – Olha, eles botaram karatê pra luta. Tinham
que botar era uma oficina
Gilvandro - Oficina.
Eurico - Uma oficina para aprender negócio de móveis. Uma escola pra aprender mecânica. Essas coisas assim seria muito bom.
Gilvandro - Profissionalizante?
Eurico - Seria bom para os meninos. Eles pegavam
gosto e iam trabalhar.
Gilvandro - Nunca aconteceu nem um curso profissionalizante aqui?
Eurico - Nada. Um tempo que apareceu para eletricista e encanador. Alguns jovens daqui fizeram e
pegaram emprego. O menino, o filho do meu compadre Vanildo é eletricista. O Elizeu é eletricista.
Ainda tem mais quatro ou cinco eletricistas e alguns
encanadores. Os cursos deviam acontecer sempre.
Fórum Carajás outubro de 2010
Gilvandro - Essas pessoas de fora são mais ou menos de qual estado?
Eurico - Piauí, Maranhão, Parnaíba e Rio Grande
do Norte.
Gilvandro - E como vocês se relacionam com as
pessoas de fora?
Eurico - Agente se dá. Conversa com eles. São bacanas.
Gilvandro - O senhor falou em sítios, como eram
esses sítios?
Eurico - Sítio é quando tem Açaizeiro, Mangueira,
Abacabeira.
Gilvandro - Mas era vocês que plantavam mesmo?
Eurico - Agente tinha sítios plantados. A Albrás tomou conta de tudo.
Gilvandro - Vocês vendiam pra quem?
Eurico - Vendia pro marreteiro, que levava pra Belém.
Gilvandro - E dava algum dinheiro?
Eurico - Dava. Deus o livre. Esse que veio aqui agora o compadre Bené dava era duas viagem por semana. Ele ia cheio de pupunha, uxi, abacate, cupuaçu.
Itupanema era o 1° produtor de cupuaçu daqui.
Gilvandro - Era mesmo?
Eurico - Era sim, laranja dava muito, acabou tudo.
Eu me sinto meio triste. Tanta gente passando fome
aí. Não tem nada. Era muito farto aqui o que estragou foi isso aí.
Gilvandro - As empresas?
Eurico - É lá no Conde tá tudo seco. O menino disse: a minha mãe vem morar pra cá, o vento joga pra
lá todinho a fumaça das empresas. Os açaizeiros tão
todo vermelho na beirada. Olha não era tão calor
agora é mais calor que de antigamente porque a poluição sobe se pega com o sol e dispara muito calor.
Gilvandro - O senhor se sente muito triste por
tudo?
Eurico - É porque tem gente que não tinha nenhum
ganho e ia pra fora pegar um peixe. Dez quilos de
pescada eu pegava de linha de mão. Se eu botasse a
rede era de vinte quilos. Agora pega um quilo, dois
é triste mesmo. Não tem fruta pra vender. Tem que
comprar a farinha. Tem que comprar o carvão.
Gilvandro - O sr. estava falando sr. Eurico das pessoas que foram remanejadas do Conde e das pessoas que moravam aqui.Eles vieram pra cá, para Vila
Nova?
Fórum Carajás outubro de 2010
Eurico - Para Vila Nova, não só as pessoas que tava
daí mesmo. O de lá de onde era Alunorte/Albrás foram tudo para Bacuri, Colônia Nova, CDI, Massarapó, e agora criam peixes. Está bom lá pra eles. Falei
com uma comadre... Ah compadre, graças a Deus.
Tem Rio Capim, para subir em cima do terreno deles
pagaram 40 mil, e ainda deram um lugar para eles.
O pessoal tem cooperativa para lá: maracujá. Agora
peixe. Vão fazer gaiola para criar peixe.
Gilvandro - Aqui em Itupanema, sr. Eurico, tinha
condição de fazer esse trabalho, tipo cooperativa?
Eurico - Aqui não adianta mais.
Gilvandro – Qual o motivo?
Eurico - A terra está tomada. Olha, aqui para baixo tem mais ou menos 4 km. Daqui até no Caripi a
Albrás não deixa tirar nem uma vara. Não tem ninguém aí. Nem um morador.
Gilvandro - Mas porque, o que ela alega?
Eurico - Porque é dela.
Gilvandro - Mas ela faz algum trabalho?
Eurico - Meio Ambiente. Não pode derrubar. Não
pode morar. Lugar até pra lá que já é CODEBAR a
pessoa pode até entrar, fazer uma casinha. Mas aqui
não. Deus me livre. E o pescador que fez lá uma
casa, pescava camarão. Há muitos anos lá. Chegou
a Albrás. Tira sua casa daí, que não pode. Deram
dinheiro para ele, comprou telha para ele e tábua.
Fez a casinha dele. Ele vendeu, foi embora. Aí um
rapazinho fez uma puxada na praia. Foram lá. Queimaram a barraca dele. E ele era pescador.
Gilvandro - Mas quem queimou a barraca dele?
Eurico - O pessoal da Albrás
Gilvandro - Que ano foi isso?
Eurico - Está fazendo uns cinco anos.
Gilvandro - E era pescador aqui de Itupanema?
Eurico - Filho da Ilha. Mas casou com uma mulher
daqui, que a mulher ficou até aí. Não pode. Quando
chegou uns dias aí estava queimada a casa. Era uma
pena. Era uma puxada de palha.
O depoimento de seu Eurico é de grande riqueza e mostra como os moradores de Itupanema
vivenciaram o processo de desapropriação, implantação e operação das fábricas. Alguns dos muitos
pontos levantados são dignos de nota e serão comentados a seguir.
A memória permite a reconstrução de paisagens perdidas. seu Eurico descreve vividamente as
42
árvores, os botecos, os lampiões, as casas de palha
e a banda que alegrava as festas. Talvez não haja
qualquer imagem desta paisagem, mas a descrição
de seu Eurico permite a reconstrução da paisagem.
Nota-se o interlocutor trabalha como é frequente encontrarmos nos depoimentos de pessoas
que vivenciaram grandes perturbações, uma construção feita de oposições, marcada pela temporalidade de um evento: a chegada das fábricas. Assim,
antes, a natureza distribuía copiosamente seus frutos
e o peixe abundava nos rios. Um passado que, por
melhor que tenha sido, é vivido de forma idealizada.
Por outro lado, o depois fica imerso na tragédia e é
marcado pela falta, pelo bem limitado, pela fome.
A fome parece ser a categoria crítica definidora do
antes e do depois.
Outra categoria associada ao depois é o “engano”. As empresas enganam, enquanto que o antes
era marcado pela confiança e pela solidariedade. O
evento das desapropriações - que mais foram expropriações ou expulsões - é o marco temporal central e
o seu promotor lembrado por muitos pelo nome.
A construção mais reveladora se dá em torno
da poluição. Essa é apropriada e descrita segundo
43
uma lógica nativa baseada nas relações com a natureza, mas também é o instrumento de reivindicação.
A ideia da compensação dos danos perpassa as relações com a empresa. A poluição coloca a empresa
em dívida, por isso podem ser cobrados desde os
barcos ao salário mínimo, à infraestrutura urbana ou
o reparo da igreja.
Por outro lado, a empresa manipula as obras,
disputando espaço de poder com a prefeitura do município. A implantação das indústrias de alumina e
alumínio não atendeu a expectativa de desenvolvimento da grande maioria da população de Barcarena. Pois esses projetos fizeram uma opção por um
modelo fundamentado nos princípios capitalistas e
privilegiaram alguns grupos econômicos, em detrimento da agricultura familiar tradicionalmente utilizado na região.
Estes agricultores receberam pouco apoio,
uma vez que nenhuma política foi criada para minimizar os impactos provocados pelo modelo de produção trazido para o município, constatando que a
agricultura familiar sempre ocupou um lugar secundário na sociedade brasileira (Wanderley, 1996).
Fórum Carajás outubro de 2010
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Fórum Carajás outubro de 2010
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Energia limpa na ponta e desgraça na
fonte, resultado de mega hidrelétricas na
Amazônia
Edilberto Sena1
O consumismo capitalista, tanto nacional com internacional, olha a Amazônia com olhos de cifrão,
eldorado, lucro, mesmo que para isso aconteça o saque, a destruição e os impactos sociais e ambientais.
Como o alarme mundial, por causa do aquecimento climático, se intensificou nos últimos 20 anos: o sistema fantasiou o chamado desenvolvimento sustentável para continuar o saque do eldorado amazônico. A
partir do ano 2.000 o saque se intensificou, mineradoras, agronegócio, madeireiras, fazendas de gado e
também mais recente, as obras do tal Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC.
1 Rádio Rural de Santarém e Frente em defesa da Amazônia.
Como entender o PAC do
governo federal, num momento
histórico em que se discute os
efeitos das mudança climáticas
no planeta e a Amazônia é um dos
pontos chaves para esse controle?
Será ele o prosseguimento do anterior “Avança Brasil” do governo FHC? E se for, o que parece,
o que estará por trás desses programas megalomaníacos, mesmo
quando se fala em defesa da Amazônia, controle do desmatamento
e coisas parecidas?
Como não há transparência
da parte das autoridades federais,
é preciso se buscar causas que
são camufladas por presentinhos
amansadores da população regional. Daí, o PAC reserva alguns
milhões de reais para saneamento
básico aqui e ali, alguns milhões
para alguns programas ambientais
aqui e por ali, tudo para as populações se iludirem que o PAC veio
para melhorar a vida dos nativos.
Santarém, por exemplo, tem previstos R$ 75 milhões do PAC para
saneamento básico da cidade.
Porém, do total previsto
(504 bilhões de reais) para ser
gasto em cinco anos, até 2012,
dois terços serão gastos em grandes projetos tais como, rodovias,
hidrovias, ferrovias, hidrelétricas
e telecomunicações. Então, os recursos do PAC na maior parte, não
são para beneficiar as populações
em si, mas o crescimento econômico. E todas essas obras estão
previstas num outro plano maior
e mais abrangente de crescimento econômico, o IIRSA (Iniciativa de Integração da Infraestutura
Regional Sul-Americana), criado
já no ano 2.000 entre os presidenFórum Carajás outubro de 2010
tes dos países da América do Sul,
sob inspiração do Banco Interamericano de Desenvolvimento, o
BID. Tal plano tem o objetivo de
interligar os países da América do
Sul desde o oceano Atlântico ao
Pacífico, através de corredores de
circulação de transportes de produtos ainda abundantes neste continente e ansiosamente procurados
pelos países do G-8 e os emergentes que estão crescendo, apesar da
crise econômica mundial.
É neste contexto que se
deve compreender os grandes
projetos do PAC. Entre outros,
cinco hidrelétricas só na bacia do
rio Tapajós, num total de cerca de
15 mil mega wattz de energia, que
o presidente da república costuma alardear que é abundância de
energia limpa. Grupos da sociedade civil organizada em Santarém,
Itaituba, entre os índios Mundurucus e até em coordenações de unidades de conservação no entorno
da bacia to rio Tapajós se perguntam – energia limpa e abundante
para quem? Indagado quatro meses atrás em Brasília por um interlocutor da Amazônia, o ministro
do meio ambiente, Carlos Minc
desviou a resposta e só disse
que era para o desenvolvimento
da Amazônia. O interlocutor riu
ironicamente do ministro que se
fazia de bobo, porque sabia que
a resposta honesta seria – para
atender às empreiteiras que controlam os contratos de construção
de barragens no Brasil inteiro e,
principalmente atender à fome de
eletricidade intensiva das grandes
empresas mineradoras que estão e
vão se instalar na região, especialmente no oeste do Pará.
A Eletronorte já vem tra46
balhando no programa de cinco
hidrelétricas no Tapajós/Jamanxim há mais de 10 anos, silenciosamente e sem dialogar com
as populações ribeirinhas e da região do Baixo Amazonas que será
toda impactada pelas obras faraônicas. Apenas nos dois últimos
anos, alguns grupos do movimento popular organizado descobriram que a coisa era urgente para o
Ministério das Minas e Energia e
a Eletronorte. Os estudos já estavam bem adiantados e nunca eles
chamaram a sociedade regional
e menos ainda os moradores, os
indígenas e os responsáveis pelas
áreas de conservação que serão
atingidas pelas barragens.
Segundo dados da Eletronorte o cronograma está assim
montado: o estudo de viabilidade
já foi feito, agora chega o pedido
de licença para o EIA RIMA, se
possível ainda antes do fim deste
ano. Em 2.012 deve ser dada a licença de operação, depois de falaciosas audiências públicas, como
foram as de Belo Monte dias atrás.
E assim por diante, de forma que
se não houver entraves, até o ano
2.018 as primeiras turbinas estarão gerando 6.000 megawatts em
São Luiz do Tapajós.
Em recente encontro em
Itaituba (21/08) a convite do Conselho Consultivo do Parque Nacional da Amazônia, estiveram
em confronto duas exposições,
com visões opostas de Amazônia e de desenvolvimento. Três
técnicos da Eletronorte (dois de
Brasília e um de Manaus) compareceram para expor o cronograma
e as vantagens das construções
de cinco hidrelétricas na bacia do
Tapajós. Logo após, apresentei
um contraponto àquela exposição
que chamei de propaganda para
“inglês ver”. Eles mostraram as
vantagens das hidrelétricas para o
crescimento econômico “do Brasil” (Alcoa, Rio Tinto, Vale, Caima e demais empresas exploradoras de minérios na Amazônia).
Mostraram eles um documentário bem feito, ilustrativo de
como as hidrelétricas no Tapajós
serão modelo mais moderno, com
mínimos impactos ambientais e
sociais. Oito ou dez minutos de
propaganda que me fez lembrar a
estratégia de Goebels e Hitler na
Alemanha nazista (uma mentira
repetida muitas vezes parece verdade...). Depois descobrimos que
o próprio presidente Luiz Inácio
determinou que todas as embaixadas brasileiras tivessem uma
cópia do filmete para mostrar a
todos os visitantes e contatos, em
línguas diferentes.
Isto é, o presidente parece
estar preocupado com as lutas que
a sociedade civil está assumindo
em Belo Monte, Jirau, Santo Antonio e Tapajós. Surpreendentemente, os três técnicos não contestaram minhas argumentações que
mostravam a desgraça para os habitantes da região, caso as hidrelétricas venham a ser construídas.
Apenas, em certo momento um
disse que eles são técnicos e só
respondiam a questões técnicas,
já as questões políticas das obras
só o governo podia responder.
Como ele costuma dizer,
“nunca antes neste país...” um
presidente decidiu enfiar goela
abaixo, dez mega hidrelétricas na
Amazônia, sem respeitar os moradores da região. Estes são entraves ao crescimento, indígenas,
ribeirinhos, quilombolas, ONGs e
Ministério Público Federal. Para
ele o que interessa é o PAC a serviço do grande Plano IIRSA. Os
entraves que possam aparecer
devem ser afastados com lei, ou
novas normas.
No momento atual, um
movimento está iniciando em defesa dos rios Tapajós e Jamanxin.
Três encontros já aconteceram em
Itaituba e um em São Luiz do Tapajós, desde novembro de 2008.
Três seminários fora promovidos
pelo movimento BR.163 sustentável em aliança com o Movimento popular Frente em Defesa da
Amazônia (FDA), de Santarém. O
mais recente encontro foi promovido pelo Conselho Consultivo do
Parque nacional da Amazônia.
Em Santarém foram realizados dois seminários, organizados pela Diocese de Santarém em
aliança com a Frente em Defesa
da Amazônia. Encontros já foram
realizados na cidade de Aveiro,
nas comunidades Tauaraí e Pinhel,
no baixo Tapajós. A FDA orga-
47
nizou uma exposição a ser feita
num confronto com pessoal da
Eletronorte em sessão especial na
Câmara de Vereadores em Santarém, em outubro.
Na primeira semana de novembro, membros da FDA estarão
na missão Cururu, entre os índios
Mundurucus em três dias de encontro. A organização dos frades
e freiras franciscanos, que estão
há cem anos na missão entre os
Mundurucus, está organizando os
encontros com lideranças indígenas para refletir sobre os danos e
invasões que as cinco hidrelétricas farão nas terras e costumes
deles.
Assim alguns movimentos
populares estão sensibilizando as
comunidades, cidades e povos sobre a gravidade dos projetos hidrelétricos promovidos pelo governo
“Brasil de Todos” contra a Amazônia e seus povos. Infelizmente
ainda é pequena a participação
popular. Mesmo organizações de
moradores, sindicatos, professores continuam indiferentes, como
se os projetos hidrelétricos, como
os outros grandes projetos não os
atingissem. Outros raciocinam
como se aqueles viessem trazer
empregos e desenvolvimento. Mas
a luta continua como continua em
Porto Velho e no Xingu. Tapajós
viverá.
Fórum Carajás outubro de 2010
Geração de energia na Amazôniacaso de Estreito em questão1
Rogério Almeida2
O presidente Lula inaugurou no dia 04 de outubro de 2008 a segunda casa de força da hidrelétrica de
Tucuruí, no sudeste do Pará. A UHE de Tucuruí é a maior hidrelétrica genuinamente nacional e foi erguida
no rio Tocantins há 24 anos para alimentar com energia subsidiada empresas de produção de alumínio no
Pará, Albrás e Alunorte, do grupo Vale e a Alumar, no Maranhão, da estadunidense Alcoa. 75% da produção
de energia de Tucuruí vão para a exportação e o estado possui uma das tarifas domésticas mais caras do país.
O derradeiro reajuste foi de 16%.
1 Reportagem publicada originalmente no blogue FURO em novembro de 2008 e reproduzida no site do www.forumcarajas.org.br, que apoio
o trabalho.
2 Colaborador da rede Fórum Carajás, mestre em Planejamento do Desenvolvimento pelo Núcleo de Altos Estudos da Amazônia (NAEA/
UFPA).
A segunda casa tem potência instalada de 4,1 mil megawatts.
Junto com a primeira casa de força a potência instalada de Tucuruí
vai ser de 8,3 mil megawatts. O
maior empreendimento do setor
de energia encontra-se em construção no mesmo rio, na fronteira
do estado Maranhão com o Tocantins, no município de Estreito.
A construção de hidrelétricas na Amazônia integra um portfólio de projetos baseados no uso
intensivo dos recursos naturais da
região. O modelo de desenvolvimento tem na concentração da
terra, renda e do poder político
e econômico seus pilares e ativa
tensões entre populações consideradas tradicionais e grandes corporação do capital mundial.
No caso de Estreito, tais
projetos tensionam com comunidades indígenas Krahô, Apinajé,
no estado do Tocantins, e Gavião
e Krikati no Maranhão. Na fronteira há ainda pescadores, extrativistas e camponeses, ladeados por
reservas como a Serra das Mesas
do lado maranhense e um sítio de
árvores fossilizadas no Tocantins.
A hidrelétrica de Estreito prestes
a completar o segundo ano em
fevereiro de 2009, avança sobre
o rio.
tituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE). Ainda conforme o IBGE, até 2001 a população
total do município era calculada
em torno de 22.930, bem antes do
início da obra, fevereiro de 2007.
O município de Estreito
encontra-se numa região repleta
em implantação de grandes projetos púbicos e privados. A cidade
dista 100 km do pólo de soja considerado um dos mais importantes
do país, na cidade de Balsas, sul
do Maranhão e tem como vizinha
Aguiarnopólis, cidade do norte do
Tocantins e fica mais de 500 km
da capital do estado, São Luís. Os
economistas tratam o modelo econômico de enclave, traduzindo,
não dinamiza a economia local.
Além do pólo de soja, impactam o município a implantação da ferrovia Norte-Sul, a ampliação da BR-010 e a construção
do maior projeto hidrelétrico do
país, a hidrelétrica de Estreito, no
rio Tocantins. Não muito distante
dali, no município de Açailândia,
um pólo de gusa dinamiza uma
cadeia de destruição ambiental e
de trabalho escravo para a produção do carvão vegetal.
O grotão e o planeta
O empreendimento da
Estreito em questão – um UHE de Estreito pluga o grotão
mapa de enclaves
marcado por inúmeras chacinas
de camponeses ao resto do munA BR-010 corta o muni- do através da geração de energia.
cípio de Estreito, oeste do Mara- O empreendimento pertence ao
nhão. A cidade há três anos tinha Consorcio Ceste, que aglutina as
uma população estimada em 10 grandes corporações do quilate
mil habitantes localizados na sede da Camargo Corrêa (4.44%), ALde um total de 26.490, conforme COA (25.49%), Vale (30%) e a
os dados do ano de 2007 do Ins- belga Suez-Tractebel (40.07%).
49
O custo da obra é estimado
em 2.5 bilhões de reais para que
Estreito gere 1.087 MW de energia. Os barramentos no rio devem
ultrapassar a casa das 50 unidades
entre grandes e Pequenas Centrais
Hidrelétricas (PCH’s). As PC’s
produzem no máximo 3 mil kw.
Ambientalistas que tratam sobre
barragens advertem que caso se
sacramente o planejamento estatal, o rio Tocantins deve se transformar num grande lago, onde os
impactos ambientais e cumulativos são imensuráveis.
A radical alteração do ciclo
de reprodução dos peixes, destruição da mata ciliar e inundação
de florestas nativas que abrigam
animais silvestres são alguns dos
impactos pontuados. Empreendimentos de grande porte tendem a
atrair grandes contingentes de migrantes. 5.500 operários da construção civil estão no canteiro de
obras atualmente. Cabe interrogar: para onde essa população irá
após a conclusão da obra, prevista
para 2010?
Estreito e Carolina no Estado do Maranhão, e Aguiarnópolis, Babaçulândia, Barra do Ouro,
Darcinópolis, Filadélfia, Goiatins,
Itapiratins, Palmeirante, Palmeiras do Tocantins e Tupiratins serão os municípios afetados diretamente pela obra.
As cidades abaladas pelo
empreendimento tendem a ter os
preços da terra, do aluguel e venda
de imóveis inflacionados. As periferias proliferam ladeadas pela
marginalidade, aumento de consumo de álcool e a criminalidade.
Até três anos atrás no município
de Estreito não se via mendigos
Fórum Carajás outubro de 2010
nas ruas. Um passeio na rodoviária local indica a alteração dessa
realidade.
Carros das empresas sinalizados com uma bandeira vermelha com um X, homens fardados
de variadas indumentárias que
indicam a variedade de empresas
que atuam no canteiro de obras da
barragem, ônibus que os carregam
agora fazem parte da paisagem na
cidade. O trabalho é terceirizado.
A hidrelétrica de Estreito
encontra-se em croquis dos planejadores de velha data. Localiza-se
na bacia Araguaia-Tocantins, considerada a maior em potencial de
geração de energia hidroelétrica
do Brasil. Tal modelo de empreendimento ratifica uma economia
baseada no uso intensivo dos recursos naturais, ou seja, extrativa.
O hoje ministro das Minas
e Energia, Edson Lobão, reconhecido pelos serviços prestado
à ditadura, integrante do ninho
da família Sarney, ainda quando
senador foi um dos mais fervorosos defensores da implantação da
hidrelétrica de Estreito. Dono de
meios de comunicação na região
Tocantina, cedeu os veículos que
controla para que alardeassem as
“benesses” da instalação do empreendimento.
A Tractebel em Goiás
Bento Rixen, da Comissão
Pastoral da Terra (CPT) de Goiás em artigo publicado em 2003,
numa publicação do Fórum Carajás, “Escritos sobre a água” alerta
sobre os passivos sociais e ambientais provocados pela empresa na construção da hidrelétrica
de Cana Brava, nos município de
Minaçu e Cavalcante.
Fórum Carajás outubro de 2010
Por conta da indiferença dos diretores da Tractebel em
relação às populações atingidas
a CPT mobilizou a visita de um
grupo de representantes de ONGs
belgas. Os militantes internacionais puderam conhecer o cotidiano
das famílias que foram expulsas
de suas terras, e os desdobramentos do lago que surgiu depois da
construção da barragem.
Rixen em um artigo explicita que a indenização proposta
aos atingidos pela barragem ficou no patamar de R$ 5.300,00.
O militante da CPT adverte que
muitos não aceitaram esse valor
considerado uma “mixaria”. No
Ministério Público de Brasília e
em Goiânia um documento enumera 804 famílias cadastradas
como atingidas.
O reassentamento é uma
das questões mais delicada no
processo de implantação de hidrelétricas. Em geral não se consegue reproduzir as mesmas condições de reprodução de vida das
origens dos trabalhadores rurais.
Esse tem sido um questionamento
constante, e a construção de Lajeado e Serra da Mesa, erguidas
no estado do Tocantins ratificam
a tese sobre a questão.
A equipe de belgas visitou uma área de 26 famílias reassentadas pela empresa Tractebel.
Apesar de boa casa e uma parcela de 20 ha, eles não estão bem.
Entrevistados reclamam que só é
possível produzir em um hectare. Posto ter de manter a reserva
ambiental e a impossibilidade de
plantar sobre os morros. Segundo
a família, a plantação tem de ser
irrigada, entretanto, eles não possuem dinheiro para pagar a ener50
gia da bomba de irrigação, revela
Rixen.
Um grupo de 42 famílias
na época vivia debaixo da lona
preta na periferia de Minaçu. Os
belgas denunciaram que eles ficaram sem comida, sem água potável e sem emprego. A “moradia”
ficava a 500 metros de uma área
de mineração de amianto, em um
terreno que a própria prefeitura
cedeu.
Em outro local de visita
da equipe as terras férteis viraram brejos por conta da proximidade com o lago da barragem.
Tornou-se impossível produzir os
alimentos para sustento da família. O cheiro de fermentação e os
mosquitos completavam o quadro
crítico.
Desenvolvimento
quem?
para
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o principal agente financiador da obra, ou seja, a
sociedade financia um modelo de
desenvolvimento arcaico. Não seria mais prudente o Estado induzir
um modelo de desenvolvimento
contrário, em setores intensivos
em tecnologia, por exemplo?
Artigo no jornal Le Monde Diplomatique Brasil, edição
de outubro de 2008, do professor João Roberto Lopes Pinto, da
Pontifícia Universidade Católica
(PUC/RJ), baseado em relatórios
do próprio BNDES, indica que tal
opção de desenvolvimento intensiva no uso dos recursos naturais,
induz a um crescimento menor de
renda e da produtividade, onde
prevalecem a ocupação informal,
precária e de baixa qualificação.
Gozam da gentileza do Estado
o setor da mineração, celulose e
etanol.
Tal modelo de desenvolvimento induzido pelo Estado
tende a fortalecer ainda mais as
desigualdades existentes no país.
Nesse sentido um conjunto de
organizações sociais e políticas
organizaram a frente “Plataforma BNDES,” explica o artigo do
professor Pinto. A frente deseja
pressionar o governo para que
reoriente a política do BNDES
em favor de um desenvolvimento
que busque a superação das desigualdades e promova os direitos
sociais.
Pinto reflete que a Plataforma argumenta que se faz necessário, entre outros pontos, a)
fortalecer a economia de base
camponesa e familiar, que garante produção para o mercado interno; b) descentralizar o crédito
e que fomente a diversificação
produtiva e a inovação técnica; c)
incentivar a participação pública
em obras de infraestrutura social,
como uma política de saneamento
básico.
Comissão Mundial de
Barragens Adverte
Entre os anos de 1997 a
2000 uma comissão realizou estudos sobre a construção de barragens em todo o mundo. Tucuruí
foi o caso selecionado na América
Latina. A construção de barragens
do Brasil é responsável por 40%
do valor da dívida externa. Entre os impactos da construção de
barragens como a de Estreito os
estudos organizados pela Comis-
são Mundial de Barragens (Banco
Mundial, construtores, atingidos
por barragens, pesquisadores)
verificaram-se:
a) Alagamento e salinização afetam um quinto das terras
irrigadas no mundo, incluindo
terras irrigadas por grandes barragens e apresentam graves impactos de longo prazo, muitas
vezes permanentes, sobre a terra,
a agricultura e a subsistência da
população;
b) as grandes barragens
provocam impactos cumulativos
sobre a água, inundações naturais
e a composição de espécies quando várias barragens são implantadas em um só rio (caso da bacia
Araguaia-Tocanstins); c) as grandes barragens provocam destruição da floresta e locais selvagens,
o desaparecimento de espécies e
a destruição das áreas de captação
à montante devido à inundação da
área do reservatório;
d) as grandes barragens
provocam o deslocamento de 40
a 80 milhões de pessoas em todo
o mundo; muitas das pessoas deslocadas não são reconhecidas (ou
cadastradas) como tal e, portanto,
não são reassentadas ou indenizadas.
Histórias de garimpeiros
Na região as histórias de
venturas e desventuras sobre a
busca de riqueza fácil em garimpos no Pará é generosa. Francisco foi o moto-taxista que serviu
como guia na ensolarada Estreito.
Ele soma uns 40 anos e é filho de
migrantes do Ceará, estado que
nunca chegou a retornar após ter
ficado adulto. O nosso guia perambulou pelos garimpos do su51
deste do Pará nos município de
Xinguara, Rio Maria, Redenção e
São Félix do Xingu.
Mamão, Pedra Rica, Camuru são alguns dos garimpos em
que Francisco passou. Num deles
ganhou um pouco de dinheiro com
o ouro encontrado. Fala que não
guardou muito da sorte que teve
na década de 1980. “Dinheiro de
garimpo parece que é amaldiçoado. Nunca durou muito”, reflete o
moto-taxista. Francisco informa
que passou no maior garimpo a
céu aberto do mundo, o de Serra
Pelada, mas não ficou por lá.
Ele lembra de pessoa que
“bamburou“ (achou muito ouro)
até 300 quilos de ouro. Teve fortuna em fazendas de gado e casas,
como o caso de um garimpeiro
que mora em Estreito conhecido
como Índio. O afortunado é do
município de Codó. Quando ele
pegou o dinheiro comprou uma
penca de carros e invadiu a cidade natal exibindo o “sucesso” em
terras paraense, conta Francisco.
Nas idas e vindas de Francisco ao Pará em busca de riqueza
perdeu dois irmãos. A perda mais
trágica foi a do caçula. Francisco
lembra que o irmão tinha apenas
16 anos, e que era muito generoso
com as pessoas ao redor. Mas, a
realidade do garimpo não permite
tal atitude.
Após achar uma pequena porção de ouro foi tocaiado e
morto por parceiros de farra em
bebidas e cabarés. Um outro irmão não tem notícia faz mais de
15 anos. Francisco acredita que
ele mora em Redenção, sudeste
do Pará.
Fórum Carajás outubro de 2010
A busca pelas fotos
Falo a Francisco do interesse em fazer fotos da obra da
UHE de Estreito. Ele sugere que
alugue uma canoa. Somente ela
pode levar você até o local onde
a construção começou. Numa viagem até um portinho tenho sorte,
deparo-me com José Antônio por
volta das 11h da manhã de um dia
escaldante. Antônio entre outras
atividades é pescador, feirante e
dono de sítio.
Passou toda a manhã numa
exaustiva viagem, onde foi buscar
a esposa e uns porcos para criar
no sítio que tem na periferia do
município de Estreito. Acusando
cansaço resistiu em pegar a empreitada de uma viagem que durou mais de uma hora ida e volta
no caudaloso Tocantins até o canteiro da obra. A viagem ganha em
emoção posto o motor da canoa
padecer de panes quando esquen-
ta. O jeito é parar e apreciar a paisagem.
No portinho algumas embarcações. Uma barraca comercializa bebidas. Moradores se divertem no rio e tomam umas pingas.
As casas são humildes. Destoam
do gigantismo da obra vizinha. A
arquitetura de compensado e cobertura de palha socorre os moradores nos dias de chuva. Antônio
limpa a merda dos porcos da canoa e iniciamos a viagem. Ainda
de onde saímos é possível avistar
o local.
Dragas, barcos de vigilância, numa paisagem onde é possível se avistar babaçuais e outros
tipos de vegetação antecipam a
nossa chegada. A passagem de
uma embarcação veloz conhecida
como voadeira forma banzeiros e
faz a nossa canoa sacudir no meio
do Tocantins. Antônio sugere cuidado.
O pescador avisa que os
vigilantes do barco ficam ali para
impedir que a passagem dos ribeirinhos quando usam dinamite na
obra. Segundo ele, as explosões
são comuns no raiar do dia e no
apagar da tarde.
Há luz nos grotões?
A instalação da hidrelétrica de Estreito coleciona inúmeros
capítulos. Os relatórios de impactos sócio-ambientais amplamente
criticados, as ações nos Ministérios Públicos do Maranhão e
Estreito, mobilizações do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), apoiados pelo MST,
atentado à bala de um gerente de
operações contra militantes contrários a instalação da barragem,
greve de operários do canteiro de
obras por conta da péssima qualidade da comida e assédio moral
de um gerente, que acabou sendo
espancado pelos operários.
O progresso, geração de
emprego e desenvolvimento são
os argumentos dos alinhados na
defesa do projeto. Qualquer voz
que destoe de tal perspectiva é tratada como ressonância de forças
externas que não desejam o progresso do país. É comum a ojeriza
a movimentos sociais e manifestações de xenofobia a análises e
ONG´s internacionais que fazem
oposição ao modelo do empreendimento.
Isso foi verificado desde
o processo de audiências públicas. A força da “grana” coopta de
clérigos a políticos, passa pelo incentivo a criação de associações
de fachada, como o caso da Associação de Atingidos pela Barragem, entre outras. As audiências
que seriam um espaço de debate
possuem ares de congresso de
“partido único”, isso na capital ou
interior.
uma confusão sobre o papel do
Estado e o da empresa. São ofertados ainda em parcerias com o
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), cursos
de panificação e costura.
Não raro os boletins inundam suas páginas com depoimentos de famílias que já foram desapropriadas pelo Consórcio. Tudo
é flor nesse jardim? Uma série de
reportagens de Beatriz Camargo,
pública no site Repórter Brasil,
no mês de julho indicam que não.
Sobre a especulação imobiliária,
a série indica que houve pressão
por parte de pessoas de empresas
terceirizadas na compra de imóveis, com vistas a serem desapropriados com um melhor preço
pelo consórcio.
A não inclusão dos povos
indígenas como setores que podem ser afetados pela construA propaganda é a alma
ção é um outro ponto. O certo é
do negócio?
que desde o começo do processo
há uma série de temas nublados.
Os boletins do Ceste ceEnquanto isso as obras avançam
lebram uma série de ações junto
sobre o rio, sobre as histórias das
aos mais diversos segmentos da
populações locais, a reconfigurar
sociedade. Um posto de atendiuma região prenhe em conflitos
mento ao migrante localizado na na disputa pele terra e os recursos
pequena rodoviária indica para naturais nela existentes.
que as pessoas façam ficha no
Sistema Nacional de Emprego
Sindicato dos Trabalha(SINE), sempre com filas enor- dores Rurais (STR)
mes. Escritórios do consórcio se
espraiam em cidades estratégicas
Raimundo Carvalho, conos dois estados.
nhecido como Cabeça Branca,
dirigente sindical rural de EstreiOs jornais do consórcio to, explica que no começo todo
celebram ainda cursos que pas- mundo achava que a barragem ia
sam pela “inclusão digital” com a ser boa. Aos poucos o povo vai
Colônia de Pescadores- Z-35, que aprendendo que não é bem assim.
se manifestou contra o acampa- Carvalho foi operário na construmento do MAB, doação de ambu- ção da barragem de Boa Esperanlância, doação de computadores a ça, no rio Parnaíba, no estado do
unidades de saúde. O que traduz Piauí na década de 1960, e tam53
bém um atingido pela própria
obra que ajudou a erguer.
Carvalho lembra que o dinheiro que ganhou não conseguiu
comprar nem metro de terra depois. “Com a terra a gente comia
todos os dias, ganhava um dinheirinho e podia trabalhar a família
por muito tempo. Dinheiro não é
tudo na vida”, arremata o senhor.
Ele alerta que a média de indenização tem sido de 30 mil reais.
Ele teme pelos idosos. “Tenho um
colega que mora só. Vai ser desabrigado. Tem uns 80 anos. O que
ele vai fazer aqui na cidade?”, interroga o sindicalista.
Construção civil - sindicato em construção
Delfino Araújo é o presidente do recém criado Sindicato
da Construção Civil de Estreito,
que tem 140 sócios como fundadores. Ele explica que o registro
para a criação do sindicato foi
publicado no Diário Oficial em
fevereiro deste ano. O sindicato
ainda está em fase de construção,
é o que se conclui após a conversa
com o dirigente.
Araújo ainda não sabe
quantificar quantas empresas estão no canteiro de obras da hidrelétrica e nem o número preciso de
operários. Ele informa que já solicitou os dados para o setor responsável.
Sobre a paralisação de
11 dias dos operários no mês de
julho, Araújo relata que as condições precárias de trabalho e a
ração foram os motivadores. O dirigente alerta que o sindicato necessita tomar pé dos dados, para
que possa garantir uma intervenção qualificada.
Fórum Carajás outubro de 2010
Grandes Projetos na Amazônia:
mineração em Juruti e a produção
de energia1
Rogério Almeida
1.500 pessoas ocuparam no dia 28 de janeiro de 2009 uma área de operação da empresa estadunidense Alcoa, no município de Juruti, oeste do Pará. No local é explorada uma mina de bauxita, matéria-prima
para a produção de alumina que é em seguida transformada em alumínio.
O empreendimento fica na bacia do Amazonas. Um bilhão de reais deve ser aplicado para produzir
1 Trabalho publicado no site www.plataformabndes.org.br em fevereiro de 2009
quatro milhões de toneladas do
minério. Desse total de investimento a sociedade brasileira vai
entrar com 500 milhões através
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) a juros módicos.
A companhia é uma das
maiores mineradoras do mundo
e opera em 32 países nos quatro
continentes. No Maranhão mantém uma empresa de produção de
lingotes de alumínio. A Alumar,
desde a década de 1980, em sociedade com a BHP Billiton e que
deverá incrementar a produção
de 368 mil para 420 mil toneladas. Por isso o interesse na mina
de Juruti, que também vai emancipar a Alcoa do fornecimento da
Mineração Rio do Norte, da Vale,
que extrai a bauxita no município
de Oriximiná, na mesma região.
Além das frentes de mineração o
baixo Amazonas tem em pauta a
construção de hidrelétricas no rio
Tapajós e é impactado pela monocultura de grãos e pelo porto da
Cargill.
Além de negócios no Maranhão e agora no Pará, a Alcoa
também é acionista majoritária
do consórcio Baesa, responsável
pela usina hidrelétrica de Barra
Grande, localizada na região Sul
do país. Junto com o grupo Votorantim, a Alcoa foi denunciada pela violação das Diretrizes
para Empresas Multinacionais
da Organização para Cooperação
e Desenvolvimento Econômico
(OCDE).
A Alcoa e o grupo Votorantim foram denunciados pelo
Movimento de Atingidos de Barragens (MAB) no ano de 2005. As
empresas aproveitaram a Avalia-
ção de Impacto Ambiental apresentada, em 1999, pela empresa
Engevix Engenharia S. A., que
atestava de modo fraudulento a
viabilidade ambiental da exploração do potencial hidroelétrico no
rio Pelotas, afluente do rio Uruguai, informa nota do MAB.
No caso do Pará, os militantes denunciam os danos aos recursos hídricos, redução do pescado, impedimento do direito de ir e
vir dos ribeirinhos, diminuição da
coleta da castanha do Brasil, andiroba e outras fontes de proteína e
recursos da flora usados para fins
medicinais.
O projeto representa também um risco de morte aos trabalhadores, por conta da construção
da ferrovia que escoará o minério.
Eles explicam que não há túneis
ou desvios nos trechos que cortam os projetos de assentamento
impactados pela obra.
Durante a ocupação, a tropa de choque da Polícia Militar foi
acionada. Os policiais usaram gás
de pimenta e bombas de gás lacrimogêneo contra os manifestantes.
Crianças e mulheres foram atingidas. Afinal, quem é o inimigo?
Documento sistematizado
por Raimundo Gomes da Cruz
Neto, sociólogo que visitou as
comunidades atingidas, esclarece que a mina está localizada
numa área de floresta densa, nas
cabeceiras do lago Juriti Grande,
caracterizada por três platôs. A
ferrovia atravessa dois projetos
de assentamento de agricultores,
criados pelo Instituto Nacional de
Colonização e Reforma Agrária
(INCRA).
Um deles é o Socó, com
420 famílias, das quais 43 tive55
ram seus lotes atravessados pela
ferrovia, que receberam por indenização R$ 0,24/metro quadrado,
por força de um acordo entre o
sindicato e a empresa, enquanto
reivindicavam R$ 3,00. O porto
está colado à cidade sede do município de Juruti, de onde várias
famílias estruturadas social e economicamente no bairro Terra Preta foram expulsas.
Gerdeonor Pereira, dirigente no Projeto de Assentamento
Extrativista (PAE) Juruti Velho,
informa que 80% do minério estão no PAE. O militante informa
que pelo menos 50 mil hectares
de floresta devem ser derrubados.
“O projeto trouxe para a
cidade umas 15 mil pessoas. O
município não tem estrutura para
cuidar desse povo com moradia,
saúde e escola. Hoje a empresa
já iniciou as demissões porque
as construções estão em fase de
conclusão. Para onde esse povo
vai”, interroga Pereira? Há informes que por conta de migração o
município passou por dois surtos
de hepatite. A fase de construção
é considerada onde a prefeitura
mais fatura com arrecadação do
Imposto Sobre Serviço (ISS). A
estimativa é de um milhão por
mês desde 2006.
A presença da empresa
também incrementou o mercado
de prostituição, drogas, especulação imobiliária e ocupações.
Os passivos socioambientais já experimentados nas 60
comunidades onde vivem cerca
de quatro mil famílias num total
aproximado de nove mil pessoas
foram omitidos nos estudos de
impactos ambientais, realizados
pela empresa CNEC Engenharia
Fórum Carajás outubro de 2010
e apresentado pela Alcoa para obter a licença.
A CNEC é a mesma empresa que realizou os estudos
para a construção da hidrelétrica
de Estreito, onde a Alcoa é sócia
da Vale, da Suez Energy, da BHP
Billiton e da Camargo Correa.
A hidrelétrica de Estreito
está sendo erguida no rio Tocantins, fronteira do Maranhão com
o estado do Tocantins e é considerado o maior empreendimento do
setor no Brasil. No caso de Estreito, entre as omissões consta que
as áreas indígenas nos dois estados, Krahô, Apinajé, no estado do
Tocantins, e Gavião e Krikati no
Maranhão não serão afetadas pela
obra. Informação que foi contestada pelas comunidades indígenas
e pelos defensores dos direitos
humanos.
As omissões nos relatórios
que indicam os impactos ambientais da exploração da bauxita do
Pará estão entre as motivações da
ação movida na justiça pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual (MP) desde 2005. Nestes
termos, a Alcoa funciona na ilegalidade em terras do Pará, posto
as contestações dos MP sobre o
processo de licenciamento da exploração de bauxita.
O não cumprimento da
recomendação dos MP também
resvala no governo do estado do
Pará. Gabriel Guerreiro, deputado estadual (PV) e Walmir Ortega, ambos ex-secretários do meio
ambiente, respondem por improbidade administrativa. O primeiro
pela aprovação da licença de operação da Alcoa e o segundo pela
manutenção, contrariando a recomendação dos MP, que decidiram
pela suspensão.
Fórum Carajás outubro de 2010
Assim a Alcoa, como a
Cargil que produz grãos no município vizinho de Santarém, que
ergueu um porto ao arrepio da lei,
finaliza a construção de rodovia,
ferrovia, porto e tanques de contenção de rejeitos para a extração
do minério.
O MPF e o MPE consideram que o Instituto Brasileiro
dos Recursos Renováveis e do
Meio Ambiente (IBAMA) deveria licenciar o projeto Juruti e não
a Secretaria de Meio Ambiente,
como ocorreu: Os elementos que
demonstram a necessidade de que
o licenciamento se dê no âmbito
federal são:
1 - a área na qual estão localizadas as minas de bauxita pertence à União, tendo sido objeto
de arrecadação administrativa e,
hoje, encontra-se em processo de
regularização fundiária, tendente
a permitir a fixação dos clientes
da reforma agrária;
2 - todas as atividades para
a obtenção da bauxita (escavações
e deposição de rejeitos nas cavas)
ocorrerão sobre o aquífero Alterdo-Chão, importante reserva de
água doce que atravessa dois estados (Pará e Amazonas);
3 - o porto está localizado
às margens do rio Amazonas, rio
internacional, sem que tal impacto tenha sido nem mesmo corretamente mensurado ou nem sequer
estudado;
4 - todo o Projeto Juruti
está contido na bacia hidrográfica do Amazonas, sob jurisdição
federal;
5 - há o registro de 73 ocorrências de sítios arqueológicos na
Área de Influência Direta (AID),
até esta fase;
56
6 - na AID existem espécies vegetais (castanheiras, paucravo, pau rosa) protegidas pela
legislação ambiental;
7 - na AID existem os ecossistemas de várzeas.
Negociações - Após a mobilização da população atingida
pelo grande projeto de mineração que deve durar entre 80 a 100
anos, uma rodada de negociação
foi realizada entre 9 a 11 de fevereiro, no município pólo da região,
Santarém.
Além dos atingidos pelo
projeto, participaram dos debates o representante da Alcoa na
América Latina, Franklin Feder,
os Ministérios Públicos, Prefeitura de Juruti e representantes
do Governo do Estado. A rodada
teve várias divisões. Dia de debate com todos os envolvidos na
questão, dia dedicado ao debate
entre os atingidos e a empresa e
uma rodada de negociação encerra com a participação de Walmir
Ortega, então Secretário de Meio
Ambiente do Pará, informa Pereira.
Reivindicações – A Associação das Comunidades de Juruti
Velho exige entre outras coisas,
a participação de 1,5 % nos lucros da empresa, investimentos
em educação, saúde e moradia
e a definição de uma agenda de
compromisso. Gerdeonor Pereira
esclarece que a primeira reivindicação já foi atendida.
Tal tipo de empreendimento na Amazônia coloca em lados
opostos grandes corporações com
staff de capacidade internacional
de negociação e populações consideradas tradicionais. Tanto no
caso do Pará como na fronteira
do Maranhão com o Tocantins, a
empresa apresenta um discurso
de redenção da pobreza através
do grande empreendimento, que
deve ser seguido como se fosse
um mantra da prosperidade.
A cooptação de políticos e
agentes que representem algum
tipo de liderança consta como
agenda da ação da empresa, em
particular para fazerem coro próempreendimento nas audiências
públicas onde são apresentados os
estudos de impactos ambientais.
A empresa também não
se descuida em “convencer” os
meios de comunicação locais da
sua nobre causa. É raro algum veículo de comunicação dar visibilidade sobre as mazelas dos grandes projetos. No caso da Alcoa
nenhum veículo informou que a
mesma opera de forma ilegal. O
destaque conferido recaiu sobre
a nota da empresa sobre os possíveis prejuízos.
Tanto no caso da usina de
Estreito, como no caso da exploração mineral em Juruti, o fato foi
verificado. Qualquer questionamento que soe a ambientalismo é
logo satanizado. E os portadores
de inquietações sobre os impactos
socioambientais tratados como agentes que defendem o “atraso” do lugar.
O processo de licenciamento das obras e
as populações tradicionais locais são classificados
como os grandes entraves pelos empreendedores.
Os mesmos podem ter em breve as suas demandas
aceitas no que tange ao processo de licenciamento
de obras na Amazônia. Ao menos, se depender do
esforço de Mangabeira Unger, que deseja azeitar o
já delicado processo.
O desenvolvimento e o progresso formam a
dorsal do discurso de defesa dos grandes empreendimentos, que segundo as empresas, vai fazer germinar como se fosse leite e mel, o emprego e a fortuna nos rincões. Numa clara linha de desinformação
sobre a lógica que conforma tais empreendimentos
nas periferias do planeta, o enclave. Ou seja, o saque
dos recursos naturais.
um dos agentes do projeto de Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americano (IIRSA).
Do conjunto de 10 eixos de integração, quatro se destacam, por suas riquezas naturais e possibilidades de conexões: o Amazonas, o Hidrovia
Paraná-Paraguay, o Capricórnio e o Andino. O objetivo central prima em facilitar a circulação de mercadorias.
O eixo do Amazonas compreende os seguintes países: Colômbia, Peru, Equador e Brasil e visa
criar uma rede eficiente de transportes entre a bacia
amazônica e o litoral do Pacífico, com vista à exportação.
Nesse sentido o BNDES exerce protagonismo continental, financiando obras de integração
além de nossas fronteiras. Outro ator importante no
longa metragem de extração das riquezas do continente é o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
No mundo do Brasil, alguns se arriscam em
Mineração na Amazônia e os eixos de intepontuar que o Programa de Aceleração do Crescigração do continente
mento (PAC) é uma miniatura do IIRSA.
O extrativismo tem regido a economia na
Amazônia. O ciclo mais recente é o mineral, iniciado a partir da década de 1950, no estado do Amapá,
quando o mesmo ainda tinha o status de território.
A exploração do manganês na Serra do Navio
foi o pontapé inicial, e que em apenas cinco décadas
se exauriu, restando apenas o buraco, literalmente.
A exploração mineral no Amapá, considerada a primeira na Amazônia, foi protagonizada pela empresa
estadunidense de Daniel Ludwig, a Bethlehem Steel
Company em sociedade com o empresário Augusto
Trajano de Azevedo Antunes, dono da Indústria e
Comércio de Mineração S. A. (ICOMI).
O ciclo da mineração ganhou maiores proporções na Amazônia a partir da região de Carajás
com a presença da Vale na extração do minério de
ferro na década de 1980, no Pará.
É creditado a Eliezer Batista, ex-executivo
da Vale, a construção do mapa das riquezas naturais
na América do Sul. Batista é pai de Eike, festejado
como o novo bilionário nacional. Obra do acaso? Os
levantamentos de Batista foram encomendados pela
Corporação Andina de Fomento (CAF). A CAF é
Fórum Carajás outubro de 2010
Antes do fim
No dia 16 de setembro de 2009 o Pará viveu
um dia histórico. Em Belém o aparato policial foi
usado contra populares numa audiência pública sobre o projeto da hidrelétrica de Belo Monte. Já no
município de Juruti a governadora Ana Júlia Carepa
(PT) cortava a fita do projeto de mineração de bauxita da Alcoa. Além de cortar a fita a governadora
plantou uma árvore. Uma exacerbação do marketing.
Os dois projetos estão localizados na mesma
região, sudoeste do estado. Numa foto de um diário
local a governadora aparece amparada pelo representante da Alcoa na América Latina, Franklin Feder.
Ainda na mesma foto destaque para o ministro das
Minas e Energia, Edson Lobão, uma figura íntima
do senador José Sarney. Desde o regime de exceção.
Essa tal de governabilidade...
Mais irônico, o Instituto de Pesquisa Aplicada (IPEA), acabava de apresentar relatório onde indica que a produção de alumínio é um desastre para
região amazônica.
58
Grandes projetos no município
de Barcarena: conflitos sociais e
ambientais
Manoel Maria de Morais Paiva1
Meu nome é Manoel Paiva. Sou engenheiro ambiental e ex - presidente do Sindicato dos Químicos
de Barcarena. Atualmente coordeno a Organização Não Governamental (ONG) Ecologia Sócio Ambiental
da Amazônia (Ecosaam), com sede em Barcarena/Pará. E acumulo a direção da CTB e estou presidente do
diretório municipal PC do B.
Resido em Barcarena desde 25 de setembro de 1985. Faz 25 anos que convivo com o projeto Albras
e Alunorte. Entre 1985 a 1995 fui funcionário da Albras, trabalhando como operador de manuseio, forno e
ponte rolante, até julho de 1995.
Em agosto de 1995 passei a trabalhar como funcionários da Alunorte. Em 2001 foi eleito presidente do Sindicato dos Químicos, que representa os trabalhadores da planta química da Alunorte. Fiquei
liberado até 2007, quando perdemos a eleição para chapa que a Empresa Alunorte montou.
Em todos esses anos o que menos se viu em todas as ações das empresas em Barcarena, foi justi-
1 ex-presidente do Sindicato dos Químicos de Barcarena, engenheiro ambiental. [email protected] (91) 37544965 / 88713621}
ça. Desde a implantação do pólo
Industrial de Barcarena o capital
tem atropelado as comunidades,
trabalhadores e o meio ambiente.
O poder do recurso financeiro tem
preponderado. O passivo social e
ambiental que ficará para Amazônia, ao final desse ciclo será incalculável. Hoje são centenas de
homens e mulheres mutilados em
todos os sentidos, em decorrência
dos ataques aos seus direitos.
Temos capital suficiente
para articular um grande debate
sobre a situação de cada comunidade afetada pelos grandes projetos. Sejam eles da Vale, Alcoa,
MMX ou CCM. Necessitamos
apresentar propostas que possam
garantir a permanência de famílias tradicionais em seu habitat.
E as suas terras, suas raízes, suas
culturas, sua identidade e meio
ambiente.
Os passivos sociais e ambientais se repetem a cada projeto.
O que acresce são a crueldade e
a injustiça. Podemos citar como
exemplos os ribeirinhos do rio
Murucupi. Os mesmos tiveram de
deixar suas casas, por não poderem mais usar o rio em decorrência da contaminação da água. O
rio foi a garantia por muitos anos
da segurança alimentar e fonte de
renda de milhares de ribeirinhos,
pescadores, camaroeiros. Era comum em tempos de abastança a
presença de turistas que encostavam nas tabernas para beber uma
pinga, cerveja ou comer um tira
gosto.
A matemática dos grandes
socializa a miséria e os desastres
sociais e ambientais. A máxima
de geração de emprego desaparece quando se faz um paralelo com
os desempregados indiretamente.
Fórum Carajás outubro de 2010
E as pessoas que não tiveram a
oportunidade de conhecer a fortuna dos rios. Os grandes projetos
na Amazônia têm deslocado comunidades centenárias, subtraindo chances de ao menos reclamar.
Os protagonistas das nossas dores
nunca aparecem em cena.
A saúde do trabalhador é
delicada. Há um montante significativo de operários reclamando
seus direitos. E outros que não
têm a mesma iniciativa. Por conta
da estratégia do calar. A regra consiste em empregar filhos, filhas ou
parentes dos ex-funcionários para
que os mesmos fiquem presos no
cordão umbilical da fábrica. Por
conta do medo do desemprego
agonizam calados. Dores que eles
dividem somente com as famílias.
A demissão é um fantasma constante. O futuro para as
empresas quem faz é o próprio
trabalhador, quando deposita seu
INSS, descontado em seu contra
– cheque todo mês. Pois todo trabalhador que chega a essa condição de aposentadoria é um peso a
menos para as empresas, que não
garantem absolutamente nada
aos trabalhadores por mais que
os trinta e não sei quantos anos
para a aposentadoria tenham sidos trabalhados somente naquela
empresa. Deveria haver leis que
garantissem pelo menos plano de
saúde vitalício para trabalhadores
que prestaram serviços por cinco,
dez ou vinte anos para grandes
empresas.
Pois ao se aposentar o trabalhador gasta metade do seu rendimento com medicação, principalmente na cultura do nosso país
que quanto mais velho mais caro.
A Amazônia, em especial o Estado do Pará, se destaca
60
pela exuberância de suas riquezas,
minérios, rios, floresta e biodiversidades. Tudo dentro de um equilíbrio que garante a sustentabilidade dos ecossistemas terrestres e
aquáticos.
Não queremos dizer com
isso que vamos envelopar a Amazônia. Mas, não podemos mais
aceitar sermos meros exportadores de matérias primas para países
desenvolvidos. Ditos do primeiro
mundo, à custa do sofrimento do
nosso povo.
O saque aos nossos recursos tem se repetido desde os
tempos coloniais. Desde o descobrimento, até os dias de hoje.
Os ciclos econômicos saqueiam
nossas riquezas e não deixam
para nosso povo reflexos positivos. Foi assim com ciclo com do
pau brasil, borracha, ouro e pedras preciosas. E agora entramos
na era dos minérios primários. Os
mesmos são tratados aqui para serem exportados, sem o perigo de
contaminação pela geração de rejeitos perigosos. Até que tentaram
sangrar o coração da Amazônia
com a Estrada de Ferro Madeira
Mamoré. A natureza não permitiu.
Onde estão os primeiros
habitantes das comunidades que
existiam nas proximidades do
projeto Albras /Alunorte? Deveriam no mínimo ter um endereço
que servisse como referência para
o resgate de sua cultura. Famílias
inteiras foram esfaceladas para
dar espaço para a construção das
grandes fabricas de alumina, alumínio e caulim.
O povo do Pará tem fama
de ser um povo hospitaleiro, alegre, falante e de fácil relacionamento. Mas, o que percebemos
hoje no semblante das pessoas
Gilvandro, Damasceno e Manoel Paiva durante lançamento do livro Alumínio na Amazônia em Belém(PA) - foto: arquivo Fórum Carajás
que foram remanejadas das suas
comunidades não é o das referências acima. A atitude hoje é desconfiança, revolta, sentimento de
terem sido enganadas e desprezadas.
O projeto não trouxe a elas
nenhuma perspectivas de melhoria de vida. Como as empresas haviam propagado. Em particular os
responsáveis pelas mentiras que
convenceram os moradores tradicionais a saírem de suas terras.
Terras que passaram centenas de
anos sem ter um dono. O direito da propriedade privada se sobrepôs a posse ancestral da terra.
Com os s grandes projetos apareceram donos de todo que é lado:
União, Estado, Município e até as
próprias empresas que estão chegando e as aqui instaladas.
Essa questão da terra não
é muito diferente dos conflitos
agrários. Esses que a mídia tenta reproduzir de forma distorcida,
quando “satanizam” os integrantes do MST. A questão é mais
complexa e envolve os governos federal, estadual e municipal.
Além de políticas públicas que
possam garantir a distribuição de
terras e incentivo à produção da
agricultura familiar.
É preciso levar em conta que cada comunidade vive de
acordo com suas disponibilidades
e facilidades. Portanto não podem
ser avaliadas e deslocadas para
qualquer lugar. É necessário respeitar cada atividade lucrativa de
sustento das famílias. Por exemplo: pescador em área propicia
61
a pesca e agricultores em áreas
agricultáveis. Para evitar que haja
conflitos no repasse das atividades as novas gerações.
Muitos dos remanejados
para a implantação dos grandes
projetos não conseguem assimilar, nem aceitar as ofertas feitas
pelos grupos de interessados pelo
projeto. Há registros de pessoas
ganhando muito bem pra fazer a
menor oferta possível às famílias.
Muitas delas quase sempre desprovidas de informações das reais
intenções acabam ficando entregue a própria sorte.
O estado que deveria disponibilizar profissionais capacitados para fazer as primeiras abordagem, e servir como o mediador
não o faz. A perspectiva nos imFórum Carajás outubro de 2010
postos que o projeto poderá gerar,
acaba deixando de lado as comunidades a serem remanejadas.
Em tal contexto as comunidades tornam-se alvo fácil perante a pressão das grandes empresas. Quando existe resistência de
uma ou outra família, as empresas
usam de estratégias. Cooptam as
pessoas mais esclarecidas, como
se essas fossem funcionárias das
empresas. Os empreendedores fomentam visitas a outras empresas,
geralmente em outros estados. O
objetivo é que elas possam ser as
futuras formadoras de opinião e
defendam os interesses das empresas.
Após o convencimento é
comum as empresas enviarem as
comunidades de interesse delas
olheiros (as). A missão consiste
em realizarem levantamento das
debilidades das políticas publicas,
e necessárias ao atendimento das
pessoas. A partir desse diagnóstico passam a fazer um grande marketing para vender a imagem de
uma empresa cidadã. Geralmente
criam cooperativas para reciclar
lixo, criação de animais, confecção de uniformes, fabricação de
papel reciclado, produção de brinquedos com restos de madeiras
das fábricas e outros. As iniciativas sobrevivem até atenderem os
interesses das empresas.
As empresas nunca permitem que as próprias comunidades toquem o projeto. As iniciativas são na verdade uma exigência
dos agentes financiadores, como
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), Caixa Econômica Federal,
Banco da Amazônia (Basa) e a
Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam). E
outros agentes que condicionam a
Fórum Carajás outubro de 2010
liberação do financiamento para a
efetivação de um projeto social.
Um exemplo: a gestão passada do Sindicato dos Químicos
exigiu das empresas a construção
das casas para os operários. Tudo
acertado no acordo coletivo que
obriga a empresa a construir casas aos trabalhadores. Por conta
disso a Caixa Econômica exigiu
um projeto social, que foi decidido entre empresa e construtora. A
escolha foi troca de lajotas e a cor
de pintura. Tentamos descobrir
qual foi o projeto apresentado a
Caixa Econômica Federal, porém
até o final de nossa gestão não nos
foi informado. É assim que funciona.
Os próximos anos se desenham como de grandes conflitos. Pois estão em processo de
licenciamento dois grandes projetos: o da termoelétrica e o da
Companhia de Alumina do Pará
(CAP). Todos dois ainda sobre
conflitos não resolvidos. Alguns
moradores chegam até a acusar
o Governo Estadual de receber
dinheiro da Vale, e ainda não ter
repassados aos moradores que
precisam deixar a área. A termoelétrica a carvão mineral, esta com
o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto
Ambiental (RIMA), questionado
pelo ministério publico. Mas que
pela prepotência da Vale já existe
até peças da estrutura da usina em
depósitos de Vila do Conde.
Na década de 70, eles
faziam da maneira deles, hoje ou
discutem com a sociedade ou não
fazem. Pois o povo não perdeu
oportunidade de buscar conhecimento para jogar um papel importante nas decisões de seus desti62
nos. Prova recente disso foram
as manifestações contrárias a implantação da usina termoelétrica,
e a não permissão para aceitar o
lixo do município de Abaetetuba.
Dois projetos que não justificam seu licenciamento. Se levarmos em conta as discussões
sobre aquecimento global, onde o
Brasil apresentou em Copenhagen,
na Dinamarca sua contribuição
para diminuição do aquecimento
do planeta, usar carvão mineral é
remar contra maré. Maior contribuinte para emissão de gases do
efeito estufa.
Além da pressão sobre as
terras das populações originárias,
as contaminações ambientais têm
sido denunciadas constantemente.
Sinalizo isso como avanço da sociedade civil organizada local. Os
crimes ambientais são aos órgãos
competentes. Tem sido freqüente
acidentes nos locais de operações
das grandes empresas. Algumas
vezes por conta da perda de controle do processo das empresas.
Outras vezes por conta do descaso
com a segurança, o que podemos
qualificar como consciente.
Não podemos ver a Amazônia como uma alternativa para
geração de artefatos primária de
interesse do capital internacional.
Acima de qualquer especulação
financeira precisamos saber se o
projeto será bom também para
nossa terra, nossa água, nossa
gente. Saber se realmente haverá retorno em forma geração de
emprego e renda, com respeito às
comunidades tradicionais, ribeirinhos, pescadores, agricultores,
caçadores e operários. E principalmente para preservação das
espécies entre elas o homem e a
mulher.
A exploração mineral e suas
consequências na Amazônia brasileira 1
Airton dos Reis Pereira [1]
José Batista Gonçalves Afonso [2]
Raimundo Gomes Cruz Neto [3]
1 – Introdução
Hoje, o que mais se ouve é que as grandes empresas são meios essenciais ao desenvolvimento econômico e tecnológico do país. Na propaganda e nos discursos oficiais de governantes e de políticos influentes elas são apresentadas como símbolo do desenvolvimento, do progresso e da geração de empregos. E
por estarem atreladas a mercados bem mais amplos que os regionais e por serem estratégicas no marketing
internacional, não por acaso, recebem gigantescos investimentos do Estado.
1 Trabalho publicado originalmente no Relatório Sobre Violência da Comissão Pastoral da Terra (CPT), 2009.
A exploração mineral na
Amazônia brasileira não é algo recente, muitos foram os garimpos
de extração de ouro, diamante e
cristal, nas margens dos rios Araguaia, Tocantins, Tapajós, Xingu
e Madeira e em vários de seus
afluentes. Há casos de “ciclos”
de extração aurífera, embora
de forma isolada e fragmentada
ainda no período colonial como,
por exemplo, no Amapá e Mato
Grosso. Mas a partir do final da
década de 1950 e início dos anos
1960 tornou-se uma prática quase
que intensiva como, por exemplo,
com a descoberta da província
aurífera do médio rio Tapajós e
de cassiterita, em Rondônia e em
São Felix do Xingu (PA).
Na década de 1980, as atividades auríferas se intensificaram nos estados do Pará, Roraima
e Rondônia. No Pará os garimpos
de ouro em Serra Pelada, Cumaru
e nos arredores de Itaituba e Jacareacanga atraíram milhares de garimpeiros de quase todas as partes
do Brasil [4].
A exploração mineral de
forma empresarial teve início em
meados da década de 1940 com
a extração de manganês pela empresa Indústria e Comércio de Minérios S/A (ICOMI), no Amapá.
Em 1947 essa empresa assinou
contrato de concessão para exploração mineral e em 1953, assinou
o contrato de concessão para a
atividade portuária e ferroviária,
considerado o marco zero da exploração mineral na Amazônia
[5].
Atualmente, embora se
2 - Exploração mineral: possa constatar que a exploração
da garimpagem à atividade em- mineral esteja espalhada por toda
a Amazônia, é possível considerar
presarial
Na Amazônia brasileira,
grandes empresas do ramo da mineração são beneficiadas com infra-estrutura (estradas, ferrovias,
hidrovias, portos, energia, etc.)
financiadas com dinheiro público,
créditos subsidiados, isenção de
impostos, etc. Controlam a “coisa
pública”, os principais meios de
comunicação e extensos territórios, onde exercem gestão autônoma criando enclaves que causam
impactos sobre a organização social regional e o meio ambiente.
Para essas empresas, a Amazônia
assume um alto valor estratégico,
pois ao controlar recursos e o espaço regional, fortalecem sua hegemonia.
O crescimento da produção industrial nos últimos anos e
o consequente aumento do valor
dos principais minérios no mercado internacional tem provocado
uma corrida cada vez mais acelerada do capital internacional sobre
as reservas minerais existentes.
Na Amazônia esse processo é extremamente visível. São dezenas
de projetos de exploração mineral
em funcionamento e tantos outros
em fase de instalação, resultado
de uma política nacional vergonhosa e entreguista que coloca o
país na condição de mero fornecedor de matéria-prima e de subserviência aos interesses do capital internacional. São projetos que
evidenciam poucas possibilidades
de incremento à economia local
e têm trazido sérios prejuízos às
comunidades de camponeses e ao
meio ambiente.
Fórum Carajás outubro de 2010
64
que essa prática seja mais intensa e de efeitos trágicos às comunidades camponesas em quatro
grandes pólos: “Amapá” com a
exploração de bauxita, manganês, caulim e ouro; “Oeste do
Pará” com a extração da bauxita
pela Aluminium Limited of Canadá (Alcan) e a Mineração Rio
do Norte (MRN); “Carajás”, com
a exploração de ferro, manganês,
cobre, níquel e ouro por diversas
empresas, entre elas a Companhia Vale do Rio Doce, a Vale, e
“Paragominas” com a retirada de
bauxita e caulim pela Vale e Pará
Pigmentos S/A.
É visível que a Amazônia
tem um peso significativo na atividade de extração e transformação
mineral realizada em território
brasileiro, considerando a ocorrência na região de diversos minerais que influenciam na balança
comercial do país, sendo o Pará o
segundo maior estado exportador
de minérios [6]. Em 2008, a extração do nióbio colocou o Brasil
em 1º lugar no ranking internacional, em 2º com a extração do ferro,
manganês e alumínio (bauxita), e
em 5º com o caulim e o estanho.
O estado do Amazonas participa
com 12% do nióbio extraído no
Brasil, e com 60% do estanho. Já
o minério de ferro de Carajás, no
sudeste paraense, ocupa o 2º lugar
na extração nacional, colocando o
Pará atrás apenas de Minas Gerais
[7].
A tendência para 2009, dependendo das condições da crise
na economia mundial, é de que
haja um crescimento significativo
na extração da bauxita, cobre, níquel, fosfato e ferro, considerando
a entrada em operação das minas
de cobre e níquel, da Vale, em Carajás, a mina de bauxita da Alcoa,
em Juruti, e o salto da extração
de ferro de Carajás de 96 milhões
de toneladas em 2008, para 126
milhões de toneladas, em 2009.
Há de se considerar ainda que na
Amazônia, enquanto a extração
mineral responde por 25% do
total das exportações, a transformação (ferro gusa, alumina e alumínio) responde por 21%. [8]. É
importante ressaltar ainda que o
extrativismo mineral representou
59,2% dos 8 bilhões de dólares
produzidos pela indústria mineral
do estado do Pará.
Tratando-se de reservas
conhecidas, o Brasil ocupa o terceiro lugar no ranking mundial
em bauxita, com depósitos concentrados em três distritos principais: Trombetas (médio Amazonas), Almeirim (baixo Amazonas)
e Paragominas-Tiracambú (plataforma Bragantina). Já os depósitos de caulim estão distribuídos
em três principais distritos: Manaus (médio Amazonas), Almeirim (baixo Amazonas) e Capim
(plataforma Bragantina). O ouro
e cassiterita estão distribuídos pelas mais diversas áreas da região
amazônica. Serra Pelada, no sudeste do Pará, por exemplo, ainda representa grande potencial
aurífero, fato que causa entreveros entre a Vale e cooperativas
de garimpeiros, no município de
Curionópolis. As jazidas de ferro
em Carajás, com seus 18 bilhões
de toneladas de minério, correspondem à maior concentração de
alto teor já localizada no planeta,
distribuídas em quatro setores
principais: Serra Norte, Serra Sul,
Serra Leste e Serra de São Félix
ou Serra Arqueada.
Vale considerar que a pesquisa, extração e transformação
mineral no estado do Pará ocorrem em quatro principais regiões:
no Oeste, envolvendo os municípios de Oriximiná, Juruti, Monte
Alegre, Alenquer e Óbidos; no
Nordeste, compreendendo os
municípios de Paragominas, São
Domingos do Capim e Barcarena; no sudeste destaque para os
municípios de Marabá, Cuirionópolis, Parauapebas e Canaã dos
Carajás; e no Sul, os municípios
de Xinguara, Ourilândia do Norte, Tucumã, São Félix do Xingu,
Rio Maria, Floresta do Araguaia,
Santa Maria das Barreiras e Conceição do Araguaia.
3 – As conseqüências
A extração e transformação mineral na Amazônia efetivada pelas principais empresas do
ramo: a Companhia Vale, a Anglo
Americana, a ALCOA, a Albras,
a Aluminum Limited of Canadá,
a Alunorte, Rio Tinto, a Mineração Rio do Norte, Companhia
Brasileira de Alumínio (CBA),
Imerys Rio Capim Caulim S/A,
Caulim da Amazônia S/A (CADAM/Vale), ICOMI, Pará Pigmentos S/A (PPSA/Vale), X Trata
e Caraíba Metais, com o apoio e
incentivo dos governos estaduais
e federal vem se dando de forma
espoliatória e predatória, desterritorializando populações tradicionais e degradando o meio ambiente. É notória a poluição do ar, do
solo e das bacias hídricas, além
do desflorestamento, destruição
de habitat natural, de animais silvestres e de sítios arqueológicos
[9]. São projetos dirigidos de fora
65
para dentro da região, sem que a
população da Amazônia tenham a
oportunidade de discutir e opinar
sobre a viabilidade, necessidade e
conseqüências desses empreendimentos.
O que se percebe é que o
impacto da mineração é localizado, desestruturante e ao mesmo
tempo estruturante, ao modo que
interessa às empresas. Desestrutura as comunidades locais (urbanas ou rurais), além de provocar a
migração de milhares de pessoas.
Diversas são aquelas que chegam
de outras regiões do país acreditando que as atividades dessas
empresas vão melhorar as suas
vidas. É visível o aumento, sem
controle, da população no entorno dos projetos mineralógicos.
Não só os núcleos urbanos próximos dessas áreas passam por rápidas e indesejáveis transformações
com o crescimento populacional,
como também surgem outros
aglomerados urbanos. O emprego
esperado não aparece. Para sobreviver muitos são aqueles que se
enveredam nos trabalhos temporários e informais. Assim, grande
é o contingente de trabalhadores e
trabalhadoras itinerantes, de vida
marcada pela provisoriedade e
mobilidade, e de mão-de-obra polivalente que lutam cotidianamente pela sobrevivência. Os efeitos
até então incontroláveis, nessas
regiões, têm sido a elevação do
índice de violência com destaque
para os homicídios, comércio de
drogas, prostituição e acidentes
de trânsito [10].
A própria Vale encaminhou
uma pesquisa nesses municípios e
constatou que entre 2000 e 2005
o crescimento populacional foi
de 22,9% e a projeção de cresciFórum Carajás outubro de 2010
mento do ano de 2005 para o ano
de 2010 será de 92,9%. No ano
de 2000 essa área contava com
334.386 habitantes, em 2005, com
423.361. Na projeção para o ano
de 2010, se forem desenvolvidos
todos os investimentos previstos,
segundo esta pesquisa, essa área
contará com 817.268 habitantes [11].
Os migrantes que ali chegam diariamente, sem alternativa,
se aventuram na formação de novos bairros (ocupações) compostos por casas, às vezes precárias,
sem água encanada e sem esgoto
sanitário. São, em sua maioria,
trabalhadores pobres, analfabetos ou de baixa escolaridade, sem
profissão definida.
Os povos indígenas estão sendo cercados, não somente pelos latifúndios e exploração
madeireira, mas também pela exploração mineral. O próximo alvo
do setor minerário é conseguir a
liberação da mineração em ter-
ras indígenas, que ocupam hoje
22% do território amazônico. [12]
Como exemplo dos danos causados a esses povos, no sudeste
do Pará, os índios Gaviões tiveram as suas terras atravessadas
pela rodovia BR-222, pela linha
de transmissão de energia elétrica de alta tensão da Eletronorte,
que sai de Tucuruí rumo ao nordeste brasileiro, e pela Estrada
de Ferro Carajás. Agora se vêem
na iminência de ter parte do seu
território inundada pela hidrelétrica de Marabá, no rio Tocantins.
Os Xikrins do Cateté estão sendo
ameaçados pela Vale a partir da
execução dos projetos Salobo, de
extração de cobre, no município
de Marabá, e pelo projeto de extração de níquel na Serra do Puma,
em Ourilândia do Norte. Além de
impactar diretamente sobre esses
povos que ali habitam, são sérios
os riscos de degradação ambiental com alterações significativas à
biodiversidade.
Por outro lado, o impacto
da mineração é estruturante ao
modo que interessa às empresas.
Elas se aproveitam da conivência
e submissão do Estado, das precárias condições em que vive a
maioria da população dos municípios onde elas se instalam, para
através da manipulação da consciência das pessoas, com o discurso
da chegada do desenvolvimento e
do progresso, criar um ambiente
favorável para sua implantação e
domínio. Desse modo, os governantes municipais, governadores
dos estados e não raros deputados
e políticos influentes assumem o
discurso e a defesa dessas empresas além de lhes possibilitar infraestrutura, colaboração financeira
e isenções tributárias, com vistas
a fornecer-lhes condições competitivas e asseguratórias ao bom
funcionamento dos seus empreendimentos.
Uma das situações emblemáticas que até hoje tem gerado
consequências negativas ao meio
ambiente e à população local é a
exploração do manganês, em Macapá, no estado do Amapá. Depois da retirada de quase todo o
minério, crateras de até 170 metros de profundidade ficaram a
céu aberto. Enormes também são
os estoques de rejeitos. “Calculase, que em Santana, estão estocadas cerca de 70.000 toneladas de
rejeito provenientes do processo
de pelotização e que apresenta
um percentual de arsênio superior ao encontrado no minério in
natura. A Fundação Evandro Chagas (Belém), depois de inúmeros
exames laboratoriais, recomenda
a imediata retirada desses rejeitos para que não se tenha risco de
contaminação de qualquer natureza às pessoas ou comunidades
próximas a estes locais”. [13]
Em Oriximiná (PA), a Mineração Rio Norte (MRN) que
explora as reservas de bauxita
nesse município, provocou degradação do meio ambiente com
os rejeitos da mineração a partir
da emissão de partículas sólidas e
material estéril, como argila, bauxita fina e areia. O maior desastre
foi causado no lago do Batata. As
populações locais, formadas em
sua maioria por camponeses e ribeirinhos foram alijadas de seus
direitos sobre as áreas de castanhais que ficam ao norte da Floresta Nacional de Sacará-Taquera,
onde a mineradora está situada.
Já a Alumínio Brasil S/A (ALBRAS) e a Alumina Norte Brasil
S/A (ALUNORTE), grandes produtoras nacionais de alumina e
alumínio instaladas no município
de Barcarena (PA), têm causado
enormes prejuízos às comunidades locais com o carreamento de
poluentes compostos com dióxido
de alumino e soda cáustica para
os cursos d’água. A Pará Pigmentos S/A (PPSA) é outra empresa
que tem causado sérios danos ambientais às comunidades no norte
do estado do Pará. O beneficiamento de caulim, no município de
Ipixuna tem contaminado cursos
d’água afetando tragicamente as
comunidades ribeirinhas. A Vale
tem trazido sérios prejuízos às
comunidades de quilombolas de
Jambuaçú e outras comunidades
dos municípios de Acará e Mojú
com a construção de 180 quilômetros de mineroduto (transporte
de bauxita) e linhas de transmissão de energia elétrica. Não só a
produção agrícola foi prejudicada,
mas vilas e povoados foram impactados diretamente pelos empreendimentos.
Casos notórios são também aqueles causados pela Vale
no sudeste do Pará. A exploração do ouro no igarapé Bahia espalhou substâncias químicas na
região por conta do uso de soda
cáustica e cianeto para a separação do minério da rocha primária.
Não muito distante, a empresa
construiu uma barragem de contenção no igarapé Gelado para o
barramento de rejeitos oriundos
da exploração do minério de ferro
na Serra de Carajás. Em 1992 esta
barragem transbordou e inundou
áreas de camponeses da região
causando sérios prejuízos econômicos e ambientais. Desde então
são ameaçados por outras inundações. Recentemente esta empresa
tem causado danos aos assentados do Projeto de Assentamento
67
Cinturão Verde, município de
Marabá. Os serviços de prospecção efetivados pela empresa têm
contaminado nascentes de águas
e danificado estradas e cercas de
arame dos camponeses. A Mineração Buritirama S/A, instalada
dentro desse mesmo assentamento vem contaminando as águas dos
igarapés Bandeira e Grotão com a
exploração do manganês. Trabalhadores têm reclamado que no
período chuvoso os rejeitos provenientes da lavagem do minério
têm alcançado os cursos d’água,
impossibilitando o seu uso.
Em 2003, a mineradora
Canico do Brasil, da Specific International Scientific Cooperation
Activities (INCO), empresa canadense, proprietária dos direitos
minerários do projeto de extração
de níquel nas serras do Onça e do
Puma, no município de Ourilândia do Norte, sul do Pará, expulsou 82 famílias através de compra
ilegal dos lotes nos projetos de
assentamentos Campos Altos e
Tucumã, danificou reservas florestais, contaminou os igarapés
e desestruturou a comunidade
com os serviços de pesquisas. Em
2006, a Vale adquiriu o controle
do projeto e continuou causando
danos ambientais, econômicos e
sociais, inviabilizando a vida de
centenas de famílias assentadas
que ainda resistem nos referidos
assentamentos. Agora essa empresa pleiteia a expulsão de mais
93 famílias assentadas. A direção
nacional do Instituto de Colonização e Reforma Agrária (INCRA)
tem sido totalmente conivente
com os desmandos da empresa e
omisso no que diz respeito aos direitos dos trabalhadores rurais.
Fórum Carajás outubro de 2010
As empresas de mineração
na Amazônia são beneficiadas
pela Lei Complementar nº 87, de
1996, também conhecida como
Lei Kandir. Como elas exportam
produtos considerados matériasprimas são isentas de pagar Impostos sobre Circulação de Mercadorias (ICMS). Os valores dos
royalties ou da Contribuição Financeira pela Exploração de Recursos Minerais (CFEM) repassado pelas empresas aos municípios
são extremamente baixos. Eles
variam entre 1 e 3% do faturamento líquido. Como os cálculos
são feitos pelas próprias empresas
mineradoras, a União, o Estado e
os municípios são lesados. O município de Parauapebas (PA), após
uma auditoria, identificou que foi
lesado pela Vale em mais de 700
milhões, como a Vale não se propõe pagar, a reclamação está na
justiça [14].
4 – Resistências
Em quase todas as regiões
onde se desenvolvem trabalhos
de extração e de transformação
mineral pelas grandes empresas
do ramo, com apoio quase que incondicional do Estado, os movimentos sociais têm demonstrado
alguma reação. Os camponeses,
sobretudo, têm implementado,
embora que em âmbito local, diversas ações contrárias a esta lógica perversa do capital.
Na região Guajarina, proximidades de Belém, as comunidades quilombolas do Jambuaçu,
no ano de 2006, após muitos dias
de mobilização e protesto, derrubaram uma torre de transmissão de
energia elétrica da Vale para que
a empresa concordasse em negoFórum Carajás outubro de 2010
ciar as compensações pelos danos
ambientais, sociais e econômicos
causados em seu território com a
construção de um mineroduto que
leva bauxita de Paragominas para
Barcarena.
Na região de Carajás, em
junho 2003, os índios Xicrin com
flechas e bordunas ocuparam as
instalações do Projeto Sossego,
da Vale, em Canaã dos Carajás, no
sul do Pará. Eles exigiam a construção de uma estrada até a aldeia,
escola e casas. Haviam-se completado dez anos de promessas
não cumpridas da empresa às aldeias Cateté e Djudjecô [15]. Em
outubro de 2006, os Xicrin ocuparam por mais de três dias a mina
de ferro de Carajás na tentativa de
obrigar a Vale a negociar valores
referentes a direitos dos índios,
em decorrência dos impactos sofridos pelo projeto Ferro Carajás.
No final de 2007 e início de 2008,
povos indígenas e trabalhadores
rurais ligados ao Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra
(MST) e à Via Campesina fizeram várias manifestações com
ocupações dos trilhos da Estrada
de Ferro de Carajás administrada
pela Vale. Essas ações culminaram com a criação do Movimento
dos Trabalhadores na Mineração
(garimpeiros) e o lançamento de
um manifesto intitulado Manifesto da Mobilização dos Camponeses de Marabá.
Em setembro de 2008, no
município de Ourilândia do Norte,
mais de 200 trabalhadores rurais
dos Projetos de Assentamento
Tucumã e Campos Altos, interditaram, por três dias, uma estrada
usada pela Vale, que dá acesso à
área de mineração da Serra Onça,
68
onde a empresa iniciou trabalhos
para a extração de níquel. Os
trabalhadores só deixaram o local depois que representantes da
Companhia se dispuseram a discutir com a comunidade os problemas sociais e ambientais causados por ela.
No final de janeiro de 2009,
em Juruti, oeste do Pará, trabalhadores atingidos pela extração e
transformação de bauxita pela mineradora ALCOA iniciaram ferrenha luta pelos seus direitos. Uma
manifestação que começou com
800 trabalhadores, terminou com
2.500. A manifestação que durou
uma semana, resultou numa negociação entre os trabalhadores
e o representante da empresa envolvendo órgãos estaduais e os
ministérios públicos estadual e
federal.
Se por um lado é possível
perceber que os amazônidas e os
movimentos sociais vêm tomando consciência dos impactos dos
projetos de mineração, por outro,
lideranças e suas organizações sofrem com o processo crescente de
difamação, ameaças e criminalização, orquestrado pelas mineradoras, grupos políticos ligados a
elas, os meios de comunicação e o
poder judiciário. Devido a Prelazia do Xingu, através do seu bispo
Dom Erwin Klauter, ter se colocado em defesa das comunidades
indígenas e contra a construção
da hidrelétrica de Belo Monte, no
Rio Xingu, o religioso vem sendo vítima de uma campanha de
difamação movida pelos meios
de comunicação ligados à Vale e
tem sido ameaçado de morte tendo, inclusive, que andar protegido
por policiais militares.
No Sudeste do Pará, o advogado da CPT, José Batista Gonçalves Afonso, que atua na defesa
dos trabalhadores e lideranças
indiciadas ou processadas em decorrência de conflitos com a Vale,
foi vítima de uma condenação pela
Justiça Federal de Marabá, em junho de 2008. Ele foi condenado
a uma pena de 2 anos e 5 meses
de prisão sem direito à pena alternativa. Acredita-se que a pesada
condenação imposta pelo juiz foi
em razão da atuação do advogado em defesa dos trabalhadores e
contra os interesses da Companhia.
Nessa mesma região, em setembro
de 2008, uma liderança do MST
e duas lideranças do Movimento
dos Trabalhadores na Mineração
(garimpeiros) foram condenadas
pelo mesmo juiz ao pagamento
de uma multa de 5 milhões e 200
mil reais por elas terem participado de mobilizações que resultaram
na interdição da Estrada de Ferro
Carajás. Contrariando o que diz a
própria Lei, o juiz atribui às três
pessoas uma condenação que, teria que ser aplicada a cada uma das
quinhentas pessoas que participaram da interdição. A explicação do
juiz é que eles eram lideranças e,
por esta razão, deveriam ser condenados.
5 – Considerações Finais
As características do capitalismo são as mesmas em
qualquer parte do mundo: concentração dos meios de produção; desenvolvimento das forças
produtivas; exploração da força
de trabalho; acumulação da maisvalia por poucos; e geração de pobreza e miséria para a maioria.
Na Amazônia, a expansão
da exploração mineral, como foi
demonstrada, nada mais é do que
a expansão do próprio capitalismo destruidor e perverso, que expropria e explora intensivamente
a terra, as águas, as florestas e a
força dos trabalhadores.
São projetos baseados no
extrativismo, de curta duração,
que não agregam riquezas para as
localidades, mas desestruturam relações de trabalho, comunidades
e desterritorializam pessoas num
processo de estruturação de uma
sociedade do caos: aglomerados
populacionais com alto índice de
desemprego, criminalidade, com
péssimas condições de habitação,
saneamento básico e educação.
O Estado, entreguista e arrecadador de migalhas na defesa
do capital, coloca à disposição das
corporações todo seu aparato jurídico e policial, para facilitar a implantação dos empreendimentos
e seu funcionamento ao mesmo
tempo que reprime e repreende os
movimentos sociais que venham
a se opor a esta lógica.
É necessário e urgente fazer
com que os bens naturais da Amazônia sejam colocados à disposição
de seus povos e não para aumentar
os lucros das grandes empresas. Os
minérios, ao contrário do que vem
acontecendo até o momento, devem
gerar benefícios para as populações
locais e diminuir as desigualdades e
a pobreza. Não é justo e nem lícito
que as empresas com direta participação do Estado continuem causando sérios prejuízos às comunidades
camponesas e ao meio ambiente.
Não interessa para a sociedade amazônica a extração e transformação mineral, na forma de
saque como está sendo feita, com
a geração de crateras que jamais
possam ser recuperadas. Não interessa os rejeitos tóxicos, as matas
devastadas, o solo e águas poluídas.
Pelo contrário, torna-se um desafio
a desconstrução do atual modelo
imposto pelo capital e a construção
de um modelo sustentável e racional de aproveitamento dos recursos
minerais na Amazônia.
6 – Bibliografia
CRUZ NETO, Raimundo Gomes da. Impacto so- [5] Fórum Paraense de Desenvolvimento. 50 anos de mineracioambiental da mineração na região de Carajás, ção na Amazônia. Belém: Cejup, 2003.
Marabá: CEPASP, 2008 (Fotocópia).
[6] A situação dos minérios mais extraídos na Amazônia é esta:
CVRD e Diagonal. Diagnostico Integrado em So- em primeiro lugar, o ferro, que em 2008, respondeu por 35,2%
cioeconomia para os empreendimentos da CVRD. do total nacional. Em segundo lugar, a alumina (bauxita) com
17,6%, em terceiro, o alumínio com 15,1% e em quarto, o co2006.
bre com 11,3%. O manganês da Mina do Azul, em Carajás,
CORREIO DO TOCANTINS, Marabá, 10 a
12/01/2009.
e da Buritirama, em Marabá, contribuíram com mais de 50%
da extração nacional, dos 2,4 milhões de toneladas extraídas
em 2008. O estado do Pará é ainda responsável por 100% da
INSTITUTO BRASILEIRO DE MINERAÇÃO
(IBRAM). Informações e Análises da Economia
Mineral Brasileira, 3ª edição, IBRAM, 2008.
extração nacional do caulim, 85% da bauxita, 60% do cobre
e 10% do ouro (Companhia Vale do Rio Doce. Relatório de
Produção, 2008).
__________. Indústria da Mineração, IBRAM, Ano
III, nº. 20, 2008.
[7] O município de Parauapebas, no sudeste paraen
se, participou com 35,8% (minério de ferro), Barcarena com
33,3% (alumina e alumínio), Canaã dos Carajás com 10% (co-
FÓRUM PARAENSE DE DESENVOLVIMENTO. bre), Marabá com 7,1% (ferro gusa e manganês), Oriximiná
50 Anos de Mineração na Amazônia, Belém: Cejup, com 6,3% (bauxita), contribuindo significativamente para o
crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) estadual. O muni2003.
cípio de Belém participou com 28,21%, para o PIB do estado,
O LIBERAL, Belém, 13/06/03.
em segundo lugar, Barcarena com 8,03%, Parauapebas com
6,72%, Marabá com 5,91%, Ananindeua com 5,56%, Canaã
SANTOS, Breno Augusto dos. Recursos Minerais
da Amazônia, 2002.
dos Carajás com 1,58% e Oriximiná com 1,42%.
[8] Instituto Brasileiro de Mineração (IBRAM). Informa-
SCHMINK, Marianne and WOOD, Charles H. ções e Análises da Economia Mineral Brasileira, 3ª edição,
Contested Frontiers in Amazonia. New York: Co- IBRAM, 2008.
lumbia University Press, 1992.
[9] O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
_______________________________________
Naturais Renováveis (IBAMA) já lavrou 56 autos de infração
contra a Vale, desde que foi privatizada, o que resultou em 37
milhões de reais em multas não pagas.
[1] Historiador e Agente da Comissão Pastoral da Terra, em
Marabá.
[10] Os registros mostram que na área de influência da Vale, no
[2] Advogado e Agente da Comissão Pastoral da Terra, em
sudeste paraense (municípios de Marabá, Parauapebas, Canaã
Marabá.
dos Carajás, Eldorado dos Carajás, Curionópolis, Ourilândia
do Norte e Tucumã), as mortes por causas violentas aumenta-
[3] Sociólogo e Agrônomo do Centro de Educação, Pesquisa e
ram em 23% de 2007 para 2008, considerando os corpos que
Assessoria Sindical e Popular.
passaram pelo Instituto Médico Legal (IML) de Marabá. No
ano de 2008, os municípios de Marabá e Parauapebas foram os
[4]Marianne Schmink and Charles H. Wood Contested Fron-
que mais registraram mortes por assassinato. Marabá saltou de
tiers in Amazonia. New York: Columbia University Press, 187 assassinatos, em 2007, para 266, em 2008, e Parauapebas,
1992.
Fórum Carajás outubro de 2010
saltou de 62, em 2007, para 94, em 2008 [10].
70
[11] CVRD e Diagonal Urbana Consultoria. Diagnóstico
[14] Em 1997, do faturamento de mais de 2 bilhões de dólares
Integrado em Socioeconomia para os empreendimentos da
das empresas com a movimentação da bauxita extraída, em
CVRD. 2006.
Oriximiná, e da produção de alumínio, em Barcarena, somente
30 milhões de dólares foram recolhidos aos cofres públicos, o
[12] Tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei
que representa apenas 1,5% do faturamento. Em 2008, o reco-
1610/96 com o objetivo de regulamentar o art. 231 da Consti- lhimento de 700 milhões de reais representou somente 1,44%
tuição Federal que impede a atividade em território indígena.
do faturamento. Significa que nem os 2%, como manda a Lei
que determina o valor da CFEM, para o caso da bauxita, está
[13] (Fórum Paraense de Desenvolvimento. 50 Anos de Mine-
sendo cumprido.
ração na Amazônia, Belém: Cejup, 2003).
[15] O LIBERAL, Belém, 13/06/03.
LINKS DE INTERESSE
www.forumcarajas.org.br
www.justicanostrilhos.org
http://relicariominado.blogspot.com
http://rogerioalmeidafuro.blogspot.com
http://mineracaosudesteparaense.wordpress.com
www.faor.org.br
www.forumsocialpanamazonico.org
www.justicaambiental.org.br
http://racismoambiental.net.br
http://atingidospelavale.wordpress.com
www.gta.org.br
71
Fórum Carajás outubro de 2010
Reunião do Grupo Salvaterra em Rio do Cachorros, São
Luís/MA
Visita de Sussane (Assessora de mineração/MISEREOR ) ao Escritório do Fórum Carajás.
Carvoarias no Baixo Parnaíba Maranhense
Mineração Aurizona em Godofredo Viana/MA
Integrantes do Fórum Carajás, Sindmetal e pesquisadores alemães (ASA) em
visita a Alcoa.
Fórum Carajás outubro de 2010
72
Alcoa em Juruti/PA