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TÍTULOS DE CRÉDITO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: UMA
ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE A LETRA DE CÂMBIO E A NOTA
PROMISSÓRIA1
Rinaldo Ribeiro Moraes2
RESUMO3
Este trabalho de Direito Empresarial foca o debate da relevância dos títulos de
crédito no ordenamento jurídico brasileiro e, foca mais ainda, dois dos
principais títulos existentes – letra de câmbio e nota promissória. A inquietação
da pesquisa (ou problema de pesquisa) é: como se configura a Letra de
Câmbio e a Nota Promissória no ordenamento jurídico brasileiro? Sabe-se que
a internet tem o seu poder avassalador para transformar e aproximar
poupadores e investidores, mas a questão jurídica legal tem a sua dinâmica e
relevância própria. O objetivo do trabalho, em um alinhamento com a proposta
do problema, é de fazer uma análise de relevância jurídica entre a Letra de
Câmbio e a Nota Promissória enquanto títulos de créditos dentro do
ordenamento jurídico brasileiro. A pesquisa é descritiva (quanto aos fins) e
bibliográfica (quanto aos meios). A abordagem qualitativa pois o problema
apresenta relações entre variáveis. O resultado da pesquisa mostrou que tanto
a letra de câmbio quanto a nota promissória, neste tempo de intensas relações
virtuais, são profundamente relevantes para o debate jurídico e mercadológico
atual – e isto em todas as suas complexidades. De uma forma geral, ainda que
tenham as suas especificidades, o que vale são as suas convergências
conforme preceitua a LUG – Lei Uniforme de Genebra.
PALAVRAS-CHAVES: DIREITO EMPRESARIAL, TÍTULOS DE CRÉDITO,
NOTA PROMISSÓRIA, LETRA DE CÂMBIO.
ABSTRACT
This work focuses on Business Law of the debate on the relevance of debt
securities in the Brazilian legal system and focus even more, two of the main
existing titles - bill of exchange and promissory note. The restlessness of
research (or research problem) is, how to set up the Bill of Exchange and
Promissory Note in the Brazilian legal system? It is known that the internet has
its overwhelming power to transform and bring savers and investors, but the
legal legal matter has its own momentum and relevance. The objective, in
alignment with the proposal of the problem is to do an analysis of legal
significance of the Bill of Exchange and Promissory Note as titles of credits
1
Este artigo é um resumo do trabalho de conclusão de curso submetido ao curso de especialização do
autor em Direito Empresarial realizado na Pós Graduação da Estácio.
2
Professor Doutor da Estácio do Pará (FAP). Economista, Administrador e Contador. Acadêmico de
Direito. Pós graduando em Direito Empresarial.
3
Um agradecimento especial aos meus três grandes professores de Direito Empresarial da Estácio do
Pará (FAP): Professora Luciana, Professor Francisco Helder e Professora Isabela Figueiredo.
within the Brazilian legal system. The research is descriptive (how to use) and
literature (as the means). The qualitative approach as the problem shows
relationships between variables. The survey results showed that both the bill of
exchange as the promissory note, in this time of intense virtual relationships,
are deeply relevant to the legal debate and current marketing - and this in all its
complexities. In general, even if they have their specificities, which are worth
their convergences as precepts of LUG - Law Geneva Uniform.
KEYWORDS: BUSINESS LAW, OF CREDIT, promissory note, bill of exchange.
INTRODUÇÃO
A temática tratada neste artigo é o título de crédito e, vale dizer, esta
necessidade tem seu ponto de partida na tentativa de entender toda a dinâmica
do crédito cambiário brasileiro sob a égide do Direito Empresarial. De fato,
mesmo, existem dezenas de espécies de títulos de crédito sendo que podemos
classificar os seguintes conforme Bertoldi (2013, p. 388):
i)
ii)
iii)
iv)
v)
vi)
vii)
viii)
ix)
Letra de câmbio;
Nota promissória;
Cheque;
Duplicata;
Conhecimento de transporte;
Warrant;
Título de crédito rural;
Título de crédito industrial;
Título de garantia imobiliária.
Nesta pesquisa trataremos tão somente dos títulos de créditos mais
utilizados – letra de câmbio, nota promissória, cheque e duplicata. Focaremos,
por questão de delimitação teórica, nos dois primeiros. Coelho (2015) assinala
que títulos de crédito são documentos representativos de obrigações
pecuniárias e que não se confundem com a própria obrigação – mas se
distinguem dela na exata medida em que a representam.
O tema escolhido, de forma bem específica do Direito Empresarial, é a
Letra de Câmbio e a nota promissória e essa escolha é tanto pela necessidade
de se entender a importância de dois dos principais títulos de crédito do
passado – e ainda do presente na nossa economia. Autores como Ramos
(2012) e Rosa Junior (2007) assinalam que a Letra de Câmbio e a nota
promissória foram os títulos de crédito mais prestigiado no mundo jurídico de
algumas décadas passadas mas que hoje se encontram em franco declínio não só pelo surgimento de outros tipos de títulos de crédito, como também pela
modernização e agilização dos meios de cobrança.
O tema deste trabalho dialoga com as legislações aplicáveis à Letra de
Câmbio e Nota Promissória– e isto significa que a proposta da pesquisa é um
diálogo que avance além da LUG mas também mas, também, com o direito
interno. Significa dizer que o tratamento da Letra de Câmbio, especificamente,
no Brasil, ainda se vale de várias reservas que, conforme Coelho (2015), ainda
deixa lacunas na legislação. Coelho chama isto de colcha de retalhos – pelo
fato da legislação brasileira não ter, ainda, uma posição clara acerca da Letra
de Cambio.
O problema de pesquisa deste artigo pode ser colocado em forma de
uma pergunta: como se configura a Letra de Câmbio e a Nota Promissória no
ordenamento jurídico brasileiro? As perguntas que irão nortear o trabalho de
pesquisa são:
- O que são títulos de crédito?
- Qual a relevância da LUG no ordenamento jurídico brasileiro para o
tratamento da Letra de Câmbio e a Nota Promissória?
- Como se configura a legislação da Letra de Câmbio e da Nota
Promissória na legislação interna?
Na discussão da problemática proposta, a pesquisa dialoga com vários
autores que tratam da temática do Direito Empresarial, especificamente do
título de crédito, com destaque para Fábio Ulhoa Coelho, Luiz Emylio da Rosa
Júnior, Arnaldo Rizzardo, André Cruz Ramos. A pesquisa é, portanto,
bibliográfica e descritiva com abordagem qualitativa.
De forma proposital e dentro de um alinhamento proposto com a
problemática, o estudo não foca o lado da economia – oportunidades de
investimentos, renda variável, comportamento de riscos – pois o necessário é
explorar a perspectiva do Direito Empresarial. Foca, sim, a perspectiva de
comparação entre a Letra de Câmbio e a Nota Promissória – dentro do
arcabouço da legislação atual, nacional e internacional.
A motivação para a realização deste trabalho faz parte da vivência
profissional do respectivo autor que é formado em Economia e Contabilidade.
De uma forma geral, sempre ouve a inquietação para se conhecer um pouco
mais sobre título de crédito – e, também, toda a sua perspectiva histórica – e
as graduações citadas apenas operaram na superficialidade.
O que se nota, ainda que se viva intensamente em um mundo plugado
tecnologicamente, é que os mercados necessitam cada vez de instrumento que
possa viabilizar as transações – tanto de curto, quanto de médio ou longo
prazo. Os títulos de crédito são esses instrumentos.
A pesquisa, então, é uma incursão proposital nos títulos de crédito
focando, especificamente, dois – nota promissória e letra de câmbio. O
problema de pesquisa representa a angústia aqui citada - como se configura a
Letra de Câmbio e a Nota Promissória no ordenamento jurídico brasileiro?
No aspecto acadêmico, a relevância da pesquisa foi de focar estabelecer
um debate teórico entre dois dos principais títulos de créditos – letra de câmbio
e nota promissória. O foco aqui não foi avançar para as perspectivas
econômicas mas, sim, focar o lado jurídico e suas questões complexas.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Esta parte do trabalho trata do alicerce teórico que fundamenta as
discussões expostas no tema proposto. A primeira parte trata do Direito
Empresarial -e esboça-se, aqui, algumas considerações sobre a questão.
Depois, de fato, entra-se na discussão dos títulos de crédito – com destaque
para os preceitos relativos à letra de câmbio e nota promissória
Direito Empresarial – Considerações Preliminares
Dentro de uma perspectiva da história do direito e para as intenções
deste trabalho, é necessário um comentário científico que consiga situar o
direito comercial nas suas fases até chegar aos dias de hoje. Gusmão (2012,
pp.1 e 2) é uma professora que na sua obra tenta aceitar esse desafio. Para
tanto, então, afirma que o direito comercial se divide em quatro fases, que são:
1) Fase um: segunda metade do século XII e a segunda metade do
século XVI;
2) Fase dois: entre os séculos XVI e XVII;
3) Fase três: entre o século XIX e primeira metade do século XX;
4) Fase quatro: atual – teoria da empresa.
Sobre a primeira fase, Gusmão (2012, po.1) fala:
O direito comercial é especial, restrito, separado do direito civil e
aplicável apenas aos comerciantes matriculados nas suas repartições
de ofício. Com isto adota-se um critério subjetivo para a definição do
objeto de sua incidência. Assim se diz por que esse ramo do direito,
nascido na Idade Média, foi elaborado pelos próprios comerciantes
para disciplinar entre os inscritos nas corporações as atividades
profissionais a que se dedicavam. Nesse período, o direito comercial
já conhece a letra de câmbio, os bancos e o seguro.
O que se no comentário da autora citada é que o direito empresarial
ainda não tem uma dinâmica própria de se alinhar aos princípios legais – ou de
uma condição de força de executabilidade, condição natural do próprio Direito.
Percebe-se, por outro lado, uma condição diferente, da força na economia
medieval que, pouco a pouco, vai intensificando suas relações de troca. O
destaque são as corporações de ofícios – que mais tarde irão se transformar
em organizações mais densas e efetivamente capitalistas.
A segunda fase compreende os séculos XVI e XVII e, assim, o direito
comercial, concentrado na Europa Medieval, trata do direito das corporações
dos comerciantes – mas o desenvolvimento da Common Law, na Inglaterra,
acentua a superação dessa característica. Gusmão (2012, p.1) comenta sobre
isto:
Nasce, nesta fase, a sociedade anônima. Com o mercantilismo, o
prestígio das corporações de ofício declina e o Estado chama a si a
primazia de elaborar leis aplicáveis às relações do comércio. Na
França surgem as primeiras codificações comerciais com as
Ordenações Francesas. A primeira dela, de 1673, conhecida como o
Código Savary, disciplinava o comércio terrestre. Em 1681 surgiu a
Ordenação da Marinha, que regulava o comércio marítimo.
De alguma forma, nesta segunda fase, já se pode perceber um
movimento de sofisticação no mercado – pelas intensas relações de troca
proporcionada pelo mercantilismo. O próprio nascimento das sociedades
anônimas já refletia esse período e o seu respectivo dinamismo no comércio
internacional. Nesta leitura, o Código Savary serviu de inspiração para o
Código de Comércio Napoleônico de 1807.
A terceira fase do direito empresarial ocorre, conforme Gusmão (2012,
p.1) entre o século XIX e a primeira fase do século XX. Nesta fase supera-se o
critério subjetivo de identificação do âmbito do direito comercial para definí-lo
com o CODE DE COMMERCE napoleônico, de 1807, não mais como o direito
dos comerciantes mas como o direito dos atos de comércio. Com esse Código,
O direito comercial abandona, definitivamente, o caráter subjetivista –
isto é, de um código feito por comerciantes para comerciantes – e
adota um critério objetivo: o direito comercial passa a basear-se na
prática de atos de comércio taxativamente enumerados na lei,
segundo critérios históricos. Não é mais um direito do comerciante
matriculado nas corporações, mas de qualquer pessoa que praticasse
regularmente aqueles atos de comércio especificados nas leis
(GUSMÃO, 2012, p.2).
A teoria dos atos de comércio, de tradição francesa, assinala que o
direito comercial deixa de ser direito de uma categoria específica de
profissionais, reunidos em corporações, para tornar-se um conjunto de atos
disciplinados que poderiam ser praticados por qualquer pessoa.
A quarta fase é a atual. Trata do atual momento que estamos vivendo na
economia de mercado (capitalista) aqui no Ocidente. É a fase que o objetivo
central do direito comercial deixa de ser o ato de comércio – da mera relação
de atos tradicionalmente praticados pelos comerciantes – para ser a empresa.
O destaque a ser comentado, aqui, é a edição na Itália do Codice Civile,
de 1942, que unifica o direito privado italiano e que reúne, numa só lei, as
normas do direito privado civil, comercial e trabalhista. Esse código nega os
fundamentos da doutrina francesa dos atos de comércio – ou a TEORIA DOS
ATOS DE COMÉRCIO. O foco é a empresa – e daqui advém a moderna teoria
da empresa.
Nesta fase, da teoria da empresa, diferentemente da teoria dos atos do
comércio, não interessa o gênero da atividade mercantil mas o
desenvolvimento da atividade econômica pela organização do trabalho, do
capital, da tecnologia e da matéria-prima.
Ou seja, conforme Gusmão (2012, p.2):
Ao contrário da teoria francesa dos atos de comércio, a italiana,
centrada no conceito de empresa, não separa as atividades
econômicas em dois núcleos – um civil e outro comercial -, mas as
agrupa em um regime amplo, aplicável à quase totalidade das
atividades econômicas, deixando de fora aquelas que, p0or sua
peculiaridades,, mereciam tratamento diferenciado em leis especiais
como as de natureza intelectual, literária, artística ou científica.
Coelho (2002, p.18) que é mais correto entender a teoria da empresa
como um núcleo de um sistema novo de disciplina privada da atividade
econômica e não como expressão da unificação dos direitos civil e empresarial.
De tudo isto, é um conceito bem diferente do que era propagado pela teoria
dos atos de comércio.
Considerava-se ato de comércio aquele praticado com habitualidade,
profissionalidade e intuito de lucro pelos não comerciantes e comerciantes. Os
atos de comércio não eram, portanto, definidos pelo Código Comercial mas
pelos artigos 19 e 20 do Regulamento n.737, editado em 1850 e que vigorou
até 1875, quando, então, foram extintos os Tribunais do Comércio (Gusmão,
2002).
Origem e evolução histórica dos títulos de crédito
Etimologicamente, o termo crédito deriva do latim creditum, decorrente
de credere, no sentido de confiar, ter fé, podendo, no entanto, ter outros
significados como, por exemplo, o direito que o credor ter de receber do
devedor a prestação objeto da obrigação (significado jurídico), a confiança que
uma pessoa inspira em outra baseada em seus atributos morais (significado
moral), ou pode ainda consistir na importância que constitui objeto da relação
crédito/débito.
Rizzardo (2002) assinala que o crédito é produto decorrente daquilo que
se acredita ou se crê com absoluta confiança. Nasce da raiz do seu próprio
verbo latino. E neste sentido, sua origem remonta à época das trocas que
precedeu o direito romano. Comenta:
Em tempo assaz afastados, quando, no encadeamento das trocas em
espécies, um dos operadores se propunha receber o que
necessitava, dando, depois, os frutos de sua semeadura em curso de
amadurecimento, tanto que chegados a ponto de colheita; e o outro
confiava no ofertante assentindo. Assim, deverá ter-se realizado a
primeira operação de crédito (FERREIRA, 1962 citado em
RIZZARDO, 2002, p.5).
Do exposto acima o nascimento dos títulos de crédito foi uma
decorrência da criação do crédito. Ou seja, após uma fase inicial da instituição
do crédito em si, impunha-se a necessidade do instrumento – isto, com efeito
ensejou a formação de títulos de crédito (RIZZARDO, 2002, p. 6). Destaca,
neste sentido, o autor:
Num período primitivo havia o cambium, ou a troca de mercadorias,
que se fez necessário documentar, especialmente quando se
realizava entre locais distintos e afastados. Era a chamada economia
natural passando, numa fase seguinte, à monetária, caracterizada
pela moeda como instrumento de troca. Bem mais adiante, implantouse a economia creditícia. São criados os títulos de crédito que
substituem o dinheiro.
Diz, neste sentido, ainda, Almeida (1978, p.2), sobre os títulos de
crédito.
De início operavam como mero instrumento de contrato de câmbio
trajetício, isto é, operando a circulação de dinheiro. Mais adiante
vamos encontra-los representando valores que podem, desde logo,
ser realizados, delineando, de forma nítida, a sua função essencial,
qual seja, a circulação do respectivo valor.
Diante do exposto, ocorre o surgimento do cambium trajecticium, por
meio do qual o mercador, ao deslocar-se de um ponto a outro, trocava o seu
dinheiro pelo do local onde chegava – o qual era usado pelos adquirentes que,
por sua vez, adquiriam produtos do local de onde era proveniente o mercador.
Nesta fase pré-capitalista, não é exagero assinalar que tal
encadeamento foi necessário para determinar, futuramente, a economia de
mercado. De fato mesmo, na Idade Média, apareceram títulos representativos
de valores pagáveis por vendas de produtos. Nos negócios já era comum a
utilização da lettera – um instrumento de crédito no qual “
Se descrevia o tipo de operação havida, e se lançava o montante a
que se comprometia o adquirente a pagar, a quem se remetia o título,
a qual deu origem à letra de câmbio. Ante as dificuldades e perigos
que oferecia o transporte de valores e materiais preciosos de um
ponto a outro dos territórios, e especialmente pelo mar, em épocas de
proliferação da pirataria, a solução encontrada foi o depósito do
dinheiro nas casas bancárias que iniciavam a proliferar na Itália,
Espanha, França e Inglaterra. Recebiam os depositantes documentos
que valiam pelo valor que traziam inserido (RIZZARDO, 2002, p. 7).
Oliveira (1999, p. 7) comenta a natureza e a função da lettera – que veio
a dar na letra de câmbio.
Nesse período, a letra de câmbio não era outra coisa que
um simples instrumento do contrato de câmbio (troca de
moedas). Sujeita-se, ainda, às regras do Império Romano
relativas ao contrato de compra e venda. Tal título, porém,
livra-se da condenação canônica e do direito comum
endereçados à usura. Entendia-se, até então, que a
cobrança de interesses (juros) era, por outro lado,
atentatório à fraternidade cristã e, por outro lado, como
sustentava São Tomás de Aquino, o juro é o preço do
tempo, mas o tempo só a Deus pertente, portanto, não
pode o homem impor-lhe o preço. Livrava-se a letra dessa
condenação porque a cobrança de interesses era, no
caso, justificada com a diversidade de praças e
consequentemente de moedas com as quais operava.
Deste exposto inicial podemos assinalar que a história da letra de
câmbio se confunde com a história dos títulos de crédito. Com o passar do
tempo, todavia, a evolução do título de crédito ocorreu de forma efetiva para as
características atuais passando a representar o valor a ser pago à vista ou à
prazo. A evolução permitiu a criação de categorias criadas em torno do título
como, por exemplo, endosso, aval, fiança, etc.
Conceitos e princípios de Título de Crédito
Nesta parte do estudo utilizaremos a visão de vários autores sobre o
significado do título de crédito. Vale dizer, todavia, que de todas as definições
parte de uma que, conforme Martins (2009) é a mais completa – e neste caso,
vale o conceito que Vivante (citado em Martins, 2009, p.5 e Rizzardo, 2009,
p.6)) que diz que “título de crédito é o documento necessário para o exercício
do direito, literal e autônomo, nele mencionado”.
O artigo 887 do Código Civil de 2002 apresentou a definição de título de
crédito com a mesma redação de Vivante, mas foi destacado um acréscimo:
“somente produz efeito quando preencha os requisitos da lei”.
Rizzardo (2009, p.6) também apresenta o seu entendimento de título de
crédito. Neste sentido diz:
O título de crédito é o documento criado por lei para representar um
determinado crédito, devendo conter certos requisitos que lhe dão
total idoneidade. Trata-se de uma obrigação que nasce de uma
declaração unilateral de vontade.
Nesta discussão conceitual, vale também a definição de Rosa Junior
(2007). Este autor diz que o título de crédito é um dos institutos mais
importantes do direito comercial por ser aquele que influiu mais tipicamente na
formação da economia moderna como o instrumento mais adequado da
mobilização da riqueza e da circulação do crédito.
Coelho (2015, p.273) assinala que os títulos de crédito são documentos
representativos de obrigações pecuniárias. Este mesmo autor conceitua título
de crédito da seguinte forma: “documento necessário para o exercício do
direito, literal e autônomo, nele mencionado”.
O destaque de Rosa Junior (2007, pp.1-2) são as suas interpretações
dos conceitos econômicos sobre a questão do crédito e faz isto relacionamento
com outros pensadores. Vejamos algumas:
- Charles Guide: crédito é a troca no tempo e no espaço.
- Stuart Mill: crédito é a permissão de usar capital alheio.
- crédito é o saque contra o futuro.
- Werner Sombart: crédito confere poder de compra a quem não dispõe
de recursos para realiza-lo.
- Crédito é a troca de prestação atual por prestação futura.
Rosa Junior (2007) comenta sobre as três compreensões do crédito na
economia atual. Vejamos o comentário um:
Quando um banco empresa empresta dinheiro a um empresário
comercial, está havendo uma troca da prestação atual pelo banco (a
entrega do dinheiro) por uma prestação futura a ser cumprida pelo
mutuário, que corresponde ao pagamento do empréstimo acrescido
de juros. Por outro lado, quando uma sociedade de crédito e
financiamento fornece recursos a alguém para a compra de
automóvel, na realidade está conferindo a essa pessoa um poder de
compra que ela não possui, por não dispor de recursos próprios para
adquirir o bem. Ademais, ao comprar o bem com os recursos que lhe
foram entregues pela instituição financeira a beneficiária do crédito
está utilizando, sob o ponto de vista econômico, capital alheio (ROSA
JUNIOR, 2007, p.2).
Prossegue o autor sobre a sua compreensão de crédito.
Crédito é a possibilidade de dispor imediatamente de bens presentes
para poder realizar, nos produtos naturais, as transformações que os
tornarão, no futuro, aptos a satisfazer as mais variadas necessidades.
Desse modo, o crédito é fundamental para criar os instrumentos de
produção (os bens instrumentais, segundo os economistas), cuja
importância cresce à medida que mais complexa se torna a obra de
conquista e transformação dos produtos naturais (ROSA JUNIOR,
2007, p. 2).
De fato, mesmo, na atualidade, o crédito é a maior das dinâmicas do
mundo capitalista para o incentivo tanto do consumo, quanto da importação,
exportação, gastos do governo e produção.
O crédito à produção tornou-se no mundo moderno tão relevante que
relegou a segundo plano, na consciência comum, o crédito de
consumo, que se dava particular importância nos séculos passados.
O mesmo ocorre com o empresário comercial porque se o
comerciante devesse prescindir do crédito e movimentar apenas os
próprios capitais, teria necessariamente de restringir as suas
aquisições e reduzir o número daqueles a quem forneceria os bens
adquiridos (ASCARELLI, 2007, p. 112).
Sobre os princípios do regime jurídico cambial, Coelho (2005) assinala
que são três os princípios que tratam dos títulos de crédito.
i)
ii)
iii)
Cartularidade
Literalidade
Autonomia
Martins (2009) destaca que as características do título de crédito como
instrumento para circulação de direitos:
i)
ii)
iii)
Literalidade
Autonomia
Abstração
O princípio da cartularidade diz respeito ao documento em si – à própria
posse do documento. Diz Coelho (2015, p. 273): “Para que o credor de um
título de crédito exerça os direitos por ele representados é indispensável que se
encontre na posse do documento (também conhecido como cártula)”. Sem
esse princípio, sem essa condição, mesmo que a pessoa seja efetivamente a
credora, não poderá exercer o seu direito de crédito valendo-se dos benefícios
do regime jurídico-cambial.
Na visão de Bertoldi (2013), a cartularidade é essencial e permite a
ampla negociabilidade do título. Assim, sem o documento (cártula) não pode
ser exercido o direito nele incorporado. Significa dizer que o possuidor do título
aos olhos do devedor e de terceiros, representa o real credor.
A vantagem do cumprimento deste princípio dá se de modo prático na
seguinte condição, ou seja, com ele tem-se a impossibilidade de se promover a
execução judicial do crédito representado instruindo-se a petição inicial com
cópia xerográfica do título de crédito. Deve ser o original – e isto vale, também,
para o caso de pedido de falência, no qual o ajuizamento deve vir
acompanhado do original do título de crédito, da própria cártula.
Sobre o segundo princípio, da literalidade, trata da condição do que é
expresso efetivamente nele. Ou seja, o que não se encontra expressamente
consignado no título de crédito não produz consequências na disciplina das
relações jurídico-cambiais. Mas o princípio da literalidade vai mais além
conforme Martins (2009, p. 9).
Significa que tudo o que está escrito no título tem valor e,
consequentemente, o que nele não está escrito não pode ser
alegado. Literalidade é, assim, o que está escrito no título limitando
os direitos nele incorporados.
Sobre este princípio da literalidade, Bertoldi (2013) diz que este princípio
tem razão de ser na medida em que propicia a devida segurança jurídica para
o adquirente do título. Esclarece o autor.
O título está destinado a circular tal como se encontra redigido, sendo
a aquisição do direito nele estampado fundamentada tão somente
nos termos do que nele vem redigido, de forma que seu adquirente,
de posse do título, tem amplas condições de identificar seu conteúdo,
extensão e modalidade dos direitos que representa. Assim, se um
aval for dado em documento apartado do título, este será considerado
inexistente como aval, visto que para ser considerado, deverá
constar no próprio título a assinatura do avalista (BERTOLDI, 2013,
p.385).
O terceiro princípio é o da autonomia e sobre ele Coelho (2015,
pp.274/275) diz.
Por este entende-se que as obrigações representadas por um mesmo
título de crédito são independentes entre si. Se uma dessas
obrigações for nula ou anulável, eivada de vício jurídico, tal fato não
comprometerá a validade e eficácia das demais obrigações
constantes do mesmo título de crédito. Se o comprador de um bem a
prazo emite nota promissória em favor do vendedor e este paga uma
sua dívida, perante terceiro, transferindo a este o crédito
representado pela nota promissória, em sendo restituído o bem, por
vício redibitório, ao vencedor, não se livrará o comprador de honrar o
título no seu vencimento junto ao terceiro portador. Deverá, ao
contrário, pagá-lo e, em seguida, demandar ressarcimento perante o
vendedor do negócio frustrado.
Martins (2009) assinala que o princípio da autonomia trata da autonomia
das obrigações assumidas – é o que disse Coelho acima. É por este princípio
que se é capaz de promover, com segurança, a circulação dos direitos
emergentes dos títulos.
A autonomia das obrigações assumidas é uma das
maiores garantias dos títulos de crédito dando ao portador
a segurança do cumprimento dessas obrigações por
qualquer uma das pessoas que tenham lançado suas
assinaturas nos mesmos.
Bertolde (2013) diz que a autonomia dos títulos de crédito verifica-se em
função de que cada obrigação a eles relacionada não guarda relação de
dependência com as demais. Significa dizer que aquele que adquire o título de
crédito passa a ser titular autônomo do direito creditício ali mencionado sem
que exista qualquer interligação com os adquirentes anteriores. A exemplo dos
autores citados acima, também este diz que é essa característica que torna o
título de crédito apto a circular entre inúmeras pessoas, mantendo rígido o
direito que dele emerge. Ou seja, conforme Martins (2009, p. 8).
quanto mais o título circule recebendo assinaturas, tanto mais
segurança terá o portador de que, no momento aprazado, poderá
reembolsar-se da importância mencionada no documento, facultandolhe a lei recebe-la não apenas do obrigado principal mas, na falta
desse, de qualquer dos que lançaram as suas assinaturas no título e,
assim, assumiram a obrigação de pagá-lo, se a isso forem justamente
chamados (MARTINS, 2009, p.10).
A exemplo de Coelho (2015), Bertolde (2013) também destaca que em
decorrência do princípio da autonomia surgem dois outros subprincípios:
1) Inoponibilidade das exceções ao terceiro de boa fé;
2) Abstração.
Sobre o princípio da inoponibilidade das exceções ao terceiro de boa fé,
Bertoldi (2013, p. 384) assinala que
Quando o devedor principal venha a ser instado a pagar o valor ao
qual se obrigou quando da emissão do título, não poderá alegar, para
se esquivar do pagamento, possíveis exceções relacionadas com a
relação causal que deu origem à divida consubstanciada no título, ou
seja, se o título se originou de um negócio de compra e venda, o
emitente do título –devedor, portanto – não poderá alegar ao terceiro
de boa fé, ao vir este lhe apresentar esse título para pagamento, que
o objeto adquirido apresentou-se em desconformidade com as
qualidades que dele se esperavam. Neste caso, o pagamento deverá
ser feito podendo o adquirente procurar o vendedor para obter
ressarcimento dos danos que foi obrigado a suportar.
Destaque a ser dito é que a inoponibilidade das exceções está prevista
na Lei Uniforme (Decreto 57.663/66) em seu artigo 17 que diz:
As pessoas acionadas em virtude de uma letra não podem opor ao
portador exceções fundadas sobre as relações pessoais delas com o
sacador ou com os portadores anteriores, a menos que o portador ao
adquirir uma letra tenha procedido conscientemente em detrimento do
devedor. O Código Civil em seu artigo 916 igualmente determina: “As
exceções, fundadas em relação do devedor com os portadores
precedentes, somente poderão ser por ele opostas ao portador, se
este, ao adquirir o título, tiver agido de má-fé” (BERTOLDI, 2013, p.
384).
Sobre o subprincípio ou o princípio da abstração derivado da autonomia
da obrigação cambial, refere-se ao fato de que, quando o título de crédito
passa a circular, encontrando-se nas mãos de alguém que não participou da
relação causal-base que lhe deu origem, ele desvincula por completo do
negócio que ensejou sua criação.
Em decorrência disso, o título de crédito não depende de nenhum
outro documento para que seu titular exerça o direito creditício dele
emergente, bastando sua apresentação. Essa característica acaba
por gerar a segurança necessária a respeito do título de crédito,
podendo este circular livremente, sem a necessária investigação das
causas de seu surgimento (BERTOLDI, 2013, p.385).
Títulos de crédito no Código Civil e na LUG (Lei Uniforme de Genebra)
O Código Civil de 2002 contém normas sobre títulos de crédito que se
aplicam na hipótese de lacuna na lei específica – pois é o que diz o artigo 903:
“Salvo disposição diversa em lei especial, regem-se os títulos de crédito pelo
disposto neste Código”.
Diz o artigo 887 do Código Civil de 2002 sobre disposições gerais sobre
títulos de crédito: “O título de crédito, documento necessário ao exercício do
direito literal e autônomo nele contido, somente produz efeito quando preencha
os requisitos da lei”.
Destaque, ainda, no artigo seguinte (888) que diz que a omissão de
qualquer requisito legal, que tire ao escrito a sua validade como título de
crédito, não implica a não validade do respectivo negócio jurídico que lhe deu
origem.
Vale dizer que não tem aplicação as disposições contidas no Código
Civil de 2002 quando o respectivo título de crédito é disciplinado por lei
específica própria. Por exemplo, a nota promissória e a letra de câmbio não s
submetem às disposições do Código, mas da Lei Uniforme de Genebra que as
disciplina por completo. Da mesma forma, também o cheque não se submete
às disposições do Código de 2002 pois é disciplinado inteiramente por lei
específica.
Coelho (2015) assinala que também a duplicata não se submete às
prescrições do Código Civil de 2002 porque a lei correspondente a submete ao
regime aplicável à letra de câmbio – que, como visto, é exaustivo conforme diz
a lei n.5.474/69, no seu artigo 25: “Aplicam-se à duplicata e à triplicata, no que
couber, os dispositivos da legislação sobre emissão, circulação e pagamento
das Letras de Câmbio”.
De todo o exposto, o Código Civil de 2002 tem aplicação efetiva e
imediata em apenas três tipos de títulos de crédito típicos – que de alguma
forma não foram disciplinados completamente pelas respectivas leis de
regência:
a) O Warrent Agropecuário;
b) O Conhecimento de Depósito Agropecuário (Lei n.11076/04);
c) A Letra de Arrendamento Mercantil (Lei 11.882/08).
Sobre a Lei Uniforme de Genegra (LUG), trata de uma legislação
internacional – da qual o Brasil é parte interessada – que disciplina tanto a letra
de câmbio quanto a nota promissória. É a legislação que se encontra em vigor
no Brasil – ainda que, conforme Coelho (2015), seja uma colcha de retalho da
LUG, pois o governo brasileiro fez muitas reservas da introdução da respectiva
lei no ordenamento jurídico nacional.
No anexo, destaca-se a LUG e o respectivo decreto do governo
brasileiro com as reservas enumeradas. Trata-se, na verdade, de perceber que
a LUG não foi totalmente aceita pelo Estado Nacional –e é isto que Coelho
chama do colcha de retalho.
Função e importância dos títulos de crédito
Os títulos de crédito são reflexos da economia que estão inseridos – e
de fato, a dinâmica econômica que se apresenta neste século XXI é bem
diferente dos primórdios dos respectivos títulos. Todavia, não seria exagero
dizer que a função permanece a mesmo. Conforme Rosa Junior (2007), nesta
questão da função, destaca apenas uma – a circularidade. Diz o autor.
A principal função do título de crédito consiste na sua circularidade,
permitindo a realização do seu valor mesmo antes do seu vencimento
através de operações de desconto, e, por isso, o título de crédito
nasce para circular e não para ficar imóvel entre as partes primitivas.
Os títulos de crédito desempenham papel relevante na economia
moderna em razão de sua negociabilidade, atuando, por exemplo, no
sistema financeiro como intermediários de crédito entre as instituições
financeiras e as pessoas, naturais e jurídicas, que dele necessitam
(ROSA JUNIOR, 2007, p.47).
Uma outra função dos títulos de crédito e que, atualmente, ganhou
grandes contornos de relevância tendo em vista a importância do mercado de
capitais, é a função de captação de poupança no respectivo mercado de
capitais. Com isto, viabiliza-se o aporte de recursos financeiros para as
empresas e também para os consumidores.
Rosa Junior (2007, p.47) exemplifica o processo para o entendimento
das operações de crédito feitas por instituições financeiras através da utilização
de títulos de crédito. Fala, primeiramente, das operações de desconto.
Em primeiro lugar, a operação de desconto, pela qual o portador do
título de crédito, mediante endosso, transfere a sua propriedade para
terceiro, geralmente instituição financeira e, em contrapartida, dele
recebe, mesmo antes do vencimento, a soma constante a soma
constante do título. A financeira, como portadora legítima do título, só
pode apresenta-lo, para pagamento, ao emitente (devedor originário),
no seu vencimento, ocorrendo, portanto, um intervalo de tempo entre
os momentos em que a financeira antecipa o valor do título ao
endossante (operação de desconto) e aquele em que recebe do
devedor originário a soma dele constante (vencimento). Por isso, a
financeira, ao descontar o título, não entrega o seu valor integral ao
endossante, pois dele deduz a soma correspondente ao juro e
demais encargos financeiros, calculados segundo o período que
decorrer entre as datas da antecipação feita ao endossante e aquela
em que ocorrer o efetivo recebimento da soma cambiária a ser paga
pelo emitente. O beneficiário do título, endossando-o para terceiro,
passa a integrar a relação cambiária como devedor indireto para
melhor proteção do terceiro adquirente, facilitando, assim, a
circulação do título de crédito (ROSA JUNIOR, 2007, p.48).
Um outro momento – e não menos importante – das operações de
crédito feitas por instituições financeiras ocorre através da operação de
desconto. Vejamos o que diz Rosa Junior (2007, p.48).
Em segundo lugar, deve ser destacado a operação de garantia, pela
qual o beneficiário transfere o título a uma instituição financeira
mediante endosso-cauçao (LUG, artgo 19), em garantia do
cumprimento das obrigações por ele assumidas junto à financeira,
decorrente de um outro negócio jurídico como, por exemplo,
empréstimo. O endosso-caução pode ter por objeto a letra de câmbio,
a nota promissória e a duplicata, mas não se aplica ao cheque porque
consubstancia ordem de pagamento à vista, insuscetível de ser dado
em garantia. O endosso-caução é espécie de endosso-impróprio e,
por iss, o beneficiário do título de crédito não transfere os direitos dele
decorrentes mas apenas o seu exercício, e, assim, não integra a
relação cambiária como devedor.
A partir, então, da função, pode-se perceber a real importância do título
de crédito que, neste sentido, nasce para circular e essa função da
negocialidade revela a sua importância nas áreas econômica, civil, comercial,
particular e publica porque embora disciplinado pelo direito comercial, constituise, na realidade, em instituto geral de direito, em instrumento de técnica
jurídica, a que recorrem, para fins de financiamento, o comerciante e o
lavrador, o indústria e o construtor de prédios, o particular, o Estado, etc.
Ascarelli (1947, p.34), em sua clássica publicação sobre títulos de
crédito, consegue perceber importâncias mais específicas para o título de
crédito, como é o caso das sociedades anônimas.
Os títulos de crédito influem sobre o próprio caráter
econômico da propriedade, pois com eles a propriedade
começa a ter por objeto não só bens materiais,
normalmente gozados por m sujeito e por ele mesmo
administrados com o auxílio de prepostos, mas pedaços
de papel que, por seu turno, corporificam direitos e não
bens materiais. Tal fato ocorre, por exemplo, nas
sociedades anônimas, instituídas para permitir a
transformação de economias individuais em capital,
visando a realização de empreendimentos insuscetíveis
de serem feitos individualmente, o que exige a
responsabilidade limitada do acionista e a divisão do
capital em ações facilmente circuláveis
Classificação dos Títulos de Crédito
Coelho (2015) trata da classificação dos títulos de crédito a partir de
quatro critérios, que são:
- quanto ao modelo;
- quanto à estrutura;
- quanto à hipótese de emissão;
- quanto à circulação.
A classificação dos títulos de crédito quanto ao modelo trata da distinção
que se faz do título que pode ser modelo livre ou modelo vinculado. Coelho
(2015, p. 276) trata assinala assim:
No primeiro grupo (modelo livre), de que são exemplos a letra de
câmbio e a nota promissória, estão os títulos de crédito cuja forma
não precisa observar um padrão normalmente estabelecido. Os seus
critérios devem ser cumpridos par que se constituam títulos de
crédito, mas a lei não determina ma forma específica para eles. Já o
grupo dos títulos de modelo vinculado, em que se encontram o
cheque e a duplicata mercantil, reúne aqueles em relação aos quais o
direito definiu um padrão para o preenchimento dos requisitos
específicos de cada um. Um cheque somente será um cheque se
lançado no formulário próprio fornecido, por talão, pelo próprio banco
sacado. Mesmo que se lancem, em um instrumento diverso, todos os
requisitos que a lei estabelece para o cheque, este instrumento não
será título de crédito, não produzirá os efeitos jurídicos do cheque.
Quanto à classificação em relação à estrutura, os títulos de crédito
podem ser entendidos como ordem de pagamento ou promessa de pagamento.
No primeiro caso, ordem de pagamento, o saque cambial dá nascimento à três
situações jurídicas diferentes: i) a de quem dá a ordem, ii) a do destinatário da
ordem e iii) do beneficiário da ordem de pagamento.
No caso da promessa de pagamento, apenas duas situações jurídicas
diferentes ocorrem na dinâmica do saque cambial: i) a de quem promete pagar
e, ii) e a do beneficiário da promessa do respectivo pagamento. A nota
promissória é uma promessa de pagamento; do outro lado, a duplicata, o
cheque e a letra de câmbio são ordens de pagamento.
Quanto às hipóteses de emissão, os títulos de créditos podem ser
causais ou não-causais (também chamados de abstratos). São abstratos ou
não-causais os títulos que se desvinculam completamente da causa que lhes
deu origem, ou seja, a relação fundamental não tem relação relevância diante
do terceiro de boa fé, mas tão somente entre credor e devedor originais. São
exemplos de títulos abstratos a nota promissória, o cheque e a letra de câmbio
(BERTOLDI, 2013). Coelho (2015, p. 277) diz que “um título abstrato ou nãocausal pode ser criado por qualquer causa para representar obrigações de
qualquer natureza no momento do saque”.
Sobre os títulos de créditos causais, Bertoldi (2013, p. 387) fala o
seguinte:
Os títulos causais também chamados de impróprios ou imperfeitos,
ao contrário, vinculam-se necessariamente às causas que lhes deram
origem, ao negócio jurídico fundamental, porque somente podem ser
emitidos quando da realização de um determinado negócio jurídico
nos termos determinados em lei. A duplicada é um exemplo típico
dessa espécie de título de crédito – título causal – na medida em que
somente poderá ser emitida diante de uma compra e venda de
mercadorias ou da prestação de serviços que dê origem.
Coelho (2015) diz que um título causal somente pode ser emitido se
ocorrer o fato que a lei elegeu como causa possível para sua emissão. A
duplicata mercantil, exemplo clássico de título causal, somente pode ser criada
para representar obrigação decorrente de compra e venda mercantil.
Bertoldi (2015, p.387) especifica mais um ponto de classificação que vai
além da classificação clássica de Coelho (2015). Trata-se da condição da
natureza do título de crédito que pode ser próprio ou impróprio. São próprios os
títulos que corporificam “uma verdadeira operação de crédito, entendida como
tal aquela em que uma pessoa empresta a outra uma determinada quantia para
pagamento no futuro”. Inserem-se nesta categoria a nota promissória e a letra
de câmbio.
Do outro lado, sobre títulos impróprios, diz Bertoldi (2013, p.387).
Impróprios são os títulos que não representam uma operação de
crédito, ou seja, o seu pagamento não se difere no tempo. É o caso
do cheque que é uma ordem de pagamento à vista – mesmo que nele
conste uma data de vencimento posterior, poderá ser apresentado
para pagamento logo após a sua emissão.
Finalmente, e voltando ao alinhamento com Coelho (2015, p.278), a
classificação dos título de crédito quanto à circulação podem ser ao portador ou
nominativo. O autor diz que os títulos ao portador são aqueles que, por não
identificarem o seu credor, são transmissíveis por mera tradição. Do outro
modo, os títulos de crédito nominativos são os que identificam o seu credor e,
portanto, a sua transferência pressupõe, além da tradição, a prática de um
outro negócio jurídico.
Coelho (2013) destaca, ainda, que os títulos de crédito nominativos
podem ser à ordem ou não-à-ordem. Os nominativos com a cláusula à ordem
circulam mediante tradição acompanhada de endosso. Do outro lado, os
nominativos com a cláusula não-à-ordem circulam com a tradição
acompanhada de cessão civil de crédito. Coelho (2015, p. 279) assinala que no
Código Civil o conceito de títulos nominativos é diverso. Seriam desta categoria
os “títulos em que o nome do favorecido consta de registros do emitente (artigo
192) e cuja circulação depende de alterações neste registro. Não há, no direito
brasileiro, nenhum título de crédito que atenda a essa condição”.
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A metodologia desenvolvida nesta pesquisa foi do tipo descritivobibliográfica. A abordagem adotada na pesquisa foi do tipo qualitativa. A
pesquisa qualitativa aponta a existência de, pelo menos, duas variáveis para
ser validada como tal. No caso desta as variáveis independentes são os títulos
de créditos e as variáveis dependentes são as implicações no ordenamento
jurídico brasileiro.
A coleta de dados foi feita mediante uma intensa revisão bibliográfica
dos principais autores que tratam sobre a problemática do Direito Empresarial,
especificamente dos títulos de crédito.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Letra de Câmbio –
Conceitos e elementos da letra de câmbio
A letra de câmbio foi originariamente disciplinado no Código Comercial
brasileiro no Capítulo I do Título XVI, nos artigos 354 a 427, que foram, no
entanto, revogados pelo artigo 57 do Decreto nº. 2.044 de 1908.
Posteriormente, a letra de câmbio passou a ser regrada basicamente pelo
Decreto nº57.663/66, que promulgou as Convenções de Genebra de 1931,
continuando, no entanto, em vigor algumas normas do Decreto nº2.044/1908,
não só em razão do silêncio da LUG sobre determinadas matérias como,
também, por força das reservas adotadas pelo governo brasileiro –conforme já
falado anteriormente.
Rosa Junior (2007) destaque a letra de câmbio é título de crédito
abstrato correspondendo a um documento formal, decorrente de relação de
crédito ou relações de crédito entre duas pessoas ou mais, pela qual a
designada sacador dá ordem de pagamento pura e simples, à vista ou à prazo,
a outrem, denominada sacado, a ser favor ou a favor de terceira pessoa
chamada de beneficiária ou tomador, no valor e nas condições dela constantes.
A letra de câmbio é um título de crédito. Entende-se por ela uma ordem
dada, por escrito, a uma pessoa, para que pague a um beneficiário indicado, ou
à ordem deste, uma determinada importância em dinheiro. Requer, assim,
conforme Martins (2009, p.27), três elementos pessoais que no título tem
funções diversas:
i)
ii)
iii)
Sacador (sujeito que dá a ordem);
Sacado (o sujeito a quem a ordem é dada;
Tomador ou beneficiário (aquele a favor de quem é emitida a
ordem).
Coelho (2015) assinala que em virtude do princípio da autonomia das
obrigações cambiárias e sendo diversas as funções exercidas pelos sujeitos da
Letra, vale dizer que é possível uma mesma pessoa (jurídica ou física) poder
figurar no título ora como sacador, ora como sacado e mesmo beneficiário.
A letra de câmbio é uma ordem de pagamento. É o que diz Coelho
(2015, p. 284).
Isto significa que do seu saque, de sua criação, decorre o surgimento
de três situações jurídicas distintas. São três diferentes complexos de
direitos e obrigações que nascem juntamente com o título. Em
primeiro lugar, tem-se a situação jurídica daquele que dá o ordem de
pagamento que determina que certa quantia seja paga por uma
pessoa a outra. Quem se encontra nesta situação é chamado de
sacador. Em segundo lugar, há a situação jurídica daquele para quem
a ordem é dirigida, o destinatário da ordem, que deverá, dentro de
condições estabelecidas, realizar o pagamento ordenado. A pessoa
nesta situação é denominado sacado. Finalmente, existe a situação
jurídica do beneficiário da ordem de pagamento, aquele em favor de
quem se fez dita ordem, e que por isso é o credor da quantia
mencionada no título. Quem se encontra nesta terceira situação
jurídica é conhecido como tomador. São três situações jurídicas
distintas que surgem com a prática de um ato cambial chamado
saque.
Rizzardo (2002, p. 131) faz referência à Wiltaker (195) sobre uma
conceição diferente da letra de câmbio quando este diz que é um retângulo de
papel, escrito, na frente (no anverso) no sentido do seu comprimento, atrás (no
verso) de sua largura contendo os elementos ou requisitos discriminados no
artigo 1 da LUG – Lei Uniforme de Genebra (anexo 1 conforme anexo).
1) A palavra letra, inserta no próprio texto do título e expressa na língua
empregada para a redação desse título;
2) O mandato puro e simples de pagar uma quantia determinada;
3) O nome daquele que deve pagar (sacado);
4) A época do pagamento;
5) A indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento;
6) O nome da pessoa a quem ou à ordem de quem deve ser paga;
7) A indicação da data em que, e do lugar onde a letra é passada;
8) A assinatura de quem paga a letra (sacador).
O Saque
O saque é um dos conceitos principais quando se fala da letra de
câmbio. É o ato solene de criação, de emissão da letra de câmbio. Após este
ato cambial, o tomador estará autorizado a procurar o sacado (quem deve)
para, dadas certas condições, poder receber dele a quantia referida no título.
Rosa Junior (2007) diz que o saque é o ato cambiário pelo qual o
sacador cria a letra de câmbio e dá ordem de pagamento ao sacado e
corresponde a uma declaração cambiária necessária e originária. Neste sentido
diz o autor (p.140): “Trata-se de declaração cambiária originária porque,
observando-se a ordem natural das declarações cambiárias, corresponde à
primeira manifestação de vontade traduzida na letra de câmbio mediante a
posição da assinatura do sacador, ensejando seu nascimento, e a ela seguemse o aval, o aceite, e o endosso, se existirem”.
Sobre o saque, Rizzardo (2009, p..134) assinala.
Considera-se o ato de criação do título, ou a declaração
feita por uma pessoa mediante a qual é criada a letra de
câmbio. Elabora-se o título, e lança-se a assinatura
daquele que se diz credor. Eis a definição de Paulo Maria
de Lacerda: “emitir uma letra de câmbio é redigir uma
ordem cambiária de pagamento. Esse ato se diz saque”.
Coelho (2015) assinala que o saque produz ainda um outro efeito – o de
vincular o sacador (emissor do titulo) ao pagamento da letra de câmbio. O
sacado é que se encontra na posição de destinatário da ordem de pagamento;
ele é que, em princípio, quando realizado o aceite, deverá pagar o título.
No entanto, conforme explicitado no artigo 9 da LUG, se o sacado não
realizar o pagamento, ou se não realizarem as condições da obrigação do
sacado, o tomador poderá cobrar a letra de câmbio do próprio sacador, que, ao
praticar o saque, tornou-se o codevedor do título.
Então, conforme já visto anteriormente, embora o saque na letra de
câmbio crie três situações jurídicas distintas, a lei faculta que uma mesma
pessoa ocupe mais de uma dessas situações. Assim, conforme estabelece o
artigo 3 da LUG, a letra poderá ser sacada em benefício do próprio sacador – a
mesma pessoa ocupando, ao mesmo tempo, as situações jurídicas de sacador
e tomador – ou ainda, sobre o próprio sacador – a mesma pessoa ocupando,
ao mesmo tempo, também, as situações jurídicas de sacador e sacado.
O Aceite
Constitui o aceite a declaração pela qual o sacado, ou a pessoa a quem
é endereçado o título, concorda, por meio de sua assinatura, com a ordem de
pagamento que lhe é dirigida. Conforme Rizzardo (2009, p.134), o “aceite é
assim uma declaração do sacado (só ele pode ser aceitante), lançada no
próprio título, geralmente no anverso da letra, consistente apenas na sua
assinatura com as seguinte expressões – aceito, aceitamos, pagarei, honrarei,
vista para pagar, vista de acordo, ou ainda um mero sim”. Coelho (2015) diz
que a assinatura pode ser feita também no verso, desde que identificado o ato
praticado pela expressão “aceito” ou outra equivalência.
Pelo que se verifica, então, o sacado, em nenhuma hipótese, está
obrigado a cumprir o ordenado por esta espécie de título de crédito. É
necessário o aceite do sacado. Nada o obriga a aceitar a letra de câmbio, nem
sequer a prévia existência de obrigação perante o sacador ou o tomador. O
sacado somente assumirá obrigação cambial, pelo aceite, se o desejar. É o
aceite ato de sua livre vontade.
Então, conforme Coelho (2015), o aceitante é o devedor principal da
letra de câmbio. Isto significa que, na prática, no vencimento, o credor do título
deverá procurar, inicialmente, o aceitante para cobrar o seu pagamento.
Somente na hipótese de recusa do respectivo pagamento pelo devedor
principal é que o credor poderá cobrar o título – em determinadas condições,
dos coobrigados. Cada título de crédito, em espécie, tem o seu devedor
principal, em relação ao qual se aplica esta regra.
Sobre a recusa do aceite – já que o devedor não é obrigado a fazê-lo – o
que a lei reserva para resguardar os interesses do tomador do título? Neste
caso, conforme Rizzardo (2009), trata-se do vencimento antecipado, previsto,
inclusive, no artigo 43 da LUG. Se o sacado não aceitar a ordem de pagamento
que lhe foi dirigida, o tomador – ou o credor – poderá cobrar o título de imediato
do sacador, posto que o vencimento originariamente fixado para a cambial é
antecipado com a recusa do aceite.
O Endosso
Conforme já visto anteriormente, o título de crédito é concebido para
circular – e isto naturalmente vale para a letra de câmbio. O título de crédito
circula quando passa das mãos do credor original para uma terceira pessoa
que, ao tornar-se detentora do título, passa a incorporar todos os direitos por
ele representados. Nada impede que essa terceira pessoa venha a transferir o
título a outrem e assim sucessivamente.
A circulação do título se dá por meio do instituto cambiário chamado
endosso. Conforme Bertoldi (2013), trata-se, o endosso, da assinatura que
apõe o proprietário do título (endossante), em seus verso ou anverso,
transferindo-o a terceiro (endossatário). Com o endosso, conforme o artigo 14
da LUG, transmitem-se todos os direitos emergentes da letra de câmbio.
Rosa Junior (2007) diz que o endosso é um instituto tipicamente cambial
por meio do qual ocorre a transferência do título do endossante (aquele que
está a transferir a propriedade do título) ao endossatário (pessoa para quem o
título é transferido e que a partir de então, passa a ser o seu proprietário).
Bertoldi (2013) diz que o endosso é ato abstrato, porque se desvincula
da causa extracartular que lhe deu origem; é formal tendo em vista que
somente tem validade quando dado no próprio título, seja em seu verso ou
anverso, sendo que se o endosso for em branco, necessariamente deverá ser
lançado no anverso do título.
Em regra, o endosso produz dois efeitos:
a) Vincula o endossante ao pagamento do título na qualidade de
coobrigado – conforme diz a LUG em seu artigo 15.
b) Transfere a titularidade do crédito representado na letra do
endossante para o endossatário.
O endosso pode ser de duas espécies: em branco e em preto. O
endosso em branco ocorre quando não identifica o endossatário. Neste caso,
conforme Coelho (2013), o endosso em branco transforma a letra
necessariamente sacada nominativa em título ao portador. Ou seja, o
endossatário de um título por endosso em branco poderá transferir o crédito
nele representado por mera tradição, hipótese em que não ficará coobrigado.
Geralmente tem a expressão: “Pague-se”. O endosse em preto é o mais usual.
Identifica o endossatário. Neste caso, resulta o endosso da simples assinatura
do credor do título lançado no seu verso, podendo ser feita sob a expressão
“Pague a Paulo Silva”.
O Aval
Martins (2009) diz que aval é uma obrigação cambiária assumida por
alguém no intuito de garantir o pagamento da letra de câmbio nas mesma
condições de um outro obrigado. É uma garantia especial que reforça o
pagamento da letra, podendo ser prestada por um estranho ou mesmo por
quem já se haja anteriormente obrigado no título.
Deste exposto, o pagamento de uma letra de câmbio pode ser total ou
parcial – garantido por aval. Coelho (2015) diz que pelo aval, uma pessoa
chamada avalista garante o pagamento do título em favor do devedor principal
ou de um coobrigado. O devedor em favor de quem foi garantido o pagamento
do título é chamado de avalizado.
O aval pode ser em branco ou em preto. O aval em branco é quando
não identifica o avalizado. No aval em preto, se identifica. O aval em branco,
conforme o artigo 31 da LUG, é dado em favor do sacador. É ele o avalizado
pelo aval em branco.
Nota promissória
Conceito e regime jurídico
A nota promissória é um título de crédito que corresponde a uma
promessa de pagamento que uma pessoa faz em favor de outra. Com o saque
da nota promissória surgem, então, duas situações distintas:
i)
A situação daquele que promete pagar quantia determinada e;
ii)
E a situação daquele que se beneficia da respectiva promessa de
pagamento.
Do exposto acima, Coelho (2015, p.311) assinala que a pessoa que se
encontra na situação primeira é chamada de sacador (ou emitente ou
subscritor). Do outro lado, a pessoa que se encontra na segunda posição é
chamada de sacado ou beneficiário.
Rizzardo (2009, p. 175) conceitua “a nota promissória como um
compromisso de pagar a outrem uma certa importância em dinheiro. Ou
simplesmente, é uma promessa escrita de pagar que uma pessoa faz em favor
da outra.
Torres (1969), um dos autores clássicos da discussão de títulos de
crédito diz que a nota promissória é uma promessa de pagamento (conforme
Decreto Legislativo n. 2.044 de 31 de dezembro de 1908, artigo 54). Ou seja, é
um compromisso solene, escrito, pelo qual alguém se obriga a pagar a outre
certa soma em dinheiro.
Martins (2009, p.259) assinala-se que entende-se por nota promissória a
promessa de pagamento de certa soma em dinheiro, feita, por escrito, por uma
pessoa em favor de outra ou à sua ordem. Prossegue o autor:
Aquele que promete pagar, emitindo o escrito, tem o nome de
sacador, emitente, ou segundo a Lei Uniforme, o subscritor; a pessoa
em favor de quem a promessa é feita denomina-se beneficiário ou
tomador. Na nota, como se vê, figuram, inicialmente, apenas dois
elementos inicialmente, o emitente e o tomador, ao contrário do que
acontece com a letra de câmbio para cuja emissão são
indispensáveis três pessoas, o sacador que dá a ordem, o tomador,
beneficiário da mesma, e o sacado, pessoa designada para cumpri-la.
Deve-se essa divergência ao fato de, na nota promissória haver uma
promessa de pagamento, já se sabendo, assim, que o emitente será
o responsável principal por esse pagamento, enquanto que na letra
de câmbio, sendo uma ordem de pagamento, não se tem a certeza,
na emissão, se o sacado cumprirá ou não essa determinação do
sacador.
No que tange ao regime jurídico e observado a Lei Uniforme de Genebra
(LUG) em seus artigos 77 e 78, a nota promissória está sujeita às mesmas
normas aplicáveis à letra de câmbio. Assim, tudo o que diz respeito à parte
prescrita acerca do aval, endosso, vencimento, pagamento, protesto, execução
e demais temas relativamente às letras de câmbio, tudo também se aplica à
nota promissória.
Coelho (2015, pp.312/313) destaca, por outro lado, as seguintes
especificações deste título de crédito.
i)
ii)
iii)
iv)
v)
A nota promissória é uma promessa de pagamento e, por isso, não
se aplicam, a ela, as normas relativas à letra de câmbio
incompatíveis com esta natureza da promissória – ou seja, não se
aplicam questões de aceite, vencimento antecipado por recusa do
aceite, cláusula não aceitável, etc;
O emissor da nota promissória é o seu devedor principal e, por esta
razão, a LUG, em seu artigo 78, prevê que a sua responsabilidade é
idêntica à do aceitante da letra de câmbio. Deste exposto, conforme
Coelho, pode-se concluir que o protesto é facultativo para o exercício
do direito de crédito contra o emitente; também se pode concluir que
o exercício desse direito prescreve em 3 anos.
O aval em branco da nota promissória favorece o seu subscritor
(artigo 77 da LUG).
As notas promissórias, embora não admitam aceite, poder ser
emitidas com vencimento a certo termo da vista. Nesta hipótese, o
credor deverá apresentar o título ao visto do emitente no prazo de 1
ano do saque (art. 23 da LUG) sendo a data desse visto, conforme
Coelho (2015) o termo a quo do lapso temporal de vencimento. A
nota promissória desta espécie pode ser protestada por falta de data
(artigo 78, LUG, segunda alínea).
Depois da prescrição da pretensão à execução da nota promissória o
credor pode promover ação monitória em face do emitente, no prazo
de 5 anos, contados do vencimento do título (STJ, Súmula 504).
Requisitos essenciais e regime jurídico
A nota promissória deve atender aos requisitos definidos pelos artigos
75 e 76 da LUG. São esses:
a) A expressão nota promissória;
b) A promessa pura e simples de pagar;
c) Nome da pessoa a quem ou a ordem de quem se deve pagar;
d) Indicação da data em que é passada;
e) Assinatura do emitente (sacador).
A nota promissória está sujeita às mesmas normas aplicáveis à letra de
câmbio – com algumas exceções estabelecidas pela LUG em seus artigos 77 e
78. Assim, tudo o que se escreveu acerca do endosso e aval relativos à letra
de câmbio, também se aplicam ao regime jurídico da nota promissória
(MARTINS, 2009).
Vejamos, todavia, conforme Coelho (2015, pp.312 e 313), as
especificidades deste título de crédito:
a) A nota promissória é uma promessa de pagamento e, por isso, não
se aplicam, a ela, as normas relativas à letra de câmbio
incompatíveis com esta natureza da promissória. Assim, não há que
se falar de aceite, vencimento antecipado por recusa do aceite,
cláusula não aplicável, etc.
b) O subscritor da nota promissória é o seu devedor principal.
c) O aval em branco da nota promissória favorece o seu subscritor.
d) As notas promissórias, embora não admitam aceite, podem ser
emitidas com vencimento a certo termo de vista. Nesta hipótese, o
credor deverá apresentar o título ao visto do emitente no prazo de um
ano do saque – artigo 23 da LUG, sendo a data desse visto a termo a
quo do lapso temporal de vencimento. A nota promissória desta
espécie pode ser protestada por falta de data (artigo 78, segunda
alínea, da LUG).
e) Depois da prescrição da pretensão à execução da nota promissória,
o credor pode promover ação monitória em face do emitente, no
prazo de 5 ano, contados do vencimento do título (STJ, Súmula 504).
Ainda que tenha suas especificidades, a nota promissória estará sujeita
ao mesmo regime jurídico da letra de câmbio – isto quanto à constituição e
exigibilidade do crédito cambiário.
CONCLUSÃO
O desafio de um trabalho científico é conseguir responder às inquietações
sinalizadas no problema de pesquisa. No nosso caso, aqui, a pergunta de
pesquisa foi: como se configura a Letra de Câmbio e a Nota Promissória no
ordenamento jurídico brasileiro? Foi, portanto, em busca da resposta que
caminhou todo o trabalho. Do problema veio o objetivo geral da pesquisa:
Fazer uma análise de relevância jurídica entre a Letra de Câmbio e a Nota
Promissória enquanto títulos de créditos dentro do ordenamento jurídico
brasileiro.
Como se pode notar no trabalho exposto, a pergunta foi respondida – e,
consequentemente, o objetivo geral foi alcançado. Depois de uma intensa
revisão bibliográfica sobre títulos de crédito, avançou-se para as especifidades
da empreitada – a relevância jurídica e mercadológica da letra de câmbio e
nota promissória no ordenamento jurídico brasileiro.
Focando na diferença, as especificidades básicas da nota promissória
em relação à letra de câmbio é que esta última se define como ordem de
pagamento figurando três pessoas: sacador, sacado e tomador ou beneficiário.
Neste sentido, não seria exagero dizer que a nota promissória é mais prática e
vantajosa do que a letra de câmbio pelo fato de, ao ser emitida, já ficar
formalmente pronta, saindo com o aceite que corresponde à assinatura do
sacador. Não necessita de um momento seguinte como acontece com a letra
de câmbio que deve ser aceita e se tornar título de crédito. Uma vez aceita, no
entanto, equipara-se à nota promissória.
No geral, o trabalho foi além da verificação das diferenças de um ou
outro título de crédito. O que valeu, vale dizer, foi a experiência e o
conhecimento por ter trilhado um caminho, até então, desconhecido – do lado
complexo das perspectiva jurídicas de cada um. Creio que a missão foi
cumprida – e segue o conhecimento.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Amador P. Teoria e prática dos títulos de crédito. 3 edição.
São Paulo: Saraiva, 1978.
ASCARELLI, Túlio. Teoria geral do título de crédito. São Paulo: Saraiva,
1947.
BERTOLDI, Marcelo e RIBEIRO, Márcia Carla. Curso avançado de
Direito Comercial. 7 edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2013.
CAMPINHO, Sérgio. O direito de empresa à luz do código civil. 13 edição.
Rio de Janeiro: Renovar, 2014.
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 27 edição. São
Paulo: Saraiva, 2015.
_____. Curso de Direito Comercial. Volume I. 17 edição. São Paulo:
Saraiva, 2013.
GUSMÃO, Mônica. Lições de Direito Empresarial. 11 edição. Rio de
Janeiro: Forense, 2012.
MARTINS, Fran. Títulos de crédito. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
OLIVEIRA, Jorge A. P. Títulos de crédito. 3 edição. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 1999.
RAMOS, André L. Santana Cruz. Direito empresarial esquematizado. 2
edição. Rio de Janeiro: Forense, 2012.
RIZARDO, Arnaldo. 2 edição. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
ROSA JUNIOR, Luiz E. Franco da. Títulos de crédito. 5. Edição. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de crédito financeiro e tributário. 19
edição. Rio de Janeiro: Renovar, 2013.
MAGARINOS, Torres. Nota promissória. 7 edição. Rio de Janeiro:
Forense, 1969.

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