t - Miembros ADEPAC

Transcrição

t - Miembros ADEPAC
Ciência da alma é um conjunto de reflexões do junguiano
Edward E Edinger, cuja apresentação hábil e clara dos
conceitos junguianos ajudou muitos a compreenderem
o essencial da psicologia profunda, seja em seus aspec­
tos coletivos, seja em sua aplicação pessoal.
Nas reflexões da presente obra, ele demonstra a impor­
tância de o ser humano cultivar a própria alma, ou, por
suas próprias palavras, "manter uma ligação viva com o
inconsciente coletivo". Tal ligação pode se dar mediante
uma crença, uma religião ou uma mitologia viva. No en­
tanto, a partir da Idade Moderna, a linguagem religiosa
então dominante não mais respondeu à ne­
e mítica
cessidade de muitos. A psicologia profunda veio, então,
ser instrumento de contato com o inconsciente coletivo
para o mundo que fala a linguagem da ciência. Por isso,
a psicologia junguiana tem papel importante a ser de­
senvolvido em nosso tempo: ajudar as pessoas a cura­
rem as feridas de sua alma.
A leitura deste livro é útil tanto àqueles que têm pouco
conhecimento da psicologia analítica como a especialis­
tas, pois o autor trata tanto de conceitos fundamentais,
como Si-mesmo e sombra, bem corno da relação entre
terapeuta e paciente.
F. EDINGER ficou conhecido por seus muitos escri·
tos e palestras sobre a aplicação da psicologia junguiar
dentre eles comentários psicológicos a respeito da Bíblia e
inestimáveis guias para a compreensão das principais obras
de Jung.
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Edinger, Edward F. Ciência da alma: uma perspectiva junguiana I Edward F. Edinger; Itradução Gustavo Gerheim]. - São Paulo: Paulus, 2004. - (Amor e psique) ._:_
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1. Jung. Carl Gustav, 1875-1961 2. Inconsciente 3. Psicologia junguiana
4. Psicopatologia I. Titulo. 11. Série.
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1. Psicologia: Perspectiva (unguiana 150.1954
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Titulo original: Science 01 lhe soul Bibliogralia. ISBN 85-349-2 62-8 04·1028
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COleção AMOR E PSIQUE coordenada por Or. Léon Bonaventure, Pe. Ivo S/orniolo, Ora. Maria Elci Spaccaquerche Tílulo original
Science of /he Soul: A Jungian Perspective
© Innar City Books, Canadá, 2002.
ISBN 1-894574-03-6
Tradução
Gustavo Gerheim
Editoração PAULUS Impressão e acabamento PAULUS © PAULUS - 2004
Rua Francisco Cruz, 229' 04117 -091 São Paulo (Brasil)
Fax (11) 5579-3627 • Tel. (11) 5084-3066
www.paulus.com.br·edilorí[email protected]
homem descobriu novos
caminhos que o leyam para a
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sua interioridade:o §>eu próprio espaço interior torna-se
um lugar J?OYo de~experiência. Os viajantes destes cami~
nhos
'revelam-que somente o amor é capaz de gerar a
alma, mas também o amor precisa de alma. Assim, em
lugar de buscar causas, explicações psicopatológicas às
nossas feridas e aos nossos sofrimentos, precisamos, em
primeiro lugar, amar a nossa alma, assim como ela é ..
Deste mod.o.é que poderemos reconhecer que estas feri­
das e estes sofrimentos nasceram de uma falta de amor.
Por outro lado, revelam-nos que a alma se orienta para
um centro pessoal e transpessoal, para a nossa unidade e
a realização de nossa totalidade_ Assim a nossa própria
vida carrega em si um sentido, o de restaurar a nossa
unidade primeira.
Finalmente, não é o espiritual que aparece primei­
ro, mas o psíquico, e depois o espiritual. E a partir do
olhar doimo espiritual interior que a alma toma seu sen­
tido, o que significa que a psicologia pode .de. novo psten­
der a mão para a teologia.
Esta perspectiva psicológica nova é fruto do esforço
para libertar a alma da dominação da psicopatologia, do
espírito analítico e do psicologismo, para que volte a si
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mesma, à sua própria originalidade:'Elarp.'asce:u de refle­
xões durante a prática psicoterápica, e está começando a
renovar o modelo e a finalidade dá psicoterapia. É uma
nova visão do homem na sua existência cotidiana, do seu
tempo, e dentro de seu contexto cultural, abrindo dimen­
sões diferentes de nossa existência para podermos reen­
contrar a nossa alma. Ela poderá alimentar todos aque­
les que são sensíveis à necessidade de inserir mais alma
em todas as atividades humanas.
A finalidade da presente coleção é precisamente res­
tituir a alma a si mesmare "ver a.parecer uma geraç~o de
sacerdotes capazes de 'e~eender 'novâme.nte á llnguagem
da alma", como C. G.JÜhgo desejava.)' ( ;
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o m\l!ldo est~ cheiÇl de pessoas j.1}co.nsçien~es -
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las que I).ão ,~abem por ,que, fazem ,aquilo' que fazem.
Edward F. Edinger fez wais do qlle qp.alquf;r <;mtra pes­
soa para corrigir ess~, sit.uação., Qomeu ponto. qe vista,
ele foi tão fiel a J ung quanto se. pode ser. Af?S!D;l como
Marie-{;ouis~ vop.Fr.ap.z, ,ele, foi \lD;l jungl,lianQ c~ássico:
absolu,tªweI'lte innuenciado pela mensagem"c!~ Jp.ng,
amplificou -a \.isa.ndo l?egs pI:ópri()s t,alepto~.: "
Para aqueles qu~ copsigE;lram,Jp.I'lgup:l9-I~itp.ra difí­
cil, Edinger tem sido o iptérpre.t~ pr~emií1~nt~ pqr IIlais
de trinta anos. Em palestras, livros; 'fitas e vídeos, ele
apref:?énto,u com muita habilidade a essência destilada da
obra de Jung, iluminando a sua relevância tanto para a
psicologia coletiva quanto para a pessoal. Desse modo,
por exemplo, suas Mysterium Lectures e Aion Lectures
não são apenas, pesquisas acadêmicas brilhantes sobre
as obras mais importantes de J ung, mas também um guia
prático para o que está acontecendo no laboratório do in­
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Desde que a Inner City publicoú seu livro A criação
da consciência em 1984, 'Ed e'eu mantivemos muito mais
do que uma boa relação proyssional de editor-autor, Visi­
tei-o em sua casa em Los Angeles algumas vezes e en­
viei-lhe cópias de cada novo título da Inner City que era
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homem não' nasce todo dia.:Ele nasce 'só uma 'vez, em um
ambiente histórico específico, com.' qualidades históricas
específicas e, dessa forma, ele só é completo quando possui
uwa relaçÇio.,co.m essa~ coisas. $e você cresce sem ~igação
com o passado~ é cómo se qocê nascesse sem olhos e ouvi­
dós ... leJ isso é uma m"utltaçad do ser humano. 1 '
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Para que'"I urri', i~divíduo seja' ~audá~el do 'po~to de
vista psicológico, ele deve manter uma: lig~ção viva com o
incons'ciente coletivo. Xo 'longo da história, e'ssà ligação
tem 'sido forhecidapel~ religião óperant'e ou pela mitolo­
gia: em vigor'em dada sociedade, Uma religião'específica
ou uma mitologia viva funcionam como um recipiente para
inconsciente coletiyo,Apessoa que crê em um mito vivo
tem' acess~ a dogmas, cerimônias é imagens simbólicas
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O h,omem sempre viveu no' ~ito, e' a,cre<Jitamos ser capa­
zes de nascer hoje em dia e viver fora' do mito, fora da
história. Jsso é umadoença,totalmerde anormal, pois o
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I Jung, "The:Hóuston Films~,êrriWilliam MaguireeR. F. C. Hul!, eds., C.
GiJu'!-gSpeqking, p. 348,. [Q~ vídeos de]<;dinger possuem breves trechos de
uma fala de Jung;aqui impressos em itálico, tirados de entrevistas que maIS
tarde foram publicadas em C. G. Jung Speaking. - Nota do Editor]
11
que se encontram entre todgs nós e a realidade bruta do
inconsciente coletivo.
é a função dos mitos vivos e
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Enquanto o sujeito está ligado a um mito religioso,
ele não precisa dar atenção à psique. A instituição reli­
giosa cuida disso e, se ele é um bom membro, que vive
dentro da estrutura dogmática, ele está salvo.
aquele ditado, vocês sabem, de que não há salvação fora
da Igreja. Isso é verdade, não há salvação fora de u"!a
igreja, uma mitologia viva, a não ser pelo processo de
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individuação, e este é raro e difíciL
Assim, de maneira ger::tl, é mais ou menos Verdade
que não há salvação' fora dá Igr~ja, e não importa dequal
Igreja estamos f9..li:qlçl9.. À.'m:~qidª qu,e !?~, po!?sJ,l.i l,J.m·:reci­
piente para o inconsciente coletivo, e o sujeito é um mem­
bro sincero de alguma congregação religiosa, ele esta sal­
vo, do ponto de vista psicológico. b sujeito fem uma reíação
com a imagem de Deu!3 projétaq..a.'.Coíno disse J~~g, as
grandes religiões ~ão ~a~des sist~mas psicoterápiéos. É
isso que elas
e elas fornecem aos seus membros uma
ligação com a imagem de Deu~, 2 Si-~~S}1W·~S~~w.esWP'1~
Deus sendo virtualmente termos sinônimos), por meio,de
rituais e dogmas de d~terminada .~g"fej,a.. "', r •
Enquanto esse método furiéionar,nãoná1o
que
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lar contra ele. Nq enta~t?; nãp,h,~, à po·!?~~piJ,i<1:ª,Qe.de..u~fl
psicologia profi.lI~da e#quéll1tR se esi'á- f0riti5:lo, ~f.l1·,unia
Igreja. Enquanto oin~oil"scÍE~#te c,9Iet!y~ esti':/er pres?,:~or
assim dizer, ao simbolismo
de uma
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e~pec.í?ca e concre~a,p.~o ~x.iste!(po.s~~RiydlF,~·~e .~~?r~~
nencla-Io de maneIra empínca e IndIvIdual. A pSlçologla,:
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profunda não se aplica àqueles que estão 'contidos em umá
crença religiosa específica porque eles não necessitam
dela. A psicologia profunda nasceli, na Idade· Moderna
porque muitos necessitam dela. 'Realmente precisamo$
dela.
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Vários poetas do século XIX - Nietzsche, Matthew
Arnold e outros 2 - a~úp.ciaram que a mitologia Cristã tra­
dicional predoIllÍnan.te nã<;>mais servia ao seu propósito,
e que os indivíduos IDQQerno!?nãQ ',estavam mais contidos
por ela. No mínimo,a min9tia criatJ~adasocie,dade oci­
dental não ca,be.majs!lo recjpient~_dOÍI1ito 8ristão e, desse
modo, está qb~rta ~ dispoI).~v~1 pará a possibilidade de
descobrir empiricamente a PsicQlogia profunda.
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A idade da tdulsfôrmação
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Uma grande inudinça' aconteceu 'ná' psicologia cole­
tiva em torno do século XV. Como eu gosto de dizer, de
maneira um tanto dramática, "Deus caiu do' céu para
dentro da psique". 3 Foi màis ou menos niquela época que
a projeção coletiva da 'divindade: no rein~ métafísico do
dogma religioso recuou. Foi um processo' lento, que co­
meçou apenas em algumas pessoas, más foi lá que ele
realmente 'tev'é' iriíCio: kirriagem'de Deus foi se 'retirarido
da proj'eção 'metafísicàeeritrando na psique.' O que vi­
mos, então, foi uma inflação coletiva,'um grande 'cresci-'
menta da energia do ego, que' se manifestava em todos os
lugares. As pessoas' 'começ'aràma 'exploraro'globo, e a
fazer todô tipo'de descobertas nas' ciências e' nas'artes.
Houve uma grande expansaoda consciência humana no
nível do ego. Mas o preço para isso foi uma progressiva
perda de ~ligàção coin 'a'dimensão' trailspe.sso,al, um pro­
cesso'que agorà:alcança setiápice~'
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O ego-humano tomou o controle'das energias psíqui­
cas' de talformaJque a'realidade da'psique objetiva, a
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Notes àn the Seminar given in 1934­
1939, e Edinger, The Mysterium Lectures: A Joumey ThroughJung's Mysterium
Coniunctionis, pp. 222ss. (Nota do Editor)
3 VerE;dil)ger, T.h.e. A.ion.4ect.ure~:Exploring the Selfin C. G. Jung's Aion,
esp. caps ..9, 10,23, (Nota do Editor)
13
realidade da dimensão. transpesso.al da: psique, queántes
era garantida pelas co.nvicções religio.sas e' metafísicas',
ago.ra encontra-se em grande parte ineficaz Como'um, fa}
tor efetivo na vida coletiva. Essa situação atingiu um
extremo tão grande que, da forma co.mo eU: a entendo., ela
é o precursor da próxima era,~Esse estado décoisás esta:~
va previsto na Bíblia, no'Apocalipse, onde tudo está ex':
posto de maneira simbólica.4,·'
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A descoberta da psico.lo.gia profunda no. século. XX é,
na minha opinião, pelo 'me?-.~~it~9, !~~çrtl1:ç.~equ~I1tp,
igual em grandeza, à desco.berta da física nuclear. Vejam
o que aconteceu. Por míH;tares de an9s, a humanidade
possui o conceito. de'alma, de psique', de u~a consci~ncia
elementar de qiI~ 'a subjetivj~ad~ ~~manal~i um -f~tor
muito importante, mas a humanid~de estava,tão!próxi­
ma a essa realidade, que; ~ão ,conseguia trGltá-Ia de ma­
neira empírica ou cien~ífiça. '.
A imagem que gosto de usar é a de um peixe nadan-.
do numa lago.a. Existe uma anedot,a,agrad:%ye!, uma (ln~,.;
dota oriental, que ch~gou, mim certa vez. O mestre Zen
pergunta ao aprendiz: "Qu~~ descobriu a ~gua?" Oap'ren-:
diz não. sabe, então o. f11e?tr~. respon<;l~: ,"Bom, eu, também.
não sei, mas sei que~ não. a;descobriu; ~ 'peixe."
Como. vo.cês. po.dem v'er, QS seres .hum~nos e,stão,exa­
tamente na mesma ppsiçãoem rel,ação..à psique.,~lel?,>;H
vem dentro. dela. É o seu 'meio'ambiente,é existf!m aI-,
guns pequeno.s vislumbres de luz so.breo lugar o.nde ,o.s
egos individuais existem nesse ambie'nte' ger;:tl da psique:
mas eles estão. tão. perto d~sse'qmbiente que não. conse­
guem reconhecê-lo co.mo um:objéto. empíric9 que po.dE2 ser;
estudado da mesma forma como a natureza é estudada ­
como. um o.bjeto. Mas o qll:e aco.:ç.te.c~u. CQrn a desç,o.berta
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4 Ver Edinger,Archetype orthe apocalypse: A Jungian Study orthe Book or
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Reuelation. (Nota do Editor)
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do inconsciente, co.m Freud e Jung, foi que de repente a
psique tornou-se um objeto do ego subjetivo. o.bservador.
E foi isso que abriu as portas para o. estudo científico. da
psique. Essa é realmente Uma eno.rme revolução coperni­
cana que ainda mal éomeçoti a penetrar, na consciência
coletiva:
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Junge Freud
Nós realmente devemos a descoberta' empírica do.
inco.nsciente a Freud. Ele estudo.u. caso.s de histeria e, a
partir desse estudo., desco.briu o. inconsciente. Jung, ao
mesmo tempo,emborafosse dezenove anos mais novo do
que Freud; conduzia experimento.s que chegaram ao. in­
consciente pqr um outro ângul<? Ele estava fazendo. ex­
periênçia,s 'co.m o. teste de asso.ciação. de palavras, o qual
revelou o. que ele chamo.u deco.mplexo.s inconscientes. 5
Então, quando. Jung começou 'a ler Freud, percebeu que
eles estayam lidanflo .co.~ o. mesmo fenÔmeno.,.e marca­
ram um~enco.ntro .. Foi um encóntrohistÚico.
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Bem, eu/Til uiiLtá.lo din Vúma eficamos convúsando por
(reze horás sem parar.,·.. nem percebemos que estávamos
" quase mortos ao final:daconversa ... Eu ainda era muito
jovem naquela época, ele era mais. velho, ·tinha uma enor·
. me e~per:iência e ~stq.va, é, ,claro, muitC?nÇL minha frente,
. então;aqúiesci pç,ra poder aprender alguma coisa pri­
m~iro.6
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tivesse .emyíen<t e 0., ?:utro,er,n ,Zurique, enco.ntraram-~e
com Gerta freqüêncí<;l:etíveram muitas co.nversas. HaVIa
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5 Ver Experimental Res(!arches, CW 2(CW é uma referência a The Collected
Works orC. G.Jung). (Nota do Editor)
6 Jung, "The Stephen Black Interviews", em Maguire and Hull, eds" C. G.
Jung Speaking, p. 253,
muitas diferenças, mas por um longotempó Jung sub­
meteu suas próprias idéias às de Freud., poiss~bia que
Freud tinha mais experiência do que ele. No:e.qtanto, tudo
mudou a partir da publicação, em 1912, do liy:ro'Transfor­
mations and Symbols.of the Libido 7 ; de Jung. Os cami­
nhos separaram-se nesse momento, pois Jung estava co.­
locando suas idéias para fora, e ele sabia ql,.le existiam
diferenças muito sérias na forma como cada um compre­
endia a psique, especialmente em relação áÚ~iàJ, '6tie~er~
gia psíquica.
'" ! J 1 ~
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Aquele livro custou-me:minha amizade com Freud, pois
ele não o aceitava.. Para.ele, o inconsciente era umproduto
da consciência, qy.e sim.plrç.sllJe.iJ..te co.rl~~1Jha ?U(:i.o,o que dela
sobrava; era Ulr;t tipo de ,q uar~o 4e d,espejo 9nde toeja,s as
coisas que a consciência -descartaüã' efá,.n: amontbàdas e
largadas, Pará' mim, ja 'naqueld época! o inconsciente êra
uma matriz, Uma base de consciência: de uma natu-r.eza
criativa, capaz,de',atos·autônomos.
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Jung passou, então, por' uma\profú'nda'experiência
do inconscien'te, de'1914 ai 1'9-18, e foi'néssa épqca" que 'ele
fez a descoberta pesso~l e'ilT!-ediatad9 inçonsci~nt~ cole­
tivo. Freud descobrira o irÍçonsdente, mas"ap~n~~ sua
dimensão pessoal, que'é;ceFtamente; muito.reabOs con­
teúdos do inconsciente de J,i'reud referiam-s~'apenas à vida
pessoal do indivíduo, à infância'em'particular; e':q.quanto
o inconsciente coletivo; descobriu Jurig; àlargavaimen­
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samente as perspectivas da psique individual. I~so se deve
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A versão literal da edição alemã or!ginal' de 1912, Wandlungeri ulld
Symbole der Libido, seria Transfõrmatiõris andSyíiibôls bt.tM <Libtdó" em \Jota
em inglês o livro tenha se chamado On the Psychology ofthe Ullconscious:.~m
uma edição bem revisada de 1952, o livro passou a se chamàr Symbols of
Transformation, CW 5. (Nota do Editor) Em português, Símbolos:da Transfor.
mação, (Nota do Tradutor)
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8 Jung, "The Houston Films", em Maguireáhd Hull,eds., C, Q,
Speaking, p. 339,
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ao fato de essa descoberta revelar que a psique individu­
al está flutuando, por assim dizeI!, em um oceano com­
partilhado por toda a nossa espécie.
i.
A natureza dos sonhos
o que são os sonhos e como devemos compreendê­
los? Aqui, mais uma vez, existe uma profunda diferença
nos pontos d~ vista de Freu~, ~. ..rung;~l~s~çmc?rdavam
que o sonho é o caminho régio'paráü'iíí.cOIlsCiénte, mas
discordavam quanto ao destino dessa estrada. Freud acha­
va que ela levav~à descoberta dÚ's desejos inconscientes,
e que a naturezasimbólicà dos sÓnhbs"pôd'éria sei expli­
cada ao se po~t).lla'r aJ~m dp(rq~ 'c8D;s'hrq.Jung 'não acei­
tava essa i~~l?,çl~J,ei~~. ge,nplJ-n.1;, E?le Go~sideràya '9 :\30 nho
um produto da natureza. A natureza p.ão' engana, ela ape­
nas fala na sua própria linguagem; 'e depende de nós
aprendermos essa linguagem, chegar a uma compreen­
são dela .." '
., ", ' : ,,,'
i'i
I"
Oss'Onhos' falam';\sim,: uma lingüagemsimbó1icà
em relação a qual devemos adquirl'ta'Ca'pacidade:dé'coni­
preender. Existêm,tambéhi, diferenté's níVeis de sonhos
- sonhós super.ficiais esonliós profundos;'son'hos peque~
nos e grandes sonhos. 0s grandes sonhos possuem;' em
seu cont~údo,.imagens aiquetfpicas: Os 'sonhos menores
parecenicletivár do:iricon'stiente pess6aJ;'é'os sonhó'smai'­
ores têm"> mais' do' que' ürilàreléVânCià pessoal: 'Eles 'S'ão
relevantes a toda 'uma cornunid:àde, ou sociédadé, já que
os fat6f.és) afquet'ípicós"qctedeterfuináin 'a éxistêriCia in­
dividual também estão op:erantes· na)coletividade mais
ampla. E tanibéfué vérdade'<lue, em"àlguns casos, pode­
se percéber uma sabedoria'impressiónanterevelada nos
sonhos, sabedoria não apenas do presente e do passado,
mas às vez~s, sabedoria do futuro ..
i
17
Jung demonstrou que o inconsciente funciona para além das categorias de tempo e espaço. Isso significa que um evento relevante ao qual um sonho se refere. pode encontrar-se no futuro, em vez de no passado, que o evento futuro está projetando sua sombra para trás, por assim dizer. Para o ego racional, é difícil aceitar essas coisas, mas existem dados muito claros de que essas coisas acon~ tecem.
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A criação da consciênciÁ "
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A consciência é umJfatorJ, e existe, um· outro, ' tão impor­
tante quanto ela, o ~nc:ons~iente/ que pode interfer,ir na cons­
ciência na hora que quiser. E claro que éu dissf! a mim
mesmo: "Mas isso é muito desconf9rtável, porque eu acho
que sou o único mestre' em miríhacása". Contudo, deÚiJ
admitir que existe um outro alguém nessacasa.que pode
fazer umas travessuras. 9
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Quando procuramos uma definição, estamos,tentan­
do conceituar uma experiênciª ou uma entidade. ,A pró­
pria palavra "conc~ito" <:arrega consjgo a ~~agem de cO+I1.­
preender essa experiência pu entidade, E para podermQs
compreender alguma;coisa, devemos ter um alcap.ce gran~
de o suficiente para podermos incorporá,la. ~o entan,to,
muitas dessas entidades básicas são t~o grand~s ql)e se
tornam incompreensíveis pa:r;aQs meiQ.8 raçionais,.e tu,ç1ó
o que podemos fazer é fal,ar s9qre o assunto, rod~~ando.~Q,
olhando para os seus dife~entes,aspect9s .. I; J, ': j ; :
Então, deixem-me tentar fazer isso com a entidade à
qual chamamos de consciênc.ia.':...
'~' " ~
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Thdo o que sabemos da con$ci~ncia é ,o que 0ê indi~
víduos experimentam; é um termo de!?creyend~rurria ex­
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p.340,
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18
I
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periência. E se vocês refletirem sobre a experiência, po­
derão começar a dizer algo sobre ela. Normalmente, é bas­
tante útil refletir sobre as versões iniciais de tal expe­
riência, então podemos considerar as versões iniciais da
consciência. Por exemplo, em sua autobiografia Jung des­
creve sua expétiência de' tornar~se consciente mais ou
menos aos onze anos. Um dia, sem mais nem menos, foi
como se ele saísse de
nevOéiro' e percebesse: "Agora eu
sou eu mesmo, agora eu existo". 10 Antes disso, esse conhe­
cimento simplesmente nunca tinha ocorrido a ele.
Consciência significa, acima de' túdo, estar ciente. E
significa.não apenas estar ciente dós objetos, pois até
os animais o estão; os' animais não ficam se chocando
com os objetos, eles estão cientes dos objetos e mantêm­
se afastados deles, e q~ando eles vêem vocês, reconhe­
cem vocês e mantêm certadis'tã.ncia. Então; eles estão
cientes dos objetos, mas não estão cientes deles mesmos.
EssG\ ~ a, ,car~ct~rís:q9a F1J.~ial ~a,c~:hsç~ênci~: ~ conscjên­
cia éci~nte êIe si,me,sma, é oego fica:n~ociente de si mes­
mÇ). Quando Jung saiu' do 'nevoeir9 e percebeu "Eú sou",
naqu~le exato mom'ento ó ego estàvàpérceb'erido~se como
um objeto.',
"','! ~
, , Esse é o grande mistério da consciência, e~a tem o
poder reflexivo de olhar para o espt'llhoe se epxergar como
um~'irrUl&em ~,eparad~.Não éflP~nas u~,~cid'enteo fato
de Iahweh, no Antigo Testàmento,'expor sua identidade
como "E~ sou':.uAcho qu~~xi~t~\~mà'Iig~~ão entre a psi­
cologia da' conscIência'e a im.ágén; si~bólica de Iahweh.
Vejam o q~e acontece com a desê~bérta rev61uéionária do
"Ellsou". E um nascimento, coÍno vocês podem ver, o nas-
um
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, IO·Memories, Dreams, Reflections, pp. 33s. (Ver também "The 'Face to Face'
Intervle~", em 'Maguire and Húll, eds., C. G.Jung Speaking, p, 425. - Nota do
Editor),
11 Ex 3,14. (Ver Edinger, The Bible and the Psyche: lndioiduation Motifs in
,
the Old Testament, p. 48. - Nota do Editor)
19
cimento de uma luz que n~o existia ,antes, E;! () que ela,
traz consigo é uma maior consciê,Iícja dflsobgrania d9.ego.
No curso de perceber a própria exist~IíÇi~, () ~go p(;')r­
cebe, simultaneamente, que ele .existe.:em urrLamb~~nte,
e que há objetos e Qutr,as pes.soas qlJ~o tambépl ex:is.t~m.
Ao mesmo tempo, o indivíduo perc;eQe qlJ.e "l-, cO~$ciêf,lcia
interna é um reino sep,ara,do'que nã()pocle.~ex,pen,e~r~d,o;
é inviolável. Essa é a fonte do siml;wlismo do r~i, ,Q. r~C9nhecimento de que a c'Qnsciência tra~ GOI).sigQ uom Sf;I}$O
de soberania. E esse é osentjdQquet"l-n,tós,f; fl?::pap.diu, na,
sociedade ocidental W?S \Íltjwo$ :quinh~I).tos 'a,nos: â. per­
cepção do ego d,e s\.!.a s9.b~raniq em ,rela,çã9 à natur€)z,ae
'" .
ao mundo.
A consciência no inconsciente
"
Estamos falando da cOrisciência 'e seus muiÚplo~as:
o
pectos, o que traz à tona outra: pergUnta, que seri~: "EXiste
consciência noincclIisciénte?" E a resposta é:'''Sim''. ~ung:
discu te essa questão hô importantíssimo' texto' '''On the'
Nature of thEi Psyché",12 onde mostra'que a corisdênt{à
existente no inconsciente é difusa e parcial. Elà não pos'­
sui a clarezà de enfoquequekúonsciência dp ego po'ssui;
ela é de uma natúreza 'diferente e talvéz seja 'descrità1
melhor como consciênCia latente. 'Isso, t~mbé'm' significá'
queoinconscienteéumsujeito.t
:~_·L,!I., ,)
Parte do fenôm~no'da: consciência'diz r~speito à âis~)
criminação entre sujeito e óbjeto, Estou ciente',cl.e quesoli;
um ser consciente; sou o' suj~ito nessa: consCiência. Quan:',
do olho para o mundo, vejo objetos e, nO'processo'de~e
separar da identificação com esses objetos, ocorre uma se­
paração entre sujeito e objeto. Essa é a forma'como a tons-,
'''0
•q
ciência se desenvolve, separando sujeito de objeto. Eu sou
o sujeito, e todas as coisas com as quais eu tenho de lidar
do lado de fora são os objetos da minha percepção .
Agora, o mesmo aconteçe no mundo interno. O sujei­
to descobre. que Oiitconsd~:ritéposs'l;li conteúdos qu'e são
objetos da>lpróP.ii'a s~bJetividadé. E'eu';possó percebê-los
como objetos,'ê'fa'la~ 'delescqmo's~ndó psiq'l;le objetiva.,
No entanto~\jéiã que posso·també~ êlizer que'a psique
objetiva que eu percebo cóniô um' óbjeto' é~ 'ela própria,
um sujeito, que me percebe como um objeto? E a resposta
é: "Sim", Por definição,
..seáconsciêncja existe, ela tem de
ter um sujeito, ela:"tem de ter uma base onde possa se
apoiar. Esse é Q sentido -'da palavta;sujeito.
À medidâ'que admitimosqu€j' o inconsciente possui
uma consciência, admitimos que ele é um sujeito, que pode
olhar para mim e se relacionar comigo como um objeto.
Esse é o fenômeno expresso simbolicamente na noção do
Olho de Deus. 13 •.- .
'
Vejam, 'uma das características da expgriência do
Si-mesmo é ser ooservado pelo Olho dê'Deus,' Uma expe­
riência muito inquietadora essa de ser observado com to­
tal objetividade por um sujeito interno que nos trata como
um objeto. Ao serm'os tratados comoóbjeto, não somos
mais soberanos. Enquantõsônios'o sujeito, somos o sobe­
rano, o soberano que examina o seu próprio reino. Mas
quando so'moso,objeto; o 'sujeito que está olhando para
nÓs.é'o,·soberano examinando o rein'o dele, e esse fato nos
leva eíndireção a todo o simbolismo'assóciado ao arqué­
tipo:dd Julgamento Final.
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20
The Structure and Dynamics of the Pf?ychg: 'CW
1
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yer ,Eding~r,(('{!e
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çreatiof!.,;r;.Consciousness: Jung's Myth for Modem
Man., é5p. pp, 4255,; também Eding~r, The Mystcrium Lectures, pp, 218f. (Nota
do Editor)
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13
12
.-,j.
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_________ 9.L-._
A estrutura da psique
,
Persona
I._.)
Todo modelo da psiquedeve começar pelo ego. O ego
é a base da consciência e o centro subjetivo' do senso de
identidad~ do indivíduo: Desse modo, tudo o' que 'existe
na consciência deve estar rélacionado' a uJ!l ego,. a úm'
sujeito.
é o ponto de partida.·,- .... - .,
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SOMBRA
ANIMAI ANIMUS
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Então, segundo o p1odelo de,Jung,. ao se olhar do:ego'
para o mundo externo, existe uma função, uma entidade,1
que ele chama de persona, palavra latina q1,lesignifica a:
máscara do ator, e que é parte da palavra personaHdadeJ
Essa função psicológica permite que o indivíduo funcione
como um hipócrita. Uso essa palavra especificamente
porque hipócrita é a palavra grega para ator, e :~(isso que
somos quando funcionamos através dapersona ..Claro que
ela também representa uma. funçãdde adaptação, ';lma
marca da nossa ligação ao ambien'te, para que possamos,
22
nos adaptar à expectativa dos outros. Mas o resultado é
que todas as profissões tendem a desenvolver sua pró­
priapersona. Temos, assim, ap~rsona médica, apersona
eclesiástica, e assim por diante. E claro que a análise tam­
bém possuipersonas, apersonaanalítica, o fato de se tor­
nar uma tela de projeção em branco, embora essa não
seja aprovada pelos analistas junguianos.
Desse modo, apersona.é ·a:entidade psíquica que
opera entre'o ego e o mundo externo.Agora, quando olha­
mos na outra. direção, para .dentro, o que encontramos
primeiro é a·sombra: Essa é aparte inferior da 'persona­
lidade, onde. se· encontram todos ,aqueles aspectos que o
indivíduo"considera indesejáveis; escuros,' até mesmo
demoníacos, emJ si mesmo. Em geral, não os ,reconhece­
mos por serem muito desmoralizante13. Essa é a primeira
coisa com à qual'o indivíduose'defronta aO'se s'lJ,bmeter a
uma análise profunda. Abaixo dela encontra-se o que cha­
mamos ,de.anima.e.de alJ,imus ,a,anima .representandoa
imagem feminina no homem, e oanimus, a imagem mas­
culina na mulher. A projeção de animus ou: de anima é,
muitas vezes, responsá,velpela experiência do apaixo­
namento ou~:de modó inverso, pot. uma imensa aversão.
Por trás dessas imagens estão a Grande Mãe e o Pai Ce­
leste. ,E.·bemno centro.da;psique, se alguém conseguir
chegar tão.· longe assim; está o Si-mesmo, a imagem in­
ternasle Deus.
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Sombra'
I,
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. . ':.
Comecemos'com um.exame sobre como a sombra é
criada~.- Pois ess.eé. () pano d.e fundo da sua própria
integra.çãQ. Dura,nte a inf~ncia é a adolescência, à medi­
da que o egose desenvolve;.é'de vital.importância que ele
estabeleça um senso :de .autonomia perante as outras
pes~oas e:.o -mundo externo. É por esse motivo que, du­
23
rante alguns períodos da infância,' as .cr:ianças. dizem
tanto "não".
'::~,.
Vejam, temos de ser capazes de,dizer '~não" 'Para po­
der estabelecer nossa distância perante os outros.: O ego
não consegue se formar com uma concordância perpétua.
Ele não se estabelece dessa forma.'Assim, àxnedida que o
ego se desenvolve, ele diz;, "Não~:eu não gostQdissÇ>,.gosto
é daquilo"; ele diz: "Não,.eu não so.uassim,.s.ou.assado; eu
sou bom, não sou mau'~. E aoJazer' todas, essas,discrimi­
nações, ele cria a sombra, .0 .recipiente ,p'ar:a o.que nãoé.
É de vital importância que um .ego jovem. se .sinta
mais bom do que mau. Se.ele:c.ai na certeza delsermais
mau do que bom, torna;'seum caso perdido. rEntãó, ele co­
meça a viver a partir.dessa idéia, e., aí temos ,a crimina­
lidade e todos.os tipos deéomportamento anti-socü,!1.Por
isso, o ego deve. seícoÍlv,enc,er. de .qUe_é/mai,s .bom do; que
mau. Mas e o que .acontece aJodas:aqú'elas cái::acterísti­
cas assim cha,madas.negativas, quede nega possuir? Elas
vão para a sombra,.para. o inconsciente., ,.~ ',,;!.
Acima e além da: soinbta pessoal, ·há ,tambémo. aF­
quétipo da sombra. Na .culturajudaico:,cristã"ele é.nor­
malmente personificado pelo, :diabo. : Quando a t sombra
pessoal está inconsciente·; elase.funde ,com, a. sombra
arquetípica; e.aí não há m~is:uma.discrimináção·claFa
entre o pessoal e o arqúétípico, e;o ,individuo encontr:a-se
aberto à possibilidade de realmente su:cumbir- à:posses­
são pelo arquétipo do mal.
Mas, em algum momento, mais ou menos n~ meta9.!'l
da vida do indivíduo, se ele estiver destinado ao desenvol­
vimento, esse processo de relação_com a sombra;.deve ser
revertido. Ele deve começar~a recupera!' todos aqueles.as­
pectos negativos e inferiores que ele,rejeitóú nO.processo
prévio de formação do ego. Mas esse~é·ur:ú negóçio.artisca­
do. É arriscado porque se o indivíduo for inunda,do de ma­
neira muito abrupta pelas qualidadesi.da-:sombra,. pod~
24
chegar à conclusão: "Na verdade, não sou a pessoa boa que
eu pensava ser, eu realmente tenho todas essas qualida­
des desprezíveis". E isso pode ser muito desmoralizante.
Como o indivíduo' se protege, para não cair nessa
sombra arquetípica? Eu: só conheço uma maneira segu­
ra, que é ficar ciente da: existência'da sombra arquetípica
como algo distinto da sombra pessoal. Em outras pala­
vras, uma compreensão intelectual desses diferentes com­
ponentes da psique já' pode ser uma grande ajuda. Pois
aí, se tudo correr bem, virá à meI1te a' idéia: "Ah sim, li a
respeito diSso no Jung;compreendo o que é e estou ciente
de que não dev6me identificar com isso\'.
Anima e aiúmus
.
.)
'"
~
.'
O arquetipo' é u'ma'rorça. Elé temu;na auto~of7.1-ia e pode,
apoderar-se de você de repente. É como um ataque repenti·'
no. Apaíxohar-se a primeira vista 'é alguma coisa pareci­
da com isso. Veja, você posslúcerta imagem de mulher, da
n;ufher, dentro d? voçç'flteslXw, sem o !)aber. Aí; você vê
essa" moça, ,ou, pelo menos,. uma boa imitação "dela,. e .na
mesm,a ~Ora.voc~ sofre um ataque . e l{ocê está perdido. E
mais tarde você pode chegar à conclusão de ql.le fora um
enorme engano: Um' homem 'é'capâz, ele é inteligente o'
bastante, de perceoér que d mulher que ele "escolheu", como
se diz, não foi u.n;a escolha dele, eleloi'capturqdof,Ele sabe
q!le ela não é.legal, que ela é Um grande problema, e ele me
conta
tudo
isso. Ele diz; "Pelo !amor
de Deus,
doutor, aju­
,
',
.
r '
.'
~'I'
de-me a me livrar dessa mulher!" Contudo, ele não conse­
gue sair, ele é como argila nai mãos"clelcL Esse é óarqueti­
po, o arquétipo da anima... Coni' as 'mulheres acontece o
mesmo: ,Quando .um homem canta muito alto, a moça acha
que ele deve- ter um caráter espiritual maravilhoso, pois
?le c·on,segue atingir 9 dó agudo, e ela fica extremamente
desapontada quando casa com esse homem em particular.
14
Bom, esse é o arquétipo do animus.
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14
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Jung,. ~'The Houston Films"; em Maguire and Hull, eds" C. G. Jung Spea·
king, p, 294.
25
Jung diz que a assimilação da sombra é. a.tarefa
ou opus menor, e que a assimilação da anima é o' opus,
maior. 15 Não é muito difícil obter algq.ma consciência so­
bre a própria sombra; está dentro do alcance da maioria
das pessoas, ao lhes fornecer alguma in~trução e assis­
tência. Parece ser muito mais difíçil, todav~a,' tornar. a:
anima ou o animus conscientes.
:'
Não são poucas as pessoas desavisadas, que I1ãj) re~'
conhecem nem a exist~ncia empíricaq,à anima ou do
animus. Elas pensam que são apenas conéeitos, idéias;
dispensáveis em suas vidas. Mas eles não são apenas con­
ceitos, são organismos psíquicos vivos que êons~guimos;
reconhecer e dos quais tornamo-nos cientes somente quan­
do passamos por uma experiência que nos, torna cientes'.
Contudo, é necessária uma boa dose de insight para
chegar a essa consciênCia. "
'" . .
.. \,
Falarei primeir;:)' da animâ 'no homem.' ,
A anima éilma enÜdaderiéa; conÍplexae ambígua,
que contém muitos 'aspecto's diferentes; Ela'penetra'bem
fundo no inconsciente coletivo 'e possui u.m aspecto "forte­
mente arquetípiéo. A anima també,n1 incorpónl todas as
experiências importantes que o homem tem :de:uma. mu­
lher. Tudo isso é construído na imageIll daa",im4" de
maneira que ela se' torna uma entidade fataL Fatalidade
é uma das palavras~chave quepoclêm ser ápli'cadas à
anima do homem. Quárl.do aàrl.Íma é\ ativada, pode-se
saber que alguma coisa ,fatal ,está .para, aéimteêer, seja
para o bem ou para o m a L "
Assim como acontece'com todos os arquétipos, aqni­
ma é uma união paradoxal de opostos: Ela é, i:io mêsmo
tempo, uma prostituta e a Virge~ 'M,aria. Ela tem pode,..
.; ~
". •
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J'
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. . . :
15 "Se o encontro com a sombra é a 'primeira obra' no desenvolvimento
individual, o encontro com a anima é a 'obra·prima' ". (The Archetypes and the
. '
Collectiue Unconscious, cw 9i, par, 61). (Nota do Editor)
26
res, poderes divinos; de sedução e encantamento, orien­
tação e elevação espirituais. Ela pode tanto tentar um
homem até. a sua destruição total, quanto levá-lo à sua
maior realização. Essa é a amplitude de suas capacida­
des e não preciso nem dizer que um ego racional sozinho
não consegue:,dar.conta-,de:·uma entidade de tamanha
grandeza. Mas elaé isso mesmo.· r.: .. "
Deixem-me repetir: -isso não é um conceito, mas uma
realidade empírica Niva, que ,pode ser!demonstrada se
vocês se derem J ao· tràbalho de olhar: pelo telescópio da
psicologia profunda:. ,(Estou'pensando no' telescópio de
Galileu, pelo qual as ,pessoas! se recusavam a.olhar por
não querersaber.que Júpiter tinha várias:luas.) A gran~
de manifestação inicial~dadnúna!é; quase sempre, por
meio de uma projeção.'Um homem :C:onhece uma mulhep
que lhe .salta aos olhos ,e se apaixona: 'Esse· fenômeno· é
uma projeção de anima.tTentem lhe.dizer, isso nesse mo­
mento e vocês· não chegarão muito.longe~ Mas a' projeção
pode ser demonstrada.,' Eu i não l falo ~isso \paradepreciap
essa experiência, de forma algum á; chamá-la de projeção
significâ~que sua.força vem dedentro,-'não deforà, mas
issôde maneirafalguma'diminui a sua! importância.
" Às vezes, a projeção pôde .acontecer de Uma vez só,
como·noambrà primeiravista,mas\ela:pode cair de uma
vez SÓ" também. A pessoa, precisa apenas enxergar uma
pontinha da falibilidade, ou dos defeitos pessoais da mu­
lher real; umà única' vez,.e issó pode ser. o· suficiente pára
que toda a projeção colapse, desaparecendo no vento. Em
tal casoi issô:significa queorelemento fatal da projeção não
foi ativado:, Quando o elemento· fatal da 'anima é ativado,
quando ele encontrá 'Uma mulher em particular lia qual ha­
bitar,então'essamulher torna-se o destino do homem, para
o bemoupará.·o mal;.e pormáis que ele se debata, ela o tem
em suas mãos. Um 'exemplo clássico disso está em Carmen,
a ópera, mas os exemplos, claro, estão em toda parte.
27
Um outro modo pelo qual a ahima,pQde se ma:r:ifes­
tar é por meio da possessão dO.,ego,.e!D VflZ de;exer,cer um
encantamento sobre ele, por. meio de,uma projeção.exter­
na. Se o ego cair em umestapo de .identificação. com, a
anima, então o homemJoma-se meio,eferrünado,chorosb
e ressentido. Isson?o .é . incomum. Qua1)do. a',anima
manifesta como possessão, de
~mas, qualidades inega:
tivas prevalecem;;Ilão :h;tum
.l:1Qlido, operante, para
se relacionar com elad.) que acontece entffio: é qJ,.I.e· O~ego
cai em um compo:r.tarngntõre~esstvo,.infantil,~de un),jei;
to ou de outro; o~,<}spectQmJiterno dª afúmq:.é :;ltj.:v:.adq
internamente e o.ego .ficá. esperando ,de :tpdo:s :lllp.a· :rela~
ção de I)1aterÍlag~P1. Emyer§ões meIlOsexJrernas;:JerrlQS
o que chamamos"de)huniox8s;~de_llnima, ,q\le,,~mgeral
aparecem quando há JJ.ffi. conflito 1)a r~lação. A ']ilulhex
cai em um humor de animus, o qual menci.onáre.i datJ.lli a
pouco, e,o homem é.pre~flde um.humor d~ ani"!;ÇL. Phti.
mor de animu$ çaZ:ªêteri.za~se .por~}1IÍl opiIlar,agressiy,Q, e
o humor de anima por'-\lm.a.q\lêix:aSesse,Q-tida.:)
c.;<;
Agora, vamos faJar do·aaimu,s .i·
.'i' ) '- .
do qUe lel! disiSe .sobre a à,nü:natflmbém:se
aplica ao animu~ dê. UnlçH l1lIlIwr. Vejam, awOa.s.as imaÍ
gens têm sua raiz,·no.s~-m~smo :e, ,de.ssa. maneira, pos­
suem a imagem de PellS em selJ. n\íçleo, QU .urna face da'
Imagem de Deus. Coloqve.mrnas jUfltas"çoloquem-nas
em uma sizígia, em \ln} par inqi$s,o.lúy,el; e eptão .voc~~
terão a combinação, a.,cor-iunCtiQ"as .d:uasda Imã 7
gem de Deus.
. . ' L . ) ~:'
,1.\'
,j
'f",
Assim cOmo a animq, o,C!lJiPJ.l!,S ~fh~m~do a p,artir .d~
uma combinação de fatores Jlrquetípií;o.s ,8, pe$soais, E;
com certa freqüência, assim como a roãe,pessoaUemum"!.
contribuição a dar à anima do homerfuJambé.m'o pai dá
uma contribuição enorme para a imagem realdo.a,nimus
da mulher. Os mesmos fatores fatais aplicam-se, ames,
ma ambigüidade, a mesma união de op.ostos..
_:
O animus é, por um lado, o melhor guia espiritual
existente, ou salvador, e por outro, um estuprador
lento. Os dois lados estão 'i::óntidos na' mesma imagem.
Não é pouca coisa uma mulher 'conseguir integrar essas
duas imagens, reconhecê:''las éoin:b uma unidade. Um dos
maiores empreenditnéntos psiéólógicos que Há é alcan­
çar tal grau de integraç'ãó, _ser 'capaz de' enxergar para
além dos opostos, réconhécet que etes'são dois lados do
mesmo fenômeno; 'E eles são mesmo: .
r,
De modo geral; o aniniustem máis a verébma men­
te e a anima corn:ocoração, de modo que ocohhe'êÍménto'
dessas figuras:é da forma como elas' funcionam riapsiqliEi'
é extremamente útil para se compreendér;o que acontece'
nas relações íntimas.
Vejam; em todo relacidnamento entre" os' ddis sexos
há, na verdade,quàt:i:'o jogadores: ó ego do homem e ó dá.·
mulher, .aaninü:i:'do homem e 'o ánimusda mulher. Issó)
pode ser ilústtado da seguiiite inaneira: 16 . ,";;~
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ego
da mulher
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Diaira~f!adaptad,o dp 1isçp~q 9~'.Jung em "The Psychology of the
dor.,,..,,,,,", The Practiée af Psychotherapy, CW 16, par. 422. (Nota do Editor)
16
29
Quando um homem e uIl).a mulher se gostam e co­
meçam um relacionamento, primeiro haverá. entre ele~
uma relação no nível consciente. O homem, consciente­
mente, gosta do que a mulher: é,.e vice"vers<;, e ele~ come~
çam a se relacionar nesse nível; esse é o primeiro e mais
óbvio nível. Mas aí, os outros jogadores entrqm na jog~­
da; se houver algum tipo çle profupdidadena relaçao de-o
les, a anima do homem s~rá projetad,a, a tada à mulher, e
o animus dela será projetado no homem. Aí então temos
um intercâmbio mais complexo, pois:ohomem . passa a
enxergar não apenas a mulher da qual ele tem consciên­
cia, mas também a sua projeçã.o de anima; e a mulher vê
não apenas o homem do qual ela tem consciência; mas
também sua projeção de animus.
.
E ainda fica mais complicado,'pois o animusda mu­
lher vê a anima do ,homem 'e começa a re,agi,~a e~a; e-fi
anima dohomem ..vê,o an.imus da mulher e reage a,f~l~:
Então, como vocês, podem ver,. esse intercâmbio pode fij
car bastante complexo. Quandoduas pessoas entram em
disputas ou desentendimentos, uma consciência dessa
fenomenologia estr-utural é uma ajuda para se resolver
os problemas.
.
.
o Si-mesmo
7
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O Si-mesmo é algo -realmente·imenso. É com ele ,que
você se encontra ao descer:ao fundo do inconsciente co­
letivo. Uma das características dà-experiência;do Si-mes­
mo é que ela nosJeva a uma consciência .de que existem
dois centros na psique. Essa.foi uma desçobérta,gran­
diosa do século vinte, feita por Jung, a existência 'de dois
centros na psique individual, em vez de um. O ego é um
centro, e o Si-mesmo, o outro. E quando a experiência do
Si-mesmo irrompe no indivíduo, na mesma hora terp-se
a noção de que: "Não estou sozinho, em' minha ,própria
30
casa, existe um outro que viveu aqui durante todo o tempo,
e eu nunca o conheci", Essa é uma experiência grandiosa.
O protótipo disso é, naturalmente, a experiência do
outro externo; todos nós vivemos essa experiência bem
cedo em nossas vidas e aprendemos a nos ajustar a ela. A
criancinha perCebe que não é o centro do universo, que
existem outros centros que exigem a' mesma considera­
ção que ela. Isso então leva ao fenômeno da socialização
do ego, à percepção do outro externo. A experiência do Si­
mesmo é a versão interna dessa experiência e, em alguns
casos, o impacto é tão grande 'que estilhaça o ego. Pode
gerar uma psicose, esse tipo de experiência. Mas quando
o ego está desenvolvidó o bastant~, de modo a ser capaz
de viver essa êxpetiênciá, torna-se possível assimilá-la.
Agora, o que acontece com certa freqüência é quê, se
há algum sistema' 'religioso ou mitológico à disposição do .
indivíduo, a experiência sêrá assimilada den.tro dessa'
formulação religiosa em.particular, e sêrá descrita como'
uma experiência de Deus,dentro'dos preceitos dessa re­
ligião. Mas o que temos em mãos agora, pela primeira
vez, é a oportunidÇ\.de de .criar uma ciência empírica que,
diz respeito a 'esse'nível de realidade: psíquica. Sempre
tivemos inúmeros credos de diversas formas; mas nUI).ca'
tivemos uma ciêncía empíriça desse fenômeno, e foi'isso
que Jung disponibilizou para nós.
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Individuação
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Individuação é um termo muito usado por J ung para
descrever todo, o processo psicológico no qual o ego torna­
se progressivamente consciente de sua'própria natureza,
de seu background, e da base à qual ele está ligado. Uma
outra forma de explicar a individuação é dizer que ela é o
processo pelo qual o ego toma consciência do Si-mesmo e
1
se relaciona com este; ou que é o processo pelo qual o ego
experimenta'uma diferenciação de suas iden­
tidades coletivas.
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\_' ';
O conceito de individuação abrange uma área enor­
me. A palavra possui'a mesma raiz de indivíduo, o que sig­
nifica que é muito. fácil confundir individualismo com indi­
viduação. Gosto muito, do Emerson, e ele é bem relevante
para toda essa questão, pois ele foi o grande expoente ame­
ricano da dignidade e da amplitude do individual Ele é
tas vezes mal compreendido porque as pesSOas aéham que
ele prega um tipo de individualismo egoísta, o que não é ver­
dade. Em seus ensaios está claro que ele tinha a consciên­
cia intuitiva,do que Jung chama'de Si-mesmo. Vocês podem
encontrá-la no artigo ~'The Over-Soul",F por exemplo.
O século dezenove ainda não possuía a consciência
conceitual dos dois diferentes centros da psique,'de modo
que o comportamElntQ egocentr::ido e o, comportamento
centrado no Si-mesmo-não podiam ser: diferenciados. Isso
leva a uma confusão e à má c,OmpreensãQ de pensadores
como Emer:son. Contudo, individuação não é i:pdividua­
lismo. O individualismo é o engrandecimento do Elgo, en­
quanto que a ipdividuaçãQ s~ refere ao processo por meio
do qual o sujeito descobre a rea,lidade do Si~mesrno, o se­
gundocentro da psique,e Elntão reJacionao ~eu modo de;
vida a essa liga:ção.
" ;. " ;~l' ,:j,
O paradigma clássico do mito cristão para esse tipo de experiência
é a conversão dEl Paulo no caminho de Da­
8
masco.1 Ele teve um encontro com o Si-mesmo,rsimboli_
zado pela imagem de Cristo, e esse encontr~'t~~n'sfo~mou
sua vida. A partir daquele momento: ele não eta,rliais um
homem egocentrado, m'as úmhomem centradQ.no,Si-mes_
mo. Ele chamou o Si-mesmo'de Cristo; pois essa foi 'a ima­
l7
18
32
Emerson $
Atos 9,
artigo ix.
gem por meio da qual ele assimilou a expe:-iência. E, de­
pois disso, em suas cartas, ele descreve a SI mesmo como
o "escravo de Cristo" (a tradução inglesa suaviza a ex­
pressão e o chama de "se1!Vo",mas ,no original encontra­
mos d'u'ls, que significa escravo). Esse é o efeito de um
encontro decisivo com o Si-mesmo: Ele' gera um contato
com uma autoridade que carrega um tipo divino'de qua­
lidade, de maneira que o sujeito sente-se obrigado a sere
vi-la. O resultado é que o ego fica' relativizado. Essa'é a
maior conseqüência da individuação" o que ,é muito:dife~
rente de individualismo, ;. -.
,'.'" .
Anteriormente, falei ,dó ego como se fosse um-peixe
em uma lagoa, que nãdtem consciência do meio rtoqual
ele vive. Da mesma forma, o ego primitivo e imaturo existe
basicamente em identificação com seus arredores., Ele
possui apenas uma.consciência,frágil de sua :existência
individual. A maior parte das energias e dos efeitos da
psique são experimentados como algo externo. Isso está
expresso naquilo que chamamos de fase animista da reli­
gião, quando espíritos animados são percebidos como en­
tidades existentes em nossos arredores: "Algumas á1!Vo:
res ou animais possuem espíritos animados, e uma pessoa
primitiva, ao ter de tomar uma decisão, diria: "tenho de
consultar o meu espírito da árvore"; ou "tenho de consul­
tar a minha cobra que vive em um buraco ao lado da mi­
nha cabana". Esses são exemplos do que chamamos
animismo, e eles ilustramo'fato de que.a psique primiti­
va encontra-se exteriorizada:..- o individual está espalha­
do por toda a pàrte:,' ,_. \1 ,
Algo semelhante 'acohtéce"ao hbmem,modetno nos
primeiros estágios de desenvolvimento egóico. Todos nós
começamos identificados com o ambiente e com as pes­
soas que se encontrarn nele. É isso que torna -a opinião
dos outros tão extraordiríariamente.ünportante para os
jovens - a psique deles encontra-se nos outros.,
;,.
33
Agora, o processo de indi~iduaçãq, cómo Jung o con­
cebe, é um processo atr,avés,do ql!-aJ o indivíduo coleta,
progressivamente, esses pe,daços de simesnw e "devolve­
os" ao recipiente ao quaIeles pertencem. BoIll,"devolver?
não é bem a palavra çerta, pois, p,ata cOmeçar, eLe$ nuncá
estiveram lá. De qualquer modo; ~(transfere-os" de ,S1.la lo­
cação externa pÇlr~ a unida,qe conteI1tora, qa psiql,le indi­
vidual. E ao fazer isso, o indivíduo descobre coisas notá­
veis. Ele descobre que ~ dife,rente de seu grupo, de $e11S
amigos, de ~elJ cônjuge.
Veja, enquanto nos identifica,rIllos, torÍ:l, o.utras pe,S­
soas, ou com U!l1a outra pes,Soa, estfl1l10S admitindo, auto­
maticamente, sem nenh-q.ma reflexão, que certas qua,li;­
dades ,e,experiência$ básjca,s e$U~os.endo co..wPÇlrtilhad.as.
Ent~o, é l!-mª_revelaç~o e tanto de_$cobrirquen,ão, Çlol.,i­
tra PI?Ssoa ~ bem separaqa, com e~periência,s,e percep­
çÕ,es bemdiferente.s, Ull1 mundo totalmente dif~re.p.te, n,à
verdade: ",
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Essa,s descobertas. são' toda,~ ,partI?, dPPTocessQ.ge
individuaçi~.9, nQqual o indivíduo discrirp.ina-:$e, ,ç~da ,!,ez
mais, da participation mystiq~e iniGial-,esse ~ Um termo
técnico empr~gad9 .Q:~ psicologia jUI!~ianaL qUe yem do
sociólogo ~~'\{!:Bruh!,.19~pois descreve de maIJ.eir,a muito
adequada o e~tad9 do ego pr:im~~iyo identificado cqmseu
ambiente. Pess.oas,relatiya:n1ente maduxas nãoqeve,riam se gabar de est~r livres d~participCftion mystique, poi$, podem acreditar, não esta,mos livres dela,. Durante_tQda, a vida descobrimos pequenos. pedaços de pçxrtiç.,ipation mystique, em lugares onde supomos p.avE)r algm;n tip9 de identidade quando, n~verd.ade, estawos lidandocoPt pro­
fundas diferenças individua,is.
.
,
Claude Lévi-Bruhl (1837-1939) foi um filósofo francês.cujo estudo sobre
a pSiCOlOgia dos povos primitivos deu à antropolo~a: uma nova abordagem
para a Compreensão de fatores irracionais no pensamento'social,'na religião e
na mitologia primitivas, (Nota do Editor)
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34
Ao longo do processo de diferenciação da identidade
e realidade individuais dos outros e do ambiente, o indi­
víduo também se diferencia dos fatores internos. Vejam,
essa desidentificação procede à medida que o 'processo
analítico revela os .fatores internos, como objetos.
Uma vez que um fator interno é percebid(l como um
objeto de escrutínio, ele é percebido em ~ua diferença e o
ego não pode mais identificar-se.:com ele. Assim, o indiví­
duo pode tomar consciência da sombra, e se. relacionar
com ela, sem cair numa identific'ação com ela, ou projetá­
la. Projeção e identificação são duas versõ~!S do mesmo
fenômeno. Da mesma forma, quando oindivídúo torna­
se ciente do animus ou da anima, ele não cai máis nem
em uma identificação com a imagem nem em uma proje­
ção. A mesma coisa acontece ,com o Sio-mesmo.
Então, esses são os procedimentos, procedimentos de
longo prazo. Aindividu.ação é uma tarefa para avida toda,
e só pode ser alcançada q:uando uma quantidade signifi­
cativa de energia é aplicada,a ela. Ela não é um trabalho
de meio período 'porque ela é,o próprio processo da vida;
ela incorpora _tudo 'o que acontece em,nossa vida. ' '
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Implicações' s~c,iais;
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À medida que: o ind.ivíduo progride no processo de,
autoconhe:cimento, qu,al alimportância 'de' se apmU'''':
der sobre cada, um desses items, dessas funções, que aju­
dam a compor'aestrut1:lrada psique'da forma,como,des~
crevi?
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O ego é,o ponto,dê.p.artida'pÇlnltudo._Umdos objeti­
vos do processo de. vida,~ do processo natural de vida, bem
como do processo de análise,é,o,desenvolviinento do ego~
Não há como passar porumà. análise de verdade, por uma
confrontação efetiva cóm o'Ínconsciente"a não ser que se
tenha um ego viggroso, responsá~el e ético. Antes disso
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não há como colocar em prática uma'análise 'profunda,
apenas uma psicoterapia de apoio 'que promova' o desen_
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volvimento do ego. "'" ',')', " ,,',
É de vital importância, em termos de umal estrutura
social estável, que os/membros da soCiedade tenham egos
bons, fortes e confiáveis/Isso' significa que eles precisam
ter uma percepção:autêntica.de sua própria identidade;
eles precisam ter adquirido uma estrutura de 'caráter que
lhes possibilite funcionar de maneira responsávehm re­
lação às outras pessoas./Iüâoisso é produto do desenvol­
vimento do ego. Assim, para começar, o desenvolvirriento
do ego é bom não só para 'o indivíduo; mas também para
a sociedade. , ;, '"
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Consciênciáda pers~ría
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Agora,. qual é o'valor,'para oiindivíduo ou para'aso­
ciedade, de se ter uma ,consciência da persona? Aqui nova"
mente, assim 'como em.todo o autoconhecirnento,tanto o
indivíduo 'quanto a' sociedadel são' beneficiados., 'Vejam; é
muito comum, em maior ou menorigrau;'que'aiguém'se
identifique com a própria persona. É tão conveniente. Já é
bem difícil ser competente na área profissional e, .uma vez
que se adquire essa competência, as s'atisfações d~ssa con­
quista são tão' importantes que existe forte téndência de o
indiVíduo se identificar Com esse papel profissionaL,. ',í ;
Assim, o sacerdote adquire uma persona apropriadáJ
ao passar pelo seminário, e começa o seu ,primeiro traba"
lho como pastor assistente; o estudante de medicina ad~
quire a persona médica, o advogado adquire a sua; e as­
sim por diante. E, uma vez adquirida, aS'coisas funcionam
tão bem ao colocá-la em operação que existe forte tendên"
cia de se identificar com ela.iMas o problema é que; 'para
a sociedade como um todo, quando alguém se 'encontrai
com o seu médico, seu pastor, seu ,advogadoj'Qu COm'o que'
36
/.
uer que seja, não está encontrando com um ser humano
~teiro. Está encontrando-se com a máscara.
Posso lhes dizer que isso é um grande problema na
medicina. Os médicos são muito o~upados e ser uma pes­
soa real demanda muito tempo. E muito mais fácil fun­
cionar através da persona médica. A grande vantagem
disso, embora temporária, é que não é ,necessário fazer
muito esforço, você não precisa dar um retorno aos pa~
cientes a partir das realidades humanas mais profundas.
Assim, você pode produzir muito mais em um dia;, pode
visitar mais pacientes." L.eva muito mais te.mpoescutá­
los e dar um retorno mais humanoe isso lhe. deixa com­
pletamente atrasadono,s.eu,hQrário. ,~, "
Tudo isso é compreensível. :Masseo auto-conheci-'
mento está emjogo ese .0sjndiY~duos qu~r~m ;=ttingir uma
personalidade completa e'simétrica, é importante que
eles percebam a re;=tlid;=tde da:!Jer$ona e 9 fato de que ela
não é idêntica ao ~gQ, Se eles, ,pqr aca.so,identifiçam-se
com ela de vez em qUq,!ldo,, dev~mrentenderque estão
diminuindo a si, mesmos. Uma vez que ess,as coisas fi­
cam claras, a id~ntificação inicial é quebrada e,m esmo
que você escolha· funóoI).ar; ,a, partir ,da persQnaem, al­
guns momentos"você 'sabe.o, que está fazendo . .faz uma
enorme diferenç~ o fato ,de se,fazer,algumaeoisa cons­
ciente ou inconscientem«;n.t~, pois a ~scolha está emjogo.
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Consciência da.sdmbfà'f.
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Indo para o proxtmo iteIIl,q. sombra, qual é a vanta­
gem social de se estar consciente dela? Posso lhes dizer
que a vantagem 'é imensa, porque enquanto o sujeito está
inconsciente da sombrk, ela'é projetada, normalmente em
uma pessoa oU'grupo quefotnece'algum gancho, alguma
qualidade' qUe, 'talvez apenas em um pequeno grau,
corresponda/àrnatureza da própria sombra do sujeito.
37
Quando isso acontece, o projetor passa pela .qeliciosa ex­
periência de localizar o mal. Ele está ai,em você. Agora
eu sei o que devo atacar parai transformar' o mundo em
um lugar melhor. Nas projéções de sombra menores, tal­
vez nenhum dano muito sério seja causado. Apenas um
arranhão na mecânica comum das relações'humanas or­
dinárias. Mas quando ela,câmeça a'funCionar em-escala
coletiva, é um desastre. _
'. :,'
Eu nem-preciso: dar exemplos disso,' pois eles .podem
ser vistos sempre que se,tem umá facção em oposiçao a
outra, atribuindo. todàsas intenções' más; sombrias, se
não diabólicas, ao inimigo"Vemos isso acontecerem to..:
dos os lugares. É Umá conséqüência- da 'projeçãó da
bra, e. é1realmente uma .vergonha;· hoje :em dia, um ser
humátio iupostarrrente maduro ser pego'em pUras proje,
ções da sombra. Mas,vergonha oil não,; acontece' o tempo
todo e traz enormes danos à nossa estrutura s'ociaI.;
Desse modo, à medida que um indivíduo, por meio
de um Processo analíticoóu.qualqueroutra coisa, toma)
consciência de sua sombra, é menos- provável que ele a
projete. Ele passa a reconhecer que à qualidade, idéia, Ou'1
estilo de vida particular-que e tão irritante na outra pes-'
soa é, na verdade/timaexpressão de sua própria 'sombra,:
que é responsável pela irntaçãd; ,Pod'eínos- tetcoisas de
que gostamos ede·que não gostamos, mas quando certo'
nivel de afeto entra em ação; essa é uma indicação infalí­
vel de uma prOjeção dá sombra. Aq lieles $Ue es,tã ;IWonSj CIentes de Sua própria sombra são uma enormeoameaça ao bem-estar da socü~dadeco1no'lúri todo. ~ .,: _ /, . ~
~
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Consciência do animus e da anima '.~,. 'J',p
Sóm~'
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~aíspro:(u~dq.doih:;
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Aqui chegamos a umq.camada
consciente, onde os aspectos sociais,não pogem,se;.,de.!j_
Crttos em termos tão simples, Elesestão,presente,s"mas
38
são muito mais complexos. Certamente, podemos dizer
que alguém que possua até mesmo uma consciência ru­
dimentar da realidade da anima ou do animus irá se re­
lacionar com o sexo .oposto de uma forma mais autêntica,
mais consciente, mais profícua e mais realista.
Afinal de contas, a relação entre os sexos é funda­
mental para todo o processo social. A família baseia-se
nela, e a criação dos filhos, seu hem-estar e desenvolvi­
mento psicológicojnicial, em muito depende do nível de
relacionamento consciente existente entre os pais. O tipo
de relação compreensiv.a, ' que consegue suportar o inevi­
tável conflito dos opostos, beneficia-se de uma conscien­
tização do animus.e daanima.\ Com,essaconsciência,
evita-se a projeção mais·pura.e a pessoa pode. se relacio­
nar com o parceiro a partir. de sua:realidade" em vez de
relacionar-se a partir. das expectativas. ilusórias, que se
tem quandot.se projeta:a' anima ouo.animus. no.parceiro.
-'t't :-
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Consciência dó Sicmesmo
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'~,
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Como eu já .disseantes, o Bi-mesmo é o centro e a
totalidade da 'psique. ,Um de seus sinônimos é a Imagem
de Deus interna. Ele é.a autoridade transpessoal da psi~
que. O egoé. a autoridade menor, o Si~mesmo, a maior,
Quando o indivíduo estabeleceum.c.ontato c.Om o Si;:mes7
mo, o ego se relativiza; ele reconhece que sua vida deve
ser governada por uma autoridade superior a ele mesmo.
Agora, o que talreconhecjm€ m to tem a~ter'éoma so­
ciedade? Muita coisa, na verdade. De certa forma; pode­
mos dizt7f q~e -à' sociedade é '0 e$pelho exteriorizàdo da
psiqu-e' individuaL Todà sociedade: possui alg'úirl tipo de
líder '..:,:U:Ín: reÇpr~sidente','6u primeiro~r:ni~istró.Às ve­
zes, é uma oligarquia de aristocratas. Contudo, para que
uma soCiedadéseja cresa é' orgânica, ela sempre precisa
ter umà aütoiidade~entrar,e essa autoridade social.cen~
traI, externa, é um espelho da autoridade interha-do Si­
mesmo. Ê por esse motivo que, quando se, sonha com um
rei ou um presidente ou com uma capital,na maioriados
casos esse sonho se refere 'ad Si-mesmo. '
,
O que está emjogo aqui é'a relação do'indivíduo Com
a autoridade. Se ele não possui 'umaconexão com o Si­
mesmo e, particUlarmente, quando.oego é fraco, quando
existe um baixo nível de diferenciàção~Psico1ógica _ espe~
cialmente em tempos de distúroios sóciais'e.angústias-i­
há forte tendência do Si-mesmo, o 'princípio da' autorida­
de organizadora central da psique, ser'projetado.
Em tempos de corifusão,' o aspecto compensatório da
psique é ativado;~ a desordem constela a 'Ordem ~, em tais
circunstâncias,. a ordem é, em:geraI,impo,sta com um'grau
de disciplina e,autoritarismo:: ~ ' : ,
...
O que pode acontecer em tais casos são projeções- co'"
letivas maciças do Si-mesmo em um líder, um Führerpor
exemplo. Isso aconteceu na Alemanha nazista, e temos aí
uma lição da magnitude, quaseinimaginável, dos perigos
da projeção, da projeção coletivá, do Si-~ésm~. Também
podemos observá-Ia'em~todos os tipos de; cultos religiosos
carismáticos e,. em menor escala, em todos os lugares. QUàn:
do perdemos a contenção exercida por nossos mitos religio~
sos convencionais;'esse perigo' cresce. Essa éa maior amea~
ça à humanidade,t muito maior: do 'que a boinba 'nuclear.'1
I'
tl'" ' '.' _1~.
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J.\ ' : ~ .' ,,"";., ;~
Transformação ~~Jíp~~eWAe Deus ' I ! d
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~,fi il
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Jung coloca
esse ~onceitó
de, f9rll1a
muitõ sucinta .éní
"
, '
, ' ) '. ')
p, ,- , . " : •.'
Resposta a Jó', quando diz:
age
sobre Ele". 20Vejam, ess~:ç mp~ q~çl#raç~osiP1Bólica. ~:m
,'I·' ; "'I" I
" ,
11
1;.,)'.'.
i ,.,' " , "
0,1" "
"Q1f~rp:c~~heç~;fJJe~'H'
I,
I
l,
tamb~m
: f
I
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'.
r"
) "
:'
~.
PSYChology and Religion, CW n, par. 617 ..yer
Eclinger, Tran.s,­
formatLon ofthe God-/mage: An Elucidation ofJungí; Answer to' Job, pp. 60s.
(Nota do Editor)
"
"
, , '1,
20
40
.:~"
"
termos psicológicos, o Si-mesmo precisa do ego, da cons­
ciência e da relação do:ego'para com ele" para que possa
ser transformado. Assim; colocamos essa idéia em nossa
linguagem psicológica' neutra.. ,. (:'
O Si-mesmo, ou Imagem de Deus~ .em sua forma in­
consciente, como eu jádisseantes,.ê uma.união parado­
xal de opostos. 'Esse é o;solo, de nosso, ser psicológico, e o
Deus cristão do·amor.é;apenas.uma metade dela. Ê por
isso que Satã nunca desapar:eceu;ele leva uma existên­
cia isolada, mas ainda está por aí. Jung nos demonstrou
que Cristo e Satã são os dois filhos, os dois filhos opostos,
da mesma diyindadeJparadoxal.~,.l.E- quando' essas ima­
gens chegam 'ao alcanceda'experiência empírica,elas.
requerem algum tipo de reconciliação. Elas geram um
conflito interno. intoleráv:el até"que. atinjam alguma re­
conciliação, e isso! é'o que acontece quandoo',indivíduol
encontra a Imagem: de 'Qeus primordial: em seusr opostos:
paradoxais. Ele experimenta a'ativação· do conflito ine­
rente à natureza da divindade. No entanto, também está
contido em toda essa' dinâmica p potencial para a união:
dessesopostos,que,Jem p1uitos casos;· pode ser ·alcançad&
no processo de1individuaçãó por meio ,da imaginação ati~
va. A conseqüência:disso<.é:que'aJpsique,não mais, se en-';
contra dividida.' ,) ~);" ' l , \ I . ' Í '
' • ' >',-,
A psique cr,istã~estádividida,:eisso englobá. a todos)
nós. O fato de você professar ou não o.cristianis~o é irrele'é
vante; ele faz,partelda psique coletiva' compartilhada por
todos nós\ ,de modo 'que .estamos:,todos divididos,. pois a,
Imagem deBeusestá,di\iididaiNaNerdade; a divisão ocor­
reu antes mesmo do cristianismQ;ela ocorreu com Platão
e os Estóicos; de forma que ela !possui uma raiz filosófica
também:'Mas::essa diyisã9,·!~.ssa. duplicidad~ paradoxal
21 Ver íbid., pp. 11,81, 121s., e Edinger, The Aion. Lectures, pp. 565. (Nota
do Editor)
da divindade, é o que sofre uma reconciliação':etransfor­
mação quando uma consciência humana individual com­
promete-se com essa questão profunda. em sua própria
vida. Assim, essa pequena parte da psique coletiva car­
regada pelo indivíduo é transformada. Se um :número
suficiente de indivíduos passa. por essa experiência e,
desse modo, participa dessatnansformação da' Imagem
de Deus, eles agem como um tipo'de, influência para a
sociedade como um todo e, de maneira bastante' gradual,
surge uma nova Imagem de Deus coletiva.
Bom, esta questão aparece· muito no pensamento
moderno: "O Cristianismo 'está cornos dias contados? Será
que ele está Iseesgotando?" Jung, fala algo ml,lito inte­
ressante a esse respeito. Ele diz que omito cristão possui,
nele próprio, como parte de sua estruturatemática, a morte
de Deus\Vamos ver se eu consigo explicarisso,:pois acho
que é uma questão de muita impoItância.
Segundo o mito cristão; e eutrabalho'em cima~disso
no meu livro The'ChristianArchetypel:Deus desce à ter­
ra ao encarnar..;:l si' próprio como, homem, por meio da
intervenção do EspíritoSantó,.que engravida.a Virgem
Maria. Deus vive/então, ,na forma'de ,homem; uma vida
humana na terra. Ele sofre uma pai 4 ão, morre; ressusci­
ta, e aí ascende aos céus. De modo que,' éI?;l sua forma
encarnadá, Ó, mito descreve ~a divindade pàssando por uma
morte. O que' acontece, então, depois' de.lsua morte,.'se"
gundo o mito cristão, é que' .0. Espírito Santo .desce mais
uma vez durante o Pentecostes~ E dessa vez, ,de ,acordo
com o dogma, nasce a Igréja~ OPEmtecostes'.é consid.era~
do o nascimento da Igr!')ja;,Assim; o ciclo.da,.encarnação
se repete: o Espírito Santo, a.dí:v.indade, de$ce ,e encarna,
por uma segunda vez na Igreja; que se autodenomin~o
corpo de Cristo.
22
42
Então, segundo certos teólogos ,23 a Igreja como o cor­
po de Cristo é obrigada a viver a mesma seqüência fatal
de Cristo. IssO significa que a Igreja também deve passar
por uma paixãO e uma morte. Pois a Igreja projeta esses
eventos lá para o dia do juízo final, para o mais longe
possível. Mas, do ponto de vista psicológico, devemos con­
siderar que isso está acontecendo neste momento. Com a
Igreja comO o corpo de Cristo, a encarnação coletiva de
Cristo, por assim dizer - Cristo foi a primeira encarnação, individual, a Igreja foi a segunda, coletiva, que também precisa passar pela paiião.e pela morte, e pela ressurrei­ ção _, segundo o meu ponto de vista, aressurreição inicia­
rá um terceiro ciclo, no qual o Espírito Santo se encarnará noS próprios indivídttos.
.
Esse é o argumento de Jung. Como vocês podem ver,
quando eu o esmiúço dessa forma, ele se'1ll0s tra uma conti­
nuação e reinterpretação consistente e bem apropriada do
mito cristão. Jung tinha, na verdade, uma grande.preo­
cupação de que o mito cristão não 'se perdesse para:o ho­
mem moderno. O que ele forneceu foi uma reinterpretação
transformativa,do mito, com a noção da encarnação contí­
nua, a qual preserva. todo o rico simbolismo cristão, agora
compreendido em um nível intiividual, psicológico. É assim
que consigo entender o que significa uma nova época, e é por
isso que Jung é, para mim, um homem que marcOU época.
Estamos caminhando para graves distúrbios na es­
trutura social coletiva da 'sociedade ocidental. Jung esta­
va atento para isso, e chegou at~ mesmo a fazer a notável
afirmação, em uma carta, de que ele escreveu "Resposta
a Jó" porque não queria deixar"que as coisas se dirigis­
u
sem para a'catástrofe'iminente}4 Q que ele .revelo na­
;."' ~ J "
23 Por exemplo, o teólogo católico Hugo Rahner. Ver ibid., pp. 17, 128. (Nota
'..
do Editor)
24 Letters,'vol.·2, p. 239: .
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I
' . '
,
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•
"
.
43
Ver esp. pp. 128s. (Nota do Edito~)
- ------"
dO:lC com a consciência humana. É isso que a transfor­
ma.alEsse é o processo que vejo agora em suas fases ini­
ciais e que, acredito, continuará com uma intensidade
cada vez maior na coletividade.
Experiências da natureza do holocausto nazista são
eventos psicológicos, expressões da psique humana cole­
tiva. Elas não são desastres naturais, não caem do céu;
são eventos psicológicos, fenômenos que ilustram a natu­
reza da psique coletiva. É isso que noS aguarda ao atra­
vessarmos a transformação catastrófica da imagem divi­
quela carta, de maneira lÍluitofclara;(é~qlle "Resposta a
Jó" é um antídoto para o apocalipse. Se pudermos com­
preender "Resposta a Jó", estaremos em uma posição, do
ponto de vista psicológico, de'sobreviver ao vi.olento ata­
que do apocalipse, da transição de uma época para outra.
O que isso significa;.sem querer. resumir ó:livrotodo,
é que há um processo em andamento" no qual a Imagem
de Deus está passando por uma transformação, e que o
processo dessa transformação.requ.er.que haja'uma çons­
ciência. humana dessa natureza divina, pÇira,que ,eJa pos­
sa ser transformada.rEsse,é um bom·resu~.o dessa idéia.
Vou repetir. Aessência de "Resposta ,a Jó", que pode levar
o indivíduo a .sobreviver psicologicamente ao apocalipse,
está na percepção de que o apocalipse.é·llm-processo na
transformação de Deus,no qual·, ·por meio da entrada na
consciência humana, a natureza divina pode transformar­
se. Tudo 'isso está dito na Bíblia, no Livro de J,ã. El,l t,am­
bém discuto essa questão .no meuJivro sobre a série de
gravuras de·Blake para o Livro de JÓ. f5, '.. ~Vejam,'uma.parteda natureza divina (e lembrem-se
de que esto.u falando de maneira psicológica, não meta­
física) é que a Imagem/de D,eus é uma união .,de, opostos.
Não é.apenas Cristo"mas.também Satã, Não é·apenas
Iahweh do.Livro.de Jó, mas ~q.mbém.Behemoth e Leviatã.
E essa Imagemde,D.eus paradoxal, cOm su,a natureza
dupla, passa por um processo .de transformação ao ser
experimentada pela, consciência,humana-. Ser vista, pela
consciência humana é o agente de sua trallsformação, um
indivíduo de cada vez. Ela-não acontece coletivamente,
em um comitê; mas emumindivíd:uo de,cadayez, naque~
les que experimentam a,ambigüidade divina e, ,no pro­
cesso dessa experiência, penetram nesse Si-mesmo para-
na de uma era para outra.
O mundo pende em uma linha estreita, e essa linha é a
psique do homem. Hoje em dia, não somos ameaçados por
catástrofes dos elementos. Não há, na natureza, nada pa­
recido com a Bomba H - esse é um feito absolutamente
humano. Nós somos o maior perigo; a psique é o maior
perigo. E se alguma coisa sair errado com a psique?26
,.:l :
~j'
.
,.1
25 Ver Encounter with lhe Self: A J ungian Commentary on' Willi(,lm Blake's
Illustrations of the Book of Job, esp. pp. 53ss. (Not~ do Egitor.). . "
44
26
,
\
.)
'.
'I
" ..
Jung, "The Houston Films", em Maguire and Hull, eds., C. G. Jung
Speaking, pp. 303s.
L-·_.. . -_. ,-­
45
2
~: ENCONTRO
'I!
COM A PERSONALIDADE MAIOR
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I,
'11.
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I!
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I,
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Alguns anos atrás, falei 'sobre o Llvro de Jó,' c~m uma
ênfase especial' nas gravuras'que Blake fez para esse li~
vro.27 A minha fala hóje é' lim'éncadêamEmtb lógicüdessé
assunto,' ou' seja,' o' te~a do'Jénco'ritro do ego com o Si~
mesmo, o centro regulador da' psique,
Essa é á c~rátteristica básica da psicologia junguiana
_ o ego e como ele se reláciona com a realidade do Si-mes­
mo, A psicolbgia jtinguiana é a únicavertentê da psicolo":
gia que parte 'da idéia de que'há dois centros' na psique:
Algumas outràs linhas, outras abordagens analíticas, es­
tão cientes dê. que há duas entidades na psique; o incons­
ciente é uriia'ségOOda entidade: Mas nenhuma outra linha
parte dopiÍrlCípio de que há dois centros. Isso é exclusivo da
psicologiajunguiana. Ejá que existem dois centros, se essa
idéia chega a toiç1ar-se' cOl!s~iente, es~es dois centros de­
vem colidir, 'eles devem ter um e'ncontroum com.o outro,
Isso acontece quando o ego, que é o pequeno centro, tem um
encontro com o Si-mesmo, o grande centro. ,
Toda a análise psico~ógica não émáis do que um'pre­
lúdio pa~a ess,a e,xperiência, o encontro com o Si-pesmo.
Vejam como Jung ,çoloco,ll essa.idéiFl-:, , . 7 " . . " ,; . \
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A Anunciação à VIrgem, por Mathis Nithart (Isenheimer Altar, séc. XVI. Unterlindenmuseum. Kolmar)
. (
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. (.
27 pubI.icado como Encounter with the Self A Junguian' Commentary on
William Blake's Illustrations ofthe Book of Job. (Nota do Editor)
47
A análise deveria liberar em nós uma experiência que nos
fascina ou que se lança sobre nós como se viesse de cima
uma experiência que tem substância e corpo, como o qU~
ocorria com os antigos. Se eu 'fósse simbolizá-la, escolhe.
ria a Anunciação.?'
,
~; :'
Bom, uma coisa que pode acontecer é que essa expe­
riência, embora seja preparada pela análise, pode não acon­
tecer durante o período da análise propriamente dita. Ela
pode acontecer muitos anos mais tarde. Nesse caso, o su­
jeito irá se sentir muito grato por possuir algum conheci­
mento consciente sobre a psicologia junguiana. O sujeito
tem um mapa, por.assim dizer, que o ajuda a encontrar a
conduta1apropriada no momento em que essa experiência
lhe cai dos céus. Ele pode dizer com Jó: "Ouvi falar de ti
pelo ouvido: mas ago'ra :viriun-te meus olhos" (Jó 42,5). É
isso que acontece quando se t~m tal experiência.
Ela também acontece sem o auxílio de nenhuma aná­
lise, e pode acontecer sem que se tenha uma preocupação
particular com o inconsciente. É por isso que acho extre­
mamente importante falar sooré'o Si-mesmo em público.
Nunca saberemos quando est~mós falando com alguém
que já teve ou que está para t'elumà'~xperiência dessas,
e essa pessoa pode lembrar-sé"do dh~ foi falàdo e isso
pode ser de grande ajuda nas hOra·s.de aperto. Eu sei, por
experiência, que essas coisas acontecem.
Então vamos falar do Si-mesmo. Mas o que é o Si­
mesmo?
A natureza do Si-mesmo
Como eujá disse antes, o Si-mesmo é o segundo cen­
tro da psique, e o ego éd pnmeir6:J Para:se dizer'u:mLpou­
co mais, ele é o centro opjetivo, em oposição ao centro
.. : i .
-', :
28
48
Seminar 1925, p. 111.
'I t
).
~
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subjetivo. É o cen~ro tran~pessoal, que inclui ,tanto a cons­
.ên quanto o lllconsclente. . .
..'
.. S
CI cia
,
.
IssO não é uma teona,
masf
um atO. PrecIsamo
usar
palavras para descreVer os fatos, mas posso garan,ir-lhes
que estamOs falando de um fato, que p~de se"comprova­
do pela experiência de llluitas pessoas. No entanto,
ece ê
por muito difícil descrever o Si-meSmO:, Qgue, I:!CoI;lt
ele ser uma entidade maior do. que:o egp, oJl.lWsiglüfjça que ele não pode ser compree.ndido,.nãO PQO,e$er:.abl?-rça-: do. em toda a sua extensão, pelo ego. por esse motivo, não pOdemos defini-lo. Para podérino s defini,' áli;Um"'Ópisa, ela tem de ser menor dQql1;e
Isso é
~
~ ó~go que'.·a.
~ define.
I...
contraditório e paradox ;3.I,p.o.qV.e C;op.cer,I:t.e }i$ c~tegorias
de compreensão do ego.:E,.assim comO, a pedra filosofaI
dos alquimistas, ele possui muitos sinônimos; que expres­
sam as diferentes facetas d~ssa reaiídade complexa. Um
dos sinônimoS ql,l~ rltmg propôs para o Si-mesmO é Perso­
nalidade Maior, e "e1>sa é a. entidade específica da qual
,
•
• J
_.'
-
•
j
,
vamos falar esta noite.
Jung introduz esse tema em seu artigo "Concerning
Rebirth", onqe elefàla da individuação comC! "um proces­
so demorado de transformação interna e do renascimento
ser",I:e ')C1;
assim
vai:
em um outro
"
;,)~'
s ;~?l'L~r~;
1:
~ ~
Este. ".Ol!..t:r:().>s,er'~ éo ouwü~Jjl ;nós"a,.personali~ade fU~1,1ra.
mai!3
.. ÍlIJ:..l
p'or
é.
confortante
noS. ao
amigo
,
,para
"
í ' encontrarmos
,.,
. .•
" o.......
,.
"e
compa- .
mo
nheiro reproduzido num ritual sagràdo, c9 ; por ex'em­
RIo, naquela(relação de amiiadeéntre Mitra eo deus
É a,representE1'çãO de' uma amizade >masculina, ,imagem
externa d~ \lW.fatoJ}:lt~rnQ: .tratacse da:çepresentaçãoda.
relação com o ,ap;tigp ,inter.nq da,alma,np,qpfl\ a. própria
natureza gostaria de noS transmutar: naquele óutro, que
tambérh sdmo ;: e que nunca chegamos' ~á.lcánçar plena:
s
mente. a;nomemé'b'par de Dióscuros;:eheque'uin é mor­
tal e o outro, imortal; 'sempre estão juntos e apesar dissO
nunca.s transformam inteiramente num só. Os proces­
e
sos de transformação
pretendem aproximar ambos, a cons­
~D,1pl,!};
'l,
"
a~tgo,}pt~r,n9 ~l}~I?1~'
.
~~so ~lgo_
SoL~
49
ciência, porém, resiste a isso,. pQrqge o outro lhe parece de
início como algo estranho e inquietante" e não podemos
acostumar-nos â idéia de não sermos senhores absolutos
na própria casa. Sempre 'preferiríamos ser' "eu" e mais
nada, Mas confrontamo_nos com o amigO'bu inúnigo inte­
rior, e de nós depende ele ser um'ououtro. 29
•
:'
t
'
É aí que Jung introduz o tenno Personalidadé Maior,
mas nesse mesmo artigo ele descreve o encontro do ego
com a Personalidade'Maior nessas importantes palavras:
culmi~ante
qU~'
Num pont'o'
da vida em
o hotão:se abre em
flor e do menor surge o maior, "um torna-se dois"; e a figu­
ra maior que 'sempre fomos, mas perm"anecia invisível
comparece diànté do homem que'fomos até então, com a
força da revelação. Overdadeir:amente pequeno e sem
esperança sempre reduz à sua pequenez a revelação do
grand~. f:l jam4is ~ompreenderá que o Juízo Final também
despontou para a sua pequenez. O ser humano intima­
mente grande sabe, porém, qúe o amigo da almâ; pelo qual
há tanto ânsiava, o imortal, chegou enfim de fato para:
levar "cativo seu cativeiro" (Ef 4,8), aquele'que sempre
trouxe em si aprisionado a fim de capturá-lo permitindo
que a ~!Ua 'vida dese~bocasse naquela vida maior.: um
momento dê perigo'mórta1!30 . '.
"
; ,.
'. r
.'.
'J
f,
Essa frase final nos atinge comb um raiá. Depois:de ouvir a bela descrição do encontro do ego com a Persona­ lidade Maior, ficamos sabendo apenà's no fim q'ue esse encontro é perigo só, de um perigo mortal. IS,sç faz,.refe­
rência ao efeito dano~o ,quEl o Si-m'esmo exerce sobre o
ego no primeiro encontro. Na pior das hipóteses,o encon­
tro do ego COm o Si,mesmo póde'desencadear uma psico­
se. E mesmo na melhor, o piimeiro edecisivo'encontro do
ego com o Si-mesmo traz consigo uma humilhação dolo­
rosa e um sentimento de derrota desmor.qlizan~e. Como
. . _J:,t
29
30
50
l."
1) Existe um enconf~o 'entre o' ego' e 'a Pe~sonalidade
Maior representada por Deu~, por um anjo ou um ser su­
perior qualquer."
"
.,
"
'
2) Existe uma ferida;ou uni sofrimento'do ego, em
decorrência desse encontro.
. '
3) Apesar da dor, <> ego 'persevera e resIste à prova­
ção, examinando a experiência .em busca 'dq s~u signifi­
t.
cado.
.
.,
4) Como conseqüênCia dessa perseverança, há uma
revelação 'divina,:mediante a qu~l o ,ego é'~~compensado
com um insightsobre a psique transpessoal.
'
Repetindo: há um encontro, unia ferida, u~à perse,
verança e uma revelação.
Darei quatro exemplos desse tema: Eles variam, cada
exemplo enfatiza,um a~pe'cto empa.rticular, mas, se olhar­
mos para todose'les juntos, eles' nos fornecem uma ima­
gem ampla da natureza desse fenômeno. Cada indivíduo que passa por essa experiência a vivencia de maneira úni­
ca; ela, nunca será exatamente como a de.Jó·Qu do apóstolo Paulo, nem como a de Nietzsche 0'l:l de quem quer que seja. Mas o conheCimento' de vários exemplos lhes ajudará a reconhecer o fenômeno quando vocês o encontrarem. lista
enorme partindo da his­
. . Poderíamos 'fazer uma
I
,
to ria cultural humana, mas: só para lhes dar uma breve
idéia, aquívão alguns e,xemplos: Jacó e o anjo de lahweh,
" j
'":
h
e
.<
• ' ..
The Archetypes
235 .
par. 217. and the COlleétiue UnconsCious, CW 9i, par.
'j
:
TL"
Jung coloca em outro momento: "A experiência do Si-mes­
mo é sempre uma derrota para o ego".31
A experiência de lesão ou de derrota faz parte do que chamei de arquétipo de JÓ. 32 Usei esse termo porque a his­
tória de Jó é um exemplo,bem apropriado desse padrão­ cujas característicascÉmt.rais são quatro: 31
My!,~erium
32 Ver
Ed,inger,
'Ansuier to Job; pp..2955,
,
par,n8 (itálicos no original).
God.[mage: An Elucidation of J ung's
51 ,.I:
li
~l
II
li
'(
.')
I
"
~
I'
=) sobre o qual falarei; o encontro de'Arjuna com Krishna,
sobre o qual falarei; o encon~ro de-Paulo com Cristo; o
encontro de Moisés. coin EI Kidhr, o homem verde, qUe
vocês podem encontrar na 18. s s ura doCorãoi o encontro
de Fausto com Mefistófoles no,Fausto de Goethe; o capi_
tão Acab e o encontro ,Coma baleia no Moby Dick de
de Nietzsche com Zaratustra, ,sobre
MelvilIe; o
o qual falarei; e, po:r;- fim,: aquele 'que est~ mais próximo
de todos nos, o enéontrode iung com Fi1emon, como ele o
Meníórias~Sonhos;
descreve
Reflexões.em
" seu
. livro autobiográfico,
!
,"
: ' , r,
e~contro
}t,
"."
"
Aqui, ficarei
" , apenas com os que 'se referem
, a Jacó,
Arjuna, Paulo e Nietzsche. Como prOCuro dar apenas' uma
visão geral desses exemplos, por favor; perdoem a manei­
ra resumida como trato cada um deles. É realmente uma
grande inj':'stjça'iratar' de forma tão'
epis ódios tão
profundos da história êultural da raçk'humàha. Aminhá
justificativa para tal é dar voc'ês uma idéia do arquéti­
po, e não conheço nenhuma forma melhor para isso do
exemplos individuais.
'Eles' vao,
'q ue apresentar
'.,
, I. breves
.
,
',,"
no mínimo; dar a vocês uma idéia da imagem simbólica
geral subjacente', que fu'ncíona com: algumas' variações
individuais.~ . ;, . '.
r,' ,
,
'.'
"
~reve
a
'J,
~
:.
~.'
'.
.,'1 "
"
',.
,
, ,
JaCÓ e o anjo de Iahweh '
,
.,
"
; -;
"~"~O,'
~"•
r~
j ,
Esse relato e~contra-se ~o capít~1;32 'do Gêne~Ú{
Vocês devem
que Jaéó
seu' i
Esaú o direito de primogen,iíura çoro um
e de:
pois, conspirando coms lia mãe
a
de seu pai, que pertencia, por direito,
o filho màis
velho. Então, Jacó teve de abandonar sEm país'para escá'­
par da vingança do irmão. Muitos anos depois, com duas
esposas e uma riqueza considÉwável, ele ~~Ve deret9rnar
ao seu país. Mas esse retorno significava qu~ ,ele teria de
lero~>:ar,~é d~
52
(i:o~ d~' rn;~ó
embu.~te;
)leb~ca, 'roV,bo,~, ~ênçà~
~ Esa~,
se encontrar com Esaú, o irmão que ele havia prejudica­
do tantos anos antes, e ele, certamente; estava com medo.
Sempre temos medo das pessoas que prejudicamos.
E na noite anterior ao encontro com Esaú, ele encon­
t;ou-s e com o anjo de Iahweh no. vau do rio Jaboc. A Bí­
blia de Jerusalém traz o seguinte relató desse evento:
E alguém lutou com ele até surgir a aurora. Vendo que
não o dominava, tocou-lhe na articulação da coxa, e a coxa
de Jacó se deslocou enquanto lutava com ele. Ele disse:
"Deixa-me ir; pois já rompeu o dia" .. Mas Jacó respondeu:
"Eu não te deixarei ,se não me' abençoares". Ele lhe per­
guntou: "Qual é o teu nomer - "J,acó", respóndéu ele,Ele
retomou: "Não te cháinatás mais Jacó; mas Israel, porque
foste forte contra Deus e contra os homens, e tu prevale­
ceste..." E ali mesmo o:abençoou.
Jacó del). a este lugaro nOple,de:Fanuel, "P9rqq.e", dis­
se ele, "eu yi a Deus face aJace e a minha vidl:i foi salva".
Nascendo o sol, ele tinha passado Fanuel e manquejava
de uma coxa. (Gn 32,25ss.; Bíblia ,de Jerusalém)' .
Essa históriaco~témtodo's, os quatro'elementos ci~
tados acima. Há um encontro com um .ser superior, uma
ferida, uma perseverança e, por fim, uma reyelação divi,
na. A revelação nesse.c~sbé,.emprimeiro: lugar, a bên­
ção, e em segundo; o inv:estimento.de um novo nome, uma
segunda identidade. A identidade coletiva de Jacó é'reve­
lada porque ele agora se torna, o antecessor,de IsraeL
O 'queí,é ,par.ticularmente interessante~ do ponto de
vista psicológieo, nesse exemplo, é que ele mostra que
um encontro' com a Personalidade Maior pode ocorrer
junto com um encontro com,a sombra. Jacó também ex­
perienciou grandemente 'o.e,ncontr.o ,posterior com Esaq
como um encontro com.Deus.·Esau tornou-se,,para Jacó,
um tipo de. substit.uto de, Deus. Isso aconteceu porque
a consciência culposa de Jacó imbui Esaú de um poder
divino ..AsEscrituras dizem,démodo específico, que quan­
do Jacó .enco!,\tril"se com ,Esaú, .diz a ele: "Vejo tua face,
53
co.mo. se visse a face de Deus: .." (Gn 33,10), de'mo.do. que
Esaú e Deus so.brepõem~se.Psico.lo.gicamente, isso. sig­
nifica que a so.mbra,. quando. 'não. no.s relacio.n,amo.s
co.m ela, po.de ativar o. Si-mesmo.,.e se o. indivíduo. enga­
.no.u a so.mbra, o. que, é ativado. é o. Si-mesmo. em seu as­
pecto.vingativo.. Esse tema,po.de o.peràrjnternao.u exter­
namente.
.
De uma fo.rIrIa externa, se, fiz mal a algué~, terei
medo. do. desejo. de vingança d~ssa pesso.a'., Sei que ele tem
o. direito. de s~ vingar po.rque eu o.'prejudiquei, e essa si­
tuação. co.nstela o. Si-rit,~smp. "'A mim;pert'eq.ceà ~ingan­
ça', disse o. Sénho.r" (Dt 32,35). To.do. o. fen.ômeno. da vin­
gança pertence ao.' centro. traI!spesso.al da psique, ao.
Si-mesmo., e se uma pesso.a fo.i prejudicada seriamente,
uma respo.sta d.efensiva do. Si-mesmo. é âtivada. Se al­
guém co.lo.ca o. Si~mesmo. co.ntra vo.cê, vo.cê está em gran­
de desvantagem.
."
"
,
'
De forma semelhante, se vio.lei a figura inte'rna que
Co.nstitui minha so.mbra, isso. po.de pro.vo.car uma vingan­
ça do. si-mesmo. .co.ntra.o ego, e to.do. o.'tipo"âeco.isaspóde
aco.ntecer - po.sso. me éo.rtarco.m a.serra.elétrica, o.U so~
frer um acidente de carro.; qualquer co.isa desse tipo.po.de
' •. ':' ' ..)
aco.ntecer se essa co.nstelação.:se instalar.
Ago.ra"o.'que Jacó·precisafàzer nessa.sitúação.é ~n~
co.ntrar a reação. que fo.i co.nsteladate,supo.rtá-.lasem su~
cumbir nem a.uma ho.stilídade:defensivanem'ao. deses­
pero.. Se ele tiver sucesso, :isso. co.rrespo.nderá a uma.luta
bem-sucedida co.m 6 anjo.'. Uma maneira de se pensar nisso.
é que, talvez, Jacó tivesse de lutar co.ma.raiva que sentià.
po.r Esaú antes de po.der chegar a uma atitude co.nciliató~
ria. Sabemo.s que ele chego.u:a uma atitude co.nciliatória
porque ele envio.u presentes.a Esaú; sendo. bem-sucedi­
do., mas ele não. po.deria fazer isso. antes .de superar essa
reação.. Essa reação. po.deria se expressar tanto..na raiv.a
co.ntra Esaú po.r lhe causar pro.blemas, .quanto. em um
54
terrível medo. po.r saber que Esaú tinha uma acusação.
legítima
ele.o.bservação.
. . ' muito. pro.funda so.bre isso.,
Jungco.ntra
faz uma
em Símbolos da 'Iransformação:
Inicialmente ele (Deus) aparece, portanto, sob uma forma
inimiga, como eútidadeviolentacontra a qual o herói pre­
cisa lutar. Isto corresponde à violência da dinâmica in­
consciente. Ne!\lta o deu~se revet(l, e nesta forma ele deve
ser vencido. A luta tem seu correspondente na luta de Jacó
com o anjo deJavé nov'audo jaboc.. dsurto de violência
dos instintos é vivência divina q}J:ando o homem não su­
cumbe à força deles, não os segue cegamente, mas defen­
de com sucesso sua condição hum'ana contra o caráter
animal da força divina.'É,"terrívelcair nas mãos do Deus
vivo"(Hbl0,31).~3,
':'
,.,
O que ele di'z aqui é que afetosintensos sao manifes­
Maior.
NÓs n~ncà
nos'
tações da PerSoriàlidad~
.
"",'
" déverlaÍríos
\'"
'
respúnsabilizar
u.mafetú intenso.
dessa Ílatureia
nunca é acio.nado. po.rnós. Ess:(ls cúis?-s 'caem ,do. céu, ou
bramem das pro.fundezas. Todo afetôintenso é uma mani-­
af.àque ifúrIúSo.
festação. do.
se podemos nos relacionar com ele com essa compreensão;
então ele se to.rn a uma experiência da divindade, assim
comO. fo.i alcançado. na luta de Jacó co.m o..anjo;' ,v
.. :í,
Outro. aspecto. de tamanho encontro é mencionado
púrJung: "'."',", '-, '; j I.:"> j . ' , ' "
p~r
'
"
~g~
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si-mesm~ "o
do in~tinto;' ~e
J
n~o
~;,:
'::.;.'\
disc~tid,,: e·s~.
Um Jacó contemporâneo .. , ficaria indeciso na posse de um
s",vedo quê
pudesse ser
tornaria. um·
estranho na.."coletlVldade,.34
!
.' l' :' '
':~" ,-- J_ J l
Isso éorrespo.nde ao. fato. de que um' enco.ntro com à
Personalidáde Maiúr é riecessariamente ül:n segredo; não.
se po.~e falat so.bre ele, úU, pelo. meno.s,' não. se po.de en­
'1'
_L_-_"
33
.• :,
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cw 5;pa~ 524(gnfo meiÚ,' -::
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M'mo"",,·D,,om', R,J",tiO""
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4
•. 34 ..
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.,. ,'.
"
55
trar em detalhes. É um segredo que cria o indivíduo.comq
algo separado do coletivo e, ao mesmo tempo, éuma feri­
da que separa e aliena; de· maneira dolorosa, o indivíduo
da coletividade, de forma a possu~r tanto um ladopositi~
vo quanto um negativo.
,.
Um ótimo ,~~emnlo: desse fenôm~ngl,é ~flg~i'a de
Filoctetes,no mitogrego.rEle herdou as flechasdQuradas
de Héracles, 'representante da, Personalidade Maior no
mito, Filoctetes; uma pessoa comum como todos nós, não
sabia lidar com tal ~rmà e se feriu com 'uma das flechas
envenenadas, que herdou.,Aferid? tornou-se incurável. O
fedor era tal. que ninguém conseguia ficar perto dele, e
então ele foi abandonado em uma ilha. Contudo,' num dado
momento um oráculo disse que a guerra de 'Tróia: só po­
deria st;'lr vencida pelos gregos se eles obtivessem a ajuda
de Filoctetes. 'Eles tiveram"de ';voltar, e se' desculpar pelo
banimento dele e tr~zê-lo àe 'volta à ~oretivida~e. 'É's'se é
um belíssim6j~xem.ploàe certo aspecto ,do fenômeno; 9
indivíduo fica ,~lie~a~() ,e torna-se"um 'peso desagradável
para a coletiv!dade.~~~áindaa~sim;·a colétividade preCis~
dele.
'
'..ti
"
,
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Arjuna e
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Esse é realm~nt~ ~niJ~~emplo' ma~ífic~ àe'um ,e~:
contro com a Personalidade'Maior. Está reiístrado Bâ!
gavad-Gita. Assinícomo OYI:,Ívro de'Jó, súàcaractérística
central éum diálo'g~"erifre'un:í homem.'supéragoniado e
uma personificação da divindade:' Nãó terihoum 'és tudo
mais profundo arespeito do;Qita.Ele é, ohv,úl.mente, um
documento composto que chego\l à sua forma,atuaI.devij­
do a uma série de acréscimos., Mas eu ,~cho,:consideran;
do-o do ponto de vista psicológico, que não é de todo
possível que ele tenha se originado, assim cO,mo acredito
que o Livro de Jó tenha se originado;lda.experiência real
56
de uma pessoa com a PérsonalidadeMaior. Seja como for,
em sua forma ,atual ele é tini' dos exemplos mais refina­
dos do mundo sobre ess~ ~xperiê~cia.
,
,A hist.ória começa com o.desesperodo príncipe Arjuna
antes de uma batalha, em que ele não quer entrar por­
que ela' é contra seu próprio povo.
ao expressar sua
angústia, o deus'Krishna responde por meio 'da figura do
cocheiro. Primeiro fala 'Arjuna: .
Ó,Krish~a, ve~sio aí o m~~,povo; re.llnid~ aq~i, ~çqen:
to por uma luta, minhas pernas traem-me, minhâ'boca:
seca' ' .. ,
".'.,;,.
,c'
Meu corpo treme', meu' cabelo arrepia-se, meu Gandiva
(arco) escapa ,à minha mão, minha pele queima~se."
Ó Keshava,(Krishna,o assassino de Keshi), eu não con-,
sigo ficar de
minha mente está confusa e eu vejC! pres~
ságios adversos.
.'
.
Ó Krishna; eu também não vejo nada de bom em ex­
termin~r me\l prqpriq po~o nessa batalha. Não qesejo nem
a vitória, nem o reino, nem os prazeres...
"
Essesglierreiros eu não desejo:matât, apesar de eu ser
morto, por éles. 3? '
;I
h
l'
,KrishÍla
responde:
';:!
l }
~
1
'
~
'!
! .
l,'
!
l.
~
,
Estás lamentando-se por aqueles a quem não se deve­
ria lamentar... mas o verdadeiro sábio lamenta-se nem
p~19 Il1qrt(), nempelp y:ivo...
!". c" ,; , , :
, '.
"
,Esses.corpo~ são perecív~is; çont].gio, os.habit,aI1tes çles­
ses corpos são 'eternos,' fndestruhveis' eimpenetráv'eis;
pbrtanto, lute, Ó descenden.te (de Bhadtiár'
' (.~ ,"
Aqu,el,equ y ? (qi ~ Il1ei!?rp.o), ~on~,iqera o, ,exte:r;minador ou
aque!e q1fe pensa que ele .cSi-ml~sIlfo) é exterminado, ne­
nhum deles conhece a Verdade, pois Elé não extermina
nem é extermiríádo. J
, ' •
r,
Elfii,(Si-mes~'r'ío) nu~ca na,sc'el,i,' ~'nun'ca morre) nem
depois de tervóltado não:ser~'Ele(Si~rúesn:lO) não nasce,
a
"
,
35 "The Blcssed Lord's Song" (= Srimad-Bagavad.Gita), traduzido por Swami
Paramanada, em Lin Yutang, ed.) The wisdom ofChina and fndia, p, 59.
57
é eterno, imutável, antigo. Nunca é destruído, nem mes_
mo quando o corpo é destruído..: '
.
'" Sendo assim, 6 filho de Kunti, erga-se e vá a luta.
Considerando o prazer e a 'dor, ganhos e perdas, vitó_
ria
e derrota;
entre nessa batalha. Assim,
o pecado não o
36'
,
. maculará.
De modo. típico, a Personalidade. Maior apresentou
uma atitude muito ampla para:a compreensão do ego.
Arjuna está confuso porque lhe .foi apresentada uma
atitude para q.lém dos ·opostos. E,'nesse caso,o't~ma da
ferida esta representado pela su'a confusão. Vejam, a
ferida não é tão proeminente nessa história "oriental
quanto oéna, história ocidental de Jó, e.isso, acredito,
diz algum'a coisa 86bre a diferença entre a, psique orien­
tal e ocldental' .
t.,
'I
De
,
;
qualqu.~r mgdo, Arjuna responde: i',','
, .
~e
6 J anqrdaI'ia, ó Kesh::lVa (Rnsh.q,aJ, 'para:ti (6 caminho
da) sabedoria é superior a (o caminho da) ação; então por
que estás co;nprometendo-meconú~o te'rríveláç'ão,? Com
essas palavras aparentemente conflitantes, estás confun­
dindo-me a compreensão. (Aí está a ferida, vocêsyêem)
Assim, diga-me com convicção qüàl
que, segúindo­
o, possolchegaI; aom,ai!? al~o}7_.,!, ,fi
-.. }.
'i f.~
.,
#{
, ..
~t~~~,
,
.., Aquele que, controlando os órgãos da ação, senta-se
retendo o pensamento dos objetos do sentido em sua men­
te, esse ser auto-enganador é chamadÇl de hipócrita .
No entanto, ó Arjuna, aquele que, controlando os sen­
tidos com a mente, segue sem apego o caminho da ação
com seus órgãos da ação, é estimado;
Realiza, portanto, as ações que lhe são impostas, pois
a ação é superior à inaçãp. Sem ,trabalho, até mesmo a
simples manutenção de telJ. corpo não Serla possível.
Este mundo é determinado'por açõ~s, exceto quando
elas são executadas em noine de Yajna' (sacrifício religio­
so, adoração etc.).
"0 filho de Kunti, realizaas·ações
sem apego.~a,·
" ",\
J • ::';'
_
d~plb
:'
6 homem
ne'stemtlndo
está 6 caminho que
descrevi.Q câminhO,pa saoêd()ria ~ para os meditati­
vos, e o caminho do trabalhb é; paiáos ativos'. ;' " ,
O homem não alcança a liberdade da ação pelli não­
execução da ação, 'nemalcançá'a peifel:çãó'simplesmente
abandonando a ação.
, I .,
'
"
"
36
58
Ibíd., Pp. 62s. Ibíd., p. 67.
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-'
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_,.
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C.'
~.'
i
t
E então Krishna prossegue' com 'o que sÓ"podemos chamar de ufiI'a explicação muito paciEmte. Eu o imagino começando comi U,~ SU$pirQ. li" .. ~r', !: " .'. " ! 37
.
,"
;.
"
.~.
~.
...
I
1"1'"
Eu sou a origem e também a dissolução do universo. (Essa
é a frase que reverberou na mente de RobertOppenneimer
ao testemunhar a primeira explosão atômica.: "a origem e a
dissolução ,do U!liver~o::) N'ãp há nad:;t que exista acima de
tod9 universo és~á' . preso
mim,' Gomo pérolas em um Cct1iir,
r I.. ,
a Mim: Sou o gosto âis águas e o esplendor do sol e da lua,
A alma' sagrada; Om em todos 'ó~1Vedas, 'o som no éter, a
cOf!.sciência D.? raçap.~mana. Sou a fr'i\gr~ncia sagrada na
tem;! e o)Srilno rio fogo.. So~'a :vida erp,todos os seres e a
,B:tlsteridaêle nos ascetas. Rec,ollheçam-me como a semente
eterna de tõdos os seres. Sou o intelecto do
ea
bráVil~â ci.os·br~lVos. '6 AI]ü~~; conheço o passado, o n",~}(""'C1r.p
, .~ o futuro de.todos os seres; mas niriguém Me ",V~.La'-."
)'.)"
pur~,
"'.~ lI' .
"f
A isso segue uma des.crição long? e magnífic;;t do modo
de vida religio~o. Particul~rment~ digna de flOta é a des,
crição de Krishnà" çle s~a próPTi?, natur~~a: I~ein~ le~~
brem-se de que, do, pqnto d~ vist?, pSicóh?gico, o qll;e est,a­
mos escutandQ é f) Si-:mesRlf), descr~ven,do,$ua própria
natureza par;a o eg9. ~'l1tão, ,e$sa.l ~ão é"ílpenap,
1i1:l1a his;
.
.
tória de um~vento remot?; é m;n relato ~e ':lWi1 eXI?eriên-;
cia que pode se suceder com qualquer um de" nós.
Vejamos como KrisJ:;ma descreve a si m~S1JlO, em parte:
I
I "
~
'\'
••
o
~"
.... ,
, .....
,
"
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.;1:
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!'
1;.
)
~8;Ibíd:
39
.
""
Ibíd., pp. 80ss. (modificado e abreviado),
F;Q
Lembrem-se, o que está sendo expresso aqui é a na­
tureza do Si-mesmo, o que a psique ÍIldividi.ul1 pode en­
contrar. Essa é a' maneira COmo o' Si-m,esmo fala de si.
,-,
.
,
essa é a sua fenomenologia. Aúnica manifestação dispo_
nível para o Si-mesmo na consciência é como uma encar_
nação individual. Cada Si:..rnesmo individual, à medida
que se torna manifesto, expressa-se dessa forma.
A maneita'comó RrlsJína descreve-se asi mesmo para
Arjuna é semelha:\lt~ à maneira como Iahweh fala com
Jó no furacão. Mas, ao mesmo tempo, é bastante diferen_
te. Vejam, todo o estilo é diferente, muito mais calmo,
mais objetiyo. Aqui não há furacão. Pode-se dizer que é
mais civilizado, 'mais' pSicológico. 'Psicologicaniente, o
Ocidente é bárbaro se comparado com: o Oríente:Mas o
que Krishna' faz··fé i explicar, .corli muita: padêndà, .para
Arjuna', dessejeAo caimo,·objetivo,adiferença.:entre o
ego e o Si-me'smo; inteirando~o, assim, dá natureza da
Personalíd:úÍe Màior., E essa revela'ção aconteceu porque;
Como Jó, Arjuna'persev,erou'e qulistionou Krishna~
)
,',.\;.
;~.,-'~
Paulo eCristô
L
)
,
I
~~--~~._>:.
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'u,
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I
".
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fI-.,
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Aqui, mais.l1mª vez, voltamo-nos'àsescritl..!Tas de
outra religião mundial. Os textos relevantes 'encontram_
se basicamente nó Livrados Atos, e vou ler pará vocês
uma compilação, um r~sumo tom.~inna's próprijlS pala­
vras, dos acontecíment9s' essé.ncüús\ Patilódiz"assün:
Antes, eu achava que 'era o'meu dever usar todos os
meios para combater o nome dé Jesus, o Nazareno: Isso
aconteceu em Jerusalém. Eu mesmo mandei muitos san­
tos para a prisão, sob a'autoridade do Sumo sacerdÓte. E
quando eles eram condenádos à niorté', meu .voto era
sempre a favor da: pena. Muitas vezes', ~odéava as' SInago­
gas infligindo penas, tentando, assim, forçá-los a renun­
ciar à sua fé, Minha ira contra eles era tamanha que eu
até mesmo os perseguia em outras cidades., ','
o
60
Numa dessas expedições, eu ia a Damasco, armado com
plenos poderes e com un:a ,carta do sU,mo sac~rdote. Ao
meio-dIa, enquanto ~egU1a ~o meu cammho, VI uma luz,
mais brilhante do que o sol, descer dos céus. Ela: brilhava
ao meu redor e ao redor'de meus compànheiros de via~
gemo Caímos todos no chão,' eeu 'ouvi uina voz dizendo
para mim em hebraico: "Saulo, Saulo" porque você. me
persegue? É difícil paravpcê, lutand9 assim contra a cor­
rente". Então eu perguJ,ltei: :'Quep; é você, Senhor?" e Elé
respondeu: "Eu sou'Jesús 'e' voéê está me perseguindo. Mas
levante-se, pois eu apateci a você por esse motlvo: para
designá-lo como meu servo e como'testemunha'dessa vi­
são na qual você me viU'; e ,das. outras 'nas ,quais.aparece­
rei para você.' Levante.s~;",agora. e ~n,tre n11. c~dacj.e e lhe
dirão o que voçê ,dyy~, fazt:;:r~'". "
~:
Os homens que viajavarrl com Sa'ulo ficaram sem fala,
pois, apesar de terem' ouvido' a voz, :hãoçohseguiam ver
ninguém: 'Saulo levanfou.lse,' mas, 'mesmo'éom os olhos
bem abertos"não conseguiave'r nada; e tiv.eram de guiá..;
lo até Damasco. ,Por ,três; di<}s ,ele nã,o.eIl?'ergou nada, e.
ficou sem c9~er,nem be~er'1, 4..'
'!
.
.1,
' 'I
,
•
, ,
Bom, a princípio Paulo fico.u ,absoluta:,?en~~ ab~lado
com o encontro ,com a Personalidade Maior. ,Ficou cego
por três dias\e, segundo algumas tradições e outros rela­
tos, existem motivos para se acreditar'que ele levou três
anos na Arábia para se recuperar, Osrelatos Bíblicos não
dizem isso exatamehte, mas 'existem algumas tradições
que o sugerem. 'Eu' acho muito provável que tenha sido
assim.""',"
.
;.:'
. ..
.
Paulo \dentifiéou' á Personalidadê;Maiorque-encon­
trou com Cristo, Essa é a origem da Igreja Cristã como a
encontrá com a'Personálidade Maior pode
conhecemos.
provocar uma resistência violenta do ego consciente, como
podeJitos ver com a'p~rseguiçãb dos cristãos por Raulo an­
bem
tes deder a'visão. Esse é,um'fenômenopsicológico
't
.
.
documentado,' e b encbntnúnos com certa freqüência na
análise, É claro que, no caso de Saulo, isso é compreensí­
vel, em vista do fatá dequea consciência que lhe foi trazida
Um
.
~..
~,'
I
• I ~ ~
.,
"
61
pelo encontro com a Personalidade Maior impôs àlgumas
exigências super-rigórosasem Sua vida. Ele·foi obrigado a
totalmente
depbis,doencontro.
sacrificar sua vida pessoal
r
,
,,"
,..
Ele tornou-se uIIles~ravo,de Cristfi. Ele começa "!-~ cartas
aos romanos e aos filipenses chamando a si pqJprio de
Paulo, servo de Cristo. E começa.a carta a Filemon com as
palavras: "Paulo, prisioneiro de Jesus Cristo"; E é isso
mesmo que ele'era, literalmente um'prisioneiro. :
A experiênci;;t
de
Saulo
é uma das declaraçÕes mais
.
I
~
claras que t~I1l0S sobre CQmo é ter um encontrq desses
com a Personalidade Maior.. :Esse estado de estar preso é
muito bem resumido no<'segundo capítulo .dos Gálatas,
onde Paulo diz: "Estol,l crucificado coiriCristb: apesar dis­
so, eu vivo; ~onttido, não eu, Il1afi 'Cristo vive 'em mim"
(2,20). Jung:fez;
que
não fica muito longe disso. Depois de seu encontro com o
inconsciente'le com a personificaçao' da Personalidade
Maior, à qual ele chamou Filemon, 'ele diz:' '
j
I
j
"
~~a'd~~lar~ção'em suara~tobiografiá
•
~.
, '
j
~
.' : .
:'"
-.
,..
t "
Foi entãolquê 'deixei
pertericer somente a mim mesmo, . deiXei 'de ter 'cf direito 'pára. tal: A partir de'en tão; minha. então-que me,dedi"
vida. 'pertencia'
. à,generalidade..::Foi
d
.
40'
quel aose,ryl_~Q,a.pslqu~., ", .'':' " " i . i ; ' i .1
serviço"fI~,~~p&,!~,psi9P~.é
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serv~çp ~uJi
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escravidão de Pàulo a Cristo.-Os dois tennos diferentes pará
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O mesmo fenOineno são apropnados ao contexto de .s~~,~ diferentes backgrounds PsÍqjlicos çulturais.,e col~tivos. . , .•
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'I.:
Nietzsche e Zaré\tust,ra,
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,)I.r'JU
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i .")
}~ \'j('''
Agora, farei um salto d:e uns. dois ÍnU..ànos, dir;etd
para os tempos mOdernos.,Preceden.do Jimg,.o Assírrl
falava Zaratustra de
reglstio d!l'"
f
,\
' .
J
•
•
Nietzs'ch~éQ, ;rr~~de
40
62
Memories, Dreams, Re/Zections, p. 192.
'.
~
.!j
i)
,J ; ~ 41
"1
l);1
i ;\ ~ ;
",1
".n;
~
.,,'
)
um encontro moderno. com '8. Personalidade Maior. Não
podemos saber quantos enc,ontros anônimos dessa na­
tureza existem, ma$, se eles permanecem s.ecretos, nun­
ca transmitido:s à t?letiyi~ade, a,experiência morre des­
percebida.
" , ' , ' .,_~
É verdade que as tragédias. do Fausto de Goethe e do
Zaratustra de Nietzsche marcam os primeiros vislum­
bres de uma irrupção Há experiência total na civilização
ocidental. Po~ "irr~pção"da' exper~ê~cia total" quero dizer
um encontrp com ~ P~rsonalidadE,l Maior., N:os tempos
modernos, apenasFausto.e Zaratustra testemunham esse
encontro com o centro mais amplo da psique,'
O Zaratustra de Nietz.sche é muito maisimportan­
te, do ponto Cle vista psicológico, na minha, çrpinião, por­
que o autor viveú. es.s,,,!- exp~riê,ncia totalI).Í.ep.t~ ..GQethe
não. Ele manteve certa pQstura olímpica ,por· sobre a ex­
periência desc,ritá em Fausto. Nietzsche'viveusúaexpe­
riência tdtalmenté,até o seu aÍnàrgo fim. Então, é o pri­ meiro e~cohtrci d~urri ego mJdei:rio çom, ~a Pei~o'rialidade Maior, o primeiro qU,e'deixou um registro,
.
Nietzsche .sucumbiu nesse encontro, Mas, também,
como poderia ser diferente,já que ele foi o primeiro a ex­
plorar essa regiao déSconhecida é claro, não 'conhecia
seus perigos. Os perigos to:çnaram-se claros somente de­
pois quejá o haviam cercado. Acredito que temos uma
dívida imensa pàra,com Nietzsche. Jung aprendeu mui­
to a partir daI experiência dele. Estou convencido de que,
se~ o . exemplo
'anterior de 'Niétzs~he, a f!xp~riência de
'.
."
,I
. . I
Jung teria' sido provavelmente fatal,
,.
'Em. su"a' ~ufobio'grafia',
.JlPlg' di;; 'ter descoberto
r
Nie'tzs'che em 1898. Ele diz o seguinte: 1 . .
'I'
:
')
",
... _
'I·'
~
.... ,
1
'
1.1 ',.
.
I
'\
.".
'.;
1,'
>.
I
I
1
Apesar de meus temores, estava curioso e me dispus a lê­
Caiu-me nas mãos o livro Considerações Inaturais.
Entusiasmei-me e li em seguida Assim falava Zaratustra.
Essa leitura, como a. d.o Fausto de Goethe, foi uma de mi­
63
'I
,i
:,~ nhas impressões mais profundas'. Zarátustraera,o Fausto
de Nietzsche, seu n.o2 (sua pers(:malidade n, o 2); e p1eu n. O
2 agora correspondea Zaratustra.... Achei Za!atustr:~
mórbido. Seria támbém o' meu n. 2 m'órbido? Essa possi­
bilidade encheu-me'de um temor que nUnca ousara 'con­
fessar a mim mesmo, mas que me deixava em suspenso,
manifestando_se reiteradamente, de um modo inoportu­
no e que me .obrig~v~ a refletir sobre 'mim, mesmo.
N ietzsche descobrira o, seu n, o 2 p1ais ta~cj.e" depois da se­
gunda metade de sua existência, ao passo qUe euconhe­
cia o meu desde ajuventude:-Nietzsclie falava ingênua e
irrefletidamente desse arrheton (segredo), coino se fizes­
se párte ~da ordem comum. Eu, entretanto; soube muito
cedo que,e~,sa atittl.de.Jliwa a experiências negativa~". S~u
equívoco mó:r:bid9 ~ pensei fora o de expor seu n.? 2 com
uma ingenuidade e' uma falta de reserva excessivas a um
mundo totalmente igriorante de tais cois'as e' ihcapaz de
compreendê-las,· Ele alimentava ,a esperança infantil de
encontrarlJ.omens que pUdessem'experimentar seu êxta­
se e, conwreend~r "a transmu~ação ,de todos os' v,alor~s".
Como os outros, não se compreendeu a si mesmo ao cair
no fuuTld.o do'mistério e, do' indizível, Pretendendo':" ~léin
domais' ~X:ilJi-loa umamassaamoi-fa e' aba'nd.ó'nada'p:~~
deuses. Daí a ênfase da sua linguagem, a superabun_
dânéia das metáfor:as, o.entusiasmoépico que tentava em
vão falar, desse mundo. voltado a um saber absurdo.,.E -;­
C0Il19 'umf~~n,çarigod~çorda
,- acabpu pqr ,cair ãl~qiA~~~
mesmo. 41
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Hoje em dia temos dados que demonstram que Nietzs~
11
che encontrou
com
a Personalidade
Maior
pelaprimeirâ
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vez na adolescência: Evidentemente,Jung não tinha co­
nhecimento d~ská i'riforniáção., Pouca!f pessoas o tê'In~ Depois que Nietzsch~ t~v~ "um~urto' eril1889, foi hóspi~ ~
'J
talizado fi consideraqo)ouco pelO ,res'to da yiâa" os 0Il~e anos seguintes. Ele tornou-se incapaz d'e se expressar 'dê uma maneira coerente. '
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Memories, Dreams, RefleCtions, p. 1025.>'
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(
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No entanto, seu funcionamento psicológico interno
estava muito mais intacto do que sua aparência externa
poderia indicar. ~le escrevEm um manuscrito enquanto
estava interrladoe conseguiu fázer com que o texto saís­
se clandestinamente com um páciente que estava indo
embora. O texto tinha de passar longe dos olhos atentos
de sua irma, 'que,' provavelmente; o téria 'destruído.
Esse é um evento muito dramático e,importante. Foi
finalmente publica<lo e ~.st~ disponível e].TI uma tradu­
ção, mas pouquíssimas pessoa9 o conhecem. Os estudio­
sos de Nietzsche estão' envoltos
'uÍIÍa conspiração de
silêncio êontra
texto, 'porque ele falà sobr~ os fatos
psicológicos 'da vida dele,' Os estudiosos àcredit~m que
esses fatos depreciam NietzscI1e" o' filósofo~ O que eles
fazem, na v.erdade, é engrandecer Nietzsche, o ser huma­
no. Essa obra foi publicadàcomo título MySister and 1.
Um título muito' infeliz, mas que não foi éscolhidó por
Nietzsche; e sim por seus edi,tores, par<;l- çapitalizar o as­
pecto mais eséandalQso do texto, qlle falà,sobre a relação
íncestuos'a éntre-ele e a irmã desde a infâiIcia. Não é p~eciso dizer, ele ,tinha de passar longe dos olhos da irmã..
My Si~ter: and 1 é um. documento psicológico maravi­
lhoso porque Nietzsche tem insights, dentro de sua expe­
riência de.d~rrota total 7'" o que a insanidade aparente re­
presenta para" u~a pessoa de, tal brilho in'telectual-.de
que el«;l, se realizou completamente comÇ> ser humano, e
tudo isso. é dito nessa obra. Algum dia, alguém fará um
estudo de caso psicológj.co çompleto sobre Nietzsche e esse
livro, e ele ocupará, I:lIltão,: seu lugar como o primeiro psi­
cólog()pI:ofundQ:
,
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Aqui.~st;í o. que Nietzsche nos diz:.
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De todos dS livros dá Bíblia, Primeiro Samuel, principal­
mente nas passagens iniciais, foI o que causou as impres­
sões mais profundas em mim. De certa forma, ele pode ter
sido o responsável por um elemento espiritual importan­
65
te em minha vida. A p,assagern é aquela onde o S,enhor
acorda o menino profeta, três vezes e Samuel, por três ve7
zes, confunde a voz celeste com' a voz de Eli, qué dórmia
perto dele no templo. Convencido, depois da terceira vez,
de que seu prodígio estava sendo chamado a serviços su"
periores a aqueles que lhe eram disponíveis na casa de
sacrifícios, Eli ip.strui o menino nos caminhos da profecia.
Eu não tinha, um Eli (nem mesmo um Schopenhauer)
quando uma visão se~elhante obscuréceu os primeiros
dias da minha adolescêncià. Eu tinha doze anos quando o
Senhor irrompeu em mini em toda a Sua glóriá;úma fu~
são fulgurante das imagens de Abraão, Moisés e'do jovem
Jesus da Bíblia. ,Em Sua segunda visita, Ele v~io a mim
não fisicamente,mas em um estremecimento da. consci­
ência no qual o bem e o mal clamaram, diante dos portões
da minha alma, por um igual reconhecimento, Na tercei­
ra vez Ele agarrou-me'em frente à minha casa na formà
de um terrível vento. Reconheci a ação de urna força divi i
na, pois foi naquele momento que eu concebi a Trindaçl~
c~,mo ~eus, o' Pai, Deus, o _Filho~ e Deus, o Diabo. 42
Estamos falanao de um adolescente aqui; e essa pas­
sagem indica que a função profética d~ Niétzsche'surgiu
quando ele tinha doze anãs. As revelações propria~eÍ1tê
ditas, com ênfase no conflito dos opostos, iridicam que o
Si-mesmo, em sua fenomenologia moderna, na forma
cômo o conhecemos, foi constelado' nele, de modo que ~
questão principal' para ele passou a sera polàrÚlade eu:
tre Cristo e Anticristo.1\o ler"sUas obras c'oniatençãó;
pode-se perceber que'essa é a questão principal por trás
de toda a sua escrita:, Conscientemente, Nietzsche ideh l
tificou-se de maneira deliberada com o Anticristo.Contudo, inconscientemente, ele identificou-se cOm Cristo.
Assim, depois de seu surto, chegou a assinar algumas de
suas cartas como "O CruCificado",' De qualquer forma,
como vocês podem ver, ele viveu sua, vida com 'lfma pro­
' , .
, "
funda atitude religiosa. '
I
i
42
66
My Sister and l, p. 184.
~
:....
Jung dÍz'qu e a tragédia deZaratustra é que, devido
à morte de .seu Deus, o' p'roptio Nietzsche virou um deus
e que isSO áconte'ceu porque ele não era ateu. Ele
tinh~
uma natureía m~,:lÍto 'posihya'pa~a' tolerar a neurose ur­
bana do ateísmo. Parece perigoso pata um homem des­
ses afirmaI:' que Deus ~stá 'Inorto. Ele 'se torna vítima da
inflação na mesma h O F a . ' ;
Nietzsche foi muito importante para Jung, o que se torna evidente no'fato dé' qúêéle conduzi\:i um seminário sobre o Zardt'ustr'a dúfante'cib.co'anos.' Aqui éstá um pe­
,
queno excerto
desse seminário:'
~
~
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•
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,_.!
.'
•
(Niet~s,che) nasceu em 1844,.e começOl;í a,é;;crever Zara­
"""
tustra,~m 18Bi?, quaq.do ,~~n1fa tfi,p.ta e nove, a,nos. A ma­
nein,i çomo o, f?screveu é, impressionallte. ~l.e fez ,até um
ns
verso sobre issO'. Ele .disse: "Da \yurdeei :zu zwei und
Zarathustra gil1g anmir vorbei", que'quer 'dizer: "Então,
um tornou-se dois, e Zaratustra'ultrapassou-me", signifi­
cando que Zaratustra'tornoti-s e inanifestô comó-\lma se­
gunda pe.rsónalidade dentro dele. Isso nOS mostr?: que ele
tinh~ ~l~rf1 roção de n,ão ,syr,. çle pr.ópri,9~ ~dêIlj;ico 13. Za­
ratustrá. Mas cOJno ele poderia evitar tornar-se tal iden­
tid'adenaqueles diá.~ em que J?ào'existiàlà l#ié'Ól~gia? Nin­
guém, naquelà'épóca; teria à;coragem d~h~va:r; ?-' sério a
idéia de personificação, oU!lle'smo de urna ,açã~ espiritual
autônoma e independente. Mil oitocentos e oitenta e três
foi oanó' da eclosão da filosofi~' materialísta. por' isso, ele
,
••
>'
•
• Y·,
1
li,'
,""
teve
de , ldentlficar-se
com" 'Z_aratustra
ap~~ar
q,e perc;eber,
cómo prova esse verso, uml.'l. difer~nça defin.itiva entre ele
e o velho sáhio.En,tãO j essaidéil.'l. d,e qúeZaiâtustra tinha
de vpltar parii reparar as fa:ltas'desua invenção .anterior
ns
é belJ1 caracte:t1sbca" dopo,ntô çle vista psicológico;demo
­
~r~ que élé'poSf3llià ~~ntimeJ1t.9 ,apsolutamente histó­
. rico s'ob~eissq,\:.o q\ie1o' cob.riU'dé um sentido particular
de destino'.:. '-- . ' .', , ,.,.-' " , ,.
'. É claro 'qu~ :um s,entÍl;nento, desses é extremamente
ence
enriquecedor... a experiência dionisíaca par excell
. Na
última parte, o ekstasis dionisíaco aflora ... Em uma das
cartas a sua irmã, ele descreve de nlaneira comovente o
ekstâsís no qual escreveu Zaratustra ... Ele fala de sua for­
•
I'
.'
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\,
"
,
um
67
ma de escrever, que simplesmente ~manaya de dentro dele,
uma produção quase aut9~oma; t~nho' cer;teza, absoluta
de que as palavras se apresentavam por si próprias, e eSsa
descrição nos dá uma idéia do que 'foi esse estaCIo absolu­
tamente extraordinário rio qual ele se éncontrava,um es­
tado de possessão: .. Foi çomq se ele estivesse possuído por
um gênio crjativo que pegou o seu ç.§rei?ro e produziu essa
',\. ,
obra por pura necessidade.43
Quero dár,-)h~s u~ ~xemp,lo;' E1l~ ge~cr~~é, melhor do
que eu Q ekstasis em que Nietzsch.e se encontrava:.
Alguém, no fim do século de'ienove, tem idéia' do . os
.poetas de outras eras chal,Daram inspiração? Se
vou
'explicar. 'QJem' carrega um resíduo de superstição, por
menOr que seja,' dificilmente. poderá reje~tar ao mesmo
~emp~ a idéia ,de que ,somos mera encarnação, mero por­
ta-voz, meramente um instrum~nto para as forças Supe­
riores. O conceito de revelação- no sentido de que de re­
pente" com uma cert~zà e su'tÍleza indescritíveis, algo
torria~s'é i/isível, audível, algo que abàla' o indivíduo em
todas as suas est~uturas e o joga no chão -: é apenas uma
descrição dos fatos. O indivíduo ouve, não procura; aceita,
e não 'pergunta q'U:em está"dandó; como uinraio, um pen­
samento lámpeJa, Com'necessidade, sem hesitação quan­
to à
formá - e'u nunca tive escÓlha. I
'.,
arrebatamento, cuja enorme tensão muitas vezes
é desc~rregada em uma torrente de .lágrimas _ agora o
passo acelerl'l-se inyoluntariamente, ago.r.~ torna-se,mais
lento; o indivíduo está fora de si mesmo por completo, Com
a clara consciência, de qrrepios sutis e de calafrios dos pés
à cabeça; um poço de felicidade onde ate mesmo 'o,que é
mais doloroso e triste não soa como uma antítese; mas
como algo condi'cionado, prqvocado; uma ;cor necessária
em tal superabundância de luz;, )lID instinto para relações
rítmicas que abarca amplos espaços dás formas _ a exten­
são, a necessidade de um ritmo amplo, são quase tama­
da força da inspiração, um tipo de compensação, por
,.
,
Sua pressão e tensão, " .
sua
. Um
o
Tudo acontece.de maneira involuntária, no mais alto
grau, mas como em uma explosão de sentimentos de li­
berdade, incondicionalidade; poder, divindade. Ainvolun­
tariedade da imagem e da metáfora é ,o mais estranho de
tudo; não se t~m mais nenhuma noção do que seja uma
imagem ou uina,metáforáf tudo se~oferece como aexpres­
são mais próxima,mais"óbvia; mais_!?imples. Na verdade
parece, para aludir a uma frase de Zaratustra, como se
as coisas se aproximassem e"se.ofer~cessem 'como metá­
foras ("Aqui; tudo aparecé carinhosament~ no,teu discurso
e te dá prazer; pois eles querem cavalgar nas tuas costas.
Em toda 'metáfora, diriges-te a toda verdade ..:' Aqui as
palavras e os,sàntuários das palavras de, tod,o o ser abrem­
se diante de ti; aqui, toçlos .os seres' ,desejam toí;nar-se
palavra, todo o,devir qu~er aprender contigo" a falar").44
Essa é a experiêncja do inconsciente em seu ímp,eto
criativo de imagens significativas. Pouq~íssimos escrito­
res cons'eguein igualar-se i1 Nietzsche ~m sua[esplêndida
"
,.
capacid;ldé dé expressão..
A m~i.o~parte de'A,ssÚ~ fâiava'Zar~tustr-;;' foi escrita
nesse estado mental extático. As palavras brO.tavám do
inconscien~e. A PerSO.nalidade Maior é,afigura de Zara­
tustra; a.reenca,rIlaçãci do an~igO.profeta. A figll rá anun­
cia uma
m'O.ralldádé' e uma visão de mundo comple­
~ nova
~~
tamente nova; o que ela al).Ullcj~·é, na v!')rdade, o ,precursor
j,
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da psicologia profunda.
Zaratustra é um dO.cumento'psicológicO. absolutamen­
te extbordináriO." kfO.rma' como eledescrev'e
a sombra
t'
.',
coletiva do homem moderno~ é de tirar o fôlego. O texto
abunda em verdades pS,icológicas brilhantes, mas tam­
bém pode ser'um perigO.so veneno. podemos adoecer com
ele. Eu não consigo ler uma parte muito grande do
._
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.
44
Notes on the Seminar Giuen in 1934,1939; p. 9ss.
.
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Eçee Homo.-p, 3005: (Também citado, em uma tradução diferente, em
t'"''''''
\
z""thu,t". p. " ,
Nota do Edito')
69
Zar atu stra - ele me ' dei xa doente
, lite ralm ent e, porqu
seu s ins igh ts tran sce nde nta is.a ind
a não foram assimila~
dos pelo hom em inteiro e, por issd;ain
da,rião foram huma.
nizados. Isso 'os tor na ma us e des
tru tivo s, e eles podel1l
ma tar.
,
. .':' ,
Mas ess a éa nat ure za da Pers'onalid
ade Maior. Essa
é um a par te dela:: É por isso que Jal
am osd as feridas. Elas
não exi ste m den tro das cat ego rias
. dó' ego, da decência
hum ana . Ela s'ex trap ola m ess as cat
ego rias em ambos os
lados, do lado! bóm e ,do ruim.' Ma
s como um, (enõmeno,
são abs olu tam ent e extraordinárias::.
' 'I,.
. Muitas' das idéias.com as qua ise
sta 'mo s:a cos tum a­
dos na psi col ogi aju ngu ian aap are cem
em Zar atu stra . Por
exemplo, vou ler úm a peq uen a.p ass
age mq ue é um a des­
crição.explícit::} do Si-mesmo. Vejam
se vocês concordam
que isso soa familiar, .
.
,
'. Tuâ izes "Eu "e orgulh'as-té' des:
:;à pal~rvra. No ent ant o,
maior'- coisa que tu nãó que res cre
r:"
razão gra nde . Ele não diz Eu, mas é o teu'corpo e a tua
proced
O que os sen tido s apr eci am ,oq uéo e:cómoEu.
esp írito conhece,
nun ca em si tem seu fim. Mas,os sen
tido s e o esp írito que.rem te per sua dir de que são o fim
de
soberbos são . Os sen tido s e o esp írito tOqas ?-,s coi~as: tão
s&o inst rum ent os e
joguetes: por trás deles ain da há
o própriô' ser. Elé tam ­
bém pro cur a com 'os olhos dos sen
tido s;\t a'm bém ' esc uta
, com o ouv ido 'do espírito. Ele séin
pre:
compara, domina, conquista, destrói esc uta 'e procura:
;·Ele controla, e tam bém tem o controle dO,ego.
,
"~<o
Por trás de teu s pen san ien tos e. sen
tim
ent
os; meu '
r , . , . " , irmão, está um póderoso soberano.:.
cujo nom!,! é.si
-meSíno.
Em teu corpo ele 'hab ita; elê é ~ teu
corpo.' \)
"
Exi ste mai s raz ão em teu cor po'd
o'qU
e.em
tlia
mai or
sabedoria. E quemlsabe ppr, que ojte
)l corpo pre cisa exatq.~
men te de tua mai or sab edo ria? t
O si-mesmo ri do ego e de seu s salt
significam par a mim esses salt os e os arro gan tes: "Que
vôos do pensamento?",
ele diz par a si mesmo. "Um rod eiq
par a o meu próprio fim.
Eu tenho o controle do ego e sou. a
origem de sua s idéias."
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o si_",es",o diz ao ego' "Sinta do' aqui>"
pensa eo",o pode pa, a' eOU> sofrin"nto E ego sof,e e
- e é po' isso que
ele O
foi si-"
feito,e,,"
paroa diz
penao
sar.ego' "Sinta p,a ze
deleita-se e pensa eo,"O pod "á dele i,",- ' aqui!" E ° ego
se nova",ente - e
é po' issO que ele foi feito p" a pen sa"
" ,
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, como ulll- tipo ihtuiçãO; ass oci ou o
Si- m ­
tzsc
'"o à fun
çãoheinfe rior , OU sej a; à sen saç ão,
rep res ent ada
pelo corpo, entãO o Si
<\ 9 corpo
IssO ge­
,,!m ent e acontece com os"intu,itiv
Os,
Se yqcês
prestarelll- ate nçã o em seuS amigos
Que in)ere,ssatn po,
trabalhOS corporaiS, v" "o, Que Quase
",d os o)es, sãO, intu i­
tivos' NóS, tipo
nãO pre cis an, os, pre sta r tan ta
atençãO no corpo; não preeisainoS
inizá-lo.. '
Ma s o pon to ina is not áve l desdiv
se rela to éa descrição
eXplícita do Si_ m
no como' um seg und o cen tro da
personalidade, u,m, eSI
centro, litie é su,pertO r aO ego,
sab ia dissO SO!l\eIlte,p9rQué'êlé iA:,
e
experiêp.cia, Ela
não foi tota lme nte ass imi lad a nO
Ulotnento etn Que ele a
des cre veu , ma
tev e à experiénCia, Ela foi asS imi
lad a
sél e
nO hos pita l psiq
uiátriCO - como dem ons tra o doc
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ent o
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EuOvou ' diz er ;'Ig u,n a,p ala vra s
tutn
<m'lioÍriérlagem a
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,VeJo-o <01110 u,u 'inú tir da cau sa
da psicologia
pro funche
da em erg e"t e, Qu em :' li> com atel
iÇão'percebe al­
gam as pis tas de Que ele esc olh eu
o can tinh ó cbb
da inflaçãO
de ma nei ra deU ber adá , par a Qne pud
ess e des
etn rir o'Que
se esc ond ia do out ro iad o, Ele foi
um
holllde utn a co­
ragelll- psicológica illl-e
'psicológica imennsa uin a
sa, ma s
l ado
ele ten ha sid o lev
à imi nêr cia de ,-\t n.p siC Ose por ,U1:na
doe nça lll-e nta sifl­
Iitica" 4.
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ess e cam inh o, Veja1l1 o Que ele diz
etn sua aut obi Oll 'af' "
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~lll-bém,"or~geJ""~ ~inborauda~cia
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70
J...-----­
J..4.fUTh
ion
us
spoke Zafathustra. part 1. sect
4).
71
Os poetas míticos virâm 'Empédocles lançando-se nas
mas flamejantes do Etna, mas esse destino estava
do não ao grande Pré-socrático, mas a mim apenas. Após
ter sido separado do amor.da minha vida (Lou Salomé), o
amor que me fez humano, fiz, então, mel!- mergulho des .
perado nas chamas da loucura, esperando, .COmo Zaratustra,
es
encontrar fé em mim mesmo ao enlouquecer e entrar em
uma região superior de sanidade _ a sanidade do lunático
delirante, a loucura normal dos Conderiados!46
E no mesmo texto Nietzsche escreVe essas. palavras
comoventes em seu quarto do manicômio:.
A minha honra está perdida porque as mli1l1eres trafram_
me e deixaram_me fraco, ou traf a minha prÓPria força
indo atrás do Poder do conhecimento verdadeiro, que pode,
SOzinho, livrar-nos da Perdição? Estou completamente
perdido por estar esmagado embáixo do mortos
nas planícies de Maratona? Qv,e Demóstenes, o "",""çu",,,.
eloqüente da honra ateniense, derrame sua oração tUne­
bre sobre mim: "Não, Você nã.o falhóu; Frederick Nietzsche!
. Existem nobres derrotas 'ssim Como existem 'mortes no­
. bres
voéê mOrreu nobremente.Não, Você não falhou!
EUju,ro pelos mortos nas planici'lS del\faratona.''' ._.
~e
AgOra que essa obra final de Nietzsche está. dispo­
nfvel a nós, podemos ver sua vida Por completo, CÓnÍo urrli,
um saçrifi,ioque'inaugurou
da PSicolOgia profunda e que .b-o uxe ,. pela primeira vez, a
Personalidaqe Maior ã Consciênciã modeina. À experiên_
cia de Nietzsche preparou o caminh.ó para Jung.'.
,.
~ '. ,
. -,
tragédiaberpi~a,
~.época
'.
,
Comentários f~nais ,
'l<
'j
}o
I
~
T
I.
.'.
•
,
VOCês devem ter notado, e iss,i'"é realmehte -impor­
tante, que três dos quatró casos que apreSentei encdn_
tram-se nas escrituras <lealgumas das:n,aiores relig;ões
46
47
72
My Sister alld I, p. 114.
TO
"
Pp.
'
I,
'
,
"
'
" ' •••
"f";",
rnundiais: ?utro ex~mplo q,ue não foi dis~utido, a históMOlsese EI Kidhr, encontra-se no LIvro sagrado do
Islã. Isso nos mostra que aexperi'ênda da Personalidade
Maior é de taman};la, numin:osi.d~de que pqde, muitas ve­
zes, ser a origem de uma nova religião ..Mas agora, pela
primeira vez, no que eu chamaria de "a era junguiana",
estamos em posição de começar a compreender, de forma
geral e científica, as entidades psicológicas que geram as
religiões.
Essa enorme quantidade de novos conhecimentos
está afluindo à psique moderna. É claro que ela aflui aos
indivíduos primeiro, mas também à psique coletiva. E esse
afluxo representa tanto uma grande oportunidade quanto
um grande perigo. É como se, do ponto de vista coletivo,
estivéssemos próximos de encontrar a Personalidade
Maior que, corpo diz Jung na passagem .citadaant~­
riormente, pode fazer nossa vida fluir para aquela vida
maior, mas que também é "um momento de perigo mortal".
Parece-me que nossa melhor oportunidade dE;! evitar
uma catástrof~ co.Ietiva rel:jide na possibilidade de que
um número suficiente de pessoas tenha encontros cons­
cientes individua.is com a Personalidade Maior e, assim,
contribuam pa,ra o processo de imunizar a sociedaçle con­
tra uma inflação ateísta em massa. Se cada um de n6s
tentar alcançar esse objetivo, assimilando de maneira
diligente nossas projeções e buscando nosso próprio en­
contro, único e individual, estaremos contribuindo para
esse processo de imunização. Enquanto isso acontecer na
arena da psique individual, não precisará acontecer na
terrível arena da psique coletiva.
Nas palavras de Jung, com as quais termino a mi­
nha apresentação:
Para que o conflito projetado se cure, ele
voltar à psique do indivíduo, onde teve sua origem inconsciente. Ele deve ,celebrara Última' C€!ia consigo mesmo, comer 73
)
sua própria cafI1e e beber.,$eu Pf9Pri9
o que signi.
fica que ele deye reconhecer eaceitftr o outro nele mes.
mo... Será esse o significado dós ensinamentos 'de Cristo
de que cada um'deye carregar Sua própria' cruz? Pois s~
você0$tiver
de suportar a si me$mo,como
poderá prejudi_
car
outros?48
,
". ·3
A VIDA TERAPÊUTICA
)/-'
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Fatores pessoais~ a~qlletíp,i~o~
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Mysterium Coniunctionis, CW 14,Pár:52.,
1 •
·,r,
A questão principal da relação do pessoal com o ar­
quetípico no desenvolvimento psicológico é a seguinte: Até
que ponto o desenvolvimento da personalidade é determi­
nado por padrões inatos, apriori no indivíduo - ou seja, os
fatores arquetípicos - e átéque ponto é determinado pela
experiência pessoál e pela influência do meio, da cultura e
das relações pessoais relevantes..". os fatores pessoais?
Jung sempre enfatizou que a psique não é uma ta­
bula rasa, uma folha em bránco onde es~revemos nossa:
vida; apesar disso, ela sofre uma profunda influência, po­
sitiva ou negativa, dás experiências interpessoais, Como
se dão essas influências e como 'elas se relacionam com os
padrões arquetípicos inatos, da forma 'como os compre­
endemos, é a questão que iremos explorar agora.
Sabemos, por meiÇ) da nossa própria vida e do tra­
balho.clínico; dos. profundoSi ,efeitos, que os eventosda in­
fância e as relações pessoais com os pais podem exercer na
personalidadéfutura da cri~riça. Mediante relatórios fei­
tos cóin crianças selvagens,' sabemos que, se faltar à crian­
ça um relacionamento humano, a personalidade humana
não se desenvolve., Em tais casos, as fases de desenvol­
vimento arquetípiconão aco~tecem e a criança pode per­
75
manecer em um nível anim{l]. O mesmo acontece naque­
les casos raros e trágicos onde a criança fica trancada em
um quarto por anos, completaniéútê rejeitada pelos pais.
Semelhantemente, quando a criança sofre a perda
de um pai ou mãe muito cedo na vida e este não é substi­
tuído de forma adequada, cria-se um tipo de buraco na
psique da criança. Uma imagem arquetípica importante
não passou pela personalização por meio de uma relação
humana, de modo que o arquétipo conserva uma força
ilimitada e primordial, que ameaça inundar o ego se este
se aproximar. Contudo, em alguns casos, um relaciona­
mento com outra pessoa que não'uffi.dos pàis pode suprir
essa falta. Todos conhecemos pessoas que, apesar de te­
rem exp!3riências m'uitoI;l.egati"B;stom os pais, foralll ca­
pazes. de. fqrjar uma, relação .positIva .çOm algum Qutro
adulto durante. a infâI,lcia. Esse adulto pode.ter !3ido uma
empregada, um parente, ou um prof~ssor, qú~ tenha sido
capaz de se relac.ionar de maneira genuína com a criança
e de person.ali~a:r uma imagem.a:rquetípica, Nesses ca­
SOS,aiS inadequações, dos pajs.,!eIl)bora.prejtidici~is, não
foram fatais no desenvolvimento da criaJ:lçq. Mes,m.o que
essas relações positivas d.\Jrem apenas .1J.lll breve:ÍJ:lstan­
te, seus. efe.ito,s podem ser inc9rpO:rç(dQs pa:ra sempre na
personalidade, em de$ep-volyif[:U:~1JtQ,
Um dos primeiros.Jllu;ftQs.de Jung;Eric;h N~urp.ann,
tentou responder 'a eiSSp. q:uestãp. Elefal9l! da, .ev9cação
pessoal do arqu,étipo,da s~guinte m::meira: , "
A estrutura transpessoal e eterrÍâ doarquétipo;inerente
à psique da criança e pronta p'ata ó desenvolvimento, deve
primeiro ser lib~ra.da e atiyaq!:l pelQ,en,contrQ pess.oal com
um ser humano... .A evocação do.I:l:rqu(!tipo é um evento
pessoal na históriaindividual e; poi isso, suJeítõ a' possí­
".. " ," ' , '"
veis distúrbios,49
",,t~
\
·,in; 'i.')
f
49 "The Significance of the Genetic Aspect fÓi- fArial;ticàí:psydíologyi,; 'em
Journal ofAnalytícal Psychology •.voJ. 4. J1,o 1 W1.5\1).' r' . ')_'.' L, ,
, < '
76
Adiante, Neumannfalado "fenômenoda chave e fe­
chad ", por meio do quàl a imagE;lm arguetípica e a re­
laçãOura
com um ser'human6'ativam a personalidade em
desenvolviment~, Ess~ conceito :rn,ostr~ cl~~o ayanço so­
bre a idéia anterior e muito mais simples de que a crian­
ça projeta ~os pais b àrq~étipo in:terno. No erilanto, o con­
ceito de Neumani:l não explica como. a personalidade
específica dos pais inUuencia' a' psique" da Criança. Ainda
há uma lacuna e~ hos~fl compreensãO da interaçao do
pessoal coro o
". .' . ·
. '.' .' '.
M. Esther' Harding, também uma das primeiras alu~ nas de Jung, tentou lidar com esse próblemà por(ineio da idéia do arquétipo danificado, expressa,em seu'liVrdThe
rental Imagei tis Injury' and RêconstruGtio n . Mks como pode eU: 'entendo, um arquétipo ser dánificado?Da' forma'
só pode haver uma relação danificada com u'm arquétipo.
Para o ego em desénvolvimento de uma criança,a're~
lação com um arquétipo torna-se possí';"el apenas qu"ando
ele a experimenta
umaencaniação pessoaL A imagem
arquetípica só, pode ser experimentada e concretiiada
quando é infundida coro um conteúdo pessoal e tangível
ç
através de
rehtçãO hll'niana.'Desse';rnodo, à :rehl ãô
com os pais não apenas evoca o arquétipo, como também
fornece uI1}a
arquétipo que a perso-halidade dos pais pode ativar, me­
diar e personificar, é aparte <iliepode, maIs facilmente, ser
!
;
", '
'
,', "
,"
mcorporada pela personalidade da criança. Aquela parte
do arquétipoàqual os pais nã6 se'refà'don'arn'fidará larga­
da, sem reConhecimento, no reino dasfornias eternas, ain­
da não enca~I}'adà
história de vida pess6al 'da 'criança.
Não côncordo corb"Neumann', pelo menos. em parte,
quando ele diz:' ' {'
ar~úetíPicO.
Pa~ cci~o'
em
~Ü1a
pa,rt~ do,s~U; c~nteúdo ~~~pecí!ico. p:~ar;te 'do
•
,f"
"
'na
I'
'
'
A evocação pessoal do arquétipo é uma necessidade do
destino, de forma que uma infinidade de coisas acontec~
além daquilo que os pais fazem ou pretendem fazer, A atl­
77
vidade deles libera as piop,~nsºe.sinªr:~ritt::!.S.fiQ ~tquétipo
transpessoal na psiqu~; infaQtil, as qu;::li~não podem origi_
nar-se, de forma alguma, dá figur~ p.:;ssoapo, '­
LJ.
l."
•
•
•
Esse ponto de vista eilfatiza os cçnteúdos inatos e a
priori do arquétipo de m,~iieira'r~1Uito '~xtreri:ía, nêgando
o ponto até ,onde as perspnalidádes dos pais determinam
os conteúdos específicosl ido
arquétipo,
da
maneira, como
·,
.,'
"
são experimentadospelacriança:'Oconteúdq fqtal do
arquétipo não liberado automaticamen;te a p~rtir de uma
experiênda co.m os pai~, Emyez qissõ, ele' é pá,réÍalniente
liberado, de acórdo' com a parte do arquétipo que os pais
encarnam'e, expressam,
,;
,
Se s'eguirino?, N eumaíul, os ,pai~, são. rE!ispoJ7.s~veis,
apena,spela ativação de' conteúdos' arquetípicos preexis­
tentes. Todavia~ essêponto de ~ista! rlãp consegue expli­
car os profundos efeitos queos pais exercem 'sobre a vida
das crianças', Prefiro Supor que a éxperiência com oS pais
torna-se :parte da própria imagem: arquetípica, tórpan~
do-se uma parte permanente da personalidade: Esse con­
ceito origina-se na idéia de que um arquétipo só :po(;le ser
experimentado e assi,milado
form~sigÍ1ificativa por
meio de uma:relação pessoal espeCífica - poi'meio de um
processo de' personalizC;l.ção, "
, ,
.,,' ' .
. Todo o processo de desenvolvimento pSicplógico Indi­
vidual, por meio dd (lUa'l o-ego emerge de seü' estado qri~
ginal de unidadecqm a psique objetiva e aiquetfpica, podé
ser considerado COn;tç um proces'so de pe.rso?alizaç~o: A
experiência e a realização conscient~ das imagens arque~
típicas somente é possível ao se detront~r çoin e~sas ima­
gens encarnadas nos outros. Neuniann alude a essa idéi~
quando fala da fase necessária da "personalização secun­
.' '
. ,('
dária":
e
de
, j
50
78
Ibid,
Esse princípio (da personalização ,secundária) sustenta
haver no homem uma persistente tend(mcia no sentido de
tomar Oi? con,teúdos primáriÇls e traJ;lspessoais como se­
cundários e pessoais e de reduzi-los a fatores pessoais. A
personalização está diretamente ligada à formação do ego,
da consciência e da individuàlidade... por meio da quaL
o ego emerge da torrente dos, eventos transpessoais e co­
letivos,., A personalização secundária traz um declínio da
influência do transpessoal e prQmove o progresso da im­
5t
portância do ego e da' personalidade.
•
~,•
.' •
,,'
, .
! .. " '
Aqui, Neumanrtse refere, a urríáatitudeque perso­
naliza o transpessoalpara despotencializá;.lo. Eu ,diria,
também,que: há um processo experimental anterior a
qualquer atitude co;nsciente que personaliza. os conteú"
dos transpessoais e que~sse processo é a.carqcterística
essencial do desenvolvimento do ego. e do cr:esCimento.da
consciência, -.' '
""
.,'
,. : \ .
A importância d~ se enfatizar os aspectos pessoais
da experiência é demonstrada pela anál~se de alguns pa­
cientes borderline. Lemoro,-'me, por exemplo, de uma mu..,
lher que entrava em pânico sempre que eu mencionava a
palavra arquetip9 ou fazia qualquer referência a fatores
transpesl?oais. Ela 'conseguia exprimir a natureza de seu
medo de,forma muito clara. Ela sentia que qualquer co­
mentário que a afastas§>e da realidade direta de sua rela­
ção pessoal comigo ou de sua vida diária abriria um vas­
to oceano de possibilidades disformes e ameaçadoras que
a deso.rien~ariaI?:Ela era forçaqa a se agarra,r ao ime­
diato, ao pessoal, ao concretó,'Tódas as generalidades amea~
çavam-na como tltn perigo mortal.
Normalménte, enéontramoso mesmo tipo de objeção
ao tentar interpretar a transferência~como a projeção çie
uma imagem arquetípica ..Bara alguns ,pacientes com egos
frágeis, a simples' idéia de uma projeção pode ser um vene­
f _ \~~ >/
'1'
51' The
Oi'igin~ and Histary af Çansciausne~s, p .• 336s;
79
Life", de 1939, ondeséUS comentários são muito sinceros
no psíquico. Para eles, a idéia de que certa reação pode
representar a projeção de' algUm comPdnente interno ar­
ruína o seu senso de realidade' do mundo externo efaz com
que eles se percam no niar de pu;:t su6jeti~idad~. Um exem­
plo extremo do fracasso <la personalização cias imagens
arquetípicas é encontrado na esquizofrenia,. onde a cons­
ciência é inundada'pÓr imagens arquetípkas, primordiais
e sem limites. Nesses casos, o indivíduo nUnca teve uma
oportunidade adequada para expe~ÍIriéntar os arquétipos
mediados .e personalizados pelas relações humanas.
A manéita como muitos pacientes se atêm obstina­
damente à 'experiência original com 'os pais é devida a
essa necessidade vital da' personalizaçãodo·arquétipo.
Por exemplo, se a experiência parental foi muito destru­
tiva, o paciente.pode ter muita dificuldade' em aceitar e
suportar uma experiência parental positiva~ Tenho a cla­
ra impressão de_qu~euma pessoa irá persistir em uma
orientação, 'negativa dó arquétipo, paterno_pelo simples
motivo de que esseéo.aspecto da ímagemque foi. perso­
nalizado em'sua prÓpria,vida,apresentando, assim,;uma
segurança, .embora- sejaum ,aspecto:négativo, ,Parà, essa
pessoa, encontrar o' as'pectopositívo do 'arqúétipo' é ame,
açador 'porque,~ cQriloesse'~lado nuncaJoi personálizado,
ele carrega uma·ri1agnitude·transp.essoal.que ameaçacdis.
,) , _ I _ .
solver os limites do ego.'"
't ,,;)
!"5:!~:r.~J
_~;
A transferêpCia: arquetíp{ca
, ,;,.!~ .
:__ ~>."
J~'~.'
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eo'.~~co:.itr'Ó p~ssoa]~.Jfll,~ --
,,~,'
~
.-~.)
A forma como compteendemosa ligação entre osfa:­
tores pessoais e arquetípicos, nodesenvolvirilento psico­
lÓgico influencia a maneira' como lidamoscdm os sonhos
arquetípicos.e com a.transferênciá:arqu,etípica.
Um Ótimo exemplp disso foi ImbliCadó(por Jung.pelâ
primeira vez em 1966, em Two Essays on Analytical Psy­
chology. Ele também falou disso na palestra "The.8ymbolic
d.
80
",;
e informais:
".'i I
i,
"
-
') .
.
~~~
Lembro-me-de,um caso rpuito simples. Era uma estudan­
te de filosofiá, uma mulp.er muito inteligente, Isso acon­
teceu bem no início da minha carreira. Eu era um médico muito jovem e não conhecia nada além de Freud. Não era um caso muito importante de neur?se, e.eu t~nha,quase certeza absoluta de que ela poderia 'curar-se; mas ela não se curava. A'moÇa havia'desenvolvido Uma transferência paterna iniprEissionante comigo -:. projetando a: imagem do pai em mim. Eú disse: "Mas,'veja, eu-nao sou seu pai!" "E-q sei", ela disse, ,"que voqê-não é meu pai, mas é como se
fosse:,'.E\a se .c,omportou de ,acordoçom
papel e.
apaixonou por mim, e euera se'u pai, irmão, filho, aman­
ó
te, macido _ e,' é 'claro: também ,eu her , e salvado' ­
todàs às cóisas ilnagináveisr"Mas", eu disse, "isso
em não faza
isso",el
o menor. sentido!': "Mas eu:não posso vívers
respon9.eu.,O que é que poderia fazer:? Nenhun;ta expli.
caçãO depreciativa iria ajudarf!1uito. Ela disse: «Você
VOpode
Q
di,er, ,9 que qui,er;é i'"o que"eu',\nt "
"ta n'"
garras de
imagem inconsciente. Então, tive-urna idéia:
'''Bom; sé alguém sabe algúma: coisá> sobre isso, esse al­
guém temq"e 'ser~o incóJ;lsciente, que.pro:duziu uma situa.­S
a observar de 'perto 9
çãotãQ. cOJllP\icaQ.!l:".
aparecia como o
s9nhQ$./Ij.:la
'ionho,
DepoiS; apareci
como o amante, e também como o mando - todos eles eStavam'ÍlO mesmo filão, DepoiS, comecei a mudar de tama­
'Íl~'o; eu era. muito maior do que um ser humano comum;
"em .lgun, momento' eu tinha até me,mo atributo' rdivi,
;i ,'1 ,,',Pep,ei,,"Bem,es," é a velha idéia do "Iv.do ", E
. então
comecei a assumir as formas mais surpreendentes.
o
"" 'Àpa,éci, pC< exe",plo, no tamanho de um deu', ,obre '"
a
_segurando- a em meus braços como se fosse um
;,bebê; e o'vento soprava sobre o milho e os campos ondul ­
,: i\;Ylirtl comÇl
da mt;lsma forma eu a
,ai,
"Agora eu vejoO que ,o 'inconsciente está realmente pro-a
.j . ' (,
'
.'
., '
.,
" (l' ,
" 'i·'
""
"
,.., curando:
ele
quer fazer' 'de_mim
um
deus:
a garota
précIS
de um deus... Ele quer encontrar um deus, e porque não
consegue, ele diz: "O Dr. Jung, é um deus"c E então contei
e~se
~u
EI~
um~
,Lºgo,~çOll1éCei
~iph~.~onhpsrtOEl quais'~u
Pli,c;,,~e?,,~,
:~J'ca~Pos,
ró, trab~lhan""
ond.llsd.Ortl~r,e
nin~va
,,em,\m~,",,,br,a,o,, ~ q~dQ:fi, ~",",\",ag~m, pen,~)'
81
i
\
!
a ela o que eu estava pensando: '~E;ú não 'sou' um 4 s,
eu
seguramente, mas seu inconsciente precisa de um deus.
é uma necessidade muito séria e genuína":.: Isso
mudou a situação por completo; fez toda a diferença do
mundo.
Eu Curei5~esse caso, POrque satisfiz a'necessidade
do
inconsciente.
"
Esse caso;' apárentemente, foi um' dos primeiros e
decisivos casos que ,I
J ung pensar no
árque­
típico do inconsCIente em
pesso<jtl. Nes­
se caso, ele abriu mão dá interpretação pessoal, mudou
para uma interpretação arquetípica~ e curou a paciente.
É'c1aro que b caso foi 'símpÍlficadoê projetado pat.. che­
gar a uma
para
.
,
',,,
, '.
, I.
demonstrar a imagem arquetípica e Sua necessidade de
~
~
ser realizada conscientemente. Para nos, que nos basea­
mos por completo nessa idéia; àcredito que outras ques­
tões devam ser levantadas. ..' , ... ', "
1
~vQti
~
,1)í~el
oPQSiÇã9'_~onÍv~1
condusãoespeCÍfica:'n1ai~precisame~te~
•
,
-
•
• _
i
•
I,
'~ugar,
Em primeiro
nOSsa' experiênçüi.',Cii1)ica' nos
mostra que umpacierite com sonháS' desse tipo'.dificil_
mente é curado
pehinterpretação,"ru-qUetíPicádos sónhos,
e
evitando:s 'qualquer tipo' de encontÍ'o intenso e pessoal.
Na minha éxperiênciá; tais sonhos·têmindicadO' um in­
z;nas um
tenso dinamism'o~,
dinamismo que não pode ser ,dissolvido
sua despersonalização por meio -de interpretações religiOsas ou arquetípjcas. O único' procedimento que tem funcio­
nado COmigo é acoitar eS sess6nhbstiÍmo'uma deScriÇão aCurada da imporiând<:t;,p(,lra o p,ácie.qte;,da re'laçãó que ~
~.' I "".'
~~ ,
ele mantém Comigo, Se, carrego comigo
o valor
projetado
ou personalizado d~ Deus ou do Si-mesmo; nã~ exi~'te uma forma interpretativa de me livrar dessa responsabilida_ de, O desenvolvimen tó pSlcológico dá
por meio
de Um interCâmbio interpessoaJ'pfolohgádo; 'qué'perso_
...
arqUetíPicona'transferên~ia:l'
",
'
'.
.
,.
'.'
,
"
J
,
atr~vésAa
.,
•
I
nalíza ecoIlcretizá, demaheirá gradual, a imagem arque,/:
"
típica ativada.' I; ,; ." "
Em Two Essays, JJ.mg descreve esse caso de forma
muito mais circunspecta. 53 Torna-se claro, então, que a
paciente não se curou imediatamente com a interpreta­
ção arquetípica, ,mas, em v:ez disso, ocorreu uma mudan­
ça bem graduaL Sem negar a validade da interpretação
arquetípica; podemos nos perguntar se a interpretação
foi o que exerceu a influênCíacuraâora decisiva. O prin­
cipal fator de ·cura pode muito bem ter sidó o interesse
pessoal ea pre'Ocupaçao de Jung por essa.paciente e:seu
materiaL Ela, por acaso, estavaào lado dele n'O momento
em que .uma grande teoria. da personalidade humana.es..,
tava em processo de germinação. Jung compartilhou essa
experiência pessoal tão importante com ela. Eu diria que
foi o encontro pessoal-com a personalidade:aberta e hu­
mana de Jung quepersonalízou o arquétipo ativado e le-i
vou à sua: assimilação como UffiIlOvo pedaço da própria
personalidade da paciente.'
J ung descreve sua busca por' um sentido nesses
sonhos emTwo Essays. -Ele termina ,com as seguintes
idéias: .
.
','
,
.•
~ ~dri1ente
,...
52
82
'-.',
,;
';
I
"0
The Symbolic Li{e, CW 18, par 634: i
;I
J
• '1
r,
-:,.
'
Pensei: talvez, o in.~onsci~nte· esteja tenta,ndo .criar
deus, apoiando-se na pessoa do médiéo, a fim de libertar
concepção de deus dos invólucrós dé uma: instância
soaI: Dessa forma, a tránsferência reali~ada na pessoa do
médico não passaria de um equívoco da consciênciá, de
uma brincadeira estúpida,do "sen,socomum" .... Acaso a
nostalgia de um deus poderia ser uma paixão, manando
de uma natureza obscura e instintiva, uma paixão intócada
por quàisquer influências externas,talvez mais'profunda
e forte do que o amor por um ser humano?54
,
,I
53
54
CW 7, pars~ 206ss. h
Ibid., par. 214.
\
J.: ~
83
Essa, é claro, era a forma como .Jung enx~rgava a
transferência arquetípica. No entanto, tal Pbntod>eyista
tende a depreciar, e até mesmo ajustificaÍ'como ~m"mal­
entendido, a. natureza intensament~ pespoal da. tr"!fis(e­
rência.
.,
ê J , . , •.•
Há uma outra forma, Complementar, ,de se olhar para
a transferência; .que, deyolve,ao :aspecto pessoal o valor
que lhe é de direito. Em. ve.z.de c.ompreendE):r os sonhos
dessa mulher s,omerite . como uma tentativa"do 'incons­
ciente de "libertar uma.vis'ão de De,)fs'do véll dm; aspec,
tos pessoais", .,podemos, compreendê-lq,s
também, ou. pre­
.
ferivelmente, .éomo uma.tentativa.do arquétipo. de eme;rgir
de seu reino remoto e ,ete!nQ para se encarnar pessoal­
mente na vida real.da paciente, na ,.r.elaç~Q,d.ela çom q
analista.
, ."..
" .' '. ''''''''',
... }.
Se pensarmos.assim, nãoteremosznais ªqllele ,an­
seio de mandá-lo de volta para Q lugar de ond~,saiu,
tentando separar o arquétipo da pessoa do analist,a."Na
verdade, agir assim pode fazer cQm que.a paéi.ente perT
ca uma,oportunidade q.edar Um graIlde passo.no seu
desenvolvimento psicológico.. Namaioria dos casos, uma
imagem arquetípica ativada somente pode ser assimi~
lada se ela puder, primeiro, encarnar-se em uma expe­
riência'I pessdal Essa ét ,al oportunidáde
fornecida
pela
•
.J'lt
,
relação analítica. ~e nos der:;cuida~l;lO,~ ou tel]:tamos nos
esquivar desse pr,ocesso,prolongado deinte.rcâmpio pes­
soal que segue à ativação de um arquétipo, se conside­
ramos a transferência um estorvo, e não·:uma oportuni­
dade valiosa, causamos. uni c-urtó,.circuito'
processo /'
natural
de
desenvolvimento
fi
levamos
a
personalidade
.
55' :
:
'~
de volta
ao status quo ante.. I '
:.
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',;
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I
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J
1
I
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LI'
.
J (
55 Para uma discussão mais completa sobre a transferência como uma
"oportunidade valiosa", ver o último artigo deste livro, "O fenômeno da ,Trans.
l'
..
• . ..1
ferência". (Nota do Editor)
84
.
A cura em harmonia coma psique objetiva
~
:
~
I
Essa discussão leva'a uma questão 'mais geral, rela­
tiva ao efeito curadQr e à interpretação dos sonhos. Até
que ponto as .imagén~ ·.onírlcas autÔnomas 1~vain a uma
cura e a ~~a maior consCiêncüi, ~até que pontó'a reação
do analista o contexto' interpessoal' dó processo de in­
:.'
terpretaç'ão dos' ~'õnhos con t~ibu.em?"
Essa é lim:aqúestão dificíliIna. ror um ladô'; existem
muitas evidências
de
um processo psico19gico,
inato~ ~ e es­
~.'
~.." ~
~
~,.
1
pontâneo, que luta pela auto-realização. A série de so-, nhos public~dâ por Jung em p,sychológy andAlcliéTJty é. um ótimo exemplo disso. 5s Ppr'outro ladp, existe.m mui­
tos outros exemplos na pr~tica psicoterápíc'aonde nos~;as próprias ~~~postase
.envolvimento parecem ser fator~s ~
e
L.
."'
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.
f
J
'
cruciais.
Acredito que a maioria de nós concorda que a.mes­
ma coisa que ac'õntece com os fenÔmenos pSfquíêos e in­
conscientes acontece com os fenômenos da física subatÕ~
mica: quer
dizer,/que
eles Ilão~ podem
s~r
..obser:vados
sem'
~
,
.
.»
•
...
~
'<.J "
.
'" ' ~
-' :
que o próprio. processo de observação 'os influencie. As;
sim, uma óbservação~ objetiva ·éne~tra do incons,ciente é,
impossíve!..·, ' ' . '
' .
.
.,
Esse 'é o 'ponto de vista de Jung, e ele o re~firmou
várias vezes., Por exemplo, ele diz em "General P r .obleIp5j
of Psychotherapy":
É que, queiramos ou não, a relação médico-paciente é uma
relação'pessoal, dentro do quadro impessoal de um trata,
mef1.tomédic.o. Nenhum artifício evitará. que o tratamer;:t­
to seja o produto de uma .interação entre o paciente e o
médiéo, éomoser~sinteíios ... Esta éa razão por.que mui­
tas vezes a personalidade do médico (como também ado
paciente) é infinitameÍlte mais importante para um tra"
tamento psíquico do que aquilo ~q'ue o médico ,diz ou pen"j
56CW 12.
85
sa... o encontro deduas.personalidades'é como a misturá
de duas substâncias químicas diferentes: no caso de se
dar uma reação, ambas se transformam. 57 "
O que Jung descreve aqui é um campo 'dinâmico de
influência psíquica. éompartilhàClo peló rriédicó' e" pelo'
paciente, para o qu~l os dÓIS contribuem e pelo qual
ambos são afetados. E dentro desse caxnpo de influência
mútua que todas' às observações sobre à psicologia:
profundadevem:'ser feitas. Nesse campo,é impossí~'el fa­
zer qualquer ôbservação"objetlva";A observação impli­
ca, inevitavelrriente;em uma participação.
É impos­
,
sível para nós saber'se um sonho específico ou determi­
nado curso de desenvolvimento são' n'aturais do pacien­
te, se são evocados pelos interesses pessoais e pelas res­
postas do analista, ou se derivam de uma' combinação
dos dois.
A concÍusão parece inevitável. Independente do
quão cuidadosos somos ao trabalhar com os sonhos do
paciente, nunca poderemos saber ao certo se estamos
promovendo seu'próprio padrão de desenvolvimento ou
imprimindo riossa propriavisão demtindo em uma,psi­
que maleável. Já que a participação pessoal de um ou­
tro ser humano é essencial
de
. na infância e no processo
.
cura da análise, esse processo de impressão praticado
pelo analista parece ser tanto necess;irio 'quanto inevi­
tável.
Essas considerações levantam questões sobre a na­
tureza essencial do processo analítico, da interpretação
dos sonhos e da individuação, da forma como surgem na
análise. Nossa teoria b~sica' a respeito do desenvolvimento
psicológico é que a personaliqade individua'l contém seu
próprio padrão inato' de to~alidade: tamb~m.[ o in'ipulso
para realizá-lo. Essa hipótese omite o efeito da experiên­
\
,
e
51
The Pra.ctice orPsychotherapy, CW 16, par. 163.
cia pessoal ou da influência cexercida pelas relações
interpessoais. O problema é qUe não podemos comprovar
essa hipótese. Aobservação da psique de outras pessoas
inevitavelmente envolve a influência exercida pelo ob­
servador:Isso complica os dados obtidos, de forma a não
podermos dizer se o que estamos observando originou-se
no objeto obse~ado' ou' em 'nós mesmos. Não podemos
saber ao certo se estamos observando a individuação de
outra pes'soa ou noss'a própria, ou quem: sabe a indivi­
duação de Jung acontecendo em nós! . ,
Uma forma de lidar com esse problema' é entender a:
individuação como umpadtão coletivo de totalidade com­
partilhado por todos os seres humano's e talvez por todos
os seres vivos. Assim, não' teria importância'saber se oS
sonhos arquetípicos ou as imagens da individuação' origi­
naram-se nó paciente ou no 'terapeuta. Se um terapeuta.
consegue introduzir o paciente-nas 'energias básicas, co­
letivas e psicológicas por meio da sua (do terapeuta) par~
ticipação hélas, então ele;está a serviço da função cura­
dora. Não' t'éiia impb'rtância sabérse 'ele se direcionou
pelo inconsciente do paciente ou por sua própria experiên~
cia de vid~,'desdeque ele esteja em harmonia com as
realidades da psique objetiva consideradas como um cam-'
po compartilhado de dinamismo psicológico do qual to­
dos os sérés humanos participam.
Para utilizar a analogia do fruto do carvalho: se so­
mos todos' carvalhos, então podemos compartilhar' nos'.:
sos padrões de 'carvalho como paciente, qu~ também é unÍ
carvalho em potEHlbÍal. O que damos de nós mesmos ta.ín~
bém se t,ornará parte do paciente, já,que compartilhl1mos
os mesmos padrões' inatos. Esse conceito pode ser, ilus­
trado pelo seguinte exemplo da rela,ção dos fatores pesso­
ais e arquetípicos na. análise.' ' .,
. ,
O paciente é um homem talentoso e muitoiIltuitivo,
por volta de seus tript,aanos de idade, cujl; infância foi
i
86
87
altamente comprometida do ponto de vista emocional.
Essa privação levou,a uma, quase absoluta paralisia em
sua vida adulta.,EI~Joi uma cri?-nça bastarda, çxiada por
pais adotivos quase psicóticos, e sU9- adaptação à vida
adulta é precária. EWQ9ra tenha granQ.e talento musical,
teve poucas oportunidade.:;; (,le obtE1T uma ~ducação for­
mal. Ele já estava cOI)ligo há Illais de dois anos quando
do momentod9: se§são que vou ciescrever. EI.e me disse
que havia, recebiqo uma oportunidad~ úpica de estudar
música, que demandava uma despe$a maior do que ele
podia dar conta. Seus problemas psicológicos haviam tor­
nado quase impossível que ele entrasse em qualguer aula
mais séria no passado, mas agora ele começava, a perce­
ber que talvez fosse capaz de fazê-lo.
' , ,
Depois de conversarmos sobre o a,ssunto por algum
tempo, chegamos à corclusão de ,qu~ e§sa ,era, de fato,
unia oportunidade ünportante que, se dava em 'um' mo­
mento propício de, seu' próprio processo psíquico, -e que
ele pode:r:ia r~al,nient~ aproyéltar ~ssa·opórtunip.ade. Eu
lhe disse, então, que estariã dispostõ a reduzir ainda mais
o preço da, súà sess,~o; q~'~ j ~ er~ baixo,' pã,;~' q].le ele pu­
desse obter ~ dinheiro
neéess'áriõ paià éomeçár,
os estu~
.J_ l.....
,I., .
dos. Elê ~cou, bastante empcionad~corp. a Ç>ferta e acei7
tou-a dé bom,grado.
. ,
N a visita seguinte, ele falou uni pouco mais sobre suas reações conscientes. Ele disse que ficara muito toca­ do' pela ~in~a;gen~ros{ç.ade," e. sen ti~. qúe cessá era sua primeira ,experiência de ter urp p'ai. A r~s'posta de' seu in~ consciente podê ser ~ista no' seguinte sonho: . -
_JIO
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,o,'
'
",
{
Estou sent~dodiante de um e'ntalhe àntigo de uma cruci­
ficação. Ele éde metal, Irias está parcialmente coberto por
uma substância,pareç~d~ com cen;l, ,o que me leva.~ desco~
brir umas velas sobre ele, uma de ~ada ~ado.,Percebo que
estou prestes a acender ils velas, fázendo com que a cera
desça para dentro do eilta:lhe~ e qb'e i'sso e~;"tirreH{c'ionado
Com a refeição ritual qú:e eu voti'com~r.iJ . '::. "'I,
88
j
Acendo as velas e a cera,n')almente desce para dentro da
forma vazia da ,crucificação, ~I,lando o entalhe enche, eu o
tiro da parede; estou prestes a comer minha refeição. Pe­
guei a cabeça 'da imagem, que se formou ao se encher o
entalhe, e a estou comendo: Ela é feita de uma substância
parecida com chumbo - muito pesada - e começo a me
perguntar se serei capaz de digeri-la. Fico pensando se os
humanos conseguem digerir o chumbo. Percebo que co­
memos um pouco todo dIa, e que comemos prata também.
Acho que nãohá problema ter éômido o chumbo, mas es­
tou com medo de comer demais. O sonho termina enquan­
to estou comendo.'
Escolhi discutir esse sonho pàrticularmente PÓF duas
razões. Primeiro, é óbvio que esse é um sonho arquetípico
que parece estar claramente relacionado a, se não for com':
pletamente causadopela,minha oferta pessoal, ao pa J
ciente. Segundo, se 'eu a'compreendo da maneira correta,
a imagem do sonho refere-se especificamente ao assunto
dessa palestra, ou seja, à relação entre as experiências'
arquetípica e pessoal. Minha oferta de reduzir o preço foi
uma tentativa,de, ser o pai zeloso.,Eu gostava desse hü':
mem e sabia ,de seus' potenciais não realizados. A reação
consciente dele igualav'a-se à minha' intenção consciente:'
pela primeira vez ele experimentou O sentimén'to'de teF
um pai. No entanto, o sorihoque se seguiu'oferecia ima­
gens diferentes sem nenhuma associação pessoal impor J
tante. Eu não trabalhei esse sonho cóm ó paciente em:
detalhes, mas sinto uma necessidade pessoal de com-\
preendê-Io:· ,,'--_.
'.~
Em primeiFo lugaF,'o 's'onho;,apresenta' um' entalhe
antigo da crucificação. Um entalhe é uma es'Cültur:a em
depressão,'um rélevo negativo,- o 'quál, quando pressio­
nado sobre algum matérialin'acio tàlcomo a cera, produz
uma imagem com relevo positlvo. Compreendo o entalhe
nesse sonho,como,referente aüma estrutüra arquetípica,
Uma forma inata, vaz'ialem si;m:esma.É um mecanismo
89
de impressão que cria imagens de si mesmo a partir de
matérias amorfas, como a cera. O sonho diz que o enta­
lhe é antigo. Isso se refere à sua natureza 3:rquetípica,
histórica - algo flntigp.e preexistente ria psique. O for­
mato do entalhe é a' crucificação. O paciente foi criado
como católico e levava essa religião muito a séri.o na in­
fância; as imagéns cristãs estavam, por esse motivo, fa­
cilmente disponíveis para ele. ,
.
Cristo suspe~so 'na cruz é,. em essência, uIp.a mandala
e, por isso, pode ser tomado como uma' repr~sentação do
Si-mesmo. A imagem da crucificação apresenta o tema
central de tpdo o mito cristão, muito pertinel).te à nossa
discus~ãoi. ou s~ja, a encarnação de Deus na forma hu­
mana,~)U, para colocarmos em termos, psicológicos, a
encarnação de um arquétipo, o Si-me,smo, n11 experiência
pessoa.l; conçr:eta e histórica. Omito cristão da encarnação
corresponqe ao processo de personalizar: o arquétipo no
desenvQlvimen.to psicológico. A encarnação de Deus cons­
trói a pqnte entr~ q mundo consciente do ego e o mundo
transpessoal da psique objetiva, Sem o proc~sso de encar­
nação, oburacq~entre!o h01:p.em ~ o divino,egQ,e Si-mes­
mo, não pode ser fechado.: Falanqo de forma teológica,
'i.
não haveria salvaçãq, ., . ,: ". \ ' ': .:
O próxirpo dado do so.nho'é <;I acender das duas velas
e a cera ,çorrendo para og1olqe do .e,ntalhe. Vejo as velas
acesas como. um,símqolo do próprio proc;esso de vida. A
cera derretida, produzida pela chô:ma .9.as velas, pode ser
compreendida cómo uma substância maleável produzida
pelo ato de se viveria qu~l, enquanto está quefl;t~, toma­
rá a forma do molde sobre o qual flui. ,: .', ;
No sonho, a cera derreticla é o material·bruto, a subs­
tânc~a amorfa, moldada emuma,irn11gempredetermina­
da. E esse processo de molçiagem, que, corppreendo como
uma expressão simbólica espeCífica d.a enc;:trnação pes­
soal da imagem arquetípica. Sem;.uqta ~ubst<1ncia sobre
90
a qual posf:!a irp.primir a mesma, para poder criar um
conteúdo real e positiv:o, a forma arquetípica representa­
da pelo entalhe. perman,ece. apenas um contorno vazio.
por outro lado, ?cera.que representa o produto da expe­
riência de vida. pessoal per:m?nece .amorfa, sem uma es­
trutura outp:p, ~.ignificado" ,atéencoJ?trar, seu caminho
dentro da imagem ;;rquetípic;;,-:- OI ent(jJhe - e. ser molda­
I
da em urp.a forma. significativa, .
por que são ,dl.,l.;;s as velas, não sei,a.o c~rto. Aparen­
temente, o processo é. duplo.Isso me faz lembrar dªs ima­
gens de Mitr.a,. que o m.Qstramladeado. por ,dois· guias es­
pirituais, um segurando uma tocha par;; çima, o outro
para baixo., O entalhe da cr,ucificaçãocom .uma vela de
cada lado também é análogo à. cena corwelJ.cional da cru·,
cificação, onde Cristo eh_c.ontra-se ladeado ,por dois lap.rões.
Embora esseisonl:lolnão seja,clefinitivo, acreditQlque ele
faça uma. alusão a lnll processo. trinitário, As du?s. v:elaS
derramam .se u produto em um terceiro objeto, ,o entalhe;
que junta os dois'e molda-os em urnaJor:r;Ila significativa.
Se estivermos .n9 canlÍnho certo, as dq.as velas represen~
tariam os opostos, e de seU funcionamento conjunto ,sai­
ria o material bruto. para;;s formas simbólicasLsign.ifi­
.' " F " "
' I , "1
' .•
cativas. ' .;,
O spnho entãoxepr:es.en,ta a ingéstã.ü ritual da figura
de cera. Essa imagem possui um paralelo preciso nas refei~
ções de comunbão.sagrada . nas qu;;iso paFticipant.e con­
some uma representação da divind::tcle. Ela repre!3ep,ta a
necessidade.do sonhado!' de assimilar,psicologicamente.
o produto.do prpcesso,que:acaba de. ocorrer, para:torná-lq
verdadeiramente, seu.. Nesse ponto, aparece :!lma, caracte,
rística muito l interessante -;- a consciência, no. sonhador,
do peso da substância a ser comida e su.a digestibilidade
não quest,ionad;;. Aêu.fase po peso s\Jgere a realidade só,
lida, substanci.al, d9 que. está séndo ingeridQ. Q indjvíduo
Curva-se com esse peso, e fica mais próx.Üno do, chã.o...
91
Um aspecto desse peso, acredito, refeI'e-se ao tipo
psicológico do paciente. Ele 'e extremamente intuitivo,
talvez a pessoa mais intuitiva qUe já conheci. Dessa for­
ma, sua experiência do Si-me'smo deve se dar, inevitavel_
mente, por intermédio da sensação, Sua função inferior.
A sensação, a função da re'alidade, é experimentada pe­
los intuitivos, em geral, como algo muito pesado e inerte,
daí a preocupação do sonhador Com sua càpacidade de
lidar com todo aquele peso: Na última parte do sonho, o
material torna-sEf chumbo. Isso·é importante porque o
sonhadortiv:era outros sonhos onde o chumbo' tinha um
,: ;
papel proeminente.
Chumbo é um dos termos cómuns pataaprúná ma­
teria na alquimia-; era a substância original, da qual o va­
lor supremo ouro, a pedra filôsofal- deveria ser criado. A
característica mais notável do chumbo é seu peso, Sua so­
lidez. Ele é um símbolo apropriado para a realidade terres­
tre, e assim; 'representa as realidades concretas de nossa
vida'pessoal, opostas às formas arquetípicas eternas, que
não têm'pesó ou realidade própnaaté que sejam preen­
chidas com algum conteúdo, Uma conclusão semelhante é
indicada pelárélação astrológica entre o chumbo e o planeta
Saturno. As características saturninas incluem cautela,
controle, responsabilidade é uma praticidade séria: 'Essas
são' as característiCas que mais faltam a esse paciente.
Esse soriho foi muito útil para m'im, ná ordenação das
minhas idéias sobre a relação entre os fatores pessoais e
arquetípicos no des'ehvolvimento psicológico, Ele veio
como uma resposta à minha experiência' pessoal de ofer­
ta de redução do preço da' sessãó do paciente: o.'sónho
diz, de fato, que minha oferta foi vivida pelo inconsciente
desse homem como uma oportunidade de participar de
uma refeição sagrada e de incorporar uma imagem da
divindade. Esse é o sig:ilificado arquetípico que súbjaz ao
encon tro pessoaL
,(
92
A experiêntiaarquetípiéá poderia ter, ocorrido sem
a relação pessoal? Duvido: muito."O arquétipo deve ser
encarnado; meSmo que escassamente. Minha simples ofer­
ta de assistência veio 'nomorrléhto certo' para que pu­
desse ser vivida e inéorporada pela: personalidade do pa­
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A encarnaçao pessoal dos arquetIpos
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::I~
De fórmàínilito' clàra e'enfática, poI' repetIdas 've~
zes, J uhgénfatizou 'a necessidade'dê nóS' relaCionarmos
com os pacientes cOIÍl'tod'({a nossá'pérsonalidàde. É 'I:jro~
vável que, mais 'do que qualquer' ilm de nós; ele tenha sido
capaz de partiéi~ar vitalmente':do encontro'an1álítico:' J
Eni seús escritos, ele insiste na importância da paf~
ticipaçãopessoal'do analista. No entanto, as passagens,
em seus textos que recomendam essa participação estão)
muitas vezes; esé'ritas de maneira didática e exortàtória:
Ele não relacioná a importância da participação pessoal
à sua teoria'da estrutura da psique. Não podemos' dizer
que issose devà àsupostadescrença dê Jung em relação
às teorias: Ele' estava disposto a construir uma teoria da
estrutura da psique, da natureza dos sonhos'e dá. libido.
A falta de uma têoria que diz respeito aos efeifo's psicoló~
gicos da experiência"interpessoal parece ser uma verda~
deira omissão que ainda deve ser preérichida. '. ,',;',
A partir 'de sua 'distinção originàl entre" as 'camadas
pessoais' e cóletivás ,do' ihcoris'cien te; ele toriui va'-sé' cacÍà
vez mais preoctfpa:do'comó aspectocoletivó, arquétípicoi
Seu procedimento an'alítico'tornou.!semaise mais um rrie~
todo de educação esPiritual que pressupunha uma 'per­
sonalidade cOÍlséiénte:beni-desenvolvida: Os estágios pri­
mários do Clesenvolvíriiénto 'dó' égo':eiám 'relativ.amente
negligenciados e não recebiam' uma 'elaboração teórica.
Contudo, lidamos com pacientes em todos os estágios de
93
desenvolvimento :e, por"isso, precisamos··de; mIl? teoria
geral que abarque todas as fases do desenvolvimento.
Todas as experiências. psicológicas são· arquetípicas,
no sentido de que são, padronizadas, determinadas, pelas
formas inatas, univers.ais, da existência ,humana. Iss,O é
bem visível na criança, na qual os conteúdos pessoais e
arquetípic,Os estão misturad,Os de forma inextri~ável. Já
n'os adultos, iss,O é m~it,O"menos ~yident~, pois a R~ique já
pass,Ou por um processo' de persoiiálizáção' que é siri"ônimo
de um desenvolvimento do" eg,O:,É exatamente d~sse pro­
cesso de pers,Onalização que muit,OS dQsnoss,O$ pacientes
precisam desesperadamente. A carpa<.la pesspal 'da psique
é f,Ormada c'om o passar do tempo, e a melhor forma de se
pensar nela é sob o prisma do desenvolvimeI).to. Ele cQme,
ça no nascimento e continua ao longo da vida d,O indivíduo.
'Ibdas as nossas experiências, internas e externas, e
também as dos nossos pacientes, são, ,em essência, per­
sonalizações d,O arquétipo. Então; a natureza do trabalho
terapêutico, especialmente na prip1eira metade da vida,
é ajudar.o paciente a se relacionar com as,formas arque­
típicas emergentes, Jornecendoo contexto de uma rela~
ção interpessoal,por,meio da'qual e1\)sas formas possam
ser per~o.nalizadas. I~$o pode ser feito, sem se mencionar
a palavra;.';arq1J.étipo;:, e tenho, ce~teza de que,issoaçonte­
ce com freqiiêI)cia çompsicoterapeutas de 'outras escolas,
que nem sabem nada sobre,osarquétipos. ";, 1 \ " •
Quandp pos·r:eferimos ao ç:r;escimento,Ou àsexperiên­
cias transfor:I]1ad,Oras"como ,opost~s .àqueias que r~sul­
tam de. ;uma ','di~torção projetiva\o,conceito de persona;
lização do arquétipo é preferível à conc~pção cçmyencional
de projeção de imagens.arquetípicas. Essa projeçãol,da
imagem arquetípicap,Ode·servista como UI;n,esforç,O ,do ar­
quétipo para alcançar, um? enc;:trI1ação pessoal ,',O primei­
ro passo n'o processo de assinlilação ,cons,cientedo arqué­
tip,O.
.1 1 i1
!. ,'J.)
*',! ií ','
i
94
Essa. f,Orma de conceituação leva a uma ênfase dife­
rente daquela"de'Jung de que ,os conteúdos do incons­
ciente devem quase sempre ser integrados via projeção.
A forma como Jung:diz isso S'oa quase c'o,mo uma descul­
pa. Devido às conotações da palavra "projeção", parece
que ele está dizendo: "Infelizmente, a natureza d,O pro­
cesso psicológico é tal que devemos suportar certas proje­
ções por ,algum tempO, para que elasp,Ossam ser assimi­
ladas". Essa forma de se iniciar o processo parece refletir
um tipo introvertido. Ela nega o valor do encontro pesso­
al, assim cómonega a importância inerente ao processo
de personalização.
.
" ' ('
.
No que diz respeito à teoria junguiana de desenvol­
vimento da personalidaqe,. parece-me que temos presta?
do pouca atenção 'aos efeitos dos relacionamentos,pes­
s,Oais. Os' fatoresinato.s,predeterminàdos" arquetípic,Os,
foram enfatizados/em.detrimentq quase,total.do pessoal.
Esse" desequilíbri,Oé conseqüência das circunstâncias his-"
tóricas no momento. do nasciment,O da psicologia' àna~íti-:
ca. O desequilíbrio .foi corrigido nQ próprio método analí~
tico d~ Jung, ,O 'qual ele conduzia de forma bem livre e
pessoat Os .efeitps d,essa abordagem, contudo, nunca fo~
ram iI,lvestigados de maneira específica,ném receberam
uma formulação teórica.
r ,: . , " "
"'.'
De alguma forma, os fatores pessoais e arquetípicos
devem ser agFUpado~ ém uma teoria gera1. Isso pod~ ser,
feito' ao se compreender a necessidade da encamaçãop.es::;
soaI dos' arqlú~tipos na, ex'periência individuaL TO,das 'âs
realizações.arq'!l~típicas ~ão e devem ser pessoais. Q:corpo
em que um arquétipo.encamaé form ad,O de substânciá'
pessoal,já que a,re;:tlidade pessoaléa única que podemos:
experimental" Osarquetipos não possuem Qutra forma de'
se expressar a I,lãoser por intermédio de imagens que de-:
rivam da experiência pesso;:tI::Por.isso, vento;fogo, água,
sol, lua e estrelas; todos serverrt1corpo imagens para os con­
95
teúdas arquetípicas. Más até mesma essas imagens relati_
vamente impessaais derivam da experiência pessaal. Can­
sideramas que tais imagens se refiram a canteúdas trans_
pessaais, a que é verdade. A técnica da amplificação. é um
métada refinada ,de persanalizaçãa, que assacia as ima­
gens de nassa, herança histórica ,à imagem de um sanho
pessoal, de moda a fixá-la na cansciência. A amplificação.
nas leva um passo além, rumo. à nassa ascendência cultu­
ral e geralmente humana. Mas ela nas relaciona ,com nas­
sa herança cultural de maneira pessoal e, assim, é uma
abardag~m geral da persanalização do arquétipo..
A personalização. das arquétipos nern sempre preci­
sa de uma relação. interpessaaL Ela também pode surgir
da rela.çãa.com U:Q1 campo de estudo' au comum interesse
inquietante. :Um grande. interesse pela ciência, nature­
za, espart~sou política, par exemplo, pade representar a
encarnação pessaal de um arquétipo. É clara que um in­
teresse desses tambéin .pode ser considerado camo umá
prajeção de um significado essencialmente interna.' Mas,
ao descrevê'cla camo uma prajeção, aamas: uma atenção.
exclusiva às origens .internasda'cante~da,e não. atribuí­
mas nenhum valor específico ao processa de persanali~
zação - a qual traz a imageminconsciente para uma rea­
lidade empírica.
)..
Nosso interesse e comprómetimento com.a psicolo­
gia profunda e cam a"psicaterapia, por exempla,é um
exemplo. de uma .encarnação pess9al .de, j.lrriarquétipó.
Esse interesse traz uma estrutura e um·sentida para nos-'
sa vida e talvez par trás dele esteja a imagem do Si-mesma.'
N a entanto., será que podemas descrever nossa trabalha!
nasso interesse principal e nassa vocação., adequadamen-í
te, coma uma projeção. da Si-mesma? Uma 'afirmação. des­
sas sugere que a prajeçãa pade ser retirada e que peide­
mos transcender as realidades espaça-temporais da
existência pessaal. Eu prefiro uma formulação. que dê um
96
valor roais es pecífi€Oc à encarnação pessoal e concreta do •
arquétipo da que o, conceito de, ,projeção. A idéia de
encarnaçãO pessoal da arquétipo serve a esse prapósita.
Ao. utilizÇl.r a termo "persanalizaçãodo aiquétipo" em vez de "projeçãa"; a' arigem das arquétipas emergentes
as fica em aberta. Isso. é mais precisa em termas de nass
conhecimentos atuais. ,Par exemplo, em uma transferên­ cia paterna positiva, podemQs.afirmar, com certeza, quê o paciente"prajetaa imagem do pai n051nalista?'NãO se­
ria igualme'(lte'passível que o analista funciane a partir da sua pró.pria imagem paterna positiva e que a paciente respanda a ela? Em vez de uma projeçãounilater;al,pode ser mais apropriadO pensar em um campo arquetípico do qual tanta.a paci~ntequanta o analista p-ârticipam. Segundo a argumentaçãO anterior, da influência ine-'
aa
vitável que a observador exerc.e sobre a psique da pess
abservada, fica evidente que não. pademas saber ao. certa
quemé o re$ponsável pela ativação. de nenhum arqIuéti­
po, quer ~le Séarigine'nopaciente au na analista. Quanto
mais fundo vamos ne.ssa.questão, mais clara fica que em
umaps~c.aterapia .eficaz, paciepte e analista estão parti­
cipa'(lda de um campa dinâmica da psique abjetlya, que
eles c9mpar:tilham entre si. Essa forma de se alhar para
o processo psicoterápica pa!ece mais conducente a uma
terapia bem-sucedida da que a noção. dê prajeçãa, que
te.
a'calacar toda a respansabilidade na paciente e nega
nde
a realidade:do analista, participativo . , ' '~.
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~>'
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~'-
·",l.. "
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A personalidade do terapeu.ta
e:o~ proPósitositranspessoais ,:. ':,;1';('
,. ".'
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«li.' '. 'L
_! I, ,No meu trabalhacorilas pacientes,
muitas vezes en­
contro~abjeções'aa ten~an interpretara transferência pa­
sitiv.acómo, Ul1}a projeçãO. de canteúdas incanscientes ín­
97
ternos. Eles não aceitam a desconsideração da minha rea­
lidade pessoal e do que.~elasignifica para eles. Aos pou~
cos, fui chegando à conclusão de que é um equívoco com­
preender a transferência positiva apenas em. termos da
projeção. Não estou mais. certo de que o progresso da
transferência é determinado exclusivamente pelas ten­
dências inerentes ao paciente. O que eu sou pessoalmen­
te parece exercer uma importante influência na direção
que a análise segue. Em outras palavras, eu dou uma
corporificação pessoal às formas' arquetJpicas emergen,
tes, que são, então, incorporadas à personaliqad~ do pa­
ciente parao.bem ou,para,o mal.. '.
Para colocar de maneira mais direta, uma análise
psicológic.a profunda envolve um processo irrevitáveLern
que o: paciente ~assimila. partes ,da personalidade do
terapeuta. As..formas arquetípicas são inatas em todos
nós, mas,os conteúdos pessoais específicos que são des­
pejaqos nelas contêm, inevitavelmente', .alguns conteú~
dos da personalidade do analista.. Se certos aspectos da,
personalidade dO.analista forem .muito estranhos 'ou
destrutivos para o paciente, haverá uma resistênGia ou
uma rejeiç~o total a eles. No entanto, mais uma vez,não
podemos estar tão 'seguros disso. Uma-psique que neces~
sita desesperadamente de algu~a corporificação pessoab
para trazer à tona formas arquetípicas iminentes está
propensa a ace~tarqualquer coisa que estiver disponíveli
Lembro-me da reação de uma pessoa à descrição de'
Jung do arquétipo do velho sábio. Essa pessoa disse: "Essa
é exatamente a imagem do próprio Jung. É claro que ele
vai obter esse tipo de sonhos dos. seus. pacientes~'. ESSá
observação pode ser considerad~.comoJum.equívoco per",
sonalista, mas ela também carrega a sua verdade. Jung
foi capaz de encarnar a sabedoria pessoalmente, na 'rela­
ção com seus pacientes. Será que podemos afirmar com
certeza que a sabedoria de Jung evoçou a potencialidade
98
de sabedoria inata no pacieilte? Ou será que a sabedoria
de Jung foi assimilada pelo paciente, embora, com certe­
za, uma forma' àrquetípica .Íner.ente ao.padentê estivesse
pronta para receb~-l~?r/.' ';.U·vIJ .~. '
Sabemos que o desenvolvimento psicológico não acon­
tece na ausência das relações pessoais. No entanto, ao
mesmo tempo, todas as, experiências pessoais seguem
certos padrões típicos e universalmente humanos que cha­
mamos arquétipos. Embora ãs' formas arquetípicas se­
jam inatas, os conteúdos específicos são determinados por
fatores pessoais e históricos. O processo da psicoterapia
envolve não apenas a ativação das formas arquetípicas,
como também, e principalmente, o preenchimento des­
sas fo~u{as ~ó~ conteúdos pessoais. Parte desses conteú­
,
',_"
" ~
,'~ i ,I
~
dos vêm de imagens culturais e mitológicas, fornecidas
pelo probes~o de·amplifi~ação. Mas o ingrediente prin­
cipal; niínEm ponto de vista, continua sendo a personali­
dade do terapeúta. Isso inClui absolutamente tudo sobre
ele: suas idéias e opiniões', séntime~tos; preconceitos,
~;
~:
~
gostos pessoaIS e, o .que talvez seja maIS Importante, sua
visão de mÜ~d~ t~tal e sua atitude'~era~te a vida.
"
, E bastante desconfortável pÉmsar que, inevitavel­
mente, os analistas estão reproduzindo a si mesmos nas
personalidades
de seus pacientes. A única d~fesa contra
~
o
mau
uso
desse
enorme
podei f"é estarmos
firmemente
."'~ '>,."
'!r·~ ' f ,[', " " ,
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dedicados
aos
propósitos
transpessóais
da
vida.
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PSICOTERAPIA.PROF;UNDA:
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Acredito que s~mosmúito privilegiados por termos
descobertÓ a pSiêotérapia profunda. No meu caso, pessb~
almente, sou m'uito grató por'líaver descoberto' uma pro~
fissão que' tem' reàlm~,iite a ver comigo, e' espero que o
mesmo fambém seja ,verdaae'para vocês,càso contrário:
"
vocês nem deveri';rni' estar aqui. 58 " " ' "
o que eu quero fazer hoje é explorar apfofi~sãô'àa
psicoterápia profunda "de uma maneira geiâI,procuran~
do sabér qu'em's'omos'ziós; como teràpeútas, o que fa­
zemos 'e as tiâdiçõés' histÓ~icas qúenos ÍigáIri ao' pas;
sado.
.
,,
"' ... ,
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,
Considero essa profissãôriin fenômenO' exclusivo'dÓ
século vint'J. Ela s~;rge'áj:iartir dadescoberÚl da-reklidi~
de da psiqúe.Essà' descobú'ta,'comó' um' conhécimEmt~
empírico, é um produto do século vinte. A pSicoterapia
profunda nunca havia sido conhecida antes. De certo
modo, ela corresponde à física nuclear, outra profissão
exclusiva do Século vinte, e que surgiu com a descoberta
da realidade subatômica, que contém certos paralelos com
a descoberta da psique autônoma.
58
100
Tanto a d~scoberta doinéonsciente por Freud quan­
to a descoberta da radioatividade por Madame Curie acon­
teceram'Dem. no final do século' dezenove, no vértice do
novo século. Duas profissões únicas resultaram dessas
descobertas.
A psicotetápia profunda' é 'tanto uínaciência quanto
uma art~, ta~to teoria quantoprática.Com9 ciência, é
um estudo.de conhecimento empírico .estruturado com
conceitos intelectuais que seaplitam à psique ern geral.
Mas como arte, é um compromisso prático e pessoal com
outra pessoà~'queátirigea vidá-e'Q desenvolvimento dela.
Isso vai muito além do aspecto científico. É, !fá verdade,
uma arte.
Como cientistas, podemos di~er gU~!lqssa_m~ta é o
conhecimento objetivo da psique. Essa"meta é abstrata,
objetiva e'tem aplicações muitó'gerais: Mas 'como arte e
prática',riossa meta' éa cdmpreensão, que é empátíca e
relacionada. O aspecto do conheciinento se aplica a todas
as psiqués; enquanto' a compreensão é particular e se
aplica apenas â uniindivíduodi:rcadavez. A eom'preen­
~ã(jé singulai.'
. .'
. . " I ;.
.' Aconteêe, não raro, um confliÍ;oentre essés dois mo.,
dos de furicionamen tô: ming fála ,d'esse 'córifli to na qua'rta
parté de "Tne Undiscovered'Self1: 59 Sé a 'pe.ssoa é muito
científica; 'ela é dénúisiad~mente objetiva, 'abstrata e teó­
rica~r ~'então' perde}~e o 'ihdividitàl. Por"outro' lado, se há
mú'ità compreensão: 'térapeuta'é' p<;lCÍente tendem a se
fundir~e~m suasubjétividade éIÍlpátfca~ e a dimensão ob­
jétiva' se perdê. É preéis<fque'hajaum equilíbrio.
Se eu estiver corretei"em afirmar que a: profissão da
psicoterapia profunda é'uma ocúpaçãonova e exclusiva
1. à raçá humána, podemos levantar uma questão: ela pos­
súi'algum antecedente? Ela é uma novidade sem raízes,
Edinger está falando para analistas e analistas traínee, (Nota do Editor)
59
Ciuilization in Transitíon, CW 10, pars. 525ss.
101
ou existem precedentes cultunlise psicológicos?~E,~e cla­
ro, a resposta é que sim; existemaritecedEmtes;'Opróprio
Jung nos.adverte quantOià falta de raízes. Em Mysterium
Coniunctionis ele diz:'" ~
,
y
Qualquer repovação .que ~ã(l es.tá c~Ic~da nas gra~~es tra~
dições espiri,tuai$ é efêmera; mas a d~minante que cresce
das raízes hist6ricasage conio um seI' vivo dentro do ho­
mem circühdadopeló ego', Ele'não:possúi'a cldminante,
mas é po~suído por ela:6Q ",' , ' ,
') '" L'
'rr
I,
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,
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~.
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Ess~ comentáriodiz.':r~speito à n~cessidade de com­
preendermo!;> ~s r~íz,eshis,tQricas de nos:sá.profissão.
"
>
Raízes etimológicas
'.
'.­
l:J
~
J ., •
~'.
_
Va,mps G()meçar com,o q'l1eé, I).ormalm~nte, () melhor
método paraJse descobrir as raíze~ históricas de um fenô­
meno, ou,sej;:t, a etimologia."
;',
No termo psicoterapia prQfunda, a palavra.'~profun_
da" é usad.a para. d~13ignar ,o t,ipo dEl, psiçoterapi~ que lida,
com a realidade do inconsciente, da psique opjetiva. A
palavra, '.'P'si~9ter!lpi~" ,é wn.p,roduto de ,doi~ raciicais:
psyche, ..,.,que t3 ignifica originalmente alma ou e1?pfrito d~
vida e o vefpo grego therape'ueirt - qUe 'significa cuidar;
servir. O uso qriginaI deS.~9-,palavra er;~h"servir a9s deu­
ses, 'nos templos'~. E~tão;' nos_ :templos:~da, a,ntiguidade, therapeuein ,refer!ê:-§e àa:ssis,t~nci!l,cuidaçlósa. nos cultos e nas cerimôniasfEllíiiosa.s.pép.oit3, ppr,exten,sãod sen­
El
tido, o verbo passou,ase:refe,rir ao, cuidado e;ao, trata­
mento dos pacientes em um ambiente médicq.;, Nossa compreensão do equivalente moderno, "tera­
pia", é aprofundada quando refletimos sobre S~1,l signifi­
cado original, que sugere que o serviço à alP1a. _ p~ique­
•
.
• •
1"
I
60
102
CW 14, par, 521,
;',
'
não é apenas 'uma tarefa seculàt; é mais do que um as­
sunto dominado pelo e'go, pois, possui uma dimensão trans­
pessoal. '
\
Imagens arquetípicas: subjacentes
à psicologia,profunda
t'
Ao observarmos as raízes da- psicoterapia em nossa
prática,e também como a própria etimologia sugere, exis­
tem três grandes figuras que'emergem: o médico-curan-)
deiro, o filósofo-cientista e o sacerdote-hierofante. Essas
figuras correspondem.a três imagens arquetípicas que
são consteladas no curso. da maioria das psicoterapias
profundas. Não estamos interessados na história apenas
pela própriahístória. Estamos ,interessàdos nas raízes
históricas porque a história é uma realidade viva no in­
conscienteécoletivo; Quando,alguém lida com o inconscien­
te coletivo, essas raízes históricas ganham vida e tornam­
se realidades vivas no presente. o.s analistasjunguianos,
interes!;>aII)-se pela história não como um investigador de
antiguidades, mas por razões muito práticas.
A primeira imagem,do ~édico-curandeir9,represen­
ta o conheciín~nto curador aplicado àS,feri9-as e enfermi­
dades da hu,manidade, com o objetivo de securar por meio
de um tratamento específico.
A ségvnda imagem éta do filósofo-cientista - e eu uso
esse ter-mO.duploporque PS filósofos naturais originais fo~ ,
ram os primeiros Cien,tistàs, e a eiê:qcia moderna se desen­
volveu a partir do campo da filosofia. De fato, a psicologia
como ciência, em boa parte do século dezenove, ainda era
parte ,da' faculdade de filosofia na maioria das universi­
dades. Por isso, esses termos realmente devem ficar jun­
tos ,ao considerá-los do po~to de vista histórico. O filóso­
fo-dentista representa figura que possui a capacidade
a
GAZETA DO POVO
Biblioteca
103
grande peSOr q"e <ligQ q"., .às vezes,. esc"to alll"ém se
examinadora da consciência ,racional; diferenciada. O
método utilizado é o diálogo socrático. Aintenção é ensi.
nar e alcançar a verdade. O fil6sofo~cientista ensina sob
a luz da razão, de forma que podemos nos conscientizar
do que realmente sabemos e do que não sabemos.
De maneira semelhànte," a- terceira: figurá, do sacer­
dote-hierofante possui duas furíçõés umpoúêodiferen_
tes, ambas servindo aos desígnios religiosos de um ri­
tuaL O hieroJante trabalha principalmente no contexto
dos mistérios,' assim como os mistérios. de ,Elêusis, en­
quanto o padre trabalha. no contexto de cerimônias reli­
giosas mais ortodoxas. Aimagem do sacerdote-hierofante
carrega .medi'arfatore.s. trànspessoais ,;':"'0 conhecimento
sobre os deuses e sobre'a forma como serelaciónar com
eles. A tarefa dO:sacerdote~hierofanteé transrilÍtir a reali­
dade religiosa, fornecendoads érimtes individuais ou ini­
ciados a revelação da teofania6~"""" a experiência da dimen­
são transpessoàl...,. que possui um efeito.transformador.
Essas imagens são, muitas' vezes, consteladas no
curso da ,psicoterapia profunda. É importante. éstar fa-.
miliarizado com elas para que' se 'possa reconhecê-las:
quando elas apareCerem.. Elas não vêm com uma etique­
ta no pescoço. Em.vez disso"elás se revelam:por meio de
formas de comportamento ou por ceítas1atitudes:Se vocês'
estiverem familiarizados, com as. atitudes, que acompa­
nham essas figuras, conseguirão. reconhecê-las. Obvia
mente, é muito importante queo.analista não se identifi­
que com essas figtlrasquando ela&,são co.nsteladas,.ou;
quando ele está sob a projeçãode.uma delas.. :.
.:-.
Em nosso trabalho como psicoterapeutas. profun­
dos, não somos médicos, filósofos, ci,entistas, nem padres)
ou hierofantes. Não somos nadadi.sso, no entanto, é,com
declarando como um dessep, pe:t:sqJ:H,l.gens,. Eu não reco­
Jlleo "ma atit"de dessaS. Somos moa nova entidade,
do
sui generis,
uma nova profissão, que apresenta, como
parte de se" f"ncionamento, a constelação dessas ima­
gens arq"etípicas. Mas elas não pertence,!:, a nÓS; elas
pertencem à psiq"e objetiva. Elas foram 'geradas pelo
paciente e, por isso, deveriam ser devolvidas a ele, não
consideradas algo noss'o.·
"
Acreditá que todos nós fomos treinados ,em uma des­
fiz~
saS disciplinas iradicion.\s:' Alguns 'de' Ílós
mbs me­
dicina e herdamos a tradição médici,.. Alll"ns de nóS pas. samoS pelas disciplinas acMémic•• da psicologia, serviço social ou aconselhamento; todas elas são"fruto cÍ.k tradi­ ção filosófica. E alg"ns de nóS somoS seminaristas e ad­
quirimos a tradição JacerdotaL Mas comO a psicoterapia
e
e
em sua origem abarca transcende todas essas tradi­
ções, isso ~ignificá que,'
que co~~erÍle ao nossO treina­
mento básico, somos todos tendenciosos e 'unilaterais em
relação a uma ou outra
háâições.
.
Toclos
a:um equilÍbrio'. Os
pos­
suem umtreinaroento médico precisam da educação filo­
a psicoterapiaprofunda é mais do
sófica e religiosa,
que a cur~ de uni~ doença. 0s que :possuem treinamento
acadêmico serão 'fraéos nas
do tratamento prático
do paciente e;',das,realid~des.re.ligioS~s, porque a psique
é mais do.que .um:objeto do conhecimento, é também su­
jeito. E os que possuem treinamento teológico necessita­
rão de urna educação adicional nas disciplinas empíricas
e racionais da medicina e da ciência, para ensiná-los que
ppique. é, d. fato, "m íenôrooM empírico e para q"e eles
simbólicas de urna mi­
u?
d~ssas
ae~Ennoscheg~r
poi~
ár~à.s
0
.,
'
~
n~Q ~e êon.fuJ.ld.aÜlçoD}"a,s!D}age~s
tologia religiosa específica.'
Agora, voU falar de cada urna dessas tradições com
.!.í
r
!I'
I',~'-'"
"1~·;I",r'~
~:'
:~i'#~'""'"'
tI'
A manifestação ou aparição de Deus'ÇJú de um deus'a úma 'pe~sóa~ (Nota. do Editor)
"
"',.'
, ".Ii 61
104
',\
q~e
"m pouCO mais
~e prof"ndidade. Cada "ma delas é dife­
105
rente no que diz 'respeito à questão concreta subjetiva à
qual se dirige, mas o que eu quero, focar aqui é a atitude
que acompanha cada tradição. ,É aí que se encontram os
preconceitos de; cada, uma. '
,
Legado ~édico
,
Na psicoterapia, a situação'rião {muito diferente daq1,1ela
da medicina somática, onde,-ª çjr.urgia, ~ realizada no in~,
divíduo. 62
, '"
",,'
~'
Ou então:
..
l.
Assim como exigimos - e com raz'ão - que o cirurgião não
tenha as mãos infectadas, também temos de insistir, com
muita ênfase, na necessidade de autocrítica do psicQterai
'"
106
E também:
Mysterium Coniunctionis, CW 14, par, 125n,
,\
A cirurgia e' a obstetríciii'sabein, há muito tempo, que não
basta lavar ri paciente:, as mãos do próprio roédico têm de
estar limpa,s, Um psicoterapeuta neurótico tratará
infali­
64
"
sua
própria
neurose
no
paciente.
velroente de
~'
~
,
,
No que diz respéito'à tradição·médlca;:l atitude que
se aprende está relacionada com o cuidado a pacientes
em sofrimento. 'llid(f o que se aprende esta voltado' a esse
propÓsito: O juramento hipocráticó é realmente o epítome
da', atitude médica na qtfal o médico promete não fazer
nenhum' mal, daro melhor de si para oindivíduo queso­
fre, ê considerar o tratamento como algo sagrado' e confi­
dencial. Essa é uma atitude muito preCiosa que se apren­
de nó final 'do treinamento medico, por pratifá-Io todos
os dias. Não é apenas urria'qm3stãô de conhecimento abs­
trato;'é unj;cQrihécimentó pratico; NÉúnafilosófia n~ní Ó
sacerdóciô'possueniessã atitude:de preocupação ética pelo
indivíduo . .A ética do 'nosst;> 'campo; psicoterapia profun­
da, está totalmente báseãda nas 'raízes inédicas da nossa
tradição. ", " ' ,
'
Em seus le'xf6s,J~rig f;iz comparações erit~e'opera~
ções méd~~as e psicotera'r)ia..~ Por~xeinplo:,,'
, .' .' '
62
peuta, isto é, que ele esteja pronto a fazê-la a qualquer
rooroento,\,3: ,'I
'
, '
•
•
"
't
'i'
"
I,
•
Essas sãoâlgumas d~s idéias que surgem, ao consi­
derarmos as raíz~qI!lédicas ~e n,ossaprofiss;3.o., '
Legadofi1osófic~,
"
Agora, vamoS nos voltar para a tradição filosófica.
Na civilização ocidental, essa tradiçãO,chego u '3:'uma ma­
nifestação plJna com 'Sócrates, como foi regístrado' poro
Platão, Acho 'que podemos diz'er'que a essência da filoso­
fia antiga está resumida em duas, frases: a déclaração 'de
Sócrates,- "a'vi'da'sem ,refle'xãó não merece:ser vivida" e a frase supostá'mehteégtavadà no orácu'lo de Deifós, "có­
nhéce-te a tf mesmo".
"
"
Essas deClàraçÕes possuem rima aplicação direta na psicoterapia, o qüe é beril claro; A filosófiá,Iero sua forma original', era consideràda'Oinsthúnento para esse tipo de exartie:'Em épocas remotas, o indivídriopodia se conhe­
cei por meio da investigação filosófiéa, que era praticada com uma. atitude religiosa. Se vocês tiverem alguma dú­
vida.a esse respeito;leiama Apologid:de' Platão, onde ele descreve a defesa de Sócrates no' seu julgamento. " Devemb~'niiiito ao'que chamam'os de método socrá­
tico:' Vejam uIÍlàdescriçãodéle tíráda de um dicionário de filosofia:
' ,,
! ,
63
"Fundamental Questions of Psychotherapy", The Practice af psychathe"
rapy, CW 16, par. 237.
64 "Principies of Practical Psychotherapy", lbid., par. 23.
1
l.;
____----------------107.-----­
Legado religioso
(O método socrático) é uma forma de 'ensino em que o
mestre declara não poder passar nenhum tipo de infor­
mação (pois, no caso de Sócrates, ele dizia não ter nenhu­
ma), mas suscita cada vez mais respostas por meio de per­
guntas in,dicativa~ .
qlétodo é ilq,strado m~lhor nas
perguntas que ,Sócrates faz ~ 'úrp escravo jovem e inculto
no Meno de Platão. O escravo é levado, pa,sso a passo, a
uma dempnstr~ção' de, um caso. esp'ecial' do teor~ma de
Pitágoras': O uso original desse métod.o por Sócrátes ba­
seia-se na crença de que as crianças já pascem com o co­
nhecimento em suas almas, mas não conseguem lembrar­
se do quejá sabem sem uma ajuda (teoria da anamnesis).
Isso também está relacionado à ironia socrática, isto é, a
profissão da ignorância por parte d() \{uestionadqr, que
pode, na verdade, ser um ~ande sábio. 55
~
.o
:'
dócio:
. O sacerdócio, falarido de uma forma bem ampla, deve
sua origem à necessidade, uiiiversaldo homem de obter
uma assistência sobre-humana na luta da vida. Entre to­
dos os povos ~~\ste a crença de que, sob certas circunstân­
cias; um ou outro. tipo de'vantagem é obtida do mundo
sobrenatural...· ,
Em muitos casos os selvagens consideram-se incapa­
.zes ele .se comunicarem diretamente com os deuses, Ao
reconhecerem sua inferioridade nesse aspecto, eles consi­
deram os sacerdotes como os únicos mediadores entre eles
e o poder supremo. Os sacerdotes são seus;únicos prote­
tores; sem eles, a população ignorante seria abandonada
55
aos infortúnios que surgem da ,fúria dos deuses.
Acredito que vocês podem notar um.claro p,aralelo
entre o diálogo socrático e a abordagem analítica de Jung.
Eles não são idênticos, de jeito nenhum, mas exií?tem cer­
tas semelhanças.
Também é verdade que o método científiGo, .da ciên­
cia empírica, da forma como ev.oluiu <;la filosofia" é um.
diálogo. Nem sempre pensamos na ciênci~dessa manei­
ra, mas, de fato, ela é um diálogo. O.cientista formula
questões bem planejadas e as colóca .para ~ natureza em
um experimento - e recebe uma resposta. Assim, o co­
nh~ciI,11ento :científico deriva "se de um proçesso de diálo­
gos. De. maneira muito interessante, a psicoterapia re-,
verte esse processo. Em vez de colocar questões para a
natureza, corp.o ps 'cientistas, a natureza é que nos coloca
as questões., Um Pêlcie)1tevem;at~ nó;; com um problema
- um conju,nto de sintomas,. sonhos,fanti3-sias - e essas
são,as qu.estões da natu:reza:.É nossa tarefa: responder a
essas questões, por meio do diálogo.
Não são muitos'. dos nossos,pacientes que poderiam
verbalizar seus problemas dessa maneira, mas "infor­
túnios que surgem da fúria dos deuses" é, com certeza, o
mecanismo inconsciente subjacente que leva ü' homem
moderno à psicoterapia. Eni muitos casos 'a descrição é
muito
adequada, embü;a
o paciente não'.'a expresse
dessa
."
:
_.
forma. Reconhecendo uma incapacidl:J,de de "se comuni­
car diretamente com os deuses", o p~cilªnte procura um
mediador
tentativa de conseguir algum tipo de prote­
ção contr'a os infortúnios que surgem da fúria deles. Essa
é unia man~ira de se descre~er o motivo pelo qual as pes­
soas, vêm para a ~nálise. Elas podt1 não pensar assim
no co~éço, mas aptoximam-se dessa idéia mais adiante,
depois que já estão trabalhando por um tempo.
Na maioria das sociedades, os sacerdotes são nor­
malmelfte vistos ,como pessoas' que foram chamadas, não
,\',
\
na
m
I,
'.'
66
65
)
D~ixem-i:ne ler para vocês algumas frases da Encycla­
paed(a afReligian and Ethics de. ,f[astings , sobre o sacer­
D. Runes, ed., Dictionary of Pjú(osophy, p. 295.
• ,.
"
•
'
EncycloPCJ:"}dia of.Religion and Ethics, vol. 10; p. 2785$.
109
108
'l...
eleitas. O chamado deles é divino. Não é lima"eleiçãQ de­
mocrática, nem uma indicação. Isso corresponde à idéia
de que o verdadeiro psicoterapeuta possuí um chamado
interno. Ele não o faz apenas·como' uma maneira' conve~
niente de ganhar a vida.
'ri
O sacerdócio do antigo Isra~l é, talve~, o rIOSSO exem­
plo mais desenvólvido e familiar. A sua função principal
como a de muitos outros sacerdócios) era osacrifí­
cio para se obter faVores divinos: O sacerdot'e' oficiáva nas
oferendas sacrificifüs, reéoncifiandó 'todos 9.s J)resentes
com Deus ao praticar um_a compensação por s,eus peca­
dos, e a teofania se manifestava pelo fato de qúe favores
e perdão eram concedidos. Na Ígreja Católica Romana,
'
,
" ' "
I
essa função evoluiu para a missa, e o confessionário, que
é um apêndi~e da m i s s a . '
,
No pro~esso psicoterápico, o cOI1(ess,ionário é @uitas
vezes constelado. Jung discute esse assunto em "Problems
ofModerD- Psychotherapy'\ Vejam algumas partes, do que
,,;;. ' . ' , ) ;
ele. diz:
~ ~J
As or;igen,$,de qualquer:. tratamento apalítico da alma
estão no modelo do sacramento da confissão...
I
'" o que é oculto é segr,edo. O possuir um segredo te,m o
mesmo efeito do veneno, de um'veneno psíquico que torna
o portador do segredo estranho à comunidade.'Mas essé
veneno, em pequenas doses, 'pode ser um medicamento
preciosíssimo, e até uma condição prévia in,dispensávela
qualquer diferenciação individual. Tanto é que o homem
primitivo já sente fatalmente a necess,idade de inventá~
mistérios, a fim de, possuindo-os, proteger-se contra"a'sua
absorção pura e simples 'no inconsciente da coletividade,
como se isso fosse um :perigo mortal para a alma. Estão a
serviço desse instinto, de dif~JenciaçãCl; sa.bidamente, Os
antiqüíssimos e muito conhecidos ritos, de inicüiçã,O, com
seus cultos e mistérios.... " ,
'
"
" , ,
Um segredo partilhado com di~ersas pesso~s'é tão cons:'
trutivo quanto destrutivo é o segredo estritamente pes­
tem o mesmo efeito, da culpa, segregando 'seu
soal.
"
110
' "
••
.1_-[
.infelizp~!-'tador, ,do, çonvívio co~ os demais seres huma­
nos. Quando se tem consciência daquilo que se oculta, o
prejuízo é evidentemente' menor do que quando não se
sabe que
recalcando e o que se recalca. 67
O isolamento pode prolongar-se com o.silêncio ... Mas
.pela confissão lanç,ocme novamente nos braços da huma~
nídade, livre dopeso do exílio moral. 68 •
. ", AJninh.~ id~ia p~in~ipal a'q~i é que aqui~o que o indi­
víduo. tem mE;ldq de reconhE?cer ef!l S} pr,óp ri9 - o que está
c~rcG!-çlo,de sentimentos depecado, culpa, ou dolorosa in­
ferioridade - todos esses estados internos constelam-se
~o~ível'primitivo. gaQ~iqU(~~om;o m~do da ira dos deu­
ses. Essa é ;1 formá arquetípica de se compreender fenô-:
menos tais como ~12siedad,e e aprE?ensã5? qu~~.çlo
vai
confessar ~lgum pecaclo ou defeito. .
.
Vejam, quando o paciente confessa tais coisas ao psi­
coterapeuta e sobrevive à experiência sem sofrer nenhum
dano, a figura arquetípica do sacerdote mediador é cons­
telada quase autom'aticámente:
grand~ 'oncia ge fP:~:
tidão inunda o paciente. Mas a gratidão pertence à divin­
dadE) ,que acªboun~o ~e tornando tão furiosa quanto o
paciente temia.~Apesar disso,o arquétipo. do sac~rdote é
prºjet ado , quase semprl'::l, no psicoteI:"apeut~, que, é bem
P!'9~ável,' não, fez naclG!-.ma!ª, do qtle ªbanar a cabeça e
di?-er: "Euj~üuvi coisas ,mllito piqtes". Mas isso é o sufi­
~!ente para se evocar a proj€lção
uIlJ.a questão realmente
iITlPortante tiver sid() constelada.
Acho que todos nós deveríamos nos conscientizar
4.ess as pro1eções. É certo que nã9 podemos evitá-las, mas
não qevE)ríamos nos identificar com elas. Em Qutras pa­
lavras, não deveríamos nos sentir merecedores de toda
ElSs·~·;gratiçl~p'.' pe jeito .~enh~m. Yqcês estão apenas fa­
•
_ " .
w
~
- . ,
-
. " \.
-
•
Uma
67
The P;actice oi Psychotherapy, CW 16, pars. 123ff. ?8 ibid.~ par. , 1 3 4 . , ' : 111
zendo o seu trabalho. Vocês merecem ó pagamento que
recebem, nada mais que isso. Vejam, os sent{mentos de
gratidão do paciente serão o S9-crifíçi() que, nos ~rituais
mais antigos, era oferecido pelo sacerdote. O psicotera­
peuta contribui para essa oferenda quando não aceita o
sacrifício pessoalmente. .
,
O hierofante, que significa "o revelador do sagrado",
é uma variação do sacerdote. O termo era usado para de­
signar aqueles que conduziam as iniciações mistéricas
na antiguidade. Sacrifício e reconciliação não eram à meta
principal; em vez disso, o ritual fornecia uma oportuni­
dade de se experimeritar uma revelação direta e imedia­
ta. Até hoje não sabemos exatamente em que compreen­
dia a revelação dos mistérios de Elêúsis, pois a revelação
dos mistérios era considerada um crime capitaL'
Jmagensarquetípicas correspondentes
às fases da terapia"
i
.
Essas três tradições surgem no processo teFapêutico
como diferentes modalidades de atitude. O médico, o filó~
sofo e o sacerdoteconstelam~'seem diferentes graus'dU­
rante diferentes fases dá psicoterapia. Para descrever
essas fases, farei uma distinção bem nítida entre elas,
por motivos de clareza. Na ,verdade, as diferenças não
são tão óbvias assim; na prática, elas se fundem umá na
outra.
Na fase do médico-curandeiro, 'a palavra-chave é tra1
tamento. O paciente sente-se mál, precisa de ajuda,ese
apresenta a um terapeuta para um exame, ,diagnóstico e
tratamento, assumindo uma postura ou atitude mais ou
menos passiva. A idéia é a de que o médico possui um co­
nhecimento que pode levar à cura, e que e!)te irá usá-lo
em troca de dinheiro. Essa atitude por parte'do paciente
112
acaba levando a uma esterilidaçle, pois ele experimenta
a análise apenas de.Uma maneira passiv.a.
Na fase do filósofo, a palavra-chaveé.diálogo. O pa­
ciente descobre que a atitude anterior, da busca de um
tratamento, é~nadequada.e muito.passiva, e percebe que
o terapeuta, assim como, Sócrates, realmente não sabe de
nada, e 'possui apenas um método dialético de intercâm­
bio, ,no qual os dois busc9-m juntos a verdade para o pa­
ciente.
, Na fase do sacerdote, a palavra-chave é revelação,
revelação' do numinosum. 69 Durante essa fase, as outras
duas são transcendidas, pelo menos até certo ponto. O
diálogo no nível pessoal.leva à ativação do inconsciente
coletivo,pór, meio da qual uma experiência direta da dic
mensão transpessoal torna-:se.possível. Agora, paciente e
psicoterapeuta participam juntamente de um diálogo com
a psique objetiva.
Como essas fases se inlmifestamna prática? .
Na fase do médico, o paciente espera ser tratado:em
troca de uma taxa. Ele espera por um senriço. Esse as­
pecto da psicoterapianunca é totalmente transcendido ­
de fato; a ética profissional está muito baseada nele -,
mas sea ter~pia pretende ser mais do que uma terapia
de apoio diretiva, ela precisa ultrapassar essa fase.Acon­
tece muitas
de asaida dessa fase ser uma conseqü­
ência da insatisfação ,do. próprio paciente. Ela,não está
melhorando. Ele não e,stá se curando. As coisas não estão
acontecendo como o esperado. Isso dá ao terapeuta a opor­
tunidade de ressaltar: "Bom, essa não é bem a forma como
trabalhamos. Não é assim que funciona. Nós trabalha­
mos através do diálogo".
'I.
,
~,69 De The,ldea of the Holy, de Rudolf Otto, onde a palavra numinosum é
usada para descrever a impress)onante intensidade emocional comum a todas
as experiências religiosas, independentemente da cultura ou da seita, (Nota
do.Editor)
113
Isso norma lment e 'gera' algum a resistê ncia da psi­
que infantil. Depois que essa resistê ncia é pacien temen ­
te analis ada, a próxim a fase torna- se acessível.
Na fase do filósofo, o terape uta expre ssa livrem ente
(e o pacien te aceita ) o fafo:de que ele (terap euta) não pos­
sui nenhu m conhecimento.secreto sobre a forma como o
paciente.deveria viver a'próp ria vida. O ~nalistanã9 sabe
o que é bom para o paciente" o que .ele, ou ela "deye" fazer.
Tudo o que o terape uta pode oferecer são reações ao com­
portam ento, sonhos e.expressões de todos os tipos do pa­
ciente, com o objetivo de se estabe lecer um diálogo.'
Nessa fase, sempr e surge a questã o de até onde o
psicot erapeu ta deve éhega r com suas reações sincer as,
Nós. devemos trabal har com nossa personalid::tde total,
mas a verdad e é que també m temo's de usar o bom senso.
E essa e, de fato, a marca d~um analis ta habilidoso
saber qual nível de reação autên tica é aprop:i:-iadoem de"
terminado. estágio do desenvolvimento do paciente. É claro
que há momentos e.m que ultrap assam os esse nível e en­
tão precis amosr ecuar de uma forma ou de outra. O bom
senso é necessário, o que implica no fato de que o estágio
do médico ainda não foi totalm ente supera do. Ainda tei­
mos a respon sapilid ade étiça de tratar do pacien te, pois
ele precis a de tratam ento. . A tercei ra fase, do sacerd ote, caract eriza- se por uma
emerg ência da psique arque típica ,junto com as image ns
e experi ências múnin osas que são caract erístic as desse
nível. É nessa fase que a anális e jungu iana revela sua singul aridad e, pois é a única escola psicot erápic a equi.:
pada com uma teoria e uma prátic a para lidar com Oin~
consciente coletivo. Somos pratic a,men te.os únicos até
mesmo a saber de sua existência.
Agora, isso é uma vantág em, masta mbéin 'é um pe­
rigo. Por os analis tas jungu ianos possu írem algum a' com­
preens ão dos arquét ipos e essa compreensão ser, por sua 114
(j
vez, transn ütida aos analis andos , existe forte tendên cia
de a psique arquet ípica ser conste lada pelo analis ta por
indução. Isso muita s' vezes, bem favorável, promoven­
do o trabal ho profundo que tentam os alcançar, mas em
alguns momentos isso não. é o melho r para o pacien te. Os
pacien tes borderline, por exemplo, podem estar correndo
grand e perigo ao trabal har com esses analis tas que têm
uma tendên cia, fora do seu controle consciente, de cons­
telar a psique arquet ípica, Devemos 't~~i~s~' sempr e em
mente . Em mais dê um: caso, durán te a entrev ista com
um candid ato anális e; Ou quand o Cf anális e começou a
dar errado por um ou outro motivo i indiqu ei a pessoa a
alguém que nãoçonstele' a psique arque típica e com quem
seja relativ ament e seguro para0 pacien te trabal har.
Nessa fase, transc ende-s e o estágio do diálogo pes­
soal e odiáló go passa a ocorre r dentro do paciente. O te­
rapeu ta contin ua a oferecer reaÇões, interp retaçõ es e am­
plificações, mas elas não são mais o enfoque principaL O
enfoque princi pal' passa a--ser ~ teofaríeiél, a experi ência
partic ular do indivíduo e, embor a o terap~úta possa ser
testem unha disso, ele não tem as mesm as experiências.
A experiência. singul ar da teofaÍüa dissolve'a transf erên­
cia residu al e nivela a ligação entre pacien te e terape uta;
eleS' tornam -se parcei ros em sua huma nidad e cómum e
peran te à manif estaçã o divina, Jung se refere a esse de­
senvolvimento da 'segui ntema neira:
a
Realm ente, à medid a que o fenômeno da transfe rência
nada mais é do que uma projeção, ele cria tantas divisões
quanto s vínculos. Más a experi ência mostra que, mesmo
depois de dissolvida a projeção, não se 'rompe certa cone­
xão na transfe rência . Isso porque por detrás dela existe
um fator instint ivo da maior import ância, a libido de pa­
rentesc o. 70
.,
.
.
.
• 70 "The Psy.chology of the Transfer ence",
The Practice ar psychatherapy,
CW 16; par, 445, '
115
Como eujá disse, não existem fases_muito bem defi­
nidas que podem ser claramente distintas. umas das ou­
tras. Elas.
em geral, mist.uradas, mas acredito ser
muito útil ter esse esquema em mente, pois ele ajuda a
distinguir a avalancha.de informações que_chega até nós
na relação analítica.
psiCologiajunguianaé que não devemos nos identificar
com nossoconhe.cimento, nossa subjetividade ou nossa
experiência.. À medida que somos os' portadores de tal
conhecimerito,ele é uin peso tanto quanto um privilégio.
Com certeza, ele .não justifica a fomentação de fantasias
secretas de. superioridade, pois,. em certos aspectos, ele.
representa,uma 4errota tanto ,quanto uma vantagem.
A tradição oculta
Exist.eum apêndice ambíguo' à tradição do sacerdo­
te-hierofante, a tradição oculta. Quando. sacerdotes e
hierofantes trabalham dentrp de determinada ortodoxia,
estão relativamente protegido,s ,dos perigos de..1l!D encon­
tro direto com a.psique, arquetípica. Mas aqueles que pro­
fessam um contato individual com.o tqmspessoal sãO' sem­
pre marginalizados e geralmente anatematizádos como
hereges ou como Qcultistas perigosos pelas autoridades
ortodoxas ..
,
Os psicoterapeutas junguianos são vítimas da mes­
ma caracterização. por aqueles_ que' n'ão nos conhe.cem
bem. Por isso, não se.surpreendam se v.Ocês encon­
trarem esse tipo de Projeção de. vez em. quando. Como
analista, também há o perigo d.e S:e cair em uma posses­
são sutil, 0lJ, não tão sutil assim, Pela suposição dese pos­
suir algum conhecimento ou sabedoria especiais. ;O.me­
lhor antídoto que conheço para ~sso.,.é termos muito
cuidado na maneira como cons,ideramqs a opiP. iã 9 dos
outros.
"',
, ,
,
Sempre que t~ndemo~ <l; nãb ter' um~uidado ~uito
grande ao considerar a opinião elos. outro.s. nosso respei­
to, estamos no caminho da inflação. Vejam, a verdade. é
que a psicolOgia profunda junguiárta nos leva,de fato, a
um conhecimento secreto - que só é conhecidó por aquele
que viveu a experiência da teofania -, mas esse conheci­
mento não precisa ser alienante. Um princípio básiço da
ª
116
Privilégios,cresponsabilidades e perigos
.
~
j'
O chamado da psicoterapia profunda possui privi~
légios, responsabilidades e perigos exclusivos: De'fato, é
um grande privilégio podermos interagir diariaJ;riente com
a psique autônoma em todas as suas formas~de existên­
cia manifestas. E.uma opo.rtunidade singular poder olhar
no fundo da alma de tantas pessoas, ter todas essas jane­
las para as mais variadas realidades h'!lmanas vivas. Que
outra. profissão ofereceésse tipci de oportunidadeprivile­
giada? Não .consigopensarem mais n.enhuma. Somos
extremamente. privilegiados pela profissão que escolhe­
mOS, ou;qúe nos .escolheu.
As responsabilidade_s, contudo, são enormes: Devido
à natureza de nosso trabalho, evocamos, com freqüência,
projeções profundas - não só projeções pessoais, mas tam­
bém arquetípicas~ Éfun:darÍie'h~ai que e;t~jáinos atentos
para p.ã,o nos aproveitÇlfWos_elÇlauto[,idade e do poder que
tais projéçõ~s nOS conceÀem. Is~o é uma responsabilida­
demuitO.séria, porque o trÇlbalho que'faz;e:t;nos é realiza­
do .em segredo~ ,Ele n~o.é monitor~dQ.,.Ninguém sabe o
que está aconteçenÇlo. entre- o .tpaciente .e o terapeuta a
J)~oserelesmesmos.Aresponsabilidaçle do membro mais
consciente nesse processo é realmente imensa.
. Há". tam..bém, perigos graves e riscos ocupacionais
nJ.tJ.itoséd'o$:É PNvá,vel que o mais comum seja o simples
117
perigo psicológico de inflação. É qUase iriev,itável'que nós,
como terapeutas, nos identifiquemos, em'algum grau, Com
as projeções que ~arregamos" pelo menos nos primeiros
estágios da carreira, Jsso é um perigo pessoal, pois todos
nós sabemos, ou deveríamos saber,. quea.inflaçãolsempre
leva a uma queda. Quanto 'm~tisaltéro võo,maio'r aqueda,
e pode haver algumas 'quedas psicológicas desastrosas
como parte dos .fiscos ocupacionais de nosso trabalho.
Outro perigo em lidar com o material profundo de
nossos pacientes é"o de essa .ÍÍlformaç.ão. fugir' d.e .nossa
compreensão: Principalmente com os analistas mais jo­
vens, não é muito incomúm encontrar alguns p'acientes
que estão.lutandó com dimep.sões. profundas que o ana"
lista ainda não<alcqnçou. Em ·talcqso, ,se o 'analista não
percebe o que está acontecendo, existe,operigo real de se
precipitar de maneira muito imprudente, Ele pode'então
levar um grande tombo e terá. muita ;sortese conseguir
se erguer novament'e. Esse :é, um grande perigo.,' .~.~
A consoláção pa.ra tais ,experiências - e ninguém ,pàs~
sa por muitos ânos de trabalho analítico ileso - é talvez a'
compreensã,o de que elas tinnam de ,acQntecerconbscó,!
pois eram parte de nosso próprioprócesso de indiyiduação,
chegando até'nós pelo mundo externo. ',: é " ,
I , .!,
~ ~
o mistério da psic:;oterapia
profunda"
.
-
~"
"
,
Para terminar; quero dizer algúmàs palav.ras sobre. 'I
o processo misterioso da·psicoterapia profunda. O que é e'
como ela funcioná? Isso é 'realmente 'um mistério. Nós
não sabemos como ela funciona. Temos müitàs idéias, mas,'
para sermos honestos e verdadeiros· pará com a nossa:
herança socrática, temos dê admitir que não sabemos com
certeza. Mas aqui vão algumas idéias.
Estou falando sobre a autêntica psicoterapia profun­
da. Existem outras terapias que funciona'm em vários'
118
L
níveis diferentes, mas estoú me referindo ao que tenta­
moS fazer como terapeutas junguianos. Como Jung nos
diz, nossO trabalho exige a personalidade total, o que não
quer dizer que tenhamos de ser indivíduos completamente
individuados. Isso significa que; é esperado que a pessoa
tenha circunavegado todo 'O círculo de seu ser e saiba quem
ela é: suas força:s;,suas~ fraquezas e seus pontos cegos. É
isso que Jung sugere ao dizer'que se'r analista requer a
personalidade total. Com. certeza, a personalidade do te­
rapeuta é o instrumento singular do processo, e o requi.
sito básico'é a'consciêntiá, pela qual queremos 'dizer o
completo conhecimento da ,psicologia de si mesmo.
Ao examinar os candidatos para o programa de trei­
namento, tenh6 em mente quatro fatoresprineipais. Em
primeiro lugar, a questão da vocação: existe clara evidên­
cia de um'chamado'genuíno para esse tipo de trabalho?
Em segurido; o nívef de desenvolvünentoegóico e adap­
tação à realidade:: essa peSsoa 'possui um ego be.m.desen-·
volvido que jáarcançoU: uma adaptação sadia 110 mundo
externo? O terceiro fator é (j caráter, que envolve a integri-,
dade moral, .uma, consciência de, e devoção a,valores bá­
sicos, E o quarto éa conexão com as profundezas::ter uma
relação viva com o 'inconsciente' e com à, psique objetiva:
'Como 'Jung' dizia, um psicôterapeutanão pode levar
um paciente nem um'passo adiantédo que eleprôprío já
caminhou. Qualquer complexo que não estiver totalmen­
te consciente por parte do'analista irá contaminar o pro­
cesso terapêutico. O terapeuta 'irá, 'étitão, tnitar o pró­
prio complexo, projetado no p,àciente. ,Isso é uma verdade
infalível,já que o 'órgão ,ou instrumento'da psicoterapia é
à persº11-~lidade.dq;ánalista. '.' j .
"
, .' 'Quanão o'térapeuta possui' um bom nível de consciên­
cia, o que parece ocorrer é um efeito indutivo progressivo
no paciente. O efeito indutivo ajuda a gerar os sonhos; na
verdade, 'o grau de profundidade de ligação cultivada pelo
119
analis ta é bastan te adequ ada para 'deter minar de onde
os sonho s do pacien te estão surgin do: o incons ciente
adora ser recebido, ser reconhecido. Se o' incons ciente do
pacien te encon tra um terape uta que realm ente compr e­ ende a psique 'arque típica e a recoIihece quand o ela se
aprese nta, ele reage aprese ntand o um ntater ial.qu e cor­
respon de a essa compr eensão . É isso.q ue.eu quero dizer
quand o falo. de efeito ind}ltivo.·
, '.
A minha exper! ência pessQallevou::me.fi. conclu são
inevitá vel d.e que a consciência é contagiosa, com uma
impor tante ressaJva: a psique dó pacien te deve estar aber­
ta o sufici ente para r~cebê-Ia. Em algün s casos, .podem
ser necess ários muitos , anos de ànális e para's e criar essa
abertU ra. É uma grand e' tarefa a,brir a psique o suficien­
te para poder acolhe r o que pode ent~o .emergir. Ml,litas
vezes, essa abertu ra não ocorre de p1aheir~ PJena, e', em
alguns casos, ocorre apeha ssupe rficial mente . Nes~e caso;
eu diria que o pacien te não está.de9ti.Qado a'de.senvolver,
se mais, pelo menos nesse mome~to... çorqo cienM.~tas
empíri cos sensat os; devem os sempr e respe itara rea.lida­
de que nos é aprese ntada . E que Deus nos, livred ealgu -.
ma vez ünpor nossa s hipóte ses precol )çebid assobr e até
onde determ inado caso deve chegar. )SSQ I).ão SQIlJ,QS 'nós
que devemos determ i I1 a.r:' Tais qllestõesdeYem,s~rdeixa­
das para o· trabal' ho mister ioso do destino'."
_
.
.
• 1'; ~ ,'"
Pergu ntas e respo stas .
Pergunta:' Você fez ~liuns co~eniáiios .sob~e os' de:
feitos que acomp anham a' bê~ç~o des?a, P~O~SSão. E'ü
queria saber um pouco mais sobre o que vqcê estava pen'­
sando quand o disse isso ," .'
•
.
'
. • . -. ,-
... 1
!
"
"
~:.
!."
,_'
Edinger: Bom, existemalgun~ cari'did~tos,aJgun~
indiví duos que se inscre vem para Q p~ogramª de tre~n;l,
120
mento, e acaba 'serido determ inado, por algum motivo,
que eles não sãefad equad os 'para o progra ma, Às vezes
acontece de o candid ato sé sentir arrasa do com essa notí­
cia _ e ficar com raiva, às vezes com muita raiva, reagin ­
do de manei ra muito hostiL Quand o tenho a oportu nida­ de de falar com essaS peSsoas, digo algo do tipo: "Olha , eu
não sei o que você pensa que:é' um analis ta jungu iano, mas acredi to que não seja o que você está pensa ndo. Você
está projet ando algo nessa image m que' não é aprop ria­
do. Você e~tá, projet ando algum t~po de vaÍo.r, de grand e
conqu istada qual voéê foi agor<;lprivado. Eu:nã o vejo as­
sim". Oll entãp eu digo: "É' uma ativid ade muito específi­
ca, a psicoÍógia profun da. Ela éxige umtlp o muito espe­
cífico de tempe ramen to. Ela reque r uma ligação' meio que
contín ua e' regula r com profun dezas psíqui cas, o que não
é muito natura l, eú 9.iria que é até mesm o anorm aL A
maior ia das pessoa s que vieram a' tornar -se analis tas
jungu ianlÍs começ aram caindo em algum tipo de buraco
profundo; possue m algum tipo de defeito em sua psique
ou nunca teriam ' caído em:ta is profun dezas. Fique feliz
por não' precis ar chega r a"esse ponto! Vá dar aula em
uma univer sidade ou fazer isso ou aquilo. Não fique tris­
te. Não' é tãoru ün assiin"'.:'
,. Pergunta:,yoçê falous obre,a arte de devolv er as pro­
jeções. Você já é analis ta há muito s anos. Existe algum a
coisa que você possa nos dizer sobre o que sabe dessa
arte?
.
Edinger.: Bom, você sabe que rima das partic ularid a­
des da arte é que ela é incom unicáv el. Mas posso dar al­
gumas sugest ões.
Uma manei ra de mand ar a projeção de volta é agir
de forma s que a contra digam . E se ela carreg a certa gló­
ria divina consigo, e você demon stra certa fragili dade
huma na, essa ação tende a 'refrea r a projeção. por outro
121
lado, se você realmentE)_ sabe, o que estáfa_:?~Il.çio,:não pre­
cisa ter medo ~ela.. ,Você não precjsa, mal~-la prematura­
mente. Isso tamqém é pa:r;teda, arte, porque yocê está de
posse de um cQnteJJ.<lo !?agrado, o;riundQ çl~s proJundezas
do pacient~, ~ voc~ quer.deyolvê.~lojntacto,.,C? niio rasga­
do, dilaceradQ. M9-s çhe.ga o rp.om~nto em que, m.aisrea­
ções h.umana,s sª9,apropria,qflS do que oqlle.foi. apresen­
tado no ca'so <:lnt~rior:...
l' .,
' . ,.' " ,
Pergunta:' :Ao nos abster de pos 'identific~r: corri vá­
rias de'nossas próprias'caraéterísticas, você tem unia idéia
de como é qu~ nos identificamos? Se o indivíduónão se
identifica com nada; onde está sEm'senso 8.eidentidade?
l,
:III,~,
~_~"~
"_"~
,'r,
Edinger: A ide~tidade" por natureza, é um fenômeno
individual. Você nã-ó pode dizeraoso{ltros como ele1:)'i:>o­
dem f~rmar unia identidade: E~istem ~luitos proceçÜmen­
tos coletivos que reco~endam a identifiiaçãoeom ~fa"
mílià,com ~- gr~po étnicC?: com a, comimid~ç.Ei!.~$sà '~ãp é
minha Iloção- déldent.id~de. ':, -- , .- •_
. _ ' , ' ....
, MiI1ha Il()ção de.identi,dflde_é a de uma,personalidfl­
de úldividuaI"qlle.cresce como üma planta, declentro,pa,ra
fora, e é iS,so que tC?do o proce$SO de psicoter;apip. p~rofun~
da procura alcançar-ao direcioIl-ar a aten'ção - ~tençãó
viva, afetuosa, consistente - para a psique do indivíduo
que necessita descobrir e realizaÍ' sua identidade' com­
pleta. No final dàs contas, a semente da üÍenticlade'é' o
Si-mesmo, e o' Si-mesmo está àlém de qualquer défiÍü:'
ção. Jung tentou, com grande afinco, abordá-lo de m'uito's
ângulos.71 No entantp,!? ~km,esm~ ~ ""!P~. e?,pe.riê~cia e
não pode ser definido.
. '.
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r\
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. ~ j
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7\
122
Ver adiante: "Apêndice: notas
~
I
I
j
•
"'i
-5
" ~." I:.. _
.
o FENÔMENO DAtTRANSFERÊNCIA
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Ele usou b termo trqnsf~I."~ncia,p'ara 9.escreve~,o envolvi~
me~to enÍocio~aÍ entr'é' pa'de~tee Ínédic~,ém ~m~r~la­
ção ppispteráp\c<:l.,~l~so,nsideravê fl. transfe,rêrci~/eomo
uma ,revivescência de padrões regressivos infantis ,de
comportáment~dentro da situação te-rapêutic~: 9- rela­
ção imatutfl d~pende~te com ÓS p~is s'e~do' recapitulada
com Ót~rapeuta; as ,~ecessidades neuróticãs do pacien­
te .e as: e:l;(pecta.tivas de satisfação destas sendo trans­
feridas para o analista. Daí a palavra t;ansferência..
É ,ciafo- que nós, jUI).guianos!, não podemos aderir, a
ess~, descrição .. F,alarei,sobre as, ra~ões, para isso mais
t~r:<;ie., COI),tudo, a interpretação de. Freud da natureza d~
traI1sfer~ncia,cieye $e~ m.e,ncionada qqlfi, pois essa inter­
pretqç~o ~~dut~va foi responsável pela. palavra neutra e
indiferE:nteque ele .escolhé:u P!lrad~~ nome ao fenômeno.
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Transferência e projeção; ,
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. Como voçêS podem ver, a palavra transferência tem,
em essência,~o mesmo significado de projeção. No entan­
to;;na minhà:opinião,otermotransferência é pobre. Pre­
123
cisamos de uma palavra que possa expressar mais espe­
cificamente o envolvimento dinâmico intenso que ocorre
uma palavra que. transmitaa. naturéza, tránsformador~
da experiência da transferência. Esse termo ainda não
existe. Por enquanto, devemos nos conformar com o ter­
mo que nos está disponível; um termo que adquiriu uso e
aceitação bastante amplos.
É muito difícil definir a transferência de maneira
abrangente. Em seu sentido mais amplo, ela inclui todas as
vivências onde há uma projeção psicológica. No sentido
mais restrito, refer~-se a uma ligação intensa, positiva e
libidinal do: paciente com o terapeuta 'em uma relação
psicoterápica.:onde'o'paciEinte se confronta com seus con­
flitos mais intensos. Se for trli:tada de maneira apropria­
da, essa relação oferece uma oportunidade única de trans­
formação psíqui'ca.·
No momento em que 'rios afastàmos dessa'definição
limitada da transferência, abrimos a porta para um ban­
do de outros fenômenos menos importantes de:iJrojeção.
Falamos de tnirisferencia negativ'a, coritratranSferência,
transferência com os méq,icos, padres, professores,' e as­
sim vai, e· até mesmo transferência com os amigos. Por
exemplo, conheço' um psiquiatra que, recentemente, fez
uma entrevista para um cargo ém um 'sanatório famoso
por sua ênfase 'no que eles chamam'de psicoteràpiadinâ­
mica. Ele foi bem na entrevista e consegUiu o emprego. O
homem que o entrevistou gostou dele. Mas eles nãófala­
ram assim. Disseran1~lheque'haviam feito uma fáulsfe­
rência positiva para co'fi ele. Isso é um absurdo. Quando
o termo é usado de maneira tão solta, ele perde toda a
sua significação específica. Por:taritp,Jlsarei.atrapsferêp­
cia apenas no sentido restrito, como 'foi definido acima,
com uma exceção: não vou ,excluir as relações libidinais
intensas que ocorrem fora da situação psicoterápica, pois
elas demonstram um potencial para a transformação ,psíc
i
124
.
quica, partiCularmente pela emergência de temas arque­
típicos característicos que vou citar daqui a pouco.
Lola Paulsen demonstrou uma opinião semelhante,
diferenciando a projeçãó da' tranSferência. Ela diz:
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A transferência é'mais do que uma projeção, pois é algo
arquetípico;incohsciente e metafórico, e, sendo as'sim,
representá fenômenos e processos: As projeções positivas
e negativas apenas dão a ela sua form? e seJ..l.;' ~símbolos.
Como transcend~ às projeções;o termo tr1:\nsfer;ência pode
ser legitimamente diferenciado do térm9projeção, e usa­
do para designar os sul:essivos estágios dd processo de
individuaçãO à medida qlÍe ocorrem' em reláção aoanalis­
ta... As projeções são auxiliares no "trabalho"; elas o refle­
tem, mas. não devem ser iden.tificadas coro ele, e então a
transfer~l).cia <;lo prócessqde individuação aconte.ce
por
72
trás, ou tampém se pode dizer, dentrodélas.
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A transf~!,encía apresenta aspectos diferentes depen­
dendo do ponto de vista' com o qual ,se blha para ela. Para
a psicologia freudiana extrovertida, ela se baseia no amor
indigente de'natúreza infantil e 'incest\.losa: Para a aborda­
gem introvertida de Adler, eÍa é um, "arranjo" na luta pelo
poder. Segundo as teorias de Harry Stack Sullivan, indi­
víduo extremamente introvertido e serisível, ela é um ema­
ranhado dó que ele chamà de "operações de segurança" ,
que são proje'tadas'para se evitarios danos que podem ser
causados por uma pes90a.supostamente perigosa e impre­
visível. A posição de SullivaD., como'vocês podem ver, é uma
variaçàô da visãO de'Adler. Os dois 'são introvertidos, dan­
do uma importância maior ao sujeito'do que ao objeto. Con­
tudo; Sullívan 'dá ênfase aos procedimentos passivos e de­
fensivos, colocando a segurança como o objetivo final. As
teor'íasdeA.dlersugerem uma'abordagem mais agressiva.
A vontade de poder supõ'é,que o ataque é a melhor defesa.
.
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72
"":ansference andProjection", in Journal or Analytical Psychology, voI.
1, n,O 2 (1956),
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125
A nat ure za arq uet ípi ca da tI:'a
ps.(erêQ.ci.@.
Não podemos esq:qeçer qp.e Jun g'a
cei tgy a a val ida de
par cia l dessés,ip_QnJosd~ vis ta. Eles
,"s~,? pªr te do todo e
não pod em ser c~~~i~er,ados falso~.,
O que fa~ta a ess as
teo rias red utiv às é a éonsciência da
nat ure za arq uetípica
e prospe~ti~àiá' tranSferênd.~ ,8
"'$lJ.~S PQt~,ncüilidades
tran sfo rma dor as. '
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Psi cot erà peu tas red,utivi~tas,,'ehfà
tizain as ma nife s­ taçõe's ext ern as ~'ln teipêssóai~ éil
traÇlsferêl1d~, 'com to­
das as s~as característiéa·s inf ant
is. Se ''Eiles e~tJdassem
os ,so~h~s:dos pac ien tes de Ulanei
nl'objeÜya, :po, sur gi­
me nto da' tran sfe rên cia , é mu ito pou
co pro váv el que fra­
cas sas sem em rec ohh éce ros tem as
arq uet ípic os imp res ­
sio nan tes que :su rge m daí. AlgUns
jun gui ano s;' por out ro
lado, tende,~ a, ir pflra o ex~replO op~
sto. o prazer: q,ue en­
con tram , {lO d,escobrir" 1.fW' arçiu~tip
o l~OS )iqd os, de seu s
paçiente$, e' ~ âns ia de ,us ?r ,~?4Q
9, $~U ,çonh~simento de
mitolQ~a '~ simb91~smo,~?~~ aml?
lifi,C:CZ( e~?~, ~Nuét,~po?
pode le,\';:í~los a neg lige nçi ar al} ªfu
rez
pessoai~ do pac ien te. N~gar a s~tuaçã?a d,a~relações inte r­
concretÇi aQ sup er­
val ori zar QJ1late:çial arq uet jpic q ,pod
e, cri ar ou pr91~ngar
um est adó 'pe rlg osp de inf laç ãon arc
isis ta.. j\ch o q~e e~sa
tendênci~ é l1m ~eri~op.fH·,a iodos,
,os ~u~gijüuio(~. E~p'ero
que nós nãppr9Jetem~s. pos1sa pr:o
re.a~
abo rda gen s red utiv as de Fre ud e pna $oJURr? s,?b
Adler. " ,
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Dit o isso, ago ra pre cisa mo s crit ica
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cla hda des posItIvas d!3 ~a:l expene
nCIa. :OepoI.~ de desco;
bri r a transferência,Freud{~ des~re
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ser unilate ral, não é um a descrição acu rad
a da rea lida de. A re­
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sfe rên cia é p.m~ par,
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te essencial de sua sem elh ant e dep
reciação da infância,
do inconsciente e do ser hum ano que
por acaso tem um a
neurose. Ela cor res pon de à sua pro
fun da ant ipa tia pelo
irracional, que ele afa sto u de si ao
apl ica r-lh e um a term i­
nologia mó rbid a e patológica. Ess
e pro ced ime nto é um a
ver são civilizada dó primitivo,"nom
e-mágico" e, nem pre ­
ciso dizer, os jun gui ano s não dev eria
m ade rir a isso.
Tra nsf erê nC ia po sit iva ' :)
Emb 9ra elelll~ntosI."egre~sivo.s, ima
tur~s .e ,neuró­
ticos sej am mu ito com uns na tran
sfe rên cia , ,eles não re­
pre sen tam seu' significado básico
ou cen tral . O conteúdo
básico dá tran sfe rên Cia pos itiv a é
a libido sau dáv el- a
cap aci dad e de exp erim ent ar a vid
a int ens am ent e e de
se rela cio nar com out ras pessoas
- :lu tan dop ara se ex­
pre ssa r.
A tran sfe rên cia tom a mu itas formas
diferentes e cad a
caso é único eD;l alg uns aspectos.
Ap esa r disso, pad rõe s
ger ais em'ergem ,rep etid as vezes.
O ter ape uta com fre­
qüê nci a apa rec e como um ser de mu
ito val or e como um a
figu ra cen tral na vid a do pac ien
te. O fenômeno básico
par ece ser o sur gim ent o de libido
rep rim ida ou late nte no pac ien te - da cap aci dad e de con
er val or e amor.
Essa~ forças a favor <;la ,yid~ são, eD;lced
.g~ral, dire cio nad as
em prim eiro lug ar par a o tera peu
ta, que é o age nte res­
pon sáv el pel a sua ativ açã o. A ima
gem n~sse está gio é,
muitas. vezes, de depÉmdência e neu
,ro se- na superfície,
O pflciente est á, qua se sem pre , cie
nte da nat ure za
apa ren tem ent e ina deq uac ia e ano
rma l des ses sen tim en­
tos e' irá res isti r a eles com mu ito
vigor. No ent ant o, o
ma ior err o do terapeu~a é ace itar a
ava liaç ão neg ativ a do
pac ien te em re'a ção à transfet;ên
cia. Ess e é o erro dos
frt';!udianos:,e sua con seq üên cia é
a per pet uaç ão do est a­
do de dissociaçã,o pSíqúicà que é a
orig em da neu ros e. O
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127
medo e a resistê ncia dô paden teàlib ido são'àt ívados si­
multa neame nte pela tninsferêricia. Para minor ar o. medo
e a resistê ncia, o.S aspect os po.sttivos e co.nstrutivos de­
vem ser enfáti zados, o. que é, com fre-qüência, corro.bo.rado pelos sonho.s subseqüéntê~. r. "
Como vo.cêssabem, ao. contrário. da análise.freudiana,
na psico. logiaj unguia na o'uvimos falar muito. po.UCo. so.bre
resistê ncia e defesas. Muita s razões há para isso.. Quero
menci onar apena s que o.S termp s r~sistência,e defes~ Sl!­
gerem que alguém está atacan do - talvez seja o. analis ta.
De fatá,a ' abo.rdagem 'redut iva que desvalo.riza o.S
conteúdos; inconscientes,' especi almen te a transf erênci a, como.'apenas regres sivos e infant is, é realm ente um ata­
que aos fundamel1to.s dapers o.nali dade huma na. Em uni
caso. desses; uma defesa e uma resistê ncia vigo.ro.sas são.
a respos ta apro.priada. Co.nheço. paCientes em anális e '(não.
jungu iana) que, depo.is de se debate r inutilm ente co.m uma
barrei raco.n stante de interp retaçõ es reduti vas, fizeram
um eno.rme pro.gresso co.m o. surgimentoi::la resistê ncia e
o abando.no da terapi a. Algo. semel hante aco.ntece co.m o.S
ado.lescentes que ficam expo.stos à atitud e reduti va do.s
pais. Uma resistê ncia declar ada 'e rebeld ia são as respos­
tas saudá veis pará isso..
O sigrÚficado. real da tranSferênCia 'revela-se ao. co.m­
parar o. estadó de cónsc iêiióa prévio do. paciente.co.m à
nova co.nsc iência -ttarts ferêné iá,e ao. éstuda r'
sdnho.s
que aco.mpanham'o surgimento. da transf erênci a. As dúis
abord agens chega m à' mes~a' respo.sta: 'O estado. pré~
transf erênci a será, pro.vavelmente, um :estado. de éspíri­
to. estéril , falido. o.U paralisado., que deixa o. indivíduo, de
algum a fo.rma, iSo.lado. do.s o.ufro.se' de!exp eriênc ias de
vida significativas. A transf erênc ia muda' isso.: O pacien­
te fica profun damen te envolvido com' pelo. meno.s um ou~
tro ser human o. A capacidade de,co.nferir valo.r eintere sse
a o.bjeto.s ou pesso.as fo.i despe rtada. Algo co.mplêtam~nte
128
no.vo. e fascina,nte entro.u,na consciência, de forma que o.
pacien te encon tra-se envolvidoco.m a vida de no.vo.. Em
uma pal~vra, ele e,ntro.u,em co.ntato Co.m a própri a libido.
Os so.nho.s que $e segue m a essa experi ência apóiam essa
idéia. Eles norma lment epo.ss uem temas , tais co.mo.: uma
criança. nasce e sobrevive.aos perigo.s iniciais; a água da
vida fo.i encon trada; um casamento. fQi realizado., o.U uma
relação. sexual, e aS$im. po.r diante .
J
Trans ferên cia na vida cotid iana
A transf erênci a, meSmO. quando. em um sen,tido. limi­
tado. Co.mo.Jo.i de$crito acima, não aco.nt ecé.ap enasn a re­
lação. co.mo .terap euta. PJ?de ha,-:er experi ências muito.
profun das, de transf erênci a na,. vida. cotidiana. das rela­
ções :entre home ip e rrlulp.er, entre. g.uas mulhe res, o.U,
co.mmeno.s freqüê ncia, entre ,dois ho.mens.rr:ais expe­
riênci as po.dem ser..c haínad as.de tran$f erênci a de aco.rdo.
com no.ssa. definição., desde que ,a intens idade libidin al
seja .adequada, a perso. nalida detotà l esteja envo.lyida e
o.S temas típico.sde transf ormaç ão surjam . Se tais :expe­
riênci as são. viv~das de. manei ra respo.psável e integr adas
na co.nsciência, .elas pro.duzem uma mudan ça perma nente na person alidad e.
. No. entanto.,. essa não. é uma tarefá fácil, nem dentro.
nem fo.ra da anális.e. Ela. equivale. ao. opus aIquímico e re.­
quer muita persev erança , hones tidade e devo.ção., .Um
co.nflito. do.lo.ro.so quase sempr e está presen te. A e'xplo.sào.
inicial de alegria ao. se desco.brir um amigo..querido. o.U uma
amant e aos pouco.s vai se misturando. Co.m a sensação. de
que se é prisio.neiro. do. amo.r do o.utro.. O poder co.meça a
quere r vir à to.na. Manifestam-se sentimento.s de raiva e
ressentimento.. Cada um começa a quere r co.agir o.U indu­
zir o. outro. para a satisfação. de suas próprias pro.jeções. Uma
aç~o. irada leva a uma reação. irada, e a briga começa.
129
Para conse rtar uma situaç ão dessas , é preciso a capa­
cidade de se fazer uma distinção consciente entre o ser
hurna no e o que foi,projetado na outra pessoa, seja a som­
bra, o animu s ou·a anima . E, com muita freqüência, o po­
der do Si-mesmo aparec e em meio a essás outras imagens.
É a esse poder.íntimo qüeo indivíduo deve subme ter-se, e
não ao outro indivíduo. Se essa distinção entre a pessoa e
a projeção puder ser feita, o conflito de pôder pessoal é
dissolvido e substi tuído por um sofrimento voluntário.
No reino da vida .cotid ian,a, não .çonsigo pensa r em
urna oportu nidade melho r para se lidar de manei ra criati­
va corn'a experiência da transf erênci a do que no casamen­
to. Nem é preciso dizer que o casam ento tem muito mais
possibilidades de dar certo se pelo menos um dos parcei­
ros está numa anális e, oujá passou por esta. O casam ento
norma lment e começa sob a força de projeções mútua s po­
derosas, quenã osãô difere ntes das. que surgem na análi­
se. A diferença é que, no casam ento, as projeções existe m
dentro da estrut ura de uma situaç ão de vida real,e m vez
da atmos fera artifiCial da análise. Esse fato, ju:p.to com o
fato de que ambos os parceiros estão envolvidos mutua ­
mente , fazem com que essas projeções ·sejam muito mais
dificeis de se identi ficar..Todavia, se a pesso a tem êxito, as
recompensas são també m muito maiores.
Depois da eufori a inicial do casam ento, o padrã o co­
mum é o dos parcei ros sosseg arem. echeg arem a.um es­
tado mais ou menos confortável de simbiose. ,O auto-ero­
tismo de ambos perma nece relativ ament e satisfe ito e
confo rtavel mente incons ciente . Às vezes, isso també m
ocorre na transf erênci a analíti ca. O pacien te comparece
às sessões para se aquec er no calor dos sentim entos eró­
ticos e mostra -se disposto a contin uar deleitá ndo-se por
um tempo indefinido apesa r dos custos. disso. Nesse. mo­
mento, uma operação radica l pode ser neces$ ária para
tirar o pacien te de seu berço confortáveL
130
Nos casos ·corre spond entes de casam ento, també m
chega umpon tó):md e tudo começa a ruir. Cada um come­
ça a ver as fraque zas (com freqüência, em parte proje­
tadas) do outro. Multip licam- se os ressen timen tos e as
recriminações. Esse é. o mome nto em que um conheci­
mento da nature za da transf erênci a :ed~Lprojeção é de
vital impor tância . Se .os' cônjuges são sufici entem ente
conscientes, respon sáveis 'e flexíveis, .serão capaz es de li­
dar com s!1asdificuldadeE;, retirar~as. projeçqes e expan ­
dir suasp ersóna lidade s. Contudo, essaé uma tarefa lon~
ga, que pode durar tanto quant o a vida de casados.
Às vezes; 'outro stipos .de relacio namen tos també m
fornecem um veículo para uma experi ência real de trans­
ferência. Não é muito 'incomum que uma ligação erótic a
entre duas mulhe res .tenha conseqüências transf orma­
doras, o.que també m é possível, porém não muito comum,
entre dois homens. Até mesm o relações. entre pais e. fi­
lhos podem ser.vir a esse propósito, princi palme nte para
os pais. Esse assun to foiest udadô de manei ra magní fica
por Elean or Bertin'e, em seu texto a respei to da's relações
human as, onde ela chama.o aspecto extrovertido da indivi­
duaçã o de amorobjeta1. 73 o.prec ursor pqicológico do.amor
objetai é o que podemos chamar~deamor ,indigente, pos­
sessivo e pegajoso, uma busca de amor que se origin a em
uma posição de fraque za.
Tr~üisferêrici~: e' centr overs ão
Para o aspecto introv ertido da individuação, vou to­
mar empre stado o termo de Erich Neum ann, centroversão
_ a descob erta e devoção à autori dade intern a do Si-mes­
mo, que liberta o indiví duo da servidão à autori dade ex­
<
73, Ver Close Relation ships: Family, Friendsh
ip, Marriage, e5p. pp. 4355.
(Nota do Editor)
131
terna projetada. 74 Eu diria que,d~ mesma forma"que o
amor indigente é o precursor do amor objetaI, a vontade
de poder é o precursor psicológico da ce~trciversão.
A vontade de poder rebela-se contra a dependência
psicológica ao objeto externo,. Ela luta por independência
e autonomia. Amorindigeiíte e luta por poder são. duas
manifestações' do mesmo' nível de desenvolvimento psi­
cológico. Dois aspectos; da mefiimacoisa,' duas maneiras
nas quais a personalidade insegura procura superar suas
fraquezas, ou, colocando deforma mai~ positiva, duas ma­
neiras nas quais a libido se manifesta: nesse nível de de­
senvolvimento da personalidade. Amorindigente e luta
pelo poder normalmente se alternam dentro da mesma
pessoa. O que'se precisa numa situação dessas é de um
crescimento' da consciência que possa transformá-los em
suas formas maduras de amor obje.tal e centróversão. Essa
transfor~ação possibilita, ao mesmo tempo, 'a capacida~
de de se relacionarobjetiva~ente com os outros e de fun~
cionar de maneira autõnomá a partir de uma forite: de
autoridade intenla.
Essatra:nsformação .nunca é completa. Amorindi l
gente e lutê! por poder são características da psique pri­
mordial que estão sempre presentes. O~, colocando 'de
outra maneira, §ião manifestações im.utáveis e instinti­
vas de protoplasma, vorazes, lascivas ~ devoradoras.·,O
máximo que podemos fazer é sermos conscientes e respon­
sáveis, pois a criança ou o ser primitivo está sempre
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74 "A cen troversão é a tendência inatà da totalidade em estabelecer a' unida­
de' das suas partes e de coordenar as ,su.as í:liferenças em. sist.emas uniGcados.
A unidade do todo é mantida por processos compensatórios que a centroversão
controla, processos com a ajuda dos quais o todo' se tOrna um sistema autocriador
e em expansão. Num estágio posterior, a centroyersãose manifesta como urp
centro diretivo, isto é, como centro de consciência no ego e como centro psíqui.
co no Si-mesmo ... Ela opera de modo inconsciente, como a função integradora
da totalidade, em todos os organismos, da ameba ao homem." (Neumman, The
~.
Origins and History ofConSciousness, pp. 2.136s) (Nota do Editor)
132
conosco. Estar' inconsciente desse fato significa estar
fiado ou ser infantil nas relações com os outros.
N a transferência, o indivíduo tem uma oportunida­
de de
tornar cônscio desse aspecto primordial da libi­
do. Parte dessa libido ,pode, então, ser tran.sformada em
energia eficaz para uma vida criativa e para as relações
interpessoais. No entantp, a criança eterna permanece.
Ela precisa se relacionar conscientemente com a autori­
dadeíntima.Q.o Si-mesmo. O :indivíduo precisa ser um
filho de Deus pará évitarcom.portar.:.se como uma crian­
.
ça perante os outros.
Transfe:.;ência e tr~nsforma.ção'
N a transferência, consciência e transformação pare­
cem ser sinônimos. No momento em qúe uma nova carga
dé libido emerge na consciência, sonhos' de processos
tránsformadores aparecem dé umjeito ou de ou:tro, como
se o próprio·.ato de tornar-se consciente "trahsformasse
um conteúdo psíquico. Isso é, 'de fato, verdade. O que antes
estava morto ou ainda por nascer -ganha vida. O que era
apenas potencialidade tor:p.a-se realidade psíquica. É isso
que eu considero como o elemento essencial da tra'nsfe­
rência: uma situação de envolvimentbdinâmicó que vita­
liza, a personalidade consciente e traz consigo a capaci­
dade de viver a vida mais intensamente. Em resumo, é o
nascimento ou uma ressurreição da libido o bem mais
precioso da humanidade. Os sonhos e as outras produ­
ções inco.nscientes que emergem com O surgimento da
transferência tOfIlprovam totalmente esse ponto de vis­
ta. Deixem-me dar-lhes alguns exemplos.
O primeiro caso é o de uma transferência que acon­
teéeu na vida cotidiana, sem nenhum contato terapêu­
tico que sej a. Seu fim foi trágico, mas as produções
inconscientes revelam a magnitude de sua importân­
133
cia potencial, que a personalidade consCiente não Com­
preendeu.
Encontrei essa. mulher em.um hospitàl psiquiátrico
quando elajá estava completamente psicótica. Ela tinha
sessenta e quatro anos de idade. ,Segundo a informação
que temos, não havia nada, dê muito estranho sobre sua
vida até três anos antes da hospitalização. Ela foi criada
no catolicismo e continuava com sua prática. Casou-se
com dezoito anos e teve cinco filhos: Sua .personalidade
foi descrita como afetuosa e amigável. Seu maiór interes­
se era sua família, mas ela também gostava de jogar brid­
ge, ler e tocar piano. Sua vida e seus interesses sempre
foram normais e convencionai,s. O único dado suspeito
nessa história de vida apárenteinent~ normal fói o comen­
tário d~ seu maridQ de qué,ela era "convenc.ionalmente
fria" no ato sexual..
EssJ~ era o retrato da sua v.ida quanpo, três ,anos an­
tes de ser, hospitalizada, .ela começou. a fazer um trata­
mento dentário, Ela..desenvolveu unia "atraÇão erótica
muito r:ápida pelo dentista. Nes!3aépoca, sua família
notou uma completa n;mdança de personalidade e ela tor­
nou-se, em pouco tempo, uma psicótica delirante. Embq­
ra a família fizesse todo o possível para evitar a hospita­
lização, ela a.cabou tornando-se necessária.
As idéias delirantes que surgiamnessamulher,jun­
to com seu envolvimento erótico, são extremamente inte­
ressantes e pertin,entes para nosso assuntp. Não se es­
queçam que as idéias delirantes .têm a mesma origem e o
mesmo significado dos sonhos .. A úl1ica diferença é que o
delírio é tão intenso, e o ego consciente está tão frágil, que
os conteúdos inconscientes não podem ser diferenciados
da realidade externa. .
"
Essa mulher começou a acreditar que iria receber
uma grande herança do. dentista. Havia outras ilusões
também, idéias paranóides de que pe.ssoas. perigosas eS­
134
tavam contra ela. Mas a convicção central, e a mais inte­
ressante, era a de que o dentista havia descoberto um
remédio milagroso que.ir~a prolongar a :vida indefinida­
mente, Ela esperava, receber esse re'médio maravilhoso
dele. Todo o seu comportamento revelava sua certeza
absoluta dessa boa sorte. Ela estava inflada e bem fora
do contato com a realiçlade.
.
A paciente estava louca. O ego consciente foi estraça­
lhado. Nesses casos; os processos inconscientes profun­
dos são expostos a olhos nus. A reação i!lconsciente ao
seu envolvimento erótico é clara e incontestável. O den­
tista oferece a ela.algo de enorme valor, quer dizer, a vida,
ou, segundo nossa terminologia, a libido. Infelizmente,
ela não tinha a menor capacidade de lidar com essa situa­
ção. Embora levasse uma vida insossa, seus sentimentos
pelo dentista continham algo de valor supremo. Se a per­
sonalidade inconsciente fosse capaz de compreender a
mensagem simbolicamente, ela teria sido forçada a lidar
com os difíceis problemas reais que a mensagem trazia.
Ela não foi capaz disso, contudo, e tornou-se delirante­
mente 'inflada com a convicção de que iria literalmente
receber um remédio revigorante.
Transferência em úma série de sonhos
, Agora, vou'apresentarpara vocês uma série de so­
nhos que apareceram simultaneamente com o surgimento
e o desenvolvimento de uma transferência.
A paciente é uma mulher de uns cinqüenta anos que
estava em análise. havia dois anos. A queixa dela era a
queixa característica da idade: a libido para as ativida­
des e interesses da juventude a havia abandonado, mas
ela ainda não era capaz de aceitar as exigências da se­
gunda metade da'vida. Ela estava presa no limbo entre
os dois estágios da vida.
135
Po.UCo. antes do. surgimento. d.a trafl$f.~rênci,a, I?la teve
vário.s So.nho.S so.bre 'lo.ngas. jo.rnadas, o.U v.iagens o.ceâni­
cas para lugares estnmhos e desco.nhecidos. SJla atitude
no.s so.nhos era de ince.rt~za~obre a,co.nY*'l!'.'liência de se
tais viagens .. Então., elp. $o.nho.u o. se,guinte:
>
Sonho 'I :"Ela e a irmã estavam voltando à cidade onde
passaram a infância. Elas sabiam que estavam na estra­
da certa,.porém, a estrada terminou de repente em um
campo. Para baixo do. morro, à esquerda, ela n~çonheceu
sua cidade natal. Ao descer a montanha, o céu escureceu
até parecer noite, apesar de. ser apenas nove e meia da
manhã. A sonhadora ficou muito assustada, mas procu­
rou se tranqüilizar dizendo: "Isso só pode ser um eclipse,
vai passar. Vou agüentar firme e não vou ficar com medo".
Esse so.nho. revela 0., t.ema característico que emerge
em quaseto.do.s9S pro..eesso.s de transfo.rmação. psíquica­
a viagem às treyas, o. reto.rno. à infância e a psique primo.r­
dial inco.nsciente da qual surgiu o. ego.. O so.nhado.r expe­
rimenta.o.s mesmo.s pav:.ores so.mbri.os que ,o. pr:imitiyo.ao.
se co.nfro.ntar co.m um eclipse do. so.l. Esse é ó medo pri­
mordial.de se perder a orientação co.nsciente ,em.meio ao.
ilimitado. e desco.nhecido.
A viagem trevas, que representa ao. mesmo. tempo.
o. início. da transferência, está simb9lizada no. so.nhopor
um reto.rno à infância. Esse"é um te~a b~rrrb'atacte'iísÚ:
co, e fica muito. claro.
se pe:r:ceber o,lJlo.tivo. pelQqual
Freud compreendeu. a tr.ansferênciaco..IPo. se.ndo. um fe­
nômeno. exclusivame.Ií.te.infantil. Ele.interpreto.u literal­
mente uma imagem que :devéria ter sido. entendida de
maneira simbólica. Fazendojustiça a Freud, devemo.s
dizer que só se po.de fazer esse tipo. de interpretação. co.m
pesso.as mais velhas, relativamente mais maduras. Nin~
guém pode fazer um reto.rno. simbólico. à infância se já
não. a tiver deixado. Muito. do. mal-entendido entre o.S po.n­
to.s de vista de Freud e Jung surgiu po.rquese misturq.-:.
136
ram dua,sdiferehte.S faixas etárias. Os jo.vens neurótico.s,
que ainda ef?tão preso.s na infância, devem ser tratado.s
de maneira bastante.redutiva·na maio.r parte do. tempo..
A abo.rdagem simbólica e co.nstrutiva é muito. mais eficaz
quando. já se atingiu certa maturidade.
Depo.is desse ;So.nho., ci tema da viagem sumiu. Ela
não. tinha ido. muitQ longe, m'as, ao que parece, já era o.
bastante para fertilizar o. inco.nsciente e trazer algo. no.vo.
à vida. Os dois so.nho.s seguintes são. So.breo. nascimento.
de uma criança. Sonho 2: Uma jovem forte e saudável uns doze ou treze anÇlS é levada àO hospital em trabalho de parto. Apacien­ te a vê. deitada em forma de cruz em uma cama quadrada. Na cama, está desenhada a cruz de ferro germânica. Existe certa: preocupação sobre possíveis dificuldades· no parto, mas o nascimento ocorre normalmente. O éo.nfro.nt~ di so.nhadora com a escuridão. teve um
efeito im~diato.: U~a criançà está nascendo. dentro. d~ ~'(mbo.­
do.' Si:mesmo. ~" a cr1}z germ~n,ü:;~ ~m um,a cama quadra­
da. Apesar de não. ser um nascimento fácil, ofub,lro. é pro.-'
misso.;r. No entart?, o.'so.nho. seguinte revel~.sério.s perigo.s:
Sonho 3: A sonhadora estava dando à luz uma criança de
. maneira bastante inc.omum. Tem algum tipo de constru­
ção envolvida. Alguém disse a ela que ela estava fazendo
errado e que, se cóntinuasse, iria matar a criança. Contudo,
ela não iria ceder, e continuou. O résultado era incerto.
Obviamente; as' co.isas deram errado.. A paCiente in­
jeto.u uma intencio.nalidade egÓica em um pro.cess o. natu­
ral, co.lo.cando. em perigo. a no.va criação. Isso. fico.u claro.
em um o.utro. so.nho. qlÍe ela teve ria mesma no.ite, no.
ela carimbava tudo. o. que via pela frente co.m o. seu pró­
prio. carimbo. de bo.rracha. Po.ssessiviâade e reivindica­
ções de po.der po.r parte do. ego. ameaçavam to.mar o. co.n­
tro.le.
é um problema muito co.mum. O ego. co.nsciente
137
possui uma tendência qüase irresü~tível dê se intrometer no processo natural inconsciente, distótcendo-o em seu favor. Isso é revelado em uma outra imagem de um outro sonho da série:
.
o bebê realmente tinha nascido? O marido dela entrou no
J!1
!
Esse.so:hno .comprova que o bebê ainda está vivo. É
interessá.nte qtie o visco sàgrado seja uma prova disso:
Dentre 'as.várias características miraculosas atribuídas
ao visco estão 'as crenças de que ele fertiliz,a o. gado' esté­
ril e de que se uma mulher carregá~lo consIgo, ele a ajuda­
rá a engravidar.No sonl}o"um símbplo da fertilidade
minina prov~ que. Çl: paciente ~ .criativa.
A criança se defrontou com. outros. perigós e outras
incertezas, mas yamos·passar direto para os dois últimos
sonhos:
,': ' , '
...
Sonho 4: A faxineira da, ,son4adQra, ):lma mulher simples,
afetuosa e realista,mandou um buquê de flores para ela.
Ao tentar'arruniá-IO, uma flor ficava caindo no chão e de­
sarrumandoas outras, até que ela deixou que a flor ficas­
se no chão. De repente, essa flor se transformou numa
criatura de pele dura, meio marisco, meio tamanduá, Cor­
de-tijolo e muito feia. A moça decidiu que'o bicho deveria
,ser morto e começou a bater nele com uma vara. Ele rea­
gia furiosamente e, quanto mais ela batia nele, mais ele
crescia. Ela percebeu que, se ele continuasse a crescer,
iria tornar-se realmente perigoso. Ela parou de bater nele;
então, ele'começou a diminuir de tamanho e foi embora.
Esse sonho é bem reveladoro Junto com o nascimen­
to da criança também fora:mativados poderes que amea­
çavam sua sobr~vivência. A natureza dessás forças é
simbolizada pela criatura feia; de pele'dura. Esse bicho
represent~ a 'natureza priinordial, desumana e instinti­
va do protoplasma. Do ponto de' vista' psicológico; ela se
manifesta como voracidade,' possessividade e luta por
poder. Ela não pode ser morta. Reprimi-la de forma bru­
tal aperias faz com que ela cresça e fiquemáis perigosa.
Ela é o verme no núcleo da vida que não é agradável, mas
precisa ser aceito. O surgimento dessa criatura primiti­
va interferiu no andamento regular da análise, é, claro.
Ela não pode ser reprimida e, também, não se pode dei­
xar que ela realize seus desejos de maneira autônoma.
Depois de um períod.o de batalhas com essa intro­
importuna, o tema de um novo nascimento foi rei­
terado com o seguinte sonho:
Sonho 5: A paciente estava em' casa, de 'camà, depois de
dar à luz uma criança. Mas havia alguma incerteza no ar.
138
quarto sorrindo, e apontou para um visco que estava de­
pendurado sobre a cama. Essa era a ~omprovação de que
o bebê havia re<;l.lmente nascido. ,
tI
Sonho'ô: Ela'ganhou um presente de um médico famoso,
um homem que a havia despertado de anos de torpor, e
por quem ela havia se apaiXonado, O 'presente consistia
de'uma sacola de plástico redonda· cpntendo tudo o que
era necessário para a vida, incluindo o Tempo. O Tempo
era representado por um cordão umbilical em círculo, em
volta da sacola.
Esse foi um sonho muito forte para a paciente, ape­
sar do fato de ele não conter nenhum elemento cósmico ­
exceto, -talvez, pela noção dé Tempo. O sonho é uma re~
presentação dela mesma, contendq todos os requisitos
necessários para a vida, e çercàdo pelo círculo urobórico
do cordão umbilical representando o Tempo como um cír­
culo . e t e r n o . ' '
O sonho foi particularmente interessante para mim
por revelar de forma clara uma importante transforma­
ção íntima.de sua atitude perante a experiência externa
da -transferência. Eu, é claro, não havia dado a ela ne­
nhum presente desse tipo, tão valioso. Ele veio do curan­
deiro arquetípico. Todavia, é quase impossível entrar em
\
139
contato com essa força curadora interna a: 'não ser a par­
tir do contato profundo com lima outra pessoa, o que equi­
vale a dizer que só se pode entrar em 'contato e integrar o
inconsciente pelas vias dá projeção. O 'óbjetivo, é claro, é
separar o significado único e pessoal de tal experiência
da pessoa coIp. q]-le~'a ~xperi~nci~ acontef8u. A projeção
do Si-mesmo precisa ser retiraqa do terapeuta se o pacien­
te não quiser'permanecer numa depeD-dê'nciâjmpotente.
to~a
~ess~"quesfM,: ' 1. "..':'
','
.
O -sonho "r'fip'~l
•
{
,.
.,
,
~
J
'
J.
I
lo
~.!
~
~
Sonho 7: Asonha'd6rí:t viu b plano de' sua'vida sendo tecido
em uma grande estéira, Cada fió da esteira tinha um sig­
nificado diferente e muito importante, Terminada, ela era
quadraqaJ9;rl!}acj.;:t por ;váriasp~quen>as suásticas, e ela a
colocou em um carrinho de mão do lado de fora da casa,
bem ao lado da porta, O Dr. Edinger veio falar com ela e,
vençlo o carrinho, de mão, sentou-se nele e copversou com
ela, enquanto, ela estava de pé na· porta. Elaquey;ia pro­
testar por ele estar sen~ado no seu plano, mas percebeu
que a visita dele era temporária, que logo ele iria .levan­
tar-.se e ir, embora e que, o medo e a 'grosseria, dela não
eram n e c . e s s á r i o s . · ' · , . ,.
Aqui está sendo mostrado que a figura do terapeuta
está obscurecendo o plano,de vida oú modelo de ideritida­
de da paciente: A consciência desse modelo normalmente
emerge no curso de uma relação analítica e, a princípio,
está intimamente ligada à personalidade do terapeuta.
Ou seja, está projetada. Ness'es casos, o analista pode até
mesmo aparecer comoluna obstrução aó desenvolvimerü
to. O que se precisa é de uma separação entre o analista
como lima pessoa real e as projeções. Pepois disso, por
fim, temos dois seres humanos completos. encontrando
um ao outro da forma como eles sao de verdade. Amor
objetaI e centroversão emergem ao mesmo tempo corrio
duas formas de se manifestar o mesmo: acontecimento·....,.
integração psíquica e totalidade.
140
'.)
Pr.eciso dizer que a paciente áinda não experimen­
tou conscientemente e por corripIe to todas as implicações
desses sonhos. Esse 'ainda é um processo parcial, como
normalmente acontece. Ainda há muito o que se fazer. A
individuação é1um--processo em 'direção' a um objetivo
inalcançável, nunca um fato consumado. Quando estuda­
moS os ,processos inconsciente~em uma série ,de sonhos
como esta, estamos,olhando para potencialidades ..Q quan­
to se realiza depende; do que a personalidade consciente
faz com eles:Se não tiver ninguém em ca,sa,.eles vão ba-,
ter na porta à toa, ,I",;.'
.­
'Meuóbjetivoao, apresentar essa:série de sonhos foi
enfatizar o fato de ,que a individuação e.seuS temas arque­
típicos normalmente aparecem, e, devem aparecer, em
uma situação.interpessoal bem definida, ou seja, na trans­
ferência. De fato, toda experiência arquetípica pode trans­
formar-se em veneno. psíquico senão for.incorporada em
uma relação significativa com a sociedade e com os ou­
tros. Como'o primeiro caso nos mostrou, ela pode acabar
em inflação 8' psicose.
..,
Transferência erótica e religiosa
,
• I
'
, J- ,
~,
'
,
~
..:
~"
' , )
~;
:1
Ao lidar com a'transferência, repetidas vezes encon­
trâmosdois tipos de, material:' o erótico e o religioso. O
mesmo também é verdade para as' produções da insani­
dade. Por isso, temos boas razões para acreditar que o
núcleo da 'personalidade humana é ou erótico ou religio­
so, ou os dois~
c"i É normal tomar alguma posição nessa questão e,
:dépendendo do lado escolhido, interpretar o material se­
xual religiosamente, ,ou o material religioso sexualmen­
te. Com certeza, os teólogos revelam essa tendência quan­
do interpretam conteúdos obviamente eróticos no Antigo
Testamento como uma referência a Cristo e sua noiva, a
•
141
Igreja. A psicanálise freudiana faz o mesmo ao contrário,
ao interpretar a crença religiosa como derivada da ques­
tão edípica e, por conseguinte, como sendo primariamen­
te erótica. Essas :tentativas de se .ampliar.um aspecto da
vida em detrimento do outro criam i.magens distorcidas e
unilaterais dá realídade.
As terminologias religiosa e erótica' são claramente
intercambiáveis. As visões dos místicos abundam em ima­
gens eróticas e; por outro lado, a linguagem dos amantes
é, muitas vezes, religiosa. EU: diriaique os pontos de vista
erótico e religioso correspondem ao que chamamos ante­
riormente de amor objetaI 'e' centroversão. Eles são os
aspectos extrovertidos e'introvertidos,respeétivamente,
da individuação. A atitude religiosa e a.atitude erótica
madura são, em essência,.a mesma. A atitude religiosa,
ou centrovertida, refere-se à fonte in tema devida, a Deus.
A atitude erótica madura refere-se. ao respeito e à impor­
tância dos nossos companheiros humanos.
O.conceito de uma relação Eu-Tu de Martin Buber é
aplicável aqui. Para usarmos as palavras dele"podería­
mos dizer que a maturidade psicológica se revela pela
capacidade de se relacion~r com um Tu:-; algo,Çlue é com­
pletamente outro perante o ego. O aspecto 'extrovertido,
erótico, da relação E:u-Tu'seria o.amor objetaI; o aspecto
introvertido, religioso, corresponderia à'.centroversão. Na
prática, essas duas possibilidades aparecem simultanea­
mente. 75
Assim como a centroversão, a atitude religiosa, pre­
cisa livrar-se da luta pelo poder pessoal, também eros, o
amor objetaI, deve SE;).I:>urgardo amor indigente e da pos­
sessividade. Aí, eles, adquirem ostatus. de dois princípios
iguais, ou melhor, de duas manifestações iguahp.ente vá­
"
Para mais dados sobre este tema,ver Mario Jacoby, The Analytic En·
counter: Transference and Human ~elationship. esp. Capo 4: '(Nota.do Editor)
75
142
'l
r
lidas do mesmo princípio. O que antes era um par de opos­
tos é reconciliado. Tanto o modo 'extrovertido quanto o
introvertido de vida são respeitados. Esse é um dos fru­
tos possí.vets ,de uma exp~:riência criativa de transfe­
rência.
Transferência.como um chamado à tótalidade
I'
Tanto se Ocorre ria análise quanto na vida pessoal de alguém, a 'transferência ê, em essência, um chamado à totalidade. A libido corré para alguma cóisaque ela reco­
nhece como sua propriedade ou potencialidade própria. Essa é uma das razões para a possessividade tão exi­
gente de tal relação. Inconscientemente, o indivíduo re­
conhece que o analista ôu amigo carrega um fragmento projetado de sua própria psique, e ele quer reaver esse
fragmento. Se o indivíd'úo for capa~ de assimilar a proje­
ção, estará dando um passo importante em direção à to­
' ",.
'
talidade: ',.
A transferência co'mo uma luta pela totalidade está
belamente ilustrada no mito narrado no $ymposium de
Platão, onde. a natureza do amor é discutida. Vou citar
um pedaço deste mito. Diz ,Aristófanes:
"
, Mas é preciso primeiro aprenderdes a natureza humana
e as suas. vicissitudes. Com efeito"noss a natureza outrora
. ,não era a mesma que a de agora, mas diferente ... inteiriça
era 'a forma de cada homem, como dorso redondo, os
flancos em círculo; quatro mãos ele tinha, e as pernas o
mesmo tanto das mãos, dois'rostos sobre um pescoço tor­
neado, 'semelhantes em tudo; mas a cabeça sobre os dois
rostos opostos
ao outro era uma só, e quatro orelhas,
dois sexos, e tudo o mais como desses exemplos se poderia
" supor. E 'quanto ao seu andar, era também ereto como
agora, em qualquer das duas direções que quisesse; mas
:.,quando se lançavam a uma rápida corrida, como os que
,cambalhotando e virando as pernas para cima fazem uma
um
143
,
roda, do mesmo Ilfodo, aRoiando-se nos seus oito mem­
bros de então, rapidamé11,te eles se loconioviam em cír­
culo... Eram por consegUinte de uma força e de um vigor
terríveis, e uma grande presunção eles tinham; mas vol­
taram-se contra os deuses; e o que diz Homero de Efialtes
e de Otes é a eles que se refere, a tentativa de fazer uma
escalada: ao céu, para investir contra os deuses. Zeus en­
tão e os demais deuses puseram-se a deliberar sobre o
que se' devia fazer com eles, e embaraçavam-se; não po­
diam nem matá-los e, após fulminá-los como aos gigan­
tes, fazer desaparecer-lhes a raça- pois as honras e os
templos que lhesyin~am dos homens desapareceriam­
nem permitir-lhes que continuassem .11,a impiep.ade. De­
pois'de labóriosa refléxão, diz Zeus: "Acho que tenho um
meio de fazer com que os homens possam existir, mas pa­
rem com a intemperança, tornados mais fracos, Agora com
. efeito, continuou, eu, os cortarei a cada um em dois, e ao
mesmo temp'o eles serã~ mais fracos e também mais úteis
para n6s, pelo fato de se terem tornado mais l}umetosos; e
andarão eretos, sobre 'dúas' pernas, Se ainda pensarem
em' arrogância e não quisérem acomodar-se, de novo, dis­
,se ele, eu os cortarei em dois, e a~sim sobre uma só perna
eles andarão, saltitando". Logo que disse isso, pôs-se a
cor:tar OS homens em dois, como os que corta~ as sorvas
para a conserva, ou como os que cortam OVO$ com cábelo ...
Por conseguinte, desde' que a nossanatureia se'mutilou
em duas, alisiava caq,a um por sua própria metade e a ela
se unia, e envolvendo-se com'as mãos e enlaçando-se um
ao outro, no ardor de se confundirem ... por nada quere­
rem fazer longe um do outro. E sempre que, morria uma
das metades e a outra ficava, a que ficava procurava ou­
tra e com ela se enlaçava,:quer se encontrasse' com a me­
tade do todo que era mulher 'o que agora chamamos
mulher quer com a de um homem ... É então de há tanto
tempo que o amor de um pelo outro está implantado nos
homens, restaurador da nossa antiga natureza, em sua
tentativa de fazer um só de dois e de curar a natureza
humana, Cada um de nós, portanto,. é uma téssera com­
plementar de um homem, porque cortados como· os lin­
guados, de um só em dois; e procura então cada um o seu
próprio complemento ... nossa antiga natureza era assim
e nós éramos um todo; e portanto ao desejo e procura do
144
todo que se dá o no~~ d~ a11!0r. Anteriormente, como es­
tou dizendo, nós éramos um só, e agora é que, por causa
da nossa injustiça,fomos separados pelo deus, e como o
foram os árcades pelos lacedemônios; é de temer então, se
não formos moderados para çomos deuses, que de novo
sejamos fendidos em dois, e perambulemos tais quais os
que nas estelas estão de perfil, serrados na linha do nariz,
como os ossos que se fendem. Pois bem, em vista dessas
eventualidades, todo homem deve a todos exortar à pie­
dade para com os deuses, a fim de que evitemos uma e
alcancemos a outra, à medida que o Amor nos dirige e
comanda. Que ninguém em sua ação se lhe oponha - e se
opõe todo aquele que aos deuses se torna odioso pois
amigos do deus e com ele reconciliados descobriremos e
conseguiremos o nosSO p~óprio amado. 76
l
1
~\
.Platão termina a fala de Arif3tófanes COII~ as seguin­
tes palavras, q1J.e eu vou tomar emprestadas para ami­
nha própria conclusão:
'
E se disso fôssemos glôrificár o deus responsável, mereci­
damenteglorificaríamos o Amor, que agora nos é de máxi­
ma utilidade, levando-nos ao que nos é familiar,'e que'para
o futuro nos dá ~s maiores esperanças, se formos piedosos
. para cornos' deuses, de restabelecer-nos em nossa primi­
tiva natureza e, depois de nos curar, fazer-nos bem-aven­
turados e felizes. 77
"
,
\ f
," ~ ~,
~,
"
~
I
,
"
.:
~
L
{
lo'
,
··i ,
'The Dialogue~'of Plato, pp. 316ss. 77 11:Íid:, p, 318,'
",
,
76
145
Ap ên dic e
NOTAS SOBRE O Sr_l\4:1~}SMO
Po r J. Gary
Sp~~ks
'
_ des te com o ego,
Jun g fala do Si-mesmo, e da rel8-Ç8~ da1 Yàn sfo rm a­
sob vários pontOs de vis ta. Em Sím
bol o or completo, ele
ção, em bor a não des env olv a o
­
concel·to pito S de her óis
,o
ilus tra, por meio da inte rpr eta ção e
d :- do Si-mesmo: a
que ma is tar de irá atr ibu ir à ativ
id8- e i8-reÍn a perso:'
cap~cidade de pro dut os inconsciente
S ~r~senta a idé ia
nah dad e consçiente. E~ Símbolos,
ele eri go da bat alh a
deq ue" ass imc om o o her ói se exp
õe aOé~1. o·e go pode ser
ou do encontro com o mo nst ro, tamb
J11 OU pel a desci­
gui ado ~ orien~ado pe! a confr?n~~
çãO
c~íp8-1 e.-. na ~istó­
da ao remo do mconSClente. Ald eIa . lJ
prf ão .inIcIal e a de
ria da psicologia - nov a nes sa fon ul
n 8-ç ue vem de um a que existe um a ori ent açã o par a
o ego ~ue est á fora da
fonte de den tro da per son alid ade
, I118- 5
. ot e . (Ver Transforpercepção do ego, isto é, no inc ons CIe
8- stu dy gui de to
ma tion of Libido - esp . pp. 34, 3~,
68. - M8-is adi ant e, em
Sym bol sof Tra nsf orm atio n de Edll1ger
) ....-.0
três out ras formulações sob re o S · e5~J.~' Jun g desenI-Ill
.
volve e ela bor a ess a obs erv açã o ini
cia l. b éIll o de pesquiO.primeiro modelo com ple to, e t8-J
1l pre ens ão do ~i­
sa maIS det alh ada , de Jun g par a
8- co:J111.1iIllia. Ele ve a mesmo vem de sua pes qui sa com
8- 8- IQ ão física imagi­
Ç
descrição dos alq uim ista s da tra nsf r
o J1.1.8- nte'Ill" dois ele-
"CO
nad a de um a sub stâ nci a ma ter ial
.
que
146 rnentos ,qu.ünicos opostos - que se
alc anç a som ent e com a
pre sen ça de um terc eiro ele me nto
-co mo um a me táfo ra
par~oprocesso de tran sfo rma ção psicoló
gica por meio do
qua l tan to a :pe rso nal ida dec ons cie
nte qua nto a incons­
cie nte são tran sfo rma da. s por me ip
da ação de um tercei­
rO fator, o Si_rnesmo .. -Em .ou tra spa
lav ras , ele am plia e
explica nos ,mínimos det alh es a·fo
rmaccomo o ind ivíd uo
receb.e orieJ?tação de; um Jat or loca
lizado, fora' do seu con~
trQle,ao.dernoI).strarcomo,p Si~mes
mo or,ques.tra a tra ns­
fQrmaçãQ:.tap.t,o do ego lqu ant o das
,:partes inconscientes
dapersoIÍalidade~ (Ver Mysterilfm ,Co
fâunctioriis e "Psy­
cho!ogy ofthefl'ra;nsference" de Jun
g; e,também.o9 gui as
de ,estudo de Edi nge r par a esseS,
textos, res pec tiva me n­
te:' The Mysterium Lectures, esp.
p'... 22ss.,' 321s8., e The
Mysteryo{the,Coniunctio, esp .p.A
8s . , 74ss.) ~ .
:..O 'seg und o modelo do Si-mesmo
€i de sua rela ção 'co m
o ego des crit o'p or Jun g pode ser. e,nc
oIttrado no simbolis~
mo do gnosticismo. No mito gnóstic
o, o De us cria dor se
per de na ma tér ia qua ndo o mu ndo
é cria do e deve ser
recomposto por completo a cad a vez
que um cre nte mo rre
e a cen telh a de De us que hav ia fica
do pre sa em sua alm a
ret om a à divindade. Jun g utiliza a
me táfo ra gnóstica par a
rep res ent ar a res pon sab ilid ade do
ego de rea gru par , na
forma original, os frag me nto s do
Si-mesmo perdidos no
mu ndo em um Si~mesmo recriado
- seg und o sua me tá­
fora, por meio da projeção. Ess a for
ma de se compreen­
der o Si-mesmo acr esc ent a ma is um
a nua nça à compre­
ens ão der iva da da alq uim ia, ao enf
atiz ar o pap el do ego
na criação das condições que per mit
am que o Si-mesmo
ass um a sua função de guia. Simesmo deve ser "cons­
truí do" e dep ois seguido. (Ver Aio
n de Jun g e The Aio n
Lectures, de Edi nge r, esp. p. 141, 146
Por fim, em "Re spo sta a Jó", Jun g.)
enc ont ra um tex to
que rev ela um terc eiro modelo par
a se com pre end er o Si­
mesmo e a sua relação com o ego:
Assim como Jó teve de
147
°
Ap ên dic e NOTAS SOBRE O SI-~ESMO
.,Por J. Gary Sp ark s
Jun g fala do Si-mesmo, e da rela ção
des te com o ego,
sob vários pon tos de vis ta. Em Sím
bolos da Transforma­
ção, em bor a não de~envolva o
conceito por comple~o, ele
ilus tra, por 'meio da inte rpr eta ção
de mitos de heróis, o
que ma is tar de irá atri bui r. à ativ
ida de do S~~mesmo: a
cap aci dad e de pro dut os inconscie
ntes gui are m a perso~
nal ida de consciente. Em Símbolos,
ele apr ese nta a idé ia
de que, ass imç om o o he; Óis e expõe
ao pe;i'go dab àta lha
ou do encontro com o mo nst ro, tam
bém o ego pode ser gui ado e ori ent ado pel a confronta
ção com 'ou pel a desci­
da ao reino do inconsciente. A idé ia
pri nci pal e - n'a histó­
ria da psicologia -'n ova nes sa for
mulação inicial é a de
que existe um a ori ent açã o par a o
ego que vem de um a
fonte de den tro da per son alid ade
, ma s que est á fora da
percepção do ego, isto é, no incons
ciente. (Ver Transror­
ma tion or Libido esp, pp. 34, 37,
68. -a stu dy gui de to
Sym bol s ofT ran sfo rma tion de Edi nge
r) Mais adiante', em
trê s out ras formulações sobre o Si-m
esmo, Jun g desen­
volve e ela bor a ess a observação inic
ial.
O prim eiro modelo completo, e tam
bém ode pesqui­
sa ma is det alh ada , de Jun g par a
a compreensão do Si­
mesmo vem de sua pes qui sa com
a alq uim ia. Ele vê a
descrição dos alq uim ista s da tran sfo
rma ção física imagi­
nad a de um a sub stâ nci a ma teri al
que "conténi" dois ele-
146
me nto s quínÜcos opostos - que se
alc anç a som ent e com a
pre sen ça de um terc eiro ele me nto
- como um a me táfo ra
par a0 processo de tram~formaçãops
icológica por meio do
qua l tan to a per son alid ade conscie
nte qua nto a incons­
ciente,.são transforII).adás por me io
da açã o de um tercei­
ro fator, o S,i-mesmo., Em out ras
pal avr as, ele am plia e
exp lica nos "mínimos det alh es a for
ma,como o indivíduo
r~c~b..e orie~tação deu m:f ato rJo cal
iza do fora do seu con
­
trole, ao.deJllO nstr.arcQmoQ Si~ine
smo or.questra a tra ns­ form;:!.çã.Q~tap.to do ego; quanto, das
.:pa rtes inconscientes
da :personalidade. (Ver, Mysterütm
Conii17íctioriís e "Psy­
cho,logy Qfthe TraIlsference" de Jun
g, e, tam bém .os gui as
de ,estudo de Edi nge r par a esses, tex
tos , res pec tiva me n­
te:.The Mysterium Lectures, esp.
p.2 2ss .; 32i ss., e The
Mystery:of the ConiunctiQ, esp. p. 48s
.,
,~, 'O seg und o modelo do Si-mesmo 74ss.) .
e' des uar ela ção 'co m
o ego descrito por Jun g pode ser epc
ont rad o nos imb olis ­
mo do gnosticismo. No mito gnóstic
o, o De us cria dor se
per de na ma tér ia qua ndo o mu ndo
é cria do e deve ser
recomposto por completo a cad a vez
que um cre nte mo rre
e a cen telh a de De us que hav ia fica
do pre sa em sua alm a
reto rna à divindade. Jun g utiliza a
me táfo ra gnóstica par a
rep res ent ar a res pon sab ilid ade do
ego de rea gru par , na
forma original, os frag me nto s do
Si-mesmo perdidos no
mu ndo em um Si~mesmo recriado
- seg und o sua me tá­ fora, por meio da projeção. Ess a for
ma de se compreen­
der o Si-mesmo acr esc ent a ma is um
a nua nça à compre­
ens ão der iva da da alq uim ia, ao enf
atiz ar o pap el do ego
na criação das condições que per mit
am que o Si-mesmo
ass um a sua função de guia. O Simesmo deve ser "cons­
truí do" e,depois seguido. (Ver Aio
n de Jun g e The Aio n
Lectures, de Edi nge r, esp. p. 141, 146
Por fim, em "Re spo sta a Jó", Jun g.)
enc ont ra um tex to
que rev ela um terc eiro modelo par
a se com pre end er o Si­
me sm o e a sua rela ção com o ego:
Assim como Já tev e de
147
res isti r a Iah we h e ref leti r 'pa ra
Ele .a .tealíclade de seu
com por tam ent obe stía l, tam bém o'e
gop tec isa ,'em alg uns
momentos, oferecer alg um a res istê
hci a ao Si~mesmo, par a
que se inicie um a 'tra nsf orm açã h
·dentro do pró prio Si­
mesmo. Ma is um a vez; o pap el do
egolllo fun cio nam ent o
do Si-mesmo é elucid~do, contudo,.com\mais um a nova
ênfase. Aqui, a infl uên cia do Si~mes
m(j sob re o ego é ex­
per ime nta da, -ai príncfpío;como adv
ers ária e~passa a ser­
vir o ego .so me nte -qu and o est e res
iste vig oro sam ent e à
ma nife staç ão hos til do Si'-mesmQ no
enc ont ro inicial: (Ver
"Answer to.-·Job':de.Jung, ê-Tran
sformation .ofithe .God­
Image, esp ..p. 29, e Encountér wit
h the Sel f de-EdiIiger.)
Ca da modelo rep res ent a, vár ios .
asp ect os da expe­
riên cia do Si-mesmo vívida pelo ego
.. Jun fas , as formula­
ções teóricas de Jun g circunscrevem
a fenomenologia das
ativ ida des ;'or ien tad ora s do Si-mesm
o na. psi que dos indi­
víd uos Íno der nos .que·querem tornar
~se co.nscientes ....
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5 Introdução à Coleç~Q ~qr eI.'siqJ.!~
7 Prefácio do editor
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9 Agradeci~en,to,~ ,
I'
11 1. Ciência (la alma
11
O inconsciente coletivo
13
A idade da tra,n9forml3.ç.ão, ,, ;. \, .. ' 'v
15
Jung e FreucC ,. ~
. '
17
A natureza dos sonhos" . ,,-,
18
A criaçãô da: consciência'
20
A consciência no inconsciente
22
A estrutura da psique
31
individuação'
35
Implicações sociais 40
Transfóffuàçãó dà Imagém
de De~~ ,',
,
.
~-,
'-
\
•
-
',!
,\
'~
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,,~:
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(>
,~
~
47 2..En.çontro com a Personalidade,Maior
48,
A natureza do Si-mesmo
'
52
Jacó e o anjo dê Iahweh 56
Arjuna e Krishna 60
Paulo e Cristo 62
Nietzsche e Zaratustra 72
Comentários finais _ .
) '1'~
75 3. A vida terapêutica
75
Fatores pessoais e arquetípicos
80
A transferência arquetípica e o encontro pessoal
85
93
97 A cura em harmo!iial,ç({ml~ psique objetiva A encarnação pessoal dos arquétipos. A personalidade do terapeuta e os propósitos tra~spes­
, soais
o~O"
'1
100 4. Psicoterapia profunda: a profissão 100
Introdução 102
Raízes etimológicas
103
Imagens arquetípicas subjacentes à psicologia profunda
106
O legado médico
107
O legado filosófico
109
O legado religioso
Imagens arquétípicas corre'spondehtes às fases 112
da terapia 116
A tradição oculta 117
Privilégios, responsabilidades e perigo's 118
O mistério da psicoterapia profunda' 120
Perguntas e respostas 123 5. O fenômeno da transferência
123
Transferência e projeção
126
A natureza arquetípiça, da trarisferência
127
Transferência positiva'
'
,
Transferência na vida cotidiana'
129
131
Transferência e centroversão'
133
Transferência e transformação,
"
135
Transferência em uma série de sonhos,
141
Transferênci~ erótica e religios~: ." ' , . , )
143
Transferência como um chamado'àtotalidade
'(y<J.
j;
V1"
1 ...
1, ,:'..
--
----
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iD~ -c13 ...11
L
i
-,
~~;~te livro deve ser devolvido na
última data carimbada
.. (':)~I
149 Bibliografia
! \-:.
-\
~
""
146 Apêndice: Notas sobre o Sl-mesl.Do por J. Gary Sparks
\I; : ~
fi'
,:;.--:;:-;:;;--.;.
COD.21753 --­

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