Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do
Transcrição
Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do
PUBLICAÇÃO EDITADA PELO / PUBLICATION EDITED EVERY FOUR MONTHS BY ABRES Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) Associação Brasileira de Economia da Saúde Diretoria Nacional / National Board of Directors Avenida Brasil, 4036 – sala 802 – Manguinhos 21040-361 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil Tel.: (21) 3882-9140, 3882-9141 Fax.: (21) 2260-3782 E-mail: [email protected] / [email protected] Home page: http://www.ensp.fiocruz.br/parcerias/cebes/cebes.html COMITÊ EXECUTIVO (2005-2006) / EXECUTIVE COMMITTEE (2005-2006) DIREÇÃO NACIONAL (GESTÃO 2006-2009) / NATIONAL BOARD OF DIRECTORS (YEARS 2003-2006) Diretoria Executiva Presidente / President Sonia Fleury (RJ) 1O Vice-Presidente / 1st Vice-President 2O Vice-Presidente / 2rd Vice-President 3O Vice-Presidente / 3th Vice-President 4O Vice-Presidente / 4th Vice-President Ligia Bahia (RJ) Ana Maria Costa (DF) Luiz Neves (RJ) Mario Scheffer (SP) 1O Suplente / 1nd Substitute 2O Suplente / 2nd Substitute Francisco Braga (RJ) Lenaura Lobato (RJ) Presidente / President Vice-Presidente /Vice-President 1a Secretária / First Secretary Suplente de Secretária / Second Secretary Tesoureira / Treasure Suplente de Tesoureira / Second Treasure CONSELHEIROS / COUNSELORS Presidente / President Conselheiro / Counselor Conselheiro / Counselor Silvia Porto (ENSP/FIOCRUZ) Áquilas Mendes (FAAP/SP e CEPAM) Janice Dornelles de Castro (UNISINOS/UERGS) Eli Iôla Gurgel Andrade (UFMG) Elezabeth Barros (Brasília) Maria Helena Lima Souza (SES/CE) Sérgio Piola (IPEA/Brasilia) Gabriel Ferrato (UNICAMP) Martha Teixeira (SES/BA) CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL CONSELHO FISCAL / FISCAL COUNCIL Áquilas Mendes (SP), José da Rocha Carvalheiro (RJ), Assis Mafort (RJ), Sonia Ferraz (DF), Maura Pacheco (RJ), Gilson Cantarino (RJ) & Cornelis Van Stralen (MG). CONSELHO CONSULTIVO / ADVISORY COUNCIL Sarah Escorel (RJ), Odorico M. Andrade (CE), Nelson Rodrigues dos Santos (SP), Lucio Botelho (SC), Antonio Ivo de Carvalho (RJ), Roberto Medronho (RJ), José Francisco da Silva (MG), Luiz Galvão (WDC), André Médici (DF), Jandira Feghali (RJ), José Moroni (DF), Ary Carvalho de Miranda (RJ), Julio Muller (MT), Silvio Fernandes da Silva (PR) & Sebastião Loureiro (BA). Sílvia Marta Porto – ENSP/FIOCRUZ Eli Iola Gurgel Andrade – UFMG Maria Alicia Ugá – ENSP/FIOCRUZ Mariângela Leal Cherchiglia – UFMG Mônica Viegas Andrade – UFMG Marcos Bosi Ferraz – CEPES/UNIFESP Janice Dornelles de Castro – UNISINOS/UERGS Sebastião Antônio Loureiro de Souza e Silva – ISC/UFBA Francisco Assis Acurcio – UFMG Waleska Teixeira Caiaffa – UFMG Sueli Saes – SES-SP CONSELHO EDITORIAL / PUBLISHING COUNCIL Paulo Amarante (RJ), Jairnilson Paim (BA), Gastão Wagner Campos (SP), Ligia Giovanella (RJ), Edmundo Gallo (DF), José Gomes Temporão (RJ), Francisco Campos (MG), Paulo Buss (RJ), Eleonor Conill (SC), Emerson Merhy (SP), Naomar de Almeida Filho (BA) & José Carlos Braga (SP) EDITORA EXECUTIVA / EXECUTIVE PUBLISHER: Maria Eneida de Almeida SECRETARIA EXECUTIVA / EXECUTIVE SECRETARIES: Marília Fernanda de Souza Correia INDEXAÇÃO / INDEXATION Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS) Os artigos sobre História da Saúde estão indexados pela Base HISA – Base Bibliográfica em História da Saúde Pública na América Latina e Caribe The articles about Health History are indexed according to the HISA Base – Base Bibliográfica em História da Saúde Pública na América Latina e Caribe (Bibliographic Base on History in Latin America and the Caribbean) Divulgação em Saúde para Debate: Revista do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES – no 1 (1989) – Rio de Janeiro: Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, 2007. A Revista Divulgação em Saúde para Debate é associada à Associação Brasileira de Editores Científicos n. 38; 27,5 cm ISSN 0103-4383 Apoio: 1. Saúde Pública, Periódico. I. Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, CEBES CDD 362.1 Rio de Janeiro Número 38 ISSN 0103-4383 Janeiro 2007 II Jornada de Economia da Saúde – ABRES SÉRIE CONASEMS Saberes e práticas da gestão municipal SUMÁRIO / SUMMARY EDITORIAL / EDITORIAL ○ ○ ○ ○ APRESENTAÇÃO / INTRODUCTION ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 3 5 ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo Use and access to health care services among the elderly population in São Paulo city Marília C. P. Louvison, Maria Lúcia Lebrão, Fernão D. de Lima & Yeda A. O. Duarte ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Equitable allocation of resources for secondary and tertiary health care: a proposal for Ceará state (Brazil) Maria Helena Lima Sousa; Maria Alrenice de Oliveira; Paulo Egídio Santos Feitosa; Edilmar Carvalho de Lima; José Romério Melo; Lúcia de Fátima Sales Costa; Maria das Graças de Sousa & Rosa Maria Salani Mota ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará Preoperative hospital stay and its impact on Ceará state health services costs Maria de Fátima Façanha Elias Reis ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil Cost-effectiveness of uterine cervical neoplasms screening in Brazil Rosângela Caetano, Cid Manso de Mello Vianna, Luiz Cláudio Santos Thuler & Vania Reis Girianelli ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Estimando as perdas de rendimento devido à doença renal crônica no Brasil Estimating earnings losses due to chronic renal disease in Brazil Marcia Regina Godoy, Giacomo Balbinotto Neto, Pedro Pita Barros & Eduardo Pontual Ribeiro ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ Panorama da gestão de hemoderivados no Sistema Único de Saúde Brasileiro: Perspectivas e cenários para a auto-suficiência Overview of blood derivatives management in the Brazilian Health System: perspectives and scenarios for self-sufficiency Esdras Daniel dos Santos Pereira & Luiz Cláudio de Queiroz Rodrigues ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ 7 14 35 48 62 68 EDITORIAL O gasto em saúde no Brasil: é muito ou pouco? E m setembro de 2006, o Cebes, a Abrasco e a Abres lançaram um manifesto sobre os gastos com saúde, considerando imprescindível reforçar o Sistema Único de Saúde (SUS) – público e universal – entendendo que este sistema necessita contar com o aporte de recursos compatível com o ordenamento constitucional segundo o qual a saúde é um dever do Estado e um direito do cidadão para caminhar na direção de um desenvolvimento econômico e social em nosso país. Quem analisa o Orçamento da União como mera peça contábil, pode ser levado a pensar que a área de Saúde estaria satisfatoriamente financiada. Os gastos em saúde, cerca de 40 bilhões em 2006 – superados apenas pelo orçamento da Previdência Social – representam cerca de 7% da despesa corrente líquida. Mas este cálculo não expressa a realidade dos gastos do governo, pois dele já foram expurgados os recursos destinados ao pagamento de juros da dívida, orçados em cerca de R$ 180 bilhões! Ou seja, gasta-se quatro vezes mais com pagamento com pagamento de juros do que com saúde! Sabe-se que o nosso sistema público e universal, o SUS, somente sobrevive porque foram definidos recursos constitucionalmente vinculados para seu financiamento no nível das três esferas de governo – por meio da Proposta de Emenda Constitucional 169 – por fim transformadas na Emenda Constitucional-29. Contudo, a sociedade brasileira precisa ser alertada sobre as profundas implicações das políticas macroeconômicas para a garantia de recursos estáveis, seguros e definidos para o SUS. A insuficiência do financiamento do SUS evidencia-se: • Na estagnação dos gastos públicos entre US$ 120 e 150 per capita e na persistência de alta proporção dos gastos privados (55%), enquanto nos países desenvolvidos, de todos os gastos com saúde, no mínimo 70% são provenientes de fontes públicas. • Na comparação internacional em relação ao PIB, nossos recursos públicos destinados à Saúde significam 3,2%, correspondendo a patamares menores que os da Argentina (5,12%), Cuba (6,25%), Estados Unidos (6,2%), Japão, Inglaterra, Austrália, Portugal, Itália, Canadá, França, Alemanha (8,1%) (OMS, 2002). • No tocante à participação das três esferas de governo no gasto público em Saúde, a fonte federal caiu de 60,7% para 49,6% entre 1995 e 2004, e as fontes estadual/municipal cresceram de 39,3% para 50,5%, nesse mesmo período. Por sua vez, o baixo financiamento e os repasses fragmentados vêm levando os gestores das três esferas de governo a alternativas de sobrevivência, buscando em vão, desonerar-se entre si. A aprovação, neste ano, do Pacto pela Vida e do Pacto de Gestão representou grande avanço no processo de gestão compartilhada. No entanto, o baixo financiamento do SUS é hoje o fator que mais impossibilita aos gestores municipais e estaduais organizar a oferta de serviços com qualidade. Os reflexos dessa situação provocam a sub-remuneração e a precarização dos vínculos de trabalho dos profissionais e dos estabelecimentos prestadores de serviços, a ausência de investimento em melhores edificações e equipagem de unidades de saúde, e o atraso constante do pagamento de prestadores e fornecedores, colocando em risco a viabilidade da gestão. Portanto, os gastos em saúde devem ser encarados como investimentos na cidadania, no prolongamento da vida e desfrute de sua plenitude, para todos e para cada um dos brasileiros. Nesta perspectiva, defendemos: • A aprovação do Projeto de Lei Complementar n. 1, de 2003, que trata da regulamentação da Emenda Constitucional-29. • A não-renovação da DRU em 2007 – Desvinculação das Receitas da União – que, a título de conferir maior flexibilidade ao governo central, retira 20% dos recursos constitucionalmente destinados à área social. • A retomada do debate sobre a seguridade social, buscando-se fontes alternativas para financiar a inclusão previdenciária de milhões de trabalhadoras e trabalhadores que atualmente não têm vínculo formal com o mercado de trabalho. O Cebes Vive! Viva o Cebes! Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 3-4, janeiro 2007 3 EDITORIAL Health Expenditure in Brazil: Too Much or Too Little? I n September 2006, Cebes, Abrasco and Abres launched a manifesto on Health expenditure, regarding as fundamental to strengthen the Unified Health System (SUS) – public and universal – and understanding that this system needs to receive resources compatible with the constitutional disposition which states that Health is a duty of the State and a right of all citizens, in order to move towards the economical and social development of our country. Those who examine the Union budget as a mere piece of accountability might think the Health segment would be sufficiently well financed. Health expenditure, around R$ 40 billion (more than US$ 18 billion) in 2006, only falls behind the Social Security budget and represents around 7% of the net current expenses. But this estimate doesn’t express the reality of government expenditure, as it doesn’t include resources destined for the payment of external debt interests, that reach to the amount of R$ 180 billion (almost US$ 84 billion)! It means that the values assigned to pay debt interests represent four times what is spent in Health! It is widely known that our public and universal system, SUS, only survives due to constitutionally linked resources defined to finance it in the three government spheres — through the Proposal of Constitutional Amendment 169, finally turned into the Constitutional Amendment 29. However, the Brazilian society needs to be warned about the deep implications of macroeconomics policies on the guarantee of constant, safe and defined resources for SUS. The lack of sufficient SUS financing is evidenced by: • The stagnation of public expenditure between US$ 120 and US$ 150 per capita and the endurance of a high proportion of private expenditure (55%), while in developed countries at least 70% of all Health expenses come from public sources. • The international comparison in relation to the GDP, according to which our public resources invested in Health represent 3.2%, corresponding to levels below Argentina (5.12%), Cuba (6.25%), USA (6.2%), Japan, England, Australia, Portugal, Italy, Canada, France and Germany (8.1%) (WHO, 2002). 4 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 3-4, janeiro 2007 • The participation of the three government spheres in the public expenditure on Health, considering that federal resources were reduced from 60.7% to 49.6% between 1995 and 2004, and state/municipal resources were increased from 39.3% to 50.5% in the same period. The low financing and the fragmented transfers, in their turn, are leading the three spheres’ managers to survival alternatives, trying in vain to get rid of the financial burden. The approval, this year, of the Pact for Life and the Management Pact represented great advancement in the process of shared management. However, the low SUS financing is currently a major impairing factor, stopping municipal and state managers from organizing the offer of quality services. The reflections of this situation cause the underpayment and the unsteadiness of professionals’ working bonds and service-providing units. They also lead to the lack of investments in better buildings and equipment for health units and the constant delays in payment to employees and suppliers, putting in risk the viability of management. It becomes clear that Health expenses should be faced as investments in citizenship, in prolonging life and allowing a high life quality to the whole Brazilian people. Based on this perspective, we advocate: • The approval of the Complementary Law Project number 1 of 2003, on the regulation of the Constitutional Amendment 29. • The non-renewal in 2007 of the Desvinculation of Union Resources (DRU), which, on the pretext of granting greater flexibility to the central government, withdraws 20% of the resources constitutionally assigned to the social sector. • Resuming the discussion on social security and searching for alternative sources for financing its extension to millions of workers who currently have no formal bonds with the employment market. Cebes lives! Long live Cebes! APRESENTAÇÃO D esde 1989, quando foi criada a Associação Brasileira de Economia da Saúde (ABRES), uma agenda voltada para a abordagem e desenvolvimento do tema no país tem propiciado o encontro sistemático de pesquisadores e profissionais do sistema de saúde em seus diversos segmentos de gestão. Foram realizados sete encontros, três jornadas de âmbito nacional, além dos Congressos de Economia da Saúde da América Latina e do Caribe em 2004 e 2006. Nesta edição especial da revista Divulgação para Saúde em Debate, temos a satisfação de apresentar os trabalhos selecionados e apresentados na 2ª Jornada de Economia da Saúde, realizada em Belo Horizonte, no ano de 2005, organizada pela ABRES e o Grupo de Economia da Saúde da Universidade Federal de Minas Gerais (GPES-UFMG). Convocados ao debate sobre ‘A Contribuição da Economia da Saúde na Política e na Gestão do SUS (Sistema Único de Saúde)’, os trabalhos selecionados revelaram as potencialidades de formulação neste campo de conhecimento no Brasil. O debate percorreu questões conceituais e práticas acerca da aplicação da teoria econômica à gestão sanitária; sobre a avaliação econômica e a regulação do mix público/privado; revelou experiências inovadoras sob a ótica da eficiência e equidade na organização da atenção; as desigualdades no uso e no acesso aos serviços, além de contemplar a sempre importante pauta do financiamento e alocação de recursos no Sistema Único de Saúde. A abordagem dada a aspectos tão fundamentais à consolidação de um sistema de saúde universal e equânime autoriza a idéia de que a incorporação da Economia da Saúde já se apresenta como auxiliar indispensável na determinação das prioridades da gestão em saúde e na ampliação da eficiência na provisão de serviços, seja sob o aspecto da demanda, por meio da identificação das necessidades da população, seja sob o aspecto da oferta, em termos da forma como esses serviços são disponibilizados. O importante e decisivo apoio manifestado pelo Ministério da Saúde (MS) – por intermédio do Departamento de Economia da Saúde (DES) e da Secretaria de Ciência e Tecnologia e Insumos Estratégicos (SCTIE), ao lado da Secretaria de Estado da Saúde (SES-MG), da Fundação João Pinheiro (FJP) e Secretaria Municipal de Saúde (SMSBH) – reitera os avanços na apropriação institucional da economia da saúde, assegurando as possibilidades de uma parceria instigante e inovadora entre as universidades, centros e núcleos de estudo e pesquisa em economia da saúde e as instâncias e profissionais responsáveis pela gestão do sistema de saúde em nosso país. Esta edição especial da revista Divulgação para Saúde em Debate compõe-se de dois números. Neste segundo número, são apresentados seis trabalhos que analisam aspetos específicos desde a perspectiva da economia da saúde: uma avaliação da utilização e acesso da população idosa de São Paulo, efetuada a partir de inquérito de base populacional; uma proposta de metodologia de alocação equitativa de recursos elaborada para distribuição de recursos entre hospitais-pólo no estado do Ceará – para este mesmo estado também foi analisada a repercussão da permanência hospitalar nos custos dos correspondentes serviços; na gestão de hemoderivados, analisam-se aspectos históricos, legais e econômicos, e apontam-se perspectivas para a incorporação de tecnologias e incremento da produção nacional; uma das técnicas de avaliação econômica, custo-efetividade, é utilizada para avaliar a utilização do Teste de Papanicolao, hoje acessível em todo o sistema público de saúde, em comparação com as novas tecnologias de rastreamento do câncer cérvicouterino; por último, são estimadas as perdas de rendimento devido a doença renal crônica, sugerindo que políticas direcionadas para reduzir a incidência da doença podem contribuir para a redução das desigualdades. Com estas publicações, a ABRES pretende contribuir para a divulgação do campo da economia da saúde, hoje ainda incipiente entre nós, e estimular o desenvolvimento de estudos que articulem a pesquisa científica a e a gestão dos serviços de saúde, buscando sempre o alcance de sistemas universais, integrais e equitativos. Sílvia Porto Presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde – ABRES Eli Iola Gurgel Andrade Presidente da Comissão Organizadora da II Jornada de Economia da Saúde Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 5-8, janeiro 2007 5 INTRODUCTION S ince 1989, year of creation of the Brazilian Association of Health Economics (ABRES), an agenda oriented to the discussion and development of this subject in the country allowed systematic meetings of researchers and professionals from several management segments. Seven meetings, three nationalwide one-day meetings and the Congresses of Health Economics in Latin America in 2004 and 2006 were accomplished. In this special edition of the Health Disclosure for Discussion Journal, we are pleased to introduce papers selected and presented in the 2nd Health Economics One-Day Meeting, which took place in Belo Horizonte city in the year 2005, organized by ABRES and the Group of Health Economics of the Minas Gerais Federal University (GPES-UFMG). Joining the debate on ‘The Contribution of Health Economics to Politics and SUS (Brazilian Unified Health System) Management’, the selected papers disclosed possibilities of formulation in this knowledge field in Brazil. The debate encompassed conceptual and practical issues on the application of the economical theory to sanitary management, the economical assessment and the regulation of the public/private mix. It also disclosed innovative experiences from the perspective of efficiency and equity in health care organization, and the inequalities in the use and access to services. Besides, it comprehended the always important agenda of financing and resource allocation in the Brazilian Unified Health System. The approach towards such fundamental aspects for consolidating an universal and equitable health system reinforces the idea of incorporation of Health Economics as an essential auxiliary for determining priorities in health management and extending the efficiency in the provision of services, both in the aspect of demand, by means of identifying the population’s needs, and in the aspect of offer, in relation to the way these services are supplied. The significant and crucial support given by the Brazilian Health Ministry (MS) — through the Department of Health Economics (DES) and the Department of Science, Technology and Strategic Inputs (SCTIE), along with the 6 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 5-6, janeiro 2007 Minas Gerais State Health Department (SES-MG), the João Pinheiro Foundation (FJP) and the Belo Horizonte City Health Department (SMS-BH) — supports improvements in the institutional appropriation of health economics. It ensures the possibilities of an impelling partnership among universities, study and research centers in health economics and the instances and professionals responsible for our country’s health system management. This special edition comprises two issues of the Health Disclosure for Discussion Journal. The second one brings six papers which examine specific subjects from a health economics perspective: an assessment of use and access of the elderly population to health services in São Paulo city, based on a populational inquiry; the proposal of an equitable resource allocation methodology, developed aiming at the resource distribution among core hospitals in Ceará state; also in Ceará state, an analysis of the impacts of hospital stays in service costs; the historical, legal and economical aspects of hemoderivative management, pointing out perspectives for the incorporation of technologies and increments to the national production; the economical assessment technique of cost/effectiveness is employed to evaluate the use of Papanicolaou Test, currently available in the whole public health system, in comparison with the new technologies of uterine and cervical cancer tracking; and, finally, an estimate of profit losses due to chronic renal disease, which suggests that policies for reducing the occurence of this disease can contribute to the reduction of inequalities. With these publications, ABRES intends to contribute to disclosing the currently embryonic health economics field, and to stimulate the development of studies capable of articulating scientific research and management of health services, always searching for universal, complete and equitable systems. Sílvia Porto Chairman of the Brazilian Association of Health Economics – ABRES Eli Iola Gurgel Andrade Chairman of the Organizing Commission 2nd Health Economics One-Day Meeting ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo Use and access to health care services among the elderly population in São Paulo city Marília C. P. Louvison1; Maria Lúcia Lebrão2; Fernão D. de Lima3 & Yeda A. O. Duarte4 RESUMO Este estudo é parte do Projeto Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (SABE), inquérito de base populacional que, em 2000, entrevistou 2.143 indivíduos com 60 anos ou mais no município de São Paulo. A amostra foi obtida em dois estágios, utilizando-se de setores censitários com reposição, probabilidade proporcional à população e complementação da amostra de pessoas de 75 anos. Os dados finais foram ponderados, de forma a serem expandidos. Foi mensurado o uso de serviços hospitalares (internações) e ambulatoriais (consultas médicas) nos últimos quatro meses e o não-uso de serviços de saúde (mesmo precisando), relacionando-os com renda total, escolaridade, seguro saúde, morbidade referida, autopercepção, sexo e idade. Foram observadas desigualdades no uso e acesso aos serviços de saúde e inadequação do modelo de atenção, indicando necessidade de políticas públicas que levem em conta as especificidades dessa população, facilitem o acesso e possam reduzir essas desigualdades. PALAVRAS-CHAVE: Desigualdades em Saúde; Serviços de Saúde; Saúde do Idoso. ABSTRACT This study is part of the Health, Well-being and Aging (SABE) project, a populational research which, in the year 2000, interviewed 2,143 individuals aged 60 or older in São Paulo city, Brazil. Data was obtained in two stages, using census sectors with replacement, probability proportional to the population and additional interviews in order to achieve the desired number of respondents aged 75 or older, with weighting of the final results. The study measured, during four months, the use and access to outpatient care and hospital admission services, as well as the choice not to seek health care services (even when in need of them). These factors were analyzed in relation to income level, education, possession of health insurance, morbidity rate, self-perception, gender and age. The results demonstrate inequalities in the use and access to health services and an inadequate health care system. Public policies should take into account the different needs of this older population, in order to facilitate access to these services and to reduce inequalities. KEYWORDS: Inequalities in Health; Health Care Services; Health Care for the Aged. 1 Médica Sanitarista. Mestre em Saúde Pública. Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). e-mail: [email protected] 2 Médica. Professora Titular. Chefe do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). 3 Analista de sistemas do Departamento de Epidemiologia da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). 4 Enfermeira. Professora da Escola de Enfermagem da USP. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 7 LOUVISON, Marília C. P. et al INTRODUÇÃO os núcleos familiares, e a adoção função das disparidades regionais de cuidadores, familiares ou não. e sociais. Uma conseqüência desse A população humana vem sofren- Além disso, com o prolongamento processo é o prolongamento da vida, do, ao longo do tempo, profundas da vida, aumenta-se a necessidade sem resolução ou melhora da so- transformações na sua composição, da atenção à saúde, com mais e brecarga de doenças, o que representa transformações estas observadas, mais incorporação tecnológica para piora na sua qualidade. A utilização principalmente, pelo aumento pro- manter a qualidade de vida dessa dos serviços de saúde, na forma gressivo da expectativa de vida e da população, o que causa grande como está organizado hoje, ao apre- proporção de idosos. O processo de impacto no sistema de saúde e em sentar efeito exclusivo na redução da envelhecimento populacional deu-se toda a sociedade. mortalidade, pode contribuir para o de forma mais acentuada nos países Associadas à redução na morbi- incremento na morbidade, na medida desenvolvidos, mas se intensificou, dade e à mortalidade por doenças em que provoca a extensão da vida de maneira geral nos últimos anos, infecciosas, as doenças crônicas não com pouca capacidade de repercus- inclusive no Brasil – embora esteja são na sua qualidade (BLACK REPORT, ocorrendo de maneira diferenciada 1982/1988; MUSGROVE, 1983). nas diversas regiões do país em função das desigualdades e suas implicações (VERAS & DUTRA, 1993; RAMOS et al., 1987; CAMARANO, 1999/2000). No Brasil, de maneira rápida e intensa, os idosos, que em 1980 re- A superposição de agravos gera O CRESCIMENTO DEMOGRÁFICO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA ACIMA DE 60 ANOS INTRODUZ GRANDES DESAFIOS NAS presentavam 6,3% da população to- POLÍTICAS PÚBLICAS, EM PARTICULAR NOS tal, em 2025 poderão representar GRANDES CENTROS URBANOS uma crescente demanda pelos serviços de saúde com incremento dos custos da assistência médica, na medida que o novo padrão epidemiológico requer assistência mais especializada, com incorporação de tecnologias de mais alto custo. O 14%, num total de 32 milhões de aumento desta demanda clama por pessoas, o sexto país do mundo com uma ampliação e reestruturação da o maior número de pessoas idosas rede de assistência, cuja eficácia vem sendo sistematicamente questionada. (VERAS, 2002; FRIES, 1983). O crescimento demográfico da transmissíveis se tornam mais pre- O padrão de utilização de servi- população brasileira acima de 60 valentes. Os modelos macroteóricos ços de saúde de um determinado anos introduz grandes desafios nas lineares de explicação derivam da grupo populacional é principalmente políticas públicas, em particular necessidade de entender o processo explicado por seu perfil de necessi- nos grandes centros urbanos. So- de transição demográfica, demons- dades em saúde. A utilização dos bretudo nestes centros, convive-se trado pela redução nas taxas de na- serviços está condicionada, também, com altos graus de pobreza e desi- talidade e mortalidade, redução esta por numerosos outros fatores, inter- gualdade, baixa escolaridade e ar- atribuída às modificações no nível nos e externos ao setor, relaciona- ranjos familiares pouco continentes, de desenvolvimento das sociedades, dos tanto com a forma como está que geram necessidades de interven- que evoluíram de um padrão tradi- estruturada a oferta de serviços, ções mais rápidas e equânimes, cional para um padrão moderno. quanto com as preferências e esco- além de respostas às novas deman- No Brasil se verificam distintos lhas do usuário. A utilização de ser- das assistenciais que transcendem padrões para as diversas regiões em viços de saúde se dá em função das 8 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo necessidades e do comportamento acesso e do padrão de utilização de vre para os grupos ampliados para dos indivíduos diante dos seus pro- serviços de saúde por idosos no complementar a amostra de idosos blemas de saúde, assim como das município de São Paulo, em 2000. em idade avançada). formas de financiamento dos serviços e recursos disponíveis para a Para a realização da amostra pro- MATERIAL E MÉTODOS babilística foi utilizado o cadastro população, incluindo a estrutura permanente de 72 setores censitári- administrativa e os mecanismos de Essa pesquisa é parte do Projeto os existentes na Faculdade de Saú- pagamento existentes (QUARTAROLI et SABE – Saúde, Bem-estar e Envelheci- de Pública da Universidade de São al., 2002; PINHEIRO et al., 1999). mento, estudo multicêntrico, coorde- Paulo, coordenadora do estudo no As doenças próprias do envelhe- nado pela Organização Pan-america- Município, selecionados sob o cri- cimento ganham maior expressão no na de Saúde (OPAS), com pessoas de tério de probabilidade proporcional conjunto da sociedade e o idoso con- 60 anos e mais, na América Latina e ao número de domicílio do cadas- some mais serviços de saúde, as in- Caribe. A população de estudo no Bra- tro da PNAD (Pesquisa Nacional por ternações hospitalares são mais fre- Amostra de Domicílios) de 1995. Em qüentes e o tempo de ocupação do seguida, foram sorteados sistema- leito é maior quando comparado a ticamente os domicílios a serem vi- outras faixas etárias. Em geral, as sitados. A complementação da amos- doenças dos idosos são crônicas e AS DOENÇAS PRÓPRIAS DO tra de pessoas de 75 anos e mais foi múltiplas, perduram por vários anos ENVELHECIMENTO GANHAM realizada pela localização de mora- e exigem acompanhamento constan- dias próximas aos setores selecio- te, cuidados permanentes, medicação MAIOR EXPRESSÃO NO CONJUNTO nados ou, no máximo, dentro dos contínua e exames periódicos (LIMA- DA SOCIEDADE E O IDOSO CONSOME limites dos distritos aos quais per- COSTA et al., 2003; FIRMO et al., 2004). No entanto, essa situação está tenciam os setores sorteados. MAIS SERVIÇOS DE SAÚDE Os dados foram obtidos em en- relacionada ao modelo de atenção em trevista domiciliar, por meio de um voga, que não privilegia a preven- questionário elaborado por um co- ção e a promoção de saúde, assim mitê regional composto pelos prin- como a organização integrada e sil foi composta pelos idosos residen- cipais pesquisadores de cada país e multiprofissional dos serviços de tes, no ano de 2000, na área urbana por especialistas em temas específi- saúde. O crescente aumento da po- do município de São Paulo (LEBRÃO et cos da pesquisa. Inicialmente, o ins- pulação idosa e suas características, al., 2003). O inquérito consta de 2.143 trumento foi submetido a dois pré- bem como o aumento da demanda e idosos entrevistados, incluindo uma testes até chegar à forma final, sub- utilização de serviços de saúde por complementação da amostra na po- dividido em 11 seções: Dados pes- essa população, de maneira desigual, pulação de maiores de 75 anos. soais, Avaliação cognitiva, Estado justificam a necessidade de estudos A amostra final foi calculada de saúde, Estado funcional, Medi- que analisem as desigualdades no com base na contagem populacio- camentos, Uso e acesso a serviços, acesso e na utilização de serviços nal da Fundação IBGE, de 1996, com- Rede de apoio familiar e social, His- públicos e privados, possibilitando posta pela somatória de uma amos- tória laboral e fontes de renda, Ca- intervenções na busca da equidade. tra probabilística (sorteio) e de uma racterística de moradia, Antropome- Este estudo objetiva a análise do amostra intencional (composição li- tria, e Flexibilidade e Mobilidade. No Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 9 LOUVISON, Marília C. P. et al presente estudo, analisaram-se as variáveis referentes ao uso e acesso GRÁFICO 1 – Distribuição dos idosos, segundo referência à seguro saúde, no Município de São Paulo, em 2000 aos serviços de saúde, referentes ao bloco F do questionário, relacionando-os com as características gerais (em particular, sexo, idade e escolaridade), condição de saúde (bloco C), representada pela autopercepção e morbidade referida e com as condições de ocupação e renda (bloco H). RESULTADOS As mulheres representaram 58,6% do universo estudado de ido- Fonte: Projeto SABE. GRÁFICO 2 – Uso e Acesso de serviços de saúde, nos últimos quatro meses, entre os idosos, no Município de São Paulo, em 2000 sos paulistanos, contra 41,4% dos homens; e 46,4% tinham menos de quatro anos de estudo. Uma proporção elevada dos entrevistados declarou sofrer de três ou mais doenças, mais comuns entre as mulheres (48%), sendo a doença de maior prevalência a “pressão alta” (53,3%). Fonte: Projeto SABE. Com relação à auto-avaliação de saúde, 46% consideraram ser muito boa/boa e 54% regular/má. Observou-se que 41,6% detêm plano e/ou TABELA 1 – Taxa de internações hospitalares dos idosos, nos últimos quatro meses, segundo doenças crônicas auto-referidas e renda, no Município de São Paulo, em 2000 seguro privado de saúde, sendo que Internações hospitalares apenas 53,4% identificaram ter se- Sem doenças referidas guro social brasileiro (Sistema Único de Saúde/SUS). Outro seguro pú- Uma e Duas doenças blico, relativo a assistências de servidores municipais, estaduais e fe- Três ou mais doenças derais foram descritos em 9,1% Total A proporção dos entrevistados População % Até o 3º quintil 1.003 1,7 Maior que o 3º quintil 1.802 2,5 Até o 3º quintil 9.364 4,3 Maior que o 3º quintil 11.937 6,0 Até o 3º quintil 8.226 9,6 Maior que o 3º quintil 8.107 12,6 40.439 4,7 Fonte: Projeto SABE. que referiu ter procurado algum serviço de saúde nos últimos 12 meses referiram pelo menos uma interna- A distribuição por escolaridade foi de 83,3%, e 64% pelo menos um ção hospitalar, com taxas mais ele- evidenciou que 46,4% tinham me- atendimento ambulatorial nos últi- vadas quanto maior a necessidade nos de quatro anos de estudo. A re- mos quatro meses. Do total, 4,7% e maior a renda. ferência ao SUS e ao Uso de Servi- 10 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo ços Públicos é inversamente proporcional à escolaridade. TABELA 2 – Distribuição dos motivos de não ter ido aos serviços, mesmo precisando, nos últimos quatro meses, entre os idosos, no Município de São Paulo, em 2000 A referência a não ter usado os serviços, mesmo precisando, foi bai- Motivo da falta de acesso aos serviços O problema não era grave Automedicou-se Outro Atendimento ruim Tempo e custo da viagem / falta de transporte Não tem dinheiro / custo Não tem tempo / família precisa dele NS/NR Total xa e os motivos para não ter ido aos serviços, nos últimos quatro meses, estão relacionados principalmente às questões da gravidade da doença e automedicação, mas, também, à qualidade, distância e custo dos serviços. Dos atendimentos ambulatoriais, 24,7% ocorreram em hospital público e 24,1% em serviço ambulatorial pú- População 14.287 14.261 22.860 9.074 5.231 6.127 5.530 2.286 79.656 % 17,9 17,9 28,7 11,3 6,6 7,7 7,0 2,9 100,0 Fonte: Projeto SABE. blico, sendo que nos serviços privados, 14,5% ocorreram em hospital e 33,7% em clínicas. Os que referiram saúde ruim/regular, mulheres, com GRÁFICO 3 – Uso de serviços de saúde nos últimos quatro meses, segundo tipologia e categoria do serviço, entre os idosos, no Município de São Paulo, em 2000 maior renda, com seguro saúde privado, sem freqüentar escola, com uma ou mais doenças crônicas apresentaram maiores taxas de utilização. O diabetes apresentou uma associação mais forte que as outras doenças, talvez por ter maior relação com os serviços no sentido de necessidade de controle. A escolari- Fonte: Projeto SABE. dade apresentou um comportamento distinto das outras variáveis, quando os que freqüentaram escola utilizaram menos os serviços. DISCUSSÃO Apesar da universalidade do SUS TABELA 3 – Distribuição dos serviços utilizados nos últimos quatro meses, segundo tipologia de serviço, entre os idosos, no Município de São Paulo, em 2000 Tipologia de serviço População % Consul. partic. 181.651 33,7 Clín. públ. 129.973 24,1 brasileiro, este foi pouco referido. Hosp. particular 78.012 14,5 Quem não precisou usar o SUS e Hospital públ. 133.101 24,7 quem utiliza o sistema privado, ten- Farmácia 2.372 0,5 de a considerar que não tem seguro Própria casa 6.301 1,2 social. Indica também a pouca lem- Outro 7.045 1,3 brança e confiança dos idosos brasi- Total 538.456 100,0 leiros no sistema público. Relacio- Fonte: Projeto SABE. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 11 LOUVISON, Marília C. P. et al TABELA 4 – Uso de serviços de saúde, conforme variáveis relacionadas Davidson & Whitehead, 1988, Penguin, London, p.211-213. Uso de Serviços de Saúde População % Freqüentou a escola 416.295 63,05 CAMARANO, A. A. (org.), 1999. Muito Recursos suficientes referidos 164.124 63,49 Além dos 60: Os Novos Idosos Bra- Classe Renda Baixa 252.492 64,04 sileiros. Rio de Janeiro: Instituto de Muito Idosos (75 anos e mais) 119.975 64,87 Pesquisa Econômica Aplicada. IBGE Casa Própria 427.992 65,25 (Fundação Instituto Brasileiro de Feminino 334.438 68,25 Geografia e Estatística), 2000. Com seguro saúde privado 210.907 68,64 Com doença referida 443.331 71,49 Saúde referida Regular/Má 326.662 72,35 Doença Mental 94.640 72,84 Hipertensão referida 325.873 73,08 Diabetes referida 116.453 77,95 TOTAL 537.107 64,23 FIRMO, J. O. A.; LIMA-COSTA, M. F. & UCHÔA, E. Projeto Bambuí: maneiras de pensar e agir de idosos hipertensos. Cad. Saúde Pública, v.20, n.4, Rio de Janeiro, jul./ago., 2004. FRIES, J. F. The compression of morbidity. Health and Society, 1983, Fonte: Projeto SABE. 61(3): 397-419. O fato de quem freqüentou es- LEBRÃO, M. L. & DUARTE, Y. A. O. SABE cola utilizar menos os serviços de – Saúde, Bem-estar e Envelhecimen- Existe uma associação entre a saúde pode demonstrar a interface to: O Projeto SABE no município de idade e a utilização de serviços, entre saúde e educação, com acu- São Paulo: uma abordagem inicial. principalmente entre as mulheres mulação de saberes nesse idoso Brasília: OPAS – Organização Pan- e as com maior renda, e o grupo que apresenta maior possibilida- Americana da Saúde, 2003. dos idosos com menor escolarida- des de autocuidado. na-se mais à sua utilização do que à incorporação de um direito social. de e com menor renda utilizou pre- É de extrema importância a im- ferencialmente serviços hospitala- plantação de políticas públicas res e públicos, indicando desigual- que possam dar conta das necessi- dades e dificuldades no acesso e dades de saúde específicas do ido- uso dos serviços e inadequação do so. A disponibilização de serviços modelo de atenção. de saúde resolutivos é fundamental LIMA-COSTA, M. F; BARRETO, S., GIATTI, L. & UCHÔA, E. Desigualdade social e saúde entre idosos brasileiros: um estudo baseado na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Cad. Saúde Pública v.19 n.3 Rio de Janeiro jun. 2003. A associação de renda, escolari- para a população idosa, que depen- dade, sexo e morbidade referida tra- de da atenção à saúde para a ma- MUSGROVE, P. La equidad del sistema duz a grande necessidade e o baixo nutenção de sua qualidade de vida, de servicios de salud: conceptos, poder de utilização dos idosos, sen- independência e portanto, que per- indicadores e interpretation. Boletín do que os com menor renda e sem mita um envelhecimento saudável. de la Oficina Sanitaria Panamericana, 1983, n.95, p.525-546. seguro-saúde utilizaram preferenci- REFERÊNCIAS almente serviços hospitalares e públicos, indicando desigualdades no PINHEIRO R. S. & TRAVASSOS C. Estudo da desigualdade na utilização de acesso e uso dos serviços, bem como BLACK REPORT, 1982. Inequalities in serviços de saúde por idosos em três inadequação do modelo de atenção. Health. Edited by P. Townsend, N. regiões da cidade do Rio de Janeiro. 12 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 Uso e acesso de serviços de saúde entre a população idosa do município de São Paulo Cad. Saúde Pública v.15 n.3 Rio de Janeiro jul./set. 1999. QUARTAROLI, C.; CAMPINO, A.C.C. & MONTOYA DIAZ, M.D. Condições de acesso à serviços de saúde, sob o aspecto da equidade,no interior do Estado de São Paulo e região Metropolitana. Apresentado no Congresso Brasileiro de Economia em Saúde/2002. Disponível no site: www. abres.fea.usp.br. RAMOS, L. R., VERAS, R. P. E., KALACHE, A. Envelhecimento populacional: uma realidade brasileira. 1987, Rev. Saúde Públ., 21(3), p.211-24. VERAS, R. P. & cols, Terceira Idade. Gestão Contemporânea em Saúde. Editora Ediouro, 2002. . & DUTRA, S. Envelhecimento da população brasileira: reflexões e aspectos a considerar quando da definição de desenhos de pesquisas para estudos populacionais. Physis; 1993, 3(1), p. 107-26. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 7-13, janeiro 2007 13 SOUSA, Maria Helena Lima et al ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil)1 Equitable allocation of resources for secondary and tertiary health care: a proposal for Ceará state (Brazil) Maria Helena Lima Sousa2; Maria Alrenice de Oliveira3; Paulo Egídio Santos Feitosa4; Edilmar Carvalho de Lima5; José Romério Melo6; Lúcia de Fátima Sales Costa7; Maria das Graças de Sousa8 & Rosa Maria Salani Mota9 RESUMO Pretende-se elaborar uma proposta para distribuição de recursos do Tesouro do Estado do Ceará para hospitaispólo no nível secundário e terciário, que não compõem a rede de hospitais da Sesa, observando critérios de necessidades e eqüidade. Desenvolvido por Roy Carr-Hill, o método parte da seleção de variáveis de necessidades socioeconômicas, demográficas, epidemiológicas, morbidades e fatores de risco, cobertura, tendo como base o ano de 2003. Concluise que é necessário aprofundar a investigação, utilizando-se outros métodos antes da tomada de decisão para utilização do método, como critério de distribuição de recursos entre estes hospitais. PALAVRAS-CHAVE: Alocação Eqüitativa de Recursos na Saúde; Economia da Saúde; Políticas de Saúde; Saúde Pública. ABSTRACT This study aims to elaborate a proposal for Ceará State Treasure resource distribution to the core hospitals in the secondary and tertiary levels, which do not belong to the Ceará Health Secretariat (SESA) hospital network, taking into account equity and necessity criteria. This method, developed by Roy Car-Hill, is based on the selection of variables related to necessities, socioeconomic elements, demography, epidemiology, morbidity, risk factors, and coverage, having year 2003 as a reference. The study concludes that it is necessary to deepen the investigation using other methods, before deciding for this one to be used as a resource distribution standard among the hospitals. KEYWORDS: Resource Equitable Allocation; Health Economics; Health Politics; Public Health. 1 Este estudo foi orientado pelo Prof. Roy Carr-Hill da Universidade de York (UK). 2 Economista, mestre em Saúde Pública, gerente do Nupla / Supervisão de Economia da Saúde da Sesa-CE. 3 Economista, especialista em Economia da Saúde, técnica do Nupla / Supervisão de ES/Sesa-CE. 4 Economista, especialista em Economia da Saúde; mestrando em Avaliação de Políticas Públicas; assessor técnico da Coordenadoria do Sistema Estadual de Urgência e Emergência da Sesa-CE. 5 Economista; especialista em Economia da Saúde; técnico do Nupla / Supervisão de ES/Sesa. 6 Farmacêutico, mestre em Saúde Pública; especialista em regulação e vigilância sanitária da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). 7 Farmacêutica; especialista em Economia da Saúde; coordenadora do Centro Estadual de Referência de Saúde do Trabalho (Cerest-CE) da Sesa-CE. 8 Economista; especialista em Desenvolvimento Econômico e Planejamento; Analista de Planejamento da Seplan. 9 Matemática; mestre em Estatística; professora das Universidades Federal e Estadual do Ceará. 14 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) INTRODUÇÃO A finalidade deste estudo é desenvolver um método de alocação pontânea da população por serviços A decisão adotada foi a segunda de saúde dos municípios circunvizi- opção, ou seja, a estratégia seria alo- nhos; disposição política dos muni- car recursos próprios do Tesouro do cípios para a pactuação. Estado para que, hospitais com aten- de recursos do Tesouro do Estado Essa proposta de regionalização dimento restrito ao município pas- do Ceará para os hospitais-pólo mi- visa beneficiar a população por meio sassem a operar no nível microrre- crorregionais e macrorregionais de da redução, no âmbito de cada mu- gional, evitando assim que pacien- saúde, visando o fortalecimento do nicípio, da sobre-oferta de alguns ser- tes com necessidade de atendimen- processo de descentralização dos ser- viços de saúde por um lado, e a sub- to especializado de média comple- viços de saúde no estado. oferta por outro. Além disso, preten- xidade superlotassem hospitais ter- A partir do ano 2000, as regiões de diminuir os custos sociais e eco- ciários que, por seu porte mais com- assistenciais do setor saúde do esta- nômicos do deslocamento dos cida- plexo, têm um custo mais elevado e do foram redimensionadas, passan- dãos em busca de atenção à saúde. localizam-se a uma grande distân- do o Ceará a ser dividido em três Para viabilizar a política de aten- cia da maioria dos municípios. Esta Macrorregiões de Saúde (Fortaleza, ção secundária, a SESA estava diante decisão foi tomada levando-se em Sobral e Cariri) e 21 Microrregiões de duas alternativas: a primeira seria consideração a necessidade de oti- Assistenciais de Saúde. As Microrre- construir, em cada uma das 21 Mi- mizar recursos, numa região já bas- giões de Saúde são espaços territori- crorregiões de Saúde, um hospital- tante castigada pelas condições so- ais compostos por um conjunto de pólo para o atendimento da média cioeconômicas e geopolíticas. municípios que compartilham os seus complexidade, segundo as determina- Por essa razão, algumas Micror- serviços de saúde, formando uma rede ções da Norma Operacional de Assis- regiões de Saúde possuem de um a assistencial integrada (CEARÁ, 2002). tência à Saúde (NOAS), o que natural- três hospitais-pólo, dividindo respon- Os principais critérios que deli- mente seria uma opção bastante dis- sabilidades de acordo com sua capa- mitaram as Microrregiões de Saúde, pendiosa do ponto de vista financei- cidade de oferta. Assim, no ano de adotados pela Secretaria Estadual de ro. Além disso, demandaria muito tem- 2003 a SESA co-financiou 18 hospitais- Saúde do Ceará / SESA (idem), são: po para se operacionalizar, o que re- pólo microrregionais no valor de R$ contigüidade intermunicipal; existên- presentaria um prejuízo para a popu- 10.192.991,00 e cinco hospitais terci- cia de hospitais com no mínimo qua- lação. Uma segunda opção seria iden- ários no valor de R$ 3.540.000,00. Em tro clínicas básicas, quais sejam: tificar hospitais conveniados ao SUS 2004 e 2005, o número de hospitais- pediatria, clínica médica, gineco-obs- que pudessem, com um mínimo de pólo microrregionais que receberam tetrícia e cirurgia geral; malha viá- investimento e reduzido espaço de tem- ajuda financeira do Estado ampliou- ria entre os municípios; demanda es- po, adaptar-se à nova realidade. se para 251, sendo que em 2004 fo- 1 1ª MR de Fortaleza (Hospital N.S. das Graças em Cascavel); 2ª MR de Calcada (Maternidade Dr. P. Saraste e Hospital Municipal A. G. da Rocha) em Calcada; 3ª MR de Maranguape (Hospital Municipal Dr. Ageu B. Herbert); 4ª MR de Baturité (Hospital J. Pinto do Carmo em Maranguape e Hospital Sta. Isabel em Aracoiaba); 5ª MR de Canindé (Hospital S. Francisco em Canindé); 6ª MR Itapipoca (Hospital S. Vicente de Paula em Itapipoca); 7ª MR Aracati (Hospital Municipal e Hospital Sta. Luiza de Marilac em Aracati); 8ª MR Quixadá (Hospital Eudásio Barroso e Hospital Mat. Jesus M. José em Quixadá e o Hospital Regional Dr. P. Neto em Quixeramobim); 9ª MR Russas (Hospital e C.S. de Russas); 10ª MR Limoeiro do Norte (Hospital S. Raimundo e Hospital Municipal Dr. D. Lima Verde em Limoeiro); 11ª Sobral (Soc. De Proteção a Maternidade e Infância de Ipu, em Ipu); 13ª MR Tianguá (Hospital Madalena Nunes em Tianguá); 14ª Tauá (Hosp. E Mat. Dr. A. Feitosa Lima em Iço); 15ª Crateús (Hospital São Lucas em Crateús); 16ª MR Camocim (Hospital Murilo Aguiar em Camocim); 17ª MR Icó (Hosp. Regional Deputado Oriel G. Nunes em Iço); 18ª MR Iguatu (Hospital Regional de Iguatu); 20ª MR Crato (Hospital São Francisco no Crato) e 21ª MR de Juazeiro do Norte (Hospital São Lucas em Juazeiro do Norte). Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 15 SOUSA, Maria Helena Lima et al ram repassados R$ 25.716.000,00 e, bral (filantrópico) e na Macro do pecializados de 2º e 3º níveis de mé- em 2005, estão previstos no orça- Cariri, o Hospital São Vicente (fi- dia complexidade ambulatorial, hos- mento R$ 26.580.000,00. Com rela- lantrópico) localizado em Barbalha. pitalar e de apoio diagnóstico e tera- ção aos hospitais terciários, o volu- Dentro deste contexto, o Ceará pêutico nas áreas identificadas como me de recursos recebidos pelos cin- passou, a partir de 2003, a co-finan- co hospitais em 2004 foi de R$ ciar o custeio de hospitais que aten- Os critérios utilizados no primei- 7.680.000,00 e, em 2005, estão pre- dem nos níveis secundário e terciá- ro ano (2003) para distribuição dos vistos R$ 7.440.000,00. Vale ressal- rio, que fossem identificados como recursos foram baseados na experi- tar que não foram repassados recur- pólo e passassem a operar dentro do ência piloto da Microrregião de Ba- sos para a 12ª MR de Acaraú e a 19ª princípio da Integração, ou seja, nos turité, observando o planejamento do MR de Brejo Santo. A primeira por- três níveis de atenção (primário, se- Plano Diretor de Regionalização que não possui hospital que atenda cundário e terciário) com responsa- (PDR), da rede de Urgência e Emer- minimamente às exigências da NOAS bilidades bem definidas, formando gência, da capacidade de atendimen- resolutivas pelo referido hospital. para tornar-se pólo. A segunda por- to neonatal e gestante de risco. Já que o único hospital que atenderia a em 2004 e 2005, ampliaram-se os essas exigências é particular. Entre- critérios observando-se o número de A LIMITAÇÃO DE RECURSOS FINANCEIROS, ASSOCIADA À especialidades, os recursos huma- tratégia do estado foi co-financiar FRAGILIDADE DE CRITÉRIOS PARA microrregião, os recursos financei- os hospitais-pólo macrorregionais ALOCAÇÃO DE RECURSOS ros e o perfil dos gastos do hospital tanto, encontra-se em construção o hospital-pólo na 19ª MR. Quanto à atenção terciária, a es- que não integravam a rede SESA nos existentes, os equipamentos instalados, a população residente na e sua estrutura física. (complexo de seis hospitais de por- CONSTITUI UM DESAFIO QUE Apesar de todo o esforço na bus- te terciário gerenciados pelo Esta- SE PRETENDE ULTRAPASSAR ca da eqüidade, os métodos utili- 2 do) com a finalidade de fortalecer zados até o momento pela SESA não alguns serviços essenciais deficitá- foram suficientes para garantir rios. Portanto, os hospitais que re- uma distribuição que minimize as cebem ajuda financeira do estado um sistema integrado que funciona desigualdades em saúde com con- são cinco. Na Macro de Fortaleza por meio de mecanismos articulado- sistência metodológica. Portanto, a são: a Maternidade-escola Assis res, entre eles o sistema de referên- limitação de recursos financeiros, Chateaubriand da Universidade Fe- cia e contra-referência (CEARÁ, 2002). associada à fragilidade de critéri- deral do Ceará; o Instituto Dr. José A operacionalização dessa estra- os para alocação de recursos cons- Frota pertencente à Prefeitura Mu- tégia se deu através de convênios fir- titui um desafio que se pretende nicipal de Fortaleza e a Santa Casa mados entre a Secretaria Estadual de ultrapassar no alcance da promo- de Misericórdia de Fortaleza (filan- Saúde e os municípios-sede de pólo, ção da saúde com qualidade de vida trópica). Na Macro de Sobral: a formalizando assim um compromis- e eficiência do sistema de saúde Santa Casa de Misericórdia de So- so para a prestação de serviços es- para os cearenses. 2 Hospital Geral de Fortaleza (HGF); Hospital de Messejana (coração e pulmão); Hospital Geral Dr. César Cals (HGCC); Hospital São José de Doenças Infecciosas (HSJ); Hospital Infantil Albert Sabin (HIAS) e Hospital Mental de Messejana. 16 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Na SESA, a discussão sobre como térios eqüitativos de alocação de ria dos tipos de eqüidade existente alocar recursos vem amadurecendo recursos do Tesouro do Estado do na literatura pode ser sintetizada em nos últimos anos, sempre tendo Ceará apenas para a Atenção Secun- três: a) tratamento igual para neces- como foco referencial a busca pela dária e Terciária da Saúde, levando sidades iguais; b) igualdade de aces- eqüidade. Recentemente, identificou- em consideração critérios de neces- so; e c) igualdade de saúde. Portan- se, em estudo realizado no âmbito sidades dos municípios cearenses e to, este trabalho foi desenvolvido da Economia da Saúde pela SESA/ sua capacidade de oferta, e não para nesta lógica conceitual. CECONS, que existe uma forte corre- o sistema como um todo. Após a seleção das variáveis, ten- lação entre as desigualdades socio- Para a construção deste modelo do como base o ano de 2003, foi econômicas e o perfil de morbida- foram observados critérios de neces- construída uma variável padroniza- des e mortalidades entre municípi- sidades, ora desenvolvidos no Rei- da de gastos por faixa etária com os do Ceará (SOUSA, 2004). Ao identi- no Unido sob a orientação do pro- hospitalização (AIH) de recursos fe- ficar esta forte associação verificou- fessor Roy Carr-Hill, da Universida- derais e totais de gasto esperado, e se a necessidade de aprimorar crité- uma variável de acesso por interva- rios de alocação de recursos que los de distância. Através da correla- favoreçam a redução dessas desi- ção linear (simples) de Pearson, re- gualdades através de uma política de saúde mais equânime. Alguns estudos nacionais e inter- NO CEARÁ, OPTOU-SE POR BUSCAR A EQÜIDADE NA gressão linear múltipla usando-se o processo stepwise e regressão linear múltipla em dois estágios, pesqui- nacionais têm desenvolvido propos- DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS sou-se quais das variáveis dependen- tas para alocação de recursos utili- DA SAÚDE OBSERVANDO AS tes tinham boa correlação linear com cada uma das variáveis independen- zando uma fórmula que reúne critérios de necessidades para o sistema NECESSIDADES DE CADA tes. Através dos processos estatísti- de saúde como um todo em seus di- NÍVEL DE ATENÇÃO cos citados, determinaram-se quais versos níveis de atenção, seja de um variáveis independentes que melhor estado ou país. Entretanto, no Cea- se correlacionavam com as variáveis rá, optou-se por buscar a eqüidade dependentes e, depois, foi construí- na distribuição dos recursos da saú- de de York. Dessa forma, foram se- da uma variável composta chamada de observando as necessidades de lecionadas variáveis socioeconômi- gueswork que foi utilizada para a cada nível de atenção. Esta opção é cas, demográficas, indicadores epi- correção da população dos municí- conseqüência da política de financi- demiológicos, de morbidade e fato- pios. Por fim, fazendo a distribuição amento do setor saúde, que direcio- res de risco e recursos financeiros e dos recursos de forma proporcional na os recursos de forma distinta para de coberturas dos hospitais-pólo à população corrigida do município, cada nível de atenção, o que, para o micro e macrorregionais. estes foram em seguida distribuídos nível intermediário como é o caso do Estes critérios são considerados proporcionalmente ao acesso dos poder público estadual, harmonizar de primordial importância para jul- pacientes dos municípios a cada hos- sua política de distribuição de recur- gar o sucesso das políticas de Saú- pital-pólo micro e macrorregional. sos com a política federal. de (ENSOR, JOWETT & THOMPSON (2000) Portanto, o objetivo geral deste Neste sentido, a elaboração des- apud CARR-HILL (2002). Para LE GRAND estudo é elaborar uma proposta para te trabalho procura estabelecer cri- (1978) apud PEREIRA (2002), a maio- distribuição de recursos do Tesouro Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 17 SOUSA, Maria Helena Lima et al do Estado do Ceará entre hospitais- como forma para desenvolver mé- nada de utilitarismo, preconizada por pólo que atendem nos níveis secun- todos que propiciem a redução das autores como Hume, Locke e Sidgwi- dário e terciário (exceto os hospitais desigualdades em saúde. ck e, depois, Smith, tem uma abor- da rede SESA), observando critérios O ponto principal que tem pauta- dagem dentro do pensamento liberal, de necessidades e favorecendo a alo- do a elaboração de propostas de jus- que considera o quanto uma socie- cação eqüitativa de recursos desti- tiça social no pensamento contempo- dade é corretamente ordenada, e, nados à saúde. Para atingir este ob- râneo está relacionado à necessida- portanto justa, quando obtém a mai- jetivo maior, buscou-se conhecer as de de definir qual igualdade se pro- or soma de satisfação independente experiências nacionais e internacio- cura, que desigualdades são aceitá- da sua distribuição entre os indiví- nais sobre alocação eqüitativa de veis e quais seriam, inclusive, dese- duos pertencentes a essa sociedade; recursos, em especial o caso da In- jáveis (RAWLS (1985), SEM (1992), finalmente, a reflexão efetuada por glaterra. Também se identificou o FREURBAEY (1988); PINDER (1988) e Rawls em sua ‘Teoria da Justiça’, que montante de recursos e os critérios CULYER (1988) apud PORTO, (2002). deve ser compreendida no contexto utilizados pela SESA para alocar re- atual da evolução do pensamento li- cursos próprios do Tesouro do Es- beral, no qual são repensados os pro- tado entre os hospitais-pólo micro e blemas sociais, o papel do Estado e macrorregionais que compõem a Atenção Secundária e Terciária. A BUSCA DE EQÜIDADE O passo seguinte foi desenvol- EM SAÚDE TEM SIDO ver uma proposta de alocação de UMA CONSTANTE EM recursos com base em critérios de o conceito de cidadania. RAWLS (1985) apud PORTO (2002) discute o ponto de partida de pessoas livres, iguais e racionais em uma suposta carta fundadora de uma as- necessidade em saúde da popula- DIVERSOS SISTEMAS DE sociação e diz que elas deveriam ter ção dos municípios, tendo como SAÚDE DO MUNDO entre os princípios que as desigual- foco os serviços de média e alta dades econômicas e sociais deveri- complexidade dos hospitais micro am privilegiar os mais desfavoreci- e macrorregionais. Por fim, tentou- dos, dentro dos limites de um justo se elaborar uma estratégia de dis- princípio de repartição, e que devem cussão da proposta para verificar Diversos autores trataram o as- estar relacionadas a funções e posi- sua viabilidade no contexto da po- sunto sob diversas formas. Porto ções abertas a todos, de acordo com lítica estadual de saúde em suas (2002) identifica três abordagens: a o princípio de justa igualdade de instâncias de decisão. primeira explicada por Rousseau no oportunidades. Além disso, para Ra- seu famoso Discurso sobre a origem wls, cada pessoa deve ter direito igual das desigualdades entre homens que ao sistema mais amplo possível de manifesta uma clara preocupação liberdades básicas respeitando as li- com o aprofundamento das desigual- berdades dos demais. EQÜIDADE, DESIGUALDADE E JUSTIÇA SOCIAL A busca de eqüidade em saúde dades introduzidas pelo processo de A partir da reflexão de Rawls, tem sido uma constante em diver- socialização e que, por conseqüên- pode-se fazer um contraponto deste sos sistemas de saúde do mundo, cia, seu conceito de justiça social é pensamento com o princípio de especialmente o europeu, que tem permeado pela idéia de igualdade; igualdade preconizado no SUS bra- procurado utilizar este conceito outra adotada pela corrente denomi- sileiro, o que leva a identificar con- 18 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) ceitos diferentes para a identificação saúde. PORTO, (2002) destaca que Tra- das, achado este que é interpretado da eqüidade e, conseqüentemente, vassos se refere à possibilidade de como sinal de não-eqüidade. das desigualdades. um profissional escolher tratamen- P EREIRA (2002) destaca que os WEST (1979) apud NUNES (2001) tos diferentes para necessidades resultados empíricos que se basei- considera que existem duas formas iguais em função do grupo social a am em dados do Inquérito Nacio- de eqüidade: uma horizontal, que que pertence o paciente, ou seja, a nal de Saúde de 1987, realizados defende tratamento igual para iguais ideologia poderia determinar trata- em Portugal, revelam que a distri- e uma vertical que recomenda tra- mento de primeira para cidadão de buição das doenças em geral é des- tamento desigual para desiguais. primeira e tratamento de menos qua- favorável aos grupos de menor ren- Para PEREIRA (2004), o conceito lidade para pessoal de baixa renda. da. Esta diferença é mais acentua- de eqüidade não é necessariamente Para PEREIRA (2002), de todos os da ao se considerar a severidade equivalente ao de igualdade, em- objetivos de eqüidade seguidos pe- da morbidade, e não apenas a sua bora os dois termos sejam por ve- los sistemas de saúde modernos, a prevalência. No entanto, as clas- zes usados como sinônimos e mui- ses mais pobres são compensadas tos objetivos de eqüidade em saú- com um maior nível de benefício de, particularmente nos países eu- dos cuidados de saúde em relação ropeus, sejam definidos em termos de igualdade. O autor destaca que ALOCAÇÃO DE RECURSOS este conceito é também utilizado SIGNIFICA DISTRIBUIR como igualdade no acesso a serviços de saúde; igualdade de trata- aos grupos mais ricos. P ORTO et al. (2002) identificou profundas desigualdades na distribuição dos recursos federais entre RECURSOS DE ACORDO regiões brasileiras. Este estudo foi mento para necessidades iguais; COM PRIORIDADES financiado pelo REFORSUS, com o igualdade de nível de saúde; maxi- PREESTABELECIDAS objetivo de desenvolver uma me- nin de Rawls; igualdade de capaci- todologia de alocação geográfica dades básicas; distribuição livre de de recursos federais do SUS, ten- inveja; distribuição de acordo com do como princípio norteador a a capacidade de pagar; prestação eqüidade (focalizando eqüidade prestação de cuidados de acordo com como igualdade de recursos para Para alguns autores (TRAVASSOS, as necessidades da população é pro- necessidades iguais). 1992 apud PORTO, 2002 E NUNES et al., vavelmente aquele que gera maior 2001), é importante distinguir o con- consenso. Por essa razão, é também ceito de eqüidade em saúde do con- o mais discutido e avaliado na lite- ceito de eqüidade no uso dos servi- ratura internacional, a exemplo de ços de saúde. Os determinantes das LE GRAND (1978), ADAY et al. (1980) e Alocação de recursos significa desigualdades em saúde não são os PUFFER (1986) apud PEREIRA (2002). distribuir recursos de acordo com mesmos das desigualdades no con- Para este autor, a maior parte dos prioridades preestabelecidas. Neste sumo de serviços de saúde, como estudos conclui que, às classes po- conceito está embutido o conceito de também a eqüidade no uso de servi- bres são prestados menos cuidados custo de oportunidade, na medida ços de saúde não resulta, necessari- de saúde por unidade de necessida- que, ao se alocar recursos para uma amente, em eqüidade na situação de de do que às classes mais favoreci- atividade, deixa-se de alocar em de um mínimo básico etc. ALOCAÇÃO DE RECURSOS: CONCEITUANDO E REVENDO EXPERIÊNCIAS Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 19 SOUSA, Maria Helena Lima et al outra. Identifica, também, qual a alternativas, segundo as necessida- a eficiência e o custo dos serviços, prioridade que está sendo dada a des de saúde identificadas. Portan- pois, sendo os recursos limitados a cada atividade, o que, conseqüente- to, toda alocação de recursos cor- um conjunto de atividades, não esta- mente, revela a concepção ideológi- responde a um processo de decisão rá disponível para outros; e, por úl- ca e política do gestor. para se estabelecer onde se devem timo, todo padrão de alocação de re- alocar os recursos disponíveis. cursos corresponde a certas priori- A discussão sobre como alocar recursos no SUS de forma mais jus- Para COUTTOLENC & ZUCCHI (1998, dades, ainda que implícitas. Ressal- ta vem se aprofundando no Brasil, p.97), alocação de recursos é o pro- ta-se a observação do autor de que é nos últimos anos e, em especial, no cesso pelo qual os recursos existen- comum autoridades políticas e/ou Ceará, entre profissionais e gesto- tes são distribuídos entre usos alter- sanitárias definirem um conjunto de res da saúde. nativos, que podem ser finais (pro- políticas e prioridades, mas uma O assunto é muito vasto, porém gramas ou atividades-fim), interme- análise do padrão de alocação de CARR-HILL (2002, p.1) recomenda que diários (os diversos insumos e ativi- recursos pode revelar outra ordem seja tratada, de modo especial a se- de prioridades. Nesse caso, natural- guinte questão: primeiro que seja re- mente, é o padrão de alocação que conhecido que existe um problema de mostra as verdadeiras prioridades. COUTTOLENC & ZUCCHI (1998, p.97- (des)igualdade; segundo, que seja desenvolvida uma metodologia ade- TODA ALOCAÇÃO DE RECURSOS 100) identificam quatro formas de quada para avaliar as desigualdades CORRESPONDE A UM PROCESSO alocação de recursos: alocação por em saúde; terceiro, que os recursos sejam alocados eqüitativamente e, por DE DECISÃO PARA SE ESTABELECER último, que sejam realizadas interven- ONDE SE DEVEM ALOCAR OS ções de promoção de saúde para resolver as desigualdades em saúde. RECURSOS DISPONÍVEIS nível de atenção (primário, secundário e terciário) e tipo de serviço (hospitalar versus ambulatorial, preventivo versus curativo); alocação por tipo de gasto ou função, para identificar até que ponto os recur- Critérios de alocação eqüitativa de recursos sos estão sendo dirigidos para a atividade fim; alocação por tipo de in- A importância maior dada por dades necessárias à produção do ser- sumo, verificando o impacto causa- governantes ao tentar desenvolver viço final), ou definidos em termos do pelo custo, qualidade e efetivi- métodos mais eqüitativos de alo- dos usuários dos serviços. O autor dade dos serviços prestados; e alo- car recursos deve-se, sobretudo ao destaca três aspectos importantes: o cação por critérios geográficos e propósito de contemplar um maior primeiro, que toda alocação resulta populacionais, destacando que esta contingente populacional de saúde ou corresponde a um processo deci- modalidade serve às vezes de apro- para desenvolver melhor suas fun- sório sobre “onde gastar o dinheiro”, ximação a uma distribuição por gru- ções de produção e acumulação, ressaltando que mesmo que a deci- pos socioeconômicos, cuja utilida- garantindo assim maior desenvol- são seja alocar o recurso de acordo de reside na avaliação da capacida- vimento econômico. com a estrutura de gasto do ano an- de dos serviços de saúde atingirem Alocar recursos, portanto, está terior representa uma decisão. Outro os grupos mais desfavorecidos, intimamente correlacionado ao esta- fator importante é que toda alocação àqueles que mais precisam do sis- belecimento de prioridades diante de tem um impacto direto e claro sobre tema público de saúde. 20 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Os critérios utilizados comumen- de distribuição de recursos que pos- térios específicos para cada item de te por gestores da saúde para alocar sam levar em consideração critérios despesa – internações não psiquiá- recursos são os critérios tradicionais, de necessidades para distribuição tricas, serviços ambulatoriais, saú- ou não explícitos, quase sempre fun- eqüitativa dos recursos, a exemplo de coletiva, ambulâncias, interna- damentados no padrão histórico dos de outros países que já o utilizam. ções psiquiátricas, internações de gastos, passando a privilegiar apenas a rede instalada e o quadro de pessoal disponível (COUTTOLENC & ZUCCHI, 1998, p.100-101). Esta modali- incapacitados mentais, administra- Experiências na alocação de recursos para a saúde EXPERIÊNCIAS INTERNACIONAIS dade aprofunda as desigualdades ção; e, finalmente, deveria ser aplicável tanto para Regiões (Regional Health Authorities – RHA) quanto para áreas (Área Health Authoriti- existentes no sistema de saúde, na Na Inglaterra, de 1976 a 1994, medida que não levam em conside- utilizou-se um único indicador epide- O RAWP é construído por três eta- ração o contingente populacional, o miológico para dimensionar as neces- pas: a primeira consiste na defini- es – AHA) (PORTO, 1997). perfil epidemiológico e as necessida- ção da distribuição de recursos le- des de saúde da população. vando-se em consideração as dife- Para suprir as deficiências do critério tradicional, o SUS tenta corrigir essas distorções incluindo os critérios demográficos, epidemiológicos e incentivos às ações básicas como forma de distribuição dos re- renças na estrutura demográfica de PARA SUPRIR AS DEFICIÊNCIAS DO CRITÉRIO TRADICIONAL, O SUS TENTA CORRIGIR ESSAS DISTORÇÕES INCLUINDO OS cursos federais. A dificuldade de CRITÉRIOS DEMOGRÁFICOS, EPIDEMIOLÓGICOS definir e operacionalizar um crité- E INCENTIVOS ÀS AÇÕES BÁSICAS cada região. Esse procedimento consiste em atribuir, a cada categoria de sexo e idade, a taxa de utilização nacional média respectiva à categoria, obtendo-se dessa forma a utilização esperada de um determinado serviço para cada região. A se- rio simples de alocação de recur- gunda etapa corresponde a uma cor- sos que reflita as políticas e priori- reção para as diferenças de necessi- dades de saúde e reduza os dese- dades, utilizando-se como proxy a quilíbrios existentes, mostra de taxa de mortalidade padronizada modo claro a necessidade de se (SMR) sendo essa última definida aprofundar a discussão e análise sidades, graças à fórmula RAWP (Re- como a razão entre a taxa de morta- de alocação de recursos financeiros sourse Allocation Working Part) ela- lidade de uma região e a taxa de (COUTTOLENC & ZUCCHI, 1998, p.101). borada por Carr-Hill et al. (1994). mortalidade nacional. Vale ressaltar Nos estados e municípios brasi- O método formulado no RAWP que o RAWP padroniza ainda a taxa leiros, o critério tradicional, junta- partiu de alguns princípios básicos: de mortalidade por grupos de idade mente com o demográfico, são as deveria ser aplicado visando distri- e sexo e pela Classificação Interna- formas mais utilizadas para alocar buir o total dos recursos, incluídos cional de Doenças. Essas últimas recursos, embora já se discuta pon- os relativos aos médicos gerais (Ge- padronizações foram abandonadas tualmente em alguns estados como, neral Practitioners – GPS); deveria a partir da revisão do RAWP na déca- por exemplo, Rio de Janeiro, Bahia, ser definido um tratamento diferen- da de 1980. Assim, regiões que pos- Minas Gerais e Ceará e no próprio ciado para as transferências de cus- suem taxa de mortalidade maior que Ministério da Saúde, novas formas teio e de capital, e determinados cri- a média nacional tenderão a rece- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 21 SOUSA, Maria Helena Lima et al ber mais recursos. A terceira e últi- dica que o uso dos serviços de saú- recomenda que a escolha de indica- ma etapa consiste no ajuste para as de não é apenas função das necessi- dores deve levar em consideração, diferenças regionais nos custos de dades de saúde, mas também, da além de tecnicamente confiáveis, provimento dos serviços de saúde oferta de serviços. Utiliza modela- válidos e relevantes para as políti- como, por exemplo, diferenças nos gem estatística para estimar as ne- cas, também possam ser usadas de custos de transporte, honorários cessidades ajustadas pela variação modo operacional em uma situação médicos etc. (ANDRADE, 2004). na oferta de serviços. Para dar o tra- prática. Questões consideradas es- Em 1985 foi realizada uma revi- tamento adequado à determinação senciais dizem respeito a: Consistên- são no RAWP por solicitação do Ma- simultânea entre oferta e uso de ser- cia Técnica; Transparência; Objetivi- nagement Board – NHS, na ten- viços (endogeneidade) trabalha-se a dade; Plausibilidade; Ausência de tativa de uma aplicação mais justa técnica de regressão em duas eta- incentivos perversos e Confiabilida- dos recursos existentes para a saú- pas (two stage least square) do mé- de do cálculo. Ele também conside- de. Entretanto, as propostas não fo- todo estatístico mais adequado do ra desejável quais sejam: Compreen- ram aceitas na sua totalidade pelo sível para leigos; Durabilidade; Va- governo, sendo revista outra vez e riabilidade; Clareza da contribuição apresentada com mudanças em dos indicadores; Flexibilidade; Esta- 1988 (SHELDON et al., 1993, p.835, A INGLATERRA DEFINE A apud PORTO, 1997, p.58). A nova fórmula elaborada em 1994 pela Universidade de York (que ESTIMATIVA DAS NECESSIDADES A não tinha sido implementada em PARTIR DE UM MODELO DE UTILIZAÇÃO 1996) tomou por base o modelo de DE SERVIÇOS DE SAÚDE demanda formulado por CARR-HILL et CONTROLADA PELA OFERTA al. (1994), que leva em consideração as características socioeconômicas não relacionadas de forma direta com as necessidades em saúde, a oferta de serviços, as necessidades que as regressões tradicionais (SHEL- de serviços de saúde e a utilização. DON et al., 1994, apud PORTO, 2002). bilidade e Materialidade. Sobre o abuso no uso perverso de indicadores, CARR -HILL (2002, apud BRYK & HERMANSON, 1993) ressalta que: “Existe uma premissa de que as ações de políticas baseadas em indicadores produzirão um resultado esperado. Indicadores são usados para desenvolver ação construtiva, mas a ação está inserida em um contexto. As variáveis culturais e de entendimento básico sobre as inter-relações individuais, familiares... e sociais [devem ser levadas em conta]. O perigo é que o modelo de indicador enrijeça a discussão subseqüente.” Esta nova metodologia elabora- Este método primeiramente modela da por CARR-HILL et al. (1994) e utili- a oferta a partir de um conjunto de zada desde 1996 pela Inglaterra de- variáveis de saúde e sociais (deno- fine a estimativa das necessidades minadas instrumentos) e aplica os Além da escolha das variáveis a partir de um modelo de utilização valores preditos da oferta como va- para o estabelecimento de um mé- de serviços de saúde controlada pela riáveis explicativas na regressão do todo, CARR-HILL (2002, p.2 ) aponta oferta, ou seja, baseia-se em dados uso dos serviços (PORTO et al., 2001). uma discussão sobre eqüidade dis- de uso dos serviços de saúde para Muitas são as opções indicadas tributiva que levanta as seguintes estimar a demanda potencial aos na literatura para a composição de questões: qual o grau de necessida- serviços, gerada pelas necessidades variáveis que possibilitem a redução de de uma pessoa ou qual o grau de saúde. Como modelo teórico, in- das desigualdades. CARR-HILL (2002) de necessidade existente numa área? 22 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Que nível de recursos deve ser pro- em países como: Austrália, Bélgi- te em classificar os indivíduos em porcionado? Quem decide? Tudo isto ca, Canadá, Finlândia, Inglaterra, grupos, segundo estrutura etária de tendo como pano de fundo a discus- França, Alemanha, Israel, Itália, sexo, etnia (proporção de aborígi- são sobre a alocação de recursos por Países Baixos, Novos Zelândia, Ir- nes) e classes de renda. A partir desta eqüidade e por área geográfica. landa do Norte, Noruega, Escócia, classificação é construída uma ma- O resultado desta problemática se Espanha, Suécia, Suíça, Estados triz de contingência, cujas células reverte pela busca de uma fórmula Unidos e País de Gales, utilizando representam grupos populacionais para o financiamento. Diversos são diferentes combinações que inclu- mutuamente exclusivos. Para cada os argumentos utilizados: os que em um nível individual de planeja- um desses grupos estima-se a utili- abordam a eqüidade refletem a exis- mento e outros fatores relevantes, zação por tipo de serviço de saúde, tência de se garantir a todos o mes- tais como: idade/sexo, grupo étni- que combina com as informações de mo acesso no atendimento à saúde co; estado de bem-estar, deficiência; custos por unidade de serviços da (assim como as necessidades de aten- situação de emprego etc., no pri- província, determina a quantidade dimento à saúde) e aqueles que fa- total de recursos a ser alocada para lam da eficiência, assegurando que cada autoridade regional de saúde. esta é que permite o controle dos Como se pode observar, diversos gastos (idem, p.3). Estes argumen- países têm buscado definir metodo- tos se revestem de importância, so- DIVERSOS PAÍSES TÊM BUSCADO bretudo porque, sendo os recursos DEFINIR METODOLOGIAS EQÜITATIVAS escassos, é fundamental que esses dois pontos, eqüidade e eficiência, sejam observados e que o uso de fórmulas com base nas medidas de necessidades ‘objetivas’ sejam aplica- logias eqüitativas para distribuição geográfica de recursos destinados ao financiamento da saúde, entretanto PARA DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DE a experiência brasileira ainda é bas- RECURSOS DESTINADOS AO tante incipiente, embora a discussão FINANCIAMENTO DA SAÚDE esteja aberta e já se tenha bons profissionais trabalhando e se aprofundando no assunto. das ao invés de considerações políticas, precedentes históricos ou sim- EXPERIÊNCIAS NACIONAIS plesmente o tamanho da oferta. CARR-HILL (idem) considera duas meiro; mortalidade; nível educaci- As experiências de maior relevo abordagens básicas para identificar onal e desemprego e etc., no segun- no Brasil estão sendo desenvolvidas os fatores de necessidades: a nor- do; e utilização particular, varia- pelo Ministério da Saúde: recente- mativa e a empírica. Com base na ção de custos etc., no terceiro. mente foi realizado um estudo, fi- normativa, os fatores são seleciona- Além dessas experiências, ANDRA- nanciado pelo REFORSUS, com o obje- dos com base na evidência epidemi- DE et al. (2004) ressalta que em Que- tivo de desenvolver uma metodolo- ológica ou outra evidência científi- bec a fórmula de capitação de re- gia de alocação de recursos federais ca. Na abordagem empírica, os fa- cursos utiliza uma metodologia si- pautada por critérios de eqüidade. tores são selecionados com base milar àquela desenvolvida pelo sis- Essa iniciativa procurou responder numa associação provada com os tema inglês de saúde. Em Alberta, aos princípios estabelecidos na Lei gastos em atendimento à saúde. desde 1997/98, utiliza-se o modelo Orgânica de Saúde, a qual estabele- A experiência internacional com de financiamento baseado na popu- ce que, além do critério populacio- capitação de recursos foi realizada lação, metodologia esta que consis- nal, o SUS deve incorporar as dife- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 23 SOUSA, Maria Helena Lima et al renças no perfil epidemiológico para Embora muito bem elaborada, Esses autores fizeram uma simu- nortear a distribuição de recursos a proposta ainda não chegou a lação entre a distribuição per capi- (ANDRADE, 2004, p.7). ser implementada pelo Ministério ta e utilizando o critério demográfi- da Saúde. co. O resultado revela que o critério Esse estudo, desenvolvido por PORTO et al., 2001, concluiu que as Minas Gerais também formulou demográfico implicaria o favoreci- experiências internacionais mostra- uma proposta eqüitativa para dis- mento a municípios pertencentes às ram-se pouco apropriadas ao caso tribuição dos recursos da saúde. regiões mais ricas, mas quando se brasileiro. Assim sendo, foi constru- Segundo ANDRADE et al. (2004), o considera também a medida de ne- ído um indicador, composto por método proposto consiste na distri- cessidade, a correção se faz a favor meio de um procedimento de análi- buição per capita de recursos finan- de municípios de regiões mais po- se estatística multivariada (análise ceiros para os municípios mineiros bres. Esta experiência foi a única a dos componentes principais) para a ajustada, de início, segundo as di- ser implementada até o momento no estimativa das necessidades, a par- ferenças na utilização de serviços caso brasileiro. tir de um subconjunto de 12 variá- Existem, ainda, em fase de con- veis epidemiológicas e socioeconô- clusão e discussão, estudos sobre a micas da base de dados com 124 distribuição eqüitativa de recursos unidades geográficas. nas Secretarias Estaduais de Saúde Os resultados distributivos ob- AS EXPERIÊNCIAS tidos a partir dessa metodologia INTERNACIONAIS apontam para a existência de ini- da Bahia e do Rio de Janeiro, a exemplo do Ceará que, além deste também conclui um outro indicador di- qüidades na alocação efetuada MOSTRARAM-SE recionado para a atenção básica. pelo Ministério da Saúde no ano POUCO APROPRIADAS Sabe-se, também, que o MS está repensando os critérios de financia- de 1999, e permitiram verificar que AO CASO BRASILEIRO a maior iniqüidade está relacionada com os repasses destinados ao mento da atenção primária. PROPOSTA: MÉTODO E RESULTADOS financiamento de assistência hospitalar e ambulatorial. Escolha das variáveis do modelo A proposta elaborada por PORTO decorrentes da estrutura etária e de et al., 2001 previa um redireciona- sexo e, num segundo momento, con- A elaboração desta proposta par- mento dos recursos da maioria dos siderando as diferenças na necessi- te da seleção de variáveis considera- estados das regiões Sudeste e Sul e dade de cuidados com a saúde, dos na literatura como essenciais do Distrito Federal para os estados mensurada a partir da construção para desenvolvimento de um estudo do Norte e Nordeste. Entretanto, a de um índice elaborado para todos de alocação eqüitativa de recursos. pesquisa observou que, projetando os municípios do estado. Trata-se Assim, foram selecionados quatro o ganho de recursos para a saúde de um indicador composto de um conjuntos de variáveis consideradas através da Emenda Constitucional conjunto de variáveis epidemioló- essenciais para cada um dos muni- 29, bastariam apenas três anos para gicas e socioeconômicas, o qual cípios cearenses, quais sejam: uma se cobrir o déficit de cerca de um permite classificar os municípios coleção de variáveis de “necessida- bilhão de reais para se evitar a per- segundo uma escala crescente de des”, composta por variáveis socioe- da de recursos dos estados. necessidades em saúde. conômicas, demográficas, epidemi- 24 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) ológicas e fatores de risco; uma co- dades socioeconômicas existentes portância desses fatores para se leção de variáveis de oferta de servi- entre os municípios cearenses e a combater a iniqüidade existente no ços; uma variável padronizada de verificação de sua interface com a estado do Ceará. gastos; e uma variável de acesso. situação de saúde. A escolha das variáveis demográ- Vale salientar que as necessida- Este índice foi construído a par- ficas, indicadores epidemiológicos, des em saúde podem ser vistas so- tir de dados censitários (IBGE-2000), variáveis de morbidade e fatores de bre diversos ângulos. PEREIRA (2004) por meio de uma análise fatorial, e risco obedeceu à recomendação da ressalta que não existe uma defini- consta de três fatores (econômico, Célula de Análise e Tendências da SESA. ção consensual na literatura, sendo social e habitacional) e Cluster O critério para seleção dos recur- notória a tendência dos economis- Analysis para agrupamento em cin- sos de cobertura obedeceu à influ- tas em evitar o uso do termo. Uma co classes, sob base municipal. ência que estes fatores exercem no taxonomia muito utilizada consiste A importância das variáveis uti- da distinção entre três tipos de ne- lizadas no ISE-M para a saúde deve- perfil de gastos da atenção secundária que se quer fortalecer. cessidade: as necessidades sentidas O passo seguinte foi definir as – assim identificadas como pelos variáveis que geram gastos nos indivíduos; as necessidades expres- hospitais associados à média e sas – aquelas apresentadas pela alta complexidade. população aos serviços de saúde e Em seguida foi construída uma AS NECESSIDADES EM variável padronizada de gastos com sinônimos de ‘procura de cuidados’; SAÚDE PODEM SER o intuito de tornar visível o compor- e as necessidades normativas – de- VISTAS SOBRE que são quase sempre tomadas como finidas e identificadas pelos profissionais de saúde. O conceito de ne- tamento dos gastos do estado e dos municípios, por faixa etária. DIVERSOS ÂNGULOS Construção da Variável Padronizada de Gastos cessidade adotado neste estudo é o definido pela escola de York, ou seja, refere-se à capacidade de beneficiar Para a construção da variável (PEREIRA, 2004 apud WILLIAMS, 1979). padronizada de gastos procedeu-se As variáveis de necessidades se à grande influência que os fato- da seguinte forma: primeiramente selecionadas para construção do res socioeconômicos exercem no foram definidas faixas etárias para modelo foram as seguintes: variá- estado da saúde e vice-versa. Dos a realização da padronização dos veis socioeconômicas; demográfi- resultados principais desta pesqui- gastos, da seguinte forma: < 1 ano; cas; indicadores epidemiológicos, sa, evidenciou-se a influência das 1-4 anos; 5 a 6 anos; 10 a 14 anos; de mortalidade; e fatores de risco desigualdades socioeconômicas so- 15 a 19 anos; 20 a 24 anos; 25 a 29 e recursos de cobertura. bre a situação de saúde, notada- anos; 30 a 34 anos; 35 a 39 anos; As variáveis socioeconômicas mente na mortalidade infantil, em 50 a 54 anos; 55 a 59 anos; 60 a 64 foram escolhidas tendo como refe- crianças de menos de 5 anos em anos; 65 a 69 anos; 70 a 74 anos; rência as variáreis que compõem o idade escolar, e que o risco de ado- 76 a 79 anos e 80 ou + mais anos. Índice Socioeconômico (ISE-M) de- ecer e morrer aumenta entre as clas- Em seguida foram levantados os senvolvido pela CECONS / SESA em ses mais desfavorecidas – dentre ou- gastos federais provenientes das AIH 2003 para identificar as desigual- tros achados, o que sinaliza a im- pagas em 2003 o Ceará, por faixa Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 25 SOUSA, Maria Helena Lima et al etária. Vale salientar que não se utilizou o gasto com recursos estadu- GRÁFICO 1 – Perfil dos gastos (AIH) por faixa etária da população cearense em 2003, incluindo Fortaleza ais porque a política para atenção secundária da saúde só foi viabilizada a partir de 2003, e esses dados não são, até o momento, disponibilizados por faixa etária como o são os recursos federais. Depois, foi levantada a população estimada do Ceará por faixa etária no ano de 2003, de acordo com a padronização adotada neste trabalho. A partir dos dados levantados foi possível calcular o gasto per capita no Ceará, por faixa etária. Para se chegar à variável padronizada de gastos de um município, necessitou-se das seguintes GRÁFICO 2 – Perfil dos gastos (AIH) por faixa etária da população cearense em 2003, excluindo Fortaleza informações, por faixa etária: distribuição da população do município; gasto real do município e gasto esperado, que é estimado multiplicando-se o gasto per capita do estado do Ceará pela população do município. Assim, a Variável Padronizada de Gastos é a razão entre o Total Real de gasto do município (VR) e o Total Esperado de Gastos do Município (VE). O que se observa a partir deste procedimento metodológico é que os gastos da hospitalização no Ceará são mais expressivos no nascimen- Mesmo com a ordem invertida, pois é neste contingente humano to e, em seguida, na terceira idade este é um dado muito importante, que se concentram as doenças crô- (Gráficos 1 e 2). Comparando-se a tendo em vista que o perfil demo- nicas que requerem medicamentos realidade do Ceará com países de- gráfico da população brasileira, e de uso contínuo e de alto custo. senvolvidos, verifica-se que nestes em particular da cearense, passa Este achado fortalece a necessida- últimos se evidencia mais o gasto por uma transição demográfica, de de indicadores que incluam os na terceira idade e em segundo lu- carecendo de políticas de saúde di- idosos na fórmula de alocar recur- gar em menores de 5 anos. recionadas para a terceira idade, sos para o Ceará. 26 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Construção da Variável de Acesso O movimento dos pacientes na busca por serviços de saúde de mé- vel para os residentes em outros ao campo da atenção secundária da municípios adjacentes, o que provo- saúde microrregional. ca um problema de acessibilidade. Com relação aos hospitais-pólo Observa-se que, dos 30 hospi- macrorregionais, apenas o Institu- tais-pólo microrregionais apenas to Dr. José Frota (IJF, hospital mu- vela quão resolutivo estes hospitais três atendem a pessoas com uma nicipal gerenciado pelo município estão sendo quanto à política de distância de 0 a 299 km. São eles: de Fortaleza), referência para todo Atenção Secundária e Terciária. Hospital São Francisco de Canindé, o estado do Ceará, consegue aten- Então, para construção da vari- os dois hospitais-pólo de Quixadá der um raio de 600 km, refletindo e ável de acesso foram primeiramen- (Hospital Eudásio Barroso e Hos- confirmando sua abrangência e te definidos intervalos de distância pital Maternidade Maria José) e acesso à população cearense. Os em quilômetro, entre o volume de Hospital Nossa Senhora das Gra- hospitais Maternidade-escola Assis atividades (em reais) realizado pe- ças, em Cascavel, que tem um aten- Chateaubriand, em Fortaleza, per- dia e alta complexidade entre hospitais micro e macrorregionais re- los hospitais de cada município de tencente à Universidade Federal do residência em cada um dos 30 hos- Ceará, e a Santa Casa de Misericór- pitais estudados. dia de Fortaleza atendem um raio de 500 km, entretanto de maneira Os intervalos definidos foram: A HIPÓTESE INICIAL É DE bastante insipiente. O grosso no 400 a 499 km; 500 a 599 km e QUE OS INDIVÍDUOS QUE HABITAM A sidente em até 200 km. O Hospital 600 a 600 km. 0 KM DE UM HOSPITAL TÊM 100% São Vicente de Barbalha, como é DE ACESSO FÍSICO AOS LEITOS ACESSÍVEIS região do Cariri, portanto uma re- 0 (zero) km; 1 a 99 km; 100 a 199 km; 200 a 299 km; 300 a 399 km; Para cada hospital estudado foi verificado o número de pacientes atendimento se dá à população re- referência macrorregional para a atendidos a partir de cada distância, gião de atendimento de menor den- e feita a distribuição gráfica para sidade populacional se comparada identificar se existia ou não um pro- às outras duas, seu atendimento se blema que precisaria ser enfrentado. dá a uma distância de até 300 km. A hipótese inicial é de que os in- dimento diferencial e atende num divíduos que habitam a 0 km de um raio de 100 km e de 300 a 500 km. hospital têm 100% de acesso físico A maioria dos outros hospitais-pólo aos leitos acessíveis. Assim, o nú- atende a uma clientela no raio de Na tentativa de identificar as mero de leitos disponíveis àqueles até 200 km, ou seja, 80% só conse- principais variáveis dos gastos, as que habitam a 0 km (RB0) é a quan- guem atingir municípios que estão análises foram feitas através da tidade de fato disponível nas unida- a uma distância relativa de 200 km Correlação Linear de Pearson, Re- des dos hospitais estudados que se e 26,7 % dos municípios só atendem gressa Linear Simples e Múltipla encontram dentro da distância de 0 a população residente a uma distân- pela técnica Stepwise e Regressão km (número de leitos). Ou seja, na cia de 100 km, o que na verdade é a Linear Múltipla em dois estágios medida que esses leitos ficam dispo- população do próprio município, ou (Stepwise), várias aproximações níveis para uma população residen- seja, não chega a resolver os pro- com diversas variáveis considera- te no município, ele fica indisponí- blemas propostos no que se refere das dependentes (taxa de hospita- Método Estatístico para Distribuição dos Recursos Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 27 SOUSA, Maria Helena Lima et al lização e atendimento pré-natal) e ções por AVC na população de 60 mortalidade em menor de 5 anos/ tantas variáveis independentes anos e mais (SIH); a Taxa de inter- 100.000 (TM<5) (SIM); % de crian- quanto possíveis. Todo este pro- nação na população de 60 ou mais ças com baixo peso ao nascer (CBP) cesso de análise foi realizado na anos /1.000 hab (SIH); a Taxa de in- (SINASC); Percentual de domicílio com tentativa de encontrar uma variá- ternações por causas externas nos um só morador (IBGE). vel composta que mais tarde pu- homens /1.000 hab (SIH); e a % de A Correlação Linear de Pearson, desse vir a ser uma variável pre- mães com mais quatro consultas até mesmo com benefício da dúvi- ditora dos gastos hospitalares e pré-natais (SINASC). da, sugere que apenas cinco das também servisse de fator de corre- Entre as variáveis estudadas fo- variáveis independentes estão rela- ção da população dos municípios. ram definidas como variáveis inde- cionadas linearmente com “boa” di- Foram definidas como variáveis pendentes: Proporção de idosos (60 reção com as variáveis dependentes dependentes: Taxa de internações anos e mais) na população (PI >60) (as pessoas mais pobres por ficarem por IRA<5 anos/1.000 crianças < (IBGE); Esperança de vida ao nas- mais doentes irão requerer mais de 5 anos (SIH); a Taxa de interna- cer (em anos) 2000 (IBGE); Taxa de atenção hospitalar, ver Quadro 1). QUADRO 1 – Quadro das correlações entre as taxas de internações e variáveis para identificar as de melhor direção em 184 municípios Variáveis Esperança de vida ao nascer (em anos) 2000 (EVN) P Taxa de mortalidade em menor de 5 ano/100000 (TM<5) P Proporção de idosos (>= 60 anos) na população (PI >60) P % de Crianças com peso baixo ao nascer P Até um morador P Taxa de internação por IRA < 5 anos /1000 criança < 5 anos (TIRA) % de crianças com baixo peso ao nascer (CBP) Taxa de internação Taxa de internação Taxa de internação % de mães com 4 por causas externas por AVC na na pop de 60 ou + ou mais consultas homens / 10000 população de 60 ou anos /1000 pré-natal (CPN>4) (TICE) + anos (TAVC) (TI>60) 0,079 0,346 0,083 0,092 0,176 0,079 0,289 0,000 0,263 0,218 0,017 0,289 0,246 -0,135 0,103 0,080 -0,196 0,246 0,001 0,068 0,166 0,282 0,008 0,001 0,281 -0,181 0,158 0,176 0,034 0,281 0,000 0,014 0,032 0,017 0,644 0,000 0,064 0,228 0,175 0,140 -0,008 0,064 0,392 0,002 0,018 0,059 0,909 0,392 0,097 0,172 0,088 0,137 0,132 0,097 0,191 0,020 0,237 0,064 0,074 0,191 Fonte: Elaboração própria. Esperava-se que um número no Brasil (PORTO, 1997). É prová- vado número de subnotificações e maior de variáveis fossem encon- vel que este resultado seja conse- sub-registros. tradas em “boa direção”, entretan- qüência da confiabilidade das in- A partir deste estudo, foi defini- to o que se pode dizer é que este é formações, principalmente com da uma variável composta pela um resultado idêntico ao encontra- relação a mortalidades e morbida- soma dos escores estandardizados, do em outros estudos realizados des nas quais se registram um ele- a que se chamou Guesswork: 28 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) Através da análise das correlações Guesswork = zesper + zpro_ido + zmort_5 +zbaixo_p +zmord_1 entre as variáveis independentes com Onde: os Gastos e Leitos disponíveis verifi- zesperan – escore padronizado da Esperança de vida ao nascer (em anos) 2000 (EVN); cou-se que somente os itens 1, 2, 3 e zprop_ido – escore padronizado da Proporção de idosos (³ð 60 anos) na população (PI >60); zmort_5 – escore padronizado da Taxa de mortalidade em menor de 5 anos/100.000 (TM<5); zbaixo_p – escore padronizado do % de crianças com baixo peso ao nascer (CBP); zmord_1 – escore padronizado dos domicílios com um só morador. O Quadro 2 apresenta a correlação Após a construção da variável entre a variável Gueswork e as variáveis composta Guesswork foram feitas as dependentes (taxas de internação e aten- correlações entre Variáveis Indepen- dimento pré-natal). Neste quadro obser- dentes com os Gastos e Leitos dis- va-se “boa” correlação do Gueswork com poníveis (Quadro 3). ção com os gastos e leitos. Resultado da Análise de Regressão Linear Múltipla para as Variáveis Dependentes As tentativas de Regressões Lineares Simples e Regressões Lineares Múltiplas pelo processo stepwise para identificar, entre as variáveis independentes, as principais as variáveis dependentes. variáveis preditoras dos gastos mostra, segundo o consultor, que possi- QUADRO 2 – Correlação entre as taxas de internações e a variável composta Guesswork Tx de internação na Tx de internação por pop de 60 ou + anos AVC na pop de 60 ou /1000 (TI>60) + anos (TAVC) GUESSWORK 7 têm, ao mesmo tempo, boa correla- velmente este seja o único modelo Tx de internação por IRA < 5 anos/1000 criança < 5 anos (TIRA) Tx de internação por causas externas nos homens / 10000 (TICE) Correlação de Pearson 0.248 0.250 0.310 0.19b8 Sig. (2-tailed) 0.001 0.001 0.000 0.008 180 180 180 180 N que pode ser elaborado com as variáveis disponíveis e com uma variável construída a partir das poucas variáveis em boa direção (Guesswork – Esperança de vida ao nascer (em anos) 2000; Proporção de idosos (³ð60 anos) na população; QUADRO 3 – Correlação entre Variáveis Independentes com Gastos e Leitos disponível em 2003 Variáveis Gastos Padronizados Correlação p Nº de leitos acessíveis Correlação p Taxa de mortalidade em menores de 5 anos/1.000; % de crianças com peso baixo ao nascer; e % de domicílios com um só morador). 1. Proporção de idosos (>=60 anos) na população 0,054 0,466 - 0,342 0,000 2. % de internações por município de ocorrência segundo as condições sensíveis (IMCS) 0,136 0,136 0,066 - 0,169 0,022 3. % cobertura vacinal contra influenza em idosos 0,058 0,437 - 0,066 0,371 4. Média de anos de estudo 0,452 0,000 0,293 0,000 5. Esgoto 0,204 0,005 0,193 0,009 6. Água 0,295 0,000 - 0,151 0,041 7. Até um morador 0,161 0,029 0,029 0,077 0,298 - 0,236 0,001 - 0,59 0,430 0,440 0,000 - 0,039 0,601 Ao se utilizar as variáveis de ofer- - 0,412 0,000 0,000 - 0,172 0,020 ta como explicativas, foi mostrado 0,289 0,000 - 0,071 0,339 que existe endogeneidade, pois, o p 8. Pelo menos sete moradores no domicílio 9. Renda familiar mais de 5 SM 10. Renda familiar até ½ SM 11. Guesswork Teste de Endogeneidade As variáveis de oferta utilizadas para o teste de endogeneidade foram as seguintes: os Leitos Clínicos; os Leitos Pediátricos e os Leitos Cirúrgicos. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 29 SOUSA, Maria Helena Lima et al de F no ponto 2,10 com 8 e 176 graus de cobertura vacinal contra influen- tiplicado pelo número de pacientes forma, o sistema de equações foi de internações por município de ocor- pital dividido pelo total de pessoas de liberdade é 0,038 (p-value). Dessa za em idosos acima de 60 anos, e % considerado endógeno. rência segundo condições sensíveis (IMCS), na Regressão Linear Múlti- Resultados Finais para o Gasto 0,0009 Leitos Clínicos 0,0120 Leito Cirúrgico de qualidade encontra-se: Internações sensíveis Vacina (Constante) 0,5400 ep (B) 0,0001 0,0034 Beta T A primeira análise que permite p 0,20 1,4000 0,1600 7,32 3,4200 0,0008 - 3,1900 0,0017 2004, no valor de R$ 33.396.000,00, 0,0017 0,0012 0,14 1,4800 0,1400 se implementada a fórmula utili- 0,0078 0,0004 0,0023 0,2100 0,24 0,015 2,4300 0,1500 2,5400 0,0160 e o que estes receberiam caso fos- 0,8800 zando-se critérios de necessidade 0,0120 ção ajustada = (Gueswork + 100) x A análise da variância mostra os seguintes resultados: Resíduo 6 117 F = 7.349 Signif F = 0.000 Sum of Squares 2.289 9,189 Mean Square 0,3815 0,0519 Distribuição dos Recursos A proposta de distribuição de re- cursos para o Tesouro do Estado entre hospitais-pólo microrregional e macrorregional de saúde está es- truturada da seguinte forma: 1) Primeiramente foi feito um ajuste na população de cada município pelo fator composto Guesswork (Popula- 30 sos recebidos pelos hospitais-pólo em - 7,24 Análise da Variância Regressão é realizada comparando-se os recur- 0,0031 [Coeficiente de Correlação Múltipla = 0,4466; Coeficiente de Determinação Ajustado = 0,1723 (ep=0,2279) e Dependentes variáveis STD - CSTS (Multiple R = 0,4466); R Square = 0,199); (Ajusted R Square = 0,1723) e (Standard Error = 0,2279)]. DF verificar o resultado desta proposta - 0,0100 0,0190 GUESWORK ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE O CRITÉRIO ATUAL E O PROPOSTO de oferta e variáveis alternativas e veis Alternativas e de Qualidade: % Leitos Pediátricos de acesso do município). das variáveis Guesswork, variáveis dos (STD – CSTS) e sendo as variá- Coeficiente estimado (B) internadas pelo município (ou total pla do gasto padronizado em função Calculando os gastos padroniza- Variável que cada município internou no hos- População/100); 2) Em seguida, calculou-se o percentual da população ajustada (% Pop Ajustada = Pop ajus- tada x 100/ População Total); 3) Depois se obteve os Recursos por mu- (Tabelas 1 e 2). Nesta simulação verifica-se que todos os hospitais-pólo microrregionais perderiam recursos pelos crité- rios ora propostos. Esta perda seria em termos globais de R$ 14.997.362,00, o que representa 58,3% dos recursos recebidos em 2004 (Tabela 1). Quem ganharia seriam os hospitais terciários (Tabela 2). A variação percentual da perda nicípio multiplicando o fator com- entre os hospitais secundários va- ção ajustada dividido por 100; 4) No de Iguatu) e 86,7% (Hospital Santa posto Guesswork pelo % de populapasso seguinte, levantou-se o número de internações realizadas pelo município em cada hospital e o total de internações por município (2003); 5) Por último, para se obter o valor que cada hospital-pólo receberia, fez-se o somatório do recurso total de cada município (que é igual ao fator composto Guesswork x % da população ajustada /100), mul- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 ria entre 22,4% (Hospital Regional Isabel em Baturité). Entre os hospi- tais com maiores perdas estão os municipais (exceto os de número 4, 22 e 25), e os com menor perda são os filantrópicos (exceto 7, 10, 12, 14 e 17), talvez por terem estes um maior grau de eficiência (Tabela 1). Os maiores beneficiados com a atual proposta seriam os cinco hospi- tais terciários, pois parece evidente Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) que estes ainda estão recebendo gran- Ora, levando-se em consideração servação preliminar que se poderia fa- municípios por uma dificuldade dos ção secundária, por ter um custo mais tais-pólo MR encontra-se aquém do mais efetiva na solução dos proble- regionalização dos serviços de saúde de quantidade de pacientes dos 184 25 hospitais em atuar de maneira mas de saúde na média complexidade. Assim, esses hospitais passariam a receber um incremento de recursos estaduais na ordem de 194,3%, ou seja, R$ 14.997.362,00, provenientes da perda que sofreriam os hospitaispólo secundários (Tabela 2). que a SESA tenciona fortalecer a aten- baixo que o terciário e fortalecer a ofertados à população na lógica da reordenação da atenção secundária, este resultado poderia ser analisado como equivocado, pois estaria fortalecendo a atenção terciária já que a divisão dos recursos financeiros nes- ta análise os beneficiaria. Outra ob- zer é que a resolutividade dos hospique se esperaria, pois os pacientes continuam se dirigindo aos hospitais terciários, possivelmente por serem estes mais resolutivos. Entretanto, levando-se em consideração que a política de ajuda financeira do Estado aos hospitais-pólo microrregionais iniciou-se em 2003, considera-se prematura tal conclusão. TABELA 1 – Comparativo entre os recursos e distribuição aos hospitais-pólo microrregionais em 2004 e simulação com a atual proposta e sua variação percentual R$ 1,00 Microrregião nº 1ª Fortaleza 1 2ª Caucaia 3ª Maracanaú 4ª Baturité 5ª Canindé 6ª Itapipoca 7ª Aracati Hospital N. Senhora das Graças [F] Recebido em 2004 960.000 574.525 220.148 – 385.475 – 619.0852 – 40,2 – 73,8 7 6 José Pinto do Carmo [F] Santa Isabel (Aracoiaba) [M] 960.000 1.560.000 279.073 210.509 – 680.927 – 1.349.491 – 70,9 – 86,5 São Vicente de Paula [F] 1.560.000 871.662 4 7 8 Municipal Dr. A.B.Herbert [M] São Francisco Canindé [F] 9 10 Municipal de Aracati [M] Santa Luiza de Marilac [F] 14 Casa de Saúde de Russas [F] 1.440.000 382.778 – 1.057.222 – 73,4 720.000 207.623 – 512.377 15ª Crateús 20 São Lucas [M] 1.440.000 Regional de Icó Dep. O.G. Nunes [M] 780.000 16ª Camocim 21 Murilo Aguiar [F] 18ª Iguatú 23 Regional de Iguatú [M] 21ª Juazeiro N 25 São Lucas [M] 17ª Icó 20ª Crato 22 24 960.000 158.179 543.698 275.760 365.904 87.835 – 561.821 – 776.302 – 804.240 – 78,0 – 58,8 – 74,5 – 390.096 – 572.165 – 51,6 – 86,7 388.343 – 811.657 – 67,6 606.965 – 833.035 415.198 – 544.802 – 71,2 – 56,8 – 57,8 540.000 322.983 – 217.017 – 40,2 1.560.000 1.210.144 – 349.856 – 22,4 720.000 135.490 São Francisco [F] 1.140.000 Total 25.716.000 Fonte: Elaboração própria [ F= Filantrópico; M= Municipal] – 44,1 1.440.000 1.200.000 Maternidade. Dr. A. Feitosa Lima [M] – 688.338 – 41,7 – 79,3 – 60,0 Madalena Nunes [M] 19 – 600.209 – 53,7 – 760.903 – 431.825 18 Soc. de Prot.a Mat.e a Infância de Ipú [F] 839.791 – 386.803 199.097 288.175 13ª Tianguá 17 333.197 960.000 720.000 756.000 660.000 14ª Tauá 11 12 13 720.000 São Raimundo [F] Municipal Dr. Deoclecio Lima verde [M] 11ª Sobral – 41,9 960.000 840.000 15 16 10ª Limoeiro N – 402.496 Variação % Maternidade Dr. Paulo Sarasate [F] Municipal Abelardo G. da Rocha [M] 720.000 1.320.000 1.080.000 9ª Russas 557.504 Diferença 2 3 Eudasio Barroso [M] Maternidade Jesus Maria José [F] Regional Dr. P. Neto [M] 8º Quixadá Proposta 395.501 – 384.499 – 49,3 848.556 – 291.444 – 25,6 10.718.638 14.997.362 – 58,3 – 584.510 – 81,2 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 31 SOUSA, Maria Helena Lima et al TABELA 2 – Comparativo entre os recursos recebidos pelos hospitais-pólo macrorregionais em 2004 e simulação com a atual proposta e sua variação percentual R$ 1,00 Hospitais Maternidade Escola Assis Chateaubrian (M-Fortaleza) 2004 3.544.550 960.000 5.131.249 4.171.249 2.400.000 Santa Casa de Misericórdia de Fortaleza (M-Fortaleza) 1.800.000 Hospital São Vicente em Barbalha (M-Cariri) Fonte: Elaboração própria (Nota – M=Macrorregião) Diferença 4.504.550 Instituto Dr. José Frota (Centro) (M-Fortaleza) Santa Casa de Misericórdia de Sobral (M-Sobral) Proposta 960.000 1.560.000 7.680.000 Numa análise preliminar para 6.396.950 3.996.950 Variação % 369,2 166,5 434,5 3.627.239 1.827.239 101,5 22.677.362 14.997.362 195,3 3.017.374 1.457.374 93,4 Uma outra análise realizada avaliar em quanto cada município diz respeito ao preço que cada hos- os hospitais secundários estuda- crorregião de Fortaleza, por exem- contribui para gerar receita para pital recebe por paciente. Na 1ª Mi- seja de um município que não compõe a sua MR. CONSIDERAÇÕES FINAIS A proposta aqui apresentada re- presenta um esforço na direção de uma distribuição mais justa dos recursos do estado do Ceará, dire- cionada ao fortalecimento da atenção secundária e terciária já que os atuais critérios de distribuição de recursos não levam em consi- deração critérios de necessidade, fazendo jus à utilização de favorecimento sem mérito. dos, verifica-se que dos 25 hospi- plo, o valor que o hospital recebe- tal de municípios da Microrregião. que é um município desta MR, se- proposta segundo os critérios essen- pital receberia R$ 1.405,98 do (2002, p.15) para a escolha de um tais, apenas 15 atenderam ao toDez deles ficaram durante todo o ano de 2003 sem atendimento a um ou mais municípios da MR. Levando-se em conta que 2003 foi o ano inaugural desta política, este fato pode ser importante para se levar a cabo um acompanhamento deste comportamento como um dos pontos a serem observados na avaliação de desempenho desta polí- tica – entretanto este item não tem relevância para uma análise de resultados da política. ria por um paciente de Aquiraz, ria R$ 452,14, enquanto que o hosmunicípio de Tamboril – que não é um município desta MR. Esta lógica permeia todos os hospitais, Analisando-se os resultados desta ciais recomendados por CARR-HILL índice, verifica-se que a proposta tem consistência técnica,3 transparên- cia,4 objetividade,5 plausibilidade6 e já que o valor que cada município confiabilidade do cálculo,7 o que pode veis que compõem o Guesswork na formulação deste modelo. Entre- receberia tem a ver com as variá- ajustado. Teme-se que a atual pro- posta possa causar distorções, levando hospitais a priorizarem pacientes de municípios que remu- nere melhor que outro, mesmo que ser considerado como fator positivo tanto, quando se analisa do ponto de vista da ausência de incentivos perversos, ressaltando que “a fórmula não deve criar incentivos financeiros que possam conflitar com a operação As técnicas usadas para desenvolver a fórmula devem ter uma base acadêmica estabelecida, e devem ser baseadas em evidências e usadas de acordo com as práticas apropriadas para as técnicas. 3 Em geral, a formula deve ser fácil de entender, mesmo que os detalhes sejam mais complexos. Técnicas analíticas devem, em geral, ser capazes de realizar avaliações de qualidade objetivas, como as fornecidas por testes de importância estatística. Idealmente, apesar disto ser difícil de quantificar, o resultado do processo deve ser aceito de maneira ampla, ou seja, de modo geral considerado correto. 4 5 A fórmula deve ser objetiva e aplicável de modo consistente a todas as agências. 6 A plausibilidade das relações definidas pela fórmula deve poder ser explicada de forma razoável e sem ambigüidade. 7 A fórmula deve usar dados de qualidade que sejam consistentes entre autoridades administrativas e disponíveis para todas as autoridades. 32 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 Alocação eqüitativa de recursos para a atenção secundária e terciária: uma proposta para o estado do Ceará (Brasil) sensata dos serviços”, verifica-se que Em segundo lugar, propõe-se hospital para se avaliar como fica a todológicos com instâncias decisóri- Sugere-se, ainda, que, paralelo distribuição dos recursos. este item não está contemplado, na uma discussão sobre aspectos me- cebidos por paciente varia entre os as da SESA, como o Conselho Execu- ao teste, a CECONS lance mão do mo- tite e o Conselho Estadual de Saúde. por ANDRADE (2004) e PORTO et al. medida que a média de recursos re- municípios. Este fato pode estimular hospitais-pólo a facilitar o acesso de pacientes de municípios com remu- tivo, a Comissão Intergestora Bipar- Após a etapa de compartilha- neração mais elevada, mesmo que mento do conhecimento deste pro- região, desvirtuando a política de in- ladores da proposta com instânci- não seja um município da sua micror- centivos à descentralização da atenção secundária. Vale salientar que, mesmo uti- lizando sofisticação estatística duto (fórmula) por parte dos formuas técnicas e de decisão do SUS-CE, recomenda-se sua implementação como teste para possibilitar a rea- rados desejáveis por C ARR -H ILL (2002, p.15-16) de “compreensíveis para leigos, durabilidade, viabilidade, clareza da contribuição, fle- xibilidade, Estabilidade e Materialidade” sejam atendidos, desde que bem trabalhados pela equipe responsável por sua implementação. Considera-se esta uma proposta RECOMENDA-SE QUE A SESA LEVE A DISCUSSÃO DA PROPOSTA AQUI APRESENTADA, JUNTAMENTE COM A DE IMPLEMENTAÇÃO DE UM SISTEMA DE APURAÇÃO DE CUSTOS, A ESSES HOSPITAIS-PÓLOS ção secundária pela SESA, carecen- lização de ajustes ao modelo e aná- critérios desejáveis, sobretudo com Considera-se também relevante a do maior aprofundamento sobre os relação à sua viabilidade. RECOMENDAÇÕES A primeira recomendação acerca desta proposta é que ela seja primeiramente discutida com técnicos res- ponsáveis pela política de atenção secundária e terciária da SESA para melhor compreensão do método. paração entre os dois métodos para identificar qual o que melhor se assemelha às ânsias de eqüidade no sistema de saúde cearense preconizado pela SESA. Recomenda-se que a SESA leve a discussão da proposta aqui apreplementação de um sistema de apuração de custos, a esses hospitais-pólos, permitindo alcançar dois objetivos básicos no sistema de saúde cearense: o primeiro diz respeito à eqüidade na distribuição dos recursos, no sentido de que aqueles que mais precisem tenham mais oportunidade de acesso aos serviços secundários de atenção à saúde, aliviando a pressão nos hos- ainda preliminar para ser implemen- tada como política oficial da aten- (2001), possibilitando assim a com- sentada, juntamente com a de im- para a construção do modelo, é possível que os critérios conside- delo de análise fatorial utilizado lise de sua viabilidade. necessidade de um acompanhamen- to efetivo e periódico do comportamento das internações nos hospitais- pólo MR pelos municípios, tentando-se aprofundar este estudo por clínica e/ou procedimento, inclusi- ve seus custos. Além disso, é im- pitais terciários que sofrem com constantes filas e dificuldade de acesso; e, de outro, que se consi- ga avançar na eficiência do sistema de saúde, otimizando recursos que são escassos num estado pobre que tente enfrentar as desigual- dades sociais e de saúde por meio de políticas públicas consistentes, justas e eficientes. Com isso espera-se melhorar o portante também verificar o resul- nível de saúde e contribuir para uma cursos federais recebidos por cada população cearense. tado deste modelo incluindo os re- melhoria na qualidade de vida da Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 33 SOUSA, Maria Helena Lima et al AGRADECIMENTOS A Comissão de Capacitação, Es- tudos e Pesquisas em Economia da Saúde da SESA agradece ao Projeto CEARÁ. Secretaria Estadual de Saúde PORTO, Silvia M. Eqüidade na Dis- Implantação da Microrregião de em Saúde: Uma contribuição para do Ceará (SESA). A Experiência de Saúde de Baturité, 2002. CEARÁ. Secretaria Estadual de Saúde de Cooperação Técnica entre Bra- do Ceará (SESA). O Modelo de Fazer mia da Saúde do Department for za-Ce, 2002. sil e Reino Unido / Projeto EconoInternational Development - DFID, pelo financiamento da pesquisa; aos companheiros da Célula de Análise e Tendências da SESA, pela ajuda na escolha dos indicadores; Saúde no Estado do Ceará. FortaleCOUTTOLENC, Bernard F. & ZUCCHI, Pao- de Economia da Saúde no Ceará, Brasília, 2001, p.17. especial na análise dos resultados. REFERÊNCIAS ANDRADE, Mônica Viegas; NORONHA; K.V. M. S; MORO, S.; MACHADO; E. N. M. & FORTES, F. B. C. T. P. Metodolo- gia de Alocação Eqüitativa de Recursos: Uma Proposta para Minas Gerais. Belo Horizonte, SES, Viva a Vida, 2004, p.15; p.8. CARR-HILL, Roy. Avaliação e Monitoramento de Desigualdades na Saúde. Relatório para Vagem de Estu- dos na Área de Saúde do Grupo Brasileiro.Universidade de York. Mimeo, 2002. CARR-HILL, Roy; HARDMAN, Geoffrey; MARTIN, Stephen; PEACOCK, Stuart; 34 Pública, Área de Concentração Planejamento em Saúde. Rio de Janeiro, Agosto de 1997; p.47. on Small Area Use of Hospital Beds. gualdades em Saúde no Brasil. Uma todo o trajeto da pesquisa e em do Cruz, Escola Nacional de Saúde ITAÚ. São Paulo, 1998. Saúde & Cidadania. IDS/US/BANCO Políticas de Saúde da SESA e uma pelas relevantes contribuições por do apresentada à Fundação Oswal- SHELDON, Smth, PETER. A Formula for NUNES, A.; SANTOS, J. R. S; BARATA, R. das principais indutoras da área o caso brasileiro. Tese de doutora- la. Gestão de Recursos Financeiros. especial à economista Vera Maria Câmara Coelho, coordenadora de tribuição Geográfica dos Recursos Distributing NHS Revenues Based University of York. 1994. B. & VIANNA, S. M. Medindo as desi- SOUSA, M. Helena Lima; ARAÚJO, Ana proposta de monitoramento. IPEA, LIMA, M. Cláudia Nogueira & TELLO, PEREIRA, João. Economia da Saúde. micas, Morbidade e Mortalidade no Glossário de Termos e Conceitos. APES, 4ª Edição, Portugal, 2004, p.24; p.29. . Prestação de Cuidados de M. Matos; MACHADO, Cícera Borges; Juan E. Desigualdades Socioeconô- Ceará (Brasil): Implicações na Política Sanitária. SESA /CECONS, Fortale- za, 2004. TRAVASSOS, C. 1992. Equity in the Use Acordo com as Necessidades? Saú- of Private Hospitals Contracted by Gestão da Saúde. Org. Sérgio F. Pio- the City of Rio de Janeiro, Brazil, in de: Conceito e Contribuição para a la e Sólon M. Vianna. IPEA, Brasília, 2002, p.141;p.162. PORTO, Silvia M. Justiça Social, Eqüidade e Necessidades em Saúde. Economia da Saúde: Conceito e Contri- buição para a Gestão da Saúde. Org. Sérgio F. Piola e Solon M. Vianna. IPEA, Brasília, 3ª Edição. 2002. PORTO, Silvia M.; VIANNA , SOLON V.; UGÁ, M. Alicia; VIANA, C. M.; MAR- TINS, M. & LUCCHESI, P. T. R. Metodolo- gia de Alocação Eqüitativa de Recursos. Mimeo, 2001. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 14-34, janeiro 2007 a Compulsory Insurance Scheme in 1986. Tese de doutorado. The Lon- don School of Economics and Political Science, Londres. 282 pp. ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará1 Preoperative hospital stay and its impact on Ceará state health services costs Maria de Fátima Façanha Elias Reis2 RESUMO Esta pesquisa tem como objetivo geral analisar os custos da permanência hospitalar pré-operatória em cirurgias eletivas, em hospitais públicos terciários de Fortaleza, utilizando os Hospitais Geral de Fortaleza (HGF) e Geral César Cals (HGCC) como fonte de dados. O objetivo específico é aferir a permanência hospitalar pré-operatória em cirurgias eletivas; realizar análise destes custos; discutir repercussões socioeconômicas da permanência estudada e produzir subsídios para uma gestão eficiente de leitos cirúrgicos. O estudo mostra que a eficiência na gestão de serviços de saúde, com normatização de critérios de internamento em cirurgias eletivas, poderiam reduzir a permanência pré-operatória e custos da atenção terciária, disponibilizar leitos/dia em serviços complexos melhorando o acesso e a equidade, produzindo mudanças no perfil cultural de gestores e profissionais de saúde nos hospitais de ensino e pesquisa. PALAVRAS-CHAVE: Permanência Hospitalar; Custos de Serviços de Saúde. ABSTRACT The present work aims to analyze the expenses associated with preoperative hospital stay for programmed surgeries in tertiary public hospitals of Fortaleza city, having the Fortaleza General Hospital (HGF) and the Cesar Cals General Hospital (HGCC) as a reference. The specific objective of the study is to measure the preoperative hospital stay for programmed surgeries; to analyze the associated costs; to discuss the socioeconomic impacts of this stay; and to produce subsidies for an efficient management of inpatient surgical beds. The study shows that a more efficient service management, with the standardization of admittance criteria for programmed surgeries, would reduce the preoperative stay and the costs of tertiary care, offer a larger number of daily beds for complex services, improve access and equity and produce changes in the cultural profile of health care managers and professionals in these teaching and research hospitals. KEYWORDS: Hospital Stay; Health Services Costs. 1 2 Monografia submetida à Universidade Estadual do Ceará, no ano 2003, como parte dos requisitos para obtenção do título de Especialista em Economia da Saúde. Orientador: Prof. Alexandre José Mont’Alverne Silva, MS. Médica formada pela Universidade Federal do Ceará, com especialização em Pediatria e Economia da Saúde. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 35 REIS, Maria de Fátima Façanha Elias INTRODUÇÃO Segundo BURNESTER et al. (2000) “em termos globais de saúde pú- blica, o Brasil investe US$ 280 per capita, o que equivale a 7,8% do seu produto interno bruto, inclu- indo a administração federal, estadual, municipal e ainda os provedores privados”. Os investimentos em saúde em todo o mundo são feitos prioritariamente na área curativa e em especial na assistência hospitalar. Segun- Fortaleza realizou em 2001 e 2002, respectivamente, 60% e 57% dio do Fundo de Ação Social (FAZ), do do Ceará, com médias de 9.360 hospitais privados, apoiados na das internações cirúrgicas do estae 9.392 internações/mês, respecti- vamente. Considerando que a capital cearense possui cerca de um ter- ço da população do estado, percebe-se uma concentração destes pro- cedimentos na cidade, fato também observado em outros grandes municípios do Brasil (CEARÁ, 2001a e 2002a). Esta concentração de pro- do ZANON (2001), “a assistência mé- dica hospitalar consome recursos que variam entre 4 e 14% do Produto Interno Bruto (PIB) de uma nação” (MAGALHÃES, 2001). Estes gastos são crescentes e podem ser atribuídos à: mudança do perfil etário da população, que hoje apresenta maior longevidade; crescente incidência de doenças crô- O SISTEMA PÚBLICO DE SAÚDE FICOU DEPENDENTE DA REDE PRIVADA QUE, POR SUA VEZ, AMPLIAVA A DEMANDA DA ASSISTÊNCIA NUMA TENTATIVA DE AUMENTAR A RECEITA cedimentos em Fortaleza não é só saúde, além de outras causas, ge ações de maior complexidade e ção de riquezas e o empobrecimento populacional (CEARÁ, 2002b). No Ceará, existem 218 hospitais vinculados ao Sistema Único de Saú- de (SUS), totalizando 15.979 leitos cadastrados, sendo 3.068 leitos cirúrgicos, o que corresponde a 19,2% do total dos leitos cadastrados no estado (BRASIL, 2002). 36 tor. O modelo era centrado na assistência hospitalar e esta necessitava de expansão. O sistema público de saúde ficou dependente da rede pri- vada que, por sua vez, ampliava a demanda da assistência numa ten- tativa de aumentar a receita. Bus- cando racionalizar gastos, o sistema passou a apresentar uma retra- rários, que levou supostamente a um equilíbrio da oferta e da deman- da. Esta retração da tabela colaborou para uma progressiva queda do perfil de qualidade da assistência nos hospitais do SUS e, paralelamen- te, a um descadastramento de leitos hospitalares privados e filantrópi- cos. Um bom padrão de qualidade nanciamentos, como é o caso dos leva o paciente a exigir melhor como a globalização, a concentra- crença de maior eficiência deste se- hoje está na dependência de co-fi- nologia, que em saúde incorpora atenção e resultados nas ações de foram financiadas construções de ção progressiva da tabela de hono- nicas degenerativas; avanço da teccustos; exercício da cidadania que Na década de 1970, por intermé- quantitativa, como também abrandecorre da pouca resolubilidade nas cidades de pequeno e médio hospitais públicos gerenciados pela Secretaria da Saúde do Estado do Ceará (SESA), que têm mais de 50% dos seus recursos financiados pelo Tesouro Estadual. Atualmente, em todo o mundo, há portes, da maior estrutura secun- uma tendência à não-hospitalização. tal e de que a grande maioria dos apresenta cada vez mais inviabilida- dária e terciária instalada na capimédicos com especialização reside na região metropolitana, haja vista o fato de que, no Brasil, diferentemente de muitos países, as capitais são as maiores cidades. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 A internação hospitalar tradicional de econômica frente a outras opções de tratamento tão eficazes quanto esta e com custos mais reduzidos, como são os casos da internação em hospital/dia cirúrgico e clínico, in- Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará ternação domiciliar e outros. Pa- Cals; discutir repercussões socioe- latorial está cada vez mais reso- lar pré-operatória; e produzir sub- ralelamente, a assistência ambu- lutiva. Tudo colabora para uma redução do número e da permanência média das internações. A carência de recursos na aten- conômicas da permanência hospita- Geral de Fortaleza (HGF) e Hospital sídios para o uso racional de leitos cerem à Secretaria da Saúde do Es- cirúrgicos no HGF e HGCC, reduzindo a permanência pré-operatória. ção terciária no estado do Ceará exi- METODOLOGIA tos nesta área. A pouca disponibili- Amostra Selecionada ge que sejam realizados investimen- dade de recursos destinados à saúde no estado e municípios impõe que os gestores em saúde pública busquem racionalizar melhor o uso vada. Buscando contribuir neste es- forço, foram estudados os custos de permanência hospitalar pré-operató- ria nos hospitais de atenção terciária Hospital Geral de Fortaleza (HGF) e Hospital Geral César Cals (HGCC). OBJETIVOS tado do Ceará, por serem hospitais de referência terciária; por possuírem custo operacional elevado; com percializado e uma estrutura física, ins- Foram tomados sensitariamente todos os pacientes que realizaram ci- rurgia eletiva no Hospital Geral de talações e equipamentos praticamen- te únicos no estado. Estas unidades são as únicas neste perfil que reali- zam apuração de custos, possibili- tando este tipo de pesquisa. Ambas enfrentam grandes desafios com a A ASSISTÊNCIA AMBULATORIAL ESTÁ CADA VEZ MAIS RESOLUTIVA. TUDO COLABORA PARA UMA REDUÇÃO DO NÚMERO E DA PERMANÊNCIA MÉDIA DAS INTERNAÇÕES enorme demanda para internação de pacientes na emergência e em espe- cialidades cirúrgicas e clínicas ne- cessitando aumentar a oferta, a produtividade e a resolubilidade. Segundo o Plano Diretor de Regi- onalização (PDR), o HGF e o HGCC são unidades hospitalares públicas, de terceiro nível de referência esta- dual ou terciária, com estrutura de alta complexidade, credenciados Geral: Analisar os custos da per- manência hospitalar pré-operatória, Geral César Cals (HGCC) por perten- fil de recursos humanos muito espe- dos recursos já instalados, prática esta já freqüente na iniciativa pri- Foram escolhidos os Hospitais como hospitais de ensino e pesquisa nível II (CEARÁ, 2001b). como parte dos custos inadequados Fortaleza (HGF) e no Hospital Geral estado do Ceará, Brasil. 31 de agosto de 2002. Os pacientes ca médica e especialidades clíni- damento em Mapa Cirúrgico das res- des cirúrgicas, gineco-obstetrícia, em hospitais públicos terciários no Específicos: Examinar a perma- nência hospitalar pré-operatória de pacientes submetidos a cirurgias eletivas nos Hospitais Geral de Fortaleza e Hospital Geral César Cals; proceder à análise dos custos das diárias hospitalares pré-operatórias de pacientes submetidos a cirurgi- as eletivas nos Hospitais Geral de Fortaleza e Hospital Geral César César Cals (HGCC), no período de 01 a foram identificados mediante o agenpectivas unidades, confirmado a realização do procedimento cirúrgico por meio de Relatório do Centro Cirúrgico (Enfermagem) e apresentados ao Sis- tema de Informação Hospitalar (SIH), por Autorização de Internação Hospi- talar (AIH) magnética, nos meses de setembro e outubro de 2002. Realizam internação em clíni- cas, cirurgia geral e especialida- pediatria e ou neonatologia e unidade de terapia intensiva (UTI) adulto e neonatal. Prestam servi- ços ambulatoriais nas diversas especialidades e possuem grande diversificação e resolubilidade em métodos auxiliares de diagnóstico e terapêutica. Estão credenciados Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 37 REIS, Maria de Fátima Façanha Elias e realizam há mais de dois anos o se, micoses superficiais, afecções ar (PAD). Possuem, ambos, servi- clínicas não especificadas etc. Esta Programa de Assistência Domiciliços de urgência e emergência em gineco-obstetrícia e o HGF, urgên- cia e emergência em clínica e cirurgia (CEARÁ, 2001b). O mês de agosto foi o escolhido de vias urinárias, intercorrências permanência foi contabilizada como permanência pré-operatória. Critérios de Exclusão Foram postos à margem deste en- por ser identificado como um mês saio: pacientes com leitos hospitala- res, ausência de feriados e tempo- Centro Cirúrgico e ou Mapas de Ci- de atividades hospitalares regularadas de férias e por não terem sido observadas causas de redução de res não identificados no Relatório do rurgia (pacientes externos); doentes oferta de serviços, como greve de turas de enfermaria, centro cirúr- FORAM INCLUÍDOS gico e apoio diagnóstico. TODOS OS PACIENTES Critérios de Inclusão QUE REALIZARAM Foram incluídos todos os paci- CIRURGIA ELETIVA entes que realizaram cirurgia ele- NO MÊS DE AGOSTO tiva no mês de agosto de 2002, nos DE 2002 citados hospitais, agendados nos Mapas de Cirurgia da Unidade, tadas ao SIH em setembro e outu- cujas internações se deram em decor- na data da cirurgia, ocupando lei- que tenham sido realizados procedi- identificado no Mapa de Cirurgia ou Relatório do Centro Cirúrgico). Foram incluídos nesta pesquisa os pacientes para os quais foram apresentadas AIH clínicas prévias ao ato cirúrgico cujos diagnósticos não justificavam a internação pré-operatória, tais como escabio- 38 tificação dos pacientes dos Mapas de Cirurgia e Relatórios do Centro Cirúrgico (nome) complementado com dados da AIH, colhidos nos Relatórios do SIH apresentados em setembro e outubro de 2002, como idade, sexo e procedência (CEARÁ, 2002a e CEARÁ, 2002c). Os Relatóri- os do SIH foram fornecidos pela Cé- lula do Sistema de Informação HosVigilância Avaliação e Controle (CO- VAC) da Secretaria da Saúde do Esta- do do Ceará (SESA). Dados da internação Os dados da internação (leito e dia da cirurgia) foram colhidos do Mapa Cirúrgico e Relatório do Centro Cirúr- gico. Outros dados da internação (procedimento, especialidade, data da de alta, permanência ou óbito) foram dimento no Relatório do Centro Ci- tos hospitalares (leito hospitalar Foram colhidos os dados de iden- internação, data da alta, condições confirmada a realização do proce- bro de 2002 e que se encontravam, Dados de identificação do paciente pitalar (CESIH) da Coordenadoria de servidores ou reformas nas estru- rúrgico, cujas AIH foram apresen- Coletas de Dados obtidos do Relatório do SIH. rência de doenças clínicas, mesmo Apuração de custos mentos cirúrgicos eletivos, posterio- dois hospitais estudados, foram ao procedimento estudado, na mes- dia de enfermarias exclusivamente res; aqueles com cirurgias anteriores ma internação; os nascidos na unidade com cirurgias na mesma interna- ção do nascimento (recém-nascidos/ RN); pacientes que realizaram cirur- gia de urgência por intermédio das equipes de emergência das unidades. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 Mediante sistemas de custos dos identificados os custos de paciente/ cirúrgicas com especialidades diver- sas no mês de agosto de 2002. Estas enfermarias são centros de cus- tos produtivos para as quais são apurados os custos diretos e indire- tos (energia, água e outros) acresci- Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará dos do rateio dos centros de custos administrativos e auxiliares. Este custo é denominado Custo Operacional Total (Tabela 1). Os custos da permanência hos- TABELA 1 – Características das enfermarias cirúrgicas cujos custos foram estudados. Agosto 2002 Características Sexo pitalar pré-operatória, apurados Faixa Etária vante denominados Custo Operaci- Especialidades em moeda corrente (Real), doraonal Específico, correspondem aos N.º Leitos custos operacionais totais, excluindo-se os de medicamentos, materi- trans e pós-operatório. gia diferente no cálculo dos custos. O HGF emprega o programa Excel Microsoft, tendo sido elaborada uma grande planilha com 142 centros de custos. O HGCC usa metodologia e programa informatizado desenvolvido no próprio hospital, em Axes, com 86 centros de custos. Em ambos não são considerados os investimentos em estrutura física e equipamentos, nem suas depreciações. Os dados deste estudo foram ta- bulados utilizando planilha do Excel Microsoft. RESULTADOS Representatividade da Amostra Estudada O HGF apresentou média mensal de 990 internamentos no ano de 2002, Cir. Geral 27 Cir.Proctol 5 Cir.Vascular N.º Internação 4 6 11 Urologia 10 4 Mastologia 107 1.024 Média de Permanência 9,48 8,53 80% 119.804,03 Fonte: HGF e HGCC. * HGCC – Bloco 100 B: especialidades diversas, exceto ginecologia. e outubro do mesmo ano, foram realizados 452 procedimentos cirúrgicos, sendo 412 eletivos. 69 640 85% 94% 97.422,55 202.729,31 9,27 Características das Diárias Hospitalares da Amostra Estudada No HGF foi observada média de O HGCC apresentou uma média permanência hospitalar de 6,99 ano de 2002, das quais 209 foram ria de 2,80 dias (40%) do total e pós- mensal de internações de 1.109 no internações com procedimentos ci- rúrgicos. Em agosto de 2002, foram realizados 248 procedimentos cirúr- gicos, sendo que 182 foram eletivos. Após utilizados os critérios de exclusão, foram analisadas 214 in- cirúrgicos. No mês de agosto de 2002, totalizando 360 pacientes de cirur- com AIHs apresentadas em setembro 120 1.015 analisados por meio do SIH, com média mensal de 375 internamentos 2 N.º Paciente/dia Custo Total R$ 22 6 Neurocir Tx. Ocupação Fem. 5 Otorrino Cada hospital utiliza metodolo- Adulto 39 Ginecologia mente se concentram no período Adulto 41 Cir. Plást. rapia, uma vez que estes habitual- HGCC Bloco 100 B Mas/Fem. Adulto Total * Ala D Mas/Fem. Cab/Pescoç ais médicos hospitalares e gasote- HGF Ala A ternações no HGF e 146 no HGCC, gias estudados. dias, com permanência pré-operató- operatória de 3,18 dias (46%), sen- do 14% o dia do procedimento, permanência trans-operatória (Figuras 1 e 2). No HGCC a média de permanência hospitalar foi de 7,27 dias sendo de permanência pré-operató- ria 3,41 dias (47%) e permanência pós-operatória de 2,86 dias (39%) (Tabela 2). Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 39 REIS, Maria de Fátima Façanha Elias FIGURA 1 – Percentual de diárias hospitalares, segundo o dia da cirurgia HGF. Agosto 2002 representou, durante o mês de agos- to de 2002, 498 diárias hospitalares que, anualizadas, representariam 5.976 diárias hospitalares. Estes resultados totalizariam no ano 13.176 diárias hospitalares pré-ope- ratórias em hospitais terciários no estado do Ceará. A média de permanência hospita- lar dos pacientes cirúrgicos apresen- tados ao SIH em 2002 foi de 6,91 no Fonte: CESIH-COVAC e HGF. HGF, e 6,01 no HGCC, enquanto que FIGURA 2 – Percentual de diárias hospitalares, segundo o dia da cirurgia HGCC. Agosto 2002 a média de permanência do total das internações no mesmo período foi de 8,3 dias no HGF e 6,3 dias no HGCC. Custo das Diárias Pré-Operatórias No HGF foram analisados os cus- tos operacionais da ala A, composta de 41 leitos, sendo 27 de cirurgia geral, cinco de cirurgia vascular, cinco de cirurgia proctológica e quatro de cirurgia de cabeça e pescoço; e da ala B, composta de 39 leitos, Fonte: CESIH-COVAC e HGF. TABELA 2 – Diárias Hospitalares com referência ao dia da cirurgia. Agosto 2002 Permanência Diárias Qtde Trans-Operatória 214 Pré-operatórias Pós-operatória Total 600 HGF Média Perm. Qtde 1,00 146 681 1495 Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados. 2,80 3,18 6,99 No HGF, a média de permanência HGCC 498 418 1062 Média Perm. Total Qtde 2,86 1099 O total de pacientes analisados nas 1,00 7,27 360 xos masculino e feminino (Tabela 2). 2557 duas alas foi de 194, com 2.039 A permanência pré-operatória no talares que, anualizadas, significa- 40 agosto de 2002, 600 diárias hospi- ria 7.200 diárias hospitalares. A permanência pré-operatória no HGCC Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 de urologia e dois de mastologia, com leitos distribuídos entre os se- ratório, enquanto que no HGCC a ria é maior do que a pós-operatória. quatro de otorrinolaringologia, dez 1098 HGF totalizou, durante o mês de média de permanência pré-operató- de ginecologia, 11 de neurocirurgia, 3,41 pré-operatória é pouco menor do que a média de permanência do pós-ope- sendo seis de cirurgia plástica, seis pacientes/dia e taxa de ocupação de 80% na ala A e 85% na ala B. As taxas de ocupação de leitos aproximam-se do preconizado pela Orga- nização Mundial de Saúde (OMS), que é de 80%. Conforme metodologia já descri- ta, o custo operacional específico da Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará diária pré-operatória foi definido tória de R$ 63.921,50 (Tabela 5). cluídos os custos de material médi- período um custo operacional es- como o custo operacional total, exco-hospitalar, que são os materiais de consumo operatório (fios de su- tura, sondas, gazes, compressas, filmes RX e outros), medicamentos (anestésicos, analgésicos, antibióti- cos, soros e outros) e gasoterapia, por serem estes utilizados majorita- Enquanto o HGCC teve no mesmo Diárias Pré-Operatórias segundo o Sexo e Equivalência em Leitos pecífico de permanência pré-opera- ternamento hospitalar varia com o tória de R$ 151.723,15. Especificação cional total encontrado foi de R$ Custo Operacional Total 119.804,03, enquanto o custo operacional específico somou R$ 113.478,10. Na ala B, o custo ope- racional total foi de R$ 97.422,55, ao passo que o especifico totalizou R$ 94.409,52. O custo operacional total do paciente/dia foi de R$ 118,03, na ala A, e de R$ 95,14, na ala B, com um custo operacional específico do paciente dia de R$ 111,86 e R$ 92,20, respectivamen- te. Nas duas enfermarias do HGF, o custo operacional total do paciente/dia foi de R$ 106,54 e o específico de R$ 101,96 (Tabela 3). No HGCC, bloco 100 B, o custo Custos Ala A Ala D Total 119.804,03 97.422,55 217.226,58 6.325,93 3.013,03 9.338,96 113.478,10 94.409,52 207.887,62 41 39 80 Leito/dia 1.271 1.209 2.480 Internação 107 120 227 Paciente/Dia 1.015 1.024 2.039 Custo Operacional Total por Paciente/dia 118,03 95,14 106,54 Custo Operacional Específico por Paciente/dia 111,80 92,20 101,96 Mat.Med.Hosp + Medicamentos + Gasoterapias Custo Operacional Específico Leito Fonte: HGF / Sistema de Custo Gerencial. * Ala A (41 leitos) e Ala D (39 leitos). TABELA 4 – Demonstrativos de custos operacionais em reais em enfermaria cirúrgica* do HGCC. Agosto 2002 operacional total foi de R$ 202.729,31 Especificação um custo operacional total do paci- Mat.Med.Hosp + Medicamentos + Gasoterapias e o específico de R$ 194.985,57, com ente/dia de R$ 316,76 e custo opera- cional específico do paciente/dia de R$ 304,66 (Tabela 4). Surpreendentemen- te, os custos do HGCC são três vezes maiores do que os do HGF. No mês de agosto de 2002, o HGF teve um custo operacional específico de permanência pré-opera- sexo. A ocupação dos leitos com TABELA 3 – Demonstrativos de custos operacionais em R$ em enfermarias cirúrgicas* do HGF. Agosto 2002 riamente no trans e pós-operatório. Na ala A, do HGF o custo opera- A necessidade de leitos para in- Custos Custo Operacional Total 202.729,31 Custo Operacional Específico 194.985,57 Leito 7.743,70 22 Leito/dia 682 Paciente/Dia 640 Internação Custo Op.Total por Paciente/dia 316,76 Cust Op.Espec por Paciente/dia 304,66 Fonte: HGCC / Sistema de Custo Gerencial. * Enfermaria 100 B (Clínica cirúrgica feminina). Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 41 REIS, Maria de Fátima Façanha Elias diárias pré-operatórias, distribuídos segundo o sexo, no mês de agosto de 2002, é, no HGF, de 314 leitos/ TABELA 5 – Pacientes analisados e custos em reais da permanência pré-operatória nos Hospitais HGF e HGCC. Agosto 2002 Especificação dia femininos e 286 leitos/dia mas- Diárias Pré-operatórias culinos, o que equivale a dez leitos lizando 19 leitos, correspondentes a No HGCC, foram utilizados 349 leitos/dia femininos e 149 leitos/dia masculinos equivalendo a 11 leitos femininos e cinco masculinos, totalizando 16 leitos, que correspondem a 73% do Bloco 100 B. Diárias Pré-Operatórias segundo Faixa Etária Analisando a Tabela 7 observa- se uma menor taxa de permanência pré-operatória na faixa etária abaixo de 15 anos e acima de 80 anos, o que não reduz os custos sociais des- 498 1.098 316,76 - 63.921,50 157.748,74 221.670,25 Custo da permanência pré-operatória Específica R$ 61.173,40 151.723,15 212.896,55 101,96 Fonte: HGF e HGCC / Sistema de Custo Gerencial. 304,66 - TABELA 6 – Pacientes analisados, diárias hospitalares e equivalência em leitos segundo o sexo. Agosto 2002 SEXO Qtde Diárias Pré-oper Feminino 94 Masculino Total HGF Leitos Diárias Hosp. Leitos 314 10 678 120 286 9 214 600 19 HGCC Qtde Diárias pré-oper Leitos Diárias Hosp. Leitos 22 112 349 11 756 24 817 26 34 149 5 306 10 1495 48 146 498 16 1062 34 Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados TABELA 7 – Pacientes analisados e diárias hospitalares, segundo faixa etária. Agosto 2002 HGF Diárias pré- Diárias oper A Hosp. B Faixa Etária Qtde te. Portanto, além de retirar uma 0-4 16 19 criança da escola ou um idoso de seu ambiente, subtrai um adulto 5-9 17 acompanhante das atividades labo- 10- 14 ta permanência pré-operatória, haja 106,54 Total Custo da permanência pré-operatória Total R$ Custo Op. Espec. por Paciente/dia R$ 24% dos leitos das Alas A e D do HGF HGCC 600 Custo Op.Total por Paciente/dia R$ femininos e nove masculinos, tota- juntas (Tabela 6). HGF HGCC Diárias pré- Diárias per. A' Hosp. B % A/B Qtde 68 28% – – – – 8 61 13% – – – – 8 10 42 24% – – – – 15- 19 14 58 145 40% 5 30 48 63% 20- 29 23 45 105 43% 15 50 96 52% 30- 39 38 91 229 40% 40 93 222 42% 40- 49 37 132 307 43% 29 100 196 51% Dos 214 pacientes analisados 50- 59 17 58 144 40% 24 111 227 49% no HGF no mês de agosto de 2002, 60- 69 19 86 165 52% 20 62 123 50% que ocasionaram 600 diárias hospitalares pré-operatórias, 82% pro- 70- 79 20 61 143 43% 11 43 126 34% cediam da capital do estado, 4% de 80 + 5 32 86 37% 2 9 24 38% Total 214 600 1495 40% 146 498 1062 47% vista a necessidade de acompanhan- rais, sociais e da presença no lar. Diárias Pré-Operatórias segundo Procedência outras cidades da região metropo- 42 Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 % A'/B' Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará litana de Fortaleza e 14% de muni- talar pré-operatória de 2,36 dias, de um internamento (AIH), avalia a entes provenientes de outros mu- que tiveram média de permanên- dimento. Foi analisado para avaliar cípios de outras regiões. Os pacinicípios não metropolitanos tiveram média de permanência hospi- menor do que os 82% de Fortaleza, cia hospitalar pré-operatória de 3,04 dias (Tabela 8). HGF Município Qtde Média perm. % óbito em três (0,8%) e permanência Qtde Diárias pré-oper. Média perm. % Região Fortaleza 161 489 3,04 82% 125 437 3,50 88% Metropolitana Outros 17 26 1,53 4% 10 31 3,10 6% Não Metropolitanos 36 85 2,36 14% 11 30 2,73 6% Total 214 600 2,80 100% 146 498 3,41 100% Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados. Dos 146 pacientes do HGCC, 88% apenas dois pacientes, não podendo outros municípios da região metro- No HGCC, o perfil é semelhante, eram procedentes de Fortaleza, 6% de ser analisada (Tabela 9). politana da capital e 6% de outras regiões. Da mesma maneira que no HGF, exceto na urologia, que tem média os não metropolitanos tiveram média cirurgia ginecológica, que foi me- os pacientes provindos de municípide permanência hospitalar pré-opera- tória de 2,76 dias, menor do que os oriundos de Fortaleza, que tiveram média de permanência hospitalar préoperatória de 3,5 dias. Portanto, o tempo de permanência hospitalar pré-ope- ratória não guarda relação direta com distância domiciliar. Diárias Pré-Operatórias segundo Especialidade No HGF as maiores médias de permanência pré-operatórias ocor- rem nas especialidades de neuroci- rurgia, cirurgia de glândulas, e do aparelho digestivo e ginecológico. A oftalmologia teve um universo de lar pré-operatória teria relação com Nos pacientes analisados, ocorreu HGCC Diárias pré-oper. se o tempo de permanência hospita- a gravidade do estado do paciente. TABELA 8 – Pacientes analisados e diárias pré-operatória, segundo a procedência. Agosto 2002 Procedência alta, óbito ou mudanças de proce- de permanência pré-operatória 2,6 vezes maior do que no HGF, e em nos da metade deste. O grupo de pacientes submetidos a cirurgias do aparelho digestivo é quantitativamente o maior, representando 34 e 35% dos pacientes ana- lisados no HGF e HGCC, respectivamente, e 47 e 48% das diárias pré- operatórias estudadas. Neste grupo de pacientes, a média de permanên- cia pré-operatória é metade da permanência hospitalar. Diárias pré-operatórias segundo Motivo de Cobrança ‘Motivo de cobrança’, expressão utilizada pelo SIH para conclusão hospitalar pós-operatória mais longa por morbidade em oito (2,2%) (Ta- bela 10). São índices esperados para cirurgias eletivas, demonstrando não haver na amostra gravidade significativa nos pacientes estudados. DISCUSSÃO Foram analisados 214 pacientes no HGF e 146 no HGCC, submetidos a procedimentos cirúrgicos eletivos no mês de agosto de 2002. Estes pacien- tes ocuparam 2.557 leitos/dia nas duas unidades – 1.495 no HGF, e 1.062 no HGCC. Eles apresentaram grande e injustificada permanência pré-opera- tória de 600 leitos/dia no HGF e 498 leitos/dia no HGCC, correspondendo a 40% e 47% da permanência total, res- pectivamente, equivalente à ocupação de 35 leitos em hospitais terciários, que, se usados em cirurgia com a mesma permanência trans e pós-ope- ratória do estudo, possibilitariam mais 143 cirurgias/mês no HGF e 129 no HGCC (Tabela 11). Os leitos supracitados, se utili- zados para cirurgia em regime de hospital/dia, seria possível, em um mês de 22 dias úteis, pelo menos, 418 procedimentos cirúrgicos no HGF e 352 no HGCC. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 43 REIS, Maria de Fátima Façanha Elias TABELA 9 – Pacientes analisados e diárias hospitalares, segundo especialidade cirúrgica. Agosto 2002 Especialidade HGF Cirúrgica Perm. pré-operatória HGCC Perm. Hospitalar Cirurgia do Qtd Diár. A Méd Perm Diár. B Ap.Urinário 43 79 1,84 319 7,42 Ap. Cardiovascular 6 3 0,50 14 Ap.Digestivo 74 288 4,20 Ap.Ginecológico 10 33 Oftalmológica 2 Otorrino % A/B Perm pré-operatória Perm. Hospitalar % A’/B’ Média Qtd Diár. A’ Média Perm Diár. B’ 25% 12 57 4,75 125 10,42 46% 2,33 21% 6 13 2,17 27 4,50 48% 577 8,17 50% 52 228 4,38 446 8,58 51% 4,80 78 9,3 42% 58 130 2,24 318 5,48 41% 15 7,50 6 3 250% 1 0 0,00 3 3,00 0% 33 28 0,85 110 3,33 25% 0 0 – 0 – – Pele e anexos 17 25 1,48 80 4,71 31% 8 27 3,38 47 5,88 57% Ortopédia 17 48 2,82 148 8,71 32% 0 0 – 0 – – Neurocirurgia 4 36 12,33 92 25 39% 2 15 7,50 24 12,00 63% Glândulas 5 43 8,60 62 12,4 69% 1 8 8,00 13 13,00 62% Tórax e Mana 1 1 1,00 3 3 33% 6 20 3,33 59 9,83 34% Maxilobucofacial 2 1 0,50 6 3 17% 0 0 – 0 – – 214 600 3,86 1495 6,98 40% 146 498 3,41 1062 7,27 47% Total Média Perm Perm. Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados. TABELA 10 – Pacientes analisados e diárias hospitalares, segundo motivo de cobrança. Agosto 2002 MOTIVO DE COBRANÇA Especificação Alta Melhorado ou Curado Permanência Por Intercorrência ou Cirurgia de emergência Óbito Total <>48 hs - C/ ou S/ Necropsia Fonte: CESIH-COVAC e Hospitais estudados. 44 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 HGF Qtde % 207 97% 7 0 214 Perm. PréOper HGCC % Qtde % 578 96% 142 97% 3% 2 4% 1 0% 0 0% 3 100% 600 100% 146 Perm. PréOper % 479 96% 1% 2 0% 2% 17 3% 100% 498 100% Permanência hospitalar pré-operatória e sua repercussão nos custos dos serviços de saúde no Ceará TABELA 11 – Pacientes analisados e repercussão dos resultados tiveram uma permanência pré-operatória menor nas duas unidades. Resultados Especificação HGF HGCC Total Pacientes analisados 214 146 360 Diárias hospitalares pré-operatórias -agosto/02 600 498 1098 7.200 5.976 13173 19 16 35 61.173,40 151.723,15 212.896,55 143 129 272 1.716 1.548 3.264 418 352 770 5.016 4.224 9.240 Anualizadas Equivalência em Leitos Custo Operacional Específico da Permanência Préoperatória R$ - agosto/02 Possibilidades de cirurgias eletivas/mês Anualizadas Possibilidades de cirurgias hospital/dia Anualizadas Fonte: HGF / Sistema de Custo Gerencial Examinada a necessidade da de- Após análise dos dados estuda- manda, estes leitos poderiam ter dos segundo sexo, idade, procedên- ca médica, obstetrícia ou assistên- foram encontradas justificativas outras destinações, como em clíni- cia semi-intensiva. Projetando-se os dados encontrados para 12 meses, ficaram indisponíveis 13.173 leitos/ dia nestas unidades. Possivelmente, esta realidade é semelhante em ou- tras unidades terciárias do estado do Ceará, como o Hospital Infantil Albert Sabin, o Hospital de Messeja- na, o Hospital Universitário Walter Cantídio e o Instituto Dr. José Frota. Foi encontrado, para esta perma- nência pré-operatória, um custo de R$ 61.173,40 no HGF e R$ 151.723,15 no HGCC, totalizando R$ 212.896,55. Estes custos recaem sobre a Secretária de Saúde do Es- tado, instituição à qual estas unidades estão vinculadas. cia e especialidade cirúrgica, não para uma permanência hospitalar pré-operatória de 2,8 dias no HGF e 3,41 no HGCC, quando os mesmos pacientes tiveram uma média de permanência hospitalar pós-opera- tória de 3,18 dias no HGF e 2,86 no HGCC. A grande maioria dos pacientes analisados no HGF teve proce- dência da região metropolitana de Fortaleza (86%); o mesmo aconteceu com 94% dos pacientes analisados no HGCC, não tendo sido portanto, confirmada a hipótese de que uma Algumas especialidades, como ci- rurgia do aparelho digestivo, de glândulas e neurocirurgia, foram as que mais contribuíram nesta longa permanência pré-operatória, provavelmen- te por suspensão ou adiamento das cirurgias em virtude de problemas, como a não-disponibilidade de leitos de UTI, avaliações pré-operatórias inadequadas ou desatualizadas, assim como grande período de tempo entre a emissão das guias de internamento e as admissões hospitalares. Além dos custos mencionados, deve-se enfatizar o custo-oportuni- dade, uma vez que ficaram indisponíveis 1.098 leitos/dia em agosto/ 2002, mês estudado que, anualizados, correspondem a 13.173 leitos/ dia. Estes, se disponibilizados, reduziriam em muito a demanda reprimida referenciada para estas uni- dades. Considerando que o mês analisado foi de produtividade cirúrgi- ca maior do que a média anual nas duas unidades em estudo (ausência de feriados, greves ou reformas) e, portanto, com possibilidades de média de permanência pré-operatória menor, os dados ora apresenta- dos podem ser maiores e, portanto, com maior repercussão negativa. Outros fatores advindos deste fato permanência pré-operatória maior costumam comprometer os resulta- nientes do restante do estado. Os cirúrgicos como o aumento do ris- poderia advir dos pacientes prove- dados apontam o oposto, os pacientes de regiões não metropolitanas dos esperados dos procedimentos co de infecção hospitalar e o estres- se a que são submetidos os pacien- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 35-47, janeiro 2007 45 tes em regime de hospitalização. estado do Ceará são subutilizados, hospitalar, a Central de Regulação com repercussões negativas graves ratória não justificada, gerando cus- É necessário e urgente que seja Ambos são fatores bem estudados e e bem definidas. Tão importantes ou mais graves do que os custos analisados são os custos psicológicos e sociais, pois a ansiedade da espera em um internamento com permanência pouco definida dá origem à angústia e imobiliza o paciente que planeja a sua vida para o pós-cirúrgico. A permanência pré-operatória longa faz au- mentar o absenteísmo escolar na faixa etária estudantil, bem como o absenteísmo do trabalho, causando redução da produção e aumento do risco de desemprego, tanto para o paciente como para o acompanhan- te, no caso de crianças e idosos. Esta prática impõe também a ausência dos chefes de família, pacientes e acompanhantes, dos seus lares oca- sionando desagregação familiar com todas as suas repercussões. Sendo esses hospitais unidades de ensino e pesquisa, perpetua-se nos novos profissionais de saúde em formação a cultura do longo devido à longa permanência pré-ope- tos desnecessários ao Sistema de procedida uma reavaliação dos sis- estas distorções sejam corrigidas, unidades estudadas, sendo neces- Saúde e à sociedade. Sugere-se que inicialmente, com medidas gerenci- ais, adotando-se ações operacionais efetivas, e, no médio prazo, com mudanças na postura e na cultura dos profissionais de saúde. RECOMENDAÇÕES É fundamental que novos estu- dos como este sejam incrementados na busca de um melhor entendimen- to dos fatores que levam a esta permanência hospitalar pré-operatória elevada, para que, a partir destes, possam ser implementadas ações gerenciais e operacionais com as conseqüentes mudanças de postu- ra, não só dos gestores e líderes, como também de todos os profissionais de saúde envolvidos, responsáveis neste processo. bulatorial na unidade, com amplia- tionamento, além de reduzir o nú- as mudanças de prática no ato da mero e a diversificação de casos clínicos em razão da menor rotati- vidade do leito, prejudicando o aprendizado e a pesquisa. CONCLUSÃO Foi demonstrado que os leitos cirúrgicos em hospitais terciários no temas de apuração de custos nas sário também um esforço para im- plantação, nas outras unidades de saúde pública, para que se possam comparar dados entre estas instituições e minorar os dispêndios desnecessários nos hospitais do estado do Ceará. As conclusões desta monogra- fia, após sua apresentação e juízo crítico por parte da Coordenação do Curso de Especialização em Economia da Saúde, serão disponibilizadas aos gestores da Secre- taria da Saúde, HGF e HGCC para que, caso considerem convenien- te, sirvam de base para se discutir a racionalização e a redução dos custos do internamento pré-operatório nestas unidades. REFERÊNCIAS O incremento da assistência am- tempo de permanência hospitalar no serviço público, sem o devido ques- do Estado e a Atenção Primária. ção da oferta e da resolubilidade, BRASIL. Ministério da Saúde. Rela- internação e na dinâmica do agen- lares. Disponível em: <http:// www. damento cirúrgico eletivo, a integração intersetorial dentro das unidades e a definição e emprego de pro- tocolos clínicos poderão reduzir em muito a permanência pré-operatória nestas unidades. Estes problemas também serão reduzidos com uma maior integração entre a unidade tório de hospitais e leitos hospita- datasus.gov.br>. Acesso em: 02 set. 2002. BURNESTER, H. et al. Indicadores PROAHSA 2000. São Paulo: FGV 2000. CEARÁ. Secretaria da Saúde do Esta- do. Relatório de procedimentos mais frequentes – SIH. Fortaleza, 2001a. CEARÁ. Secretaria da Saúde do Estado. Plano diretor de regionalização. Fortaleza, 2001b. CEARÁ. Secretaria da Saúde do Esta- do. Relatório de procedimentos mais frequentes – SIH (Jan. à mai.). For- taleza, 2002a. CEARÁ. Secretaria da Saúde do Estado. Relatório de pacientes – SIH (apresentação set.). Fortaleza, 2002b. CEARÁ. Secretaria da Saúde do Estado. Relatório de pacientes – SIH (apresentação out.). Fortaleza, 2002c. MAGALHÃES, M. G., Qualidade hospi- talar: instrumento de avaliação. For- taleza : Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, 2001. ZANON, U. Qualidade da assistência médico-hospitalar: conceito, avaliação e discussão dos indicadores de qualidade. São Paulo: Medsi, 2001. CAETANO, Rosângela et al ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil1 Cost-effectiveness of uterine cervical neoplasms screening in Brazil Rosângela Caetano2, Cid Manso de Mello Vianna3, Luiz Cláudio Santos Thuler4 & Vania Reis Girianelli5 RESUMO O objetivo do estudo foi estimar a custo-efetividade do Teste de Papanicolaou versus as novas tecnologias de rastreamento do câncer cérvico-uterino. Foi utilizado um modelo analítico de decisão tendo como unidade de desfecho os casos detectados de câncer ou lesões precursoras de alta malignidade. A perspectiva adotada no estudo foi a do sistema de saúde, utilizando os valores propostos pela tabela da AMB, 2004. O teste de Papanicolaou revelou-se a opção mais custo-efetiva, com um custo por caso detectado de R$ 14.586,86, seguida do teste para HPV (R$ 47.805,30). As estimativas dos preços para o SUS foram: captura híbrida para HPV, R$ 19,12; associação do exame de Papanicolaou com teste para HPV, R$ 11,82; citologia em meio líquido, R$ 8,22. PALAVRAS-CHAVE: Diagnóstico Precoce; Câncer do Colo do Útero; Custo-efetividade; Teste de Papanicolaou; Papilomavirus humano. ABSTRACT Cost-effectiveness study that compares the Papanicolaou test to new screening technologies for uterine cervical neoplasms. The decision-analytical model had as outcomes the detected cases of uterine cervical neoplasms or high-malignant precursor lesions. The study adopted the health system perspective, using values proposed by the Brazilian Medical Association (AMB) chart, 2004. The Papanicolaou smear was the most cost-effective option, with a cost per detected case of US$ 6,770, followed by the Papillomavirus (HPV) testing (US$ 22,190). The estimated prices for the Brazilian Public Health System (SUS) were: Hybrid Capture II HPV test collected by health professional, US$ 8.85; association of the Papanicolaou smear and the Hybrid Capture II HPV test, US$ 5.50; and liquid-based cytology, US$ 3.80. KEYWORDS: Early Diagnosis; Uterine Cervical Neoplasms; Cost-Effectiveness; Papanicolaou Smear; Human Papillomavirus. 1 2 3 4 5 48 Esta pesquisa foi subvencionada pela Fundação Ary Frauzino de Pesquisa e Controle do Câncer/INCa e pela Digene do Brasil. Doutora em Saúde Coletiva; professora do Instituto de Medicina Social, Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). E-mail: [email protected] Doutor em Economia; professor do Instituto de Medicina Social, Uerj. E-mail: [email protected] Doutor em Medicina; médico-epidemiologista do Instituto Nacional do Câncer (Inca). E-mail: [email protected] Doutoranda em Epidemiologia, pesquisadora do Inca. E-mail: [email protected] Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil INTRODUÇÃO O carcinoma de colo uterino é uma das neoplasias mais comuns em mulheres em todo o mundo. No Brasil, é a quarta causa de morte por câncer em mulheres, sendo o tipo mais comum em algumas áreas menos desenvolvidas do país. Sua ocorrência se concentra principal- mente em mulheres acima dos 35 anos de idade. De acordo com da- dos do Instituto Nacional de Câncer, a taxa de mortalidade por essa neo- incidência e mortalidade, observa- panicolaou variou entre 74% e 93%, maioria dos países desenvolvidos, realizado pelo Sistema Único de Saú- das desde o início dos anos 1960 na tem sido atribuída à prática de rastreamento periódico com este teste. Ainda que seja um exame rápido, de baixo custo e efetivo para detecção precoce, sua técnica de realiza- ção é vulnerável a erros de coleta e de preparação da lâmina e a subje- passando de 3,44 casos/100.000 mulheres nesse ano, para 4,45/ 100.000 em 1998 (aumento de 23% em dez anos). Para 2005, as estimativas de incidência são de 20.690 novos casos, com um risco estimado de 22 casos a cada 100 mil mulheres (BRASIL/INCA, 2004) . lheres regularmente examinadas COLO UTERINO OCORREM EM MULHERES REGULARMENTE EXAMINADAS foram perdidas devido à sensibilidade sub-ótima do teste de Papani- colaou. Isso tem motivado o desenvas técnicas, com o objetivo de su- especificidade do exame, com uma 99%) e 68% (variação de 14% a 97%), respectivamente (FAHEY et al., 1995). nal das ações de do rastreamento Grande proporção das reduções na (pelo menos a cada três anos) e que volvimento de um conjunto de no- dio III ou IV (BRASIL/INCA, 2003a). medidas relativamente simples. tardo no diagnóstico pode se acom- res de colo uterino ocorrem em mu- CÂNCERES DE Adicionalmente, em nosso meio, incipiente, quando é curável com deixam de ser detectadas (isto é, tes- estimam que cerca de ¼ dos cânce- cientes com câncer de colo uterino de detectá-lo em fase pré-maligna ou Quando displasias, lesões pré- agressivo. HUTCHINSON et al. (2000) CERCA DE ¼ DOS média de 58% (variação de 11% a O teste de Papanicolaou é capaz das no Brasil (BRASIL/INCA, 2003a). necessidade de tratamento mais tardio e em fases avançadas. Segun- tem um diagnóstico inicial em está- altas taxas de incidência observa- panhar de progressão da doença e nas estimativas de sensibilidade e leiros, em média, a metade das pa- taxas de mortalidade, bem como as tes falso-negativos), o resultante re- tico, estando sua mortalidade forte- do os Registros Hospitalares brasi- nóstico tardio e a manutenção das apresentado grande variabilidade tados. Diante disso, os estudos têm uterino depende muito da extensão mente associadas ao diagnóstico total, o que em parte explica o diag- malignas ou malignas da cérvix O prognóstico no câncer de colo da doença no momento do diagnós- de (SUS) variou entre 33% e 64% do tividade na interpretação dos resul- plasia tem apresentado um contínuo e sustentado aumento desde 1979, o percentual destes exames que foi existe uma baixa cobertura nacio- perar os potenciais problemas men- cionados e, conseqüentemente, me- lhorar a acurácia do exame citopatológico. Entre estas novas tecno- logias, destacam-se a citologia em meio líquido e os testes para detec- ção do papilomavirus (HPV) por captura híbrida. A citologia em meio líquido é um desta neoplasia: embora o Inquéri- método em que as células cervicais tério da Saúde tenha mostrado que, vante antes da fixação da lâmina, to Domiciliar realizado pelo Minis- para as 16 localidades analisadas, a cobertura estimada do exame Pa- são imersas em um líquido conser- evitando-se o ressecamento do ma- terial, reduzindo-se a quantidade de Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 49 CAETANO, Rosângela et al artefatos e produzindo uma menor determinado ou em mulheres de Decisões acerca da cobertura e uso melhor qualidade dos resultados intra-epitelial escamosa de baixo muito auxiliadas por estudos vol- taxa de exames insatisfatórios. Essa teria como conseqüência uma sen- sibilidade potencialmente maior que a do teste de Papanicolaou, possibilitando ainda que o material residual possa ser utilizado para o diagnóstico, por meio de métodos biomoleculares, de infecções sexual- mente transmissíveis como clamí- dia, gonococcia e também para o HPV (SHERMAN et al., 1997; BOLICK & HELLMAN, 1998; ALVES et al., 2004). mais de 35 anos com neoplasia grau. O teste de captura de híbri- dos (CH II) identifica 13 tipos de vírus considerados de alto risco oncogênico (subtipos 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59 e rior à do exame citopatológico convencional na identificação do cân- NA ATUALIDADE, APENAS O TESTE DE PAPANICOLAOU FAZ rus, com o agente sendo identificado em até 99,7% dos espécimes de PARTE DO ROL câncer cervical (MUNOZ, 2000). A in- DE PROCEDIMENTOS fecção por este agente apresenta COBERTOS PELO SUS uma prevalência em torno de 20 a 40% entre as mulheres jovens, estan- do a carcinogênese associada ao tipo cer do colo do útero ou suas le- à carga viral (SANTOS et al., 2003; 2003; MSCA, 2003). Além disso, o sões precursoras (F LORES et al., MYERS et al., 2000). teste CH II também oferece a pos- detecção do HPV têm sido propos- ternativa que permite aumentar a cérvico-uterino e de suas lesões precursoras, na triagem mais ime- diata de pacientes com células es- camosas atípicas de significado in- 50 tividade comparativa das seguintes detecção precoce do câncer de colo uterino: a) citologia convencional/ Teste de Papanicolaou; b) citologia com coleta por profissional de saúde; d) teste de CH-HPV, com autoco- leta; e) combinação de citologia convencional com teste de CH-HPV, com coleta por profissional de saúde; f) combinação de citologia em meio líquido com teste de CH-HPV, com coleta por profissional de saúde. Um segundo objetivo foi a esti- mativa dos preços que as tecnologias de rastreamento não presen- persistência e integração no geno- tica na detecção precoce do câncer O presente trabalho teve como em meio líquido; c) teste de CH-HPV, vos é a infecção pelo papilomaví- ou substitutiva da citologia oncó- perspectiva societal. estratégias diagnósticas utilizadas na mas do colo pré-invasivos e invasi- tos como estratégia complementar sua custo-efetividade medido sob a 44), com uma sensibilidade supe- risco oncogênico (6, 11, 42, 43 e para o desenvolvimento de carcino- Como decorrência, testes para va destes métodos, em termos de objetivo principal avaliar a custo-efe- mostrado que o maior fator de risco ma da célula hospedeira, bem como tados para a eficiência comparati- 68) e cinco tipos de vírus de baixo Estudos epidemiológicos têm viral (alto risco oncogênico), à sua destes procedimentos podem ser em sibilidade de autocoleta, uma alcobertura do exame em regiões de difícil acesso ou com característi- tes na tabela de reembolso do SUS precisariam ter para que as rela- ções de custo-efetividade fossem, no mínimo, equivalentes ao teste de Papanicolaou. MÉTODOS Um modelo analítico de decisão, cas culturais que levem à resistên- tomando por base modelagens de- Na atualidade, apenas o teste de Advisory Committee australiano cia ao exame ginecológico. Papanicolaou faz parte do rol de procedimentos cobertos pelo SUS. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 senvolvidas pelo Medical Services (MSAC, 2003, 2002a, 2002b), foi usado para simular os impactos Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil econômicos e em saúde das novas rio da Saúde (BRASIL/INCA, 2003b) HPV (Figuras 2 e 3, respectivamen- trutura do modelo está baseada na em meio líquido (Figura 1); no caso American Câncer Society (SALOW et tecnologias de rastreamento. A esprática clínica compatível com as condutas clínicas preconizadas pelo Programa VIVA MULHER do Ministé- para as citologias convencional e de teste de captura híbrida para papilomavirus (CH-HPV) e da as- sociação entre as citologias e CH- te), tomou-se por base diretrizes da al., 2002) e do American College of Obstetricians and Gynecologists (WRIGHT et al., 2004). FIGURA 1 – Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com Citologia Convencional (Papanicolaou) ou Citologia Líquida Legenda: 1 – espécimes que se mostraram inadequados à avaliação oncótica devido a material acelular ou hipocelular (< 10% do esfregaço) ou leitura prejudicada (> 75% do esfregaço) por presença de sangue, piócitos, artefatos de dessecamento, contaminantes externos, intensa superposição celular ou outros. 2 – Lesão intra-epitelial de baixo grau (efeito citopático pelo HPV e neoplasia intraepitelial cervical grau I – NIC I) e células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) de origem possivelmente não neoplásica; 3 – Células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) onde não se pode afastar lesão intra-epitelial de alto grau, células glandulares atípicas de significado indeterminado (AGUS), lesão intra-epitelial de alto grau (neoplasias intra-epiteliais cervicais graus II e III – NIC II e NIC III), carcinoma epidermóide invasor e adenocarcinoma); 4 – normal, NIC I e HPV; 5 – NIC II, III, e carcinoma escamoso ou adenocarcinoma invasor FIGURA 2 – Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com o teste de Captura Híbrida para Papilomavirus (CH-HPV) por auto-coleta ou coleta por profissional de Saúde Legenda: 1 – baixo risco oncogênico (tipos virais 6, 11, 42, 43 e 44). 2 – alto risco oncogênico (tipos virais de número 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59 e 68); 3 – normal, NIC I e HPV; 4 – NIC II, III, e carcinoma escamoso ou adenocarcinoma invasor. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 51 CAETANO, Rosângela et al FIGURA 3 – Árvore de decisão de condutas clínicas relacionadas com as associações da citologia (Convencional ou Citologia Líquida) e do teste de Captura Híbrida para Papilomavirus (CH-HPV) com coleta por profissional de Saúde Legenda: 1 – citologia negativa, lesão intra-epitelial de baixo grau (efeito citopático pelo HPV e neoplasia intra-epitelial cervical grau I – NIC I) e células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) de origem possivelmente não neoplásica e CH-HPV negativo (normal ou positividade para tipos virais de baixo risco oncogênicos); 2 – espécimes que se mostraram inadequados à avaliação oncótica devido a material acelular ou hipocelular (< 10% do esfregaço) ou leitura prejudicada (> 75% do esfregaço) por presença de sangue, piócitos, artefatos de dessecamento, contaminantes externos, intensa superposição celular ou outros. 3 – citologia positiva – células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS), células glandulares atípicas de significado indeterminado (AGUS), lesão intra-epitelial de alto grau (neoplasias intra-epiteliais cervicais graus II e III – NIC II e NIC III), carcinoma epidermóide invasor e adenocarcinoma ou CH-HPV positivo (positividade para tipos virais de alto risco oncogênico); 4 – normal, NIC I e HPV; 5 – NIC II, III, e carcinoma escamoso ou adenocarcinoma invasor. As eficiências comparativas das por base estudo de acurácia recente- menos um exame alterado e uma ção incremental de custo-efetividade. al., 2003, 2004), além de pesquisa atório, daquelas mulheres com to- estratégias foram medidas pela relaO benefício em saúde foi expresso em número de casos detectados de lesões mente realizado pelo INCA (GIRIANELLI et bibliográfica específica sobre o tema. O referido estudo incluiu 1.777 precursoras com alto grau de malig- mulheres entre 25 e 59 anos de ida- calculados a partir da matriz de pro- exame citopatológico (13,5%) ou o nidade ou de câncer do colo do útero, babilidades derivadas do modelo. A população utilizada no modelo foi de coorte teórica de 10.000 mulhe- res representativas da população que poderia participar de tais programas e o horizonte de tempo trabalhado no modelo restringiu-se a um ano. TESTES DE RASTREAMENTO E MEDIDAS DE EFETIVIDADE As estimativas de efetividade dos métodos de rastreamento tomaram 52 de, que nunca haviam realizado o haviam realizado há mais de três amostra sistemática, com início aledos os resultados negativos. Todos os exames citopatológicos e de cap- tura híbrida para HPV foram realizados na Seção Integrada de Tecno- logia em Citopatologia (SITEC) do INCA. Do total, 585 mulheres (33%) anos. Em uma única visita, foi co- apresentaram alteração em pelo vico-vaginal para a realização de com uma positividade para lesões lhida uma amostra de esfregaço cér- citologia convencional, seguida de uma amostra para a realização de citologia em base líquida e do teste menos um dos exames realizados, igual ou maior que células escamo- sas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) de 9,6% para o teste de captura híbrida para HPV; uma de Papanicolaou e de 16,2% para a do teste de DNA do HPV foi colhida sitividade para ASCUS (onde não pode terceira amostra para a realização pela própria paciente. Foram enca- minhadas para colposcopia todas as mulheres que apresentaram pelo Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 citologia em meio líquido. Já a poafastar lesão intra-epitelial de alto grau), células glandulares atípicas de significado indeterminado (AGUS) Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil e neoplasias intra-epiteliais cervi- cais de grau maior ou igual a II (NIC II) foi de 5,4% no teste de Papanicolaou e de 7,7% para a citologia em meio líquido. Mostraram-se positi- vas para HPV de alto risco oncogênico, 11,4% e 14,0% das amostras, TABELA 1 – Medidas de acurácia das estratégias de rastreamento do câncer cérvico-uterino Citologia convencional Citologia em meio líquido conforme tivessem sido colhidas por CH-HPV colhido por profissional pria paciente, respectivamente. CH-HPV por autocoleta profissional de saúde ou pela próA citologia convencional apresen- tou 2,2% de amostras insatisfatórias. Já a citologia em meio líquido apresentou um percentual de 3,4%, influ- enciado basicamente pela ocorrência de esfregaço hemorrágico (90,2% das amostras insatisfatórias). No entan- Sensibilidade Estratégia de rastreamento Citologia convencional + CH-HPV colhido por profissional* Citologia em meio líquido + CH-HPV colhido por profissional* (IC 95%†) 71,4% (53,4-84,8) 66,7% (48,1-81,4) 91,4% (75,8-97,8) 77,1% (59,4-89,0) 97,1% (83,4-99,9) 90,9% (74,5-97,6) Especificidade (IC 95%†) 91,6% (90,2-92,8) 84,8% (83,0-86,5) 90,2% (88,7-91,5) 87,3% (85,6-88,8) 84,9% (83,1-86,5) 78,3% (76,3-80,2) Legenda: CH-HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus; † IC 95% = Intervalo com 95% de confiança. *Critérios de positividade dos testes em paralelo: Citologia convencional e Citologia em meio líquido ≥ ASCUS e/ou CH-HPV positiva para subtipos com alto risco oncogênico. Fonte: GIRIANELLI et al., 2004. to, quando foram excluídas as amostras que apresentaram sangramento após a primeira coleta, ocorreu uma queda significativa no percentual de amostras insatisfatórias, passando para 1,6% (p < 0,001), sugerindo que a citologia em meio líquido poderia ter apresentado melhor desempenho se fosse baseada na primeira coleta. Foram detectados 35 casos de lesões precursoras de alto grau/cân- TABELA 2 – Principais probabilidades de transição empregadas nos modelos de decisão, segundo tecnologia de rastreamento do câncer cérvico-uterino Resultados Normal Insatisfatório Baixo grau Papanicolaou (%) Citologia Líquida (%) 2,20 4,05 90,37 1 5,97 2 Alto grau3 cer cervical, ao exame anatomopa- Colposcopia imediata sem lesão visível plasia Intra-epitelial Cervical (NIC) Anatomopatologia negativa 3,66 1,30 83,84 8,46 7,71 4,46 tológico, assim distribuídos: Neo- Colposcopia imediata com lesão visível II – 15 casos; NIC III –18 casos; ade- Anatomopatologia positiva adenocarcinoma invasor – um caso. Normal e especificidade dos diferentes tes- Alto risco oncogênico7 11,42 13,96 Colposcopia imediata com lesão visível 5,01 5,63 nocarcinoma in situ – um caso; Os resultados de sensibilidade 4 5 Resultados Baixo risco oncogênico6 tes encontram-se sintetizados na Colposcopia imediata sem lesão visível dades utilizadas nas árvores de Anatomopatologia negativa Tabela 1 e as principais probabili- decisão encontram-se na Tabela 2. Anatomopatologia positiva 2,37 3,24 1,18 1,04 1,18 2,20 CH-HPV coleta profissional (%) CH-HPV autocoleta(%) 2,25 3,04 86,33 6,42 3,21 1,80 83,01 8,33 4,11 1,52 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 53 CAETANO, Rosângela et al TABELA 2 – Principais probabilidades de transição empregadas nos modelos de decisão, segundo tecnologia de rastreamento do câncer cérvico-uterino (continuação) Resultados Todos os testes negativos Papanicolaou + CH-HPV coleta profissional (%) Citologia Líquida + CH-HPV coleta profissional (%) 2,19 4,05 Insatisfatório 83,27 Qualquer teste positivo8 16,73 Colposcopia imediata com lesão visível 7,10 Anatomopatologia positiva 1,92 Colposcopia imediata sem lesão visível Anatomopatologia negativa 77,00 23,00 9,63 14,77 5,18 6,49 8,23 1,74 Legenda: CH-HPV – Captura híbrida para papilomavirus; 1 – espécimes que se mostraram inadequados à avaliação oncótica devido a material acelular ou hipocelular (< 10% do esfregaço) ou leitura prejudicada (> 75% do esfregaço) por presença de sangue, piócitos, artefatos de dessecamento, contaminantes externos, intensa superposição celular ou outros. 2 – Lesão intra-epitelial de baixo grau (efeito citopático pelo HPV e neoplasia intra-epitelial cervical grau I - NIC I) e células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) de origem possivelmente não neoplásica; 3 – Células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) quando não se pode afastar lesão intraepitelial de alto grau, células glandulares atípicas de significado indeterminado (AGUS), lesão intra-epitelial de alto grau (neoplasias intraepiteliais cervicais graus II e III - NIC II e NIC III), carcinoma epidermóide invasor e adenocarcinoma); 4 – normal, NIC I e HPV; 5 – NIC II, III, e carcinoma escamoso ou adenocarcinoma invasor; 6 - baixo risco oncogênico (tipos virais 6, 11, 42, 43 e 44); 7 – alto risco oncogênico (tipos virais de número 16, 18, 31, 33, 35, 39, 45, 51, 52, 56, 58, 59 e 68); 8 - citologia positiva - células escamosas atípicas de significado indeterminado (ASCUS) onde não se pode afastar lesão intra-epitelial de alto grau, células glandulares atípicas de significado indeterminado (AGUS), lesão intra-epitelial de alto grau (neoplasias intra-epiteliais cervicais graus II e III - NIC II e NIC III), carcinoma epidermóide invasor e adenocarcinoma - e/ou CH-HPV positivo (positividade para tipos virais de alto risco oncogênico) Fonte: Girianelli et al. 2003. CUSTOS DAS ESTRATÉGIAS DE RASTREAMENTO A perspectiva de análise utiliza- da foi a do Sistema de Saúde, sendo apenas considerados aqueles custos diretamente envolvidos na detecção e confirmação dos casos. Dada a opção por utilizar como unidade de análise o número de casos detectados, não foram considerados os custos envolvidos com o tratamento das lesões ou dos casos de câncer detectados. Utilizou-se, como medida de va- loração dos custos, os valores de reembolso constantes na Classifica- 54 do; colposcopia; biópsia de colo uterino e anatomopatologia (Tabela 3). A citologia em meio líquido e cap- tura híbrida para HPV não se encontram dentro dos procedimentos apro- vados para reembolso no SUS, impe- dindo que se possa comparar as vá- rias estratégias de rastreamento sob a perspectiva do sistema público de saúde brasileiro. Procedeu-se a uma estimativa de qual deveria ser o preço máximo destes testes de rastrea- mento para o SUS, de modo a garantir a equivalência em custo-efetividade ao teste de Papanicolaou. Para este cálculo, utilizaram-se os valores dos itens de custo presentes na tabela de reembolso do SUS (BRASIL/ MS, 2004) (Tabela 3). RESULTADOS O teste de Papanicolaou foi aquele ção Brasileira Hierarquizada de Pro- que apresentou a melhor razão incre- elaborada pela Associação Médica das as estratégias de rastreamento cedimentos Médicos (AMB, 2004), Brasileira, Sociedades de Especialidades e Conselho Federal de Medici- na. Esta tabela apresenta diferenças entre os vários estados da federa- ção, de modo que se admite uma banda de 20%, para mais ou para menos, para fins de regionalização, com estas variações sendo testadas na análise de sensibilidade. Os seguintes itens foram utilizados para estimar os custos das estratégias de rastreamento: consulta; exame Pa- panicolaou; revisão de lâminas; exa- me CH-HPV; citologia em meio líqui- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 mental de custo-efetividade entre to- analisadas. As estratégias de CH-HPV por autocoleta, citologia em meio lí- quido e a combinação desta com o teste de HPV são dominadas pelo teste de Papanicolaou. Tomando este úl- timo como base, os valores para o teste de Papanicolaou, combinação do teste de Papanicolaou com teste de CHHPV com coleta por profissional e teste de HPV com coleta por profissional aplicado de forma isolada foram, respectivamente, de R$ 14.586,86, R$ 73.556,84 e R$ 146.638,86 por caso adicional detectado (Tabela 4). Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil TABELA 3 – Item de Custo, códigos e respectivos valores em reais nas Tabelas da CBHPM-AMB e de Reembolso de Procedimentos do SUS Item de Custo Consulta Exame Papanicolaou Coleta Papanicolaou Código CBHPM Valor CBHPM 4.06.01.013-7 27,85 1.01.01.001-0 — 07.051.01-8 1,00 228,13 — — Citologia em meio líquido 4.06.01.032-3 44,75 Biópsia de colo uterino 3.13.03.002-2 Anatomopatologia 4.13.01.010-4 12.011.02-9 — 24,00 17.051.01-0 120,75 12.012.03-3 368,00 4.06.01.019-6 5,37 — 166,50 Colposcopia 12.011.01-0 02.012.06-5 4.06.01.015-3 4.06.01.029-3 Valor SUS 42,00 Revisão de lâminas Exame DNA do HPV Código SUS 08.031.01-0 2,04 Citologia em Meio Líquido Citologia em Meio Líquido + CH-HPV coleta por profissional Teste de Papanicolaou CH-HPV coleta por profissional Teste Papanicolaou + CH-HPV coleta por profissional 14,66 20,87 Teste de Papanicolaou Teste Papanicolaou + CH-HPV coleta por profissional sultados serão reexaminados dentro dos intervalos de tempo previstos nas condutas clínicas nacionais e in- a construção do modelo (BRASIL/INCA, Casos / 10.000 mulheres Custo por caso detectado CEI 152 162 19.005,57 19.315,22 19.005,57 0,0152 4.127.641,37 0,0174 174 23.722,08 84.434,48 2.552.628,79 0,0175 175 14.586,45 -1.575.012,58 0,0162 0,0180 180 18.254,57 23.918,50 146.638,86 0,0192 192 19.807,79 43.105,99 2.552.628,79 0,0175 175 14.586,45 14.586,45 3.803.094,99 0,0192 192 19.807,79 73.556,84 Comparação entre as alternativas mais custo-efetivas rastreamento têm implicações dire- ternacionais tomadas por base para 2.888.846,43 3.803.094,99 lores de sensibilidade dos testes de dado que algumas categorias de re- 1,69 Efetividade 3.285.823,07 mais ou menos. Além disso, os va- soras ou câncer – como nos custos, — Custo 3.133.408,29 assumindo variações de 20% para casos detectados de lesões precur- TABELA 4 – Custo-efetividade das estratégias usadas no rastreamento do câncer cérvico-uterino CH-HPV autocoleta nos valores de reembolso praticado, tas tanto na efetividade –número de 5,37 Obs: – = Item não existente na tabela. Fontes: AMB, 2004 e BRASIL/MS, 2004. Procedimento mite que existem variações regionais CEI = ∆ Custo /∆ caso; HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus. ANÁLISE DE SENSIBILIDADE Com vistas testar a robustez dos resultados, foi realizada uma análise de sensibilidade que incluiu mudanças em alguns dos parâme- 2003b; SALOW et al., 2002; WRIGHT et al., 2004). Por fim, também a taxa de exames insatisfatórios pode alte- rar a relação custo-efetividade das estratégias de rastreamento em questão porque implica em nova coleta e reexame dos casos. Desse modo, as seguintes situa- ções foram consideradas nas análises de sensibilidade: a) redução em 20% dos itens de custo relacionados às outras estratégias de rastreamen- to, mantendo o valor da estratégia do teste de Papanicolaou inalterada; b) redução em 20% dos itens de cus- to relacionados às outras estratégi- as de rastreamento, com o valor da estratégia do teste de Papanicolaou tros que pudessem influenciar as re- lações de custo-efetividade calcula- das para as várias opções de rastre- amento. A tabela da Classificação Brasileira Hierarquizada de Procedimentos Médicos (AMB, 2004) ad- elevada também em 20%; c) sensibilidade do teste de Papanicolaou no limite inferior do intervalo de confi- ança encontrado para essa medida de acurácia no estudo do INCA (GIRIA- NELLI et al., 2003, 2004), qual seja, sensibilidade igual a 53,4%; d) sen- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 55 CAETANO, Rosângela et al sibilidade da citologia em meio líquido no limite superior do mencio- nado intervalo de confiança (81,4%); e) redução na taxa de exames insa- tisfatórios relacionados com a citologia em meio líquido para um va- lor de 1,6% (média nas taxas de insatisfatórios presentes na literatura). As simulações levando em consi- deração as mudanças aqui mencio- TABELA 5 – Custo-efetividade das tecnologias de rastreamento do câncer cérvico-uterino com teste de Papanicolaou apresentando sensibilidade reduzida para 53,4% Procedimento HPV auto-coleta Teste de Papanicolaou Citologia em Meio Líquido Custo Efetividade 2.888.846,43 0,0152 3.292.367,10 0,0162 2.547.072,72 Citologia em Meio Líquido + HPV 4.127.641,37 nadas não mostraram influência sig- HPV coleta por profissional 3.285.823,07 A redução na sensibilidade do teste Comparação entre alternativas mais custo-efetivas rou seu papel como opção mais cus- HPV coleta por profissional 0,0174 0,0180 CEI 152 19.005,57 19.005,57 162 20.323,25 74.529,44 152 174 180 23.722,08 16.757,06 69.606,19 18.254,57 -140.303,05 de Papanicolaou (Tabela 5) não alte- Teste de Papanicolaou 2.547.072,72 0,0158 152 16.757,06 16.757,06 Teste Papanicolaou + HPV 3.803.094,99 0,0192 192 19.807,79 43.105,99 tenha se reduzido de 175 para 152 casos detectados em 10 mil mulhe- res, o impacto nos custos é pouco significativo, com a razão incremental se elevando de R$ 14.586,45 para R$ 16.757,06, permanecendo melhor 0,0180 Custo Efetividade mento na efetividade da citologia em HPV autocoleta 2.888.846,43 0,0152 resultado inicialmente encontrado: o Teste de Papanicolaou 2.552.628,79 0,0175 teste de Papanicolaou ainda se mantém, com preços normais, como a tecnologia de rastreamento mais custo efetiva (Tabela 6). Por fim, redu- ção na proporção de exames insatis- fatórios também não modifica significativamente os resultados finais. Os preços dos itens de custo agre- gados a cada estratégia, contudo, se revelaram uma variável com impac- 18.254,57 43.105,99 26.383,94 TABELA 6 – Custo-efetividade das tecnologias de rastreamento do câncer cérvico-uterino com citologia em meio líquido apresentando sensibilidade aumentada para 81,4% Procedimento meio líquido também não altera o 180 19.807,79 CEI = ∆ Custo /∆ caso; HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus. que a da segunda alternativa mais custo-efetiva (R$ 26.383,94). O au- 192 16.757,06 Teste Papanicolaou + HPV 3.285.823,07 0,0192 Custo caso detectado nificativa sobre o resultado inicial. to-efetiva: ainda que a efetividade 3.803.094,99 0,0152 Casos / 10.000 mulheres Citologia em Meio Líquido + HPV HPV coleta por profissional Citologia em Meio Líquido Teste Papanicolaou + HPV 4.127.641,37 3.182.392,01 3.285.823,07 3.803.094,99 Comparação entre alternativas mais custo-efetivas Teste de Papanicolaou Citologia em Meio Líquido Teste Papanicolaou + HPV 2.552.628,79 3.182.392,01 3.803.094,99 0,0174 0,01796 Casos / 10.000 mulheres Custo caso detectado CEI 152 19.005,57 19.005,57 175 14.586,45 -1.575.012,58 174 180 23.722,08 17.718,74 56.308,86 136.725,95 0,01801 180 18.246,59 218.781,81 0,0175 175 14.586,45 14.586,45 0,0192 0,0180 0,0192 192 180 192 19.807,79 17.679,96 19.807,79 43.390,87 125.952,64 73.556,84 CEI = ∆ Custo /∆ caso; HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus. to nos resultados iniciais. A estraté- a redução em 20% dos valores dos dos para o teste de Papanicolaou as- lhida por profissional de saúde, com igual proporção dos valores pratica- to-efetividade incremental (Tabela 7). gia de captura híbrida para HPV co- 56 itens de custo e uma elevação em Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 sume a posição de melhor razão cus- Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil ESTIMATIVA DE PREÇOS PARA AS NOVAS TECNOLOGIAS DE RASTREAMENTO As duas novas tecnologias exa- minadas nesse estudo, de forma iso- lada ou em combinação com o teste de Papanicolaou – citologia em meio líquido e captura híbrida para HPV – não se encontram dentro dos procedimentos aprovados para reem- TABELA 7 – Redução em 20% nos valores dos itens de custo relacionados às outras estratégias de rastreamento, com o valor da estratégia do Papanicolaou elevado em 20% Casos / 10.000 mulheres Custo por caso detectado CEI 152 162 15.204,45 15.452,18 15.204,45 0,0174 174 18.977,66 67.547,58 Procedimento Custo Efetividade HPV autocoleta 2.311.077,14 0,0152 Citologia em Meio Líquido + HPV 3.302.113,10 coleta por profissional Citologia em Meio Líquido 2.506.726,63 0,0162 19.134,80 Teste de Papanicolaou 3.063.154,55 0,0175 175 17.503,74 -238.958,55 gias de rastreamento sob a perspec- Teste Papanicolaou + HPV coleta por profissional 3.042.476,00 0,0192 192 15.846,23 34.484,79 brasileiro. Na ótica da avaliação Teste de Papanicolaou 3.063.154,55 0,0175 175 17.503,74 -86.899,22 tes ao teste de Papanicolaou, elas Teste Papanicolaou + HPV coleta por profissional 14.603,66 17.503,74 3.042.476,00 0,0192 192 15.846,23 34.484,79 relação custo-efetividade deste últi- HPV coleta por profissional 2.628.658,46 0,0180 180 14.603,66 14.603,66 3.042.476,00 0,0192 192 15.846,23 34.484,79 bolso no SUS, o que impede que se possam comparar as várias estratétiva do sistema público de saúde econômica, para se considerar que essas estratégias fossem equivalen- deveriam ter no mínimo a mesma mo teste. Para isso, procedeu-se en- tão a uma estimativa de qual deveria ser o preço máximo destes tes- tes de rastreamento para o SUS, de modo a garantir o aqui pretendido. A partir dos valores pagos pelo SUS, foi estimado o custo da estratégia de Papanicolaou para o sistema público CH-HPV coleta por profissional 2.628.658,46 Comparação entre as alternativas mais custo-efetivas HPV coleta por profissional 2.628.658,46 Comparação entre as alternativas mais custo-efetivas Teste Papanicolaou + HPV coleta por profissional Teste de Rastreamento casos detectados em 10 mil mulhe- CH-HPV combinado com Papanicolaou 1.404,36 por caso detectado de cân- cer ou lesão precursora de alto grau. Estimou-se, então, o preço que cada uma das outras tecnologias precisa- Citologia em Meio Líquido Preço SUS estimado (a) Preço AMB (b) Preço 20% AMB (c) 8,22 44,75 35,80 19,12 11,82 DISCUSSÃO A elevação quase universal dos gastos em saúde e os crescentes colaou no reembolso público, qual escassez de recursos vis-à-vis às seja, de R$ 1.404,36. Estes valores encontram-se presentes na Tabela 8. -86.899,22 228,13 228,13 182,50 182,50 a/b a/c 8,38% 10,48% 18,37% 5,18% 22,96% 6,48% em termos de seu custo-efetividade. ria atingir para igualar a razão de custo-efetividade do teste de Papani- 180 14.603,66 TABELA 8 – Preços estimados das novas tecnologias de rastreamento para o SUS CH-HPV res, a razão de custo foi de R$ 0,0180 180 CEI = ∆ Custo /∆ caso; HPV – teste de captura híbrida para papilomavírus. como sendo de R$ 245.762,79. Toman- do por base uma efetividade de 175 0,0180 constrangimentos decorrentes da demandas têm imposto a necessida- de de se justificar as novas técnicas Assim, tão importante quanto os diferenciais de efetividade entre os vários métodos, é a sua eficiência comparativa em termos da utilização dos recursos médicos e sociais. Em alguns casos, a introdução de uma nova tecnologia pode produzir Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 57 CAETANO, Rosângela et al economia de recursos do programa rança e com implicações importan- PR, 1999, ICSI, 2003), responsáveis custo aumentado dos testes, como parativa entre os métodos. cisões relativas à cobertura e ao re- de rastreamento que suplantam o por exemplo, quando a sensibilida- tes para os custos e a eficiência comA avaliação das novas tecnologi- de do novo teste torna possível au- as propostas precisa também consi- se modo reduzindo os custos totais obtenção, processamento e interpre- mentar o intervalo entre exames, des- dos programas (HUTCHISON et al., 2000). No caso do câncer de colo uterino, o tempo médio entre o apareci- mento de anormalidades detectáveis e o desenvolvimento de doença invasiva é considerado como de cerca de 10 a 15 anos. Entretanto, intervalos derar os custos associados com a tação dos exames, bem como aqueles referentes ao reexame decorrente de amostras inadequadas. Além disso, melhorias na acurácia envolvem a identificação de um número aumen- tado de pacientes com lesões intra- menores de tempo entre os exames de detecção são necessários devido ao número de testes falso-negativos, ou seja, as mulheres necessitam ser retestadas de um a três anos após um exame normal para reduzir a chance de se perder anormalidades existentes e não devido ao rápido desenvolvimento da doença. De forma bastante consistente, NEM SEMPRE O TESTE DE PAPANICOLAOU SE REVELARÁ A ESTRATÉGIA DE RASTREAMENTO DE CÂNCER CÉRVICO-UTERINO DE MELHOR RELAÇÃO CUSTO-EFETIVIDADE to-efetividade do rastreamento, indeaumenta exponencialmente à medi- testes falso-positivos ou anormais de rastreamento diminuem, efeito de investigar e tratar mulheres com devem também ser avaliados. Os novos métodos introduzidos que é ampliado pelo aumento da sen- para o rastreamento do câncer cér- 2001). Testes de rastreamento mais versos estudos de custo-efetivida- sibilidade do teste (GOLDIE et al., sensíveis, porque garantem que uma maior proporção de indivíduos com vico-uterino têm sido objeto de dide (FLORES et al., 2003, FAHS et al., 1996, MANDELBLATT et al., 2002), em doença seja captada no rastreamen- particular por agências internacio- dos intervalos sem prejuízo da segu- (MSAC, 2003, 2002a, 2002b; AHC- to, podem permitir um espaçamento 58 vados. Em geral, os estudos e revisões parecem apontar que, embora estes testes mostrem melhor acu- rácia diagnóstica, com sensibilida- de igual ou maior que a do teste de Papanicolaou, as incertezas presen- tes nos modelos empregados ainda não permitem concluir por maior custo-efetividade tanto da citologia de captura para HPV. Neste estudo, o teste de Papani- colaou apresentou a melhor razão incremental de custo-efetividade en- tre todas as estratégias de rastrea- mento analisadas. Entretanto, as análises de sensibilidade demonstraram que este resultado é dependen- te dos custos das estratégias empre- gia de captura híbrida para HPV com epiteliais de baixo grau, e os custos da que os intervalos entre os exames los sistemas de saúde, público e pri- gadas. Tanto é assim que a estraté- programas de rastreamento cervical pendente da tecnologia utilizada, embolso destes procedimentos pe- em meio líquido quanto dos testes estudos de análises econômicas dos têm mostrado que a relação de cus- em seus países por auxiliar nas de- nais de avaliação tecnológica Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 coleta por profissional de saúde, com a redução em 20% dos valores dos itens de custo e uma elevação em igual proporção dos valores praticados para o teste de Papanicolaou, assume a posição de melhor razão de custo-efetividade incremental. Isto significa que nem sempre, tomando por base os preços propos- tos para o setor privado de saúde, o teste de Papanicolaou se revelará a estratégia de rastreamento de câncer cérvico-uterino de melhor relação custo-efetividade. Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil Tanto a redução na sensibilida- pressão de um exercício preliminar, tigação adicional e ao tratamento lor proposto de reembolso para o les relacionados ao diagnóstico pre- de do teste de Papanicolaou quanto que não deve ser tomado como va- logia em meio líquido não alteram SUS, para o qual seriam necessári- o aumento da sensibilidade da citoos resultados acima relatados, exceto quando se alteram os custos das estratégias de rastreamento. os estudos de custos mais detalha- dos, que não estiveram presentes no são muito mais elevados que aquecoce, sua inclusão poderia modifi- car os resultados aqui encontrados. Outra limitação foi a utilização escopo deste projeto. de valores de reembolso e não o le- cando identificar os preços que as do merecem ser mencionadas. Pri- cada uma das opções de rastreamen- mir no sistema público, de modo a foi a do sistema de saúde, não fo- As estimativas realizadas bus- novas tecnologias precisariam assu- atingirem uma razão de custo-efeti- vidade equivalente ao do teste de Papanicolaou. Tomando por base o Algumas limitações desse estu- meiro, como a perspectiva adotada ram incluídos os custos indiretos. Na ótica da sociedade, por exemplo, valor de reembolso atualmente pra- ticado para o teste de Papanicolaou de R$ 5,37, mostraram que os valores reembolsados pelo SUS para os testes de captura híbrida para HPV com coleta por profissional de saú- de, da citologia em meio líquido e da combinação do CH-HPV com a citologia convencional, deveriam ser de, no máximo, R$ 19,12, R$ 8,22, e R$ 11,82, respectivamente. NO BRASIL, A MAIORIA DAS UNIDADES DE SAÚDE NÃO TEM SISTEMAS DE CUSTEIO OPERANTE E DESCONHECE O CONSUMO PRECISO DE RECURSOS VINCULADOS À PRESTAÇÃO DE CADA INTERVENÇÃO OU SERVIÇO além dos custos diretamente relaci- uma nova tecnologia pelo sistema cisariam agregar os custos relativos de saúde. Usualmente, a modifica- ção de rotinas já estabelecidas implica, entre outros, em custos não previstos, perda de produtividade transitória e necessidade de treina- onados à detecção dos casos, se prea deslocamento dos pacientes e acompanhantes, perda de produtividade decorrentes de absenteísmo, aposentadoria e morte precoce, etc. à prestação de cada intervenção ou dado procedimento pelo SUS dizem respeito aos gastos contabilizados pelo sistema e não ao consumo dos recursos empregados em uma fun- ção de produção relativa àquele pro- cedimento. Embora o uso dos fatores envolvidos na função de produ- ção de cada intervenção seja um custo na perspectiva do Estado brasileiro, na medida que o valor da tabela de não venha a cobri-los, este uso não corresponde ao que é custo para SUS, que se restringe ao valor efetivamente pago por este sistema. CONCLUSÕES A principal conclusão deste es- não foram considerados nas estima- tivo, outras tecnologias e estratégi- assistência nos novos moldes. Ou- tivas realizadas os custos dos tra- que os cálculos efetuados são ex- sumo preciso de recursos vinculados tudo é que, embora o teste de Papa- da de efetividade escolhida, também trossim, deve-se observar também custeio operante e desconhece o con- Por sua vez, em função da medi- mento e capacitação de recursos humanos para a reorganização da des de saúde não tem sistemas de reembolso de procedimento do SUS estimados não estão incluídos os custos relacionados à adoção de to. No Brasil, a maioria das unida- serviço. Os valores pagos por um Vale ser ressaltado, entretanto, que nesses valores de reembolso vantamento dos custos atribuíveis a tamentos dos casos detectados. Como os valores referentes à inves- nicolaou possa ser mais custo-efe- as de rastreamento do câncer de colo uterino mais recentemente introdu- zidas podem vir a mostrar melhor Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 59 CAETANO, Rosângela et al razão de custo-efetividade na depen- co de Saúde. SIA-SUS. Sistema de In- GIRIANELLI, V. R.; THULER, L. C.; SZKLO, tor de saúde. Dadas as incertezas 2004. In: http://www.calcmed.com.br/ ZANA, dência dos preços praticados no se- existentes em vários parâmetros-cha- ve, faz-se necessária a realização de estudos mais completos que contem- plem os vários estágios da evolução natural do câncer de colo de útero em nosso meio e os efeitos das transições entre esses estados, a serem explorados por meio de modelos de universo temporal mais longo. REFERÊNCIAS AHCPR – Agency for Health Care Policy and Research. Evaluation of Cervical Cytology. Evidence Report/Technology Assessment. Number 5, February 1999. AHCPR Publication No. 99-E010. ALVES, V. A. F.; BIBBO, M.; SCHMITT, F. C. L.; MILANEZI, F. & LONGATTO-FILHO A. Comparison of manual and automa- ted methods of liquid-based cytology: a morphologic study. Acta Cytol 2004; 48(2):187-93. formações Ambulatoriais do SUS, tabelasnet/tabelas_sus.asp BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa 2005: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA – Coordenação de Prevenção e Vigilância, 2004. BRASIL. INCA Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Inquérito domiciliar sobre comportamentos de risco e morbidade referida de doenças e agravos não transmissíveis. Rio de Janeiro: INCA; 2003a. BRASIL. INCA Ministério da Saúde. Se- cretaria de Assistência À Saúde. Instituto Nacional do Câncer. Nomenclatura Brasileira para Laudos Ci- topatológicos Cervicais e Condutas Clínicas Preconizadas. Rio de Janeiro: INCA, 2003b. FAHEY, M. T.; IRWIG, L. & MASCASKILL, P. Meta-analysis of Pap Test Accuracy. M.; DONATO, A.; ZARDO, L. M. G., LO- J. A. et al. Validade dos Exa- mes do DNA do HPV e Citologia em Base líquida na Detecção Precoce do Câncer do Colo do Útero e suas Lesões Precursoras. Relatório Final de Pesquisa realizada pelo Instituto Nacional de Câncer, 2003. . Comparação do desem- penho do teste de captura híbrida II para HPV, citologia em meio líquido e citologia convencional na detecção precoce do câncer do colo do útero e de suas lesões precursoras no Rio de Janeiro, Brasil. Rev. Bras. Cancerol 2004; 50(3):225-6. GOLDIE, S. J., KUHN, L., DENNY, L., PO- LLACK, A. & WRIGHT, T. C. Policy analy- sis of cervical cancer screening stra- tegies in low-resource settings: Clinical benefits and cost-effectiveness. JAMA 2001; 285:3107–15. HUTCHISON, M. L.; BERGER, B. M. & FAR- BER, F. L. Clinical and Cost Implicati- ons of New Technologies for Cervi- Am. J. Epidemiol 1995; 141:680-9. cal Cancer Screening: The Impact of quizada de Procedimentos Médicos. BLATT, J. 2000;6:766-80. sil. 2004, 3ª edição. national review. Pharmacoecono- AMB – Associação Médica Brasilei- ra. Classificação Brasileira HierarCâmara Brasileira do Livro, SP. Bra- BOLICK, D. R. & HELLMAN, D. Labora- tory implementation and efficacy assessment of the Thin Prep cervi- FAHS, M. C.; PLICHTA, S. B. & MANDELS. Cost-effective policies for cervical cancer screening: An intermics 1996, 9:211-30. FLORES, Y.; BISHAI , D.; LAZCANO, E.; SHAH, K.; LÖRINCZ, A. et al. Improving cal cancer screening system. Acta cervical cancer screenning in Mexi- BRASIL. Ministério da Saúde. Departa- Study. Salud Pública Méx 2003; Cytol 1998; 42:209–13. mento de Informática do Sistema Úni- 60 co: Results from the Morelos HPV 45(Suppl. 3): S388-98. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 Test Sensitivity. Am. J. Manag. Care ICSI – Institute for Clinical Systems Improvement. Liquid-Based Cervical Cytology. Technology Assessment Committee, Technology Assessment Report #76, 2003. MANDELBLATT, J. S.; LAWRENCE, W. F.; GAFFIKIN, L.; LIMPAHAYOM, K. K.; LUMBI- GANO, N. P., WARAKAMIN, S., et al. Costs and Benefits of Different Strategies Custo-efetividade no diagnóstico precoce do câncer de colo uterino no Brasil to Screen for Cervical Cancer in LessDeveloped Countries. J. Natl. Cancer Inst 2002; 94(19):1469-83. MSAC – Medical Services Advisory Committee (MSAC). Human papillo- vical graus 2 e 3. Cad. Saúde Pública 2003; 19(4):1029-1037. SHERMAN, M. E.; CHIFFMAN, M. H.; LORINCZ, A. T.; HERRERO, R.; HUTCHINSON, M. L.; BRATTI, C., et al.. Cervical spe- mavirus testing for cervical screen- cimens collected in liquid buffer are May 2003. and ancillary human papillomavi- ing. Assessment report, Austrália, . Human papillomavirus testing in women with cytological prediction of low-grade abnormality. suitable for both cytologic screening rus testing. Cancer J Clin. 1997; 81:89 –95. WRIGHT, J. R. T. C.; SCHIFFMAN, M.; SO- Canberra, Austrália, 2002a. LOMON, cervical screening. Assessment report, dance for the Use of Human Papillo- . Liquid based cytology for Austrália, August 2002b. MUNOZ, N. Human papillomavirus and cancer: the epidemiological eviden- D.; COX, J. T.; GOLDIE, S.; HATCH, K.; NOLLER, K. L.; et al.. Interim Gui- mavirus DNA Testing as an Adjunct to Cervical Citology for Screening. Obstet Gynecol 2004: 103:304-9. ce. J. Clin. Virol 2000; 19(1-2): 1-5. MYERS, E. R. M. C.; CRORY, D. C.; NAN- DA, K.; BASTIAN, L. & MATCHAR, D. B. Mathematical Model for the Natural History of Human Papilloma- virus Infection and Cervical Carcinogenesis. Am. J. Epidemiol. 2000; 151(12): 1158-71. SALOW, D.; RUNOWICZ, C. D.; SOLOMON, D.; MOSCICKI, A. B.; SMITH, R. A.; EYRE, H. J. & COHEN, C. American Cancer Socie- ty Guideline for the Early Detection of Cervical Neoplasia and Cancer. CA Cancer J Clin, 2002, 52: 342-362. SANTOS, A. L. F.; DERCHAIN, S. F. M.; CALVERT, E. B.; MARTINS, M. R.; DUFLO- TH, R. M. & MARTINEZ, E. Z. Desempe- nho do exame colpocitológico com revisão por diferentes observadores e da captura híbrida II no diagnóstico da neoplasia intra-epitelial cer- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 48-61, janeiro 2007 61 PEREIRA, Esdras Daniel dos Santos & RODRIGUES, Luiz Cláudio de Queiroz ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Panorama da gestão de hemoderivados no Sistema Único de Sáude brasileiro: perspectivas e cenários para a auto-suficiência Overview of blood derivatives management in the Brazilian Health System: perspectives and scenarios for self-sufficiency Esdras Daniel dos Santos Pereira1 & Luiz Cláudio de Queiroz Rodrigues2 RESUMO Ao Estado compete promover políticas de saúde de acordo com os princípios do SUS, incluindo-se neste âmbito os usuários de hemoderivados. O gasto para a aquisição destes insumos é da ordem de US$ 80 milhões/ano, o que mostra a sua importância econômica e social. O Brasil ainda não domina todos o processo de produção dos mesmos. O presente artigo analisa aspectos situacionais da gestão de hemoderivados, abordando elementos históricos, legais e econômicos, além de apontar perspectivas para a incorporação de tecnologia e incremento da produção nacional e do acesso aos serviços desta terapêutica. As conclusões aqui apresentadas baseiam-se em dados oficiais e documentos de referência que permitiram uma análise crítica sob a ótica econômica e propiciou, também, a sugestão de intervenções na gestão e, sobretudo na implementação da produção nacional. PALAVRAS-CHAVE: Hemoderivados; Hemobras; Sistema Único de Saúde (SUS). ABSTRACT It is the State’s responsibility to promote health policies according to the principles of the Brazilian Health System (SUS), which include the users of blood derivatives. The expenses for the acquisition of these products reach US$ 80 million/year, showing its economic and social importance. Brazil still doesn’t have control over the whole production process of blood derivatives. The present article analyzes certain aspects of blood derivatives management, with an approach to historical, legal and economic elements, and establishes perspectives for adopting new technologies and increasing the national production, besides improving the access to services related to this kind of therapy. The conclusions presented here are based on official data and reference documents, which allowed an economic-focused critical analysis, and also the suggestion of interventions in the national production management and, specially, implementation. KEYWORDS: Blood Derivatives; Hemobras; Brazilian National Health System (SUS). 1 2 62 Farmacêutico clínico e industrial, Universidade de Brasília (UnB); consultor técnico da Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa, Ministério da Saúde. e-mail: [email protected] Graduando em Ciências Farmacêuticas, UnB. e-mail: [email protected] Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 Panorama da gestão de hemoderivados no Sistema Único de Sáude brasileiro: perspectivas e cenários para a auto-suficiência INTRODUÇÃO O Sistema Único de Saúde (SUS) teve o seu arcabouço legislativo consolidado com a Constituição Fe- deral de 1988, após intenso debate e mobilização social. Dentre as ino- que após a deflagração da chamada ‘Operação Vampiro’, quando comprovada a participação de tuacionais da gestão de insumos vam os recursos estatais. nuances históricas, marcos regula- citatórios fraudulentos, que ceifaEstima-se que o gasto anual para a aquisição de hemoderivados cor- lar e os princípios da Universali- sentando montante significativo do dade, Integralidade e Equidade. Esta nova maneira de conceber o sistema público de saúde fez com que o Estado reconhecesse a saúde responda a U$$ 80 milhões, repre- orçamento federal na área da saúde. É importante ressaltar que o Bra- sil não domina todos os elos da ca- zação dos serviços. Alicerçado nestes princípios, o Estado passa a desencadear polí- ticas que estruturam a prevenção, a promoção e a recuperação da saúde para diversos segmentos po- BUSCAR A AUTO-SUFICIÊNCIA E PRODUZIR NOVAS TECNOLOGIAS NESTE SEGMENTO SE FAZ IMPERATIVO PARA A NAÇÃO moderivados (proteínas obtidas deia produtiva para desenvolvimen- micos e, sobretudo por meio do fra- nacional, fazendo com que tenha cionamento do plasma sanguíneo, com finalidade terapêutica destina- da a hemofilias e demais coagulopatias hereditárias), carecendo assim de um olhar diferenciado da gestão. Apesar de ser uma antiga preocupação, a questão que toca aos hemoderivados ganhou desta1 corporação de tecnologia e incremen- to da produção nacional e do acesso aos serviços dessa terapêutica. METODOLOGIA da Saúde do Brasil em seu banco de dados (DATASUS1) e a leitura de documentos de referência, buscou-se tra- çar um panorama da realidade do tema e seus matizes, o que permi- tiu a análise crítica sob a ótica econômica da relação de custo-efetividade (IPEA, 2002) e embasamento na gestão de hemoderivados, sobre- que 9 mil pessoas apresentam ne- por meio de processos físico-quí- apontar perspectivas visando a in- para a proposição de intervenções pulacionais. No Brasil, estima-se cessidades do uso de produtos he- tórios e gestão econômica, além de dos disponibilizados pelo Ministério se novos nortes para a gestão e fido da descentralização e regionali- hemoderivados no SUS, abordando Por meio de levantamento de da- como um direito, e com que traçasnanciamento, apontando no senti- Pretende-se analisar aspectos si- agentes públicos em processos li- vações trazidas por este sistema destacam-se a participação popu- OBJETIVOS to de hemoderivados em território que recorrer à importação, o que acaba por onerar o balanço de pa- tudo no que se refere à implementação da produção nacional. DISCUSSÃO O mercado mundial de hemo- gamentos do país. Buscar a auto- derivados é dinâmico, apresentan- logias neste segmento se faz impe- ta e grande volume em importa- suficiência e produzir novas tecno- rativo para a nação, com vistas a consolidar a proposta do SUS e reforçar a soberania brasileira. do demanda quantitativa de monções e exportações. Os processos de compra dos países, bem como seus perfis econômicos, influenci- www.saude.gov.br/datasus Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 63 PEREIRA, Esdras Daniel dos Santos & RODRIGUES, Luiz Cláudio de Queiroz am diretamente no preço a ser mento em que se levantou indícios além de mostrar que o processo lici- do encontrar variações no preço de indo de tal processo a vantagem da não vinha se dando de maneira idô- pago por cada produto, permitincompra em um intervalo de US$ 0,25 a US$ 1,75 para um mesmo de cartelização do mercado, subtralivre concorrência. A mencionada Operação Vampi- insumo (BROKER, 2005). Vale ressal- ro, deflagrada pela Polícia Federal ção destes fatores concentrados se tasse para as questões inerentes tar que a tecnologia para a obtenrestringe a um pequeno número de laboratórios farmacêuticos. A realidade brasileira em rela- ção aos hemoderivados é marcada por forte dependência da importação. A demanda do fator sanguíneo IX é em 2002, fez com que o país atenaos hemoderivados. Parecer da Se- cretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE/MJ) traçou algumas características do mercado nacional de hemoderiva- totalmente suprida pela importação tivado é produzido nacionalmente (REZENDE, et al., 2005). No Brasil, a aquisição de produ- tos hemoderivados se dá por meio de compra centralizada, sendo que A REALIDADE BRASILEIRA EM RELAÇÃO AOS HEMODERIVADOS É MARCADA POR FORTE DEPENDÊNCIA DA IMPORTAÇÃO de dos recursos são de responsabi- lidade federal (BRASIL, 2001). Até citação de livre concorrência, regi- para licitações e contratos da Admi- mesmo parecer, apontou qual as propostas de preço eram encaminhadas em envelopes lacra- dos e a concorrência se alicerçava por coerência técnica das especifi- cações dos produtos e a garantia de oferta pelo menor custo. Conforme apontou o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), este proces- so se mostrou falho a partir do mo- 64 tivas que recursos da ordem de cer- ca de R$ 2 bilhões tenham sido gas- tos além do previsto, desde da déca- da de 1990, fato gerado, sobretudo, pelo inconveniente cumprimento das regras de licitação (BRASIL, 2004). Diante deste cenário, em 2003, o Ministério da Saúde modificou o gão presencial’ do tipo menor pre- ço, no qual representantes das empresas interessadas apresentam a capacidade de produção e o custo de seus produtos, a fim de estabelecer contrato de fornecimento (BRA- SIL, 2001). Este processo é regido pela Lei 10.520/02 aplicando-se subsidi- 8.666/93. Esta modificação gerou dos, dentre os quais destaca-se a nistração Pública (BRASIL, 1993), na mesmo parecer também traz estima- ariamente as disposições da Lei 2002, o processo de compra era re- do pela lei que estabelece normas recursos públicos em demasia. O so de concorrência denominado ‘pre- a gerência do processo e a totalida- alizado na forma modalidade de li- nea, o que acabava por consumir mecanismo licitatório para o proces- e apenas 10% da quantidade neces- sária de complexo protrombínico ina- tatório de aquisição destes produtos forte cartelização, que segundo o “... por meio de uma observação preliminar do mercado reparou-se que há um pequeno número de firmas, homogeneidade dos produtos, baixo custo de monitoramento do cartel, ausência de estímulo à deserção e tecnologia de produção madura e semelhante, que geravam práticas anticoncorrenciais, com aptidão para gerar efeitos prejudiciais à concorrência e a livre iniciativa, nos termos da Lei 8.884/94”, Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 impactos positivos na política de aquisição de hemoderivados, conforme pode ser comprovado no Grá- fico 1. Os preços praticados foram reduzidos em até 36% garantindo aos 7 mil hemofílicos brasileiros que dependem da medicação a assistência ininterrupta da mesma. Outras ações relativas ao pro- cesso de gestão pública de hemo- derivados foram desencadeadas na esfera federal como, por exemplo, a ampliação e o aperfeiçoamento da hemorrede nacional, na qual Panorama da gestão de hemoderivados no Sistema Único de Sáude brasileiro: perspectivas e cenários para a auto-suficiência foram destinados recursos da or- to de plasma no país, buscando a meio de doações voluntárias, é fra- do de 1997 a 2001 (ANVISA/1999); dos. No tocante às ações educati- acordo celebrado recentemente en- dem de R$ 217,8 milhões no perío- elaboração da política nacional de sangue e hemoderivados , regida 2 pela Lei 10.205/01, que elabora um programa nacional de sangue com vistas a, no curto prazo, processar o plasma excedente e imple- mentar indústrias de fracionamen- auto-suficiência em hemoderiva- vas, destacam-se os investimentos da ordem de R$ 60 milhões para o Programa Nacional de Doação Vo- cionado no exterior, por meio de tre o Ministério da Saúde (MS) e laboratórios europeus. Segundo estimativas do MS, a luntária, que pretende ampliar o implementação da HEMOBRAS está or- de prevenir perdas por desvio de levará três anos para que sua plan- volume de sangue captado, além qualidade (BRASIL – ANVISA, 1999). çada em cerca de US$ 65 milhões e ta produtora esteja concluída e cinco anos para que o empreendimen- to seja autofinanciável. A perspecti- GRÁFICO 1 – Gastos na aquisição dos Fatores VIII e IX por ano versus preço em dólar va de produção desta empresa deve se dar no fracionamento de 400 a 500 mil litros de plasma por ano (BRASIL – ANVISA, 1999 ). Diante deste novo panorama em que passa a ser tratada a questão dos hemoderivados no Brasil, se faz necessária reflexão sobre possíveis intervenções e cenários, de modo a contribuir com a construção e consolidação da Política Nacional de Sangue e Hemoderivados, bem como fundamentar a proposta da HEMOBRAS. No que tange aos aspectos eco- Fonte: Rezende et al., Haemophilia 2005. nômicos, as perspectivas de incre- Seguindo a recomendação da Empresa Brasileira de Hemoderiva- que investigou aspectos inerentes à gundo seu estatuto, a empresa terá Comissão Parlamentar de Inquérito, falsificação de medicamentos, materiais hospitalares e insumos labo- ratoriais – CPI dos Medicamentos, ocorrida no ano de 2000 (BRASIL, 2000) –, o Governo Federal remeteu ao Congresso Nacional o projeto de lei que versa sobre a criação da 2 dos e Biotecnologia (HEMOBRAS). Se- a finalidade de explorar diretamen- te a atividade econômica consistente na produção de hemoderivados, prioritariamente para tratamento de pacientes do SUS, a partir de plas- ma obtido no Brasil (BRASIL, 2005). Hoje, o plasma captado no país, por mento da produção nacional apon- tam para um aumento do poder de negociação do país frente aos fornecedores de hemoderivados interna- cionais, colocando o Brasil num ce- nário favorável de redução dos gastos e propiciando o remanejamento dos recursos de pagamento de insu- mos para investimentos em tecno- logia. A previsão de contrapartida das esferas estadual e municipal Disponível em: www.anvisa.gov.br Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 65 PEREIRA, Esdras Daniel dos Santos & RODRIGUES, Luiz Cláudio de Queiroz vislumbra perspectivas de celerida- tretanto, ressalta-se a necessidade de resgatando os ditames da Lei 10.205/ ampliação da capacidade produtiva rios sanitários e tributários entre os 15 versa sobre o desenvolvimento de de no tempo de implementação e da HEMOBRAS, além de permitir a resolução de falhas regionais de aces- harmonização de marcos regulatópaíses-membros do bloco. A necessidade de incorporação de so e cobertura de serviços. Convém tecnologia e de conhecimento para a de a reforçar o pacto federativo no rivados torna imperativa a constitui- lembrar que tal medida também tenpaís, ao envolver a esfera federal, estadual e municipal em seu processo de gestão e financiamento. Outro viés a ser destacado re- mete às relações comerciais e de cooperação do país com outras nações, que serão de sobremaneira afetadas com a implementação da produção nacional de hemoderiva- dos, acarretando na modificação do perfil brasileiro, passando de im- portador para exportador destes insumos. Tal afirmação se embasa deflagração da produção de hemode- ção de uma relação formalizada entre a proposta da HEMOBRAS, e os cen- tros nacionais de produção do saber (universidades e institutos de saúde), de plasma que, se processados no país, dariam conta de 33,05% do volume importado de Fator VIII; 233,73% do volume importado de Fator IX; 254,47% volume importa- do de Imunoglobulinas e 84,99% do volume importado da Albumina, conforme demonstrado na Tabela 1. Outro ponto a ser considerado é o da geração de divisas qualifica- das para o Brasil, haja vista a agregação de conhecimento e tecnologia obtida por tal ação. Neste aspecto, destaca-se a potencialidade do Mer- cosul como mercado para o qual o país possa orientar a implementa- ção da prática de exportação. En- 66 ensino e pesquisa em hemoterapia e hematologia. A adequação da proposta estatutária da HEMOBRAS para tal questão pode desencadear um novo paradigma nesta relação, colocando assim o desafio de produzir hemo- derivados como alavanca para a geração de conhecimento e incremento da pesquisa nacional. TABELA 1 – Potencial de produção de hemoderivados versus importação em 2001 Produto Produção Fator VIII 102.884.375 UI 1.160.000 g 455.850 g 72.500.00UI Albumina 6.960.000g Imunoglobulinas Importação 34.800.00UI Fator IX Fonte: Política Nacional de Hemoderivados – ANVISA. na capacidade de coleta nacional, quando se obtém 288.909 litros/ano 01, que em seu capítulo III, artigo CONCLUSÃO O princípio da Equidade deve ser abordado nos processos de gestão sob a forma de olhares diferencia- dos para cada questão inerente ao tema Saúde, no qual a manutenção do direito à vida não pode ser dissociado dos aspectos econômicos. A temática dos hemoderivados per- 31.018.250 UI 8.189.190g % 33,05 233,73 254,47 84,99 colocando o país em destaque em relação às demais nações em desen- volvimento, possibilitando maior garantia de acesso a estes insumos essenciais, além de acrescentar as- pectos como agregação de tecnolo- gia e desenvolvimento de pesquisas, potencializando fatores que reafirmam a soberania nacional. Vale ressaltar que outros mati- passa uma demanda populacional zes ligados à hemofilia e coagulo- cando um eixo norteador de ações os para a gestão, como a implemen- específica e considerável, signifi- que podem resultar em realocação e otimização de recursos, gerando maiores benefícios sociais. A iniciativa de constituição da HEMOBRAS traz uma inovação no perfil gerencial de políticas de Saúde, Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 patias hereditárias indicam desafitação de acompanhamento na Aten- ção Básica; incentivo à doação voluntária de sangue e melhoria das ações de vigilância e controle sani- tário, visando o estabelecimento da Integralidade em Saúde. Panorama da gestão de hemoderivados no Sistema Único de Sáude brasileiro: perspectivas e cenários para a auto-suficiência REFERÊNCIAS BRASIL. Decreto nº 5.402/05. Presidência da República, Aprova o Es- tatuto da Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia – HEMOBRÁS, 2005. ais Hospitalares e Insumos de Laboratórios-Relatório Final, 2000. BRASIL. ANVISA 1999 – Relatório ano 1999 da Gerência Geral de Sangue e Hemoderivados – Disponível em www.anvisa.gov.br. BRASIL. Lei 8.666 /93.Congresso Na- BRASIL. Secretaria de Direito Econô- cional, Regulamenta o art. 37, in- tório Visando Apurar Prática de institui normas para licitações e mico/ Ministério da Justiça , RelaCartel em Licitações Promovidas pelo Ministério da Saúde para a Compra de Hemoderivados – Versão Pública-2004. BRASIL . Lei 10.520/02. Congresso Nacional Institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras providências, 2002. ciso XXI, da Constituição Federal, contratos da Administração Pública e dá outras providências, 1993. B ROOKER . M, Price ande Usage Variation. VI Global Forum of World Federation of Hemophilia 2005 – Disponível em www.wfh.org. IPEA. Economia da Saúde: Conceitos e Contribuição para a Gestão da Saúde. Brasília, 2002. REZENDE, S. M. et al, Knocking down the price of factor concentrate in Bra- zil. Haemophilia, 2005; 11: 290-291. BRASIL. Lei 10.205 /01. Congresso Nacional, Regulamenta o § 4º do art. 199 da Constituição Federal, relativo à coleta, processamento, estocagem, distribuição e aplicação do sangue, seus componentes e de- rivados, estabelece o ordenamento institucional indispensável à execu- ção adequada dessas atividades, e dá outras providências, 2001. BRASIL. CongressoNacional. Câmara dos Deputados, Comissão Parlamentar de Inquérito Destinada a Inves- tigar os Reajustes de Preços e a Fal- sificação de Medicamentos, Materi- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 62-67, janeiro 2007 67 GODOY, Marcia Regina et al ARTIGOS ORIGINAIS / ORIGINAL ARTICLES Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil1 Estimating earnings losses due to chronic renal disease in Brazil Marcia Regina Godoy2; Giacomo Balbinotto Neto3; Pedro Pita Barros4 & Eduardo Pontual Ribeiro5 RESUMO O artigo tem como objetivo estimar as perdas de rendimentos individuais devido a doença renal crônica. A partir de dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD/1998) são estimadas as perdas de rendimento através dos métodos dos mínimos quadrados ordinários e de regressão quantílica, que permite medir o impacto da doença sobre os rendimentos, ao longo da distribuição do salário no Brasil. Os resultados indicaram que os mais pobres têm maior redução de rendimento devido à doença renal crônica, sugerindo que políticas direcionadas para reduzir a incidência da doença renal crônica podem contribuir para a redução de desigualdade de rendimento. PALAVRAS-CHAVE: Regressão Quantílica; Perda de Rendimento; Doença Renal Crônica. ABSTRACT This paper estimates the earnings losses due to chronic renal disease in Brazil. Based on data from the National Household Sample Survey (PNAD/1998), the study estimates these earnings losses using the ordinary least squares and the quantile regression methods. The quantile regression method allows to measure the impact of illness on incomes, in association with wage distribution in Brazil. The results showed that the most affected are those with lower income, which demonstrates that policies aimed at reducing chronic renal disease would contribute to diminishing earnings inequalities. KEYWORDS: Quantile Regression; Earnings Losses; Chronic Renal Disease. 1 Esta pesquisa contou com o apoio financeiro da CAPES e CNPq. 2 Doutoranda em Economia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Mestrado em Economia – Universidade de Brasilia. 3 Professor Adjunto na UFRGS. Doutor em Economia pela USP. 4 Professor Catedrático na Universidade Nova de Lisboa. Doutor em Economia pela Universidade Nova de Lisba. 5 Professor Adjunto na UFRGS. Doutor em Economia pela University of Illinois. 68 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil INTRODUÇÃO Este ensaio tem por objetivo esti- mar as perdas de rendimento devido à doença renal crônica (DRC). A base cente dos economistas tem ocorrido nicos, a doença ainda pode ter ou- blicos e privados com o tratamento segundo a Sociedade Brasileira de em função dos elevados gastos púdos pacientes renais crônicos. O tratamento dos pacientes re- de dados utilizada é a Pesquisa Naci- nais crônicos tem importantes im- de 1998. A abordagem teórica utili- vados gastos em transplantes e no onal de Amostra de Domicílios (PNAD) zada é a teoria do capital humano e o modelo de demanda por saúde. O número de pacientes com in- suficiência renal crônica tem cres- cido bastante, tanto no Brasil quanto no resto do mundo, tornando-se plicações econômicas, pois há ele- tratamento de terapia renal substi- tutiva (TRS). A assistência médica aos pacientes é bastante dispendio- sa para o Sistema Único de Saúde (SUS). Segundo dados do DATASUS, um grave problema de saúde públi- ca (LESSA, 2004; SCHIEPPATI & REMUZI, 2005). A insuficiência renal crônica (IRC) é uma doença fatal, a menos que o paciente seja submetido a tratamento de terapia renal substitutiva (TRS) ou a transplante de rim. NÉRI & SOARES (2002), usando dados da PNAD/1998, verificaram que cerca de 5% dos entrevistados declara- O TRATAMENTO DOS PACIENTES RENAIS CRÔNICOS TEM IMPORTANTES IMPLICAÇÕES ECONÔMICAS, POIS HÁ ELEVADOS GASTOS EM TRANSPLANTES E NO TRATAMENTO DE TERAPIA RENAL SUBSTITUTIVA estudar aspectos ligados ao tratacipalmente propondo mecanismos SUS foram gastos em transplantes1, transplante renal (BARNEY & REYNOLDS, 1989; KASERMAN & BARNETT, 1991; BE- CKER & ELIAS, 2004; ROTH et al., 2005, SU & ZENIOS, 2005). O interesse cres- tes renais estão na faixa etária de 15 a 49 anos que, em conseqüência da insuficiência renal crônica, reduzem suas atividades profissionais durante o tempo de tratamento. Embora a solução mais eficaz para a IRC, desde que não haja contra-indicação médica, seja o transplante de rim, este pode demorar cerca de três po em que aguarda por transplante, o paciente é submetido à diálise3, porém suas atividades ficam mais res- tritas em virtude das longas horas dedicadas ao procedimento. Em geral, o paciente fica submetido à hemodiálise para a filtragem do sangue, em três sessões semanais, que duram cerca de quatro horas cada. das horas disponíveis para o trabaem 2004, 16% dos recursos desti- para diminuir as longas filas para em listas de espera para transplan- Deste modo, ocorre uma redução Desde o final da década de 1980, mento da doença renal crônica, prin- Nefrologia (SBN), 50% dos pacientes anos para acontecer. Durante o tem- ram ter doença renal crônica. vários economistas começaram a tras implicações econômicas pois, nados à cobertura hospitalar pelo e 13,17%2 dos recursos destinados à cobertura ambulatorial foram gastos em diálise. Além dos gastos públicos, com o tratamento dos pacientes renais crô- lho e outras atividades, o que, muitas vezes, inviabiliza o exercício de atividade profissional e pode influenciar as decisões de participação no mercado de trabalho e/ou de alocação de tempo para trabalhar. Corroborando com este raciocí- nio, analisando os registros da Central de Transplantes do Estado do Rio No ano de 2004, foram pagos pelo SUS 10.921 transplantes de órgãos e tecidos, sendo que 3.058 foram transplantes renais, os quais representaram um gasto de R$ 55.595.009,00. 1 2 Valor igual a R$ 1.010.858.392,53. 3 Dentre as técnicas de diálise, a hemodiálise é a mais utilizada, no Brasil: 89,77% dos pacientes recebem este tratamento (SBN, 2005). Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 69 GODOY, Marcia Regina et al Grande do Sul, verificamos que 62%4 seção três é feita uma análise des- saúde pode influenciar a obtenção e pera para transplante renal, não exer- crônica dentro de algumas faixas tal, isto porque, na busca da manu- dos pacientes inscritos na lista de escem atividade profissional, e que 52% dos pacientes da lista de espera estão na faixa etária de 18 a 50 anos. Dados da Sociedade Brasileira de Nefrologia mostram que dos critiva a respeito da doença renal salariais e educacionais; a seguir, são apresentados os resultados das estimações. Na seção quatro são tecidas as considerações finais. REVISÃO DA LITERATURA 58.808 pacientes em TRS no Bra- sil, 49,3% estão na faixa etária de 15 a 49 anos. Sendo assim, a manutenção de pacientes em TRS, por longo tempo, pode trazer sérias implicações econômicas. Os modelos de capital humano consideram que a saúde é a base para a produtividade do trabalho, Embora COELHO (2002, p.22) e NERI SAÚDE E EDUCAÇÃO mais presente nos níveis socioeco- nômicos mais baixos, e em muitos SÃO OS DOIS PILARES casos associada a condições de higiene, os autores não aprofundaram DA TEORIA DO a discussão. CAPITAL HUMANO Assim, este artigo busca, através de um estudo econométrico, verifi- liza o modelo de regressão quantíli- para o desenvolvimento intelectu- obter informações sobre o impacto cação são os dois pilares da teoria buição de salário no Brasil. O texto está organizado do se- guinte modo: além da introdução, na seção seguinte são discutidos alguns aspectos teóricos sobre ca- pital saúde e capital humano. Na 4 dados de saúde. A saúde pode afe- tar tanto o capital humano quanto o fisico. Uma vez que, com a presença de doenças graves, os indivíduos tendem a fazer um menor in- vestimento em educação. A redução do nível educacional pode, então, afetar os rendimentos do indivíduo. 1960, em virtude da preocupação cada vez maior com os problemas de crescimento econômico e melhor distribuição de renda. A teoria começou a ser desenvolvida com os estudos de Gary Becker. O pressu- posto central dessa teoria é o de que o capital humano é algo que pode de decisões de investimento em edu- mentos dos portadores de doença re- saúde, em alguns pontos da distri- sico e financeiro para adquirir cui- ser produzido, ou seja, é o produto car o impacto da DCR sobre os rendi- das variáveis de capital humano e indivíduos podem usar o capital fí- nhou força a partir da década de Brasil a doença renal crônica está ca para capital humano, visando tenção das condições de saúde, os A teoria do capital humano ga- & SOARES (2002) mostrem que no nal crônica no Brasil. Para tanto, uti- a manutenção das formas de capi- al, físico e emocional. Saúde e edu- do capital humano. Conceitualmente, as pessoas podem ter três tipos de capital: capital saúde, na forma da saúde do próprio corpo; capital humano, na forma de educação e cação ou em treinamento. Conside- ra-se, aí, que o grau de educação possuído por um indivíduo correla- ciona-se positivamente com os rendimentos pessoais, e buscam-se explicar as diferenças de produtivida- de dos indivíduos por diferenças no estoque de capital humano. Embora os trabalhos de BECKER capital físico; e financeiro na for- (1965) e MUSHKIN (1962) tenham in- TON , te do estoque de capital humano, os ma de bens ou ativos (CASE & DEA2003). Entretanto, o capital dicado que o capital saúde faz par- Fonte: Cálculos feitos pelos autores a partir do banco de dados da Central de Transplantes do Estado Rio Grande do Sul. 70 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil autores deram maior ênfase à edu- cação e não fizeram uma modelagem incluindo a variável saúde. modo simultâneo (JUDGE & PATTERSON, me a idade do indivíduo e conside- Nesse sentido, a saúde afeta os médicos elevam-se com a idade. Um 2001; KENEDY, 2003). O conceito do capital saúde deri- salários através de seus efeitos so- GROSSMAN (1972), em seu artigo se- Adicionalmente, há a suposição de va da teoria de capital humano. minal, construiu um modelo de de- manda para o capital saúde, eviden- ciando que o estado de saúde afeta a produtividade e influencia os salários dos indivíduos. De acordo com a teoria do capital humano, aumentos no estoque de capital de conhecimento eleva a pro- bre a produtividade do trabalhador. que os indivíduos mais saudáveis possuem maior estoque de capital humano, implicando que estes ten- deriam a ser mais produtivos do que correntes deste aumento de produti- vidade. Conseqüentemente, os indi- víduos teriam um incentivo para investir em educação e treinamento. A diferença entre capital humano e capital saúde se dá em função de o estoque de conhecimento de uma pessoa afetar sua produtividade; en- aumenta a eficiência com que os investimentos em saúde são produ- zidos. Deste modo, os indivíduos com maior nível educacional demandam mais cuidados de saúde. A análise dos impactos de doen- ças sobre os rendimentos tem cres- são baseia-se no modelo de GROSSMAN COX A teoria que permeia esta discus- cido na academia. MARCOTTE & WIL- (2003), através de regressão quantílica, estimaram as perdas de rendimento devido a doença mental HÁ A SUPOSIÇÃO DE QUE OS INDIVÍDUOS MAIS SAUDÁVEIS POSSUEM MAIOR ESTOQUE DE CAPITAL HUMANO, IMPLICANDO QUE ESTES TENDERIAM A SER MAIS PRODUTIVOS DO QUE AQUELES COM SAÚDE PRECÁRIA quanto que o estoque de saúde de- e verificaram que essas perdas são maiores em mulheres. KAHN (1998, p.895), utilizando o modelo tobit, verificou que os diabéticos têm rendimento inferi- or aos dos não-diabéticos. YOUNG et al. (1994, p.911) verificaram que a incidência do diabetes melitus e da doença renal crônica são inversamente correlacionadas com termina a quantidade total de tempo que ela pode ter em atividades pro- aspecto relevante é que a educação aqueles com saúde precária. dutividade dos indivíduos, podendo assim, obter ganhos potenciais de- ra que as despesas com cuidados o status socioeconômico. No Brasil, a pesquisa envolven- dutivas (GROSSMAN,1972, p.224) ou (1972), o qual busca explicar as va- do a questão da desigualdade de entre as atividades de mercado e as médicos, entendendo a saúde como sido discutida desde os anos 1960. como será feita a divisão de tempo de não-mercado (BOLIN et al., 2002). Segundo FUCHS (2004, p.655), a relação entre saúde e renda é forte. Muitos estudos têm indicado uma estreita relação entre renda e saú- de, uma vez que um estado de saúde pobre leva a baixos rendimentos, e que a baixa renda leva a uma piora do estado de saúde; ou seja, as variáveis são determinadas de riações na saúde e nos cuidados um estoque de capital durável que produz um tempo de vida saudável, renda, escolaridade e saúde tem Autores como NÉRI (1999), NÉRI & S OARES (2002), A LVES & A NDRADE utilizado nas atividades de lazer e (2002), THOMAS & STRAUSS (1997), de- estoque inicial de saúde, o qual se saúde no Brasil. trabalho. Os indivíduos herdam um deprecia com a idade e pode ser au- bateram a desigualdade de renda e THOMAS & STRAUSS (1997), utili- mentado por investimentos. zando os dados do Estudo Nacio- uma taxa de depreciação do esto- analisaram a relação entre saúde Desta forma, o modelo inclui que de saúde, que aumenta confor- nal de Despesa Familiar (ENDEF), e produtividade no trabalho. Os re- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 71 GODOY, Marcia Regina et al sultados por eles obtidos confir- fre alteração de acordo com o nível cuidados com a saúde, independen- forma de capital humano que in- da saúde sobre os rendimentos so- cas individuais. Contudo, o modelo mam a idéia de que a saúde é uma fluencia os rendimentos. KASSOUF (1999) utilizou dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN) de 1989 para avali- ar o impacto de condições inadequadas de saúde sobre os rendimentos de renda, e desta forma os impactos frem alterações ao longo da distribuição de renda. Deste modo, poder- se-iam obter estimativas mais acu- radas a respeito do impacto da saúde sobre os rendimentos. NÉRI & SOARES (2002) analisaram de homens (com idade de 18 a 65 a distribuição de ativos entre pobres que uma saúde precária provoca na questão da saúde e planos de saú- anos) no Brasil. A autora mostrou perdas tanto por meio da redução na probabilidade de o indivíduo partici- A SAÚDE É UMA FORMA DE CAPITAL autora, indicaram que as condições HUMANO QUE de saúde têm efeitos significativos INFLUENCIA OS sobre os rendimentos dos indivídu- os e que aqueles com IMC< 20 têm RENDIMENTOS menores taxas de salário. ALVES & ANDRADE (2002), utilizan- dos 10% mais ricos possuem planos evidências de que o estado de saú- dos 10% mais pobres o possuem. rioração da saúde com o tempo, in- fluenciando, assim, a variável auto- avaliação de saúde, que foi utilizada pelos autores. Além disto, a va- riável auto-avaliação de saúde so- 72 Diaz (2003) analisou as desigual- saúde no Brasil por meio da men- para a variável ‘auto-avaliação’ do nados pela Pesquisa Domiciliar sobre Padrões de Vida (PPV/1996). Os resultados obtidos pela autora revelaram a presença de desigualda- des que favorecem os indivíduos das camadas mais elevadas das escalas socioeconômicas. SESSO et al. (2003), investigando uma amostra de 118 pacientes do verificaram que existe correlação tos no Brasil. Os autores, através lo de GROSSMAN (1972) ocorre a dete- teoricamente esperados. Hospital de Clínicas de São Paulo, do dados da PNAD/1998, verificaram renda, pois de acordo com o Mode- encontrados por NÉRI & SOARES são os estado de saúde, com dados origi- ral (IMC). Os resultados, obtidos pela a inclusão de coorte para idade e tos em saúde, ou seja, os resultados suração de índice de concentração de saúde foi Índice de Massa Corpo- sível extensão desse trabalho seria alta tendem a fazer mais investimen- de. Os autores verificaram que 74% utilizada como proxy para o estado de afeta os rendimentos. Uma pos- mostra que aqueles com renda mais dades socioeconômicas na área da menor taxa de salários. A variável de um modelo logit, encontraram de demanda por saúde de Grossman e não-pobres enfocando a discussão par da força de trabalho quanto da a relação entre saúde e rendimen- te das características socioeconômi- de saúde, enquanto que, apenas 2,9% Além disto, verificaram que existe uma relação inversa entre estado de saúde e planos de saúde, isto é, aqueles com mais necessidades de atendimentos de saúde possuem entre o status socioeconômico e doença renal crônica. Além disso, os autores constataram que após um ano de hemodiálise os pacientes com maior status socioeconômico têm um aumento maior da qualidade de vida do que os com status socioeconômico mais baixo. RIVERA & CURRAIS (2004), utilizan- menos planos de saúde. Isto, segun- do dados da Pesquisa Domiciliar de eqüidade vertical, que diz que os examinaram, por regressão quantí- do os autores, contraria o princípio serviços de saúde devem ser distri- buídos segundo a necessidade de Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 sobre Padrões de Vida (PPV/1996) lica, a relação entre salários e saúde. Os autores também utilizaram Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil variáveis instrumentais para esti- tuar investimentos neles mesmos, consumo ao longo da vida são vis- utilizada como instrumento na equa- de conhecimento ou capital huma- mento, de tal forma que o consu- mar uma equação de saúde que foi ção de rendimento. Os resultados indicaram que escolaridade e renda afetam positivamente a renda e que ocorre o inverso diante de má qua- lidade de moradia. Na equação de rendimento, notaram que um melhor status de saúde aumenta o nível de rendimento para homens e mulhe- res. O uso regressão quantílica per- mitiu verificar que os impactos da saúde variam ao longo da distribuição, sendo que o primeiro quantil buscando aumentar o seu estoque no, de modo que ocorra uma ele- vação da sua produtividade e, conseqüentemente, aufiram maiores rendimentos. A fim de obter tais ganhos de produtividade, os indivíduos possuem incentivos para investir em educação ou treinamen- to. Através da relação custos de investimentos e retornos salariais, pode-se determinar o nível ótimo de investimento em capital humano. GROSSMAN (1972) buscou expandir (0.10) apresenta maior coeficiente. as aplicações da teoria do capital Modelo de Grossman por Saúde, em que as escolhas de Michael Grossman foi quem pri- humano e fez o modelo de Demanda meiro tratou o ‘bem’ saúde como um estoque de capital (1972). Ele midor pode escolher entre investir na sua própria saúde ou investir no mercado financeiro, de modo que a formação do capital saúde5 determina a quantidade de tempo que os indivíduos podem gastar para trabalhar e obter renda e para outras atividades. Assim, um aumento no estoque de saúde reduz a quantidade de tempo perdido por estar enfermo, permitindo maior nível de rendimento. O modelo de Grossman usa uma função de utilidade intertemporal de um consumidor típico: U = U (φ o H o ,..., φ n H n , Z o ,..., Z n ) construiu um modelo que explica onde: dicos, em termos de variações de Hi = estoque de saúde no tempo i variações na saúde e cuidados mé- tas como um problema de investi- Ho = estoque de saúde herdado curvas de oferta e de demanda pelo φi = fluxo de serviço por unidade de estoque de pode ser vista como um bem de Zi = total de consumo de outros bens no período i. função ‘utilidade’ dos indivíduos e Por (1) temos que a função utili- ‘bem’ saúde. Nesse modelo, a saúconsumo que entra diretamente na hi = φi Hi consumo total de serviços de saúde também como um ‘bem de capital’ dade do consumidor depende tanto DO, também desse estoque em cada que permite dias saudáveis (ACEVE2000). De certo modo, pode-se dizer que este modelo foi oriundo da teoria do capital humano desenvolvida por Gary Becker. Os trabalhos de Becker eviden- ciam que os indivíduos podem efe- (1) do estoque de saúde herdado, como momento do tempo; além do consumo de outros bens. trição de recursos. Além disto, (1) está sujeita a algumas restrições: a) Depreciação O Modelo de Grossman assume O tempo de vida depende da que, em cada período, o consumi- utilidade sujeita a produção e res- que o investimento líquido no esto- quantidade de Hi que maximiza a dor faz investimentos em saúde e Capital saúde é a acumulação de fontes de saúde, tanto físico como psicossocial, que podem ser herdados ou adquiridos durante os estágios da vida que vai determinar a saúde atual e a saúde potencial no futuro (KIISKINEN, 2002, p.9). 5 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 73 GODOY, Marcia Regina et al que de saúde é igual ao investimento bruto, menos a depreciação: Hi+1 – Hi = Ii - δHi onde: (2) Ii = investimento bruto δ = taxa de depreciação durante o período i. A taxa de depreciação é assu- mida como exógena, mas ela pode variar de acordo com a idade. b) Funções de Produção Os consumidores fazem inves- timento bruto em saúde e em outros bens, que estão presentes na sua função de utilidade e variam de acordo com um conjunto de função de produção: ( 3’ ) ( 3’’ ) onde: Mi = cuidado médico (serviços mé- dicos, medicamentos, etc.) educadas produzem investimento em saúde de forma mais eficiente. GROSSMAN (1972) assumiu que uma mudança no capital humano afeta a eficiência do processo de produção nas atividades não-mercado, bem como a mudança de tecnologia muda eficiência do processo de produção no setor onde: Pi e Vi = preços de Mi (cuidados médicos) e Xi (outros bens), Wi = taxa salarial, TWi são as horas de trabalho, Ao = renda descontada, r = taxa de juros. d) Restrição de Tempo mercado. Ele definiu também que todas as funções de produção de seu A restrição de tempo requer que modelo são homogêneas de grau 1, Ω, o tempo total disponível em qual- tária no modelo. Conseqüentemente, de todos os possíveis usos. isto implica que não há ilusão monea função de investimento bruto em saúde pode ser escrito como: I i = M i g (t i ; E i ) ( 4 ) onde: ti = TH i M i . Segue que os produtos marginais do tempo e dos cuidados médicos na função de produto do investimento bruto em saúde são dados por: quer período, seja exaurido através TW i + TL i + TH I + Ti = Ω ( 7 ) onde: Ω representa o tempo total dispo- nível em cada período, que é dado por: TW (tempo dedicado ao trabalho) + (tempo perdido devi- do à doença) + TH (tempo usado para produzir investimento em saú- de) + T (tempo para produzir outros bens (Z)).6 Por (7) pode ser notado que os indi- Xi = insumos na produção de Zi, ∂I i ∂g = = g´ ( 5’ ) ∂TH i ∂ti usado na produção de saúde e ou- ∂I i = g − ti g´ ( 5’’ ) ∂M i a) dividir o tempo entre trabalho c) Restrição Orçamentária b) dividir o tempo restante de la- THi e Ti = insumos tempo (tempo tras atividades) Z i = consumo de bens em cada período i, Ei = estoque de capital humano. E corresponde a educação e busca transmitir a idéia de que a produtividade na produção de investimento em saúde (3’) depende do nível de educação, isto é, pessoas mais 6 A equação (6) representa o valor presente dos rendimentos, que é igual ao valor presente dos bens da cesta orçamentária, durante o ciclo víduos têm um conjunto de decisões: e lazer; zer na produção de saúde e outros bens; c) dividir o rendimento gerado entre bens intermediários para a produ- de vida, mais a renda descontada: ∑ PM W TW i i + Vi X i = ∑ i ii + A0 ( 6 ) i (1 + r ) (1 + r ) d) investir em saúde para o perío- O modelo assume que TLi é inversamente relacionado ao estoque de saúde, isto é, ∂TLi / ∂Hi<0. 74 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 ção de saúde e do bem consumo; do seguinte. Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil O tempo perdido com doenças é dado pelo tempo total disponível, feitas no modelo de GROSSMAN (1972) , dado ano. BOLIN, JACOBSSON & LINDBERG (2002) que menos os dias saudáveis em um TLi = Ω – hi . ( 8 ) Se Ω (7) for mensurado em dias e se φi for definido como o fluxo de dias saudáveis por unidade de Hi, hi será igual ao número total de dias saudáveis em um determinado ano. Considerando que, se a taxa de depreciação do estoque de saúde fos- se constante, um aumento em THi aumentaria Ii e Hi+1, e reduziria TLi+1. Então, THi e TLi+1 seriam negativa- mente correlacionadas. De maneira simplificada, pode-se dizer que os principais pontos deste modelo são: a) a idade é negativamente correlacionada com o capital saúde, mas positivamente correlaci- onada com os gastos em cuidados METODOLOGIA Várias extensões teóricas já foram 7 Descrição dos Dados como, por exemplo: o trabalho de analisa como se dá a demanda de saúde dentro das famílias, buscando verificar como se dá a distribuição dos investimentos em saúde entre os membros da família. Os autores assumem a hipótese da existência de incerteza nos investimentos em saú- de. São modeladas tanto as decisões A análise é baseada na PNAD de 1998, suplemento saúde. Essa pes- quisa é realizada anualmente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), contudo as questões de saúde não são abordadas todos os anos. Vale ressal- tar que, infelizmente no Brasil não de investimentos em saúde seja para existe pesquisa que faça acompa- (marido e esposa), como também para indivíduo, impedindo dessa forma família com apenas dois membros nhamento temporal de um mesmo famílias com filhos. Segundo os au- a aplicação de estudo por dados tores, os indivíduos nas famílias não produzem apenas saúde para si, mas em painel. A PNAD cobre todo o território bra- também para os outros membros. sileiro, exceto a área rural da região que os indivíduos não sabem com pre- tadas 344.975 pessoas, distribuídas LILJAS (1997) introduz a incerteza, já cisão a idade em que morrerão. Norte. Na PNAD/1998 foram entrevispelas faixas etárias da Tabela 1: TABELA 1 – Distribuição por faixa etária – PNAD/1998 com saúde; b) a taxa salarial dos Faixa etária (anos) Freqüência Percentual Perc. acumulado cionada tanto com a demanda por 18 a 24 045.246 013,12 050,00 cuidados de saúde; c) a educação é 30 a 34 indivíduos é positivamente correla- 0 a 17 saúde, quanto com a demanda por 25 a 29 positivamente correlacionada com o capital saúde, mas negativamente correlacionada com os gastos com cuidados de saúde; d) os que possuem maior nível educacional deman- dam maior estoque ótimo de saúde; 35 a 39 40 a 44 45 a 49 acima de 50 Total 127.233 027.235 026.788 024.731 021.914 017.628 054.299 344.974 036,88 007,89 007,77 007,17 006,32 005,11 015,74 100 036,88 057,89 065,66 072,83 079,15 084,26 100,00 Fonte: Dados da pesquisa. e) que o bem saúde é uma commodi- ty que é produzida individualmente. 7 GROSSMAN (1999) apresenta e discute várias destas extensões. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 75 GODOY, Marcia Regina et al A renda dos entrevistados está distribuída conforme a Tabela 2. Em relação à auto-avaliação de saúde, a Tabela 3 mostra que pou- cos indivíduos com doença renal crônica relataram ter um estado de saúde “muito bom” e “bom”. Como pode ser verificado na Ta- bela 4, a doença renal crônica não está distribuída uniformemente por escolaridade. Nota-se que, quanto menor os anos de estudo, maior é a taxa de incidência. Percebe-se que a taxa de incidência dos indivíduos com um ano de estudo é quase cinco vezes superior aos com 14 anos de estudo. Considerando os dados aqui ex- TABELA 2 – Distribuição da renda – PNAD/1998 Renda (em Reais) Freqüência Percentual Perc. Acumulado 101 a 200 035,676 013.00 072.05 301 a 400 013,592 Até 100 201 a 300 401 a 500 501 a 1.000 0008.11 008,711 0003.17 0004.95 0006.69 0002.13 003,043 2.001 a 5.500 0001.11 004,199 5.501 a 10.000 0001.53 000556 Acima de 10.000 0000.20 000139 Total 00000.05 274.386 100 059.05 080.16 085.12 088.29 094.98 097.11 098.22 099.75 099.95 100.00 Fonte: Dados da pesquisa. TABELA 3 – Auto-avaliação de saúde dos indivíduos com e sem doença renal crônica – PNAD/1998 Sem DRC Nº de Pessoas % 91.694 99.54 175.861 98.69 56.406 93.29 9.001 86.47 1.876 83.56 Auto-avaliação de Saúde as perdas de rendimentos em função Muito bom da doença renal crônica ao longo da Bom distribuição de rendimento. Regular Modelo Econométrico: regressão quantílica rendimentos, é utilizada a metodo- 022,246 005,837 1.501 a 2.000 tílica permite verificar como ocorrem ça de doença renal crônica sobre os 059.05 018,357 1.001 a 1.500 postos, a técnica de regressão quan- Para verificar o efeito da presen- 162,030 Ruim Muito Ruim Pearson chi2(5) = 1.4e+04 Pr = 0.000. Com DRC Nº de Pessoas % 423 0.46 2.343 1.31 4.056 6.71 1.408 13.53 369 16.44 TABELA 4 – Distribuição dos casos de DRC por anos de estudo – PNAD/1998 logia de regressão quantílica, desen- Anos de Estudo % Não tem DCR % tem DCR Total A regressão quantílica permite ana- 2 95,10 4,90 100 volvida por KROENKER & BASSET (1978). 1 94,66 5,34 100 lisar o impacto das variáveis expli- 3 95,24 4,76 100 condicional da variável dependente 5 96,08 3,92 100 cativas ao longo da distribuição (lnw = salário), enquanto que a regressão de mínimos quadrados es- tima apenas o efeito médio do impacto de uma variável. 76 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 4 6 7 8 9 95,39 970,0 4,61 30,0 100 100 97,17 2,83 100 97,36 2,64 100 97,31 2,69 100 Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil TABELA 4 – Distribuição dos casos de DRC por anos de estudo – PNAD/1998 (continuação) Anos de Estudo % Não tem DCR % tem DCR Total 11 98,30 1,70 100 10 98,10 12 98,11 13 98,27 14 98,89 15 98,53 16 98,39 Total 96,85 1,90 1,89 100 100 1,73 100 1,11 100 1,47 100 1,61 100 3,15 100 Fonte: Dados da pesquisa. A Figura 1 fornece uma ilustração dos ajustes aos dados pretendidos com uso de estimações por quantis, em contraste com a regressão estimada por Mínimos Quadrados (MQO). FIGURA 1 – Ajustes das Regressões por MQO e Regressão Quantílica Fonte: Silveira Neto & Campelo (2003). Os modelos de regressão quantílica têm sido bastante utilizados para estudar o retorno das variáveis do capital humano, desigualdade e renda no Brasil. Nesse sentido, trabalhos como os de RIBEIRO (2001), SILVEIRA NETO & CAMPELO (2003), ARABSHEIBANI, CARNEIRO & HENLEY (2003), JUSTO (2004) entre outros, exploram esta abordagem. O modelo de regressão quantílica pode ser escrito como: ln w i = x i β θ + µ θi , Quant θ (ln w i | x i ) = x i β θ , ( 9 ) onde xi é um vetor de variáveis exógenas e condicional de lnw dado x, onde θ ∈ (0,1). β θ é um vetor de parâmetros. Quantθ (ln wi | xi ) denota o quantil Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 77 Segundo Vieira (1999, p.100), o objetivo é estimar o vetor de parâmetros desconhecidos βθ para di- min n −1 ∑ θ y t − x t β + b∈ℜ t∈{t:y t ≥ x t β } em que ρ é a função “check” de- finida por: (10.1) θ u, ρ θ (u) = (θ − 1)u, ferentes valores de θ ∈ (0,1). A re- gressão quantílica pode ser vista como uma extensão natural dos onde a função ρθ multiplica os resí- possuem comandos próprios para do conjunto de dados; • Regressão quantílica é robusta quantis mais freqüentemente estimados são: 0,1; 0,25; 0,50; 0,75 e 0,90. Deste modo, a regressão quantílica permite descrever como ocorre o impacto das variáveis explicativas sob a dependente ao longo da distribuição. De acordo com SILVA & PORTO JUNIOR (2004), as principais vantagens da regressão quantilica são: • A técnica de regressão quantílica permite caracterizar toda distri- buição condicional de uma variável resposta a partir de um conjunto de regressores; • A regressão quantílica pode ser usada quando a distribuição não é gaussiana; Muitos pacotes econométricos já esta finalidade, tais como R, SPLUS, Stata, SHAZAM, entre outros. Uma das justificativas para o a outliers; uso de tal metodologia neste ensaio cional da variável resposta, po- tar distribuída uniformemente entre dem-se estimar os intervalos de quantis podem ser obtidos. Os ( 10 ) considerando a totalidade dos da- gulares de cada quantil é obtida para que desta forma sejam trataCom a variação de θ, diferentes qual assume a seguinte forma: ta a estimação dos parâmetros. • Por utilizar a distribuição condi- dos assimetricamente. εt , o • A estimação dos coeficientes an- duos por θ se eles forem não-nega- tivos e por (θ – 1) caso contrário, um modelo linear yt =Xtβ + n −1 (1 − θ) y − x β = min n ρ θ (y t − x t β) ∑ ∑ t t t∈{t : y t < x t β } i = 1 dos, ou seja, não há subamostras u ≥ 0 u < 0 quantis amostrais para o caso de confiança dos parâmetros e do regressando diretamente dos quantis condicionais desejados; • Como os erros não possuem uma distribuição normal, os estimadores provenientes da regressão quantílica podem ser mais eficientes que os estimadores por meio de MQO; • A regressão quantílica pode ser representada como um modelo de programação linear, o que facili- se dá em função da doença não esos decis de rendimento – conforme Quadro 1 –, havendo redução da incidência com o aumento da renda (YOUNG et al., 1994, NÉRI & SOARES, 2002), ou seja, nos decis de renda mais baixos a presença de doença renal crônica é maior, e diminui ao longo da distribuição. A equação de rendimento estima- da depende de características individuais como sexo, cor, idade e ca- racterísticas de capital humano, escolaridade e presença de doença renal, e é expressa por: log Wθ = α 0θ + α 1θ E + α 2θ S + α 3 I + α 4θ I 2 + α 5θ D + α 6θ B + ε θ (11) onde: doença renal crônica e 0 em caso (v0610); I: idade (v8005); S: sexo dummy que é igual a 1 se o indiví- W: renda; E: anos de estudo (v0302); D: dummy que é igual a 1 se o indivíduo reporta a presença de contrário; B (branco) (v0404): duo é branco e 0 em caso contrário, θ denota o quantil estimado. QUADRO 1 – Presença de doenças crônicas, segundo decis de rendimento – PNAD/1998 Tem doença de coluna ou costas Tem artrite ou reumatismo Tem câncer Tem diabetes Tem bronquite ou asma Tem hipertensão Tem doença do coração Tem doença renal crônica Tem depressão Tem tuberculose Tem tendinite ou tenossinovite Tem cirrose Fonte: Néri & Soares (2002). A variável dependente (lnw) é o 1 40,8 18,9 0,1 1,4 2,4 13,9 3,6 6,3 6,0 0,3 2,3 0,2 2 44,0 23,3 0,2 2,5 3,6 20,3 6,3 5,6 6,8 0,2 2,7 0,3 3 37,4 17,9 0,3 3,3 3,6 21,9 7,4 5,4 8,1 0,2 2,7 0,5 4 35,0 17,5 0,4 3,2 4,6 20,7 8,5 6,6 8,1 0,3 2,9 0,4 Decil de Rendimento 5 33,2 13,7 0,3 3,5 4,2 19,4 7,2 5,9 6,6 0,1 2,5 0,4 6 32,1 15,3 0,4 4,2 5,2 21,0 8,3 5,2 7,3 0,2 2,9 0,2 7 28,9 12,4 0,4 3,7 4,0 21,0 7,8 4,3 7,3 0,1 2,7 0,3 A utilização do salário-hora faz logaritmo do salário-hora, e foi ob- com que seja melhor identificado o to total (v4719),8 dividida pelo nú- nal crônica (v1316), controlando des- tida através da variável rendimenmero de horas trabalhadas (v4707) e multiplicada por 4. impacto da presença da doença re- te modo, o problema da utilização da variável rendimento total (v4719) 8 27,4 11,6 0,5 4,5 3,7 21,6 6,9 3,9 6,7 0,1 2,6 0,3 9 26,2 9,7 0,6 4,8 3,2 20,6 7,1 3,8 6,5 0,1 3,1 0,2 10 22,5 8,3 0,6 5,1 3,2 19,7 6,9 2,8 6,1 0,1 3,9 0,2 Total 32,7 14,9 0,4 3,6 3,8 20,0 7,0 5,0 6,9 0,2 2,8 0,3 que pode ser afetada pela redução do número de horas trabalhadas pelos indivíduos com doença renal crônica, já que, teoricamente, uma pessoa doente tende a trabalhar menos tempo em decorrência da doença (THOMAS & STRAUSS, 1997). TABELA 5 – Estatística Descritiva – PNAD/1998 – Brasil (18 a 55 anos – Mulheres) Variável Média Idade Renda em R$ Anos de Estudo Horas semanais de Trabalho 37.47 293.44 7.04 037.40 Fonte: Dados tabulados pelos autores. Com DRC Desvio Min Padrão 9.36 18 449.81 8 4.21 1 15.19 2 Max Média 55 6150 16 98 33,94 427.03 7,78 38.23 Sem DRC Desvio Min Padrão 9.77 18 656.25 3 4.39 1 13.91 1 Média 34.18 628.26 7.55 45.43 Sem DRC Desvio Padrão Min 10.0 18 1012.78 5 4.31 1 12.04 1 TABELA 6 – Estatística Descritiva – PNAD/1998 – Brasil (18 a 55 anos – Homens) Variável Idade Renda Anos de Estudo Horas semanais de Trabalho Fonte: Dados tabulados pelos autores. 8 Média 39.01 533.45 5.94 47.20 Com DRC Desvio Padrão 9.21 873.79 4.09 12.80 Min 18 4 1 2 Max 55 15.000 16 98 Max 55 20.000 16 98 Max 55 20.000 16 98 Nota: os números das variáveis entre parênteses referem-se ao código da variável atribuído pelo IBGE na PNAD/1998. GODOY, Marcia Regina et al Nas Tabelas 5 e 6, nota-se que a anos, com renda maior que R$ 1,00. resultados mais consistentes, as doença renal crônica é menor do que valo de idade é que, segundo a Soci- bootstrapping de cem replicações. renda média dos indivíduos com a dos demais. As mulheres com doença renal crônica recebem cerca de 45,52% menos do que as que não têm a doença. No caso dos homens A justificativa para utilizar tal interedade Brasileira de Nefrologia, a maior parte dos pacientes renais crônicos situam-se nesta faixa etária. De início, utilizou-se o método de esta diferença é muito menor mínimos quadrados ordinários para número de anos de estudo é menor doença renal crônica sobre os rendi- (17,77%). Percebe-se ainda que o entre os indivíduos com DRC. Em relação ao número de horas de trabalho por semana, as Tabelas 5 e 6 mostram que, em média, os verificar o impacto da presença da mentos em diversas faixas de renda. Os resultados estão apresentados no Quadro 2 e mostram que nas faixas homens com doença renal crônica trabalho do que os que não têm a OS HOMENS DOENTES doença. No caso das mulheres, ocorre o inverso, ou seja, as mulheres OFERTAM MAIS HORAS que não têm DRC trabalham mais horas do que aquelas que têm do- DE TRABALHO DO QUE ença renal crônica. Este padrão é si- OS NÃO DOENTES milar ao encontrado por ALVES (2002), que verificou que os homens doen- pelas metodologias de mínimos quadrados ordinários e de regressão quantílica. Os resultados foram obtidos utilizando o software Stata, versão 8.2. As estimações foram feitas utilizando dados da PNAD/1998. A amostra utilizada contém 111.988 observações de homens e mulheres com idade entre 18 e 55 80 por gênero, para os quantis 0,10, 0,25, 0,50, 0,75 e 0,90. Tal proce- dimento permite fazer uma análi- se mais adequada dos impactos da doença renal crônica. No Quadro 3 encontram-se os re- sultados das estimações para a amos- tra total. Logo adiante, nos Quadros 4 e 5, são apresentados os resulta- Os resultados obtidos mostraram que todos os sinais das variáveis são os esperados teoricamente e significativos estatisticamente. A variável cor apresenta sinal positivo, indicando que os indivíduos brancos têm maior rendimento. O coeficiente da variável sexo mos- to menor do que os homens, pois o do que os não doentes. resultados econométricos obtidos conjuntamente quanto separada tra que as mulheres têm rendimen- tes ofertam mais horas de trabalho Nesta seção são apresentados os As estimações foram feitas tanto dos das estimações por gênero. ofertam maior número de horas de RESULTADOS ECONOMÉTRICOS estimativas foram obtidas com de renda mais baixas (de R$ 2,00 a R$ 900,00) a variável renal é signifi- cativa, indicando que os indivíduos mais pobres são os que têm mais coeficiente da variável tem sinal negativo, indicando desta forma a existência de discriminação no mercado de trabalho para mulheres. O impacto da presença de doen- perda de rendimento. Os resultados ça renal crônica é mais importante dos neste trabalho revelam que os dos quantis. Os resultados indicam de SESSO et al. (2003) e os encontra- indivíduos dos estratos sociais mais baixos sofrem maior impacto com a doença renal crônica. A seguir a equação (11) foi es- timada via regressão quantílica simultânea (SQREG). De modo a obter Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 no quantil 0,25 e diminui ao longo que o impacto da presença de DRC varia entre 10,3% e 13,2%. O valor do coeficiente no quantil 0,90 sugere que os rendimentos dos indivídu- os neste quantil são menos sensíveis à presença da DRC. Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil QUADRO 2 – Resultados das Estimações por Mínimos Quadrados Ordinário por Faixa de Renda Variável dependente: lnw Renal Sexo Estudo Idade Idade 2 Branco Constante Nº Observações R2 R$ 2 a R$ 179 R$ 180 a R$360 R$361 a R$600 R$601 a R$900 R$901 a R$1300 R$1301 a R$1800 R$1801 a R$2500 R$2501 a R$5000 R$ 5.001 a R$10.000 Mais de R$10.000 0.067 (10.87)** 0.090 (20.53)** 0.107 (17.79)** 0.102 (11.68)** 0.093 (9.16)** 0.090 (6.88)** 0.083 (5.56)** 0.071 (4.00)** 0.080 (1.84)* 0.315 (2.43)*** -0.042 (2.60)** 0.039 (43,62)** 0.0170 (8.66)** -0.019 (6.79)** 0.055 (9.12)** 1.555 (47.68)** 31838 0.0818 -0.0405 (3.51)** 0.028 (47.02)** 0.063 (4.42)** -0.037 (1.83)* 0.3185 (8.03)** 2.501 (103.08)** 35764 0.1046 -0.046 (3.01)** 0.022 (31.38)** -0.037 (1.91)* 0.007 (2.90)** 0.134 (2.73)** 3.319 (96.51)** 20364 0.1008 -0.052 (2.22)*** 0.023 (22.09)** -0.451 (1.41) 0.008 (1.97)*** 0.014 (2.02)*** 3.771 (65.24)** 8528 0.1114 -0.024 (0.80) 0.020 (16.18)** -0.046 (1.13) 0.007 (1.37) 0.000 (0.04) 4.170 (54.12)** 6273 0.0824 -0.032 (0.93) -0.030 (0.73) 0.020 (11.83)** 0.020 (11.57)** -0.057 (0.96) -0.061 (0.87) 0.010 (1.28) 0.010 (1.21) -0.002 (0.23) 4.780 (34.55)** 3257 2772 0.0797 0.019 (7.91)** -0.064 (0.70) 0.012 (0.70) 0.000 (0.04) 4.504 (40.59)** 0.053 (0.83) 0.0701 0.005 (0.29) 5.229 (28.35)** 2573 0.0406 -0.203 (3.00)** -0.000 (0.00) -0.019 (0.89) 0.290 (1.09) 0.009 (0.23) 6.390 (14.02) 545 0.0215 0.022 (0.16) -0.071 (2.77)** -0.179 (0.39) 0.025 (0.46) 0.116 (1.12) 8.023 (8.78)** 98 0.1822 QUADRO 3 – Resultados das Estimações por MQO e Regressão Quantílica Sexo Estudo Idade Idade 2 Branco Renal Constante R2 / Pseudo R2 MQO RQ .10 RQ .25 RQ .50 RQ .75 RQ .90 0.141 (258.33)** 0.122 (111.90)** 0.130 (172.00)** 0.141 (215.07)** 0.147 (212.91)** 0.150 (162.88)** -0.359 (78.23)** 0.874 (54.74)** -0.088 (38.52)** 0.104 (23.36)** -0.111 (8.33)** 0.246 (9.30)** 0.44 -0.308 (35.28)** 0.717 (32.77)** -0.077 (24.66)** 0.101 (12.76)** -0.112 (4.72)** -0.127 (3.51)** 0.1704 -0.324 (64.00)** 0.793 (36.49)** -0.083 (27.27)** 0.110 (19.25)** -0.132 (7.15)** 0.051 (1.39) 0,2155 Estatística t entre parênteses. ** Significante a 1%. Nº Observações: 111.988. -0.359 (65.71)** 0.878 (40.93)** -0.383 (54.43)** 0.947 (39.98)** -0.089 (29.00)** -0.093 (26.64)** -0.119 (7.91)** -0.115 (5.77)** 0.108 (18.28)** 0.233 (6.66)** 0.2610 0.104 (20.66)** 0.485 (12.93)** 0.3033 -0.378 (42.75)** 1.014 (26.61)** -0.099 (18.08)** 0.101 (12.80)** -0.103 (5.26)** 0.744 (12.00)** 0.3213 A variável estudo teve sinal posi- de estudo é maior para os indivídu- os adultos entre 18 e 55 anos, a qual taxa de retorno de anos adicionais senta os retornos de escolaridade para são mais elevados no percentil 0,90. tivo e significativo, e revela que a os do quantil 0,90. A Tabela 7 apre- também evidencia que os retornos Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 81 GODOY, Marcia Regina et al Para obter maior robustez dos resultados estimou-se as regressões TABELA 7 – Retorno (em lnw) de Anos de Escolaridade por percentil – Adultos de 18 a 55 anos Categoria de Escolaridade (anos de estudo) Não sabe ler 1- 3 4 5- 8 9-11 >12 por gênero. Sendo os resultados apresentados no Quadro 4. Os resultados das regressões quantílicas para o sexo masculino e feminino são similares aos obti- dos para a amostra completa, sen- A variável de interesse deste es- tudo (renal) apresenta coeficiente negativo, de monta. Para os ho- mens, o coeficiente é mais alto no quantil 0,25 e diminui ao longo da distribuição condicional de salário, variando entre 11,3% e 14,8%. Já no caso do sexo feminino, os valores Estudo Idade Idade 2 Branco Renal 0,10 é o que apresenta maior coefi- R2 / Pseudo R2 ciente. A comparação dos valores dos coeficientes da variável renal para o sexo masculino e feminino sugere que a presença de doença renal crônica tem menor impacto sobre os rendimentos das mulheres. Em síntese, os resultados suge- rem que doença renal crônica têm impacto negativo sobre os rendimen- tos. A utilização da técnica de regressão quantílica permitiu verifi- car que este impacto é muito mais importante nos quantis de renda mais baixos. De modo geral, os resultados encontrados são similares aos de RIVIERA & CURRAIS (2004), que Mediana p 75 p 90 1.504 1.792 1.897 2.095 2.383 3.219 1.897 2.095 2.383 2.526 2.862 3.807 2.303 2.526 2.813 2.996 3.401 4.423 2.788 3.076 3.337 3.481 3.992 5.043 3.258 3.507 3.807 3.973 4.605 5.521 QUADRO 4 – Resultados das Estimações por MQO e Regressão Quantílica – Sexo Masculino dos coeficientes são menores, vari- ando de 6,9% a 10,4%, e o quantil p 25 Fonte: Dados tabulados pelos autores. do todos os sinais esperados e estatisticamente significativos. p 10 Constante MQO 0.135 (185.12)** 0.924 (45.62)** -0.095 (32.78)** 0.228 (38.73)** -0.130 (7.58)** 0.140 (4.18)** 0.45 RQ .10 0.115 (102.07)** 0.778 (22.98)** -0.087 (18.18)** 0.208 (21.84)** -0.113 (4.53)** -0.206 (3.51)** 0.1704 RQ .25 0.123 (142.90)** 0.853 (33.59)** -0.092 (25.39)** 0.219 (29.79)** -0.148 (7.27)** -0.041 (0.96) 0.2155 RQ .50 0.136 (152.65)** 0.947 (48.01)** -0.099 (34.95)** 0.219 (31.85)** -0.137 (6.73)** 0.101 (3.16)** 0.2610 RQ .75 0.143 (147.74)** 0.991 (33.02)** -0.099 (23.27)** 0.217 (26.81)** -0.132 (5.76)** 0.380 (7.74)** 0.3033 RQ .90 0.144 (110.44)** 1.045 (28.86)** -0.101 (20.25)** 0.231 (19.68)** -0.118 (3.03)** 0.653 11.28)** 0.3213 Estatística t entre parênteses. ** Significante a 1%. Nº Observações: 68.688. Quadro 5 – Resultados das Estimações por MQO e Regressão Quantílica – Sexo Feminino9 Variável dependente: lnw Estudo Idade Idade 2 Branco Renal Constante R2 / Pseudo R2 MQO 0.135 (155.59)** 0.785 (31.03)** -0.078 (21.55)** 0.238 (33.38)** -0.092 (4.35)** 0.045 (1.08) 0.45 RQ .10 0.123 (64.43)** 0.611 (12.22)** -0.063 (8.74)** 0.237 (16.75)** -0.104 (2.99)** -0.331 (4.00)** 0.1885 RQ .25 0.127 (105.21)** 0.684 (22.36)** -0.069 (15.13)** 0.232 (25.02)** -0.087 (3.75)** -0.115 (2.23)* 0.2216 RQ .50 0.132 (132.70)** 0.776 (28.16)** -0.077 (19.69)** 0.236 (30.21)** -0.086 (3.26)** 0.079 (1.66) 0.2643 RQ .75 0.140 (121.76)** 0.874 (26.01)** -0.087 (17.73)** 0.240 (21.70)** -0.069 (3.46)** 0.251 (4.53)** 0.3012 Estatística t entre parênteses. ** Estatisticamente significante ao nível de 1%. Nº Observações: 43.324. RQ .90 0.144 (96.28)** 0.934 (23.65)** -0.091 (15.82)** 0.257 (20.47)** -0.072 (2.00)* 0.506 (7.56)** 0.3127 A utilização do procedimento de Heckman (1979, 1990), que trata do problema de viés de seleção, pode melhorar as estimativas para o sexo feminino em função das decisões de participação no mercado de trabalho. Contudo, neste artigo, não foi utilizado tal procedimento. 9 82 Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil verificaram que um melhor estado sível calcular a perda total causada bre os rendimentos. rando seus efeitos sobre a partici- de saúde tem impacto positivo so- CONCLUSÃO O principal objetivo deste ensaio pela doença renal crônica, conside- pação no mercado de trabalho, o número de horas trabalhadas e o salário-horário. REFERÊNCIAS dimento. Os resultados das estima- ACEVEDO, Juan Miguel. Aspectos Teó- nários (MQO) e regressão quantílica terminante del Crecimiento Econó- ções por mínimos quadrados ordisugeriram que a presença de doen- ça renal crônica tem um impacto negativo sobre os rendimentos. Os resultados de MQO mostra- ram que este impacto é mais importante nas faixas de rendimento mais baixas, ou seja, os efeitos são mais fortes sobre os mais pobres. ricos sobre la Salud como un De- nica Viegas. O impacto do estado de saúde sobre rendimentos individuais no Brasil e em Minas Gerais. Encontro de economia Mineira. 2002. ça renal crônica afeta negativamen- para a redução de desigualdade de rendimento e possibilitar a existên- cia de uma população mais saudável e com maior participação no mercado de trabalho. Considerando que as regressões & HENLEY, A. Human capital and 1998: quantile regression evidence. 3147, p.1-20, 2003. BARNEY. L. & REYNOLDS, L. An Econo- mic Analysis of Transplant Organs. Atlantic Economic Journal; Sep 1989; 17, 3, 1989. BECKER, Gary S. A theory of the allo- cation of time. The Economic Jour- nal, 75(299):493–517, 1965. estimadas utilizaram apenas infor- BECKER, Gary & ELIAS, J. Introducing trabalhando, é necessário obter-se Cadaveric Organ Donations. Working mações dos indivíduos que estavam dados sobre aqueles doentes renais crônicos que estavam fora do mer- cado de trabalho. Assim, será pos- nal no Brasil. Tese de Doutorado. Unicamp, Campinas, 2002. DIAZ, Maria Dolores. Desigualdades 7-25, 2003. World Bank Research Working Paper prevenção da DRC podem contribuir Política de Saúde e Transplante Re- ALVES, Luis Fernando & ANDRADE, Mo- radores de Investigación, n.5, 2000. de toda a distribuição condicional forma que medidas que visem a Our Health Declines. NBER. Working Econômicas na Saúde. Revista Bra- earnings inequality in Brazil 1988- te os rendimentos, indicando desta Broken Down by Work and Sex: How mico. Universidad del Rosario. Bor- ARABSHEIBANI, G. Reza; CARNEIRO, G. F. de rendimento a presença de doen- C ASE , Anne C. & D EATON , Angus. COELHO, V. Escassez Ou Ineficiência? A utilização de regressão quantílica permitiu mostrar que ao longo 81 And 1988/89. 2002 Paper 9821, 2003. foi verificar o impacto da presença de doença renal crônica sobre o ren- And Health Care In Sweden 1980/ sileira de Economia. Vol 57(1), p. FUCHS, Victor. Reflections on the socio-economic correlates of health. Journal of Health Economics, 23, p. 653-661, 2004. GROSSMAN, Michael. On the Concept of Health Capital and the Demand for Health. Journal of Political Economy 80:223 – 255, 1972. . The Human Capital Mo- del of the Demand for Health. NBER. Working Paper 7078, 1999. HECKMAN, James. Sample selection bias as a specification error. Econometrica, vol. 47(1), p. 679-694, 1979. HECKMAN, James. Selectivity Bias: New Developments. American Economic Review, Vol. 80, 1990. Incentives in the Market for Live and JUDGE, Ken & PATERSON, Iain. Poverty, Paper. Mimeo, 2004. SURY WORKING PAPER, 01/29, 2001. BOLIN, Kristian; JACOBSON, Lena & LIND- GREN, Björn. The Demand For Health Income Inequality and Health. TREA- JUSTO, Wellington. Capital Humano Diminui Desigualdade? Evidências Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 83 GODOY, Marcia Regina et al Para o Brasil a Partir de Regressões mics. Working paper. Lund Univer- ney International, vol.68, supple- tro Nacional de Economia, 2004. dicine and Institute of Economic SESSO, R.; RODRIGUES NETO, J. F. & FER- Quantílicas. Anais do XXXII Encon- KAHN, Matthew. Health and labor market performance. Journal of labor Economics, p. 878-899, 1998. KASERMAN, David L. & BARNETT, A. H. An Economic Analysis of Trans- plants Organs: a comment and ex- tension. Atlantic Economic Journal; Jun 1991; 19, 2; pg. 57, 1991. KASSOUF, A. L. Rendimentos perdidos por trabalhadores em condições ina- dequadas de saúde. Economia Apli- cada. São Paulo, v. 3, n. 2, p. 239262, abr./jun. 1999. KENNEDY, Steven. The Relationship between Education and Health in Australia and Canadá. SEDAP Research Paper No. 93, 2003. KIISKINEN, Urpo. A Health Producti- on Approach to the Economic Analy- sis of Health Promotion. University of York, United Kingdom. Department of Economics and Related Studies. Tese de Doutorado, 2002. KOENKER, R. & BASSETT, G. “Regressi- on quantiles. Econometrica, 50, p.43-61, 1978. LESSA, Inês. Níveis séricos de creati- nina: hipercreatininemia em seg- sity: Department of Community MeResearch, 1997. MARCOTTE, D. & WILCOX, V. Estimating earnings losses due to mental illness: a quantile regression approa- ch. Journal of Mental Health Policy and Economics. Sep;6 (3), p. 123134, 2003. MUSHKIN, Selma. Health as an Inves- tment. Journal of Political Economy,70, 2, pp. 129-157, 1962. NERI, Marcelo & SOARES, Wagner. De- sigualdade Social e Saúde no Brasil. Caderno de Saúde Pública, Rio de Janeiro, 18(Suplemento):77-87, 2002. NERI, Marcelo, et all. Los activos, los mercados y la pobreza en Brasil. El Trimestre Economico, Vol. LXVI(3), nº 263, 1999. RIBEIRO, Eduardo. Asymmetric Labor Supply. Empirical Economics, 26, p. 183-197, 2001. RIVERA, Berta & CURRAIS, Luis. Indivi- dual Returns to Health in Brazil: a quantile regression analysis. Universitat Pompeu Fabra. Mimeo, 2004. ROTH, Alvin E.; SÖNMEZ, Tayfun & ÜNVER, M. Utku. Pairwise Kidney mento da população adulta de Sal- Exchange. Working Paper, Univeri- Epidemiologia, Vol. 7, Nº 2, 2004. SCHIEPATTI, Arrigo & REMUZZI, Guiseppe. vador, Brasil. Revista Brasileira de LILJAS B. Demand for health, life-time income, and imperfect financial markets. Studies in Health Econo- 84 ty of Harvard. 2005. Chronic renal diseases as a public health problem: epidemiology, social, and economic implications. Kid- Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 ment 98, pp; S7-S10, 2005. RAZ, M. B. Impact of socioeconomic status On quality of life of ESRD pa- tients. American Journal Kidney Disease, vol 41, p.186-195, 2003. SILVA, Everton & PORTO JUNIOR, Sabino. Sistema Financeiro e Crescimento Econômico: uma aplicação de regressão quantílica. Anais do XXXII En- contro Nacional de Economia, 2004. SILVEIRA NETO, R. da M. & CAMPELO, A. K. O Perfil das Disparidades Regionais de Renda no Brasil: Evidências a Partir de Regressões Quantílicas para os anos de 1992 e 2001 Anais do XXXI Encontro Nacional de Economia, Porto Seguro, 2003. SISTEMA NACIONAL DE TRANSPLANTES. Site do Sistema. Disponível em: http:// dtr2001.saude.gov.br/transplantes, 2005. Acesso em agosto de 2005. SOCIEDADE BRASILEIRA DE NEFROLOGIA. Censos-SBN/vários anos, 2005. Disponí- vel em: http://www.sbn.org.br/ censos.htm. Acesso em agosto de 2005. SU, Xuanming & ZENIOS, Stefanos. Pa- tient Choice in Kidney Allocation: A Sequential Stochastic Assignment Model. Operational Research, 2005. THOMAS, Ducan & STRAUSS, John. Heal- th and wages: evidence on men and women in urban Brasil. Journal of Econometrics, 77, p. 159-185, 1997. VIERA, José Antonio. The Evolution of Wage Structures in Portugal Estimando as perdas de rendimento devido a doença renal crônica no Brasil 1982-1992. University of Amesterdan. Tin Bergen Institute Research Series, 197, 1999. YOUNG, Eric W. et al. Socio-econo- mic status and end-stage renal disease in the United States. Kidney International; vol. 45, 1994: pp. 907-911, 1994. Divulgação em Saúde para Debate, Rio de Janeiro, n. 38, p. 68-85, janeiro 2007 85 ASSOCIE-SE AO CEBES E RECEBA AS NOSSAS REVISTAS O CEBES tem duas linhas editoriais. a revista Saúde em Debate, que o associado recebe quadrimestralmente em abril, agosto e dezembro, e a Divulgação em Saúde para Debate, cuja edição tem caráter temático, sem periodicidade regular. QUEM SOMOS Desde a sua criação em 1976 o CEBES tem como centro de seu projeto a luta pela democratização da saúde e da sociedade. Nesses 30 anos, como centro de estudos que aglutina profissionais e estudantes, seu espaço esteve assegurado como produtor de conhecimentos com uma prática política concreta, em movimentos sociais, nas instituições ou no parlamento. Durante todo esse tempo, e a cada dia mais, o CEBES continua empenhado em fortalecer seu modelo democrático e pluralista de organização; em orientar sua ação para o plano dos movimentos sociais, sem descuidar de intervir nas políticas e nas práticas parlamentares e institucionais; em aprofundar a crítica e a formulação teórica sobre as questões de saúde; e, em contribuir para a consolidação das liberdades políticas e para a constituição de uma sociedade mais justa. A produção editorial do CEBES é resultado do trabalho coletivo. Estamos certos que continuará assim, graças a seu apoio e participação. A ficha abaixo é para você tornar-se sócio ou oferecer a um amigo! Basta enviar a taxa de associação (anuidade) de R$ 100,00 (cem reais) em cheque nominal e cruzado, junto com a ficha devidamente preenchida, em carta registrada, ou solicitar, nos telefones ou e-mail abaixo, o envio do boleto bancário. É possível também efetuar o pagamento por cartão de crédito. Consulte a secretaria do CEBES sobre esta forma de pagamento. CORRESPONDÊNCIAS DEVEM SER ENVIADAS PARA CEBES – Centro Brasileiro de Estudos de Saúde Diretoria Nacional – Av. Brasil, 4.036 – Sala 802 – Manguinhos – 21040-361 – Rio de Janeiro – RJ – Brasil Tel.: (21) 3882-9140 e 3882-9141 – Fax.: (21) 2260-3782 www.ensp.fiocruz.br/parcerias/cebes/cebes.html E-mail: [email protected] / [email protected] # FICHA DE INSCRIÇÃO (preencher em letra de forma) Valor: R$ 100,00 Para efetuar depósito: Caixa Econômica Federal – Agência: 1343 C/C: 0375-4 Operação: 003 CNPJ: 48.113.732/0001-14 Pagamento de Anuidade Nome: Nova Associação Endereço: Atualização de Endereço Rua/Av.: Bairro: CEP: Cidade: UF: Tel.: ( ) Cel.: Fax.: ( E-mail: Local de Trabalho: Profissão: Data de Inscrição: Assinatura: ) INSTRUÇÕES AOS AUTORES DIVULGAÇÃO EM SAÚDE PARA DEBATE Revista do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES), voltada para a área de Saúde Pública e Saúde Coletiva, é distribuída a todos os associados em situação regular com a tesouraria do CEBES. Aceita trabalhos inéditos sob forma de artigos originais, artigos de opinião, artigos de revisão ou de atualização, relatos de casos e resenhas de livros de interesse acadêmico, político e social. Os textos enviados para publicação são de total e exclusiva responsabilidade dos autores. É permitida a reprodução total ou parcial dos artigos desde que identificada a fonte e a autoria. A publicação dos trabalhos está condicionada a pareceres do Conselho Editorial Ad-Hoc estabelecido para cada número da revista. Eventuais sugestões de modificações da estrutura ou do conteúdo, por parte da Editoria, serão previamente acordadas com os autores. Não serão admitidos acréscimos ou modificações depois que os trabalhos forem entregues para a composição. ARTIGOS Seqüência de Apresentação do Texto 1. Título em português e em inglês. O título deve expressar claramente o conteúdo do artigo. 2. Folha de apresentação com nome completo do(s) autor(es), endereço, e-mail e no rodapé as referências profissionais (contendo filiação institucional e titulação). Quando o artigo for resultado de pesquisa com financiamento, citar a agência financiadora. 3. Resumo em português e inglês (abstract), em que fique clara uma síntese dos propósitos, dos métodos empregados e das principais conclusões do trabalho; descritores (descriptors), mínimo de três e máximo de cinco palavras, não ultrapassando o total de 700 caracteres (aproximadamente 120 palavras). Para os descritores utilizar os apresentados no vocabulário estruturado (DECS), encontrados no endereço http:// decs.bvs.br. Caso não sejam encontrados descritores disponíveis para a temática do artigo, poderão ser indicados termos ou expressões de uso conhecido. 4. Artigo propriamente dito. a) as marcações de notas de rodapé no corpo do texto, deverão ser sobrescritas. Ex.: Reforma Sanitária1 b) para as palavras ou trechos do texto que são destacados a critério do autor, utilizar aspas simples. Ex.: ‘porta de entrada’. c) quadros e gráficos deverão ser apresentados, também, em folhas separadas do texto, numerados e titulados corretamente com indicações das unidades em que se expressem os valores e com as fontes correspondentes. d) os autores citados no corpo do texto deverão estar escritos em caixa baixa (só a primeira letra maiúscula), observando-se a norma da ABNT NBR 10520: 2001 (disponível em bibliotecas). Ex.: Conforme Mario Testa (2000). e) as referências bibliográficas no corpo do texto, deverão ser apresentadas entre parênteses em caixa alta seguidas do ano e, se possível, da página. Ex.: (MIRANDA NETTO, 1986; TESTA, 2000, p. 15). 5. Referências Bibliográficas deverão ser apresentadas no final do artigo, observando-se a norma da ABNT NBR 6023: 2000 (disponível em bibliotecas). Exs.: CARVALHO, Antonio Ivo. Conselhos de saúde, responsabilidade pública e cidadania: a reforma sanitária como reforma do Estado. In.: FLEURY, Sônia Maria Teixeira (Org.). Saúde e democracia: a luta do CEBES. São Paulo: Lemos, 1997. p. 93-112. COHN, Amélia; ELIAS, Paulo Eduardo M.; JACOBI, Pedro. Participação popular e gestão de serviços de saúde: um olhar sobre a experiência do município de São Paulo. Saúde em Debate, Londrina (PR), n. 38, 1993. p. 90-93. DEMO, Pedro. Pobreza política. São Paulo: Cortez, 1991. 111p. EXTENSÃO DO TEXTO O artigo propriamente dito deve conter até 15 laudas. Os artigos que ultrapassarem este total, serão devolvidos aos autores. Obs.: 1 lauda tem 1.400 caracteres (com espaço), portanto a cada 20 linhas de 70 caracteres resulta em 1 lauda. Na carta de apresentação do artigo, o(s) autor(es) deve(m) mencionar o número de laudas. RESENHAS Serão aceitas resenhas de livros de interesse da área de Saúde Pública e Saúde Coletiva, a critério do Conselho Editorial. Devem dar uma noção Devem dar uma noção do conteúdo da obra, de seus pressupostos teóricos e do público a que se dirige, em até três laudas. ARTIGOS DE OPINIÃO Serão aceitos trabalhos referentes a textos publicados na revista ou a assuntos de conjuntura de interesse nacional. Serão publicados a critério do Conselho Editorial. Devem conter até sete laudas. ENVIO DO ARTIGO 1. Os trabalhos para apreciação do Conselho Editorial devem ser enviados à Secretaria Executiva do CEBES – Av. Brasil, 4036 – sala 802 – CEP: 21040-361 Manguinhos – Rio de Janeiro – RJ Tel.: (21) 3882-9140 e 3882-9141 Fax.: (21) 2260-3782. 2. Deverão ser apresentados impressos em 03 vias e em disquete. Aceitaremos textos no programa Word for Windows. 3. Os gráficos e/ou tabelas deverão ser apresentadas em arquivo separado, no mesmo disquete. INSTRUCTIONS FOR AUTHORS DIVULGAÇÃO EM SAÚDE PARA DEBATE Journal of the Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES) which focuses on Public Health and Collective Health, distributed to all associated individuals up-to-date with CEBES´ treasury. It accepts original studies in the form of original articles, opinion articles, review or update articles, case studies and critical book reviews of academic, political, or social interest. Texts sent for publishing are responsibility of the authors. Total or partial reproduction of articles is permitted, as long as both authorship and source are identified. Publication of articles is subject to approval by the Ad-Hoc Editorial Advisory Board established for each issue of the journal. Any suggestion of changes in structure or content, by the editors, will be previously agreed by the authors. No changes or additions can be made after articles are sent to typesetting. ARTICLES CARVALHO, Antonio Ivo. Conselhos de saúde, responsabilidade pública e cidadania: a reforma sanitária como reforma do Estado. In.: FLEURY, Sônia Maria Teixeira (Org.). Saúde e democracia: a luta do CEBES. São Paulo: Lemos, 1997. p. 93-112. C OHN , Amélia; E LIAS , Paulo Eduardo M.; J ACOBI , Pedro. Participação popular e gestão de serviços de saúde: um olhar sobre a experiência do município de São Paulo. Saúde em Debate, n. 38, 1993. p. 90-93. DEMO, Pedro. Pobreza política. São Paulo: Cortez, 1991. 111p. TEXT LENGTH The article itself must have a maximum of 15 pages. Articles that do not comply to this will be returned to authors. Note: one page has 1,400 characters (including spaces), so every 20 lines of 70 characters each forms one page. In the article presentation letter, the author(s) must state the number of pages. Text presentation sequence 1. Title in Portuguese and English. Titles must clearly express article content. 2. Cover containing full author(s) name(s), address, Email, and, as footnotes, professional references (including institutional affiliation and titles). When the article is a result of a sponsored research, the sponsoring agency should be mentioned. 3. Abstract in Portuguese and English, containing a summary of purpose, used methods and main work conclusions; descriptors, between three and five words, not more than 700 characters (approximately 120 words). For descriptors use the ones presented in the available structured vocabulary (DECS), which can be found at http://decs.bvs.br, in case available descriptors are not found for the article’s theme, terms or expressions of known use can be indicated. 4. Article. a) footnote numbers inserted in the text must be superscripted. E.g.: Sanitary Reform1 b) for highlighting words or excerpts the author should use simple quotation marks. E.g.: ‘entrance’. c) tables and graphics should also be presented in separate sheets, numbered and correctly named, with indication of the units used and corresponding sources. d) authors mentioned in the text should be written in lower case (only first letters of each name in capital letters), according to regulation ABNT NBR 10520: 2001 (available in libraries). E.g.: Mario Testa (2000) e) bibliographic references in the text shall be presented inside brackets and upper case followed by year and, if applicable, page. E.g.: (MIRANDA NETTO 1986; T ESTA, 2000, p. 15). 5. Bibliographic References shall be presented in the end of the article, according to regulation ABNT NBR 6023: 2000 (available in libraries). E. g.: REVIEWS Critical reviews of books of interest to Public Health and Collective Health, will be accepted, at the discretion of the Editorial Board. They must discuss book’s content, its theoretical postulates and the audience it aims to reach, in up to three pages. OPINION ARTICLES Articles about previously published articles in this journal or about national interest issues will be accepted. These will be subject to Editorial Board approval. Must be made up of seven pages maximum. ARTICLE SUBMISSION 1. Articles should be submitted to the following address for appreciation by the Editorial Board: Secretaria Executiva do CEBES – Av. Brasil, 4036 – sala 802 – CEP: 21040-361 – Manguinhos – Rio de Janeiro – RJ Phone: +(55)21 3882-9140 and +(55)21 3882-9141 Fax: +(55) 21 2260-3782. 2. Articles must be submitted in three copies and in diskette. We will accept articles in Word for Windows program. 4. Graphics and/or tables must be presented in a separate file, in the same diskette. REVISÃO DE TEXTO Sonia Regina P. Cardoso – português Nina Bandeira Seabra – inglês Luciana Danielli de Araújo – normatização bibliográfica CAPA, DIAGRAMAÇÃO E EDITORAÇÃO ELETRÔNICA Adriana Carvalho & Carlos Fernando Reis da Costa IMPRESSÃO E ACABAMENTO Corbã Editora Artes Gráficas TIRAGEM 3.500 exemplares PROOFREADING Sonia Regina P. Cardoso – portuguese Nina Bandeira Seabra – inglês Luciana Danielli de Araújo – bibliographic standardization COVER, LAYOUT AND DESK TOP PUBLISHING Adriana Carvalho & Carlos Fernando Reis da Costa PRINT AND FINISH Corbã Editora Artes Gráficas NUMBER OF COPIES 3.500 copies Esta revista foi impressa no Rio de Janeiro em janeiro de 2007. This publication was printed in Rio de Janeiro on january, 2007. Capa em papel couche 180 gr Cover in couche paper 180 gr Miolo em papel off set 75 gr Core in off set paper 75 gr