l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição

Transcrição

l`o sse rvator e romano - Paróquia Nossa Senhora da Conceição
y(7HB5G3*QLTKKS( +]!"![!#!&!
Preço € 1,00. Número atrasado € 2,00
L’OSSERVATORE ROMANO
EDIÇÃO SEMANAL
Unicuique suum
EM PORTUGUÊS
Non praevalebunt
Cidade do Vaticano
Ano XLVII, número 14 (2.408)
quinta-feira 7 de abril de 2016
Na festa da divina misericórdia o Pontífice propôs que em cada diocese se realize uma obra caritativa em recordação do jubileu
Reconciliação e paz
E convidou a realizar uma coleta a favor da população da Ucrânia
No «dia que é o coração do Ano
santo da Misericórdia» o pensamento do Papa dirigiu-se «a todas as
populações que têm mais sede de reconciliação e de paz», em particular
da Ucrânia. Confidenciou ele mesmo ao meio-dia de domingo, 3 de
abril, no adro da basílica vaticana
antes do Regina caeli com o qual
concluiu a missa celebrada na festa
da Divina misericórdia.
Quase como a concluir idealmente
os dois dias — iniciados com a vigília na noite anterior — inteiramente
dedicados à espiritualidade que está
no fundamento do jubileu extraordinário, o Pontífice quis transmitir
uma mensagem concreta, propondo
um gesto de caridade a favor da
Ucrânia. E através do Pontifício
conselho Cor unum organizou para
o domingo 24 de abril uma coleta
especial em todas as igrejas católicas
da Europa, cujo valor será destinado
«ao drama de quem sofre as consequências da violência» no país: «de
quantos permanecem nas terras assoladas pelas hostilidades que já causaram vários milhares de mortos»,
explicou, e de quantos — mais de
um milhão de pessoas — «foram impelidos a deixá-las devido à grave situação que perdura». Recordando
que «estão envolvidos sobretudo
idosos e crianças», o Papa garantiu a
sua oração constante e revelou a
própria intenção de «promover um
apoio humanitário a seu favor». Eis
o convite aos fiéis europeus a uni-
rem-se à iniciativa «com um contributo generoso», porque — disse —
este «gesto de caridade, além de aliviar os sofrimentos materiais, quer
exprimir a minha proximidade pessoal e a solidariedade da Igreja intei-
ra» à Ucrânia, com os votos de que
«possa ajudar a promover sem ulteriores impedimentos a paz e o respeito pelo direito naquela terra tão
provada».
E não só. Com efeito, Francisco
quis unir a este projeto de paz a recordação do dia mundial contra as
minas antipessoal, exortando a renovar «o compromisso por um mundo
sem minas». Porque, observou, «demasiadas pessoas continuam a ser
assassinadas ou mutiladas por estas
armas terríveis, e homens e mulheres
corajosos arriscam a vida para bonificar os terrenos minados».
Precedentemente, durante a vigília
de oração de sábado 2, que coincidia
com o décimo primeiro aniversário
da morte de João Paulo II, o Papa
Francisco fez outra proposta concreta aos muitos fiéis que vivem a espiritualidade da divina misericórdia:
realizar em cada diocese uma obra
estrutural, uma espécie de «monumento» do Ano santo. E sugeriu como a iniciativa poderia ganhar forma: «um hospital, uma casa para
idosos, para crianças abandonadas,
uma escola, uma casa para toxicodependentes».
PÁGINAS 8
E
9
Na audiência geral o Papa recordou que Jesus é misericórdia
Solidariedade e compaixão
«Jesus pôs-se em fila com os pecadores. Não teve vergonha», mas
«desde o início do seu ministério
manifestou-se como Messias que assume sobre si a condição humana,
movido pela solidariedade e compaixão», recordou o Papa iniciando na
audiência geral de quarta-feira 6 de
abril uma série de reflexões sobre o
tema do jubileu lido à luz do Evangelho.
Nos lugares de perseguição
As partículas escondidas
num frasco de remédios
GIULIO ALBANESE
NA PÁGINA
4
Conferência do Unhcr em Genebra
Pessoas no centro
CHARLES
DE
PECHPEYROU
NA PÁGINA
5
Depois de ter falado nas semanas
precedentes aos fiéis presentes na
praça de São Pedro acerca dos fundamentos bíblicos da misericórdia, a
partir desta semana o Pontífice explica «como o próprio Jesus a levou
ao seu pleno cumprimento», frisando também que «Jesus nos trouxe o
amor! Um amor grande, um coração
aberto a todos! Um amor que salva». Por conseguinte, é necessário
evitar a tentação de julgar os outros.
«Quantas vezes — explicou — nós
dizemos: “Mas, este é um pecador,
fez isso ou aquilo...”, e julgamos».
Ao passo que «cada um de nós deveria questionar-se: “Sim, aquele é
um pecador. E eu?”». Com efeito,
«todos somos pecadores, mas todos
somos perdoados: todos temos a
possibilidade de receber este perdão
que é a misericórdia de Deus».
Portanto, acrescentou, «não devemos ter medo de nos reconhecermos
pecadores, de nos confessarmos pecadores». Também porque, concluiu,
«o poder do amor do Crucificado
não conhece obstáculos e nunca se
esgota. E esta misericórdia cancela
Durante a audiência Francisco abraçou e tocou os olhos de Elizabeth Myers, a criança americana
de seis anos que sofre da síndrome de Usher, uma doença genética degenerativa rara ainda hoje
incurável, que lhe está a fazer perder progressiva mas inexoravelmente a vista e a audição. O seu
maior desejo era ver o Papa, as estrelas e a aurora na praia antes que se apague a luz
as nossas misérias». No final da audiência o Papa recordou também o
terceiro dia mundial do desporto,
proclamado pelas Nações Unidas,
encorajando «a viver a dimensão
desportiva como escola de virtude».
PÁGINA 16
Sobre a «Misericordiae vultus»
Bem-vindo a casa
PÁGINA 7
L’OSSERVATORE ROMANO
página 2
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
Mensagem do Pontifício conselho para a pastoral no campo da saúde
Aliança para as pessoas autistas
Uma nova aliança entre os setores
da saúde, social e educativo para a
inserção das pessoas autistas em atividades laborais, a fim de aumentar
a sua autonomia. Disse o arcebispo
Zygmunt Zimowski, presidente do
Pontifício conselho para a pastoral
no campo da saúde, por ocasião do
dia mundial sobre o autismo que se
celebrou a 2 de abril.
Tendo chegado à nona edição, a
iniciativa tem por finalidade aumentar a conscientização e a sensilibilização acerca de uma problemática
de grande atualidade, que envolve
também pesquisadores, educadores,
técnicos da reabilitação psiquiátrica,
agentes pastorais e sociais, professores. Numa mensagem com o título
«artífices e testemunhas de esperança» o prelado disse estar ciente de
que «muitas vezes a fadiga diária, a
desilusão, a desorientação, a solidão,
a ansiedade pelo futuro podem predominar sobre a esperança, que deveria animar sempre as famílias, os
agentes da saúde e as associações
científicas e de pesquisa, as instituições escolares, os voluntários e
quantos, por diversos motivos e de
maneira sinérgica, estão ao lado das
pessoas com distúrbios do espetro
de autismo». Eis o motivo do convite a «estimular o compromisso neste
setor, para o melhoramento dos serviços e a promoção da pesquisa», assim como a «estar ao lado das pessoas autistas e dos seus familiares».
Para fazer isto, explicou o presidente do dicastério vaticano, «estamos chamados a voltar a pôr a nossa
confiança em Deus», sobretudo no
nosso «tempo no qual se tem dificuldade de encontrar razões para esperar, e sobretudo face ao problema
relativo aos distúrbios do espetro de
autismo, que muitas vezes são difíceis de diagnosticar, mas — sobretudo nas famílias — de aceitar sem vergonha ou fechamentos na solidão».
De facto, observou D. Zimowski,
«mesmo se por definição a esperança olha para o futuro, ela radica-se
no hoje de Deus, o qual não pode
deixar de amar e nos procura incansavelmente. Deus é bondade e benevolência sem limites, cuida dos seus
filhos e nunca abandona aqueles que
chamou a entrar na sua comunhão,
sejam quais forem as dificuldades».
De resto, continuou a mensagem,
isto é confirmado também pelo facto
de que «a sensibilização em relação
a um distúrbio neurológico e comportamental, até há pouco tempo
considerado um estigma social», hoje «está a adquirir cada vez mais
consideração no campo da pesquisa,
assim como da assistência, da inserção escolar e laboral, e no acompanhamento do crescimento espiritual». Também documentou isto a
Conferência internacional promovida
há dois anos pela Santa Sé sobre o
tema A pessoa com distúrbios de espetro do autismo: animar a esperança.
Eis por que, exortou o arcebispo,
«não pode faltar o compromisso de
todos para favorecer o acolhimento,
o encontro, a solidariedade, numa
obra concreta de apoio e de renova-
L’OSSERVATORE ROMANO
EDIÇÃO SEMANAL
Unicuique suum
EM PORTUGUÊS
Non praevalebunt
Intervenção da Santa Sé
Paz segundo as mulheres
«As mulheres são elementos-chave do desenvolvimento
humano em muitos âmbitos: na família e nas comunidades de fé, nas iniciativas socioculturais e nos esforços
humanitários, na educação e na saúde, na mediação e
na diplomacia preventiva, no peacekeeping e no peacebuilding», e portanto «a agenda de 2030 para o desenvolvimento sustentável não pode ser completada sem a
contribuição das mulheres».
Foi este o ponto fulcral da intervenção do arcebispo
Bernardito Auza, núncio apostólico, observador permanente da Santa Sé na Organização das Nações Unidas,
por ocasião do debate aberto no Conselho de seguran-
GIOVANNI MARIA VIAN
diretor
Giuseppe Fiorentino
vice-diretor
Cidade do Vaticano
[email protected]
www.osservatoreromano.va
da promoção da esperança, tendo
em conta sobretudo o facto de que o
autismo se prolonga por toda a vida». E deveria ser garantida, durante toda a existência, «a continuidade
do compromisso a favor destes nossos irmãos e irmãs». Em particular,
«permitindo uma integração funcional entre os serviços específicos da
idade evolutiva e da idade adulta,
permite-se que a pessoa com autismo conserve as capacidades adquiridas com intervenções de habilitação
em idade juvenil, evitando a sua regressão e a ineficácia dos recursos
empregados».
Por fim, a mensagem reafirmou
que «neste compromisso oneroso,
mas não impossível, o efeito das intervenções educativas, de saúde e sociais em apoio às pessoas com distúrbios do espetro de autismo e das
suas famílias pode constituir um válido incentivo para encontrar e promover políticas eficazes, criando assim no território e também nos países com baixo rendimento — como
afirmou o Papa Francisco no encontro com as crianças e pessoas autistas e seus familiares a 22 de novembro de 2014 — “uma rede de apoio e
de serviços, completa e acessível”,
que possa “ajudar as famílias a superar a sensação, que por vezes surge,
de inaptidão, ineficácia e frustração”». Também porque, disse o prelado, o Pontífice «neste Ano santo
da misericórdia, estimula crentes e
não-crentes a redescobrir atitudes de
acolhimento e de solidariedade fraterna».
Redação
via del Pellegrino, 00120 Cidade do Vaticano
telefone +390669899420
fax +390669883675
TIPO GRAFIA VATICANA EDITRICE
L’OSSERVATORE ROMANO
don Sergio Pellini S.D.B.
diretor-geral
ça, que teve lugar no dia 28 do passado mês de Março.
A contribuição feminina para a manutenção e a
construção da paz é de particular importância nas regiões mais flageladas pela guerra e pela miséria, principalmente na África. «A Santa Sé — explicou Auza —
exprime o seu apreço pelas iniciativas promovidas pelo
Conselho de segurança e pelos governos, em vista de
aumentar a consciência e chegar ao pleno reconhecimento do papel vital das mulheres na diplomacia preventiva, na mediação, nas missões de pacificação e nos
processos de promoção da paz», de maneira especial
na região dos Grandes Lagos.
No entanto, tal reconhecimento «deve ser plenamente traduzido em acção, com a finalidade de promover a
habilidade e a capacidade que as mulheres têm de fazer emergir do caos a ordem, da divisão a comunhão e
do conflito a paz». A este propósito — acrescentou o
arcebispo — devem ser recordadas as mulheres que pagaram com o sofrimento ou com o sangue a violência
do terrorismo, as quais devem poder encontrar «segurança e compreensão» nas instituições internacionais e
nas organizações localmente presentes.
«O espírito de sacrifício para o bem do próximo leva algumas mulheres inclusive à própria morte». Por
este motivo, o núncio apostólico evocou «com gratidão
e amargura» as quatro religiosas missionárias massacradas por um grupo de fundamentalistas em território iemenita, no início do passado mês de Março. «Elas
consagraram a sua vida às mulheres pobres e idosas,
uma dúzia das quais foram assassinadas juntamente
com elas».
Assinaturas: Itália - Vaticano: € 58.00; Europa: € 100.00 - U.S. $ 148.00; América Latina, África,
Ásia: € 110.00 - U.S. $ 160.00; América do Norte, Oceânia: 162.00 - U.S. $ 240.00.
Administração: telefone +390669899480; fax +390669885164; e-mail: [email protected]
Serviço fotográfico
Para o Brasil: Impressão, Distribuição e Administração: Editora santuário, televendas: 0800160004, fax: 00551231042036, e-mail: [email protected]
telefone +390669884797
fax +390669884998
[email protected]
Publicidade Il Sole 24 Ore S.p.A, System Comunicazione Pubblicitaria, Via Monte Rosa, 91,
20149 Milano, [email protected]
L’OSSERVATORE ROMANO
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
página 3
Funeral do cardeal Cottier
Um teólogo que via com os olhos da fé
Na manhã do dia 2 de abril no altar da Cátedra da basílica vaticana, o Papa
Francisco presidiu ao rito da última «commendatio» e da «Valedictio» no final
das exéquias do cardeal dominicano suíço Georges Marie Martin Cottier, teólogo
emérito da Casa pontifícia, falecido a 31 de março. A missa fúnebre foi celebrada
pelo cardeal decano Angelo Sodano, que pronunciou a homilia cujo texto publicamos a seguir.
ANGELO SODANO
A primeira leitura desta Santa Missa
falou-nos de uma bem-aventurança
particular: a bem-aventurança de
quem morre no Senhor. No sermão
da montanha Jesus anunciou aos
seus discípulos várias bem-aventuranças: dos pobres, dos aflitos, dos
mansos, dos puros de coração, dos
pacíficos e dos perseguidos pela justiça (cf. Mt 5, 1-11).
No Apocalipse o apóstolo João
recordou-nos outra bem-aventurança, revelada pelo Espírito: «Eu,
João, ouvi uma voz do céu, que dizia: “Escreve: Felizes os mortos que
doravante morrem no Senhor. Sim,
diz o Espírito, descansarão dos seus
trabalhos, pois as suas obras os seguirão”» (14, 13).
Telegrama de pesar
do Santo Padre
O cardeal dominicano suíço Georges
Marie Martin Cottier, teólogo
emérito da Casa pontifícia, faleceu a
31 de março na policlínica Agostino
Gemelli em Roma. Teria completado
94 anos no dia 25 de abril. Ao
receber a notícia o Papa Francisco
recolheu-se em oração e em seguida
enviou à irmã do purpurado, Marie
Emmanuelle Pastore Cottier, o
telegrama cujo conteúdo publicamos
em seguida.
Ao receber com comoção a triste
notícia do falecimento do seu irmão, cardeal Georges Marie Martin Cottier, O.P., desejo exprimirlhe a minha sentida participação
no luto que vivem todas as pessoas que conheceram e estimaram
este zeloso servo do Evangelho.
Com profunda gratidão, recordo
a sua fé inabalável, a sua amabilidade paterna e a sua intensa atividade cultural e eclesial, em particular ao serviço dos Papas são
João Paulo II e Bento XVI, como
teólogo da Casa pontifícia. Dirijo
uma fervorosa oração ao Senhor a
fim de que, com a intercessão da
Virgem Maria e de são Domingos, conceda ao saudoso cardeal a
recompensa prometida aos seus
discípulos fiéis e, em sinal de
conforto, concedo de todo o coração a bênção apostólica à senhora
e a todas as pessoas que apreciaram o seu zelo sacerdotal e a sua
dedicação à Igreja e ao Sumo
Pontífice.
FRANCISCUS
PP.
Análogo telegrama foi enviado pelo
cardeal Pietro Parolin, secretário de
Estado.
Com esta fé na palavra de Deus
reunimo-nos hoje em oração ao redor do altar do Senhor. O nosso
querido irmão cardeal Georges Marie Cottier deixou-nos depois de
uma longa vida inteiramente consagrada à difusão do Reino de Deus
no mundo atual. Certamente, ele
mereceu a bem-aventurança de
quem morre no Senhor!
No telegrama enviado à irmã do
nosso querido Irmão, o Papa Francisco recordou-o como «zeloso servo
do Evangelho... com fé inabalável e
amabilidade paterna». Assim hoje
recordam-no também muitos de nós
que tivemos a ventura de lhe estar
próximos nestes anos e de gozar da
sua amizade.
Nesta Santa Missa queremos dar
graças ao Senhor por no-lo ter oferecido, confiando-o depois nas mãos
misericordiosas do Pai que está nos
céus, cientes como somos das fragilidades de cada homem, que precisa
sempre da misericórdia de Deus.
A segunda leitura da Missa convidou-nos a refletir sobre a carta de
são Paulo aos Romanos: «Nenhum
de nós vive para si, e ninguém morre para si. Se vivemos, vivemos para
o Senhor; se morremos, morremos
para o Senhor» (14, 7-9).
Por fim, o Evangelho desta Santa
Missa recordou-nos as palavras que
Jesus dirigiu a Marta e Maria que
choravam pela morte do irmão Lázaro: «Eu sou a ressurreição e a vida. Aquele que crê em mim, ainda
que esteja morto, viverá. E todo
aquele que vive e crê em mim, jamais morrerá» (Jo 11, 17).
Será publicada a 8 de abril
Calendário das celebrações
presididas pelo Papa
«Amoris laetitia»
IV
DE
D OMINGO
PÁSCOA
Basílica Vaticana, 9h15, Ordenações
presbiterais, Santa Missa
24
Ele foi um cantor da fé do cristão,
que tudo examina «com os olhos da
fé», «avec les yeux de la foi», como
gostava de repetir. Certamente, como grande teólogo tomista, reconhecia também o valor da razão humana e aliás frequentemente citava a
comparação usada pelo Papa João
Paulo II na Encíclica Fides et ratio,
que dizia: «Fé e razão são como as
duas asas com as quais o espírito
humano se eleva para a contemplação da verdade». Apraz-me recordar
estas palavras precisamente hoje, 2
de abril, décimo primeiro aniversário
da santa morte do Papa João Paulo
II.
Neste sentido, o nosso amado cardeal Cottier ensinou a Teologia em
várias cátedras universitárias e durante quinze anos foi teólogo da Casa pontifícia. O serviço que prestou
à Igreja foi deveras grande.
Que ele ensine também a nós a
sermos no mundo atual testemunhas
de que Cristo é sempre «o Caminho,
a Verdade e a Vida» (Jo 14, 6).
Nestes dois meses
Abril
17
Toda a existência do nosso querido cardeal Cottier recorda-nos este
profundo espírito de fé. Ele foi um
teólogo que agia «como se visse o
invisível», como a carta aos Hebreus
fala de Moisés na sua peregrinação
no deserto (cf. 11, 27).
V
DE
D OMINGO
PÁSCOA
Praça de São Pedro, 10h30, Santa
Missa, Jubileu dos Jovens
15 D OMINGO
DE PENTECOSTES
Basílica Vaticana, 10h00, Capela Papal, Santa Missa
26 QUINTA-FEIRA
SOLENIDADE D O SANTÍSSIMO CORPO
E SANGUE DE CRISTO
Praça de São João em Latrão, 19h00,
Capela Papal, Santa Missa, Procissão até Santa Maria Maior e Bênção
Eucarística
29 IX D OMINGO
TEMPO COMUM
Praça de São Pedro, 10h30, Santa
Missa, Jubileu dos Diáconos
DO
Maio
5 QUINTA-FEIRA
SOLENIDADE DA ASCENSÃO
D O SENHOR
Basílica Vaticana, 18h00, Vigília de
oração para «Enxugar as lágrimas»
Vaticano, 2 de abril de 2016.
Mons. GUID O MARINI
Mestre das Celebrações
Litúrgicas Pontifícias
Intitula-se Amoris laetitia a exortação apostólica pós-sinodal do Papa Francisco sobre o amor na família, que será apresentada na
manhã de 8 de abril na sala de
imprensa da Santa Sé.
O documento reúne os frutos
do caminho sinodal sobre a família, realizado em duas etapas durante o pontificado, com a assembleia extraordinária de outubro
de 2014 e a ordinária, que teve lugar no ano seguinte.
No encontro intervirão os senhores cardeais Lorenzo Baldisseri, secretário-geral do Sínodo dos
bispos, e Christoph Schönborn,
arcebispo de Viena. Ao seu lado,
estarão presentes os cônjuges
Francesco Miano e Giuseppina
De Simone, respetivamente docente de filosofia moral na universidade dos estudos de Roma
«Tor Vergata» e professora de filosofia na faculdade teológica da
Itália meridional de Nápoles.
página 4
L’OSSERVATORE ROMANO
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
GIULIO ALBANESE
Uma coisa é falar das perseguições,
outra é fazer experiência do encontro com quantos vivem permanentemente nesta condição. É preciso ver,
ouvir, sentir de perto para compreender do que estamos a falar.
Durante os anos Noventa, graças
à ajuda de um organismo humanitário, consegui entrar num país em
guerra, onde a sharia, a lei islâmica,
predominava. Para garantir a incolumidade da pequena comunidade
cristã ali residente, é preciso esclarecer que sou obrigado ainda hoje a
omitir os nomes das localidades geográficas e das pessoas. A cidade na
qual estava era a capital e a insegurança reinava soberana. Em toda a
parte havia homens armados que
manifestavam ódio e rancor pelo
Ocidente. Sabia que arriscava a vida, mas não podia voltar atrás. Sentia que estava em jogo a minha dignidade de cronista comprometido a
dar voz aos sem voz. Obviamente,
em situações semelhantes a prudência é obrigatória.
Obtive o visto de entrada como
jornalista porque se tivesse declarado
que era um religioso católico provavelmente agora não estaria aqui a
narrar esta história. Um colega espanhol disse-me que, não obstante a
presença dos milicianos jihadistas,
havia na cidade uma pequena comunidade de religiosas, pertencentes a
uma congregação missionária. Para
chegar ao seu convento era necessário superar a pé uma barreira entre
as duas fações armadas opostas que
disputavam o controle do território.
Tratava-se de uma faixa de cerca de
um quilómetro, atravessada por estradas em más condições, cheias de
barrancos. Os edifícios circundantes
estavam desertos e a atmosfera era
surreal. O sol ardia e caminhando o
suor escorria abundante.
Ao chegar à outra margem, imediatamente fui inspecionado por
dois milicianos que, por sorte, tinham sido avisados da minha chegada. As religiosas viviam numa pequena casa pré-fabricada, coberta
pela sombra de algumas palmeiras.
No início, aquelas mulheres, três italianas, pensaram que fosse um cronista em busca de scoop e portanto
mostraram-se muito desconfiadas.
Aliás, quando telefonei para avisar
sobre a minha visita, por prudência,
não revelei a minha verdadeira identidade. Mas quando consegui explicar quem eu era, comoveram-se muito a ponto que, com lágrimas nos
olhos, me pediram para celebrar a
santa missa. Havia meses que não
podiam participar numa missa e
muito tempo tinha passado da última eucaristia. Pedi que me acompanhassem à capela. «A nossa é a menor catedral que o senhor já visitou», disse a superiora, que tinha
cerca de cinquenta anos. Com um
sinal fugaz convidou-me a segui-la,
acompanhando-me até ao seu quarto, um cubículo, iluminado por uma
janelinha aberta no teto.
Dentro do armário, escondido no
meio das roupas, havia um pequeno
tabernáculo. Pegou a mesinha de cabeceira, que teria sido o altar, e colocou-a ao lado da cama. Disse-me
para sentar enquanto preparava o
Histórias de fé cristã nos lugares de perseguição
As partículas
escondidas num frasco de remédios
necessário para a celebração. Em seguida, as duas religiosas sentaram-se
na cama juntamente com ela, com
grande devoção, pedindo-me para
iniciar a liturgia. Estava emocionado, tendo deveras a percepção de
me encontrar na periferia da história, onde há tanta humanidade sofredora, esquecida por todos. Dos paramentos só usei a estola pois a humidade era de 99 por cento e a temperatura no limite da suportação.
Não escondo a minha dificuldade
em partir o pão da Palavra de Deus
com aquelas mulheres tão corajosas.
Aliás, depois de pouco tempo uma
vés dos catequistas de quatro pequenas comunidades. Precisamente o
que restava, em termos numéricos,
de uma Igreja, pequeno rebanho.
Estou aqui a testemunhar não só a
sua grande fé, mas a atitude misericordiosa diante dos seus perseguidores. «Porque — disse-me a superiora
— ser cristão significa nunca se pôr
contra alguém». Só então compreendi quanto é verdadeiro o ensinamento de Jesus: «Bem-aventurados sereis
quando vos caluniarem, quando vos
perseguirem e disserem falsamente
todo o mal contra vós por causa de
mim. Alegrai-vos e exultai, porque
será grande a vossa recompensa nos céus,
pois assim perseguiram
os profetas que vieram
antes de vós» (Mt 5, 1112). No mesmo dia em
que me encontrei com
aquelas mulheres valorosas visitei os vestígios
Terrorismo, guerras, ditaduras,
da catedral católica praperseguições, migrações: a religião,
ticamente arrasada em
deturpada e instrumentalizada para
sinal de desprezo não
finalidades ideológicas, quando não
só pela religião católica
financeiras, é cada vez mais usada
mas também e sobretucomo instrumento de ódio e divisão
do pelo ex-poder colonas numerosas periferias do planeta,
nial, que a cultura exdenunciou o sacerdote comboniano,
tremista islâmica associa
diretor da revista «Popoli e Missione»
ao pior demónio deste
no livro Vittime e carnefici.
mundo, o Shaytān. SeNel nome di «dio» (Turim, Einaudi, 2016,
gundo a religião islâmi178 páginas). Publicamos em seguida
ca ele tenta de todas as
uma sinopse do capítulo intitulado «Lo
maneiras, só para criar
scontro delle civiltà».
desanimar as pessoas,
fazê-las cair na tristeza,
tendo jurado vingança
até ao fim dos tempos.
delas teria sido assassinada. Li nos Pois bem, Shaytān seríamos nós que
livros de teologia o que quer dizer com o nosso modus vivendi, as nossas
martyria, mas aquele dia deveras dei- convicções, o poder e a afeição ao
me conta do significado desta pala- deus dinheiro, teríamos desafiado a
vra. Consagrei dois quilos e meio de única verdadeira civilização, a umma,
hóstias, mantidas num recipiente de comunidade de quantos seguem os
lata. Sucessivamente, explicaram-me preceitos corânicos. Obviamente,
que as partículas teriam sido coloca- ninguém pretende ignorar os erros
das em pedaços dentro de pequenos cometidos pelo mundo ocidental,
frascos de remédios, cobertas com com todas as suas incongruências,
algodão e distribuídas aos fiéis atra- mas esquecer o bem praticado pelas
Vítimas
e carnífices
religiosas mencionadas com grande
abnegação, afirmando que elas são
filhas das trevas, é verdadeiramente
pouco generoso. Além disso, estes
cruéis intérpretes da violência esquecem que o cristianismo nasceu no
Médio Oriente há dois mil anos.
Contudo, a recordação que conservo
no coração daquelas religiosas, autênticas sentinelas da manhã, é deveras a lembrança de um dia inesquecível. Uma fé, a delas, certamente
não identitária mas inclusiva, orientada ao serviço dos pobres nas periferias da história. Quem reconhece
isso naquele país cujo nome ainda
hoje não me é lícito pronunciar, é a
sociedade civil islâmica que sempre
contrastou o pensamento débil jihadista. O que vem a confirmar que,
enfrentando o tema das perseguições, é injusto generalizar.
Durante a estadia naquele país de
maioria islâmica, consegui visitar lugares onde antes havia algumas igrejas. Primeiramente, visitei os vestígios da catedral local. Depois encontrei-me clandestinamente com
um idoso sacristão de uma paróquia,
a cerca de setenta quilómetros da capital. O edifício tinha sido derrubado e o campanário destruído. Fiquei
muito chocado ao constatar o modo
horrível como reduziram o altar-mor.
A mesa tinha sido partida em dois
troncos. O idoso explicou-me que
conseguiu salvar as certidões de batismo e que os conservava com zelo
na sua casa. Perguntei-lhe se mantinha contato com as religiosas que viviam na capital. Respondeu que pelo menos uma vez por mês recebia
os frascos dos remédios que continham as partículas. Antes de partir,
ofereci-lhe um tercinho. Pôs-se a
chorar como uma criança e pediume que o benzesse. Depois, escondeu-o num alforge no qual estava escrito Allāh Akbar, explicando, em
voz baixa que para ele aquela escrita
referia-se ao Deus dos cristãos, mas
ninguém sabia.
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 5
Conferência do Unhcr em Genebra
de Genebra
CHARLES DE PECHPEYROU
Depois de mais de cinco anos de
guerra na Síria, a crise migratória
provocada pelo conflito tornou-se «a
crise mais relevante da nossa época»: foi com esta constatação dramática que o secretário-geral da Onu
Ban Ki-moon inaugurou a 30 de
março a importante conferência convocada pelo alto comissariado das
Nações Unidas para os refugiados
(Unhcr). Os números falam claramente: até hoje cerca de 4,8 milhões
de pessoas foram obrigadas a fugir da Síria.
São os países da região que recebem a
maioria dos refugiados
sírios, mas muitos
continuam a sua viagem, sobretudo rumo
à Europa. Não obstante todos os perigos,
a travessia do Mediterrâneo não desanima
quantos, na sua pátria
e nas regiões limítrofes, já não têm esperança alguma. Segundo um recente estudo
realizado pela Onu e
pelo Banco mundial,
90 por cento dos refugiados sírios no Líbano e na Jordânia vivem abaixo da linha
de pobreza.
«Hoje estamos aqui
reunidos para lançar
um apelo a favor da
criação de novas e
mais diversificadas soluções legais de admissão dos refugiados
sírios em vários países
nos próximos três anos», declarou
no início do dia o alto comissário
das Nações Unidas para os refugiados Filippo Grandi, diante dos representantes de uma centena de países e organizações intergovernamentais.
Até agora os diversos Estados prometeram 178.000 lugares. Portanto,
são indispensáveis novos programas
plurianuais que permitam a reinserção e outras formas de admissão dos
refugiados a nível humanitário. Trata-se de um apelo lençado em primeiro lugar aos países que ainda se
mostram relutantes a comprometerse neste tipo de iniciativas, com a finalidade de compartilhar o mais
equitativamente possível as responsabilidades em relação aos refugiados. Em conformidade com o Unhcr, daqui a três anos deve ser reinserido pelo menos 10 por cento dos
4,8 milhões de refugiados sírios, número contudo considerado insuficiente por alguns participantes na
conferência de Genebra.
Será ouvido o solene apelo a um
«aumento exponencial da solidariedade mundial», lançado por Ban
Ki-moon durante a conferência das
Nações Unidas? Até agora o balanço
é deveras modesto. A atitude da Europa, principalmente ao longo destes
últimos meses, suscitou várias críticas. O alto comissário deplorou a indiferença existente em relação às
«firmes decisões» tomadas há um
ano pela União europeia, para gerir
os fluxos de refugiados e de migrantes com método e princípios», e o
comportamento atual dos Estados
que «não deram demonstração da-
Pessoas
no centro
quela solidariedade que exige a partilha da responsabilidade e a distribuição equitativa dos refugiados e
dos requerentes de asilo».
Perante a crescente preocupação
da opinião pública, «às vezes habilmente manipulada por líderes políticos irresponsáveis», frisou Filippo
Grandi, a prioridade para os Estados
trabalho, em estreita colaboração
com a Comissão europeia e com os
Estados membros da Ue, de modo
particular com a Grécia, para gerir a
crise migratória.
Como prova desta boa vontade
comum, durante a citada conferência
a União europeia comprometeu-se a
assegurar a reinserção de mais
Fila de migrantes na fronteira entre a Grécia e a ex-República jugoslava da Macedónia (Afp)
membros não parece ser tanto o acolhimento dos refugiados quanto o
fechamento das fronteiras. O resultado é que cerca de 50.000 refugiados
e migrantes hoje estão bloqueados
na Grécia, em condições terríveis.
Por conseguinte, o Unhcr comprometeu-se a dar continuidade ao seu
54.000 refugiados sírios provenientes
da Turquia. Contudo , no final do
dia Filippo Grandi quis elogiar alguns compromissos assumidos durante os trabalhos: contribuições para a reunião familiar, novos programas de concessão de vistos para a
América Latina, supressão das bar-
reiras administrativas à admissão dos
refugiados e assistência financeira ao
Unhcr.
No entanto, o que é mais importante, estas promessas constituem
apenas o primeiro passo na retomada das ajudas aos refugiados sírios.
Com efeito, esta conferência inserese no ciclo de encontros internacionais sobre os migrantes, realizados
ao longo de vários meses. Ciclo encetado com a conferência de Londres sobre a Síria, que teve lugar no
passado mês de fevereiro — onde foram examinadas as dimensões financeiras da crise humanitária dentro e fora
das fronteiras sírias, e
as necessidades das
comunidades nos países de acolhimento —
e que se concluirá em
19 de setembro, com a
reunião plenária de alto nível da assembleia
geral das Nações Unidas em Nova York,
dedicada aos movimentos de refugiados
e migrantes em larga
escala.
Entrementes,
nos
dias 23-24 de maio em
Istambul, na presença
de representantes governamentais, de organizações humanitárias
mas também de responsáveis
religiosos,
terá lugar o primeiro
encontro humanitário
mundial,
convocado
para definir uma nova
organização mundial
neste campo. Trata-se
da assembleia à qual o
Papa Francisco se referiu na sua mensagem urbi et orbi
para a Páscoa. Com efeito, o Pontífice formulou votos a fim de que tal
encontro «não deixe de pôr no centro a pessoa humana com a sua dignidade e de elaborar políticas capazes de assistir e tutelar as vítimas de
conflitos e de outras emergências».
Organizações humanitárias voltaram a criticar o acordo Ue-Turquia
Que direitos para os migrantes
«Este é o primeiro dia de tempos muito duros para os
direitos dos refugiados». Foi o primeiro comentário da
organização internacional Amnesty International sobre
a entrada em vigor do plano Eu-Turquia para a gestão
da emergência imigração. Palavras claras, que ressaltam
o nó crucial à volta do qual se continua a debater nestas horas: a salvaguarda dos direitos dos migrantes e o
respeito pelas normas internacionais sobre o direito de
asilo. Precisamente estes aspetos não seriam protegidos
de modo adequado pelo acordo. E à Amnesty International uniu-se também Save the Children, que denunciou «a falta de tutelas para os migrantes rejeitados» e
pediu aos líderes europeus «que suspendam o plano e
o reconsiderem urgentemente». Sob acusação também
as condições de acolhimento no centro de detenção de
Moria em Lesbos, onde se encontram mais de mil menores. Ali «famílias e crianças dormem ao ar livre» denuncia a organização. Um apelo semelhante foi lançado também pela Cáritas e pela Comece (Comissão das
conferências episcopais da Comunidade europeia).
«Está a verificar-se na prática o que não queríamos»
declarou Oliviero Forti, responsável da área imigração
da Cáritas italiana. «Criticámos o acordo e agora vemos os primeiros efeitos de uma Europa que só quer
afastar os refugiados dos seus confins» acrescentou.
«O facto que os repatriamentos não dizem respeito aos
sírios não diminui a gravidade de fazer regressar os migrantes a um país que não oferece algum tipo de garantia para o respeito dos direitos humanos». A Cáritas
«terá a possibilidade direta de verificar as condições
nas quais estas pessoas serão acolhidas».
No jornal mensal da Comece, «Europeinfos», frisouse a inadequação do acordo, pondo em relevo sobretudo o «abismo» das dez mil crianças migrantes desacompanhadas que desapareceram literalmente no vazio.
«Para os menores — lê-se — dever-se-ia seguir os parâmetros internacionais da proteção das crianças».
No entanto, depois de dar início ao plano com o reenvio de 202 migrantes para a Turquia, a seguir não
houve regresso algum. Confirmam-no as autoridades
gregas, explicando que a maior parte dos prófugos
atualmente retidos nas ilhas apresentaram pedido de
asilo que deverão ser avaliados individualmente antes
de eventuais regressos. Segundo Atenas, entre os migrantes rejeitados não havia requerentes de asilo. Houve desordens no campo de Idomeni, na fronteira entre
a Grécia e a ex-República jugoslava da Macedónia.
Desde há dias o campo foi bloqueado devido ao fechamento das fronteiras.
L’OSSERVATORE ROMANO
página 6
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
Água, alterações climáticas e «Laudato si’»
O motor
da mudança
ANDREA AGAPITO LUD OVICI
As mudanças climáticas representam
o desafio mais imediato para a humanidade, como foi universalmente
reconhecido na Conferência de Paris
(Cop 21), realizada de 30 de novembro a 12 de dezembro passados.
Também o Papa Francisco, na encíclica Laudato si’, frisou as pesadas
consequências das mudanças climáticas que, provavelmente, incidem sobre os países em vias de desenvolvimento; é neles, com efeito, que
«muitos pobres vivem em lugares
particularmente atingidos por fenómenos relacionados com o aquecimento, e os seus meios de sustento
dependem em grande medida das
reservas naturais e dos chamados
serviços do ecossistema».
Assim também na Itália, ao longo
do século XXI, no cenário mais pessimista, está previsto um aumento de
temperatura de até 8 graus, especialmente no verão e no outono e depois calcula-se, em escala nacional,
uma forte diminuição das precipitações devida a verões mais áridos. Está previsto um aumento das chuvas
em particular na zona alpina, enquanto que no sul se manifestaria a
maior diminuição de chuvas.
Devido a tudo isto é necessário favorecer políticas de adaptação, como
evidenciou o Acordo de Paris (Art.
7); com efeito, trata-se de promover
todas as ações para incrementar a
capacidade de adaptação, fortalecer
a resiliência e limitar a vulnerabilidade à mudança climática na perspetiva de contribuir para o desenvolvimento sustentável e garantir uma
resposta adequada aos objetivos de
limitação do aumento das temperaturas.
Nesta perspetiva a gestão da água
pode ser o veículo principal para
afirmar novos modelos de gestão
sustentável, adequados às diferentes
realidades do nosso planeta. É o
que, por exemplo, foi realizado no
vale do rio Sourou no Burquina Faso. Naquele território que, já há alguns anos, foi feita uma experiência
significativa de contrat de rivière, como instrumento para gerir de modo
participativo os recursos hídricos numa região caracterizada pela escassez
dos mesmos.
As comunidades locais responderam bem à campanha inicial de sensibilização e participação e foi possível um intercâmbio de informações
entre os vários «saberes locais» e os
dados científicos. O resultado foi encorajador: as 103 ações indicadas
conjuntamente no «contrato fluvial»
foram realizadas em tempos breves.
Deste modo, favoreceu-se e valorizou-se a agricultura local, propondo
um uso sustentável do solo; foi envolvida a população na tutela do
meio ambiente, hídrico em particu-
lar, e dos recursos. Houve um progresso geral na gestão hídrica na zona, determinando também um melhoramento da qualidade do rio. O
contrat de rivière demonstrou-se um
ótimo instrumento, dinâmico, flexível, adaptável que, prevendo a participação voluntária, favoreceu o envolvimento ativo, sem imposições,
das comunidades locais e o confronto e a promoção de boas práticas.
Uma boa experiência de participação, integração, interdisciplinaridade que permitiu enfrentar de maneira solidária e sustentável o uso da
água e a gestão dos recursos naturais
daquele território. Em geral, infelizmente não se age sempre de maneira
virtuosa, aliás a «regra» caracterizase por grandes obras que, com frequência, devastam o ambiente e as
comunidades locais e que, com frequência, se revelam contraproducentes. Eis por que é bom questionar-se
se a produção de energia hidroelétrica, portanto em teoria limpa e renovável, e a contribuição para a «defesa» das inundações que se pretende
obter com a construção da gigantesca barragem das Três Gargantas na
China no rio Amarelo compensam a
submersão de mais de 1300 sítios arqueológicos, 13 cidades, 140 vilas e
1352 aldeias, com a transferência de
cerca de um milhão e meio de habitantes (mas está prevista a transferência de outros quatro milhões de
pessoas da zona até 2023), o desaparecimento definitivo de numerosíssimas espécies animais e vegetais e a
destruição de inteiros habitats naturais.
No Brasil, a Associação Survival
international denunciou o programa
nacional de «crescimento acelerado», que promove o desenvolvimen-
to económico do país através da
construção de grandes infraestruturas, como uma série de grandes barragens na Amazônia.
É o caso de dois grandes diques,
Jirau e Santo Antônio, em construção no rio Madeira, que ameaçam
diretamente quatro povos indígenas
que vivem na parte alta da bacia: os
Karitianas, Karipunas, Uru-Eu-WauWau, e Katawixis, danificando também outras tribos (Parintintin, Tenharim, Pirahã, Jiahui, Tora, Apurinã, Mura, Oro Ari, Oro Bom, Cassupá e Salamãi). Neste caso, face a
um investimento de cerca de quinze
biliões de dólares, no qual participam também companhias europeias,
como a francesa Gdf Suez, e bancos
como o espanhol Santander, é legítimo questionar-se quanto valem os
direitos dos nativos e as consequências da destruição de um habitat
único.
Um pouco em toda a parte no
mundo, como na Índia ao longo do
Gange e do Narmada, há conflitos
devidos à construção de grandes
barragens, que viram as comunidades locais rebelar-se a escolhas governamentais que não prevêem o seu
envolvimento. Estas obras gigantescas arrasam rios e bacias inteiras, in-
cidindo grandemente sobre o ciclo
hidrológico de regiões inteiras; assim
o território torna-se frágil e cada vez
mais vulnerável às mudanças climáticas: deveríamos perguntar-nos seriamente se isto significa «adaptar-se»
ou não e talvez favorecer os efeitos
do climate change e lançar as bases
para futuras catástrofes. Perguntas
que podem encontrar resposta na
busca de uma abordagem nova ao
governo do território e à gestão das
águas através da participação e responsabilização das populações. Infelizmente na Itália continua a prevalecer uma lógica ligada à emergência, à construção de obras — canalização dos rios, barragens, envasaduras artificiais, caixas de expansão —
sem prevenção, planificação e participação, nem uma visão ampla da
bacia hidrográfica, como ao contrário é exigido pelas diretrizes Águas
e
Inundações
(2000/60/CE)
(2007/60/CE) da União Europeia.
Neste momento em que se procura a
mudança talvez devêssemos prestar
uma atenção particular às cidades,
nas quais está concentrada grande
parte da população mundial, muitas
vezes com incríveis densidades por
quilómetro quadrado e com enormes
consumos de água e de energia, mas
onde há uma grandíssima potencialidade de informação, sensibilização e
participação.
Muitas cidades europeias já promoveram e realizaram sistemas urbanos de drenagem sustentável (Suds),
como Berlim ou Hanover, aproveitando do melhor modo possível os
espaços marginais, os estacionamentos ou os jardins; estes sistemas contribuem para a redução do risco de
alagamentos, a diminuição da poluição e o melhoramento e incremento
das áreas verdes urbanas e da qualidade da vida. Poupar onde se gasta
mais pode reduzir a dependência de
outras áreas periféricas, fazendo diminuir a exigência de grandes obras
e favorecendo processos virtuosos de
participação territorial.
É necessário um compromisso de
ampla abordagem para «se adaptar», para fazer face à complexidade
que temos diante de nós e enfrentar
do melhor modo possível as mudanças climáticas. A água pode ser o
motor desta necessária mudança de
rota.
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 7
Bernardette Lopez
«Vai, reconcilia-te com teu irmão» (2009)
No sacerdote confessor o penitente
deveria encontrar um grande e silencioso abraço paterno que diz: «Bemvindo a casa!». Foi com esta imagem
que monsenhor Krzysztof Nykiel,
regente da Penitenciaria apostólica,
concluiu o congresso promovido pelo mesmo dicastério sobre a bula jubilar Misericordiae vultus, realizado
de 31 de Março a 1 de Abril. Talvez
também graças à redescoberta desta
imagem do confessor — frisou o regente — «um dos principais frutos
deste ano da misericórdia» foi precisamente «o retorno ao confessionário por parte de numerosas pessoas
que já há muitos anos não se aproximavam do sacramento da reconciliação». Do mesmo modo, observa-se
também a redescoberta das obras de
misericórdia corporal e espiritual, sobre as quais o Papa Francisco insistiu, convidando sobretudo os fiéis
«a praticá-las com generosidade».
Em seguida, monsenhor Nykiel
recomendou que cada confessor «receba os fiéis como o pai da parábola
do filho pródigo, manifestando-lhes
a ternura do Pai sempre pronto a
conceder-nos o seu perdão». Com
efeito — explicou o prelado — ele
«só acolhe o que Deus já fez nascer
no coração do homem: a nova vida
de filho, que somente Deus suscita e
que ele simplesmente constata e recebe». Por este motivo o Pontífice,
na bula de proclamação do Ano
Santo, pede constantemente que os
«confessores sejam um verdadeiro sinal da misericórdia do Pai», chamados a «ser sempre, em toda a parte e
em cada situação, e apesar de tudo,
o sinal do primado da misericórdia».
A variedade dos conteúdos e das
perspectivas salientados nas três sessões de trabalho confirmam que a
misericórdia é verdadeiramente o
âmago do Evangelho. Com efeito —
explicou o regente — o congresso foi
uma «grande celebração» da misericórdia de Deus, «um hino de louvor
à misericórdia divina, segundo as
palavras sugestivas do salmo 117:
“Louvai ao Senhor, porque Ele é
bom, porque eterna é a sua misericórdia”».
A misericórdia — acrescentou o
prelado — é o Deus Pai, que não
quer a morte do pecador, mas deseja
que ele se converta e viva. A misericórdia é Jesus Cristo que, «na cruz,
revelou todo o poder da misericórdia de Deus». A misericórdia é o Espírito Santo, «amor compassivo do
Pai e do Filho que — como recorda
o autor do livro da Sabedoria —
“através dos tempos, entrando nas
almas santas, forma amigos de Deus
e profetas”». Enfim, a misericórdia é
a Igreja, «Mãe compassiva, dispensadora de graças, “serva do ministério da misericórdia que se alegra todas as vezes que pode conceder este
dom divino”». A este propósito, o
regente recordou que já no início do
congresso o cardeal penitenciáriomor Mauro Piacenza realçou: «É na
misericórdia divina do Coração divino-humano de Cristo que se edifica
a Igreja, sacramento universal de salvação e ministra da misericórdia enquanto continuação, no espaço e no
tempo, da presença viva e da obra
salvífica de Cristo». Assim, a Igreja
Concluído o congresso sobre a «Misericordiae vultus»
Bem-vindo
a casa
inteira está como que «impregnada»
desta misericórdia, e é nela que se
«desenvolvem toda a sua vida e missão, que consistem em anunciar o
amor misericordioso do Pai».
Depois, monsenhor Nykiel voltou
a percorrer o conteúdo evidenciado
pelas várias intervenções, salientando
em primeiro lugar que a credibilidade da Igreja «se fundamenta no
anúncio da misericórdia de Deus
verdadeira e perfeita revelação da
misericórdia de Deus, o único autêntico inocente e Salvador decisivo
que, em obediência ao Pai e perdoando os culpados, morre dando a
própria vida por todos, inclusive por
quantos quiseram provocar a sua
morte». É assim que o mal e a morte são derrotados de forma definitiva, e que o homem é finalmente libertado do seu poder.
Um testemunho concreto desta vitória, comentou monsenhor NyA credibilidade da Igreja
kiel, «podemos admirá-lo
na Imaculada Conceição
fundamenta-se no anúncio
da Bem-Aventurada Virda misericórdia de Deus
gem Maria». Com efeito,
nela tudo «foi plasmado
que em Jesus se tornou palpável
pela presença da miserie experimentável
córdia feita carne» e, como observou o padre
Francesco De Feo, Maria
que, em Jesus, se tornou palpável e é a «Mãe da misericórdia porque é a
experimentável». Frisou-o no seu re- Mãe daquele que é a misericórdia, e
latório o sacerdote Laurent Touze, porque Deus lhe confiou de maneira
recordando que da misericórdia do peculiar esta função no plano da
Pai o cristão não recebe unicamente economia salvífica». De objecto e
o perdão dos pecados mas também, ícone da misericórdia divina, Maria
em Jesus Cristo e no Espírito Santo, «torna-se um caminho privilegiado
uma nova existência: «Uma vida de para a sua realização. É a Mãe Imadocilidade, conversão, perdão, justi- culada, «cheia de graça e de miseriça e misericórdia, oferecida ao próxi- córdia, que nos exorta a não ter memo porque recebida de Deus».
do de nos abandonarmos ao amor
Por sua vez, Bruna Costacurta ob- compassivo do seu Filho, que derroservou que suspenso no madeiro da tou o mal pela raiz, libertando-nos
cruz não está apenas «um homem do seu domínio».
condenado à morte pela maldade
Toda a obra de Jesus — acrescendos homens, mas o Filho de Deus, tou ainda o regente — é precisamen-
te uma obra de misericórdia e de
perdão, como explicou o sacerdote
padre Serge Thomas Bonino. No
seu livro autobiográfico Memória e
identidade, João Paulo II já tinha
afirmado que existe um limite divino
imposto ao mal, e que ele consiste
na misericórdia. Quando entra em
contato com o pecado — ressaltou
em seguida monsenhor Nykiel — «o
amor de Deus não se apaga mas, ao
contrário, inflama-se ainda mais
transformando-se em misericórdia».
No entanto, segundo a admoestação
do padre José Granados, a misericórdia «não se limita a tolerar o mal
que nós causamos. Isto seria demasiado pouco!». Pelo contrário, a misericórdia recorda-nos «a nossa bondade originária e, deste modo, realiza em nós uma verdadeira regeneração: permite-nos nascer de novo e
volta a inserir-nos na vida segundo a
aliança com Deus».
Além disso, a misericórdia «ajuda
o filho a reconhecer a sua dignidade
filial indelével». Com efeito, como
testemunharam Ernesto Olivero e
Salvatore Martínez, a experiência da
misericórdia floresce em nós como
obra de misericórdia. «É neste amor
— recordou — que nasce e se desenvolve a vida cristã. O cristão que
realmente experimentou o amor misericordioso de Deus não pode deixar de ser, por sua vez, testemunha e
portador da misericórdia divina:
“bem-aventurados os misericordiosos, porque encontrarão misericórdia”». Com efeito — frisou depois o
prelado — quem experimenta o amor
de Deus «é impelido a ter compaixão pelos pobres, pelos últimos e
por todos aqueles que ainda não
acolheram o amor de Deus na própria vida».
A misericórdia de Deus torna-nos
«cada vez mais misericordiosos e
ajuda-nos a percorrer mais rapidamente o caminho da santidade, em
conformidade com o exemplo dos
numerosos santos e beatos que fizeram da misericórdia a missão da sua
vida». Na Igreja — como explicou o
padre Antonio Sicari, apresentando
seis gigantes de santidade e de misericórdia: Teresa do Menino Jesus,
Faustina Kowalska, Vicente de Paulo, Damião de Veuster, Madre Teresa
de Calcutá e Leopoldo Mandić —
«nunca faltou o anúncio da misericórdia e incontáveis santos sempre a
testemunharam e viveram». No entanto é significativo que, precisamente entre os finais do século XIX e
os inícios do século XX, Deus «tenha
decidido transmitir à humanidade
um novo apelo, urgente, abrangente,
solene e reiterado, à sua misericórdia»: uma evocação «que representa
um elemento característico também
das outras grandes religiões, de maneira especial no judaísmo e no islão».
Por fim , o regente concluiu recordando que no seu relatório Massimo
Introvigne salientou o modo como
as grandes religiões, «apesar das
suas sensibilidades e pontos de vista», exprimem «saudade da misericórdia, como premissa para um diálogo difícil mas indispensável, num
mundo que tem necessidade dela».
L’OSSERVATORE ROMANO
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
página 8/9
Na vigília de oração o Papa propôs que se recorde o jubileu com obras em cada diocese
Monumentos à misericórdia
«Um hospital, uma casa para idosos,
para crianças abandonadas, uma escola
onde não houver, uma casa para
recuperar os toxicodependentes», numa
palavra, um «monumento» deste Ano da
Misericórdia que deve ser realizado em
cada diocese. Desejou o Papa Francisco
no final da vigília presidida na praça de
São Pedro no final da tarde de sábado, 2
de abril, vigília da festa da divina
misericórdia.
Caravaggio, «As sete obras de misericórdia» (1606-1607, igreja «Pio Monte della misericordia», Nápoles)
Com alegria e gratidão, partilhamos estes momentos de oração que nos introduzem no Domingo da Misericórdia,
tão desejado por São João Paulo II —
partiu há onze anos, em 2005, num sábado da Divina Misericórdia como hoje — e queria este Domingo para satisfazer um pedido de Santa Faustina. Os
testemunhos que nos foram oferecidos
— e que agradecemos — e as leituras
que ouvimos abrem clareiras de luz e
de esperança para entrar no grande
oceano da misericórdia de Deus. Quantas são as faces da misericórdia com
que Ele vem ao nosso encontro? São
verdadeiramente muitas; é impossível
descrevê-las todas, porque a misericórdia de Deus cresce sem cessar. Deus
nunca Se cansa de a exprimir, e nós
não deveríamos jamais recebê-la, procurá-la, desejá-la por hábito. É sempre al-
go de novo que gera surpresa e maravilha à vista da imaginação criadora de
Deus, quando vem ao nosso encontro
com o seu amor.
Deus revelou-Se, manifestando várias
vezes o seu nome; este nome é «misericordioso» (cf. Êx 34, 6). Tal como é
grande e infinita a natureza de Deus,
assim é grande e infinita a sua misericórdia, de tal modo que se revela uma
árdua tarefa conseguir descrevê-la em
todos os seus aspetos. Repassando as
páginas da Sagrada Escritura, vemos
que a misericórdia é, antes de mais nada, a proximidade de Deus ao seu povo.
Uma proximidade que se exprime e
manifesta principalmente como ajuda e
proteção. É a proximidade dum pai e
duma mãe que se espelha numa bela
imagem do profeta Oseias. Diz assim:
«Segurava-os com laços humanos, com
laços de amor, fui para ele como os que
levantam uma criancinha contra o seu
rosto; inclinei-me para ele, para lhe dar
de comer» (11, 4). O abraço dum pai e
duma mãe ao seu filho. É muito expressiva esta imagem: Deus pega em
cada um de nós e levanta-nos até ao
seu rosto. Quanta ternura contém e
quanto amor manifesta! Ternura: palavra quase esquecida e de que o mundo
atual, todos nós temos necessidade.
Pensei nesta palavra do profeta quando
vi o logótipo do Jubileu. Jesus não só
leva aos seus ombros a humanidade,
mas tem o seu rosto tão chegado ao de
Adão, que os dois rostos parecem fundir-se num só.
Nós não temos um Deus que não
saiba compreender e compadecer-Se
das nossas fraquezas (cf. Hb 4, 15). Pelo contrário! Foi precisamente em virtude da sua misericórdia que Deus Se fez
um de nós: «Pela sua encarnação, Ele,
o Filho de Deus, uniu-Se de certo modo a cada homem. Trabalhou com
mãos humanas, pensou com uma inteligência humana, agiu com uma vontade
humana, amou com um coração humano. Nascido da Virgem Maria, tornouSe verdadeiramente um de nós, semelhante a nós em tudo, exceto no pecado» (Gaudium et spes, 22). Por conseguinte, em Jesus, podemos não só pal-
Queridos irmãos e irmãs, a misericórdia não pode jamais deixar-nos tranquilos. É o amor de Cristo que nos
«inquieta» enquanto não tivermos alcançado o objetivo; que nos impele a
abraçar e estreitar a nós, a envolver
quantos necessitam de misericórdia, para permitir que todos sejam reconciliados com o Pai (cf. 2 Cor 5, 14-20). Não
devemos ter medo; é um amor que nos
alcança e envolve de tal maneira que se
antecipa a nós mesmos, permitindo-nos
reconhecer a sua face na dos irmãos.
Deixemo-nos conduzir docilmente por
este amor, e tornar-nos-emos misericordiosos como o Pai.
Como ouvimos no Evangelho, Tomé
era um teimoso. Não acreditara e encontrou a fé, precisamente quando tocou as chagas do Senhor. Uma fé que
não é capaz de se imergir nas chagas
do Senhor, não é fé. Uma fé que não é
Escritores vivos do Evangelho
«Muitos outros sinais miraculosos realizou ainda Jesus, na presença dos seus
discípulos, que não estão escritos neste
livro» (Jo 20, 30). O Evangelho é o livro da misericórdia de Deus, que havemos de ler e reler, porque tudo o que
Jesus disse e fez é expressão da misericórdia do Pai. Nem tudo, porém, foi
escrito; o Evangelho da misericórdia
permanece um livro aberto, onde se há
de continuar a escrever os sinais dos
discípulos de Cristo, gestos concretos
de amor, que são o melhor testemunho
da misericórdia. Todos somos chamados a tornar-nos escritores viventes do
Evangelho, portadores da Boa Nova a
cada homem e mulher de hoje. Podemos fazê-lo praticando as obras corporais e espirituais de misericórdia, que
são o estilo de vida do cristão. Através
destes gestos simples e vigorosos, mesmo se por vezes invisíveis, podemos visitar aqueles que passam necessidade,
levando a ternura e a consolação de
Deus. Deste modo damos continuidade
ao que fez Jesus no dia de Páscoa,
quando derramou, nos corações assustados dos discípulos, a misericórdia do
Pai, efundindo sobre eles o Espírito
Santo que perdoa os pecados e dá a
alegria.
Mas, na narração que ouvimos, aparece um contraste evidente: por um lado, temos o medo dos discípulos, que
fecham as portas da casa; por outro, temos a missão, por parte de Jesus, que
os envia ao mundo para levarem o
anúncio do perdão. O mesmo contraste
pode verificar-se também em nós: uma
luta interior entre o fechamento do coração e a chamada do amor para abrir
as portas fechadas e sair de nós mesmos. Cristo, que por amor entrou nas
portas fechadas do pecado, da morte e
da mansão dos mortos, deseja entrar
também em cada um para abrir de par
em par as portas fechadas do coração.
Ele que venceu, com a ressurreição, o
medo e o temor que nos algemam, quer
escancarar as nossas portas fechadas e
enviar-nos. A estrada que o Mestre res-
suscitado nos aponta é estrada de sentido único, segue-se apenas numa direção: sair de nós mesmos, sair para testemunhar a força sanadora do amor
que nos conquistou. Muitas vezes vemos, diante de nós, uma humanidade
ferida e assustada, que tem as cicatrizes
do sofrimento e da incerteza. Hoje, face ao seu doloroso clamor de misericórdia e paz, ouçamos como que dirigido
a cada um de nós o convite feito confiadamente por Jesus: «Assim como o
Pai Me enviou, também Eu vos envio a
vós (Jo 20, 21).
Cada doença pode encontrar na misericórdia de Deus um auxílio eficaz.
Com efeito, a sua misericórdia não se
detém à distância: quer vir ao encontro
de todas as pobrezas e libertar de tantas formas de escravidão que afligem o
nosso mundo. Quer alcançar as feridas
de cada um, para medicá-las. Ser apóstolos de misericórdia significa tocar e
acariciar as suas chagas, presentes hoje
também no corpo e na alma de muitos
dos seus irmãos e irmãs. Ao cuidar destas chagas, professamos Jesus, tornamoLo presente e vivo; permitimos a outros
que palpem a sua misericórdia, e O reconheçam «Senhor e Deus» (cf. Jo 20,
28), como fez o apóstolo Tomé. Eis a
missão que nos é confiada. Inúmeras
pessoas pedem para ser escutadas e compreendidas. O Evangelho da misericórdia, que se deve anunciar e escrever na
vida, procura pessoas com o coração
paciente e aberto, «bons samaritanos»
que conhecem a compaixão e o silêncio
perante o mistério do irmão e da irmã;
pede servos generosos e alegres, que
amam gratuitamente sem nada pretender em troca.
«A paz esteja convosco!» (Jo 20, 21):
é a saudação que Cristo leva aos seus
discípulos; é a mesma paz que esperam
os homens do nosso tempo. Não é uma
paz negociada, nem a suspensão de algo errado: é a sua paz, a paz que brota
do coração do Ressuscitado, a paz que
venceu o pecado, a morte e o medo. É
a paz que não divide, mas une; é a paz
que não deixa sozinhos, mas faz-nos
sentir acolhidos e amados; é a paz que
sobrevive no sofrimento e faz florescer
a esperança. Esta paz, como no dia de
Páscoa, nasce e renasce sempre do perdão de Deus, que tira a ansiedade do
coração. Ser portadora da sua paz: esta
é a missão confiada à Igreja no dia de
Páscoa. Nascemos em Cristo como instrumentos de reconciliação, para levar a
todos o perdão do Pai, para revelar o
seu rosto de amor nos sinais da misericórdia.
No Salmo Responsorial, foi proclamado: «O seu amor é para sempre»
(118/117, 2). É verdade, a misericórdia
de Deus é eterna; não acaba, não se esgota, não se dá por vencida diante das
portas fechadas e nunca se cansa. Neste
«para sempre», encontramos apoio nos
momentos de provação e fraqueza, porque temos a certeza de que Deus não
nos abandona: permanece connosco para sempre. Demos-Lhe graças por este
amor tão grande que nos é impossível
compreender. É tão grande! Peçamos a
graça de nunca nos cansarmos de tomar a misericórdia de Deus e levá-la
pelo mundo: peçamos para ser misericordiosos, a fim de irradiar por todo o
lado a força do Evangelho, para escrever aquelas páginas do Evangelho que
o apóstolo João não escreveu.
Coleta para a Ucrânia
Uma «coleta especial» a favor da
Ucrânia será recolhida «em todas as
igrejas católicas da Europa no domingo,
24 de abril»: anunciou o Papa
Francisco na praça de São Pedro no
final da missa celebrada na manhã de 3
de abril, na festa da Divina
misericórdia. Antes da recitação do
Regina caeli o Pontífice recordou também
o Dia mundial contra as minas
antipessoal.
Neste dia, que é como que o coração
do Ano Santo da Misericórdia, o meu
pensamento dirige-se a todas as populações que mais têm sede de reconciliação e de paz. Penso, em particular, aqui na Europa, no drama de
quem sofre as consequências da violência na Ucrânia: de quantos permanecem em terras assoladas pelas hostilidades que já causaram vários milhares de mortos, e de quantos — mais de
um milhão — foram obrigados a deixá-las devido à grave situação que
perdura. Ficam envolvidos sobretudo
idosos e crianças. Além de os acompanhar com o meu pensamento constante e com a minha oração, quis decidir
promover um apoio humanitário a seu
favor. Para esta finalidade, terá lugar
Na homilia da missa dominical o Pontífice convidou a testemunhar o amor de Cristo
«O Evangelho da misericórdia permanece
um livro aberto, no qual continuar a
escrever» porque «todos somos chamados
a tornar-nos escritores viventes do
Evangelho da Boa Nova a cada homem e
mulher de hoje». Afirmou o Papa
Francisco na homilia da missa celebrada
no adro da basílica de São Pedro na
manhã de domingo 3 de abril, festa da
divina misericórdia.
Domingo 24 de abril em todas as igrejas católicas da Europa
par a misericórdia do Pai, mas somos
impelidos a tornar-nos nós mesmos instrumentos da misericórdia. Falar de misericórdia pode ser fácil; mais difícil é
tornar-se suas testemunhas na vida concreta. Trata-se dum percurso que dura
toda a vida e não deveria registar interrupções. Jesus disse-nos que devemos
ser «misericordiosos como o Pai» (cf.
Lc 6, 36). E isto requer a vida inteira!
Muitas são, portanto, as faces com
que se apresenta a misericórdia de
Deus! É-nos dada a conhecer como
proximidade e ternura, mas, em virtude
disto, também como compaixão e partilha, como consolação e perdão. Quem
dela mais recebe, mais é chamado a
oferecer, a partilhar; não pode ser mantida oculta nem retida só para nós mesmos. É algo que faz arder o coração e
o desafia a amar, reconhecendo a face
de Jesus Cristo, sobretudo em quem está mais longe, fraco, abandonado, confuso e marginalizado. A misericórdia
não fica parada: vai à procura da ovelha perdida e, quando a encontra, irradia uma alegria contagiosa. A misericórdia sabe olhar cada pessoa nos
olhos; cada uma delas é preciosa para
ela, porque cada uma é única. Quanta
amargura sentimos no coração, quando
ouvimos dizer: «Esta gente... esta gente, estes miseráveis, expulsemo-los, deixemo-los dormir na estrada». Será isto
de Jesus?
capaz de ser misericordiosa, à semelhança das chagas do Senhor que são
sinal de misericórdia, não é fé: é mera
ideia, é ideologia. A nossa fé está encarnada num Deus que Se fez carne,
que Se fez pecado, que Se cobriu de
chagas por nós. Por isso, se quisermos
acreditar a sério e possuir a fé, devemos
aproximar-nos e tocar aquela chaga,
afagar aquela chaga e também inclinar
a cabeça e deixar que os outros afaguem as nossas chagas.
Para isso é bom que seja o Espírito
Santo a guiar os nossos passos: Ele é o
Amor, Ele é a misericórdia que é comunicada aos nossos corações. Não ponhamos obstáculos à sua ação vivificante, mas sigamo-Lo docilmente pelas
sendas que nos aponta. Permaneçamos
de coração aberto, para que o Espírito
possa transformá-lo; e assim, perdoados, reconciliados, imersos nas chagas
do Senhor, nos tornemos testemunhas
da alegria que brota do encontro com o
Senhor Ressuscitado, vivo no meio de
nós.
[Bênção]
Há poucos dias, em conversa com os
dirigentes duma associação de assistência, de caridade, surgiu esta ideia e
pensei comigo: «Vou dizê-la, sábado,
na Praça de São Pedro». Como seria
CONTINUA NA PÁGINA 10
uma coleta especial em todas as igrejas católicas da Europa no domingo
24 de abril. Convido os fiéis a unir-se
a esta iniciativa com uma generosa
contribuição. Este gesto de caridade,
além dos sofrimentos materiais, quer
expressar a proximidade e a solidariedade minha pessoal e de toda a Igreja. Faço votos sinceros de que ele possa ajudar a promover sem ulteriores
demoras a paz e o respeito do direito
naquela terra tão provada.
E ao rezarmos pela paz, recordamos que amanhã se celebra o Dia
Mundial contra as minas antipessoal.
Demasiadas pessoas continuam a
morrer ou ficam mutiladas por estas
armas terríveis, e homens e mulheres
corajosos arriscam a vida para bonificar os terrenos minados. Renovemos,
por favor, o compromisso por um
mundo sem minas!
Por fim, dirijo a minha saudação a
todos vós que participastes nesta celebração, em particular aos grupos que
cultivam a espiritualidade da Divina
Misericórdia.
Dirijamo-nos todos juntos em oração à nossa Mãe.
Dia mundial contra as minas antipessoal
Herança de morte
A 4 de abril celebrou-se no mundo inteiro o dia internacional para a sensibilização e a assistência na ação contra as minas antipessoal, dispositivos
letais que continuam a matar durante
décadas, inclusive após os períodos de
beligerância. E quando não matam,
tornam as suas vítimas inválidas para
sempre, com despesas enormes também para a coletividade.
As principais vítimas destes terríveis
instrumentos de morte são — segundo
os dados da Organização das Nações
Unidas — os civis e em especial as
crianças. No entanto, não existem estatísticas oficiais exatas acerca do número das pessoas que perderam a vida ou ficaram mutiladas por este tipo
de dispositivos letais. Cada ano são
produzidas cerca de dez milhões de
minas antipessoal — nesta tipologia
podem ser incluídas também as cluster
bombs (as tremendas bombas de fragmentação), os Ieds («improvised explosive devices») e as bombas valmara. Quando são disseminadas no terreno ou lançadas dos aviões, podem
matar ou ferir por um tempo indefini-
do. E ao longo dos anos torna-se cada
vez mais difícil localizá-las.
Com efeito, como indica a organização humanitária Land of Mine, enquanto as primeiras minas antipessoal
eram feitas de metal, e portanto podiam ser facilmente localizadas, as minas de última geração «evoluíram»,
pois são construídas com uma resina
sintética não corruptível pelos componentes químicos do terreno e passam
despercebidas aos olhos eletrónicos
dos sapadores. Desde 1945 — indicam
os especialistas neste setor — foram
inventadas seiscentos tipos de minas
terrestres.
Sem dúvida, as bombas de fragmentação são as mais perigosas, devastadoras e ameaçadoras. Muitas vezes são coloridas e brilhantes, e acabam por atrair o olhar das crianças,
que podem ser vistas como brinquedos perdidos por alguém. Uma sua
simples manipulação ativa o gatilho, e
a explosão pode ser imediata ou atrasada. A particularidade destas minas é
que, explodindo, dispersam submuniCONTINUA NA PÁGINA 10
L’OSSERVATORE ROMANO
página 10
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
Jen Norton, «As obras de misericórdia» (2016)
O cardeal Amato falou da misericórdia na vida dos santos
Como limão e mirto
NICOLA GORI
Na vigília da festa da divina misericórdia, instituída por João Paulo II
no ano 2000 e celebrada no segundo
domingo de Páscoa, é atual como
nunca a recordação dos santos que a
interpretaram na sua vivência diária.
Começando pela irmã Faustina
Kowalska, que recebeu de Cristo os
segredos da devoção à misericórdia
divina, até madre Teresa de Calcutá,
que a tornou tangível com os seus
gestos de caridade. Sobre isto falou
o cardeal Angelo Amato, prefeito da
Congregação para as Causas dos
Santos, nesta entrevista ao nosso jornal.
A misericórdia é apenas uma atitude
filantrópica ou uma dimensão constitutiva da santidade?
Na cultura cristã a palavra misericórdia tem muitos significados e pode indicar caridade, bondade, perdão. Ela inclui também uma multiplicidade de gestos, que a tradição
concretizou em quatorze comportamentos práticos, as chamadas obras
de misericórdia corporal e espiritual.
Trata-se de manifestações que desde
o início caraterizaram os discípulos
de Jesus, com frequência em contraste com uma certa cultura da época, que considerava a compaixão, a
piedade, como uma debilidade humana. Os estoicos, por exemplo,
consideravam-na uma doença da alma, que perturbaria a paz do sábio.
Contudo, é preciso acrescentar que
isto não impedia que Cícero julgasse
a misericórdia um sinal de sabedoria
«próprio do homem bom» e condenasse como absurdo o conceito estoico. Contudo, a misericórdia cristã
não é só expressão filantrópica, mas
tem profundas raízes teológicas. Misericordioso é a qualificação do próprio nome de Deus, como foi revelado a Moisés: «O Senhor, Deus misericordioso e piedoso, lento para a ira
e rico de graça e fidelidade». Este
precioso vestígio da bondade divina
Monumentos
à misericórdia
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 8
bom se em cada diocese, como
recordação, digamos, como «monumento» deste Ano da Misericórdia, se erguesse uma estrutura
de misericórdia: um hospital, uma
casa para idosos, para crianças
abandonadas, uma escola onde
não houver, uma casa para recuperação dos toxicodependentes...
Tantas coisas que se podem fazer!
Seria bom que cada diocese pensasse nisto: que posso deixar como recordação viva, como obra
de misericórdia viva, como chaga
de Jesus vivo neste Ano da Misericórdia? Pensemos e falemos com
os bispos. Obrigado!
afirma-se plenamente na revelação
neotestamentária de Deus como
amor. O Magnificat de Maria é o
cântico da misericórdia divina, que
de geração em geração se dilata sobre quantos o temem.
Como interpretaram os santos a misericórdia divina?
Se a misericórdia é o amor apaixonado de Deus pelas suas criaturas,
ela expressa também a caridade intensa do santo em relação ao próximo. Para Tomás de Aquino a virtude
da misericórdia está em harmonia
com a justiça, a qual sem misericórdia seria crueldade. De acordo com
o dado bíblico, o Aquinate afirma
que é próprio de Deus ter misericórdia. Portanto, ser misericordioso significa mostrar-se autêntico filho de
Deus: «Sede misericordiosos como é
misericordioso o vosso Pai celeste».
Os santos perfumaram a história
com o bálsamo da misericórdia. Na
festa judaica de Sucot — ou festa dos
tabernáculos — há o seguinte rito.
Ligam-se quatro plantas: limão, mirto, salgueiro e palmeira. Todas unidas, a fragrância do limão e do mirto transmite-se também às outras
duas plantas não perfumadas. E assim o perfume quadruplica-se. A misericórdia, como perfume de caridade, é efusiva e superabundante. Desta forma a fragrância das boas obras
dos santos contagia beneficamente a
debilidade e a fragilidade humana.
Há santos que se distinguem de modo
particular pela misericórdia?
Ela toca transversalmente todos os
santos e qualifica do melhor modo o
seu heroísmo virtuoso. Se quiséssemos mencionar algum nome, citaria
por exemplo madre Teresa de Calcutá, que será canonizada a 4 de setembro, universalmente conhecida
como a mulher da imensa compaixão para com os pobres, os marginalizados, os doentes, ou seja, para
com quantos são chamados os descartes da humanidade. Por isso fundou a congregação das missionárias
da caridade, para testemunhar concretamente com as obras a presença
da misericórdia divina nas chamadas
periferias do mundo. Madre Teresa
revelou o segredo do seu coração
misericordioso no diálogo com um
jovem sacerdote, Angelo Comastri,
hoje cardeal. Num encontro fortuito,
a irmã perguntou-lhe quase de surpresa: «Quantas horas rezas todos
os dias?». O sacerdote, surpreendido, esperava uma chamada à caridade e um convite a amar mais os pobres. Ao contrário, a madre perguntava-lhe quantas horas rezava. Depois, pegando nas suas mãos disse:
«Meu filho, sem Deus somos demasiado pobres para poder ajudar os
pobres! Recorda-te: eu sou apenas
uma pobre mulher que reza. Rezando, Deus põe o seu amor no meu
coração e assim posso amar os pobres. Rezando!». Para ela a misericórdia caía como chuva do céu da
união com Deus na oração. Depois
de ter retirado o prémio Nobel em
1979, na sua viagem de
regresso de Oslo, madre
Teresa passou por Roma. Os jornalistas precipitaram-se para a entrevistar e ela recebeu-os
pacientemente pondo na
mão de cada um uma
pequena medalha da
Imaculada. A um jornalista que lhe manifestou
a convicção de que depois da sua morte o
mundo teria sido igual a
antes, cheio de maldade,
ela respondeu com simplicidade: «Veja, eu nunca pensei que podia mudar o mundo! Procurei apenas ser
uma gota de água limpa, na qual
pudesse brilhar o amor de Deus.
Acha que é pouco?». Depois, no silêncio comovido dos jornalistas
prosseguiu: «Procure ser também o
senhor uma gota limpa e assim seremos duas gotas. É casado?». «Sim,
madre». «Diga isto também à sua
esposa, assim seremos três. Tem filhos?». «Três filhos, madre». Diga-o
também aos seus filhos, e seremos
seis...». Em síntese, convidava ao
contágio benéfico da misericórdia.
Outros exemplos?
Poderiam ser citados os santos
hospitaleiros, como João de Deus,
Camilo de Lellis, que fizeram da misericórdia o programa do seu apostolado a favor dos doentes; os santos
da caridade, como Vicente de Paulo,
Maximiliano
Kolbe,
Faustina
Kowalska; os santos educadores da
juventude, como João Bosco. Aqui
gostaria de recordar João Paulo II, o
Papa que, a partir de 2000, dedicou
o 2º domingo de Páscoa à Divina
Misericórdia. É o Pontífice que, com
a encíclica Dives in misericordia de 30
de novembro de 1980, escancarou a
janela para o paraíso, revelando-nos
o rosto do Pai, rico em misericórdia
para com todos. Mas a galeria dos
santos mestres da misericórdia divina
não se limita aos poucos que quisermos citar. Todos os santos são tocados pela misericórdia divina, tornando-se seus ministros. Todos são filhos da Mãe da misericórdia, obraprima da misericórdia divina. Ao
proclamar o ano jubilar da misericórdia o Papa Francisco afirmou de
Maria: «Conservou no seu coração a
divina misericórdia em perfeita sintonia com o seu Filho Jesus». É ela
que, com sentido materno, forma os
fiéis para o exercício da misericórdia,
educando-os a vivê-la mediante as
obras de misericórdia corporal e espiritual. Por fim, são muitas as congregações religiosas masculinas e femininas marcadas pelo carisma da
misericórdia. Neste ano jubilar elas
difundem o seu perfume no mundo
inteiro, sobretudo no coração dos
pequeninos e dos muitos necessitados do mundo.
CONTINUA NA PÁGINA 12
Herança de morte
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 8
ções ao seu redor, ampliando incrivelmente o seu efeito destruidor.
Em geral todos os anos, por causa das cerca de 100 milhões de minas antipessoal disseminadas pelo
mundo afora, continuam a morrer
milhares de indivíduos. E o dado
mais aterrador é que a partir de
2014 o número de vítimas voltou a
aumentar em relação aos anos precedentes. O triste recorde de vítimas pertence ao Afeganistão, seguido pela Colômbia, Angola,
Myanmar, Paquistão, Síria, Camboja e Mali. Na Europa a Bósnia e
Herzegovina é o país mais infestado pelas minas antipessoal, lançadas durante a guerra de 1992-1995,
ainda hoje disseminadas em mais
de dois por cento do território nacional, e cujo trabalho de eliminação não acabará antes de 2025. Um
drama humanitário que persiste
longe das guerras, a décadas de
distância, que atrasa — quando não
impede — o regresso à normalidade, proíbe o cultivo do terreno,
obstaculiza a volta dos deslocados
e destrói as atividades ligadas à
economia.
A Onu procurou pôr remédio a
este flagelo, primeiro mediante
uma resolução em 1993, e depois
através do tratado internacional de
1997, assinado em Ottawa por 120
países, mas não pelos Eua, Rússia,
Índia, China, Paquistão, Japão e
Iraque. A Itália, em especial, que
era uma das principais produtoras
e exportadoras de minas (os analistas falam de um milhão de peças
construídas cada ano, até 1993), em
1994 aprovou a moratória contra as
minas antipessoal, comprometendo-se a bloquear a sua produção
por parte de empresas nacionais, e
em seguida assinou também o tratado de Ottawa.
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 11
Missas matutinas em Santa Marta
Segunda-feira
4 de abril
O dia do sim
«Sim»: para o cristão não há outra
resposta à chamada de Deus. E sobretudo nunca deve existir a atitude
de quem finge que não entende, voltando-se para o outro lado. Foi precisamente na solenidade da Anunciação do Senhor que o Papa convidou
a viver uma verdadeira «festa do
sim», celebrando a missa na capela
da Casa de Santa Marta.
E um «sim» convicto foi pronunciado esta manhã pelos sacerdotes
que concelebraram com Francisco
no dia do quinquagésimo aniversário
de ordenação e também pelas religiosas vicentinas que trabalham em
Santa Marta, as quais renovaram os
votos. «É toda uma história que acaba e recomeça nesta solenidade que
hoje celebramos: a história do homem, quando sai do paraíso» quis
realçar imediatamente o Papa no início da homilia. Com efeito, depois
do pecado, o Senhor ordena ao homem que caminhe e habite toda a
terra: «Sê fecundo e vai em frente».
Mas «o Senhor estava atento ao que
o homem fazia». A tal ponto que
«às vezes, quando o homem errou,
Ele puniu-o: pensemos em Babel ou
no dilúvio».
Assim Deus «estava sempre atento
ao que o homem fazia: numa determinada altura, este Deus que olhava
e custodiava o homem, decidiu criar
um povo e chama nosso pai Abraão:
“Sai da tua terra, da tua casa”». E
Abraão «obedeceu, disse “sim”» ao
Senhor «e partiu da sua terra sem
saber para onde teria ido». É «o primeiro “sim” do povo de Deus». E
precisamente «com Abraão, Deus —
que olhava para o seu povo — começou a “caminhar com”». E caminhou
«com Abraão: “Caminha na minha
presença” disse-lhe».
Deus, explicou o Papa, «fez depois o mesmo com Moisés, ao qual
com oitenta anos disse: “faz isso”. E
Moisés que tinha oitenta anos — era
idoso — diz “sim”. E vai libertar o
povo».
Mas Deus, afirmou ainda o Pontífice, «fez o mesmo com os profetas»: pensemos por exemplo em
Isaías que, quando o Senhor lhe diz
para ir dizer as coisas ao povo, responde que tem «os lábios impuros».
Mas «o Senhor purifica os lábios de
Isaías e ele diz “sim!”».
E também com Jeremias, recordou
o Papa, acontece o mesmo: «Senhor,
eu não sei falar, sou um rapazinho!»
é a primeira resposta do profeta.
Mas Deus ordena-lhe que vá de
qualquer maneira e ele responde
“sim!». Foram «tantos, tantos»
aqueles «que disseram “sim”», é deveras uma «comunidade de homens
e mulheres idosos que disseram
“sim” à espera do Senhor». E na homilia Francisco quis recordar também Simeão e Ana.
«Hoje — explicou — o Evangelho
diz-nos o fim desta corrente de
“sim” e o início de outro “sim” que
começa a crescer: o “sim” de Maria». Precisamente «este “sim” faz
com que Deus — afirmou o Pontífice
— não só observe como procede o
homem, não só caminha com o seu
povo, mas que se torne um de nós e
assuma a nossa carne». Come efeito,
«o “sim” de Maria abre a porta ao
“sim” de Jesus: “Eu venho para fazer
a tua vontade”». É «este “sim” que
acompanha Jesus durante toda a vida, até à cruz: «Pai, afasta de mim
este cálice; entretanto, não seja feita
a minha vontade, mas o que Tu desejas!”». É «em Jesus Cristo que, como diz Paulo aos coríntios, há o
“sim” de Deus: Ele é o “sim”».
«É um dia bonito — frisou o Papa
— para agradecer ao Senhor por nos
ter ensinado esta estrada do “sim”,
mas também para pensar na nossa
vida». Aliás, «alguns de vós — disse
dirigindo-se diretamente aos sacerdotes presentes na missa — celebram
o quinquagésimo aniversário de sacerdócio: bonito dia para pensar nos
“sim” da vossa vida». Mas «todos
nós, cada dia, devemos dizer “sim”
ou “não”, e pensar se dizemos sempre “sim” ou se muitas vezes nos escondemos, de cabeça baixa, como
Adão e Eva, para não dizer “não”
fingindo não compreender aquilo
que Deus nos pede».
«Hoje é a festa do “sim” repetiu
Francisco. Com efeito, «no “sim” de
Maria há o “sim” de toda a história
da salvação e ali começa o último
He Qi, «Anunciação»
“sim” do homem e de Deus: ali
Deus recria, como no início com um
“sim” fez o mundo e o homem,
aquela bonita Criação: com este
“sim” eu venho para fazer a tua vontade e recria mais maravilhosamente
o mundo, recria todos nós». É «o
“sim” de Deus que nos santifica, que
nos faz avançar em Jesus Cristo».
Eis por que hoje é o dia justo «para
agradecer ao Senhor e para nos
questionarmos: eu sou homem ou
mulher do “sim” ou sou homem ou
mulher do “não”? Sou homem ou
mulher que olho para o outro lado,
para não responder?».
Portanto, o Papa expressou a esperança de «que o Senhor nos dê a
graça de entrar neste caminho de
homens e mulheres que souberam
dizer “sim”». E depois de ter dedicado um pensamento aos sacerdotes,
Francisco concluiu dirigindo-se às
religiosas da comunidade de Santa
Marta: «Neste momento, em silêncio, as irmãs que estão nesta Casa
renovarão os votos: fazem-no todos
os anos, porque são Vicente era inteligente e sabia que a missão que lhes
confiava era muito difícil, e por isso
quis que todos os anos renovassem
os votos. Nós em silêncio acompanhamos esta renovação».
Terça-feira
5 de abril
Como se cria
a harmonia
Para viver em harmonia e no apoio
recíproco a comunidade cristã deve
renascer do Espírito Santo. E há
dois sinais para compreender que se
está na estrada certa: o desapego do
dinheiro e a coragem de testemunhar Cristo ressuscitado, afirmou o
Papa. Uma indicação acompanhada
pela advertência de não confundir a
verdadeira harmonia com uma tranquilidade negociada ou hipócrita.
«Jesus diz a Nicodemos que se
deve renascer, mas renascer
do Espírito: é precisamente
o Espírito que nos dá uma
nova identidade, nos dá a
força, uma nova maneira de
agir»: eis a chave de leitura
proposta à luz do trecho
evangélico de João (3, 7-15)
pela liturgia do dia.
E esta sintonia — observou — vê-se já «na primeira
leitura, um dos três ou quatro resumos contidos nos
Atos dos apóstolos» (4, 3237): um trecho que narra
«como vivia a primeira comunidade, os “renascidos”
no Espírito».
Francisco observou que
eles «viviam em harmonia e
só o Espírito Santo pode
dar a harmonia». Com efeito «podemos estabelecer
acordos, uma determinada
paz, mas a harmonia é uma
graça interior que só o Espírito Santo pode proporcionar». Portanto, estas primeiras comunidades «viviam em harmonia»: e pode-se compreender isto
através de dois sinais que caracterizam a harmonia, explicou o Papa.
O primeiro sinal é que «ninguém
vive na necessidade, isto é, tudo é
comum». O sentido autêntico é explicado pelo próprio trecho dos Atos
dos apóstolos: «Tinham um só coração, uma só alma e ninguém considerava sua propriedade o que lhe
pertencia, mas entre eles tudo era
comum. De facto, entre eles não havia necessitados».
De resto, afirmou Francisco, «a
verdadeira harmonia do Espírito
Santo tem uma relação muito forte
com o dinheiro: o dinheiro é inimigo da harmonia, o dinheiro é egoísta». E «por isso o sinal que dá é que
todos ofereciam o seu a fim de que
não houvesse necessitados».
Em particular nos Atos «cita-se o
exemplo de José, chamado pelos
apóstolos Barnabé, que significa “filho da exortação”, um levita originário de Chipre, proprietário de um
campo». Pois bem, José vendeu o
seu campo e «entregou o dinheiro
depondo-o aos pés dos apóstolos».
Numa palavra, esta é a verdadeira
«harmonia» que, por conseguinte,
«tem uma relação com o espírito de
pobreza, que é a primeira bem-aventurança».
Ao contrário, muito diferente é «o
caso daquele casal, Ananias e Safira:
vendem o campo e dão tudo, dizem
que se deve dar tudo aos apóstolos,
mas subtraem às escondidas uma
quantia pondo-a de lado a fim de a
conservar para si mesmos».
Uma história que é narrada sempre nos Atos dos apóstolos (5, 1-11).
Mas — recordou Francisco — «o Senhor pune com a morte estes dois,
porque Jesus disse claramente que
não se pode servir a Deus e ao dinheiro: são dois senhores cujo serviço é irreconciliável».
Contudo, advertiu o Pontífice, «a
harmonia, que só o Espírito Santo
pode criar, não deve ser confundida
com a tranquilidade». A ponto que
«uma comunidade pode ser muito
tranquila, funcionar bem» mas não
estar em harmonia. «Uma vez —
confidenciou o Papa — ouvi um bispo dizer algo sábio: “Na diocese tem
tranquilidade. Mas se abordes este
problema ou aquele, de repente explode a guerra”».
Porque esta — observou — é «uma
harmonia negociada e não a do Espírito: é uma harmonia, digamos, hipócrita, como a de Ananias e Safira
com o que fizeram». Mas «a harmonia do Espírito Santo concede-nos
esta generosidade de não possuir nada de próprio, enquanto houver um
necessitado».
Depois há uma segunda atitude
suscitada pela harmonia do Espírito
Santo e Francisco apresentou-a repetindo as palavras dos Atos: «Com
grande força, os apóstolos davam
testemunho da ressurreição do Senhor Jesus, e em todos eles era grande a graça».
Resumindo, o segundo sinal da
harmonia verdadeira é «a coragem».
Assim «quando há harmonia na
Igreja, na comunidade, há coragem:
a coragem de dar testemunho do Senhor ressuscitado».
Nesta perspectiva o Pontífice sugeriu «ler e reler este trecho dos
Atos dos apóstolos: o capítulo 4, do
versículo 32 em diante». E logo explica o motivo: «Porque foi o que
Jesus pediu ao Pai na última ceia:
que fossem “um só”, que houvesse
harmonia entre eles». E «quando
chega o dom do Pai, que é o Espírito Santo, ele é capaz de estabelecer
esta harmonia».
Eis porque, concluiu o Papa, «nos
fará bem ler este trecho hoje e verificar o que diz e como cada um de
nós pode ajudar a sua família, o seu
bairro, a sua cidade, os colegas de
trabalho, os companheiros de escola,
todos os que nos estão próximos,
para criar esta harmonia que se faz
em nome do Senhor Jesus ressuscitado e é uma graça do Espírito Santo».
L’OSSERVATORE ROMANO
página 12
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
A difícil arte de reconhecer o amor no Evangelho de Lucas
E se fosse uma pregação?
Publicamos o comentário de uma monja de Bose a Lucas 7, 36 — 8, 3, tirado do livro «La follia del Vangelo»
(Qiqajon, 2014) que saiu no nosso suplemento mensal «Mulheres Igreja
Mundo» de 3 de março.
MARIA
DELL’ORTO
Mais uma vez o Evangelho nos
anuncia o que considera mais importante, ou seja, que o início, o fim e a
própria substância da fé que quer
suscitar nos nossos corações é o
amor. Que viver na fé de Jesus significa viver em prol dos outros, conformando-se a ele que veio não para
ser servido mas para servir. E que,
por conseguinte, a única visibilidade
da fé, a única eloquência cristã, é o
amor humilde e grande de quem serve o seu próximo. Ora bem, precisamente porque a fé vale o preço elevado do amor gratuito ou, caso contrário, não pode ser considerada fé
de modo algum, o Evangelho põe o
dedo na ferida, mostrando a tenta-
dição à santidade, uma desmentida
da sua identidade de profeta. Nem
os gestos da mulher nem a atitude
de Jesus são para ele oportunidade e
provocação para se questionar a si
mesmo, mas apenas ocasião para se
fortalecer na sua cegueira corrompida. Jesus denunciou muitas vezes o
grande mal da cegueira e da hipocrisia que tenta os homens religiosos:
considera que a identidade religiosa
conta mais do que as ações, mais do
que se faz ou não se faz; usar a
identidade religiosa de peritos na lei
de Deus como evasão da responsabilidade que precisamente aquela mesma Lei confere a cada um para agir
com justiça, verdade e amor. Nunca
esqueçamos que em Mateus 25 todos
os pecados graves criticados são pecados de omissão.
Simão, ignorante em amor, não o
reconheceu nos gestos gratuitos da
mulher. Indo além da evidência e da
inteligência destes gestos, que outra
inteligência lhe resta? Com efeito, o
motivo do seu duvidar de Jesus —
ra entre todos, entrevê em Jesus com
a intuição do amor um pobre e também um homem de Deus verdadeiro e compassivo, e faz por ele tudo o que está em seu poder, tudo o que a sua grande inteligência amorosa lhe sugere.
No Evangelho não se diz de
forma
alguma
que esta mulher
procurava perdão e salvação.
Não. Isto também é importante. A própria salvação nunca pode ser o objetivo
do amor. É apenas, mas sempre,
a sua consequência. Pois quem quer salvar a própria
vida perde-a, e só quem a perde por
amor salva-a. Dela só se fala do seu
grande amor, e da sua capacidade de
não se deixar inibir pelo olhar do
dono de casa, que por experiência
sabia prever muito bem.
Paolo Veronese, «Jantar na casa de Simão» (1567-1570)
ção eterna dos homens religiosos,
aquela fé que se quer tornar visível a
baixo preço, subtraindo-se à responsabilidade do amor.
O episódio evangélico narra o
grande amor de uma prostituta por
Jesus. Um amor demonstrado não
com palavras — com efeito não disse
praticamente nada — mas com a eloquência de gestos amorosos, humildes e sábios, como verdadeira perita
em amor. Jesus vê os seus gestos de
tão amoroso e humilde serviço, totalmente silenciosos, e neles reconhece a sua fé e a sua salvação. E no final dirá: «A tua fé te salvou, vai-te
em paz». E em seguida encontramola com Jesus e os outros discípulos e
discípulas servindo-os.
Mas além do olhar de Jesus, é-nos
narrada a reação, perante os mesmos
gestos, de um homem religioso, Simão, pertencente ao grupo dos fariseus, que era o dono de casa que
convidara Jesus para sentar à sua
mesa.
O Evangelho é impiedoso ao narrar-nos a visão cega de Simão, a sua
perceção distorcida do que acontece
sob os seus olhos. Onde há um
grande amor, o da mulher, ele vê a
impureza e o pecado. Onde há discernimento e acolhimento amoroso e
estupefacto de Jesus em relação à
uma mulher que ama tanto, ele vê
uma carência religiosa, uma contra-
«Se este homem fosse profeta, saberia quem é e de que espécie é a mulher que lhe está a tocar» — revela
que não conhece nem sequer o ministério que Deus, por amor do seu
povo, dá aos seus servos os profetas
nas Escrituras sagradas de Israel.
O ministério do profeta não é
porventura o estar exigente e puro
entre a santidade de Deus e a miséria inclusive moral do povo? Admoestando-os para que voltem para
Deus deixando de cometer injustiças
e começando a amar o próximo? E
de facto Jesus, como verdadeiro profeta, vendo no amor da mulher a sua
cura e salvação, cuida de Simão, o
verdadeiro doente.
A cegueira de Simão, homem religioso, é admoestação severa, profética e evangélica, para cada um de
nós. O que David nosso pai soube
ouvir, e reconhecer, dos lábios do
profeta Natã, no Primeiro Testamento: «Tu és este homem» (2 Samuel,
12-17), o Evangelho o diz a cada um
de nós. Porque o Evangelho nunca
nos confirma nos nossos preconceitos, aliás, ao revelar a sua hipocrisia,
admoesta cada um para que desperte e se converta.
Assim como a cegueira de Simão
é severa admoestação, também o discernimento amoroso da mulher e de
Jesus são um magistério fundamental para nós. Aquela mulher, primei-
E para nós o olhar de Jesus que
se deixa surpreender como se fosse
uma revelação, e sabe tirar proveito
destes gestos gratuitos e eloquentes
de amor, é magistério. Sabe tirar deles não só consolação, mas também
edificação e ensinamento para si.
Com efeito, antes de ser preso e as-
sassinado, a fim de dar um sinal significativo da sua grandeza, humildade e gratuitidade do seu amor pelos
discípulos, inclina-se aos seus pés e
lava-os. Com esta narração o Evangelho suplica-nos para que tenhamos
olhar e discernimento a fim de conhecer o amor onde quer que se manifeste, independentemente da boa
ou da má fama das pessoas, e aprender a amar com elas.
Falando a Simão, Jesus pronuncia
uma dupla sentença: «São-lhe perdoados os seus muitos pecados, porque muito amou; mas àquele a quem
pouco se perdoa, pouco ama», confirmando assim um dúplice vínculo
entre perdão e amor. Esta dupla sentença, que não se refere à dificuldade de perdoar, mas àquela de estar
consciente da própria necessidade
do perdão do outro, é um bom critério de discernimento e de interpretação dos nossos amores: quer dos
que são felizes, quer daqueles miseráveis, ou aos quais tudo falta.
Devemos questionar-nos se cada
amor que vivemos nos leva a conhecer melhor a nós mesmos como pessoa necessitada de perdão, ou se pelo contrário torna mais pequena, ou
até apaga esta consciência. Porque,
neste caso, diz o Evangelho, este
amor diminui a nossa capacidade de
amar.
Como limão e mirto
CONTINUAÇÃO DA PÁGINA 10
Para que serve canonizar os santos?
Desde os primeiros séculos a
Igreja celebrou os mártires e os
santos como heróis do Evangelho,
que com a sua vida virtuosa e o
seu testemunho martirial mostraram a beleza do seguimento de Jesus, o primeiro mártir e o três vezes santo. A este propósito podemos recordar que o número dos
mártires dos primeiros três séculos
oscila, nos testemunhos dos históricos, entre dez e cem mil, mesmo se
não falta quem faz aumentar notavelmente este número. Também
não é possível estabelecer exatamente o número dos santos canonizados entre os séculos III e VIII
com base na vox populi ou no sensus fidelium e na comum opinio
sanctitatis, tendo também em consideração o facto de que, até ao século XIII, estava em vigor a canonização episcopal. Contudo, para obter uma primeira informação sobre
o nome dos santos, poder-se-iam
citar os que estão na editio typica de
2001 do Martyrologium romanum.
Como se vê, canoniza-se um servo
de Deus, devido quer à santidade
da sua vida virtuosa quer ao testemunho do seu martírio. Ao propôlo à veneração dos fiéis, a Igreja
afirma que, enquanto amigo de
Deus, o santo torna-se intercessor
de graças e favores celestiais para
os fiéis ainda peregrinos na terra.
Os santos amparam a Igreja na sua
luta perene contra o mal e, ao mesmo tempo, oxigenam a sociedade
com o ar limpo da sua bondade e
da sua caridade misericordiosa.
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
L’OSSERVATORE ROMANO
página 13
A partir de 6 de abril a plenária do episcopado
Chegou a hora dos leigos
no Brasil
A reflexão sobre o papel dos cristãos
leigos «na Igreja e na sociedade»,
como «sal da terra e luz do mundo», é o tema central da assembleia
plenária da CNBB, que se realiza de 6
a 15 de abril em Aparecida. O anúncio foi dado pelo site do episcopado
brasileiro, através do qual o secretário-geral e bispo auxiliar de Brasília,
D. Leonardo Steiner, frisou a exigência de relançar a missionariedade
da Igreja. «Os nossos leigos, irmãos
batizados — explicou o prelado —
desempenham um papel muito importante na Igreja com base na vocação que recebem por meio do batismo» e por isso «estão convidados
a ser testemunhas de Jesus crucificado e ressuscitado».
Uma chave de leitura eclesial que
contudo não subestima o compromisso e o testemunho no cenário público. Ainda mais num contexto como o atual, no qual a sociedade brasileira está a enfrentar uma forte crise moral e económica. «Os leigos —
continuou o prelado — têm a missão
de revigorar as comunidades, segundo as orientações oferecidas pelos
sacerdotes». Portanto, sobretudo no
ano santo extraordinário da misericórdia, os pastores e os movimentos
eclesiais «são chamados a reconsiderar a missão dos leigos na sociedade
a fim de que sejam capazes de levar
misericórdia, consolação e atenção
aos mais pobres e necessitados».
À atenção dos prelados brasileiros
— com a participação de 320 bispos
— é submetida também a elaboração
de um novo volume da série «Pensando o Brasil», que apresenta a visão do episcopado sobre a realidade
social do país. Em 2014, por ocasião
da plenária, foi elaborado o primeiro
volume, intitulado «Os desafios
diante das eleições de 2014». Em
2015, o segundo volume tratou as
desigualdades sociais, e este ano os
prelados concentram-se nas próximas eleições municipais. Naturalmente, explicou D. Steiner, os bispos não pretendem dar indicações
de voto, mas ajudar os fiéis a compreender a difícil realidade política.
«A Igreja deve fazer sempre a opção
pela democracia — frisou o prelado
— e a CNBB procurou sempre ser fiel
inclusive às orientações e indicações
do magistério pontifício». Por isso,
«a partir do Evangelho, dos documentos da Igreja e do magistério do
Papa Francisco — explicou D. Steiner — o livro reflete sobre a situação
cultural, política e social do Brasil e
procura propor soluções para superar a crise atual».
A grande preocupação pela situação do país, de resto, foi expressa há
poucos dias pelos prelados, depois
das clamorosas evoluções sobre o caso Petrobras, que chegaram a envolver diretamente o ex-presidente Lula. Com efeito, numa nota assinada
pelo presidente da CNBB, D. Sérgio
da Rocha, arcebispo de Brasília, e
aprovada pelo Conselho permanente
do episcopado que se reuniu de 8 a
10 de março na capital brasileira,
condenou-se com decisão todas as
formas de corrupção e exortou-se a
superar a crise através da transparência das instituições e do diálogo entre as forças sociais. «Vivemos numa
profunda crise política, económica e
institucional que tem como pano de
fundo a falta de referências éticas e
morais, pilares para a vida e a organização de toda a sociedade», foi a
advertência dos bispos dos quais
chegou também o convite «a fomentar a concórdia e a paz nas próprias
atividades e declarações». Nesta
perspetiva, cada pessoa é chamada a
oferecer a sua contribuição e a «procurar soluções aos problemas que temos diante de nós. Somos chamados
a dialogar para construir um país
justo e fraterno». Sem esquecer de
pôr em primeiro lugar os interesses
do povo e, sobretudo, dos mais pobres.
Preocupação das comunidades cristãs perante a fase de crise
Oração e diálogo social para os brasileiros
«As Igrejas rezem pelo país»: o apelo lançado recentemente pelo pastor
Olav Fykse Tveit, secretário-geral do
World Council of Churches (Wcc)
resume de forma eloquente o sentido
da forte preocupação que toda a comunidade cristã sente relativamente
ao destino do Brasil que está a viver,
pelo menos nos últimos anos, uma
fase inédita marcada por uma grave
crise moral antes ainda que económica.
Nas últimas semanas, como se sabe, diante das manifestações públicas devido aos desenvolvimentos estrondosos das investigações sobre o
caso Petrobras, que chegaram a envolver diretamente o ex-presidente
Lula, os bispos católicos mediante
uma nota do presidente da Conferência episcopal, D. Sérgio da Rocha, arcebispo de Brasília, condenaram com firmeza qualquer forma de
corrupção, convidando a superar a
crise através da transparência das
instituições e do diálogo entre as
forças sociais. A voz católica, sem
dúvida, volta a fazer-se ouvir por
ocasião da plenária do episcopado
que se realiza em Aparecida de 6 a
15 de abril. Nesta ocasião, como foi
anunciado pelo secretário-geral e
bispo auxiliar de Brasília, D. Leonardo Steiner, os prelados providenciarão a elaboração de um novo volume da série «Pensando o Brasil»,
que apresenta a visão do episcopado
sobre a realidade social do país.
Portanto, à preocupação da comunidade católica une-se também a das
outras confissões cristãs. Vozes não
propriamente marginais, sobretudo
se se considerar que as realidades
eclesiais que fazem referência às comunidades nascidas com a reforma
protestante representam mais de 20
por cento da população. Nesta perspetiva, recentemente o secretário-geral do Wcc expressou a sua preocupação pelas turbulências sociais e
políticas em curso no Brasil, exortando as comunidades cristãs e todos os setores da sociedade a «defender os princípios democráticos, a
respeitar os direitos humanos fundamentais e garantir liberdade de expressão e de opinião a todos». Tveit
frisou em particular a necessidade de
«respeitar a dignidade humana e o
estado de direito com a finalidade
de evitar incitação à violência através
de um discurso de ódio». Acrescentando: «É importante que casos suspeitos de corrupção sejam investigados plenamente, respeitando os direitos constitucionais das pessoas indagadas e que a sociedade brasileira
e os atores políticos previnam a incitação à violência e superem a crescente polarização e radicalização no
país». O líder da organização ecuménica afirmou também que «a futura estabilidade democrática no
Brasil é muito importante para todos os grupos de cidadãos do país,
mas também para a América Latina
no seu conjunto». Que, este é o apelo, as Igrejas e as comunidades eclesiais no Brasil «rezem pelo país, promovendo o respeito do estado de direito e se façam embaixadoras de re-
conciliação em nome do Senhor Jesus Cristo».
A preocupação principal é o respeito pela legalidade e pela Constituição. E se já no dia 10 de março o
Conselho da Igreja presbiteriana
unida do Brasil condenou a espetacularização de algumas ações judiciárias — «criam um misto de cultura
pernicioso, permeado de ódio por
quem pensa de modo diverso, que
pode degenerar» — há poucos dias
um movimento que reúne milhares
de evangélicos em todo o país, com
a participação de mais de 1.500 pastores, divulgou um manifesto pela
normalidade democrática. Um texto
que — como frisou o jornal online
Riforma.it — denuncia a seletividade
dos meios de comunicação na transmissão de informação, adverte os
próprios fiéis a não entrar no jogo
da condenação apressada e pede o
respeito pelo voto de 2014. Aliás,
uma tomada de posição não distante
do que a 20 de março afirmou o bispo católico da diocese de Crateús,
D. Ailton Menegussi: «Não aceitamos que partido político algum
aproveite desta crise para dar um
golpe no país. Não estamos interessados simplesmente em mudar de
governo, queremos que o país seja
respeitado, que o cidadão brasileiro
seja respeitado, é isto que a CNBB
deseja. Não apoiamos uma mudança
de governo, de pessoas interessadas
que só querem instalar-se e são carreiristas», concluiu.
L’OSSERVATORE ROMANO
página 14
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
Numa produção de Sky e Ctv
Basílicas romanas em 3D
ão uma, mas algumas primícias: um verdadeiro tour cinematográfico com pontos
de vista inéditos e filmagens antes
nunca realizadas. Depois de Musei
Vaticani 3D e Firenze e gli Uffizi 3D
chega aos cinemas italianos, de 11 a
13 de abril, San Pietro e le Basiliche
Papali di Roma 3D, nova produção
cinematográfica realizada por Sky 3D
e Centro televisivo vaticano (Ctv),
distribuída por Nexo Digital, com o
objetivo de redescobrir, por ocasião
do jubileu da Misericórdia, os grandes tesouros de arte da cidade eterna.
O filme — que depois será distribuído em mais de cinquenta países
(entre os quais México, Chile, Peru,
Colômbia, Canadá, Reino Unido,
Irlanda, Espanha, Holanda, Rússia e
Hong Kong) — foi reconhecido de
interesse cultural pelo ministério italiano dos Bens e das atividades culturais e do turismo, da Direção geral
do Cinema. Com efeito, entre as novidades da película, que dura noventa minutos, há imagens exclusivas da
Pietà de Michelangelo filmada sem o
vidro que a protege, da cúpola de
São Pedro vista do alto e a pouca
distância, dos célebres grafites no túmulo do apóstolo estudados por
Margherita Guarducci, e das outras
três basílicas papais filmadas excepcionalmente a portas fechadas.
O filme, realizado nos formatos
3D, 4K e HD, é fruto de um projeto
de Cosetta Lagani. A direção é de
Luca Viotti e os textos de Laura Allievi. O diretor de fotografia é Massimiliano Gatti, e as músicas originais de Matteo Curallo.
N
São Pedro
em versão 3D
A conduzir o espectador através
do itinerário que pretende conjugar
imagens e cultura são Antonio Paolucci, diretor dos Museus do Vaticano (para a basílica de São Pedro); o
arquiteto Paolo Portoghesi (para São
João de Latrão); o historiador de arte Claudio Strinati (para Santa Maria Maior); e Micol Forti, diretor da
Coleção de arte contemporânea dos
Museus do Vaticano (para São Paulo fora dos Muros, reconstruída como se sabe no coração do século XIX
depois do incêndio desastroso de
1823).
Os peritos, cada um segundo o
próprio ponto de vista, descrevem as
basílicas explicando a sua evolução
nos séculos, ilustrando as obras de
arte que conservam e traçando as características salientes dos artistas que
nelas trabalharam: Giotto, Bramante, Michelangelo, Francesco Borromini, Gian Lorenzo Bernini, Domenico Fontana, Arnolfo di Cambio,
Jacopo Torriti.
O guia das quatro basílicas é introduzido por alguns excertos de
Passeggiate romane de Stendhal lidos
por Adriano Giannini: o escritor
francês que chegou pela primeira
vez à Itália com 17 anos, obviamente
visitou, encantando-se, as quatro basílicas romanas, desde sempre metas
obrigatórias do tradicional Grand
Tour. E observava: «Nada no mundo pode ser comparado com o interior de São Pedro». Stendhal foi tes-
temunha também do grave incêndio
que em 1823 destruiu quase totalmente a basílica ostiense, que depois, devido aos restauros, se tornou
um verdadeiro laboratório artístico.
Graças a meios técnicos em uso
nas mais avançadas produções cinematográficas foram realizadas imagens inéditas, inclusive com a utilização de helicópteros. E para completar esta singular instalação visual
há o poder do 3D, capaz de pôr o
espectador no centro da cena e em
contato direto com as obras de arte.
O filme foi enriquecido por modelações tridimensionais baseadas
em projetos originais, em parte conservados na Biblioteca apostólica vaticana, como o desenho do Abbraccio
di Piazza San Pietro de Bernini e os
projetos com desenhos originais de
Borromini das naves de São João de
Latrão.
E o vasto arsenal tecnológico utilizado permite que decifrar e apreciar
também os pormenores mais escondidos dos tesouros de arte visitados,
como a assinatura de Michelangelo
na Pietà.
Inaugurada a exposição fotográfica sobre a Guarda Suíça pontifícia
Retrato quotidiano
«La vita di una guardia svizzera: uno scorcio privato» [«A vida de um guarda suíço: uma visão particular»], narrada pela exposição fotográfica — com
oitenta e seis fotos em branco e preto e em cores de
Fabio Mantegna — inaugurada recentemente nos
Museus do Vaticano.
«Um título — explicou o comandante do corpo
Christoph Graf durante a cerimónia de abertura da
exposição, que se encerra a 12 de junho — que não
deixa entender expectativas extraordinárias», nem
suscita «interesse sobre quem sabe quais curiosidades, mas que indica aspectos normais de vida».
Com efeito, afirmou, é a vida normal de um guarda
que «queremos mostrar ao visitante, precisamente
como um guarda vive no seu dia a dia».
Habituados à clássica imagem do guarda em uniforme de gala, os fiéis e os peregrinos que chegam
ao Vaticano têm «a impressão de que aquela é a
normalidade». Mas, advertiu Graf, «não é assim».
De facto, também na vida do corpo existem dias
«ritmados por ordinárias atividades diárias e por
serviços internos; serviços que aliás são sempre um
desafio e um compromisso para os guardas que os
desempenham». Como por exemplo o comandante
citou a experiência do serviço efetuado pelos guardas a partir da meia-noite até às seis da manhã: um
serviço que — evidenciou — muitos deles enfrentam
organizando um programa de atividades que «consiste no estudo da língua italiana, na leitura de jornais e livros, na preparação de exames e nas orações».
Mas qual é o perfil do guarda pontifício? «São
jovens suíços — explicou o comandante — com cerca
de vinte, vinte e três anos, que depois de um aprendizado ou do ensino secundário e do serviço militar
desempenham por um mínimo de dois anos outra
atividade». Os motivos que impelem à escolha de
servir o corpo podem ser várias: entre eles Graf enumerou «a tradição, o privilégio, servir uma organização militar, estudar a língua ou conhecer a cultura
italiana, descobrir o Vaticano e a Igreja católica, servir o Papa». Mas, acrescentou, há motivos de fé.
«Muitos guardas — revelou — desejam crescer espiritualmente e até na Guarda temos também algumas
vocações. Quase todos os anos temos um guarda
que decide entrar no seminário ou numa ordem religiosa».
Depois o comandante evidenciou a dimensão
«familiar» do corpo da guarda suíça: «uma família
— disse — que precisa de cuidado e apoio». E acrescentou que o objetivo principal é «fazer com que
estes jovens se sintam bem, em casa». Só deste modo, explicou, «podemos desempenhar a nossa missão. Não queremos ser super-heróis ou ser intitulados os anjos da guarda do Santo Padre». Contudo,
deve ser evidenciada a vontade de trabalhar «em silêncio, com dedicação e humildade» e em espírito
de serviço. «Estamos intimamente convictos — garantiu, concluindo — de que não existe uma tarefa
mais nobre e bonita do que a do guarda suíço».
Entre os presentes na inauguração da exposição
— idealizada por Romina Cometti e realizada também graças aos Patrons of the Arts in the Vatican
Museums — o cardeal Giuseppe Bertello, presidente
do Governatorato do Estado da Cidade do Vaticano, o arcebispo Georg Gänswein, prefeito da Casa
Pontifícia, o embaixador da Suíça junto da Santa
Sé, Pierre-Yves Fux, o capelão do corpo, padre
Thomas Widmer, e Antonio Paolucci, diretor dos
Museus do Vaticano.
L’OSSERVATORE ROMANO
número 14, quinta-feira 7 de abril de 2016
página 15
Audiências
la, até hoje Núncio Apostólico na
Tanzânia.
O Papa Francisco recebeu em audiências particulares:
Arcebispo de Bar (Montenegro), o
Rev.do Pe. Rrok Gjonlleshaj, do clero
da Administração Apostólica de Prizren, até agora Pároco da Paróquia
de Santo António em Prishtina e
ecónomo da Administração Apostólica de Prizren.
A 1 de abril
O Senhor Cardeal Donald William
Wuerl, Arcebispo de Washington
(EUA); D. Renzo Fratini, Núncio
Apostólico na Espanha e no Principado de Andorra; e o Rev.do Pe.
Hans Stapel, Fundador da Fazenda
da Esperança (Brasil).
O Doutor Libero Milone, RevisorGeral.
INFORMAÇÕES
Nomeações
O Sumo Pontífice nomeou:
A 31 de março
A 2 de abril
Os Senhores Cardeais Marc Ouellet,
Prefeito da Congregação para os
Bispos; Robert Sarah, Prefeito da
Congregação para o Culto Divino e
a Disciplina dos Sacramentos; e
João Braz de Aviz, Prefeito da Congregação para os Institutos de Vida
Consagrada e as Sociedades de Vida
Apostólica, com o Secretário do
mesmo Dicastério, D. José Rodríguez Carballo; e D. Savio Hon TaiFai, Secretário da Congregação para
a Evangelização dos Povos.
A 4 de abril
Os Senhores Cardeais Leonardo
Sandri, Prefeito da Congregação para as Igrejas Orientais; e José Luis
Lacunza Maestrojuán, Bispo de David (Panamá), com D. José Domingo Ulloa Mendieta, Arcebispo de
Panamá; D. Luis Mariano Montemayor, Núncio Apostólico na República Democrática do Congo; e D.
Santo Gangemi, Núncio Apostólico
na Guiné e no Mali.
Renúncias
O Santo Padre aceitou a renúncia:
No dia 31 de março
De D. Jacobus Kim Ji-Seok, ao governo pastoral da Diocese de Wonju
(Coreia), em conformidade com o
cânone 401 § 1 do Código de Direito Canónico.
De D. Florentino F. Cinense, ao governo pastoral da Diocese de Tarlac
(Filipinas), em conformidade com o
cânone 401 § 1 do Código de Direito Canónico.
No dia 1 de abril
De D. Felipe Salazar Villagrana, ao
governo pastoral da Diocese de San
Juan de los Lagos (México), em
conformidade com o cânone 401 § 1
do Código de Direito Canónico.
No dia 4 de abril
De D. Mile Bogović, ao cargo de
Bispo de Gospić-Senj (Croácia), em
conformidade com o cânone 401 § 1
do Código de Direito Canónico.
No dia 5 de abril
D. Zef Gashi, ao governo pastoral
da Arquidiocese de Bar (Montenegro), em conformidade com o cânone 401 § 1 do Código de Direito Canónico.
Bispo de Wonju (Coreia), D. Basil
Cho Kyu-man, até esta data Auxiliar
da Arquidiocese de Seul.
Bispo de Tarlac (Filipinas), o Rev.do
Pe. Enrique V. Macaraeg, do clero
da Arquidiocese de Lingayen-Dagupan, até esta data pároco da «Saint
Ildefonse Parish» em Malasiqui,
Pangasinan.
D. Enrique V. Macaraeg nasceu em
Manila (Filipinas), no dia 28 de dezembro de 1955. Foi ordenado Sacerdote a 19 de maio de 1979.
Presidente do Conselho de Administração do Fundo de Pensões do Vaticano, o Prof. Nino Savelli, Docente na Faculdade de Ciências Bancárias, Financeiras e dos Seguros da
Universidade Católica de Milão.
A 1 de abril
Legado Pontifício às celebrações que
terão lugar em Gniezno e em Poznań de 14 a 16 de abril, por ocasião
do 1050° aniversário do Batismo da
Polónia, o Senhor Cardeal Pietro
Parolin, Secretário de Estado.
Enviado Especial à inauguração do
Santuário de Toruń (Polónia), dedicado a Maria Santíssima Estrela da
Nova Evangelização e a São João
Paulo II, que terá lugar a 18 de
maio, o Senhor Cardeal Zenon Grocholewski, Prefeito emérito da Congregação para a Educação Católica.
D. Zdenko Križić, O.C.D., nasceu
em Johovac, na Bósnia e Herzegovina,
a 2 de fevereiro de 1953. Recebeu a
Ordenação sacerdotal no dia 26 de junho de 1977.
Bispo de Hinche (Haiti), o Rev.do
Pe. Désinord Jean, do Clero da diocese de Port-au-Prince, até esta data
Diretor da Rádio Télé Soleil.
D. Désinord Jean nasceu a 26 de
setembro de 1967 em Furcy (Haiti).
Foi ordenado Sacerdote no dia 13 de
novembro de 1994.
Administrador Apostólico sede vacante da Arquidiocese de Messina —
Lipari — Santa Lucia del Mela (Itália), D. Luigi Benigno Papa,
O.F.M.Cap., Arcebispo Metropolitano
Emérito de Taranto.
Administrador Apostólico sede vacante et ad nutum Sanctae Sedis da
Diocese de Franceville (Gabão), D.
Basile Mvé Engone, S.D.B., Arcebispo de Libreville.
D. Rrok Gjonlleshaj nasceu no dia
10 de fevereiro de 1961 em Velezh
(Montenegro). Recebeu a Ordenação
sacerdotal em 1987.
Prelados falecidos
Adormeceu no Senhor:
No dia 24 de março
D. Timothée Modibo-Nzockena,
Bispo de Franceville (Gabão).
O ilustre Prelado nasceu em Mbomo
(Gabão), no dia 1º de janeiro de 1950.
Recebeu a Ordenação sacerdotal a 22
de junho de 1980. Foi ordenado Bispo
em 11 de janeiro de 1997.
Início de Missão
de Núncios Apostólicos
D. Claudio Gugerotti, Arcebispo Titular de Rabellum, na Ucrânia (22
de dezembro de 2015).
A 5 de abril
D. Vito Rallo, Arcebispo Titular de
Alba, no Reino de Marrocos (25 de
janeiro)
Núncio Apostólico no Kuwait e Delegado Apostólico na Península Arábica, D. Francisco Montecillo Padil-
D. Miguel Maury Buendía, Arcebispo Titular de Italica, na República
de Moldova (3 de março).
O Papa recebeu a Pontifícia comissão bíblica
Lei de Deus e liberdade
Bispo de San Juan de los Lagos
(México), D. Jorge Alberto Cavazos
Arizpe, até esta data Auxiliar de
Monterrey.
Bispo de Isangi (República Democrática do Congo), o Rev.do Pe.
Dieudonné Madrapile Tanzi, do clero de Isiro-Niangara, até hoje Professor convidado na Pontifícia Universidade Urbaniana.
D. Dieudonné Madrapile Tanzi nasceu no dia 18 de agosto de 1958, em
Faradje (República Democrática do
Congo). Recebeu a Ordenação sacerdotal a 25 de agosto de 1985.
Bispo de Osogbo (Nigéria), o Rev.do
Pe. John Akin Oyejola, do clero de
Oyo, até hoje Pároco e Diretor do
Centro diocesano para a pastoral familiar.
D. John Akin Oyejola nasceu em
Aawe (Nigéria), a 8 de maio de 1963.
Foi ordenado Sacerdote no dia 5 de
Outubro de 1991.
A 4 de abril
Bispo de Gospić-Senj (Croácia), o
Rev.do Pe. Zdenko Križić, O.C.D., até
à presente data Reitor da Comunidade do Colégio Internacional Teresianum em Roma.
As temáticas de antropologia bíblica não dizem respeito apenas «ao crente, mas a cada pessoa. Com efeito, através da Bíblia, Deus indica a base
sólida e a orientação certa para o comportamento humano», disse o cardeal presidente Gerhard Ludwig Müller inaugurando em Santa Marta, na
segunda-feira 4 de abril, os trabalhos da assembleia plenária anual da
Pontifícia comissão bíblica. Os participantes, que se encontraram com o
Papa Francisco, estarão reunidos até ao dia 8 para aprofundar temáticas
de antropologia bíblica. «Conhecer Deus como Pai de todos, descobrir as
tarefas que nos confiou e agir cientes da nossa responsabilidade em relação a Ele — recomendou o prefeito da Congregação para a Doutrina da
Fé — é uma das atitudes fundamentais da antropologia e moral bíblica».
Todavia, hoje, advertiu o purpurado, «na mentalidade de muitos ganha
cada vez mais raiz a convicção de que a realização do homem deve ser
atuada de forma autónoma, sem fazer referência a Deus e à sua lei».
Mas, realçou, «a lei de Deus não atenua, nem elimina a liberdade do homem», «pelo contrário garante-a». Sobretudo, acrescentou, com a encarnação do filho de Jesus, que é «síntese da liberdade perfeita na obediência total». Aliás, concluiu o cardeal Müller, «a função originária do Decálogo não é abolida pelo encontro com Cristo, mas levada à plenitude».
página 16
L’OSSERVATORE ROMANO
quinta-feira 7 de abril de 2016, número 14
«Jesus pôs-se em fila com os pecadores.
Não sentiu vergonha. Portanto, desde o
início do seu ministério manifestou-se
como Messias que assume a condição
humana, movido pela solidariedade e
pela compaixão». Recordou o Papa
Francisco ao iniciar na audiência geral
de quarta-feira 6 de abril uma série de
reflexões sobre o tema do jubileu
interpretado à luz do Evangelho.
Queridos irmãos e irmãs, bom dia!
Depois de ter refletido sobre a misericórdia de Deus no Antigo Testamento, hoje iniciamos a meditar sobre o modo como o próprio Jesus a
levou ao seu pleno cumprimento.
Uma misericórdia que Ele expressou, realizou e comunicou sempre,
em cada momento da sua vida terrena. Encontrando-se com as multidões, anunciando o Evangelho, curando os doentes, aproximando-se
dos últimos, perdoando os pecadores, Jesus torna visível um amor
aberto a todos: sem excluir ninguém! Aberto a todos sem confins.
Um amor puro, gratuito e absoluto.
Um amor que alcança o seu ápice
no Sacrifício da cruz. Sim, o Evangelho é deveras o «Evangelho da
Misericórdia», porque Jesus é a Misericórdia!
Os quatro Evangelhos afirmam
que Jesus, antes de empreender o
seu ministério, quis receber o batismo
de João Batista (cf. Mt 3, 13-17; Mc 1,
9-11; Lc 3, 21-22; Jo 1, 29-34). Este
evento imprime uma orientação decisiva a toda a missão de Cristo.
Com efeito, Ele não se apresentou
ao mundo no esplendor do templo:
podia fazê-lo. Não se fez anunciar
pelo retumbar de trombas: podia fazê-lo. E nem sequer veio nas vestes
de um juiz: podia fazê-lo. Ao contrário, depois de trinta anos de vida
escondida em Nazaré, Jesus foi até
ao rio Jordão, juntamente com muitas pessoas do seu povo e pôs-se em
fila com os pecadores. Não sentiu
vergonha: estava ali com todos, com
os pecadores, para ser batizado. Portanto, desde o início do seu ministério, Ele manifestou-se como Messias
que assume a condição humana, movido pela solidariedade e pela compaixão. Como Ele mesmo afirma na
sinagoga de Nazaré, identificando-se
com a profecia de Isaías: «O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu; e enviou-me para
anunciar a boa nova aos pobres, para sarar os contritos de coração, para
anunciar aos cativos a redenção, aos
cegos a restauração da vista, para
pôr em liberdade os cativos, para
publicar o ano da graça do Senhor»
(Lc 4, 18-19). Tudo o que Jesus realizou depois do batismo foi o cumprimento do programa inicial: anunciar
a todos o amor de Deus que salva.
Jesus não anunciou o ódio nem a
inimizade: anunciou-nos o amor!
Um amor grande, um coração aberto a todos, a todos nós! Um amor
que salva!
Ele fez-se próximo aos últimos,
comunicando-lhes a misericórdia de
Deus que é perdão, alegria e vida
nova. Jesus, o Filho enviado pelo
Na audiência geral o Papa falou do Evangelho da misericórdia recordando o exemplo de Jesus
Em fila
com os pecadores
Pai, é realmente o início do tempo
da misericórdia para toda a humanidade! Quantos estavam presentes
nas margens do Jordão não compreenderam imediatamente a importância do gesto de Jesus. O próprio
João Batista admirou-se com a sua
decisão (cf. Mt 3, 14). Mas não o Pai
celeste! Ele fez ouvir a sua voz do
alto: «Tu és o meu Filho muito amado; em ti ponho minha afeição» (Mc
1, 11). De tal modo o Pai confirma o
caminho que o Filho empreendeu
como Messias, enquanto sobre Ele
desce como uma pomba o Espírito
Santo. Então o coração de Jesus bate, por assim dizer, em uníssono
com o coração do Pai e do Espírito,
mostrando a todos os homens que a
salvação é fruto da misericórdia de
D eus.
Podemos contemplar ainda mais
claramente o grande mistério deste
amor dirigindo o olhar para Jesus
crucificado. Enquanto inocente está
para morrer por nós, pecadores, suplica ao Pai: «Pai, perdoa-lhes; porque não sabem o que fazem» (Lc 23,
34). É na cruz que Jesus apresenta à
misericórdia do Pai o pecado do
mundo: o pecado de todos, os meus,
os teus, os vossos. É na cruz que Ele
os apresenta ao Pai. E com o pecado
do mundo todos os nossos pecados
são perdoados. Nada e ninguém
permanece excluído desta oração sacrifical de Jesus. Isto significa que
não devemos temer reconhecer-nos e
confessar-nos pecadores. Quantas
vezes dizemos: «Mas, ele é um pecador, fez isto e aquilo...», e julgamos
os outros. E tu? Cada um de nós deveria perguntar-se: «Sim, ele é um
pecador. E eu?». Todos somos pecadores, mas todos fomos perdoados:
temos a possibilidade de receber este
perdão que é a misericórdia de
Deus. Portanto, não devemos temer
reconhecer-nos e confessar-nos pecadores, porque todo o pecado foi levado à Cruz pelo Filho. E quando
nos confessamos arrependidos confiando-nos a Ele, temos a certeza de
que somos perdoados. O sacramento
da Reconciliação torna atual para
cada um a força do perdão que brota da Cruz e renova na nossa vida a
graça da misericórdia que Jesus nos
conquistou! Não devemos temer as
nossas misérias: cada um tem as próprias. O poder do amor do Crucificado não conhece obstáculos e nunca se esgota. E esta misericórdia cancela as nossas misérias.
Caríssimos, neste Ano jubilar peçamos a Deus a graça de fazer a experiência do poder do Evangelho:
Evangelho da misericórdia que
transforma, que faz entrar no coração de Deus, que nos torna capazes
de perdoar e olhar para o mundo
com mais bondade. Se acolhermos o
Evangelho do Crucificado Ressuscitado, toda a nossa vida será plasmada pela força do seu amor que renova.
No final da audiência o Papa saudou,
como de costume, os vários grupos
linguísticos presentes e recordou o
terceiro dia mundial do desporto pela
paz e o desenvolvimento, proclamado
pelas Nações Unidas. Eis, entre outras,
algumas das suas saudações.
Queridos peregrinos de língua portuguesa, de coração vos saúdo a todos, nomeadamente ao grupo de São Sebastião do
Pontal, desejando-vos neste
Ano Jubilar a graça de experimentar a força do Evangelho da misericórdia que
transforma, que faz entrar no
coração de Deus, que nos
torna capazes de perdoar e
olhar o mundo com mais
bondade. Assim Deus vos
abençoe a vós e às vossas famílias.
Hoje decorre o Terceiro
Dia Mundial do Desporto
pela Paz e o Desenvolvimento, promovido pelas Nações
Unidas. O desporto é uma
linguagem universal, que
aproxima os povos e pode
contribuir para fazer encontrar as pessoas e superar os
conflitos. Por isso encorajo a
viver a dimensão desportiva
como exercício de virtude no
crescimento integral dos indivíduos e das comunidades.

Documentos relacionados