DA REGULAÇÃO PARA A EMANCIPAÇÃO: OS CAMINHOS DO
Transcrição
DA REGULAÇÃO PARA A EMANCIPAÇÃO: OS CAMINHOS DO SÉCULO XXI James Ladeia1 “ A o t ér m in o de um per í od o d e d e c ad ê nc ia s obr e v ém o pon t o de m utaç ã o. A l u z p o der os a qu e f or a ba n i da r es s ur ge . Há m o v im ent o, m as e s te n ão é g er a do p e la f o r ç a .. . O m ov im ent o é n at ur a l, s ur g e es p o nt a ne am en te . P or es s a r a zã o , a tr ans f o r m aç ão do a nt i go tor n a- s e f ác i l. O v e lh o é d es c a r t a do , e o no v o é i ntr o du zi d o . Am bas as m ed i das s e har m o ni zam c om o tem po , nã o r es u lt a n do d aí , por t an to , n e nh um da n o” . I Ching Introdução As reflexões contidas neste trabalho têm como suporte central as idéias de Boaventura de Souza Santos desenvolvidas em quatro livros de sua autoria, desde a década de 80 até o ano 2000. O desenvolvimento do trabalho apresenta momentos distintos: primeiramente, é estabelecida a definição de paradigma como modelo ou padrão e o seu possível desdobramento em dogmas. Num segundo momento é delineada, de forma analítica, a evolução do conhecimento, desde seu desenvolvimento no Renascimento, no século XV, com a introdução de uma nova orientação para a época, à modernidade. No terceiro momento, são analisadas, debatidas e descritas as idéias de Boaventura Santos sobre a construção do conhecimento, a racionalidade, o senso comum e o desenvolvimento das ciências sociais. Em seguida, avaliam-se os sinais da profunda crise pela qual passa a racionalidade científica. Boaventura assinala algumas condições teóricas para essas transformações paradigmáticas e demonstra os paradigmas emergentes. No momento final, são feitas algumas considerações sobre direitos humanos na ótica da regulação social e emancipação social. Definição de paradigma 1 Mestre em Ciências Sociais pela PUC/MINAS. Professor de Ciência Política e Teoria Geral do Estado Faculdade Alberto Deodato, Professor de Metodologia Científica na Faculdade de Engenharia Kennedy e Assessor do Governo de Minas Gerais para a região Metropolitana 1 Do grego “paradeigma”, o termo é definido geralmente como modelo, exemplar ou padrão. O conceito de paradigma é importante para o pensamento social do século XX em dois contextos: no desenvolvimento dos “argumentos baseados em casos paradigmáticos”, como passaram a ser chamados; e por sua centralidade no livro imensamente influente de T.S. Kuhn, intitulado The Structure of Scientific Revolutions (1962). O uso por Kuhn da palavra “paradigma” distingue dois significados principais: • A constelação inteira de crenças, valores, técnicas etc. compartilhados pelos membros de determinada comunidade, ou seja, uma matriz disciplinar. • Uma espécie de elementos dessa constelação, as soluções concretas de quebracabeças que, empregados como modelos ou exemplos, podem substituir regras explícitas como base para a solução dos restantes quebra-cabeças da ciência, ou seja, um exemplar. Exemplos desse último significado são as Principia Mathematica (1687), de Isaac Newton, e New System of Chemical Philosophy (1808), de John Dalton. Essas obras fornecem os paradigmas para o trabalho da ciência normal – recursos a serem explorados, não hipóteses a serem testadas na elaboração e desenvolvimento da tradição disciplinar. Finalmente, quando aparecem suficientes anomalias, ocorre uma crise e inicia-se então um período de ciência revolucionária até que se forma um novo paradigma em torno do qual a comunidade cientifica (ora mudada) poderá uma vez mais manter-se coesa.2 Os paradigmas podem ser transformados em dogmas, todas as explicações devendo estabelecer um sentido único e oficial determinado pelo mundo acadêmico para tentar definir os questionamentos da natureza humana. Como exemplos de paradigmas, temos o marxismo, o positivismo, o weberianismo, o anarquismo, o socialismo etc. São importantes para tentar entender mudanças no pensamento, percepção e valores que formam uma determinada visão da realidade. O Renascimento e a modernidade São antigos os estudos acerca da idéia de que somos capazes de refletir de uma maneira inteligente sobre a natureza do ser humano, sobre as relações que este mantém com os seus semelhantes e com as forças espirituais, e sobre as estruturas sociais que ele criou e dentro das quais se move. O saber chegou até nosso tempo através de lendas e tradições, além de ser produzido e reproduzido através da sabedoria oral. 2 Outhwaite, William & Bottomore, Tom. Dicionário do Pensamento Social do Século XX. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.1996, p.598. 2 O Renascimento, a partir do século XV, designa a renovação moral, intelectual e política decorrente do retorno aos valores da civilização em que, supostamente, o homem teria obtido suas melhores realizações: a greco-romana. Assim, o período renascentista teve como característica fundamental o humanismo renascentista. Esse introduziu uma nova orientação para uma época que aparecia no horizonte: a modernidade, com a ampliação do conceito do homem como sujeito da história, as descobertas científicas, a racionalidade como doutrina do domínio, do conhecimento, da moral e da experiência e a rejeição de qualquer autoridade além da razão, faculdade pela qual o homem pode conhecer e julgar: raciocínio. A formação dos Estados modernos é um dos aspectos que distinguem o surgimento da época moderna e sua grande importância na sistematização do saber. A racionalidade adotada contribuiu para que se reformulasse o campo cognitivo, no intuito de que houvesse domínio e controle do conhecimento para si. Max Weber salienta o Estado moderno como o detentor do poder físico e institucional, responsável pela estrutura construída pela modernidade, expressando a racionalidade através da burocracia. A revitalização da universidade a partir do século XVII, laicizando o ensino e atingindo um público diversificado, é outro fato importante para o desenvolvimento da era moderna. As idéias e reflexões de Boaventura de Souza Santos sobre a construção do conhecimento A racionalidade – O senso comum – O desenvolvimento das ciências sociais Ao nos debruçarmos sobre o passado da humanidade, a primeira impressão é de condescendência, de superioridade inconteste. Um olhar mais atento, porém, nos mostra um quadro diferente: “Se fecharmos os olhos e os voltarmos a abrir, verificamos com surpresa que os grandes cientistas que estabeleceram e mapearam o campo teórico em que ainda hoje nos movemos viveram ou trabalharam entre o século XVIII e os primeiros vinte anos do século XX, de Adam Smith e Ricardo a Lavoisier e Darwin, de Marx e Durkheim a Max Weber e Pareto, de Humboldt e Planck a Poincaré e Einstein. De tal modo é assim que se torna possível dizer que em termos científicos vivemos ainda no século XIX e que o século XX ainda não começou nem talvez comece antes de terminar”. (Santos,1987:5) Dessa forma, Santos opõe “as potencialidades da tradução tecnológica dos conhecimentos acumulados que nos faria crer numa sociedade de comunicação 3 libertada das carências e inseguranças que ainda hoje compõem os dias de muitos de nós”. Para o autor, estamos em tempos de transição, difíceis de entender e de percorrer. É necessário voltar às coisas simples, à capacidade de formular perguntas simples, perguntas que, como Einstein costumava falar, só uma criança pode fazer, mas que depois de feitas, são capazes de trazer uma luz nova à nossa perplexidade. Boaventura Santos refere-se a Rousseau e a seu Discurso sobre as Ciências Sociais e as Artes, em Dijon, em 1750, a propósito da seguinte questão proposta: o restabelecimento das ciências e das artes terá contribuído para aprimorar os costumes?3 As indagações formuladas por Rousseau, para responder a essa questão, permanecem atuais e poderiam ser corretamente feitas em nossa época: “Há alguma relação entre a ciência e a virtude? Há alguma razão de peso para substituirmos o conhecimento vulgar que temos da natureza e da vida, e que partilharmos com os homens e mulheres da nossa sociedade, pelo conhecimento científico produzido por poucos e inacessível à maioria? Contribuirá a ciência para diminuir o fosso crescente na nossa sociedade, entre o que se é e o que se aparenta ser, o saber dizer e o saber fazer, entre a teoria e a prática?" Para o autor, precisamos perguntar “pelas relações entre a ciência e a virtude, pelo valor do conhecimento ordinário ou vulgar que criamos e usamos – como sujeitos individuais e coletivos – para dar sentido às nossas práticas e que a ciência teima em considerar irrelevante, ilusório e falho; e temos de perguntar pelo papel de todo o conhecimento científico acumulado no enriquecimento ou empobrecimento prático das nossas vidas, ou seja, pela contribuição positiva ou negativa da ciência para a nossa felicidade". Para Rousseau, ciências e artes são antagônicas às virtudes: “Nesse ponto, porém, o efeito é certo, a depravação é real, e nossas almas se corrompem à medida que nossas ciências e nossas artes avançam no sentido da perfeição”. (Os Pensadores,1987:124) Rousseau parece conectar ciência e arte com o luxo e a dissolução. Dessa forma, embora as perguntas sejam corretas e aplicáveis ao tempo presente, as respostas, na época, são consideravelmente mais simples do que hoje. Boaventura Santos argumenta que a nossa diferença existencial em relação a Rousseau é que, se as perguntas são simples, as respostas sê-lo-ão muito menos. Estamos no fim do ciclo 3 O termo “restabelecimento” das ciências no texto refere-se ao movimento da Renascença em reação à Idade Média. 4 de hegemonia de uma certa ordem científica. A epistemologia das nossas perguntas está inscrita no avesso dos conceitos que utilizamos para lhes dar resposta. Santos analisa que é necessário um esforço de desvendamento conduzido sobre um fio de navalha entre a lucidez e a ininteligibilidade da resposta. São igualmente diferentes e muito mais complexas as condições sociológicas e psicológicas do nosso perguntar. Em suma, o que é retirado substancialmente de Rousseau é a prioridade de perguntar, mais do que responder. Boaventura Santos passa então a anatomizar a ordem científica hegemônica. A palavra-chave que caracteriza a ciência moderna é racionalidade, constituída após a revolução científica do século XVI e desenvolvida nos séculos seguintes, alcançando as ciências sociais no século XIX. A partir de então, pode-se falar de um modelo global de racionalidade científica que admite variedade interna, mas que se distingue e se defende, por vias de fronteiras ostensivas e ostensivamente policiadas, de duas formas de conhecimento não científico – e, portanto, irracional – potencialmente perturbadoras e intrusas: o senso comum e as chamadas humanidades ou estudos humanísticos (em que se incluíram, entre outros, os estudos históricos, filológicos, jurídicos, literários, filosóficos e teológicos). A nova modalidade científica, sendo um modelo global, é também um modelo totalitário, na medida em que, hegemônica e estabelecida, conforme Thomas Kuhn, sobre os escombros dos paradigmas derrotados, nega o caráter racional a todas as outras formas de conhecimento não moldadas pelas suas regras metodológicas. As ciências naturais foram alvo desse modelo racional a partir da “teoria heliocêntrica do movimento dos planetas de Copérnico, nas órbitas planetárias de Kleper, nas leis de Galileu sobre a quebra dos corpos, na grande síntese da ordem cósmica de Newton e, finalmente, na consciência filosófica que lhe conferem Bacon e sobretudo Descartes”. (Santos,1987:11) É curioso notarmos o componente contraditório à racionalidade científica que encontramos, por exemplo, na própria teoria da gravitação universal, de Newton. Esse, respondendo ao conceito abstrato e pouco racional de atração da gravitação, fala da seguinte forma: “Até o momento, expus os fenômenos dos céus e de nossa mãe terra por meio da força da gravidade, mas ainda não atribuí nenhuma causa à gravidade”.4 Newton sugere que a ação à distância dos corpos celestes era uma exigência do conjunto de observações. E acrescenta: 4 Princípios Matemáticos de Filosofia Natural, Coleção “Os Pensadores”: Nova Cultural,1991, p.170. 5 “E agora poderíamos acrescentar algo concernente a um certo espírito mais sutil que penetra e jaz escondido em todos; um espírito através de cuja força e ação as partículas dos corpos se atraem entre si a distâncias próximas, e se unem, se contíguas; mas isto não pode ser exposto em poucas palavras e, ademais, as experiências que devem tornar conhecidas e determinar com exatidão as leis das ações desse espírito não existem em número suficiente”. Esse conceito de atração à distância já era conhecido pela Alquimia e o Magnetismo, rejeitados depois por falta de racionalidade científica. Nas palavras do biógrafo de Newton, John Keynes, o próprio Newton foi “o grande gênio da revolução científica e também o último dos mágicos”. (Capra,1982:60) Essa ruptura fundante com os paradigmas anteriores é bem refletida em Kepler, que escreve no seu livro, Harmonia do Mundo, publicado em 1619, a propósito das harmonias naturais que descobrira nos movimentos celestiais: “Perdoai-me, mas estou feliz; se vos zangardes, eu perseverarei; (...) o meu livro pode esperar muitos séculos pelo seu leitor. Mas Deus teve de esperar seis mil anos por aqueles que pudessem contemplar o seu trabalho”. Para Boaventura Santos, essa confiança epistemológica decorre, não tanto da melhor observação dos fatos em relação à ciência aristotélica, mas sobretudo de uma visão do mundo e da vida. Ao contrário da ciência aristotélica, a ciência moderna desconfia sistematicamente das evidências da experiência imediata. Tais evidências estão na base do conhecimento vulgar e seriam ilusórias. É, portanto, total a separação entre a natureza e o ser humano: “A natureza é tão só extensão e movimento; é passiva, eterna e reversível, mecanismos cujos elementos se podem desmontar e depois relacionar sob a forma de leis; não tem qualquer outra qualidade ou dignidade que nos impeça de desvendar os seus mistérios, desvendamento que não é contemplativo, mas antes ativo, já que visa conhecer a natureza para a dominar e controlar”. Nas reflexões de Rousseau, esse distanciamento da natureza é a causa da infelicidade do homem. As idéias que fundamentam a ciência moderna são as idéias matemáticas. A matemática fornece à ciência moderna, não só um instrumento privilegiado de análise, mas também a lógica da investigação e, ainda, o modelo de representação da própria estrutura da matéria. Para Galileu, o livro da natureza está inscrito em caracteres geométricos. 6 Para a ciência moderna, conhecer significa quantificar. As qualidades intrínsecas do objeto são, por conseqüência, desqualificadas. O conceito de rigor científico deve ser entendido dessa forma. Santos observa que as leis da natureza estabelecidas como uma das regras do Discurso sobre o método, de Descartes, são arbitrárias. No entanto, é nelas que se fundamenta toda a ciência moderna. Portanto, o conhecimento científico é antagônico ao senso comum. As razões são assim dadas pelo autor: “As leis, enquanto categorias de inteligibilidade, repousam num conceito de casualidade escolhido, não arbitrariamente, entre os oferecidos pela física aristotélica. Aristóteles distingue quatro tipos de causa: a causa material, a causa formal, a causa eficiente e a causa final. As leis da ciência moderna são um tipo de causa formal que privilegia o como funciona das coisas, em detrimento de qual o agente ou qual o fim das coisas. É por esta via que o conhecimento científico rompe com o conhecimento do senso comum. É que enquanto no senso comum e, portanto, no conhecimento prático em que ele se traduz, a causa e a intenção convivem sem problemas, na ciência a determinação da causa formal obtém-se com a expulsão da intenção. É este tipo de causa formal que permite prever e, portanto, intervir no real que, em última instância, permite à ciência moderna responder à pergunta sobre os fundamentos do seu rigor e da sua verdade com o elenco dos seus êxitos na manipulação e na transformação do real”. (Santos, 1987: 16) O fato de a ciência moderna rejeitar a experiência baseada no senso comum e apegar-se à explicação quantitativa dos fenômenos conduz à idéia do mundomáquina, que pode ser desmontado e remontado. Em síntese, um mundo explicado pelo racionalismo cartesiano. Essa idéia é tão forte que vai se transformar na hipótese universal do mundo moderno, o mecanicismo. O mundo mecanicista é um mundo determinístico. No plano social, é também o horizonte cognitivo mais adequado aos interesses da burguesia. Tal como foi possível descobrir e descrever as leis da natureza, seria igualmente possível descobrir as leis da sociedade. Bacon, Vico e Montesquieu foram os grandes precursores. Bacon afirma a plasticidade da natureza humana e, portanto, a sua perfectibilidade, dadas as condições sociais, jurídicas e políticas adequadas, possíveis de determinar com rigor. Vico sugere a existência de leis que governam deterministicamente a evolução das sociedades e tornam possível prever os resultados das ações coletivas. Com grande premonição, identifica e resolve a contradição entre a liberdade e a imprevisibilidade da ação humana individual e a determinação e previsibilidade da ação coletiva. Montesquieu pode ser considerado um precursor da sociologia do direito, ao estabelecer a relação entre as leis do sistema jurídico, feitas pelo homem, e as leis da 7 natureza. Em decorrência desse paralelo, no século XVIII, as ciências sociais serão criadas no século XIX: “A consciência filosófica da ciência moderna, que tivera no racionalismo cartesiano e no empirismo baconiano as suas primeiras formulações, veio a condensar-se no positivismo oitocentista. Dado que só há duas formas de conhecimento científico – as disciplinas formais da lógica matemática e as ciências empíricas segundo o modelo mecanicista das ciências naturais – as ciências sociais nasceram para serem empíricas". (Santos, 1987:18) Boaventura Santos distingue duas vertentes para explicar o modelo mecanicista que as ciências sociais assumiram. A primeira – a dominante – consistiu em aplicar ao estudo da sociedade, na medida do possível, todos os princípios epistemológicos e metodológicos que presidiam o estudo da natureza desde o século XVI. A segunda consistiu em reivindicar para as ciências sociais um estatuto epistemológico e metodológico próprio, com base na especificidade do ser humano e na sua distinção central em relação à natureza. Para o autor, essa redução nem sempre é fácil e nem sempre se consegue sem distorcer os fatos ou torná-los irrelevantes. As ciências sociais têm um longo caminho a percorrer no sentido de se compatibilizar com os critérios de cientificidade das ciências naturais. O autor observa que na teoria de Thomas Kuhn o atraso das ciências sociais é dado pelo caráter pré-paradigmático dessas ciências, ao contrário das ciências naturais, essas sim paradigmáticas. Enquanto nas ciências naturais o desenvolvimento do conhecimento tornou possível a formulação de um conjunto de princípios e de teorias sobre a estrutura da matéria que são aceitos sem discussão por toda a comunidade científica – conjunto esse que se designa por paradigma – nas ciências sociais não há consenso paradigmático, pelo que o debate tende a atravessar verticalmente toda a espessura do conhecimento adquirido. Boaventura Santos assinala que o esforço e o desperdício que isso acarreta são simultaneamente causa e efeito do atraso das ciências sociais. O argumento fundamental da segunda vertente que reivindica para as ciências sociais um estatuto metodológico próprio é que a ação humana é radicalmente subjetiva. “O comportamento humano, ao contrário dos fenômenos naturais, não pode ser descrito e muito menos explicado com base nas suas características exteriores e objetiváveis, uma vez que o mesmo ato externo pode corresponder a sentidos de ação diferentes. A ciência 8 social será sempre uma ciência subjetiva e não objetiva como as ciências naturais”. (Santos, 1987:21) Os paradigmas emergentes Boaventura Santos avalia que os sinais de uma profunda crise do modelo de racionalidade científica são muitos fortes e que estamos a viver um período de revolução científica, embora não se saiba como isso acabará. Há, portanto, em conformidade com o autor, uma crise do paradigma dominante: “A primeira observação, que não é tão trivial quanto parece, é que a identificação dos limites, das insuficiências estruturais do paradigma científico moderno é o resultado do grande avanço que ele propiciou. O aprofundamento do conhecimento permitiu ver a fragilidade dos pilares em que se funda”. O autor assinala algumas condições teóricas para a crise de paradigmas: no paradigma da ciência dominante, a primeira deveu-se a Einstein e à sua teoria da relatividade. • Heinserberg, com o princípio da incerteza, retira o sistema de referência da mecânica newtoniana, ao expressar a impossibilidade de se precisar, num dado momento, a posição das partículas. • A teoria da incompletude de Kurt Godel dessacraliza as certezas matemáticas. Ele mostrou que, se fixarmos as regras de inferência e um número finito qualquer de axiomas (normas admitidas como princípios), haverá asserções precisamente formuladas que não poderemos demonstrar que são verdadeiras, nem que são falsas.5 • A teoria das estruturas dissipativas, de Ilya Prigogine, segundo o qual processos submicroscópicos pressionam o sistema para além de um limite máximo de instabilidade e o conduzem a um novo estado macroscópico, de equilíbrio dinâmico. A teoria de Prigogine recupera conceitos aristotélicos como os de potencialidade e virtualidade, que a revolução científica do século XVI parecia ter atirado definitivamente no lixo. Essa teoria faz parte, segundo Santos, de um movimento convergente, pujante sobretudo a partir da última década, que atravessa as várias ciências da natureza e até as ciências sociais, um movimento transdisciplinar ou paradigma da emancipação e que tem aflorações, entre outras, 5 Sumariamente, podemos dizer que o grande sonho dos matemáticos foi a seguinte esperança: de que para toda asserção precisamente a respeito dos números inteiros, pudéssemos deduzir de maneira sistemática se ela é verdadeira ou falsa. Foi essa esperança que Godel aniquilou. 9 na teoria de Prigogine, na sinergética de Haken, na teoria da vida de Eigen, na teoria da ordem implicada de David Bohm, na teoria da matriz-S de Geofrey Chew e na filosofia bootstrp de Fritjof Capra. O autor avalia que o segundo grande tema de reflexão epistemológica versa mais sobre o conteúdo do conhecimento científico do que sobre sua forma. “Sendo um conhecimento mínimo que fecha as portas a muitos outros saberes sobre o mundo, o conhecimento científico moderno é um conhecimento desencantado e triste que transforma a natureza num autômato, ou, como diz Prigogine, num interlocutor terrivelmente estúpido. Esse aviltamento da natureza acaba por aviltar o próprio cientista, na medida em que reduz o próprio diálogo experimental ao exercício de uma prepotência sobre a natureza. O rigor científico fundado no rigor matemático é um rigor que quantifica, e que, ao quantificar, desqualifica, um rigor que, ao objetivar os fenômenos, os caricaturiza. É, em suma e finalmente, uma forma de rigor que, ao afirmar a personalidade cientista, destrói a personalidade da natureza. Nestes termos, o conhecimento ganha, em rigor, o que perde em riqueza e a retumbância dos êxitos da intervenção tecnológica esconde os limites da nossa compreensão do mundo e reprime a pergunta". (Santos,1987:32) A crise de paradigma, conforme Boaventura Santos, abriu caminho para a industrialização da ciência, principalmente a partir das décadas de 30 e 40, acarretando os compromissos desta com o centro de poder, cujos sinais mais visíveis foram as bombas jogadas em Hiroshima e Nagasaki. Isso seria o indício de uma produção científica inclinada a transformar acidentes em ocorrências sistemáticas. Em suma, a ciência e a tecnologia vão revelando as duas faces de um processo histórico em que os interesses militares e os interesses econômicos convergem até a sua quase indistinção. Assim o autor apresenta o paradigma emergente através de um conjunto de teses, juntamente com suas justificações. Do conhecimento científico (regulação) ao científico-social (emancipação) “A distinção dicotômica entre ciências naturais e ciências sociais deixou de ter sentido e utilidade. Esta distinção assenta numa visão mecanicista da matéria e da natureza a que contrapõe, com pressuposta evidência, os conceitos de ser humano, cultura e sociedade". (Santos,1987:37) Boaventura Santos avalia que a superação da dicotomia ciências naturais/sociais ocorrerá sob a proteção das ciências sociais. Observa também que a concepção de Thomas Kuhn sobre o caráter pré- paradigmático das ciências sociais terá de ser abandonada ou profundamente revista. Nesse aspecto, a superação da 10 dicotomia ciências naturais/ciências sociais tende a revalorizar os estudos humanísticos, mas essa revalorização não ocorrerá sem que as humanidades também sejam profundamente transformadas. É necessário avaliar o fato de terem resistido à separação sujeito/objeto e preferido a compreensão do mundo à manipulação do mundo. O gueto a que as humanidades se recolheram foi em parte uma estratégia defensiva contra o assédio das ciências sociais, armadas do viés científico. Foi assim nos estudos históricos, com a história quantitativa, nos estudos jurídicos, com a ciência pura do direito e a dogmática jurídica, e nos estudos filológicos, literários e lingüísticos, com o estruturalismo. Há pois de recuperar esse núcleo genuíno e pô-lo a serviço de uma reflexão global sobre o mundo. Todo conhecimento é local e total Na ciência moderna, o conhecimento avança pela especialização. O conhecimento é tanto mais rigoroso quanto mais restrito é o objeto sobre o qual incide. Santos enfatiza nisso o dilema básico da ciência moderna: o seu rigor aumenta na proporção direta da arbitrariedade com que analisa o real. Sendo um conhecimento disciplinar, tende a ser disciplinado, isto é, segrega uma organização do saber orientada para policiar as fronteiras entre as disciplinas e reprimir os que as quiserem transpor. A parcelização e a disciplinarização do saber científico fazem do cientista um ignorante especializado e os efeitos são profundamente negativos. Para Santos, os males da parcelização do conhecimento e o reducionismo arbitrário são hoje reconhecidos, mas a solução para esse problema acaba por reproduzir o modelo existente. Ainda segundo o autor, no paradigma emergente o conhecimento é total e tem como horizonte a totalidade universal ou a totalidade indivisa. Mas, sendo total, é também local. Portanto, constitui-se em redor de temas que em dado momento são adotados por grupos sociais concretos como projetos de vida locais, seja para reconstruir a história de um lugar, manter um espaço verde, fazer baixar a taxa de mortalidade infantil, erradicar uma doença etc. A fragmentação pós-moderna não é disciplinar, mas temática. Os temas são escoadouros por onde o conhecimento se movimenta ao encontro uns dos outros. “Ao contrário do que sucede no paradigma atual, o conhecimento avança à medida que o seu objeto se amplia, ampliação que, como a da árvore, procede pela diferenciação e pelo alastramento das raízes em busca de novas e variadas interfaces”. (Santos,1987:47) 11 Em suma, o conhecimento pós-moderno, sendo total, não é determinístico, sendo local, não é descritivista. Baseia-se numa pluralidade metodológica. O conceito que vem mediar essa pluralidade metodológica denomina-se transgressão metodológica. Da regulação social à emancipação social “A ciência moderna consagrou o homem enquanto sujeito epistêmico, mas expulsou-o, tal como a Deus, enquanto sujeito empírico. Um conhecimento objetivo, factual e rigoroso não tolerava a interferência dos valores humanos ou religiosos. Foi nesta base que se construiu a distinção dicotômica sujeito/objeto”. (Santos,1987:50) Boaventura Santos examina o distanciamento nas ciências sociais, na antropologia e nas ciências naturais. Nas ciências sociais, construiu-se o distanciamento do sujeito/objeto através do uso de metodologias. Um exemplo: ao se procurar estudar a história de um determinado povo, não era permitido recorrer a outras disciplinas como filosofia, psicologia, geografia etc. Desse modo, o conhecimento ficava compartimentado. Caso contrário, era definido como sem objetividade e fora dos métodos estipulados pela comunidade acadêmica. Na sociologia, era pequena ou nula a distância empírica entre o sujeito e o objeto: eram cientistas “civilizados” a estudar os seus concidadãos. Nesse caso, a distinção epistemológica obrigou que essa distância fosse aumentada através do uso de metodologias de distanciamento: por exemplo, os métodos quantitativos, o inquérito sociológico, a análise documental e a entrevista estruturada. (Santos, 2000: 82) Nas ciências naturais, especialmente através da física quântica, o sujeito regressa na veste do objeto. O autor prossegue afirmando que hoje o objeto é a continuação do sujeito por outros meios. Por isso, todo conhecimento emancipatório é autoconhecimento. Ele não descobre, cria, e o ato criativo protagonizado por todo cientista e pela comunidade científica no seu conjunto tem de se conhecer intimamente antes que conheça o que com ele se conhece de real. Os pressupostos metafísicos, os sistemas de crenças, os juízos de valor não estão antes ou depois da explicação física da natureza ou da sociedade. Assim, a ciência moderna não é a única explicação possível da realidade e não há sequer razão científica para considerá-la melhor que as explicações alternativas da metafísica, da astrologia, da religião, da arte ou da poesia. O apelo ao rigor científico ou à racionalidade fica assim esvaziado. Em conformidade com o autor, no paradigma emergente o caráter autobiográfico do conhecimento emancipatório ou auto-referenciável da ciência é plenamente assumido: 12 “Um conhecimento compreensivo e íntimo que não nos separe e antes nos una pessoalmente ao que estudamos. Não se trata do espanto medieval perante uma realidade hostil possuída do sopro da divindade, mas antes da prudência perante um mundo que, apesar de domesticado, nos mostra cada dia a precariedade do sentido da nossa vida, por mais segura que esta esteja quanto à sobrevivência, sendo que para a esmagadora maioria da população mundial não o está”. (Santos, 2000, 84) Todo conhecimento emancipatório visa constituir-se em senso comum Santos argumenta que a ciência moderna nos ensina pouco sobre a nossa maneira de estar no mundo e que esse pouco, por mais que se amplie, será sempre pequeno, porque a exiguidade está inscrita na sua forma de conhecimento. Assim, a ciência moderna produz conhecimentos e desconhecimentos. Ao contrário, a ciência pós-moderna sabe que nenhuma forma de conhecimento é em si mesma racional; só a configuração dela é racional. Procura dialogar com outras formas de conhecimento, deixando-se penetrar por elas. A mais importante de todas é o conhecimento do senso comum, o conhecimento prático e vulgar com que no cotidiano orientamos as nossas ações e damos sentido à vida. Na análise de Santos, o senso comum pode permitir melhor apreensão da realidade do que uma cultura mecanicista. Em Mário Vargas Llosa encontramos resposta a essa questão: “Um indígena dos Andes com freqüência é analfabeto. Significa que é inculto? Nada disso. É um homem imerso numa cultura própria, arcaica, sem dúvida, que não se desenvolveu, mas que ele soube conservar e lhe permitiu viver integrado e em solidariedade com outros homens como ele, relacionar-se com o passado e com a terra que trabalha, que o dotou de forças espirituais para resistir a todo tipo de adversidades, desde a exploração até as catástrofes naturais. Embora analfabeto, esse camponês é certamente mais culto que universitários que, embora saibam ler e escrever, vivem intelectualmente de modo precário, repetindo idéias que aceitaram de forma mecânica e que, por isso mesmo, em vez de servir-lhes para conhecer a realidade na qual vivem, divorciam-nos dela”. Segundo Santos, na fase de transição da revolução emancipatória a insegurança que sentimos resulta ainda do fato de a nossa reflexão epistemológica ser muita mais avançada e sofisticada que a nossa prática emancipatória: “Duvidamos suficientemente do passado para imaginarmos o futuro, mas vivemos demasiadamente o presente para podermos realizar nele o futuro. Estamos divididos, fragmentados. Sabemo-nos o caminho, mas não exatamente onde estamos na jornada. A condição epistemológica da ciência repercute na condição existencial dos 13 cientistas. Afinal, se todo conhecimento é autoconhecimento, também todo desconhecimento é autodesconhecimento". (Santos,1987: 58) Considerações finais Este trabalho pretendeu analisar de forma sucinta a crise de paradigmas pela qual passam as ciências sociais. A base para o desenvolvimento das idéias foi o autor Boaventura de Souza Santos. A etapa inicial voltou-se para a definição de paradigma. Em seguida, veio a explicação de como se construiu o conhecimento, a partir do período renascentista, juntamente com a época que despontava, a modernidade. Como modernidade entende-se, antes de tudo, uma mudança de atitude do homem ocidental frente ao mundo e frente a si mesmo. O texto abordou a racionalidade, o desenvolvimento das ciências sociais e a idéia do senso comum. Finalmente, como contexto mais amplo, os paradigmas emergentes, quando passamos a tecer considerações finais. Entre os problemas com os quais a humanidade ocidental atualmente se defronta, Boaventura Santos identifica três tensões dialéticas. A primeira ocorre entre regulação social e emancipação social. O autor afirma que o paradigma da modernidade se baseia numa tensão dialética entre regulação social e emancipação social, presente, mesmo que de modo diluído, na divisa positivista “Ordem e progresso”. Neste final de século e início de milênio, essa tensão deixou de ser criativa. A emancipação deixou de ser auto-regulação para se tornar o duplo da regulação. Enquanto até finais dos anos sessenta as crises de regulação social suscitavam o fortalecimento das políticas emancipatórias, hoje a crise de regulação social, simbolizada pela crise do Estado regulador e do Estado-providência, e a crise da emancipação social, simbolizada pela crise da revolução social e do socialismo enquanto paradigma de transformação social radical, são simultâneas e alimentam-se uma da outra. A política de direitos humanos deste milênio que se inicia é um fator-chave para compreender tal crise. Essa política, que foi simultaneamente reguladora e emancipadora, está “presa” nessa dupla crise, ao mesmo tempo que é sinal do desejo de ultrapassá-la. A segunda tensão ocorre entre o Estado e a sociedade civil. O Estado moderno apresenta-se como minimalista, mas é potencialmente maximalista, pois a sociedade civil, enquanto o outro do Estado, reproduz-se através de leis e da regulação que 14 deriva do Estado, para as quais não parecem existir limites, desde que as regras democráticas da produção das leis sejam respeitadas. Os direitos humanos estão no cerne dessa questão: enquanto a primeira geração de direitos humanos (os direitos civis e políticos) foi concebida como uma luta da sociedade civil contra o Estado, a segunda e a terceira gerações (direitos sociais, econômicos e culturais, da qualidade de vida etc.) pressupõem que o Estado é o principal garantidor dos direitos humanos. Por fim, a terceira tensão ocorre entre o Estado-nação e o que designamos como globalização. O modelo político da modernidade ocidental é um modelo de Estado-nação soberano, coexistindo num sistema internacional de Estados igualmente soberanos (sistema interestatal). Hoje, a erosão relativa do Estado-nação, imputável, com a intensificação da globalização, segundo Santos, suscita a questão de saber se a regulação social ou a emancipação social deverão ser deslocadas para o nível global. É nesse sentido que já despontam uma sociedade civil global, um governo global e uma eqüidade global. Na primeira linha desse processo está o reconhecimento mundial dos direitos humanos. Porém, a tensão repousa, por um lado, no fato de tanto as violações de direitos humanos, como as lutas em sua defesa continuarem a ter uma decisão nacional, e, por outro lado, no fato de que as atitudes perante os direitos humanos assentam-se em pressupostos culturais específicos. A política de direitos humanos é, basicamente, uma política cultural, na análise de Boaventura Santos. Tanto assim é que podemos pensar os direitos humanos como sinal de regresso cultural e até mesmo religioso, no início deste milênio. Portanto, o autor indaga como poderão os direitos humanos ser uma política simultaneamente cultural e global. Nessa ordem de idéias, é necessário desenvolver um quadro analítico capaz de reforçar o potencial emancipatório das políticas de direitos humanos no contexto da globalização, da fragmentação cultural e das políticas de identidades. Em resumo, é fundamental implementar uma política progressista de direitos humanos com âmbito global e legitimidade local. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix, 1982. LLOSA, Mário Vargas. Contra Vento e Maré. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1983. SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução a uma Ciência Pós-moderna. Rio de Janeiro:Graal, 1989. 15 _____________________ A Crítica da Razão Indolente. São Paulo: Cortez, 2000. _____________________ Um Discurso sobre as Ciências. Porto: História e Idéias,1987. _____________________ Pela Mão de Alice. São Paulo: Cortez, 1999. OUTHWAITE, William & BOTTOMORE, Tom. Dicionário do Pensamento Social do Século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1996. 16
Documentos relacionados
Novo paradigma ou irracionalismo
impossibilidade prática de se ter uma visão total ou de traços predominantes da sociedade, inviabilizando, portanto, uma análise e, muito menos, formulações propositivas de transformação (mesmo por...
Leia maisOS PARADIGMAS DOMINANTE E EMERGENTE NOS ESPAÇOS
ou eles sejam construídos pelos sujeitos sociais a partir da análise do paradigma moderno e de suas fragilidades, buscando superá-las. Olhando para a Ciência moderna e seus equívocos, no entendimen...
Leia maisepistemologia e educação: conhecimento para
Esse tipo de compreensão quebra a unidade existente entre o homem e a natureza, dando ensejo a que muitos erros sejam cometidos, permitindo que a técnica e a tecnologia que tanto ajudaram na libera...
Leia maisPARADIGMAS E MODELOS: proposta de análise epistemológica
novo paradigma. Sobre modelos, em visão mais geral, podemos dizer que pode ser empregado sob diversos aspectos: epistemológicos, metafísicos, éticos e estéticos. Interessou-nos, contudo, o seu sign...
Leia mais