A Tábua de Isopor por Eron Falbo

Transcrição

A Tábua de Isopor por Eron Falbo
A Tábua de Isopor
por Eron Falbo
© Quills Produc-ons 2008-­‐2011
Capitulo Primeiro – Marchando pro
Norte
1A 1. “Hermes Trismegistos escreveu com uma
ponta de diamante, em uma lamina de esmeralda”.
Estavamos todos no Duque – meu corsa sedan preto
com nenhum adicional–, eu e os Constantinos, minha
banda de Rítmo e Blues clássico, cantando o disco
antigo e iluminado de Jorge Ben e tentando absorver
influências brasileiras para o nosso primeiro disco que
estava para se tornar um grande sucesso nas rádios do
país. Parece que naquela época do disco as pessoas se
deslumbravam publicamente quando descobriam o
esoterismo e que hoje quase ninguém descobre nada
antigo novo, e quando descobrem se sentem especiais e
formam alguma espécie de igreja, seita ou ritual
envolvendo plantas “medicinais”. Tudo é uma
renascença, uma revisitação, e nada, parece, é algo
como sempre foi. Todos se empolgam como se tivessem
achado o Santo Graal. Santa infantilidade.
1A 2. Me chamo Leonidas Maçaneta, sou cidadão
de Brasilia e viajante de terras distantes.
Nesses
tempos específicos, Os Constantinos eram uma banda
de baile tocando em festas de 15 anos, bodas e
formaturas com ocasionais soirées em bares e clubes
noturnos para alimentar a vaidade. Tocamos mais de
100 shows durante o ano, agora já era dia primeiro de
Outubro e queríamos nos concentrar na criatividade.
Precisavamos traduzir o Ritmo e Blues da Motown para
o portugues, difundir o mojo nas regiões lusófonas. No
Brasil ainda falta uma “Pride and Joy” ou “I Heard it
Through the Grapevine”, do Marvin Gaye. Quem chegou
mais perto foi Roberto Carlos com “Não Há Dinheiro Que
Pague” e “Se Você Pensa”. Nesses tempos eu sentia a
obrigação de carregar essa tocha adiante.
1A 3. Depois do ensaio eu sempre deixava o
baterista em casa sozinho, mas dessa vez os outros dois
membros da banda, os Irmaos Corleone, estavam juntos
também porque vieram de carona em vez de trazer
carro. Silvanete entregou-os no ensaio de manhã
quando ia ao trabalho. Ela era a eterna namorada de
Reginaldo Corleone, o baixista. No carro, as músicas de
Jorge Ben nos inspiravam para a gravação de nosso
primeiro disco. Nesses tempos já era raro nós quatro
estarmos juntos fora dos ensaios e eu achava que tinha
que aproveitar, para harmonizar nossas ondas. Parava
o disco a cada 30 segundos para comentar,
aproveitando a presença de todos.
1A 4. Os namorados Reginaldo e Silvanete
pareciam viver em um filme. Era uma graça, na época.
Eu achava saudável pois sabia que Reginaldo
administrava bem os romances, mesmo que demorasse
pra cair a ficha. Vamos falar de Reginaldo a fundo mais
na frente, mas por enquanto vamos chamá-lo de
“Catetinho” que é seu justo apelido entre os mais altos
escalões do Rock.
Seu irmão Reges Corleone era
chamado, entre os Classicos, de “Capretinho”, por ter a
pele mais escura e continuar idêntico ao irmão. Os
Classicos são meus amigos. Todos os nobres
cavalheiros entre Socrates e algum porteiro com quem
conversei durante 30 segundos. Todos os gloriosos
cientistas e desapegados charlatões entre Osama Bin
Laden e Tony Total. Sim, Tony T-O-T-A-L. Se eu me
lembro bem de alguém desses tempos, eu lembro bem
de Tony Total, mas eu já falo quem ele é.