Paramahansa Yogananda

Transcrição

Paramahansa Yogananda
PARAMAHANSA YOGANANDA
Como Eu O Conheci
Experiências, Observações e Recordações de um Discípulo
Roy Eugene Davis
CSA Press / Lakemont, Georgia
Copyright © 2005 by Roy Eugene Davis
Existe um propósito fundamental para nossas vidas.
Devemos mirar além dos nossos objetivos imediatos para o
que realmente queremos realizar, e considerar o elevado
potencial que a vida apresenta para o desenvolvimento.
Paramahansa Yogananda
FOTO DA CAPA: Quando não se apresentava em público, o Mestre prendia seu cabelo comprido atrás
da cabeça ou o inseria por dentro da roupa. Esta foto retrata a sua personalidade como eu me recordo dele,
durante nossos encontros informais em Los Angeles e em seu retiro do deserto, em Twenty-Nine Palms,
Califórnia.
2
ÍNDICE
Prefácio ......................................................................................................................................6
1. Os primórdios .........................................................................................................................7
2. Primeiras experiências com meu Guru ................................................................................. 10
3. Observações e recordações de um discípulo ........................................................................ 20
4. Transições ............................................................................................................................ 43
5. Graça duradoura ...................................................................................................................51
6. Perguntas e Respostas .......................................................................................................... 54
7. Apêndice ...............................................................................................................................80
8. Fotografias.............................................................................................................................91
3
Um homem, que tinha viajado pelo mundo todo, conversara com
muitos instrutores e buscadores da verdade, em sua busca de
conhecimento. Repetidamente lhe diziam: “Somente Deus é real, tudo
o mais é insubstancial e transitório. Em sua essência, você é
consciência pura. Realize isso, e será livre.”
“Com certeza”, ele pensou, “para alcançar a iluminação, é preciso
haver mais do que isso.”
Continuando sua busca pelo conhecimento, foi finalmente aceito como
discípulo por um guru. Após uma década de serviço dedicado no
ashram e da prática de disciplinas preparatórias, seu guru consentiu em
instruí-lo no conhecimento mais elevado.
– Somente Deus é real, tudo o mais é insubstancial e transitório. Em
sua essência, você é consciência pura. Realize isso, e será livre.
Desapontado, o discípulo exclamou:
– Tenho estado aqui por dez anos esperando sua instrução! Isso é tudo
o que tem a dizer?
O guru respondeu:
– A Verdade não mudou nestes dez anos.
4
Paramahansa Yogananda discursando na inauguração do Santuário do Lago da SRF, agosto de 1950. (Na extrema
esquerda, em túnica branca, está Rev. Bernard Cole; próximo a ele, Rev. Stanley, depois Dr. Lewis, o Mestre e
Donald Walters. Eu estou de pé, na extrema direita.)
5
PREFÁCIO
Sou freqüentemente perguntado como era estar na presença de Paramahansa Yogananda. Ele
era tranqüilo, atencioso, bondoso, paciente, habitualmente bem-humorado e algumas vezes jovial.
Seu interesse sincero no bem-estar alheio era óbvio. Quando se concentrava em seus muitos
projetos para o benefício dos outros, era prático e inovador, ainda que um tanto desapegado,
como se estivesse desempenhando um papel. Ele era muito sábio.
Quando eu estava com ele, bem como em outras vezes quando sintonizava minha mente e
consciência com a dele, algo que ele me pedia com freqüência para que fizesse, minha mente
estava tranqüila; sentia-me seguro e repleto de paz; minha consciência era calma e límpida; eu
ficava mais consciente de mim e de Deus.
Agora, cinqüenta e seis anos após o encontro com meu guru, as memórias daquela ocasião e
de todos os meus demais momentos com ele estão tão vívidas como se tivessem ocorrido a
poucos instantes. Nas páginas seguintes, compartilhei o que ele disse a mim e aos outros, descrevi
algumas de minhas experiências e forneci informações que espero sejam úteis para os leitores que
forem devotados em seu caminho espiritual.
Algumas de minhas percepções e observações de meu guru, como ele era, quem ele era e o
que ensinou, são diferentes daquelas que foram descritas por alguns outros de seus discípulos,
pois nossas percepções não foram as mesmas. Neste livro, retrato Paramahansa Yogananda como
eu o conheci.
As perspectivas de meu guru eram universais. Com relação as variadas opiniões filosóficas
dos outros, ele sempre dizia: “O mundo é um lugar enorme; nele há espaço para todos”.
Nosso mundo está muito diferente do que era na metade do século passado. Descobertas
científicas nos permitiram compreender melhor nosso relacionamento com o universo, e muitas
invenções tecnológicas agora influenciam diretamente nossas vidas. Mais de quatro bilhões de
pessoas foram acrescidas à população global, um número crescente delas está sinceramente
preocupado na conservação dos recursos naturais do planeta, nos esforços cooperativos que
podem beneficiar a todos, e no cultivo de um autêntico crescimento espiritual.
Roy Eugene Davis
Março de 2005
Lakemont, Geórgia
Notas:
No texto, refiro-me a Paramahansa Yogananda como Mestre, como o faziam muitos de seus
discípulos. Um mestre (do latim magister) é uma pessoa que é reconhecidamente proficiente em um ramo
de aprendizado ou que possui capacidades e talentos únicos.
Pronúncia do nome: Pa-ram-hâng-sa Iô-gá-nan-da
Em Paramahansaji, o sufixo ji (“djí”) é utilizado para demonstrar respeito.
6
CAPÍTULO UM
Os Primórdios
Quando eu era criança, tinha freqüentes lampejos de realidades superiores e estava quase
sempre consciente de uma Presença permeadora e benevolente que incluía a mim e a todas as
coisas em sua onipresença. Percepções desse tipo não são incomuns entre crianças que, tendo
acabado de chegar a este mundo físico, ainda não foram devidamente influenciadas pelas idéias ou
comportamentos dos outros.
Nasci pouco depois da meia-noite de 9 de março de 1931, em Leavittsburg, Ohio, ao sul de
Cleveland, o quarto de seis filhos e o segundo homem. Quando tinha seis anos de idade, minha
família se mudou para uma fazenda de quarenta e cinco acres, em Braceville Township, Condado
de Trumbull, onde cresci e freqüentei a escola. Por dois anos depois de nossa mudança à fazenda,
não tivemos a conveniência de possuir luz elétrica. Lamparinas de querosene eram utilizadas para
iluminar nossa casa à noite. Uma lareira no porão queimando carvão e madeira providenciava o
aquecimento nos meses de inverno. A comida era feita em um grande fogão de ferro na cozinha.
Tirávamos água de um poço aberto e a levávamos para casa utilizando baldes.
Meu pai, DeWitt Talmage Davis, foi assim batizado em homenagem a um famoso clérigo do
meio-oeste, porque sua mãe queria que ele fosse um ministro religioso. Seu avô paterno tinha
imigrado do País de Gales; sua avó materna era uma americana nativa, mas não me recordo de
qual tribo. Minha mãe, Eva Lee Davis, nasceu em Kentucky e casou-se com meu pai no sul de
Ohio, no início da década de 1920.
Minha infância foi normal. Aprendi a trabalhar na fazenda muito cedo. Eu brincava com meus
amigos, nadava em riachos próximos nos meses de inverno, perambulava pelas florestas, gostava
de montar o cavalo em minha adolescência e ajudei com a plantação e a colheita das safras.
Juntamente com minha família, eu freqüentava regularmente os serviços dominicais na
United Brethren Church,1 onde os “pecadores” na congregação eram freqüentemente
aconselhados a se “arrependerem e serem salvos”. Embora fosse inspirado por algumas histórias
da Bíblia, eu não me impressionava pelas doutrinas fundamentalistas, nem mesmo acreditava que
fossem verdadeiras. Experimentei, contudo, durante meus anos da adolescência, uma forte
sensação de estar sendo chamado para o ministério de uma forma mais universal. Em minha
mente, contemplava-me viajando pelo mundo para falar aos outros sobre Deus e como possuíam
a inata capacidade de conhecê-Lo.
Durante meu último ano no colégio, passei por alguns episódios de pequeno desconforto
devido a infecções bacterianas na garganta. Em fevereiro de 1949, minha doença foi
diagnosticada pelo nosso médico familiar como sendo febre reumática e me foi dito que eu
deveria ficar na cama até que minha saúde fosse restaurada. Dessa forma, começaram cinco meses
de reclusão, os quais me proporcionaram muitas oportunidades para alimentar minha mente,
expandir minha consciência, descobrir o caminho da Kriya Yoga e saber com maior certeza o
grande objetivo para minha vida.
Eu já tinha lido muitos livros emprestados da Biblioteca do Condado. Livros de psicologia e
movimentos religiosos tinham um forte apelo para mim, assim como alguns poemas de Alfred
Lord Tennyson e os escritos de Ralph Waldo Emerson, Henry David Thoreau e Walt Whitman.
Aprendi sobre as práticas de ioga lendo os livros de Francis Yeats-Brown: Vidas de um Lanceiro
1
A United Brethren Church era uma denominação pequena e fundamentalista que mais tarde se fundiu com a
Igreja Metodista.
7
de Bengala; de Paul Brunton: A Índia Secreta; e de Theos Bernard: Hatha Yoga. Comecei a
praticar Hatha Yoga, cujas posições conseguia realizar com facilidade, e tentei meditar. Sozinho,
em meu quarto no segundo andar, algumas vezes me sentava no chão na postura de lótus e
imaginava que era um iogue espiritualmente realizado no Himalaia.
Enquanto estive confinado na cama, li artigos em revistas especializadas em saúde que me
motivaram a escolher a dieta vegetariana. Em uma dessas revistas, li um anúncio sobre a
Autobiografia de um Iogue,2 de Paramahansa Yogananda, publicada pela Self-Realization
Fellowship, e encomendei uma cópia pelo correio. Tão logo recebi o livro, comecei a lê-lo, e o lia
com freqüência. Enquanto avançava cuidadosamente no texto e contemplava as fotografias de
santos e iogues, eu soube que Paramahansa Yogananda era o meu guru.
Descobri que havia lições impressas com métodos de meditação disponíveis pela SelfRealization Fellowship, e as solicitei. Logo, aprendi como utilizar um mantra de meditação e a
ouvir a vibração de Om.
Orei pela cura e por orientação acerca de meu futuro. Durante um período de intensa oração,
uma leva de energia repentinamente moveu-se para cima em minha coluna até meu cérebro.
Minha coluna enrijeceu-se e arqueou enquanto meu corpo ficou imóvel por vários minutos.
Enquanto durou a força daquela energia, fiquei muito tranqüilo e senti que um evento
significativo havia ocorrido. Durante as derradeiras semanas de confinamento, aguardei
pacientemente que minha cura física estivesse completa e aguardava com antecipação os eventos
que iriam se desenrolar. Mentalmente, eu já estava em Los Angeles com Paramahansa
Yogananda.
No início de julho de 1949, tive a permissão de sair da cama. Quando olhei para meu reflexo
no espelho, fiquei impressionado ao ver como meu corpo estava raquítico após cinco meses de
inatividade física. Naquela noite, minha mãe morreu de ataque cardíaco.
Na manhã seguinte, meu pai me contou que ele tinha visto uma luz emergir do rosto da
minha mãe enquanto ela abandonava o corpo. E, sabendo que eu vinha lendo sobre religião, ele
me pediu que contasse para minha irmã de seis anos de idade acerca da morte da nossa mãe.
Como eu sabia que o corpo físico é apenas uma habitação temporária da alma, orei pelo bemestar espiritual da minha mãe, mas não fui atormentado pelos pensamentos ou sentimentos de
perda e luto.
Nos meses que se seguiram, preparei as refeições para meu pai e minha irmã mais nova, aderi
a uma dieta vegetariana e pratiquei Hatha Yoga e meditação todos os dias.
Em novembro, com o vigor físico recuperado, senti que era hora de mudar para a Califórnia.
Imaginando que eu precisava primeiro ganhar bastante dinheiro para as despesas da viagem,
decidi impulsivamente ir para a Flórida, de modo a evitar outro inverno de Ohio e conseguir um
emprego temporário. Meu pai, ainda um pouco desequilibrado emocionalmente por causa da
minha inesperada decisão e relutante em se despedir de mim tão repentinamente, deu-me alguns
dólares e me levou até a rodoviária de Greyhound, na cidade vizinha de Warren.
A viagem de ônibus até a Flórida foi uma experiência inusitada. Até então, eu nunca tinha
estado a mais de trezentos quilômetros de onde nasci. No centro de Miami, aluguei um quarto de
um hotel modesto por dois dólares a diária, e logo arrumei emprego em um pequeno restaurante
no subúrbio, trabalhando na cozinha, pelo que recebia um dólar a hora e recebia uma refeição no
almoço. Duas semanas mais tarde, atraído pela perspectiva de um pagamento melhor, filiei-me a
um grupo de jovens rapazes que eram contratados para vender assinaturas de revistas.
2
A Autobiografia de um Iogue de Paramahansa Yogananda foi publicada pela primeira vez em 1946. Atualmente
publicada em diversas edições pela Self-Realization Fellowship, ela já foi traduzida em mais de vinte dos mais
importantes idiomas do mundo.
8
Enquanto estava com a equipe de vendas em West Palm Beach, indo de uma casa a outra,
batendo nas portas naquilo que provou ser uma vã tentativa de vender assinaturas de revistas,
aconteceu um evento oportuno. Quando bati na porta de uma pequena casa, uma mulher de meia
idade e comportamento gentil abriu a porta e me convidou a entrar em sua cozinha para tomar
uma xícara de chá. Quando ela me perguntou sobre meus planos para o futuro, eu a informei
acerca de minha intenção de viajar à Califórnia para estudar com Paramahansa Yogananda. Ela
sorriu e me levou para uma saleta com muitas prateleiras repletas com centenas de livros sobre
filosofia e religião. Ela então informou que tinha sido ali que William Walker Atkinson (utilizando
o pseudônimo de Yogi Ramacharaka), o autor de vários livros sobre temas relacionados com a
ioga e New Thought3 que foram publicados no início do século 20, tinha escrito alguns de seus
livros. Enquanto agradecia minha anfitriã e me preparava para sair, ela observou:
– Se quer estar com seu mestre, por que não vai para lá agora? – Suas palavras reforçaram
meus pensamentos particulares.
Naquela noite, quando informei o gerente de vendas acerca da minha decisão de ir para a
Califórnia, ele rapidamente aquiesceu com meu plano. Eu só havia vendido duas assinaturas nas
duas últimas semanas. No dia seguinte, em Tampa, ele me levou de carro até a extremidade norte
da cidade, emprestou cinco dólares e desejou boa sorte. Paguei a dívida algumas semanas depois.
Em um armazém nas proximidades, comprei um pouco de amendoins, passas e aveia seca
embalada, para dar algumas mordidas durante o caminho. Então permaneci à beira da rodovia
pacientemente por várias horas, esperando que algum motorista de passagem me oferecesse uma
carona4 até Tallahassee, de onde eu partiria em direção ao oeste. Nenhuma carona me foi
oferecida. Naquela noite dormi em um laranjal, parcialmente aquecido por uma bruxuleante
fogueira.
Cedo pela manhã, com uma atitude mental positiva, fui até a rodovia. Dentro de poucos
minutos, recebi uma carona até Tallahassee. Seis dias mais tarde, eu estava em Los Angeles. Na
seção de religião-filosofia da Biblioteca Pública de Los Angeles, li edições anteriores da SelfRealization Magazine, e verifiquei o endereço da Sede Central da SRF. Quando anoiteceu,
precisando comer e descansar, fui andando até a vizinha Fifth Street Mission, onde consegui um
banho quente, um jantar aquecido e uma cama limpa para a noite.
Na maior parte do dia seguinte, fiquei novamente na Biblioteca Pública. No final da tarde,
caminhei algumas quadras até onde se podia pegar os bondes e perguntei para o balconista de
uma loja qual direção deveria pegar a fim de chegar no distrito de Highland Park na cidade. Ele
me providenciou a informação que precisava e voluntariamente me deu dez centavos para pagar o
bilhete de embarque.
Vinte minutos mais tarde, enquanto começava a caminhar na rua íngreme e curvilínea que
leva ao topo de Mount Washington, um carro parou ao meu lado. O motorista, um jovem rapaz,
perguntou:
– Para onde você vai? – Quando respondi, ele disse:
– Entre. Passarei por lá. Vou deixar você no portão da frente.
3
New Thought é o nome de um movimento religioso moderno com ênfase no ensino metafísico, que surgiu nos
Estados Unidos nos fins de 1880. Seus membros incentivam o ideal do bem-estar espiritual e da utilidade do
pensamento positivo e da vida construtiva. Centenas de igrejas e centros de ensino (grupos independentes como
Unity, Science of Mind, Religious Science e Divine Science) nos Estados Unidos e outros países servem a um
crescente número de pessoas. Os escritórios e arquivos da New Thought Internacional ficam em Mesa, Arizona.
Uma revista é publicada trimestralmente e um congresso com uma semana de duração é realizado anualmente, no
qual se reúnem os ministros e membros leigos.
4
Hoje em dia não recomendo pegar caronas.
9
CAPÍTULO DOIS
Primeiras Experiências Com Meu Guru
Cheguei à Sede Central1 da Self-Realization Fellowship na sexta-feira à noite, 23 de
dezembro de 1949, poucos minutos após as 18 horas.
Quando bati à porta de uma cabana situada logo depois da entrada de automóveis da
propriedade, um homem que aparentava ter sessenta anos me cumprimentou, se apresentou como
Ralph Sherman e me levou até a sala de jantar dos homens, no porão do edifício principal. Lá, fui
apresentado a vários jovens discípulos residentes e fui convidado a me juntar à sua refeição
noturna.
Após o jantar, Donald Walters,2 um jovem que mais tarde descobri ser o responsável pela
coordenação das atividades diárias e dos horários de meditação dos discípulos homens, conduziume ao alto de uma escada até uma área separada na sala principal de entrada, onde poderíamos
conversar em particular. Ele interrogou sobre meu passado e perguntou como eu tinha ouvido
falar da organização e de Paramahansa Yogananda. Ele era polido, amigável e alegre, e parecia
genuinamente interessado em meu bem-estar. Dentro de alguns minutos, quando os sons abafados
de um elevador descendo provinham de um corredor próximo, ele ficou em pé, virou-se em
direção do corredor e exclamou: “O Mestre está vindo!” Eu também fiquei em pé e voltei-me em
direção ao corredor com vigilante antecipação.
Paramahansa Yogananda entrou na sala, seguido por duas jovens discípulas, Faye Wright3 e
sua irmã Virgínia.4 Ele estava vestindo um paletó azul escuro, cachecol branco e um chapéu de
feltro azul. Depois de cumprimentar Donald, ele parou na minha frente, mirou meus olhos, sorriu
gentilmente enquanto segurava minha mão com um aperto gentil, e perguntou baixinho:
– Quantos anos você tem? – Seu olhar era firme, revelando olhos que expressavam amor
insondável e uma alma livre no Infinito.
– Dezoito, senhor – respondi.
1
A Sede Central da Self-Realization Fellowship fica localizada na San Rafael Avenue, 3880, Los Angeles,
Califórnia. Na Índia: Yogoda Satsanga Math, Dakshineswar, Calcutá, Bengala Ocidental.
2
James Donald Walters tornou-se discípulo de Paramahansa Yogananda em 1948, pouco após completar sua
formação superior. Em pouco tempo, recebeu a responsabilidade de supervisionar as atividades dos monges, foi
ordenado ministro e, por muitos anos, esteve envolvido em diversos departamentos administrativos, tanto nos
Estados Unidos quanto na Índia. Foi ordenado na antiga ordem dos swamis e recebeu o nome de Kriyananda. Após
deixar a Self-Realization Fellowship, no começo dos anos de 1960, fundou a muito bem-sucedida Comunidade
Espiritual Ananda, perto de Nevada City, na Califórnia.
3
Faye Wright (Daya Mata, 1914 - ) tinha dezessete anos de idade em seu primeiro encontro com Paramahansa
Yogananda em 1931, quando compareceu a uma série de palestras em Salt Lake City, Utah. Logo após, ela se
mudou para o sul da Califórnia para viver no Centro da SRF em Los Angeles. Ela e sua irmã Virgínia trabalharam
próximas do guru por muitos anos: processando a correspondência, agendando seus compromissos e envolvidas
com uma variedade de projetos organizacionais. Presidente da Self-Realization Fellowship desde 1955, ela tem
sido o instrumento diligente para completar muitos dos projetos que Paramahansa Yogananda tinha em mente para
a organização. Seu nome monástico, Daya Mata (mãe de compaixão), é compatível com seu comportamento
carinhoso e sua amável personalidade.
4
Virgínia Wright (Ananda Mata, 1915-2005) foi também secretária, tesoureira e membro da Mesa Diretora da
organização.
Richard Wright (1911-2002), um dos irmãos, viajou para a Índia com Paramahansa Yogananda em 1935.
Algumas das anotações de seu diário foram transcritas na Autobiografia de um Iogue (capítulos 40-42).
10
– Seus pais sabem que está aqui? – perguntou.
– Está tudo certo quanto a isto, senhor – garanti, e ele pareceu satisfeito.
Ele continuou a fitar meus olhos e pude sentir que estava sondando meus pensamentos e
sentimentos mais recônditos. Tocando levemente minha testa com sua mão em um gesto de
bênção, ele falou em voz baixa:
– Muito bem. Falarei com você novamente.
Então, com Faye e Virgínia, ele entrou no cadilaque sedã azul que eu tinha visto antes na
entrada, próximo dos degraus da varanda. Donald me levou então para fora através de um
caminho no jardim, até uma pequena casa de um pavimento que era utilizada como o dormitório
dos homens. Um pequeno grupo deles estava praticando posturas de Hatha Yoga na sala
principal. Outros, em silêncio, realizavam tarefas pessoais.
Enquanto desfazia minha mala, fui informado que na manhã seguinte todos iriam se reunir no
prédio principal para a meditação de um dia inteiro. Recebi uma pequena cama, no canto do
quarto da frente. Ali, após um banho e quando as luzes foram apagadas, minha consciência
pairava diante dos portais do sono, enquanto eu refletia em minha extrema felicidade. Foi assim
que, no dia 23 de dezembro de 1949, cheguei ao ashram de meu guru. Foi o começo do que
seriam quase quatro anos de treinamento espiritual intensivo e o alicerce para os muitos anos de
atividade ministerial que se seguiram.
Na manhã seguinte, sábado, às 9 horas, após uma noite de sono restaurador e o café da
manhã, juntei-me aos quase duzentos discípulos residentes e estudantes visitantes que se reuniram
na grande sala de recepção do edifício principal para a ocasião: a meditação de Natal. Houve um
pequeno atraso, porque Paramahansaji ainda não havia descido do seu apartamento, no terceiro
andar. Durante esse período de espera, fui apresentado a vários discípulos que só chegaram
naquela manhã. Pouco tempo depois, quando o Mestre, acompanhado de James J. Lynn,5 um
5
James Lynn (1892-1955) nasceu próximo de Archibald, Louisiana. Seu pai trabalhou em uma fazenda de
algodão. Aos quatorze anos, James Lynn já estava trabalhando. Quando tinha dezessete, viajou de trem até Kansas
City. Lá, conseguiu um emprego, completou sua educação colegial, entrou para a faculdade de direito e estudou
contabilidade. Foi admitido ao Conselho de Contabilidade e se tornou Auditor Público com vinte e um anos.
Casou-se em 1913 e foi admitido como contador para a Companhia de Seguros U.S. Epperson. Foi logo promovido
para a posição de gerente geral. Alguns anos mais tarde, com a ajuda de um enorme empréstimo de um banqueiro
amigo, comprou a companhia. Ele posteriormente criou uma outra companhia de seguros, investiu em ferrovias e
ações bancárias, comprou uma fazenda de frutas cítricas no Texas e arrendou milhares de acres de terra em
Louisiana e no Texas, onde foi bem sucedido na extração de petróleo. Na década de 1940, seus negócios geravam
muitos milhões de dólares.
A casa do Sr. Lynn em Kansas City ficava em uma área de cem acres de floresta com um campo de golfe de nove
buracos. Bem sucedido nos empreendimentos dos negócios, ele, contudo, ainda era muito inquieto e não
completamente satisfeito com sua vida. Em janeiro de 1932, Paramahansa Yogananda visitou Kansas City para
uma série de palestras e aulas. Durante uma dessas palestras que o Sr. Lynn compareceu, ele percebeu que havia
ficado muito tranqüilo e relaxado. Nos dias que se seguiram, antes de ir para seu escritório, ele ia até o quarto de
hotel de Paramahansaji para conversar e meditar com ele. Após ter recebido a iniciação, na primeira vez que
praticou o pranayama de kriya, ele experimentou um estado extático de consciência.
Enquanto continuava seu sucesso nas aventuras empresariais, o Sr. Lynn mantinha uma agenda regular de estilo
de vida holístico e prática de meditação. Tanto quanto possível, viajava para a Califórnia para estar com seu guru e
meditar. Sua generosas doações ao longo dos anos ajudaram a providenciar uma sólida fundação financeira para a
Self-Realization Fellowship. Na década de 1930, ele comprou a propriedade de frente ao oceano em Encinitas, que
atualmente é um centro de retiros da SRF e construiu um Eremitério no terreno, enquanto Paramahansaji estava na
Índia. No início da década de 1950, doou o dinheiro que permitiu à SRF comprar a propriedade sobre a qual o
templo do Santuário do Lago foi posteriormente construído, doou um milhão de dólares em ações da Ferrovia
Kansas City Southern e providenciou para que dois milhões de dólares fossem doados após a morte de sua esposa
(que ocorreu por volta de 1965).
Enquanto foi presidente da SRF (1952-1955), vendeu seus diversos negócios e mudou-se permanentemente para
Borrego Springs, ao norte de San Diego, onde contratou trabalhadores para plantar e colher uma variedade de
11
discípulo espiritualmente adiantado, entrou na sala caminhando devagar, percebi que ele estava
em estado de superconsciência, envolto por uma aura de divino distanciamento. Ambos estavam
radiantes e uma profunda vibração de paz espalhou-se pela sala, enquanto eles adentraram na
capela., onde se sentaram em poltronas diante do altar. Os indicadores de lugar convidaram a
todos para que entrassem e se sentassem em lugares designados.
Fotografias emolduradas da linhagem de gurus de Paramahansaji, juntamente com uma
gravura artística representando Jesus, adornavam o altar. A luz de velas contribuía para o estado
de espírito sagrado e distinguia-se a suave fragrância do incenso.
O Mestre proferiu carinhosas palavras de boas-vindas, expressou sua felicidade por estar com
todos nós, falou sobre o significado desses dias sagrados, mencionou os nomes de alguns
discípulos e agradeceu seus anos de devoção e serviço, e também falou sobre Deus e a linhagem6
de gurus. Referia-se a Deus como Pai e Mãe, como o Ser Supremo além da criação e como a
Energia Cósmica expressando-se como e na Natureza. Sua compostura imóvel e convicção
alicerçada na Auto-realização criavam uma aura de interiorização, intimidade e confiança. Foi um
interlúdio mágico. As fronteiras ilusórias de tempo e espaço pareciam se dissolver na Eternidade.
A um sinal do Mestre, Dr. Minot Lewis,7 ao órgão, começou a tocar um dos cânticos
devocionais que Paramahansaji havia, anos antes, adaptado daqueles de sua terra natal.
– O ato de cantar irá capacitá-los a vencer metade da batalha na meditação – o Mestre
anunciou. – Quando vocês cantam com ardente devoção a Deus, todos os pensamentos inquietos
são expulsos da mente. Então, conhecerão a presença de Deus!
O canto em grupo continuou por vários minutos. Quando os últimos versos enfraqueciam,
fomos instruídos na prática da meditação e encorajados a ficar sentados por um tempo
prolongado de prática silenciosa e a “mergulhar profundamente” na meditação. A cada 30 ou 40
minutos de silêncio, o Mestre falava serenamente sobre Deus, os santos e a utilidade da devoção,
e conduzia uma outra sessão de cânticos8 que era seguida por mais meditação silenciosa. Ao
meio-dia, tivemos uma pequena pausa de 30 minutos para descanso.
Muito depois, um discípulo me contou que enquanto saía da capela, sentiu várias rajadas de
vento, suaves mas perceptíveis, passarem por ele no corredor. Ao voltar para a capela,
Paramahansaji lhe perguntou:
– Você os viu? Você os viu? Havia santos aqui, e eles deixaram a sala quando você saiu!
frutas orgânicas e vegetais em sua recém-adquirida fazenda de 640 acres.
Em 1952, quando eu era ministro do Centro da Self-Realization Fellowship em Fênix, Arizona, Faye Wright
informou em uma carta que o Sr. Lynn estava se recuperando de um procedimento cirúrgico ao qual havia se
submetido para a retirada de um tumor benigno em seu cérebro. Os médicos e enfermeiras do Sr. Lynn ficaram
impressionados com seu comportamento tranqüilo, clareza de consciência e ausência de qualquer indicação de dor
ou desconforto. Após um terceiro procedimento cirúrgico, em outubro de 1954, seu sistema imunológico ficou
enfraquecido. No dia 20 de fevereiro de 1955, às 4 horas da manhã, ele pacificamente abandonou o corpo.
6
A informação sobre a linhagem de gurus desta tradição de Kriya Yoga encontra-se no apêndice deste livro.
7
O Dr. Minot Lewis (1893-1960) conheceu Paramahansa Yogananda em Boston, no ano de 1920. Até se aposentar
da prática da odontologia, em 1945, e se mudar para o Centro da SRF, em Encinitas, ele conduzia aulas semanais
de meditação e viajava com freqüência à Califórnia para estar com seu guru. Em seus últimos anos, ele palestrou e
ministrou aulas no templo da SRF em San Diego. Em 7 de abril de 1960, deu entrada no Hospital Scripps
Memorial em La Jolla, Califórnia, para fazer uma bateria de exames cardíacos. No dia 13 de abril, cedo pela
manhã, com a companhia de sua esposa, Mildred, ele se sentou na cama para meditar. Alguns minutos depois,
abandonou o corpo.
8
Estudos recentes têm demonstrado que o canto repetitivo de uma melodia curta e simples pode reduzir o estresse,
acalmar a mente e produzir interações entre dos hemisférios cerebrais que ajudam o indivíduo a meditar mais
efetivamente.
12
Com o passar dos meses, soube que o Mestre ocasionalmente falava de santos e almas
espiritualmente adiantadas que amiúde o visitavam em suas formas sutis. Almas altamente
iluminadas, capazes de atravessar com facilidade os véus ilusórios de consciência, os quais as
pessoas espiritualmente adormecidas julgam impenetráveis, costumam ser atraídas para santuários
e outros lugares sagrados, onde prevalece o amor de Deus.
Na sessão vespertina, o Mestre falou de Krishna e Radha, como símbolos da interação que
existe entre o Espírito e a Natureza, aspectos duais de Deus, a única Realidade. O Sr. Lynn caiu
repentinamente da cadeira, o rosto banhado em fulgor beatífico. Alguns momentos depois,
quando já estava novamente recomposto e sentado direito, o Mestre deu um risinho de leve, e
disse:
– São Lynn não agüenta quando falo essas coisas. Ele sempre entra em êxtase!
Por causa do estado espiritual de Sr. Lynn, o Mestre sempre se referia a ele como santo, e o
fez nessa ocasião.
Após a sessão de seis horas de meditação, o Mestre falou por alguns minutos e pronunciou
uma bênção, depois, ficou em pé na entrada da capela para abençoar cada um enquanto saíam.
No domingo de manhã, compareci ao serviço regular da Igreja de Todas as Religiões da SelfRealization Fellowship9 (como era então chamada), na Sunset Boulevard, em Hollywood.
Consagrado em 1942, o santuário possui um gramado e jardins floridos, que o separam da
entrada em forma de arcada.
O Mestre abriu o serviço, liderando a congregação em uma oração conduzida, leu alguns
versículos do Bhagavad Gita e do Novo Testamento, e fez um breve comentário. Um interlúdio
de cântico devocional e uma meditação silenciosa precederam seu sermão-ensinamento, que
durou cerca de uma hora. Durante sua conversa franca, sem rodeios e improvisada, ele
compartilhou histórias interessantes, mencionou alguns santos que havia conhecido, descreveu
algumas de suas experiências pessoais e clamou a todos para que se dedicassem ao caminho
espiritual até que alcançassem a Auto-realização e a Realização Divina. Sua apresentação era
singularmente motivadora, especialmente ao compartilhar casos e relatos pessoais de sua relação
com Deus. Os temas filosóficos mais profundos eram às vezes acompanhados de apartes
espontâneos e comentários bem-humorados. Ele então pediu para que todos ficassem em pé,
erguessem as mãos e cantassem Om com ele por três vezes, “para a cura do corpo, da mente e da
alma”.
Enquanto muitas pessoas se reuniam ao redor do Mestre para falar com ele e receber sua
bênção, Myrna Brown,10 uma de suas secretárias, aproximou-se de mim.
– O Mestre quer vê-lo após terminar com os outros que agendaram com ele – ela disse. –
Vou informá-lo quando ele estiver pronto.
Era costume de Paramahansaji encontrar-se com amigos e estudantes após os serviços
dominicais, e esses encontros só terminavam no final da tarde.
No final daquela tarde, fui levado para uma saleta próxima do púlpito e de onde ficava o altar
no templo. O Mestre, sentado em um pequeno divã, pediu para que eu me sentasse a seu lado.
Colocando-me à vontade com um sorriso de boas-vindas, ele permaneceu em silêncio por um
momento. Depois, em um tom quase inaudível, perguntou:
9
O Templo de Hollywood da Self-Realization Fellowship fica na Sunset Boulevard, 4860. O Santuário do Lago e o
Templo, em Pacific Palisades, ficam na Sunset Boulevard, 17190, a menos de 400 metros da rodovia Pacific Coast.
10
Myrna Brown (Mrinalini Mata, aprox. 1931 -) conheceu Paramahansa Yogananda por volta da metade da
década de 1940, em San Diego, durante seus primeiros anos da adolescência. Ela tem sido a responsável pela
edição e publicação dos livros da SRF, e é a vice-presidente da Mesa Diretora desde 1966.
13
– O que posso fazer por você?
Senti que ele sabia por que eu estava lá, mas preferia que eu verbalizasse o pedido.
– Quero ser seu discípulo, senhor – respondi.
Ele pareceu satisfeito e ficou em silêncio de novo, por um momento. Então, disse
suavemente:
– Este não é um caminho de escapismo, você sabe… – Era ao mesmo tempo uma afirmação
e uma pergunta.
– Sei disso, senhor – garanti a ele.
Ele perguntou sobre minha saúde. Quando afirmei que me sentia bem, ele disse:
– Vamos ver – e estendeu a mão esquerda para sentir minha pulsação no punho. Alguns
momentos depois, murmurou, sorrindo:
– Sim, está tudo bem com você.
O diagnóstico de pulso é comum em vários sistemas de cura, com raízes na Ásia e no
Extremo Oriente. Um hábil praticante desse método pode detectar, só pelo toque, o nível de
vitalidade do paciente, bem como a condição de funcionamento dos principais sistemas e órgãos
do corpo.
Após algumas outras palavras de conselho e encorajamento, ele concluíu a entrevista
colocando a mão em minha testa e pronunciando sua decisão:
– Você pode ficar. Eu o verei de vez em quando.
Ele aconselhou que eu lesse apenas seus escritos e algumas escrituras durante o primeiro ano,
realizasse as tarefas que me fossem designadas e meditasse regularmente. Enquanto tocava minha
testa, suas palavras finais foram:
– Leia um pouco. Medite mais. Pense em Deus o tempo inteiro.
Naquela noite, discípulos e convidados visitantes se reuniram no salão principal da sede
central para o jantar anual de Natal. Enquanto aguardavam a chegada do Mestre, alguns deles se
misturavam a pequenos grupos para conversar em voz baixa com os amigos.
O Sr. Lynn se aproximou do grupo de monges no qual eu estava, apresentou-se para mim e
ofereceu seu conselho pessoal. Sabendo que eu acabara de ser aceito pelo Mestre para receber
treinamento, ele recomendou que eu meditasse em horários fixos por curtos períodos de tempo
até que fosse capaz de meditar com proficiência; então poderia meditar por períodos mais longos.
Ele me disse:
– Isso foi o que descobri ser útil quando comecei a meditar após ter encontrado o Mestre,
muitos anos atrás. – E concluiu:
– Tudo o mais é a graça de Deus e o amor do Mestre.
Instantes depois, o Mestre entrou na sala; todos foram convidados a se sentar em grandes
mesas, e grandes travessas e pratos de comida foram trazidos da cozinha. Eu nunca antes
experimentara tanta variedade culinária: vegetais cozidos, alguns levemente temperados e outros
bastante apimentados, saladas, arroz, pães e sobremesas. O Mestre, na cabeceira da mesa com
alguns discípulos mais antigos e outros convidados especiais, ocasionalmente falava de Deus e da
importância da lealdade e da dedicação ao caminho espiritual.
Após ter sido servida a sobremesa, o Mestre falou por pouco mais de uma hora. Ele
reconheceu a dedicação dos discípulos que estavam lá e enfatizou a importância de permitirmos
14
que nossos desejos fossem disciplinados pela sabedoria. Então convidou a todos para “virem aqui
e receberem as bênçãos de Deus por minhas mãos”.
Quando a maioria dos convidados se retirou, alguns de nós nos reunimos em torno de
Paramahansaji, numa pequena sala próxima, enquanto ele conversava com alguns hóspedes que
ainda permaneceram, e presenteava pessoas que estavam lá pela primeira vez com cópias de seus
livros.
Durante as semanas seguintes, participei juntamente com os outros monges das rotinas
matinais e noturnas de exercícios e meditação, também cumprindo diligentemente minhas tarefas:
recolher folhas secas, varrer as calçadas e a entrada dos carros, limpar alguns dos prédios e
ocasionalmente datilografar cartas que eram enviadas para os membros da SRF que recebiam as
lições semanais pelo correio. Donald Walters coordenava as atividades dos homens e presidia as
sessões de meditação, que precediam o café da manhã e o jantar. As noites e os finais de semana
nos proporcionavam uma oportunidade para o estudo particular e reflexão. Em algumas manhãs
de sábado, uns poucos monges se reuniam para sessões informais de canto devocional e
meditação.
Naquelas primeiras semanas, também trabalhei no recém-adquirido Santuário do Lago, em
Pacific Palisades, que estava sendo urbanizado e preparado para a inauguração ao público mais
tarde naquele verão. Circundando um pequeno lago, encontram-se santuários em honra das
maiores religiões do mundo e áreas isoladas para meditação particular. Torres brancas, com
domos de lótus dourados, são o ponto central. Atrás delas, junto a um aterro, está um sarcófago
de pedra, ornamentado, vindo da China, onde foram guardadas porções das cinzas do Mahatma
Gandhi. A pedido de seu guru, Sr. Lynn doou o dinheiro para a compra de vários acres de terra
acima do Santuário do Lago. O Mestre queria proteger a privacidade do lugar e, mais tarde,
expressou o desejo de que um dia fosse construído um templo no local. Em 1996, um belo templo
foi construído naquela área.
Na Sede Central da SRF, o Mestre ocasionalmente caminhava para manter a forma e fazer
sugestões acerca da manutenção e melhorias do terreno e das edificações. Quando os discípulos
se encontravam com ele nessas ocasiões, ele freqüentemente parava para conversar com eles, ou
os convidava para que o acompanhassem em suas caminhadas. Durante tais intervalos
inesperados, ele expressava o lado mais pessoal de sua natureza e nos dava instruções particulares
para aperfeiçoarmos nossas práticas espirituais. Às vezes, dizia:
– Eu passo pelas almas de vocês todos os dias, para seguir seus passos e ajudá-los… se vocês
me permitem ajudá-los.
Paramahansaji monitorava cuidadosamente o progresso espiritual dos discípulos. Para quem
fosse muito emotivamente devocional, ele podia aconselhar o cultivo do desprendimento e de um
desenvolvimento mais intelectual. Para outro que fosse predominantemente analítico, ele podia
aconselhar um equilíbrio entre devoção e serviço altruísta. Para quem gostasse de trabalhar muito,
podia aconselhar mais tempo de silêncio e meditação. A um discípulo introvertido, com pouco
interesse em assuntos externos, podia recomendar um envolvimento inteligente em atividades
importantes. Sua ênfase, sempre, era no viver equilibrado, ao mesmo tempo ancorado na
consciência de Deus.
Durante um dos meus encontros fortuitos com ele, fui aconselhado:
– Seja paciente, Roy. Tenho planos para você.
Numa noite, eu estava caminhando próximo da entrada do edifício principal com um
condiscípulo. Encontramos o Mestre, que estava dando uma volta. Após alguns minutos de
conversa aleatória, ele entregou sua bengala para mim e seu chapéu para o outro discípulo, e
15
inalou e exalou profundamente algumas vezes enquanto tencionava e relaxava os músculos da
parte superior de seu corpo. Retomando sua bengala e chapéu, ele disse:
– Vejam! Não importa quão ocupado eu esteja, sempre faço meus exercícios.11
Alguém tinha doado para os monges um conjunto de tênis de mesa, que foi temporariamente
instalado próximo da sala de jantar, no porão. Numa noite, eu saía da sala de jantar quando o
Mestre entrou na sala, com Faye e Virgínia Wright. Quando viu a mesa de tênis, ele fez sinal para
que eu pegasse as raquetes. Poucos instantes depois que começamos gentilmente a bater na
bolinha para lá e para cá, um brilho emanou de seus olhos e ele repentinamente mandou um
torpedo veloz e furioso com sua raquete. Satisfeito com sua performance, ele disse para Faye e
Virgínia:
– Quem é que costumava ser o melhor jogador de tênis de mesa por aqui?
Ele então caminhou até o elevador próximo e entrou. Um instante após a porta ter-se
fechado, ela se abriu novamente. O Mestre olhou para fora me procurando, e disse:
– Você tem um futuro maravilhoso, Roy.
Ainda fitando meus olhos enquanto a porta se fechava, ele disse gentilmente:
– Boa noite, Roy.
Continuei sozinho ali por vários minutos, antes de ir para meu quarto, meditar.
Em outra noite, quando o Mestre passava pelo corredor inferior e me viu com três outros
discípulos, ele se dirigiu até a sala de jantar dos homens e pediu para comer alguma coisa. Uma
tigela de cereais com leite foi preparada para ele. Enquanto comia seu lanche, ele viu uma
garrafinha de molho de pimenta na prateleira, e pediu que a trouxesse. Após ter despejado um
pouco do molho na colher, ele o provou e sorriu. Então, disse:
– Alinhem-se, rapazes – e, com alegria, mediu uma pequena porção para cada um de nós,
enquanto dizia que poderíamos, com a prática, aprender a retirar a atenção dos sentidos e não
sentir qualquer desconforto.
No dia 5 de janeiro, aniversário do Mestre, os discípulos na Sede Central se reuniram de
noite para meditar com ele na capela, após o que tivemos um banquete muito apreciado por
todos. Em tais ocasiões, ele louvava a dedicação dos discípulos que estavam firmes em suas
práticas espirituais. No transcurso de sua conversa, ele disse:
– Entre os que estão aqui esta noite, muitos se tornarão jivanmuktas e alguns serão siddhas.
Um jivanmukta é uma alma (jiva) livre (mukta), Auto-realizada, mas com tendências
subliminares (condições cármicas) ainda para serem eliminadas. Os iogues siddhas (realizados)
estão plenamente libertos de todas as condições que antes embaçavam e confinavam suas
consciências.
Durante os primeiros dois meses que estive com o Mestre, fiquei a cada dia mais consciente
de que um profundo relacionamento estava sendo estabelecido entre nós dois. Embora ele ainda
não houvesse me aceitado formalmente como discípulo, tratava-me da mesma maneira como o
fazia com os outros discípulos e esperava comportamento apropriado. Embora raramente
perguntasse sobre minha condição interior, seus comentários e comportamento para comigo
confirmavam que ele a conhecia. Com o passar das semanas, recebi dele a transmissão direta de
conhecimento, e fui capaz algumas vezes de intuir seus pensamentos e prever seus comentários
11
Os “exercícios de energização” criados por Paramahansa Yogananda consistem na leve tensão dos músculos e
respiração padronizada, enquanto a força vital consciente flui do bulbo raquiano, na base do cérebro, para os
músculos que estão sendo utilizados. Os exercícios aprimoram a força muscular, vitalizam o corpo e reduzem o
estresse.
16
antes que ele falasse para mim ou para outros. Quando eu discernia seus pensamentos não
verbalizados, ele olhava para mim com o sorriso de quem sabia. Quando eu não estava
fisicamente com ele, freqüentemente me sintonizava mental e espiritualmente com sua mente e
consciência, e “sentia” sua presença.
Poderosos fluxos de energia percorreram meu corpo dentro de poucas semanas, depois que
conheci o Mestre. No começo, senti suas ações enquanto realizava minhas tarefas. Ondas
inesperadas de força vital subiam rapidamente pela coluna vertebral, e então desciam. Quando eu
me sentava para meditar, os fluxos se tornavam mais pronunciados. Se eu não estivesse relaxado
quando o processo acontecia, meu corpo algumas vezes sofria um espasmo e assumia a postura
ereta, involuntariamente. Joe Carbone [Irmão Bimalananda], um irmão discípulo, percebeu esses
movimentos ocasionais e perguntou sobre eles. Quando descrevi as sensações, ele sorriu, com ar
de quem sabia.
– Isso se deve ao seu contato rotineiro com o Mestre e porque você está neste ambiente – ele
explicou. – Isso aconteceu comigo nas minhas primeiras vezes, também.
Os iogues chamam essa infusão de forças vitais transmitidas pelo guru como shaktipat:
compartilhar com alguém receptivo a shakti, que é a manifestação vital, expressiva, da kundalini,
para despertar suas forças espirituais adormecidas. Quando um discípulo receptivo começa seu
relacionamento pessoal com um guru divinamente desperto, forças adormecidas são liberadas
internamente no discípulo, conforme o grau de sua receptividade. Isso pode acontecer
espontaneamente, ou o guru pode transmitir intencionalmente a força vital para o discípulo – pelo
toque, pelos olhos ou por um ato de vontade, muitas vezes durante a iniciação. Por meio da
experimentação, descobri que quando eu ficava relaxado durante a meditação, as ondas de
energia conseguiam fluir livremente, como se fossem dirigidas por uma inteligência inata, sem
causar uma reação física. Em vez disso, um tranqüilo êxtase era vivenciado, quando as correntes
fluíam em níveis mais profundos.
Poucos dias após minha chegada à Sede Central da SRF, um discípulo mais antigo, Sr.
Brockway, adoeceu. Eu, junto com outros dois ou três, fui designado para levar as refeições ao
quarto dele. Ele tinha dito para outro discípulo:
– Tenho grande respeito pelo Mestre, mas não tenho a fé que vocês rapazes parecem ter. Eu
gostaria que tivesse.
Quando sua condição continuou fragilizada, ele foi levado para um hospital. O Mestre foi vêlo e voltou tarde da noite. Eu estava na entrada inferior do prédio principal junto com alguns
monges, quando ele chegou. Ele nos disse:
– Acabei de visitar o Sr. Brockway. Perguntei a ele: “Você quer viver? Se quiser, diga-me
agora mesmo, e eu o curarei.”12 Mas ele disse: “Não, senhor”. Ele perdeu a vontade de viver e
não pude ajudá-lo. Se tivesse dito “sim”, eu o poderia ter curado, e ele teria alguns anos a mais
para fazer progresso espiritual. Foi triste vê-lo daquela maneira.
O Sr. Brockway fez sua transição alguns dias depois, e eu limpei seu quarto e empacotei seus
pertences pessoais para enviá-los à sua família. Depois, sentei-me em seu quarto por alguns
minutos, para refletir sobre a precariedade e fragilidade da condição humana, e meditar na
segurança do Espírito eterno. A presença invisível, mas tangível, do Mestre permeava a quietude.
De muitas e variadas maneiras, durante aquelas primeiras semanas com Paramahansaji,
tornei-me cada vez mais consciente da assombrosa profundidade de seu estado de realização
12
Durante suas palestras públicas na década de 1920, Paramahansaji algumas vezes demonstrava seus métodos de
cura, que incluíam oração, afirmação, visualização, força de vontade concentrada e direcionamento consciente das
forças vitais. Ele enfatizava exercícios, dieta vegetariana e prática de meditação. Muitas pessoas também foram
curadas pelo sua ação silenciosa em benefício delas.
17
divina e do poder para fazer o bem que estava disponível, através dele, para quem quer que fosse
receptivo à sua disposição de oferecer ajuda espiritual em qualquer nível de necessidade. Ele às
vezes dizia aos discípulos:
– Se me permitirem, eu lhes revelarei Deus.
Uma vez, tarde da noite, o Mestre conversou em particular comigo na sala de estar de seu
modesto apartamento de dois quartos, no andar superior do edifício central. Enquanto me
abençoava e garantia que conversaria comigo de tempos em tempos, pegou uma banana de uma
tigela próxima e a deu para mim. No dormitório dos homens, alguns minutos depois, sentado em
minha cama e refletindo na boa sorte que era ter o Mestre como meu guru, comi lentamente a
banana, inclusive a casca, porque não queria me privar de quaisquer bênçãos que fluíam de suas
mãos.
Uma nova edificação, que o Mestre chamou de India House, estava então sendo construída
ao lado do templo de Hollywood. Um restaurante vegetariano ficava no nível da rua, uma sala de
confraternização no andar inferior seria utilizada para propósitos sociais e culturais. Quando as
paredes de concreto estavam sendo sedimentadas, todos os monges foram designados para o
projeto. Bernard Cole,13 um ministro sênior da SRF, chegou no final de uma tarde para examinar
o trabalho em andamento. Quando passou por mim, ele disse:
– O Mestre quer vê-lo esta noite. Esteja no corredor do porão, próximo ao elevador, às sete
horas.
Depois do jantar, sentei-me em silêncio, sozinho no local indicado, com espírito meditativo.
Fisicamente cansado, mas mentalmente alerta, aguardei duas horas, no silêncio da noite.
Finalmente, às 9 horas, pensando que o Mestre fora detido por outros assuntos mais importantes,
fui para o dormitório e peguei no sono.
– Onde você esteve na noite passada? – A inesperada pergunta foi dirigida a mim por Bill
Brown, um dos monges mais novos. – O Mestre precisou sair ontem à noite e retornou tarde. A
primeira coisa que me perguntou quando chegou foi: “Onde está Roy?” Quando me ofereci para
procurar você, ele disse que o veria mais tarde.
Fiquei desapontado e envergonhado por minha falta de paciência algumas horas antes.
Naquela tarde, Bernard me procurou de novo e informou:
– O Mestre quer vê-lo – ele disse. – Mesma hora, mesmo lugar.
Naquela noite, às 7 horas, reassumi minha vigília. Após eu ter esperado pacientemente por
quase duas horas, o carro do Mestre foi trazido até a entrada do prédio e uma bagagem foi
colocada no porta-malas. Havia comentários de que ele iria para seu retiro em Twenty-Nine
Palms, três horas de carro a leste de Los Angeles, e ficaria lá por vários meses.
Por muitos anos, era rotina de Paramahansaji retirar-se ocasionalmente da atividade
organizacional e ir para a solidão, meditar e concentrar-se em seus projetos literários.
Trinta ou mais discípulos alinharam-se no corredor para prestar ao guru uma afetuosa
despedida. Não demorou muito e alguém anunciou que o Mestre estava falando ao telefone e não
iria partir até a manhã seguinte. A bagagem foi retirada e o carro voltou para a garagem; os
discípulos se dispersaram e fiquei novamente sozinho, desta vez firmemente resolvido a
permanecer lá a noite inteira, se necessário. Não precisei esperar muito.
13
Bernard Cole (1922-1979) conheceu Paramahansa Yogananda em 1939 e foi ministro da Self-Realization
Fellowship em finais da década de 1940 e início da década de 1950. Ele deixou a organização em 1955 para
ensinar de maneira independente por algum tempo e, depois, trabalhou por vários anos nos campos da eletrônica e
da engenharia.
18
Ouvi o elevador descer, e parar. Quando a porta deslizou e se abriu, o Mestre espiou para
fora, me viu, abriu um amplo sorriso e exclamou com exuberância:
– Aí está meu menino!
– Venha comigo, Roy – ele me convidou, enquanto andava rapidamente até o quarto de
Bernard. Batendo na porta, ela logo se abriu e nós entramos. Clifford Fredericks, um discípulo
residente mais antigo, também estava lá.
O Mestre, vestido como se fosse sair para caminhar, estava mordiscando algumas amêndoas
de sua mão cheia delas. Notando minha curiosidade, ele observou:
– Oh, esta é a primeira coisa que como hoje.
No quarto de Bernard, o Mestre pediu para que eu me ajoelhasse diante dele, e segurou
minha mão direita na sua. Em tom de voz gentil e paternal, disse diretamente para mim:
– Anos atrás, quando Sri Yukteswar me aceitou como discípulo, ele disse: “Prometo a você
meu amor eterno e incondicional. Não importa o que você faça, ou deixe de fazer, eu o amarei
para sempre.” – O Mestre fez uma pausa. Segurando minha mão com mais firmeza ainda, disse:
– Roy, do mesmo modo, eu prometo a você meu amor eterno e incondicional. Você pode
prometer esse mesmo amor para mim?
– Sim, senhor – garanti a ele. Minha voz parecia ecoar em minha consciência, como se fosse
pronunciada numa imensa câmara de espaço infinito, intemporal.
Quando fiquei em pé, o Mestre colocou a mão em minha cabeça, num gesto de bênção, e
fitando meus olhos, perguntou:
– Você fará o que eu pedir?
Minha resposta foi imediatamente afirmativa.
– Quero que você vá para Fênix. Temos um novo projeto lá. O clima ainda fará bem para sua
saúde. Bernard irá levá-lo para a estação de trem pela manhã.
Após confirmar o horário do trem com Bernard, o Mestre sugeriu que eu fosse descansar um
pouco e me pediu que lhe escrevesse freqüentemente e o visitasse pelo menos a cada dois meses.
19
CAPÍTULO TRÊS
Observações e Recordações de um Discípulo
Em Fênix, fui recebido por Herbert Freed,1 o ministro do Centro da SRF2 que tinha sido
inaugurado pelo Mestre no fim da década de 1940. Localizado na West Monroe Street, 1800, a
duas quadras da sede do governo estadual, a casa de um pavimento possuía quatro modestos
cômodos, e uma capela na qual os serviços dominicais e de meio de semana eram ministrados.
A mãe de Bernard estava visitando Fênix por alguns dias e havia preparado uma refeição
leve. Na mesa da cozinha, Herbert me contou acerca do “novo projeto”: produção de leite de
cabra. Enquanto comíamos, Herbert iniciou uma explicação detalhada sobre a venda de laticínios,
exaltou as virtudes do leite de cabra e predisse um sucesso glorioso para o empreendimento. Um
ano ou dois mais velho que eu, Herbert era, obviamente, um visionário. Seu entusiasmo,
aparentemente ilimitado, era contagiante e gostei dele imediatamente.
A Fazenda de Leite de Cabra Rosebud, situada a aproximadamente cinco quilômetros de
Scottsdale, Arizona, que na época era um pequeno vilarejo com uma só sinaleira, havia sido
comprada por Sr. Lynn. Uma pequena casa, um estábulo e um rebanho de vinte cabras
compartilhavam o terreno de cinco acres. Poucas semanas depois de minha chegada, três novos
estábulos de argila foram construídos e, para aumentar a produção de leite, oitenta cabras foram
compradas de um produtor californiano.
Preparei um pequeno altar em um canto de meu quarto privativo, no qual coloquei
fotografias emolduradas do Mestre e de minha linhagem de gurus. Antes do amanhecer e tarde da
noite, eu me sentava lá, diante do altar, e meditava. Utilizava as técnicas que tinha aprendido e
aplicava os preciosos aconselhamentos que o Mestre me dera, bem como aqueles que tinha
ouvido ele dar para outros. Minhas meditações se tornaram consistentemente mais satisfatórias e
eu devotava duas ou três horas por dia para praticar.
Muitas interessantes percepções meditativas aconteceram, sempre que eu conseguia estar
mais descontraído e plenamente dedicado aos processos de meditação. Numa noite, após mais de
uma hora de concentração interior, tornei-me consciente de mim mesmo como um ponto de
consciência localizado próximo do segundo chakra, na parte inferior da coluna vertebral. Pude
ver o lado de dentro de meu corpo: órgãos internos, sistema circulatório, músculos, ossos,
sistema nervoso e o cérebro, todos iluminados por uma luz branca radiante. Parecia uma
percepção perfeitamente natural e fui capaz de observar vários processos fisiológicos com
interesse desapegado. Após alguns instantes, senti como se estivesse me expandindo, até que
voltei novamente a ficar identificado com meu corpo físico.
Freqüentemente tive visões do que pareciam ser reinos astrais; algumas visões pareciam ser
resultado de memórias da vida passada. Às vezes, Babaji, Lahiri Mahasaya, Sri Yukteswar, o
Mestre e seres luminosos desconhecidos apareciam momentaneamente em meu olho espiritual.
Por vezes, minha consciência parecia estar tão expandida que incluía o cosmos, em uma
1
Herbert Freed (aprox. 1929-1994) foi o ministro residente do Centro da SRF em Fênix de 1949 a 1952. Após dois
anos de serviço militar no Exército Americano (1954-1956), ele formou uma pequena firma de consultoria
empresarial na Flórida e foi posteriormente um agente da liberdade condicional dos jovens em Los Angeles, onde
ele e sua esposa também providenciavam lares para crianças abandonadas.
2
O Templo da Self-Realization Fellowship em Fênix, Arizona, fica situado na Avenida North Central, 6111. O
primeiro Centro da SRF em Fênix, localizado na Rua West Monroe, 1800, foi inaugurado por Paramahansa
Yogananda em 1948.
20
combinação de reinos celestiais: astral e causal. Algumas dessas percepções podiam ter sido
fenômenos mentais ilusórios produzidos pelo cérebro e reforçados pela imaginação;3 muitas,
todavia, eram vividamente reais – ou tão “reais” quanto quaisquer fenômenos neste lado da Esfera
Transcendental podem ser.
O Mestre me havia aconselhado anteriormente: “Permaneça em sintonia comigo e serei capaz
de ajudá-lo. Quando você está agitado ou com dúvidas, isso causa uma estática no seu rádio
mental que torna mais difícil para mim ajudá-lo. Portanto, fique sintonizado comigo.”
Enquanto falava com um pequeno grupo de discípulos, ele disse: “Quando estiverem em
sintonia comigo, vocês podem estar em sintonia com Deus”. Compreendi que ele estava nos
dizendo que, devido ao fato de estar sempre consciente de Deus, ao nos sintonizarmos com ele,
automaticamente estaríamos também conscientes da realidade de Deus.
Na companhia de meu guru eu estava sempre consciente de sua pureza inata, do poder que
fluía através dele, proveniente de um reservatório de força infinita, invisível, porém intuitivamente
sentido, e de sua sabedoria. Aprendendo a estar sintonizado com sua consciência, quando me
encontrava ausente de sua presença física, essa mesma pureza, poder e sabedoria continuavam a
meu alcance.
Com efeito, experimentei que quando eu estava mental e espiritualmente em harmonia com
Paramahansaji, sentia-me interiormente em paz e minhas meditações eram mais frutuosas.
Também descobri que ele conhecia meus pensamentos e sentimentos, mesmo quando estávamos
fisicamente separados por muitos quilômetros. Durante raras ocasiões em que experimentei
breves episódios de apatia ou desânimo, ele me enviava uma carta concisa ou um bilhete, escritos
à mão. Invariavelmente, suas palavras confirmavam seu conhecimento preciso de minhas
condições internas e circunstâncias pessoais.
Durante meu primeiro ano de discipulado, variações ocasionais de humor perturbaram minha
paz interior com pensamentos de que Deus não estava respondendo às minhas orações, ou de que
eu tinha um longo caminho pela frente e a libertação de minha consciência poderia não acontecer
tão cedo. Em um desses episódios ocasionais, o Mestre me enviou pelo correio uma breve nota,
escrita de próprio punho: “Querido Roy. Você está se fazendo infeliz cedendo à melancolia e
tocando em sua mente um disco fonográfico de pensamentos negativos. Por que você não quebra
esse disco e se liberta?” Era verdade que meus intervalos de melancolia eram uma forma de
comodismo. Suas palavras práticas e sua graça me permitiram afastar esse hábito autolimitador.
De tempos em tempos, o Mestre pedia que eu o visitasse, geralmente em seu retiro no
deserto, onde havia duas casas modestas em terrenos adjacentes. Uma delas era a sua residência;
a sala de estar era usada para escrever, processar a correspondência e reunir-se com discípulos
que eram convidados a estar com ele. Algumas de suas discípulas, que datilografavam suas cartas,
transcreviam e editavam seus escritos, moravam na outra casa. Os discípulos homens que faziam
o trabalho de manutenção ou que estavam visitando o Mestre dormiam em uma cabana distante
alguns quilômetros.
Durante uma de minhas visitas a Twenty-Nine Palms, enquanto ajudava um discípulo mais
velho a segurar a tela de arame na parede da garagem para receber o gesso, o Mestre caminhava
por perto e entrou para conversar. Alguns metros adiante de onde ele estava parado, havia uma
pequena piscina que havia sido recentemente construída para seu uso. O Mestre pediu ao outro
discípulo:
3
Quem medita precisa aprender a discernir a diferença entre fenômenos produzidos pela mente e as experiências
que são o resultado de um autêntico despertar espiritual. Alguns cientistas acreditavam que as conexões entre as
células cerebrais são formadas no início da vida e não se modificam mais. Atualmente se sabe que a meditação
pode modificar os circuitos cerebrais. Paramahansa Yogananda costumava dizer que o cérebro pode ser
desenvolvido pela meditação, a prática do pranayama de Kriya e o uso intencional e criativo da mente.
21
– Jerry, pegue a bomba na garagem e esvazie a piscina.
Para meu total espanto, Jerry nem sequer afastou os olhos de seu trabalho. A resposta
aparentemente desinteressada foi:
– Não posso fazer isso agora, senhor. Estou muito ocupado com este trabalho.
Virando-se para mim, o Mestre perguntou:
– Você pode esvaziar a piscina, Roy?
Atendendo a seu pedido e seguindo suas instruções, encontrei dois baldes de vinte litros e
uma pequena corda na garagem, e fui realizar a tarefa.
Amarrando a corda em um balde, eu tirava água da piscina, despejava no segundo balde,
enchia novamente o primeiro e carregava os baldes até uns arbustos e plantas próximas. Várias
horas depois, descobri que mesmo uma pequena piscina pode conter muitos milhares de litros de
água. No meio da tarde, com as mãos calejadas e músculos cansados, fiquei feliz ao ver que o
nível da água na piscina havia sido significativamente reduzido.
Na manhã seguinte, enquanto me preparava para continuar a tarefa, o Mestre saiu de sua
casa. Do lugar em que ele estava no pátio, a piscina aparentava estar vazia.
– Meu Deus! – ele exclamou – Olhe o que Roy fez!
Quando chegou mais perto, ele viu a água que ainda permanecia na piscina. Sem olhar para
trás para confrontar-se com o discípulo que estava trabalhando na parede da garagem, o Mestre
simplesmente ergueu a voz e ordenou:
– Jerry, pegue a bomba e termine de secar a piscina!
Jerry moveu-se com assombrosa rapidez para obedecer.
Alguns dos meus momentos mais memoráveis naquelas visitas com o Mestre aconteciam nas
primeiras horas do entardecer, quando ele caminhava ao longo do perímetro da propriedade e
convidava os outros para caminharem com ele. Às vezes, ele caminhava sozinho comigo. Se
notasse um pedacinho de papel no chão, pedia-me para recolher. Ocasionalmente, quando via
alguma pedrinha, chutava para alguns metros adiante, como faria uma criança por diversão.
Algumas vezes, caminhávamos em silêncio, ocasionalmente de mãos dadas. Em outras, ele falava
sobre Deus e me encorajava a viver uma vida de inspiração divina.
Durante uma de nossas caminhadas, ele atraiu minha atenção para uma montanha próxima.
– Vê aquela montanha lá adiante? – perguntou, apontando-a com sua bengala. – A maioria
das pessoas, quando olha para ela, enxerga apenas uma massa de terra e pedras – ele disse. –
Quando olho para ela, vejo Deus.
Após termos caminhado em silêncio por vários minutos, ele perguntou se eu tinha alguma
pergunta.
Eu raramente me dirigia ao Mestre com perguntas; apenas estar em sua presença já era
suficiente. Naquela ocasião, entretanto, uma pergunta com relação a alguns dos santos sobre os
quais ele tinha escrito em sua autobiografia surgiu em minha mente.
– Senhor, quantos santos, daqueles que são mencionados em seu livro, estão agora
totalmente libertos? – perguntei.
Sua resposta foi imediata.
– Não muitos. Alguns santos ficam tão satisfeitos com a bem-aventurança da comunhão
divina que não aspiram ultrapassar esse estágio. Eles se esquecem da decisão de alcançarem a
22
libertação. Podem permanecer absortos nessa bem-aventurança durante milhões de anos antes de
transcendê-la na completa realização divina.
Após uma pausa, ele disse:
– Desta vez, você deve percorrer o caminho inteiro.4
Em uma das minhas primeiras visitas com ele, aconteceu um incidente aparentemente casual,
porém transformador. Antes de sair para Twenty-Nine Palms, eu vinha sentindo algumas dores
ocasionais em meu peito e braço esquerdo, geralmente após um dia de extenuante trabalho físico
na leiteria.
Enquanto conversávamos assim que cheguei, ele perguntou:
– Como estão seus pais? – Antes de ele terminar de falar, tendo entendido erroneamente sua
pergunta como sendo: “Como está sua dor?”, respondi impulsivamente:
– Não está tão ruim agora, senhor.
Com uma expressão de preocupação no rosto, ele perguntou:
– O que não está tão ruim agora?
– Esta dor que venho sentindo vez por outra – eu lhe disse.
– Você tem dor? – ele insistiu.
Quando tentei começar a descrever os sintomas, ele tocou meu peito com a mão e disse:
– Você ficará bem agora – e mudou o assunto de nossa conversa. Não tocamos novamente
no assunto. Nem os sintomas retornaram.
Tive muitas oportunidades de observar as várias maneiras pelas quais o Mestre influenciava e
instruía beneficamente seus discípulos, geralmente de maneira direta, mas às vezes sutilmente.
Suas boas maneiras e padrões de comportamento eram exemplares. Sempre bem arrumado, seu
corpo emanava uma agradável fragrância. Estar em sua presença era inspirador. Durante o
transcurso de uma conversa casual, ele podia dizer algo que era significativamente relevante para
a necessidade do ouvinte naquela hora. Quando um discípulo se comportava mal e uma
admoestação direta se fazia necessária, ele não hesitava em dizer o que precisava ser dito nem em
fazer aquilo que precisava ser feito para corrigir a situação. Sei disso por experiência própria.
Enquanto estive na fazenda leiteira em Scottsdale, Herbert algumas vezes me pedia para fazer
as entregas de leite quando ele não pudesse devido a suas outras tarefas. Quando andava de carro
pelo vilarejo de Scottsdale, notei uma livraria e cedi ao impulso de fazer uma parada lá. Folheei
um livro no qual eram vividamente descritas as experiências místicas de um santo que vivera na
Índia no final do século 19, e fiquei totalmente fascinado. Sabendo que o Mestre tinha conhecido
o autor e já havia falado favoravelmente sobre o santo, comprei o livro.
Sentindo-me um tanto culpado por ter-me lembrado da recomendação do Mestre para que
lesse apenas seus escritos e alguns outros livros que ele recomendou durante o primeiro ano5 que
4
O conselho de Paramahansaji para que eu aspirasse a ser totalmente liberto ao invés de me satisfazer com o
prazer prolongado dos estados meditativos está em conformidade com os ensinamentos de Patânjali nos Yoga
Sutras.
5
O conselho de meu guru para que eu lesse apenas literatura específica durante meu primeiro ano com ele foi para
o propósito de estar em sintonia mental e espiritual com ele, bem como para adquirir informações úteis e básicas,
para então aplicá-las. Por isso sua instrução dada a mim durante nossa primeira conversa foi para que eu lesse um
pouco, meditasse mais e pensasse em Deus o tempo inteiro. Ao ler aquele livro que comprei na livraria em
Scottsdale no meu primeiro ano com ele, eu adulterei (misturei e tornei de algum modo impuros) os pensamentos
de minha mente e minha sintonia com ele. Mais tarde, conforme ele me disse, eu poderia ler mais amplamente e
discernir com mais facilidade o que seria de utilidade para mim.
23
estive com ele, mantive o livro guardado em meu quarto, onde os demais monges não podiam vêlo, e então lia sozinho todas as noites. Enquanto eu cumpria minhas tarefas diariamente, minha
mente estava ocupada com o que tinha lido na noite passada, e minhas sessões de meditação não
estavam mais tão concentradas como tinham estado antes.
Algumas semanas depois, visitei a Sede Central da SRF. Quando cheguei, o carro do Mestre
estava parado na entrada inferior. Ele estava no corredor do porão falando com vários discípulos
enquanto caminhava em direção ao carro. Ele olhou em minha direção, mas desta vez não me
cumprimentou, como era seu costume fazer sempre que eu voltava de alguma viagem mais longa.
Eu estava parado perto, no momento em que ele ia entrando no carro. Sem olhar para mim, ele
falou tranqüilamente para todos:
– Roy é um prostituto espiritual. – Ele provavelmente quis dizer “adúltero”; a palavra que
utilizou causou um impacto mais forte.
Sem dar qualquer explicação aos demais, ele olhou para mim.
– Existe uma razão quando lhe pedi que lesse apenas determinados livros durante seu
primeiro ano. Daqui a um ou dois anos, quando seu discernimento estiver melhor aprimorado,
você poderá ler qualquer coisa sem ficar confuso. – Após um momento de silêncio, ele
perguntou:
– Você está bem, agora?
Quando assenti com a cabeça, ele falou:
– Esse é o meu menino.
Herbert admitiu mais tarde que tinha visto o livro que eu lia e contou para o Mestre. O
Mestre não aprovava fofocas; contudo, gostava de ser informado sobre assuntos relevantes.
Quando o Mestre perguntava: “Como está Roy?”, Herbert fazia algumas vezes um assunto que eu
considerava de menor importância parecer um grande problema.
O conhecimento adquirido de fontes confiáveis pode ser útil; o conhecimento Auto-revelado,
experimentado diretamente, é iluminador. Durante uma conversa com um devoto que fez muitas
perguntas sobre Deus e o caminho espiritual, Paramahansa Yogananda disse:
– Você me lembra uma pessoa que fala o tempo todo em comida, mas não come. Por que
você não medita e “prova” Deus de verdade, por si mesmo?
Em uma ocasião, para um discípulo que se comportava de maneira inapropriada,
Paramahansaji disse:
– Por que você diz aos outros que é meu discípulo, se se recusa a fazer o que lhe digo para
seu próprio bem?
Em outra ocasião, referindo-se a certos discípulos que residiram na Sede Central da SRF,
mas depois de alguns meses começaram a dar sugestões não-solicitadas a respeito de como a
organização deveria ser administrada, Paramahansa Yogananda disse:
– Algumas pessoas vêm aqui e querem nos reformar, antes de mudar a si mesmas.
24
É essencial que o discípulo seja receptivo ao aprendizado e esteja disposto a aplicar o que
aprendeu. Nunca discuti com meu guru; quando ele falava comigo, eu escutava suas palavras com
atenção alerta e procurava compreender o significado do que me dizia. Muito do que ele ensinava
era subentendido (sugerido indiretamente) e comunicado por sua presença e comportamentos.
Descobri que quando eu estava sintonizado com a consciência e a mente dele, tinha acesso à sua
percepção interior e sabedoria, e podia discernir intuitivamente seus pensamentos e intenções,
quando ele então reconhecia por um gesto, um olhar, um comentário verbal ou uma breve carta
ou bilhete escritos à mão.
Em alguns bilhetes ou cartas endereçados a mim, embora Paramahansaji fosse sempre
apoiador e incentivador, suas instruções eram específicas e freqüentemente francas. Poucos meses
depois de chegar a Fênix, na tentativa de aprimorar minha compreensão da filosofia e das práticas
da Kriya Yoga, tive uma longa conversa com Herbert. Equivocadamente, Herbert presumiu que
eu estava tendo dúvidas e (descobri mais tarde) informou nosso guru sobre a conversa. Pouco
depois, recebi uma carta manuscrita de Paramahansaji, que estava em reclusão em Twenty-Nine
Palms:
“Querido Roy: Dúvidas são como estáticas no rádio mental que interferem no fluxo das
bênçãos de Deus”. O segundo parágrafo foi duro: “Ou você fica conosco cem por cento, ou não
fique conosco”. No último parágrafo, ele me assegurou de seu continuado apoio e boa vontade,
assinando: “Bênçãos incessantes, P.Yogananda”.
Imediatamente, enviei uma carta ao Mestre, afirmando meu amor a ele e meu compromisso
com o caminho da Kriya Yoga.6
Em Fênix, Herbert me disse que iria pedir ao único membro abastado de nosso Centro para
doar dinheiro para duas latas de tinta a fim de pintarmos uma das salas do templo. Poucas
semanas depois, quando perguntei a ele quando poderíamos começar o projeto, ele respondeu:
– Ainda não pedi a doação. Estou aguardando até o momento em que eu achar que ela estará
receptiva à idéia.
Algumas semanas depois, quando Herbert foi para a Califórnia, utilizei parte do meu salário
para comprar a tinta e completei o projeto. Quando ele retornou para Fênix e viu o que eu tinha
feito, não ficou nem um pouco satisfeito.
Visitei o Mestre em seu retiro no deserto algumas semanas mais tarde. Após ter falado
comigo por alguns instantes, ele assumiu uma expressão paternal do tipo: “Agora, filho, preciso
discutir um assunto sério com você, seu menino travesso”, e então me disse:
– Herbert me contou sobre o projeto da pintura. Quando você aprenderá a perder sua
impulsividade? – Então, sorrindo, ele dirigiu nossa conversa para outro rumo.
– A vida precisa ser vivida de alguma maneira – ele dizia. – Por que então não vivê-la da
maneira mais elevada? Vocês podem me mostrar a obra de arte mais linda, mas, se eu quisesse,
6
No caso acima, não se trata de que Paramahansaji tenha lido errado meus pensamentos ou intenções. Muitas
vezes, suas palavras e ações indicavam que ele sabia tudo sobre mim. Essa história envolvia outra pessoa que
havia, com boas intenções, informado a meu guru de suas preocupações a meu respeito. Foi essa pessoa que me
interpretou mal. Penso que Paramahansaji escreveu o bilhete para completar o ciclo da comunicação (ou para
eliminar a possibilidade de mal-entendidos) e recordar-me da importância do compromisso firme com o caminho
do discipulado. Aquela era também uma fase da vida dele, um ano ou dois antes de sua morte, em que, como ele
mesmo disse, estava “fazendo uma faxina” – confrontando alguns discípulos para encorajá-los a demonstrarem de
maneira mais clara seu envolvimento com o discipulado e os ideais e propósitos da organização, ou então irem
embora. Em todo caso, como qualquer outra pessoa, ao atuar no “nível da consciência exterior” mesmo alguém
iluminado pode cometer erros intelectuais. O que nos confere benefícios redentores em nossa relação com o guru
não são as características de sua personalidade, mas o seu estado interno de realização e a transmissão da força
espiritual.
25
encontraria algum defeito nela. Porém, por que eu faria isso? Sempre olhem para o lado bom das
coisas.
Em outra ocasião, conhecedor do meu desejo intenso de ser Auto-realizado, o Mestre disse:
– Você precisa querer Deus com tamanha intensidade que não poderá esperar sequer mais
um dia para ter realização divina, mas também deve ter paciência se Deus não responder nesse
dia.
Certa vez, eu estava me sentindo frustrado, mas não sabia direito precisar o motivo. Eu tinha
todas as razões para ser feliz, mas não era, e não sabia o que fazer para solucionar o problema.
Telefonei para Faye Wright e pedi para falar com o Mestre. Ela me disse que fosse ao Eremitério
da SRF em Encinitas, e ela diria ao Mestre que eu havia telefonado.
Na noite seguinte, no Centro de Encinitas, fui até o Eremitério. Leo Cocks, 7 um
condiscípulo, estava comigo. O Mestre entrou na sala e sentou-se no sofá. Conversou brevemente
com Leo e então lhe pediu que fosse para outra sala.
Fazendo um sinal para que me sentasse ao lado dele, perguntou gentilmente:
– Qual é o problema?
Através de um rio de lágrimas que repentinamente afluíram, eu disse:
– Não sei.
Ele pôs seus braços a meu redor, puxou-me para perto e me segurou enquanto eu chorava
em seu ombro. Quando a torrente de lágrimas secou, ele perguntou:
– Você está bem agora? – Eu estava.
Ele chamou Leo, disse quem iria nos levar até a rodoviária em San Diego, abençoou a nós
dois com ternura e nos mandou de volta para Fênix naquela noite.
O Mestre era usualmente franco em suas comunicações conosco. Em outras ocasiões, podia
falar com uma pessoa para que os outros presentes também pudessem se beneficiar. Em uma
dessas vezes, já era tarde e a noite estava escura. Eu estava com três condiscípulos ao portão, na
frente da casa do Mestre, preparando-nos para voltar a nossos quartos, quando ele saiu para falar
conosco por alguns minutos. Algumas discípulas estavam com ele. Ele usava uma pequena
lanterna, que desligou assim que chegou ao local onde queria. Após conversar por vários minutos,
ele dirigiu o facho da lanterna para meu rosto e ficou segurando firme. Então muito gentilmente,
porém alto o suficiente para todos ouvirem, ele disse:
– Roy, quando você veio a mim pela primeira vez, eu perguntei aos demais (alguns deles
estavam presentes): “Devemos aceitá-lo, ou mandá-lo embora?” Sabe o que responderam?
– Não, senhor – respondi, sem saber para onde a conversa estava indo.
O Mestre prosseguiu:
– Disseram: “Ele esteve doente antes, e talvez fique doente de novo”.
Ele fez uma pausa, permitindo que alguns momentos de absoluto silêncio pairassem no ar.
Todos estavam calados. Então:
– Mas eu olhei em seu coração, e disse: “Ele fica”.
Após uma breve pausa, ele encerrou a conversa com:
7
Leo Cocks (8/9/1929-) tornou-se membro da ordem monástica da SRF em 1950 e trabalhou comigo na produção
de leite de cabra em Scottsdale, Arizona, por vários meses. Pouco depois do mahasamadhi de nosso guru, ele se
mudou para San Francisco, trabalhou por vários anos e continuou suas práticas espirituais. Após a aposentadoria
dele e de sua esposa, ambos se mudaram para Encinitas, na Califórnia.
26
– Boa noite, Roy.
O facho da lanterna foi então dirigido para o chão, e o grupo se dispersou. Ninguém disse
nada por um bom tempo.
Meu guru, na tradição siddha de mestres iluminados, conseguia discernir facilmente a
condição cármica8 de seus discípulos e de outras pessoas que encontrava. Ele dizia: “Não estou
interessado em ter uma organização só para atrair um enorme séqüito. Uma organização como a
nossa é a colméia; Deus é o mel. Uma organização sem o mel de Deus não tem valor. Só estou
interessado no bem-estar das almas.”
Meu guru não viera à América para fundar uma nova religião, ou para se promover como
salvador a ser idolatrado ou cultuado. Queria que todos que fossem capazes de compreender e
aplicar o que ele ensinou despertassem do que ele chamava “o sonho da mortalidade” e fossem
tão iluminados e livres como ele era. Embora fundasse uma organização para expandir e
perpetuar a sua missão, sempre dizia que as almas eram mais importantes que as instituições; que
os esforços religiosos organizados, se não fossem animados pelo Espírito de Deus e
administrados por trabalhadores altruístas, eram de pouco ou nenhum valor real para os
indivíduos e a sociedade.
Durante uma de minhas caminhadas noturnas com meu guru, em seu retiro, ele me disse:
– Você tem muito bom carma, Roy, ou não estaria aqui comigo. Aproveite ao máximo a sua
oportunidade [de conhecer Deus].
À medida em que fui me tornando cada vez mais consciente das sutis transformações que
estavam acontecendo, percebi como o Mestre examinava ocasionalmente os discípulos para
discernir a condição interna deles e o grau de consciência espiritual que atingiram. Ele me fitava
desse jeito quando eu o visitava. Se eu estivesse meditando profundamente e minha mente estava
bem-organizada, ele dizia:
– Veja como você está se tornando mais tranqüilo e amando a Deus. Continue fazendo o que
tem feito.
Se eu não estivesse tão centrado espiritualmente quanto gostaria de estar, ele dizia:
– Medite mais, Roy. Mergulhe profundamente no oceano de Deus. Reze a Deus. Diga a Ele:
“Senhor, só quero a Ti”. Você chegará lá.
Em 1950, durante uma de nossas caminhadas noturnas, ele me falou:
8
Carma é a palavra usada para indicar influências causativas, como pensamentos habituais, intenções, desejos,
anseios, nossas tendências para reagir a acontecimentos e circunstâncias, em vez de responder a eles de modo
racional, e o acúmulo de lembranças e impressões subconscientes que influenciam (ou têm o potencial de
influenciar) os pensamentos, humores e comportamentos. Enquanto somos afetados por tais influências, não somos
verdadeiramente Autodeterminados. Nossos pensamentos, humores, comportamentos e estados de consciência
devem ser sabiamente regulados. O que pretendemos experimentar ou realizar deve ser sabiamente escolhido.
Todos os desejos devem ser monitorados para que decidamos quais aqueles que têm valor. Anseios doentios devem
ser renunciados. Devemos reagir de maneira construtiva e apropriada aos eventos que ocorrem e às circunstâncias
que surgem. Lembranças devem ser vistas como meras impressões de experiências passadas. As influências das
impressões subconscientes que sejam incômodas devem ser neutralizadas. Crenças falsas e ilusões devem
renunciadas. Um modo efetivo de resistir, enfraquecer e eliminar influências subconscientes é assumir atitudes
mentais, sentimentos e estados de consciência que sejam mais inspiradores, e colocar em prática comportamentos
construtivos. As influências superconscientes resistem, enfraquecem e neutralizam de maneira eficaz as influências
do carma desagradável.
Paramahansaji freqüentemente lembrava seus discípulos para evitarem pensar neles mesmos como vítimas do
carma. Um devoto de Deus deve controlar seus estados mentais, emoções e comportamentos pelo uso construtivo
da força de vontade.
27
– Você quase morreu no ano passado, mas seu amor a Deus o puxou de volta. Você tem uma
nova vida agora; deve aproveitar o máximo dela.
Após um momento de reflexão, em um tom de voz que indicava uma leve surpresa, como se
uma intuição acabasse de surgir em sua consciência, ele disse:
– Você morreu jovem da última vez, também.
Perguntei a ele:
– Já estive com o senhor antes?9
Ele respondeu:
– Como poderia estar comigo agora se já não houvesse estado antes? É claro: você já esteve
comigo antes, e estará comigo muitas vezes no futuro. Você veio, assim como vieram alguns
outros, para me ajudar neste trabalho.
Um discípulo mais antigo certa vez perguntou ao Mestre:
– Roy não seria novo demais para estar sozinho lá em Fênix?
O Mestre o repreendeu:
– Você deixe o meu menino em paz. Eu sei o que estou fazendo.
Por vezes, quando precisava corrigir o comportamento de um discípulo, ele também poderia
dizer: “Só o repreendo porque desejo o melhor para você. Agrada-me quando você compreende
o que eu digo. Fico ainda mais satisfeito quando compreende, sem que eu tenha de dizer. Eu
quero que vocês sejam tão fortes quanto eu.”
Para um jovem discípulo que perguntou: “Por que minha mente é tão inquieta?”, o Mestre
respondeu:
– É porque você fala muito.
O Mestre se doava sem reserva aos discípulos, de acordo com a necessidade e a capacidade
deles de receber seu conselho e suas bênçãos silenciosas. Comigo, ele sempre falava sobre Deus e
os santos, do verdadeiro sentido da vida e da importância da dedicação “cem por cento” à vida
espiritual. Ele animava e desvendava minhas aptidões espirituais, enriquecia minha mente e
fortalecia minha fé. Ocasionalmente, me dizia: “Você tem um futuro maravilhoso, Roy”.
Trabalhador incansável pela causa a que estava dedicado, sempre dirigia sua atenção para a
realização de seus objetivos. Alguns dos discípulos que trabalhavam próximos a ele eram
freqüentemente desafiados a acompanharem sua agenda de atividades. Ele dormia
aproximadamente três horas por noite, sempre se recolhendo ao quarto só muito depois da meianoite. Algumas vezes, quando conversava com um discípulo ou quando um visitante parecia
receptivo em aprender, ele os mantinha consigo até o amanhecer do dia seguinte. Todas as
manhãs logo cedo, ele meditava por três ou quatro horas antes de cumprir as obrigações da
organização. Quando envolvido em projetos, ele lhes dedicava total atenção. Seus únicos apegos
eram a Deus e ao serviço aos demais. Acerca de seus muitos projetos editoriais e de construção,
ele dizia: “Eu sempre mordo mais do que posso mastigar, e então mastigo”.
Se alguém expressasse dúvidas sobre a possibilidade ou não de seus projetos terem êxito, ou
se fizesse algum comentário negativo sobre eles, o Mestre dizia: “As pessoas quase sempre me
9
Muitas pessoas supõem que a reencarnação seja uma verdade sem terem qualquer conhecimento real sobre ela.
Uma das indicações mais confiáveis de que as almas podem reencarnar reside no fato de que muitas pessoas
espiritualmente despertas declarem que ela ocorra. Paramahansa Yogananda freqüentemente mencionava a
reencarnação, enfatizando, porém, que aquilo que é feito agora para despertar a Auto-realização é mais importante
do que aquilo que pode ter acontecido antes.
28
dizem que aquilo em que estou trabalhando não dará certo. Quando o sonho começa a se
materializar, todos querem tomar parte dele.” Quando decidia fazer alguma coisa, ele persistia. Se
alguém tentasse desencorajá-lo, poderia ouvir como resposta: “Deus me pediu para fazer!”10
Um dia, quando estava ditando seu comentário ao Bhagavad Gita, ele afirmou que
Mahavatar Babaji tinha sido um legendário santo da Índia que vivera centenas de anos antes. A
discípula que editava o manuscrito lhe disse:
– Oh, senhor, nós não podemos dizer isso: alguns leitores poderiam discordar.
Faye Wright posteriormente me contou sobre o incidente:
– O Mestre pulou da cadeira, caminhou pela sala como um leão, e perguntou: “Por que não
posso dizer isso? É a verdade! Eu só falo a verdade!”
Para uma mulher que expressou sua surpresa pelo fato de o Mestre aparentemente ter ficado
impaciente com um monge que trabalhava em um projeto de construção e ter falado asperamente
com ele, o Mestre observou:
– Nunca fico com raiva; é que eu tenho uma personalidade enérgica.
Eu fui formalmente iniciado pelo Mestre na prática da meditação de Kriya Yoga em agosto
de 1950, após oito meses de preparo sob sua orientação. Naquela ocasião, após o serviço de
iniciação, recebi dele uma bênção especial: a meu pedido, ele me ensinou a ver a luz interior.
Ele começou a cerimônia de iniciação dando as boas-vindas aos mais de duzentos discípulos
residentes e estudantes da SRF presentes, expressando sua felicidade de ver tantos reunidos para
o evento. Disse-nos que, durante seus primeiros anos em Boston, na década de 1920, apenas
pequenos grupos de pessoas assistiam às suas aulas e ele tinha mais tempo para trabalhar
individualmente com cada uma, às vezes ajudando o estudante a se concentrar no olho espiritual e
ver a luz. Ele então explicou como praticar as técnicas de meditação da Kriya e convidou a todos
para virem até aonde ele estava sentado para receber suas bênçãos. Quando cada um parava à sua
frente, ele punha a mão na testa da pessoa. Enquanto abençoava os presentes, pude ouvi-lo dizer:
– Quando toco seu olho espiritual, vejo a luz entrar em vocês. Estou introduzindo a luz em
seus corpos. Estou lhes dando tudo. Cabe a vocês receberem.
Imediatamente após a cerimônia, ajudei alguns dos meus irmãos discípulos a retirar o excesso
de cadeiras. O Mestre estava sentado em uma poltrona na frente do altar. Quando me veio à
mente o comentário que fizera sobre como ajudava os outros a verem a luz interior, fui falar com
ele e pedi que me ajudasse a vê-la.
Pondo as mãos em minha testa, ele me disse que “olhasse para o olho espiritual”.
Imediatamente observei duas luzes brilhantes, de um branco prateado, em forma de meia-lua,
flutuando contra um campo de luz azul escura. Após um momento, ele disse:
– Olhe para longe.
Enquanto eu olhava fixamente para o olho espiritual, as duas luzes brancas começaram a se
fundir. Antes de se unirem completamente, fui distraído pelo som de algumas cadeiras sendo
arrastadas, e as luzes se dispersaram.
O Mestre disse:
– Vamos esperar um pouco.
Então, novamente colocando as mãos em minha testa, ele esperou até que as duas luzes
brancas reaparecessem diante de minha visão interior. Ele disse:
10
Quando Paramahansa Yogananda dizia: “Deus me pediu para fazer”, ele queria dizer que foi inspirado a fazer.
29
– Agora, olhe para longe. – Naquele momento, as luzes se fundiram e se tornaram uma só,
convertendo-se num brilhante círculo de luz branca em torno de um campo azul escuro. Enquanto
retirava as mãos de minha cabeça, ele disse:
– O que você viu representa Krishna e Radha, o Espírito e a Natureza. De agora em diante,
poderá ver essa luz sempre que quiser.
Enquanto as duas luzes apareciam, o Mestre não perguntou o que eu estava vendo, nem
mesmo ofereceu conselho até o momento crítico, quando disse: “Olhe para longe”.
A luz, que pode ser vista quando a mente estiver tranqüila e a atenção estiver concentrada na
região frontal e superior do cérebro, é produzida pela convergência das correntes ascendentes da
força vital. O campo magnético que emanou das mãos do Mestre, bem como sua intenção
concentrada, atraíram minha atenção e as forças vitais mais fortemente para o olho espiritual.
Antes da iniciação (durante a qual uma forma dinâmica de pranayama é ensinada, juntamente
com orientações básicas para viver uma vida centralizada em Deus), o buscador da verdade no
caminho da Kriya Yoga aprende técnicas de meditação preliminares: oração, mantra e
contemplação da correnteza do som interior. Em outras tradições de ioga, técnicas diferentes
podem ser enfatizadas, segundo a própria experiência e compreensão do instrutor.
Em 1950, o Santuário do Lago da SRF foi inaugurado. Goodwin J. Knight, então vicegovernador da Califórnia, e outros convidados ilustres foram apresentados, uma porção das
cinzas de Mahatma Gandhi foi depositada em um sarcófago de pedra e três discípulos
demonstraram posturas de ioga. Enquanto assistia aos eventos, eu estava preocupado com um
assunto particular.
Alguns dias antes, em Fênix, enquanto me preparava para ir à Califórnia para estar na
inauguração do Santuário do Lago, decidi que, quando falasse com o Mestre, lhe pediria que me
desse a experiência do samadhi. Quanto mais eu pensava nisso, tanto mais certeza tinha de que
isso aconteceria, e comecei a me preparar com meditações profundas e praticando mais
pranayamas de Kriya, na esperança de aumentar minha receptividade.
Durante a viagem noturna para a Califórnia, sentei-me na última poltrona do ônibus onde
poderia ficar sozinho. Entre pequenos cochilos, pratiquei Kriya e meditei.
No Santuário do Lago, após o término da programação, o Mestre conversava amavelmente
com alguns amigos e discípulos. Esperei até que ele estivesse sozinho, e me aproximei. Tocando
seus pés,11 perguntei:
– Senhor, poderia me conceder o samadhi?
– O que você disse? – ele perguntou, obviamente surpreso.
Quando repeti meu pedido, ele sorriu, segurou meu topete, virou-se para Sr. Lynn que estava
sentado a seu lado, e disse:
– Ele quer samadhi.
O Sr. Lynn sorriu e murmurou:
– Bendito seja.
Minutos depois, estando em pé ao lado de uma das colunas dos lótus dourados, vi Sr. Lynn
passeando ao longo do caminho que margeia o lago. Quando o encarei, ele veio para onde eu
estava. Sem abrir a boca, pôs sua mão esquerda em meu peito e a mão direita em minha cabeça, e
fechou os olhos. Senti uma correnteza fluida de energia derramar-se para dentro de meu coração
e espalhar-se por todo o meu corpo. Fiquei momentaneamente sem respirar, enquanto ondas de
11
Na Índia, e em algumas outras partes da Ásia, tocar os pés de alguém é comumente um gesto de respeito.
30
êxtase permeavam meu corpo e minha consciência se expandia. Os pensamentos cessaram, e a
pura alegria tornou-se predominante. Após alguns momentos, Sr. Lynn deu um passo para trás,
sorriu afetuosamente, deu um tapinha em meu ombro e foi se juntar novamente ao Mestre.12
Em 1951, após um ano de esforço diligente, quando ficou evidente que a fazenda de leite de
cabra não teria tanto sucesso quanto previsto anteriormente, ela foi vendida e eu fui transferido
para o Centro da SRF em Fênix. Minhas tarefas eram limpar as salas, atender ao telefone, arrumar
a capela para os serviços matinais de domingo e noturnos nas quintas-feiras, e também aparar e
irrigar o gramado. Depois de alguns meses, um grupo de discussão aos domingos de noite foi
formado, usando as lições impressas do Mestre como tema, e eu fui indicado para ser o líder. Eu
também dava aulas de Hatha Yoga e ocasionalmente demonstrava as posturas em organizações
civis e na televisão local.
Antes de ser iniciado eu meditava por duas ou mais horas todos os dias, usando o mantra
hong-só e escutando a vibração de Om. Depois de ser iniciado em Kriya Yoga, estabeleci uma
nova rotina de meditação que funcionou bem para mim. Três horas da manhã, tomava banho e ia
para a capela. Após acender uma vela no altar, sentava-me em uma cadeira confortável, cantava
por vários minutos, praticava as técnicas de meditação e ficava em silêncio. A sessão matinal
prosseguia por quatro horas, até às 7 da manhã. Um curto período de meditação era feito ao
meio-dia. À noite, três horas também eram dedicadas à prática da meditação, geralmente das seis
ou sete até às dez.
Quando a meditação não fluía facilmente, eu rezava e cantava por um período maior até que
meu fervor devocional fosse despertado e minha consciência ficasse mais tranqüila. Fosse a
meditação recompensadora ou não, eu sempre ficava sentado pelo tempo pré-determinado. Fazer
isso era meu compromisso pessoal com Deus e os gurus. Exceto por raras ocasiões em que
atividades especiais demandavam minha atenção ou quando o Mestre me pedia para visitá-lo na
Califórnia, essa rotina de meditação foi mantida por aproximadamente dois anos.
Quando não estava meditando, eu estava consciente das mudanças físicas e psicológicas que
ocorriam. Meus poderes intelectuais e intuitivos de discernimento melhoraram, como também
minha compreensão dos princípios filosóficos nos quais se baseiam a prática da ioga.
Ocasionalmente, quando eu visitava meu guru em sua casa de retiro no deserto ou em Los
Angeles, ele examinava minha prática das técnicas de meditação e me dava conselho pessoal.
Nunca me perguntou a respeito de meu esquema de meditação ou de minhas experiências
internas. De vez em quando, dizia:
– Está fazendo bom progresso; seja lá o que esteja fazendo, continue assim.
Havendo escolhido a vocação monástica nesta fase de minha vida, eu não estava obrigado a
cultivar relacionamentos sociais, nem sequer lia publicações seculares ou tinha acesso a aparelhos
de rádio ou televisão. Para aprendizado e inspiração, lia os livros do Mestre, o Bhagavad Gita,
trechos da Bíblia e biografias de vários santos católicos13 que o Mestre havia recomendado.
Em uma ocasião, impaciente por querer um progresso espiritual mais rápido, conversei com
o Mestre em seu retiro no deserto. Sabendo que eu havia lido a respeito da prolongada e solitária
contemplação de Santo Antão antes que ele experimentasse sua iluminação, o Mestre aconselhou:
12
Uma pessoa Auto-realizada pode às vezes ajudar outras que sejam receptivas a se tornarem parcialmente Autorealizadas. Isso pode ser feito quando a consciência de ambas estão bem sintonizadas, ou pode ocorrer quando a
pessoa Auto-realizada transmite um fluxo de energia criadora (kundalini shakti) que temporariamente ilumina a
consciência da pessoa que a recebe. O essencial é a receptividade desta pessoa.
13
Paramahansaji ocasionalmente recomendava que seus discípulos monásticos lessem sobre a vida de alguns
místicos católicos devido a sua devoção, disciplina e comprometimento com as práticas espirituais. Ele geralmente
falava favoravelmente sobre Santa Teresa d’Ávila, São João da Cruz, São Francisco e Santo Antão.
31
– Pense em Santo Antão, Roy. Como ele foi paciente!
Naquele momento, as tribulações de Santo Antão não estavam nos primeiros lugares em
minha lista de prioridades, quando eu pensava em minhas próprias aspirações. Contudo, apesar
dos meus sentimentos quando fui até o Mestre, apenas alguns minutos com ele foram suficientes
para renovar minha autoconfiança e elevar minha consciência.
Paramahansa Yogananda aconselhava os discípulos a “meditarem cada dia mais
profundamente que no dia anterior”. Embora seja improvável que isso seja possível, a aspiração
para fazê-lo melhorará muito nossa prática da meditação. Paramahansaji freqüentemente dizia:
“Na meditação, na hora que os outros terminam, estou apenas começando”. Ele me explicou que
as técnicas de meditação eram apenas “ferramentas” para serem usadas com o propósito de
tranqüilizar a mente e interiorizar a atenção, devendo então serem postas de lado. Dizia também:
“Devoção a Deus é mais importante do que técnicas ou processos de meditação; todavia, devoção
e técnicas de meditação, juntas e corretamente praticadas, fazem uma combinação imbatível”.
Ambas proporcionam ao devoto de Deus uma oportunidade sem limites de crescimento espiritual.
Devocional por natureza, contudo buscando conhecimento e realização de Deus, sempre
notei que os descortinos e as instruções de meu guru eram práticos e coerentes. Inspirado por seu
exemplo e motivado por minha própria determinação, aderi fortemente à minha agenda de
meditação e ao estilo de vida holístico.
Um acontecimento incomum se deu durante uma sessão de meditação num domingo à tarde,
em que uma vívida experiência cósmica se revelou. Eu já estava sentado há aproximadamente
uma hora quando o som de uma porta sendo batida com força interrompeu minha concentração.
Herbert tinha começado a entrar na capela, me viu, e saiu apressadamente. Por causa da regra de
que o sossego deveria prevalecer na casa, fiquei levemente perturbado. Acalmando-me, fechei os
olhos e novamente focalizei minha atenção para dentro. De repente, eu não era mais um devoto se
esforçando para meditar; eu era um ponto de percepção em um imenso espaço azul. Minha
percepção era esférica: eu podia ver, simultaneamente, em todas as direções. Uma diversidade de
luzinhas brancas, brilhantes e longínquas, tremeluziam e preenchiam o aparentemente infinito
campo de luz azul. O oceano de consciência no qual eu repousava era tranqüilo, porém vibrante
de vida. Não havia qualquer sensação de medo ou estranheza, apenas uma percepção natural da
condição.
Após um tempo, não sei quanto, regressei à consciência do corpo. Muitas vezes desde então,
tenho experimentado percepções similares, durante a meditação e enquanto pairo no breve
intervalo entre a consciência de vigília e a sonolência.
A literatura iogue fornece informação sobre uma variedade de estados de consciência que
estão acessíveis àquele que tem vontade de descobri-los. Nos intervalos entre os estados de
consciência e entre os pensamentos que surgem e desaparecem, é possível penetrar em níveis de
consciência ainda mais sutis. Pode ser, portanto, de grande ajuda iniciar a prática de observar os
estados transicionais da consciência: do sono para a vigília, da vigília para o sono, e quando
atitudes mentais e alterações de humor ocorrem durante o dia. Com a prática, o observador
atento aos estados mentais e de consciência pode aprender a estar sempre centralizado na
percepção do Eu, a despeito das condições transicionais. Desde que é durante ocasiões de
inconsciência ou de esquecimento do Eu que a alma se torna identificada com humores, atividades
mentais e fenômenos externos, o cultivo intencional da observação desapegada de tudo que não
seja o nosso próprio Eu é útil para o crescimento espiritual.
Durante meditações prolongadas, eu às vezes via, no olho espiritual, personagens luminosos,
alguns conhecidos a mim, outros não. Graus de consciência cósmica eram espontaneamente
experimentados, mesmo quando eu estava ocupado com atividades corriqueiras. Consciente de
meu ego-personalidade, eu estava também consciente de mim mesmo e do universo como
32
existindo numa esfera de consciência ilimitada. Ao meditar, e em outras ocasiões também,
correntes poderosas de força vital fluíam através de meu corpo, contribuindo para sensações que
me faziam crer que minhas faculdades mentais estavam sendo purificadas e meu cérebro,
reestruturado. Por meio da experimentação, confirmei a eficácia da prática da ioga, e por meio de
revelações espontâneas, o conhecimento superior me foi revelado.
O Mestre me ordenou ministro em 1951. Eu estava na Sede Central da SRF com Herbert
Freed, para assistir a uma celebração especial pelos fins do outono. Na noite anterior à data em
que deveríamos retornar para Fênix, encontramos o Mestre descendo até a entrada do porão. Ele
nos convidou para acompanhá-lo até a parte superior do prédio.
Após ter discutido alguns assuntos relacionados ao Centro de Fênix com Herbert e dar
conselhos sobre certos assuntos, o Mestre pediu que eu me ajoelhasse diante de sua cadeira. Com
as mãos em minha cabeça, ele disse:
– Eu o ordeno ministro da Self-Realization. Ensine como eu ensinei, cure como eu curei, e
inicie os devotos de Deus no caminho da Kriya Yoga.
Com essas breves palavras, recarregadas pela potência de sua bênção, Paramahansa
Yogananda me ordenou como representante desta antiga tradição espiritual.
Herbert, surpreso com a referência do Mestre à iniciação em Kriya Yoga, perguntou:
– Senhor, Roy dará iniciações?
A resposta do Mestre foi enfática:
– Você também. O mesmo Deus que está em mim, está em vocês. O que eu fiz, vocês devem
fazer.
Meu guru nunca clamou para si a originalidade daquilo que ensinava, mas disse que ensinava
o que aprendeu de seu guru Sri Yukteswar, que aprendera de Lahiri Mahasaya o que este
aprendera de Mahavatar Babaji. Babaji dissera que estava apenas reapresentando ao mundo o que
fora conhecido no passado, de um modo que fosse adequado aos devotos sinceros desta era. Em
anos recentes, tornou-se moda alguns instrutores de ioga afirmarem que estão oferecendo o
ensinamento “autêntico”, às vezes sugerindo que Paramahansa Yogananda modificou o processo
para torná-lo mais aceitável aos buscadores da verdade novatos ou a pessoas que não eram
capazes ou não estavam dispostas a praticar como Mahavatar Babaji instruíra. Tais afirmações e
alegações não estão fundamentadas nos fatos. O Mestre ensinou o processo completo,
concedendo instrução pessoal a discípulos mais adiantados, quando estavam receptivos.
Eu, também, ensino o processo completo conforme o aprendi de Paramahansaji. Não afirmo
interpretar seus ensinamentos, porque o que ele ensinou é o que os santos e sábios têm revelado
através das idades. Naturalmente, o que ele ensinou foi filtrado através de sua personalidade, mas
o Mestre sempre dirigia seus discípulos para a Fonte, para Deus, e honrava todas as tradições
autênticas de iluminação espiritual. Eu o ouvi dizer: “Os discípulos freqüentemente discutem
sobre assuntos filosóficos; os mestres iluminados, porém, compreendem uns aos outros e se dão
muito bem juntos”.
Em uma ocasião, Herbert disse para o Mestre que algumas pessoas que freqüentavam os
serviços no Centro de Fênix o haviam informado que, muito embora gostassem do serviço
durante a semana, sentiam falta de um ambiente religioso tradicional e tinham vontade de ir para
uma igreja aos domingos, onde seus filhos também pudessem freqüentar. Naquela época, no
Centro da SRF de Fênix, não havia classes para crianças.
O Mestre aconselhou:
33
– Aconselhe-os a irem para uma Igreja Unitária.14 O que ensinam lá é muito parecido com o
que ensinamos. Diga-lhes que Deus está em toda parte e dentro deles. Se viverem corretamente e
meditarem, realizarão Deus.
Ao se referir aos diversos (ou à falta de) interesses e às características de personalidade das
pessoas, Paramahansaji sempre dizia: “O mundo é grande, e há espaço suficiente para todos”.
Uma vez, quando alguém criticou a conduta pessoal de certo instrutor espiritual, meu guru
disse:
– Sim, ele tem defeitos. Quase todos têm defeitos. Lembre-se, porém, que ele faz um bom
trabalho e ajuda muita gente.
Através dos anos, vários discípulos de Paramahansaji, a quem ele havia ordenado para
ensinar, terminaram por se separar dele, pensando que poderiam ter êxito sozinhos (mas não
tiveram). Só raramente, em circunstâncias privadas, ele expressava seu desapontamento; em
público, nada dizia contra eles. Ciente das fraquezas e tendências humanas, sempre se esforçava
para trazer à tona as melhores qualidades de todos.
Um swami de Los Angeles, que representava outra organização, tinha inveja da popularidade
de Paramahansaji. Ambos eram de Bengala, no nordeste da Índia. De vez em quando, meu guru o
convidava para almoçar ou jantar com ele, na sede central da SRF, supervisionando pessoalmente
o preparo da comida, e até providenciava um cinzeiro para que seu convidado, um fumante
inveterado, pudesse fumar o seu cigarro após a refeição. Tanto quanto sei, o swami nunca
superou sua inveja; mas eu sei que Paramahansaji jamais deixou de ser amável e atencioso.
A pessoas que resistiam à idéia de um relacionamento guru-discípulo, pensando
erroneamente que significasse colocarem o guru entre elas mesmas e Deus, ou a discípulos que
estavam ficando pessoalmente apegados a ele, o Mestre algumas vezes dizia: “Eu não sou o guru.
Deus é o verdadeiro Guru. Sou apenas o servidor Dele.”
Em outra ocasião, em 1951, em Los Angeles, eu estava com Paramahansaji e um pequeno
grupo de discípulos, enquanto ele nos falava da necessidade de purificarmos a consciência de ego
e, depois, renunciarmos a ela. Estávamos perto da entrada inferior do prédio da Sede Central da
Self-Realization Fellowship, quando seu carro entrou e estacionou. Ele abriu a porta de trás,
cumprimentou-nos com um caloroso sorriso e falou por vários minutos. Notei que ele estava um
tanto retirado. Devagar, como se estivesse escolhendo as palavras, ele disse, serenamente:
– De agora em diante, externamente, parecerei ser como vocês sempre me conheceram;
interiormente, porém, estou afastado de tudo, livre. Só estarei representando um papel.
Então, referindo-se a seu corpo e sua personalidade nessa conversa íntima, da qual me
recordo vividamente, ele disse:
– Eu matei Yogananda há muito tempo; apenas Deus reside aqui [neste corpo] agora. 15 –
Enquanto operasse através de sua personalidade e forma física, o Mestre estava alicerçado na
14
O Movimento Unitário, iniciado por Charles Fillmore e sua esposa Myrtle, em 1889, promovia uma abordagem
metafísica integral da vida, com ênfase na meditação, oração, curas e dieta vegetariana. Os buscadores da verdade
de muitos países mundo afora obtiveram benefícios comparecendo aos serviços da Igreja Unitária e lendo suas
publicações. A revista Daily World tinha um número de leitores muito maior do que o número de membros da
organização. O livro The Unity Movement (de Neal Vahle, Templeton Foundation Press) é uma boa fonte de
informação.
15
Quando Paramahansaji dizia às vezes: “Apenas Deus habita neste corpo agora”, não estava insinuando que era
um avatar – uma encarnação de Deus em forma humana. Alguns de seus discípulos preferem acreditar que ele foi
uma encarnação divina e não fazem rodeios ao promoverem esta opinião. Muito embora realmente expressasse
atributos divinos, ele descreveu em sua Autobiografia de um Iogue a necessidade que teve, durante os anos de sua
juventude, de aprender com outros.
34
onipresença. O estado de perfeita consciência de Deus que ele confidenciou possuir é o que todo
kriya yogi deve aspirar a alcançar.
Eu estava na Sede Central da SRF uma noite, em 1951, quando um condiscípulo me disse:
– O Mestre quer vê-lo.
Fui até o prédio central e subi as escadas até seu quarto. O Mestre, de pijamas, estava
sentado na cama, com o lençol puxado até o peito e as costas apoiadas em um enorme
travesseiro. Embora cuidadoso em receber a maioria das pessoas de maneira socialmente
aceitável, o Mestre recebia seus discípulos próximos em seus momentos mais descontraídos. Ele
me convidou para sentar em uma cadeira, perto dele. Estava relaxado e parecia muito feliz.
Conversamos por quase uma hora, a respeito de Deus, do caminho espiritual e da importância de
oferecer todas as ações ao Supremo. Como ele era generoso em nos dar seu tempo e energia,
quando deles precisávamos!
Após alguns minutos de conversa, o Mestre descreveu como, em 1937, ele tinha ajudado Sr.
Lynn a ter sua primeira experiência do samadhi transcendental, após Sr. Lynn ter praticado
meditação por cinco anos.
– Estávamos sentados na praia de Encinitas, meditando. Olhei para ele e vi que estava
preparado. Coloquei a mão em seu peito, e instantaneamente ele entrou em um profundo estado
de samadhi. Ele não estava consciente do corpo. Sua boca tinha ficado aberta e precisei afastar os
insetos voadores para longe de seu rosto. Deixei que ele ficasse assim por algum tempo antes de
trazê-lo de volta.
Enquanto o Mestre terminava sua narrativa, Sr. Lynn, que estava residindo lá naqueles dias,
entrou no quarto para dizer boa-noite ao Mestre. Estivera meditando, e estava radiante e repleto
de bem-aventurança. O Mestre exclamou:
– Estava agora mesmo contando a Roy como foi a sua primeira experiência de nirbikalpa
samadhi.
Ambos deram uma risadinha de recordação. O Sr. Lynn cumprimentou-me com um olhar, em
seguida dirigiu-se ao Mestre, abraçou-o carinhosamente, beijou-lhe a testa e saiu em silêncio.
Quando saiu, o Mestre disse:
– O Sr. Lynn ficará aqui alguns dias. Ele satisfez todas as minhas expectativas. É um perfeito
exemplo para você e os demais. Anos atrás, quando lhe dei a Kriya ele foi até meu quarto no
hotel e meditou comigo. Naquela primeira vez, ele pratiou por seis horas e experimentou um
estado de êxtase. Desde então, nunca o vi sem que ele estivesse absorto em Deus!
O Mestre então me contou sobre como Sr. Lynn tinha vencido, com êxito, sua última e
importante prova pessoal com relação às coisas materiais, e como o terreno acima do Santuário
do Lago foi adquirido:
– Quando adquirimos o Santuário do Lago – começou ele – eu queria que tivéssemos aquele
pedaço acima da propriedade, para que ninguém mais o comprasse no futuro e estragasse a nossa
privacidade. – Ele mencionou o preço, que pode ter sido substancial no começo dos anos de
1950, mas era modesto em comparação aos valores imobiliários atuais.
– Durante todos os nossos anos juntos, nós muito raramente discutimos assuntos monetários.
Quando ele vinha aqui para ficar conosco, eu queria que ficasse livre de preocupações
profissionais e só tivesse pensamentos sobre Deus e meditasse. Mas eu sabia que ele ainda tinha
um pequeno apego e queria que se livrasse dele, para seu próprio bem espiritual. Assim, escolhi a
compra daquela propriedade como uma oportunidade para ele enfrentar esse apego.
35
– O Sr. Lynn e eu estávamos sentados sozinhos, juntos. Expliquei para ele como seria
importante termos aquela propriedade para proteger a privacidade do Santuário do Lago.
Perguntei a ele: “Você a comprará para mim?” Ele ficou chocado, porque eu nunca tinha falado
diretamente com ele sobre tais assuntos. Pela primeira vez em nossos muitos anos juntos, ele não
pôde olhar para mim. Após um longo tempo, ele me olhou, e tinha lágrimas nos olhos. Ele disse:
“Sim, senhor, eu compro”. O último apego que ele ainda tinha era o apego ao dinheiro. Eu sabia
disso, e escolhi aquele momento para ajudá-lo a se livrar dele. Quando disse isso, ele venceu seu
último pequeno apego. Ele será livre nesta vida. Não por causa do dinheiro, mas por ter
renunciado a todo apego às coisas materiais.
Ao contar sua primeira experiência de samadhi à Irmã Gyanamata, Sr. Lynn lhe dissera:
– O que o Mestre me deu, jamais poderei lhe retribuir.
Nosso guru não esperava recompensa por seus esforços, mas Sr. Lynn, de seu próprio jeito,
mais do que compensou pelo que recebera. Para mim, o exemplo de Sr. Lynn, de uma vida
centrada em Deus, foi a maior oferenda. Todavia, ao longo dos anos, meu irmão discípulo cuidou
dos principais compromissos financeiros do trabalho; permitiu ao Mestre visitar a Índia em 19351936, construiu o eremitério de Encinitas, fez contribuições especiais e, antes de sua morte em
1955, providenciou para que mais de 3 milhões de dólares fossem transferidos para a organização
do Mestre. O Sr. Lynn era um santo, mas também sabia da importância dos assuntos práticos.
Após a morte de Paramahansaji, Sr. Lynn assumiu o duplo papel de presidente e diretor
espiritual do trabalho, mas não aceitou representar o papel de guru para os discípulos.
Dissociando-se de todas as responsabilidades empresariais, comprou um grande terreno perto de
Borrego Springs, no sul da Califórnia, e foi morar ali, quando não estava residindo em um dos
retiros da Self-Realization Fellowship. Sempre muito interessado na vida holística, era
vegetariano estrito e contratou um administrador para supervisionar a produção de vegetais em
sua fazenda de Borrego Springs. Ele tomava suco de frutas pela manhã, sucos de verduras ao
meio-dia e uma refeição cozida apenas no começo da noite. Tinha o hábito de tirar os sapatos no
escritório e preferia não usar gravatas; quando as usava, geralmente deixava o nó bem folgado.
Sempre que podia, esse homem extraordinário visitava a Califórnia e passava semanas em
reclusão – meditando e comungando com a natureza. Geralmente, seus dias na Califórnia eram
passados em Encinitas, onde ele tinha seu próprio apartamento. Lá, no gramado, diante do azul
do Oceano Pacífico, ele se exercitava e meditava. Freqüentemente, o Mestre se juntava a ele em
períodos prolongados de contemplação interior. Às vezes, muito além das ondas que se
quebravam na praia, ele permanecia boiando sobre o mar, consciente apenas da água, do céu e de
Deus! Uma vez, o Mestre nos disse:
– Nestes dias, Sr. Lynn está sempre perdido em Deus. Está tão absorto na meditação, que
tenho dificuldade para fazer com que ele durma ou se alimente.
Paramahansaji dissera aos discípulos que Sr. Lynn era uma alma que realizou Deus. Em uma
carta pessoal, mais tarde publicada, o Mestre revelou a Sr. Lynn que ele (Sr. Lynn) tinha sido um
iogue do Himalaia, e sua encarnação no Ocidente era parte do Plano Divino. Um visitante da
Índia me disse, após receber a bênção de meu irmão discípulo: “Nem mesmo em meu país vi
tamanha manifestação completa de Deus!”
Kriya yogi dedicado, com um estilo de vida disciplinado e equilibrado, Sr. Lynn
experimentava facilmente estados de samadhi sabikalpa (com o apoio de percepções internas)
quando meditava. Alguns anos depois, ele progrediu para o samadhi nirbikalpa (sem apoio). Em
uma ocasião, Paramahansaji disse:
– O Sr. Lynn já dominou os estados preliminares de samadhi e está se aproximando
rapidamente dos estados superiores.
36
Após afastar-se dos envolvimentos nos negócios, Sr. Lynn dedicou quase todo o seu tempo e
atenção ao trabalho interno, espiritual.
A alguns discípulos, ele contou uma experiência que tivera em 1953.
Por muitos anos, suas meditações eram beatíficas e, freqüentemente, tinham proporções
cósmicas. Sempre que Sr. Lynn acordava, ele se interiorizava para meditar. Certa manhã, quando
começou a meditar, ele não experimentou a bem-aventurança e a luz interior, que eram sua
percepção natural. Em vez disso, só havia escuridão e um sentimento de vazio interior. Por vários
dias ele experimentou essa ausência incomum de percepção espiritual, como se o
desenvolvimento de sua alma tivesse sido bloqueado. Persistindo em seus esforços de meditação,
porém, Sr. Lynn concentrou-se firmemente no olho espiritual e, finalmente, experimentou a
percepção de uma pequena luz branca. De repente, ele se tornou essa luz! E, de uma partícula de
luz a outra, ele percebeu a estrutura de sua forma física e, em seguida, sua percepção continuou a
se expandir, envolvendo seu quarto, o prédio, o planeta e os corpos celestes que se movem no
espaço. A luz se expandiu até incluir o cosmos e tornar-se infinita. Tudo era luz, e ele era essa luz
da qual tudo é formado! Após um longo tempo, ele voltou à consciência do corpo e descansou na
bem-aventurança e no poder de sua nova realização. Depois de nos contar essa experiência, ele
disse:
– Agora sei que não sou o corpo. Só existe luz. Só existe o Infinito. Já não importa se tenho
corpo ou não. Minha percepção do Um é permanente.
Em outra ocasião, em 1954, durante a meditação, Lahiri Mayasaya apareceu a ele em um
fulgor de luz. Em seguida, apareceram Sri Yukteswar, o Mestre e Babaji. O Sr. Lynn e o Mestre
flutuaram sobre enormes reuniões de pessoas, abençoando-as enquanto as sobrevoavam. Essa
experiência durou seis horas. Após ela, Sr. Lynn disse: “O Mestre está tão ocupado lá, quanto
estava aqui, trabalhando com as pessoas em outras esferas e mostrando-lhes o caminho para a
liberdade espiritual.”
Embora Sr. Lynn fosse um iogue consumado, capaz de experimentar estados de samadhi à
vontade, foi apenas nos últimos anos de sua vida que ele foi capaz de libertar-se do apego ao
dinheiro e da necessidade de estar no controle dos acontecimentos e circunstâncias. Superar
completamente as tendências do subconsciente não é coisa fácil, pois à medida que alguém avança
no caminho, as tentações se tornam cada vez mais sutis. Sua capacidade de administrar o dinheiro
e enfrentar seus problemas pessoais e empresariais o capacitou a ser bem-sucedido em todas as
aventuras que escolheu e em fazer muito bem aos outros. Devido ao seu dinanismo natural e
atitude forte e autodeterminada, o maior desafio de Sr. Lynn era a auto-entrega. Sua “lição” final
foi perceber que ele era apenas um instrumento através do qual o poder e os propósitos divinos
eram cumpridos. Conforme Paramahansaji me dissera, Sr. Lynn já havia alcançado o estágio de
jivanmukti (liberto das compulsões cármicas enquanto se está encarnado, ainda que pudesse ter
um resíduo de carma para ser resgatado, dissolvido ou transcendido) e, quando fez sua transição
em 1955, já estava completamente liberto e plenamente Auto-realizado e consciente de Deus.
Ele sempre dizia:
– O amor, a alegria, a bem-aventurança que sinto nestes dias são maravilhosos. Nada se pode
comparar a isto. Às vezes, sinto que não posso suportar mais; o êxtase é muito forte. Contudo,
mais chega e, de algum modo, agüento. Agora sei por que o Mestre se referia a Deus como bemaventurança e alegria sempre-nova!
Leo Cocks contou-me a seguinte história:
– Quando eu estava com nosso guru, na Sede Central da Self-Realization Fellowship, Sr.
Lynn entrou no quarto por alguns minutos. Fiquei comovido ao ver sua conduta respeitosa. Mais
tarde, Paramahansaji me disse: “Ele sabe de onde vem o poder que tem”.
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Em 20 de fevereiro de 1955, em seu retiro do deserto, na fazenda de Borrego Springs,
Califórnia, Sr. Lynn entrou em mahasamadhi. Na cabeceira de sua cama, onde ele meditava,
havia um pequeno nicho na parede, com fotografias de nossa linhagem de gurus. Um dos métodos
de meditação de Sr. Lynn era visualizar cada guru, um de cada vez, e sintonizar-se com eles
enquanto entrava no silêncio.
O Sr. Lynn foi um dos exemplos de vida mais inspiradores que conhecemos. Jamais o vi sem
que ele estivesse sossegado e gentil no trato com as pessoas. Admirava-me que alguém tão
bondoso e, até mesmo, tímido pudesse ser o líder dinâmico de muitas corporações. Quando ele se
tornou o presidente da SRF, durante uma de minhas visitas à Califórnia, fui a Encinitas para
prestar meus respeitos a Sr. Lynn. Sentamo-nos no gramado e conversamos por alguns minutos a
respeito do trabalho em Fênix, e ele me perguntou sobre minhas práticas espirituais e me deu
sugestões para melhorar minhas meditações. A seu pedido, meditamos por algum tempo e ele me
abençoou com suas palavras e sua presença. Quando me preparava para sair, ele meteu a mão no
bolso de seu calção de praia e me deu trinta dólares em dinheiro.
– Use no que precisar. O Mestre quer que você fique com isto – ele murmurou.
Fiquei comovido, não só pelo presente, mas porque era o tipo de coisa que o Mestre sempre
fazia quando eu o visitava. Em mais de uma ocasião, enquanto me abençoava antes de eu partir,
meu guru colocava alguns dólares em minha mão ou dentro do bolso de minha camisa e dizia:
– Use isto para você. Quero que fique com isto.
Meras palavras, aqui na página impressa, não podem sequer começar a transmitir o amor, o
calor humano e o interesse que eu sentia quando estava na presença de Yoganandaji e de “São”
Lynn. Aprendi, através dos anos, que a mensagem importante é sempre a consciência, e não os
esforços verbais que fazemos.
Eram poucas as instruções para os discípulos nos vários centros e retiros da SRF. Devíamos
estar bem-vestidos, ter boas maneiras, cumprir com nossas obrigações, ser atenciosos quando
estivéssemos interagindo socialmente e não nos tornar excessivamente envolvidos em
relacionamentos pessoais. Deveríamos cultivar a consciência da nossa verdadeira natureza e da
presença de Deus, meditar em horários regulares e usar nosso tempo livre para o estudo e a
meditação. Discípulos residentes recebiam cinco dólares por mês para uso pessoal. Quando estive
no Centro da SRF em Fênix, recebia um modesto salário para cobrir despesas de alimentação e
vestuário.
Nós não tínhamos aulas formais; o aprendizado se dava pela experimentação,
proporcionando-nos a oportunidade de suportar a transformação psicológica e o desenvolvimento
espiritual. Alguns ministros recém-ordenados trabalhavam com ministros experientes até que
aprendessem como ministrar aulas e sermões. Em outras vezes, o Mestre dizia para um discípulo
recém-ordenado como deveria preparar um sermão.
Para um desses discípulos, ele disse:
– Escolha um assunto que seja de interesse. Escreva um resumo sobre o que irá falar. Inclua
uma anedota humorística para ilustrar um argumento e faça com que todos se sintam
confortáveis. Antes de falar, reveja o resumo, medite profundamente e então fale a partir de seu
coração.
Quando me deu um conselho parecido, disse para sempre conduzir um período de meditação
“longa e profunda” em cada serviço dominical ou de meio de semana.
– Faça as pessoas se aferrarem à prática da Kriya Yoga – ele me aconselhou. – Eles terão
experiências pessoais e benefícios que mudarão suas vidas!
38
Também falou para que me certificasse de que meus sapatos estavam engraxados, inclusive
nos calcanhares, e para vestir uma túnica quando estivesse aconselhando alguém.
– Você é jovem – ele disse. – As pessoas terão mais respeito por você quando o virem como
um ministro.
– Se estiverem de mau-humor ou tiverem problemas pessoais – o Mestre nos dizia – não
falem sobre suas dificuldades com os outros. Não envenenem as mentes deles. Venham a mim, ou
a alguém que eu indicar para lhes dar aconselhamento.
Acerca do treinamento de professores e ministros, ele disse:
– A coisa mais difícil para mim tem sido atrair pessoas qualificadas e dedicadas, que
compreendam o que estamos fazendo e que permanecerão leais aos ensinamentos. Muito
freqüentemente, elas vêm aqui pensando que vai ser fácil; ou que poderão aprender um pouco, e
então sair para ensinar aquilo que pensam que sabem, ao invés do que é real e importante.
A um jovem discípulo que solicitara permissão para ensinar, Paramahansaji respondeu:
– O que você tem para oferecer aos outros? Prepare-se primeiro, depois será capaz de ajudar
os demais. Foi o que eu fiz, e é o que você precisa fazer.
Mas a pessoa não precisa esperar até ser espiritualmente iluminada para ajudar os outros.
Tudo o que é necessário é a disposição para fazê-lo e aderir a algumas regras básicas.
Paramahansaji me disse:
– Enquanto você ainda está aprendendo a nadar, pode ajudar os outros a nadar também.
Ele freqüentemente dizia: “Prefiro a companhia de uma alma que ame a Deus à de uma
multidão, mas amo multidões de almas que amam a Deus”. Foi seu destino trabalhar com
discípulos em nível pessoal e, também, ir ao encontro de centenas de milhares de pessoas sedentas
de Deus. Embora soubesse que apenas umas poucas dentre elas seriam receptivas, sua
determinação e entusiasmo nunca diminuíram. Ele dizia: “Estou procurando santos em potencial”.
Para mim e três outros jovens discípulos que estavam presentes, ele aconselhou:
– Preparem-se agora. Hoje, milhares de pessoas estão buscando Deus. No futuro próximo,
milhões estarão buscando, e não haverá suficientes professores qualificados e com realização
divina para atender a demanda. O mundo está enfrentando extremas dificuldades agora. Não se
preocupem com elas. A situação irá melhorar. Uma nova ordem mundial se aproxima. No futuro,
a ioga será ensinada nas escolas e faculdades.16 Vocês verão isso acontecer. A vontade de Deus
será feita, não importa o que as pessoas façam ou deixem de fazer, não importa se vocês
participem dela ou não. Mas é muito melhor participar voluntariamente! Se o fizerem, seu
crescimento espiritual será acelerado. Quando estiverem sintonizados com a vontade de Deus,
serão levados por ela para o seu próprio desenvolvimento espiritual.
Enquanto estava encarnado, meu guru sabia que somente uns poucos discípulos eram tão
disciplinados e focalizados como deveriam ser. Apesar de saber disto, eles os observava de perto
e continuava a encorajá-los.
16
Os comentários de Paramahansaji sobre a ioga ser afinal ensinada nas escolas e faculdades se tornaram
realidade. Meditação e Hatha Yoga são agora ensinadas em diversas escolas particulares e em algumas faculdades
de medicina, hospitais e clínicas, como formas de combater o estresse, diminuir os processos biológicos de
envelhecimento e fortalecer o sistema imunológico do corpo.
39
– Estejam cem por cento no caminho! Que a aspiração de vocês seja como uma fogueira, que
queima firme por longo tempo; não seja ela como fogo de palha, que brilha e logo se apaga. Não
andem só até a metade do caminho, ou até dois-terços do caminho, ou quase até o final, dando
meia-volta depois. Andem o caminho todo nesta vida! Com resolução intensa e a prática da Kriya
Yoga, vocês podem fazê-lo!
Ocasionalmente, dizia aos discípulos que alguns, dentre eles, logo deixariam o caminho,
enquanto outros persistiriam através dos anos e alcançariam a libertação. Pouco antes de partir,
Paramahansaji disse que sua organização estava sendo purgada (referiu-se ao processo como uma
“faxina”), tanto na América quanto na Índia, de pessoas que não queriam cooperar. Ele me disse:
– Cabeças vão rolar. Você vai ver.
Alguns dos discípulos espiritualmente mais adiantados de meu guru não eram de sua
comunidade monástica. Embora tivessem família e responsabilidades profissionais, estavam
comprometidos com o viver construtivo e com a prática espiritual. A um jovem que expressara o
desejo de vender sua empresa promissora, em uma cidade do centro-oeste, e mudar-se para a
Califórnia para viver em uma das comunidades monásticas da SRF, Paramahansaji disse:
– Você não precisa fazer isso. Permaneça onde está. Continue com seu trabalho e
relacionamentos. Pratique Kriya Yoga fielmente, medite profundamente e seja um bom exemplo
para os outros. Atraia pessoas que estejam interessadas em meditação e ensine-as a meditar,
criando um grupo de meditação. Apóie este trabalho (a organização) quando puder. Fale comigo
por telefone de tempos em tempos, e venha me ver sempre que tiver condições.
Em novembro de 1951, enquanto meditava, tive a visão de um grupo de pessoas ao lado de
um caixão. O pensamento que cruzou minha mente foi de que eu estava vendo o funeral do
Mestre e, imediatamente, telefonei para Faye Wright e perguntei se tudo estava bem com ele. Ela
me garantiu que ele estava bem. Considerei a visão como simples produto de minha imaginação.
Alguns dias depois, Herbert recebeu uma ligação telefônica do Mestre, informando-o de que
a Irmã Gyanamata,17 uma discípula antiga, havia acabado de falecer e que deveríamos vir a
Encinitas para comparecer ao funeral dela. No serviço fúnebre vespertino no Eremitério, diante
do Oceano Pacífico, notei que todos os detalhes do acontecimento eram idênticos aos de meu
sonho-visão; a exceção era que o Mestre, radiante na consciência de Deus, estava presidindo.
Durante o serviço fúnebre, o Mestre contou para todos os acontecimentos que antecederam a
morte da Irmã Gyanamata. Ela tinha estado doente e estava muito fraca. Quando o Mestre foi
informado sobre sua condição, entrou no quarto dela. Quando ela pediu o samadhi nirbikalpa
(transcendente), o Mestre lhe disse: “Você não precisa disso. Tendo chegado ao palácio, por que
ainda desejaria voltar ao jardim?”
A Irmã Gyanamata compreendeu o significado das palavras do Mestre. Ele freqüentemente
contava a história de um homem que foi convidado por um rei para visitar seu palácio. Tendo
chegado muito cedo aos portões palaciais, foi dito a ele que esperasse em um belo jardim.
Encantado pelo que viu, esqueceu seu compromisso com o rei, e não foi convidado de novo para
vir ao palácio. O Mestre concluía a história dizendo: “Se ele tivesse honrado o compromisso com
o rei e ambos tivessem se tornado amigos, poderia visitar o jardim sempre que quisesse”.
17
A Irmã Gyanamata (Edith Ann Bissett, 1869-1951) estava morando em Seattle, Washington, com seu marido e
filho quando encontrou Paramahansa Yogananda, em 1925. Em 1932, após a morte de seu marido, Clark Bissett,
um professor da Universidade de Direito de Washington, ela se mudou para a Sede Central da SRF em Los
Angeles e, mais tarde, viveu no Eremitério de Encinitas pelo resto de sua vida. Silenciosa, altruisticamente
dedicada ao serviço dos outros, ela inspirou a todos que a conheceram. Paramahansaji disse que, embora ela
praticasse ioga, seu caminho era o do conhecimento e da sabedoria, e que a libertação espiritual dela aconteceu
pela graça.
40
O “palácio” representa a Realização Divina transcendental; o “jardim” são as percepções
subjetivas que a pessoa pode experimentar quando os estados superconscientes se misturam com
os pensamentos e as emoções.
Na noite seguinte, quando o Mestre foi vê-la novamente, disse a ela:
– Se você tiver qualquer desejo, eu o realizarei agora mesmo. Diga-me.
Três vezes ela respondeu: “Não”. Então ele perguntou:
– É verdade?
Ela respondeu:
– Sim, senhor.
Quando o Mestre deixou o quarto da Irmã Gyanamata, ele pediu para Faye Wright e algumas
outras discípulas para que o acompanhassem em seu carro e dessem uma volta pela cidade de
Encinitas. Durante o passeio, ele permaneceu em silêncio meditativo. Após uma hora, disse:
– Agora, vamos voltar.
No Eremitério, quando foi dito que a Irmã Gyanamata havia acabado de abandonar o corpo,
ele entrou no quarto dela e ficou lá sozinho por alguns instantes; depois pediu que Faye Wright e
as outras discípulas entrassem no quarto para sentirem o topo da cabeça da Irmã, que estava
quente. Ele explicou que isso indicava que ela havia deixado o corpo no estado mais elevado de
samadhi, saindo através do sétimo chakra. O Mestre então falou para os discípulos que também
ele, em breve, iria deixar este mundo, o que realmente aconteceu menos de quatro meses depois.
O Mestre dissera a alguns discípulos: “Não viverei muito tempo depois da Irmã”.
Foi no seu retiro do deserto, em Twenty-Nine Palms, que vi o Mestre pela última vez, poucas
semanas antes de ele abandonar o corpo conscientemente, transição que os iogues chama de
mahasamadhi, a “grande unificação”.
Estávamos sentados na sala de estar de sua casa. Era o começo da noite, e ele estava
descansando em uma grande cadeira reclinável que Sr. Lynn lhe dera dois anos antes, como
presente de Natal. Virgínia Wright trouxe um copo de suco de abacaxi e aguardou até que ele o
tomasse.
Quando ela deixou a sala, o Mestre disse:
– Veja! Por anos eu não tinha dado muita atenção às necessidades do corpo. Agora, como
pôde ver, elas fazem eu me cuidar. Trate bem seu corpo, Roy. Você tem muito trabalho a fazer.
Ele estava com vitalidade e radiante, claramente borbulhando de bem-aventurança.
– Acabei de finalizar o último capítulo dos comentários ao Bhagavad Gita18 – ele me disse. –
Agora meu trabalho está terminado. Alguns instantes atrás eu estava sentado aqui, meditando. Vi
18
O Bhagavad Gita tem nutrido espiritualmente milhões de pessoas por mais de dois mil anos. Os dois
personagens centrais na história são Arjuna e Krishna. Arjuna representa o verdadeiro buscador de conhecimento e
experiência de Deus. Krishna representa a consciência de um ser iluminado. Em dezoito capítulos, uma ampla
gama de conceitos filosóficos são explorados minuciosamente e são fornecidos conselhos práticos de como viver
plena e efetivamente. Muitos leitores deduzem que o texto afirma que Krishna é Deus em forma humana; um
exame mais cuidadoso revela que aquilo que é descrito não possui forma, é a Realidade transcendente que deve ser
percebida. Nos primeiros dez capítulos são descritos os caminhos do conhecimento (Jnana Yoga), meditação (Raja
Yoga), amor devocional (Bhakti Yoga) e ações corretas e altruístas (Karma Yoga). No décimo primeiro capítulo,
Arjuna está capacitado, pela graça, a perceber a Consciência suprema em todas as coisas. Os capítulos finais são
dedicados a explicações sobre como utilizar aquilo que foi aprendido.
Swami Sri Yukteswar, guru de Paramahansa Yogananda, escreveu um comentário ao Gita nos primeiros anos da
última década do século 19. Após conduzir grupos de debate sobre essa escritura, ele levava suas anotações a seu
guru Lahiri Mahasaya, e pedia-lhe que elucidasse certos pontos.
41
um círculo de luz dourada no olho espiritual. Quando abri os olhos, eu ainda a enxergava, ali. – E
apontou para um ponto na parede. – Então, Babaji, Lahiri Mahasaya e Sri Yukteswar apareceram
na luz. Eles estavam sorrindo e me abençoando. Vieram me agradecer por ter terminado o livro.
Estão satisfeitos comigo. – Ele era quase infantil em seu modo de falar, obviamente feliz por ter
completado um projeto importante e por seus esforços serem reconhecidos pela linhagem de
gurus.
Esticando-se para perto de mim, ele disse:
– Roy, não se preocupe demais com o que os outros fazem ou deixam de fazer, se eles lhe
parecem estar ou não dedicados ao caminho. Trate você de andar o caminho inteiro. Não olhe
para trás. Não olhe para a esquerda ou para a direita. Olhe firme para a frente, para a sua meta, e
ande o caminho inteiro nesta vida. Você pode fazê-lo. Você precisa fazê-lo. Sri Yukteswar
costumava dizer: “A balsa que leva as almas através do rio da ilusão está pronta para partir.
Quem irá? Quem irá? Se ninguém for, eu irei.” Você precisa ter esse tipo de atitude!
O Mestre ficou calado por alguns momentos. Então prosseguiu falando de seu guru:
– Certa vez, antes do mahasamadhi de Sri Yukteswar, estávamos conversando quando, de
repente, seu corpo estremeceu. Quando expressei minha preocupação, ele disse: “Assim como um
pássaro que ficou muito tempo na gaiola pode hesitar em deixar sua prisão e ser livre, algumas
vezes a alma reluta em abandonar o corpo e desfrutar a onipresença”.
Olhando para mim, o Mestre perguntou:
– Compreende?
Senti que ele estava me preparando para a sua própria despedida em breve.
Poucos meses antes, ele dissera para mim e outros discípulos que “estava vivendo com tempo
emprestado”, e que tinha “apenas mais algumas tarefas para cumprir” e alguns poucos discípulos
ainda para receber. Disse que sua missão tinha sido estabelecer os ensinamentos da ioga no
Ocidente e ajudar certos discípulos a alcançarem a realização divina. Disse que já sabia de sua
missão desde quando era jovem, e sabia que certos discípulos seriam atraídos a ele para
receberem a Auto-realização e a Realização Divina.
Antes de finalizar nossa conversa, tirou uma nota de vinte dólares do bolso de sua calça,
dobrou-a e colocou no bolso de minha camisa.
– Use isto para comprar comida – ele disse. – Você precisa permanecer forte e saudável para
o trabalho que deve realizar.
Os primeiros comentários de Paramahansaji ao Gita foram publicados há muitos anos pela Self-Realization
Fellowship como uma série de artigos em sua revista (East-West, até 1944, quando o nome foi mudado para Inner
Culture, agora revista Self-Realization). Durante seus últimos anos, ele escreveu e ditou um total de 1.500 páginas
inéditas de comentário ao Gita. Na noite de 5 de janeiro de 1952, quando muitos discípulos se reuniram para
comemorar seu aniversário, na sede internacional da Self-Realization Fellowship, ele exclamou: “Uma nova
escritura nasceu! Vocês verão, quando for publicada no próximo ano!”
Meu guru experimentou seu mahasamadhi dois meses depois. No fascículo da primavera de 1952 da revista SelfRealization, que noticiava a sua transição, um anúncio de meia página informava os leitores que seu comentário
seria publicado no ano seguinte, com o título God Talks With Arjuna. Por causa da necessidade de cuidadosa e
acurada revisão, foi mais tarde decidido deixar de anunciar a publicação do livro até que uma data mais adequada
fosse determinada. O livro foi finalmente publicado pela Self-Realization Fellowship em 1995, mais de 40 anos
depois. O livro do Mestre merece receber toda a atenção dos leitores em potencial.
42
CAPÍTULO QUATRO
Transições
No dia 7 de março de 1952, Herbert telefonou tarde da noite desde Los Angeles para me
informar que o Mestre havia acabado de fazer sua transição. Ele providenciou alguns detalhes e
pediu para que eu conduzisse um serviço memorial para o Mestre no Centro de Fênix antes de
viajar para Los Angeles. Fiz nisto no dia seguinte e, em seguida, viajei de trem para estar com
meus irmãos e irmãs discípulos.
Ao chegar à Sede Central da SRF, fui imediatamente mandado para o apartamento do
Mestre, no andar de cima, onde seu corpo, vestido com uma de suas túnicas alaranjadas,
repousava em sua cama. Vários discípulos estavam em pé ao redor. Fiquei entristecido por saber
que o Mestre não iria abrir os olhos e sorrir com reconhecimento e boas-vindas. Contudo, eu não
estava desolado. Ele me havia preparado para esse evento e minha sintonia com seu espírito
continuava. O que eu sentiria mesmo falta era de sua voz vibrante, do toque de sua mão
abençoando e daqueles momentos especiais de intimidade.
No dia 11 de março, todos os discípulos residentes e muitos membros da SRF, de perto e de
longe, reuniram-se para um serviço memorial de duas horas para o Mestre, na capela e na sala de
recepção da Sede Central da SRF. Seu corpo, em um ataúde de bronze1, permaneceu em frente ao
altar na capela. Ministros veteranos, entre eles Doutor Lewis, leram algumas passagens do Novo
Testamento e do Bhagavad Gita e realizaram uma cerimônia simples. O Sr. Lynn falou por alguns
minutos, como também Oliver Black,2 um discípulo de longa data e ministro da SRF em Detroit,
1
O corpo físico de um swami não é cremado (geralmente), porque se considera que já foi simbolicamente cremado
quando os apegos materiais foram renunciados.
2
Oliver Black (1893-1989) nasceu em Grover Hills, Ohio, e cresceu em Indiana. Em 1920, em Detroit, Michigan,
com um investimento inicial de 500 dólares, ele formou a Peninsular Metal Products, que manufaturava peças
automotivas e com o tempo acabou se tornando uma companhia com ações públicas de muitos milhões de dólares.
Ele conheceu Paramahansa Yogananda em Detroit, em 1931, tornou-se discípulo, logo foi ordenado, conduziu
serviços dominicais e de meio de semana por vários anos e iniciou centenas de pessoas nas práticas de meditação
da Kriya Yoga. Após se aposentar dos negócios em 1967, fundou o Song of the Morning Ranch: um Retiro de Ioga
de Nível Superior, situado em 800 acres de terra florestal próximo de Vanderbilt, Michigan. Em 1976, seis anos
após a morte de sua esposa, ele se mudou para o retiro, supervisionou seu desenvolvimento e ministrava aulas até
sua morte com a idade de noventa e seis anos.
Em seus anos finais, embora frágil fisicamente, estava ativo e mentalmente alerta. Quando estava no Hospital
Ostego Memorial em Gaylord, Michigan, após ter passado por uma bateria de exames, foi mantido em um quarto
particular. Mais tarde naquele dia, com vários de seus discípulos presentes, sentado na cama com um semblante
meditativo, ele conscientemente deixou o corpo. O Sr. Black, a quem foi conferido o título de Yogacharya (alguém
que vive uma vida divina) por Paramahansa Yogananda, tinha uma personalidade gentil e extrovertida, com um
jeito direto de falar a agir. Em um serviço memorial conduzido no Song of the Morning Ranch, pela ministra da
SRF Irmã Mukti Mata que veio de Los Angeles, uma das discípulas falou sobre a influência que ele teve na vida
dela e na de outros aos quais guiou: “Ele nos aceitava como éramos e nos encorajava a descobrir e aflorar nosso
pleno potencial. Muitos de nós não sabíamos como amar ou confiar – ele nos ensinou a amar e a confiar. Ele nos
deu aquilo que muitos de nós nunca tivemos: um lugar seguro para estar e uma amizade divina jamais
enfraquecida. Ele nos ensinou a meditar, e a amar a Deus.”
Os irmãos e irmãs condiscípulos do Sr. Black apreciavam ouvir suas histórias das experiências que teve com
Paramahansaji. Ele nos contou que, certa vez, o guru lhe telefonou da Califórnia, pedindo que iniciasse três
homens que iriam visitar Detroit, tendo dito: “Estarei com você quando fizer isso”. Enquanto o Sr. Black estava
meditando com os homens, ele ouviu uma vibração no quarto e rapidamente viu Paramahansaji em pé a seu lado.
Quando perguntei se os outros homens tinham visto o Mestre, o Sr. Black disse: “Não, mas todos sentiram a
presença dele, e um deles até chorou lágrimas de devoção”. Quando o Sr. Black voltou para casa mais tarde
43
Michigan. O Sr. Binay Ranjan Sen, Embaixador da Índia nos Estados Unidos, proferiu um
discurso durante o qual mencionou que, quando estava sendo levado para o topo de Mount
Washington, ele viu um arco-íris, o que sentiu ser um sinal auspicioso.
Na conclusão do serviço, passamos lentamente em frente ao ataúde para ver a forma do
Mestre pela última vez, e despejamos pétalas de rosa sobre a tampa de vidro enquanto
cantávamos em uníssono: “Om Guru, Om Guru”. Seu corpo foi então levado para o Forest Lawn
Memorial-Park,3 na cidade vizinha de Glendale, Califórnia.
Procurei um lugar afastado próximo do prédio principal, para ficar sozinho com meus
pensamentos e me recompor. Após, encontrei Sr. Oliver Black, que me dirigiu palavras
particulares de conforto e compreensão.
Tínhamos comemorado o qüinquagésimo nono aniversário do Mestre com ele, apenas dois
meses antes de sua morte. Naquele dia ele expressou suas esperanças pelo nosso crescimento
espiritual e do trabalho, e anunciou publicamente que seu comentário ao Bhagavad Gita havia
sido completado. Em seus aniversários e no Natal, ele recebia uma variedade de presentes, que
eram graciosamente aceitos e, freqüentemente, os que ele não precisava eram doados depois, em
particular, para quem pudesse usar.
Em outra ocasião, quando um jovem discípulo começou a se queixar de um conflito de
personalidades que estava tendo com outro discípulo, Paramahansaji disse:
– Converse com ele e resolvam juntos esse problema. Vocês não devem me incomodar com
tais assuntos. Nestes dias, estou vivendo mais nos domínios astrais, ajudando almas ali.
Nos dias que antecederam sua morte, ele estivera extraordinariamente ocupado. Voltando do
retiro no deserto no dia 4 de março, o Mestre recebeu o Embaixador Sen, a Sra. Sen e outros
convidados, em um almoço privativo na Sede Central da SRF, e conversou particularmente com
alguns discípulos veteranos. No dia 6 de março, ele foi levado de carro para o Santuário do Lago.
Lá, caminhou ao redor do lago, almoçou com alguns discípulos, tocou o órgão na capela e cantou
repetidas vezes as palavras escritas pelo poeta indiano Rabindranath Tagore: “Em meu lar, com
Tuas próprias mãos, acende a lâmpada do Teu amor”. Após seis horas no Santuário do Lago, ele
retornou para a Sede Central da SRF.
Herbert Freed tinha viajado de Fênix para consultar o Mestre a respeito de assuntos do
ministério e esteve no carro aquele dia em Pacific Palisades. Mais tarde, Herbert me contou que o
Mestre tinha ficado entusiasmado por um novo projeto.
– Vejam só! – ele disse. – Tenho a oportunidade de iniciar uma nova obra no centro-oeste,
muito parecida com esta, que não irá interferir com nossas atividades aqui. – O Mestre não entrou
em detalhes na ocasião, mas podia estar se referindo ao projeto que já tinha discutido com Oliver
Black, sobre a fundação de um centro de ioga para retiros e uma comunidade espiritual no norte
de Michigan.
No dia 7 de março, o Mestre permaneceu nos seus aposentos em silêncio meditativo até sair,
no final da tarde, para o Hotel Biltmore no centro de Los Angeles, onde um quarto havia sido
reservado para ele. Enquanto se preparava para sair da Sede Central da SRF, ele comentou com
alguns discípulos:
– Imaginem! Tenho um quarto no Biltmore! Estou voltando para onde tudo começou. – Ele
estava se referindo a quando permaneceu lá por várias semanas, em 1925, quando deu palestras
naquela noite, o telefone estava tocando. Quando ele atendeu, Paramahansaji disse: “Viu, Oliver, eu disse que
estaria com você!”
3
A cripta de Paramahansa Yogananda na Sala do Sono Dourado, na sessão Holly Terrace do Grande Mausoléu,
no cemitério Forest Lawn em Glendale, Califórnia, é um local de peregrinação freqüentemente visitado por muitos
praticantes da Kriya Yoga.
44
para milhares de pessoas que lotaram o vizinho Philharmonic Auditorium. Três mil pessoas
tinham vindo para ouvi-lo e milhares de outras não puderam entrar por falta de espaço.
Naquela noite, o Mestre compareceu a um banquete patrocinado pela Indian Association of
America, em honra ao Embaixador Sen. Duzentos e quarenta convidados compareceram ao
evento. Para concluir o programa, vários oradores foram apresentados. Quando o Mestre foi
apresentado, antes de se levantar até o microfone, ele disse para a Sra. Sharma, uma das
convidadas que estava sentada a seu lado:
– Lembre-se sempre: a vida tem suas lindas rosas e também seus espinhos… e precisamos
aceitar os dois.
Durante sua breve exposição, em que falou com mais lentidão do que costumava fazer, como
se estivesse escolhendo cuidadosamente as palavras, ele discursou sobre seu ideal de cooperação
pacífica entre as nações do mundo, tendo concluído sua fala de dez minutos às 21h30min,
recitando um trecho de um de seus poemas: “Minha Índia”. Quando terminou de pronunciar o
último verso – “Santificado estou: meu corpo tocou esse solo” – ergueu os olhos, virou-se um
pouco para a direita e deslizou até o chão. Faye Wright e vários outros discípulos correram para
ajudá-lo, mas ele já tinha partido.
Herbert me disse o que tinha observado naquela noite:
– Quando o Mestre estava falando, vez ou outra seus olhos eram puxados para o olho
espiritual, sendo que ele precisava usar sua força de vontade para manter a concentração no
discurso.
O Sr. Lynn estava no Eremitério de Encinitas quando o Mestre realizou sua transição em Los
Angeles. Quando fui informado disso, lembrei-me do que o Mestre dissera algumas semanas
antes, durante uma conversa com os discípulos. Ele nos contou que, certa vez, em uma meditação
profunda, ele se expandiu para além do corpo e estava desfrutando dessa liberdade. Um discípulo
que entrou em seu quarto percebeu que ele não estava respirando e rapidamente chamou Sr.
Lynn, que estava no prédio. O Sr. Lynn sentou-se ao lado do Mestre, meditou e mentalmente
pediu para que voltasse à consciência física, o que ele fez. Quando nos contou sobre essa
experiência, o Mestre disse:
– Eu não tinha a intenção de voltar. Na próxima vez que me for, tomarei providências para
que Sr. Lynn não esteja por perto.
Dois meses depois de o Mestre ter deixado o corpo, os diretores da Associação Forest Lawn
enviaram uma carta para a Self-Realization Fellowship na qual o primeiro parágrafo continha a
seguinte informação:
A ausência de quaisquer sinais visíveis de decomposição no cadáver de Paramahansa
Yogananda constitui o mais extraordinário caso de nossa experiência. Se as proteínas
musculares e o fluxo sangüíneo não estivessem comparativamente livres de bactérias, a
deterioração do corpo deveria ter-se iniciado a partir de seis horas após o óbito.
Nenhuma desintegração física era visível no corpo, mesmo vinte dias após a morte.
O corpo do Mestre não tinha sido colocado imediatamente na cripta porque se aguardava que
dois membros da Yogoda Satsanga, o braço indiano da Self-Realization Fellowship, chegassem
na América para vê-lo; o caixão fora fechado com uma tampa de vidro, mas não foi selado
durante aproximadamente três semanas. Como a viagem deles foi adiada, completaram-se os
procedimentos finais e o caixão foi colocado numa cripta já preparada. Flores frescas são
colocadas diariamente na alcova, e o lugar serve de local de peregrinação para devotos visitantes.
45
Nos dois últimos anos de sua vida, o Mestre experimentara alguns episódios de desconforto
físico. Quando foi inaugurado o India House, adjacente à Igreja de Hollywood, fui solicitado a
permanecer na entrada lateral com três de meus irmãos discípulos para que, quando o Mestre
chegasse, pudéssemos ajudá-lo a descer as estreitas escadas até o corredor no andar inferior.
Muito embora parecesse estar cansado e sentir dor para andar, ele estava muito feliz porque um
novo projeto importante havia sido finalizado.
Uma das causas de seu rápido desconforto físico pode ter sido o excesso de trabalho, algo
característico para muitas pessoas que têm um forte senso de missão a ser cumprida, como era o
caso dele. Ele dormia muito pouco, supervisionava detalhes da organização e freqüentemente
passava longas horas escrevendo, ditando cartas e conversando com os discípulos. Ele também se
preocupava com o futuro “do trabalho”, que era como ele se referia à organização. Alguns
discípulos acreditam que ele absorveu o carma físico de outros para aliviar o sofrimento deles. Ele
disse que fez isso para algumas pessoas.
A transferência das causas sutis das doenças físicas de uma pessoa que está sendo ajudada
para a pessoa que está ajudando pode ocorrer quando uma sintonia solidária se forma em níveis
astrais e causais. Esse método de ajudar não se recomenda para uma pessoa comum. Também
precisa ser dito que alguns discípulos de um mestre iluminado não querem acreditar que seu
mestre possua um carma físico, que tenha herdado alguma predisposição genética para a doença
ou que possa sofrer de alguma enfermidade física devido ao estresse ou qualquer outra causa. É
mais conveniente para eles acreditar que seu mestre assumiu o carma dos outros ou de condições
planetárias, e então tentam encorajar os demais a compartilharem dessa opinião.
Aos discípulos que haviam perguntado ao Mestre sobre como manteriam a sintonia com ele
quando não estivesse mais no corpo, ele disse: “Se pensarem que estou próximo, estarei
próximo”. Para mim ele disse:
– Sempre que você iniciar alguém em Kriya Yoga, eu ou um dos gurus estaremos lá.4
A organização possuía discípulos que foram treinados para ensinar e disseminar seus escritos.
Ele também tinha autorizado alguns discípulos ordenados a iniciar seus estudantes sem precisar de
autorização dos Diretores da SRF. Ele sabia que a transmissão e autorização dos ensinamentos da
Kriya Yoga através da linhagem de gurus continuaria por seus discípulos espiritualmente
adiantados e os sucessores deles.
A Self-Realization Fellowship anunciou posteriormente a seus membros que Paramahansa
Yogananda foi o último na linhagem de gurus da SRF. Essa afirmação é erroneamente
interpretada por muitos como sendo de que ele foi o último guru na linhagem, ou seja, que ele
não teve sucessores.5 Também foi proclamado que aqueles que forem iniciados no futuro por um
ministro da organização deveriam aceitar Paramahansa Yogananda como seu guru. Milhares de
pessoas que foram iniciadas desde 1952, às quais foi dito que o aceitassem como seu guru, não
têm um mestre que esteja acessível para dar instrução e aconselhamento. Elas podem ser
4
Ao me dizer: “Sempre que você iniciar alguém em Kriya Yoga, eu ou algum dos gurus estaremos lá”, meu guru
quis dizer que a consciência e a força espiritual de um ou mais da linhagem de gurus estariam presentes, e não que
eles estariam literalmente sempre lá. Quando, no final de 1951, Paramahansa Yogananda me disse para iniciar
outros nas práticas da Kriya Yoga compreendi que estava se referindo ao futuro, quando eu estivesse preparado
para tal. Ele me deu a permissão para iniciar quando me ordenou porque sabia que deixaria o corpo em 1952. Meu
papel é o de servir a Deus. Vim para fazer este trabalho, o Mestre confirmou isto, e eu o faço. Quando dou
iniciação, estou plenamente consciente de que sou um representante de meu guru e de Sri Yukteswar, Lahiri
Mahasaya e Babaji.
5
Pelo fato de os poucos discípulos diretos ainda vivos de Paramahansaji, que servem como ministros ou
conselheiros, ou conduzem iniciação, se considerarem apenas seus representantes, ao invés de instrutores, sou seu
único sucessor ainda vivo.
46
inspiradas pelos escritos do Mestre, sentir-se enlevadas quando pensam nele ou imaginar que
estão em sintonia com ele, mas não podem ser instruídas ou guiadas pessoalmente por ele.
Em 1950, em uma de suas últimas reuniões com a Mesa Diretora da Self-Realization
Fellowship, o Mestre disse que, através dos anos, ele sempre tinha generosamente oferecido
iniciação para estudantes que freqüentaram suas aulas e se inscreveram para receber as lições
impressas. Explicou que muitos deles não mantiveram sua associação com ele ou com a
organização após terem sido iniciados, porque pensaram que já tinham recebido tudo o que era
oferecido. Então recomendou que, no futuro, cada pessoa que solicitasse a iniciação deveria ser
conscientizada do valor da manutenção de sua filiação, para que, no momento em que mais
precisasse, pudessem ter apoio e encorajamento no seu caminho espiritual. Ele disse:
– Até agora tenho sido muito liberal ao dar iniciação. Muitas pessoas que vêm a nós pensam
que, após um ou dois anos de estudo e terem sido iniciadas, já aprenderam tudo o que temos a
oferecer. Então, vão embora para estudar outros sistemas, ou perdem interesse na prática. Ao
fazerem isso, ficam sem o benefício do nosso apoio quando mais necessitam dele, e nós ficamos
sem o benefício de sua companhia e do seu apoio ao trabalho. Não é justo para elas, e não é justo
para nós. De agora em diante, precisamos enfatizar o valor supremo da iniciação e a importância
do estudo e da participação continuados.
Em 1951, seis meses antes de abandonar o corpo, o Mestre anunciou que Sr. Lynn seria o
próximo diretor espiritual e presidente da Self-Realization Fellowship. Na ocasião, após um
serviço de iniciação em Kriya Yoga do qual centenas de devotos participaram, nosso guru
conferiu a Sr. Lynn o título monástico de Rajasi Janakananda. O título era bastante adequado,
pois Sr. Lynn era ao mesmo tempo um êxito material e espiritual. Rajasi refere-se ao “poder
cósmico”; sua escolha dessa palavra teve a intenção de significar “rishi (vidente) régio” ou “rei
dos santos”. O nome Janakananda, “bem-aventurança (ananda) idêntica a de Janaka”, foi
escolhido para comparar o estado de realização divina de Sr. Lynn com a de Janaka, um grande
rei da Índia antiga que era também um homem de Auto-realização. Vários anos mais tarde, alguns
discípulos discutiram a escolha da palavra pelo Mestre e decidiram que deveria ter sido Rajarsi.
No meu Certificado de Instrutor da SRF, datado de 9 de março de 1952, Sr. Lynn assinou seu
nome como Rajasi Janakananda.
Pouco tempo depois do mahasamadhi do Mestre, Sr. Lynn, durante uma reunião com seus
irmãos e irmãs de discipulado, garantiu que não pediria que fossem feitas quaisquer mudanças
drásticas nos rumos da organização, e disse: “O Mestre será sempre nosso guru. Jamais haverá
outro guru para a Self-Realization Fellowship”. Ficou presumido, portanto, que os escritos e as
gravações do Mestre satisfariam as necessidades dos futuros estudantes e que todos os atuais e
futuros ministros da organização iriam apenas representá-lo, ao invés de serem eles mesmos
mestres na linhagem de gurus.
Em conversas informais, o Mestre tinha dito que alguns dos seus discípulos (ele citou Oliver
Black, Irmã Gyanamata e um ou dois outros) tinham eles mesmos seus próprios discípulos.
Embora desejasse que a organização que fundara promovesse seus ensinamentos no futuro,
também sabia que a força espiritual que flui através da linhagem de gurus continuaria a ser
transmitida por alguns de seus discípulos-sucessores.
No dia seguinte ao serviço memorial do Mestre, Faye Wright me informou que ele havia
indicado anteriormente para ela que eu seria o ministro em Fênix. Herbert foi transferido para a
Califórnia.
Em Fênix, eu conduzia os serviços de domingo de manhã e de quinta-feira à noite, tendo
ainda continuado com minha rotina diária de meditação logo cedo pela manhã e no meio da noite.
Ocasionalmente, eu dava aconselhamento a alguns membros. O Mestre sempre dedicara ao centro
47
de Fênix uma consideração especial. Consagrando-o em 1948, ele nutriu seu progresso com
amorosa atenção.
Durante o verão de 1953, comecei a considerar a idéia de abandonar a vida monástica.
Embora minha devoção a Deus fosse constante e o meu respeito pela organização do Mestre não
houvesse diminuído, eu sentia a necessidade de experimentar o mundo secular. Após muita
introspecção, marquei um encontro com Faye Wright para discutirmos o assunto. Ela me contou,
em confidência, sobre algumas decisões que havia encarado durante os anos, e me ofereceu sábios
conselhos.
Falamos sobre a possibilidade da minha mudança para outra cidade em que, após me adaptar
e conseguir uma fonte de renda, eu poderia formar um grupo de meditação filiado da SRF e
continuar a compartilhar os ensinamentos. Contudo, até que tivesse certeza de ter tomado a
decisão certa, eu permaneceria no Centro de Fênix.
Alguns meses mais tarde, com alguma trepidação, mas com as palavras do Mestre – “Roy,
você tem um futuro maravilhoso” – ecoando em minha mente e meu coração, e estando receptivo
a todos os bons augúrios que a graça de Deus poderia proporcionar, escolhi uma nova trajetória
para minha vida.
Quando telefonei para Faye Wright, em Los Angeles, e a Sr. Lynn, em Kansas City, e lhes
contei sobre a decisão que havia tomado, eles foram solidários. O Sr. Lynn chegou a dizer, com
tristeza:
– Gostaria que tivesse conversado comigo sobre isto.
As palavras de um dos escritos em prosa de Rabindranath Tagore descrevem perfeitamente o
estado de espírito que dominou meus pensamentos por vários meses após a minha decisão de
deixar a vida monástica:
O que me oprime é minha alma tentando sair para espaços abertos, ou a alma do mundo batendo
à minha porta para entrar.
Sem saber direito o que fazer, alistei-me no Exército e servi por dois anos no ambulatório
militar. Em 1955, em Fort Riley, Kansas, com alguns meses ainda de serviço militar pela frente,
fiz aquilo que julguei ser o mais prático. Matriculei-me em uma faculdade de quiropraxia, tive um
bem-sucedido exercício profissional em Denver, Colorado, que beneficiou muitas pessoas, formei
um centro de meditação e continuei a ensinar sob a filiação da Self-Realization Fellowship. Eu
logo descobriria, porém, que os planos particulares de uma pessoa nem sempre estão de acordo
com a tendência dos acontecimentos futuros.
No final de fevereiro daquele ano, um jovem rapaz com o qual trabalhei no hospital de Fort
Riley e tinha ensinado práticas de meditação, entregou-me uma edição matinal de um jornal de
Kansas City, que apresentava uma reportagem de primeira página anunciando a morte de James
Lynn. Essa alma tão santa e bela deixara o mundo material em 20 de fevereiro de 1955, em sua
casa de Borrego Springs. Uma década antes, em uma reunião de devotos, ele lhes dissera:
Se estamos em paz dentro de nós mesmos, podemos cumprir nossos deveres harmoniosamente,
mesmo na esfera dos negócios. Podemos realizar coisas admiráveis neste mundo, sem
necessariamente entrar em choque com os outros. Depois de nosso dia de trabalho, podemos nos
retirar para o íntimo e estar com Deus. Com o tempo, mesmo no mundo dos negócios, podemos
realizar todos os nossos deveres com plena consciência da presença de Deus. Se estamos
tranqüilos e em paz, venha o que vier – êxito ou aparente fracasso – permaneceremos equânimes,
na certeza de que a vontade Dele está sendo feita. Ainda se pudéssemos ganhar o mundo inteiro,
não encontraríamos a felicidade. Bens terrenos não nos podem dar paz e alegria. Deus pode.
48
Surpreendido com a notícia, eu não sabia então como sua ausência poderia influenciar o
leque de minhas opções futuras para o ministério. Ler a notícia da transição de meu irmão
discípulo refrescou minhas lembranças de associações ocasionais com ele e focalizou minha
atenção em minhas próprias prioridades: qual o curso de ação tomar, quando meus deveres
militares terminassem daqui a alguns meses.
Antes de meu retorno à vida de civil, enderecei uma carta para Faye Wright, que havia
acabado de ser eleita como presidente da SRF, na qual descrevi meu plano de ir para Denver e
minha prontidão para estabelecer um centro de meditação.
Várias semanas depois, sua resposta formal me informou que a Mesa Diretora tinha decidido
que eu não receberia a permissão que almejava. Não havia explicações para a decisão.
Por quase dois anos, eu havia formulado planos baseados na crença de que poderia ensinar
sob os auspícios da organização. Agora, na ausência de Sr. Lynn e tendo os membros da Mesa –
alguns dos quais não me conheciam pessoalmente – decidido o contrário, novos planos teriam de
ser feitos e logo implementados.
Minha primeira reação trouxe à tona uma leve sensação de desapontamento e de ter sido
rejeitado. A despeito das opiniões pessoais que algumas pessoas que compõem uma mesa diretora
pudessem ter, eu era ainda discípulo do Mestre e tinha sido autorizado por ele para ensinar.
Alguns dias mais tarde, após ter analisado objetivamente a decisão deles, percebi que ela era a
correta, tanto para eles quanto para mim.
O Mestre tinha provido a Mesa Diretora com orientações concernentes à publicação e
distribuição de seus escritos, a fundação de novos templos e o treinamento de monásticos,
ministros e instrutores. Ele tinha dito para que fizessem propaganda regularmente da
Autobiografia de um Iogue em revistas com grande tiragem e expandisse a influência da
organização no mundo. Era o dever deles seguir suas instruções da melhor forma que
conseguissem, o que têm feito até hoje. A morte de Sr. Lynn ocorreu três anos depois de o
Mestre ter abandonado o corpo, e a Mesa Diretora precisou tomar decisões que teriam um longo
alcance. Quanto a mim, ao deixar a ordem, eu não renunciei a quaisquer votos, porque nunca
havia feito nenhum. Minha relação pessoal com meu guru, ao invés de qualquer acordo formal
com a organização, era, e ainda é, meu vínculo com ele e com a linhagem de gurus desta tradição.
Mas eu tinha que atingir a maturidade espiritual e emocional necessária para ser livre e realizar o
trabalho que precisava fazer.
Em Denver, aluguei um auditório, apresentei uma série de palestras públicas, ministrei aulas
de meditação duas vezes por semana durante um ano, iniciei várias pessoas e comecei a publicar
um boletim informativo e uma revista trimestral. Também projetei e anunciei um plano detalhado
para erguer o centro de retiro Santuário de Todos os Credos, próximo a Denver, no qual haveria
um templo de meditação, aulas, chalés para convidados, uma biblioteca, um spa para cuidar da
saúde e um departamento editorial. De maneira ingênua, eu tinha acreditado que bastava o
projeto ser alardeado, as doações generosas e entusiasmadas choveriam imediatamente. Muitas
pessoas disseram que era uma boa idéia; ninguém se ofereceu para participar. Na época, eu não
tinha ainda noção de que meu projeto era prematuro ou que, dezesseis anos depois, situações
imprevistas ocorreriam para tornar possível sua realização, não no Colorado, mas no nordeste da
Geórgia, no sopé das Montanhas Apalache.
Permaneci em Denver por um ano, ensinando regularmente a pequenas classes e escrevendo
e publicando algumas brochuras. A palavra impressa, sempre útil para mim, parecia um serviço
ministerial natural para alcançar os outros.
Uma senhora que assistira a minhas aulas providenciou um encontro entre mim e Joel S.
Goldsmith, quando ele visitava a cidade em viagem de conferências. Antigo vendedor e, mais
49
tarde, proeminente praticante da Christian Science antes de se tornar um instrutor independente,
Joel era um dedicado professor e buscador da verdade. Encontramo-nos em sua suíte no Brown
Palace Hotel, no centro de Denver.
– Conheci seu guru – ele me disse. – Éramos amigos espirituais. – Ele confidenciou que
Paramahansaji o havia iniciado nas práticas de meditação da Kriya Yoga e lhe fizera um convite
aberto para permanecer no retiro de Encinitas sempre que quisesse meditar lá.6 Anos mais tarde,
soube que Joel e sua esposa hospedaram Paramahansaji em sua casa, perto de Boston, durante as
visitas do Mestre no final da década de 1920.
Joel me convidou para meditar com ele por alguns minutos, após os quais exclamou:
– Ora, Roy, seu mestre está bem aqui, junto de você! Pode estender a mão e tocá-lo a
qualquer hora!
Sabendo que a consciência espiritual despertada de Joel o havia capacitado também a
alcançar o êxito profissional, perguntei-lhe como proceder com meus esforços no ministério;
especialmente sobre como conseguir fundos para tornar possíveis os vários projetos que tinha em
mente. Ele deu uma risadinha e disse:
– Ora, Roy, está tudo a seu redor. Tudo o que tem a fazer é estender a mão e pegar!
Mantivemos nossa amizade espiritual por meio de trocas de cartas e encontros eventuais em
várias cidades, quando nossos respectivos programas de viagem coincidiam. Ele fez sua transição
em 1964, enquanto fazia uma viagem de ensino por Londres, na Inglaterra.
Pregar a um pequeno grupo de buscadores sinceros da verdade em Denver era
recompensador, mas ao mesmo tempo restritivo. Minha missão espiritual, eu sabia, era assistir
espiritualmente devotos de Deus em todo o mundo – mas como proceder e o que iria se
desenvolver não estavam completamente claros em minha mente. Orei sobre o assunto e fiquei
aberto à orientação.
O líder de um centro metafísico em Seattle, Washington, leu um de meus livretes e me
convidou para falar lá, o que fiz por várias semanas. Através dele e de outros, vim a saber de
outros grupos na costa oeste e ofereci meus serviços, viajando e falando por todo o Oregon e o
sul da Califórnia.
Enquanto estava em Los Angeles, conheci vários instrutores espirituais: Ernest Holmes, do
Science of Mind Institute; Neville Goddard, que estava palestrando no distrito de Wilshire
Boulevard; Manly Palmer Hall, de vasto conhecimento filosófico; Ernest Wilson, da Igreja
Unitária; e Walter C. Lanyon, escritor e conferencista independente. Todos eles conheceram o
Mestre e alguns tinham lembranças de seus encontros pessoais, as quais prontamente
compartilhavam.
No final da primavera de 1958, aceitei um convite para falar em Miami, Flórida. Ali palestrei
quatro noites por semana e duas vezes cada domingo, durante seis semanas, e fui entrevistado por
jornalistas e repórteres de programas de rádio, inclusive Larry King, que na época iniciava sua
carreira profissional. Antes de deixar Los Angeles, Walter Lanyon, com quem eu discutira meus
planos, disse-me:
– Vá! O Espírito de Deus irá adiante de você e tudo se desenvolverá em uma ordem divina.
Sabendo que o ministério ao qual fui chamado iria com o tempo atingir âmbito mundial,
decidi viajar e ensinar por várias cidades nos Estados Unidos.
6
Paramahansaji às vezes iniciava instrutores espirituais que não eram seus discípulos e mantinha uma amizade
íntima com eles através dos anos.
50
CAPÍTULO CINCO
Graça Duradoura
Do final de 1957 até o início da década de 70, dei palestras1 e apresentei seminários de
meditação em mais de cinqüenta cidades na América do Norte, iniciei centenas de buscadores da
verdade, falei em conferências de ioga, fui entrevistado por rádios e televisões regionais e
nacionais, e escrevi vários livros.
Inspirado e muito motivado, logo aprendi que os eventos ou circunstâncias que idealizei e
acreditei ser possíveis acabavam por se realizar quase que sem esforço. Fui, portanto, capaz de
experimentar aquilo que as pessoas espiritualmente iluminadas têm ensinado ao longo das eras:
existe uma Força controladora inteligente e animadora que sustenta o universo e com a qual
podemos aprender a cooperar com suas inclinações para termos um efetivo amparo. Quando
assim procedemos, tornamo-nos cada vez mais conscientes daquela Realidade invisível que supre
cada necessidade nossa quando aprendemos a confiar Nela.
Freqüentemente ouvi o Mestre dizer: “Deus lhes dará tudo quando vocês se prepararem para
receber.”
Em 1971, a cadeia de eventos imprevistos que culminariam na criação de um centro de
retiros começou a se desenrolar. Após uma de minhas palestras em Atlanta, Edwin e Lois O’Neal
convidaram-me para um jantar mais tarde naquela noite. Eles contaram sobre o trabalho que
estavam realizando no nordeste da Geórgia, onde haviam adquirido dez acres de área florestal em
Lakemont, próximo do Lago Rabun, para a formação de uma comunidade espiritual. Para
financiar o projeto, eles tinham criado um comércio de rotativas gráficas que logo se desenvolveu
até o surgimento de uma companhia editora de livros. Quando pediram minha permissão para
publicar e distribuir meus livros, concordei com a proposta. Em 1972, eles me convidaram para
ser um membro permanente de sua Mesa Diretora e ser o responsável pelas atividades de
ministério segundo meus próprios termos.
Mudei-me para Lakemont em 1973, organizei os procedimentos de escritório para coordenar
as atividades do Center for Spiritual Awareness,2 tracei os planos para o desenvolvimento de
nosso centro de retiros e continuei a viajar e dar palestras durante vários meses no ano. Após uma
breve doença, Lois morreu em 1976. Dois anos mais tarde, Edwin se aposentou e eu fui indicado
como presidente de nossa corporação sem fins lucrativos. Em razão de o negócio da editora não
ter sido rentável, fechei suas portas para dedicar minha atenção inteiramente às atividades do
ministério.
O desenvolvimento das instalações do retiro avançou de maneira uniforme. Uma sala de
meditação, inaugurada em 1977; seis chalés para hóspedes; o prédio da biblioteca; o Templo de
Meditação Santuário de Todos os Credos e uma livraria foram construídos nos decurso dos dez
1
Em 1964 e 1978 palestrei em diversas cidades no Japão para o Seicho-No-Ie, um movimento da verdade com dois
milhões de membros, fundado em 1931 por Dr. Masaharu Taniguchi. Durante as três últimas décadas, tenho
palestrado com freqüência, apresentado seminários de meditação e conduzido serviços de iniciação em Kriya Yoga
por toda a América do Norte e na Alemanha, Suíça, Itália, Inglaterra, África, Brasil e Índia.
2
O nome da corporação sem fins lucrativos que foi formada por Sr. e Sra. O’Neal em 1964 era Christian Spiritual
Alliance, escolhido porque era inofensivo, e o acrônimo CSA poderia ser utilizado para designar a corporação e
também a Cool Spring Acres – o nome pelo qual o local do retiro era anteriormente conhecido. Denominei o
departamento de exterior do ministério de Center for Spiritual Awareness, para distinguir mais adequadamente
nossos ideais e propósitos. CSA Press é nosso departamento editorial e de publicação de livros.
51
anos seguintes. Os projetos de construção e os serviços do ministério são primordialmente
mantidos pelas doações de nossos membros, que moram em vários países e aos quais são
enviadas mensalmente pelo correio as lições impressas.
Retiros de finais de semana ou de uma semana inteira são marcados aqui, desde o início da
primavera até o final do outono. No início da primavera, geralmente visito algumas cidades na
América do Norte e, às vezes, na Europa, na Índia e na África, para apresentar seminários e
iniciar pessoas preparadas nas práticas de meditação da Kriya Yoga.
A missão e o propósito do Center for Spiritual Awareness é utilizar todos os meios
disponíveis para fornecer informações úteis a buscadores da verdade sinceros de todo o mundo,
bem como encorajá-los a vivenciar seu bem maior em todos os aspectos de suas vidas, enquanto
vão progressivamente despertando na realização divina.
A natureza humana é a mesma em todas as partes do mundo. Cada pessoa, consciente ou
inconscientemente, anseia conhecer sua verdadeira natureza e seu relacionamento com o Infinito.
Em momentos de solidão sem distúrbios, quando os acontecimentos externos são ignorados e não
mais impressionam nossos sentidos, podemos saber intuitivamente que nossa jornada neste mundo
nada mais é do que um breve interlúdio no espaço-tempo, e que nossa necessidade inata de ter
nossa consciência restaurada em sua totalidade pura e original não pode continuar a ser
negligenciada ou ignorada.
A Auto-realização pode ser definitivamente atingida por cada pessoa razoavelmente
inteligente que escolha viver uma vida bem ordenada e que incentive seu crescimento espiritual. O
seu despertar irá progredir então dos estados ordinários egocêntricos de consciência até a
superconsciência, consciência cósmica, Auto-realização e Realização Divina. A culminação do
esforço correto é a completa e permanente libertação da consciência.
Os benefícios colaterais da prática espiritual – melhora na condição de saúde, paz mental,
relacionamentos harmoniosos, circunstâncias confortáveis e a habilidade de viver mais
eficazmente – podem ser apreciados. Deve-se lembrar, entretanto, que o objetivo final da prática
espiritual é ser Auto-realizado.
O caminho espiritual é o caminho da solidão em Deus. Relacionamentos externos, íntegros e
incentivadores podem ser mantidos e objetivos relevantes podem ser atingidos enquanto o
indivíduo permanecer ancorado no autoconhecimento e na consciência divina. Embora possa ter
algum valor o reconhecimento do estado espiritual de outros que já são Auto-realizados e
também se associar com eles quando possível, cada indivíduo deve despertar sua própria
compreensão acerca de sua verdadeira natureza e de seu relacionamento com Deus.
No primeiro capítulo, descrevi minha experiência de uma enfermidade prolongada quando
tinha 18 anos e de ter feito, após ler a Autobiografia de um Iogue, a promessa de viver uma vida
de serviço espiritual. Naquele tempo – eu já sabia, e Paramahansaji me confirmou durante uma
conversa particular alguns meses depois de me aceitar como discípulo – eu havia começado uma
nova vida; minha vida até então fora de algum modo determinada pelo carma (causas passadas).
A partir de então e até agora, minha vida é vivida sem qualquer compulsão cármica; somente
minhas percepções das possibilidades, disposição para servir, ações do momento e a graça de
Deus. Meu guru sempre me aconselhou a não me contentar com estados superconscientes
parciais e temporários, mas a aspirar ao completo despertar na Auto-realização e na Realização
Divina nesta encarnação.
Meu papel é dar apoio e encorajamento mental e espiritual aos discípulos desta tradição para
que desenvolvam suas capacidades inatas e experimentem seu mais alto bem. Porque não tenho
poderes especiais, não posso fazer com que as coisas aconteçam. Sou um representante desta
tradição de Kriya Yoga, ordenado por meu guru em 1951. Estou disponível para aconselhamento,
52
embora não seja necessário um contato pessoal continuado. O que é mais importante é a sintonia
interna da pessoa e sua dedicação ao viver correto e às práticas espirituais.
Ao longo dos anos venho tendo a experiência de que, muito embora eu tenha procurado
utilizar com sabedoria o conhecimento e as capacidades que adquiri, a maioria dos eventos
benéficos que aconteceram na minha vida só foram possíveis pela graça de Deus – a qual
reconheço e por ela sou grato.
53
CAPÍTULO SEIS
Perguntas e Respostas
O que Paramahansa Yogananda fazia como diversão e lazer?
Ele parecia estar mais feliz quando estava na companhia de sinceros buscadores da verdade
ou quando estava criativamente engajado em projetos importantes. Em grandes ocasiões públicas,
ele dizia: “Prefiro uma alma que ama Deus a uma multidão; porém, adoro estar com multidões de
almas que amam Deus”.
Durante seus primeiros anos, ele jogava tênis e tênis de mesa, caminhava, fazia excursões e
adorava nadar, velejar, espaços abertos, oceanos, lagos, florestas e montanhas. Ele gostava que os
centros da SRF estivessem em terrenos aprazíveis e que tivessem uma variedade de flores,
arbustos e árvores. Suas habilidades culinárias eram muito desenvolvidas e bastante inovadoras.
Se ele descobrisse uma nova receita que o intrigasse, fazia experimentos com ela até que os
resultados o satisfizessem e agradasse o paladar de seus convidados. Ele não ia muito ao cinema.
No início de 1950, quando Uday Shankar estava no sul da Califórnia com sua trupe de dança
indiana clássica, o Mestre foi anfitrião de um almoço para eles no Eremitério de Encinitas e foi
assistir a sua performance noturna em Los Angeles, a qual posteriormente afirmou ter sido
impecável. Para descanso e revigoramento, ela geralmente passava alguns dias no centro da SRF
situado de frente ao oceano em Encinitas ou no seu retiro no deserto em Twenty-Nine Palms,
para poder ficar sozinho e dedicar mais tempo à meditação prolongada.
Paramahansa Yogananda podia sentir tristeza, raiva ou hostilidade?
Ele ficava temporariamente triste quando alguém íntimo dele morria, quando os outros
sofriam ou quando algum discípulo que poderia ter alcançado a Auto-realização se afastava do
caminho espiritual. Ele nunca sentia raiva. Sua compaixão pelos demais era ilimitada.
Alguma vez seu guru fez alguma previsão catastrófica?
Ele disse que haveria conflitos regionais e globais, dificuldades econômicas e que alguns
desastres naturais iriam acontecer. Conhecedor das tendências da evolução e das mudanças
transformadoras ocorrendo na consciência coletiva do planeta, ele era otimista ao promover
ativamente sua visão de paz e harmonia para todas as pessoas do mundo sem a existência de
guerras, pobreza, ou sectarismo religioso fundamentalista.
Algumas seitas cristãs (Adventistas do Sétimo Dia, Testemunhas de Jeová e outros grupos
fundamentalistas e da new age) ainda se agarram à idéia de um iminente acontecimento
catastrófico que dará fim à era atual de decadência materialista, a qual será seguida por uma era
de luz e graça. A mentalidade apocalíptica é típica de indivíduos e grupos incapazes de avaliar
racionalmente os cursos da história e podem estar frustrados e oprimidos por causa dos
acontecimentos e circunstâncias que predominam hoje em dia. Esperam, portanto, um
acontecimento que purificará a consciência humana para prepará-la para uma condição mundial
nova e melhor. Desde que suas idéias e expectativas (falsas) brotam de suas atitudes derrotistas,
sua percepção mental das futuras condições do planeta são um tanto mórbidas. É verdade que
esperam um mundo melhor, mas prevêem destruição em massa, sofrimento coletivo e punição
para aqueles que eles acham serem a causa de sua infelicidade. Os mestres iluminados ensinam
que os indivíduos devem ser responsáveis por seu próprio bem-estar e crescimento espiritual aqui
e agora, ao invés de basearem suas aspirações em ilusões de possibilidades futuras.
54
Segundo a teoria dos ciclos cósmicos do tempo, proposta por Sri Yukteswar em seu livro
The Holy Science (“A Ciência Sagrada”), já estamos agora (em 2005) a 305 anos de distância da
última Idade Obscura e avançando rapidamente em um ciclo ascendente que nos está afastando
dos valores materialistas, devido ao crescimento mental e espiritual acelerado da família humana
global. Posso recomendar três coisas: 1) recorra ao livro acima mencionado para adquirir a
compreensão dos cursos da evolução; 2) evite discussões inúteis com pessoas que estejam
firmemente convencidas de idéias apocalípticas (ou intrigadas com essas idéias); 3) dedique total
atenção ao viver correto e devote-se às práticas espirituais a fim de facilitar seu despertar para a
plenitude da vida.
Em seus escritos, Paramahansa Yogananda algumas vezes se referia a Deus como Pai Celestial,
Mãe Divina, Ele, Ela, e de outras formas que denotam um conceito pessoal de Deus. Contudo,
em outras ocasiões, sua ênfase era mais absoluta. Por que ele fazia isso?
Como ele falava ou escrevia sobre Deus era determinado por sua inclinação particular
naquele momento, mais devocional ou mais elevada, e pelo estado de consciência e a capacidade
daqueles para os quais estava falando ou escrevendo. Desejoso que era por comunicar sua
mensagem para todos, ele escolhia palavras que satisfizessem uma ampla gama de necessidades.
No tocante a sua missão, ele enfatizava aquilo que chamava de trabalho quantitativo e trabalho
qualitativo. Trabalho quantitativo tinha o propósito de ensinar para o máximo de pessoas dos
mais variados estilos de vida as diretrizes básicas e as práticas espirituais que seriam de ajuda para
elas. O trabalho qualitativo poderia ser realizado com discípulos que possuíam capacidade
intelectual para compreender o verdadeiro valor daquilo que ele ensinava e que iriam
diligentemente aplicar esse conhecimento em suas vidas. Para mim, ele enfatizava o ideal da se
realizar o aspecto sem forma e impessoal de Deus.
O trabalho quantitativo de Paramahansaji atraiu críticas de alguns instrutores de ioga na Índia
que expressaram a opinião de que ele tinha diluído os ensinamentos para torná-los mais aceitáveis
ao povo do Ocidente. Ele ensinou as práticas da ioga de uma maneira que as pessoas podiam
compreendê-las. Alguns de seus críticos também disseram (e ainda dizem) que ele ensinou as
técnicas de meditação de Kriya de uma forma simplificada para ficar mais fácil de seus estudantes
ocidentes praticá-las. Poucos anos atrás, eu estava conversando com um swami da Índia que disse
isso. Quando o informei que Paramahansaji havia ensinado todas as intricadas práticas de
meditação, ele disse: “Oh, eu não sabia disso”. O swami tinha dado ouvidos a fofocas; ele não
havia falado com ninguém que tinha um conhecimento pessoal do que meu guru ensinou.
Por que Paramahansa Yogananda fazia citações da Bíblia, escrevia comentários sobre ela e se
empenhava em comparar favoravelmente algumas doutrinas cristãs com as práticas da ioga?
Quando ele veio para a América em 1920, e ao longo dos anos que se seguiram, de modo a
garantir para as pessoas que freqüentavam suas palestras de que ele não iria pedir que
abandonassem sua herança cristã, ele freqüentemente citava versos da Bíblia que podiam ser
interpretados como sendo compatíveis com as práticas da ioga. Ele também escreveu comentários
sobre o Novo Testamento que foram publicados durante muitos anos na revista Self-Realization.
Seus comentários foram editados e publicados em livro, em 2004.
Quando o ouvi falar em reuniões de grupo, ele algumas vezes citava versos da Bíblia e
afirmava que Jesus havia praticado métodos de meditação iogue na Índia. Nas vezes em que
estávamos sozinhos, ele não falou comigo sobre tais assuntos. Seu esforço para relacionar os
conceitos cristãos com as práticas da Kriya Yoga foi uma forma de atingir um maior número de
pessoas, um aspecto de sua missão quantitativa.
Paramahansaji encorajava para que todas as pessoas tivessem uma abordagem universal da
vida e respeitassem todos os métodos válidos de prática espiritual. O nome que ele escolheu para
55
os templos da SRF em Hollywood e San Diego, no início da década de 1940, foi “Igreja de Todas
as Religiões” da Self-Realization, para que as pessoas soubessem que a verdade subjacente em
todas as tradições religiosas autênticas era reconhecida e honrada naqueles locais. Em seus
primeiros escritos, ele recomendava que as pessoas visitassem ocasionalmente as diversas igrejas
cristãs, sinagogas, mesquitas e templos budistas e hindus, e para que apreciassem a visão religiosa
e as práticas dos outros.
Assim como Lahiri Mahasaya e Sri Yukteswar ensinaram práticas de Kriya Yoga para fiéis de
várias religiões, também meu guru recebia a todos e se relacionava com eles de maneiras que
fossem compatíveis com suas visões religiosas, temperamento psicológico, capacidade de
compreensão daquilo que ensinava e a habilidade de praticar Kriya Yoga.
Em anos recentes tem sido dito que um dos objetivos de Paramahansa Yogananda era o de
restaurar “o cristianismo original de Jesus e a ioga original de Krishna” – um empreendimento
bastante nobre, mas que é impossível de realizar totalmente. Registros históricos sobre a vida de
Jesus e de Krishna são poucos, e a maioria das coisas que foram escritas trata-se de mera
conjectura – deduções baseadas em evidências incompletas ou inconclusivas. O cristianismo se
desenvolveu após a morte de Jesus. O Krishna histórico não foi o instrutor original das práticas da
ioga, pois elas já eram praticadas muito tempo antes dele. O Krishna retratado no Bhagavad Gita
como personificação da Consciência suprema é um personagem criado pelo autor para o
propósito de descrever os princípios e práticas da ioga.
Alguns aspirantes espirituais fundamentalistas que dizem que Deus é uma pessoa e que o
nome Dele é Krishna podem realmente acreditar que isso é verdade; todavia, crença (ou opinião
pessoal) e verdade são coisas diferentes.
Como Paramahansaji se relacionava com pessoas cuja compreensão de assuntos espirituais era
limitada ou que tinham uma tendência para fantasiar ao invés de procurar a verdade?
Com os discípulos que eram muito próximos, ele ia direto ao ponto com seus comentários e
orientações. Com estudantes que ainda não eram capazes de compreender aquilo que ele
ensinava, o Mestre era paciente e compreensivo.
Quando eu estava em Fênix, Herbert Freed e eu fomos convidados por uma participante da
SRF para jantar com ela e seu marido na casa deles, distante alguns quilômetros da cidade.
Quando estávamos lá, ela nos mostrou seu atelier artístico onde pintava paisagens e retratos por
diversão pessoal. Perante um enorme retrato que pintara e que parecia ter a aparência de um
antigo sábio, ela disse: “Esse é o meu mestre. Ele aparece para mim em sonhos e visões, e me dá
instruções”. Eu não perguntei sobre o retrato ou sobre os sonhos e visões dela.
Na viagem de volta para Fênix, Herbert disse que meu silêncio tinha sido apropriado, e
contou a seguinte história: “Quando ela me mostrou aquele retrato no ano passado e me disse a
mesma coisa que disse para você hoje, caí na tentação de contestar sua história. Quando
perguntei ao Mestre sobre isso, ele disse: ‘É a fantasia dela. Não diga isso para ela. Se o fizer,
fará com que se afaste. Com o tempo, ela irá superar isso’.”
Muitas pessoas afirmam que estão em contato com seres iluminados de outros planos porque
1) querem acreditar; 2) impressionam-se com o que outros dizem sobre isso; 3) seus poderes de
discernimento não estão desenvolvidos; 4) são emocionalmente imaturas e dependentes; 5) são
atraídas pela fantasia.
56
Madame Blavatsky, fundadora da Sociedade Teosófica, declarou estar em contato pessoal
com “mestres” do Himalaia (El Morya, Kuthumi, etc.), aos quais descreveu vividamente. Quando,
anos mais tarde, ela negou a existência deles, muita gente preferiu continuar acreditando que eram
reais. Em nossa era moderna, numerosos indivíduos e grupos organizados continuam a promover
a crença nesses e em outros personagens fictícios.
Em anos recentes, médiuns de larga publicidade têm atraído seguidores, afirmando que
representam “entidades espiritualmente adiantadas”: Ramtha, Kryon, Lázaro, Maitreya,
tripulantes de OVNIs, etc. Há uma pessoa que afirma ser médium das “vibrações” emitidas por
golfinhos e baleias. A mulher que, muitos anos atrás, escreveu “Um Curso em Milagres” disse que
o livro lhe foi ditado por Jesus. Livros, nos quais as vidas de Jesus e sua mãe são descritas como
sendo “reveladas” para os autores através de telepatia, visões e outros meios, estão agora
disponíveis para confundir ainda mais as mentes de leitores ingênuos.
Não são apenas “seres” do outro mundo que são supostamente representados por indivíduos
“espiritualmente sensitivos”. Sei de várias pessoas que afirmam se comunicar regularmente com
Babaji, de nossa linhagem de gurus, por meio de telepatia ou visões. Na Índia, muitos anos atrás,
um jovem declarou que era Babaji e atraiu um grupo de seguidores até antes de morrer. Enquanto
estive na Índia, em 2002, conheci duas pessoas confusas que disseram ter encontrado Babaji no
Himalaia. Uma delas me disse que seu desejo “de longa data” para ver Babaji, Jesus e Moisés
juntos foi cumprido enquanto estava lá. Não lhe perguntei por que nutria esse desejo nem lhe pedi
detalhes de sua fantasia. Os estudantes da verdade devem evitar envolvimentos com falsos
ensinamentos e com os que os promovem.
Vez por outra recebo carta de alguém me informando que sente estar em contato telepático
(em sonho ou em visão) com Paramahansaji (ou outros santos), e que foi instruído a fazer certas
coisas ou a ensinar e ajudar os outros, mas não sabe como proceder. Se o contato e a instrução
fossem inegavelmente claros, não haveria dúvida sobre o fato, nem confusão sobre como
proceder. Embora essas pessoas possam estar influenciadas pelos santos, é mais provável que o
anseio de sua própria alma crie a ilusão desse contato com um santo para encaminhá-las a
buscarem conselho e encorajamento de alguém que esteja bem-informado e fisicamente disponível
para comunicação. Freqüentemente, quando sou solicitado a dar conselho ou instrução, se a
minha resposta é muito pragmática, a pessoa me informará depois que “se sentiu guiada” a seguir
sua própria orientação sobre o assunto. Prefere as ilusões aos fatos. Estou encarnado, tenho
conhecimento e experiência desses assuntos, sei discernir a verdade do erro, e posso oferecer
informação precisa e útil – se alguém que precise de esclarecimento estiver disposto a ouvir e
aprender.
Para os que são emocionalmente imaturos, a fantasia é mais atraente do que a realidade. Por
essa razão, vemos tantas pessoas, em nossa época atual, obcecadas por anjos, mediunidade e
outras formas de presumida comunicação sobrenatural. Interesse em tais envolvimentos atrai a
nossa natureza infantil, que não quer enfrentar a necessidade adulta de exercitar a razão e se
dedicar ao comportamento resoluto e responsável.
Em uma ocasião, meu guru disse: “Depois que eu partir, algumas pessoas dirão que estão
recebendo mensagens minhas e dos outros gurus. Não acreditem nelas. As almas iluminadas
nunca falam através de médiuns.”
Onde estiverem nosso interesse e atenção, ali estará a nossa experiência. Nossos sonhos com
os santos são construtivos, como são as visões superconscientes durante a meditação, porque
indicam que estamos abertos a influências elevadoras. Durante a meditação, todavia, é melhor
empenhar-se por transcender os fenômenos mentais a favor de estados expansivos de consciência
e intuições transcendentais. Se ocorrerem visões de santos durante a meditação, elas podem ser
desfrutadas, mas não devem se tornar objeto de apego mental ou emocional. Toda orientação
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verdadeira, venha ela das profundezas de nosso próprio ser, ou seja discernida pela observação
das circunstâncias disponíveis, oferecida por um amigo ou colega, lida num livro ou outra fonte
de publicação, ministrada por um instrutor ou ainda comunicada telepaticamente por alguém que
nos seja conhecido ou desconhecido, provém da Fonte, através daquele instrumento ou canal de
comunicação. O instrumento ou canal não são tão importantes quanto a verdade que nos é
revelada. Precisamos afinal despertar para o estágio em que o conhecimento claro sobre nós
mesmos, juntamente com o conhecimento de Deus e os processos da vida sejam constantes. Não
teremos então qualquer necessidade de ajuda externa. O que é necessário, para todos os devotos
que ainda não estão iluminados, é o compromisso sincero com a Kriya Yoga, como meio de
acelerar o desenvolvimento espiritual e libertar a consciência.
Paramahansa Yogananda era um vegetariano rigoroso?
Ele preferia comidas vegetarianas e aconselhava que as pessoas adotassem uma dieta
vegetariana, a qual dizia ser mais saudável e compatível com os ideais da não-violência. Quando
eu estava com ele, no começo dos anos de 1950, os discípulos tinham permissão de beber leite e
comer ovos, com moderação.
Na década de 20, numa tentativa de encorajar seus estudantes a escolher alimentos
vegetarianos, ele fez experiências com glúten e criou receitas com substitutos da carne. Certa vez,
escutei-o dizer, meio brincando: “Eu consigo fazer uma imitação de fígado com cebolas, ou
frango, que você vai pensar que é de verdade”.
Alguns discípulos me disseram que se ele fosse um convidado de um jantar em uma casa de
uma pessoa que não soubesse que ele preferia comidas vegetarianas, se fosse servido carne, o
Mestre poderia provar e fazer um comentário cortês e adequado, ao invés de criar uma
controvérsia por causa disso.
A constituição físico-mental de Paramahansaji aparentava ser uma combinação dos tipos
kapha e pitha descritos na literatura ayurvédica. A parte superior de seu corpo era robusta; seu
quadril e pernas eram finos. Ele era paciente, poderia suportar longas horas de atividade física e
também se abster de alimentos sem sofrimento, o que são características do tipo kapha. Suas
características pitha eram evidenciadas por seus agudos poderes de percepção e inteligência,
objetividade, persistência, energia e criatividade.
Por vezes, ele teve que prestar atenção na dieta e na rotina de exercícios, para manter o peso
ideal do corpo. Se comesse muito, rapidamente ganhava peso. Na Índia, na década de 1930, seus
amigos insistiam em preparar banquetes em sua honra. Ele ganhou 27 quilos, os quais perdeu
depois que retornou para a América.
Durante uma visita a seu retiro no deserto, eu estava almoçando uma comida leve com três
irmãos discípulos, no pátio próximo à casa do Mestre. O Mestre saiu para conversar conosco. Ao
vir uma costeleta feita de soja em um prato na mesa, ele pegou um pouquinho, provou e cuspiu os
pedaços no chão, próximo do muro. Com um sorriso maroto e uma piscada de olho, ele disse:
“Se elas (suas discípulas secretárias) perguntarem se comi alguma coisa aqui, digam que não.
Vocês viram que eu não comi.”
Explique mais a respeito do conceito de avatar. O que significa ser um avatar? Existem
avatares atualmente em nosso planeta?
A teoria filosófica tradicional chama de avatar uma manifestação irrestrita de Deus em forma
humana, um ser que encarnou sem ter tido uma encarnação prévia para resgatar seu carma ou
despertar para a Realização Divina. Não sei de nenhuma dessas encarnações. Um exame objetivo
das vidas de indivíduos, do passado e do presente, que têm sido considerados avatares revela que
eles experimentaram numerosos desafios pessoais antes de despertarem para a Auto-realização.
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Na Índia, muitos santos que são considerados avatares empenharam-se em práticas espirituais
intensivas antes de despertarem na Realização Divina. Se Deus, em Sua plenitude, realmente Se
encarnasse, o acontecimento seria tão dramático que não haveria dúvida sobre isso.
É comum para os devotos de um santo plenamente iluminado considerarem tal pessoa um
avatar porque: 1) acreditam nisso; 2) querem acreditar; 3) pensam que aquela pessoa tinha (ou
tem) qualidades ou habilidades que são excepcionais, comparadas com as pessoas cuja percepção
e talentos são comuns.
Só precisamos visitar o local onde um presumido avatar reside para ver que as condições não
são sempre harmoniosas e que os devotos que vivem lá nem sempre são mentalmente saudáveis,
racionais ou espiritualmente conscientes. Se Deus estivesse realmente presente em um corpo
dotado de conhecimento e poder irrestritos, tudo e todos que se relacionam com aquela
manifestação de Deus seriam imediatamente transformados, e as pessoas de nossa era atual, em
um número cada vez maior, seriam espiritualmente iluminadas.
Alguns discípulos de Paramahansa Yogananda fincam o pé na crença de que ele era um
avatar e parecem obter um certo conforto nessa crença. O Mestre via a si mesmo e todas as almas
como ondas no oceano da vida infinita, preferindo reconhecer o Todo, do que seus aspectos.
Quando um discípulo lhe perguntou se ele fora, em uma encarnação anterior, determinado santo
amplamente admirado, ele disse: “Que importância tem os nomes que sejam dados às ondas que
sobem e descem na superfície do oceano?”
O título de “avatar” pode também ser usado para indicar respeito especial. Assim,
Paramahansaji referia-se a Babaji como maha (grande) avatar; a Lahiri Mahasaya como
yogavatar (encarnação da ioga); e a Sri Yukteswar como jnanavatar (encarnação do
conhecimento-sabedoria). Muitos membros da Self-Realization Fellowship referem-se a
Paramahansa Yogananda como premavatar (encarnação do amor divino). Paramahansaji disse
que concedera a Lahiri Mahasaya e a Sri Yukteswar aqueles títulos como modo de homenageálos e ao trabalho deles. Eles também, como meu guru, empenharam-se na prática espiritual
durante muitos anos, antes de despertarem (ou redespertarem) para a Auto-realização. Não
sabemos a história pessoal de Babaji. Amiúde, mesmo almas altamente Auto-realizadas
experimentam um temporário obscurecimento de sua percepção quando se encarnam.
Na Índia, também, quando um santo ou mestre espiritual desempenha uma missão especial, é
às vezes chamado de avatar (a encarnação dos atributos e influências) do aspecto de Deus
relacionado com a sua missão. Assim, ele pode ser considerado avatar de Vishnu, se a ênfase for
na preservação dos valores sociais e tradicionais (e/ou no bem-estar do planeta), ou avatar de
Shiva, se o trabalho envolve a transformação das tradições e dos valores sociais, para permitir a
emergência de novos valores, necessários e mais significativos. Exemplos: Krishna é considerado
pelos devotos um avatar de Vishnu; Mahavatar Babaji é um avatar de Shiva. Shiva é a divindade
patrona dos iogues, porque a prática da ioga resulta em transformação e regeneração. (Vishnu e
Shiva não são entidades distintas, mas aspectos e funções do mesmo Deus único.)
Não há dúvida, porém, de que os gurus da linhagem devem ser objetos de respeito reverente
por parte do discípulo: todos eles, com um respeito especial ao guru que estabeleceu o contato. O
verdadeiro Guru é Deus; os gurus (instrutores) encarnados são Seus representantes.
Quantas iniciações são dadas nesta tradição da Kriya Yoga?
A primeira iniciação, em que o pranayama de Kriya é ensinado e o iniciado faz o firme
compromisso do discipulado, é a mais importante. Depois de adquirir proficiência na prática da
meditação, técnicas de meditação complementares poderão ser ensinadas, com ou sem uma
cerimônia formal de iniciação.
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Lahiri Mahasaya ensinava a seus discípulos técnicas de meditação de Kriya por etapas, dando
mais instruções à medida em que a capacidade do discípulo para praticar aumentava.
Paramahansaji também fez assim. Alguns gurus da Kriya Yoga dão quatro iniciações, outros dão
mais, segundo o modo que cada um escolheu ensinar. Não há regra estrita nesse assunto; um guru
competente ensinará de acordo com a capacidade que o discípulo tem de aprender e praticar.
Ao novo iniciado é dito para não contar aos outros o que lhe foi ensinado durante a iniciação,
porque cabe a eles aprender e praticar; falar sobre isso desvia a atenção da prática e enfraquece o
vínculo psíquico entre eles e o guru. O que é aprendido deve ser internalizado.
Os métodos de meditação que são ensinados pelos gurus nesta tradição da Kriya Yoga não
são secretos; foram descritos em várias obras já publicadas e são ensinados porque são eficazes,
quando usados de maneira correta.
Alguns praticantes de Kriya Yoga que ainda não usaram diligentemente as técnicas de
meditação básicas, ou cujas vidas ainda não são bem organizadas, pensam erroneamente que, se
pudessem aprender métodos adiantados, seu progresso espiritual seria mais satisfatório. Ao invés
de usarem efetivamente o que já sabem, vão de um instrutor a outro, falam excessivamente com
seus amigos sobre as práticas de meditação, lêem uma variedade de livros, ou pesquisam páginas
da internet, no esforço de adquirir a informação que desejam obter. Tornam-se confusos e
negligenciam sua prática espiritual.
Paramahansaji disse que o samadhi pode ser experimentado usando-se apenas o pranayama
de Kriya, ou mesmo a técnica de meditação com mantra – se a pessoa persistir até a mente se
tornar tranqüila e a percepção, clara. Em uma conversa particular com alguns discípulos, ele
aconselhou um deles, cuja concentração se distraía facilmente quando usava o mantra, para
imaginar que estava respirando através do olho espiritual. Essa prática o capacitou a envolver sua
atenção de maneira mais completa na prática da técnica.
Durante o pranayama, observe que, quando sua mente está tranqüila e a respiração flui
lentamente e sem esforço, que sua percepção é mais lúcida e que é mais fácil se concentrar. Após
a Kriya, sente-se por longo tempo em silêncio profundo. Lahiri Mahasaya também enfatizava a
importância de se descansar nos “efeitos posteriores de tranqüilidade” produzidos pela prática
atenta do pranayama de Kriya. As técnicas de meditação devem ser praticadas com atenção
consciente, e depois a pessoa deve se sentar por um período prolongado em silêncio meditativo,
tranqüilo, livre de pensamentos.
Após ser iniciado nas práticas de Kriya Yoga, é válido ser iniciado de novo?
Participar de outros serviços de iniciação pode ser salutar, porque a informação será útil,
você terá a oportunidade de revisar suas práticas de meditação e será uma ocasião ideal para
renovar seu compromisso com o caminho espiritual.
Eu fui iniciado por meu guru pela primeira vez em agosto de 1950, após o que ele me ajudou
a ver a luz do olho espiritual. Estive também presente no último serviço público de iniciação
dirigido por Paramahansaji, em 1951, e nas iniciações conduzidas por James Lynn (Rajasi
Janakananda), em 1952 e 1953. Em todas as sessões de que participei após ser iniciado por meu
guru, aprendi algo novo e me beneficiei da companhia de outros devotos de Deus.
No final do serviço de iniciação conduzido por Sr. Lynn em 1953, ele ergueu as mãos e disse,
serenamente: “Recebam a bênção do Mestre. Recebam. Recebam.” Todos os que eram receptivos
puderam realmente sentir, como eu, as ondas magnéticas emanadas das mãos dele, que
inundavam a sala inteira.
A qualidade especial da força espiritual que está presente na ocasião da iniciação em Kriya
Yoga é transformadora. Uma vez, quando eu visitava Paramahansaji em sua casa de retiro no
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deserto, em Twenty-Nine Palms, na Califórnia, ele me disse: “Sempre que você der iniciação em
Kriya, eu, ou um dos Grandes (gurus), estaremos lá”. Estava se referindo à correnteza da graça
que flui de Deus através da linhagem de gurus.
Embora eu esteja consciente de meu papel como representante dos gurus de nossa tradição
da Kriya Yoga, algumas pessoas que inicio não estão cônscias disso. Não olham para além de
minha personalidade, para Aquilo que origina o fluxo do poder e da graça redentora da
Consciência.
Seu guru recomendava a prática de Hatha Yoga?
Era recomendada, mas não enfatizada. Se ele pudesse ver a aceitação que a ioga vem
atingindo em nossa sociedade hoje em dia, ficaria satisfeito. Se pudesse ver as inúmeras maneiras
diferentes em que a Hatha Yoga é atualmente promovida e ensinada, acharia um tanto engraçado.
Bishnu Ghosh, o irmão mais novo de Paramahansaji, foi um famoso fisiculturista na Índia.
Em 1939, quando esteve no sul da Califórnia, ele se ofereceu para ensinar a Sr. Lynn posturas
avançadas de Hatha Yoga. Quando Sr. Lynn perguntou ao Mestre se deveria aprendê-las e
praticá-las, recebeu a resposta: “Se o fizer, poderá perder sua bem-aventurança”. Para outra
pessoa, o Mestre poderia ter respondido diferentemente. Naquela ocasião, como a rotina de
Hatha Yoga de Sr. Lynn já era satisfatória, ele foi aconselhado a se concentrar no
aperfeiçoamento de suas práticas de meditação.
É o celibato necessário para a pessoa que está no caminho espiritual?
O celibato – não se casar, especialmente quando se fez votos religiosos, ou abster-se
completamente de relações sexuais – não é necessário para a pessoa que está no caminho
espiritual. O desejo de ter um relacionamento afetivo não é incompatível com a aspiração ao
crescimento espiritual, nem este é inibido por se ter tal relacionamento. Um relacionamento
romântico sadio, compatível, pode aumentar a saúde física, emocional e espiritual.
Relacionamentos pessoais que não sejam harmoniosos ou significativos devem ser evitados;
dissipam o tempo, as energias e os recursos pessoais do indivíduo, e podem contribuir para a
inquietude mental e emocional.
Os membros de algumas ordens religiosas optam por um estilo de vida que lhes permite
focalizar seus pensamentos e energias nas práticas espirituais e no serviço aos outros. Algumas
pessoas que não são membros de uma ordem religiosa e não estão casadas preferem evitar
relacionamentos e atividades que não são significativas, bem como circunstâncias que podem
complicar suas vidas ou distraí-las de seus objetivos principais. A pessoa que opta por uma vida
de celibato e sente-se bem assim não deve ter sentimentos de orgulho, superioridade ou
presunção por causa de sua opção.
A preocupação com pensamentos e atividades relacionados com o sexo podem, como
qualquer outra obsessão, resultar em desperdício de tempo, energia e até de dinheiro. Quando
necessário, os impulsos e energias podem ser transmutados. Tudo que é natural pode ser
permitido. Tudo que causa sofrimento psicológico, físico ou circunstancial deve ser evitado. O
uso excessivo de qualquer dos sentidos é prejudicial à saúde física, mental e emocional; dissipa as
forças vitais, faz com que a atenção se torne fragmentada e excessivamente voltada para o
exterior, resultando em inquietude e insatisfação. A repressão pode causar conflito psicológico,
confusão mental e doença física. A masturbação, porém, não é uma alternativa recomendada, por
causa da ausência de satisfação emocional e das interações de energias masculina e feminina que
ocorrem entre casais compatíveis. O controle prudente dos desejos, impulsos sensórios e ações
nutre a saúde, contribui para o viver efetivo e confere paz mental e satisfação espiritual.
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Paramahansaji recomendava o celibato para os membros da comunidade monástica. Aos
discípulos casados, ele às vezes dava conselho pessoal, particular: geralmente, amar e cuidar um
do outro, e aplicar-se a regimes de vida correta e às práticas espirituais. Quando isso é feito, as
relações pessoais têm toda a probabilidade de serem adequadas, sem que haja adesão rigorosa a
regras de conduta.
Um condiscípulo meu, espiritualmente adiantado, contou-me que quando conheceu o Mestre,
no começo dos anos de 1930, foi aconselhado a dirigir a energia conscientemente para cima,
através dos chakras, durante suas relações com a esposa. Dessa maneira, o sistema nervoso pode
ser vitalizado e o prana ascendente flui sem ser, de algum modo, neutralizado pela energia que
flui para fora, característica comum da experiência sexual. Lahiri Mahasaya dava o mesmo
conselho a seus discípulos casados. Homens e mulheres podem praticar isso.
Se o impulso sexual é um problema e precisa ser regulado, isso se pode fazer de várias
maneiras. Seja moderado em todas as atividades: evite comer em excesso, dormir demais,
atividades inquietas e companhia de pessoas que tenham hábitos irregulares. Não alimente a
mente com pensamentos perturbadores. Pratique o pranayama da Kriya Yoga regularmente.
Exercite-se adequadamente. Cultive todas as qualidades mentais, emocionais e físicas que sejam
elevadoras ou sáttvicas. Viva de maneira decidida, atenta, para que as energias sejam dirigidas a
fins construtivos. Evite ter conflitos com os impulsos naturais. Renuncie ao sentimento de culpa
ou de vergonha, se for esse o problema. Apenas viva uma vida equilibrada, saudável e
construtiva.
E não temos de especular sobre se Deus aprova ou desaprova nossos pensamentos,
sentimentos e comportamentos normais. Trilhões de criaturas e bilhões de seres humanos têm
características e comportamentos sexuais. A vida orgânica não existiria, nem poderia persistir,
sem eles. Uma visão mais cósmica da vida, juntamente com uma percepção expandida e rotinas de
vida práticas, é tudo que a pessoa necessita para viver eficazmente neste mundo, enquanto
continua a experimentar um autêntico crescimento espiritual.
Qual é a melhor maneira de se aprender a praticar Kriya Yoga?
A melhor maneira de se aprender qualquer coisa de valor é encontrar uma fonte de
informação fidedigna. Na Kriya Yoga, de grande valor é que seja feita uma conexão com uma
tradição autêntica de ensinamento e com a linhagem de gurus. De grande valor, também, é o
compromisso pessoal para ser dedicado ao caminho espiritual. Sem tal compromisso e sem a
sintonia com os gurus, a instrução não passa de mera transmissão de informações, que podem ou
não ser úteis.
Nem todos os que pedem iniciação compreendem a importância da ocasião. Alguns
indivíduos consideram a experiência um acontecimento interessante de suas vidas, em vez de uma
oportunidade para aprenderem como experimentar um rápido crescimento espiritual. Outros
sabem apreciar no momento da iniciação, mas depois saem para misturar (e tentar praticar) o que
aprenderam com uma variedade de outros sistemas que são promovidos no “mercado da new
age” – e depois se perguntam por que seu progresso espiritual não é satisfatório.
De que modo o estudante da verdade deve lidar com pessoas más? Toda vida é expressão da
única Vida. Nós exterminamos bactérias e outros insetos. A não-violência não inclui esses
animais nocivos e outros seres humanos perversos?
Nós temos a responsabilidade de preservar nossa saúde e bem-estar. Quando for necessário
exterminar bactérias ou insetos nocivos, ou nos defender, ações apropriadas deverão ser tomadas,
sem que se tenha sentimentos fortes de aversão ou prazer pelo que precisa ser feito.
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Um de meus irmãos discípulos se alistou na Marinha e foi enviado para a guerra na Coréia
(no começo dos anos de 1950). Paramahansa Yogananda lhe disse: “O serviço militar foi escolha
sua. Agora terá de cumprir o seu dever. Mas… não tem de gostar dele.”
Eu gostaria de encontrar um instrutor espiritual (guru) para me instruir e orientar. Como posso
encontrar o instrutor correto?
Primeiro, antes de procurar um guru, certifique-se de que você seja um discípulo (ouvinte)
receptivo. Você é sincero? Está disposto a ouvir e aplicar o que lhe for recomendado? Se a
resposta for sim, prepare-se, adquirindo conhecimento útil de fontes confiáveis e aplicando-o na
vida diária. Ao ler livros ou obter informação de outras fontes, use seu discernimento para decidir
o que é verdadeiro e de valor. Viva de maneira saudável e construtiva. Cultive o otimismo. Aspire
a ser plenamente desperto. Aumente suas faculdades intelectuais e intuitivas. Ore por orientação e
seja receptivo ao seu bem mais elevado. Se estiver destinado a ter um instrutor que possa ensinálo e guiá-lo, os eventos e as circunstâncias favoráveis aparecerão para tornar isso possível.
Melhor que procurar um guru é preparar-se para ser um discípulo ideal.
Sri Yukteswar uma vez comentou que muitas pessoas procuram um guru que seja feito à
própria imagem delas: um instrutor que atenderá às suas idéias preconcebidas do que um guru
deve ser, e que as satisfará – em vez de atender ao que seja necessário para facilitar a
transformação psicológica delas. Se queremos um guru, mas também queremos perpetuar nossa
condição humana, muito pouco benefício resultará de nosso contato com um guru autêntico. Ao
entrarmos na relação guru-discípulo a que estamos destinados, precisamos estar preparados para
abandonar todos os outros instrutores, se isto nos for pedido para o nosso maior bem. Não é que
o guru queira dominar ou controlar (uma pessoa que queira fazer isso não é iluminada e deve ser
evitada), mas é que o guru quer que o discípulo aprenda os fatos da vida e os demonstre. O guru
quer que o discípulo acorde de todas as ilusões e erros: ser Auto-realizado e livre.
Alguns professores de ioga dizem que o ego da pessoa precisa ser eliminado. É verdade?
Um senso de eu como sendo distinto do mundo e dos outros eus é necessário para permitir
que nos relacionemos com o mundo e com os demais. O egocentrismo, estar confinado a um
senso de eu restrito, pode e deve ser transcendido, por ser o principal obstáculo à Autorealização. Quando o ego é purificado (não eliminado), podemos enxergar o mundo e todas as
nossas relações com objetividade, sendo ao mesmo tempo centrados na alma. Nosso senso de eu
como sendo distinto do mundo e dos outros é transcendido quando a atenção se interioriza
durante nossos períodos de meditação superconsciente (samadhi).
Quando eu era ministro da igreja da Self-Realization Fellowship em Fênix, Arizona, durante
os anos de 1952 e 1953, uma visitante uma vez me confrontou com uma pergunta direta: “Por
que é”, ela indagou, “que vocês estão sempre falando em Auto-realização? Não é ser muito
egocêntrico?”
Sendo nova no ensinamento, sua compreensão ainda não estava clara a respeito da diferença
entre o Eu como alma, e o eu como identificação da personalidade fixada no ego. Achava que
dávamos ênfase ao último, o que certamente seria a ênfase errada para um estudante da verdade.
Tentei explicar a ela a diferença entre o Eu como alma e o eu como percepção limitada do nosso
próprio ser verdadeiro, e o que era que estávamos aspirando a realizar. Notei, todavia, que a
mente dela estava fechada ao pensamento de aceitar uma idéia nova, ou que ela mesma não era,
naquele tempo, capaz de compreender. (Também, minha explicação pode não ter sido adequada.)
Quero conseguir meditar eficazmente. Como posso fazer?
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Decida meditar todos os dias. Escolha um horário e um local adequados. Sempre que
possível, medite no mesmo horário todos os dias. Se você for iniciante, medite de quinze a vinte
minutos. Você poderá meditar mais tempo quando estiver mais experiente.
Por que é recomendado que as práticas de meditação da Kriya Yoga não sejam misturadas com
outras práticas? Por favor, dê algum exemplo.
A pessoa pode, obviamente, observar suas práticas religiosas tradicionais: cristianismo,
judaísmo, hinduísmo, budismo, islamismo e outras, se foi criada nelas. Babaji iniciou muitos
discípulos de outras tradições, como também Lahiri Mahasaya, Sri Yukteswar e Paramahansa
Yogananda. Quando Paramahansaji veio a este país em 1920, ele estava ciente de que a maioria
dos americanos já estavam acostumados com a tradição cristã e não lhes pediu que a
abandonassem, se a considerassem satisfatória.
O que não convém é misturar a prática da Kriya Yoga com outras práticas de tradições ou
sistemas que não compartilham os mesmos ideais ou objetivos. A maioria dos métodos “new age”
(hipnose, mediunidade, preocupação com auras, ou então os chamados métodos de “iluminação
rápida”: shaktipat, despertar a kundalini e tantra) deveria ser evitada, bem como outras práticas
que podem desviar o praticante dos métodos espirituais eficazes e lhe causar confusão mental.
Às vezes fico me perguntando se chegarei a ser iluminado espiritualmente algum dia. Pode a
realização divina ser alcançada em uma encarnação?
Sim. Sua encarnação atual é a única que é real para você. Um desejo sincero de ser
espiritualmente desperto é mais importante do que o número de anos que você passou neste
planeta
Esse comentário me faz lembrar de um discípulo que era devocional, mas não conseguia (ou
não queria) controlar seu comportamento pessoal. Quando alguém perguntou a Paramahansaji
sobre essa pessoa, o Mestre disse: “Orei para saber seu futuro e me foi dito que ele será liberto
nesta encarnação”.
A pessoa que tinha perguntado falou: “Não sei como isso pode ser possível”.
Paramahansaji deu uma risadinha, e então replicou: “Eu também não, mas isso é o que me foi
dito, então deve ser verdade”.
Você certamente será iluminado espiritualmente, pois o seu destino é ser plenamente
desperto. No núcleo do seu ser, você já é íntegro e sapiente.
Quando o senhor conheceu Paramahansa Yogananda, em que estágio de despertar espiritual
ele estava na época? Já estava liberado?
Sua indagação refere-se aos sete níveis do despertar: 1) nenhuma percepção espiritual; 2)
autoconsciência disfuncional; 3) autoconsciência funcional; 4) Autoconhecimento; 5) estados de
consciência cósmica; 6) consciência de Deus; 7) completa iluminação espiritual. Paramahansaji
estava sempre consciente de Deus e era (é) plenamente liberto. Sua consciência, palavras e corpo
físico irradiavam pureza, serenidade e poder espiritual.
O que significa estar liberado? Significa que todas as ilusões (crenças errôneas) foram banidas
pelo conhecimento, e que os erros (percepções equivocadas) não mais obscurecem sua
consciência. Quando eu era adolescente, freqüentando a igreja fundamentalista vizinha à minha
casa, ouvia falar sobre a possibilidade de alcançar a salvação, mas reconheci que a simples crença
em um sistema de teologia não era suficiente para garantir esse estado ideal. Quando li a filosofia
da ioga, comecei a compreender o que é a libertação e como pode ser experimentada. Quando
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conheci Paramahansa Yogananda, ele me explicou o processo da libertação e demonstrou em sua
vida como a pessoa liberta pensa e atua.
Mestres espirituais como Paramahansa Yogananda experimentam onipotência, onisciência e
onipresença? As pessoas espiritualmente iluminadas conhecem tudo? Alguma vez suas opiniões
podem estar erradas? Comentem elas equívocos?
Pessoas espiritualmente iluminadas ou experimentam realmente esses atributos da
Consciência suprema, ou podem intuitivamente estar conscientes deles e compreendê-los. Elas
têm Auto-realização e Realização Divina. Podem não saber tudo que é possível conhecer a
respeito dos acontecimentos e circunstâncias relativas, a menos que dirijam sua atenção para eles.
Se não são bem-informadas, suas opiniões podem não ser mais acuradas do que as opiniões dos
outros, e suas decisões e ações podem não ser perfeitas. Às vezes contam-se histórias a respeito
de “santos” que são fluentes em todos os idiomas e que “sabem tudo”. Eu ainda não encontrei
uma tal pessoa, nem me foi oferecida qualquer evidência confiável que apóie tais afirmações.
Ouvi dizer que, quando uma pessoa é maltratada, é porque tratou mal alguém em uma vida
anterior. Isso é verdade? Parece-me um tanto simplista.
Não é só simplista; não é verdade. Nem tudo o que fazemos voltará a nós na mesma moeda.
A maioria das experiências que as pessoas têm são resultado de seus atuais estados de
consciência, que determinam seu modo de pensar, comportamentos, atividades e escolhas de
relacionamentos pessoais.
Por favor, comente o fenômeno das fotografias dos gurus e santos. Algumas delas parecem
estar impregnadas de poder magnético, elevando minha mente e consciência de tal maneira que
me sinto mais em paz – até mesmo extasiado.
Ao olharmos para uma fotografia ou gravura de uma pessoa, podemos quase sempre ficar
sintonizados com os estados mentais e de consciência dessa pessoa. A fotografia é, então, o
“ponto de contato” para a nossa conexão mental e espiritual. Contemplar uma fotografia de um
guru ou santo pode nos recordar aquilo que nós, também, podemos conhecer e realizar. Em nossa
casa do CSA, que eu uso como local de trabalho, toda sala tem fotografias e pinturas de nossos
gurus. Estão ali para que eu veja, e eles estão em meu coração, em meu ser.
Quando os discípulos perguntavam a Lahiri Mahasaya se a fotografia dele abençoaria suas
casas, ele dizia: “Se pensarem que irá abençoar, abençoará. Do contrário, será apenas um retrato
meu.”
Quando meu guru tinha oito anos de idade, ele experimentou uma cura ao mirar com
reverência a fotografia de Lahiri Mahasaya. Havia contraído o cólera asiático e os médicos nada
podiam fazer para ajudá-lo. Sua mãe, discípula de Lahiri, obrigou-o a fitar a fotografia. “Se
mostrar interiormente sua devoção, você será curado”, disse ela. O Mestre viu uma luz brilhante
que envolveu seu corpo e inundou o quarto, curando-o instantaneamente.
Entre as milhares de pessoas que participaram das aulas de Paramahansa Yogananda e as
centenas que se tornaram seus discípulos, quantas despertaram para a Auto-realização e a
Realização Divina?
Não muitas. Ao ensinar a grandes classes nos anos de 1920 e 1930, ele procurava inspirar e
motivar as pessoas para se tornarem mais conscientes de sua relação com Deus, embora soubesse
que só um pequeno número delas continuaria a praticar. Dizia: “Estou plantando sementes
espirituais no solo de suas mentes, para que algum dia possam brotar, crescer e beneficiá-las”.
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Dos discípulos que tiveram sua orientação pessoal e encorajamento continuado, somente uns
poucos tinham a capacidade de compreender e a habilidade para praticar diligentemente o que ele
ensinava.
Algumas pessoas são atraídas para o caminho espiritual porque desejam melhorar a saúde, ter
paz de espírito ou êxito material. Algumas lêem literatura metafísica e oram ou meditam
passivamente, para evitar o desafio do viver responsável. Algumas se associam com amigos que
compartilham seus interesses em espiritualidade porque gostam da interação social. Muitos
devotos são assim; querem conhecer Deus, enquanto continuam como são. Tenho conhecido
muitos kriya yogis que, embora fossem geralmente gentis, compassivos e capazes de meditar
profundamente, ainda não transcenderam as características que são comuns àqueles que têm uma
consciência ordinária. Somente uns poucos entre os muitos que conheci foram atraídos para o
caminho da Kriya Yoga porque eram sinceros em seu desejo de serem Auto-realizados e
conscientes de Deus, e estavam dispostos a persistir no caminho certo até que sua aspiração se
realizasse.
A maior parte dos mais de cem mil indivíduos que foram iniciados por Paramahansaji durante
seus 31 anos nos Estados Unidos não manteve um relacionamento com ele, nem continuou com
seus estudos e suas práticas de meditação.
Os esforços dele não foram perdidos, porém. Milhares de pessoas foram ajudadas para um
estilo de vida melhor, centenas progrediram espiritualmente e muitas ainda são inspiradas por sua
vida, livros e ensinamentos, os quais continuam a ser oferecidos pelos representantes de sua
organização e por alguns de seus discípulos diretos. Quando perguntado por que as vidas de
tantas pessoas foram transformadas depois de lerem seu livro Autobiografia de um Iogue, ele
disse: “Porque meu espírito está nesse livro”.
O senhor conheceu alguém que tenha sido (ou é) Auto-realizado ou consciente de Deus como
resultado da prática da Kriya Yoga?
Sei de alguns poucos sobre quem Paramahansaji disse que eram ou seriam Auto-realizados e
conscientes de Deus na presente encarnação. Não posso determinar o grau de Auto-realização de
uma pessoa, a não ser que eu tenha a oportunidade de observá-la de perto. Sei que muitos
devotos cometeram o engano de se satisfazer com um sentimento de comunhão com Deus, em
vez de aspirarem a ser completamente iluminados espiritualmente. Alguns deles foram
complacentes, porque quiseram ser receptivos “à vontade de Deus” para eles. Quem acredita que
a Auto-realização só é determinada por Deus está propenso a ficar esperando e aguardando, em
vez de fazer o que é necessário para purificar a mente, refinar o corpo e iluminar sua percepção.
Alguns devotos que sentem que sua missão é serem servos de Deus estão sendo influenciados
pelo sentimento, e não pela razão ou pelo impulso inato de serem plenamente despertos. Pensam
equivocadamente que não podem ser plenamente despertos, ou relutam em assumir o ajuste
radical de seus pontos de vista, que lhes permitiriam ser Auto-realizados e conscientes de Deus.
Os devotos que não estão dispostos ou não são capazes de experimentar a transformação
psicológica tendem a dramatizar sua excessiva dependência emocional em seus relacionamentos
pessoais, e quando pensam ou se relacionam com Deus e os gurus. Freqüentemente têm
dificuldades quando tentam compreender conceitos filosóficos abstratos ou a realidade dos
estados de consciência que sejam diferentes daqueles com os quais estão acostumados. Uma
característica comum é a de tentar adaptar estados de consciência esclarecidos a seus estados
condicionados: querer ser Auto-realizado sem ter de mudar suas opiniões, pontos de vista ou
comportamentos. Geralmente, preferem crer do que saber, receber do que dar, lutar do que
alcançar, esperar do que conseguir, dar desculpas do que praticar, seguir do que conduzir, e se
consolar com a companhia estimulante de outras pessoas cujos traços psicológicos e
comportamentos pessoais são similares aos seus.
66
Em reuniões públicas, Paramahansaji às vezes dizia (com bondosa dose de bom-humor):
“Somos todos um pouquinho loucos [diferentes do que é considerado normal, enfatuados de
interesses pessoais], mas nem sempre sabemos disso, porque tendemos a nos associar com
aqueles que são semelhantes a nós”.
O que os outros fazem ou deixam de fazer não nos deveria preocupar. Nossa resolução de
despertar espiritualmente deve ser definitiva.
Por que alguns praticantes da Kriya Yoga que parecem ser calmos e devocionais ainda têm
crenças errôneas?
Eles não usam suas faculdades intelectuais para discernir o que é verdadeiro, ou podem não
ser bem-informados. Conheço praticantes da Kriya Yoga que acreditam em Satã como entidade
personificadora do mal,1 dizem que Paramahansa Yogananda foi a reencarnação de Jesus Cristo e
declaram que não é possível alguém ser Auto-realizado e consciente de Deus em uma encarnação.
Alguns deles ficam confusos quando tentam adaptar os conceitos filosóficos sobre os quais as
autênticas práticas de iluminação espiritual estão baseadas, às falsas crenças religiosas tradicionais
adquiridas quando eram crianças ou jovens. Eles também se associam habitualmente com amigos
que pensam como eles.
Quando meditam, tendem a ficar satisfeitos em obter apenas um sentimento de paz ou de
beatitude, os quais enganosamente presumem serem evidências de comunhão com Deus. Se
experimentassem regularmente estados superiores de samadhi e usassem seus poderes de
discernimento, seu conhecimento dos fatos da vida seria impecável.
Embora a prática regular das técnicas de meditação de Kriya produza alguns benefícios
psicológicos e fisiológicos, para que o despertar e o crescimento espiritual ocorram a pessoa deve
também desejar fervorosamente despertar e crescer, e empenhar-se por viver conscientemente
como se já fosse uma pessoa iluminada. Muitos iniciados praticam suas técnicas mecanicamente e
continuam a pensar e sentir que são meros seres humanos, com numerosos problemas para
vencer. Esperam melhorar – algum dia – mas não se empenham ativamente para renunciar a suas
ilusões, desmascará-las ou mudar suas atitudes mentais e comportamentos.
A prática da Kriya Yoga deveria ser intensa (concentrada), se a pessoa quiser experimentar
resultados satisfatórios. A prática correta inclui tudo o que devemos fazer para cultivar nosso
bem-estar geral e remover e renunciar a todos os pensamentos, sentimentos e comportamentos
que interfiram na revelação e rápida emergência de nossas capacidades e qualidades divinas
inatas. Muitos kriya yogis não são bastante conscientes da necessidade da prática intensiva. Eles
lêem com desatenção literatura metafísica, meditam apenas esporadicamente e de maneira passiva,
estão por demais envolvidos em relacionamentos e atividades sem importância, não disciplinam
seus pensamentos, humores e comportamentos, e permitem que estados de consciência ordinários
e condicionados prevaleçam. Sendo assim egocêntricos, em vez de Autoconscientes, são
propensos a viver como pessoas “comuns” enquanto (talvez) esperam experimentar o crescimento
espiritual. Ser espiritualmente iluminados não é o seu objetivo mais importante na vida. Se o
fosse, eles se comportariam de maneira diferente.
Quando eu estava com Paramahansa Yogananda, estava sempre consciente de sua ênfase no
pensamento autodisciplinado, na estabilidade emocional, no estudo atento e na prática da
meditação. Ele sempre dizia que o domínio da atenção era a chave para o êxito no caminho
1
Paramahansaji nunca mencionou Satã para mim. Em algumas palestras públicas e escritos, quando ele
mencionava Satã (por causa dos cristãos em sua audiência), referia-se ao tamas guna, à inércia ou o peso de maya
(o campo primordial da natureza, a partir do qual tudo no universo é formado), que obscurece a consciência da
alma, e não a uma entidade personalizada. Todavia, isso nem sempre está claramente explicado em seus escritos
editados. Eu, pessoalmente, acredito que referências a Satã ou a forças demoníacas apenas colaboram com as
superstições das pessoas, e deveriam ser inteiramente evitadas.
67
espiritual. Quando a nossa atenção não é controlada, podemos ser inclinados a nos distrair
facilmente dos assuntos importantes e a permitir que pensamentos, emoções e comportamentos
sejam influenciados pelos estados de humor e caprichos.
Este caminho da Kriya Yoga é o meio direto de despertar rapidamente para a Autorealização, mas somente quando estamos sinceramente decididos a fazer o que for necessário para
ajudar a nós mesmos. Se não somos dedicados, os resultados não virão. Este caminho é fácil
quando somos dedicados; é difícil e improdutivo quando deixamos que as tendências egocêntricas
prevaleçam.
Meu guru sempre dizia: “Pelo esforço concentrado, você pode condensar suas experiências e
acelerar sua evolução espiritual”.
Após a transição de Paramahansa Yogananda em 1952, o senhor ainda se comunica com ele?
Teve algum outro instrutor espiritual?
Não tenho tido comunicação direta com meu guru desde que ele deixou este plano. Sonho
com ele de vez em quando, e tenho um sentimento de orientação interior. Antes de partir, ele me
aconselhou a permanecer sintonizado com os gurus (o estado de consciência deles) como um
modo de estar em sintonia com Deus. Encorajou-me também a persistir em alcançar minha
própria libertação da consciência. Minha última conversa com ele foi em sua casa de retiro no
deserto, em Twenty-Nine Palms, na Califórnia, algumas semanas antes de ele abandonar o corpo,
em 7 de março de 1952. Sou grato a ele por ter-me ajudado a ser auto-suficiente e por assegurarme de que eu cumpriria meu destino espiritual. Não posso descrever, com meras palavras, sua
influência positiva e permanente em minha vida.
Nunca tive nem procurei outro instrutor. Minha conexão espiritual com meu guru foi
estabelecida muito tempo antes de minha presente encarnação. Soube disto intuitivamente quando
li pela primeira vez a Autobiografia de um Iogue (em 1949) e ele mesmo o confirmou várias
vezes, em conversas particulares em sua casa de retiro, quando eu ia visitá-lo (1950-1951). O que
aprendi de meu guru, e o amor, a energia espiritual e a consciência iluminada que ele me
transmitiu me sustentam até hoje.
Através dos anos, tenho tido muitas boas amizades espirituais com outros instrutores: Ernest
Holmes, Ernest Wilson, Neville Goddard, Manly Palmer Hall, Walter Lanyon, Masaharu
Taniguchi, Joel Goldsmith, Swami Muktananda, Swami Rama e outros. Todavia, meu caminho
espiritual e a missão para ensinar sempre estiveram ancorados nesta tradição. Embora respeitando
todas as tradições autênticas de iluminação (o que devemos fazer), jamais me desviei de nossos
ensinamentos e práticas fundamentais, e nunca tive o desejo de fazê-lo.
É verdade que alguns indivíduos espiritualmente iluminados podem viajar a lugares distantes
em corpo sutil ou aparecer em sonhos para seus discípulos a fim de lhes dar ajuda ou
instrução?
Embora a viagem em corpo sutil possa acontecer (muito raramente), ela não é necessária.
Uma pessoa espiritualmente iluminada não precisa ir a parte alguma para ajudar os outros, porque
é sabido que a plenitude da Consciência única inclui tudo dentro de si mesma. A idéia de distância
só existe quando a nossa consciência está no estado ordinário.
Embora a sintonia mental ou espiritual com outra pessoa nos possa fazer sonhar com ela e
até considerar o sonho como sendo de valor, a noção de que instrutores espirituais possam
aparecer a toda hora no sonho de alguém é muito exagerada.
Vários anos atrás, eu soube de um debate entre “gurus” de uma certa tradição a respeito
desses assuntos. Um deles dissera que os relatos de seus aparecimentos em sonhos eram
68
resultados da imaginação daqueles que declaravam tais experiências. Um membro mais antigo
dessa tradição disse: “Por que não deixá-los acreditar, se isso lhes aumenta a fé e parece ajudálos?” A razão óbvia para que a verdade seja dita é que as crenças falsas mantêm o ego confinado
e alimentam a fantasia.
Ocasionalmente, tenho tido sonhos vívidos, nos quais um ou mais gurus de nossa tradição de
Kriya estão presentes. Embora tais sonhos sejam muito agradáveis, eu os reconheço como
criações de minha mente subconsciente.
Todas as religiões ou caminhos espirituais levam a Deus?
Apesar de muita gente dizer isso, não é verdade. Dizer isso é como dizer que todos os
alimentos são nutritivos, que todas as estradas levam ao mesmo destino, que tudo acontece para o
melhor, ou que todas as ações produzem os mesmos resultados.
Algumas crenças e práticas espirituais estão baseadas em opiniões equivocadas, raciocínio
falho ou superstições. Embora possamos respeitar os direitos dos outros de terem suas opiniões e
de cultuarem ou praticarem o que quiserem, nós devemos ter conhecimento do que é certo e
escolher as práticas espirituais que proporcionem resultados ideais.
Por que não deveríamos tentar nos lembrar de encarnações anteriores?
Tentar lembrar de encarnações passadas é olhar para trás em vez de olhar para a frente.
Devemos nos empenhar para sermos plenamente conscientes enquanto ainda aspiramos à Autorealização e à Realização Divina.
O que pode parecer memórias de encarnações passadas geralmente são ilusões (percepções
enganosas) e fantasias criadas pela mente. Se você está com vontade de olhar para trás, procure
“recordar” como era quando sua Consciência era pura.
Além de levar uma vida correta, dos estudos metafísicos e da prática de meditação, o que mais
pode ser feito para incentivar o despertar espiritual?
Até que você atinja a Realização Divina, anseie constantemente ser plenamente desperto. O
desabrochar do conhecimento inato de sua verdadeira natureza e da realidade de Deus poderá
ocorrer a qualquer momento. Para uma pessoa que perguntou a Paramahansaji como poderia
saber quando sua Auto-realização e Realização Divina fossem autênticas, ele respondeu: “Você
saberá quando souber”.
Paramahansa Yogananda recomendava a fundação de comunidades espirituais?
No último capítulo (“Em Encinitas, na Califórnia”) da primeira edição da Autobiografia de
um Iogue, ele descreveu uma conversa com um discípulo, em 1945, durante a qual tinha dito:
“Um projeto há longo tempo planejado está começando a tomar forma definitiva.(…) Naquele
belo ambiente iniciei uma colônia mundial em miniatura. Um pequeno grupo harmonioso vivendo
aqui poderá inspirar outras comunidades idéias por toda a Terra. Realizaremos aqui várias
conferências (…) convidando delegações de todos os países. Bandeiras de todas as nações
tremularão em nossos corredores. Tão logo quanto possível pretendo iniciar aqui um Instituto de
Ioga.”
Embora fosse característico de meu guru querer que seus planos fossem imediatamente
postos em prática e completados, ele sabia que alguns deles eram prematuros. Deste último tipo,
ele disse que havia plantado as sementes (dos projetos específicos) no éter, que produziriam os
resultados ideais em seu devido tempo.
69
Freqüentemente sinto enorme aversão pelos membros de organizações religiosas que afirmam
possuírem a “única” verdade. Não posso deixar de me sentir incomodado quando ouço suas
opiniões. Como posso evitar tais sentimentos?
Apenas ignore as palavras de pessoas sem esclarecimento e sem inteligência.
Qual era o conselho de Paramahansa Yogananda em relação a como superar ou eliminar
influências cármicas problemáticas?
Condicionamentos subconscientes, pensamentos, crenças, atitudes mentais, estados de
consciência, emoções, desejos, hábitos e ações são influências causadoras (cármicas) que podem
gerar efeitos tanto prejudiciais e debilitadores, quanto construtivos e aprimoradores, ou nenhum
deles.
A maneira de superar influências cármicas problemáticas é cultivar o pensamento construtivo
e ordenado, substituir crenças por conhecimento exato, alimentar o otimismo, manter um estado
límpido de consciência, escolher ser emocionalmente estável, desejar apenas o que é benéfico,
adotar bons hábitos e realizar ações que produzirão resultados positivos.
Em 1950, meu guru disse: “Na primeira vez que você veio a mim, Deus assumiu cinqüenta
por cento do seu carma. O guru assume vinte e cinco por cento. Os vinte e cinco por cento
restantes, cabe a você mesmo trabalhar”. Sua menção a porcentagens não deve ser interpretada
literalmente. Quando o indivíduo escolhe uma trajetória clara de ação correta, muitos eventos
problemáticos podem ser evitados e fluxos de graça podem ser mais livremente expressos. A
orientação do guru e a transmissão de energia espiritual, bem como a sintonia do discípulo com a
consciência divina do guru, enfraquecem e neutralizam muito do carma do discípulo. A
responsabilidade do discípulo é viver corretamente, cultivar suas capacidades espirituais inatas e
despertar para a libertação da consciência o mais rápido possível.
Algumas pessoas espiritualmente iluminadas ainda têm carma para resgatar ou superar?
Sim. Alguém pode ser Auto-realizado e ter algumas influências subconscientes para serem
neutralizadas ou transcendidas. É por isso que algumas almas iluminadas continuam suas práticas
espirituais – não para aumentar sua realização, mas para remover todas as condições cármicas
problemáticas. As predominantes influências construtivas da superconsciência afinal purificam o
campo mental.
Até que a Auto-realização seja permanente, a meditação deve ser praticada para purificar
ainda mais a mente e eliminar impressões subliminares que poderão, se despertarem, obscurecer a
percepção da pessoa. Em seu comentário ao Bhagavad Gita, Sri Yukteswar escreveu: “Se neste
[primeiro] estado [de Auto-realização] a pessoa não continua com a prática da Kriya, a ilusão
[pode] gradualmente emergir e obscurecer de novo a revelação da Consciência [pura].”
Mesmo quando a mente está completamente purificada, a pessoa pode escolher meditar
regularmente (ou ocasionalmente) para se retirar das circunstâncias externas e ficar absorta na
consciência pura.
Eu soube que Paramahansa Yogananda confidenciou a alguns de seus discípulos que ele se
reencarnaria várias anos após o seu mahasamadhi. Ele disse quando e onde? Ele já retornou?
Ele não foi específico sobre quando e onde retornaria a este plano. Disse que descansaria no
espaço por algum tempo e depois ficaria com Babaji, no Himalaia, por um período de preparo,
antes de voltar a ser ativo no cenário mundial. Afirmou que alguns de seus discípulos estarão com
ele e com Babaji. Alguns discípulos para quem ele disse isso ainda estão encarnados. Eu o ouvi
dizer, em uma palestra informal com os discípulos, durante um jantar pelo seu 59 o aniversário (5
70
de janeiro de 1952): “Eu voltarei e observarei vocês. Eu os conhecerei, mas vocês não me
reconhecerão. Minhas cores serão azul e dourado.” 2 Eu sinto, intuitivamente, que ainda se
passarão muitos anos terrestres antes que ele retorne.
Alguns boatos interessantes foram trazidos recentemente à minha atenção. Uma pessoa me
disse que havia conhecido o Mestre em sua encarnação mais recente, 20 anos atrás, no Arizona.
Segundo ela, ele era na época um menino e atendeu quando ela o chamou por seu antigo nome de
infância. Quando questionado, ele supostamente disse que sua missão desta vez estava de algum
modo relacionada com uma descoberta no campo da eletricidade. Ela perdeu o menino de vista,
quando a família que o adotara mudou-se para outra cidade. Considero isto um exemplo de
especulação vazia, ou de identidade equivocada.
Outra pessoa me disse que, estando na Índia recentemente, alguém de um ashram que ela
visitou lhe disse que o Yogananda reencarnado é agora um adolescente e às vezes visita o
ashram, mas não entra na propriedade. Considero isto uma pseudo-informação: “fofocas de
ashram” sem fundamento, do tipo que as pessoas se envolvem quando não têm nada melhor para
fazer com seu tempo.
Paramahansa Yogananda sempre me encorajou a estar estabelecido na consciência de Deus.
Sua assistência pessoal foi útil durante nossos momentos de interação, quando ele estava
encarnado, e ainda é útil, por causa de nossa presente sintonia espiritual. Todavia, ele tem estado
fisicamente ausente desde 1952, e eu não sei onde ele está ou o que está fazendo. O Mestre pode
já estar reencarnado ou pode ainda demorar a fazê-lo. Se está ou não, é de pouca conseqüência,
pois ele não é um corpo ou uma mente, da mesma maneira que nós também não somos.
Como Paramahansa Yogananda aconselhava as pessoas que precisavam de cura?
Meu guru era defensor do que ele chamava de “vida simples e pensamento elevado”.
Enfatizava um modo de vida natural, reconhecendo ao mesmo tempo o papel útil dos médicos e
de outros que são competentes em assuntos relacionados à saúde e o bem-estar.
Em uma ocasião, Paramahansaji conversou com um homem que queria ser curado de dores
nas costas. Após conversar com ele, o Mestre o encaminhou para um conhecido seu na
comunidade, que se especializara em ajudar as pessoas a corrigirem a postura. Descobriu-se que
as dores que o homem sentia nas costas deviam-se a ele ter uma perna mais curta, causando um
desequilíbrio estrutural. Quando ele passou a usar um sapato com calço para corrigir o
desequilíbrio, suas dores cessaram. Ele então passou a falar para quem tivesse ouvidos sobre os
grandes poderes de cura de seu guru! Quando o Mestre contou essa história, ele ressaltou que
medidas práticas podem freqüentemente, de maneira muito fácil e rápida, conseguir os objetivos
almejados.
Tenho notado que muita gente pratica a cura impondo as mãos sobre os outros, usa cristais
para curar e “equilibrar os chakras” e parece usar diversas habilidades psíquicas (siddhis) para
ganhar dinheiro. Muita gente toma aulas e participa de seminários para aprender a canalizar
energia aos outros. O que pensa disso?
Tentar curar impondo as mãos sobre (ou perto de) uma pessoa tem-se tornado uma prática
mais ampla em anos recentes. A força vital pode fluir de uma pessoa para outra dessa maneira; se
isto tem valor ou não, da maneira como é praticado por muitos indivíduos, é questionável.
Freqüentemente, os benefícios reportados se devem à sensação de conforto e bem-estar
2
Paramahansaji preferia as cores azul, dourado e branco para a literatura de sua organização e para decorar seus
templos e edifícios. Em seus escritos e palestras, ele sempre se referia a essas cores quando descrevia a luz do olho
espiritual. Dourado, ele disse, é a cor da freqüência vibratória de Om; azul escuro é a cor da consciência de Deus
que tudo permeia; branco representa o Espírito.
71
experimentada pelo paciente-cliente, pelo fato de ter recebido atenção. O efeito placebo é bemconhecido: se a pessoa acredita que um programa de terapia ou meditação é benéfico, a crença
pode fortalecer o sistema imunológico, resultando em respostas fisiológicas positivas e tornando a
pessoa mais tranqüila e confiante.
Se alguém tem habilidades excepcionais (siddhis), não está errado usá-las sabiamente
ajudar a si mesmo ou aos outros. Se um serviço profissional está sendo prestado,
compensação, em forma de pagamento razoável, pelo tempo e atenção do praticante
apropriada. É claro que a pessoa não deve usar o serviço aos outros como um “negócio”
ganhar dinheiro.
para
uma
será
para
Ao orar (ou fazer trabalho interno) pelos outros, primeiro medite até que esteja tranqüilo e
consciente de Deus ou do Eu. Então, pense naqueles que precisam de ajuda e compartilhe com
eles sua percepção do todo. A proximidade física não é necessária; todos nós habitamos no
oceano da Vida infinita.
A maioria das pessoas que buscam assistência de canalizadores de energia fariam muito
melhor se aprendessem a se ajudar, elas mesmas, ajustando suas atitudes, modificando seu
comportamento e adotando regimes e estilos de vida sadios. Os médicos, por exemplo, sabem que
60 (ou mais) por cento dos pacientes que buscam sua ajuda melhorariam se ignorassem seus
sintomas, buscassem repouso e continuassem com suas atividades corriqueiras. (Não estou
sugerindo para não buscar ajuda profissional quanto esta é necessária.)
Através dos anos, conheci muitas pessoas que me disseram ter freqüentado um curso para
aprender a canalizar energia aos outros, pessoas que não eram mentalmente alertas,
emocionalmente equilibradas nem espiritualmente despertas. Provavelmente 99 por cento (uma
conjetura, mas não muito longe da marca) de tais programas são perda de tempo e de dinheiro
para os participantes – tempo e energia que seriam beneficamente melhor aproveitados na
Autodescoberta, na aquisição de conhecimento de valor verdadeiro e na prática espiritual
genuína. Ainda que essas pessoas possam ser um canal para o fluxo da força vital e tenham boas
intenções, eu não me colocaria nas mãos delas para receber esse tipo de tratamento. Portanto, não
recomendo essa prática, a não ser que seja feita por alguém espiritualmente desperto, altruísta e
saudável no corpo e na mente.
A maneira mais útil e significativa de aprender sobre a espiritualidade é através de alguém
que seja espiritualmente iluminado, ou esteja perto disso. Uma pessoa iluminada, porém, não
ensina esses métodos aos quais você se referiu.
Nos últimos anos, tenho escutado gravações da voz de Paramahansa Yogananda e muitas frases
dele emergem em minha mente de vez em quando. Recentemente, me lembrei das palavras: “Eu
sou o vínculo vivo dos mestres – sigam-no…” Tenho tentado me sintonizar com os gurus e
certamente noto a diferença. Existem algumas coisas especiais que possamos fazer para
alimentar a devoção e, talvez, ter uma melhor sintonia com a nossa linhagem de gurus?
Para aprimorar a sintonia com os gurus, seja aberto com eles. Não tente se esconder deles.
Respeite-os e seja agradecido e reconhecido por seus ensinamentos, apoio e bênçãos. Sinta que
eles estão com você o tempo todo; que as mentes deles estão unificadas com a sua, que a
consciência deles está dissolvida na sua, que a realidade deles está ancorada, junto com a sua, em
Deus. Enquanto é receptivo à ajuda que eles oferecem, ajude-os a cumprirem sua missão. A
maneira mais óbvia de ajudá-los a cumprir seus objetivos é ser um discípulo dedicado e provar
isto vivendo da maneira correta. Ao cultivar a sintonia, empenhe-se por viver de acordo com o
que eles ensinam. Evite a perversidade mental: tendências para distorcer os ensinamentos para
obter vantagens egoístas. Também evite fantasiar. As ondas da graça de Deus, através dos gurus,
72
estão sempre fluindo para as praias de nossa consciência. À medida em que nos tornamos
receptivos à graça, nossas capacidades espirituais são desenvolvidas.
Leia sobre os gurus nos escritos de Paramahansaji e outros, para se informar a respeito deles.
Eles são mais do que seus guias espirituais – são membros mais velhos de sua família espiritual.
Eu vejo o Mestre como meu pai espiritual, Sri Yukteswar como meu avô espiritual, e Lahiri
Mahasaya e Babaji como meus ancestrais espirituais. Por que então não deveria eu amá-los e ser
dedicado à causa a que eles se dedicaram? Por que não deveriam eles me amar e compartilhar
incessantemente comigo seu amor e bênçãos? Onde há comunhão, onde há amor, ali haverá graça
e realização.
Uma coisa útil que você pode fazer para melhorar sua sintonia com nossos gurus é meditar
mais profundamente em ocasiões especiais: nos seus aniversários de nascimento ou de transição
deste plano terreno (seus episódios de mahasamadhi ou “grande unificação”), e em outras datas
significativas. Para isso, lembre-se deles com respeito especial naqueles dias e sintonize a mente e
a alma com as deles ao meditar.
Deposite uma flor no altar, perto da fotografia ou gravura do guru que está sendo
homenageado. Acenda uma vela. Reze a Deus e sintonize-se mental e espiritualmente com os
gurus, com atenção especial naquele cujo dia está sendo celebrado. Pratique sua rotina de
meditação e sente-se por longo tempo em silêncio, mergulhado em Deus, cônscio da presença
viva dos gurus.
Não importa se algum dos nossos gurus, além de Babaji, possa estar atualmente encarnado
em outro corpo, estabelecido no samadhi transcendental ou envolvido em alguma missão em um
domínio celestial, astral ou causal. Sua sintonia com os gurus é sintonia com Deus. Essa é a coisa
principal a ser lembrada. Os gurus são um ponto de contato com a Consciência Infinita, a partir
do qual nossa percepção pode se expandir para a onipresença e a completa liberdade.
O ritual externo, de vez em quando, pode nos ajudar a sermos mais focalizados e atentos em
nossas práticas. Ao praticar rituais devocionais, seja consciente do que está fazendo e por que
está fazendo. Isso também pode ser útil para recarregar seu santuário de meditação com
vitalidade espiritual. Após realizar seu ritual preferido, interiorize-se, pratique as técnicas de
meditação da Kriya Yoga e encontre-se com Deus e os gurus nos planos interiores. A prática
supersticiosa e rotineira de rituais tem algum valor para os devotos espiritualmente adormecidos,
porque pode oferecer um grau de apoio no caminho; pode alimentar a devoção e inspirar a fé. De
valor superior é o ritual realizado com conhecimento, na forma de um procedimento preliminar,
após o qual a pessoa vai para além dele, na contemplação de Deus sem nome e sem forma.
Para mim, pensar em conceitos filosóficos abstratos é difícil. Tenho um temperamento
devocional. Gosto do ritual e do canto devocional. É isso adequado no caminho espiritual?
A prática de um ritual e do canto devocional pode ajudar a focalizar a concentração e
despertar um sentimento de percepção de Deus. Será útil equilibrar sua tendência devocional com
a investigação intelectual, da mesma maneira como é útil para os indivíduos intelectualmente
inclinados cultivarem a devoção. Equilibre, pois, suas práticas devocionais, lendo e refletindo
sobre o significado interno dos conceitos filosóficos. O estudo das realidades superiores o ajudará
a se relacionar de maneira mais efetiva com o mundo e desenvolverá seu conhecimento inato.
Seja, ao mesmo tempo, devoto e bem-informado. Ser devocional não significa que não deva usar
o bom senso. O caminho da devoção sozinho pode resultar em sentimentalismo. O crescimento
espiritual equilibrado e satisfatório pode ocorrer mais facilmente quando os aspectos mais úteis de
todos os caminhos iogues são integrados.
Paramahansa Yogananda tinha um temperamento fortemente devocional quando encontrou
seu guru. Já Sri Yukteswar, era fortemente intelectual. Paramahansaji disse uma vez que seus
73
primeiros meses com seu guru não foram fáceis, por causa da maneira franca e direta de Sri
Yukteswar, sua ênfase no pensamento racional e sua atenção aos detalhes. Disse que precisou da
influência de seu guru para desenvolver uma personalidade mais equilibrada, estabilizar sua
natureza devocional e preparar-se para a sua missão.
Paramahansaji enfatizava a importância de a pessoa ultrapassar a etapa de devoto e despertar
para a Auto-realização e a Realização Divina.
Li que ao iniciar os discípulos, Paramahansa Yogananda estabelecia com eles uma conexão.
Que significa isso?
Ao iniciar, o guru introduz no discípulo a força espiritual, que é recebida na medida da
receptividade do discípulo. Quando o guru transmite a força espiritual, seja impondo as mãos
sobre o discípulo, fitando-lhe os olhos, seja simplesmente pensando no discípulo, o fluxo dessa
força é dirigido pela intenção ou vontade do guru. Uma conexão mental e espiritual (de alma para
alma) é então estabelecida. Quando nutrida pela sintonia, ela permite que as irradiações da
consciência e da mente do guru fluam continuamente para o discípulo. De acordo com uma
história, uma pessoa que tinha sido iniciada por Paramahansaji informou mais tarde para ele que
havia encontrado um novo instrutor. Ele disse: “Muito bem, vou retirar meu raio de você”.
Depois disso, ele não era mais responsável pelo bem-estar espiritual dela.
Paramahansaji disse aos discípulos: “Eu passo pelas almas de vocês todos os dias”. Ele
pensava em nós, sintonizava sua consciência com a nossa e nos ajudava em silêncio. Quando um
discípulo pensa no guru, quando existe sintonia, ele recebe o apoio da consciência do guru – que
está unificada com Deus.
É possível para alguém ter um guru que não esteja encarnado?
Se seu guru o iniciou antes de ter deixado este plano, a relação não muda. Lembre-se do que
aprendeu e adira às práticas que ele lhe ensinou. Se há necessidade de mais instrução e orientação,
leia os escritos de seu guru ou peça a ajuda de um irmão (ou irmã) discípulo que seja
espiritualmente adiantado. Se isso não for possível, encontre fontes confiáveis de conhecimento,
cultivando ao mesmo tempo sua sintonia mental e espiritual com seu guru e a linhagem de
instrutores de sua tradição.
Se não teve a oportunidade de encontrar pessoalmente o guru iluminado que está agora em
outro plano e com quem você sente uma forte sintonia, peça instrução de um dos discípulos vivos
do guru, ou de um dos descendentes deles, que esteja qualificado e autorizado a ensinar e iniciar.
Não imagine que é discípulo de um guru a quem nunca conheceu só porque sente uma forte
atração por esse instrutor. Você pode respeitar o guru, e até tentar imitá-lo, mas evite a fantasia.
A imaginação a respeito de uma relação não proporciona benefícios permanentes. As ilusões,
embora possam atrair e confortar a mente, devem ser reconhecidas como tais e renunciadas, para
permitir que ocorra o genuíno crescimento espiritual.
Guru significa instrutor. Um sat (ser, realidade) guru é um instrutor da verdade e o agente
por meio do qual a força espiritual juntamente com a influência da consciência iluminada são
transmitidas às pessoas receptivas. A verdade não pode ser comunicada, nem podem a força
espiritual ou a influência da consciência iluminada serem transmitidas a alguém que, mesmo
sincero, não seja receptivo. A receptividade ao que o guru oferece é determinada pelo grau de
pureza da mente e da percepção do discípulo e da sensibilidade do seu sistema nervoso.
Quando medito, às vezes vejo no olho espiritual, na região frontal do cérebro, um brilhante
círculo de luz azul com um halo dourado. O que causa isso, e o que devo fazer quando o vir.
74
A luz que você descreve é o reflexo focalizado das correntes de força vital que fluem para
cima, através da coluna vertebral, e convergem na base do cérebro (bulbo raquiano). Às vezes,
você poderá ver, também, uma luz branca menor, brilhante, no centro da luz azul. Alguns iogues
dizem que a luz dourada pode ser considerada a freqüência de energia da vibração de Om, o
poder da Consciência; a luz azul é a freqüência de energia da Consciência que se expressa no
domínio da natureza; a luz branca transcende as luzes dourada e azul. Ao vir a luz do olho
espiritual, deixe que sua atenção seja atraída para ela. A luz pode também aparecer como um
túnel, dentro do espaço interior. Se o vir, permita-se ser atraído e puxado por ele.
Os gurus da nossa tradição da Kriya Yoga alguma vez pedem ou aceitam dinheiro ou alguma
outra coisa para darem instrução ou iniciação?
Os instrutores de nossa tradição não vendem seu conhecimento, seu serviço e suas bênçãos.
A pessoa que solicita instrução e/ou iniciação deve querer aprender, ter a capacidade para
aprender e estar disposta a praticar o que lhe for ensinado. Um pequeno donativo, a ser usado
para fins caritativos, pode ser solicitado pelo instrutor. Considera-se que esse donativo “purifica”
a mente e a percepção do estudante. Doando liberalmente a um propósito digno, o estudante
demonstra disposição para servir os outros. Lahiri Mahasaya pedia aos novos iniciados o donativo
de 5 rúpias, que eram mais tarde enviados a Babaji, nos contrafortes do Himalaia, que então
mandava alguns discípulos seus usarem o dinheiro para prestar serviço social ou religioso às
pessoas que viviam nas aldeias da região. Comida era distribuída, alguns pequenos templos eram
construídos e cerimônias religiosas eram conduzidas em reuniões públicas.
Durante os anos de 1920, Paramahansa Yogananda palestrou para grandes auditórios, em
muitas das principais cidades dos Estados Unidos, à base de donativos. Uma taxa de 25 dólares
era solicitada para uma série de cinco aulas noturnas, apresentadas após as palestras públicas. O
dinheiro era usado para pagar os custos de aluguel do auditório e anúncios nos jornais para atrair
estudantes. Estou certo de que as pessoas sinceras que não podiam pagar essa quantia (uma soma
considerável para o trabalhador comum daquela época) podiam doar de acordo com seus
recursos, ou podiam assistir de graça. Embora os estudantes e discípulos iniciados sejam
encorajados a apoiar, conforme necessário, o trabalho de ensino do guru, deve ser compreendido
que não pode haver compensação material pelo que o guru ensina (e pode silenciosamente
transmitir de acordo com a receptividade intelectual e espiritual do discípulo). Se o estudante não
tem dinheiro, alguma forma de serviço útil pode ser prestada, altruisticamente, em benefício de
alguém ou do público. Quem se dedica ao caminho espiritual deve aprender a dar generosamente,
tanto quanto recebe.
Seguindo o exemplo dos gurus de nossa tradição da Kriya Yoga, eu ensino de graça. Um
donativo pode ser aceito para o ministério; não para meu uso pessoal. Todos os que não podem
contribuir são calorosamente recebidos e generosamente servidos. Deus é a fonte de todo bem e o
único autor real das ações nobres.
Qual era a atitude de Paramahansa Yogananda em relação ao dinheiro e outras coisas
materiais?
Ele não tinha fortes apegos ou aversões. Via as “coisas” como elas são: aspectos da natureza,
com as quais se pode relacionar de maneira adequada e para serem utilizadas. Ele aconselhava:
“Expulse a idéia de que há uma separação entre o que é espiritual e o que é material”. O poder da
Consciência (Om) manifesta o Campo Primordial da natureza (espaço, tempo e forças cósmicas)
do qual o universo emanou. O universo físico é tão “espiritual” quanto qualquer outro plano. Três
atributos (gunas) permeiam todos os planos. Embora o tamas guna (peso, inércia) seja mais
influente no mundo físico, não precisamos permitir que nossos pensamentos e sentimentos sejam
muito influenciados por ele. No Bhagavad Gita e nos Yoga Sutras, se diz que as “forças da
75
natureza” são as últimas influências a serem superadas ou transcendidas. Não significa que
tenhamos de evitar contato com as coisas materiais. A chave para a liberdade é “estar no mundo
sem ser do mundo”, relacionar-se adequadamente com o mundo, mantendo a percepção do Eu e
de Deus.
Durante seus primeiros anos com Sri Yukteswar, quando meu guru expressou o desejo de ser
um iogue recluso sem ter de se envolver em atividades de organização, Sri Yukteswar lhe disse:
“Essa é uma atitude egoísta; você quer todo o alimento divino só para si? Onde estaria você hoje
se uma linhagem de gurus de coração generoso não lhe houvesse dado a oportunidade de
conhecer Deus? Muito trabalho ainda resta para você fazer no mundo.”
Paramahansaji trabalhou incansavelmente durante 32 anos para estabelecer os ensinamentos
da ioga no Ocidente e treinar discípulos que eram receptivos. A sua não foi uma missão fácil de
ser cumprida. Dos muitos milhares que foram atraídos a ele, somente uns poucos realmente
“ouviram” sua mensagem, e menos ainda praticaram o que lhes foi ensinado. Ele não desanimou.
Dizia: “Estou plantando sementes [espirituais] no solo de suas mentes subconscientes que
[quando o tempo certo chegar] deitarão raízes e germinarão”. Ele era um grande visionário, que
sempre dizia: “Estou plantando no éter as sementes do futuro deste trabalho”. Muitos de seus
projetos manifestaram-se durante sua vida e muitos ainda estão emergindo.
Em 1951, meu guru me falou de seu desejo de que um templo fosse construído no terreno
acima do Santuário do Lago da SRF, em Pacific Palisades, Califórnia. Disse-me que havia pedido
a James Lynn, um discípulo rico, espiritualmente adiantado, que comprasse o terreno para a
organização (o que Sr. Lynn fez). O templo, inaugurado em 1996, agora serve a milhares de
devotos. Quando eu morava no Centro da SRF em Fênix, Arizona, no começo dos anos de 1950,
ele me falou que um grande trabalho, florescente, afinal se desenvolveria naquela cidade. O que
ele imaginou e desejou é agora realidade.
Para conseguir seus propósitos, meu guru usava todos os meios disponíveis para alcançar e
servir os buscadores da verdade. Dizia: “Não é errado usar métodos de negócio (anúncios em
revistas, jornais e outros meios efetivos de comunicação) para fins espirituais”. Dedicando a
maior parte de seu tempo e energia para servir os outros, ele reservava algumas horas, todas as
manhãs, para meditar e fazer seu trabalho interno em benefício dos discípulos. (Seu “trabalho
interno” consistia na sintonia mental e espiritual com os discípulos, e na visualização e oração
pela harmonia e iluminação global.)
Nos três anos antes de sua morte, optou por viver em uma casa modesta, perto de TwentyNine Palms, na Califórnia, a quase duas horas de carro de Los Angeles. Ali, escreveu seu
comentário ao Bhagavad Gita, reunia-se com alguns discípulos e continuou a dirigir as atividades
da organização.
É útil para o devoto da Kriya Yoga avaliar seu horóscopo? Sri Yukteswar às vezes aconselhava
os discípulos a usarem metais e/ou pedras preciosas, as quais eram prescritas para propósitos
específicos. Isso seria útil?
O horóscopo revela a condição cármica da pessoa na hora exata de seu nascimento físico e as
influências planetárias que prevaleciam quando ela nasceu. Um exame astrológico acurado
geralmente confirma o que a pessoa já sabe a respeito das características, tendências, habilidades
e desafios de sua personalidade. Indícios de boa sorte no futuro próximo ou distante podem
oferecer encorajamento; indícios de desafios na vida podem ser considerados oportunidades a
serem superadas, evitadas ou transcendidas. Quando o devoto é espiritualmente desperto e vive
com propósito intencional, as influências cármicas e planetárias problemáticas são neutralizadas e
as influências cármicas e planetárias construtivas são mais auxiliadoras.
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Embora o uso de metais e pedras preciosas possa ser útil em alguns casos, é melhor não
depender deles. Sri Yukteswar usava seu conhecimento de astrologia e seus poderes de intuição
para ajudar os discípulos. Ele também dizia que, quase sempre, a bênção do guru é mais poderosa
do que os talismãs astrológicos que ele prescrevia. Paramahansa Yogananda (imitando Sri
Yukteswar) aconselhava alguns discípulos a usarem um bracelete feito de fios entrelaçados de
cobre, prata e outro. A outros discípulos, ele dizia: “Você não precisa disso”.
Ouvi dizer que Paramahansa Yogananda dissera aos discípulos: “Se forem fiéis a este caminho
até o fim (de sua vida na terra), quando partirem, eu ou um dos gurus estaremos lá para
introduzi-los no Infinito”. Pode me explicar mais sobre isso?
Ele me disse isso, em uma de minhas conversas particulares com ele, em sua casa de retiro
em Twenty-Nine Palms, na Califórnia, no começo de 1950.
Como isso é possível, e como podemos saber se teremos tal ajuda e orientação naquela hora?
Para mim, as palavras de meu guru são suficientes. Mestre de ioga plenamente iluminado, ele
falava com base em sua realização interna e experiência pessoal.
Não podemos saber qual dos gurus (ou outros santos de nossa tradição de Kriya) estará
conosco quando fizermos nossa transição do corpo, porque não sabemos onde eles estão agora.
Lahiri Mahasaya deixou o corpo em 1895; Sri Yukteswar partiu em 1936; Paramahansa
Yogananda, em 1952. Não deveríamos pensar que eles estão apenas residindo nos domínios
celestiais, aguardando nosso chamado quando deixarmos este mundo. Eles podem ter outras
coisas para fazer: podem se reencarnar, ou podem transcender o reino astral sutil e o plano causal
mais refinado.
Para abandonar o corpo (na hora apropriada), o iniciado em Kriya pode, em meditação,
retirar a consciência dos objetos externos, dos sentidos, das emoções e dos processos mentais, e
atravessar o canal da coluna vertebral, subindo até o olho espiritual e o chakra coronário,
aspirando ao mesmo tempo a experimentar a percepção lúcida e a realidade da plenitude de Deus.
As influências favoráveis necessárias serão, então, providenciadas.
A melhor preparação para a transição final é viver uma vida metódica, sadia, cultivar as
virtudes e meditar superconscientemente, em horários regulares. O viver correto acarreta saúde
psicológica, que elimina a confusão mental e emocional. A meditação superconsciente acarreta
Auto-realização e percepção de Deus, capacitando-nos a explorar os reinos internos da
consciência enquanto estamos encarnados.
Existe algum outro movimento de iluminação, além do nosso, que ensine que não estamos no
ciclo de tempo conhecido como Kali Yuga (Idade Obscura)?
Nenhum que eu conheça. Mesmo entre iogues e swamis “versados”, e outros que deveriam
saber melhor, é “tradicional” referir-se ao nosso atual ciclo de tempo como uma das
circunstâncias da Idade Obscura, mesmo quando uma visão alternativa lhes é apresentada. Se
estão meramente ensinando uma opinião tradicional porque lhes é mais conveniente fazer isso do
que instruir as pessoas, estão perpetuando um mito. Se não sabem melhor, podemos questionar
por que sua formação espiritual é tão incompleta, ou duvidar seriamente de seu grau de
(presumida) iluminação.
Mahavatar Babaji e Lahiri Mahasaya ensinaram que a presente Idade (Dwapara, a segunda),
durante a qual as eletricidades e outras forças sutis da natureza seriam descobertas e utilizadas,
começou a emergir de maneira mais evidente há 305 anos e continuará até 4100. Será seguida
pela Idade Mental (Treta, a terceira), de 3.600 anos de duração, e duas consecutivas Idades da
Verdade (Satya Yuga), de 4.800 anos cada, durante as quais a iluminação será a condição comum
da maioria das pessoas. Sri Yukteswar explicou as causas das manifestações desses ciclos de
77
tempo, em seu livro The Holy Science (“A Ciência Sagrada”). Segundo ele, essas causas estão
relacionadas com as influências das forças cósmicas que emanam do centro de nossa galáxia, as
quais revelam as faculdades intelectuais da maioria das pessoas durante as Idades ascendentes, e
as obscurecem durante as Idades descendentes. A idéia de que forças cósmicas possam causar
esses efeitos é difícil de ser compreendida pela pessoa comum, e esta é a única razão por que
tanta gente está confusa sobre o assunto.
Às vezes, quando observo a condição do mundo como reflexo dos estados de consciência de
seus quase 6 bilhões de habitantes humanos, lembro-me de que só estamos na alvorada da atual
Idade ascendente. Saber disso, no entanto, também me dá o descortino sobre o que ainda precisa
se desenvolver e a confiança no Poder inteligentemente dirigido, que determina os processos da
evolução e o despertar das almas.
Estou interessado no crescimento espiritual, mas não quero me tornar demasiadamente
imprático e “viver no mundo da lua”. O que recomenda?
Evite se preocupar com especulações metafísicas a ponto de perder o interesse em se
relacionar com o mundo físico e funcionar nele de maneira eficaz. Use sua compreensão
aprimorada para cumprir seus deveres com habilidade e alcançar seus objetivos dignos. Pense
racionalmente, seja decidido e goste do que faz. Freqüentemente ouvi Paramahansa Yogananda
dizer: “Quando você conhece Deus, a vida é divertida”.
Alguns indícios de que você está progredindo no caminho espiritual são: as necessidades são
mais facilmente atendidas; os desejos, mais facilmente satisfeitos; a compreensão dos princípios
metafísicos melhora; e a percepção da totalidade da vida é mais vívida.
Só existe um reino: o reino de Deus, com uma variedade de categorias, incluindo o universo
físico – nossa morada atual. A plenitude de Deus pode ser realizada enquanto estamos aqui.
Embora o universo físico não seja nosso destino final, compreender as realidades superiores torna
a vida neste mundo mais fácil e mais agradável. Considere a vida prática, consciente do Eu e de
Deus, como um treinamento e preparo úteis para o que ainda precisa ser alcançado.
Algumas pessoas dizem que os poderes excepcionais de percepção e as habilidades funcionais
extraordinárias que se podem obter como resultado do despertar espiritual não devem ser
utilizados para satisfazer seus próprios desejos pessoais. É verdade isso?
O que se recomenda é que não sejam usados para satisfazer as inclinações egocêntricas. O
conhecimento e as habilidades adquiridos devem ser sabiamente utilizados para aperfeiçoar nossas
vidas e as vidas dos outros, e para nutrir e completar o nosso despertar espiritual.
Que posso fazer para experimentar a consciência cósmica?
Purifique e expanda sua consciência. Aspire a perceber tudo que possa ser percebido e
conhecer tudo que possa ser conhecido. À medida que a sua capacidade de perceber e conhecer
aumenta, estados de consciência cósmica serão experimentados. Embora a pessoa que tenha sede
possa querer beber uma grande quantidade de água, a quantidade que poderá realmente beber é
determinada pelo tamanho de seu estômago. De modo parecido, quando aspiramos à consciência
cósmica, só podemos experimentá-la de acordo com a nossa capacidade de apreender.
Ao meditar em silêncio, expanda sua percepção. Visualize-se como uma unidade de
consciência pura no espaço infinito. Em outras ocasiões, lembre-se de que você vive no oceano
da Consciência e que tudo no universo material, e além dele, existe nesse Oceano. Também pode
ser útil manter a atenção no chakra coronário (no topo da cabeça) e sentir que você não está
confinado à mente ou ao corpo.
78
Leia o poema Samadhi, de Paramahansa Yogananda, no qual ele descreve uma experiência
em consciência cósmica.
Estou interessado em meditar com outros iniciados em Kriya Yoga. Como posso fazê-lo?
Há grupos de meditação da Self-Realization Fellowship em várias comunidades dos Estados
Unidos, América Central e do Sul, Europa e Índia. Procure no catálogo telefônico ou pergunte a
seus amigos kriya yogis para localizar um. Ao participar de uma reunião de meditação da SRF, vá
com o propósito de meditar, não para conversar sobre os ensinamentos. Lembre-se, porém, que
não é absolutamente necessário ter o apoio dos outros. Não há necessidade de discutir suas
aspirações com os demais. Sua iluminação espiritual é responsabilidade exclusiva sua.
Se vive na Califórnia, visite os templos da SRF em San Diego, Encinitas, Fullerton,
Hollywood, Pacific Palisades, Pasadena ou Richmond (perto de Oakland). Sempre que estiver no
sul da Califórnia, visite o Santuário do Lago da SRF e alguns outros centros em cujos terrenos
Paramahansaji caminhou. Sua “presença viva” ainda está lá. Se mora em Fênix, Arizona, visite o
templo da SRF, na North Central Avenue.
Quais são algumas das coisas mais importantes que você aprendeu de seu guru?
A sempre desejar ardentemente estar totalmente desperto em Deus, bem como pensar e viver
sempre de uma maneira que permita que o despertar espiritual possa acontecer mais rapidamente.
Paramahansa Yogananda nos anos de 1920
“A coluna vertebral é a rodovia para o Infinito. Seu
corpo é o templo de Deus. É no íntimo que Deus
precisa ser realizado. Quaisquer que sejam os lugares
de peregrinação que você visite externamente,
quaisquer que sejam os rituais que você pratique, a
peregrinação final terá de ser interiormente. O rito
religioso definitivo será a oferenda de sua força vital
no altar da comunhão com Deus.”
Paramahansa Yogananda
79
APÊNDICE
A Linhagem dos Gurus
Mahavatar Babaji
Em nosso atual ciclo de tempo, a transmissão dos ensinamentos da Kriya Yoga está fluindo
da Fonte de todo conhecimento, através de linhagens de gurus iluminados e seus discípulos
iniciados. Este caminho de iluminação é para todos os que possam discernir seu valor e escolham
adotar regimes de vida disciplinada e práticas espirituais. Kriya Yoga, o caminho do viver
metódico e da percepção direta de Deus, é idealmente aplicável às necessidades dos sinceros
buscadores da verdade em nossa era. Foi só recentemente, desde que a consciência coletiva da
humanidade emergiu do último ciclo da Idade Obscura, que pessoas em números crescentes têm
se tornado suficientemente receptivas às implicações filosóficas deste ensinamento e são capazes
de apreciar e obter benefícios de sua prática.
Foi o santo mortal-imortal, mais conhecido como Babaji, um guru espiritualmente iluminado
do Himalaia, que reviveu esta tradição da Kriya Yoga no século 19 e escolheu seu discípulo Lahiri
Mahasaya para torná-la disponível a todos os buscadores da verdade em todos os estilos de vida.
Babaji (“reverendo” ou “santo” pai) é um título comum utilizado na Índia para se referir a
um homem virtuoso ou santo. Mataji (reverenda mãe) é o título utilizado para uma mulher santa.
O Babaji desta tradição de Kriya Yoga é pouco conhecido porque geralmente está recluso no
Himalaia, com uns poucos discípulos espiritualmente adiantados. Acredita-se que Babaji está
encarnado há centenas de anos, conservando sua juventude e vitalidade, e afirma-se que há outros
que se mantêm encarnados por mil anos ou mais; eles têm demonstrado que a vida
excepcionalmente prolongada no corpo é possível. Babaji informou a um dos discípulos de Lahiri
Mahasaya que havia muitas vezes feito regimes sutis de regeneração e rejuvenescimento físico,
conhecidos como kaya-kalpa e rasayana; agora, seu corpo não está mais sujeito aos assaltos da
doença e do envelhecimento, sendo sustentado pelo poder de sua vontade iluminada e pela
influência de seu estado superior de Realização Divina.
Meu guru disse que a missão de Babaji, de ajudar as pessoas a se realizarem espiritualmente
em nossa presente era, não está confinada a esta tradição de Kriya Yoga, nem sua influência está
restrita ao planeta Terra. Ele é um siddha, um ser liberto que vive na Terra para ser o conduíte
através do qual as forças redentoras cósmicas e espirituais fluem para purificar a consciência
planetária e a acelerar o crescimento espiritual coletivo. Há muitos mestres espirituais iluminados
agora, na Terra, e muitos deles são assistidos por Babaji, porque seu papel é inspirar e apoiar
todos os que estão ativamente envolvidos em atender às verdadeiras necessidades das almas que
agora estão despertando para níveis superiores de compreensão.
Ele tem sido conhecido por vários nomes em diferentes épocas e lugares. Alguns títulos de
respeito dados a ele por discípulos de Lahiri Mahasaya, e por outros, são Mahamuni Baba
(“Grande Pai Silencioso”), Mahayogi (“Grande Iogue”) e Trambak Baba ou Shiva Baba (nomes
que o relacionam a Deus no aspecto de dissolvedor das formas e circunstâncias para que possam
ser manifestadas outra vez, e que são utilizados para indicar sua influência transformadora).
Paramahansaji se referia a Babaji como mahavatar, uma “grande (maha) encarnação de
qualidades divinas”. Existe alguma evidência indicando que ele era conhecido dos habitantes da
aldeia de Hariakhan e outros vilarejos do distrito Nainital do Himalaia, na última década do século
19 e nas duas primeiras décadas do século 20 (ver fotografia na pág. 94); em anos mais recentes,
certos devotos adiantados da Kriya Yoga tiveram contato pessoal com ele. Todavia, afirmações
80
que têm sido feitas recentemente por várias pessoas, sobre a presença de Babaji num ashram ao
norte da Índia e de que Babaji pessoal ou telepaticamente as teria autorizado para ensinar ou de
que ele fala através delas, são falsas e não devem ser levadas a sério. A única informação válida
que eu conheço a respeito de Mahavatar Babaji encontra-se na Autobiografia de um Iogue, de
Paramahansaji. Há outras histórias circulando por aí: que ele saiu da reclusão, que recebe todos
os buscadores da verdade que viajam para encontrá-lo, e que autorizou novas linhagens de
instrutores de Kriya Yoga. Todas elas parecem derivar de fontes não confiáveis ou fantasiosas.
Para a pessoa comum, os esforços para encontrar-se com Babaji estão destinados ao
fracasso. Se alguém não está estabelecido na superconsciência, não há possibilidade de
compreender o estado de realização divina de Babaji. Existe uma razão para ele permanecer
recluso; ele trabalha nos planos interiores, e não quer ser incomodado por devotos espiritualmente
imaturos. Também não há necessidade para Babaji indicar novos “representantes” – a linhagem de
gurus, através dos quais este trabalho é transmitido, já está estabelecida. Paramahansaji disse que
Babaji às vezes trabalha com outros indivíduos, mas de maneira silenciosa e privada, de modo a
não entrar em conflito com a transmissão da Kriya Yoga através da linhagem de gurus.
Lahiri Mahasaya aconselhou seus discípulos a se sintonizarem com a consciência de Babaji,
meditando e absorvendo sua percepção no olho espiritual. Paramahansaji também disse que é
possível comungar com Babaji em meditação e, algumas vezes, descrevia suas próprias
experiências dessa natureza. Embora sempre disposto a abençoar os devotos, o desejo de Babaji é
de que as almas busquem a Auto-realização, sua própria relação consciente com o Infinito. Não é
preciso viajar para um país distante, num esforço de obter sobre o caminho espiritual informações
que já estão disponíveis em livros e através dos instrutores desta tradição.
Shyamacharan Lahiri (Mahasaya)
Discípulo de Mahavatar Babaji
30 de setembro de 1828 – 26 de setembro de 1895
No vilarejo de Ghurni, distrito de Nadia, em Bengala, no dia 30 de setembro de 1828, uma
alma que iria desempenhar um papel fundamental na apresentação da Kriya Yoga às multidões
nasceu na família Lahiri e recebeu o nome de Shyamacharan. Anos mais tarde ele viria a ser
conhecido como Lahiri Mahasaya (alguém “cuja mente é larga (maha) ou expandida”).
Na escola, Lahiri aprendeu os idiomas inglês, sânscrito, urdu, hindi, bengali e persa. Dotado
de abundante vitalidade, era ativo nos esportes e freqüentemente nadava no rio Ganges. Aos
dezoito anos de idade, casou-se com Kashimoni Devi. Embora eles não começassem a ter filhos
senão após Lahiri ter sido iniciado por Babaji, com o passar dos anos tiveram cinco filhos: dois
meninos e três meninas.
Lahiri Mahasaya era empregado em Benares (Varanasi) como contador no departamento de
engenharia do governo militar britânico, e estava envolvido em projetos de construção de
estradas. Atento a seu trabalho, família e serviços comunitários, também praticava meditação e lia
o Bhagavad Gita e outras escrituras na privacidade de sua casa, na Chowsatti Ghat Lane, onde
tinha acesso ao rio Ganges.
Em 1861, foi temporariamente transferido para Ranikhet, uma região florestal perto de
Nainital, no sopé do Himalaia. Uma tarde, enquanto vagava pelas elevações no Monte Drongiri,
atraído pelas lendas locais de que “santos viviam por lá”, encontrou um jovem que o informou:
“Um santo quer vê-lo”.
Seguindo seu novo conhecido, ele foi levado até uma caverna, de onde saiu um iogue que o
saudou: “Shyamacharan, você chegou!” O santo era Mahavatar Babaji, que havia, por meios
81
telepáticos, arranjado os eventos para que a relação guru-discípulo que havia entre eles durante
várias encarnações pudesse ser renovada.
Lahiri foi levado a uma caverna, onde lhe foram mostrados os simples pertences de um
recluso: uma moringa, uma esteira de meditação e outros artigos pessoais. Ao toque de Babaji,
Lahiri lembrou-se da encarnação passada, quando ambos estavam juntos, e da caverna como o
local onde ele havia estado anteriormente ocupado na prática da meditação. Babaji informou a seu
discípulo: “O caminho da Kriya realmente lhe pertence. Seu ancestral, o sábio Shandilya, foi autor
do Shandilya Upanishad.” O livro a que Babaji se referiu é um tratado sobre práticas adiantadas
de ioga, anterior ao Yoga Sutras de Patânjali, que é um compêndio a respeito dos princípios
essenciais para compreender e dominar os estados superiores de consciência que levam à
libertação.
Logo após esse encontro inicial, Babaji deu a Lahiri um copo de óleo mineral para beber,
instruindo-o para que fosse a um rio próximo, na floresta, e descansasse até que o tratamento
purificasse seu corpo. Em seguida, lhe foi dada a iniciação nos processos de meditação da Kriya
Yoga, após a qual Lahiri experimentou vários dias de bem-aventurança superconsciente e estados
superiores de samadhi. No local da iniciação, Babaji materializara um palácio de ouro, ao desejar
que influências elementais sutis, presentes no espaço, se manifestassem. (Em outra ocasião,
Mahavatar Babaji derramou água no fogo para fazê-lo arder de maneira mais intensa. A água foi
instantaneamente transformada em óleo enquanto entrava nas chamas. Babaji explicou a um
discípulo como fizera isto por um simples ato de vontade ou intenção: “Eu vi o óleo na água”. O
domínio desse processo capacita o vidente realizado a manipular os elementos e a materializar e
desmaterializar formas.) Babaji explicou a Lahiri que fizera isso para satisfazer o desejo
subconsciente do discípulo, que havia persistido desde a encarnação anterior. Nas duas semanas
seguintes, foram ensinados a Lahiri todas as técnicas e os procedimentos detalhados da Kriya
Yoga.
O momentum de suas práticas espirituais do passado e a bênção de seu guru capacitaram
Lahiri a dominar, em um tempo relativamente curto, a prática do samadhi, que geralmente exige
do devoto comum muitos anos para conseguir. Tendo sido altamente iluminado em encarnações
anteriores, ele rapidamente despertou para estados transcendentais de consciência.
Enquanto estava com Babaji e seu pequeno grupo de discípulos, Lahiri presenciou muitos
incidentes interessantes. Em uma ocasião, ao visitar um tempo próximo à noite, observou um
santo entrar no templo para adorar. Um brilhante halo luminoso circundava o santo, a quem
Babaji mais tarde informou que se tratava de Ashvattaman,1 o filho de Dronacharya, que vivera
naquelas montanhas centenas de anos antes, junto com os Pandavas, a facção virtuosa da família
dinástica que, depois, se envolveu na guerra civil descrita no épico Mahabharata.
Antes de deixar Ranikhet, Lahiri iniciou alguns discípulos na prática da Kriya, a pedido de
Babaji. Quando Lahiri se preparava para retornar a Benares, pediu permissão a seu guru recémencontrado para dar iniciação a outros que, assim como ele, possuíam família e responsabilidades
mundanas. Após uma breve discussão, Babaji de algum modo modificou as antigas restrições
relativas à iniciação iogue, concordando que era agora apropriado encorajar a disseminação mais
ampla dos ensinamentos e das práticas de Kriya Yoga; ele disse: “Conceda iniciação em Kriya
para aqueles que forem honestos e queiram praticar”. E também: “Quando as pessoas lhe pedirem
iniciação, peça-lhes para lhe darem seu dinheiro e sua família”. Esse foi um modo de dizer que os
devotos, enquanto responsáveis por seus recursos materiais e obrigações familiares (e sociais),
não devem ser apegados a eles. “Dar todas as suas posses ao instrutor” significa dá-las a Deus,
renunciando ao apego a elas. Quando o instrutor tem certeza de que o buscador está preparado
para ser discípulo, a iniciação pode ocorrer.
1
Segundo o Mahabharata, por ter violado as regras da guerra, Ashvattaman foi castigado por Krishna e Vyasa a
ficar encarnado por dois mil anos.
82
Em Benares, Lahiri viveu, externamente, uma vida normal, secular, enquanto realizava suas
práticas espirituais durante a noite. Ensinou seus discípulos a fazerem o mesmo, iniciando em
Kriya Yoga mais de cinco mil devotos durante seus anos remanescentes na Terra. Ele os instruía:
“Não digam a ninguém que sou seu guru e não revelem que estão praticando esses métodos”.
Alguns iogues altamente adiantados também foram iniciados por ele, incluindo-se Swami Sri
Yukteswar, Swami Pranabananda, Keshavananda Avadhut, Sri Shastri Mahasaya, Srimat
Bhupendranath, Dayal Maharaj e Ram Gopal. Swami Trailanga, famoso santo daquela época,
uma vez prestou reconhecimento público a Lahiri, diante de seus discípulos, dizendo: “Eu
renunciei a tudo para obter aquilo que Lahiri Mahasaya recebeu de Deus”.
Lahiri permitiu que vinte e seis pequenos livros, com os comentários sobre diversas escrituras
preparados a partir de suas anotações e observações aos discípulos, fossem publicados por um
deles e tornados disponíveis para os iniciados em Kriya. Por causa de seu estilo conciso e o uso
de palavras descritivas que somente os discípulos que tinham contato pessoal com ele conheciam
o significado, suas interpretações únicas das escrituras não são amplamente conhecidas. Ele não
permitiu que nenhum esforço formal organizado fosse feito em seu nome, para popularizá-lo ou
divulgar o ensinamento, mas recomendava que a Kriya Yoga fosse transmitida para aqueles que
fossem atraídos para ele e através de algum de seus discípulos qualificados; preferia ensinar e
iniciar apenas aqueles buscadores da verdade que fossem sinceros.
Lahiri, com a permissão de Babaji, ensinava as técnicas de meditação de Kriya em ordem
seqüencial, com os procedimentos mais simples ensinados primeiro e as técnicas mais avançadas
ensinadas à medida que a proficiência do discípulo na prática se aprimorasse. Seguindo o
conselho de Babaji sobre como iniciar os outros, antes de conceder instrução sobre a prática ele
primeiro se certificava de que as pessoas que pediam iniciação fossem de bom caráter e se
comprometessem a praticar. Queria que os discípulos seguissem seu exemplo: viver
tranqüilamente, honrar seus compromissos e praticar a meditação privativamente. Aconselhava à
maioria de seus jovens discípulos que se casassem e tivessem uma vida secular equilibrada, a qual
pudesse fornecer um alicerce firme para suas práticas espirituais. Diversos ashrams modestos
foram mais tarde fundados por seus discípulos renunciantes, mas a ênfase maior estava em
encorajar os devotos a cumprirem suas obrigações familiares e sociais, enquanto viviam uma vida
centralizada em Deus.
Quando Paramahansa Yogananda tinha um ano de idade, seus pais, que eram discípulos de
Lahiri Mahasaya, o levaram até a casa de seu guru para que fosse abençoado. Segurando a
criança no colo, ele pronunciou: “Seu filho será uma grande locomotiva espiritual, que levará
muitas almas para Deus”.
Quando Babaji encontrou Sri Yukteswar em 1894, pediu para que informasse a Lahiri que
sua encarnação presente logo estaria concluída. Seis meses antes de sua transição, Lahiri contou a
sua esposa acerca de seus planos para abandonar o corpo durante o mês de setembro de 1895. No
dia 26 daquele mês, em que se comemorava o Mahastami, no segundo dia de adoração da Mãe
Divina no aspecto de Durga (um dos muitos aspectos da energia criativa de Deus), estava sendo
realizado um ritual na casa de um vizinho. Durante aquele rito religioso, o momento mais
significativo é a transição da fase lunar, quando ela se torna mais brilhante, entre o oitavo e o
nono dia. Naquele momento, Lahiri abriu os olhos por um instante, tornou a fechá-los e recolheuse em meditação para deixar o corpo de modo consciente.
O corpo foi cremado no dia seguinte, no ghat Manikarnika, às margens do rio Ganges. Um
discípulo, Swami Keshavananda, estava em seu quarto quando uma grande luz se manifestou.
Lahiri Mahasaya apareceu em corpo material, mais jovem e radiante que antes, e disse: “Meu
trabalho no mundo como chefe de família terminou, mas não deixo a Terra inteiramente.
Doravante, passarei uma temporada com Babaji no Himalaia e no cosmos.”
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Swami Sri Yukteswar (Priya Nath Karar)
Discípulo de Lahiri Mahasaya
10 de maio de 1855 – 9 de março de 1936
Devido ao intelecto excepcional e poderes intuitivos de Sri Yukteswar, Paramahansa
Yogananda se referia a ele como um Jnanavatar (“encarnação da sabedoria-conhecimento”).
Yukteswar (yuk, união, e Ishwara, o aspecto de Deus que controla os processos cósmicos), foi o
nome dado a ele quando foi ordenado swami, vários anos após ter se encontrado com Lahiri
Mahasaya.
Nascido em 1855, ele recebeu o nome de Priya Nath. (Karar era seu nome de família.) Em
sua juventude, freqüentou a universidade, onde assistiu a aulas de medicina e anatomia, mas a
abandou por discordar de um dos professores. Por si mesmo, estudou anatomia, ayurveda e
astrologia védica, lendo também o Bhagavad Gita e outras escrituras. Casou-se, foi pai de uma
filha e sustentava a família administrando as propriedades que herdara dos pais. Após a morte
prematura da esposa, procurou conselho espiritual de vários mestres, até que encontrou Lahiri
Mahasaya e foi iniciado por ele em Kriya Yoga. Após ter praticado as disciplinas da ioga por dez
anos, seu guru lhe concedeu permissão para que desse iniciação a outros.
Além de mestre de ioga, era também um astrólogo de renome e conhecedor profundo dos
princípios ayurvédicos. Atendendo a um pedido de Babaji, escreveu um pequeno livro, The Holy
Science (“A Ciência Sagrada”), no qual explicou a relação entre os eventos mundiais e os ciclos
de tempo cósmico, descreveu alguns dos ensinamentos compatíveis das várias religiões e
compartilhou suas intuições acerca do caminho espiritual. Também escreveu um comentário sobre
o Bhagavad Gita. Artigos seus sobre astrologia védica, a educação de crianças e jovens e temas
filosóficos eram também publicados em vários jornais da época. Ele fundou dois ashrams para
treinamento de jovens discípulos homens: em Puri, nas proximidades da Baía de Bengala, e em
Serampore, próximo a Calcutá. Também visitava regularmente muitos vilarejos remotos para
ensinar Kriya Yoga e iniciar discípulos.
Perito como terapeuta espiritual, Swami Yukteswar raramente exibia abertamente seus
poderes excepcionais. Era compassivo, embora permanecesse pragmático. Quando Paramahansaji
era um discípulo adolescente e pensava em cortar os laços de família, seu guru perguntou: “Por
que excluir a família de seu amor por Deus?” Às vezes, ele era incisivo em seu modo de ensinar
os discípulos. Àqueles cuja natureza era devocional, mas precisavam de incentivo para cultivar as
capacidades intelectuais, Sri Yukteswar comentava: “A santidade não é tontice!” Paramahansaji
sempre dizia: “Ele poderia ter sido o guru mais procurado da Índia, se não fosse tão severo no
seu modo de treinar discípulos”.
Uma pessoa que tinha lido a Autobiografia de um Iogue e ficara favoravelmente
impressionada disse a Paramahansaji: “Swami Yukteswar deve ter sido um homem magnífico”.
Meu guru exclamou: “Ele não era um homem; era um deus!”
Paramahansaji permaneceu com Sri Yukteswar por dez anos, antes de ser enviado por ele ao
Ocidente, em 1920. Na ocasião, Sri Yukteswar lhe dissera: “Se você for agora, todas as portas
estarão abertas”. Ele expressava profundo interesse no desenvolvimento do trabalho na América
e, em 1935, pediu a Paramahansaji que voltasse à Índia para visitá-lo.
Sri Yukteswar partiu deste mundo no dia 9 de março de 1936. Seu corpo foi enterrado no dia
seguinte no jardim de seu ashram em Puri, durante os últimos ritos ministrados por Paramahansa
Yogananda. Um pequeno templo-santuário foi posteriormente construído sobre a sepultura.
Poucas semanas antes de abandonar o corpo, Sri Yukteswar indicou Paramahansaji como o
responsável pela administração de seus ashrams e providenciou detalhes sobre a transferência de
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suas propriedades. “Deixo tudo em suas mãos”, ele disse. “Você será capaz de navegar com
sucesso o barco de sua vida e da organização para as praias divinas.”
Três meses após a morte de Sri Yukteswar, em um quarto de hotel em Bombaim,
Paramahansaji viu e conversou com seu guru em sua forma “ressuscitada”. Na ocasião, Sri
Yukteswar lhe deu informações pessoais sobre os acontecimentos mundiais, explicou em detalhes
a vida nos domínios sutis e disse que sua nova missão era a de ajudar espiritualmente as almas
adiantadas nas esferas astrais superiores a despertarem para as percepções causais e os estados
transcendentais de consciência.
Paramahansaji assumiu a responsabilidade de dar prosseguimento às atividades organizadas
iniciadas por seu guru na Índia. Alguns outros discípulos de Sri Yukteswar também foram
autorizados a ensinar Kriya Yoga de maneira independente, e alguns deles fundaram ashrams para
esse propósito.
Paramahansa Yogananda (Mukunda Lal Ghosh)
Discípulo de Swami Sri Yukteswar
5 de janeiro de 1893 – 7 de março de 1952
Embora a ciência da ioga já fosse de algum modo conhecida na América, nos primeiros anos
do século XX, foi Paramahansa Yogananda quem trouxe a mensagem dos sábios da Índia ao
Ocidente com influência de longo alcance e deu a ela um alicerce firme.
Meu guru nasceu em Gorakhpur, nordeste da Índia, perto do Himalaia, onde viveu até que
sua família se mudasse para Calcutá em seu décimo primeiro ano de idade. Dos quatro filhos e
quatro filhas de seus pais, ele foi o segundo menino e quarto filho. Ambos os pais eram discípulos
de Lahiri Mahasaya, cujo retrato estava no altar que a família tinha dentro de casa. Seu pai foi um
executivo da companhia ferroviária e um dos diretores de um pequeno banco que havia ajudado a
organizar. Sua mãe faleceu quando ele tinha onze anos.
Espiritualmente batizado por Lahiri Mahasaya à idade de um ano, enquanto crescia o menino
Mukunda costumava visitar santos e iogues, aprendendo com eles e sendo incentivado em sua
busca pela iluminação. Ele uma vez mencionou que estava consciente no ventre de sua mãe e mais
tarde se lembrou de encarnações anteriores em que fora um iogue.
Aos doze anos de idade, ele meditou por dois dias em um quartinho no sótão de sua casa em
Calcutá, disposto a orar sem cessar até que pudesse experimentar Deus diretamente. Após o
término da meditação, enquanto descia as escadas, encontrou uma de suas irmãs, cujo braço
estava machucado. Quando tocou nela, a cura foi instantânea. Anos mais tarde, em uma de suas
palestras na América, ele se referiu àquela experiência de meditação como “Minhas quarenta e
oito horas na Eternidade”.
Ele aprendeu técnicas de meditação com seu pai e com seu professor de sânscrito, um
discípulo de Lahiri Mahasaya. Conheceu seu guru Sri Yukteswar em 1910, quando tinha
dezessete anos, iniciando um período de uma década de intensivo treinamento espiritual. Logo
após sua formatura da faculdade, em 1914, quando foi iniciado na Ordem dos Swamis por Sri
Yukteswar, escolheu como seu nome monástico Yogananda: bem-aventurança (ananda) através
da união divina (yoga).
Antes de deixar a Índia para vir à América, Paramahansaji foi ativo no trabalho
organizacional de seu guru e, em 1917, fundou uma escola residencial para meninos, com aulas
das matérias do currículo escolar comum e também de práticas da ioga. Certo dia, enquanto
meditava na escola, teve uma visão em que viu muitas pessoas as quais intuitivamente soube que
seriam seus estudantes e discípulos na América. Dias depois, quando foi solicitado que
discursasse em uma conferência de religiosos liberais em Boston, Massachussetts, aceitou o
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convite. A generosa ajuda financeira de seu pai proporcionou sua viagem de navio até Boston e
sua permanência lá após a conferência. Quando seu pai entregou o dinheiro para a viagem, disse:
“Não estou fazendo isto como seu pai, que deseja que você permaneça na Índia. Faço isto como
discípulo de Lahiri Mahasaya.”
Quando o Mestre contou a seu guru que havia sido convidado para discursar na conferência
em Boston, Sri Yukteswar disse: “Se você for agora, todas as portas estarão abertas”.
O Mestre deu palestras públicas, falou em igrejas e faculdades, e ministrou aulas em Boston e
outras cidades da Nova Inglaterra durante três anos, período em que aceitou seus primeiros
discípulos americanos. Quando contou aos estudantes acerca de seus planos de viajar e ensinar
mais amplamente, eles doaram cinco mil dólares para apoiar o projeto. No decurso dos anos
seguintes, fez palestras para enormes platéias nas maiores cidades dos Estados Unidos e deu
iniciação a mais de cem mil pessoas. Recebeu as boas-vindas de governantes e empresários de
muitas cidades. Em Washington, D.C., suas palestras atraíram mais de três mil pessoas e ele foi
convidado para visitar o presidente Calvin Coolidge na Casa Branca.
Adotando métodos modernos de comunicação, Paramahansaji foi extremamente eficaz em
apresentar seus ensinamentos a milhares de pessoas. Acerca das muitas pessoas que freqüentaram
suas palestras e aulas, mas que não compreendiam plenamente aquilo que ensinava ou que não
continuaram suas práticas espirituais depois que o Mestre deixava a cidade, ele disse: “Pelo
menos, estou plantando as sementes espirituais no subconsciente deles, que mais tarde poderão
germinar e crescer”. Entre aqueles que foram até suas palestras e receberam iniciação, muitos se
tornaram discípulos pela vida inteira e fiéis apoiadores de sua missão.
Em 1925, durante suas primeiras palestras públicas em Los Angeles, o Mestre procurou por
um local onde pudesse estabelecer uma sede central permanente. Na área Highland Park de Los
Angeles, quando viu uma propriedade de dez acres sobre a qual havia um hotel de sessenta
quartos, em Mount Washington, disse para os amigos que estavam com ele: “Este lugar parece
nosso!” Quando soube que a propriedade estava à venda e informou a seus estudantes, eles
doaram vinte e cinco mil dólares para o pagamento da entrada. Alguns de seus estudantes foram
convidados para morar e trabalhar lá com ele.
Durante a visita do Mestre à Índia, em 1935-36, Sri Yukteswar o reconheceu como um
paramahansa: alguém que é capaz de separar perfeitamente a verdade da inverdade enquanto
vive livre no mundo. No caminho para a Índia, na companhia de um pequeno grupo de discípulos,
ele palestrou para enormes platéias em Londres e passou por várias partes da Europa. Na Índia,
passou algum tempo com Sri Yukteswar, falou em diversas cidades, visitou ashrams e santos, e
coletou informações sobre a vida de Lahiri Mahasaya que mais tarde incluiu em sua autobiografia.
De volta à América, ele se concentrou no treinamento dos discípulos, ministrou aulas e
palestras na Califórnia, escreveu livros e artigos, tendo também supervisionado a construção de
novos templos em Los Angeles e San Diego. Aulas no meio da semana eram também ministradas
no eremitério de Encinitas. Dois novos templos foram inaugurados no começo da década de
1940, e nos dois últimos anos antes de sua morte, ele supervisionou o projeto e a construção de
um anexo ao templo de Hollywood, inaugurou o Santuário do Lago, em Pacific Palisades, e
passou muito tempo em reclusão, na sua casa de retiro no deserto de Mojava. No final da década
de 1940, com “apenas mais alguns trabalhinhos a serem feitos” para completar sua missão, ele ia
com mais freqüência até sua casa isolada no deserto, para meditar e finalizar seus projetos
literários.
Até o fim de sua vida terrena, Paramahansa Yogananda viveu conforme aconselhava os
demais a viverem. Poucos meses antes de sua morte, enquanto falava com seus discípulos, disse:
“Abandonem a falsa crença de que existe separação entre a vida material e a vida espiritual.
Cumpram habilidosamente suas tarefas. Todo trabalho é purificador se for feito com a motivação
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correta. Se algumas vezes vocês falharem na realização de seus propósitos, não percam a
coragem. Essa é a melhor hora para semear as sementes do êxito. Em tudo o que fizerem,
expressem suas ilimitadas qualidades da alma.”
Ele deixou uma organização equipada por discípulos dedicados, aos quais havia treinado
pessoalmente para continuarem a disseminação dos ensinamentos de Kriya Yoga, e alguns outros
discípulos para representarem essa tradição independentes da afiliação organizacional. Ele estava
ciente de que a transmissão do ensinamento e o fluxo da graça através da linhagem dos gurus
continuariam por intermédio de seus discípulos espiritualmente adiantados e daqueles que por eles
fossem treinados e iniciados. Após a sua morte, alguns representantes de sua organização
anunciaram que ele seria o último da linhagem dos gurus da Kriya Yoga a ser reconhecido por
eles. A declaração, porém, não significa que a linhagem de gurus terminou com Paramahansaji,
apenas que a mesa diretora não reconhecerá outro guru na organização dela. Felizmente, tal
decreto não pode deter o fluxo continuado de poder iluminador através dos iniciados em Kriya
Yoga, que despertam para a sua relação com o Infinito e continuam a servir como representantes
desta tradição.
Todo ano – conforme parece – um novo “mestre perfeito, avatar, instrutor mundial ou
messias” é promovido como tendo vindo para iluminar a humanidade e introduzir a Idade de
Ouro. Recentemente li um anúncio de uma mulher indiana, proclamada “a mestra espiritual mais
adiantada do século”. Outro anúncio descrevia um tal “mestre de Kriya Yoga” da Índia, que é “o
único representante atual desta tradição realizado em Deus” e que “realizou o elevado estado de
nirvikalpa samadhi, no qual permanece sem pulso e sem respiração” (e, naturalmente, ele oferece
a Kriya Yoga “autêntica, original”). Entre alguns representantes da Kriya Yoga há demasiado
debate sobre quem (ou que organização) ensina as técnicas e os procedimentos “autênticos”, e se
eles foram ensinados corretamente ou não. Se os ensinamentos fluem de uma linhagem de gurus
iluminados e bem-informados, são autênticos. Se autênticos, a transmissão se processa de maneira
natural, com os devotos sendo atraídos para uma fonte honesta.
Nesta tradição, o discípulo é autorizado por seu guru e recebe dele o poder para iniciar os
outros, para que a transmissão do ensinamento e da força espiritual permaneçam sem adulteração.
Segundo disse Lahiri Mahasaya, se a iniciação não for dada por uma pessoa autorizada (quer
dizer, se a pessoa apenas presume estar preparada para iniciar sem receber primeiro a permissão
de seu guru), então não é uma iniciação real, mas apenas instrução vazia, sem potência. Não há
transmissão da shakti ou força espiritual redentora, e, portanto, não há verdadeira sintonia com a
linhagem de gurus.
Apenas aprender uma técnica de meditação mais intricada não é garantia de que a prática será
eficaz. Ao ser iniciado, o discípulo torna-se sintonizado com a linhagem de gurus, e as “ondas” da
graça-bênção que deles fluem para o discípulo são de extremo benefício. A bênção dos gurus é
tão importante quanto a prática das técnicas de meditação, se não for mais, pois muitos discípulos
já experimentaram a iluminação da consciência por causa de sua devoção a Deus e amor pelos
gurus, mesmo sem terem sido versados na prática das técnicas de meditação. Sem entrega a Deus
e sem sintonia com os gurus, a prática da técnica é mecânica.
Antes de deixar a Índia em 1920, Paramahansaji rezou para receber a bênção e a orientação
de Babaji. Babaji o visitou, garantiu-lhe sua bênção e disse: “Kriya Yoga acabará por difundir-se
em todos os continentes e ajudará a harmonizar as nações por meio da percepção pessoal e
transcendente de Deus.”
O impulso divino, manifestado pela primeira vez em 1861, em um recanto afastado do
Himalaia, expandiu-se lentamente no começo e está agora se difundindo com influência crescente
para trazer à tona os acontecimentos que realizarão essa profecia.
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A Sabedoria de Lahiri Mahasaya
O (supremo) Eu é a Realidade definitiva. É a fonte de tudo. A alma é
imortal. Os atributos divinos a permeiam. Que o seu caminho espiritual
seja de comunhão com Deus.
Quando os movimentos das ondas mentais são transcendidos durante a
prática da meditação, a consciência é purificada e a união com o Eu
supremo é compreendida. Então, a consciência do buscador da verdade
e a Consciência Suprema são vivenciadas como uma só.
Meditação é a prática da percepção interna consciente de Deus. É a
lembrança constante do Espírito transcendental. Deus é revelado dentro
de nós quando nossa consciência é purificada pela liberação de todos os
conceitos de dualidade e finitude.
Quando a mente está serena, a realidade de Deus se reflete nela. Deus,
eterno e onipresente, transcende a mente e o intelecto.
A meditação resulta em revelação divina. Da realidade do ser individual
emerge a percepção e a realização do puro Eu, a Divindade que habita
em seu interior. Auto-Realização é o conhecimento consciente de nossa
identidade absoluta com Deus, a Auto-revelação da nossa verdadeira
natureza através da iluminação da consciência pura.
A mente é o elo entre a alma e os sentidos. Percepções divinas são
adquiridas quando os sentidos são espiritualizados. Alegria, doçura e
júbilo preenchem todo o ser quando os sentidos são purificados e
inspirados pela pureza da alma.
Cada pessoa é responsável por sua vida interior – a qual é a criação dos
próprios pensamentos, desejos, sentimentos e ideais de cada indivíduo.
88
A Sabedoria de Swami Sri Yukteswar
Apenas alguns poucos indivíduos podem [facilmente] erguer-se por
sobre a influência de suas crenças professadas e descobrir a
concordância harmoniosa e absoluta nas verdades propagadas por todas
as grandes fés. Pessoas que estão presas às preocupações mundanas
precisam da ajuda e orientação daqueles seres sagrados que trazem luz
para a humanidade. Todas as criaturas, das mais evoluídas às menos,
estão ávidas por realizar três coisas: existência, consciência e bemaventurança.
Deus, a única Realidade no universo, não é compreendido pela pessoa
comum até que sua consciência se eleve acima dos atributos da
Natureza.
Quando, por dedução, a relação entre a verdadeira natureza do universo
e a essência individual é conhecida, e quando o indivíduo compreende
que a falta de conhecimento é a causa que faz as almas esquecerem seu
Eu verdadeiro de modo a gerar sofrimento, surge a vontade de escapar
dessa má-fortuna. Libertar-se do cativeiro dessa ignorância então se
torna o objetivo primordial da vida.
Coragem moral, quando firmemente estabelecida, remove todos os
obstáculos à salvação [libertação da consciência]: ódio, vergonha, medo,
pesar, condenação dos outros, preconceito racial, orgulho ancestral e
egoísmo.
Quando descansa pela prática de kriya, o sistema nervoso é revigorado.
Se o sistema nervoso obtiver diariamente esse descanso, o corpo físico
também é vitalizado. Vida e morte recairão sob o controle do iogue que
persevera na prática desse pranayama.
89
A Sabedoria de Paramahansa Yogananda
Se quer a orientação de Deus em sua vida, não perca tempo
conversando fiado com os outros. O silêncio é o altar do Espírito.
Definir-se a si próprio em termos de limitações humanas é profanar a
imagem de Deus que você é.
A pessoa mais sábia é aquela que aspira a conhecer Deus. A mais bemsucedida é aquela que realizou Deus.
Ore assim: “Infinito Deus, eu raciocinarei, quererei e agirei. Guia,
porém, minha razão, vontade e atividade para que eu possa fazer o que
tenho de fazer.
Jamais permito que a palavra “impossível” penetre em minha mente; nem
vocês devem permiti-lo.
Pensar que você não está livre o impede de ser livre. Pare de pensar
assim, e você será livre.
Ter a realização divina é conhecer o seu Eu como o grande oceano do
Espírito, dissolvendo a ilusão de que você é o pequeno ego, corpo ou
personalidade.
O objetivo final de nossas vidas não é o que a maioria das pessoas
imagina.
Estenda as fronteiras de seu amor; inclua nelas sua família e vizinhos,
sua comunidade, seu país e todos os países. Seja um amigo cósmico,
imbuído de bondade e afeição por toda a criação, espalhando amor em
toda parte.
Quando quiser conhecer Deus tal qual a pessoa sedenta quer beber água,
você O conhecerá. Quando colocar Deus no primeiro lugar em sua vida,
experimentará a plenitude e a bem-aventurança da realização divina.
Pela meditação profunda e vivendo só para Deus, tranqüilize as ondas
do pensamento e do desejo que constituem a sua presente percepção da
realidade. Na superconsciência, você contemplará todas as coisas como
elas realmente são.
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Fotografias
Eu, quando era ministro do Centro da Self-Realization Fellowship em Fênix, Arizona, 1952
Paramahansa Yogananda abençoando James J. Lynn (Rajasi Janakananda), agosto de 1951
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Yogacharya Oliver Black
Paramahansa Yogananda, na frente de sua casa de retiro, em Twenty-Nine Palms, Califórnia
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Paramahansa Yogananda, conduzindo um serviço em memória do Mahatma Gandhi, no Templo da SelfRealization Fellowship em Hollywood, Califórnia, foto do Los Angeles Times, 1948
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Fotografia rara do Babaji de Hariakhan, no Himalaia, considerado por
alguns como sendo o próprio Mahavatar Babaji (começo do século 20)
Roy Eugene Davis
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