rede para o desenvolvimento
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Dezembro 2008 Setorial www.valoronline.com.br SANEAMENTO REDE PARA O DESENVOLVIMENTO OS MELHORES E OS PIORES MUNICÍPIOS Capa_Saneamento_v09.indd 1 F FGTS LANÇA PROGRAMA PARA AS EMPRESAS P Á ÁREA ATRAI PROFISSIONAIS 12/9/08 5:38:52 PM CARTA AO LEITOR | Valor Econômico S.A. Conselho Editorial Agostinho Cardoso Vieira, Aluízio Maranhão Gomes da Silva, Antonio Manuel Teixeira Mendes, Celso Pinto, Luís Frias, Nicolino Spina, Otavio Frias Filho, Roberto Irineu Marinho e Vera Brandimarte Conselho de Administração Antonio Manuel Teixeira Mendes, Luís Frias, Paulo César Pereira Novis, Roberto Irineu Marinho Diretor-Presidente Nicolino Spina Diretor de Publicidade Noticiário André Chaves de Moraes Leme Diretora de Publicidade Legal Andréa Flores Diretor de TI Oziris de Oliveira Filho Diretor de Circulação Marcos Rodrigues Diretora de Redação Vera Brandimarte Diretora-Adjunta de Redação Claudia Safatle Diretora de Projetos Editoriais Rosvita Saueressig Laux Diretor-Adjunto de Projetos Editoriais Carlos Raíces Editores Executivos José Roberto Campos, Pedro Cafardo Secretária de Redação Célia de Gouvêa Franco Unidade de Projetos Editoriais Revistas – Suplementos – Seminários Diretora Rosvita Saueressig Laux Diretor-Adjunto Carlos Raíces Gerente de Publicidade – Brasília Luiza Pupe Gerente de Publicidade – Rio de Janeiro Paulo Roberto Santos da Costa Gerente de Marketing Eduardo Guterman Analista de Publicidade Elza Favorito Valor Setorial Saneamento Editora Maria Cândida Vieira Repórteres e colaboradores Ediane Tiago, Genilson Cezar, Gleise de Castro, Lauro Veiga Filho, Margareth Boarini, Roberto Rockmann, Rosangela Capozoli Revisão Clara Ywata Arte Editor de Arte/Fotografia: Silas Botelho Editor-Assistente de Arte: Renato Brandão Coordenador: Eli Sumida Fotos: Pesquisa de imagem Fernanda Prado Capa: Pepe Casals Pesquisa e Revisão Técnica: Valor Data Gerente: Willian Volpato Pesquisadores: Andrea Rodrigues dos Santos, Edgard Kanamaru, Eni Ribeiro dos Santos, Marcos Roberto de Andrade Silva, Murilo Giovaneli, Robinson Moraes Editoração Eletrônica: Grecco Comunicação Apoio na Comercialização Casa de Sucesso Representação Comercial e Organização e Eventos Ltda. Rua: Irmã Pia, nº 422, 3º andar - Jaguaré Cep.: 05335-050 - São Paulo (SP) Fones.: (11) 3768-1025, 3768-1157, 3768-1192 Marisa de Stephano Feba Márcia Caracciolo Vilma Takami Sameshima 4 ValorSetorial 04-05 Indice.indd 4 AVANÇOS SÓ COM ARTICULAÇÃO E mbora o Brasil tenha profundas carências em água e esgoto, todos os anos sobram recursos porque a maioria das 27 companhias estatais estaduais, responsáveis pela gestão do saneamento para cerca de 100 milhões de pessoas, está endividada e não pode pegar o dinheiro disponível do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), fonte de financiamento desses serviços básicos. Dos R$ 18 bilhões destinados ao setor, de 2003 a 2008 menos da metade, R$ 8,2 bilhões, foi contratada pelas empresas estaduais. E apenas R$ 3 bilhões foram efetivamente investidos no setor. Das 27 empresas estaduais, apenas sete conseguiram pegar recursos do FGTS em 2007, porque as outras não passaram pela análise de crédito da Caixa Econômica Federal (CEF), gestora dos recursos do FGTS. Para estruturar um programa de revitalização da área de saneamento, com o objetivo de assegurar a expansão dos serviços de água e esgoto de maneira eficiente e com qualidade, é proposto um novo modelo de operação: a participação do FGTS não só como financiador, mas como investidor direto nas companhias estaduais, seja com participação minoritária no capital, seja por meio de outros instrumentos de mercado, como o lançamento de debêntures. A entrada do FGTS como investidor exigirá um trabalho profundo de auditoria para verificar a situação financeira e de gestão das companhias estaduais, ou seja, será traçado um diagnóstico completo. Depois haverá uma avaliação da empresa, terminando com a elaboração ou não de um plano de negócio específico para cada uma delas. Mas tudo isso exige uma ampla articulação entre companhias, governadores, políticos, empresários e trabalhadores. As linhas básicas da proposta foram apresentadas no seminário Reestruturação do Setor de Saneamento, organizado pelo Valor, no fim de novembro, em São Paulo, com o patrocínio do Conselho Curador do FGTS, da CEF e do Ministério do Trabalho. A proposta foi bem recebida por empresas como a Compesa (PE), Casal (AL) e Cesan (ES). O Conselho Curador do FGTS, as entidades de classe e os empresários do setor avaliam que já existem os marcos regulatórios para a área de saneamento, e não faltam recursos para investir em água e esgoto, havendo, assim, a necessidade de melhorar a situação das empresas públicas estaduais. A reestruturação do setor de saneamento é fundamental para superar a triste realidade brasileira: sete crianças morrem todo dia no país vítimas de diarréia e 700 mil pessoas são internadas a cada ano nos hospitais públicos devido à falta de coleta e tratamento de esgoto. O investimento em obras de saneamento representa uma poupança para o país, porque para cada R$ 1 investido significa uma economia de R$ 4 em gastos com saúde. Além disso, pode gerar entre 550 mil e 600 mil novos empregos por ano. SANEAMENTO 08.12.08 18:21:07 ÍNDICE | SANEAMENTO 6 18 6 14 18 34 36 38 40 43 46 48 50 PERSPECTIVAS CENÁRIO REESTRUTURAÇÃO SABESP COPASA SANEPAR 46 INFRA-ESTRUTURA MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS MÃO-DE-OBRA MELHORES MUNICÍPIOS PIORES MUNICÍPIOS SANEAMENTO 04-05 Indice.indd 5 ValorSetorial 5 08.12.08 18:21:19 PERSPECTIVAS | POR GENILSON CEZAR VENCER AS LIMITAÇÕES ENVOLVE NEGOCIAÇÃO O setor de saneamento básico precisa ser reestruturado porque a maioria das empresas estaduais está endividada e sobram recursos do FGTS S e depender da boa vontade de autoridades do governo, empresários, representantes de entidades de classe e dirigentes de companhias públicas e sindicais, a situação ao mesmo tempo dramática e esdrúxula que envolve o setor de saneamento básico no Brasil está com seus dias contados. Em torno do drama de milhões de brasileiros que ainda hoje vivem sem a menor condição de atendimento de água e esgotos, enquanto quantias fabulosas de recursos financeiros colocados à disposição do mercado para realização de obras de infra-estrutura são extravagantemente descartadas por conta da ineficiência, mobilizam-se atualmente agentes dos diversos segmentos do setor no país. O objetivo é estruturar um programa para revitalização da área de saneamento de modo a assegurar a prestação de serviços de água e esgotamento sanitário de maneira eficiente e com melhor qualidade. O ponto fundamental do novo modelo de operação, cujas linhas básicas foram apresentadas no seminário Reestruturação do Setor de Saneamento, organizado pelo Valor, no dia 26 de novembro, em São Paulo, prevê a participação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) como investidor direto, seja com participação minoritária em companhias estaduais do setor, seja por meio de outros instrumentos de mercado, como debêntures (veja reportagem na página 18). “A reestruturação do setor de saneamento é fundamental não só para a geração de emprego como para dar cidadania”, avalia o ministro do Trabalho, Carlos Lupi, que também preside o Conselho Curador do FGTS. “Nós temos um grande percentual da população brasileira que não tem água potável ainda e que não é beneficiária de um saneamento de infra-estrutura. Ou seja, de esgoto público, de tratamento desse esgoto. Temos 83% da população com água potável, o que significa que há ainda uma margem de 17% da população que precisa ter essa água, e temos apenas pouco mais de 51% que é atendida por saneamento básico tratado”, explica o ministro. Segundo 10,24 O que se gasta efetivamente Em R$ bilhões* Compromissos de gastos Desembolsos realizados 3,41 3,12 2,45 0,92 2003 1,17 2004 As séries foram indexadas pelo IGP-DI médio anual da FGV para o ano 2007 6 ValorSetorial 1,84 3,32 3,53 1,47 2005 2006 2007 Fonte: Ministério das Cidades SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 6 08.12.08 18:22:01 KANNO / MULTISP Recursos para sistemas de água e esgoto* no Brasil A fatia de cada um Em R$ bilhões, em 2007 17 (77%) Estatais estaduais No Brasil, em R$ bilhões 178,3 Total 4 (18%) Municipais 151,1 1 (5%) 123,6 Privadas 70,1 27,2 16,8 12,9 6,7 6,3 Gestão do saneamento 74,4 Sudeste Em milhões de pessoas, em 2007 37,3 Nordeste 33,0 Sul 17,3 Centro-Oeste 16,3 Norte 2000 2010 2015 96,0 (67,8%) Estatais estaduais 2020 32,0 (22,6%) Municipais *Investimentos em expansão e reposição no meio urbano e rural – valores em R$ milhões (2003) Fonte: Programa de Modernização do Setor de Saneamento II (PMSS) 13,6 (9,6%) Privadas Gastos comprometidos Total R$ 10,24 bilhões – 2007 Por região 7,4% Norte 13,8% C.-Oeste Sul 10,6% 27,2% Nordeste Verba condicionada Recursos onerosos comprometidos – R$ 5,3 bilhões - 2007 Verba assegurada Recursos não onerosos comprometidos – R$ 4,94 bilhões – em 2007 8,9% 6,0% 47,03% 8,8% 6,6% 21,2% 63,90% 41,0% 14,7% Sudeste 16,6% 6,2% * Investimentos em expansão e reposição no meio urbano e rural – valores em R$ milhões (2003) ** As séries foram indexadas pelo IGP-DI médio anual da FGV para o ano 2007 Fonte: Programa de Modernização do Setor de Saneamento II (PMSS)/Ministério das Cidades SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 7 ValorSetorial 7 08.12.08 18:22:13 | Lupi, a situação se complica quando se analisa os recursos colocados à disposição de Estados e municípios para obras de saneamento básico. “Dos R$ 18 bilhões que o governo federal destinou, de 2003 a 2008, para financiamento do setor, menos da metade, R$ 8,2 bilhões, foi contratada por companhias estaduais da área de saneamento. Apenas R$ 3 bilhões foram efetivamente investidos”, reclama ele. O mais grave, de acordo com Paulo Eduardo Cabral Furtado, secretário executivo do Conselho Curador do FGTS, é que a instituição trouxe de volta ao seu caixa cerca de R$ 16 bilhões provenientes da amortização de financiamentos concedidos, ou seja, um volume de recursos superior ao das novas contratações. “Há uma baixa efetividade dos recursos disponíveis por conta da incapacidade da maioria das 27 empresas estaduais tomarem recursos do FGTS. Desse total, apenas sete contrataram recursos do FGTS, porque as outras não passaram pela análise de crédito da Caixa Econômica Federal”, diz Furtado. Não é que não tenha havido avanços significativos no setor de saneamento do país nos últimos anos. O compromisso de gastos com obras de saneamento, de acordo com o Ministério das Cidades, passou de R$2,45bilhõesem2003paraR$10,24 bilhões em 2007. Um balanço do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), que reservou R$ 40 bilhões para investimentos e financiamentos de obras do setor até 2010, mostra que até setembro foram contratados R$ 22,5 bilhões para saneamento. Até o fim de 2008, informa Leodegar Tiscoski, secretário nacional de Saneamento Ambiental do Ministério das Cidades, serão selecionados mais R$ 5,5 bilhões em contratos, e para 2009 a previsão é contratar entre R$ 3 bilhões e R$ 4 bilhões em novos projetos, fechando o ano com R$ 30 bilhões em empreendimentos. O impacto dos desembolsos nas condições de saneamento do país já pode ser contabilizado. Segundo a pesquisa Saneamento, Saúde e Bolso 8 ValorSetorial SERGIO ZACCHI / VALOR PERSPECTIVAS Carlos Lupi: reestruturação para gerar empregos e também garantir a cidadania do Consumidor, realizada pelo Instituto Trata Brasil e a Fundação Getulio Vargas (FGV), em 2007, ano em que o PAC foi lançado pelo governo federal, o saneamento básico foi o serviço público que teve o maior crescimento no Brasil, atingindo 49,4%, um salto de 5% em relação a 2006. O percentual de domicílios atendidos por rede geral de abastecimento de água (83%) cresceu 0,1% (1,49 milhão de unidades a mais) em relação a 2006, indica o estudo da FGV com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2007). Já a participação de domicílios atendidos por rede coletora de esgo- tos aumentou 2,8% e, dessa forma, o Brasil passou a ter mais da metade (51,3%) dos seus domicílios ligados à rede coletora de esgotamento sanitário. Com isso, indica a pesquisa da FGV, as doenças infecciosas e parasitárias causaram menos mortes entre crianças de 1 e 4 anos. “Este índice vinha crescendo ano a ano desde 1996, mas em 2007 teve uma queda de 14,1% em relação a 2006”, afirma o economista Marcelo Neri, coordenador da pesquisa da FGV. Houve uma evolução, certamente, mas as exigências ainda são dramáticas. Pelo menos 100 milhões de brasileiros continuam sem coleta e SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 8 08.12.08 18:22:25 tratamento de esgotos; 48 milhões usam obsoletas fossas sépticas e 45 milhões de habitantes não têm água tratada. Nas zonas rurais, apenas 4% da população têm coleta de esgoto. “O grande problema é que, para cumprir as metas de melhorar o atendimento do saneamento básico, hoje muito baixo, em torno de 50% apenas, o Brasil terá que realizar investimentos muito altos”, diz o exgovernador fluminense Wellington Moreira Franco, vice-presidente de fundos de governo e loterias da Caixa Econômica Federal (CEF). Segundo ele, o Ministério das Cidades prevê investimentos de R$ 178,3 bilhões até 2020 para cumprir as metas de universalização estabelecidas para os serviços de água e esgoto. Um estudo da Associação Brasileira da Infra-estrutura e Indústria de Base (Abdib) mostra a necessidade de o país elevar o percentual de investimentos, público e privado, dos atuais 0,28% do Produto Interno Bruto (PIB) para 0,60% do PIB até 2020. É uma trajetória que passa por investimentos de R$ 138,5 bilhões até 2010, R$ 169,4 bilhões até 2015 e chega a até R$ 200 bilhões em 2020. “A preocupação é grande, existe um passivo ambiental muito elevado e uma necessidade enorme de recursos para superar uma triste realidade”, diz Newton de Lima Azevedo, presidente da Abdib. O quadro é assustador, segundo ele: sete crianças morrem todo dia no país, vítimas de diarréia, e 700 mil pessoas são internadas a cada ano nos hospitais públicos devido à falta de coleta e tratamento de esgoto. Mais do que gasto, o investimento em obras de saneamento, segundo Azevedo, representaria uma poupança para o país. “Cada R$ 1 investido em saneamento significa uma economia de R$ 4 em gastos com saúde”, afirma. “Além disso, o investimento estimado pelo setor para a universalização do saneamento no Brasil poderá gerar 550 mil novos empregos por ano”, assinala. Do ponto de vista político, econômico e de legislação para o setor, As empresas privadas respondem pelo atendimento nos serviços de água e esgoto a 13,6 milhões de pessoas, 9,6% da população urbana o cenário induz investimentos em saneamento, asseguram os empresários e agentes governamentais. Depois de idas e vindas no campo legislativo, o setor vive hoje sob o guarda-chuva de um novo marco regulatório, que começou com a aprovação da Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs) – Lei nº11. 079 –, em dezembro de 2004, passou pela aprovação da Lei dos Consórcios Públicos (Lei nº11.107), em abril de 2005, e se consolidou com a Lei do Saneamento Básico (Lei n° 11.145), aprovada em janeiro de 2007. “Hoje, temos um ambiente regulatório, com regras claras, que abre novas possibilidades de investimentos, tanto para o setor público quanto para o setor privado”, acredita Yves Besse, presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon). Para o setor privado, observa o executivo, o estabelecimento do novo marco regulatório gerou de imediato uma retomada dos investimentos. “O setor privado estava praticamente sem novos contratos de concessão desde o ano 2000. Ficou praticamente parado até 2007, quando assinou 12 contratos, com investimentos de R$ 250 milhões. Em 2008, o setor assinou mais oito novos contratos, no valor de R$ 430 milhões”, indica ele. De acordo com a Abcon, as empresas privadas respondem atualmente pelo atendimento nos serviços públicos de água e esgoto a 13,6 milhões de brasileiros (9,6% da população urbana). São 64 concessionários e 21 empresas privadas, com faturamento estimado em 2008 da ordem de R$ 2 bilhões. “As empresas privadas podem ajudar o poder público a atingir a universalização do saneamento brasileiro mais rapidamente”, diz Besse. “Temos condições de, em dez anos, atender a 42 milhões de pessoas, que corresponde a 30% da população urbana”, adianta. Isso significaria, menciona ele, passar de R$ 1 bilhão por ano, previstos para 2009 e 2010, para R$ 3 bilhões até 2017. “É um ritmo muito acelerado de investimentos, estimulado pelo marco regulatório, mas que procura suprir deficiências do setor público. A opção do privado é em parceria ou em substituição ao operador público”, atesta Besse. No caso das PPPs, em setembro foram assinados os primeiros contratos de saneamento com o governo federal – em Rio das Ostras (RJ) e Rio Claro (SP), com investimentos que somam R$ 456,5 milhões, dos quais R$ 313,4 milhões financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). A vontade do setor privado e o marco regulatório são necessários, mas não são suficientes, reitera Newton Azevedo, presidente da Abdib. “É preciso ter um processo de aculturamento de todo o setor para tornar claro isso. Temos projetos de PPPs na Bahia, no Rio de Janeiro e em São Paulo, temos 65 contratos de variados tipos, com participação privada no país. Existe uma série de coisas acontecendo, mas numa dimensão muito pequena para o tamanho do problema brasileiro na área de saneamento. Existe uma demanda clara, existem grupos privados com disposição, grupos capacitados e milhões de brasileiros sem esgoto tratado. O que temos que encontrar é um equilíbrio e uma vontade de gestão que permitam enfrentar o SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 9 ValorSetorial 9 08.12.08 18:22:35 PERSPECTIVAS problema, porque dinheiro não falta”, afirma Azevedo. O PAC é um exemplo claro desse impasse, sugere o empresário. Segundo o Ministério das Cidades, o país deve fechar o ano com R$ 2 bilhões habilitados para projetos executados por empresas privadas, enquanto o PAC tem disponíveis R$ 8 bilhões, do total de R$ 40 bilhões a serem investidos até 2010. “Estamos preocupados porque o que foi previsto no PAC para o setor privado diretamente não foi totalmente objeto de procura dos empresários, tanto que estamos definindo um cronograma de remanejamento desses recursos para setores interessados na área pública”, informa o ministro das Cidades, Márcio Fortes. “Não haverá solução de continuidade”, garante. Esse é um caminho que deve ser trilhado com alguma cautela, adverte Azevedo. “O PAC é uma grande iniciativa, mas a minha preocupação é que se coloque dinheiro DIVULGAÇÃO Esgoto tratado reduz internações por diarréia, que chegam a 700 mil por ano | 10 ValorSetorial na mão de quem não sabe gerir. As empresas estaduais de saneamento, que hoje têm problemas de gestão, estão recebendo dinheiro do PAC. Ou se coloca um freio nisso ou estaremos dando corda para enforcado”, afirma. A palavra-chave é modelo de gestão, julga Azevedo. “No cenário atual, está muito clara a necessidade de definir modelos de gestão nas empresas estaduais de saneamento que permitam a sua sustentabilidade econômico-financeira, possibilitando ao mesmo tempo a melhoria da qualidade dos serviços prestados”, diz. O foco das atenções são as companhias estaduais das 27 unidades da Federação. Paulo Furtado, do Conselho Curador do FGTS, explica por quê. “Essas empresas respondem hoje por 70% da cobertura dos serviços de água e esgotos para a população brasileira. Das aplicações de recursos da ordem de R$ 23 bilhões realizadas em 2007, as Companhias Estaduais de Saneamento Básico (CESBs) responderam por uma fatia de 77%, algo como R$ 17 bilhões, enquanto o setor privado respondeu por 1% ( R$ 1 bilhão) e o segmento municipal por 18% (R$ 4 bilhões). São 27 empresas, mas apenas sete tiveram condições de tomar recursos do FGTS. “O problema dessas empresas pode ser uma questão de gestão corporativa, pode ser uma questão de gestão operacional. Nossa intenção é avaliar como é que está a rede de serviços, como está o nível de perdas dessas empresas, como ela mede essas perdas, qual a quantidade de pessoal da empresa para gerir isso. Cada empresa terá um diagnóstico”, explica Furtado. A idéia dos formuladores do plano de revitalização do setor de saneamento no Brasil é fazer uma intervenção na empresa com instrumentos experimentados pelo mercado em empresa com situação análoga a das companhias de saneamento. Com o pleno acordo do controlador, o governo do Estado, por exemplo, o programa de revitalização pretende deixar muito SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 10 08.12.08 18:22:44 | LEONARDO RODRIGUES / VALOR PERSPECTIVAS Paulo Furtado: o problema das empresas pode ser de gestão operacional 12 ValorSetorial claro que as novas diretrizes não se caracterizam por política pública. Mas usará instrumentos do mercado. Para início de conversa, será feito um trabalho profundo de auditoria para verificar a situação das empresas estaduais de saneamento, um trabalho que será realizado por consultorias do mercado, e a partir daí será traçado um diagnóstico do comportamento da empresa. Depois será feita uma avaliação da companhia, terminando com a elaboração de um plano de negócio. “O Conselho Curador do FGTS acredita que essa é uma forma eficiente de melhorar a situação das empresas públicas estaduais”, diz Furtado. Esse tipo de ação não é sem propósito. Há vários casos de empresas que receberam intervenção do mercado com real sucesso, relata o dirigente do conselho curador do FGTS. É o caso da América Latina Logística (ALL), privatizada em 1997, quando estava praticamente falida, e hoje se tornou numa das maiores empresas de logística na área de transporte ferroviário do mundo. Antes de ser privatizada, em 1997, a companhia ferroviária era uma empresa sucateada. Cerca de 70% dos seus ativos não eram operacio- nais, fazia anos que a empresa não contratava ninguém e os índices de segurança, um elemento vital numa ferrovia, eram muito baixos. “A nossa virada aconteceu através de uma gestão profissional”, resume Bernardo Hess, presidente da ALL, hoje uma empresa de capital aberto, com 4 mil colaboradores (150 dos quais são acionistas), crescimento anual de 20% e R$ 1 bilhão em caixa. “Tivemos que implementar sistemas integrados de gestão com programas de melhorias contínuas e o envolvimento de todos os nossos colaboradores em programas de metas prioritárias e eficientes”, conta o executivo. Simplificar com criatividade foi o caminho adotado pela empresa para se tornar a maior companhia de logística da América Latina”, indica Hess. Segundo ele, trata-se de um modelo de gestão que também pode ser aplicado em empresas públicas. “Temos vários exemplos de empresas públicas que já estão usando esse modelo, que se baseiam principalmente na vontade, na disciplina e no uso do bom senso”, diz Hess. “O governo de Minas Gerais, por exemplo, implantou o programa progressivo de remuneração variável baseado no conceito de valor econômico agregado”, diz o executivo. Os trabalhadores também estão preocupados se os recursos do FGTS estão sendo bem aplicados em obras de infra-estrutura, principalmente se estão gerando empregos. As experiências do passado não recomendam muito, segundo eles: boa parte dos recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) foi usada em governos anteriores ao do presidente Lula para amparar empresas, que acabaram gerando a perda de emprego de seus funcionários. “É preciso reestruturar as empresas públicas de saneamento, mas sem que isso venha a provocar desemprego”, diz Jacy Afonso de Mello, representante da Central Única dos Trabalhadores (CUT) no conselho do FGTS. Segundo ele, o trabalhador está preocupado com a utilização dos recursos do FGTS, principalmente se eles estão gerando emprego ou não. “A política do FGTS não é para aplicações em títulos públicos para ter rentabilidade e gerar desemprego no país. Ou para aplicar recursos para reestruturar empresas para, igualmente, gerar desemprego, como aconteceu no passado com recursos do FAT. Nosso objetivo é que as empresas estaduais de saneamento sejam reestruturadas, que o setor público tenha capacidade de investimento, e que todas as dificuldades, inclusive legais, sejam vencidas”, afirma Mello. A CUT, diz ele, está disposta a discutir mecanismos e instrumentos do mercado financeiro que possibilitem aumentar a capacidade de investimentos das companhias públicas de saneamento. Claro, as propostas apresentadas pelo Conselho Curador do FGTS ainda devem ser apreciadas pela direção da central de trabalhadores. Mas Mello antecipa: “Não temos preconceito ou posições definidas em relação a parcerias com o setor privado. Mas é preciso que se estabeleçam metas para atender às demandas de saneamento da população. Não queremos metas para o futuro”, diz Mello. SANEAMENTO 06-12 perspectivas.indd 12 08.12.08 18:22:56 CENÁRIO | POR LAURO VEIGA FILHO O DIFÍCIL CAMINHO DA RECUPERAÇÃO Sem capacidade de captar recursos e às voltas com a baixa geração de caixa, empresas estaduais lançam programas para reequilibrar contas S eparadas às vezes por distâncias que superam 3 mil quilômetros, empresas estaduais de saneamento atravessam dificuldades semelhantes, para as quais buscam soluções parecidas. Com poucas exceções, quase todas não têm capacidade para captar recursos no mercado, enfrentam problemas típicos gerados por um fluxo de caixa,senãonegativo,aindainsuficienteparasuportarsuas necessidadesdecrescimentoefazerfrenteàsdemandaspor água e esgoto em suas regiões, além de carregar passivos, em alguns casos, várias vezes superiores às receitas. Sãoelas:Cedae,doRiodeJaneiro;Compesa,dePernambuco;Caern,doRioGrandedoNorte;Deso,deSergipe;Caema, do Maranhão; Cosanpa, do Pará; Adespisa, do Piauí; e Casal,deAlagoas.Nasomadasoitoempresas,consideradas economicamente viáveis sob o ponto de vista do mercado, a receita líquida no ano passado atingiu R$ 4,15 bilhões, representando 22,5% do faturamento conjunto das 22 empresasestaduaisdeáguaesaneamentoparaasquaishá dadosdisponíveis.Aindaemrelaçãoaogrupoemanálise,o resultado líquido foi negativo em R$ 52,6 milhões. Sem a Cedae, que teve lucro de R$ 149 milhões, e a Compesa, com ganho de R$ 25 milhões, as demais anotaram prejuízo de R$ 226,6 milhões, o que representou uma rentabilidade patrimonial negativa de 12,7%. Na mesma comparação, os resultados antes de juros, impostos, depreciação e amortizações (Ebitda) das seis menores limitaram-se a R$ 23,8 milhões, para uma despesa financeira líquida mais de quatro vezes e meia maior, na faixa de R$ 108 milhões, conforme dados de balanço apurados pelo anuário Valor 1000. “Um terço das empresas estaduais de saneamento necessitam de apoio, principalmente nas regiões Norte e Nordeste”, afirma Walder Suriani, superintendente executivo da Associação das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe). Formada por 24 empresas estaduais de água e esgoto, a associação acredita que os problemas não estão apenas dentro das empresas. Algunspaíses,apontaSuriani,adotaramacentralização doserviço,atépordeterminismogeográfico.“Nocasobrasileiro, temos 5.564 municípios, dos quais cerca de 4 mil têmmenosde30milhabitantes,eescolhemosummodelo 14 ValorSetorial regional, por Estado, adotado desde os anos 60 sem qualquerdiscussãotécnica.Afinal,qualomodelodegestãoque melhor se aplica às nossas condições?”, questiona. O modelo brasileiro previa um sistema de subsídios cruzados, lembra ele, onde municípios superavitários asseguravam receitas para subsidiar custos nas regiões onde o serviço é deficitário. As dificuldades técnicas, econômicas e financeiras para operacionalizar o serviço criaram problemas de acesso a recursos, especialmente para as regiões menos desenvolvidas, num “ambiente de gestão não muito eficiente”. Gestão parece ser a chave para alavancar as empresas estaduais e destravar investimentos, na visão de Cassilda Teixeira de Carvalho, presidente da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes), uma organização não-governamental com sede no Rio de Janeiro, que reúne mais de 5 mil associados em todo o país, entre engenheiros, biólogos, acadêmicos, economistas e outros profissionais liberais, além de empresas municipais, estaduais e privadas da área de saneamento. Na sua avaliação, a situação econômica e financeira das empresas estaduais indica que nem tudo está perdido. Ao contrário, diz ela, há boas chances de recuperação para a maioria delas. “Vejo que há solução, mas isso não ocorrerá por meio da constituição de consórcios de municípios, porquedenadaadiantaassociarpessoasquenãodispõem da técnica nem da visão do negócio”, afirma Cassilda. Por princípio e tecnologia, diz ela, o saneamento é um “monopólio natural e atomizado, o que empurra as empresas para uma gestão pouco visionária”. E reforça: “Não há falta de recursos para o setor, mas má utilização de recursos”. A Abes, segundo Cassilda, tem procurado motivar o corpo gerencial das empresas na direção recomendada pela melhor técnica na área, que implica maior capacitação de recursos humanos e adoção de modernas práticas de gestão. “É preciso entender o abastecimento como um negócio focado em resultado, com avaliação constante de metas.” Cassilda cita o exemplo da Companhia de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), segunda maior empresa dosetor,quetreinoumaisdetrêscentenasdeprofissionais SANEAMENTO 14-17 Empresas.indd 14 08.12.08 18:23:28 Quadro complicado Situação das companhias estaduais de saneamento Margem da DEX* Tarifa média praticada Suficiência de caixa Tarifa média Produtividade praticada/DEX Perdas faturamento Hidrometração Macromedição SABESP CEDAE COPASA SANEPAR CORSAN EMBASA CAESB SANEAGO COMPESA CAGECE CASAN CESAN CAGEPA CAERN DESO COSANPA AGESPISA SANESUL CAEMA CASAL SANEATINS CAERD CAER CAESA DEAS COSAMA Bom Razoável Baixo Insuficiente *Despesas de exploração. Fonte: dados 2006/SNIS SANEAMENTO 14-17 Empresas.indd 15 Despesas operacionais ValorSetorial 15 08.12.08 18:23:40 | DIVULGAÇÃO CENÁRIO Cassilda Carvalho: gestão eficiente é a chave para as companhias estaduais 16 ValorSetorial nas novas ferramentas de gestão disponíveis no mercado. Segundo Fernando Avelino Boeschenstein Vieira, diretor financeiro e de relações com investidores da Cedae, a companhiavemsendopreparadaparasetornarumasociedade anônima, regida pelos critérios da boa governança. “Estamos trabalhando como se fôssemos fazer IPO (oferta pública inicial de ações) amanhã”, afirma Avelino. Numa parceria com a Fundação Getulio Vargas (FGV), a Cedae espera estar pronta “financeira e administrativamente” para abrir seu capital e oferecer ações ao mercado entre o primeiro e o segundo trimestres de 2009. Mas a meta é preservar o controle do Estado sobre 51% das ações. “Podemos realizar três ou quatro tranches, no Brasil e no exterior, para atingir essa composição final (do capital). Quandoacolocaçãodeveráacontecer?Issoéomercadoque vaidizer.Oquepossoadiantaréquejáestamosrespirando com pulmão de atleta”, diz Avelino. O caminho para reerguer a companhia não foi nada simples. “Num caso raro, a BDO Trevisan Auditores Independentes recusou-se a expressar sua opinião acerca das demonstraçõesfinanceirasde2006,dadoograndevolume de ressalvas às contas do balanço.” Foram 15 ressalvas. Ao publicar o balanço de 2007, a nova gestão alterou os critériosdeavaliaçãodarubricacontasareceberdeclientes, reparouacontabilizaçãodepassivoscontingenteseapagar, constantes da demonstração do ano anterior, num ajuste totaldeR$2,28bilhões.Comoresultado,opatrimôniolíquido desabou de R$ 6,71 bilhões para quase R$ 4,42 bilhões, enquantoacontadeprejuízosacumuladossaltoudeR$2,38 bilhõesparaR$4,66bilhões.Oresultadode2006,quehavia sidoindicadocomonegativoemR$378,3milhões,disparou para um prejuízo de R$ 2,66 bilhões, representando 60,3% dos recursos à disposição dos acionistas. A reestruturação e a busca por melhorias na área de governançaforaminiciadasnoprimeiromêsde2007.“Nos primeiros três meses, só fizemos pagamento de despesas obrigatórias, fundamentais para a operação, e renegociamos todos os contratos”, diz Avelino. Os primeiros resultados surgem na conta de resultados do balanço de 2007, com lucro de R$ 149 milhões e retorno ao azul após quase uma década de prejuízos. Mais importante, lembra Avelino, a Cedae qualificou-se para contratar diretamente um empréstimo de R$ 527 milhões para implantar dez projetos na área de água e esgoto, incluindo a melhoriaeampliaçãodosistemaGuandu,entreoutros.“Há muitotempoissonãoerapossívelporfaltadecapacidadede pagamento”,dizodiretor.OcontratocomaCaixaEconômica Federal deverá ser firmado em janeiro de 2009. ACompanhiaPernambucanadeAbastecimento(Compesa), nas palavras de seu presidente, João Bosco de Almei- SANEAMENTO 14-17 Empresas.indd 16 08.12.08 18:23:51 da,atravessoudoismomentosdistintos,antesdeconseguir recompor seu caixa e retomar, ainda marginalmente, os investimentos em manutenção e melhoria da rede. Com receita líquida de R$ 578,4 milhões no ano passado, 11,2% maior do que em 2006, a empresa preparou-se para ser privatizada entre 1999 e 2003, mas o processo não deu certo. “Isso trouxe desgaste para a companhia, que passou a enfrentar prejuízos, exigindo aporte de recursos do Estado, que assumiu a dívida em atraso com a concessionária de energia elétrica, privatizada em 2001”, diz Almeida. À época, esse passivo somava perto de R$ 200 milhões. Numadecisãoradical,entre2004e2007,foramsuspensasasinversõesnosistemacomrecursospróprios.Oobjetivo erarecuperarofluxodecaixa,oqueocorreuem2007,quando a empresa passou a investir 8% de sua arrecadação mensal,depoisdedescontadasdespesasdeexploração,impostos e amortizações, em recuperação e manutenção do sistema. “Essa política”, diz Almeida, “deixou um grande passivo de investimentos não realizados em melhorias.” Atualmente, 75% dos sistemas de captação operam em regime de rodízio, afetando mais de 4 milhões de usuários. Comoníveldegeraçãodecaixaconsideradoapenasrazoável pelo Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS), a Compesa não tem tido fôlego para bancar a ampliação da rede. Todo o investimento em expansão, afirma Almeida, vem sendo realizado pelo governo do Estado, com recursos do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e de repasses da União. Almeida afirma que o Estado contratou, no âmbito do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), investimentos de R$ 1,4 bilhão até 2010, dos quais R$ 850 milhõesseencontramemobras.Aaplicaçãodessesrecursos vai permitir a normalização do abastecimento da região metropolitana do Recife, com o fim do rodízio. “Estamos organizando a empresa para receber esse volume todo de investimentos”, relata. No ano passado, a Compesa teve lucro de R$ 25 milhões para um patrimônio líquido de R$ 1,24 bilhão, o que representou rentabilidade de 2%. Comindicadoresconsideradosbaixosparaamargemda despesadeexploração,suficiênciadecaixaeprodutividade, segundo classificação do SNIS, a Companhia de Saneamento do Pará (Cosanpa) busca superar seus problemas internosepretendeatingiroequilíbrioeconômicoefinanceiro, recuperando sua capacidade de geração interna de caixa,até2013,segundoEduardodeCastroRibeiroJúnior, presidente da empresa. “Como a maioria das empresas do setor,hojenãotemosapossibilidadedecaptarrecursosno mercado,etodooinvestimentotemsidofeitopormeiodo Estado”, acrescenta. Ribeiro Júnior prevê um aumento na receita líquida de R$ 158,7 milhões para R$ 177 milhões neste ano. Espera-se uma redução da inadimplência de 32% em 2007 para 28% neste ano, com elevação da arrecadação efetiva de R$ 108 milhões para R$ 120 milhões. Mas a elevada despesa de exploração e os passivos acumulados deixaram, em 2007, um prejuízo líquido de R$ 70,2 milhões. A política de recuperação e saneamento da empresa adota três eixos estratégicos, detalha Ribeiro Júnior: a ampliaçãodacobertura,hojelimitadaa59dos143municípios do Estado; investimentos em desenvolvimento institucional; e modernização da gestão. Nos dois primeiros casos, a empresaesperaserfavorecidaporinvestimentosdeR$450 milhões, contratados via recursos do PAC e do programa Saneamento para Todos. Perto de R$ 70 milhões daqueles recursos deverão ser destinados a projetos de desenvolvimento institucional, o que inclui ampliação da macro e da micromedição, reabilitação de unidades operacionais, constituição de cadastros nas áreas gerencial e comercial. Já a Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso) enfrentaumasituaçãoparadoxal.Seusindicadoresdeliquidez (3,66)eendividamento(3,9%)são,pelaordem,osmaisaltos e mais baixos entre todas as empresas estaduais com dados disponíveis para comparação. Mas ela se encontra entre aquelas com baixa suficiência de caixa e de produtividade, commargemdedespesasdeexploraçãoapenasrazoávelna classificaçãodoSNIS.Alémdeapresentarumarelaçãoentre despesas operacionais e receitas líquidas na faixa dos 98%. Emresumo,aempresaparecedeverpouco,temrecursos parafazerfrenteaopassivocirculanteeaoexigíveldelongo prazo, mas não dispõe de caixa para investir. Segundo dados de seu balanço, fornecidos pelo presidente da companhia,MaxMaiaMontalvão,somados,osexigíveisdecurtoe longoprazos,emdezembrode2007,representavam10,9% do ativo total e 12,3% do patrimônio líquido. Em 2007, a receita líquida cresceu menos de 2%, saindo de R$ 180,51 milhões para R$ 184,07 milhões, enquanto as despesas operacionais permaneceram estabilizadas em R$ 180,8 milhões. O prejuízo subiu 20,2% ao passar de R$ 2,75 milhões para R$ 3,31 milhões. “Estamos há dois anosnaempresaetodonossotrabalhotemsevoltadopara suarecuperação,comalongamentodosprazosdasdívidas tributárias e com a Previdência”, diz Montalvão. Quando a União renegociou o passivo do governo piauiense,em1994,aÁguaseEsgotosdoPiauíS/A(Agespisa) devia em torno de R$ 400 milhões, incluídos no pacote darenegociaçãoetransferidosparaacontadoEstado.Mas aempresanãofoisaneadae,desdeentão,voltouaacumular dívidas, passando a dever R$ 675 milhões. “Não há como pagar essa dívida com receita de tarifas”, constata Merlong Solano, na presidência da Agespisa desde maio de 2007. Defato,adívidarepresentamaisdequatrovezesareceita líquidarealizadaem2007,emtornodeR$158,7milhões,e é 12,2 vezes maior do que o patrimônio líquido da companhia, estacionado em apenas R$ 55,2 milhões. O prejuízo da empresa em 2007 subiu 32%, para R$ 73,4 milhões, enquanto a geração de caixa medida pelo Ebitda ficou no negativo(perdadeR$20,7milhões).Oresultadooperacional, conforme Solano, saiu de R$ 109,3 milhões em 2006 paraR$73,9milhõesnoanopassado,semprenovermelho. Para este ano, a companhia prevêum prejuízo operacional nafaixadeR$40milhões,cercade46%menorqueem2007 e 63% abaixo das perdas registradas em 2006. SANEAMENTO 14-17 Empresas.indd 17 ValorSetorial 17 08.12.08 18:24:02 REESTRUTURAÇÃO | POR GENILSON CEZAR À PROCURA DE SAÍDAS PARA AS EMPRESAS Além de financiar o setor, o FGTS poderá ter participação acionária ou usar instrumentos de mercado para capitalizar as companhias Newton Azevedo: as estatais precisam ter uma visão empresarial 18 ValorSetorial inicial de R$ 10 bilhões, através da compra de participação acionária minoritária nas empresas estaduais, pelo menos nas mais deficitárias, e da aquisição de debêntures e de outros instrumentos do mercado financeiro. A proposta, apresentada durante o seminário Reestruturação do Setor de Saneamento, organizado pelo Valor, em São Paulo, no dia 26 de novembro, obteve repercussão positiva imediata em várias companhias estaduais de saneamento. “Mais do que uma disposição de aderir, eu diria que a nossa companhia é hoje uma das mais preparadas para sentar imediatamente com o Conselho Curador do FGTS para discutir esse novo PAULO PAMPOLIN / VALOR M ergulhadas num poço profundo de dívidas bancárias e fiscais, algumas sem dinheiro sequer para pagar a conta de luz, desorganizadas administrativamenteecomexigênciasbrutaisdeinvestimentos paradarcontadasmetasdeatenderplenamenteapopulaçãoemsuasnecessidadesdeserviçosdeáguaetratamento de esgotos, as companhias estaduais de saneamento, senão todas, mas um grupo significativo delas, podem ter encontrado sua tábua de salvação. O Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) apresentou um programa, cujo texto final deverá ser aprovado no primeiro trimestre de 2009, que prevê o desembolso SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 18 08.12.08 18:30:00 ANA PAULA PAIVA / VALOR programa, que cai como uma luva em nossos planos de reestruturação, já em andamento”, resume João Bosco de Almeida, diretor-presidente da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa) e secretário estadual de Recursos Hídricos de Pernambuco. De acordo com André de Souza, membro do Grupo de Apoio do Conselho Curador, o objetivo do programa é ampliar o número de companhias de saneamento com capacidade de receber os recursos do FGTS, mediante processo de adesão e em condições sustentáveis de retorno. Segundoele,das27companhiasestaduaisdesaneamento que operam no país, apenas sete, entre as quais estão a Sanepar (PR), Sabesp (SP), Copasa (MG) e Corsan (RS), possuem hoje condições de tomar empréstimos, distorção que tem impedido o FGTS, na condição de uma das principais fontes de recursos para o setor, de cumprir satisfatoriamente sua missão. Desde 2003, o FGTS colocou à disposição do setor cerca de R$ 18 bilhões, no entanto, só conseguiu emprestar R$ 8,2 bilhões, dos quais foram efetivamente desembolsados R$ 3 bilhões. Paradoxalmente, o FGTS recebeu o pagamento de R$ 16 bilhões como retorno de empréstimos passados. “Nós queremos ter empresas saudáveis como parceiras do FGTS e deixar de ser meramente um financiador do setor. Para isso, precisamos resgatar a capacidade das companhias de contrair empréstimos sem depender dos tesouros estaduais e municipais”, afirma Souza. Para Joaquim Lima, superintendente do FGTS da Caixa Econômica Federal (CEF), a preocupação não está apenas em conseguir liberar recursos para essas empresas com grande grau de endividamento, mas em garantir a boa gestão dos recursos. “Essas empresas têm dificuldades de gestão, e o FGTS seria um parceiro para solucionar esse problema”, diz ele. O plano elaborado pelos gestores do FGTS tem duas linhasdeação:umacarteiraadministradaparaaaquisição de debêntures, Fundos de Iinvestimentos em Direitos Creditórios (FIDCs), Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRIs) e outros instrumentos de dívida, destinada preferencialmente para as companhias que reúnam condições adequadas de estrutura de capital, níveis satisfatórios de governança e gestão operacional. Empresas que já têm acesso ao mercado de capitais, como Sanepar (PR), Sabesp (SP), Copasa (MG) e Corsan (RS), por exemplo; e um Fundo de Investimento em Participações (FIP) para aquisição de participações acionárias, voltado para as companhias que não atingiram patamares satisfatórios em receitas, gestão operacional, governança corporativa e outras dimensões de negócios. Mas são empresas com potencial de valorização. A carteira administrada para a aquisição de debêntures, fundos de direitos creditórios e outros, explica Souza, visa desobstruir um pouco o endividamento público, cuja expectativa é atingir R$ 6 bilhões no próximo ano. A idéia é trazer esses instrumentos de capitalização para o FGTS e fazer operações que as empresas já estão acostumadas a fazer no mercado financeiro. “Não tem sentido continuar gerando endividamento, tendo instrumentos mais ágeis, instrumentos mais de acordo com as estruturas dessas empresas, mais aderentes, que possam estar vinculados a um plano de obras, a um plano de serviços. O FGTS tem condiçõesdefazerissoaumcustomaisadequadoebarato que o mercado pratica hoje”, afirma. A outra ponta do processo, indica o executivo, é trazer Moreira Franco: trata-se de um programa de adesão voluntária SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 19 ValorSetorial 19 08.12.08 18:30:13 REESTRUTURAÇÃO | o FIP do FGTS para aquisição de participações acionárias. “Esse fundo foi muito polêmico na sua criação. Muitos achavam que ia tirar dinheiro da habitação e do saneamento, mas não tirou dinheiro de ninguém. Tiramos foi dinheiro das letras do Tesouro Nacional “LFT, FTN, dinheiro estéril que corrói a riqueza nacional através de juros”, diz Souza. Hoje, observa ele, o FI-FGTS tem uma carteira de R$ 6 bilhões no setor elétrico e R$ 12 bilhões aplicados no setor de infra-estrutura. “Mas não temos conseguido investir na área de saneamento, por isso decidimos montar dentro do Fundo de Infra-estrutura um FIP-Saneamento com objetivo claro de fazer aquisições e participações acionárias em empresas estaduais de saneamento”, conta. Essa participação acionária do FGTS observará alguns critérios de segurança, de acordo com os membros do Conselho Curador. O primeiro critério é que o FIP-Saneamento deve entrar com 90% e o FGTS atrai um investidor, público ou privado, que possa entrar com pelo menos 10%. Fundos de pensão dos Estados e grandes consumidores estaduais (a Companhia Vale do Rio Doce foi um exemplo citado por ser uma empresa interessada nos serviços de fornecimento de água para realizar sua atividade de exploração e exportação de minério) poderão ser atraídos para operar como co-investidores. As aquisições acionárias serão realizadas no âmbito de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) formada pelo FIP-Saneamento e pelo co-investidor. “Na nossa visão, a SPE deve ter no máximo 49% do negócio, enquanto o governo do Estado, a companhia estadual ou outro controlador, na forma que o Estado definir, terá pelo menos 51%. Nós não queremos – até porque não é nosso papel – entrar com participação maior. Governador e prefeito são as instancias que devem decidir como vão regular suas concessões e eleger os operadores. Por isso queremos limitar nossa participação em 49%”, explicita Souza. Onde o FGTS entrar com participação acionária, a idéia é ter um plano de negócio e de investimento que admita a composição das duas modalidades. Ao mesmo tempo em que entra na participação acionária, também entra como financiador com instrumentos como debêntures, fundos de direitos creditórios etc. Essa entrada do FGTS, quando se fala de participação acionária, pode se dar de várias formas, de acordo com o que for definido nas negociações com as companhias estaduais. É possível que o FGTS não entre na empresa como um todo, mas segregue alguma atividade, algum ativo, por exemplo, uma determinada Companhias como a Compesa (PE), Casal (AL) e Cesan (ES) consideram a proposta do FGTS de revitalização do setor como muito positiva 20 ValorSetorial bacia ou manancial de água e montar uma SPE para administrar o serviço naquela área. “O FGTS pode entrar com participação acionária somente naquela SPE”, diz Souza. “Ou então, vamos separar a empresa que será responsável pela distribuição e criar uma nova empresa para cuidar da captação e tratamento da água, o FGTS entrando com participação nessa SPE. A intenção é ter muita flexibilidade, entender a situação do Estado, a partir de um diagnóstico, e elaborar um plano de negócio. A participação do FI-FGTS vai se dar de acordo com o que ficar determinado nesse diagnóstico e pactuado com o Estado. Queremos tirar o melhor proveito desses instrumentos financeiros para fazer a reestruturação do setor”, afirma. A iniciativa do FGTS abre a possibilidade das empresas públicas ampliarem seus investimentos em outros Estados, como também representa uma chance para as empresas privadas aumentarem sua participação no setor de saneamento. “O papel das Parcerias Público-Privadas (PPPs) é muito importante, por que trouxe uma nova modalidade de contratação do setor privado, para além da modalidade de concessão. Mas tem acontecido em ritmo lento. A possibilidade de ter 10% em participação de uma SPE para investir em empresas estaduais amplia a forma de o setor privado contribuir levando experiência de eficiência de gestão”, diz Yves Besse, presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon). Os gestores do FGTS deixam claro que a intenção é fazer uma intervenção nas companhias estaduais de saneamento com instrumentos experimentados pelo mercado financeiro, da mesma forma como agem as empresas privadas. “É preciso deixar muito claro que esse é um programa por adesão voluntária”, confia Paulo EduardoCabralFurtado,secretárioexecutivodoConselho Curador do FGTS. “Não se trata de uma política pública, mas sim de uma proposta feita por um fundo privado do trabalhador em parceria com o setor de saneamento”, completa Wellington Moreira Franco, ex-governador do Rio de Janeiro e atual vice-presidente de fundos do governo e loterias da Caixa Econômica Federal. Ele assinala que 2008 foi eleito pela Organização das Nações Unidas (ONU) como o Ano Internacional do Saneamento, e há um compromisso de todos do governo com as metas de universalização, cujo cumprimento não está assegurado diante do cenário econômico-financeiro que se avizinha no país e que depende de uma quantidade muito grande de investimentos. No passado, conta Moreira Franco, esse tipo de mobilização assegurou o sucesso, por exemplo, do Plano Nacional de Saneamento (Planasa), nos anos 1970, quando foram aplicados R$ 15 bilhões em abastecimento de água e R$ 8 bilhões em esgoto, através de recursos do FGTS. “O colapso desse programa nos anos 1980, por conta da recessão econômica e do alto grau de endividamento dos mutuários habitacionais, criou as dificuldades por que atravessamhojeascompanhiasestaduaisdesaneamento”, SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 20 08.12.08 18:30:30 ANA PAULA PAIVA / VALOR dizele.Omomentoatualépropícioàsmudançaspropostas pelos gestores do FGTS, de acordo com Moreira Franco. “Temos um novo modelo institucional capaz de financiar o saneamento, uma nova disposição de buscar modelos inovadores. E o FGTS está numa situação confortável com R$ 210 bilhões em caixa e e 543 milhões de contas dos trabalhadores”, informa. “As necessidades de investimentos dosEstadosparaatingirasmetasdeuniversalizaçãosomam R$ 183 bilhões até 2020 e precisamos de instrumentos eficazes de financiamento, além de propostas inovadoras de modelagem para recuperação administrativa, financeira e econômica das empresas de saneamento”, afirma. Oplanopropostotambémemnadaalteraasaplicações tradicionais do dinheiro do FGTS, de acordo com os agentes governamentais. “Estamos falando de um programa de reestruturação que não vai subtrair R$ 1 das linhas de financiamento tradicionais do FGTS, vai ser uma nova alocação de recursos”, justifica Souza. Não há qualquer inversão dos objetivos do FGTS, garante ele. “O nosso compromisso com a política nacional de saneamento, o nosso compromisso com o importante Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na área de saneamento continua imaculado”, afirma. Segundo ele, o orçamento do FGTS em 2008 para o financiamento da área de saneamento dentro do PAC foi de R$ 5,4 bilhões e, no próximo ano, deveremos se repetir no mesmo patamar. “Temos toda disposição de ampliar esse orçamento para financiar a política pública de saneamento até onde for a capacidade de Estados, municípios e companhias de tomarem esses recursos”, diz. Para Souza, o PAC tem papel estratégico e fundamental não só em outros setores da economia, mas especialmente na área de saneamento. “O PAC conseguiu reequilibrar uma relação que nós não víamos em governos anteriores. De 1994 até 1998, quando saíram as primeiras medidas de contingenciamentoparaosetorpúblico,oFGTSconseguia emprestar apenas para meia dúzia de companhias. Com o PAC, a distribuição inteligente de recursos onerosos para Estados e municípios, que podem tomar recursos a fundo perdido, conseguiu viabilizar os investimentos na área de financiamento para corrigir os desequilíbrios regionaisqueopaístinhanosetor.Portanto,nossapolítica públicadeinvestimentospermanece,ocompromissocom o PAC deve ser inclusive ampliado, só que nós temos uma vontade muito grande de fazer mais. Não queremos continuar simplesmente emprestando os recursos do FGTS para aquelas companhias que têm condições de tomar ou continuar emprestando para Estados e municípios onde o tesouro estadual está se endividando. É preciso haver uma relação de cumplicidade entre os FGTS e seus clientes, “as empresas estaduais de saneamento. É desta cumplicidade que estamos tratando, de forma aberta, de forma franca, pensando num horizonte de longo prazo onde possam trabalhar a reestruturação do setor de saneamento e ter empresas em condições de contrair empréstimos e retornar esses empréstimos de forma sustentável”, destaca Souza. Para várias companhias estaduais de saneamento, esse ambiente de cumplicidade já existe e pode representar uma boa oportunidade para as empresas vencerem suas dificuldades. “Os pressupostos que o FGTS coloca como condições necessárias para que as companhias estaduais possam aderir ao plano, nós temos praticamente todos: conselho de administração, conselho fiscal e auditoria externa. Temos inclusive um plano de recuperação da companhia em execução, que prevê reestruturação da Joaquim Lima: preocupação em garantir boa gestão de recursos SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 21 ValorSetorial 21 08.12.08 18:30:44 | ANA PAULA PAIVA / VALOR REESTRUTURAÇÃO André de Souza: as aquisições acionárias serão por meio de SPEs 22 ValorSetorial companhia, informatização de processos, redução de perdas, revisão cadastral, revisão do plano de gestão pessoal e a criação de uma nova central de logística”, conta João Bosco de Almeida, diretor-presidente da Compesa. “A entrada dos recursos previstos pelo FGTS vai basicamente acelerar ao nosso plano em execução, que é o plano que o FGTS gostaria de ver aplicado na empresa. Inclusive não fazemos qualquer objeção à venda de ações da companhia”, assinala ele. De acordo com Almeida, as mudanças previstas no programa do FGTS não precisam sequer ser aprovadas pela Assembléia Legislativa, porque oestatutodacompanhiaprevêaparticipaçãoacionáriaea constituição de subsidiárias. “Na realidade, nós temos um empréstimo do BNDES de R$ 70 milhões, com debêntures, na mesma linha do FGTS. Isso foi acertado em junho do ano passado, e já desembolsamos 20% do total”, indica. O Estado de Alagoas também pretende aderir às propostas do FGTS, conforme Álvaro José Menezes da Costa, diretor-comercial da Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal). “Trata-se de uma proposta é viável. O Estado de Alagoas e a Casal têm plena consciência de que essa proposta do FGTS viabilizará a prestação de serviços e a melhoria da qualidade do atendimento à população”, diz ele. A Casal tem um índice de atendimento de água em torno de 70%, e o esgotamento sanitário está na casa dos 30%. “Para superar essas deficiências, nós precisamos não só dos recursos financeiros, mas aumentar essa capacidade de gerenciar os recursos com os resultados que a população exige”, diz. O Estado de Alagoas está aplicando recursos da ordem de R$ 1,2 bilhão, oriundos do PAC, para implantação de sistemas de água e esgotamento sanitário na capital. “Não temos outros recursos que não sejam do PAC, e para vencer esse déficit apenas na Região Metropolitana de Maceió seriam necessários investimentos da ordem de R$ 2 bilhões ”, aponta Costa. A questão da gestão administrativa da companhia, uma das exigências para se adequar ao plano de investimento do FGTS, segundo o diretor da Casal, tem sido uma preocupação do governo estadual. “O governador Teotônio Vilela mudou um pouco o perfil da gestão da Casal. Estabeleceu que a gestão da Casal e da Secretaria de Infra-estrutura teriam gestões puramente técnicas. A intenção foi criar logo um diferencial de gestão, que não estivesse atrelado ao regime normal de órgãos pú- SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 22 08.12.08 18:31:06 blicos. O grande problema da Casal nos últimos tempos é a ausência de um planejamento de longo prazo que pudesse ser seguido gestão a gestão. A cada mudança de humor de um governador, mudava-se a diretoria. Houve períodos em que a Casal teve cinco diretorias num período de quatro anos”, lembra Costa. “Isso quebra qualquer ritmo de planejamento, inviabiliza qualquer gestão de longo prazo”, afirma. No caso do Espírito Santo, relata Ricardo Maximiliano Goldschmidt, diretor-presidente da Companhia Espírito Santense de Saneamento (Cesan), as idéias apresentadas pelos gestores do FGTS estão de acordo com a expectativa que a empresa tem de atrair capital, em condições diferentes das existentes hoje. “No momento, temos um programa de investimentos muito arrojado e há um comprometimento grande com ele. Mas ainda precisamos de maioresinvestimentosparaatingironíveldeuniversalizaçãodesejada”,observa.Asmetasdeuniversalizaçãonoque diz respeito ao atendimento de água para a população no Espírito Santo, segundo Goldschmidt, estão próximas dos 100% e no setor de tratamento de esgoto está atualmente em torno de 36%. “Temos um programa para chegar a 60% dentro de três anos, no entanto, para atingir todas as nossas metas o prazo é até 2025”, diz. A Cesan opera com investimentos de quase R$ 700 milhões, nos próximos três anos, uma parte de recursos do Banco Mundial, outra parte do PAC, além de dinheiro proveniente do governo do Estado e geração própria da empresa. Trata-se de um programa que envolve recursos da ordem de R$1 bilhão desde o início do governo, dos quais foram efetivamente realizados cerca de R$ 400 milhões. “A companhia passou por uma boa reestruturação e está bem situada na questão da gestão, no entanto, ainda temos uma grande demanda de investimentos pela frente, portanto, precisamos de mais recursos”, afirma Goldschmidt. Em determinados casos, como o da Águas e Esgotos do Piauí S.A (Agespisa), a possibilidade de novas formas de acessoainvestimentoserecursosdoFGTSpodesignificara saída de um quadro de extrema precariedade, avalia Merlong Solano, presidente da empresa. “Pretendemos aderir ao programa do FGTS, estamos em vias de elaboração de um plano de metas, para discutir com a Caixa e definir sistemas de concessão de empréstimos. A minha dúvida é se a Agespisa terá condições de dar o passo seguinte, que é o de receber os investimentos de participação, de ser beneficiada integralmente pela proposta”, admite ele. “A Agespisa vem adotando processos de saneamento de sua situação econômico-financeira, mas ainda está distante SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 23 ValorSetorial 23 08.12.08 18:31:17 REESTRUTURAÇÃO | de ser uma empresa equilibrada. Conseguimos baixar nosso prejuízo operacional para R$ 73 milhões em 2007, e estimamos terminar o ano de 2008 com prejuízo na casa de R$ 40 milhões. Mas para se ter uma idéia das nossas dificuldades, nem a conta de energia nós pagávamos há vários anos. Agora já estamos pagando”, relata ele. Para executivos de algumas companhias estaduais de saneamento, a proposta, porém, deve ser mais bem analisada. “Acho importante a discussão das idéias apresentadas pelo FGTS para ampliar bastante os investimentos na área de saneamento, mas tenho que levar o plano para discussão junto ao governo do Estado”, diz Max Maia Montalvão, presidente da Companhia de Saneamento de Sergipe (Deso). “É um plano factível, sem dúvida, mas as impressões que tenho no momento são pessoais e me reserva de manifestar posições em nível de governo”, afirma. Para Wagner Granja Victer, presidente da Companhia Estadual de Água e Esgotos, do Rio de Janeiro (Cedae), a iniciativa do FGTS é um projeto novo, em processo de elaboração, interessante para conhecer e para discutir. “Mas estamos hoje com algumas outras ações bastante mais evoluídas que estão dando o mesmo resultado. Um deles é o empréstimo com a Caixa Econômica Federal, no valor de R$ 600 milhões, que está em fase final de negociação. Possivelmente deve ser concluído no primeiro semestre do ano que vem”, diz ele. Há dois anos, informa Victer, a Cedae vem executando um plano de reestruturação visando superar suas dificuldades, principalmente um pesado passivo. “Já pagamos mais de 80% das dívidas de curto prazo. Fizemos uma ampla modernização gerencial na empresa, reduzimos em 30% os cargos gerenciais, a empresa diminuiu bastante seu custeio”, diz. Além disso, a o Cedae assinou a contratação de seu novo auditor independente, a PricewaterhouseCoopers, e prepara junto com a Fundação Getulio Vargas a abertura de capital da empresa. “A FGV fez um plano estratégico que previa a abertura de capital para 2009. Ainda é muito cedo para dizer se vai haver ou não condições de mercado, mas a situação hoje é pouco favorável”, assinala. As alternativas apresentadas pelo FGTS, segundo Victer, devem ser analisadas com cautela. “Queremos que a entrada de novos sócios e de novos recursos sejam acompanhados de princípios modernos de administração. A Cedae é hoje uma empresa pública, que Passivos pesados Dados das empresas no ano de 2007 Empresa Sede Receita líquida (em R$ milhões) Var. (em %) Resultado líquido (em R$ milhões) Resultado da atividade (em R$ milhões) Resultado financeiro (em R$ milhões) Ebitda (em R$ milhões) Patrimônio líquido (em R$ milhões) Endividamento financeiro (em R$ milhões) Nível de endividamento financeiro (em % do PL) Sabesp SP 5.970,8 8,0 1.048,7 2.076,4 -561,0 2.699,0 9.784,0 5.685,2 58,1 Cedae RJ 2.542,1 10,4 149,0 432,2 -330,9 674,5 4.749,6 1.405,1 29,6 Copasa MG 1.863,5 10,8 329,3 389,3 48,4 645,3 3.511,4 1.459,1 41,6 Sanepar PR 1.218,1 5,6 157,0 342,8 -118,8 472,3 2.538,2 983,9 38,8 Corsan RS 980,6 6,7 53,4 149,3 -45,6 245,9 562,2 429,6 76,4 Embasa BA 861,1 13,2 47,9 -67,7 101,2 180,2 3.794,4 336,6 8,9 Caesb DF 684,9 8,6 55,2 159,6 -57,4 199,8 750,5 470,3 62,7 Saneago GO 662,9 14,8 -20,6 69,4 -93,2 185,8 1.792,5 488,6 27,3 Compesa PE 578,4 11,2 25,0 53,9 -14,1 74,5 1.242,3 57,3 4,6 Cagece CE 428,9 9,8 43,8 91,9 -15,5 127,7 995,6 246,4 24,7 15,6 Casan SC 379,3 6,8 54,4 48,0 -62,5 144,9 788,0 123,1 Cesan ES 322,2 7,0 32,1 46,7 -17,1 85,7 746,5 55,0 7,4 Sanasa SP 321,4 10,8 38,2 68,1 -24,2 93,6 281,0 207,8 73,9 Cagepa PB 266,4 11,8 2,7 3,7 -18,2 48,3 533,2 163,3 30,6 Caern RN 229,7 -1,1 2,8 22,6 -17,6 42,3 241,0 13,6 5,7 Deso SE 184,1 2,0 -3,3 3,2 0,3 22,7 804,2 31,7 3,9 Caema MA 173,5 -0,3 -44,2 -22,9 -21,7 12,5 764,8 24,2 3,2 Águas do Amazonas AM 167,3 24,5 6,5 11,5 -1,7 41,6 445,3 34,0 7,6 Cosanpa PA 158,7 1,3 -70,2 -63,2 -16,1 -43,1 408,3 59,2 14,5 Agespisa PI 158,7 14,4 -73,4 -36,9 -37,1 -20,7 55,2 59,3 107,4 Sanesul MS 155,2 9,3 27,9 37,5 -12,4 45,3 124,0 35,6 28,7 Casal AL 126,3 0,2 -38,3 -21,4 -15,8 10,2 -484,5 22,5 - Fonte: anuário Valor 1000 (edição 2008, com dados de 2007) e balanços das empresas. Elaboração: Valor Data 24 ValorSetorial SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 24 08.12.08 18:41:52 atua com projetos de interesse social, mas que tem que ter rentabilidade e gestão como se fosse uma empresa privada”, afirma. É claro que para efetivar a participação do FGTS como investidor muitas empresas estaduais de saneamento precisam ter autorização da Assembléia Legislativa. A partir daí, devem passar por uma auditoria que avaliará a empresa. Segundo Roberto Madoglio, gestor do Fundo de Investimento do FGTS, o plano abrangerá reestruturação administrativa, reorganização dos negócios, governança e estratégias para futura abertura de capital. “Os recursos não são livres, serão direcionados ao plano de negócios e o FGTS deverá ter participação no controle igual ao do acionista principal”, diz ele. O primeiro diagnóstico elaborado pelo FGTS, que dividiu as companhias estaduais em quatro grupos, mostra que a situação mais grave é a das empresas que menos faturam (até R$ 200 milhões) e que precisaminvestirR$30bilhõesaté2020parauniversalizar os serviços. “É um quadro assustador”, sentencia Souza. “Mas é nesse quadro que é possível ter um programa de reestruturação, de recapitalização, de implantação de regras de gestão”. Os passivos são de várias ordens, inclusive com os fornecedores de energia, e alguns de grande proporção. Mas nenhuma empresa deverá ser deixada de lado, dizem os gestores do FGTS. “Do ponto de vista econômico, pode-se chegar a uma decisão de não investimento. Porém, não vamos e nem queremos fechar as portas para qualquer Estado. Se houver um caso de uma empresa cujo volume seja de tal ordem que não possibilite a entrada de recursos diretos, vamos sentar com o governador, com a Assembléia Legislativa e essa dívida será paga. O importante é que essa dívida, que um dia será paga, não continue sendo um impeditivo do investimento, do desenvolvimento de uma empresa capacitada, de uma empresa que possa responderpelosinvestimentosesaneamentoqueoEstado precisa”, diz Souza. NaavaliaçãodaAssociaçãoBrasileiradaInfra-Estrutura e Indústria de Base (Abdib), entidade que representa as empresas de infra-estrutura, o setor de saneamento deve estar atento para discutir profundamente as propostas apresentadas. Segundo Newton Lima de Azevedo, presidente da Abdib, as empresas devem se concentrar em cinco questões fundamentais: abandonar a discussão ideológica e atentar para a importância da participação do setor privado; resgatar a eficiência da gestão na grande maioriadasconcessionáriaspúblicas,poissomentesobreviverãoasempresascomvisãoempresarial,aberturadecapital e acesso aos mercados; preocupar-se com as agências reguladoras,umavezqueoinvestidorprecisaestabilidade e clareza para ser atraído; desenvolver novos modelos de estruturação financeira, segurança do capital investido; e lugar pela igualdade de oportunidade, via instrumentos jurídicos institucionais existentes. “Isso trará alto grau de eficiência para o atendimento da população e preços justos para os operadores de serviços”, conclui. O guardião de R$ 210 bilhões Membros do Conselho Curador respondem pelo FGTS O Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é regido por normas e diretrizes estabelecidas pelo seu Conselho Curador, que é composto por representantes dos trabalhadores, empregadores e governo. Cabe a este grupo assegurar que os recursos serão utilizados de acordo com as leis estabelecidas para o FGTS. Ao todo são 16 conselheiros, oito ligados a órgãos governamentais, quatro indicados pelas centrais sindicais e quatro ligados às entidades patronais. Eles se reúnem seis vezes ao ano e definem como os recursos do fundo serão utilizados. Se for necessário, o conselho realiza sessões extraordinárias. Para avaliar as pautas das reuniões, o conselho conta com um grupo de apoio que analisa todos os pedidos e projetos e os alinha com os interesses do governo, dos representantes das empresas e dos empregados. A função do grupo de apoio é a de preparar o conselho para as decisões, evitando situações em que o governo imponha a sua vontade por ser maioria, com oito representantes. Criado em 1989, o conselho é a entidade máxima de gestão e administração do FGTS. Cuida dos R$ 210 bilhões do fundo, que tem um patrimônio líquido da ordem de R$ 23 bilhões. Sua atuação é limitada aos parâmetros estabelecidos pelas leis do FGTS, e o conselho não tem o poder de mudálas. Todas as suas ações devem levar em conta investimentos nas áreas de habitação, infra-estrutura ou saneamento. Os recursos do fundo são geridos pela Caixa Econômica Federal (CEF). O Conselho Curador do FGTS aprovou, em outubro, um orçamento de R$ 27,4 bilhões para 2009, o que representa aumento de mais de 60% em relação a 2008. Esse avanço é resultado do crescimento da arrecadação do fundo em conseqüência de 1,7 milhão de empregos gerados em 2007. Do orçamento previsto para o próximo ano, R$ 7,4 bilhões serão destinados para habitação popular, 40% a mais do que em 2008, e R$ 4,6 bilhões para a área de saneamento, um acréscimo de R$ 3,6 bilhões do orçamento atual de R$ 3,1 bilhões. Para o FI-FGTS, que investe nos setores de energia, rodovias, hidrovias, ferrovias, portos e saneamento foram aprovados R$ 10 bilhões, dos quais R$ 7 bilhões estão pevistos para projetos financiados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). SANEAMENTO 18-25 Reestruturação.indd 25 ValorSetorial 25 08.12.08 18:31:28 | POR ROSANGELA CAPOZOLI Gesner Oliveira: as bandeiras vermelhas vão desaparecer das praias RICARDO BENICHIO / VALOR SABESP UMA META MUITO ALÉM DA ÁGUA E DO ESGOTO Com recursos da ordem de R$ 5,5 bilhões, a maior empresa da América Latina investe na despoluição do Rio Tietê, de córregos e do litoral A maior empresa de saneamento da América Latina quer relacionar seu nome a uma missão bem mais ampla que a de fornecer água e coletar esgoto. A companhia vem criando e desenvolvendo uma série de produtos e serviços, que passou a chamar de Sabesp Soluções Ambientais. Fundada em 1973, a Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (Sabesp) produz 100 mil litros de água por segundo para abastecer 26 milhões de habitantes de 367 municípios do Estado. Só na região metropolitana de São Paulo estão concentrados 15,5 milhões dos seus clientes. 34 ValorSetorial Umplanoplurianual,queprevêinvestimentosdecerca de R$ 5,5 bilhões até 2010, contempla uma lista de grandes projetos englobados dentro da filosofia de Soluções Ambientais. Entre os principais, o presidente da Sabesp, Gesner Oliveira, cita o Projeto Tietê, de despoluição do rio; o Programa de Uso Racional da Água (Pura), para reduzir perdas e racionalizar o consumo de água; e o programa Onda Limpa, voltado para o esgotamento sanitário da BaixadaSantistaedoLitoralNorte,alémdoProjetoCórrego Limpo,quepretendedespoluirerecolheroesgotolançado em pelo menos 300 córregos da região metropolitana. SANEAMENTO 34-35 SABESP.indd 34 08.12.08 18:24:33 Só no Tietê, nas três fases em que o projeto foi dividido, estão sendo aplicados mais de R$ 3 bilhões. A primeira etapa foi de 1992 a 1998 e consumiu R$ 1,5 bilhão. Na segunda, de 2002 até este ano, os gastos chegam a R$ 800 milhões. Na terceira, que começa agora e vai até 2014, estão sendo negociados R$ 1,2 bilhão de empréstimos com o Banco Mundial (Bird), além de contrapartida da própria empresa. O Projeto Onda Limpa é apontado por Oliveira como “o maior salto feito até agora na despoluição das praias e no esgotamento sanitário do litoral”. Em cinco anos, de 2007 a 2011, a cobertura sanitária que era de 50% passará para 95%. “Hoje, durante boa parte do ano, você tem bandeiras vermelhas nas praias indicando que elas são impróprias para banho”, diz. “Essas bandeiras vão acabar. Imagine o impacto que isso terá na saúde e no turismo”, afirma. O programa foi dividido em oito lotes compreendendo de Peruíbe a Ubatuba, no Litoral Norte, e está orçado em R$ 1,1 bilhão. Dois outros grandes programas estão relacionados com o saneamento na Grande São Paulo e completam o Projeto Tietê. Um deles é o Vida Nova, voltadoparaapreservaçãodosmananciais,desviandooscursos clandestinos que lançam água de esgoto nas represas. Essas medidas devem reduzir em muito o custo de tratamento e produção da água. Os investimentos estimados sãodeR$1,2bilhão,dosquaisR$85milhõessãodaSabesp, R$ 170 milhões do Banco Mundial, com o restante envolvendorecursosdaCompanhiadeDesenvolvimentoHabitacionaleUrbanodoEstadodeSãoPaulo(CDHU),Secretaria de Saneamento e Energia do Estado de SãoPaulo, além das prefeiturasdeGuarulhoseSãoBernardodoCampo.Outro projeto que caminha na mesma direção do esgotamento sanitário da região metropolitana é o Córrego Limpo, cuja meta é retirar o esgoto dos corpos de água. Segundo Oliveira, a Sabesp coleta 84% do esgoto produzido nas áreas de concessão, mas desse total apenas 70% são tratados. “Quando começamos, em 2007, o tratamento era de 63% e terá um grande salto com a conclusão do Projeto Tietê”, garante. Os números de esgoto não tratado e jogado em cursos de água impressionam. Em 6,7 mil pontos (que a empresa tem informações) são lançados cerca de 1,3 bilhão de litros por dia. A Sabesp ligou à rede de esgoto nos últimos anos quase 3,5 mil pontos, mas a conexão de toda a malha que corre para os córregos, além das 100 mil ligações clandestinas da capital, deverá ser totalmente conectada aos coletores em 2018. Para agravar a situação, seis municípios da Grande São Paulo, que não são atendidos pela Sabesp, têm menos condições de tratar seus esgotos e estima-se que lancem nos córregos quase 400 milhões de litros de detritos por dia. Segundo a empresa, os 39 municípios da região metropolitana produzem cerca de 50 mil litros de esgoto por segundo, e as cinco estações de tratamento têm capacidade para 18 mil litros por segundo, embora fiquem abaixo dessa produção. Dentro de uma década, em 2018, é a data em que a Sabesp toma como referência para tratar todo o esgoto de seus municípios. “O escoamento sanitário é nosso principal desafio”, diz Oliveira. Além de grandes investimentos, os projetos dependem da continuidade no longo prazo e de mudanças de hábitos das pessoas. Pelo menos 15% do lixo levado pelos córregos escorre das ruas ou é jogado nos cursos de água pela população. Embora a venda de água e outros serviços possa aumentar a receita da companhia, o esgoto já é cobrado inclusive nas áreas onde não é tratado. Uma das fontes de recursos que a Sabesp pretende explorar mais é o fornecimento de água a grandes clientes, a preçosquepossamcompetircomoscustosdospoçosartesianos ou a venda pelos caminhões-pipa. Neste ano, foram “fechados50contratosdedemandafirmecompreçosmais vantajosos que os poços artesianos”. A estimativa inicial é conquistar 10 mil novos clientes empresariais que consumammaisde3milhõesdelitrosdeáguapormês.Segundo ele, o número de perfurações de poços é tão grande que há risco de contaminação do lençol freático em São Paulo. Outra fonte de receita e de redução de consumo é o tratamento e venda de água de reuso. A água utilizada passa por um processo de tratamento e seu uso e seu preço dependem da qualidade da água a ser fornecida. Até o início do ano, a Sabesp vinha tratando 100 mil metros cúbicos por mês de água de reuso, o equivalente a apenas 0,5% do esgoto tratado. “Já vendemos água de reuso para as subprefeituras lavarem as ruas, para a lavagem de vagões e resfriamento de fornos, além de irrigação em alguns tipos de plantações”, afirma. Um grande projeto, assinado em março passado, prevê o fornecimento da água de reuso para o Pólo PetroquímicodeCapuava,quedeveráfornecermillitrosporsegundo, um volume de água equivalente ao consumo de uma cidadedoportedeSantos.SegundoaSabesp,trata-sedomaior projeto de reuso de água no Brasil. A água será utilizada por dez empresas do pólo, será tratada na Estação de Esgoto do ABC e seguirá por 16,5 quilômetros de tubulação de aço. Segundo a Sabesp, o metro cúbico da água potável custa cerca de R$ 9,00. No reuso, cai para algo entre R$ 0,77 e R$ 2,58, dependendo da qualidade da água. OutrodesafiodaSabespéreduziroíndicedeperdas.De acordo com Oliveira, a Sabesp produz hoje 100 mil litros de água por segundo, servindo 26 milhões de pessoas. Desse total, há uma perda estimada de 28%, ou seja, quase um terço da água produzida se perde em vazamentos ou está entre as perdas aparentes, água que chega ao cidadão, mas não é faturada, seja por furto, fraude ou fruto de submedição. A Sabesp diz que pretende derrubar esse índice para 24% em 2010 e chegar a 13% em 2019. A importância desse monitoramento de perdas pode ser medida por alguns números da empresa: são 6,15 milhões de ligações de água, 198 estações de tratamento, 2.033 reservatórios, 1.078 poços, 4,5 mil adutoras e 57,8 mil quilômetros de redes de distribuição de água. SANEAMENTO 34-35 SABESP.indd 35 ValorSetorial 35 08.12.08 18:24:45 COPASA | POR ROSANGELA CAPOZOLI APOSTA NO MANANCIAL DE NOVOS NEGÓCIOS Além das prioridades de esgotamento sanitário, a companhia mineira investe no engarrafamento de água mineral e em projetos de irrigação A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) vem conseguindo fazer da água um negócio cada vez mais rentável. Além de oferecer água potável nas torneiras, recolher e tratar esgotos, a empresa iniciou em 2008 duas outras atividades no ramo: engarrafar água mineral, associando seu nome às fontes mais tradicionais do país, como Araxá e Caxambu, e investindo em projetos de irrigação. Minas Gerais é um Estado privilegiado na sua fartura de água. Mas o bom desempenho da Copasa, que a coloca como uma das melhores empresas de saneamento do país, se dá também pela profissionalização de sua gestão, alta tecnologia e grandes investimentos. Segundo seu diretor-presidente, o engenheiro civil Márcio Nunes, a empresa mantém os mesmos 12,2 mil funcionários que tinha em 2002, embora de lá para cá o número de pessoas atendidas tenha aumentado em 2,5 milhões de pessoas. “Nossas tarifas são reajustadas de acordo com o IGP-M, como fazem todas as empresas de saneamento. E nesse período a Copasa passou de deficitária a lucrativa”, afirma. Nunes atribui esse sucesso a capacitação constante dos profissionais, a um planejamento estratégico de médio e longo prazos e à boa governança, reforçada com o “choque de gestão”, política pública que o atual governo adotou no início de sua administração, em 2003. Entre os funcionários, 20% têm salários variáveis em função do cumprimento de metas. De2003a2010,aempresaprogramouinvestimentosde R$ 5,4 bilhões. Desse valor, R$ 2,4 bilhões vêm de empréstimos, incluídos recursos do PAC; R$ 2,2 bilhões de recursos próprios e R$ 800 milhões da venda de ações a partir de 2006, quando a empresa abriu seu capital na Bovespa. Neste ano, os investimentos somaram R$ 850 milhões, o mesmovalorde2007.“Osinvestimentospróprioseavenda de ações indicam a boa saúde da empresa”, diz o diretorpresidente da Copasa. O Estado detém 53% das ações e os 47% estão nas mãos do mercado e de prefeituras. Hoje, a empresa atende 13,5 milhões de moradores com água tratada – ou 70% da população do Estado – e 7,7 milhões com coleta de esgoto, 40% do total de mineiros. 36 ValorSetorial De um total de 853 municípios do Estado, 615 são atendidos com água e 180 com coleta de esgoto da Copasa. As prioridades são para o esgotamento sanitário, política adotada pelas empresas de saneamento diante das novas exigências da legislação ambiental. Esse é um mercado que se abre para a Copasa, por causa do grande número de moradores ainda não atendidos e municípios servidos por outras empresas. “Pretendemos fazer com que o índice de cobertura com abastecimento de água nas localidades operadas seja de 100% da população, e a cobertura de esgotos seja de 95%. Planejamos chegar em 2010 com um percentual de tratamento de esgotos da ordem de 70%, contra 26% que encontramos no início do governo, em 2003”, diz Nunes. Segundo ele, a empresa fechou o terceiro trimestre com um lucro de R$ 14,5 milhões, 24,6% a mais frente ao trimestre anterior. A receita operacional líquida cresceu 13,8% em relação ao mesmo trimestre de 2007, chegando a R$ 540,3 milhões. “Nesse período”, diz Nunes, “ampliamos em 4,72% nossa base de clientes. Comparando os números com os do trimestre anterior, conseguimos reduzir as despesas totais em 1,4%. A linha é esta: reduzir custos e ampliar receitas.” Outra iniciativa, na área de engenharia de operações, foi o investimento em um Centro de Operações de Sistemas que monitora, em tempo real, variáveis importantes e críticas do processo de tratamento e distribuição de água. Com isso, é possível saber, a partir de um único ponto, dados como pressão, vazão, níveis de reservatórios, qualidade de água, consumo de energia, além de controlar válvulas e registros. Cerca de 800 unidades operacionais da empresa na Região Metropolitana de Belo Horizonte estão integradas eletronicamente. Para Márcio Nunes, além de melhorar as condições de trabalho, essa tecnologia faz com que a Copasa esteja em primeiro lugar entre as empresas de saneamento com menor índice de perda de água. Segundo dados de 2006, do Sistema Nacional de Informação sobre Saneamento (SINS), as perdas da Copasa foram de 264,2 litros por ligação-dia. A Sabesp, de acordo com o SINS, estava na média nacional, com 511,7 litros-ligação SANEAMENTO 36-37 copasa.indd 36 08.12.08 18:25:13 KATIA LOMBARDI / VALOR dia, enquanto na Cedae, do Rio de Janeiro, as perdas chegavam a 1.829 litros por ligação-dia. Segundo Nunes, as perdas da Copasa em 2008 caíram para 210 litros-ligação dia. Ele lembra que muitas das cidades mineiras têm grandes diferenças de níveis entre os bairros, fazendo com que a pressão da água seja muito forte nos pontos mais baixos, provocando vazamentos. “Em Belo Horizonte, essa diferença de nível é de 700 metros”, afirma. “Para controlar essa pressão, instalamos anéis em toda a cidade e estabelecemos redutores de pressão em cada um desses anéis.” O engarrafamento de água começou em outubro, tendo sido criada uma concessionária. “É um negócio novo, que deve dar um retorno de 20% para cerca de R$ 10 milhões de lucro líquido por ano”, diz Nunes. “É um negócio pequeno, mas é uma questão de prestar um novo serviço e associar a imagem da companhia de saneamento com a produção de água mineral. Ninguém duvida da nossa capacidade em cuidar e tratar de água, portanto administrar o engarrafamento e a comercialização das águas mineiras seria um caminho natural.” Nunes diz que a empresa assumiu a concessão das águas das fontes de Cambuquira, Lambari, Caxambu e Araxá, conhecidas no Brasil e no exterior. Segundo ele, as quatro fontes juntas têm um volume de 150 milhões de litros por ano e deverão ser colocados à venda 100 milhões de litros. Os outros 50 milhões são utilizados para lavar as garrafas, como se faz no engarrafamento das águas minerais.“Vamosusaroqueasfontesnosoferecem.Temos o compromisso de não usar meios artificiais para a produção de água.” Na prática, a Copasa começa a atuar em um mercado dos mais disputados: o das águas minerais. Outra frente aberta em 2008 é a operação do maior projeto de irrigação da América Latina, o Jaíba, no norte de Minas. Trata-se de um projeto iniciado há cerca de 15 anos pelo governo federal que, segundo Nunes, foi interrompido porque não se conseguiu distribuir água. “Estamos colocando todo nosso conhecimento técnico nesse projeto, que pode chegar a 80 metros cúbicos por segundo, muito mais que toda a água produzida pela Copasa em Minas Gerais. São 65 mil hectares de área produtiva irrigável, produzindo riqueza para Minas e para o Brasil”, afirma. Um terceiro programa deve atender áreas carentes do norte de Minas. Com a utilização de poços artesianos de grande profundidade e água de rios, o projeto deve atender as localidades com 200 a 500 habitantes. Segundo Nunes, as tarifas subsidiadas custarão 40% abaixo das cobradas de populações carentes dos centros urbanos, que são 50% inferiores à média domiciliar. Márcio Nunes: empresa assumiu as concessões das fontes de Araxá e Caxambu SANEAMENTO 36-37 copasa.indd 37 ValorSetorial 37 08.12.08 18:25:21 | POR ROSANGELA CAPOZOLI MANTER A EFICIÊNCIA EXIGE PLANOS AMBICIOSOS MAGDALENA GUTIERREZ / VALOR SANEPAR Ligações de esgoto no Paraná saltaram de 500 mil para 1,1 milhão em menos de uma década e a prioridade é tratar os dejetos em áreas de mananciais Stênio Jacob: investimentos constantes na formação dos funcionários 38 ValorSetorial SANEAMENTO 38-39 Sanepar.indd 38 08.12.08 18:25:45 O s números e projetos explicam por que a Sanepar, a Companhia de Saneamento do Paraná, é uma das empresas mais premiadas do país no setor. Em menosdeumadécada,elaaumentouasligaçõesdeesgoto em 120% e, em alguns anos, pretende ser auto-suficiente em energia limpa, utilizando o biogás. Os investimentos para o triênio 2008/2010 somam R$ 1,5 bilhão e estão garantidos. Mas a Sanepar, em parceria com outras companhias de saneamento, vem reivindicando junto ao governo federal um financiamento exclusivo para o setor. “Reiteramos o pleito para que o governo federal abra uma nova linha de crédito para o poder público. Há recursos disponíveis no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para saneamento destinados às Parcerias Público-Privadas (PPPs)”, afirma Stênio Sales Jacob, presidente da Sanepar e da Associação das Empresas de Saneamento Básico do Brasil (AESB). O pleito de Jacob foi levado ao ministro das Cidades, MárcioFontes,emnovembro,duranteoFórumdeSecretários de Saneamento. “O ministro está analisando essa medidaeacreditoqueseráviável”,diz.Há outrapossibilidade vista por Jacob com otimismo. “Está se abrindo uma nova perspectiva através do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) com a emissão de debêntures, o que independeria da política federal porque se trata de uma operação de crédito entre as companhias e essas instituições”, diz. O programa de investimentos do FGTS no setor foi discutido no seminário sobre reestruturação do setor de saneamento, promovido pelo Valor. A empresa, que atua em 344 dos 399 municípios paranaenses e tem a concessão do município de Porto União, em Santa Catarina, aplicará os R$ 1,5 bilhão em 150 obras. Desse montante, R$ 800 milhões são provenientes do PAC. Em 2008, foram desembolsados R$ 410 milhões, dos quais R$ 15 milhões absorvidos no meio rural. “As comunidades rurais estão tendo acesso a pequenos sistemas de abastecimentodeágua,comreservatórioeprocessodetratamento. Aprópriacomunidadevaioperaressessistemas”,dizJacob. Deacordocomele,aprioridadeem2008foiamanutenção do abastecimento de água com quantidade e qualidade para 100% da população urbana e expansão dos serviços de esgoto sanitário. “Perto de 2 mil localidades rurais no Paraná são atendidas com esse sistema de tratamento, denominado Programa Água da Pedra, desde 1991”, afirma. Dos R$ 1,5 bilhão, cerca de 60% serão destinados às obras de expansão dos serviços de esgoto sanitário. Hoje a companhia serve água a 8,6 milhões de habitantes e atende com coleta e tratamento de esgotos 4,5 milhões de pessoas. As localidades atendidas com abastecimento de água totalizam 616 e aquelas com esgoto sanitário 153. Este ano, foram implantados 355 mil metros de rede de esgotos, representando 35 mil novas ligações prediais. Para estimular a população a conectar-se à rede, a empresa criou um programa intitulado “Se Ligue na Rede”, que tem por objetivo despertar na população a importância da coleta e tratamento de esgoto. Aprimeiraetapadoprojeto,quecontribuiparamelhorar a qualidade da água dos rios no Paraná, realizado na Bacia do Rio Mathias Almada, em Foz do Iguaçu, foi concluída. O trabalho mostrou que quase 1,2 mil imóveis, ou 11% das ligações, eram irregulares. Além disso, nas vistorias, os técnicos da Sanepar, fiscalizaram possíveis fraudes na ligação deágua,condiçõesdoreservatóriodoméstico(caixad’água) e possíveis focos do mosquito da dengue. A Sanepar é uma empresadeeconomiamistacomcapitalabertonaBolsade Valores de São Paulo (Bovespa), sendo o governo do Estado do Paraná o maior acionista, com 60% do capital votante. Os planos para o período 2008/2010 da Sanepar são ambiciosos. A política da empresa prevê para cidades com mais de 50 mil habitantes um índice de coleta de esgotos denomínimo80%dapopulaçãourbanaatéoanode2012. Para as cidades com 5 mil a 50 mil habitantes, o índice será de no mínimo 65%, como é recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Com esta política, o índice de atendimento de esgoto pela Sanepar passará de 52% para 70% da população urbana nas localidades operadas pela companhia. As áreas prioritárias são aquelas em que o esgoto gerado esteja em áreas de mananciais e regiões com grande adensamento populacional. O número de ligações de esgoto passou de 500 mil para 1,1 milhão, aumento de 120%. Aliada a esse crescimento, a empresa oferece taxas mais em conta para a população de baixa renda, favorecendo o acesso à rede de esgotos. A tarifa social é de um terço daquela cobrada para a média dos moradores, tanto em água como em esgoto. O projeto de energia limpa desenvolvido na Estação de Tratamento de Esgoto Ouro Verde, em Foz do Iguaçu, é referência para pesquisadores, universitários e técnicos. A estação já recebeu missões internacionais, pesquisadores deuniversidadesbrasileirasetécnicos.Desdequecomeçou a funcionar, em maio de 2008, cerca de 1,5 tonelada de gás metano deixou de ser lançada no ambiente. O gás metano éumdosquemaiscontribuemparaoaquecimentoglobal. Quando o projeto for estendido às 199 Estações de TratamentodeEsgotodaSanepar,maisde8miltoneladasdegás metano por ano deixarão de poluir o ambiente. A Sanepar é a primeira do ramo a usar o biogás na produção de energia elétrica. Na estação são produzidos cerca de 1.500 quilowatts/hora por mês. Segundo Jacob, o gasto com energia elétrica é a segunda maior despesa da Sanepar e, futuramente, a energia resultante do processo de tratamento poderá trazer uma economia de cerca de R$ 3 milhões/ano. O presidente da Sanepar costuma dizer que “o bom desempenho da companhia se explica pelo elevado nível de seus 6.450 colaboradores. Investimos na formação do nosso quadro de funcionários. Somos uma administração responsável”.Porcausadisso,aparanaenserecebeunofim de outubro o prêmio intitulado “Excelência em Gestão” da 5ª Pesquisa de Responsabilidade Social Empresarial, baseada nos indicadores do Instituto Ethos. SANEAMENTO 38-39 Sanepar.indd 39 ValorSetorial 39 08.12.08 18:25:55 | POR GLEISE DE CASTRO DOS PROJETOS ÀS OBRAS, RITMO ACELERADO Esforços das empresas de engenharia e de construção para cumprir os cronogramas dos empreendimentos contratados com o dinheiro do PAC E mpresas de engenharia, construção e fabricantes de equipamentos estão trabalhando em ritmo acelerado desde 2007 para atender à demanda gerada por uma grande quantidade de obras de saneamento que estão sendo realizadas em todos os Estados, incluindo concessionárias públicas e privadas. Essas obras foram detonadas pela combinação de dois fatores – a criação do marco regulatório para o setor, a Lei 11.455/2007, e a destinaçãoderecursosdoPACparasaneamento–,quesomaram R$ 15,1 bilhões contratados até dezembro de 2007 e mais R$ 22,6 bilhões até setembro de 2008. “O setor está aquecido.Asempresasestãoemumbommomento,porqueobras 40 ValorSetorial Pedro Hallack: criar condições para o início de um círculo virtuoso estãosendocontratadascomessedinheiroqueestásaindo do PAC”, diz Newton de Lima Azevedo, vice-presidente da AssociaçãoBrasileiradaInfra-estruturaeIndústriasdeBase (Abdib) e presidente da Eco-Enob Soluções Ambientais. Pedro Hallack, gerente executivo de projetos da Camargo Corrêa, também comemora esse aquecimento. “Após um longo período de estagnação, que se refletiu em significativa redução de atividade e desmobilização de recursos, estamos desde 2007 em uma fase de retomada dos investimentos, com o lançamento de inúmeros empreendimentos dos mais variados portes em todo o país”, diz. Estão em planejamento ou execução, afirma SANEAMENTO 40-42Infra estrutura.indd 40 09.12.08 18:36:44 JEFFERSON DIAS / VALOR INFRA-ESTRUTURA JEFFERSON DIAS / VALOR Hallack, desde complexos sistemas de tratamento e disposição final de esgotos até redes de distribuição de água em pequenas comunidades. “Todos os agentes do setor, as empresas de engenharia e construção inclusive, estão tendo que empreender um intenso esforço para conseguir viabilizar um atendimento adequado a essa demanda e superar a inércia causada pela crônica falta de investimento em saneamento no passado recente.” É preciso agora, observa Hallack, criar condições para que esse momento se constitua no início de um círculo virtuoso, e não uma bolha que venha a se esgotar em cinco anos. “Os governos federal e estaduais estão desenvolvendo vários programas de saneamento ligados ao PAC. O desafio é perenizar esse fluxo de investimento para saneamento”, afirma. Para ele, os investimentos no setor devem vir não só de recursos próprios e de financiamentos, mas também de verbas a fundo perdido. Isso porque nem todos os projetos são viáveis do ponto de vista econômico-financeiro. É também importante, diz ele, a participação do setor privado, não só isoladamente como concessionárias, mas em investimentos com o setor público, como no caso de Parcerias Público-Privadas (PPPs). A proposta de maior alocação de recursos por parte do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), que deixaria de ser apenas financiador de projetos de saneamento para se tornar investidor direto nas companhias estaduais, apresentada no seminário sobre reestruturação do setor de saneamento, promovido pelo Valor, em São Paulo, no dia 26 de novembro, é considerada por Hallack como muito bem-vinda. “Ela vem como resposta a uma percepção muito forte e correta de que fragilidades de muitos executores de ações de saneamento ambiental previstas no PAC podem até mesmo inviabilizar essas ações”, diz. O desafio, acrescenta, será aprová-la e colocá-la em prática, processo que vai demandar uma grande articulação política e econômica, envolvendo vários e diferentes agentes e grupos. A Camargo Corrêa desenvolve no momento, isoladamente ou em consórcios, diversas obras, entre as quais a implantação do tratamento secundário da estação de tratamento de esgotos (ETE) Alegria, no Rio de Janeiro, o aumento da capacidade de captação de água para o sistema Alto Tietê, em São Paulo, a construção da ETE Anhumas, em Campinas, e a ampliação do sistema de produção de água de João Pessoa. Esse projeto, desenvolvido para a Cogepa (Paraíba), com investimentos estimados de R$ 1,2 bilhão oriundos do PAC, visa abastecer a Grande João Pessoa, incluindo os municípios de Cabedelo, Bayeux e Santa Rita, até 2030. “Há todo um cenário propício para que as empresas públicas e privadas avancem na meta de universalização dosserviçosdesaneamento”,dizNewtondeLimaAzevedo, daAbdib.Paraisso,aseuver,éprecisotambémumchoque de gestão na maioria das companhias estaduais, que acumulam problemas de endividamento e não conseguem levantar financiamentos. “Não faltam recursos, não falta demanda nem marco regulatório. O que falta são modelos degestãoeficientesparaamaioriadasempresasestaduais, que propiciem sua sustentabilidade econômico-financeira.” Segundo o Conselho Curador do FGTS, só sete companhiasestaduaistêmcondiçõesdetomarfinanciamentos.A proposta feita no seminário sobre reestruturação do setor de saneamento é considerada por Azevedo como uma boa alternativa para o setor. “Ela vem se somar às propostas existentes, para reoxigenar o setor e fazer frente aos investimentos de que o país precisa”, afirma. A proposta também foi bem recebida pelas próprias companhias estaduais. Para Walder Suriani, superintendente executivo da Associação Brasileira das Empresas de Saneamento Básico Estaduais (Aesbe), a reestruturação das empresas com problemas é muito boa. “Ter o FGTS como sócio é importantíssimo para melhoria da gestão das empresas”, diz. Quanto à alocação de recursos, em sua opinião, só o futuro vai dizer se essa reestruturação vai se traduzir em capacidade de captar financiamentos. “As empresas a serem revitalizadas são pequenas, de Estados pequenos,queprecisamderecursossubstanciais.Podeser que o modelo proposto não seja suficiente”, diz Suriani. Suriani considera importante a criação de subsídios ao setor, na forma de recursos a fundo perdido, como existe em outros países. Segundo ele, o PAC desencadeou uma série de obras necessárias, mas elas são limitadas no tempo, cobrindo cerca de 20% das necessidades do setor. Dos 3.960 municípios onde as companhias estaduais atuam, 80% têm menos de 30 mil habitantes, que não possuem recursos e necessitam de subsídios, principalmente federal, porque Estados e municípios nessas regiões têm dificuldades orçamentárias. É nesses locais, concentrados nas regiões Norte e Nordeste e onde há maior carência, que existe o maior potencial futuro para obras de infra-estrutura de saneamento. Nas empresas bem geridas, como Sanepar (Paraná) e Sabesp (São Paulo), a execução de obras no setor vem se expandindo. A Sanepar anunciou investimentos de R$ 1,5 bilhão até 2010 para elevar a média estadual da população com coleta e tratamento de esgoto de 43% para 65%. A população atendida com esgoto coletado e tratado passará de 3,4 milhões para quase 5,5 milhões. Os investimentos ainda contemplam a expansão da rede de água, que atinge quase 100% da população urbana, para acompanhar seu crescimento vegetativo. Na Sabesp, também o ritmo está se intensificando. Além das várias obras em andamento, a empresa tem dois importantes projetos para 2009. Um é a instalação de coletores e tronco de redes de abastecimento de água, no município de São Paulo, com investimentos de R$ 48 milhões, cujas obras devem começar em março. O outro envolve a construção da estação de tratamento de esgotos de Caieiras e obras complementares de redes, interceptores e coletores para o sistema isolado de esgoto do extremo norte da Região Metropolitana de SANEAMENTO 40-42Infra estrutura.indd 41 ValorSetorial 41 08.12.08 18:26:28 INFRA-ESTRUTURA São Paulo. Nesse projeto serão investidos R$ 30 milhões e a licitação começará em fevereiro de 2009. A Sabesp também assinou, em junho deste ano, os contratos da parceria público-privada do sistema produtor Alto Tietê com a CAB-Sistema Produtor Alto Tietê, sociedade formada pelas empresas Galvão Engenharia e CAB Ambiental. O contrato de prestação de serviços tem prazo de 15 anos, durante os quais estão previstas obras de ampliação da capacidade da estação de tratamento de água de Taiaçupeba, no município de Mogi das Cruzes, a construção de 17,7 quilômetros de adutoras e de quatro reservatórios com capacidade para armazenar 70 milhões de litros. O conjunto de obras e serviços vai ampliar a oferta de água de 10 mil para 15 mil litros por segundo. Será investido R$ 1 bilhão, dos quais R$ 300 milhões só em obras, a cargo da Galvão Engenharia. “A roda do saneamento, que estava parada, começou a girar e não vai parar”, diz Yves Besse, presidente da Associação das Concessionárias Privadas de Serviços de Saneamento Básico (Abcon) e da CAB Ambiental. As DIVULGAÇÃO Obras planejadas ou executadas vão de tratamentos de esgotos até redes de água | 42 ValorSetorial concessionárias privadas começaram a operar em 1995. Depois de um período de fraca evolução, entre 2003 e 2006, elas voltaram a investir em novos contratos de concessão,estimuladaspelonovomarcoregulatório.Em2007 e 2008, foram fechados 20 contratos de concessão, que aumentaram de 8,3 milhões para 13,6 milhões o número de pessoas atendidas por seus serviços, o equivalente a 9,6% da população urbana do país. A previsão, segundo Besse, é de que esse percentual chegue a 30% até 2017. Isso se reflete em investimentos feitos pela iniciativa privada no setor, que saltaram de R$ 150 milhões anuais até 2006 para R$ 250 milhões em 2007 e devem encerrar 2008 em R$ 400 milhões. Até 2010, podem alcançar a marca de R$ 1 bilhão por ano e, até 2017, chegar a R$ 3 bilhões anuais. Do total investido, financiado pela Caixa Econômica Federal (CEF) e pelo Banco Nacional de DesenvolvimentoEconômicoeSocial(BNDES),alémderecursos próprios ou captados no mercado, 80% são destinados a obras e equipamentos de infra-estrutura. O mercado potencial das operadoras privadas são os municípios onde não há uma companhia estadual eficiente e envolve, segundo Besse, de 50% a 60% da população urbana. Além dessa parceria, a CAB Ambiental, criada em 2006, como coligada da Galvão Engenharia, atua em três concessões de serviços de água e esgoto – de Palestina (SP), Mirassol (SP) e Paranaguá (PR) – e uma de esgoto, de Guaratinguetá (SP). Nesses contratos, está investindo R$ 450 milhões só em obras de infra-estrutura, a cargo de empreiteiras locais, para atender 3,32 milhões de pessoas. Já a Eco-Enob Soluções Ambientais, criada em 2006, começou neste ano, em associação com a Odebrecht, uma PPP com o governo da Bahia para a construção e operação do emissário submarino Jaguaribe, para aperfeiçoar e ampliar a estrutura da rede de esgoto de Salvador. A obra vai demandar investimentos de cerca de R$ 300 milhões. NoeixodeatuaçãodaSaneamentoAmbientalÁguasdo Brasil, formada em julho de 2008 pelas construtoras Queiroz Galvão, Develop, do grupo Carioca, e Trana, do grupo nordestinoEIT,estãosendoaplicadosR$105milhõesentre 2008 e 2009 em obras, englobando suas cinco concessões plenas,todasnoEstadodoRio–Niterói,Campos,Petrópolis, Resende e Região dos Lagos (Araruama, Saquarema e Silva Jardim).Ostrêssóciosjátinhamessasconcessõesesejuntaram, segundo Cláudio Abduche, diretor-geral da empresa, porque vislumbraram a expectativa de novos negócios no setor, especialmente depois da nova lei de saneamento. Entre as obras em andamento, tocadas por um consórcio formadopelastrêsconstrutoras,figuraaampliaçãodarede de distribuição de água de Petrópolis. A Cibe Saneamento, dos grupos Bertin e Equipav Pavimentação, que controla três concessionárias em sete cidades do Mato Grosso do Sul, Rio de Janeiro e São Paulo, está investindo pesado. Sua controlada Águas Guariroba, responsável pelos serviços de água e esgoto de Campo Grande (MS), vai aplicar R$ 350 milhões para atender 98% da população, de 800 mil pessoas. SANEAMENTO 40-42Infra estrutura.indd 42 08.12.08 18:26:37 | MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS POR ROBERTO ROCKMANN DIVULGAÇÃO APESAR DAS INCERTEZAS, OTIMISMO COM O FUTURO Demanda para os fabricantes se mantém aquecida desde 2007 com a aprovação do marco regulatório e os investimentos públicos e privados D esde2007,osfabricantesdemáquinas,equipamentos e peças de saneamento básico têm obtido forte desempenho. De um lado, a aprovação da Lei do Saneamento fez os investidores privados voltarem a ter interesse por concessões. De outro, mineradoras, siderúrgicas, fabricantes de papel e celulose e petroquímicas investiram mais em sistemas de tratamento de água e efluentes líquidos, para aumentar sua ecoeficiência. Já, do ladopúblico,olançamentodoProgramadeAceleraçãodo Crescimento (PAC) impulsionou os recursos para a área, ampliando as encomendas. No primeiro semestre, as vendas das cerca de 100 empresas que estão reunidas no Sindicato Nacional das Indústrias de Equipamentos para Saneamento Básico e Ambiental(Sindesam)subiram28%emcomparaçãoanual. A expectativa é de que em 2008 a alta fique entre 28% e 50%, segundo a entidade, que atende às encomendas de empresas privadas e concessionárias de água e esgoto. Os dados da Associação Brasileira dos Fabricantes de Materiais e Equipamentos para Saneamento (Asfamas), que não contabilizam a demanda industrial, também confirmam o bom momento do segmento. De janeiro a outubro, o índice de faturamento das empresas reunidas na entidade, cujo foco é a demanda das concessionárias públicas e privadas de saneamento, subiu 57% em comparação anual. Uma das principais razões do forte desempenho é o aumento dos investimentos. Em 2006, a aplicação de recursos chegou a R$ 4,5 bilhões. “Em 2007, estimo que tenham sido investidos R$ 5 bilhões e, neste ano, devem chegar a R$ 6,4 bilhões”, diz o vicepresidente do Asfamas, Carlos Alberto Rosito. A crise financeira internacional e os seus impactos sobre o Brasil, no entanto, trazem algumas incertezas para o setor. “Antes da crise, prevíamos crescimento de 20% na demanda de máquinas em 2009. Agora deve ser menor, pode ficar entre 10% e 15%, ou ficar estagnado em relação a 2008”, afirma Rosito. A escassez de crédito tem atingido empresas da área: obter linhas de financiamento para capital de giro tornou-se mais caro. “Buscamos agilizar o processo de recebimento, que em alguns casos pode levar dois meses. Se o serviço foi bem feito, uma idéia é antecipar em 20 dias o recebimento. Isso daria maior fôlego ao setor”, diz o presidente do Sindicato da Arquitetura e Engenharia (Sinaenco), José Roberto Bernasconi. Paulo Nascentes: mercado aquecido no Centro-Oeste e Nordeste, onde há carências maiores SANEAMENTO 43-44 Equipamentos.indd 43 ValorSetorial 43 08.12.08 18:27:27 MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS A crise poderá levar algumas empresas a adiar os investimentos para fortalecer seu caixa, mas no médio e longo prazos as perspectivas para o segmento são positivas. As carências do setor são enormes e os investimentos começam a crescer. “Desde 2007, com a aprovação do marco regulatório, há um crescimento dos investimentos na área, sustentado em dois pilares: os investidores privados têm participado mais, enquanto o governo está ampliando os recursos com o PAC”, diz o presidente da Amanco, Marcos Bicudo. A empresa, que não participava ativamente do fornecimento de tubos e conexões para infra-estrutura, começou a focar o segmento em 2006, antecipando uma melhoria do cenário para a área de saneamento básico. Nesteano,areceitadaAmancodevedobrarparaR$100 milhões no segmento. Para crescer, a empresa vem lanDIVULGAÇÃO Marcos Bicudo: lançamento de novos produtos vai dobrar o faturamento | SANEAMENTO 44 ValorSetorial çando novos produtos. Em 2008, a novidade incorporada na linha foi a Novafort, tubos corrugados especialmente desenvolvidos para o segmento de saneamento básico, que têm melhor resistência mecânica e peso reduzido. Os investimentosempesquisas,desenvolvimentodoproduto e a fabricação chegam a R$ 17 milhões. Em 2009, apesar das incertezas com os desdobramentos da crise financeira internacional, a expectativa é de crescer mais que as rivais e ampliar sua presença no mercado de 28% neste ano para 32% no próximo. Investir em inovação tecnológica e ampliar a capacidade produtiva fazem parte da estratégia para expandir sua atuação. “Vamosapresentarnopróximoanoumagrandenovidade no mercado”, diz Bicudo. Um dos focos da empresa é desenvolver soluções para promover o uso racional de água e reduzir as perdas, ainda bastante elevadas no Brasil. Fabricante de tubos e conexões de PVC, a Tigre deve fechar este ano com vendas entre 40% e 50% mais altas em relação a 2007. “Mas a base de comparação é muito baixa, porque 2007 foi muito ruim com os investidores à espera da aprovação do marco regulatório”, diz o diretor de vendas da empresa, Paulo Nascentes. Em relação a 2006, uma base de comparação melhor, as vendas da Tigre devem crescer 15% neste ano. Para 2009, o executivo prevê um nível de vendas semelhante ao verificado neste ano. O mercado está especialmente aquecido no CentroOeste e Nordeste, onde a demanda por serviços de água e esgoto é ainda mais forte, porque as carências são maiores e os investimentos públicos têm crescido. “O mercado começa a crescer nessas regiões. Já temos uma unidade em Camaçari, na Bahia, e iremos inaugurar uma no primeiro semestre de 2009 em Pernambuco”, diz Nascentes. Com a nova unidade, a capacidade para atender o mercado do Nordeste deverá crescer em cerca de 30%, produzindo tubos para os mercados de infra-estrutura, construção e irrigação. A empresa também observa a demanda no Norte do país. “Ainda não temos unidade lá, mas para construir uma fábrica vai depender das perspectivas da região ao longo dos próximos anos. Será uma tomada de decisão de longo prazo”, destaca Nascentes. Não é só a procura das concessionárias públicas e privadas de saneamento que tem aumentado. As indústrias investem cada vez mais na área. A demanda de empresas de papel e celulose, mineração, siderurgia e petroquímica por sistemas de água e tratamento de efluentes tem sido grande nos últimos anos, mas a crise coloca em dúvida o ritmo da expansão futura, pelo menos no curto prazo. “A queda nos preços das commodities está fazendo muitas empresas adiarem seus investimentos em sistemas de água e efluentes. Em alguns segmentos deve haver uma queda de 80% nos investimentos direcionados a esses equipamentos, principalmente na aquisição de novos sistemas”, afirma o diretor comercial da Centroprojekt, Valdir Fogosi. Se no curto prazo o movimento é de queda, as perspectivas de longo prazo se mantêm muito otimistas. SANEAMENTO 43-44 Equipamentos.indd 44 08.12.08 18:27:42 Para reduzir o conteúdo de teor de enxofre existente no diesel, a Petrobras irá investir mais de US$ 5 bilhões apenas na modernização das 11 refinarias existentes no país. Neste contexto, terá de aplicar recursos em sistemas de água e efluentes para reduzir a captação de água na produção de combustíveis mais limpos. A aplicação de recursos na área não irá parar por aí. Simultaneamente, mais de US$ 10 bilhões deverão ser aplicados pela Petrobras na construção de duas novas refinarias na região Nordeste, com o objetivo de produzir e exportar diesel menos poluente. Empresários estimam que somente a estatal poderá investir mais de R$ 5 bilhões em sistemas de tratamento de água e efluentes ao longo dos próximos anos. No setor de papel e celulose, as fabricantes de fibra de eucalipto, grande vocação do Brasil, ganham espaço no cenário mundial. Grandes consumidoras de água no processo industrial, devem investir em sistemas de tratamento de água e efluentes. Mineradoras e siderúrgicas também ocupam importante posição no xadrez estratégico de seus setores no mundo e devem se beneficiar no médio e longo prazos do crescimento de China e Índia. As duas economias emergentes deverão assistir à migração de 650 milhões de seus habitantes da zona rural para as cidades, gerando grandes demandas de metais. “A crise pode fazer alguns projetos serem postergados por algum período, mas as perspectivas de médio e longo prazos para essas encomendas do setor privado continuam bastante positivas”, diz o presidente do Sindesam e também vice-presidente da Aquamec, Gilson Cassini. Em 2008, a receita da Aquamec deve crescer 67%, para R$ 75 milhões, com a alta da demanda industrial. Para o próximo ano, a receita pode dobrar, depois do fechamento de contrato para fornecer equipamentos para a Sabesp. Para atender à expansão, a empresa irá investir entre R$ 2 milhões e R$ 4 milhões até 2010 para ampliar o pátio de montagem e composição de obras e na melhoria dos sistemas de gestão. Foi bem recebida pelo setor a intenção do Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) de utilizar recursos para investimentos diretos em participações em companhias de saneamento ou para a compra de papéis dessas empresas, como debêntures. “Parece ser uma idéia inteligente em um setor bastante carente de recursos”, diz Folgosi. Aumentar os recursos para o setor implicaria acréscimo nas encomendas para as empresas que atuam fornecendo bens e serviços. “Hoje os investimentos das empresas estaduais de saneamento estão concentrados em menos de dez empresas”, diz o vice-presidente da Asfamas, Carlos Alberto Rosito. Melhorar a gestão das empresas e diminuir o nível de endividamento delas seria importante para aumentar os investimentos na área, de forma a diminuir as carências. Com nível de endividamento alto, muitas A Lei de Saneamento trouxe maior segurança jurídica para o setor, o que deve aumentar ainda mais os investimentos em água e esgoto estaduais não podem obter recursos do governo federal, agravando o cenário do setor. “Para reduzir os problemas, é fundamental ampliar o dinheiro disponível tanto do Estado quanto do setor privado”, observa Rosito. Os fabricantes de máquinas e equipamentos acompanham de perto os investimentos das concessionárias privadas, como a parceria público-privada (PPP), realizada pelo município de Rio Claro, no interior paulista. Com a regulação da Lei de Saneamento, deve haver um aumento da segurança jurídica na elaboração de contratos, o que poderá ampliar ainda mais o ingresso de investimentos no setor. Conseqüentemente, mais encomendas seriam feitas às fabricantes de bens de capital. “Com a lei, investidores privados podem ter maiores vantagens para ampliar sua presença no segmento”, afirma Folgosi. O setor privado responde por menos de 10% das concessões de água e esgoto no Brasil, participação que poderá crescer ao longo dos próximos anos. A desvalorização do real em relação ao dólar pode aumentar a competitividade do segmento em contratos no exterior. Na mira das empresas, África e América Latina são os dois principais alvos. “Nossa intenção é aproveitar oportunidades no exterior atuando com parceiros brasileiros ou grupos locais”, observa Cassini, da Aquamec, que terminou recentemente a primeira etapa de um contrato com três fases em Angola. Com esse contrato, que tem a gigante Odebrecht como principal responsável, a Aquamec, que anteriormente apenas fornecia equipamentos para o exterior, ampliou sua participação no mercado externo. No empreendimento, o papel da Aquamec foi projetar, escolher a tecnologia, enviar e instalar os equipamentos para tratar a água e os efluentes desse condomínio industrial. “Cerca de 10% de nossa receita está atrelada às exportações, com interesse, além da África, na América do Sul e Central”, ressalta o executivo. No entanto, as bruscas oscilações cambiais e as incertezas em relação ao cenário de 2009 tornam complicada a tarefa de ampliar as exportações do segmento. “Trabalhamos com encomenda de máquinas que levam de seis a doze meses para serem entregues. Há hoje uma grande dificuldade para fixar um preço, porque não se sabe se o câmbio daqui a doze meses estará em R$ 1,90 ou R$ 2,30. Isso atrapalha a busca de negócios fora do Brasil”, analisa o diretor comercial da Centroprojekt, Valdir Fogosi. SANEAMENTO 43-44 Equipamentos.indd 45 ValorSetorial 45 08.12.08 18:27:53 MÃO-DE-OBRA DIVULGAÇÃO | POR MARGARETH BOARINI UMA DISPUTA ACIRRADA PARA ATRAIR EMPREGADOS Obras de saneamento geram empregos diretos e indiretos, como o de pedreiro, operador de máquina e comércio em geral N o momento em que a crise econômica mundial começa a motivar demissões, ampliação de férias coletivas, fechamento de fábricas e adiamento de planos no Brasil, incentivar investimentos na área da infra-estrutura pode ser numa saída para a geração de empregos. O setor de saneamento dá sinais de que está amadurecido e preparado para tocar esta empreitada através da realização de obras, mas depende da disposição de governos municipais e estaduais para viabilizar projetos. A intenção do Conselho Curador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) de que o fundo se torne investidor direto, via participação minoritária em companhiasdosetorououtrosinstrumentosdemercado, pode contribuir para o aquecimento dos negócios na área e abertura de vagas. Para Yves Besse, presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon), a iniciativa é louvável e desafiadora para os agentes do setor. Na área do trabalho, Besse acredita que o projeto poderá gerar até 600 mil empregos por ano como resultado de investimentos da ordem de R$ 30 bilhões nas empresas. Resta saber, segundo ele, se a área política responderá a contento ao projeto. O lado privado, afirma ele, sente-se provocado a aceitar sua parte no desafio, de realizar parcerias e compartilhar um modelo de gestão eficiente das empresas. Leonardo Barbirato, presidente do Sintercon, lembra que onde a iniciativa privada participa o desenvolvimento é mais acelerado. “A contratação de uma empreiteira para uma obra de saneamento, por exemplo, impacta positiva46 ValorSetorial Com o aumento de investimentos, a previsão é gerar até 600 mil novos empregos por ano menteoníveldeempregos,porquecontemplanãoapenas ostrabalhadoresdiretos,masumasériedepostosindiretos, como operadores de máquinas, comércio de material de construção, empresas de recapeamento, pedreiros para fazer a ligação do esgoto das residências às tubulações das ruas e até vendedores de marmitex, entre outros”, diz Barbirato, que também é presidente da Águas Guariroba, concessionária de esgoto de Campo Grande (MS). ParaMarceloSallesHolandadeFreitas,diretordetecnologia,empreendimentosemeioambientedaSabesp,uma das maiores empresas do setor, toda obra de saneamento gera emprego. A liberação de recursos do FGTS voltados para a recuperação de empresas estaduais que se encontram em má situação financeira obedeceria ao mesmo raciocínio. Na avaliação de Flávio Presser, diretor-geral do Departamento Municipal de Água e Esgoto (Dmae), mais que novas vagas, o projeto deve estimular investimentos na qualificação de profissionais. O aquecimento dos negócios nos últimos anos tem transformado o dia-a-dia das empresas e coloca o setor no mesmopatamardeoutrosemníveldeemprego.Antesvista comoúltimadasopçõespromissorasdomercadodetrabalho,aáreadesaneamentoamadureceuapontodeimpactar os negócios em empresas de recrutamento de executivos, levaràmodernizaçãodecurrículosdecursosdeengenharia efazercomqueasconcessionáriasrealizemtreinamentoe invistam na capacitação de seus profissionais. Em 2007, a Case Consulting, especializada em recrutamento, tinha apenas um cliente de saneamento em sua carteira. Ao longo deste ano, seis empresas da área de SANEAMENTO 46-47 maodeobra.indd 46 08.12.08 18:28:39 DIVULGAÇÃO engenharia com operações voltadas para o setor procuraram a consultoria para buscar executivos no mercado. É uma tarefa complicada. A falta de investimentos, ao longo da última década, provocou a escassez de profissionais especializados. O mercado disputa desde os já formados, com perfil sênior, até os estagiários, que até então chegavam a desprezar a área pela ausência de perspectiva de crescimento profissional. Para encontrar colaboradores de média gerência, a Case viu-se obrigada a voltar suas baterias para outros setores da economia e, em alguns casos, até mesmo para a concorrência. O perfil do funcionário desejado tem que saber conjugar conhecimento técnico com gestão do negócioedepessoaseterdisponibilidadeparatocarobras emvárioslocais.“Temquesermeiocigano”,brincaAdriana Bravo, diretor da Case. Como exemplo, ele cita um dos clientes da consultoria quebuscavafuncionáriosqualificadosparaatuaremobras no Nordeste. A primeira tentativa foi prospectar profissionais na região, mas não deu certo. Os mais experientes e qualificadosencontravam-seemáreasondeosaneamento havia recebido mais investimentos nos últimos anos e a saída foi a “importação” de executivos de outras regiões do país para o Nordeste, lembra Bravo. O salário da média gerência no setor acabou valorizado por causa da demanda. Contra um salário de R$ 6 mil mensais de poucos anos atrás, hoje é possível um engenheiro especializado ocupar uma vaga de média gerência por um salário de R$ 10 mil a R$ 12 mil, estima o headhunter. A “caçada” por mão-de-obra qualificada acontece também nas universidades. A demanda reprimida por tantos anos não gerou número suficiente de profissionais para atuarem na área e, agora, até os estagiários são disputados pelas empresas, afirma José Carlos Mierzwa, engenheiro químico e professor do Departamento de Engenharia Hidráulica e Sanitária da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli USP). “A meninada que se forma hoje sai da faculdade com inúmeras propostas de trabalho. Emboraaengenhariacivilaindaocupeamaioriadasvagas, o setor se abriu para outras especialidades, como a engenharia ambiental e a de produção”, diz Cassilda Teixeira de Carvalho, presidente nacional da Associação Brasileira da Engenharia Sanitária e Ambiental (Abes). Atentas às mudanças do setor, as universidades passaram a incluir conceitos de gestão e a investir na interdisciplinaridade da formação do aluno de engenharia. ReginaLúciadeOliveiraMoraes,diretora-superintendente do Centro Superior de Educação Tecnológica (Ceset) da Unicamp, define a introdução deste tipo de tema como programa de “mentes abertas”. “Ele possibilita a criação de projetos mais integradores.” Na Poli (USP), esse tipo de formaçãotambémacontece.Oalunodeengenhariaassiste aaulasnasfaculdadesdeSociologia,Economiaparaserum profissional multidisciplinar, afirma Mierzwa. A CAB Ambiental lança em dezembro um programa direcionadoparatraineeseestagiários,concebidoempar- ceria com algumas universidades do país. A idéia é atrair e formar profissionais especializados no setor e motivar o desenvolvimento de pesquisas, segundo Giuliano Dragone, gerente técnico e operacional da empresa. Na região deRibeirãoPreto,aempresarecrutoudoistraineesebusca estagiários para compor a equipe. O engenheiro sanitarista e ambiental Lineu Machado sabe o que é conciliar a vida de estudante com a de profissional. Hoje, aos 28 anos, é gestor de obras e serviços da ÁguasGuariroba,ondeingressoucomoestagiárioquando cursava o terceiro ano da faculdade. “Tinha planos de me voltar para a área ambiental, mas consegui o estágio aqui, numa empresa de saneamento. Logo gostei da área, fui contratado assim que me formei e não tenho dúvidas de que o setor é um dos que mais oferecem oportunidades para o desenvolvimento profissional”, diz Machado. Para participar da nova fase que o setor de saneamento vive, porém, não basta ter conhecimento técnico. Gestão também se tornou palavra-chave na área, a exemplo do que acontece em outras. “Tive que me capacitar em planejamento estratégico, gestão do negócio, liderança, porque é preciso tocar uma obra de forma diferente de como se fazia no passado”, diz. Dragone, da CAB Ambiental, reconhece a guinada profissional que o engenheiro que trabalha na área de saneamento precisou dar para administrar obras. Não basta direcionar o foco para a obra em si, diz. “O conceito de prestação de serviços deve nortear todo o negócio, e cabe ao gestor compreender o processo de produção, ter visão de longo prazo, conhecer e informar os stakeholders. Não se pode mais ser reativo. É necessário tomar iniciativas e surpreender as expectativas de consumidores, acionistas, funcionários”, acredita. Ele mesmo tem formação em engenharia de produção, mas sentiu ao longo da carreira a necessidade de fazer um MBA em gestão financeira e especialização em processos de saneamento, automação e instrumentação pelo Office Internacional de L’ Eau, na França. A Sabesp, com 17 mil funcionários, criou a sua Universidade Empresarial Sabesp em 2000. De janeiro a setembro deste ano, aconteceram mais de 90 participações em atividades de capacitação e desenvolvimento presenciais e a distância, o que significa 31 horas de treinamento por funcionário. A média anual está em torno de 52 horas. O foco da universidade em 2008 foi a disseminação do conceito de saneamento ambiental para dar a empregados e colaboradores uma visão mais estratégica e integradora. Em Porto Alegre, o Dmae também investe na sua universidade corporativa. Inaugurada em 2007, com o nome de Unidmae, capacitou neste ano mais de 5 mil colaboradores. Os treinamentos abordam temas técnicos e da área de gestão, com foco em recursos humanos e qualidade. “Antigamente,ofocodosetoreraobra.Hojeéserviço,eisso embuteumacomplexidadeenormedeconhecimentosque os profissionais da área devem ter”, afirma Presser. SANEAMENTO 46-47 maodeobra.indd 47 ValorSetorial 47 08.12.08 18:28:47 | POR EDIANE TIAGO Raul Pinho: despoluição da Baía de Todos os Santos é levada a sério DIVULGAÇÃO / EUGÊNIO GOULART MELHORES MUNICÍPIOS ATUAÇÕES EXEMPLARES DIGNAS DE IMITAÇÃO Políticas consistentes de saneamento garantem bons serviços para os habitantes de municípios como Niterói, Jundiaí, Maringá e Salvador C om muito trabalho e planejamento, algumas cidades brasileiras têm dado a volta por cima e provado que saneamento é uma política pública que dá bons resultados. Municípios como Niterói (RJ), Jundiaí (SP), Maringá (PR) e Salvador (BA) apostam em planos diretores para oferecer um bom serviço a seus habitantes e colhem os frutos do reconhecimento da população. Estas cidades foram citadas pelo Instituto Trata Brasil como exemplos de superação. Em alguns casos, como o de Salvador, ainda há muito trabalho 48 ValorSetorial a ser feito, mas o avanço tem despertado a atenção e surpreendido os especialistas. A cidade apresentou, no censo realizado em 1991, índice de abastecimento de água de 85,2% e, dez anos depois, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou 96,6%. Em relação ao acesso à coleta de esgoto, o crescimento foi ainda mais surpreendente, tendo em vista as complexidades de uma capital. Em 1991, apenas 24% da população era atendida pela rede de coleta de esgoto. Em 2000, o índice foi de 76,5%. SANEAMENTO 48-50 MELHORES E PIORES.indd 48 08.12.08 18:29:12 “Existe um projeto para a despoluição da Baía de Todos os Santos e o município o tem levado a sério”, diz Raul Pinho, presidente do Instituto Trata Brasil. Segundo dados do governo da Bahia, o projeto de saneamento ambiental para a despoluição da baía, que envolve investimentos em Salvador, tem um orçamento de US$ 600 milhões, verba do Estado e de instituições financeiras internacionais e nacionais. O objetivo é oferecer cobertura para coleta de esgoto a 80% da população. A cidade também recebe verbas do Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), uma vez que o Estado recebeu recursos de R$ 1,3 bilhão para obras de urbanização de favelas e saneamento. “Não estamos surpresos com o avanço por conta dos investimentos empregados. Mas ainda há opiniões divergentes sobre algumas tecnologias utilizadas, como a dos emissários submarinos”, diz Larissa Cayres, pesquisadora da ONG Onda Azul. O questionamento da pesquisadora mostra outra importante evolução: o envolvimento da sociedade que quer resolver os problemas da capital baiana. Os baianos questionam a construção e operação do sistema de disposição oceânica do Jaguaribe, obra orçada em R$ 205 milhões, e que será feita por meio de uma parceria público-privada (PPP) com a Odebrecht, que financiará 30% do empreendimento. A parceria prevê a construção do emissário submarino da Boca do Rio, do emissário terrestre e da estação de condicionamento prévio, além da ampliação da estação elevatória de esgoto do Saboeiro. A obra permitirá o tratamento e a disposição final, de maneira rápida e segura, dos esgotos gerados nas cidades de Salvador e Lauro de Freitas. “Não há estudos que comprovem a segurança desta tecnologia de tratamento para atividades como a pesca e a balneabilidade. Temos medo de apenas levarmos o esgoto para o alto-mar, e não resolver o problema”, afirma Larissa. Em Niterói, a virada começou há cerca de dez anos, quando o município resolveu privatizar a operação dos sistemas de abastecimento de água e coleta e tratamento de esgoto. Em 1999, quando a concessionária Águas de Niterói ganhou a concorrência para ser a prestadora de serviços da cidade por 30 anos, encontrou um desafio e tanto. Na época, o município fluminense dispunha de abastecimento de água para 72% de sua população e esgoto tratado para apenas 35%. Com um plano diretor focado na universalização dos serviços, estendeu o benefício para 100% de cobertura no abastecimento de água, coleta 90% do esgoto e trata 100% desse total. “Temos ainda problemas em alguns bairros bastante pobres. Com recursos do PAC,vamosatuarnainfra-estruturaparaurbanizaçãodessas áreas e ampliar a nossa rede”, afirma Lincoln Silveira, diretor de operações da Empresa Municipal de Moradia, Urbanização e Saneamento de Niterói. A autarquia acompanha de perto o trabalho da Águas de Niterói e participa da definição dos investimentos. “Delegando a operação, ganhamos capacidade de gestão. Eles têm experiência com saneamento, e nós podemos entender quais são os passos importantes para planejar o futuro”, diz Silveira. Ao conquistar o contrato de concessão, a Águas de Niterói trouxe uma carteira com R$ 250 milhões para investir em saneamento na cidade durante o período do acordo. A cidade de Jundiaí, a 60 quilômetros da capital paulista, também apostou no saneamento para conquistar a população. Para dar conta das demandas, destinou o trabalho de tratamento, reserva e distribuição à DAE S/A Água e Esgoto, que teve como origem uma autarquia fundada em 1969, e o tratamento de esgoto à Cia Saneamento de Jundiaí (CSJ), que obteve concessão para operar na cidade em 1995, em um contrato com duração de 20 anos. Com a operação das duas empresas, Jundiaí é considerada um modelo de saneamento no Brasil, leva água tratada e encanada a 98% dos domicílios do município e na área urbana a cobertura chega a 100%. Em relação ao esgoto, a coleta chega a 97% das famílias e a cidade trata todos os dejetos que coleta. “Só não chegamos onde realmente não é possível. Temos casos como o de loteamentos irregulares nos quais dependemos de liberação legal para atuar”, diz Eduardo Palhares, presidente da DAE. Entre os diferenciais de operação de Jundiaí está a reciclagem do esgoto. A empresa trata os dejetos e produz adubo, utilizado na agricultura de cana-de-açúcar e nas florestas de eucalipto. A preocupação crescente com o futuro também é marcante na gestão do saneamento. A cidade pensa em garantir serviços para os próximos 40 anos. Para assegurar o suprimento de água, a cidade investiu na duplicação da represa, aumentando a capacidade de armazenamento de 5,5 bilhões de litros para 12,5 bilhões. “Com um bom reservatório, preservamos os cursos de água da região, pois não temos de tirar deles”, comenta Palhares, com a certeza de que a água é um recurso escasso. O investimento constante é um dos segredos do município. A DAE conta com orçamento anual de R$ 94 milhões. Para 2009, 10% desse total será destinado a investimentos na infra-estrutura de saneamento ambiental. “Queremos sempre ampliar o alcance dos serviços e oferecer qualidade”, diz. Entre as ações, estão previstas a manutenção da rede de distribuição da água e investimento em sistemas de gestão, com o objetivo de reduzir o índice de perda, que na cidade chega a 32%. “Nossa meta é reduzir o desperdício e melhorar o desempenho operacional”, afirma. Em Maringá, situada no noroeste do Paraná, a rede de coleta e tratamento de esgoto está ganhando reforço. A cidade coleta e trata 88% do esgoto e a meta é que 95% da população tenha acesso ao serviço até 2010. Neste ano, o governo do Estado do Paraná, a prefeitura de Maringá e a concessionária Sanepar anunciaram que destinarão R$ 5 milhões para ampliar o acesso ao serviço. Os recursos serão liberados pela Sanepar e pela Caixa Econômica Federal. SANEAMENTO 48-50 MELHORES E PIORES.indd 49 ValorSetorial 49 08.12.08 18:29:19 PIORES MUNICÍPIOS | POR EDIANE TIAGO O ATRASO DO BRASIL NO TRATAMENTO DE ESGOTO Com 80% dos dejetos lançados em lagos, rios, mares e mananciais, municípios como Guarulhos correm para mudar a situação O sdadossobresaneamentonosmunicípiosmostram que não se prioriza no Brasil a qualidade no acesso à águatratadanemàcoletaeaotratamentodoesgoto, causando danos à saúde e impactos ao meio ambiente. De acordo com a Associação Brasileira de Entidades do Meio Ambiente (Abema), 80% do esgoto produzido no país não recebenenhumtipodetratamentoeédespejadoemlagos, rios, mares e mananciais. Mesmonosmunicípiosondeoesgotoécoletado,apenas 31,5% recebe tratamento, segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS). Para agravar mais a situação, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)alertavaparaofatoquemaisde40milhõesdebrasileiros(21,4%dosdomicílios)utilizarem,em2005,obsoletas fossassépticasparaodespejodeseusdejetos,oque,entreos danos,podecontaminaroslençóisfreáticos.“Gabamos-nos dos nossos índices de acesso à água encanada – que estão na casa dos 90% da população –, mas nos esquecemos de que a perda deste importante insumo durante a operação dossistemasestácontabilizadaem45%”,afirmaYvesBesse, presidente da Associação Brasileira das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcon). Para combater a má interpretação de dados e cobrar os municípios de forma mais eficiente, o Instituto Trata Brasil está realizando um estudo que analisa índices disponíveis no IBGE, no Ministério das Cidades e no SNIS. A idéia é avaliar o real desempenho de cidades com mais de 300 mil habitantes quando o assunto é saneamento e criar um ranking. A iniciativa coloca na lista de maus exemplos localidades como Guarulhos (SP), Montes Claros (MG) e Bauru(SP).Emcomum,estascidadespossuemaltosíndices de acesso à água tratada e de esgoto coletado. “Coletam, mas não tratam nada”, afirma Raul Pinho, presidente do Instituto Trata Brasil. PartedamaiormetrópoledaAméricaLatina,acidadede Guarulhos(SP)éumexemploàsavessasdosaneamento.SegundoJoãoRobertoRochaMoraes,engenheirosanitarista e superintendente do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE)deGuarulhos,em2001,quandoaautarquiainiciou umareestruturaçãoparaformarequipeeenfrentarospro50 ValorSetorial blemasdesaneamento, acidadechegavaaficar20diassem abastecimento de água. “Não dava nem para cogitar obras com esgoto se estávamos sem o básico”, afirma. Com uma população de 1,3 milhão de pessoas, o município correu atrás de financiamento para a construção de reservatórios.Acidade,quepossuíadoisdepósitosdeágua, hojecontacomoitoetemprevisãodeconstruirmaisquatro até2010.“Atendemos94%dapopulação,masaindatemos rodízio no abastecimento de água em 40% da cidade”. Em 2001, o índice de coleta de esgoto era de 53%, atualmente está em 75%. Com R$ 225 milhões comprometidos comobras,Guarulhospretendechegara2010com97%do esgoto coletado. O investimento prevê obras para iniciar o tratamento dos dejetos, que deve chegar a 70% do total coletado. Para enfrentar o problema, o município estima orçamento total de R$ 600 milhões, o que quer dizer que ainda faltam mais de R$ 300 milhões. ConsideradavilãnabaciadoTietê,acidadejogainnatura 100% do esgoto coletado no rio, o que, segundo a autarquia,correspondea7%dosdejetosresidenciaisgeradosna região metropolitana de São Paulo. Junto com municípios como Santo André, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá e Mogi das Cruzes, Guarulhos contribui para que as bacias dos rios Pinheiros, Tietê e Tamanduateí se traduzam em uma fétida via receptora de esgoto sem tratamento. EmMontesClaros(MG),oprefeitoAthosAvelinopagou oquesuaequipechamadecustopolíticodeobrasdesaneamento. Médico sanitarista, ele encarou o grave problema: a falta de tratamento de esgoto. Em sua gestão, investiu R$ 150 milhões para iniciar o tratamento de esgoto na cidade, que oferece aos munícipes 100% de acesso à água tratada e 100% de coleta de esgoto. A primeira estação de tratamentoentraemoperaçãoem2009edevesersuficienteparatratartodooesgotocoletado.Avelinoassistirácomo expectador,umavezquenãofoireeleito.“Quemtemvisão política para uma obra dessa tem de estar preparado para perder. A população não enxerga os resultados durante a gestão e pensa que a prefeitura não fez nada”, diz GuilhermeGuimarãesOliveira,engenheirosanitaristaepresidente do Instituto Municipal de Desenvolvimento Urbano. SANEAMENTO 48-50 MELHORES E PIORES.indd 50 08.12.08 18:29:28