Revista HUGV 2014 n.1 - Hospital Universitário Getúlio Vargas

Transcrição

Revista HUGV 2014 n.1 - Hospital Universitário Getúlio Vargas
revistahugv
Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
The Journal of Getulio Vargas University Hospital
V.13. N. 1 JAN./JUN. – 2014
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Rua Apurinã nº 04 – Praça 14 de Janeiro, Cep: 69020-170 Manaus - AM
Fones: (092) 3305-4708
E-mail: [email protected]
FUNDADORES
Ricardo Torres Santana
Jorge Alberto Mendonça
LISTA DO CONSELHO EDITORIAL DA REVISTA HUGV
EDITOR-CHEFE
Fernando Luiz Westphal
Maria Augusta Bessa Rebelo
Kathya Augusta Thomé Lopes
LISTA DO CONSELHO CONSULTIVO DA REVISTA HUGV
Aristóteles Comte Alencar
Armando de Holanda Guerra Júnior
Celsa Moura
Domingos Sávio Nunes de Lima
Edson de Oliveira Andrade
Ermerson Silva
Eucides Batista da Silva
Eurico Manoel Azevedo
Fernando César Façanha Fonseca
Fernando Luiz Westphal
Francisco Mateus João
Giuseppe Figliuolo
Ione Rodrigues Brum
Ivan da Costa Tramujás
Jean Jorge Silva de Souza
José Correa Lima Netto
Julio Mario de Melo e Lima
Juscimar Carneiro Nunes
Kathya Augusta Thomé Lopes
Leíla Inês de A. R. da Camara Coelho
Lourivaldo Rodrigues de Souza
Luís Carlos de Lima
Luiz Carlos de Lima Ferreira
Luiz Fernando Passos
Marcus Vinicius Della Coletta
Maria Augusta Bessa Rebelo
Maria do Socorro Lobato
Maria do Socorro L. Cardoso
Maria Fulgência Costa L. Bandeira
Maria Lizete Guimarães Dabela
Márcia Melo Damian
Marcus Tolentino
Massanobu Takatani
Miharu Magnória Matsuura Matos
Patrícia Bandeira de Melo Akel
Petrus Oliva Souza
Ricardo Torres Santana
Rodolfo Fagionato
Rossiclei de S. Pinheiro
Rubem Alves da Silva Júnior
Sandra Lúcia Euzébio
Taís Freire Galvão
Wilson Bulbol
Zânia Regina Ferreira Pereira
revistahugv
Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
The Journal of Getulio Vargas University Hospital
V.13. N. 1 JAN./JUN. – 2014
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CULTURA
UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Copyright© 2014 Universidade Federal do Amazonas/HUGV
REITORA DA UFAM
Prof.ª Dra. Márcia Perales Mendes Silva
SUPERINTENDENTE DO HOSPITAL UNIVERSITÁRIO GETÚLIO VARGAS
Dr. Rubem Alves da Silva Júnior
PRODUÇÃO GRÁFICA-EDITORIAL
Fernando de Souza Neto
ORGANIZAÇÃO
Thaís Borges Viana
DIRETORA DA EDUA
Prof.ª Dra. Suely Oliveira Moraes Marquez
DIRETORA DA REVISTA
Profª Dayse Enne Botelho
EDITOR-CHEFE DA REVISTA
Prof. Dr. Fernando Luiz Westphal
REVISÃO (LÍNGUA PORTUGUESA)
Sergio Luiz Pereira
CAPA
Serviço de Ergodesign
TIRAGEM 300 EXEMPLARES
CDU 61(051)
R454 Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
Revista do Hospital Getúlio Vargas. V. 13, n. 1 (2014) / Manaus: Editora da Universidade
Federal do Amazonas, 2013
86 p.
Semestral
Título da revista em português inglês
ISSN – 1677-9169
1. Medicina-Periódico I. Hospital Universitário Getúlio Vargas II. Universidade Federal do Amazonas.
CDU 61(051)
Sumário
Editorial
11
Fernando Luiz Westphal
Artigos Originais
Perfil Clínico e Epidemiológico dos Pacientes Internados com Diagnóstico de Insuficiência
Cardíaca Crônica Internados no Centro de Referência em Cardiologia do Estado do Amazonas
13
José Ricardo Ferreira; Marlúcia do Nascimento Nobre; Yanna da Silva de Melo
Avaliação da Dor Pós-Operatória e do Grau de Satisfação dos Pacientes Submetidos à
Cirurgia para Colecistectomia
20
Raquel Normando Cunha; Mozer da Silva Campos; Juscimar Carneiro Nunes; Thiago Monteiro de Carvalho
Glomerulopatias Primárias no Amazonas: Avaliação de Biópsias Renais Percutâneas durante
20 Anos
28
Rebecca Souza Mubarac; Christiany Moreira Almeida; Ricardo Sena; Antônio Duarte Cardoso; Wilson Seffair
Bulbol; Rolando Vermehren
Relato de Caso
Cistadenocarcinoma Seroso Papilífero de Ovário: Relato de Caso
34
Manuel Rios Ruiz; Giovanna Lopes Colares; Sandra Karina Rodriguez Rios; Leonardo Simão Coelho
Hepatite Aguda Induzida por Propiltiouracil: Relato de Caso
40
Vinicius Renan Pinto de Mattos; Evelyn Santos de Paula; Mauro Martins Lippi; Aline Brasil Aranha; Maria
Cristina Tavares da Costa
Esclerose Múltipla com Rebaixamento do Nível de Consciência: Relato de Caso
44
Juliana Keth Hidalgo Farina Costa; Daniel Ribeiro; Nise Alessandra de Carvalho Sousa; Monique de Souza
Vitoriano; Giselle Ferreira Benevides; Clécida Mara Normando Rebouças
Hérnia de Spiegel: Relato de Caso
49
Rebeca Aparecida dos Santos Di Tommaso; Rubem Alves da Silva Neto; Priscila Cavalcanti Ballut; João José
Corrêa Bergamasco; Marcelo Henrique dos Santos; Tikara Hagiwara
Amiloidose de Laringe
54
Raimundo Monteiro Maia Filho; Luís Frederico Bonilla; Ziza Emi Sakamoto; Paulyne de Souza Viapina
Granuloma Glótico por Tubo de Montgomery
Andra Aleixo Aguiar; Lubyanka Ferreira Pereira Custódio; Márcia dos Santos da Silva; Renato Telles de Souza;
Fernando Luiz Westphal; José Corrêa Lima Neto
59
Múltiplos Fenômenos Embólicos Pulmonares e Periféricos Secundários à Tromboflebite de
Veia Jugular Interna: Um Relato de Caso de Síndrome de Lemierre
63
Mary Cristina Bentes Pontes; Victor de Sá Guimarães Fleury Machado; Lívia Garcia Mendonça de Oliveira;
Guilherme Augusto Pivoto João; Eduardo da Silva Ramos; Henrique Samuel Carvalho de Albuquerque
Schwannoma Gástrico Mimetizando Gist: Um Relato de Caso
69
Gerson Suguiyama Nakajima; Rubem Alves da Silva Neto; Marcos Vinícius Monteiro Lins de Albuquerque;
João José Corrêa Bergamasco; Mônika Maya Tsuji Nishikido; Diego da Costa Matos
Hérnia de Amyand: Relato de Caso
74
Paulo Inácio Diniz; Giselle Macedo; Vitor Montenegro; Ricardo Estevam; João Bergamasco; Isabela Carvalho
Tratamento Cirúrgico de Corpo Estranho no Brônquio Principal Esquerdo
77
Fernando Luiz Westphal; Luís Carlos de Lima; José Corrêa Lima Netto; Ricardo Augusto Monteiro Cardoso;
Lincoln José Trindade Martins
Timolipoma, Uma Massa Mediastinal Gigante: Relato de Caso
Fernando Luiz Westphal; Luiz Carlos de Lima; José Corrêa Lima Netto; Michel de Araújo Tavares; Ricardo
Augusto Monteiro Cardoso
82
Contents
Editorial
Fernando Luiz Westphal
11
Original Articles
Clinical and epidemiological profile of patients diagnosed with chronic heart failure
hospitalized in Amazonas State cardiology center
13
José Ricardo Ferreira; Marlúcia do Nascimento Nobre; Yanna da Silva de Melo
Evaluation of cholecystectomy undergone patients postoperative pain and satisfaction
degree
20
Raquel Normando Cunha; Mozer da Silva Campos; Juscimar Carneiro Nunes; Thiago Monteiro de Carvalho
Amazonas Primary Glomrulopathies: 20 Years Kidney Percutaneous Byopsies Review
28
Rebecca Souza Mubarac; Christiany Moreira Almeida; Ricardo Sena; Antônio Duarte Cardoso; Wilson Seffair
Bulbol; Rolando Vermehren
Case Report
Serous cystoadenocarcinoma papiliferous of ovary
34
Manuel Rios Ruiz; Giovanna Lopes Colares; Sandra Karina Rodriguez Rios; Leonardo Simão Coelho
Propylthiouracyl-induced hepatitis: case report
40
Vinicius Renan Pinto de Mattos; Evelyn Santos de Paula; Mauro Martins Lippi; Aline Brasil Aranha; Maria
Cristina Tavares da Costa
Multiple Sclerosis with Decreased Level of Consciousness: A Case Report
44
Juliana Keth Hidalgo Farina Costa; Daniel Ribeiro; Nise Alessandra de Carvalho Sousa; Monique de Souza
Vitoriano; Giselle Ferreira Benevides; Clécida Mara Normando Rebouças
Spiegel´s hernia: a case report
49
Rebeca Aparecida dos Santos Di Tommaso; Rubem Alves da Silva Neto; Priscila Cavalcanti Ballut; João José
Corrêa Bergamasco; Marcelo Henrique dos Santos; Tikara Hagiwara
Laryngeal amyloidosis
54
Raimundo Monteiro Maia Filho; Luís Frederico Bonilla; Ziza Emi Sakamoto; Paulyne de Souza Viapina
Glottic granuloma after Montgomery tube
Andra Aleixo Aguiar; Lubyanka Ferreira Pereira Custódio; Márcia dos Santos da Silva; Renato Telles de Souza;
Fernando Luiz Westphal; José Corrêa Lima Neto
59
Multiple Pulmonary and Peripheral Embolic Phenomena Secundary to Internal Jugular Vein
Trombophlebitis: A Lemierre’s Sindrome Case Report
63
Mary Cristina Bentes Pontes; Victor de Sá Guimarães Fleury Machado; Lívia Garcia Mendonça de Oliveira;
Guilherme Augusto Pivoto João; Eduardo da Silva Ramos; Henrique Samuel Carvalho de Albuquerque
Gastric Schwannoma Mimicking Gist: A Case Report
69
Gerson Suguiyama Nakajima; Rubem Alves da Silva Neto; Marcos Vinícius Monteiro Lins de Albuquerque;
João José Corrêa Bergamasco; Mônika Maya Tsuji Nishikido; Diego da Costa Matos
Amyand’s Hérnia: Case Report
74
Paulo Inácio Diniz; Giselle Macedo; Vitor Montenegro; Ricardo Estevam; João Bergamasco; Isabela Carvalho
Foreign body surgical treatment in the left main bronchus
77
Fernando Luiz Westphal; Luís Carlos de Lima; José Corrêa Lima Netto; Ricardo Augusto Monteiro Cardoso;
Lincoln José Trindade Martins
Thymolipoma, a giant mediastinal mass: a case report
Fernando Luiz Westphal; Luiz Carlos de Lima; José Corrêa Lima Netto; Michel de Araújo Tavares; Ricardo
Augusto Monteiro Cardoso
82
Editorial
A RHUGV encontra-se em expansão com muitos artigos sendo submetidos para avaliação
pelo Conselho Editorial. Nesse momento, estamos atingindo a estabilidade de um periódico que
alcançou credibilidade junto à comunidade científica, pois transmite a certeza de que os artigos
enviados serão analisados com o rigor científico necessário e condizente com o nível dos nossos
editores associados.
É claro que não possuímos ainda o número de artigos originais necessários para pleitearmos nossa
ascensão em uma base de dados nacional ou internacional, fato que conseguiremos à medida
que os Grupos de Pesquisa se estruturarem dentro do Hospital Universitário e na Faculdade de
Medicina. Vários aspectos estão previstos nesse contexto, desde a construção do novo hospital, a
implantação do Programa de Bolsas de Iniciação Científica do Hospital Universitário e das Escolas
de Saúde da Ufam.
É certo que precisamos dessa elevação de classificação para angariar novos artigos para a nossa
revista. O ingresso da RHUGV nas plataformas cientificas necessita de uma reformulação dos
artigos que devem ser a contextualização dos projetos de pesquisas realizados, seja no nível de
iniciação científica ou de pós-graduação.
Talvez possamos pleitear o ingresso nas plataformas de divulgação internacional quando a
comunidade do Hospital almejar algum incentivo para realizar pesquisa clínica, tais como carga
horária destinada à pesquisa ou financiamento para participação em Congressos.
Um dos fatores importantes de inclusão e manutenção da Revista HUGV na base de dados Qualis é
a publicação de trabalhos científicos de produções realizadas em Programas de Pós-Graduações.
Nesse momento, faço novamente um apelo aos coordenadores dos programas de pós-graduação
da Universidade Federal do Amazonas para que enviem seus trabalhos para a nossa Revista, pois
sabemos da existência de diversos trabalhos de conclusão de Mestrado que ficam nas prateleiras
das bibliotecas sem publicações, determinando uma diminuição na avaliação do Curso de PósGraduação pela Capes.
Os objetivos a serem cumpridos por nossa Revista HUGV são manter a qualidade do conteúdo:
o mérito científico de um jornal é a qualidade primária considerada na seleção para indexação.
Aspectos como a originalidade dos artigos, sua importância e validade, dentro do campo de
conhecimento, são elementos-chave para a aceitação de uma revista. A qualidade do trabalho
editorial a revista deve mostrar características que contribuam para a objetividade, credibilidade
e qualidade de seu conteúdo. Manter um percentual de 70 a 80% dos artigos de um número da
Revista como artigos originais e não relatos de caso como ocorre atualmente.
O Corpo Editorial da RHUGV está em constante renovação, isso porque estamos recebendo
novos colegas pós-graduados no Hospital, das diversas áreas da Saúde, com qualificação e com
determinação para desenvolver projetos de pesquisa. Já sabemos que a aprovação de Projetos
numa Instituição gera formação de pessoal, aquisição de tecnologia de ponta e permite ao Hospital
ter uma boa classificação junto aos órgãos governamentais.
Outro aspecto importante a ser ressaltado é o papel dos revisores, que não recebem remuneração
e a confecção de um parecer necessita de tempo das suas obrigações de trabalho e, mais
importante, dos seus momentos de lazer. Com frequência, uma revisão exige a consulta de
bibliografia complementar e a busca ativa de artigos adicionais. A complexidade de questões
| 11 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
metodológicas e testes estatísticos também podem exigir discussão do manuscrito com outros
colegas especializados nessas áreas. Além disso, todo esse processo deve ocorrer em tempo hábil,
idealmente dentro de um mês após a primeira submissão, e de duas semanas para as demais
apresentações.
Aos que tentam denegrir a imagem do periódico, falando que ele não tem valor, pois é Qualis C,
convido-os a participarem ativamente com propostas e apresentação de artigos originais para
conseguirmos uma classificação maior nos Periódicos Capes. Lembro-lhes ainda de que atualmente
a RHUGV é para a maioria dos Serviços do HUGV a única memória contextualizada existente.
A luta é constante e diária. Sabemos que a manutenção de um periódico atualmente é extremamente
difícil, visto que a objetividade e praticidade do atual modo de vida não permite que atividades
não rentáveis possam ser desenvolvidas com desgaste do precioso tempo, fator que afasta mentes
brilhantes do espírito científico. De outra forma, temos a convicção de que a manutenção da
pesquisa e da academia são pontos cruciais para o desenvolvimento da ciência em nossa região
e sempre teremos pessoas imbuídas desse sentimento que permitirão que essa caminhada não
decline.
| 12 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
PERFIL CLÍNICO E EPIDEMIOLÓGICO DOS
PACIENTES INTERNADOS COM DIAGNÓSTICO
DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CRÔNICA
INTERNADOS NO CENTRO DE REFERÊNCIA EM
CARDIOLOGIA DO ESTADO DO AMAZONAS
CLINICAL AND EPIDEMIOLOGICAL PROFILE OF PATIENTS DIAGNOSED WITH
CHRONIC HEART FAILURE HOSPITALIZED IN AMAZONAS STATE CARDIOLOGY CENTER
José Ricardo Ferreira,* Marlúcia do Nascimento Nobre,** Yanna da Silva de Melo***
Resumo
Objetivo: Traçar o perfil clínico e epidemiológico dos pacientes com diagnóstico de Insuficiência
Cardíaca Crônica (IC), internados no Centro de Referência em Cardiologia do Estado do Amazonas no
período de janeiro a dezembro de 2011. Métodos: Trata-se de um estudo retrospectivo, descritivo
e observacional de pacientes com Insuficiência Cardíaca crônica, hospitalizados no período de
janeiro a dezembro de 2011, no Hospital Universitário Francisca Mendes (HUFM) da Universidade
Federal do Amazonas (Ufam). Foi feito o levantamento dos prontuários por meio do código
internacional de doenças (CID) de IC e realizado o levantamento estatístico para traçar o perfil
epidemiológico (idade, sexo, naturalidade e procedência), e o perfil clínico (principal etiologia,
causa da descompensação clínica, classe funcional da admissão e da alta hospitalar). Resultados:
Foram avaliados um total de 151 prontuários, destes entraram para o estudo 61 pacientes. A
média de idade foi de 57,19 anos, sendo 69,49% do sexo masculino e 30,51% do sexo feminino. A
naturalidade predominante foi do Amazonas com 77,97%. Em relação à procedência dos pacientes,
44,07% foram provenientes da capital, 33,90% provenientes do interior do Estado e 22,03%
provenientes dos demais Estados do Brasil. A principal etiologia identificada da IC foi a Isquêmica
com 47,58% seguida da Valvulopatia com 8,47%, tendo como maior causa de descompensação
um novo evento isquêmico com 50,85%, seguida das doenças infecciosas com 27,12%. A classe
funcional predominante na admissão hospitalar foi a III com 45,76% e na alta hospitalar foi a II com
64,41%. Conclusão: A cardiopatia isquêmica foi a principal causa de insuficiência cardíaca, sendo
um novo evento isquêmico o maior responsável pela descompensação clínica e nova internação
hospitalar.
Palavras-chave: Insuficiência Cardíaca, Perfil Clínico e Epidemiológico.
Abstract
Objective: Describe the clinical and epidemiological profile of chronic heart failure patients
admitted in the Amazonas State cardiology center between january and december/2011.
Methods: This is a retrospective, descriptive, observational study of chronic heart failure patiets,
hospitalized between january and december/2011, at Francisca Mendes University Hospital
(HUFM) of the Federal University of Amazonas (UFAM). The inmates survey was conducted through
the international code of diseases (ICD) of heart failure records and performed the statistical
* Especialista em Clínica Médica/Cardiologia e residente de Ecocardiografia do HUGV.
** Preceptora titular da Cadeira de Cardiologia e Ecocardiografia do HUGV.
*** Graduada em Medicina pela Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
| 13 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
PERFIL CLÍNICO E EPIDEMIOLÓGICO DOS PACIENTES INTERNADOS COM DIAGNÓSTICO DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CRÔNICA
INTERNADOS NO CENTRO DE REFERÊNCIA EM CARDIOLOGIA DO ESTADO DO AMAZONAS
research to delineate the epidemiological (age, sex, nationality and origin), and clinical profiles
(main etiology, because of clinical decompensation, functional class admission and discharge).
Results: We evaluated a total of 151 records, from these, 61 entered the study. The average age
was 57.19 years, which 69.49% were male and 30.51% female. The Amazon palce of birth was
predominant with 77.97%. Regarding the origin of the patients 44.07% were from the capital,
33.90% from the State countryside and 22.03% from the other regions of Brazil. The main etiology
of HF was identified Ischemic with 47.58% followed by Valvulopathy to 8.47%, with the largest
cause of decompensation a new ischemic event with 50.85%, followed by the Infectious Diseases
with 27.12%. The predominant functional class at admission was III with 45.76% and at discharge
was II with 64.41%. Conclusion: Ischemic heart disease was the leading cause of heart failure, a
new ischemic event was most responsible for clinical decompensation and new hospitalization.
Keywords: Cardiac Insufficiency, Clinical and Epidemiological Profile.
Introdução
A Insuficiência Cardíaca (IC) é uma síndrome
clínica complexa de caráter sistêmico,
definida como disfunção cardíaca que ocasiona
inadequado suprimento sanguíneo para atender
necessidades metabólicas tissulares, na presença
de retorno venoso normal, ou fazê-lo somente
com elevadas pressões de enchimento.¹
condições socioeconômicas, ainda existem
formas de IC associadas à doença de Chagas,
endomiocardiofibrose e a cardiopatia valvar
reumática crônica, que são situações especiais
de IC em nosso meio.¹
Infecções virais prévias e exposição a drogas
(álcool,
quimioterápicos,
antidepressivos
tricíclicos etc.) também podem levar à
miocardiopatia dilatada.5
Estudos de prevalência estimam que 23 milhões
de pessoas no mundo tenham IC e que dois Perto de 20 a 30% dos casos de IC com fração
milhões de casos novos são diagnosticados de ejeção reduzida nos adultos, a causa
exata não é conhecida e esses pacientes são
anualmente.²
referidos como portadores de miocardiopatia
Segundo os dados do Sistema Único de Saúde, dilatada idiopática. A insuficiência cardíaca
tivemos perto de 398 mil internações por é caracterizada por uma fase crônica na
insuficiência cardíaca no ano de 2000 com 26 mil qual o paciente apresenta-se estável e outra
mortes. Essas internações correspondem a mais fase de descompensação aguda marcada por
de 30% das internações e consumiram 33% dos reinternação hospitalar frequente.3-9
gastos com doenças do aparelho circulatório,
tornando-se a primeira causa de internação de Múltiplos fatores de riscos estão presentes
simultaneamente e precedem o surgimento da
pacientes > 65 anos no SUS.³
IC, o que torna difícil selecionar a causa básica
No último Censo (2010), observa-se crescimento e definir ações específicas de planejamento de
da população idosa no Brasil e, portanto, com saúde, de modo a reduzir sua incidência.6,10
potencial crescimento de pacientes em risco ou
Em nosso meio, há carência de dados
portadores de insuficiência cardíaca.4
epidemiológicos, clínicos e terapêuticos sobre a
A IC consiste na via final comum de várias doença, o que dificulta a definição de prioridades
doenças, como, por exemplo: hipertensão para elaboração de estratégias preventivas.²
arterial sistêmica, diabetes e coronariopatias.²
No Brasil, a principal etiologia da IC é a Este trabalho tem como objetivo principal
cardiopatia isquêmica crônica associada à identificar esse perfil clínico e epidemiológico,
podermos
conhecer
melhor
as
hipertensão arterial. Em determinadas regiões para
características
da
Região
Norte
do
país
e
traçar
geográficas do país e em áreas de baixas
| 14 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Ferreira et al
medidas para melhoria do atendimento ao
portador de IC.
Tipo de estudo e local da pesquisa
Por meio do Serviço de Arquivo Médico e
Informações em Saúde (Same) do HUFM o
número de pacientes e seus respectivos
prontuários, foram levantados por intermédio
do CID (Código Internacional de Doenças) de
insuficiência cardíaca.
Trata-se de um estudo retrospectivo, descritivo
e observacional de pacientes com Insuficiência
Cardíaca crônica, hospitalizados no período
de janeiro a dezembro de 2011, no Hospital
Universitário Francisca Mendes (HUFM) da
Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
Inicialmente foram encontrados um total de
151 prontuários que apresentavam CID de
insuficiência cardíaca, 52 não foram incluídos
no estudo por não serem IC o diagnóstico,
apesar de estarem cadastrados com o código de
insuficiência cardíaca.
Pacientes e Métodos
Restaram 99 pacientes; destes, cinco foram
excluídos por serem hospitalizados para
realização de procedimentos não relacionados
Os critérios de inclusão escolhidos foram:
com a IC, 18 foram excluídos por terem fração
preencher os critérios clínicos de Framingham4
de ejeção maior a 50% e 15 foram excluídos
para IC, terem fração de ejeção abaixo
por não terem a fração de ejeção preenchida
de 50% pela ecocardiografia transtorácica,
no questionário, restando para o estudo 61
estarem hospitalizados no período de janeiro
pacientes.
a dezembro de 2011, pertencentes a qualquer
classe funcional, sexo ou idade.
Posteriormente foi realizada a coleta dos
dados, por meio de uma ficha (Figura 1), que
Os critérios de exclusão foram: diagnóstico
continha informações sobre: nome do paciente,
não definido de insuficiência cardíaca (ex:
idade, sexo, naturalidade, data do diagnóstico
DPOC exacerbado), pacientes internados para
de insuficiência cardíaca, tempo de internação,
procedimentos eletivos não relacionados à
etiologia da insuficiência cardíaca, fração
IC descompensada (ex: troca do gerador em
de ejeção, número de internações, causa da
usuários de marcapasso).
descompensação clínica, classe funcional NYHA
na admissão e alta e número de óbitos.
Critérios de inclusão e exclusão
Procedimentos e coleta dos dados
FICHA DE COLETA DE DADOS
1. Nome do paciente:_______________________________________________________
2. Idade: (
)
Sexo: M ( )
F( )
3. Naturalidade:___________________________________________________________
4. Procedência:____________________________________________________________
5. Data do diagnóstico de insuficiência cardíaca:__________________________________
6. Tempo de internação:_____________________________________________________
7. Etiologia da Insuficiência Cardíaca na admissão:________________________________
8. Fração de ejeção:_________________________________________________________
9. Número de internações:___________________________________________________
10. Causa da descompensação clínica:__________________________________________
11. Classe funcional NYHA na admissão:_______________________________________
12. Classe funcional NYHA na alta hospitalar:___________________________________
13. Óbito: não ( ) sim ( )
Figura 1: Ficha de Coleta de Dados
| 15 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
PERFIL CLÍNICO E EPIDEMIOLÓGICO DOS PACIENTES INTERNADOS COM DIAGNÓSTICO DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CRÔNICA
INTERNADOS NO CENTRO DE REFERÊNCIA EM CARDIOLOGIA DO ESTADO DO AMAZONAS
Analise estatística
financiamento.
A análise estatística foi realizada utilizando o
software Minitab versão 15.0, no qual se fez a
análise exploratória dos dados.
Resultados
Aspectos éticos
O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética
em Pesquisa Humana e Animal da Universidade
Federal do Amazonas, protocolo número
179.782/2012, e não houve fontes externas de
A média de idade da amostra estudada foi de
57,19 anos com um desvio padrão de 14,23,
variando de 18 e 81 anos, sendo 69,49% do sexo
masculino e 30,51% do sexo feminino (Figura 2).
A naturalidade predominante foi do Amazonas
com 77,97%, seguido do Pará com 8,47%, Ceará
e Rio Grande do Norte com 5,08% do Ceará, e
Rio de Janeiro com 3,39%.
Figura 2: Porcentagem de pacientes com IC de acordo com o sexo.
Em relação à procedência dos pacientes estão
assim distribuídos: 44,07% provenientes da
capital, 33,90% provenientes do interior do
Estado do Amazonas e 22,03% provenientes dos
demais Estados do Brasil (Figura 3).
Figura 3: Procedência de pacientes internados com IC.
A principal etiologia identificada entre os com 6,78%, a periparto com 5,08% e as demais
pacientes foi a Isquêmica com 47,58% seguida da etiologias com 1,69% (Figura 4).
Valvopatia com 8,47%, em seguida a idiopática
| 16 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Ferreira et al
Figura 4: Principais etiologias identificadas.
As principais causas de descompensação da IC
foram: novo evento isquêmico com 50,85%,
seguida das doenças infecciosas com 27,12%
e arritmias e não adesão ao tratamento com
6,78% (Figura 5).
Figura 5: Principais causas de dencompensação da IC.
Dentre as causas infecciosas o predomínio foi
de infecção do trato urinário (ITU) com 31,25%,
seguido de pneumonia com 25%.
Flebite, erisipela, pé diabético e infecção de
vias aéreas superiores todas tiveram a mesma
porcentagem de 6,25%. 12,5% não tiveram o
tipo de infecção especificada (Figura 6).
Figura 6: Principais causas infecciosas de descompensação clínica.
| 17 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
PERFIL CLÍNICO E EPIDEMIOLÓGICO DOS PACIENTES INTERNADOS COM DIAGNÓSTICO DE INSUFICIÊNCIA CARDÍACA CRÔNICA
INTERNADOS NO CENTRO DE REFERÊNCIA EM CARDIOLOGIA DO ESTADO DO AMAZONAS
A proporção da classe funcional (CF), segundo
a NYHA, na admissão foi de 45,76% em CF III e
40,68% na CF IV. A alta hospitalar foi de 64,41%
em CF II e 35,59% na CFI.
Discussão
Estudos sobre o perfil epidemiológico e clínico
do paciente com IC são escassos no Estado do
Amazonas o que dificulta na elaboração de
políticas de prevenção, controle e manejo dessa
síndrome.
De acordo com o estudo de Framingham,7 a
idade mais predisponente para o aparecimento
da IC foi acima de 60 anos. No presente estudo,
verificou-se que a média de idade foi 57,19
anos, variando de 18 e 81 anos, sendo a média
inferior aos encontrados por Framingham.
Quanto à distribuição por sexo, observouse que 69,49% eram do sexo masculino, esse
predomínio também foi observado no estudo de
Rassi e cols.8
Foi observado que houve predominância da
procedência dos pacientes da capital, mas
houve um número expressivo de atendimentos
de pacientes do interior do Estado, mostrando
o papel fundamental desse centro de referência
em cardiologia para o Estado do Amazonas.
A etiologia predominante foi a isquêmica, dado
semelhante à da literatura nacional, seguido de
valvopatia. A principal causa de descompensação
foi um novo evento isquêmico seguido de
infecção. Esse dado mostra a necessidade de
se intensificar o tratamento e seguimento mais
minucioso dos pacientes coronarianos.
Dentre as causas infecciosas de descompensação
da IC, o destaque ficou por conta da infecção
urinária e pneumonia, outro dado similar à
encontrada na literatura nacional.
Em geral, os dados encontrados neste trabalho
foram similares aos da literatura nacional,
mas foi observada uma significativa exclusão
de prontuários durante a elaboração do
trabalho, que se deu principalmente da não
compatibilidade do CID na admissão e a real
doença do paciente e da falta de algumas
informações nos prontuários médicos.
Isso demonstra a necessidade de elaboração de
mais trabalhos na área e do comprometimento
no preenchimento completo dos dados dos
pacientes.
Mesmo com essa limitação observada neste
trabalho, seus resultados podem auxiliar na
elaboração de políticas públicas para prevenção
de doenças cardiovasculares, sobretudo a
miocardiopatia isquêmica, visando reduzir
internações hospitalares, cirurgias, mortalidade
e o alto custo gerado por essas hospitalizações.
Referências
1. Bocchi EA, Marcondes-Braga FG, Ayub-Ferreira
SM, Rohde LE, Oliveira WA, Almeida DR e cols.
Sociedade Brasileira de Cardiologia. III Diretriz
Brasileira de Insuficiência Cardíaca Crônica. Arq
Bras Cardiol 2009; 93(1 supl.1): 1-71.
2. Nogueira PR, Rassi S, Corrêa KS. Perfil
Epidemiológico, Clínico e Terapêutico da
Insuficiência Cardíaca em Hospital Terciário.
Arq Bras Cardiol. 2010; [on-line]. Ahead print,
p. 0-0.
3. Tavares LR, Victer H, Linhares JM, Barros
CM, Oliveira MV, Pacheco LC, Viana CH, Pereira
SB, Silva GP, Mesquita ET. Epidemiologia da
Insuficiência Cardíaca Descompensada em
Niterói. Projeto Epica. Niterói. Arq Bras Cardiol
2004, volume 82(n.º 2): 121-4.
4. Bocchi EA, Marcondes-Braga FG, Bacal F,
Ferraz AS, Albuquerque D, Rodrigues D, et al.
Sociedade Brasileira de Cardiologia. Atualização
da Diretriz Brasileira de Insuficiência Cardíaca
Crônica, 2012. Arq Bras Cardiol 2012: 98(1 supl.
1): 1-33.
5. Walsh CR, Larson G M, Larson, Evans JC,
Djousse L, Elisson RC, Vasan RS, Levy D. Alcohol
consumption and risk for congestive heart
failure in the Framingham Heart Study. Ann
Intern Med, v. 136, 2002. p. 181.
6. Lessa I. Epidemiologia da hipertensão arterial
| 18 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Ferreira et al
sistêmica e da insuficiência cardíaca no Brasil.
Rev Bras Hipertensão 2001; 8(4): 383-92.
7. Ho KKL, Pinsky JL, Kannel WB, Levy D. The
epidemiology of heart failure: the Framingham
study. J Am Coll Cardiol. 1993; 22(Suppl A):
6-13.
8. Rassi S, Barreto ACP, Porto CC, Pereira
CR, Calaça BW, Rassi DC. Sobrevida e fatores
prognósticos na insuficiência cardíaca cistólica
com início recente dos sintomas. Arq Bras
Cardiol. 2005; 84(4): 309-13.
9. Braga JCV, Reis F, ARAS R, Costa ND, Bastos
C, Silva R. Aspectos clínicos e terapêuticos da
insuficiência cardíaca por doença de Chagas.
Arq Bras Cardiol. 2006; 86(4): 297-302.
10. Latado AL, Passos LCS, Braga JCV, Santos
A, Guedes R, Moura SS, et al. Preditores
de letalidade hospitalar em pacientes com
insuficiência cardíaca avançada. Arq Bras
Cardiol. 2006; 87(2): 185-92.
| 19 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AVALIAÇÃO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA
E DO GRAU DE SATISFAÇÃO DOS
PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA PARA
COLECISTECTOMIA
EVALUATION OF CHOLECYSTECTOMY UNDERGONE PATIENTS
POSTOPERATIVE PAIN AND SATISFACTION DEGREE
Raquel Normando Cunha,* Mozer da Silva Campos,** Juscimar Carneiro Nunes,*** Thiago Monteiro de Carvalho****
Resumo
Objetivos: O presente estudo tem o objetivo de avaliar a incidência de dor aguda e o grau
de satisfação do paciente com o tratamento recebido no pós-operatório. Métodos: A população
estudada foi composta de pacientes cirúrgicos submetidos à colecistectomia no período de sete
meses no Hospital Universitário Getúlio Vargas. Os pacientes foram abordados após 24 horas do
término da cirurgia e questionados sobre a presença de dor em algum momento e, em caso
positivo, classificaram-na dentro da escala visual analógica (EVA) da dor. Perguntas adicionais sobre
a vontade de ter recebido mais medicações analgésicas e o grau de satisfação com o tratamento
analgésico recebido foram inclusas no questionário. Resultados: Quando questionado sobre a dor,
apenas 14,09% pacientes relataram ausência de dor, 50,34% pacientes queixaram dor leve, 30,87%
dor moderada e 4,70% dor intensa. Apesar da alta incidência, com um total de 72% dos pacientes
queixando-se de dor aguda pós-operatória, 77,85% dos pacientes afirmaram que não necessitavam
de mais medicamentos analgésicos e 81,88% mostraram-se satisfeitos com o tratamento recebido.
Conclusão: A medicina focada em seu aspecto de doença finda por não tratar como prioridade
a dor do paciente. Até o próprio absorve esse conceito, conforma-se e julga ser aceitável a dor
pós-operatória. Dentro de suas expectativas, o paciente não está ciente do grau de analgesia que
merece receber. Esse cenário precisa mudar, o paciente deve expressar sua dor e uma equipe
multidisciplinar, composta por equipe de enfermagem, médicos cirurgiões e anestesiologistas,
deve estar capacitada para atendê-los.
Palavras-chave: Dor aguda, Dor, Analgesia, Satisfação.
Abstract
Objectives: This study aims to assess the acute pain incidence and the patient’s satisfaction
degree with the treatment received postoperatively. Methods: The study population consisted of
cholecystectomy undergone patients in the period of seven months at University Hospital Getúlio
Vargas. Patients were addressed 24 hours after the surgery end, asked about the pain presence
at some point, if so, rated it within the visual analogue scale of pain. Additional questions about
the desire of receiving more analgesics and satisfaction with the analgesic treatment received
were included in the questionnaire. Results: When asked about pain, only 14,9% patients reported
no pain, 50,34% patients complained mild pain, 30,87% moderate pain and 4,70% severe pain.
*Graduada em Medicina (Ufam), médica residente de Anestesiologia (HUGV)
**Acadêmico de Medicina (Ufam).
***Graduado em Medicina (Ufam), especialista em Anestesiologia (SBA/AMB/CFM), mestrado (Unifesp), doutorado (Unesp). Professor da disciplina
de Anestesiologia da Faculdade de Medicina e supervisor do Programa de Residência Médica em Anestesiologia da Universidade Federal do Amazonas (Ufam). Professor da disciplina de Anestesiologia Clínica da Universidade do Estado do Amazonas (UEA).
**** Graduado em Medicina (UFRR), médico residente de Anestesiologia (HUGV).
| 20 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AVALIAÇÃO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA E DO GRAU DE SATISFAÇÃO DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA PARA COLECISTECTOMIA
Despite the high incidence, with 72% patients complaining of acute postoperative pain, 77,85%
of patients stated that they did not need more painkillers and 81,88% were satisfied with the
treatment received. Conclusion: The medicine focused on their appearance of illness, ending not
treat as a priority the patient’s pain. Even the patient absorbing this concept conforms to it and
thinks about postoperative pain as a common outcome. Within their expectations, the patient
is not aware about the acceptable analgesia degree. This scenario needs to change, the patient
should express their grief and a multidisciplinary team consisting of nursing staff, surgeons and
anesthesiologists should be trained to serve them well.
Keywords: : Acute pain, Pain, Analgesia, Satisfaction.
Introdução
Apesar dos avanços no arsenal terapêutico para
analgesia, a dor pós-operatória ainda é muito
frequente e permanece sendo uma causa de
sofrimento para o paciente cirúrgico. Alguns
dos fatores que contribuem para esse fato é o
conformismo do paciente e a grande preocupação
dos médicos com os efeitos adversos das drogas.
A educação tanto dos pacientes quanto da
equipe multidisciplinar assistente, dentre eles
técnicos de enfermagem, enfermeiros, médicos
cirurgiões e médicos anestesiologistas, trará
ganhos na assistência ao paciente. A graduação
da dor com o uso da escala analógica visual é de
grande valia e o seu uso rotineiro contribui para
o tratamento satisfatório.1,2,3,4,5
A dor, seja aguda ou crônica, quando
inadequadamente tratada, tem repercussões
negativas psicológicas, econômicas e sociais
para os pacientes, seus familiares e para a
sociedade. Logo, está justificado o empenho
em promover analgesia satisfatória com uso de
protocolos e uma equipe treinada para oferecer
amparo ao paciente com dor.5,6,7,8
Métodos
Este é um estudo prospectivo, descritivo, tipo
corte transversal aonde foram submetidos
à pesquisa pacientes cirúrgicos do Hospital
Universitário Getúlio Vargas que realizaram
cirurgia para colecistectomia no período de
1.º/4/2013 a 31/10/2013. Foram inclusos na
pesquisa pacientes com estado físico ASA I, ASA
Procedimentos cirúrgicos levam a grandes II e ASA III, sem limite de faixa etária, tanto do
alterações na hemostasia do corpo causando sexo masculino quanto feminino. Foram exclusos
hipercatabolismo,
hipercoagulabilidade
e do estudo pacientes que realizaram seu pósinflamação. Esse quadro sem intervenção operatório em Unidade de Terapia Intensiva e
oportuna leva ao aumento da frequência aqueles que não compreenderam a metodologia
cardíaca, da resistência vascular sistêmica, da pesquisa. As técnicas anestésicas foram as
de catecolaminas circulantes elevando o risco usualmente empregadas pelo corpo clínico
de infarto do miocárdio e acidente vascular do Serviço de Anestesiologia bem como a
cerebral. Outras complicações possíveis são analgesia pós-operatória também não sofreram
sangramento, náuseas e vômito, dor, íleo interferências, sendo mantida a prescrição
paralítico, fadiga, distúrbios do sono e da pelos médicos responsáveis pela condução do
mecânica respiratória. Esse quadro compõe a paciente na enfermaria pós-cirúrgica. O estudo
resposta endócrino-metabólica ao trauma e cada foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética
um desses sintomas e complicações contribui em Pesquisa da Ufam.
para o aumento da morbidade e permanência
do paciente da instituição hospitalar no pós- Os pacientes selecionados para o estudo
operatório. Intervenções com o intuito de responderam ao questionário informando seus
abolir essa resposta fisiológica é recomendável dados pessoais e no pós-operatório foram
e nesse campo o tratamento da dor ganha abordados na enfermaria após 24 horas de
importância.1,2,5
pós-operatório. Nessa ocasião, o paciente foi
questionado se houve dor em algum momento
| 21 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Cunha et al
após a cirurgia e se a resposta for positiva,
classificaram-na por meio da escala visual
analógica de dor (EVA). Em uma pontuação que
varia de 0 a 10, é considerado dor leve quando
atribuído os escores 0, 1 e 2, é considerado dor
moderada, quando atribuído valores 3, 4, 5, 6 e 7
e, por último, é considerado dor intensa quando
atribuído valores 8, 9 e 10. Adicionalmente,
foram questionados sobre grau de satisfação
com o tratamento analgésico oferecido e se
desejariam ter recebido mais medicamento
para o tratamento da dor. Dados de prontuário
como idade, sexo, índice de massa corporal,
estado físico, pressão arterial, frequência
cardíaca, tipo de anestesia a que o paciente
foi submetido e se a cirurgia foi realizada
por videolaparoscopia ou laparotomia, foram
anotados no momento da abordagem.
As informações foram registradas em um banco
de dados, sendo utilizado o programa Epi
Info. As análises estatísticas serão realizadas
por meio de testes do qui-quadrado e t de
student ou teste de Mann Whitney para testar
diferenças entre variáveis categóricas e
contínuas, respectivamente. Métodos padrões
de análise para estudos descritivos serão
conduzidos. A análise dos dados foi iniciada
com descrição estatística simples, IC 95% e
testes de significância foram empregados para
validar essas proporções encontradas. A curva
de sobrevida foi formulada a partir da análise
de Kaplan-Meier.
Resultados
Um total 149 pacientes participaram do estudo
respondendo ao questionário proposto. A faixa
etária incluiu pacientes adolescentes (2,68%),
adultos (74,50%) e idosos (22,82%), do sexo
feminino (87,25%) e masculino (12,75%).
Durante o período de coleta de dados houve
colecistectomias videolaparoscópicas (28,19%) e
por laparotomia (71,81%) e a técnica anestésica
escolhida foi variável, sendo anestesia geral
balanceada (85%), anestesia combinada de geral
+ peridural (11%), bloqueio peridural isolado
(2%) e anestesia geral venosa total (3%).
Quando questionado sobre a dor, apenas 21
(14,09%) pacientes relataram não ter sentido
nenhuma dor, 75 (50,34%) pacientes queixaram
dor leve, 46 (30,87%) dor moderada e 7 (4,70%)
dor intensa. Apesar da alta incidência de dor no
pós-operatório, com um total de 128 pacientes
(72%) queixando-se de dor em algum momento
das primeiras 24 horas de pós-operatório, 77,85%
dos pacientes afirmaram que não necessitavam
de mais medicamentos analgésicos e 81,88%
afirmaram que estavam satisfeitos com o
tratamento que receberam.
A relação entre a dor referida pelo paciente
e o tipo de anestesia a que ele foi submetido
mostrou que daqueles que receberam bloqueio
regional
peridural,
nenhum
apresentou
queixa de dor intensa no pós-operatório,
porém não houve significância estatística
conforme representado no Gráfico 1. A relação
da dor com o tipo de cirurgia mostrou que
proporcionalmente os pacientes submetidos
a cirurgias videolaparoscópicas evoluíam com
menor intensidade da dor na escala visual
analógica (EVA) conforme a Gráfico 2.
Gráfico 1: Relação entre o tipo de anestesia x intensidade da dor (p-valor = 0.8261).
| 22 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AVALIAÇÃO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA E DO GRAU DE SATISFAÇÃO DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA PARA COLECISTECTOMIA
Gráfico 2: Relação entre o tipo de cirurgia e a intensidade da dor (p-valor = 0.2357).
O estado físico dos pacientes variou de P1 a P3,
sendo 90 (60,40%) pacientes em estado físico
ASA I, 37 (24,83%) em estado físico ASA II e 22
(14,65%) pacientes em estado físico ASA III. Os
pacientes em estado físico P3 foram os que
mais queixaram dor, com um total de 95,45%
afirmando sentir dor ao questionamento. Esses
dados estão demonstrados no Gráfico 3 e não
houve relevância estatística.
Gráfico 3: Relação entre o estado físico ASA x intensidade da dor (p-valor = 0.1254).
Os resultados mostraram uma alta incidência de
dor mesmo naqueles pacientes que receberam
analgésicos
potentes
no
pós-operatório
imediato conforme demonstrado no Gráfico 4.
Dos pacientes que receberam opioides, 84,33%
relataram ter sentido dor, enquanto aqueles
que receberam sua analgesia com outras classes
de medicamentos, como anti-inflamatórios não
esteroides e analgésicos, 87,87% referiram dor
aguda nas primeiras 24 horas.
| 23 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Cunha et al
Gráfico 4: Relação entre o uso de opioides x intensidade da dor (p-valor = 0.9397).
Discussão
suas expectativas, o paciente não está ciente
do grau de analgesia que merece receber. Esse
A dor aguda está presente em todo o mundo, cenário precisa mudar, o paciente deve ser
em países desenvolvidos e naqueles em orientado a expressar sua dor e deve existir uma
desenvolvimento. Independentemente de sua equipe multidisciplinar, composta por médicos
etiologia, seja dor no período pós-operatório, cirurgiões, médicos anestesiologistas e equipe
dor em pacientes com câncer ou dor ocasionada de enfermagem capacitada para atendê-los.3,4,5
por traumatismo em serviços de urgência/
emergência, o alívio da dor tem sido inadequado. No estudo em questão, 35,57% relataram
Apesar de todo o conhecimento da fisiopatologia dor e a classificaram como de moderada à
da dor e do grande arsenal terapêutico intensa segundo a escala visual analógica. Esse
disponível, o sucesso do tratamento da dor dado mostra que o estudo feito no Hospital
encontra-se mais teórico do que prático.5,7,8,9,10 Universitário Getúlio Vargas, assim como em
diversos estudos já realizados com esse mesmo
A medicina atual focada em seu aspecto de enfoque, a analgesia está sendo insuficiente
doença e seus mecanismos fisiopatológicos para o nível de dor apresentado pelo paciente.
finda por não tratar como prioridade a dor do Apesar de ser claramente possível otimizar a
paciente. Mais importante que o conforto e terapêutica nessa ocasião, 97,32% dos pacientes
bem-estar deste, recebe enfoque a cicatrização declararam-se satisfeitos ou muito satisfeitos
da ferida cirúrgica, presença de fístulas e débito com a analgesia que lhes foi prescrita. Isso
dos drenos. Estudos apontam que mais de 40% reflete o que foi acima citado, o julgamento de
dos pacientes em pós-operatório apresentam dor que a dor é parte normal do processo anestésicode moderada à severa intensidade revelando o cirúrgico, está enraizada culturalmente
grande índice de falha terapêutica. Os principais tornando-se um problema de difícil manejo.3,4,5
fatores para esse controle inapropriado são
médicos com pouca experiência, mitos sobre A analgesia pós-operatória é um grande passo
a adição e temor de complicações após alta para diminuir a morbidade do paciente e trazer
conforto em sua estada hospitalar. Permite ao
hospitalar.3,5,10,11
paciente a deambulação precocemente com
Até o próprio paciente absorve esse conceito prevenção de doenças tromboembólicas como
e conforma-se com o fato, supondo ser normal tromboembolismo pulmonar e trombose venosa
e aceitável a dor pós-operatória. Dentro de profunda, assim como permite a fisioterapia
| 24 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AVALIAÇÃO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA E DO GRAU DE SATISFAÇÃO DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA PARA COLECISTECTOMIA
respiratória prevenindo a atelectasia e
infecções pulmonares. Uma complicação
digna de preocupação é dor crônica póscirúrgica. Esta ocorre mais frequentemente
após toracotomias para ressecção pulmonar,
herniorrafias inguinais e mastectomias, e
são fatores de risco reconhecidos para essa
síndrome intensidade e persistência da dor
aguda pós-operatória não tratada. A síndrome
da dor crônica prende o paciente ao serviço de
saúde, levando-o a repetidas consultas durante
várias semanas ou meses sem resolutividade. A
dificuldade do tratamento traz ao paciente e
à equipe cirúrgica certo grau de insatisfação e
frustração. Logo, a prevenção dessa condição
sempre será o melhor caminho.1,2,6,7,8
cada droga irá agir por meio de mecanismos
de ação distintos aplicando-se os princípios
anteriormente citados. Essa redução da dose
possibilita baixa incidência de efeitos adversos
visto que há uma relação direta entre eles.4,10,12
Cada procedimento cirúrgico tem a própria
característica e risco pós-operatório; logo, o
uso da analgesia combinada deve ser avaliado
individualmente para cada cirurgia visando
reduzir suas eventuais consequências clínicas.
Temos como exemplo o uso de opioides em
baixas doses associados a bloqueio peridural
para cirurgias do aparelho digestivo, pois nessas
cirurgias há potencial risco de desenvolvimento
de íleo paralítico. Assim como seria benéfico
medicamentos analgésicos não opioide em
Há três pontos que devem ser levados em cirurgias de abdome superior e naquelas por
consideração na abordagem da dor pós- videolaparoscopia onde há maior prevalência de
operatória: a terapia com analgesia multimodal, náuseas e êmese. Outro caso a ser considerado é o
protocolos específicos para cada procedimento uso de drogas não anti-inflamatórias em cirurgias
baseado em evidências; e o requerimento da otorrinolaringologia pela possibilidade de
analgésico individual do paciente. O ponto- sangramento, e uso preferencial de técnicas
chave desses protocolos não está somente em anestésicas regionais associada à analgesia
diminuir a dor, mas também em reduzir os sistêmica em cirurgias torácicas com o intuito de
efeitos adversos dos medicamentos analgésicos manter gradiente de ventilação/perfusão com
trazendo qualidade ao pós-operatório.4,12
volumes e capacidades pulmonares adequados,
prevenir hipoxemia, atelectasias e pneumonia
A analgesia multimodal ou balanceada surgiu no pós-operatório.4,12,13
trazendo benefícios, tendo como princípios
os efeitos aditivos e sinérgicos das drogas Atenção especial deve ser direcionada para
analgésicas. A combinação de drogas favorece certas cirurgias e, especialmente, nas primeiras
a diminuição da dose de cada uma, pois 24 horas de pós-operatório conforme Figura 1
abaixo:
Figura 1: Demonstrativo do potencial de dor de cada cirurgia.
| 25 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Cunha et al
Salvo a tolerância de dor de cada paciente, podese notar que a colecistectomia por laparotomia
tem potencial para causar dor intensa nas
primeiras 48 horas, o que tornaria necessário
um esquema analgésico adaptado para esse
nível de dor. Já a cirurgia por videolaparoscopia
tem um potencial menor para dor, podendo
assim a terapia analgésica ser realizada sem
medicamentos opioides.12,13
A percepção da intensidade da dor e a necessidade
de tratamento são bastante variáveis e deve
ser avaliada separadamente. Alguns fatores são
sabidamente preditores de dor no pós-operatório
como presença de dor aguda ou crônica antes
da cirurgia, distúrbios do humor (níveis altos
de ansiedade ou estados depressivos), estado
físico ASA III ou IV e idade menor que 21 anos.
Quanto ao sítio cirúrgico, a intensidade da dor
é maior em cirurgias torácicas seguidas por
cirurgias em abdome superior, abdome inferior
e cirurgias ortopédicas. O paciente deve ser
orientado quanto ao procedimento cirúrgico
e o que acontecerá em seu pós-operatório,
só essa simples informação já diminui o seu
nível de ansiedade. Ele deve estar ciente de
que existe uma equipe apta para atendê-lo na
enfermaria e que o alívio da dor faz parte do
seu tratamento.2,4,12,13,14,15
Existe uma escada da dor proposta pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) em 1996
que nos ajuda a manusear a terapia da dor.
Para dor considerada leve, ou seja, aquela com
escore de 1-4 na escala visual analógica, devese usar analgésicos comuns de baixa potência
como dipirona e paracetamol associados ou não
a fármacos anti-inflamatórios não esteroides
+ adjuvantes. Para dor classificada como
moderada, ou seja, com escore de 5-7, devemse usar fármacos opioides fracos associados a
anti-inflamatórios não esteroides + adjuvantes.
Para dor considerada intensa, ou seja, com
escore de 8-10 na escala, sugere-se iniciar
com opioides fortes + anti-inflamatórios não
esteroides + adjuvantes e, se necessário, poderá
ser realizados métodos invasivos para o alívio
da dor, como bloqueios anestésicos periféricos
ou regionais.4,16
Um caminho de forte incentivo é a analgesia
controlada pelo paciente, nesta o paciente
comanda uma bomba de infusão contínua de
analgésicos. Essa modalidade traz conforto e
tranquilidade ao paciente, já que ele mesmo
diz quando e quanto de analgésico necessita.
Está fortemente indicada na analgesia pósoperatória, diminuindo o tempo entre a demanda
e a oferta da medicação, além de permitir uma
concentração plasmática constante e mais
apropriada do fármaco, evitando doses que
propiciam efeitos indesejáveis.1,2,6,7
Segundo informações coletadas no nosso estudo,
não houve grandes diferenças na incidência
nem mesmo na intensidade da dor naqueles
pacientes que utilizaram fármacos opioides e
naqueles que utilizaram sua analgesia somente
com analgésicos comuns e anti-inflamatórios
não esteroides. Alguns questionamentos podem
ser feitos na tentativa de explicar tal fato.
Foi usada a escala visual analógica da dor? O
opioide estava bem indicado nos casos em que
foi utilizado? Quando utilizado, foi prescrito
de modo sistemático ou como medicação de
resgate? Nesta última situação sendo necessário
primeiro o paciente sentir dor para depois
receber a medicação. Esses questionamentos
permanecem e será de grande valia novos
estudos com o intuito de respondê-los.16
Conclusão
A dor envolve complexas reações fisiológicas
com manifestações autonômicas e psicológicas
negativas como mal-estar, sensação de fadiga,
aumento do consumo de oxigênio, espasmos
musculares, má perfusão tecidual, liberação
hormonal de cortisol e glucagon e aumento do
catabolismo de uma maneira geral.1,2,4,5
A dor é um sintoma de difícil mensuração,
cada indivíduo a sente de sua maneira e com
graus de intensidade variáveis. Talvez por essa
variabilidade encontramos resultados desiguais
no estudo, como exemplo nos pacientes com
queixa de dor intensa e outros sem queixas
álgicas apesar de terem sido submetidos ao
mesmo procedimento cirúrgico e tratamento
analgésico. A valorização da resposta de
cada paciente é fundamental para o sucesso
do tratamento e a escala visual analógica
| 26 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AVALIAÇÃO DA DOR PÓS-OPERATÓRIA E DO GRAU DE SATISFAÇÃO DOS PACIENTES SUBMETIDOS À CIRURGIA PARA COLECISTECTOMIA
juntamente com a escada da dor da OMS orienta
a terapêutica medicamentosa.5,12,15
Dessa maneira, os pacientes cirúrgicos do
Hospital Universitário Getúlio Vargas seriam
melhor amparados quanto as suas necessidades
físicas e psicológicas, aumentando seu grau de
satisfação e bem-estar. É esperado que o alívio da
dor pós-operatória leve a desfechos favoráveis
como redução de disfunções orgânicas, da
morbidade e consequente diminuição do tempo
de internação hospitalar. Dados estatísticos
ainda não são suficientes para provar impactos
sobre a mortalidade.1,2,4,8
Referências
1. Cavalcanti I, Cunha L, Abrão M, Sarmento
R. Tópicos de anestesia e dor. Rio de Janeiro:
Saerj, 2011. p. 445-474.
2. Cangiani L, Posso I, Potério G, Nogueira C.
Tratado de Anestesiologia. 6.ª ed. São Paulo:
Saesp, 2006. p. 379-485.
3. Iuppen LS, Sampaio FH, Stadñik CMB.
Satisfação dos pacientes com a implantação do
conceito dor, o quinto sinal vital, no controle
da dor pós-operatória. Rev Dor São Paulo, 2011;
12(1): 29-34.
4. White P, Kehlet H. Improving postoperative
pain management. Anesthesiology 2010; 112:
220-5.
5. Brennan F, Carr D, Cousins M. Pain
Management: A fundamental human right. Pain
Medicine, 2007.
6. Joshi GP, White PF. Management of acute
and postoperative pain. Curr Opin Anaesthesiol
2001; 14: 417-421.
7. Power I. Recent advances in postoperative
pain therapy. British Journal of Anesthesia 2005;
95(1): 43-51.
8. Apfelbaum J, Chen C, Mehta S, Gan T.
Postoperative pain experience: Results from
a national survey suggest postoperative pain
continues to be undermanaged. Anesth Analg
2003; 97: 534-40.
9. Joshi GP, White PF. Management of acute
and postoperative pain. Curr Opin Anaesthesiol
2001; 14: 417-421.
10. Ballantyne J. Managing acute pain in the
developing world. International Association for
the study of pain (IASP), Pain Clinical Updates,
vol. XIX, Issue 3, june, 2011.
11. Sommer M, de Rijke JM, van Kleef M et al.
The prevalence of postoperative pain in a sample
of 1490 surgical inpatients. Eur J Anaesthesiol
2008; 25: 267-274.
12. Usichenko I, Rottenbach I, Kohlmann T,
Julich A., Lange J, Mustea A, Engel G, Wendt
M. Implementation of the quality management
system improves postoperative pain treatment:
a
prospective
pre-/post-interventional
questionnaire study. British Journal of Anesthesia
2013; 110(1): 87-95.
13. Couceiro T, TSA et al. Prevalência e influência
do sexo, idade e tipo de operação na dor pósoperatória. Rev. Bras. Anestesiol. vol. 59, n. 3,
Campinas, may/june, 2009.
14. Uchiyama K, Kawai M, Tani M et al.
Gender differences in postoperative pain after
laparoscopic cholecystectomy. Surg Endosc
2006; 20: 448-451.
15. Gesbershagen H, Rothaug J, Kalkman C,
Meissner W. Determination of moderate-tosevere postoperative pain on the numeric rate
scale: a cut-off point analysis applying four
different methods. British Journal of Anaesthesia
2011; 107(4): 619-26.
16. Daudt A, Hadlich E, Facin M, Aprato R,
Pereira R. Opioides no manejo da dor – uso
correto ou subestimado? Serviço de Oncologia do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Faculdade
de Medicina da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Rev Ass Med Brasil 1998; 44(2):
106-10.
| 27 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GLOMERULOPATIAS PRIMÁRIAS NO AMAZONAS:
AVALIAÇÃO DE BIÓPSIAS RENAIS PERCUTÂNEAS
DURANTE 20 ANOS
AMAZONAS PRIMARY GLOMRULOPATHIES: 20 YEARS KIDNEY PERCUTANEOUS
BYOPSIES REVIEW
Rebecca Souza Mubarac,* Christiany Moreira Almeida, * Ricardo Sena, * Antônio Duarte Cardoso,** Wilson Seffair Bulbol, **Rolando Vermehren**
Resumo
Introdução: As glomerulopatias representam importante causa de doença renal em estágio terminal
no mundo, porém no Brasil ainda não dispomos de um registro nacional, mas diversas são as
tentativas de reunir informações sobre a distribuição e comportamento das doenças glomerulares.
Pacientes e métodos: Foram avaliadas retrospectivamente 1.033 biópsias renais durante 20
anos (março de 1993 a abril de 2012), em pacientes internados no Hospital Universitário Getúlio
Vargas, em Manaus, Amazonas, Brasil, todas realizadas por meio de agulha e pistola, guiadas por
ultrassonografia, sob anestesia local, exceto em crianças e retirados no mínimo dois fragmentos.
Desse total, 743 biópsias tiveram diagnóstico de glomerulopatias primárias ou secundárias e essas
serão o objetivo de análise deste trabalho. Resultados: A média de idade entre os pacientes foi
de 32,78 ± 16,56, variando entre dois e 82 anos, distribuídos entre 630 (61%) mulheres e 403 (39%)
homens. A glomerulosclerose segmentar e focal (GESF) foi a doença glomerular primária mais
frequente, diagnosticada em 99 pacientes (24,75%), seguida de Lesão Histológica Mínima (LM)
em 83 pacientes (20,75%) e Glomerulonefrite Membranosa (GNM) em 70 (17,50%). Conclusão: As
informações obtidas a partir deste estudo é uma contribuição importante para o entendimento da
prevalência e padrão de Glomerulopatias primárias no Estado do Amazonas. Poderá ser utilizado
como fonte de referência para mais investigação em áreas específicas de doenças renais.
Abstract
Introduction: The glomerulopathies represents an important cause of end-stage renal disease in the
world, regardless of several attempts to gather glomerular diseases information on its distribution
and behavior, Brazil still don´t have a national registry about this pathologies. Patients and
methods: Were evaluated retrospectively 1,033 renal biopsies for 20 years (march 1993 to april
2012), in patients hospitalized at the University Hospital Getúlio Vargas, in Manaus, Amazonas,
Brazil, all performed by needle gun, guided by ultrasound under local anesthesia and removed
at least two fragments. Of this total, 743 biopsies were diagnosed with primary or secondary
glomerulopathy. Results: The patients average age was 32,78 ± 16,56, ranging from 2 to 82,
distributed among 630 (61%) women and 403 (39%) men. The focal segmental glomerulosclerosis
was the most frequent primary glomerular disease, diagnosed in 99 patients (24,75%), followed by
low Histological Injury in 83 patients (20.75%) and Membranous Glomerulonephritis in 70 (17,50%).
Conclusion: The information obtained from this study is an important contribution to understanding
the primary Glomerulopathies prevalence and pattern in the State of Amazonas with the intention
of giving future survey data for specific kidney disease researches.pulse cyclophosphamide terapy.
Clinical treatment was initiated with antibiotic therapy and subsequently surgical cleaning.
*Médica(o) residente de Nefrologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas, Manaus, Amazonas, Brasil.
**Médico assistente do Serviço de Nefrologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas, Manaus, Amazonas, Brasil.
| 28 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GLOMERULOPATIAS PRIMÁRIAS NO AMAZONAS: AVALIAÇÃO DE BIÓPSIAS RENAIS PERCUTÂNEAS DURANTE 20 ANOS
Introdução
em região subcostal. Retirados no mínimo dois
fragmentos.
A biópsia renal percutânea tem contribuído
como método para diagnóstico das doenças
parenquimatosas renais, e também para a
classificação das doenças glomerulares e dos
mecanismos imunopatogênicos envolvidos.
Atualmente, a ultrassonografia auxilia na
realização dessas biópsias e permite precisar
o local de punção e diagnosticar possíveis
complicações.1,2
Após o procedimento, o local puncionado sofria
compressão manual durante 10 minutos. Os
pacientes permaneceram internados e em
repouso absoluto no leito durante 24 horas, sendo
que, nas seis primeiras horas, eram mantidos em
decúbito dorsal horizontal e a pressão arterial
aferida de 1/1hora, com observação constante
da cor da urina, em frascos separados. Na
semana seguinte à biópsia, foi recomendado
As glomerulopatias representam importante repouso relativo. O tempo de internação dos
causa de doença renal em estágio terminal pacientes variava de acordo com a presença de
no mundo.1 Segundo o Censo da Sociedade hematúria ou a necessidade de compensação
Brasileira de Nefrologia, as glomerulopatias clínica da doença de base, mas em média era
estão em terceiro lugar (11,4%) entre as causas de 72 horas principalmente após a introdução
de doença renal em estágio terminal com da técnica de biópsia realizada por agulha e
necessidade de terapia substitutiva renal.3 guiada por ultrassonografia, pois diminui o risco
Somente na Região Norte do Brasil existe de complicações e de insucesso na coleta do
uma prevalência de 279 pacientes por milhão material.
da população de tratamento dialítico,3 sem
contar os pacientes que estão em tratamento O procedimento de uma forma geral pode
trazer complicações desde hematúria discreta,
conservador.
hematúria maciça, hematoma perirrenal,
O objetivo deste trabalho é identificar o perfil choque hipovolêmico e óbito. Esses dados não
das glomerulopatias no Estado do Amazonas no foram avaliados neste trabalho.
decorrer de 20 anos de estudo em pacientes
internados no Hospital Universitário Getúlio Desse total, 743 biópsias tiveram diagnóstico
de glomerulopatias primárias ou secundárias e
Vargas, em Manaus, Amazonas, Brasil.
essas serão o objetivo de análise deste trabalho.
Utilizou-se, para esse fim, a classificação das
Pacientes e métodos
glomerulopatias da Organização Mundial de
Foram avaliadas retrospectivamente 1.033 Saúde. Modificada em 1995 e para Nefrite Lúpica,
biópsias renais, incluindo rins nativos e enxertos a classificação da Sociedade Internacional de
4
renais, realizadas durante 20 anos (março de Nefrologia de 2003.
1993 a abril de 2012), em pacientes internados
no Hospital Universitário Getúlio Vargas, em
Manaus, Amazonas, Brasil.
As biópsias, desde o ano 2000, são todas
realizadas por meio de agulha e pistola,
guiadas por ultrassonografia, sob anestesia
local, exceto em crianças que são submetidas
à sedação por anestesistas em centro cirúrgico,
além da anestesia local. Antes desse período,
eram realizadas com marcação por intermédio
de radiografias simples e marcação anatômica,
a cerca de 4 centímetros da coluna vertebral,
As indicações de biópsia foram: síndrome
nefrótica,
hematúria
persistente,
glomerulonefrite rapidamente progressiva,
nefrite lúpica, doenças metabólicas com
alteração renal (proteinúria ou elevação de
creatinina) e lesão renal aguda persistente.
A análise baseou-se nos seguintes parâmetros:
idade, sexo, frequência dos diversos tipos
histológicos de glomerulopatias primárias e
secundárias (Figura 1).
| 29 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Mubarac et al
PROTOCOLO DE COLETA DE DADOS
NOME
IDADE
SEXO
ANO DA BIÓPSIA
DIAS INTERNADOS
INDICAÇÃO DA BIÓPSIA
QUANTIDADE DE GLOMÉRULOS (MATERIAL SUFICIENTE?)
PRESENÇA DE LESÃO RENAL AGUDA
( )SIM
( ) NÃO
PRESENÇA DE HEMATÚRIA ISOLADA
( ) SIM
( ) NÃO
PADRÃO HISTOPATOLÓGICO ( ) LESÃO PRIMÁRIA
( ) BX NORMAL
( ) INFILTRADO LINFOIDE
( ) NEFRITE TÚBULO-INTERSTICIAL
( ) LESÃO SECUNDÁRIA
( ) MATERIAL INSUFICIENTE
( ) ENXERTO RENAL ( ) NTI + NTA
GLOMERULOPATIA PRIMÁRIA
( ) DÇ MEMBRANA FINA
( ) GESF
( ) GLOMERULOESCLEROSE DIFUSA
( ) GN CRESCÊNTICA ( ) GN MEMBRANOPROLIFERATIVA
( ) GN MEMBRANOSA
( ) GN PROLIFERATIVA DIFUSA ( ) GN ENDOCAPILAR
( ) GN PROLIFERATIVA MESANGIAL ( ) LHM ( ) N. C1q ( ) N. IgA ( ) N. IgM
( ) GN CRÔNICA ( ) NÃO CLASSIFICÁVEIS
LES (CLASSE 2003)
()I
( ) II ( ) III ( ) IV ( ) IV+V ( ) V ( ) VI
LES E SD NEFRÓTICA
( ) SIM
( ) NÃO
Figura 1: Protocolo de coleta de dados
Todas as amostras de tecido renal foram
processadas para microscopia óptica (HE, PAS,
prata metanamina e tricrômio de Masson)
e imunofluorescência direta, sendo para
tal incubadas com soro anti-imunoglobulina
humana (IgG, IgA e IgM), antifibrinogênio,
anticomplemento (C3, C4, C3b, C3d e C1q) e
anticadeias leves (kappa e lambda).
Os resultados foram dispostos em tabelas de
frequência e expressos como percentagens e
como média ± desvio padrão (X ± DP).
Resultados
Ao longo dos vinte anos de existência do Serviço
de Residência Médica em Nefrologia do Hospital
Universitário Getúlio Vargas, foram realizadas
1.033 biópsias renais. Desse total, 863 biópsias
(83,54%) foram em rins nativos e 170 biópsias
(16,46%) em enxertos renais. A média de idade
entre os pacientes foi de 32,78 ± 16,56, variando
entre dois e 82 anos, distribuídos entre 630
(61%) mulheres e 403 (39%) homens.
| 30 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GLOMERULOPATIAS PRIMÁRIAS NO AMAZONAS: AVALIAÇÃO DE BIÓPSIAS RENAIS PERCUTÂNEAS DURANTE 20 ANOS
Lesões
glomerulares
primárias
foram Membranosa (GNM) em 70 (17,50%).
observadas em 400 dos 1.033 casos (38,72%),
glomerulopatias secundárias em 343 (33,20%), O lúpus eritematoso sistêmico (LES) foi a
outros achados podem ser vistos na Tabela 1.
doença mais frequentemente diagnosticada
como causa de glomerulopatia secundária
Características
das
glomerulopatias (73,76%); além disso, a classe IV contribuiu
primárias podem ser vistas na Tabela 2. A com 24,79% do total das doenças glomerulares
glomerulosclerose segmentar e focal (GESF) foi (entre primárias e secundárias), constituindo-se
a doença glomerular primária mais frequente, no padrão histológico mais frequente no grupo
diagnosticada em 99 pacientes (24,75%), como um todo, e correspondeu a 71,9% dos
seguida de Lesão Histológica Mínima (LM) em casos de nefrite lúpica (Tabela 3).
83 pacientes (20,75%) e Glomerulonefrite
nf
Padrão Histopatológico
(%)
Biópsia normal6
0,58%
Glomerulopatia primária
400
38,72%
Glomerulopatia secundária
343
33,20%
Infiltrado linfoide
1
0,10%
Material insuficiente
46
4,45%
Nefrite túbulo-intersticial
22
2,13%
Nefrite tubular aguda
42
4,07%
Transplante renal
170
16,46%
NTI + NTA
3
0,29%
Total Geral
1.033
100,00%
Tabela1: Achados gerais de todas as 1.033 biópsias renais realizadas ao longo de 20 anos.
Gn Primária
Doença de Membrana Fina
Glomeruloesclerose Difusa
Glomeruloesclerose Segmentar e Focal
Gn Crescêntica
Gn Membranoproliferativa1
Gn Membranosa7
Gn Proliferativa Difusa
Gn Proliferativa Mesangial
Lesão Mínima8
Nefropatia por C1q
Nefropatia por IgA
Nefropatia por IGM
Não Classificáveis
Gn Crônica
Gnpd Endocapilar
Total Geral
nf
1
92
99
23
43
0
11
37
3
41
24
10
30
10
11
(%)
0,25%
,25%
24,75%
5,75%
,50%
17,50%
2,75%
9,25%
20,75%
,00%
6,00%
,25%
,75%
2,50%
2,75%
400
100,00%
Tabela 2: Diferenciação entre as glomerulopatias primárias. GN= glomerulonefrite;
GNPD= glomerulonefrite proliferativa difusa
| 31 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Mubarac et al
Tipos Histológicos (OMS)
nf
Classe I3
(%)
1,19%
Classe II
27
10,67%
Classe III
10
3,95%
Classe IV
182
71,93%
Classe V
24
9,49%
Classe IV + V
4
1,58%
Classe VI
3
1,19%
253
100,00%
Total Geral
Tabela 3: Distribuição das lesões glomerulares em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico de acordo
com a classificação da Sociedade Internacional de Nefrologia de 2003 para nefrite lúpica, em biópsias renais realizadas no HUGV/AM.
Discussão
mesmo centro, publicado em 2006, quando a
GNM era a segunda glomerulopatia primária
16
A biópsia renal é mandatória para o diagnóstico mais prevalente. Atualmente, observamos que
etiológico da doença renal e, nos casos das a LM ultrapassa a GNM. Acreditamos que esse
glomerulopatias, define os padrões morfológicos aumento de prevalência esteja relacionando
da lesão, cujo tratamento poderá ser definido e ao maior número de biópsias renais realizadas
nos últimos anos em crianças e isso pode estar
guiado.5
associado à melhora no diagnóstico da rede básica
O Amazonas é a referência para diagnóstico, de Síndromes Nefróticas e encaminhamento
acompanhamento e tratamento das doenças precoce aos serviços de referência.
renais na Região Norte do Brasil, onde são
realizadas cerca de 50 a cem biópsias renais A frequência de nefropatia por IgA também tem
ao ano. A partir do exposto, as glomerulopatias aumentado (6%), quando comparada ao estudo
primárias são as mais prevalentes no nosso de 2006 e foi maior do que foi encontrado
8,16
A nefropatia por IgA é
estudo (38,72%) semelhante, de forma em Fortaleza (CE).
qualitativa e não quantitativa, ao encontrado considerada a glomerulopatia primária mais
por alguns autores no Paquistão ao longo de 18 comum em todo o mundo e a baixa prevalência
anos de acompanhamento6 e por outros autores no Brasil pode dever-se ao fato de não se fazer
biópsias rotineiramente em pacientes com
ao longo de 13 anos de acompanhamento.7
hematúria assintomática.8,14-17
Dentre as glomerulopatias primárias, a principal
lesão encontrada foi a GESF em 24,75% dos casos,
seguida de LM em 20,75%. Diferente das lesões
encontradas na literatura, incluindo dados
brasileiros, de ser a GESF a mais prevalente,
seguida de GNM em segundo lugar e somente
em terceiro LM.7-8 Dados europeus de biópsia
renal, no entanto, mostram menor prevalência
de GESF, fato que sugere predileção racial e
étnica.9-15
Notamos uma alteração no padrão das biópsias
renais em relação ao estudo realizado no
A casuística encontrada neste trabalho mostra
que a GESF foi a glomerulopatia primária mais
prevalente seguida de LM, diferente da descrição
em outros Estados brasileiros, em países
europeus, no Paquistão e do que foi encontrado
no mesmo centro de estudo. Porém mantemse as causas de glomerulopatias secundárias e a
Nefrite Lúpica classe IV continua em destaque.
Em conclusão, as informações obtidas a partir
deste estudo são uma contribuição importante
para o entendimento da prevalência e padrão
de glomerulopatias primárias no Estado do
| 32 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GLOMERULOPATIAS PRIMÁRIAS NO AMAZONAS: AVALIAÇÃO DE BIÓPSIAS RENAIS PERCUTÂNEAS DURANTE 20 ANOS
Amazonas. Poderá ser utilizado como fonte de
referência para mais investigação em áreas
específicas de doenças renais.
Referências
1. Couser WG. Pathogenesis of glomerular
damage in glomerulonephritis. Nephrol Dial
Transplant. 1998; 13(1): 10-5.
2. Donovan KL, Thomas DM. Experience with
a new method for percutaneous renal biopsy.
Nephrol Dial Transplant. 1991; 6: 731-3.
3. Sesso RCC, Lopes AA, Thomé FS, Lugon JR,
Watanabe Y, Santos DR. Diálise Crônica no Brasil
– Relatório do Censo Brasileiro de Diálise, 2011.
J Bras Nefrol. 2012; 34(3): 272-277.
10. Covic A, Schiller A, Volovat C et al.
Epidemiology of renal disease in Romania: a 10
year review of two regional biopsy databases.
Nephrol. Dial. Transplant. 2006; 21: 419-24.
11. Rychlik I, Jancova E, Tesar V et al. The Czech
registry of renal biopsies. Occurrences of renal
diseases in the years 1994-2000. Nephrol. Dial.
Transplant. 2004; 19: 3040-9.
12. Rivera F, Lopez-Gomez JM, Perez Garcia R.
Clinicopathologic correlations of renal pathology
in Spain. Kidney Int. 2004; 66: 898-904.
13. Schena FP. The Italian Group of Renal
Immunopathology. Survey of the Italian Registry
of renal biopsies. Frequency of the renal
diseases for 7 consecutive years. Nephrol. Dial.
Transplant. 1997; 12: 418-26.
4. Órgão Oficial Trimestral da Sociedade
Brasileira de Nefrologia. J Bras Nefrol volume
14. Naumovic R, Pavlovic S, Stojkovic D, BastaXXVII, n. 1, Supl. 1, maio, 2005.
Jovanovic G, Nesic V. Renal biopsy registry form
5. Kidney Disease Improving Global Outcomes a single centre in Serbia: 20 years of experience.
(KDIGO). Clinical Practice Guideline for Nephrol. Dial. Transplant. 2009; 24: 877-85.
Glomerulonephritis. Chapter 2: General
principles in the management of glomerular
disease. Kidney International Supplements.
2012(2): 156-162; doi: 10.1038/kisup. 2012: 15.
15. Polito MG, Moura LAR, Kirsztajn GM. An
overview on frequency of renal biopsy diagnosis
in Brazil: clinical and pathological patterns
based on 9617 native kidney biopsies. Nephrol
Dial Transplant. 2010; 25: 490-496.
6. Rabbani MA, Memon GM, Ahmad B, Memon
S, Tahir SA, Tahir S. Percutaneous Renal Biopsy
Resultus: a retrospective analysis of 511 16. Cardoso ACD, Kirsztajn GM. Padrões
consecutives cases. Saudi J Kidney Dis Transpl. histopatológicos das doenças glomerulares no
Amazonas. J Bras Nefrol. 2006; 28: 39- 43.
2012; 23(3): 614-18.
7. Mubarak M, Kazi JI, Naqvi R, Akhter F, Anqvi
SAA, Rizv SA. Pattern of renal diseases observed
in native renal biopsies in adults in a single
centre in Pakistan. Nephrology 2011; 16: 87-92.
8. Queiroz MMM, Silva Júnior GB, Lopes MSR,
Nogueira JOL, Correia JW, Jerônimo ALC.
Estudo das Doenças Glomerulares em Pacientes
Internados no Hospital Geral César Cals
(Fortaleza-CE). J Bras Nefrol. 2009; 31(1): 6-9.
17. Bahiense-Oliveira M, Malafronte P.
Epidemiologia das glomerulopatias. In: Barros
RT, Alves MAR, Dantas M, Kirsztajn GM, Sens YAS
editores. Glomerulopatias: patogenia, clínica e
tratamento. 2. ed. São Paulo: Sarvier; 2006. p.
55-63.
9. Carvalho E, do Sameiro Faria M, Nunes JPL,
Sampaio J, Valbuena C. Renal diseases: a 27year renal biopsy study. J. Nephrol. 2006; 19:
500-7.
| 33 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
CISTADENOCARCINOMA SEROSO PAPILÍFERO
DE OVÁRIO: RELATO DE CASO
SEROUS CYSTOADENOCARCINOMA PAPILIFEROUS OF OVARY
Manuel Rios Ruiz, Giovanna Lopes Colares, Sandra Karina Rodriguez Rios, Leonardo Simão Coelho
Resumo
Apresentamos um caso de uma paciente de 37 anos, oriunda, fumante crônica, multípara, com
amenorreia de um ano após o parto, com antecedente de amamentação esporádica que procurou atendimento por apresentar tumoração abdominal de rápido crescimento. Ao exame clínico
apresentava dispneia moderada, abaulamento abdominal no abdome inferior, sólida, levemente
dolorosa e pouco móvel à palpação. Realizada ultrassonografia pélvica e tomografia abdominal
evidenciando uma massa abdominal pélvica, volumosa; os marcadores tumorais B-HCG e CA 125
com valores aumentados. Foi realizada uma laparotomia exploradora evidenciando a presença de
uma massa ovariana à direita sendo realizada sua ressecção por histerectomia total, anexectomia bilateral e omentectomia; o resultado do estudo anatomopatológico foi cistadenocarcinoma
seroso papilífero. Foi derivada para tratamento e seguimento oncológico com quimioterapia complementar.
Palavras-chave: Cistadenocarcinoma, ovário, câncer, marcadores tumorais.
Abstract
Case report of 37 year-old female patient, chronic smoker, multiparous, with amenorrhea one
year after the labor, with antecedent of sporadic breast-feeding that it sought medical care after
presenting abdominal fast growth tumor. At the clinical exam it presented moderate dyspnea,
abdominal camber in the lower abdomen, solid, slightly painful and relative low mobility.
Accomplished pelvic ultrasound and abdominal computer tomography scan evidencing a pelvic
abdominal mass, bulky. The tumoral serologic markers B-HCG and CA 125 demonstrated increased
values. Exploring laparotomy was accomplished evidencing the presence of ovarian mass on
the right being accomplished her resection with total hysterectomy, bilateral anexectomy and
omentectomy; the result anatomopathological study was cistadenocarcinoma serous papilifer.
Patient was refered for oncologic treatment and complementally chemotherapy.
Keywords: Adenocarcinoma cist, ovary, cancer, tumoral markers.
Introdução
Apesar do carcinoma de ovário ser a segunda
neoplasia ginecológica mais comum, é
certamente a mais letal; com uma incidência
nos Estados Unidos de 15 casos para cada cem
mil mulheres entre 50 e 54 anos de idade por
ano, 35 casos para cada cem mil mulheres entre
70 a 74 anos; no Brasil, de oito casos para cada
cem mil mulheres na Região Sul, dois casos para
cada cem mil mulheres na Região Norte e uma
incidência mundial de 6,3 casos para cada cem
mil mulheres. De 70 a 75% dos casos de câncer
de ovário tem diagnóstico tardio; de 6-7%
das mulheres no momento do diagnóstico são
portadoras de massas anexiais assintomáticas.1,2
Dentro dos fatores de risco temos: períodos
ovulatórios prolongados, menarca precoce,
menopausa tardia todos relacionados com o
número aumentado dos períodos ovulatórios,
exposição de asbesto (produtos relacionados
como talco que pode estar contaminado com
| 34 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
CISTADENOCARCINOMA SEROSO PAPILÍFERO DE OVÁRIO: RELATO DE CASO
asbesto) fumo, álcool, fatores alimentares
(gordura animal, carne vermelha, café) e fatores
hereditários. Dentro dos fatores de proteção
temos: a ovulação bloqueada (gravidez,
amamentação, uso de anticonceptivos orais),
ligadura de trompas, histerectomia. Os grupos
etários mais afetados são as maiores de 50 anos
e nulíparas. São classificados em três grandes
grupos de acordo ao tipo de célula de origem:
neoplasias epiteliais (80-90% dos casos),
tumores de células germinativas e tumores de
células especializadas. Os tumores epiteliais
constituem cerca de 90% de todos os tumores
malignos, originando-se do epitélio que reveste
a superfície externa do ovário, destes os tumores
serosos são os mais comuns.1,2,3,4
O cistadenocarcinoma seroso é o mais
frequente de todos os tumores malignos do
ovário alcançando 35-40%, apresentam um
epitélio semelhante ao da tuba uterina que
secreta um líquido seroso, com tendência a
desenvolver tanto na superfície externa e
interna formações papilares, passando a se
chamar cistadenocarcinoma seroso papilífero.
Podem ser císticos, com áreas sólidas, bilaterais
em aproximadamente 50% dos casos podendo
alcançar grandes tamanhos. É uma doença de
diagnóstico tardio e de alta mortalidade em
seus estádios avançados, sendo assintomático
em fases iniciais.1,2,3 A ultrassonografia é
na atualidade o método propedêutico mais
solicitado para o diagnóstico diferencial de
tumores pélvicos mesmo com todos os avanços
médicos.2,5,6
macroscópico e o exame citológico da cavidade
abdominal que inclui a coleta de líquido
ascítico e lavado das goteiras parietocólicas e
a pelve.2,3,6
Relato de Caso
Paciente de 37 anos de idade, sexo feminino,
oriunda atendida no ambulatório de Ginecologia
do Hospital Santa Júlia, Manaus-AM. Refere
emagrecimento progressivo havia dois meses,
associado à dor pélvica, constipação, distensão
abdominal, náuseas, vômitos e dispneia. Sua
história gineco-obstétrica apresentou quatro
gestações sendo todos partos normais; menarca
aos 11 anos; ciclos menstruais regulares III/30
dias apresentando amenorreia desde seu último
parto havia um ano. Última colpocitologia
oncótica negativa a malignidade havia dois
anos; usuária de anticonceptivo injetável até
três meses atrás; tabagista há 17 anos.
Ao exame físico se mostra em regular estado
geral, lúcida, orientada no tempo e no espaço,
levemente hipocorada, dispneia moderada,
acianótica, sem linfonodomegalias, com
desnutrição moderada. Aparelho respiratório
com MV fisiológicos com diminuição no terço
inferior do hemitórax à esquerda. Aparelho
cardiovascular com RCR, BNF, sem sopros.
Abdome globoso, distendido com massa
abdominal volumosa localizada no abdome
inferior não dolorosa à palpação, pouco
móvel com presença de ascite sem irritação
peritoneal. A avaliação laboratorial inicial
apresenta o hemograma sem alterações;
Os tumores ovarianos continuam sendo um funções hepáticas e renais estáveis; marcadores
desafio para os ginecologistas porque não tumorais com valores elevados beta hCG de
se conseguiu uma redução significativa na 988 mUI/ml e Ca 125 de 125 U/ml. Método de
mortalidade provocada por essa doença. Sua imagens; tomografia de tórax: derrame pleural
incidência tem diminuído consideravelmente bilateral mais acentuada no lado esquerdo com
nas últimas décadas, porém é necessário avaliar atelectasia à esquerda por compressão sem
os fatores de risco e proteção para poder sinais de implante pleural. Ultrassonografia de
determinar uma possível causa. O tratamento abdome total apresenta massa sólida pélvica
do cistadenocarcinoma seroso papilífero é e tomografia computadorizada de abdômen
cirúrgico, e requer histerectomia total com mostra massa volumosa em topografia de
salpingo-ooforectomia
bilateral
associada ovário direito com componente sólido e líquido
à omentectomia com biópsias peritoneais (Figura1).
mediante a qual se realiza o estadiamento
| 35 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Ruiz et al
Figura 1: Imagem da massa abdominal na tomografia computadorizada de abdome.
Realizada toracocentese à esquerda, diagnóstica
e terapêutica; e submetida a tratamento
cirúrgico mediante laparotomia exploradora
realizando-se ressecção de massa tumoral de
618 gramas, medindo 14,5 x 10,5 x 7,0 cm
correspondendo ao ovário direito (Figuras
2 e 3), histerectomia total, anexectomia
bilateral (salpingo-ooforectomia bilateral) e
omentectomia. Presença de discreto volume de
líquido ascítico, cuja amostra foi encaminhada
para pesquisa de células neoplásicas. Paciente
evoluiu
satisfatoriamente
obtendo
alta
hospitalar no 4.º DPO. Resultado da pesquisa de
líquido pleural e ascítico para células neoplásicas
negativo.
O
laudo
anatomopatológico
confirmou cistadenocarcinoma seroso papilífero
moderadamente diferenciado com extensão
capsular. Ausência de comprometimento
neoplásico das trompas uterinas, ovário
esquerdo e omento.
Figura 2: Tumoração ovariana durante a ressecção cirúrgica.
| 36 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
CISTADENOCARCINOMA SEROSO PAPILÍFERO DE OVÁRIO: RELATO DE CASO
Figura 3: Imagem comparativa do tumor em relação ao tamanho uterino e ovariano contralateral.
Discussão
pacientes entre 55 e 74 anos, porém ainda não
é generalizado.5,6,7
A neoplasia maligna epitelial de ovário é o
segundo câncer mais comum do trato genital
feminino e a quinta causa de morte por câncer
em mulheres. No Brasil, o câncer de ovário ocupa
o terceiro lugar entre as neoplasias malignas
que acometem os órgãos genitais femininos,
sendo raro o aparecimento dela antes dos 30
anos de idade. Apresentam fatores de riscos
que se pode identificar por meio da história
clínica na suspeita diagnóstica como história de
neoplasias individuais e familiares; idade acima
de 65 anos, infertilidade e nuliparidade; os
contraceptivos orais por mais de quatro anos,
gestações múltiplas e amamentação estão
considerados como fatores protetores do câncer
de ovário.4,5,6
Quando estamos diante de uma paciente
suspeita de neoplasia de ovário, devemos iniciar
a investigação com uma boa história clínica
enfatizando a história familiar, ultrassonografia
transvaginal com Doppler e solicitação dos
marcadores oncogênicos principalmente o CA
125 e outros como alfafetoproteina e beta-hCG
que são menos específicos.6,8
Com os parâmetros de idade, as características
ultrassonográficas e valores de CA 125, podemos
determinar o Índice de Risco de Malignidade
(IRM). A idade avançada é diretamente
proporcional ao risco de malignidade com um pico
máximo entre 75 e 79 anos. A ultrassonografia
é o método propedêutico mais solicitado para
O câncer ovariano epitelial, embora tenha diferenciar os tumores pélvicos; determinando
ocorrido uma melhora significativa na sobrevida a presença e localização. A complexidade da
em cinco anos, não existe nenhum método ultrassonografia está diretamente relacionada à
confiável para seu rastreamento; a elevada maior risco de malignidade; sendo considerada
mortalidade e a pequena quantidade de casos complexidade, tumor com tamanho maior de 10
de câncer de ovário diagnosticados em estádios cm, presença de partes sólidas em seu interior,
iniciais tornam essencial a busca de métodos excrescências papilares, multilocularidade,
de rastreamento de identificação precoce septos, bilateralidade, ascite, metástase e
de doença. Tem grandes ensaios tratando de alterações de resistência vascular ao Doppler.
verificar a eficácia da associação da dosagem do O CA-125 é o marcador tumoral mais usado e
CA 125 sérica e a ultrassonografia transvaginal considerado positivo acima de 34U/ml, seu
observando uma redução na mortalidade de valor está diretamente proporcional ao risco de
| 37 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Ruiz et al
malignidade, não deve ser utilizado isoladamente
para diagnóstico por ser inespecífico. Ele é mais
utilizado no seguimento pós-operatório para
descartar recorrência e na monitorização da
evolução da doença durante e após tratamento
adjuvante.
O cálculo do IRM resulta da soma do índice
etário (IE) com o índice ultrassonográfico (IU) e
com o índice do CA 125 simplificado na seguinte
fórmula:
IRM = IE + IU + índice do CA-125.
A pontuação para o IE é: com menos de 40 anos
= 1 ponto; entre 40 e 49 anos = 2 pontos; com 50
ou mais anos = 3 pontos. Para o IU: ausência de
critérios de malignidade = 1 ponto; presença de
um critério de malignidade = 2 pontos; mais de
um critério de malignidade = 3 pontos. Para o
índice do CA-125: < de 35U/ml = 1 ponto; entre
35 e 64,9U/ml = 2 pontos; > 65U/ml = 3 pontos.
Devendo ser considerados tumores com alto
risco de malignidade os que apresentam IRM >
de 6 pontos com uma sensibilidade de 76,5% e
especificidade de 87,9%.5
Em estágios avançados o tratamento cirúrgico
está associado à terapia adjuvante com
quimioterapia sistêmica.6 A abordagem cirúrgica
videolaparoscópica ainda não é consenso,
porque sua manipulação indevida pode mudar o
estadiamento e prognóstico, indicando-se para
estadiamento em suas fases iniciais. Para tanto,
deve-se levar em consideração a experiência,
habilidade cirúrgica em videolaparoscopia,
o estágio da doença atual e conhecimentos
básicos em oncologia.9,10
No relato de caso, a paciente não tinha fatores
de risco predominantes para evoluir de forma
tão rápida e grave; porém no cálculo do IRM é 7
que indica alto risco de malignidade. Sua faixa
etária baixa indica pouco risco de malignidade,
porém as características ultrassanográficas e os
valores do CA 125 indicam o contrário.5
Pacientes
pós-operadas
por
carcinomas
ovarianos
devem
ser
acompanhadas
regularmente; além do minucioso exame clínico
geral, a ultrassonografia abdominal e pélvica
e radiografia de tórax devem ser efetuadas
trimestralmente no primeiro ano e cada seis
meses nos anos subsequentes. Os marcadores
A tomografia computadorizada (TC) do abdome tumorais têm, nessa fase, importante papel,
e a pelve com contraste por via oral e venosa pois quando alterados indicam a presença de
pode ser usada, ajudando a detectar focos metástases ou recidiva da doença.8 Um consenso
de doença intra-abdominal (metástases do National Cancer Institute recomenda uma
hepáticas), identificação de linfadenomegalia, história clínica cuidadosa e exame pélvico anual
comprometimento de órgãos adjacentes e o em todas as mulheres. Atualmente a tecnologia
comprometimento da parede pélvica importante tenta descobrir novos marcadores que possam
para definir a viabilidade de tratamento dar valor discriminatório entre mulheres
cirúrgico; podendo ser também utilizada a saudáveis e com câncer de ovário.6
ressonância magnética da pelve quando a TC
não puder esclarecer o quadro adequadamente. Referências
O uso da tomografia por emissão de pósitrons
(PET) está sendo avaliada para a detecção dos 1. Gebrim R. Ginecologia Oncológica. Rio de
locais em que a doença está apresentando Janeiro: Atheneu Editora, 1999: 358-389.
recorrência.6
2. Glauco B. Ginecologia oncológica. Manual
O tratamento do cistadenocarcinoma de ovário de Condutas. São Paulo: Fundação Antonio
é cirúrgico, em estágios iniciais da doença Prudente, 2010: 37-52.
o tratamento totalmente curativo; e requer
histerectomia total com salpingo-ooforectomia 3. Freitas F. Rotinas em Ginecologia. 6.ª ed.
bilateral associada à omentectomia com Porto Alegre: Artmed Editora, 2011: 478-497.
biópsias peritoneais, diafragmática bilateral,
das goteiras parietocólicas, do peritônio 4. Ristow CM, Yanamoto CT, Fávalo M. Fatores
pélvico e dos linfonodos para-aórticos e ilíacos. de risco e patogênese das neoplasias malignas
| 38 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
CISTADENOCARCINOMA SEROSO PAPILÍFERO DE OVÁRIO: RELATO DE CASO
epiteliais de ovário. Revista Brasileira de
Cancerologia 2006; 52(2): 185-195.
5. Fernandes LRA, Lippi UG, Baracat FF. Índice
de Risco de Malignidade para Tumores de
Ovário Incorporando Idade, Ultrassonografia e
o CA-125. Revista Brasileira de Ginecologia e
Obstetrícia 2003; 25(5): 345-351.
6. Cortinhas CF. Tratamento do Câncer de
Ovário. Programa de Atualização em Cirurgia.
Proaci. Porto Alegre: Editora Artmed, ciclo 6,
módulo 1, 2009: 127-150.
7. López-Olmos J, Navarro P. Carcinoma papilar
de la superfície serosa del Ovario. Clin Invest
Gin Obst. 2002; 29(9): 334-339.
8. Ribeiro L, Barros I, Alvoero L, Branco R,
Neto F, Távora I, Coutinho J, Pimentel A.
Cistadenocarcinoma do Ovário. A propósito de
um caso clínico. Medicina Interna 1995; 2(4):
233-237.
9. Reis RJ, Coelho FA, Zanato AB, Link CA,
Maestri D, Edelweiss IA. Videolaparoscopia para
o Tratamento de Câncer de Ovário de Baixo
Potencial de Malignidade: Quando Indicar?
Relato de Caso e Revisão da Literatura. Revista
Brasileira de Videocirurgia 2004; 2(2): 79-82.
10. Viscimi F. O tumor de ovário pode ser
abordado por Videolaparoscopia? Rev Ass Med
Brasil. 2001; 47(4): 279-280.
| 39 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HEPATITE AGUDA INDUZIDA POR
PROPILTIOURACIL: RELATO DE CASO
PROPYLTHIOURACYL-INDUCED HEPATITIS: CASE REPORT AND LITERATURE REVIEW
Vinicius Renan Pinto de Mattos,* Evelyn Santos de Paula,* Mauro Martins Lippi,* Aline Brasil Aranha,* Maria Cristina Tavares da Costa
**
Resumo
O Propiltiouracil é uma droga amplamente utilizada no tratamento dos distúrbios da tireoide. A
hepatite induzida por propiltiouracil se apresenta como uma séria complicação, ainda que rara, e
deve ser considerada em todo paciente recebendo essa droga que se apresente com sintomas de
disfunção hepática. O quadro clínico pode variar de rápida recuperação após interrupção da droga
até hepatite fulminante com insuficiência hepática e morte. Relata-se um caso de hepatite aguda
acometendo mulher de 38 anos em uso de propiltiouracil para tratamento de hipertireoidismo.
Causas virais, metabólicas e autoimunes foram excluídas. Houve remissão dos sintomas e melhora
laboratorial após pronta suspensão da droga.
Palavras-chave: Propiltiouracil, Hepatotoxicidade, Hepatite Induzida por Drogas.
Abstract
Propylthiouracil is a drug widely used in the treatment of thyroid disorders. Propylthiouracilinduced hepatitis presents as a serious complication, although rare, and should be considered
in all patients using this drug with symptoms of liver dysfunction. The clinical presentation may
range from rapid recovery after discontinuation of the drug to fulminant hepatitis with hepatic
failure and death. We report a case of acute hepatitis affecting a 38 years old woman using
propylthiouracil as therapy for hyperthyroidism. Viral, metabolic and autoimmune causes were
excluded. There was remission of the symptoms and laboratorial improvement after the prompt
discontinuation of the drug.
Keywords: Propylthiouracil, Hepatotoxicity, Drug-induced Hepatitis.
Introdução
pneumonite intersticial.1,2,3 A hepatotoxicidade
se apresenta como uma séria complicação,
O Propiltiouracil (PTU) vem sendo amplamente ainda que rara,2 tendo sido relatada como
utilizado no tratamento dos distúrbios da efeito adverso inicialmente em 1947.4 A
tireoide desde sua apresentação em 1946.1 hepatite induzida por PTU deve ser considerada
Apesar de ter sido utilizado com segurança por em todo paciente recebendo essa droga que
muitos anos, diversas reações adversas foram se apresente com sintomas de disfunção
relatadas, incluindo agranulocitose, leucopenia, hepática, as quais podem incluir icterícia, dor
anemia hemolítica, anemia aplásica, coagulação no quadrante abdominal superior direito, malintravascular disseminada, vasculite cutânea e estar, náuseas, vômitos e anorexia. O quadro de
* Médica residente em Ginecologia e Obstetrícia, Hospital Universitário Francisca Mendes.
** Professora de Tocoginecologia da Universidade do Estado do Amazonas.
| 40 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HEPATITE AGUDA INDUZIDA POR PROPILTIOURACIL: RELATO DE CASO
hepatotoxicidade por PTU pode variar de rápida
recuperação após interrupção da droga até
hepatite fulminante com insuficiência hepática
e morte.2,3,5-8
Relato de Caso
EAL, feminino, parda, com 38 anos,
diagnosticada com hipertireoidismo havia cinco
anos, em tratamento irregular. Trinta dias antes
da admissão hospitalar, iniciou terapia com
propiltiouracil (PTU) na dose de 300 mg/dia,
evoluindo após cerca de três semanas com quadro
de icterícia, colúria, acolia, mialgias, fadiga e
astenia. Negava uso de outras drogas, exceto
Propranolol na dose de 120 mg/dia. Tampouco
apresentava histórico de etilismo, uso de drogas
ilícitas, exposição a sangue ou derivados, bem
como exposição a outros fatores de risco para
hepatites virais. Ao exame físico, apresentavase em regular estado geral, icterícia importante
de pele e escleras, exoftalmia com mobilidade
ocular intrínseca preservada, tireoide palpável
com presença de sopro e frêmito bilateralmente,
hepatomegalia discreta e ausência de outros
estigmas de hepatopatia crônica. A avaliação
laboratorial anterior ao início da terapia
com PTU mostrava-se sem alterações. Nova
avaliação laboratorial diante do quadro clínico
apresentou os seguintes resultados: Aspartato
Aminotransferase (AST): 300U/L (VR: 12-38
U/L); Alanina Aminotransferase (ALT): 800UL
(VR: 7-41U/L); Fosfatase Alcalina (FA): 613U/L
(VR: 35-104U/L), Gamaglutamil Transpeptidase
(GGT): 181 (VR: 8-41U/L); Bilirrubinas Totais: 21
mg/dl (VR: 0,3-1,3 mgdl); Bilirrubina Direta: 12
mg/dl (VR: 0,1-0,4 mg/dl); Bilirrubina Indireta:
9 (VR: 0,2-0,9 mg/dl). Por conta do conhecido
potencial hepatotóxico do PTU, optou-se pela
suspensão da droga, mantendo-se o propranolol
(120 mg/dia) para controle das manifestações
clínicas da tireotoxicose. Os marcadores
sorológicos para hepatite A (anti-HAV Total),
hepatite B (anti-HBc IgM, HBsAg) e hepatite C
(anti-HCV) apresentaram-se negativos, bem
como os testes sorológicos para Citomegalovírus
(CMV), Epstein-Barr Vírus (EBV), e o fator
antinuclear (FAN). Após suspensão da droga,
a paciente apresentou melhora progressiva
da sintomatologia e do padrão laboratorial.
Foi submetida a tratamento definitivo do
hipertireoidismo com radioiodoterapia (I131).
Pela boa evolução do quadro recebeu alta
hospitalar após período de nove dias de
internação, ainda com quadro de astenia,
porém com melhora do padrão laboratorial (AST:
221U/L; ALT: 537U/L; FA: 172U/L; GGT: 152 U/L;
Bilirrubina Total: 12,59 mg/dl; Bilirrubina Direta:
8,73 mg/dl/ Bilirrubina Indireta: 3,86 mg/dl).
Manteve acompanhamento ambulatorial, e no
seguimento apresentou remissão dos sintomas,
com avaliação laboratorial após quatro meses
demonstrando normalização das provas de
função hepática (AST: 15U/L; ALT: 26U/L; FA:
152U/L; GGT: 61U/L).
Discussão
A incidência estimada de hepatotoxicidade
associada ao PTU varia de 0,1 a 1,2%.1,9 A maior
parte dos eventos tóxicos ocorre de um a três
meses após o início da terapia (podendo variar
de seis a 450 dias),3,10 com a dose média de 300
mg/dia, tanto em crianças quanto em adultos.10
A fisiopatologia da lesão hepática é controversa.
Para uns, a observação da normalização das
aminotransferases pela redução da dose de PTU
sugere que o efeito tóxico é dose dependente,12
contrariando a assertiva de outros, que sugerem
tratar-se de reação imunológica desencadeada
por linfócitos sensibilizados pelo PTU.2,3,12 Uma
revisão de 1995 põe a hepatite induzida por PTU
como uma reação idiossincrática secundária a
mecanismos imunológicos, hipersensibilidade,
além de toxicidade direta da droga entre as
hipóteses patogênicas.13 Durante o tratamento
pelo PTU a participação do sistema imunológico
pode ser constatada pela presença de anticorpos
antinucleares (FAN) e antitireoidianos, reação
autoimune que desaparece pela suspensão da
droga,1 podendo levar a confusão com hepatite
autoimune.1,14
Até 72% dos pacientes com hipertireoidismo
podem apresentar elevação de pelo menos
uma enzima hepática.9,11,12 A elevação de
transaminases
parece
ser
multifatorial,
e inclui consumo hepático de oxigênio
aumentado, inadequada compensação do fluxo
sanguíneo, congestão e redução da produção
de ácidos biliares.3,9,12 Mesmo em casos de
hipertireoidismo grave, porém as bilirrubinas
| 41 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Mattos et al
e
as
aminotransferases
apresentam-se
1,15
apenas levemente alteradas.
e a elevação
de
transaminases
não
necessariamente
contraindica o uso de drogas antitireoidianas.11,12
A hepatotoxicidade por PTU tem sido relatada
em pacientes tanto com função hepática normal
quanto anormal nos testes pré-tratamento, e
nenhum fator específico pode identificar o risco
de hepatite em um paciente.3,11,16
– ausência de insulto hepático agudo como
choque ou sepse; 5 – ausência de evidência
de doença hepática crônica; e 6 – ausência de
outras drogas administradas, especialmente
hepatotoxinas conhecidas.5
Necrose hepatocelular inespecífica é o
achado comum da biópsia hepática.12 Baseado
na severidade do processo, os achados
patológicos podem variar de sinais precoces de
Aumento transitório nas enzimas hepáticas inflamação hepatocelular até necrose hepática
seguindo o início de tratamento com PTU submaciça.2,3,9,12
ocorre em 15-28% dos casos.9,11 Essas elevações
são transitórias, reduzindo com a diminuição No reconhecimento de hepatotoxicidade, o
da dose da medicação ao longo do tempo, com PTU deve ser interrompido.3,12 Com terapia
os pacientes permanecendo assintomáticos, de suporte, a maioria dos pacientes deve se
contradizendo observações prévias de que recuperar. Contudo, a literatura não é clara
a hepatite induzida por PTU é evento raro e se a rápida interrupção do tratamento garante
comumente severo.11
uma boa evolução do quadro hepático. Deve ser
realizado seguimento clínico intensivo, já que a
Em 1997, um estudo de revisão analisou 30 disfunção pode progredir mesmo com a suspensão
casos relatados de hepatotoxicidade associada da droga.3,12 Não há na literatura registros de
ao PTU,12 tendo relatado maior incidência em estudos controlados ou não controlados de
mulheres do que em homens, com uma relação tratamento com corticoesteroides para hepatite
de 8,3:1. Quando foram comparados pacientes induzida por drogas.12
que sobreviveram e os que morreram, não
houve diferença na idade, dose ou meses A avaliação da função tireoidiana deve
de tratamento com PTU antes do início do ser realizada com T4 livre (visto que o
quadro de hepatotoxicidade. A apresentação T4 total é adversamente afetado pela
do quadro é inespecífica,3,12 e varia de hiperbilirrubinemia).3,12 O tratamento da
quadros assintomáticos, apresentando apenas doença tireoidiana subjacente impede que a
anormalidade ou piora dos testes bioquímicos, tireotoxicose contribua com a deterioração
até insuficiência hepática terminal. Na presença clínica.3,12 As opções de tratamento para o
de hepatite aguda, a mortalidade pode ser tão hipertireoidismo nesses pacientes é limitada.12
alta quanto 25%.12
PTU está contraindicado por conta do mecanismo
desconhecido de hepatotoxicidade e a relatada
Anormalidades ou piora dos testes de função recorrência de lesão após reexposição à
hepática sugerem o diagnóstico. Contudo, a droga.2,3,12 O tratamento definitivo deve
busca por outras potenciais causas de disfunção constituir na terapia com iodo radioativo.12 Na
hepática permanece necessária.12 Injúria revisão de Williams e colaboradores, essa forma
hepática induzida por drogas consiste em de tratamento foi significativamente associada
um diagnóstico difícil e frequentemente de com sobrevivência. Contudo, como o tempo
exclusão.1,2 Critérios teóricos e práticos foram médio de tratamento foi maior que a duração da
propostos por Hanson em 1984 para auxiliar no sobrevivência dos pacientes que faleceram em
diagnóstico de hepatite induzida por drogas. razão da hepatotoxicidade por PTU, os efeitos
Os critérios incluiriam: 1 – evidências clínicas positivos do I131 não podem ser firmemente
e laboratoriais de disfunção hepatocelular; 2 – estabelecidos com os dados disponíveis, podendo
início dos sintomas temporalmente relacionados ter ocorrido viés de seleção dos pacientes.
com o início da terapia farmacológica; 3 – Mesmo assim, o tratamento ideal pode ser
ausência de evidência sorológica de infecção I131 quando a hepatotoxicidade por PTU foi
atual por hepatite A, B ou C, CMV ou EBV; 4 suspeitada. Alternativamente, metimazol tem
| 42 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HEPATITE AGUDA INDUZIDA POR PROPILTIOURACIL: RELATO DE CASO
sido utilizado com sucesso após a normalização
das enzimas hepáticas.12
Referências
1. Parolin MB, Lopes RW, Telles JE, Ioshii
SO, Hajar N. Hepatite Aguda Colestática
pelo Propiltiouracil. Relato de Caso. Arq
Gastroenterol. 2000; 37: 129-132.
2. Hardee JT, Barnett AL, Thannoun A, Eghtesad
B, Wheeler D, Jamal M.
Propylthyouracil-induced Hepatotoxicity. West
J Med. 1996; 165: 144-147.
3. Gonçalves Júnior JC, Oliveira RA, Carvalho
AM, Jorge PT. Hepatite por Propiltiouracil:
Apresentação de Dois Casos com Evoluções
Diversas. Arq Bras Endocrinol Metab. 1999; 43:
129-133.
4. Livingston HJ, Livingston SF. Agranulocytosis
and hepatocellular jaundice. Jama. 135: 422425.
5. Hanson J. Propylthiouracil and hepatitis: Two
cases and a review of the literature. Arch Intern
Med. 1984; 144: 994-996.
6. Limaye A, Ruffolo PR. Propylthiouracil-induced
fatalhepatic necrosis. Am J Gastroenterol.
1987; 82: 152-4.
Metab. 2009; 94: 1881-1882.
11. Liaw YF, Huang MJ, Fan KD, Li KL, Wu SS,
Chen TJ. Hepatic injury during propylthiouracil
therapy in patients with hyperthyroidism – A
chohort study. Ann Intern Med. 1993; 118: 424428.
12. Williams KV, Nayak S, Becker D, Reyes J,
Burmeister LA. Fifty Years of Experience with
Propylthiouracil-Associated
Hepatotoxicity:
What Have We Learned? Jornal of Clinical
Endocrinology and Metabolism. 1997; 82: 17271733.
13. Lee WM. Drug-Induced Hepatotoxicity. N
Engl J Med. 1995; 333: 118-127.
14. Maggiore G, Larizza D, Lorini R, Scotta
MS, Severi F. Propylthiouracil hepatotoxicity
mimicking autoimmune chronic active hepatitis
in a girl. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 1989; 8:
547-8.
15. Levy M. Propylthiouracil hepatotoxicity.
A review and case presentation. Clin Pediatr.
1993; 32: 25-9.
16. Peter SA. Propylthiouracil-Associated
Hepatitis. J National Medical Assoc. 1989; 83:
75-77.
7. Safani MM, Tatro DS, Rudd P. Fatal
propylthiouracil induced hepatitis. Arch Intern
Med. 1982; 142: 838-9.
8. Jonas MM, Eidson MS. Propylthiouracil
hepatotoxicity: two Pediatric cases and review
of the literature. J Pediatr Gastroenterol Nutr.
1988; 7: 776-9.
9. Benyounes M, Sempoux C, Daumerie
C, Rahier J, Geubel AP. Propylthiouracylinduced severe liver toxicity: An indication for
alanine aminotransferase monitoring? World J
Gastroenterol. 2006, october 14; 12(38): 62326234.
10. Cooper DS, Rivkees SA. Putting
Propylthiouracil in Perspective. J Clin Endocrinol
| 43 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
ESCLEROSE MÚLTIPLA COM REBAIXAMENTO DO
NÍVEL DE CONSCIÊNCIA: RELATO DE CASO
MULTIPLE SCLEROSIS WITH DECREASED LEVEL OF CONSCIOUSNESS: A CASE REPORT
Juliana Keth Hidalgo Farina Costa,* Daniel Ribeiro,** Nise Alessandra de Carvalho Sousa,** Monique de Souza Vitoriano,*
Giselle Ferreira Benevides,* Clécida Mara Normando Rebouças*
Resumo
Relatamos o caso de um paciente de 16 anos, do sexo masculino, estudante, natural e procedente
de Eirunepé (AM), com diagnóstico de esclerose múltipla(EM). A esclerose múltipla é uma doença
crônica, inflamatória, auto-imune e desmielinizante do siste¬ma nervoso central (SNC), que
possui grande variedade de sinais e sintomas como manifestação, dependendo da área do SNC que
ocorrer a desmielinização, porém manifestação com alteração do nível de consciência não está
descrito na literatura, fato ocorrido neste relado. A paciente estava uso de Intérferon Beta 1-A,
interrompendo o seu uso por conta própria, e apresentando novo surto, atípico, após duas semanas,
caracterizado por rebaixamento do nível de consciência. No exame físico de admissão, apresentava
– se com paresia facial e ptose palpebral bilateral, pupilas médio-fixas, força muscular grau III em
membro superior direito e grau I em membro superior esquerdo e membros inferiores. Durante a
internação, apresentou rebaixamento do nível de consciência, evoluindo para torpor e coma, com
discreta resposta apenas ao estímulo doloroso. Foi realizada pulsoterapia com metilprednisolona
1grama ao dia, por cinco dias e iniciado o Intérferon beta 1-B em dias alternados. Após conduta,
apresentou melhora progressiva do quadro e, no terceiro dia, houve melhora significativa do nível
de consciência, porém permanecendo com ptose palpebral. Houve melhora progressiva do grau
de força muscular e no dia da alta hospitalar já deambulava com apoio. No momento, segue em
acompanhamento ambulatorial sem novos surtos, permanecendo ptose palpebral parcial à direita.
Palavras-chave: Esclerose Múltipla, Estado de Consciência, Neurologia.
Abstract
We report the case of a 16 year old male student, born and raised in Eirunepé (AM), diagnosed with
multiple sclerosis (MS). Multiple sclerosis is a chronic, inflammatory, and autoimmune demyelinating
disease of the central nervous system (CNS), which has a wide variety of signs and symptoms of
disease manifestations, depending on the area of the CNS demyelination occurs, but with altered
manifestation level of consciousness is not described in the literature, this fact occurred case
report. The patient was Interferon Beta 1a, interrupting its use on their own, and presenting
new outbreak, atypical, after two weeks, characterized by decreased level of consciousness.
On physical examination at admission, had - with facial palsy and bilateral ptosis, fixed-medium
pupils, grade III muscle strength in the right upper limb and grade I in the left upper limb and
lower limb. During hospitalization, showed decreased level of consciousness, progressing to stupor
and coma, with only slight response to painful stimuli. Pulse therapy with methylprednisolone 1
gram a day was held for five days and started interferon beta 1b every other day. After conduct,
showed gradual improvement and by the third day, there was significant improvement in the
level of consciousness, but staying with ptosis. There was progressive improvement in the degree
of muscle strength and the day of discharge has walked with support. At the time, follow-up in
outpatients with no new outbreaks, remaining partial right ptosis.
Keywords: Propylthiouracil, Hepatotoxicity, Drug-induced Hepatitis.
* Médicas residentes do Programa de Residência Médica em Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
** Neurologistas preceptores do Programa de Residência Médica em Neurologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
| 44 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
ESCLEROSE MÚLTIPLA COM REBAIXAMENTO DO NÍVEL DE CONSCIÊNCIA: RELATO DE CASO
Introdução
A esclerose múltipla (EM) é uma doença crônica,
inflamatória, auto-imune e desmielinizante
do siste¬ma nervoso central (SNC). Acomete
pacientes jovens, principalmente na faixa etária
dos 20 aos 40 anos, que corresponde à fase
de maior produtividade dos indivíduos. Possui
uma preferência pelo sexo feminino (relação 3
mulheres para 2 homens). O maior número de
casos diagnosticados desta doença encontrase nos países da Europa, América do Norte e
Austrália, ou seja, nos países temperados, em
indivíduos de raça caucasiana.1,2,3
Ainda não existe uma evidência científica de um
fator responsável por esta doença. Acredita-se
que a EM seja causada por uma combinação
de fatores, entre fatores hereditários que na
presença de fatores ambientais desconhecidos
mas facilitadores da doença e em situações
emocionais adversas, favoreçam a ativação
do sistema imunológico no sentido deste não
reconhecer os seus próprios tecidos e ativar um
processo inflamatório na substância branca do
sistema nervoso central (reação auto-imune),
deste modo, iniciar o processo da EM.3
apresentações clínicas, como primariamente
progressiva, secundariamente progressiva e
progressiva com surtos.4
Neste relato, descrevemos um caso de esclerose
múltipla (EM), com uma evolução atípica,
apresentando um surto novo caracterizado por
rebaixamento do nível de consciência.
Relato de Caso
Paciente de 16 anos, do sexo masculino,
estudante, natural e procedente de Eirunepé
(AM), procurou o serviço de neurologia do
Hospital Universitário Getúlio Vargas, com
quadro de hemiparesia e hemiparestesia à
esquerda, paralisia do VI nervo craniano à
direita, associado a alterações da marcha e do
equilíbrio.
Relata que já havia apresentado anteriormente
dois episódios semelhantes. Em um desses
episódios, procurou atendimento médico
em Manaus, sendo realizada tomografia
computadorizada (TC) de crânio, que não
evidenciou alterações. Nesta mesma ocasião,
foi solicitada ressonância nuclear magnética
(RNM) de crânio para melhor investigação, que
Esta doença possui grande variedade de sinais demonstrou alteração do sinal no hemisfério
e sintomas como manifestação, dependendo cerebelar esquerdo, associada à acentuação
da área do SNC que ocorrer a desmielinização.3 das folias e sulcos correspondentes; lesão
Provoca incapacidades funcionais progres¬sivas, heterogênea
em
hemisfério
cerebelar
causando grande impacto na vida dos direito, com epicentro na substância branca,
portado¬res e de seus familiares.1,2
estendendo-se discretamente ao pedúnculo
cerebelar e vérmis adjacentes (Figura 01).
A principal forma de evolu¬ção da doença é a Foi iniciado tratamento com corticoide,
surto-remissão (EMSR), para a qual se preconiza apresentando melhora significativa em 30 dias,
atualmente tratamento medicamentoso com permanecendo apenas ptose palpebral parcial
imunomoduladores1,2. Há também outras direita.
| 45 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Costa et al
Figura 1: RNM de crânio evidenciando alteração do sinal no hemisfério cerebelar esquerdo,
com acentuação das folias e sulcos correspondentes, no hemisfério cerebelar direito apresenta l
esão heterogênea com epicentro na substância branca, estendendo-se ao pedúnculo cerebelar e
vermis adjacente, medindo de 1,7 x 2,7 x 2,5cm.
Quando procurou nosso serviço de neurologia, foi
realizada internação hospitalar e investigação
diagnóstica. Devida à história clínica foi
concluído que se tratava do terceiro surto, sendo
solicitada nova RMN de crânio (Figura 2), análise
do líquor e pesquisa de bandas oligoclonais. O
líquor não apresentou nenhuma alteração e a
pesquisa de bandas oligoclonais apresentou-se
positiva. Na RNM de crânio foram identificadas
áreas de encefalomalácia circundadas por
gliose nos hemisférios cerebelares, áreas de
hipersinal junto ao ventrículo lateral esquerdo,
na ponte, hipocampo esquerdo e tálamo direito
(Figura 3). Como houve evolução têmporoespacial das lesões, foi confirmado o diagnóstico
de Esclerose Múltipla Remitente-Recorrente
e iniciado tratamento com Intérferon Beta
1-A. Paciente apresentou melhora do quadro
e foi encaminhado para acompanhamento
ambulatorial.
Figura 2: RNM de crânio (29/11/2009) com lesão hipertensa pericalosa
Figura 3: RNM de crânio em Flair (25/11/2010) com lesão hiperintensa em mesencéfalo
| 46 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
ESCLEROSE MÚLTIPLA COM REBAIXAMENTO DO NÍVEL DE CONSCIÊNCIA: RELATO DE CASO
Devido a problemas sociais e por morar no
interior, interrompeu o uso do Intérferon por
conta própria e, após duas semanas, apresentou
novo surto. Este, porém, com uma evolução
atípica, caracterizado por rebaixamento do
nível de consciência. No exame físico de
admissão, apresentava diparesia facial, ptose
palpebral bilateral, pupilas médio-fixas, força
muscular grau III em membro superior direito e
grau I em membro superior esquerdo e membros
inferiores. Durante a internação, apresentou
rebaixamento do nível de consciência,
evoluindo para torpor e coma, com discreta
resposta ao estímulo doloroso. Foi realizada
pulsoterapia com metilprednisolona 1grama ao
dia, por cinco dias e iniciado o Intérferon Beta
1 B em dias alternados. Apresentou melhora
progressiva do quadro e no terceiro dia, houve
melhora significativa do nível de consciência,
permanecendo com ptose palpebral e
persistência do déficit motor. Houve progressiva
recuperação do grau de força muscular e na
alta hospitalar já deambulava com apoio.
No momento, segue em acompanhamento
ambulatorial sem novos surtos, permanecendo
com semiptose palpebral à direita.
evoluir marcadamente de modo semelhante aos
pacientes com EMPP.5
As manifestações clínicas variam conforme
a forma de apresentação da EM. Na forma
EMPP, o comprometimento de tratos longos é
comum, e o motor é o mais frequente seguido
pelo cerebelo. As alterações piramidais estão
presentes em até 80% dos pacientes, e a
fraqueza está, em geral, relacionada com a
mielopatia, primeiro nos membros inferiores,
evoluindo de modo gradual para tetraparesia.
Na progressão, distúrbios sensitivos alterações
cerebelares, síndromes de tronco cerebral,
perda visual, disfunção esfincteriana e sexual,
além de comprometimento cognitivo podemse desenvolver, demonstrando a evolução da
doença no espaço e no tempo.5
Os sintomas iniciais mais frequentes na EMSR
foram alterações sensitivas e neurite óptica.
A forma EMPS possui seus sintomas iniciais
semelhantes a EMSR, pois ela é uma extensão
da doença surto-remissão.5
O diagnóstico inicial da EM, principalmente
para definir qual a forma, pode ser difícil de
ser dado inicialmente, muitas vezes somente
DISCUSSÃO
conseguimos após acompanhamento de um certo
Na história natural da EM dois padrões período da doença. No caso da EMPP é difícil de
bem marcados de apresentação inicial são se caracterizar a progressão dos sintomas, que
reconhecidos: a forma surto/remissão (EMSR) na maioria dos casos se instala de modo lento,
e a forma primariamente progressiva (EMPP). diferente dos surtos que são manifestações
A EMPP é caracterizada pela progressão dos agudas. Os exames complementares podem
sintomas desde o início sem ocorrência de surtos auxiliar no diagnóstico quando apresentam
definidos. Já a EMSR pela ocorrência surtos anormalidades, sendo eles: ressonância nuclear
agudos entremeados a remissões clínicas, sendo magnética, análise do líquor e potencial
5
esta a forma inicial da doença mais comum, evocado visual.
entre 85 a 90% dos pacientes.5
Realizamos uma busca na literatura atual à
Nos pacientes com EMSR, a progressão pode procura de trabalhos que descrevam os sinais e
sobrepor-se aos surtos, e a doença se tornar sintomas da EM e sua evolução. Alguns trabalhos
6-8
secundariamente progressiva (EMSP). De internacionais dividem os sinais e sintomas
acordo com estudos prévios, mais que 50% iniciais em: piramidais, tronco/cerebelo,
dos pacientes EMSR com mais de 10 anos de ópticos, sensitivos e medulares. Trabalhos
9-12
que também estudaram os sinais
doença evoluem com progressão secundária. nacionais
Os paciente com EMPS são aqueles nos quais a e sintomas iniciais e sua evolução, comparam
primeira fase da doença se caracterizou pela com a literatura internacional, mostrando que
nítida presença de surtos decorrentes de maior os dados coincidem. Porém em nenhum destes
atividade inflamatória, os surtos podem ou trabalhos foi encontrado algum caso descrito
não estar presentes, e os pacientes passam a de rebaixamento do nível de consciência, como
| 47 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Costa et al
paciente apresentado neste artigo.
Neurol Scand 1972, 48:19-46.
O paciente relatado apresentava evolução típica
de EM, conforme descrita na literatura pela
forma surto/remissão, porém com a suspensão
do tratamento apresentou um novo surto de
forma atípica, caracterizado por rebaixamento
do nível de consciência.
7. Bauer HJ. Problems of symptomatic therapy
of multiple sclerosis. Neurology 1978, 28:8-20.
Com este relato concluímos que existe uma
grande variedade da gravidade de alguns
surtos e a importância de se fazer diagnósticos
diferenciais com outras patologias que
caracterizam-se por comprometimento da
consciência, como por exemplo, encefalomielite
disseminada aguda (ADEM).13,14,15
8. Kuroiwa Y. Nationwide survery of MS in Japan.
Neurology 1975, 25:845-851.
9. Tilbery, C.P; Felipe, E; Baldauf, C.M; Peres,
M.F.P. Esclerose múltipla: análise clínica e
evolutiva de 214 casos. Arq. Neuro-Psiquiatr.
1995, vol.53, n.2, pp. 203-207.
10. Lana-Peixoto MA, Lana-Peixoto MI. Is
multiple sclerosis in Brazil and Asia alike? Arq
Neuropsiquiatr 1992, 50:419-425.
11. Callegaro D. Contribuição do estudo clínico
evolutivo da esclerose múltipla: análise de 120
1. Noseworthy JH, Lucchinetti C, Rodriguez M, pacientes. Tese de Doutorado, Faculdade de
Weinshenker BG. Multi¬ple sclerosis. N Engl J Medicina da Universidade de São Paulo. São
Paulo 1989.
Med 2000;343:938-951.
REFERÊNCIAS
2. Kantarci O. H; Weinshenker B. G; Natural
history of multiple sclerosis. 2005 Neurol Clin.;
23:17-38.
12. Moreira, M.A; Felipe, E; Mendes, M.F; Tilbery,
C.P. Esclerose múltipla: estudo descritivo de
suas formas clínicas em 302 casos. Arq. NeuroPsiquiatr. 2000, vol.58, n.2B, pp. 460-466.
3. Pedro, L., & Pais-Ribeiro,J. (2006). Revisão de
instrumentos de qualidade de vida na esclerose
múltipla. In: I.Leal, J. Pais-Ribeiro & S.Neves,
(Edts.). Actas do 6º Congresso Nacional de
Psicologia da Saúde (pp.121-126). Lisboa: ISPA
13. Rowland, L. P, Pedley, T. A. Merrit – Tratado
de Neurologia. 12ª edição, Rio de Janeiro:
Editora Guanabara Koogan; 2011. p.909-24.
14. Tilbery, C. P; Felip, E; Baldauf, C. M;
4. Lublin FD, Reingold SC. Defining the clinical Peres, M. F. P; Esclerose múltipla: Análise
course of multiple scle¬rosis: results of an clínica e evolutiva de 214 casos. Arquivos de
international survey. National Multiple Sclerosis neuropsiquiatria. 1995, 53(2).
So¬ciety (USA) Advisory Committee on Clinical
trials of New Agents in Multiple Sclerosis. 15. Noseworthy, J.H; Lucchinetti, C; Rodriguez,
M; Weinshenker, B.G. Multi¬ple sclerosis. N Engl
Neurology 1996;46:907-911.
J Med 2000;343:938-951.
5. Vasconcelos CCF. Formas Progressivas da
Esclerose Múltipla: Primária e Secundária.
Em: Brasil Neto JP, Takayanagui OM, editores.
Tratado de Neurologia da Academia Brasileira
de Neurologia. Rio de Janeiro: Editora Elsevier;
2013. p.499-505.
6. Kurtzke
Kurland LT,
history of
laboratory
JF, Beebe GW, Dagler B, Auth TL,
Defzger MD. Studies on the natural
multiple sclerosis: clinical and
findings at first diagnoses. Acta
| 48 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HÉRNIA DE SPIEGEL: RELATO DE CASO
SPIEGEL´S HERNIA: A CASE REPORT
Rebeca Aparecida dos Santos Di Tommaso,* Rubem Alves da Silva Neto,* Priscila Cavalcanti Ballut,* João José Corrêa Bergamasco,*
Marcelo Henrique dos Santos,** Tikara Hagiwara***
Resumo
Hérnia de Spiegel é um defeito raro da parede abdominal, com protrusão por meio da linha
semilunar. É de interesse cirúrgico pelo quadro clínico vago de queixas abdominais, com elevado
risco de encarceramento e estrangulamento. Tradicionalmente é tratada com hernioplastia
anterior com aproximação da musculatura e reforço com tela de polipropileno, sendo a técnica
laparoscópica uma alternativa ao procedimento cirúrgico aberto. O presente trabalho visa relatar
dois casos de pacientes com diagnóstico de hérnia de Spiegel operadas no Serviço de Cirurgia
Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas pela técnica tradicional.
Palavras-chave: Linha de Spiegel, hérnia de Spiegel, hernioplastia anterior.
Abstract
Spiegel´s hernia is a rare abdominal wall defect, presenting itself as a protrusion through the
semilunar line. It is surgical interest because of its high incarceration and strangulation risk.
Traditionally, repair consists on open anterior hernioplasty, using direct muscle approximation and
polypropylene mesh. Laparoscopic technique is an alternative to the open procedure. This paper
aim to report two Spigelian hernia cases treated with the traditional technique in the Getúlio
Vargas University Hospital General Surgery Department.
Keywords: Spigelian line, Spigelian hernia, anterior hernioplastia.
Introdução
A hérnia de Spiegel ocorre por meio da fáscia
de Spiegel, que é composta da camada
aponeurótica entre o músculo reto medialmente
e a linha semilunar lateralmente; estendendose da extremidade no nono arco costal até
o tubérculo púbico, sendo mais estreita na
porção superior e se alargando abaixo da linha
transversal umbilical, assumindo a forma de
uma meia-lua.1,2
Quase todas as hérnias de Spiegel ocorrem na
linha arqueada ou abaixo dela. A ausência de
fáscia do reto posterior pode contribuir para
uma fraqueza inerente nessa área. São hérnias
em geral interparietais, com o saco herniário
dissecando posteriormente a aponeurose do
músculo oblíquo externo, não sendo possível
palpar o anel herniário.1
O orifício herniário se localiza lateralmente
à borda externa do músculo reto, mais
frequentemente em uma área compreendida
entre duas linhas paralelas: a linha
interespinhosa (entre as espinhas ilíacas
anteriores superiores) e outra linha transversal,
traçada seis centímetros acima.2
*Residente em Cirurgia Geral da Universidade Federal do Amazonas.
** Residente em Cancerologia Cirúrgica da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Amazonas.
***Cirurgião assistente do Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
| 49 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HÉRNIA DE SPIEGEL: RELATO DE CASO
O objetivo deste trabalho é relatar dois casos
de Hérnia de Spiegel operados no Serviço de
Cirurgia Geral do Hospital Universitário Getúlio
Vargas.
hepática, em tratamento regular de suas
comorbidades; tendo realizado procedimento
cirúrgico para correção de prolapso vaginal.
Negava história familiar e pessoal de hérnias da
parede abdominal. Ao exame físico, evidenciado
abdome globoso, flácido, assimétrico pelo
Relato de Caso 1
abaulamento em região de flanco e fossa ilíaca
Paciente do sexo feminino, 47 anos, encaminhada direita, de consistência fibroelástica e móvel
à nossa instituição após diagnóstico de hérnia à palpação; sem visceromegalias ou falhas
de Spiegel; evoluindo havia três anos com dor aponeuróticas palpáveis. Procurou atendimento
em região de flanco e fossa ilíaca à direita, tipo de urgência, onde realizou ultrassonografia
surda, que melhorava com o repouso. Um ano de abdome a qual não evidenciou nenhuma
e meio após o início do quadro álgico iniciou alteração. Por persistência e piora progressiva
abaulamento em região de flanco e fossa ilíaca do quadro clínico a paciente realizou tomografia
direita, com aumento progressivo dele associado de abdome e pelve a qual diagnosticou hérnia
à piora da dor aos esforços físicos. Portadora de Spiegel.
de hipertensão arterial sistêmica e esteatose
Foto 1: TC de abdome evidenciando presença de falha aponeurótica,
com conteúdo de alça intestinal no interior do saco herniário.
A paciente foi submetida à hernioplastia de
parede abdominal, tendo sido evidenciado no
intraoperatório falha aponeurótica de 10 cm de
extensão com volumoso saco herniário contendo
alças de intestino delgado e epíplon. Realizado,
após abertura de saco herniário, o embricamento
dele com fio absorvível; aproximação da falha
aponeurótica com fio inabsorvível e reforço
dela com tela de polipropileno.
A paciente evoluiu sem intercorrências,
recebendo alta no 2.º dia pós-operatório.
| 50 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Di Tommaso et al
Foto 2a: Isolamento e abertura de saco herniário, evidenciando o seu conteúdo.
Foto 2b: Embricamento do saco herniário com aproximação de falha aponeurótica.
Foto 2c: Aspecto final após fixação de tela de polipropileno.
Relato de Caso 2
Paciente do sexo feminino, 62 anos, encaminhada
à nossa instituição após diagnóstico de hérnia
de Spiegel; evoluindo havia oito meses com dor
em região de flanco esquerdo com irradiação
para região lombar ipsilateral, tipo surda,
intermitente; associada a náuseas. Relatava
ainda abaulamento em região de fossa ilíaca
esquerda à manobra de Valsalva. Apresentava
melhora do quadro ao repouso e piora dele
aos esforços físicos. Portadora de hipertensão
arterial sistêmica, em tratamento regular; tendo
realizado colecistectomia e apendicectomia
prévias. História pessoal de herniorrafia
umbilical havia seis meses. Ao exame físico,
evidenciado abdome globoso, flácido, simétrico,
sem visceromegalias ou massas palpáveis,
porém, à manobra de Valsalva, evidenciava-se
abaulamento discreto em região de fossa ilíaca
esquerda, mas sem falha aponeurótica palpável
ao exame físico.
Procurou atendimento de urgência, onde
realizou tomografia de abdome e pelve a
qual evidenciou solução de continuidade no
músculo transverso abdominal, na fossa ilíaca
à esquerda, na altura da linha semilunar, por
onde ocorria insinuação da gordura pélvica,
com saco herniário de 3,7 x 2,9 cm; evidenciou
ainda diástase dos músculos retos abdominais
ao nível da cicatriz umbilical, por onde ocorria
insinuação de gordura intra-abdominal.
A paciente foi submetida à hernioplastia de
parede abdominal, tendo sido evidenciado no
intraoperatório falha aponeurótica de 3 cm de
extensão com saco herniário pequeno contendo
apenas epíplon. Realizado, após abertura de
saco herniário, o embricamento dele com
fio absorvível; procedido então aproximação
da falha aponeurótica com fio inabsorvível e
reforço dela com tela de polipropileno.
A paciente evoluiu sem intercorrências,
recebendo alta no 2.º dia pós-operatório.
Foto 3a: Dissecção e isolamento de saco herniário.
Foto 3 b: Aspecto final após o reparo da fragilidade da parede abdominal com tela de polipropileno.
| 51 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HÉRNIA DE SPIEGEL: RELATO DE CASO
DISCUSSÃO
sensibilidade do exame físico.8,9 Os sintomas
e sinais mais comuns são dor abdominal e
Hérnia de Spiegel consiste em uma protrusão abaulamento na porção lateral do abdome
de saco peritoneal, órgão ou gordura pré- inferior, com massa palpável e dolorosa.10 O
peritoneal por meio de um defeito, congênito ou exame físico isolado falha em estabelecer o
adquirido, na aponeurose de Spiegel. Também diagnóstico em mais de 50% dos casos.11
conhecida como “hérnia ventral lateral”,
“hérnia anterolateral” ou hérnia por meio do O diagnóstico diferencial deve ser feito com
tendão conjunto”.3,4
hematoma de músculo reto abdominal, seroma
e abscesso abdominal; entidades menos comuns
Hernias de Spigel são entidades raras, como fibroma, lipoma, sarcoma e hemangioma
constituindo 0,12-2% de todas as hérnias da de parede abdominal.4
parede abdominal. Adrian van der Spiegel foi
o primeiro a definir a linha semilunar, também O diâmetro do colo herniário é geralmente de
conhecida como linha de Spiegel. Em 1764, 0,5-2 cm, podendo resultar em obstrução e
Klinklosch descreveu pela primeira vez a hérnia encarceramento; sendo a hérnia diagnosticada
como entidade clínica, nomeando de “hérnia da durante cirurgia de urgência.12 O conteúdo do
linha de Spiegel”.5
saco herniário pode conter omento, intestino
delgado, colón, apêndice, bexiga, mais
Na maioria dos casos é uma hérnia adquirida, raramente ovário e divertículo de Meckel.4,9
ocorrendo principalmente em adultos entre
40 e 70 anos, afetando ambos os lados (direito Ultrassonografia e tomografia computadorizada
e esquerdo) de maneira semelhante, sendo evidenciam o local exato do defeito herniário,
discretamente mais frequente em mulheres.4,5 seu tamanho, sua extensão, o conteúdo, além
A etiologia da hérnia de Spiegel está associada de informações importantes para a escolha
à teoria vascular, na qual o prolapso dessas da melhor abordagem cirúrgica.8 A tomografia
hérnias por meio da aponeurose do músculo computadorizada é considerada a ferramenta
transverso seria pelos orifícios dos vasos e diagnóstica de maior sensibilidade.13,14
nervos perfurantes na linha semilunar; associada
à teoria do defeito musculoaponeurótico com Após o diagnóstico da hérnia de Spiegel, o
fragilidade nas aponeuroses dos músculos tratamento cirúrgico se faz necessário em
transverso e oblíquo interno do abdome, onde consequência das complicações associadas
diversos fatores que aumentam a pressão à
entidade,
como
encarceramento
e
intra-abdominal ou causam deterioração da estrangulamento (21-33%).15 As opções cirúrgicas
parede abdominal são considerados fatores de reparo da hérnia de Spiegel podem ser tanto
predisponentes (obesidade mórbida, distúrbios pela técnica aberta como laparoscópica. A
do colágeno, múltiplas gestações, ganho ou hernioplastia aberta apresenta baixa morbidade
perda ponderal importante, doença pulmonar e mortalidade, baixa recorrência, porém associacrônica).3,6
se à maior incisão e dissecção da área afetada
para completa correção do defeito. É ainda a
Pode ainda estar associada à presença de orifícios técnica de escolha em casos de complicações e
anormais na aponeurose do músculo transverso cirurgia de urgência.4,8,16
para passagem da artéria epigástrica inferior e
seus ramos, predispondo à fragilidade.7 Trauma A técnica laparoscópica pode ser realizada tanto
e defeito congênito por desenvolvimento intra-abdominal como extra-peritoneal, sendo
anormal da parede abdominal também estão a intra-abdominal reservada para os casos de
envolvidos na etiologia dessas hérnias.6
múltiplas cirurgias na mesma intervenção.4,8,16
A hénia de Spiegel é uma entidade rara entre
O diagnóstico inicial é difícil pela variedade de as hérnias da parede abdominal, de diagnóstico
sintomas inespecíficos, o pequeno tamanho da muitas vezes difícil; porém demanda tratamento
herniação, a localização interparietal e à baixa cirúrgico imediato após seu diagnóstico em vista
| 52 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Di Tommaso et al
do índice de complicação a ela associado. O
tratamento cirúrgico aberto é uma abordagem
factível, com baixas taxas de recidiva e de
morbimortalidade.
REFERÊNCIAS
1. Malangoni MA, Rosen MJ. Hérnias. In:
Townsend CM, Beauchamp RD, Evers BM,
Mattox KL. Sabiston: Tratado de cirurgia. A base
biológica da prática cirúrgica moderna. 18.a ed.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2010. p. 1085-1107.
2. Speranzini MB, Deutsch CR. Hérnias da
parede abdominal anterior. In: Speranzini MB,
Deutsch CR, Yagi OK. Manual de diagnóstico e
tratamento para o residente de cirurgia. São
Paulo: Atheneu Editora, 2009. p. 635-642.
Rare? Puzzling diagnosis? Chirurg. 1982; 53:
314-317.
12. Montes IS, Deysine M. Spigelian and other
uncommon hernia repair. Surg Clin N Am. 2003;
83: 1235-1253.
13. Coulier B. Multidetector computed
tomography features of linea arcuata (arcuateline of Douglas) and linea arcuata hernias. Surg
Radiol Anat. 2007; 29: 397-403.
14. Bennett D. Incidence and management
of primary abdominal wall hernia: umbilical,
epigastric and spigelian. In: Fitzgibbons RJ,
Greenburg AG, editors. Nyhousand Condon’s
hernia. 5th ed. Philadelphia: Lippincot Williams
and Wilkins, 2002. p. 389-413.
3. Skandalakis PN, Zoras O, Skandalakis JE, 15. Rogers FB, Camp PC. A strangulated spigelian
Mirilas P. Spigelian Hernia: surgical anatomy, herniamimicking diverticulitis. Hernia. 2001; 5:
embryology and technique repair. Am Surg. 51-52.
2006; 72(1): 42-48.
16. Moreno-Egea A, Carrasco L, Girela E, Martin
4. Perrakis A, Velimezis G, Kapogiannatos G, JG, Aguayo JL, Canteras M. Open vs Laparoscopic
Koronakis D, Perrakis E. Spigel hernia: a single repair of Spigelian hérnia. Arch Surg. 2002; 137:
center experience in a rare hernia entity. 1266-1268.
Hernia. 2012; 16: 439-444.
5. Topal E, Kaya E, Topal NB, Sahin I. Giant
spigelian herniadue to abdominal wall injury: a
case report. Hernia. 2007; 11: 67-69.
6. Ignatius JA. Spigelian hernia. Am J Surg.
1955; 90: 300-391.
7. Thévenot T, Gabourd T. Les hernies spontanées
du repli semi-lunaire de Spiegel. Rev Chir Paris.
1907; 35: 568-585.
8. Moreno-Egea A, Flores B, Girela E, Martin
JG, Aguayo JL, Canteras M. Spigelian hérnia:
bibliographical atudy and presentation of a
series of 28 patients. Hernia. 2002; 6: 167-170.
9. Spangen L. Spigelian hernia. World J Surg.
1989; 13: 573-586.
10. Jain KM, Hestings OM, Kunz VP. Spigelian
hernia. Am Surg. 1977; 43: 569-600.
11. Stirnemann H. The Spigelian hernia: missed?
| 53 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AMILOIDOSE DE LARINGE
LARYNGEAL AMYLOIDOSIS
Raimundo Monteiro Maia Filho,* Luís Frederico Bonilla,** Ziza Emi Sakamoto,*** Paulyne de Souza Viapina****
Resumo
Amiloidose corresponde a menos de 1% das lesões benignas de laringe. Acomete cerca de 5-10
casos por milhão de pessoas ao ano, com mais de 20% ocorrendo na Cabeça e Pescoço, sendo a
laringe o local mais acometido. Os autores apresentam um caso de amiloidose laríngea em uma
paciente de 42 anos cujo sintoma era rouquidão progressiva havia dez anos, discutindo sobre as
principais características da doença que, se diagnosticada e tratada precocemente, poderá evitar
comprometimento grave de vias aéreas.
Palavras-chave: Amiloidose, Cirurgia, Laringectomia.
Abstract
Amyloidosis occurs in less than 1 percent of the larynx benign diseases. Affects approximately
5-10 per million per year, with up to 20% of these cases involving the Head and Neck zone. The
larynx is the most commom local. A larynx amyloidosis case report in a 42 years old female patient
reffering progressive hoarseness for 10 years. Discussion is made about the disease caractheristics
to promove an early diagnose and to avoid acute airway compromisse.
Keywords: Amyloidosis, Surgery, Laringectomy.
Introdução
A amiloidose consiste em uma doença ainda de
origem desconhecida, na qual ocorrem depósitos
extracelulares de proteína fibrilar insolúvel
(amiloide).1 Pode acometer diferentes tecidos
e se apresentar de forma isolada ou sistêmica.
Cerca de 5-10 casos por milhão de pessoas
são diagnosticadas por ano, 20% deles são de
Cabeça e Pescoço,2,3 sendo a laringe o principal
órgão acometido. Há descrição de 300 casos de
amiloidose de laringe na literatura entre 1877 e
1990 no mundo.3
Relato de Caso
MS,
sexo
feminino,
42
anos,
natural
e
procedente de Manaus, relata que havia dez
anos apresentou ruptura de cordas vocais
evoluindo com rouquidão e piora progressiva.
Afirma ter procurado assistência, porém sem
melhora clínica. Há aproximadamente um ano
apresentou infecção de vias aéreas superiores
com agravamento do quadro, sendo então
encaminhada à Fundação Centro de Controle
de Oncologia do Amazonas. Na ocasião negou
disfagia, dispneia e outras alterações. Paciente
não apresenta história de tabagismo ou etilismo
e afirma ter realizado retirada de cisto no dorso
havia quatro anos.
Ao exame físico apresentava-se em bom estado
geral, eupneica e normocorada, sem edemas
e com boa perfusão capilar periférica. As
auscultas pulmonar e cardíaca não apresentaram
* Residente de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Fundação Centro de Controle de Oncologia do Estado do Amazonas (FCECON).
**Cirurgião de Cabeça e Pescoço e preceptor da Residência de Cirurgia de Cabeça e Pescoço da Fundação Centro de Controle de Oncologia do
Estado do Amazonas (FCECON).
***Médica assistencialista do Hospital Pronto-Socorro João Lúcio Pereira Machado.
****Acadêmica de Medicina da Universidade Federal do Amazonas (Ufam).
| 54 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AMILOIDOSE DE LARINGE
alterações. Ao exame da região cervical,
ausência de abaulamento, sem turgência em
jugulares, ausência de linfonodomegalias.
Realizado videolaringoscopia (Figuras 1 e 2),
que demonstrou presença de lesão infiltrativa
acometendo a hemilaringe direita, com presença
de fixação da corda vocal ipsilateral (lesões
polipoides no bordo livre), sendo realizada
biópsia para esclarecimento diagnóstico.
Figura 1: Imagem da lesão à videolaringoscopia.
Figura 2: Imagem da lesão à videolaringoscopia.
Ao exame histopatológico da biópsia de
corda vocal, foram evidenciados fragmentos
de laringe revestidos por epitélio escamoso
estratificado parcialmente desgarrado, sem
evidências de alterações displásicas. No tecido
subepitelial destacou-se a presença de tecido
conjuntivo frouxo, mixoide de aspecto elástico,
com vasos congestos e raras células do infiltrado
inflamatório. A coloração de vermelho-congo foi
positiva para depósito no tecido subepitelial. Os
achados foram então sugestivos de amiloidose
laríngea (Figura 3).
Figura 3: Microscopia da lesão.
| 55 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Filho et al
Ao exame imuno-histoquímico, evidenciou-se
a deposição subepitelial de material amiloide
positivo para a coloração vermelho-congo
(Figura 4) e refringente sob a luz polarizada,
achados consistentes de amiloidose.
Figura 4: A lesão positiva para vermelho-congo.
A paciente foi submetida à laringectomia parcial ocorreu sem intercorrência e ela se encontra
supracricoide, com retirada da epiglote, pela em seguimento ambulatorial.
infiltração dela (Figuras 5 e 6). O pós-operatório
Figura 5: Intraopertório.
| 56 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
AMILOIDOSE DE LARINGE
A
B
Figura 6: Produto de laringectomia parcial: a) visão anterior, b) visão posterior.
Discussão
A amiloidose corresponde a menos de 1% das
lesões benignas encontradas na laringe e
raramente está associada à doença sistêmica.
Acomete a faixa etária de 40 a 60 anos
predominando no sexo masculino em uma
proporção de 3:1.1
As regiões mais acometidas da laringe são:
falsas pregas (55%), ventrículo laríngeo (36%),
espaço subglótico (36%), pregas vocais (27%),
pregas ariepiglóticas (23%) e comissura anterior
(14%).4
O sintoma mais comum é a disfonia progressiva,2
podendo ocorrer também a disfagia, dispneia,
sensação de corpo estranho e até hemoptise,1
geralmente relacionado a localização.
sendo a via endoscópica a mais utilizada, salvo
em casos mais invasivos que produzam obstrução
da via aérea, sendo necessária a realização de
laringectomia parcial ou total. O tratamento
clínico com radioterapia ou corticosteroides
tem sido considerado ineficaz.1 Optou-se pela
laringectomia parcial supracricoidea pelo grau
de infiltração e os sintomas relatados pela
paciente. Durante o procedimento cirúrgico,
decidiu-se pela retirada de epiglote em razão
do acometimento dela pela doença.
O prognóstico é bom por se tratar de uma
doença benigna e sem relato comprovado de
malignização, porém as taxas de recidiva são
elevadas, com necessidade de várias abordagens
cirúrgicas. Em uma série com 22 pacientes, 45 %
tiveram de ser submetidos a múltiplas exéreses.8
Amiloidose laríngea é uma doença benigna, de
Macroscopicamente se apresentam como edema crescimento lento, porém pode causar risco
subepitelial difuso sem alteração de mucosa de morte ao obstruir as vias aéreas. De fácil
(mais comum) ou como nódulos amarelos, não tratamento quando diagnosticado precocemente
ulcerados e com depósitos subepiteliais.5,6,7 e de bom prognóstico, lembrando sempre que
Tem como diagnóstico diferencial os pólipos a forma sistêmica, apesar de raramente estar
de pregas vocais, cistos de retenção das associada ao acometimento laríngeo, deve ser
falsas cordas vocais, laringocele, os tumores sempre investigada.
laríngeos benignos e malignos e as doenças
Referências
granulomatosas.1,7
O diagnóstico é feito a partir do histopatológico.
A proteína amiloide, quando em contato com
o corante vermelho-congo e sob luz polarizada
produz uma birrefringência verde-maçã
característica da doença.
O tratamento da doença localizada é cirúrgico,
1. Bastos AS et al. Amiloidose laríngea primária:
Revisão bibliográfica e um caso relatado. Revista
Brasileira de Otorrinolaringologia 2004; 70(1):
133-136.
2. Jacques TA et al. Head and Neck manifestation
amyloidosis. The Otorhinolaryngologist 2013;
| 57 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Filho et al
6(1): 35-40.
3. Arrarte JLF et al. Amiloidose laríngea
primária: Relato de caso. Revista Brasileira de
Otorrinolaringologia 1997; 63(2): 152-156.
4. Mitrani M et al. Laryngeal amyloidoses.
Laryngoscope 1985; 95: 1346-1347.
5. Passerotti GH et al. Amiloidose com múltiplos
focos em trato aéreo-digestivo superior: Relato
de caso e revisão de literatura. Revista Brasileira
de Otorrinolaringologia 2008; 74(3): 462-466.
6. Valera FCP et al. Amiloidose localizada
laríngea: Relato de caso e revisão de literatura.
Revista Brasileira de Otorrinolaringologia 2004;
70(3): 423-426.
7. Figueiredo RR, Azevedo AA. Amioidose
laríngea nodular isolada: Relato de caso. Arq.
Int. Otorrinolaringol. São Paulo. 2010; 14(2):
243-246.
8. Lewis JE et al. Laryngeal amyloidosis: A
clinicopathologic in imunohistochemical review.
Otolaryngol Head Neck Surg. 1992, 106(4): 372377.
| 58 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GRANULOMA GLÓTICO POR
TUBO DE MONTGOMERY
GLOTTIC GRANULOMA AFTER MONTGOMERY TUBE
Andra Aleixo Aguiar* Lubyanka Ferreira Pereira Custódio* Márcia dos Santos da Silva,*Renato Telles de Souza,**Fernando Luiz Westphal***José
Corrêa Lima Neto***
Resumo
O granuloma em prega vocal é um processo inflamatório inespecífico constituído por tecido de
granulação geralmente localizado no processo vocal da cartilagem aritenoide. Vários fatores
contribuem para a etiopatogenia do granuloma, mas esta continua indeterminada, tais como: abuso
vocal, doença do refluxo laringo-faríngeo (RLF) e intubação endotraqueal. Quando nenhuma causa
é evidenciada considera-se como idiopática. Neste trabalho, relatamos o caso de um paciente com
granuloma em prega vocal após uso de tubo de Montgomery para correção de estenose traqueal.
Palavras-chave: Granuloma, glote, laringe, estenose traqueal.
Abstract
The glottic granuloma is a nonspecific inflammatory process consisting of granulation tissue
usually located in the arytenoid cartilage vocal process. Several factors contribute to the
granuloma pathogenesis, but this is still undetermined. The main factors are: vocal abuse, disease
laryngopharyngeal reflux (LPR) and endotracheal intubation. When no evident cause is determined
it is classified as idiopathic. A case report about glottic granuloma appearance after Mountgomery
tube use for tracheal stenosis treatment.
Keywords: Granuloma, glottis, larynx, tracheal stenosis.
Introdução
porção cartilaginosa.4
Os granulomas da laringe são afecções orgânicas
relativamente raras, que apresentam um quadro
clínico e patológico bem definido.1 Existem
ainda controvérsias sobre sua nomenclatura,
etiopatogenia, classificação e tratamento. Entre
os diversos fatores etiológicos responsáveis
pelo aparecimento dos granulomas laríngeos,
destacam-se: a intubação endotraqueal, o
refluxo gastroesofágico, os traumatismos
laríngeos externos, o fonotraumatismo e a
origem idiopática.2,3
Existem dois tipos de granulomas: os
inespecíficos (geralmente associado aos fatores
etiológicos supracitados) e os específicos
(causados por doenças como tuberculose,
sarcoidose, paracococidioidomicose, sífilis,
granulomatose de Wegener, doença de Crohn
etc.).2,5 É importante investigar, durante o
exame clínico do paciente, sobre história de
intubação endotraqueal, abuso vocal e sintomas
de refluxo laringo-faríngeo por esses serem os
principais fatores envolvidos na etiopatogenia
dos granulomas laríngeos. Neste trabalho,
relatamos o caso de um paciente que, após
intubação endotraqueal prolongada, evoluiu
Em geral ocorrem na porção posterior das
pregas vocais, frequentemente na ou acima da
*Médica residente de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
**Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Universitário Getúlio Vargas. Mestre em Otorrinolaringologia.
***Médico assistencial do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
| 59 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GRANULOMA GLÓTICO POR TUBO DE MONTGOMERY
com estenose traqueal tendo a necessidade de
colocação de tubo de Montgomery para manter
as vias aéreas pérvias. Após dois anos com o
tubo de Montgomery evoluiu com granuloma em
prega vocal.
A análise histopatológica do material coletado
na cirurgia foi compatível com nódulo fibroso
de pregas vocais.
Cerca de um ano após a intervenção cirúrgica
foi realizada nova broncoscopia que verificou
epiglote e cordas vocais normais; traqueia de
Relato de Caso
aspecto normal com presença de 90% de luz
Paciente do sexo masculino, 43 anos, foi pérvia.
encaminhado ao Serviço de Otorrinolaringologia Atualmente, dois anos depois da microcirurgia
pelo achado sugestivo de granuloma glótico de laringe, o paciente está assintomático e
durante broncoscopia para controle de tubo apresenta videolaringoscopia sem evidência de
de Montgomery. O paciente relatou história recidiva do granuloma glótico.
de meningite bacteriana, havia cinco anos,
e necessitou de intubação endotraqueal Discussão
prolongada. Como complicação desta, evoluiu
com estenose traqueal sendo então submetido Estudos descrevem o granuloma laríngeo
à colocação de tudo de Montgomery para a relacionado à intubação endotraqueal por conta
correção da estenose. Após dois anos, quando de fatores como: as intubações prolongadas e
foi submetido à broncoscopia para controle do traumáticas, a utilização de tubos traqueais
tubo de Montgomery, foi visualizada uma lesão de maior diâmetro, as elevadas pressões no
volumosa, obstruindo toda a região glótica, o interior dos balonetes dos tubos traqueais,
que impossibilitou a retirada do tubo (Figura principalmente nas anestesias que utilizam
1A).
óxido nitroso, e a inadequação dos planos de
sedação.3 Além disso, possíveis movimentações
cervicais do paciente são capazes de deslocar
o tudo traqueal permitindo o atrito dele com a
mucosa da laringe e da traqueia. Movimentos
involuntários de deglutição, respiração e
de fonação também são responsáveis por
traumatizar a mucosa das vias aéreas por meio
da compressão causada pelo tubo durante esses
movimentos, além de dificultar a cicatrização da
laringe por segunda intenção, o que em último
estágio determina a formação do granuloma.6,7
Esses eventos podem explicar a causa de
formação do granuloma nesse paciente.
Figura 1: A – Granuloma glótico visualizado por broncoscopia. B – Laringe após exérese do granuloma visualizada por microscópio cirúrgico. C – Peça cirúrgica.
Histologicamente essas lesões têm aspecto de
granulomas piogênicos, formados por tecido de
granulação, com edema e infiltrado inflamatório
crônico, neovascularização e fibrose, recoberto
por epitélio escamoso.5,8
Após confirmação da lesão sugestiva de granuloma
glótico, por meio da videolaringoscopia, o
paciente foi submetido à microcirurgia de Alguns fatores são descritos como predisponentes
laringe com retirada dela (Figura 1B).
para formação do granuloma: sexo feminino,
idade adulta, anemia, desnutrição, hipotensão,
No quinto dia de pós-operatório, o paciente infecção respiratória, entre outros.6,9
realizou nova broncoscopia na qual foi observada
perviedade das vias aéreas possibilitando a O diagnóstico é feito pela história clínica, exame
retirada do tudo de Montgomery.
otorrinolaringológico e videolaringoscopia.2,5
| 60 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Aguiar et al
De aspecto marrom-amarelado, pediculados,
localizam-se nas pregas vocais ou na porção
medial da cartilagem aritenoide, podem situarse em outras regiões da laringe e na traqueia
em áreas de contato com o tubo ou nas bordas
da traqueostomia.6
geralmente proposta para os casos mais
volumosos ou que acometem ambas as pregas
vocais.11,12,15 Isso é possível pela interrupção
do fator causal, o que contribui para a baixa
recorrência comparada aos granulomas de
origem não relacionada à pós-intubação.11
Regridem, em geral, após a descanulação e em
algumas ocasiões exigem exérese endoscópica.
Pelo fato de as lesões se posicionarem na
comissura glótica posterior, a voz, em muitos
casos, é pouco comprometida, uma vez que
podem não impedir a coaptação glótica.3
Alterações de qualidade da voz e dispneia
podem estar presentes quando se trata de um
granuloma volumoso.10 Outros sintomas como
sensação de globus faríngeo, tosse e pigarro
podem constituir o quadro clínico. No caso
apresentado, como o paciente estava com o
tubo de Montgomery, não apresentava dispneia
ou disfonia e a lesão foi um achado incidental
durante a broncoscopia.
Dessa forma, o paciente evoluiu satisfatoriamente
após a microcirurgia de laringe com remoção do
granuloma glótico, uma vez que foi cessado o
estímulo com a retirada do tubo de Montgomery.
A
mesma
fisiopatologia
envolvida
no
surgimento do granuloma glótico pós-intubação
endotraqueal prolongada pode ocorrer em
pacientes que são submetidos à colocação de
tudo de Montgomery, uma vez que o atrito dele
com o epitélio de revestimento da mucosa da
laringe e da traqueia podem gerar compressão
e traumatização dela.
3. Martins RHG, Dias NH, Santos DC, Fabro
AT, Braz JRC. Aspectos clínicos, histológicos
e de microscopia eletrônica dos granulomas
de intubação das pregas vocais. Rev Bras
Otorrinolaringol. 2009; 75: 116-22.
4. Pontes PAL, De Biase NG, Gadelha MEC.
Clinical evolution of laryngeal granulomas:
treatment and prognosis. Laryngoscope. 1999;
109: 289-94.
Os estudos dividem bem a conduta em relação
ao tipo de granuloma, apesar de ainda
serem controversos quando relacionados aos
granulomas idiopáticos e aos que apresentam
como fator desencadeante o abuso vocal e
o refluxo gastroesofágico. Nestes, mesmo o
tratamento sendo direcionado para os fatores
contribuintes, a regressão do granuloma nem
sempre é possível e as recidivas pós-cirúrgicas são
frequentes.11,12 Recentemente foram descritas
boas experiências desses casos refratários com
o uso de toxina botulínica, injeção intralesional
de corticoide e remoção cirúrgica seguida de
radioterapia imediata.11,13,14
Referências
1. Pinto JA, Simon SP, Júnior SNS.
Granulomas inespecíficos da laringe. Rev Bras
Otorrinolaringol. 1993; 59: 253-6.
2. Lemos EM, Sennes LU, Imamura R, Tsuji DH.
Granuloma de processo vocal: caracterização
clínica, tratamento e evolução. Rev Bras
Otorrinolaringol. 2005; 71: 494-8.
5. Dieguez FSM, Barbosa MVC, Almeida AAR,
Souza VA. Granuloma laríngeo: relato de caso.
Rev Científica da FMC. 2010; 5: 15-18.
6. Coelho MS, Stori Jr. WS. Lesões crônicas da
laringe pela intubação traqueal. J Pneulmol.
2001; 27: 68-76.
7. Porto AJS, Alves SN. Granuloma pósentubação. Rev Bras Anestesiol. 1989; 39: 4345.
8. Tsuji DH, Sennes LU, Bohadana SC, Imamura R,
Cahali R. Exérese cirúrgica associada à injeção
Nos casos relacionados à intubação orotraqueal de toxina botulínica como novo tratamento do
prolongada pode-se observar sua regressão granuloma de processo vocal. Revista eletrônica
espontânea por meio da fonoterapia exaustiva de ORL. 2002; 6: 21-24.
ou ainda resolução após remoção cirúrgica,
| 61 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
GRANULOMA GLÓTICO POR TUBO DE MONTGOMERY
9. Santos P, Afrassiabi A, Weymuller E. Prospective
studies evaluaing the standard endotracheal
tube and a prototype endotracheal tube. Ann
Otol Rhinol Laringol. 1989; 98: 935-940.
10. Yilmazer C, Sener M, Yilmaz I. Bilateral giant
posterior laryngeal granulomas with dyspnea: a
rare complication of endotracheal intubation.
Anesth Analg. 2005; 101: 1881-1882.
11. De Biase N, Master S, Pontes P, De Biase S.
Granuloma Posterior da Laringe: Evolução Após
Injeção de Botox. Rev Bras Otorrinolaringol.
2001; 67: 557.
12. Shoffel-Havakuk H, Halperin D, Yosef L,
Feldberg E, Lahav Yonatan. Lesions of the
Posterior Glottis: Clinical and Pathologic
Considerations and Treatment Outcome. Journal
of Voice 2014; 28: 263.
13. Wang CT, Lai MS, Lo WC, Liao LJ, Cheng PW.
Intralesional steroid injection: an alternative
treatment option for vocal process granuloma in
ten patients. Blackwell Publishing Ltd. Clinical
Otolaryngology. 2013; 38: 69-94.
14. Song Y, Shi L, Zhao Y, Zhao D, Shi M, Deng Z.
Surgical Removal Followed by Radiotherapy for
Refractory Vocal Process Granuloma. Journal of
Voice 2012; 26: 666.
15. Hong-Gang D, He-Juan J, Chun-Quan Z,
Guo-Kang F. Surgery and proton pump inhibitors
for treatment of vocal process granulomas. Eur
Arch Otorhinolaryngol. 2013; 270: 2921-2926.
| 62 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
MÚLTIPLOS FENÔMENOS EMBÓLICOS
PULMONARESE PERIFÉRICOS
SECUNDÁRIOS À TROMBOFLEBITE DE VEIA
JUGULAR INTERNA: UM RELATO DE CASO DE
SÍNDROME DE LEMIERRE
MULTIPLE PULMONARY AND PERIPHERAL EMBOLIC PHENOMENA SECUNDARY TO INTERNAL
JUGULAR VEIN TROMBOPHLEBITIS: A LEMIERRE’S SINDROME CASE REPORT
Mary Cristina Bentes Pontes,* Victor de Sá Guimarães Fleury Machado,* Lívia Garcia Mendonça de Oliveira,*
Guilherme Augusto Pivoto João,* Eduardo da Silva Ramos,*** Henrique Samuel Carvalho de Albuquerque****
Resumo
A Síndrome de Lemierre (SL) é uma doença rara com acometimento basicamente em jovens,
caracteriza-se por febre, dor cervical e manifestações respiratórias, estas oriundas de
tromboflebite da veia jugular interna, secundária a uma infecção da orofaríngea, causada pelo
Fusobacterium necrophorum, patógeno anaeróbio, que promove uma fonte de bacteremia
contínua cursando com êmbolos sépticos pulmonares e em outros órgãos. Pouco conhecida
e dificilmente diagnosticada, aumentando assim a morbidade e mortalidade caso não seja
instaurado precocemente o tratamento adequado com antibioticoterapia. Discorremos sobre
um paciente do sexo masculino, 34 anos, com quadro de febre, calafrios que evoluiu com dor
em região cervical posterior. Tomografia de tórax com múltiplas lesões pulmonares, trombose
venosa em veia jugular interna à direita e em membro inferior direito, sendo o quadro clínico
compatível com a síndrome de Lemierre. Apresentou significativa melhora após tratamento com
antibióticos.
Palavras-chave: Síndrome de Lemierre, trombose venosa, injúria pulmonar.
Abstract
Lemierre syndrome (LS) is a rare disease wich affects basically young people, characterized by
fever, neck pain and respiratory symptoms, these coming from thrombophlebitis of the internal
jugular vein secondary to oropharyngeal infection caused by Fusobacterium necrophorum, an
anaerobic pathogen, which promotes a continuous source of bacteremia concomitant with septic
pulmonary embolism and in other organs. Unheard of and difficult to de diagnosed, thereby
with high morbidity and mortality if an appropriate treatment with antibiotic therapy is not
initiated early. Case report over a male patient, 34, with fever, chills that envolved with pain
in the posterior cervical region. Thorax tomography with multiple pulmonary lesions, venous
thrombosis in the internal jugular vein to the right and the right lower limb and and the clinical
presentation compatible with Lemierre syndrome. Patient presented significant improvement
after treatment with antibiotics.
Keywords: Lemierre syndrome, venous thrombosis, pulmonary injury.
* Médicos residentes de Clínica Médica do Hospital Universitário Nilton Lins.
** Médico infectologista e preceptor da Residência de Clínica Médica do Hospital Universitário Nilton Lins.
*** Médico neurologista e preceptor da Residência de Clínica Médica do Hospital Universitário Nilton Lins.
**** Interno do 6.º ano de Medicina da Universidade Nilton Lins.
| 63 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
MÚLTIPLOS FENÔMENOS EMBÓLICOS PULMONARESE PERIFÉRICOS SECUNDÁRIOS À TROMBOFLEBITE DE VEIA JUGULAR INTERNA:
UM RELATO DE CASO DE SÍNDROME DE LEMIERRE
Introdução
pelo interior do Amazonas e tabagismo (cinco
maços/ano).
Síndrome de Lemierre, também conhecida
como necrobacilose, é uma complicaçcão
potencialmente fatal, caracterizada por uma
tríade clássica, de infeccção orofaríngea,
trombose de veia jugular e sepse embólica. A
mortalidade é de 90% nos pacientes acometidos.
É uma condição rara, com um número de
casos relatados de um por milhão a cada
ano. A incidência é maior em adultos jovens,
entretanto pode ocorrer em todas as faixas
etárias.1 O agente etiológico mais frequente
é o Fusobacterium necrophorum, havendo
casos descritos de infecção por Staphylococcus
aureus,2 Porphyromonas spp.3 e Streptococcus
pyogenes.4 Uma minoria manifesta a tríade
ou evidência de trombose de veia jugular ao
exame.5 Portanto, a apresentação clínica pode
variar consideravelmente, envolvendo uma
infecção primária, a qual pode incluir febre,
odinofagia e edema, associada à tromboflebite,
dor pleurítica, hemoptise, dispneia ou artralgia,
resultando em tromboembolismo séptico.6
À admissão, apresentava-se com palidez
cutâneo mucosa, taquidispneia, febre (40ºC) e
pressão arterial de 140 x 100 mmHg. Ao exame
físico, foi notada lesão endurecida em região
cervical posterior direita com sinais flogísticos,
além de expansibilidade torácica e murmúrio
vesicular diminuídos à direita, com estertores
crepitantes em base. Seus exames laboratoriais
demonstraram hiperglicemia, hipocalemia,
leucocitose com desvio à esquerda e elevação
das provas inflamatórias. O raio x de tórax
evidenciou opacidade heterogênia em base
pulmonar direita. Foi então iniciado tratamento
empírico com Ceftriaxona e realizada pesquisa
de BAAR no escarro.
No terceiro dia pós-admissão, ainda apresentava
persistência dos sintomas clínicos e episódios de
diarreia, evoluindo com cervicalgia à direita.
Foram solicitadas culturas microbiológicas
e troca do antibiótico para Ciprofloxacino
e Clindamicina. Também foram realizadas
USG da região cervical, que evidenciou lesão
Relato de Caso
hiperecoica em veia jugular interna direita
Paciente do sexo masculino, 34 anos, admitido no sem contiguidade. Posteriormente realizouServiço de Clínica Médica após procurar unidade se tomografia de tórax, onde foram vistas
de urgência apresentando quadro de dispneia, opacidades arredondadas, moderadamente
dor torácica, ventilatório dependente, turvação bem marginadas, com densidades de partes
visual e astenia intensa. Havia duas semanas moles, medindo 3,2 cm no maior diâmetro,
anteriores aos sintomas respiratórios, informou correspondendo a focos circunscritos de tecido
início do quadro com febre, temperatura anormal, caracterizando nódulos e áreas
axilar de 39ºC, associado a calafrios, sendo, à radioluscente central em alguns nódulos com
época, medicado com sintomáticos. Realizou cavitações (Figuras 1A e 1B). Foi-nos entregue o
também teste para detecção de malária com resultado da pesquisa de BAAR: as duas amostras
resultado negativo. Antecedentes pessoais e foram negativas. Iniciadas, então, investigações
comorbidades, relatou diabetes mellitus tipo adicionais, incluindo pesquisa para neoplasia.
II, não insulino-dependente, viagem recente
| 64 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Pontes et al
1A
1B
1C
Figuras: 1A: Tomografia de tórax: opacidades arredonadas, moderadamente bem marginadas, medindo
1,8 cm de diâmetro, caracterizando nódulos de localização esparsa bilateral. 1B: Tomografia de tórax:
nódulos marginados cavitados, de localização difusa, predominantemente subpleural, medindo até
3,2 cm no diâmero maior ao corte axial. 1C: Tomografia de tórax: opacidades marginais de contornos
irregulares, medindo 2,1 x 1,7 cm, de localização apical no lobo superior direito e 2,7 x 2,2 cm, de
localização no segmento basal anterior do lobo inferior direito.
Não obstante a terapêutica instituída, no
sétimo dia de internação, ainda persistia a
febre alta e quadro séptico seguido de queda
dos índices hematimétricos, necessitando de
transfusão de concentrado de hemácias (duas
unidades). Evoluiu ainda com lesão endurecida
A
e dor intensa em membro inferior direito. Foi
realizado Eco Doppler venoso, que evidenciou
trombose venosa em sistema tibial profundo
e poplíteo distal, além de trombo em jugular
interna direita (Figuras 2A e 2B), mesmo com o
uso de heparina profilática.
B
Figura 2A: Eco Dopler venoso de membro inferior direito: trombose em sistema tibial profundo e
poplíteo distal. Figura 2B: USG de região cervical: trombo em jugular interna direita.
Agregando a evolução dos sinais e sintomas
apresentados, corroborou-se a hipótese de
Síndrome de Lemierre, por conta da trombose
de jugular associada à embolia séptica pulmonar
e periférica, o paciente foi questionado sobre a
ocorrência de amigdalite no início do quadro,
porém não recordava. Nenhum microrganismo
foi isolado nas hemoculturas. No 8.º dia de
internação, foram trocados os antibióticos em
curso por Meropenem e vancomicina. A partir de
tal medida, houve melhora progressiva e rápida
do quadro clínico e laboratorial, sendo mantido
o tratamento com Meropenem, estendido para
21 dias e associado, então, a metronidazol
oral. A anticoagulação foi suspensa por falta de
evidências que comprovem seu benefício.
Os episódios de hiperglicemias foram corrigidos
| 65 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
MÚLTIPLOS FENÔMENOS EMBÓLICOS PULMONARESE PERIFÉRICOS SECUNDÁRIOS À TROMBOFLEBITE DE VEIA JUGULAR INTERNA:
UM RELATO DE CASO DE SÍNDROME DE LEMIERRE
com medidas dietéticas e insulinização
plena
conforme
protocolo
hospitalar
baseado no esquema basal-bolus. O controle
hidroeletrolítico e da função renal foram
realizados com correção adequada quando
necessário. Os níveis pressóricos mantiveram-se
estáveis, sem variações significativas.
o uso da penicilina. Porém, nos anos 90, houve
um aumento do número de casos, atribuídos ao
uso indiscriminado de antibióticos.10,11
Uma série de casos foi utilizada para comparar
diferentes definições, sendo rejeitada a
puramente microbiológica. A melhor opção foi
um híbrido de critérios clínico e microbiológico,
A tomografia computadorizada de tórax após com evidência de lesões metastáticas
o curso de antibióticos mostrou redução nos pulmões e/ou outros sítios, além de
das cavitações pulmonares e a USG Doppler tromboflebite venosa de jugular interna, sendo
evidenciou recanalização em veia jugular que alguns autores não requerem o isolamento
interna direita. O abcesso em membro inferior do Fusobacterium sp para o diagnóstico.12
direito foi drenado, não sendo coletada
amostra para cultura. Após completado A maioria dos casos ocorre em adolescentes e
o curso da antibioticoterapia, o paciente adultos jovens, saudáveis e sem comorbidades,
recebeu alta hospitalar, permanecendo com com manifestações clínicas que incluem febre
antibioticoterapia oral por seis semanas.
alta e calafrios, alterações respiratórias e
astenia. Nosso paciente encontra-se dentro
da faixa etária classicamente envolvida nessa
Discussão do Caso
síndrome, porém não era previamente hígido,
A Síndrome de Lemierre, descrita pela primeira sendo portador de diabetes mellitus tipo II não
vez em 1900, por Courmont e Cade, por meio insulino-dependente e tabagista. Entretanto,
de um caso de sepse grave após uma infecção existem alguns relatos na literatura de
amigdaliana, é mais comumente causada por pacientes com essa síndrome e portadores de
13
um anaeróbio Gram negativo não formador comorbidades.
de esporos, o Fusobacterium necrophorum.
As fusobactérias são bacilos Gram negativos Em 97% dos casos há embolia séptica para
anaeróbios obrigatórios que fazem parte da o pulmão e para outros lugares, podendo
flora normal do trato respiratório superior, gerar inclusive artrite séptica e osteomielite.
genital feminino e gastrointestinal. Por conta Existem casos descritos de abscessos hepáticos,
dos abscesos necróticos produzidos pelo trombose do seio cavernoso e infarto cerebral
14
Fusobacterium necrophorum, a condição passou relacionados à síndrome.
a ser conhecida como necrobacilose.7
O diagnóstico pode ser feito por meio de
A principal divulgação da síndrome foi feita tomografia computadorizada de tórax, que
por André Lemierre, em 1936, em uma revisão demonstra opacidades bilaterais e ainda
de mais de vinte casos de sepse pós-faringite, derrames pleurais pequenos com possibilidade
destacando a tromboflebite séptica como de detecção de cavitação, ou por ecografia
característica da doença, secundária a uma simples ou ainda por Duplex Scan, que pode
15
infecção por anaeróbios na região da cabeça demonstrar trombose e sua extensão. O caso
ou pescoço, complicada com embolização relatado demonstra na tomografia de tórax
séptica de órgãos a distância, por disseminação múltiplas opacidades marginadas bilaterais,
subpleurais,
algumas
hematogênica.8 Apesar de o evento inicial ser predominantemente
mais frequentemente atribuído a uma faringite, com cavitações. Associado às opacidades
também pode ser associado à mastoidite, lesões pulmonares, foi visto trombose em sistema
dentárias ou ainda a outro sítio que não cabeça tibial profundo e poplíteo distal, no Eco Dopler
venoso de membro inferior direito e trombo em
e pescoço.9
jugular interna direita vista na USG de região
Na era pré-antibiótica, apresentava uma grande cervical. Caracterizando, então, múltiplos
mortalidade, diminuindo consideravelmente com fenômenos embólicos pulmonares e periféricos,
| 66 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Pontes et al
secundários à tromboflebite de veia jugular
interna.
O diagnóstico deve ser iniciado pela identificação
do microrganismo por hemocultura, o que nem
sempre é conseguido. O Fusobacterium sp. é
difícil de ser identificado e se confunde com
Bacteroides sp. Frequentemente é encontrado
associado com outros patógenos (33% dos
casos). Entretanto, existem outros agentes
etiológicos como Streptococcus sp., Bacteroides
sp., Peptostreptococcus sp. No paciente do
caso relatado, não foi identificado nenhum
microrganismo. Isso pode dever-se ao uso prévio
de antibióticos, bem como a não solicitação de
hemoculturas anaeróbias.16
O tratamento é baseado em antibioticoterapia
com cobertura para anaeróbios, com
duração mínima de quatro semanas. Os
mais preconizados são os betalactâmicos
resistentes à betalactamases, metronidazol
ou clindamicina. Outros tratamentos, como a
ligadura ou excisão da veia jugular acometida,
são raros. Atualmente a anticoagulação ainda é
controverso, por não haver evidências científicas
de estudos controlados e randomizados, em que
se baseie essa recomendação.17,18
Síndrome de Lemierre é uma doença rara
e potencialmente fatal. Nós relatamos
esse caso para conscentizar os profissionais
de saúde a respeito dessa síndrome e
suspeitá-la em pacientes com febre, dor
cervical e manifestaçãoes respiratórias, que
posteriormente mostram sinais de doença
sistêmica. As culturas foram negativas, mas
não são imperativas para o diagnóstico. O
rápido diagnóstico e tratamento adequado
são fundamentais, previnindo a consequente
morbidade e mortalidade.
Referências
1. Shah SA, Ghani R. Lemierre’s syndrome:
a forgotten complication of oropharyngeal
infection. J Ayub Med Coll Abottabad. 2005;
17(1): 30-33.
2. Boga C, Ozdogu H. Lemierre syndrome
variant: staphylococcus aureus associated with
thrombosis of both the right internal jugular
vein and the splenic vein after the exploration
of a river cave. J Thromb Thrombolysis. 2007;
23: 151-4.
3. Vandenbos F, Roth S, Girard-Pipau F, Neri
D, Boscagli Melaine A, Montagne M. Lemierre
syndrome due to Porphyromonas spp. in a 21
year-old patient. Rev Med Interne. 2000; 21:
909-10.
4. Wilson P, Tierney L. Lemierre syndrome
caused by Streptococcus pyogenes. Clin Infect
Dis. 2005; 41: 1208-9.
5. Bliss SJ, Flanders SA, Saint S. Clinical problemsolving: a pain in the neck. N Engl J Med. 2004;
350: 1037-42.
6. Baig MA, Rasheed J, Subkowitz D, Vieira J. A
review of Lemierre syndrome. Internet J Infect
Dis. 2006; 5(2).
7. Riordan T. Human Infection with Fusobacterium
necrophorum (necrobacillosis), with a focus on
lemierre’s syndrome. Clin Microbiol Rev. 2007;
20(4): 622-659.
8. Lemierre A. On certain septicemias due to
anaerobic organisms. Lancet. 1936; 1: 701-3.
9. Chirinos JA, Lichtstein DM, Garcia J, Tamariz
LJ. The evolution of Lemierre syndrome: report
of 2 cases and review of the literature. Medicine
(Baltimore). 2002; 81: 458-65.
10. Sinave CP, Hardy GJ, Fardy PW. The Lemierre
syndrome: suppurative thrombophlebitis of the
internal jugular vein secondary to oropharyngeal
infection. Medicine (Baltimore). 1989; 68: 8594.
11. Hagelskjaer LH, Prag J, Malczynski
J, Kristensen JH. Incidence and clinical
epidemiology of necrobacillosis, including
Lemierre’s syndrome, in Denmark 1990-95. Eur
J Clin Microbiol Infect Dis. 1998; 17: 561-5.
12. Riordan T. Human Infection with
Fusobacterium necrophorum (necrobacillosis),
with a focus on lemierre’s syndrome. Clin
| 67 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
MÚLTIPLOS FENÔMENOS EMBÓLICOS PULMONARESE PERIFÉRICOS SECUNDÁRIOS À TROMBOFLEBITE DE VEIA JUGULAR INTERNA:
UM RELATO DE CASO DE SÍNDROME DE LEMIERRE
Microbiol Rev. 2007; 20(4): 622-659.
13. Afra K, Laupland K, Leal J, Lloyd T, Gregson
D. Incidence, risk factors, and outcomes
of Fusobacterium species bacteremia. BMC
Infectious Diseases 2013, 13: 264.
14. Chirinos JA, Lichtstein DM, Garcia J, Tamariz
LJ. The evolution of Lemierre syndrome: report
of 2 cases and review of the literature. Medicine
(Baltimore). 2002; 81: 458-65.
15. Auber AE, Mancuso PA. Lemierre syndrome:
magnetic resonance imaging and computed
tomographic appearance. Mil Med. 2000; 165:
638-40.
16. Andes DR, Urban AW, Acher CW, Maki DG.
Septic thrombosis of the basilica, axillary,
and subclavian veins caused by a peripherally
inserted central venous catheter. Am J Med.
1998; 105: 446-50.
17. Seidenfeld SM, Sutker WL, Luby JP.
Fusobacterium
necrophorum
septicemia
following oropharyngeal infection. Jama. 1982;
248: 1348-50.
18. Golpe R, Marin B, Alonso M. Lemierre’s
syndrome (necrobacillosis). Postgrad Med J.
1999; 75: 141-4.
| 68 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
SCHWANNOMA GÁSTRICO MIMETIZANDO GIST:
UM RELATO DE CASO
GASTRIC SCHWANNOMA MIMICKING GIST: A CASE REPORT
Gerson Suguiyama Nakajima,* Rubem Alves da Silva Neto,** Marcos Vinícius Monteiro Lins de Albuquerque,** João José Corrêa Bergamasco,**
Mônika Maya Tsuji Nishikido,*** Diego da Costa Matos***
Resumo
Schwannomas são tumores benignos mesenquimais de células nervosas, os quais acometem
mais comumente os nervos cranianos e periféricos, porém podem acometer também o aparelho
digestivo, sendo o estômago o local mais comum no trato gastrintestinal. Este relato descreve o
caso de uma paciente de 44 anos, com queixas de epigastralgia e pirose retroesternal, portadora
de uma massa em topografia de fundo gástrico, visibilizada em endoscopia digestiva alta e
tomografia computadorizada, sugestiva de Tumor Estromal Gastrointestinal (GIST). Foi submetida
a uma gastrectomia parcial, com excisão total da tumoração a qual foi encaminhada para estudo
anatomopatológico e complementado pelo estudo imuno-histoquímico, que revelou ser tumor
mesenquimal, de origem nervosa, compatível com Schwannoma.
Palavras-chave: Neurilemoma, neoplasias gastrintestinais, imuno-histoquímica.
Abstract
Schwannomas are benign mesenchymal tumors of nerve cells, which most commonly affect the
cranial and peripheral nerves, but can also affect the digestive tract, and the most common site in
the gastrointestinal tract is stomach. A 44 years old female patient case report presenting epigastric
and retrosternal heartburn, with a mass in the topography of the gastric fundus, visualized on
endoscopy and CT, suggestive Gastrointestinal Stromal Tumor (GIST). She underwent a partial
gastrectomy with excision of the tumor, which was sent to pathology and complemented by an
immunohistochemistry study that revealed a nervous origin mesenchymal neoplasy, consistent
with Schwannoma.
Keywords: Neurilemmoma, gastrointestinal neoplasms, immunohistochemistry.
Introdução
como neurilemomas, são mais raros no trato
gastrointestinal; quando encontrados, o
Tumores mesenquimais do aparelho digestivo sítio mais comum também é o estômago e
são neoplasias de células do tecido conjuntivo sua incidência compreende 0,2% de todos os
representados
pelos
Tumores
Estromais tumores gástricos e 4% de todos os tumores
Gastrointestinais
(GIST),
leiomiomas, gástricos benignos.2,3
leiomiossarcomas e schwannomas.1
Os schwannomas que acometem o estômago
Dentre estes, o GIST é o tumor mesenquimal normalmente são originários das células do
mais comum no estômago, com incidência de plexo de Auerbach.4 Geralmente são benignos
60-70%. Os schwannomas, também conhecidos e assintomáticos; quando sintomáticos, as
* Professor associado do Depto. de Clínica Cirúrgica/FMUFAM; coordenador da disciplina Cirurgia do Aparelho Digestório, Órgãos, Anexos; supervisor
da Residência de Cirurgia Digestiva do HUGV.
** Médico residente de Cirurgia do Aparelho Digestivo do HUGV.
*** Médico(a) residente de Cirurgia Geral do HUGV.
| 69 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
SCHWANNOMA GÁSTRICO MIMETIZANDO GIST: UM RELATO DE CASO
principais queixas são: hemorragia digestiva alta
e massa palpável abdominal.5 Sua característica
macroscópica é de uma massa exofítica surgindo
da parede gástrica, semelhante a neoplasias
como GIST, leiomiomas ou leiomiossarcomas,
sendo desafiador o diagnóstico pré-operatório.6
O diagnóstico definitivo inclui o exame imunohistoquímico, positivo para proteínas S100 e
Proteínas Ácidas Fibrilar Glial (GFAP) e negativo
para CD 117, produto do gene c-KIT.3,7,8
genitor faleceu por neoplasia pulmonar e sua
progenitora de neoplasia de bexiga. Negou
etilismo ou tabagismo.
Admitida no Serviço de Cirurgia Geral do
Hospital Universitário Getúlio Vargas/Ufam,
com a queixa de epigastralgia, apresentando-se
em bom estado geral, normocorada, eupneica,
hidratada, anictérica. Ao exame físico especial
o abdome encontrava-se plano, flácido,
timpânico e discreta dor abdominal à palpação
O objetivo deste trabalho é relatar o caso profunda de região epigástrica.
de paciente portadora de lesão expansiva
em fundo gástrico, sugestiva de GIST, sendo Na endoscopia digestiva alta, foi verificada
tratada cirurgicamente e que evoluiu de forma lesão polipoide sugerindo ser de localização
satisfatória, porém o resultado do imuno- submucosa, endurecida à palpação com pinça,
histoquímico foi de schwannoma benigno.
medindo 3 cm; evidenciada espessamento tênue
de mucosa antral, além de enantema com áreas
de friabilidade. Sua hipótese diagnóstica foi
Relato de Caso
de Tumor Gástrico Estromal (GIST). Realizada
Paciente de 44 anos, sexo feminino, natural biópsia, que caracterizou o diagnóstico de
de Amambai/MS e procedente de Manaus/ gastrite crônica inespecífica e ausência de
AM. Iniciou, em março de 2013, um quadro de malignidade no local.
epigastralgia, pirose retroesternal e náuseas
principalmente
relacionados
à
ingestão O estudo propedêutico foi complementado
pela tomografia computadorizada de abdome
alimentar.
que evidenciou lesão expansiva nodular de
Era portadora de diabetes mellitus tipo 2, densidade de partes moles com realce pósnegando outras comorbidades. Foi submetida contraste, situada em topografia da porção
a quatro cirurgias previamente: fistulectomia anterossuperior da grande curvatura gástrica,
anal, dois partos cesáreos e uma laqueadura projetando-se para a luz, medindo 3,8 x 3,0 cm
tubária. Na história familiar, relatou que seu (Figura 1).
Figura 1: Tomografia computadorizada evidenciando tumoração na porção
anterossuperior do estômago.
| 70 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Nakajima et al
Com o diagnóstico de lesão expansiva em
fundo gástrico e hipótese diagnóstica de GIST,
indicou-se o tratamento cirúrgico. O inventário
da cavidade abdominal evidenciou tumoração
em parede anterior do estômago, próximo ao
fundo, na grande curvatura, que acometia
transmuralmente a região (Figura 2); observouse a presença de pequeno linfonodo, com aspecto
macroscópico benigno, de aproximadamente
0,5 cm distante de 1,0 cm da tumoração.
Figura 2 Foto do intraoperatório demonstrando a tumoração em fundo gástrico.
Realizou-se a gastrectomia parcial “em cunha”
com grampeador linear, envolvendo ambas
as paredes (anterior e posterior) na grande
curvatura, excisando-se totalmente a lesão
expansiva (Figura 3). Ressecção linfonodal.
Figura 3 Peça cirúrgica: aspecto macroscópico: peça fechada e aberta respectivamente.
| 71 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
SCHWANNOMA GÁSTRICO MIMETIZANDO GIST: UM RELATO DE CASO
O pós-operatório seguiu sem intercorrências e
a paciente obteve alta hospitalar no quinto dia
pós-operatório.
podem ser semelhantes em modalidades de
imagem preliminares. É necessário diferenciar
entre schwannomas gástricos de outros
tumores mesenquimais pela disparidade de
O
laudo anatomopatológico
evidenciou seu potencial maligno. GISTs, que são tumores
neoplasias de células fusiformes, com gastrointestinais mesenquimais mais comuns,
margens cirúrgicas livres, compatível com foram recentemente demonstrados que têm
GIST; complementado pelo exame imuno- alto potencial de transformação maligna.
histoquímico que apresentou evidências da Os schwannomas, no entanto, permanecem
expressão para proteína S100 e proteína quase uniformemente benigno e raramente são
ácida fibrilar glial (GFAP), consistentes com o sintomáticos.10
diagnóstico de schwannoma benigno. O exame
anatomopatológico do linfonodo não mostrou Embora o diagnóstico definitivo de schwannomas
gástricos seja determinado pelo exame
malignidade.
anatomopatológico
e
imuno-histoquímico,
exames como endoscopia digestiva alta,
Discussão
tomografia computadorizada e outros métodos
de estudo podem ser úteis em fornecerem
Schwannomas ou neurilemomas são tumores
informações limitadas sobre o tumor.7
mesenquimais de células fusiformes, que
se originam a partir de qualquer nervo que
A diferenciação entre schwannoma gástrico
tenha uma bainha de células de Schwann. No
e GIST pode ser difícil no pré-operatório. Ao
trato gastrointestinal, os GISTs constituem
exame tomográfico apresenta-se principalmente
o maior grupo de tumores mesenquimais,
como massa submucosa do estômago, bem
enquanto schwannomas são raros e encontrados
circunscrita, com características distintas
principalmente em idosos (com idade média
com realce de contraste homogêneo ou
de 58 anos), mostrando uma ligeira predileção
heterogêneo sem sinais de necrose, calcificação
feminina.7 Representam apenas 0,2% de todos os
ou degenerações císticas, em contraste com o
tumores gástricos, e envolvem principalmente a
GIST.7,11
submucosa e muscular própria.2 A transformação
maligna do schwannoma gástrico é muito rara,
No exame endoscópico podem-se identificar
sendo documentados na literatura, apenas oito
lesões submucosas, com ou sem ulceração,
comunicações.7
e ser útil na determinação da sua localização
e caracterização. Estudos endoscópicos e
Apresentam crescimento lento e exofítico e são
de imagem podem determinar o diagnóstico
normalmente assintomáticos. Por esse padrão de
provável de schwannoma, mas não pode
crescimento indolente, esses tumores são, com
distingui-la de outras neoplasias mesenquimais;
frequência, descobertas incidentais via exames
por isso, o diagnóstico conclusivo é
de imagens como tomografia computadorizada e
histopatológico e complementado pelo estudo
ressonância nuclear magnética ou endoscopias.2
imuno-histoquímico.9
Quando sintomáticos, podem causar desconforto
abdominal, dor ou sintomas digestivos, assim
A origem histológica dos tumores mesenquimais
como a paciente deste relato. Uma massa
do trato gastrointestinal foi apenas recentemente
palpável também pode estar presente quando
esclarecida por meio de procedimentos imunoo tumor é volumoso e exofítico; em casos de
histoquímicos. Positividade forte para a proteína
ulceração profunda, hemorragia digestiva alta
S-100 e GFAP, além de coloração negativa para
também pode estar presente.7-10
CD117 (c-Kit) caracterizam os schwannomas.3,8
Esses tumores possuem um excelente prognóstico
O diagnóstico diferencial e subsequente
após a ressecção cirúrgica completa da lesão,
manejo dos tumores submucosos gástricos
não havendo necessidade de se realizar grandes
são efetivamente difíceis. GISTs, leiomiomas,
ressecções, pelo comportamento benigno do
leiomiossarcomas, schwannomas e outros
| 72 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Nakajima et al
tumor. A taxa de recorrência é praticamente
nula.9
No presente caso, a paciente foi submetida à
gastrectomia parcial “em cunha”, excisandose totalmente a lesão expansiva, com margem
de segurança, a qual se obteve a confirmação
diagnóstica de schwannoma gástrico, uma
patologia rara e eminentemente benigna, com
um excelente prognóstico em longo prazo.
Referências
1. Miettinen M, Lasota J. Gastrintestinal stromal
tumors – definition, clinical, histological,
immunohistochemical, and molecular genetic
features and differential diagnosis. Virchows
Arch. 2001; 438(1): 1-12.
Benign schwannoma of the gastrointestinal tract:
a clinic pathologic and immunohistochemical
study. Hum Pathol. 1988; 19(3): 257-64.
9. Reta JAV, Terrazas JMS, González ET, Murga
RF, Guerrero ALV, Guerrero ARV, González GAG.
Schwannoma gástrico. Reporte de un caso.
Asociación Mexicana de Cirugía Endoscópica
2010; 11(2): 103-6.
10. Alvarez JF, Ben-David K. Gastric Schwannoma:
A rare find. J Gastrointest Surg. 2013; 17(12):
2179-81.
11. Hong HS, Ha HK, Won HJ, Byun JH, Shin
YM, Kim AY, Kim PN, Lee MG, Lee GH, Kim MJ.
Gastric schwannomas: radiological features
with endoscopic and pathological correlation.
Clin Radiol. 2008; 63(5): 536-42.
2. Yoon W, Paulson K, Mazzara P, Nagori S,
Barawi M, Berri R. Gastric Schwannoma: A Rare
but Important Differential Diagnosis of a Gastric
Sub mucosal Mass. Case Rep Surg. 2012.
3. Zheng L, Wu X, Kreis ME, Yu Z, Feng L, Chen
C, Xu B, Bu Z, Li Z, Ji J. Clinic pathological
and Immunohistochemical Characterization of
Gastric Schwannomas in 29 Cases. Gastroenterol
Res Pract. 2014.
4. Fujiwara S, Nakajima K, Nishida T, Takahashi
T, Kurokawa Y, Yamasaki M, Miyata H, Takiguchi
S, Mori M, Doki Y. Gastric schwannomas revisted:
has precise preoperative diagnosis become
feasible? Gastric Cancer. 2013; 16(3): 318-23.
5. Melvin WS, Wilkinson MG. Gastric schwannoma:
Clinical and pathologic considerations. Am Surg.
1993; 59(5): 293-6.
6. Miettinen M, Majidi M, Lasota J. Pathology
and diagnostic criteria of gastrintestinal stromal
tumors (GISTs): a review. Eur J Cancer. 2002;
38(5): 39-51.
7. Atmatzidis S, Chatzimavroudis G, Dragoumis
D, Tsiaousis P, Patsas A, Atmatzidis K. Gastric
schwannoma: a case report and literature
review. Hippokratia. 2012; 16(3): 280-2.
8. Daimaru Y, Kido H, Hashimoto H, Enjoji M.
| 73 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HÉRNIA DE AMYAND: RELATO DE CASO
AMYAND’S HÉRNIA: CASE REPORT
Paulo Inácio Diniz,* Giselle Macedo,* Vitor Montenegro,* Ricardo Estevam,** João Bergamasco,*** Isabela Carvalho****
Resumo
Hérnia de Amyand é uma doença cirúrgica rara com diagnóstico pré-operatório difícil, na qual o
apêndice vermiforme encontra-se dentro do saco herniário inguinal. O objetivo deste estudo foi
relatar o caso clínico de paciente do sexo masculino, com 68 anos de idade apresentando hérnia
inguinal direita com achado intraoperatório de hérnia de Amyand, operado no Serviço de Cirurgia
Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas, Manaus, Amazonas.
Palavras-chave: Hérnia, inguinal, apêndice.
Abstract
Amyand’s hernia is a rare surgical disease which has very difficult diagnosed in the pre operatory,
defined as when the vermiform appendix is inside a inguinal hernia sac. Case report of a 68-yearsold male patient, operated by the Getúlio Vargas University Hospital in Manaus-Amazonas General
Surgical departament, diagnosed on pre operatory like right inguinal hernia, which eventually
turned out to be Amyand’s hernia in surgery.
Keywords: Hernia, inguinal, appendix.
Introdução
Relato de Caso
A hérnia de Amyand, descrita por Claudius
Amyand no ano de 1735, caracteriza-se pela
presença de apendicite aguda no interior do
saco herniário inguinal.1-2 Esse epônimo vem
sendo empregado, mesmo naquelas situações
em que o apêndice cecal encontra-se normal.3
A incidência do apêndice normal dentro do saco
herniário é estimada em aproximadamente 1%
pela literatura.1-2
Paciente do sexo masculino, 68 anos,
aposentado, natural e procedente de
Manacapuru (AM), procurou o ambulatório de
cirurgia geral queixando-se de abaulamento
inguinal à direita havia dois anos, com aumento
progressivo, associado a dor local com irradiação
para coxa direita nos últimos seis meses. Ao
exame físico apresentava abaulamento inguinoescrotal de moderado volume, irredutível e com
impossibilidade de palpação de anel inguinal
externo.
A seguir relatamos o caso de um paciente no
qual foi encontrado o apêndice cecal aderido
ao saco herniário, durante herniorrafia inguinal
eletiva.
Após a inguinotomia para realização de
herniorrafia, durante a dissecção e abertura do
saco herniário oriundo do anel inguinal interno,
observou-se a presença do apêndice cecal no
seu interior (Figura1).
* Médico residente de Cirurgia Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
** Médico assistente de Cirurgião Geral do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
*** Médico residente de Cirurgia do Aparelho Digestivo do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
**** Acadêmica de Medicina do 6.º ano da Universidade Federal do Amazonas.
| 74 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
HÉRNIA DE AMYAND: RELATO DE CASO
Figura 1: Apêndice cecal em saco herniário.
Realizado fechamento do saco herniário após
apendicectomia incidental. E posteriormente,
o reparo da parede posterior com a técnica
de Bassini e colocação de tela de Marlex à
Lichtenstein.
Paciente
apresentou
evolução
clínica
satisfatória,
recebendo
alta
hospitalar
no segundo dia de pós-operatório. No
acompanhamento
ambulatorial,
paciente
encontra-se sem queixas ou intercorrências.
Discussão
O apêndice no saco herniário pode estar normal
ou comprometido.3
sexo masculino.5
Os casos com apendicite aguda apresentam
manifestações clínicas variáveis, dependentes
da extensão do processo infeccioso apendicular
e da presença ou não de contaminação
peritoneal. Nos casos típicos encontramos um
doente portador de hérnia inguinal irredutível,
com quadro de escroto agudo, com celulite
ou abscesso na região inguinal, ressaltandose, entretanto, que no exame físico palpatório
não identificamos sensibilidade dolorosa
localizada no ponto de McBurney. O diagnóstico
diferencial é feito com hérnia estrangulada ou
encarcerada.2-5
O diagnóstico dessa enfermidade é feito sempre
5
A presença do apêndice cecal dentro do saco na mesa de cirurgia durante o ato operatório.
herniário inguinal é uma ocorrência rara. Na Se estiver normal recomenda-se redução da
2
literatura a incidência está ao redor de 1%.1-2 víscera e tratamento do saco herniário. O
Mais raro e excepcional é a ocorrência de caso apêndice será retirado se: o paciente autorizar;
de apêndice complicado com apendicite aguda facilitar o tratamento da hérnia; para evitar
dentro do saco herniário. Na literatura essa apendicite aguda pós-operatória por isquemia
apendicular, ao se liberar esse órgão; houver
incidência varia entre 0,13 e 0,1%.1-4
possibilidade de o apêndice estar comprometido
A hérnia de Amyand pode afetar qualquer faixa por causa da estase, sobretudo das hérnias
3
etária (6 semanas – 88 anos) é mais comum no antigas.
| 75 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Diniz et al
A
literatura também recomenda a
apendicectomia por meio da inguinotomia e,
quando não houver contaminação intracavitária,
deve-se realizar o reparo da hérnia no mesmo
tempo cirúrgico.1
Além da raridade desse tipo de hérnia, achamos
importante o seu relato, pois, embora o apêndice
estivesse normal no caso apresentado, a
lembrança da associação entre a hérnia inguinal
direita estrangulada e a apendicite aguda,
orientam os médicos na sua correta conduta
terapêutica dessa emergência cirúrgica.
Referências
1. Cunha HAV, Sugahara RD, Castilho MV. Hérnia
de Amyand. Rev Col Bras Cir. [periódico na
internet] 2009; 36(3): 279-280.
2. Anagnostopoulou S, Dimitroulis D, Troupis TG,
Allamani M, Paraschos A, Mazarakis A, Nikiteas
NI, Kostakis A. Amyand’s hernia: A case report.
Word J Gastroenterol. 2006, ago; 12(29): 47614763.
3. Alcino, LS. Hérnias. 2.ª ed. São Paulo: Editora
Roca, 2006.
4. Salles VJA, Bassi DG, Speranzini MB. Hérnia
de Amyand. Rev Col Bras Cir. [periódico na
Internet] 2006, set-out; 33(5): 339-340.
5. Henriques ASN, Oliveira Júnior RNR, Siqueira
WM, Alves CMR. Hérnia de Amyand: Relato de
Caso. Rev Para Med. 2013, abr-jun; 27(2).
| 76 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TRATAMENTO CIRÚRGICO DE CORPO ESTRANHO
NO BRÔNQUIO PRINCIPAL ESQUERDO
FOREIGN BODY SURGICAL TREATMENT IN THE LEFT MAIN BRONCHUS
Fernando Luiz Westphal,* Luís Carlos de Lima**José Corrêa Lima Netto*** Ricardo Augusto Monteiro Cardoso****Lincoln José Trindade Martins*****
Resumo
Os corpos estranhos de vias aéreas são difíceis de manejar e acarretam risco de morte iminente.
Podem causar insuficiência respiratória aguda e/ou alterações crônicas nas vias aéreas inferiores,
tais como fístulas ou hemoptise. A aspiração de corpos acomete comumente crianças e adolescentes,
porém, em certas ocasiões, pode ocorrer também com adultos, especialmente idosos, mas em
menor escala. Sem diagnóstico específico, o tratamento eficiente da doença depende da rápida
identificação de possível hipoxemia, febre, leucocitose ou infiltrados pulmonares. Pode evoluir
para traqueobronquite, atelectasia e infecções pulmonares. Relatamos um caso de corpo estranho
em um paciente adulto, do sexo masculino, que foi atingido por dois projéteis. Um desses projéteis
atingiu o nariz, perfurando a cavidade nasal e o palato duro, alojando-se na cavidade oral, após
foi broncoaspirado. O projétil ficou alojado no brônquio principal esquerdo.
Palavras-chave: Corpos estranhos, broncoscopia, pulmão/lesões.
Abstract
The foreign bodies in the airway may be difficult to manage and they are a serious risk to the
patient’s life. They may cause acute respiratory insufficiency and/or chronicle alterations in the
airway, such as fistula or hemoptysis. Bronchoaspiration usually happens in newborns, infants and
teenagers, although it also may occur in adults, specially the elderly, it happens in a smaller scale.
Without a specific diagnose, the efficient treatment depends on a quick hypoxemia recognition,
fever, leukocytosis and pulmonary infiltration. It may progress to traqueobronchitis, atelectasis
and pulmonary infection. It’s described the case of an adult patient, male, which has been shot
twice. One of those bullets hit the patient’s nose, went through the nasal cavity and the hard
palate and fell into the oral cavity, then was aspirated. The bullet was lodged in the left main
bronchus.
Keywords: foreign bodies, broncoscopy, lung/injury.
Introdução
A aspiração de um corpo estranho é um acidente
potencialmente grave e que pode levar a óbito.
Nos estágios iniciais da doença, o paciente pode
apresentar engasgos, taquipneia e tosse. Após a
fase inicial, tem início a fase de apresentação
das complicações, tais como: pneumonia,
atelectasia e abcessos pulmonares.
Dependendo do grau de alojamento do corpo
estranho nas vias aéreas, o procedimento
*Professor-adjunto da Universidade Federal do Amazonas.
**Chefe do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital Universitário Getúlio Vargas.
***Médico assistente do Serviço de Cirurgia Torácica do Hospital Universitário Getúlio Vargas
**** Acadêmico de Medicina da Universidade Federal do Amazonas.
***** Acadêmico de Medicina da Universidade Nilton Lins.
| 77 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TRATAMENTO CIRÚRGICO DE CORPO ESTRANHO NO BRÔNQUIO PRINCIPAL ESQUERDO
padrão, a broncoscopia, pode não ser a via
mais eficaz para a remoção do objeto, sendo
necessário outro tipo de intervenção cirúrgica.
Apresentamos um caso de aspiração de
projétil de arma de fogo que foi removido por
toracotomia associada a broncoscopia rígida.
A seguir relatamos o caso de um paciente no
qual foi encontrado o apêndice cecal aderido
ao saco herniário, durante herniorrafia inguinal
eletiva.
Relato de Caso
Relatamos um caso de corpo estranho de
difícil manejo em um paciente adulto, do sexo
masculino, vítima de tentativa de homicídio,
no qual foi alvejado com dois tiros, em que
um dos projéteis atingiu seu nariz, perfurando
o palato duro e atingindo a orofaringe, sendo,
então, broncoaspirado (Figura 1). Este ficou
alojado no brônquio principal esquerdo,
quando o normal seria alojar-se no direito, por
conta da sua anatomia mais retílinea. O outro
projétil transfixou o hemitórax direito com o
desenvolvimento de hemotórax, que foi tratado
com pleurostomia intercostal fechada (Figuras
2A e 2B e Figura 3).
A remoção por via endoscópica não foi possível
por conta dos danos causados pelo projétil à
cavidade oral do paciente e também à maneira
que esse corpo estranho oclusor estava aderido
ao brônquio, impedindo seu deslocamento.
Para a remoção do corpo estranho, o paciente
foi submetido a uma toracotomia posterolateral
direita com abertura da traqueia ao nível da
carina e remoção do corpo estranho. Paciente
evoluiu sem complicações recebendo alta no 7.º
dia de internação.
Figura 1: Seta indicando o orifício de entrada do projétil em face.
| 78 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Westphal et al
Figura 2A: Raio x de tórax evidenciando projétil em brônquio fonte esquerdo e dreno de tórax direito.
Figura 2B: Tomografia computadorizada revelando projétil em brônquio fonte esquerdo.
Figura 3: Fratura do seio maxilar direito e osso nasal.
| 79 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TRATAMENTO CIRÚRGICO DE CORPO ESTRANHO NO BRÔNQUIO PRINCIPAL ESQUERDO
Discussão
A aspiração de um corpo estranho é um acidente
potencialmente grave e que pode levar
morbidade e a óbito.1 De acordo com o conselho
de segurança nacional dos EUA, a osbtrução
das vias aéreas, por objetos orgânicos ou
inorgânicos, entre 2005 e 2007, foi responsável
por 3.700 óbitos, principalmente de crianças e
idosos.2
Os objetos com alto teor de óleo em sua
composição podem causar grave inflamação
da mucosa, além de acúmulo de tecido de
granulação.3 Características que também podem
ser observadas na presença prolongada de
objetos enferrujados, pontiagudos, metálicos
(como o projétil relatado no caso) e cápsulas
de medicamentos.3
Corpos estranhos têm a tendência de se alojar
no brônquio fonte direito, graças as suas
características anatômicas: mais calibroso,
vertical e curto que o esquerdo.1 Entretanto,
como no caso apresentado, objetos podem
ingressar e ficar alojados no brônquio fonte
esquerdo, dependendo da posição na qual
o paciente estava no momento do evento
aspirativo.
O relato mais antigo relacionado de uma
broncotomia para a remoção de um corpo
estranho ocorreu em 1759.4 Já a endoscopia
relacionada à remoção desses corpos ocorreu
pela primeira vez em 1897; desde então,
graças as suas melhorias ao longo do tempo,
a broncoscopia vem sendo considerada o
procedimento padrão-ouro para análise e
remoção de corpos invasores das vias aéreas.5
A radiografia, tomografia computadorizada e a
ressonância magnética auxiliam o diagnóstico
de aspiração de corpo estranho, mostrando o
objeto, identificando áreas de aprisionamento
aéreo, pneumotórax, aéreas de hiperinsulflação
e atelectasia.6 A avaliação das imagens deve
ser feita com cuidado. Certos autores indicam
que 65% das crianças que foram submetidas
ao raio x apresentaram resultados normais;
porém quando submetidas à broncoscopia, por
conta de outros indicadores, foram encontrados
corpos estranhos em suas vias aéreas.7
Em alguns casos, quando objetos estão
alojados no brônquio, ocorrem mudanças no
posicionamento das estruturas mediastinais,
que se deslocam em direção às vias aéreas não
obstruídas durante a expiração.8
A broncoscopia rígida provê uma maior margem
de segurança, recomendando seu uso tanto para
crianças quanto para adultos.9 O broncoscópio
rígido permite uma determinação mais precisa
das possíveis lesões e obstruções das vias aéreas,
permite ventilação da via aérea afetada e maior
eficiência na retirada dos corpos estranhos,
tendo em vista o seu maior calibre.10
Entretanto, o princípio usado na maioria
dos casos de remoção de corpos estranhos
não pôde ser aplicado nesse paciente, pois o
projétil causou fratura do osso maxilar direito e
extrosão traumática de quatro dentes da arcada
dentária superior, logo a inserção e manejo
do equipamento durante o procedimento de
retirada do corpo estranho poderiam concorrer
para a extensão dos danos. Outro fato importante
é que a broncoscopia flexível poderia remover o
corpo estranho, porém, pela fragmentação e a
forma como o projétil estava alojado, tornaram
o manejo do corpo estranho via broncoscopia
flexível, difícil, podendo causar grandes danos
à árvore brônquica e ao paciente.
Em ocasiões nas quais o corpo estranho não
pode ser deslocado por meio da broncoscopia,
recomenda-se a realização de uma toracotomia
seguido de uma broncotomia para retirada do
objeto que obstrui o brônquio.11 A quantidade
de casos que requer esse tipo de procedimento
mais extensivo varia entre 0,3 a 4% dos casos de
aspiração de objetos.12
Antes da execução da cirurgia, convém testar a
manipulação de um objeto similar fora do corpo,
assim o risco de fragmentação ou locomoção
indesejada é minimizado. O planejamento
antecipado da abordagem ao objeto oclusor
do brônquio é fundamental, pois quanto maior
for o número de tentativas, maior será o risco
da ocorrência de algum tipo de complicação
(como edema, perfuração, pneumotórax).3 Um
projétil não é facilmente fragmentado, logo,
foi indicada a remoção na primeira tentativa.
| 80 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Westphal et al
A tática operatória da abordagem da traqueia
terminal, carina e brônquios fontes seguem as
seguintes recomendações. Traqueia terminal,
carina, brônquio fonte direito e terço proximal
do brônquio fonte esquerdo devem ser abordados
por acesso transtorácico direito. Os dois terços
distais do brônquio fonte esquerdo devem ser
abordados por toracotomia posterolateral
esquerda.
5. Dixit S, Agarwal R, Kumar N, Verma RK, Krishna
V, Sahini JL. Management of tracheobronchial
foreign bodies experience of cardiothoracic
deparment of cardiology institute. Indian J
Thorac Cardiovasc Surg. 2011; 12(6): 34-35.
Referências
10. Benedict JW, Wood TE, Wood DE. Endoscopic
diagnosis of thoracic disease. In: Sellke FW,
Nildo P, Swan son S editors. Surgery of the
Chest. 8th ed. Philadelphia: Saunders Elsevier;
2008. p. 65.
6. Bittencourt PF, Camargos PA, Scheinmann
P, de Blic J. Foreign body aspiration: clinical,
radiological findings and factors associated with
its late removal. Int J Pediatr Otorhinolaryngol.
A abordagem realizada para extração do corpo 2006; 70(5): 879-84.
estranho nesse caso foi por meio da toracotomia
posterolateral direita, com abertura da carina 7. Metrangelo S, Monetto C, Meneghini L, Zadra
e brônquis fontes, observando-se uma boa N, Giusti F. Eight years’ experience with foreing
exposição destes.
body aspiration in children: what is really
important for a timely diagnosis? J Pediatr Surg.
Finalizando, corpos estranhos alojados no 1999; 34(8): 1229-31.
brônquio principal esquerdo são uma ocorrência
rara e que pode gerar consequências graves 8. Baharloo F, Veyckemans F, Francis C, Biettlot
como bronquiectasia e atelectasia. Constatado MP, Rodenstein DO. Tracheobronchial Foreign
o corpo estranho nas vias aéreas, por exames Bodies: presentation and management in
de imagem ou endoscopia, deve-se realizar children and adults. Chest. 1999; 155(5): 1357imediatamente a sua retirada. Quando o objeto 62.
oferecer risco à integridade da parede brônquica,
pela sua mobilização, a toracotomia seguida de 9. Weissberg D, Schwartz I. Foreign Bodies In
uma broncotomia deve ser realizada, visando a The Tracheobronchial Tree. Chest. 1987; 91(5):
melhora no prognóstico desse paciente.
730-3.
1. Mahmood M, Imam S, Patel H, King M. Foreign
Body Aspiration of a Dental Bridge in the Left
Mainstem Bronchus. Case Reports in Medicine,
vol. 2012, article ID 798163, 4 pages, 2012. doi:
10.1155/2012798163.
2. Wilcox SR, Ribeiro VS, de Menezes Filho,
Nadel ES, Brown DF. Foreign Body Aspiration
after High-Speed Trauma. J Emerg Med. 2009;
37(4): 411-4.
3. Gonçalves MEP, Cardoso SR, Rodrigues AJ.
Corpo Estranho em Via Aérea. Pulmão RJ. 2011;
20(2): 54-58.
11. Doody DP. Foreign Body Aspiration. In:
Grillo HC. Surgery of the Trachea and Bronchi.
Ontario: BC Decker, Inc; 2004. p. 712.
12. Singh JK, Vasudevan V, Bharadwaj N,
Narasimhan KL. Role of Tracheostomy in the
management of foreign body airway obstruction
in children. Singapore Med J. 2009; 50(9): 871.
4. Dolan RV, Sanderson DR, Payne WS.
Bronchotomy For Removal Of Foreign Body.
Report Of Its Use After External Penetrating
Trauma Chest. Annals of Thoracic Surgery. 1971;
12(6): 655-659.
| 81 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TIMOLIPOMA, UMA MASSA MEDIASTINAL
GIGANTE:RELATO DE CASO
THYMOLIPOMA, A GIANT MEDIASTINAL MASS: A CASE REPORT
Fernando Luiz Westphal,*(Te Sbct), Luiz Carlos de Lima,* José Corrêa Lima Netto,** Michel de Araújo Tavares***
Ricardo Augusto Monteiro Cardoso****
Resumo
O timolipoma é um tumor benigno raro do timo, localizado no mediastino anterior e que, geralmente,
cursa com quadro de tosse, dispneia e dor torácica, no entanto pode ser assintomático. Apresentamos
um caso de um paciente com 37 anos, do sexo masculino, com uma massa mediastinal volumosa,
descoberta incidentalmente por radiografia simples de tórax. A única queixa era sensação de
entalo na garganta à noite. A ressonância nuclear magnética revelou uma lesão expansiva de
densidade similar à de tecido adiposo no mediastino anterior com extensão para o terço médio e
inferior do hemitorax direito. O paciente foi submetido a uma esternotomia, permitindo completa
exérese da massa. O diagnóstico foi confirmado pelo exame histopatológico.
Palavras-chave: Timolipoma, mediastino, esternotomia.
Abstract
Thymolipoma is a rare benign tumor of the thymus, located in the anterior mediastinum and that
usually attends with coughing, dyspnea and thoracic pain, however, may be asymptomatic. Case
report of a 37 year-old male with a bulky mediastinal mass, which was incidentally discovered on
chest radiography. The only complaint was throat compressed felling at night. Magnetic resonance
imaging revealed an expansive lesion with a fat tissue similar density in the anterior mediastinum
extending to the middle and lower third of the right hemithorax. The patient underwent a
sternotomy, allowing complete mass excision. The diagnosis was confirmed by histopathology.
Keywords: Thymolipoma, mediastinum, sternotomy.
Introdução
Passou a ser denominado timolipoma após
proposta de Hall (1949).2,3,5,7 É responsável
O timolipoma é uma rara neoplasia benigna por 2-9% dos tumores de timo, pode acometer
do mediastino anterossuperior,1,2 composta qualquer faixa etária e não há diferenças de
de tecido tímico e tecido adiposo maduro, incidência entre gêneros.3,8 Apresentamos o
envolvidos por uma cápsula.3 No mundo inteiro, caso de um paciente com um tumor gigante,
foram relatados menos de cem casos.4 Foi timolipoma, tratado por uma esternotomia
descrito pela primeira vez havia quase cem anos longitudinal mediana completa.
como lipoma do timo, por Langer (1916).2,3,5,6
*Cirurgião torácico, doutor em Medicina, Universidade Federal do Amazonas. Título de especialista pela Sociedade Brasileira de Cirurgia Torácica.
** Cirurgião Torácico e Doutor em Bases Gerais da Cirurgia pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho
*** Médico radiologista da Universidade Federal do Amazonas.
**** Acadêmico de Medicina da Universidade Federal do Amazonas.
| 82 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TIMOLIPOMA, UMA MASSA MEDIASTINAL GIGANTE:RELATO DE CASO
Relato do caso
inferior do hemitórax direito. À ressonância
nuclear magnética (RNM) evidenciou-se lesão
Homem de 37 anos procurou serviço médico por expansiva nas porções inferior e terço médio
apresentar sensação de compressão na região mediastinal com hipersinal de contornos
superior do tórax mais perceptível no período lobulados, mantendo íntima relação com a
noturno, mas sem sintomas respiratórios. À parede lateral do coração e o diafragma ao
radiografia de tórax observou-se uma opacidade corte coronal (Figuras 1 e 2) e ao corte axial
ocupando o mediastino anterossuperior e a região (Figura 3).
1
2
Figuras 1-2: Ressonância magnética na sequência ponderada em T2 no plano coronal.
3
Figura 3: Ressonância magnética na sequência ponderada em T2 no plano axial.
| 83 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Westphal et al
A massa possuía áreas de tecido compatíveis
com tecido adiposo, alternadas com de tecido
de partes moles, tendo como consequência
cobalamento do terço inferior do pulmão
direito e compressão cardíaca. Apresentava
diminuição quase total do murmúrio vesicular
(MV) no terço inferior direito. O paciente
foi submetido à esternotomia longitudinal
mediana completa com ressecção da massa
mediastinal com extensão para o terço inferior
do hemitórax direito (Figura 4). Evoluiu bem no
pós-operatório, com alta no 5.º DPO. Na visita
de controle pós-operatório o paciente relatou
anisocoria à direita, consequente à provável
manipulação do plexo simpático, na porção
superior do hemitórax.
Figura 4: Timolipoma ressecado por esternotomia longitudinal mediana. Observam-se os cornos tímicos
no ápice da lesão (seta).
Discussão
Seu crescimento é bem lento, fazendo com que
o paciente não apresente sintomas por muitos
Em um indivíduo normal, o timo apresenta, ao anos, sendo diagnosticado incidentalmente,10
nascer, 10 a 35 gramas e atinge seu peso máximo o que justifica o paciente do caso não ter
durante a puberdade, 20 a 50 gramas, sofrendo apresentado sintomas, além da sensação de
atrofia e substituição por tecido fibroadiposo peso. O paciente só passa a apresentar sintomas
após a puberdade. Atinge cerca de 5 gramas se o tumor está suficientemente grande para
no idoso. A causa de formação do timolipoma comprimir alguma outra estrutura adjacente,
ainda não é completamente conhecida. Existem desde vias aéreas a pulmões e coração.3,11
várias teorias para explicar sua patogênese, a
mais aceita diz que o tecido tímico é substituído As queixas do paciente podem ser vagas
relacionadas à compressão como tosse,
por tecido lipídico maduro.3,9
dispneia e desconforto torácico, ou a sinais
| 84 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
TIMOLIPOMA, UMA MASSA MEDIASTINAL GIGANTE:RELATO DE CASO
de invasão, como paralisia diafragmática (por
acometimento do nervo frênico), rouquidão (por
acometimento do nervo laríngeo recorrente),
dispneia (relacionada a derrame pleural) e
até síndrome da veia cava (dilatação das veias
cervicais, edema de membros superiores,
cianose e pletora facial, em função de obstrução
da veia cava superior causando diminuição do
seu fluxo).
Nos exames de imagem, a lesão apresentou
características de gordura e foi realizado
diagnóstico diferencial com outros tumores
como lipossarcoma, lipoma, teratoma, timoma,
carcinoma tímico, carcinoide tímico, cisto
tímico, linfoma e o restante dos tumores de
mediastino anterior.
Alguns desses tumores podem apresentar
carcterísticas radiológicas semelhantes ao
timolipoma:
alargamento
mediastinal
e
velamento de grandes áreas pulmonares à
radiografia simples de pulmão, lesão de baixa
densidade à TC e de hipersinal em T1 e em T2 à
RNM, compatíveis com tecido adiposo.12
Considerando seu caráter não invasivo,
crescimento
extremamente
insidioso,
localização em mediastino anterior, ausência
de sinais e sintomas significantes, e imagem
bastante sugestiva; nossa principal hipótese
diagnóstica foi timolipoma. O diagnóstico
foi confirmado após a cirurgia, por meio da
histopatologia da peça cirúrgica, já que a
biópsia é mandatória.3
À histolopatologia, encontrou-se “ilhas” de
tecido tímico escassas, envovidas por grande
quantidade de tecido adiposo maduro,
característico de timolipoma.
O único tratamento é a ressecção completa
do tumor. O acesso cirúrgico depende de cada
tumor e de cada paciente; nesse caso, por se
tratar de um tumor muito extenso, descartouse a abordagem toracoscópica.
Dentre as abordagens cirúrgicas, optou-se
por uma esternotomia longitudinal mediana
completa pela sua alta facilidade de dissecção
do mediastino, ao invés da toracotomia
anterolateral direita (cujas indicações são
ressecções pulmonares, esofagectomia total
e lobectomias medianas) e toracotomia
posterolateral direita (cujas indicações são
ressecções pulmonares, algumas cirurgias
mediastinais, esofágicas, diafragmáticas, de
aorta e de terço distal da traqueia, brônquio
fonte direito e raiz do brônquio fonte esquerdo).
Em conclusão, os tumores mediastinais benignos
podem acarretar sintomas compressivos que
são tratados prontamente com ressecção
cirúrgica como demonstrado no presente caso,
salientando que a esternotomia longitudinal
mediana é uma incisão adequada para ressecção
de tumores volumosos de mediastino.
Referências
1. Sirpal YM, Chadha SK, Banarjee AK.
Thymolipoma a rare mediastinal tumour-report
of two cases and review of literature. Indian J
Cancer 1995; 32(1): 23-6.
2. Vicuña CH et al. Timolipoma gigante
assintomático na infância: relato de caso.
Revista Brasileira de Cancerologia 2002; 48(1):
107-11.
3. Mourad OMA, Andrade FM, Abrahão P,
Monnerat A, Judice LF. Massa mediastinal gigante
assintomática: um raro caso de timolipoma. J
Bras Pneumol. 2009; 35(10): 1049-1052.
4. Abi Ghanem M, Habambo G, Bahous J,
Chouairy C, Abul Khalil B. Large thimolipoma
causing primary respiratory distress. J Med
Liban. 2012; 60(2): 106-9.
5. Puntel VM, Vasconcelos LMF, Falcão P.
Timolipoma simulando cardiomegalia. Rev Col
Bras Cirurgiões 1999; 27(1): 52-3.
6. Lange L. Uber ein lipom des thymus. Zentralbl
Allg Pathol. 1916; 27: 97-101.
7. Hall GFM. A case of thymolipoma with
observations on a possible relationship to
intrathoracic lipomata. Br J Surg. 1948; 36:
321-4.
8. Moran CA, Rosado-de-Christenson M, Suster
| 85 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014
Westphal et al
S. Thymolipoma: clinicopathologic review of 33
cases. Mod Pathol. 1995; 8(7): 741-4.
9. Toyama T, Mizuno T, Masaoka A, Shibata K,
Yamakawa Y, Niwa H et al. Pathogenesis of
thymolipoma: report of three cases. Surg Today
1995; 25(1): 86-8.
10. Gamanagatti S, Sharma R, Hatimota P,
Guleria R, Arvind S. Giant thymolipoma. AJR Am
J Roentgenol. 2005; 185(1): 283-4.
11. Ceran S, Tulek B, Sunam G, Suerdem M.
Respiratory failure caused by giant thymolipoma.
Ann Thorac Surg. 2008; 86(2): 661-3.
12. Faerber EN, Balsara RK, Schidlow DV,
Marmon LM, Zaeri N. Thymolipoma: computed
tomographic appearances. Pediatr Radiol. 1990;
20(3): 196-7.
| 86 |
revistahugv - Revista do Hospital Universitário Getúlio Vargas
v.13. n.1 jan./jun. - 2014

Documentos relacionados