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Mudanças climáticas e saúde pública: Uma reflexão com enfoque
para Moçambique
Mohsin M. Sidat1 e Alfredo Vergara2
1
Faculdade de Medicina, Universidade Eduardo Mondlane, Moçambique
2
Vanderbilt Institute of Global Health, Vanderbilt University, EUA
RESUMO: As mudanças climáticas são uma realidade inegável e resultam, sobretudo, das acções humanas
(antropogénicas). Estas mudanças colocam em sério perigo a saúde humana e de outros seres vivos existentes no
planeta Terra. As manifestações dessas mudanças ocorrerem em múltiplos sectores e aos diferentes níveis. No
sector da saúde, as manifestações incluem a ocorrência de distúrbios psicossociais, em consequência dos eventos
climáticos extremos (seca, cheias, ciclones, etc.); alterações nos padrões de ocorrência de doenças transmitidas
por vectores (como malária e dengue) e por água contaminada (como cólera e outras doenças diarreicas); e
doenças respiratórias (sobretudo as resultantes da poluição ambiental como asma e outras crónicas nãotransmissíveis). Alguns dos efeitos das mudanças climáticas já se fazem sentir em Moçambique, incluindo a
ocorrência com relativa frequência de eventos climáticos, como vagas de calor e de frio, secas e cheias. Apesar
de Moçambique não ser grande tributário das mudanças climáticas globais, tem corroborado em incitativas e
esforços internacionais de forma activa. Assim, este artigo pretende informar, duma forma sumária,
particularmente sobre o impacto das mudanças climáticas sobre a saúde humana. Por outro lado, pretende
estimular uma reflexão sobre o papel dos diferentes sectores na resposta coordenada e atempada para fazer face
aos efeitos das mudanças climáticas no contexto global de Saúde Pública no país. O artigo poderá ser útil
também para despertar a atenção e o interesse dos académicos sobre esta temática e incentivá-los a darem o
melhor de si próprios na busca de soluções mais adequadas através da realização de pesquisas e partilhando
experiências das diversas áreas científicas com finalidade de contribuir para um controlo mais eficaz dos factores
que favorecem a ocorrência das mudanças climáticas no nosso país e ao nivel global.
Palavras-chave: mudanças climáticas, impacto, saúde pública
Climate change and public health: a point view focused on
Mozambique
ABSTRACT-Climate change is an irrefutable reality and it is mainly caused by human actions (anthropogenic).
These changes posit a serious threat to human health and the existence of other species on planet Earth. The
manifestations of these changes occur at multiple sectors and at different levels. In health sector, the
manifestations include the occurrence of psychosocial disturbances resulting from extreme climate events
(drought, floods, cyclones, etc.); changes in occurrence profile of vector transmitted and water borne diseases
(such as malaria and dengue fever, cholera and other diarrheal diseases) and of respiratory diseases (mainly those
caused by air pollution such as asthma and other chronic non-transmissible respiratory diseases). Some of the
effects of climate changes are already being felt in Mozambique and these include relatively frequent
occurrences of extreme weather events such as heat and cold waves, flooding and drought. Despite not being one
of the contributors to such global climate changes, Mozambique has been actively supporting all international
initiatives and efforts to counter climate change. Thus, this article intends to inform, in brief, about the impact of
the climate change on human health. Further, the study pretends to encourage a reflection on the role of different
sectors that could be involved in responding in a coordinated and timely manner to address the effects of climate
change within in the global context of Public Health in the country. The article could be of utility to raise the
attention and the interest of academicians on the theme here presented and incentivise them to carry out research
and share experiences from diverse scientific background purposefully to contribute to a more effective control
of the factors that favour the occurrence of climate change in our country and globally.
Keywords: climate change, impact, public health
_________________
Correspondência para: (correspondence to:) [email protected]
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
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MM Sidat e A Vergara
Cada um de nós é uma causa de aquecimento global, mas cada um de nós pode se
tornar parte da solução – em nossas decisões sobre o produto que compramos, a
electricidade que consumimos, o automóvel que conduzimos, as opções de estilo de
vida que fazemos. Podemos certamente escolher opções que permitam reduzir as
nossas emissões de carbono até zero (Al Gore, no documentário “Uma Verdade
Inconveniente, 2006)
sobre os factores contribuintes para as
mudanças climáticas e seu impacto
socioeconómico e na saúde humana e,
finalmente, apresentar uma breve discussão
sobre alguns aspectos das mudanças
climáticas com relevância para o nosso
país e o papel da saúde pública face à essas
mudanças.
INTRODUÇÃO
As evidências actualmente existentes não
deixam quaisquer dúvidas sobre o impacto
das mudanças climáticas sobre a saúde
humana (HAINES e PATZJ,2004;
KUMARESANA
e
NALINISATHIAKUMAR,
2010;
TULCHINSKY e VARAVIKOVA, 2009).
As mudanças climáticas são uma
preocupação global porque os seus efeitos
adversos têm implicações em todo o
mundo. Contudo, as consequências mais
severas das mudanças climáticas, segundo
alguns estudiosos (ST. LOUIS e HESS,
2008), irão ocorrer em países mais pobres,
constituindo, assim, um nítido paradoxo,
quando se toma em consideração a
contribuição dos mesmos na génese das
mudanças climáticas. A deficiência dos
serviços de saúde e a escassez de recursos,
são apenas dois factores identificados
como contribuintes para a gravidade do
problema nos países mais pobres
(CAMBELL-LENDRUM e CORVALÁN,
2007;
KUMARESANA
e
NALINISATHIAKUMAR,
2010).
Moçambique enquadra-se neste grupo de
países onde as mudanças climáticas
poderão resultar em graves consequências,
de acordo com um estudo recente do
Instituto Nacional de Gestão de
Calamidades (INGC, 2009), o que justifica
a escolha do tema, como forma de trazer
alguma informação sobre este assunto
nesta edição. Assim, neste artigo,
apresentam-se primeiro alguns conceitos
teóricos relacionados com o tema aqui
proposto, seguida duma breve discussão
O termo “clima” refere-se, de acordo com
o Dicionário da Língua Portuguesa de
Almeida Costa; Sampaio e Melo (1987),
“ao conjunto de fenómenos meteorológicos
que caracterizam o estado médio da
atmosfera numa dada região, meio ou
ambiente”. As designações “mudanças
climáticas” ou “alterações climáticas”
referem-se às variações regionais ou
globais do clima ao longo do tempo
observadas
na
Terra,
devido
à
variabilidade natural ou como resultado
das acções humanas (BARCELLOS et al.,
2009; BERNARDI, 2008).
No contexto das mudanças climáticas e
saúde, é frequente fazer-se referência ao
ambiente e, por isso, seria importante
também apresentar aqui o conceito de
“ambiente”. Segundo Bernardi (2008),
“ambiente” pode ser definido como um
complexo de factores físicos, químicos e
biológicos nos quais os organismos vivos
ou comunidades existem. Ainda, de acordo
com Bernardi (2008), o ambiente se refere
aos componentes da Terra que inclui entre
outros: i) a terra, a água e o ar e todas as
suas camadas atmosféricas; ii) a matéria
orgânica e inorgânica e os seres vivos; e
iii) a interacção com e entre os
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Mudanças climáticas e saúde pública
componentes referidos em i) e ii). Assim,
vários cientistas e estudiosos da matéria
preferem usar o termo Sistema Climático
por ser inclusivo de todos os componentes,
nomeadamente: atmosfera, hidrosfera,
biosfera, litosfera e criosfera (BENARDI,
2008).
adequadas para satisfazer as necessidades
do consumo. Nos países onde estas
medidas foram implementadas de forma
eficaz, sobretudo nos chamados países
industrializados, os resultados foram
nítidos com melhorias significativas nos
indicadores de saúde populacionais (a
realçar a redução nas taxas dos episódios
anuais ou morbilidade e nas taxas de
mortalidade das doenças transmissíveis),
melhoria da qualidade de vida e da
esperança de vida. Aliás foram as
constatações dos resultados positivos ao
nível da saúde das populações da
implementação de algumas medidas1 de
forma organizada e integrada, que de
alguma forma, deu origem à “Saúde
Pública” como uma área do saber ou da
ciência. Por isso, nem sempre é fácil
apresentar o conceito de Saúde Pública
sem que seja feita referência das
contribuições das diferentes áreas do saber
no seu estabelecimento como ciência e
como área de actuação ao longo dos
tempos. Por exemplo, as melhorias
observadas na área da agricultura
contribuíram
para
melhorias
na
alimentação bem como nas melhorias nas
condições de vida sócio-económicas das
populações. Assim, também, os avanços
em biotecnologia, microbiologia e
imunologia permitiram o desenvolvimento
de vacinas mais eficazes e contribuíram
sobremaneira na redução e controlo de
algumas doenças infecciosas que eram
responsáveis por grande sofrimento e
muitas mortes até meados do século XX
(TULCHINSKY
e
VARAVIKOVA,
2009).
O termo “saúde” pode ser definido de
várias formas, incluindo a partir das
estatísticas de morbilidade e mortalidade
ou recorrendo a proposta apresentada pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) que
é a mais vulgarmente referida quando se
fala de “saúde” no contexto biomédico
(TULCHINSKY
e
VARAVIKOVA,
2009). A OMS refere à saúde como um
estado de completo bem-estar físico,
mental e social, e não simples ausência de
doença ou enfermidade (WHO, 2006). Este
conceito tem merecido alguma contestação
e podem ser encontrados vários artigos
contrapondo a definição de saúde
apresentada pela OMS na literatura
biomédica e na das ciências sociais e
humanas. De recordar que o conceito de
saúde evoluiu ao longo da história da
humanidade acompanhando de certa forma
os progressos técnico-científicos e
socioeconómicos
observados
(TULCHINSKY
e
VARAVIKOVA,
2009).
O acesso aos Serviços de Saúde e outras
comodidades (como saneamento do meio,
acesso a água com qualidade adequada
para o cunsumo, entre outras) que
permitam aos indivíduos desfrutar e manter
uma vida saudável e com qualidade
desejável, são de primordial importância
para a saúde e bem-estar das populações.
Este facto é conhecido desde os tempos
remotos e que levou a que fossem
empreendidos esforços incluindo na
melhoria da qualidade de água para o
consumo e das condições de saneamento
do meio, no desenvolvimento de
tecnologias para uma produção de
alimentos com qualidade e em quantidades
São várias as definições de “Saúde
Pública”.
Entretanto,
todas
são
concordantes na essência referindo-a como
“a arte e a ciência de manter, proteger e
melhorar a saúde da população, por meio
de esforços organizados da comunidade”
(TARRIDE, 1998; TULCHINSKY e
VARAVIKOVA, 2009). Constituem,
portanto, objectivos principais da Saúde
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MM Sidat e A Vergara
Pública “promover e preservar a saúde e
prevenir doenças” (TARRIDE, 1998). Para
tal, o âmbito de actuação dos profissionais
de saúde pública inclui não só a busca de
formas de preservar ou restabelecer a
saúde e o bem-estar dos indivíduos de
forma isolada, como também de toda a
comunidade ou população duma forma
organizada e integrada. Daí o importante
papel da Saúde pública no contexto das
mudanças climáticas. Assim, cabe aos
profissionais de saúde pública buscar
formas de melhorar as condições
ambientais, contribuir para o controlo ou a
redução dos factores que levam à
ocorrência de doenças e promover factores
que contribuem para uma melhor saúde das
populações
(TULCHINSKY
e
VARAVIKOVA, 2009).
Conferências Internacionais regulares, com
destaque para a Conferência das Nações
Unidas sobre Ambiente Humano em
Estocolmo (Suécia), em 1972, e a do Rio
de Janeiro (Brasil), em 1992, tendo nesta
última sido estabelecida a Agenda 21, com
um programa de acções para o século XXI
e em que é destacado claramente o papel
do ambiente e da necessidade de acções
concertadas para a promoção da saúde
humana.
Desde o estabelecimento da Agenda 21,
várias foram as iniciativas levadas a cabo
em prol da questão ambiental mundial. A
Avaliação do Ecosistema Millennium é a
maior do género até a data, no que diz
respeito à saúde do ecosistemas mundiais.
Esse projecto foi lançado em 2001 pelo
então Secretário-Geral das Nações Unidas
Kofi Annan e ratificado pelos Governos
através
das
quatro
convenções
internacionais. Essa avaliação tinha como
propósito informar os decisores e o público
em geral sobre a saúde dos ecosistemas no
mundo3.
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E O SEU
IMPACTO SÓCIOECONÓMICO E NA
SAÚDE HUMANA
As mudanças climáticas estão ocorrendo
desde os primórdios da existência humana
na Terra, como destaca Barcellos et al.
(2009). Para estes autores, “[…] o clima da
Terra esteve, desde sempre, sujeito a
mudanças, produzidos por ciclos longos ou
curtos, que estão registados na história da
Humanidade”. Entretanto, apenas nas
últimas cinco décadas esta questão
começou a merecer uma atenção especial e
cada vez maior2 (SANTOS, 2007).
As
mudanças
climáticas
resultam,
essencialmente, das alterações ao nível do
sistema climático (BALLESTER; DIAZ e
MORENO, 2006). Actualmente, existem
evidências
inegáveis
das
causas
provocadas por acção humana nas
mudanças climáticas, associada aos estilos
de vida adoptados, da produção e consumo
de bens que contribuem para a exploração
dos recursos duma forma instável e
insustentável para a natureza (NICHOLS et
al., 2009). A acção humana é responsável
pela poluição do ar que provoca, por um
lado, a destruição da camada de ozono da
estratosfera, cuja função é reduzir a
quantidade de radiação solar que atinge a
superfície da Terra (troposfera); e, por
outro, um aumento das concentrações de
gases, provocando o efeito estufa na
troposfera. Estas alterações levam ao
aquecimento global, alterações no padrão
das chuvas, aumento na frequência dos
O ambiente tem claramente importância na
saúde humana (HAINES e PATZJ, 2004) e
esta
relação
ambiente-saúde
é
relativamente bem conhecida desde a
antiguidade, como demonstram, por
exemplo, os escritos de Hippocrates como
reportado por Pignatti (2004). No entanto,
a atenção ao ambiente e aos seus efeitos na
saúde humana é também um fenómeno
recente. Segundo Freitas (2005), é a partir
do século XX que o Mundo, dum modo
geral, começa a prestar maior atenção às
questões ambientais com a realização de
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Mudanças climáticas e saúde pública
desastres naturais, entre outros efeitos
negativos na natureza (PARMESAN e
YOHE, 2003). Estas mudanças como
demonstradas no relatório da Avaliação do
Ecosistema Millenium, são tão profundas
levando a que alguns peritos na matéria a
chamem de nova era geológica onde os
seres humanos representam a principal
força motriz das mudanças geológicas em
curso. Estes peritos designaram esta nova
era geológica como “antropoceno”
(ZALASIEWICZ, et al., 2011).
não existam muitos dados estatísticos sobre
essa relação. Uma publicação recente faz
uma tentativa, apesar das limitações, de
apresentar algumas estimativas anuais
globais: 800 mil mortes em consequência
da poluição do ar ambiental; 1,6 milhões
de mortes por poluição do ar
intradomiciliar; e 154 mil óbitos
resultantes das alterações climáticas
(EZZATI et al., 2002). Estas estimativas
representam cerca de 2,5 milhões de
mortes que podiam ser evitadas a cada ano
no mundo. Entretanto, os especialistas na
matéria antevêem um cenário mais grave
se os actuais níveis das emissões de gases,
da poluição e da destruição da natureza
continuarem a acontecer (ST. LOUIS e
HESS, 2008).
A
relação
saúde-doença-ambiente,
particularmente na vertente da causalidade,
é complexa e envolve múltiplos factores
que interagem entre si de diferentes
maneiras e com resultados nem sempre
fáceis de avaliar, no que diz respeito ao
papel e peso de cada um desses diferentes
factores
(PIGNATTI
2004;
TULCHINSKY e VARAVIKOVA, 2009).
No entanto, é facto conhecido desde os
tempos remotos, que uma população
saudável depende dum ambiente saudável
e, por isso, qualquer alteração significativa
no ambiente tem consequências na saúde
populacional (BERNARDI, 2008).
Segundo Nichols et. al. (2009), o impacto
das mudanças climáticas sobre a saúde
caracteriza-se pelo aumento da ocorrência
das doenças infecciosas e nos problemas
de saúde resultantes das ondas (vagas) de
calor, cheias, secas, incêndios/queimadas,
entre outros desastres naturais que levam a
uma maior demanda de cuidados com
impacto significativo ao nível dos serviços
de saúde, para além de consequências
socioeconómicas para os países com
escassos recursos e populações vulneráveis
(STEPHENSON et al., 2010). Uma
distribuição espacial e temporal das
doenças causadas por vectores como a
malária podem ocorrer com maior
frequência por causa do aumento da
temperatura que cria condições apropriadas
para o desenvolvimento dos vectores desta
doença, contribuindo, dessa forma, para
alterações nas dinâmicas das doenças
transmissíveis (ST. LOUIS e HESS, 2008;
TULCHINSKY
e
VARAVIKOVA.,
2009). Para mais exemplos vide o artigo de
ST. LOUIS e HESS (2008).
O impacto das mudanças climáticas, com
consequências socioeconómicas e para a
saúde humana vão sendo observadas em
várias partes do Mundo, mas a magnitude
desse impacto não está uniformemente
distribuída (STERN, 2007; CAMBELLLENDRUM e WOODRUFF, 2006).
Aparentemente, as suas consequências
mais severas, segundo alguns estudiosos
(ST. LOUIS e HESS, 2008), irão ocorrer
em países mais pobres constituindo um
nítido paradoxo quando se toma em
consideração a sua contribuição para a
poluição
ambiental.
Segundo
a
Organização Mundial de Saúde (PrussÜstun e Corvalán,2006), o peso das
doenças atribuíveis às mudanças climáticas
ao nível global é significativo, apesar das
claras variações com relação a este aspecto
em diferentes regiões do Mundo, embora
As consequências das mudanças climáticas
são também observadas em outros
sectores, como agricultura, pecuária e
pesca, que, por sua vez, poderão
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igualmente ter reflexos de forma indirecta
na saúde das populações (NICHOLS et al.,
2009). Os cientistas têm chamado atenção
também para os efeitos dos poluentes no
meio ambiente e na degradação ambiental
com redução das áreas cultiváveis para
agricultura (MCMICHAEL, 1999). Outras
consequências negativas verificam-se: na
quantidade e qualidade dos recursos
hídricos; na diversidade biológica e dos
ecossistemas naturais; nos processos de
erosão dos solos e das regiões costeiras.
São exemplo, o fenómeno El Niño de
1997-1998, que resultou em graves
consequências a nível mundial resultantes
dos eventos naturais extremos como secas
e cheias causando enormes prejuízos
socioeconómicos e perdas em vidas
humanas, estimando-se que, como
corolário, mais de 10 milhões de pessoas
foram afectadas ou deslocadas (SARI
KOVATS, 2000). O fenômeno El Niño foi
ainda considerado responsável pela
ocorrência de epidemias de malária em
várias partes do Mundo, incluindo em
países endémicos da África (SARI
KOVATS, 2000). Foi na sequência do
fenómeno El Niño que a Organização
Mundial de Saúde criou um grupo de
trabalho que incluía epidemiologistas e
entomologistas para abordar as questões
dos fenómenos climáticos com potencial
impacto
na
saúde
humana
(ORGANIZACIÓN PANAMERICANA
DE LA SALUD, 2000).
factores que contribuem para uma melhor
saúde das populações (TULCHINSKY e
VARAVIKOVA, 2009).
Papel da Saúde Pública
Mudanças Climáticas
Assim, com base na revisão da literatura
efectuada no âmbito da redacção deste
manuscrito, foram listadas algumas
medidas que podem ser tomadas como
acções de saúde pública:
Face
Nas últimas duas décadas observamos o
aparecimento de cada vez mais publicações
sobre o impacto das mudanças climáticas
sobre a saúde humana na literatura
biomédica. Para além de fornecer
evidências da relação causa-efeito entre as
mudanças climáticas e o aumento da
ocorrência de algumas doenças e/ou
reaparecimento
de
outras,
estas
publicações procuram igualmente alertar
sobre a necessidade de actuar de forma
efectiva por razões ético-social e
obrigações profissionais (FRUMKIN et al.,
2008).
Várias propostas concretas podem ser
encontradas na literatura sobre como a
Saúde Pública, que poderá contribuir para
responder, de forma efectiva, às mudanças
climáticas (BALLESTER, DIAZ e
MORENO, 2006; BARCELLOS et al.,
2009; BERNARDI, 2008; BLASHKI; EBI
et al., 2006; MCMICHAEL e KAROLY,
2007;
FRUMKIN
et
al.,
2008;
KUMARESANA
e
NALINI
SATHIAKUMAR, 2010; MCMICHAEL,
1999; PRÜSS-ÜSTÜN e CORVALÁN,
2006; ST. LOUIS e HESS, 2008; WHO,
2009). Uma proposta é apresentada por
Ballester; Diaz e Moreno (2006) e que
reproduzimos na Figura 1 deste artigo.
às
Como vimos anteriormente, a Saúde
Pública tem um papel importante a
desempenhar no contexto destas mudanças.
Como
parte
significativa
desses
fenómienos resultam das acções humanas,
cabe aos profissionais de saúde pública
buscar formas de contribuir para a
melhoria das condições ambientais, para o
controlo ou a redução dos factores que
levam à ocorrência de doenças e promover
 Mitigação
dos
efeitos
das
mudanças climáticas: através de
advocacia pelos profissionais de
Saúde Pública para adopção de
políticas locais e internacionais
para a redução das emissões dos
gases com efeito estufa ao nível
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Mudanças climáticas e saúde pública
Governamental e todos os sectores
socioeconómicos (p.e. adopção do
Protocolo de Kioto, da legislação e
políticas locais para a redução das
emissões dos gases, promoção de
colaborações intersectoriais para
melhor resposta aos efeitos das
mudanças climáticas, etc.);
(no país) como também dos efeitos
que essas mudanças produzem
sobre a saúde humana e outros
sectores socioeconómicos do país.
Um melhor conhecimento destes
aspectos poderão ajudar a definir
melhores estratégias de prevenção
de doenças e servir para acções de
promoção e preservação baseadas
em evidências concretas para as
realidades locais;
 Fortalecimento dos sistemas e
serviços de saúde pública: para
prevenir e responder de forma
efectiva aos efeitos das mudanças
climáticas, incluindo a capacitação
dos profissionais de saúde sobre a
matéria relacionada com efeitos
sobre a saúde humana e outros
sectores da sociedade; e reforço do
sistema
de
vigilância
epidemiológica
de
modo
a
monitorizar as tendências das
doenças sujeitas de aumentar ou
emergir em consequência das
mudanças climáticas;
Em muitos países, sobretudo nos
considerados em desenvolvimento, existem
enormes desafios na implementação das
medidas acima listadas, quer no sector de
saúde quer em outros sectores da sociedade
(CAMBELL-LENDRUM.; CORVALÁN e
NEIRA, 2007). Algumas razões são:
inexistência de sistemas adequados de
alerta e resposta para fazer face aos
eventos extremos da natureza; falta de
recursos
financeiros
e
humanos
capacitados; serviços de saúde com
cobertura limitada e com infra-estruturas
nem sempre adequadas às necessidades
populacionais;
e
deficiências
nas
colaborações intersectoriais (CAMBELLLENDRUM D.; CORVALÁN e NEIRA,
2007).
 Promoção da educação e
consciencialização:
das
populações, dos líderes e dos
fazedores
de
políticas
ou
legisladores aos diferentes níveis,
aos agentes económicos e outros
sectores de produção, entre outros,
sobre os efeitos das mudanças
climáticas sobre a saúde humana
em particular, mas também sobre o
meio ambiente, recursos hídricos,
diversidade biológica e sobre os
ecossistemas naturais;
Uma abordagem mais recente sobre as
consequências das mudanças climáticas,
postula que a eliminação das causas
(emissão de CO2 e outros gases no
ambiente) e as medidas actuais não serão
suficientes para lidar com as actuais
consequências deste vasto problema e, por
isso, recomenda a planificação e execução
de medidas considerada de adaptação, de
modo a assegurar a sobrevivência da
sociedade aos efeitos do aquecimento
global (SMIT et al., 2001). As adaptações
recomendadas incluem aquelas que podem
ser conseguidas através de soluções mais
imediatas, como no caso das cheias e das
secas. Como exemplos dessas medidas
temos: o realojamento preventivo das
populações que vivem em áreas de alto
 Implementação de planos de
alerta e resposta locais: para fazer
face aos eventos extremos da
natureza (p.e. secas, cheias,
epidemias, etc);
 Promoção de investigações: para
melhor compreensão, tanto dos
factores contribuintes para as
mudanças climáticas ao nível local
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MM Sidat e A Vergara
risco para as cheias; promoção de
diversificação de cultivos optando pelos
menos
vulneráveis
às
secas;
desenvolvimento
e
expansão
das
infraestruturas de saúde necessárias para
enfrentar
calamidades
naturais
(STEPHENSON et al., 2010; SMIT et al.,
2001). Há que diferenciar entre as
adaptações planificadas pelos Governos no
âmbito do seu programa social com as
adaptações autónomas realizadas pelos
indivíduos isoladamente como resultado
das
pressões
ambientais
vividas
(STEPHENSON et al., 2010; SMIT et al.,
2001). No entanto, a actuação isolada dos
indivíduos não livre de influências e uma
multiplicidade de factores poderão
contribuir
incluindo
pressões
sócioeconómicas da própria sociedade e
políticas definidas pelos Governos
(PELLING, 1999).
criados pelas mudanças climáticas
(FRUMKIN et al., 2008; MAKENBACH,
2007).
Uma resposta efectiva aos problemas
impostos pelas mudanças climáticas requer
disponibilidade e aplicação de uma porção
significativa de recursos financeiros por
parte dos países, situação que se agrava
face ao actual contexto de crise financeira
internacional. Entretanto, a não priorização
e falta duma actuação rápida e eficaz por
relutância na aplicação atempada de fundos
resultarão em consequências cujos custos
financeiros serão certamente ainda maiores
(ROBERTS, 2008). Por isso, há
necessidade de se colocar esta questão de
mudanças climáticas e seu impacto na lista
das prioridades de cada um dos países, pois
só as acções locais alinhadas com esforços
globais poderão deter ou mesmo reverter
os problemas causados por este fenómeno
(BALLESTER; DIAZ e MORENO,2006;
BERNARDI, 2008; FRUMKIN et al.,
2008;
GUGGENHEIM,
2006;
MAKENBACH, 2007; NICHOLS et al.,
2009; WHO, 2009). Foi esse o
reconhecimento
que
levou
alguns
estudiosos a advogar por leis internacionais
sobre o ambiente, como forma de
galvanizar esforços nacionais com os
internacionais de uma forma mais efectiva
(von SCHIRNDING; ONZIVU e ADEBE,
2002).
Um dos grandes obstáculos para
desenvolvimento e implementação das
estratégias adaptativas está na falta de
fundos tanto para estudar as opções que
possam ser mais efectivas para países com
escassos recursos como para a sua
implementação. Por outro lado, as
calamidades naturais possuem um alto grau
de incerteza e, por isso, nem sempre é fácil
argumentar sobre a necessidade de se fazer
pesquisa para buscar formas mais efectivas
de prevenir calamidades naturais perante
outras prioridades competitivas para
financiamentos sobretudo para países com
escassos
recursos.
As
instituições
académicas tradicionalmente constituem
um foco importante para a busca de
evidências sobre diferentes assuntos e
problemas. Por isso, essas instituições,
incluindo as vocacionadas na formação de
profissionais de Saúde Pública (EVANS,
2009; EBI et al., 2006), têm um papel
importante
a
desempenhar
na
implementação de pesquisas que possam
ajudar a buscar evidências e a desenvolver
estratégias adequadas para responder de
forma mais adequada aos problemas
MUDANÇAS CLIMÁTICAS E SAÚDE
PÚBLICA EM MOÇAMBIQUE
Pela situação geográfica e características
socioeconómicas da sua população,
Moçambique é, por muitos, considerado
um país vulnerável ao impacto das
mudanças climáticas, entre as razões,
citam-se: uma costa de cerca de 2700 km;
cerca de 60% da população habita zonas
costeiras com dependência socioeconómica
nos
recursos
costeiros;
grande
vulnerabilidade aos ciclones e à subida no
nível do mar; infra-estruturas sanitárias
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
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Mudanças climáticas e saúde pública
inadequadas e limitados recursos de alerta
e resposta aos eventos extremos da
natureza (INGC, 2009).
estações do ano e ao longo do país (com
maior destaque para a Zona Norte); apesar
da pluviosidade não mostrar alterações
significativas, início tardio da estação
chuvosa bem como um aumento em dias
secos (sobretudo no Nordeste do país);
aumento em número de desastres naturais
nas últimas três décadas (destaque para a
Zona Central do país). Este relatório
identifica riscos claros de aumento nas
temperaturas máximas diárias em todas as
partes do país com consequências
negativas para a saúde das populações e
também para outros sectores de actividades
socioeconómicas. As secas, por um lado,
foram os eventos que mais pessoas
afectaram Moçambique (estimado em 16
milhões no total) e as secas ocorridas nos
anos 1981/85 causaram cerca de 100 mil
mortes no país (QUEFACE, 2009). Por
outro,
as
cheias
também
foram
relativamente comuns no país nas últimas
três décadas causando cerca de 1600
mortes directas e sendo responsável por
várias epidemias que por sua vez causaram
muitas mortes nas populações do país
(QUEFACE, 2009). Por exemplo, só nas
cheias de 2000 mais de 800 pessoas
perderam a vida e mais 4,5 milhões de
pessoas
ficaram
afectadas
sendo
consideradas as piores cheias que o país já
alguma vez tivesse vivido (QUEFACE,
2009). Um dos problemas frequentemente
negligenciado nos países com escassos
recursos sobre as consequências dos
eventos extremos da natureza refere-se à
saúde mental das populações causadas por
crises de ansiedade e/ou depressivas
sobretudo pós-trauma mental (JESSICA e
FRITZ, 2008). No caso de Moçambique,
de facto não há estudos que nos possam
informar sobre este assunto.
O Governo de Moçambique criou o
Ministério para a Coordenação da Acção
Ambiental (MICOA), através do Decreto
Presidencial nº 2/94, com a finalidade de
promover uma melhor coordenação de
todos os sectores de actividades e
incentivar uma utilização correcta e
responsável dos recursos naturais do país.
Entre as suas obrigações, cabe aoo MICOA
exercer o controlo e a fiscalização sobre as
actividades económicas e sociais no que se
refere às suas implicações ambientais. É
nesse contexto que em 1997 foi criada a
Lei do Ambiente (Lei nº 20/97) que tem
como objectivo fornecer um quadro legal
básico para o uso e gestão correcta do
ambiente e seus componentes de modo a
assegurar um desenvolvimento sustentável
do país. Para a materialização dos
objectivos preconizados na Lei do
Ambiente foram estabelecidos vários
Regulamentos e diversa legislação
sectorial em matéria de protecção e
preservação do meio ambiente. Também a
Constituição da República adoptada em
2004 consagra aspectos relativos ao
ambiente, por exemplo, nos seus artigos
90º, 98º, e 117º. Mesmo não sendo um país
problemático com relação à sua
contribuição negativa para o ambiente ou
mudanças climáticas regionais/globais,
Moçambique tem assinado/ratificado as
várias
Declarações
e
Convenções
Internacionais.
O Governo de Moçambique reconhece que
as mudanças climáticas representam uma
séria ameaça para o desenvolvimento do
país e, por isso, solicitou um estudo sobre
“Impacto das Alterações Climáticas no
Risco de Calamidades em Moçambique”
ao Instituto Nacional de Gestão de
Calamidades (INGC, 2009). Com base
nesse estudo (INGC, 2009) constatou-se:
aumento nas temperaturas em todas as
As mudanças climáticas observadas no
país podem até ser reflexo da poluição e
outros agravos ambientais produzidos ao
nível global, e não necessariamente
resultado das actividades socioeconómicas
levadas a cabo no território nacional. O
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
47
MM Sidat e A Vergara
estabelecimento
da
indústria
com
potencialidades para poluir o ambiente é
recente, como é o caso da MOZAL na
Província de Maputo. Por isso, é
necessário reforçar a capacidade não só de
inspeccionar e monitorar os agravos
ambientais nas zonas circunvizinhas desse
tipo de indústrias, mas também
desenvolver sistemas de vigilâncias das
doenças prováveis que possam resultar
especificamente dos diferentes tipos de
actividades industriais.
pelos vectores como a malária e/ou das
gastroenterites (doenças diarreicas) como a
cólera. Por outro lado, o risco da
diminuição das áreas cultiváveis que
poderá para criar maiores problemas na
actual situação delicada da segurança
alimentar e agravar a situação de pobreza e
malnutrição sobretudo para agregados
familiares mais vulneráveis.
Os agravos socioeconómicos e de saúde
provocados pelas mudanças climáticas irão
criar maior demanda na já frágil
capacidade de assistência social e dos
serviços de saúde colocando ainda mais
dificuldades e sérios riscos para o
desenvolvimento do país. Assim, algumas
das possíveis respostas citadas na Figura 1
poderão igualmente ser aplicadas para o
contexto específico de Moçambique e,
desse modo, procurar minimizar o impacto
das mudanças climáticas (pois que alguns
dos efeitos climáticos são irreversíveis).
Entretanto, se tomarmos em conta o estado
de desenvolvimento socioeconómico actual
podemos, provavelmente, afirmar que
serão certamente as mudanças climáticas
globais que maiores ameaças ambientais
irão colocar para o futuro do nosso país e
as suas consequências poderão ser várias e
não muito diferentes dos que já
anteriormente foi referido. Os aumentos da
temperatura e da pluviosidade poderá levar
ao agravamento das doenças transmitidas
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
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Mudanças climáticas e saúde pública
EFEITOS ADVERSOS SOBRE
A SAÚDE
ALTERAÇÕES NOS FACTORES
INTERMÉDIOS
Políticas de mitigação para redução
da emissão dos gases com efeito de
estufa:
Eficiência energética
Uso de fontes de energia renováveis
Diminuição do uso desnecessário de
energia
Conservação florestal
Influências moderadoras
Medidas de adaptação
Densidade e crescimento
populacional
Programas de vacinação
Condições de vida e ambiente
local
Vigilância epidemiológica de
doenças
Estado de saúde pré-existente
Tecnologias de previsão e alerta
meteorológicos
Acesso e qualidade da
assistência sanitária
Prevenção e educação sobre
assuntos de Saúde Pública
Infra-estruturas de Saúde
Pública
Legislação e gestão adequada de
recursos naturais e ambientais
FIGURA 1: Efeitos prováveis das mudanças climáticas na saúde e possíveis respostas
Fonte: BALLESTER; DIAZ e MORENO, Gaceta Sanitária, 2006, 20 (Supl 1), 160-174, com permissão da
Elsevier Doyma.
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
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MM Sidat e A Vergara
da Faculdade de Medicina da Universidade
Eduardo Mondlane por ter-se dignado em
ler o primeiro draft do artigo e ter dado
valioso feedback. A ambos ficam aqui
expressos
os
nossos
sinceros
agradecimentos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O impacto das mudanças climáticas sobre
a saúde humana clama por um maior
envolvimento do sector responsável pela
saúde pública na avaliação e monitorização
das alterações ambientais em curso e dos
seus
efeitos
sobre
a
ocorrência/agravamento
das
doenças
transmissíveis e não transmissíveis no país.
Neste artigo, procuramos ilustrar não só
alguns dos efeitos das mudanças climáticas
sobre a saúde humana e outros sectores
socioeconómicos como também sobre
algumas medidas ou estratégias que podem
ser implementadas sobre ao nível do sector
de saúde. É necessário realçar a
importância da implementação das
políticas com base em evidências sendo
para tal necessário um investimento em
pesquisa que permita buscar melhores
formas de enfrentar as consequências das
mudanças climáticas de uma maneira
proactiva. Uma abordagem proactiva é
necessária para atingir níveis de adaptação
social, económica e cultural. É imperativo
também promover um olhar a longo prazo
que permita enfocar sobre os aspectos da
sustentabilidade dos sistemas económicos
que dominam a nossa sociedade,
procurando buscar um equilíbrio entre
investimentos económicos a curto-médio
prazo com e longo prazo, tendo em
consideração os custos ambientais e na
saúde humana resultantes desses mesmos
investimentos. Por fim, importa dizer aqui
que cabe a cada um nós dar o nosso
contributo no sentido de abrandar as
mudanças climáticas em curso tal como
ressalta o documentário “A Verdade
Inconveniente”.
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AGRADECIMENTOS
Os autores querem manifestar os seus
agradecimentos ao Muhammad M Sidat
(filho de Mohsin Sidat) por ter adaptado a
Figura 1 deste artigo e ao dr José Carlos
Langa do Departamento de Microbiologia
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1
Estas “medidas” ficaram vulgarmente conhecidas como “medidas ou intervenções de saúde pública” e são matéria de
estudo obrigatório dos curricula de formação dos profissionais de saúde pública.
2
O filme “Uma Verdade Inconveniente” dirigido por Davis Guggenheim e apresentado pelo ex-Vice Presidente dos Estados
Unidos de América Al Gore apresenta, com recurso às técnicas áudio-visiuais, os fenómenos naturais recentes (incluindo o
aumento gradual da temperatura da Terra) e relacionando duma forma mais perceptível as mudanças climáticas recentes com
as acções humanas (GUGGENHEIM, 2006). É esta verdade inegável de que as mudanças climáticas resultam sobretudo das
acções humanas (antropogénicas) que tem movimentado cientistas e individualidades de todo o Mundo a advogarem em prol
de medidas que já se mostraram essenciais na redução dos factores causais das mudanças climáticas. Portanto, dum modo
geral, as mudanças climáticas antropogénicas incluem a industrialização, o aumento do consumo de recursos naturais, os
processos socioeconómicos e culturais, a urbanização crescente e a sobrecarga imposta aos ciclos biogeoquímicos da
natureza (MCMICHAEL, 1999)
3
Apenas a título informativo, enfatizar o facto de que o relatório deste projecto foi lançado em 2005 e foi elaborado por
1.360 peritos de 95 países, com 80 revisores integrando um grupo de editores independentes. Um aspecto importante desse
relatório é a constatação dos efeitos excepcionais do aquecimento global nas populações para além doutros efeitos nocivos ao
nível do ecosistema mundial (Millennium Ecosystem Assessment 2005).
Rev. Cient. UEM, Ser: Ciências Biomédicas e Saúde Pública, Vol. 1, No 0, pp 39-52, 2012
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