Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças

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Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças
Proposta de Implantação de um Programa de
Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública
do Município de Florianópolis com Foco na
Redução de Morbidade Cardiovascular e na
Economia de Recursos Financeiros
Aluno: Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior1
Orientadora: Alessandra de Linhares Jacobsen2
Tutora: Maria Luciana Biondo Silva3
Resumo
Abstract
O envelhecimento populacional, e com ele o
aumento da prevalência das doenças crônicas,
acarreta uma necessidade de mudança no foco
dos serviços de saúde. O presente trabalho procura abordar o potencial de impacto do recurso
de gerenciamento de doenças crônicas na rede
pública de serviços de saúde em Florianópolis,
Santa Catarina, com foco na morbidade cardiovascular e na economia de recursos financeiros.
Por meio de levantamento bibliográfico e de levantamento de dados nas bases epidemiológicas
do Ministério da Saúde, constatou-se que a elaboração de uma política municipal voltada para
a área de doenças crônicas, com o conhecimento
epidemiológico de fatores de risco, e a educação
em saúde da população afetada apresentam
um potencial de impacto positivo na redução de
complicações das doenças, na qualidade de vida
e nos custos do serviço de saúde.
The aging of population and with it the increasing prevalence of chronic diseases leads to
a need for change in the focus of health services. This paper seeks to approach the potential
impact of chronic disease management in the
public health services in Florianópolis, Santa
Catarina, with a focus on cardiovascular morbidity and economy of resources. Through
bibliographic search and survey data bases in
Ministry of Health, we found that the development of a municipal policy focused on the area
of chronic diseases with epidemiological knowledge of risk factors and health education of
the affected population has a potential positive
impact in reducing complications of disease,
costs of the health service and improvement of
lifequality.
Key words: Chronic Disease Management.
Health Services Organization. Cost Analysis.
Palavras-chave: Gestão de Doenças Crôni- Processassessment in Healthcare.
cas. Organização de Serviços de Saúde. Economia em Serviços de Saúde. Avaliação de
Processos em Cuidados da Saúde.
1
Especialista em Medicina da Família e da Comunidade pela Associação Brasileira de
Medicina de Família e Comunidade. E-mail: [email protected].
2
Doutora em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Santa Catarina (2004).
E-mail: [email protected].
3
Especialista (Lato Sensu) em Gestão de Pessoas nas Organizações pela Universidade
Federal de Santa Catarina. E-mail: [email protected].
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Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
1 Introdução
As doenças crônicas não transmissíveis são a maior causa de morte em
todo o mundo. Segundo a World Health Organization (WHO), essas doenças foram responsáveis por 36 milhões de óbitos. Nesse âmbito, as doenças
cardiovasculares foram responsáveis por 48% das mortes no grupo, seguidas
pelo câncer (21%), pelas doenças respiratórias crônicas (12%) e pelo diabetes
(3%). (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011)
Mais de nove milhões do total de óbitos registrados em 2008 foram de
pessoas com menos de 60 anos, sendo que 90% dessas mortes – consideradas
prematuras – foram registradas em países de baixa e de média renda. (WORLD
HEALTH ORGANIZATION, 2011). Segundo a WHO, homens e mulheres que
vivem em países pobres têm cerca de três vezes mais risco de morrer antes dos
60 anos em razão de doença crônica não transmissível do que pessoas que
vivem em países de alta renda (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005;
2011). Ainda, de acordo com a WHO, os altos níveis de pressão arterial, de
colesterol, de massa corporal e de açúcar no sangue são os fatores que aumentam a possibilidade de desenvolver doenças crônicas não transmissíveis.
Segundo o relatório da WHO sobre doenças crônicas de 2005, nos
dez anos seguintes deveria ocorrer uma redução de cerca de 3% nas mortes
causadas por doenças infecciosas, relacionadas à gestação e ao parto, e por
deficiências nutricionais, enquanto as mortes relacionadas por doenças crônicas
deveriam aumentar aproximadamente 17% no mesmo período. Com base
nesse cálculo, isso causaria um número total de 41 milhões de óbitos relacionados a doenças crônicas no ano de 2015, com profundos impactos, tanto
para a sociedade quanto para os custos nos serviços de saúde, especialmente
nos países em desenvolvimento.
Além disso, considerando o envelhecimento populacional causado
pela redução das taxas de fecundidade e pela melhora das condições de
vida e de recursos, a saúde de uma maneira geral em todo o mundo terá um
incremento significativo nas próximas décadas da prevalência das doenças
crônico-degenerativas. Essa correlação impactará brutalmente nos custos
dos sistemas de saúde. Nos Estados Unidos, por exemplo, o custo anual para
tratamento de doenças cardíacas e diabetes foi estimado para o ano de 2008
em U$ 352 bilhões e U$ 116 bilhões respectivamente. (WORLD HEALTH
ORGANIZATION, 2005; DALL, 2008)
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No Brasil, as Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT) se tornaram a principal causa da carga de doenças nas últimas décadas e, em 2007,
representaram 72% dos óbitos. (SCHMIDT; DUNCAN; STEVENS, 2011).
Apesar da implementação de políticas públicas de fortalecimento, a promoção
e prevenção realizadas nos últimos anos no Sistema único de Saúde (SUS), a
epidemia de obesidade e o aumento na prevalência de doenças relacionadas
à diabetes e ao coração têm acarretado um grande impacto nos serviços de
saúde brasileiros. (SCHMIDT, DUNCAN, STEVENS, 2011; BRASIL, 2005)
Completando 24 anos, o SUS ainda enfrenta enormes desafios,
particularmente nos municípios brasileiros, com suas múltiplas e facetadas
realidades regionais. No Município de Florianópolis, por exemplo, houve um
enorme atraso de quase duas décadas na execução de uma rede municipal
hierarquizada de saúde. Nos últimos anos, a Secretaria Municipal de Saúde
de Florianópolis iniciou uma série de ações, com o eixo central na Atenção
Primária em Saúde (APS), como forma de ampliar e de fortalecer os princípios
do SUS (ZEPEDA; MOUTINHO Jr.; SARAIVA, 2010). A APS teve o número
de Equipes de Saúde da Família (ESF) ampliado, chegando, em 2012, a 116
equipes ou 93% de cobertura populacional. Cada equipe é composta por um
Médico de Família, um Enfermeiro, dois Técnicos de Enfermagem e, em média, seis Agentes de Saúde. A cada duas ESF há uma Equipe de Saúde Bucal
(ESB) ligada, composta por um Odontólogo e um Técnico de Higiene Dental.
A APS foi organizada como eixo organizador e ordenador dessa Rede
de Saúde. Para entrar nos demais níveis de atenção, como consultas e exames especializados, há a necessidade de se passar primeiramente pela ESF
de sua referência. Quatro Policlínicas no município de Florianópolis foram
reformadas e/ou construídas, nesse caso, o município passou a oferecer consultas e procedimentos de média complexidade, regulados pela ferramenta
eletrônica SISREG III do Ministério da Saúde. As Unidades de Atendimento
Pré-Hospitalar municipais, também de forma integrada, desenvolvem a lógica
de acolhimento por classificação de risco, devolvendo o paciente à APS após
estabilização do quadro agudo.
Toda a Rede de Saúde é integrada por meio de um Prontuário Eletrônico informatizado, desburocratizando o sistema, eliminando referências
e contrarreferências. Essa rede amplia o acesso à informação por parte dos
profissionais assistentes e aperfeiçoa e otimiza recursos, eliminando duplicidade
de encaminhamentos e de exames.
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1.1 Justificativa
Apesar da enorme importância, tanto no impacto da qualidade de vida
quanto na utilização dos serviços de saúde em todos os países, principalmente
nos países em desenvolvimento, como os BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China),
o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento do Milênio (PNUD)
não contempla em suas diretrizes a abordagem para as DCNTs. Esse fato
ganha ainda mais importância quando se considera que para o manejo e a
abordagem das doenças crônicas existem soluções efetivas e, grandemente,
custo-efetivas (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011). Segundo a WHO,
o emprego dessas tecnologias de baixo custo e de alto impacto produziria uma
redução de 2% nas taxas de mortalidades por DCNT em todo o mundo por
ano, o que impactaria em uma redução em 36 milhões de óbitos evitáveis em
uma década. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2005; 2011)
Programas de gestão da doença são cada vez mais incorporados aos
sistemas de saúde em todo o mundo, a fim de melhorar a qualidade e a continuidade de cuidados para as doenças crônicas, melhorando a eficiência dos
serviços de saúde e a utilização de recursos (DE BRUIN; HEIJINK, 2011). A
gestão da doença pode ser definida como um sistema de intervenção focado
no paciente, para grupos específicos, com ênfase nas exacerbações e nas
complicações, bem como no autocuidado (autogestão) e na promoção de
atividades específicas focadas de acordo com cada grupo. Geralmente, essa
gestão utiliza guidelines e métodos centrados em evidências clínicas para a
escolha da abordagem mais efetiva (MATTKE; SEID; MA, 2007). A gestão
da doença organiza uma variedade de serviços em volta de uma doença
para um indivíduo e isso contribui para elevar o nível de cuidados que essa
pessoa recebe.
Assim, de acordo com Todd et al. (1998), os objetivos da gestão da
doença incluem:
a) o encorajamento da prevenção da doença;
b) a promoção do planejamento de um diagnóstico e de tratamento
corretos;
c) a maximização da efetividade das intervenções clínicas;
d) a eliminação dos cuidados e das intervenções desnecessárias e não
efetivas;
e) a utilização apenas de diagnósticos e de terapêuticas custo-efetivas; e
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f) a melhoria contínua de resultados do processo e do próprio processo.
1.2 Objetivos
Considerando a expansão de serviços na rede municipal de Florianópolis, que abrange uma população estimada pelo Censo IBGE de 2010 (IBGE,
2010) em aproximadamente 421.000 habitantes, bem como a prevalência cada
vez maior das DCNTs, faz-se necessário indicar possíveis propostas para uma
gestão de doenças crônicas na rede pública municipal, a partir dos objetivos,
geral e específicos, apresentados a seguir.
1.2.1 Objetivo Geral
Propor a implantação de um programa de gestão de doenças crônicas
na rede pública do Município de Florianópolis com foco na redução de morbidade cardiovascular e na economia de recursos financeiros.
1.2.2 Objetivos Específicos
a) Levantar dados epidemiológicos sobre as principais causas de morbidades crônicas em Florianópolis.
b) Descrever pontos fortes e fracos do atual modo de gerenciamento
de doenças crônicas na rede municipal de serviços de saúde de
Florianópolis.
c) Apontar meios para a implantação da nova proposta de gerenciamento de doenças crônicas na rede de Florianópolis.
2 Revisão da Literatura
A gestão dos serviços na área da saúde pública tem se apresentado como
um importante fator de transformação e de operacionalização na construção
de modelos para atender às necessidades de saúde de uma população, um
bem de expectativa infinita. Na medida em que uma sociedade melhora seus
indicadores sociais e econômicos, há uma pressão por maior acesso a recursos
de saúde e a uma maior qualidade deles. Na saúde, especialmente no campo
da introdução de tecnologias, não há substituição: não se deixa de utilizar um
aparelho de raios-x com a utilização de uma ressonância nuclear magnética.
Assim, com a sobreposição de custos em novas tecnologias, há a necessidade
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de otimização de ferramentas administrativas para oportunizar a utilização
dos recursos na área de saúde.
A partir das crises estruturais e econômicas do denominado Estado do
Bem-Estar Social (Welfare State), especialmente nos Estados Unidos e na
Europa nos anos de 1980, surge uma necessidade de que as organizações
governamentais, incluindo as de saúde, atuem com maior flexibilização, e a
participação de poder decisório ao chamado controle social. Segundo Osborne (1995), a gestão pública passa a ter a necessidade de apresentar uma
profunda transformação, saindo de uma posição apenas burocrática gerencial,
para uma ação de criatividade e de flexibilidade, além de cooperação entre
novos atores e cenários.
A proposta de um programa de gestão de doenças crônicas se alinha
com os novos cenários de busca de gerenciamento e de qualidade na medida em que preconiza que recursos podem ser usados mais efetivamente se
o doente se tornar o centro em volta do que o sistema de saúde se organiza
(HUNTER, 1997). A proposta é reforçar a mudança de paradigma, já iniciada
na reforma sanitária e na posterior expansão da Atenção Primária do país,
focando o processo saúde/doença condicionado a variáveis determinantes de
saúde, saindo de uma visão focada na doença para o indivíduo, e sua atuação
proativa como processo para a busca da qualidade de vida.
A gestão de doenças crônicas é bem-vinda como uma resposta estruturada, inserida numa estratégia global para um conjunto de problemas
que são evidentes em todos os serviços de saúde. Esses problemas incluem
arranjos descoordenados para a prestação de cuidados e a falta de foco na
prevenção e na promoção; a lógica de direcionamento a tratamentos agudos
em Unidades de Pronto Atendimento (UPA) ou a emergências hospitalares;
e o crescimento na utilização de condutas não baseadas em evidências. Em
última análise, a gestão da doença pode ser encarada como uma abordagem
multidisciplinar, baseada na longitudinalidade da prestação de cuidados de
saúde que, proativamente, identifica populações com ou em risco de desenvolver doenças crônicas. (COONS, 1996)
Considerando resultados de saúde para pacientes portadores de patologias
crônicas, existem evidências de impacto positivo para diabetes, insuficiência
cardíaca e depressão (OFMAN et al., 2004; ADAMS et al., 2007; STEUTEN
et al., 2007; CONSTANTINI, 2001). Ainda, estudos, cuja base foi construída
a partir de revisões sistemáticas de literatura sobre a implementação de programas de gestão de doenças, apresentaram uma variação importante entre
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o potencial de redução de custos, especialmente entre pacientes com doenças
cardíacas e doenças respiratórias crônicas (BRASIL, 2005; CONSTANTINI,
2001), particularmente no curto prazo, relacionados a uma redução nas
complicações e nas utilizações de serviços hospitalares. Entretanto, De Bruin
e Heijink (2011) e o Ministério da Saúde (BRASIL, 2005) chamam a atenção
para o fato de que, devido a uma série de diferenças entre os trabalhos, incluindo a sua metodologia e a consistência dos dados, em alguns casos não
foi levantado uma correlação estatística entre as intervenções controladas e
as usuais, ou outros não apresentaram resultados com significância estatística.
Dentro de uma rede de cuidados de saúde, os esforços bem-sucedidos
para desenvolver programas de gestão da doença que tenham por propósito
a efetividade devem considerar várias questões-chave, que, segundo Crocker
e Mangotich (2001), são estas:
a) Que população é afetada pela doença? Qual a prevalência?
b) Essa população é suficientemente grande para garantir a implementação de um programa?
c) Existem disponíveis intervenções efetivas para reduzir o risco e melhorar os resultados?
d) Há evidência (bibliografia) de potencial para reduzir o nível do risco
dos doentes através do programa?
e) É possível quantificar os resultados? Podem ser medidos os custos e
os benefícios esperados do programa?
Considerando a prevalência dentre as doenças crônicas na população,
o presente trabalho avalia programas de gestão de doenças para patologias
como hipertensão arterial, insuficiência cardíaca, diabetes e doenças respiratórias crônicas. Além do potencial de mudança na qualidade de vida com
a redução de episódios de agravamento da doença, os custos relacionados
especialmente à utilização de serviços de média e alta complexidades as tornam
elegíveis para a análise do presente estudo para a cidade de Florianópolis.
3 Metodologia
O presente trabalho é um estudo qualitativo, realizado por meio de
uma revisão da literatura de dados coletados em fontes literárias em língua
portuguesa e inglesa nas principais bases médicas científicas, como Medline,
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Lilacs, Biblioteca Cochrane e Scielo. Essas bases foram selecionadas em revisões sistemáticas ou em estudos de coortes prospectivos; através de dados
disponibilizados pela Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis, pelo
Ministério da Saúde, no Sistema de Informações em Atenção Básica (SIAB) no
Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos (SIOPS) e no DATASUS –
Ministério da Saúde. Todos os dados, quando necessário, foram organizados
e tabulados utilizando-se o programa Microsoft® Excel 2003.
Os dados levantados pelo presente estudo foram separados anualmente, tendo como referência a última década entre 2001 e 2010. Sempre que
disponíveis, foram também estendidos até o ano de 2011, ou ressaltada a sua
tendência. O gráfico do índice de envelhecimento (Figura 2) apresenta dados
de 1991 até 2009, a fim de ampliar a visão da tendência citada. Os citados
dados foram, então, organizados em histogramas ou em gráficos do tipo linha
para que se visualize melhor o resultado e a compreensão do tema em estudo.
4 Resultados
Na sequência, serão apresentados e analisados os dados coletados para
a presente pesquisa.
4.1 Levantamento de Dados Epidemiológicos sobre as Principais Causas de Morbidades Crônicas em Florianópolis
O Município de Florianópolis, assim como o Brasil, vem sofrendo uma
transformação em sua pirâmide etária (Figura 1) com a redução nas taxas de
fecundidade e a ampliação da expectativa de vida ao nascer. Comparando o
período entre os últimos dois levantamentos censitários, a população acima de
60 anos de idade passou de 8,3%, em 2000, para 11,2% do total de habitantes, em 2010, ocasionando maior necessidade de se desenvolverem políticas
públicas voltadas para essa faixa etária. Além disso, é esperado também um
incremento cada vez maior na prevalência de doenças crônico-degenerativas,
além do crescimento nas causas externas de mortalidade, o que passou a ser
chamado de tripla-carga de doenças. (MENDES, 2012)
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Figura 1: Pirâmide etária Florianópolis/SC 2010
Fonte: IBGE (2010)
Outro indicador que corrobora a situação relacionada à mudança na
pirâmide etária é o índice de envelhecimento de Florianópolis (Figura 2),
calculado pelo número de pessoas acima de 60 anos de idade para cada 100
pessoas menores de 15 anos de idade no mesmo local. Esse indicador mostra
uma elevação de mais de 120% entre os anos de 1991 e 2009 no índice de
envelhecimento populacional.
Figura 2: Índice de envelhecimento em Florianópolis
Fonte: IBGE (2010)
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Levantamentos realizados nas principais fontes disponíveis (Medline,
Lilacs, Biblioteca Cochrane e Scielo) revelaram não haver estudos suficientes
em âmbito nacional, inexistindo estudos diretos sobre Florianópolis a respeito
da prevalência de DCNTs. Para conseguir uma avaliação mais próxima dessa
prevalência, foram considerados os dados de internações hospitalares em
maiores de 30 anos de idade em Florianópolis, adquiridos através das bases
de dados do DATASUS/MS para aferir as principais causas de morbidade entre
as doenças crônicas. Também serão considerados os resultados dos estudos
do VIGITEL (GARCIA; SILVEIRA; CALDERON, 2012), entre 2006 e 2011,
que são realizados em 26 capitais brasileiras e no Distrito Federal, a fim de
monitorar a frequência e a distribuição de fatores de risco e proteção para
DCNT, por meio de entrevistas telefônicas realizadas em amostras probabilísticas da população adulta.
Por se apoiar em entrevistas telefônicas, o VIGITEL (BRASIL, 2011) não
pode aferir diretamente a frequência de fatores de risco para doenças crônicas
que necessitem de diagnóstico médico. Nesses casos, de forma semelhante à
empregada por outros sistemas de vigilância, o VIGITEL estima a frequência
de indivíduos que referem diagnóstico médico prévio do fator de risco. É evidente que as frequências estimadas dessa maneira serão influenciadas pela
cobertura da assistência à saúde existente em cada cidade, podendo, assim,
subestimar, em maior ou em menor grau, a prevalência real do fator de risco
na população. De qualquer modo, de imediato, fornecem informações úteis
para avaliar a demanda por cuidados de saúde originada pela presença do
fator. Em médio prazo, com a expansão e a universalização da cobertura da
atenção à saúde da população adulta do país, espera-se que a frequência de
casos diagnosticados se aproxime da prevalência real daquelas condições na
população, propiciando assim informações seguras para o seu acompanhamento ao longo do tempo.
Considerando ambas as fontes de dados, verifica-se que as cinco principais causas de internações hospitalares agudas ou crônicas (devido a doenças
do aparelho circulatório, respiratório, digestivo, causas externas e neoplasias)
representam juntas 63% do total de internações em maiores de 30 anos de
idade, no ano de 2011, em Florianópolis (Quadro1).
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Doenças do aparelho circulatório
Neoplasias
Doenças do aparelho digestivo
Causas Externas
Doenças do aparelho respiratório
Somatório
Total Internações (excetuando gravidez/parto)
2011
(%)
1.873
1.428
1.177
1.122
810
18,4%
14,0%
11,6%
11,0%
8,0%
63,0%
10.169
Quadro 1: Principais causas de internações hospitalares em maiores de 30 anos de idade
em Florianópolis no ano de 2011
Fonte: Elaborado pelo autor deste artigo
Quando se observam as patologias que usualmente estão implicadas
em condições crônicas, é possível observar que, em 2011, as principais causas de internações hospitalares por doenças crônicas estavam relacionadas a
doenças do aparelho circulatório, neoplasias, doenças do aparelho respiratório
e doenças endócrinas, que somadas representavam mais de 25% do total de
internações acima dos 30 anos de idade (Quadro 2):
2011
Doenças do aparelho circulatório
Hipertensão essencial (primária)
Outras doenças hipertensivas
Infarto agudo do miocárdio
Outras doenças isquêmicas do coração
Insuficiência cardíaca
Hemorragia intracraniana
Infarto cerebral
Acidente vascular cerebral não específico hemorrágico
ou isquêmico
Neoplasias malignas
Neoplasia maligna da mama
Neoplasia maligna de traqueia brônquios e pulmões
Outras neoplasias malignas da pele
Neoplasia maligna do cólon
Neoplasia maligna do estômago
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
1.203
11
15
213
467
167
127
17
186
1.097
163
95
76
66
60
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Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
2011
Doenças do aparelho respiratório
Bronquite e enfisema
Asma
Doenças endócrinas nutricionais e metabólicas
Diabetes mellitus
Total
% sobre Total de Internações > 30 anos
198
180
18
89
89
2.587
25,4
Quadro 2: Principais causas de internações hospitalares por doenças crônicas em maiores
de 30 anos de idade em Florianópolis no ano de 2011
Fonte: Elaborado pelo autor deste artigo
Segundo os dados do VIGITEL (BRASIL, 2011), em 2010, 18,4% da
população maior de 18 anos de idade eram diagnosticados com Hipertensão
Arterial Sistêmica (HAS) e 5,9% de Diabetes Mellitus, valores que se encontram
em trajetória ascendente entre os estudos de 2006 e 2010 (Figuras 3 e 4).
Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
que referem diagnóstico médico de hipertensão arterial,
por sexo - Florianópolis
25
20,2
20,3
20
15
22,1
17,7
14,9
18,3
23,6
21,7
19,6
22,6
21,1
19,3
17,2
20,8
18,7
20,8
18,7
16,3
10
5
0
2006
2007
Total
2008
2009
Masculino
2010
Feminino
2011
Figura 3: Percentual de adultos que referem diagnóstico de hipertensão arterial em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
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Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
que referem diagnóstico médico de diabetes, por sexo, Florianópolis
8
7
6
5
4
3
2
1
0
5,9
6,2
5,8
4,5
5,4
5,8
5,7
5,6
5,4
4,6
7,1
6,3
5,5
6,2
5,9
5,5
3,7
2,9
2006
2007
Total
2008
2009
Masculino
2010
2011
Feminino
Figura 4: Percentual de adultos que referem diagnóstico de diabetes mellitus em
Florianópolis.
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
De acordo com a WHO, um pequeno conjunto de fatores de risco responde pela grande maioria das mortes por DCNTs e por fração substancial da
carga de doenças devido a essas enfermidades. Dentre esses fatores, destacam-se o tabagismo, o consumo excessivo de bebidas alcoólicas, a obesidade e a
inatividade física. (Figuras 5 a 8). Todos os fatores relacionados anteriormente
representam determinantes comportamentais e biológicos que podem ser
alvo de atuação das equipes de saúde para reduzir os fatores de risco para a
morbidade relacionada às DCNTs.
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Percentual de adultos (com idade maior ou igual a 18 anos)
fumantes, por sexo - Florianópolis
30
26,4
25
20
15
21,9
18,7
15,8
20,2
14,5
20,6
20,2
19,9
20,1
17,6
15,4
18,4
17,4
16,4
10
17,5
14,3
11,5
5
0
2006
2007
Total
2008
2009
Masculino
2010
2011
Feminino
Figura 5: Percentual de adultos que referem uso de tabaco em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
O percentual de adultos que se referem ao uso de tabaco em Florianópolis vem apresentando redução desde 2007. A partir de 2010, com sanção
da Lei n.8.042, que proíbe o fumo em espaços coletivos, potencializou-se
ainda mais a redução da utilização de tabaco no município, que poderá ser
avaliada nos próximos anos quanto a sua efetividade.
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
que, nos últimos 30 dias, consumiram mais do que quatro
doses (mulher) ou cinco doses (homem) de bebida alcoólica
em uma mesma ocasião - Florianópolis
35
30
25
20
15
10
5
0
30,2
28,6
24,3
18,1
7,2
2006
18,9
10,1
2007
27
17
17,7
10,5
9,3
2008
2009
29,2
20,3
12,3
Total
Masculino
Feminino
2010
Figura 6: Percentual de adultos que referem consumo excessivo de bebidas alcoólicas em
Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
88
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
O percentual de consumo de álcool de forma abusiva apresentou acréscimo entre 2006 e 2010, mantendo-se estável entre homens, mas o aumento
se deu devido a um crescimento de aproximadamente 70% entre mulheres,
o que sugere a necessidade de políticas públicas voltadas para esse público.
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
com excesso de peso (1ndice de Dassa orporal ш Ϯϱ ŬgͬmϮ),
por sexo - Florianópolis
60
50
48,5
40
40,4
30
32,2
52,7
44
35,8
48,3
41,8
35,7
52,4
45
38,1
54,2
46,3
38,9
Total
Masculino
20
Feminino
10
0
2006
2007
2008
2009
2010
Figura 7: Percentual de adultos com IMC • 25 kg/m2 em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
Ocorreu um crescimento de 14,6% no percentual de adultos com sobrepeso em Florianópolis, de 2006 a 2010. Entre as mulheres, esse crescimento
chegou a 20,8% no mesmo período, e, entre homens, o percentual passou de
mais da metade da população adulta, atingindo 54,2% em 2010.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
89
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
Percentual de adultos (com idade maior ou igual 18 anos)
fisicamente inativos*, por sexo - Florianópolis
40
35
30
25
20
33,4
27,7
35,2
32,2
29,6
22,5
30,2
27,3
24,7
23,9
Total
18,5
15
13,6
10
13,3
12,2
11,3
Masculino
Feminino
5
0
2006
2007
2008
2009
2010
Figura 8: Percentual de adultos fisicamente inativos em Florianópolis
Fonte: Adaptada de Garcia, Silveira e Calderon (2012)
O conhecimento do número de pessoas acometidas pelas doenças
crônicas, bem como os fatores de risco associados a possibilidades de complicações dessas patologias é de crucial importância para o planejamento e
execução de ações na programação da saúde pública. Identificando e levantando estratégias, as políticas públicas podem ser pensadas a fim de propiciar
ações mais custo-efetivas e voltadas para o objetivo de redução de gravidade
na morbidade ao longo do tempo. A inserção da epidemiologia no campo do
planejamento em saúde proporciona uma efetiva contribuição na tomada de
decisões e no alcance de metas.
4.2 Descrição do Gerenciamento de Doenças Crônicas na Rede
Municipal de Serviços de Saúde em Florianópolis
O Município de Florianópolis apresentou na última década um crescimento expressivo na cobertura da Atenção Primária em Saúde. Em decorrência
dessa expansão e da entrada do município na gestão da média complexidade
a partir de 2007, houve a necessidade de reorganizar os fluxos da rede de
serviços municipais, e a opção foi a coordenação pela APS, como porta de
entrada preferencial e ordenadora dos demais níveis de atenção, seguindo
as diretrizes do SUS. O crescimento na coordenação do cuidado exigiu a
construção de fluxos e de protocolos de atenção à saúde, a fim de procurar
90
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
garantir a melhor estratégia efetiva para cada caso. Assim, como no Ministério
da Saúde, Florianópolis historicamente trabalha com linhas de cuidado por
ciclos de vida, organizando-os por meio de Programas na APS: Saúde da
Criança, Saúde da Mulher, Saúde do Idoso, Saúde Bucal e Saúde Mental.
Posteriormente, foi ampliado o programa da Saúde da Mulher, para Saúde
do Adulto, englobando ações para a Saúde do Homem.
Está em fase ainda de construção um Protocolo de Saúde do Adulto,
que trará orientações, diretrizes clínicas e organização de serviços acerca das
Doenças Crônicas Não-Transmissíveis. Apesar de ser um documento organizado
por profissionais que compõem as equipes técnica da SMS, selecionado entre
médicos e enfermeiros que trabalham na APS ou na Média Complexidade,
o escopo do material não traz em suas linhas gerais uma proposta de gerenciamento de doenças crônicas, servindo como uma linha técnica de cuidado
para doenças crônicas.
Atualmente, dentro do contexto da APS em Florianópolis existe um
acompanhamento fragmentado das patologias crônicas que são consideradas
dentro deste trabalho, cardiovasculares e respiratórias, tanto no que diz respeito a sua prevenção primária ou secundária (pós-evento adverso) quanto ao
seguimento. Na maioria dos casos, ocorre uma escolha de conduta baseada
em experiências pessoais da equipe multiprofissional, ou o seguimento de
estratégias orientadas por protocolos do Ministério da Saúde.
Apesar disso, alguns aspectos e ações têm de ser destacados, especialmente por trabalharem com propostas de intervenção voltadas para a
promoção e a prevenção. Existe em Florianópolis, desde o ano de 2007, um
plano de intervenção ao combate do uso do tabaco, pela descentralização do
tratamento e cuidado pela APS em todos os Centros de Saúde, com realização
de grupos, distribuição de medicamentos e tratamento corresponsabilizado
entre a equipe de APS e profissionais do Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), como Psicólogos e Psiquiatras. Ainda neste trabalho, foi possível
a criação da Lei Municipal n. 8.042/2009 proibindo o consumo de tabaco
em ambientes fechados. A extensão deste trabalho vem sendo levada até as
escolas municipais e estaduais dentro do Programa Saúde do Escolar (PSE),
que também agrega outras ações de prevenção às DCNTs em longo prazo,
como alimentação saudável e atividade física nas escolas.
Outro aspecto salutar é a existência do programa municipal de atividades
físicas – Floripa Ativa, que engloba desde atividades de prevenção primária
para grupos de idosos, com caminhadas orientadas por profissionais de edu-
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
91
Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
cação física ou nutricionistas, até atividades de prevenção secundária para
redução de risco cardiovascular após um evento adverso. Ambos os programas existem nos cinco Distritos Sanitários e são organizados pelas Equipes
de Saúde em cada bairro.
Um grande gargalo para um programa sistematizado de gerenciamento
de doenças crônicas também já encontra resposta no serviço municipal, que é
a utilização de uma ferramenta integrada de Prontuário Eletrônico em todos
os níveis de atenção (Centros de Saúde, Policlínicas e Unidades de Pronto
Atendimento). A facilidade de acesso ao prontuário e a utilização dele por
uma variedade de profissionais que acompanham o paciente potencializam o
acompanhamento do caso e reduzem intervenções repetidas. Por outro lado,
o sistema atual não proporciona o apoio de protocolos clínicos para tomada
de decisão baseados em evidências científicas.
4.3 Propostas de Abordagens no Gerenciamento de Doenças
Crônicas na Rede Municipal de Florianópolis
As intervenções para prevenção e controle de DCNT incluem diversas
ações, que têm sido monitoradas e avaliadas por meio de vários estudos. A
WHO divulgou, recentemente, as intervenções consideradas mais custo-efetivas,
quais sejam (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2011):
a) aumentar impostos e preços sobre os produtos do tabaco;
b) proteger as pessoas da fumaça do cigarro e proibir que se fume em
lugares públicos;
c) advertir sobre os perigos do consumo de tabaco;
d) restringir a venda de álcool no varejo;
e) reduzir a ingestão de sal e do conteúdo de sal nos alimentos;
f) substituir gorduras trans em alimentos por gorduras poli-insaturadas;
g) promover o esclarecimento do público sobre alimentação e atividade
física, inclusive pela mídia de massa;
h) criar programas comunitários de atividade física e alimentação
saudável; e
i) construir ambientes que promovam atividade física.
Além das ações populacionais, são consideradas efetivas as intervenções
individuais para portadores de DCNT (primária ou secundária) ou em seus
92
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
fatores de risco associados. Tais intervenções podem ser altamente efetivas
e de baixo custo. Quando estão em conjunto, intervenções populacionais e
individuais podem potencializar a médio e longo prazo o impacto sobre os
serviços de saúde.
A adoção de um programa municipal de gerenciamento em Florianópolis deverá contemplar:
a) A construção de um Protocolo/Guideline, com as melhores intervenções custo-efetivas disponíveis para populações com DCNTs ou com
os fatores de risco cardiovasculares ou respiratórias.
b) A capacitação contínua de equipes multidisciplinares de APS, bem
como das equipes de profissionais de apoio (NASF e especialidades
de média complexidade relacionadas às DCNTs em foco).
c) A readequação da ferramenta de prontuário eletrônico, prevendo a
incorporação de guias de gerenciamento de doenças, com lembretes
e feedbacks positivos ou negativos dentro do prontuário de cada
paciente.
d) Educação em saúde voltada para a população em foco, através de
qualquer meio: rádio, TV, programas transmitidos dentro dos Centros
de Saúde, reuniões de grupos. O componente de autocuidado é o
primeiro e mais importante dentro da construção eficaz do gerenciamento de DCNTs.
A mensuração do programa de gerenciamento de DCNTs é feita por
indicadores de performance divididos em três grandes áreas, que são a de
indicadores de desfecho clínico, de processos e a de indicadores financeiros.
Todos os indicadores devem ser incorporados para análise e levantamento
de dados ao prontuário eletrônico, como ferramenta gerencial ao gestor e às
equipes de saúde. Nessa linha, alguns indicadores sugeridos são os que seguem:
a) Indicadores de desfecho clínico.
i. Doenças Cardiovasculares: Redução da pressão arterial (mmHg)/
Redução de peso (em %)/Redução de Escala de fatores de Risco;
ii. Doenças Respiratórias: aumento no VEF1 (Volume Expiratório
Forçado em 1 min.); e
iii. Para ambos: número de Internações Hospitalares/ano.
b) Indicadores de Processos.
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
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Proposta de Implantação de um Programa de Gestão de Doenças Crônicas na Rede Pública do Município de
Florianópolis com Foco na Redução de Morbidade Cardiovascular e na Economia de Recursos Financeiros
i. Aderência ao tratamento farmacológico/não farmacológico proposto; e
ii. Realização de exames anuais previstos em Protocolo.
a) Indicadores financeiros.
i. Custos diretos relacionados à doença (medicamentos, equipe de
saúde, diárias hospitalares e exames).
Indicadores são utilizados como forma de aferir resultados e indicar
caminhos. Cada indicador tem a função de, em conjunto com as ações
sugeridas, induzir modificações no trabalho da rede municipal de saúde,
com o intuito de melhorar o gerenciamento das condições crônicas e suas
complicações para a população de Florianópolis. A verificação por meio de
indicadores que possam balizar o desempenho do efeito esperado modula e
proporciona o passo consequente a qualquer atividade de programação ou
planejamento em saúde, que é a verificação da efetividade e a possibilidade
de indicar a necessidade de mudar algum fluxo ou ação dentro da rede de
serviços, se necessário.
5 Considerações Finais
Toda mudança é amparada na perspectiva de modificar um curso de
eventos. Ao mesmo tempo em que orienta para prover uma resposta a novos
desafios, a novas práticas na área de gerenciamento na saúde pública, as mudanças também trazem o aspecto ligado à quebra de paradigmas e às antigas
abordagens. Assim como um grande objeto pesado, as grandes corporações
administrativas, de saúde ou não, tendem a buscar a inércia burocrática, e
movimentar-se em uma direção nova tende a romper arranjos pessoais ou
ideológicos.
Novas ferramentas no âmbito do gerenciamento administrativo na
saúde pública trazem em seu bojo estrutural práticas de governança utilizadas
habitualmente em empresas privadas, sobretudo nos aspectos de organização,
métodos e qualidade.
As doenças crônicas, se não partem da perspectiva de cura por um
sistema de saúde, podem ser prevenidas ou controladas, por meio de detecção precoce, acompanhamento médico, práticas de vida saudáveis e uso de
medicamentos quando necessário. O objetivo do gerenciamento é promover
a educação em saúde, corresponsabilizando o indivíduo, prevenindo com-
94
Coleção Gestão da Saúde Pública – Volume 1
Carlos Daniel M. S. Moutinho Júnior # Alessandra de Linhares Jacobsen # Maria Luciana Biondo Silva
plicações, procedimentos invasivos e hospitalizações, diminuindo com isso o
impacto financeiro ao sistema de saúde.
A adesão ao tratamento é fundamental para que o paciente tenha condições de levar uma vida normal. Os profissionais da área da saúde devem
atuar na comunidade como um elo entre paciente e tratamento, informando
sobre a doença ao paciente e aos familiares, abordando aspectos como o
risco da não adesão às recomendações, o uso adequado dos medicamentos
indicados, bem como o estímulo à redução de fatores de risco. Quanto mais
o paciente e a família ganham a responsabilidade de atuação proativa diante
da doença crônica, melhores são os indicadores de aderência e a redução de
eventos adversos.
O envelhecimento populacional e com ele o incremento acelerado
na prevalência de doenças crônicas no Sistema Único de Saúde requerem
mensuração adequada do impacto, planejamento e execução de ações que
minimizem a sobrecarga cada vez maior nos recursos públicos. O estudo do
custo das doenças, o apoio de medidas custo-efetivas de cunho populacional
ou individualizadas e o gerenciamento de doenças crônicas representam uma
importante ferramenta para auxiliar gestores e trabalhadores do sistema de
saúde, além de contribuir significantemente com a melhor condição de vida
para os usuários desse sistema.
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