Software livre e interoperabilidade na área de SIG: ficção ou
Transcrição
Software livre e interoperabilidade na área de SIG: ficção ou
Software livre e interoperabilidade na área de SIG: ficção ou realidade? Claudia de Andrade Tambascia, Lin Tzy Li*, Marta Duarte Teixeira, Rafael de Melo Cuba, Sandro Danilo Gatti Este artigo apresenta os principais projetos de software livre na área de Sistemas de Informações Geográficas (SIG), abordando banco de dados espaciais, bibliotecas, soluções de software básico de infraestruturas e aplicativos de visualização de mapas. O artigo tem como foco a contribuição de conceitos de interoperabilidade e de iniciativas internacionais na definição de padrões abertos para o crescimento de software livre na área de SIG. Com a experiência do CPqD no desenvolvimento de soluções corporativas e de missão crítica baseadas em manipulação de informações georreferenciadas na área de telecomunicações, foi possível alavancar pesquisas em software livre e padrões abertos para sistemas de informações geográficas. Os impactos dessa atuação forneceram ferramental para atuar em projetos de contexto diferenciado do quadro corporativo, como prefeituras, empresas de diversos portes e também em políticas públicas de telecomunicações junto ao Ministério das Comunicações através do projeto SIGPPT. Palavras-chave: Interoperabilidade. OGC. Padrões abertos. Componentes. SIG. 1 Introdução O software livre (SL) (FSF, 1994) (DAHER, 2004b) tem revolucionado o mercado de software, principalmente pela oferta de uma gama de produtos que vão de simples editores de texto a robustos servidores de aplicação. A definição de padrões abertos para Sistemas de Informações Geográficas (SIG), principalmente pelo Open Geospatial Consortium (OGC) (OGC, 2005c), tem possibilitado não apenas a interoperabilidade entre sistemas, mas também o uso de arquiteturas SIG baseadas em componentes. É justamente essa arquitetura que torna a combinação SL e padrões abertos muito interessante para toda a comunidade SIG, pois impulsiona o trabalho tanto da comunidade de SL, uma vez que os padrões viabilizam o desenvolvimento de componentes livres, como do OGC, que busca a comprovação prática de suas especificações. Os resultados de pesquisa do projeto de P&D SIGPPT1 (CPqD, 2006) apresentados neste artigo mostram a viabilidade do desenvolvimento de aplicações SIG com soluções de SL e padrões abertos para a obtenção de interoperabilidade e * 1 flexibilidade na composição de uma solução SIG baseada em componentes, totalmente baseada em SL ou como parte de uma solução baseada em software proprietário. A seguir, serão apresentadas a tecnologia envolvida no desenvolvimento de software livre e soluções interoperáveis e a viabilização de uma solução SIG utilizando componentes livres e padrões abertos internacionais. Também serão mostrados alguns componentes e bibliotecas existentes de SL para SIG e casos de sucesso aplicando conceitos e propostas discutidos neste artigo. 2 J2EE e arquitetura em componentes no desenvolvimento de software Uma arquitetura de software estruturada é essencial para o sucesso de uma aplicação. Para minimizar impactos e atender às pressões do negócio e da tecnologia, são necessários requisitos como flexibilidade, adaptabilidade, manutenibilidade, reusabilidade, aproveitamento do legado, interoperabilidade, escalabilidade, robustez, menor tempo de desenvolvimento e baixo risco. Uma Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected]. Sistemas de Informações Geográficas para Política Pública de Telecomunicações – SIGPPT. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 7 18/7/2006 19:08:17 Software livre e interoperabilidade na área de SIG arquitetura multicamada e modularizada em componentes facilita o desenvolvimento e a evolução do software. A tecnologia J2EE (OLIVEROS, 2004) e seu modelo baseado em componentes facilitam o desenvolvimento e a evolução de soluções de software. A tecnologia provê liberdade de escolha de plataforma de execução e conectividade, além de padronização da arquitetura através do uso de HTTP e XML. 3 Solução SIG utilizando componentes livres e padrões abertos Conceitualmente, arquiteturas SIG são formadas por componentes como sistema de armazenamento de dados espaciais, servidores de mapas e dados e aplicações cliente para visualização e manipulação de dados. As arquiteturas SIG existentes, tanto comerciais (MapGuide, ArcGIS, MapInfo, Geomedia) como livres (TEIXEIRA et al., 2004), diferem em relação à representação de estilo, formato dos mapas, representação das geometrias, armazenamento de dados espaciais, formato de imagens, etc. Considerando-se ainda as linguagens de programação, plataformas e interfaces de comunicação, é possível compreender por que o conceito de reuso de componentes no contexto SIG parece, a princípio, inviável. Porém, graças à definição de um padrão internacional aberto e ao suporte da comunidade SIG, isso se tornou possível no desenvolvimento das soluções da área. A definição de padrões abertos para SIG, principalmente pelo OGC (OGC, 2005c), tem possibilitado não apenas a interoperabilidade entre sistemas, no sentido de comunicação e troca de dados, mas também a definição de arquiteturas baseadas em componentes e distribuídas, conforme Figura 1, em que cada padrão OGC é uma “linguagem” utilizada para a comunicação. 3.1 Padrões OpenGIS Os principais padrões (Figura 1) definidos pelo OGC (OGC, 2005c) que vêm impulsionando o desenvolvimento de componentes de software livre para a área de SIG também têm sido adotados por empresas como Oracle, IBM, Autodesk, ESRI e MapInfo no desenvolvimento de produtos, o que torna real a interoperabilidade e a flexibilidade na combinação de diferentes componentes de software. A seguir, os principais padrões OGC são descritos. 3.1.1 Simple Features (SFS) O objetivo da especificação Simple Features for SQL (SFS) (OGC, 1999) (DAHER, 2004a) é definir um esquema no padrão SQL que suporte o armazenamento, a recuperação, a consulta e a atualização de coleções de objetos espaciais através de uma API ODBC. 3.1.2 Geography Markup Language (GML) A GML (OGC, 2004b) é uma codificação XML para transporte e armazenamento de informações geográficas, incluindo tanto as propriedades espaciais como as não-espaciais de objetos (features). Figura 1 Soluções SIG e visão geral do uso de padrões OGC [17] 8 CPQDv2.indd 8 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:17 Software livre e interoperabilidade na área de SIG 3.1.3 Filter Encoding (Filter) A especificação OGC Filter Encoding (OGC, 2005a) define um vocabulário XML para a construção de filtros. Um filtro é uma estrutura utilizada para descrever restrições formadas por propriedades alfanuméricas e espaciais dos objetos, com o propósito de identificar um subconjunto de um determinado tipo de objeto (feature type). 3.1.4 Styled Layer Descriptor (SLD) A especificação Styled Layer Descriptor (SLD) (OGC, 2002a) (OLIVEIRA, 2005) define um esquema XML para a representação de estilos e layers, bem como de interfaces necessárias para a utilização desses elementos em um servidor de mapas (WMS). quais camadas podem ser mostradas e quais podem ter seus objetos consultados. Um servidor WMS pode empregar um SLD para aplicar um estilo fornecido pelo cliente para a geração de um mapa. Um cliente WMS é qualquer aplicação que se comunica com um ou mais servidores de WMS. O cliente WMS deve organizar as camadas retornadas pelas requisições ao servidor, compondo o mapa, conforme Figura 2. É possível agrupar servidores WMS em cascata (WMS Cascading), disponibilizando o acesso a vários outros WMS em um único servidor (Figura 3). Isso simplifica as alterações na configuração dos servidores e, em alguns casos, contorna deficiências de outros WMS que não podem, por exemplo, publicar dados em determinada projeção ou determinado formato. 3.1.7 Web Map Context (WMC) 3.1.5 Web Feature Services (WFS) A especificação Web Feature Services (OGC, 2002b) (MANDOLESI, 2004) define interfaces para que dados de um servidor de objetos espaciais (features) possam ser acessados via HTTP. Documentos GML são utilizados para representação de metainformações e dados. O padrão OGC Filter Encoding é utilizado para definição de consultas. Um servidor WFS pode oferecer suporte a transações (insert, update, delete). Um cliente WFS é qualquer aplicativo que se comunica com um ou mais servidores WFS utilizando as interfaces definidas nesse padrão. 3.2 Produtos, componentes e bibliotecas de software livre para SIG 3.1.6 Web Map Services (WMS) 3.2.1 Sistemas Gerenciadores de Banco de Dados A especificação Web Map Services (OGC, 2004a) (MANDOLESI, 2004) padroniza as interfaces utilizadas por clientes para requisitar mapas e metadados aos servidores e sua resposta. Há interfaces para a requisição de mapas, consulta a objetos apresentados no mapa, descrição de Os Sistemas Gerenciadores de Banco de Dados (SGBD) livres com suporte espacial mais relevantes são o MySQL e o PostgreSQL. O MySQL (MySQL AB, 2005), (DAHER, 2004c) tem uma arquitetura simples e leve, focada no desempenho. Conta com suporte nativo a trata- Figura 2 Cliente WMS Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 9 A especificação OGC Web Map Context (WMC) (OGC, 2005b) define um documento XML que descreve um conjunto de mapas, o qual deverá ser exibido ao cliente, proveniente de um ou mais servidores WMS. O WMC inclui informações como, por exemplo, camadas que compõem o mapa e servidores que as provêem, área geográfica apresentada, sistema de coordenadas e tamanho do mapa. Figura 3 Cascade WMS 9 18/7/2006 19:08:18 Software livre e interoperabilidade na área de SIG mento de dados espaciais a partir da versão 4.1, mas ainda não permite criar tabelas espaciais que suportem transação. O MySQL implementa o suporte a dados espaciais seguindo um subconjunto da especificação OGC SFS (OGC, 1999). O PostgreSQL (POSTGRESQL, 2005) (DAHER, 2004c) oferece tipos geométricos nativos, inúmeras funções geométricas de conversão e operadores espaciais. Porém, as funcionalidades geográficas podem ser melhoradas com a extensão PostGIS (REFRACTIONS RESEARCH, 2005b). Ela adiciona uma série de tipos para a manipulação de dados geográficos e funções para operações mais complexas contempladas pela especificação OpenGIS SFS (OGC, 1999). 3.2.2 Servidores de Mapas e Dados (WMS e WFS) 3.2.2.1 MapServer O MapServer (UMN, 2005) (OLIVEIRA & GATTI, 2005) é um ambiente de desenvolvimento de software livre para aplicações espaciais baseadas em Internet. É baseado em outros sistemas de software livre como Shapelib, FreeType, Proj.4, GDAL e LibTIFF. Assim, grande parte das características oferecidas pelo MapServer é provida por serviços de outros sistemas e bibliotecas. De acordo com as bibliotecas opcionais incorporadas, o MapServer oferece suporte a formatos vetoriais e raster, indexação espacial, mapas temáticos utilizando expressões lógicas ou regulares, consultas a SGBD com suporte geoespacial no padrão SFS, protocolos OGC WMS (Cliente/Servidor), WFS (Cliente/Servidor) não-transacional, WCS (Servidor) (OGC, 2003), WMC, SLD, GML, Filter Encoding, SFS, e suporte à dimensão temporal em WMS. O MapServer pode ser executado como uma aplicação CGI de um servidor HTTP, ou pode-se utilizar a API do MapServer diretamente em aplicações mais avançadas. 3.2.2.2 Geoserver Geoserver (TEIXEIRA, 2004) é uma implementação Java da especificação OGC WFS, com suporte completo a transações e um WMS integrado, que permite a recuperação de dados tanto no formato GML (através do WFS) como em imagens (através do WMS). Utiliza a biblioteca Geotools (TEIXEIRA, 2004) para a implementação das interfaces definidas pelo OGC, como representação de features, feature type, filtros, estilo em SLD e acesso a diversas fontes de dados. Suporta dados do tipo PostgreSQL/PostGIS, Shapefile, 10 CPQDv2.indd 10 Oracle Spatial, ArcSDE, MySQL e WFS remoto, além de todos os operadores espaciais para base de dados Oracle Spatial e PostgreSQL/PostGIS. O Geoserver WMS foi desenvolvido como uma opção para disponibilizar os dados do servidor WFS de forma gráfica. 3.2.2.3 Deegree A arquitetura do Deegree (DEEGREE, 2004) é totalmente baseada nos padrões OGC: dados e metainformação dos objetos representados como feature e feature type (GML, WFS), geometrias no padrão SFS e estilos no padrão SLD. O Deegree WFS trabalha com formatos de dados de entrada: Oracle, PostgreSQL/PostGIS, MySQL (com extensão espacial), SDE (ESRI), objetos do tipo ponto armazenados em bancos convencionais (geometria colunas X/Y), objetos com parte espacial representada em GML em bancos convencionais, Shapefiles e MapInfo (MIF). As feature types são configuradas definindo-se um GML e um arquivo XML de mapeamento entre o esquema GML e o esquema de armazenamento. Como fonte de dados, o Deegree WMS utiliza os serviços dos componentes Deegree WFS e Deegree WCS. O Deegree WMS não acessa a base de dados diretamente. O servidor WMS pode obter dados de WFS e WCS locais, localizados na mesma máquina virtual, ou de WFS, WCS e WMS remotos. 3.2.3 Clientes WMS e WFS O MapServer pode também ser configurado como um cliente WFS e/ou WMS, fornecendo mapas a simples clientes HTML, além de empregar o SLD para descrever sua simbologia. O iGeoPortal (DEEGREE, 2005) é um cliente de mapas no padrão cliente WMS. Ele possui arquitetura em módulos componentes baseados em HTML e JavaScript. Isso permite que o cliente de mapas seja expandido e adequado de acordo com as necessidades de um projeto específico. A arquitetura foi projetada visando à interoperabilidade e à configuração através dos padrões OGC. 3.2.4 Software SIG Desktop Com relação ao ambiente desktop, destacam-se o uDig (REFRACTIONS RESEARCH, 2005a) e o JUMP (Unified Mapping Platform) (VIVID, 2005b). O uDig (User-friendly Desktop Internet GIS) é um framework Java para desenvolvimento de aplicações sobre plataforma Eclipse Rich Client Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:19 Software livre e interoperabilidade na área de SIG Figura 4 Arquitetura uDig (Fonte: Refractions Research) Figura 5 Arquitetura JUMP (Fonte: Vivid Solutions) Platform (RCP). Novos módulos e funcionalidades são facilmente incorporados em sua arquiteturabase por meio de plug-ins. A arquitetura do uDIG é mostrada na Figura 4. O JUMP é um framework Java para o desenvolvimento de aplicações de visualização e manipulação de dados espaciais. Sua arquitetura (Figura 5) é dividida em duas partes principais: JUMP API, usada para a representação de features, entrada e saída de dados e funcionalidades espaciais fundamentais e JUMP Workbench, uma interface gráfica de acesso às funcionalidades disponibilizadas. 3.2.5 Bibliotecas O Geotools (TEIXEIRA, 2004) é um conjunto de APIs Java que pode ser utilizado para o desenvolvimento de soluções SIG, em conformidade com o padrão OGC. Não é objetivo do projeto Geotools desenvolver aplicações completas e sim disponibilizar bibliotecas que possam ser utilizadas para esse fim. A arquitetura é modularizada, o que permite que novas funcionalidades sejam facilmente incorporadas às bibliotecas. Entre as funcionalidades providas pelas APIs, destacamse a análise em redes, a manipulação de grid e Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 11 imagens e os componentes para a criação de uma aplicação SIG. O JTS Topology Suite (VIVID, 2005a) é uma API Java que implementa o modelo geométrico para objetos espaciais definido na especificação SFS e funções espaciais sobre esse modelo. É uma biblioteca robusta, utilizada por uma série de outros projetos de software livre como Geotools, uDig, Geoserver, Deegree e JUMP. O TerraLib (INPE, 2005) é uma biblioteca de classes e funções para SIG, disponível sob licença LGPL. Entre outras características, permite a “espacialização” de bancos de dados que não suportam nativamente dados espaciais ou a extensão dessa capacidade, através da definição de um modelo de dados geográficos e um conjunto de funções externas ao SGBD. As funções, escritas em ANSI C++, englobam algoritmos de estatística espacial, processamento de imagens e projeções cartográficas, entre outras. 4 Solução SIG/GIS do CPqD Com os resultados obtidos pelo projeto de P&D SIGPPT (CPqD, 2006) nasceu uma nova solução SIG/GIS no CPqD, construída sobre os seguintes 11 18/7/2006 19:08:19 Software livre e interoperabilidade na área de SIG Figura 6 Solução GIS composta por Cliente Mapas, Visualizador de atributos, Geocodificador, GeoAnálise Figura 7 Composição da consulta e visualização do resultado (formato tabular) pilares básicos: emprego de software livre, arquitetura baseada em componentes empregados conforme as necessidades do cliente, padrões abertos de interoperabilidade – em especial OGC e W3C, ambiente Web, plataforma J2EE e banco de dados geográfico objeto-relacional. Os componentes que formam a solução SIG/GIS completa são descritos a seguir e ilustrados na Figura 6. 12 CPQDv2.indd 12 4.1 Visualizador de atributos O visualizador de atributos (FDV) (GIGLIOTTI, 2005e) é uma ferramenta de consulta a dados georreferenciados. O usuário pode fazer consultas com expressões lógicas, como AND, OR, >, <, =, e LIKE sobre quaisquer campos de um determinado tipo de objeto. O resultado pode ser mostrado Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:20 Software livre e interoperabilidade na área de SIG em formato tabular ou destacado no mapa. Sua implementação é baseada nos padrões WFS, GML e Filter, que o torna independente de banco de dados. O resultado da consulta com saída em formato tabular é ilustrado na Figura 7. 4.2 GeoAnálise O GeoAnálise (GIGLIOTTI, 2005d) é uma ferramenta de configuração e geração de mapas temáticos que utiliza os padrões OGC GML, WFS e Filter e auxilia as análises do usuário. A construção de consultas temáticas pode ser feita por valor único ou por estratificação e o usuário escolhe a propriedade do objeto a ser usada na análise, o método de estratificação dos dados e as cores ou símbolos dos temas a serem utilizados na exibição dos resultados da consulta no mapa. Um exemplo de geração de um mapa temático, cuja consulta é feita por estratificação e diferenciada por cores, é ilustrado na Figura 8. 4.3 Cliente Mapas O Cliente Mapas (GIGLIOTTI, 2005a) é uma ferramenta criada pelo CPqD para a visualização de mapas em ambiente Web baseado no cliente WMS e Context iGeoPortal. Ele oferece funciona- lidades de legenda, mapa de referência, zoom, pan, controle de camadas e recuperação de informações de objetos ativos no mapa (Figura 9). Além disso, permite que o usuário inclua dinamicamente camadas de outros servidores WMS de mapas disponíveis na rede, bastando indicar o endereço HTTP do servidor. O Cliente Mapas é responsável pela integração dos vários componentes da solução GIS apresentados na Figura 6. Ele é flexível para configurar itens como as camadas a serem habilitadas e o nível de zoom desejado quando o módulo é iniciado pela primeira vez. 4.4 Geocodificador O Geocodificador (GIGLIOTTI, 2005b, 2005c) é uma ferramenta para localização geográfica de um endereço no mapa. Esse endereço pode ser um número da casa, um logradouro, um cruzamento ou um ponto de referência, mesmo incompleto. As formas de representação do endereço, requisição e resposta são baseadas no padrão OpenLS do OGC, adaptado para o modelo de endereçamento brasileiro. O componente Geocodificador está ligado ao Componente de Endereços, camada responsável pela manipulação de diferentes padrões de endereça- Figura 8 GeoAnálise: escolha do modo de estratificação do resultado e definição do estilo de exibição do resultado temático no Cliente Mapas ao fundo Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 13 13 18/7/2006 19:08:23 Software livre e interoperabilidade na área de SIG Figura 9 Cliente Mapas ao fundo com camadas Ruas e Lotes e informação sobre a camada ativa (Lote) selecionada mento presentes na base de dados. O Componente de Endereços utiliza o framework Geotools, que permite acesso a diferentes SGBDs de forma transparente, usando os padrões GML e Filter. 5 Aplicações e cases Os cases descritos a seguir foram desenvolvidos pelo CPqD com base nas premissas discutidas na Seção 4, demonstrando, na prática, a viabilidade e a flexibilidade do emprego de componentes e padrões internacionais nas soluções SIG, fomentando a interoperabilidade e soluções baseadas em software livre e/ou software proprietário. 5.1 RadCom SIG O RadCom SIG (CARVALHO, 2005) busca georreferenciar rádios comunitárias, fornecendo consultas e validações de coordenadas, e apresenta um simulador de pontos que o Ministério das Comunicações (MC) poderia usar para novas outorgas de rádio, baseado em regras de negócios do próprio ministério. Possui, ainda, controle de autenticação e acesso, administração de privilégios de usuários e funcionalidades para o cidadão verificar a viabilidade de candidatar-se a um processo de outorga do MC. 2 5.2 SMP Solução para a área de Atendimento a Clientes SMP (call center, suporte e lojas de atendimento) que fornece aos clientes informações sobre área de cobertura, localização de lojas e pontos de venda de cartão. O SMP emprega o Geocodificador (Seção 4.4) para informar dados de cobertura, nível de sinal, estado de operação das estações radiobase, localização de lojas de venda e pontos de assistência técnica mais próximos da localização do cliente. Nessa solução, foi utilizado o Autodesk MapGuide como cliente e servidor de mapas para a visualização geográfica dos elementos do sistema no mapa e SGBD Oracle Spatial, que segue a especificação OGC SFS. Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico (COMITÊ EXECUTIVO, 2005). 14 CPQDv2.indd 14 Esse é um dos primeiros exemplos de implementação de interoperabilidade entre sistemas, segundo e-PING2, para o compartilhamento de informações comuns com o sistema de cadastro de rádios comunitárias do MC. Além disso, foi um caso totalmente baseado em software livre, aplicando a arquitetura J2EE e as especificações dos padrões WMS e SLD, servidor de aplicação JBoss, banco de dados PostgreSQL, em ambiente Linux. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:25 Software livre e interoperabilidade na área de SIG 5.3 Monitoração RNI O CPqD Monitoração RNI (ALMEIDA et al., 2005) é um sistema para a medição contínua e a simulação de intensidade das emissões eletromagnéticas das estações radiotransmissoras dos sistemas de telecomunicações sem fio. O sistema usa os componentes Cliente Mapas, Geocodificador e GeoAnálise. O Cliente Mapas provê interação do usuário com o mapa e a visualização dos elementos georreferenciados do sistema (simulação de emissões eletromagnéticas, arruamento, estradas, praças, entre outros), enquanto a consulta de um endereço e sua localização no mapa são funcionalidades providas pelo componente Geocodificador. A criação de camadas préconfiguradas com destaque de objetos no mapa por um determinado atributo, como é o caso de pontos de coleta conforme a data da operação, foi possível graças ao componente GeoAnálise. Esse é um exemplo em que a parte SIG da solução foi composta exclusivamente por software livre e pelo reuso de componentes. 5.4 SAM Outro exemplo de uso exclusivo de software livre em sua solução SIG é o protótipo do projeto Serviços de Aplicações Móveis (SAM) de “uma plataforma de comunicação de dados entre agentes em campo e os centros de dados de suas corporações, utilizando terminais móveis” (BRUZONI et al., 2005). O SAM emprega o componente Geocodificador, sendo adotados o SGBD PostgreSQL/PostGIS e o servidor de mapas WMS Mapserver. 5.5 MapForce Com o objetivo de minimizar o deslocamento de equipes de atendimento ao cliente, aumentar a eficiência e melhorar o gerenciamento da força de trabalho de campo, foi idealizado um software com a capacidade de disponibilizar, via Web, informações de posicionamento geográfico e de roteirização sobre atividades, elementos e força de trabalho. Essa solução (CPqD, 2005), desenvolvida para georreferenciar objetos específicos do sistema (atividades, executores, estações) a partir de seus endereços e do mapeamento urbano cadastrados no sistema, utiliza o Geocodificador. O GeoAnálise, por sua vez, é o responsável por construir mapas temáticos que ajudam na análise dos objetos plotados no mapa, como, por exemplo, na definição de como os objetos aparecerão no mapa ou como deverão ser agrupados, de acordo com sua situação no sistema. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 15 Neste case, foram utilizados o Oracle Spatial como SGBD e o Autodesk MapGuide como servidor e cliente de mapas, em conjunto com os componentes SIG aqui descritos, baseados em software livre. Embora o Autodesk MapGuide não suporte alguns padrões OGC utilizados no desenvolvimento dos componentes SIG – por exemplo, o SLD –, foram desenvolvidos adaptadores que possibilitaram o reuso de componentes. Esse é um exemplo do benefício do uso de padrões e componentes, possibilitando o reaproveitamento e a composição de solução SIG com software livre e software proprietário. 6 Conclusão O software livre deixou de ser exercício acadêmico, tornando-se parte do mercado mundial de software. Ele já é utilizado em diversos sistemas críticos e a evolução dos sistemas de software gerados como SL tem sido veloz. A definição de padrões abertos para SIG, principalmente pelo Open Geospatial Consortium (OGC), tem possibilitado não apenas a interoperabilidade entre sistemas, no sentido de comunicação e troca de dados, mas também a definição de arquiteturas SIG baseadas em componentes, facilitadas graças a esse “protocolo-padrão de comunicação”. Essa arquitetura impulsiona o trabalho tanto da comunidade de SL como do OGC, uma vez que o OGC busca a comprovação prática de suas especificações e a comunidade de SL precisa de padrões que viabilizem o desenvolvimento baseado em componentes. Nesse cenário fértil, acrescenta-se ainda a vantagem da portabilidade, já que a linguagem Java foi eleita como a linguagem de programação da grande maioria dos desenvolvedores da comunidade de SL. A administração pública e as organizações em geral têm muito a ganhar com o SL e padrões internacionais abertos que oferecem vantagens como a interoperabilidade entre os vários sistemas desenvolvidos nessa plataforma, o não-aprisionamento a um único fornecedor e a interrupção da obsolescência programada. Empresas de desenvolvimento de soluções SIG ganham agilidade no processo de implementação e flexibilidade para decidirem onde utilizar software livre e quais produtos, proprietários ou não, comporão sua solução. Em suma, através de software livre e padrões internacionais abertos, pessoas e organizações de todo o mundo têm se beneficiado da liberdade de escolha e do compartilhamento de informações. O CPqD contribui com o desenvolvimento de soluções empregando esses novos instrumentos. Conforme descrito neste artigo, os componentes 15 18/7/2006 19:08:25 Software livre e interoperabilidade na área de SIG desenvolvidos pelo projeto SIGPPT, fundamentados nesses conceitos, fizeram parte de uma gama de soluções que evidenciam a flexibilidade na composição com software livre ou software pro- prietário, graças à sinergia entre padrões abertos e SL. Portanto, o uso de software livre e padrões abertos em soluções SIG é definitivamente uma realidade nos dias atuais. Referências ALMEIDA, A. M. et al. Controle e gestão de radiações não-ionizantes produzidas pelo sistema de telecomunicações: uma abordagem inovadora. Cadernos CPqD de Tecnologia, Campinas, v.1, n.1, p. 71-84, jan./dez. 2005. BRUZONI, A. L. et al. Serviços e aplicações móveis. Cadernos CPqD de Tecnologia, Campinas, v.1, n.1, p. 85-94, jan./dez. 2005. CARVALHO, K. R. F. de. RadCom 1.2.1: Manual do usuário. PD301168A0034A-RT08AA. Campinas: CPqD, mar. 2005. (Relatório técnico). COMITÊ EXECUTIVO DE GOVERNO ELETRÔNICO (Brasil). e-PING, Padrões de Interoperabilidade de Governo Eletrônico: Documento de referência. Versão 1.5. Brasil, 2005. Disponível em: <http://www.governoeletronico.gov.br/ governoeletronico/publicacao/down_anexo. wsp? tmp.arquivo=E15_677e-PING%20v1. 5%2016%2012%2020051.pdf>. Acesso em: 12 abr. 2006. CPqD. Map Force. Versão 3, 1.ed. Campinas: CPqD, set. 2005. p. 13-18 (Manual de usuário SW 3.0). CPqD. Relatório de execução física do CPqD relativo ao Plano de Aplicação de Recursos, Período 2005 – 2007: Exercício 2005, FUNTTEL, Projeto Sistemas de Informações Geográficas para Política Pública de Telecomunicações. Campinas: CPqD, jan. 2006. (Relatório técnico). DAHER, A. M. Estudo da especificação OGC: Simple Feature for SQL. PD301168A0036ART01AA. Campinas: CPqD, nov. 2004a. (Relatório técnico). DAHER, A. M. Estudo de software livre e suas licenças. PD301168A0025A-RT16AA. Campinas: CPqD, nov. 2004b. (Relatório técnico). DAHER, A. M. Estudo de infra-estrutura de software livre básico: SGBDs com suporte a informações espaciais. PD301168A0025ART03AA. Campinas: CPqD, abr. 2004c. (Relatório técnico). 16 CPQDv2.indd 16 DEEGREE. Deegree Home Page. Disponível em: <http://deegree.sourceforge.net/>. Acesso em: 28 abr. 2004. DEEGREE. Deegree iGeoPortal. Disponível em: <http://deegree.sourceforge.net/src/demos. html#client>. Acesso em: 01 jun. 2005. FREE SOFTWARE FOUNDATION (FSF). Disponível em: <http://www.fsf.org/>. Acesso em: nov. 1994. GIGLIOT TI, A . V. CPqD Cliente Mapas. PD301168A0035A-OR07AA. Campinas: CPqD, jun. 2005a. (Relatório técnico). GIGLIOTTI, A. V. CPqD Geocodificador Aplicação Web. PD301168A0035A-OR08AA. Campinas: CPqD, jun. 2005b. (Relatório técnico). GIGLIOTTI, A. V. CPqD Geocodificador Serviços. PD301168A0035A-OR04AA. Campinas: CPqD, jun. 2005c. (Relatório técnico). G I G L I O T T I , A . V. C P q D G e o A n á l i s e . PD301168A0035A-OR05AA. Campinas: CPqD, jun. 2005d. (Relatório técnico). GIGLIOTTI, A. V. CPqD Visualizador de Dados. PD301168A0035A-OR06AA. Campinas: CPqD, jun. 2005e. (Relatório técnico). INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE). Divisão de Processamento de Imagens. TerraLib. Disponível em: <http://www.terralib. org/>. Acesso em: 24 abr. 2005. MANDOLESI, G. WFS e WMS: Aspectos técnicos. PD301168A0036A-RT02AA. Campinas: CPqD, dez. 2004. (Relatório técnico). MySQL AB. MySQL. Disponível em: <http://www. mysql.org/>. Acesso em: 24 abr. 2005. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). OpenGIS® simple features implementation specification for SQL, version 1.1, reference number: OGC 99-049. USA: OGC, 1999. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). Styled layer descriptor implementation specification, version 1.0.0, reference number: OGC 02-070. USA: OGC, 2002a. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:25 Software livre e interoperabilidade na área de SIG OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). Web feature service implementation specification, version 1.0.0, reference number: OGC 02-058. USA: OGC, 2002b. OLIVEROS, D. L. C. Estudo de infra-estrutura de software livre básico. PD301168A0025ART02AA. Campinas: CPqD, abr. 2004. (Relatório técnico). OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). Web coverage service implementation specification, version 1.0.0, reference number: OGC 03-065r6. USA: OGC, 2003. POSTGRESQL GLOBAL DEVELOPMENT GROUP. PostgreSQL. Disponível em: <http://www. postgresql.org/>. Acesso em: 24 abr. 2005. O P E N G E O S PAT I A L C O N S O R T I U M I N C (OGC). Web map service implementation specification, version 1.3, reference number: OGC 04-024. USA: OGC, 2004a. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). OpenGIS® Geography Markup Language (GML) encoding specification, version 3.1.1, reference number: 03-105r1. USA: OGC, 2004b. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). Filter encoding implementation specification, version 1.1.0, reference number: OGC 04-095. USA: OGC, 2005a. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC (OGC). Web map context documents implementation specification, version 1.1, reference number: OGC 05-005. USA: OGC, 2005b. OPEN GEOSPATIAL CONSORTIUM INC Home Page. Disponível em: <http://www.opengeospatial. org>. Acesso em: 22 abr. 2005c. OLIVEIRA, C. M.; GATTI, S. D. Estudo de SIG para Web: MapServer. PD301168A0036A-RT07AB. Campinas: CPqD, jan. 2005. (Relatório técnico). OLIVEIRA, C. M. Padrão OGC: SLD – Styled Layer Descriptor. PD301168A0036A-RT04AA. Campinas: CPqD, mar. 2005. (Relatório técnico). REFRACTIONS RESEARCH. User-friendly Desktop Internet GIS (uDig). Disponível em: <http://udig.refractions.net/confluence/ display/UDIG/Home>. Acesso em: 24 abr. 2005a. REFRACTIONS RESEARCH. PostGIS. Disponível em: <http://www.postgis.org/>. Acesso em: 24 abr. 2005b. TEIXEIRA, M. D. Estudo de SIG para Web: Geotools, Geoserver, Geoclient, Deegree Client. PD301168A0025A-RT04AA. Campinas: CPqD, abr. 2004. (Relatório técnico). TEIXEIRA, M. D. et al. Estudo de infra-estrutura de software livre básico: Proposta de uma arquitetura GIS. PD301168A0025A-RT10AA. Campinas: CPqD, mai. 2004. (Relatório técnico). UNIVERSITY OF MINNESOTA (UMN). Welcome to MapServer – UMN MapServer. Disponível em: <http://mapserver.gis.umn.edu/>. Acesso em: 24 abr. 2005. VIVID SOLUTIONS. JTS topology suite. Disponível em: <http://www.vividsolutions.com/jts/>. Acesso em: 01 jun. 2005a. VIVID SOLUTIONS. JUMP – Unified Mapping Platform. Disponível em: <http://www. vividsolutions.com/jump/>. Acesso em: 01 jun. 2005b. Abstract This article presents the main free software projects related to the Geographic Information System (GIS) area, addressing spatial databases, basic tools and applications for mapping and viewing spatial data. This paper is focused on how the interoperability concept and international initiatives for open standards have contributed to the growth of GIS free software. CPqD’s large experience in developing corporate critical mission solutions based on geospatial data processing, mainly in the telecommunications field, has led to research on free software and GIS open standards. As a result, a set of tools has been developed, proving CPqD competence to offer solutions in distinctive projects such as city halls, enterprises of any size and telecommunications public policies for the Brazilian Ministry of Communications through the SIGPPT project, which in Portuguese stands for Geographic Information System for a Telecommunication Public Policy. Key words: Interoperability. OGC. Open standards. Components. GIS. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 7-17, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 17 17 18/7/2006 19:08:25 CPQDv2.indd 18 18/7/2006 19:08:26 Avaliação de impactos para gestão ambiental: um estudo dos descartes de empresas de telecomunicações Sirney Silveira*, Evandro C. Longui, Joceli M. G. Angelini, Luiz Carlos Neves, Maria A. Rodrigues, Rozely F. Santos Este trabalho tem como objetivo apresentar alguns resultados obtidos no projeto Telecomunicações e seus Impactos na Saúde e Meio Ambiente, através de um levantamento feito junto às empresas do setor de telecomunicações sobre o estado-da-arte do descarte de produtos pós-uso na rede de telecomunicações. Os produtos e seus componentes foram classificados segundo normas brasileiras e internacionais. A partir desses dados, foi desenvolvida uma nova metodologia para auxiliar a avaliação do impacto ambiental do descarte de produtos de telecomunicações. A significância do impacto produzido foi avaliada com o uso de ferramentas ambientais, sendo identificados quatro produtos prioritários a serem tratados na elaboração de um programa ambiental no setor de telecomunicações. Palavras-chave: Meio ambiente. Resíduos. Rede de telecomunicações. Rede externa. Impacto ambiental. 1 Introdução As atividades das empresas de telecomunicações geram produtos e subprodutos que interferem direta ou indiretamente no meio ambiente, na geração de materiais ou produtos de descarte, cujo controle e manejo são imprescindíveis. Não há muitos dados disponíveis sobre o impacto ambiental decorrente de instalações, processos e produtos de telecomunicações. As indústrias e operadoras desse setor geram uma grande quantidade de produtos que passam a ser sucatas e, via de regra, não se conhece seu destino. Não existem padrões para controle do desempenho das fontes de poluição ou do estado de qualidade do meio ambiente nas cercanias das instalações ou áreas de descarte desses produtos (REICHLING & OTTO, 2002). A ITU Telecommunication Standardization Sector (ITU-T) é um órgão permanente da International Telecommunication Union (ITU), responsável por estudos técnicos e operacionais e pela elaboração de procedimentos padronizados para o setor de telecomunicações. Em 1996, a ITU-T aprovou a norma ITU-T L.24, voltada para a classificação de produtos de rede externa pósuso. Para o desenvolvimento do presente trabalho, foram realizadas a identificação e a classificação dos produtos e materiais de telecomunicações que causam maior impacto ambiental. A estratégia * utilizada foi desenvolvida por meio de entrevistas e pesquisas junto a empresas de telecomunicações, operadoras, empreiteiras, terceirizadas do setor e também órgãos públicos. Posteriormente, foi realizada a análise do estágio atual da disposição pós-consumo dos produtos identificados como problemáticos que foram classificados sob os padrões nacional e internacional de resíduos sólidos, segundo as normas ABNT:NBR 10004 (Resíduos Sólidos – Classificação) (ABNT, 1996) e ITU-T L.24 (Classification of Outside Plant Waste) (ITU-T, 1996). Foi feito também um levantamento dos tipos de contaminação e processos patológicos oriundos do descarte desses produtos, bem como de áreas críticas de contaminação, utilizando, para isso, ferramentas específicas de avaliação ambiental chamadas de matrizes de conformidade (SANTOS, 2004). A aplicação dessas ferramentas justifica-se pela diversidade de componentes e substâncias dos produtos, cujos impactos podem apresentar uma variação significativa de potencial, tipo, abrangência, entre outros fatores. A Seção 2 deste artigo apresenta as definições utilizadas no desenvolvimento do trabalho e a Seção 3 mostra uma compilação de dados relativos a quantidades e tipos de disposição final dos produtos de telecomunicações no Brasil. Na Seção 4, são destacadas as metodologias utilizadas para a valoração dos aspectos do Autor a quem a correspondência deve ser dirigida: [email protected]. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 19 18/7/2006 19:08:26 Avaliação de impactos para gestão ambiental descarte e seus impactos ambientais. A análise e a discussão dos resultados são realizadas na Seção 5 e a conclusão final é apresentada na Seção 6. 2 bidimensionais, dispostas em forma de linhas e de colunas. Em uma delas, por exemplo, são elencados os produtos ligados ao descarte ou as principais atividades e, na outra, são apresentadas as principais características que, pelo menos potencialmente, induzem a impactos. O objetivo é identificar as interações possíveis entre todos os componentes por meio da avaliação das células correspondentes (BLOCK, 1999). Os números inseridos em cada célula correspondem a uma pontuação de magnitude da interação, em uma escala arbitrária de 0 a 3 ou de 0 a 5, que pode representar a intensidade do efeito do descarte. A partir dessa ferramenta, construiu-se uma matriz de conformidade que permite definir, para cada um dos produtos, se existe conformidade ou não no descarte (SANTOS, 2004). Definições Neste trabalho, serão chamados de “aspectos” as características associadas ao descarte de produtos e materiais de telecomunicações e de “impactos ambientais” os efeitos decorrentes da existência, do manejo e das ações tecnológicas relativas a esse descarte, realizado numa determinada área de abrangência (BLOCK & MARASH, 2006). Estabeleceu-se, na realidade, uma relação de causa e efeito entre produtos e materiais de descarte e alterações ambientais. Foi também necessário observar os impactos que não são decorrentes de uma única ação ou de uma única matéria, mas de um conjunto que, quando associado, tem um efeito particular; dados importantes para o cumprimento da legislação sobre o meio ambiente (VENTURA & RAMBELLI, 1996). Ferramentas metodológicas auxiliaram na identificação e na qualificação dos impactos ambientais. Optou-se por utilizar listas de verificação e diferentes tipos de matrizes. A lista de verificação é um instrumento que arrola os diferentes produtos, materiais e atividades, e tem como objetivo a garantia de um levantamento sistemático e exaustivo dos aspectos ligados a esses elementos. As matrizes são listas 3 Quantidade e disposição dos produtos de telecomunicações Após levantamento de dados das empresas de telecomunicações, obteve-se uma listagem de produtos e de procedimentos utilizados em sua disposição após o uso. Na Tabela 1, são destacados os principais produtos pesquisados, sua disposição usual e a estimativa de descarte anual. O universo total estudado é composto de 19 classes de produtos e, neste trabalho, é apresentada a fatia mais importante dos resultados. Tabela 1 Disposição pós-consumo de produtos de telecomunicações e estimativa de descarte anual no Brasil• Produtos Disposição usual* Descarte anual (base 2004)** Cabos de fibras ópticas Reuso, almoxarifado ou descarte em lixo comum Fios FE Almoxarifado ou descarte em lixo comum 3.475 toneladas Orelhões Reuso, aterros, descarte em lixo comum ou incineração 4.005 toneladas Baterias Reciclagem ou descarte em lixo comum 212 toneladas Baterias de celular Aterros ou reciclagem 40 toneladas Conjuntos de emenda metálica (chumbo) Descarte em lixo comum 102 toneladas Cabos metálicos Reuso, descarte em lixo comum ou reciclagem Bobinas de cabos Reuso, almoxarifado ou descarte em lixo comum Miscelâneas metálicas (mistura de todos os tipos Almoxarifado ou descarte em lixo comum de produtos metálicos de pequeno porte) 722 toneladas 29.615 toneladas 508 toneladas 1.341 toneladas Embalagens (madeira, plástico e papel) Descarte em lixo comum Postes Reuso, descarte em lixo comum, concessionária de energia ou almoxarifado 173 toneladas 2.690 peças Conjuntos de emenda Almoxarifado, leilão e reciclagem 15.178 peças Alguns locais entrevistados recolhem os produtos pós-uso e os disponibilizam para empresas de reciclagem, ou para outros fins, através de leilões. ** Os valores totais do descarte anual foram obtidos por meio de extrapolação dos dados regionais obtidos para as respectivas operadoras, tendo como base o número de acessos fixos instalados, que correspondem a 86% do total de acessos fixos instalados no Brasil. * 20 CPQDv2_posgrafica.indd 20 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 26/7/2006 17:57:39 Avaliação de impactos para gestão ambiental 4 Estabelecimento de critérios para valoração dos aspectos do descarte e seus impactos ambientais Foram estabelecidos critérios que permitissem valorar os aspectos ou características dos produtos e materiais de descarte. Para tanto, atribuíram-se pesos a cada aspecto em função desses critérios. Foram definidos dois tipos de pesos: o primeiro referente à importância do aspecto ou característica e o segundo referente à potencialidade do provável efeito ou impacto. Alguns procedimentos gerais propostos foram: • a análise de cada aspecto deve ser feita separadamente, pois, muitas vezes, eles podem ser antagônicos (WORLD ECONOMIC FORUM, 2001); • nos casos em que não exista conhecimento suficiente ou não existam elementos que permitam avaliar um determinado critério estabelecido, ele deverá ser retirado da análise; • a avaliação de cada critério ou aspecto segue dois tipos de escala: uma baseada na presença ou ausência de determinadas condições, que não podem ser quantificadas, e, por isso, foram estipulados parâmetros variáveis para a avaliação; e outra, baseada na intensidade com que se apresentam determinadas condições, por meio de parâmetros quantificáveis como, por exemplo, o peso ou o número de peças de descarte de determinado produto; • a proposta de atribuir somente quatro valores, por exemplo, de 0 a 3, permite identificar situações intermediárias entre as melhores e as piores condições, sem apresentar um número excessivo de valores que não expressam maior precisão na avaliação. Os conceitos são atribuídos segundo as regras descritas na Tabela 2. Tabela 2 Regras para atribuição de conceito Conceito Atribui-se o conceito nos seguintes casos: 3 Observam-se as piores condições 2 Observam-se condições ruins ou insatisfatórias 1 Observam-se condições aceitáveis, embora não sejam totalmente adequadas 0 Observam-se condições adequadas Foram estudados 18 critérios que envolvem os produtos e materiais de descarte, suas características e os impactos decorrentes. Os conceitos e pesos atribuídos a eles são exemplificados na Tabela 3. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 CPQDv2_posgrafica.indd 21 Tabela 3 Conceitos relativos à quantidade do descarte Descrição do critério: Considera a quantidade dos produtos e materiais acumulada em função das disposições pós-consumo, segundo estimativa de descarte anual pelas empresas de telecomunicações selecionadas. A quantidade foi avaliada em toneladas ou peças. Conceito Atribui-se o conceito nos seguintes casos: 3 Quantidade acima de 5.000 toneladas ou acima de 15 mil peças 2 Entre 100,01 e 5.000 toneladas ou de 3.001 a 15 mil peças 1 Entre 5,01 e 100 toneladas ou de 1.501 a 3.000 peças 0 Entre 0 e 5 toneladas ou de 0 a 1.500 peças Os critérios analisados foram classificados em três grandes blocos conforme suas características, aspectos relativos a prováveis impactos oriundos do descarte e aspectos relativos à minimização do efeito: 1. Critérios relativos às características do descarte, indutores de efeitos negativos ao meio ambiente: quantidade, volume, periculosidade e regularidade de produção do descarte; tipo de disposição final, probabilidade de contaminação e duração do descarte no meio, área de influência dos materiais e produtos, patogenicidade, complexidade do ciclo de vida do produto e aspectos legais. 2. Critérios relativos a prováveis impactos oriundos do descarte: severidade, ordem ou origem dos impactos, desencadeamento e duração do impacto. 3. Critérios relativos à minimização do efeito: capacidade de manejo e possibilidade de reciclagem ou reuso do descarte e reversibilidade dos impactos relativos ao produto. Os valores atribuídos a cada critério foram ordenados de acordo com sua importância referencial e são apresentados na Tabela 4. A totalização das linhas e colunas da tabela permite uma análise comparativa dos dados obtidos para cada produto, através da matriz de conformidade normal. 4.1 Atribuição de pesos aos critérios Para cada critério, pesos variando de 1 a 5 foram atribuídos, em função do potencial para causar maior ou menor impacto no meio, conforme descrito na Tabela 5. O valor atribuído em cada célula da matriz referese ao potencial e magnitude de um produto sobre o material de descarte para produzir impacto ao meio ambiente com relação aos aspectos dos filtros de significância (critérios). 21 26/7/2006 17:57:40 Avaliação de impactos para gestão ambiental pesos dos filtros de significância (Pi) constantes na Tabela 5. Assim: Os valores na Matriz de Conformidade Normal (MCN) foram obtidos a partir da soma dos valores das linhas (Vi) para cada produto da Tabela 4. Dessa forma: Os valores na Matriz de Conformidade Ponderada (MCP) foram calculados pela soma dos valores atribuídos aos produtos elevados aos respectivos pesos dos filtros de significância. Dessa forma: Os valores na Matriz de Conformidade Linear (MCL) foram obtidos pela soma dos produtos entre os valores atribuídos (Vi) pelos respectivos Tabela 4 Valoração dos critérios relativos ao descarte dos produtos que induzem a impactos ambientais (V) Cabos de fibras ópticas Fios FE Orelhões Baterias Baterias de celular Conjuntos de emenda metálica (chumbo) Quantidade do descarte 1 2 2 1 1 1 Volume do descarte 3 3 3 1 1 1 Periculosidade do descarte (ABNT-T) 1 3 1 3 3 3 Critério Periculosidade do descarte (ITU-T) 3 2 3 3 3 3 Tipo de disposição final 3 3 3 2 1 3 Área de influência dos materiais e produtos 0 0 2 3 3 3 Duração do descarte no meio 3 3 3 3 3 3 Regularidade de produção do descarte 3 3 3 0 3 3 Patogenicidade 3 3 3 3 3 3 Probabilidade de contaminação do descarte 3 3 3 3 3 3 Complexidade do ciclo de vida do produto 3 2 1 2 3 1 Aspectos legais 0 0 0 3 3 3 Severidade 3 3 3 3 3 3 Ordem ou origem dos impactos 0 1 0 3 3 3 Desencadeamento e duração dos impactos 2 2 3 3 3 2 Sinergia dos impactos 3 3 3 3 3 3 Capacidade de manejo do descarte 1 1 2 2 1 1 Possibilidade de reciclagem ou reuso do descarte 1 1 1 2 1 2 Reversibilidade dos impactos relativos ao produto 3 3 3 3 3 3 Tabela 5 Ponderação e agrupamento dos critérios Peso do critério (P) Critério Critérios relativos a características do descarte, indutores de efeitos negativos ao meio ambiente Quantidade do descarte 3 Volume do descarte 2 Periculosidade do descarte 5 Tipo de disposição final 4 Área de influência dos materiais e produtos 4 Duração do descarte no meio 3 Regularidade de produção do descarte 1 Patogenicidade 5 Probabilidade de contaminação do descarte 5 Complexidade do ciclo de vida do produto 2 Aspectos legais 2 Critérios relativos aos prováveis impactos oriundos do descarte Severidade 5 Ordem ou origem dos impactos 2 Desencadeamento e duração dos impactos 3 Sinergia dos impactos 4 Critérios relativos à minimização do efeito Capacidade de manejo do descarte 4 Possibilidade de reciclagem ou reuso do descarte 2 22 CPQDv2.indd 22 Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:26 Avaliação de impactos para gestão ambiental A Tabela 7 apresenta a prioridade para tratamento da disposição de cada produto segundo a avaliação de cada matriz de conformidade. A Tabela 8 apresenta a compilação dos resultados obtidos pelas matrizes de conformidade normal, linear e ponderada, com relação aos filtros de significância estudados. Os resultados mais expressivos para cada tipo de matriz estão destacados. Os cinco resultados mais significativos no universo total de 19 classes de produtos, em cada uma das matrizes (conformidade normal, linear e ponderada), foram separados do conjunto global, para uma análise mais específica. A Tabela 6 apresenta a compilação dos resultados mais relevantes de cada matriz. Tabela 6 Compilação das matrizes de conformidade – produtos Valor na matriz normal Valor na matriz linear Valor na matriz ponderada Cabos de fibras ópticas 39 147 1.347 Fios FE 41 156 1.389 Produto Orelhões 42 163 1.420 Baterias 46 169 1.248 Baterias de celular 47 164 1.223 Conjuntos de emenda metálica (chumbo) 47 167 1.279 Indica os cinco itens de maior severidade. Tabela 7 Prioridade para medidas de mitigação entre os três primeiros produtos selecionados pelos diferentes tipos de matrizes de conformidade Primeira prioridade Segunda prioridade Terceira prioridade Matriz normal Baterias de celular Conjuntos de emenda metálica Baterias Matriz linear Baterias Conjuntos de emenda metálica Baterias de celular Matriz ponderada Orelhões Fios FE Cabos de fibras ópticas Tabela 8 Tabela de compilação das matrizes de conformidade – filtros de significância Valor na matriz normal Valor na matriz linear Quantidade do descarte 24 120 624 Volume do descarte 33 165 1.563 Periculosidade do descarte (ABNT-T) 33 132 493 Filtro de significância Valor na matriz ponderada Periculosidade do descarte (ITU-T) 43 172 943 Tipo de disposição final 50 200 1.248 Área de influência dos materiais e produtos 38 152 988 Duração do descarte no meio 50 150 434 Regularidade de produção do descarte 45 45 45 Patogenicidade 43 215 2.803 Probabilidade de contaminação do descarte 40 200 2.740 Complexidade do ciclo de vida do produto 32 64 68 Aspectos legais 14 28 32 Severidade 40 200 2.560 Ordem ou origem dos impactos 22 44 50 Desencadeamento e duração dos impactos 35 105 185 Sinergia dos impactos 34 136 764 Capacidade de manejo do descarte 24 96 186 Possibilidade de reciclagem ou reuso do descarte 20 40 36 Reversibilidade dos impactos relativos ao produto 50 200 1.312 Indica os seis itens de maior severidade. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 23 23 18/7/2006 19:08:28 Avaliação de impactos para gestão ambiental 5 Análise e discussão dos resultados A partir dos resultados apresentados na Tabela 6, é possível a aplicação de diferentes formas de análise para a elaboração de conclusões sobre os produtos de maior potencial de impacto. As conclusões podem ser utilizadas na criação de programas ambientais que podem ser inseridos em um sistema de gestão ambiental de uma empresa de telecomunicações. Em uma análise global, verifica-se que os quatro produtos que aparecem entre os mais críticos (maior pontuação) nos três tipos de matrizes são os fios FE, os orelhões, as baterias e os conjuntos de emenda metálica. Eles aparecem como potencialmente poluidores, independentemente da forma de tratamento, indicando que precisam ser priorizados na elaboração de um programa ambiental do setor de telecomunicações. Avaliando-se somente os resultados da matriz de soma ponderada, verifica-se que o manejo ambiental dos produtos obedece a seguinte ordem decrescente: orelhões, fios FE, cabos de fibras ópticas, conjuntos de emendas metálicas e baterias. O primeiro grupo de materiais e produtos é o mais problemático sob a perspectiva ambiental, atribuindo-se a eles a maior prioridade para encaminhamento de soluções, em curto prazo, para a minimização dos impactos oriundos do descarte pós-consumo. As baterias de celular aparecem como o segundo grupo a ser priorizado, pois se apresentam como críticos em duas matrizes (de soma normal e linear). No terceiro grupo, com apontamento crítico em uma matriz, incluem-se os cabos de fibras ópticas. Os critérios mais importantes a serem considerados na análise global dos filtros de significância visualizados na Tabela 8 são: tipo de disposição final, patogenicidade e reversibilidade. Eles se apresentam críticos nas três matrizes, sugerindo ações imediatas para a mitigação do impacto ambiental. Essas ações podem ser abordadas de várias maneiras, como, por exemplo, a conscientização da empresa para o descarte adequado, o desenvolvimento de processos de reciclagem, a prevenção dos processos patogênicos oriundos da disposição dos produtos de telecomunicações no meio ambiente e a aplicação da metodologia de Análise de Ciclo de Vida (ACV) na integração dos aspectos ambientais no desenvolvimento de produtos – o chamado Ecodesign. Dessa forma, verifica-se a necessidade de planejamento por parte das empresas do setor de telecomunicações e a criação de um programa destinado à avaliação integrada do descarte de produtos, tendo como objetivo o controle da sobreposição de efeitos e o monitoramento do sistema por auditoria. Em 24 CPQDv2.indd 24 relação à capacidade técnico-financeira das empresas para a minimização dos impactos, destacam-se os altos valores para a reversibilidade, que é uma questão a ser tratada dentro dos programas ambientais internos. É possível identificar também três critérios de ordem secundária que devem ser priorizados pela empresa: a severidade, a probabilidade de contaminação e a periculosidade. Essas características são constantes entre os diferentes materiais em duas matrizes diferentes. Esses materiais devem ser tratados com atividades técnicas eficientes e eficazes porque elementos com alto grau de severidade, probabilidade de contaminação ou periculosidade podem, com um único evento, causar conseqüências graves para a saúde humana e para o ambiente. Análises parciais também podem ser realizadas para a obtenção de diferentes informações. Por exemplo, o volume de descarte apresenta-se entre os seis primeiros itens somente na soma ponderada, enquanto a periculosidade só se inclui entre os seis primeiros itens nas somas normal ou linear, evidenciando a importância das diferentes formas de tratamento dos dados obtidos, as quais devem ser realizadas de acordo com o objetivo desejado. 5.1 Conclusão As matrizes de conformidade originadas por este estudo destacaram, entre os produtos descartados pelo setor de telecomunicações, aqueles que se apresentam como mais problemáticos, do ponto de vista ambiental. A metodologia utilizada gerou uma lista de prioridades para tratamento dos produtos pós-consumo a serem consideradas em um programa ambiental no setor de telecomunicações. Os resultados deste trabalho sugerem que tal procedimento deve ser implantado o mais brevemente possível, pois, embora a maioria das operadoras e entidades coligadas ao setor se considerem “empresas limpas”, verifica-se a existência de vários problemas disseminados em todo o território nacional, os quais podem originar grande impacto ambiental em médio prazo. Além da metodologia desenvolvida apresentada neste trabalho, os seguintes resultados foram obtidos: 1. Dados para o desenvolvimento de ferramentas que podem ser utilizadas como instrumentos de desenvolvimento sustentável para aplicação corretiva e preventiva no setor de telecomunicações como, por exemplo, a classificação dos produtos quanto ao risco potencial ao meio ambiente e à saúde humana; a listagem Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 18/7/2006 19:08:28 Avaliação de impactos para gestão ambiental dos componentes potencialmente perigosos, sob o ponto de vista ambiental; a classificação quanto à destinação final; a estimativa nacional da média anual de descarte, a possibilidade de reciclagem; o apoio ao cumprimento da legislação vigente e recomendações específicas. 2. Contribuição ao Grupo de Estudos da ITU-T para a implantação de metodologia de levantamento de dados na atualização da norma L.24 – Classification of Outside Plant Waste, a ser implantada nos países em desenvolvimento e também naqueles com economia em transição. Os itens descritos evidenciam que o Brasil tem condições de assumir uma posição proativa no setor de telecomunicações com relação aos processos de mitigação de impactos ambientais originados por suas atividades. Referências AS SOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR ISO 14001: Sistemas de gestão ambiental: requisitos com orientações para uso. Rio de Janeiro, out. 1996. BLOCK, M. R. Identifying environmental aspects and impacts. EUA: ASQ Quality Press, 1999. ISBN 0-87389-446-4. BLOCK, M. R.; MARASH, R. Uma visão geral da ISO 14000. Disponível em: < http://www.hgb. com.br/.> Acesso em: 16 jun. 2006. ITU TELECOMMUNICATION STANDARDIZATION SECTOR (ITU-T). L.24: Classification of Outside Plant Waste. Genebra, 1996. REICHLING, M.; OTTO, T. The environmental impact of the new economy, Deutsche Telekom AG. In: PARK, J.; ROOME, N. The ecology of the New Economy: Sustainable transformation of global information, communications and electronics industries, Part II. Sheffield, UK: Greenleaf Publishing Limited, 2002. ISBN 1874719-47-0. SANTOS, R. F. dos. Planejamento ambiental: teoria e prática. São Paulo: Oficina de Textos, 2004. ISBN 85-86238-32-5. VENTURA, J. V.; RAMBELLI, A. M. Legislação federal sobre o meio ambiente: legislação ambiental anotada. 2. ed. Taubaté: Vana Ltda, 1996. ISBN 0-932633-18-8. WORLD ECONOMIC FORUM. M e r c o s u r Economic Summit 2001 - Report. Argentina, May, 2001, 80p. Abstract This paper presents findings from the project entitled “Telecommunications and its impacts on health and environment”. The project was developed by CPqD in collaboration with telecommunication carriers and service providers in Brazil and with consulting support from Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A survey on the state-of-the-art disposal of telecom products and waste was carried out among companies in the telecommunications sector. Telecom products and components were grouped according to Brazilian and international regulations and significant assessment tools were used. Based on such data, a new methodology was developed to evaluate the impacts of the disposal of telecommunication products on the environment. The significance of the impacts was evaluated through environmental tools and the results indicated that the prioritization of four products must be considered in the elaboration of an environmental program in the Telecommunications Sector. Key words: Environment. Waste. Telecommunications network. Outside plant. Environmental impact. Cad. CPqD Tecnologia, Campinas, v. 2, n. 1, p. 19-25, jan./jun. 2006 CPQDv2.indd 25 25 18/7/2006 19:08:29 CPQDv2.indd 26 18/7/2006 19:08:29