Doença Inflamatória Crónica Intestinal

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Doença Inflamatória Crónica Intestinal
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CONSULTÓRIO
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Doença Inflamatória
Crónica Intestinal
Francisco Teves
Médico veterinário
A Doença Inflamatória Crónica Intestinal (abreviada por
“IBD” da designação anglo-saxónica) é hoje identificada
como uma das maiores responsáveis pelo quadro clínico
composto por vómitos e diarreias em cães e gatos. A designação “Doença Inflamatória Crónica Intestinal”, abrange
várias patologias intestinais que têm em comum a infiltração difusa das paredes intestinais (mais propriamente a
lâmina própria) por células do sistema imunitário ou inflamatório, tais como macrófagos, linfócitos, eosinófilos, plasmócitos e neutrófilos. Estas doenças são classificadas
mediante a sua localização no intestino (ex: colite, no caso
de estar localizada no cólon – intestino grosso) e o envolvimento celular em causa (ex: linfoplasmocítica, envolve com
relevância linfócitos e plamócitos). As causas mais descritas
para o desenvolvimento dos sintomas está muito associado
a reacções imunes inadequadas do próprio organismo à sua
mucosa intestinal e a reacções de hipersensibilidade da
mucosa a diversos agentes como sejam os alimentos ou
microrganismos intestinais. No entanto, a verdadeira origem para o desencadeamento destas respostas imunitárias
e de hipersensibilidade aos agentes não é perfeitamente
clara nos animais. De entre as várias patologias que se
enquadram na IBD, a enterite linfoplasmocítica e a colite
linfoplasmocítica são as mais frequentes em cães e gatos,
com maior tendência de ocorrer em animais de meia idade
a idosos, e nos cães de raças médias ou grandes de raça
pura (como por ex. o Pastor Alemão, Rottweiler e Golden
Retriever). O vómito é um dos sinais clínicos mais relacionado com a patologia, não sendo permanente, mas sim intermitente, durante desde algumas semanas, a meses ou
anos, podendo ser claro, esverdeado (com relação biliar) ou
espumoso, não sendo frequente apresentar sangue, caso
que, se acontecer, poderá indicar que o estômago também
está envolvido (devido a erosões, presença de corpos estranhos, gastrite ou neoplasias). Nos momentos em que o animal vomita, apresenta desconforto e exuberância ao fazê-lo
(em alguns casos, alguma “agonia” mesmo). Apesar deste
provável sintoma, os animais poderão não apresentar desconforto em casos de patologia suave, portanto esta evidência não é “obrigatória”. O segundo sintoma associado à
IBD é a diarreia, que pode ser o único sintoma em cães ou
estar associada ao vómito intermitente. A diarreia é crónica
e é responsiva (pelo menos temporariamente) às alterações
na dieta e à medicação sintomática não específica indicada.
Deve-se, em primeiro lugar e perante o sintoma de diarreia, identificá-la como sendo de origem no intestino delgado, no intestino grosso ou em ambos, uma vez que as consequências e a abordagem poderá ser diferente. A de origem no intestino delgado é caracterizada por produção de
grandes quantidades de fezes volumosas e aquosas, de
cheiro muito intenso e cor escura (devido ao sangue que
apresentam), podendo ocorrer perda de peso do animal e
alterações clínicas com gravidade como desidratação, emagrecimento extremo (anorexia), e apatia com falta de apetite, constituindo uma situação grave, necessitando de suporte veterinário urgente. A diarreia com origem no intestino
grosso é de fraca consistência (mole, mas não aquosa), viscosa, pode apresentar sangue fresco e/ou muco, sendo
caracterizada pela produção de pequenas quantidades, com
maior frequência que o normal e em locais que não são
habituais. Estando limitada ao intestino grosso, os animais
permanecem activos, alertas, com apetite e não perdem
peso, traduzindo-se numa situação clínica menos delicada.
Outros sintomas associados a estas patologias são a dor à
figura 1
palpação abdominal e, à auscultação abdominal, a audição
de sons típicos (borborigmos). Com vista ao diagnóstico,
são necessários realizar alguns exames complementares,
como análises sanguíneas (hemograma e bioquímicas),
ecografia, radiografia (menos importante), endoscopia
(sempre que disponível, apesar de não estar frequentemente disponível – figura 1) e, o mais importante na identificação definitiva do diagnóstico, a biopsia para exame histopatológico. Uma vez que o diagnóstico de IBD é moroso e
dispendioso, muitos donos não têm a disponibilidade
necessária para levarem este exaustivo processo até ao fim.
É importante estabelecer o diagnóstico diferencial com
algumas patologias similares que partilham alguns dos sintomas descritos (ex: parasitismo, hipertireodismo, insuficiência pancreática exógena, sobrecrescimentos intestinal
bacteriano). O tratamento passa sempre por uma adequa-
ção da dieta à patologia, podendo ser necessário associar
terapia imunossupressora por forma a atenuar e controlar a
reacção exacerbada do organismo à causa subjacente.
Dependendo do envolvimento clínico, poderá ser necessária antibioterapia (antibióticos). Nos casos em que se procede a terapia imunossupressora por longos períodos, há que
fazer monitorização com hemograma para controlar efeitos
secundários e complicações associadas a essa medicação.
Contudo, o tratamento pode permitir que o animal permaneça sem medicação por longos períodos, podendo ter
recorrências, nas quais terá de repetir os tratamentos de
controlo, ou, por outro lado, a patologia pode obrigar a
medicação permanente. Resumindo, a IBD é uma doença
idiopática (de causa desconhecida) com uma componente
genética e graus variáveis de resposta ao tratamento imunossupressivo.
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