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 A regra do jogo
“Queria colocar tudo dentro do quadro até que ele caísse como um fruto podre no chão”
Jorge Guinle
Talvez o principal nome da prosa romântica brasileira, José de Alencar é conhecido
por uma narrativa de estilo rebuscado, refletido em seus romances em períodos
extensos e minuciosamente descritivos sobre a flora e a exuberância da natureza e do
homem natural, além dos exageros de elogios às mulheres, verdadeiras heroínas
românticas. Em Senhora, Alencar resume em uma frase, em meio a descrições que se
estendem por páginas e se desdobram em adjetivos, Aurélia Camargo, a personagemtítulo do romance urbano publicado em 1875: “Um traço basta para desenhá-la sob
esta face”.
Assim como Alencar, a obra da artista paulistana Renata Egreja, que iniciou seus
estudos em Artes Plásticas na Faculdade Armando Álvares Penteado (FAAP) e
graduou-se na École Nationale Supérieure des Beaux-Arts (ENSBA), em Paris, se
constrói pelos excessos. Nesta exposição encontra-se reunido um conjunto de
pinturas e aquarelas, algumas inéditas, revelando um pouco da produção recente da
artista.
Em um primeiro encontro, a produção de Renata Egreja revela-se pelo grande
acúmulo de informações. Pinturas de grandes dimensões e aquarelas apresentam
como lógica pictórica um raciocínio voltado para a construção caótica. Grandes
campos de cor são invadidos por linhas, tramas, escorridos, formas geométricas,
formas de contornos mais arredondados e dividem espaço com referências da história
da arte brasileira, principalmente uma história da pintura brasileira (com as cores de
Tarsila do Amaral e as formas de Leda Catunda e Beatriz Milhazes), além de
referências do Oriente e de elementos da botânica. Cores, formas, padrões e
movimentos são combinados e recombinados, sobrepostos, ora velando e ora
revelando umas as outras, construindo a memória do trabalho. Nesse jogo, cada uma
dessas “peças” é colocada no “tabuleiro” de maneira pensada, visando o equilíbrio. O
acaso tem espaço nessa lógica de construção. Já a gratuidade, não.
“Queria colocar tudo dentro do quadro até que ele caísse como um fruto podre no
chão”, disse uma vez o pintor Jorge Guinle (1947-1987). “A operação é vertiginosa,
exaustiva e engaja um olhar físico, pronto a sentir as palpitações da matéria, a energia
dos gestos, as diferentes e divergentes decisões do artista – os ataques bruscos, as
manobras obsessivas, os vários humores que cada tela parece literalmente exalar. Não
há como percorrê-las a partir de um ponto de vista ideal: é necessário experimentá-las
pelos poros da pintura”, escreveu o crítico Ronaldo Brito sobre a vigorosa pintura de
Guinle. Em certo sentido, Renata Egreja parece querer dialogar com essa lógica, com
essa herança de um dos nomes mais importantes da Geração 80 no Brasil.
Nesse embate pictórico, cores, formas, motivos e toda uma série de intenções de
pintura se misturam, mas olhando com mais calma, vemos que todo esse excesso
tem como ponto de partida um interesse primeiro: o gesto. Todas as pinturas e
aquarelas são como estudos das inúmeras possibilidades desse movimento simples,
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que se repete, sobrepõe-se, potencializa-se, apaga-se e se transforma em outro. O
gesto que pode servir para dar contornos às formas também é o responsável por
borrar os limites estabelecidos dentro da tela entre dois campos de cor. Vistas lado a
lado, essas pinturas evidenciam esses traços, esses gestos, como estudos sobre as
possibilidades da prática da pintura. É como se a cada movimento a artista se
perguntasse: “Até onde um traço, um gesto pode ir? Até onde ele consegue ser
esticado?”.
Vemos então que a regra do jogo é só uma: um traço basta.
Fernanda Lopes
Rio de Janeiro, maio de 2012
Em entrevista a Frederico Morais. O Globo, Rio de Janeiro, 31 de maio de 1982.
BRITO, Ronaldo. “Paroxismos de pintura”. In: GUINLE, Jorge. Jorge Guinle. São Paulo: Galeria Luisa Strina,
1984. p. [3-6].
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