apresentaçào - mma consultoria

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apresentaçào - mma consultoria
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
APRESENTAÇÃO
Apresentação
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TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Apresentação
2
O sistema capitalista internacional, nas últimas três décadas, tem
apresentado como uma de suas tendências marcantes a ênfase na gestão do
Capital.
Boltanski e Chiapello (1999) salientam que, se na década de 1970 havia
uma forte crítica ao capitalismo familiar, na década de 1990 a discussão se deu a
partir das grandes organizações, das questões da hierarquia e da planificação.
Nos anos 1990 ganharam expressão várias teorias administrativas (orientais
e ocidentais), muitas delas tendendo à rejeição da hierarquia, pelo entendimento
de que esta se assenta na dominação e é uma forma antiquada de coordenação.
Para Lojkine (1995), as três grandes características da revolução industrial
(a especialização, a estandardização e a reprodução rígida) foram contrapostas
pelas três maiores características da Revolução Informacional: a polifuncionalidade
(que é distinta da polivalência tapa-buracos), a flexibilidade (variedade de uso das
máquinas informacionais) e a estrutura de redes descentralizadas.
Do ponto de vista do trabalho,
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Um cotidiano construído passo a passo
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a reestruturação do capitalismo nas duas últimas décadas feita em
torno dos mercados financeiros e dos movimentos de fusãoaquisição
de
multinacionais
num
contexto
de
políticas
governamentais favoráveis em matéria fiscal social e salarial, foi
acompanhada
rigorosamente
de
importantes
incitações
do
crescimento de flexibilização do trabalho. As possibilidades de
emprego temporário, de uso de mão-de-obra provisória, de
horários flexíveis e a redução de custos de dispensa de
trabalhadores se desenvolveram largamente [...] corroendo pouco
a pouco os dispositivos de segurança instalados no decorrer de um
século de luta social.1 (Boltanski e Chiapello, 1999:21 – tradução
minha)”
Aparece assim a outra face deste cenário: um contexto de agudização do
desemprego, em que os postos de trabalho são cada dia mais escassos e é cada
vez mais difícil as pessoas conseguirem um emprego com carteira assinada, é
crescente o número de indivíduos que busca sua sobrevivência em atividades não
assalariadas, seja como trabalhador por conta própria, seja se associando a outros
trabalhadores em busca de alguma ocupação coletiva que permita sua
sobrevivência.
O Brasil não tem tradição no âmbito da política de emprego, e só muito
recentemente se iniciaram mudanças institucionais voltadas para políticas ativas de
emprego, trabalho e renda. Ao aproximar-me da temática foco desta pesquisa –
geração de emprego, trabalho e renda – e, percebendo o hiato existente entre a
necessidade de empregos e a oferta de postos de trabalho, decidi direcionar meus
estudos para projetos não governamentais que buscam encontrar saídas para
estas situações.
1
Tradução livre da autora (1999:21).
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Fruto de meu envolvimento político, sempre privilegiei em minha prática
profissional e social a ótica dos movimentos populares. Mais do que um exercício
intelectual, eu buscava propostas concretas que pudessem ser implementadas e
que favorecessem grupos populares. A preocupação subjacente era relativa ao fato
de inúmeros grupos populacionais não serem alcançados pelas estratégias das
políticas públicas de combate ao desemprego. Como resposta a isso, grupos da
sociedade civil buscam alternativas de sobrevivência a partir da geração de
trabalho e renda.
Através da minha militância pastoral e política, foi possível um primeiro
contato com algumas experiências produtivas nascidas nos meios populares. Foi
assim que me relacionei com as fábricas comunitárias de Birigüi que, há mais de
dez anos, vêm desenvolvendo um projeto de produção de tênis. Considerei que
poderiam se constituir no universo empírico de minha tese e então empreendi as
primeiras aproximações agora com olhos de pesquisadora.
O objetivo inicial dos grupos que criaram as Fábricas comunitárias era o
estabelecimento de um modo de viver e sobreviver em comum. Durante toda a
trajetória deles estão muito presentes os sentimentos de união e de construção
comunitária. Desde sua constituição, as decisões tomadas sempre priorizam a
incorporação de pessoas, mais do que a acumulação. A prioridade maior é com a
relação interna à fábrica, ainda que num esforço contínuo para se manterem no
mercado.
A história das Fábricas Comunitárias é perpassada por diversas propostas,
dentre elas, o cooperativismo; mas é como empresa limitada que elas têm
funcionado nos últimos anos. A novidade que apresentam é justamente um
sistema de gestão híbrido que busca construir um espírito de convivência num
espaço que é produtivo.
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Para entender o desenho organizativo das Fábricas comunitárias foram
necessários estudos sobre gestão de empresas em geral, passando por propostas
como cooperativismo, autogestão e co-gestão, e isto para constatar que em seu
processo estas fábricas comunitárias não concretizam de modo puro nenhum
destes modelos.
A partir do desenho adotado, os sócios do empreendimento estão alocados
na operação direta da produção, num face a face com os trabalhadores cuja
principal característica é a ausência de intermediários, sejam eles gerentes ou
contramestres.
Ao coletar dados, a preocupação que me movia era entender esta nova
dinâmica de produção que parecia anunciar “sementes socialistas implantadas nos
poros do modo de produção capitalista” (Singer, 1998a:114) e que vinha iluminada
pelo ethos cristão e pela exigência de uma relação mais fraterna entre os sócios
dos empreendimentos e os trabalhadores.
Mais do que a necessidade de um grau acadêmico, o que me impulsionou
para este doutorado foi um interesse em realizar estudos que contribuíssem para a
construção de respostas à realidade de desemprego que cada dia assola nosso
povo, e o objeto escolhido parece dar pistas neste sentido.
Esta pesquisa tem por objeto um estudo crítico de uma organização
produtiva, sediada em Birigüi – município da Região Noroeste do Estado de São
Paulo – buscando verificar em que medida ela pode se apresentar como uma
possibilidade de geração de emprego, trabalho e renda em municípios de médio
porte. Mesmo sendo uma experiência datada, contextualizada e localizada, suas
potencialidades indicam a possibilidade de uma replicabilidade reservadas as
características próprias que contém.
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Entendo ser este um objeto que permite, e exige mesmo, uma
multiplicidade de enfoques, e portanto mereceria um estudo multiprofissional.
Faço, assim um esforço de recorte e focalização do objeto, considerando
naturalmente minha formação profissional, ciente da pouca experiência em
pesquisa. Este contexto permitiu que, ao final do estudo, chegasse a
considerações, ainda preliminares, que sugerem novas questões e caminhos a
serem trilhados por outros pesquisadores.
A questão norteadora deste estudo pode ser entendida como a busca de
elementos que permitam identificar se é possível aos trabalhadores, à classe
trabalhadora, organizar-se dentro do sistema capitalista sem reproduzir as mazelas
da forma mais contundente da relação Capital/Trabalho.
Os objetivos do estudo foram: (1) reconstruir a história do grupo e da
Marc’ellsse (uma das fábricas comunitárias); (2) compreender e analisar as
características particulares do objeto estudado, ou seja, as condições internas e
externas que permitiram tecer esta experiência; e (3) analisar se as Fábricas
comunitárias se constituem em empreendimentos de geração de emprego,
trabalho e renda.
Meus primeiros contatos com as Fábricas comunitárias ocorreram no
contexto de uma articulação mais ampla que envolve a Região Noroeste do Estado
de São Paulo. Produtores rurais, bordadeiras, confeccionistas, catadores de papel e
sapateiros se articulam ao redor de uma “Rede de Experiências Econômicas
Alternativas”. A troca de experiências nas áreas de formação e de produção são
muito intensas e há uma rede de comercialização comum permitindo que grupos,
mesmo frágeis, sobrevivam de seus trabalhos.
Estas experiências se originaram nas CEBs – Comunidades Eclesiais de
Base, que, segundo Sandri representavam
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no campo estritamente político, [...] a reação popular à exclusão
radical de toda a sociedade em relação à participação na política
econômica, social, educacional. Era a nova sociedade que nascia a
partir da base, do povo. (1990:174)
A constituição das Fábricas comunitárias foi conseqüência de um trabalho
de educação popular realizado principalmente pela Igreja Católica. Ancorado na
proposta pedagógica de Paulo Freire, este trabalho partia da cultura e do saber do
povo, e o ajudava a assumir, conscientemente sua vida social e política.
Ao me aproximar da experiência das Fábricas comunitárias, estava movida
por uma curiosidade comprometida com trabalhos desse tipo, e em cada um dos
momentos busquei olhar para depois ad-mirar, no sentido dado por Paulo Freire.2
Conhecendo esses empreendimentos há alguns anos, sabia de antemão
que, no início, eles buscavam saídas para suas vidas, quem sabe com a intenção
de construir um caminho que também pudesse ser trilhado por outros grupos;
mesmo ao nominarem seus empreendimentos de “fábricas comunitárias”, não
pretendiam construir um novo conceito, mas demonstrar que era possível
concretizar o sonho que esteve presente em seu discurso quando eram
simplesmente militantes de CEBs.
Ao aprofundar o conhecimento sobre o modo como organizavam a produção
nesse empreendimento, foi possível perceber que, de fato, ele tem características
diferenciadas, principalmente no que se refere às relações internas de produção.
Para a realização do estudo, percorri a seguinte trajetória metodológica:
2
“Ad-mirar, olhar por dentro, separar para voltar a olhar o todo admirado, que é um ir para o todo, um voltar
para suas partes, o que significa separá-las, são operações que só se dividem pela necessidade que o espírito
tem de abstrair para alcançar o concreto. No fundo são operações que se implicam dialeticamente”. (Freire,
1981:44)
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A primeira etapa consistiu em levantamento e estudo bibliográficos iniciais
sobre políticas de emprego, cooperativismo e trabalho informal. Na verdade, a
pesquisa bibliográfica acompanhou todo o percurso da pesquisa.
A definição das Fábricas comunitárias como objeto empírico do estudo
exigiu, de um lado uma aproximação com a realidade do setor calçadista, e de
outro lado um conhecimento da realidade de Birigüi – sua história e
desenvolvimento econômico – de modo a situar-me no cenário no qual se move o
objeto de estudo em questão.
Com esta intencionalidade, fiz contato tanto com técnicos da Secretaria de
Estado e Relações do Trabalho (SERT) e do CEPAM – órgão vinculado à Fundação
Prefeito Faria Lima e que assessora os municípios paulistas; quanto com a
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Vestuário, que inclui calçadistas,
vinculada à CUT que me possibilitou acesso ao Sindicato dos Trabalhadores em
Calçado de São Paulo. Já no primeiro momento, iniciei a prática que me
acompanharia durante todo este percurso que era o de guardar as informações na
memória para posteriormente registrá-las num Diário de Campo.
Ainda na construção deste cenário, realizei entrevistas com os presidentes
do Sindicato dos Trabalhadores em Calçado de São Paulo e da Comissão Municipal
de Empregos de Birigüi.
Numa primeira viagem à cidade, iniciei estudos exploratórios que
permitiram, naquele momento, esboçar a história das fábricas comunitárias e de
suas relações no município de Birigüi e na região de Araçatuba. No decorrer do
mesmo processo, entrevistei pessoas ligadas à Igreja Católica (Diocese de
Araçatuba) objetivando conhecer a memória delas sobre o processo vivido pelas
fábricas comunitárias.
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A transcrição das entrevistas e anotações das conversas foram cotejadas
com informações que eu já dispunha sobre o objeto empírico, na medida em que
já conhecia o grupo há cinco anos. Isto possibilitou a elaboração de um plano de
estudos e pesquisas.
Com referência à construção do cenário, ainda havia dois tipos de
preocupação: como me apropriar do pano de fundo relativo às relações sociais na
região, e como apreender a dinâmica do setor calçadista de modo a identificar as
questões-chave.
Ao sistematizar as informações dispersas que, durante vários anos, havia
recebido e que se relacionavam ao grupo, percebi várias lacunas e mesmo
algumas contradições. Tudo isso foi considerado quando elaborei os primeiros
roteiros de entrevistas que permitiriam a apropriação do objeto em estudo.
Foram de muita utilidade na construção dos instrumentos de coleta de
dados as informações e dados obtidos no CEPAM: a dinâmica da Comissão
Municipal de Empregos de Birigüi, os subsídios para elaboração do diagnóstico
municipal e as primeiras aproximações feitas pela Comissão de Empregos. Foi
significativo o estudo feito por Vedovotto e publicado com o título de Birigüi: a
revolução que começou pelos pés (1998).
Objetivando contextualizar o estudo, realizei uma pesquisa documental, em
fontes secundárias. A primeira delas foi relativa à situação de emprego e
desemprego no Brasil e no Estado de São Paulo; as fontes de dados foram o IBGE,
a Fundação Seade, o Ministério do Trabalho/Datamec, a Secretaria do Emprego e
Relações do Trabalho e a Fundap. No decorrer de quatro anos, outros documentos
foram se juntando aos primeiros e, sem dúvida, enriqueceram a investigação.
A busca do significado das fábricas comunitárias implicou dois movimentos
que se somam e se alternam. Um deles buscou o significado das fábricas em si, ou
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seja, cotejou a proposta original, o discurso de seus membros e sua atuação
efetiva, assim como buscou apreender a leitura do processo que é feita pelos
trabalhadores das fábricas.
O
outro
movimento
buscou
apreender
o
significado
das
fábricas
comunitárias para si, ou seja, na sua relação com o município em que estão
situadas, levando em conta sua relação com os Sindicatos Patronal e de
Trabalhadores. As fábricas comunitárias instauraram uma relação diferenciada
entre gestores do capital e trabalhadores; a partir delas, tanto há um preservar
das condições de trabalho quanto há uma qualificação maior na gestão da
produção.
Outro aspecto em que pude me deter foi o modo como tem sido construída
a identidade híbrida desses sujeitos sociais que, vindos da classe trabalhadora,
buscam, no exercício da função patronal que hoje exercem, preservar seu
compromisso com os trabalhadores.
As estratégias metodológicas adotadas foram o estudo de caso e a pesquisa
participante. A opção pelo estudo de caso objetivou a reconstrução da história e o
desenvolvimento das fábricas comunitárias. A partir dessa reflexão, busquei
apreender a filosofia dos empreendimentos, cotejando-a com a proposta original.
Entendendo a pesquisa participante como uma estratégia que pode ser
intermediada por diversas técnicas, utilizei um misto de instrumentos de natureza
qualitativa
e
quantitativa,
dando
prioridade
aos
qualitativos.
Os
dados
quantitativos, a meu ver, complementam a pesquisa; desta forma buscamos a
totalização das informações que permitissem o entendimento do processo de
produção.
Considero que o objetivo maior da pesquisa participante é a incorporação de
setores populares no processo de produção e comunicação de conhecimento.
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Segundo Silva (1991), é no compromisso do pesquisador e na sua relação com os
grupos que surge um método novo a partir do qual é possível a obtenção do
conhecimento e a compreensão da realidade. Brandão (1984:12) enfatiza que o
compromisso da pesquisa participante mais do que conhecer para explicar, é de
compreender para servir. Pesquisador, metodologia e grupos sociais são
indissociáveis e não podem ser concebidos separadamente.
Concordando com Freire, reafirmo a idéia de que toda pesquisa é ato de
conhecimento e como tal é orientada politicamente, seja pela análise, seja pela
seleção de procedimentos.
O conhecimento empírico que emerge desse processo prático pode
extrapolar os canais acadêmicos, o que não significa ser menos preciso que aquele
gerado
pela
ciência
dominante;
possuindo
racionalidade
própria,
este
conhecimento expressa-se em uma linguagem e segundo uma cultura diferentes
daquelas que têm sido usadas nos processos dominantes.
Elaborado o plano de estudos e pesquisa, realizei 18 entrevistas – todas elas
conduzidas com base em roteiros orientadores. Conforme se verifica no Anexo III,
dentre os entrevistados, encontram-se vários sujeitos da experiência (sócios,
trabalhadores
contratados
e
vendedor),
empresários
do
setor
calçadista,
sindicalistas, representante de entidade patronal, assim como pessoas ligadas à
Igreja Católica. Se as primeiras visavam a coleta de informações sobre a dinâmica
desse setor produtivo e a situação de emprego/desemprego de Birigüi, estas
últimas tiveram como sujeitos as pessoas envolvidas na experiência, tanto aquelas
que trabalham diretamente nas fábricas comunitárias como aquelas cuja atuação
tem interface com as mesmas.
Os dados obtidos nas entrevistas foram complementados por conversas
informais e levantamentos da situação da produção e do perfil de trabalhadores
envolvidos em algumas das fábricas comunitárias. Todo esse processo encontra-se
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devidamente registrado em meu diário de campo. O instrumento utilizado na
coleta de dados junto aos trabalhadores contratados pelas fábricas comunitárias
foi um questionário de pesquisa contendo 14 questões [O Anexo III traz o
instrumental e a tabulação dos dados].
Além das conversas e entrevistas individuais, houve dois momentos de
observação significativos: no primeiro deles, os sócios da Marc’ellsse permitiram a
minha presença numa de suas reuniões de direção, o que possibilitou uma
primeira aproximação ao processo de tomada de decisões da fábrica. O segundo
momento foi a realização de reunião com objetivo específico de coleta de dados,
no qual os sócios da Marc’ellsse conversaram comigo sobre sua história e o
processo que vêm empreendendo.
Outro momento significativo foi a participação numa oficina realizada pelo
Programa Gestão Pública e Cidadania, da FGV-SP,3 no qual a experiência das
fábricas comunitárias foi discutida com um seleto público de especialistas em
pobreza e emprego. Essa oficina possibilitou uma interlocução com vários
especialistas, ampliando o diálogo e as óticas de análise do objeto.
As informações coletadas por meio do conjunto desses instrumentos foram
sistematizadas em tabelas, quadros e gráficos de modo a facilitar as análises.
Não tomei como referência teórica nenhum autor especialmente, mas
busquei apoio teórico e metodológico em vários autores que possibilitaram o
estudo e análise do objeto de estudo.
A Tese, assim construída, compõe-se de quatro capítulos, conforme descrito
a seguir:
O primeiro capítulo – Trabalhar: busca permanente dos trabalhadores – traz
a construção do cenário no qual este objeto se move. Esta breve contextualização
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foi elaborada a partir de duas óticas principais: a das Pastorais da Igreja Católica e
a situação de emprego e desemprego no Estado de São Paulo, com base nas
estatísticas oficiais.
Na seqüência, para retratar o município onde se situa o objeto, busquei
conhecer sua história e desenvolvimento, especialmente o setor calçadista que é
prioritário na cidade de Birigüi.
O segundo capítulo – Uma história construída no trabalhar – traz a história
das fábricas comunitárias contada a partir do depoimento das pessoas que
vivenciaram esta experiência.
O terceiro capítulo – A dinâmica de produção da Marc’ellsse – traz a análise
da Organização Produtiva da Marc’ellsse, fábrica comunitária priorizada neste
estudo. A maior ênfase é dada ao seu sistema de gestão e à relação que
estabelece internamente e com outros atores da região.
O quarto capítulo – Trabalhador/empresário, empresário/trabalhador: uma
reflexão sobre identidade – traz uma reflexão sobre a identidade híbrida destes
sujeitos.
Finalmente, nas Considerações finais estão algumas observações sobre o
processo que, sem se pretenderem conclusões terminadas, esperam que este seja
o início de um novo diálogo sobre estes empreendimentos.
3
O relatório desta oficina foi publicado em 2000, num volume intitulado Estratégias Locais para Redução da
Pobreza – Construindo a Cidadania (Camarotti e Spink, 2000).
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Capítulo 1
Capítulo 1
TRABALHAR: BUSCA PERMANENTE
DOS TRABALHADORES
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O conteúdo deste capítulo objetiva situar o cenário no qual este estudo se
desenvolve. Ainda que de forma breve, a contextualização aqui apresentada foi
elaborada tomando por base duas óticas principais: de um lado a das Pastorais da
Igreja Católica que têm iluminado os textos voltados para a preparação e
capacitação da militância que se empenha na construção de uma sociedade mais
justa e fraterna; de outro lado a situação de emprego e desemprego no Estado de
São Paulo, vista a partir das estatísticas oficiais.
E, ainda, para retratar o Município de Birigüi, onde o objeto de estudo está
situado, busquei conhecer sua história e desenvolvimento, principalmente no que
concerne ao seu perfil de pólo calçadista da região noroeste paulista. Mais do que
a juntada de dados estatísticos e dos relatos da História oficial, construir esse
cenário implicou um interagir com os diversos atores que de uma ou de outra
maneira influenciaram esse processo. O papel da Igreja Católica é um elemento
bastante significativo na construção do perfil das pessoas daquela região, e as
ações socioeducativas que lá se desenvolveram deixaram sementes que têm
germinado de diversos modos.
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Conforme evidenciará esta tese, desde seu surgimento, a experiência
analisada tem sido fortemente marcada pelo ethos cristão.
1.1. Raízes significativas
A descrição do contexto no qual se insere a experiência que está sendo
estudada indica a necessidade de voltarmos ao passado recente de nosso país, nos
detendo principalmente nas ações das classes e categorias sociais na luta pela
conquista de direitos, bens e equipamentos, e pela luta contra injustiças sociais,
discriminações ou atentados contra a dignidade humana.
No governo de Vargas (1930/1945) a questão social tornou-se uma questão
legal. Diz Vieira que foi neste período que “as camadas mais humildes da
população brasileira tinham visto surgir a possibilidade de reclamar perante o
Estado o cumprimento de seus direitos” (1985:19). Ainda que o populismo
perdurasse por muito tempo, as alianças partidárias percebiam o impacto causado
pela força dos trabalhadores que apresentavam reivindicações cada dia mais
consistentes. Os governantes procuravam estabelecer relações diretas com estes
trabalhadores para ouvi-los e para solicitar sua colaboração na busca de saídas.
Vieira aponta que “o jogo político de Getúlio encontra um de seus
fundamentos na dificuldade das massas populares constituírem uma classe, com
certo grau de unidade e com aptidão para ficar responsável pelas tarefas
governamentais” (1985:23).
Ao ser empossado, em 1956, Juscelino Kubitschek propunha uma “mudança
na rota de um país empenhado em transpor a barreira do subdesenvolvimento e
ocupar, entre os povos do mundo, o lugar que lhe cabe em extensão, pelas suas
riquezas, pelo valor de seus filhos” (apud Cardoso, 1977:80).
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A ideologia desenvolvimentista, que impregnava o continente latinoamericano, buscava equacionar o subdesenvolvimento pela via do crescimento
econômico:
Desenvolver-se significava atingir o modelo das sociedades
desenvolvidas ou “sociedades modernas”. Para a explicação da
passagem do “tradicional” ao “moderno”, faziam-se recorrências a
um modelo e a uma ideologia de modernização, com os matizes e
diferenciações que comportam. (Wanderley, 1998:22)
O povo foi chamado a participar da construção desta nova sociedade
desenvolvida e moderna – cinqüenta anos em cinco era o que propunha o governo
JK.
É nesse mesmo período que a irrupção do povo na cena política passa a ter
algum poder de pressão. Há a exigência de novas políticas de controle social em
substituição às velhas táticas coronelísticas de forte controle em nível local.
Estudiosos do assunto apontam ser este um dos períodos mais ricos em
mobilizações e propostas sociais.4
1.2. O protagonismo cristão
Entre os anos 50 e 60, a Igreja Católica desenvolveu uma série de ações
nos meios agrário, operário, secundarta e universitário com a finalidade de
organizá-los para participar da vida societária e, conseqüentemente, da vida
política nacional, à luz dos ensinamentos do Evangelho.
4
Dentre outros, é interessante conhecer as análises feitas por Wanderley (1980); Jacobi (1989); Boschi
(1983); Cardoso (1983); Doimo (1984); Evers (1982, 1984); Gohn (1980, 1985, 1991); Moisés (1978 e 1982);
Sader (1984, 1988), Scheren-Warren e Krischke (1987).
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Capítulo 1
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Foi intensa a participação de estudantes na vida política nacional, no
período de 1957 a 1964, tendo levado inclusive à redefinição de sua principal
entidade, a UNE – União Nacional dos Estudantes – palco de intensas lutas
políticas internas entre as alas esquerda e direita, estimuladas principalmente pela
JUC – Juventude Universitária Católica.
No período seguinte (1964/1974), sob o regime de ditadura militar, foi
intensa a articulação de forças políticas que, operando na clandestinidade,
desenvolviam ações violentas respaldadas na crença da necessidade da luta
armada como a única forma de instalar uma nova sociedade no país. As massas
populares sofriam forte arrocho salarial, mas se mantinham caladas pois havia o
medo da perda do emprego e era extremamente perigoso se manifestar
publicamente em virtude da forte repressão policial. Não havia vida políticosindical, a não ser de caráter assistencialista. O “sonho da casa própria” foi
alimentado pela possibilidade da compra do lote nas periferias das cidades e o uso
da autoconstrução familiar. Só na década de 1970 é que explodem as
reivindicações, surgidas pela constatação de que os lotes eram clandestinos e que
não era possível sobreviver nas casas construídas sem um mínimo de infraestrutura urbana.
É importante salientar que, desde o tempo do Brasil Colônia, eram
significativos a presença e o protagonismo de leigos na direção de cultos e na
criação de formas organizativas da religiosidade popular dentro dos espaços
institucionais que a Igreja oferecia. Ruiz (1997) menciona a tutela do Estado sobre
a Igreja nesse período histórico – regime do padroado régio – apontando que os
conflitos e a luta de interesses quando da necessidade de indicação de um novo
bispo fazia com que as dioceses ficassem vacantes durante muito tempo, o que
aliado à grande extensão territorial de cada diocese dificultava a organização da
estrutura clerical, potencializando a ações de leigos nesses espaços.
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Capítulo 1
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Na década de 1970, a Igreja Católica faz uma inflexão e explicita sua opção
preferencial pelos pobres, buscando melhorar as condições de existência na vida
cotidiana dos setores populares. A partir desta orientação florescem diversas
experiências comunitárias que estão na origem das Comunidades Eclesiais de
Base, CEBs.
Nas CEBs, os pobres descobrem um novo modo de ser Igreja e vão
apontando caminhos para um viver solidário que é alimentado por uma fé
comprometida com a justiça. O Concílio Vaticano II, o Congresso de Medellin
[1968] e a Conferência de Puebla [1978] são marcos referenciais desta nova
Teologia da Libertação, de origem latino-americana.
Nessa mesma época torna-se visível a confluência da religiosidade popular
com os movimentos sociais e populares, que identificamos como Comunidades
Eclesiais de Base. Ao estudar a construção do imaginário nas CEBs, Ruiz (1997:24)
opta pelas categorias gênese e genealogia, contrapondo-as à categoria de
surgimento.5
O imaginário das CEBs não vai limitar seus objetivos a uma
atuação interna na Igreja, mas vai pretender, também, construir
um imaginário que seja alternativa de ação na sociedade, com
propostas próprias ou integradas nos movimentos populares. (Ruiz,
1997:30)
Nas CEBs, incorporam-se os símbolos tradicionais da religiosidade e da
cultura, porém com significados modificados, buscando uma travessia de uma
consciência ingênua para uma consciência crítica da realidade. Se a primeira
mantinha as pessoas alienadas da realidade social e domesticadas ao poder
dominante, esta segunda vai procurar imprimir uma dimensão transformadora
5
Surgimento transmite uma noção de imediatismo, algo que pode ser localizado pontualmente no espaço e no
tempo. Gênese indica um processo e que, como tal, não é facilmente manipulado em nossas categorias de
espaço e tempo. A categoria da genealogia se opõe à causalidade linear.
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Capítulo 1
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dessa realidade injusta e opressora, projetando a possibilidade de uma utopia
social e histórica que questiona o status quo presente. Essa mudança de
significações levará à construção de uma nova práxis na medida em que motiva e
orienta o agir.
Compromisso com a justiça e esperança que empurra para a libertação tudo
aquilo que oprime o povo: este foi o sentido, para a Igreja do Brasil, das novas
diretrizes. Segundo Beozzo (1994:11) permitiu-se que novas formas de
eclesialidade fossem sendo tecidas no chão da Igreja: eis o advento das CEBs. A
CNBB – Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, em documento aprovado em
1982, afirmava: “As Comunidades Eclesiais de Base constituem hoje, em nosso
país, uma realidade que expressa um dos traços mais dinâmicos da vida da
Igreja...” (CNBB, 1986).
Segundo Souza, foi no Brasil que começou a concretizar-se a teologia da
libertação. Para afirmar isso, este autor conta que Gustavo Gutierrez, teólogo
peruano e um dos precursores da Teologia da Libertação, expressou repetidas
vezes que:
foi no Brasil [...] no início dos anos 60 que muitas das intuições do
que constituiria mais tarde a teologia da libertação latinoamericana começaram a concretizar-se num lento processo ligado
a uma prática e, sobretudo, a uma prática política. (apud Souza,
1984:9)
Este tema é bastante complexo e impossível de ser reconstituído em poucos
parágrafos. Há uma vasta e extensa bibliografia e um tratamento aprofundado
extrapola os objetivos deste trabalho.
No entanto, é importante frisar que foi a partir do fortalecimento do papel
do leigo na Igreja que começaram a ser construídos caminhos de emancipação
que irão extrapolar o espaço eclesial e expandir-se para o mundo. No Brasil, a
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
21
Ação Católica (ACB) suscitou que leigos assumissem responsabilidade e voz ativa.
Este foi o ponto de partida para a consolidação de movimentos de juventude (JEC
– Juventude Estudantil Católica; JUC – Juventude Universitária Católica; JOC –
Juventude Operária Católica).
Além disso, sua ação social é orientada por uma definição clara:
As CEBs ampliarão [...] a visão de classe social para além dos
elementos puramente econômicos, definindo sua opção de ação
social pela categoria dos “pobres”. Esta categoria do “pobre” inclui
não só o lugar ocupado nas relações de produção, mas se amplia a
outras variáveis como marginalizados sociais, culturas oprimidas,
etnias dominadas, relações de gênero, mulher marginalizada,
crianças abandonadas, etc. (Ruiz, 1997:43)
As CEBS, inspiradas na Teologia da Libertação, foram construindo uma visão
dialética da sociedade, com base em reflexões sobre as contradições que
provocam a pobreza, a marginalização e miséria, a partir da lógica marxista.
Richard, analisando a Igreja latino-americana da época, afirma que “a razão da
contradição principal, no atual confronto teológico, reside na dialética: OPRESSÃOLIBERTAÇÃO. Esta contradição abrange fundamentalmente o nível econômico,
como também o nível político, cultural e teológico” (1982:14).
A ACB tinha como estratégia atingir minorias conscientizadas que atuariam
como fermento na massa social. Já as CEBs, mais do que na formação de quadros,
investem na formação de lideranças populares por entenderem que a própria
massa popular é o sujeito da ação. É a busca da participação do povo para o
crescimento dos grupos em número de pessoas e em participação.
Os grupos assim constituídos estariam assumindo a luta pela justiça social,
contra a miséria, pela erradicação da fome e do analfabetismo, etc. Trata-se de
um esforço concentrado na busca de melhores condições de vida que passa por
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
22
melhorias habitacionais e o atendimento a outras necessidades. Segundo Santa
Ana (1985:106)
do ponto de vista cristão, o processo de libertação dura a vida
toda. O objetivo último da luta contra a pobreza é criar a sociedade
humana sem opressores nem oprimidos, onde todos se esforçam
para ser verdadeiramente humanos.
Santa Ana continua a reflexão apontando três níveis nos quais os esforços
precisam ser envidados na busca da construção dessa sociedade justa, inclusiva,
participativa e sustentável.
No nível dos valores, é preciso superar os modelos vigentes de economia e
sociedade, e fortalecer a busca da comunidade como lugar de partilha e
solidariedade com os mais fracos e de responsabilidade social com a coletividade.
No nível das instituições, o desejo emancipatório leva a priorizar o esforço pela
igualdade econômica e social, construindo-se canais de participação que levam à
identificação com as necessidades dos mais pobres e à solidariedade como précondição para a elaboração de políticas voltadas para a eqüidade.
O resultante do cruzamento destas duas prerrogativas é a construção de
sistemas sociais nos quais a lei não precisa ser mais o jogo do mercado, mas um
imperativo de autoconfiança. Sistema nascido da ação popular e onde o destino
dos pobres não seja mais a opressão, mas a libertação.
Na discussão sobre a identidade dos trabalhadores sujeitos desta pesquisa
(Capítulo 4), estas reflexões serão retomadas, pois são constituintes da experiência
em análise.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
23
1.3. O universo do emprego
Para conhecer o contexto de emprego no Estado de São Paulo, é preciso
cuidado especial com conceito de desemprego, pois tal conceito foi cunhado em
países desenvolvidos onde o mercado de trabalho é bem estruturado e as pessoas
estão claramente empregadas ou desempregadas. No Brasil, os vínculos
empregatícios são frágeis e inexistem esquemas consistentes de proteção social
que permitam às pessoas sobreviver durante os períodos de desemprego.
As primeiras fontes consultadas traçam a evolução da População
Economicamente Ativa – PEA no marco de três universos: o Estado de São Paulo
como um todo, sua Região Metropolitana (RMSP) e o Interior do Estado. Dentre
elas, destacam-se a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), realizada
pelo IBGE, e a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pela
Fundação Seade e Dieese. Cruzamentos quanto a faixa etária, gênero, raça e
escolaridade serão priorizados no entendimento de que estes enfoques são
fundamentais ao equacionamento do tema desta pesquisa.
No que se refere aos dados relativos ao desemprego, há controvérsias em
relação aos números apresentados por um e outro instituto, e elas se originam das
metodologias utilizadas.
A PNAD, realizada pelo IBGE,
considera como População Economicamente Ativa, na semana em
referência, todas as pessoas de 10 anos e mais que, no período,
tinham vínculo de trabalho (pessoas ocupadas) ou estavam
dispostas a trabalhar, tendo, para isso, tomado alguma providência
efetiva. As pessoas que não tinham trabalho e nem tomaram
qualquer providência, na semana em referência, para consegui-lo,
foram classificadas como não-economicamente ativas.(Fundação
Seade, 1991:495)
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
24
O limite de uma semana para uma pesquisa de mão de obra, principalmente
nas condições do mercado brasileiro, é preocupante, e mais ainda pelo fato de
esta semana ser variável ao longo dos anos.
A amostra da PNAD no Estado de São Paulo e sua Região Metropolitana é
de 1/800 e vem sendo modificada (ampliada ou reduzida) através dos anos (em
1986, voltou a ter o tamanho de 1976). A fração da amostragem no Estado de São
Paulo já foi de 1/400. Especialistas consideram que a redução de 1/400 para 1/800
pode comprometer a precisão das estimativas.
Sobre a PED, o Anuário estatístico do Estado de São Paulo - 1990 traz as
seguintes definições:
A Pesquisa de Emprego e Desemprego na Grande São Paulo (PED)
considera como População Economicamente Ativa todas as pessoas
de
10
anos
ou
mais
que
se
encontram
ocupadas
ou
desempregadas. São ocupadas as pessoas que:
a) possuem trabalho remunerado, exercido de forma regular,
independentemente de haver procura de trabalho;
b) têm trabalho remunerado, exercido de forma irregular, sem
procura de trabalho;
c) têm trabalho não-remunerado de ajuda em negócios de
parentes ou remunerados em espécie/benefício, sem procura de
trabalho;
d) não são consideradas ocupadas as pessoas que, de forma
excepcional, exerceram algum trabalho nos últimos 30 dias.
Consideram-se desempregadas as pessoas que se encontram
numa destas três situações:
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
25
a) desemprego aberto – procuraram trabalho de forma efetiva, nos
trinta dias que antecederam a entrevista, e não exerceram
nenhuma ocupação nos últimos sete dias;
b) desemprego oculto pelo trabalho precário – realizaram, de
forma irregular, algum trabalho e, efetivamente, procuraram
trabalho nos últimos trinta dias;
c) desemprego oculto pelo desalento – não possuem trabalho e
nem o procuraram nos últimos trinta dias, por desestímulos do
mercado de trabalho ou por circunstâncias fortuitas, havendo,
entretanto, procurado nos últimos doze meses.(Fundação Seade,
1991)
Importante observar que o segmento crescente formado pela população
que mora na rua não é computado numa ou noutra amostra, na medida em que
sobrevivem de bicos sem pressionar o mercado de trabalho.
A amostra da PED é de 10.000 pessoas por mês e a metodologia e
conceitos utilizados atendem a recomendações internacionais, seguindo critérios
da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Atente-se que em países como
Estados Unidos, Alemanha, Canadá, Espanha, Chile e Costa Rica a taxa de
desemprego aberto é calculada para o período de referência de 30 dias.
Diante da controvérsia sobre os números do desemprego, a Fundação
Seade esclareceu que
O desemprego oculto é subdividido em desemprego oculto pelo
desalento (medida acolhida pela OIT) e desemprego oculto pelo
trabalho precário, inovação introduzida pela PED e, portanto, não
comparável internacionalmente.6
6
A propósito, consultar a última revisão de 4/12/97: URL: http://www.seade.gov.br/ped/declara.html.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
26
Na construção deste capítulo, utilizo informações estatísticas de diversas
fontes. Uma das mais significativas é a Pesquisa Emprego e Desemprego, que vem
sendo construída pela Fundação Seade. Os dados estatísticos sobre o Município de
Birigüi foram extraídos do documento “Subsídios para a Elaboração do Diagnóstico
Municipal” preparado pela Comissão Estadual de Emprego de São Paulo (CETE-SP,
1997).
1.3.1. A segunda metade do século XX
No período de 1950 a 1980 o Brasil foi um país que experimentou um
crescimento e uma transformação econômica sem par. A mudança do perfil
econômico rural – com forte concentração populacional no campo – para o urbano
toma impulso em meados dos anos 50 quando se introduzem novos ramos
industriais voltados para a produção de bens de capital, insumos básicos e bens de
consumo duráveis. Esse desempenho, considerado altamente favorável, entra em
colapso na década de 1980 em virtude do pesado endividamento externo
acumulado na década de 1970: inicia-se um período de crise e estagnação.
Entre 1950 e 1980 o PIB7 brasileiro multiplicou-se por dez e a renda per
capita por quatro: o processo de expansão e modernização, impulsionados pelo
Estado, traduziu-se numa taxa de crescimento médio do PIB da ordem de 7,4% ao
ano (Oliveira, 1993).
No início dos anos 80 há o esgotamento do padrão de crescimento e uma
dívida externa no valor de ¼ do PIB nacional, além de uma inflação que parecia
incontrolável. Década perdida foi a denominação usada para definir esse período
com forte descontinuidade na condução da política econômica, com redução de
investimentos, bruscas oscilações nas taxas de inflação e atraso tecnológico no
7
PIB = Produto Interno Bruto é o correspondente ao total de bens e serviços produzidos no país.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
27
setor industrial, além de uma forte dependência do exterior no que se refere a
inovações.
Nesse mesmo período, o PIB nacional caiu para uma taxa anual de apenas
1,5%, e o PIB per capita de US$ 3.000 passou a US$ 2.856, tendo se acirrado
ainda mais as disparidades regionais (Oliveira, 1993).
Importante salientar a mudança no padrão de produtividade8 que ocorre a
partir de 1991, com expressivo crescimento se a compararmos com a década de
1980. Naquela década, havia variação no emprego ao mesmo tempo em que
variava o nível de atividade industrial. Na década de 1990, há uma redução
acentuada no emprego enquanto a produção se mantém: isso se deve à queda do
emprego na indústria e à perda da capacidade de gerar empregos no setor
manufatureiro.
Os setores de transporte, mecânica, papel e papelão, alimentação e química
mantêm ganhos de produtividade por estarem em crescimento ou terem
estabilidade em seu nível de atividade. A perda de empregos é menor do que a
média verificada nas indústrias de transformação.
Os setores têxtil, de material elétrico e de comunicações têm sua
produtividade acoplada a uma queda acentuada do nível de emprego que é maior
do que a média das indústrias de transformação, uma vez que a produtividade
está intimamente relacionada com a estagnação do seu nível de atividade.
Em situações como estas, a queda de investimentos tem sido compensada
pela reestruturação que gera uma maior eficiência no uso de sua capacidade
8
A noção de Produtividade é vista de diferenciadas formas: igual ao produto dividido por um de seus
elementos de produção (OCDE); a integração de quatro elementos principais: terra, capital, trabalho,
organização, e sua medida é a proporção destes elementos na produção (OIT); maximizar cientificamente o
uso de recursos (Centro de Produtividade do Japão). Para uma reflexão mais aprofundada, ver Fundação
Seade (1995b).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
28
instalada. Modernização e racionalização estão condicionadas à automação flexível
e à adoção de novas técnicas gerenciais.
Há necessidade de atenção para o fato de que tal processo tem um limite
que, esgotado, exigirá a retomada dos investimentos e a difusão de novas
tecnologias para se alcançar novamente o crescimento da produtividade. A maior
fraqueza é nosso atraso tecnológico.
Uma Trajetória de Perdas
Estudos sobre o desemprego no Brasil apontam uma redução de mais de
dois milhões de postos de trabalho entre os anos de 1990 e 1997. Além disso,
pioram a qualidade do emprego e as relações de trabalho.
O trabalho informal e as situações esdrúxulas dos assalariados sem carteira
crescem a cada dia. Nos anos 90, de cada 10 empregos criados, oito eram não
assalariados, enquanto na década anterior, de dez empregos, oito eram
assalariados. Segundo Pochmann (1999), o mercado de trabalho no Brasil está se
desestruturando antes mesmo de atingir a maioridade como nos países
desenvolvidos.
A População Economicamente Ativa cresceu 6,8%, entre 1990 e 1996. Os
registros em carteira, no mesmo período, caíram em 9,5%, tendo crescido em
39,1% o número de trabalhadores sem carteira. Os autônomos cresceram 18,9%
no mesmo período e estão espalhados por todo o país. Praticamente todos os
estados apresentam redução no número de postos de trabalho de melhor
qualidade.
O desemprego não pode mais ser visto como um fenômeno isolado que só
ocorre nas regiões mais industrializadas, nem está restrito às capitais. Ele está
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
presente
em
áreas
geográficas
distintas
Capítulo 1
e
com
diferentes
graus
29
de
desenvolvimento.
A PEA em 1996 era da ordem de 70 milhões, 16,5% a mais do que aquela
existente no início da década. No entanto, a população efetivamente ocupada
aumentou apenas 11,4% no mesmo período o que levou o contingente de
desempregados a crescer em 179,1%. São 7,3 milhões.
Nos anos 90 chegaram ao mercado de trabalho 1,417 milhões de pessoas
por ano, e no entanto os empregos criados anualmente foram 951,4 milhões. Em
virtude disso, o desemprego atingiu 465,7 mil pessoas por ano.
A situação encontrada no Estado de São Paulo não difere muito desta
realidade nacional. Crescimento e pobreza, pujança e miséria são faces da mesma
moeda, apontando que o crescimento econômico acelerado e a mobilização
vertical que o acompanhou não contribuíram para o equacionamento da pobreza e
no mesmo período ampliaram-se os segmentos de população submetidos a
situações inadequadas de sobrevivência.
1.3.2. O Estado de São Paulo na década de 1990
Com 247.898 km2, o Estado de São Paulo compreende 3% do território
brasileiro, mas é responsável por uma parcela considerável do PIB nacional9. A
população economicamente ativa localizada em suas terras é de 16.491.029 o que
significa que o estado acolhe 22,6% da PEA nacional, da qual 48% estão na
Região Metropolitana de São Paulo (RMSP).
A década de 1990 iniciou-se com retração que ocasionou o crescimento do
desemprego e a diminuição dos rendimentos reais. Apenas em 1993 esse
9
39% do PIB nacional em 1995; e 49% do PIB industrial no mesmo ano.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
30
movimento foi interrompido: nesse ano houve um comportamento positivo mas
com variações inexpressivas na maioria dos indicadores relevantes. O melhor
desempenho é o do setor de serviços. A indústria ampliou significativamente sua
produção, mas continuou a reduzir sua participação nos postos de trabalho. Um
dos aspectos, em relação ao ano de 1993, foi a incapacidade da indústria em gerar
novos postos de trabalho mesmo tendo apresentado crescimento. As explicações
apontam a expansão das jornadas de trabalho no setor e a racionalização das
atividades. No mesmo período, o setor de comércio e serviços apresentou aumento
nos postos de trabalho; constata-se, no entanto, que os postos gerados são de
pior qualidade do que aqueles suprimidos pelo setor industrial. Além da redução de
postos na indústria, houve uma redução na participação dos assalariados com
carteira assinada, ampliando-se o peso dos assalariados sem carteira e dos
autônomos no comércio e nos serviços.
Em 1994, o mercado de trabalho continuou em linha ascendente. Ressaltese, no entanto, o comportamento bastante desigual dos indicadores: no primeiro
semestre os índices não foram favoráveis à retomada das atividades, só a partir de
meados do ano é que houve uma melhoria nos indicadores do mercado de
trabalho. O pequeno aumento da ocupação, aliado a uma menor inserção de
pessoas no mercado de trabalho contribuiu para a redução, ainda que pequena, da
taxa de desemprego na RMSP ( índices Seade/Dieese apontam 14,6% da PEA, em
1993 e 14,2% em 1994). No ano de 1996, o PIB Paulista cresceu 2,4% em relação
a 1995. Nos vários setores de atividade o percentual do PIB do Estado de São
Paulo é significativo em relação ao PIB Nacional, conforme se pode ver na Tabela
1.1.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
31
Tabela 1.1
Participação do PIB Paulista no PIB Nacional em termos reais por setor de
atividade econômica
Estado de São Paulo – 1990/1995
Ano
1990
1991
1992
1993
1994
1995
Agropecuária
15,42
15,48
14,75
14,91
14,34
14,24
Indústria
41,57
41,54
41,49
41,33
42,06
41,37
em porcentagem
Serviços
Total
33,05
34,41
35,38
35,49
33,90
34,42
32,60
32,62
38,03
36,30
37,82
36,24
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996).
Nos últimos anos tem havido uma mudança estrutural no mercado mundial
que se reflete diretamente na economia brasileira, com impacto no nível de
empregos. O terciário se sobressai nesse movimento tornando-se o setor mais
importante sob o aspecto da geração de renda e empregos. Em 1996 o setor de
serviços foi responsável por 55% do PIB Paulista, e segundo o Banco Central,
“assumiu a liderança na captação de investimentos diretos em moeda estrangeira
no Brasil, deixando para trás a indústria de transformação” (Fundação Seade,
1997a, introdução).
No Estado de São Paulo, a População em Idade Ativa (PIA)10, que no início
da década era de 25.813.511, em 1996 perfaz 27.772.432 podendo-se verificar um
aumento da força de trabalho feminina, que de 35,73% em 1990 passou a 39,44%
em 1996.
Na
RMSP
a
força
de
trabalho
feminina
tem
correspondido
a
aproximadamente 40% do total de ocupados, com ligeiras oscilações, conforme
evidencia a Tabela 1.2. Atente-se que, na década de 1970, o percentual de
mulheres no mercado de trabalho era da ordem de 30%. Na década de 1980
houve um crescimento visto por alguns estudiosos como conseqüência das
10
A PIA é aquela de 15 anos ou mais, ocupada, desempregada e inativa.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
32
condições propícias à absorção de trabalho feminino.11 Desde então, tem estado
mais ou menos independente das flutuações relativas aos ciclos econômicos.
Tabela 1.2
Distribuição dos Ocupados, segundo o sexo
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
em porcentagem
Ano
Homens
Mulheres
Total
1990
61,5
38,5
100,0
1991
60,0
40,0
100,0
1992
59,9
40,1
100,0
1993
59,3
40,7
100,0
1994
59,8
40,2
100,0
1995
59,2
40,8
100,0
1996
58,5
41,5
100,0
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996).
Na verdade, na maioria dos países vêm se verificando profundas alterações
nas condições de funcionamento do mercado de trabalho, havendo hoje, em nível
internacional, um intenso debate sobre o significado e o alcance das
transformações no mundo do trabalho: deterioram-se as condições de trabalho e
aumentam as taxas de desemprego, em especial nos países europeus mas
também nos Estados Unidos.
Estudiosos chamam a atenção para a deterioração da qualidade dos postos
gerados e da distribuição de renda. Por outro lado, apontam um crescimento da
participação das mulheres no mundo do trabalho, fenômeno que está ocorrendo
nas principais cidades do mundo. Encontramos hoje mulheres ocupando postos
que, até tempos atrás, eram monopolizados por homens.
O número de empregados com carteira assinada no Estado de São Paulo
(Tabela 1.3) diminuiu entre os anos 1990 e 1992, tendo um crescimento entre
11
Costa (1994: 19 ) aponta que “Árias e Cordeiro, com base na Rais, constataram que quatro de cada cinco
empregos gerados no Brasil no setor formal, no período de 1981 a 1988 foram preenchidos por mulheres
(Árias e Cordeiro, 1990, p. 11)”.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
33
1993 e 1995 e voltando a cair em 1996, ocasião em que alcançou um número
inferior a 92% do contingente empregado no início da década.
Tabela 1.3
Número estimado de empregados com carteira assinada
Estado de São Paulo, Região Metropolitana e Município de São Paulo
1990/1996
Ano
Estado de São Paulo
Região Metropolitana de São Paulo
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
7.868.712
7.768.102
7.708.737
7.756.288
7.796.130
8.186.215
7.177.023
4.673.155
4.577.201
4.504.257
4.481.454
4.392.920
4.648.096
4.056.935
Município de
São Paulo
3.316.996
3.263.413
3.219.017
3.201.180
3.075.659
3.258.277
2.782.045
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Ministério do Trabalho (Lei
4923/65).
Os números do município de São Paulo são ainda mais alarmantes pois há
uma queda constante ano após ano, sendo o número de empregados de 1996
correspondente a menos de 84% dos empregados com carteira assinada no início
da década. Na Região Metropolitana há queda dos números até 1994, uma reação
em 1995 e nova queda em 1996.
Ao longo da década de 1990, manteve-se a taxa de participação12 (Tabela
1.4). O crescimento de 1,6 pontos percentuais entre 1990 e 1996 pode ser visto
como variação aleatória tendo em vista tratar-se de uma coleta amostral. No ano
de 1994 houve uma pequena retração (0,7%) que foi recuperada em 1995.
Nesta década, a PEA situada na RMSP cresceu em quase dois milhões e não
houve o crescimento correspondente em postos de trabalho. A Tabela 1.5 aponta
12
Taxa de participação é o percentual da população em idade de trabalhar que está, de fato, no mercado de
trabalho, trabalhando, temporariamente ausente ou procurando trabalho. A definição de qual a faixa de idade
que estas taxas de participação vão considerar é feita por cada país. No caso brasileiro, considera-se a faixa
de idade que vai dos 10 aos 65 anos, apesar de a legislação definir que apenas aos 14 anos o jovem deveria
estar inserido no mercado de trabalho.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
34
que neste mesmo período foi reduzido o percentual de ocupados que passou de
54,0% no início da década para 52,5% em 1996.
Tabela 1.4
Distribuição da População em Idade Ativa (PIA), segundo a Condição de Atividade
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
Condição de Atividade
TOTAL
População Economicamente Ativa
Ocupados
Desempregados
Inativos
1990
100,0
60,2
54,0
6,2
39,8
1991
100,0
61,3
54,1
7,2
38,7
1992
100,0
61,5
52,1
9,4
38,5
1993
100,0
61,4
52,5
9,0
38,6
1994
100,0
60,7
52,1
8,6
39,3
em porcentagem
1995
1996
100,0
100,0
61,1
61,8
53,0
52,5
8,1
9,3
38,9
38,2
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Secretaria de Economia e Planejamento:
SEP/ Pesquisa de Emprego e Desemprego.
Na mesma tabela pode-se perceber o aumento do contingente de
desempregados que no início da década era da 6,2% e em 1996 já aponta 9,3%,
significando um aumento da ordem de 50% no contingente de desempregados.
Gráfico 1.1
Distribuição da População em Idade Ativa, segundo a condição de atividade
RMSP/1996
Inativos
38%
Ocupados
53%
Desempregados
9%
Fonte: Fundação Seade (1997a).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
35
O Gráfico 1.1, com dados correspondentes à última coluna da Tabela 1.5,
permite visualizar a PEA da RMSP em 1996 e sua distribuição entre ocupados,
desempregados e inativos.
Perfil dos Ocupados
Podemos visualizar, no Gráfico 1.2, o perfil dos ocupados no Estado de São
Paulo, em 1996. Na distribuição dos ocupados, pode-se perceber que o setor que
acolhe uma maior porcentagem de trabalhadores é o de serviços (45,5%), seguido
da indústria de transformação (28%) e do comércio (14,8%). A agricultura
ocupava 8,6% dos trabalhadores.
Gráfico 1.2
Distribuição dos ocupados por setor de atividade
Estado de São Paulo – 1996
50
45,5
40
28
30
20
14,8
8,6
10
3,1
0
Serviços
Indústria
Comércio
Agricultura
Outros
Fonte: Fundação Seade (1997a).
Na Tabela 1.5, os dados relativos à distribuição dos ocupados por setor de
atividade são apresentados de modo mais detalhado, ficando evidenciados a
participação significativa da prestação de serviços (21,7%) e ainda da indústria de
transformação (20,3%).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
36
Tabela 1.5
Distribuição dos ocupados por setor de atividade
Estado de São Paulo – 1996
SETORES
Serviços
Prestação de Serviços
Serviços Auxiliares de Atividade Econômica
Transporte e Comunicação
Social
Administração Pública *
Indústria
Indústria de Transformação
Construção civil
Outras Atividades Industriais
Comércio
Agricultura
Outras Atividades
TOTAL
Números Absolutos
6.845.375
3.262.217
768.673
702.266
1.477.129
635.090
4.218.444
3.050.979
1.028.665
138.800
2.235.439
1.291.055
457.108
15.047.421
Números Relativos (%)
45,5
21,7
5,1
4,7
9,8
4,2
28,0
20,3
6,8
0,9
14,8
8,6
3,1
100,0
Fonte: Retrato do Mercado de Trabalho Paulista (PNAD/IBGE).
* inclui apenas estatutários e militares.
Sabendo-se que as relações de trabalho no comércio e nos serviços são
mais frágeis, é preocupante o aumento constante do percentual correspondente a
estes setores. Na RMSP, o setor terciário (comércio mais serviços) respondeu por
63,8% em 1994; 64,6% em 1995 e 65,8% em 1996, notando-se que são setores
em expansão no que se refere à sua posição na economia do Estado (Tabela 1.6).
Tabela 1.6
Distribuição dos ocupados, segundo o setor de atividade econômica
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
Setor de Atividade
Indústria de Transformação
Construção Civil
Comércio
Serviços
Serviços Domésticos
Outros
TOTAL
1990
31,2
3,4
16,0
42,5
6,0
0,9
100,0
1991
28,3
2,9
16,3
44,9
6,9
0,7
100,0
1992
26,4
3,3
16,3
46,0
7,3
0,7
100,0
1993
25,2
2,9
16,3
47,7
7,1
0,6
100,0
1994
25,3
3,0
16,9
46,9
7,2
0,6
100,0
1995
24,7
2,6
17,0
47,6
7,6
0,6
100,0
em porcentagem
1996
22,6
3,0
17,2
48,6
8,1
0,6
100,0
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Secretaria de Economia e
Planejamento: SEP (Convênio Seade/Dieese; PED).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
37
Houve crescimento da produção física na Indústria, sem que isso tenha
propiciado um aumento correspondente na geração de postos de trabalho, muito
pelo contrário, entre 1990 e 1996 reduziram-se em 27,56% (de 31,2% passou
para 22,6%) os postos de trabalho na indústria.
Nesse processo evaporaram 2.100.000 postos de trabalho, dos quais mais
de um milhão eram do setor industrial. Na verdade, desde o início da década de
1980 o crescimento industrial e o conseqüente uso da capacidade instalada tem
funcionado como uma sanfona: de 1981 a 1983 decresceu, crescendo de 1984 a
1986; ficando estagnado de 1987 a 1989. Voltou a decrescer de 1991 a 1992 e
cresceu novamente de 1993 a 1995. Observe-se que este último crescimento
(1993/1995) não gerou novos postos de trabalho (regulares) na medida em que
“as empresas opta(ra)m por ajustes de sobrevivência que, em geral, representam
a transferência do maior peso dos custos para os trabalhadores e o Estado”
(Singer, 1996a:137).
Gráfico 1.3
Distribuição da PIA, segundo a condição de atividade
Estado de São Paulo – 1990/1996
60
50
40
Indústria de Transformação
30
Construção Civil
Comércio
20
Serviços
Serviços Domésticos
10
Outros
0
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
38
Por outro lado, comparando-se os índices médios anuais do total de pessoal
ocupado (Tabela 1.7) comprova-se o quanto esta queda é significativa: a TPO caiu
de 103,3 em 1990 para 75,4 em 1996, tomando-se como base 100 o ano de 1978.
O mesmo quadro aponta que as horas trabalhadas também se reduziram de 94,9
em 1990 para 71,3 em 1996 - dados da FIESP.
Tabela 1.7
Índices médios anuais do total do pessoal ocupado (TPO) e das horas trabalhadas
na produção (HTP)
Estado de São Paulo – 1990/1996
TPO
HTP
1990
103,3
94,9
1991
95,2
85,2
1992
89,1
80,0
1993
85,8
80,4
1994
83,8
79,5
[1978 = 100]
1995
1996
82,5
75,4
78,8
71,3
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Federação das Indústrias do
Estado de São Paulo.
Distribuição dos desempregados
Quando visualizamos o setor de atividade de onde saíram os maiores
contingentes de desempregados (Tabela 1.8) verificamos índices crescentes nos
diversos setores desde o início da década até o ano de 1996. Os 5 pontos
percentuais que foram acrescidos no índice de desemprego total nesses 6 anos se
distribuem nos diversos setores com certa semelhança.
Quanto à relação entre tipo de desemprego e sexo (Tabela 1.9), podemos
observar que, na Região Metropolitana de São Paulo,
no desemprego aberto
cresceu mais o contingente feminino (9,1% para 12,5%) que o masculino (6,3%
para 8,1%). No desemprego oculto, os dois gêneros tiveram comportamentos
semelhantes (3,0% para 4,7% e 2,9% para 5,4%).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
39
Tabela 1.8
Distribuição dos desempregados em relação ao setor de atividade do último
trabalho
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
Setor de Atividade
TOTAL
Indústria de Transformação
Comércio
Serviços
1990
10,6
11,5
14,7
8,1
1991
12,5
14,2
16,1
9,7
1992
16,0
18,0
20,6
12,7
1993
14,6
16,5
19,3
11,4
em
1994
14,9
16,2
19,7
12,1
porcentagem
1995
1996
13,9
15,9
14,6
17,4
17,9
21,0
11,7
13,2
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Secretaria da Economia e
Planejamento: SEP (Convênio SEADE/DIEESE).
Exclui empregados domésticos.
No Município de São Paulo, assim como nos municípios da região
metropolitana encontramos comportamento semelhante, o que alerta mais uma
vez para a necessidade de uma preocupação com gênero quando se equaciona a
situação emprego/desemprego:
Estudos efetuados no Brasil e no exterior demonstram que o uso
mais freqüente de relações laborais baseadas na contratação de
trabalhadores por tempo determinado, com jornada parcial de
trabalho e que exercem suas atividades no próprio domicílio atinge
predominantemente as mulheres. Se isto amplia as possibilidades
de inserção feminina, permitindo a combinação de suas atividades
domésticas com as do mundo do trabalho, contribui também para
que sua inserção se dê em condições precárias e inseguras,
geralmente levando à intensificação da carga de trabalho, à
redução da remuneração e à perda da proteção oferecida pela
legislação” (Fundação Seade, 1998:1)
Atente-se para o fato de nem todas as mulheres exercerem trabalhos
informais e em jornada parcial. Não se pode negar que nos últimos anos tem
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
40
havido uma maior inserção feminina no mundo do trabalho em geral, inclusive em
postos tradicionalmente ocupados pelos homens.
Em todo esse período (1990 a 1996) manteve-se uma tendência de
aumento da participação informal, ou seja, daquela que não é regulamentada e é
sempre mais precária.
Tabela 1.9
Taxa de Desemprego, em relação à respectiva PEA, segundo tipo de desemprego e
o sexo
Região Metropolitana de São Paulo, Município de São Paulo e demais Municípios da
Região Metropolitana – 1990/1996
Tipo de Desemprego e sexo
1990
em porcentagem
1995
1996
1991
1992
1993
1994
10,3
9,1
12,1
7,4
6,3
9,1
2,9
2,9
3,0
11,7
10,8
13,0
7,9
6,8
9,6
3,7
4,0
3,4
15,2
13,9
17,1
9,2
7,7
11,5
6,0
6,2
5,5
14,6
13,4
16,3
8,6
7,1
10,9
6,0
6,3
5,4
14,2
12,7
16,4
8,9
7,4
11,2
5,3
5,3
5,2
13,2
11,8
15,3
9,0
7,4
11,3
4,2
4,4
3,9
15,1
13,5
17,2
10,0
8,1
12,5
5,1
5,4
4,7
9,7
8,6
11,4
10,8
9,7
12,2
14,2
13,2
15,7
13,4
12,5
14,7
13,1
11,6
15,2
12,4
11,3
13,9
14,0
12,6
15,9
16,1
14,5
18,7
14,7
12,6
17,9
17,0
15,1
19,8
REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
Desemprego Total
Homens
Mulheres
Desemprego Aberto (*)
Homens
Mulheres
Desemprego Oculto
Homens
Mulheres
MUNICÍPIO DE SÃO PAULO
Desemprego Total
Homens
Mulheres
DEMAIS MUNICÍPIOS DA REGIÃO METROPOLITANA DE SÃO PAULO
Desemprego Total
Homens
Mulheres
11,4
10,1
13,6
13,4
12,6
14,8
17,1
15,3
19,9
16,8
15,1
19,4
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996). (*) Os dados não comportam a
desagregação por município e região metropolitana.
Para analisarmos os vários tipos de desemprego e a inserção das pessoas é
fundamental considerarmos uma outra variável: os grupos de idade. A Tabela 1.10
traz dados relativos à Região Metropolitana de São Paulo, apontando que o maior
contingente de desempregados é jovem, com idades inferiores a 17 anos, e que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
41
estes jovens se colocam tanto no contingente de desemprego aberto como no
oculto.
Tabela 1.10
Taxa de desemprego em relação à PEA, segundo tipo de desemprego e grupo de
idade
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
1990
1991
1992
TOTAL
10,3
11,7
15,2
10 a 14 anos
28,3
28,6
38,7
15 a 17 anos
28,3
28,6
38,7
18 a 24 anos
14,4
16,0
20,8
25 a 39 anos
7,7
9,3
12,0
40 anos e mais
4,6
6,2
8,1
DESEMPREGO ABERTO
7,4
7,9
9,2
10 a 14 anos
21,7
22,5
27,3
15 a 17 anos
21,7
22,5
27,3
18 a 24 anos
10,7
11,4
13,5
25 a 39 anos
5,1
5,7
6,4
40 anos e mais
3,0
3,6
4,3
DESEMPREGO OCULTO
2,9
3,7
6,0
10 a 17 anos
6,6
6,1
11,4
18 a 24 anos
3,7
4,6
7,3
25 a 39 anos
2,6
3,5
5,5
40 anos e mais
1,6
2,6
3,8
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a,
em porcentagem
1993
1994
1995
1996
14,6
14,2
13,2
15,1
42,2
42,9
42,6
44,3
38,1
38,0
32,7
38,7
20,1
20,1
19,1
21,0
11,4
11,0
10,1
11,9
7,3
6,9
6,9
8,3
8,6
8,9
9,0
10,0
31,4
33,1
34,9
32,5
26,0
26,5
24,9
29,8
12,5
13,6
13,8
14,8
6,0
6,2
6,3
7,2
3,6
3,7
3,9
4,7
6,0
5,3
4,2
5,1
11,7
11,1
7,8
9,6
7,6
6,5
5,2
6,1
5,4
4,8
3,8
4,8
3,7
3,2
3,0
3,6
1995a, 1996).
A Tabela 1.11 traz a distribuição de desempregados segundo o grau de
instrução, o que provoca uma reflexão relativa ao estoque educacional no Estado.
Segundo dados da Fundação Seade (1997a:2), “pouco mais de um terço dos
ocupados da RMSP havia concluído pelo menos o 2o. grau, percentual superior ao
de todos os demais anos da década de 90. 46% dos ocupados não tinha chegado
a concluir o 1o. grau”.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
42
Tabela 1.11
Distribuição dos desempregados segundo o grau de Instrução
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
Grau de Instrução
1990
Analfabeto
3,8
1o. grau incompleto
62,4
1o. grau incompleto + 2o. grau incompleto
20,1
2o. grau completo + 3o. grau incompleto
11,1
3o. grau completo
2,6
Fonte: Secretaria de Economia e Planejamento Desemprego - PED.
em porcentagem
1991
1992
1993
1994
1995
1996
4,1
4,3
4,3
4,1
4,6
4,0
61,0
60,3
58,2
54,3
52,8
52,3
20,8
20,4
22,3
24,4
23,8
24,9
10,9
12,0
12,1
14,0
15,2
15,2
3,3
3,1
3,1
3,2
3,6
3,6
SEP (Convênio SEADE/DIEESE); Pesquisa de Emprego e
O crescimento da escolaridade entre os ocupados e o fato de o maior índice
de desempregados estar entre aqueles que têm baixa escolaridade (Tabela 1.12)
têm levado a ações de capacitação que, de certa forma tentam maquiar a situação
de desemprego estrutural.
Tabela 1.12
Taxas de desemprego em relação à PEA, segundo tipo de desemprego e cor
Região Metropolitana de São Paulo – 1990/1996
em porcentagem
Cor
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
TOTAL
10,3
11,7
15,2
14,6
13,6
13,2
14,0
Branca
9,7
10,6
13,7
13,1
12,1
12,0
13,1
Não Branca
11,6
13,9
18,2
17,6
16,4
15,4
18,6
Desemprego Aberto
7,4
7,9
9,2
8,6
8,0
9,0
9,3
Branca
7,0
7,4
8,4
8,0
7,5
8,4
8,9
Não Branca
8,1
9,1
10,8
9,9
8,9
10,2
12,0
Desemprego Oculto
2,9
3,7
6,0
6,0
5,6
4,2
4,7
Branca
2,7
3,2
5,2
5,1
4,6
3,6
4,2
Não Branca
3,5
4,8
7,3
7,6
7,5
5,2
6,6
Fonte: Fundação Seade (1991, 1992a, 1993, 1994a, 1995a, 1996), Secretaria de Economia e
Planejamento: SEP (Convênio Seade/Dieese).
Gênero e raça têm sido os maiores diferenciais no que se refere aos
contingentes de ocupados e desempregados. Em todos os tipos de desemprego
são apontados índices maiores para as parcelas “não-brancas” – utilizando a
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
43
nomenclatura da PNAD – do que para as parcelas brancas (Tabela 1.12). No total
de desempregados na Região Metropolitana, que de 10,3% em 1990 passaram a
14% em 1996, há um distanciamento crescente quanto aos “não-brancos” (11,6%
em 1990 e 18,6% em 1996). A diferença é de três pontos percentuais no
desemprego aberto e 2 pontos no desemprego oculto por trabalho precário.
Dados da Comissão Estadual do Emprego apontam interiorização da
indústria paulista a partir da década de 1970, tendo ocorrido uma queda da
participação na RMSP e um aumento de participação nas outras Regiões
Administrativas. O município de Birigüi, onde está situado nosso objeto de estudo,
é da Região Administrativa de Araçatuba, no noroeste do Estado de São Paulo.
Segundo a Comissão, “este processo de interiorização da indústria foi
acompanhado de uma profunda alteração na estrutura de apoio à produção
industrial, que se desenvolveu impulsionado pela urbanização” (CETE/SP, 1997:6).
1.4. Birigüi: sua história e desenvolvimento
Para o levantamento da história de Birigüi, foram usadas fontes
secundárias, especialmente publicações sobre o município (Ramos, 1961;
Vedovotto, 1998) e folhetos preparados pela Igreja Católica e que eram utilizados
na formação de seus militantes na década de 1980. Entrevistas com diversos
moradores da cidade, empresários e militantes da Igreja Católica trouxeram mais
cor ao relato.
É sabido por seus habitantes que o nome da cidade é também o nome de
um mosquito díptero hematófago13, da família dos psicodídeos [Phlebolumos] que
é transmissor de febres. Abundante naquela Região, deu nome ao riacho que
13
“Birigüi” é derivado do Tupi: “mberú-i”, mosca pequena, ou “mberu-gui”, mosca que vem.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
44
cortava a clareira onde havia um ponto de parada das locomotivas e depois à
própria cidade que foi fundada por Nicolau da Silva Nunes.
Até 1905, aquela região constava dos mapas como sendo desconhecida e
habitada por índios ferozes [caigangues]. As pessoas preferiam o transporte por
trem, pois nas estradas de rodagem havia o perigo de tocaias. Dizia-se que ali
dava bugres até nas árvores e que os traiçoeiros caigangues viviam nas imensas
florestas e eram comparsas da fauna e da flora. Ela havia sido explorada desde o
século XVIII, ao longo do Rio Tietê, pelos paulistas que o navegavam em demanda
do ouro de Cuiabá (MT). Foi também ao longo do Rio Tietê que, pouco antes da
Guerra do Paraguai foram instaladas duas colônias militares sob responsabilidade
da Marinha, uma no salto de Avanhandava e outra no salto de Itapura.
Em 1906, o Governo do Estado de São Paulo enviou à área duas expedições
geográficas para estudo dos vales do Rio Feio/Aguapei e do Tietê. As expedições
estudaram o solo, o clima, a vegetação, o regime das chuvas e dos rios,
assinalando também os vários pontos onde era mais patente a presença indígena.
Um ano antes, partindo de Bauru e buscando a linha do espigão entre os
rios Tietê e Feio, foi iniciada a construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil,
que já alcançava, em 1908, Lins e Araçatuba.
A afluência àquela região intensificou-se a partir de 1912 em virtude da
crescente fama da qualidade das suas terras. A Companhia de Terras Madeiras e
Colonização de São Paulo foi uma das principais responsáveis pela ocupação
planificada ocorrida naquela região. As terras eram de boa qualidade e os
pequenos agricultores implementaram culturas diversificadas e racionalizadas o
que levou ao progresso da região. Das suas lavouras, a principal foi o café.
Em dois outros lugares havia uma penetração datando do início do século,
nos lados de Pirajuí, com a fazenda Faca e São Benedito da Corredeira e na altura
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Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
45
de Penápolis, onde foram doadas terras aos capuchinhos para iniciar o patrimônio
que deu origem à cidade de Penápolis (1914). Em ambos os lugares foram
constantes os choques com os índios da região.
O povoamento precisava de autonomia administrativa e lutou por ela. Foi
elevado a distrito de paz, ao mesmo tempo em que ganhou foros de vila a 10 de
novembro de 1914 [lei 1426]. Em 1917, foram inaugurados a Estação de trens e o
telégrafo de Birigüi. A autonomia potencializou um crescimento extremamente
acelerado que levou a uma auto-suficiência baseada na agricultura e na pecuária.
O nível de renda melhorou a qualidade de vida e propiciou uma poupança interna
excedente que, mais tarde permitiu que se implementasse uma industrialização
auto-sustentada.
Ao contrário do restante da Região de Araçatuba, onde se considera que o
ciclo do café foi um dos maiores responsáveis pela forte imigração, especialmente
na década de 1940, quando atingiu o auge, em Birigüi a produção da café nunca
foi a cultura mais forte. No final da década de 1940, a safra birigüiense era de 840
mil arrobas de caroço de algodão, quantidade que superava em produtividade as
colheitas de Araçatuba, Penápolis, Lins e Bauru. Sua produção de amendoim da
seca apenas era superada por Penápolis e Cafelândia. Glicério, Penápolis e Lins
tinham maior produção de arroz do que Birigüi.
Na década de 1940, na região, 80% da população morava na zona rural, e
apenas 20% na zona urbana. A Igreja Católica era bastante atuante, tendo mais
de 500 capelas rurais em pleno funcionamento e que eram o centro da vida do
povo, realizando encontros, celebrações, e devoções.
Entre as décadas de 1940 e 1950 propriamente não há imigração. Os
deslocamentos são pequenos e dentro da própria região, saindo de Bauru e
Araçatuba e indo para outras cidades. Nesse processo é que crescem os
municípios de Guararapes, Valparaíso, Bento de Abreu, Mirandópolis e Andradina.
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Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
46
Entre 1960 e 1970, houve um grande êxodo, provocado pela erradicação do
café e pela entrada das pastagens e do boi: cerca de 250.000 pessoas deixaram a
região e foram para centros maiores, principalmente para São Paulo, Campinas, e
Americana.
Tabela 1.13
Produção agrícola
Município de Birigüi – 1940/1994
Produto
Caroço de algodão
Amendoim da seca
Arroz
Café
Fonte: Vedovotto (1998).
Década de 1940
840 mil arrobas
60 mil sacas
54 mil sacas (60 kg)
86 mil sacas (60 kg)
Década de 1950
27 mil arrobas
18 mil sacas
56 mil sacas
26 mil sacas
Censo 93/94
11.220 arrobas
7.500 sacas
3.100 sacas
3.048 sacas
Comparando-se os números das décadas de 40, 50 e 90 verificamos ter
havido uma diminuição expressiva na produção agrícola daquela região (Tabela
1.13), números estes que, de certa forma, explicam o êxodo rural sofrido pelo
município, apontados pela Tabela 1.14. A Tabela 1.15 permite visualizar, na Região
de Araçatuba, o êxodo ocorrido dos municípios pequenos e intermediários para os
maiores, dos anos 70 aos 90.
Tabela 1.14
População urbana e rural
Município de Birigüi – 1940/1990
Ano
População Rural População Urbana
9.667
33.245
1940
12.550
18.468
1950
27.118
7.858
1970
45.338
5.551
1980
70.567
4.558
1990
Fontes: IBGE e Secretaria da Agricultura do Estado de São Paulo.
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Capítulo 1
47
Tabela 1.15
Distribuição Populacional
Região de Araçatuba – 1970/1990
Ano
1970
População
620.000 habitantes
1980
580.000 habitantes
1990
700.000 habitantes
Municípios
223.200 nos municípios maiores
80.600 nos pequenos municípios
316.200 nos municípios intermediários
313.200 nos municípios maiores
34.800 nos pequenos municípios
232.000 nos municípios intermediários
413.000 nos municípios maiores
33.600 nos pequenos municípios
253.400 nos municípios intermediários
%
36%
13%
51%
54%
6%
40%
59%
4,8%
36,2%
Fonte: Fundação Seade (1991).
Até 1970, a região apresenta crescimento populacional positivo, no entanto,
inferior às taxas do crescimento vegetativo. Essa emigração agravou-se na última
década, quando houve, inclusive diminuição da população em termos absolutos, o
que gerou um processo de esvaziamento.
Uma das marcas fortes na região foi a construção, na década de 80 das
grandes barragens de Jupiá e Ilha Solteira [Alta Noroeste], e na década seguinte
as de Promissão e Nova Avanhandava [Média Noroeste].
Com a aceleração do ritmo de construção civil, milhares de trabalhadores
foram contratados; a maioria destes eram da própria região, mas outro tanto vinha
de outras partes do país. Apelidados de barrageiros ou peões, estes trabalhadores
aumentaram sobremaneira a população e o comércio local. Tratava-se de um
aumento transitório que provocava apenas um inchaço demográfico ocasional.
Este crescimento inesperado e rápido abalou as precárias estruturas dessas
cidades que não tinham condições de acolher e instalar todos aqueles que não
dispunham de alojamento ou moradia. O comércio local também não tinha
condições para atender tão grande demanda.
Na década de 1970, ocorre o inverso: com o término da construção das
barragens, as cidades que já começavam a se adaptar à nova realidade sofrem um
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Capítulo 1
48
esvaziamento quase tão repentino quanto ocorrera o inchaço. O próspero e
crescente comércio decaiu rapidamente, famílias se desagregaram, maridos
deixaram mulheres e filhos para seguir em busca de outras obras como Tucuruí,
no Pará, e Itaipu, na Foz do Iguaçu, no Paraná.
Tabela 1.16
Componentes do crescimento demográfico
Região de Araçatuba – 1940/1980
Período
Crescimento Absoluto
Crescimento Percentual
Total
Vegetativo
Migratório
Total
Vegetativo
Migratório
17,17
29,75
46,92
49.536
85.817
135.353
1940-50
15,36
29,04
13,68
65.104
123.083
57.979
1950-60
15,40
25,93
10,53
74.197
124.940
50.743
1960-70
19,23
18,77
- 0,46
- 102.388
99.985
- 2.423
1970-80
Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos; Fundação Seade, Movimento do Registro Civil.
Segundo documento da Fundação Seade (1982), os números absolutos
apresentados na Tabela 1.16 não representam os fluxos migratórios ocorridos em
cada década. Não há como medi-los, o que se tem são os saldos resultantes
dessas duas correntes, de entrada e de saída da região. O uso combinado de
dados do Registro Civil e do censo permite a verificação do número de pessoas
que migraram e sobreviveram à morte e à migração de retorno e não o volume
total dos saldos migratórios.
Na região de Araçatuba, declinou o crescimento vegetativo no período, e
isso se deve, em parte à queda da fecundidade. Apesar de o crescimento ter sido
sempre positivo, a diminuição de seu volume contribuiu para o esvaziamento
populacional, pois os nascimentos não compensaram os óbitos e menos ainda as
emigrações.
Essa região sempre foi pouco povoada em relação ao restante do Estado.
Dados do IBGE apontam que em 1940 naquela região vivia 4,02% da população
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Capítulo 1
49
do Estado; já em 1980, essa taxa corresponde a 2,12%. Dados da Fundação
Seade, apontam que, em 1997, essa taxa corresponde a 1,88% (Tabela 1.17).
Tabela 1.17
População Total
Região de Araçatuba – 1940/1980
Período
1940
1950
1960
1970
1980
1997
Araçatuba
265.622
313.680
350.193
358.842
379.825
651.615
4,64
3,76
3,00
2,12
1,88
% do Estado
4,02
Fonte: Fundação IBGE, Censos Demográficos do Estado de São Paulo de 1940 a 1980.
O processo de urbanização de Birigüi acelerou-se nas duas últimas décadas.
Até 1980, 89,1% da população total se localizava na zona urbana e este
percentual cresceu para 95,5% em 1996 (Tabela 1.18).
Tabela 1.18
População Urbana e Rural
Município de Birigüi – 1970/1996
População
1970
N°s Abs.
Urbana
27.118
7.858
Rural
Total
34.976
Fonte: Fundação IBGE –
1980
1991
1996
%
N°s Abs.
%
N°s Abs.
%
N°s Abs.
%
77,5
45.066
89,1
70.567
93,9
81,563
95,5
22,5
5.514
10,9
4.558
6,1
3.864
4,5
100,0
50.580
100,0
75.125
100,0
85,427
100,0
Censo Demográfico (1970, 1980 e 1991), Contagem Populacional de 1996.
A média anual de crescimento, no período de 1980 a 1991, foi de 3,6%.
Nos anos seguintes (1991 a 1996), o ritmo de crescimento caiu para 2,6% ao ano.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 1
50
É este crescimento da população urbana que vai influir no aumento de densidade
do município, conforme se vê pela Tabela 1.19.
Tabela 1.19
Densidade Habitacional
Município de Birigüi – 1980/1996
habitantes/km2
1980
1991
1994
1996 (dado preliminar)
96,02 141,71 154,47
160,70
Fonte: Fundação IBGE. Censo demográfico 1991 e Contagem Populacional de 1996.
A industrialização em Birigüi cresceu a partir da década de 1960;
documentos apontam que tal se deu em virtude do saneamento, da fácil
comunicação e das ruas e avenidas com boas condições de tráfego, além da água
potável tratada e das boas condições de moradia para operários e para as
empresas. Relacionado a isso, conforme já apontado anteriormente (Tabela 1.19),
houve um forte processo de urbanização no período 1970-1996.
É também na década de 1970 que as fábricas de calçados começam a
despontar: menos de 1% das indústrias foram implantadas na década de 1960.
Pouco a pouco a vocação da cidade vai se consolidando.
De uma cidade que “exportava” mão-de-obra para a zona rural por
falta de opção, (...) hoje recebe trabalhadores de todos os
municípios vizinhos, e nada menos que dezenove ônibus chegam
todos os dias, trazendo 969 trabalhadores das cidades de Bilac
(dois ônibus), Braúna (dois), Buritama (um), Clementina (dois),
Coroados (três), Gabriel Monteiro (dois), Glicério (três), Rinópolis
(um) e Brejo Alegre (três). (Vedovotto, 1998:32)
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
51
Comentando essa situação dos trabalhadores que se deslocam para Birigüi
para trabalhar na indústria do calçado, Mestriner14, disse que suas fábricas estão
localizadas em Birigüi, em Gabriel Monteiro e em Penápolis e que a proposta de
deslocar as fábricas para estas cidades foi para diminuir o tempo de transporte dos
trabalhadores até a fábrica.
Segundo a Pesquisa Agrícola Municipal que é realizada anualmente pelo
IBGE, Birigüi apontava em 1990 doze culturas na lavoura temporária [9.946 ha]
sendo as principais o milho [3.800 ha] e feijão [1.350 ha]. Em 1995, apesar de ter
crescido a área plantada [12.547 ha], havia onze culturas, mantendo-se o milho na
dianteira [5.900 ha]; a soja passou para 2.150 ha e o feijão para 1.492 ha (CETE,
1997). No período de 1990 a 1995 houve redução significativa daquelas que são
consideradas lavouras permanentes como o café e a laranja. Esta última reduziuse em 95,7% no período.
A população em idade ativa (PIA), em 1991, representava 66,5% do total. O
tamanho da PIA serve como referência para o dimensionamento do mercado de
trabalho local, na medida em que esta é a parcela da população apta para o
trabalho.
Tabela 1.20
População segundo faixa etária
Município de Birigüi – 1991
Faixa Etária
Números absolutos
21.202
0 a 14 anos
49.978
15 a 64 anos
3.945
65 anos e Mais
75.125
Total
Fonte: Fundação IBGE. Censo Demográfico de 1991.
Dados do IBGE informam que, em relação à renda dos chefes de domicílios,
a maior faixa de população (47,6%) encontra-se entre os que recebiam até dois
14
Carlos Alberto Mestriner, diretor das Indústrias de Calçados Klin, foi presidente do Sindicato das Indústrias
do Calçado e Vestuário de Birigüi no biênio 1996/1997.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
52
salários mínimos (Tabela 1.21). 17,2% recebiam até um salário mínimo. Observase que, se dentre aqueles com renda mensal até 1 salário mínimo temos uma
maioria de rurais, na faixa que vai de 1 a 2 salários mínimos, há um número
menor (46%) de moradores urbanos do que de rurais (74,1 %).
Tabela 1.21
Renda dos Chefes de Domicílios
Município de Birigüi – 1991
Renda Mensal
%
7,2
até ½ SM
7,2
Urbanos
6,7
Rurais
17,2
até 1 SM
38,8
Urbanos
28,4
Rurais
47,6
até 2 SM
46,0
Urbanos
74,1
Rurais
52,2
mais de 2 SM
53,8
Urbanos
25,6
Rurais
Fonte: Fundação IBGE. Censo Demográfico de 1991.
No Estado de São Paulo, naquele mesmo período (1991), 36,6% da
população recebia até 2 salários mínimos, enquanto 15,9% até 1 salário mínimo.
Na zona urbana, 34,4% recebiam até dois salários mínimos, enquanto na zona
rural esse percentual era de 67%.
Quanto à alfabetização, enquanto no Estado de São Paulo havia uma
parcela de 11,3% de chefes de domicílios analfabetos, em Birigüi essa taxa era de
13,5%. Enquanto os chefes de domicílio do sexo feminino em Birigüi eram 13,9%,
no Estado de São Paulo eram 16,8%.
Em 1991, Birigüi possuía 19.251 domicílios particulares, 94,2% dos quais
estavam localizados na zona urbana. No Estado de São Paulo, esse percentual era
de 93,0%. Desses domicílios, 4,3% possuíam abastecimento de água inadequado
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
53
e 17,2% esgoto sanitário, também, inadequado. No Estado, estes percentuais
atingiam, respectivamente, 4,7% e 20,8%.
A taxa de mortalidade infantil em Birigüi, no ano de 1996, era de 18,6 por
mil nascidos vivos, e a taxa de natalidade era de 15,7 por mil. O coeficiente de
leitos gerais, em 1994, foi de 1,8 por mil habitantes, enquanto o parâmetro
estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) é de 4,5 leitos por mil.
1.4.1. Os calçados no nascimento de uma vocação
Os documentos mais antigos apontam que a primeira selaria e sapataria de
Birigüi foi a
Selaria e Sapataria Noroeste onde a família Tokunaga iniciou a
fabricação de botinas, botas e sapatos, [que eram] vendidos
diretamente ao consumidor, [e ainda] de chinelos e sandálias [que
eram] vendidas no atacado (Vedovotto, 1998:23)
A fabricação desses calçados era totalmente manual e a maior dificuldade
era a falta de profissionais habilitados. Apenas a partir de 1945 é que começaram
a ser introduzidas as primeiras máquinas nesse tipo de produção. A Selaria e
Sapataria Noroeste transformou-se em espaço de aprendizado para quantos se
interessassem por aquele ofício. Sua ação foi bastante significativa e isso pode ser
atestado pelo fato de muitos empresários calçadistas que surgiram na fase
seguinte, mais industrializada, terem passado pelo aprendizado nessa empresa,
que encerrou suas atividades na década de 1960.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
54
Na raiz da vocação industrial de Birigüi pelo calçado infantil, encontra-se
uma decisão tomada em 1958 por um dos pioneiros naquela indústria: Antônio
Ramos de Assumpção15. Seu depoimento é relatado por Vedovotto (1998:31)
Tínhamos conhecimento na época de que a cidade de Franca era
especialista em calçado masculino, Jaú grande produtora de
sandálias femininas e que o Estado do Rio Grande do Sul era
fabricante conhecido de sapatos femininos. Daí, então, optamos
pelo calçado infantil e também porque este exigia menos capital.
A partir da década de 1960 é que há um crescimento das indústrias de
calçado de Birigüi:
Menos de 1% das indústrias foram implantadas antes da década
de 60. Nos anos 60, oito fábricas apareceram. Na década de 70,
houve crescimento de 9,6%, quando surgiram mais quinze
unidades. Na atual década, registrou-se crescimento de 16,6%,
com mais 26 novas empresas. (Vedovotto, 1998:33)
Um olhar para o perfil dos empresários de calçado de Birigüi levou
Vedovotto a afirmar ser esta indústria genuinamente birigüiense. 74% deles
nasceram na cidade de Birigüi. E, além disso, 66% vieram de outras indústrias de
Birigüi (aproximadamente 140) onde eram empregados.
Mestriner afirma que em Birigüi há apenas cinco grandes empresas, e
explica que estas são grandes em relação ao município, mas pequenas se
considerarmos as indústrias nacionais.
O setor já chegou a empregar diretamente mais de 16 mil
trabalhadores e com o advento do Plano Real teve o maior índice
de desemprego registrado em torno de 5 mil pessoas. Até então a
15
Esta primeira fábrica de calçado infantil, a Ramos de Assumpção Ltda. transformou-se na Fiorotto e
Assumpção e mais tarde na Popi Indústria e Comércio de Calçados Ltda. que é hoje uma das maiores fábricas
da cidade [em 1986, 980 funcionários e produção de 11.000 pares/dia].
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
55
média de dispensa em todos os inícios de ano girava entre 1500 e
2 mil trabalhadores. Hoje, com algumas fábricas trabalhando com
todo o seu potencial, mantém-se a média de 11 mil empregos
diretos. (Vedovotto, 1998:34)
Além disso, a indústria calçadista alimenta setores correlatos que geram
mais de mil empregos: a cartonagem, a representação, os fornecedores de
componentes, as fábricas de solados, as fábricas de favas industriais para
balancins, a indústria de colas, etiquetas, máquinas, fivelas e outros enfeites,
assim como palmilhas, cadarços, etc. Comentando a relação que há entre as várias
empresas da cidade, Mestriner disse que
Birigüi é uma cidade em que todos nós nos conhecemos. E todos
nós viemos do nada. Todos nós, ontem, fomos funcionários de
alguém. Ninguém nasceu em berço de ouro. [...] A essência desse
entrelaçamento entre os empresários é que há um convívio ou na
infância ou no conhecimento... mesmo que eu não conheça você,
eu sei quem você é... não tem ninguém de fora, todos são daqui
ou das cidades vizinhas e todos nós nos conhecemos.16
Apesar de a indústria do calçado ser a principal atividade industrial da
cidade, Vedovotto atesta que ela se fez por si só, não tendo em nenhum momento
contado com ajuda do poder público.17
1.4.2. Perfil econômico
Um dos instrumentos para a caracterização do perfil econômico dos
municípios é a análise do valor adicionado por setor industrial18. Em 1996, com
16
As citações de entrevistas coletadas durante a pesquisa serão apresentadas em itálico.
Segundo Vedovotto (1998:34) “a primeira atitude em favor da iniciativa privada (...) foi em 1985, com a
implantação do primeiro Distrito Industrial local onde não se encontra instalada uma única fábrica de
calçados”.
17
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 1
56
603 estabelecimentos industriais (Tabela 1.22), Birigüi participou com 27,7% no
total do valor adicionado da Região Administrativa de Araçatuba; este valor
correspondeu, ainda, a 65,6% do Valor Adicionado Municipal.
A Tabela 1.22 traz o número de estabelecimentos segundo o ramo industrial
ano após ano. Analisando estes dados, observa-se que Vestuário, Calçados e
Artefatos de Tecidos tem sido um dos ramos industriais de maior destaque no
município. Esse setor correspondia a 61,4% do total da indústria em 1990 e 61,5%
em 1996. Em termos regionais, Birigüi é responsável por 87% da produção
industrial desse setor.
Tabela 1.22
Número de estabelecimentos, segundo ramo industrial (valor adicionado)
Município de Birigüi – 1980/1996
Ramo Industrial
Vestuário, Calçados e Artef. Tecidos
Material de Transporte Metalurgia
Material Elétrico e de Comunicações
Produtos Químicos
Produtos Alimentícios
Produtos Têxteis
Produtos Farmacêuticos, Médicos e Perf.
Produtos Minerais Não-metálicos e Cimento
Papel e Papelão
Mecânica
Material Plástico
Produtos de Borracha
Bebidas, Liq. Alcoólicos e Vinagre
Mobiliários
Editorial e Gráfica
Indústria Diversos (I e II)
Indústria Diversos (I)
Artigos e Artefatos de Madeira
Produtos Agrícolas
Produtos Pecuários e Frigoríficos
Fumo e Produtos Derivados
Pedra e Outros Materiais de Construção
Couros, Peles e Prod. Similares
Outras Indústrias
Indústria Extrativa
Total da Indústria
1980
65
2
15
1
2
8
1
11
2
5
1
1
6
13
8
2
4
15
2
4
1
1
170
1985
91
3
12
2
1
7
2
8
2
5
5
3
14
6
1
2
4
13
4
2
1
188
1990
247
4
29
2
2
9
1
8
5
9
2
2
32
10
7
4
5
12
5
2
3
2
402
1995
343
7
40
3
6
20
4
2
13
8
13
9
2
39
10
5
4
9
5
3
3
3
4
555
1996
371
6
41
5
5
24
2
4
13
10
13
10
3
41
15
3
4
14
4
5
3
3
4
603
RA/1996
752
27
203
16
24
148
20
10
187
22
36
26
9
27
185
70
35
10
75
75
34
2
9
21
20
26
2.069
Fonte: Secretaria de Estado dos Negócios da Fazenda do Estado de São Paulo. Dipam.
18
Declarado anualmente, o VA (valor adicionado) é a diferença entre entradas e saídas de mercadorias das
diversas empresas. Corresponde ao montante que os processos produtivos acrescentam de valor às matériasprimas, e é base para apuração dos índices de participação no ICMS.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
57
Em relação à produção nacional de calçados infantis, Birigüi destaca-se
como o maior produtor. Em 1986, já tinha uma produção de 100.000 pares/dia e
era uma liderança nacional em produção de calçados infantis. Eram 64 unidades
fabris que geravam 6.000 empregos diretos.
A Tabela 1.23 apresenta a produção de Birigüi em comparação com
algumas outras cidades e com o Estado de Minas Gerais. Pode-se dizer, em relação
ao calçado infantil, que Birigüi não é suplantada por nenhuma outra região do país,
o que lhe confere o título de Capital Brasileira do Calçado Infantil. Interessante
observar que a produtividade encontrada em Birigüi (11 pares/dia por trabalhador)
é maior do que aquela encontrada em Franca e no Estado de Minas Gerais (4,5
pares/dia por trabalhador).
Tabela 1.23
Produção de calçados
Birigüi, Jaú, Franca, EMG, São Paulo e Santa Cruz do Rio Pardo
Município
Produção / dia
(em mil)
129
65
90
Empregados
Observações
Birigüi
Jaú
Franca
Número de
Fábricas
152
160
350
11.000
4.200
20.000
Estado de MG
1500
350
75.000
90 % infantis
80% femininos e 10% infantis
20% entre infantis e femininos
5% infantis
10% infantis
masculino
500
25
5
Cidade São Paulo
Santa Cruz do Rio Pardo
Fonte: Vedovotto, 1998.
As representações patronais e de trabalhadores encontram-se articuladas
desde 1979 quando foram criadas a Associação dos Trabalhadores nas Indústrias
do Vestuário de Birigüi, e a Associação Profissional da Indústria do Vestuário de
Birigüi que mais tarde se transformaram, respectivamente, no Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias de Calçados, Confecções de Roupas, Material de
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
58
Segurança e Proteção ao Trabalho de Birigüi e Região (1983) e Sindicato das
Indústrias do Calçado e Vestuário de Birigüi e Região (1986). “As primeiras
reivindicações
de
melhoria
do
segmento
começaram
a
ser
formuladas
conjuntamente pelos dois sindicatos, que em 1985 pleiteavam a instalação de uma
escola profissionalizante” (Vedovotto, 1998:98).
O Centro de Treinamento Calçadista Avak Bedouian encontra-se instalado
desde 1985 e uma das metas atuais do sindicato patronal é a implementação de
uma Escola Completa do Calçado que em conjunto com o Senai e com a prefeitura
estimulariam o desenvolvimento da indústria, além de se constituir em um
laboratório para testes.
O sindicato patronal vem apoiando a micro e pequena indústria, tanto a
partir de cursos de qualificação quanto na facilitação para que estas participem de
congressos e feiras internacionais, como a Couromoda e a Francal. A Feira das
Indústrias de Birigüi (Fibi) é outra conquista que já se encontra em sua 4ª edição.
Segundo Vedovotto (1998:101), nessas feiras, “os micros e pequenos empresários,
através da venda direta ao consumidor, têm a oportunidade de ‘engordar’ o caixa,
garantindo o pagamento de seus compromissos, principalmente no final do ano,
quando se acumulam férias, o 13º, etc...”
A articulação dos empresários foi se fortalecendo e desde 1996 reúnem-se
mensalmente. O objetivo é se constituírem numa “unidade industrial organizada
onde todos os sensos – de utilização, ordenação, limpeza, saúde e autodisciplina –
pudessem ser colocados em prática, transformando-se de forma radical o conceito
da indústria calçadista” (Vedovotto, 1998:112). Nesse processo tem tido papel
significativo o Sebrae e a Fundação Christiano Ottoni, de Minas Gerais, que
contribuem na qualificação: “foi aplicado um treinamento intensivo em 84
facilitadores incumbidos de levar os princípios da qualidade a outros 4 mil
trabalhadores de 32 empresas associadas ao projeto” (Vedovotto, 1998:114).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
59
Essa preocupação com a qualidade tem produzido efeitos positivos:
Este novo movimento, que está sensibilizando até as grandes
indústrias locais (a Bical aderiu ao Programa de Qualidade e
contratou a Fundação Christiano Ottoni para gerir as fases de
implementação), desperta a atenção de todo o país, é bem
recebido por clientes e fornecedores, entidades governamentais e
privadas. (Vedovotto, 1998:113)
1.4.3. O mercado de trabalho em Birigüi
Até 1990, os estabelecimentos com maior peso eram aqueles voltados para
as atividades comerciais, seguidos da indústria e dos serviços. Naquele período, a
agropecuária era o setor menos expressivo na economia do município. Entre 1990
e 1995, expande-se quantitativamente este setor, colocando-se na dianteira da
Construção Civil.
No mesmo período, o total de estabelecimentos sediados em Birigüi
aumentou de 1.206 para 1.669, sendo no setor agropecuário o maior acréscimo
[218 estabelecimentos].
Tabela 1.24
Distribuição dos ocupados, segundo o Setor de Atividade
Município de Birigüi – 1990/1995
Setor de Atividade
Indústria
Construção civil
Comércio
Serviços
Agropecuária
Outros
Total
Fonte: Ministério do Trabalho. RAIS.
Município
1990
11.525
603
2.027
3.970
160
754
19.039
Região Administrativa
1995
12.251
447
2.408
4.466
512
88
20.172
1995
29.342
2.650
14.977
36.008
10.627
786
94.390
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
60
Em 1995, o Município de Birigüi incorporava a maior parte dos ocupados do
mercado de trabalho formal na indústria – especialmente a calçadista –, seguidos
do setor de serviços e dos funcionários da administração pública, transportes e
comunicação, além do comércio varejista.
O nível de ocupação apresentou desempenho positivo entre 1990 e 1995 –
aumento de 1.133 pessoas ocupadas no período, conforme se verifica na Tabela
1.24.
O crescimento do número de ocupados [variação de 6,0%, ou seja, 1.133
pessoas] deve ser visto com cautela. Ele tanto pode ser um crescimento real como
o resultado da formalização de vínculos trabalhistas no setor agrícola, em
decorrência das sucessivas reivindicações salariais. A indústria acresceu 726
postos, os serviços, 496; o comércio, 381 e a agropecuária, 352. Diminuíram as
pessoas ocupadas na construção civil [156 pessoas] e em outros [666 pessoas].
Segundo análise feita pela Comissão Estadual de Emprego de São Paulo–
CETE-SP (1997), pode-se observar as seguintes características no Município de
Birigüi.
•
Ele detinha 21,4% da totalidade dos postos de trabalho (94.390)
concentrados na sua Região Administrativa;
•
a estrutura do mercado de trabalho formal da Região Administrativa de
Araçatuba tinha poucas semelhanças com as do Município: na região, de
modo diverso do município, constatava-se predomínio dos ocupados nos
Serviços;
•
a maior contribuição do município sobre o total de ocupados da região
era na indústria (418 %).
O mesmo relatório aponta que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 1
61
em 1996, a tendência do mercado de trabalho foi de ampliação,
tendo o contingente de admitidos superado o de demitidos,
levando ao acréscimo de 979 postos de trabalho, ao longo do ano.
Este resultado deveu-se, principalmente, ao desempenho verificado
na Indústria, com saldo positivo de 443 postos, nos Serviços, que
incorporou 383 pessoas, além do aumento de 220 ocupados na
Construção Civil, naquele ano. (...) O mercado de trabalho formal
em Birigüi, em 1997, manteve-se em recuperação – o contingente
de admitidos superou em 2.180 pessoas o de demitidos. O setor
com melhor desempenho nesse ano foi o industrial, com saldo de
1.421 admitidos, seguindo-se acréscimos menos substantivos nos
demais setores, exceção feita ao agregado Outros, que se mostrou
relativamente estável ao longo do ano. (CETE/SP, 1997)
A breve contextualização aqui apresentada permite situar o cenário onde se
desenrola a experiência analisada nesta tese, conforme veremos nos capítulos que
se seguem.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
Capítulo 2
UMA HISTÓRIA CONSTRUÍDA
AO TRABALHAR
62
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
63
Na busca de elementos para escrever a história do grupo que protagoniza
esta experiência, foram colhidos depoimentos, em longas “conversas” com cada
um dos sujeitos, buscando resgatar a memória do grupo, reconstituindo assim esta
história a partir de seus protagonistas. Por outro lado, foram ouvidos alguns
militantes tanto da Igreja Católica quanto da luta por direitos humanos, a partir
dos quais é possível perceber o modo como esta experiência foi vista, no decorrer
destes anos, por estes outros atores. Na construção deste texto busquei guardar
uma linguagem o mais próxima possível das expressões, metáforas e exemplos
utilizados pelos sujeitos, de modo a respeitar a originalidade dos relatos.
Assim, os depoimentos apontam que tudo começou com a participação de
cada um deles em grupos de jovens de diversas paróquias da cidade de Birigüi. Na
militância católica, foram se conhecendo e convivendo. Suas discussões e reflexões
foram amadurecendo, fruto da vivência nas CEBs e nas atividades de oposição
sindical onde também estavam engajados.
As discussões que propiciaram a formação da Marc’ellsse começaram em
1991, porém a semente já havia sido lançada tempos antes e ainda que os frutos
só chegassem mais tarde, já era possível ver o surgimento de pequenos brotos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
64
verdes que indicavam que o campo era fértil, mas que era necessário tempo e
trabalho para chegarem a colher frutos.
A amizade destes jovens, católicos de classe média baixa, foi alimentada e
fortalecida pela participação em grupos de jovens de diversas paróquias da Igreja
Católica. A ação pastoral da Igreja de Lins levava grupos de jovens de várias
paróquias a se encontrarem para cursos bíblicos, nos quais refletiam sobre o papel
dos cristãos na construção de uma sociedade diferente daquela na qual viviam.
Quando perguntados sobre o início desse processo, eles rememoram um
Encontro de Jovens que teria ocorrido em Peacatu, cujo tema central foram os
ensinamentos cristãos contidos no Ato dos Apóstolos19. A metodologia utilizada
salientava os potenciais individuais, motivando os jovens a colocá-los em comum.
Dessa reflexão surge a idéia de experienciar um modo de vida semelhante ao dos
apóstolos.
Se eles viviam assim lá, na época, deve ser bom aqui, hoje,
também (RP).
Ao mesmo tempo em que refletiam sobre as comunidades primitivas, estes
jovens procuravam atuar de maneira coerente com tais ensinamentos. A busca de
uma sociedade mais justa levou-os a se engajarem na luta sindical, participando
da oposição ao sindicato constituído, e num segundo momento resolveram
experimentar uma nova forma, criando um empreendimento que pudesse garantir
a sobrevivência, em um processo em que não houvesse explorados nem
exploradores.
19
Parte constitutiva do Novo Testamento, o “Ato dos Apóstolos” é o texto que, na Bíblia, apresenta a história
das origens cristãs. O trecho que é mais citado por estas pessoas é o dos versículos 44 e 45: “Todos os fiéis,
unidos, tinham tudo em comum: vendiam as suas propriedades e os seus bens e dividiam o preço entre todos,
segundo as necessidades de cada um”.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
65
A utopia20 era mostrar à cidade que a força comunitária pode transformar
um sonho em algo real. Na construção do sonho, decidiram que buscariam sua
sobrevivência no trabalho, fazendo aquilo que a maioria já sabia fazer: produzir
sapatos. Ao mesmo tempo em que amadurecia a idéia, o grupo buscou convidar
pessoas que, acreditavam, tinham os mesmos ideais que os seus. Dizem eles que
quinze pessoas foram chamadas para uma primeira reunião, mas no processo de
construção da proposta o grupo foi se consolidando ao redor de oito pessoas:
Carlos Alberto Moraes (Carlinhos), Edson Esperança Roman (Pardal), Jean Cesar
Maran (Jean), Luciano Moraes Filho (Luciano), Marlene Arquilini Moraes (Marlene),
Mauro Martins da Silva (Mauro), Roberto Piloto (Roberto) e Rosa Helena dos
Santos Silva (Rosa).
Estes oito iniciaram estudos e planejamentos que levaram seis meses e que
objetivavam a construção de uma oficina de produção de tênis.
Alguns deles eram nascidos em Birigüi, outros vindos do interior do Paraná
onde haviam trabalhado na roça. Dois estavam casados [um recentemente e outro
esperando o primeiro filho], os outros eram solteiros e as namoradas [hoje sócias
e esposas] participavam dos mesmos grupos.
Durante este período, mais quatro pessoas se juntaram a eles e com isso,
na concretização das primeiras ações, o grupo era constituído de 12 pessoas.
Durante esses dez anos, dois desistiram, dois casaram... de novo, eram 12. Dois
foram para a segunda fábrica (Maic d’jol) e mais dois casaram... e, mais uma vez,
eram 12.
A gente falava que sim, vai dar certo, mas era uma aventura. A
gente não pensava – minha vida vai ser isso aqui... (CAM)
20
O sentido dado à palavra utopia, por estas pessoas, não é a de um projeto irrealizável, uma quimera. Seu
significado emana da leitura cristã que considera a possibilidade da realização terrena do Reino de Deus.
Assim, a ação dos cristãos não é distinta da ação dos não-cristãos, em termos do que fazem; no entanto, vem
impulsionada por motivações e significados de construção de um mundo de justiça e liberdade para todos.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
66
Alguns destes jovens haviam participado de uma experiência não bemsucedida de formação de um sindicato de trabalhadores que objetivava a defesa
dos sapateiros de Birigüi... Não conseguiram oficializar o sindicato e ficaram
conhecidos entre os empresários como radicais, o que fez com que perdessem o
emprego e ficassem marginalizados pelas indústrias da cidade. Outro tinha sido
dono de um negócio, uma pequena fábrica de calçados, e apontava uma
frustração por não ter podido realizar naquela fábrica um trabalho comunitário e
social.
Dez, dos doze tinham escolaridade de primeiro grau. No momento da
conclusão da pesquisa, um deles tem formação universitária (administração); dois
têm segundo grau completo; dois têm segundo grau incompleto e seis têm
primeiro grau incompleto; alguns deles estão estudando à noite.
Dos 12 que constituem o grupo atual dez tinham experiência profissional no
calçado, um era expert em vendas e outro administrador de empresas. A
experiência profissional do grupo era bastante diversa, havendo dois deles que
tinham grande habilidade na modelagem. Segundo o depoimento de Mestriner,
eles têm conhecimento do como funcionam as grandes fábricas já
que trabalharam lá, e usam bem esse conhecimento.
A experiência concreta de colocar em comum o pouco que tinham era uma
solução para o desemprego daqueles que haviam sido demitidos, mas, mais do
que isso, era a possibilidade de experimentar uma nova forma de vida, que
objetivava, sim, a sobrevivência, mas que trazia o impulso de um projeto de vida.
A proposta era produzir calçados de forma comunitária, fazendo desta função algo
também social – “proteger os pés das pessoas menos favorecidas” – e também
garantir uma sobrevivência de forma digna e honesta através do trabalho. Partiam
para o fortalecimento de uma verdadeira experiência de vida comunitária no
cotidiano, e que tudo seria partilhado: lucros, prejuízos, alegrias, dificuldades,
idéias e até mesmo o sonho de cada um.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Jean Cesar
Moran e
Shirlei Lobo
Moran,
casados, tem
uma filha –
Taís - de 4
anos
Elizabete Maria
Folini Buono,
casada com Luis
Cláudio Buono,
tem dois filhos:
Ariele, de 5 anos
e Caio de 4
meses.
Roberto Piloto e
Lucinéia Cuer Piloto,
são casados e tem um
filho – Rafael – de 4
anos
Capítulo 2
Élio Arquilini e
Marilene
Marchesini
Arquilini,
casados, tem
dois filhos:
Caroline de 5
anos e Felipe de
9 meses
Carlos Alberto
Moraes e Marlene
Arquilini Moraes,
casados, tem dois
filhos: Danilo de
3 anos e Carlos
Alberto de 5
meses.
Edson Esperança
Roman (Pardal) e
Marinete Lot
Roman, casados,
têm um filho,
Anderson, de 7
anos
Luciano Moraes
Filho é casado com
Míriam Costa
Rodrigues Moraes
e têm um filho –
João Vitor – de 1
ano
67
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
68
Ao definir a razão social da empresa que concretizaria a proposta, estes
jovens fizeram um exercício de construção de um nome que fosse um anagrama
que utilizasse as iniciais dos nomes de todos eles: Marc’ellsse. No mesmo processo
definiram um código [FK12] cujo significado somente é conhecido por três deles e
cujo segredo serve para avaliar o grau de confiabilidade que cada um pode ter no
outro. “O rompimento, se ocorresse, poderia significar o fim do sonho”, declarou
JCM em entrevista fornecida a Vedovotto (1998:82). Segundo informações dos
sócios, este “mistério” ainda continua. O início do trabalho é relatado por
Vedovotto:
Em uma das reuniões feitas no domingo à tarde surgiu a idéia de
fabricar um sapatinho fechado. No domingo à noite foram para São
Paulo buscar as matérias-primas necessárias. Embora a cidade
tivesse infra-estrutura para oferecer o que precisavam, tinham a
informação de que encontrariam o produto por um custo menor na
capital. (Vedovotto, 1998:82)
Ainda não era desta vez que venceriam. O sapatinho produzido não vendeu,
encalhou e as dívidas pesavam no orçamento daquelas pessoas que viviam de
salários baixos e precisaram administrar um prejuízo que parecia impagável a
alguns. A maioria do grupo era solteira, mas já havia entre eles dois casais, um
deles esperando o primeiro filho... A saída encontrada foi coletiva, juntaram-se e
foram vender gelinho, um sorvete caseiro e muito popular, no Estádio Pedro Marim
Berbel.
Mas o sonho não estava abandonado: continuavam a se reunir, discutindo a
montagem de uma sociedade diferente, sociedade que ia começar sem dinheiro e
onde pretendiam “estar dos dois lados”:
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
69
A gente estaria sentindo a parte dos empregados que até aquela
época nós éramos, e estaríamos sentindo a parte do empresário,
porque também estaríamos como empresários. (MMS)
Dando continuidade ao sonho, no início de 92, decidiram iniciar a produção
de um tênis infantil. Desta feita não repetiram o que haviam feito inicialmente de
produzir primeiro e descobrir se o produto era vendável, depois. Fizeram apenas
um
mostruário
com
alguns
modelos
e
colocaram
nas
mãos
de
um
vendedor/viajante. A expectativa era a de uma encomenda pequena, cerca de 30
pares/dia, possível de ser produzida artesanalmente e suficiente para garantir a
sobrevivência dos três companheiros que estavam desempregados. Com o
crescimento das encomendas, que avaliavam poder ocorrer em um ano, outros
deles sairiam de seus empregos e se ocupariam da Marc’ellsse. Na primeira saída
do vendedor, a surpresa: foi feito um pedido para 450 pares, e na segunda
semana, mais 200...
Sérgio – aquele primeiro vendedor e que, ainda hoje é representante da
Marc’ellsse – avalia que aquele tipo de tênis estava fazendo falta no mercado...
segundo sua lembrança, era época ruim para venda de calçados.
Eu comecei a mostrar, o pessoal começou a gostar, e daí foi uma
semana que vendeu uns 450 pares...
Sérgio conta que sempre trabalhou com diversas marcas, mas naquela
semana percebeu que mostrava o modelo deles e o pessoal gostava... passou a
dizer que era uma marca nova que estava vendendo bem e o pessoal gostou e as
vendas cresceram.
Como ainda não tinham nenhuma fábrica, decidiram começar a produção na
garagem da casa dos pais de um deles (JCM). Em apenas um mês, aquele espaço
já estava pequeno e precisaram mudar-se para um prédio maior.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
70
Esta primeira produção era bastante artesanal. O corte era feito com
estilete, o pesponto era feito com máquina caseira, e haviam construído uma
frizadeira usando para isso motor de um liqüidificador... Para a compra da matériaprima, fizeram uma “vaquinha”, na qual cada um entrou com o que podia para
com isso formar o capital inicial. Com esse capital, compraram os instrumentos
manuais necessários, e uma máquina de coluna. A criatividade e o esforço coletivo
foram fundamentais para racionalizar o uso do pouco que tinham e que precisava
ser constantemente multiplicado.
O espírito era o da partilha. Como as possibilidades de contribuir com
dinheiro eram diversas, combinaram que cada um entrava com o que podia, que
os débitos eram de pessoa a pessoa e o capital juntado era de todos.
Ele tinha uma Brasília, comprou a máquina de coluna: vendeu a
Brasília, comprou a máquina e ficou sem dinheiro. O Luciano pegou
o acerto dele na fábrica e investiu. Foi mais ou menos o dinheiro
que entrou. Entrou dinheiro só suficiente para fazer a abertura dos
documentos, comprar a máquina, comprar o motorzinho, e mais
alguma coisa que precisava para o funcionamento e complemento.
(MMS)
Conseguir o capital para a compra de matéria-prima não era a única
dificuldade. Eles contam que a primeira vez que visitaram um fornecedor,
buscando comprar matéria-prima precisaram do aval de um empresário da cidade.
Eram garotos, vestiam camisetas, bermudas e sandalinhas de dedo e não
inspiravam confiança. A sorte foi que um dos empresários, Ismael Varoni21,
apresentou-os, dizendo ao fornecedor que não se arrependeria por vender para
eles, e que se tivesse problemas no recebimento poderia recorrer a ele.
Além da falta de capital, havia outra questão a administrar que era
disponibilidade
das
pessoas.
Aqueles
três
que
estavam
desempregados,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
71
imediatamente, passaram a se ocupar da produção, e os outros trabalhavam à
noite e nos finais de semana. Com o crescimento dos pedidos, aqueles que
estavam empregados foram saindo de seus empregos e se inserindo na fábrica.
A primeira grande decisão acho que foi do pessoal que estava
trabalhando fora da empresa, a gente tirar e puxar para dentro da
empresa. Foi uma das maiores decisões do início. (RP)
Desde esse primeiro momento, decidiram partilhar tudo, inclusive os salários
que cada um recebia em seus empregos. Esses valores entravam num caixa
comum que, depois de tirar o necessário para garantir a produção, deixava o saldo
a ser dividido por todos.
A gente já tinha definido isso aí. A partir do momento em que
fosse precisando, que iria saindo do serviço um por um. A gente
começaria por aqueles que ganhavam menos, e iria até o último
que era aquele que ganhava mais. Mesmo porque o salário que a
gente ganhava fora era dividido com o pessoal que estava dentro.
Era depositado todo o salário e feito média. (CAM)
Com o crescimento das vendas, tiveram que pensar numa estratégia para
superar a falta de capital. A saída encontrada foi comprar a matéria-prima a prazo,
e descontar as duplicadas com agentes financeiros para arcar com os
compromissos. Em menos de três meses, estavam produzindo 150 pares por dia.
Compra material, transforma em calçado, pega o cheque,
transforma o cheque em dinheiro, paga o material, compra outro,
transforma em calçado, transforma em dinheiro... até as coisas
equilibrarem. (MMS)
O sonho estava se tornando realidade muito rapidamente. O aumento da
produção, não previsto, exigiu que muitos deles trabalhassem de forma
21
Indústria Peroni, iniciada em 1990, produz 2.500 pares de tênis por dia.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
72
extraordinária o que gerou desgastes físicos e psicológicos.22 Avaliam que um dos
principais instrumentos para a superação dessa situação foram as reflexões e
confraternizações que realizavam.
Durante todo o processo de implementação das fábricas, o grupo mantinha
um cronograma de reuniões de formação e de reflexão, além de celebrações e
mesmo encontros recreativos que iam permitindo o amadurecimento da proposta e
solidificando os laços entre eles.
A idéia nossa, no início, era estabilizar os 12, e fazer como lá na
Alemanha, que junta o grupo, cresce até certo ponto, pára,
estabiliza, e começa a viver a vida. (RP)
O processo de admissão de outros sócios seria lento uma vez que implicaria
amadurecimento frente à filosofia de trabalho e aos objetivos do grupo. Visto que
as vendas aumentavam e havia dificuldades em formar rapidamente um novo
grupo, a saída encontrada foi a contratação de mão-de-obra. O processo
preparatório à incorporação de novos trabalhadores foi de muita discussão. As
primeiras reflexões estavam centradas no conflito entre uma decisão anterior de
que não teriam empregados e o entendimento de que o processo de formação de
novos sócios demandaria um tempo que a urgência da produção não permitia.
Num primeiro momento, os trabalhadores seriam contratados e, pouco a pouco,
seriam motivados para criar um novo grupo que trabalharia em parceria.
Mais do que uma decisão empresarial, a contratação de empregados foi
uma contingência – os pedidos eram maiores do que os sócios sozinhos poderiam
produzir e não havia tempo hábil para se pensar em um novo grupo.
Durante todo esse tempo, o grupo dialogava com as comunidades de base,
das quais participavam, fazendo depoimentos sobre suas conquistas, seus limites e
22
Estes desgastes se relacionavam com a sobrecarga de trabalho, e pela tensão de trabalhar com grande
volume de dinheiro, muito maior do que os valores que o grupo tinha, e o necessário endividamento para
garantir a produção.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
73
as dificuldades que enfrentavam... Esses depoimentos eram motivadores e
provocaram o surgimento de um segundo grupo que formou uma segunda
indústria comunitária: a Maic d’jol. Partilhando os mesmos ideais, o novo projeto
pôde apropriar-se da experiência acumulada pela Marc’ellsse. Entre os dois grupos
havia um processo constante de intercâmbio de experiências. Como parte desse
intercâmbio, um dos sócios da Marc’ellsse, foi emprestado para a Maic d’jol,
acabando por incorporar-se a essa nova empresa.
Precisavam de alguém que já tinha passado por aquilo, para ajudar
eles. Quem sabia mais, quem já tinha passado, quem estava
passando mas que já tinha feito uma vez, para resolver aquilo.
(MMS)
O sócio que se deslocou de uma para outra fábrica é um exímio modelador,
e, além disso, tinha interesse em participar da organização administrativa da
fábrica, o que não vinha sendo possível já que as tarefas de cada um eram bem
definidas. Desde o primeiro momento, o grupo acreditava ser muito importante
que todos conhecessem o processo inteiro, mas que deveriam estar locados no
setor em que tinham maior habilidade. Ao mudar-se para a Maic d’jol, MMS
almejava experimentar uma nova posição, atuando na organização ainda que
continuasse auxiliando na modelagem.
Em abril de 1994, as duas fábricas iam de vento em popa, os pedidos se
sucediam e a produção aumentava. Foi então, que, ocorreu uma tragédia.
A Marc’ellsse, a mais antiga das duas, estava com muitos pedidos para
produzir, o espaço estava pequeno e eles estavam atolados de material no
almoxarifado. Como não cabia mais embaixo, foi feita uma plataforma em cima da
sala da frente e sobre ela foi colocado o material, que ia até perto do telhado, pois
não havia mais local para estocar. Era uma época de calor, havia sido um dia
muito quente... com o aquecimento do telhado e a composição do material houve
atrito e foi produzida uma faísca que provocou um incêndio, que destruiu tudo. O
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
74
imóvel no qual a fábrica estava instalada era alugado e de propriedade da Pinókio
– Indústria e Comércio de Calçados Ltda.
Segundo a Perícia Técnica, houve combustão espontânea no
estoque de matéria-prima. O desespero tomou conta de todos ao
verem seus sonhos virarem cinzas. O que o fogo não destruiu,
destruiu a água. Perderam-se o estoque de matéria-prima, o
estoque de calçados já produzidos, e as máquinas todas tiveram
que passar por revisão. (MMS)
A fábrica estava segurada, e o prêmio foi utilizado para pagar a manutenção
das máquinas, algumas das quais tiveram que ser mandadas para o sul do país,
para que fossem feitas as reformas. O prejuízo foi muito grande, pois não houve
quem pagasse a reposição do material já produzido, a reposição da matéria-prima
e os dias parados.
Dos
pedidos
feitos,
alguns
foram cancelados, porque
alguns
dos
compradores não esperaram, preferindo comprar de outros fornecedores... Mas,
nem tudo foram dificuldades. Ao contar o ocorrido, apontam que a desgraça serviu
para mostrar que já haviam adquirido o respeito de pessoas da cidade. Muitas
pessoas vieram a eles para consolá-los, e rezar por eles. Houve alguns
empresários que se solidarizaram de maneira mais concreta. A Pinókio cedeu suas
máquinas [balancins]: como a jornada de seus trabalhadores terminava às 17:18
horas, ala permitiu que os trabalhadores da Marc’ellsse entrassem para produzir
das 17:30 horas em diante.
A matéria-prima para a produção também foi cedida por outras empresas
visto que não podiam pedir empréstimo a Banco, pois o que tinham como garantia
era apenas uma fábrica queimada. Empresários solidários compravam a prazo, por
eles, a matéria-prima. Os dois empresários que tiveram um papel mais significativo
nesse momento foram Ismael Varone, da Perone Indústria e Comércio de Calçados
Ltda., e Dorival Canassa, da Pinókio Indústria e Comércio de Calçados Ltda.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
75
Ressalte-se o significado destes fatos, que expressam a confiança depositada nos
jovens empreendedores, uma vez que estes não podiam oferecer garantias de
pagamento, após o consumo da matéria-prima emprestada.
Após o incêndio, foi necessário buscar um novo local, pois a reconstrução
do barracão antes utilizado pela fábrica seria muito demorada. Um novo local,
liberação pela companhia de energia elétrica, e ei-los recomeçando mais uma vez.
E estavam recomeçando em 1995, período no qual todo o setor de calçados
passava por dificuldades ocasionadas principalmente pela entrada no país dos
calçados importados da China, de custo bastante baixo, com grandes repercussões
no mercado.
No relato que fazem desse período apontam o incêndio como um momento
em que se fortaleceu a união do grupo. As dificuldades enfrentadas naqueles
primeiros anos tinham exigido maior empenho na produção dos calçados, deixando
em segundo plano os momentos de reflexão, celebração e mesmo de convivência
informal, o que, avaliam eles, causou uma certa dispersão face ao projeto inicial,
gerando atritos. Recomeçar exigiu a revitalização do entusiasmo dos primeiros
dias, e com isso o sonho foi retomado.
Foram grandes as dificuldades vividas pela Marc’ellsse: havia escassez de
pedidos e a situação era grave, mas a experiência vivida até então serviu para que
acreditassem ser possível vencer, pois tinham segurança no que faziam. Assim, na
busca da superação daquele momento, criaram novas estratégias para manter a
fábrica. Durante este período, o grupo se ocupou de tarefas diversas [construção
de casas, roça, vendas] e apenas dois ou três ficaram trabalhando dentro da
fábrica.
Ao avaliar aquele período, os sócios da Marc’ellsse mencionam a conjuntura
de crise do setor calçadista, mas consideram que, ao invés de procurar sobreviver
com base em atividades paralelas, como fizeram, deveriam ter buscado fazer um
diagnóstico dos produtos que ofertavam no mercado.
Além da conjuntura,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
76
apontam a necessidade de análise das causas intrínsecas sobre as quais,
geralmente, se tem a governabilidade.
Se nova crise ocorresse nos dias de hoje, sem dúvida, agiriam
diferentemente, buscando a resposta dentro da própria fábrica e não saindo para
fazer trabalhos dispersos na cidade.
O grupo da Marc’ellsse resistia à idéia de ter empregados e acreditava que
todas as pessoas tinham o mesmo sonho que eles. Assim, nos momentos em que
a produção exigiu a contratação de pessoas, isso foi considerado uma situação
provisória e essas pessoas eram trabalhadas o tempo todo para que se tornassem
independentes criando novos núcleos produtivos.
Fruto desse processo, surge, em 1996, a Greiffer, que foi formada por um
grupo de funcionários da Marc’ellsse que resolveu sair para montar sua própria
fábrica. Ao sair da Marc’ellsse, estes funcionários receberam, como gratificação
uma ou duas máquinas que constituíram seu capital inicial. Tanto as pessoas da
Marc’ellsse como da Maic d’jol ajudaram a orientar o novo grupo, inclusive
repassando pedidos quando eles estavam começando. Esta fábrica enfrentou
dificuldades e hoje está ativa, mas fazendo apenas produtos terceirizados.
Processo semelhante foi o da Marc shildrem que foi formada por
funcionários da Maic d’jol. A Marc shildrem funcionou de 96 a 99 e no momento
encontra-se paralisada.
Ainda em 1996, foi iniciada uma outra fábrica comunitária, a Dejalmy, cuja
proposta é semelhante. Inicialmente eram 15 pessoas, no processo algumas foram
desistindo e recentemente estavam com apenas cinco sócios. Como nas situações
anteriores, o capital veio da venda de bens pessoais. Um dos rapazes tinha uma
moto que, vendida, permitiu comprar uma máquina de meia coluna. A Dejalmy
cresce lentamente, mas de maneira sólida e estável.
As várias fábricas tiveram ritmos diferenciados de desenvolvimento.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
77
Quadro 2.1
Dados da produção diária das fábricas comunitárias
Birigüi – 1992/2000
Marc’ellsse
1992
1993
1º
2º
1º
2º
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
sem =
sem =
sem =
sem =
250
250
350
600
650
650
850
30
120
120
180
Maic d’jol
Dejalmy
Greiffer
Marc
shildrem
20
80
80
180
250
400
500
500*
50
100
120
120
250
400
20
70
150
150
150*
20
70
150
150
fechou
* TerceirIzado.
No Quadro 2.1, podemos ver dados da produção ano a ano das cinco fábricas
comunitárias.
Em todas elas há procedimentos comuns:
•
A dinâmica de produção é semelhante;
•
o maquinário e equipamentos utilizados têm as mesmas características,
muitas vezes sendo cedidos por uma das fábricas já em funcionamento
para aquela que começava;
•
a matéria-prima é comprada dos mesmos fornecedores, o que possibilita
negociar melhores condições de preço e pagamento;
•
os momentos de treinamento e formação dos trabalhadores são feitos
em comum;
•
nos primeiros tempos, quando uma das fábricas tinha mais pedidos do
que sua capacidade de produção, estes eram repassados para a fábrica
que estivesse com escassez de pedidos;
•
ao iniciar o empreendimento, os sócios que ainda permaneciam
trabalhando fora, punham o salário em comum, porque o que desse
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
78
para tirar de dentro da fábrica era somado com o que era recebido pelo
pessoal que trabalhava fora e dividido por todos. Ao mesmo tempo em
que atuavam profissionalmente nas fábricas, os grupos continuavam sua
militância junto à Igreja Católica.
Desde meados de 1994, uma articulação de grupos de base, potencializada
pela EPOP – Equipe Permanente de Organização Popular23 – voltava-se para a
questão da sustentação de grupos de geração de renda. Eram pequenas
confecções, bordadeiras, pequenos produtores rurais, artesãos, etc., e dentre eles
destacava-se o “grupo de Birigüi”. Como a maioria dos grupos tinha dificuldades
de comercialização, decidiram criar uma Rede que foi nomeada “Rede de
Experiências Econômicas Alternativas”. Esta Rede criava momentos de capacitação
para os grupos e realizou eventos a partir dos quais os produtos eram levados a
várias cidades, para comercialização. A FEPAL – Feira de Experiência de Produção
Alternativa – trouxe uma maior visibilidade aos grupos e, conseqüentemente, às
fábricas comunitárias de calçados.
O significado da comercialização do produto das fábricas comunitárias
nesses eventos sempre foi de pequeno porte; o que garantia a produção era o
trabalho de vendas, conforme citado anteriormente. No entanto, depoimentos dos
sócios atestam a importância do participar desses espaços devido à visibilidade nas
cidades da região e junto aos grupos de Igreja. Por outro lado, os organizadores
das Feiras consideravam que a participação do grupo de Birigüi nos eventos
garantia uma outra qualidade, uma vez que os outros grupos tinham mais
dificuldades em apresentar produtos que chamassem a atenção dos consumidores.
Na busca da melhoria das condições de vida, algumas pessoas ligadas à
Marc’ellsse (aquelas que não tinham moradia) cotizaram-se e compraram uma
área onde construíram suas moradias, pomar, horta, espaço para as crianças, ou
23
Grupo de assessoria, mantido pela Diocese de Lins (Igreja Católica), que atuava na articulação, apoio e
assessoria aos grupos de base.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
79
seja, uma pequena vila. As casas têm plantas diferenciadas por considerarem que
apesar da proposta comunitária, as necessidades são diferentes. Fazem
coletivamente apenas aquilo que consideram que precisa ser coletivo: água, luz,
esgoto, pomar, horta, etc.
A dosagem entre o que deve ser comum, por ser coletivo, e o respeito às
diferenças tem permitido uma certa autonomia dos sujeitos, sem que isso
signifique perda em relação ao projeto coletivamente construído.
Ainda que com um projeto semelhante, as várias fábricas comunitárias têm
tido desempenhos diferenciados:
Nunca cresce por igual porque tem a diferença das pessoas, a
estrutura das fábricas... (...) A Marc’ellsse foi um grupo
privilegiado, porque nós pegamos numa época em que nós
estávamos na Comunidade... Pegamos aquelas pessoas que
sonhavam firme e formamos um grupo bom. No caso da Maic d’jol,
também, nós conseguimos formar um grupo com maioria de
pessoas que participavam de movimento, então já tinham alguma
vivência nessa parte. E pegamos épocas menos piores. Aí está o
resultado de uma crescer mais rápido e outras mais devagar. Umas
começam com menos gente na experiência do calçado, outras não
têm ninguém que pense administração e modelagem, e isso atrasa
um pouco o crescimento. (MMS)
Ao fundar a Marc’ellsse o grupo pretendia desencadear um processo a partir
do qual surgiriam inúmeras pequenas empresas: queriam garantir espaços de
trabalho, nos quais a sobrevivência estivesse assegurada e onde se estabelecesse
uma relação de trabalho diferente daquela vivenciada nas fábricas tradicionais.
Essas empresas seriam articuladas, formando um grupo mais forte que pudesse
conseguir melhores condições de compra da matéria-prima, acesso a informações
sobre novas tecnologias e novidades do mercado, de modo a viabilizar cada
pequeno empreendimento.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
80
... As fábricas, normalmente, faziam intercâmbios de material;
quando faltava pedido para uma, a outra passava; havia também
empréstimo de máquinas. Então, já existia o intercâmbio.
Comprávamos materiais juntos. Aí a gente conversou na hipótese
de formalizar isso, formar a cooperativa de fato mesmo, no papel.
A gente conversou quase um ano em cima disso, fazendo estatuto,
fazendo essas coisas. (MMS)
Querendo consolidar esses intercâmbios entre as fábricas, é que toma corpo
a discussão de criação da COMPABI – Cooperativa Mista de Produção Alternativa
de Birigüi – cujos associados seriam os sócios das fábricas comunitárias. Da
discussão que precedeu a fundação da COMPABI participaram os quadros das
cinco fábricas, porém pouco antes do registro do Estatuto da Cooperativa, o
pessoal da Marc’ellsse decidiu retirar-se por discordar de algumas decisões do
grupo. Ao ser registrada, portanto, a COMPABI24 era formada pela Maic d’jol, Marc
Shildrem, Dejalmy e Greiffer. Poucos dias após, no entanto, antes mesmo de
começar a funcionar, o pessoal da Greiffer resolveu, também, retirar-se, tendo
ficado, portanto Maic d’jol, Marc Shildrem e Dejalmy.
O processo de constituição da COMPABI foi polêmico e mais desagregou do
que agregou. É consenso na direção das fábricas que, ao formalizar juridicamente
o intercâmbio que tinham, eles criaram um peso para as fábricas, porque cada
uma teria que disponibilizar pessoas que ajudassem no funcionamento da
cooperativa. Além disso, algumas pessoas viam o risco de que a cooperativa viesse
a tirar a liberdade de cada fábrica definir seu caminho.
Seja como for, é notório que a Maic d’jol perdeu muita vitalidade, pois seus
sócios assumiram mais responsabilidades na condução da COMPABI e isso parece
24
O Estatuto da COMPABI aponta os seguintes objetivos: Unir os participantes dos Grupos comunitários;
Administrar compras de matéria-prima e vendas dos produtos industrializados pelos grupos comunitários;
Promover cursos de capacitação técnica e qualitativa; Promover trabalhos sociais junto aos cooperados, bem
como creches, refeitórios, formação pessoal, plano de saúde, habitação entre outros; Promover a
conscientização política, social, profissional, cooperativista e comunitária; e Ser empreendimento
economicamente eficaz, de autogestão, onde os cooperados tomem as decisões. O Estatuto define, ainda, que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
81
ter interferido no funcionamento da fábrica, que se encontra numa situação de
fragilidade difícil de ser superada.
As fábricas comunitárias são bem conceituadas pelos moradores da cidade,
assim como nos meios empresariais e dos movimentos populares. Alguns dos
sócios têm participado com outros micro-empresários e com representantes de
sociedades amigos de bairro da União das Comissões Amigos de Bairro com as
Micro-empresas. A primeira iniciativa posta em prática, União das Associações de
Moradores – UNAM, foi uma articulação das várias Associações de Moradores que
se reuniu e escolheu uma diretoria comum. O objetivo principal era o combate ao
desemprego na cidade. Posteriormente, as fábricas comunitárias se juntaram à
UNAM.
Dentre as propostas da UNAM, destaca-se a criação de um mini-parque
industrial. Discute-se com a Prefeitura a utilização de um espaço à beira da estrada
que possibilitaria a construção de 20 pequenas fábricas, e mesmo um minishopping. Um mini-parque industrial ampliaria as vendas e possibilitaria às
pequenas empresas construírem suas fábricas, já que a maioria funciona em
imóveis alugados. Em médio prazo, essa providência baixaria o custo de produção,
possibilitando a ampliação das fábricas e conseqüentemente a criação de novos
empregos. Em curto prazo, geraria empregos na Construção Civil.
Além disso, propuseram à Prefeitura que estude incentivos para as
indústrias da cidade, pois várias indústrias têm sido procuradas por administrações
de cidades próximas com promessas de cessão de terrenos, de construção a baixo
custo e de isenção de impostos por 10 anos.
À medida que fui me aproximando do objeto de estudo e conhecendo sua
complexidade, foi preciso fazer uma opção metodológica: para uma análise mais
detalhada, seria conveniente restringir o universo estudado.
a COMPABI vai articular-se com outras organizações, apoiando iniciativas de ação e organização social, rural e
urbana, e promovendo a solidariedade entre as pessoas e grupos.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 2
82
Por isso, decidi concentrar-me no estudo da Marc’ellsse. Sendo a mais
antiga das fábricas comunitárias, pode ser considerada a pioneira dentre este tipo
de empresas, e foi no dia-a-dia de seu processo que foi amadurecendo esta nova
relação de trabalho, refletindo os caminhos a serem seguidos, fazendo diversas
experimentações e tendo que decidir empiricamente quais as melhores saídas. Sua
história permite o acompanhamento desse processo. Esta fábrica comunitária
iniciou, no ano 2000, um processo de exportação de seus produtos.
O próximo capítulo focará o olhar na forma de organização da produção da
Marc’ellsse, uma vez que se constituiu num aspecto essencial para compreensão e
análise desta experiência.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
Capítulo 3
A DINÂMICA DE PRODUÇÃO DA
MARC’ELLSSE
83
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
84
Como já apontado no Capítulo 1, a Igreja Católica, a partir da Conferência
dos Bispos da América Latina, realizada em Medellin, na Colômbia, passou a
orientar seus agentes para um trabalho voltado a uma tomada de consciência da
exploração sofrida, fazendo surgir no meio popular as Comunidades Eclesiais de
Base [CEBs], espaços de experiência comunitária, participativa e de renovação
religiosa-cultural que tinham como características mais importantes:
•
O aspecto educativo-cultural que, opondo-se à massificação e
manipulação cultural impetrada pela ditadura e pela burguesia,
atacou na raiz o autoritarismo e a cultura da dominação que vinham
desde as origens da colonização;
•
A experiência de democracia dentro dessas organizações, onde eram
partilhadas as tarefas e responsabilidades, mas também a tomada de
decisões.
Neste
sentido
havia
um
trabalho
significativo
na
recuperação do valor, do poder e do uso da palavra e na capacitação
de todos para assumir seu lugar na sociedade e na organização
desses núcleos que se propunham a intervir politicamente.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
85
No capítulo precedente foi evidenciado que a motivação alimentada na
participação em Comunidades Eclesiais de Base, associada ao “espírito de
aventura” próprio da juventude incitou um grupo de jovens a construir um projeto
que concretizasse seus ideais e ao mesmo tempo possibilitasse sua sobrevivência
material. Os membros do grupo eram jovens, a maioria solteiros. Talvez, naquele
momento, mais do que construir o futuro, buscassem viver uma aventura:
A gente falava que sim, vai dar certo, mas era uma aventura. A
gente não pensava minha vida vai ser isso aqui [...] de início a
gente não tinha isso na cabeça não.(EER)
A experiência profissional acumulada e a vocação da cidade onde viviam
foram determinantes na opção pela produção de calçados.
3.1. Proposta inicial
Para analisar a dinâmica produtiva da Marc’ellsse, é necessário retomar
alguns aspectos já abordados no Capítulo 2. Em depoimento fornecido a
Vedovotto, JCM afirmava:
Produzir calçado de forma comunitária, que tivesse função social,
protegendo os pés dos consumidores, e que, ao mesmo tempo
garantisse a sobrevivência digna e honesta, pelo trabalho,
fortalecendo a experiência de vida comunitária, em que tudo
pudesse ser partilhado: lucro, prejuízo, alegria, dificuldades,
conhecimentos, idéias e até mesmo os sonhos de cada um.
(Vedovotto, 1998:82)
Este foi o objetivo construído pelo grupo de 12 jovens que decidiu iniciar o
primeiro de uma série de empreendimentos que denominaram de fábricas
comunitárias.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
86
3.1.1. Fábrica comunitária
A fábrica de calçados (tênis) que é objeto deste estudo foi nomeada por
seus membros como fábrica comunitária. Isto nos remete ao conceito de
comunidade: pode-se dizer que a discussão “foi gestada, inicialmente, no período
de transição da sociedade feudal para a sociedade burguesa. Os principais
intelectuais da época, diante das enormes transformações que se operavam pelo
advento e hegemonia do capital cunharam a categoria de comunidade como
expressão do tipo de relações sociais que se tinha no primeiro momento, buscando
contrarrestar com o novo tipo de relações sociais que se iam afirmando, à base de
contrato e dos interesses estabelecidos à base da troca, a partir da venda de
mercadorias, típicas da sociedade burguesa.
Comunidade e sociedade, então, eram categorias que expressavam dois
tipos de organizações sociais” (Simões, 1998:16). A partir deste entendimento,
comunidade é o local onde as pessoas estão associadas e têm laços orgânicos.
Ancoradas
nessa
relação,
as
pessoas
se
ajudam
mutuamente,
pensam
coletivamente e buscam a melhoria de todos. Segundo Tönnies, os homens se
associam quando estabelecem relações positivas; esta vontade de associar-se, que
é a base para qualquer associação, é subjetiva (pessoal); e leva as pessoas a
agirem de forma homogênea tanto externa quanto internamente.
O conceito de comunidade foi se modificando no tempo sob a influência das
diferentes matrizes teórico-metodológicas. Nas tendências epistemológicas em que
prevalece, por exemplo, a noção de processo, a concepção de comunidade pode
ser entendida como processo histórico em que indivíduos e grupos assumem
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
87
identidade referida ao coletivo. Nesta acepção é o sentido de coletivo que se
sobrepõe ao de comum.
Juridicamente, a fábrica é uma sociedade comercial de capital limitado, cujo
patrimônio é constituído pela participação financeira, mobiliária e imobiliária dos
sócios, doações, empréstimos e financiamentos, além da capitalização nas
operações mercantis. Seu capital encontra-se distribuído igualmente entre os doze
sócios que coordenam a produção, atuando cotidianamente na linha de
montagem. Atente-se para o fato de que as retiradas dos sócios, enquanto prólabores, representam valor muito próximo daquele que é pago como salário aos
trabalhadores.
Sua área de atuação é a produção de calçados tipo tênis que são
comercializados em vários estados brasileiros, estando em andamento um
processo de exportação de seus produtos para o exterior. A direção técnica da
fábrica está em mãos dos sócios (detentores do capital) que criaram um desenho
organizacional no qual se situam estrategicamente nos diversos pontos da fábrica,
atuando junto com os trabalhadores. É sistema de gestão em que os sócios
combinam a visão ampla da produção com visões específicas necessárias à tomada
de decisões relativas ao funcionamento de cada um dos setores. Nas atividades
que objetivam aprofundamento sobre novas tecnologias, os sócios se fazem
acompanhar de trabalhadores da fábrica de modo a garantir que os estudos sejam
feitos considerando a ótica de quem está na linha de produção, além de garantir a
circulação de informações entre os trabalhadores.
Poder-se-ia fazer um paralelo desta forma de organização e gestão com o
que Marx chamou de “sociedades por ações”
No século passado, Karl Marx, no seu O Capital, já via nas
sociedades por ações os fundamentos técnicos-formais de um novo
modo de produção, que integra o “trabalhador coletivo” tornando
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
88
obsoleta a direção do capitalista. Em outros termos, a estrutura
das sociedades por ações redefiniu o capitalismo como modo de
produção,
às
custas
da
exclusão
do
capitalista
enquanto
propriedade e direção personalizadas. Por isso Marx enunciara que
sob a ótica capitalista o lucro aparece como fruto do trabalho do
capitalista, e ele, como trabalhador, fazendo jus ao que Marx
denominara “salário de superintendência”. Esse tipo de salário
aparece em qualquer estrutura que se funde no antagonismo de
classes. (Tragtemberg, 1989:9)
As fábricas comunitárias aqui estudadas não se configuram como
sociedades por ações – juridicamente são sociedades comerciais de capital limitado
– porém, vale salientar, da citação acima, a referência ao “trabalhador coletivo”
que, segundo Marx, torna obsoleta a direção do capitalista, excluindo-o enquanto
propriedade e direção personalizadas. Na Marc’ellsse, como nas outras fábricas
que seguem seu modelo de gestão, há uma integração não apenas do capitalista
com o diretor/controlador da produção, mas destes com o trabalhador, pois estes
controladores estão alocados na linha de produção. Neste sentido, seus salários
não podem nem ao menos ser considerados salários de superintendência, pois são
remunerados por seu trabalho na produção.
Em termos clássicos, há nas empresas três tipos de papéis: o acionista, o
executivo e a força de trabalho. Detentores do fator Capital, os acionistas
assumem todos os riscos, recebendo em troca algumas compensações relativas e,
talvez alguns benefícios de poder. Os executivos, contratados para a tomada de
decisões, devem garantir os interesses dos acionistas. E os trabalhadores que, pela
venda de sua força de trabalho, garantem o funcionamento da empresa.
Nestas fábricas comunitárias, os meios de produção são propriedade de
alguns trabalhadores, num processo em que eles próprios estavam desejosos e
habilitados a assumir o controle dos meios de produção. Por esta condição, estes
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
89
trabalhadores vivem os três papéis, por vezes em diferentes momentos, e às
vezes, até mesmo concomitantemente, tendo que conviver com os conflitos
existentes entre eles.
Tragtemberg aponta que o grande obstáculo para a realização de idéias
como esta é a participação operária nas decisões da empresa:
Segundo os ideólogos das grandes corporações, o problema é
evitar que o trabalho usurpe as funções de poder gerencial
legitimadas. Enquanto isso, sob o impacto do desemprego
tecnológico, os operários procuram vincular-se à fábrica enquanto
“propriedade coletiva”. (Tragtemberg, 1989:12)
Imbuídos do espírito comunitário, os idealizadores destas fábricas têm uma
preocupação permanente com a formação dos trabalhadores e com a manutenção
de processo democrático de tomada de decisões. Ainda que a decisão esteja em
mãos da minoria diretiva que são os sócios, há um processo de consulta e de
discussão da dinâmica de produção que envolve o conjunto de trabalhadores.
3.1.2. O início da produção
O primeiro produto do grupo foi nomeado de “sapatinho de menina-moça” –
calçado infantil, fechado. A matéria-prima foi comprada em São Paulo, pois tinham
a informação que os preços da capital eram menores do que aqueles que
poderiam encontrar na cidade de Birigui, onde residiam.
O sapatinho de menina-moça não vendeu, encalhou e com as
dívidas acumuladas bateu o desespero na maioria porque eram
pessoas que viviam de salários baixos e de repente precisavam
administrar um prejuízo considerado impagável para alguns.
(Vedovotto, 1998:82)
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
90
Meses depois, no início de 92, foi iniciada a produção do tênis infantil,
marca FK-12. A lição aprendida com o primeiro produto levou-os a uma nova
estratégia: produziram apenas um mostruário que foi colocado nas mãos de um
experiente vendedor do setor de calçados e aguardaram as vendas antes de iniciar
a produção. Nas primeiras semanas, as vendas do novo produto extrapolaram as
previsões, indicando que a empresa poderia ter sucesso.
A proposta inicial foi a constituição da fábrica como uma sociedade limitada.
A sede inicial foi instalada em dois cômodos construídos no fundo do quintal dos
pais de JCM. O valor arrecadado pelo grupo – FGTS de um e venda do carro de
outro – era suficiente apenas para a compra de uma máquina de costura e de
ferramentas.
As necessidades foram superadas com esforço e criatividade. Em seus
depoimentos, contam que improvisaram uma frizadeira com um motor de
liqüidificador e construíram artesanalmente uma prensa de madeira. O corte das
peças era feito com estiletes, a partir de moldes em papelão.
Nesse primeiro momento os produtores eram os próprios sócios que tinham
experiências em setores diversos da produção de calçados e assim se dividiam
como modeladores, cortadores, pespontadores e montadores. Cada sócio
participava com seu trabalho e conhecimento.
A maior dificuldade foi a obtenção de crédito para compra da matériaprima; o apoio para superá-la veio de Ismael Varoni, proprietário da Peroni –
Indústria e Comércio de Calçados Ltda., que além de incentivador, colocou seu
nome à disposição do grupo, servindo de referência para ele junto aos
fornecedores.
Certa feita fomos até a K & B, de Mauri Oliveira, buscar matériaprima e demos Ismael como referência. Ao ver uns garotos de
camiseta, alguns com chinelo de dedo, Mauri não acreditou e ligou
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Capítulo 3
91
imediatamente para Ismael. Só depois disso conseguimos o
material e o crédito.(Vedovotto, 1998:83)
A compra da matéria-prima a prazo – saída encontrada para superar a falta
de capital – imprimia uma velocidade maior à produção.
“Compra material, transforma em calçado, pega o cheque, transforma o
cheque em dinheiro, paga o material, compra outro, transforma em calçado...” –
desta forma, Mauro explica a dinâmica inicial para fazer frente à falta de capital.
As vendas eram feitas para pagamento 30 dias após a entrega. A duplicata,
ou cheque pré-datado, era trocada em agentes financeiros informais de modo a
possibilitar o pagamento da matéria-prima comprada com prazo de 45 dias.
Qualquer atraso na produção ocasionaria uma falta de caixa para respeitar o
compromisso assumido com os fornecedores, o que geraria uma perda do crédito,
a conseqüência disso era uma jornada de trabalho extensiva.
Dentro da pequena fábrica, desde esse primeiro momento, está muito clara
a cooperação baseada na divisão de tarefas: corte; colagem e pesponto;
montagem; expedição e administração. As vendas seguiam sendo feitas por aquele
primeiro representante, que vendia, cobrava e entregava a mercadoria.
Durante o ano de 199325, a produção teve um crescimento de 50% [120
pares/dia em janeiro e 180 pares/dia em dezembro]. O cumprimento dessa tarefa
foi possível devido à extensão das jornadas de trabalho e os próprios sócios deram
conta de toda a produção.
25
Ainda neste ano, surge a segunda fábrica comunitária - a Maic d’jol, que realizava uma produção inicial de
20 pares/dia.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
92
3.2. A busca de um sistema de gestão·
Integração grupal, crescimento pessoal e profissional,
visando à satisfação e bem-estar de todos, com responsabilidade
de crescer com qualidade, projetar o sucesso de nossa marca onde
identificamos nossa existência. (Missão da Marc’ellsse, 2000)
3.2.1. Autogestão
O propósito da Marc’ellsse era a constituição de experiências coletivas de
trabalho e produção nas quais trabalhadores, visando à preservação de seus
postos de trabalho, assumiam uma postura pró-ativa, empenhando-se na
formação de empresas autogeridas e co-geridas.
Ultimamente, a idéia da autogestão tem estado presente no debate público
nacional e internacional.26 Não se pode considerar, no entanto, que a autogestão
seja uma novidade da década de 1990: ela é tão velha quanto a própria empresa
industrial. Segundo Vieitez (1997:27)
Hoje, ela volta ao cenário em função, basicamente, das
experiências denominadas de economia social, terceiro setor e
cooperativismo de trabalho, que apresentam uma vitalidade
impressionante nas economias da Europa Ocidental e Estados
Unidos.
26
Segundo dados da SERT (1998:9), em 1998, as cooperativas brasileiras eram responsáveis por 75% do
trigo, 40% do açúcar, 32% do álcool, 37% da soja, e 41% da cevada produzidos no país. São elas ainda as
responsáveis por 43% das exportações brasileiras de lã e derivados, por 53% do leite inspecionado, 25,5% do
leite em pó integral, 42% do leite desnatado, 50% da manteiga, 35% do queijo e 40% do iogurte produzido
no Brasil e ainda de 23% da capacidade nacional de armazenamento de grãos.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
93
No Brasil, muitas dessas empresas autogeridas e co-geridas são fruto de
falências, muitas das quais atribuídas à abertura do mercado interno, com câmbio
sobrevalorizado e altas taxas de juros:
São milhares de trabalhadores resgatando auto-estima e cidadania
que, hoje, detêm em suas mãos os meios de produção e o próprio
destino. Não são mais operários em construção. São cidadãos
brasileiros construindo a autogestão e garantindo o sustento de
milhares de famílias. (Anteag, 2000:3)
O BNDES considera que
Autogestão é um modelo administrativo no qual o controle da
empresa é exercido pelos trabalhadores. O objetivo principal é a
democratização do capital através de soluções coletivas para a
manutenção dos postos de trabalho, associada ao desenvolvimento
e ao crescimento empresarial. Os projetos de autogestão
destinam-se aos trabalhadores organizados, na sua maioria em
associações ou cooperativas nos setores industrial e de serviços.27
Segundo Rech (1995) este “trabalhar junto” era visto como um embrião de
uma nova sociedade onde os trabalhadores estariam livres do jogo do capital,
podendo mesclar interesses pessoais e coletivos.
Não se trata aqui apenas do aumento da força produtiva individual
por meio da cooperação mas da criação de uma força produtiva
que tem de ser, em si e para si, uma força de massas. [...]. O
trabalho individual de cada um pode ainda assim representar,
como parte do trabalho global, diferentes fases do próprio
processo de trabalho, as quais o objeto de trabalho percorre mais
rapidamente em virtude da cooperação. [...] Por outro lado, ocorre
combinação de trabalho quando, por exemplo, uma construção é
27
Texto extraído de: www.bndes.gov.br/atuar/cogestao.htm.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
94
iniciada ao mesmo tempo, de vários lados, embora os que
cooperam façam o mesmo ou algo da mesma espécie.(Marx,
1985a:260)
A idéia inicial da cooperação total foi inviabilizada em virtude da absorção
da idéia cooperativa pelo sistema capitalista, na medida em que a cooperação
vinculada ao capital tomou ares de uma empresa de características comerciais,
havendo algumas exceções em países com tradição cultural coletivista.
A ANTEAG – Associação Nacional dos Trabalhadores em Empresas de
Autogestão e Participação Acionária –, em seu folder institucional defende que a
autogestão é um “modelo administrativo onde as decisões e o controle da empresa
são exercidos pelos trabalhadores”. Trata-se de uma proposta por meio da qual os
trabalhadores “decidem sobre tudo: metas de produção, salários, políticas de
investimento e modernização, política de pessoal, mercado, etc.”. Segundo essa
concepção, prossegue o folder da Anteag,
a autogestão é a busca de soluções coletivas para problemas
sociais, em meio à crise industrial e o desemprego, por meio do
controle das empresas. É a participação direta e inteligente do
coletivo na tomada de decisões e no poder da empresa.
A autogestão contribui para a busca de saídas relativas a problemas
concretos de alguns grupos de trabalhadores, pois preserva postos de trabalho que
de outra forma estariam perdidos.
Este novo experimento social aponta para mudança radical que se encontra
em construção tanto do ponto de vista pessoal (dos trabalhadores) quanto nos
seus aspectos legais, de gestão e de organização da produção. Nesse processo de
mudança emergem aspectos que precisam ser constantemente aprofundados uma
vez que propõe:
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
•
Capítulo 3
95
uma nova relação entre propriedade e liberdade de ação – ainda que,
ao nível do discurso, os trabalhadores explicitem que “são os donos”,
ao inserir-se na cooperativa, a maioria deles se comporta como se
ainda tivesse “patrão”;
•
uma outra perspectiva de remuneração – além da esperança do vir a
ganhar mais, há um sentimento subjacente do “nunca mais ser
demitido” que gesta um sentimento de segurança;
•
uma co-responsabilização pelas decisões – que exige um apropriar-se
do todo do “negócio” e uma postura clara no definir os regimentos;
•
um equilíbrio orçamentário que permita a compra dos equipamentos
necessários sem esquecer a necessidade de remuneração justa para
os trabalhadores.
A autogestão implica um potencial novo que é a coesão entre os
trabalhadores: relação que se constrói apesar e a partir dos conflitos. Nesse
processo, as empresas autogestionárias têm provocado um efeito colateral que é
um aumento da participação de setores populares. Estes setores, que sempre
estiveram excluídos, demandam uma pedagogia nova a partir da qual apropriamse de tecnologias produtivas, adequando-as à sua cultura e ao saber popular,
iniciando a construção de um novo conceito: a economia popular solidária, que,
ainda que se integre e se comunique com a economia de mercado, mantém uma
certa autonomia por conter no seu interior uma outra lógica que é a lógica da
solidariedade e da democracia. Esta construção não se dá sem riscos como a
remuneração ficar muito baixa (pela necessidade de novos investimentos), haver
uma sobrecarga de trabalho (horas extras não remuneradas para superar
equipamentos desatualizados), o imobilismo na espera de subsídios e, até mesmo,
um certo desapontamento quando os benefícios e dividendos demoram a ser
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
96
distribuídos (muitas vezes pela sobrecarga ocasionada pelas dívidas da empresa
anterior28 que podem vir a ser eternas).
Segundo Paul Singer, em entrevista concedida para esta pesquisa (2000),
pontua que
a autogestão é a experiência mais revolucionária face ao
autoritarismo característico das relações de trabalho capitalistas.
Ela constitui um modo de produção distinto dentro do sistema
econômico dominado pelo capital e prenuncia uma economia
democrática, sucessora da atual.
Ainda falando sobre o significado das experiências de autogestão, Singer
pondera que elas
proporcionam a criação de postos de trabalho, mas em nível
inevitavelmente lento, pois exigem um processo de reeducação da
maioria dos trabalhadores. Dada a urgência em enfrentar o
desemprego em massa, a autogestão não substitui políticas de
desenvolvimento econômico que ensejam a reinserção de milhões
na produção e consumo.(idem)
A Marc’ellsse tem características híbridas de gestão, pois, ainda que
mantenha o estatuto jurídico de uma empresa limitada, construiu um sistema de
informações e um processo de tomada de decisões em que cada um dos
trabalhadores participa da decisão sobre metas de produção, salários, políticas de
investimentos, modernização e política de pessoal.
28
Muitos destes novos empreendimentos estão ancorados em empresas em situação pré-falimentar o que faz
com que estes trabalhadores tenham que dar conta da empresa em construção e dos compromissos herdados.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
97
3.2.2. A vinda de novos trabalhadores
O ritmo de crescimento iniciado em 1992 e 1993 manteve-se em 1994. A
produção de 1994, que se iniciara com 180 pares/dia, chega a 250 pares/dia no
final do ano. Para essa produção o grupo dos 12 já não era suficiente e foi
necessário incorporar novos trabalhadores.
Decidida a contratação das pessoas, havia uma segunda decisão a ser
tomada e essa era relativa à remuneração. Desde o princípio, os sócios se dividiam
cumprindo as diversas funções que a produção demandava e todos percebiam o
mesmo valor. Ainda que tivessem vindo de empresas onde estas funções são
remuneradas diferentemente, dependendo de sua complexidade, haviam decidido
que todos ganhariam igualmente e reforçavam isso dizendo que
se houvesse o cortador, mas não houvesse o passador de cola, o
sapato não saía pronto lá na frente, e nós não íamos faturar.
Então, não adianta você ter um cortador, ele jogar 50.000 pares
cortados lá na frente e ficar sem passar cola para continuar a
produção. [RP]
Sem considerarmos a criação de novos modelos [desenho, modelagem,
etc.] e nem a questão administrativa [compras, manutenção de estoque, etc.]
existem algumas tarefas profissionais que são imprescindíveis na produção de
calçados. São elas o corte das peças, a colagem, o pesponto e a montagem. No
mercado profissional, as funções de cortador e de montador são mais bem
remuneradas do que a função de pespontador. Evidentemente, os auxiliares
(montagem, corte, pesponto) ganham menos do que os responsáveis pela tarefa.
A função pior remunerada é a do colador.
A decisão da Marc’ellsse pela contratação de trabalhadores foi perpassada
por muitas discussões no âmbito dos doze sócios, em virtude de a proposta
original ser de um empreendimento em que não houvesse patrões nem
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
98
empregados, em que todos fossem responsáveis pela produção e pudessem
igualmente repartir os frutos do trabalho do conjunto das pessoas.
Tal decisão foi determinada pela impossibilidade de estabelecerem novo
processo de procura de mais sócios, pelo fato de pedidos estarem crescendo e ser
necessária uma ampliação imediata da produção.
O entendimento dos sócios, naquele primeiro momento, era que as pessoas
seriam contratadas imediatamente como trabalhadores da Marc’ellsse, mas com
elas seria feito um processo que possibilitaria a formação de um novo grupo, e,
portanto a criação de uma nova fábrica, onde, novamente, ninguém seria patrão
ou empregado, mas todos teriam igual responsabilidade na produção, cujos frutos
seriam divididos igualmente entre todos.
Segundo Marx (1978:81),
A força de trabalho de um homem consiste, pura e simplesmente,
na sua individualidade viva. Para poder crescer e manter-se, um
homem precisa consumir uma determinada quantidade de meios
de subsistência, o homem, como a máquina, se gasta e tem que
ser substituído por outro homem. Além da soma de artigos de
primeira necessidade exigidos para o seu próprio sustento, ele
precisa de outra quantidade dos mesmos artigos para criar
determinado número de filhos, que hão de substituí-lo no mercado
de trabalho e perpetuar a raça dos trabalhadores. Ademais, tem
que gastar outra soma de valores no desenvolvimento de sua força
de trabalho e na aquisição de uma certa habilidade.
A partir deste entendimento, e considerando a importância de cada uma das
funções na produção, o grupo propunha que os salários fossem iguais,
independente da tarefa que o trabalhador desempenhasse na produção. O salário
proposto era equiparado àqueles que eram pagos, pelas outras fábricas da cidade,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
para
os
trabalhadores
mais
qualificados
Capítulo 3
[cortadores].
Estas
99
condições
permaneceram por cerca de um ano, porém, desagradou aos trabalhadores. Os
cortadores (considerada a função mais especializada) – questionavam estar
ganhando o mesmo que as pespontadeiras ou coladeiras. De outro lado, as
pessoas que eram coladeiras de peça [a função mais simples que há na produção]
não tinham incentivo algum para empenhar-se em aprender outras funções, uma
vez que a remuneração não se alteraria se mudassem de função. Sobre isso, Marx
já pontuava...
Dentro de um sistema de salariado, o valor da força de trabalho se
fixa como o de outra mercadoria qualquer; e, como distintas
espécies de força de trabalho possuem distintos valores ou exigem
para
a
sua
produção
distintas
quantidades
de
trabalho,
necessariamente têm que ter preços distintos no mercado de
trabalho. Pedir uma retribuição igual ou simplesmente uma
retribuição justa, na base do sistema do salariado, é o mesmo que
pedir liberdade na base do sistema de escravatura. (Marx,
1978:81-82)
Interessante observar que não há uma distância muito grande de salários
entre as funções acima citadas29 e, no entanto, os trabalhadores apresentaram
resistências em receber o mesmo salário. Os relatos demonstram que os
trabalhadores reclamavam de seus salários, porém permaneciam na fábrica, pois,
na realidade seus salários eram superiores aos praticados pelo mercado local.
A reconstituição da história do grupo revela que também não é verdade que
todos os trabalhadores que vieram para a Marc’ellsse aceitaram o desafio de iniciar
uma nova fábrica. Dos 10 trabalhadores que foram contratados pela Marc’ellsse,
naquele primeiro momento, cinco se dispuseram a fazer a tentativa, e criaram a
29
Em setembro de 2000, a Marc’ellsse praticava os seguintes salários (mensais): Cortador = R$ 285 a R$ 416;
Montador = R$ 398; Pespontador = R$ 260 a R$ 321; Coladores = R$ 225; Auxiliar de Montagem = R$ 163 a
R$ 335; Auxiliar de Pesponto = R$ 215 a R$ 240. As variações dentro de uma mesma função estão referidas
ao tempo de trabalho.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
100
Greiffer, que funcionou alguns anos mas com muita dificuldade. Hoje, a maioria
dos sócios saiu de lá, alguns deles tendo voltado para suas funções anteriores na
Marc’ellsse, e o pequeno grupo que se mantém está fazendo apenas serviço
terceirizado.30
3.2.3. Crise nas vendas e diminuição da produção
O crescimento da estrutura de cada uma das fábricas representou sempre
um processo cuidadoso. Há preocupação do grupo com o ambiente da fábrica e
com o bem-estar dos trabalhadores, e, são muito cautelosos para não fazer
ampliações temporárias que levem num segundo momento a demissões.
O grupo encarregado da produção na Marc’ellsse era de 25 pessoas, treze
sócios e doze colaboradores, quando em 1995 eles tiveram um ano ruim em
vendas. A primeira providência foi a redução de jornada com redução de salários
para todos, de modo a não demitir ninguém. Num segundo momento, a situação
se agravou ainda mais e repetindo o que haviam feito no primeiro momento,
quando das dificuldades em relação ao primeiro produto, os sócios decidiram
buscar outros trabalhos [colheita de feijão, construção de casas, etc.] deixando
poucas pessoas encarregadas pela pequena produção que havia sido vendida31. As
pessoas que haviam sido contratadas no ano anterior foram convidadas a
acompanhar os sócios nessa empreitada, mas poucos aceitaram. Os que não
aceitaram, saíram da empresa e foram procurar sua sobrevivência em outro lugar.
O ano seguinte, 95, foi um ano difícil. Tivemos que fazer casa,
fazer horta... Faltou trabalho para todo mundo, aí nós optamos por
pegar casas para construir, acho que construímos umas três ou
30
A terceirização aqui apontada não é o trabalho por facção em que uma fábrica faz apenas uma parte do
produto. A Greiffer produz o calçado todo, do corte à montagem, mas a empresa que repassa o pedido a eles
se responsabiliza pela compra da matéria-prima e pela venda dos produtos acabados.
31
A Maic d’jol, fábrica irmã, procedeu da mesma maneira.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
101
quatro casas. Ficavam algumas pessoas aqui dentro fazendo o
sapato que vinha encomenda (...) e os outros trabalhando fora. Foi
assim até a coisa dar uma clareada, e voltamos todos para a
fábrica. (MMS)
Os salários recebidos nas distintas tarefas desempenhadas eram diferentes,
mas o acordo de partilha fazia com que aquilo que cada um ganhava fosse
colocado num caixa comum e redividido por todos, de forma igualitária.
Este hiato durou três meses. Após esse tempo, a produção foi retomada a
partir de um novo modelo de sapato que, apresentado ao mercado, reaqueceu as
vendas.
A interrupção da produção ensejou reformulações: rediscutiram as regras
relativas à forma de trabalho, à remuneração e ao vínculo dos trabalhadores com a
empresa. Naquele momento, ainda acreditavam que muitos trabalhadores
tivessem o mesmo sonho que eles e buscavam fortalecê-los por meio de atividades
de formação, nas quais refletiam o processo vivido e as lições aprendidas.
Ainda que juridicamente constituídas como sociedades comerciais de capital
limitado, as fábricas comunitárias, assim construídas, propõem que, entre todos as
pessoas que trabalham na fábrica, independente de seu vínculo com o
empreendimento, haja um relacionamento de cooperação.
O trabalho baseado na cooperação é definido por Marx: ”A forma de
trabalho em que muitos trabalham planejadamente lado a lado e conjuntamente
no mesmo processo de produção ou em processos de produção diferentes, mas
conexos, chama-se cooperação” (1985a:259).
Levando em conta os conflitos que haviam vivido no período anterior, em
que
muitos
não
aceitavam
a
igualdade
de
remuneração
para
funções
diferenciadas, foram criadas três faixas de salário, acompanhando os valores de
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
102
mercado. Essa decisão, tomada pelo conjunto dos 12 sócios, redundava numa
economia para a fábrica. Convencionaram que o excedente seria guardado para
fazer frente às folhas de pagamento nos períodos em que houvesse necessidade
de diminuição da produção por problemas nas vendas.
Ainda no ano de 199532, conseguiram retomar a produção de 250 pares/dia
na Marc’ellsse e 80 pares/dia na Maic d’jol.
O espaço de reflexão sobre os processos empreendidos e a socialização dos
avanços e das dificuldades propiciava trocas diversas entre as fábricas. Exemplo
disso foi a utilização, pelas várias fábricas, em sistema de rodízio, das primeiras
máquinas de bordar. O repasse de pedidos, quando uma tinha muito serviço e
outra estava ociosa e a compra conjunta de matéria-prima foram algumas das
ações concretas que apontavam a conveniência de um trabalho em rede.
3.3. A divisão do trabalho
A experiência da Marc’ellsse, e das fábricas que seguiram seu exemplo,
representa a concretização de um empreendimento onde a divisão técnica do
trabalho acompanha as exigências de mercado, ao mesmo tempo em que se
garante a convivialidade que se contrapõe à separação que geralmente ocorre e é
provocada pela divisão social do trabalho.
Dez anos passados da instalação da primeira empresa, a experiência aponta
a construção de um novo modo de trabalhar. O grupo tem buscado acompanhar
as evoluções da tecnologia do seu setor e, com isso, mantém uma divisão técnica
do trabalho avançada, com momentos de formação dos trabalhadores, atuando no
32
Foi neste mesmo ano que surgiu a terceira fábrica comunitária, com uma produção inicial de 50 pares/dia. A
Dejalmy – montada nos mesmos moldes – e que passou a atuar em parceria com as outras duas.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
103
sentido de que esta especialização não provoque distanciamento entre os
trabalhadores ou um olhar fragmentado da produção.
A preocupação com a formação e a constatação da baixa escolaridade da
maioria dos trabalhadores, levou à montagem de um curso de alfabetização que
funcionou durante alguns anos e foi reconhecido pelo MEC – Ministério da
Educação e Cultura.
Retomando aspectos importantes da trajetória do grupo, vale a pena
ressaltar que o que eles propunham, inicialmente, era um empreendimento onde
não houvessem empregados, onde todos fossem igualmente proprietários dos
meios de produção. Segundo Gorz (1989:17) “a propriedade coletiva dos
instrumentos pode significar que a comunidade se empenha em utilizá-los de
modo a promover relações sociais de convivência”.
Na construção das relações sociais de convivência, entenderam, desde o
princípio, a necessidade de divisão de responsabilidades pelas diversas funções
existentes na produção do calçado. Cada um deles conhecia o processo como um
todo, mas estava incumbido de uma parcela da produção, mantendo-se naquela
função para a qual tinha melhores habilidades. A unidade dos trabalhos
socialmente divididos buscava corresponder à experiência da cooperação, da troca,
de uma produção em comum de um resultado global.
Marx (1985a:275) afirma que:
As diferentes operações que são executadas alternadamente pelo
produtor de uma mercadoria e que se entrelaçam no conjunto de
seu processo de trabalho apresentam-lhe exigências diferentes.
Numa ele tem de desenvolver mais força, em outra mais
habilidade, numa terceira mais atenção mental etc., e o mesmo
indivíduo não possui essas qualidades no mesmo grau. Depois da
separação, autonomização e isolamento das diferentes operações,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
104
os trabalhadores são separados, classificados e agrupados segundo
suas qualidades dominantes. Se suas peculiaridades naturais
formam a base sobre a qual se monta a divisão do trabalho, a
manufatura desenvolve, uma vez introduzida, forças de trabalho
que por natureza só são aptas para funções específicas unilaterais.
O trabalhador coletivo possui agora todas as propriedades
produtivas no mesmo grau de virtuosidade e ao mesmo tempo as
despende de maneira mais econômica, empregando todos os seus
órgãos,
individualizados
em
trabalhadores
ou
grupos
de
trabalhadores determinados, exclusivamente para suas funções
específicas.
Podemos fazer um paralelo entre este modo de funcionamento e o
mecanismo que era utilizado no período manufatureiro onde o próprio trabalhador
coletivo era composto de muitos trabalhadores parciais.
Em vez do mesmo artífice executar as diferentes operações dentro
de uma seqüência temporal, elas são desprendidas umas das
outras, isoladas, justapostas no espaço, cada uma delas confiada a
um artífice diferente e todas executadas ao mesmo tempo pelos
cooperadores. Essa divisão acidental se repete, mostra suas
vantagens peculiares e ossifica-se pouco a pouco em divisão
sistemática do trabalho. Do produto individual de um artífice
autônomo, que faz muitas coisas, a mercadoria transforma-se no
produto social de uma união de artífices, cada um dos quais realiza
ininterruptamente uma mesma tarefa parcial. (Marx, 1985a:268)
Podemos dizer que a produção inicial na Marc’ellsse era praticamente
artesanal; por exemplo: o corte das peças era realizado com base em moldes
sobrepostos ao tecido e cortados com estiletes por um trabalhador que tinha
habilidade nisso; as máquinas de costura eram poucas e nem sempre totalmente
adequadas ao produto realizado; a montagem era manual. Dentre os sócios, havia
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
105
aqueles que eram bons modeladores, cortadores e montadores e havia aqueles
que vinham de outros ramos de trabalho e que, por isso, não tinham
especialização na indústria calçadista. Dentre eles, havia divisão do trabalho, mas
não havia hierarquia, pois consideravam que todas as tarefas eram igualmente
necessárias para que o calçado fosse produzido com qualidade.
Na Crítica da divisão do trabalho, Gorz (1989:23) alerta que
nem a hierarquia nem a divisão do trabalho nasceram com o
capitalismo. A divisão social do trabalho, a especialização das
tarefas é uma característica de todas as sociedades complexas e
não um traço particular das sociedades industrializadas ou
economicamente evoluídas; basta pensar na divisão do trabalho
em castas e na hierarquia que a acompanha, na sociedade
tradicional hindu. A divisão técnica do trabalho, tampouco, é
exclusiva do capitalismo ou da indústria moderna. A produção
têxtil, por exemplo, mesmo sob o sistema corporativo, era dividida
em tarefas separadas, cada uma controlada por especialistas. Mas,
como já dissemos, o artesão membro de uma guilda controlava o
produto e o processo de produção. O que devemos esclarecer é
por que a divisão do trabalho de tipo corporativo sucumbiu à
divisão do trabalho do tipo capitalista, na qual a tarefa do
trabalhador tornou-se tão especializada e parcelada, que ele não
tinha praticamente mais produto para vender e, em conseqüência,
devia submeter-se ao capitalista para combinar seu trabalho com o
dos outros operários e fazer, do conjunto, um produto mercantil.
Levaram mais de seis meses procurando pessoas que, com eles, aceitassem
o desafio de começar algo novo: um empreendimento no qual não haveria patrões
e empregados. Por esta proposta, haveria tarefas separadas que seriam realizadas
pelos sócios, além de um controle coletivo do produto e do processo de produção.
Eram doze e doze continuariam sendo, e produziriam aquilo que seus braços o
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
106
permitissem, sem a ambição de ir além disso. Conforme já explicitado, no início, as
tarefas foram distribuídas entre todos, e independente do grau de complexidade
delas, todos recebiam salários do mesmo valor.
Muito rapidamente, o grupo compreendeu que a empresa criada estava
dentro do sistema capitalista no qual ou se acompanha o ritmo do mercado ou se
sucumbe e morre. A aceitação do produto forçou o aumento da produção, o que
significou, necessariamente, a incorporação de novos trabalhadores num prazo
curto de tempo, e a manutenção de um ritmo acelerado na produção. Não havia
tempo de fazer o mesmo processo de seleção que buscasse identificar pessoas que
aceitassem o desafio de construir um paradigma novo; era preciso contratar
trabalhadores no mercado como o fazem as outras empresas.
Nas primeiras contratações, a Marc’ellsse apresentava uma proposta que se
diferenciava das de outras empresas em dois aspectos: a relação entre os
trabalhadores e sócios e a definição de que, independente do papel a ser exercido
na produção, a remuneração e as condições de trabalho seriam as mesmas. Não
apenas os trabalhadores das diversas funções tinham a mesma remuneração, mas
esta era igual à remuneração recebida pelos sócios do empreendimento. As regras
colocadas, também, eram iguais para todos.
O grupo procurava vivenciar uma igualdade de condições entre os
detentores dos meios de produção e os trabalhadores.
Durante os primeiros anos, os membros do grupo inicial partiam do
pressuposto de que todos os trabalhadores querem ser seus próprios patrões e
buscavam incentivá-los e mesmo dar condições para que eles formassem novos
grupos que começassem uma experiência autônoma.33
33
Vide, no capítulo 2 – Uma História Construída ao Trabalhar, o relato sobre o surgimento da Marc Shildrem,
Greiffer e Dejalmy.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 3
107
Alguns anos após a contratação dos primeiros empregados, a fábrica
redefine sua política de remuneração estabelecendo faixas de salários de acordo
com o tipo de função exercida na produção. A retirada dos sócios corresponde a
25% a mais do que a faixa de salário mais alta, sendo este valor fixo, ainda que
estes sócios façam horas a mais de trabalho, o que para os empregados
corresponde a horas extras.
3.3.1. A apropriação da riqueza
Para
distinguir
a
origem
do
acréscimo
de
produtividade
de
um
empreendimento como a Marc’ellsse, é preciso analisar sua estrutura e como se dá
no seu interior a composição orgânica do Capital. Para o entendimento da
estrutura da Marc’ellsse, vamos nos deter em três aspectos: sua dimensão, sua
complexidade e sua formalização.
Na identificação da dimensão, é necessário atentar ao fato de que a
Marc’ellsse é uma empresa limitada, sendo um empreendimento voltado para
produção final que é vendida em lojas sediadas em diversos estados. Tem doze
sócios e 78 trabalhadores, além do seu corpo de vendedores, que é autônomo.
Sua produção, totalmente comercializada (just in time), é da ordem de 800
pares/dia. Sendo seu ponto de equilíbrio alto, há a necessidade constante de
investimento para manutenção de sua marca no mercado. O valor apropriado por
seus proprietários pode ser visto como custo, tendo em vista a colocação de cada
um deles na linha de produção.
Não podemos deixar de considerar, no entanto, que os proprietários dos
meios de produção, ainda que não façam retiradas sistemáticas maiores do que os
trabalhadores, estão acumulando capital na medida em que a empresa cresce em
maquinário e equipamentos. Na verdade, a organização do processo de produção
está subordinada a uma determinação tecnológica e a uma outra social, que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
108
interferem nas condições concretas de trabalho. Estas determinações são
exteriores à esfera de produção imediata uma vez que “o imperativo tecnológico
que comanda a organização da produção opera em condições econômicas e
culturais, historicamente determinadas, segundo uma lógica e na base de uma
longa história” (Pignon e Querzola, 1989:126).
Outro aspecto da estrutura a ser evidenciado é o da complexidade. Tendo a
sociedade uma composição de doze sócios que atuam diretamente na linha de
produção, há certa descentralização do poder, ainda que haja linhas claras de
autoridade, uma vez que cada um deles está locado num ponto-chave da estrutura
produtiva. O corpo de trabalhadores é pouco estratificado, pois não há
encarregados, nem contramestres; os trabalhadores atuam a partir de tarefas,
numa divisão clara de responsabilidades. A produção do calçado implica algumas
funções especializadas (modelista, cortador, pespontador e montador) que atuam
de forma complementar.
Na Marc’ellsse há um diálogo permanente com os trabalhadores relativo aos
objetivos da produção e às normas e planejamento das atividades. Os
trabalhadores têm, permanentemente, acesso aos dados relativos ao pagamento
das obrigações tributárias, cujos comprovantes ficam afixados em quadro na sala
de produção.
No entanto, uma afirmação de Gorz (1989:14) nos leva a refletir sobre os
meios de produção:
ela [a fábrica] também não é do povo, se o trabalho, mesmo
favorecendo o desenvolvimento das faculdades corporais e
intelectuais, tem finalidades que não podem ser as de todos e
produz riquezas reservadas, por definição, a uma minoria.34
34
Neste trecho, ao autor sublinha “por definição”, apontando (em nota) que: “o desenvolvimento capitalista,
com efeito, progride modernizando os privilégios (‘Concorde’, TV a cores, casa com piscina, etc.) ao mesmo
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
109
Na experiência aqui analisada, esta relação capital/trabalho tem estado
amenizada, pois além de as decisões sempre serem tomadas com a participação
dos trabalhadores, a “riqueza” produzida não tem sido desagregada do
empreendimento, sendo feitas retiradas pelos detentores do capital em valores
correspondentes às tarefas empreendidas na operação direta na fábrica.
N’O Capital, Marx (1985a:171) pontua os papéis dos diversos fatores do
processo de trabalho, dizendo que:
As mesmas partes componentes do capital, que do ponto de vista
do processo de trabalho se distinguem como fatores objetivos e
subjetivos, como meios de produção e força de trabalho, se
distinguem, do ponto de vista do processo de valorização, como
capital constante e capital variável.
A composição orgânica do capital é a relação entre estes valores: constante
e variável e é a análise desta relação que nos permite analisar o como se dá a
apropriação da riqueza.
As sociedades aquisitivas – pré-capitalistas ou socialistas – criam
instituições graças às quais as coletividades determinam a taxa de
acumulação. Na sociedade capitalista moderna, a taxa de
acumulação é determinada principalmente pela grande empresa, o
truste. (Marglin, 1989:40)
O grande esforço da Marc’ellsse, em todos estes anos, tem sido a busca da
manutenção do seu “capital constante” próximo da média das empresas do seu
ramo de atividade. Por outro lado, não pode prescindir da manutenção de um
“capital variável” principalmente levando-se em conta que o setor de calçados
mantém uma produção embasada mais nos trabalhadores do que no maquinário.
tempo que a pobreza. À medida que a massa tem acesso aos bens outrora reservados à elite, esta tem acesso
a bens ‘melhores’, que desvalorizam os primeiros. O modelo de consumo capitalista baseia-se no princípio de
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Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
110
Ora, garantir o capital constante, por um lado, e o capital variável pelo outro,
mantendo-se dentro de preços próximos aos valores de custo da produção, mas
que permitem que seus produtos sejam competitivos no mercado. Isto coloca o
ponto de equilíbrio da empresa além da média do seu ramo produtivo, o que
diminui a margem de acumulação.
3.3.2. A hierarquia
A organização hierárquica do trabalho não tem como função social
a eficácia técnica, mas a acumulação. Interpondo-se entre o
produtor e o consumidor, a organização capitalista permite gastar,
para a expansão das instalações e melhoria dos equipamentos,
muito mais do que fariam os indivíduos, se pudessem controlar o
ritmo de acumulação do capital. (Marglin, 1989:41)
Ao pensarmos na hierarquia existente no empreendimento objeto deste
estudo, identificamos uma proximidade com aquela encontrada nas sociedades
pré-capitalistas, onde no ápice, como na base, encontrava-se um produtor. “O
mestre artesão trabalhava junto com o aprendiz, em vez de simplesmente indicarlhe o que fazer” (Marglin, 1989:43). Tratava-se de uma hierarquia linear, havendo
grande possibilidade de o aprendiz um dia chegar a companheiro, possivelmente a
mestre.
Em Birigüi, o grande desafio era introduzir essa proposta em uma sociedade
na qual as hierarquias são do modo capitalista, organizadas piramidalmente e a
mobilidade é muito pequena.
A proposta do grupo era a manutenção de pequenas empresas com cerca
de 12 a 13 pessoas e que poderiam servir como laboratório de que sairiam
que aquilo que é bom para todos não é bom para ti. O modelo de consumo comunista baseia-se no princípio
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Capítulo 3
111
pessoas que poderiam abrir novas fábricas nas quais se colocariam como
proprietários. O tempo mostrou a eles que nem todos têm o desejo ou as aptidões
para isso. Pouco a pouco, foram entendendo seu papel como empresários que
coordenam e mantêm uma produção que dá trabalho àqueles trabalhadores que
têm outras aptidões que não a empresarial. A origem do empreendimento e a
intenção do grupo se mantêm no sentido da construção de uma outra relação
entre todos os envolvidos na produção, independente do seu vínculo institucional.
Marglin salienta que
o artesão membro de uma corporação não estava separado do
mercado por um intermediário. Vendia igualmente um produto e
não seu trabalho, por conseguinte, controlava, ao mesmo tempo, o
produto e o processo de trabalho. (1989:43)
Com o advento das fábricas, no mundo capitalista, o controle da produção
saiu do produtor/operário e foi transferido para os capitalistas, que detêm tanto o
controle do produto quanto o controle do processo de produção. “A função da
hierarquia de fábrica, em última análise, é subtrair ao controle operário as
condições e as modalidades do funcionamento das máquinas, tornando a função
de controle uma função separada” (Gorz, 1989:83).
Na Marc’ellsse os trabalhadores participam da organização do processo de
trabalho. Exemplificando, pode-se citar a consultoria voltada para a melhoria da
qualidade que está sendo acompanhada por dois diretores e um grupo de
colaboradores. A partir deste modo de ordenar a fábrica, a satisfação dos
trabalhadores é sempre considerada quando são propostas modificações que
objetivem um aumento da produtividade ou melhoria do produto. Um dos sinais
deste modo de funcionar é a inexistência de encarregados ou contramestres. Cada
equipe de trabalhadores tem tarefas que vão sendo expressas num quadro que
oposto: só é bom para mim o que é bom para todos”.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
112
torna visível para o conjunto dos trabalhadores como o processo de produção está
se desenrolando.
As mudanças implementadas em nome de uma maior eficácia tecnológica35
têm sido discutidas com o conjunto dos trabalhadores. Neste entendimento, não
basta que um novo método seja eficaz em termos de uma maior produção diária
se ele exigir mais horas de trabalho, um esforço mais intenso ou condições de
trabalho mais desagradáveis.
3.4. O sistema de produção
Os sócios das fábricas comunitárias têm uma vivência de militância em
comunidades eclesiais de base e em movimentos populares e sindical. Desde o
primeiro tempo das fábricas comunitárias, eles mantiveram as portas de suas
fábricas abertas ao movimento sindical e buscaram dialogar com o sindicato
patronal, e pouco a pouco foram se introduzindo no diálogo empresarial local.
Segundo Mestriner, num primeiro momento essas fábricas comunitárias
causaram um certo estranhamento entre os empresários, mas hoje eles “já
mostraram que têm competência, que fazem um trabalho fantástico, e são bem
aceitos na comunidade empresarial”.
Quando presidente do sindicato patronal, preocupou-se com o acesso de
suas filiadas a informações que permitissem melhorar a performance das
empresas. Assim, o sindicato deu atenção diferenciada às pequenas empresas por
entender que as grandes empresas têm menos dificuldade de acesso a
informações e conhecimentos. “As pequenas, de menor porte assimilaram bem a
35
Um método é considerado tecnologicamente eficaz se não existir nenhum outro que lhe seja superior. Em
termos econômicos, é eficaz aquele método que custa menos independente de outras circunstâncias.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 3
113
idéia e ganharam conhecimento com todo esse trabalho que a gente procurou
fazer”, diz ele.
A primeira etapa desse processo levou pouco mais de um ano [maio de 96 a
junho de 97] e envolveu, além do sindicato patronal, a prefeitura de Birigüi, o
Sebrae/SP – agência Araçatuba, e a Fundação Cristiano Otoni.
Mais de 500 pessoas participaram de palestras iniciais, e 32 empresas
aceitaram o desafio colocado pelo sindicato patronal: abrir sua dinâmica de
produção para que fosse vista e analisada pelas outras empresas, num processo
de socialização das conquistas e dificuldades que objetivavam levar ao
aprimoramento da dinâmica de produção. Estas 32 empresas foram divididas em 3
grupos. A Marc’ellsse estava no grupo 1 e a Maic d’jol no grupo 2.
O processo consistiu na
apresentação do histórico da empresa, discussão das metas a
alcançar, visitas às fábricas, mesas redondas e sugestões a serem
aplicadas na unidade visitada. Ao mesmo tempo, o Sindicato
Patronal providenciou a filmagem de todas as fábricas envolvidas
no programa para que pudessem acompanhar no tempo a
evolução das melhorias. (Vedovotto, 1998:111)
Em seus relatos, os sócios da Marc’ellsse e da Maic d’jol dizem que é muito
interessante a comparação da realidade documentada nos vídeos (1996) e aquela
que vivem hoje. “Não dá para acreditar que nós trabalhávamos daquele jeito”, diz
MMS.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
114
3.4.1. Primeiro momento [1994/1996]
A Marc'ellsse iniciou suas operações de forma artesanal, cortando as peças
com estilete, utilizando apenas uma máquina de costura e as máquinas
construídas artesanalmente para substituir a frizadeira e a prensa.
Para definir as etapas necessárias à produção do tênis, o grupo se baseou
em sua experiência de trabalho em outras fábricas de calçado. Como eram
profissionais competentes, não tiveram dificuldades em estabelecer o “modus
operandi”. Pouco a pouco, cada um deles deveria se assenhorear das várias fases
do processo ainda que se mantivesse como especialista numa delas. O desafio era
estabelecer um relacionamento fraterno, em que as decisões seriam discutidas
amplamente e as condições de trabalho teriam um peso significativo, ainda que
subordinadas às necessidades da produção.
Com o crescimento da Marc’ellsse, e o surgimento de outras fábricas
comunitárias foi comprado o primeiro balancim [máquina de corte] que passou a
cortar peças para as diversas unidades. Dois modelistas se revezavam criando
modelos para as três fábricas. Com o passar do tmepo, cada uma das fábricas foi
comprando suas máquinas e preparando seus trabalhadores e sócios para a
execução de todas as tarefas de modo a serem independentes umas das outras,
mantendo uma relação de parceria entre si.
Na reconstituição da história do grupo sujeito desta pesquisa, como vem
sendo analisado, é forte a presença da doutrina cristã, principalmente quanto à
divisão dos bens. Nestes dez anos, a partilha tem sido algo que perpassa o
cotidiano das fábricas. Há um olhar atento às necessidades de cada grupo em cada
momento e uma disponibilidade em contribuir para o equacionamento das
situações que se apresentam.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
115
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Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
116
O processo que começou a ser desencadeado sem grandes regras, no qual
a convivência e o bom senso dirimiam as diferenças entre os doze, foi se tornando
complexo no decorrer do tempo, principalmente pela incorporação de um número
significativo de trabalhadores. Pouco a pouco algumas regras foram se impondo no
dia-a-dia da fábrica. À primeira vista, a Marc’ellsse pode ser entendida como uma
empresa familiar, pois há cinco casais dentre os doze sócios e muitos dos
trabalhadores da fábrica são aparentados entre si e com os sócios. No ambiente da
fábrica, estas condições parecem não interferir nas relações entre trabalhadores e
entre estes e os sócios na medida em que as regras são claras, não havendo
privilégios e sim uma consideração por igual que busca levar em conta as
necessidades de cada um dos trabalhadores.
3.4.2. A atual configuração do sistema de produção
Desde sua formação, o grupo tinha uma preocupação com as relações entre
as pessoas e pretendia estabelecer um sistema democrático no qual o poder seria
dividido entre os detentores do capital e os trabalhadores, procurando trocar as
relações de mando e obediência por relações de companheirismo e compromisso
com a atividade-fim.
A reformulação da produção (Figura 3.1) proposta em 1996, coincidia com a
preocupação existente entre os sócios da Marc’ellsse, pois desde a criação da
fábrica estavam em busca de um sistema de administração democrático que
valorizasse cada um dos trabalhadores enquanto pessoa responsável e capaz de
críticas construtivas.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
117
Figura 3.1 – Esquema básico do sistema atual de produção da Marc’ellsse
Definição do Modelo
*
Produção do Mostruário
não
*
Compra de
matéria-prima
Corte das
sim
peças
Bordar?
Bordar
não
Colar
Costurar
Fechar
peça
Não
a
*
Obs.: o processo de Cola e
Pesponta ocorre várias vezes,
indo e vindo de um trabalhador
para outro.
Modelar
*
Montar
*
Controle de
qualidade
Expedir para
vendedores
Entregar e
*
cobrar
*
As * indicam os pontos nos quais os sócios
estão locados.
O centro da filosofia do Controle de Qualidade é mobilizar e canalizar toda a
inteligência, todo o potencial colocando-os a serviço da empresa. Após vários anos
de aplicação no Japão, o “5 S”36 chegou ao Brasil em 1991. A partir desta
36
O “5 S” é um sistema organizador, mobilizador e transformador de pessoas e organizações abertas à
filosofia da qualidade. São cinco as palavras japonesas que deram origem a esse nome: seiri, seiton, seisou,
seiketsu e shitsuke que significam utilização, ordenação, limpeza, saúde e autodisciplina. Segundo Silva
(1996a:22), “No Japão, o sistema ou programa 5 S foi formalizado no ambiente empresarial no início da
década de 50, apesar de sua longa existência informal como fundamento da educação moral daquele país.
Tendo sido introduzido nas empresas japonesas para acabar com o trabalho forçado, o sistema foi
redescoberto em países como Taiwan e Cingapura na década de 80 e considerado uma excelente maneira de
se comunicar, pronta e eficazmente a idéia de qualidade como um hábito, e não como um mero ato”.
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Capítulo 3
118
proposta, mais do que definir regras que busquem a produtividade, as
organizações procuram trabalhar as condições para que ela ocorra. Assim, os
dirigentes das empresas devem “criar uma atmosfera na qual seus trabalhadores
gostem de trabalhar” (Silva, 1996a:20).
Nesta ótica, é fundamental que a fábrica tenha um ambiente de ordem e
tranqüilidade, que as tarefas estejam distribuídas eqüitativamente num ambiente
onde impere o diálogo que permite a comunicação dos desejos e onde as idéias de
cada trabalhador sejam valorizadas de modo a que se consiga trabalhar em equipe
na busca do objetivo final.
Esta busca da qualidade deve atender a diversos interesses que podem ser
agrupados do seguinte modo:
•
Interesses dos empregados – remuneração condizente com o trabalho
executado, condições de trabalho adequadas, respeito aos ideais e sonhos
de cada um, em especial aqueles voltados para a auto-expressão e o
consumo;
•
Interesses dos acionistas – retorno de seus investimentos;
•
Interesse da sociedade – compromisso e responsabilidade social;
•
Interesses do mercado – atualização tecnológica, a partir da seleção dos
melhores profissionais, das condições de trabalho e da utilização do
potencial criativo que apenas se obtém com educação e treinamento
constantes.
Esta proposta é complementada pelo just in time37, que busca uma
utilização mais eficiente dos equipamentos, de modo a obter um padrão de
qualidade superior e eliminar perdas. A proposta é a formação de grupos de
37
Just in time é mais conhecido como a redução do inventário, mas é muito mais do que isso: é “a
organização total do processo de produção, de modo que as peças e submontagens – tanto compradas quanto
manufaturadas – encontram-se disponíveis no piso da fábrica somente quando necessárias – nem antes, nem
depois do tempo certo” (Moura, 1994:VII).
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Capítulo 3
119
trabalhadores que, a partir de círculos de melhoria de qualidade buscam
desenvolver novos métodos de produção.
O Just in time (JIT) trabalha em conjunto os processos de manutenção e
administração, procurando atingir três metas: pequenos ciclos de manufatura,
qualidade total e aperfeiçoamento contínuo.
A Administração da tecnologia está voltada para a criação de um ambiente
de produção receptivo, baseado na manufatura em fluxo contínuo, na produção
em pequenos lotes, na redução do setup38 e na adaptação ao uso, ou seja ao
exato atendimento às necessidades do cliente39.
A Administração de pessoas visa o aperfeiçoamento contínuo através das
pessoas;
tanto a alta gerência quanto os horistas recebem responsabilidade
e autoridade para sugerir e implementar aperfeiçoamentos num
ambiente
de
riscos
assumidos
onde
é
possível
o
rápido
aperfeiçoamento sem se gastar muito dinheiro. (Moura, 1994:12)
Os elementos básicos desta administração de pessoas são: envolvimento
total dos funcionários, controle através da visibilidade, organização física do
espaço e qualidade total.
A Administração de Sistemas volta-se para a aplicação cuidadosa dos
recursos do negócio: equipamento, material, pessoal, dinheiro e tempo. Este estilo
de organização propõe um processo mais cooperativo e integrado, dando ênfase
aos enfoques de fluxo, de modo a maximizar o uso eficiente dos recursos. Para
tanto, deve-se atentar para quatro aspectos: carga equilibrada e fluxo
sincronizado, manutenção preventiva, participação dos fornecedores em relações
38
Intervalo de tempo que se leva para preparar máquinas ou linhas de produção para uma nova peça.
Cliente aqui é entendido não apenas como a pessoa que compra o produto. “O passo seguinte no processo
de reposição total é o cliente do passo anterior, e os resultados de um centro de trabalho devem atender as
necessidades ou exigências do próximo centro de trabalho...” (Moura, 1994:11)
39
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
120
estáveis de parceria e kanban, método de programação onde os materiais são
“puxados” apenas quando necessários.
Figura 3.2– Fundamentos do Just in Time
PEQUENOS
CICLOS DE
MANUFATURA
ADMINISTRAÇÃO
DA TECNOLOGIA
• Manufatura em fluxo
contínuo
• Produção em pequenos
lotes
ADMINISTRAÇÃO
DE PESSOAS
• Envolvimento total dos
colaboradores
• Controle através da
visibilidade
• Redução do Setup
• Ordem
• Adaptação ao uso
• Foco na Qualidade Total
QUALIDADE
TOTAL
ADMINISTRAÇÃO
DE SISTEMAS
•
•
•
•
•
Carga tributária e fluxo balanceado
Manutenção Preventiva
Participação Preventiva
Participação do fornecedor
Sistemas de Puxar
MELHORIAS
CONTÍNUAS
(KAISEN)
Fonte: Moura, 1994.
Segundo Moura (1994:14)
quando estas três áreas do negócio [...] estão em equilíbrio e os
elementos do JIT são implantados numa empresa de manufatura,
o
resultado
é
grandes
aperfeiçoamentos
de
desempenho,
chegando a custos significativamente menores e Lead Times mais
curtos.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
121
Apesar de controversa, combatida e sempre muito discutida, a Qualidade
Total enquanto filosofia ainda é a principal corrente da atualidade e seus princípios
têm prevalecido na definição das dinâmicas produtivas.
3.5. Uma gestão diferenciada
As etapas evolutivas vividas pelas fábricas comunitárias são muito
semelhantes àquelas vividas por muitos dos pequenos empreendimentos. O
primeiro momento é aquele em que todas as pessoas estão envolvidas
afetivamente com aquilo que fazem e os pactos substituem regras de convivência.
Com o crescimento, começa-se a admitir pessoas com base em critérios
mais técnicos do que afetivos e vai sendo necessário explicitar os limites, as regras
e o que se espera de cada profissional. O que diferencia a Marc’ellsse de outras
empresas do mesmo setor é um relacionamento horizontal entre colaboradores e
sócios.
As decisões empresariais são muito discutidas, pois têm clareza de que a
empresa precisa ser competitiva, mesmo assim é “ponto de honra” a garantia de
condições de trabalho adequadas. Na fábrica, não apenas a higiene é impecável,
tendo pessoas encarregadas da limpeza que vão e vem entre as máquinas para
não deixar sobras de material no chão; mas o cafezinho está servido durante todo
o expediente, não havendo horário pré-definido: cada trabalhador interrompe sua
tarefa no momento em que deseja um café, uma água ou mesmo uma pequena
pausa em seus afazeres.
A opção por ter os sócios distribuídos pelos setores de produção, e em
atividades de linha e não de supervisão, permite uma visão da produção sem a
intermediação de encarregados ou gerentes:
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
122
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
A
Capítulo 3
123
gente trabalhando num setor, tudo chega até a gente. Em
outras fábricas, tem coisas que acontecem nos setores, e que
nunca o dono vai ficar sabendo. Não fica sabendo porque os
líderes ou os gerentes abafam ali e eles nem ficam sabendo. (LCP)
Isto nos remete a Gorz (1989:104) quando diz que
para liberar a iniciativa das massas é preciso dar-lhes a palavra.
Mas como? Há obstáculos: os contramestres, por exemplo, que
não são bons representantes das equipes operárias. Em suas
relações com os superiores hierárquicos costumam esconder os
fatos que não lhes são favoráveis e responsabilizar os operários –
que lhes são subordinados – por todas as dificuldades encontradas.
Além disso, estão numa posição desconfortável: considerados,
pelos engenheiros, como operários que subiram de posto [...]; e,
pelos
operários
como
representantes
da
hierarquia.
Os
contramestres ou se sentem questionados pelas iniciativas dos
trabalhadores, ou então procuram apropriar-se delas. Entre outras
conseqüências lamentáveis desse estado de coisas: as iniciativas
das massas são bloqueadas.
Os sócios da Marc’ellsse têm consciência de que sua proposta é diferente
daquelas de outras empresas. Um dos depoimentos (EER) dá conta disso:
nas outras empresas, na reunião de direção, tem inspetor que
participa, mas não é quem está lá no setor que vai decidir... aqui
acontece muito disso, a gente comprar a briga dos funcionários e
fazer valer... A gente está acompanhando ali do lado das pessoas e
sentindo as dificuldades como as pessoas.
Perguntado sobre esse esquema de gerenciamento, Mestriner disse que:
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 3
124
quando você coloca diretores em pontos estratégicos, no corte, no
pesponto, na montagem, na expedição, você tem uma visão do
todo, e como eles são donos do negócio, eles pensam como donos.
Então, muda um pouco a visão deles. Então, eu acho que a visão
deles é uma visão que, primeiro, envolve o negócio, eles são mais
transparentes, eles conseguem transmitir de uma forma mais
independente, uma coisa assim mais desprendida... Porque uma
coisa é diferente: ninguém vai levar bronca... Aqui, eu acho que,
às vezes, quando se discute com a equipe, as informações podem
ser distorcidas. E, aí prejudica uma decisão, uma alavancagem de
recursos, e essa coisa toda. Eu acho que eles conseguem ter uma
coisa mais homogênea. Quando você toma uma decisão diante de
várias informações reais, transparentes, e chegam num consenso
bastante homogêneo, depois de várias discussões, eu acho que é
mais assertiva uma decisão destas.
Um dos aspectos desta forma de gerenciamento da produção é o
reconhecimento da competência dos trabalhadores na organização da produção, o
que permite o incentivo às iniciativas individuais canalizando-as para o objetivo do
grupo.
Questionado sobre este modo de gerenciar a fábrica e a ausência de
gerentes e encarregados... um dos sócios (RP) justifica dizendo que “as coisas que
saem de cima dificilmente chegam até a linha de produção”.
Na
busca
de
qualificação
e
do
acompanhamento
das
mudanças
tecnológicas, há momentos de contratação de profissionais que chegam propondo
mudanças na planta produtiva. Nestas situações, os sócios acompanham de muito
perto o modo como esse novo profissional se relaciona com o conjunto de
trabalhadores na medida em que a busca destas inovações precisa se adequar ao
tipo de relação estabelecido no cotidiano da fábrica. “Tem pessoas (gerentes) que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 3
125
chegam com um pensamento que para você comandar um grupo, tem que ser
radical, precisa humilhar a pessoa, para a pessoa se rebaixar...”, explica RP.
Interessante observar que, a postura “doméstica” dos primeiros tempos em
que o desprendimento era a regra maior e aceitavam ficar sem receber ou receber
a metade por acreditarem no empreendimento que construíam, foi pouco a pouco
sendo modificada para uma postura mais empresarial na qual as decisões são
tomadas com muita preocupação com a manutenção das condições de trabalho e
da relação com os trabalhadores, mas priorizando os interesses da empresa.
3.5.1. Relação com o mercado
A relação da Marc’ellsse com o mercado tem sido mediada por um corpo de
vendedores (viajantes) que trabalham com mostruários por meio dos quais captam
pedidos. Na opinião de Sérgio, vendedor da fábrica desde o primeiro momento, é
muito interessante a estratégia de venda que permite ao lojista escolher não
apenas os modelos mas a quantidade de cada tamanho, comparada a outras
estratégias que exigem a venda de toda a grade de números independente da
saída que a loja tenha. Comentou ele, ainda, que os lojistas opinam sobre os
modelos fazendo sugestões de mudança de cor, e até mesmo trazendo fotos de
calçados produzidos em outros países e que poderiam ser produzidos aqui.
Na faixa de preço em que seus calçados estão situados, o produto da
Marc’ellsse é considerado de boa qualidade e as vendas têm fluído sem maiores
dificuldades. Esta comercialização é feita por um corpo de aproximadamente 30
vendedores. Em agosto de 2000, ao sentirem que estava havendo problemas nas
vendas, realizaram uma Convenção de Vendedores na qual foram apontadas as
dificuldades enfrentadas e várias sugestões foram incorporadas. A convenção
definiu metas a serem atingidas e antecipou-se a problemas que poderiam ocorrer.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 3
126
Entre outras coisas, nessa convenção definiu-se a contratação de uma pessoa que
tem visitado os clientes, colhendo informações sobre seus produtos e buscando
uma relação mais próxima com eles.
Uma boa relação com o mercado pressupõe o acompanhamento de
inovações tecnológicas de modo a garantir que a qualidade do produto
apresentado satisfaça ao público consumidor.
Nesta proposta em que o controle está mais no processo do que no
produto, mais na operação do que no resultado e se busca mais a qualidade do
processo de qualidade do que um controle de qualidade no final, tem sido bastante
significativo o fato de os controladores (sócios) terem uma participação direta na
produção/operação.
Tal dinâmica tem garantido a participação dos trabalhadores como um todo,
e a estruturação das tarefas a partir da discussão em grupos. Isto requer um
compromisso, uma co-responsabilidade e um autocontrole. Sob essa ótica, os
processos de avaliação de desempenho são conseqüência das atividades muito
mais do que processos individuais de cada trabalhador. A contrapartida é uma
maior circulação de informações e até mesmo uma certa capacidade gerencial
mais
socializada
que
permite
a
instalação
de
sistemas
confiáveis
de
rastreabilidade, reprodutibilidade e repetitividade.
Vedovotto, em entrevista, salientou que “eles têm feito um trabalho voltado
sempre para a melhoria de produtividade, melhoria do produto, diminuição de
retrabalho, e a gente percebe que a empresa hoje está bem sólida; tendo métodos
de vendas adequados, e etc.” Falando sobre a estratégia de gestão adotada pela
Marc’ellsse, ele comenta que cada um dos sócios cuida de uma parte da produção
e sempre buscando fazer o melhor que pode. Nessa busca, envolve as pessoas e
busca excelência.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
127
A gente sabe que eles colocam a busca da qualidade em prática,
tem alguns problemas, pára, senta, roda a ferramenta de
qualidade, busca a causa, o âmago da causa, não vai só no efeito,
na coisa em si, vai na causa. Eliminou a causa, o efeito gere, não
é? Então, são coisas assim científicas... Eles hoje têm a ambição de
ter aquela fábrica lá cientificamente: tem controle de retrabalho,
tem controle de desperdício...
Na opinião dele, a única coisa que está faltando é a participação nos
resultados que eles ainda não implementaram.
Mais do que simplesmente se adequarem às propostas de Qualidade Total,
a preocupação que tem movido os sócios da Marc’ellsse é entender as lógicas das
propostas tecnológicas e organizacionais que visam à produtividade e à qualidade
do produto para poder desvendar seus mitos e ilusões de modo a revertê-las em
estratégias a favor não só da produção, mas dos trabalhadores.
Os produtos da Marc’ellsse têm sido vendidos em diversos estados, a partir
da ação de vendedores/representantes viajantes. Numa proposta de ampliação do
alcance de suas vendas, uniram-se a seis outras empresas de calçados da cidade
num consórcio exportador. Enquanto fazem as adequações necessárias para
conseguirem o selo ISO 14000, estão expondo e vendendo seus produtos pela
internet.
3.5.2. Relações com outros produtores de calçados da região
Nalberto Vedovotto, em entrevista, faz uma descrição do empresariado
birigüiense:
Birigüi é uma cidade sui-generis. Ela começou esse parque
industrial, nós temos pessoas preocupadas com a cidade, [...] com
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
128
a falta de empregos, preocupadas de depender só de duas
empresas, multinacionais [...] Pensaram em criar uma forma de
negócio. E, através da idéia de um, ficou um nicho de mercado que
na época não tinha, tanto que era voltado para o infantil... e a
coisa começou. Saiu uma, dessa outra, saiu o chefe e abriu uma
outra, e abriu uma outra, aí o outro chefe pensou: não vou
trabalhar de empregado e abriu uma outra... e foi assim. Com
raras exceções de pessoas que vieram de fora, que não tinham
nenhum vínculo com a cidade, que aprontaram e que até sumiram,
mas 90% é gente nascida aqui. Nasceu, passou a infância, a
adolescência, tem família e tal... então, já há um círculo de
amizade muito grande, se conhecem, sabem quem presta e quem
não presta...
Comentando especificamente o caso das empresas comunitárias, ele
prossegue:
No caso destes meninos, como são gente simples, tem um passado
de luta muito difícil, tinham muito preconceito com eles porque
eles tinham opinião política pessoal, combatiam muito essa
questão da exploração, ficaram muito tempo até sem emprego, e a
única alternativa que eles tiveram foi abrir uma empresa para não
morrer de fome. Hoje o pessoal viu que eles não comem
criancinha. São gente igual aos outros, e quando perceberam que
tem dificuldades, se ajudam. E, no caso, não é só deles, não, tem
muitas empresas que hoje existem em função dessa ajuda... um
pega material e empresta para o outro, faz aquele acerto, depois,
lá na frente, o outro empresta para o um, e vai ajudando.
Sem dúvida, o ambiente empresarial calçadista de Birigüi tem um papel
significativo no desenvolvimento da experiência que aqui estudamos. A Marc’ellsse,
como a grande maioria dos empresários, iniciou seu empreendimento com
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
129
pequeno capital e contou com o apoio dos outros empresários para dar os
primeiros passos.
As primeiras informações obtidas sobre o relacionamento entre a Marc’ellsse
e outros empresários de Birigüi despertaram o interesse em conhecer melhor como
se dá o diálogo empresarial naquele município. Em conversa com Mestriner, ele
disse que:
a relação entre os empresários é fantástica. Com exceção de
alguns [...] que não têm contribuído muito para que a gente, de
fato, pudesse consolidar essa ação conjunta. Por exemplo, se me
faltar uma matéria-prima minha, hoje, [...] pode ter certeza que
qualquer fábrica me abastece. Eu não fico sem matéria-prima.
Quem tiver, não me deixa sem. Em contrapartida, também é da
mesma forma. Agora, tem que ter uma seriedade...
e ele explicou que quando uma empresa empresta material para outra, numa
relação de seriedade, tem a certeza de que vai receber, ainda que a outra empresa
tenha dificuldades. E continuou dizendo que:
Eu acho que precisa melhorar, mas existe, sim, uma iniciativa
muito boa dos empresários se entenderem. De repente, me
quebrou uma máquina. Alguém me cede uma máquina, me
empresta uma máquina... acaba matéria-prima, empresta matériaprima... empresta funcionário...
Como, geralmente, no sistema capitalista o motor da relação entre
empresários é a concorrência, busquei entender um pouco melhor o porquê destes
empresários terem esse tipo de relacionamento. Mestriner explicou do seguinte
modo:
É que Birigüi é uma cidade de 90.000 habitantes, [...] em que
todos nós nos conhecemos. [...] Todos nós fomos, ontem,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
130
funcionários de alguém. Ninguém nasceu em berço de ouro.[...] Eu
trabalhei, comecei como office-boy numa firma de artefatos para
calçados, trabalhei até os 20 anos como vendedor, e comecei a
funcionar a fábrica eu e mais dois colaboradores... todo mundo
tem uma história muito simples, muito humilde! Então, acho que
ninguém esquece do berço e da onde ele veio... Então acho que
isso influencia muito. A essência desse entrelaçamento entre os
empresários é que há um convívio, ou na infância, ou um
conhecimento... mesmo que eu não conheça você, eu sei quem é
você, há realmente... não tem ninguém de fora. Não tem nenhum
empresário que veio de fora, não tem. Todos são daqui ou de
cidades vizinhas aqui... da zona rural... então eu já sei, fala o
nome e eu já sei quem é... bairro tal, perto de Birigüi... todos nós
nos conhecemos. Isso facilita este entrelaçamento. Esta união. Eu
acho que é por causa desse gancho que nós podemos fazer muito
mais juntos.
Nós participamos de eventos, de festividades juntos, então, o que
acontece... aqui, nós somos parceiros, do trevo de Birigüi para fora
nós somos concorrentes. Lá no mercado, mercadologicamente, eu
quero vender mais que o outro, o outro quer vender mais, e eu
tenho claro isso... aqui nós brigamos... se alguém falar mal de um
outro, é capaz da gente sair defendendo, mesmo o concorrente...
lá no mercado, já existe... entre os próprios vendedores não existe
este relacionamento, os nossos vendedores, cada um vem de um
lugar, um vem de uma família, outro vem de outra, ninguém se
conhece, e aí existe um confronto.
Vários empresários entrevistados foram unânimes em afirmar que o
mercado é cruel, e que está deixando as pessoas cada dia mais frias e calculistas...
a estratégia de pequenos empresários de uma cidade do porte de Birigüi tem sido
a união, que permite buscarem estratégias comuns para divulgação dos produtos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
131
de várias fábricas, mesmo sabendo da concorrência de mercado que existe entre
elas. “Se eu tiver uma ação de marketing melhor, se eu tiver uma ação com os
lojistas, se minha distribuição for melhor, eu tenho um melhor desempenho”, diz
Mestriner.
3.5.3. Na relação interna, a diferença
Numa conversa coletiva com os sócios da Marc’ellsse, perguntei qual era o
diferencial da fábrica deles em relação às outras fábricas. LCP disse que não
encontraríamos grandes diferenças, e explicou que, com o crescimento do número
de colaboradores, tiveram que ir criando regras de funcionamento que fazem com
que muita coisa seja igual às outras indústrias. Só o que se mantém diferente,
completa ela, é a relação entre as pessoas e o ambiente da fábrica. LMF disse: “a
burocracia é igual, tem que fazer de acordo com a lei”. Na mesma hora, RP
acrescentou:
o relacionamento, nós estamos 10 pontos na frente. Independente
do cara falar que trabalha com qualidade total... a regra é criada
de cima para baixo... As nossas regras não são criadas de cima
para baixo. Tanto que o time que joga para a melhoria da
empresa40 tem só a Shirley que é sócia e tem um monte de
pessoas que são funcionários da empresa.
Desde o início, os sócios da Marc’ellsse colocaram-se em setores da
produção, o que tem garantido um diálogo cotidiano com os trabalhadores.
A
introdução de ferramentas de qualidade total tem sido filtrada por esta definição
anterior que determina a relação interna na fábrica. Neste sentido, o “time que
40
Ele está se referindo ao grupo que participa das reuniões com outras fábricas para implementação de
estratégias e ferramentas voltadas para a melhoria da qualidade do produto.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
132
joga para a melhoria da empresa” constrói junto com cada trabalhador as regras
de funcionamento da fábrica.
Em termos do “modus operandi”, pode-se dizer que a Marc’ellsse é parte de
um pool de empresas que partilham um mesmo universo de treinamento e busca
da qualidade total. Durante os últimos anos, foi desencadeado todo um processo
voltado para a sensibilização dos setores envolvidos, desde os sócios/dirigentes até
os vendedores/representantes, passando por todos os setores de produção.
A partir do impulso dado pelo sindicato patronal, em 1996, os sócios da
Marc’ellsse se mantiveram alertas no acompanhamento das possibilidades de
formação
e
treinamento,
e
vêm
sendo
acompanhados
por
consultores
especializados em qualidade. Todo esforço tem sido feito na busca do aumento da
produtividade, melhoria do produto e diminuição do retrabalho.
Segundo informações coletadas durante visita, ocorrida em setembro de
2000, a fábrica está entrando em um novo momento em que deve se dar a
manualização, ou seja, a sistematização de procedimentos, com a definição da
padronização e do controle dos processos voltados para a qualidade definida como
padrão. Com isto, a empresa está iniciando uma operação voltada para a
exportação de seus produtos para o exterior.41
A proposta de horizontalização, adotada por eles, pressupõe a ausência de
funções de controle fora do processo, e um empenho maior no controle do
processo do que na verificação do produto final: a ênfase é na operação mais do
que no resultado.
Däubler que analisa as formas de cooperação institucionalizadas dentro das
indústrias japonesas, cita a existência de conselhos consultivos nos quais
“representantes dos trabalhadores trocam idéias com os diretores” (1994:35). Esse
41
Isto pode ser acompanhado através do site da APEMEBI – Associação dos Pequenos e Médios Empresários
de Birigüi: www.apemebi.com.br.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
133
autor aponta ainda que “um levantamento do Ministério do Trabalho japonês
mostrou que o número de instituições deste tipo é duas vezes maior em empresas
com sindicatos do que em empresas sem sindicato”. Ele prossegue, esclarecendo:
Em mais ou menos metade dos casos, sua criação se baseia no
contrato coletivo; nos outros casos trata-se de acordos informais
ou de iniciativas da própria direção da empresa. A composição por
parte dos empregados não é uniforme. Ao lado de delegados
sindicais há também representantes dos funcionários eleitos por
estes; em mais de 10% dos casos, os “representantes dos
funcionários” são nomeados pelo empregador. Os itens discutidos
nestes conselhos são muito amplos, referindo-se a um grande
número de questões relacionadas com a política empresarial.
(Däubler, 1994:35)
Ao fazer uma reflexão sobre estilos europeus de gerenciamento das
relações de trabalho, Baglioni (1994) os resume da seguinte forma:
estilo constitucional: aquele que, com a presença de maiores ou
menores
regras
contratação
institucionais,
considera
fundamentais
a
coletiva e as representações sindicais para a
regulamentação do uso do trabalho;
estilo “consultativo” que tende a utilizar institutos e procedimentos
para uma participação mais estreita dos trabalhadores e para uma
maior identificação deles com os problemas e o desenvolvimento
das empresas;
estilo desregulativo ou neoliberal que estabelece relações de
trabalho que reduzam a regulamentação e a lógica contratual e
permitam a máxima flexibilidade no uso e na remuneração da
mão-de-obra. (Baglioni, 1994:64)
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
134
No mesmo texto, é constatada a existência de variações significativas e são
apontadas variações do estilo consultativo.
Formas de participação que convivem com, ou envolvem também
as representações sindicais (e neste caso podem, às vezes,
atravessar as fronteiras da lógica da democracia industrial);
Formas de participação que implicam relacionamento direto com os
trabalhadores (que representam a versão mais nova e dinâmica
deste estilo);
Formas
de
participação
que
despertam
o
interesse
dos
trabalhadores para a estrutura ou para os resultados da empresa
(ações, obrigações conversíveis, participação nos lucros), ou
também para os processos produtivos (círculos de controle de
qualidade, grupos para a tramitação de informações, grupos de
trabalho autônomos, etc.);
Formas de envolvimento que, em troca de flexibilidade, oferecem
garantias da vaga de trabalho ou, caso a empresa enfrente
dificuldades, mais simplesmente negociam a redução de direitos
adquiridos (por exemplo, direitos sindicais). (idem)
Neste caso em estudo, é possível dizer que a relação existente dentro da
Marc’ellsse aproxima-se daquela que Baglioni aponta como a versão mais nova e
dinâmica do estilo “consultativo”, uma vez que os diretores participam do dia-a-dia
dos trabalhadores ao partilharem a mesma tarefa.
Uma questão que se levanta na análise desta relação é aquela relativa aos
conflitos capital/trabalho. Em texto sobre a evolução histórica da idéia do
corporativismo, Silva aponta que a relação empregado/empregador não mais se
circunscreve ao local de trabalho, mas avança por toda a sociedade. “Esta visão
inicial, meramente econômica, se deixa permear de elementos sociais, em que os
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
135
trabalhadores passaram a reivindicar, além do salário, melhores condições não só
de trabalho, mas de vida” (1994:110).
A configuração do conflito capital/trabalho nos nossos dias é diversa
daquela existente antes da Revolução Industrial e pode ser caracterizada por:
•
Oposição clara de interesses entre trabalhadores e detentores dos
meios de produção;
•
Existência de instrumentos jurídicos próprios (convenção coletiva,
greve e co-gestão) que algumas vezes minimizam essa oposição mas
não a excluem;
•
A organização é bilateral numa composição que se faz pela
negociação mais do que pela disciplina e pela hierarquia interna.
A presença dos detentores dos meios de produção no dia-a-dia dos
trabalhadores vem construindo uma relação diferenciada no interior da unidade
fabril. O Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Calçado de Birigüi considera
que as condições oferecidas aos trabalhadores são adequadas, havendo momentos
de contato com os trabalhadores dentro da própria fábrica.
Nesta dinâmica de produção, a função gerencial aparece diluída no processo
de autogestão o que não significa que ela não se explicite situacionalmente em
suas funções de cobrança, auditoria, definição de ritmo, avaliação e coordenação
do processo.
Procurando analisar a multiplicidade de tarefas que se expressa na planta
produtiva da Marc’ellsse, é interessante observar o locus no qual cada um dos
sócios está situado (Figura 3.1). Sem dúvida, cada um deles está colocado em
pontos-chave, cada um dos quais tem aspectos de controle, de verificação, de
definição de ritmo, de implementação de velocidade, de desobstrução de linha e
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
136
de redução ou aumento do setup, que são os pontos de estrangulamento da
produção.
Cada um destes gestores, ao mesmo tempo em que busca a excelência no
setor em que está situado, envolve-se com a demanda vinda dos trabalhadores.
Essa postura tem levado à busca da qualidade na prática, propiciando que os
problemas sejam atacados de imediato a partir da utilização de ferramentas de
qualidade, o que permite que se ataque o âmago da causa e não apenas o seu
efeito. Este esforço é comunicado nas reuniões de direção, o que faz com que o
aprendizado seja socializado para a fábrica como um todo.
3.5.4. A solidariedade na colaboração
Desde o primeiro momento, no início da década de 1990, a experiência da
Marc’ellsse vem sendo acompanhada por grupos de CEBs sediados naquela região.
Inúmeros foram os relatos – para CEBs, Paróquias, etc. – nos quais se
apresentavam tanto as vitórias e novas conquistas como as dificuldades. A paixão
com que construíam sua utopia, pouco a pouco, foi levando outros grupos a
fazerem experiências semelhantes.
O grupo que iniciara a Marc’ellsse havia instituído espaços de formação
voltados não apenas para que os sócios socializassem suas experiências, mas na
busca de outros saberes. Atuavam na fábrica de segunda a sexta, e, nos finais de
semana, participavam de seminários e oficinas em que podiam ouvir outras vozes.
Cada novo grupo que foi criando oficinas de produção de calçados [Maic d’jol, Maic
shildrem, Dejalmy, Greiffer] foi se incorporando nestes espaços de formação.
Ora, se as pequenas fábricas e oficinas potencializavam em muito a relação
entre trabalhadores, o que é considerado fundamental no desenvolvimento da
proposta, o fato de serem pequenas criava alguns impasses em termos de custo
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
137
da produção. A intermitência entre pedidos, por fragilidade das equipes de
vendedores; máquinas, como as de bordar, demandavam uma produção maior e
poderiam ficar ociosas se fossem utilizadas em pequenas produções; o preço da
matéria-prima é mais alto quando se compra em quantidades menores. Tudo isto,
e mais a necessidade de socializar as lições aprendidas nas experiências que já
vinham sendo desenvolvidas há mais tempo, foram indicando ao grupo a
conveniência de uma organização em rede que, permitisse uma partilha que
resguardasse a particularidade de cada nova experiência.
A convivência e a intimidade vivida pelos grupos levava à discussão das
dificuldades na busca de saídas comuns e pouco a pouco começaram a trocar
pedidos, fazer compras conjuntas de matéria-prima e mesmo a dividirem o uso de
máquinas como as de bordar. A perspectiva era a de ações em rede, mantendo-se
a autonomia de cada uma das fábricas.
Mance aponta a colaboração solidária como um dos fundamentos das novas
e
concretas
marginalizados
alternativas
pelo
que
vêm
movimento
sendo construídas pelos excluídos e
de
globalização
solidária
significa
do
capitalismo.
Neste
entendimento,
colaboração
um
trabalho
e
consumo
compartilhados cujo vínculo recíproco entre as pessoas advém,
primeiramente, de um sentido moral de co-responsabilidade pelo
bem-viver de todos e de cada um em particular. (2000:17)
3.6. Os trabalhadores
Em setembro de 2000, a Marc’ellsse tem um total de 78 trabalhadores,
sendo 33 homens e 43 mulheres. Destes, 33 têm menos de um ano na empresa,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
138
33 têm entre um e três anos, nove têm entre três e cinco anos e apenas um tem
mais de cinco anos.
Se for cruzado o tempo de trabalho na empresa com as funções
desenvolvidas, é possível identificar um certo espaço para o crescimento
profissional dentro da empresa: a grande maioria assume, de início, funções de
auxiliar. Dos trabalhadores com menos de um ano, há dois auxiliares de corte, sete
auxiliares de montagem, um passador de cola, 15 auxiliares de pesponto e sete
pespontadoras. As pespontadoras contratadas diretamente, sem um período como
auxiliar, são profissionais que tinham experiência anterior, algumas delas, em
outras fábricas comunitárias.
Os trabalhadores que têm mais de um e menos de três anos de empresa
estão distribuídos entre as seguintes funções: dois auxiliares de corte, dez
auxiliares de montagem, um auxiliar de modelagem, cinco auxiliares de pesponto e
um faxineiro. Têm mais de um e menos de três anos, três cortadores, seis
pespontadores, três bordadores, uma plancheteira e um expedidor. Como neste
período (1997 a 2000) a produção cresceu em 50%, o acréscimo de profissionais
ocorreu em virtude da necessidade de ampliação de máquinas.
A maioria dos trabalhadores que atua na empresa há mais de três e menos
de cinco anos ocupa cargos semelhantes àqueles que são desempenhados pelos
sócios. A única exceção é um trabalhador com quatro anos de empresa e que se
mantém como auxiliar de montagem. Saliente-se que, na montagem há apenas
um titular e 18 auxiliares.
Quanto ao corte de gênero, o maior contingente de mulheres está localizado
no pesponto, como titular (15 trabalhadoras) ou auxiliar de pesponto (19
trabalhadoras). Algumas outras funções também são exercidas por mulheres: há
três mulheres como auxiliar de montagem, duas como plancheteiras e outras três
distribuídas como cortadora, auxiliar de corte e coladeira.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
139
Já os homens estão em maioria como auxiliar de montagem (15) ou como
cortadores (cinco). São também homens os bordadores (três) e a maioria dos
auxiliares de corte (três). Os outros sete se distribuem como auxiliar de pesponto,
pespontador, montador, auxiliar de modelagem, braqueador, expedidor e vigia.
Quanto à escolaridade, sabe-se que nenhum dos trabalhadores tem nível
universitário. Vinte e seis têm segundo grau completo e seis possuem segundo
grau incompleto. Sete possuem primeiro grau completo. Os demais (34) estão em
séries que vão da 2ª à 8ª do primeiro grau. Dentre os sócios, 50% está cursando
séries que vão da 5ª à 8ª do primeiro grau; um tem primeiro grau completo, dois
estão cursando o segundo grau, dois têm segundo grau e um tem nível
universitário.
Tabela 3.1
Escolaridade dos trabalhadores da Marc’ellsse
2000
Escolaridade
Universitário
2º grau completo
2º grau incompleto
1º grau completo
Cursando séries da 5ª à 8ª
Sócios
1
2
2
1
6
Porcentagem Contratados Trabalhadores
8,33
Nenhum
16,66
26
16,66
6
8,33
9
50,00
24
Porcentagem
0,00
33,33
7,69
11,53
30,76
Cursando séries da 3ª à 4ª
0
0,00
10
12,82
Menos de 2ª série
0
TOTAL
12
Fonte: Dados coletados pela autora.
0,00
100,00
0
78
0,00
100,00
A maioria dos trabalhadores é jovem: 20 deles têm entre 17 e 20 anos; 22
entre 21 e 25 anos; 12 entre 26 e 30 anos; 15 entre 31 e 39 anos; e apenas seis
têm mais de 40 anos.
Na coleta de dados junto aos sócios da Marc’ellsse e das outras fábricas,
priorizei o uso de entrevistas – tanto individuais como coletiva – e conversas
informais. Já a captação do entendimento que os trabalhadores contratados têm
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
140
do processo foi feita por meio da aplicação de um questionário por ser inviável
entrevistar um número considerável de pessoas.
O instrumental continha 14 questões e buscava identificar a percepção dos
trabalhadores sobre o processo, comparando-o com sua vivência em outras
fábricas. Foram distribuídos 78 questionários e recolhidos 47.
Comparando o perfil daqueles que responderam o questionário com o
universo de trabalhadores da Marc’ellsse, os Gráficos 3.1 e 3.2 retratam,
respectivamente, o tempo de trabalho na empresa e a função exercida.
A amostra recolhida foi considerada significativa, pois representa a opinião
de 60% dos trabalhadores. Observe-se que a amostra está equilibrada se for
ponderado o tempo de empresa dos trabalhadores. Responderam ao questionário,
100% dos trabalhadores com mais de 5 anos (um), 66,66% dos trabalhadores que
têm entre três e cinco anos (seis em nove), 54,54% dos trabalhadores com mais
de um e menos de três anos de casa (18 em 33) e 66,66% dos trabalhadores com
menos de um ano (22 em 33).
Gráfico 3.1
Tempo de trabalho na empresa
Marc’ellsse – 2000
40
30
20
10
total na fábrica
0
menos
questionários
entre 1 de 1
entre 3 e 3 anos ano
mais de e 5 anos
5 anos
Fonte: Dados coletados pela autora.
questionários
total na fábrica
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
141
O segundo aspecto a observar são as funções exercidas na produção pelos
trabalhadores que responderam aos questionários. Eles representam 60% do total
da empresa e estão distribuídos entre as seguintes funções:
•
51,05% dos questionários (24) foram respondidos por trabalhadores
encarregados do pesponto, como titulares (11) ou auxiliares (13). Estes
trabalhadores representam respectivamente 72,22% e 61,11% do total de
auxiliares e de pespontadores;
•
12,76% dos questionários (seis) foram respondidos por trabalhadores
encarregados do corte, como titulares (cinco) ou auxiliares (um). Estes
trabalhadores representam respectivamente 83,33% e 25% do total de
titulares e de auxiliares;
•
6,38% dos questionários (três) foram respondidos por trabalhadores
encarregados da montagem, como titulares (um) ou auxiliares (dois). Estes
trabalhadores representam respectivamente 100% e 11,11% do total de
titulares e auxiliares;
•
4,25% dos questionários (dois) foram respondidos por bordadores e
representam 66,66% do total de trabalhadores encarregados do bordado;
•
2,125% dos questionários (um) foram respondidos por trabalhadores
encarregados da plancha, representando 50% do total de planchadeiras.
Não foi obtida nenhuma resposta de trabalhadores encarregados da
modelagem, da braqueadeira e nem da expedição. O questionário não
identificou a variável sexo.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
142
Gráfico 3.2
Funções Exercidas
Marc’ellsse – 2000
100%
80%
60%
40%
20%
0%
re s po nde ra m
to ta l fá bric a
Fonte: dados coletados pela autora
Um primeiro aspecto que a pesquisa permitiu observar foi o ambiente de
trabalho na fábrica. Mais de 90% dos trabalhadores que responderam ao
questionário souberam da vaga por meio de suas relações pessoais – parentes que
já
trabalhavam
lá
(50%);
participação
da
comunidade
(19%);
foram
encaminhados por colegas, amigos ou namoradas (10,6%); eram amigos dos
sócios (6%). Outros dois trabalhadores dizem ter chegado à fábrica pelos
mecanismos tradicionais de procura de emprego e cinco não responderam.
A principal característica da gestão da Marc’ellsse está referida à relação
estabelecida dentro da fábrica. Ainda que o poder diretivo permaneça nas mãos
dos doze sócios, os mecanismos pelos quais o conjunto de trabalhadores participa
das decisões sobre a dinâmica de produção deveriam fazer diferença a ser
percebida por todos.
Esta “diferença” não foi explicitada nos questionários e é apenas nas
entrelinhas que se consegue identificá-la. Na aplicação do mesmo questionário aos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
143
sócios, encontramos referência à vida em comunidade, ao espírito coletivo e
comunitário, mas isto não acontece quando analisamos as respostas dos
trabalhadores contratados, apesar de nove deles informarem ter sabido da vaga
pela participação na comunidade.
O fato de 90% dos trabalhadores ter chegado à fábrica por indicações
pessoais pode significar uma avaliação positiva por parte daqueles que fizeram a
indicação, aspecto este, porém, bastante subjetivo.
Ainda em relação ao processo de admissão de novos trabalhadores, foi
perguntado o que os havia atraído para esta fábrica. 76,6% das respostas
apontam o ambiente de trabalho como atrativo para sua procura de trabalho na
Marc’ellsse: “ambiente de camaradagem, onde o trabalhador é valorizado e tratado
com educação e compreensão e onde há honestidade”.
Esta resposta parece referendar as características do ambiente criado onde
as pessoas têm liberdade de interromper seu trabalho para um café ou mesmo
para um pequeno descanso, exigindo-se em contrapartida seu compromisso com a
produção estipulada.
Três das respostas apontam mudanças na qualidade de vida, após ter
iniciado o trabalho na fábrica e as creditam ao prazer de trabalhar e ao
comportamento dos sócios. Uma delas afirma: “Mudou muito a minha vida, porque
a única fábrica que gostei de trabalhar”. Esta resposta é de um trabalhador que
estava empregado em outra empresa quando optou por vir para esta fábrica.
Observando-se a situação ocupacional destes trabalhadores no momento
em que se apresentaram como candidatos à vaga na fábrica, verifica-se que 70%
(33) estavam desempregados, 32% (15) tinham outros empregos, 4,25% (dois)
trabalhavam em casa. Sete não responderam. Na questão relativa à experiência
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
144
anterior, 93% (44) tinham experiência anterior em fábricas de calçados. Três
deixaram de responder.
Daqueles quinze que apontaram ter outros empregos, um definiu trocar de
trabalho em virtude do horário, e nove apontam as condições de trabalho, um
deles explicitando que nesta fábrica valoriza-se o trabalhador.
Os motivos pelos quais um trabalhador procura um novo emprego, quando
está empregado, sempre estão referidos a melhores condições de trabalho ou
salário e à expectativa de crescimento profissional.
Sabe-se, pelos depoimentos dos sócios, que no processo de contratação de
novos trabalhadores é feita uma seleção que leva em conta a experiência anterior.
Um dos trabalhadores aponta isto em seu questionário, dizendo: “fiz um curso de
cortador e consegui uma chance”.
Outra questão refere-se à percepção dos trabalhadores acerca do seu
conhecimento do processo de trabalho e no que isto altera seu modo de trabalhar.
Dos 47 questionários, 32% disseram que conhecem mais o processo do que
quando estavam em outro tipo de fábrica. Quanto aos benefícios trazidos por este
conhecimento, 12,7% apontaram uma melhor qualidade do que é produzido, em
virtude de vários fatores. Dentre as respostas obtidas, pode-se identificar algumas
que valorizam a “organização, compromisso, habilidade e muita qualidade”;
apontando a necessidade de se trabalhar com mais qualidade e com menos erros:
“menos erros, menos consertos e mais produtividade”.
Outro aspecto que foi valorizado é relativo à confiança, que gera uma
atenção maior no desenrolar do trabalho. Esse tipo de resposta pode indicar uma
sensação de co-responsabilidade e compromisso de cada trabalhador com a
produção que está sendo feita.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
145
Outra questão referia-se à percepção do trabalhador em relação a
mudanças na sua qualidade de vida: Ela está melhor ou pior depois que veio para
esta fábrica?
Não foi apontada nenhuma piora na qualidade de vida; 40% (19) disseram
que está tudo igual e 60% (28) declararam que a vida melhorou. Em quatro
questionários, esta melhora está referida ao fator renda. Outras quatro à
segurança no emprego. E há uma resposta que junta estas três condições: “as
condições de trabalho, trouxe mais satisfação e um melhor salário”.
Outras respostas apontam outro tipo de ganho por trabalhar na fábrica.
Tanto há alguns que falam em conhecimentos, aprendizado que traz mais
confiança na vida profissional e uma maior independência – “Hoje sou uma
profissional com bons exemplos e capacidade” – quanto outros que indicam
mudanças de comportamento no trabalho e na relação familiar: “Melhorou a minha
maneira de ser e de agir, somos mais unidos uns aos outros”.
Entre as respostas apontando que sua vida não mudou nada, há indícios de
alguma mudança, pois há as seguintes respostas: “quase nada, só tenho mais
liberdade de trabalho”; “Não mudou nada, ainda!”
Mudanças de comportamento, melhores salários, menos tempo de
deslocamento para ir ao trabalho, mais liberdade, união entre os trabalhadores...
ao mesmo tempo em que os trabalhadores apontam tudo isso, dizem que é tudo
igual, que não mudou nada... Interessante cotejar este tipo de respostas àquelas
referidas ao futuro.
A última pergunta era relativa ao futuro: o que se espera dele? As respostas
podem ser agrupadas em dois grandes blocos: respostas genéricas e a busca de
melhores condições de trabalho e renda. Este segundo bloco aponta desejos que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 3
146
podem ser subdivididos em quatro itens: ser empresário; ganhar mais e ter um
cargo melhor; preparação para o trabalho e a busca de uma outra profissão.
Dentro da busca de melhores condições de trabalho e renda, 27% (13) das
respostas apontam o futuro deste trabalhador ligado ao futuro da Marc’ellsse –
“que a cada dia melhore mais a situação da empresa para que assim também
possa melhorar a de todos os funcionários”. Algumas destas respostas apontam
um certo receio: “Que a fábrica com seu desenvolvimento não se esqueça dos
empregados”.
Duas respostas apontam a busca de objetivos pessoais, apontando a vida
que tiveram em criança e aquela que estão conseguindo dar aos filhos: “Que Deus
me dê saúde para que eu possa continuar a trabalhar, para dar à minha filha o
que os meus pais não puderam me dar”.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
Capítulo 4
UMA REFLEXÃO SOBRE
IDENTIDADE
147
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
148
Em seu texto “A invenção do trabalho”, Freyssenet (1993) considera que o
“trabalho seria esse momento que permite ao homem obter direta ou
indiretamente mediante troca ou algo equivalente, aquilo que lhe é necessário
para viver dentro da sociedade onde ele está inserido”. Na nossa sociedade, este
trabalhar se dá baseado em relações sociais que ordenam e constroem aqueles
que nela estão inseridos, mas que, ao mesmo tempo tais relações podem ser
pensadas,
construídas
e
transformadas
pelas
ações
desses
mesmos
trabalhadores.42
O século XIX foi muito rico em debates e conflitos que permitiram aos
assalariados reconhecerem e terem o reconhecimento de que a relação
Capital/Trabalho representava uma relação específica de subordinação que exigia,
inclusive, um tratamento diferenciado; é daí que surgem as legislações trabalhistas
e outros tratados e documentos sobre direitos, proteção, etc...
Leven (1994:9) diz que
as relações de trabalho no Brasil nascem de um sonho de paraíso
encontrado e progressivamente perdido. Durante quatro séculos,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
149
elas foram relações de colonização o que constitui uma relação
política de mando e submissão e de escravidão que implica
produção e trabalho, numa relação de propriedade e lucro.
Trabalhar é só ser posse do outro para produzir.
No mesmo artigo, Leven trata das descontinuidades e continuidades
constitutivas das relações de trabalho na contemporaneidade, concluindo que,
hoje, estas relações estão
maduras porque trabalhadores expressam sua subjetividade; o
mundo do trabalho se reconhece como o espaço do conflito entre
classes sociais; o local de trabalho é vivido como experiência do
sofrimento e também da realização dos indivíduos. (1994:11)
Vários fatores impulsionaram o grupo de Birigüi a experienciar uma nova
relação de trabalho. Possivelmente em virtude das reflexões potencializadas pela
Igreja Católica, redescobriram o espaço de trabalho como campo de conflito e
negociação. Nesse processo, engajaram-se na luta sindical que buscava tomar os
sindicatos oficiais através das oposições sindicais e, a partir delas, construir um
novo modelo sindical. Ainda que em várias partes do Brasil essa luta tenha sido
vitoriosa, possibilitando a renovação de parte significativa dos sindicatos, no que
se refere ao Sindicato de Trabalhadores do Calçado de Birigüi o resultado foi a
derrota.
Mesmo derrotado, o grupo saiu da luta ciente de que “para compreender o
trabalho é necessário desenvolver a consciência de que o ser humano se faz, se
constrói, se constitui a si mesmo, e o faz coletivamente, conflitivamente” (Cunha,
1994:29). Procuraram, então, concretizar na realidade cotidiana e familiar a utopia
presente no discurso que preconizava relações mais horizontais.
42
Marx aponta a proeminência da relação capital-trabalho sobre outras relações existentes em sociedade.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
150
O ensinamento bíblico servia de parâmetro para o grupo que se expressava
assim:
Nós pegamos aquela história e adaptamos à nossa. Pensamos o
seguinte: [...] eles venderam tudo e dividiram com os pobres [...]
Nós não tínhamos nada, se nós vendêssemos e dividíssemos com
os pobres, iam ser mais doze pobres, ia piorar a situação. Então,
resolvemos mudar, e fazer alguma adaptação: juntar o que nós
tínhamos – cada um entrava com o que tinha – e começarmos
alguma coisa para gerar emprego, gerar trabalho para nós
mesmos. (MMS)
Um aspecto a ser salientado é o processo de construção social de
identidade desses trabalhadores que têm compartilhado experiências comuns
baseadas na manutenção da sua identidade de classe [trabalhadora] ainda que
vivenciando uma experiência que tradicionalmente é de outra classe [empresarial].
Referindo-se a atores sociais, Castells considera que identidade é
o processo de construção de significado com base em um atributo
cultural, ou ainda um conjunto de atributos culturais interrelacionados, o(s) qual(is) prevalece(m) sobre outras fontes de
significado. Para um determinado indivíduo ou ainda um ator
coletivo, pode haver identidades múltiplas. No entanto, essa
pluralidade é fonte de tensão e contradição tanto na autorepresentação quanto na ação social. (1999:22)
As normas existentes em todas as sociedades influenciam o comportamento
das pessoas, mas tal influência depende dos papéis que estas desempenham.
Cada ator social pode, simultânea ou consecutivamente, desempenhar vários
papéis: mãe, filho, trabalhador, militante de determinada causa, etc.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
151
As identidades constituem processos de individuação e são fontes de
significado para os próprios atores. A construção das identidades está referida às
instituições dominantes da sociedade, mas somente se concretizam ao serem
internalizadas pelos sujeitos.
Ainda segundo Castells (1999:23),
identidades são fontes mais importantes de significado do que
papéis, por causa do processo de autoconstrução e individuação
que envolvem. Em termos mais genéricos, pode-se dizer que
identidades organizam significados, enquanto papéis organizam
funções.
A identidade dos trabalhadores se forma e se transforma no trabalho e nas
relações sociais que o engendram, e não é característica que se constrói fechada
em si mesma, ela vai sendo forjada
no curso das experiências vividas em coletividade, isto é, através
da apropriação/reelaboração do patrimônio social. As relações de
trabalho constituem um processo criador: produzem, ao mesmo
tempo, a objetividade e a subjetividade humana. (Palangana:
1998:13)
Para conhecer esta identidade é preciso observar os dados, mas mais do
que isso é necessário que estejamos atentos às ações desenvolvidas. No início do
empreendimento (a fábrica Marc’ellsse) todos eles eram trabalhadores, a
identidade pressuposta, portanto é uma identidade trabalhadora que vem se
metamorfoseando na construção de uma nova identidade trabalhador-empresário.
Os sócios das fábricas comunitárias verbalizam, de diversas formas, a
consciência de que, mesmo naquele primeiro momento, estariam vivendo um
papel híbrido. Quando falava da proposta inicial, MMS dizia assim: “A gente estaria
sentindo a parte dos empregados que já naquela época nós éramos, e estaríamos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
152
sentindo a parte do empresário, porque também estaríamos como empresários”.
Ser trabalhador e estar empresário, eis o modo como eles afirmavam este seu
novo estado.
Aparentemente, esta identidade em construção é uma interpenetração dos
dois aspectos – ser trabalhador e ser empresário – de forma que a individualidade
empresarial assim construída pressupõe um processo anterior de constituição
destes sujeitos como trabalhadores.
A construção de identidades vale-se da matéria-prima fornecida
pela
história,
geografia,
biologia,
instituições
produtivas
e
reprodutivas, pela memória coletiva e por fantasias pessoais, pelos
aparatos de poder e revelações de cunho religioso. Porém, todos
esses materiais são processados pelos indivíduos, grupos sociais e
sociedades, que reorganizam seu significado em função de
tendências sociais e projetos culturais enraizados em sua estrutura
social, bem como em sua visão de tempo/espaço. (Castells,
1999:23)
O processo vivido pelo grupo da Marc’ellsse tem implicado uma ruptura com
as representações dominantes e a reelaboração de experiências e relações
mediante práticas sociais.
É através da experiência que a identidade vai perdendo uma certa
noção de “fixidez” e se constituindo, via articulação de práticas e
representações, particularmente, nas sociabilidades dos grupos e
espaços de luta e afirmação de projetos comuns. (Macedo,
1998:88)
No desenrolar desse processo, cada um dos indivíduos tem precisado
reelaborar suas experiências a partir da identificação ou não identificação com
características que vão formando sua identidade enquanto trabalhador e
empresário, enquanto empresário e militante em CEBs, etc. Simultaneamente,
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
153
ocorre a construção desta identidade a partir da elaboração de novas
representações sociais, coerentes com suas realidades e práticas sociais, num
processo de mediação entre solidariedade e conflito na construção deste novo ser.
Considerando que a construção social da identidade sempre ocorre num
contexto marcado por relações de poder, Castells propõe uma distinção entre três
formas e origens na construção de identidades:
Identidade legitimadora: introduzida pelas instituições dominantes
da sociedade no intuito de expandir e racionalizar sua dominação
em relação aos atores sociais, tema este que está no cerne da
teoria de autoridade de Sennett, e se aplica a diversas teorias do
nacionalismo;
Identidade de resistência: criada por atores que se encontram em
posições/condições desvalorizadas e/ou estigmatizadas pela lógica
da dominação, construindo, assim, trincheiras de resistência e
sobrevivência com base em princípios diferentes dos que permeiam
as instituições da sociedade, ou mesmo opostos a estes últimos,
conforme propõe Calhoun ao explicar o surgimento da política de
identidade;
Identidade de projeto: quando os atores sociais, utilizando-se de
qualquer tipo de material cultural ao seu alcance, constroem uma
nova identidade capaz de redefinir sua posição na sociedade e, ao
fazê-lo, de buscar a transformação de toda a estrutura social. Este
é o caso, por exemplo, do feminismo que abandona as trincheiras
da resistência da identidade e dos direitos da mulher para fazer
frente ao patriarcalismo, à família patriarcal e, assim, a toda a
estrutura de produção, reprodução, sexualidade e personalidade
sobre a qual as sociedades historicamente se estabeleceram.
(1999:24)
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
154
Num esforço conceitual preliminar, poder-se-ia dizer que o processo de
construção de identidade do grupo da Marc’ellsse aproxima-se daquilo que Castells
chama de “identidade de resistência”. Trabalhadores, descontentes com as
relações estabelecidas no seu cotidiano, resolveram experimentar uma nova
relação baseada em princípios diferentes daqueles vivenciados nas empresas que
conheciam. Por outro lado, se considerarmos o fato de que este grupo está
construindo um “projeto de vida” embasado no ethos cristão e em sua militância
sindical, poderíamos entender esta identidade em formação como sendo uma
“identidade de projeto”.
O fato é que esta identidade vem se constituindo pela articulação de
práticas e de representações, e é potencializada na sociabilidade do grupo. É nos
espaços de conflito e de luta que se afirma, se modifica e se reconstrói o novo
projeto. Cotidianamente, ele vem sendo negociado, na interface com um conjunto
de pertencimentos sociais, e é na interconexão dessas semelhanças e diferenças
que vai se definindo a identidade.
Podemos imaginar as mais diversas combinações para configurar
uma
identidade
como
uma
totalidade.
Uma
totalidade
contraditória, múltipla e mutável, no entanto una. Por mais
contraditório, por mais mutável que seja, sei que eu que sou
assim, ou seja, sou uma unidade de contrários, sou uno na
multiplicidade e na mudança.(Ciampa, 1991:61)
A primeira característica comum do grupo em estudo é o fato de seus
membros serem originários da classe trabalhadora. Não é esta, no entanto, a
novidade que apresentam, já que praticamente a totalidade dos empresários
calçadistas de Birigüi tem essa mesma origem.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
155
O que parece ter singularidade e apontar algo de novo diz respeito à
dinâmica das relações implementadas na fábrica, que tem relação com a
identidade de seus atores.
O desenho organizacional em que controladores/sócios se distribuem entre
os trabalhadores encarregados da linha de produção, todos realizando tarefas
similares, tem alguma semelhança com a chamada administração flexível, proposta
na qual se reduzem os níveis hierárquicos e se confere maior autonomia e
responsabilidade ao pessoal de linha.
Na Marc’ellsse há um bom sistema de informações, fazendo com que os
trabalhadores saibam até onde levar a negociação salarial. A liberdade relativa por
meio da qual cada trabalhador administra o seu tempo está vinculada ao
compromisso de produção e às tarefas especificadas para cada dia, o que exige
mais do que o controle, o consenso.
No seu dia-a-dia, a Marc’ellsse tem participado de fóruns de discussão
voltados para a melhoria da produção, seja em termos de qualidade do produto,
seja em termos de aumento da produtividade. Desses fóruns, participam alguns
poucos diretores e uma parte significativa dos trabalhadores que, envolvidos
diretamente na discussão e nos debates externos, vai construindo parâmetros para
orientar as decisões que devem encontrar o meio termo entre as necessidades da
produção e o bem-estar dos trabalhadores. Este processo procura estar acima dos
interesses particulares e se constrói a partir da recusa da busca de privilégios e da
barganha de interesses particulares.
Macêdo, cita Lavinas43, quando fala na identidade como uma “categoria da
prática”, ou seja, que emerge da ação pela qual os indivíduos adquirem autonomia
e
43
transformam-se
em
sujeitos.
Esse
processo
de
identificação
implica,
A obra citada por Macêdo é Lavinas, Lena, Identidade de gênero: um conceito da prática. In; Encontro
Anual da Anpocs, 13., 1989, Caxambu. (mímeo).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
156
necessariamente, e ao mesmo tempo, elaboração de si mesmo e do outro, via
interação social.
É nesse encontro com o outro que vai sendo reforçado um senso
de pertença ou mesmo de afastamento – o que reafirma a
proposição de que identidade não pode ser tomada como “dada”,
mas como um processo construído num contexto de relações
sociais. (1998:88)
Embora cada um de nós seja uma totalidade, em cada momento de nossa
vida se manifesta uma faceta desta identidade, uma parte deste nós. Esta unidade
de
contrários
que
somos
reflete-se
como
desdobramento
das
múltiplas
determinações às quais estamos sujeitos. Neste sentido, cada um de nós é um
feixe de relações, uma rede de representações.
Ciampa (1987) falando nos modos de produção da Identidade aponta
quatro possibilidades:
•
predominância de um personagem44 sobre outro [modo dominante de
produção];
•
transformação gradativa, no início há um conservar do modo de ser
anterior que vai sendo sucedido por uma nova personagem;
•
coexistência de dois personagens;
•
alternância dos personagens dependendo da situação.
A construção desta identidade, seja pela coexistência, pela alternância ou
pela transformação gradativa é bastante complexa. A administração dos interesses
44
“A identidade, que inicialmente assume a forma de um nome próprio, vai adotando outras formas de
predicações, como papéis, especialmente. Porém, a forma personagem expressa melhor isso na sua
generalidade” (Ciampa, 1987:134).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
157
de duas classes contraditórias exige muita reflexão e elaboração, num processo de
construção da consciência que nasce desta hibridez.
Segundo
Kofes45
(1997),
pensar
em
identidade
exige
o
reconhecimento da existência de uma tensão constante entre
igualdade e diferença, por entender-se que nenhuma identidade se
constrói sem o componente da diferenciação. (Macedo, 1998:87)
Macedo ressalva, logo a seguir, que “diferença não deve ser vivida como
inferioridade.
Trata-se
aqui
de
diversidade
e,
ainda,
de
resgate
de
potencialidades”.
Entre empresário e trabalhador, no entanto, mais do que uma “diferença”
existe um conflito de interesses na medida em que de um lado temos os gestores
do capital e de outro a classe-que-vive-do-trabalho e que é despossuída dos meios
de produção.
Seriam estas pessoas trabalhadores adjetivados como empresários? Ou
seriam eles empresários adjetivados como trabalhadores? Qual a ação que melhor
os define? São gestores do capital que trabalham na produção? Ou seriam
trabalhadores da produção que gerem seu negócio? O ser-empresário sucedeu o
ser-trabalhador, ou haveria uma coexistência das duas identidades? Esta
coexistência é permanente ou as duas identidades se alternam, dependendo dos
momentos?
Da análise feita, parece-nos que a “marca original” é o ser trabalhador.
Pode-se observar que esta marca é forte e foi cunhada numa militância
trabalhadora, principalmente nos momentos de oposição sindical. Quando o
segundo personagem [ser-empresário] buscou se estabelecer, encontrou nestas
45
A obra citada por Macêdo é Kofes, Suely. Estudos de Gênero: pressupostos teóricos e campos de pesquisa.
Salvador, ago. 1997 (Anoptações de Curso – Mestrado em Sociologia, FFCH-UFBa).
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
158
pessoas um filtro que colocou barreiras e fez com que a construção da nova
identidade se desse sem negar a anterior.
Ao mesmo tempo em que a Identidade nos diferencia no conjunto de iguais,
iguala-nos frente à sociedade mais ampla, levando a nos identificar neste
conjunto. Haveria alguma diferença entre estes empresários-trabalhadores e
outros empresários, cujas identidades empresariais sucederam a identidade
trabalhadora que tiveram anteriormente?
Estes
empresários/trabalhadores
são
trabalhadores
atuando
como
empresários? Ou seriam empresários com preocupações de trabalhadores? Isso
pode parecer um jogo de palavras, mas não é. Se a identidade de fundo é o ser
trabalhador, e a forma como esse trabalho se apresenta é o estar empresário, é
muito diferente de se ter uma identidade empresarial ainda que se execute
algumas tarefas de trabalhador.
Isto não significa que se fundiram as duas esferas [empresário e
trabalhador] ou que seus limites tornaram-se indefinidos. O que tem ocorrido, por
força da natureza do empreendimento que conduzem, é que estes trabalhadores
têm buscado transitar entre os dois mundos: dos trabalhadores e dos empresários.
Perguntado sobre a Marc’ellsse e sua opinião sobre ela, Mestriner disse que:
eu acompanhei à distância. Eu acho que quando eles começaram o
desenrolar da empresa, olha, eles são uns meninos muito sérios.
[...] Eu acho que, até, alguns empresários não viram com bons
olhos o trabalho deles. [...] Porque, na verdade, tem duas formas
de enxergar o trabalho deles: [...]Eles têm competência, eles têm
feito um trabalho fantástico, mas acho que eles deveriam estar
mais junto das discussões, das colocações... Eles têm, hoje,
conseguiram introduzir, implementar nestes anos, entendeu, uma
seriedade. [...] Eu acho que eles mostraram serviço e eu acho que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
159
eles podem se posicionar muito mais do que eles se posicionam,
hoje. Apesar de que existe uma evolução, e eles estão num
processo evolutivo, mesmo. Mas, eu acho que está na hora deles
se posicionarem mais.
Segundo Marx,
os proprietários de simples força de trabalho, os proprietários de
capital e os proprietários de terras, cujas respectivas fontes de
receita são o salário, o lucro e a renda do solo, ou seja, os
operários assalariados, os capitalistas e os latifundiários formam as
três grandes classes da sociedade moderna, baseada no regime
capitalista de produção. (1979:99)
Os empresários da Marc’ellsse têm sua origem na classe trabalhadora, e,
mais do que isso, parecem não ter perdido seu vínculo com a classe-que-vive-dotrabalho, de tal forma que seu que-fazer empresarial talvez possa ser visto como
uma ação “subversiva” pois, situados no sistema capitalista, eles não se deixaram
cegar pela ambição da acumulação.
Estes trabalhadores-empresários têm procurado organizar os trabalhadores
para uma nova relação no mundo do trabalho, e, nesta tarefa, buscam ir à origem
das desigualdades e aos espaços de poder, procurando compreender os
mecanismos empresariais, numa postura que nega a exploração e a opressão.
Neste processo, os trabalhadores-contratados da Marc’ellsse têm acesso a todas as
informações relativas ao empreendimento, e são convidados cotidianamente para
reflexões voltadas para uma reestruturação de suas consciências, de modo a
construir uma nova relação de trabalho.
Segundo Antunes, foram profundas as transformações ocorridas no mundo
do trabalho durante a década de 1980, e ele afirma que
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
160
a classe-que-vive-do-trabalho sofreu a mais aguda crise deste
século, que atingiu não só a sua materialidade, mas teve profundas
repercussões
na
sua
subjetividade
e,
no
íntimo
inter-
relacionamento destes níveis, afetou a sua forma de ser. (1995:15)
Dentre as mudanças ocorridas na década de 1990, salientam-se um grande
salto tecnológico, a automação e a microeletrônica no mundo fabril, que vêm
alterando as relações de trabalho e de produção do capital. Fordismo, taylorismo e
outros processos produtivos (neofordismo, neotaylorismo, pós-fordismo) mesclamse a experiências como as da “Terceira Itália”. É neste contexto que se apresenta
a tese de Sabel e Piore – especialização flexível – trazendo uma nova forma
produtiva que articula desenvolvimento tecnológico e desconcentração produtiva.
A partir da criação da Marc’ellsse, estes trabalhadores assumiram
atribuições da classe patronal, passando a responder pela coordenação da
produção, pelas relações internas, processo de trabalho e incremento da
produtividade.
Pelos relatos de outros empresários calçadistas de Birigüi, ficou evidenciado
que a grande maioria deles tem sua origem na classe trabalhadora. O que parece
novidade, no caso dos empresários da Marc’ellsse, é o fato de não terem
abandonado algumas das características da classe trabalhadora. Mesmo no
desempenho de suas funções empresariais, eles permanecem na linha de
produção e consideram a ótica dos trabalhadores quando da tomada de decisões.
O processo de tomada de decisões ganha uma outra complexidade em
virtude de estes empresários-trabalhadores precisarem conciliar interesses de
classe que, muitas vezes, são antagônicos.
A Marc’ellsse, para se manter no mercado, necessita responder às
exigências de qualidade e preço dos produtos; isto demanda o aumento da
composição orgânica do capital pela incorporação de novas máquinas e
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
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Capítulo 4
161
equipamentos. De outro lado, o compromisso com os trabalhadores demanda
condições de trabalho e de salário.
Aparentemente, eles estão num processo de transição em que já não são
puramente trabalhadores e nem são burgueses. Num processo de mudança de
cultura como este, dez anos são um período curto e somente o tempo nos dirá
como eles caminharão.
Nesta forma de gestão da fábrica, sócios e trabalhadores assumem relações
de trabalho baseadas na busca de cooperação entre novos saberes tecnológicos e
antigos saberes da experiência. O desafio está em estabelecer um “modus
operandi” no qual todos os trabalhadores, independente de posto ou lugar na
produção, desfrutem de igual voz e audiência.
Toda produção deve atender à lógica do mercado quanto à produtividade,
escala, baixos custos, exploração dos recursos financeiros, materiais e humanos,
manutenção da competitividade, etc. Neste sentido, podemos considerar que, no
seu papel de coordenador da produção, o empresário é aquele que define:
•
o método de gestão;
•
a participação ou não dos controladores na produção;
•
as relações internas [horizontais ou verticais];
•
o processo de trabalho;
•
as formas de incremento da produtividade;
•
a estruturação das tarefas;
•
os mecanismos de rastreamento e solução de problemas;
•
os indicadores de desempenho;
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
•
o fluxo de trabalho e sua velocidade;
•
as condições de trabalho e salário;
•
a conveniência de inserir novos investimentos.
162
Por outro lado, é próprio da classe trabalhadora e produtora um
comportamento, algumas vezes até mesmo corporativo, voltado para a defesa,
conquista e garantia de direitos.
O período inicial de formação da Marc’ellsse, e das demais fábricas
comunitárias, foi tempo de construção de um relacionamento com o mundo real
no qual os ideais foram abrindo caminhos novos a partir do confronto entre o
sonho e os limites colocados pelas exigências de produção e do mercado. Foi esse
o tempo de identificar o cliente e o mercado certos, buscar as pessoas adequadas
que tivessem a dedicação esperada e a identificação com o projeto.
Com o passar do tempo, e com o crescimento do grupo, foi sendo
necessária a criação de certa burocracia que garantisse o funcionamento de uma
empresa mais complexa mas que mantivesse o espírito de convivência dos
primeiros tempos. Os pactos que até então eram subentendidos e subliminares
ganham forma e transformam-se em regras.
Ainda
imbuídos
do
espírito
inicial,
e
conservando
sua
identidade
trabalhadora, foram construindo um modelo de gestão no qual buscam
compatibilizar as exigências que tinham quando eram apenas trabalhadores e esta
sua nova condição de responsáveis pela produção.
Palangana (1998:45) afirma que “o trabalho organizado nos moldes
capitalistas amesquinha os que se encontram nos dois pólos sociais: tanto o
trabalhador como o patrão”. Esta forma de gestão no qual trabalhadores e
gestores do capital atuam lado a lado tem possibilitado que a organização da
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Capítulo 4
163
produção seja definida em conjunto com os trabalhadores o que garante condições
de trabalho mais adequadas.
No caso da Marc’ellsse e de outras fábricas comunitárias, os detentores do
capital continuam atuando como trabalhadores de linha o que faz com que nem
percam de vista seu objeto de produção, nem deixem de estar conscientes das
dificuldades dos diversos setores, o que faz com que tenham mais condições de
tomar as decisões que o caso requer.
Na relação interna, assim estabelecida, não há uma submissão dos
trabalhadores,
mas
um
comportamento
de
companheirismo
e
co-
responsabilização.
A novidade que esta experiência apresenta está principalmente nas relações
que se dão no interior da fábrica. Esta experiência contextualizada geográfica e
historicamente parece estar favorecendo a construção de um campo de
reconhecimento, ação e reflexão comuns no qual estes sujeitos estão situados, na
medida em que está sendo proposta uma relação diferenciada entre gestores do
capital e trabalhadores.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
CONSIDERAÇÕES
FINAIS
164
Considerações Finais
165
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
A minha aproximação da Marc’ellsse e das demais fábricas comunitárias,
construindo a partir da experiência delas o objeto desta pesquisa, foi movida pelo
desejo de conhecer mais de perto as propostas que grupos de trabalhadores vêm
criando no enfrentamento ao desemprego e às dificuldades vividas por eles.
As
informações
preliminares
deixavam
entrever
nestes
grupos
características que pareciam interessantes de conhecer e analisar, porém não dava
para imaginar a riqueza de ações e significados que encerram.
Cabe, ao final do trabalho, reforçar pontos que pareceram importantes no
decorrer do processo e que não devem ser vistos como conclusões terminadas,
mas aspectos significativos no decorrer da aproximação, da vivência e do estudo
empreendido.
Considero que esta experiência contribuiu para repensar as relações sociais
de produção dentro de um empreendimento industrial estabelecido nos marcos do
capitalismo vigente no Brasil.
Nascida da concretização de um ideal cristão, a montagem destes
empreendimentos industriais buscava construir uma relação de responsabilidade
na produção onde todos fossem igualmente trabalhadores. O grande desafio
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
166
Considerações Finais
estava na construção de relações que não fossem de exploração, ainda que
contextualizadas no sistema capitalista.
A experiência em questão situa-se num município de médio porte, onde, nas
últimas décadas, vem se incrementando o desenvolvimento industrial. A indústria
calçadista de Birigüi é genuinamente birigüiense, tendo contribuído para estancar a
migração que fazia com que um contingente significativo de trabalhadores
deixasse a cidade em busca de seu sustento; hoje, ao contrário, diariamente
chegam à cidade 19 ônibus trazendo trabalhadores vindos de diversas cidades da
região. Segundo o censo de 1991, Birigüi foi a cidade que apresentou o maior
crescimento populacional do estado. Sem dúvida, este ambiente regional foi
fundamental para o êxito dos empreendimentos aqui analisados.
Dowbor (2000) salienta nossa dificuldade de repensar o universo social
numa perspectiva nova, e considera que isso ocorre pelo fato de as mudanças
terem sido rápidas em termos históricos e por terem se dado de maneira
progressiva, sem um momento preciso de ruptura. Segundo ele, ao invés de
aceitar o desafio da construção de novos conceitos, fomos “espichando” os
existentes para dar cobertura à nova realidade que se apresentava: “O lumpenproletariado adquiriu forma mais ampla no conceito de exclusão social, o
proletariado evoluiu para um conceito mais geral de classes trabalhadoras e assim
por diante”.
Apontando que esta preocupação não é apenas da esquerda, continua sua
reflexão dizendo que
o empresário efetivamente produtivo – não o controlador dos
casinos globais – pode acreditar que está defendendo a liberdade
de iniciativa, mas cada empresa que fecha ou é adquirida por
algum investidor institucional o deixa com mais dúvidas. E quando
compara os seus lucros, que resultam de esforço e riscos reais,
com as fortunas que especuladores ganham com o dinheiro dos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
167
Considerações Finais
outros, inclusive com remuneração assegurada pelo governo a
partir dos seus próprios impostos, começa a colocar em questão,
intimamente, a própria lógica do sistema. (Dowbor, 2000:3)
Uma característica importante identificada no objeto de estudo desta
pesquisa é sua condição híbrida: não é uma experiência de autogestão, mas tem
algumas de suas características; não corresponde exatamente aos tipos de
empreendimentos que vêm sendo estudados como de economia solidária, mas tem
uma lógica que se aproxima deles; as pessoas que têm conduzido este projeto têm
uma certa hibridez até mesmo em sua identidade, conforme apontado no capítulo
anterior. Esta condição multifacetada pediu uma abordagem que evitasse o mero
enquadramento nos modelos e nas descrições existentes.
A maioria das propostas conhecidas, originárias de grupos de trabalhadores,
partem do pressuposto de que a manutenção do ser trabalhador tem como limite,
quando muito, as experiências autogestionárias ou co-gestionárias, não se
considerando a possibilidade de este trabalhador transformar-se em empresário
para mostrar que é possível conduzir a empresa em outros moldes. E foi isto o que
ocorreu com os sujeitos estudados nesta Tese.
Tal novidade parece apontar a possibilidade de relações diferentes dentro
de empresas que continuam se movendo no mundo capitalista. Trata-se de uma
experiência datada, localizada e contextualizada. Com certeza, não pode ser
tomada como modelo a ser generalizado, mas isso não significa que não possa ser
tomada como referência de análise para outras situações, na medida em que ela
tem positividades.
Para isso, no entanto, é preciso primeiro ponderar as particularidades da
experiência:
•
Inserção em município de médio porte cuja trajetória de crescimento,
nas últimas décadas, suplantou outras cidades da região, fazendo com
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
168
Considerações Finais
que, de exportadora de mão-de-obra, passasse a gerar um número
significativo de empregos;
•
Setor industrial que tem exercido atração regional, o que cria um
ambiente favorável para estas empresas;
•
Maioria dos empreendimentos do setor são pequenas empresas e 66%
dos empresários vieram de outras indústrias de calçados onde eram
empregados ou ex-proprietários;
•
Trabalhadores jovens que aceitaram o desafio do novo;
•
Ethos cristão fortemente influente na formação destes trabalhadoresempresários;
•
Interface com CEBs e com a militância sindical, especialmente as de
oposição;
•
Empresas com características de empreendimento familiar.
Ainda que cada uma das características destes empreendimentos possam
ser encontradas em outras experiências, o modo como elas se articulam na
construção das fábricas comunitárias é bastante singular.
Vejo como uma potencialidade o sucesso obtido quanto à garantia de um
espaço de trabalho para um número significativo de pessoas, o que representa,
portanto, uma experiência de geração de trabalho e emprego e o fato de estarem
cunhando uma relação diferenciada que vem atestando ser possível a construção
de relações sociais sem exploração em meio a um empreendimento capitalista.
Mas é preciso acentuar que é uma experiência com limites bastante definidos.
De um lado, trata-se de uma experiência de pequeno porte e que tem
conseguido, quando muito, uma alteração de relações num ambiente restrito a
menos de dez empresas, num universo de quase 200, que são as sapatarias de
169
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
Birigüi. Por outro lado, está assentada num determinado perfil de empresário, uma
vez que este modelo propõe que o organizador da produção seja também ele um
produtor, isto é, trabalhador, e se contente com o salário de produtor.
Estes jovens empresários foram formados numa dupla militância nas
Comunidades Eclesiais de Base e na luta sindical
e isto, sem dúvida, imprime
elementos singulares que precisam ser considerados em outros estudos similares.
Impulsionados por uma “aventura” que foi pouco a pouco se transformando
num “projeto de vida”, estes pioneiros iniciaram uma pequena oficina apostando
na sua habilidade profissional e num processo de ação-reflexão-ação, construindo
um caminho que, segundo Marx, constitui-se numa relação dialética do real
pensado.
O processo de consolidação das fábricas comunitárias foi, também,
educativo, construindo uma trajetória de prática e reflexão sobre a prática. A dupla
militância – CEBs e Sindical – não apenas permitiu que tomassem conhecimento de
propostas que foram sendo experimentadas, adotadas e/ou descartadas, mas
serviu ao mesmo tempo de fonte de inspiração, escola de formação e espaço de
reflexão da prática que ia se instituindo. Além disso, a abertura ao diálogo com
diversos atores possibilitou não apenas o contato com diversas óticas, mas
também para a recepção de insumos diversos como aqueles emanados do
sindicato patronal e da discussão no fórum formado com a UNAM.
A localização dos controladores na operação direta, a eliminação de
encarregados e contramestres, as dificuldades no repasse de pedidos a outra
fábrica pela diferença de qualidade do produto, as estratégias de controle de um
capital que é sempre escasso sem perderem seu lugar no mercado foram passos
de um processo que os levou a se experimentarem em várias situações.
Sem dúvida, um dos pontos-chave deste processo tem sido a definição do
caráter do empreendimento. A proposta desenvolvida tem características de
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TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
autogestão, num empreendimento formalizado juridicamente como empresa
limitada; a atuação em rede com as demais fábricas comunitárias trouxe, em
determinado momento, uma preocupação com a relação entre elas e o perigo do
assistencialismo. Na busca de saídas, consideram a possibilidade de criação de
uma cooperativa “guarda-chuva” dentro da qual as empresas se moveriam. A
Cooperativa chegou a ser criada e funcionou por quase dois anos. Quando do
encerramento, avaliaram que este não era o caminho, porque o coletivo colocava
em risco a autonomia de cada empresa.46
Os ascpectos destacados a seguir são apresentados como pontos de partida
para a continuidade e aprofundamento da pesquisa sobre o assunto. O fato de ser
dado maior realce aos pontos positivos não significa que a experiência não
apresente conflitos, contradições e limites, que são inerentes à trajetória própria
dos
sujeitos
individuais
e
coletivos
que
compõem
a
história
destes
empreendimentos, alguns dos quais puderam ser observados no decorrer deste
estudo.
Propriedade dos meios de produção
A propriedade dos meios de produção está restrita aos doze sócios, e ainda
que as retiradas que estes fazem sejam muito próximas dos valores pagos como
salários para os trabalhadores, não se pode negar que vai se constituindo um
patrimônio que é apenas dos doze e não do conjunto de trabalhadores do
empreendimento. Importante salientar, também, que os mecanismos de inserção
produtiva nos mercados nacionais e internacionais têm exigido aumento constante
da composição orgânica do capital que, de certa forma, redunda em capitalização
dos sócios e não dos demais trabalhadores.
46
O processo de construção e desconstrução da Cooperativa não está detalhado nesta Tese por fugir ao seu
escopo, mas o assunto mereceria ser tema de outro estudo.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
171
Considerações Finais
A indústria do tênis, calçado produzido pelas fábricas comunitárias, é um
empreendimento que requer pouco capital, sendo possível – como foi feito pela
Marc’ellsse – ter, de início uma produção quase artesanal na qual a composição
orgânica do capital pode ser bastante restrita. Foi assim que estes pioneiros
começaram sua produção: cortes das peças com estilete, máquina de costura
caseira, frizadeira artesanal montada com motor de um liquidificador. O capital
inicial e os créditos conseguidos foram utilizados quase totalmente na compra de
matéria-prima.
Para dar início ao empreendimento, cada um dos sócios investiu o valor de
que dispunha, e, estes valores diferiam de um para o outro. Em aproximadamente
um ano, tais valores foram devolvidos a cada um e como todos tinham entrado
com o mesmo empenho no trabalho que realizaram, consideraram que cada um
dos sócios tinha partes iguais na empresa.
Uma das características destes empreendimentos é a sua dimensão de
convivialidade. A proposta inicial previa que todos seriam sócios, baseada numa
visão organizacional na qual um dos princípios era a participação dos trabalhadores
nas decisões. Tradicionalmente, esta convivencialidade é incompatível com
unidades produtoras em grande escala que demandariam um tipo de organização
mais vertical.
A remuneração recebida pelos sócios (retiradas) pode ser entendida como
custo na medida em que eles estão inseridos na operação direta da fábrica e os
valores são aproximados daqueles pagos como salários aos trabalhadores
contratados. Saliente-se que os contratados recebem horas extras quando sua
jornada é estendida, o mesmo não ocorrendo com os sócios.
Ainda que a propriedade dos meios de produção esteja nas mãos dos
sócios, que são minoria entre os trabalhadores do empreendimento, a lógica a
partir da qual a empresa se orienta não é de acumulação; em várias das decisões
172
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
tomadas, percebe-se a prevalência do aumento do número de trabalhadores na
fábrica e não de ampliação das taxas de acumulação.
Desenho organizacional da produção
Um segundo aspecto observado diz respeito à busca de superação da
hierarquia. Quando se pergunta a qualquer um dos sócios sobre o número de
trabalhadores na fábrica, a resposta é noventa. Eles entendem que são
trabalhadores tanto aqueles que foram contratados e que recebem salários,
quanto os doze sócios. A localização de cada um deles na operação direta na
produção é um dos fatores que mantém cada um deles como um trabalhador de
linha e não como um coordenador do processo que é desenvolvido pelos
trabalhadores.
Um dos pilares do modelo de gestão construído pela Marc’ellsse e pelas
demais fábricas comunitárias é, sem dúvida, esta presença dos sócios na linha de
produção. O convívio direto e diário com os trabalhadores, aliado à sensibilidade
potencializada pelo compromisso com eles, faz com que a direção da empresa
acompanhe o desenvolvimento de cada um dos contratados, podendo atentar para
as dificuldades e mesmo sugerir mudanças de função de modo a tornar as tarefas
mais adequadas à produção e à situação de cada trabalhador.
Pela dinâmica adotada, cada setor tem afixado em quadros visíveis a todos
os trabalhadores qual está sendo o andamento da produção naquele setor, o que
permite que cada um acompanhe seu desempenho e o de seus companheiros. Por
outro
lado,
sendo
profissionais
competentes
e
estando estrategicamente
localizados na produção, o grupo de sócios tem condições de monitorar o conjunto
da produção, seus pontos de estrangulamento, propondo alterações no ritmo de
produção de cada setor.
Experienciar este modo de gestão que nega uma hierarquização rígida exige
o ajuste das técnicas de produção, testando-lhes o funcionamento. A base sobre a
173
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
qual se assenta tal gerenciamento é o entendimento de que os trabalhadores
conhecem melhor do que ninguém o seu trabalho e, ao se sentirem livremente
responsáveis pela produção, apontarão os melhores caminhos. Importante lembrar
que isto se dá dentro de uma sociedade fundamentada na hierarquia o que, sem
dúvida, implica mudança cultural dos sujeitos envolvidos.
Levantamento feito com os trabalhadores (questionários) possibilitou atestar
certa dificuldade inicial de participar de uma estrutura não hierarquizada.
Muitos dos estudiosos em autogestão apontam a necessidade de rodízio de
funções como uma maneira de cada um dos trabalhadores conhecer o todo do seu
negócio, para assim poder tomar decisões adequadas. Um contra-argumento
apresentado por Costa enfatiza o respeito à diversidade e às habilidades das
pessoas.
Supor que todos devam ser capazes de fazer tudo com o mesmo
bom desempenho, é fortalecer uma compreensão totalitária do
coletivo, isto é, uma compreensão que nega e desvaloriza a
riqueza presente na diversidade. No meu entender, a circulação de
informações
é
fundamental
para
que
haja
uma
gestão
efetivamente coletiva do trabalho. (Costa, 1989:24)
A maioria dos trabalhadores contratados pela Marc’ellsse tem função fixa na
produção e isto ocorre não apenas porque as funções requerem habilidades
diferenciadas – atenção, força, etc. – mas até mesmo em virtude das convenções
coletivas definirem salários diferenciados para as funções.
Os sócios são mais versáteis e muitos deles podem se colocar em qualquer
ponto da produção, mas, sem dúvida, há setores nos quais as suas habilidades
estão mais adequadas. Nas reuniões de direção, discutem a fábrica como um todo
e a situação de cada setor. Assim, por exemplo, é a configuração gerada pelo
afastamento de trabalhadores por férias ou licenças, que define a posição que
174
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Considerações Finais
cada sócio deve ocupar na produção naquele período. A meu ver, trata-se de um
rodízio parcial, pois está subordinado às conveniências da produção.
O rodízio por si só não garante um conhecimento com qualidade de cada
setor da empresa. Tratando-se de um empreendimento produtivo e não de um
espaço voltado apenas para o aprendizado, há que se respeitar as habilidades, e a
garantia do conhecimento do todo deve se dar na forma de gestão. A superação
da fragmentação deve se dar no processo de tomada de decisões possibilitando a
cada sócio dominar a organização do trabalho mesmo que permaneça fixado no
setor para o qual sua aptidão é maior ou sua especialização exija.
Nas fábricas comunitárias, as decisões são coletivas – considerando-se
como coletivo o corpo de sócios – mas o processo que as fundamenta perpassa o
conjunto dos trabalhadores, que discutem e opinam livremente.
Na instância maior de decisão da empresa, no entanto, apenas os sócios
têm assento; e, ainda que consideremos que cada um deles possa ser o porta-voz
dos trabalhadores do seu Setor, fica patente que este é um dos espaços onde se
manifesta a ambigüidade do trabalhador-empresário. Resta saber, afinal das
contas, qual o interesse que prevalece.
A política salarial adotada está baseada na CLT e os trabalhadores têm
garantidos seus direitos e salários que acompanham as convenções coletivas da
categoria. Os valores pagos para cada uma das funções é pouco maior do que
aqueles pagos por outras empresas. Segundo a presidente do sindicato de
trabalhadores, há liberdade de acesso à fábrica pelo sindicato, que considera
adequadas as condições de trabalho e ganho.
O
controle
administrativo
da
fábrica
é
diferenciado
daquele
que,
tradicionalmente, é visto em outras empresas e cujo objetivo é a extração do
máximo de mais-valia, por meio do implemento de uma produtividade cada dia
maior. Trata-se de um controle coletivo, exercido pelos próprios trabalhadores e
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
175
Considerações Finais
que se coloca horizontalmente na busca da realização das tarefas propostas com
um menor desgaste e fadiga por parte dos trabalhadores.47 O ambiente da fábrica
é tranqüilo e as relações são democráticas e isso garante um bom relacionamento
entre todos os trabalhadores, sejam eles sócios ou empregados.
Nesta experiência, assim como em outras, o controle pode estar a serviço
dos trabalhadores. Exemplificando, cito Pedrini48 que, analisando um grupo
semelhante a este, diz: “pode haver um modo de controle e burocracia que venha
a defender os direitos dos trabalhadores, no caso do controle que favoreça a
estes...” (1998:169).
Existe, nas relações de produção, um controle exercido sobre o trabalhador,
considerado alienado, que parte do pressuposto de que ele precisa ser vigiado
porque se percebe explorado e adota mecanismos de defesa, desde a diminuição
do ritmo de trabalho até a realização de procedimentos inadequados à qualidade
esperada.
Num processo de produção mais transparente, em que os detalhes são
conhecidos por todos os trabalhadores, e estes sabem que seus ganhos são
semelhantes àqueles que são percebidos pelos sócios do empreendimento, o
controle toma características de um autocontrole, pois cada trabalhador assume a
responsabilidade sobre as tarefas que estão a seu cargo.
Tal vivência vai construindo uma nova compreensão da autoridade, numa
relação de respeito, camaradagem e compromisso.
47
Drucker (1991:66) afirma que foi apenas a partir da Segunda Guerra que os trabalhadores passaram a ser
ouvidos e surpreenderam a todos, na medida em que “eles não eram irracionais, nem imaturos, nem
desajustados. Eles conheciam muito a respeito do trabalho que faziam, sua lógica e ritmo, as ferramentas, a
qualidade e assim por diante”.
48
O objeto de Tese da Dalila Pedrini (1998) é a Empresa Alternativa de Produção Socializada. Assim como as
fábricas comunitárias aqui estudadas, a origem da EAPS está ligada a um grupo de jovens da Igreja Católica
que, há 11 anos, decidiu iniciar um projeto social, político, econômico e de convivialidade.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
176
Considerações Finais
Segundo foi possível observar, a relação estabelecida entre os sócios e os
trabalhadores contratados baseia-se na reciprocidade, estando mais próxima da
liderança do que da chefia. Nesta lógica, em cada situação específica, quem define
a ação é aquele que reúne as melhores condições para fazê-lo no momento. Como
conseqüência, cada membro do grupo sente-se pessoalmente responsável pelas
deliberações e pelo êxito da tarefa empreendida. Numa proposta como esta, a
acumulação deixou de ser a finalidade dominante da produção, sendo contrastada
à satisfação dos trabalhadores.
Este tem sido o caminho trilhado pela Marc’ellsse, que, ao buscar uma
responsabilidade compartilhada na produção, permite um maior aproveitamento do
potencial de cada trabalhador, respeitadas suas necessidades e limites.
Para que a empresa se mantenha no competitivo mercado capitalista, ela
precisa ser eficaz. Em nome da eficácia tecnológica, exige-se a atualização
permanente dos métodos de produção – um método somente é eficaz se não
existir nenhum outro que o suplante. Já a eficiência significa o uso adequado dos
instrumentos e equipamentos; esta eficiência tem que ser construída a partir de
dois olhares, as condições de trabalho (turnos, descansos, férias e regras) e as
necessidades de produção versus formação dada aos trabalhadores.
A discussão das propostas de melhoria da produção, realizada com o
conjunto de trabalhadores da fábrica, objetiva a racionalização e a elevação da
produtividade, assim como a eliminação do desperdício e do retrabalho. O que se
almeja é o crescimento da habilidade individual de cada trabalhador, a economia
dos lead times (tempo que o trabalhador perde quando passa de um trabalho para
outro), e o uso de máquinas que permitam abreviar o tempo de execução das
tarefas. Importante salientar que a produtividade da qual se fala é aquela
decorrente do desenvolvimento do processo social de produção e não aquela
proveniente da exploração capitalista.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
177
Considerações Finais
À medida que os trabalhadores vão se apropriando de algumas
competências gestionárias, sua intervenção na gestão do processo produtivo vai
sendo qualificada.
Capacitação continuada
O processo de formação, a socialização das informações e a participação,
ainda que indireta, na tomada de decisões vai possibilitando uma apropriação
coletiva do progresso técnico e um maior controle e subordinação das máquinas
pelos trabalhadores que as submetem ao seu ritmo de trabalho e vida. Este
processo demanda uma capacitação continuada dos trabalhadores, sejam eles
sócios ou não, de modo a garantir ao mesmo tempo o padrão de qualidade
adequado e satisfação pessoal.
Todos estes componentes vão construindo uma forma de gestão que
perpassa o coletivo dos trabalhadores na medida em que as decisões só se
efetivarão se forem assumidas por todos aqueles que trabalham na fábrica. Há um
investimento continuado na formação de modo a que se possa somar o saber
prático que eles têm e exercitam no seu dia-a-dia e as novas propostas
tecnológicas apontadas por outras experiências. Introduzir novas formas de
trabalho, mantendo as características de participação na gestão é um processo
complexo e que requer mais do que simplesmente disciplina no trabalho.
Esta trajetória apresentou dificuldades de diversas ordens, mas ainda assim
o grupo não esmoreceu. Muito pelo contrário, os participantes aceitaram o desafio
de continuar e foram cunhando sua própria história, permitindo que as relações
extrapolassem a fábrica e invadissem o cotidiano e a vida de cada um de seus
membros. Permitiram também a multiplicação para outras fábricas.
O tempo de existência da Marc’ellsse – doze anos – ainda que suficiente
para a análise de alguns aspectos, é insuficiente para que se possa pensar no seu
significado futuro. Se aceita a idéia de que a identidade destes empresários está
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
178
Considerações Finais
em transição49, será possível garantir que a postura aqui registrada se manterá no
decorrer do tempo?
A Marc’ellsse parece sólida o suficiente para se manter no mercado nos
próximos anos, e, sendo uma empresa com características familiares, poderá ser
assumida pelos filhos dos atuais sócios – que hoje são crianças com idades entre
alguns meses e 10 anos. Mas os herdeiros terão os mesmos sonhos que seus pais,
ou tenderão a transformar-se em empresários distantes dos trabalhadores como
tantos que conhecemos? Não sabemos! O que dá para afirmar é que o
compromisso comum e a transparência no agir vêm aumentando a confiança entre
eles. e isso tem permitido ações ousadas de construção do futuro sonhado.
Cabe salientar, ainda que:
•
as várias fábricas comunitárias tiveram diferenciados graus de sucesso
no empreendimento e as pessoas envolvidas avaliam que um dos
motivos disso deve-se ao maior ou menor grau de capacidade
empreendedora de seus iniciadores;
•
as ações em rede foram significativas para a socialização entre as
diversas fábricas;
•
à medida que se aproximam de formas institucionalizadas do agir social,
precisaram ser formalizados os acordos verbais e definida a metodologia
organizacional;
•
processos como este não se dão sem conflitos e mesmo os consensos
alcançados foram construídos a partir da discussão dos pontos de vista
de cada um dos envolvidos;
•
a consolidação da identidade coletiva tem sido um processo interativo
que implica investimentos contínuos.
49
- Na concepção de Ciampa, identidade é metamorfose, portanto é/está sempre em transição.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO/TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
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Considerações Finais
Finalizando, quero deixar registrado o quanto a pesquisa deste processo
significou na minha formação e amadurecimento, e ainda que possa revelar
insuficiências, quero fazer minhas as palavras de um dos associados de uma das
fábricas comunitárias:
Cada momento de nosso trabalho, cada lembrança de nossos
passos e obstáculos, cada grupo de pessoas interessadas em
seguir nossa caminhada nos deixa a certeza de que estamos
contribuindo na organização de uma nova sociedade onde pessoas
são valorizadas e não excluídas.
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Um cotidiano construído passo a passo
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TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
ANEXOS
210
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
Anexo I - QUESTÕES ORIENTADORAS PARA
AS ENTREVISTAS
I. Presidente da Comissão Municipal do Emprego
em Birigüi
1) Qual o desempenho do setor de calçados em Birigüi ? Qual o percentual
de valor agregado pelo qual ele é responsável ?
2) Quantos são os estabelecimentos do setor calçadista ? Quantos são os
trabalhadores em atividade ? Há um índice de desemprego do setor ?
3) Qual tem sido a tendência do setor de calçados (anos 80 e 90) no que
se refere à absorção e exclusão de mão-de-obra ?
4) A que estas situações estão ligadas:
• implantação de novos empreendimentos ?
• encerramento de atividades dos estabelecimentos?
• introdução de novas tecnologias e/ou procedimentos de gestão ?
• outras causas. Quais ?
5) Quais as ocupações/ profissões que têm sofrido com o processo de
enxugamento da mão-de-obra e quais têm apresentado maior número
de admissões ?
6) A mão-de-obra disponível para contratação tem o nível de qualificação
adequado para as necessidades do setor ? Qual o nível de qualificação
de mão-de-obra que tem sido admitida e da que tem sido demitida no
setor ?
7) No setor de calçados, (em especial a produção de tênis) qual a
predominância: pequenas, médias ou grandes empresas ?
8) Como se dá a qualificação da mão-de-obra ? Quem faz, quanto tempo
leva...
9) Qual o perfil do profissional desse setor ? Tem havido mudanças em
virtude de novas tecnologias ?
10) Como se distribui a produção de calçados no Brasil, no Estado de São
Paulo e em Birigüi ?
211
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
11) Birigüi está no segundo lugar no “ranking” de empregos do setor, em
especial no que se refere a calçados infantis. Que análise podemos fazer
da parcela do setor de calçados localizado nessa cidade ?
12) Como foi formada a Comissão Municipal do Emprego e qual foi o
processo de formação?
212
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
II. Presidente da COMPABI – Cooperativa Mista de
Produção Alternativa de Birigüi
1)
2)
3)
4)
5)
6)
7)
8)
9)
Conte-me como tudo começou, ou seja, como vocês iniciaram a Oposição
Sindical e o que houve com ela. Período, conquistas, dificuldades...
Como surgiu a idéia da oficina de sapatos ? Vocês haviam saído de um
curso de CEBs, não é... que influência o curso teve no desenrolar dos
acontecimentos ?
Quem são os membros desse primeiro grupo ? Quais estavam
desempregados e assumiram a oficina e quais eram a retaguarda ?
quais foram as primeiras providências, como venderam os primeiros
pares... em quanto tempo perceberam que daria certo e chamaram os
outros.
Qual foi o processo de definição do regimento interno (dinâmica)?
Quantas pessoas participaram ? Quem teve a idéia de formar um nome
com as iniciais de todos ?
Quanto tempo ficaram nesse primeiro espaço ? Como foram compradas
as máquinas (seguintes) ?
Como surgiu a Maic d’joll ? Quanto tempo depois ? Quem era o grupo
novo? Qual a dinâmica que criaram ? Onde instalaram a segunda
oficina ?
Fale do incêndio. ( Como aconteceu ? O que ocasionou? Quem socorreu?
Como a imprensa cobriu?
Como foi o recomeçar ? Local, apoios, tempo que levou para “levantar”...
Como foram estes anos ? Fale do que foi bom e do que foi difícil. Sei do
tempo das “vacas magras” em que alguns de vocês foram trabalhar no
campo para garantir a continuidade do projeto. Quem são eles ? Como
foi isso ?
10) Hoje são cinco fábricas, mas houve algumas outras... como são estas
histórias ?
11) Como tem sido o crescimento das fábricas ?
12) Em muitos lugares (Franca, Jaú, etc..) a indústria de calçados tem um
sistema de terceirização com tarefas que as pessoas executam nas suas
casas. Isso também ocorre em Birigüi ?
13) Vocês dão serviço para ser feito em casa ?
14) Cada trabalhador (nas fábricas) tem uma função fixa, ou são polivalentes
? (execução, projeto, administração, etc...)
213
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
15)Como são os treinamentos ? Quem treina hoje e quem treinou os
primeiros?
16) Acompanhei alguns espaços de formação que vocês tinham. Ainda tem ?
Há anotações de quais as discussões que ocorreram nestes espaços ?
17) O fato das pessoas terem esse tipo de envolvimento aumenta o
entusiasmo? Isso se reflete na produção ? (faltas, doenças, alcoolismo,
drogas)
18) Compare os salários e benefícios que os trabalhadores das fábricas
recebem com o que paga o mercado de calçados de Birigüi.
19) Vocês dialogam com os Sindicatos patronal e de trabalhadores ?
20) Qual o percentual de trabalhadoras mulheres ? Aquela preocupação com
gravidez, como se resolveu ?
21) Como o povo da cidade vê essa iniciativa ?
22) Qual o relacionamento de vocês com outros empresários do setor ?
23) Vocês acompanharam a tentativa de criação da câmara setorial de
calçados de Birigüi?
24) Você tem acompanhado o que faz a Comissão Municipal do Emprego ?
25) O processo de produção que vocês realizam é igual ao das outras
fábricas? Parece-me que vocês não mantêm estoques de calçados, mas
vão produzindo conforme os pedidos. É isso mesmo ? Por que isso ?
Como é organizada a produção ?
26) Houve um período em que vocês produziram na informalidade ? Em
algum momento tiveram problemas trabalhistas ?
27) Como são comercializados os produtos (lojas, pedidos, consignação,
vendedores ambulantes ?Qual o tamanho do corpo de vendedores, e o
sistema de vendas... eles são cooperados ?
28) Como consolidou-se a cooperativa ? (marca “dectoner”? / todas as cinco
?) O relatório que foi encaminhado à FGV fala em 270 pessoas: funções,
cooperados ou não, vendedores...
29) Como você viu o processo da lojinha ? Como funcionam as lojinhas de
fábrica?
30) Você acha viáveis as idéias da Edna de caixas de sapato e solas de
material reciclável ?
31) O que aconteceu com aquela idéia de produção de chinelos tipo Rider ?
32) Qual o significado da Rede de Experiências Econômicas Alternativas no
desenvolvimento da COPABI ? Qual o significado da COPABI na Rede ?
214
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
33) Fale
da
creche
(desde
quando,
quantas
condições(profissionais/custo/quem custeia, onde...)
Anexos
crianças,
34) E o refeitório (desde quando, quantas refeições, quem paga, quem
trabalha e quem define as refeições ?
35) E o programa de alfabetização ? como surgiu ? Como o MEC soube dele
? Quantas pessoas passaram e passam por ele... Fale do prêmio.
36) E a gleba onde estão construindo ? Conte um pouco...
215
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
III. Assistente Social que trabalha na Vila
Bandeirante (bairro pobre de Birigüi) e cuja
Dissertação de Mestrado foi sobre os
Sapateiros de Birigüi
1. Como você vê a situação social de Birigüi ?
2. A pobreza com a qual você trabalha é fruto do desemprego permanente,
do desemprego de entressafra, ou do nível de salários ?
3. Quais as estratégias de reação da população: como fazem para
sobreviver?
4. Que outros problemas devem ser encarados (alcoolismo, drogas,
violência)?
5. Que ações do Poder Público têm sido significativas ?
6. Como tem sido a ação da Igreja Católica de Birigüi ? e Igrejas de outras
confissões ?
7. Que outras forças têm sido significativas ? (Rotary, Lions, Maçonaria,
Entidades Sociais)
8. Você trabalha com essa população há vários anos, como vê as mudanças
que ocorreram nesse período em termos organizativos ? Como ela
reagia e como reage hoje ?
216
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
217
IV. Sindicatos dos Trabalhadores em Calçado50
1) A maioria das empresas do setor de calçado, que produzem tênis, são
grandes, médias ou pequenas empresas ?
2) Qual tem sido o comportamento do Setor de Calçados no que se refere a
emprego/desemprego ?
3) Quais as causas do Desemprego no Setor Calçadista? [Fechamento de
empresas ? Novas tecnologias ? Procedimentos de gestão ? Outros ?]
4) Qual a importância, o significado da parcela do Setor Calçadista que está
sediado em Birigüi ?
5) Qual o perfil do trabalhador do setor de calçado ? Que mudanças houve
nesse perfil do final da década de 80 até os nossos dias ?
6) Quais os efeitos das novas tecnologias no setor: maior reciclagem ou
desemprego?
7) Qual o perfil do desempregado do setor de calçados ?
dificuldades que encontra ?
Quais as maiores
8) Sabe-se que o setor calçadista de Franca se utiliza muito de trabalho em
casas. Como é Birigüi em relação a isso?
9) Qual a incidência de trabalho infantil em Birigüi ?
10) CONTAR DA COMPABI: Qual o significado de um Projeto como este?
11) Ao visitar as fábricas comunitárias de Birigüi, o que devo observar ?
50
O mesmo roteiro foi utilizado com o Sindicato de Trabalhadores em Calçado de São Paulo, Sindicato dos
Trabalhadores nas Indústrias de Calçado de Birigüi.
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
V. Sindicato da Indústria de Calçados Patronal de
Calçados
1. Qual o desempenho do setor de calçados ? Qual o percentual de valor
agregado pelo qual ele é responsável ?
2. Quantos são os estabelecimentos do setor (calçadista) ? Quantos são os
trabalhadores em atividade ? Há um índice de desemprego do setor ?
3. Qual tem sido a tendência do setor de calçados (anos 80 e 90) no que se
refere à absorção e exclusão de mão-de-obra ?
4.
•
•
•
•
A que estas situações estão ligadas:
implantação de novos empreendimentos ?
encerramento de atividades dos estabelecimentos?
introdução de novas tecnologias e/ou procedimentos de gestão ?
outras causas (quais)
5. Quais as ocupações/ profissões que têm sofrido com o processo de
enxugamento da mão-de-obra e quais têm apresentado maior número de
admissões?
6. A mão-de-obra disponível para contratação tem o nível de qualificação
adequado para as necessidades do setor ? Qual o nível de qualificação
de mão-de-obra que tem sido admitida e da que tem sido demitida no
setor ?
7. No setor de calçados, (em especial na produção de tênis) qual a
predominância: pequenas, médias ou grandes empresas ?
8. Como se dá a qualificação da mão-de-obra ? Quem faz, quanto tempo
leva...
9. Qual o perfil do profissional desse setor ? Tem havido mudanças em
virtude de novas tecnologias ?
10. Qual a distribuição regional (no Brasil e em São Paulo) ?
11. Birigüi está no segundo lugar no “ranking” de empregos do setor, em
especial no que se refere a calçados infantis. Que análise podemos fazer
da parcela do setor de calçados localizado naquela cidade ?
218
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
VI. Empresários do Setor Calçadista de Birigüi
Anexos
[ diversos]
1. Você acompanhou o surgimento da primeiro oficina deles – a
Marc’ellsse?
2. O que acha dessa proposta de uma produção de certa forma socializada
onde os empregados têm certo poder de decisão sobre a produção?
Isso é semelhante ou diferente da sua fábrica?
3. Como você vê a relação deles com os outros produtores de tênis da
cidade? Por que os grandes deixam essas fábricas continuarem?
4. Na sua opinião, como eles conseguem ter espaço no mercado? Menor
margem de lucro, condições de pagamento? O que?
5. Como foi a ajuda que você deu a eles? Compra de matéria prima?
Cessão da sua fábrica para que produzissem? Como foi isso – deu certo,
criou problemas... Por que você teve confiança neles?
6. Na sua opinião, como os outros empresários vêem essa experiência?
7. Você participa do Fórum de Pequenos Empresários e Associações de
Moradores? O que acha desse fórum e de suas propostas?
219
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
VII. Pessoas ligadas à Igreja Católica e às CEBs de Lins
1. Discurso da Igreja Oficial x Desenvolvimento das Pastorais na Igreja
Particular de Lins
2. Memória dos trabalhos ( relatórios, relatos, materiais tipo jornaizinhos...
onde encontrar?) – organizar o povo em torno das necessidades
sentidas, o que significava isso?
3. O que foi o processo de “inserção na produção”? Em Birigüi teve um
primeiro
grupo
[
Sérgio/comércio,
Carlão/contabilidade,
Foquito/professor, Djalma, Dorival] que começou depois de um projeto
que a Igreja desenvolveu na Bahia... ficaram um ano lá...
4. Como eram os grupos de jovens na década de 80/90? Como eram as
CEBs na região e em Birigüi? O que mais frutificou como eles?
5. Que curso foi feito em Gabriel Monteiro que ficou marcado por todos
esses anos?
6. Que visão de empresário esse processo passava?
7. Você tem acompanhado a trajetória desse grupo de Birigüi? – conversar
sobre o desenho de construção e reconstrução da COMPABI...
[incubadora/autodidata]
8. Nova forma de organização da produção – a produção é socializada,
diferente da tradicional... a circulação se resolve no mercado
[
Waldemar Rossi à os pés dos mais pobres...]
9. Por que deram certo?
existir?
Por que os grandes empresários os deixam
10. 10) Como você vê o processo como elemento de reinserção profissional
e de valorização profissional?
11) Por que e como mobilizaram a sociedade quando houve o incêndio?
12) Como são vistos pela Igreja, pelos Empresários, pelo Movimento Popular,
pelos Sindicatos e pela sociedade em geral?
13) Como era a relação das fabriquinhas na EPOP? Dos outros trabalhos
comunitários que assumiram experiências econômicas, quais tem atuação
significativa?
14) O que poderemos tirar como lição da experiência da rede de experiências
econômicas alternativas?
220
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
VIII. Conversa com Pessoas que
participam das Fábricas
comunitárias
1) Trajetória pessoal, antes da Marc’ellsse. Dados pessoais/familiares [ idade,
casamento, filhos, escolaridade, naturalidade] dados profissionais [ onde
trabalhou, experiência profissional/funções que exerceu, avaliação],
militância [ sindical, partidária, Igreja, CEBs].
2) Além de vir para esse processo, quem mais trouxe com você... no início e
durante a trajetória.
3) O que mudou na sua vida por conta da fábrica? Era essa sua expectativa?
4) O que vocês queriam no início e o que querem hoje? Monopólio ou só
resolver o problema do grupo?
5) Por que pequenas unidades? Impostos ou relações?
6) Qual o perigo de saturação do mercado pelo desdobrar de novos grupos?
7) Como você vê essa nova forma de organização da produção? Considera
que vocês conseguiram socializar com todos como propunham?
8) Como você avalia o processo de venda? Em algum momento pensaram
num processo diferente... os pés dos mais pobres...
9) Por que deram certo? Preço, qualidade, condições de pagamento?
10) Como é a relação com os outros empresários?
11) Como vocês são vistos pela Igreja, empresários, movimento popular,
sociedade, sindicato patronal e sindicato de trabalhadores?
12) Por que e como vocês conseguiram mobilizar a solidariedade da
sociedade quando houve o incêndio?
13) Os desdobramentos, o surgimento de novas fábricas foram momentos de
crescimento ou maneira de resolver pequenos conflitos?
14) Você considera que esse processo significou reinserção profissional? Para
quem? E valorização profissional? Para quem?
15) Quem toma pequenas decisões – compra de matéria prima, novas
máquinas, reciclagem/treinamento dos funcionários, onde buscar dinheiro?
16) De onde vem a orientação técnica e estética?
17) Como é decidida a divisão do excedente?
221
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
IX. Conversas com Dirigente da Maic d’jol
1) Quais foram os passos que tornaram o processo das fábricas comunitárias
efetivo?
2) Qual o nível de informação/formação que têm os sócios? E os
empregados? Quais os meios de comunicação que garantem isso? [
reuniões, escritos, boca a boca, etc..]
3) Qual o lugar das mulheres? Tem por quê?
4) Houve trabalhadores que foram das fábricas comunitárias e voltaram para
as tradicionais?
5) A técnica/tecnologia utilizada pelas fábricas comunitárias é mais avançada
ou semelhante à que é utilizada pelas outras fábricas da cidade?
6) As fábricas têm um núcleo de gestão comum? Uma assessoria
administrativa?
7) Há regras claras no que se refere a direitos e deveres dos empregados, ou
se resolve cada caso domesticamente?
8) Existe um risco de auto-exploração por parte dos sócios?
9) Como é a relação das fábricas comunitárias com as outras fábricas de
Birigüi?
10) O que mudou, na Maic d’jol, depois da saída do Mauro
retirada, encarregados...]?
[ regras de
11) Como foi o processo de construção e desconstrução da COMPABI?
222
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
X. Conversa com dirigentes da
Marc’ellsse
1. No primeiro momento, quando ainda eram só os 4 primeiros, que tipo de
pessoas procuraram para construir a proposta, constituindo o grupo dos
primeiros 12?
2. Quem construiu aquela máquina com motor de liquidificador?
3. Quem desenhou os primeiros modelos?
4. Quem montou os primeiros mostruários?
5. Quanto tempo levaram para conseguir o lugar da primeira Marc’ellsse, na
medida em que os pedidos eram maiores do que esperavam?
6. Como resolveram o problema da dispobilidade das pessoas nesse primeiro
momento?
7. Chamadas à comunidade, buscando convidar pessoas a formarem o
segundo grupo e mesmo a se juntar ao primeiro eram feitas como:
depoimentos ou individualmente?
8. Esta intensidade do contato (trabalhar, viver e se confraternizar sempre
com as mesmas pessoas) não cansa, nem dá atritos?
Anexos
223
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
XI. Primeiro Vendedor
No relato das fabricas comunitárias, é muito forte aquele primeiro momento
em que produziram um mostruário e deram na sua mão, pensando que
conseguisse vender poucos pares e você vendeu 400 na primeira semana e
200 na outra.
1. Como foi aquele primeiro momento? Vendeu 400 no mesmo lugar ou em
vários? O que facilitou aquelas primeiras vendas? Qualidade/estética do
produto, preço, condições de pagamento? O fato de ser uma fábrica
comunitária ajudou em alguma coisa naquela venda?
2. Qual o prazo de entrega daquelas primeiras mercadorias? [precisaram
reestruturar tudo... deu tempo?]
3. Quem são os compradores deste tipo de mercadoria? Que tipo de lojas?
Cidades pequenas ou grandes, lojas populares ou mais finas... o que?
4. O que abre espaço de venda no mercado desses produtos? A qualidade
deles, o preço, o prazo de entrega, as condições de pagamento ou o papo
do vendedor?
5. Você vende só para estas fábricas ou para outras?
6. Como se dá a renovação da circulação, ou seja, como você abre novas
portas para venda?
7. As lojas nas quais você vende têm algum poder de influência na definição
do que vai ser produzido? Rejeitam algum tipo de produto, apontam
quais são melhor aceitos? Há algum processo de sentar junto para
conversar sobre novos produtos? Como saber o que vende mais?
224
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
XII. Conversa com Carlos Alberto
Mestriner
Na história das fábricas comunitárias de Birigüi, foi muito significativo o salto
de qualidade que pode ser dado a partir da ação desencadeada pelo
Sindicato Patronal voltado para a qualificação da produção de calçados de
Birigüi.
1) Qual foi a proposta do seu mandato de qualificação das pequenas
empresas?
2) A partir de qual momento, o Sindicato tomou conhecimento das fábricas
comunitárias?
3) O que você acha dessa proposta de uma produção de certa forma
socializada onde os empregados tem certo poder de decisão sobre a
produção?
4) Como foi aquele processo de troca entre os vários fabricantes que foi
desencadeada pelo Sindicato Patronal?
5)
Como você vê a relação deles com os outros produtores de tênis da
cidade? Por que os grandes deixam essas fábricas continuarem?
6) Na sua opinião, como eles conseguem ter espaço no mercado? Menor
margem de lucro, condições de pagamento? O que?
7) Na sua opinião, como os outros empresários vêem essa experiência?
1) Como você vê a ação da União das Associações de Moradores que junta
pequenos empresários? Como avaliar suas propostas e o espaço de
concretizá-las?
225
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
XIII. Conversa coletiva com pioneiros
1) A utopia de viver em comum era igualmente forte para todos, ou alguns
precisaram ser convencidos? Houve embates?
2) Muitos são casais. Maridos e mulheres concordavam com a proposta? O
que pensavam os pais dos mais jovens?
3) A socialização tem estado presente na produção... já a venda é feita no
Mercado. Como fica a parte da utopia relativa aos pés dos mais pobres?
4) Vocês conseguiram transformar em realidade a proposta de acabar com a
exploração dos patrões contra empregados? Como foi a luta para não
serem engolidos pelo mercado?
5) Mudou a visão que vocês tinham do empresário?
6) Quais os grandes momentos de decisão e como vocês se organizaram
para decidir?
226
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexo II -
Anexos
227
QUESTIONÁRIO APLICADO AOS TRABALHADORES DAS
FÁBRICAS
Questões para os Trabalhadores e Trabalhadoras das fábricas
Estou fazendo um estudo sobre o modo como pode se organizar o trabalho. Escolhi
como ponto de partida a experiência das fábricas comunitárias da qual você faz parte.
Venho conversando com várias pessoas, mas é muito importante que eu saiba o que
vocês, que estão trabalhando aí dentro pensam.
Você não precisa pôr o seu nome. Não importa quem diz cada coisa, desde que
possamos saber como vocês se sentem. Por favor, responda sinceramente.
1) Há quanto tempo você trabalha nesta fábrica?
5 anos
entre 3 e 5 anos
entre 1 e 3 anos
ano
2) Qual a sua relação com esta empresa?
sócio fundador
sócio, não fundador
vendedor
outro. O que? _______
menos de um
empregado
3) Como foi que você chegou aqui ?
através de parentes
na comunidade
outros. Explique:
______________________________________________________________
__
4) Das fábricas comunitárias, essa é a primeira onde você trabalha ou
trabalhou em outras?
esta é a primeira
trabalhei em outra à qual? ______________
por quanto tempo? _____________ Por que trocou ? ______________
5) Qual era sua condição quando optou por vir para esta fábrica ?
desempregado
cuidava de casa
trabalhava em outro lugar
5) Você já tinha, anterior a esse trabalho, experiência em produção de
calçados?
não
sim. Em que setor? ______________________________
6) O que te atraiu para esta fábrica ?
salário
horário
condições de trabalho
outro. Explique
______________________________________________________________
__
7) Atualmente, você tem uma função fixa na fábrica, ou atua em várias
frentes?
várias frentes
função fixa. Qual? ____________________
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
8) Você acha que os trabalhadores desta fábrica conhecem melhor o
processo todo do que os trabalhadores de fábricas tradicionais de
produção de tênis?
nós conhecemos mais
é tudo igual
eles conhecem mais
9) O que esse conhecimento altera no seu modo de trabalhar?
______________________________________________________________
__
10) Isso traz mais ou menos satisfação para você?
mais satisfação
mesma coisa
menos satisfação
11) Sua vida, hoje, é melhor ou pior do que quando começou a trabalhar
nesta fábrica?
pior
igual
melhor
12) O que você considera que mudou na sua vida por trabalhar aqui?
______________________________________________________________
__
13) O que você espera do futuro ? ( se necessário, escreva atrás)
______________________________________________________________
__
Tabulação dos Questionários
Dos 47 trabalhadores que responderam ao
questionário, 23 souberam da vaga por parentes que já trabalhavam na
fábrica; 9 souberam a partir da participação na comunidade; 5 foram
encaminhados por colegas, amigos ou namorada; 3 tinham amizade com um
ou mais sócios; e apenas 2 chegaram à fábrica por processos naturais de
procura de emprego em fábricas. 5 deixaram de responder a este item.
Olhando a situação imediatamente anterior destes novos trabalhadores,
verifica-se que 33 estavam desempregados, 15 tinham outros empregos, 2
trabalhavam em casa e 7 não responderam.
Na questão relativa à
experiência anterior, 44 tinham experiência anterior em fábricas de calçados,
e três deixaram de responder.
O questionário perguntava, ainda, “o que te atraiu para esta fábrica?”
Das respostas obtidas, 36 apontaram as condições de trabalho, tendo havido
os seguintes acréscimos, como depoimentos:
• “trabalhar aqui é bom”;
• “estava desempregada e a firma é muito boa”;
• “Os sócios são amigos e honestos, são exemplos de bondade e
compreensão”;
• “São pessoas educadas e que sabem valorizar o funcionário”.
228
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
Apenas nos questionários aplicados aos sócios é
que encontramos referência à vida em comunidade, espírito coletivo e
comunitário...
13 questionários apontam situações de necessidade, e colocaram os
seguintes depoimentos:
• “Estava desempregado”;
• “Necessitava de trabalho”;
• “Estava desempregada e a firma é muito boa”;
• “Precisava trabalhar para ajudar em casa”;
• “Estava precisando de um serviço”;
• “Desemprego”;
• “Falta de emprego”;
• “Precisava trabalhar”;
• “Por precisar de trabalho”;
• “Estava desempregada” (apareceu duas vezes);
• “Necessidade de emprego”;
• “Para pagar as contas”.
Uma das respostas – “fiz um curso de cortador e
consegui uma chance” – aponta para a questão da seleção que é feita cada
vez que se vai contratar trabalhadores novos.
Duas pessoas apontaram facilidades de horário de trabalho. Achamos
interessante cotejar estas duas respostas com a questão seguinte: “Sua vida
está melhor ou pior depois que veio trabalhar aqui?” na medida em que 4
das respostas apontam como melhoria de vida o fato de trabalharem mais
perto de casa o que sem dúvida faz o tempo render mais. Foram os
seguintes os depoimentos relativos à proximidade entre trabalho e
residência:
• “Muito mais perto e patrões considerados bons para trabalhar”;
• “Ficar mais perto e as amizades”;
• “Facilita a correria por ser perto de casa”;
• “Sobrar mais tempo para cuidar dos deveres de casa”.
Atente-se para o fato de que nenhum
questionário apontou piora na qualidade de vida, 19 disseram que está tudo
igual e 28 declararam que a vida melhorou.
Dos questionários que apontam melhora na qualidade de vida, quatro
apontam o fator renda como determinante:
• “Melhorou minha renda familiar”;
• “Melhorar a minha renda”;
• “Minha condição de vida melhorou”;
• “Minha renda, meu ânimo”.
Quatro dos questionários apontam o fator
segurança como chave da melhoria alcançada.
• “Emprego garantido”;
• “As condições no trabalho, trouxe mais satisfação e um melhor
salário”;
• “Estou mais despreocupada por estar trabalhando”;
• “Paz, segurança e confiança”.
Cinco
questionários
apontam
novos
conhecimentos, um aprendizado que traz a confiança de ser profissional,
gerando uma maior independência.
• “Eu aprendi várias coisas”;
229
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
“Novos conhecimentos”;
“Hoje sou uma profissional com bons exemplos e capacidade”;
“Adquiri experiência”;
“Fiquei mais independente”.
Outros sete questionários vão mais ou menos
no mesmo sentido mas apontam mudanças de comportamento no trabalho e
na relação familiar.
• “Posso usar meu próprio dinheiro e ter minha profissão”;
• “Melhores condições e roupas novas que eu não tinha”;
• “Melhorou a minha maneira de ser e de agir, somos mais unidos uns
aos outros”;
• “Relacionamento pessoal”;
• “Comportamento Melhorou a minha maneira de ser e de agir, somos
mais unidos uns aos outros”;
• “Relacionamento pessoal”;
• “Mudei de comportamento”.
“Dois dos respondentes falaram da busca de
seus objetivos pessoais, um deles apontando uma mudança entre a vida que
teve em criança e a que está conseguindo dar aos filhos:
• “A facilidade de conseguir meus objetivos”;
• “Que Deus me dê saúde para que eu possa continuar a trabalhar, para
dar à minha filha o que meus pais não puderam me dar e conseguir a
minha casa própria”.
Nove questionários apontam que não mudou
•
•
•
•
nada. Três deles se expressaram do seguinte modo:
• “Quase nada, só tenho mais liberdade de trabalho”;
• “Minha vida sempre foi normal e continua normal;”
• “Não mudou nada, ainda!”
Três dos questionários apontam que mudanças
e as creditam ao prazer de trabalhar e ao comportamento dos sócios.
• “Mudou muito a minha vida, porque a única fábrica que gostei de
trabalhar”;
• “Os sócios ajudaram muito a minha situação”;
• “Os sócios são muito educados e amigos”.
Outra questão foi relativa ao processo de
trabalho. Perguntou-se: Você acha que os trabalhadores desta fábrica
conhecem melhor o processo todo “do que os trabalhadores das fábricas
tradicionais de produção de tênis?”
A essa pergunta, três responderam que
conhecem menos. 15 disseram que conhecem mais e 31 disseram que o
conhecimento é igual em fábricas dos dois tipos. Na seqüência, perguntouse “no que este conhecimento altera seu modo de trabalhar”.
O maior número de respostas (seis) apontou
uma melhor qualidade do que é produzido, em virtude de vários fatores:
• “Organização, compromisso, habilidade e muita qualidade”;
• “Na organização, respeito e compromisso com a qualidade do tênis”;
• “Mais qualidade e menos erros”;
• “que tudo o que a gente aprende nunca é demais”;
• “Aperfeiçoar cada dia mais, fazer qualidade e aprender mais
Aperfeiçoar cada dia mais, fazer qualidade e aprender mais”;
• “Trabalhar com mais qualidade e conhecimento no que fazemos”;
• Altera a intenção de evoluir cada vez mais”;
230
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
• “Menos erros, menos consertos e mais produtividade”.
Outros quatro questionários apontaram a
confiança e que esta gera uma atenção maior no desenrolar do trabalho.
• “A gente tem mais confiança”;
• “Altera ter mais atenção, observação para aprender como eles
conhecem bem o tênis para poder falar tudo sobre ele”;
• “Porque aqui na fábrica nós temos mais liberdade”;
• “Ser mais atencioso e procurar fazer o melhor possível, não desanimar
nunca.”
Ao lado destas respostas que apontam um
detalhe do que mudou, há dois blocos de respostas relativas a “mudou tudo”
e “não mudou nada”, que reproduzimos abaixo:
• “Tudo”;
• “Muita coisa”;
• “Melhora”;
• “Nada, pois onde eu for trabalhar tenho que ter responsabilidade e
consciência do que estou fazendo”;
• “Nada, porque somos sapateiros como todo mundo”;
• “Nada, porque os processos de trabalho são idênticos”;
• “mínimo possível”.
Por fim, há uma resposta que parece trazer uma angústia: “Às vezes,
eu fico nervosa”.
Uma última questão (aberta) era relativa ao futuro e se expressava
assim: “O que você espera do futuro?”
Agrupamos as respostas recebidas em três blocos: no primeiro deles,
colocamos as respostas que podem ser consideradas genéricas:
• “Que o desemprego acabe e que todos tenham o direito a um salário
digno e que tenham sua própria moradia”;
• “Saúde, paz e não estar desempregado”;
• “Alcançar novos horizontes”;
• “Melhorar”;
•
“Que a humanidade se ame mais e leve a sério as leis de Deus,
conseguindo assim que o amor fale mais alto trazendo a paz que todos
procuram”;
•
“O futuro não existe, espero saúde no meu presente”;
•
“Que o amor brote no coração de cada um, amando mais o próximo”;
•
“Que todos conseguimos crescer e ter uma vida melhor ainda do que
temos, etc. ..”;
•
“Melhores condições de vida e sempre muita saúde para trabalhar”;
•
“Minha própria casa com meu trabalho”;
•
“Que Deus liberte a todos nós e que as pessoas não passem fome
como hoje estão neste caso absurdo”;
•
“trabalhar sempre e estar ao lado das pessoas que gosto”.
Um segundo bloco, pode ser lido como a busca de melhores
condições de trabalho e Renda, e que subdividimos em quatro sub-ítens:
SER EMPRESÁRIO:
• “Ser uma grande empresária”;
• “ser uma boa empreendedora de negócios”;
• “ter meu próprio negócio”.
GANHAR MAIS, TER UM CARGO MELHOR:
• “Uma profissão para ganhar mais”;
• “ser reconhecida para ter um cargo melhor e provar a minha
capacidade”;
231
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
• “quero um futuro de progresso e que eu me realize profissionalmente.
Em relação á fábrica, que ela continue assim e se mudar que seja para
melhor”;
• “que suba o meu salário”.
PREPARAÇÃO PARA O TRABALHO:
• “Ampliar meus conhecimentos e especificações para estar mais
adaptável ao mercado de trabalho”;
• “continuar estudando para progredir cada vez mais”;
• “me aperfeiçoar mais para progredir cada vez mais”.
BUSCA DE UMA OUTRA PROFISSÃO:
• “Uma profissão para ganhar mais”;
• “mudar de profissão e conseguir um serviço melhor”;
• “continuar um bom tempo trabalhando aqui, melhorar com o tempo de
função, me estabilizar e ter uma renda boa para crescer no mundo lá
fora [ pretendo fazer um curso para secretária]”;
• “ter uma profissão melhor.”
Um último bloco de respostas, entende seu
futuro ligado ao futuro da Fábrica.
• “Que a firma cresça e que um dia eu possa me situar numa função de
empregadora”;
• “Que a firma cresça cada vez mais e melhore o meu padrão de vida”;
• “Que a empresa cresça mais e que eu tenha um cargo melhor e ganhe
mais”;
• “Que a cada dia melhore mais a situação da empresa para que assim
também possa melhorar a de todos os funcionários”;
• “Que a fábrica com seu desenvolvimento não se esqueça dos
empregados”;
• “Que abra mais caminho para que a gente cresça”;
• “Que eu possa tirar proveito o máximo possível nesta fábrica, aprender
ao máximo as tarefas que tenho que cumprir. O mundo aí fora exige
muito da gente...”;
• “Que eu cresça profissionalmente para que a empresa tenha mais
qualidade no meu serviço”;
• “Um trabalho melhor”;
• “Mudar de função”;
• “Espero mudar para um serviço melhor”;
• “Que a fábrica possa evoluir, crescer cada vez mais. Espero sair da
função que estou e partir para uma função melhor”;
• “Que todos aprendam a respeitar e amar o próximo, criando assim um outro
ritmo de vida e melhor ambiente de trabalho”.
232
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
233
Anexo III - FICHAS DOS ENTREVISTADOS
Nome: João Reis Rodrigues
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: Presidente da Comissão Municipal de Empregos de Birigui
religião [ não foi perguntado]
Observações: A entrevista foi agendada por telefone. Havia sido elaborado um roteiro que foi
entregue ao pesquisado para que ele se inteirasse do objetivo da entrevista. Depois disso foi
deixado que ele se expressasse livremente, sendo colocadas perguntas apenas para detalhar os
momentos em que o relato deixava dúvidas. O entrevistado nos recebeu em sua fábrica – Calçados
Hobby Ind e Com Ltda – que visitamos na saída da entrevista.
Data da entrevista: 16/7/98
Data da transcrição: 23/7/98
Responsável pela transcrição:
Magdalena
Nome: Mauro Pereira da Silva
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
Birigüi /SP
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Presidente da COMPABI
religião católica
Ocupação atual:
Observações: A primeira entrevista foi precedida de uma conversa informal, no dia 8/7/98, em São
Paulo [ Mauro havia vindo para apresentar os produtos da COMPABI na Francal, Feira de Calçados].
Foram realizadas, mais três entrevistas, a primeira delas na COMPABI, em Birigüi, a segunda em
São Paulo, num Hotel onde Mauro estava hospedado em virtude de um Workshop sobre Geração
de Trabalho promovido pela FGV-SP. A terceira foi em Birigüi, na sede da sua nova empresa.
Data das entrevistas:
Data
das
transcrições: Responsável pela transcrição:
8/7/1998;17/7/1998;
9/7/1998;
24/7/1998; Magdalena
12/3/1999; 8/9/2000
14/3/1999 e 15/9/2001
Nome: Sílvia Helena de Souza
Idade
sexo x F
M
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: Assistente Social da Prefeitura, responsável pelas creches
religião
católica
Observações: Militante em Direitos Humanos. Acompanha os movimentos populares, em especial a
Vila Bandeirantes. O marido dela, Sérgio, participou de uma experiência semelhante a essa. Em
1982 alguns militantes da Pastoral Operária montaram uma fábrica de tamancos. O
empreendimento durou 3 anos e faliu.
Data da entrevista: 17/07/1998 Data da transcrição: 25/7/98
Responsável pela transcrição:
Magdalena
Nome: Edna Flor
Idade
sexo x F
M
estado civil:
x solteiro
casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: Advogada e vereadora
religião católica
Observações: Militante dos Direitos Humanos, acompanha toda a movimentação da região. É
uma das dirigentes da EPOP e assessora vários movimentos populares.
Data da entrevista: 30/06/1998
Data da transcrição: 10/7/1998
Responsável pela transcrição:
Magdalena
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
Nome: Edilson Sérgio Borella
Idade
sexo
F xM
estado civil:
x solteiro
Naturalidade
nacionalidade brasileiro
Ocupação atual:
dirigente do CDH / funcionário da CUT
casado
divorciado
raça: negra x branca
religião
234
outros
outra
católica
Observações: Enquanto dirigente de um Centro de Direitos Humanos, participava da organização
dos grupos de economia popular na região. Realizava feiras (FEPAL) e chegou a montar uma feira
de produtos populares em Araçatuba.
Data da entrevista: 30/06/1998 Data da transcrição: 10/7/1998 Responsável pela transcrição:
Magdalena
Nome: José Carlos Getz
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: Presidente do Sindicato de Trabalhadores em Calçado de São Paulo
religião
não foi perguntado
Observações: A entrevista objetivava coletar dados sobre a dinâmica do setor calçadista.
Data da entrevista: 16/06/98
Data
da
20/06/1998
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
Nome: Dorival Canassa
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
Ocupação atual diretor da Pinókio, Indústria e Comércio de Calçados Ltda.
religião católica
Observações: A entrevista foi concedida na sede da empresa.
Data da entrevista: 04/09/2000
Data
da
10/09/2000
outros
outra
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
Nome: Ismael Varoni
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: diretor da Peroni – Indústria e Comércio de Calçados Ltda.
religião católica
Observações: A entrevista foi concedida na sede da empresa.
Data da entrevista: 05/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
10/09/2000
Nome: Carlos Alberto Mestriner
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
Birigüi
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: diretor das Indústrias de Calçados Klin
religião (não foi perguntado)
Observações: A entrevista foi concedida na seda da Klin. Mestriner foi presidente do Sindicato
Patronal no biênio 96/97 e a entrevista focalizou prioritariamente seu mandato.
Data da entrevista: 08/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
13/09/2000
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
235
Nome: Nalberto de Milton Vedovotto
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: diretor executivo do Sindicato das Indústrias do Calçado e Vestuário de Birigüi
religião (não foi perguntado)
Observações: A entrevista foi concedida na sede do Sindicato Patronal. Além de informações sobre
a proposta do Sindicato, o entrevistado falou sobre as fábricas comunitárias.
Data da entrevista: 05/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
14/09/2000
Nome:
Milene Rodrigues
Idade
sexo x F
M
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Calçado de Birigui
Observações: A entrevista foi concedida na sede do Sindicato. Foi uma longa entrevista que versou
sobre a situação do setor de calçados visto pela ótica dos trabalhadores.
Data da entrevista: 06/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
15/09/2000
Nome: Sérgio Luiz Campian (negão)
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual : vendedor de calçados de diversas indústrias
religião
Observações: Sérgio foi o primeiro vendedor da Marc’ellsse e permanece nesta função até hoje. A
entrevista possibilitou ouvir um relato desta história a partir do desenvolvimento das vendas.
Data da entrevista: 04/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
14/09/2000
Nome: Luiz Francisco Morgado
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
Ocupação atual: diretor da Maic d’jol Indústria de Calçados
religião católica
Observações: A entrevista foi concedida na sede da Maic d’jol. Morgado está desde o início da Maic
d’jol e pode falar sobre o processo das fábricas sob esta ótica. Além deste momento da entrevista,
tivemos várias conversas com Luiz Morgado
Data da entrevista: 04/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
15/09/2000
Magdalena
Nome: Fernando Santiago
Idade
sexo
F xM
estado civil:
solteiro x casado
divorciado
outros
Naturalidade
nacionalidade brasileira
raça: negra x branca
outra
religião católica
Ocupação atual:
Observações: Fernando foi responsável pelas ações da Diocese de Lins durante muitos anos e viu o
surgimento e crescimento das fábricas comunitárias. Era responsável pela Rede de Experiências
Alternativas da qual as fábricas fizeram parte.. Na entrevista com ele, estava presente, também a
Miquelina.
Data da entrevista: 07/09/2000 Data
da
transcrição: Responsável pela transcrição:
Magdalena
15/09/2000
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
236
Anexo IV - PRODUÇÃO DA MARC’ELLSSE
Fábrica: Marc’ellsse Indústria e Comércio de Calçados Ltda
Endereço: Rua Ângelo Borin, 715
cep: 16204-165
Fone: [18] 642-4001
Fax: [18] 642-4001
Responsável pelos dados: Shirlei função: sócia proprietária
1.1- ESPAÇO FÍSICO
próprio
v alugado
Tamanho: 800 m2
cedido
_____________________
Desde que data a fábrica está neste local ? 1994
Condições de Adequação do Espaço Físico
O prédio não é adequado, pois não tem ventilação ideal e, mesmo com ventiladores não é o
ideal, mas como não temos condições de ter barracão próprio ainda estamos nos adequando ao
espaço.
Planta
(administração, lojinha, depósito material, depósito produto, área de trabalho, etc.)
1.2 - Maquinário
Nome da máquina
Quantidade
Máquina waster
1
Quantas
pessoas
em cada
máquina
1
lixadeira
1
1
Máquina zig
1
1
Máquina escarnir
1
1
balancim
6
1
Máquina de bordar
2
1
Máquina de
pesponto
Máquina conformar
1
1
1
Pinheiro
1
5
Prensa
1
1
Braqueadeira
1
1
Forno frio
1
1
Observações
O maquinário é adequado. Nossa
produção é de 800 pares/dia e o
nosso maquinário é suficiente.
Exceto a máquina de bordar e
balancim e a braqueadeira que é
feito em dois turnos
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
237
Custo do Produção
O cálculo feito do custo é do produto pronto:
Tênis infantil – média R$ 8,00
Tênis adulto – média R$ 11,00
Como é feita a estocagem de matéria prima
Tem um espaço reservado, onde trabalha uma pessoa.
Como é feita a estocagem de produto pronto
Normalmente os produtos não ficam no estoque, pois são feitos conforme os pedidos e temos a
loja onde tem sempre um pouco de estoque.
1.3 - Pessoal envolvido na fábrica
Nome
Idade
Sexo
Escolaridade
Função
Salário
Tempo na
fábrica
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
33
34
35
36
37
38
39
40
41
42
43
44
24
26
52
34
17
44
20
19
28
26
27
22
34
38
18
31
23
31
19
20
19
19
20
22
23
17
20
37
24
40
34
44
22
21
23
18
35
31
19
25
17
M
F
F
F
F
F
M
M
F
M
F
M
F
F
M
F
F
M
F
F
F
M
F
M
F
F
M
M
F
F
M
M
M
M
F
M
F
F
M
F
F
F
M
M
4 série
6série
6série
2º grau
2s/ 2ºGrau
1ºgrau
2º grau
2º grau
4 série
6 série
2º grau
6 série
5 série
1º grau
7 série
6 série
1º grau
1º grau
2º grau
2º grau
2º grau
7 série
2º grau
2º grau
1s/2º grau
2º grau
5ª série
2º grau
1º grau
4ª série
5ª série
3ª série
2º grau
5 série
2º grau
2º grau
2ªs/2º grau
7ª série
1s/ 2º grau
6ª série
1º grau
2º grau
2ºgrau
5ª série
Cortador
Coladora de peça
Auxiliar de pesponto
Pespontadeira
Auxiliar de montagem
Pespontadeira
Auxiliar de montagem
Cortador
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Auxiliar de corte
Cortador
Auxiliar de montagem
Pespontadeira
Auxiliar de montagem
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Cortador
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Auxiliar de pesponto
Expedidor
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Cortador
Auxiliar de pesponto
Faxineira (por hora)
Auxiliar de montagem
Montador
Auxiliar de corte
Auxiliar de Montagem
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de modelagem
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Bordador
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Auxiliar de pesponto
Pespontador
Vigia noturno
416.00
225.00
225.00
280.00
215.00
304.00
225.00
416.00
215.00
281.00
234.00
350.00
255.00
290.00
215.00
300.00
240.00
285.00
218.00
215.00
230.00
260.00
230.00
280.00
260.00
215.00
240.00
380.00
215.00
0.99/ h
215.00
398.00
280.00
260.00
230.00
245.00
300.00
230.00
250.00
215.00
163.00
215.00
280.00
283.00
3 anos
1 ano
1 ano
4 meses
1 ano
3 anos
1 ano
1 ano
4 meses
2 anos
2 anos
3 anos
2 anos
11 meses
6 meses
1 ano
2 anos
1 ano
11 meses
5 meses
1 mês
2 anos
1 mês
1 ano
2 anos
4 meses
1 ano
1 ano
8 meses
1 ano
6 meses
4 anos
5 meses
2 anos
1 mês
2 anos
2 anos
1 mês
2 anos
6 meses
3 meses
6 meses
5 meses
6 anos
24
52
TRABALHADOR/EMPRESÁRIO, EMPRESÁRIO TRABALHADOR:
Um cotidiano construído passo a passo
Anexos
238
Nome
idade
sexo
Escolaridade
Função
Salário
Tempo na
fábrica
40
41
42
43
44
45
46
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
65
66
67
68
69
70
71
72
73
74
75
76
25
17
F
F
F
M
M
M
M
M
F
F
F
F
F
F
F
F
F
F
M
M
M
M
F
F
F
M
F
F
F
M
M
M
M
F
F
M
M
6ª série
1º grau
2º grau
2ºgrau
5ª série
6ª série
2º grau
4ª série
5ª série
5ª série
1º grau
5 série
2º grau
4 série
2º grau
4 série
6 série
1º grau
8ª série
2º grau
2º grau
2º grau
1º grau
2º grau
5 série
2ªs/2º grau
3ª série
7ª série
2º grau
4 série
4 série
2º grau
5 série
5 série
2º grau
2º grau inc
5 série
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Auxiliar de pesponto
Pespontador
Vigia noturno
Auxiliar de pesponto
Braqueador
Auxiliar de montagem
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Cortadora
Pespontadeira
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Pespontadeira
Pespontadeira
Auxliar de pesponto
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de montagem
Auxiliar de montagem
Bordador
Auxiliar de corte
Auxiliar de pesponto
Planchadeira
Pespontadeira
Auxiliar de Montagem
Pespontadeira
Pespontadeira
Auxiliar de pesponto
Auxiliar de corte
Bordador
Auxiliar de Montagem
Auxiliar de Montagem
Planchadeira
Pespontadeira
Auxiliar de Montagem
Auxiliar de Montagem
215.00
163.00
215.00
280.00
283.00
240.00
276.00
240.00
321.00
215.00
416.00
275.00
285.00
232.00
270.00
321.00
220.00
230.00
215.00
230.00
234.00
255.00
240.00
273.00
290.00
215.00
310.00
321.00
215.00
250.00
276.00
312.00
335.00
250.00
290.00
234.00
215.00
6 meses
3 meses
6 meses
5 meses
6 anos
2 anos
3 anos
2 anos
4 anos
6 meses
4 anos
8 meses
1 ano
1 ano
2 anos
8 meses
8 meses
1 mês
5 meses
3 meses
2 anos
3 meses
2 anos
3 anos
2 anos
1 ano
1 mês
8 meses
6 meses
1 ano
2 anos
4 anos
2 anos
2 anos
11 meses
3 meses
6 meses
24
52
18
21
24
39
42
33
29
27
35
21
34
26
17
21
20
19
22
28
24
22
17
27
28
27
34
36
27
19
25
27
22
24
Sócios Proprietários
Nome
Retirada mensal
Função
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
800.00
Administração
Administração
Modelagem
Pesponto
Montagem
Cronometragem/custo
Montagem
Pesponto
Compras
Administração
Serviços gerais/bancos/ buscar material
Administração
Escolaridade
2º
3º
1º
1º
1º
2º
1º
1º
1º
2º
1º
2º
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
grau
incompleto (estuda)
incompleto (estuda)
incompleto
incompleto
incompleto
incompleto
incompleto
incompleto
12
Obs: Por uma questão de ética, deixamos de explicitar os nomes dos trabalhadores e sócios da Marc’ellsse.
(estuda)
(estuda)
(estuda)
(estuda)

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