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ISBN 9075828152 / EAN 9789075828153, EURACT Educational Agenda. Authorized Portuguese translation,
guaranteed by Luís Filipe Gomes as Portugal Council Representative, free for academic purposes.
Edição portuguesa da ADSO
(Associação dos Docentes e Orientadores de Medicina Geral e Familiar)
Julho 2006
Tradução de Telma Costa e Luís Filipe Gomes
Revisão de Armando Brito de Sá
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Introducão
Agenda Educativa
Do Euract
A
A medicina geral e familiar vem sendo reconhecida como um elemento cada vez mais importante nos sistemas de saúde modernos: popular entre os pacientes capazes de manter uma
relação pessoal com o seu médico no mundo cada vez mais impessoal da prestação de cuidados de saúde, popular entre os políticos pela eficiência dos custos que lhe é inerente (1).
São pontos destacados pela OMS no seu trabalho sobre saúde na Europa (2).
Em 2002 a WONCA Europa publicou a nova Definição Europeia de Medicina Familiar.
Este trabalho resultou de uma revisão das definições anteriores que estavam datadas e careciam de uma actualização para o século XXI. Estas definições eram predominantemente descrições das tarefas do médico de família, das quais a mais conhecida era a criada pelo grupo
de Leeuwenhorst em 1974 (3). De início reconheceu-se a necessidade de uma abordagem
diferente e de começar por definir os elementos essenciais da disciplina de clínica
geral/medicina familiar; só depois de feita esta definição se poderia passar à do papel do
médico de família.
Justin Allen & Jan Heyrman
A medicina geral
e familiar é o trabalho
mais fácil de se
fazer mal feito
e o mais difícil
de se fazer bem feito
Professor Sir Denis Pereira Gray
A definição contém as onze características fundamentais da disciplina que são, ou deviam
ser, generalizáveis a todos os sistemas de saúde, independentemente das diferenças de
contexto. Estas foram depois combinadas na descrição do papel do médico de família.
É importante compreender que os plenos benefícios da clínica geral/medicina familiar para
os pacientes e para os sistemas de saúde só serão alcançados se estas onze características
fundamentais estiverem presentes.
O documento não fica por aqui, prosseguindo com a exploração das competências indispensáveis a um expoente qualificado da disciplina. Na terminologia de Miller (4), a competência
está relacionada com o que o formando é capaz de demonstrar quando interrogado ou avaliado, e o desempenho tem a ver com o exercício do formando no cenário da prática quotidiana. Este documento mostra como estas características podem ser agrupadas em seis
competências nucleares e como a sua aquisição se pode converter em aptidões de desempenho e, porventura, vir a aplicar na realidade dos cuidados aos pacientes. Fez-se uma
opção deliberada por não definir os elementos concretos do desempenho, pois este depende muito das condições de trabalho na consulta, as quais dependem por sua vez e em muito
do lugar efectivamente ocupado pela CG/MF no sistema nacional de saúde.
2
*Adaptado do original “WONCA tree” do College of Primary Care Medicine / U.Grueninger / www.kollegium.ch © 2004
Referido nesta agenda do EURACT como a “árvore da sabedoria”
Depois de passar dois anos a elaborar a definição e a reunir o consenso necessário, o conselho da EURACT continuou a trabalhar: Foram gastos mais três anos a definir as consequências educativas a tirar. As seis competências nucleares conduziram à definição dos 25
objectivos educacionais de primeiro nível e dos 80 de segundo nível. As implicações deste
trabalho para a formação e investigação em medicina familiar são profundas. A EURACT
continuou a trabalhar nas questões educativas que surgiram e, como primeiro passo, elaborou esta «agenda educativa». Para o encontro da WONCA em 2004, em Amesterdão, a
EURACT produziu um primeiro esboço da sua «Agenda Educativa», então classificado como
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um trabalho em desenvolvimento. Recebidos os comentários de diferentes pessoas e
segundo abordagens variáveis, cabe agora produzir, para a reunião da WONCA em 2005, em
Cós, uma versão mais definitiva que dure pelo menos alguns anos. A designação de «agenda» foi deliberada. O termo significa que ela constitui simultaneamente uma revisão dinâmica do ensino e aprendizagem da medicina familiar na Europa e uma identificação do trabalho que tem ainda de ser feito - o outro elemento da “agenda”. Espera-se que suscite discussões, reflexões e emendas e que estimule grupos de especialistas a debater alguns dos
temas, bem como a produção de novos trabalhos sobre as questões levantadas. Ao cabo
de alguns anos poderemos chegar assim a versões revistas.
Porquê uma agenda
educativa?
Enquadramento
para as recomendações
para elaboradores
de curricula
Enquadramento
para as recomendações
para investigadores
A agenda destina-se a fornecer uma estrutura pedagógica das competências nucleares para
todos os que se dedicam à formação em clínica geral e ao desenvolvimento de programas
de ensino de clínica geral. Aos que estão a aprender a disciplina pretende oferecer uma
estrutura pedagógica que estabeleça os objectivos de aprendizagem e acompanhe a sua
execução. Para os que se encontram envolvidos na elaboração de currículos serve para
determinar as prioridades de ensino e aprendizagem da clínica geral. Para os promotores
dos cuidados de saúde constitui um contributo para o desenvolvimento das políticas nacionais. Para o conjunto da profissão médica foi concebida para definir que competências
específicas devem ser esperadas da disciplina específica denominada Clínica
Geral/Medicina Familiar como contribuição crucial para os cuidados de saúde.
Nos últimos 30 anos a medicina familiar tem estado na linha da frente do desenvolvimento
de metodologias educativas, processos pedagógicos e de avaliação. E isso verificou-se
mesmo quando precisou de operar em sistemas pedagógicos destinados à formação noutras disciplinas e em instituições em que a medicina de família não se pratica. Com o aumento da pressão sobre os curricula médicos é importante abordar estas questões. Os programas de formação de diversos países têm vindo a alargar-se e a sede da formação está a
mudar, transferindo-se dos estágios hospitalares para os locais onde se exerce clínica geral,
embora a situação seja muito variável. A UEMO (5) emitiu uma declaração sobre formação
específica em que sugere que um mínimo de 50% da formação aconteça no contexto da clínica geral, que todos os médicos recebam formação em clínica geral, tanto na formação pré-graduada como na pós-graduação antes de entrarem em formação específica e, muito particularmente, que o objectivo da formação específica seja produzir um clínico geral que
tenha obtido um grau de competência clínica suficiente para a prática autónoma. É contudo
preciso convencer os políticos da necessidade de aumentar o investimento no ensino da clínica geral.
A Agenda Educativa da EURACT é também necessária para definir a agenda da investigação
relativa a estas competências. Precisamos de provas que demonstrem a opinião largamente aceite entre os médicos de família de que a medicina familiar se aprende melhor na prática. Precisamos de rever o estado da arte da educação em clínica geral que levará ao
desenho da agenda para o seu desenvolvimento futuro. Precisamos de saber que perguntas ainda não estão respondidas, que evidência deve ser procurada e em que áreas se deve
centrar a investigação pedagógica. É importante determinar de que modo a clínica geral é
aprendida como especialidade e também qual o lugar que a educação em clínica geral
ocupa no curriculum médico geral. Especificamente, a disciplina precisa de definir:
4
• Como se aprende melhor a medicina geral e familiar?
• Onde deve ser ensinada?
• Quando deve ser ensinada?
• O que deve ser ensinado?
• O que deve a medicina geral e familiar ensinar aos formandos de outras disciplinas?
A clínica geral tem um contributo a dar no ensino de todos os médicos em todas as fases
da sua formação. Geralmente ocorrem mudanças de atitude nos alunos de medicina depois
de terem tido oportunidade de resolver por si problemas de cuidados primários e observar
como os seus professores resolvem os problemas que se lhes apresentam. O contacto precoce dos alunos de medicina com a clínica por períodos breves de alguns dias a várias
semanas, no início do curso de medicina, pode lançar as bases que permitem ao estudante de medicina apreender o sentido de toda a formação médica, aprendendo sobre as pessoas no contexto dos seus problemas de saúde. Aulas ou pequenos seminários no período
pré-clínico podem ser eficazes para dar ao aluno determinados conhecimentos necessários
antes de começar a trabalhar com pacientes. Todos os estudantes deviam poder aprender
a prestar cuidados primários aos pacientes através de um estágio em clínica geral com algumas semanas de duração nos últimos anos da escola médica.
Um guia para o ensino
médico básico
A nova definição da disciplina, de 2002, estabelece as competências nucleares que deve
adquirir quem quiser considerar-se médico de família plenamente formado. Por isso a
Agenda Educativa da EURACT deve apoiar e defender o conteúdo da formação na especialidade de medicina geral e familiar na Europa. As seis competências nucleares da disciplina
são ponto de partida. Num sétimo capítulo exploram-se os três aspectos essenciais da qualificação do médico formado e por último o crucial valor acrescentado da síntese que torna
única esta profissão. São estes elementos que servem de estrutura aos oito capítulos da
agenda. Podem considerar-se a chancela de um programa pedagógico em medicina geral e
familiar e devem ocupar o seu centro. Em cada um dos capítulos identificamos os objectivos pedagógicos específicos e destes tiramos os métodos de aprendizagem e avaliação
adequados e as opções específicas de conteúdo e estrutura horária do curriculum.
O foco central na formação
especializada em Medicina
Geral e Familiar
Neste documento decidimos manter-nos no nível conceptual global e não referimos com
grande pormenor coisas como tempo e lugar. Enquanto disciplina devemos promover a passagem do ensino de base horária e curricular para o ensino com base na competência e nos
resultados. Normalmente o curriculum de clínica geral consiste em períodos fixos de serviço
em especialidades restritas - três meses de pediatria; quatro meses de ginecologia, etc. sem levar em conta as questões pedagógicas surgidas inicialmente. Precisamos de sair
deste quadro curricular com base no horário e na instituição e elaborar um programa pedagógico relevante orientado sobretudo para as competências. Aprende-se melhor clínica
geral num ambiente de clínica geral, embora seja possível aprender as competências e qualificações específicas no cenário de outras disciplinas. Há também que não esquecer que
aprender é coisa para a vida inteira, que não cessa no fim do curso nem com o diploma da
especialidade.
Do ensino de base horária e
curricular para o ensino
com base na competência e
resultados; do objectivismo
para o construtivismo como
paradigma d aprendizagem
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Neste documento decidimos aceitar a complexidade da prática real como questão central e
a aprendizagem da complexidade como paradigma educativo. A medicina familiar tem um
perfil holístico, tratando a doença e os quadros patológicos no contexto do paciente e da
sua família. O construtivismo (6) é o modelo educativo que coloca no centro «o processo de
aprendizagem do aluno». Aprender é visto como um processo que depende em muito dos
conhecimentos pré-adquiridos e do contexto da aprendizagem (7). Os professores são
sobretudo arquitectos de um ambiente estimulante da aprendizagem. A variedade individual
das estratégias a aplicar é estimulada. O objectivo final não é a aquisição de uma lista de
determinados conhecimentos e aptidões, mas o princípio «agir com sabedoria» (8).
Isto implica o uso de conhecimento especializado, sendo central a avaliação de situações
específicas em que haja conflito dos valores com que se decide quais os problemas a resolver e como resolvê-los. Requer conhecimento em acção, reflexão em acção e reflexão sobre
a acção, usando listas de exemplos, imagens e modos de compreender aprendidos através
da experiência. Implica usar protótipos memorizados de situações frequentes para construir
interpretações de situações interrelacionadas. Foi por isso que a «árvore da sabedoria» se
tornou o logotipo definitivo desta Agenda Educativa da EURACT.
Harmonização europeia
ao nível dos objectivos
de competência e dos
resultados pedagógicos
A harmonização dos diferentes programas de ensino da Europa ao nível dos objectivos europeus comuns de competência e dos resultados pedagógicos é provavelmente o melhor que
podemos alcançar. A União Europeia está em expansão, passou recentemente a ter 25
membros e quase 500 milhões de pessoas. A União Europeia pretende promover a harmonização do conteúdo e do nível da formação em toda a região. Já em 1993 a Directiva
Europeia de reconhecimento mútuo das qualificações médicas (9) tentava harmonizar a qualidade, harmonizando a extensão da formação profissional, o cenário em que devia ter lugar
e as autoridades supervisoras nacionais. A Directiva não se refere a questões de conteúdos
ou competências e, neste sentido, não é satisfatória: mais promove o livre movimento de
médicos do que garante a qualidade dos cuidados prestados.
Há uma alternativa académica, definida na declaração de Bolonha de 1999 (10): desenvolver, até 2010, uma «Zona Europeia de Educação Superior», dotada de mobilidade, com base
no Sistema Europeu de Transferência de Créditos(1) , em vigor desde 1988. No campo médico, a formação de especialistas é uma questão profissional e académica. Em ambas as lógicas verifica-se uma necessidade de harmonia, de equivalência dos padrões de qualidade e
de mobilidade. Numa declaração recentemente divulgada no âmbito de um projecto
Sócrates (projecto TUNING, 11) sugere-se que: «a harmonização pode limitar-se a encontrar
pontos de convergência e de entendimento comum, por forma a promover a transparência
no desenvolvimento dos perfis profissionais e dos resultados pedagógicos desejáveis. A harmonia em matéria de competências de chegada e de resultados de aprendizagem é provavelmente o nível mais alto que se pode atingir.»
A Agenda Educativa EURACT pretende contribuir para a harmonização dos resultados de aprendizagem dos diferentes programas educativos de
toda a Europa a este nível. Bastará talvez conseguir uma «sintonia» óptima dos programas de treino de especialidade, avançando no sentido de
mais convergência e maior concordância. A EURACT deseja que esta agenda educativa, que deriva das competências nucleares aceites por
todas as escolas de CG/MF da Europa no decurso da reunião da WONCA Europa em Londres, em 2002, e completada com as opções de aprendizagem definidas nesta agenda educativa e apresentadas na reunião de Cós, Grécia, em 2005, permita criar um instrumento de harmonização
Panorama
Das Competências
Nucleares do Documento
“A Definição Europeia de MGF”
Versão reduzida, EURACT 2005”
1. Gestão em Cuidados Primários
Inclui a capacidade para:
- gerir o contacto primário com os pacientes, lidando com problemas não seleccionados;
- cobrir todo o leque de problemas de saúde;
- coordenar os cuidados com outros profissionais dos cuidados primários e com outros
especialistas;
- dominar a prestação eficaz e adequada de cuidados de saúde e a utilização dos serviços
de saúde;
- disponibilizar ao paciente os serviços adequados dentro do sistema de saúde;
- actuar como advogado do paciente.
A definição da disciplina de clínica
2. Cuidados Centrados na Pessoa
plina, independentemente do sistema
Inclui a capacidade para:
- adoptar uma abordagem centrada na pessoa ao lidar com os pacientes e os seus
problemas no contexto das circunstâncias do paciente;
- desenvolver e aplicar a consulta de clínica geral para promover uma eficaz relação
médico-paciente, com respeito pela autonomia do paciente;
- comunicar, estabelecer prioridades e actuar em parceria;
- proporcionar continuidade longitudinal de cuidados tal como a determinarem as necessidades do paciente no que se refere à gestão continuada e coordenada de cuidados.
aplicadas.
família especialista deve conduzir
directamente às competências nucleares do clínico geral/médico de família.
“Nucleares” significa essenciais à discide saúde em que as competências são
As onze características da disciplina
referem-se às onze aptidões que todos
os especialistas de medicina geral
e familiar devem dominar. Dadas as suas
inter-relações, agrupam-se em seis
3. Aptidões para a Resolução de Problemas
Específicos
Inclui a capacidade para:
- relacionar os processos específicos de decisão com a prevalência e incidência das
doenças na comunidade;
- reunir e interpretar selectivamente a informação recolhida na anamnese, exame objectivo
e exames complementares e aplicá-la a um plano de acção adequado em colaboração
com o paciente;
- adoptar princípios de trabalho adequados, por exemplo, pedindo exames complementares de modo sequencial, e usando o tempo como um instrumento e como modo de tolerar a incerteza;
- intervir com urgência quando necessário;
- gerir as situações que se apresentem precocemente e de forma indiferenciada;
- utilizar as intervenções diagnósticas e terapêuticas de modo efectivo e eficiente.
aceitável para os conteúdos da formação pós-graduada em toda a Europa.
(1)”European Credit Transfer System”, geralmente conhecido como ECTS (N.do R.)
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geral/medicina familiar e do médico de
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categorias independentes de competências nucleares. Cada grupo é descrito nos
seus aspectos principais.
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4. Abordagem abrangente
3. Aspectos Científicos
A inter-relação das competências nuclear-
Inclui a capacidade para:
- gerir simultaneamente múltiplas queixas e patologias, e tanto problemas de saúde agudos como crónicos do indivíduo;
- promover a saúde e o bem-estar aplicando adequadamente as estratégias de promoção
da saúde e prevenção da doença;
- gerir e coordenar a promoção da saúde, prevenção, cura, tratamento, paliação e reabilitação.
(Adoptar uma abordagem da prática crítica e baseada na investigação e mantêla mediante aprendizagem e melhoria da qualidade contínuas)
Estar familiarizado com os princípios gerais, métodos, conceitos da investigação científica e com princípios elementares de estatística (incidência, prevalência, valores preditivos, etc.);
Ter pleno conhecimento das bases científicas da patologia, sintomas e diagnóstico, terapêutica e prognóstico, epidemiologia, teoria da decisão, teorias da formação de hipóteses e da resolução de problemas, cuidados preventivos;
Ser capaz de aceder à literatura médica, lê-la e avaliá-la criticamente;
Desenvolver e manter formação contínua e melhoria da qualidade.
A inter-relação das competências nucleares e as características essenciais da
sua aplicação caracterizam a disciplina e sublinham a complexidade da especialidade. É esta inter-relação complexa que deve guiar e reflectir-se no desenvolvimento das agendas relacionadas de ensino, investigação e melhoria da
qualidade.
es e as características essenciais da sua
5. Orientação Comunitária
Inclui a capacidade para:
- conciliar as necessidades de cada paciente e as necessidades de saúde da comunidade
em que ele vive, de acordo com os recursos disponíveis.
6. Abordagem Holística
-
-
-
Inclui a capacidade para:
- usar um modelo biopsicossocial levando em conta as dimensões cultural e existencial.
Aspectos essenciais de aplicação
Na aplicação das competências ao ensino, aprendizagem e prática da medicina familiar é
necessário considerar outros três aspectos essenciais: contextual, de atitude e científico. Têm
a ver com características dos médicos e determinam a sua capacidade de aplicar as competências nucleares na vida real no contexto do seu trabalho. Em clínica geral podem ter maior
impacto por causa da estreita relação entre o médico de família e as pessoas com quem ele
trabalha, mas dizem respeito a todos os médicos e não são específicos da clínica geral.
1. Aspectos Contextuais
-
(Compreender o contexto dos próprios médicos e o ambiente em que trabalham, incluindo condições de trabalho, comunidade, cultura e estruturas financeira e reguladora)
Compreender o impacto da comunidade local, incluindo factores sócio-económicos, geografia e cultura, no local de trabalho e na prestação de cuidados.
Estar consciente do impacto da carga laboral sobre os cuidados prestados aos
pacientes e os meios (pessoal, equipamento) disponíveis para os prestar.
Compreender os contextos financeiros e jurídicos em que são prestados os cuidados de saúde ao nível da prática clínica.
Compreender o impacto das instalações e ambiente laboral do próprio médico
sobre os cuidados que presta.
2. Aspectos da Atitude
(Com base nas capacidades, valores e ética profissionais do médico)
- Estar consciente das capacidades e valores pessoais próprios - identificar os
aspectos éticos da prática clínica (prevenção / diagnóstico / terapêutica / factores que influenciam o estilo de vida);
- Ter consciência de si mesmo: compreender que as atitudes e sentimentos do
próprio são importantes para o modo como exerce;
- Justificar e clarificar a ética pessoal;
- Estar consciente da mútua interacção entre trabalho e vida privada e procurar
um bom equilíbrio entre ambos.
8
9
aplicação caracterizam a disciplina e sublinham a complexidade da especialidade.
É esta inter-relação complexa que deve
guiar e reflectir-se no desenvolvimento
das agendas relacionadas de ensino,
investigação e melhoria da qualidade.
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A relação entre
a Agenda Educativa EURACT
e outros enquadramentos
de competência usados
internacionalmente
Professores, responsáveis pelos currículos, profissionais e académicos, procuram constantemente estruturas adequadas de apoio à elaboração e formatação dos programas educativos, incluindo todo o conteúdo que lhe é próprio. A presente Agenda Educativa EURACT
propõe um enquadramento internacional para a concepção, harmonização ou, pelo menos,
convergência de programas de formação específicos em Clínica Geral/Medicina Familiar na
Europa. Será útil estabelecer a relação entre esta agenda e outros exercícios semelhantes
que despertaram grande interesse entre a comunidade docente na Europa e não só.
Abordaremos dois exemplos, o Dutch Blueprint(2), publicado em 1994, e o projecto canadiano CanMEDS, desenvolvido a partir de 1993, que teve a sua primeira grande avaliação por
alturas de 2000. Este exercício servirá para compreender melhor o que a Agenda Educativa
EURACT é e o que deliberadamente não é e, logo, como pode ser usada.
O «Dutch Blueprint», publicado por Metz e colaboradores em 1994, consiste em 180 resultados pedagógicos que garantiriam os conhecimentos e aptidões necessárias no contexto
da prática médica. Estão divididos em quatro subgrupos:
- conhecimentos e aptidões relativos a todos os processos médicos desde as queixas
até ao diagnóstico, tratamento e referenciação
- conhecimentos das bases científicas da medicina e aptidões para manter actualizados
o conhecimento científico e as aptidões profissionais
- requisitos pessoais no contacto com os pacientes e na atitude profissional
- conhecimento dos aspectos estruturais e financeiros da orgânica, ética e condições
jurídicas dos cuidados de saúde.
O projecto CanMED arrancou em 1993 «para garantir que os programas de treino de especialização pós-graduada respondem cabalmente às necessidades da sociedade - John
Wade, 1993». Com a sua aplicação sistemática em todas as faculdades do Canadá a partir
de 2002 e com o interesse que suscitou na Austrália, Países Baixos, Dinamarca e Reino
Unido, tornou-se um definidor internacional de tendências. O seu objectivo genérico foi
«representar as competências genéricas comuns a todos os especialistas». Um aspecto
simpático é que parte de sete papéis que todos os clínicos devem conhecer bem, porque
correspondem às necessidades da sociedade: o perito médico como papel central, mas
rodeado por seis outros papéis - comunicador, colaborador, advogado da saúde, gestor,
académico e profissional. As competências nucleares derivam destes sete papéis. No final
do internato os clínicos deveriam possuir as bases para cada papel e as noções que permitam desenvolver qualificações específicas sempre que necessário, em qualquer momento
da sua futura carreira. De cada um destes sete papéis derivam competências chave e são
definidos objectivos de aprendizagem, métodos pedagógicos, métodos de avaliação específicos e questões relevantes para o desenvolvimento das faculdades.
Conceptualmente o projecto CanMED anda muito próximo das opções feitas independentemente nesta Agenda Educativa EURACT, embora o núcleo básico seja diferente: o
CanMEDS é um conjunto estrutural de competências, comuns a todos os especialistas. Não
distingue as competências específicas da disciplina; estas têm de ser definidas por cada
disciplina a partir do documento. A Agenda Educativa EURACT, pelo contrário, é sobre a formação na especialidade de Medicina Geral e Familiar e é específica da especialidade/disciplina. Na agenda, as competências individuais podem não ser sempre exclusivas da clínica
geral, mas a combinação destas e a respectiva síntese são o que define a disciplina.
A Agenda Educativa EURACT deriva de um novo documento definidor, adoptado em 2002
pela sociedade académica de CG/MF da Europa e que distingue as onze características da
disciplina e delas extrai seis competências nucleares e três aspectos essenciais de aplicação. Como o CanMEDS, a Agenda define objectivos pedagógicos, métodos de aprendizagem e de avaliação para cada uma das competências e tece algumas considerações
sobre os momentos e contextos curriculares. É natural que a Medicina Geral e Familiar,
como disciplina com tarefas específicas na prestação de cuidados de saúde à sociedade,
dê diferente relevo a papéis e competências diferentes. Mas, como salienta o CanMEDS na
sua declaração de princípios, todas as especialidades devem cobrir sempre os sete papéis
básicos, embora por ordem, prioridade e destaque diferentes.
O documento é muito voltado para as tarefas: qual é o trabalho do profissional médico e que
conhecimentos e aptidões servem de suporte ao conteúdo e à qualidade das suas tarefas.
O documento pretendia servir de orientação ao currículo médico de base, mas diferentes
disciplinas médicas usaram a sua estrutura para dela derivar os seus objectivos de ensino
específicos. Na Holanda e na Bélgica, por exemplo, a Clínica Geral definiu a sua «descrição
básica das tarefas» a partir destas listas e adaptou em conformidade os objectivos pedagógicos específicos. A descrição básica das tarefas usou ainda quatro categorias: tarefas derivadas das categorias dos problemas dos pacientes, tarefas derivadas do próprio processo
de prestação de cuidados, tarefas de apoio como a colaboração, a formação permanente
ou a gestão da consulta e funcionamento pessoal.
(2) Projecto Holandês (N.do R.)
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No quadro que se segue fez-se um exercício simples de comparação entre os sete papéis
do CanMEDS e as competências nucleares deles derivadas com os oito capítulos de competências do EURACT e as suas especificações no primeiro nível. No plano global, ajustamse bem. Mas mesmo a esse nível, entrando na pormenorização verifica-se que os agrupamentos são diferentes. Nenhum dos oito capítulos das competências se ajusta por completo a um dos papéis do CanMEDS. É certo que o capítulo da gestão de cuidados primários
tem muitos elementos do papel de gestão, mas apresenta igualmente elementos dos papéis
de colaborador e de advogado da saúde. O capítulo sobre a centragem na pessoa requer
muito do papel do comunicador, e o capítulo sobre a resolução de problemas específicos
está muito relacionado com o papel central do perito em medicina. Mas os capítulos sobre
abordagem abrangente, orientação comunitária e abordagem holística não têm praticamente qualquer relação com os papéis definidos no CanMEDS. Será isto normal? Provavelmente
sim, pois estas competências são praticamente específicas da profissão e da especialidade
que é a Medicina Geral e Familiar. A Agenda Educativa EURACT constitui claramente um
quadro de referência para a especialidade de MGF, o seu programa de internato de especialidade com ligações ao Desenvolvimento Profissional Contínuo e à aprendizagem ao longo
da vida. Pode considerar-se que se enquadra no CanMEDS e ser comparada com ele, mas
é independente e adequada a esta disciplina.
Agenda Educativa do EURACT comparada com os CanMEDS
Capítulos EURACT
Competências EURACT
Competências Can MEDS
Papéis CanMeds
1. Gestão de Cuidados
Primários
2. Cuidados Centrados
na Pessoa
Gestor
1.a 1º contacto problemas não seleccionados
1.b todas as situações
tecnologia de informação
1.c coordenação de cuidados
eficiência na organização
1.d utilização efectiva dos cuidados
gestão de recursos finitos
1.e disponibilidade de cuidados ao paciente
contribuição para a equipa
Colaborador
1.d advogado do paciente
advocacia para os pacientes
Advogado da saúde
2.a abordagem centrada na pessoa
Identificar e sintetizar informação relevante
Comunicador
2.b consulta centrada na pessoa
discutir informação apropriada
2.c relação de parceria Relação terapêutica
2.d cuidados longitudinais
3. Aptidões específicas para a
resolução de problemas
Bibliográficas
1. Starfield B. Primary care: balancing health needs, services and technology. Oxford University Press, 1998
2. Framework for Professional and Administrative Development of General Practice / Family Medicine in Europe, WHO
Europe, Copenhagen, 1998
Perito médico
3.a tomada de decisão específica
3.b reunir e interpretar informação médica
aceder a informação médica e aplicá-la
3.c adoptar estratégias típicas de diagnóstico
diagnosticas e terapêuticas aptidões
diagnósticas e terapêuticas
3.d intervir em situações de urgência
perito médico exterior aos cuidados d i re c t o s
3.e gerir situações precoces e indiferenciadas
aptidões efectivas para a consulta
3.f uso eficiente de intervenções
reconhecer os limites pessoais
3. The General Practitioner In Europe: A statement by the working party appointed by the European Conference on the
Teaching of General Practice. Leeuwenhorst, Netherlands 1974
4. Abordagem abrangente
4. Miller G. “The assessment of clinical skills/competence/performance”. Acad .Med. 1990, 65, S63-S65
Advogado da saúde
4.a multipatologia simultânea
5. UEMO Policy Paper on Specific Training in general practice /family medicine in Europe, Stockholm, 2003
4.b promoção da saúde e bem-estar
6. Spencer JA, Jordan RK. “Learner centred approaches in medical education”, BMJ 1999,318; 1280-1283
4.c gestão de espectro completo
identificação de determinantes da saúde
7. Innes RB. Reconstructing undergraduate education. Using Learning Science to Design Effective Courses. Larence
Erlbaum, New Jersey London 2004.
8. Harris IB. “Educating Professionals, Responding to New Expectations for Competence and Accountability”, in
5. Orientação
Comunitária
5.a conciliar necessidades de saúde
e da comunidade
„New Expectations for Professional Competence“ in Curry L, Wergin JF and ass., Jossey-Bass, 1993
9. “Council Directive 93/16/EEC to facilitate the free movement of doctors and the mutual recognition of their
6. Abordagem Holística
6.a modelo biopsicossocial, cultural e existencial
diplomas, certificates and other evidence of formal qualifications”. Official Journal of the European Community,
1993,165: 7/7/93
10. Bologna Declaration 19 June 1999
7. Aspectos centrais
de aplicação
11. Tuning project: Tuning educational structures in Europe, a European Socrates project, under the lead of Julia Gonzales,
Duesto Spain and Robert Wagenaar, Groningen Netherlands 2003
responsabilidade ética
7.a contextuais
comportamentopessoal apropriado
7.b de atitude: limites pessoais, ética
integridade, honestidade e compaixão
7.c científicos
educação contínua pessoal
avaliação crítica dos recursos
facilitar a aprendizagem dos pacientes
contribuir para o desenvolvimento de
novos conhecimentos
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8. Integração
e implementação
8.a aceitar a complexidade
8.b aptidões para concretizar na prática
Académico Profissional
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Responsável pelo capítulo:
Yonah Yaphe (Israel)
Contribuições de Francesco
Carelli (Itália), Jan
Heyrman (Bélgica), Roar
Maagaard (Dinamarca),
Gertraud Rothe (Áustria),
Job Matsemakers (Holanda)
Introdução
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Capítulo 1.
Gestão em Cuidados Primários
Inclui a capacidade para:
- gerir o contacto primário com os pacientes, lidando com problemas não seleccionados;
- cobrir todo o leque das situações de saúde;
- coordenar os cuidados com outros profissionais dos cuidados primários e com outros
especialistas;
- dominar a prestação efectiva e adequada de cuidados de saúde e a utilização dos
serviços de saúde;
- disponibilizar ao paciente os serviços adequados no âmbito do sistema de saúde;
- actuar como advogado do paciente.
Ensinar os conhecimentos, aptidões e atitudes necessários a um atendimento eficaz dos
pacientes dos cuidados primários é a base da agenda educativa para a Medicina Geral e
Familiar.
O conteúdo e a base teórica da disciplina académica de Medicina Geral e Familiar estão
bem definidos numa série de livros de texto e o leitor é encorajado a consultar esses textos
(1,2,3) onde encontrará uma descrição pormenorizada do conteúdo da especialidade. Este
capítulo de abertura da Agenda Educativa EURACT irá descrever as tarefas determinadas
pela nova definição europeia da profissão, com destaque para os conceitos de primeiro contacto do clínico com pacientes, globalidade, cuidados coordenados, custo-efectividade e
advocacia do paciente.
O trabalho do médico de cuidados primários assenta prioritariamente no «livre acesso a
todos os problemas individuais», em direcção a uma população utilizadora com um elevado
nível de queixas complexas e baixa prevalência de doença grave. O médico deve portanto
desenvolver conceitos de saúde, função e qualidade de vida nas populações que serve, bem
como modelos de doença. Este quadro encontra a sua expressão nas actividades clínicas
preventivas e de promoção da saúde e na gestão de factores de risco. Exprime-se também
nas decisões relativas a cuidados paliativos e terminais. Os médicos de cuidados primários
enfrentam também o desafio cada vez maior de precisarem de ter em consideração os custos dos cuidados de saúde. É pois necessário que os médicos aprendam durante o seu treino a compreender a custo-efectividade. Muitos médicos de cuidados primários trabalham
com profissionais de outras disciplinas médicas. Por isso o contexto da formação em cuidados primários pode promover a aprendizagem da integração de diferentes disciplinas em
equipa para uma prestação optimizada de cuidados primários.
Objectivo 1.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de gerir o
contacto primário com os pacientes.
Para tal precisa de:
1.1.1 - conhecimentos sobre a epidemiologia dos problemas e queixas que
surgem nos cuidados primários
1.1.2 - conhecimentos sobre os sintomas e queixas típicos, tal como se apresentam
nos cuidados primários, sobretudo em fases precoces, seus sinais e sintomas, seu diagnóstico e possibilidades terapêuticas
1.1.3 - domínio de uma abordagem que permita acesso fácil aos pacientes com problemas indiferenciados
1.1.4 - abordagem organizativa da gestão das situações crónicas
Objectivo 1.2: No final do programa de formação o formando estará em condições de cobrir
todo o leque de problemas de saúde.
Para tal precisa de:
1.2.1 - conhecimento das actividades preventivas necessárias à prestação de cuidados primários
1.2.2 - aptidões médicas nas situações agudas, crónicas, preventivas, paliativas e
urgentes
1.2.3 - aptidão clínica para a anamnese, exame objectivo e uso de exames complementares para o diagnóstico das situações apresentadas pelos pacientes nos
cuidados primários
1.2.4 - aptidões terapêuticas que incluem a abordagem medicamentosa e não medicamentosa do tratamento destas situações
1.2.5 - capacidade de estabelecer prioridades entre problemas
Objectivo 1.3: No final do programa de formação o formando estará em condições de coordenar a prestação de cuidados com outros profissionais dos cuidados primários e com outros
especialistas.
Para tal precisa de:
1.3.1 - conhecimento da organização da sua unidade de cuidados primários
1.3.2 - domínio da comunicação eficiente com outros membros do pessoal
1.3.3 - aptidões de trabalho efectivo em equipa
1.3.4 - domínio da colaboração eficiente com outros especialistas
Objectivo 1.4: No final do programa de formação o formando estará em condições de dominar a prestação de cuidados adequados e de uma utilização eficaz dos serviços de saúde.
Para tal precisa de:
1.4.1 - conhecimento da estrutura do sistema de saúde e da função das suas componentes em relação aos cuidados primários
Objectivo 1.5: No final do programa de formação o formando estará em condições de proporcionar ao paciente o serviço mais adequado dentro do sistema de saúde.
Para tal precisa de:
1.5.1 - aptidões de comunicação para aconselhar, ensinar e tratar os pacientes e as
suas famílias
1.5.2 - aptidões organizacionais para manter registos, gerir informação, trabalhar em
equipa, dirigir uma unidade de saúde e efectuar auditoria da qualidade da prestação de cuidados.
14
15
Gestão em Cuidados
Primários:
Objectivos
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Objectivo 1.6: No final do programa de formação o formando estará em condições de agir
como advogado do paciente.
Para tal precisa de:
1.6.1 - desenvolver e manter uma relação e um estilo de comunicação que se caracterizam pelo estabelecimento de uma parceria com o paciente
1.6.2 - aptidões de chefia, negociação e compromisso efectivos.
Consequências
para os métodos
pedagógicos
Ensinar os conhecimentos, aptidões e atitudes necessários a um médico para gerir problemas em cuidados primários exige antes de mais que os professores sejam excelentes clínicos gerais/médicos de família. Muitas vezes, a mais eficaz ferramenta pedagógica é o exemplo. Alunos, internos e médicos graduados observam e copiam os modelos personificados
nos seus professores/tutores/facilitadores na prática.
A observação é simultaneamente um método de aprendizagem e de avaliação. A observação directa inclui a consulta real ou simulada com o paciente. Pode ser presencial (paciente real), entrevista de consultório simulada ou video/audio-registada (com paciente real ou
simulado).
O s métodos específic os para o conseguir incl u e m :
- observação directa pelo formando do formador a actuar em clínica geral;
- realização de tarefas de clínica geral pelo formando em funções;
- simulação de tarefas de clínica geral com análise do desempenho;
- aprendizagem baseada em portfólios para estimular os alunos a documentarem o
seu desempenho com um vasto leque de actividades pedagógicas na prática como
apresentação de casos, auditorias e leituras orientadas.
Gestão em Cuidados
Primários:
Consequências
para a avaliação
Avaliar a aquisição de conhecimentos, atitudes e aptidões para a gestão de cuidados primários cobre toda a extensão da aprendizagem necessária ao clínico geral, exigindo por isso
uma vasta série de métodos de avaliação. Testes de conhecimentos como os testes de
escolha múltipla e de perguntas de desenvolvimento podem avaliar a adequada aquisição
de dados necessários à prestação de cuidados primários. As aptidões de gestão podem ser
examinadas mediante testes de competência como os OSCE(2) e outras simulações, como
exames com pacientes simulados. A avaliação do desempenho do trabalho diário do estudante ou interno mediante listas de verificação e classificações globais frequentes pode
também ser útil e fiável na avaliação das capacidades de prestação de cuidados primários.
A aquisição de atitudes apropriadas à gestão eficaz de cuidados primários pode avaliar-se
pela observação (a saber, observação directa, consulta ombro a ombro, videogravada), discussão ou entrevista na avaliação somativa e formativa que caracteriza muito da relação
professor-aluno no ensino de um para um em MGF.
R esult ados da ap r e n d i z a gem
O formando deverá mostrar:
- capacidade de desempenhar as tarefas necessárias em simulação;
- capacidade de desempenhar tarefas na prática real através da observação directa
ou da análise de consultas gravadas em vídeo.
(2) Objective Strutured Clinical Evolution - Avaliação Clínica Objectiva Estruturada (N. do T.)
16
O ensino da gestão de cuidados primários deve ser feito no contexto da clínica geral. O uso
do papel de modelo, da prática em primeira mão de aptidões pelos formandos e a avaliação
do desempenho, tudo isso exige a inserção no ambiente da consulta de medicina geral e
familiar. O conhecimento que é adquirido no ensino clássico da faculdade de medicina é
depois aperfeiçoado no cenário exclusivo da medicina geral e familiar.
Consequências
para o contexto
e enquadramento
temporal
O Ensino Médico Básico (EMB) deve incluir pelo menos os cuidados primários e a gestão de
problemas e de pacientes como um importante contributo para os cuidados de saúde. Deve
também encarar o desafio de incluir actividades preventivas na consulta e de tratar os
pacientes com problemas em fases precoces e com afecções crónicas.
Durante a Formação Especializada o interno deve aprender a dominar as aptidões necessárias para a prestação de cuidados primários.
Objectivos
Métodos de aprendizagem
Meios de avaliação
Conhecer a epidemiologia
dos problemas e queixas
apresentados pelos pacientes em cuidados primários
Palestra
TEM, TPC
Discussão em pequenos grupos
Ensaio
Leitura
Conhecer e compreender
o papel e as funções da
equipa de cuidados primários
Prática clínica
Leitura
Observação
Discussão (de um para um,
pequenos grupos, equipa,
outras)
Conhecer o sistema de
saúde e compreender a sua
relação com a MGF
Palestra
Leitura
Ensaio
Discussão (um para um, peque- TEM, TPC
nos grupos, equipa, outras)
Saber como diagnosticar os
problemas do Paciente através da obtenção apropriada
da história clínica, do exame
físico e dos testes auxiliares
Pacientes simulados
Treino de aptidões
Demonstração
Prática de consulta
(1)
Quadro resumo
educação
em gestão
de cuidados
primários
Observação directa
Observação
OSCE(2)
Saber como providenciar a
Leitura
gestão inicial efectiva destes
Discussão
problemas com ou sem presObservação
crição medicamentosa
TEM, TPC
Ensaio
Discussão
OSCE
Observação
Demonstrar capacidade de
comunicação efectiva
Pacientes simulados
Prática de consulta
OSCE
Observação
Valorizar a abordagem dos
cuidados primários incluindo
uma visão generalista,
tolerância quanto à incerteza,
curiosidade, diligência e preocupação.
Ensino ombro a ombro
Observação
Aprender pelo exemplo
Discussão
Discussão em pequenos grupos
Ensaio
Reflexão
17
(1)TEM, TPC - Teste de Escolha Múltipla, Teste
de Perguntas Curtas
(2) OSCE - Avaliação Clínica Objectiva
Estruturada (ACOE)
Bibliográficas
1. Jones, R. ed. Oxford Textbook of
Primary Medical Care. Oxford
University Press, 2004 .
2. Rakel, R.E. Textbook of Family
Practice, W B Saunders. 6ª edição,
2001
3. McWhinney, I. R, A Textbook of Family
Medicine. Oxford University Press;
2ª edição, 1997
4. Mash, R., Handbook of family medicine, 2000. Oxford University Press,
África do Sul, 1ª edição, 2001
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Responsável pelo capítulo:
Jan Heyrman (Bélgica)
Contribuições de Anders
Baehreim (Noruega), Filipe
Gomes (Portugal), Monica
Lindh (Suécia), Fergus
O'Kelly (Irlanda). Wolfgang
Spiegel (Áustria),
Bernardina Wanrooij
(Holanda), Egle Zebiene
(Lituânia), Bernhard
Rindslisbacher (Suíça),
Mario Sammut (Malta)
Introdução
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Capítulo 2.
Cuidados Centrados na Pessoa
Inclui a capacidade para:
- adoptar uma abordagem centrada a pessoa no lidar com os pacientes e seus
problemas no contexto das circunstâncias do paciente;
- desenvolver e aplicar a consulta de clínica geral para promover uma eficaz
relação médico-paciente, com respeito pela autonomia do paciente;
- comunicar, estabelecer prioridades e actuar em equipa;
- proporcionar continuidade longitudinal de cuidados tal como a determinarem as
necessidades do paciente, assegurando a gestão continuada e coordenada de
cuidados.
Se a Clínica Geral/Medicina Familiar se posiciona como “medicina centrada na pessoa” e
adopta a “abordagem centrada na pessoa” como princípio que a distingue das outras profissões médicas, o ensino e a formação da centragem na pessoa é uma competência nuclear. Nos seus nove princípios da medicina familiar, McWhinney (1) cita três deles como elementos de base: dedicação à pessoa em vez de a um determinado corpo de conhecimentos, busca da compreensão da doença no seu contexto pessoal, familiar e social, e atribuição de importâcia também aos aspectos subjectivos da medicina.
A abordagem centrada na pessoa é mais uma maneira de pensar do que apenas uma maneira de agir. Significa ver sempre o paciente como uma pessoa particular num contexto particular. Inclui a perspectiva total da saúde do paciente, não apenas os elementos da doença
que é possível reconhecer nos problemas e nas queixas, mas também os recursos e as
forças do paciente que possam facilitar o lidar com as situações. Neste tipo de contacto
médico, não só o paciente traz consigo o seu contexto e a sua história como também o
médico fica implicado enquanto pessoa, portadora das suas próprias normas de vida e história, valores e conceitos (1,2,13).
Levar em conta as preferências e expectativas do paciente em todos os passos do método
de consulta centrada no paciente (3) é crucial neste ponto. Esta postura beneficia de uma
transferência da orientação para doença para uma orientação para objectivos, como defende Mold (4).
À relação médico-paciente chama-se por vezes “parceria sustentada”. A sustentabilidade da
relação assenta num compromisso mútuo e total durante longos períodos, ainda que não
necessariamente para uma vida inteira, do nascimento até à morte. Parceria significa uma
relação médico-paciente baseada na participação e na receptividade do paciente, em que
se evita o paternalismo e a dominação. Está relacionada com o “modo deliberativo” da
relação, definido por Emanuel (6) como mais produtivo do que os modos paternalista, informativo e interpretativo.
- compreender a pessoa como um todo, em que os diferentes elementos poderiam ser
encarados em separado mas representam de facto uma dimensão acrescentada na pessoa humana, total e integrada;
- no diagnóstico, explorar sempre a afecção e a doença em relação com a pessoa e o contexto. Em todas as afecções há uma parte do comportamento que é aprendido e culturalmente definido. Por outro lado, uma doença constitui um perfil médio deliberado em que
se tenta não levar em conta as variantes individuais, usando um prognóstico médio como
principal orientação para decisões terapêuticas geralmente efectivas. “Se quisermos
curar, precisamos de conhecer os nossos pacientes enquanto indivíduos: podem ter as
mesmas doenças, mas são únicos nas suas reacções a essas doenças.» (7)
- nos cuidados de saúde centrados na pessoa, tentar sempre encontrar plataformas de
entendimento e fazer planos em parceria por forma a que o paciente esteja sempre no
centro da acção e conserve a sua autonomia.
- na relação médico-paciente, os dois intervenientes formam uma parceria com papéis e
responsabilidades assimétricos mas definidos.
- no contacto com o paciente, incorporar a prevenção e a promoção da saúde em equilíbrio com todos os elementos de gestão da doença.
- como atitude de base, ser realista, concreto e intervir sem perder de vista a solução.
Os cuidados centrados na pessoa dão grande importância à continuidade do processo relacional. A continuidade é uma questão multidimensional vasta que inclui muitos aspectos
diferentes. Neste documento define-se continuidade como “o grau em que uma série de
eventos clínicos isolados se revela coerente, relacionado e compatível com as necessidades
médicas e contexto pessoal do paciente” (8). Cobre cinco domínios: o domínio cronológico
da continuidade no tempo, a continuidade geográfica da equipa clínica num local, a continuidade interdisciplinar sem barreiras da equipa de cuidados primários, a continuidade interpessoal e a continuidade de informação, como garantia da disponibilidade da informação
médica em todos os locais onde o paciente é observado. Podemos considerar três tipos distintos de continuidade (9): a “continuidade pessoal” de consultar sempre o mesmo médico;
a “continuidade de informação” de se ter informação sempre disponível ao tomar conta de
uma situação ou ao efectuar a sua referenciação; e a “continuidade de cuidados”, que
garante atendimento organizado 24 horas sobre 24. McWhinney (1) salienta que a palavrachave é responsabilidade e não disponibilidade pessoal a todas as horas.
Há um paralelismo entre a relação médico-paciente e a relação professor-aluno. Há similitudes entre a abordagem centrada na pessoa nas opções para o exercício profissional e a
abordagem centrada no aluno para o modelo pedagógico. Estas semelhanças podem ser
usadas para sensibilizar e clarificar ambos os conceitos. Compreender o ponto de vista do
formando permite gerar exemplos para tornar aceitável o ponto de vista do paciente. Na
capacidade de o aluno reflectir sobre o seu processo pedagógico, é possível salientar e avaliar o manuseamento e reflexão do processo do paciente.
O estilo particular do médico pode fazer a diferença (14). Há dados que comprovam a
influência desse estilo sobre a qualidade dos cuidados primários na opinião do paciente e a
satisfação que ele reconhece e apoiam fortemente a exequibilidade e o valor do modelo centrado na pessoa.
A abordagem centrada no paciente pode considerar-se condição prévia do método clínico
centrado no paciente em que se baseia a Medicina Geral e Familiar enquanto disciplina. As
mensagens fundamentais são:
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Cuidados
Centrados
na Pessoa:
Objectivos
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Objectivo 2.1: No final do programa de formação o formando terá desenvolvido uma abordagem centrada na pessoa ao lidar com os pacientes e os problemas no contexto das circunstâncias do paciente.
Para tal precisa de:
2.1.1 - conhecimento científico básico para compreender a pessoa, a sua evolução,
objectivos e aspirações;
2.1.2 - desenvolver um quadro de referência para compreender e lidar com a
dimensão familiar, com a comunidade, com as dimensões social e cultural
que informam as atitudes, valores e crenças da pessoa;
2.1.3 - dominar os conceitos de afecção e de doença.
Objectivo 2.2: No final do programa de formação o formando estará em condições de aplicar o modelo de consulta centrado no paciente, de comunicar e de agir em parceria.
Para tal precisa de:
2.2.1 - ser capaz de monitorizar o modelo de consulta centrado no paciente que
começa pela exploração da agenda do paciente (p.ex.: ideias, preocupações
e aspirações), que integra a agenda do formando, encontra plataformas de
entendimento e negoceia um plano comum para o futuro;
2.2.2 - ser capaz de comunicar a informação de um modo adequado e compreensível, incluindo informar os pacientes sobre concepções pessoais e encontrar
plataformas de entendimento para posterior tomada de decisão;
2.2.3 - ser capaz de tomar decisões respeitando a autonomia do paciente;
2.2.4 - ter consciência da subjectividade da relação clínica, quer do lado do paciente
(sentimentos, valores e preferências) quer na perspectiva do formando (consciência dos seus próprios valores, atitudes e sentimentos).
Objectivo 2.3: No final do programa de formação o formando estará em condições de
comunicar, estabelecer prioridades e actuar em parceria.
Para tal precisa de:
2.3.1 - aptidões e atitude propícias ao estabelecimento de uma relação de parceria
com o paciente;
2.3.2 - aptidões e atitude adequadas para equilibrar distância e proximidade em
relação ao paciente.
Objectivo 2. 4: No final do programa de formação o formando estará em condições de providenciar continuidade longitudinal de cuidados.
Para tal precisa de:
2.4.1 - compreender e dominar os três aspectos da continuidade: continuidade pessoal como suporte para toda a vida (atitude adequada a um relacionamento
duradouro com uma pessoa), continuidade na informação permitindo disponibilizar informação médica adequada em qualquer momento e para todos os
contactos necessários com o paciente (presenciais ou electrónicos) e continuidade no atendimento no tempo, noite e dia (pessoalmente ou com recurso
a sistemas de substituição).
20
O processo pedagógico deve pautar-se pela aprendizagem auto-dirigida e prática ponderada. “Reflectir agindo” imediatamente e “reflectir sobre a acção” a posteriori, em particular
quando acontece algo de inesperado, são atitudes muito instrutivas. Reflectir em geral sobre
o impacto do próprio e sobre a influência do estilo pessoal é crucial (14). Esta reflexão relaciona-se intimamente com o pensamento crítico e deve estimulá-lo. O tutor deve assumir o
papel de facilitador, estimulando a aprendizagem auto-dirigida, o pensamento crítico e a
reflexão, promovendo o crescimento pessoal e profissional.
Consequências
para os métodos
pedagógicos
O conhecimento do paciente como um todo consegue-se não apenas nas aulas mas também lendo romances, discutindo histórias de pacientes e reflectindo em pequenos grupos
sobre interacções médico-paciente concretas. As sessões de treino de aptidões profissionais devem focar o estilo de comunicação específica adequado ao papel de parceiro médico num contacto centrado na intervenção, incluindo o papel de advogado. Um modelo de
consulta deve ser concebido e ensinado nos seus diferentes elementos, o estilo variável de
comunicação dentro da consulta e o papel de modelo adequado ao médico.
O treino para a intervenção deve basear-se na resposta do paciente, deve incluir treino em
comportamento cognitivo e voltar-se mais para a solução do que para o problema, com elementos de uma abordagem sistémica que inclua pelo menos as dimensões da pessoa, da
família e da comunidade.
O ensino deve destacar explicitamente o médico como pessoa, desenvolvendo os pontos
fortes individuais e tentando equilibrar valores pessoais e saúde. O chamado “método
Balint” (9), a par de métodos afins desenvolvidos mais tarde, são bons exemplos de reflexão
participativa em que se aprende a aceitar, compreender e usar a pessoa como elemento de
uma abordagem eficaz do paciente centrada na pessoa.
O s mét odos específic os para o conseguir incl u e m :
- ensino que parte da apresentação dos problemas pelo paciente, atribuindo um lugar
central às narrativas e histórias que o paciente conta nos diferentes eventos pedagógicos;
- instrumentos como os genogramas, enredos familiares e eco-mapas, que incluem
aspectos relacionados com o trabalho e o lazer;
- formação num modelo de comunicação dirigido à receptividade do paciente como
pressuposto do método de prática clínica centrado no paciente;
- sessões temáticas sobre tópicos específicos, como tomada de decisões em
comum, respeito pela autonomia, fornecimento de informação de retorno, perguntas
não agressivas, etc.;
- aulas sobre conceitos e modelos definidos em relação com o tópico que forneçam
um quadro para a compreensão e interpretação meta-cognitiva do que acontece
durante o encontro médico-paciente;
- prática tutelada e modelos de aprendizagem reflexiva durante a formação.
A avaliação de uma abordagem centrada na pessoa deve basear-se na apresentação de
casos. Podem ser usados diferentes formatos: observação directa mediante consultas simuladas, índices baseados em informação dada pelo paciente, progressão cronológica de
casos, videogravação de casos, e também métodos indirectos, como a discussão de casos
de pacientes ou a reflexão oral sobre casos simulados.
As aptidões parciais, relacionadas com aspectos pessoais do médico e com a apreciação e
compreensão de aspectos pessoais de pacientes, podem ser avaliadas por processos tipo
revisão interpares, como discussões de grupo, apresentação de problemas ou reuniões da
equipa.
Podem também usar-se novas abordagens, como o portfólio pedagógico de reflexão, em
que o formando mostra as suas aptidões como pessoa sob a forma de reflexão pessoal e
dá garantias da capacidade de reflectir sobre o papel do paciente no encontro médicopaciente.
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Cuidados Centrados
na Pessoa:
consequências
para a avaliação
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Resultados da aprendizagem
O formando mostrará:
- capacidade de lidar com os problemas do paciente segundo os conceitos da abordagem centrada no paciente;
- capacidade de conduzir uma consulta segundo o método centrado no paciente;
- capacidade de estabelecer uma parceria em que haja receptividade por parte do
paciente;
- domínio dos conhecimentos sobre prestação longitudinal de cuidados.
Consequências
para o contexto
e enquadramento
temporal
O Ensino Médico Básico deve assegurar os conhecimentos e aptidões básicos necessários
a todos os elementos de uma abordagem centrada na pessoa pela introdução dos conhecimentos sobre o enquadramento trazidos das ciências correlatas sobre desenvolvimento e
evolução pessoal, família, sociedade, cultura e influências religiosas sobre as crenças, valores e comportamentos individuais.
A EMB deverá promover desde cedo a concentração no paciente, por forma a que os elementos científicos e relacionados com as patologias no espírito do estudante tenham consequências úteis nos cuidados prestados aos pacientes.
Objectivos
Métodos de aprendizagem
Ver o Paciente como uma
pessoa - ideias,
preocupações, expectativas
Desenvolvimento conceptual
- Observação directa
- Palestras temáticas
ou de videogravação
- Leitura de histórias de
de consultas reais
Pacientes, novelas e narrativas ou simuladas
- Informação de retorno
dos Pacientes
- Progressão cronológica
dos casos
Aplicar modelo de Consulta
e Comunicação Centradas
no Paciente
- Estilo de resposta comunicacional do Paciente
- Começar e acabar
com o Paciente
Prática clínica
Observação pelo Orientador
(“sit-in”) com informação de
retorno
Consultas videogravadas
Discussão (um para um, pequenos grupos)
A EMB deve assentar na complementaridade das abordagens centrada no paciente e centrada na doença e familiarizar todos os estudantes com a MGF - mesmo os futuros especialistas de campos diferentes da MGF.
A Formação Especializada em MGF deve ter lugar predominantemente num cenário de
Medicina Geral e Familiar. Deve assentar no método clínico centrado no paciente que parte
do modelo de consulta centrada no paciente e aplica a capacidade de comunicar buscando a receptividade do paciente.
Demonstrar capacidade de
resposta às preferências,
sentimentos e expectativas
dos Pacientes
Estabelecer parcerias
sustentadas
Usar o Médico como uma
pessoa: usar e cuidar do
equilíbrio pessoal e dos
valores próprios
- Auto-reflexão
- Auto-avaliação
22
Meios de avaliação
- Observação indirecta
- Registos
- Relatórios de progresso
- Discussão de casos
de Pacientes
- Reflexão sobre casos
Simulados
- Observação directa
(consultas videograva
das, “sit-in”)
Quadro resumo educação
em cuidados
centrados
na pessoa
Bibliografia
1. McWhinney, I. R, A Textbook of Family
Medicine. Oxford University Press; 2ª
edição, 1997
2. Fehrsen, G. S., Henbest, R. J., «In
search of excellence. Expanding the
Patient-centred Clinical Method: a
Three-stage assessment». Family
Practice, 1993 vol. 10, nº 1, pág 49-54
3.Stewart, M., ea. Patient-centred Medicine:
transforming the Clinical Method, Sage
Ensino de Modelos Orientados - Avaliação temática de
publ., 1995
para Finalidades
diversos subelementos
4. Mold, J. W., «Goal-Oriented Medical
Exercícios de exploração
Care», Family Medicine, 1991, 23, 1,
Observação pelo Orientador
46-51
com informação de retorno
5. Leopold, N., «Sustained partnership in
Primary Care», J. Fam. Pract., 1996,
Videogravação de consulta com
42, 129-7
informação de retorno pelo
6. Emanuel, E. J., «Four models of the
Orientador e reflexão pelo
physician-patient relationship», JAMA
Formando
1992, 267, 2221-6
7. McWhinney, I.R., «Being a general
practitioner: what it means». Eur. J.
Reflexão na consulta
Avaliação indirecta de
Gen. Pract., 2000, 6, 1359
- Vídeo e tempo
potencialidades relacionais 8. Freeman & Olesen: comunicação programática à conferência WONCA de
para auto-reflexão
Viena 2000
9. Haggerty, J. L., «Continuity of Care»,
BMJ, 2003, 1219-1221
Grupos participativos
Portfolio de reflexão
10. Balint, M., The doctor, his patient and
de reflexão
com a opinião do
the illness, Pitman Medical Publishing,
Portfolio de reflexão
Orientador
Londres, 1964
11. Henbest, R. J., Stewart, M., «PatientCentredness in the consultation. 2:
Does it really make a difference?»,
Family Practice, 1.990, vol 7, nº 1, p.
28-33
12. Levenstein, J. H., ea, «The patientcentred clinical method. I. A model for
the doctor-patient interaction in family
medicine», Family Practice 1986, 3:24
13. Mead, N., Bower P. «Patient-centredness: a conceptual framework and
review of the empirical literature»,
Social Science & Medicine 2000,
51:1087-1110.
14. Flocke, S. A., Miller, W. L., Crabtree,
B. F., «Relationships between physician
practice style, patient satisfaction, and
attributes of primary care», Journal of
Family Practice, 2002, 51, 10
15. Schön, DA. Educating the Reflective
Practitioner, Jossey-Bass, 1987. p. 26.
23
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Responsável pelo capítulo:
Yonah Yaphe (Israel)
Colaborações de Francesco
Carelli (Itália), Bernard
Gay (França), Jan Heyrman
(Bélgica), Mladenka VrcicKeglevic (Croácia), Job
Matsemakers (Holanda),
Andreas Rothenbühler
e Bernard Rindslisbacher
(Suíça)
Introdução
Page 24
Capítulo 3.
Aptidões Específicas para a
Resolução de Problemas
Inclui a capacidade para:
- relacionar os processos de decisão específicos com a prevalência e incidência das
doenças na comunidade;
- reunir e interpretar selectivamente a informação recolhida na história clínica,
exame físico e exames complementares e aplicá-la a um plano de acção adequado em colaboração com o paciente;
- adoptar princípios de trabalho adequados (por exemplo, exames complementares
sequenciais), usar o tempo como uma ferramenta, tolerar a incerteza;
- intervir com urgência quando necessário;
- gerir as situações que possam apresentar-se precocemente e/ou de forma indiferenciada;
- usar com efectividade e eficiência as intervenções de diagnóstico e terapêutica.
A capacidade de resolução de problemas específicos está relacionada com o contexto em
que os problemas surgem, a natureza e a história natural dos próprios problemas, as características pessoais dos pacientes que apresentam esses problemas, as características pessoais dos médicos que os gerem e os recursos disponíveis para a sua resolução. A resolução de problemas em medicina geral e familiar é em grande medida dependente do contexto.
Tanto a gestão partilhada dos problemas com o paciente como o conflito sobre o uso justo
de recursos limitados suscitam questões éticas ligadas à resolução de problemas. O professor de medicina geral e familiar pode chamar a atenção para as questões éticas sempre que
apropriado em casos específicos ou tomar a iniciativa e apresentar casos simulados para
proporcionar a discussão destes problemas e das estratégias para lidar com eles.
Pode ser difícil para alguns formandos entender ou aceitar as diferenças de estratégia para
a resolução de problemas entre a clínica geral e o hospital. Há que identificar e analisar os
conflitos (4). Há muitos “momentos ensináveis” que podem ser usados com grande vantagem para o treino de resolução de problemas.
Objectivo 3.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de relacionar o processo específico de tomada de decisão com a prevalência e incidência da doença
na comunidade.
Para tal precisa de:
3.1.1 - Conhecer as afecções e doenças dos cuidados primários, incluindo a sua
incidência e prevalência específicas;
3.1.2 - Conhecer a população da consulta (distribuição por idades e por género, prevalência de doenças crónicas);
3.1.3 - Aptidões para tomada de decisão específica (com recurso a instrumentos como
o raciocínio clínico e as regras de decisão).
Objectivo 3.2: No final do programa de formação o formando estará em condições de colher
e interpretar selectivamente a informação recolhida na anamnese, exame objectivo e exames
complementares e aplicá-la a um plano de acção adequado em colaboração com o paciente.
O material teórico que pode ajudar professores e alunos é a literatura sobre o modelo hipotético-dedutivo de Esltein (1). Um segundo modelo útil ao ensino é o conceito de reconhecimento de padrões ou de argumentos de aprendizagem (2). Ambos podem ser usados no
ensino dos casos específicos encontrados para tornar evidente a estratégia de resolução de
problemas do médico. Um terceiro ponto fundamental é o uso de literatura relevante para
demonstrar as decisões de gestão (3,4). Neste ponto é relevante a discussão com o aluno
dos vieses de selecção. São muitos os exemplos: a literatura proveniente da MGF sobre
séries de casos de pacientes com linfadenopatia ou dor torácica comparada com os achados em pacientes dos cuidados terciários pode ser instrutiva (4).
Para tal precisa de:
3.2.1 - Conhecer os pontos relevantes da anamnese e as indicações importantes do
exame físico e relacionar uns e outros com o problema apresentado, com
destaque especial para a inclusão ou exclusão de possíveis problemas urgentes;
3.2.2 - Saber coligir o contexto relevante do paciente, incluindo factores familiares e
sociais;
3.2.3 - Conhecer os exames complementares e os recursos de tratamento disponíveis para os problemas apresentados;
3.2.4 - Possuir aptidões para a recolha da história e para efectuar o exame objectivo
e aptidão para interpretar os dados;
3.2.5 - Dispor-se a envolver o paciente no plano de acção.
A importância da resolução de problemas quando se depara a fase precoce, indiferenciada,
da doença ajuda o formando a concentrar-se na abordagem baseada no problema em vez
da abordagem baseada na doença. Há vários bons manuais de cuidados primários organizados segundo esta linha de raciocínio. É especialmente importante a detecção de possíveis problemas que requeiram acção urgente (5).
Objectivo 3.3: No final do programa de formação o formando estará em condições de adoptar princípios de trabalho adequados usando exames complementares sequenciais, o tempo
e tolerando a incerteza.
Usar o tempo, exames complementares sequenciais, lidar com a incerteza, tudo isso interessa para uma mudança de atitude que pode tornar-se necessária a estudantes de MGF.
Existe um corpo crescente de literatura sobre estes tópicos, em apoio dos professores que
encorajam os alunos a reflectir sobre estes aspectos únicos da resolução de problemas (6).
24
Para tal precisa de:
3.3.1 - Adoptar atitudes características de uma orientação generalista incluindo a
curiosidade, diligência e atenção;
3.3.2 - Adoptar o procedimento por passos na tomada de decisão médica, usando o
tempo como ferramenta de diagnóstico e tratamento;
3.3.3 - Compreender a inevitabilidade da incerteza na resolução de problemas em cuidados primários e no desenvolvimento de estratégias para tolerar a incerteza.
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Aptidões Específicas
para a Resolução
de Problemas:
Objectivos
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4:42 PM
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Objectivo 3.4: No final do programa de formação o formando estará em condições de intervir com urgência quando necessário.
Para tal precisa de:
3.4.1 - Aptidões específicas para a tomada de decisão em situações de emergência;
3.4.2 - Aptidões específicas em procedimentos de emergência em situações de cuidados primários.
Objectivo 3.5: No final do programa de formação o formando estará em condições de gerir
problemas de saúde que possam ap r e s e n t a r-se precocemente e com carácter indiferenciado.
Para tal precisa de:
3.5.1 - Saber quando esperar e tranquilizar e quando iniciar actos de diagnóstico adicionais.
Objectivo 3.6: No final do programa de formação o formando estará em condições de usar
eficazmente as intervenções diagnósticas e terapêuticas.
Para tal precisa de:
3.6.1 - Conhecer o valor preditivo positivo e negativo dos sintomas e sinais e dos resultados de exames complementares obtidos na recolha de dados, e o modo
como dependem da prevalência da doença em causa;
3.6.2 - Compreender as noções de custo-eficiência e custo-benefício de exames complementares e tratamentos e conhecer o número necessário para tratar ou prejudicar de tratamentos específicos.
Consequências
para os métodos
pedagógicos
Muito do ensino no cenário dos cuidados primários utiliza a técnica do papel de modelo. A
prática independente com supervisão, análise e reflexão sobre os casos que se deparam é
outra técnica pedagógica fundamental.
O problema particular do ensino de aptidões médicas de emergência é difícil de resolver no
cenário da medicina geral e familiar, em especial em estágios mais curtos dos alunos mas
também em estágios de Formação Especializada mais prolongados. A colaboração com os
serviços de urgência dos hospitais ou, em alguns cenários, com serviços de emergência de
rua, permite ultrapassar este problema. Há que prestar atenção aos diferentes protocolos de
resolução de problemas usados no centro de saúde, na rua ou na visita domiciliária, em
comparação com os que são usados na urgência dos hospitais.
A avaliação das aptidões para a resolução de problemas nos cuidados primários utiliza uma
série de métodos. A Avaliação Clínica Estruturada por Objectivos(4) pode simular problemas
raros ou difíceis que poderão não ter surgido durante a breve passagem do formando pelo
consultório. A observação directa da consulta com recurso a listas de objectivos e pontuações globais pode ser também usada para avaliar as aptidões para a resolução de problemas. O exame oral, com todas suas limitações, tem o seu lugar na avaliação de atitudes
e de aptidões para a resolução de problemas mediante situações hipotéticas e de evolução
dos casos.
O conhecimento da prevalência e incidência pode ser avaliado por testes de escolha múltipla, perguntas abertas e exames orais, a competência na tomada de decisões por OSCE e
o desempenho na tomada de decisão pela revisão do desempenho. A capacidade para a
resolução de problemas específicos pode ser avaliada por OSCE, observação do formando
e revisão do desempenho específico. As entrevistas ou os questionários dirigidos ao paciente podem ser usados para avaliar a satisfação deste relativamente às tentativas do formando para o envolver no processo de cuidados.
R esult ados da ap r e n d i z a g e m
O aluno deverá mostrar:
- capacidade de relacionar os processos de decisão específicos com a prevalência e
incidência das doenças na comunidade;
- capacidade de colher e interpretar selectivamente a informação recolhida na anamnese, exame objectivo e avaliação laboratorial e aplicá-la a um plano de acção adequado em colaboração com o paciente.
A gestão médica de problemas comuns e indiferenciados, bem como dos recursos disponíveis, deve ser incluída no Ensino Médico Básico. Estas questões podem ser apresentadas
em aulas ou em discussão em pequenos grupos, ainda nos anos pré-clínicos. Os laboratórios de aptidões podem ser usados em alunos pré-clínicos para apresentar métodos de
resolução de problemas. A resolução de problemas ensina-se melhor em ambiente clínico
com pacientes reais seguidos ao longo do tempo de forma a permitir a avaliação de resultados. Uma grande parcela da Formação Especializada é dedicada à aprendizagem de
aptidões para a resolução de problemas e ao desenvolvimento de um estilo clínico único e
pessoal, sob a orientação de um tutor por um período de vários meses ou anos.
Entre os métodos específicos para o conseguir contam-se:
- Estudo autónomo sobre incidência e prevalência (leituras, aulas);
- Criação de um perfil da consulta (ou estudo de um perfil existente);
- Realização de consultas de medicina geral e familiar com reflexão e supervisão das
tomadas de decisão;
- Ao nível dos conhecimentos, leitura de textos de diagnóstico físico e de estudo de
casos;
- Ao nível das aptidões, simulação da recolha da anamnese e exame objectivo (por
ex., num laboratório de aptidões);
- Observação do desempenho do aluno e consequente apreciação desse desempenho;
- Ao nível da atitude, discutir com o aluno o valor da parceria com o paciente.
(4) Tradução de Objective Strutured Clinical Examination - Técnica conhecida pelo acrónimo “OSCE”.
Dada a sua disseminação generalizada, este acrónimo será utilizado neste texto (N.do R.)
26
Aptidões Específicas
para a Resolução
de Problemas:
consequências para
a avaliação
27
Consequências
para o contexto
e enquadramento
temporal
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Quadro resumo
- educação em
aptidões específicas
para a resolução
de problemas
(1) OSCE
(2) Serviço de Urgência
Bibliografia
1. Dowie, J., Elstein, A.S. (eds),
Professional judgement: a reader in cli nical decision making. Cambridge
University Press, 1991.
2. Schmidt, H. G., Norman, Gr.,
Boshuizen H. P.A., «A cognitive perspective of medical expertise: Theory
and implications», Acad. Med. 1990,
65, 611-621.
3. Knotnerus, J.A., «Medical decisionmaking by general practitioners and
specialists», Fam. Pract. 1991, 8, 305307.
4. Rosser, W. W., «Approach to diagnosis
by primary care clinicians and specialists: Is there a difference?», The journal
of Family Practice 1996, 42, 139-44.
5. Pewsner, D., Battaglia, M. ea., «Ruling a
diagnosis in or out with "SpPIn" and
"SnNOut": a note of caution», BMJ
2004, 329, 209-13
6. Sheldon M., Brooke, J., Rector, A.
(eds), «Decision-making in general
practice» MacMillan Press, Londres,
1985.
7. Page, G. B., Bordage, G., Allen, T.,
«Developing key-feature problems and
examinations to assess clinical decision-making skills», Acad. Med. 1995,
Mar. 70(3}:194-201.
8. Regehr, G., Norman, G. R., «Issues in
cognitive psychology: implications for
professional education», Acad Med.
1996, Set., 71(9):988-10Q1. Recensão.
9. Bordage, G., «Elaborated knowledge: A
key to successful diagnostic thinking»,
Acad. Med. 1994, 69, 883-885.
10. Case, M. S., Swanson, D.B.,
Wooliscroft, J. O., «Assessment of diagnostic pattern recognition skills in
medical clerkship using written tests».
in Trabalhos da Conferência
Internacional sobre Abordagens da avaliação em competência clínica, , Parte
II, Escola Médica do Ninewells
Hospital, Dundee 1992, 452-458.
11. Kassirer, J. P., Kopelman, R. I.,
Learning clinical reasoning, Williams and
Wilkins, Baltimore 1991.
12. Norcini, J. J., Shell, J. A., «The effect
of level of expertise on answer key
development», Acad. Med., 1995, 65,
515-516.
13. Thistlethwaite, J., E., «Making and
sharing decisions about management
with patients: the views and experiences of pre-registration house officers in
general practice and hospital», Med.
Educ., 2002, 36, 49-55.
Page 28
Objectivos
Métodos de aprendizagem
Meios de avaliação
Palestra
Conhecer a incidência e preSeminário
valência de problemas
Leitura
comuns
Discussão
TEM, TPC
Orais
Saber como conduzir uma
pesquisa eficiente para definir o problema
Casos simulados
Observação
Discussão de casos
ACOE (1)
Observação
Auditoria de registos
médicos
Saber como definir e gerir o
problema em colaboração
com o Paciente
Casos simulados
Prática clínica
Observação / “sit-in”
Observação
ACOE
Trabalho em Su(2)
Saber lidar com situações de Simulação
emergência
Leitura
Prática Clínica
Saber lidar com problemas
indiferenciados
Casos simulados
Discussão
Leitura
Valorizar uma abordagem
Discussão
progressiva, usando o tempo
Reflexão
e aceitando a incerteza
Discussão
Valorizar uma abordagem
Observação
ética que permita o uso adeLeitura
quado de recursos limitados
Reflexão
Capítulo 4.
Abordagem Abrangente
Inclui a capacidade para:
- gerir simultaneamente queixas e patologias múltiplas e problemas de saúde tanto
agudos como crónicos do indivíduo;
- promover a saúde e o bem-estar aplicando adequadamente as estratégias de promoção da saúde e prevenção da doença;
- gerir e coordenar a promoção da saúde, a prevenção, cura, tratamento, paliação
e reabilitação.
TEM
ACOE
Observação
Exame oral
ACOE
Observação / “Sit-in” /
Vídeo
Entrevista
Discussão
Exame oral
Entrevista
Discussão
Exame oral
Um requisito importante para os médicos de família é a capacidade de enfrentar as muitas
queixas e problemas dos pacientes que cuidam e, ao mesmo tempo, apoiar as forças e os
recursos individuais que permitem lidar com esses problemas. Quando sentem que necessitam de assistência médica, os pacientes tornam-se pessoas doentes e muitas vezes não
são capazes de distinguir entre as diferentes doenças de que podem sofrer. Ter em conta os
múltiplos problemas de saúde de um indivíduo é um importante desafio. Exige a importante
capacidade de interpretar os dados e de os ordenar em termos de prioridades durante a
consulta com o paciente (1).
O médico de família deve apontar para uma abordagem do paciente cujo principal foco seja
promover a sua saúde e bem-estar geral, o que muitas vezes entra em contraste marcado
com a abordagem do especialista hospitalar, pois trata de tantos problemas médicos quantos possível. Lidar adequadamente com os factores de risco através da promoção dos auto-cuidados e do reforço do poder do paciente é uma tarefa importante do médico de família.
O objectivo do médico é minimizar o impacto dos sintomas do paciente sobre o seu bem-estar mediante levar em conta a sua personalidade, família, quotidiano e ambiente físico e
social (2). Adoptar uma abordagem baseada na evidência permite proporcionar ao paciente
o tratamento mais bem documentado e actualizado e ao médico a melhor informação documental sobre diagnóstico e tratamento.
Coordenar os cuidados a prestar significa também que o médico de família está adequadamente preparado não só para gerir a doença e a prevenção como para cuidar do paciente,
fornecer cuidados paliativos nas fases terminais da vida dos pacientes e providenciar reabilitação. O médico deverá ser capaz de coordenar os cuidados prestados ao paciente por
outros profissionais de saúde.
28
29
Responsável pelo capítulo:
Igor Svab (Eslovénia)
Colaboração de Ivanka
Bogrova (República Checa),
Margus Lember (Estónia),
Janos Szabo (Hungria),
Anders Baerheim
(Noruega), Llukan
Rrumbullaku (Albânia),
Justin Allen (Reino Unido),
Dolores Fores (Espanha),
Muharem Zildzic e Samira
Herenda (BósniaHerzegovina), Bernhard
Rindlisbacher (Suíça)
Introdução
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Abordagem
Abrangente:
objectivos
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Objectivo 4.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de gerir
simultaneamente queixas e patologias múltiplas, e problemas de saúde tanto agudos como
crónicos do indivíduo.
Os conhecimentos podem ser avaliados por exames, por avaliação das apresentações de
pacientes e por exames orais. As competências podem ser avaliadas por OSCE, por vídeogravações, ou através da utilização de pacientes simulados.
Para tal precisa de:
4.1.1 - compreender o conceito e as complementaridades da plurimorbilidade num só
paciente;
4.1.2 - aptidão para gerir problemas de saúde simultâneos através da identificação,
exploração, negociação, aceitação e estabelecimento de prioridades;
4.1.3 - aptidão para usar devidamente registos médicos e outras informações;
4.1.4 - capacidade para procurar e dar uso prático à melhor evidência disponível.
O desempenho pode ser avaliado pelo orientador observando o médico no consultório, na
execução das tarefas relevantes para este capítulo (elaborar uma lista de problemas, avaliar
o registo de um paciente, trabalhar no consultório com pacientes reais, etc.) (3). Podem usarse vários métodos de avaliação formativa e somativa. De um modo geral, o paciente deve
ser o ponto de partida da avaliação.
Objectivo 4.2: No final do programa de formação o formando estará em condições de promover a saúde e o bem-estar aplicando adequadamente as estratégias de promoção da saúde
e prevenção da doença.
Para tal precisa de:
4.2.1 - compreender o conceito de saúde em todas as suas facetas;
4.2.2 - integrar a promoção individual da saúde no âmbito dos contactos diários;
4.2.3 - promover a saúde através de programas específicos de promoção da saúde e
de prevenção da doença no contexto dos cuidados primários;
4.2.4 - compreender o papel do médico de família nas actividades de promoção da
saúde na comunidade;
4.2.5 - reconhecer a importância das tensões éticas entre as necessidades do indivíduo e as da comunidade e agir de forma adequada.
Objectivo 4.3: No final do programa de formação o formando estará em condições de coordenar os elementos de cura, cuidado, paliação e de reabilitação para cada paciente individual.
Para tal precisa de:
4.3.1 - compreender as diferentes possibilidades e contributos dos membros da equipa;
4.3.2 - capacidade de usar diferentes abordagens no mesmo paciente;
4.3.3 - aptidão para coordenar uma equipa de saúde.
Consequências
para os métodos
pedagógicos
Podem usar-se vários métodos pedagógicos. Convém fazer uma reflexão teórica sobre a
abordagem abrangente, mas essa reflexão só terá sucesso se for associada à experiência prática.
Entre os métodos específicos para o conseguir contam-se:
- Exposição precoce obrigatória à prática clínica no cenário dos cuidados primários;
- aulas curtas para explicar os conceitos de plurimorbilidade e o funcionamento do
sistema de saúde;
- exercícios com modelos no ensino das aptidões comunicacionais;
- atribuição de tarefas (p. ex., apresentações aos pacientes num cenário de cuidados
de saúde comunitários);
- estudo de casos e discussão em pequenos grupos para avaliar a complexidade do
paciente;
- crítica à consulta individual;
- auto-avaliação clínica;
- trabalho e reflexão contínuos no cenário dos cuidados primários.
30
Abordagem
Abrangente:
Consequências
para a avaliação
Resultados da aprendizagem
O formando deverá mostrar:
- conhecer o quadro teórico da plurimorbilidade;
- conhecer os conceitos de saúde e de salutogénese (4);
- compreender o quadro teórico da promoção efectiva da saúde;
- capacidade de identificar, explorar, negociar, aceitar e atribuir prioridades a problemas simultâneos e aos recursos de cada paciente;
- capacidade de fazer a promoção da saúde individualmente no âmbito da consulta
de medicina geral e familiar;
- saber usar apropriadamente os registos médicos e a melhor evidência para gerir problemas de plurimorbilidade;
- capacidade de prestar e coordenar os cuidados nestas áreas.
A abordagem abrangente pode ser ensinada a diferentes níveis de conhecimento e complexidade.
Ao nível do Ensino Médico Básico o estudante deve conhecer a estrutura teórica da abordagem abrangente e aplicar esta abordagem em casos simples.
Ao nível da Formação Especializada o médico deve ser competente em abordagem abrangente.
Ao nível do Desenvolvimento Profissional Contínuo o médico deve demonstrar um desempenho adequado nesta área.
Bibliografia
1. Kaufman, D. M., «ABC of learning and teaching in medicine: Applying educational theory
in practice», Br. Med. J., 2003, 326, 213-6.
2. Stewart, M., Patient centred medicine: transforming the clinical method, Sage publ.,
1995
3, Van der Vleuten, C. P. M., «The assessment of professional competence: developments,
research and practical implications» Advances in Health Sciences Education, 1996,
1:41-67.
4. Aritonowsky, A., Unraveling the mystery of health, Jossey-Bass Inc., California.
31
Consequências
para o contexto
e enquadramento
temporal
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Quadro resumo educação em
abordagem
abrangente
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Objectivos
Métodos de aprendizagem
Meios de avaliação
Compreender o conceito
de multimorbilidade
Palestra
Descrição e apresentação
de casos
Prática clínica
TEM, TPC
Avaliação da apresentação
pelo Orientador
Avaliação pelo Orientador
Gestão de problemas
de saúde simultâneos
Construção de lista
de problemas balanceada
com lista de capacidades de
resistência/adaptação
Apresentação de casos
Prática clínica
ACOE
Avaliação de registos de
Pacientes
Avaliação pelo Orientador
Avaliação prelo Orientador
Uso de registos médicos
Construção de listas
de problemas
Prática clínica
ACOE
Avaliação pelo Orientador
Procura e uso da melhor
evidência
Prática clínica
Avaliação pelo Orientador
Compreender o conceito
de Saúde
Desempenho de papéis
ou doentes simulados
Apresentação de casos
Prática clínica
Análise de videogravações
Avaliação em grupo
Auto-avaliação, avaliação
pelo Orientador
Promover a saúde a nível
individual como parte da
consulta normal
Palestra sobre mudanças de
estilo de vida
Vídeogravação
Desempenho de papéis
Pacientes simulados
Prática clínica
TEM, TPC
Análise de vídeogravações
Avaliação/informação de
retorno pelo Orientador ou
pelo paciente simulado
Avaliação pelo Orientador
Promover a Saúde através
de programas de Promoção
de Saúde e/ou de Prevenção Reunião de grupo
no âmbito dos cuidados primários
Avaliação por pares
Compreender o papel do
Médico de Família em actividades de promoção de
saúde na comunidade
Avaliação do material
Avaliação por pares
Avaliação da sessão
Avaliação pelo Orientador
Preparar material
Reunião de grupo
Preparar e dirigir uma sessão
Preparar um projecto
Reconhecer a importância
das tensões éticas entre as
P.e. observação de conSeminário, discussão em grupo,
necessidades dos indivíduos
sulta simulada, exame
leitura
e aquelas da comunidade, e
oral, discussão
actuar apropriadamente
Leitura / Seminário
Ter atenção os recursos disDiscussão
poníveis quer na comunidade
Visita de estudo / Visita de
local quer no sistema de
Unidades de Saúde
saúde
Trabalho de campo
32
Capítulo 5.
Orientação Comunitária
Inclui a capacidade de:
- conciliar as necessidades de saúde dos pacientes e as necessidades de saúde da
comunidade em que eles vivem com os recursos disponíveis.
Responsável pelo capítulo:
Igor Svab (Eslovénia)
Colaboração de Ivanka
Bogrova (República Checa),
Margus Lember (Estónia),
Janos Szabo (Hungria),
Anders Baerheim
(Noruega), Llukan
Rrumbullaku (Albânia),
Justin Allen (Reino Unido),
Dolores Fores (Espanha),
Muharem Zildzic e Samira
Herenda (BósniaHerzegovina)
Os médicos de família têm para com a comunidade em que trabalham responsabilidades
que estão para além da consulta com determinado paciente. O trabalho do médico de família é determinado pela composição da comunidade e por isso o médico tem que compreender os potenciais e limitações dessa comunidade. O médico de família encontra-se numa
posição que lhe permite apreender essas questões. Em todas as sociedades, os sistemas
de saúde estão a ser racionados e os médicos participam nas decisões de recionamento,
tendo uma responsabilidade ética e moral de influenciar a política de saúde na comunidade.
Introdução
Objectivo 5.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de conciliar as necessidades de saúde dos pacientes com as necessidades de saúde da comunidade
em que eles vivem, em equilíbrio com os recursos disponíveis.
Orientação
Comunitária:
objectivos
Para tal precisa de:
5.1.1 - compreender as necessidades de saúde das comunidades a partir das características epidemiológicas da população;
5.1.2 - compreender as inter-relações entre cuidados de saúde e assistência social;
5.1.3 - compreender o impacto da pobreza, da origem étnica e da epidemiologia local
sobre a saúde;
5.1.4 - aperceber-se das desigualdades nos cuidados de saúde;
5.1.5 - compreender a estrutura do sistema de saúde e suas limitações económicas;
5.1.6 - trabalhar com os outros profissionais envolvidos na política comunitária da
saúde e compreender o seu papel;
5.1.7 - compreender a importância da informação oriunda da prática clínica e da
comunidade como instrumento de garantia da qualidade da consulta;
5.1.8 - compreender como o médico e o paciente podem utilizar o sistema de saúde
(referenciação, comparticipações, baixas, problemas jurídicos, etc.) no seu contexto específico;
5.1.9 - conciliar as necessidades dos indivíduos com as necessidades da comunidade em que eles vivem.
TEM, TPC
Orais
Relatório
33
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4:42 PM
Consequências
para os métodos
pedagógicos
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Podem usar-se vários métodos. Às considerações teóricas deve associar-se o trabalho prático, pois é absolutamente vital uma compreensão clara do contexto em que são prestados
os cuidados primários na prática e da dinâmica social da comunidade em questão. Para tal
é necessária a experiência directa no ambiente circundante.
Entre os métodos específicos para o conseguir contam-se:
- reflexão estruturada sobre a experiência de trabalho (discussão de casos, análise de
registos clínicos);
- métodos escolares convencionais (aulas, seminários, sessões em pequenos grupos,
resolução de problemas);
- visita a instituições de saúde e assistência social;
- trabalho de campo;
- projectos;
- auditoria clínica;
- estudo individual assistido;
Orientação
Comunitária:
Consequências
para a avaliação
Os conhecimentos podem ser avaliados por meio de testes (p.ex., testes de escolha múltipla ou perguntas abertas), exames escritos e orais, avaliação das apresentações do paciente e avaliação das tarefas atribuídas e dos projectos.
As competências podem ser avaliadas por OSCE, avaliação de registos em vídeo com
desempenho de papéis ou pacientes simulados.
O desempenho pode ser avaliado pelo orientador observando o médico no consultório,
durante a execução das tarefas relevantes para este capítulo.
Métodos de aprendizagem
Meios de avaliação
Compreender as necessidades
de saúde das comunidades
através das características
epidemiológicas da população
Aula convencional
Seminário
Discussão em pequenos grupos
Visita a instituições sociais
e de saúde
Auditoria
Projecto
Trabalho de campo
TEM, TPC
Exame oral e escrito
Apresentação sobre paciente ou projecto
Avaliação pelo Orientador
Relatório
Relatório
Avaliação pelo Orientador
do estágio
Compreender as inter-relações
entre saúde e cuidados sociais
Compreender o impacto da
pobreza, etnicidade e epidemiologia local na saúde
Estar atento às desigualdades
dentro dos cuidados de saúde
Visita a instituições sociais
e de saúde
Discussão em pequenos grupos
Trabalho de campo
Aula convencional
Avaliação pelo Orientador
Discussão com o Orientador
do estágio
Bibliografia
Teste de conhecimentos
1. Feachem, R. G. A., «Poverty and ine-
Compreender a estrutura do
sistema de saúde e as suas
limitações económicas
Reflexão estruturada sobre experiência baseada na prática (discussão de
casos, revisão de processos)
Visita a instituições sociais
e de saúde
Trabalho de campo
Aula convencional
Seminário / discussão
Discussão com o Orientador
do estágio
Avaliação pelo Orientador
Discussão com o Orientador
do estágio
Teste de conhecimentos
Trabalhar com outros profissionais envolvidos na política
comunitária relacionada com a
saúde e compreender os seus
papéis
Trabalho de campo (trabalho com
Avaliação pelo Orientador
outros profissionais)
Discussão com o Orientador
Reflexão estruturada sobre experiêndo estágio
cia baseada na prática (discussão de
casos, revisão de processos)
Compreender a importância da
informação baseada na prática
e na comunidade para a garantia de qualidade da unidade
de saúde
Auditoria à unidade de saúde
Projecto
Trabalho de campo
Estudo pessoal facilitado
Avaliação pelo Orientador
Compreender como o sistema
de saúde pode ser usado pelo
Paciente e pelo Médico
(referências, regimes de pagamentos, baixas, problemas
legais etc.) nos seus próprios
contextos
Estudo pessoal facilitado
Uso de recursos da Internet
Trabalho de campo
Avaliação pelo Orientador
Resultados da aprendizagem
O aluno deverá mostrar:
- conhecer as necessidades de saúde da comunidade;
- compreender as relações entre saúde e assistência social;
- compreender o impacto de pobreza, origem étnica e epidemiologia local sobre a
saúde;
- compreender a estrutura do sistema de saúde e suas limitações económicas;
- compreender a importância da informação oriunda da prática clínica e da comunidade como garantia da qualidade da sua consulta;
- compreender como médico e paciente podem utilizar o sistema de saúde;
- aperceber-se das desigualdades nos cuidados de saúde;
- capacidade de trabalhar com outros profissionais envolvidos na política comunitária
da saúde;
- capacidade de conciliar as necessidades dos indivíduos com as necessidades da
comunidade em que eles vivem.
Consequências
para o contexto e
enquadramento
temporal
A orientação para a comunidade e o impacto da dimensão comunitária sobre o atendimento individual podem ser ensinados a diferentes níveis de conhecimento e complexidade, mas
o ensino tem que ser feito no cenário da prática clínica.
Ao nível do Ensino Médico Básico o estudante deve conhecer a base teórica do impacto da
comunidade sobre os cuidados e ser capaz de a aplicar em casos simples.
Ao nível da Formação Especializada o médico deve ser competente quanto ao impacto da
dimensão comunitária sobre o atendimento individual em certas prestações e mostrar o seu
envolvimento com a comunidade em projectos específicos.
Ao nível da Educação Médica Contínua/Desenvolvimento Profissional Contínuo, o médico
deve demonstrar um desempenho adequado nesta área.
34
Quadro resumo educação
em orientação
comunitária
Objectivos
Reflexão estruturada sobre experiênReconciliar as necessidades
cia baseada na prática (discussão
dos indivíduos com aquelas da
de casos, revisão de processos)
comunidade em que se inseEstudo pessoal facilitado
rem
Trabalho de campo
Discussão com o Orientador
do estágio
Discussão com o Orientador
do estágio
35
quity: a proper focus for the new century», Bulletin of the World Health
Organization, 2000, 78 (1)
2. Gulbrandsen, P., Fugelli, P., Hjortdahl,
P., «General practitioners' knowledge of
their patients' psychosocial problems:
multipractice questionnaire survey»,
BMJ 1997, 314:1014-1018.
3. Gulbrandsen, P., Fugelli, P., Sandvik,
L., Hjortdahl, P., «Influence of social
problems on management in general
practice: multipractice questionnaire
survey». BMJ 1998, 317:28-32
4. Longlett, S. K., Kruse, J. E., Wesley, R.
M., «Community-oriented primary
care: critical assessment and implications for resident education», J. Am.
Board. Fam. Pract. 2001, 14:.141-7.
5. Marmot, M., «Improvement of social
environment to improve health», Lancet
1998, 352: 57-60.
6. Oandasan, I. F., Ghosh, I., Byrne, P. N.,
Shafir, M.S., Measuring communityoriented attitudes towards medical
practice, Fam. Pract. 2000, 17:243-7.
7. Pearce, N., Foliaki, S., Sporle, A.,
Cunningham, C., «Genetics, race, ethnicity, and health», BMJ, 2004; 328:
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8. Pollock, A. M., Majeed, F. A.,
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BMJ 1995, 310:481-2.
9. Smeeth, L., Heath, I., «Tackling health
inequalities in primary care», BMJ,
1999, 318 (7190): 1020-1.
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4:42 PM
Responsável pelo capítulo:
Egle Zebiene (Lituânia)
Contribuições de Filipe
Gomes (Portugal), Jan
Heyrman (Bélgica), Fergus
O'Kelly (Irlanda), Monica
Lindh (Suécia), Iuliana
Popa (Roménia), Athanasios
Simenoidis (Grécia),
Wolfgang Spiegel (Áustria),
Paula Wainiomäki
(Finlândia), Bernardina
Wanrooij (Holanda), Stefan
Wilm (Alemanha), Adam
Windak (Polónia), Bernhard
Rindslisbacher (Suíça),
Introdução
Page 36
Capítulo 6.
Abordagem holística
Inclui a capacidade de:
- usar um modelo biopsicossocial levando em conta as dimensões culturais e existenciais.
A medicina é parte integrante de uma cultura mais vasta. Baseia-se num conjunto de
crenças e valores partilhados, como qualquer prática cultural. A abordagem holística tem
sido aplicada a vários níveis da assistência médica e o desafio não é saber se se aplica a
abordagem holística, mas que tipo de abordagem holística aplicar (1). O termo holismo tem
muitas interpretações na prática médica, incluindo práticas alternativas ou complementares.
Os autores podem pretender determinado significado e os leitores entenderem-no diferentemente (2). A definição de abordagem holística geralmente aceite em cuidados médicos e
que será usada neste documento implica «cuidar da pessoa no seu todo no contexto dos
seus valores, crenças familiares, sistema de família e situação cultural e sócio-ecológica na
comunidade alargada e levar em conta toda uma série de tratamentos baseados na demonstração dos seus benefícios e custos » (3). O holismo, como afirma Pietroni, implica uma «propensão para usar um vasto leque de intervenções... o destaque dado a uma relação mais
participativa entre médico e paciente; e a consciência do impacto da "saúde" do clínico
sobre o paciente» (4). Como a abordagem holística é muito centrada no indivíduo, os mesmos tratamentos ou intervenções propostos ao paciente terão diferentes significados conforme as pessoas. Este foco no indivíduo torna a abordagem holística muito próxima da
medicina familiar. Implica uma base de medicina biológica que define a natureza holística
dos órgãos; de um ponto de vista médico comporta uma abordagem sistémica; como disciplina centrada na pessoa confere o papel central à pessoa no seu todo (1). A visão holística reconhece as explicações científicas objectivas da fisiologia, mas também admite que
as pessoas têm experiências interiores que são subjectivas, místicas e (para alguns) religiosas e que podem afectar a sua saúde e as suas crenças sobre a saúde (5).
O reconhecimento de que toda a doença tem componentes mentais e físicos e que há uma
relação dinâmica entre componentes de sistemas (teoria geral dos sistemas) levou ao
desenvolvimento do modelo biopsicossocial da medicina moderna (6). A posição do modelo biopsicossocial foi enunciada com grande clareza por George L. Engel (7, 8) que defendeu que, para que a psiquiatria conceba explicações plenamente científicas e inclusivas da
doença mental, há que superar as explicações bio-reducionistas e adoptar outras que se
pautem pelos princípios da teoria geral dos sistemas desenvolvida por Ludwig von
Bertalanffy e Paul Weiss. Proclamou-se o modelo biopsicossocial como uma mudança de
paradigma porque parece dissolver a dualidade mente-corpo (9). Compreender a afecção
36
(não a doença) como processo, com igual importância conferida às determinantes biológicas, psicológicas e sociais na patogénese, diagnóstico e terapêutica, constitui a abordagem
holística, com a consequente adopção de medidas práticas.
O uso do modelo biopsicossocial como base para a cura e para os cuidados de saúde implica aceitar que muitos factores influenciam a nossa compreensão do que é ser humano. Os
médicos de família aceitam que há influências de uma grande diversidade de factores. No
entanto, há sempre um limite à extensão da influência que uma pessoa pode exercer num
ambiente terapêutico. Entre esses factores podemos citar:
- a disposição natural, que inclui elementos como género, constituição genética e tipologia;
- ambiente micro-social, como a família, e ambiente macro-social, como a comunidade
local e a comunidade alargada, com todos os seus elementos culturais e sócio-ecológicos;
- as crenças sobre saúde e as experiências da vida que fazem de uma pessoa a entidade
que é;
- os recursos de conservação da saúde da pessoa, tais como a compreensão dos acontecimentos, a aceitação do significado, a autonomia que conduzem à convicção de que a
vida pode ser vivida;
- experiências pessoais, como doenças passadas, contactos médicos e sociais.
À medida que a lista de factores aumenta, é também importante salientar que são cruciais
uma consciência e entendimento básicos das próprias limitações do médico. Tendo em
conta a autonomia fundamental do paciente, são limitadas as oportunidades de o médico
de família intervir ocasionalmente e um tanto «tangencialmente» com um conhecimento interessado mas muito escasso da história, sentimentos e prioridades da pessoa. Por outro
lado, a integração dos factores influentes é crucial e constitui o valor acrescentado.
Referimo-nos à abordagem sistémica, em que o todo é mais que a soma das partes.
Objectivo 6.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de usar
um modelo biopsicossocial levando em conta as dimensões culturais e existenciais.
Para tal precisa de:
6.1.1 - conhecer o conceito holístico e as suas implicações nos cuidados ao paciente;
6.1.2 - capacidade de compreender o paciente como um todo biopsicossocial;
6.1.3 - aptidão para transformar a compreensão holística em medidas práticas;
6.1.4 - conhecer os antecedentes culturais e existenciais do paciente relevantes para
os cuidados de saúde;
6.1.5 - tolerância e compreensão das experiências, crenças, valores e aspirações do
paciente que possam afectar a prestação dos cuidados de saúde.
São vários os métodos que podem ser usados no ensino e aprendizagem da abordagem
holística, a começar pelas considerações e discussões teóricas em torno da ideia holística
e dos diferentes níveis de holismo. A clarificação do modelo biopsicossocial baseada na leitura, aulas e seminários deve estar na base do uso destes métodos. Para se poder tratar
uma vasta série de campos integradamente, o ensino e aprendizagem posteriores devem
basear-se em grande medida em estudo de casos, narrativas, histórias de pacientes e no
contexto global que pode ser ensinado e aprendido no cenário do consultório.
37
Abordagem
Holística:
objectivos
Consequências
para os métodos
pedagógicos
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Entre os métodos específicos para o conseguir contam-se:
- estudo de casos, descrição e apresentação de casos isolados;
- entrevistas videogravadas, vídeo-análise de encontros clínicos, pacientes simulados;
- discussão em grupo, discussão de um para um;
- visitas ao terreno, observação no consultório, supervisão no consultório do orientador;
- trabalho com as artes, a literatura e o cinema (11-12).
Abordagem
Holística:
Consequências
para a avaliação
No centro da avaliação das competências deste capítulo está a apresentação de casos, a
observação directa de consultas, a análise de videogravações e classificação através da
avaliação contínua pelo orientador, observação em unidades de saúde com prática de ensino/aprendizagem e avaliação interpares. As questões conceptuais podem ser avaliadas por
simulação de casos num exame oral ou escrito. Relatórios escritos, trabalhos sobre temas
e aspectos específicos podem também considerar-se muito úteis para avaliar a capacidade
do aluno de levar em conta os vários factores e os integrar no processo de cuidados.
Objectivos
Conhecer o conceito
holístico e as suas
implicações nos cuidados
aos pacientes
Métodos de aprendizagem
Meios de avaliação
Leitura
Discussão em pequenos grupos
Observação
Palestra
Discussão de um para um
Demonstrar capacidade
para entender
o Paciente como um todo
biopsicossocial
Estudo de caso
Entrevistas videogravadas
Discussão em pequenos grupos
Seminário
Análise de videogravações
Avaliação contínua pelo
Orientador
Avaliação por pares
Demonstrar aptidões para
transformar compreensão
holística em medidas
práticas
Doentes simulados
Papel-modelo
Ensino Baseado em Problemas
Supervisão na prática
Reflexão
Observação da consulta
Avaliação contínua pelo
Orientador
Casos simulados
Conhecer os fundamentos
culturais e existenciais do
Paciente relevantes para os
cuidados de saúde
Leitura
Narrativa
Visita de campo
Exame oral
Relatório escrito
Ensaio
Apresentação de casos
Tolerar e compreender
as diversas experiências,
crenças, valores e expectativas dos pacientes que
possam afectar a oferta
de cuidados de saúde
Desempenho de papéis
ou doentes simulados
Estudo de casos
Reflexão
Visita de campo
Análise de histórias de pacientes
Resultados da aprendizagem
O formando deverá mostrar:
- conhecimento do conceito holístico e suas implicações na prestação de cuidados ao
paciente;
- capacidade para compreender o paciente como um todo biopsicossocial;
- aptidões para transformar a compreensão holística em medidas práticas;
- conhecimento dos antecedentes culturais e existenciais do paciente relevantes para
os cuidados de saúde;
- tolerância para com as experiências dos pacientes, as suas crenças, valores e aspirações que possam afectar a prestação de cuidados de saúde.
Consequências para
o contexto e
enquadramento
temporal
O Ensino Médico Básico deve incluir conhecimentos científicos básicos e as aptidões básicas para uma completa abordagem biopsicossocial e não apenas biomédica. A abordagem
analítica dos problemas deve equilibrar-se e completar-se com a abordagem sistémica
como contribuição para a resolução de problemas. Os formandos devem dispor de ocasiões
para entrar em contacto com a abordagem ao paciente em que a integração holística constitui o modelo de base para o diagnóstico, tratamento e atendimento.
Na apresentação de casos, aulas, fora de discussão e reflexão sobre o atendimento individual no âmbito da Formação Especializada, há que salientar a dimensão biopsicossocial,
integrar o melhor possível os aspectos culturais e existenciais. Especial destaque será dado
à necessidade de prosseguir a reflexão permanente nesta área. Se necessário, fornecer-se-á informação específica sobre as diferenças culturais e étnicas nas atitudes relativas à
saúde e à doença.
TEM
Exame oral
Relatório escrito
Ensaio
Observação da consulta
Apresentação de casos
Avaliação contínua pelo
Orientador
Observação da consulta
No Desenvolvimento Profissional Contínuo, é importante não perder de vista este ponto de
vista e garantir que este aspecto da prática médica é mantido e reforçado mediante a discussão de casos, a orientação e informação de retorno.
38
39
Quadro resumo
- educação
em abordagem
holística
Bibliografia
1. Kolcaba, R., «The primary holisms in
nursing», Journal of advanced nursing,
1997, 25: 290 -296.
2. Patterson, E., «The philosophy and
physics of holistic health care: spiritual
healing as a workable interpretation»
Journal of Advanced nursing, 1998,
27(2): 287-293.
3. Kemper, K. J., «Holistic pediatrics,
Good Medicine», Paediatrics, 2000.
Par:t 3 of 3,Vol 105, issue 1.
4. Pietroni, P., «Holistic medicine: new
lessons to be learned», The Practitioner,
1987, 231 (1437):1386-1390.
5. Edlin, G., & Golanty, E., Health & well ness: A Holistic Approach, 4ª ed., Jones
&Boston, 1992.
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Sompson, S., «Medically unexplained
symptoms: the biopsychosocial model
found wanting», Journal of the Royal
Society of Medicine, 2004, 97: 219-222.
7. Engel, G. L., «The need for a new
medicalmodel: a challenge for biomedicine», Science, 1977, 196 (4286),
pp.129-36
8. Engel, G. L., «The clinical application
of the biopsychosocia[ model», Am. J.
Psychiatry, 1980, 137 (5): 535-44
9. McWhinney, I. R., «Beyond diagnosis:
an approach to an integration of behavioral science and clinical medicine» N.
Engl. J. Med., 1972; 287:384-387.
10. Wharton, M., «Clinical training in the
community - a holistic approach»,
BMJ, 1995, 310 (6976): 407.
11. Frich, J. C., Fugelli, P., «Medicine and
the arts in the undergraduate medical
curriculum at the University of Oslo
Faculty of Medicine», Oslo, Noruega,
Acad. Med., 2003 Out., 78(10):1036-8.
12. Smith, B. H., «Literature in our medical schools» Br. J. Gen. Pract., 1998,
Jun., 48(431):1337-40.
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4:42 PM
Responsável pelo capítulo:
Jan Heyrman (Bélgica)
Colaborações de Justin Allen
(Reino Unido), Francesco
Carelli (Itália), Monica Lindh
(Suécia), Samira Herenda
(Bósnia-Herzegovina),
Bernhard Rindlisbacher
(Suíça), Smiljka Radic
(Sérvia-Montenegro),
Jaroslava Lankova
(República Checa)
Page 40
Capítulo 7.
Factores essenciais de aplicação
Ao aplicar as competências ao ensino, aprendizagem e prática da medicina geral e familiar
é necessário considerar outros três aspectos de fundo essenciais: o contextual, de atitude
e científico. Têm a ver com características dos médicos e determinam a sua capacidade para
aplicar as competências nucleares na vida real e no ambiente do trabalho. Em medicina
geral e familiar terão ainda maior impacto por causa da relação entre o médico de família e
as pessoas com quem trabalha, mas dizem respeito a todos os médicos e não especificamente aos especialistas de medicina geral e familiar.
1. Aspectos contextuais
Compreensão do contexto dos próprios médicos e do ambiente em que trabalham,
incluindo condições de trabalho, comunidade, cultura e enquadramentos financeiro e
regulador.
2. Aspectos da atitude
Assente nas capacidades profissionais, valores e ética do médico.
3. Aspectos científicos
Adopção de uma abordagem da prática crítica e baseada na investigação e mantê-la
mediante a aprendizagem contínua e a melhoria da qualidade.
Introdução
Neste capítulo, a ênfase é colocada nos aspectos essenciais de aplicação que influenciam
todas as aptidões, as atitudes e a aquisição de conhecimentos no ensino da medicina geral
e familiar. Estes aspectos não são ensinados nem aprendidos como competências à parte,
antes condicionando e formatando todos os elementos de competência.
A capacidade de um médico aplicar as competências nucleares na vida real e no cenário do
trabalho está relacionada com três factores essenciais: aspectos contextuais do local de trabalho, aspectos da atitude do médico e aspectos científicos, que incluem a formação médica e a experiência clínica do médico.
O contexto dos próprios médicos e o ambiente em que trabalham têm influência sobre o que
se pode fazer e o que deveria ser feito. Entre os aspectos contextuais estão as condições
de trabalho em si mesmas, o trabalho em equipa com colegas e as redes com as disciplinas afins. Entre os factores que influenciam o contexto profissional contam-se também as
normas profissionais, os incentivos e metas do exercício, as políticas governamentais, os
quadros financeiro e regulamentar, as limitações/recursos financeiros, etc. Além disso, as
normas culturais, as aspirações sociais e os factores sócio-económicos moldam o contexto (1). Esta realidade está sempre presente e interfere com a prática quotidiana.
Os valores, atitudes e sentimentos dos médicos são determinantes da maneira de praticar
medicina (2), especialmente na medicina geral e familiar e nos cuidados clínicos centrados
no paciente, em que o médico se envolve como pessoa numa relação diádica com o paciente e não apenas como médico assistente. O ensino deve permitir compreender e aprender
a usar as atitudes, forças e fraquezas, valores e crenças pessoais numa relação de parceria
com cada paciente. Isto implica uma abordagem reflexiva e o desenvolvimento de intros-
40
pecção e de consciência do próprio. Alimentar ilusões e esforçar-se até à exaustão só servem para dificultar o funcionamento do especialista de medicina geral e familiar, sendo
situações a prevenir (3). Pelo contrário, desenvolver a consciência de si e ser realista quanto às suas próprias capacidades (forças e fraquezas) e prioridades são atitudes que ajudam.
Sendo embora uma disciplina voltada para a pessoa e para a família e que dá importância
a aspectos subjectivos da medicina, a medicina geral e familiar deve basear-se tanto quanto possível nos dados científicos relevantes para e da medicina geral e familiar. A experiência baseada na prática, que é muito importante nesta disciplina, deve sempre que possível
apoiar-se e conferir-se por informação sólida baseada na evidência, publicada e coligida nas
bases de dados da literatura médica. Combinar e equilibrar as abordagens baseada na
experiência e baseada na informação para o desenvolvimento de linhas de orientação resulta na abordagem cientificamente fundamentada que complementa o apoio da comunidade
científica. A formação deve fornecer a competência para procurar, seleccionar, compreender
e interpretar criticamente a investigação científica. Usar o mais possível a evidência existente, analisar criticamente a experiência e pôr em prática linhas de orientação baseadas na literatura de referência devem tornar-se as atitudes científicas a manter durante toda a carreira
profissional. Conhecer e utilizar os conhecimentos da aprendizagem ao longo da vida e da
melhoria de qualidade deve ser considerado uma competência essencial.
Factor 1. Aspectos Contextuais
Objectivo 7.1: No final do programa de formação o formando estará em condições de
compreender o contexto dos próprios médicos e o ambiente em que trabalham, incluindo condições de trabalho, comunidade, cultura, estruturas financeira e reguladora
Para tal precisa de:
7.1.1 - compreender o impacto da comunidade local, incluindo factores sócio-económicos, geografia e cultura, sobre o local de trabalho e a prestação de cuidados.
7.1.2 - tomar consciência do impacto da carga laboral total sobre os cuidados prestados aos pacientes e os meios (por exemplo, pessoal, equipamento) disponíveis
para os prestar.
7.1.3 - compreender as estruturas financeiras e jurídicas em que são prestados os cuidados de saúde ao nível do consultório.
7.1.4 - compreender o impacto do ambiente pessoal do médico, quer em casa quer no
local de trabalho, sobre os cuidados que presta.
Factor 2 . Aspectos da Atitude
Objectivo 7. 2: No final do programa de formação o formando estará em condições de
lidar com as suas capacidades, valores e ética pessoais
Para tal precisa de:
7.2.1 - estar consciente das suas capacidades e valores pessoais, identificando os
aspectos éticos da prática clínica (prevenção/diagnóstico/terapia/factores que
influenciam o estilo de vida);
7.2.2 - tomar consciência de si: compreender que as atitudes e sentimentos de cada
um são importantes para o modo como exerce;
7.2.3 - justificar e clarificar a ética pessoal;
7.2.4 - estar consciente da mútua interacção entre trabalho e vida privada e procurar
um bom equilíbrio entre ambas.
41
Objectivos do
ensino - factores
adicionais
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Factor 3. Aspectos Científicos
Objectivo 7. 3: No final do programa de formação o formando estará em condições de
adoptar uma abordagem da sua prática que seja crítica e baseada na investigação, e de
mantê-la com recurso à formação contínua e à melhoria da qualidade
Para tal precisa de:
7.3.1 - familiarizar-se com os princípios gerais, métodos, conceitos da investigação
científica e com o essencial da estatística (incidência, prevalência, valores
preditivos, etc.);
7.3.2 - ter pleno conhecimento das bases científicas da patologia, sintomas e diagnóstico, terapêutica e prognóstico, epidemiologia, teoria da decisão, teorias
da formação de hipóteses e da resolução de problemas, cuidados de saúde
preventivos;
7.3.3 - ser capaz de encontrar, ler e avaliar criticamente literatura médica;
- Desenvolver e manter formação contínua e melhoria da qualidade.
Consequências
para a aprendizagem, ensino
e avaliação
Num curriculum construtivista, com uma exposição suficiente do formando a um ambiente
de ensino rico, muitos destes factores adicionais serão ensinados implicitamente: reportar-se ao exercício real, usar atitudes pessoais e combinar a autoridade baseada no exercício
com a evidência científica, tudo isso acontece - deve acontecer - implicitamente. Há uma
necessidade de aprendizagem tácita, por oposição a aprendizagem “propositiva”, a aprendizagem por livros e documentos escritos. O caso real “não vem nos livros”. Segundo DA
Schön (2), “saber-em-acção” é “saber mais do que sabemos dizer”. A melhor maneira de
aprender a lidar com a situação típica na prática não é - como no sistema tradicional - adquirir uma porção de conhecimentos teóricos ou “propositivos” primeiro e depois aplicar esses
conhecimentos aos “baixios pantanosos dos intrincados e confusos problemas do consultório”. A melhor maneira de nos prepararmos para isso é a prática, com a ajuda dos colegas
mais velhos.
Isto pode ser descrito como aprendizado, um modelo que tem as suas raízes no desenvolvimento de aptidões artesanais noutros campos. Antigamente, o aprendiz estava ligado ao
mestre e desempenhava tarefas servis e banais em troca da oportunidade de ver o mestre
trabalhar e desempenhar as tarefas próprias do ofício, com complexidade crescente à medida que o tempo passava e ia adquirindo aptidões; e esse aprendizado incluía formação tanto
moral como técnica e uma introdução à ética do ofício. As aptidões iam-se desenvolvendo
lentamente até se chegar à mestria. Para ser efectivo, o ensino baseado no aprendizado
deve incluir a referência às suas dimensões culturais e à socialização na profissão (3), como
funciona e qual o lugar do profissional na sociedade. Portanto, o modelo deve ser considerado no seu sentido mais lato e abarcar tanto a cultura e a ética da profissão como as atitudes e comportamentos do mestre. Dá-se assim ao aluno a oportunidade não só de adquirir
aptidões como de praticar a sua aplicação no cenário profissional.
Não se pode ensinar ao formando o que ele precisa de saber, mas pode-se treinar o aluno.
Este conhecimento tácito está implícito nos modelos espontâneos de acção demonstrados
na vida quotidiana por profissionais habilitados. Compreende agir, reconhecer e fazer juízos
espontaneamente (5). Este “saber-na-prática” tende a tornar-se cada vez mais tácito,
espontâneo e automático. Quando um profissional apreende o sentido de uma situação que
entende como única, vê nela algo que estava já presente no seu repertório e que é simultaneamente semelhante e diferente do que já conhece sem que, a princípio, seja capaz de
dizer em quê.
42
O desempenho profissional precisa não só de fazer bem como de saber porque está bem
feito e de ter um conceito profissional que enquadre o fazer bem. É aí que entram a teoria,
os modelos e os conceitos. A dada altura têm que ser introduzidos para enquadrar a experiência e orientar a prática.
A Medicina Baseada na Evidência deve estar na base de uma prática baseada na evidência
dentro de um sistema de saúde baseado na evidência. Os estudantes devem aprender princípios da tradução dos problemas clínicos em perguntas investigáveis e ter uma estratégia
de busca exequível, com recurso a processos como o sistema PICO (Problema, Paciente,
População / Intervenção / Comparação / Resultado)(5) e a estratégia da queda de água (primeiro as linhas de orientação, depois as bases de dados terciárias com crítica sistemática e
meta-análise, depois, se necessário, processos secundários de pesquisa como a Pubmed e
a Embase, e só no fim, se as respostas ainda não tiverem sido encontradas, as publicações
primárias) (6).
Aprender o contexto do trabalho no exercício real requer uma rede de práticas de ensino
associadas representativas das várias condições de trabalho, equipas ligadas às situações
no terreno e redes de prestação de cuidados. A qualidade do ensino depende muito da rede
pedagógica.
O trabalho em Medicina Geral e Familiar é complexo e requer um elevado nível de envolvimento pessoal. Os jovens hesitam por vezes em se envolver numa profissão com um nível
elevado de definição das tarefas. Aprender a equilibrar a vida profissional com outros objectivos - pessoais, familiares e sociais - é um tópico crucial no ensino e aprendizagem.
Aprender a gerir o distanciamento e o envolvimento ajuda a sobreviver. A prevenção da
exaustão começa pela definição de uma tarefa profissional realizável e uma plétora de oportunidades de aprendizagem ao longo da vida que sejam gratificantes.
No Ensino Médico Básico, a prática médica deve relacionar-se com o contexto em que se
trabalha, com a comunidade e com os regulamentos do sistema de saúde. A custo-eficiência deve ser ensinada como constituindo uma preocupação básica. Construir a personalidade do formando, pô-lo em contacto com os valores e a ética pessoais deve ser um objectivo pedagógico. Os elementos básicos de uma disciplina científica em constante evolução,
criticamente e com tenacidade, com relatividade e variabilidade de conceitos, devem constituir um importante pano de fundo de todo o processo pedagógico.
Na Formação Especializada estes aspectos essenciais de aplicação devem centrar-se no
seu impacto sobre o mundo real do trabalho com pacientes como médico de família. É
importante que a formação a este nível decorra num cenário de cuidados primários. O
desenvolvimento da excelência técnica na consulta requer tempo para que seja possível
compreender plenamente as atitudes próprias de cada um e o seu impacto sobre os cuidados que cada um for capaz de prestar.
Na Educação Médica Contínua há que dar relevo suficiente a estes aspectos essenciais de
aplicação. Em especial, a necessidade de o clínico se manter actualizado e de compreender
os progressos científicos nos cuidados primários e na sua prestação.
(5) PICO: Mnemónica criada a partir de Problem, Patient Population/Intervention/comparison/outcome.Só parcialmente reproduzível na tradução portuguesa (N. do R.)
43
Consequências
para o contexto e
enquadramento
tempora
Bibliografia
1. Mead, N., Bower, P., «Pacient-centredness: a conceptual framework and review
of the empirical literarature», Social
Science & Medicine, 2000, 51:1087-1110
2. McWhinney, I. R, A Textbook of Family
Medicine. Oxford University Press; 2ª
edição, 1997
3. Smith, R, editor, «Why are doctors so
unhappy?» BMJ, 2001, 322:1073-4
4. Bleakley, A., «Pre-registration house officers and ward-based learning: a "new
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Education, 2002, 36: 9-15
5. Schön, DA. Educating the Reflective
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6. Degryse, J., «Over evidence based medicine of een op ondersteunende gegevens
gebaseerde geneeskunde» In Buntinx, F.,
Boffin, N., Degryse, J., Vanderstichele, R.,
&Van Royen, P. (eds.), Omgaan met
medische documentatie en informatie,
Lovaina, Acco, 1998
7743.Medicina Geral portugues
11/7/06
4:42 PM
Responsável pelo capítulo:
Jan Heyrman
Colaborações de Monica
Lindh (Suécia), Samira
Herenda (BósniaHerzegovina), Bernhard
Rindlisbacher (Suíça),
Smiljka Radic (SérviaMontenegro), Jaroslava
Lankova (República Checa),
Francesco Carelli (Itália),
Mario Sammut (Malta)
Introdução
Page 44
Capítulo 8.
Síntese e integração,
uma combinação única
A especialidade de Medicina Geral e Familiar
Os médicos de família são médicos especialistas formados nos princípios desta disciplina. São médicos pessoais, primariamente responsáveis pela prestação de cuidados
globais e continuados a todos os indivíduos que procurem assistência médica, independentemente da sua idade, sexo e doença. Tratam indivíduos no contexto da sua
família, da sua comunidade e da sua cultura, respeitando sempre a autonomia dos
seus pacientes. Reconhecem ter também uma responsabilidade para com a comunidade em que se inserem. Quando negoceiam os planos de acção com os seus pacientes integram factores físicos, psicológicos, sociais, culturais e existenciais, utilizando
os conhecimentos e a confiança criados em repetidos contactos. Os médicos de família exercem o seu papel profissional promovendo a saúde, prevenindo a doença e providenciando cura, tratamento ou paliação. Fazem-no directamente ou através dos serviços de terceiros, conforme as necessidades de saúde e os recursos disponíveis no
seio da comunidade que servem, assistindo os pacientes sempre que se torne necessário aceder a esses serviços. Devem assumir a responsabilidade de desenvolver e
conservar as suas aptidões, equilíbrio pessoal e valores como base de um exercício
eficaz e seguro dos cuidados aos pacientes.
A primeira definição europeia da profissão (definição de Leeuwenhorst) (1) referia já que “é
a síntese ... que é única”. Vale a pena sublinhar também neste documento, em que as competências são agrupadas e tratadas em diferentes capítulos, que a síntese e integração de
todas as competências é proposta como objectivo pedagógico em si mesma. As competências enunciadas nos capítulos 1 a 7 são aspectos específicos de uma realidade efectivamente complexa e os diferentes aspectos são destacados sobretudo por motivos didácticos. O
valor acrescentado está na síntese. O todo é mais que as partes. A Medicina Geral e Familiar
é mais que a soma de todas as subespecialidades.
A Medicina Geral e Familiar, enquanto disciplina centrada no paciente, é uma “disciplina de
elevado contexto” (2) que usa na sua definição dos problemas, a recolha da história, o diagnóstico, bem como diferentes aspectos da intervenção, todos os elementos subjectivos do
paciente, a sua história individual, a sua experiência anterior, as suas ideias sobre saúde,
aspirações e objectivos na vida, incluindo tanto as influências familiares e culturais como as
sócio-económicas. A maior parte das restantes especialidades da medicina evoluem como
“disciplinas de baixo contexto” e limitam, se possível, a tomada de decisões aos factos
objectivos, informação quantitativa mensurável e técnicas visuais de diagnóstico. As
variações individuais são apenas “desvios da média”.
Neste contexto, a Medicina Geral e Familiar aproxima-se mais da teoria da complexidade do
que dos processos dos sistemas lineares. Os sistemas adaptativos complexos, como são
os pacientes, podem definir-se por uma organização interna complexa, acções baseadas em
regras internas que são não-lineares e imprevisíveis, mas que têm um padrão intrínseco e
uma organização própria intrínseca assentes em regras simples aplicadas localmente. A
desvantagem é que esta situação impõe à MGF um “paradoxo insolúvel entre a necessidade de padrões de atendimento coerentes e baseados na evidência e problema único do
44
paciente e do seu contexto, prioridades e escolhas. O trabalho clínico em MGF decorre
sobretudo em situações complexas em que há muita ambiguidade e incerteza e pouca certeza e concordância. A vantagem é que o resultado observável das intervenções neste
campo é superior à soma das partes (3).
A integração é um processo que leva tempo. É costume dizer-se que se demora pelo menos
cinco anos de prática num cenário de Medicina Geral e Familiar até se conseguir uma capacidade profissional satisfatória. A integração pega em diferentes partes que podem ser ensinadas separadamente mas prioriza-as, simplifica o seu uso e transporta os seus elementos
até um nível mais genérico e abstracto. A integração permite ver as regras básicas, os
padrões fundamentais da doença, bem como da prestação de cuidados e dos diferentes tratamentos. É necessária para não se passar por cima da quantidade esmagadora de factos
e números sempre a mudar ao longo do tempo. É crucial para que a disciplina consiga dominar todo o campo dos problemas médicos humanos.
A integração está relacionada com o nível meta-cognitivo. A meta-cognição pode ser descrita como o saber sobre o saber, pensar sobre o pensamento, conhecimento sobre os processos cognitivos ou saber e conhecimento sobre os fenómenos cognitivos (4,5).
A integração estabelece limites à capacidade humana. Como um médico de família trabalha dentro dos limites da capacidade de integração do ser humano, a diversidade de conceitos, modelos, conteúdos, atitudes e técnicas deve ser limitada. O conteúdo nuclear da abordagem profissional, em particular, deve ser cuidadosamente seleccionado dentro de um
nível atingível.
A finalidade última da integração é um profissional que combina, usa e aplica os diferentes
elementos das aptidões profissionais de um modo fluido, normal e interiorizado, sabendo a
cada momento que existem opções de fundo e conhecendo os factores chave que lhes
estão ligados. Um comportamento profissional não é simplesmente fazer bem as coisas,
mas saber quando e porque é correcto o comportamento apresentado.
Síntese e integração, em conjunto com a continuidade pessoal, constitui o fulcro e o valor
acrescentado da Medicina Geral e Familiar dentro do sistema de saúde. Síntese e integração
não são factores adicionais quando todos os outros subelementos e funções estão cobertos. São uma maneira de tratar toda uma série de subelementos de modo a preservar o valor
acrescentado do todo.
O ensino e aprendizagem de factores exclusivos, como a síntese e a integração, tem que se
basear na prática. O processo de aprendizagem assemelha-se à aprendizagem das artes:
liberdade de aprender fazendo, num cenário de risco relativamente baixo, com acesso a formadores que iniciam os alunos nas “tradições da vocação” e os ajudam, “dizendo-lhes o
que é preciso”, a descobrir por si mesmos e à sua maneira o que mais precisam de ver.
Devemos portanto estudar a experiência do aprender fazendo e a arte do bom formador (6).
Esta é a abordagem construtivista (7).
«O objectivo da prática é o saber em acção. O saber pode implicar o uso de conhecimento
especializado, mas o fundamental é formular juízos sobre situações específicas com valores
em conflito, em que há problemas a resolver, e saber resolvê-los» (6). Implica usar protótipos memorizados de situações que surgem com frequência para construir interpretações de
situações semelhantes (8). Precisa da realidade quotidiana do consultório e da reflexão
sobre a prática em que o conhecimento adquirido em acção é delineado, criticado, reestruturado e incorporado na acção futura.
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Consequências
para a aprendizagem, ensino
e avaliação
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Consequências
para o contexto e
enquadramento
temporal
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A Ensino Médico Básico consiste sobretudo em tratar das “diferentes partes e elementos da
medicina”. Há que incluir oportunidades de compreender e aprender o valor acrescentado
do “todo”, a integração de todos os aspectos que rodeiam cada paciente. O contacto com
a prestação de cuidados de saúde reais e com pacientes vistos como os principais interessados no sistema de saúde deve fazer parte do curriculum desde o princípio.
A Formação Especializada deve usar como ferramentas principais a modelação e o treino
do crescimento pessoal enquanto pessoa, profissional e cientista. O objectivo final deve ser
criar um médico de família capaz de combinar e usar os diferentes elementos da competência profissional de um modo fluido, interiorizado e genérico.
Bibliografia
1. The General Practitioner In Europe:
A statement by the working party appoin ted by the European Conference on the
Teaching of General Practice.
Leeuwenhorst, Holanda,
1974 (revisto em 1981)
2. Helman, C. G., «The role of context in
primary care», J. Royal Coll. Gen.
Pract. 1984,
34; 547-50
3. Plsek, P., Greenhalgh, T., «The challenge of complexity in healthcare», BMJ,
2003, 323: 625-8
4. Flavell, J. H., «Metacognition and cognitive monitoring: a new area of cognitive-developmental inquiry», American
Psychologist 1979, 34: 906-911
5. Fraser, S. W., Greenhalgh, T., «Coping
with complexity: education for capability», BMJ, 2001, 323: 799-803
6. Harris, I. B., «New Expectations for
Professional Competence», in Curry, L.,
Wergin, J. F., e ass., Educating
Professionals, Responding to New
Expectations for Competence
and Accountability, Jossey-Bass, 1993
7. Grabinger, S., «Rich environments for
active learning» in D. Jonassen (ed),
Handbook of research for educational com munications and technology, Londres,
Prentice Hall 1996, p
665-693.
8. Bordage, G., Zacks, R., «The structure
of. medical knowledge in the memories
of medical students and general practitioners: categories and prototypes»,
Med. Educ. 1984, 18: 406-416
A Educação Médica Contínua deve prosseguir o processo de reflexão metacognitiva, mantendo a “árvore da sabedoria” a crescer ao longo de toda uma carreira de Medicina Geral e
Familiar.
Adenda:
Glossário de alguns termos
pedagógicos
Na presente Agenda Educativa EURACT são usados muitos termos pedagógicos. Em apêndice, reunimos um breve glossário com alguns destes termos. Certas definições são adaptadas do projecto TUNING (SINTONIA), «sintonia das estruturas do ensino na Europa», um
projecto europeu Sócrates que decorreu em 100 universidades sob a direcção de Julia
Gonzales, Duesto Spain e Robert Wagenaar, Groningen, Holanda, 2003.
A descrição dos tipos de avaliação baseia-se em A Handbook for Medical Teachers, de
David Newble e Robert Cannon, Kluwer Academic Publishers, 3ª edição, 1996.
Terminologia geral
46
Segundo a Declaração de Bolonha de 1999 para que em 2010 esteja criada uma «Área
Europeia de Estudos Superiores», a primeira parte básica de cada currículo deve ter, de preferência, três anos e 180 pontos de estudo.
Bacharelato
Adopção voluntária de medidas adequadas para alcançar um objectivo comum.
Convergência
A «moeda» usada para medir o volume de trabalho dos estudantes de modo a que se tenha
uma ideia do tempo de aprendizagem necessário para alcançar determinados resultados
pedagógicos.
Crédito
Processo de aprendizagem planeado e talhado individualmente na prática quotidiana, com
destaque para a qualidade dos cuidados prestados. O DPC inclui identificação das necessidades de aprendizagem, elaboração de uma agenda pedagógica, traçado de um plano de
aprendizagem concreto e controlo segundo um formato pedagógico de portfólio.Como está
ligado à aprendizagem ao longo da vida, pode tornar-se um Plano de Desenvolvimento
Pessoal para a vida inteira.
Desenvolvimento Profissional
Contínuo
Qualificação de alto nível internacionalmente reconhecida como qualificação para a investigação ou o trabalho académico. Há-de incluir uma parte substancial de trabalho de pesquisa original a ser apresentado como tese. É geralmente designado como grau conferido
depois de completado o terceiro ciclo de estudos.
Doutoramento
Sistema destinado a aumentar a transparência dos sistemas educativos e a facilitar a mobilidade dos estudantes de toda a Europa mediante a transferência de créditos. Baseia-se no
pressuposto geral de que o volume de trabalho global de um ano académico é igual a 60 créditos. Os 60 créditos são depois atribuídos às unidades do curso para designar a proporção
do volume de trabalho dos alunos exigida para os respectivos resultados pedagógicos. A
transferência de créditos é garantida por acordos explícitos entre a instituição de origem, a
instituição de acolhimento e o aluno em trânsito.
ECTS (European Credit Transfer
System)
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Ensino Médico Básico
Parte do currículo médico relativa a todos os estudantes de medicina para lhes dar uma
base sólida para futura formação profissional ou especializada. A União Europeia exige um
mínimo de seis anos de EMB.
Educação Médica Contínua
Todo e qualquer meio que permita a um médico formado continuar a aprender e a evoluir na
prática ao longo da vida.
Formação Especializada
Parte do currículo médico que chega a seguir ao programa de ensino médico básico para
todos os alunos de medicina, centrado na aquisição de competências exigíveis para a disciplina de especialidade e tarefas relacionadas nos cuidados de saúde.
Mestrado (Inicial)
Segundo a Declaração de Bolonha de 1999 para que em 2010 esteja criada uma «Área
Europeia de Estudos Superiores», após a obtenção de um primeiro grau de bacharel, a
segunda parte do currículo leva a um grau de mestre. Deve ter um mínimo de dois anos e
120 ECTS - pontos de estudo. Para os estudos de mestrado em medicina, a maior parte dos
países europeus aceita um período clínico de três a quatro anos. A obtenção do grau de
mestre obedece normalmente a uma qualquer forma de tese de mestrado.
Mestrado pós-mestrado ou grau
de Mestrado pós-inicial
Nível dos créditos
Segundo a Declaração de Bolonha de 1999 para que em 2010 esteja criada uma «Área
Europeia de Estudos Superiores», após a obtenção do mestrado inicial, os programas
podem dar acesso a um programa de mestrado pós-inicial. Dentro desta lógica, a formação
especializada deve considerar-se um programa de mestrado pós-inicial.
Indicador da exigência relativa do ensino e da autonomia do aluno. Pode basear-se no ano
de estudo e/ou no conteúdo do curso (p.ex., Básico, Intermédio, Avançado, Especializado).
Quadro de créditos
Sistema que facilita a medição e comparação dos resultados pedagógicos conseguidos no
contexto de diferentes qualificações, programas de estudo e ambientes de aprendizagem.
Qualificação do primeiro grau
Primeira qualificação do ensino superior obtida pelo aluno. É-lhe concedida após ter completado com sucesso o primeiro ciclo de estudos que, segundo a Declaração de Bolonha,
deve normalmente durar um mínimo de três anos ou 180 créditos ECTS.
Tipo de créditos
Indicador do estatuto das unidades do curso no programa de estudo. Pode classificar-se
como Nuclear (principal unidade do curso), Paralelo (instrumentos/apoios da unidade) e
Menor (unidade de curso opcional).
Sintonia (Tuning)
Evolução para a concordância e harmonia pela combinação do som singular numa «melodia» ou padrão de sons. O termo é usado em «Projecto de sintonia» para se alcançar uma
forma de harmonização encontrando pontos de convergência e entendimento comuns.
Terminologia
do conteúdo
pedagógico
Aprendizagem baseada
em problemas
Modelo pedagógico que toma o problema do paciente e o médico como pontos de partida
do currículo de ensino. É altamente centrado no aluno, optimiza o uso de conhecimentos
pré-existentes e estimula a aprendizagem e as estratégias de pesquisa.
Aprendizagem
construtivista social
Modelo pedagógico que coloca no centro o processo de aprendizagem do estudante.
Aprender é considerado um processo, muito dependente dos conhecimentos anteriores e
do contexto de aprendizagem. Os professores são sobretudo arquitectos de um ambiente
de aprendizagem estimulante. É apoiada a variedade individual nas estratégias de ensino.
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Modelo educativo tradicional baseado na transferência de conhecimentos do professor para
o aluno. É muito centrado no professor, o conteúdo estrutura-se nos manuais, o ensino consiste fundamentalmente em aulas dadas por professores experientes e o comportamento
copiado dos modelos já experimentados.
Aprendizagem objectivista
Conjunto das actividades de aprendizagem que permitem conseguir os resultados pedagógicos (isto é, aulas, trabalhos práticos, recolha de informação, estudo em privado, etc)..
Carga de trabalho
Capacidade de desempenhar tarefas de observação isoladas num ambiente de avaliação
definido, separadamente do trabalho efectivo. Na terminologia de Miller, inclui os níveis do
“saber” (factos básicos), “saber como” (saber aplicar o conhecimento) e “mostrar como”
(saber demonstrar mostrar aptidões), mas exclui o nível “fazer”, a actividade na prática.
Competência
Curso a escolher de uma lista predeterminada.
Curso opcional
Período de permanência mais longa num cenário de prática diária
Estágio
Refere-se tanto a estudantes como a médicos em formação especializada e a todos os que
participam nos programas de formação.
Formandos
Lista de competências que devem estar adquiridas no fim de um período de formação, formatada como uma lista claramente definida, verificável pelo aluno, pelo professor ou por
ambos, que proporciona um panorama constante do que já foi adquirido e do que falta
aprender.
Lista de aferição
Escala numérica ou qualitativa que serve para descrever os resultados da avaliação de uma
unidade ou módulo de curso.
Nota
Nível de prestação real em cuidados clínicos e comunicação com os pacientes na prática
diária. Corresponde ao nível “fazer” da terminologia de Miller. Está altamente dependente
das condições e requisitos, oportunidades financeiras e estruturais, oportunidades de prática e apoios existentes do serviço de saúde.
Desempenho
Designa todos os profissionais envolvidos num momento educativo como especialistas.
Professores
Sinónimo de tutor, mentor, facilitador: profissional envolvido no processo pedagógico como
líder do processo, para orientar e reflectir em benefício dos formandos.
Orientador
Declarações sobre o que o aluno deve saber, compreender e/ou ser capaz de demonstrar
depois de completado o processo de aprendizagem. Distinguem-se os resultados pedagógicos dos objectivos pedagógicos porquanto se relacionam mais com as aquisições do
aluno do que com as intenções gerais do professor. Os resultados pedagógicos devem ser
acompanhados de critérios de avaliação que permitam verificar se foram atingidos os resultados esperados. Os resultados pedagógicos mais os critérios de avaliação definem os
requisitos mínimos para a concessão de créditos, ao passo que as notas se baseiam em
resultados acima ou abaixo dos requisitos mínimos para a obtenção de créditos.
Resultados da aprendizagem
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Terminologia
dos métodos
pedagógicos
Aprendizagem interactiva
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Combinação de pacotes modulares de reflexão, estudo de casos relacionados, reflexão
temática, grupos de discussão, pesquisa bibliográfica e/ou reflexão sobre o processo pedagógico.
Aula
Provisão de conteúdo pedagógico que consiste numa apresentação e explicação (se possível incluindo uma demonstração) por um professor.
Curso
Programa estruturado de conteúdo pedagógico, muitas vezes apresentado em formato oral,
apoiado por material próprio.
Desempenho de papéis
Uso da representação de um papel como paciente, acompanhante, médico, enfermeiro, etc,
para descobrir perspectivas pedagógicas sobre sentimentos, intenções e acções
Discussão
Sessão de debate de um tópico específico ou apresentação de caso que pode ser organizada como sessão a dois com o orientador ou supervisor, sessão de grupos de colegas,
sessão com um pequeno grupo como um grupo de foco ou grupo Balint; também pode ser
uma sessão com um grupo grande/temporário em seminários, aulas ou oficinas.
Treino de aptidões
Aprendizagem de aptidões em cenários específicos adaptados como:
- treinar gestos num laboratório de aptidões
- aprender as técnicas da consulta, por exemplo, desempenhando papéis
- aprender a fazer a pesquisa de bases de dados médicos
- aprender técnicas de liderança através da orientação de reuniões pedagógicas ou temáticas.
Leitura/estudo
Leitura de livros, protocolos, informação da medicina baseada na evidência, romances, narrativas, internet, etc.
Observação
Aprendizagem mediante observação ponderada por um orientador/supervisor em diferentes
cenários pedagógicos: assistência a consultas com pacientes reais ou simulados.
Aprendizagem através de consultas videogravadas de pacientes reais ou simulados (observação pessoal, com orientador/supervisor, colegas, etc.)
Oficina (Workshop)
Sessão supervisionada em que os formandos trabalham em tarefas individuais e recebem
auxílio e orientação sempre que preciso.
Pesquisa bibliográfica
Aprender a realizar uma pesquisa em bases de dados médicos, incluindo a definição de uma
pergunta clínica, a busca de evidência médica, a reflexão crítica sobre a evidência e a passagem à prática.
Redacção de estudos de pacientes, estudos de caso..
Actividade pedagógica, com atribuição da tarefa de redigir um documento de descrição
e/ou reflexão, para receber o comentário de um orientador/supervisor.
Reflexão
Seminário
Pessoal, por exemplo, mediante um diário, vídeos ou num grupo de reflexão participativa.
Período de instrução baseado em contribuições orais ou escritas dos formandos.
Supervisão
A supervisão implica encontros/sessões regulares, estruturados, com o orientador/supervisor e análise e comentário por este nas várias áreas abordadas.
Trabalho clínico/prática clínica
sob supervisão
Ensino no decurso do trabalho no ambiente clínico, no consultório / unidade de saúde / contexto de cuidados primários. Pode ser organizado com ou sem supervisão.
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Redacção de um projecto individual ou integrado num grupo dentro de um formato definido:
- auditoria
- projecto de investigação
- projecto de trabalho de campo.
Trabalho de projecto
Visita pedagógica a um consultório, instalações de uma clínica, instituições de assistência
social, autoridades de saúde, etc.
Visita de estudo
Terminologia
dos instrumentos
e métodos
de avaliação
Conjunto total de testes escritos, orais e práticos, bem como dos projectos e portfólios que
serve para apreciar o progresso do aluno numa unidade de curso ou num módulo. Estas
classificações podem ser usadas pelo formando para avaliar o seu próprio progresso (avaliação formativa) ou pelo professor responsável para verificar se a unidade de curso ou
módulo foi satisfatoriamente completada em função dos resultados pedagógicos da unidade ou módulo (avaliação somativa).
Avaliação
A avaliação é feita pelos colegas e não pelo monitor/supervisor. Há diferentes formatos. Um
deles é o formato de avaliação a 360 graus em que pelo menos 10 colegas, profissionais da
saúde e pessoal auxiliar contribuem para a avaliação.
Avaliação interpares
Descrição do que se espera que o aluno faça, de modo a ser demonstrado que foi conseguido um resultado pedagógico.
Critérios de avaliação
A investigação demonstrou que a aprendizagem em medicina é muito casuística. Dominar
um conjunto limitado de casos e/ou problemas não garante o domínio de outros casos,
áreas e problemas, especialmente num campo vasto como é a MGF. Por isso a avaliação
baseada na abordagem de um ou de uns quantos casos fornece muito pouca informação
sobre a competência de um candidato. A avaliação com 10 pequenas tarefas de cinco minutos escolhidas a partir de uma boa listagem dá normalmente informações mais valiosas do
que um longo caso de 50 minutos.
Especificidade casuística
Refere-se à reprodutibilidade das notas da avaliação: alta fiabilidade indica que, se o teste
for repetido noutra altura, o examinando receberá as mesmas notas que recebeu da primeira vez. Se as notas de avaliação não forem fiáveis e reprodutíveis (como numa experiência)
é quase impossível interpretar o significado dessas notas, pois falta a validade da prova.
Fiabilidade
Esquema representativo da importância relativa das diferentes áreas clínicas que dá cobertura a um processo de avaliação de acordo com uma grande variedade de casos e problemas e sua prevalência na realidade do consultório. No vasto leque de problemas de CG, o
mapeamento é importante por causa do problema da especificidade dos casos
Mapa(6)
Método de avaliação que ajuda o estudante a compreender a sua própria qualificação e
desempenho. Os critérios e padrões definem-se numa série de encontros de pessoal e alunos em pequenos grupos. Os estudantes usam depois os critérios para avaliar o seu próprio
desempenho.
Método de auto-avaliação
(6) Tradução possível de “blueprint”. O termo “Lista” pode ser por vezes, ser mais adequado em
português (N. do R.).
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Método de observação directa
Observação directa do exercício de aptidões técnicas ou interpessoais em cenário real,
simulado ou de exame.
- consulta a dois com pacientes reais ou simulados no consultório.
consulta videogravada com pacientes reais ou simulados no consultório.
Método válido, mas de baixa fiabilidade. Pode tornar-se mais objectivo com recurso a listas
de verificação, formulários de classificação e treino dos examinadores.
Método de observação indirecta
Simula a observação directa.
- usando os registos dos pacientes (auditoria da ficha clínica), certificados médicos, relatórios da evolução.
- usando a discussão de casos de pacientes.
Método oral
Método tradicionalmente mais usado, com elevado valor facial, mas moroso e pouco fiável.
Pode melhorar-se pela estandardização do conteúdo (definição clara, selecção de um conjunto padrão, pacientes-padrão, etc.) ou reduzindo as incoerências dos examinadores (folhas de classificação, desdobramento dos examinadores que atribuem classificações independentes).
Método OSCE
Avaliação Clínica Objectiva Estruturada (ACOE): formato de avaliação objectiva que incide
sobre a aferição das aptidões (complexas) mediante listas de factores desejáveis e indesejáveis em relação a uma dada aptidão
Método de resposta curta
Apreciação mediante perguntas para respostas curtas específicas sobre histórias clínicas: o
que é o diagnóstico, enuncie dois sintomas típicos...
Método de resposta escrita
estruturada
Refere-se aos dados demonstrativos de apoio ou refutação do significado ou da interpretação dos resultados da avaliação. Todas as avaliações requerem documentação avalizadora e quase todos os tópicos da avaliação implicam uma qualquer forma de validação. A validade é a condição sine qua non da avaliação, pois sem documentação da validade, as avaliações na formação médica têm pouco ou nenhum significado intrínseco
Perante uma certa quantidade de dados do paciente o formando tem que seleccionar a resposta correcta numa série de opções. Dois tipos: a gestão de problemas do paciente e o
teste de respostas curtas num campo mais vasto de opções possíveis.
Método de testes objectivos
Inclui uma série de formatos de testes em que a marcação ou a resposta são objectivas.
- perguntas verdadeiro/falso
- perguntas de escolha múltipla
- perguntas dependentes do contexto, que exigem algum grau de análise para encontrar as
respostas
- perguntas para comparações: combinação mais complexa de temas, cenários, vasto leque
de opções possíveis, por vezes em relação com condições específicas
Perguntas de resposta aberta
Reflexão escrita sobre questões específicas do tipo resposta extensa (descreva o que se
deve fazer quando... ) ou concisa (descreva a questão específica correspondente a esta afirmação). O problema é o gasto de tempo e a baixa fiabilidade.
Portfólio, pedagógico ou de
reflexão
Um portfólio é um resumo das principais actividades e realizações docentes em relação com
um Curriculum Vitae, incluindo produtos e publicações. Torna-se portfólio pedagógico ou de
reflexão quando se acrescenta uma parte de reflexão em que o aluno reflecte sobre o seu
processo de aprendizagem pessoal.
Teste de escolha múltipla - Teste
de perguntas curtas
Teste de escolha múltipla: formato de medição objectiva dos conhecimentos do aluno. Mais
tarde adaptado a outros formatos: teste de perguntas curtas, etc. O O teste de perguntas
curtas inclui raciocínio clínico, não apenas teste dos conhecimentos.
(7) ver nota 3
(8) Traduções possíveis de MCQ - Multiple choise Questionnaire e de MEQ - Modified Essay
Questionnaire (N.do R.).
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53
Validade
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índice
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Introdução à Agenda Educativa do EURACT
3
Panorama das Competências Nucleares do Documento de
definição Europeia de MGF, Versão reduzida, EURACT 2005
7
A relação entre a Agenda Educativa EURACT e outros
esquemas de competência usados internacionalmente
10
Comparação entre AE-EURACT e CanMEDS
13
Capítulo 1. Gestão em Cuidados Primários
14
Capítulo 2. Cuidados centrados na pessoa
18
Capítulo 3. Aptidões Específicas para a Resolução de Problemas
24
Capítulo 4. Abordagem Abrangente
29
Capítulo 5. Orientação Comunitária
33
Capítulo 6. Abordagem holística
36
Capítulo 7. Factores essenciais de aplicação
40
Capítulo 8. Síntese e integração, uma combinação única
44
Adenda:
47
Glossário de alguns termos pedagógicos
54
55