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N. 35 • NOV & DEZ 2015
A origem do nome Caleme
O processo de independência do Brasil:
entre rupturas e permanências! Capítulo
II: O papel da Maçonaria no Brasil
“Mais vale morrer com honra
que viver com desonra”
‘‘Segredos, mentiras e
democracia" e "O Legionário"
Detalhe: Dubois, François. ‘‘O Massacre no Dia de São Bartolomeu’’, 1576.
A Revista de História Amnésia é
uma publicação bimenstral. Os
artigos enviados
poderão ser
publicados caso sejam aprovados
pela Revista. As opiniões expressas
nos ar tigos assinados são de
responsabilidade exclusiva de seus
autores.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA
Expediente
LUIZ ALBERTO
FUNDADOR E EDITOR-CHEFE
ARTUR ESTEVES
Editor e revisor
MARCELO CAMPOS
Editor e revisor
RODRIGO MELO
Diagramação
Acesse o nosso blog:
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Errata
Na edição 34 a marcação correta das páginas
é PP. 06 - 11 e não P. 05 - 11.
35
novembro & dezembro / 2015
05 - Editorial
06 - A origem do nome Caleme
Alessandro Lopes Silva.
07 - “Mais vale morrer com honra que viver com desonra”
Paulo Paranhos
09 - O processo de independência do Brasil: entre rupturas e
permanências! Capítulo II: O papel da Maçonaria no Brasil...
Marco Antonio dos Santos de Souza
16 - Um Breve Ensaio sobre a Intolerância Religiosa Através da
História
Artur Esteves
18 - Resenhas: ‘‘Segredos, mentiras e democracia", de Noam
Chomsky, e o filme "O Legionário", de Peter MacDonald.
Artur Esteves
Editorial
O bairro teresopolitano Caleme é abordado por Alessandro Lopes Silva,
que escreve sobre a origem do topônimo, a relação entre urbanização e meio
ambiente e a situação do local após a calamidade de 2011.
A mineira Hipólita Teixeira de Melo é destacada por Paulo Paranhos.
Filha de um rico minerador, casada com um coronel e tendo adotado dois filhos,
exerceu um papel ativo na articulação da Inconfidência Mineira ao enviar e
interceptar correspondências a partir da Fazenda Ponta do Morro, local
estratégico devido à proximidade com a Estrada Real.
No capítulo segundo de seu trabalho, Marco Antônio dos Santos de Souza
aborda o papel da Maçonaria na independência; levanta uma discussão acerca da
natureza e limite do nacionalismo no Brasil; trata do príncipe na colônia e a
inviabilidade de uma suposta união entre Brasil e Portugal; evidencia o “dia do
fico”; discute a ideia da participação popular na independência e também a elite
brasileira no poder.
Artur Esteves traça um curto panorama da intolerância religiosa através da
história pontuando exemplos europeus e focando nas mudanças e permanências
de atitudes em relação às religiões de matriz afro-brasileira.
O mesmo autor recomenda o livro ‘‘Segredos, mentiras e democracia’’, de
Noam Chomsky, e o filme ‘‘O Legionário’’, de Peter MacDonald.
Editores
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 05 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Alessandro Lopes Silva
[email protected]
A origem do nome Caleme
O nome Caleme originou-se do sobrenome do engenheiro-geógrafo, Christian
Wilhelm Klemme, um alemão que chegou ao Brasil em 1912 para trabalhar no
saneamento básico da baixada fluminense.
Christian
Wilhelm
Klemme e
mulher
desconhecida.
Acervo Casa
da Memória
Arthur
Dalmasso.
Textos
Alessandro
Lopes Silva
é graduando
em História
pela
Universidade
Norte do
Paraná,
UNOPAR,
Teresópolis,
RJ
Fotografia aérea da fazenda Guinle. Acervo Casa da
Memória Arthur Dalmasso.
V
indo para Teresópolis em 1928, executou
diversos trabalhos na localidade onde hoje
é o bairro do Caleme. Os moradores
tinham dificuldade em pronunciar o seu nome,
portanto chamavam de K-le-me.
Ná década de 1940, com a vinda da família Guinle,
Otávio Guinle adquire uma área de 300.000m2 no
bairro, onde constrói o Sítio Caleme para sua
moradia proporcionando aos seus visitantes um
belo cenário natural.
Trecho do
Caleme
após as
chuvas de
2011. Autor
6
Assim como o sítio acima, o bairro inicialmente
possuía grandes terrenos com amplas áreas verdes e
construções residenciais esparsas.
Conforme dito pelo morador Luiz Alberto
Carvalho de Souza, o bairro possuía
aproximadamente seis casas ainda na década de O crescimento da cidade tornou o bairro um eixo de
expansão natural do município, com casas e
1970.
comércio a beira rua e ao longo dos cursos d´água,
onde não aconteciam enchentes e tinha até peixes,
segundo Luiz. Na década de 1990, é construído o
conjunto habitacional Felismindo Gonçalves da
Silva, assim como realização de calçamento das
ruas.
No ano de 2011 o bairro do Caleme, assim como
outros, sofreu com a grande quantidade de chuvas
que abateu o município, porém, segundo a moradora
Marlene, as pessoas estão voltando para as áreas
devastadas por falta de opção e por alguns não terem
recebido o aluguel social, sendo realizadas somente
obras de contenção de encostas e recuperação de vias
de acesso.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 06 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Construído
o conjunto
habitacional
Felismindo
Gonçalves
da Silva em
1990.
Acervo
Casa da
Memória
Arthur
Dalmasso.
Paulo Paranhos
Textos
Paulo
Paranhos é
historiador e
membro do
Instituto
Histórico e
Geográfico
de Minas
Gerais
IHGMG
[email protected]
“Mais vale morrer com honra que
viver com desonra”
Há alguns números, destaquei o papel da mulher lutadora, denodada, na figura de Maria
Carolina de Jesus. Agora relembro o nome de uma outra mulher que dignificou as
Minas Gerais: trata-se de Hipólita Jacinta Teixeira de Melo, nascida na cidade de Prados
no ano de 1748
F
ilha de portugueses, foi
batizada com o nome de
Theodozia, tendo sido o
m e s m o t r o c a d o ,
posteriormente, para Hipólita.
Casou-se com o coronel
Francisco Antônio de Oliveira
Lopes; o casal não teve filhos,
mas adotou um menino que
fora abandonado na porta de
sua fazenda, que seria,
futuramente, o barão da Ponta
do Morro. Hipólita criou,
ainda, outra criança também
deixada em sua porta, e que
mais tarde seria vigário e
deputado à Assembleia
Provincial entre os anos de
1866 e 1867. Seu marido era membro ativo do
grupo dos inconfidentes, amigo particular de
Tiradentes, a quem conhecera no Regimento dos
Dragões de Minas, em Vila Rica, e Hipólita tinha
pleno conhecimento e apoiava o movimento.
Seu pai, Pedro Teixeira de Carvalho, era um rico
minerador e capitão-mor da Vila de São José Del
Rei (atual Tiradentes). Ao falecer deixou toda a
sua fortuna para a filha, inclusive a Fazenda da
Ponta do Morro e ali morou com Francisco
depois de casada. A fazenda tornou-se
praticamente um quartel general dos
inconfidentes graças à sua localização
estratégica: próxima à Estrada Real, facilitando
a comunicação entre os conjurados. Segundo o
historiador Ronaldo Simões Coelho, sua casa foi
transformada em ponto de encontro de outros
descontentes; ali compareciam os heróis da
Inconfidência Mineira. Só não sabiam que, entre
eles, um sobrinho por afinidade de Francisco
Antônio, chamado Joaquim Silvério dos Reis,
viria a ser um delator, um traidor, pois não lhe
conheciam a falta de caráter.
Américo,
Pedro. ‘‘A
mais
importante
reunião dos
conjurados.’’
Pintura de
1892 -1893.
Hipólita foi uma mulher excepcional para o seu
tempo: da fazenda enviava bilhetes aos
inconfidentes, principalmente ao padre Carlos
Correia de Toledo e Melo, que residia em São
José Del Rei, e ao seu marido. É de sua autoria
uma carta que denunciou Joaquim Silvério dos
Reis como o traidor da revolução. São de sua
autoria, também, diversos avisos secretos, dando
conta de que Tiradentes fora detido no Rio de
Janeiro.
Uma carta escrita ao marido, em maio de 1789,
alertava que o líder Tiradentes e o traidor Joaquim
Silvério dos Reis encontravam-se presos no Rio
de Janeiro por causa dos planos da revolução,
delatados pelo próprio Silvério dos Reis ao
governo português. Segundo o historiador André
Figueiredo Rodrigues, na carta, ela pediu para o
marido agir com cautela, mas sem se furtar ou
esquecer de que ele fazia parte de um grupo de
revoltosos que lutavam por ideais de melhoria
das condições de vida e trabalho em Minas
Gerais.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 07 - 08 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
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Textos
Parreiras,
Antônio.
‘‘Os
martíres’’.
1927
Outros inconfidentes
também foram
alertados por Hipólita
para que procurassem
proteção. Por meio de
seu compadre
Vitoriano Veloso, que
morava em um distrito
próximo a Prados, ela
enviou esta mensagem
ao padre Toledo: Douvos parte, com certeza,
de que se acham
presos, no Rio de
J a n e i ro , J o a q u i m
Silvério dos Reis e o
alferes Tiradentes,
para que vos sirva ou se ponham em cautela; e
quem não é capaz para as coisas, não se meta
nelas; e mais vale morrer com honra que viver
com desonra.
Veloso também levou, a mando da comadre,
uma mensagem ao tenente-coronel Francisco
de Paula Andrade, em Vila Rica, para que
iniciasse o levante revolucionário
imediatamente e organizasse uma reação em
toda a região das Minas Gerais, a partir da Vila
do Príncipe (hoje cidade do Serro).
Outro episódio importante que demonstra o
envolvimento de Hipólita foi o fato de proibir o
marido de entregar ao então governador de
Minas, o Visconde de Barbacena, uma cartadenúncia delatando o movimento. A carta, que
seria entregue pessoalmente por Francisco
Antônio para tentar diminuir sua pena por
participar da Conjuração Mineira, foi queimada
por Hipólita, que também deu fim a outros
documentos que pudessem denunciar os
revolucionários.
8
Parreiras,
Antônio. ‘‘ A
prisão de
Tiradentes’’.
1914
Seu marido foi detido e sentenciado ao degredo
perpétuo em Moçambique, mas com o intuito de
obter o perdão da Coroa, mandou confeccionar um
cacho de bananas, em ouro maciço, solicitando ao
seu irmão que o oferecesse a D. Maria I de
Portugal. A valiosa peça, entretanto, jamais
chegou ao destino, uma vez que teria sido
interceptada pelo próprio visconde de Barbacena.
Hipólita deixou um testamento transcrito nos
Autos de Devassa (v. 9, pág. 429 a 436), e através
dele se pode compreender melhor sua
extraordinária figura. Pela participação na
Conjuração Mineira teve os bens sequestrados
pela Coroa portuguesa, inclusive os recebidos de
herança paterna. Inconformada, escreveu ao
Secretário do Ultramar solicitando a restituição do
patrimônio sequestrado em Minas Gerais,
alegando ser herança paterna. Após um longo
processo judicial, em 1808 Hipólita conseguiu
reaver boa parte de seu patrimônio. Faleceu em 27
de abril de 1828, tendo sido sepultada na capelamor da Igreja de Nossa Senhora da Conceição em
Prados
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 07 - 08 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Marco Antonio dos Santos de Souza
[email protected]
Textos
Marco
Antonio dos
Santos de
Souza é
professor de
História da
Rede
Estadual e
pósgraduado em
História do
Brasil pela
Universidade
Salgado de
Oliveira Universo-RJ
O processo de independência do Brasil:
entre rupturas e permanências! Capítulo II:
Debret,
JeanBaptiste.
Loja de
barbeiros,
1821.
O papel da Maçonaria no Brasil
A Emília Viotti fala da participação da elite, que
fora educada sob os princípios da Ilustração e
também o papel da maçonaria no processo de
independência.
...Toda uma geração, no entanto, fora educada nos
princípios revolucionários que os homens da
Ilustração se tinham incumbido e a Revolução
Francesa de por em prática (...) a elite educada
nos princípios da Ilustração, embora pouco
numerosa, teria um papel importante a
desempenhar por ocasião da Independência e,
mais tarde, quando se tratou de organizar a
nação... As sociedades secretas do gênero da
Maçonaria que começaram a se multiplicar no
Brasil nos fins do século XVIII teriam, por sua vez,
importante papel na divulgação dessas teorias
(...). (VIOTTI, 1999, p.28).
As sociedades secretas do gênero na Maçonaria
que começaram a se multiplicar no Brasil nos fins
do século XVIII teriam, por sua vez, importante
papel na divulgação dessas teorias. Várias lojas,
assim como eram chamadas, as casas onde os
maçons se reuniam, foram fundadas no Brasil: “Os
Cavaleiros da Luz” na Bahia. Em Pernambuco
fundou-se o Areópago, de onde saíram duas
academias: “Paraíso” e “Suassuna”. No Rio de
Janeiro, também essa sociedades se multiplicaram.
“Conta-se que D.João VI, mandando averiguar a
situação das sociedades secretas, foi informado de
que grande número de personagens importantes
ligados ao governo estava envolvido nessas
sociedades”. (VIOTTI, 1999,p.29).
D.João VI, percebendo o “perigo” que aquelas
sociedades representavam, mandou fechar todas
as lojas suspendendo suas atividades. No entanto,
logo depois se organizaram novamente e estavam
em pleno funcionamento. Elementos mais
A abertura dos portos em 1808 e a entrada de representativos da sociedade faziam parte dessas
estrangeiros em número crescente a partir dessa s o c i e d a d e s : p r o f e s s o r e s , f u n c i o n á r i o s ,
data, intensificando os contatos entre Brasil e comerciantes, fazendeiros e numerosos padres.
Europa, facilitaram ainda mais a divulgação de
ideias revolucionárias.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
9
Textos
“Ao contrário do que se verificava na Europa, onde
a Maçonaria assumira posição nitidamente
anticlerical, no Brasil eram íntimas as relações
entre clero e Maçonaria.” (VIOTTI, 1999, p.29),
pois caso o Brasil se emancipasse de Portugal a
igreja estaria lá para apoiar o novo estado.
“Ás vésperas da independência a Maçonaria
estava pronta para participar de forma eficiente no
movimento, imprimindo-lhe suas diretrizes.”
(VIOTTI, 1999, p.29).
Gomes faz uma abordagem interessante a respeito
da maçonaria:
A história do Brasil está repleta de mitos nos quais
acontecimentos reais do passado se confundem
com situações imaginadas, construídas ou
modificadas pelas gerações posteriores de acordo
com a conveniência ou a necessidade de cada
momento. Um desses inúmeros mitos está
relacionado ao papel desempenhado pela
maçonaria em 1822. Por ele, a separação de
Portugal teria sido inteiramente tramada e
decidida dentro das lojas maçônicas nos meses
que antecederam o grito do Ipiranga. A maçonaria
teve papel fundamental na Independência, mas é
um erro apontá-la como um grupo homogêneo.
Nem de longe os maçons foram unânimes nas suas
opiniões. Ao contrário, foi ali que se travaram
algumas das disputas mais acirradas no período e
que envolveram ninguém menos do que o jovem
príncipe regente e futuro imperador Pedro I.
Em 1822, a maçonaria brasileira estava dividida
em duas grandes facções. Ambas eram favoráveis
à independência, mas uma delas, liderada por
Joaquim Gonçalves Ledo, defendia ideias
republicanas. A outra, de José Bonifácio,
acreditava que a solução era manter D. Pedro
como imperador em regime de monarquia
constitucional. Esses dois grupos disputaram o
poder de forma passional, envolvendo prisões,
perseguições, exílios e expurgos. (GOMES, 2007,
p.238)
Gomes fala ainda sobre a maçonaria, que em uma
época onde não havia partidos políticos
organizados. Foi o trabalho das sociedades
secretas que levou a semente da independência às
regiões mais distantes e isoladas do território
brasileiro e menciona o Piauí.
O mesmo autor mostra como a maçonaria no
começo do século XX era vista: uma organização
altamente subversiva, comparável ao que seria a
Internacional Comunista no século 20. Nas suas
reuniões, conspirava-se pela implantação das
novas doutrinas políticas que estavam
transformando o mundo. Cabia aos seus agentes
propagar essas novidades principalmente na
América que depois de séculos de colonização,
começava a se libertar de suas antigas metrópoles e
a testar essas novas ideias políticas
10
implantando regimes até então praticamente
desconhecidos, como a república.
Segundo o historiador Oliveira Lima,(?) “mostra
bem que as ideias subversivas dos tronos eram
espalhadas pelas sociedades secretas, (...) e
passavam de um país para outro, de um continente
a outro, com celeridade e eficácia.”.
Gomes (2007) fala da importância que a
maçonaria teve ao mundo. Que estaria
virtualmente por trás de todas as grandes
transformações ocorridas nos dois séculos
seguintes: na Revolução Francesa, cunhou o lema
“liberdade, igualdade e fraternidade”. Os
libertadores da América Espanhola também
participaram da maçonaria. Quase cem por cento
dos homens que assinaram a declaração de
independência americana eram maçons.
No Brasil, a independência foi proclamada por um
grão-mestre maçom, D. Pedro I. E a República, por
outro, o marechal Deodoro da Fonseca.
Conforme Gomes (2007) a passagem de D. Pedro I
pela maçonaria foi meteórica, pelo menos
oficialmente, pois há fortes indícios de que ele
frequentasse as atividades da maçonaria há mais
tempo.
A maçonaria usou diferentes grupos de pressão na
época da independência e foi usada por eles, de
acordo com as circunstâncias do momento. No
episódio do “dia do fico”, “do “grito do Ipiranga”
e da “aclamação do imperador”, saiu triunfante.
Sairia vitoriosa novamente em 1831, na
abdicação do imperador. Na dissolução da
constituinte, na Confederação do Equador e em
outros momentos, perdeu. Foi, portanto, um
elemento importante no poderoso jogo de pressões
que se estabeleceu no momento em que o Brasil
dava seus primeiros passos como nação
independente, mas não o único nem o mais
decisivo. (GOMES, 2007, p.245)
Sendo assim, pode-se dizer que a Maçonaria
esteve presente no processo de independência do
Brasil e foi um dos fatores que contribuiu para o
acontecimento da mesma e as ideias liberais que
eclodiram na Europa, chegassem ao Brasil. Claro
que essas ideias foram selecionadas, ou seja,
importou-se as ideias que eram favoráveis à elite.
Vale lembrar que a maioria dos livros didáticos não
trazem informações consistentes a respeito da
maçonaria; o assunto é tratado de forma sucinta,
não abordando o que foi e o significado dessas
sociedades para o processo de independência do
Brasil. Constatando esse fato, percebe-se que
existe algo implícito, ou seja, academia não
publica certos detalhes sobre a História. Talvez, o
que aconteça, seja que não haja interesse da classe
dominante em informar os cidadãos acerca dos
fatos históricos, pois
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Textos
a informação é capaz de transformar mentes e
sendo assim, há de haver futura formação de
cidadãos conscientes e críticos e
consequentemente a grande pirâmide existente
pode vir a sofrer alterações, o que a elite tanto
teme.
Natureza e limites do nacionalismo
Emilia Viotti fala também a respeito do
nacionalismo, se é que ele existiu de fato.
Assim como o liberalismo, o nacionalismo,
frequentemente associado na Europa aos
movimentos liberais, não teria condições de
assumir seu significado pleno num país cuja
economia baseava-se essencialmente na
exportação, onde o mercado interno era
extremamente limitado, as vias de comunicação
escassas e, por isso mesmo, difíceis os contatos
entre as várias regiões. Ainda às vésperas da
Independência eram mais fortes os laços das
várias províncias com a Europa do que entre si.
Faltavam as condições que na Europa levavam a
uma maior integração nacional. Eis por que todos
os movimentos revolucionários anteriores à
independência sempre tiveram caráter local,
irradiando-se, quando muito, às regiões mais
próximas, jamais assumindo um caráter mais
amplo. (...) O nacionalismo brasileiro manifestase sobretudo sob a forma de um antiportuguesismo
generalizado. Apesar de elementos de origem
portuguesa participarem dos movimentos
revolucionários, a maioria dos que aderiram a
esses movimentos era de origem brasileira.
(VIOTTI, 1999,p.33)
Diante do que a autora expõe, pode-se concluir que
não havia um nacionalismo como na Europa,
talvez até houvesse, mas não da forma que
conceituamos hoje em dia e se olhássemos com
nosso olhar de hoje incorreríamos no que
chamamos de anacronismo.
O príncipe regente na Colônia tropical
D. João VI voltou para Portugal, mas seu filho, o
príncipe regente, ficou no Brasil. Houve inúmeros
conflitos entre os portugueses e brasileiros. Esses
não tardaram a emergir. Várias medidas foram
tomadas pelas cortes a fim de tornar patente a nova
orientação assumida em relação ao Brasil
revelando as intenções de restringir a autonomia
administrativa da colônia, limitar a liberdade de
comércio, restabelecer monopólios e privilégios
que os portugueses haviam usufruído
anteriormente à transferência da corte portuguesa
para o Brasil.
(...) Decretos de setembro e outubro determinavam
a volta do príncipe regente para Portugal,
nomeando para cada província, na qualidade de
poder executivo, um governador de armas,
independentemente das juntas governativas que se
tinham criado. Ao mesmo tempo destacavam-se
novos contingentes de tropas com destino ao Rio
de Janeiro e a Pernambuco.
As decisões tomadas pelas cortes repercutiram no
Brasil como uma declaração de guerra,
provocando tumultos e manifestações de
desagrado. No Brasil crescia o número dos
adeptos da Independência. Proclamações
apareciam pregadas nas paredes, panfletos eram
deixados no umbral das casas protestando contra
política das Cortes e concitando a população e o
príncipe a resistirem.
Os propósitos recolonizadores das cortes tinham
agravado a tensão entre colônia e metrópole,
pondo em risco a solução de compromisso
almejada pela maioria dos que compunham a
classe dominante no Brasil. Estes encaravam
inicialmente com simpatia a instituição de uma
monarquia dual, desde que fosse resguardada a
autonomia do Brasil. Essa era a opinião, por
exemplo, de José Bonifácio, o qual encarava com
suspeição as situações revolucionárias que
envolviam mobilização das massas. Mas ele não
era o único a se declarar inimigo da democracia e
a confessar sua aversão pelas massas em geral. A
aversão às formas populares de governo, a
desconfiança em relação à massa ignara que
compunha a maioria que compunha a maioria da
população, o receio da revolta de escravos que a
situação revolucionária poderia propiciar
levariam esses homens a contemporizar, enquanto
puderam, com a monarquia portuguesa.
Finalmente, romperam com esta quando
perceberam a inviabilidade dessa união. O
príncipe regente lhes apareceu então como
instrumento ideal para a conquista e consolidação
da autonomia desejada, sem que para isso fosse
preciso mobilizar a população. (VIOTTI, 1999,
p.46)
Diante do exposto pela autora percebe-se que os
brasileiros que possuíam algum poder perceberam
que a união de Portugal e Brasil era inviável Mota
(1986) menciona isso em seu livro também.
“(...) a reação das elites brasileiras, que
conseguem envolver em seu movimento o príncipe
D.Pedro, que guardara no espírito os conceitos do
pai - e proclamou a independência. Mas os
problemas persistiam, em suas dimensões
dinástica e política, e a possibilidade de reunir as
coroas acaba paulatinamente por
incompatibilizar o Príncipe com a nação recémcriada. (MOTA, 1986,p.8)
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
11
Textos
Mota, assim como Viotti, descreve sobre a
inviabilidade de uma suposta união entre Brasil e
Portugal. A elite que vivia aqui no Brasil desejava
um Brasil independente, mas não queriam a
participação popular, havia o medo de uma revolta
popular, o povo não poderia se unir, pois isso era
visto como uma ameaça. A solução foi apoiar o
príncipe e a ideia da independência, pois mesmo
que o Brasil tivesse um imperador e o país tivesse
nas mãos dele, D.Pedro estaria no poder, mas ao
lado dos grandes fazendeiros. Era necessária a
proclamação da independência o quanto antes, pois
a revolta popular era iminente e ninguém desejava
tal situação.
Gomes em seu livro, “1822”, esclarece fatos
importantes a respeito do desenrolar da
independência. Mostra que não foi tão fácil como a
historiografia muitas vezes mostra.
Segundo ele a relação que existe hoje entre
brasileiros e portugueses que hoje se encontram e
conversam se dão bem, não foi sempre assim,
“existiu um clima tenso de ódio e confronto entre
esses dois povos no ano da independência do
Brasil”. ( Gomes, 2010).
(...) na semana do Fico, bandos de portugueses
armados percorriam as ruas do Rio de Janeiro em
atitude de desafio aos brasileiros que apoiavam a
decisão do príncipe regente de contrariar as cortes
de Lisboa e permanecer no Brasil (...).
Um mito recorrente sobre a Independência do
Brasil diz respeito ao caráter pacífico da ruptura
com Portugal. Por essa visão, tudo teria se
resumido a uma negociação entre o rei D.João VI e
seu filho D.Pedro com algumas escaramuças
isoladas e praticamente sem vítimas. É um erro. A
guerra da independência foi longa e desgastante.
Duraram 21 meses, entre Fevereiro de 1822 e
novembro do ano seguinte. Nesse período milhares
de pessoas perderam a vida em roças, morros,
mares e rios em que se travou o conflito. O número
de combatentes foi maior do que o das guerras de
libertação da América espanhola na mesma época.
Só na Bahia mais de 16.000 brasileiros e
aproximadamente 5.000 portugueses trocaram
tiros durante um ano e quatro meses.
Não há estatísticas confiáveis a respeito do número
de mortos, mas evidências indicam ter sido maior
do que se imagina. No Piauí, entre duzentos e
quatrocentos brasileiros tombaram em cinco horas
de combate na trágica e simbólica Batalha do
Jenipapo, ocorrida no dia 13 de março d 1823. Na
Bahia, duzentas a trezentas pessoas morreram nas
ruas de Salvador.Milhares de brasileiros e
portugueses morreram em combate. A soma de
números imprecisos com informações ainda mais
vagas sobre enfrentamentos em outras regiões
torna razoável supor que a guerra da
independência
12
brasileira custou entre 2.000 e 3.000 vítimas (...) o
Brasil ficou dividido, nem todos estados apoiavam
a independência, como por exemplo Pará e
Maranhão.
A ruptura formal entre Brasil e Portugal
aconteceu no começo de 1822, quando as cortes
declararam D.Pedro e seus ministros rebeldes e
começaram os preparativos militares para atacar
a antiga colônia. Portugal se preparara para
atacar o Brasil (...) ao tomar conhecimento de
notícias tão alarmantes, os brasileiros se
prepararam para a guerra. No dia 1 de agosto de
1822, D.Pedro e seu ministério declararam
inimigas as tropas que fossem enviadas de
Portugal para o Brasil. Lanchas e navios
portugueses que por ventura fossem capturados
deveriam ser afundados ou incendiados (...)
(GOMES, 2000, p.164).
O autor da obra “1822” deixa claro que a
independência do Brasil não foi pacífica como
muitos acreditam ser. Foi uma guerra sangrenta e
milhares de vidas foram perdidas. O Brasil ficou
dividido, uns estados apoiavam os brasileiros,
outros, os portugueses. Pode-se perceber que os
brasileiros não estavam unidos, não havia uma
identidade. Destarte conclui-se que a
independência do Brasil foi conquistada com
muita luta e derramamento de sangue e está longe
de ter sido pacífica.
O Dia do “Fico” e a proclamação da
independência
Em 9 de Janeiro de 1822, o príncipe, aceitando a
solicitação do Senado da Câmara do Rio de
Janeiro, decidiu-se a desobedecer às ordens de
Lisboa e a permanecer no Brasil. “Não se tratava
ainda de uma ruptura, pois o gesto de
desobediência foi saldado com gritos de Viva as
cortes, Viva a Religião, Viva a Constituição, Viva
e l R e i C o n s t i t u c i o n a l , Vi v a o P r í n c i p e
Constitucional...” ( Viotti, 1999).
Tentava-se ainda manter aberta a possibilidade de
se constituir uma monarquia dual com sede em
Portugal e no Brasil ao mesmo tempo, visando
manter o Brasil como Reino Unido a Portugal e
também se procurava preservar a autonomia
administrativa e comercial que tinham alcançado.
(...) convergiam para o príncipe aspirações as
mais contraditórias. Para os portugueses, ele
representava a possibilidade de manter o Brasil
unido a Portugal. Acreditavam eles que só a
permanência do príncipe no Brasil poderia evitar
um movimento separatista. Os brasileiros que
almejavam a preservação das regalias obtidas e
pretendiam a criação de uma monarquia dual
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Textos
consideravam também essencial a permanência
do príncipe. O mesmo pensavam os que
almejavam a independência definitiva e total, mas
temiam as agitações do povo. Para estes, o
príncipe representava a possibilidade de realizar a
independência sem alteração da ordem.
A tensão entre colônia e metrópole agravou-se
depois do “Fico”. O príncipe procurou apoio
entre os homens de prestígio do país e de
reconhecida fidelidade à monarquia. (VIOTTI,
1999, p.47)
Após análise das ideias contidas no texto da autora,
é possível concluir que, de certa forma, a figura de
D. Pedro foi usada a benefício da elite, pois ela viu
no imperador uma saída para evitar um movimento
separatista e também temiam que o povo se
reunisse e juntos alterassem a ordem, a agitação
popular era algo que deveria ser evitado. Pode-se
dizer que houve uma troca, D. Pedro procurou
apoio da elite e a mesma preservou seus poderes,
ele chegou até ser considerado defensor perpétuo
do Brasil.
Participação popular no movimento de
independência
Algumas bibliografias afirmam ter havido
participação popular no processo de
independência do Brasil, que o povo participou,
outras negam totalmente. Na época da
independência o Brasil não estava preparado para
lutar contra Portugal: “pelos cálculos do
historiador naval britânico Brian Vale, no começo
de 1822 D. Pedro podia contar no máximo com
oito navios de guerra confiáveis com um total de
duzentos canhões, enquanto os portugueses
tinham quatorze embarcações equipadas com pelo
menos o dobro do armamento” (Gomes,2010).
Gomes (2007) traz informações pertinentes a
respeito da participação popular na luta contra os
portugueses:
(...) além de precisar de um número muito maior de
navios, o Brasil enfrentava uma dificuldade
adicional: faltavam oficiais e marinheiros para
comandar e defender as embarcações. Nesta
época, havia no Brasil cerca de 160 oficiais de
marinha, quase todos portugueses vindos junto
com a corte de D. João em 1808. Além de poucos,
não eram confiáveis. Ninguém tinha certeza de
como reagiriam se tivessem de enfrentar seus
compatriotas numa batalha. (...) havia dificuldade
nos mares, e estas se reproduziam em terra. O
exército brasileiro herdara a estrutura das forças
portuguesas da época da colônia, organizadas em
corpos de primeira, segunda e terceira linhas.
A primeira recebia soldo para permanecer no
serviço ativo. As outras duas, eram forças de
reserva e só eram convocadas em caso de
emergência. Seus integrantes, na maioria
brasileira, não recebiam soldo e geralmente
faziam parte dos bandos de jagunços ou
seguranças que os coronéis locais mantinham
em suas fazendas. Estes eram mal treinados e
ficavam dispersos pelo território, sem um
comando unificado e seguro.
Além disso, em todo Brasil predominava uma
aversão generalizada ao serviço militar. Os
soldados eram recrutados de forma arbitrária
pelos coronéis e capitães do mato. Nas cidades
de Vila Rica (atual Ouro Preto), Sabará e São
João Del Rei, houve casos em que a população
foi convocada para se reunir na praça central
com a desculpa de que ali haveria uma
cerimônia religiosa ou um comunicado
importante. Ao se aproximar, no entanto, os
rapazes eram surpreendidos pelos soldados da
corte que os laçavam com cordas e os
despachavam para o Rio de Janeiro. Os novos
recrutas chegavam à capital acorrentados uns
aos outros pelo pescoço e vigiados por guardas
a cavalo. Alguns rebeldes também tinham os
pés algemados. Viajavam dias seguidos sem
comer. Em 1826, o Ceará ofereceu 3.000
recrutas ao imperador. Embarcados para o Rio
de Janeiro no porão de um navio, 553 deles
morreram de fome e sede durante a viagem. Nos
quartéis a disciplina era bárbara. Os infratores
e preguiçosos eram punidos com pauladas e
chibatadas.
O pavor do serviço militar entre a população
pobre tão grande que muitos jovens se
mutilavam para fugir do recrutamento.
“Na prática, o recrutamento forçado atingia
apenas as classes mais humildes e
desprotegidas”, explicou o historiador militar
gaúcho Juvêncio Saldanha Lemos. “Mas foram
esses homens que, humilde e anonimamente,
amparam a independência”. (GOMES, 2000,
p.168)
Destarte, chega-se a conclusão que no processo
de independência houve participação popular
sim, o povo humilde, a classe menos
favorecida, participou da luta, todavia,
compulsoriamente, vidas foram sacrificadas e o
uso da violência esteve presente para forçar esse
povo a lutar contra Portugal. Foi uma
independência conquistada com muito sangue
favorecendo não a classe dos que lutaram
forçadamente, mas sim, uma elite.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
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Textos
Debret,
JeanBaptiste. ‘‘
Um jantar
brasileiro’’,
1827.
A elite no poder e do poder...
Não cuidavam senão em diminuir o poder do rei,
aumentando o próprio, não pensando de modo
Durante o processo de independência havia os algum nas classes inferiores. (VIOTTI, 1999,
radicais e os conservadores, cada um com suas p.55)
ideias; após a independência a diferença entre eles
se acentuou. José Bonifácio, que era maçom, fazia O Brasil tornou-se independente, mas o poder
parte da sociedade secreta que reunia figuras de ficou nas mãos da elite, D.Pedro estava lá, mas o
projeção e relevo da sociedade. Nessa sociedade poder era dividido entre seus membros e povo não
havia um juramento que os unia. Eles procuravam participava, estava à margem de tudo o que se
integridade, independência e felicidade do Brasil passava dentro do governo.
como império Constitucional. A partir da “Entre o arcabouço jurídico que liberal importado
independência Bonifácio procurou colocar em da Europa, sobre o qual se ergueu o Estado
prática esse princípio. Na loja “Grande Oriente” independente, e a prática social haveria uma
outro grupo dos maçons liderado por Ledo Januário enorme distância, facilmente observada pelos
da Cunha Barbosa Alves Branco assumiu o controle viajantes estrangeiros que percorriam o Brasil”
(Viotti, 1999).
da situação e fez de D.Pedro grão-mestre.
(...) o governo da nação ficava nas mãos de um Estes viajantes espantavam-se diante da falta de
grupo de elite: fazendeiros, comerciantes, pessoas correspondência entre a legislação e a realidade
que ocupavam altos postos na administração e no que a desrespeitava a cada passo.
governo, muitos dos quais foram mais tarde (...) a constituição afirmava a igualdade de todos
titulados por serviços prestados por ocasião da perante a lei, bem como a garantia de liberdade
independência. (...) em sua maioria, eram homens individual. A maioria da população, no entanto,
de mais de cinquenta anos. Uns poucos eram permanecia escravizada, não se definindo em
portugueses de origem. A maioria realizara seus termos jurídicos como cidadãos. A Constituição
estudos na metrópole. Ligavam-se frequentemente garantia o direito de propriedade, mas 19\20 da
por laços de família. Muitos tinham ocupado população rural que não se enquadrava na
posições na qualidade de funcionários da coroa, e categoria de escravos eram compostos de
depois da independência ocupavam vários postos “moradores” vivendo em terras alheias, sem
de importância política e administrativa. nenhum direito a ela. A Constituição assegurava a
Constituíram uma verdadeira oligarquia fazendo liberdade de pensamento e expressão, mas não
parte do Conselho de Estado, Senado, Câmara dos foram raros os que pagaram com a vida o uso
deputados, exercendo funções de presidentes de desse direito, que, teoricamente, lhes era
garantido pela Constituição.
província e de ministros de Estado.
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REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Textos
. A lei garantia a segurança individual, mas por
alguns poucos mil réis podia-se mandar matar,
impunemente, um desafeto. A independência da
justiça era, teoricamente, assegurada pela
Constituição, mas tanto a justiça quanto a
administração transformaram-se num instrumento
dos grandes proprietários. Aboliram-se as torturas,
mas nas senzalas continuava-se a usar os troncos,
os anginhos, os açoites, as gargalheiras, e o senhor
decidia da vida e da morte dos seus escravos (...)
A elite de letrados, falando em nome das categorias
socialmente dominantes, seria a porta-voz de uma
ideologia liberal que mascarava as contradições do
sistema. (...) com a independência, haviam atingido
o objetivo fundamental a que se propunham:
libertar o país das restrições impostas pelo Estatuto
Colonial, assegurar a liberdade de comércio e
garantir autonomia administrativa. A organização
do país independente refletiria os anseios desses
grupos sociais que assumiriam o poder no Primeiro
Império. Ficaram excluídas do poder as camadas
populares, uma vez que escravos e índios foram
excluídos do conceito de cidadão, tendo-se adotado
ainda um sistema de eleição indireta, recrutando-se
os votantes segundo critérios censitários.
A concentração do poder nas mãos dessa minoria
que disputaria ao imperador o privilégio de dirigir
a nação, levando à abdicação em 1831.
(...) “o povo nada ganhou absolutamente com a
mudança operada”. Comparando o que estava
acontecendo no Brasil com o que se passara na
França, por ocasião da Revolução Francesa,
comentava: “A maioria dos franceses lucrou com a
Revolução que suprimiu privilégios e direitos
auferidos por uma casta favorecida (...)”.
(...) A emancipação política pelas categorias
dominantes interessadas em assegurar a
preservação da ordem estabelecida, e cujo único
objetivo era combater o Sistema Colonial no que
ele representava de restrição à liberdade de
comércio e de autonomia administrativa, não
ultrapassaria os limites definidos por aqueles
grupos. A ordem econômica tradicional seria
preservada, a escravidão mantida. A nação
independente continuaria na dependência de uma
estrutura colonial de produção, passa
A fachada liberal construída pela elite
europeizada ocultava a miséria, a escravidão em
que vivia a maioria dos habitantes do país.
Conquistar a emancipação definitiva e real da
nação, ampliar o significado dos princípios
constitucionais foram tarefa relegada aos
pósteros. (VIOTTI, 1999, p.59)
O recém-país independente possuía agora uma
Constituição, no Brasil a conjuntura permanecia a
mesma. Como na época em que a escravidão foi
abolida e que o Brasil enganou os ingleses,
fingindo cumprir o decreto, mas realidade
continuando com o tráfico. “O Brasil para inglês
ver” sempre existiu. E na independência foi o que
aconteceu! A lei estava somente no papel. A
constituição existia, mas tudo continuava como
antes. A Independência não foi para os pobres e
sim para uma elite que soube levar vantagem.
Outra questão relevante é o fato de falarem da
independência como se ela tivesse sido plena:
alguns livros didáticos tratam essa questão dessa
forma, como se o Brasil tivesse ficado totalmente
independente. A Historiografia desbanca essa
ideia.
Debret,
JeanBaptiste
Comboio de
café rumo à
cidade.
1826
continua na próxima edição
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
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Artur Esteves
[email protected]
Um Breve Ensaio sobre a Intolerância
Religiosa Através da História
Dubois,
François. ‘‘O
Massacre no
Dia de São
Bartolomeu’’,
1576.
N
estes últimos anos temos visto
bastante casos de intolerância
religiosa, seja no Brasil ou no resto do
mundo, muitas vezes levando seus
contendores a lutarem até a morte para
fazerem prevalecer seus pontos de vista e
ideologias. Todavia, a intolerância religiosa
existe desde as primeiras civilizações.
Um dos exemplos mais conhecidos são as
cruzadas, movimento este que foi incentivado
pelo papado no intento de se livrar do excesso
de pessoas que haviam na Europa daquela
época, principalmente os que eram detentores
de poucas posses ou nenhuma. . Foi prometido
o perdão de todos os pecados para os que
fossem a Terra Santa (hoje em dia Israel,
Palestina, Síria e Líbano) combater os
“infiéis”, diga-se de passagem, os
muçulmanos. Os europeus venceram as
primeiras cruzadas, instalando nos antigos
territórios muçulmanos o terror e a
intolerância religiosa. Na conquista de
Jerusalém foram assassinados milhares de
judeus, muçulmanos e até mesmo cristãos
pereceram pela fé e pela espada.
16
Outro episódio de intolerância religiosa foi o
massacre de São Bartolomeu na França em
1572 onde morreram aproximadamente 3000
protestantes. Poderia citar muitos outros casos
mais. Porém falarei do Brasil.
Nosso país foi formado por diversas culturas,
sendo as influências africanas muito fortes o
que atraiu muitos pesquisadores de outros
países, como o francês Roger Bastide, o qual
estudou as religiões africanas com destaque
para o candomblé. Outros que sobremodo
estudaram a cultura afro-brasileira foram o
folclorista Edison Carneiro, Luís da Câmara
Cascudo e o historiador Joel Rufino dos
Santos (recentemente falecido). Rufino, além
de ter sido estudioso da temática, escreveu
vários livros sobre a cultura afro-brasileira,
além de ter sido um fervoroso militante pela
causa negra no Brasil, o que lhe acarretou
perseguição durante a ditadura militar. As
religiões de matrizes africanas são umas das
mais perseguidas no Brasil, talvez pelo fato
das pessoas não compreenderem os alicerces
daquelas; e o que a mídia passa em sua
maioria reforça o senso comum que diz que
são religiões animistas, fetichistas.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 16 - 17 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
Textos
Artur
Esteves é
Professor e
Historiador
Textos
Até o período Vargas havia leis proibindo suas
práticas e as invasões de terreiros e espancamentos
de adeptos eram comuns, sendo aceitos pela
sociedade da época que via nessas religiões a
subversão a ordem social estabelecida e ao status
quo. Para evitar as perseguições, uma das
estratégias adotadas foi o registro desses templos
como entidades filantrópicas, beneficentes, além de
se valerem de alguns preceitos do Kardecismo no
intento de dar uma cientificidade aos cultos e
rituais. Após a Segunda Guerra Mundial, os
terreiros de umbanda e de candomblé tiveram
grande crescimento, sendo sua prática não mais
considerada como um crime pelo código penal.
Hoje em dia, mesmo com tantos avanços sociais,
políticos e econômicos, ainda existem perseguições
as religiões de matrizes africanas e seus praticantes.
Mesmo a intolerância religiosa ser crime de acordo
com a constituição, dificilmente alguém vai preso
ou é processado por este tipo de ato.
Atualmente o ensino de história da África é
obrigatório nas escolas, o que muitas vezes não
é cumprido, visto alguns educadores
professarem algum credo que é contra as
religiões de origem africana. Nos últimos anos
vários movimentos em prol da tolerância
religiosa têm sido realizados na intenção de
quebrar tabus e pré-conceitos sobre as já
citadas religiões. Ainda há um longo caminho
pela frente e só o tempo mostrará erros e
acertos pelas sendas da história.
Imagem: Édouard Debat-Ponsan (18471913) - Certa Manhã à Porta do Louvre óleo sobre tela -1880.
REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 16 - 17 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
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Artur Esteves
[email protected]
Textos
Artur
Esteves é
Professor e
Historiador
N
a obra Segredos, Mentiras e
Democracia, o filósofo Noam
Chomsky discorre acerca de
vários temas, como democracia por
exemplo. Este livro é resultado de uma
série de entrevistas feitas pelo jornalista
David Barsamian nos anos de 1993 e
1994, onde Chomsky fala sobre suas
concepções de política, das
transformações passadas pela sociedade
após a Segunda Guerra Mundial,
mostrando que no que tange à política, no
caso a política interna e externa norte
americana, esta deve ser analisada com
olhar crítico, pois o que a mídia passa a
respeito muitas vezes não passa de
mentiras, sendo o termo “democracia”
bastante questionado pelo autor. Será que
vivemos em uma democracia?
Segredos,
Mentiras e
Democracia
Autor: Noam
Chomsky
Editora:
Universidade
de Brasília
Ano: 1999
N
este filme Van Damme faz o papel do
lutador de boxe Alain Lefevre que
após uma luta na qual havia sido
obrigado pela máfia da cidade de Marselha a
perder a luta, o mesmo contraria a vontade da
organização criminosa, o que acaba lhe
acarretando perseguição por parte desta. Para
fugir Lefevre se alista na Legião Estrangeira,
organização criada na França no intuito de ser
um braço do exército francês na manutenção e
conquista de novas colônias, principalmente
no norte da África. Ao chegar à África é
enviado para um dos fortes mais perigosos
juntamente com outros homens que assim
como ele se alistaram para fugir de algo ou
alguém. Normalmente a Legião era composta
de homens de diversas partes do mundo e
alguns também da França, os quais na maior
parte das vezes morriam, seja nos combates
contra as populações locais que procuram
resistir ao invasor europeu, ou então de fome;
e sobretudo nas marchas pelos escaldantes
desertos.
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REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 18 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015
O Legionário
Ano: 1998
Diretor: Peter
MacDonald
Elenco: Jean
Claude Van
Damme e
outros
Duração: 1h
e 39 minutos

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