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N. 35 • NOV & DEZ 2015 A origem do nome Caleme O processo de independência do Brasil: entre rupturas e permanências! Capítulo II: O papel da Maçonaria no Brasil “Mais vale morrer com honra que viver com desonra” ‘‘Segredos, mentiras e democracia" e "O Legionário" Detalhe: Dubois, François. ‘‘O Massacre no Dia de São Bartolomeu’’, 1576. A Revista de História Amnésia é uma publicação bimenstral. Os artigos enviados poderão ser publicados caso sejam aprovados pela Revista. As opiniões expressas nos ar tigos assinados são de responsabilidade exclusiva de seus autores. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA Expediente LUIZ ALBERTO FUNDADOR E EDITOR-CHEFE ARTUR ESTEVES Editor e revisor MARCELO CAMPOS Editor e revisor RODRIGO MELO Diagramação Acesse o nosso blog: revistaamnesia.wordpress.com Quer publicar um artigo? Entre em contato conosco: Correio eletrônico: [email protected] Errata Na edição 34 a marcação correta das páginas é PP. 06 - 11 e não P. 05 - 11. 35 novembro & dezembro / 2015 05 - Editorial 06 - A origem do nome Caleme Alessandro Lopes Silva. 07 - “Mais vale morrer com honra que viver com desonra” Paulo Paranhos 09 - O processo de independência do Brasil: entre rupturas e permanências! Capítulo II: O papel da Maçonaria no Brasil... Marco Antonio dos Santos de Souza 16 - Um Breve Ensaio sobre a Intolerância Religiosa Através da História Artur Esteves 18 - Resenhas: ‘‘Segredos, mentiras e democracia", de Noam Chomsky, e o filme "O Legionário", de Peter MacDonald. Artur Esteves Editorial O bairro teresopolitano Caleme é abordado por Alessandro Lopes Silva, que escreve sobre a origem do topônimo, a relação entre urbanização e meio ambiente e a situação do local após a calamidade de 2011. A mineira Hipólita Teixeira de Melo é destacada por Paulo Paranhos. Filha de um rico minerador, casada com um coronel e tendo adotado dois filhos, exerceu um papel ativo na articulação da Inconfidência Mineira ao enviar e interceptar correspondências a partir da Fazenda Ponta do Morro, local estratégico devido à proximidade com a Estrada Real. No capítulo segundo de seu trabalho, Marco Antônio dos Santos de Souza aborda o papel da Maçonaria na independência; levanta uma discussão acerca da natureza e limite do nacionalismo no Brasil; trata do príncipe na colônia e a inviabilidade de uma suposta união entre Brasil e Portugal; evidencia o “dia do fico”; discute a ideia da participação popular na independência e também a elite brasileira no poder. Artur Esteves traça um curto panorama da intolerância religiosa através da história pontuando exemplos europeus e focando nas mudanças e permanências de atitudes em relação às religiões de matriz afro-brasileira. O mesmo autor recomenda o livro ‘‘Segredos, mentiras e democracia’’, de Noam Chomsky, e o filme ‘‘O Legionário’’, de Peter MacDonald. Editores REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 05 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Alessandro Lopes Silva [email protected] A origem do nome Caleme O nome Caleme originou-se do sobrenome do engenheiro-geógrafo, Christian Wilhelm Klemme, um alemão que chegou ao Brasil em 1912 para trabalhar no saneamento básico da baixada fluminense. Christian Wilhelm Klemme e mulher desconhecida. Acervo Casa da Memória Arthur Dalmasso. Textos Alessandro Lopes Silva é graduando em História pela Universidade Norte do Paraná, UNOPAR, Teresópolis, RJ Fotografia aérea da fazenda Guinle. Acervo Casa da Memória Arthur Dalmasso. V indo para Teresópolis em 1928, executou diversos trabalhos na localidade onde hoje é o bairro do Caleme. Os moradores tinham dificuldade em pronunciar o seu nome, portanto chamavam de K-le-me. Ná década de 1940, com a vinda da família Guinle, Otávio Guinle adquire uma área de 300.000m2 no bairro, onde constrói o Sítio Caleme para sua moradia proporcionando aos seus visitantes um belo cenário natural. Trecho do Caleme após as chuvas de 2011. Autor 6 Assim como o sítio acima, o bairro inicialmente possuía grandes terrenos com amplas áreas verdes e construções residenciais esparsas. Conforme dito pelo morador Luiz Alberto Carvalho de Souza, o bairro possuía aproximadamente seis casas ainda na década de O crescimento da cidade tornou o bairro um eixo de expansão natural do município, com casas e 1970. comércio a beira rua e ao longo dos cursos d´água, onde não aconteciam enchentes e tinha até peixes, segundo Luiz. Na década de 1990, é construído o conjunto habitacional Felismindo Gonçalves da Silva, assim como realização de calçamento das ruas. No ano de 2011 o bairro do Caleme, assim como outros, sofreu com a grande quantidade de chuvas que abateu o município, porém, segundo a moradora Marlene, as pessoas estão voltando para as áreas devastadas por falta de opção e por alguns não terem recebido o aluguel social, sendo realizadas somente obras de contenção de encostas e recuperação de vias de acesso. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 06 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Construído o conjunto habitacional Felismindo Gonçalves da Silva em 1990. Acervo Casa da Memória Arthur Dalmasso. Paulo Paranhos Textos Paulo Paranhos é historiador e membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais IHGMG [email protected] “Mais vale morrer com honra que viver com desonra” Há alguns números, destaquei o papel da mulher lutadora, denodada, na figura de Maria Carolina de Jesus. Agora relembro o nome de uma outra mulher que dignificou as Minas Gerais: trata-se de Hipólita Jacinta Teixeira de Melo, nascida na cidade de Prados no ano de 1748 F ilha de portugueses, foi batizada com o nome de Theodozia, tendo sido o m e s m o t r o c a d o , posteriormente, para Hipólita. Casou-se com o coronel Francisco Antônio de Oliveira Lopes; o casal não teve filhos, mas adotou um menino que fora abandonado na porta de sua fazenda, que seria, futuramente, o barão da Ponta do Morro. Hipólita criou, ainda, outra criança também deixada em sua porta, e que mais tarde seria vigário e deputado à Assembleia Provincial entre os anos de 1866 e 1867. Seu marido era membro ativo do grupo dos inconfidentes, amigo particular de Tiradentes, a quem conhecera no Regimento dos Dragões de Minas, em Vila Rica, e Hipólita tinha pleno conhecimento e apoiava o movimento. Seu pai, Pedro Teixeira de Carvalho, era um rico minerador e capitão-mor da Vila de São José Del Rei (atual Tiradentes). Ao falecer deixou toda a sua fortuna para a filha, inclusive a Fazenda da Ponta do Morro e ali morou com Francisco depois de casada. A fazenda tornou-se praticamente um quartel general dos inconfidentes graças à sua localização estratégica: próxima à Estrada Real, facilitando a comunicação entre os conjurados. Segundo o historiador Ronaldo Simões Coelho, sua casa foi transformada em ponto de encontro de outros descontentes; ali compareciam os heróis da Inconfidência Mineira. Só não sabiam que, entre eles, um sobrinho por afinidade de Francisco Antônio, chamado Joaquim Silvério dos Reis, viria a ser um delator, um traidor, pois não lhe conheciam a falta de caráter. Américo, Pedro. ‘‘A mais importante reunião dos conjurados.’’ Pintura de 1892 -1893. Hipólita foi uma mulher excepcional para o seu tempo: da fazenda enviava bilhetes aos inconfidentes, principalmente ao padre Carlos Correia de Toledo e Melo, que residia em São José Del Rei, e ao seu marido. É de sua autoria uma carta que denunciou Joaquim Silvério dos Reis como o traidor da revolução. São de sua autoria, também, diversos avisos secretos, dando conta de que Tiradentes fora detido no Rio de Janeiro. Uma carta escrita ao marido, em maio de 1789, alertava que o líder Tiradentes e o traidor Joaquim Silvério dos Reis encontravam-se presos no Rio de Janeiro por causa dos planos da revolução, delatados pelo próprio Silvério dos Reis ao governo português. Segundo o historiador André Figueiredo Rodrigues, na carta, ela pediu para o marido agir com cautela, mas sem se furtar ou esquecer de que ele fazia parte de um grupo de revoltosos que lutavam por ideais de melhoria das condições de vida e trabalho em Minas Gerais. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 07 - 08 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 7 Textos Parreiras, Antônio. ‘‘Os martíres’’. 1927 Outros inconfidentes também foram alertados por Hipólita para que procurassem proteção. Por meio de seu compadre Vitoriano Veloso, que morava em um distrito próximo a Prados, ela enviou esta mensagem ao padre Toledo: Douvos parte, com certeza, de que se acham presos, no Rio de J a n e i ro , J o a q u i m Silvério dos Reis e o alferes Tiradentes, para que vos sirva ou se ponham em cautela; e quem não é capaz para as coisas, não se meta nelas; e mais vale morrer com honra que viver com desonra. Veloso também levou, a mando da comadre, uma mensagem ao tenente-coronel Francisco de Paula Andrade, em Vila Rica, para que iniciasse o levante revolucionário imediatamente e organizasse uma reação em toda a região das Minas Gerais, a partir da Vila do Príncipe (hoje cidade do Serro). Outro episódio importante que demonstra o envolvimento de Hipólita foi o fato de proibir o marido de entregar ao então governador de Minas, o Visconde de Barbacena, uma cartadenúncia delatando o movimento. A carta, que seria entregue pessoalmente por Francisco Antônio para tentar diminuir sua pena por participar da Conjuração Mineira, foi queimada por Hipólita, que também deu fim a outros documentos que pudessem denunciar os revolucionários. 8 Parreiras, Antônio. ‘‘ A prisão de Tiradentes’’. 1914 Seu marido foi detido e sentenciado ao degredo perpétuo em Moçambique, mas com o intuito de obter o perdão da Coroa, mandou confeccionar um cacho de bananas, em ouro maciço, solicitando ao seu irmão que o oferecesse a D. Maria I de Portugal. A valiosa peça, entretanto, jamais chegou ao destino, uma vez que teria sido interceptada pelo próprio visconde de Barbacena. Hipólita deixou um testamento transcrito nos Autos de Devassa (v. 9, pág. 429 a 436), e através dele se pode compreender melhor sua extraordinária figura. Pela participação na Conjuração Mineira teve os bens sequestrados pela Coroa portuguesa, inclusive os recebidos de herança paterna. Inconformada, escreveu ao Secretário do Ultramar solicitando a restituição do patrimônio sequestrado em Minas Gerais, alegando ser herança paterna. Após um longo processo judicial, em 1808 Hipólita conseguiu reaver boa parte de seu patrimônio. Faleceu em 27 de abril de 1828, tendo sido sepultada na capelamor da Igreja de Nossa Senhora da Conceição em Prados REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 07 - 08 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Marco Antonio dos Santos de Souza [email protected] Textos Marco Antonio dos Santos de Souza é professor de História da Rede Estadual e pósgraduado em História do Brasil pela Universidade Salgado de Oliveira Universo-RJ O processo de independência do Brasil: entre rupturas e permanências! Capítulo II: Debret, JeanBaptiste. Loja de barbeiros, 1821. O papel da Maçonaria no Brasil A Emília Viotti fala da participação da elite, que fora educada sob os princípios da Ilustração e também o papel da maçonaria no processo de independência. ...Toda uma geração, no entanto, fora educada nos princípios revolucionários que os homens da Ilustração se tinham incumbido e a Revolução Francesa de por em prática (...) a elite educada nos princípios da Ilustração, embora pouco numerosa, teria um papel importante a desempenhar por ocasião da Independência e, mais tarde, quando se tratou de organizar a nação... As sociedades secretas do gênero da Maçonaria que começaram a se multiplicar no Brasil nos fins do século XVIII teriam, por sua vez, importante papel na divulgação dessas teorias (...). (VIOTTI, 1999, p.28). As sociedades secretas do gênero na Maçonaria que começaram a se multiplicar no Brasil nos fins do século XVIII teriam, por sua vez, importante papel na divulgação dessas teorias. Várias lojas, assim como eram chamadas, as casas onde os maçons se reuniam, foram fundadas no Brasil: “Os Cavaleiros da Luz” na Bahia. Em Pernambuco fundou-se o Areópago, de onde saíram duas academias: “Paraíso” e “Suassuna”. No Rio de Janeiro, também essa sociedades se multiplicaram. “Conta-se que D.João VI, mandando averiguar a situação das sociedades secretas, foi informado de que grande número de personagens importantes ligados ao governo estava envolvido nessas sociedades”. (VIOTTI, 1999,p.29). D.João VI, percebendo o “perigo” que aquelas sociedades representavam, mandou fechar todas as lojas suspendendo suas atividades. No entanto, logo depois se organizaram novamente e estavam em pleno funcionamento. Elementos mais A abertura dos portos em 1808 e a entrada de representativos da sociedade faziam parte dessas estrangeiros em número crescente a partir dessa s o c i e d a d e s : p r o f e s s o r e s , f u n c i o n á r i o s , data, intensificando os contatos entre Brasil e comerciantes, fazendeiros e numerosos padres. Europa, facilitaram ainda mais a divulgação de ideias revolucionárias. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 9 Textos “Ao contrário do que se verificava na Europa, onde a Maçonaria assumira posição nitidamente anticlerical, no Brasil eram íntimas as relações entre clero e Maçonaria.” (VIOTTI, 1999, p.29), pois caso o Brasil se emancipasse de Portugal a igreja estaria lá para apoiar o novo estado. “Ás vésperas da independência a Maçonaria estava pronta para participar de forma eficiente no movimento, imprimindo-lhe suas diretrizes.” (VIOTTI, 1999, p.29). Gomes faz uma abordagem interessante a respeito da maçonaria: A história do Brasil está repleta de mitos nos quais acontecimentos reais do passado se confundem com situações imaginadas, construídas ou modificadas pelas gerações posteriores de acordo com a conveniência ou a necessidade de cada momento. Um desses inúmeros mitos está relacionado ao papel desempenhado pela maçonaria em 1822. Por ele, a separação de Portugal teria sido inteiramente tramada e decidida dentro das lojas maçônicas nos meses que antecederam o grito do Ipiranga. A maçonaria teve papel fundamental na Independência, mas é um erro apontá-la como um grupo homogêneo. Nem de longe os maçons foram unânimes nas suas opiniões. Ao contrário, foi ali que se travaram algumas das disputas mais acirradas no período e que envolveram ninguém menos do que o jovem príncipe regente e futuro imperador Pedro I. Em 1822, a maçonaria brasileira estava dividida em duas grandes facções. Ambas eram favoráveis à independência, mas uma delas, liderada por Joaquim Gonçalves Ledo, defendia ideias republicanas. A outra, de José Bonifácio, acreditava que a solução era manter D. Pedro como imperador em regime de monarquia constitucional. Esses dois grupos disputaram o poder de forma passional, envolvendo prisões, perseguições, exílios e expurgos. (GOMES, 2007, p.238) Gomes fala ainda sobre a maçonaria, que em uma época onde não havia partidos políticos organizados. Foi o trabalho das sociedades secretas que levou a semente da independência às regiões mais distantes e isoladas do território brasileiro e menciona o Piauí. O mesmo autor mostra como a maçonaria no começo do século XX era vista: uma organização altamente subversiva, comparável ao que seria a Internacional Comunista no século 20. Nas suas reuniões, conspirava-se pela implantação das novas doutrinas políticas que estavam transformando o mundo. Cabia aos seus agentes propagar essas novidades principalmente na América que depois de séculos de colonização, começava a se libertar de suas antigas metrópoles e a testar essas novas ideias políticas 10 implantando regimes até então praticamente desconhecidos, como a república. Segundo o historiador Oliveira Lima,(?) “mostra bem que as ideias subversivas dos tronos eram espalhadas pelas sociedades secretas, (...) e passavam de um país para outro, de um continente a outro, com celeridade e eficácia.”. Gomes (2007) fala da importância que a maçonaria teve ao mundo. Que estaria virtualmente por trás de todas as grandes transformações ocorridas nos dois séculos seguintes: na Revolução Francesa, cunhou o lema “liberdade, igualdade e fraternidade”. Os libertadores da América Espanhola também participaram da maçonaria. Quase cem por cento dos homens que assinaram a declaração de independência americana eram maçons. No Brasil, a independência foi proclamada por um grão-mestre maçom, D. Pedro I. E a República, por outro, o marechal Deodoro da Fonseca. Conforme Gomes (2007) a passagem de D. Pedro I pela maçonaria foi meteórica, pelo menos oficialmente, pois há fortes indícios de que ele frequentasse as atividades da maçonaria há mais tempo. A maçonaria usou diferentes grupos de pressão na época da independência e foi usada por eles, de acordo com as circunstâncias do momento. No episódio do “dia do fico”, “do “grito do Ipiranga” e da “aclamação do imperador”, saiu triunfante. Sairia vitoriosa novamente em 1831, na abdicação do imperador. Na dissolução da constituinte, na Confederação do Equador e em outros momentos, perdeu. Foi, portanto, um elemento importante no poderoso jogo de pressões que se estabeleceu no momento em que o Brasil dava seus primeiros passos como nação independente, mas não o único nem o mais decisivo. (GOMES, 2007, p.245) Sendo assim, pode-se dizer que a Maçonaria esteve presente no processo de independência do Brasil e foi um dos fatores que contribuiu para o acontecimento da mesma e as ideias liberais que eclodiram na Europa, chegassem ao Brasil. Claro que essas ideias foram selecionadas, ou seja, importou-se as ideias que eram favoráveis à elite. Vale lembrar que a maioria dos livros didáticos não trazem informações consistentes a respeito da maçonaria; o assunto é tratado de forma sucinta, não abordando o que foi e o significado dessas sociedades para o processo de independência do Brasil. Constatando esse fato, percebe-se que existe algo implícito, ou seja, academia não publica certos detalhes sobre a História. Talvez, o que aconteça, seja que não haja interesse da classe dominante em informar os cidadãos acerca dos fatos históricos, pois REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Textos a informação é capaz de transformar mentes e sendo assim, há de haver futura formação de cidadãos conscientes e críticos e consequentemente a grande pirâmide existente pode vir a sofrer alterações, o que a elite tanto teme. Natureza e limites do nacionalismo Emilia Viotti fala também a respeito do nacionalismo, se é que ele existiu de fato. Assim como o liberalismo, o nacionalismo, frequentemente associado na Europa aos movimentos liberais, não teria condições de assumir seu significado pleno num país cuja economia baseava-se essencialmente na exportação, onde o mercado interno era extremamente limitado, as vias de comunicação escassas e, por isso mesmo, difíceis os contatos entre as várias regiões. Ainda às vésperas da Independência eram mais fortes os laços das várias províncias com a Europa do que entre si. Faltavam as condições que na Europa levavam a uma maior integração nacional. Eis por que todos os movimentos revolucionários anteriores à independência sempre tiveram caráter local, irradiando-se, quando muito, às regiões mais próximas, jamais assumindo um caráter mais amplo. (...) O nacionalismo brasileiro manifestase sobretudo sob a forma de um antiportuguesismo generalizado. Apesar de elementos de origem portuguesa participarem dos movimentos revolucionários, a maioria dos que aderiram a esses movimentos era de origem brasileira. (VIOTTI, 1999,p.33) Diante do que a autora expõe, pode-se concluir que não havia um nacionalismo como na Europa, talvez até houvesse, mas não da forma que conceituamos hoje em dia e se olhássemos com nosso olhar de hoje incorreríamos no que chamamos de anacronismo. O príncipe regente na Colônia tropical D. João VI voltou para Portugal, mas seu filho, o príncipe regente, ficou no Brasil. Houve inúmeros conflitos entre os portugueses e brasileiros. Esses não tardaram a emergir. Várias medidas foram tomadas pelas cortes a fim de tornar patente a nova orientação assumida em relação ao Brasil revelando as intenções de restringir a autonomia administrativa da colônia, limitar a liberdade de comércio, restabelecer monopólios e privilégios que os portugueses haviam usufruído anteriormente à transferência da corte portuguesa para o Brasil. (...) Decretos de setembro e outubro determinavam a volta do príncipe regente para Portugal, nomeando para cada província, na qualidade de poder executivo, um governador de armas, independentemente das juntas governativas que se tinham criado. Ao mesmo tempo destacavam-se novos contingentes de tropas com destino ao Rio de Janeiro e a Pernambuco. As decisões tomadas pelas cortes repercutiram no Brasil como uma declaração de guerra, provocando tumultos e manifestações de desagrado. No Brasil crescia o número dos adeptos da Independência. Proclamações apareciam pregadas nas paredes, panfletos eram deixados no umbral das casas protestando contra política das Cortes e concitando a população e o príncipe a resistirem. Os propósitos recolonizadores das cortes tinham agravado a tensão entre colônia e metrópole, pondo em risco a solução de compromisso almejada pela maioria dos que compunham a classe dominante no Brasil. Estes encaravam inicialmente com simpatia a instituição de uma monarquia dual, desde que fosse resguardada a autonomia do Brasil. Essa era a opinião, por exemplo, de José Bonifácio, o qual encarava com suspeição as situações revolucionárias que envolviam mobilização das massas. Mas ele não era o único a se declarar inimigo da democracia e a confessar sua aversão pelas massas em geral. A aversão às formas populares de governo, a desconfiança em relação à massa ignara que compunha a maioria que compunha a maioria da população, o receio da revolta de escravos que a situação revolucionária poderia propiciar levariam esses homens a contemporizar, enquanto puderam, com a monarquia portuguesa. Finalmente, romperam com esta quando perceberam a inviabilidade dessa união. O príncipe regente lhes apareceu então como instrumento ideal para a conquista e consolidação da autonomia desejada, sem que para isso fosse preciso mobilizar a população. (VIOTTI, 1999, p.46) Diante do exposto pela autora percebe-se que os brasileiros que possuíam algum poder perceberam que a união de Portugal e Brasil era inviável Mota (1986) menciona isso em seu livro também. “(...) a reação das elites brasileiras, que conseguem envolver em seu movimento o príncipe D.Pedro, que guardara no espírito os conceitos do pai - e proclamou a independência. Mas os problemas persistiam, em suas dimensões dinástica e política, e a possibilidade de reunir as coroas acaba paulatinamente por incompatibilizar o Príncipe com a nação recémcriada. (MOTA, 1986,p.8) REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 11 Textos Mota, assim como Viotti, descreve sobre a inviabilidade de uma suposta união entre Brasil e Portugal. A elite que vivia aqui no Brasil desejava um Brasil independente, mas não queriam a participação popular, havia o medo de uma revolta popular, o povo não poderia se unir, pois isso era visto como uma ameaça. A solução foi apoiar o príncipe e a ideia da independência, pois mesmo que o Brasil tivesse um imperador e o país tivesse nas mãos dele, D.Pedro estaria no poder, mas ao lado dos grandes fazendeiros. Era necessária a proclamação da independência o quanto antes, pois a revolta popular era iminente e ninguém desejava tal situação. Gomes em seu livro, “1822”, esclarece fatos importantes a respeito do desenrolar da independência. Mostra que não foi tão fácil como a historiografia muitas vezes mostra. Segundo ele a relação que existe hoje entre brasileiros e portugueses que hoje se encontram e conversam se dão bem, não foi sempre assim, “existiu um clima tenso de ódio e confronto entre esses dois povos no ano da independência do Brasil”. ( Gomes, 2010). (...) na semana do Fico, bandos de portugueses armados percorriam as ruas do Rio de Janeiro em atitude de desafio aos brasileiros que apoiavam a decisão do príncipe regente de contrariar as cortes de Lisboa e permanecer no Brasil (...). Um mito recorrente sobre a Independência do Brasil diz respeito ao caráter pacífico da ruptura com Portugal. Por essa visão, tudo teria se resumido a uma negociação entre o rei D.João VI e seu filho D.Pedro com algumas escaramuças isoladas e praticamente sem vítimas. É um erro. A guerra da independência foi longa e desgastante. Duraram 21 meses, entre Fevereiro de 1822 e novembro do ano seguinte. Nesse período milhares de pessoas perderam a vida em roças, morros, mares e rios em que se travou o conflito. O número de combatentes foi maior do que o das guerras de libertação da América espanhola na mesma época. Só na Bahia mais de 16.000 brasileiros e aproximadamente 5.000 portugueses trocaram tiros durante um ano e quatro meses. Não há estatísticas confiáveis a respeito do número de mortos, mas evidências indicam ter sido maior do que se imagina. No Piauí, entre duzentos e quatrocentos brasileiros tombaram em cinco horas de combate na trágica e simbólica Batalha do Jenipapo, ocorrida no dia 13 de março d 1823. Na Bahia, duzentas a trezentas pessoas morreram nas ruas de Salvador.Milhares de brasileiros e portugueses morreram em combate. A soma de números imprecisos com informações ainda mais vagas sobre enfrentamentos em outras regiões torna razoável supor que a guerra da independência 12 brasileira custou entre 2.000 e 3.000 vítimas (...) o Brasil ficou dividido, nem todos estados apoiavam a independência, como por exemplo Pará e Maranhão. A ruptura formal entre Brasil e Portugal aconteceu no começo de 1822, quando as cortes declararam D.Pedro e seus ministros rebeldes e começaram os preparativos militares para atacar a antiga colônia. Portugal se preparara para atacar o Brasil (...) ao tomar conhecimento de notícias tão alarmantes, os brasileiros se prepararam para a guerra. No dia 1 de agosto de 1822, D.Pedro e seu ministério declararam inimigas as tropas que fossem enviadas de Portugal para o Brasil. Lanchas e navios portugueses que por ventura fossem capturados deveriam ser afundados ou incendiados (...) (GOMES, 2000, p.164). O autor da obra “1822” deixa claro que a independência do Brasil não foi pacífica como muitos acreditam ser. Foi uma guerra sangrenta e milhares de vidas foram perdidas. O Brasil ficou dividido, uns estados apoiavam os brasileiros, outros, os portugueses. Pode-se perceber que os brasileiros não estavam unidos, não havia uma identidade. Destarte conclui-se que a independência do Brasil foi conquistada com muita luta e derramamento de sangue e está longe de ter sido pacífica. O Dia do “Fico” e a proclamação da independência Em 9 de Janeiro de 1822, o príncipe, aceitando a solicitação do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, decidiu-se a desobedecer às ordens de Lisboa e a permanecer no Brasil. “Não se tratava ainda de uma ruptura, pois o gesto de desobediência foi saldado com gritos de Viva as cortes, Viva a Religião, Viva a Constituição, Viva e l R e i C o n s t i t u c i o n a l , Vi v a o P r í n c i p e Constitucional...” ( Viotti, 1999). Tentava-se ainda manter aberta a possibilidade de se constituir uma monarquia dual com sede em Portugal e no Brasil ao mesmo tempo, visando manter o Brasil como Reino Unido a Portugal e também se procurava preservar a autonomia administrativa e comercial que tinham alcançado. (...) convergiam para o príncipe aspirações as mais contraditórias. Para os portugueses, ele representava a possibilidade de manter o Brasil unido a Portugal. Acreditavam eles que só a permanência do príncipe no Brasil poderia evitar um movimento separatista. Os brasileiros que almejavam a preservação das regalias obtidas e pretendiam a criação de uma monarquia dual REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Textos consideravam também essencial a permanência do príncipe. O mesmo pensavam os que almejavam a independência definitiva e total, mas temiam as agitações do povo. Para estes, o príncipe representava a possibilidade de realizar a independência sem alteração da ordem. A tensão entre colônia e metrópole agravou-se depois do “Fico”. O príncipe procurou apoio entre os homens de prestígio do país e de reconhecida fidelidade à monarquia. (VIOTTI, 1999, p.47) Após análise das ideias contidas no texto da autora, é possível concluir que, de certa forma, a figura de D. Pedro foi usada a benefício da elite, pois ela viu no imperador uma saída para evitar um movimento separatista e também temiam que o povo se reunisse e juntos alterassem a ordem, a agitação popular era algo que deveria ser evitado. Pode-se dizer que houve uma troca, D. Pedro procurou apoio da elite e a mesma preservou seus poderes, ele chegou até ser considerado defensor perpétuo do Brasil. Participação popular no movimento de independência Algumas bibliografias afirmam ter havido participação popular no processo de independência do Brasil, que o povo participou, outras negam totalmente. Na época da independência o Brasil não estava preparado para lutar contra Portugal: “pelos cálculos do historiador naval britânico Brian Vale, no começo de 1822 D. Pedro podia contar no máximo com oito navios de guerra confiáveis com um total de duzentos canhões, enquanto os portugueses tinham quatorze embarcações equipadas com pelo menos o dobro do armamento” (Gomes,2010). Gomes (2007) traz informações pertinentes a respeito da participação popular na luta contra os portugueses: (...) além de precisar de um número muito maior de navios, o Brasil enfrentava uma dificuldade adicional: faltavam oficiais e marinheiros para comandar e defender as embarcações. Nesta época, havia no Brasil cerca de 160 oficiais de marinha, quase todos portugueses vindos junto com a corte de D. João em 1808. Além de poucos, não eram confiáveis. Ninguém tinha certeza de como reagiriam se tivessem de enfrentar seus compatriotas numa batalha. (...) havia dificuldade nos mares, e estas se reproduziam em terra. O exército brasileiro herdara a estrutura das forças portuguesas da época da colônia, organizadas em corpos de primeira, segunda e terceira linhas. A primeira recebia soldo para permanecer no serviço ativo. As outras duas, eram forças de reserva e só eram convocadas em caso de emergência. Seus integrantes, na maioria brasileira, não recebiam soldo e geralmente faziam parte dos bandos de jagunços ou seguranças que os coronéis locais mantinham em suas fazendas. Estes eram mal treinados e ficavam dispersos pelo território, sem um comando unificado e seguro. Além disso, em todo Brasil predominava uma aversão generalizada ao serviço militar. Os soldados eram recrutados de forma arbitrária pelos coronéis e capitães do mato. Nas cidades de Vila Rica (atual Ouro Preto), Sabará e São João Del Rei, houve casos em que a população foi convocada para se reunir na praça central com a desculpa de que ali haveria uma cerimônia religiosa ou um comunicado importante. Ao se aproximar, no entanto, os rapazes eram surpreendidos pelos soldados da corte que os laçavam com cordas e os despachavam para o Rio de Janeiro. Os novos recrutas chegavam à capital acorrentados uns aos outros pelo pescoço e vigiados por guardas a cavalo. Alguns rebeldes também tinham os pés algemados. Viajavam dias seguidos sem comer. Em 1826, o Ceará ofereceu 3.000 recrutas ao imperador. Embarcados para o Rio de Janeiro no porão de um navio, 553 deles morreram de fome e sede durante a viagem. Nos quartéis a disciplina era bárbara. Os infratores e preguiçosos eram punidos com pauladas e chibatadas. O pavor do serviço militar entre a população pobre tão grande que muitos jovens se mutilavam para fugir do recrutamento. “Na prática, o recrutamento forçado atingia apenas as classes mais humildes e desprotegidas”, explicou o historiador militar gaúcho Juvêncio Saldanha Lemos. “Mas foram esses homens que, humilde e anonimamente, amparam a independência”. (GOMES, 2000, p.168) Destarte, chega-se a conclusão que no processo de independência houve participação popular sim, o povo humilde, a classe menos favorecida, participou da luta, todavia, compulsoriamente, vidas foram sacrificadas e o uso da violência esteve presente para forçar esse povo a lutar contra Portugal. Foi uma independência conquistada com muito sangue favorecendo não a classe dos que lutaram forçadamente, mas sim, uma elite. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 13 Textos Debret, JeanBaptiste. ‘‘ Um jantar brasileiro’’, 1827. A elite no poder e do poder... Não cuidavam senão em diminuir o poder do rei, aumentando o próprio, não pensando de modo Durante o processo de independência havia os algum nas classes inferiores. (VIOTTI, 1999, radicais e os conservadores, cada um com suas p.55) ideias; após a independência a diferença entre eles se acentuou. José Bonifácio, que era maçom, fazia O Brasil tornou-se independente, mas o poder parte da sociedade secreta que reunia figuras de ficou nas mãos da elite, D.Pedro estava lá, mas o projeção e relevo da sociedade. Nessa sociedade poder era dividido entre seus membros e povo não havia um juramento que os unia. Eles procuravam participava, estava à margem de tudo o que se integridade, independência e felicidade do Brasil passava dentro do governo. como império Constitucional. A partir da “Entre o arcabouço jurídico que liberal importado independência Bonifácio procurou colocar em da Europa, sobre o qual se ergueu o Estado prática esse princípio. Na loja “Grande Oriente” independente, e a prática social haveria uma outro grupo dos maçons liderado por Ledo Januário enorme distância, facilmente observada pelos da Cunha Barbosa Alves Branco assumiu o controle viajantes estrangeiros que percorriam o Brasil” (Viotti, 1999). da situação e fez de D.Pedro grão-mestre. (...) o governo da nação ficava nas mãos de um Estes viajantes espantavam-se diante da falta de grupo de elite: fazendeiros, comerciantes, pessoas correspondência entre a legislação e a realidade que ocupavam altos postos na administração e no que a desrespeitava a cada passo. governo, muitos dos quais foram mais tarde (...) a constituição afirmava a igualdade de todos titulados por serviços prestados por ocasião da perante a lei, bem como a garantia de liberdade independência. (...) em sua maioria, eram homens individual. A maioria da população, no entanto, de mais de cinquenta anos. Uns poucos eram permanecia escravizada, não se definindo em portugueses de origem. A maioria realizara seus termos jurídicos como cidadãos. A Constituição estudos na metrópole. Ligavam-se frequentemente garantia o direito de propriedade, mas 19\20 da por laços de família. Muitos tinham ocupado população rural que não se enquadrava na posições na qualidade de funcionários da coroa, e categoria de escravos eram compostos de depois da independência ocupavam vários postos “moradores” vivendo em terras alheias, sem de importância política e administrativa. nenhum direito a ela. A Constituição assegurava a Constituíram uma verdadeira oligarquia fazendo liberdade de pensamento e expressão, mas não parte do Conselho de Estado, Senado, Câmara dos foram raros os que pagaram com a vida o uso deputados, exercendo funções de presidentes de desse direito, que, teoricamente, lhes era garantido pela Constituição. província e de ministros de Estado. 14 REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Textos . A lei garantia a segurança individual, mas por alguns poucos mil réis podia-se mandar matar, impunemente, um desafeto. A independência da justiça era, teoricamente, assegurada pela Constituição, mas tanto a justiça quanto a administração transformaram-se num instrumento dos grandes proprietários. Aboliram-se as torturas, mas nas senzalas continuava-se a usar os troncos, os anginhos, os açoites, as gargalheiras, e o senhor decidia da vida e da morte dos seus escravos (...) A elite de letrados, falando em nome das categorias socialmente dominantes, seria a porta-voz de uma ideologia liberal que mascarava as contradições do sistema. (...) com a independência, haviam atingido o objetivo fundamental a que se propunham: libertar o país das restrições impostas pelo Estatuto Colonial, assegurar a liberdade de comércio e garantir autonomia administrativa. A organização do país independente refletiria os anseios desses grupos sociais que assumiriam o poder no Primeiro Império. Ficaram excluídas do poder as camadas populares, uma vez que escravos e índios foram excluídos do conceito de cidadão, tendo-se adotado ainda um sistema de eleição indireta, recrutando-se os votantes segundo critérios censitários. A concentração do poder nas mãos dessa minoria que disputaria ao imperador o privilégio de dirigir a nação, levando à abdicação em 1831. (...) “o povo nada ganhou absolutamente com a mudança operada”. Comparando o que estava acontecendo no Brasil com o que se passara na França, por ocasião da Revolução Francesa, comentava: “A maioria dos franceses lucrou com a Revolução que suprimiu privilégios e direitos auferidos por uma casta favorecida (...)”. (...) A emancipação política pelas categorias dominantes interessadas em assegurar a preservação da ordem estabelecida, e cujo único objetivo era combater o Sistema Colonial no que ele representava de restrição à liberdade de comércio e de autonomia administrativa, não ultrapassaria os limites definidos por aqueles grupos. A ordem econômica tradicional seria preservada, a escravidão mantida. A nação independente continuaria na dependência de uma estrutura colonial de produção, passa A fachada liberal construída pela elite europeizada ocultava a miséria, a escravidão em que vivia a maioria dos habitantes do país. Conquistar a emancipação definitiva e real da nação, ampliar o significado dos princípios constitucionais foram tarefa relegada aos pósteros. (VIOTTI, 1999, p.59) O recém-país independente possuía agora uma Constituição, no Brasil a conjuntura permanecia a mesma. Como na época em que a escravidão foi abolida e que o Brasil enganou os ingleses, fingindo cumprir o decreto, mas realidade continuando com o tráfico. “O Brasil para inglês ver” sempre existiu. E na independência foi o que aconteceu! A lei estava somente no papel. A constituição existia, mas tudo continuava como antes. A Independência não foi para os pobres e sim para uma elite que soube levar vantagem. Outra questão relevante é o fato de falarem da independência como se ela tivesse sido plena: alguns livros didáticos tratam essa questão dessa forma, como se o Brasil tivesse ficado totalmente independente. A Historiografia desbanca essa ideia. Debret, JeanBaptiste Comboio de café rumo à cidade. 1826 continua na próxima edição REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 09 - 15 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 15 Artur Esteves [email protected] Um Breve Ensaio sobre a Intolerância Religiosa Através da História Dubois, François. ‘‘O Massacre no Dia de São Bartolomeu’’, 1576. N estes últimos anos temos visto bastante casos de intolerância religiosa, seja no Brasil ou no resto do mundo, muitas vezes levando seus contendores a lutarem até a morte para fazerem prevalecer seus pontos de vista e ideologias. Todavia, a intolerância religiosa existe desde as primeiras civilizações. Um dos exemplos mais conhecidos são as cruzadas, movimento este que foi incentivado pelo papado no intento de se livrar do excesso de pessoas que haviam na Europa daquela época, principalmente os que eram detentores de poucas posses ou nenhuma. . Foi prometido o perdão de todos os pecados para os que fossem a Terra Santa (hoje em dia Israel, Palestina, Síria e Líbano) combater os “infiéis”, diga-se de passagem, os muçulmanos. Os europeus venceram as primeiras cruzadas, instalando nos antigos territórios muçulmanos o terror e a intolerância religiosa. Na conquista de Jerusalém foram assassinados milhares de judeus, muçulmanos e até mesmo cristãos pereceram pela fé e pela espada. 16 Outro episódio de intolerância religiosa foi o massacre de São Bartolomeu na França em 1572 onde morreram aproximadamente 3000 protestantes. Poderia citar muitos outros casos mais. Porém falarei do Brasil. Nosso país foi formado por diversas culturas, sendo as influências africanas muito fortes o que atraiu muitos pesquisadores de outros países, como o francês Roger Bastide, o qual estudou as religiões africanas com destaque para o candomblé. Outros que sobremodo estudaram a cultura afro-brasileira foram o folclorista Edison Carneiro, Luís da Câmara Cascudo e o historiador Joel Rufino dos Santos (recentemente falecido). Rufino, além de ter sido estudioso da temática, escreveu vários livros sobre a cultura afro-brasileira, além de ter sido um fervoroso militante pela causa negra no Brasil, o que lhe acarretou perseguição durante a ditadura militar. As religiões de matrizes africanas são umas das mais perseguidas no Brasil, talvez pelo fato das pessoas não compreenderem os alicerces daquelas; e o que a mídia passa em sua maioria reforça o senso comum que diz que são religiões animistas, fetichistas. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 16 - 17 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 Textos Artur Esteves é Professor e Historiador Textos Até o período Vargas havia leis proibindo suas práticas e as invasões de terreiros e espancamentos de adeptos eram comuns, sendo aceitos pela sociedade da época que via nessas religiões a subversão a ordem social estabelecida e ao status quo. Para evitar as perseguições, uma das estratégias adotadas foi o registro desses templos como entidades filantrópicas, beneficentes, além de se valerem de alguns preceitos do Kardecismo no intento de dar uma cientificidade aos cultos e rituais. Após a Segunda Guerra Mundial, os terreiros de umbanda e de candomblé tiveram grande crescimento, sendo sua prática não mais considerada como um crime pelo código penal. Hoje em dia, mesmo com tantos avanços sociais, políticos e econômicos, ainda existem perseguições as religiões de matrizes africanas e seus praticantes. Mesmo a intolerância religiosa ser crime de acordo com a constituição, dificilmente alguém vai preso ou é processado por este tipo de ato. Atualmente o ensino de história da África é obrigatório nas escolas, o que muitas vezes não é cumprido, visto alguns educadores professarem algum credo que é contra as religiões de origem africana. Nos últimos anos vários movimentos em prol da tolerância religiosa têm sido realizados na intenção de quebrar tabus e pré-conceitos sobre as já citadas religiões. Ainda há um longo caminho pela frente e só o tempo mostrará erros e acertos pelas sendas da história. Imagem: Édouard Debat-Ponsan (18471913) - Certa Manhã à Porta do Louvre óleo sobre tela -1880. REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • PP. 16 - 17 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 17 Artur Esteves [email protected] Textos Artur Esteves é Professor e Historiador N a obra Segredos, Mentiras e Democracia, o filósofo Noam Chomsky discorre acerca de vários temas, como democracia por exemplo. Este livro é resultado de uma série de entrevistas feitas pelo jornalista David Barsamian nos anos de 1993 e 1994, onde Chomsky fala sobre suas concepções de política, das transformações passadas pela sociedade após a Segunda Guerra Mundial, mostrando que no que tange à política, no caso a política interna e externa norte americana, esta deve ser analisada com olhar crítico, pois o que a mídia passa a respeito muitas vezes não passa de mentiras, sendo o termo “democracia” bastante questionado pelo autor. Será que vivemos em uma democracia? Segredos, Mentiras e Democracia Autor: Noam Chomsky Editora: Universidade de Brasília Ano: 1999 N este filme Van Damme faz o papel do lutador de boxe Alain Lefevre que após uma luta na qual havia sido obrigado pela máfia da cidade de Marselha a perder a luta, o mesmo contraria a vontade da organização criminosa, o que acaba lhe acarretando perseguição por parte desta. Para fugir Lefevre se alista na Legião Estrangeira, organização criada na França no intuito de ser um braço do exército francês na manutenção e conquista de novas colônias, principalmente no norte da África. Ao chegar à África é enviado para um dos fortes mais perigosos juntamente com outros homens que assim como ele se alistaram para fugir de algo ou alguém. Normalmente a Legião era composta de homens de diversas partes do mundo e alguns também da França, os quais na maior parte das vezes morriam, seja nos combates contra as populações locais que procuram resistir ao invasor europeu, ou então de fome; e sobretudo nas marchas pelos escaldantes desertos. 18 REVISTA DE HISTÓRIA AMNÉSIA • TERESÓPOLIS • N. 35 • P. 18 • NOVEMBRO & DEZEMBRO 2015 O Legionário Ano: 1998 Diretor: Peter MacDonald Elenco: Jean Claude Van Damme e outros Duração: 1h e 39 minutos