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MATILDE CARONE SLAIBI CONTI HELENA - Memórias - HOMENAGEM no seu centenário Niterói 2010 Para seus netos Carlos Eduardo, Ricardo Augusto, Rodrigo Otávio, Lenise, Themis Alexandra, Carlos, Poliana, Nathalia Cristina, Endrich, Mariana, Ana Beatriz, Elton Para seus bisnetos Thiago, Natália, Leandro, Lucas, Carolina, Maria Victória, João Maurício, Luiza, Henrique e, naturalmente, Maria Cristina Barros Gutierrez Slaibi Nagib Slaibi Filho José França Conti Niterói 2010 A Thiago, Primeiro bisneto de Helena, que me acompanhou na feitura desta obra com carinho, interesse e dedicação. EPÍGRAFE Ponha sua mão na minha e não haverá mais nada fora do lugar. (Autor desconhecido.) 5 AGRADECIMENTO Para Nice Soldati, amiga de todo o sempre, que supera a deficiência visual, digna e prestimosa. SUMÁRIO PRIMEIRAS PALAVRAS ...................................................................... 9 1. A HISTÓRIA DE HELENA ................................................................ 11 2. O BATIZADO ..................................................................................... 13 3. A CIDADE NATAL ............................................................................ 15 4. MOCIDADE DE HELENA ................................................................. 17 5. HISTÓRIA DE AMOR ........................................................................ 20 6. NAGIB SLAIBI ................................................................................... 23 7. O CASAMENTO ................................................................................. 28 8. A VIDA QUE SEGUE ......................................................................... 32 9. A MORTE DE HELENA .................................................................... 34 PALAVRAS FINAIS ............................................................................... 37 ANEXOS .................................................................................................. 39 1. POESIAS .............................................................................................. 40 2. ESCRITOS DE HELENA ................................................................... 46 3. DESENHOS DE HELENA ................................................................. 52 4. DEPOIMENTOS .................................................................................. 54 5. HELENA (valsa) ................................................................................ 10 PALAVRAS INICIAIS O ano de 2010 é pródigo na comemoração de centenários. Entre eles, incluiu-se o centenário de minha mãe, Helena Carone Slaibi. Podemos afirmar que o memorialismo é manifestação do sentimento, em que o escritor elabora os fatos colhidos, recolhidos e constituídos por suas reminiscências, segundo critério subjetivo, porque toda lembrança é subjetiva e não pode ser apropriada por outrem. Nenhum esforço é preciso para evidenciar que a memória é uma forma de mergulho interior, captando fatos, pensamentos, criando personagens, extravasando sentimentos e estados de alma. Ainda na seara da memória, ela é notadamente paixão à verdade. Ela une passado, presente, futuro, função prospectiva e projetiva, criando mitos identitários, recriando esperanças, perspectivas e expectativas. A memória, pode-se dizer, apresenta-se então como um jogo da trama social, eivadas de subjetivações, de escalas morais e de seletividade. 11 O exercício da memória, no seio da trama social, revela as experiências históricas, aqui entendidas como vivências, e as expectativas de futuro. Portanto, a memória não está alheia às representações individuais nem coletivas. Posto isto, em relevo, ela está balizada pela posição do memorialista no evento em si e pelas suas representações sociais, culturais e religiosas. A memória é um campo de observação transdisciplinar e, apesar de sua relação com o passado, ela atua no presente, na esfera daquilo que se lembra ou se quer lembrar. Os literários afirmam que, ao contrário do que parece, não é muito fácil estabelecer um divisor, do que seja na realidade memória e literatura, pois todas as artes literárias, na realidade, gozam de atributos semelhantes. Não há como separar, de todo, o homem da sua obra. E isto já se vê nas pegadas que deixamos na praia... A obra a ser apresentada é, assim como eu mesma, apenas um reflexo do criador. Fico grata por esta oportunidade e grata também a Deus por me ter colocado nos caminhos de Helena e de Nagib. 1. A HISTÓRIA DE HELENA Corria o ano de 1910, eram tempos da Primeira República. Ano este em que se elegeria presidente do Brasil, Hermes da Fonseca, eleição esta em que se trouxe à luz a fragilidade da aliança política entre São Paulo e Minas Gerais, na denominada política café com leite. Hermes da Fonseca foi casado ainda na presidência com Nair de Tefé. A política do Café com Leite consistiu em uma preponderância de uma ou duas forças políticas, mas estas não são suficientes para contar toda a história, deixando algumas lacunas que devem ser mais bem exploradas, além do que, ao longo da história, temos a emergência de algumas divergências e um grande desacerto final, que culminou com a Revolução de 1930. Contudo, no dia em que Helena nasceu, 16 de abril, um dia outonal, demasiadamente fecundo, entrava no quarto, através das frestas da persiana, do casarão alto e imponente, um cântico gregoriano, vindo da igreja matriz situada ao lado. Era um canto muito harmônico e até mesmo angelical. Talvez, adveio daí sua inclinação para a música e em especial para o violino, instrumento musical que ela mais amou. Helena entrou apressada no mundo. Era prematura, magra, pequenininha, com uma carinha redondinha. Tinha os cabelos escuros e lisos 13 como sua mãe, Matilde Nonato Pinheiro, e não chorou, mas só olhou em volta com muita curiosidade e admiração. Eu vou nascendo um pouco a cada dia. Ouvindo de manhã, a passarada cantando, alegre, em doce revoada, numa eclosão de amor que contagia. Então, todos que naquele momento estavam presentes, observaram a cor de seus olhos: cor de âmbar, isto é, amarelos esverdeados, que se tornaram, durante sua longa vida, verdadeiras estrelas cadentes em noites fulgurantes; olhar igualzinho ao de seu pai, João Carone, e seu irmão Jorge, o primogênito da família. Ao todo foram sete irmãos: Jorge, Abrahão, Abdalla, Helena, Sofia, Agia e João, o mais novo de todos. Muitos anos depois, Jorge tornou-se advogado e casou-se com Ducília, que era do Rio de Janeiro; Abrahão, que era médico, morreu jovem ainda; Abdalla formou-se em Farmácia, vindo a casar-se com Judith. Das suas duas irmãs, Sofia casou-se com Fuád, professor e advogado, e Agia com Antonio, que era construtor; João, advogado, fez concurso para juiz de Direito, casando-se com Aurea, uma moça da vizinha cidade de Ubá. João Carone sentia grande orgulho de seus filhos, pois todos conseguiram seu diploma: havia advogados, médico e farmacêutico, sendo que as moças eram todas professoras. 2. O BATIZADO Helena logo foi batizada. Temia-se que a menina morresse do mal dos sete dias e fosse direto para o limbo, conforme pensavam na época, e não para o céu, para onde vão os inocentinhos, em seus caixãozinhos azuis, quando morriam e já tivessem sido batizados pelo pároco do local. Mas sua proteção foi muito grande desde o dia do seu nascimento, ela nunca mais ficou sozinha, conforme a pureza dos anjos que a acompanharam, durante toda a sua vida. A camisola do batismo era branca, feita pelas mãos prendadas de sua mãe, toda de Ponto Paris, da forma que nem se usa mais, bordada e rebordada com muitos babados e entrelaçada com fitas de cetim e veludo. Na cabeça, uma touca, e nos pezinhos um minúsculo sapatinho de crochê parecendo de boneca. Seu nome, Helena, foi uma homenagem a sua avó paterna, nascida em Istambul e que veio a falecer muito jovem, em um desastre de carruagem no Líbano, juntamente com o seu filho menor, conforme sempre contava seu pai, com os olhos umedecidos pelas lágrimas da saudade e de fatos ocorridos em uma terra tão distante. João Carone, como tantos outros imigrantes, nunca mais voltou a sua terra natal. 15 Apesar de todos os receios, porque na época havia poucas vacinas e nenhum antibiótico, Helena cresceu, como crescem todas as menininhas, cheia de graça e encantos mil, alegre, radiante e buliçosa. Mesmo porque, em Guiricema, a vacinação contra a febre amarela, apregoada pelo médico sanitarista Oswaldo Cruz, nem sequer chegou. Ainda mais porque a população do Rio de Janeiro, no princípio do século, lá pelo ano de 1904, tinha se insurgido contra as autoridades sanitárias, provocando uma insurreição que ficou conhecida como A Revolta da Vacina. Merece alusão aqui, pois, no batizado de Helena, o dia mostrava-se claro e o vento outonal começava a soprar pela terra, flamejando, com um resquício do calor do verão, antes de mergulhar na estação invernal. 3. A CIDADE NATAL No início do século XIX, José de Lucas Pereira dos Santos, desbravador português, com título militar de Furriel, visitando essa região, deliberou nela instalar-se com seus familiares e escravos, tal a fertilidade do solo. Mais tarde, construiu uma capela que serviu de marco inicial do povoado. O cenário da cidade natal de Helena, Guiricema, situada na Zona da Mata de Minas Gerais, era uma localidade quase rural. Poucas ruas e travessas, algumas vielas, nenhum calçamento, um amontoado de pequenas casas, carroças, carros de boi, parelhas de burros e verde, muito verde ao redor, pois a terra era boa para a plantação e a lavoura. Guiricema, cujo nome é de origem indígena, significando, subida de Bagres, foi a terra dos índios Coroados e Puri, fazendo hoje parte do importante pólo moveleiro, cuja data comemorativa é 15 de agosto, muito importante na região. Toda a cidade se encontra sob a proteção da padroeira Nossa Senhora da Encarnação, em cuja igreja, da sua casa paroquial, se encontram hoje os móveis antigos de estilo manuelino, doados por sua irmã Agia Carone Martins. Eu era igual a toda meninada Quanta travessura que eu fazia Jogos de botões sobre a calçada 17 Eu era feliz e não sabia Aos domingos havia missa na matriz. E, ainda hoje, a bela construção da igreja debruça-se sobre a Praça Luis Coutinho, assim denominada numa justa homenagem ao Coronel que foi seu primeiro prefeito, empossado em 12 de fevereiro de 1939, pois o Município havia se emancipado administrativamente em dezembro de 1938. Guiricema tem se desenvolvido bastante. Lá, existe um lugar denominado Santa Montanha, aonde é um povoado extremamente religioso, seguindo o catolicismo, onde há um convento, e a primeira missa de cada mês é realizada em Latim, de costa para o público, exatamente como antes do Concílio Vaticano II. Toalhas de renda tecem o passado distante que se foi... entrelaçam recordações de jasmins, dálias, rosas e o perfume da vida no casarão que acabou, não existe mais. E Helena nem podia imaginar que, em um futuro muito distante, aquele casarão se transformaria, para ser o prédio do ginásio de que a cidade tanto necessitava. O vento, os bem-te-vis, canários e sanhaços afloram o êxtase de um tempo distante. Memórias e histórias se cruzam e se entrelaçam. Vale a pena rememorar que Nossa Senhora da Encarnação ficava a contemplar a cidade, enquanto as bençãos do Senhor enchiam de graça a vida de Helena. 18 4. A MOCIDADE DE HELENA Alegre, cheia de graça, rodeada de parentes e amigos, com os folguedos próprios da infância e da adolescência, assim Helena tornou-se mocinha. Eu fui no Itororó Beber água não achei Achei bela morena Que no Itororó deixei .................................... Ó menina linda Ó menina linda Ficarás na roda Ficarás sozinha As crianças eram felizes. Muitas vezes, em dias de sol maravilhoso, Helena e suas irmãs iam cantarolando, acompanhando sua mãe, que ia fazer visitas, lá pelos lados da Taboa. Helena, como era de costume, levava uma bandeja com quitutes, para os amigos, como sempre mandou a cortesia. Era tudo uma alegria só. Muito bolo de laranja, brevidades, broa de fubá e de aipim, em grande quantidade. Tudo coberto com toalhinhas de linho, bordado a máquina de manivela, com lindos modelos de flores, pássaros e borboletas, que somente sua mãe sabia fazer. Helena adorava ouvir e inventar histórias, brincar com o jogo da amarelinha, a peteca, as cantigas de roda, como também bonecas, muitas bonecas ou bruxinhas de pano feitas pelas tias Lulú e Bebé, que haviam 19 chegado da Bahia, lá de Santo Amaro da Purificação. Cidade esta, hoje tão famosa, por ser a terra de Caetano Veloso e Maria Betânia. Suas tias eram viúvas. Elas vieram fazer companhia a mãe de Helena, trazendo pelas mãos duas crianças: os priminhos Pedro e Lamartine. Honra, virtude e bons costumes, princípios tão caros aos mineiros, Helena aprendeu em casa, pois a casa de João Carone vivia sob o esteio da ética e da moral. Seus estudos foram iniciados com os professores da sua cidade natal. Mas um dia, já mocinha, tomou o trem que passava em Visconde do Rio Branco e foi levada pelas mãos de seu pai, até a cidade vizinha de Ponte Nova. Nenhum outro meio de transporte ilustrou tão bem o desejo de expansão do que o trem de ferro. As ferrovias atravessavam montanhas, túneis e pontes suspensas no ar, avançando sempre sob as paisagens. As chamadas mariasfumaça não mediam esforços para ampliar seu território, levando de um lado a outro pessoas, mercadorias e um novo estilo de vida. A fumaça e o vapor fizeram parte do século XIX e início do século XX. Centenas de milhões de toneladas de carvão vegetal e mineral foram queimados para por as máquinas em movimento em todo o mundo. Na época, nem se pensava ainda em “desenvolvimento sustentável”. Florestas eram depredadas, o solo explorado e grandes quantidades de dióxido de carbono jogados no ar sem a ameaça do aquecimento global ou preocupações com a camada de ozônio, pois ainda não se tinha a noção das consequências do progresso indiscriminado. 20 Estudou no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora, pertencente às Irmãs Salesianas, onde conseguiu seu diploma de professora. Apesar dos exames exaustivos e da rigidez de um colégio católico muito austero, Helena sempre foi uma aluna educada e disciplinada, recebendo assim muitas medalhas e incentivo das bondosas freiras. Apesar do tradicionalismo da Igreja, foi inegavelmente um bom curso. Amava as tarefas escolares e gostava das aulas de religião, português e literatura. Fazia trova e poesias. (...) Minhas poesias não tem rima, vem do meu olhar sobre os fatos, o tempo, a natureza e a vida. Minha poesia é a morada do meu ser, Como uma estrela distante recondita, perdida nas matrizes da constelação poética. Minha poesia não tem rima e me inspira, e te inspira. Helena nos legou também vários escritos, trabalhos manuais e lindos álbuns de desenhos enriquecidos artisticamente, como só se fazia nos tempos de antigamente. 5. HISTÓRIA DE AMOR O calendário corria, chegando o ano de 1928. Acontecia o décimo período do governo republicano sob a presidência de Washington Luis Pereira de Sousa, macaense de nascimento e que anos depois veio a ser deposto pelo movimento revolucionário. Mais tarde, em 1930, chega ao poder Getúlio Vargas, que havia sido ministro do presidente deposto. Com a ascensão de Getúlio Vargas, passou-se a valorizar determinados elementos da nacionalidade em sintonia com a conjuntura política da época: os desfiles cívicos; as homenagens à bandeira; as festividades pelo dia do trabalho; o dia da raça; o dia da pátria; o aniversário do presidente Vargas; fatores que também compuseram aquele cenário nacionalista. Para Helena, este ano foi de grande importância. Ela conseguiu seu diploma de professora. Foi somente em 1931 que o Ministro Francisco Campos instituiu a Reforma do Ensino. 22 “Esta mulher amável, carinhosa, que traz no rosto plácida ternura, é a professora amiga, fervorosa, sempre bondosa e meiga criatura.” É a primeira professora formada de sua cidade natal, tendo sido até mesmo indicada para vir a ser diretora do Grupo Escolar existente naquela época, em Guiricema, sendo que este primeiro Grupo Escolar foi criado em 1927. Helena moça viveu numa época mística: do amor romântico, das palavras não ditas substituídas por um olhar, dum roçar de mãos, talvez um rubor ou mesmo um silêncio prenunciando um grande amor. Era o tempo de Belle Époque, das coquetes e melindrosas, onde as moças casadoiras sonhavam então com um grande amor. Em seus devaneios pensavam que o príncipe encantado chegaria em um cavalo branco, alado, e as arrebatariam para todo o sempre, para as terras da eterna paixão e do encantamento. A Belle Époque foi construída sobre o glamour de uma sociedade burguesa, cujo maior modelo de inspiração foi Paris, denominada a Cidade Luz. Na realidade, o princípio do século passado foi cheio de estereótipos, que permaneceram, chegando até nós, merecendo sim uma releitura melhor. O amor é algo estranho e muito mágico. E um dia, sempre tem um dia, o amor chegou também para Helena. 23 Vestida de azul e branco Trazendo um sorriso franco E um rostinho encantador Então a linda normalista rapidamente conquistou o coração que estava fechado dentro do peito, muito guardado, daquele por quem também se enamorou. 6. NAGIB SLAIBI O seu príncipe encantado veio personificado na figura de um grande e dileto amigo de seu pai, João Carone. Encontraram-se durante um carnaval. A alegria era geral. Havia muita música, serpentinas e confete. Foi no tempo em que as modinhas e canções falavam do amor romântico. (...) Helena, Helena vem me consolar... Mesmo baixinho o teu nome eu chamava. Helena dos meus encantos Vem me fazer um carinho... O dia já vem raiando, e a minha Helena Não vem. Por que será? Nagib Slaibi não veio montado em um cavalo árabe, mas veio também de muito longe, de um país longínquo, situado no Oriente Médio. Veio do Líbano, país encantado, das mil e uma noites, das histórias de Sherazade. 25 Líbano significa terra do mel e do leite, das montanhas cobertas de neve eternamente. Ponte entre o Ocidente e o Oriente. Líbano, país nascido dos fenícios. Foi berço do alfabeto. Foram os introdutores do uso da moeda e da navegação, de riquíssima literatura e extraordinário prestígio no campo da arte, da Filosofia, do Direito sendo patrimônio cultural da humanidade. O então menino fez seus estudos em árabe e francês na denominada Escola da Sabedoria, dirigida por bispos católicos maronitas, de longa tradição, no Oriente Médio. Nagib Slaibi veio adolescente de sua terra natal. Saiu de Beirute através do Porto de Marselha, na França, e de Dakar na África, chegando ao Brasil, na cidade do Rio de Janeiro no ano de 1912. Durante toda a viagem se fez acompanhar pelo casal Abílio Aad, que havia se casado no Líbano. Conta-nos a história que esta foi a época das grandes imigrações. Aqui chegaram italianos, espanhóis, japoneses e árabes, muitos com incentivo do próprio governo. Aqui já trabalhava seu irmão, Youssef, vindo também o Said, o Chicrala e, depois, sua irmã Haifa, todos esperançosos com a terra da promissão e da liberdade. Chegaram, lutaram e venceram. Essa emigração livre, espontânea, sem intervenção de agenciadores ou contratos feitos pelo governo brasileiro, foi a responsável pela chegada 26 de um enorme contingente de italianos, portugueses, espanhóis, sírios e libaneses, judeus, franceses. Os grupos mais numerosos, sem dúvida, foram, respectivamente, os portugueses, italianos, espanhóis e libaneses. Os estrangeiros deixaram suas marcas na sociedade brasileira não só caminhando conjuntamente com o crescimento e modernização das principais cidades, como contribuindo para essa modernização. A miscigenação racial e cultural brasileira, certamente, tem muito a ver com a chegada desses povos. Entretanto, se as diferenças de língua e estilo de vida dificultavam a rápida adaptação dos imigrantes, a expansão do sistema capitalista em direção à periferia do Ocidente garantia-lhes uma identidade comum com a cultura na qual logo estariam inseridos. Nagib Slaibi foi comerciante, fazendeiro e químico industrial da usina de açúcar São João, então existente na cidade, e o primeiro presidente da Associação Comercial e co-fundador da extinta Associação Beneficente Libanesa. Aqui se naturalizou, tornando-se Riobranquense, e a bandeira de Minas Gerais, com o seu dístico de liberdade, igualdade e fraternidade, embalou o seu coração. Tinha estatura mediana, pele clara, cabelos lisos, mas seus olhos eram dotados de grande gentileza e simpatia. 27 Hoje seu nome é nome de rua, importante porta de entrada da cidade de Visconde de Rio Branco, mais precisamente no trevo entre Ubá, Guiricema, São Geraldo. Aí, encontramos em destaque um monumento em sua homenagem, constando a seguinte inscrição: Rua Nagib Slaibi – Riobranquense por opção. Como ensina Cléber Lima: “Ser Rio-branquense não é apenas privilégio de nesta terra ter nascido, mas a consciência de assumir este estado de espírito”. Sua vida transitou entre o Cedro do Líbano e o Angico: “O cedro é o símbolo nacional de seu país, sendo uma árvore de copa frondosa e raízes profundas, cuja madeira levou os barcos fenícios além-mar e à descoberta dos novos mundos, pois foram eles grandes navegadores”. Estas palavras foram pronunciadas por seu filho, Nagib Slaibi Filho, por ocasião da inauguração do monumento em homenagem a seu pai. A História nos conta que a cadeira do imperador Pedro II foi feita de Cedro, oferecida pelos libaneses que aqui já estavam. O angico ao qual se refere o orador no seu discurso, por sua vez, é árvore portentosa, acolhedora, nativa da América, encontrado nas regiões montanhosas, como nas belas montanhas de Minas Gerais. 28 Com o Cedro do Líbano que ficou na saudade, Nagib fez a opção pelo Brasil, representado pelo Angico e sob cuja dimensão optou por viver o restante de sua existência. “Ser Riobranquense é viver o presente, cultuando o passado, resgatando sua memória e acreditando no futuro.” Na antiga fazenda Santa Matilde, de sua propriedade, está ainda hoje o antigo Angico, que, com seus galhos frondosos, o abrigava nas suas viagens para Guiricema. Entre os produtos da sua fazenda, estava a festejada aguardente Preferida de Rio Branco, que tantos prêmios obteve nas exposições agropecuárias. Tinha espírito progressista e sempre se interessou pela política, tendo integrado o Partido Republicano, levado que foi pelas mãos de Artur Bernardes. Participou sempre intensamente da vida riobranquense, sendo muito amigo daquele que viria a se tornar seu cunhado, Jorge Carone, e que se elegeu, na década de quarenta, prefeito de Visconde do Rio Branco e mais tarde seu filho, Jorge Carone Filho, seguiu o mesmo caminho. Foi na bela mansão dos Carone que Nagib e Helena vieram a se casar, como também suas duas irmãs, Sofia e Agia. 29 7. O CASAMENTO Em nenhum outro momento da história ocidental, apostou-se tanto e com tantos meios na comunicação de massa. Pode-se dizer que o período foi pródigo na criação de apelos visuais cada vez mais chamativos, capazes de expor, para os transeuntes mais distraídos, os produtos e os espetáculos feitos na medida exata do conforto e do deleite burgueses. Os cartazes publicitários começavam a ser habituais na paisagem das cidades, mostrando belas dançarinas e divulgando a última novidade em luvas, bengalas e cartolas. Também houve uma constante preocupação de tornar a arte objeto de consumo cotidiano, adequando as formas estéticas tanto à arquitetura externa dos prédios como aos objetos do dia-a-dia, tornando-os agradáveis e úteis. Movimentos artísticos, como o estilo decorativo da art nouveau adornavam a vida burguesa, aliando os processos de produção industrial com a confecção de utensílios domésticos. Porém, nenhuma destas iniciativas foi tão impactante como a invenção do cinema, criado em 1895, pelos irmãos Lumière. O cinema pode ser considerado a arte-síntese do período. Criado a partir das inúmeras pesquisas científicas no ramo da ótica, da química e da fisiologia, resultou em um produto cultural extremamente poderoso para 30 exprimir as transformações que vinham ocorrendo no mundo. Numa época em que a velocidade com que a locomotiva atravessava continentes e com que o telégrafo fazia circular a informação, o cinematógrafo captava imagens em movimento, algo impensável com a pintura e a fotografia, mostrando a ação acontecendo no tempo. Sem papel dentro de um projeto de cultura de massa também foi crucial, sendo um dos pilares principais do que seria futuramente chamado de indústria cultural. Nos Estados Unidos, desde o início do século XX, os pequenos empresários do ramo do entretenimento vinham apostando no cinema como arte popular, promovendo sessões a preços baratos, chamando a atenção dos frequentadores de circo, vauevilles e teatro de variedades. 30 de abril de 1941. Naquele dia, todos os cinemas anunciavam o filme com o maior número de indicações ao Oscar, E o vento levou... Ficou famosa em Hollywood a disputa das atrizes pelo papel de Scarlet O´Hara, que foi conseguido pela atriz inglesa Vivien Leigh, casada com o ator Sir Laurence Olivier. O ator principal foi Clark Gable, que atuou como Rhett Butler no filme que se tornou um clássico, adaptado do livro homônimo, da autoria de Margaret Mitchell. 31 Contudo, não se pode deixar de assinalar que, do outro lado do Atlântico, uma grande guerra acontecia, a Segunda Guerra Mundial, que tinha se iniciado em 1939, com a invasão da Polônia pela Alemanha. Mas, para Helena, 30 de abril de 1941 foi um dia de transcendental importância em sua vida, era o dia de seu casamento. Aquele dia, para sempre foi diferente de todos os outros. Era uma manhã tão bonita que a vida parecia uma nova canção, embrulhada numa nuvem cor de rosa. Mais uma vez vesti o meu vestido mais bonito, Soltei os meus cabelos, refiz o meu sorriso e você notou. Mais uma vez Me fiz presença (...) Quando Helena surgiu toda de branco, linda muito linda, seu longo véu caía em cascata, todo enfeitado com miçangas, vidrilhos e muitos cristais. Os cristais faziam a luz se decompor, não em sete cores como o do arco-íris, mas em infinitas cores inexistentes. Era tanto amor a transbordar, que o noivo ficou hipnotizado, escutando o farfalhar daquele longo e belo vestido de noiva, de seda pura, alvíssima, entrecortado de rendas. Parecia que o mundo todo havia parado. Só havia ele e ela. Mais ninguém. Mais nada, só o amor a os unir. 32 Muitos anos se passaram, e ele, o noivo, ouvia ainda o alarido dos convidados e o vozerio das crianças que ficou para sempre, no céu das suas lembranças, nos detalhes trançados na sua memória, daquela tarde de sonhos e muito afeto. Esses detalhes nunca morreram, na longa estrada. Seu coração batia forte, acelerado diante da noiva, a sua Helena diáfana, etérea quase mítica, com seus cabelos pretos, olhos claros e as faces muito rosadas, sorrindo-lhe ternamente. Só nós dois é que sabemos Quanto nos queremos bem Só nós dois é que sabemos Só nós dois e mais ninguém Não havia nada que lhes faltassem, desde que tivessem um ao outro. O sonho havia se tornado realidade, com as bençãos de Deus e de toda a sociedade. 8. A VIDA QUE SEGUE Helena e Nagib trilharam juntos o novo caminho, passo a passo seguindo juntos pela mesma estrada. Helena viveu todos os encantos de um amor sincero, num lar onde a dignidade, o carinho e o respeito abençoaram a vida familiar. Tiveram dois filhos: Matilde Carone Slaibi e Nagib Slaibi Filho. Assim, ela tinha tudo para ser feliz: a educação de primeira, a presença constante da família, dos amigos, dos filhos, como também um marido sensível, sempre preocupado com o país, pois ele tinha fortes sentimentos democráticos, além de ser uma pessoa extraordinária. Nagib era um conversador nato, mas muito mais, um ouvinte atencioso. Teve uma longa existência de muitos amigos e muita respeitabilidade. Assim, a vida continuou... Aconteceu o ano de 1979. Ano este em que passou a governar o país o presidente militar João Batista Figueiredo. 34 O governo do general Figueiredo foi marcado por uma enorme crise econômica e pelo processo de reabertura política do País. Uma das principais medidas tomadas por esse novo governo foi abolir o sistema bipartidário e realizar a anistia política dos militares e perseguidos políticos. Inicialmente, o projeto de anistia não iria beneficiar todos os envolvidos com crimes políticos. Nas eleições de 1985, o processo eleitoral foi disputado por dois candidatos civis. Tancredo Neves, candidato apoiado pelos grupos democráticos, venceu o pleito, mas, por motivo de doença, não foi empossado Presidente do Brasil, pois veio a falecer na véspera. Assim, toma posse na presidência da República José Sarney. Contudo, para Nagib Slaibi o outono do tempo se aproximava. Nagib Slaibi veio a falecer em agosto daquele ano, com oitenta e três anos de idade. Adeus, adeus, chegou a hora da partida. Não derrames o pranto assim minha querida. Do sono térreo passou para o sono eterno. Tudo é igual a nada. Tudo se tornou escuro, silencioso e vazio. Simplesmente segurou na mão de Deus e foi... 9. A MORTE DE HELENA Tudo passou. Passou o sol, passou a chuva, passou a noite, passou o dia, passou a aurora e o crepúsculo, só não passava a lembrança de tudo o que Helena tinha vivido. Nunca quis deixar a sua cidade e nem os seus amigos de sempre tão queridos. Foi seu desejo continuar no casarão, pois amava aquela casa, a sua rua e seus vizinhos. Mas, agora, estava sozinha: o marido morto e os filhos vivendo longe, em outra cidade. A perda do amado se fazia presente na solidão e na saudade. Assim, a vida foi sendo de pequenas e grandes nostalgias, entremeada de névoas da recordação das coisas passadas. Tão distante dela, estava ele agora. Minha vida é muito triste, Meu coração sofredor, Dentro do meu peito existe Saudade de um grande amor. 36 Mas, professava a fé com a força de todas as crenças e nunca esquecia da sua devoção, o querido Santo Antonio, no seu nicho, dentro de um grande oratório, que tinha no casarão, cheio de volteios na madeira, verdadeiro estilo rococó, banhado pela luz azulada que sempre permanecia acesa. Na quietude de sua solidão conversava sempre com Deus, pois sabia o que era o próximo, no exercício da oculta caridade. Conhecia a força da oração, orou a vida toda e tudo conseguiu orando. E os anos assim transcorreram lentos e solitariamente. Deus deu-lhe a graça de chegar ao fim da vida sem o menor sinal de senilidade. Seu cabelo estava grisalho, orvalhado, mas sua cabeça era límpida e clara. Ela bem merecia aquilo que Manuel Bandeira escreveu sobre Irene no céu: Pode entrar você não precisa pedir licença. No dia dezesseis de novembro, assistida por seu médico de toda a vida, José Slaibi, que era também seu sobrinho, seus olhos se fecharam e veio a falecer no Hospital São João Batista. Agora, rezam-lhe ofícios tecendo-lhes os anjos lindas grinaldas, no divino paraíso. Sobre ela, o jubilo dos anjos e dos santos Sobre ela a face iluminada de Deus! 37 Envolta no manto sagrado, na atmosfera densa e mística, feita de amor e de sonho, na mais intensa fé, Helena mergulhou, bem mais feliz, porque Deus a abençoava e os arcanjos entoavam o estribilho de uma música sacra, muito cantada na Igreja de Santo Antonio, que ela tanto frequentou: E me convidaram, vamos para casa Vamos para a Casa do Amor. Assim, ela foi. PALAVRAS FINAIS Ao evitar os ardis de uma memória sempre fluida e apaixonada, podemos afirmar que a história de Helena não acabou. Ela continua com a Matilde e o Conti, o Nagib e a Cristina, com todos os seus netos e bisnetos. As Sagradas Escrituras, através do insigne Mestre, nos leciona: “Olha para os céus e conta as estrelas, assim será a tua descendência”. Sherazade, a princesa Das Mil e Uma Noites, contava as suas histórias intermináveis para o rei, seu marido. Helena, muito mais que Sherazade, que narrava suas histórias acontecidas lá nas Arábias, Helena sim, viveu um grande amor, vindo de lá, pois Nagib veio dessa terra, linda, e encantada narrada pelos contos de fada, o maravilhoso e eterno Líbano. Tudo igualzinho como Helena havia tanto sonhado. Um dia, quem sabe, talvez um dia, muito longínquo, um neto de seu neto contará também uma história: 39 “Era uma vez, uma avozinha de lindos olhos esverdeados e que nasceu lá pelas bandas da Mata Mineira, nas antigas terras dos índios Coroados e Puri. Seu nome era Helena. Essa avozinha gostava de tocar violino e amava a todos, guardando consigo uma grande fé. Viveu numa cidade hospitaleira que tem uma marca de glória indelével em seu nome, pois carrega um título majestoso e honorífico: Visconde do Rio Branco”. Não há como negar que a história vai continuar... Para sempre, eternamente. ANEXOS 1. POESIAS 42 ADEUS VIDA COLEGIAL Helena Carone Tudo passa, passou também A nossa vida estudiosa Só nos resta deste tempo Uma lembrança saudosa. Depois que estamos formados Adeus Irmãs minhas queridas Adeus colegas, discursos... Que jamais serão esquecidos Findará a vida folgazã Dos jogos e também das rodas Levaremos só orações. E o saber, de nossos lábios Sairão pra educar e elevar As almas e os corações! 43 ELZA1 Helena Carone Conserva tua alma pura Pura como o clarão do luar! Nas tuas orações a Jesus, Pede-lhe sempre para te guiar! Que vale o mundo querida Com seus processos e seduções Pede a Jesus que te guie... Pede-lhe a luz em tuas orações. Promete guardar sempre Elza Os sãos conselhos das Irmãs! Elza não os esqueça jamais... 1 Elza era sua colega no Colégio Nossa Senhora Auxiliadora e morava em Abre Campos, Minas Gerais. 44 A vida é flor efêmera Dela só vale a virtude! Guarda-a junto ao amor de teus pais. 45 MÃE2 Helena Carone Era feliz, pois te possuía Ó minha mãe, ignorava o sofrer Tudo para tua filha sorria Feito era o mundo de prazer. Mas quando te vi um dia No leito pálida, a morrer, A minha alma em dor enlouquecia Sabendo, mãe, que ia te perder. Mãe, fala a desilusão Ao inexperiente coração Que o mundo não é só de gozar... 2 Poesia feita por ocasião da morte de sua mãe, na cidade do Rio de Janeiro, em 1928. 46 Eu provando, da orfandade, O cálice da tenra idade, Sinto-me triste, senti, ó luar! 2. ESCRITOS DE HELENA 48 CHOPIN François Frederic Chopin, 1810-1849 – nasceu em Zelazowa Wola, na Polônia. Estudou no conservatório de Varsóvia. Com a idade de 14 anos, iniciou sua carreira de compositor, compondo sua primeira obra, um rondó para dois pianos; e, daí em diante, firmou sua reputação como criador de melodias. Aos 20 anos, deixa definitivamente seu país natal, indo para Viena, e depois se estabeleceu em Paris, onde foi professor de renome e como pianista brilhou nos salões parisienses. Liszt apresentou Chopin, a famosa romancista George Rand. Chopin dedicou-se mais ao piano, porque este instrumento musical lhe oferecia mais recursos para interpretar seus pensamentos, com linguagem mais rica e variada, adaptando-se mais para execuções de seus trabalhos de música. Chopin dedicou-se exclusivamente às forças pianísticas mais modestas, atribuindo a si mesmo a tarefa de tornar-se mestre nessas forças, e adaptá-las às suas múltiplas exigências artísticas. Chopin compôs 169 obras para piano. Entre elas, destacamos suas obras-primas: célebres estudos, prelúdios, valsas, polonaises, mazurcas, sonatas, baladas, fantasias, improvisos etc. 49 Nas, suas polonaises e mazurcas, músicas profundas recordam a alma vibrante do povo polaco. Chopin, na história do seu país, é o único nome marcante que se imortalizou na arte musical. Ele mostrou ser poeta dos sons no gênero musical das célebres baladas e noturnos, como filho sentimental do Romantismo do século XIX. Quanto às valsas, Chopin como pianista, apresenta encantamento e magia no teclado, fascinando, com suas execuções musicais, os salões de Paris. A sua valsa AP 69, n° 1, dedicada à Maria Wodzinska, foi inspirada na hora da separação, devido à resistência dos pais da jovem, recusando seu pedido de casamento. 50 ORQUESTRA ANTIGA A palavra orquestra designava antigamente a parte do teatro ocupada pelos músicos; mais tarde passou a ser considerada o conjunto de músicos quando se reuniam para executar obras de grande envergadura, tais como óperas, ou peças sinfônicas. Tem a orquestra sofrido profundas transformações, dado o desejo dos compositores de aumentar-lhe o poder sonoro, enriquecendo-a com grande número de instrumentos de timbres, bem diversos. A orquestra empregada por Claudio Monteverdi, em 1607, para acompanhar sua peça “Orfeu”, considerada a primeira grande obra dramática: 2 cravos, 2 órgãos de madeira, 2 violinos, 10 violas, 2 contrabaixos, 2 guitarras, 1 harpa, 1 flauta, 2 cornetas, 1 clarino (trombeta da qual se originou o trompete), 3 trombetas, 4 trombones, 1 regale (espécie de realejo). Observa-se nesta orquestra antiga a presença da guitarra. Outros instrumentos desse tipo eram também usados com alaúde e liras; tais instrumentos, de sonoridade muito seca e fraca, foram desaparecendo dos conjuntos orquestrais, reforçando-se no seu lugar o número de instrumentos de arco (violino, violas, violoncellos, contrabaixo). Para isso concorreram em grande parte Carissimi na Itália e Luly na França. 51 SCHUMANN Roberto Schumann nasceu em 1810, na cidade de Iwickau, na Soxonia. Começou a carreira de Direito, mas depois se inclinou para a música, ser sua vocação natural. Em 1830, foi para Leipsig dedicar-se exclusivamente aos estudos de música, criando suas primeiras composições musicais. Schumann mereceu o título de poeta da música, devido aos seus escritos musicais, cheios de imaginação poética, sentimentalismo, ternura e fantasia. Em formas menores, foi mestre, quer pela técnica, quer pela inspiração, apresentando belas obras musicais para piano ou para voz humana, salientando assim seu talento e força criadora. Estas formas menores, repletas de maravilhosas fantasias, seu gênio criador apresentava-as, ora poéticas e crônicas, ora nostálgicas e heróicas. Nessas miniaturas é que ele mais se salientava em composições para piano ou para voz humana, pois expandia em inspirações, nesse campo musical, todo o seu gênio criador e talento. Ele se sentia menos à vontade, era em desenvolver suas obras musicais, em sinfonias, quarteto de cordas, concerto. 52 Antes de 1840, Schumann só apresentou criações musicais para piano, depois dessa época, seu gênio compositor ofereceu variadas composições de música sobre todas as formas. De tempos em tempos – ele aperfeiçoava um ramo de sua arte, de cada vez uma forma de música, ora canções ou sinfonias, ora música de câmara. 3. DESENHOS DE HELENA 55 4. DEPOIMENTOS 56 Visconde do Rio Branco, 19/03/2010 Falar sobre Dona Helena Carone Slaibi é gratificante, uma vez que ela fez parte da minha história de vida, na vizinhança, na comunidade de fé, nas alegrias e tristezas que a vida nos oferece; mas pessoa de fé madura, muito amor, supera com a firmeza que lhe era peculiar, e com ela aprendi lições de vida. Entusiasmada, inteligente, esposa e mãe exemplar, sempre se preocupava com a Educação dos Filhos, e, assim, atravessava a rua para me contar o sucesso que Matilde fazia nos estudos e, posteriormente, Nagibinho. Seu testemunho de fé, sua devoção a Santo Antônio era vivenciado através das caridades que praticava. Por isso fez sempre doação de enxovais para as noivas carentes da comunidade. Conhecimento, nós adquirimos com as pessoas, e, com Dona Helena eu os adquiri e ficaram acumulados em minha vida. Obrigada, valeu a pena tê-la conhecido! Maria Tartaglia de Souza 57 Visconde do Rio Branco, 16/03/2010 D. Helena morava na Rua Dr. Linch, nº 529, rua que era conhecida pelo tradicional nome de Carrapicho. D. Helena era muito querida por todos os vizinhos. Ao lado de sua casa, moravam a Marta e o Santinho, casal que teve dois filhos: Alarcon e Silvano. Marta pedia sempre à D. Helena para rezar pelos seus filhos, pois dizia que não tinha fé. D. Geny, esposa do Dr. Cícero, era outra vizinha que também teve dois filhos: Luiz Gonzaga, conhecido como Luiz Violão e Edmur. Luiz Violão era músico famoso, de muito sucesso no Rio de Janeiro. D. Laila Salomão morava mais abaixo, com suas filhas: Chafia, Sara e Emília. Chafia chefiava um atelier de alta costura e fazia os mais belos vestidos de festa para as moças da sociedade riobranquense. Inclusive costurava para a filha de D. Helena: a Matilde, tendo feito seu vestido da festa dos 15 anos e seu vestido de noiva. Ao lado morava o Sr. Peron e D. Gilda com sua família: Peron, que fundou e chefiou a Filarmônica Rio Branco por toda sua vida; Hilda e Luiza suas filhas, como também o Zé Zueira, que era filho adotivo e hoje é um grande empresário. O Luiz Rocha tinha uma oficina mecânica à frente da casa deles, de grande movimento. 58 O Sr. João Durso e D. Maria que moravam ao lado, tiveram os filhos: Rui, Eli, Dalva, Terezinha e Maria Esther. Ele era alfaiate e D. Maria costureira. Mais à frente moravam os irmãos: Arquimedes, Zezinha e Nica, três solteirões, cuja casa ficava praticamente em frente da ponte. D. Ofélia, outra vizinha, fazia festa no dia de seu aniversário e todos os anos convidava a todos os vizinhos, para homenageá-la. Ela adorava a festa! Seguindo, tinha a casa do sapateiro Sr. Chichico, casado com a Sinhá, que eram os pais da Marta e sogros do Santinho. O Sr. José Equi e D. Ziza moravam ali perto. Ele trabalhava na Casa Teles e D. Ziza, mãe de Clarisse e da Terezinha, fazia lindo trabalhos de tricô. Os Equi eram descendentes de italianos que vieram da Toscana. Lembramos ainda de D. Bárbara Siqueira, que tinha um grande lote ao lado de sua casa, onde eram armados os circos, sendo um deles o Circo do Bartolo e que era bisavó da Marisa Nascimento, que morava no Rio de Janeiro. Muitos anos mais tarde, ela veio a se tornar madrinha do Carlos Eduardo, filho da Matilde, que é médico em Mato Grosso do Sul. Na esquina da rua, perto da ponte, morava o Sr. Chaim, comerciante libanês, que teve os filhos: Chaim, Abdo, Asise, Anísio, Alberto e Adma. Ao lado morava D. Mariquinha Filó, mãe do dentista Lélio, entre outros. A seguir, tinha a fábrica de macarrão São José, pertencente ao Sr. José Vicente Soldati, casado com D. Zinha, casal que tinha cinco filhos: Nilton, Neuza, Nicinha, José Luiz e Carlos Ivan, sendo riobranquenses só os dois últimos, já que o casal veio de Sant`Ana de Campestre, município de Astolfo Dutra, no ano de 1943. 59 D. Zinha Soldati e sua filha Nicinha eram muito amigas de D. Helena. Nicinha brincava com Matilde, quando criança, e continuam amigas até hoje. Quando o Sr. Nagib faleceu, Nicinha dormia com D. Helena para fazer-lhe companhia. Havia uma venda do Sr. José de Souza, casado com a professora Maria Tartaglia. Esta venda é que surtia as despesas de nossas casas, fazendo as anotações nas devidas cadernetas. À frente da casa de D. Helena, tinha o engenho do Sr. Antônio Soares de Souza, onde eram realizadas as festas anuais de São João Batista, padroeiro da cidade, que eram prestigiadas por toda a população local, pois lá se podia dançar, ver os meninos subirem no pau de sebo, comer canjica e outras guloseimas juninas e pular a fogueira. Era muito bom! Lá no alto da rua morava D. Cidinha Mesquita, pianista e professora de música da Escola Normal. Tinha como companhia a Judith que também se tornou professora. Seus pais já haviam falecidos há muito tempo, por isso, elas moravam sozinhas. D. Helena era muito caridosa, ajudava os pobres, tinha muita fé e carinho com seus vizinhos. Ia toda terça-feira na Igreja Santo Antônio, quando pegava carona com a Neuza Soldati, que ia de carro trabalhar na escola da Colônia. Ela gostava muito de conversar com a D. Zinha Soldati sobre receitas culinárias e assuntos familiares. Foi assim, por muitos e muitos anos. Neuza e Nicinha Soldati 60 Visconde do Rio Branco, 22/03/2010 Cresci ouvindo minha mãe tecer comentários sempre elogiosos sobre sua amiga D. Helena, mãe do meu estimado colega de “primário” Nagibinho. Ela foi uma pessoa muito religiosa e as duas sempre se encontravam nas missas de terça-feira da Igreja de Santo Antônio. Quando retornei para minha terra, passei também a admirar D. Helena, e me tornei sua amiga. Demorei muito a engravidar. D. Helena sempre muito católica, a pedido de minha mãe, iniciou também orações para este fim, pois percebera a angústia de sua amiga de querer e não conseguir engravidar. Assim minha mãe e a querida D. Helena muito rezaram para eu conseguir alcançar este desejo, e quando meu filho Jorge Augusto nasceu, eu já ia completar 11 anos de casada. Logo que engravidei, tratei de levar a notícia a minha amiga, que ficou muito feliz e rezou mais uma vez para que minha gravidez fosse saudável e tranquila. Assim é a lembrança que tenho desta pessoa maravilhosa que foi dona Helena. Maria Ângela Candido Carvalho 61 Visconde do Rio Branco, 03/04/2010 Atendendo ao honroso pedido de Matilde, aqui deixo suaves lembranças da sua querida mãe e minha grande amiga. Foi uma amizade antiga de muitos anos. Helena era uma jovem sonhadora e que fazia poesias. Sempre lia para mim seus sonetos, mas nunca permitiu que eu mesma lesse seus versos no papel que ela me mostrava. Era coisa de seus versos. Tão zelosa que ninguém podia saber que ela era poetisa. Modéstia? Humildade? Passaram-se anos. Nós duas já estávamos casadas e um dia lhe perguntei: - Você ainda faz poesias? - Ah! Hoje faço bolos, quibes e adoro cantigas de ninar... Gosto de cantar para as crianças dormirem... – respondeu Helena. Mais alguns anos se passaram. Num de nossos encontros Helena me disse: - Estou novamente fazendo poesias... Família criada... Casa grande... Só eu e Nagib... Filhos longe... Sobra tempo e muita saudade. Será que voltou a inspiração, os versos foram surgindo e Helena escrevendo e os escondendo? Maria Soares Lima da Silva 62 5. HELENA (valsa) 63 * Foram utilizados poemas e músicas do cancioneiro popular. Os personagens e os fatos narrados são verdadeiros.