NAMOROS VIOLENTOS - Sinopsys Editora
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NAMOROS VIOLENTOS - Sinopsys Editora
S h e i l a G i a r di n i M u r ta C a r l o s E d u a r d o Pa e s L a n d i m R a m o s T h a u a n a N a ya r a G o m e s T a v a r e s E u d e s D i ó g e n e s A lv e s C a n g u s s ú M a r i n a S i lv a F e r r e i r a D a C o s t a Libertando-se de NAMOROS VIOLENTOS Um g u i a s ob r e o a b a n d o n o de r e l aç õe s a m oro s a s a b u s i va s M979l Murta, Sheila Giardini Libertando-se de namoros violentos: um guia sobre o abandono de relações amorosas abusivas / Sheila Giardini Murta, Carlos Eduardo Paes Landim Ramos, Thauana Nayara Gomes Tavares, Eudes Diógenes Alves Cangussú, Marina Silva Ferreira da Costa. – Novo Hamburgo : Sinopsys, 2014. 80p. ; 16x23cm. ISBN 978-85-64468-29-0 1. Psicologia – Adolescentes. I. Ramos, Carlos Eduardo Paes Landim. II. Tavares, Thauana Nayara Gomes. III. Cangussú, Eudes Diógenes Alves. IV. Costa, Maria Silva Ferreira da. V.Título. CDU 159.9-053.6 Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto – CRB 10/1023 M a r i n a S i lv a F e r r e i r a D a C o s t a Libertando-se de S h e i l a G i a r di n i M u r ta C a r l o s E d u a r d o P. L . R a m o s T h a u a n a N a ya r a G . T a v a r e s NAMOROS Libertando-se de VIOLENTOS S hi ó e ig l ae n G ieasr d i M a ssú Eudes D Ai.n C au nrgt u C a rM lo d uaa rS d L aonsdti a m Ramos a sr Ei n . oF . Pa deas C T h a u a n a N aya r a G o m e s T a v a r e s E u d e s D i ó g e n e s A lv e s C a n g u s s ú M a r i n a S i lv a F e r r e i r a D a C o s t a NAMOROS VIOLENTOS Um g u i a s ob r e o a b a n d o n o de r e l aç õe s a m oro s a s a b u s i va s Um g u i a s ob r e o a b a n d o n o de r e l aç õe s a m oro s a s a b u s i va s 2014 © Sinopsys Editora e Sistemas Ltda., 2014 Libertando-se de namoros violentos – Um guia sobre o abandono de relações amorosas abusivas Sheila Giardini Murta, Carlos Eduardo Paes Landim Ramos, Thauana Nayara Gomes Tavares, Eudes Diógenes Alves Cangussú Marina Silva Ferreira da Costa (Orgs.) Capa: Maurício Pamplona Revisão: Jade Bueno Arbo Supervisão editorial: Mônica Ballejo Canto Editoração: Formato Artes Gráficas Sinopsys Editora Fone: (51) 3066-3690 E-mail: [email protected] Site: www. sinopsyseditora.com.br Autores Sheila Giardini Murta. Professora Adjunta no Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília (UnB). Mestre em Psicologia do Desenvolvimento Humano pela Universidade de Brasília e Doutora em Psicologia Social e do Trabalho pela UnB, com estágio de doutoramento na Queensland University of Technology, Austrália. Pós-Doutora pela Universidade Federal de São Carlos e Universidade de Maastricht (Holanda). Especialista em Análise Política e Políticas Públicas (UnB). Investiga o desenvolvimento, a avaliação, a difusão e a adaptação cultural de programas de promoção de saúde mental e prevenção a riscos para transtornos mentais para pessoas em diferentes estágios e transições do ciclo de vida. Carlos Eduardo Paes Landim Ramos. Graduando em Psicologia pela Universidade de Brasília (UnB). Thauana Nayara Gomes Tavares. Graduanda em Psicologia pela Universidade de Brasília (UnB). Eudes Diógenes Alves Cangussú. Graduando em Psicologia pela Universidade de Brasília (UnB). Marina Silva Ferreira da Costa. Graduada em Psicologia pela Universidade de Brasília (UnB). Agradecimentos Aos jovens que compartilharam conosco suas experiências amorosas e nos ensinaram sobre o processo de abandonar relações violentas e “tomar as rédeas da própria vida”. Aos adolescentes e jovens que cederam seu tempo para avaliar a adequação e atratividade deste texto, nos indicando que rumo seguir. A Larissa de Almeida Nobre Sandoval, Karine Brito dos Santos, Fabrício Guimarães e Pedro Lusz, que generosamente fizeram uso de sua expertise em qualidade da relação conjugal, violência no namoro, violência de gênero e edição de livros, respectivamente, e dividiram conosco suas impressões acerca do conteúdo e formato desta obra. Aos estudantes de Graduação em Psicologia e aos membros do Grupo de Estudos em Prevenção e Promoção de Saúde no Ciclo de Vida (GEPPSVida) da Universidade de Brasília, pela leitura do texto e comentários iluminadores. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), pela Bolsa de Produtividade em Pesquisa (triênio 2011 a 2013 – Processo 306975/2010-6) e pelo fomento para o projeto de pesquisa (Processo 4025792010-0), que geraram e viabilizaram este trabalho. Sumário Prefácio.................................................................................................... Carmem Beatriz Neufeld 11 1 Para fazer bom uso deste livro................................................................ 2 Libertando-se de namoros violentos....................................................... 13 Estágio 1. Tomando consciência do problema.......................................... Exercícios.................................................................................................. Prestando atenção nos sentimentos quando se está com ele/a..................... Prestando atenção nos bons e maus momentos.......................................... Ouvindo o que os outros dizem do seu namoro......................................... Prestando atenção na quantidade de brigas................................................ Prestando atenção nas suas reações às brigas............................................... Prestando atenção em você mesmo/a quando ele/a está distante................ Avaliando as mudanças produzidas por esse relacionamento na sua vida.... 25 26 26 27 28 29 29 30 31 Estágio 2. Preparando-se para deixar o namoro violento........................... Exercícios.................................................................................................. Reconhecendo a violência como ultrajante e inaceitável............................. Reconhecendo os estilos destrutivos nas relações amorosas........................ Reconhecendo como foram aprendidos os estilos destrutivos nas relações amorosas............................................................................. Avaliando as vulnerabilidades pessoais....................................................... Cuidando de si.......................................................................................... Fortalecendo a autoestima......................................................................... Buscando ajuda de amigos......................................................................... Planejando como seguir em frente............................................................. 33 35 35 35 21 36 37 39 41 42 43 10 Sumário Estágio 3. Terminando a relação de namoro violenta................................ Exercícios.................................................................................................. Planejando o término................................................................................ Planejando medidas de autoproteção......................................................... Investindo nos sonhos antes deixados de lado............................................ Inventário de dores vividas na relação........................................................ Mantendo o cuidado a cada dia................................................................. Cuidando para seguir em frente................................................................. Estágio 4. Protegendo-se de recaídas......................................................... Exercícios.................................................................................................. Fazendo um plano de ação para não recair................................................. Investindo na pessoa que você quer ser...................................................... Reafirmando sua responsabilidade para com você mesmo/a....................... Quem eu descobri que sou?....................................................................... 45 46 46 47 48 48 49 50 51 52 52 53 54 55 Anexos Anexo 1. Indicadores de violência no namoro........................................... Anexo 2. Indicadores de qualidade do namoro.......................................... Anexo 3. Fatores de risco para a violência no namoro................................ Anexo 4. Habilidades para manejo de conflitos no namoro....................... 59 61 64 77 Prefácio A vida afetiva e os relacionamentos amorosos ocupam uma parcela significativa do cotidiano dos seres humanos. Na adolescência, estes se tornam foco ainda mais ampliado. Quando a violência se instala nesta importante área da vida dos adolescentes, seus efeitos sobre o desenvolvimento e o bem-estar dos mesmos são devastadores. Nessa direção, a obra Libertando-se de namoros violentos: Um guia sobre o abandono de relações amorosas abusivas cumpre um papel social e educativo fundamental. Sheila Murta e colegas oferecem ao público adolescente este verdadeiro presente: uma obra que aborda o tema de forma sensível, realista e direta, além de oferecer claras sugestões de identificação, preparação para mudança e prevenção de recaídas. A sensibilidade dos autores neste tema é, no mínimo, surpreendente. O leitor encontrará, nas quatro unidades do livro, preciosas dicas que abrangem diferentes estágios do processo de abandono de uma relação amorosa violenta. Além disso, todas as unidades apresentam exercícios, planejamentos e estratégias de identificação e de intervenção nessa realidade. Você tem em mãos um verdadeiro tesouro. Uma ferramenta para o autoconhecimento, a autodescoberta e para elevação da autoestima. Fiquei sensibilizada por esta obra e pela criatividade, seriedade e serenidade com que o tema é abordado. Trata-se de uma poderosa ferramenta 12 Prefácio de mudança da realidade, de intervenção em contextos de rela cionamentos violentos e, não menos importante, de prevenção da violência em relacionamentos amorosos. Dra. Carmem Beatriz Neufeld Doutora em Psicologia pela PUCRS; Coordenadora do Laboratório de Pesquisa e Intervenção Cognitivo-Comportamental (LaPICC); Docente Orientadora do Programa de Pós-Graduação em Psicologia do Departamento de Psicologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; Presidente da Federação Brasileira de Terapias Cognitivas (FBTC) Gestão 2011-2013/ 2013-2015. 1 Para fazer bom uso deste livro Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal. (Artigo III) Ninguém será submetido à tortura nem tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante. (Artigo V) Declaração Universal dos Direitos do Homem Enquanto a violência contra a mulher vem recebendo uma atenção crescente por parte da sociedade, entre nós ainda é pouco reconhecida a violência entre casais de namorados. Uma das formas mais frequentes de violência entre namorados é a violência psicológica, que compreende, por exemplo, xingamentos, humilhações e controle do parceiro por ciúme excessivo. Outras formas de violência incluem a violência moral, como divulgar fotos íntimas na internet, difamar e caluniar; violência física, como empurrar, esbofetear e agredir com armas; violência sexual, como estuprar e usar de ameaças para forçar uma relação sexual; e violência patrimonial, como usar indevidamente o cartão de crédito do parceiro ou destruir seus pertences (carro, arquivos, fotos, agenda, celular, etc.). Essas formas de violência podem coexistir nos relacionamentos íntimos. Por exemplo, um casal, em um único episódio de conflito, pode se tratar com 14 Para fazer bom uso deste livro depreciações (maus-tratos psicológicos), empurrões (maus-tratos físicos) e quebra de objetos (maus-tratos patrimoniais). A prática da violência no namoro não é restrita a rapazes, a relacionamentos heterossexuais e a classes sociais desfavorecidas, tampouco é rara. Rapazes e moças podem ser violentos com seus parceiros. Relacionamentos heterossexuais e homossexuais podem incluir violência. Jovens casais de qualquer classe social podem praticar ou ser vítimas de violência no namoro. Longe de ser rara, a violência nas relações amorosas de adolescentes brasileiros chega a ser alarmante. Um estudo de Oliveira, Assis, Njaime e Oliveira (2011), realizado com 3.205 adolescentes de todas as regiões do Brasil, constatou que 86,9% dos participantes já foram vítimas e 86,8% já praticaram algum tipo de agressão contra o parceiro, seja física, emocional ou sexual. Além disso, verificaram que 76,6% dos participantes são ao mesmo tempo vítimas e perpetradores de violência. Logo, é comum que a violência seja mútua, ainda que isto não seja o caso de todos os casais. Não é parte da natureza humana agredir quem se ama. Ao contrário, tratar o parceiro de modo violento é, definitivamente, aprendido. As práticas culturais, os amigos, familiares e pais ensinam o uso da agressão como forma natural de resolver conflitos. A violência entre namorados está associada a uma cultura de tolerância para com a violência, a relacionar-se com amigos que endossam a violência e a praticam nas suas relações amorosas, a pais que usam de formas abusivas para disciplinar os filhos, a conviver com maus-tratos entre os pais, em sua relação como casal; à ausência da experiência de sentir-se amado, e à falta de habilidades para expressar sentimentos como raiva, frustração, carinho e ternura. A aceitação da violência é, em grande medida, favorecida também por estes mesmos fatores, os quais transmitem à vítima a crença de que “amar é sofrer”, “é assim mesmo”, “os homens” ou “as mulheres são todas iguais”. Isto é, os maus-tratos são vistos como inerentes às relações íntimas e ter um parceiro abusivo (ou parceira abusiva) é melhor do que estar só ou este é o melhor que se pôde conseguir. Os namoros violentos não são iguais. Diferentes padrões de interação íntima violenta entre casais de jovens namorados foram identificadas Libertando-se de namoros violentos 15 em um estudo feito por Martsof, Draucker, Stephenson, Cook e Heckman (2012), por meio de entrevistas com 88 jovens adultos estadunidenses, com idades entre 18 e 21 anos de idade. Foram identificados quatro padrões de interação íntima violenta: violência de curta duração (menos de um ano acadêmico) e restrita a um relacionamento (denominada “violência contida”); violência prolongada (mais de um ano acadêmico) e restrita a um relacionamento (nomeada “violência prolongada”); violência reincidente associada a múltiplos relacionamentos com grau de severidade estável entre os vários relacionamentos (intitulada “violência repetitiva”); e violência reincidente associada a múltiplos relacionamentos com grau de severidade crescente (chamada de “violência escalonada”). Conforme avança o número de relações violentas e sua duração, como é o caso das violências reincidente e escalonada, essas se tornam mais complexas e severas, requerendo tratamento diferenciado. É de se esperar, então, que as consequências da vitimização por violência no namoro variem em severidade. Assassinatos e suicídios estão entre as mais graves. Além destas consequências extremas, existem outros efeitos negativos, como desenvolver transtorno de estresse pós-traumático, usar álcool e drogas, perder a concentração nos estudos, diminuir a produtividade no trabalho, sentir-se deprimido e ter medo de envolver-se em novos relacionamentos íntimos. Infelizmente, muitos casais que se relacionam de modo violento no namoro tendem a continuar fazendo uso da violência no casamento, o que também é nocivo para os filhos. As crianças, com frequência, aprendem a ver a violência como normal e aceitável e o ciclo, se não for alterado por medidas preventivas ou de tratamento, tende a se estender no tempo e entre gerações. É por tudo isso que a violência nas relações amorosas deve ser prevenida ou eliminada o quanto antes. Quanto mais cedo cuidar, melhor. É mais fácil abandonar uma relação violenta quanto menor for o investimento na relação e o compromisso com o parceiro. Por outro lado, o alto investimento e o compromisso elevado fazem com que a tomada de decisão de sair da relação seja adiada, levando à continuidade da violência. Pedir ajuda também não é simples. A vergonha, o medo de reações negativas e a falta de conhecimento de recursos de ajuda são alguns dos fatores 16 Para fazer bom uso deste livro que dificultam ou impedem a busca de ajuda. Além disso, a exaustão emocional, a depressão, a vergonha e a baixa autoconfiança vivenciadas por adolescentes e jovens que vivem esse tipo de relação inibem a busca de soluções que levem ao término da violência (Rhatingan, Shorey & Nathanson, 2011). Esse livro resulta de pesquisas realizadas pelo Grupo de Estudos em Prevenção e Promoção de Saúde no Ciclo de Vida (GEPPSVida), do Departamento de Psicologia Clínica da Universidade de Brasília, por meio de entrevistas com pessoas que viveram namoros violentos, e foi escrito com o propósito de favorecer a autoproteção frente a namoros violentos. Acreditamos que ele possa ser utilizado como parte integrante de psicoterapia ou outros serviços de saúde mental para adolescentes e jovens que vivem namoros violentos. Ao ouvir as histórias de seus relacionamentos e seus esforços para autopreservação, descobrimos como as pessoas que sofreram namoros violentos conseguiram libertar-se (Murta, Ramos, Cangussú, Tavares, & Costa, 2014). Alguns outros estudos realizados com jovens de outros países também foram úteis para nossa compreensão acerca do processo de tomada de consciência, tomada de decisão, preparação para agir e ações de autocuidado, resultando, por fim, no término da relação violenta (Alexander, Tracy, Radek, & Koverola, 2009; Edwards et al., 2012; Shorey, Tirone, Nathanson, Handsel, & Rhatigan, 2013). Esses estudos revelam que essa travessia não é fácil, mas é possível quando recursos internos e externos facilitam mudanças, mesmo que lentas e dolorosas. Para compreender essa travessia, tomamos emprestado da Psicologia da Saúde uma teoria originalmente usada para compreender o abandono do cigarro, denominada Modelo Transteórico de Mudança (Prochaska & DiClemente, 1983), e a utilizamos para reconhecer as várias fases de mudança frente ao término de um relacionamento violento (Edwards et al., 2012): •Estágio 1: pré-contemplação, caracterizada pela resistência frente à mudança (“não há nada que eu deva fazer acerca do meu relacionamento”). •Estágio 2: contemplação, marcada pela ambivalência e início de tomada de consciência acerca da necessidade de mudança (“às vezes eu penso que eu deveria terminar o meu relacionamento”). Libertando-se de namoros violentos 17 •Estágio 3: preparação, quando se dá a tomada de decisão e passos preparatórios para viabilizar a mudança (“eu falei com alguém sobre terminar o meu relacionamento”). •Estágio 4: ação, quando a mudança propriamente dita é implementada, mesmo vacilante e com recaídas (“eu falei para o meu parceiro que estou terminando o relacionamento”). •Estágio 5: manutenção, quando o comportamento adotado no estágio anterior se mantém por, pelo menos, seis meses (“eu não respondo se meu parceiro tenta me contatar”). O livro contém orientações e exercícios para colocar em prática estratégias de transição entre os estágios de mudança, concentrando-se nos estágios de contemplação a manutenção, sendo assim renomeados: Estágio 1. Tomando consciência do problema; Estágio 2. Preparando-se para deixar o namoro violento; Estágio 3. Terminando a relação de namoro violenta e Estágio 4. Protegendo-se de recaídas. Os exercícios apresentados, similares aos utilizados em Terapia Cognitivo-Comportamental para outros propósitos de mudança, buscam fomentar a tomada de consciência sobre os ganhos e custos da violência, principal tarefa do estágio de contemplação; fortalecer a tomada de decisão e passos preparatórios para sair da relação violenta, principal tarefa do estágio de preparação; facilitar a implementação de ações para terminar o relacionamento, tarefa central do estágio de ação; e encorajar o autoconhecimento para prevenção a recaídas, por meio do reconhecimento de armadilhas e investimento em novos interesses e horizontes de vida, tarefa primordial do estágio de manutenção. Um alerta importante: as discussões deste livro resultam de estudos acerca do processo de abandono de namoros violentos, mas não de casamentos violentos. Portanto, as discussões e atividades que apresentamos referem-se estritamente a relacionamentos pré-matrimoniais. Existem diferenças importantes no grau de compromisso e investimento entre essas relações. As complicações em terminar um casamento violento são muito maiores do que as relativas ao término de um namoro. No casamento, quando existem filhos, dependência econômica, pressões sociais ou reli- 18 Para fazer bom uso deste livro giosas para manter o casamento, bem como complicações associadas à partilha de bens, os obstáculos para a dissolução da relação podem se sobrepor às vantagens do término da relação. Portanto, desaconselhamos aplicações diretas do conteúdo deste livro a relações conjugais violentas. Se você está envolvido/a ou já se envolveu em namoros violentos, este livro poderá lhe ser útil para que perceba melhor os altos e baixos da relação e decida o que fazer com seu relacionamento atual, ou para manter-se livre de recaídas. Se você tem amigos que vivem namoros violentos, presenteálos com este livro pode ser um gesto de cuidado. Se você é psicoterapeuta, este livro pode ser um recurso complementar ao seu trabalho, facilitando o processo de tomada de consciência, fortalecimento da motivação, implementação de ações de autocuidado e prevenção à recaída entre seus clientes adolescentes e jovens vitimizados pelo parceiro íntimo. Se você é professor de adolescentes e jovens ou orientador educacional, este livro poderá lhe dar ideias sobre como abordar alguns casos de alunos que cheguem até você pedindo apoio. Como profissional da educação, você pode fazer muito para agir ainda mais precocemente e prevenir a violência por meio do aprimoramento de habilidades para manter relações amorosas saudáveis na adolescência (Murta et al., 2011). Se você é pesquisador especialista nesta área ou outras afins, torcemos para que este guia inspire novos estudos acerca desse assunto ainda tão carente de investigações no Brasil, e que estas resultem em novas formas de prevenção, intervenção precoce ou tratamento. Oxalá cada um de nós, em nossos diferentes papéis, possamos fazer algo para evitar que o amar e ser amado se confunda com tortura, e para encorajar que o potencial para ser feliz se atualize e os relacionamentos floresçam. Referências Alexander, P. C., Tracy, A., Radek, M., & Koverola, C. (2009). Predicting stages of change in battered women. Journal of Interpersonal Violence, 24 (10), 1652-1672. Edwards, K. M., Murphy, M. J., Tansill, E. C., Myrick, C., Probst, D. R., Corsa, R. & Gidycz, C. A. (2012). A qualitative analysis of col- lege women’s leaving process in abusive relationships. Journal of American College Health, 60 (3), 204-210. Murta, S. G., Santos, B. R. P., Nobre, L. A., Oliveira, S. A., Diniz, G. R. S., Rodrigues, Í. O., Miranda, A. A. V., Araújo, I, F., Del Prette, A., & Del Prette, Z. A. (2011). Diferenciando Libertando-se de namoros violentos 19 baladas de ciladas: um guia para o empoderamento de adolescentes em relacionamentos íntimos. Brasília: Letras Livres. Murta, S. G.; Ramos, C. E. P. L.; Cangussú, E. D. A., Tavares, T. N. G. & Costa, M. S. F. (2014). Desenvolvimento de um website para a prevenção à violência no namoro, abandono de relações íntimas abusivas e apoio aos pares. Manuscrito submetido à publicação. Oliveira, Q. B. M., Assis, S. G., Njaine, K., & Oliveira, R. V. C. (2011) Violência nas relações afetivo-sexuais. Em M. M. Minayo, S. G. Assis, & K. Njaine (Orgs.). Amor e violência: um paradoxo das relações de amor e do ficar (pp. 87-140). Rio de Janeiro: Fiocruz. Prochaska, J. O. & DiClemente, C. C. (1983). Stages and processes of self-change of smoking: toward an integrative model of change. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 51, 390-395. Rhatingan, D. L., Shorey, R. C., & Nathanson, A. M. (2011). The impact of posttraumatic symptoms on women’s commitment to a hypothetical violent relationship: a path analytic test of posttraumatic stress, depression, shame, and self-efficacy on investment model factors. Psychological Trauma: Theory, Research, Practice, and Policy, 3, 181-191. Shorey, R. C., Tirone, V., Nathanson, A. M., Handsel, V. A., & Rhatigan, D. L. (2013). A preliminar investigation of the influence of subjective norms and relationship commitement on stages of change in female partner violence victims. Journal of Interpersonal Violence, 28, 621-642.