La Herencia de la Criminologia Crítica

Transcrição

La Herencia de la Criminologia Crítica
ALUNA: CHRISTIANE RUSSOMANO FREIRE
PROFESSOR: SALO DE CARVALHO
FICHA DE LEITURA
“LA HERENCIA DE LA CRIMINOLÓGIA CRÍTICA” – ELENA
LARRAURI
A autora se propõe a reconstruir a história da criminológia
crítica, desde o seu surgimento em fins da década de sessenta até os anos de 1990,
período em que escreveu a presente obra.
Tal reconstrução pretende refletir sobre a herança da
criminologia crítica, ou seja, o seu legado a criminologia como um todo. No sentido,
não de considerá-la “morta”, mas como aqueles pais que legam em vida a herança a
seus filhos, para que estes comecem a desfrutá-la enquanto jovens.
CAPITULO I
A BOA VINDA DAS TEORIAS NORTE-AMERICANAS
1.
A CONEXÃO SOCIOLÓGICA: CRITICA A TEORIA
DA ANOMIA E AS TEORIAS SUBCULTURAIS
As teorias criminológicas dominantes nos EUA na década
de cinqüenta foram a teoria da anomia e as teorias subculturais, ambas baseadas na
corrente sociológica funcionalista.
A sociedade analogicamente ao corpo humano é
concebida como um sistema, formado por inúmeros subsistemas (político,
econômico, cultural) desenvolvidos para assegurar o funcionamento, manutenção e
reprodução da sociedade.
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Para a criminológia a influência do funcionalismo fez com
que o delito e o sistema penal fossem estudados sob a perspectiva de suas funções
e disfunções para o sistema social. O controle social é visto como uma reação a
desviação, que representa uma deficiente socialização nas normas sociais.
Para Merton, que desenvolveu a teoria da anomia, tal
situação permanente na sociedade, se caracteriza não pela ausência de normas, e
sim pela falta de correlação entre os desejos – que são criados culturalmente e não
“por natureza ilimitados” – e as possibilidades para satisfazê-los. A desviação é vista
como uma reação a esta situação de anomia.
As teorias subculturais apresentam como pressuposto
comum, o fato de que a delinqüência é vista como uma resposta – solução cultural
compartilhada – aos problemas criados pela estrutura social.
Afirma a autora que as teorias subculturais pretendem
combinar um enfoque macro dos problemas criados pelas estruturas sociais com um
enfoque micro, de onde se localiza (áreas
desorganização
social)
e
como
se
urbanas caracterizadas
aprendem
(transmissão
cultural)
pela
os
comportamentos delitivos.
Ressalta ainda, que as teorias subculturais recepcionadas
na Inglaterra tiveram grande impacto ao ressaltarem que a delinqüência era uma
resposta aos problemas plantados pela estrutura social. Significaram um avanço
frente as teorias anteriores que explicavam os comportamentos delitivos como uma
anomalia do sujeito, de natureza patológica.
Apesar de tal avanço, tais teorias foram duramente
criticadas na década de sessenta.
A primeira crítica resultou da teoria do conflito, que
sustentou que o funcionalismo apresentava uma imagem sobreconsensuada da
sociedade, desconsiderando o fato desta estar estruturada de forma desigual, com
grupos sociais com interesses e valores distintos, e geralmente antagônicos.
A segunda crítica partiu de Mazda, que acusou as teorias
subculturais de permanecerem atreladas aos pressupostos da criminologia
2
positivista. Afirma que tais teorias adotaram um dos pilares básicos da criminologia
positivista ao considerar o delinqüente um ser distinto do cidadão convencional.
A terceira crítica deveu-se a incapacidade de tais teorias
de responder a desviação típica dos anos sessenta, “delitos sem vítimas”, isso é
drogas, homossexualismo, delitos políticos, manifestações pacifistas e outros,
realizadas majoritariamente por setores médios da sociedade. Fato este que
desfigurou as concepções subculturais, que tinham o delito como a resposta dos
estratos inferiores da sociedade frente a inacessibilidade aos objetivos culturais
almejados.
Sublinha
a
autora,
que
as
críticas
as
teorias
criminológicas da anomia e subculturais, adotavam efeito de maior alcance dirigindose as concepções funcionalistas do delito e a criminologia positivista.
2. A MORTE DE LOMBROSO
AS TENDÊNCIAS ANTICORRECIONALISTAS
Na década de sessenta Matza foi um dos principais
críticos do positivismo. Ao apresentar o caráter transitório da delinqüência, como
versão extremada da rebeldia juvenil – delinqüência, radicalismo e boêmia –
afirmando que esta afeta somente uma minoria da juventude que posteriormente
será reintegrada a sociedade convencional, desfigura um dos pilares fundamentais
do positivismo que tem o delinqüente como portador de patologia, tendente a
reeditar permanentemente a conduta “doentia”.
Assenta a autora que o positivismo estudou o fenômeno
delitivo numa atitude correcionalista, ou seja, buscava descobrir as causas que
provocavam a delinqüência a fim de incidir nestas corrigindo-as.
Matza vai opor-se a esta postura sugerindo a substituição
de uma perspectiva correcionalista por uma apreciativa, a adoção de uma imagem
de diversidade frente a patologia e a afirmação de uma relação de sobreposição
entre os mundos desviados e convencionais superando a noção simplista de
3
diferenciação. Aponta a realização de atividades convencionais por sujeitos
desviados, e atos desviados realizados por sujeitos convencionais.
As críticas de Matza a todas as teorias criminológicas –
incluindo as sociológicas – por não haver se desprendido do legado positivista
(substancialmente no que se refere a buscar nas características do sujeito a
explicação para a delinqüência) abriu caminho para a perspectiva do etiquetamento.
3.
MUDANÇA DE PARADIGMA: EL LABELLING
APPROACH
Os representantes do labelling approach foram buscar
suas premissas em outra corrente sociológica que não o funcionalismo, mas no
interacionismo simbólico que esta reemergindo na década de sessenta.
Há uma inversão no paradigma que vai cambiar do
normativo para o interpretativo. O controle social já não é visto como uma resposta a
desviação, mas de forma oposta, esta é reconhecida como resposta ao controle
social.
Larrauri vai ressaltar que a mudança de paradigma traz
consigo uma virada no objeto de estudo que deixa de estudar o delinqüente e as
causas de seu comportamento (paradigma etiológico) e passa a estudar os
organismos de controle social que tem como função controlar e reprimir a desviação
(paradigma da reação social).
Os teóricos do etiquetamento sustentavam que a
desviação não tinha uma natureza ontológica, não existindo a margem de um
processo de reação social. A reação social é que define o ato como desviado, ou
seja, o delito não é o fato em sim uma construção social.
E o desviado é aquele a quem se aplica com sucesso a
etiqueta; o comportamento desviado é aquele definido como tal.
Segundo esta teoria o processo de etiquetamente cumpria
uma função social, no sentido definido por Durkheim, ao reafirmar valores que
protegiam e coesionavam a sociedade.
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Ao questionar como se aplica o etiquetamento asseguram
que o funcionamento do sistema penal se guia por “estereótipos” provenientes da
polícia e do restante da população. Nesse sentido, as estatísticas vão demonstrar
que é o controle de determinadas condutas que se exerce de forma seletiva, posto
que as condutas delitivas estão presentes em todas as camadas da população.
A crítica elaborada pela teoria em análise ao processo
penal pode ser sintetizada nas afirmações de Matza: um processo penal que está
orientado a diminuir o número de delinqüentes provoca, com seu processo público
de etiquetamento, que o sujeito que havia realizado atos delitivos assuma a
identidade e atue posteriormente como delinqüente, que era precisamente o que se
pretendia evitar.
É com o teóricos da “labelling approach” que assistimos a
mudança de paradigma criminológico, onde o centro de atenção se desprende dos
indivíduos delinqüentes para os órgãos de controle social.
4. SOCIOLOGIA DA VIDA COTIDIANA:
ETNOMETODOLOGIA,
ANTIPSIQUIATRIA
E
MARXISMO
Essas
teorias
assumiram
conotação
“radical”
influenciadas pelos movimentos sociais ocorridos na década de sessenta.
Apresentam como noção comum a desviação como categoria socialmente
construída.
Sobreleva destacar o movimento da antipsiquiatria, que
considerava a “enfermidade mental” como resposta ao contexto social irracional e
contraditório. O indivíduo não era patológico, patológico era o contexto. A
delinqüência da mesma forma, foi considerada como resposta aos problemas
criados pela estrutura e pela intervenção dos agentes de controle.
As idéias marxistas também influenciaram a criminologia
na década de sessenta. Ao conferirem caráter político aos atos delitivos, a
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delinqüência para a ser analisada como uma manifestação a mais da luta de
classes.
Apregoavam que a nova sociedade socialista eliminaria
as causas e as situações criminógenas do capitalismo que conduzem ao delito.
A autora chama atenção para o fato de que, embora as
concepções marxistas tenham influenciado os novos sociólogos da desviação, não
significa que a estas possam ser atribuídas caráter marxista.
Conclusivamente assevera Larrauri que a influência ainda
que tênue, difusa e ambivalente, do marxismo irá servir para radicalizar e politizar as
demandas do resto das correntes norte-americanas. Toda a bagagem cultural
somada a um clima político efervescente irá geminar a elaboração de uma “nova
teoria da desviação”.
A autora destaca os pontos fundamentais das teorias
norte-americanas para a construção da “nova teoria da desviação”:
a) a criminologia européia dominada até então por
pressupostos médicos-jurídicos vai ser sacudida pelos estudos sociológicos. Os
criminológos se transformavam em sociólogos da desviação.
b) o estudo do desvio não vai mais restringir-se ao
indivíduo delituoso, mas também aos órgãos de controle social.
c) o delito passa a ser visto como reação ao controle
social.
d) crítica ferrenha as estatísticas que não são neutras e
nem objetivas, não refletem os atos cometidos e sim a reação que são objeto.
CAPITULO II
A NOVA TEORIA DA DESVIAÇÃO
1. DECADA DE 60: O SURGIMENTO DA NATIONAL
DEVIANCE CONFERENCE (NDC)
As bases teóricas que alcançaram pronta difusão foram:
1. Simpatia com o desviado;
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2. O ato desviado é racional;
3. O desviado é político;
4. Todos somos desviados;
5. O controle cria a desviação;
6. Sejamos tolerantes com os desviados;
7. O direito penal é um instrumento a serviço da classe
dominante;
8. A polícia atua com base em estereótipos;
9. Os desviantes são bodes expiatórios;
10. As estatísticas são uma construção social.
O clima político da década de 60 e a influência das idéias
marxistas, significaram uma politização do Labelling Approach. Segundo a autora, a
própria perspectiva do labelling approach permitia várias possibilidades de
respostas.
A efervescência dos anos sessenta vai influenciar
diretamente nas novas concepções – maio 68, movimento feminista, entre outros.
Neste período (1968-1973) a situação acadêmica do grupo de jovens sociólogos
interessados pelos temas da delinqüência, se caracterizou por uma crescente
alienação do que classicamente havia sido desenvolvido no âmbito da criminologia.
A criminologia havia permanecido até então com um
enfoque psiquiátrico-forense, psicológico-clínico e jurídico, com o objetivo de corrigir,
de reformar o delinqüente. Os novos sociólogos sentiam maior interesse nos novos
fenômenos sociais – drogas, homossexualismo, delito político- do que nos temas
tradicionais –delinqüência comum.
Este grupo alternativo se reúne pela primeira vez em
York, em 1968 na National Deviance Conference. Personagens chaves nesta
primeira fase da NDC foram: Roy Bailey, Stanley Cohen, Mary Mcintosh, Ian Taylor,
Laurie Tayor y Jock Young.
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O que unia todos estes sociólogos eram suas posições
contra a ordem social imperante, sua incredulidade a respeito das definições que o
sistema emitia.
2. O ENFOQUE CÉTICO: QUESTIONAMENTO DA
CRIMONOLIGA POSITIVISTA
As bases da teoria do etiquetamento e as críticas ao
positivismo são a base fundamental das formulações teóricas que se produziram
neste primeiro período da NDC. O clima político redundou numa politização das
teorias recebidas dos EUA. O produto final foi batizado com o nome de ENFOQUE
CÉTICO.
Pontos
do
postulado
positivista
que
os
céticos
questionavam:
1. O consenso social : não existe uma só ordem de
valores com base na qual podemos embasar todos os atos, existe sim uma
multiplicidade de ordens de valores e subculturas que coexistem na sociedade atual;
2. Natureza patológica da ação desviada: o ato desviado
não é patológico, mas sim diverso dos atos realizados pela maioria dos membros
convencionais da sociedade. È uma forma distinta de expressar sentimentos
generalizados . os quais não têm motivos para serem submetidos a estigmatização
posterior;
3. Status do ato desviado; o ato desviado encontra-se em
relação de sobreposição com os atos convencionais. Esta relação de sobreposição
deve-se que o ato desviado representa os mesmos valores que os presentes na
cultura dominante;
5.
A natureza
absoluta da reação: não
existe
diferença entre o comportamento normal e desviado, tudo é um problema de
definição. As valorações dependem de uma época histórica, de um contexto social,
dos diversos grupos, etc. a infração em si não importa, a reação que ocasiona esta
infração é o dado relevante - RELATIVISMO CULTURAL. Os teóricos sustentavam
que a criação de estereótipos delinqüentes coincidiam, não ocasionalmente, com as
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pessoas que já estão excluídas do mercado de trabalho, assim o sistema penal
legitimaria um exclusão previamente operada.
As perguntas feitas pela teoria do etiquetamento podiam
ser objeto de múltiplas respostas:
Por quê surge a reação perante alguns atos?
Quem define certos atos como desviados?
Como se realiza esta seleção de comportamentos aptos
de persecução penal?
Qual são as conseqüências do etiquetamento?
Que efeitos produz o processo etiquetador no sistema?
5. Caráter objetivo das estatísticas: as estatísticas não
refletem o índice real de delitos, e sim a reação ao delito, que é a seleção do que é
delito, pelos agentes de controle. O fator que explica a presença das classes sociais
mais fracas nas estatísticas não é a maior quantidades de delitos, sim sua maior
vulnerabilidade de detenção;
6. O delito comum: o que era ou não delito era uma
questão de definição e definida e o delito não era importante, porque este tipo de
delito comum não existe na quantidade que a estatística quer fazer crer que existam;
7. Caráter determinado do delinqüente: a ação era
voluntária, logo o delinqüente não poderia ser determinado como queriam os
positivistas. O sujeito não era objeto, tinha vontade;
8. Caráter do desviado: o ato delitivo como voluntário,
mitigava a importância até então conferida à determinação do que denomina
“causas do delito”. Afirmava-se que as causas são múltiplas impossíveis de
determinação, em face a complexidade das situações criadas pelo ser humano. A
busca das causas serve somente para reforçar a idéia do delito como
comportamento análogo do restante da sociedade. Justificativa para a assunção de
uma postura correcionalista.
9. Finalidade de correção da política criminal: os teóricos
céticos contrariaram as metas dos positivistas, isto é, o fim de corrigir e erradicar a
delinqüência, baseada na visão de que o sujeito estava determinado ao delito por
9
forças que não controlava. A contrariedade ao tratamento e à finalidade
correcionalista podia albergar-se na TOLERÂNCIA e na NECESSIDADE de uma
cultura onde não haja nada para corrigir, já que o desviante existe somente quando
é definido e contemplado por parâmetros culturais diversos dos seus.
Uma política anti-intervencionista também podia albergar
posições neo-clássicas, de reafirmação de uma pena justa, de um processo
garantista baseado no fato delitivo e não na personalidade do delinqüente;
10. Papel de criminólogo; os teóricos céticos adotaram o
que Matza havia denominado uma atitude apreciativa. Mas esta atitude apreciativa
que se opunha à neutralidade do positivismo, podia-se adotar de um método
naturalista até uma celebração do comportamento desviante.
Enfim, neste primeiro momento reina o consenso contra a
criminologia oficial.
CAP. III : A NOVA CRIMINOLOGIA
A nova criminologia (Taylor-Walton-Young, 1973) marca o
trânsito da recepção das teorias norte-americanas anteriormente expostas a
elaboração de uma criminologia marxista. A radicalização da concepção do
etiquetamento culminou num direcionamento marxista, em detrimento de outras
posições anarquistas e liberais presentes na NDC.
A elaboração da nova criminologia vem precedida por
artigos norte-americanos que tiveram um grande impacto nos novos criminólogos ao
dirigir uma crítica ao labelling approach desde uma perspectiva materialista. Esta
crítica provém de dois ângulos:
1. Corrente representada por Gouldner (1968), akers
(1967), que criticavam o fato do etiquetamento apresentar o desviado como um
sujeito passivo. Ex.: como o etiquetamento explica o delinqüente político, se ele
escolhe atuar politicamente?
2. Corrente proveniente de Liazos (1972), chama atenção
para o fato do descuido do etiquetamento ao analisar o crime de colarinho branco. A
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importância concedida a etiqueta ignora este tipo de delito que não se vê submetido
a um processo de etiquetamento.
Ambas
as
correntes
serão
ampliadas
pela “Nova
Criminologia” (1973). Obra que representou o início da criminologia crítica. Seu
impacto foi considerável e as críticas ao etiquetamento se converteram em
paradigmas para toda uma geração de criminólogos críticos.
A
CRÍTICA
MATERIALISTA
AO
LABELLING
APPROACH: PRECEDENTES NORTE-AMERICANOS
Gouldner (1968): foi o que criticou de forma mais
contundente o Labelling approach e, especialmente, Becker. Foi ele que escreveu o
prólogo do início da obra A Nova Criminologia
A nova Criminologia vem precedida pelo influente artigo
de Gouldner (1968) “The sociologist as partisan: sociology and the Welfare State”.
Este trabalho é uma resposta ácida a um artigo de Becker
(1967), “Whose side are we on?”, mas se leu também como uma crítica global a
perspectiva do etiquetamento.
Becker foi acusado de parcial e respondeu, afirmando que
se adotava o ponto de vista dos desviados porque era esse o grupo que se estava
estudando. Além disso, essa acusação só era expressada quando se dava
credibilidade ao grupo dos desviantes. Para Becker não era possível investigar de
forma imparcial; a situação sempre será descrita do ponto de vista de algum grupo.
A única solução para evitar distorções consistia em reconhecer claramente de que
perspectiva partimos.
A primeira crítica que Gouldner dirigiu a Becker foi que
este não respondia a pergunta : de que lado estava?
Becker situava-se do lado dos marginalizados porque
estes eram os sujeitos os quais estava estudando. Assim, Gouldner questionava-o
se posicionaria-se do lado de quem quer que fosse o seu objeto de estudo?
Para Gouldner não se tratava de ter o ponto de vista de
cada grupo estudado, mas de analisar as estruturas de poder. Por isso, não bastava
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apresentar o desviado como um resultado da má execução do tratamento de
controle, pois a crítica dos teóricos do etiquetamento alcançava, exclusivamente, os
estratos intermediários da sociedade, os agentes que executavam as ordens.
A crítica de Liazos pautava-se no fato de que a etiqueta
não faz justiça ao caráter político dos atos de tais desviados. Definir como desviados
os dirigentes negros, entre outros, era desconhecer nos seus atos o caráter de luta
política.
A dificuldade em expor a Nova Criminologia reside no fato
de que esta não explicitou seus postulados. A Nova Criminologia consistiu numa
crítica as anteriores teorias criminológicas e num programa de estudos que devia ser
desenvolvido no futuro.
A UTILIZAÇÃO DO MARXISMO PARA CRITICAR AS
TEORIAS CRIMINÓLOGICAS ANTERIORES:
1. Crítica a perspectiva do etiquetamento: a etiqueta não conduzirá a desviação e
nem será vivida como um estigma;
2. Crítica ao subjetivismo radical de Matza: para Matza a desviação se explica
exclusivamente por recurso da mente, fatores internos e existenciais do sujeito,
sem considerar o contexto social, e a única referência que se faz ao Estado, é
uma menção, inexplicada, ao Leviatã;
3. crítica a fenomenologia.
A Nova Criminologia se limitou a criticar as teorias
existentes, assinalando quais seriam os requisitos formais e materiais para a
construção de uma teoria social do desvio. As premissas fundamentais desta nova
visão, de forma sintética, consistem em:
- Aplicar o materialista histórico como método ao estudo
da desviação;
-
Analisar a função que cumpre o Estado, as leis e as
instituições
legais
na
manutenção
do
sistema
capitalista;
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- Estudar a desviação no contexto mais amplo da luta de
classes sociais;
- Vincular a teoria e a prática.
Inúmeras críticas foram dirigidas à Nova Criminologia,
essencialmente, no que tange as concepções marxistas por ela incorporadas, vistas
como a introdução de um novo determinismo econômico mecanicista. Abria-se
caminho para a contra-reforma dos anos setenta.
De outra face, cabe ressaltar
que o
impacto e
repercussão da Nova Criminologia foi enorme e pode ser considerado o marco do
surgimento da Criminologia Crítica.
IV – A CONTRA-REFORMA
Introdução –
A autora no presente capítulo se propõe apresentar os
vaivéns da criminologia crítica no período situado entre a metade dos anos setenta e
o início dos oitenta.
Localiza as mudanças no panorama político, do período
aludido, acentuando a primeira vitória de Thatcher que coloca em perigo o Estado
social, o terrorismo e as legislações anti-terroristas, o fenômeno da violência racial
agudizado pela crise econômica, o início dos primeiros movimentos de denúncia da
violência contra as mulheres; combinado com o pessimismo resultante da
experiência histórica dos países do “socialismo real”.
É nesse contexto que se produz uma revisão nos
postulados do enfoque cético e da nova criminológia.
As
principais
variações
podem
ser
sinteticamente
apresentadas como:
-
uma revalorização do delito comum;
-
a negação do caráter político da delinqüência e
-
a matização das oposições ao positivismo.
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1. OS DUROS ANOS SETENTA; O DESFALECIMENTO
DE LA NATIONAL DEVIANCE CONFERENCE
A
composição
heterogênea
da
NDC
apontada
anteriormente, apresentava como ponto de congruência o combate ao inimigo
comum – “o positivismo”.
Na década de 70 vão surgir novos sociólogos da
desviação. Dentre estes, a autora chama atenção para a contribuição de Stuart Hall,
que dirigiu um grupo de acadêmicos, na Universidade de Birmingham, voltados para
o estudo especializado de subculturas juvenis. Sua contribuição vai possibilitar uma
integração a teoria das subculturas com as tendências marxistas e estruturalistas
próprias da tradição européia.
Na Inglaterra, conforme salienta Larrauri, dois serão os
grupos que exerceram grande influência neste período. O primeiro, marcado pelas
idéias de cunho abolicionistas defendidas por Bianchi, e fundamentalmente por
Mathiesen, cujas publicações, concretamente The politics of abolition (1974), iram
causar forte impacto.
E o segundo, a incorporação ativa do grupo italiano
formado por juristas e vinculados a política do PCI, reforçando as tendências
marxistas e o estudo do direito. Ainda, nesse período assiste a um revigoramento do
movimento antipsiquiatria italiano que vai revitalizar a crítica e ataque as instituições
totais como os hospitais psiquiátricos e as prisões.
De outra face, as mudanças no cenário político vão dar
origem a contra-reforma, promovida pelo novos sociólogos e criminológos, que vai a
público em torno da metade dos anos setenta.
Distintamente do que ocorreu na década anterior, a vitória
do conservadorismo na Europa, com o conseqüente desmonte do Estado social,
impulsionou as forças progressistas que haviam advogado por um estado não
intervencionistas, a adotarem posição no sentido uma maior intervenção estatal no
que tange aos gastos sociais.
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A postura assumida pela esquerda frente a proliferação
das legislações anti-terroristas, vão no mesmo sentido, posto que se vêem
compelidas a defender o Estado de direito e as garantias legais ante a ameaça
terrorista. O que na década de sessenta foi identificado como “direitos formais
burgueses”, nos anos setenta é visto como manifestações de legalidade, que devem
ser preservadas.
A autora localiza nesse marco sócio-econômico a
decadência da NDC, como resultante das sérias divisões ideológicas, acentuadas
pelo predomínio do conservadorismo, do extenuamento da “new left”, da falta de
uma segunda geração de acadêmicos disposta a levar adiante as proposições, a
dispersão temática, a confusão teórica produto da crítica ao “idealismo e
romantismo” da década de sessenta, a retirada de seus fundadores para outros
países e sua entrada no mundo universitário oficial.
A influência deste organismo é inquestionável, conforme
assenta a autora, traduzindo-se na ampliação do objeto de estudo das diversas
formas de desviação, e incluindo na criminologia de signo oficial a importância do
controle social como variável determinante para o estudo da delinqüência.
Afirma Larrauri a importância do movimento dos anos
sessenta, ao devolver voz aos desviados, invertendo a ótica de até então, onde a
desviação passa a ser vista do ponto de vista do marginalizado. A questão deixa de
ser vista como técnica – médica ou jurídica – e sim adota natureza política.
II. O DESCOBRIMENTO DA CLASSE OPERÁRIA: A
GRAVIDADE DO DELITO COMUM.
Young (1975) principal teórico da “criminologia da classe
obrera” vai dirigir inúmeras críticas a “nova criminologia”, que podem ser sintetizadas
em algumas premissas substanciais, vejamos:
1. Ocorrem mais delitos do que se registra nas
estatísticas oficiais;
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2. O
delito
sociedade,
atenta
contra
retoma
a
interesses
concepção
comuns
da
da
valores
consensuais mínimos – vida, propriedade e etc.;
3. O delito apresenta vítimas e estas costumam a ser
predominantemente trabalhadores, Yong vai afirmar
que a maior parte dos delitos da classe trabalhadora
se comete dentro da classe e não entre classes;
4. Existe uma “simetria moral” entre o delinqüente e a
vítima, com o qual implicitamente se afirma que são
as classe trabalhadoras as que cometem mais delitos;
5. O delinqüente não é um aliado da classe trabalhadora
em sua luta contra o capitalismo, pelo contrário, a
delinqüência dificulta a luta ao desanimar e dividir os
trabalhadores;
6. Implicitamente a esperança na mudança social volta a
residir nos trabalhadores;
7. Por seus efeitos perniciosos na comunidade e no
sujeito delinqüente, deve propiciar-se um controle de
suas atividades. Portanto este controle no deve ser
exercido por organismos externos como a polícia e
sim pela própria comunidade trabalhadora;
8. A criminologia deve dirigir seu interesse ao tema da
delinqüência comum.
III.
O IDEALISMO E ROMANTISMO DE ESQUERDA:
CRITICA
A
INVERSÃO
DOS
POSTULADOS
POSITIVISTAS
A crítica dirigida a Nova Criminologia, nas palavras de
Currie consiste no fato de ter centrado seu objeto de análise em temas hippies,
conferindo a todo delito um ato de luta racional ou político, descuidando-se do
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efeitos desmoralizantes que a delinqüência comporta. Promovendo uma celebração
da delinqüência.
Young vai mais adiante (1975), afirmando que “os
idealistas e românticos” se tem limitado a produzir um inversão do paradigma
positivista: o positivismo afirmava a falta de consenso, o idealismo de esquerda se
esforçou para demonstrar a existência do disenso; o positivismo afirmava o caráter
patológico da delinqüência, esta se defendeu como racional; o positivismo havia
considerado o delinqüente como um sujeito determinado, este era dotado de
liberdade; o positivismo se baseava nas estatísticas, estas eram rechaçadas; se os
positivistas preconizavam a intervenção e o tratamento, eram respondidos exigindo
uma cultura mais tolerante.
III. 1. O consenso é “realidade e ilusão”
À visão positivista do consenso foi oposta a do disenso.
A crítica vai no sentido da exacerbação da visão da Nova
Criminológia, ao negar a existência do consenso em torno de alguns valores como a
propriedade e a vida.
Nesse sentido, Matza vai assinalar que a existência de
uma pluralidade de valores não nega a presença de um núcleo comum consentido.
A segunda crítica dirigida a Criminologia Crítica foi o papel
conferido ao Estado no sentido da reprodução da ordem social vigente, ignorando
todos os mecanismos informais de controle existentes.
III. 2. Diferença entre atos desviados
Tanto os teóricos céticos como a nova criminologia dirigiu
atenção a distinção entre a denominação que devia receber o ato: em vez de deito –
vulneração de uma norma penal -, ou desviação – vulneração de uma norma social.
Com isso se buscava colocar o ato desviado em igualdade de condições com os
atos convencionais e desprovê-lo de conotações pejorativas. Em definitivo,
considerá-los como ato que expressam uma “outra” racionalidade.
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Tal visão vai ser identificada com uma atitude simpática
em relação ao delito, vetando a possibilidade de discernir as diversas manifestações
desviadas.
A crítica vai defender a contextualização do desvio, no
sentido de não entendê-lo a priori como ato de oposição, protesto ou luta contra o
sistema.
III. 3. O ato desviado “exacerba” os valores do sistema
Outro aspecto relevante são as divergências quanto o ato
desviado: entendido como portador de valores alternativos ao sistema dominante, ou
ao contrário, representante dos valores próprios do sistema capitalista.
A nova teoria da desviação via-o como expressão de uma
nova cultura alternativa.
Cohen e Young, no final da década de setenta vão
defender a distinção entre os atos desviados. Afirmando que o caráter alternativoopositor do ato desviado somente será encontrado nos atos de resistência política –
e dentro de alguns limites, sendo os demais considerados globalmente como
exacerbação dos próprios valores capitalistas.
III. 4. A reação “não constitui” desviação
Esta visão adotada pelo labelling approach é tida como
reducionista, posto que não leva em conta as distintas respostas que o sujeito
poderá dar frente a reação social, adaptando-se em alguns casos, resistindo em
outros.
De outra face, também pode ser objeto de crítica o fato de
ser atribuído ao delito dito “primário” o livre arbítrio individual, desconsiderando as
demais condições estruturais que o levaram a agir.
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Ainda, em relação ao controle social como causador do
desvio, se contrapôs a visão de controle descentrado da figura estatal, despido de
conotação unicamente negativa.
No sentido de Foucault, o poder não somente proíbe,
reprime, como cria, cria realidade, cria novos objetos de discurso, novas áreas de
conhecimento, novas categorias. Portanto, deve ser estudado como se criam as
categorias de delinqüente, de criminalidade, e não somente como se utiliza o poder
para reprimi-las.
III. 5. O caráter “não disjuntivo das estatísticas”
A invalidação total das estatísticas é questionada,
sofrendo uma evolução. O delito comum ao se encontrar sobre representado nas
estatísticas, não obedece exclusivamente a atuação seletiva dos órgãos de controle.
Young – A maior presença do delito comum pode
obedecer ao que efetivamente é mais numeroso, a que efetivamente é mais
importante e a que efetivamente a percepção dos agentes de controle é seletiva.
III. 6. O delito comum “aumenta e é grave”
Posição que condena o delito comum, distinta da visão
até então defendida pela nova criminologia, por entender que produz sofrimento em
suas vítimas. Se antes se acusava o sistema de realizar uma inversão ideológica: o
problema do sistema é a delinqüência, em vez de que a delinqüência surge porque o
sistema tem problemas. A delinqüência é em si mesma um problema e
simplesmente um reflexo de outros problemas (Young, 1986).
III. 7. O delinqüente é “livre e determinado”
A autora aponta como problema fundamental da nova
teoria da desviação e criminologia a tentativa de combinar uma teoria crítica que
levava a identificar o capitalismo, a sociedade de consumo, os agentes de controle
social como determinantes da delinqüência, ao tempo que se negava um sujeito
determinado e se afirmava a desviação como uma livre opção.
19
Downes (1979), vai introduzir a noção de que há fontes
delitivas que não são reduzíveis as desigualdades materiais.
Ou seja, as causas estruturais podem explicar a
potencialidade do delito, porém não a sua execução. Tal análise deve ser
complementada com outras correntes de pensamento, como a teoria subcultural ou
da anomia.
III. 8. O delinqüente no é “Robin Hood”
A crítica ao delinqüente visto como herói político vai
questionar que neste caso qualquer atitude intervencionista seria inadequada, posto
que seu ato esta imbuído de resistência as desigualdades sociais.
Da mesma forma, se a desviação for vista como uma
forma prepolítica ou inconsciente de oposição, vai surgir um novo modo de
intervenção o “correcionalismo revolucionário”.
Depreende-se assim, que tanto os positivistas pretendiam
adaptar o desviado a sociedade do presente, como alguns novos criminólogos
pretendem adapta-lo a sociedade do futuro.
III. 9. Política criminal “intervencionista”
A crítica indistinta a todo o tipo de intervenção social vai
sofrer ao final dos anos setenta diversas matizações.
A
autora,
identifica
uma
espécie
de
retorno
ao
classicismo, onde se advoga uma política penal que proteja as garantias e limites do
castigo.
III. 10. O criminólogo “condenador”
A apreciação do ato delituoso não pode substituir a
condenação do ato como tal.
Passa a admitir reformas na sociedade, mesmo que estas
apresentem caráter contraditório. Propostas de política penal podem ser vistas como
avanços ao sistema.
20
III. 11. A atenuação da concepção instrumental do direito
A nova criminologia adotou uma concepção instrumental
do direito, proveniente das teorias marxistas, caracterizada pela:
1. imagem da classe dominante como monolítica, como
se esta tivesse idênticos interesses;
2. afirmação de leis que defendem exclusivamente os
interesses desta classe;
3. apresentação da delinqüência como uma resposta as
condições de exploração econômica.
Na Europa esta visão marxista ortodoxa teve vida curta,
as versões estruturalistas marxistas, elaboradas fundamentalmente por Althusser,
vão relativizar a relação direta entre formas econômicas e relações jurídicas.
È nos EUA, que a versão instrumental vai ter maior
difusão, em razão de um conhecimento mais tosco do marxismo. Contaminando
assim,
toda
a
criminologia
marxista,
que
vai
ser
acusada
desta
visão
instrumentalista.
Esta visão vai super estimar a importância do direito, e em
especial o direito penal, na sociedade atual. Esta se caracteriza por haver
estabelecido mecanismos de reprodução dependentes fundamentalmente do
mercado – há que trabalhar para consumir – e a criação de necessidades
consumistas.
Nega a autonomia ao sistema penal suas contradições
com o Estado, ocorrendo ocasiões em que este se opõe às pretensões estatais, e
outras em que tais pretensões são mais progressistas que as do sistema penal, bem
como as divergências inerentes ao próprio sistema penal, através dos distintos
órgãos.
A influência de Foucault (1984) a criminologia eliminou
definitivamente a visão instrumental do direito. Através dos “micropoderes”, com sua
autonomia, permitiu compreender que os métodos e instituições punitivas podem ter
21
uma lógica interna, mesmo quando intercorrelacionada com as estruturas globais,
lhes permite reproduzir-se como microcosmos em diversos contextos sociais.
O rechaço à visão instrumentalista possibilitou uma
revalorização do direito e dos direitos.
Estes que tinham sido vilipendiados como “direitos
formais burgueses”, experimentam um novo reconhecimento. Se o direito não é
exclusivamente um instrumento das classes dominantes, poderá ser instrumento de
proteção. Se as formas jurídicas tem uma certa autonomia, poderão ser utilizadas
para proteger os direitos dos mais débeis. O direito penal legitima a intervenção
punitiva porém também a limita; o direito penal é um meio de castigo porém é
também um meio para a proteção de castigos excessivos.
IV.
A CRISE DA CRIMINOLOGIA CRITICA
I. CRISE
Nos anos oitenta a criminologia crítica se caracteriza por
uma certa confusão, divisão e desânimo.
Divisão devida o surgimento de tendências, mais ou
menos distintas. Alguns novos criminologos param a o que se chamou “realistas de
esquerda”, outros adotam a perspectiva abolicionista, e o minimalismo começa a
distinguir-se.
Como resposta as
premissas
adotadas
nos
anos
sessenta, parece que chegara o momento de assumir um discurso de direita,
referente ao delito, para dar-lhe uma resposta de esquerda.
O contexto social estava marcada pelo fortalecimento da
ênfase ao dinheiro, a competitividade, o triunfo – era a época dos “yuppies”. Junto
disso assistia-se as cruzadas morais, o inimigo principal eram as drogas,
relacionada à delinqüência, dentro desta guerra encontrava-se uma nova moral, que
ressaltava valores tradicionais, como a saúde, as relações monogâmicas, o trabalho
individual, e uma intromissão nos direitos individuais.
22
A autora destaca
que de todos
os
fatores
que
influenciaram a criminologia neste período o mais relevante foi à presença do
movimento feminista, que possibilitou a ampliação do objeto de estudo da
criminologia.
A crise aludida propiciou compreender que a criminologia
crítica não conseguira uma mudança de paradigma, pois seguia ancorada numa
perspectiva de etiquetamento com algumas notas de materialismo.
É nesse contexto que nos inícios da década de oitenta se
produzira uma divisão na criminologia crítica.
Na Inglaterra a corrente predominante foi a denominada
“realistas de esquerda”. Entendiam o delito como um problema das classes sociais
mais débeis, advogando que o desconhecimento deste fato propiciava deixar o
terreno aberto aso conservadores paladinos da “lei e da ordem”; a tarefa da
criminologia e por conseguinte lutar contra o delito e para combatê-lo deve
recuperar-se a polícia, utilizar o sistema penal e elaborar um programa de controle
do delito mínimo, democrático e multi-intitucional.
A outra corrente agrupou-se em torno dos pressupostos
abolicionistas, os quais gozavam de uma antiga tradição nos países escandinavos e
Holanda. Tendo como principais representantes Christie, Mathiesen, Bianchi e
Hulsman.
Afirmavam a inexistência do delito enquanto realidade
ontológica1, o que se denomina delito na verdade são conflitos sociais, problemas,
catástrofes, causalidades.
Steinert (1985) – “Os problemas são reais, o “delito” é um
mito”.
Pretender tratar o delito com o direito penal, para estes
teóricos, era visto somente como forma de incrementá-los.
A esta visão extremada vai surgir o pensamento
intermediário defendido por Baratta (1985), que sugeria um direito penal mínimo –
1
Parte da filosofia que trata do ser enquanto ser, i. e., do ser concebido como tendo uma natureza comum que
é inerente a todos e a cada um dos seres: &
23
minimalismo. Compartilhava da crítica ao direito penal a partir da ótica abolicionista,
porém entendia que era necessário uma política intermediária capaz de ser
defendida na atualidade. Advogava um direito penal mínimo e limitado por princípios
legais
(tipicidade,
irretroatividade,
legalidade),
funcionais
(subsidiariedade,
proporcionalidade) e pessoais (responsabilidade pelo fato). Este direito penal
mínimo e limitado teria como missão a defesa dos direitos humanos.
II. A QUESTÃO ETIOLÓGICA: AS CAUSAS DE SEU
ABANDONO
Depois de longo tempo de dominação do se que
denominou paradigma causal, paradigma etiológico, ou criminologia positivista,
centrado na busca das causas do porque as pessoas cometem delitos, entendia-se
que este fora superado por Labelling Approach. Este afirmava que a busca da
explicação do comportamento delitivo não devia partir do porque as pessoas
cometem delitos, e sim de porquê esta atividade é definida como delitiva. Durante
umas décadas isto foi saudado como uma mudança de paradigma na criminologia. A
explicação da delinqüência não residia na ação (individual) senão na reação (social).
Por que é “crítico” recuperar a pergunta causal???
Primeiro, por que a busca dos motivos pelos quais as
pessoas cometem delitos, não excluí o estudo de por quê determinadas atividades
são definidas como tal.
Segundo, não implica em aceitar uma definição legal de
delito. Ressaltando que entre o tipificado como delito e o considerado socialmente
como delitivo, existe uma congruência inegável.
Terceiro, o que interessa estudar é por quê realiza
determinada atividade sabendo que está proibida. Ou melhor, como influí a proibição
na realização do seu ato.
A autora reafirma a idéia de processo, isto é, que junto da
atuação do indivíduo está a atuação dos “outros” que definem comportamentos,
imputam motivos, atribuem significados, etc. , em definitivo que o comportamento
24
delitivo é uma construção social é obvio, porém, se adverte, construção social onde
há um sujeito atuante por alguns motivos – causas – que devemos estudar.
Observa Larrauri que a pergunta causal permitiu que se
iniciassem programas de reforma social, e a ignorância desta pergunta facilitou o
desenvolvimento de uma política de recortes assistenciais.
Quarto, o paradigma causal não leva necessariamente a
aceitar um programa correcionalista.
A insuficiência do modelo causal, vai impelir a Nova
Criminologia a produzir um modelo integrado que ao mesmo tempo que reclama um
estudo das origens mediatas do ato desviado para situar-lo em seu contexto socioeconomico e político estrutural.
III. AS ALTERNATIVAS AO CARCERE: “REDES MAIS
AMPLAS”?
A grande questão da Criminologia Crítica é a busca de
alternativas as instituições totais.
A política de não intervenção, vista como reivindicação
progressista na década de sessenta, no final dos anos setenta passa a ser vista
como melhor aliada das políticas de mercado livre, próprias dos governos Reagan e
Thatcher.
As políticas alternativas ao cárcere, que marcaram a
década de setenta, já nos oitenta vão ser vistas por Cohen (1985) como apenas
complementares a este, permitindo submeter um maior número de pessoas as redes
penais do Estado, quanto mais benevolentes pareciam maior era sua aplicação.
“O
cárcere
seria
substituído
por
uma
“sociedade
disciplinar”.
Entre a crítica ao cárcere e o papel de controle extensivo
conferido as alternativas a criminologia crítica encontrava-se num dilema.
O surgimento do abolicionismo vai ocasionar uma virada
no debate. Os criminológos abolicionistas não estavam demasiado preocupados
25
com discutir alternativas ao cárcere senão alternativas ao conjunto do sistema penal.
Enquanto o cárcere não for abolido, as alternativas tenderam a converter-se em
adidos a esta, deveram cumprir o mesmo que o cárcere – disciplinar as pessoas na
moralidade convencional dominante; repetiram as estruturas – meios institucionais
fechados, regimes disciplinares; e reprodução de seu erros: estigmatizar o ofensor
sem dar satisfação a vítima.
Meios alternativos de resolver os conflitos sociais, dos
quais o delito é somente um deles.
Sugere
a
autora
propostas
efetivas
para
a
descarcerização, como a descriminalização de numerosos tipos penais; acentuar os
mecanismos já existentes – o perdão, as multas – nas legislações penais; reclamar
a desaparição da prisão preventiva que configura na Espanha 49, 5% da população
reclusa. E definitivamente, priorizar o objetivo da descarcerização a despeito da
criação indiscriminada de alternativas.
IV.
A FUNÇÃO SIMBÓLICA DO DIREITO PENAL: O
PARADIGMA DA NOVA CRIMINALIZAÇÃO
O papel do direito penal não foi excessivamente discutido
pela criminologia crítica. Esta se concentrou no estudo da gênese da norma e em
sua aplicação seletiva, o que levou a constatar que o direito penal era um
“instrumento de classe”, utilizado para defender os interesses dos grupos sociais
poderosos.
Tal premissa poderia levar a duas conclusões: por um
lado, rechaçar o direito penal como instrumento de dominação, e por outro, utilizar o
direito penal para proteger os “interesses difusos”, para castigar a violação aos
direitos humanos.
Cohen (1985) vai dizer que se a criminologia crítica havia
conseguido um novo paradigma, na década de oitenta este parecia ser o da “nova
criminalização”.
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Observa-se um processo no sentido dos movimentos
progressistas recorrerem ao direito pena. Grupos de direitos humanos, de
antiracistas, de ecologistas, de mulheres, de trabalhadores, reclamam a introdução
de novos tipos penais.
A década de oitenta vai adotar a “função simbólica do
direito penal”. Função positiva conferida ao direito penal.
A autora sublinha que o movimento feminista foi quem
mais elaborou a necessidade de utilização do direito penal de forma simbólica.
Dizima não estar interessados no castigo, mas na função simbólica do direito penal.
Isto é, o que se consegue com a criminalização de tais
condutas é em primeiro lugar, a discussão pública acerca do caráter nocivo delas,
que o público se conscientize mediante campanhas prévias, e em segundo lugar,
mude a percepção pública.
Feministas críticas questionam a visão exposta acima,
chamando atenção para relegitimação do direito penal para a solução de conflitos
sociais, ignorando outros meios alternativos que favorecem uma maior autonomia e
auto-organização das mulheres.
O apogeu da concepção do direito penal simbólico
apresenta certa coerência com a nova situação política. Situação esta que por um
lado se caracteriza por governos de partidos socialistas, em alguns países, ou por
conquista de parcelas de poder por grupos progressistas, convencidos da
legitimidade de utilizar o poder para impor um nova moral. E por outro, se
caracteriza por uma desmobilização social das forças tradicionais de esquerda.
Um nova discussão que surgiu renovada na década de
oitenta foi a revalorização do direito penal como um direito de garantias.
Afirmando que o direito penal não (somente) legitima a intervenção penal
também a limita; o direito penal não (somente) permite castigar também
permite evitar castigos excessivos (Ferrajoli – 1989).
A relação entre direito e sociedade, deve ser vista sob a
ótica da teoria sistêmica de Luhman – onde este questiona a existência desta
27
comunicação entre direito e sociedade, afirmando o caráter auto-referencial e autopoiético do sistema jurídico.
Nesse sentido a atribuição de papel simbólico ao direito
penal deve ser questionado, tendo em vista que este não ordena simbolicamente a
hierarquia de valores sociais.
V.
A VITIMOLOGIA: DE QUE LADO ESTAMOS???
Outro problema que enfrentou a criminologia crítica foi o
surgimento da vítima.
Na década de oitenta a criminologia para a analisar três
aspectos: o delinqüente, a reação social e a vítima.
A vitimologia que anteriormente havia tido um ar
conservador adota outra faceta. Se tratava de proteger a vítima, desde logo a
discussão questionaria a possibilidade de tal tarefa através do direito penal ou do
processo penal.
Ao analisar o papel da vítima no delito pode permitir o
estudo de como funcionam as relações de poder em um contexto social, como a
falta de poder é um importante elemento vitimizador.
VI.
A TAREFA DO CRIMINOLOGO CRITICO: O QUE
FAZER???
Anos oitenta: A Criminologia Critica deve se comprometer
com programas que persigam a erradicação do delito???
Young (1986) – “(...) de forma categórica a tarefa
fundamental de uma criminologia crítica é encontrar uma solução ao problema do
delito, e o objetivo primordial de uma política socialista é reduzir substancialmente o
índice de delinqüência”.
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A política criminal passava a ser tarefa fundametnal da
criminologia.
Segundo a autora, mesmo os abolicionistas, em sua
maioria, estão orientados para uma política criminal, de distinto signo. Enquanto os
realistas ingleses falavam de controlar o delito, recuperar a polícia, reformar o
delinqüente, etc., os abolicionistas advogavam por resolver o conflito, negociar com
a vítima, sem excluir a reforma do ofensor.
Se o poder esta disperso, ou se exerce, em múltiplas
relações, e existe em múltiplos âmbitos sociais, não há o que temer, é possível
desenvolver uma praxis crítica em todos os sitios e ... em nenhum deles esta
garantida (Scheerer, 1989).
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