Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória
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Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória
2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória [ES]: instrumento de conservação territorial Bruno Amaral de Andade Graduando em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES, e Pesquisador do Laboratório Patrimônio & Desenvolvimento Territorial – Patri_Lab. Vitória [Espírito Santo], Brasil. <[email protected]>. Renata Hermanny de Almeida Arquiteta Urbanista; Doutora em Arquitetura e Urbanismo, pela Universidade Federal da Bahia (2005), Coordenadora do Laboratório Patrimônio & Desenvolvimento Territorial – Patri_Lab. Vitória [Espírito Santo], Brasil. <[email protected]>. Nota: Este escrito deriva de investigações elaboradas no contexto de um trabalho de conclusão de curso, realizado junto ao curso de Arquitetura e Urbanismo da UFES por Bruno Amaral de Andrade, e orientado por Renata H. de Almeida. Resumo O trabalho “Uma Rota Patrimonial para o Rio Santa Maria da Vitória, como estratégia de conservação territorial” está inserido na temática contemporânea patrimônio e projeto territorial. Um dos âmbitos dessa discussão trata dos parques patrimoniais (SABATÉ; SCHUSTER, 2001) como instrumentos fundamentados na valorização e conservação do patrimônio territorial (MAGNAGHI, 2000), e da paisagem cultural (SABATÉ, 2004), conceituando patrimônio em seu entendimento mais amplo – recursos naturais e culturais. Serão investigadas a linhas metodológicas de Sabaté (2001 e 2004) e Magnaghi (2007 e 2009) do processo indissociável, arquitetônico e urbanístico, de – análise da paisagem cultural e projeto de parque patrimonial –, a fim de obter repertório que possa balizar o projeto de uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória, tendo como referência o território que compreende a bacia do rio: os municípios desde a nascente em Santa Maria de Jetibá ao deságue na baía de Vitória, perpassando Santa Leopoldina, Cariacica e Serra. Seu objetivo é reconectar os recursos patrimoniais presentes ao longo da bacia do rio Santa Maria da Vitória através da narração da história desse território, em vista a sua conservação pelo tecido de uma rota patrimonial em nível de estudo preliminar. Parte do mesmo, esse escrito pretende apresentar uma análise das referências metodológicas estudadas, uma reflexão a partir desta análise para o caso do território referenciado pela bacia do rio Santa Maria da Vitória, e uma aproximação ao inventário dos seus recursos patrimoniais. Palavras Chave Rio Santa Maria da Vitória, rota patrimonial, parque patrimonial, território patrimonial, paisagem cultural. A heritage route for Santa Maria da Vitória river [ES]: instrument for territorial conservation Abstract The paper "A Heritage Route for the Rio Santa Maria da Vitoria, as a territorial conservation strategy" is inserted in contemporary theme – heritage and territorial project. One of the ambits of this discussion deals with the heritage parks (SABATÉ; SCHUSTER, 2001) as instruments based on territorial heritage valuation and conservation (MAGNAGHI, 2000), and cultural landscape (SABATÉ, 2004), conceptualizing heritage in a broader understanding - natural and cultural resources.It will be investigated the methodological lines of Sabaté (2001 and 2004) and Magnaghi (2007 and 2009) of the inseparable process, architectural and urban, of - analysis of the cultural landscape and heritage park project - in order to obtain repertoire that can mark out a route sheet design for the Santa Maria da Vitória river, with reference to the territory that comprises the river basin: the municipalities from the source in Santa Maria Jetibá until the baía de Vitória, passing through Santa Leopoldina, Cariacica and Serra. The objective of this work is to reconnect the heritage resources presented along the basin of the Santa Maria da Vitória river through the narration of the history of this territory in order to preserve the resources by a route sheet at the level of preliminary study. However, the first semester of work offers an analysis of the cited authors, a reflection through this analysis for the territory’s case referenced for de Santa Maria da Vitória river watershed, and an approaching to the inventory of the heritage resources. Keywords Santa Maria da Vitória river, heritage route, heritage park, territorial heritage, cultural landscape. 1 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Patrimônio e projeto territorial Conceitualmente, este trabalho se insere na temática Patrimônio e projeto territorial, nos âmbitos da delimitação e análise da paisagem cultural (SABATÉ, 2004) e do território patrimonial (MAGNAGHI, 2000), objetivando a proposição de uma rota patrimonial orientada, no recorte conceitual-projetivo do trabalho, para a conservação do território. Essa relação, Patrimônio e projeto territorial, aparenta uma dicotomia transgredida a partir da renovação do conceito de território, iniciada na década de 1970, principalmente com os grupos de estudos italianos, o Grupo de Revalorização de Áreas Marginais – GRAM, o Sistema Local Territorial – SloT, e a Escola Territorialista Italiana, fundada por Alberto Magnaghi. Saquet (2010) faz uma reflexão e crítica acerca das abordagens e concepções do território, apresentando-os segundo suas especificidades. Para o desenvolvimento do estudo, adota-se o conceito de território de Magnaghi (2000): o resultado da sobreposição de três camadas, patrimônio ambiental, patrimônio territorial, e patrimônio socioeconômico. O desafio é buscar soluções contemporâneas de inserção dos recursos patrimoniais em um projeto territorial. Assim, identificam-se instrumentos, por meio da análise de estudos de caso em localidades na América e Europa, no que tange às paisagens culturais e parques patrimoniais (SABATÉ, 2004). Essas experiências contribuem para referenciar a análise e o projeto de uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória, a partir da montagem de um Mosaico Metodológico, que constitui a primeira contribuição do trabalho de monografia. Sabaté (2005, p.31) explica a importância da dissociação de soluções urbanísticas da contemporaneidade com as vigentes no século XX, caracterizando as primeiras pela ênfase na dinâmica populacional e o desenvolvimento industrial, além da utilização do zoneamento e do projeto de grandes infraestruturas como instrumentos fundamentais. Na contemporaneidade, em contrapartida, propostas de ordenação territorial começaram a atender ao binômio natureza-cultura, como signo de um conceito único – patrimônio. Nesse contexto, ressalta o sucesso de experiências, cujos objetivos em comum são: “(...) incorporar a identidade histórico-cultural nos processos de planejamento; utilizar os recursos culturais para melhorar a qualidade dos ambientes urbanos e rurais; vincular patrimônio cultural e redes de espaços naturais, a fim de criar espaços de identidade em alguns territórios crescentemente afetados por tendências globalizadas; propor medidas para encorajar a atenção e conscientização do valor desses recursos. (...) pretende em definitiva fundir a histórica cultural, com origem no passado, com o planejamento, com vontade de projetar o futuro” (SABATÉ (2005, p.32). Para este artigo, por contribuírem com lições a cerca da temática, por serem referenciados por cursos d’água, e por terem semelhança de escala com o rio Santa Maria da Vitória, foram eleitos como estudos de caso os projetos: “Eixo Patrimonial do Llobgregat” na Catalunha, Espanha (SABATÉ; SCHUSTER, 2001); “Corredor Patrimonial Nacional do Canal Ohio e Erie”, nos EUA (SABATÉ; SCHUSTER, 2001); e “Endereço Projetual para o Parque Fluvial do Valdarno de Empoli”, na Itália, Master Plan de Magnaghi (2009). O rio Santa Maria da Vitória O Santa Maria da Vitória possui 122 km de extensão da sua nascente, na serra do Garrafão, em Santa Maria de Jetibá, há 1.300 m de altura, até a baía de Vitória, perpassando os municípios de Santa Leopoldina, Cariacica e Serra, com uma área de drenagem de 1.844 2 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña km² (ver figuras 1 e 2). O seu eixo navegável situa-se entre baía de Vitória e o distrito-sede de Santa Leopoldina (ver figura 3), 47 km, historicamente explorado com objetivos socioeconômicos ao viabilizar: o translato de imigrantes, iniciando a ocupação da região e fundando a antiga colônia de Santa Leopoldina; e o transporte de cerca de 120 sacas de café por canoa, com força de mão-de-obra escrava (SCHWARZ, 1992). Figura 1. Mapa das bacias hidrográficas do Estado do Espírito. Disponível em: <http://ecobacia.org/regioes_es.html> Figura 2. Mapa da bacia hidrográfica do rio Santa Maria da Vitória. Disponível em <http://www.cesan.com.br/page.php?25> Figura 3. Foto do rio Santa Maria da Vitória, visto do distrito-sede de Santa Leopoldina, ES. 2011. Essa ocupação, a partir de um projeto do II Império, na metade do século XIX, possibilitou um encontro de diversas culturas europeias ao longo do eixo principal do rio e dos córregos, sendo as principais de origem camponesa germânica, como os prussianos, pomeranos e austríacos. Assim, foi erigida uma relevante produção arquitetônica na região, tanto em pequenos núcleos urbanos quanto em edifícios isolados no meio rural (SCHWARZ, 1992). 3 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Ainda no final do século XIX, a Colônia de Santa Leopoldina foi desmembrada, e desse processo emanciparam-se Santa Tereza, em 1890, e Afonso Claudio e Ibiraçu, ambos em 1981. Além de, tardiamente, Santa Maria de Jetibá, em 1988. Do que restou desse processo é o que se considera o atual município de Santa Leopoldina, composto pelo distrito-sede de Santa Leopoldina, e pelos distritos de Mangarai e Djalma Coutinho (SCHWARZ, 1992). É importante ressaltar que o momento áureo de desenvolvimento da Colônia se deu devido ao intercâmbio socioeconômico com o litoral, a capital Vitória, no final do século XIX, regido a partir do eixo navegável do rio. Todavia, a partir dos desmembramentos políticoadministrativos, instituindo-se outros municípios, e da abertura de rodovias, que conectaram diretamente as regiões produtoras de café e hortifrutigranjeiros à capital, o rio perdeu o valor de rota socioeconômica, rompendo-se, portanto, o seu vínculo de memória. O rio Santa Maria é um dos principais mananciais do Espírito Santo, responsável pelo abastecimento de água da Grande Vitória. No entanto, segundo a Organização Não Governamental ECOBACIAS – Instituto de Meio Ambiente, Recursos Hídricos e Desenvolvimento Sustentável (fonte: <http://ecobacia.org/regioes_es.html>), o rio enfrenta diversos problemas, dentre eles, a grande quantidade de agrotóxico despejado em suas águas devido ao manejo incorreto nas lavouras, o assoreamento e a poluição pelo esgoto e lixo (ver figuras 4 e 5). Figura 4. Principais benefícios e aproveitamentos do rio Figura 5. Principais problemas no rio. Disponíveis em: <http://ecobacia.org/regioes_es.html> Considera-se que o rio – recurso patrimonial: curso d’água – seja elemento chave para a reativação da condição próspera da região, afim de se reconectar os estratos sócio-espaço- 4 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña temporais (ANDRADE, 2006), constituídos em diversificadas paisagens culturais ao longo desse território determinado pela bacia hidrográfica do rio Santa Maria da Vitória (ver figura 2 e 3). Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória A hipótese de que o rio Santa Maria da Vitória e os recursos patrimoniais a ele vinculados estão desconectados direciona a elaboração de um projeto de rota referenciada pela bacia hidrográfica do rio, a fim de conectar o rio e os seus recursos patrimoniais. Assim, a idéia não é adotar o eixo principal do rio – patrimônio ambiental, mas sim, ir à busca dos vestígios históricos – patrimônio territorial, penetrando por caminhos delineados pela articulação dos recursos encontrados na extensão da bacia. Ademais, os edifícios históricos, alguns legalmente protegidos por meio do tombamento pelo Conselho Estadual de Cultura, que tiveram auge e relevância entre o final do século XIX e início do XX, podem estar em abandono, com uso indevido, e ainda em condições de conservação precárias. O objetivo é a conservação do território ao qual pertencem, e, por conseguinte, dos artefatos históricos. Da mesma maneira, considera-se a inexistência de uma imagem forte para a região do rio Santa Maria da Vitória, a qual possa destacá-la em escala local, regional e global. No passado, esta esteve relacionada ao vínculo socioeconômico, através do comércio do café e do translato de imigrantes europeus, entre a metade do século XIX e início do século XX. Ao objetivar a elaboração de uma imagem para o projeto da rota patrimonial, incorporando um tema que represente a narração principal do rio como patrimônio natural de escalas local e global, acredita-se estar contribuindo para reforçar o reconhecimento e revalorização da região acerca da memória do rio pelas comunidades. Pesquisa metodológica A metodologia aplicada ao trabalho articula procedimento qualitativo e empírico, por meio da pesquisa em fontes primárias, secundárias e manipulação de softwares específicos. Para Serra (2006, p. 183) “(...) o levantamento de dados secundários e a formação do embasamento teórico precedem qualquer levantamento de dados primários”. Assim este trabalho fundamenta-se no estudo dos trabalhos mais atualizados de Joaquin Sabaté e Alberto Magnaghi para referenciar a investigação do tema Patrimônio e projeto territorial. Outros dados secundários são os modelos físicos, por meio da produção do tipo analógico, com a manipulação da base Ortofotomosaico, através do uso do software ArcGis, e CorelDraw, e do AutoCAD, para o projeto de uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória. Por sua vez, visando a “descrição do objeto, com o objetivo de conhecê-lo profundamente” decidiu-se pela elaboração de estudos de caso, tendo em vista que “esse método pretende esgotar o conhecimento sobre certo exemplar, escolhido por critérios que são claramente explicitados”. (SERRA, 2006, p. 81-82) Como indicado acima, foram elencados três experiências, no que tange à paisagem cultural, território patrimonial, e parques patrimoniais. Complementarmente, será utilizado o método empírico, ou seja, “(...) a coleta de informações diretamente do real, isto é, dos objetos-concretos (...)” (SERRA, 2006, p.184). No caso do trabalho o objeto-concreto é o território referenciado pela bacia do rio Santa Maria da Vitória, e abrange visita de inspeção, e observação e descrição através de fotografias e vídeos. 5 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña As contribuições de Joaquin Sabaté e Alberto Magnaghi A principal referência metodológica utilizada no desenvolvimento analítico e projetual é a de Joaquin Sabaté (2001 e 2004). Esta abrange diversos estudos a cerca de paisagens culturais e parques patrimoniais na Europa e nos Estados Unidos, a fim de expor lições que orientem a proposição de uma rota patrimonial para o rio Llobregat, na Catalunha, Espanha. Ademais, de Alberto Magnaghi (2007 e 2009) será utilizada a metodologia de análise territorial e o projeto de um parque fluvial. Joaquin Sabaté O foco da abordagem de Joaquin Sabaté é um projeto de urbanismo baseado nos recursos patrimoniais de determinada região. Trata-se de uma aproximação relativamente recente na Europa e nos Estados Unidos, divulgada pelo Laboratorio Internacional de Paisajes Culturales, criado por Sabaté em 2001 em conjunto com professores da Universidade Politécnica da Catalunha e do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, com o intuito de investigar e difundir as paisagens culturais (SABATÉ, 2005, p.7). A busca pelo domínio dos conceitos basilares da abordagem de Sabaté se inicia pelo conceito de paisagem cultural, ou seja, “(...) o vestígio do trabalho sobre o território, algo como um memorial ao trabalhador desconhecido”. Em termos metodológicos o trabalho com a paisagem cultural e parque patrimonial, de forma geral, segue a seguinte estrutura: o inventário dos recursos, sua hierarquização e interpretação em função de uma determinada história, e a construção de uma estrutura suporte, que mediante itinerários os vincule entre si e com centros de interpretação, museus e serviço. A quantidade e relevância dos parques patrimoniais projetados nos EUA tornaram-se referência de instrumento de desenvolvimento territorial, principalmente no que tange à revalorização do seu patrimônio industrial e a atuação de diversas instituições de gestão e amparo ao patrimônio, como o National Service Park. A partir do reconhecimento desses projetos consolidou-se o modus operandi do desenho de parques patrimoniais, e os meios com os quais se devem buscar reconhecimento legal e aprovar programas de apoio (SABATÉ, 2005, p.20). Não obstante, na Europa encontram-se cada vez mais projetos de parques industriais, mineiros, agrícolas, fluviais, rotas históricas, paisagens bélicas, parques arqueológicos ou ecomuseus (SABATÉ, 2005, p.20), o que demonstra que se trata de um modelo projetual atualizado e de sucesso, que visa a reconexão dos recursos patrimoniais na lógica de articulação da rede local-global. A maioria desses projetos requer adaptação de antigas áreas industriais e agrícolas aos novos requerimentos e atividades próprias do século XXI (novas tecnologias, educação, comunicações, ócio e turismo, informação...). Metodologicamente, quatro são as fases propostas: inventário, interpretação, definição de unidades temáticas e unidades de projeto (SABATÉ; SCHUSTER, 2001). Esse processo compreende um inventário dos recursos, sua hierarquização e interpretação em função de uma determinada história, e a construção de uma estrutura suporte, que mediante percursos vincule os recursos entre si e com centros de interpretação, museus e serviços; segundo o seguinte diagrama metodológico: A) Inventário ↔ B) Interpretação ↔ C) Unidades temáticas ↔ D) Unidades de projeto Complementarmente, Sabaté (2001, p.80 e 81) desenvolve diagramas (ver figura 4) situando os vários estudos de caso, Europeus e Americanos, são eles: Parque Agrário do 6 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Baixo Llobregat, Parque das Colônias do Llobregat, Parque Agrícola do Sul de Milão, Ripoll, Parque Agrícola de Palermo, Argovian Reuss Valley and Estuary, Groenblauwe Slinger, Emschen Park e Alba Ter – como forma de apresentar a metodologia de trabalho de análise da paisagem e projeto de parque patrimonial. Figura 4. Diagrama do contexto urbano. Fonte: SABATÉ; SCHUSTER, 2001. Alberto Magnaghi Magnaghi articula desenvolvimento sustentável e território a partir da necessidade do território de se auto-sustentar e se eco-desenvolver. Com efeito, a sustentabilidade é alcançada a partir do equilíbrio de três premissas: “(...) direcionar o desenvolvimento aos requisitos humanos básicos (que não podem ser reduzidos a necessidades materiais); contar com o próprio potencial, ou seja, desenvolver a autogestão a partir da sociedade local; e alcançar o desenvolvimento da qualidade ambiental” (MAGNAGHI, 2000, p.10 e 11). Anteriores a essa conceituação, a partir da década de 1970, a produção teóricometodológica da geografia italiana originou dois grupos nas décadas seguintes: o Grupo de Revalorização de Estudos Marginais [GRAM], na década de 1980, e do Sistema local Territorial [SloT], na década de 1990 (SAQUET, 2010, p.115). No que tange ao aparato conceitual, Magnaghi afirma que território “(...) é uma obra de arte; obra da transformação da natureza por meio da sobreposição no tempo histórico de numerosos ciclos de civilização; produto do homem plasmado em matéria inerte – produto do diálogo, uma relação entre entidades vivas, o homem e a natureza, ao longo da história; um neo-ecossistema, um outro sistema gerado pela interação homem-natureza” (MAGNAGHI, 2000, p.9). 7 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Assim, o território deve ser entendido como organismo vivo e altamente complexo, constituído de localidades com história própria, características, identidade e estrutura de longo prazo (MAGNAGHI, 2000, p.9). Já o desenvolvimento auto-sustentável local está relacionado à produção do território em sua totalidade, envolvendo produção de qualidade de vida e do ambiente, valorização da produção específica de cada paisagem e da identidade urbana e cultural. A produção da qualidade territorial é um indicador de sustentabilidade ambiental, premissa da valorização do território e das relações compreendidas entre os atores sociais que o usam como suporte – territorialidades. Magnaghi (2000, p.10) defende um renascimento do território (diante da problemática atual da degradação do ambiente, crescimento populacional exponencial, pobreza nas periferias), onde seja possível travar novas alianças entre natureza e cultura, e cultura e história. A maneira de se promover esse renascimento é através da herança cultural (a identidade de cada lugar), potencial produtora de riqueza, e da herança que será legada às futuras gerações. De fato, a sua é valiosa, pois destaca o papel do território, em seu entendimento mais amplo, e define objetivos e métodos capazes de projetar um território a partir da sustentabilidade ambiental, econômica, social e cultural (ver figura 5). Em vista a perpetuar o projeto, propõe um processo de gestão particularizado na manutenção dessa reconstrução, onde a participação da comunidade local é a chave para a sustentabilidade. Figura 5. Diagrama do endereço projetual do parque fluvial do Valdarno de Empoli. Fonte: MAGNAGHI, 2009. Também se destaca a influência teórico-filosófica de Guilles Deleuze e Felix Guatarri na Escola Territorialista Italiana, para compreensão do movimento do território através da territorialização, desterritorialização e reterritorialização (TDR). Pressupõe-se assim que o território caracteriza-se por uma desterritorialização prévia, num processo de reterritorialização, constante e perene. Essa conceituação contribui para o entendimento do território como um processo continuamente em movimento, determinado pela identidade de cada lugar, pelos atores sociais, pela paisagem e pela interação entre eles. O método utilizado em “Il Nuovo Piano Paesaggistico: La Valorizzazione di un Bene Comune per la Qualità dello Sviluppo della Regione Puglia”, que pode ser traduzido como “Um novo 8 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña plano paisagístico: a valorização de um bem comum para a qualidade do desenvolvimento da região de Puglia” (MAGNAGHI, 2007), inicia-se com uma aproximação dos produtores da paisagem a consciência do lugar a partir da democracia participativa e da gestão. O plano evidencia o que deve ser feito em cada uma das três etapas do trabalho (Figura 10). A primeira etapa compreende “Identidade e estatuto”, onde é elaborado um Atlas do patrimônio territorial ambiental paisagístico e socioeconomico, que visa a descrição analítica, descrição de síntese, definição das áreas territoriais e paisagísticas, descrição dos elementos patrimoniais e das figuras territoriais de cada área; compreende ainda “Estatuto do território e da paisagem”, onde para cada figura territorial e paisagística são consideradas as variáveis estruturais que as definem, o estado de conservação das variáveis, e as regras de reprodutibilidade das variáveis. A segunda etapa “Cenário paisagístico de médio-longo prazo” abrange o desenho do futuro uso do território e da paisagem (delineado a partir dos valores patrimoniais identificados no Atlas); e Indicação dos projetos, políticas e ações de massa aos valores patrimoniais de forma sustentável; abrange também o “Projeto (de caráter integrado e multi-setorial)” relativo à viabilidade (técnica, socioeconômica, institucional e financeira) que categorize os valores patrimoniais em conservação, requalificação, valorização e/ou transformação (reconstrução/construção de nova paisagem). Já a terceira etapa “Norma técnica de atuação”, compreende a territorialização do sistema de normas: restrições, regras, projetos e avaliações. Dentre as formas de participação que o autor indica, está o conceito do Fórum da paisagem, cuja função é acompanhar de diversas formas todo o processo do planejamento, interagindo com a constituição do quadro cognitivo (definição dos valores patrimoniais e das problemáticas da construção dos cenários e dos projetos do plano). Caracteriza-se por: Iniciativas do Fórum, sítio na internet e Observatório, as Conferências da área, workshops e assembleias, e reuniões na cidade. Em suma, nota-se a abrangência e complexidade da metodologia utilizada por Magnaghi para um planejamento territorial auto-sustentável, de forma a entender-se um instrumento em particular – o parque fluvial, que pode ter como endereços projetuais: conservação, valorização, requalificação e transformação. Desta metodologia, contribui-se inerentemente para o recorte do trabalho de monografia a categorização da conservação. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória Após o levantamento de dados secundários e a formação de embasamento teórico, parte-se para o trabalho na abordagem empírica, cujo objetivo é o da aplicação da metodologia de Sabaté (2004) para o caso do rio Santa Maria da Vitória. O método empírico é aplicado no que tange à aproximação com o objetivo em estudo, o território referenciado pela bacia do rio Santa Maria da Vitória. Serra (2006, p.183) afirma que “a coleta de informações diretamente do real, isto é, dos objetos-concretos, e a conformação de uma base empírica para as suas conclusões são a parte central e mais importante da investigação, pois é nesta etapa da pesquisa que todo conhecimento novo é produzido”. Assim, apesar de entender que se trata de aplicação de metodologia préexistente, não se limita a isso. Considera-se não apenas as similaridades, mas, principalmente, as diferenciações dentre o objeto-concreto (rio Santa Maria da Vitória) e o objeto-modelo (rio Llobregat), no que tange à análise do território (MAGNAGHI, 2000). 9 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña A metodologia do objeto-modelo seguirá verificação das condições de sua operacionalidade e dos instrumentos identificados na metodologia de SABATÉ (2004) para o híbrido análiseprojeto de uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória. Neste artigo apresenta-se os estudos feitos até a primeira fase do procedimento, o inventário, com suporte de Ortofotomosaico e dos softwares ArcGis e CorelDraw para manipulação imagética. O inventário pretende identificar os recursos naturais e culturais vinculados ao rio Santa Maria da Vitória e estudar a sua implantação no território; e como produto mapeamentos da localização e implantação dos recursos. Inventário dos recursos O inventário é a base para se decidir quais recursos farão parte dos percursos principais do parque, e quais serão complementares, segundo seu valor histórico e cultural, e, principalmente, orientados pela narração principal da história que se pretende ilustrar no território. Além de compreender os recursos patrimoniais, deve-se identificar o estado de conservação dos mesmos. O objetivo é mostrar toda a potencialidade do território através da elaboração de um fichamento e produção de um mapeamento As fichas contêm dados relativos ao tipo de recurso, a quem pertence, a sua localização e importância relativa, podendo ser dividido em cinco categorias (SABATÉ, 2005). Contudo será costurada uma série de analogias considerando-se o contexto brasileiro, e espíritosantense em cada uma das categorias. Assim, tem-se: • Recursos vinculados a infraestruturas: a ponte do funil, represas da Suíça, em Santa Leopoldina, e de Rio Bonito, em Santa Maria de Jetibá, e a estrada de ferro Vitória-Minas. • Recursos vinculados ao desenvolvimento industrial: as usinas hidrelétricas da Suíça e Rio Bonito, e algumas fábricas de cerveja. • Fazendas e estradas rurais: há algumas fazendas de cana-de-açúcar e café em Santa Leopoldina, e algumas estradas rurais, entre Santa Leopoldina, Santa Maria de Jetibá e Santa Teresa. • Outros marcos singulares isolados: há algumas igrejas católicas e luteranas, em Santa Leopoldina e Santa Maria de Jetibá, e o monumento do imigrante em Santa Leopoldina. • Elementos intangíveis: Neste quinto item, analogicamente, há o Caminho do Imigrante, entre Santa Leopoldina e Santa Tersa, o livro Canaã de Graça Aranha, e a língua pomerana. O inventário está estruturado em fichamento contendo dados relacionados ao tipo de recurso e as seguintes informações: proprietário, localização, relevância à narração principal da história da rota, e apoio imagético. A partir da análise desse levantamento será possível identificar quais recursos formam parte da estrutura principal da narração da história da rota, e quais outros, possuem função complementar. Exemplo de fichamento dos recursos da região • Nome: Sítio Histórico de Santa Leopoldina. • Localização: Distrito-Sede do Município de Santa Leopoldina, ES. 10 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña • Propriedade: - • Uso dominante: - • Data da construção/criação: Final do século XIX e início do século XX • Estado de conservação: - • Descrição: Trata-se de edifícios originalmente de uso dominante comercial, em estilo colonial, com alguns elementos ecléticos, em dois pavimentos e sobre a testada do lote. • Interpretação: O papel do sítio histórico na narração da história da rota patrimonial remete ao início da ocupação da colônia de Santa Leopoldina por imigrantes germânicos a partir de 1857, e ao protagonismo do distrito-sede como entreposto comercial entre os produtores da região e a capital. Figura 6. Recorte do território referenciado pela bacia do Santa Maria da Vitória, escala 1/750.000. Fonte: ANDRADE, 2011. Figura 7. Recorte do sítio histórico de Santa Leopoldina, ES, escala 1/75.000. Fonte: ANDRADE, 2011. Figura 8. Sítio histórico de Santa Leopoldina, ES, escala 1/25.000. Figura 9. Foto do sítio histórico. Fonte: ANDRADE, 2011. 11 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña Considerações finais – Um Mosaico Metodológico O mosaico metodológico é a contribuição ímpar do trabalho até então, pois, trata-se de uma reflexão a cerca das análises do método híbrido análise-projeto de Sabaté (2001 e 2004) e Magnaghi (2007 e 2009), acionando-se uma visão crítica a respeito da adaptabilidade e elasticidade destas ao caso do território em estudo. O estudo de caso referencial é o do Llobregat, em Sabaté (2001), cujo contexto de gênese territorial se deu com o desenvolvimento industrial, a espelho do que aconteceu na Europa. Por outro lado, o Santa Maria da Vitória teve sua gênese com um projeto de povoamento do interior do Estado do Espírito Santo, por meio do incentivo à imigração e à cultura do café. A região foi desmembrada política-administrativamente; o rio perdeu o papel protagonista de comunicador do interior com o litoral; perdeu também população, que migrou para outras localidades; e a região, que teve um momento áureo de prosperidade entre o final do século XIX e início do XX, a partir de então definhou. Todavia, o legado arquitetônico proporcionado por essa fusão de etnias europeias, principalmente de origem alemã, permaneceu como recurso de memória. O objetivo do projeto da rota é, justamente, conectá-los, e contar a sua história, para que seja reativada a autoestima das comunidades; e cultuar a importância da conservação da arquitetura, como contadora de história, silenciosa, onde seja preciso ativar sentidos como ver, tocar e sentir, e não somente ouvir, ou ler nos livros. Conservar a identidade do passado é permitir uma reflexão de memória no presente, em vista a um projeto futuro balizado nas singularidades do local como chave para o desenvolvimento. Nesse sentido, Sabaté (2005, p.21), a partir da análise dos estudos de caso, elenca dez lições orientadoras para um projeto de parque patrimonial. No entanto, o recorte desse trabalho abrange o híbrido patrimônio-conservação do território; segundo enfoque dos quatro primeiros itens, principalmente à conservação dos recursos do rio Santa Maria da Vitória. Na segunda lição, é abordada a questão da narração da história do território. Segundo Sabaté (2005, p.23) a importância de se narrar uma história do lugar está relacionada com a fabulação de um roteiro geral do parque que conecte os recursos patrimoniais (naturais e artificiais), mesmo distantes, para que interajam e se reforcem. Assim, a narração do rio Santa Maria da Vitória remete ao seu protagonismo como veículo socioeconômico na região a partir da metade do século XIX e início do XX, através dos canoeiros – escravos, de mercadorias produzidas na região, principalmente o café; e dos imigrantes e a esperança de uma vida próspera, pela fuga da instabilidade político-administrativa, religiosa e econômica da Europa nesse período, além da ameaça de doenças como a febre amarela, em busca de um pedaço de terra e liberdade de culto religioso. Na terceira lição, há orientação a respeito do recorte da área de trabalho, com possibilidade de ter-se um âmbito mais extenso. Portanto, está justificada a escolha do elemento curso d’água como delimitador do âmbito do parque patrimonial, e os sub-âmbitos, as paisagens culturais, identificadas no percurso principal e dos afluentes; sendo que todas essas paisagens devem conectar-se a narração principal. A quarta lição discorre sobre o fortalecimento ou sugestão de uma imagem, é fundamental ao trabalho, pois sugere o reconhecimento e o destaque da identidade do lugar. Para a construção dessa imagem é preciso elaborar uma marca ou um ícone, que referencie cada recurso a uma escala superior. Sabaté (2005, p. 24) informa, ainda, que os próprios 12 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña residentes muitas vezes se surpreendem com a história narrada a partir da implementação do projeto, pois, geralmente, desconhecem ou pouco valorizam os seus recursos. Não obstante, o termo utilizado por Sabaté (2004) “unidades temáticas”, no trabalho de monografia é substituído por “unidades de paisagem”, pois, entende-se, exprime com maior clareza o entendimento da paisagem cultural identificada em um determinado local. Retomando-se a metodologia orientadora deste trabalho, o objeto-modelo é o território referenciado pela bacia do rio Santa Maria da Vitória. Esta escolha se deve, principalmente, à utilização da metodologia de análise e projeto territorial de Sabaté (2004), no que se refere à aplicação para a rota patrimonial do rio Llobgregat. Entre outros fatores, este será o objeto-modelo devido a similaridades de escala entre os rios, tendo o Santa Maria da Vitória, 122 km, e o Llobregat, 170 km; além de ambos os elementos terem sido decisivos para a ocupação territorial ao longo do seu eixo e afluentes, determinando características relevantes nos seus recursos construídos. Além disso, numa primeira diferenciação entre a metodologia de Sabaté (2004) para o Llobregat e esta para o Santa Maria da Vitória, torna-se imprescindível uma diferenciação entre rota e parque patrimonial para que se tenha um entendimento da totalidade desses instrumentos no território. A rota patrimonial no rio Llobregat é identificada por um âmbito (parque patrimonial) dotado de sub-âmbitos, que são as diferentes paisagens culturais referentes à ocupação ao longo do eixo do rio. Por outro lado, no rio Santa Maria da Vitória, não há uma ocupação territorial em todo eixo do rio, tornando-se impossível utilizar-se a mesma lógica do Llobregat. Assim, será necessário projetar uma rota patrimonial conectora dos diversos parques patrimoniais identificados pelas paisagens culturais no perímetro da bacia do rio. Logo, a rota para o rio Santa Maria da Vitória será de escala local e regional, no sentido de englobar e conectar cada parque, em cada paisagem cultural identificada, e regional, por conectar diversos parques, alcançada pela unidade incorporada pelo rio. Ademais, retomando os conceitos centrais de Alberto Magnaghi e Joaquin Sabaté, entendese que o patrimônio territorial de Magnaghi (2009) equipara-se ao conceito de paisagem cultural de Sabaté (2004), já que o território em Magnaghi (2009) é composto por três camadas (patrimonial, ambiental e socioeconômico), a do patrimônio territorial, avalia-se que corresponda à da paisagem cultural de Sabaté (2004). Existem outras semelhanças entre as metodologias de Sabaté (2001) e Magnaghi (2009), no que tange ao processo metodológico de análise e projeto do território, utilizando-se como instrumento em comum em vista ao projeto territorial – o parque patrimonial. A partir dessas análises, entende-se o mosaico metodológico como uma articulação entre os métodos de trabalho de Sabaté e Magnaghi, juntamente com uma avaliação a cerca da adaptabilidade dessas para o recorte sócio-espacial referenciado pela bacia do rio Santa Maria da Vitória, tendo o rio como eixo do projeto de uma rota patrimonial. A metodologia utilizada por Magnaghi (2009) divide-se em quatro fases: Criticità e valori patrimoniali; gli scenari progettuali; gli indirizzi progettuali; e gli strumenti di piano. Nota-se algumas semelhanças à metodologia de Sabaté (2001) para a rota patrimonial do Llobregat, todavia, existem diferenças fundamentais entre elas. A principal está no nível de aprofundamento da análise e do projeto, evidenciada pelas diferenciações entre os objetivos principais e secundários de cada investigação. Para Magnaghi (2009), cujo berço metodológico solidificou-se na escola territorialista, a ênfase está na complexidade do entendimento do conceito de território, das desigualdades que há nele, e como promover um planejamento que possa atender a essa complexidade. Analisa não somente o patrimônio territorial, mas também o paisagístico e o socioeconômico; enquanto Sabaté (2001) atua com objetividade na camada do patrimônio territorial ou paisagem cultural, isto é, na camada 13 ALMEIDA, Renata Hermanny de; ANDRADE, Bruno Amaral de. Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial. In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña de atuação projetual direta do arquiteto, a edificação e o entorno, a partir de um legado histórico. Quanto à metodologia de Magnaghi (2009), na primeira fase, Criticità e valori patrimoniali, o foco é a identificação dos elementos patrimoniais presentes na área em estudo (ambientais, territoriais, urbanos, paisagísticos e culturais) a fim de apoiar o projeto de requalificação, valorização e reconexão do sistema fluvial. Essa primeira fase é semelhante às primeira e segunda da metodologia de Sabaté (2004) – o inventário e a interpretação. Na segunda fase de Magnaghi (2009), Gli scenari progettuali, delineiam-se as linhas estratégicas do parque fluvial. Define-se a área de projeto do parque, e propõem-se cenários que redefinam, por exemplo, o papel dos espaços abertos no sistema fluvial como geradores de outros parques (como os agrícolas, se houver recurso para tal), e o papel da infraestrutura como meio de promover nova fruição entre rio, afluentes e território. Esta se assemelha à terceira fase de Sabaté (2004), pois reflete, analisa e propõe a definição de unidades de paisagem que serão os locais abrangidos pelo projeto do parque. Na terceira fase, Gli indirizzi progettuali, são projetos locais integrados que abrangem: uma nova relação econômica entre o parque e o território local; a valorização e requalificação da paisagem do rio; e a agricultura multifuncional nos parques agrícolas perifluviais e as hortas urbanas. Esta se assemelha à quarta fase de Sabaté (2004), pois é onde se define o projeto do parque patrimonial. Para Magnaghi, um tipo específico, o parque fluvial. Na quarta fase, Gli strumenti di piano, são instrumentos de planejamento que articulam uma proposta de gestão do território, como negociação coordenada pelos atores interessados na realização do projeto em um sistema de decisão de múltiplos atores, escalas e setores. Esta não corresponde a uma fase específica da metodologia de Sabaté (2003), apesar de este indicar que sem um programa estruturado de gestão não é possível tornar o projeto de um parque patrimonial perene. Em suma, a investigação dos trabalhos de Joaquin Sabaté e Alberto Magnaghi ocntribuíram para a construção de um Mosaico Metodológico, e, portanto, do processo criativo fundamental para “Uma rota patrimonial para o rio Santa Maria da Vitória: instrumento de conservação territorial”, e a reflexão, adaptação e aplicação dessas ideias ao caso em estudo. Referencias ANDRADE, Bruno Amaral de. Espírito Santo: territorialidades sócio-espaço-temporais. Primeiro ato: do cosmológico ao logístico. 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In: SEMINARIO DE PAISAJES CULTURALES UDELAR/UPC [Conpadre n.11/2012], 2, 2012, Montevideo [Uruguay]. Actas... Montevideo: Red Conpadre, 2012. p. 01-15. Disponible en: <www.conpadre.org>. 2º Seminario de Paisajes Culturales Udelar/UPC [Conpadre n.11/2012] Montevideo [Uruguay], 31/01 a 01/02/2012. Universidad de la Republica / Universidad Politècnica de Cataluña MAGNAGHI, Alberto; GIACOMOZZI, Sara (a cura di). Un fiume per il territorio. Indirizzi progettuali per il parco fluviale del Valdarno Empolese. 1ª ed. Firenzi: Firenze University Press, 2009. 217 p. MAGNAGHI, Alberto. Il progetto locale. 1ª ed. Torino: Bollatti Boringhieri, 2000. 344 p. MAGNAGHI, Alberto. Il nuovo piano paesaggistico: la valorizzazione di un bene comune per la qualità dello sviluppo della regione Puglia. Piano paesaggistico territoriale regionale. Bari: Presidenza della regione Puglia, Assessorato all’assetto del territorio, 2007. 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