Com demanda maior, produção de gergelim ganha
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Com demanda maior, produção de gergelim ganha
Jornal Valor --- Página 10 da edição "23/12/2011 1a CAD B" ---- Impressa por DPrado às 22/12/2011@20:08:17 Jornal Valor Econômico - CAD B - EMPRESAS - 23/12/2011 (20:8) - Página 10- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW Enxerto B10 | Sexta-feira e fim de semana, 23, 24 e 25 de dezembro de 2011 Agronegócios CLÁUDIO BELLI/VALOR Estratégia Apesar de semente ser usada na indústria de alimentos, programa de biodiesel alavancou oferta Com demanda maior, produção de gergelim ganha fôlego no país Luiz Henrique Mendes De Valinhos e São Paulo Há 32 anos, o administrador rural Túlio Benatti dava início a uma longa trajetória ligada aos alimentos. Da produção de coco ralado em Maceió ao beneficiamento de aveia e soja na mineira São Lourenço, o empresário fez de tudo um pouco. Apesar da diversidade, nenhum produto lhe fez tão reconhecido quanto o gergelim. Em 1988, Benatti fundou a Sésamo Real, empresa que se tornaria a líder do segmento. De cultivo milenar, o gergelim é uma cultura pouco expressiva no Brasil, de produção majoritariamente familiar. Ainda que não existam estatísticas oficiais sistemáticas, o setor estima que a produção nacional de gergelim, cuja safra vai de janeiro a março, seja de 4,5 mil toneladas. No mundo, o total produzido chega a 3,976 milhões de toneladas, segundo dados da FAO, a agência para Agricultura e Alimentação da Organização das Nações Unidas. Nos últimos anos, a produção brasileira de gergelim passou a receber um importante estímulo. Em fevereiro de 2010, o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) alterou uma regra do Selo Combustível Social, benefício fiscal do Programa Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) concedido a produtores de biodiesel que compram matéria-prima da agricultura familiar. Para incentivar a diversificação da produção de oleaginosas, tais como a mamona e o próprio gergelim — que quando processado, 50% se torna óleo —, o MDA criou um fator de multiplicação nas compras dessas culturas no âmbito do PNPB. Com a medida, um produtor de biodiesel que adquirisse, por exemplo, 10 toneladas de gergelim da agricultura familiar, receberia um benefício fiscal — 9,25% de PIS/Cofins — equivalente à compra de 15 toneladas. A partir dessa mudança, as compras de gergelim pelo PNPB saltaram de apenas 138 toneladas em 2009 para 1,7 mil toneladas em 2010, com previsão de alcançar 2 mil toneladas neste ano. “Se o mercado está aquecido, é por conta do PNPB”, reforça Nair Arriel, pesquisadora da Embrapa Algodão, principal centro de pesquisa da semente do país. Mas, ainda que o estímulo oficial seja voltado à produção de biodiesel, o gergelim adquirido por meio do programa do Ministério do Desenvolvimento Agrário não se torna combustível. “O gergelim não é competitivo para a produção de biodiesel”, revela Marco Antônio Viana Leite, coordenador-geral de biocombustível da Secretaria da Agricultura Familiar, ligada ao MDA. “Como qualquer oleaginosa, o gergelim pode servir para produzir biodiesel, mas sua vocação maior é para o consumo alimentar”, acrescenta Nair. De acordo com Viana Leite, o principal foco do programa não está na produção final de biodiesel a partir matérias-primas produzidas por agricultores familiares. “A grande óptica é promover inclusão social”. No caso do gergelim, o programa inclui 1,2 mil famílias, distribuídas em cerca de 40 assentamentos, a maioria na região norte de Goiás (ver mapa), principal Estado produtor da semente — 60% da produção nacional. Como o gergelim não se tornará biocombustível, as empresas de biodiesel que participam do PNPB abastecem as indústrias processadoras, que preparam o gergelim para o consumo humano. Em Valinhos, município da região de Campinas, por exemplo, a Sésamo Real recebe o gergelim adquirido pela usina Bioverde, responsável pela compra de quase toda a semente produzida pelos agricultores familiares. “A partir dessa parceria com a Bioverde, iniciada em 2009, zeramos nossas importações de gergelim”, comemora Benatti, dizendo que o feito pode ser replicado no país, que ainda não é autossufiDIVULGAÇÃO/EMBRAPA Detalhe de planta de gergelim no CE ciente. Com o consumo anual estimado em 9 mil toneladas, o Brasil importou 4,1 mil toneladas de gergelim em 2010, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Diante desse déficit, Viana Leite enxerga oportunidade para os agricultores familiares. Segundo ele, a produção brasileira de gergelim vai crescer nos próximos três anos. “A partir daí, o desafio será fazer o consumo nacional aumentar”, diz. Ainda que o gergelim tenha sido introduzido no Brasil pelo portugueses no século XIV, até os anos 1980, a demanda pela semente era restrita às comunidades árabe e asiática, grandes consumidoras de tahine (pasta de gergelim) e óleo de gergelim, respectivamente. “De lá para cá, passamos de um consumo anual de 1,5 mil toneladas para as 9 mil toneladas atuais”, conta o fundador da Sésamo Real. O salto do consumo nacional está diretamente ligado à chegada das redes de fast-food ao país. Em 1979, o McDonald’s instalou sua primeira loja no Brasil, em Copacabana, no Rio de Janeiro, trazendo seus famosos pães com gergelim. “O McDonald’s popularizou o gergelim. Hoje, baguete é sinônimo de gergelim”, diz Benatti. A Sésamo Real aproveitou a popularização da oleaginosa. Com 45 funcionários e receita anual de R$ 10 milhões, a empresa tem nas indústrias de panificação e biscoitos seus principais clientes. Os segmentos representam entre 60% e 70% da receita da companhia. A Sésamo Real processa 2,5 mil toneladas de gergelim por ano, transformando a matéria-prima em diferentes produtos: gergelim in natura, descascado (destinado à panificação), tostado (para a produção de biscoitos), óleo natural, óleo torrado, tahine, natural com tratamento especial e gergelim colorido, usado como confeito. Entre seus clientes estão indústrias como Piraquê, M. Dias Branco, Burger King, Habbib’s e o restaurante árabe Farabbud, que produz o inusitado sorvete de gergelim. O McDonald’s não faz parte da extensa lista de clientes da Sésamo Real. Mas apenas por enquanto, segundo Benatti, que negocia o fornecimento de gergelim para a FSB Foods, que produz os pães da rede de restaurantes. Enquanto isso não acontece, o gergelim do ‘Big Mac’ continuará sendo importado da Guatemala e do México. Embrapa fomenta cultivo orgânico De São Paulo Era o ano de 1985, e o bicudo infestava as lavouras de algodão no Nordeste. Em busca de alternativas à pluma, castigada pela praga, a Embrapa Algodão iniciou suas pesquisas com diversas culturas, entre elas o gergelim. De lá para cá, a estatal lançou cinco cultivares da semente e, mais recentemente, vem fomentando o cultivo orgânico de gergelim no semiárido nordestino. No processo de escolha do gergelim como uma das culturas alternativas ao algodão, os pesquisadores levaram em conta sua resistência à estiagem, típica da região. No caso das variedades desenvolvidas pela Embrapa Algodão, sediada em Campina Grande (PB), optou-se por cultivares de ciclo de produção precoce (entre 90 e 100 dias), mais adequados às regiões de regimes irregu- lares de chuvas, relata Nair Arriel, pesquisadora da instituição. Apesar dos esforços, a produção de gergelim no semiárido é ainda é bastante desorganizada. “Não temos estrutura de comercialização, e nossa produção é irregular”, diz Nair, explicando a ausência de estatísticas para a semente produzida na região. No semiárido, o gergelim não é destinado à indústria, como no Centro-Oeste, mas quase todo vendido nas tradicionais feiras de alimentos. O consumo local se dá na forma de óleo (feito artesanalmente), tempero, bolos e até mesmo de leite — rico em vitaminas e com propriedades antioxidantes. De olho num possível mercado de exportação, a Embrapa Algodão passou a fomentar, ainda que em pequena escala, o cultivo orgânico em comunidades do Piauí, Pernambuco, Ceará, Rio Grande do Norte e Paraíba. No Piauí, por exemplo, o “Projeto Gergelim Orgânico”, em São Francisco de Assis, região sudeste do Estado, produziu apenas 7 toneladas em 2007, primeiro ano do projeto. Neste ano, porém, os 122 produtores envolvidos colheram 50 toneladas, comercializadas com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Para a safra de 2012, que vai de janeiro a março, a previsão é alcançar 100 toneladas. Noutra frente, o “Projeto Dom Hélder Câmara”, contempla mais de 63 assentamentos distribuídos entre os municípios de Inhamuns (CE) e Sertão Central (CE), Apodi (RN), Cariri (PB), Araripe (PE) e Pajeú (PE). Em 2011, foram produzidos cerca de 10 toneladas. “Com um volume de produção frequente, você passa a ter mercado externo certo. E há uma demanda real na Europa por produtos orgânicos”, lembra Nair. (LHM) Túlio Benatti, da Sésamo Real, acredita que o consumo de gergelim na indústria de alimentos deve continuar a crescer Garantia de comercialização Aquisição de gergelim por empresas de biodiesel e principais polos de produção Onde ficam os municípios Volume adquirido – em toneladas 2.500 TO Novo Planalto Porangatu Bonópolis Mutunópolis Amaralina Mara Rosa MT 2.000 BA 1.875 1.700 é produção nacional estimada de gergelim; 9 mil toneladas é o consumo doméstico de gergelim 1.250 GO 625 MS MG 0 5 2008 138 2009 2010 4,5 mil toneladas 2011* Fontes: Ministério do Desenvolvimento Agrário e Sésamo Real * Estimativa Uma história das ‘Mil e uma Noites’ De São Paulo “Abre-te, Sésamo”. Essa era frase mágica usada para abrir o esconderijo onde estava o tesouro encontrado por Ali Baba, personagem de um dos contos do clássico “As Mil e uma Noites”. Quando dizia a frase, invocando as sementes de sésamo, Ali Baba referia-se ao gergelim. Graças à influência da comunidade árabe, principal consumidora da semente no país até os anos 1980, o ‘gilgilan’, em árabe vulgar, foi abrasileirado para gergelim. Na maioria dos países, no entanto, ele é chamado de sésamo, que tem origem no latim. — ‘Sesamum indicum L.’ é o nome científico dado ao gergelim. Em “Ali Baba e os Quarenta Ladrões”, a referência ao gergelim deve-se ao modo lento com que a vagem se abre, liberando suas sementes. Dessa maneira, a frase mágica significa “abre-te como um sésamo se abre”. A presença do gergelim em “As Mil e uma Noites”, coleção de contos populares compilados em língua árabe a partir do século IX, demonstra a antiguidade do gergelim, cultivado há 6 mil anos — desenhos do século VIII A.C , inclusive, já indicam o uso da semente. A longa história do gergelim, por sua vez, traz uma dúvida aos pesquisadores, que divergem sobre a região de origem da semente. Alguns autores defendem que o gergelim seja original da Etiópia, na África. Outros, no entanto, afirmam que ele é originário da Ásia e da África. Há ainda os que defendem que ele é originário apenas da Ásia. Segundo dados da FAO, agência das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação, os maiores produtores de gergelim são Myanmar (867 mil toneladas), Índia (657 mil toneladas) e China (622 mil toneladas). Juntos, os três países representam 53,9% da produção mundial. (LHM) DIVULGAÇÃO/EMBRAPA Gergelim em processo de secagem após colheita na estação experimental da Embrapa Algodão em Barbalha (CE)