1 avant-garde and kitsch arte e objeto de arte
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1 avant-garde and kitsch arte e objeto de arte
AVANT-GARDE AND KITSCH ARTE E OBJETO DE ARTE EDUARDO MANUEL MATIAS CUNHA 3110375 ESAD-CR 03 DE JANEIRO DE 2012 1 INTRODUÇÃO: Este trabalho com base nos textos de Clement Greenberg, pretende analisar os fenômenos Avant-Garde e Kitsch na sociedade contemporânea e a forma como os mesmos se relacionam. Os vanguardistas pelo seu espirito criativo e a sua ansia de mudança, como se vê no surgimento de inúmeros movimentos artísticos, e o objeto Kitsch, por estar intimamente ligado aos registos artísticos, faz constantes alusões e referências à arte e à sua história. Este fato contribui para a sua disseminação no meio social, como recurso capaz de produzir sensações semelhantes àquelas obtidas pela contemplação estética de obras originais. I Avant-Garde Existem várias condicionantes que influenciam os artistas no início do séc.XX, como a antropologia, os meios de transporte, as ciências, a teoria das cores, Foi um período demasiado explosivo, existiram acontecimentos muito marcantes como a primeira e a segunda Guerra Mundial Os artistas de repente depararam-se com demasiadas referências para exprimirem a sua contemporaneidade, aquilo que era a vida do Homem, o Homem do Mundo, o flaneur. Aquele que viajava, que ia à procura das referências do Fig. 1 - Flaneur Mundo, que passeava na cidade absorvendo a vida e as vivências, para as desenhar e pintar, para construir as suas obras, como refere Clement Greenberg “It was no accident, therefore, that the birth of the avant-garde coincided chronologically -- and geographically, too -- with the first bold development of scientific revolutionary thought in Europe.” (Avant-garde and Kitsch de Clement GREENBERG) Até essa altura o artista era mimético, não passava de um mero artesão, tinha a mestria e a capacidade de representar a realidade tal e qual era. Era uma espécie de copista. A partir do séc.XX, vão rejeitar este sistema, vão dizer que não são copistas e que têm opinião, têm vontade, emoções, têm coisas a transmitir cá para fora. Por isso, vão produzir imagens que têm a ver com as suas interpretações da realidade, do que se passava à sua volta, misturando o domínio das emoções com a sua própria interpretação. É a representação da vida vivida com influência social e politica. É esta comunicação com o espetador que se torna difícil, pois perderam a tradição, o estilo, a 2 religião. Já não encontram os símbolos e os ícones que tiveram até aí para comunicarem com o espetador e assim perderam as audiências. Se nem a nobreza, que até aí tinha comprado as obras, lhes reconhecia os símbolos, os ícones e mestria, o artista deixou de vender, e por isso, teve de arranjar trabalho noutra área ou então ceder e corromper-se com outro tipo de pintura. É aqui que aparece o chamado Kitsch, estilo barato que vende, produzido à maneira e ao gosto dos incultos. Os vanguardistas deixam de ter contato com as cortes e passam a produzir coisas estranhas e diferentes do que era o tradicionalmente promovido pela academia. Neste período a sociedade vivia uma grande agitação social e politica. Os locais de encontro deixam de ser os teatros e cinemas e passam a ser os cabarés, por isso, os artistas começaram a ser boémios, noturnos e a fazer uma vida um pouco à margem. Passaram a representar o mundo e a vida das pessoas que frequentavam esses locais como, os marinheiros e as prostitutas no Cais do Sodré, as mulheres que cantavam o fado na noite, as zangas, os amores e desamores, a vida bairrista, etc.. Esta era a imagem que refletia a nova sociedade, muito elegante mas boémia. As mulheres cortavam os cabelos à garçon, e fumavam cigarros. a sociedade vivia alterações a uma velocidade estonteante. Nessa altura apareceu o café a substituir o chá e a relação com o cigarro é quase social. As pessoas saíam à noite para tomar um Fig.2 Dance at Bougival, Renoir café e fumar cigarros numa espécie de tertúlia onde se falava de tudo, e aí, formaram-se grupos donde surgiram os movimentos artísticos. O início do séc.XX é marcado pelos artistas que acreditavam nas mesmas coisas. Por exemplo, Amadeo de Souza Cardoso e Sónia de Lo net trocaram experiencia e têm as mesmas coisas pintadas. Os movimentos apareciam porque um grupo de artistas pintava e produzia dentro dos mesmos parâmetros. Foi no início do séc. XX que nasceram os principais movimentos artísticos, como o Dadaísmo, o surrealismo, o 3 impressionismo, o futurismo, o cubismo, o suprematismo, o construtivismo, o expressionismo, o abstracionismo, o fauvismo, etc.. Não nos podemos esquecer que do período de Velasquez para o Impressionismo decorreram cerca de 300 anos e daí para o Cubismo foram somente cerca de 20 anos. Tudo aconteceu muito rapidamente. Ao longo do séc. XX aconteceram muitas mutações dos movimentos e surgiram os neo…que não é mais do que trabalhar um determinado movimento mas de outra forma, inserido noutro tempo. Os artistas, até ao movimento Avant-Garde, gravitavam á volta da sociedade burguesa, ou vinham de dentro dela ou vendiam-lhe as suas obras. Quando iniciaram os movimentos artísticos e romperam com a tradição académica saíram da proteção e acabaram por ser rejeitados. Só os intelectuais, que eram uma minoria sem dinheiro, é que os aceitaram como novos vanguardistas do séc. XX e valorizaram as suas obras. Mesmo sendo uma minoria, foram eles, que lhes deram força e coragem para continuarem a desenterrar a criatividade para o mundo das ideias e a romper com as tradições académicas e assim a estabeleceram um marco na história de arte e criaram a arte contemporânea. Foi necessário este corte radical e dizer que a arte é pelo valor da própria arte, arte pelo valor do próprio artista, e não pelo valor do documento, do retrato, da encomenda, pela mimética ou pela mimeses da realidade. Esse valor passou para a Fig.3 Piet Mondrian, 1916 fotografia e os artistas, a partir daí, poderiam pintar só pelo prazer de pintar, poderiam exprimir os seus sentimentos, foi a autonomia da arte. Relativamente aos sentimentos, os Avant-Garde dividiram-se em duas correntes. Por um lado surgiram os modernistas racionais (Mondrian, Malevitch, etc.) que trabalharam com geometria pura, com matemática, com música, com o vazio, com o cheio, com linhas retas e com a ordem. Por outro lado, os vanguardas como o cubismo ou o dadaísmo que foram movimentos artísticos que trabalharam a desordem. 4 Ao mesmo tempo, uns estavam a trabalhar a questão do caus, a explosão, o sentimento, e os outros a trabalhar sem sentimentos, a ordem, a razão, a pura matemática. Uns estavam influenciados pela guerra e os outros pelo fim da guerra. Uns estavam a querer dizer que a guerra estava a explodir e os outros, que quando a guerra acabasse teriam que reorganizar tudo. Eram dois pensamentos opostos que se tentavam afirmar na mesma altura. Fig.4 Mascara Africana, Picasso Quando Mondrian faz as suas pinturas estava a dizer que queria ordem altamente organizada e plana. Picasso e Albert Gleizes pertencentes ao movimento cubista, defenderam a fragmentação da realidade, olharam para as coisas como objetos geométricos e representaram-nos em duplas perspetivas. Por exemplo o quadro de Picasso “Guernica” é caótico, também utilizando a representação geométrica mas duma forma completamente oposta a Mondrian. Juntos com Mondrian, estavam outros como Le Courbusier (arquiteto que inventou a habitação em altura), que pensavam o mundo como uma ordem perfeita, trabalharam com as cores primárias, a ordem, sistemas repetidos, retas, perpendiculares, etc.. Ao lado destes tínhamos os vanguardistas caóticos, que pretendiam exprimir as suas emoções através da mente e do seu corpo, lançando baldes de tinta sobre as coisas. Enquanto uns defendiam que a ordem e a organização traziam um mundo melhor, os outros, pensavam que tinham de exprimir o que estava a acontecer no mundo e o relatar de forma caótica. A partir destas duas correntes (anos 50), nasceram todas as outras, como: os expressionistas e o grafiti. Nasceu a arte mais emocional mas agressiva, mais politica. Surgiram, até aos anos 80, os minimalistas, naturais, com o máximo de pureza. A partir daí, só tivemos artistas individuais. O artista vale-se mais do seu lado subconsciente do que do consciente. Podemos dizer que o artista Avant-garde não é um Deus, porque Deus é absoluto, mas tem o sentimento de criação quase divina. Toda a arte tem a referência monoteísta, no mundo ocidental, onde um só Deus influencia todos os intervenientes 5 na arte. Há uma tentativa constante de compreender a relação do artista relativamente ao ato de criar. Até ao aparecimento dos vanguardistas, a população tinha permanecido indiferente à cultura e ao processo de desenvolvimento. As massas tinham-se sempre maravilhado com a pintura. O artista tinha sempre sido considerado um ser superior, com capacidade suprema de representar. As massas não estavam capacitadas, não tinham conhecimentos artísticos nem históricos para avaliarem uma obra de arte. As massas eram ignorantes sobre aquilo que estava pintado, mas não eram ignorantes e sabiam valorizar aquilo que estava pintado. Uma pessoa por muito ignorante que fosse quando colocada em frente a uma pintura até final do séc. XIX, sentia-se maravilhada e espantada. O espanto fazia com que as massas valorizassem a obra de arte. No início do séc.XX perderam o espanto, porque não havendo técnica, não havendo o lado do artista a demonstrar a sua habilidade e mestria com as tintas e a superfície da tela, as massas não foram capazes de valorizar essa arte. Por isso, os nobres e os burgueses não valorizaram a arte porque não reconheceram nela os símbolos que conheciam. Os artistas ficaram reduzidos a uma minoria de apreciadores como os intelectuais, escritores, filósofos, letrados que não eram suficientes para alimentar a arte. II “simultaneously with the entrance of the avant- Fig.6 “O menino da lágrima”, Murillo garde, a second new cultural phenomenon appeared in the industrial West: that thing to which the Germans give the wonderful name of Kitsch: popular, commercial art and literature with their chromeotypes, magazine covers, illustrations, ads, slick and pulp fiction, comics, Tin Pan Alley music, tap dancing, Hollywood movies, etc.” (Avant-garde and Kitsch de Clement GREENBERG) Kitsch – Foi aquilo que hoje apelidamos de fuleiro. Enquanto alguns artistas estavam a abrir novos caminhos, outros estavam a retrair e a pintar clássicos e imitações. O artista Kitsch era o que estava nas ruas em Montmartre, ou o que pintava o elétrico de Lisboa. Passou a ser um ícone que as pessoas reconheciam e compravam. Estes pintores faziam-no para sobreviver. 6 O Kitsch, porque ele ainda hoje existe, é um produto industrial de iliteracia cultural. Não confundir com cultura popular como o galo de Barcelos, o folclore ou os trajes populares. Os trabalhadores da indústria vieram do campo e cederam a comprar estas pinturas porque lhes faziam lembrar as raízes. As pessoas mecanizadas nas fábricas, quando chegavam a casa pretendiam relaxar e encontrar algo que lhes Fig.6 Pintura Kitsch, vendida nas feiras chamasse ao sentimento, precisavam de sentir mimos e por isso gostavam de olhar para o menino da lágrima, o cão sentado com um ar dócil e submisso. Esta nova cultura era o que este tipo de gente gostava – o Kitsch. “Kitsch is a product of the industrial revolution which urbanized the masses of Western Europe and America and established what is called universal literacy.” (Avant-garde and Kitsch de Clement GREENBERG). Nesta altura houve necessidade de produzir para as massas e as fábricas começaram a produzir objetos em série. Também na arte houve necessidade de produzir obras que as massas gostassem e consumissem. O Kitsch é insensível aos valores da cultura mais genuína. Os artistas produziam-na para ganhar dinheiro O Kitsch promoveu a insensibilidade para receber o que vinha de novo, não trousse cultura, ainda hoje muda conforme a moda, por isso é muito pouco consistente, é fútil. Os artistas de rua são desconsiderados, sendo considerados artesãos. O movimento artístico que derivou do Kitsch foi o Pop Art. Só que este era mais intelectual, fazia séries limitadas para ser de mais alto valor. Os artistas vão buscar a arte académica para chegar ás massas. .”Self-evidently, all kitsch is academic; and conversely, all that's academic is kitsch.” (Avant-garde and Kitsch de Clement GREENBERG). Temos de saber distinguir o Kitsch do início do séc. XX do de hoje. Hoje um filme de Hollywood é considerado Kitsch porque é comercial e popular. O kitsch esgota-se logo que é visto. Não tem conteúdo intelectual, não tem história, não tem contexto. É o menino de rua que é pintado sem qualquer motivo, só porque é vendável, porque toca no coração das massas Estes artistas são os de arranque do Kitsch e todos os outros vão redescobrir, vão acrescentar alguma coisa. O Kitsch não produziu nem produz nada de mérito. 7 III Resumindo, o Avant-Guarde surge como resultado de vários acontecimentos que ocorreram na segunda metade do séc.XIX e no início do séc.XX, como o aparecimento da fotografia as alterações politicas e sociais O Avant-Garde tem sido uma busca do absoluto onde chega a ideia do abstrato e o não objetivo. É trazer a desfiguração, é a descolagem com a realidade, são as manchas, os empastelamentos e as expressões do artista que não são objetivas, ou seja, que não são racionais. Enquanto que o Kitsch imita aquilo que é eficaz, o que está no exterior e os seus efeitos, aquilo que é visível para a população. O único objetivo é fazer dinheiro, é o sucesso nas massas. “If the avant-garde imitates the processes of art, kitsch, we now see, imitates its effects.” (Avant-garde and Kitsch de Clement GREENBERG) Hoje em dia, o Kitsch continua a existir nas ruas de Montmartre, na baixa de lisboa ou em qualquer grande centro turístico, porque é de venda fácil, é acessível e popular. Quanto aos artistas de vanguarda enquanto movimento, eles já não existem. É exatamente o contrário, o artista hoje é muito mais isolado e só se junta se for para fazer um trabalho comum e com o mesmo objetivo, ele hoje quer distanciar-se o mais possível para fazer algo diferente e marcar posição e sente-se ofendido se outro pinta ou Fig.7 Elétrico de Alfama imita as suas obras. Ainda não se sabe como vai ser apelidada a nossa contemporeinidade, este estado global. O francês Nicolas Bourriaud defende a expressão “Alter Modern” que está a adquirir alguma credibilidade. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS http://www.infopedia.pt/$seculo-xx-um-seculo-de-artes-letras-ideias-e, consultado em 26/12/11 http://arteesentido.blogspot.com/2010_09_01_archive.html, consultado em 26/12/11 GREENBERG, C. Avant-Garde and Kitsch, 1939 8 http://casoseacasosdavida.blogspot.com/2009/08/pinturas-de-murillo.html, consultado em 26/12/11 http://www.clivecookpaintings.com/gallery_PT.asp?cat=water&pagenr=1&galleryid=2, consultado em 26/12/11 Caldas da Rainha, 03 de Janeiro de 2012 9