5 a edição/2015 05

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5 a edição/2015 05
#5
2015/05
Editor-Chefe:
Lei Chin Pang
Editora Associada:
Flora Shaw
Editor Português:
José Oliveira
Email:
[email protected]
Produzida pela Companhia do Desenvolvimento
Cultural e Criativo 100 Plus Limitada
Publicada pelo INSTITUTO CULTURAL do Governo
da R.A.E. de Macau
Mensagem do Editor
Conteúdos
O emblemático Festival de Artes de Macau, organizado anualmente
em Maio, apresenta dezenas de espectáculos e exposições que
atraem muitos espectadores de Macau e do exterior. Com a arte a
aparecer por todo o lado este mês, exploramos na secção “Destaque”
deste número a forma como vários grupos de artes performativas
lutam pelo seu próprio espaço. Na rubrica “Diálogo”, Lawrence Lei I
Leong, co-fundador da bem conhecida Associação de Representação
Teatral Hiu Koc, partilha a sua visão sobre o desenvolvimento das
artes performativas locais.
04......... Destaque
Na secção “Infografia” analisamos os números e o impacto das
indústrias criativas no PIB de várias regiões na Ásia, a partir dos quais
revelamos alguns aspectos do desenvolvimento desta indústria.
O Festival Literário de Macau terminou em Março e na secção
“Evento” desta edição voltamos a olhar as maravilhosas actividades
organizadas. No que toca à literatura de Macau, perceber qual será
o seu futuro e como promovê-la é qualquer coisa que merece uma
séria reflexão.
Os nossos sete bloggers, velhos e novos amigos, continuarão a trazer
até nós ideias e experiências emocionantes.
Lei Chin Pang
Editor-Chefe
Artes performativas em Macau:
tendências e implicações
16......... Diálogo
Made in Macau em palco–
Lawrence Lei I Leong olha o panorama do teatro em Macau
20......... Evento
Festival Literário de Macau:
viagem pela Rota das Letras
24......... Infografia
Indústrias Culturais e Criativas na Ásia:
Comparando PIBs
28......... Agenda Cultural
30......... Blogues
Leong Sin U --De artista a crítica de arte
Ho Ka Cheng --As bases da indústria cinematográfica de Macau
Joe Lei --Inspiração criativa e aprendizagem
Ling Lui --Raising the Bar
Yap Seow Choong --Estilo de Xangai
Ron Lam ---
Fanzines do Japão
Wilson Lam --Os pontos de vista e as opiniões constantes da presente
publicação são os dos seus autores e entrevistados, não
reflectindo necessariamente a posição do Instituto Cultural
do Governo da R.A.E. de Macau.
O Alibaba das indústrias culturais e criativas
Destaque
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#5 2015/05
#5 2015/05
Texto/ Ng King Ling, Allison Chan e
Fong Son Wa
Scott Messinger
Billy Hui
Artes performativas em Macau:
tendências e implicações
Macau é uma cidade pequena, mas recebe anualmente milhares de espectáculos de vários
géneros – desde mega produções financiadas por grandes grupos, até pequenas produções
independentes locais. Porém, tanto os grupos artísticos comerciais como aqueles que são
subsidiados enfrentam uma série de desafios e oportunidades no seio da indústria das artes
performativas. Neste número, convidámos três grupos muito diferentes – Venetian Macau,
Associação de Representação Teatral Hiu Koc e Associação de Arte Point View – para falarem
sobre o futuro das artes performativas em Macau.
Erik Kuong
Destaque
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Destaque
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#5 2015/05
#5 2015/05
Destaque
Texto/ Ng King Ling, Allison Chan e
Fong Son Wa
“Os musicais
são famosos
em todo o
mundo – dos
Estados Unidos
da América
a Macau”, diz
Scott Messinger,
vice-presidente
da área de
marketing do
Sands China.
Foto cedida por
Around Chao
Mega espectáculos em Macau
O Cats, musical da Broadway conhecido em
todo o mundo, subiu ao palco do Venetian
Macau 13 vezes em nove dias. Dos 200 mil
bilhetes disponíveis, 90 por cento foram
vendidos, o que permitiu à organização
arrecadar receitas consideráveis – sem contar
com os lucros provenientes da restauração,
alojamento e jogo.
Em breve, o Venetian vai trazer a Macau mais
um dos espectáculos favoritos da Broadway,
A Bela e o Monstro, que vai estar em cena
durante um mês e meio já a partir de Junho.
“O interessante nos musicais é que são
apreciados por todas as idades. As crianças
adoram as histórias da Disney, como é o caso
d`A Bela e o Monstro, enquanto os adultos
gostam dos momentos de música e de dança.
Os musicais são famosos em todo o mundo –
dos Estados Unidos da América a Macau”, diz
Scott Messinger, vice-presidente de Marketing
da Sands China, que detém o Venetian Macau.
Messinger explica que a Sands tem um grupo
de funcionários que estuda espectáculos
internacionais e avalia a possibilidade de os
trazer aos seus casinos. Depois de o Marina
Bay Sands, em Singapura, ter apresentado O Rei
Leão, a companhia apercebeu-se do potencial
que os musicais têm no mercado asiático e, por
isso, está agora à procura de espectáculos que
estejam actualmente em digressão.
Para o Venetian, o factor determinante é
perceber se a apresentação de determinado
espectáculo pode trazer lucros à empresa.
“Se um espectáculo já está em cena em Hong
Kong, comercialmente não fará sentido trazer
a Macau”, refere Messinger. “Ou se durante
um determinado período de tempo outros
espectáculos estiverem a ser apresentados nas
regiões vizinhas, temos de pensar se o público
estará disposto a gastar tanto dinheiro em
diferentes eventos.”
Para muitos, o Venetian não passa de um
casino. No entanto, o empreendimento conta
com um teatro de 1800 lugares e uma arena
que pode receber 15 mil espectadores e por
onde já passaram estrelas como Rihanna,
Eason Chan e a banda Girl's Generation. A
actuação conjunta das orquestras filarmónicas
de Shenzhen e de Filadélfia; e alguns
combates de boxe foram também alguns dos
eventos organizados pelo Venetian.
Além de representar um crescimento de
receitas para o hotel-casino, a organização
dos espectáculos também chama atenção
internacional para Macau, sublinha Messinger.
“A Austrália costumava ser o grande centro de
entretenimento e as pessoas apanhavam o
avião de vários pontos do mundo só para ver
um espectáculo. Agora, muitos espectadores
vêm da Europa e dos Estados Unidos a Macau
para assistir a concertos de The Rolling Stones,
o que confere à cidade o estatuto de centro
mundial de lazer e entretenimento.”
Messinger não divulga números, embora
admita que só a simples venda de bilhetes
gera lucro. Mas não tem sido sempre assim:
em 2008, a apresentação do espectáculo Zaia
do Cirque du Soleil gerou perdas à operadora
devido à fraca adesão do público. Quatro anos
depois, foi quebrado prematuramente um
contrato de dez anos. Há quem defenda que
um espectáculo de acrobacia chinesa adaptado
ao estilo ocidental pode ser um sucesso
aos olhos do Ocidente. Mas a verdade é que
não foi o suficiente para atrair espectadores
chineses – muitos dos quais têm possibilidade
de assistir a espectáculos de acrobacia chinesa
no próprio país.
“Foi um processo de aprendizagem. Os gostos
dos norte-americanos e dos chineses podem
ser muito diferentes. Para muitos, os bilhetes
também eram extremamente caros. Agora
oferecemos preços mais acessíveis, de forma a
atrair público estrangeiro e local e tornar estes
eventos mais sustentáveis”, diz Messinger.
Já o City of Dreams, situado do outro lado
da rua no Cotai, tem conseguido um enorme
êxito com o espectáculo The House of Dancing
Water, que começou em 2010. De acordo com
o relatório financeiro de 2014 da operadora
de jogo Melco, o espectáculo já subiu ao palco
mais de 1500 vezes e foi visto por mais de 2,5
milhões de pessoas.
Como é que se pode medir o sucesso do
The House of Dancing Water? Lei Chin Pang,
crítico cultural de Macau, responde a esta
questão recordando um episódio. “Quando
Hong Kong foi atingido por chuvas torrenciais,
em Março do ano passado, caiu o telhando
de vidro de um centro comercial e o espaço
ficou inundado. Muitas pessoas utilizaram a
expressão ‘The House of Dancing Water’ para
descrever a cena, o que revela o impacto
profundo que o espectáculo teve nos turistas
chineses.”
A equipa que coordena o espectáculo The
House of Dancing Water fez um trabalho
impressionante em termos de produção e
de vendas. “Desde o início do processo, os
criadores deste espectáculo tentaram adaptálo à realidade local, em vez de transplantar
uma criação estrangeira para Macau. O
espectáculo tem vários personagens e
elementos que encontram eco no público
chinês. Claro que os números de acrobacia,
emocionantes e de cortar a respiração, também
foram fundamentais para este sucesso. Como
estratégia de vendas e de marketing, os
organizadores pediram à estrela de cantopop
Sammi Cheng para cantar o tema principal
do espectáculo. Este foi um passo muito
inteligente, que veio demonstrar a importância
da utilização de elementos locais para o
sucesso do espectáculo.”
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1.
2.
1. Desde que começou,
em 2010, o The House of
Dancing Water tornou-se no
espectáculo mais popular
de Macau.
Foto cedida por Melco
Crown Entertainment
Limited
2. O musical da Broadway
Cats subiu ao palco do
Venetian Macau 13 vezes
em nove dias, permitindo
à organização arrecadar
receitas consideráveis.
Foto cedida por Sands
China Limited
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Destaque
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Destaque
TTexto/ Ng King Ling, Allison Chan e
Fong Son Wa
Billy Hui é
director artístico
do teatro Hiu
Koc
Foto cedida por
Billy Hui
Teatro Hiu Koc:
partilha de recursos no sector das
artes performativas
Empresas privadas de renome, como é o
caso do Venetian Macau e do City of Dreams,
têm capacidade para comportar os custos de
um ou mais grupos artísticos. Mas quais são
as possibilidades e expectativas dos artistas
independentes e grupos comunitários de
teatro em Macau? Como é que se podem
manter competitivos?
O Hiu Koc, fundado em 1975, é um dos mais
importantes grupos de teatro comunitário
em Macau e a sua base sólida é muito
invejada por teatros mais jovens. Tem, por
exemplo, as suas próprias instalações.
Billy Hui, director artístico do Hiu Koc,
nota: “Há dez anos, Macau era uma cidade
bastante atrasada devido à sua fraca
economia. Muitos empresários fabris
deixaram a cidade e rumaram ao Norte à
procura de oportunidades de negócio. Nessa
altura, o nosso grupo conseguiu investir num
edifício industrial, onde actualmente estão
localizadas as nossas instalações. Se não o
tivéssemos feito há tanto tempo, estaríamos
hoje a lutar arduamente para sobreviver,
já para não falar da impossibilidade de
alcançar algum êxito e prosseguir o nosso
desenvolvimento.”
De facto, com a subida dos preços do
imobiliário, tem sido difícil para os grupos
artísticos assegurar um espaço para ensaios.
A possibilidade de ter as próprias instalações
tem sido um dos factores responsáveis pelo
êxito do Hiu Koc. No ano passado, quando o
grupo terminou de pagar o espaço, decidiu
lançar um programa de apoio financeiro
para grupos de teatro com dificuldades
económicas, oferecendo o arrendamento
gratuito de duas áreas para encorajar a
criação de produções e apoiar artistas
performativos emergentes.
“Devido à alta dos preços dos imóveis,
muitos grupos de teatro são obrigados a
mudar de instalações de dois em dois anos.
Depois existe ainda a questão dos recursos
humanos, pois há falta de gestores artísticos.
É muito difícil atrair um público de dimensão
considerável se não for feita boa publicidade.
A falta de promoção tem geralmente um
impacto negativo na actuação e no moral
dos actores, o que acaba por ser um ciclo
vicioso”, refere Hu.
Com mais de 40 anos de história, o Hiu Koc
conta hoje com uma equipa de 70 pessoas –
a maioria trabalha a tempo parcial e apenas
os responsáveis pela produção e finanças
estão envolvidos no projecto a tempo inteiro.
Por vezes, os próprios actores dão apoio nas
tarefas administrativas. Hui explica que o
espaço não é gerido como uma organização
profissional, mas de forma amadora por um
grupo de apaixonados por teatro. “Até agora,
este provou ser o modelo que melhor nos
serve”, diz.
Como é que Hui justifica esta posição?
Basicamente, a maioria dos artistas
experientes do Hiu Koc trabalha a tempo
inteiro e alguns já estão reformados. Por
isso, o grupo não depende da produção
permanente de peças de teatro para cobrir
os custos correntes. Por outro lado, jovens
profissionais com formação em teatro
no estrangeiro têm estabelecido grupos
de teatro que operam de forma autosustentável.
“Como trabalhamos a tempo parcial na área
do teatro, podemos ceder ao longo do dia
as nossas instalações a outros grupos para
os ensaios e práticas criativas, tornando
possível partilhar os nossos recursos. Além
disso, também temos pensado em formar um
novo grupo de teatro com a nossa equipa
actual, para que tenhamos um subgrupo que
funcione como um grupo artístico a tempo
inteiro, enquanto a outra equipa continua a
trabalhar a tempo parcial. O nosso objectivo
é terminar esta restruturação num espaço de
três anos. Por outras palavras, prevemos que
o Hiu Koc cresça em dimensão, com grupos
de teatro exclusivos, um centro de arte e
outro tipo de produções criativas.”
Nas artes criativas, a atribuição de prémios
é geralmente vista como a melhor forma
de validar o trabalho dos bons actores e
produções. Em muitos países, prémios não
são apenas sinal de que os actores são
reconhecidos pela indústria, mas permitem
aos vencedores receberem financiamento
para formação no estrangeiro e podem
traduzir-se em oportunidades de digressão
para as produções galardoadas. E qual é a
realidade em Macau? A organização anual
de uma cerimónia de prémios poderia ser
benéfica? Hui admite que as opiniões de quem
trabalha nesta indústria local dividemse.
“É verdade que a atribuição de prémios traria
mais publicidade dos meios de comunicação
social. No entanto, a competição resultante
da premiação também pode criar rivalidades
e cisões dentro da indústria. Este tema é
debatido há anos e, por enquanto, não existe
um consenso real entre os que vivem da
arte. A prioridade actual do sector passa
por atrair mais apoio e público para o
teatro. A possibilidade de actuar com maior
frequência é o melhor e mais gratificante
reconhecimento para o trabalho dos grupos
de teatro. Um espectáculo que só pode
subir ao palco uma ou duas vezes tem
dificuldades em provar o seu valor. No ano
passado, apresentámos peças de longa
duração e a maioria subiu ao palco dez
vezes consecutivas ou mais. A peça Lungs,
por exemplo, teve um sucesso inédito. Do
mesmo modo, espero que o teatro em Macau
possa florescer, subir mais vezes ao palco e
ter oportunidade de se apresentar noutras
áreas da região do Delta do Rio das Pérolas.
Eu diria que os prémios são secundários.”
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A peça de teatro
Lungs do grupo
de teatro Hiu
Koc alcançou
um sucesso sem
precedentes.
Foto cedida
pelo Teatro Hiu
Koc
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Destaque
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Destaque
Texto/ Ng King Ling, Allison Chan e
Fong Son Wa
“Se o público
que assiste a
espectáculos
de artes
performativas
for uma minoria,
então o nosso
objectivo
é atrair a
convergência da
minoria”, diz Erik
Kuong, director
executivo da
associação Point
View.
Foto cedida por
Around Chao
Associação de Arte Point View:
onde a qualidade de arte é importante
Se, por um lado, a Associação de
Representação Teatral Hui Koc é um grupo
de teatro direccionado para a comunidade,
por outro, a Associação de Arte Point View,
estabelecida em 2008, tem como alvo
o mercado estrangeiro. A associação é
convidada todos os anos para actuar no
exterior. Focada sobretudo no teatro, a Point
View aposta em produções de carácter
experimental, recorrendo à utilização de
elementos multimédia. Por exemplo, o
espectáculo Playing Landscape, que teve
boa recepção do público, combina pintura,
simbolismo, formas e teatro. Há dois anos,
o grupo foi convidado para participar no
Festival Internacional de Teatro Mindelact
de Cabo Verde, em África. Também três das
suas mais recentes produções – Playing
Landscape, o teatro musical Picnic in the
Cemetery e o microteatro Puzzle the Puzzle
foram apresentadas na edição do ano
passado do Festival de Edimburgo no Reino
Unido, num total de quatro semanas de
actuações que receberam boas críticas.
Conhecida sobretudo por uma abordagem
artística menos convencional, a associação
Point View diferenciase dos grupos de
artes performativas tradicionais de Macau.
Há quem olhe para esta diferença como
uma lufada de ar fresco, enquanto outros
consideram que apenas uma minoria poderá
sentir-se atraída por este registo. Erik Kuong,
director executivo da associação, tem outra
perspectiva.
“Na minha opinião, o desenvolvimento do
nosso nicho não tem nada que ver com a
busca de popularidade. Penso que não é
necessário ser se grosseiro. Se o público que
assiste a espectáculos de artes performativas
for uma minoria, então o nosso objectivo
é atrair a convergência da minoria”. Kuong
diz que as artes visuais e o teatro nunca
foram actividades de entretenimento
dominantes e considera que é muito
importante que se olhe para fora de Macau
à procura de oportunidades de expansão e
desenvolvimento.
A maioria dos membros que compõe o
núcleo duro da associação recebeu formação
no estrangeiro e regressou a Macau para
dar seguimento à sua carreira artística.
Através da combinação de elementos tais
como a música, moda, produção de teatro e
design, a associação desenvolveu um nicho
na área da produção multimédia e está
agora focada num crescimento sustentado
da prática criativa. Kuong acredita que cada
actuação é uma obra de arte viva e que é
necessário tempo para que a boa arte evolua
e se desenvolva. Macau, no entanto, nem
sempre oferece um ambiente propício ao
crescimento natural das produções artísticas.
“Estranhamente, em Macau, uma peça de
teatro sobe ao palco apenas uma ou duas
vezes, ao contrário de outras regiões, onde
os grupos artísticos têm um ano para
desenvolver um espectáculo e ganhar
reputação.” Sendo a qualidade um factor
importante para a Point View, a associação
prefere trabalhar em apenas uma ou duas
produções anuais.
Claro que nem todos os grupos de teatro
podem dar-se a este luxo. Para garantir
financiamento governamental, os grupos
artísticos são geralmente avaliados pela
quantidade e não pela qualidade das suas
produções. Isto quer dizer que quanto mais
trabalho um grupo apresentar, mais apoio
financeiro pode arrecadar. Perante esta
limitação, Kuong acredita que, apesar de
um aumento do financiamento do governo,
a qualidade das produções de teatro em
Macau não tem crescido proporcionalmente.
Esta situação deve-se sobretudo à falta de
tempo que os actores têm para trabalhar
numa produção e à falta de instalações,
tornando difícil dinamizar um espectáculo
ao longo do tempo. Desta forma, a qualidade
do produto criativo fica comprometida.
“Se os grupos de teatro pudessem
apresentar apenas uma ou duas peças por
ano, então teriam muito mais tempo para
desenvolver e melhorar o produto final, e os
actores teriam oportunidade e tempo para
mostrar todo o seu potencial.” No caso da
Point View, o espectáculo Playing Landscape,
agora na sua sétima versão, foi aclamado
internacionalmente e está em digressão
todos os anos por um país diferente.
“Há pouco público de teatro em Macau. Eu
diria que é quase impossível atrair 30 mil
espectadores em Macau. No entanto, se
explorarmos outros mercados, podemos
contar com um público de mais de 3000
pessoas em Taipé, 5000 em Guangzhou,
ou mesmo procurar outros destinos como
Pequim. É a isto que me refiro quando falo
em procurar uma convergência da minoria”,
acrescenta o director executivo.
Erik Kuong acredita que a luta por mais
público não é uma competição entre vários
grupos de teatro, mas entre o teatro e outros
programas de entretenimento. “Questionome sempre se a oferta dos grupos de
teatro de Macau bastará. Por exemplo,
se eu estivesse interessado em ver um
espectáculo, é possível que não encontrasse
nada na agenda cultural, já que uma peça
local é apresentada apenas duas ou três
vezes. Perante estas limitações, é difícil atrair
novos espectadores.”
De acordo com Kuong, o governo não deveria
avaliar uma produção pela bilheteira mas
pelo desempenho individual. “O governo tem
de aprender a analisar melhor as tendências
de crescimento do público, fazendo um
levantamento demográfico com base na taxa
de crescimento dos espectadores de teatro.
Isso poderá ajudar as autoridades a fazer
uma avaliação mais abrangente e precisa
dos grupos artísticos e das suas produções
criativas.”
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Diálogo
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Texto/ Wong Io Man
tirar o dinheiro. Como já não conseguia
pagar a minha ida ao cinema, comecei
a frequentar livrarias com livros em
segunda mão, onde ficava a ler. Li Lu
Xun e Lao She, entre outros. Comecei a
interessar-me pela escrita ficcional e
concorri com algumas histórias para o
jornal Diário de Macau, que nunca chegou
a publicar os meus textos. Quando
terminei a escola secundária, comecei a
escrever peças de teatro. Foi nessa altura
que encontrei espaço para me expressar.
"Ainda há muita margem
para desenvolver o gosto
dos espectadores de Macau.
A questão é que não se
fazem estudos de mercado.
Actualmente, as peças em
cena não correspondem
àquilo que a audiência quer
e, em resposta, o público não
presta atenção ao que é feito",
diz Lawrence Lei I Leong, cofundador da Associação de
Representação Teatral Hiu Koc.
Foto cedida por Around Chao
P: Sempre soube que queria escrever peças
de teatro para Macau?
Made in Macau em palco –
Lawrence Lei I Leong olha o panorama
do teatro em Macau
L: Dramaturgo Lawrence Lei I Leong
P: Crítico cultural Lei Chin Pang
Lawrence Lei I Leong é uma lenda viva do teatro de Macau. Co-fundador da quadragenária
Associação de Representação Teatral Hiu Koc, Leong escreveu dezenas de peças e romances e
é o actual director do Conservatório de Macau.
L: Os meus trabalhos são essencialmente
sobre Macau. Uma das peças, que aborda
o tema da transferência de soberania, foi
inspirada na obra Demi-Gods and SemiDevils, porque senti que Qiao Feng, uma
das personagens, seria uma boa referência
para abordar a questão da identidade da
população de Macau. Sand Dune Journey
também se baseia num romance e explora
Demi-Gods and
Semi-Devils
(1991) aborda
questões como
a transferência
P: Qual é a mais memorável de todas as suas
criações?
L: Angry People. Foi criado no início dos anos
1980 e retratava a onda de imigrantes
ilegais que chegava do Interior da China
nessa altura. A peça foi apresentada no
Jardim Lou Lim Ieoc e as autoridades
portuguesas e académicos que estavam
presentes ficaram profundamente tocados
e aplaudiram entusiasticamente. Depois
disso, muitos grupos sentiram que não
devíamos ter apresentado aquela peça,
porque expunha o verdadeiro horror que
era a vida dos imigrantes ilegais chineses.
Acabámos por encontrar um meio-termo e
optei por um argumento mais ligeiro. Mas
penso que a peça reflecte a realidade e os
confrontos entre pessoas. Não havia nada
de político naquele trabalho.
P: Quando a associação Hiu Koc foi criada,
era raro escreverem-se peças que
reflectissem a sociedade de Macau?
L: Isso não acontecia apenas com esse tipo
de produções. Toda a cena teatral de
Macau vivia em silêncio. Nessa altura,
não havia qualquer grupo de teatro
activo. Nós escolhemos o nome Hiu
Koc [último pseudónimo do escritor Lu
Xun] para fazer despertar o teatro de
Macau, que estava moribundo. Desde que
estabelecemos o grupo, mantemo-nos
fiéis a dois princípios. Em primeiro lugar,
apenas vendemos bilhetes e nunca os
oferecemos, como forma de respeitar o
trabalho dos artistas. Em segundo lugar,
insistimos em produções originais que se
debrucem sobre temas locais. Quando a
Hiu Koc foi criada, Macau era uma cidade
muito fechada e o acesso à informação
era difícil. Naquela altura, havia uma série
de questões controversas em Macau, como
era o caso da imigração. Registava-se
uma onda de imigração ilegal em massa vietnamitas chegavam a Macau de barco,
etc. As nossas produções abordavam este
tipo de questões.
de soberania e
a identidade da
população de
Macau.
Foto cedida por
Lawrence Lei I
P: Como é que surgiu o seu interesse pelo
teatro?
L: Quando era pequeno, gostava de falava
comigo mesmo a caminho da escola e de
encarnar diferentes personagens. Também
gostava de ouvir séries radiofónicas. No
segundo ano da primária, aproveitava
o dinheiro do pequeno-almoço que eu
e os meus irmãos tínhamos guardado
para comprar bilhetes para os três no
cinema. Depois de ver os filmes, ficava a
pensar na estrutura e na forma como eu
a recriaria. Uma vez o meu irmão mais
novo desmaiou porque não tinha tomado
o pequeno-almoço e então deixei de lhe
Leong
Diálogo
a ideia do que é sentir-se em casa. As
duas peças foram buscar inspiração a
livros que adaptei à realidade de Macau.
Basicamente escrevo textos sobre Macau
porque sou de Macau.
P: Como vê o desenvolvimento do teatro
local?
L: Está a crescer. Muitos jovens foram
estudar para fora, o ambiente académico e
criativo melhorou e a informação está ao
alcance de todos. A atmosfera geral e as
políticas culturais também são favoráveis.
Por outro lado, aqueles que trabalham em
teatro, especialmente freelancers, têm de
trabalhar muito e produzir espectáculos
com grande frequência para garantirem
o seu sustento. Antigamente, tínhamos
um outro emprego a tempo inteiro e
depois trabalhávamos em teatro como
amadores, e por isso podíamos passar
meses a pensar numa produção. Isto já
não é possível na cena artística actual. O
resultado é que existem menos produções
E do que é que a classe
média precisa? Precisa de
entretenimento e de temas
com os quais se possa
identificar. As actuais peças
de teatro não encontram eco
entre o público.
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Diálogo
#5 2015/05
#5 2015/05
A peça The
Puppet of Lao
Jiu, de Lawrence
Lei I Leong, foi
apresentada em
Singapura em
2013.
Foto cedida por
Lawrence Lei I
Leong
originais em Macau. Actualmente, os
produtores não lêem livros porque
não têm tempo e, mesmo que tenham,
preferem ver filmes, que são mais
fáceis de digerir e entender. As pessoas
escolhem peças bem-sucedidas lá fora
para trazer a Macau, em vez de apostarem
em criações originais relacionadas com a
cidade. Isto preocupa-me.
P: Acredita que o teatro se pode tornar numa
indústria em Macau?
L: É possível, mas a questão passa por saber
como é que se vão criar condições para
que isso aconteça. As produções criativas
precisam de vender bem e de levar em
conta as preferências do público. Ainda
há muita margem para desenvolver o
gosto dos espectadores de Macau. A
questão é que não se fazem estudos
de mercado. Actualmente, as peças em
cena não correspondem àquilo que a
audiência quer e, em resposta, o público
não presta atenção ao que é feito. Se um
dia o nosso público for a classe média,
então poderemos dizer que o mercado
amadureceu. A classe média tem um forte
poder de compra e muita influência. Se as
peças de teatro conseguirem influenciar
essas pessoas, elas poderão, por sua vez,
influenciar a sociedade e criar dessa
forma uma série de interacções. E do que
é que a classe média precisa? Precisa de
entretenimento e de temas com os quais
se possa identificar. As actuais peças de
teatro não encontram eco entre o público.
P: Na sua opinião, o que é que está a faltar
ao teatro em Macau?
L: O teatro precisa de se abrir ao mercado,
estabelecendo, por exemplo, um local
apropriado para espectáculos. Também
não existem talentos suficientes para
trabalhar nesta área. Temos técnicos, mas
não temos pessoas criativas e actores
suficientes. É difícil para os estudantes
locais entrarem em escolas de teatro
no estrangeiro, porque existem sempre
limitações como a língua, a altura, entre
outras coisas. Além disso, uma cidade
precisa de criar produções originais. De
outra forma, por que razão alguém lhe
prestará atenção? Uma produção de
Macau tem de reflectir características e
emoções locais.
Diálogo
19
Evento
20
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#5 2015/05
Texto/ C Wong
“Esperamos que este festival
Joe Tang, escritor
possa despertar o interesse
local, fala com
por Macau não apenas
estudantes da
como destino turístico, mas
Universidade de
como lugar de cultura e de
Macau sobre a
narrativa entre os escritores,
sua experiência
e que possa estimular pelo
enquanto escritor.
mundo fora o aparecimento
-
de literatura sobre a cidade”,
Foto cedida
diz Hélder Beja, sub-director
pelo Festival
do Festival Literário de
Literário de
Macau.
Macau – Rota
-
das Letras |
Foto cedida por Around Chao
Tatiana Lages
Evento
Festival Literário de Macau:
viagem pela Rota das Letras
Numa cidade onde o chinês é a língua
mais falada e escrita, muitos poderão ter
estranhado que fosse o Ponto Final, um
dos principais jornais de Macau em língua
portuguesa, a ter a iniciativa de organizar o
Festival Literário de Macau. O sub-director
do evento, Hélder Beja, recorda: “Olhando
para trás, quando em 2011 eu e o Ricardo
Pinto falámos pela primeira vez sobre a
organização de um festival deste género,
a nossa ideia era chamar a atenção para
o facto de não haver um único festival na
China, Portugal ou Brasil que pudesse servir
de espaço de partilha entre aqueles que
escrevem em português e chinês.”
Macau, uma cidade singular, unida pelas
culturas chinesa e portuguesa, acolheu pela
primeira vez, em 2012, o festival literário.
"À excepção das obras de escritores locais,
tem havido em anos recentes uma falta
de interesse por parte de escritores de
outras paragens em utilizar Macau como
cenário para a sua escrita. Esperamos que
este festival possa despertar o interesse
por Macau não apenas como um destino
turístico, mas como um lugar de cultura e
de narrativa entre
os escritores, e que
possa estimular o
aparecimento pelo
mundo fora de mais
literatura sobre esta
cidade", realça ainda o
sub-director.
Macau, uma cidade singular,
unida pelas culturas chinesa
e portuguesa, acolheu pela
primeira vez, em 2012, o
festival literário.
O festival oferece um programa de
actividades para todos os gostos: além de
seminários, exposições e sessões de leitura
de poesia, são organizados eventos que vão
ao encontro de um público mais alargado,
como concertos, exposições de artes visuais
e sessões de cinema e teatro. Esta estratégia
permite à literatura tornar-se numa forma de
arte mais agradável e acessível, e promove
também um ambiente mais descontraído
para a troca de experiências e a discussão
literária. Uma das escritoras do Interior da
China presente no evento deste ano, Yan Ge,
realçou o acolhimento do Festival Literário
de Macau, a agradável experiência de
participar num encontro onde concertos de
música rock e eventos literários acontecem
paralelamente, e a excelente oportunidade
de encontrar
pela primeira
vez escritores
portugueses.
O festival literário,
que já vai na
quarta edição, alcançou um sucesso sem
precedentes em diversas áreas, constata
Hélder Beja. “Tivemos oportunidade de
colaborar com escolas e autores de literatura
infantil para levar os livros às salas de aulas
e fazer com que os mais novos participassem
nas nossas actividades. Este ano também
contámos com um forte apoio dos meios
de comunicação social, por exemplo em
Hong Kong, onde fizeram uma cobertura
alargada dos nossos eventos. E, por último,
a possibilidade de utilizar o Edifício do
Antigo Tribunal como base principal do
festival fez com que o evento continuasse
a ganhar maior visibilidade e se tornasse
mais acessível ao público do que em edições
anteriores.”
Sendo Macau mais conhecida pelo
desenvolvimento das indústrias do jogo e
do turismo do que pela literatura, o festival
Rota das Letras tem recebido menos atenção
do governo do que outras festividades
direccionadas para os turistas. “Há muitos
outros eventos organizados ou financiados
pelo governo que recebem um nível de
apoio financeiro muito mais elevado, mesmo
quando o seu impacto na sociedade ou
legado que deixam é provavelmente menos
significativo”, defende Hélder Beja.
Em 2012, o financiamento da primeira edição
do Festival Literário de Macau chegou
sobretudo do sector privado através do
jornal Ponto Final, contando com uma ajuda
de apenas 300 mil patacas do governo de
Macau. No ano seguinte, o Instituto Cultural
de Macau entrou como co-organizador e o
financiamento público aumentou. Já este ano,
o festival literário recebeu apoio do Instituto
Cultural e da Fundação Macau, bem como do
Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura
e do Turismo de Macau, totalizando 1,45
milhões de patacas. Com o apoio do sector
privado, o orçamento global rondou os 2,7
milhões de patacas. Hélder Beja reconhece
que, com um apoio financeiro mais generoso,
a organização terá melhores possibilidades
de equilibrar as contas deste ano.
A edição de 2015 juntou em Macau nomes
fortes da literatura e do cinema, incluindo
Wang Anyi, Ann Hui, Wong Bik Wan e Murong
Xuecun, bem como Ondjaki, Francisco José
Viegas, Maria do Rosário Pedreira e João
Botelho, do lado lusófono. No entanto,
o programa detalhado do festival só foi
divulgado muito em cima da hora. Hélder
Beja explica: “O festival é organizado por
uma equipa muito pequena, com a maioria
dos colaboradores a trabalhar a tempo
parcial. Nem sempre é fácil mobilizar
recursos humanos para apoiar a crescente
dimensão do festival. Além disso, como
preparamos todo o material de promoção
em três línguas (chinês, português e inglês),
e como o programa tem vindo a crescer, a
carga de trabalho tem vindo a aumentar
significativamente". Para o próximo ano,
acrescenta o sub-director, a programação e
o nome dos participantes serão divulgados
logo no início de Fevereiro, de modo a captar
mais público em Março.
Quem consulta a lista dos participantes do
festival, apercebe-se do reduzido número de
convidados locais. Agnes Lam, escritora de
Macau, realça: “A organização tem sempre
mostrado interesse na participação de
escritores locais, mas devido ao calendário
apertado e ao facto de a maioria dos
escritores de Macau não escrever a tempo
inteiro, é bastante difícil que estes se juntem
ao evento com tão pouca antecedência.
Outro obstáculo diz respeito à dificuldade
de comunicação entre os autores de língua
chinesa e de língua portuguesa. Antes de se
encontrarem, estes dois grupos de escritores
precisariam de mais tempo para ler as obras
uns dos outros. A maioria dos escritores de
fora nem sequer conhece a nossa literatura,
principalmente por não falarem chinês e
pela falta da tradução de obras locais. Estes
problemas dificultam verdadeiramente o
intercâmbio profícuo de ideias."
Apesar dos contratempos, o festival tem tido
um papel importante na defesa do princípio
"escrever Macau". Além de incentivar autores
de ambas as línguas a escrever sobre a
cidade, a Rota das Letras tem trabalhado
21
22
#5 2015/05
no sentido de promover a literatura local.
Este ano, a organização apoiou a tradução e
publicação da consagrada obra O Assassino
de Joe Tang em três línguas – inglês,
português e chinês simplificado – e também
preparou a compilação e publicação de Regra
de Três, terceiro tomo da antologia que reúne
contos e poemas sobre Macau, da autoria de
escritores locais e do exterior.
23
#5 2015/05
A antologia, impressa e distribuída em
Macau, também ficará disponível em versão
e-book, para que um maior número de
leitores no exterior tenha a oportunidade de
aprender mais sobre a literatura de Macau.
The Doomsday Hotel, romance
Pela primeira vez, o Festival
da escritora de Hong Kong
Literário de Macau preparou
Wong Bik Wan, passa-se em
um programa especial
Macau e foi transposto para
direccionado para jovens
recitação e música no Festival
leitores.
Literário.
-
-
Foto cedida pelo Festival
Foto cedida pelo Festival
Literário de Macau – Rota
Literário de Macau – Rota
das Letras | Tatiana Lages
das Letras | Tatiana Lages
24
Infografia
#5 2015/05
Texto/ Wong Io Man
No entanto, Agnes Lam, Directora Assistente
da Faculdade de Ciências Sociais da
Universidade de Macau, acredita que estas
classificações poderão vir a alterar-se no
futuro, principalmente devido à influência
do K-Pop, mesmo que neste momento o
sector dos “Jogos” domine a tabela. Além
disso, a importância do “Conhecimento
e Informação”, “Publicação” e “Animação”,
que inclui os e-books, aponta para que a
importância da internet e das indústrias
digitais continue a crescer.
O cinema é um
dos sectores
criativos que
Hong Kong
está a tentar
revitalizar.
Foto cedida por
Silk Tork
O governo de Taiwan começou em 2009 a
redefinir a direcção do sector das indústrias
culturais e criativas – em particular de seis
indústrias. Dados avançados pelo Conselho
para os Assuntos Culturais nesse mesmo
ano revelam que, em 2002, o valor das
indústrias culturais e criativas totalizou 435
mil milhões de dólares de Taiwan (TWD),
Indústrias Culturais e
Criativas na Ásia:
Comparando PIBs
25
Infografia
#5 2015/05
subindo em 2007 para 633 mil milhões
de TWD. Entre 2002 e 2007, as indústrias
culturais e criativas cresceram em média
7,78 por cento ao ano, enquanto o PIB
taiwanês cresceu 3,7 por cento. Em termos
de valor acrescentado, em 2002 estas
indústrias contribuíram em média cerca de
231 mil milhões de TWD para a economia
de Taiwan. Em 2007, o valor totalizou 335
mil milhões de TWD, uma subida de 104
mil milhões.
Em Hong Kong, dados oficiais revelam que,
em 2010, o valor das indústrias culturais
e criativas aumentou 22,8 por cento em
relação ao ano anterior para 77 mil milhões
de dólares de Hong Kong (HKD). A taxa de
crescimento foi significativamente mais
veloz do que a taxa de crescimento do PIB
nominal – 9,8 por cento. A participação
das indústrias culturais e criativas no PIB
de Hong Kong também aumentou de 4,1
por cento, em 2009, para 4,6 por cento,
em 2010. Para perspectivar a situação a
longo prazo, podemos ter em conta a taxa
de crescimento das indústrias culturais e
criativas entre 2005 e 2010, que subiu em
média 8,3 por cento ao ano, relativamente
aos 4,6 por cento do PIB nominal.
“Como revelam estes dados, os vizinhos
de Macau têm feito um bom trabalho no
desenvolvimento das indústrias culturais
e criativas. Isto demonstra que, numa
era em que a economia se baseia no
conhecimento, a cultura é um indicador
importante para medir a competitividade,
e o valor comercial das indústrias culturais
e criativas é crucial para estimular o soft
power”, diz Agnes Lam.
Valor das indústrias culturais e criativas na Coreia do Sul, 2007-2009
(Milhões de Won, %)
As indústrias culturais e criativas têm vindo a tornar-se numa parte importante de várias
economias mundiais. Neste número, analisamos a situação destas indústrias em três mercados
asiáticos – Coreia do Sul, Taiwan e Hong Kong.
2007
Indústria
A Coreia do Sul é actualmente uma potência
no que diz respeito à exportação cultural na
Ásia e tem sido objecto de vários estudos
em todo o mundo. De acordo com dados
publicados em 2010 e 2011 pelo Ministério
da Cultura, Desporto e Turismo da Coreia do
Sul, os “Jogos” foram o sector das indústrias
culturais e criativas que mais contribuiu em
2009 para a economia sul-coreana – com
uma participação de 50,89 por cento – e
também o mais lucrativo. Seguiram-se os
sectores do “Conhecimento e Informação”,
“Publicação” e “Animação”. A área que
apresentou uma menor participação foi o
“Cinema”, seguindo-se a “Publicidade”.
O K-pop é uma das indústrias
criativas mais promissoras
da Coreia do Sul.
2008
2009
Vendas
Valor
Acrescentado
Taxa de
Valor
Acrescentado
Vendas
Valor
Acrescentado
Taxa de
Valor
Acrescentado
Vendas
Valor
Acrescentado
Taxa de
Valor
Acrescentado
Peso
Publicação
21595539
8949107
41.44%
21052936
8972761
42.62%
20609123
8736207
42.39%
30.6%
Banda
desenhada
7616868
282052
37.03%
723286
282600
39.21%
739094
290833
39.36%
1%
Jogos
5143600
2487445
48.36%
5604700
2808000
50.1%
6580600
3348867
50.89%
11.7%
Cinema
3183301
880819
27.67%
2885572
349442
12.11%
3306672
1087895
32.9%
3.8%
Animação
311166
122506
39.37%
404760
167287
41.33%
418570
175213
41.86%
0.6%
Televisão
10534374
4267646
40.51%
11685533
3870377
32.57%
12768963
5165349
40.45%
18.1%
Produção
de vídeo
independente
﹣
﹣
﹣
727411
295838
40.67%
796175
328343
41.24%
1.1%
Publicidade
9434625
4002168
42.42%
9311635
4062666
43.63%
9186878
3445079
37.5%
12.1%
Cosplay
5115639
1801217
35.21%
5098713
1956376
38.37%
5358272
2202786
41.11%
7.7%
Conhecimento
e Informação
4297341
1729680
40.25%
4777330
1946438
41.12%
5255185
2237658
42.58%
7.8%
Serviço da
Indústria
Criativa
1679800
642524
38.25%
1866100
731698
39.21%
2036362
802734
39.42%
2.8%
Total
64414776
25952873
40.29%
66012641
26113290
39.56%
6900472
28515387
41.33%
100%
Foto cedida por Eva Rinaldi
*Taxa de valor acrescentado = (Valor acrescentado/vendas) x100%
Fonte: Inquérito sobre as indústrias culturais e criativas 2010, Relatório das tendências das indústrias culturais e criativas do primeiro trimestre de 2011
(Ministério da Cultura, Desporto e Turismo da Coreia do Sul)
26
Infografia
#5 2015/05
Infografia
#5 2015/05
A indústria
criativa é uma
das principais
indústrias de
Taiwan. Várias
infraestruturas
abandonadas
estão a ser
recuperadas
e utilizadas
como espaços
artísticos.
Foto cedida por
Chongkian
27
28
Agenda Cultural
#5 2015/05
#5 2015/05
Agenda Cultural
Agenda
Cultural
Festival Internacional de Cinema e Vídeo
de Macau 2015
Data: 12/5/2015-16/5/2015
Horário: Vários
Local: Centro Cultural de Macau
Bilhetes: MOP60
Programa: A nona edição do Festival
Internacional de Cinema e Vídeo de Macau
apresenta mais de 40 filmes de todo o mundo,
e a secção “Macau Indies” exibe 26 trabalhos
relevantes de cineastas locais.
Organizador: Centro Cultural de Macau
Website: www.ccm.gov.mo/Event.aspx/-1
Fórum das Indústrias Cultrais de Macau
2015
Data: 17/5/2015-20/5/2015
Horário: 9:30
Local: Centro de Ciência de Macau
Bilhetes: Entrada Livre (Deve enviar email para
reserva antecipada para [email protected])
Programa: A edição inaugural deste fórum
convida especialistas da UNCTAD, da China e
da Europa para partilharem os seus pontos de
vista sobre o futuro das indústrias culturais
e criativas, e de como Macau pode aprender
com as melhores práticas utilizadas em vários
lugares do mundo.
Organizador: Associação de Intercâmbio
de Culturais Chinesa (Macau), Instituto de
Indústrias Culturais da Universidade de Pequim
XXVI Festival de Artes de Macau
Le French May
Curso de Verão da TNUA 2015
Trienal de Gravura de Macau
Data: 1/5/2015-31/5/2015
Horário: Vários
Local: Vários
Bilhetes: Vários
Data: 1/5/2015-30/6/2015
Horário: Vários
Local: Vários
Bilhetes: Vários
Prazo para envio de trabalhos:
1/6/2015-30/6/2015
Exposição: 29/11/2015-14/2/2016
Local: Museu de Arte de Macau
Programa: “Encontro” foi o tema escolhido este
ano pela organização do Festival de Artes de
Macau e representa uma tentativa de explorar a
diversidade linguística das artes performativas,
rompendo com várias barreiras linguísticas. O
festival terá mais de 100 actividades, incluindo
música, teatro, dança, exposições, actuações ao
ar livre e muito mais.
Programa: Este ano, a 23.ª edição do festival
de artes Le French May tem como mote
"Essencialmente francês" e vai abordar temas
como o património e a modernidade na cultura
francesa, contando com mais de 120 actividades.
Em destaque vai estar “Ça C’est Vraiment Toi”,
espectáculo interpretado por cantores de
Rock/Pop francês; e o espectáculo de dança
“Transports Exceptionnels”, de Beau Geste.
Data: 3/7/2015-12/7/2015
(Inscrições até 31/5/2015)
Local: Universidade Nacional de Artes de Taipé
Preço: TWD$18.800—TWD$32.000 (Os valores
dependem dos módulos escolhidos)
Organizador: Instituto Cultural de Macau
Website: http://www.icm.gov.mo/fam/26/pt/
Art Revolution Taipei 2015
Data: 8/5/2015-11/5/2015
Horário: 00:00-20:00
(11:00-19:00 no dia 10/5/2015)
Local: Salão Três do World Trade Center de Taipé
Bilhetes: TWD$100
Programa: “Enjoy Art・Enjoy Happiness” é o lema
desta edição da feira Art Revolution Taipei.
Duas mil obras de arte de 62 países e regiões
vão ser apresentadas durante o evento. O
rácio de artistas que vendeu obras de arte na
edição do ano passado atingiu 93,21 por cento,
um recorde a nível mundial. A feira também
contempla um programa especial de caridade,
em que parte das receitas das vendas reverte
directamente para o Fundo para as Crianças e
Famílias de Taiwan.
Organizador: Associação Internacional de Artistas
Contemporâneos de Taiwan
Website: www.arts.org.tw
Programa: Direccionado para estudantes com
idades compreendidas entre os 14 e os 21
anos, o programa de dez dias oferece cursos
de introdução à arte, estudos de teatro, dança,
música tradicional, cinema, novos média e
animação.
Programa: A segunda edição da Trienal de
Gravura de Macau, com curadoria do consagrado
artista Wong Cheng Pou, já abriu inscrições para
o envio de candidaturas. Aceitam-se trabalhos
feitos através de todos os métodos de gravura.
O vencedor receberá um prémio pecuniário no
valor de 250 mil patacas.
Organizador: Universidade Nacional de Artes
de Taipé
Website: aaa.tnua.edu.tw/class/p2.aspx?tid=39
Organizador: Instituto Cultural de Macau
Website: www.triennialmacau.com/
Coroa dos Alpes: Colecção de Obras
-Primas do Príncipe do Liechtenstein
Feira Internacional de Indústrias Culturais
da China (Shenzhen) 2015
Abertura da C-Shop
Data: 17/4/2015-31/8/2015
Horário: 9:00-17:00
Local: Museu do Palácio Nacional, Edifício da
Biblioteca 1/F, Taiwan
Bilhetes: TWD$250
(antes de 30/8/2015: TWD$160)
Data: 14/5/2015-18/5/2015
Organizador: Consulado Geral de França em
Hong Kong e Macau
Website: www.frenchmay.com/programmes/
event.aspx?name=Roots
Programa: A mostra particular apresenta mais
de 100 trabalhos de vários mestres, como
Rafael, Peter Paul Rubens, Anthony van Dyck e
Rembrandt van Rijn. Cobrindo vários períodos
artísticos – Renascentismo, Barroco, Era
Dourada da Holanda – e vários géneros, estes
requintados trabalhos estão organizados como
um manual de história de arte esplêndido e
conciso, que pode ajudar a ler as mentes destes
grandes artistas.
Organizador: Museu do Palácio Nacional, Taiwan
Website: www.npm.gov.tw
Local: Centro de Convenções e Exposições de
Shenzhen
Bilhetes: Entrada livre
Programa: Nove salas de exposições vão
acolher mais uma edição da única feira nacional,
internacional e integrada das indústrias culturais
da China. Estão programadas várias actividades
de grande dimensão para dar apoio ao
comércio especializado, investimento e serviços
financeiros para projectos e produtos culturais.
Organizador: Ministério da Cultura da República
Popular da China, Governo Popular Municipal de
Shenzhen, etc.
Website: www.cnicif.com
Data: 5/5/2015
Horário: 11:00-20:00
Local: Avenida Doutor Mário Soares, Macau
Programa: A C-Shop apresenta produtos
feitos ou desenhados em Macau, incluindo
recordações, acessórios, livros e peças de
mobiliário. Lembre-se de pedir uma cópia do
“Mapa Cultural e Criativo de Macau”, o melhor
guia para todos os locais ligados à arte, cultura
e design na cidade.
Organizador: Instituto Cultural de Macau
Website: www.facebook.com/
MacaoCreativePavilion
29
30
Blogues
#5 2015/05
De artista a crítica de arte
Leong
Sin U
Ho
Ka Cheng
Nascida em Macau, Leong Sin U
Supervisor da Associação Audio-
frequentou a Universidade Baptista
Visual CUT, Ho é um dos realizadores
de Hong Kong e completou o
do projecto Macau Stories 1 e esteve
Mestrado em Artes Visuais (Artes e
também envolvido no Macau Stories
Cultura) em 2014. Integrou o corpo
2 – Love in the City e no Macau Stories
de críticos da edição de 2012 e
3 – City Maze. Macau Stories 2 – Love in
2013 do Festival Fringe de Taipé,
do Festival Popular Fringe de Hong
Kong e ainda do Festival de Artes
de Macau e do Festival Fringe da
Cidade de Macau.
Não há muito tempo cruzei-me com uma amiga que fez adereços
para um grupo de teatro de Macau. Perguntou-me se tinha visto uma
determinada peça de teatro local e disse-me que ainda não tinha
ouvido quaisquer comentários ao espectáculo. Havia um estranho
silêncio à volta daquela peça.
A palavra “silêncio” deixou-me a pensar – um grupo de teatro que
quer evoluir precisa de feedback. Em qualquer sector amadurecido,
os críticos são indispensáveis, e esta é uma actividade que se pode
tornar numa profissão. Além de comentarem trabalhos artísticos, os
críticos podem ajudar a aumentar a visibilidade e o debate à volta
dessas obras. Macau tem espectáculos de escala e periodicidade
limitadas e, por isso, as críticas não levarão necessariamente a
melhores resultados de bilheteira. Grande parte das críticas de arte
sublinha apenas o talento artístico, os críticos são amadores e, por
vezes, desempenham múltiplas funções.
A criação artística e a crítica de arte partem de diferentes pontos
de vista. Nos quatro anos em que estive envolvida no programa de
crítica de teatro de Macau, participei em workshops organizados na
cidade e para os quais eram convidados críticos de outras regiões
onde também se fala chinês. Participei também em eventos em
Hong Kong, Taiwan e Macau, que me ajudaram a perceber melhor
o estado da crítica de arte em diferentes regiões e o meu próprio
papel nesta área. Como estou criadora de literatura e de artes visuais,
tinha pouco conhecimento sobre o mundo do teatro, mas percebi os
desafios enfrentados por quem está ligado às industrias criativas.
Assisti aos ensaios e aos espectáculos da Comuna de Pedra e fiquei
profundamente tocada com toda a sua dedicação. No entanto, tive
de saber encarar a minha outra identidade – a de uma comentadora
solitária que tem de escrever objectivamente sobre um espectáculo.
Tenho de assumir a responsabilidade pelos comentários que faço e
eu própria também enfrento críticas. Mas para analisar uma obra de
arte e impulsionar o desenvolvimento da cena artística, é importante
fomentar a discussão através de diferentes pontos de vista.
Blogues
#5 2015/05
Se os organizadores reconhecerem a importância da crítica de
arte, esta pode até tornar-se num elemento promotor das obras.
Apesar de a crítica de arte estar também presente em eventos
oficiais como o Festival de Artes de Macau ou o Festival Fringe
da Cidade de Macau, as actualizações online dos comentários e as
promoções são feitas por agências externas. A devoção e a taxa
de actualização das entidades oficiais não são satisfatórias. Neste
aspecto, o Festival Fringe de Taipé pode ser uma boa referência.
Participei neste evento como comentadora externa em 2012 e
2013. Foi criada uma secção de crítica no website do festival e os
comentadores tinham de submeter as avaliações e as pontuações
nas 24 horas após o espectáculo. Depois, a organização publicava
estes comentários online. Mesmo quando recebiam as avaliações
às nove da noite, os funcionários do festival tinham sempre
uma resposta amigável. Assim, um dia depois do espectáculo
os interessados já podiam ficar a conhecer as pontuações e os
comentários atribuídos aos autores e às actuações.
Dos eventos de crítica de arte que são organizados, pode observarse uma intensa participação de jovens comentadores, mas isso
não quer dizer que a qualidade e a quantidade das suas avaliações
estejam garantidas, uma vez que estes jovens estão ocupados
com a sua própria profissão. Pessoalmente, entendo a importância
da crítica, mas por vezes a minha participação é afectada por
criações ou projectos que desenvolvo paralelamente. Além disso,
os comentadores trabalham muitas vezes como organizadores
ou autores de eventos, o que faz com que seja difícil manter a
independência. Esta é a situação enfrentada pelos organizadores,
caso queiram que os seus programas continuem: por um lado,
precisam que os comentadores acumulem experiência e, por outro,
precisam de sangue novo na indústria. O círculo artístico também
tem dar resposta e coordenar. É necessário dar mais atenção a este
tipo de relação interactiva.
As bases da indústria
cinematográfica de Macau
A história do desenvolvimento da indústria cinematográfica de
Macau pode dividir-se em três partes.
Em primeiro lugar está a produção, que se pode dividir em filmes
comerciais e não-comerciais. Ainda que seja difícil encontrar
produções de Macau que encaixem na definição tradicional de
“comercial”, podemos tentar. “Comercial” serve aqui para descrever
filmes que vão ao encontro dos gostos do grande público, que
duram cerca de uma hora e meia e são exibidos em salas de cinema.
Os filmes “não-comerciais” são mais individualistas, tais como os
chamados microfilmes.
Em segundo lugar temos a promoção, que se refere ao acto de trazer
filmes estrangeiros a Macau ou promover os filmes locais no exterior.
Dar a conhecer filmes estrangeiros independentes, que não sejam
convencionais nem comerciais, ajuda certamente na formação do público de
Macau, permitindo que haja acesso a uma maior selecção de filmes
bem diferente do que costuma chegar ao grande ecrã. Esta pode ser
outra forma de ajudar a desenvolver a indústria de cinema da cidade.
Mas os filmes de Macau também devem olhar para fora de Macau,
para que pessoas de outras regiões do mundo possam ficar a
conhecer a cultura local. Por agora, os filmes de Macau não são
exibidos comercialmente em outros países, mas deveriam estar pelo
menos disponíveis para ajudar ao desenvolvimento do intercâmbio
cultural entre Macau e outras regiões.
O terceiro elemento é a educação cinematográfica – tanto no sentido
profissional como liberal. O sentido profissional materializa-se com
a educação universitária, incluindo a formação em áreas como a
realização, representação, educação técnica, bem como guionismo,
distribuição, promoção, organização de festivais de cinema, teoria
do cinema e assim por diante. São todas áreas importantes. Neste
momento, nenhuma destas competências pode existir como indústria
autónoma em Macau. Uma pessoa não consegue viver apenas da
escrita guiões. Mas é importante que os estudantes do ensino
superior possam estar expostos a todos estes aspectos da indústria.
A educação liberal de cinema refere-se, por exemplo, à promoção
the City recebeu uma menção especial
no festival português de cinema
Avanca e foi mostrado nos festivais de
Tóquio e Osaka.
do filme nas escolas primárias e secundárias. Ao utilizar o cinema
como meio de comunicação, os professores podem alargar os
horizontes dos alunos, despertar o seu interesse por diversas
questões internacionais e promover o pensamento crítico. Através
do cinema, os estudantes podem aprender mais sobre a humanidade
e experimentar diferentes formas de interacção, ajudando-os na
construção dos seus próprios valores e de uma visão do mundo.
Macau ainda não tem uma indústria cinematográfica de relevo, mas já
deu o primeiro passo. Para começar, precisamos de criar um ambiente
saudável ao cinema para que a indústria floresça. Para alcançar
este objectivo, é necessário que três tipos de pessoas trabalhem em
conjunto: os produtores, os investigadores de cinema e o público.
Apenas quando estes três grupos estiverem completamente unidos
poderá a indústria avançar no caminho certo. Por exemplo, se depois
de produzido um filme nem a crítica nem o público demonstrarem
qualquer interesse, então é impossível tirar proveito dos valores
culturais dessa obra. Isto não é saudável para o desenvolvimento
pleno da indústria cinematográfica. Entenda-se por “saudável” uma
produção de cinema local que entretém do ponto de vista comercial,
mas que também contém valores culturais e históricos que podem
inspirar o público e fomentar a reflexão. Quando produtores, críticos
e espectadores estiverem juntos neste processo, então será possível
construir bases para o desenvolvimento de uma indústria saudável
em Macau, que seja diversa, inovadora e essencial.
Na última década, o governo tem vindo a apostar cada vez mais
no financiamento da indústria cinematográfica. O público local
também está a prestar mais atenção às produções de Macau e os
realizadores continuam a evoluir qualitativa e quantitativamente.
Mas Macau ainda não tem talentos na área dos estudos de cinema,
o que, quando acontecer, poderá ajudar a aprofundar o sentido e o
valor das produções locais. Até agora, não houve quem conseguisse
abrir a porta ao desenvolvimento dos estudos nesta área em Macau.
Uma cultura generalizada de crítica de cinema será uma referência
para futuros cineastas e poderá ajudar à sua criatividade. Os novos
cineastas podem tirar partido dos trabalhos dos seus antecessores
para seguirem em frente e não repetirem os mesmos erros.
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Blogues
#5 2015/05
#5 2015/05
Joe Lei
Ling
Lui
Compositor e letrista
em Hong Kong e Macau.
Jornalista de Actualidade
Escreveu mais de 300
Informativa em Hong Kong,
canções. É Capricórnio e
interessada em viagens e
gosta de chamar as coisas
com um fraco por palavras.
pelos nomes.
Inspiração criativa e aprendizagem
Muitas pessoas perguntam: a composição musical é algo que se
pode ensinar? Sim, certamente. Comecei a dar aulas de composição
de música pop há dez anos na Star House em Tsim Sha Tsui;
depois dei aulas de composição e escrita lírica na Baron School
of Music. Apesar de a carreira de ensino em Hong Kong ser bem
remunerada, deixa pouco tempo para fazer outras coisas no final de
cada dia longo e passado a viajar de um lado para o outro. Desde
que comecei a ensinar composição musical em Macau este ano, o
trajecto que faço diariamente para o trabalho é muito mais calmo.
Aqueles que se querem inscrever neste tipo de cursos (por exemplo,
composição musical) devem cumprir os seguintes requisitos:
1. Uma boa base em teoria musical – o equivalente ao Nível 5 do ABRSM;
2. Tocar pelo menos um instrumento musical, preferencialmente o piano;
3. Não ser tímido no trabalho de composição. A maioria dos
estudantes gosta de compor recorrendo a instrumentos musicais,
mas eu penso que a voz é o melhor instrumento. No entanto, muitos
alunos têm alguma resistência em utilizar o método bocca chiusa
quando compõem. Os asiáticos são introvertidos por natureza;
4. Ter uma mente aberta para ouvir vários géneros musicais, caso
contrário as composições em que trabalham abrangerão uma
variedade de estilos muito reduzida;
5. Estar disposto a ser criativo. É verdade que alguns estudantes gostam
de tirar notas e têm alguma relutância em meter mãos ao trabalho
quando chega o momento de criar – provavelmente um resultado
desastroso da educação condescendente em Hong Kong e Macau;
6. Ter computador com um software de música instalado.
Se os estudantes tiverem estas seis faculdades descritas acima,
provavelmente conseguirão entrar no curso. Alguns poderão ainda
questionar-se se a criatividade é algo que pode ser ensinado.
A questão é levantada na medida em que nos deparamos
frequentemente com romances ou filmes sobre génios, que nos
levam a acreditar que todos os artistas são “os escolhidos”. Se viu o
filme de Stephen Chow, Flirting Scholar, provavelmente terá pensado
que os académicos talentosos encontram as palavras certas para
os seus poemas sem fazer qualquer esforço. E se vir Amadeus,
provavelmente acreditará que só um génio conseguiria criar sem
grande esforço uma obra-prima que perdurasse ao longo dos tempos
- como se esse génio tivesse apenas de ter nascido, sem nunca
ter sido ensinado. De facto, este é um grande equívoco no que diz
respeito à criatividade.
Claro que existem artistas que assinam grandes obras sem
nunca terem tido formação profissional, mas são uma minoria. A
verdade é que aqueles que têm formação e experiência estão em
vantagem em relação aos que não têm. Com uma base mais sólida,
a carreira criativa de um artista será mais longa e estável. O ponto
fundamental é que ninguém pode contar apenas com a inspiração
para se manter criativo ao longo da carreira.
De facto, trabalhar nas indústrias criativas requer competências
especializadas, profundidade dos conhecimentos e muito empenho,
tal como acontece noutras indústrias. Não ponhamos a indústria
criativa num pedestal: não existe nenhum deus que ande por aí
a atingir-nos com uma seta da inspiração e a estimular as nossas
mentes; como também não existe um artista que consiga criar
uma obra de arte única do nada, sem ter sido ensinado. Na maioria
das vezes, estudamos, analisamos e refazemos trabalhos antigos,
melhorando-os ou reorganizando-os. Isto acontece principalmente
no início de uma carreira criativa. Os primeiros trabalhos de Mozart
foram muito influenciados por Haydn, e os de Beethoven por
Mozart. Bons trabalhos resultam muitas vezes de tentativas e erros
cometidos através da imitação e da prática.
Conheço vários artistas que são famosos pelas viagens que fazem
ao estrangeiro à procura de inspiração. No entanto, não parece que
os resultados criativos tenham melhorado muito com estas viagens.
Deixo aqui algumas humildes observações: em vez de procurarem
inspiração no estrangeiro, estudem seriamente ao piano ou à
secretaria e procurem desconstruir as obras-primas, ou inscrevamse num curso criativo. São formas eficazes que podem ajudar a
desenvolver a criatividade de cada um. Mas, claro, estes métodos
podem não ser tão fixe como encontrar inspiração numa viagem
ao estrangeiro.
Blogues
Raising the Bar
Não há muito tempo, numa terça-feira, o Club 71 em Central estava
a abarrotar e todas as atenções estavam viradas para um académico:
Lokman Tsui, professor assistente da Escola de Jornalismo e
Comunicação da Universidade Chinesa de Hong Kong falava sobre o
fim da internet. Abordava temas como o conceito do terceiro espaço
dos salões parisienses, bem como a monitorização e espionagem
na internet. O público, de cerveja na mão, fazia ocasionalmente
perguntas, participando na discussão.
Ao mesmo tempo, Chan Sze Chi, professor universitário do
departamento de Religião e Filosofia da Universidade Baptista
de Hong Kong, bebia um copo no Room Bar, em Sheung Wan, e
conversava sobre o encontro entre Oriente e Ocidente, um tema
que estuda há vários anos. Naquela mesma noite, dez académicos
marcaram presença em vários bares de Hong Kong, dando uma
palestra enquanto bebiam um copo. O evento, baptizado de Raising
the Bar, nasceu pelas mãos de uma série de intelectuais de Nova Iorque.
Durante muito tempo as universidades foram consideradas torres de
marfim. Alguns acreditam que o conhecimento divide a sociedade
em diferentes classes e aumenta as disparidades económicas. Mas a
verdade é que alguns académicos têm tentado levar o conhecimento
até às comunidades. A Universidade de Columbia e a Universidade
de Nova Iorque começaram a oferecer palestras gratuitas ao público,
mas não foi fácil trazer as pessoas a estas instituições, devido a um
complexo de inferioridade ou a um sentimento de não-identificação
com a arquitectura destes espaços. E assim as torres de marfim
mantêm-se – o público continua a sentir-se excluído.
Foi com base nesta situação que um grupo de economistas, escritores,
banqueiros, actores e médicos criou o Raising the Bar. Estas pessoas
recorreram a bares de bairro como escolas para partilhar ideias com o
público em geral, tornando a educação numa parte integrante da cultura
popular da cidade e transformando tópicos académicos complexos em
discussões animadas. Os temas vão da anatomia ao género musical Fado
e a questões relacionadas com a Coreia do Norte, entre outras. Cada
sessão dura 40 minutos e os espectadores sentem-se mais à vontade
para levantar questões num ambiente descontraído e de interacção.
O Raising the Bar é patrocinado pela Universidade de Columbia e
a Universidade de Nova Iorque. Os participantes devem inscreverse antecipadamente, embora o evento seja gratuito – cada qual
só precisa de pagar a sua cerveja. Em Abril, numa só noite, foram
organizados 50 seminários em 50 locais de Nova Iorque, desde as mais
sofisticadas adegas até aos bares de bairro. O evento foi patrocinado
pela Time Out de Nova Iorque e atraiu cerca de seis mil participantes.
Este evento começou em Nova Iorque, expandiu-se a São Francisco,
Hong Kong e Sydney, e os organizadores já estão a considerar outras
cidades, como Boston e Londres. Há também planos para a criação de
“escolas flash” em estações de comboio e a transformação de bares
em espaços para workshops, permitindo que estes estabelecimentos
concorram a fundos de investigação.
Nos últimos anos, as sociedades ocidentais estão cada vez mais
receptivas à organização de intercâmbios académicos em locais
como bares ou cafés. Por exemplo, o The Troubadour de Londres é
um conhecido espaço para discussões sobre poesia, com sessões
de escrita, leitura e de discussão de temas relacionados. Numa
colaboração com a University College London e o bar Bright Club
dá formação artística aos investigadores para que estes possam
apresentar em palco de forma animada e bem humorada os
resultados das suas pesquisas. Também são organizadas actividades
do género no Museu da História Natural, para tentar atrair mais
pessoas a prosseguir os estudos no ensino superior. A Associação
Britânica para o Avanço da Ciência estabeleceu o SciBar, uma escola
de ciências dentro de um bar, que permite o intercâmbio científico
enquanto se bebe uma cerveja.
Hong Kong também tem organizado eventos semelhantes em bares
e clubes nocturnos, embora isso tenha acontecido apenas durante
o Festival Literário Internacional da cidade. Durante este período,
escritores conhecidos são convidados a partilhar as suas experiências
em bares na zona de Central. Mas, por enquanto, não é nada que seja
organizado numa base semanal ou mensal, nem que faça parte do
dia-a-dia da população de Hong Kong.
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#5 2015/05
#5 2015/05
Yap
Seow
Choong
Ron
Lam
Escritor a residir no Japão,
especializado em design,
Antigo editor da Lonely
lifestyle e jornalismo de
Planet China. Tem publicado
viagem, Ron trabalhou
vários livros sobre turismo
anteriormente como editor
e design, dos quais se
Estilo de Xangai
Quando há uma década cheguei a Xangai, na cidade não se falava
muito sobre design. Na realidade, esta cidade que em tempos foi
conhecida como uma das mais cosmopolitas da Ásia, já definia
tendências desde os anos 1930. Quando foi construído, o edifício de
Huamei era uma construção à frente do seu tempo, e Laszlo Hudec
projectou muitas das estruturas memoráveis e modernas da cidade;
I.M. Pei foi inspirado a seguir a carreira de arquitecto pelo design dos
edifícios de Xangai; e Eileen Chang, não era ela também designer
de moda? Chang desenhava muitas das roupas que usava, depois
procurava os materiais certos e entregava-os a um costureiro para
que fizesse todos aqueles modelos que só ela vestia com estilo e
graciosidade.
Após mais de meio século num estado quase dormente, Xangai
começa agora a despertar e a sacudir a poeira acumulada. E com o
passado glorioso que se conhece, a cidade conseguiu rapidamente
recuperar a antiga fama de metrópole internacional e em permanente
movimento. Os amantes do design estão condenados a viver felizes
em Xangai. Quando em Março visitei a cidade, uns amigos sugeriram
uma ida ao Museu Long, na zona Ocidental do Bund. O museu está
situado numa área privilegiada – o Parque Florestal Binjiang, no
distrito de Xuhui. Eu tinha o hábito de correr nesta parte da cidade,
porque tem um ambiente fantástico e porque é tão difícil encontrar
em espaços sossegados em Xangai.
O Museu Long, fundado pelo controverso e milionário casal de
coleccionadores Liu Yiqian e Wang Wei, está repleto de peças que
os dois acumularam ao longo dos anos, incluindo algumas das mais
caras obras de arte contemporânea chinesa. O edifício foi desenhado
por uma das empresas actualmente mais reconhecidas no Interior da
China, o Atelier Deshaus. Os arquitectos conservaram uma estrutura
de 100 metros de comprimento, usada em tempos para o transporte
de carvão, e utilizaram bastante cimento à vista na concepção do
museu, em homenagem ao património desta área. Próximo do local
encontra-se também o Museu Yuz, fundado pelo magnata indonésio
destacam Wander Bhutan e
Myanmar Odyssey.
Budi Tek. A estrutura, iluminada e transparente, tornou-se a casa de
várias colecções que adquiriu por todo o mundo. Os entendidos em
design saberão de imediato que o projecto do edifício pertence ao
arquitecto Sou Fujimoto.
Graças à construção do Kerry Centre, o bairro de Jingan – perto
da antiga casa de Eileen Chang – tornou-se num local muito
frequentado em Xangai. O restaurante Calypso, no Hotel ShangriLa, serve cozinha mediterrânica, mas é a decoração que o torna
num espaço ímpar. Os interiores em madeira remetem-nos para
a Ásia ou Sul da China através de uma constante utilização de
bambu nos pilares e de outras decorações complexas. As paredes
exteriores e o telhado são feitos de vidro e conferem à estrutura
maior transparência e leveza. Em dias de sol, abrem-se as janelas e
o telhado, e as barreiras que separam o espaço exterior do interior
tornam-se quase imperceptíveis. Quando à noite as luzes se acendem,
a estrutura assemelha-se a uma caixa de jóias luminescente. O
arquitecto desta obra é Shigeru Ban, vencedor do Prémio Pritzker no
ano passado.
Além dos arquitectos internacionais, também os profissionais locais
começam a entrar em cena na cidade. A população de Xangai,
consumista e muito ligada à moda, é uma natural fonte de inspiração
para os arquitectos. Pessoalmente, gosto do design da Urban Tribe,
que considero simples mas elegante. O responsável desta marca
de roupa é um amigo que tenho há muito tempo em Xangai e que
percorre o mundo à procura de materiais e de inspiração, criando
peças de vestuário com um traço asiático discreto. Outra marca de
sucesso é a Zuczug de Wang Yiyang, que conta com lojas em centros
comerciais de Xangai e Pequim. As suas criações valorizam o corte e
procuram ser minimalistas e assertivas ao mesmo tempo. As peças
destes dois designers de Xangai nunca são exageradas e estão
extremamente bem concebidas, algo que na China é muito raro nos
dias que correm.
Blogues
das revistas MING Magazine,
Fanzines do Japão
A Kage era uma livraria a que eu adorava ir quando estudava em
Quioto. Não estava particularmente interessado nas secções de
música ou de pequenas lembranças, mas algumas das estantes perto
da saída tinham montes de revistas japonesas. Era dessas que eu
mais gostava.
Em Hong Kong, mesmo quando ainda não lia japonês, já adorava
revistas japonesas. Eu pensava que sabia muito
sobre revistas japonesas mas, quando entrei na
Kage ou na Keibunsha, apercebi-me do pouco
sabia. Existem vários fanzines independentes
no Japão – pequenas publicações com apenas
algumas dúzias de páginas A5 agrafadas. São
difíceis de encontrar, excepto em livrarias
independentes.
Um dos fanzines mais conhecidos é o Arne,
publicado até 2009 pela artista Ohashi Ayumi.
Quando fundou a revista, em 2002, Ohashi já tinha 62 anos. Naquela
altura, queria arranjar uma desculpa para conhecer pessoas que
idolatrava e decidiu criar uma publicação trimestral. Ohashi Ayumi
disse desde o começo que publicaria apenas 30 números da revista,
porque havia muita coisa que ainda queria fazer e era necessário
estabelecer um prazo limite para que o fanzine lhe deixasse tempo
para outros desafios.
Ohashi encarregou-se desde o início da fotografia e do design do
Arne. Com formação em design gráfico, a artista sentia-se pouco
à vontade com a fotografia, mas no número inaugural entrevistou
o designer industrial Sori Yanagi e levou uma câmara compacta
amadora. Na realidade, as fotografias permitiram criar uma sensação
especial de proximidade entre o leitor e Ohashi. O fanzine também
abordava de forma realista temas como a alimentação diária e o
vestuário. Ohashi não falava dos restaurantes novos ou daqueles que
estavam na moda, não utilizava uma única vez a palavra “fashion”
ELLE Decoration e CREAM.
e só fazia referência a roupas de que gostava. Mais do que focar-se
no estilo, o fanzine realçava os materiais utilizados e a sensação de
vestir uma determinada peça de roupa. Mesmo se fosse uma peça
da marca COMME des GARÇONS, este não seria necessariamente um
detalhe destacado pela autora. Mais tarde, Ohashi publicou a Adult
Style, uma revista direccionada para leitores com mais de 50 anos, e
lançou também uma linha de vestuário. Estes dois projectos surgiram
na sequência da publicação do fanzine.
Um outro fanzine de que gosto é o Salvia - uma
publicação de 32 páginas sobre artesanato.
A fundadora e editora Yurio Seki trabalhava
inicialmente em publicidade mas, por ser
um sector de grande stress e desgaste físico,
demitiu-se e decidiu tirar algum tempo
para tentar perceber o que gostaria de fazer.
Durante este período de descanso, Yurio
desenhou imenso e começou a interessar-se
por artesanato. Criou a sua própria linha de artesanato, utilizando
os desenhos que fazia como imagem de marca. Em 2001, fundou a
marca Salvia, colaborando com diferentes criadores de artesanato
japoneses na produção de uma série de utensílios domésticos e
peças de vestuário. Ao longo deste processo, Yurio aprendeu muito
sobre artesanato. A possibilidade de converter materiais comuns em
produtos bonitos tocou-a profundamente. Foi então que, em 2006,
Yurio Seki decidiu criar um fanzine com o mesmo nome - Salvia –,
quer serviu para registar as suas emoções durante o processo de
criação do artesanato.
Ouve-se muito falar na forma como a internet destruiu as publicações
tradicionais. Mas por vezes é difícil sentir verdadeiramente alguma
coisa se não pudermos tocar no papel. As revistas não vão morrer,
muito menos estas criações carregadas de afecto e originais que são
fruto da paixão dos seus criadores. Esses projectos encontrarão uma
forma de sobreviver.
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Blogues
#5 2015/05
#5 2015/05
Blogues
Wilson
Lam
Fundador da Macau
Creations, Wilson Lam
tem mais de 30 anos de
experiência em publicidade
e design gráfico. Mantémse fiel ao conceito “criar
O Alibaba das indústrias
culturais e criativas
clássicos a partir do comum”.
A função do WeChat “abanar por um envelope vermelho” foi o
centro das atenções da gala do Ano Novo Chinês 2015 da CCTV.
Isto exerceu uma enorme pressão sobre o Banco Central da China,
já que a superioridade do Alipay (sistema de pagamentos online)
está fortemente ameaçada e a precisar de encontrar respostas aos
desafios de um mercado altamente interactivo e competitivo. Se
não conseguirem melhorar a competitividade, o Taobao ou mesmo
o Alibaba poderão ficar para trás. A internet virou as indústrias
tradicionais do avesso e, por isso, é importante que as empresas
culturais e criativas consigam enfrentar este impacto.
uma posição sólida. Macau tem um governo abastado, mas o sector
privado ainda é muito frágil. Teoricamente, os recursos de Macau
deveriam estar reservados para a população local, mas é lógico
que uma pessoa olhe para além disso quando faz negócios. Graças
à liberalização da indústria do jogo em Macau, temos hoje tudo o
que é necessário para criar um centro de turismo e lazer de nível
mundial. Esta é uma prova sólida da importância da concorrência
saudável. O mercado é uma arena – não podemos actuar de acordo
com as nossas emoções nem devemos ficar sentados à espera que
algo aconteça.
Criar o Alibaba das indústrias culturais e criativas de Macau
Precisamos de uma plataforma cultural e criativa moderna, na qual o
governo assumiria a liderança na criação de um novo website comercial
sobre a indústria. Poderia tornar-se no Alibaba de Macau e ajudar a
superar obstáculos técnicos como os pagamentos internacionais, serviços
bancários electrónicos, licenciamentos de compras digitais, custos de
transporte e impostos. O governo poderia promover esta plataforma
no estrangeiro e absorver especialistas em eventos culturais, colecções
de arte, design criativo e filmes de animação. Estes talentos seriam os
embaixadores das indústrias criativas de Macau.
O marketing pode ajudar ou destruir negócios
Há falta de talentos e de recursos para trabalhar na área das
indústrias culturais e criativas em Macau. As pessoas que têm
potencial estão sozinhas nesta luta. Sem capital ou marketing
suficientes, as boas ideias não conseguem chegar ao mercado e
algumas delas fracassam mesmo antes da fase de industrialização.
O governo deve assumir a liderança
Se cabe ao governo desenvolver os negócios criativos, então as suas
acções devem demonstrar apoio e respeito. O processo de abertura
de concursos públicos de design tem de ser reestruturado. Como
responsável por uma empresa de design, oponho-me categoricamente
à submissão de projectos a custo zero para a entrada num concurso. A
sobrevivência e a reputação dos designers dependem destes esboços
de projectos, mas os processos administrativos estão a destruí-los.
Por último, penso que o governo tem de desenvolver a educação da
cultura popular, procurar talentos e empresas com potencial, e dar-lhes
apoio. Apenas uma cultura e produtos criativos extraordinários poderão
ser comercializáveis e abrir novos mercados.
A evolução da indústria não pode depender apenas da entrada
de capital, porque não é o dinheiro que vai fazer com que ideias
retrógradas ganhem nova vida. Neste sentido, o governo enfrenta
um grande desafio, porque os resultados de cada projecto que tem
financiado são questionáveis. O sucesso das campanhas criativas
depende, na maioria das vezes, da forma como é feito o marketing –
e esse é um trabalho que deve ser levado a cabo pelos operadores
e não pelo governo. O governo deve financiar projectos de longo
prazo, o que trará um impacto positivo à indústria. Quanto mais é
que o governo vai ter de pagar para industrializar o sector criativo
e cultural? Esta queixa é recorrente em Macau. O governo não
deve intervir no mercado e, por isso, cabe ao mercado e à indústria
aperfeiçoar o plano. Acredito que o ideal é promover um objectivo
comum através de diferentes projectos de desenvolvimento.
O mercado é cruel. Só os melhores produtos podem conquistar
Para participar num concurso público, o governo requer normalmente
o envio de três esboços de projectos de design, o que significa que
um projecto tem apenas um terço de hipóteses de vencer o concurso
e que os restantes não serão aproveitados. Na maioria das vezes, os
projectos de qualidade não são seleccionados porque precisam de
orçamentos mais elevados. Isto é ridículo. Esperamos que o governo
possa definir com clareza um tecto orçamental para cada concurso e
reembolsar os candidatos pelos custos básicos de criação, de modo a
que os participantes possam decidir se devem ou não investir tempo
no projecto. Isto pode também levar à restruturação dos critérios
de avaliação, dando maior destaque à criatividade. Muitas empresas
seguem o mecanismo do governo que, por dar ênfase ao orçamento,
origina uma competição feroz ao nível dos preços e subestima a
componente criativa.
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