Arte Neoclássica - O Universo da Arte

Transcrição

Arte Neoclássica - O Universo da Arte
Arte Neoclássica
O Iluminismo
“Respeito o meu Deus, mas amo o universo”
Voltaire
Ao longo da história, as grandes mudanças sociais, políticas e econômicas costumam vir
acompanhadas de transformações no modo de pensar da humanidade. O século XVIII ficou
conhecido como o “século das luzes” (luzes da razão). Esse movimento cultural ficou conhecido
como Iluminismo.
Propagam-se os pensamentos de intelectuais como Voltaire e Rousseau que defendiam a
igualdade jurídica entre os indivíduos, a tolerância religiosa e a liberdade social. Valores e ideais
típicos do pensamento burguês que ajudaram a intensificar as críticas ao Antigo Regime e o
princípio do poder divino dos reis.
Os mais importantes pensadores do Iluminismo foram: John Locke, Charles de Secondat
de Montesquieu, Françoise-Marie Voltaire, Denis Diderot, Jean d’Alembert, Jean Jacques
Rousseau e os economistas, François Quesnay e Adam Smith.
A revolução Francesa
Os ideais Iluministas forneceram os argumentos para a luta contra o absolutismo
monárquico e o Antigo Regime. Na França, onde o rei governava absoluto, com uma grande
corte elegante e perdulária, a luta assumiu forma explosiva e sangrenta.
A revolução francesa é um grande marco da chegada definitiva do espírito burguês ao
poder. Apesar dos ideais liberais burgueses, a revolução foi um movimento de massa que contou
com participação de diversos grupos, entre os quais, a população miserável das cidades, os
pequenos produtores e comerciantes, os camponeses explorados pela servidão.
O processo revolucionário francês foi bastante longo, durou dez anos (1789-1799). Segue
uma trajetória complexa e contraditória, e, começa insolitamente em 1787, com uma revolta da
nobreza e do clero reivindicando a convocação da Assembléia dos Estados Gerais.
A burguesia aproveitou a oportunidade para divulgar suas propostas de reforma por meio
de uma intensa propaganda. As massas populares do campo e das cidades teriam espaço para
demonstrar seu descontentamento. O movimento tomou as ruas, e o rei francês Luís XVI não
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tinha forças para controlá-lo. Em 14 de julho de 1789, a população invadiu e tomou a velha
prisão da Bastilha, onde eram confinados os inimigos da monarquia.
Após a Revolução, o exército se tornou peça essencial para garantir a paz e a ordem
social. Sua função era controlar o movimento popular e garantir a segura e tranqüila
administração burguesa. Era preciso também expandir os negócios da burguesia por meio de
uma forte expansão militar.
Dessa forma, o general Napoleão Bonaparte
pôde contar com o apoio burguês para assumir o
governo e entender o domínio militar francês por quase
toda a Europa.
O neoclassicismo busca ligar fatos do passado
aos acontecimentos da época, tentando substituir a
trivialidade e a sensualidade dos temas, por um estilo
lógico, científico, valorizando a linha, o contorno, a
perspectiva matemática, a nitidez. Jacques-Louis David
era o pintor oficial de Napoleão e um dos artistas
neoclássicos mais importantes, pela clareza, pelos
personagens e pela simetria de suas obras.
Jacques-Louis David, “Napoleão cruzando SaintBernard” 1800-01
Como nos diz Argan:
A cesura na tradição se define com a cultura do Iluminismo. A natureza não é mais a ordem
revelada e imutável da criação, mas o ambiente da existência humana; não é mais modelo universal, mas
um estímulo a que cada um reage de um modo diferente; não é mais fonte de todo saber, mas o objeto da
pesquisa cognitiva.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. São paulo: Companhia das Letras, 1992, p. 12.
Arte Neoclássica
O neoclassicismo é um movimento artístico que, a partir do final do século XVIII, reagiu
ao barroco e ao rococó, e reviveu os princípios estéticos da Antigüidade Clássica, atingindo sua
máxima expressão por volta de 1830. Não foi apenas um movimento artístico, mas cultural,
refletindo as mudanças que ocorrem no período, marcada pela ascensão da burguesia.
Essas mudanças estão relacionadas ao racionalismo de origem iluminista, a relacionam-se à
formação de uma cultura fortemente cosmopolita e tendencialmente profana; à pregação
da tolerância; à reação contra a aristocracia e a Revolução Industrial.Entre as mudanças
filosóficas, ocorridas com o iluminismo, e as sociais, com a revolução francesa, a arte deveria
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tornar-se eco dos novos ideais da época: objetivismo, liberalismo, ateísmo e democracia. Esses
foram os elementos utilizados para reelaborar a cultura da Antigüidade Clássica, greco-romana.
No século XVIII, as rápidas e constantes mudanças acabaram por dificultar o surgimento de um
novo estilo artístico. O melhor seria recorrer ao que estivesse mais à mão: a equilibrada e
democrática Antigüidade Clássica.
Assim nos coloca Argan:
A preemência dos problemas cuscitados pelas rápidas transformações da situação
social, política e econômica, bem como pelo impetuoso crescimento da tecnologia industrial,
sem dúvida contribui para a identificação so ideal estético com o "antigo". A razão não é mais
uma entidade abstrata: deve dar ordem à vida prática e, postanto, à cidade como local e
instrumento de vida social. (...) O modelo clássico permanece como ponto de referência para
uma metodologia de projetos que se coloca problemas concretos e atuais. (Argan, 1992, p. 22)
E foi assim que, com a ajuda da arqueologia (Pompéia tinha sido descoberta em 1748),
arquitetos, pintores e escultores logo encontraram um modelo a seguir. Surgiram os primeiros
edifícios em forma de templos gregos, as estátuas alegóricas e as pinturas de temas históricos. As
encomendas já não vinham do clero e da nobreza, mas da alta burguesia, mecenas incondicionais
da nova estética. A imagem das cidades mudou completamente. Derrubaram-se edifícios e largas
avenidas foram traçadas de acordo com as formas monumentais da arquitetura renovada, ainda
existente nas mais importantes capitais.
Pintura Neoclássica
Foi a expressão menos desenvolvida do neoclacissismo. De uma forma geral
caracterizou-se pela exaltação de elementos mitológicos ou pela celebração de Napoleão. As
figuras pareciam fazer parte de uma encenação teatral e eram desenhadas numa posição fixa,
como que interrompidas no meio de uma solene representação. Na pureza das linhas e na
simplificação da composição, buscava-se uma beleza deliberadamente estatuária. Os contornos
eram claros e bem delineados, as cores, puras e realistas, e a iluminação, límpida.
As figuras eram rígidas, quase sem vida, e os rostos, apresentando expressões
características, simulavam máscaras das antigas tragédias gregas. As túnicas e capas caíam em
dobras pesadas e angulosas, cobrindo as formas do corpo. Um enquadramento arquitetônico
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fechava a composição atrás e nos lados. A função narrativa era interpretada como uma profunda
encenação. O fato histórico se subordinava à teatralização, à captação de um momento já morto.
Grande parte dos críticos destaca as obras de Jacques-Louis David como a principal
exceção, marcada pela energia e pelo realismo, que canalizam a exaltação do heroísmo para
figuras variadas do mundo em que vive, não reproduzindo, portanto, de maneira mais marcante a
exaltação de Napoleão.
Jacques Louis David
(francês, 1748-1825)
Foi
o
mais
característico
representante
do
Neoclassicismo. Durante alguns anos controlou a atividade
artística francesa, sendo o pintor oficial da corte imperial,
pintando fatos históricos ligados à vida do imperador Napoleão.
Pintou também temas solenes, personagens e motivos inspirados
na Antigüidade Clássica, através de cores sóbrias. Sua
luminosidade lembra Caravaggio, mas é em Rafael Sânzio
(mestre inegável do equilíbrio da composição e da harmonia das
cores) que reside sua maior influência. Figuras sólidas e imóveis.
Excelente retratista.
Jacques-Louis David "A Morte de Marat",
(1793)
Obras mais importantes: A Morte
de Marat (1793); A Morte de Sócrates
(1787); As Sabinas; A Coroação de
Napoleão em Notre Dame. Uma amostra
de pintura neoclássica nesse período é O
Juramento dos Horácios, do francês. A
pintura neoclássica de David dominou o
panorama artístico francês durante quase
meio século, fazendo com que ele, acima
das contingências políticas, fosse o pintor
Jacques-Louis David, “O Juramento dos Horácios” (1784)
oficial da revolução francesa e, depois,
do regime de Napoleão Bonaparte.
Óleo sobre tela, Museu do Louvre, Paris
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Para ajudar na “compreensão” da obra de David, propomos uma leitura da obra O
juramento dos Horácios, elaborada por Jean Starobinsky e encontrada no livro “ 1789 Os
emblemas da razão” (1989:72).
“Com a obra, O juramento dos Horácios, David, dá ao tema sua expressão mais forte, a
mais reveladora do do clima estético da época. A cena é em Roma, na aurora da Republica. Os
três Horácios, diante de seu pai juram defender a pátria. O ponto central do quadro, desta vez, é a
mão esquerda do velho Horácio que ergue as três espadas, unindo simbolicamente as três
vontade. É para o punho das espadas que o pai dirige seu olhar; é para o mesmo ponto que se
elevam os braços estendidos do grupo dos filhos; e sobre os três punhos unidos e distintos, o
olhar dos filhos encontra o olhar do pai: a comunhão dos irmãos tem como núcleo central o feixe
de armas mortíferas santificadas pela mão paterna que as transmite. A direção vertical é marcada
pelas maciças colunas dóricas que escondem o cenário da cena, mas sobretudo pelo pique e pelas
espadas, em um sistema de oblíquas opostas. O sagrado reside no dever guerreiro. No nascer de
uma era de alistamentos em massa e de exércitos nacionais, aí está a antiga lenda do sacrifício à
Pátria representada num teatro simbólico. O Pai, que não olha seu filho, mas as armas que lhes
confia, faz mais questão da vitória que da vida deles. Os filhos, por seu lado, pertencem
doravante mais ao seu juramento que a si mesmos. O ímpeto heróico implica a superação dos
apegos sensíveis e dos elos naturais, à vista de uma idéia de que a mão do pai não é senão a
metáfora patética. Em O julgamento dos Horácios, era preciso que o império da emoção
imediata também fosse manifesto, ainda que apenas, para indicar a distância que mantêm em
relação a ele os guerreiros destinados à morte o ao triunfo. O grupo das mulheres, à direita,
exprime o poder ineficaz do pesar. Assim se completa a demonstração, de natureza espiritual: à
virilidade voluntária, em que o ser se esquece de si mesmo diante de um dever sangrento, opõese à feminilidade sensível, que não pode encarar a morte e que se deixa subjugar pelo horror.”
Dominique Ingres
(francês, 1780-1867)
Formado na oficina de David, permaneceu fiel aos postulados neoclássicos do seu mestre
ao longo de toda a vida. Passou muitos anos em Roma, onde assimilou aspectos formais de
Rafael e do maneirismo. Ingres sobreviveu largamente à época de predomínio do seu estilo, dado
que morreu em 1867. A partir de 1830 opôs-se com veemência, da sua posição de acadêmico, ao
triunfo do romantismo pictórico representado por Delacroix. Ingres preferia os retratos e os nus
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às cenas mitológicas e históricas. Entre os seus melhores retratos contam-se Bonaparte Primeiro
Cônsul, A Bela Célia, O Pintor Granet e A Condessa de Hassonville. Nos nus que pintou (A
Grande Odalisca, Banho Turco e, sobretudo, A Banhista) é patente o domínio e a graça com que
se serve do traço. A sua obra mais conhecida é Apoteose de Homero, de desenho nítido e
equilibrada composição.
Jean Auguste Dominique Ingres, “A Apoteose de Homero”
(1827) Museu d Louvre, Paris
Escultura Neoclássica
Estátuas de heróis uniformizados, mulheres envoltas em túnicas de Afrodite, ou crianças
conversando com filósofos, foram os protagonistas da fase inicial da escultura neoclássica. Mais
tarde, na época de Napoleão, essa disciplina artística se restringiria às estátuas eqüestres e bustos
focalizados na pessoa do imperador. A referência estética foi encontrada na estatuária da
Antigüidade Clássica, por isso as obras possuíam um naturalismo equilibrado.
Respeitavam-se movimentos e posições reais do corpo, embora a obra nunca estivesse
isenta de um certo realismo psicológico, plasmado na expressão pensativa e melancólica dos
rostos. A busca do equilíbrio exato entre naturalismo e beleza ideal ficava evidente nos esboços
de terracota, nos quais os volumes e as variações das posições do corpo eram estudados com
cuidado. O escultor neoclássico encontrou o dinamismo na sutileza dos gestos e na expressiva
suavidade das formas propostas nas diferentes produções.
Quanto aos materiais utilizados, os mais comuns eram o bronze, o mármore e a terracota,
embora, a partir de 1800, o mármore branco, que permitia o polimento da superfície até a
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obtenção do brilho natural da pele, tenha adquirido preponderância sobre os demais. Entre os
escultores mais importantes desse período destacam-se o italiano Antonio Canova, escultor
exclusivo da família Bonaparte, e o dinamarquês Bertel Thorvaldsen, que chegou a presidir a
Accademia di San Lucca, em Roma.
Na escultura, o movimento buscava inspiração no passado. A estatuária grega foi o
modelo favorito pela harmonia das proporções, regularidade das formas e serenidade da
expressão. Apesar disso, não atingiram a amplitude nem o espírito da escultura grega. Também
foi menos ousada que a pintura e arquitetura de seu tempo. Entre os principais escultores
destaca-se o italiano Antonio Canova (1757-1822), que retrata personagens contemporâneos
como divindades mitológicas como Pauline Bonaparte Borghese como Vênus (1808); Amor e
Psiché (1797).
Pauline Bonaparte Borghese de Antonio Canova,“Vênus”
(1801-1808) Palácio Borghese em Roma.
Antonio Canova, “Amor e Psichê” (179793) Museu do Louvre, Paris
Características Gerais da Escultura Neoclássica:
Temas: históricos, literários, alegóricos e mitológicos. Serviram de base para a representação de
figuras humanas com poses semelhantes às dos Deuses gregos e romanos.
Estatuária: representou figuras de corpo inteiro ou bustos e relevos pouco pessoais glorificando
e fazendo publicidade a políticos ou figuras importantes das cidades (praças, casas de nobres e
burgueses ou cemitérios).
Relevos: têm o mesmo sentido honorífico e alegórico da estatuária e revestem as frontarias de
edifícios públicos ou de palácios.
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Formas de Representação: de inspiração clássica foram representados com toda a minúcia, os
corpos eram nus ou semi-nus, formas reais, serenas e de composição simples. Rostos
individualizados (das pessoas que queriam representar), mas com pouca expressividade.
Seguiram os cânones da escultura clássica, sem qualquer liberdade criativa.
Técnica: são obras perfeitamente conseguidas, onde a sua concepção se baseia em maquetas de
barro ou gesso para um primeiro estudo. Acabamentos rigorosos e relevos de pouca
profundidade.
Materiais: mármore branco que representava a pureza, limpidez e brilho,e o bronze, mas em
menor quantidade.
Arquitetura
Na arquitetura percebemos melhor os novos ideais que se desenvolvem na Europa. De
uma forma geral, é uma arquitetura marcada pela simplicidade, sendo que, em alguns casos,
observamos uma nítida influência romana, com obras marcadas pela severidade e
monumentalidade; e em alguns casos, sobressaindo características da antiga produção grega,
fortemente revisitada nesse momento.
No fim do século XVII, inicia-se em países como a França e a Inglaterra um movimento
artístico sob a influência do arquiteto Palladio (palladianismo), que mais tarde, em pleno século
XVIII, com a revolução francesa, acabaria se estendendo por toda a Europa, sob o nome de
classicismo. A arquitetura barroca não tinha tido grande repercussão nesses países. Um exemplo
disso é a rejeição ao projeto de Bernini para o palácio do Louvre, considerado italiano demais.
Assim, pode-se falar, principalmente na França, de um segundo renascimento da Antigüidade.
Lá, as últimas igrejas construídas persistiam na dinâmica do gótico, tornando-se indispensável
uma renovação. Entretanto, seus arquitetos não estavam dispostos a prosseguir dentro da estética
empolada e amaneirada do barroco.
Os fundadores da jovem ciência da arqueologia proporcionaram as bases documentais
dessa nova arquitetura de formas clássicas. Surgiram assim os edifícios grandiosos, de estética
totalmente racionalista: pórticos de colunas colossais com frontispícios triangulares, pilastras
despojadas de capitéis e uma decoração apenas insinuada em guirlandas ou rosetas e frisos de
meandros. As cidades tiveram de se adaptar a essas construções gigantescas. Desenharam-se
largas avenidas para abrigar os novos edifícios públicos, academias e universidades. Muitos
edifícios conservam, ainda hoje, a mesma função para a qual foram projetados originalmente.
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Argan assim coloca os princípios da arquitetura neoclássica:
(...) a adequação lógica da forma à função, a extrema sobriedade do ornamento, o equilíbrio e a
proporção dos volumes: a arquitetura não deve mais refletir as ambiciosas fantasias dos
soberanos, e sim responder as necessidades sociais e, portanto, também econômicas: o hospital,
o manicômio, o cárcere etc. A técnica, por sua vez, não mais deve ser inspiração, habilidade,
virtuosismo individual, mas um instrumento racional que a sociedade construiu para suas
necessidades e que deve servir a ela. (Argan, 1992, p.21)
Algumas características deste movimento artístico na
arquitetura são:

Materiais nobres (pedra, mármore, granito, madeiras)

Processos técnicos avançados

Sistemas construtivos simples

Esquemas mais complexos, a par das linhas ortogonais

Formas regulares, geométricas e simétricas

Volumes corpóreos, maciços, bem definidos por planos murais lisos

Uso de abóbadas de berço ou de aresta

Uso de cúpulas, com freqüência marcadas pela monumentalidade

Espaços interiores organizados segundo critérios geométricos e formais de grande
racionalidade

Pórticos colunados

Entablamentos direitos

Frontões triangulares

A decoração recorreu a elementos estruturais com formas clássicas, à pintura rural e ao
relevo em estuque

Valorizou a intimidade e o conforto nas mansões familiares

Decoração de caráter estrutural
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