MC 3 - 2006 - O papel da cafeína nas cefaléias - 2.p65
Transcrição
MC 3 - 2006 - O papel da cafeína nas cefaléias - 2.p65
ARTIGO DE REVISÃO O papel da cafeína nas cefaléias: fator agravante ou atenuante? The role of caffeine in the headaches: Attenuating or aggravating factor? 1 1 Raimundo Pereira da Silva Neto, 2Adriana de Almeida Soares Neurologista, Membro da Sociedade Brasileira de Cefaléia; 2Nutricionista, Membro da Sociedade Brasileira de Cefaléia Centro de Neurologia e Cefaléia do Piauí (Neurocefaléia) – Teresina-PI Silva Neto RP, Soares AA. O papel da cafeína nas cefaléias: fator agravante ou atenuante?Migrâneas cefaléias 2006;9(3):72-77 RESUMO Introdução: A cafeína é de uso freqüente em cefaliatria, seja de forma isolada ou associada a outros medicamentos. É conhecido o seu efeito constrictor nos vasos cerebrais, mas os outros mecanismos pelos quais agrava ou melhora a cefaléia ainda são desconhecidos. Objetivos: Revisar as indicações da cafeína nas cefaléias e questionar a sua função como fator de piora ou de melhora. Métodos: Foi revisada a literatura sobre a ação da cafeína no sistema nervoso central, as suas principais fontes e a sua utilização nas diversas formas de cefaléia. Conclusões: A cafeína é fator de melhora e tem indicação terapêutica nas cefaléias hípnica, pós-punção dural, atribuída à hipotensão liquórica espontânea e da supressão da cafeína. É usada como terapêutica auxiliar no tratamento abortivo da migrânea e da cefaléia do tipo tensional. Piora a cefaléia por uso excessivo de combinações de medicamentos e é precipitante das crises de cefaléia em salvas. PALAVRAS-CHAVE Cafeína; migrânea; cefaléia. ABSTRACT Introduction: Caffeine is often used in the treatment of headaches, either on its own or with other medications. Its constrictor effect in cerebral vessels is well known, but the extent to which it aggravates or improves other mechanisms is still unknown. Objectives: To review the indication of caffeine in the treatment of headaches and to question its role as an attenuating or aggravating factor. Methods: The literature concerning the action of caffeine in the central nervous system, the main sources of caffeine and its use in the treatment of different types of headache were reviewed. Conclusions: Caffeine is an attenuating factor and is used to treat hypnic and postdural puncture headaches, caffeine withdrawal and headaches attributed to spontaneous intracranial hypotension. It is used as a therapeutic aid in the treatment of acute migraine attack and tension-type headache. It worsens headache caused by excessive use of analgesics and aggravates cluster headache attacks. KEY WORDS Caffeine; migraine; headache. 72 INTRODUÇÃO A cafeína é um alcalóide pertencente ao grupo das metilxantinas, onde se inclui também a teobromina e a teofilina e está presente em diversas plantas distribuídas por toda a terra. Não apresenta nenhum valor nutricional, sendo considerada simplesmente uma bebida energética. Registros indicam que a cafeína vem sendo utilizada no preparo de bebidas desde o período paleolítico.1 Seguramente, no século IV a.C., os chineses já a consumiam. A popularidade de tal substância se deve, em grande parte, à antiga crença de que a mesma possui poderes estimulantes, eleva o humor, diminui a fadiga e aumenta a capacidade de trabalho. Estudos mais recentes confirmaram sua propriedade estimuladora do sistema nervoso ao se demonstrar que a mesma produz certo estado de alerta de curta duração, além de ter ação vasodilatadora e diurética. Tem absorção rápida por via oral, atingindo o pico plasmático cerca de uma hora após sua ingestão. A meiavida plasmática é de três a sete horas, aumentando em duas vezes nas mulheres durante os últimos estágios de gravidez ou com o uso a longo prazo de anticoncepcionais orais. É metabolizada no fígado por desmetilação e por oxidação na posição 8, envolvendo o citocromo P450 e seu metabólito ativo é a paraxantina. Finalmente, a cafeína é excretada na urina, sendo que menos de 5% da quantidade administrada é recuperada inalterada. A nicotina aumenta a eliminação da cafeína, isso talvez explique porque os fumantes têm tendência ao consumo aumentado de cafeína. Por outro lado, os antibióticos, principalmente as quinolonas, aumentam sua concentração. Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 O PAPEL DA CAFEÍNA NAS CEFALÉIAS: FATOR AGRAVANTE OU ATENUANTE? A cafeína atravessa a barreira hemato-encefálica, tendo uma série de efeitos neurobiológicos.2 Em doses maiores que o consumido normalmente, a cafeína provoca inibição das fosfodiesterases e aumento do cálcio intracelular.3 A dose letal de cafeína para o ser humano é de cerca de cinco gramas,4 ou seja, a ingestão de aproximadamente 40 xícaras (9,6 litros) de café. A cafeína além de exercer suas ações no sistema nervoso central, também age nos sistemas cardiovascular, respiratório, gênito-urinário, digestivo e endócrino. AÇÕES NO SISTEMA NERVOSO CENTRAL Está bem estabelecido que a cafeína é um antagonista competidor dos receptores de adenosina, atuando nesses receptores em áreas muito variadas, tais como em toda a circulação periférica e no córtex cerebral. Este último, entretanto, pode ser o mecanismo principal responsável pelos efeitos estimulantes,5 como diminuição do sono e da fadiga. As ações do neurotransmissor adenosina, tanto no cérebro como no organismo em geral, são de agente inibidor e depressivo. Esses efeitos depressores ocorrem porque a adenosina promove a inibição da liberação de noradrenalina em geral e, predominantemente, no sistema nervoso simpático. Antagonizando esses efeitos, a cafeína resulta numa estimulação dos sistemas envolvidos, aumentando tanto a liberação de noradrenalina como a taxa de ativação espontânea dos neurônios noradrenérgicos. Dentre os efeitos autonômicos estimulantes da cafeína como antagonista da adenosina observa-se a estimulação cardíaca, aumento da pressão arterial por vasoconstricção cerebral e redução da mobilidade intestinal;6 enfim, produz-se um clássico estado de estimulação simpática (sim paticotônico), tal como se houvesse uma atitude de estresse onde as reservas corporais se mobilizariam. Outro mecanismo inibitório sobre o sistema nervoso central da adenosina é em relação à inibição pré-sináptica da liberação de dopamina.7 Então, diminuindo-se a ação da adenosina, como faz a cafeína, deixa de ser inibida a liberação de dopamina e seus níveis aumentam. Resumindo, consumo crônico de cafeína pode proporcionar aumento da liberação de dopamina no sistema nervoso central.8 O uso excessivo de cafeína, crônico ou agudo, (p. 2 ex:, consumo diário de 500 mg ou mais) leva ao cafeinísmo com eventual toxicidade. Os sintomas incluem inquietação, insônia, rubor facial, contração muscular, taquicardia, perturbações gastrintestinais (p. ex.: dores abdominais), tensão, pensamento e fala acelerados e desorganizados e, algumas vezes, exacerbação de uma ansiedade preexistente ou estados de pânico, depressão ou esquizofrenia. Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 FONTES DE CAFEÍNA Café O café, a mais importante fonte de cafeína, é extraído do fruto do Coffea arabica e, ao ser torrado e moído, prepara-se uma bebida bastante energética por infusão de água quente. Etimologicamente, a palavra vem do árabe Kahoua ou Qahwa e significa excitante. É originário da Etiópia (antiga Abissínia), difundindo-se na península arábica através do Iêmen ou dos árabes para o resto do mundo. Há evidências que mostram seu cultivo pela primeira vez em monastérios islâmicos no Iêmen. Hoje o café é consumido regularmente por bilhões de pessoas no mundo, configurando diversas e variadas práticas culturais, sendo até vital para algumas economias. Os países latinos têm, tradicionalmente, o hábito de tomar café mais concentrado, com maior teor de cafeína, enquanto os americanos preferem o café bem mais diluído, de preferência descafeinado. Isto porque a bebida não é tão popular nos Estados Unidos, por exemplo, como é no Brasil e em Cuba, os maiores produtores de café.1,4 O café contém uma centena de produtos químicos, a cafeína é apenas um deles; o ácido clorogênico é o mais abundante. No entanto, a cafeína é o elemento do café mais estudado até o momento e o principal responsável pelas propriedades estimulantes que deram popularidade à bebida. Mas seu consumo moderado, o equivalente a 400 a 500 mg/dia, não é prejudicial ao organismo, desde que tomados em quatro doses divididas durante o dia.9 Lembramos que uma xícara comum de café expresso contém cerca de 50 a 150 mg de cafeína. O consumo diário de café com ou sem leite em doses moderadas de até quatro xícaras diárias é recomendado para jovens e adultos de todo o mundo. A composição química do café antes de ser torrado (Tabelas 1 e 2) apresenta uma grande variedade de minerais, como potássio (K), magnésio (Mg), cálcio (Ca), sódio (Na), ferro (Fe), manganês (Mn), rubídio (Rb), zinco (Zn), Cobre (Cu), estrôncio (Sr), cromo (Cr), vanádio (V), bário (Ba), níquel (Ni), cobalto (Co), chumbo (Pb), molibdênio (Mo), titânio (Ti) e cádmio (Cd); aminoácidos como alanina, arginina, asparagina, cisteína, ácido glutâmico, glicina, histidina, isoleucina, lisina, metionina, fenilalanina, prolina, serina, treonina, tirosina e valina; lipídeos como triglicerídeos e ácidos graxos livres; açúcares como glicose, frutose, arabinose, galactose, maltose e polissacarídeos. Adicionalmente, o café também possui uma vitamina do complexo B, a niacina e, em maior quantidade que todos os demais componentes, os ácidos clorogênicos, na proporção de 7% a 10%. O percentual de cafeína é de apenas 1% a 2,5%. Estas outras substâncias podem até ser mais 73 RAIMUNDO PEREIRA DA SILVA NETO E COLABORADOR Tabela 1 Substâncias presentes no grão de café antes de ser torrado Substância Cafeína % 1,0-2,5 Cinzas Ácido clorogênico Polissacarídeos 4,2-4,4 7,0-10,0 44,0- 48,0 Proteínas Aminoácidos livres Lipídeos 11,0 0,5-0,8 16,0 Niacina 0,5 Minerais 11,8 Fonte: Encyclopedia of Food Science, Technology and Nutrition, Academic Press, 1993. Tabela 2 Distribuição dos minerais no grão café antes de ser torrado Substância mg/l Potássio (K) 100-500 Cálcio (Ca) 100-300 Magnésio (Mg) 120-250 Sódio (Na) 20-70 Cloro (Cl) 0,01 Ferro (Fé) 2,0-5,0 Zinco (Zn) 5,0-30 Estrôncio (Sr) 5,0-20 Outros 1,0-2,0 Fonte: Encyclopedia of Food Science, Technology and Nutrition, Academic Press, 1993 Tabela 3 Associação de analgésicos comuns, derivados da ergotamina e antiinflamatórios não esteróides com cafeína Nome Associação comercial Cafeína 30 mg, Dipirona 300 mg e Neosaldina Isometepteno 30 mg Cafeína 30 mg, Paracetamol 300 mg, Beserol Carisoprodol 125 mg e Diclofenaco 50 mg Cafeína 40 mg, Paracetamol 450 mg e Parcel Dihidroergotamina 1,0 mg Cafeína 40 mg, Dihidroergotamina 0,5 mg e Tonopan Propifenazona 125 mg Cafeína 50 mg, Dipirona 300 mg e Dorflex Orfenadrina 35 mg Cafeína 50 mg, Paracetamol 150 mg e Cibalena AAS 200 mg Cafeína 65 mg, Paracetamol 500 mg Excedrin Cafeína 75 mg, Paracetamol 45 0mg, Dihidroergotamina 1,0 mg e Metoclopramida 10 mg Cafeína 100 mg, Paracetamol 220 mg, Ergotamina 1 mg, Hiosciamina 87,5 g e Atropina 12,5 g Cafeína 100 mg, Ergotamina 1,0 mg, AAS 350 mg e Homatropina 1,2 mg Cafeína 100 mg, Dihidroergotamina 1,0 mg e Dipirona 350 mg Cefalium Ormigrein Migrane Cefaliv Fonte: DEF 2005/06, 34a ed. Rio de Janeiro: EPUC, 2005, 930 p. 74 importante do que a cafeína para o organismo humano. A cafeína é o único componente termo-estável, isto é, não é destruída com a torrefação excessiva. As demais substâncias, como aminoácidos, açúcares, lipídeos, niacina e os ácidos clorogênicos, são preservadas, formadas ou mesmo destruídas durante o processo de torra. Outras plantas, além do cafeeiro, também produzem cafeína, sendo conhecidas mais de 60 espécies em todo o mundo. Com isso, ela é, seguramente, a droga psicoativa mais popular no mundo.9,10 Somente nos Estados Unidos, onde a bebida não é tão popular, calculase que a média de ingestão diária de cafeína por pessoa seja superior a 150 mg, o equivalente a 3,5 kg de café por ano por pessoa. Outras bebidas A cafeína também é encontrada em outras bebidas, porém em menores proporções que no café, tais como: chá preto, chocolate, refrigerantes do tipo cola, guaraná, etc. Essas bebidas podem deflagrar crises de migrânea em alguns pacientes, sendo recomendável a sua retirada da dieta. Uma xícara comum de chá ou de refrigerantes à base de cola tem entre 35 a 50 miligramas de cafeína. Analgésicos Alguns analgésicos comuns, derivados da ergotamina e antiinflamatórios não esteróides usados no tratamento abortivo das cefaléias contêm cafeína, variando de 30 a 100 mg/dia, conforme exemplificado na Tabela 3.11 Considerando que a cafeína está presente no café, chá, chocolates, refrigerantes à base de cafeína ou medicamentos, pode-se dizer que cerca de 80% da população geral faz uso dessa substância diariamente, embora seja muito difícil quantificar seu consumo2. Nas últimas décadas, devido ao aumento do consumo de refrigerantes do tipo cola, tem crescido o consumo de cafeína, sobretudo entre os adolescentes.12 CAFÉINA EM CEFALIATRIA Migrânea e Cefaléia do tipo tensional A cafeína potencializa os efeitos de outros analgésicos e tem sido usada como terapêutica auxiliar no tratamento da cefaléia, principalmente a migrânea e a cefaléia do tipo tensional.13 Devido à sua ação constrictora nos vasos cerebrais, a cafeína compensa a vasodilatação responsável pelo quadro doloroso da migrânea, justificando com isso o seu emprego no tratamento das crises.14-17 No tratamento da cefaléia do tipo tensional episódica, a cafeína, além de aumentar a velocidade de absorção do Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 O PAPEL DA CAFEÍNA NAS CEFALÉIAS: FATOR AGRAVANTE OU ATENUANTE? analgésico, também funciona como analgésico de ação central.18-21 Um estudo realizado por Diamond & Freitag18 com 301 pacientes com diagnóstico de cefaléia do tipo tensional episódica mostrou que a cafeína associada ao ibuprofeno trata a cefaléia e atinge resultados melhores. Dos pacientes que usaram a combinação ibuprofeno e cafeína, 80% apresentaram melhora significativa da cefaléia em seis horas e tiveram um alívio da dor quase uma hora antes dos pacientes que tomaram apenas ibuprofeno. Enquanto o uso isolado de ibuprofeno só apresentou tal melhora, em 67% dos pacientes, comparados a 61% que tomaram somente cafeína e 56% que tomaram apenas placebo. Os autores acreditam que a cafeína parece potencializar os efeitos analgésicos do ibuprofeno. Cefaléia em salvas Sabe-se de muito tempo que os pacientes com cefaléia em salvas podem ter crises desencadeadas pela ingestão de álcool, conforme relata Farias da Silva,22 mas a cafeína funciona como um fator precipitante, segundo estudo realizado por Manzoni23 com 374 pacientes sálvicos, onde se observou que o abuso de cafeína foi responsável por 6,9% das crises na cefaléia em salvas episódica e por 36,6% na cefaléia em salvas crônica. Cefaléia hípnica Dentre as cefaléias lítio-responsivas encontra-se a cefaléia hípnica, devido ao lítio se mostrar bastante eficaz no tratamento profilático. No entanto, em vários casos relatados observou-se que a cafeína tem sido útil no tratamento.24,25 Cefaléia pós-punção dural A cefaléia pós-punção dural resulta, em parte, da dilatação das veias intracranianas. A cafeína é uma metilxantina conhecida por aumentar a resistência vascular cerebral e diminuir o fluxo sangüíneo por uma ação direta na musculatura arteriolar. O uso da cafeína como tratamento da cefaléia pós-punção sugere que sua causa seja a distensão vascular, especialmente das artérias intracranianas da base do cérebro. Recentemente, foi demonstrada a eficácia do benzoato sódico de cafeína por via venosa na redução global do fluxo sangüíneo cerebral em pacientes com cefaléia pós-punção.26-30 O uso de cafeína pode causar efeitos colaterais, já que tem ação no sistema cardiovascular, nos músculos e no sistema nervoso central. O uso de benzoato de cafeína sódico por via venosa é mais barato e mais fácil de ser realizado do que a administração de tampão sangüíneo e, nas doses preconizadas, não causou efeitos adversos. Já está em investigação o uso de doses repetidas de cafeína Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 por via oral, possivelmente um grande avanço no arsenal do tratamento da cefaléia pós-punção. Cefaléia atribuída a hipotensão liquórica espontânea (ou idiopática) Muitos pacientes com a cefaléia por hipotensão liquórica espontânea respondem ao tamponamento sangüíneo epidural, à infusão salina epidural ou a terapias farmacológicas, tais como a cafeína intravenosa ou os analgésicos convencionais.31,32 Cefaléia por uso excessivo de combinação de medicamentos Muitos pacientes desenvolvem uma cefaléia crônica diária por uso excessivo de medicação analgésica, principalmente aquelas combinadas com cafeína.33-36 Segundo a classificação internacional das cefaléias da International Headache Society37 a “cefaléia por uso excessivo de combinação de medicamentos” é descrita como uma cefaléia de fraca a moderada intensidade, bilateral, em pressão ou aperto (não pulsátil) e presente em mais de 15 dias por mês. É secundária à ingestão de medicações combinadas em mais de dez dias por mês por mais de três meses. A cefaléia aparece ou piora acentuadamente durante o uso excessivo de medicações combinadas e desaparece ou reassume seu padrão prévio dentro de dois meses após a interrupção da medicação combinada. Cefaléia da supressão de cafeína A classificação internacional das cefaléias da International Headache Society37 listada no item 8.4.1 a “cefaléia da supressão de cafeína” que se apresenta em peso ou pressão, na fronte bilateralmente, de intensidade leve a moderada. É uma dor incomodativa, mas não incapacita para as atividades cotidianas e não piora com as tarefas normais. Desenvolve-se dentro de 24 horas após a última ingestão de cafeína, nos pacientes que usam doses maiores ou iguais a 200 mg/dia e por mais de duas semanas. Deve-se evitar o uso de analgésicos, recomendando-se ainda ao paciente a ingestão de 100 mg de cafeína que será suficiente para o alívio da dor após uma hora e diminuir a sua ingestão diária gradativamente. Há desaparecimento total da dor após sete dias com a interrupção completa do uso de cafeína. O tratamento profilático é feito com a restrição da ingestão de cafeína, evitando-se a súbita abstinência.38-41 Citamos, como exemplo, a cefaléia do final de semana, que ocorre em pacientes que ingerem várias xícaras de café ou bebidas que contenham cafeína durante a semana de trabalho e a reduzem no final de semana. Aparece algumas horas após o paciente ter ingerido a sua última dose de cafeína.42 75 RAIMUNDO PEREIRA DA SILVA NETO E COLABORADOR Concluímos que a cafeína é fator de melhora e tem indicação terapêutica nas cefaléias hípnica, pós-punção dural, atribuída à hipotensão liquórica espontânea e da supressão da cafeína. É usada como terapêutica auxiliar no tratamento abortivo da migrânea e da cefaléia do tipo tensional. Piora a cefaléia por uso excessivo de combinações de medicamentos e é precipitante das crises de cefaléia em salvas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. Barone JJ, Roberts H. Human consumption of caffeine. In: Dews PB (ed.). Caffeine: perspectives from recent research. Berlin: Springer-Verlag; 1984, p. 59-73. 2. Strain EC, Griffiths RR. Caffeine related disorders. In: Sadock BJ; Sadock VA. Comprehensive Textbook of Psychiatry, 7th ed. Baltimore: Lippincott; 2000, p. 982-90. 3. Fredholm, BB. Adenosine, adenosine receptors and actions of caffeine. Pharmacology & Toxicology 1995;76:93-101. 4. Kerrigan S, Lindsey T. Fatal caffeine overdose: two cases reports. Forensic Sci Int 2005;153(1):67-9. 5. Holtzman SG, Mante S, Minneman KP. Role of adenosine receptors im caffeine tolerance. Journal of Pharmacology and Experimental Therapeutics 1991;256:62-8. 6. Snyder, SH. Adenosine as a midiator of the behavioral effects of xanthines. In: Dews PB (ed.). Caffeine: perspectives from recent research. Berlin: Springer-Verlag; 1984, p. 129-41. 7. Michaelis ML, Michaelis EK, Myers S. Adenosine modulation of senaptosomal dopamine release. Life Sciences 1979;24: 2.083-92. 8. Waldeck B. Some effects of caffeine aminophylline om the turnover of catecholamines im the braim. Journal of Pharmacy and Pharmacology 1971;23:824-30. 9. Glass RM. Caffeine dependence: what are the implications. Journal of the Americam Medical Association 1994; 272:1065-6. 10. Paluska SA. Caffeine and exercise. Curr Sports Med Rep 2003; 2(4):213-9. 11. Dicionário de Especialidades Farmacêuticas (DEF 2005/06), 34a ed. Rio de Janeiro: EPUC, 2005, 930 p. 12. Hering-Hanit R, Gadoth N. Caffeine-induced headache in children and adolescents. Cephalalgia 2003;23(5):332-5. 13. Diener HC, Pfaffenrath V, Pageler L, Peil H, Aicher B. Cephalalgia 2005;25(10):776-87. 14. McNeely W, Goa KL. Diclofenac-potassium in migraine: a review. Drugs 1999;57(6):991-1003. 15. Le Jeunne C, Gómez JP, Pradalier A, Titus i Albareda F, Joffroy A, Liaño H, et al. Comparative efficacy and safety of calcium carbasalate plus metoclopramide versus ergotamine tartrate plus caffeine in the treatment of acute migraine attacks. Eur Neurol 1999;41(1):37-43. 16. Lipton RB, Stewart WF, Ryan RE, Saper J, Silberstein S, Sheftell F. Efficacy and safety of acetaminophen, aspirin, and caffeine in alleviating migraine headache pain: three double-blind, randomized, placebo-controlled trials. Arch Neurol 1998;55(2):210-7. 76 17. Loder E. Fixed drug combinations for the acute treatment of migraine: place in therapy. CNS Drugs 2005;19(9):769-84. 18. Diamond S, Freitag FG. The use of ibuprofen plus caffeine to treat tension-type headache. Curr Pain Headache Rep 2001; 5(5):472-8. 19. Diamond S, Balm TK, Freitag FG. Ibuprofen plus caffeine in the treatment of tension-type headache. Clin Pharmacol Ther 2000;68(3):312-9. 20. Rabello GD, Forte LV, Galvão AC. Clinical evaluation of the efficacy of the paracetamol and caffeine combination in the treatment of tension headache. Arq Neuropsiquiatr 2000; 58(1):90-8. 21. Migliardi JR, Armellino JJ, Friedman M, Gillings DB, Beaver WT. Caffeine as an analgesic adjuvant in tension headache. Clin Pharmacol Ther 1994;56(5):576-86. 22. Farias da Silva W, Costa J, Valença MM. Cefaléia em salvas. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Cefaléia, 2004, 136 p. 23. Manzoni GC. Cluster headache and lifestyle: remarks on a population of 374 male patients. Cephalalgia 1999;19(2):88-94. 24. Evers S, Goadsby PJ. Hypnic headache: clinical features, pathophysiology, and treatment. Neurology 2003; 60(6): 905-9. 25. Dodick DW, Jones JM, Capobianco DJ. Hypnic headache: another indomethacin-responsive headache syndrome? Headache 2000; 40(10):830-5. 26. Imbelloni LE, Carneiro ANG. Cefaléia pós-raquianestesia: causas, prevenção e tratamento. Rev Bras Anestesiol 1997;47(5): 453-64. 27. Vincent S, Aboff B. Use of caffeine in post-dural puncture headache: a case report. Del Med J 2001;73(3):97-100. 28. Carrera González A, Sanz F, de la Calle B, Laustalet de la Fuente J. Headache following dural puncture refractory to caffeine. Rev Esp Anestesiol Reanim 2000;47(5):227-8. 29. Yücel A, Ozyalçin S, Talu GK, Yücel EC, Erdine S. Intravenous administration of caffeine sodium benzoate for postdural puncture headache. Reg Anesth Pain Med 1999; 24(1):51-4. 30. Stevens DS. Prophylactic caffeine sodium benzoate—postdural puncture headache versus caffeine withdrawal headache. Reg Anesth Pain Med 1999;24(6):583-4. 31. Tijssen CC, van Gulik S, Sluzewski M. Posture-dependent headache due to the spontaneous hypotension syndrome. Ned Tijdschr Geneeskd 2005;149(18):996-1000. 32. Frank LR, Paxson A, Brake J. Spontaneous intracranial hypotension – a case report. J Emerg Med 2005; 28(4):427-30. 33. Schonewille WJ. Chronic daily headaches caused by too much caffeine. Ned Tijdschr Geneeskd 2002;146(40):1861-3. 34. Fox JM. Use of analgesics in self-medication. Therapie 2002; 57(2):115-8. 35. Domingues RB, Kuster GW, Dutra LA, Santos JG. Headache epidemiology in Vitória, Espírito Santo. Arq Neuropsiquiatr 2004; 62(3A):588-91. 36. Scher AI, Stewart WF, Lipton RB. Caffeine as a risk factor for chronic daily headache: a population-based study. Neurology 2004;63(11):2022-7. Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 O PAPEL DA CAFEÍNA NAS CEFALÉIAS: FATOR AGRAVANTE OU ATENUANTE? 37. Ad Hoc Headache Classification Committee of the International Headache Society. The International Classification of Headache Disorders. Cephalalgia 2004;24(suppl 1):1-149. 38. Juliano LM, Griffiths RR. A critical review of caffeine withdrawal: empirical validation of symptoms and signs, incidence, severity, and associated features. Psychopharmacology 2004;176(1):1-29. 39. Sjaastad O, Bakketeig LS. Caffeine-withdrawal headache. The Vågå study of headache epidemiology. Cephalalgia 2004; 24(4):241-9. 40. Hering-Hanit R, Gadoth N. Caffeine-induced headache in children and adolescents. Cephalalgia 2003;23(5):332-5. 41. Sanvito WL, Monzillo PH. O Livro das Cefaléias. São Paulo: Atheneu, 2001, 210 p. 42. Krymchantowski AV, Barbosa JSS. Cefaléia dos fins de semana e o hábito brasileiro de ingerir café. Migrâneas e Cefaléias 1999; 2(2):67-70. Recebido: 12/06/2006 Aceito: 12/06/2006 Endereço para correspondência Dr. Raimundo Pereira da Silva Neto Clínica Neurocentro Rua Olavo Bilac, 1737/sala 06 64001-280 – Teresina-PI – Brasil Tel./fax: + 55 86 3226.1433 e-mail: [email protected] Migrâneas cefaléias, v.9, n.3, p.72-77, jul./ago./set. 2006 77