Circular Técnica 013/2014 - Qualidade de fibra do algodão de

Transcrição

Circular Técnica 013/2014 - Qualidade de fibra do algodão de
CIRCULAR TÉCNICA
Nº13 / 2014
Novembro de 2014
Publicação periódica
de difusão científica e tecnológica
editada pelo Instituto
Mato-grossense do
Algodão (IMAmt) e
dirigida a profissionais envolvidos com
o cultivo e beneficiamento do algodão.
Diretor executivo
Álvaro Salles
Contato
www.imamt.com.br
Email
imamt@
imamt.com.br
Tiragem
2000 exemplares
Qualidade da fibra do algodão
de Mato Grosso: Resultados
da 1ª etapa do Projeto (2012 a
2014) e síntese das apresentações
do II Workshop da Qualidade Cuiabá-MT- 22/08/2014
Jean Louis Belot1, Sergio Gonçalves Dutra2, Amandio Pires Jr. 1
(1) Instituto Mato-grossense do
Algodão, Primavera do Leste-MT.
Email: jeanbelot@
imamt.com.br
(2) Consultor
técnico
1. Qualidade da fibra: visão da Associação Mato-grossense dos Produtores
de Algodão – AMPA e da Associação
Brasileira dos Produtores de Algodão
- ABRAPA
O Projeto Qualidade de Fibra foi concebido
visando incorporar, de forma mais ampla, o
conjunto de boas práticas, em todas as etapas da cadeia produtiva do algodão, preconizadas pela AMPA e pelo IMAmt junto aos
produtores de algodão mato-grossenses,
propiciando um conjunto de informações
organizadas e sistematizadas que permita
um melhor posicionamento comercial do
setor produtivo, contribuindo para a valorização da fibra produzida, com melhor aceitação tanto no mercado interno como no
internacional.
Conforme a estratégia traçada no I Workshop da Qualidade, realizado em Cuiabá,
em março de 2013, o presidente da AMPA,
Milton Garbugio, organizou uma visita, em
maio de 2014, às empresas Tavex e Canatiba,
nos municípios de Americana e Santa Bárbara d’Oeste, no interior paulista, para ampliar a
visão da coordenação do projeto, na pessoa
do pesquisador do IMAmt Jean Belot e do
engenheiro agrônomo Sérgio Dutra, sobre
as principais interferências da qualidade da
fibra do algodão na indústria têxtil.
Esse intercâmbio foi muito importante,
pois, por meio dele, foi possível esclarecer
às empresas que, devido à diversidade das
condições climáticas, de solo e das datas de
“
plantio, há uma variabilidade muito grande
na qualidade da fibra produzida.
Nessa oportunidade, foi feito convite para
participação das empresas no II Workshop da
Qualidade, realizado em agosto de 2014, sendo que a Tavex compareceu ao evento, com a
participação de seu diretor de Sourcing Estratégico, Rogerio Segura, e da engenheira têxtil
Vanessa Bellote, gerente de Controle da Qualidade do Algodão da empresa.
Como o principal concorrente do algodão
é a fibra sintética, que possui grande uniformidade, a AMPA tem feito um trabalho contínuo e qualificado para aumentar a compe-
Foi uma experiência incrível participar de forma ativa neste II Workshop
de Qualidade. Sob minha ótica, é evidente a necessidade de um estreitamento entre as indústrias e suas vertentes junto aos produtores de algodão e
entidades facilitadoras. Ter oportunidade de expor e conhecer um pouco das
questões técnicas e comerciais que envolvem este seguimento nos ajuda na
tomada de decisão e faz com que a indústria se antecipe e se prepare para
o que está por vir. Essa informação de qualidade é percebida pela indústria
como serviço e não deprecia em nada o produto; pelo contrário, ela nos
direciona na tomada de decisão. Como exemplo posterior a este Workshop
e à visita guiada pelo IMAmt aos produtores locais, tivemos segurança para
realizar alguns negócios e até aceitar algumas características que normalmente são percebidas como “off std” pela indústria sem grandes deságios.
Quando nos antecipam informações com transparência, podemos administrar bem várias situações. Seguramente, todos ganham com isso!”
Depoimento: Rogerio Segura (Tavex/ Sourcing Director)
titividade da pluma no mercado, buscando
a evolução da padronização do algodão de
Mato Grosso, visando atender cada vez melhor seus clientes.
Em nome da ABRAPA, o Sr. Rodinei Frangiotti apresentou os trabalhos relativos à implementação do programa Standard Brasil
HVI. Esse programa contempla a implementação de um banco de dados dos resultados de
análise de todos os fardos de todos os laboratórios HVI do Brasil. Além de permitir editar
estatísticas sobre a qualidade da fibra do Brasil, o sistema irá securitizar os resultados das
análises HVI produzidas. Ademais, será construído um laboratório central de rechecagem
de amostras (1% das amostras será reanalizado) a fim de permitir que cada laboratório se
calibre em função dos níveis de leitura inter-
nacionais.
Como representante da ABRAPA e do Comitê Consultivo Internacional do Algodão
(ICAC, na sigla em inglês), o Sr. João Luiz Ribas Pessa, que participa do grupo de trabalho
CSITC (Comercial Standardization of Instrument Testing of Cotton) do ICAC, que define
as normas internacionais de análises por HVI
para as transações comerciais, apresentou os
trabalhos que estão sendo desenvolvidos por
esse grupo e a importância das ações integradas, na esfera nacional e internacional em prol
da qualidade de fibra.
2. Como manter o market share da fibra de
algodão?
Em sua palestra, o professor e pesquisador Dr.
Eric Hequet, chefe do Departamento de Plant
and Soil Science, da Texas Tech University e diretor do
Fiber and Biopolymer Research Institute, falou sobre a
evolução do consumo mundial de fibra de algodão e
da evolução do parque industrial têxtil mundial.
O pesquisador apresentou um gráfico com os dados de consumo de fibras nos últimos 50 anos, destacando que a participação das fibras sintéticas no
mercado total das fibras têxteis não parou de crescer,
reduzindo o market share da fibra de algodão para
uma participação ao redor de 32%, atualmente.
Esse percentual pode ser diferente em cada país.
Em 2010, nos países desenvolvidos, o market share da
fibra de algodão foi de 43,2%, enquanto nos países em
desenvolvimento essa participação foi de 26% (ICAC,
2013).
Até poucos anos atrás, a fibra de algodão detinha
mais de 50% do mercado das fibras totais nos Estados
Unidos. Porém, a previsão é que, em 2014, o consumo
das fibras sintéticas ultrapasse o das fibras de algodão
naquele país.
Caso a tendência de participação da fibra de algodão no mercado vá se reduzindo gradativamente,
como vem ocorrendo nas últimas décadas, a partir de
um certo nível o algodão se tornará um mercado de
nicho, com redução drástica dos investimentos dedicados a essa cadeia, como foi o caso da fibra de lã.
Portanto, as ações comerciais, de promoção e de marketing em favor do uso da fibra de algodão são fundamentais para manter viva a cadeia algodoeira mundial.
Outra evolução significativa da cadeia é relacionada à migração do parque industrial têxtil para países
asiáticos, com investimentos importantes em fiações
de anéis (spindles), a fim de produzir fio e tecidos de
qualidade.
Para esse tipo de fiação de anel, as características
de qualidade intrínseca de fibra requeridas são as seguintes, por ordem de importância: 1) comprimento;
2) resistência; 3) finura.
Uma vez que o Brasil está, cada vez mais, despontando como um país exportador de fibra de algodão
para os países asiáticos, o cotonicultor brasileiro terá
uma demanda mais seletiva para produzir fibra com
características adequadas para atender esse mercado.
3. Qualidade da fibra de Mato Grosso
Visão dos produtores:
Fernando Bertone, do Departamento de Comercialização do Grupo Bom Jesus, falou sobre a valorização
da fibra em função de sua qualidade.
Em relação ao posicionamento do algodão brasileiro no mercado mundial, o mesmo aparece no Cotlook
Indice A - 1.3/32” - Fibra 35mm comercial (Stapple). Po-
Figura 1. Consumo mundial per capita (kg/capita) e porcentagem de mercado da fibra de algodão no mercado mundial
das fibras têxteis. (Fonte: ICAC)
Tabela 1. Capacidade de fiação instaladas (anel e rotor).
(Fonte: ITMF, 2010)
rém, ele não aparece na cotação de fibra de melhor qualidade, tipo fibra Stapple 36mm (comprimento 1.1/8”),
por não ter regularidade suficiente para apresentar fibra
dessa categoria. Seria importante realizar ações e unir
esforços para que se chegue a essa cotação.
Para o estabelecimento do preço da fibra, o padrão de base é o do algodão Middling 31-4, com fibra
1.3/32”. A partir dessa base, são estabelecidos prêmios
e descontos, conforme indicados nas Tabelas 2 e 3
(próxima página).
Porém, esses valores são apenas indicativos, existindo discrepâncias entre as tabelas internas de ágio e
de deságio da ANEA e a situação real do mercado.
Finalmente, o mercado de qualidade cresce e o
mercado externo torna-se cada vez mais exigente.
Para buscar atender a essa demanda qualificada, que
permite uma remuneração melhor pela fibra, é preciso mudar os processos de produção e adotar selos de
qualidade como o da ABR/BCI, bem como ações per-
Tabela 2.
Prêmios e
descontos.
(ICA-Bremen)
Tabela 3.
Prêmios e
descontos.
(ANEA-Brasil)
http://www.
aneacotton.
com.br/agiodesagio.html
manentes para a manutenção da qualidade
de fibra.
A participação nesses mercados que requerem maior qualidade da fibra em um ambiente de maior competitividade torna claro
o cenário para o setor produtivo, sendo necessárias ações conjuntas dos produtores em
prol da obtenção de uma fibra diferenciada
para melhorar o poder de negociação e a rentabilidade.
Cid Reis, gerente de Produção do Núcleo
da Região Central de Mato Grosso do Grupo
Bom Futuro, falou sobre as variedades usadas
pelos produtores e destacou que o produtor
não quer surpresas com a qualidade intrínseca das variedades que planta. As empresas
de melhoramento genético têm acelerado os
lançamentos comerciais de novos materiais
com biotecnologias, sem a realização de todos os testes prévios necessários. Os novos
materiais apresentam irregularidades nas
características intrínsecas da fibra em função
das localidades. O ideal seria ter uma regionalização dos materiais em função das condições de plantio, altitude, latitude etc.. Porém, cabe ressaltar que certas características
intrínsecas da fibra, como a maturidade, são
altamente dependentes das condições climáticas e de manejo da cultura.
Uma característica HVI muito comentada é o conteúdo de fibras curtas (SFC). Alto
SFC pode depreciar significativamente a
fibra na comercialização, porque irá gerar
maiores índices de perdas na fiação. Essa
característica é muito dependente do funcionamento das algodoeiras, porém certas
variedades geram mais fibras curtas durante o beneficiamento do que outras.
Com a entrada da colheita com máquinas de fardos em rolo, há uma tendência
de se aumentar a variabilidade nos fardos
comerciais, provavelmente em consequência de uma menor mistura do algodão em
caroço do talhão (fardos em rolo pesam em
torno de 2,4 t e fardos em módulos prensados, por volta de 10 t).
Visão dos classificadores:
Valmir Lana é responsável pela classificação da fibra da Unicotton, em Primavera do
Leste-MT. Ele comentou que a classificação
do algodão brasileiro é realizada segundo
os padrões americanos, do USDA (Figura 2)
A Unicotton estima que, em 2014, irá classificar
cerca de um milhão de amostras. Na safra 2012/13,
39,3% da fibra foi classificada no padrão 31 e 50,84%,
no padrão 41.
Até meados de agosto 2014, do total classificado,
o tipo 31 representava 44,8% das amostras, e o tipo
41 era de 45,8%, não muito diferente da safra anterior.
As contaminações por Bark ou Picão aparecem
raramente (Figura 3).
A classificação instrumental HVI necessita de um
acondicionamento rigoroso das amostras em termos de temperatura (temperatura: 20oC +/- 2oC) e
umidade (umidade relativa: 65% +/- 4%).
As empresas de classificação que atuam no Brasil
são altamente profissionais e providenciam resultados confiáveis de classificação dos fardos comerciais
de algodão. Porém, no Brasil, ainda existe uma parcela de fibra de algodão que chega à indústria por
meio de corretores pouco escrupulosos, utilizando,
algumas vezes, certificados HVI adulterados, ocorrendo também a retirada das etiquetas de identificação, dificultando a rastreabilidade da mercadoria.
Com a construção do laboratório de referência
da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão
(ABRAPA), o sistema de classificação HVI do Brasil
ficará ainda mais confiável, permitindo que a comercialização seja baseada nos resultados HVI dos
laboratórios devidamente certificados pela ABRAPA.
Na fibra analisada no laboratório da Unicotton,
a partir de 764.212 amostras em 2012/13 e 305.502
amostras até meados de agosto 2014, o panorama
das características HVI foi o seguinte:
Comprimento da fibra: em 2013, 97,5% do algodão estava acima do padrão 1.3/32”, sendo 55,6%
acima do comprimento Stapple 37. Essa proporção é
globalmente igual à de 2014, com leve redução para
o comprimento acima de 37, que passou para 45,4%.
Figura 2. Caixa de padrões USDA para a classificação do algodão brasileiro. (Foto: Jorge J. Lima)
Figura 3. Contaminações por Bark (no alto) ou sementes de
Picão Preto (acima). (Foto: Valmir Lana)
Resistência da fibra: em 2013, só 3,48% da produção tinha menos de 27 g/tex de resistência, 27,9% com mais de 30 g/tex. Esses valores melhoraram para a atual safra de 2014, com
38,8% de fardos com mais de 30g/tex de resistência.
Em relação ao Micronaire, na safra 2013, 46,6% dos fardos estavam no intervalo entre 3,84,2, enquanto essa porcentagem subiu para 57,5% em 2014. Micronaire abaixo de 3,6 e acima
de 4,6 também apresentou uma redução de sua porcentagem entre as safras 2013 e 2014, o
que é positivo.
Já a porcentagem de fibras curtas (SFC), quando acima de 10%, começa a ser prejudicial
para a comercialização. Em 2013, quase 6,8% dos fardos tinham SFC acima de 12%. Essa porcentagem aumentou para 14,7% em 2014.
Rodinei Frangiotti, coordenador do
Grupo de Trabalho de Qualidade da ABRAPA, apresentou o panorama da qualidade
da fibra do algodão brasileiro, baseado
nos resultados de análises de mais de
5.598.098 fardos até novembro de 2013,
por 7 laboratórios.
Mais de 70% do algodão brasileiro é do
tipo 31 ou 41.
Para o comprimento da fibra, 82% da
produção está acima de 1.3/32”, sendo
51% acima de 37 Stapple.
Esses histogramas demonstram que
o algodão produzido no sul do MT, na região de Primavera do Leste e Campo Verde, apresenta qualidade igual ou superior
à média do algodão brasileiro.
Porém, o SFC parece superior na produção de algodão mato-grossense em relação à produção nacional. Talvez isso possa
estar relacionado com as variedades plantadas, como a FM 975WS, que tem sido a
variedade mais plantada, a partir da safra
2012/2013, em Mato Grosso.
Visão da indústria:
Em sua apresentação, a engenheira
têxtil Vanessa Bellote, da Tavex S/A, falou
sobre as complicações e dificuldades que
aparecem em função dos diferentes tipos
de contaminação presentes na fibra. No
Brasil, a Tavex trabalha quase que exclusivamente com algodão brasileiro.
Na oportunidade, ela apresentou os
dados de lotes de algodão adquiridos pela
empresa com pegajosidade no algodão,
entre 2010 e 2014, sendo que a porcentagem de algodão pegajoso e recusado pela
Tavex foi, respectivamente, de 9% (2010),
6% (2011), 2% (2012), 7% (2013) e 6%
(2014).
A pegajosidade da fibra é provocada
pelas excreções dos pulgões ou moscas
brancas, quando o capulho de algodão
se encontra aberto no campo. Dos diversos tipos de açucares, seja depositado
pelos insetos ou de origem fisiológica, só
aqueles que apresentam ponto de fusão
relativamente baixo (abaixo de 70°C) vão
provocar pegajosidade na fiação, já que diversas partes das fiações esquentam, mas
dificilmente acima dessas temperaturas.
Por isso, o Trehalulose é um açúcar que
provoca muita pegajosidade.
Figura 4. Algodão pegajoso. (Foto: Jean Belot)
Tabela 4. Temperatura de fusão e de decomposição de diversos açúcares.
Tipo de Açúcar
Fructose
Glucose
Sucrose
Trehalulose
Melezitose
Figura 5.
Enrolamento
de algodão nas
cardas (A) ou
maçaroqueiras
(B). (Foto: Vanessa Bellote)
(A)
(B)
Melting Point oC
116
152
184
48
152
O algodão pegajoso provoca depósitos do
açúcares e enrolamento de fibras em diversas
partes da indústria têxtil, como cardas, maçaroqueiras e fiadeiras, provocando:
• Mau andamento no processo de fiação;
• Perdas de rendimento e produção (paradas, rupturas, aumento dos ciclos de limpeza);
• Geração de defeitos nos fios.
Decomposição oC
178
210
215
193
225
Devido à grande dificuldade, para a Tavex,
de trabalhar com esse tipo de contaminação,
a empresa realiza testes prévios com o Thermodetector H2SD e recusa qualquer carga
com pegajosidade.
Outro tipo de defeito na fibra, o algodão
“encarneirado”, provocando “preparação” da
fibra, é geralmente a consequência de problemas na colheita e/ou no beneficiamento
do algodão. Testes realizados na Tavex mostraram que, para a indústria, o uso de algodão
“encarneirado” pode representar um aumento significativo das perdas totais (trash, dust,
fragmentos de fibras) durante o processo de
fiação, gerando até 6% de perdas suplementares.
A contaminação por “bark” (vestígios de
caule) pode acontecer durante a colheita,
quando as plantas são altas demais, ou nas
algodoeiras, quando os pedaços de caule não
são removidos antes de chegarem à etapa de
descaroçamento. Na fiação, esses fragmentos
de caule dificilmente são removidos e acabam
sendo integrados ao fio, provocando fios irregulares. Além disso, algodões contaminados
aumentam levemente o desperdício de matéria prima durante o processo de fiação.
Foram descritos os principais problemas
no recebimento dos fardos comerciais de fibra
nas diversas fiações da empresa Tavex:
• Fardos com pesos e tamanho excessivos
(270kg);
• Fardos com arames ou fitas trançados;
• Fardos parcialmente podres;
• Fardos com manchas de tintas usadas por
corretores para marcar manualmente os
fardos;
• Uso de carretas “ômega”;
• Algodão sujo e/ou com cores.
Por fim, foram apresentados alguns resultados de testes realizados em fios open-end,
mostrando que tanto o comprimento como a
resistência da fibra têm reflexos significativos na qualidade do fio, evidenciando a importância das características HVI do algodão para a qualidade dos fios produzidos na indústria.
Na sequência do Workshop foi apresentado o caso
de uma indústria montada por produtores, por parte
do engenheiro têxtil Antonio Marcos do Nascimento,
gerente da fiação da Cooperfibra, que comentou sobre
o desafio da confecção das misturas dentro de uma fiação de rotor.
Cada fardo de fibra recebido na indústria apresenta
características de tipo e de HVI diferentes das dos outros. Para o bom andamento da fiação, é muito importante ter misturas de fardo com qualidade parecida ao
longo dos dias.
Poucas indústrias no Brasil utilizam sistema informatizado para gerenciar os estoques de fardos e a
elaboração dessas misturas. No caso da Cooperfibra, o
uso desse tipo de software permitiu melhorar significativamente a produtividade da usina e a qualidade da
produção, fornecendo misturas com uma variabilidade
mínima ao longo do dia. Assim, a indústria consegue
utilizar fardos de produtores que seriam difíceis de serem comercializados, além de trabalhar com estoques
mais reduzidos de algodão.
Essa indústria trabalha com a produção de fibra
dos sócios da fiação. O sistema utiliza os dados de
HVI fornecidos pela Cooperfibra, uma vez que todos
os fardos desses produtores são classificados no mesmo laboratório HVI. A indústria da Cooperfibra é um
exemplo muito bem sucedido, em que se agrega valor à fibra produzida pelos produtores de algodão de
Campo Verde-MT.
4. As variedades e a qualidade intrínseca da fibra
4.1 Monitoramento da qualidade da fibra do MT
O pesquisador do IMAmt Jean Louis Belot apresentou
os primeiros dados obtidos na 1ª etapa do Projeto Qualidade da Fibra.
Ele destacou que a qualidade da fibra é inicialmente
elaborada no campo, sendo que a variedade irá definir
o padrão geral de qualidade intrínseca da fibra. Muitas características da fibra têm determinismo genético
importante, como comprimento, diâmetro da fibra e
resistência.
Porém, as condições de manejo e de clima irão interferir significativamente sobre elas, principalmente
quando afetam a nutrição da planta e o depósito de
celulose na fibra.
Assim, a qualidade intrínseca da fibra produzida em
um talhão pode ter uma variabilidade significativa, devido a essas interações entre a variedade e as condições de cultivo, inclusive dentro do talhão, apresentando diferenças nos fardos comerciais originários de fibra
Figura 6. Fardos estourados ou manchados. (Foto: Vanessa Bellote)
Figura 7. Linha de abertura numa fiação. (Foto: Antonio M. do
Nascimento)
Tabela 5. Média das características HVI das amostras 2012/2013.
Figura 8.
Distribuição do
comprimento
(UHML-mm)
das variedades
nos diversos
ambientes de
Mato Grosso Safra 2012/13.
Figura 9.
Distribuição
da resistência
(g/tex) das
variedades
nos diversos
ambientes de
Mato Grosso Safra 2012/13.
produzida dentro do mesmo talhão.
No âmbito do Projeto de Qualidade do
Algodão de Mato Grosso, o IMAmt está
realizando anualmente um trabalho de
levantamento da qualidade intrínseca da
fibra para todas as variedades cultivadas e
em todas as regiões produtoras do Estado,
realizando uma amostragem de 20% dos
talhões cultivados. Amostras de 1,5-2,5 kg
são coletadas em talhões de produtores,
em todos os núcleos da AMPA, representando ao redor de 1.200 a 1.500 amostras,
anualmente. Essas amostras são descaroçadas em uma máquina de 20 serras na
Estação Experimental do IMAmt em Primavera do Leste e a fibra é enviada para
análise no laboratório HVI da Unicotton.
A Tabela 5 apresenta os resultados das
médias das características HVI por variedades para as amostras da safra 2012/2013.
Essas médias permitem que se tenha
uma ideia do valor médio de cada característica, por variedade, apesar de cada
média ter sido obtida com um número
diferente de amostras e produzidas em lavouras diferentes.
Esses dados são, porém, insuficientes
para se escolher adequadamente uma variedade, pois não fornecem informações
sobre a variabilidade dos dados, isto é, a
amplitude de variabilidade dessas características em função das condições de manejo. Histogramas de distribuição, como
aqueles apresentados nas Figuras 8 a 11,
permitem classificar melhor a estabilidade
das variedades em relação à características de fibra.
Esses dados de distribuição de características HVI serão complementados por
uma análise da produção fardo a fardo de
diversas fazendas. Esse trabalho será possível graças à disponibilidade desses dados por parte dos
produtores de diversas regiões de Mato Grosso,
como os Grupos Bom Futuro, Bom Jesus, Falavinha, Scheffer e Vanguarda e os produtores Arilton
Riedi e Otávio Palmeira. Os dados serão analisados
e publicados de forma global, correlacionando as
características agronômicas nas lavouras e a qualidade da fibra na comercialização.
Alexandre Azevedo, do CETIQT/ SENAI, apresentou alguns resultados de um trabalho sobre
Micronaire e Maturidade realizado em colaboração com o IMAmt.
Entre 15 e 25 variedades são comercializadas
a cada ano no estado de Mato Grosso. Cada uma
dessas variedades apresenta valores de finura de
fibra muito diferentes. Em consequência, os valores de Micronaire não podem oferecer informação
consistente sobre finura/maturidade, sem conhecer a variedade de onde foi originada essa fibra.
Certas variedades de fibra fina (FM 966) podem
apresentar fibra madura com Micronaire abaixo de
3,6, enquanto variedades de fibras grossas (FMT
701) têm fibras imaturas quando o Micronaire fica
abaixo de 3,8.
Esse aspecto foi lembrado, oportunamente,
pelo pesquisador Eric Hequet durante sua palestra,
apoiando-se na Figura 12.
Nessa figura, podemos ver que algodões de Micronaire 4,0 podem ter características de finura e
maturidade totalmente diferentes. Infelizmente,
muitos contratos comerciais são baseados em valores de Índice de Micronaire - IM, com a ausência
de dados sobre a variedade, podendo ocorrer situações em que a indústria venha a ter problemas
quando processar a fibra.
O objetivo deste trabalho é de estabelecer uma
metodologia de tingimento de pequenas amostras de fibra, a fim de permitir que se avalie, para
cada variedade, a partir de qual valor de Micronaire a indústria pode começar a ter problemas
no tingimento. O trabalho ainda é preliminar, não
sendo possível, por enquanto, mostrar diferenças
de pegamento de tinta em função do valor do Micronaire.
A metodologia está sendo aprimorada visando
melhorar a caracterização das diversas variedades
cultivadas em Mato Grosso quanto ao tingimento.
Figura 10. Distribuição do Índice de Fibras curtas (SFC-%) das variedades nos diversos ambientes de Mato Grosso - Safra 2012/13.
Figura 11. Distribuição do Índice Micronaire das variedades nos
diversos ambientes de Mato Grosso- Safra 2012/13.
4.2 Características intrínsecas da fibra de interesse da indústria: orientações para o melhoramento genético
Em sua palestra, o pesquisador Eric Hequet também apresentou a evolução da indústria têxtil
Figura 12. Valores de Micronaire em função da maturidade
e da finura da fibra.
Figura 13.
Importância
das características da fibra
para a indústria, em função
do tipo de
fiação. (Fotos:
E.Hequet)
mundial e a necessidade de produzir fibra adaptada à fiação de anel com velocidade cada vez mais rápida, enfatizando a importância de algumas características da fibra.
Primeiro, lembrou uma informação já bem conhecida:
a importância relativa de cada característica HVI da fibra
em função do tipo de fiação usado pela indústria têxtil, de
anel, rotor ou de fricção (Figura 13).
Para o mercado externo, em que a maior parte do parque industrial asiático é de fiação de anel, será importante
produzir fibra com bom comprimento e resistência, além
de finura.
A maturidade da fibra tem papel importante. Ela é diretamente ligada à importância do depósito de celulose e da
espessura da parede da fibra (Figura 14).
A maturidade de uma fibra é essencial para definir sua
resistência à ruptura, principalmente durante os processos
de beneficiamento do algodão em caroço. Então, nessa hipótese, a maturidade estará diretamente ligada à distribuição do comprimento da fibra, com fibras mais ou menos
quebradas nos processos de descaroçamento e limpeza
de fibra.
Assim, a distribuição do comprimento das fibras é tão
ou mais importante que os valores dados pelo HVI. Mas
somente é possível ter acesso a essa informação da distribuição de comprimento analisando-se a fibra com os
aparelhos AFIS.
No exemplo apresentado, três amostras de fardos comerciais de mesmo comprimento HVI (1,10 polegada)
foram analisadas com AFIS, mostrando comprimentos de
fibra muito diferentes (Figura 15).
O algodão número 2 será muito melhor em fiação do
que o algodão número 1, com muito mais fibras curtas.
Essa análise consegue mostrar boa correlação entre o
nível de maturidade da fibra e a redução da taxa de fibras
curtas (quanto mais madura a fibra, menos ela quebra durante o beneficiamento) ou de resíduos em fiação de fio
penteado.
Dr. Eric Hequet chamou a atenção, também, para uma
característica da fibra pouco valorizada, o alongamento
Figura 14.
Fibra madura
(ao lado) e
imatura (abaixo) em seção
transversal.
(Foto: E. Hequet - Texas
Tech Un.)
Figura 15. Distribuição de comprimento de fibra em 3
algodões de mesmo UHML.
(“elongation”). Mostrou que, para a indústria, é possível
produzir fio de mesma resistência com fibra de resistência menor, mas com alongamento maior.
Apesar de diversos estudos mostrarem que existe
uma correlação negativa entre resistência da fibra e
alongamento, um trabalho com o programa de melhoramento genético da J. Dever (Texas A&M) evidenciou
a possibilidade de se melhorar o alongamento da fibra
usando o HVI. A melhora do alongamento irá proporcionar, indiretamente, uma redução das fibras curtas e,
consequentemente, melhorias para a indústria (redução de perdas e aumento da qualidade do fio).
Infelizmente, o sistema de comercialização internacional não permite que se valorize essa característica de
alongamento. Uma fibra resistente e de alongamento
baixo será vendida a um preço maior do que o de uma
fibra menos resistente, mas de alongamento elevado.
Nas suas conclusões, o pesquisador Hequet observou que, no caso do Brasil, país que se torna, cada
vez mais, um grande exportador de fibra, teremos que
produzir uma fibra de comprimento mínimo de 35 mm
Stapple, uniforme em comprimento (de porcentagem
reduzida de fibras curtas), resistente, fina e madura.
As fibras curtas são, geralmente, fibras imaturas que
quebraram durante os processos de beneficiamento
do algodão; daí a importância da maturidade da fibra.
Agrônomos e pesquisadores precisam unir esforços
para aumentar cada vez mais a produtividade junto
com a qualidade da fibra.
5. Qualidade na Colheita
O professor Renildo Luiz Mion, da Universidade Federal de Mato Grosso, campus de Rondonópolis, foi encarregado de conduzir trabalhos sobre a colheita do
algodão para o Projeto Qualidade da Fibra, visando
gerar dados objetivos, nas mais diversas condições de
cultivo de Mato Grosso, a incidência da colheita sobre
perdas durante a colheita e na qualidade (intrínseca e
tipo) do algodão.
No evento, ele apresentou os primeiros dados obti-
Figura 16. Capulhos colhidos com umidade acima da recomendada. (Fotos: Renildo Mion)
Figura 17. Encarneiramento das fibras devido a problemas de
manutenção no desfibrador. (Fotos Renildo Mion).
dos em ensaios realizados em agosto de 2013. Os valores de perdas totais apresentados na Tabela 6 estão
abaixo do valor mínimo de perdas encontradas em
diversos trabalhos realizados nos Estados Unidos e
no Brasil, evidenciando a boa regulagem da colhedora testada, mesmo trabalhando com velocidade de 7
km.h-¹, que é considerada alta para o padrão da lavoura
de algodão em que foram realizadas as avaliações.
Destacamos que o maior valor de perdas, grifado
em negrito na Tabela 6, ocorreu com 90% de maçãs
abertas, no início da colheita (em torno de 8 horas da
manhã).
Nesta semana e neste horário, foi encontrado o
maior valor de umidade da pluma de algodão (próximo de 10%), demonstrando que, nessas condições de
umidade, o operador da máquina deve diminuir a velocidade de colheita para reduzir as perdas, bem como
evitar problemas com “embuchamento” e retenção das
Tabela 6. Perdas totais (%) em função de diferentes horários e semanas de colheita.
Porcentagem de
maçãs abertas (%)
Semanas após
desfolha
80
80
80
90
90
90
1
2
3
1
2
3
PERDAS TOTAIS (%)
Horários
H1 (9h00)
H2 (12h00)
3,46
4,06
3,93
4,46
2,33
3,02
4,09
2,54
4,09
2,54
6,61
4,87
H3(17h00)
3,78
4,15
3,09
5,26
5,26
4,07
plumas na planta.
Essas observações estão em consonância
com as recomendações sobre a umidade ideal
de colheita disponíveis na literatura, nas quais
pesquisadores observaram que a eficiência da
colhedora é reduzida quando o algodão está
úmido, além de causar danos às fibras.
A umidade da fibra do algodão colhido mecanicamente não deve ser superior a 8%, de
modo a não ocasionar “encarneiramento”, degradação das fibras, amarelecimento e manchas que podem ocorrer devido aos fungos.
Alterações na cor são causadas por microrganismos que proliferam com o aumento da
temperatura e umidade, sendo que isso pode
ocorrer mesmo após a formação dos módulos. O algodão colhido com umidade superior
a 16% sofrerá perdas mesmo que descaroçado imediatamente.
O monitoramento de umidade deve ser
constante, principalmente no início e no final do dia, ocasiões em que a umidade pode
mudar abruptamente, em poucos minutos,
principalmente à noite, devido à presença de
orvalho, fazendo com que a temperatura seja
reduzida rapidamente.
O acompanhamento da umidade do algodão em caroço é essencial e, com o aumento
do uso dos fardos em rolo, é necessária uma
atenção especial, em função dessas novas
características que podem influir na composição dos fardos comerciais.
Aplicação de checklist de segurança
do trabalho e prevenção de incêndios
Janeiro a Dezembro de 2013
Aplicação de checklist de segurança
do trabalho e prevenção de incêndios
Janeiro a Outubro de 2014
6. Qualidade e prevenção de acidentes e
incêndios em algodoeiras e fazendas
Dentre as informações mais relevantes disponibilizadas até a presente data no âmbito do
Projeto Qualidade da Fibra, destacamos a maior
atenção à prevenção de acidentes de trabalho e
de incêndios nas mais de 100 Unidades de Beneficiamento de Algodão em operação no estado de
Mato Grosso, que tem gerado melhor sinalização
preventiva, atualizações, reformas e adequações
nesses estabelecimentos.
Nos gráficos da página anterior, pode-se observar o número de visitas realizadas para aplicação de check list de segurança do trabalho e
prevenção de incêndios. Os dados são das safras
2012/2013 e 2013/2014. O recobrimento dos trabalhos do Projeto Qualidade da Fibra têm avançado a cada safra, sendo que na safra 2013/2014
a equipe de segurança do trabalho e prevenção
de incêndios vai aplicar o check list em 100%
das Unidades de Beneficiamento ativas em Mato
Grosso.
O check list é um acompanhamento detalhado de todas as etapas do beneficiamento do algodão realizadas nas Usinas de Beneficiamento,
por meio do qual é indicado ao produtor se o
estabelecimento atende à legislação vigente.
No caso de inconformidades, é elaborada uma
orientação na qual consta a NR (Norma Regulamentadora do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE) ou a legislação do Corpo de Bombeiros, que regulamentam o assunto e que devem
ser seguidas.
Os treinamentos realizados pela equipe de
técnicos de segurança do Projeto são programados e customizados em função das demandas
dos produtores de algodão na área de segurança do trabalho e prevenção de incêndios. Geralmente, eles atendem às necessidades das Usinas de Beneficiamento referentes às constantes
atualizações das NRs e da legislação do Corpo de
Bombeiros. Trata-se de um procedimento rápido
e objetivo para manter o segmento algodoeiro
em conformidade com a legislação vigente.
Realização de treinamento
de integração de segurança
Reserva técnica de incêndio - RTI
Treinamentos nas algodoeiras conforme
solicitação - Janeiro a Outubro de 2014
Conclusão do II Workshop da Qualidade
Em razão da importância do Projeto de Qualidade da Fibra para a AMPA, foi decidido, em reunião
realizada em setembro de 2014, dar continuidade
à iniciativa por meio da elaboração e execução da
segunda fase do projeto.
A ideia é aperfeiçoar sua metodologia visando à obtenção de um maior número de informações objetivas, ampliando a ação transversal e
promovendo maior integração com os produtores, colaboradores e Assessores Técnicos Regionais (ATRs) e com o Programa de Melhoramento
de Algodão do IMAmt e com os novos Centros
de Treinamento e Difusão de Tecnologia.
Treinamentos nas algodoeiras conforme
solicitação - Realizados x Beneficiários
REALIZAÇÃO
APOIO FINANCEIRO

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