JC Relations - Jewish

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JC Relations - Jewish
Jewish-Christian Relations
Insights and Issues in the ongoing Jewish-Christian Dialogue
van Loopik, Markus | 01.03.2003
Israel e os Povos
O Profeta Zekaryóh
Markus van Loopik
Classificação cronológica
O profeta Zakaryóh (Zacarias) autor de um dos últimos livros de profetas no Tenak (Bíblia Hebraica),
era contemporâneo e sucessor do profeta Hagái (Ageu). Segundo Esdras 5,1 e 6,14, era o filho do
sacerdote `Idô´ (Ado), que vivia no tempo do governador Zerubòbél e do sumo sacerdote
Yehoshuá` (Josué). Sucedeu ao seu pai como sacerdote (Ne 12,16). A mensagem de Zakaryóh se
concentra na reconstrução de Jerusalém e do Templo, a qual foi finalmente concluída no ano 516
a.c.t. [antes da contagem do tempo] (Cf. Zc 1,16; 2,1-5.11-13; 6,15; 8,3). Como Hagái, Zakaryóh se
empenhara fogosamente pela reedificação do Santuário: “Este povo diz: O tempo ainda não veio
para construir a Casa do Eterno” (Ageu 1,2). Segundo a opinião de ambos, a reconstrução da Casa
de Deus representava a condição para a vinda do Reino de Deus. O processo de construção do
Templo parara aproximadamente 20 anos, como conseqüência do medo e falta de capacidade de
impor dos exilados regressos, os quais mostravam inicialmente mais interesse pela segurança
própria e a construção dos muros da cidade do que pela reconstrução do Templo.
Percebemos neste livro o tempo movimentado dos parentes depois do seu regresso. O profeta, por
outro lado, não se importa com os povos rodeantes, os quais contrariavam, ameaçando os
regressos na sua existência nua e crua. Entre as linhas, somos testemunhas duma ruptura definitiva
entre a Judá judaica no sul e a comunidade samaritana no norte, ambas envolvidas numa luta
religiosa e cultural. Ficava uma ferida que nunca sarava.
Logo depois da retomada do trabalho no Templo, Zakaryóh apóia a iniciativa de Hagái. A próxima
conclusão do Templo fez nele o fogo da expectativa messiânica arder alto.
Um livro, um profeta?
Os primeiros seis capítulos visionários do livro Zakaryóh mostram o entusiasmo utópico, o qual é
tão característico para este profeta. Nesta parte percebemos, antes de tudo, como Zakaryóh
descreve o transito da profecia à apocalíptica. As estranhas visões cheias de linguagem simbólica
precisam, também para o mesmo profeta, ser explicadas por um assim chamado madrík, um guia
celeste, o qual faz o significado metafórico da visão transparente. Esse fenômeno tipicamente
apocalíptico nos lembra do livro de Daniel, livro esse que, na tradição rabínica, não está sendo mais
contado aos profetas.
Em círculos acadêmicos domina a opinião de que o livro Zakaryóh, como o Yesha`yóhu (Isaias),
consta de duas partes. De conformidade com isso, os capítulos 9-14 com as suas imagens de futuro
utópicas originar-se-iam dum outro autor que os primeiros oito capítulos. De fato, encontramos na
última parte elementos e declarações que apontam a um tempo muito mais tarde. Do ângulo de
vista da interpretação bíblica rabínica, apesar disso, tais distinções de crítica do texto não têm
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importância essencial. Aí, somente o contexto da redação final do todo determina a interpretação
das diferentes partes. Também no livro Zakaryóh, a fala de ameaça e a profecia de salvação andam
coerentemente juntas. Não há razão, na base do conteúdo, de dividir o livro.
Os profetas cumprem tarefa dupla. Com palavras ameaçadoras, exortam os ímpios, os arrependidos
consolam com profecias messiânicas. Mais severo que Hagái, Zakaryóh exorta para renovação
moral. Nos seus sermões defende a posição de direito de estrangeiros, viúvas e órfãos dentre da
sociedade. Como muitos outros profetas, põe a ética sobre o ritual.
Zakaryóh 14
Nesta palestra, quero-me restringir a um assunto principal e ao fio vermelho no livro Zakaryóh: a
relação entre Israel e os povos. Depois duma breve interpretação do capítulo último e 14, vou
aprofundar mais o assunto “Israel e os povos”, expondo-o na margem mais larga da tradição
rabínica.
A imagem do futuro em Zakaryóh 14 é mais que uma exortação profética, na qual a comunidade
tem de escolher entre remuneração e punição. A imagem final respira a esfera duma profecia
inevitável, o que reforça as tendências apocalípticas no livro. Zakaryóh prediz como o Eterno
completará o Seu plano insondável de catástrofes e salvação no fim dos dias. O profeta descreve o
que os rabinos chamam os heblê yemê hamashíah: as dores de parto do tempo messiânico. Pouco
antes da vinda do Reino de Deus, todos os povos voltar-se-ão contra Israel, conforme o plano de
Deus. A situação vai parecer completamente sem esperança, mas então Deus inverterá os papeis,
mudando a opressão de Israel em triunfo.
Esse processo doloroso é tão necessário como as dores duma mulher que precedem o nascimento
duma criança. Assim Rábi Shimôn bar Jochai ensina, que a três dons de Deus precederá cada vez
um período de sofrimento: ao dom da Toráh, à tomada da terra prometida e à vinda do mundo
futuro. A Toráh só pôde ser dada depois dum período de deserto cheio de privações, numa situação
de perfeita dependência do Eterno. A tomada da terra, de novo, andou junto com provas e luta. A
geração velha precisava primeiro desaparecer, para possibilitar um começo completamente novo.
Assim, também a vinda do Reino de Deus será possível somente depois dum período de pena e dor,
no qual Israel, rodeado pelos seus inimigos, dependerá totalmente da ajuda de Deus.
Veja bBerachot 5a; cf. Mechilta de R. Jishma’el, Jitro, Par. 10; Jalkut Jitro § 303; Sifre Waechanan, piska 32 [ed. Finkelstein p. 57]; Jalkut Wa-echanan § 837; Shemot Rabba 1,1;
Tanchuma Shemot fim § 1; Midrash Tehillim 94,2; Jalkut Salmos § 850.
A visão do futuro em Zakaryóh 14 está com a idéia da conversão de Israel, esta que, por sua vez,
inicia uma conversão dos povos. Conversão é aqui, não tanto a condição profética, como antes uma
certeza apocalíptica. Experimentamos aqui a profundeza autêntica da frase talmúdica: “O Santo,
bendito seja Ele, far-lhes-á surgir um rei, cujos decretos serão duros como os de Hòmón (Amã).
Então Israel converter-se-á, e Ele os leva de volta ao bom” (bSanhedrin 97b3). Forçada pela
situação, toda a humanidade chegará a fazer recolhimento. A catástrofe é tão certa como a
salvação que seguirá aquela: “A metade da cidade sairá ao cativeiro, mas o resto do povo não será
exterminado da cidade” (14,2). Também os povos serão punidos, mas os restantes subirão junto
com Israel a Jerusalém par servir ao Eterno.
Mudança
Na sua previsão ao “dia do Eterno”, o profeta se dirige diretamente à cidade de Jerusalém: Eis que
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virá um dia para o Eterno, então repartirão os teus despojos no teu meio (14,1). A tensão
apocalíptica entre catástrofe e liberação, encontramo-la refletida nas interpretações muito
divergentes dessas palavras de introdução. Segundo uma explicação evidente, os saqueadores de
Jerusalém julgar-se-ão tão certos da sua vitória final que distribuirão tranqüilamente a sua presa no
meio da cidade santa. Em 14,4, o profeta prevê que um dia os habitantes de Jerusalém serão
exatamente aqueles que coletarão as riquezas dos povos dentro dos muros da sua cidade. O
targum4, que quer, antes de tudo, encorajar a comunidade, não aguarda essa mudança apocalíptica
nos acontecimentos. O tradutor do targum [tradução aramaica com comentário. Trad.] já antecipa
no primeiro verso a mudança favorável no destino, traduzindo: “E a Casa de Israel distribuirá as
propriedades dos povos no teu meio, oh Jerusalém.” A maldição de Israel modificar-se-á numa
benção: “Assim como fostes uma maldição entre os povos, Casa de Judá e Casa de Israel, assim
salvar-vos-ei, e sereis uma benção” (8,13). A despeito da dissecação acadêmica da crítica do texto
do livro, evidencia-se continuamente a sua clara unidade de redação e de conteúdo! Segundo o
decreto insondável de Deus, os povos vão primeiro marchar para a guerra contra Jerusalém:
“Juntarei todos os povos contra Jerusalém” (14,2; cf. 12,3). A santa cidade será destruída e
saqueada; a metade dos seus habitantes serão levados embora, mas a outra metade ficará. A
última declaração representa um pequeno aviso à futura virada salvífica. Pois, de repente, o Eterno
Mesmo aparecerá no campo da batalha, fazendo as contas com os inimigos de Israel: “Então o
Eterno sairá e lutará contra aquelas nações como no dia da Sua luta, o dia do Encontro” (14,3).
O quê o profeta quer dizer com “como no dia da Luta, o dia do Encontro”? Segundo a tradução do
targum e da maioria dos comentários, refere-se com isso ao dia em que Deus salvou Israel no mar
de juncos da mão de Faraó (cf. Ex 14,25ss.; 15,3ss.). “O dia” no mar dos juncos representa a
prefiguração do “dia do Eterno” e da liberação messiânica do futuro. Também então se tratará, não
duma luta comum, mas sim dum encontro (qerab) entre os inimigos de Israel e o Eterno Mesmo.
Assim como o Eterno fendeu o mar de juncos no passado para abrir uma saída a Israel, assim
fenderá, “nesse dia” o Monte de Oliveiras, por meio dum terremoto, em duas partes (14,4). Nascerá
um vale do leste ao oeste, através do qual Israel, diferente dos seus inimigos, escapará da
destruição dessa catástrofe de natureza: “E fugireis ao vale do Meu monte” (14,5). O targum lê as
consoantes do hebraico aqui de modo diferente, não nastêm (fugireis), mas sim nistám (será
enchido ou fechado). Lemos a seguir “e o vale do Meu monte será fechado (enchido)”. Segundo
Rashi, podemos isso entender uma como declaração de conteúdo: Quando no Monte de Oliveiras
nascer uma fenda do leste ao oeste, e as partes do norte e do sul do monte se separarem, o vale
anterior acerca do monte será enchido pelo deslocamento. Mas o targum tem realmente em vista
uma declaração de conteúdo? Sem dúvida quer mais. A tradução aramaica sublinha outra vez
especialmente a concordância com o milagre no mar de juncos. Como no mar de juncos, o caminho
de fuga de Israel será fechado para os seus perseguidores. Talvez os inimigos de Israel serão
soterrados por um mar de terra [solo]. Israel fugirá à planície, assim como no grande terremoto no
tempo do rei `Uziyóh [Usias] (14,5) [cf. Amos 3,1].
Num momento agitado e sublime, o profeta parece agora esquecer a sua audiência. Abandona a
sua apresentação descritiva do futuro, dirigindo-se num testemunho pessoal a Deus: “Então o
Eterno, meu Deus, virá, todos os santos conTigo” (14,5). O exército celeste de Deus entrará em
Jerusalém para ajudar “ao resto” de Israel na luta contra os seus sitiadores. A salvação futura será
ainda mais milagrosa que o êxito de Egito. O dia do Eterno, embora tenha um predecessor na
historia, será sem par: “E será um dia sem par” (14,7). Somente a Deus o momento escondido está
conhecido, qêts hayòmím - o momento definitivo da salvação fixado definitivamente por Deus,
motivo tipicamente apocalíptico com sob-tom profético. Precisamente porque o momento não está
conhecido, a pessoa precisa preparar-se para ele cada dia de novo.
Os últimos mistérios permanecem velados nas palavras do profeta: “E acontecerá naquele dia, não
haverá luz, mas nevoeiro e nuvens escuras” (14,6). Yeqòrôt (nevoeiros) de yoqar (ser pesado).
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Cf. yeqorôt shel midbór - nevoeiro grosso sobre a planície do deserto: Yalkut Salmos § 730,
remetendo ao Salmo 37,21.
Veqipo´ôn [ao lugar de yeqipoôn] (nuvens escuras) de qefei (coalhar, grumar). Assim Rashi
interpreta o texto hebraico que está difícil a compreender. Remete a uma profecia sobre “o dia do
Eterno” em Is 13,10: “Pois as estrelas do céu e as suas constelações não farão brilhar a sua luz. O
sol tornar-se-á escuro no seu nascer e a lua não fará brilhar a sua luz.” David Kimchi traduz
aproximadamente na mesma direção, porém a partir duma consideração um pouco mais positiva:
nesse dia acontecerá que não haverá luz clara nem nuvens densas e escuras. Segundo a sua
opinião, aparecerá uma luz vaga, sem diferença clara entre dia e noite. As palavras no versículo 7
“nem dia nem noite” parecem confirmar a sua opinião. “Nem dia nem noite” significa uma mistura
misteriosa de desgraça e liberação, a qual caracterizará o dia do Eterno. No fim da tarde, na
profundeza mais profunda do exílio, a luz clara da libertação messiânica irromperá (versículo 3): “Na
hora de anoitecer haverá luz”. Assim ensina uma tradição rabínica que o Messias nasce no mesmo
momento em que Jerusalém (no ano 70) foi devastada. Numa declaração análoga, também Rashi
interpreta “dia e noite” em sentido figurativo: O profeta fala, não do dia normal de vinte-e-quatro
horas, mas sim sobre “o dia do Eterno”, do qual os Salmos dizem: “Mil anos são, nos Teus olhos,
como o dia de ontem” (90,4). Zakaryóh fala sobre o assim chamado reino de mil anos, no qual a luz
do mundo por vir ainda não irrompeu, mas no qual o fim da longa noite da supressão de Israel já se
iniciou. Só no fim desses mil anos, à noite, brilhará a luz plena do mundo por vir.
Outros intérpretes entendem “dia e noite” no versículo 7 verbalmente. “Sol e lua, o ritmo de dia e
noite desaparecerão: E acontecerá que não haja luz nenhuma, nem a Deliciosa Luz do sol, nem a
fria (qefe´i) luz da lua” (Malbim e outros). Uma leitura tal lembra a profecia do profeta Yesha`yóhu:
Não servir-te-á o sol como luz no dia, nem luzir-te-á a lua como brilho claro; mas o Eterno te será
para Luz Eterna” (60,19). A última interpretação se junta excelentemente às maravilhosas bênçãos,
as quais Zakaryóh faz agora seguirem (14,8): “E acontecerá naquele dia que águas vivas fluam de
Jerusalém, fertilizando a terra inteira. Nessa profecia ouvimos a voz do profeta Yoêl (Joel): “E uma
fonte irromperá da Casa do Eterno, aguando o vale de Shitím” (4,18).
As bênçãos terrestres do tempo messiânico não são fim em si mesmas. Elas são a modelagem
externa do Reino de Deus: “E o Eterno será rei sobre toda a terra.” Cheio de profecias escondidas
continua então dizendo: “Naquele dia o Eterno será único e o Seu nome único (14,9). Todos os
povos reconhecerão Deus como o Único, proclamando o Seu nome somente. Aqui o livro Zakaryóh
mostra o seu conexo claro. Também em 2,10-11; 8,21; 12,3 percebemos esse surpreendente
motivo universalista, o qual levanta Israel sobre todo o particularismo e sobre toda a frustração
histórica.
Salvação genuína pode haver somente onde todo o rancor for superado. Com essas profecias de
unidade entre Israel e os povos finaliza a oração Alênu, com o qual finalizam os serviços de
sinagoga:
Portanto esperamos a Ti, Eterno nosso Deus, ver logo o triunfo da Tua glória, que todos os horrores
desapareçam da terra e os ídolos sejam exterminados; que o mundo seja aperfeiçoado pelo Reino
do Onipotente, que todas as pessoas humanas invoquem o Teu nome e todos os malfeitores na
terra se confessem a Ti; que todos os habitantes do orbe terrestre reconheçam e entendam que
diante de Ti cada joelho se deva dobrar e toda língua jurar em Ti etc. (cf. Bamberger, Sidur, p. 65).
A cidade de Jerusalém permanecerá o coração religioso da terra. Por extenso, porém (cf. Zc 2,6; Ez
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1,8 [No lugar de Ez 18 na Anmerkung (Anotação) 10 do texto alemão pode ser Ez 1,8]), e habitada
completamente, Jerusalém erguer-se-á mais além da terra adjacente. A terra de Judá estender-se-á
uma como planície ao redor da cidade, de Guêba` no extremo norte até Rimôn perto de Beêr
Shéba` no extremo sul. O ideal profético não é somente um espiritual. Ele abrange o anseio do povo
para poder viver de fato em segurança: “E habitar-se-á nela [Jerusalém]” (14,11). Na sua elevação,
a cidade será intocável: “Não haverá mais nenhuma proscrição [destruição], Jerusalém habitará em
paz.”
O juízo sobre os povos
Nessa esfera familiar duma cidade segura, o profeta faz descer como trovão o martelo do juízo
sobre os inimigos de Israel: “E isso será o tormento com que o Eterno atormentará todos os povos
que saírem à guerra contra Jerusalém” (14,12). De um momento a outro perecerão: A sua carne
apodrecerá durante de que estejam de pé ainda, e os seus olhos apodrecerão nas suas órbitas, na
sua boca apodrecerá a sua língua” (14,12). Zakaryóh pinta uma imagem amarga do pânico que se
apossará dos inimigos de Israel. Se alguém quiser segurar o seu próximo pela mão, este o
entenderá uma como ameaça e partirá imediatamente à agressão: “E acontecerá naquele dia que
surgirá uma grande confusão pelo Eterno entre eles, assim que um agarrará a mão do outro
levantando-se contra a mão do seu próximo” (14,13; cf. 12,4). Os habitantes de Judá se misturarão
na luta contra os saqueadores de Jerusalém para aí liberar compatriotas restantes (cf. 14,2). “E
também Judá combaterá (em - para) Jerusalém (14,14; cf. também 12,6-7). Já que agora os papeis
são trocados, os próprios saqueadores de Israel chegam a estar sem recursos (14,4).
Sonho universalista do futuro
Tão subitamente como tomou na mão a espada de juízo sobre os povos, Zakaryóh a embainha
(14,16). Deixa os povos participarem do futuro messiânico (veja também 2,15). Os sobreviventes
entre os povos vão reconhecer o Reinado de Deus, subindo anualmente à Jerusalém para aí, junto
com Israel, celebrar a festa dos tabernáculos. Porquê a festa dos tabernáculos? A sukóh, a cabana
de folhas, é o símbolo da presença de Deus protetora: “pois Ele me abrigará na Sua sukóh no dia da
desgraça, Ele me esconderá no esconderijo da Sua tenda; Ele me elevará numa rocha (Salmo 27,5).
A frase final das bênçãos depois do Shemá` de noite reza: “Que Ele estenda a sukóh da paz sobre
nós e sobre todo o povo de Israel” (cf. Bamberger, Sidur, p. 89s.). Para a festa das sukôt, o maior
número de peregrinos foi a Jerusalém. Como festa de agradecimento pela colheita e como instrução
para oração pela chuva (cf. 10,1.2), a festa dos tabernáculos é significativa para todos os povos. A
obrigação de morar em tempos determinados numa cabana de folhas vale para cada um. Nenhuma
festa promove tão fortemente a solidariedade das comunidades. Todas as diferenças de grau e
posição caiem na cabana de folhagem. Por isso, esta festa é de modo especial símbolo da
equivalência de todas as pessoas humanas. Os povos porém, que não quiserem servir com Israel e
os outros, não compartilharão na bênção da chuva e da boa colheita (14,17). Só para o Egito talvez,
neste caso, um castigo especial espera. É que este país está sendo regado pelo Nilo e, por isso,
menos dependente da chuva. O Egito aguarda o castigo que os povos apanham já no dia do juízo
(14,18).
Toda a vida será santificada. Os cavalos não mais transportarão soldados, mas carregarão
peregrinos nas suas costas, no caminho a Jerusalém. Nas sinetas dos seus arreios haverá as
mesmas palavras como no frontal do sumo sacerdote: “Santo ao Eterno” (14,20). Para os sacrifícios
de paz quase inumeráveis, precisar-se-á de todas as panelas e sertãs em Jerusalém e Judá. Todos os
vendedores de animais de sacrifício não mais aparecerão no templo, pois cada proprietário dum
animal dará este voluntariamente para o serviço de sacrifício.
Israel e os povos
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Tanta a interpretação desse magnífico capítulo no fim do livro de Zakaryóh. Fio vermelho através do
capítulo é a relação ambivalente entre Israel e os povos. “Um herói é aquele que sabe do inimigo
fazer um amigo”, diz o Talmude. Exatamente esse aspecto confere a esse capítulo final de Zakaryóh
o seu brilho heróico. Não é conto de vitória barato, nem antegosto do dia da vingança, mas aqui fala
amor sincero pela humanidade e a esperança de que o bom finalmente vencerá.
Em vista desse capítulo, quero agora dedicar breve contemplação à relação entre Israel e os povos
dentro da tradição rabínica.
Excomungado da comunidade do Eterno
O Tenak descreve o nascimento e a evolução ulterior do povo judaico. A história de Israel é como o
subir e descer dos anjos na escada no sonho de Jacó. Israel passou por uma história agitada e
alternante. Experiências ficaram de importância decisiva para o modo de como ele considerava a si
e os outros povos.
O Eterno embalou Israel na terra de Egito como um embrião no ventre da sua mãe (cf. o salmo
139,13). O nascimento do povo judaico era traumático. Os israelitas fugiram pela estreita senha
pelo mar dos juncos ao encontro à vida e liberdade. Além da liberdade, porém, a luta de se tornar
adulto se fez esperar. O Egito está gravado, na consciência coletiva, uma como nação sem
misericórdia, no qual as vidas de inúmeros trabalhadores forçados foram sacrificadas aos
monumentos de túmulo imensos. O Egito é a “casa de escravos” (bêt `abòdím); Ex 20,2), bastante
estranho, mas também “a horta do Eterno” (gan-hashêm; [kgan-JHVH] Gn 13,10). Reconhecemos a
atitude ambivalente referente ao Egito na mistura de respeito e aversão, com a qual Israel vai
contemplar o mundo exterior. Egito e Edôm (Esaú) - o último os rabinos identificam com Roma oprimiam e perseguiram Israel insensivelmente. Israel, apesar disso, não deve pagar pela mesma
moeda, pois, com isso, esse “povo de sacerdotes” cairia ao nível dos seus adversários.
Assim, a Toráh nos diz: “O edomita não detestes, pois ele é o teu irmão” (Dt 23,8). Jacó, quando
voltou de Labão, dirigiu-se a Esaú continuamente como “meu irmão”. E Israel sabe: “O Egípcio não
detestes, pois eras estrangeiro na terra dele” (também Dt 23,8). O povo judaico deve-se recordar
das crueldades do Egito, mas não deve pagar aos seus inimigos com a mesma moeda: “Da
experiência que estivemos, justamente primeiro, vítimas de intolerância, devemos aprender
tolerância. Do fato de que éramos, no Egito, entregados às práticas mais rudes e amorais, devemos
aprender comportamento moral” (J.M. Cohen, 1001 Questions and Answers on Pesach, Londres
1996, p. 12; cf. Lv 19,34).
E, apesar de todas as experiências más, a aversão contra Egito e Edôm ficou limitada. Em vista a
esses dois povos, a Toráh ensina: “Crianças que lhes forem nascidas, podem deles chegar, na
terceira geração, à reunião do Eterno” (Dt 23,9). Quando um egípcio ou um edomita chegar a Israel,
os seus netos podem casar com um homem ou mulher judaica, até aí, a primeira ou segunda
geração pode concluir matrimônio somente com outro prosélito.
Recusa radical
No deserto, o tempo, para assim dizer, da juventude de Israel começou. Numa crise de identidade, o
povo tinha saudades da matriz, das fontes d’água e panelas de carne do Egito. Como se vê, o povo
conservava, também, boas recordações da casa de escravos egípcia! Depois de que Ele liberara
Israel contra a vontade própria deste, o Eterno levou a Sua noiva recentemente adquirida ao Sinai
sob o baldaquim nupcial, onde lhe leu o contrato nupcial - a Toráh. Santificada ao Eterno, ligada a
Ele num casamento sem par, tornava-se cada vez mais adulta. Uma série de povos extremamente
hostis cruzava o seu caminho, como p. ex. os amalecitas, os amonitas, os moabitas e os sete povos
cananéios (Dt 7,1ss.). A aversão perante esses povos é mais radical do que perante o Egito e Edôm.
Para sempre, a Toráh delimita Israel de `amôn e moób: um amorita ou moabita não pode entrar na
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reunião do Eterno; também a sua décima geração não deve entrar na reunião do Eterno, para
sempre; porque não lhes cederam pão e água no caminho, quando saireis do Egito “(Dt 23,4-5).
Os egípcios eram, inicialmente, ainda bem intencionados com a grande família de Jacó. Ódio e
supressão aumentaram somente aos poucos. A aversão sentimental cresceu, para assim dizer, ao
mesmo tempo com a extensão de Israel. A dureza dos egípcios baseava-se no medo de estrangeiro
e automania (cf. Ex 1,10; Flavius Josephus, Antiquitates II,9). A dureza de coração de Amôn e de
Mo´ób está evidentemente, mais fundamental que aquela do Egito. A sua inimizade perante Israel
parece, já como no Amalêq (veja Tenachon, nº 8: “Konzepte” a Rachamim) sem ter motivo nenhum!
A inhospitalidade não era perdoável, porque emana duma indiferença quase natural, Quem não
estiver capaz de compaixão não se deve nunca contar com Israel.
Por isso, Israel não se devia misturar com os povos cananeus. Mesmo uma aliança com estes era
excluída (cf. Ex 34,11-16; Dt 7,1-6; 20,16-18; também Gn 24,3 e Esra 9,1). O israelita se devia
manter afastado dessas culturas, para que não pudesse ser infetado do modo de viver desumano e
despiedoso deles (veja Dt 20,18). O midrash desenha em contornos duros: “Cinco coisas Canaã
ordenou às suas crianças: Amai [somente] uns aos outros, amai o roubo, amai a impudicícia, odieis
os vossos donos e falai nunca a verdade” (veja bPeschim 113b).
A exclusão de Amalêq, Amôn, Mo´ób e dos povos cananeus é, aliás, só historicamente importante.
Não existem mais. Nenhum povo pode ser identificado com eles. A sua rejeição, então, também
certamente não é exemplo nenhum de atitude de Israel referente ao mundo exterior em geral.
Um dia, todos os povos subirão a Jerusalém, para, junto com Israel, festejar e louvar o
Eterno (cf. Is 2,3 e Zc 14,16).
O Eterno repreende Jonóh (Jonas), porque este se recusa a advertir os habitantes nãojudaicos de Nínive. Os 70 marinheiros que, ironicamente, aprenderam a temer o Eterno e lhe
ofereceram sacrifícios por causa dessa fuga, posam pela totalidade de todos os povos da
terra.
Todas as pessoas tementes de Deus são irmãos e irmãs.
Sara disse: “Quem teria dito: Sara amamenta crianças?” (Gn 21,7). Só Yitshóq (Isaac) estava
nascido nesta data. Sobre quais crianças, então, Sarah fala? São, segundo o midrash, todas
as crianças dos povos cujas mães eram convidadas na festa da circuncisão. As mamas de
Sara parecem ter bastante leite para amamentar todas as crianças abundantemente.
Também as crianças dos povos, Sara então as considera como as suas próprias crianças
(Pesikta Rabbati, Piska 43 e outros). O midrash aponta a um parentesco simbólico de todas
as pessoas humanas e povos, que querem venerar o criador do céu e da terra.
Cada vida conta
Israel é o povo escolhido e jóia de Deus, `am segulóh - o povo que é posse especial de Deus. Assim
como o dia da shabat [o sábado] está sendo posto à parte dos outros dias, assim Israel está posto à
parte dos povos para, como povo de sacerdotes, em santidade especial (cf. Dt 7,6). Apesar da fé
nessa recolha, os sábios sublinham o valor igual de todas as pessoas humanas. Todos os povos e
famílias descendem de um só pai: “Só um homem [só Adão] foi criado primeiro. Porquê então isso
assim? Por causa das diferentes famílias, para que não caiam em briga uma com outra
[asseverando que desceriam dum pai mais excelente que os outros]. E como já agora, sendo criado
somente um só pai da humanidade, guerreiam uns com os outros, quanto mais guerreariam uns
com os outros se aquele teria sido criado em dobro” (bSanhedrin 38a; cf. Mayer, Talmud, p. 83). A
mishnah ensina: “A cada um que estragar uma só alma de Israel, a Escritura o porá em conta como
se tivesse estragado um mundo inteiro. E a cada um que conservar uma única alma de Israel, a
Escritura o porá em conta como se tivesse conservado um mundo inteiro.” Isso soa muito
particularista, mesmo quando considerarmos que nisso se trata duma advertência a juízes judaicos,
os quais, dentro da própria comunidade, precisavam proferir sentença judicial num crime capital.
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Tanto mais extraordinário é que temos outros manuscritos que lêem: “Quem fizer se perder uma
pessoa humana [isso é israelita ou não-israelita], a ele a Escritura o atribui assim como se tivesse
destruído o mundo inteiro etc.” A equivalência de cada pessoas humana, sem consideração da sua
nacionalidade e fé está sendo garantida aqui. Uma tradição no midrash vai ainda um passo a frente:
“O Rabi Yohanan deu a conhecer como a sua própria opinião: Cada aflição, que Isael e os povos
compartilharem uns com os outros, é aflição [genuína]; mas cada aflição que [só] vier sobre Israel,
não será nenhuma [genuína] aflição [pois Israel nisso converter-se-á e orar, assim que a catástrofe
será evitada]” (veja DtR 2,22; há, aliás, outras variantes de texto). Abraão lutou com Deus para
salvar os habitantes ateus de Sedôm e `Amoróh da ruína (Gn 18,17-33). 70 touros é que Israel
sacrificou durante a festa das sukôt. Serviam para reconciliação das transgressões de todos os
povos no mundo (bSuka 55b). Rabi Yehôshua bem Levi doou aos inimigos de Israel a vantagem
plena, quando diz: “Tivessem os povos do mundo sabido como bom teria sido o santuário para eles,
teriam-no circundado com acampamentos de guerra para o guardar, em vez de o destruir. Eles
precisam mais dele do que Israel - Exatamente os povos que se demonstravam tão inimigos contra
a Toráh, precisam de reconciliação” (midrash Tahuma, Be-Midbar §3; cf. Bietenhard, Midrash
Tanhuma B, 2, 195s.).
Muitos sacerdotes do Santo, bendito seja Ele
A separação de Israel do círculo dos povos não é para ser vista absolutamente. Está sendo
direcionada somente ao fazer Israel tomar distancia de comportamento imoral. A escolha de Israel,
portanto, não indica, de modo nenhum, desprezo de outras culturas. É que todas as pessoas
humanas são criadas segundo a imagem de Deus. Também em outras culturas há revelação, e
outros povos têm os seus retos. A toda a humanidade, na história de salvação de Deus, está
atribuída uma tarefa. Inicialmente, Deus quis revelar a Toráh a todas as pessoas humanas. As
palavras de Gn 5.1 “Este livro é a história de nascimento de Adão” referem-se à Toráh como livro de
vida para a humanidade inteira (veja GnR 1,5). A Toráh foi revelada no deserto do Sinai, na terra de
ninguém, para que Israel não devia manter a Toráh somente para si: “Por isso, a Toráh foi dada no
deserto, comunitária e publicamente, na terra de ninguém. Se alguém [dos povos] a quiser aceitar,
venha e a aceite” (Mechilta de Rabi Yishmael, Yitra, ba-kodesh, § 1; ed. Horowitz/Rabin p. 205; A.
Wünsche, Mechilta, p. 193). Cada povo podia entender a palavra de Deus no Sinai na sua própria
língua: “Rabi Yohanán disse: O quê significa o versículo: ‘Deus deu a sua palavra, das mensageiras
[plural] boa mensagem era um exército grande’ (salmo 68,12)? [Isso significa:] Cada palavra, a qual
saiu da boca do Santo, bendito seja Ele, tem sido dividida em 70 línguas” (bShabat 88b).
Exatamente como Israel, os povos podem, através de amor e justiça, acelerar a vinda do messias:
“Os Teus sacerdotes vistam-se de justiça e os Teus piedosos jubilem!” (salmo 132,9). “Os Teus
sacerdotes - estes são os retos dos povos, pois são sacerdotes do Santo, bendito seja Ele, neste
mundo, assim com [o imperador amante das pessoas humana] Antônio e os seus amigos.” (Yalkut
Shimoni, Yesaia, 429).
Cada pessoa humana, a despeito de a qual povo pertencer, tem o poder de santificar a sua vida
com feitos retos. Num pronunciamento comovedor, o filósofo Maimônides dá a sua voz a esse ideal
judaico universalista: “Não deixes nascer a idéia em ti, como o dizem os’ tolos dos povos’ e muitos
judeus meio-intelectuais dizem, que Deus já antes do seu nascimento destinaria para ser bom ou
mal. A coisa não é assim, mas cada pessoa humana tem a possibilidade de tornar-se um piedoso
como o nosso professor Moisés ou de ser um malvado como Yòròbeóm; ser sábio ou tolo, matricial
ou cruel, avarento ou esbanjador. Igualmente está para as demais propriedades de caráter” (Mishne
Tora, Hilchot Teshuwa, 5.2; cf. Maimônides, Die Hichoth Teschubah. Die Hilchot Deoth, traduzido e
comentado por B. S. Yacobson, Zurique 1988, p. 29). Mesmo um não-judeu, o qual se ocupar do
estudo e da prática da Toráh, equivale ao sumo sacerdote em Israel (Rabi Meir em bKama 38a; cf.
Mayer, Talmud, p. 226).
Na margem da confrontação atual entre Judaísmo, Cristandade e Islame, o rabino americano, Irving
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Greenberg, perpassou a tendência universalista do Judaísmo até ao fim: “Sois as Minhas
testemunhas, diz a palavra do Eterno” (Is 43,10). O povo de Israel se compõe de servos de Deus;
são chamados e escolhidos para testemunharem do seu Deus amante e do plano divino deste com
a humanidade e do cosmo. Conforme o meu entendimento de língua, o conceito “povo de Israel”
remete, não só a israelis, nem exclusivamente a judeus, mas a todos que afirmam que Deus
concluiu aliança válida com Abraão e os descendentes deste, mas também a todos que se propõem
a tarefa de salvar o mundo, assim que a aliança possa ser cumprida; quer dizer que também os
cristãos e também os moslins serão reconhecidos como crianças de Abraão e Sara, quando se
purificarem do ódio referente aos judeus e da teologia de substituição” (lição de Irving Greenberg,
Opening the Covenant [abrindo a Aliança], debates e lições de OJEC 1, Amsterdã 1997, p. 11).
Escolha
A posição do povo judaico no meio dos outros povos obtém mais transparência, quando
contemplarmos essa posição à luz da escolha de Israel. Pois alguém poderia pôr a pergunta
justificada: Como pode o Eterno, como criador do céu e da terra e pai de todas as pessoas
humanas, escolher um povo determinado? Não se esconde por trás disso um problema? Sabemos
que a Agadá [o conto] é ambígua e rica em paradoxos, mas nenhum conceito é tão antagônico
como o de escolha - behiróh. Assim, esse assunto provocou então veementes discussões. Muitos
eruditos da Toráh lutavam com a idéia da predileção de Deus para Israel, já que esta não se
harmoniza com o tom de fundo universalista e penetrante, este que estamos acostumados de ouvir
na melodia do Judaísmo.
Como Deus pode fazer distinção entre os seus criados? Não é que disse: “Não Me sois como os
filhos dos etíopes, vós filhos de Israel, diz o Eterno? Não é que fiz subir Israel da terra de Egito e os
filisteus de Kaftor e Aróm de Qir?” (Amos 9,7). E, apesar disso, os rabinos mantêm a idéia da
escolha do povo judaico. Não há, para eles, contradição àquilo que `Amôs (Amos) diz. A
equivalência não está sendo discutida de modo nenhum. Israel não se põe em frente dos outros. Ao
contrário, exatamente porque Israel está cônscio da própria futilidade e impotência, o Eterno
escolheu esse povo. Rashi dá (a seguir ao midrash) uma interpretação acertada a Dt 7,7: “’ Não
porque seríeis mais numerosos [maiores] como todos os povos, o Eterno Se inclinou para vós e vos
escolheu - é que sois o mais insignificante entre todos os povos.’ ‘Não porque seríeis mais
numerosos’ [com isso quer dizer:] porque não vos levanteis a vós mesmos quando vos dou o bom
em abundância. Por isso, a Toráh diz que ‘o Eterno vos desejou …, pois sois o menor’ - vós que vos
fazeis menores, assim como Abraão, este que disse: ‘Porque sou poeira e cinza’ (Gn 28,27), e assim
como Moshé (Moisés) e Aharôn (Aarão), que disseram: ‘Mas quem somos nós?’ (Ex 16,7); e não
como Nebukadnetsar, este que disse: “Igualar-me-ei ao Altíssimo’ (Is 14,14) etc.” (veja Rashi a Dt
7.,7 e bHullin 89a).
A escolha de Israel não é privilégio; é condicionada e ligada a um encargo (cf. Ex 19,5). Quando
Israel falhar, isso lhe renderá desvantagens: Somente vós é que reconheci de todas as estirpes da
terra; por isso, responsabilizar-vos-ei por todos os vossos pecados (Amos 3,2).
O poeta-filósofo medieval Yehuda Há-Levi compara a colocação de Israel no meio dos povos com o
coração como o eixo da vida: Israel está entre os povos como o coração entre os membros, é o mais
doentio de todos e, ao mesmo tempo, o mais sadio … Não te estranhes quando se diz: ‘as nossas
doenças Ele carrega’ (Is 53,4). Pois, durante de que nós estamos em pena, o mundo se encontra em
calma; os sofrimentos que nos encontram, contribuem para firmar a nossa Toráh [doutrina], para
nos purificar e para eliminar as escórias de nós. Pela nossa lealdade e promoção, o espírito divino
pega no mundo.” Yehuda Há-Levi explica como Isael sente primeiro a dor do mundo arruinado, no
qual vivemos, enquanto o restante do povos continua vivendo despreocupado. Como o servo
sofrendo em Yesha`yóhu carrega as doenças da comunidade, assim Israel sofre da imperfeição da
criação. Nisso, Israel se semelha ao coração, este que sofre primeiro emitindo sinais, quando outros
órgãos no corpo não funcionarem bem. Ao mesmo tempo, Israel permanece o “motor” do mundo.
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Como o coração, o qual mantém todo o corpo vivendo, Israel liga o Espírito de Deus com a criação,
assim que esta continua existindo (cf. Yehuda há-Levi, Sêfer Al Kusari, II, 36ss.).
A lição da escolha não faz parte dum “povo de donos” a qual outros têm de servir, mas, ao contrário
a isso, a doutrina dum povo que está destinado a servir aos outros (L. Jacobs, A Jewish Theology
[Uma Teologia Judaica], p. 272). Israel está escolhido, não tanto por causa de si mesmo, mas sim
por causa da humanidade. O particularismo judaico precisa ser visto no quadro do universalismo
judaico. Como nenhum outro, o profeta Yesha`yóhu compreendeu isso, dizendo dos escolhidos: “Eu,
o Eterno, chamei-te em justiça e te pego na mão, guardando-te e te fazendo a aliança do povo, a luz
das nações, para abrir olhos cegos, eduzir presos do cárcere e da prisão, os que estão sentados no
escuro” (Is 42,6-8).
Tradução: Pedro von Werden SJ. Texto alemão
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