universidade do oeste de santa catarina
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UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA UNOESC CAMPUS DE XANXERÊ CARLA CHIAVINI “OS FANTASMAS DO MOINHO ABANDONADO”: Ilustração e design editorial para o público infanto-juvenil. Xanxerê 2010 1 CARLA CHIAVINI “OS FANTASMAS DO MOINHO ABANDONADO”: Ilustração, design gráfico e editorial para o público infanto-juvenil. Monografia de conclusão de Curso, apresentada ao Curso de Design, como quesito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Design pela Universidade do Oeste de Santa Catarina Unoesc Campus de Xanxerê. Orientador: Prof. Esp. Carlos Davi Matiuzzi da Silva Xanxerê 2010 2 CARLA CHIAVINI “OS FANTASMAS DO MOINHO ABANDONADO”: Ilustração, design gráfico e editorial para o público infanto-juvenil. Monografia de conclusão de Curso, apresentada ao Curso de Design, como quesito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Design pela Universidade do Oeste de Santa Catarina - Unoesc Campus de Xanxerê. Aprovada em BANCA EXAMINADORA Prof. Esp. Aleteonir Jose Tomasoni Junior Universidade do Oeste de Santa Catarina Prof. Esp. Carlos Davi Matiuzzi da Silva Universidade do Oeste de Santa Catarina Profa. Esp. Karina Tissiani Universidade do Oeste de Santa Catarina 3 AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a minha mãe pelo apoio em todos os momentos da minha vida, sendo sempre meu suporte e exemplo de amor e compreensão. As minhas irmãs pelo carinho, cuidado e credibilidade que sempre demonstraram e me ofereceram. Os amigos de todas as horas que esperam ansiosos pela formatura. Aos colegas de curso e professores pelos anos de dedicação, persistência e pelas palavras de amizade e descontração. Ao Professor Carlos Davi Mattiuzi, por fazer possível a realização deste projeto. 4 “Uma pessoa para compreender tem de se transformar.” Le Petit Prince - Saint Exupery 5 RESUMO O presente projeto trata do desenvolvimento do design editorial e a criação das ilustrações para compor um livro referente a história “Os Fantasmas do Moinho Abandonado”, da escritora chapecoense Anair Weirich, história escrita em meados de 2002 que até então se encontrava em arquivo pessoal da escritora sem nenhum planejamento visual e diagramação pertinente a ser impresso e comercializado. Através da elaboração do projeto gráfico do livro pretende-se valorizar e tornar mais atrativa a leitura entre jovens, priorizando a cultura local e aproximando a história de seu público alvo, o infanto-juvenil. Para isso foram utilizadas duas metodologias, a de Volnei Antônio Matté que é direcionada ao produto gráfico industrial e a de Guto Lins, específica para o desenvolvimento de livros infanto-juvenis. Durante a pesquisa constataram-se necessidades específicas a serem supridas e desenvolvidas, com base na conceituação gerada como principio essencial na construção da unidade visual do livro, chegando a um resultado final satisfatório e condizente com as expectativas tornando-se um produto de consumo e atuando diretamente no processo de conhecimento e informação. Palavras chave: Design Editorial. Infanto-Juvenil. Ilustração. 6 ABSTRACT The present Project is about the editorial design development and the creation of the illustrations to compose a book that refers to the story “Os Fantasmas do Moinho Abandonado”, written by Anair Weirich. This story was written around 2002 and till then was archived in the author‟s personal library without intentions to be printed, published and commercialized. Through the graphic process and the book elaboration, the project intends to valorize and to make the reading more attractive for the younger public, having as priority, the local culture and approaching the history with the target public, the young readers. For this, two methodologies were used, the Volnei Antonio Matte, that focuses in the industrial graphic products and the Guto Lins methodology, specific for the young-teens books. During the research specific needs to be done and developed were observed, based in the concept created as an essential principle the visual unity construction of the book, resulting in a satisfactory final result. According with the expectation that was created becoming a commercialized product and working directly in the knowledge process and information. Key-worlds: Editorial Design. Young Readers. Illustration. 7 LISTA DE ILUSTRAÇÕES Esquema 01: Proporção Áurea .................................................................................20 Esquema 02: Diagramas ...........................................................................................24 Esquema 03: Alinhamento Justificado ......................................................................25 Esquema 04: Contraste alinhado/aleatório ...............................................................27 Quadro 01: Contraste de Layout................................................................................28 Esquema 05: Estrututra de Caráteres........................................................................30 Esquema 06: Estilo Romano Antigo...........................................................................31 Esquema 07: Estilo Romano Moderno.......................................................................31 Esquema 08: Estilo Egípcio........................................................................................31 Esquema 09: Estilo Lapidário.....................................................................................32 Esquema 10: Estilo Cursivo ......................................................................................32 Esquema 11: Técnicas de Nanquim...........................................................................36 Quadro 02: Fases da Metodologia de Matté..............................................................39 Quadro 03: Complexidades de Produtos Gráficos Impressos...................................40 Fotografia 01: Capa O Pequeno Príncipe..................................................................44 Fotografia 02: Páginas 42 e 45 O Pequeno Príncipe ................................................45 Fotografia 03: Páginas 14 e 15 O Pequeno Príncipe.................................................46 Fotografia 04: Páginas 36 e 37 O Pequeno Príncipe.................................................47 Fotografia 05: Capa O Menino do Dedo Verde..........................................................48 Fotografia 06: Páginas 6 e 7 O Menino do Dedo Verde............................................49 Fotografia 07: Páginas 4 e 5 O Menino do Dedo Verde............................................50 Esquema 12: Páginas 46 e 47 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas............52 Esquema 13: Páginas 6 e 7 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas................53 Esquema 14: Páginas 35 e 36 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas............53 Esquema 15: Páginas 8 e 9 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas................54 Esquema 16: Páginas 13 e 14 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas............54 Esquema 17: Páginas 38 e 39 do Livro Variações entre Silêncios e Cordas............55 Fotografia 08: Capa Robin Hood................................................................................56 Fotografia 09: Lombada Robin Hood.........................................................................56 Fotografia 10: Páginas Internas Robin Hood.............................................................58 Fotografia 11: Páginas Internas Robin Hood.............................................................58 Quadro 04: Formatos de Papel..................................................................................62 8 Quadro 05: Tabela de Formatos................................................................................63 Esquema 18: Alceamento de Papel...........................................................................65 Desenho 01: Grampo à cavalo ..................................................................................66 Esquema 19: Impressão Offset .................................................................................67 Quadro 06: Painel Imagético .....................................................................................69 Quadro 07: Painel Semântico.....................................................................................70 Esquema 20: Geração de Alternativa 01....................................................................73 Esquema 21: Geração de Alternativa 02....................................................................74 Esquema 22: Geração de Alternativa 03....................................................................75 Esquema 23: Geração de Alternativa 04....................................................................76 Esquema 24: Geração de Alternativa 05....................................................................77 Esquema 25: Geração de Alternativa 06....................................................................78 Esquema 26: Geração de Alternativa 07....................................................................79 Esquema 27: Geração de Alternativa 08....................................................................80 Esquema 28: Geração de Alternativa 09....................................................................81 Esquema 29: Geração de Alternativa 10....................................................................82 Desenho 02: Ilustração Nanquim ..............................................................................83 Desenho 03: Teste de Capa 01..................................................................................84 Desenho 04: Teste de Capa 02..................................................................................85 Esquema 30: Estrutura modular padrão de página....................................................87 Desenho 05: Capa Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado ............................88 Desenho 06: Falsa Guarda Fantasmas do Moinho Abandonado..............................89 Desenho 07: Biografia Autora ...................................................................................90 Desenho 08: Páginas 13-14 Os Fantasmas do Moinho Abandonado.......................91 Esquema 31: Família Tipográfica Chiller ..................................................................92 Esquema 32: Família Tipográfica Candara................................................................92 Desenho 09: Páginas 15-16 Os Fantasmas do Moinho Abandonado.......................93 Desenho 10: Páginas 19-20 Os Fantasmas do Moinho Abandonado ......................94 Quadro 08: Orçamento Arcus ....................................................................................96 Esquema 33: Controle de Produção . .......................................................................97 9 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................11 1.1 TEMA...................................................................................................................11 1.2 PROBLEMA.........................................................................................................11 1.3 OBJETIVO GERAL..............................................................................................12 1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS ...............................................................................12 1.5 JUSTIFICATIVA ..................................................................................................12 1.6 METODOLOGIA DE PESQUISA E DE DESIGN.................................................13 1.7 ESTRUTURA DO TRABALHO............................................................................14 2 BASES DO CONHECIMENTO ..............................................................................16 2.1. DESIGN GRÁFICO ............................................................................................16 2.1.1 Design Editorial...............................................................................................17 2.1.2 Organização da Página ..................................................................................19 2.1.2.1 Margens ........................................................................................................ 21 2.1.2.2 Diagramas ..................................................................................................... 22 2.1.2.3 Alinhamento .................................................................................................. 25 2.1.2.4 Contraste ....................................................................................................... 26 2.1.2.5 Tipografias..................................................................................................... 29 2.1.2.6 Ilustração ....................................................................................................... 34 3 PROJETO GRÁFICO ............................................................................................. 38 3.1 METODOLOGIA DO PROJETO DE DESIGN ..................................................... 38 3.1.1 Problematização ............................................................................................. 41 3.1.1.1. Programa Projetual e Contrato ..................................................................... 41 3.2.2 Compreensão do Projeto ............................................................................... 42 3.2.2.1 Pesquisa Diacrônica e Análise dos Elementos Gráficos ............................... 43 3.2.2.2 Pesquisa Sincrônica e Análise Elementos Gráficos ...................................... 51 3.2.2.3 Aspectos Mercadológicos.............................................................................. 59 3.2.2.4 Análise de Estruturas Materiais e Processos Produtivos .............................. 60 3.2.2.4.1 O Papel ...................................................................................................... 60 3.2.2.4.2 Montagem e Acabamento .......................................................................... 64 3.2.2.4.3 Impressão................................................................................................... 66 3.2.3 Configuração do Projeto................................................................................ 68 10 3.2.3.1 Lista de Requisitos e Hierarquia de Fatores Projetuais ................................. 69 3.2.3.2 Redefinição do Problema .............................................................................. 71 3.2.3.3 Modelação Inicial ........................................................................................... 72 4 RESULTADO DO PROJETO................................................................................. 86 4.1 MODELAÇÃO FINAL E PLANEJAMENTO GRÁFICO VISUAL ..........................86 4.1.1 Supervisão ......................................................................................................95 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................99 REFERENCIAL TEÓRICO ......................................................................................100 APÊNDICE...............................................................................................................102 ANEXO A.................................................................................................................104 ANEXO B.................................................................................................................114 11 1 INTRODUÇÃO Visando compreender a relação entre as possibilidades geradas através de um projeto gráfico e editorial de livros infanto-juvenis e a relação entre ilustrações e o leitor, considera-se indispensável o estudo do histórico do design gráfico bem como suas especificidades na elaboração de projetos editoriais, pretendendo estreitar laços entre momento em que ambos se encontram e passam a ser desenvolvidos especificamente para o leitor infantil, com características específicas que vão se modificando dentro de cada parte da elaboração da parte gráfica do livro. O estudo dessas modificações, relacionado principalmente aos acontecimentos sociais, econômicos e tecnológicos pelos quais a sociedade tem passado nos permitem melhor entender o valor atribuído ao livro na infância, tanto no passado, quanto no presente. Estas intervenções mencionadas, definem-se especialmente a forma da publicação impressa, criando um elo entre leitor e objeto de leitura e gerando um processo de imersão no conteúdo apresentado de forma interligada entre textos e ilustrações. Ainda descrevendo as funcionalidades do design gráfico é possível agregar conceitos através da escolha dos tipos adequados, situação e posição das imagens, aumentando a legibilidade, expressando através de recursos gráficos toda a ludicidade apresentada pelo leitor no seu texto. 1.1 TEMA Projeto gráfico editorial e ilustrações do livro de suspense infanto-juvenil “OS FANTASMAS DO MOINHO ABANDONADO”. 1.2 PROBLEMA 12 Quais ferramentas do design gráfico podem interferir no discurso visual do projeto editorial de um livro para o público infanto-juvenil? 1.3. OBJETIVO GERAL Interpretar a história “Os Fantasmas do Moinho Abandonado” e transformar a linguagem escrita em ilustrações, para desenvolver um livro infanto-juvenil com visual atraente a partir da criação de um bom projeto gráfico que atenda todas as necessidades do leitor. 1.4 OBJETIVOS ESPECÍFICOS a) Pesquisar as influências e contribuições das ilustrações e os principais autores e referentes à temática dos livros de literatura infanto – juvenil no auxílio da formação de jovens leitores. b) Pesquisar tipografias e diagramações coerentes ao público e tema; c) Conhecer os diversos tipos de técnicas e estilos de ilustração editorial; d) Estudar os conceitos de editoriais (grid, composição e diagramação) e aplicalos no projeto gráfico do livro. e) Desenvolver ilustrações que interajam com a história tornando-a mais atrativa. f) Desenvolver o projeto gráfico editorial do livro. 1.7 JUSTIFICATIVA Através da elaboração do projeto gráfico do livro pretende-se valorizar e tornar mais atrativa a leitura entre jovens. Hoje, devido a internet e outras ferramentas foi se perdendo o interesse deste público sobre livros impressos, assim como a busca de conhecimento e pesquisa através de editoriais. A literatura foi 13 deixada de lado e este projeto permite a ação do design gráfico e editorial no resgate desses leitores e na busca de reinventar a maneira de como se lê. Possibilitar o acesso do conteúdo literário a partir de formação de identidades e conceitos gerados na aplicação de ferramentas e de estudos relacionados a diagramação, ergonomia e ilustrações etc. Tornando a obra apta a comercialização e ao interesse do público. A escolha da história se deu ao primeiro contato com seu enredo, sendo totalmente atrativo por se tratar de um fato histórico da cidade de Chapecó-SC, muito conhecida pelos antigos, mas não mais mencionada para o público o qual o livro se destina. Isso garante a existência de uma lenda durante muito anos ainda, sendo contada de geração à geração, ano após ano, instigando a fantasia que nunca deve morrer em uma pessoa, seja ela criança ou adulta. O mundo deste inicío de milênio está sofrendo uma diminuição do número de leitores. A Espanha, por exemplo, anunciou em 2001 uma queda de 50% em consumidores de livro. Se no primeiro mundo o produto livro tem sentido o golpe, imagine em um país como o Brasil, no qual o livro ainda é, infelizmente, um produto de elite. (LINS, 2004, p. 42). O fato de um conteúdo tão bem expressado através de um texto elaborado por uma escritora conhecida na cidade, estar em uma gaveta devido a falta de apoio e verba, destinadas a concepção de um livro impresso com bom acabamento e projeto gráfico de qualidade, gera indagações profundas quanto a valorização histórica e cultural no meio em que vivemos. Um livro além de item básico no processo de formação de cidadãos leitores e consequentemente acessíveis a informações é item de consumo quando bem desenvolvido diante ferramentas e caráter visual atraente. 1.6 METODOLOGIA DE PESQUISA E DE DESIGN 14 A elaboração do projeto de pesquisa consiste na abordagem do problema, sendo qualitativa a partir do estudo do processo, com objetivos exploratórios e descritivos. Conforme afirma Gil (1991), o sistema da pesquisa irá gerar processos de aplicação derivada da natureza que abrange. “Não há, evidentemente, regra fixas acerca da elaboração de um projeto. Sua estrutura é determinada pelo tipo de problema a ser pesquisado e também pelo estilo de seus autores. É necessário que o projeto esclareça como se processará a pesquisa, quais etapas que serão desenvolvidas e quais os recursos que devem ser alocadas para atingir seus objetivos” GIL (1991, p. 22). A metodologia de design será baseada na metodologia de Volnei Antônio Matté, que consiste em oito etapas no processo de desenvolvimento de publicação impressa e editorial. Juntamente com a metodologia de Guto Lins pela ênfase dada a produção especializada de livros infantis como um trabalho de intensa ligação com o design para um resultado satisfatório e que atende as regras técnicas pedagógicas, visuais, emocionais e psicológicas. 1.7 ESTRUTURA DO TRABALHO Este projeto é dividido e segmentado, visando simplificar ao leitor, todos os processos que o consistem, do que se tratam e qual a importância de cada um deles para o desenvolvimento e aplicação do tema aqui proposto. Capítulo 1 – Introdução: Aborda a introdução do assunto tratado no projeto, antecedendo os objetivos gerais e específicos que se idealizam com o projeto, a temática, e discussões geradas a partir da proposta e meios possíveis para se alcançar os resultados. Define-se a razão e justificativa do projeto, e a importância de ser resolvido o problema posposto. 15 Capítulo 2 - Bases do Conhecimento: Os temas relacionados são descritos um a um de forma detalhada, auxiliando no momento da produção por ser a base e referência para todo o projeto. Capítulo 3- Desenvolvimento do Projeto de Design: Trata da metodologia utilizada para o desenvolvimento do projeto, organizando passo a passo a que será executado no decorrer das atividades, mostrando informações e estruturas necessárias ao projeto. Capítulo 4 - Resultado do Projeto: Mostra a alternativa gerada e seu resultado aplicado após testes e análises. Capítulo 5 - Considerações Finais: Trata-se do que se concluiu com o desenvolver de todas as etapas e o produto editorial final. 16 2 BASES DO CONHECIMENTO 2.1 DESIGN GRÁFICO O design gráfico consiste entre tantas coisas, em uma atividade projetual onde busca através da utilização de ferramentas, informar, identificar, sinalizar, organizar, estimular e persuadir. A profissão é baseada em uma série de técnicas e conceitos reunidos em um processo criativo com finalidade em uma comunicação visual. De acordo com Hollis (2000) esse processo seleciona e organiza elementos visuais destinados a comunicar mensagens específicas a determinados grupos, transmitindo uma determinada informação por meio de composições gráficas, que chegam ao público destinatário através de variados suportes. Baseada numa cultura visual, social e psicológica o designer gráfico tem como principal habilidade aliar sua capacidade técnica à crítica e ao conceitual, se tornando um condutor criativo comunicacional. O design gráfico então “é a arte de criar ou escolher tais marcas, combinando-as numa superfície qualquer para transmitir uma idéia”. (HOLLIS, 2000, p.1). Ao longo de sua história Hollis (2000) afirma que o design gráfico evoluiu muito e se difundiu no mundo fazendo parte, atualmente da cultura e da economia de países industrializados. Estabelece-se a partir de uma crise na Revolução Industrial no séc. XVIII, gerada pelo capitalismo e os questionamentos que rondavam a arte e todo o movimento artístico x sociedade da época. Adquiriu um conhecimento próprio e evidência nos últimos anos se fundindo com outras áreas, se tornou profissão no século XX, quando designers foram finalmente diferenciados de artistas plásticos pela maneira de projetar levando em consideração a produção mecânica. A mensagem do designer atende às necessidades do cliente que está pagando por ela. Embora sua forma possa ser determinada ou modificada pelas preferências estéticas do designer, a mensagem precisa ser colocada numa linguagem que o público-alvo reconheça e entenda. (MUNARI, 1997, p. 69) 17 Pode-se então considerar o design gráfico um meio não apenas estético, mas também informativo, onde desde meados do séc. XIX após o surgimento de novas tecnologias é considerado uma “[...] manipulação e colagem de materiais existentes” (LUPTON, 1996 apud GRUNSZYNSKI, 2000, p.18). O ato de projetar com a finalidade de persuadir seguindo uma determinada metodologia pré - estabelecida de sua função. Sendo assim, um projeto de design gráfico é fusão de elementos organizados em um suporte bidimensional ordenando elementos solicitados. Esse processo desencadeia várias outras atividades: ilustração, a criação e organização tipográfica, a diagramação, a fotografia etc. 2.1.1 Design Editorial A partir do design gráfico pode-se extrair segmentos específicos onde se desenvolvem atividades direcionadas a um objetivo. Em um projeto onde se organiza e estrutura textos e elementos visuais, transformando-os em conteúdo conciso, para transmitir uma história ou informação a um determinado público, denominamos design editorial. Partindo da utilização de um projeto gráfico e de editoração, se possibilita apresentar uma série de materiais, dando personalidade e ordem, conduzindo o leitor, proporcionando acessibilidade ao enredo e permitindo assim que ele seja interpretado como um conjunto. Design Editorial ou Paginação, mais conhecidos como Diagramação, ou ainda Editoração são um dos nomes pelo qual é conhecida a atividade profissional onde o papel principal é distribuição dos elementos gráficos no espaço limitado da página impressa de publicações em geral, como livros, jornais e revistas. (FAGGIANI, 2006, p. 89). A origem desse processo se deve a necessidade do homem de se comunicar, desde os primeiros desenhos em cavernas até o surgimento da escrita organizada em signos na Mesopotâmia e a invenção do alfabeto mil anos antes de Cristo pelos 18 fenícios. Com o desenvolvimento esses signos se multiplicaram ganhando amplitude e transformando em literatura. Diversas culturas aplicaram a escrita em superfícies, assim como os egípcios em seus rolos de papiros sendo os percussores do que se conhece hoje como livro. Na China várias técnicas foram adotadas desde 175 d.C. criando processos de impressão que antecederiam o processo mecânico de Johannes Gutenberg, cuja maneira de criação e produção contemporânea foi nela baseada e revolucionada. Johannes Gutenberg (séc. XV) desenvolveu um sistema através do qual caracteres em metal – armazenados em caixas de madeira com vários compartimentos – eram montados manualmente em blocos de texto. A tinta era então, espalhada na superfície das letras para ser transferida para o papel com o auxílio de uma prensa. (GRUNSZYNSKI, 2006, p.26). Neste processo se possibilitou o acesso irrestrito aos textos escritos, pela possibilidade de reprodução multiplicada de cópias e reedições, acabando assim com o poder absoluto da Igreja, desde a Idade Média, sobre o ensino e conhecimento, potencializou a formação de pensadores, gerou uma troca de idéias e mudança cultural. “Ao mesmo tempo, a revolução da imprensa determinou a concentração na comunicação visual, em oposição aos sistemas orais de épocas anteriores [...]” (JAHN, 2001, p. 45). Isso consolidou e enfatizou o ofício de um designer editorial, como essencial nesse sistema de trânsito entre receptor e a leitura, transformando-o também em um produto de consumo massivo. Segundo Horie e Pereira (2005) existe uma constante procura em prender o leitor visualmente, conduzindo-o a leitura de maneira atraente, utilizando diversas ferramentas e técnicas, conduzindo uma inovação constante de métodos e apresentações dos materiais. Os elementos que consistem o processo de editoração são essenciais para um resultado satisfatório de um projeto, são eles: margens, diagramas, alinhamentos, contrastes, tipografias, ilustrações entre outros. Tais itens são potencializados e facilitados com o auxílio de programas desenvolvidos especificamente para diagramação e projeção editorial. 19 2.1.2 Organização da Página de Livros Existem variadas formas de publicações impressas, em diferentes formatos, suportes e cores, onde se apresenta os mais variados estilos de assuntos e temáticas. As mais importantes a citar são os livros, jornais e as revistas. “Livro é a preservação de fatos de qualquer natureza, através da comunicação gráfica impressa, independente de formato, cor ou assunto.” (COLLARO, 2000, p. 136). No que diz respeito a livros, existem vários fatores a serem avaliados e desenvolvidos para um bom design da página. O layout deve ser constituído por uma série de itens funcionais e organizacionais de posicionamento dos elementos e disposição de hierarquias visuais. Para entender o processo, precisa-se primeiramente entender qual a real função de um projeto gráfico e quais os princípios de cada ferramenta, visando conhecer e interpretar a essência da publicação impressa e compreendendo-a perante cada etapa necessária para seu desenvolvimento. A organização da página delimita-se antes de tudo pelo seu próprio formato, suas dimensões básicas e uniformes. Entretanto, a partir desse formato (elemento construtivo primordial) o diagramador pode, segundo a natureza do texto, optar por construções de página simétricas (mais comuns) ou assimétricas. Em ambos os casos, porém, a diagramação resultará boa ou má unicamente em virtude da habilidade de manipulação dos espaços brancos e de se alcançar, no geral, determinado equilíbrio entre os elementos que devem conformar a página. (ARAÚJO, 1986, p. 418). A proporção áurea é um dos fatores que contribuem para uma diagramação equilibrada, ela consiste em uma técnica de construção utilizada no design e na arquitetura existente desde a Idade Média e possui esse nome por se basear no valor de três, o que sugere a Santíssima Trindade como especifica Araújo (1986), resolve todas as divisões, superfícies e progressões por múltiplos de três de maneira constante sem contradição, como mostra o esquema 01. 20 Esquema 01: Proporção áurea Fonte: A autora Entretanto para Lupton (2006) a lei áurea possui propriedades surpreendentes, como demonstra o exemplo de um quadrado que retirado de um retângulo áureo, a forma restante deste será um novo retângulo áureo, este processo pode ser infinitamente repetido para criar um espiral. Alguns designers gráficos ficam fascinados com a seção áurea e usam-na para criar vários diagramas e formatos de página. De fato, livros inteiros foram dedicados a esse assunto. Outros designers acreditam que a seção áurea é tão válida quanto outros métodos utilizados para derivar formatos e proporções – tais como partir de tamanhos industriais padronizados de papel, dividir superfícies em metades ou quadrados, ou simplesmente pegar formatos de páginas com números internos e fazer divisões lógicas dentro deles. (LUPTON, 2006, p.138) Segundo Collaro (2000) existem leis compositivas que dinamizam o aspecto de uma página por sua funcionabilidade e estética a partir de regras gerais. O ritmo de um layout é definido como sendo uma sucessão harmoniosa, levando em conta o jogo de valores necessários e a compreensão dos mesmos, sugerindo ao leitor 21 destaques sutis nas mensagens contidas no projeto. A leitura é determinada pela velocidade do movimento ocular, que geralmente são bruços e intermitentes, cada pausa dura em média 250 milionésimos de segundo e aí gera a percepção do impresso. Tanto nas composições simétricas quanto nas assimétricas os elementos construtivos são os mesmos (pontos, linhas e massas dispostos em um dado formato), e suas perfeita realização independe de subordiná-las a esquemas geométricos. Estes, na verdade, são úteis, indispensáveis mesmo, porem como veículos para se atingir o máximo de legibilidade, o que, na construção da página, repousa basicamente no modo como se organizam a proporção e a comunicação das massas para daí resultarem determinada unidade, ou relação recíproca de medidas e formas, e um ritmo bem definido no espaço bidimensional onde se „movem‟ todos os componentes do grafismo. E, aqui entram a sensibilidade, o estilo e a competência de cada um. (ARAÚJO, 1986, p. 425) A observação e assimilação do objeto, quando bem posicionado e ordenado é imediatamente feita pelo leitor, garantindo coerência total nas informações por ele receptadas de uma maneira equilibrada e agradável. 2.1.2.1 Margens A busca constante pela harmonia de um layout e o ritmo de leitura de um corpo de texto, fez com que se criassem técnicas de disposição dos elementos que pertencem a uma página de maneira diversificada, como aplicar espaços em branco e imagens sangrando à mancha impressa até chegar na área de corte, tudo compondo um equilíbrio eficaz. As margens enquadram e realçam a mancha, tal como a moldura realça ao máximo um quadro. Tanto as margens quanto a moldura se submetem às leis de proporção. As margens de uma página orientam os olhos na focalização da mancha. Com efeito, nossos olhos estão acostumados a certas convenções, e qualquer desvio acentuado significa uma interrupção no fluxo da leitura. (ARAÚJO, 1986, p.424) 22 Ainda segundo Araújo (1986) a área do grafismo deve ser compensada por respiros, estes, são formados pelos brancos presentes na união das páginas em dobras de livro, nas margens superiores, inferiores, entre o corte da página e a área do grafismo etc. Algumas regras, a muito tempo aplicadas, são básicas e extremamente necessárias para uma boa organização e construção visual e ergonomia para o leitor. São elas: Deve haver mais margem ao pé da página que no alto, pois de outro modo a mancha parece estar caindo página abaixo. As margens internas devem ser menores que as externas, pois uma dupla página de texto aberta afeta os olhos como uma unidade, não como duas páginas independentes entre si. Deve-se deixar espaço suficiente nas margens externas para fácil manuseio do leitor, particularmente no momento em que as últimas linhas da página estejam sendo lidas. Boas margens são uma ajuda para a legibilidade e, afora as considerações acima, as medidas amplas das margens laterais, superior e inferior, permitem subseqüente guilhotinamento e encadernação sem dano para a mancha. (ARAÚJO, 1986, p. 425). Esses fatores quando aplicados de maneira correta, potencializam a usabilidade do receptor, tornando o ato de ler uma atividade atrativa e nada cansativa, possibilitando assim, o conforto e descanso visual e receptividade total as informações contidas no projeto pelo público. 2.1.2.2 Diagramas O diagrama sem dúvida é um item de grande importância na composição de uma página esteticamente agradável e funcional. “Os diagramas dividem o espaço ou o tempo em unidades regulares. Eles podem ser simples ou complexos, específicos ou genéricos, rigidamente definidos ou livremente interpretados.” (LUPTON, 2006, p. 113). A elaboração de um diagrama garante a expansão das possibilidades a serem desenvolvidas pelo designer, fugindo do estático e rígido e ampliando a criatividade. Para isso se dinamizam formas e medidas, caracterizando e dando a forma ao projeto. 23 Nesses esquemas de organização de página determinam-se, de fato, não só a proporção da mancha como a própria normalização visual do conjunto de páginas que compõem o livro, imprimindo a este um tratamento coerente mesmo quando se trata de construção assimétrica – por exemplo, a existência de fotos sangradas que extrapolaram o limite da mancha até a margem do corte da folha, a disposição do corpo de texto em linhas compridas ou em um número determinado de colunas, a previsão das áreas de contragrafismo e assim por diante. (ARAÚJO, 1986, p. 426). Ainda segundo Araújo (1986), o diagrama é vital para uma boa construção de página, e pode ser organizadas no número de colunas desejado proporcionando infinitas opções construtivas, formando assim uma unidade confortável para a leitura, mesmo que em cada página existam formas diversificadas. Conforme afirma Lupton (2006), diagramas serviam como molduras para um texto sólido e justificado em blocos, representavam o formato mais comum de livros no séc. XII. Já no séc. XIX surgiram as páginas onde se desenvolviam diagramas mais livres e modernos tornando-a mais sistemática e extraindo a proteção rígida da moldura, além de combinar diversos estilos de tipos e várias colunas, permitindo as linhas do texto cruzarem as da página. Após a II Guerra Mundial surgiu o termo grid, quando designers suíços inventaram uma metodologia de diagrama racionalista, dividindo a página em várias colunas, colando imagens, produzindo formas de proporções incomuns e a partir da matriz poderiam ser modulados de várias formas na mesma publicação. Segundo Collaro (2000) o diagrama mais comum e simples (geralmente utilizado em revistas) é constituído de três colunas e proporciona um visual trivial mas eficiente pois enquadra o texto em uma largura quase que perfeita em termos de legibilidade (formato revista 21 x 28 cm). O que possui quatro colunas comporta volume menor de texto por linha, porém gera flexibilidade. Um diagrama de cinco colunas tem o inconveniente das colunas estreitas requererem corpos pequenos para proporcionar uma legibilidade razoável por linha de texto ( corpo 7 ou 8 pontos). Porém, utilizando as colunas duas a duas para texto, obter-se-á um aspecto visual muito bom, podendo dinamizar a composição, ficando sempre uma coluna para ser utilizada como recurso de mobilidade, dando assim uma dinâmica maior a página. (COLLARO, 2000, p. 96). 24 O diagrama modular veio com o propósito de tornar as colunas ainda mais dinâmicas, já que esses funcionavam bem em documentos simples. Os módulos garantiam a articulação da hierarquia de uma página, com zonas específicas para cada conteúdo apoiando-as e enquadrando-as, baseadas nas divisões horizontais lineares consistentes que as formavam juntamente com as verticais já padrões nas colunas. Conforme segue esquema 02. Esquema 02: Diagramas Fonte: Lupton (2006, p. 143) A dinamização da página é a essência dos diagramas e faz o projeto adquirir personalidade, permitindo reunir os elementos de forma a auxiliar encaixes e ligações entre eles. Apesar de ser uma forma onde se delimita um espaço, ela não bloqueia o designer na hora de projetar e sim flexibiliza e impulsiona o esquema construtivo, sendo a base da infra-estrutura da diagramação. 25 2.1.2.3 Alinhamento A organização do texto em colunas se chama alinhamento, apresenta-se em bordas duras ou suaves e são nomeadas conforme seu posicionamento. Esse item é essencial no exercício de projetar layouts, ordena o texto e faz conexão visual com os elementos nele presentes. “Cada estilo básico de alinhamento traz qualidades estéticas e prejuízos potenciais ao design da página [...]” (LUPTON, 2006, p. 84). Esquema 03: Alinhamento Justificado. Fonte: A autora. Quando as margens da esquerda e da direita são uniformes, chama-se alinhamento justificado. Esse estilo produz um efeito limpo e de maior aproveitamento do espaço e é utilizado desde a invenção dos tipos móveis como padrão para textos de publicações impressas, jornais e livros de texto extenso. Tem como favor negativo os espaçamentos irregulares e grandes, formados quando a linha de texto é curta. Segundo Lupton (2006) o alinhamento à esquerda pelo contrário não permite a formação desses “vazios” entre palavras e a margem esquerda é dura enquanto a direita é suave. Gera uma aparência orgânica e aleatória quando as linhas não são muito irregulares em seu comprimento. Ainda Lupton (2006) apresenta que a margem direita dura e a esquerda suave determinam o alinhamento à direita. Esse estilo quase nunca é aplicado em longos textos, mas sim em citações, comentários, legendas e etc. 26 A tipografia centralizada são linhas entre as duas margens e dão aparência irregular ao corpo de texto. É eficaz quando necessário destacar frases, além de ser muito utilizada em convites, certificados e folhas de rosto. Esse alinhamento se caracteriza por ser estático, formal e clássico. 2.1.2.4 Contraste O contraste conduz a leitura em uma página, devido sua capacidade de chamar a atenção do leitor para pontos específicos, atraindo a visão aos elementos, produzindo uma hierarquia organizacional. Esse efeito é gerado quando aplicam-se dois elementos distintos juntos, por exemplo: imagem e texto, claro e escuro, textura áspera e lisa, tipos grandes e tipos pequenos e etc. O contraste é fundamental para o sucesso de uma composição; porém, a variação da tonalidade dos caracteres que compõem o layout deve ser usada com bom senso, pois, quando usada indiscriminadamente, pode causar desordem e conseqüente confusão no receptor. (COLLARO, 2000, p. 116). Para que seja efetivo o emprego do contraste, os elementos quando não sendo iguais, necessitam ser totalmente diferentes para serem prontamente visualizados como contrastantes. Segundo White (2006) o contraste tem a função de “fisgar” o leitor, chamando a atenção num simples „passar de olhos‟, tendo em vista o destaque visual, aplicado e relacionado com todos os elementos de uma página, formando uma unidade entre o design e o conteúdo. Existem vários exemplos de como aplicar o contraste a partir de técnicas, podendo ser citadas as mais efetivas: - Cheio e vazio: esse contraste é formado entre uma página com muito texto até as margens e outra com uma pequena mensagem chamando muita atenção e atraindo para a leitura do corpo de texto. - No alinhado e aleatório as colunas são posicionadas em alinhamento perfeito em seu topo, porém com estruturas de comprimentos variados, sendo 27 evidenciadas pelo grande espaço branco que as envolve, dando destaque visual ao irregular e a parte alinhada. - Horizontal e vertical é o impacto gerado pelas direções inesperadas organizadas na página de maneira aleatória, cria grande efeito visual. - O nivelamento e a irregularidade: as imagens, no que diz respeito a sua aplicação em impressos, que estamos acostumados a ver sempre estão dispostas na horizontal ou na vertical. Ângulos inesperados criam surpresa aos olhos e organizá-las em contrapartida às já esperadas formas niveladas gera tensão interessante, como ilustra o esquema 04. Esquema 04: Contraste alinhado/aleatório Fonte: White (2006, p. 83). - Escuro e claro consiste em inverter os padrões comuns de fundo branco e corpo de texto preto causa choque visual surpreendente aos olhos. 28 Imagem/texto: as imagens são disparos rápidos sobre o cérebro e as emoções. Por outro lado, as palavras requerem tempo para ser lidas, absorvidas e compreendidas. São duas linguagens distintas que se complementam para contar uma história de maneira mais poderosa. Sua diferença visual e intelectual pode ser explorada para aumentar tanto o impacto da história quanto o da publicação como um todo. (White, 2006 p.83) - Solto e amarrado é quando o texto está todo alinhado, simétrico e controlado é necessário aplicar algo irregular a essa rigidez para destacar e sair do padrão cansativo. Isso funciona bem com citações e legendas desalinhados e em tamanhos distintos diante de corpos de textos ajustados de maneira totalmente igual. - Cor com preto e branco: quando algumas páginas aleatórias são colocadas em meio a um conteúdo muito colorido, transforma o projeto, assim como um projeto extremamente pesado e cansativo todo em preto ou cor carregada se torna mais alegre visualmente quando algo mais sóbrio é intercalado. No que diz respeito a tipografias e a relação de tamanhos e estruturas de fonte pode-se destacar o exemplo abaixo: Quadro 01: Contraste de layout Fonte: adaptação autora 29 No esquema de diagramação do quadro 01, visualiza-se a utilização da tipografia em destaque, gerando contraste a partir de pesos diferentes posicionados com proximidade, sendo evidenciado os dois tipos distintos por completo, tanto no que diz respeito a forma estrutural quanto de família tipográfica, criando assim imediato destaque das informações de forma simples e impactante. 2.1.2.5 Tipografias A tipografia surgiu no período da Renascença no séc. XV e tem como função básica a transformação do texto manuscrito ou determinada informação, em um formato visual e impresso onde a mensagem seja transmitida de forma clara e eficaz. “Definiremos, assim, tipografia como o conjunto de práticas subjacentes à criação e utilização de símbolos visíveis relacionados aos caracteres ortográficos (letras) e para-ortográficos (tais como números e sinais de pontuação) para fins de reprodução, independentemente do modo como foram criados [...]” (FARIAS, 2001, p. 15). Os tipos são a essência do design editorial, e eleger corretamente o estilo tipográfico faz com que um projeto gráfico seja conciso e interaja com a página. Gera-se assim, uma comunicação direta com o público a qual é designado, além da mensagem desejada ser repassada de maneira efetiva, devido a escolha do estilo mais relevante ao material, formando o seu real caráter e personalidade. A tipografia auxilia os leitores a navegarem pela correnteza do conteúdo. Eles podem procurar um dado específico ou esforçar-se para processar rapidamente um volume de conteúdo e dele extrair elementos para uso imediato. Embora muitos livros vinculem o propósito da tipografia à melhoria da legibilidade da palavra escrita, uma das funções mais refinadas do design é de fato ajudar os leitores a não precisar ler. (LUPTON, 2006, p.63) 30 Por isso existem determinados estilos tipográficos que são recomendados e projetados especificamente, para que auxiliem na composição visual e organização do texto, garantindo uma sequência contínua, distinção dos itens complementares e do conteúdo. “A escolha tipográfica é fator preponderante no aspecto visual do trabalho.” (COLLARO, 2000, p. 17). A estrutura de uma letra revela sua real essência, tornando um fator de classificação para qual função é destinada. Essa estruturação é feita a partir da divisão do caractere em cinco partes, sendo elas o ápice: parte superior da letra, a haste: a letra propriamente dita, trave: presente em algumas letras em que uma parte se atravessa, base ou pé: parte inferior e as serifas: aparas que existem em alguns tipos específicos como vemos no esquema 05. Esquema 05: Estrutura de Caracteres. Fonte: Collaro (2000). Outros fatores que determinam características de usabilidade em um estilo tipográfico são definidos pelo tipo da família a que pertence. De acordo com Collaro (2000) as análises da estrutura dos tipos classificam-se em cinco famílias, são elas: romana antiga, romana moderna, egípcia, lapidária e cursiva. 31 Esquema 06: Estilo Romano Antigo Fonte: Williams (2005). Esquema 07: Estilo Romano Moderno Fonte: Williams (2005). Esquema 08: Estilo Egípcio Fonte: Williams (2005). 32 Esquema 09: Estilo Lapidária Fonte: Williams (2005). Esquema 10: Estilo Cursivo Fonte: Williams (2005). O autor descreve que a tipografia Romana Antiga possui grande contraste entre suas hastes triangulares e suas serifas o que possibilita excelente legibilidade em textos longos, tornando a leitura agradável, sendo até hoje a mais utilizada em editoriais. Entretanto a Romana Moderna é a modernização do estilo antigo, composta pelos mesmos princípios, porém com maior leveza pela acentuação do contraste das hastes com as serifas mais retas e suaves. A Egípcia se trata de um estilo serifado muito uniforme e retilíneo, tornando-a pesada e evidente. Muito indicada para títulos e para textos que exigem destaque. Na Lapidária Collaro (2000) se refere a um tipo moderno e sem serifa, garante ótima legibilidade para pequenos textos, e tornando a leitura cansativa em grandes quantidades de texto devido ao pouco contraste. A família cursiva não possui nenhuma característica citadas nas anteriores e a mais variável de todas elas, podendo apresentar serifas ou não, além de imitar a escrita manual e escritas típicas. É considerada a mais ilegível de todas, sendo mais ou menos, dependendo 33 da quantidade de ornamentos e sombreamentos presentes, devido a esses fatores é utilizada com restrições. Após esse repertório tem-se a separação por gêneros, romano, itálico, estreito, negrito e etc. O corpo que se delimita ao tamanho de uma letra pela distância entre as faces de um tipo e as fontes que são a junção de todos os itens de uma família específica, de um só corpo e gênero. Todos esses itens fazem uma conexão com a página e suas margens, auxiliando a disposição gráfica e harmonia, visando almejar o principal fator na eleição de um tipo para textos: a legibilidade. A dimensão do olho, i.e., a superfície total de impressão da letra, é um elemento dos mais importantes na escolha dos tipos. Para linhas compridas recomenda-se, naturalmente, um traçado de olho amplo e de curvas mais abertas nas minúsculas [...] (ARAÚJO, 1986, p. 347). O espaço entre linhas gerado pelas hastes ascendentes (b, d, f, h, k, l) e descendentes (g, j, p, q, y) interfere diretamente na legibilidade assim como o próprio caractere, por isso é necessário testes de simetria para averiguar se a fonte é alinhada por quadro de letra e não por linhas paralelas. A densidade provocada pela espessura da letra e a junção de um grupo de caracteres em uma página sem espaço de entrelinhas sensato, provoca o cansaço e excesso de peso, como as fontes: bodoni, bulmer e times. Posterior análise dos fatores técnicos que constituem a construção de uma tipografia e sua estrutura, deve-se levar em conta como um conjunto, questões direcionadas ao público e ao tipo de publicação a que é destinada. Quem é o leitor, qual sua faixa etária, do que se trata o conteúdo entre outros. As crianças, por exemplo, preferem caracteres grandes e espessos, enquanto o leitor comum ou „leitor-padrão‟ aceita de bom grado um romano com serifa cujo olho é aberto, possui hastes de altura média e exibe força de impressão que não „canse a vista‟. (ARAÚJO, 1986, p. 350). O corpo ideal para uma composição está relacionado ao público-alvo e o suporte a que se designa. Não existe norma específica sobre o assunto, mas deve- 34 se seguir a seguinte orientação de acordo com Collaro (2001): para menores de sete anos, corpo 24; de 7 a 8 anos, corpo 18; de 8 a 9 anos, corpo 16; de 9 a 10 anos, corpo 14; de 10 a 11 anos, corpo 12; a partir de 12 anos, corpo 10. A utilização coerente da fonte garante um resultado satisfatório ao projeto, sendo apenas possível quando se leva em consideração todos os fatores estruturais e classificatórios diante da percepção do que o receptor final da informação necessita. 2.1.2.6 Ilustração Ilustração é uma técnica onde se constrói uma imagem que apresenta uma determinada idéia a partir de grafismos. Pode ser desenvolvida com diversas ferramentas e utilizando vários materiais, transmitindo conceitos e sensações visuais. Este segmento se distingue pelo conhecimento e experiência nas formas de representação e técnicas de desenho, como por exemplo, ilustração de livros (em especial a literatura infanto-juvenil), jornais ou revistas; caricaturas e charges; ilustração publicitária; ilustração científica (livros de ciência medicina); desenho técnico; desenho digital; rendering, entre outros, normalmente usadas para acompanhar e complementar a informação de textos. (FAGGIANI, 2006, p.102). O desenho muitas vezes é confundido ao conceito de ilustração, porém o desenho é uma das ferramentas para a produção, assim como softwares e infinitas outras possibilidades que segundo Lins (2004), tem como objetivo final a criação de uma imagem eletrônica para ser reproduzida em série. Ela pode ser utilizada em anúncios e em diversas peças gráficas, interagindo com o conteúdo ou falando por si só. No caso de livros, a ilustração é um complemento a história, fazendo o leitor associar os fatos a imagem e criar uma nova versão do que leu. Segundo Araújo (1986): “Quando o livro impresso se tornou uma realidade irreversível, a arte de ilustração teve de acompanhar a profunda transformação suscitada por esse novo suporte”. Assim compreende-se que o texto e a imagem 35 sempre tiveram ligação muito estreita, sendo a ponte para a caracterização do conteúdo em linguagem visual, transportando as épocas e situações propostas. O ilustrador teve que interagir diretamente com o processo evolutivo do livro impresso e a tecnologia, passando a compreender as mudanças tipográficas, aos formatos, ampla gama de materiais e novos métodos de impressão e apresentação do projeto. O ilustrador tem hoje a seu dispor, alem de todas as técnicas de ilustração propriamente ditas, todos os recursos gráficos disponíveis. Sabendo conceituar e definir proporções, cores, ponto de fuga, texturas, efeitos de luz, etc., conhecendo as possibilidades técnicas de se solucionar graficamente (e até tipograficamente) uma ilustração e aprendendo a diagramar o texto criativamente, este profissional só tem a colaborar com o resultado plástico do livro. (LINS, 2004, p. 50). Com isso percebe-se o quão é importante construir um projeto gráfico utilizando a ilustração como ferramenta essencial na página e no contexto criativo que envolve a leitura. Devem-se conhecer métodos e técnicas possíveis no desenvolvimento de ilustrações a partir da especificidade do projeto e do público a qual é dirigido. Segundo Lee & Buscena (1986), uma técnica muito antiga e utilizada até os dias de hoje é a ilustração com nanquim, uma tinta permanente originária da Índia e exige concentração implacável devido sua cobertura do desenho tender a ser cansativa e não permitir erros. Essa tinta pode ser adquirida de forma líquida e utilizada com pincéis ou no formato de canetas prontas, ambas possuem a ponta mais rígida permitindo a aplicação de técnicas específicas de traço e preenchimento conforme mostra o esquema 11. 36 Esquema 11: Técnicas de Nanquim Fonte: Lee & Buscena (1986, p. 147) É permitido variar e misturar diversos tipos de traço numa mesma ilustração, o que amplia a variedade de estilos possíveis a serem desenvolvidos a partir da técnica de naquim. A sua melhor aposta é tornar-se igualmente fácil, com caneta e pincel. A caneta é mais fácil quando você está apenas linhas de tinta preta, mas você vai precisar de um pincel para preenchimento de áreas totalmente pretas. é claro, você também pode usar o pincel para desenhar linhas, mas é mais difícil do que a caneta que requieres grande controle de sua parte. (LEE e BUSCEMA, 1986, p. 147) Existem também técnicas de ilustração vetorias, ou seja, produzidas e finalizadas de maneira digital, partindo ou não de um desenho à mão e geradas a partir de um software específico como, por exemplo, o Illustrator criado em 1985 pela empresa Adobe. Esse sistema é bastante atual, muito difundido a partir dos 37 anos 80, como constata Collaro (2002), possibilita inúmeras ferramentas no processo de criação e apresenta resultados de excelente qualidade estética e de resolução, permitindo diversas aplicações e em variadas dimensões e proporções. Permite infinitas possibilidades de estilos, cores, texturas, formas, levando ao extremo o poder criativo e técnico substituindo tanto ferramentas de desenhos técnicos quanto artístico. Lins (2004, p. 51) especifica “O resultado é uma mistura de técnicas que acrescentam dinamismo à produção e que vai dando uma cara bastante peculiar ao livro infanto-juvenil.” Dando ênfase ao arsenal sistemático possível na projeção de idéias transformadas em imagens ilustrativas. 38 3 DESENVOLVIMENTO DO PROJETO DE DESIGN 3.1 METODOLOGIA DO PROJETO DE DESIGN A metodologia de projeto de pesquisa voltada a produto gráfico-impresso será baseada na proposta desenvolvida por Volnei Antônio Matté1 (2004), devido a sua aplicação específica nesse desenvolvimento, sendo composta por oito etapas, sendo elas a problematização, pesquisa, análise, definição, modelação inicial, modelação final, normatização e supervisão, como consta no quadro 02. 1 Bacharel em Design, Mestre em Engenharia de Produção, Doutor em Engenharia do Conhecimento – Professor do Curso de Desenho Industrial da Universidade Federal de Santa Maria-RS 39 Quadro 02: Fases da Metodologia de Matté Fonte: MATTÉ (2004). Essa proposta supre a necessidade de metodologias coerentes ao tema, demonstrando suas etapas, relações entre o produto e o grau de complexidade além do envolvimento profissional. A partir disso se distingue o aspecto informacional e físico, destacando suas variáveis e grau de complexidade, conforme se visualiza no quadro 03. 40 Quadro 03: Complexidades de produtos gráficos-impressos Fonte: MATTÉ (2004). Decorrente disso o autor defende a estimulação da competência diante da consideração de que o designer possui características e qualidades cognitivas e afetivas no desenvolvimento, além de habilidades psicomotoras, não sendo limitado ao recurso digital e mecânico. “É importante considerar esta proposta como um ponto de apoio e não como um fator limitante ao projeto. Sem qualquer dúvida, a metodologia não tem uma finalidade em si mesma, não pode ser considerada isoladamente.” (MATTÉ, 2004). A responsabilidade e dedicação ao projeto são fatores determinantes para um resultado eficaz. Como ferramenta auxiliar será utilizada um método voltado especificamente ao projeto gráfico de livros para o público infantil e infanto-juvenil, desenvolvido por Guto Lins. Esse autor contextualiza o comportamento visual de um jovem leitor perante um livro e a partir de procedimentos técnicos, dedica a ele uma metodologia adaptada ao texto-imagem, dando ênfase a ilustração associado ao texto, gerando uma amplitude de percepção e assimilação do conteúdo cognitivo presente na história. O método de Lins (2004) enfatiza o uso do texto em conjunto com a imagem, prevê um controle total do resultado final do livro tendo em vista que o ilustrador acumula a função de projetista gráfico, seguindo a metodologia em certa ordem. Esta é composta de: uma leitura subjetiva de formação de conceituação objetiva de 41 estilo, seguida da segunda leitura do texto “... decupando-o‟ em pedaços e criando relações com possíveis imagens.” (LINS, 2004, p. 56). Após coleta de dados técnicos fornecidos pelo cliente, incia-se a separação e definição do espaço nas páginas, feita como um story board, posicionando o texto e organizando a ordem de leitura e respeitando a normatização de catalogação que é formada por: capa, guarda, rosto, dedicatória (não obrigatória), miolo, créditos e cólofon (raro em livros infantis). 3.2 Problematização A problematização terá como ponto efetivo a exposição do que consistem as indagações que envolvem o projeto, visando a consolidação profissional, oficializando e citando as partes envolvidas e seus reais problemas e necessidades. De acordo com Matté aqui se estabelece uma relação legítima e estabelece o definitivo início do desenvolvimento. Sendo assim, esse projeto visa desenvolver a partir do briefing presente nos apêndices, o projeto gráfico e editorial do livro da escritora chapecoense Anair Weirich que foi escrito entre os anos de 2000 e 2002, e não foi publicado devido à falta de ilustrações e desenvolvimento projetual de seu conteúdo. 3.2.1.1 Programa Projetual e Contrato O desenvolvimento do projeto gráfico, editorial e a criação de ilustrações do livro, consistem na criação de uma linguagem visual, aplicando-a a um conjunto desenvolvido a partir de um fato histórico real, a queima da igreja de Chapecó-SC, quando os acusados foram presos e linchados em 1950, em uma construção onde originalmente funcionava um moinho. Anair criou uma história fictícia, tendo como inspiração as lendas geradas no acontecimento. Essas lendas se tornaram muito populares na cidade sendo difundidas durante anos, de geração a geração pelos populares, justificando a origem do nome do livro: “Os Fantasmas do Moinho 42 Abandonado”. Essa publicação visa perdurar as lendas, instigando e desenvolvendo a imaginação juvenil a contar um ato de crueldade ocorrido, expondo situações da época e atuais, das quais podem fazer parte do cotidiano dos jovens que venham a ler essa obra, conscientizando-os e permitindo a reflexão, auxiliando na formação de caráter do leitor. Anair Weirich nascida em 02/11/51, na cidade de Chapecó, SC, onde sempre residiu e escreve desde 1987 tendo mais de 25 obras lançadas e divulgadas por toda a região sul do país. A escritora estabeleceu algumas limitações no processo de impressão devido a redução de custos, todo o desenvolvimento será delimitado a esses fatores, sendo eles: impressão de miolo apenas em um uma cor. Existem itens a serem relevados no processo criativo e projetual, visando uma produção acessível e de qualidade ao receptor final. 3.2.2 Compreensão do projeto A compreensão do projeto consiste em uma análise de produtos gráficos impressos, similares ou não, que ofereçam referências coerentes ao projeto, auxiliando e relacionando características e soluções viáveis. Tendo em vista a análise de uma ampla gama de informações, se estabelecerão consistentes bases projetuais através da percepção do que é realmente relevante e eficaz e o que se pode ou não aplicar. Essa fase divide-se em outras três, onde serão desenvolvidas as pesquisas diacrônicas, sincrônicas e análise dos elementos e aspectos mercadológicos. 43 3.2.2.1 Pesquisa Diacrônica e Análise dos Elementos Gráficos A pesquisa diacrônica refere-se na verificação de pesquisa de produtos relacionados ao projeto após coleta de referências em editoriais, buscando amplitude e inserção. Avaliam-se as funções lógico-informacionais, técnico- funcionais e estético-formais de produtos gráficos que venham de encontro às necessidades das quais o projeto visa suprir, informações sobre materiais e processos compatíveis e soluções de estilos e conceitos que condizem a formação e desenvolvimento estrutural. Nesse caso se fará a análise diacrônica do livro O Pequeno Príncipe e O Menino do Dedo Verde. O Pequeno Príncipe do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, foi publicado em 1943 nos Estados Unidos e possui ilustrações a cores criadas pelo próprio autor. O livro é narrado pelo autor, que é Piloto de avião durante a Segunda Grande Guerra conta uma aventura vivida no deserto depois de uma pane no meio do Saara. Certa manhã é acordado pelo Pequeno Príncipe e então se inicia o relato das fantasias e questionamentos. O principezinho que abandonou o seu planeta de origem, onde vivia apenas com uma rosa vaidosa e orgulhosa, inicia uma viagem em busca de novas descobertas passando por vários planetas, fazendo amizades e demonstrando o grande poder e valor que existe nas coisas mais simples e pequenas da vida. Conforme Matté (2004) deve-se coletar dados referentes a totalidade do produto, como materiais utilizados, processos de produção, especificações técnicas, medidas entre outros, mediante a isso temos a informação de que o livro O Pequeno Príncipe é comporto por 98 páginas formato brochura, medidas 15,5 x 22 cm e contém ilustrações em cores, impressão e papel off-set 75g. 44 Fotografia 01: Capa O Pequeno Príncipe. Fonte: a autora. A capa (Fotografia 01) dessa obra literária ilustra uma hierarquia muito nítida dos dados e informações necessárias para um primeiro contato entre o leitor e o livro, tendo total harmonia com o conteúdo interno e transmitindo a essência da história de maneira muito clara. “Todos os elementos devem ser tratados com a mesma importância, não só a ilustração em particular, como a arquitetura do projeto, a escolha do tipo ou a letra desenhada.” (Ribeiro, 1993). Ainda segunda Ribeiro (1993) toda a capa deve comportar itens essenciais e a maneira como se distribuem e se comportam é o que determina uma boa capa ou não. 45 Fotografia 02: Páginas 42 e 43 O Pequeno Príncipe. Fonte: a autora. A diagramação consiste em uma formatação simples com o texto sempre justificado, apresentando variações apenas em páginas que possuem ilustrações, construindo estruturas semelhantes a molduras em torno da imagem. A numeração das páginas se encontra centralizada na base da página, assim como o nº do capítulo respeitando o diagrama do texto, porém não é aplicada ao posicionamento das imagens que a ultrapassam a margem de corte, como se pode constatar na fotografia 03: 46 Fotografia 03: Páginas 14 e 15 O Pequeno Príncipe. Fonte: a autora. Percebe-se que existem variações das ilustrações produzidas a partir da técnica de aquarela, momentos sendo aplicadas em cores e em outros em preto e branco, e modulando o texto aos atributos visuais, formando um conjunto muito consistente de leitura. “O ritmo do livro é determinado pelo projeto gráfico, levandose sempre em conta dados objetivos (técnicos) e subjetivos (conceitos).” (LINS, 2004, p.67). 47 Fotografia 04: Páginas 36 e 37 O Pequeno Príncipe. Fonte: a autora. A tipografia disposta em um diagrama único funciona bem, pois apresenta uma fonte adequada a leitura de grandes quantidades de texto e um bom espaçamento entre as linhas e palavras. Os espaçamentos que não são variáveis se resumem em margens superiores e as margens internas (onde as páginas se unem). Garantindo assim, ser um excelente livro por sua legibilidade, e diagramação simples pouco ousada. O Menino do Dedo Verde é uma obra literária do francês Maurice Druon em 1957, sendo este o único livro fictício e de linguagem infantil que o autor escreveu. O livro conta a história do menino Tistu, que vive na cidade chamada Mirapólvora numa grande casa, a Casa-que-Brilha, com o Senhor Papai, Dona Mamãe e o seu querido pônei Ginástico. Um dia seu professor jardineiro Bigode descobre que Tistu possui um dom: tem o dedo verde, o que significa que onde o menino tocava nasciam flores. Esse dom arruína a fábrica do pai e gera muitas confusões, mas também ajudar a desvendar o mistério do desaparecimento de Bigode, fazendo com que todos concluam que ele era um anjo. 48 O livro possui ilustrações na edição original de Jacqueline Duhême, mas na versão que aqui será analisada, as ilustrações são de Marie Louise Nery. O livro possui 150 páginas em brochura, formato 14 x 21 cm e é impresso em apenas duas cores: verde e preto. Fotografia 05: Capa do Livro O Menino do Dedo Verde. Fonte: a autora. A fotografia 05 mostra o posicionamento das informações da capa de maneira mais próxima e com menos contraste, essa falta de espaços transmite um peso 49 visual muito grande na parte superior e não enfatiza o título do livro, esse fator é acentuado ainda mais pelo falta de variação das cores e de pouca utilização do fundo. Fotografia 06: Páginas 6 e 7 de O Menino do Dedo Verde. Fonte: a autora. A mancha gráfica conforme fotografia 06 é composta por um diagrama único criando rigidez na composição, porém apresenta margens com medidas excelentes para o manuseio e a história é distribuída em capítulos bem delimitados. Apesar de muitas tentativas de romper com estilos tradicionais, vários movimentos propuseram novos desenhos de caracteres, porém, os princípios clássicos de equilíbrio, harmonia, proporção e funcionabilidade continuam imperando na solução tipológica dos impressos. (COLLARO, 2002, p. 17) 50 O texto é totalmente justificado e a tipografia é serifada estilo antigo, com bons espaçamentos entrelinhas garantindo assim uma boa legibilidade de todo o texto, sua estrutura de organização é muito simples não apresentando contrastes, colunas, ou seja, sem novidade alguma no decorrer da leitura. Fotografia 07: Páginas 4 e 5 do livro O Menino do Dedo Verde. Fonte: a autora. Ao contrário do livro O Pequeno Príncipe, O Menino do Dedo Verde possui páginas exclusivas para aplicação das ilustrações, tendo como peculiaridade muito interessante a utilização de inversão cromática em todas as páginas ilustradas, sendo estas com fundo todo em verde e imagem sobreposta em preto. A imagem produzida em nanquim preto com preenchimentos em diversas técnicas como a hachura e padronagens manuais. 51 3.2.2.2 Pesquisa Sincrônica e análise elementos gráficos Na pesquisa sincrônica o princípio se assimila ao da diacrônica, porém é trabalhada de forma conjunta a análise dos elementos gráficos que compõem produtos similares e produtos que atendam o mesmo público-alvo. Aqui serão dissecadas diversas formas de apresentações gráficas como o e-book Variações Sobre Silêncio e Cordas de Roseana Murray e ilustrações de Elvira Vigna, além do livro Robin Hood: O príncipe dos ladrões, sua lenda e sua história, do autor Neil Philip e com ilustrações de Nick Harris. A autora do e-book, Roseana Murray nasceu no Rio de Janeiro em 1950, publicou seu primeiro livro infantil em 1980 e atualmente possui mais de 50 livros publicados. Elvira Vigna é jornalista, tradutora, escritora e ilustradora, formada em literatura francesa em 1975, teve seus primeiros livros como escritora dirigido as crianças e jovens. Em 1984 e 1985, fez cursos de extensão universitária na Parsons School of Design de Nova York, dando seguimento assim a sua segunda área profissional, a da imagem. Variações Sobre Silêncio e Cordas, apresenta-se de forma digital e de maneira inusitada por conter pouco texto e inúmeras ilustrações. Essas ilustrações são apenas em uma cor e se assemelham muito a técnica de desenho naquim, apresentando variadas texturas e sombreamentos como podemos visualizar no esquema 12. 52 Esquema 12: Páginas 46 e 47 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. Aqui identifica-se uma grande distribuição da ilustração pela página e ênfase ente o fundo e o traço devido aos espaços, gerando uma análise minuciosa a todos os detalhes presentes e a relação entre texto/imagem. “A imagem caracteriza o personagem, podendo dar-lhe personalidades diferentes e figurinos diferentes e situá-lo em locais e épocas diferentes.” (LINS, 2004, p.31). Em certos momentos se utilizou uma composição gráfica totalmente distinta, causando surpresa e imenso contraste visual pela total ausência de ilustrações, grandes espaços brancos e tendo o texto posicionado de forma minimalista, alinhado à esquerda, direita e em menos casos centralizado, fazendo com que a leitura das paginas seja feita como um todo segundo vê-se nos esquemas 13, 14 e 15. 53 Esquema 13: Páginas 6 e 7 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. Esquema 14: Páginas 35 e 36 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. 54 Esquema 15: Páginas 8 e 9 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. Algumas páginas apresentam texto e imagem juntos, permitindo a interação de maneiras aleatórias, sempre seguindo um princípio de elementos da imagem integrando a composição ao alinhamento textual como mostra o esquema 16 e 17. Esquema 16: Páginas 13 e 14 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. 55 Esquema 17: Páginas 38 e 39 do livro Variações entre Silêncio e Cordas. Fonte: a autora. Devido ao livro ser digital, não houve a preocupação com o posicionamento do texto em certas ocasiões estar aplicado na dobra da página, o que em um livro impresso não é aconselhável. A liberdade no momento da execução do projeto gráfico evidenciou o processo conceitual e permitiu, pela pouca quantidade de textos em cada página, a utilização de uma fonte sem serifa. A variação de posicionamento dos elementos cria sensações, e é possível devido a pouca quantidade de conteúdo escrito e a faixa etária ser a infanto-juvenil, possibilitando a criação de cenários lúdicos onde o leitor possa recriar imagens associadas a elas em sua imaginação. O livro Robin Hood conta a lenda de um herói inglês fora-da-lei, que roubava dos ricos para dar aos pobres, vivia em uma floresta e prezava a liberdade. Retrata um clássico da literatura de maneira diferente, a partir de ilustrações detalhadas e fotos reais dos locais citados ao longo da história, apresentando também mapas e diversos estilos de ilustrações coloridas. 56 Fotografia 08: Capa livro Robin Hood. Fonte: a autora. De acordo com a fotografia 08, percebe-se um forte apelo visual criado por uma ilustração de impacto que ocupada quase todo o espaço e apresenta hierarquias bem definidas e posicionadas de maneira estratégica. Esta edição é produzida em capa dura e lombada quadrada, tendo um acabamento de alto padrão como se pode visualizar na fotografia 09. Fotografia 09: Lombada do livro Robin Hood. Fonte: a autora. 57 O papel utilizado é o couchê brilho 90g de alta qualidade e é muito indicado para impressão de imagens pelo resultado cromático muito fiel. Funciona bem neste caso porque o texto é distribuído em pequenas porções de forma aleatória, não possuindo grandes blocos de textos contínuos e não tornando o momento da leitura em uma atividade maçante. A tipografia utilizada aqui também é a serifada que auxilia a leitura e apóia o clima mais nostálgico por se tratar de um estilo mais clássico. Impressos editorias: a opção do papel para estes casos depende de análise do original em relação ao volume de texto e em relação ao volume de ilustração, isto é, se a predominância for de ilustrações, optaremos por papéis de acabamento polido, porém se a predominância for de texto, optaremos por papéis de acabamento opaco. O papel couchê é um exemplo típico de papel polido, enquanto o papel offset é um bom exemplo de papel opaco. (COLLARO, 2002, p.91) Outros fatores além do acabamento contribuem para Robin Hood possuir um projeto gráfico diferenciado e conceitual, de forma moderna e despojada, garantindo um relacionamento estreito entre o livro e o leitor, que acaba sendo inserido no enredo, por encontrar uma infinidade de dados e imagens dos locais onde os personagens viviam, características e estilo de vida de cada um, conduzindo assim o receptor a um processo investigatório e de estreita afinidade. 58 Fotografia 10: Páginas internas Robin Hood. Fonte: a autora. Fotografia 11: Páginas internas Robin Hood. Fonte: a autora. 59 A disposição dos elementos de forma muito modular maleável fica evidente nas fotografias 10 e 11, onde texto, ilustrações e fotografias são mescladas e detalhadas com auxílio de legendas e informações históricas e técnicas. Esta linguagem visual utilizada no livro infantil moderno, exercida de forma lúdica ou não. Está se estabelecendo como mais uma ferramenta a favor do livro, já que aumenta sua quantidade de informação e as possibilidades de leitura, aumentando o interesse e, conseqüentemente, o consumo de livros de uma maneira geral. (LINS, 2004, p. 47). O tom de modernidade é equilibrado com a linguagem da época em que os fatos ocorreram, pergaminhos e vários outros elementos situam a ordem cronológica e garantem o estilo de “diário de lembranças”, remodelando um grande clássico da literatura para que prossiga vivo e atual para os leitores dos dias de hoje. 3.2.2.3 Aspectos mercadológicos A análise de aspectos mercadológicos tem como principal característica, reconhecer fatores de reconhecimento do público-alvo, fornecedores, e o processo de comercialização levando em conta restrições recorrentes, derivados da antropologia e fisiologia relacionados ao consumidor/usuário, responsáveis pela produção industrial e aspectos de comercialização e logística do produto. Resultante disso se constatou que o público em evidência a que o livro é direcionado se trata do infanto-juvenil. O livro terá acabamento e material de qualidade sendo prevista métodos projetuais para diminuir custos sem perder o apelo atrativo comercial ao produto. Sendo um produto industrial, o livro infantil está sujeito a imposições técnicas e pedagógicas, é resultado de um trabalho artístico e cooperativo e, como tal, tem que responder aos anseios estéticos de todas as partes envolvidas, além de atender às expectativas emocionais e psicológicas do público leitor que escapam da teoria e de toda a metodologia de trabalho. (LINS, 2004, p. 44) 60 Existem na região, gráficas especializadas em produção de livros, um bom exemplo de empresa do ramo onde se encontra uma boa estrutura e qualidade na execução é a Grafia e Editora Arcus, que possui sua matriz em Chapecó e uma filial em São Miguel do Oeste – SC, e hoje está entre os maiores parques gráfico de Santa Catarina. A empresa possui equipamentos de alta tecnologia de impressão e acabamento além da produção ser exclusivamente em CTP. A área de abrangência do livro será a região sul do Brasil (Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul), sendo distribuída pela própria autora em livrarias e feiras itinerantes, onde promovem feiras em escolas e outros eventos, além de venda informal direta. 3.2.2.4 Análise de Estruturas Materiais e Processos Produtivos A Análise de Estruturas Materiais e Processos Produtivos segundo Matte (2004), consiste em segmentar o projeto e averiguar questões técnicas, produtivas, obra-prima e mão de obra, e seus respectivos custos. 3.2.2.4.1 O papel O papel é um conjunto de fibras que após a formação de uma pasta é submetida à pressão, a partir disso forma-se as folhas e/ou bobinas. Diante do tipo de pasta se determina diversas qualidades e tipos de papel, sendo caracterizadas pela sua mistura ou pureza, obtendo aplicações específicas de uso a cada uma delas, mediante sua resistência, absorção, efeito e aparência, apresentando também variações de coloração e adição de cola entre outros elementos em sua composição. Segundo Ribeiro (1993) os papéis quanto à superfície podem ser ásperos, lisos, macio ou acetinado, prensado nos dois ou em apenas um lado. O processo classificatório inclui também a gramagem, que corresponde ao peso em gramas de 61 um metro quadrado de superfície de papel, a resistência e a transparência. Especificando assim diversas espécies de papéis. Ainda segundo Ribeiro (1993), quando se trata de livros os mais utilizados são o bouffant, acetinado, couchê, bíblia e offset, sendo aplicados conforme estilo, precificação, tipo de impressão, quantidade de ilustrações e de cores, volume de páginas e natureza da publicação. Papéis offset possuem bastante cola e superfície uniforme e possuem gramatura que varia de 56 gramas a 240 gramas, os acetinados são brancos, finos e brilhantes, oferecendo muita qualidade à impressão de ilustrações. O papel bouffant se caracteriza por ser muito leve, fofo, áspero e com acabamento desigual e não acetinado. O papel bíblia como é popularmente conhecido também é chamado de papel Índia e é extremamente fino, opaco, transparente e resistente, reduzindo assim a espessura de publicações muito extensas. O termo couchê significa camada e essa qualidade de papel pode ser definida como: Papel com uma ou ambas as faces recobertas por uma fina camada de substâncias minerais, que lhe dão aspecto cerrado e brilhante, e muito próprio para a impressão de imagens a meio-tom e, em especial, de retículas finas. Para a impressão de texto, o papel gessado é muito lúcido e por isso incômodo a vista, defeito que se tem procurado contornar com a criação de tonalidades mate. (RIBEIRO, 1993, p. 20) O papel Matte trata-se de uma variação do couchê gessado e é conhecido também como couchê fosco o que facilita a leitura, podendo ser utilizado para impressão de textos longos. Ribeiro (1993) ressalta que a escolha do papel é de extrema influência no resultado de um projeto e determina a apresentação e o custo de uma obra. Na execução deve ser analisada a aparência e o peso do papel, além do entrosamento do tipo de impressão com a qualidade da tinta para um resultado funcional. Cada tipo de papel pode ser fabricado de um formato e são acondicionados em bobinas para uso em máquinas de impressão rotativas, ou em resmas utilizadas em máquinas planas. Atualmente existem padrões internacionais, sendo alguns mais freqüentes que outros. No Brasil as metragens mais comuns podem ser visualizadas no quadro número 04. 62 Quadro 04: Formatos de papel. Fonte: a autora. Todavia Lins (2004) afirma que o formato BB ainda é mais popular que o AA, cuja folha padrão possui 66 x 96 cm, onde no esquema abaixo pode-se visualizar as possibilidades de cortes e vincos visando seu melhor aproveitamento. 63 Quadro 05: Tabela de Formatos. Fonte: a autora. O bom planejamento na escolha do formato de uma publicação garante um orçamento mais acessível, pois evita o desperdício de folhas, permitindo a realização de um projeto mais sustentável e consciente. Algumas editoras já 64 possuem formatos pré-estabelecidos quando se destinam a determinadas coleções, séries, ou tipo de público. 3.2.2.4.2 Montagem e acabamento A montagem se inicia após todas as escolhas e definições de papel, formatos entre outros e se caracteriza por estabelecer o conteúdo de cada página. A partir de todas as configurações de hierarquias, grids e aplicações das ilustrações se tornam necessário fazer testes. A criação de protótipos em proporção mais próxima ao real, os chamados bonecos, permite análises e simulam como se portará a publicação quando finalizada, se o tamanho, peso e estrutura estão coerentes a faixa etária a que é destinada. Após o texto definido e formatado, se organiza conteúdos e informações mais técnicas, como os créditos obrigatórios (números, datas, códigos e endereços), se realizam a composição das abas ou orelhas como são conhecidas, usadas para biografias e apresentações, contracapas entre outros elementos. A capa então pode ter uma dedicação especial que merece, absorvendo o conceito do conteúdo e expressando-se como um verdadeiro comunicador gráfico. Ribeiro (1993) caracteriza a capa como um cartão de visitas e por ser o primeiro contato com o público tomando para si uma enorme função comercial, e seu padrão estético satisfaz e educa o gosto de quem o consume. “Embora havendo formas convencionais, a arquitetura do projeto deve possuir uma coerência com seu todo, de acordo com o estilo adotado.” (RIBEIRO, 1993, p. 340). O título da obra por sua extrema importância deve ocupar lugar de destaque e subordinado a ele o nome do autor seguido pela editora, ilustrações e a cor predominante. O acabamento em processos-industriais visa o custo-benefício, e em pequenas tiragens o preço unitário pode ficar muito elevado diante de certas escolhas. Capa dura é um luxo, sendo assim substituídas por soluções mais viáveis como o couchê e papel offset de gramaturas mais elevadas e com revestimentos especiais. Dentre esses acabamentos de capa pode-se ser citados três: plastificação, laminação e resina, que garantem mais resistência e durabilidade ao livro. 65 A capa e o miolo do livro são finalizados pela técnica de encadernação, que pode ser artesanal ou industrial. O processo industrial mais comum, consiste nas seguintes etapas: 1- coloca-se o livro em sequência na forma de cadernos alceados; Esquema 18: Alceamento sequencial Fonte: Editora Abril 2- criam-se sulcos transversais no dorso para a colocação das linhas; 3- costuram-se os cadernos por meio de linha, onde após desfiadas serão coladas, formando o principal elo entre o corpo do livro e a capa; 4- arredonda-se o dorso e se aparam os excessos; 5- coloca-se a cobertura de pano/couro. Esse tipo de técnica é aplicada em publicações de grande número de páginas e se caracterizam pela formação de lombada (parte lateral do livro), e deve conter o nome do autor, título da obra, e editora, auxiliando seu encontro quando disposto de pé em estantes. Quando o livro é composto por uma quantidade pequena de páginas, o agrupamento é feito com grampo a cavalo, que se refere a um grampo usado no dorso do impresso, tipo revista. Diferencia-se do grampo convencional por ser mais resistente, seu tamanho e espessura são determinados e ajustados de acordo com o volume de folhas a serem grampeadas. 66 Desenho 01: Grampo a cavalo. Fonte: A autora 3.2.2.4.3 Impressão Antes de 1900 é desenvolvida a impressão Offset que nada mais é do que a litografia aperfeiçoada e automatizada. Até os dias de hoje é o processo mais utilizado, pois permite grandes tiragens em boa qualidade. “A expressão “offset” vêm de “offset litography” (literalmente, litografia fora do lugar), fazendo menção à impressão indireta.” Essa impressão indireta se deve as seguintes etapas: uma chapa metálica fotossensível é revelada, deixando as partes onde será aplicada a tinta gordurosa atraindo a tinta, enquanto o restante apenas água. Posteriormente essa chapa é fixada em um cilindro onde receberá a cor. 67 Esquema 19: Impressão Offset. Fonte: COLLARO Esse sistema trabalha em CMYK que se refere aos pigmentos ciano, magenta, amarelo e preto, e para cada cor é necessário revelar chapa específica, onde a sobreposição destas permitirá a cor desejada. Após isso uma espécie de borracha absorverá a tinta, a superfície a ser impressa passa então entre o cilindro com a borracha e um cilindro que fará a pressão. A fricção gerada transfere a impressão para o papel. Evidentemente que todo esse processo obedece a um sincronismo mecânico capaz de obter em máquinas, folha a folha, uma tiragem de até 12.000 cópias por hora e, nas rotativas que trabalham com papel em bobina, até 30.000. (COLLARO, 2002, p.84). Um século depois de dominarem o processo litográfico, os designers contaram com maquinas avançadas de impressão a partir da exploração da 68 tecnologia e possibilidades do computador nos anos 70 e 80. Posterior ao Offset surge então a impressão que utiliza a tecnologia CTP (Computer To Plate). A vantagem desse sistema é que as imagens são reproduzidas diretamente na chapa, sem passar pelos processos de geração de filme e, posteriormente, de montagem. A reprodução de imagem pelo laser nas CTPs torna o processo menos sensível a falhas de registro, enquanto as chapas térmicas possibilitam uma melhor reprodução dos detalhes na hora da impressão. (FERLAUTO, 2001, p.82). Os dois métodos são similares quanto ao princípio técnico e ambos garantem alta eficiência em produção de grandes tiragens, o mecanismo CTP, porém oferece mais tecnologia e assim maior agilidade e um produto final mais fiel. Toda essa inovação exige um alto investimento, portanto não é encontrado na maioria das empresas que oferecem serviços gráficos de pequeno a médio porte. 3.2.3 Configuração do projeto Na etapa da configuração do projeto todas as informações analisadas na compreensão do projeto são identificadas e inseridas em um determinado formato, onde se delimitam referências e modelações. A partir disso se consideram todas as formas de compressão representativas do projeto, se ilustram em forma de imagens: rabiscos, rascunhos, esboços, mocapes etc., ou em textos. 69 3.2.3.1 Lista de Requisitos e Hierarquia de Fatores Projetuais Esta fase projetual consiste em classificar fatores relevantes para o seu desenvolvimento, com o propósito de perceber de forma objetiva quais características são pertinentes para compor ou não o projeto. Quadro 06: Painel Imagético. Fonte: A autora 70 As imagens que formam o painel imagético possuem em comum o propósito de retratarem situações de suspense e de aspecto sombrio, sendo diversificadas pela maneira em que são retratadas, utilizando-se das mais variadas técnicas de reprodução de imagens, seja fictícias ou não. A de nº 1 se trata de ilustração vetorial, a 2, 4, 5 e 6 ilustração com caneta nanquim em formatos distintos como em capas de livros ou desenhos. Já a nº 3 é uma fotografia produzida nos anos 50 na cidade de Chapecó – SC e retrata o local exato onde existia a antiga igreja onde se passa parte da história de Os Fantasmas do Moinho Abandonado. Quadro 07: Painel Semântico. Fonte: A autora O painel semântico sintetiza em palavras as necessidades e características emocionais que envolvem o projeto, visando supri-los de maneira consistente e 71 visível para o receptor. Esses fatores norteiam a construção processual almejando a formação de um conjunto que vise em sua essência básica à materialização de uma história projetando-a em conceitos de fácil acesso assimilativo. 3.2.3.2 Redefinição do Problema Percebeu-se após as pesquisas realizadas referentes a design gráfico e editorial, assim como as ferramentas que compõem todo o processo projetual, que o primeiro passo na construção organizacional do livro, consiste na divisão do conteúdo em páginas, estruturando-os em módulos e subseqüentemente ao estilo e ilustrações da composição como um conjunto. A partir disso constatou-se que o livro possuirá aproximadamente 40 páginas divididas na seguinte forma: capa, folhas de guarda, falsa folha de rosto, folha de rosto, dedicatória, miolo e contracapa. O tamanho do livro fechado será de 22x21 cm levando em conta o aproveitamento de papel formato 2BB de 48x66 cm, sendo possível a impressão de três lâminas contendo duas páginas cada, num total de seis páginas frente e seis páginas verso mais um centímetro de margem da máquina mais sangra de 3 cm/lado de arte. As margens oscilarão entre 1 e 2 cm possibilitando o manuseio das páginas e “respiro” entre as páginas, porém isto será irreversível quanto se tratar de texto, as imagens serão totalmente flexíveis aos diagramas, módulos e margens. A dinamização do projeto se dará na formação de ilustrações conceitos que enfatizarão fatos que constam no enredo de uma maneira lúdica, dando uma nova leitura ao contexto da história, não apresentando uma imagem formalizada préestabelecida. A técnica aplicada será apenas o desenho nanquim dando ênfase ao estilo artesanal e mais rústico, garantindo assim uma característica mais próxima ao clima de suspense do livro, fazendo ligação direta ao terror que envolve as situações citadas e gerando o contraste do negro com o branco da página. Quanto a tipografia, pela quantidade grande de texto, necessita de uma estrutura que preze pela legibilidade e conforto visual diretamente associada ao estilo serifado, todavia será relevante a leveza estética para que fique em harmonia com o estilo das ilustrações criadas. A sintonia das páginas terá de ser evidente e composta com variadas maneiras de contribuições entre o texto e imagem. 72 O papel do miolo será do tipo de couchê uncoated (semi-brilho) de gramatura 80g, pela pouca quantidade de páginas, impressão 1 x 1 cores (preto) e a capa em papel triplex 300gr com acabamento plastificado, aumentado a durabilidade do impresso, o sistema de encadernação obedecerá o grampo à cavalo estilo brochura garantindo assim uma boa apresentação e resistência ao manuseio prolongado. 3.2.3.3. Modelação Inicial A modelação inicial se caracteriza pelos modelos criados visando alcançar soluções efetivas ao projeto, unindo aspectos estruturais de leitura e estéticos do layout até que se chegue a níveis intermediários levando em consideração as pesquisas até então efetuadas e análises de diversos livros. Essa modelação partiu de um item básico em qualquer produto gráfico, os grids e margens, configurando as medidas e estruturas mais propícias para o conceito do livro e ao público direcionado. As alternativas partiram de medidas aleatórias até padrões como mostra o esquema 20. 73 Esquema 20: Geração alternativa 01. Fonte: A autora A primeira geração de alternativa iniciou-se da busca pela proporção adequada das margens e grids da página, partindo de uma medida padrão de livros, no caso 15x21 cm. Conseqüente a isso se gerou mais alternativas derivadas da inicial garantindo a observação ativa das opções prováveis como vemos nos esquemas seguintes onde também são testados estilos e largura de páginas, colunas e diferenciadas proporções dos elementos, como pode-se visualizar nos esquemas a seguir. 74 Esquema 21: Geração alternativa 02. Fonte: A autora 75 Esquema 22: Geração alternativa 03. Fonte: A autora 76 Esquema 23: Geração alternativa 04. Fonte: A autora Nessas alternativas se analisaram outros formatos de páginas diferentes do padrão geralmente utilizado, partindo das medidas de 22x22 cm e sendo adaptada para 21x22 cm, levando em conta o aproveitamento de papel mediante formatos padrões de folhas encontrados em gráficas na região (66x96 cm). A partir do tamanho estipulado, delimitou-se a padronização possível da mancha gráfica no espaço, aplicando princípios de composição, projetando um layout agradável e funcional conforme dados coletados nas pesquisas realizadas anteriormente. “Mancha é o nome dado à área destinada a receber os grafismos, ou seja, caracteres, fios e ilustrações que irão compor o layout da página.” (COLLARO 2002, p. 136). Construiu-se assim uma base organizacional e estrutural onde consequentemente se deu o início de toda a construção editorial como pode-se visualizar mediante esquemas 16, 17 e 18. 77 Esquema 24: Geração alternativa 05. Fonte: A autora 78 Esquema 25: Geração alternativa 06. Fonte: A autora 79 Esquema 26: Geração alternativa 07. Fonte: A autora Estabeleceu-se a aplicação de textos aleatórios para entender como eles se comportariam na mancha gráfica, além de testes de legibilidade, tamanhos da tipografia e a utilização do espaço como um todo. O espaço foi distribuído em duas e três colunas, proporcionando uma visualização do conforto visual gerado pelas opções aplicadas e as tipografias a elas atribuídas, a Centaur e Baskeville, nos tamanhos de 12 e 11 pontos, sendo ambas serifadas e muito legíveis, distribuídas em blocos de texto bastante fechados e rígidos. Conforme Ribeiro (1993), os caracteres exercem uma ação psicológica derivada de sua forma, podendo sugerir impressões positivas, gerar sensação de leveza ou rigidez e peso. Faz-se assim necessário escolher caracteres para compor um texto que corresponda e favoreça a expressão do sentimento evocado. 80 Esquema 27: Geração alternativa 08. Fonte: A autora 81 Esquema 28: Geração alternativa 09. Fonte: A autora Essa rigidez se tornou mais evidente a partir da proposta conjunta de uma ilustração teste em meio ao texto, onde em ambos os modelos não se formou uma unidade visual agradável, proporcionando desconforto devido aos estilos distintos entre o texto (muito formal) e a ilustração (muito orgânica), não interagindo de forma harmoniosa e estrutural. Ocorreu também a falta de maleabilidade e aproveitamento do espaço do layout, decorrente dos elementos não possuírem pesos visuais coerentes, contribuindo assim para a formação de uma visualização não contínua dos elementos. 82 Esquema 29: Geração alternativa 10. Fonte: A autora Mediante a esses fatores analisados se tornou necessário a geração de uma alternativa que possuísse maior fluidez, visando os cinco princípios citados por Ribeiro (1993) que influenciam na legibilidade dos caracteres: a simplicidade, dimensão (não sendo nem muito grande nem muito pequena), a força (a proporção entre a largura e altura), a orientação (quanto menos obliquo maior a legibilidades) e a harmonia na escolha de caracteres que formem uma mesma família. 83 Desenho 02: Ilustração nanquim. Fonte: A autora Foram estudados alguns estilos de ilustração, como o vetorial, naquim à mão e interferência digital, interpretando situações presentes na história de maneira lúdica e conceitual, devido ao estímulo gerado a imagem sugerindo uma nova análise dos fatos muito mais criativa como descreve LINS (2004, p. 36) “... a ilustração extremamente literal ou puramente ornamental e decorativa não representa mais a diversidade, a pluralidade e a riqueza de informações visuais a que as crianças de hoje têm acesso”. Justificando assim o desenvolvimento da ilustração derivada a sensações geradas através de um contexto lúdico e imaginativo. 84 Desenho 03: Teste de capa 01. Fonte: A autora Iniciaram-se posterior as gerações de alternativas das páginas, estudos de capa, partindo de um conceito minimalista, onde se invertem as cores do miolo como um negativo do conjunto padrão, gerando assim um grande contraste visual. A tipografia testada no título se chama Valium e possui fortes características voltadas ao estilo de terror, garantindo a essência de suspense que pertence ao livro, sendo aplicado na base direita gerando um grande espaçamento. O nome da autora centralizado no topo exerce uma função secundária com uma tipografia simples e reta igual a proposta ao texto geral do miolo, direcionando o olhar após a leitura do título diretamente para a parte superior, causando a sensação de curiosidade mediante ao tema. 85 Desenho 04: Teste de capa 02. Fonte: A autora Referindo-se a capa, constatou-se a necessidade de um apelo visual de maior impacto, partindo da criação de fatores e elementos atrativos ao público em que a história é voltada, criando curiosidade relevante ao contexto principal, que envolve desde a estrutura editorial assim como o acesso de informação, cultura e lazer. O estímulo a um primeiro contato com o livro conduziria a sua leitura e ao seu valor comercial: “O livro tem que ser encarado não somente como uma “jóia” a ser compartilhada, mas também como um investimento viável, com grande potencial econômico e podendo gerar um bom retorno de imagem na mídia”. LINS (2004, p. 38). 86 4 RESULTADO DO PROJETO Nesta etapa, segundo Matté (2004), serão feitos os ajustes e aprimoramentos necessários a partir de análises mais direcionadas e detalhadas das alternativas geradas e testadas. Inicia-se a modelação final e definitiva do produto gráfico visando a qualificação e nível superior de adequação para a produção em série e industrializado. 4.1 MODELAÇÃO FINAL E PLANEJAMENTO GRÁFICO VISUAL O projeto consiste em desenvolver um livro baseado em aspectos editorias e na elaboração de ilustrações direcionadas ao público infanto-juvenil a partir da história de ficção criada pela escritora Anair Weirich, no livro “Os Fantasmas do Moinho Abandonado”, estreitando os laços entre leitor e a cultura chapecoense e entre todos que gostam de suspense. Todo o planejamento visual do livro consiste em criar uma atmosfera onde o receptor interaja e se sinta instigado a conhecer o desfecho do fato descrito no enredo. Para isso, o grafismo será essencial ferramenta de apoio para gerar um conceito consistente e formar uma identidade única. A partir desse conceito definiu-se a estrutura modular da página, que permitisse a elaboração de uma composição editorial de forma a atender os quesitos necessários para o projeto. A criação dessas demarcações, contou com a padronização do layout através da estipulação de medidas e posicionamento de margens, grids, mancha gráfica e colunas, modulando e compondo o livro partindo de elementos base. 87 Esquema 30: Estrutura modular padrão de página. Fonte: A autora Determinou-se a utilização de três colunas de texto, separadas por 5mm entre elas, mediante bom aproveitamento do espaço e legibilidade devido a fluidez do texto na medida total da página. Emoldurando-as, margens laterais de 1cm em cada lado e 1,5 cm superior e inferior, garantindo assim suporte adequado para a diagramação fundamentada em um design editorial coerente. A limitação e disposição desses fatores orientarão todo o projeto, porém o comportamento da aplicação de texto, imagens e etc., se adequarão de forma a interagir ao conjunto, não tornando regra a utilização rígida de todos os espaços em todos os momentos. A formação do estilo gráfico foi delimitada por estudos e a busca de uma distinção, contextualizando uma nova idéia visual, envolvendo elementos tipográficos e da imagem em um desenrolar constante de informações e emoções. O livro tem o poder de trabalhar a criatividade humana a partir da leitura, porém as imagens que se formam são únicas e a imagem unida a história gera uma nova carga comunicativa ao contexto principal e inicial. 88 Desenho 05: Capa e 4º Capa Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado. Fonte: A autora A capa remete a essência do livro, fazendo referências ao que se refere à história, sem apresentar diretamente nenhuma imagem onde se desvenda de maneira direta o desenrolar da trama, instigando e provocando num primeiro contato. A tipografia do título é Chiller tamanho 55 pontos, sendo a mesma para o nome da autora, porém de tamanho 29 pontos, possibilitando grande visibilidade e legibilidade mesmo pertencendo a uma família tipográfica mais decorativa e artística. A ilustração é distribuída de forma contínua de lado a lado e muito contrastante, contendo muitos espaçamentos para propor o equilíbrio do layout e possibilitar o destaque do texto, mesmo que em harmonia com o restante dos elementos, assim como o nome da autora localizado junto aos componentes da imagem. Tratando-se de uma publicação independente não se aplicou a marca da editora, assim como o nome do ilustrador e projetista gráfico, na 4º capa apenas uma frase em tipografia Candara, tamanho 14 espaçamento entrelinhas 20 pontos, referente ao tema central do livro para enfatizar de onde surgiu a história e regionalizando-a. 89 Desenho 06: Falsa Guarda Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado. Fonte: A autora A falsa guarda proporciona surpresa ao leitor, sendo a única página que possui apenas ilustrações, neste caso criou-se um padrão de repetições (patterns), composta por elementos presentes e referentes ao livro, (gatos e aranhas) compondo uma estrutura que literalmente guarda a história a ser iniciada. Optou-se pela criação de uma textura, devido não se desejar a representação de nenhum fato da história de maneira direta, já que essa página abre e encerra o conteúdo, criando assim mais expectativas sobre o conteúdo a ser apresentado. Segundo Lins (2004) é muito utilizada em livros infantis, por questões estéticas e/ou poéticas, agregam informações visuais e auxiliam no acabamento. Trata-se de uma solução muito simples e de grande auxilio e força na composição editorial atual, referindo-se geralmente a primeira e última página. 90 Desenho 07: Biografia Autora do Livro. Fonte: A autora Optou-se por aplicar na última página do livro, uma breve biografia da autora, onde consta sua vida e obra, além de contatos para compra e acesso a outros tipos de trabalhos literários produzidos por Anair. Com diagramação simples, aplicou-se uma foto e dados distribuídos de forma a respeitar os outros elementos presentes no layout. O uso das ilustrações garantiu continuidade visual ao livro e tornou atrativo e leve, já que se trata de uma página geralmente não muito observada pelos leitores e que geralmente passa despercebida aos olhos por apresentar longos textos e aspecto demasiadamente formal. Para garantir um leve aspecto de formalidade, apenas a tipografia mais clássica (Candara) foi utilizada e aplicada com suas variações para as hierarquias de leitura. No parágrafo onde são apresentadas palavras da escritora se utilizou a itálica com um espaçamento maior para destaque, assim como nos títulos a tipografia foi aplicada em negrito. 91 Desenho 08: Páginas 08-09, Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado Fonte: A autora Apresentam-se aqui as páginas de número 13 e 14, onde se torna visível o conjunto integrativo dos elementos, a ilustração ultrapassando os limites da margem e da dobra, caracteriza o estilo repetindo-se nas outras páginas conseguintes formando uma unidade visual concisa. O peso da cor e estrutura das imagens gera grande impacto e contraste, porém é compensada pelos espaços brancos bem distribuídos e formando uma espécie de margem para o texto que se concentra em formas bem delimitadas, contudo essa diagramação se torna leve para a leitura devido não possuir grandes quantidades de texto e um espaçamento suave. A capitular (primeira letra do texto de tamanho diferenciado) é composta pela fonte de título, Chiller chamando a atenção para o início da leitura, a tipografia de corpo longo do texto se trata do padrão: Candara tamanho 11 pontos, onde se julgou de excelente legibilidade e coerência na composição. Nas imagens a seguir podese visualizar a família das tipografias utilizadas no projeto e todos seus caracteres pertencentes. 92 Esquema 30: Família tipográfica Chiller. Fonte: A autora Esquema 31: Família tipográfica Candara. Fonte: A autora Podemos constatar que a família da tipografia Chiller é composta por vários caracteres, acentuação, maiúsculas, minúsculas e números, possui um estilo muito peculiar, sugerindo ter sido desenhada a mão, porém muito legível e delineada, sugerindo um conceito grunge, todavia muito bem acabado. Já a família tipográfica Candara é legível e uniforme, possuindo leveza ao mesmo tempo em que é muito bem estruturada e visível, pertence ao estilo lapidário que conforme Collaro (2002) possui um desenho moderno e é a mais visual e legível de todas. Apresenta as opções de tipo regular, negrito e itálico, podendo gerar inúmeras variações na diagramação. 93 Desenho 09: Páginas 14-15, Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado Fonte: A autora A estruturação do texto de formulou-se visando as características necessárias para uma boa leitura, com isso se estabeleceram medidas de espaçamentos kerning (espaço entre caracteres) e leading (espaço entre linhas). No caso do kerning a própria família tipográfica da Candara oferecia um bom espaçamento, deixando-a então nas medidas automáticas e padrões desse estilo, a mesma medida foi aplicado na Chiller. O leading apresentou a necessidade de ser ampliado chegando a 14 pontos de espaçamento na Candara e a 16 na Chiller. Em todas as páginas foram fielmente respeitadas as margens delimitadas nas laterais (10mm), assim como as superiores e inferiores (15mm) no que diz respeito ao posicionamento de textos. O espaço entre colunas também de firmou em 5 milímetros em todo o miolo do livro e respeitando essa medida também entre as imagens mais próximas a elas, já que estas foram dispostas no decorrer do projeto de maneira muito livre, ultrapassando os limites da macha gráfica como um todo. 94 Desenho 10: Páginas 10-11, Livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado Fonte: A autora Nesse exemplo de diagramação que consta no Desenho 10, pode-se perceber uma distinta aplicação do texto, exercida assim em mais algumas páginas onde se encontram falas entre os personagens. No caso, permitiu-se uma diferenciação de tipografias, já que esse tipo de diálogo é apresentado poucas vezes no decorrer do livro, preservou-se o direito de destacá-lo mediante a caracterização de uma informalidade no tom das vozes dos que fazem parte do enredo. Sendo assim, utilizou-se a tipografia de títulos (Chiller) no tamanho 19 e espaçamento leading 16 pontos, criando espaços maiores entre o texto corrido e dando ênfase ao contraste gerado. Devido as ilustrações não respeitarem um padrão de posicionamento, a numeração das páginas necessitou de uma aplicação mais personalizada, apresentando-se de maneira específica, porém sempre na parte inferior com alimento centralizada, na tipografia Chiller tamanho 13, procurando interferir o menos possível na imagem. Essa quando presente e indispensável, poderá ser aplicada na alternativa de cor negativa, invertendo as cores, sendo assim, vezes esse elemento estará em branco e vezes em preto. Nessas páginas fica muito claro a preservação dos grandes „brancos‟ presentes junto ao texto, proporcionando em vezes um descanso visual e em outras a leitura como um conjunto único. A unidade projetual do livro foi proposta mediante 95 a formação de uma continuidade consistente e de grande impacto visual com o trabalho efetuado em uma única cor. As páginas finalizadas e organizadas em ordem conforme a proposta gráfica e editorial do livro apresenta-se nos apêndice deste projeto para uma melhor visualização do conteúdo. 4.1.1 Supervisão Esta etapa visa acompanhar o processo industrial de impressão e refere-se na assistência e apoio técnico na implementação projetual, sendo totalmente necessária de controle de qualidade ao produto final, garantindo assim a fidelidade desejada do início até o acabamento final e a normatização evitando assim situações indesejáveis entre o cliente, designer e fornecedor. Mediante contato com a indústria gráfica escolhida segue o orçamento partindo das informações técnicas do livro a ela repassadas: 96 Quadro 08: Orçamento Arcus Fonte: A autora Após as definições em relações ao custo e mão de obra da produção inicia-se o acompanhamento e controle de produção de página por página, partindo da diagramação até saída para reprodução. Para simplificar e auxiliar nesse processo existem técnicas que norteiam o posicionamento das impressões para a seqüência de montagem de maneira correta, duas a duas dobrando uma folha ao meio e enumerando-as. Lins (2004) defende a criação de bonecos em tamanho real ou o mais próximo possível para apresentação e conferência do livro final, sendo de suma importância na visualização de possíveis erros de diagramação, legibilidade ou encaixe. 97 Devido ao livro desenvolvido neste projeto conter 36 páginas é relevantemente fácil alguma página estar desencontrada com a subseqüente e assim por diante, provindo de enganos na hora da finalização, para evitar tipos de equívocos como esse é importante montar também a ordem tridimensional, como uma miniatura do livro para acompanhar a continuidade. Esquema 33: Controle de Produção. Fonte: A autora “Para saber em que lado da folha vai ser impressa determinada página existe uma fórmula simples e rápida. Sabendo-se que, com raras exceções, os cadernos são montados em múltiplos de quatro, alinha-se os números de páginas em grupos [...] COLLARO (2001, p.93). Sendo assim, as páginas pares impressas na frente e as ímpares no verso, e esse fator interfere diretamente no custo, devido a erros de impressões nas páginas invertidas significa a reimpressão de toda a lâmina de papel, além dos contratempos com prazos. 98 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O desenvolvimento do projeto teve como base as pesquisas realizadas inicialmente, tendo em vista o conhecimento dos princípios técnicos e construtivos de editoriais, priorizando a busca da essência para a elaboração de um produto final de qualidade. Com isso os objetivos foram direcionados e trabalhados de forma detalhadas visando as ferramentas chave necessárias para o processo projetual do livro Os Fantasmas do Moinho Abandonado de autoria de Anair Weirich. Percebeu-se no decorrer do processo a grande quantidade de elementos que o envolviam, cada um com sua devida característica e importância no conjunto, tornando o projeto complexo e de detalhamento estrutural, criando hierarquias e atribuindo com cuidado cada posicionamento e formato de imagem, texto, matérias e impressão, garantindo assim um conteúdo condizente ao público-alvo e suas necessidades. Criou-se então um propósito claro, consolidado na informação e clareza visual, além do acesso a cultura e entretenimento em um produto gerado a partir de conceitos sólidos agregando assim valor comercial. Esse projeto contou com o auxilio de duas metodologias voltadas ao design editorial, a de Volnei Antônio Matté focada em produtos gráficos industriais e a de Guto Lins que se trata especificamente da criação de livros infanto-juvenis do qual se trata o livro trabalhado. Munindo-se dessas duas ferramentas, se teve o controle total de cada etapa, partindo de uma análise intensa e muito estratégica, aperfeiçoando-as por intermédio de gerações de alternativas e análises concisas, criando padrões e aderindo referências. A partir dessa amplitude visual e de conhecimentos projetou-se visando alcançar os objetivos inicialmente propostos, mesmo após tantos desafios e discussões de conteúdos, materializando-os em páginas, uma a uma dando forma a um produto comercializável e capaz de transmitir uma história de grande aparato informacional que até então se encontrava sem nenhum planejamento gráfico e editorial e agora conta com uma identidade forte devido a aplicação do design e ilustrações nesse projeto. 99 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ARAÚJO, Emanuel. A Construção do Livro: princípios da técnica de editoração. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. COLLARO, Antonio Celso. Projeto Gráfico: teoria e prática da diagramação. 4. ed. São Paulo: Summus, 2000. FAGGIANI, Kátia. O Poder Do Design: da ostentação à emoção. Brasília: Theasaurus, 2006. FARIAS, Priscila. Tipografia Digital: o impacto das novas tecnologias, Rio de Janeiro: 2AB, 2001. FERLAUTO, Cláudio Augusto da Rosa; JAHN, Heloisa. O Livro da Gráfica. 3. ed. São Paulo: Edições Rosário, 2001. GIL, Antônio Carlos. Como elaborar projetos de pesquisa. 3 ed. São Paulo: Atlas, 1991. GRUSZYNKI, Ana Cláudia. Design Gráfico: do invisível ao ilegível. Rio de Janeiro: 2AB, 2006. HORIE, Ricardo Minoru ; PEREIRA, Ricardo Pagemaker. 300 Superdicas De Editoraçao, Design E Artes Graficas. São Paulo: Senac, 2005. HOLLIS, Richard. Design Gráfico: uma história concisa. Tradução: Carlos Daudt. São Paulo: Martins Fontes, 2000. LEE, Stan & BUSCENA, John. How to Draw Comics the Marvel Way. London: Titan Books Ltd., 1986. 100 LINS, Guto. Livro infantil? : projeto gráfico, metodologia, subjetividade. 2. ed. São Paulo: Rosari, 2004. LÜCKMANN, Luiz Carlos. Diretrizes para elaboração de trabalhos científicos. 2. Ed. Ver. Joaçaba: Ed. Unoesc, 2008. LUPTON, Ellen. Pensar com Tipos. São Paulo: Cosac & Naify, 2006. 182p. MUNARI, Bruno. Design E Comunicação Visual: constribuição para uma metodologia didática. São Paulo: Martins Fontes, 1997. RIBEIRO, Milton. Planejamento visual gráfico. 3. ed. Brasília: Linha, 1993 WHITE, Jan V. Edição e Design. 3. ed. JSN Editora, 2006. 238p. WILLIAMS, Robin. Design para quem não é designer: noções básicas de planejamento visual. 2 ed. São Paulo: Callis, 2005. GONDIM, André. A Fórmula da Beleza... Data de publicação. Disponível em: < http://www.tuxresources.org/blog/archives/468 >. Acesso em: 10 set. 2010. 101 APENDICE 102 APÊNDICE A - Briefing de Design BRIEFING DE DESIGN Nome do projeto: Livro “Os Fantasmas do Moinho Abandonado” Proposta: Desenvolvimento de projeto editorial e ilustrações Contato: Anair Weirich Cargo/ função: Autora/Escritora Telefone/ celular: (49)9997-5913 E-mail: [email protected] PRODUTO / LINHAS DE PRODUTOS Caracterização: Livro Infanto-juvenil Finalidade: Informação e cultura Matéria-prima: Papel couchê e triplex. Processo de produção: Impressão offset em uma cor (para reduzir custos), plastificação brilho capa (visando durabilidade) e grampo à cavalo. Preço: de 15 a 20 reais. PÚBLICO ALVO Sexo: (x) masculino (x) Feminino Faixa etária: 11 a 15 anos Classe social: B e C Atividades/ ocupações: estudantes Diferenças regionais: Sul do Brasil DESCRIÇÃO PROJETO Nome do projeto: “OS FANTASMAS DO MOINHO ABANDONADO”: Ilustração e design editorial para o público infanto-juvenil. Tipo do projeto: ( ) B2B – Empresa para empresa ( x ) B2C – Empresa para consumidor Objetivo básico: Projetar e criar um projeto editorial e de ilustrações de um livro para sua produção industrial. Objetivo de negócio: Desenvolver um produto gráfico impresso que atenda as necessidades visuais de seu público final e valor comercial agregado. Necessidade/ justificativa: Utilizar as ferramentas do design para valorizar uma história. Estratégias envolvidas no projeto: Planejamento visual agregado ao projeto editorial. A própria autora fará divulgação e venda. Resultados esperados: Valorização cultural, visibilidade, lucratividade e acessibilidade. 103 ANEXO 104 ANEXO A - Projeto Gráfico Editorial e Ilustrações do livro: Os Fantasmas Do Moinho Abandonado Capa e contracapa Folha de guarda 105 Dados técnicos Dedicatória 106 Página 05 Página 06 e 07 107 Página 08 e 09 Página 10 e 11 108 Página 12 e 13 Página 14 e 15 109 Página 16 e 17 Página 18 e 19 110 Página 20 e 21 Página 22 e 23 111 Página 24 e 25 Página 26 e 27 112 Página 28 e 29 Página 30 113 Página 32 114 ANEXO B - Os Fantasmas Do Moinho Abandonado Ficção – inspirado em lendas dos antigos do lugar, e na queima da igreja de Chapecó, quando os presos foram linchados em 1950. Ele está lá até hoje. Se suas estruturas falassem, com certeza tremeriam. Suas paredes são testemunhas vivas dos fatos grotescos que lá ocorreram. O único jeito de se ter paz, é deixar seus fantasmas em paz. Aquele lugar é sagrado de quem habita nele. Que ninguém ouse interferir nem fazer planos para aquele lugar. O antigo prédio do moinho abandonado ainda existe, e situa-se na esquina da rua Benjamin Constant com a Avenida Nereu Ramos, na cidade de Chapecó, oeste do estado de SC. Na época em que esta história foi escrita, entre 2000 e 2002, sua aparência era de abandono, e todo comércio que lá abria suas portas, tinha seu destino selado com a maldição do fracasso. As paredes, corroídas pelo tempo e chamuscadas pelo incêndio do passado, continuam em pé, numa necessidade imperiosa de luta, pois sua maldição reside exatamente nisso: manter-se em pé, para atrair os desavisados e curiosos que se aproximam daquele local. À noite, mesmo quando o céu está estrelado, bailam relâmpagos sobre o moinho, e raios misteriosos explodem em cima do prédio. As pessoas vêem e se impressionam. Fogem, mas voltam. Comentam, mas não encontram explicações. Os passantes, fascinados pelo brilho dos relâmpagos e assustados pelos sons que vinham do porão escuro e úmido, corriam, perdendo-se pelas esquinas e ruas tão amplas e tão conhecidas durante o dia, e tão misteriosas na noite. Transformavam-se em becos onde gatos perambulavam, cães uivavam e prostitutas atuavam. Ruas cheias de vultos, uivos, risos, gritos e murmúrios, como se estivesse ocorrendo alguma cerimônia fúnebre e pessoas desesperadas se descabelando. Nos idos dos anos 1950, a desordem e o crime imperavam na cidade. O banditismo, de forma organizada por parte dos que vinham de fora e alienada pelos que revidavam com a mesma violência que era a lei do oeste, reinava com seu grito 115 animalesco de horror, através de incêndios que ocorriam em vários pontos do então jovem município. A dizimação de índios nativos daquela região deixara um rastro de mortes que vagarosamente foi sendo apagado da lembrança dos habitantes. Seus fantasmas vagavam ainda pelos matos e encostas de rios, mas a vida continuava, e o machado bramia, desmatando lugares sagrados como cemitérios indígenas. Algumas tribos isoladas tentavam ainda sobreviver, mas eram escorraçadas pelos primeiros moradores, que se achavam no direito de exigir suas posses sobre as terras, ignorando o habitat natural dos indígenas. A fome dizimava os velhos e crianças restantes. Mal as cinzas dos mortos queimados haviam se espalhado nas trilhas da mata desbravada, e já se reiniciava, de forma diferente, outras mortes. O casario antigo fumegava pelas chaminés dos fogões a lenha, e os senhores de família, cedo levantavam-se, para os afazeres do dia, cada um com suas preocupações. Ora era o gado para tratar, vacas para tirar o leite, o plantio que não podia esperar, mais algumas casas de comércio que esperavam para abrir suas portas... As colonizadoras loteavam alguns pedaços de terra. Era o começo do começo. As famílias tradicionais exigiam dos menos favorecidos um respeito humilhante, pois os chamados coronéis, ao passar pelas calçadas exigiam todo espaço para eles. Que se desviassem os que por ali passavam, para dar passagem aos maiorais. Havia um respeito mudo e forçado aos políticos e comerciantes. As pessoas mais humildes tiravam o chapéu e curvavam-se, só faltando beijar-lhe os pés. Mas havia solidariedade entre os moradores. Havia amizade e ajuda mútua. Nas casas não se usavam trincos ou qualquer outra coisa que impedisse a entrada dos visitantes. Havia também, além dos antigos bodegões de comércio, os mascates que chegavam à cidade, vendendo finas sedas e outras peças raras. Mas também chegavam constantemente à cidade pessoas estranhas e misteriosas. Seus olhos eram câmeras que gravavam e espionavam tudo. Cuidavam de cada gesto dos cidadãos. Seus passos eram seguidos e registrados. Tudo se sabia e se maquinava. O sossego ia sendo minado aos poucos. Se numa família havia paz e harmonia, lá se instalava a discórdia pelos planos dos 116 malfeitores recém-chegados, que desestruturavam qualquer possibilidade de entendimento que pudesse haver entre os moradores. Se algum projeto houvesse de progresso ou de qualquer coisa que fosse, lá estavam as mentes das estranhas criaturas insinuando-se e inserindo-se nos lares, trazendo discórdia e desconfiança. Que Deus nos ajude – diziam todos. Adormeciam com pesadelos, e acordavam mais cansados e desassossegados do que quando deitavam. As crianças sensitivas tinham lampejos de visão: era um olho gigante, de cor negra e que piscava muito. Ora estava nas salas das casas, ora nos quartos, aterrorizando aos que podiam vê-lo. Quanto mais fugiam, mais o olho se deslocava de um lado para outro, e piscava, piscava, com os cílios chegando a roçar na pele dos mais apavorados. As descrições das crianças coincidiam e o pavor era coletivo. Os meninos se urinavam todos e ficavam paralisados, como se seus pés fossem fixos ao chão. Os pais não viam o que as crianças viam e não compreendiam seu desespero, mas pressentiam presenças estranhas seguindo-os pelos aposentos de suas casas. A luz do sol, na medida em que se aproximava das janelas, enfraquecia e tomava tons avermelhados, transformando-se em sangue, que escorria pelas vidraças. As achas de lenha crepitavam no fogão mas não esquentavam as panelas para cozinhar os alimentos. Os pássaros emudeciam seus cantos e frestas nas janelas se abriam, para espiar a rua, quando em tão pouco tempo atrás as janelas eram escancaradas. Os cães enfiavam-se embaixo das camas ganindo como se fosse de medo ou dor, e os gatos miavam assustados, subindo nos telhados das casas e nas árvores, para escapar de algo que pareciam ser perseguidos. As pessoas olhavam desconfiadas umas das outras, desnorteadas e sem saber o que pensar ou como agir. Os moradores sentiam o frio penetrar em seus ossos, dando-lhes uma sensação de morte. E na medida em que pessoas estranhas chegavam à cidade, mais incêndios misteriosos ocorriam, desencadeando o pânico de forma generalizada. As criaturas misteriosas rondavam as lares e premeditavam a queima da Igreja, único lugar que servia de abrigo para aquele povo temente a Deus e cheio de fé. 117 Vizinhos desconfiavam uns dos outros, como se tramassem algo às escondidas, esquecendo-se da amizade e camaradagem que os unia. O pânico estava generalizado. Na casa central da vila Norte, a menina de olhos azuis olhava com o coração aos saltos os vultos de seres esquisitos que penduravam-se nos galhos das árvores, muitos deles sentados e balançando-se, enquanto gargalhavam, como se sua morada ali fosse. Aterrorizavam-na, exigindo que abandonasse a casa. O dia estava sem vento, mas os galhos da árvore sacudiam, como se houvesse uma ventania furiosa. A garotinha de seis anos, trêmula e apavorada, queria sair, mas sua mãe não a deixava e não entendia o que estava acontecendo, somente pressentindo grandes desgraças nos calafrios que percorriam seu corpo. Sorrateira e veloz, aquela força misteriosa deslocou-se até a igreja, incendiando-a e depois abandonando a cidade. A madeira ainda crepitava quando os moradores mais próximos chegaram, trêmulos e assustados. Já não havia refúgio para a fé, a não ser nos corações dilacerados pelo medo. Os primeiros raios de sol encontraram os habitantes da cidade pasmos e sem ação, como se anestesiados. As providências foram tomadas quase ao meiodia, e os espíritos ambulantes haviam sumido, junto com a fumaça do incêndio. Houve uma falsa calmaria, mas os ânimos voltaram a se exaltar em busca de justiça. Havia uma imperiosa necessidade de se punir alguém, pelo menos encontrar um bode expiatório. Entre os moradores, um em especial estava em estado de choque: - Que aconteceu, seu Ambrósio? – indagavam todos. - Eu vi... eu vi! Eu sei prá quê os incêndio! - E porque, homem de Deus? - Os ispírito ruim só entra no corpo dos que vem de fora. É nos de fora que tá a brecha pros bixo ruim entrá... - E o que tem os incêndios a ver com isso? - Eles... os ispírito! - Fale, homem! - Os de fora, que são possuído, se alimenta da chama dos incêndio! É assim que as alma dos índio do passado se vinga das matança... É perciso fazê os demonho istrebuchá cum muita reza! 118 A sede de vingança impedia os moradores de usar o bom senso. Não acreditavam no sobrenatural e buscavam uma explicação plausível e científica para o fato. Uma busca desenfreada pelos criminosos moveu a polícia local, pressionada pelas autoridades. Quatro forasteiros foram presos em comportamento suspeito: Damião, com barba serrada e olhar ameaçador, estava enterrando um galão de gasolina no barranco à beira do riacho que atravessava a cidade. O segundo, Rui, calvo e sem um fio de barba sequer, sorria alucinadamente, deixando à mostra seus dentes cariados e tortos. Portava uma faca de lâmina prateada com cabo chapeado a ouro. Os outros dois, com os olhos vermelhos, cabelos desgrenhados e unhas sujas de terra, como se tivessem escavado o chão, tremiam e murmuravam palavras desconexas, como se acabassem de fazer algo terrível, e não tivessem noção do que era. Os quatro ficaram presos no antigo moinho que servia de cadeia, ligados por grossas correntes. Na única cela onde ficaram não batia o sol e as moscas perambulavam pelo recinto. Recebiam pão seco e água, nos intervalos do interrogatório. A única regalia era o chimarrão, bebida servida em cuias feitas de porongo, e que fazia parte da cultura daquela região. Em determinada etapa do interrogatório, como não confessavam nada, e podia-se vê-los cada vez mais atarantados, alheios à punições que os ameaçava, eram torturados com agulhados espetadas embaixo das unhas. Os olhos eram requintadamente esguichados com seringadas de gasolina e depois vazados com palitos pontiagudos. Passavam-se os dias e alguns já estavam cegos e outros quase não enxergavam, quando os guardas sofisticaram ainda mais a tortura, fazendo-os engolirem a erva do chimarrão embebida em fezes e urina. Ao cabo de poucos dias, as fezes esverdeadas e fétidas, junto com o vômito, tornavam insuportável o ambiente. O frio do inverno enregelava seus corpos magros e flácidos, que pediam clemência e alegavam inocência. Sem comprovação de seus crimes e diante de seus clamores de piedade, foram mandados para uma cela mais quente, onde batia o sol. O calor os animou um pouco, e isso foi interpretado como necessidade de fogo para alimentá-los. Então surgiu a idéia de atearem-lhes fogo aos trapos que 119 ainda tinham no corpo moribundo, testando a suspeita de que eram imunes às labaredas. Tarde demais para fazer-se qualquer coisa. A multidão que rondava o moinho, sequiosa de linchá-los, ouvia seus uivos de dor, tanto no tempo de tortura, quanto depois de mortos. Para todos os efeitos, eles foram linchados pela população revoltada. Na verdade, um linchamento que nunca existiu. A uns poucos que acreditavam os forasteiros alimentar-se de chamas, restou o temor da vingança. Foi um acontecimento que repercutiu a nível nacional, gerando imagem negativa sobre aquele povo sofrido e apavorado. É um estigma que carregam até hoje, rotulados que foram de Pistoleiros do Oeste. Findo este episódio, a cidade voltou à calmaria e as pessoas reestruturavam suas vidas. Julgaram ter chegado ao fim as aparições assustadoras e o progresso se instalou pelas ruas, casario e fazendas. Desde então, o antigo moinho ficou marcado pelos acontecimentos ocorridos ali. Todas as tentativas de abertura de algum comércio que tentava se instalar lá, eram frustradas. Nada prosperava. Cada cidadão que passava naquela esquina, sentia o velho moinho invocando os mortos que ali ficaram para sempre. Era uma energia negativa e assustadora de forma coletiva que emanava do moinho, e transformava aquele lugar em algo que causava inquietação, sem explicação aparente. O cheiro acre de carne queimada que provinha dos porões do moinho, irritava as narinas de toda a redondeza, e nada o anulava, nem mesmo o cheiro de gasolina do posto de combustível que havia em frente. Os relâmpagos no céu, bem em cima do antigo prédio, eram um mistério, e mesmo nos dias de sol eles riscavam o ar, indo se chocar nos paredões do moinho, impregnando de um surdo pavor aos que passavam. Mais alguns anos se passaram e as tentativas de abertura de um novo comércio no moinho ocorreram, desta vez uma boate. Logo os murmúrios de que lá dentro rolava droga, prostituição e bebida, invadiram a pequena cidade. Os jovens embebedavam-se, e lá dentro, nos porões, banheiros e no pequeno compartimento onde era a cela dos prisioneiros, estupravam mulheres, possuídos de tara incomum. Crimes estranhos e sem explicação eram constantes, sem que nada pudesse ser feito ou esclarecido. Era uma noite escura e barulhenta. O som da música agredia violentamente os tímpanos das pessoas e elas perdiam a noção do que estavam 120 fazendo, naquela orgia de corpos nus se entrelaçando e em frêmito. A escuridão se fez presente, no que a energia elétrica misteriosamente foi cortada. A falta de luz enegreceu a cidade toda, parecendo ressuscitar os antigos seres que apareciam nas casas, nos anos 50. Em polvorosa, a população, em sua histeria coletiva chocava-se nas ruelas e esquinas. As ruas mais largas e amplas eram invadidas por ecos e labaredas que apareciam e sumiam. Ninguém ousava se aproximar. Facas prateadas cruzavam o ar, indo cravar-se nas paredes, produzindo um retinido contínuo e uníssono, dando a impressão de uma britadeira de pedras, trabalhando a todo vapor. Na boate, embora sem eletricidade alguma, o som aumentava seu volume, fazendo o chão tremer e anulando o entendimento dos freqüentadores. De repente, o soalho se abriu, revelando as rodas do antigo moinho, fazendo os freqüentadores caírem nos porões empoçados de água podre e fétida. Em cada poça eram espelhados os rostos dos prisioneiros mortos, mostrando feições de horror, apodrecidas pelo tempo e com cavidades fosforescentes no lugar dos olhos. As paredes despregavam seus forros, revelando a marca dos corpos que foram jogados contra as mesmas, deixando indelével seu contorno. Depois, veio o estrondo. Debaixo das unhas das horríveis criaturas saíam chispas de fogo que incendiaram tudo. E o rastro de fumaça imprimia nas paredes inteiras as palavras “Justiça! Justiça!” O moinho foi lacrado com velhas costaneiras, dando a impressão que estava também lacrada definitivamente aquela história cheia de desgraças. Estamos em 2004. Na rua Benjamim Constant, exatamente em frente ao moinho, mais exatamente ainda no antigo e mal conservado calçadão, foi erguida uma moderna pista de skate. Lá andam os adolescentes que praticam esse esporte, roleiros e ciclistas. Suas piruetas no ar parecem desafiar a força latente que impera dentro do velho moinho. Ali badalam Patricinhas, Mauricinhos e todo tipo de adolescentes, formando um perfeito contraste social, visto que a classe mais pobre e carente também perambula pelas adjacências. Todos transitam com seus instrumentos esportivos embaixo do braço, nos pés ou empurrados, mas sempre com os olhos fixos nas velhas tábuas que lacraram o moinho. Circulam cautelosos, olhando com temor e respeito, aquele 121 prédio já em ruínas, com as paredes enfumaçadas e sujas, desgastadas pelo tempo. Pequenos grupos de jovens se aglomeram, fumando, bebendo e jogando cartas. Outros, discretamente manuseiam seus baseados de maconha. Como o moinho fica numa esquina, a frente que dá para a Nereu Ramos tem a vista para um posto de combustível. É ali que se reunem os jovens à noite, dividindo o espaço com os adolescentes da pista de skate. Se perguntarmos a um dos adolescentes o que fazem os jovens lá na madrugada, ele responderia: estão esquentando. Ou... estão se turbinando para a noite. A cocaína, o crack e outras drogas imperam e geram estados de alta euforia e alucinação entre os freqüentadores do local. De olhos fixos nos paredões do moinho, movidos por uma força estranha, arquitetam os mais desvairados vandalismos, ou como atacar a próxima vítima, deixando que o som dos carros o mais alto possível, tornem impossível algum ser humano da vizinhança dormir. Era como se ali houvesse um ímã para o mal. Quando a madrugada chegou, já bem inspirados, arrancaram seus carros com a descarga dos motores abertas, tornando inviável qualquer tentativa de sossego noturno que alguém pudesse querer. O sono não chega, para quem mira as paredes do moinho ao anoitecer e muito menos de madrugada. Lá dentro ouve-se a roda d‟água do moinho girando sem parar, ouve-se o som do rock dos metaleiros, como se a antiga boate ainda estivesse funcionando com força total em plena madrugada. E os relâmpagos no céu é o sinal que paira sobre o velho moinho, lembrando que lá estão acumuladas as mais estranhas e diabólicas energias do universo. O ruído de chamas crepitando faz contraste com o do riacho que corre embaixo do calçadão, dando a idéia de querer romper a massa de concreto que o recobre. Belo riacho, que outrora fluía livre a céu aberto, também represa suas forças agora... A locadora de fitas de vídeo está numa posição estratégica: como a pista de skate fica sobre o calçadão, a locadora situa-se em frente ao mesmo e ao moinho. Então, têm-se uma vista ampla e geral do movimento do pessoal circulante nas imediações. Mas o forte da locadora não é as pessoas que se movimentam nas redondezas... é a grande opção de vídeos de terror, sendo o da garotada, que eufórica disputa os lançamentos, ficando horas ali dentro da locadora mesmo, assistindo os filmes e depois saindo pela cidade, ensaiando de modo funérico os 122 maiores barbarismos. A adrenalina em alta e as fortes emoções são características de quem freqüenta o calçadão. Era uma noite tranqüila, naquele final de verão. A vizinhança estranhava o sossego, pressentindo que este estaria precedendo as maiores barbáries. Os adolescentes Jararaca, Katy, Bugra, Kibi, Amoroso e Atcho, formavam um grupo ruidoso por natureza. Chegavam do que eles chamam Gela Saco, (uma acentuada descida asfaltada do Bairro São Cristóvão), que por ser tão acentuada e eles estarem de roller, causava o famoso friozinho na espinha percorrendo o corpo, junto com o vento causado pela velocidade que entrava embaixo de suas bermudas de verão. Chegavam na pista de skate num alarido típico dos jovens: - Kibi... depois vamo subi lá na Pasteka? – (Pasteka é uma Pastelaria nos altos da Avenida Getúlio Vargas, centro da cidade). - Já disse que não me chamem mais de Kibi... eu sou Ricardo! Porque Kibi? Não sou árabe nem nada... - Kibichinho, ora essa! Você é tão feio que parece um bichinho... - Tá se achando, né Jararaca! Não é à tôa que te dão esse apelido... ruim que uma praga! - Comé... vamo na Pasteka ou não? – Bugra insistiu. - Não... vamo na praça jogá truco. Aqui tá muito podre, né Katy? – disse Amoroso. - É, mas lá o guarda não deixa a gente beber, nem fumar nem jogar truco. Só enche o saco. – argumentou Katy. - Então vamo encará a pista, aqui mesmo. O Moinho tá chamando a gente... A menina que atendia pelo nome de Jararaca, exercendo liderança sobre o grupo decidiu que assim seria. Olharam o Moinho na sua imponência ameaçadora. Mesmo com as paredes quase ruindo, era forte e exercia um misterioso fascínio sobre eles. Então, a meia-noite chegou mais depressa do que esperavam. Nem viram o tempo passar. Já meio altos pelo rum que beberam, cheirando a cigarro barato, olharam as portas cerradas pelas velhas tábuas do moinho. Flagraram-se os seis jovens no mesmo pensamento: - Jararaca... que será que tem lá dentro, de verdade, de verdade? 123 - Não sei, Atcho. Mas eu só entraria aí se tivesse aberto e eu pudesse vê o que tem dentro daqui de fora mesmo. Tiraria até fotografias. Kibi estava inquieto e incomodado com o rumo da conversa. De repente arregalou os olhos e ficou muito, muito quieto. - Que foi cara? Que tu viu? - Jararaca... tu viu o Jurão, da galera daí da frente do posto? Audacioso, ele! Quando se viraram, mal deu tempo de verem os faróis do carro de Jurão direcionados à frente do moinho que dava para o posto. Naquilo, o carro deu um salto para frente, como que impulsionado por uma mola. - Cara, parece que voa, meu... - É... mas ele tá embaladão, junto com a galera toda. De repente, o carro pisca os faróis, como num sinal combinado com alguém. - Ô meu... a porta do moinho sumiu! ... Então algo muito estranho aconteceu: Jararaca, armada de uma coragem que nunca imaginou existir dentro dela, foi até a porta, tateando a madeira que estava lá, mas que não dava para ver. Confiante, Jararaca deu um coice na porta invisível, certa que faria um som surdo de algo que batesse na madeira. Mas não havia nada ali, só o vácuo que a recebeu quando perdeu o equilíbrio. Sentiu-se despencando para um porão que parecia não ter fundo. Viu do alto de onde despencava, muitas engrenagens de ferros pontiagudos que a esperavam lá embaixo. Nem deu tempo de piscar. Viu-se transpassada pelo corpo todo, como se fosse um churrasco para assar. Naquilo, vê voar sobre ela a cabeleira loura de Atcho, que caía a toda velocidade. Com a pouca claridade do poste da rua pode vislumbrar seu amigo morrer ao seu lado, sem um gemido sequer. E engraçado... nada doía no corpo de Jararaca. Sentia-se leve e lúcida. – Será que morri e isso é a outra vida? Mas o moinho ainda é aqui... – perguntava-se. Nenhuma gota de sangue do seu corpo, nada lhe doendo e ela ali espetada. Constatava a falta de chão no moinho, que julgava haver. E via seu amigo ali, mortinho, mortinho. Tomou seu pulso pendido ao seu lado. Nenhum sinal de vida. Morreu com uma fisionomia de susto, de surpresa mesmo. 124 Ela tentou mover-se, mas seu corpo estava literalmente preso àquelas engrenagens pontiagudas. Quando olhou para o teto, tentando pedir socorro aos amigos, viu a figura grotesca de Rui, um dos prisioneiros que morreram ali, torturados. Mas era um misto da foto do prisioneiro que ela conhecia pelas pesquisas em jornais do colégio, com a fisionomia do seu amigo Kibi. Rui gargalhava num esgar ruidoso, ensurdecedor, com a careca reluzente e em chamas. Os dentes eram enormes caninos à mostra, vorazes e amarelados. Fétidos e esfomeados. Aos poucos a imagem de Kibi sumiu totalmente, deixando aparecer somente o prisioneiro da chacina. Kibi já não existia. Era Rui, o prisioneiro, clamando por vingança. Olhou para o lado em pânico, e viu então o jovem e belo rosto de Amoroso, que aos poucos ia se transformando em Damião, o outro prisioneiro que a população dizia ter sido linchado. Uma barba espessa crescia diante de seu olhos e ia enchendo o ambiente dela, grudando nas vísceras expostas de Jararaca. Foi então que deu-se conta totalmente do quanto estava encrencada. - Meu Deus! Eu grito e o som não sai da minha garganta. Quero saí daqui mas as engrenagens me prendem. Não tenho dor mas tô morrendo sem perdê uma gota sequer de sangue do meu corpo. Olhou para a porta pensando em pedir ajuda, mas só viu nela os outros dois prisioneiros montando guarda. De repente eram Bugra e Katy, de repente eram os dois prisioneiros com as unhas sujas de terra. As imagens se sobrepunham, mas as fisionomias aterradoras dos dois prisioneiros acabaram prevalecendo. Agora quem estava no teto era Damião, que segurava o galão de gasolina e despejava sobre ela. Aquele líquido frio pela temperatura da madrugada não lhe causava nenhuma sensação. Continuava insensível. A faca prateada estava nas mãos de Rui, agora sujas de sangue. E a porta sumira, somente ali estavam as figuras dos outros dois presos, com um paredão imenso atrás de si. Estava presa naquele porão chamuscado, com dois fantasmas colados ao teto e mais dois onde deveria ser a porta. De repente, os fantasmas agora eram os índios dizimados de outrora, e outra vez os prisioneiros. E então viu aquela cena que explicou a inocência dos que morreram. Jararaca via um casebre muito pobre e Damião ateando-lhe fogo. Era preciso que assim fosse, para não ser constatado o arrombamento daquele lugar. Rui, com uma 125 faca prateada cavava, afoito, a terra no chão que estava dentro do casebre. Como não houvesse outra ferramenta mais apropriada, os outros dois forasteiros também cavavam, mas com as unhas. Então apareceu uma panela de ferro cheia de jóias em ouro, que eram dos índios outrora dizimados pelos brancos. Por mais interrogados que fossem, não quiseram dizer que era ouro o que eles procuravam. Que era esta a intenção por que portavam a gasolina e a faca. Era aterrador gritar e ninguém lhe ouvir. Pior ainda, um grito que nem mesmo ela ouvia. Não sabe quanto tempo ficou assim, naquele terror, entre desmaios e voltas à consciência. Deu-se conta, bem mais tarde, que os prisioneiros voltaram a ser seus quatro amigos, agora torturados como o foram os prisioneiros. Via-os comerem erva com fezes. Viu-os sendo incendiados e torturados embaixo das unhas com farpas e todo tipo de tortura aplicada aos quatro no passado. Via Katy pedir-lhe que acabassem com aquilo logo, mas o prazer dos torturadores consistia na tortura, não na morte. Depois, de novo os prisioneiros pedindo justiça, clamando por vingança. No outro dia, pequenas réstias de sol penetravam pelo telhado quebrado, encontrando Jararaca caída sobre uma poça de água. Olhou-se, não encontrando nada que a prendesse. Mas sabia que não fora um pesadelo. Era algo real demais. Mais ainda, era um recado para ela. Fazer justiça... mas como? Na hora entendeu tudo. Só se faria justiça deixando os fantasmas em paz, no seu lugar de morada. A roda do moinho estava lá, imóvel e silenciosa, como que cansada de tanta labuta. Ouviu vozes. Virou a cabeça para todos os lados, nada doía e nada via, além dos imensos paredões cheios de teias de aranha. Era tão estranho que nada doesse... Gritou por socorro e sua voz saiu, sonora e real. E normal, como se nada tivesse havido ali. Um ou outro rato se aproximava dela, mas pareciam gordos e saudáveis. Nada a temer, então. Alguns defecavam uma massa verde, como se fosse erva de chimarrão. As baratas corriam velozes. Mais uma vez o cocô verde. Dessa vez das baratas. 126 Ouviu uma freada de carro na rua e algumas vozes. Latidos de cães se aproximando cada vez mais. Ela os ouvia farejarem, e começou a gritar mais e mais alto, em todo seu desespero. Ruídos de portas arrancadas chegou até ela, e foi então que a encontraram. Os policiais a olharam estupefatos, sem um arranhão sequer. Olhavam a tatuagem do seu braço esquerdo. Uma labareda muito vermelha e alta crescia braço acima. Olhavam-na com respeito e temor. - O que houve comigo? – conseguiu perguntar. - Você se afastou dos seus amigos ontem a noite e sumiu. A única explicação que deu foi uma mensagem no celular da Bugra: vou justificar minha tatuagem. Tenho uma missão de esclarecimento a cumprir. Nos encontramos amanhã à noite em frente ao moinho. Jararaca. - Procurávamos por você porque teus pais não conseguiram te encontrar em lugar algum. Quem nos deu uma pista tua foi um tal de Damião, que ligou dizendo onde você estava e não disse mais nada- tornou a falar o policial. E como você entrou aqui, se tivemos que despregar as portas para entrarmos? - Damião? – e então murmurou, estupefata: O fantasma do preso torturado! - Heim? - Nada... nada! Ele ainda está lá. Se suas estruturas falassem, com certeza tremeriam. Suas paredes são testemunhas vivas dos fatos grotescos que lá ocorreram. O único jeito de se ter paz, é deixar seus fantasmas em paz. Aquele lugar é sagrado de quem habita nele. Que ninguém ouse interferir nem fazer planos para aquele lugar.