Com dois anos de vida e R$ 2 milhões de investimento, a De

Transcrição

Com dois anos de vida e R$ 2 milhões de investimento, a De
EXECUTIVA
Os sócios da De Cabrón
com as tradicionais
máscaras de lucha libre
mexicanas
LOS
MESTRES
PIMENTEIROS
Com dois anos de vida e R$ 2 milhões de investimento, a De Cabrón produz
uma linha artesanal de molhos apimentados a partir de matéria-prima
brasileira, embalados em rótulos inspirados no colorido da cultura mexicana
POR DANIEL MARQUES FOTOS LUIZ MAXIMIANO
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Pode parecer estranho que
um artista plástico tenha se
juntado ao seu primo, sócio
em um conceituado escritório de design gráfico, para
criar no Brasil uma empresa
de condimentos artesanais
à base de pimentas, sem que
tivessem qualquer experiência na área de gastronomia.
Há até quem pense que esses
dois são meio excêntricos,
mas a dupla não está de
brincadeira: já conquistou a
opinião de especialistas no
assunto e está cada vez mais
presente em um mercado
que não para de crescer.
Desde 2012, os primos
paulistanos Marcelo Prado
Filho, 28 anos, e Léo Spigariol, 35, estão à frente da
fábrica De Cabrón, instalada
em Santa Cruz do Rio Pardo,
na região oeste do estado de
São Paulo, onde produzem de
forma artesanal oito produtos, entre molhos apimentados – o carro-chefe –, molho
barbecue, chips de nachos e
dois tipos de vinagres.
Com um investimento
de R$ 2 milhões desde a
criação, obtidos com a ajuda
do pai e tio Marcelo Santos,
ex-produtor de laticínios na
região, a De Cabrón conta
com 20 funcionários diretos
e planeja, até o fim de 2015,
elevar a sua produção de 20
mil unidades por mês para
50 mil. Atualmente, seus
produtos estão disponíveis
em mais de 1.200 pontos de
vendas, entre empórios –
como o sofisticado Santa Luzia, em São Paulo –, pequenas redes de supermercados,
restaurantes e postos de
gasolina em estradas paulistas. Já a loja on-line foi
desenvolvida para atender
clientes de outros estados.
Os sócios vêm conquistando também o paladar de
exigentes personalidades
gastronômicas. O chef Henrique Fogaça, proprietário do
restaurante Sal Gastronomia
e do bar Cão Véio, ambos em
São Paulo, e um dos jurados
no programa MasterChef, da
Band, foi um dos primeiros
a divulgar as pimentas em
seus estabelecimentos.
Gostou tanto que, após
conhecer os proprietários,
decidiu elaborar uma receita
original e oferecê-la em uma
parceria exclusiva com a De
Cabrón. O resultado foi um
molho com o seu nome, feito
com chipotle (veja boxe na
página 130) e maracujá. “O
cuidado com o visual das
embalagens, o sabor apurado
e a qualidade dos ingredientes tornam o produto De Cabrón sem igual no mercado”,
diz Fogaça.
Projeto de vida
Em sentido horário, a partir da foto
ao lado: os sócios da De Cabrón, Léo
Spigariol e Marcelo Prado; Prado
em viagem ao México; os primos
Gabriel, Felipe, Léo e Marcelo
ainda pequenos durante as férias; e
molhos elaborados pela marca
lista, os primos – que sempre
foram próximos – chegaram
a estudar alternativas no
ramo da gastronomia. “Sempre tive vontade de voltar a
morar no interior e trabalhar
no setor de alimentos”, conta
Spigariol. Primeiro fizeram
um curso sobre produção de
tilápia defumada. Não era
por aí. Depois estudaram
sobre criação de camarão em
água doce. Outra bola fora.
Foi durante uma viagem
ao Chile, em 2009, que
conseguiram vislumbrar a
oportunidade de negócio que
juntaria a paixão por sabores
fortes com algo rentável e
ainda pouco explorado. Lá,
observaram que a culinária
chilena tratava muito bem os
diferentes chilis locais.
A iniciativa só ganhou
forma depois de uma outra
Mexer com pimentas, porém,
não foi a primeira ideia que
bateu na cabeça de Prado e
Spigariol. Cansados da vida
estressante na capital pau122 REVISTA GOL
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EXECUTIVA
Da esq. para a dir.: Marky Ramone
aprova receita com o seu nome; chef
Henrique Fogaça com seu molho; e
lançamento da pimenta em parceria
com o chef Carlos Bertolazzi
viagem de Prado, no fi nal de
2011, desta vez ao México. De volta ao Brasil, ele
começou alguns testes com
a jalapeño, pimenta que lembra um pimentão, e produziu
o seu primeiro chipotle, um
molho com característica
defumada muito usado em
pratos mexicanos. Confiante, levou uma amostra para
a chef Lourdes Hernández,
mexicana que promovia
jantares temáticos em sua
residência em São Paulo até
2013. Sua resposta foi tão
positiva que o incentivou a
seguir em frente.
A partir de então, Prado
passou a estudar como seria
produzir a receita em escala
industrial, mantendo todo
o manuseio artesanal. Em
seguida, chamou Spigariol
para ser o diretor comercial
da marca. É ele quem elabora
os bem cuidados desenhos
e rótulos dos produtos De
Cabrón. Com sua experiência como designer, criou
para os primeiros chipotles
uma identidade visual com
influência das tradicionais
imagens de caveiras mexicanas, usadas na celebração
do Dia dos Mortos do país, e
desenvolveu uma linguagem
descontraída e com cores
vibrantes. “Procuramos
entender a cultura por trás
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O SEGREDO DOS SEUS OLHOS
(CHEIOS DE LÁGRIMAS)
JALAPEÑO
De origem
mexicana, a
pimenta tem que
ter uma espessura
específica e estar
bem madura para
extrair o máximo
do sabor. A picância
é média e atinge
principalmente o
centro da língua.
HARMONIZAÇÃO
A dupla pimenteira
indica o uso em
carnes vermelhas,
de porco, frango e
frutos do mar, como
camarão, lagosta e
lula. Também cai
bem com queijos
mais fortes, a
exemplo do blue
cheese de cabra.
ESPECIARIAS
A empresa não
revela os itens
usados, mas explica
que prima pela
sutileza no tempero,
a fim de não roubar
o sabor natural dos
jalapeños.
DEFUMAÇÃO
A pimenta é cortada,
desidratada e
defumada durante
oito a 12 dias. Esse
processo cria um
sabor amadeirado
e levemente
adocicado,
remetendo à carne
de porco e ao
pimentão.
VINAGRE
Desenvolvido
pela empresa, ele
é feito de milho.
Tem um aroma
suave e levemente
frutado. Sua função
é de conservante
natural. Por sua
natureza ácida,
desperta as papilas
gustativas.
AÇÚCAR MASCAVO
Utilizam um
fornecedor
artesanal da região.
Ele equilibra a
acidez e realça as
características
naturais do
chipotle.
de uma pimenta e tentamos traduzi-la em nossos
designs”, explica.
Hoje a De Cabrón processa, em um antigo galpão
usado para desidratar
frutas, cerca de 3 toneladas
de pimentas mensalmente,
entre jalapeños, de tradição mexicana, habaneros,
originalmente cultivada na
região amazônica, e outras
mais sazonais, como a
indiana but jolokia – considerada uma das mais fortes
do mundo. Para dar conta da
demanda, os sócios optaram
por estimular a produção
de agricultores da região de
Santa Cruz do Rio Pardo,
tradicionalmente ligados
à cultura de pimentões,
pepinos e arroz. Assim, a
empresa fornece mudas e
sementes importadas e nacionais para os produtores
e se compromete a comprar
toda a safra produzida.
Segundo a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária), o cultivo de
pimentas no Brasil ainda
é pequeno e se concentra
nos estados de São Paulo,
de Minas Gerais, de Goiás,
do Ceará, de Sergipe e da
Bahia, totalizando uma área
de 5 mil hectares. Para se ter
uma ideia, a cana-de-açúcar
ocupa uma área estimada em
9 milhões de hectares. Apesar
de a produção estar ligada a
propriedades familiares,
o mercado de molhos à base
de pimentas movimenta
R$ 83,8 milhões, de acordo
com a Associação Brasileira
da Indústria de Alimentos.
A tendência é de crescimento. Da mesma forma
como o mercado de cervejas
artesanais e cafés gourmet
conquistaram uma parcela
de consumidores que buscavam produtos de maior qualidade, as pimentas seguem
Em sentido horário,
a partir da foto ao
lado: leva fresquinha
de jalapeños; Marcos
Zanette, um dos
fornecedores locais
de pimenta bot
jolokia; e a fábrica
atual da De Cabrón
no mesmo caminho.
Aos poucos os brasileiros vão descobrindo tipos
diferentes de chilis e novas
formas de usá-los. Segundo
a Nielsen, empresa especializada em pesquisas, o
consumo nacional de molhos
de pimenta vem crescendo
nos últimos cinco anos. Em
2013, o salto foi de 8,3%.
Uma das estratégias usadas
pela empresa para expandir
seu alcance são as colaborações com nomes conhecidos.
Além de Fogaça, o chef Carlos
Bertolazzi, proprietário do
Zena Caffé e do Per Paolo,
também procurou a De
Cabrón a fim de batizar com
o seu nome um produto com
jalapeño, uísque e Coca-Cola.
A mais recente parceria
foi com o baterista Marky
Ramone, da lendária banda
Ramones, que resultou em
agosto no blitzkrieg bacon hot
sauce. O molho é feito à base
de habanero, jalapeño e bacon
e tem uma picância “punk”,
fugindo da tradicional escala
criada por Prado e Spigariol, que inclui as categorias
mirim, humana, profissa e
insana. Outra novidade prevista para este ano é um blend
com pimentas brasileiras,
como dedo-de-moça, pimenta
de-cheiro e malagueta.
20% do total do
mercado nacional de
molhos de pimentas
em cinco anos. É uma
fatia considerável de
um nicho que produz
mensalmente 2 milhões de frascos e que
segue dominada pela
gigante norte-americana Tabasco, líder
em vendas com mais
de 400 mil unidades
por mês. “Ainda não
vivo das pimentas.
Mas vamos chegar
lá”, diz Spigariol.
Os resultados de suas
iniciativas deixaram a dupla otimista. Até o final de
2015, os sócios pretendem
realocar a fábrica para
a fazenda da família em
Santa Cruz do Rio Pardo
e criar lá um museu sobre
pimentas, promovendo
visitas guiadas. Falante
que é, Spigariol enumera
outros projetos, como
criar um aplicativo
de geolocalização que
mostra sua distância para
um ponto de venda da
marca, montar um hotel e
organizar um festival de
pimentas para fomentar o
turismo ligado à gastronomia na região.
Para bancar tantas
ideias, a De Cabrón
espera passar dos quase
2% atuais e alcançar
NÚMEROS PICANTES
20
20
MIL UNIDADES
FABRICADAS
MENSALMENTE
3
2
FUNCIONÁRIOS
DIRETOS
TONELADAS
DE PIMENTAS
PROCESSADAS
POR MÊS
MILHÕES
DE REAIS INVESTIDOS
DESDE A CRIAÇÃO
DA MARCA
8
PRODUTOS
COMERCIALIZADOS
A PREÇOS ENTRE
R$ 12 E R$ 18
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