OLIVEIRA, Gabriela Aparecida de. A organização do espaço físico

Transcrição

OLIVEIRA, Gabriela Aparecida de. A organização do espaço físico
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE PEDAGOGIA
GABRIELA APARECIDA DE OLIVEIRA
A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
INFANTIL: Um estudo de caso a partir das práticas pedagógicas com bebês
São José
2011
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ – USJ
CURSO DE PEDAGOGIA
GABRIELA APARECIDA DE OLIVEIRA
A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
INFANTIL: Um estudo de caso a partir das práticas pedagógicas com bebês
Trabalho elaborado para a disciplina de Trabalho
de Conclusão de Curso (TCCII) do Curso de
Pedagogia do Centro Universitário Municipal de
São José - USJ. Orientadora: Prof. MSc. Andréa
Simões Rivero
São José
2011
GABRIELA APARECIDA DE OLIVEIRA
A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
INFANTIL: Um estudo de caso a partir das práticas pedagógicas com bebês
Trabalho de Conclusão de Curso elaborado como requisito final para a aprovação no Curso de
Graduação em Pedagogia do Centro Universitário Municipal de São José – USJ avaliado pela
seguinte banca examinadora:
______________________________
Profª. Msc. Andréa Simões Rivero
Orientadora
______________________________
Profª. MSc. Regina Ingrid Bragagnolo
Membro Examinador – NDI/UFSC
______________________________
Profª. MSc. Alexsandra de Souza Münich
Membro Examinador - USJ
São José, 21 de junho de 2011
À minha mãe Marlene (in memoriam) por ser
minha inspiração em todos os momentos da
vida.
AGRADEÇO...
... A Gilmar, meu pai, por ser meu orgulho e minha inspiração em todos os
momentos, por entender minhas decisões, por muitas vezes ter abdicado dos seus sonhos para
acreditar nos meus. Pai, és o melhor, eu te amo.
... A Marlene, minha mãe (in memoriam), por todos os ensinamentos que me
deixou, por ser meu anjo, minha inspiração na hora de tantos medos, dúvidas e incertezas.
Mãezinha, cada dia a saudade é maior! Nosso amor é infinito, ultrapassa qualquer barreira...
Te amo.
... A minha irmã Gilmara e meu cunhado Luziano, pelo apoio e pela força nos
momentos de cansaço, proporcionando-me boas risadas, alegrias e diversão. Agradeço-lhes
por terem me dado dois motivos a mais para viver e ser feliz: meu sobrinho Victor e minha
afilhada Luiza.
... Ao Rodrigo, meu irmão, que à maneira dele sempre me apoiou.
... À Luiza, que com um simples sorriso é capaz de transformar e alegrar meu dia.
A Dinda te ama demais, minha pequena.
... Ao Victor, pelo amor incondicional que por ele tenho, por me permitir fazer
parte de suas fantasias e descobertas. Quero sempre poder brincar com você. Vi, a tia te ama!
... A minhas tias: Nega, Ni, Dete, Titi, Dede, minha madrinha Elza e minha vó
Terezinha, pelos momentos de descontração em meio às minha angústias e tristezas. Obrigada
pelos constantes aprendizados sobre a vida.
... A Gabriel, Gabrieli e Mayara, por serem meus primeiros bebês. Obrigada por
dividirem comigo suas infâncias e brincadeiras.
... À minha orientadora, Andréa, exemplo admirável de comprometimento com
Educação Infantil, pela confiança que depositou em mim, pelo apoio, pela dedicação e pelos
estímulos incansáveis que me fizeram ver a real responsabilidade de ser educadora de crianças
pequenininhas.
... Ao grupo de orientação: Eliane, Juliana, Luana, Sara e Suzi, por dividirem
comigo todas as alegrias, angústias e inquietações. Vocês foram fundamentais na elaboração
desta pesquisa.
... Às professoras onde foi realizada a pesquisa, pela acolhida, e aos bebês, por
dividirem um pouco de suas infâncias comigo.
... Às professoras Alexsandra e Regina, por aceitarem compartilhar este trabalho
comigo, fazendo parte da minha banca.
... Às colegas que conquistei durante o curso, por tornarem cada momento
inesquecível. Agradeço especialmente às amigas de sempre: Juliana Cristina, Bruna
Rodrigues, Nina e Morgany. Com vocês, todos os momentos se tornaram mais fáceis.
... A todos os meus amigos que sempre torceram por mim. Em especial: Luiz
Gustavo, Juliana, Cida, Stéphany, Thais, Grazi, Karina, Ana e Bárbara. Vocês são essenciais
na minha vida.
Todas as pessoas grandes já foram um dia crianças. Mas poucas se
lembram disso. Antoine de Saint- Exupéry
RESUMO
Este trabalho sobre a educação de bebês em instituições de Educação Infantil tem como
objetivo conhecer as relações sociais estabelecidas pelos bebês entre si e com as profissionais,
considerando a influência da organização do espaço físico nessas relações. Foi realizado um
estudo etnográfico, num grupo com 13 bebês (sete meninas e seis meninos), com idade entre 4
e 10 meses, num Centro de Educação Infantil (CEI) pertencente ao município de São José,
Santa Catarina. Os dados foram obtidos mediante registros escritos, fílmicos e fotográficos.
Antes e durante a pesquisa foi realizado um levantamento teórico acerca dos estudos sobre
bebês em contextos de Educação Infantil, com a finalidade de conhecer e ampliar o
conhecimento produzido sobre esses sujeitos. As análises indicaram que no CEI pesquisado é
oportunizado para os bebês um ambiente de múltiplas e significativas relações com o espaço
físico e também com as profissionais responsáveis pelo grupo. O contexto pesquisado fornece
inúmeros indícios de que a organização do espaço físico é um fator bastante influente em
espaços coletivos de educação de bebês. Este ensaio investigativo possibilitou um maior
conhecimento das relações comunicativas dos bebês – choros, gestos, olhares, sorrisos,
movimentos –, demonstrando a necessidade de promover uma maior aproximação e mais
estudos por parte da formação inicial, em cursos de Pedagogia, e da formação em serviço,
sobre a influência da organização dos espaços físicos nas relações sociais dos bebês.
Palavras-chave: Educação Infantil. Bebês. Espaço Físico.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 09
2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA ......................................................... 12
3 A RECENTE PRODUÇÃO TEÓRICA SOBRE BEBÊS NA EDUCAÇÃO INFANTIL:
Uma primeira aproximação ................................................................................................. 21
3.1 COMO AS CRIANÇAS PEQUENAS VÊM SENDO ATENDIDAS HISTORICAMENTE
EM INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL? ............................................................. 24
3.2 O QUE DIZEM AS PESQUISAS SOBRE A ATUAÇÃO DOCENTE COM BEBÊS? ... 27
3.3 ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL ........................ 31
4 ANÁLISES DAS OBSERVAÇÕES E DOS REGISTROS REALIZADOS NO CAMPO
DE PESQUISA .................................................................................................................... 34
4.1 O CENARIO ONDE AS CRIANÇAS E AS PROFISSIONAIS DO GI SE
ENCONTRAM....................................................................................................................... 34
4.2 OS ESPAÇOS COMO PROMOTORES DE MÚLTIPLAS EXPERIÊNCIAS PARA OS
BEBÊS DO GI ...................................................................................................................... 39
4.3 AS RELAÇÕES SOCIAIS DOS BEBÊS NA CRECHE ................................................ 45
4.4 "TAIS OLHANDO A VIZINHANÇA, É ...?” Os encontros com as crianças maiores .......... 49
4.5 O EDUCAR E O CUIDAR NOS ESPAÇOS DA CRECHE ............................................ 52
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 56
ANEXO ................................................................................................................................ 59
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 61
9
1 INTRODUÇÃO
A problemática desta pesquisa surgiu a partir de inquietações produzidas ao longo da
minha trajetória no Curso de Graduação em Pedagogia no Centro Universitário Municipal de
São José (USJ). Diversos temas e problemáticas foram enfocados ao longo das disciplinas. A
partir das reflexões desencadeadas pelas disciplinas específicas sobre Educação Infantil,
surgiu meu interesse pelas relações sociais das crianças, mais especificamente dos bebês. As
relações sociais dos bebês no contexto da Educação Infantil são pouco discutidas entre os
professores e, mesmo no âmbito da formação, o estudo da prática pedagógica com bebês é
algo muito recente.
A partir da constatação da necessidade de ampliação dos estudos sobre essa temática,
surgiu a vontade de conhecer como estão sendo estudadas e discutidas as relações dos bebês e
como se caracteriza a prática pedagógica destinada a esses sujeitos, no contexto da Educação
Infantil.
Em meio às minhas vivências e observações vinculadas à disciplina de Prática de
Ensino em Educação Infantil – realizada na 6ª fase do curso de Pedagogia – surgiu meu
interesse pelos modos como as crianças se relacionavam, modificavam e recriavam os espaços
físicos da instituição. Além disso, também quis pesquisar se esses espaços eram ou poderiam
vir a ser promotores de múltiplas descobertas e encontros das crianças.
Portanto, a delimitação desta pesquisa está relacionada à escassez de trabalhos sobre a
organização dos espaços para bebês nas instituições de Educação Infantil e suas possíveis
influências na constituição social desses sujeitos.
Na busca de informações para a constituição de uma prática que respeite as crianças
pequeninas como atores sociais, segundo Schmitt (2008, p. 14), há urgência de investigações
que se aproximem daquelas produzidas, no âmbito da Sociologia e da Pedagogia da Infância,
com as crianças um pouco maiores, tentando compreender o que elas têm a nos dizer. Para
além da linguagem falada, as crianças pequeninas apresentam mais intensamente outras
formas de comunicação, tão complexas quanto a fala – balbucios, olhares, gestos, choros,
gargalhadas, sorrisos, movimentos.
A aproximação e uma observação sensível e atenta das crianças tornam-se
fundamentais para tentarmos saber e interpretar o que elas indicam, o que sentem e como se
constituem em um espaço de coletivo.
10
Os espaços educativos da creche são pensados e elaborados pelos adultos, de acordo
com o que eles esperam das crianças e da maneira como concebem e definem a educação
delas.
Ao compreender que a organização do tempo e do espaço da creche é pensada direta
ou indiretamente pelos adultos, Agostinho (2005, p. 66) afirma a necessidade de uma
organização que rompa com os modos como tradicionalmente os espaços são estruturados
para as crianças. A organização de múltiplos espaços rompe com a lógica do constante, do
igual, e oportuniza experiências heterogêneas para o grupo de crianças, distanciando-se de um
aspecto homogeneizador que prevê que todos façam a mesma coisa ao mesmo tempo. Assim,
essa organização rompe com práticas adultocêntricas e com os modelos escolarizantes;
respeita ritmos e escolhas pessoais, enriquecendo as práticas da Educação Infantil com
atividades significativas e prazerosas para crianças e adultos.
Dessa forma, considerando a importância da organização do espaço físico, este estudo
objetiva responder à seguinte questão: Que relações sociais são estabelecidas por bebês no
contexto da Educação Infantil, considerando a organização do espaço físico?
A partir desse objetivo geral, emergiram outros questionamentos:

Que relações sociais os bebês estabelecem entre seus pares e com os
profissionais, nos espaços físicos da instituição?

Quais as possíveis mediações da organização dos espaços no processo de
cuidar e educar os bebês?

Quais os possíveis indicativos dos bebês em relação à organização dos
espaços?
Para entender as relações sociais dos bebês, elegi uma creche pública municipal,
localizada em Forquilhinhas, pertencente ao município de São José – SC. Optei pelo estudo
etnográfico, e, nessa direção, foram realizadas 10 observações participantes num grupo de
berçário que atende a 13 bebês – sete meninas e seis meninos – com idades entre 4 e 10 meses
de vida. A estrutura deste trabalho é apresentada em quatro seções: após esta seção
introdutória, apresento os “Percursos Metodológicos da Pesquisa”, incluindo o processo de
escolha da creche, os primeiros contatos com o grupo, os sujeitos pesquisados e o tipo de
pesquisa.
Na segunda seção, “A recente produção teórica sobre bebês na Educação Infantil: Uma
primeira aproximação” são apresentados alguns aspectos introdutórios a respeito do
entendimento da infância como categoria social histórica. É realizado um breve levantamento
11
de trabalhos que investigaram como as crianças pequenas, em especial os bebês, são atendidas
em instituições de Educação Infantil.
Na terceira seção, apresento as “Análises das observações e dos registros realizados no
campo de pesquisa”, em que me dedico a compreender as relações sociais dos bebês no
contexto pesquisado, considerando a organização do espaço físico. Apresento como
categorias de análise: o cenário onde as crianças e as profissionais do GI se encontram; os
espaços como promotores de múltiplas experiências para os bebês; as relações sociais dos
bebês na creche; os encontros com as crianças maiores; e o educar e o cuidar nos espaços da
creche.
Para finalizar, na quarta seção, apresento as considerações finais provenientes desta
experiência investigativa.
12
2 PERCURSO METODOLÓGICO DA PESQUISA
Faz-se necessária nesta seção uma reflexão sobre o percurso metodológico e os
procedimentos que me auxiliaram na obtenção de elementos que atendessem aos objetivos do
meu estudo.
Esta pesquisa faz parte de uma perspectiva investigativa que considera as crianças
como sujeitos ativos de seu processo de constituição como seres humanos e dos contextos
sociais de que fazem parte. Os desafios para a concretização deste estudo encontram-se em
organizar metodologias que permitam incluir as crianças, analisando a legitimidade de sua
informação, sem isolar o significado capturado da totalidade das relações sociais e culturais
que as constituem. Assim como pensa Schmitt (2008), esses desafios, a meu ver, “se
fortalecem ao tratar das crianças bem pequenas, daquelas que ainda não falam [como é caso
dos sujeitos-crianças que compõem este estudo], pois exigem a apreensão de outras formas de
comunicação e expressão, alem da fala oral.”
Minha pesquisa possui um caráter de estudo de caso, pois a obtenção de dados no
estudo de caso, de acordo com Meksenas (2002), surge em torno de dados qualitativos.
O Estudo de Caso é definido como método de pesquisa empírica que conduz a uma
análise compreensiva de uma unidade social significativa. Análise compreensiva,
pois o significado que os sujeitos pesquisados atribuem a suas vidas, aos fenômenos
e às relações sociais são um dos centros de atenção do pesquisador. Que a pesquisa
incide sobre uma unidade significativa significa concentrar a pesquisa em um objeto
circunscrito: estudar determinada escola e não o sistema escolar; estudar
determinado grupo de jovens, não a juventude em geral [...]. (MEKSENAS, 2002, p.
118-119, grifos do autor)
A concepção de pesquisa que sustenta este trabalho é a de caráter qualitativo, de
acordo com Barros (2000, p. 02): “A pesquisa qualitativa tem como objetivos a observação, a
descrição, a compreensão e o significado”, pois tem como foco principal interpretar o
fenômeno que se observa. É uma pesquisa que valoriza não apenas o resultado, mas todo o
processo construído ao longo da pesquisa.
Primeiramente, delimitei a temática. Em seguida, realizei um estudo bibliográfico
sobre aquele que seria meu objeto de pesquisa. Por se tratar de uma temática com escassez de
trabalhos, encontrei algumas dificuldades em achar produções teóricas que atendessem aos
objetivos da pesquisa. Fiz um levantamento no Grupo de Trabalho Educação de Crianças de 0
a 6 anos – GT07 no site da Associação Nacional de Pós-Graduação em Educação (ANPEd),
obtendo textos sobre pesquisas recentes da área da Educação Infantil. Também localizei
13
artigos em periódicos, dissertações de mestrado e teses de doutorado que me forneceram
subsídios teóricos para estruturar meu projeto de pesquisa e, na continuidade da pesquisa,
fundamentar as reflexões e as análises.
E com o projeto de pesquisa concluído, era chegada a hora de delimitar o campo de
pesquisa no qual eu iria me inserir.
Após uma consulta na Secretaria de Educação do município de São José sobre as
instituições públicas de Educação Infantil pertencentes à rede municipal, deparei-me com a
informação de que somente três Centros de Educação Infantil (CEIs) atendiam bebês no
município de São José. Esse dado despertou meu interesse e indicou a necessidade de realizar
minha pesquisa no município. Dentre as três, eu e minha orientadora elencamos a que mais
nos chamou a atenção. Uma das razões da escolha se deveu ao fato de as crianças possuírem
faixa etária inferior a de crianças de outras instituições.
O município de São José 1 faz parte da região metropolitana da Grande Florianópolis,
faz limite com a porção continental de Florianópolis e é banhado pelas baías norte e sul.
Segundo o Censo IBGE de 2010, possui uma população de 210.513 habitantes, sendo o
quarto município mais populoso do estado, atrás de Joinville, Florianópolis e Blumenau.
O Centro de Educação Infantil (CEI) selecionado para a realização da pesquisa está
localizado em Forquilhinhas, um dos bairros de São José. O bairro caracteriza-se por possuir
delegacia de polícia, bancos, posto de saúde, escolas, comércios, etc., sendo que o CEI está
situado numa área residencial do bairro, na qual há em seus arredores: comércio de pequeno e
médio porte, uma escola estadual, um centro comunitário, uma grande praça, entre outros.
A instituição escolhida está vinculada à rede de educação do município de São José,
mas, no entanto, já pertenceu à rede estadual de educação. Em 2009, ao passar por um
processo de municipalização, passou a fazer parte da rede municipal de educação.
Atualmente, atende a 182 crianças com idades entre quatro meses e seis anos, distribuídas em
oito grupos. Nessa instituição, há professoras efetivas do estado e do município de São José e
outras admitidas em caráter temporário (ACT) pela prefeitura.
No texto de Manuela Ferreira (2003), a autora aborda os estranhos sabores que uma
pesquisadora experimenta ao estar com um grupo de crianças para fazer uma investigação.
Relata que primeiramente era uma estranha para aquelas crianças, mas depois de algum tempo
conquistou sua confiança. Entretanto, ao se aproximar das crianças e compartilhar situações
1
Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/São_José_(Santa_Catarina)>. Acesso em: 17 abr. 2011.
14
com o grupo, ela se tornou uma estranha para as professoras do grupo, pois, ao conquistar a
confiança dos pequenos, a autora passou de investigadora a “amiga” do grupo.
A pesquisa de campo feita por Ferreira (2003) em Portugal sucedeu-se continuamente
ao longo de nove meses, mas a pesquisadora, ao escrever o referido artigo, tinha interesse em
passar ao seu leitor a importância que têm as crianças enquanto sujeitos, a importância de seus
desejos e, principalmente, evidenciar os elementos envolvidos em uma pesquisa acerca do
cotidiano das crianças em Jardim de Infância 2. Seu objetivo foi também o de descrever como
desenvolveu sua pesquisa e quais as experiências viveu no jardim de infância que pesquisou.
Durante a leitura do texto, questionei-me várias vezes: como seria minha experiência
de pesquisa com crianças muito pequenas? Como seria minha interação com elas? Como seria
meu primeiro dia de observação? Como as crianças me receberiam? Qual seria a minha
reação diante de algo novo e desconhecido?
Meu primeiro contato com a instituição deu-se por meio de telefone. Nessa ocasião,
expliquei a intenção da pesquisa e meus objetivos à coordenadora pedagógica. A partir daí,
foi necessária a mediação da minha professora orientadora da disciplina de Trabalho de
Conclusão de Curso, que fez esclarecimentos sobre minha proposta de pesquisa para a
coordenadora pedagógica. Desde o primeiro momento, a coordenação do CEI mostrou-se
interessada em minha pesquisa, contudo, eu precisava da aceitação das professoras que
atendiam a faixa etária que eu pretendia observar. A partir disso, deu-se início ao meu
processo de aproximação da instituição, que aconteceu da seguinte maneira: primeiro, foi
marcada uma reunião para o dia 11 de março de 2011 com a coordenadora pedagógica,
quando tive a oportunidade de apresentar minha temática, meus objetivos e a metodologia da
minha pesquisa.
Nesse dia, a coordenadora pedagógica apresentou-me para as professoras do berçário.
Expliquei a intenção da pesquisa e meus objetivos para elas, que se mostraram interessadas,
porém, preocupadas com o momento da acolhida pelo qual as crianças estavam passando.
Nesse mesmo dia, fiquei cerca de 40 minutos conhecendo as crianças e conversando sobre
minha temática com as professoras.
Levei um cronograma com minha proposta de observação para as professoras e para a
coordenadora, que os aceitaram. Desse modo, minhas observações aconteceram duas vezes
por semana, às segundas-feiras no período matutino e às quartas-feiras no período vespertino.
2
Denominação para instituições de Educação Infantil, em Portugal.
15
Definimos, então, que eu começaria minhas observações na semana seguinte, no dia 14 de
março.
Ao iniciar minhas observações, dei início a uma nova etapa em minha pesquisa: buscar
indícios empíricos, levando em consideração as especificidades de crianças pequeninhas.
Na visão de Rocha (2008, p. 50) conhecer as crianças permite aprender mais sobre as
maneiras como a estrutura social dá conformidade às infâncias; sobre o que elas reproduzem e
transformam através da sua ação social; “sobre os significados sociais que estão sendo
socialmente aceites e transmitidos e sobre o modo como o homem e mais particularmente as
crianças [...] constroem e transformam o significado das coisas e as próprias relações sociais”.
Segundo Rocha (2005, p. 49), para a metodologia de pesquisa com crianças:
[...] aponta-se a exigência de dar atenção, não à criança como sujeito isolado, em sua
individualidade (tal como, por muito tempo, fizeram a medicina, a psicologia e
mesmo a educação, ao estudar a criança fora das suas experiências sociais), mas a
uma investigação com crianças que contemple duas dimensões: a experiência social,
que constrange não somente as crianças, mas também as crianças e suas ações e
significações dentro do contexto de relações, considerando que elas possuem uma
multiplicidade de formas de agir em diferentes contextos sociais e culturais.
Abranger os gestos, os movimentos, a entonação, o olhar e outras expressões que
compõem o ser humano não é uma exigência apenas de pesquisas com as crianças pequenas:
“Está presente, ou deveria estar, nos estudos que envolvem sujeitos de qualquer idade.
Contudo, fazem-se mais prementes nos estudos com as crianças de pouca idade, por serem
estas as formas privilegiadas pelas quais se comunicam e se expressam.” (SCHMITT, 2008.
p. 57).
Nessa perspectiva, de acordo com Salgado, Pereira e Souza (2005, p.10):
[...] a pesquisa com a criança é também um modo de compreendermos criticamente
a produção cultural de nossa época, e os lugares sociais que adultos e crianças
ocupam neste processo de criação. Portanto, é na relação dialógica e alteritária do
adulto com a criança que encontramos o fundamento teórico-metodológico da
pesquisa sobre a interação da criança com a televisão, tendo o lúdico como
linguagem mediadora dessa relação.
Ao todo, foram realizadas 10 sessões de observações participantes junto ao grupo, nos
meses de março e abril, de aproximadamente quatro horas cada, com o intuito de conhecer
melhor os sujeitos da pesquisa e perceber suas relações com os espaços físicos da instituição.
Como eu era uma “estranha” para os bebês, procurei não invadir o espaço dos pequenos.
Sentava-me um pouco mais distante das crianças e esperava que elas fossem se aproximando
16
de mim. Em algumas ocasiões, quando eu chegava à sala, duas meninas estranhavam muito
minha presença. Nessas situações, as professoras sempre faziam a mediação, trazendo as
meninas para perto de mim e dizendo quem eu era.
Nesta pesquisa, utilizei como instrumento de coleta de dados o diário de campo, o qual
considero que seja uma ferramenta importante, pois ele permite um registro dos
acontecimentos e das interações que acontecem no dia a dia na creche.
Os registros foram utilizados como uma fonte de estudo e reflexão neste trabalho, e
não como instrumento de simples ilustração do que ocorreu no interior da instituição de
Educação Infantil. Tal visão relaciona-se com o que defende Ostetto (2000, p. 199): “O
importante é exercitar o olhar atento, o escutar comprometido dos desejos e necessidades do
grupo revelados em seus gestos, falas, expressões, em suas linguagens, enfim”.
Procurei estar atenta a tudo, gestos e expressões das crianças, observando-os e
documentando-os, pois, como afirmam Gandini e Goldhaber (2002, p. 161):
[...] o processo de documentação amplia o nosso entendimento sobre os
conceitos que as crianças estão elaborando, sobre as teorias que elas estão
construindo e sobre os questionamentos que elas propõem. O processo de
documentação nos une como comunidade de aprendizagem e nos desafia a
expressar os nossos pensamentos, articulada e publicamente, e a aceitar a
responsabilidade, como sugere Carlina Rinaldi (1998), de escutar
atentamente a fim de compreender o ponto de vista dos outros.
O processo de aproximação e observação foi realizado com a intenção de compreender
as crianças nas suas singularidades e diversidades. Batista, Cerisara, Oliveira e Rivero (2004,
p. 4) nos afirmam que:
Compreendê-las na sua singularidade, nas suas diversidades, nos seus jeitos de ser,
exige que nós encontremos formas de aproximação aos universos infantis presentes
em nossas instituições, considerando que esses universos são compostos por todas
as dimensões do humano, por todas as formas de produção e manifestações
culturais.
Na pesquisa com crianças pequenas, a necessidade de abranger os sentidos e
significados de suas expressões torna indispensável o convívio com elas, pois exige do
pesquisador uma sensibilização do olhar e da escuta.
Segundo Barbosa, Kramer e Silva (2005, p. 48):
Ver: observar, construir o olhar, captar e procurar entender, reeducar o olho e a
técnica. Ouvir: captar e procurar entender, escutar o que foi dito e o não dito,
valorizar a narrativa, entender a história. Ver e ouvir são cruciais para que se possa
compreender gestos, discursos e ações. Este aprender de novo a ver e ouvir (a estar
17
lá afastado; a participar e anotar; a interagir enquanto observa a interação) se
alicerça na sensibilidade e na teoria e é produzida na investigação, mas é também
um exercício que se enraíza na trajetória vivida no cotidiano.
No que se refere aos bebês que iniciam a apropriação da linguagem, torna-se premente
a definição não apenas daquilo que os adultos ou as crianças maiores dizem na relação com
eles, mas também do não verbal que permeia todas as relações.
Podemos considerar aqui que o não verbal dos bebês se refere aos movimentos, que
vão se tornando gestos expressivos e comunicativos pela significação do outro; as
expressões faciais, que ganham sentido social; o choro, que, sendo significado nas
relações, é diferentemente identificado de acordo com cada situação, e o olhar, que
direciona e expressa o contato com o outro. Além disso, há também o não verbal
que completa e endossa os que falam, presente na entonação, no olhar, no gesto,
nos movimentos carregados de significados e sentidos, que paulatinamente vão
sendo compartilhados com as crianças pequenas, na e pela relação social.
(SCHMITT, 2008. p. 60).
Com o recurso da fotografia 3, pude refinar meu olhar para detalhes, antes
despercebidos, dos sujeitos do grupo observado. As crianças demonstravam curiosidade com
a câmera fotográfica, diversas vezes, ao ver a câmera em minhas mãos, os bebês vinham ao
meu encontro para pegá-la:
Meu primeiro contato foi com três bebês: Sofia (8 meses), Bruna (9 meses) e João (6
meses). Cheguei à sala, sentei no chão, e Sofia, que estava brincando, veio ao me
encontro. Queria pegar meu caderno e a câmera fotográfica. Desceu do colchão com
minha ajuda e tentava pegar a tatuagem que tenho no pé e na perna. (Diário de
Campo – 14/03/2011)
Estou sentada no sofá. Felipe (10 meses) vem para perto de mim, chora e faz um
gesto que eu entendo que seja para pedir colo. Eu o pego no colo, ele tenta pegar
minha câmera e meu caderno. Sofia (8 meses) também vem na nossa direção,
balbucia, engatinha até a porta e observa as crianças maiores. (Diário de Campo –
28/03/2011)
O registro fotográfico não serviu apenas de ilustração para esta pesquisa. Esse recurso
revela mais do que palavras escritas podem evidenciar. Segundo Francisco (2005, p. 35):
[...] a leitura da imagem se apresenta como um método de aproximação da realidade,
do particular, do fragmento, enfocado por diferentes ângulos e pontos de vista;
portanto, rever as fotos possibilita o desencadeamento do processo de rememoração
3
Foi enviado um pequeno texto, explicando minha pesquisa às famílias, solicitando a permissão para que os
bebês fossem fotografados. (Em anexo)
18
e reconstituição da história vivida por meio das imagens e nas imagens. A fotografia
ajuda a reconstruir o próprio olhar do observador.
As fotografias deram suporte para que cenas do dia a dia fossem revisitadas, assim
descobrindo novos detalhes, acrescentando aspectos que em outros momentos não se
tornaram presentes.
Para Rocha (2008, p. 50), “[...] como a observação sistemática e o registro de imagens
são mais do que um mero registro das observações, eles podem contribuir para ampliar nosso
olhar”.
Outra ferramenta metodológica utilizada foi o registro audiovisual. 4 Na tentativa de
compreender melhor as relações dos bebês com os espaços, esse foi um instrumento
indispensável. Por se tratar de uma pesquisa com bebês, a comunicação não se dava pela fala,
mas sim por gestos, sorrisos e expressões, e provavelmente, ao tentar descrever essas relações
com palavras, os detalhes se perderiam. Como afirmou Schmitt (2008), “confiar apenas na
observação e no registro escrito provoca o risco de perder muitas das maneiras que as crianças
utilizam para se expressar.”
No grupo com o qual realizei a pesquisa há 13 crianças – sete meninas e seis meninos
– que fazem parte do Grupo I. Dessas crianças, sete ficam na instituição em período integral.
Trata-se de um grupo misto, que atende crianças de quatro a dez meses de idade. No processo
da pesquisa, decidi atribuir nomes fictícios para preservar a identidade dos bebês, sujeitos da
pesquisa.
No GI, há uma Professora e uma Auxiliar em cada período, ambas têm uma carga
horária de 30 horas semanais. As Professoras dos períodos matutino e vespertino possuem
formação em nível de pós-graduação. A Auxiliar do período matutino possui formação em
magistério e a Auxiliar do período vespertino graduação em Pedagogia.
Ao ser apresentada ao grupo de bebês, novamente me recordei da pesquisa de Ferreira
(2003). Enquanto eu estava observando os bebês, eles faziam o mesmo a meu respeito:
Com efeito, percebi no momento que se seguiu, e aprendi ao longo do tempo, que
ficar de olhos abertos [...], a “olhar”, neste caso, para um adulto “estranho” quando
este pela primeira vez se apresenta, não é sinónimo de passividade e indiferença mas
um acto de observação atenta que intervém no conhecimento que acerca dele
constróem os sujeitos investigados [...]. (FERREIRA, 2003, p. 8).
Em muitas situações, fui recebida com estranhamento pelos pequenos:
4
Utilizo como ferramenta de gravação a mesma câmera digital usada para fazer as fotografias.
19
A professora senta-se com as crianças no colchão e entrega brinquedos para elas.
Sento-me no sofá. Ao perceber que estou ali, Marina (9 meses) olha pra mim e
chora. Saio e vou para mais longe, e Marina fica me observando. A Auxiliar traz
Marina para perto de mim, dizendo: “Olha a Gabi, Marina, ela é nossa amiguinha.”
Converso com a bebê, mas ela me olha e chora. A Auxiliar de ensino vem até a sala,
percebe alguns bebês chorando e leva Marina para „passear‟. (Diário de Campo –
30/03/2011)
E em outras era como se já eu fizesse parte do grupo:
Cheguei para a observação e fui recebida na porta com um sorriso da Bruna (9
meses), que retribuí, e fui me sentar. Logo, veio ao meu encontro o Victor (9
meses): ele queria meu caderno e minha câmera fotográfica. (Diário de Campo –
21/03/2011)
Percebi, ao longo das minhas observações, que os bebês foram construindo um vínculo
comigo. A partir disso, senti certa dificuldade de distanciamento nas situações em que era
preciso dar resposta ao outro. Isso ocorreu principalmente nos momentos em que as
professoras envolvidas com outras situações não estavam próximas dos bebês. Mesmo
tentando não interferir no grupo, em certos momentos eu não podia deixar de interagir de
modo mais próximo:
A Professora estava alimentando o Victor (9 meses). Nesse momento, chegaram os
pais da Marina (9 meses) e da Mariana (9 meses), trazendo as meninas. A Professora
me olhou como se pedisse para eu buscar as meninas. Fui até a porta, as meninas me
estranham um pouco e não quiseram sair do colo dos pais. Conversei com elas,
peguei alguns brinquedos do colchão e as chamei. Marina sorriu e veio. Mariana
estava mais resistente, peguei-a do colo da mãe, coloquei-a sentada no colchão e ela
chorou. Peguei a Mariana no colo e fui à porta do solário mostrar as outras crianças
que estavam no parque. (Diário de Campo – 11/04/2011)
E eu ajudava em algumas situações, quando percebia que algumas crianças
necessitavam:
Continuo com a Luiza (4 meses) no colo, sempre que a coloco na cama ou no
colchão ela chora. A Auxiliar faz uma mamadeira e eu ofereço-a à bebê. Luiza não
quer o leite, só quer ficar com a mamadeira na boca. Sempre que eu tirava a
mamadeira, ela chorava. Ofereci-lhe a chupeta, mas ela não a quis. Ficou mais um
pouco com a mamadeira, tirei-a e ofereci-lhe a chupeta mais uma vez, ela pegou-a e
dormiu. Coloquei-a no berço e ela se acordou, ofereci-lhe mais um pouco de
mamadeira, ela voltou a dormir, e em seguida entreguei-lhe a chupeta. (Diário de
Campo – 16/03/2011)
Felipe (10 meses) fica alguns minutos embaixo do trocador. Quando percebe mais
uma vez que a porta foi aberta e que a Auxiliar está indo tomar café, o Felipe a vê
saindo e chora. Ele vem na minha direção, faz um gesto pedindo colo, eu o pego, ele
20
se deita e pouco tempo depois dorme. [...] Quando está saindo da „sala do sono‟,
Isadora (8 meses) vem ao meu encontro e faz gesto para eu pegá-la. Vou até a porta
do solário com Isadora, ela se deita no meu ombro e também dorme. (Diário de
Campo – 16/03/2011)
Essas ações são, segundo Schmitt (2008, p. 74), “[...] de fato uma característica no
estudo com crianças, que são sujeitos e não coisas, e eu, embora não fosse profissional
daquele espaço, sentia-me corresponsável por sua segurança.”
No dia 15 de abril de 2011, fui até o CEI me despedir das crianças e entregar um CD
com as fotografias feitas durante minhas observações. Agradeci a forma receptiva como as
professoras me receberam. Despedi-me das crianças com abraços e beijos. Algumas me
olhavam com curiosidade, e outras, ao me aproximar delas, esticavam os braços para eu pegálas.
Também reafirmei, nesse dia, que será realizada – provavelmente entre os meses de
julho e agosto de 2011, durante uma reunião pedagógica do CEI – uma socialização da minha
pesquisa para os profissionais da instituição, conforme solicitou a coordenadora pedagógica
em nossa primeira conversa informal.
Enquanto pesquisadora pretendi perseguir a concretização dos objetivos do meu
trabalho, mostrando que as crianças possuem uma grande importância enquanto sujeitos
sociais. Seus desejos, seus direitos, seus modos de expressão e suas curiosidades não podem
ficar esquecidos. Minha pesquisa está voltada para a linguagem das crianças, não apenas a
linguagem oral, mas sim para todos os gestos, movimentos, olhares, expressões e
comunicações, assim como a Pedagogia da Infância. Pedagogia esta que possui a perspectiva
de olhar atentamente para as relações sociais das crianças e de enfatizar que a observação, o
registro e a reflexão são de suma importância para a compreensão do cotidiano das crianças
que vivem nas instituições de Educação Infantil.
21
3 A RECENTE PRODUÇÃO TEÓRICA SOBRE BEBÊS NA EDUCAÇÃO
INFANTIL: Uma primeira aproximação
Neste capítulo, pretendo apresentar uma primeira aproximação da produção teórica
sobre a temática do projeto. Ao fazer o mapeamento das pesquisas recentes, pude perceber
que os autores identificam uma ausência significativa de pesquisas no campo da investigação
sobre bebês em contextos de Educação Infantil.
Strenzel (2000), citada por Schimitt (2008, p.12), pontua, com base na investigação
dos resumos das teses e das dissertações sobre Educação Infantil apresentadas nos programas
de pós-graduação em Educação no Brasil entre os anos de 1983 e 1998, que, entre 387
estudos encontrados, somente 14 dizem respeito especificamente à faixa etária de 0 a 3 anos.
Coteja a autora que toda a produção referente a essa faixa etária data da década de 1990,
concluindo ser um interesse embrionário e crescente, ainda que frágil, pela forma como as
crianças pequenas se inserem no contexto da educação.
De acordo com Coutinho (2009, p. 20), pesquisadora da área de Educação Infantil, a
década de 1990 foi marcada por uma incipiente produção de estudos sobre as crianças
menores, no âmbito da sociologia e da educação. Essa situação ajuda a compreender a
existência de um pequeno número de pesquisas sobre as crianças com menos de três anos
nesses âmbitos. Nesse período, a sociologia da infância se estabilizou como campo do
conhecimento, o que também ocorreu com a área da Educação Infantil, pois foi no mesmo
período que se deu a constituição de uma pedagogia da infância.
Schimitt (2008, p. 13), em sua dissertação de mestrado, cita que as pesquisas que
tratam das crianças e dos espaços que elas compartilham são produzidas, na maioria das
vezes, em contextos com crianças a partir dos quatro anos, “comprovando a existência de uma
carência significativa de estudos que investiguem as crianças pequeninas, entre 0 e 3 anos de
idade, e mais especificamente as que envolvem os bebês com menos de 1 ano”.
Segundo Gerárd Neyrand (2005), sociólogo francês, citado por Coutinho (2002), a
concepção de bebê como sujeito social, ativo, com capacidades intelectuais, é muito recente,
ocorrendo no período pós-segunda guerra.5
A questão da lacuna de produção teórica acerca das relações sociais de bebês, na área
da educação, é abordada por Schmitt (2008, p. 14):
5
O sociólogo cita como marco dessa produção de conhecimento acerca das competências das crianças pequenas
a noção de criança sujeito de Françoise Dolto, nos anos 1970.
22
A quase ausência de pesquisas no campo da investigação dos bebês revela uma
dificuldade em perceber as crianças pequeninas como protagonistas sociais do
mundo de que fazem parte. Consequentemente, a área da educação sofre uma lacuna
de subsídios teóricos que deem visibilidade às formas como os bebês interagem
entre si e com o mundo e as contextualize, transcendendo a ideia de uma educação
desenvolvimentista, fragmentada em estágios a serem observados.
Aí estaria, portanto, uma das razões das dificuldades da área de Educação Infantil
compreender as crianças pequenininhas como sujeitos sociais ativos do e no mundo de que
fazem parte. “Os bebês entre si trocam, olham, tocam, dizem, mostram muitas coisas que
fogem à nossa compreensão”. (SCHMITT, 2008, p. 15)
No trabalho de Tristão (2004) também encontramos explicações, em uma perspectiva
histórica, a respeito das possíveis causas da escassez de estudos e pesquisas sobre as crianças
pequenas:
A produção do conhecimento acerca da infância está intimamente ligada ao lugar
social que a criança ocupa na relação com o outro, principalmente com os adultos.
Desta forma a valorização dada à criança não foi sempre igual ao longo do tempo.
(TRISTÃO, 2004, p. 31).
Walter Benjamim (1928), citado por Tristão (2004, p. 32), já relatava a dificuldade dos
adultos perceberem os bebês nas suas potencialidades: “[...] até o século XIX adentro o bebê
era inteiramente desconhecido enquanto ser inteligente, e por outro lado, o adulto constituía
para o educador o ideal cuja semelhança ele pretendia formar a criança”.
A modernidade trouxe consigo a necessidade premente de tudo controlar e explicar, de
modo que a infância não poderia ficar excluída desse processo. Construiu-se assim a infância
“normal” e a “padrão”. O ser criança passou a ser caracterizado pelas ciências médicas,
psicológicas e pedagógicas, que tiveram o poder de predizer a infância. Antes da década de
1990, não se estudava a concepção de criança, sim a de filho/aluno. (FERREIRA apud
TRISTÃO, 2004, p. 30).
Na modernidade, emerge a psicologia do desenvolvimento, legitimando o discurso
científico sobre criança e infância, além de determinar padrões de normalidade e de
deficiência, que descrevem o desenvolvimento humano como uma sequência de estágios
biologicamente determinados. (DALHLERG, MOSS & PENCE, 2003, apud TRISTÃO
2004).
As ciências modernas propuseram regras para o desenvolvimento infantil,
determinando o que é mais importante para a saúde física e mental do bebê. A partir dos
23
manuais de psicologia do desenvolvimento, crianças do mundo inteiro se desenvolvem da
mesma forma, engatinham com tantos meses, caminham com outros tantos, ou seja, tal
perspectiva fragmenta a criança em múltiplos pedaços. (SOUZA, 1996 apud TRISTÃO,
2004, p. 31).
Coutinho (2009) concebe em sua pesquisa a criança enquanto sujeito social, e afirma
que considerar as questões que dizem respeito ao ponto de vista da criança “[...] traz para os
programas de formação de professores, a tarefa de revelar a criança que se encontra no aluno,
já que a tradição dos discursos pedagógicos é tratar do aluno e invisibilizar a criança”.
A invisibilidade da criança fica ainda mais marcada quando se trata dos bebês, ou
seja, quanto menor a criança mais ausente ela está nas investigações, nos programas
de formação de professores/as, nas políticas educacionais. (COUTINHO, 2009, p.
20).
Segundo Tristão (2004), a produção do conhecimento sobre a infância “está
intimamente ligada ao lugar social que a criança ocupa na relação com o outro,
principalmente com os adultos”. Desse modo, a valorização da criança não foi sempre igual
ao longo do tempo.6
De acordo com Schmitt (2008), a importância da infância consistia no fato de ser
entendida, pelas ciências modernas, como um período evolutivo, de investimento educativo,
do qual dependeria a formação para as competências futuras:
É inegável a contribuição tanto da Medicina quanto da Psicologia do
Desenvolvimento nas descobertas científicas sobre as especificidades do cuidado
com a criança; todavia, a prescrição do desenvolvimento infantil por meio de
observações isoladas e sua classificação por testes laboratoriais resultam na
construção de um padrão universal pautado num modelo de criança distante do
contexto real e das suas condições sociais. A explicação do desenvolvimento da
criança seguia uma linha de evolução acumulativa, em que a infância era vista como
período de passagem para a constituição do futuro adulto. (SCHMITT, 2008, p. 22)
De acordo com as questões apontadas até aqui, a Educação Infantil atual tem um
significado particularmente importante quando se fundamenta numa concepção de infância
cidadã, vendo a criança como pessoa em processo de desenvolvimento, como sujeito ativo nas
relações sociais que estabelece.
6
Em relação às pesquisas sobre infância e história, destaco aqui: Philipe Ariès (1973), Ulivieri (1986), Santos
(2000) e Benjamim (1928).
24
3.1
COMO
AS
CRIANÇAS
PEQUENAS
VÊM
SENDO
ATENDIDAS
HISTORICAMENTE EM INSTITUIÇÕES DE EDUCAÇÃO INFANTIL?
Inicialmente, as creches no Brasil estiveram vinculadas ao atendimento de populações
de baixa renda, e o trabalho desenvolvido era de cunho “assistencial-custodial,” voltado para a
alimentação, a higiene e a segurança física das crianças. (VERÍSSIMO & FONSECA, 2003)
Segundo Kuhlmann Jr. e Barbosa (1998, p. 3), a creche, criada para as crianças de até
três anos, surgiu posteriormente àquelas destinadas às crianças maiores:
Fröebel, fundador do jardim de infância, na Alemanha, em 1840, chegou a escrever
sobre a educação desde a mais tenra idade, como no seu livro para as mães com
sugestões de cantigas, brincadeiras e cuidados com os bebês. Mas o jardim de
infância não foi pensado para esses pequenos.
Além da importância atribuída ao papel materno na educação dos bebês, é importante
considerar que naquela época “era quase inevitável atender os menores sem as alarmantes
consequências dos altos índices de doenças e de mortalidade”. (KUHLMANN JR, 2000).
Em diversas pesquisas7, os autores apresentam e analisam a educação dos pequenos
nas instituições brasileiras em uma perspectiva histórica. Segundo essas pesquisas, a primeira
preocupação com as crianças estava ligada à corrente higienista “[...] visando ao controle da
mortalidade infantil, dentro de movimentos encabeçados por médicos e demais profissionais
da área da saúde – as creches eram alternativas higiênicas à criadeira ou à tomadeira de
conta.” (VIEIRA, 1988 apud TRISTÃO, 2004)
Só a partir da década de 1960 as instituições de educação infantil começaram a sofrer
mudanças em relação ao caráter higienista. Segundo Montenegro (2001),
No final da década de 60 ocorreu um arrefecimento do projeto higienista, que passou
a ser considerado custoso se comparado aos novos projetos de ação comunitária,
dispensando, principalmente, a necessidade de pessoal especializado, presente no
projeto anterior. Os projetos comunitários, geralmente, consistem na conclamação à
participação da sociedade para a solução de seus problemas, mas, na maioria das
vezes, acabam institucionalizando a utilização de mão de obra voluntária, gratuita ou
sub-remunerada, geralmente feminina. (MONTENEGRO, 2001, p. 25).
O modelo de Educação Infantil implantado no Brasil foi influenciado pelos órgãos
internacionais, cuja perspectiva “legitimava atendimentos de baixo custo, utilizando tudo o
7
Vieira (1988); Kuhmann Jr (1991; 1998); Civiletti (1991); Kramer (1992).
25
que a comunidade pudesse oferecer: de instalações físicas à mão de obra, esta geralmente
feminina e sub-remunerada ou não remunerada”. (TRISTÃO, 2004).
Ainda, segundo Tristão (2004, p. 29),
[...] era lançada a ideia de que para cuidar de crianças bastava ser mulher, concepção
baseada no dom feminino inato e “natural” para esta tarefa. A não profissionalização
das mulheres ligadas à educação infantil pode, em parte, ser explicada por esta
história de políticas públicas vinculadas à assistência e à filantropia. Diante das
precárias condições encontradas em muitas creches comunitárias, a mão de obra
geralmente adveio da própria comunidade, de mulheres não formadas.
Nos estudos de Kuhlmann Jr. (2004), verifica-se que desde o início as creches, como
os jardins de infância e as escolas maternais, constituíram-se como instituições educacionais.
No entanto, até o final da ditadura militar (1985), usavam-se as expressões “escola maternal”,
“jardim da infância”, “pré-escola” para instituições que, na sua maioria, eram destinadas às
crianças de classe média e media-alta. A expressão “creche” era destinada às instituições,
geralmente de caráter filantrópico e religioso, cujo propósito era o de cuidar de crianças
pobres, órfãs ou abandonadas.
Em 1971, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação 5.692 implanta o 1º grau com oito
anos de duração, o que do ponto de vista pedagógico, “traz consequências desastrosas para a
educação infantil.” (KUHLMANN JR., 2000, p. 490) O resultado desse novo ensino de oito
anos foi que se conservaram as formas de organização do ensino primário e ginasial. A LDB
estabelece sobre a Educação Infantil: “os sistemas de ensino velarão para que as crianças de
idade inferior recebam a educação em escolas maternais, jardins de infância e instituições
equivalentes.” (art. 19, § 1º apud KUHLMANN JR., 2000, p. 490)
A perspectiva de uma Educação Infantil de qualidade passa a ser uma “tendência
elitista” (KUHLMANN, 2000). Os programas de emergência adentram o sistema educacional
e diante da falta de recursos
Renova-se também a secular proposta da “assistência científica”, que isola as
crianças pobres em instituições conformadas por uma “pedagogia da submissão”,
que considera que elas não precisam de tudo aquilo que se diz quando se fala de
educação das “outras” crianças, que (re)produz as desigualdades sociais (de classe,
de raça, de gênero, de geração). (KUHLMANN, 2000, p. 490).
Em 1974 o MEC cria o Serviço da Educação Pré-Escolar (SEPRE). As instituições de
baixo custo ganharam impulso, “ampliando o atendimento em escala muito mais acentuado.”
A Legião Brasileira de Assistência (LBA) implanta o Projeto Casulo em 1977:
26
[...] multiplicando as instituições em todo país, por meio da diminuição proporcional
do valor do per capita dos recursos repassados para as creches ligadas a entidades
sociais. Ao se ocupar de outra área, a educação, os órgãos de assistência social
acabam por interpor uma névoa a encobrir a histórica reprodução das desigualdades
e o conjunto dos direitos sociais da classe trabalhadora, dos quais o direito à creche e
à pré-escola é apenas à parte. (KUHLMANN, 2000, p. 491).
De acordo com Kuhlmann Jr. (2000), a Constituição de 1988 vai instituir que as
creches e pré-escolas passem a compor os sistemas educacionais. Apenas oito anos depois,
com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, essa constituição ganha estatuto legal:
“o reconhecimento dessas instituições como parte do sistema educacional, aponta para a
possibilidade de superação desses espaços de segregação social, que isolam as crianças pobres
em instituições educacionais vinculadas aos órgãos de assistência social.” O respeito à criança
tornou-se condição para a Educação Infantil.
Em sua dissertação de mestrado, Coutinho (2002) afirma que conceber as crianças
como seres diferentes dos adultos possibilita planejar sua educação de forma diferenciada,
com espaços e tempos que oportunizem a elas participar dessa experiência na sua
heterogeneidade. Coutinho, a partir da tese de Rocha (1996), defende a Pedagogia da Infância,
“cujo objeto de preocupação é a própria criança: seus processos de constituição como seres
humanos em diferentes contextos sociais, suas culturas, suas capacidades intelectuais,
criativas, estéticas, expressivas e emocionais”.
3.2 O QUE DIZEM AS PESQUISAS SOBRE A ATUAÇÃO DOCENTE COM BEBÊS?
Durante o século XX, muito estudos trataram sobre a infância e abordaram como as
creches e as famílias deveriam se comportar e intervir nesse período da vida. (SCHMITT,
2008, p. 32)
A preocupação com a formação das profissionais que atendem crianças pequenas
intensificou-se em 1990, antes da publicação da LDB/1996. A formação é, entre outros8, um
dos fatores muito importantes para a qualidade da educação. Em 1994 foi criado pelo MEC o
documento Por uma Política Nacional de Formação dos Profissionais da Educação Infantil,
“com textos de autoras empenhadas em desenvolver planos e propostas para a formação das
educadoras de crianças de 0 a 6 anos.” (TRISTÃO, 2004, p. 42).
8
Condições salariais, carga horária, condições de trabalho, condições de infraestrutura.
27
Ostetto (2000) faz interrogações a respeito do trabalho educativo com crianças de 0 a
6 anos, e em particular com as menores de três anos de idade:
O que fazer com as crianças, principalmente as bem pequenas? Seria possível “fazer
atividades” com crianças do berçário (turmas com até um ano de idade), além de
prever-lhes cuidados físicos (alimentação, higiene, sono etc.)? Se possível, que tipo
de atividades prever? Como planejar? Essas seriam questões de simples forma ou de
complexos fundamentos? Pensar em planejamento seria apenas uma questão de
como e do que fazer ou, além disso, principalmente, uma questão de para que e para
quem fazer? (OSTETTO, 2000, p. 175-176).
Em seu artigo, Ostetto (2000) interroga-se sobre as propostas de planejamento para as
crianças menores a partir das perguntas que as educadoras que trabalham em creches vêm
fazendo: “Que direção imprimir ao trabalho? O que considerar no planejamento? Como
organizá-lo? [...] Essas são questões que acompanham o educador em busca da qualidade de
seu fazer educativo, de profissional da educação infantil”.
Segundo Faria, qualquer proposta de planejamento na ação vai depender do educador,
[...] do compromisso que tem com sua profissão, do respeito que tem para com o
grupo de crianças, das informações de que dispõe, da formação que possui, das
relações que estabelece com o conhecimento, dos valores nos quais acredita etc.
pois, de modo geral, como já indiquei, vejo o planejamento como atitude. O
planejamento não é bom ou ruim em si. Tomado como intenção, está submetido à
direção que lhe imprimem. (OSTETTO, 2000, p. 189).
Para Ostetto (2000, p. 190), elaborar um “planejamento bem planejado” na Educação
Infantil significa “entrar em relação com as crianças”. “[...] Planejamento na Educação
Infantil é essencialmente linguagem, formas de expressão e leitura do mundo que nos rodeia e
que nos causa espanto e paixão por desvendá-lo, formulando perguntas e convivendo com a
dúvida”.
Ao discutir com um grupo de estagiárias, Ostetto (2000) constatou que as propostas de
planejamento não “davam conta” da especificidade da Educação Infantil, principalmente por
não incluírem os bebês.
A partir dessa constatação, a autora realiza novas interrogações:
Será que o planejamento na educação infantil compreende somente a
chamada “hora da atividade”, momento pedagógico por excelência? Se
assim fosse, pobres bebês, não poderiam desfrutar dessa hora! Afinal, o
que se pode fazer com eles, em meio a tanto choro, fraldas, banhos,
mamadeiras, colos, sonos? “Nem falam, nem andam, completamente
dependentes... Não há muito o que fazer com eles, ou melhor, não dá pra
28
fazer atividade pedagógica, só cuidar...” reclamam alguns educadores.
(OSTETTO, 2000, p. 191).
Nessa reclamação está a especificidade da Educação Infantil, o que parece uma
dificuldade para lidar com bebês é característica da instituição que os atende: “prover-lhe[s]
cuidado e educação.” (OSTETTO, 2000, p. 191).
As ações de educar/cuidar, alimentar e proteger tomam grande parte do cotidiano, e
isso dá uma sensação de que as relações ocorrem preferencialmente entre o adulto e a criança
individualmente. Contudo, há na instituição, além dos professores, crianças, que não ficam
passivas quando não estão diretamente com os profissionais, elas marcam sua presença,
constituem-se cotidianamente nesse espaço coletivo cheio de singularidades que decorrem dos
modos e jeitos de cada um nas relações que vivem nesse e em outros espaços.
Para Kuhlmann Jr. (1998, p. 60), a caracterização das instituições de educação infantil
como lugar de cuidado-e-educação “[...] adquire sentido quando segue a perspectiva de tomar
a criança como ponto de partida para a formulação de práticas pedagógicas”.
Planejar, na Educação Infantil, é “planejar um contexto educativo”, envolvendo
situações significativas e desafiadoras, “que favoreçam a exploração, a descoberta e a
apropriação de conhecimento sobre o mundo físico e social.” (OSTETTO, 2000, p. 193).
Considerando que a Educação Infantil é um direito público das crianças e de suas
famílias, e que pode ser um fator de promoção para uma infância digna das crianças de 0 a 6
anos, Tristão (2004) destaca vários questionamentos sobre as profissionais que trabalham com
bebês:
O que fazem estas profissionais? Quais conhecimentos mobilizam para educar e
cuidar dos bebês? Quais estratégias utilizam para construir sua prática pedagógica?
Qual é a sua formação escolar/acadêmica? Esta formação contempla as exigências
do berçário? Elas se constituem professoras? Como? O que pensam a respeito da sua
atuação profissional? Como veem seu próprio trabalho junto às crianças? Como
substituição materna? Como se relacionam com as famílias das crianças?
(TRISTÃO, 2004, p. 3).
Ana Beatriz Cerisara, citada por Tristão (2004), elenca várias outras questões sobre a
identidade profissional e formativa dessas profissionais da educação de meninos e meninas de
0 a 3 anos. Vejamos as interrogações da autora:
O que caracteriza essa profissão? Quem deve exercer essa profissão? Quais os
fundamentos dessa atividade profissional? Quais as competências que essa
profissional deve ter? Será educadora, professora, auxiliar de sala, auxiliar do
29
desenvolvimento infantil, pajem, crecheira? Como deve ser formada essa
profissional? (TRISTÃO, 2004, p. 6)
Em sua pesquisa, Tristão (2004) indaga-se sobre as práticas docentes baseadas na
concepção que as educadoras têm das crianças. Percebe-se então que nessa pesquisa, ao
observar as relações estabelecidas no grupo, a autora destaca o papel da professora, que tem
uma prática baseada na atenção a cada criança em particular, observando os bebês e suas
particularidades e seus sinais comunicativos.
Na pesquisa supracitada é evidente que a professora tem um respeito pelas crianças, o
que demonstra que considera os bebês como sujeitos sociais ativos e não “corpos a serem
banhados” (TRISTÃO, 2004, p. 118). Isso se revela no esforço da professora em proporcionar
aos bebês vivências do cotidiano, como brincar com as crianças, contar histórias. “As crianças
eram avisadas daquilo que iria acontecer: da hora do banho, da troca de fralda, da
alimentação, da ida à área”. (TRISTÃO, 2004, p. 42).
Em relação à formação dessas profissionais em 1996, a LDB criou Cursos Normais
Superiores e Institutos Superiores de Educação. Esses cursos preveem exigências menores
que os cursos universitários, “tanto em relação à formação dos docentes que lá atuarão,
quanto em relação à carga horária mínima exigida dos alunos.” (TRISTÃO, 2004, p. 43).
Na opinião de Aguiar (1997, p. 169) apud Tristão (2004, p. 44):
A formação dos profissionais sofrerá as consequências do seu afastamento de um
centro importante de produção e disseminação do conhecimento, que é a
universidade. E, nesse processo, tudo leva a crer que a luta iniciada com o processo
de democratização da sociedade brasileira nos anos 80, em defesa da constituição do
curso de formação de profissionais da educação, no âmbito da universidade, tendo
como cerne o ensino e a pesquisa, certamente sofreu um sério revés.
Aceitar que as profissionais que irão trabalhar com a Educação Infantil não se formem
nos cursos de Pedagogia “significar aceitar que tenham uma formação aligeirada, apenas
técnica-profissionalizante, restritiva de conhecimentos teóricos e culturais.” A esse respeito,
Cerisara (2002 [b], p. 336-337) citada por Tristão (2004, p. 44) comenta:
Esse encaminhamento tem por base o princípio do aligeiramento da formação no seu
sentido mais perverso, pois ao invés de capitalizar a experiência prática da aluna,
desafiando-a a aprofundar a reflexão, entende que esta seja substituível pela
vivência, desarticulando a teoria da prática sob o falacioso argumento de que quem
faz não precisa pensar o fazer. Aliada a isso, a retirada da formação das professoras
da educação básica dos cursos de pedagogia das universidades também significa a
separação entre formação profissional e formação universitária. Entra em cena a
discussão que diferencia “certificação e treinamento” de “formação”.
30
Sônia Kramer (2002) apud Tristão (2004) afirma que a formação dos profissionais
deveria ter caráter cultural, as instituições deveriam funcionar como instâncias para a
formação desses profissionais. Dessa forma, afirma que: “[...] aprendemos com a história da
formação que cursos esporádicos e emergenciais não resultam em mudanças significativas,
nem do ponto de vista pedagógico, nem do ponto de vista da carreira”.
Zanconato (1995) e Paula (1994), citados por Strenzel (2003, p. 6), abordam as
condições de trabalho das professoras nas creches, para poderem proporcionar diferentes
situações de cunho pedagógico para as crianças, seja na hora do banho, na do almoço, na do
sono, na da troca.
Estas pesquisas apontam ainda, que a ausência de formação dos profissionais que
atuam diretamente com as crianças implica em comprometimento na prática
pedagógica desenvolvida. Um maior conhecimento das crianças e das
especificidades das suas idades por parte das professoras poderia trazer
contribuições ao trabalho pedagógico desenvolvido. As pesquisas apontam também,
sobre a necessidade da revisão ou da atenção na composição da razão adulto-criança
nos diversos grupos etários. (STRENZEL, 2003, p. 6)
A busca por romper com a visão adultocêntrica que está em nós, “denunciando toda a
nossa incapacidade de perceber diferentes formas de ser e buscando legitimar o jeito próprio
das crianças sentirem, serem e agirem no mundo” (TRISTÃO, 2004, p. 2) é outro grande
desafio da área de Educação Infantil, no âmbito da formação de professores.
Nesse sentido, Tristão remete a vários questionamentos quando indaga sobre “como
podemos conhecer melhor as crianças?” As professoras que trabalham com bebês e crianças
bem pequenas sabem da riqueza do modo de ser infantil. Na pesquisa, citada a autora
percebeu que cada professora conhece o jeito de dormir, brincar, comer de cada um dos
bebês. Percebe também que além da linguagem falada, as crianças têm diferentes formas de
comunicação e expressão. “É essencial que as profissionais que trabalham com bebês nas
instituições de Educação Infantil alfabetizem-se nas diferentes linguagens das crianças
pequenas, buscando entendê-las e, de certo modo, ouvi-las.” (TRISTÃO 2004, p. 2).
A partir da relação que a professora estabelece com os bebês, explicita-se se ela
percebe a criança como um sujeito social ou apenas como um corpo que precisa ser atendido
em suas necessidades orgânicas.
Apesar desta percepção apurada em relação a cada um dos bebês, o cotidiano de um
grupo de pequenininhos em uma instituição de educação coletiva caracteriza-se por
ser composto de momentos cadenciados, tácitos e rotineiros, que são vividos pelas
professoras sem uma compreensão dos seus fins e intenções. Diversas das ações
31
realizadas pelas professoras no dia-a-dia da creche acabam sendo automatizadas e,
não sendo vistas como importantes, passam desapercebidas, de forma a não vir à
tona a riqueza da vida diária. (TRISTÃO, 2004, p. 3).
A prática docente com bebês é marcada pela sutileza das ações do cotidiano, que por
várias vezes não são percebidas na rotina diária da creche, “mas que são determinantes na
caracterização dessa profissão devido ao seu cunho humanizante”. (TRISTÃO, 2004, p. 43).
3.3 A ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO NA EDUCAÇÃO INFANTIL
No artigo escrito por Faria (1997, p. 69), somos remetidos inicialmente a vários
questionamentos: O que é fundamental para que haja uma pedagogia para a Educação
Infantil? A pedagogia da Educação Infantil consegue garantir o direito à infância? A
organização do espaço contempla as especificidades de cada criança, possibilitando assim sua
identidade cultural?
Diante desse emaranhado de questionamentos, Faria (1997) afirma que a educação
necessita de profissionais que priorizem em seus objetivos o convívio com as mais variadas
diferenças e com as regras. Fazendo uso do jogo e da brincadeira, podemos dar início a esse
processo, possibilitando vivências como a contradição, mostrando de forma prazerosa às
crianças as diversas formas de convívio e pensamentos presentes no meio social (contradição,
necessidade de transformação e provisoriedade). (FARIA, 1997, p.70).
Essa proposta nos remete à Lima (1989, p. 30) apud Faria (1997), que afirma:
O espaço físico isolado do ambiente só existe na cabeça dos adultos, para medi-lo,
para vendê-lo, para guardá-lo. Para a criança existe o espaço-alegria, o espaço-medo,
o espaço-proteção, o espaço-mistério, o espaço-descoberta, enfim, os espaços de
liberdade ou da opressão.
O ambiente planejado possibilita a organização do tempo e do espaço, fazendo da
criança o foco da prática pedagógica, para que assim a instituição possa construir a pedagogia
voltada para a Educação Infantil.
De acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de Educação
Infantil, proposto pelo MEC,
[...] o/a professor/a, junto com as crianças, prepara o ambiente da Educação Infantil,
32
organiza-o a partir do que sabe que é bom e importante para o desenvolvimento de
todos e incorpora os valores culturais das famílias em suas propostas pedagógicas,
fazendo-o de modo que as crianças possam ressignificá-lo e transformá-lo. A criança
pode e deve propor, recriar e explorar o ambiente, modificando o que foi planejado.
(BRASIL, MEC, SEB, 2006, p. 7).
Ainda de acordo com os Parâmetros Básicos de Infraestrutura para Instituições de
Educação Infantil:
[...] ampliar os diferentes olhares sobre o espaço, visando construir o ambiente físico
destinado à Educação Infantil, promotor de aventuras, descobertas, criatividade,
desafios, aprendizagem e que facilite a interação criança-criança, criança-adulto e
deles com o meio ambiente. (BRASIL, MEC, SEB, 2006, p. 8).
Segundo Faria (1997, p. 77), o espaço físico da instituição precisa contemplar o
convívio/conflito de crianças de várias idades, assim como a circulação das famílias e
condições de trabalho dignas para os professores:
Os pais e mães visitarão e observarão o lugar onde seus filhos permanecem tantas
horas do dia, as professoras registrarão suas observações, documentarão suas
iniciativas, e se as crianças de fato estiverem expressando-se através de suas cem
linguagens, criando espaços fictícios, [...] e o imprevisto acontecendo, além dos
espaços planejados para que tudo isto aconteça, os adultos precisarão de intervalos e
descanso, com locais apropriados tanto quanto para suas outras atividades.
A criança gosta de ficar sozinha, ficar com os adultos, mas do que ela mais gosta “é
ficar brincando com seus pares, imitando, reproduzindo e recriando, enfim, criando cultura
infantil”. (FARIA, 1997, p. 77).
Faria afirma que as instituições de Educação Infantil devem ser espaços “flexíveis e
versáteis”, diferente de hospitais, das casas e das escolas, “incorporando vários ambientes de
vida em contexto educativo, que possibilitem novidades a serem criadas tanto pelas crianças
como pelos adultos e que, portanto, estão em permanente construção, assim como a infância.”
(FARIA, 1997, p. 78).
O espaço interno e externo deve permitir a autonomia das crianças, precisa ser seguro,
e não ultraprotetor, não se deve impedir experiências que favoreçam os obstáculos e perigos
que o ambiente proporciona: “[...] crianças vão aprender, por exemplo, a subir e descer dos
móveis que estão na altura do adulto, vão aprender a tomar cuidado redobrado quando
pegarem uma faca ou tesoura com ponta e corte etc.” (FARIA, 1997, p. 80).
A pluralidade de características presentes nas instituições de Educação Infantil e sua
33
relevância fazem com que precisemos levar em consideração todas as especificidades
humanas, tais como: o imaginário, o lúdico, o artístico, o cognitivo e o afetivo. (FARIA,
1997, p. 74).
A partir dessas especificidades humanas, Mello (2007) destaca a importância de
considerar educacionais as atividades lúdicas que “tradicionalmente têm sido minimizadas
como atividades extras que não se incorporam no aprendizado das crianças, entre elas a
brincadeira, a fantasia, a arte, o movimento, dentre várias linguagens possíveis.”
Segundo Faria (1997, p. 75) devemos garantir também o direito da criança à infância,
possibilitando
um
ambiente
educativo
que
contemple
a
indissociabilidade
do
cuidado/educação das crianças pequenas; ambientes em que as crianças possam expressar
suas “cem linguagens”; assim como solidariedade, exercitando a tolerância, a cooperação e,
assim, a construção de sua identidade e de sua autonomia. Através das propostas de um
ambiente de autonomia para as crianças, elas poderão produzir suas atividades e realizar suas
brincadeiras, interagindo e realizando trocas de saberes. O ambiente externo ou interno deve
disponibilizar vivências com quatro elementos: ar, água, fogo e terra; atividades de
movimento de todo o tipo, de concentração, de fantasia, o direito à brincadeira. Além disso, as
crianças têm direito à água encanada e à construção sólida, iluminada, bonita, pintada,
arejada.
Os espaços devem permitir a realização de atividades individuais e em grupos, com e
sem adultos, atividades de movimento, de concentração, de fantasia, “de acesso à situações e
informações diferentes daquelas que as crianças têm em casa e/ou vão ter na escola,
destacando principalmente o direito ao não trabalho, o direito à brincadeira, enfim, o direito à
infância”. (FARIA, 1997, p. 79).
Segundo Galardini (1996b), citada por Faria (1997, p. 85),
Um espaço e o modo como é organizado resulta sempre das ideias, das opções, dos
saberes das pessoas que nele habitam. Portanto, o espaço de um serviço voltado para
as crianças traduz a cultura da infância, a imagem da criança, dos adultos que o
organizaram; é uma poderosa mensagem do projeto educativo concebido para aquele
grupo de crianças.
A organização do espaço vai favorecer e ser favorecida por uma pedagogia das
diferenças, das relações, da escuta, da animação, garantindo a melhoria das condições de vida
das crianças de 0 a 6 anos.
34
4 ANÁLISES DAS OBSERVAÇÕES E DOS REGISTROS REALIZADOS NO CAMPO
DE PESQUISA
Nesta seção, pretendo analisar de forma mais aprofundada o material empírico da
pesquisa – os registros escritos, fílmicos e fotográficos provenientes das observações
participantes junto aos bebês, bem como as informações obtidas por meio de conversas
informais com as profissionais da instituição.
4.1 O CENÁRIO ONDE AS CRIANÇAS E AS PROFISSIONAIS DO GI SE ENCONTRAM
Para entendermos como os bebês do GI se encontram e estabelecem relações no
espaço físico do CEI, torna-se necessário contextualizar o cenário 9 onde essas relações se dão,
desde a sala deste grupo aos espaços externos utilizados por ele.
A sala do GI é o espaço da creche onde os bebês permanecem por mais tempo.
Quando iniciei minhas observações, um dos primeiros aspectos que percebi foi que a sala
possuía marcas da presença de cada uma das crianças, marcas essas deixadas pelas
profissionais, indicando seu respeito e sua preocupação com os bebês do Grupo I. Ao chegar à
porta de entrada da sala, vi fixados os nomes de cada uma das crianças do grupo. E, ao entrar
na sala, observei que ela oferecia um amplo espaço para o movimento dos bebês e também
janelas altas, o que permitia um ambiente bem iluminado.
Em relação à organização do ambiente, um dos espaços que provoca a atenção dos
bebês é um balcão verde comprido, com algumas fotos do grupo do ano anterior coladas.
Fotografia 1: Felipe observando os adesivos no chão
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
9
O cenário apresentado no trabalho refere-se ao espaço da sala do GI e ao solário. Optei por não descrever o
espaço externo da instituição devido ao fato dos bebês raramente frequentarem-no.
35
Na entrada, onde há um espelho, há também um colchão envolvido por um lençol
colorido, onde as professoras disponibilizam brinquedos. Esse espaço também mobiliza
bastante os bebês.
.
Fotografia 2: Entrada da sala do GI
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
Além disso, há dois berços – um na sala do sono e outro no espaço próximo à entrada,
em que os bebês passam a maior parte do tempo –, um espelho grande e dois sofás, que as
professoras utilizam na hora de alimentar as crianças. A acomodação do berço é alterada pelas
professoras, a fim de provocar esconderijos e criar situações mais aconchegantes e
desafiadoras para os pequenos.
Fotografias 3 e 4: Bebês interagindo no espaço estruturado a partir do berço
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
36
Há uma cadeira de plástico que as professoras utilizam para o seu almoço. Na sala do
sono também há alguns colchões distribuídos no chão.
Fotografia 5: Bruna na sala do sono
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Além desses ambientes, o GI possui um solário – duas cerquinhas delimitam a passagem
da sala para o solário.
Fotografia 6: Pedro, Lucas e Victor vivenciando os espaços do solário
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
No balcão verde, como já mencionei, e na parede, há algumas fotos dos momentos
vividos com o grupo do ano anterior, expostas numa altura a que os pequenos podem observálas. Nas paredes, encontra-se também um mural com as datas de nascimento e os meses de
vida das crianças.
37
Os brinquedos da sala são mordedores de borracha, chocalhos, bonecas, bolas de
plástico, móbiles pendurados no teto por cordões de elástico, entre outros. Alguns desses
brinquedos ficam guardados em caixas plásticas dentro do armário.
A sala possui cinco bebês-conforto, que todos os dias são usados de diversas maneiras
pelas crianças, para se alimentar e se sentar, por exemplo. Além disso, algumas crianças
gostam de dormir nele e, muitas vezes, torna-se um objeto de brincadeira.
Fotografias 7 e 8: As diversas formas de exploração dos bebês-conforto
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
A sala possui uma pia e um forno de micro-ondas para as professoras prepararem as
mamadeiras e, muitas vezes, esquentarem o alimento das crianças no momento do almoço ou
da janta, quando alguma delas está dormindo e não se alimenta com o restante do grupo. A
sala também tem uma janela em contato com a cozinha, desse modo, as professoras não
precisam sair da sala para buscar os alimentos.
Fotografia 9: Sala dos bebês
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
38
Sob o trocador fica um armário vazado, onde são guardados os bebês-conforto. Esse
armário possui uma cortina de TNT colorida, que em várias situações serve como esconderijo
e espaço para brincadeiras. No trocador há um móbile e um espelho que permite que as
crianças se olhem durante uma troca de fralda, por exemplo.
Fotografia 10: João usando um bebê-conforto para se levantar
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
No solário10, há brinquedos, colchonetes e travesseiros que as professoras levavam
para acomodar melhor as crianças menores.
Fotografia 11: Bebês ouvindo histórias no solário
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
10
Espaço externo anexo à sala, que os bebês dividem com o GII.
39
Os espaços do grupo do GI são planejados pelas profissionais que trabalham com o
grupo. Em uma conversa informal com a Professora do período vespertino, ela me relatou que
esses espaços são pensados a partir do planejamento diário. As professoras discutem o
planejamento e a organização do espaço na reunião pedagógica, que acontece a cada dois
meses no CEI. A professora relatou que a função dela é “possibilitar uma rotina diferente,
trabalhando o espaço num passe de mágica. Proporcionar espaços diferentes, que não sejam
únicos, que não sejam iguais.”
4.2 OS ESPAÇOS COMO PROMOTORES DE MÚLTIPLAS EXPERIÊNCIAS PARA OS
BEBÊS DO GI
De que forma os espaços das instituições de educação infantil influenciam a vida dos
bebês dentro da creche? Como esses espaços oportunizam às crianças viver sua infância de
modo pleno? De que forma os bebês ocupam e estabelecem relações com esses espaços?
Ao lermos o documento produzido pelo MEC (1995) – Critério para um Atendimento
em Creches que Respeite os Direitos Fundamentais das Crianças –,fica evidente que muitos
dos itens observados no documento, que citam o ambiente da creche e o contato com a
natureza, estão presentes na rotina dos bebês do GI. Isso significa que muitos pontos foram
pensados pelos adultos para que as crianças do berçário desta creche tivessem um ambiente
envolvente, prazeroso, protegido e instigante.










Arrumamos com capricho e criatividade os lugares onde as crianças passam
o dia;
Nossas salas são claras, limpas e ventiladas;
As crianças têm lugares agradáveis para se recostar e desenvolver
atividades calmas;
As crianças têm direito a lugares adequados para seu descanso e sono;
Quando fazemos reformas na creche nossa primeira preocupação é
melhorar os espaços usados pelas crianças;
Quando fazemos reformas tentamos adequar a altura das janelas, os
equipamentos e os espaços de circulação às necessidades de visão e
locomoção das crianças;
Nossas crianças têm direito ao sol;
Nossas crianças têm direito de brincar com água;
Nossas crianças têm oportunidade de brincar com areia, argila, pedrinhas,
gravetos e outros elementos da natureza;
Sempre que possível levamos os bebês e as crianças para passear ao ar
livre;
40

Nossas crianças podem olhar para fora através de janelas mais baixas e com
vidros transparentes. (CAMPOS & ROSEMBERG, 1995, p. 15-16)
Levando em consideração os critérios acima citados, pensar as especificidades da
Pedagogia da Educação Infantil é tarefa que a área vem fazendo, apresentando-se esse tema
ainda como grande desafio.
Faz parte das atribuições das professoras de educação infantil projetar e organizar o
espaço que vai ser usado pelas crianças. “Um espaço caloroso, seguro, que desperte a
imaginação, a criatividade, a cooperação, a solidariedade e a autonomia das crianças” é
condição para que meninos e meninas vivam sua infância na instituição de educação de forma
livre e espontânea. (TRISTÃO, 2004, p. 94)
Em diferentes ocasiões de minhas observações, percebi a professora projetar e
organizar o espaço usado pelas crianças:
Havia uma caixa de papelão no chão, várias crianças queriam a mesma caixa, a
professora percebeu isso e trouxe várias caixas, com algumas embalagens vazias de
plástico dentro. Sofia11 (8 meses) entra na caixa com a ajuda da auxiliar e observa
as outras crianças que estão subindo nas caixas e pegando as embalagens de plástico.
(Diário de Campo – 30/03/2011)
Fotografia 12: A brincadeira com caixas de papelão
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Observei muitas vezes que as professoras oportunizavam às crianças viverem num
espaço que possibilitava a expressão corporal, “baseando suas práticas nos princípios de
11
Como mencionado na metodologia, decidi atribuir nomes fictícios para preservar a identidade dos bebês,
sujeitos da pesquisa.
41
inteireza humana, contrapondo-se à dicotomia corpo-mente instaurada em nossa sociedade”.
(AGOSTINHO, 2003, p. 121) Assim, assumindo a vontade de se movimentar manifestada
pelos bebês, para conhecer, para se comunicar, para explorar, para interagir, para se expressar:
A Professora vai até outra sala e traz uma piscina de plástico, pega uma caixa com
brinquedos e a coloca no colchão, junto com Júlia (filha da auxiliar), e conta uma
história, O pato e o peixinho:
Professora: Oi peixinho, tá gostosa essa água?
Júlia: Tá...
Professora: Ahhh, tá? Eu queria entrar, mas tô com medo. Porque olhando lá fora
tá muito friiiiiiiio. Essa água aqui é quente?
Júlia: Não, é morna, é bem boa. Não precisa ter medo.
Professora: É? Então eu vou pular. Me ajuda a contar? Me ajuda?
Isa (8 meses) está tentando entrar na piscina.
Professora: Ô, Isa ô, Isa, deixa eu pular primeiro?
João (6 meses) pega a tartaruga da mão da professora.
Professora: Ahh, o João pegou a tartaruga.
A professora pega a tartaruga de João, que tentar entrar na piscina.
Professora: Um, dois, três eeeee... Ahhhh, mergulhou, a tartaruga mergulhou. Vamo
pegar o patinho agora, quack, quack. Oi, Mariana (9 meses), onde está a sua mana
Marina (9 meses)? Acho que ela foi passear com a Alice. Ó, a Isa vai pegar mais.
Pega mais bichinho, Isa, pega mais.
A professora retira um peixe de dentro da piscina e mostra para Rafael (8 meses).
Professora: Ó o peixe, glub, glub, glub, glub.
Nesse momento, Marina chega.
Professora: Ahhh, a gente tava procurando você!
(Registro em vídeo 30/03/2011)
Fotografia 13: Professora e crianças procurando o “peixe, glub, glub”
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Durante a pesquisa, observei várias situações em que crianças iam ao balcão tentando
puxar as fotos, engatinhavam atraídas pelos adesivos colados no chão e engatinhavam por
baixo do berço. Observei, em várias ocasiões, cenas em que os bebês tentavam subir nos
42
sofás, em caixas, equilibrar-se em pé nos bebês-conforto, situações que pediam “movimentos
mais difíceis e elaborados, exigindo mais destreza, agilidade, flexibilidade, equilíbrio, num
pleno exercício de desafio. Com isso conheciam mais seus corpos, seus movimentos,
experimentavam o se movimentar no mundo.” (AGOSTINHO, 2003, p. 122)
Algumas situações merecem ser ressaltadas:
A Isadora (8 meses) vai perto da Sofia (8 meses). Sofia tira a chupeta da Isadora,
coloca na sua boca e a devolve para a Isa, que desce do colchão e vai para o armário
de fotos tentar tirá-las. Do armário, a Isa tenta subir no sofá, mas como não
consegue, deita com a cabeça no travesseiro que está sobre o sofá. Felipe (10 meses)
também tenta pegar as fotos. Ele olha para as fotos e sorri. Felipe sai do armário e
engatinha na direção dos adesivos colados no chão. Ele dá uma volta sobre os
adesivos e percebe que os bebês-conforto estão embaixo do berço. Ele puxa alguns
bebês-conforto e percebe que embaixo do trocador tem mais, e vai até lá. Felipe fica
alguns minutos embaixo do trocador, quando percebe mais uma vez que a porta foi
aberta. A Auxiliar está indo tomar café, o Felipe a vê saindo e chora. Ele engatinha
na minha direção, faz um gesto pedindo colo, eu o pego, ele deita e pouco tempo
depois dorme. (Diário de Campo – 23/03/2011)
Fotografia 14: Felipe e o encontro com os bebês-conforto
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Felipe (10 meses) sai do colchão e engatinha em direção aos adesivos colados no
chão. Pedro (9 meses) faz o mesmo. Eles tentam tirar os adesivos e engatinham
dando voltas neles. Felipe vai ao armário com as fotos coladas, puxa o papel e tira a
foto, engatinha pela sala com a foto na mão. (Diário de Campo – 28/03/2011)
Pensar o espaço da creche a partir do que as crianças nos apontam vai ao encontro da
indicação de Faria (1998), para a qual a organização desse espaço deve considerar
primeiramente as crianças.
43
Houve momentos em que percebi que as professoras mostravam uma atitude de ouvir,
tentando interpretar o que os bebês diziam ou indicavam:
Percebendo que um cobertor está sendo pouco para as crianças brincarem, a
Professora pega outro: Tô vendo que um tá sendo pouco aí, né? Deixa a Rê colocar
outro, então. No mesmo momento, Mariana (9 meses) e Marina (9 meses) vão para
baixo do berço. Não pude observar muito o que as meninas faziam, pois quando eu
chegava perto elas paravam o que estavam fazendo e ficavam me olhando. Achei
melhor sair de perto para deixá-las continuar a brincadeira. (Diário de Campo –
30/03/2011)
Em outros momentos, observei situações planejadas pela professora, que organizou e
disponibilizou sofá com colchões no solário, criando uma rampa para os bebês subirem,
oportunizando às crianças outros movimentos, outros desafios e outras emoções.
As crianças foram para o solário, pois o pessoal da limpeza precisava limpar a sala
mais cedo nesse dia. A Professora levou o sofá para a rua, junto trouxe uns colchões
e algumas almofadas de tamanhos variados. Colocou o sofá encostado na parede e
almofadas na sequência da maior para a menor, em seguida colocou um colchão em
cima, criando uma rampa, colocou em cada lado da „rampa‟ dois colchões, para o
caso de as crianças se desequilibrarem e poderem cair neles, sem se machucar.
Enquanto a Professora montava a rampa, as crianças observavam, olhavam com
estranhamento. Enquanto a Professora foi até a sala pegar uma caixa com
brinquedos, Felipe (10 meses) subiu a rampa e, ao chegar à ponta dela, olhou e
sorriu. Ao voltar, a Professora disse: Como és esperto, Fê, a Rê nem precisou te
mostrar como fazia.” Ela disponibilizou alguns brinquedos. Mariana (9 meses)
percebeu e tentou pegá-los: Vem, Mari, vem. Vamos pegar os patinhos? Aqui tem
um, dois e três patinhos.” Mariana subiu e pegou os patos. (Diário de Campo –
15/04/2011)
Fotografias 15 e 16: Mariana e Felipe descobrindo novos espaços e movimentos
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
Esses espaços precisam oferecer uma organização diversa que respeite diferenças, que
possibilite escolhas e que permita contato com imprevistos e desafios.
44
Assim como o espaço, os materiais e brinquedos usados com os bebês também devem
promover diferentes possibilidades de experiências e descobertas. Uma caixa, por exemplo,
pode proporcionar situações diversas, mediadas pelas profissionais ou não:
No chão da sala havia uma caixa de plástico. Isadora (9 meses) e Felipe (10 meses)
empurram a caixa pela sala. A Professora diz: “Vai, Fê, é o carrinho. Faz „vrum,
vrum‟ também, Isa.” (Diário de Campo – 16/03/2011)
Eu estava sentada no sofá, o Victor (9 meses) veio ao meu encontro e percebeu que
embaixo do berço ao lado havia uma caixa. Ele passou por trás do sofá, deu a volta,
passou por trás mais uma vez e conseguiu achar uma maneira de puxar a caixa.
Marina (9 meses) estava no chão observando e, ao perceber que Victor conseguiu
puxar a caixa, foi ao encontro dele para pegá-la também. Eles pegaram alguns
objetos que estavam pelo chão e os colocaram dentro da caixa. (Diário de Campo –
21/03/2011)
Fotografia 17: Victor vai ao encontro da caixa
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Identifiquei durante o trabalho que as professoras diversas vezes oportunizaram outros
ambientes para os bebês, mostrando a preocupação que tinham com os pequenos,
considerando-os sujeitos de direitos, com vontades e desejos a serem atendidos:
A Auxiliar vai até a sala do sono, volta com algumas bolinhas e as entrega para as
crianças, dizendo: “Agora a Karla vai trazer um piscina para vocês colocarem essas
bolinhas todas.” Ela traz a „piscina‟ feita com caixas de leite. No momento em que a
Auxiliar coloca a piscina no chão, Mariana (9 meses) sai do colchão e engatinha na
direção da piscina, se apoia e tenta pegar as bolinhas que estão dentro dela. Pedro (9
meses) e Victor (9 meses), que estavam no colchão, também vêm até a piscina.
Victor tenta entrar, a Auxiliar percebe e o ajuda, colocando-o na piscina. Mariana
também entra. Pedro fica do lado de fora pegando as bolinhas de dentro e
colocando-as no colchão. Marina (9 meses) está sentada observando as crianças. A
Auxiliar tira uma bola de piscina e a joga para a Marina, que sorri e engatinha até
ela. A professora leva Sofia (9 meses) para a piscina também. (Diário de Campo –
04/04/2011)
45
Fotografia 18: Brincando na piscina de bolinhas
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
Nessa cena, a professora tornou-se a mediadora entre os bebês e os objetos,
organizando e propiciando espaços e situações que articulam os recursos e as capacidades
afetivas, emocionais, sociais e cognitivas de cada criança aos seus conhecimentos prévios. “O
educador constitui-se, portanto, um parceiro mais experiente, cuja função é propiciar e
garantir um ambiente rico, prazeroso, saudável de experiências educativa e social variadas.”
(HANK, 2006, p. 6)
4.3 AS RELAÇÕES SOCIAIS DOS BEBÊS NA CRECHE
Como ocorrem as relações sociais estabelecidas nos espaços físicos da creche? Como
são propostas? Que espaços são esses e como são organizados para que as relações
aconteçam? A intenção de compreender as relações sociais de bebês exigiu minha imersão no
grupo e o acompanhamento dos processos de constituição dessas relações em seu desenrolar.
No CEI pesquisado, fui percebendo, no decorrer das observações, que a sala era
organizada de forma a possibilitar que os bebês pudessem se envolver com o espaço e entre si
mesmos. Quando as professoras precisavam dar atenção individual à determinada criança, as
outras tinham à disposição objetos, espaços estruturados de modos diversos, bem como a
possibilidade de interagir com outras crianças.
Os cantos, a seleção de objetos, o colchão com brinquedos e a presença de músicas e
sons demonstravam o respeito e a preocupação das professoras com os bebês, tanto com sua
segurança como com a constituição de sua autonomia. É o que evidencia o registro abaixo:
Bruna (9 meses) e Sofia (8 meses) descem do colchão com a minha ajuda e vão até
os adesivos colados no chão, como na primeira observação. Sofia tenta tirar os
adesivos do chão e depois engatinha sobre eles. Bruna cai, bate com a cabeça e
chora, a Auxiliar a pega no colo e diz: “Calma, Bruna, não foi nada, tás com
46
soninho, né? Vou pegar a fraldinha pra ti deitar [sic] e dormir.” A Auxiliar troca a
fralda da Bruna e a coloca no colchão deitada, entrega a ela um „cheirinho‟ e a
menina dorme. A Professora canta e Sofia bate palmas. Aqui, mais uma vez,
percebo a presença da música no cotidiano dos bebês. (Diário de Campo –
16/03/2011)
Como a intenção deste trabalho é discutir o espaço físico destinado aos bebês na
instituição de educação infantil, é importante que façamos uma reflexão ao longo do texto
sobre como ele é determinante nas relações sociais desses sujeitos. Percebemos como também
a arquitetura parece ignorar as necessidades específicas dos bebês, o que exige da instituição
e, especialmente das profissionais, uma organização do espaço para que se concretize e se
estabeleça um lugar que respeite os interesses e anseios de toda a comunidade educacional, de
forma que “a pedagogia faz-se no espaço e o espaço, por sua vez, consolida a pedagogia”
(FARIA, 2003, p. 70). As autoras italianas Galardini & Giovannini chamam de ambiente
generoso aquele que é atenciosamente planejado pelas professoras para receber crianças
pequenas:
O que costumamos chamar de ambiente generoso é o tipo de ambiente que resulta
não somente da riqueza e variedade dos materiais oferecidos, mas também das
atitudes dos professores, implícitas no cuidado com que os materiais foram
procurados, escolhidos e oferecidos às crianças. Trata-se de uma atitude generosa,
que se caracteriza pela atenção e escuta constantes por parte dos adultos que sabem
observar, oferecer coisas e fazer isso na medida e no momento certo. (GALARDINI
& GIOVANNINI, apud TRISTÃO, 2004, p. 118)
Uma situação que merece ser ressaltada foi o dia em que a professora criou um novo
ambiente para os pequenos:
A Professora sai da sala com Rafael (8 meses) e volta trazendo um cobertor. Coloca
o berço no centro da sala e o cobertor em cima, as crianças percebem e vão para
baixo do berço. A Professora disponibiliza os brinquedos perto das crianças. Sofia (8
meses) é a primeira a entrar. Isadora (8 meses) puxa o cobertor e tenta achar uma
maneira de entrar, espia por baixo e puxa o pé de Sofia. O berço estava em cima dos
adesivos que ficam colados no chão, os bebês tentavam tirá-los do chão e colocavam
brinquedos em cima deles. (Diário de Campo – 30/03/2011)
47
Fotografia 19: A curiosidade de Isadora
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Esse relato do diário de campo mostra a preocupação da Professora em criar novos
ambientes para a interação dos bebês. Os espaços devem ser pensados e planejados com
intencionalidade, oportunizando interações entre os pares, para ver os modos de
expressão/comunicação específicos dos bebês.
Observei que muitas ações pospostas pelas professoras se caracterizam pela inserção
de novos elementos no cotidiano dos pequenos:
Enquanto eu estava com a Luiza (4 meses), a Professora colocou um CD, pegou uma
caixa12 com vários brinquedos e foi até o colchão onde estavam as outras crianças:
Rafael (8 meses), Isadora (8 meses), Bruna (9 meses), Sofia (8 meses), Mariana (9
meses) e Felipe (10 meses). Enquanto tirava os brinquedos de dentro da caixa, ia
mostrando-os para as crianças e imitando e cantando músicas sobre os bichos:
“Sofia, o sapo, ahhhh, a Sofia pegou o sapo. Isadora, olha a lagarta, olá, Isa, ô, Isa,
fosse dormir a uma da manhã? Que loucura, que loucura, possa saber o que você
ficou fazendo até a uma da manhã? Nossa, Isa, nossa!” Isa pegou a lagarta e a
Professora continuou: “Ai, ai não me aperta.” Nesse momento, chegou um pai para
falar que o João (6 meses) não iria, pois estava doente. (Registro em Vídeo –
16/03/2011)
Segundo Schmitt (2008, p. 217) essas ações se caracterizam
[...] de forma a ampliarem suas possibilidades comunicativas e expressivas. São
ações que dependem dos adultos, nesse contexto às profissionais, situando os bebês
numa posição de dependência não apenas física, mas também cultural, ao
oferecerem vivências que podem contribuir para ampliar sua constituição humana.
12
As professoras utilizam diferentes caixas para guardar os brinquedos dos bebês. Por exemplo, uma caixa com
brinquedos de borracha, outra com mordedores.
48
Observei durante minha pesquisa que são raras as vezes em que os bebês transitam por
outros espaços da creche, além da sala de referência do grupo. Esse acontecimento é
justificado pelas professoras em função da limitação das condições estruturais. Isso fica em
evidência em um dos episódios do meu diário de campo:
Felipe (10 meses) sai com a Professora para o „passeio‟. Vão à sala do GIII, as
crianças querem empurrar a motoca do Felipe, em seguida vão à secretaria e por
último ao lado de fora. Ela tentou levar o Felipe ao parque, mas havia muita pedra e
a motoca não andava: “É, Fê, eles precisam colocar cimento em volta da creche
toda, pra gente poder ir pro parque também! Porque assim não dá pra gente ver as
outras pessoas.” (Diário de Campo – 06/04/2011)
No espaço da sala, os bebês quase sempre ficam livres, fora dos berços, o que permite
o seu envolvimento com os diversos objetos dispostos no espaço e com os demais bebês. Na
pesquisa, percebi que, quase sempre, as professoras davam aos bebês a liberdade de escolher e
explorar os espaços.
Nas cerquinhas do solário, os bebês se levantavam ou usavam as frestas para olhar o
espaço externo, observando as crianças maiores que estavam do lado de fora. Essas cenas,
produzidas diariamente, ao mesmo tempo em que apontavam um espaço limitado para os
bebês na sala, sugeriam também um interesse dos pequenos pelos maiores e pelo espaço
externo à sala.
Durante as observações, acompanhei várias situações de encontro entre os bebês em
posições diversas, como: de bruços na frente um do outro, sentados próximos, parados na
posição de engatinhar, deitados ou mesmo de pé. Seus diferentes tamanhos e possibilidades
de movimento provocavam relações ocorridas longe da visão dos adultos.
Em diferentes situações, observei a aproximação espontânea entre os bebês, que já
sabiam engatinhar, em espaços da sala que fugiam do olhar adulto: embaixo do trocador,
embaixo do berço, dentro da piscina que ficava na sala do sono. Esses espaços organizados
pelos adultos, e onde só cabiam os bebês, eram muitas vezes vivenciados pelos próprios
bebês, e a interação entre eles era marcada por gestos, olhares e ações.
Felipe (10 meses) sai do colchão e engatinha para os adesivos colados no chão, e
Pedro (9 meses) faz o mesmo. Eles tentam tirar os adesivos e engatinham dando
voltas neles. Felipe vai ao armário com as fotos coladas, puxa o papel e tira a foto,
engatinha pela sala com a foto na mão. (Diário de Campo – 28/03/2011)
49
Fotografia 20: O encontro entre João e Marina
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (abril de 2011)
Na cena acima podemos observar o encontro dos bebês em momentos em que as
professoras estavam envolvidas em outros episódios. Percebemos que os bebês transitam
livres pela sala e procuram descobrir o novo, despertando o interesse dos seus pares.
Segundo Schmitt (2008) esses encontros dos bebês
[...] marcam a constituição de relações sociais que não são acompanhadas e
direcionadas pelos adultos diretamente, embora sejam atravessados pelas ações
desses e por suas significações. Evidenciam que no contexto da creche os bebês
compartilham vivências, que, embora não sejam significadas imediatamente, não
deixam de existir, e precisam ser previstas e endossadas pelos adultos na forma
como organizam o espaço e na confiança que depositam na possibilidade de
encontro entre os pequeninos.
As relações sociais entre os bebês demandam um olhar cuidadoso e perspicaz para
formas muito específicas de linguagem, pouco valorizadas em nossa sociedade. O olhar, os
movimentos, os gestos, os sorrisos e os choros estão intensamente presentes nas relações entre
os bebês e marcam muitas das interações ocorridas entre eles.
4.4 “TAIS OLHANDO A VIZINHANÇA, É ...?” Os encontros com as crianças maiores
As crianças maiores aparecem na porta, e quando Sofia (8 meses) vê as crianças, ela
engatinha em direção à porta. A Professora percebe e diz: “Tais olhando a
vizinhança, é, Sofia? Conversa com as amiguinhas.” As crianças maiores jogam
brinquedos na sala para poder entrar: “Deixa eu pegá minha dedera”. Nesse
momento, perguntei se os maiores não poderiam entrar, e a Professora disse que
50
nesse momento de acolhida não, mas em outros momentos os maiores visitam de
dois em dois a sala. (Diário de Campo – 14/03/2011)
A partir desse relato de campo, é possível perceber o interesse que os bebês têm nas
crianças maiores, e os maiores nos bebês. Muitas vezes essa relação não pode ser
estabelecida, pois os bebês dependem das ações dos adultos para poder sair da sala. Durante o
tempo em que realizei a pesquisa, presenciei poucas vezes a saída dos bebês para outros
espaços da creche, e em nenhum momento observei visitas de crianças de outras salas.
Os encontros dos bebês com as crianças maiores ocorriam nas cerquinhas que
separavam a sala do solário, na porta do corredor ou quando algum profissional da instituição,
ao passar na frente da porta ou perceber o choro de algum deles, levava os pequenos para
„passear‟.
As crianças dos grupos maiores se aproximavam e buscavam tocar, conversar, realizar
brincadeiras com os pequeninos. Os bebês as recebiam com sorrisos, balbucios e muitas vezes
com estranhamento:
As crianças do GII também estão no solário, os maiores tentam brincar com os
bebês. Querem dar colo e entregar a chupeta. A Auxiliar avisa que está na hora da
janta. Entramos com os bebês, Felipe (10 meses) fica na porta observando os
maiores, Beatriz, do grupo GII que está do lado de fora, vem para a porta e tira a
chupeta do Felipe, depois a devolve e faz esse movimento várias vezes seguidas.
Felipe chora, vem em minha direção e „pede‟ colo. Pego o Felipe vou até o bebêconforto, o coloco sentado e o alimento. (Diário de Campo - 16/03/2011)
Fotografia 20: Felipe observando o GII no solário
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
51
Sobre as situações observadas em relação às crianças maiores, Schimitt (2008, p. 179)
relata que “muitas das situações observadas nesse espaço revelam que as crianças maiores,
quando se encontram com os bebês, assumem uma posição de responsabilidade e cuidado
sobre eles”. Em geral, as crianças de mais idade assumem o status de responsabilidade junto
aos pequenos. “Nessas situações, elas se aproximam das ações exercidas pelos adultos,
imprimindo sentidos de comando, atenção e controle, muitas vezes de maneira mais enfática.”
Os estudos de Vygotsky (1996), citados por Schimitt (2008, p. 151), referem que a
criança, no primeiro ano de vida, sente necessidade de se comunicar com outras crianças, e
não apenas de estar entre adultos. Segundo Vygotsky, essa relação
[...] se caracteriza por la activa búsqueda de contacto, no sólo con los adultos, sino
también con niños de su edad, por una actividad conjunta y la evidente
manifestación de las más primitivas relaciones de domínio y supeditación, protesta,
13
despotismo, sumisión, etc.
Quando as crianças se aproximavam umas das outras, pela mureta do solário ou pela
porta, nunca ouvi as professoras falando “Não entre” ou “Não desça da cerca”. Mas percebia
a limitação das crianças maiores, que ficavam nas cerquinhas que dividiam o espaço interno
do espaço externo.
Fotografia 22: Crianças do GII observando as ações dos bebês
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
13
A tradução desta citação, segundo Schmitt (2008), é: “[...] é caracterizado pela busca ativa do contato, não
somente com os adultos, mas também com crianças de sua idade, por uma atividade comum e a manifestação
evidente das relações mais primitivas de domínio e supeditacão, protesto, despotismo, submissão, etc.”
52
Percebi, em minhas observações, que os encontros dos pequenos com as crianças
maiores apontam para a necessidade de encontros frequentes entre esses sujeitos que, num
convívio mais estreito, ampliam suas relações expandindo seus saberes e suas relações
humanas e sociais.
4.5 O EDUCAR E O CUIDAR NOS ESPAÇOS DA CRECHE
O binômio educar e cuidar já se tornou um referencial padrão para distinguir o
trabalho desenvolvido com as crianças pequenas no contexto da educação infantil. Muito se
tem discutido sobre o educar e o cuidar de caráter indissociável na educação infantil. Afinal,
qual a real dimensão do educar? E a dimensão do cuidar? Por que devem ser considerados
indissociáveis?
Para Cerisara (1999), os termos educar e cuidar são heranças do processo histórico das
creches e pré-escolas no Brasil, e a autora enfatiza que analisando historicamente este
percurso percebe-se que:
Essa dicotomização entre as atividades com um perfil mais escolar e as atividades
de cuidado revelam que ainda não está clara uma concepção de criança como
sujeito de direitos, que necessita ser educada e cuidada, uma vez que ela depende
dos adultos para sobreviver e também pelo fato de permanecer muitas vezes de 10 a
12 horas diárias na instituição de educação infantil.
Para Kuhlmann Jr. (2001, p. 60), a expressão educar e cuidar possui o papel de
traduzir o sentido do trabalho pedagógico com a criança, e, segundo ele, “educá-la é algo
integrado ao cuidá-la”.
Nesse sentido, ele caracteriza a instituição de educação infantil como: “(...) lugar de
cuidado–e–educação, que adquire sentido quando segue a perspectiva de tomar a criança
como ponto de partida para a formulação das propostas pedagógicas.” (KUHLMANN Jr.,
2001, p. 60)
O cuidado necessita considerar, especialmente, as necessidades das crianças, que,
quando analisadas, ouvidas e respeitadas, podem dar pistas importantes sobre a qualidade do
que estão recebendo.
De acordo com o Referencial Nacional para a Educação Infantil (1998):
53
Os procedimentos de cuidado também precisam seguir os princípios de promoção à
saúde. Para se atingir os objetivos dos cuidados com a preservação da vida e com o
desenvolvimento das capacidades humanas, é necessário que as atitudes e
procedimentos estejam baseados em conhecimentos específicos sobre o
desenvolvimento biológico, emocional, e intelectual das crianças, levando em
consideração as diferentes realidades socioculturais.
Schimitt (2008, p. 120) relata que um ponto fundamental para se pensar no cuidado é
considerá-lo como um encontro entre dois seres humanos. A maneira como se fala com a
criança, uma troca de fralda, o olhar fazem toda a diferença:
Quero dizer com isto que conversar com os bebês é importante para sua
constituição, mas também é importante observar nosso corpo, nossa expressividade
nessa relação que é impressa de extraverbais, que completam nossa comunicação
com o outro: o tom da voz, o olhar de aprovação/desaprovação/alegria/entusiasmo, o
gesto feito com cuidado ou rapidez, a força ou a leveza do toque, a espera ou não
pela resposta do outro. Os adultos que trabalham com bebês não conversam
oralmente o tempo todo com eles, seria ilusório fazer tal afirmação, mas falam ou
dialogam constantemente por meio do corpo e de suas ações.
O que caracteriza profundamente as relações de cuidado é a proximidade dos adultos
com os bebês, “permeada pela intimidade da relação corpóreo-afetiva”. Elas se diferenciam
das constituídas com as crianças de grupos maiores, em que as relações de cuidado são
formadas por um grupo maior de crianças, num mesmo momento. (Ibid., p. 120)
Em diversos momentos do meu período de observação com o grupo de crianças, pude
perceber diferentes situações em que as professoras demonstravam uma atitude de
cuidadoras/educadoras das crianças. Penso que o real sentido do educar e do cuidar é estar
permanentemente atento ao outro. Fazer isso de modo profissional, no âmbito da educação
infantil, exige um olhar sensível e atento, aliado a condições teórico-práticas que possibilitem
uma boa análise das situações do cotidiano e avaliação permanente da prática pedagógica:
A Auxiliar traz a mamadeira e senta no colchão com o João (6 meses) no colo. João
observa um objeto pendurado atrás dele e tenta virar o pescoço: “Queres ficar
pertinho, né? Senão não comes, te conheço.” A Auxiliar senta mais perto do
brinquedo. João puxa-o, mas não consegue pegá-lo, pois ele está amarrado com um
elástico. A Auxiliar oferece a mamadeira mais uma vez, João não a aceita: “Hoje tão
tudo doente e ninguém quer comer, não sei o que fazer com vocês.” A Auxiliar
coloca o João no chão, ele engatinha até a porta e observa as crianças maiores.
(Diário de Campo – 04/04/2011)
Na cena acima, percebo que a professora compreendeu a criança como um ser inteiro e
ativo, levando em consideração a vontade da criança de manipular o brinquedo enquanto é
alimentada. João foi compreendido em sua singularidade e visto como sujeito com
sentimentos, direitos e desejos.
54
Outra situação que merece ser ressaltada sobre cuidado/educação com os pequenos é a
atenção da professora ao perceber Luiza no berço, enquanto os outros bebês estavam no
colchão:
Luiza (4 meses) está deitada no berço. A Professora a coloca no colchão junto com
os outros bebês, dizendo: “Eu não gosto de ficar ali sozinha, também gosto de um
colinho.” Fica com Luiza alguns minutos e em seguida a coloca no colchão. Ali, a
Professora entrega alguns brinquedos, e Luiza tenta pegá-los. (Diário de Campo –
26/03/2011)
Outros exemplos do diário de campo exemplificam situações de cuidado/educação
com os pequenos:
A Professora arruma o espaço do colchão para Carol (5 meses) e Luiza (4 meses)
ficarem. Coloca uma almofada alta perto da garrafa presa ao teto para Luiza alcançála. Para Carol, uma almofada nas costas, de frente para o espelho com alguns
brinquedos. Na frente do espelho tem uns chocalhos amarrados com um elástico,
Carol puxa-os, e quando o chocalho volta ela sorri. (Diário de Campo – 30/03/2011)
Enquanto Mariana (9 meses) e Marina (9 meses) estão deitadas no bebê-conforto,
Sofia (8 meses) está sentada no colchão, sacudindo chocalhos. Atrás de Sofia tem
um espelho, ela olha para ele fixamente, tenta pegar a imagem, sorri e balbucia.
Sofia tenta descer do colchão e, ao chegar à ponta, chora, quer descer e não
consegue. A Professora, percebendo isso, estimula a menina e coloca um travesseiro
para ajudá-la: “Desce, Sofia, vai, que você consegue”. (Diário de Campo –
14/03/2011)
Fotografia 23: Sofia descendo do colchão
Fonte: Gabriela Aparecida de Oliveira (março de 2011)
Assim como Tristão (2004), parto do entendimento de que educar crianças pequeninas
em ambientes coletivos “é uma profissão caracterizada pela sutileza”. Isso fica claro nas ações
quase imperceptíveis da professora, como ao colocar almofadas para Carol conseguir sentar
ou ao perceber Sofia descer do colchão, “que denotam a capacidade da professora de perceber
as crianças e agir de forma a contemplar as necessidades dos pequenos.”
55
Ao realizar a pesquisa com bebês, foi possível ter mais clareza sobre como as crianças
pequenininhas agem, descobrem e transformam o que está à sua volta. Além disso, entendi
que
elas
possuem
voz
e
manifestam
seus
desejos
e
necessidades.
seguinte, compartilharei algumas outras reflexões, a título de considerações finais.
Na seção
56
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Primeiramente, vivenciei um anseio pela definição da temática a ser pesquisada, mas,
a partir de estudos de trabalhos de pesquisadores da área da Educação Infantil, aos poucos fui
tendo clareza a respeito das questões que desejava investigar.
Ao iniciar a pesquisa, acreditei que, de certa forma, seria algo simples. Porém, ao me
deparar com o emaranhado de questionamentos que a pesquisa trouxe, percebi sua
complexidade e também a ausência de estudos com crianças bem pequenas, principalmente
com os bebês.
O primeiro desafio encontrado foi o de buscar bibliografias que abordassem a
educação dos bebês e, mais precisamente, a influência da organização dos espaços físicos
destinados a esses sujeitos em contextos de Educação Infantil.
O objetivo central do meu trabalho foi analisar as relações sociais estabelecidas por
bebês no contexto da Educação Infantil considerando a organização do espaço físico.
Os registros obtidos durante minhas idas a campo foram indispensáveis para
possibilitar um maior entendimento sobre a importância da organização dos espaços para a
prática pedagógica com bebês.
Enquanto pesquisadora, busquei compreender os bebês como sujeitos ativos, com
direitos e necessidades de serem atendidos, e aprendi a ouvi-los em suas diversas formas de
comunicação, que vão muito além da linguagem oral.
Em meu primeiro contato com o grupo, fui acompanhada de várias dúvidas e
perguntas, que me cercavam desde o momento da escolha da temática. Uma delas era: qual
seria a postura apropriada diante de um grupo desconhecido de bebês? Uma das formas de
enfrentar essa situação foi criar estratégias para os bebês virem ao meu encontro, de modo a
conhecer melhor os sujeitos da pesquisa, assim como as relações sociais que eles estabeleciam
com as profissionais e com outros bebês.
As relações sociais entre as professoras e os bebês merecem ser destacadas. Muitas
dessas relações com as professoras aconteciam na forma de ações que evidenciavam o
cuidar/educar, seja nos momentos em que as professoras davam atenção individual, seja nos
momentos em que as professoras davam atenção coletiva aos bebês. Observei que o cuidado
estava presente nas mais diversas situações, para além dos momentos em que o cuidado
geralmente está presente, como sono, alimentação e higiene. A preocupação em valorizar as
57
crianças e em educá-las enquanto sujeitos, respeitando e oportunizando novas experiências,
estava presente desde a entonação da voz das profissionais até as suas mais diversas ações.
Percebi que essa creche apresenta para esses bebês um contexto de múltiplas relações
com outras crianças e também com vários profissionais da instituição. Em diversos
momentos, presenciei situações mediadas ou não pelas professoras do grupo, que
possibilitavam a interação dos bebês com crianças maiores, com outras profissionais da
instituição, com seus pares, interações essas que favoreciam a ampliação de suas
manifestações e de suas relações em todos os momentos da rotina.
Enquanto investigadora, percebi que os bebês fornecem inúmeros indícios de que a
organização do espaço físico é um fator bastante influente em suas relações sociais.
A organização do espaço físico destacou-se em todos os momentos das minhas
observações. Esses espaços eram pensados e planejados com intencionalidade pelas
professoras do grupo, com o objetivo de proporcionar vivências diversificadas para as
crianças. Percebi que uma das prioridades das professoras em seus objetivos era o convívio
das crianças com os mais variados tipos de situações. A partir daí, os bebês produziam
diversas situações de interação com o outro sem a mediação direta ou imediata dos adultos.
A intenção deste trabalho não era discutir a postura das profissionais da instituição,
mas é essencial citar suas práticas pedagógicas em relação à organização do espaço. As
professoras tinham os bebês como foco central da sua prática, organizando com critérios
pedagógicos o tempo e o espaço da sala do GI. Em diversos momentos, presenciei cenas das
rotinas oportunizadas das mais variadas maneiras. As professoras pensavam a organização do
espaço de modo a possibilitar a produção de novas e complexas ações dos bebês. Essas ações
propostas pelas professoras possibilitavam muitos momentos significativos de construção das
relações sociais dos bebês. Essas ações eram marcadas pela sutileza que caracteriza o que é
ser professora de crianças pequenininhas, como definem algumas das pesquisas sobre bebês.
Com minhas análises, percebi que a partir da organização do espaço físico nas
instituições de Educação Infantil é possível desenvolver diversas práticas e rotinas
diferenciadas. Percebi que quanto mais espaços diversificados e estruturados eram propostos
às crianças, mais elas se expressavam e interagiam entre si. Conforme as crianças iam se
apropriando dos espaços da sala, iam fazendo descobertas, experimentando novos
movimentos e atribuindo significados ao que era proposto. Elas faziam isso buscando outras
maneiras de se envolver com armários, bebês-conforto, paredes, imagens, panos, objetos. As
crianças indicam como repensar o espaço da creche de maneira imaginativa, lúdica, artística,
afetiva e cognitiva.
58
Devido à relevância da temática, esta pesquisa foi o início de uma investigação à qual
eu gostaria de dar continuidade, com um espaço de tempo maior, visando ao seu
aprofundamento. A intenção deste trabalho, além da ampliação de meus conhecimentos sobre
a prática pedagógica com bebês, foi a de contribuir para a construção de indicativos para a
organização dos espaços físicos para bebês em instituições de Educação Infantil.
Por fim – mesmo que essas considerações tenham mais um caráter provisório do que
conclusivo –, posso dizer que compreendi que a organização do espaço físico influencia
significativamente no processo de cuidar de bebês e educá-los, contribuindo para definir a
identidade da Educação Infantil. Além disso, minha intenção com esta investigação é
contribuir para a construção de uma Pedagogia da Infância, que oportunize múltiplas e ricas
relações, assim como diferentes formas de as crianças – especialmente os bebês – viverem e
atuarem no mundo.
59
ANEXO
60
ANEXO A – TERMO DE AUTORIZAÇÃO DE IMAGEM
PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE SÃO JOSÉ
CENTRO UNIVERSITÁRIO MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ
AUTORIZAÇÃO DE IMAGENS – TCC PEDAGOGIA
O Curso de Pedagogia da USJ realiza visitas de campo, intervenções, observações
participante nas Escolas do Ensino Fundamental, Centros de Educação Infantil das redes
municipal, estadual e particular da Grande Florianópolis/SC, inclusive nas 6ª, 7ª, e 8ª fases.
Sendo assim, a acadêmica Gabriela Aparecida de Oliveira necessita registrar
algumas de suas observações geralmente utilizando de fotografias e /ou filmagens.
Nesse sentido, vimos solicitar aos senhores e pais/responsáveis a autorização para que
possamos estar usando as imagens fotográficas e/ou fílmicas nos Trabalhos de Conclusão de
Curso.
Para isso pedimos que preencha e assine a autorização abaixo e a devolva brevemente
para arquivamento.
Atenciosamente,
Andréa Simões Rivero
Wanderléa P. Damásio Mauricio
Professora Orientadora
Coordenadora de TCC da Pedagogia
---------------------------------------------------------------------------------------------------------AUTORIZAÇÃO
Eu _____________________________________________________, autorizo o uso das
imagens de _____________________________________ conforme as necessidades dos
acadêmicos da USJ, nos Trabalhos de Conclusão de Curso.
São Jose, ___/___/___.
ASSINATURA____________________________________
61
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Disponível
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S010411692003000100005, acesso em 01 de Nov. 2010 as 03h45.

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