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DOSSIER por Victor Manuel Cardoso O Transporte Rodoviário de Mercadorias Perigosas em Portugal Uma Crónica Histórica (Das Origens aos Nossos Dias) Ao iniciar esta série de artigos, gostaríamos de agradecer à Diretora da revista "segurança”, Dra. Isabel Santos, o seu empenho e sensibilidade para as questões inerentes à segurança. De outra forma, não seria possível emitir opiniões e transmitir informações sobre um conteúdo que é desconhecido à maioria dos portugueses. Sendo este o primeiro, de um grupo de seis artigos, iremos apresentar uma introdução baseada na influência que os transportes rodoviários têm na sociedade portuguesa. Iniciaremos com um perfil histórico e geográfico, fazendo referência à evolução da indústria petrolífera, ao desenvolvimento dos veículos automóveis e das vias de comunicação em Portugal. A nível europeu, o transporte de mercadorias, tem sido baseado num modelo unimodal, destacando-se a utilização excessiva do transporte rodoviário,1 do 1 EUR-Lex website. 22 SEGURANÇA 224 janeiro/fevereiro 2015 qual Portugal será um dos países da UE mais dependentes. Analisando pormenorizadamente este facto, verificamos que o modo de transporte rodoviário “é aquele que maior impacto assume ao nível das externalidades negativas”2. Ao nível comunitário, alguns especialistas destas matérias, defendem a ideia de alterar a política e a forma de transporte de mercadorias no espaço europeu, apoiando algumas penalizações para desincentivar o transporte rodoviário e promover a intermodalidade3. Como se pode verificar no gráfico, a intermodalidade no transporte de mercado2 Monteiro Ferreira, Vitor – O Setor dos Transportes de Mercadorias em Portugal: A intermodalidade enquanto fator dinamizador das empresas exportadoras, p. IV - Dissertação de Mestrado em Economia, FEUP, 2013. 3 O transporte intermodal é aquele que requer tráfego misto ou múltiplo, envolvendo mais de uma ou várias modalidades de transporte, é indicado para atingir locais de difícil acesso - Rodrigues, Rui - novembro de 2004. Transporte intermodal - Maquinistas.org. Visitado em 19 de janeiro de 2014. rias, depende das distâncias do transporte, do valor da mercadoria e do seu grau de perecibilidade. Há que ter sempre em consideração os encargos operacionais, como por exemplo o custo do trabalho, dos combustíveis e da manutenção. Segundo Alban D'Entremont do Departamento de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Navarra, o transporte intermodal, poderá ser uma alternativa mais eficiente ao transporte exclusivamente rodoviário. No entanto, não nos poderemos esquecer da capacidade de resposta das infraestruturas de transporte para que se alcance uma concreta eficiência em termos de custos e de tempo. Quando nos detemos na realidade portuguesa e, em particular na atividade dos Transportes Rodoviários de Mercadorias Perigosas (TRMP) concluímos que esta é composta por um conjunto revelador de dificuldades. Os trabalhos científicos dossier Custo do transporte por unidade de volume Avião Camião Comboio Barco Camião Comboio 120 Curtas distâncias Barco 240 600 Médias distâncias (Distância/km) Longas distâncias (Fonte: Alban D’Entremont, 1997) existentes sobre esta matéria são poucos. O progresso e melhoria das condições de segurança operacionais, assim como a defesa da promoção da saúde dos trabalhadores, não têm acompanhado as necessidades, apresentando inúmeras discrepâncias. Quando nos propomos a analisar o país real, verificam-se factos muito diferentes. Assistimos a um pequeno universo de empresas que desenvolvem padrões caraterizados pela qualidade e exigência, às quais não são estranhos os cuidados e o bom nível técnico das decisões tomadas pelos especialistas que constituem o grupo de trabalho GT8 da APETRO (Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas). No entanto, esse facto dilui-se no restante cosmos empresarial ligado ao manuseamento, armazenagem e transporte de mercadorias perigosas em geral. As dificuldades existentes são diversas. Vão desde a insensibilidade de gestores www.revistaseguranca.com e decisores, à incapacidade económica Certificação ADR6, confirma-se a relevânque as empresas enfrentam e as impedem cia da empregabilidade e o grande valor de suportar as responsabilidades de uma económico que este sector de atividade prestação de serviços, constituída pelos apresenta. diferenciadores e necessários elementos A nível oficial, as estatísticas existentes ligados ao Ambiente, Qualidade e Segu- não apresentam uma informação que referança (AQS). rencie em que áreas os profissionais dos O Transporte Rodoviário de Mercadorias transportes rodoviários de mercadorias Perigosas é um caso particular no trans- estarão ligados e, se todos os que detêm porte de produtos que faz parte da cadeia Certificação ADR estarão em plena ativide fornecimento dos países. “Durante essa dade profissional. atividade, vários fatores passam a ser crí- O progresso económico conduz ao cresticos e a imprudência pode significar não cimento do consumo de diversos prosó a perda de mercadoria como um elevado risco "(...) o transporte intermodal, poderá para as pessoas envolvidas no transporte e para o ser uma alternativa mais eficiente meio ambiente envolvente” ao transporte exclusivamente rodo(Paiva, 2008). viário. No entanto, não nos poderemos A malha rodoviária portuguesa concentra cerca esquecer da capacidade de resposta de 90% do volume de cardas infraestruturas de transporte para gas transportadas ao nível que se alcance uma concreta eficiência interno do país. Dessa quantidade, 10% represenem termos de custos e de tempo." tam transporte de mercadorias perigosas em geral e, 70% desse valor correspondem ao trans- dutos combustíveis e, por consequência, porte rodoviário de combustíveis líquidos ao seu transporte. Essas atividades são e gasosos, sendo anualmente transpor- fundamentais para o desenvolvimento tadas cerca de 11 milhões de toneladas das sociedades, visto esses produtos abasdesses produtos4. tecerem as indústrias de transformação Se atendermos a que cerca de quinze mil e extrativas, construção civil, comércio motoristas5 em Portugal são portadores da 4 Cálculos realizados a partir de informação privilegiada das petrolíferas a operarem em Portugal – Ano 2013. 5 Números não oficiais do IMT 6 Qualificação obrigatória para a condução de viaturas de transporte rodoviário de mercadorias perigosas, conforme o determinado no D.L. Decreto-Lei 170-A/2007, de 4 de Maio, alterado pelo Decreto-Lei 63-A/2008, de 3 de Abril. SEGURANÇA 224 janeiro/fevereiro 2015 23 dossier e muitos outros. Assim, a necessidade de comercialização de combustíveis realiza-se através do transporte rodoviário, ferroviário, aeroviário, dutoviário e hidroviário. Perante estes factos é evidente a importância que os transportes rodoviários em geral e, os transportes de mercadorias perigosas em particular representam para a economia portuguesa. Em 1896, estabelece-se em Portugal a empresa Vacuum Oil Company, dedicada à comercialização de óleos lubrificantes que, após algumas alterações Fonte: Site APETRO de denominação, se virá a transformar, 60 anos mais tarde, na Mobil Oil Portuguesa. A Vacuum será a empresa líder do mercado durante cerca de 50 anos. No ano de 1910, começam a ser distribuídos, pela firma The Lisbon Coal and Oil Fuel, combustíveis e lubrificantes com a marca Shell. Passados 4 anos instala-se a própria Shell, com a construção e operação dum parque de armazenagem. Somente no ano de 1924 se iniciou o transporte rodoviário de combustíveis, de uma forma mais organizada e baseada em algumas regras de segurança, quando a empresa “Vacuum” enceta a distribuição desses produtos por carro-tanque. Da iluminação a gás, ao petróleo e ao gás natural, passaram-se anos de evolução técnica, económica e social, que ao ritmo do aparecimento dessas novas fontes de energia, fazem surgir em Portugal várias empresas - a CRGE, a Sonap, a Sacor, a Cidla, a SPP e a Petrosul. Fonte: Origens e História da Galp Energia Em 1940, é inaugurada pela SACOR em Cabo Ruivo – Lisboa, a primeira refinaria portuguesa, com capacidade para abastecer 50% do mercado através da produção de cerca de 300 kt/ano. Com o lançamento do projeto do Complexo Industrial de Sines em 1971, é adjudicada ao grupo SONAP-CUF (Petrosul) a cons- 24 SEGURANÇA 224 janeiro/fevereiro 2015 trução duma refinaria e duma fábrica de petroquímica de olefinas. Em 1977, a Petrogal cria a direção de pesquisa e produção com o objetivo de participar nas concessões de áreas “onshore” em Portugal e de fazer o levantamento de oportunidades na pesquisa petrolífera em Angola. Com as necessidades do desenvolvimento económico, essas empresas sofreram uma evolução, que se traduziu no aumento do transporte rodoviário de produtos refinados, principalmente combustíveis líquidos e gasosos. Mais tarde, a história e o destino do setor energético foram marcadas pela união das empresas “timoneiras”, que em Fonte: Origens e História da Galp Energia 22 de abril de 1999, deram origem à Galp Energia, denominada GALP – Petróleos e Gás de Portugal, SGPS, S. A., com o objetivo de explorar os negócios do petróleo e do gás natural na sequência da reestruturação do setor energético em Portugal7. A Petrogal, única empresa refinadora e principal distribuidora de produtos petrolíferos, e a Gás de Portugal (GDP), empresa importadora, transportadora e distribuidora de gás natural, serão posteriormente agrupadas na Galp. Com o aparecimento do motor de combustão interna, torna-se possível o desenvolvimento da indústria automóvel, estando vários nomes associados à sua invenção, onde se destacam os alemães Gottlieb Daimler e Karl Benz. Em 1885, Karl Benz constrói o primeiro veículo automóvel na cidade alemã de Manheim. O veículo inventado por Benz possui um motor de um cilindro com sistema de ignição elétrica e atinge a velocidade de 16 Kms/h. A partir de 1886, após ter registado a patente, Daimler vende a sua invenção a vários construtores de automóveis e inicia a sua própria fabricação de veículos autopropulsionados. Em Portugal, o primeiro automóvel chega em 1895. É um veículo da marca Panhard & Levassor, importado de Paris Fonte: A história e evolução do automóvel em Portugal pelo IV Conde de Avilez. 7 http://www.galpenergia.com/PT/agalpenergia/ogrupo/origensehistoria/Paginas/Historia.aspx “Na Alfândega de Lisboa, surge a dúvida sobre a taxa aduaneira a aplicar a tão estranho artefacto. Seria uma máquina agrícola ou uma locomobile «máquina movida a vapor»? Virá a ser adotada esta última definição”8. Tal facto, para além da novidade, conduziu a uma lenta expansão das infraestruturas ligadas ao transporte rodoviário, onde se destacam as estradas. “A necessidade aguça o engenho!”, ditado popular bem elucidativo para a ação que o estado português leva a efeito em 1927 ao criar a Junta Autónoma das Estradas (JAE) e a Direção Geral de Estradas (DGE). Para a criação das estruturas que promoveram a circulação automóvel, foram fundamentais algumas instituições e empresas. De 1920 a 1930, a sinalização e orientação dos primeiros automobilistas fica a cargo do Automóvel Club de Portugal e da Vacuum Oil Company, que colocam os primeiros sinais de orientação no nosso país. A década de 30 fica marcada por fortes perturbações económicas, políticas e sociais. O parque automóvel era bastante escasso. As infraestruturas evoluíram de forma demorada e a capacidade de distribuição também. Até meados do século XX, as estradas eram praticamente construídas em Macadame 9 e somente a partir de 1909 se iniciou a utilização de asfalto. Não nos podemos esquecer que em Portugal, no início do século XIX, muitas das estradas eram ainda as antigas vias romanas. A construção de uma rede de estradas era muito importante, mas bastante dispendiosa. Portugal vivia momentos de grandes dificuldades económicas, técnicas e científicas, refletindo a instabilidade gerada pelo conflito bélico que assolava a europa e, ao posicionamento político do “orgulhosamente sós” do regime da época. Como símbolo de modernidade e bem-estar, o automóvel transforma-se numa imagem de evolução tecnológica para as nações que os produzem. Apesar da precária condição económica das famílias portuguesas, assiste-se a uma tentativa Fonte: cgretalhos.blogspot.pt 8 A História da Evolução do Automóvel em Portugal – A. M. T. C. 9 (do inglês Macadam) que é um tipo de pavimento para pistas de rodagem desenvolvido pelo engenheiro escocês John Loudon McAdam, por volta de1820, que consistia em assentar três camadas de pedras colocadas numa fundação com valas laterais para drenagem da água da chuva - http://pt.wikipedia.org/wiki/Macadame dossier de imitar o que se ia fazendo na Europa, mas somente um grupo minoritário de cidadãos apresentava meios para fazer face aos custos elevados da aquisição e manutenção de um automóvel. A distribuição de combustíveis era realizado por carroças de tração animal, transportado a granel, sem condições de segurança - como exemplo, pode-se salientar a comercialização do petróleo de iluminação (querosene) ao litro. Mediante essa realidade e as dificuldades inerentes, verificou-se a necessidade de se transportarem mercadorias mais ou menos perecíveis de uma forma rápida, simples, segura e em quantidades que pudessem ser economicamente rentáveis. A indústria automóvel vai potenciar o desenvolvimento da Europa do pós-guerra. Marcas como a FIAT na Itália, a Volkswagen na Alemanha, a Citroën, Peugeot e Renault na França, a Austin e Morris na Inglaterra, vão contribuir decisivamente para relançar os seus países na economia mundial. Na década de 50 o modal rodoviário tinha-se destacado entre os meios de transporte e, a produção de automóveis em série foi direcionada para a construção de veículos de mecânica simples. A classe média emergente procurava pequenos veículos que permitissem mais autonomia e funcionalidade. Nos Estados Unidos da América, em resultado do “boom” económico da época, a situação é quase inversa. Os automóveis são cada vez maiores, confortáveis e luxuosos, consumindo grandes quantidades de combustível. As inovações destacam-se nos acessórios, e o “design” estava associado à ideia de “styling”, uma interpretação exagerada de aerodinâmica. Os famosos “rabos de peixe” de cores alegres transformam-se num dos símbolos do estilo de vida americano10. Os anos 60 foram uma época de estabilidade económica. O pleno emprego, o aumento do nível de vida e o consequente apelo ao consumismo irão contribuir decisivamente para a massificação do automóvel. Nesta fase, assiste-se a uma evolução técnica significativa na construção de viaturas pesadas (camiões). Na década de 70, começam a surgir as grandes preocupações com a segurança dos passageiros e com a crescente poluição atmosférica provocada pelos gases emitidos pelo escape. O automóvel uniformiza-se, tanto no seu aspeto exterior como no custo, potência e dimensão. A era da evolução espontânea da indústria automóvel tinha chegado ao fim. A primeira tentativa de desenvolvimento de uma indústria automóvel em Portugal remonta aos finais do século XIX. Em 1899, a Empresa Industrial Portuguesa tenta, sem sucesso, dar início à produção industrial de automóveis no nosso país. Outras tentativas se seguem. O seu carácter pontual e experimental não permite o seu sucesso. A indústria automóvel nunca alcança grande expressão como indústria nacional11. Na década de 1950, a Fábrica de Produtos Estrela desenvolve projetos para a produção de automóveis populares e de competição, assim como carroçarias de autocarros. Apenas estes dois últimos virão a ser produzidos. Nos anos 70 e 80, algumas experiências de produção em série têm relativo sucesso, como são os exemplos da União Metalo Mecânica (UMM). 10 In Slide share – O Automóvel 11 A.M.T.C www.revistaseguranca.com Fonte: autoviva.sapo.pt Atualmente, a indústria nacional está perfeitamente consolidada destacando-se, em particular, a contribuição da Auto-Europa com um volume de produtos e uma percentagem determinante no fluxo de exportações. Não é suficiente que um veículo seja tecnicamente perfeito para se transformar num meio de transporte. Para que a utilização do automóvel seja eficaz, é determinante o aparecimento de um conjunto de instituições e infraestruturas. Sem estradas para circular, mapas para informar, regras para regulamentar, garagens e postos de abastecimento para apoiar e fornecer combustível, o automóvel não teria alcançado o sucesso que tem na nossa sociedade. O automóvel vem determinar o tempo e o espaço nos quais nos movimentamos e até a forma como o fazemos. A sua invenção demonstra como é relativo o tempo que demoramos a percorrer determinada distância. Dependendo da qualidade do veículo, do estado das estradas e do fluxo do trânsito, podemos demorar 1 hora a percorrer 100 Km, ou demorar o mesmo tempo para percorrer apenas 5 Km. Com a Primeira Guerra Mundial, tanto a produção como a diversificação dos tipos de veículo (carros de passeio, camiões, tratores etc.) sofreram algum aumento. No início, o transporte rodoviário funcionou basicamente como complemento do transporte ferroviário, mas com o decorrer do tempo, tornou-se concorrente das ferrovias, de tal forma que assistimos no nosso país à desativação de inúmeras vias, por se tornarem deficitárias. Ainda na década de 70, o desenvolvimento do país apresenta um incremento quando a economia portuguesa cresceu em média 4,8 %, conforme Rocha, Edgar faz referência in Análise Social, vol. XX - 84, 1984-5.º, p. 621-644, Até finais do século XX assistimos a avultados investimentos governamentais na construção de rodovias, situação que se inverteu nos últimos anos, devido à crise económica Internacional, e ao aumento dos custos de transporte (preço dos combustíveis, pneus, aumento de portagens e ao aparecimento do pagamento em SCTUT´s, entre outros). Com o desenvolvimento e intensificação das atividades económicas e industriais, principalmente do setor químico, a necessidade de transporte dos materiais e equipamentos produzidos aumentou. Como consequência, a importância do transporte rodoviário relativamente aos restantes modais, teve um grande crescimento ficando mais suscetível a acidentes de trânsito, devido à massificação. Os dados da matriz de transportes são resultado de um processo histórico e, as deformações apresentadas não devem servir para desconsiderar a importância do segmento rodoviário, que é o modal de transportes mais utilizado no país, sendo responsável por movimentar cerca de 218 milhões de toneladas de produtos (DGEG 2012). Com base nesses mesmos dados da DGEG relativos a dezembro de 2012, o consumo de gasolinas em Portugal foi de 1,19 milhões de TEP, com uma quebra em termos homólogos de 9,2%, ao passo que o mercado do gasóleo, com cerca de 4,26 milhões de TEP, teve uma descida do consumo de 9,3%. A descida do consumo de combustíveis rodoviários em Portugal foi mais pronunciada do que a queda global do mercado nacional de combustíveis fósseis, cujo con- SEGURANÇA 224 janeiro/fevereiro 2015 25 dossier sumo chegou ao final de 2012 com uma redução de 6%, para 14,1 milhões de TEP. O consumo de produtos petrolíferos (onde se incluem o fuel, o gasóleo, gasolinas e GPL) esteve em 2012 em queda contínua, prolongando uma tendência que já vinha de trás. Nesse ano, não houve um único mês em que o consumo anualizado de produtos petrolíferos tenha crescido. Se no final de 2011 esse consumo se situava em 7,66 milhões de TEP, em Dezembro de 2012 estava em 6,82 milhões de TEP. Apesar das quedas de consumos referidas, o congestionamento de tráfego continua a afetar de modo adverso a qualidade de vida das populações, especialmente nas cidades. É uma das imagens características da nossa rotina. Presentemente são-nos colocadas muitas questões ao verificarmos o número elevado de viaturas que circulam nas estradas portuguesas, especialmente de camiões que transportam mercadorias perigosas. No que concerne especificamente a esse tipo de transporte, encontra-se presentemente regulamentado em Portugal através do Decreto-Lei n.º 19-A/2014, de 7 de fevereiro. Enfatiza-se que a caraterização e enquadramento dos combustíveis líquidos e gasosos como perigosos para o transporte se restringem às determinações constantes no ADR (Accord Européen Relatif au Transport International des Marchandises Dangereuses par Route), baseando-se nas principais classes de produtos químicos definidos como perigosos (ONU 1997). Ao longo deste artigo, tem sido referido diversas vezes o termo “Mercadorias Perigosas” e a questão que inicialmente se coloca prende-se com o facto de saber como poderemos definir o que são mercadorias perigosas. Segundo o ADR, são consideradas mercadorias perigosas as substâncias ou preparações que devido às suas propriedades físicas e químicas (inflamabilidade, eco toxicidade, corrosividade ou radioatividade) por meio de derrame, emissão, incêndio ou explosão possam provocar situações com efeitos Fonte: UNADRCD15 - ADR 2015 negativos para o Homem e para o Ambiente. Essas substâncias são geralmente classificados relativamente ao seu risco imediato. As substâncias perigosas são classificadas de acordo com os critérios aprovados para 26 SEGURANÇA 224 janeiro/fevereiro 2015 Classificação de Substâncias Perigosas [NOHSC: 1008 (2004) 3 ª edição] Assim, problematiza-se que o transporte rodoviário de produtos perigosos se apresenta como uma atividade passível e potencial quanto a uma série de riscos humanos e ambientais, uma vez que nessa operação, os produtos estão sujeitos a uma série de situações combinadas pelos fatores adversos, tais como o estado precário das vias, a falta de manutenção, volume de tráfego, falta de sinalização, condições atmosféricas adversas, morfologia dos terrenos, estado de conservação do veículo, experiência do condutor, capacidades físicas e psíquicas, etc.. Com a evolução da ciência e da técnica ligadas à segurança rodoviária, temos vindo a assistir à implementação de regras operacionais que apresentam um conjunto de preocupações no sentido de se protegerem os trabalhadores, as máquinas, os produtos e o ambiente. Assim, a partir de um grupo de esforços conjugados ao nível da Europa, é assinado em Genebra, no dia 30 de setembro de 1957 um acordo europeu sobre o transporte de mercadorias perigosas por estrada com a designação de ADR. No ADR, as Mercadorias Perigosas, são classificados em 9 classes de riscos, com a seguinte designação: • 1 Explosivos • 2 Gases -- 2.1 Gases inflamáveis -- 2.2 Gases não-Inflamáveis -- 2.3 Gases Tóxicos • 3 Líquidos inflamáveis • 4.1 Sólidos inflamáveis • 4.2 Substâncias sujeitam a combustão espontânea • 4.3 Substâncias que em contato com água emitem gases inflamáveis • 5.1 Oxidantes • 5.2 Peróxidos Orgânicos • 6.1 Substâncias Tóxicas • 6.2 Substâncias Infetantes • 7 Material Radioativo • 8 Corrosivos ou Sustâncias corrosivas • 9 Substância Perigosas diversas ou matérias que podem causar Diversos perigos. Todas as mercadorias perigosas podem ser transportadas desde que sejam respeitadas as exigências definidas nos diversos capítulos do ADR. Nota: Num próximo artigo abordaremos em particular as especificidades dos conteúdos do ADR. Fonte: UNECE (WP 15) ADR é a abreviatura em francês de Accord Européen Relatif au Transport International des Marchandises Dangereuses par Route. O ADR contem regulamentações especiais para o transporte rodoviário, relacionados à embalagem, segurança de carregamento e identificação das mercadorias perigosas. O ADR apresenta-se como sendo uma grande conjugação de esforços diversos ligados ao contexto da fabricação das matérias, construtores de veículos e embalagens, transportadores e especialistas de segurança. Este acordo entrou em vigor a 29 de janeiro de 1968 e, ao longo dos anos, tem sido regularmente revisto e atualizado. Temos vindo a assistir à anuência e implementação dessa regulamentação de segurança, por um maior número de países, não só da Europa, mas também da África e Ásia. Poderá dizer-se que o ADR é “um lugar geométrico dos interesses ligados às mercadorias perigosas e ao seu transporte por estrada”12. Em setembro de 1992, é fundada a APETRO – Associação Portuguesa de Empresas Petrolíferas, reunindo em si as principais empresas petrolíferas que atuam no mercado Português: BP, Cepsa, Galp Energia e Repsol, às quais se juntaram mais recentemente a OZ Energia, a Spinerg e a Rubis, como associadas sectoriais. Esta associação surge numa perspetiva de fomentar e estabelecer o desenvolvimento de condições envolventes apropriadas, que facilitem uma operação responsável e lucrativa do setor petrolífero em Portugal13. Atualmente, a APETRO é reconhecida como um organismo de referência e parceiro imprescindível nos processos de discussão e tomada de decisões do contexto petrolífero. Seguindo uma dinâmica de interesse e cuidado sobre as condições de segu- 12 Eng.º José Alberto Franco - IMT 13 In site Apetro – www.apetro.pt Fonte: obervatóriodoambiente.pt dossier rança no transporte dos produtos refinados, a APETRO apresentou a partir de fevereiro de 2001, um Acordo Sobre Segurança Rodoviária Acrescentada (ASRA) com o objetivo final de definir e implementar um conjunto de regras comuns de boas práticas na atividade de transporte rodoviário dos seus produtos, tendo como objetivo final, zero acidentes rodoviários. Este documento, de caráter técnico, apresenta um conjunto de normas de bem-fazer, com a finalidade de criar paridade nas ações e exigências do serviço prestado pelas empresas transportadoras às empresas petrolíferas. O acordo ASRA é um elemento incentivador e dinamizador da cultura da organização e gestão da segurança nas empresas que laboram no universo do transporte rodoviário de produtos petrolíferos. Respeita as exigências determinadas no ADR, sobrepondo-se a esse em casos particulares, ou em áreas técnicas muito específicas do setor petrolífero. Ao concluir este artigo, poderemos referir que a atividade do transporte rodoviário de mercadorias perigosas não se resume exclusivamente às questões intrínsecas desse setor. Os reflexos de uma ação menos cuidada poderão revelar consequências que excedem o seu próprio domínio. Nos próximos artigos iremos abordar todas estas questões mais detalhadamente. BIBLIOGRAFIA ff ADR 2013 - Tutorial, Lda. Lisboa, 2013; ff APETRO – “Acordo Sobre Segurança Rodoviária Acrescentada (ASRA)”; Lisboa, 2001; ff Beuthe, M. - “Intermodal Freight Transport in Europe”, in Globalized Freight Transport: Intermodality, E-Comerce, Logistics and Sustainability, Capineri, C.; Leinbach, T. 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