Imprimindo - Revista Brasileira de Arbitragem

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Imprimindo - Revista Brasileira de Arbitragem
Doutrina Nacional
Considerações sobre a Dialética Tratado-Costume e o
Desenvolvimento Progressivo no Direito dos Investimentos
Internacionais
LARISSA RAMINA
LLM Direito dos Negócios Internacionais, Professora de Direito Internacional e
Coordenadora do Curso de Relações Internacionais das Faculdades do Brasil.
RESUMO: O artigo trata do desenvolvimento dos Tratados Bilaterais de
Investimento (TBIs), bem como de questões relativas à possibilidade de
adoção de um tratado multilateral sobre o tema. Ademais, após constatação
da existência de uma série de disposições comuns na absoluta maioria dos
TBIs, o artigo analisa se tais disposições podem ser consideradas como
"aceita como sendo de direito", conforme o art. 38, § 1º, b, do Estatuto da
Corte Internacional de Justiça, ou conforme a apresentação clássica do
fenômeno consuetudinário. O artigo aborda também problemas relacionados
à implementação de mecanismos de solução de controvérsias entre Estado e
investidor. Por fim, analisa-se a necessidade e as possíveis formas de
inclusão de dispositivos contra corrupção transnacional nos TBIs.
PALAVRAS-CHAVE: TBIs; tratado multilateral; costume.
ABSTRACT: This article analyzes the development of Bilateral Investment
Treaties (BITs), and the issues arising out of the possible adoption of a
multilateral treaty on the subject. Furthermore, after identifying provisions
which are common to most BITs, the article examines whether they could be
regarded as "accepted as law", pursuant to article 38, § 1º, b, of the Statute of
the International Court of Justice, or according to the traditional concept of
custom. The article also deals with issues that may arise out of dispute
resolution mechanisms in place between States and investors. Finally, the
author considers the need and possibilities of including in BITs provisions
against transnational corruption.
KEYWORDS: BITs; multilateral treaty; custom.
SUMÁRIO: Introdução; 1 Considerações sobre a evolução do direito dos
investimentos internacionais em nível multilateral; 2 Considerações sobre a
evolução do direito dos investimentos internacionais em nível bilateral; 3 A
recepção dos investimentos internacionais; 4 O tratamento dos investimentos
internacionais; 5 A proteção e a garantia dos investimentos internacionais; 6
A solução de controvérsias relativas a investimentos internacionais; 7 O
desenvolvimento progressivo no direito dos investimentos internacionais;
Conclusões; Referências.
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INTRODUÇÃO
A redução dos obstáculos ao comércio e aos investimentos
internacionais, assim como as possibilidades dadas às empresas
transnacionais de dispersar as atividades de produção no interior de
sistemas de produção internacional integrada fizeram com que os
fluxos desses investimentos aumentassem progressivamente. Esse
aumento conduziu os Estados a criarem um clima favorável aos
investimentos internacionais, utilizando-se principalmente de acordos
internacionais. Nessa perspectiva, verifica-se a extraordinária
multiplicação dos Tratados Bilaterais de Promoção e Proteção dos
Investimentos (TBIs) desde a década de sessenta até hoje; a tentativa
de negociar, na Organização para Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), um Acordo Multilateral sobre Investimentos (AMI)
1
;
além
da
incorporação
de algumas questões relativas ao
investimento internacional nos acordos da Organização Mundial do
Comércio.
O direito dos investimentos internacionais é um direito em
evolução, como testemunharam as negociações do projeto do AMI.
Com vistas a essa evolução, duas vias podem ser adotadas: ou a
emergência de um tratado multilateral, ou o desenvolvimento contínuo
dos tratados bilaterais.
1 CONSIDERAÇÕES SOBRE A EVOLUÇÃO DO DIREITO DOS
INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS EM NÍVEL MULTILATERAL
A negociação de um tratado multilateral sobre investimentos
fracassou inicialmente no âmbito do Banco Mundial, resultando na
adoção, em 1992, das Diretrizes para o Tratamento do Investimento
Direto, e mais recentemente na OCDE. Ainda é cedo para saber se o
resultado da morte do AMI será a interrupção definitiva das tentativas
de unificar o direito dos investimentos já que, em 1974, quando a
Assembleia-Geral das Nações Unidas adotou a Carta dos direitos e
deveres econômicos dos Estados, pensava-se que o advento de um
corpo de direito com esse objeto estava definitivamente condenado
pelo rompimento entre o Norte e o Sul. No entanto, a criação da
Agência Multilateral para a Garantia dos Investimentos (Miga), em
1985, a adoção das Diretrizes do Banco Mundial, alguns acordos no
âmbito da Organização Mundial do Comércio, além do número
crescente de TBIs concebidos em bases semelhantes,
testemunharam o contrário. Percebe-se que houve um deslocamento
das discussões relativas aos investimentos da ONU, onde na
Assembleia--Geral cada Estado tem direito a um voto, para as
organizações de Bretton Woods, não democráticas, ou para a OCDE,
integrada pelos principais países exportadores de investimentos.
A substituição de centenas de tratados bilaterais por um tratado
multilateral traz à tona algumas questões técnicas. Em primeiro lugar,
surge o problema de saber se a eventual coexistência de um
instrumento multilateral e de instrumentos bilaterais geraria relações
horizontais ou de justaposição, ou verticais ou de superposição 2.
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Em seguida, para que um instrumento multilateral pudesse sem
problemas substituir os diversos instrumentos bilaterais, seria
necessário que estes últimos fossem construídos sobre os mesmos
fundamentos. Isso não ocorre, visto que a prática dos TBIs não é
idêntica nos dois lados do Atlântico. Na verdade, coexistem dois
modelos principais: o modelo europeu, mais antigo, e o modelo
americano, mais recente.
A proliferação dos TBIs é, antes de tudo, a proliferação dos
TBIs concluídos pelos países europeus, já que os Estados Unidos
lançaram-se nessa prática somente na década de oitenta, por
considerarem o modelo europeu inadequado em dois aspectos
principais. Por um lado, as regras de proteção não eram consideradas
satisfatórias. O modelo americano evidencia a preocupação de
fortalecer as regras de proteção, especialmente aquelas relativas à
indenização em caso de expropriação ou nacionalização, ignorando a
busca de um equilíbrio entre esses interesses e aqueles dos seus
parceiros, normalmente países em desenvolvimento. Por outro, e esse
é o aspecto mais importante, o princípio do tratamento nacional foi
confinado à fase pós-investimento, ao passo que, para os Estados
Unidos, deveria incidir também na fase pré-investimento. Como
resultado, o Estado hospedeiro ficaria absolutamente proibido de
exercer controles no momento da admissão dos investimentos
americanos, incluindo os requisitos de desempenho.
Em consequência dessa proibição ser considerada uma
ameaça à sua soberania, os países em desenvolvimento
revoltaram-se contra esse modelo, fazendo com que sua propagação
fosse bastante lenta. Em 1992, os Estados Unidos haviam assinado
apenas dezoito TBIs, dos quais apenas nove haviam entrado em vigor
3
.
A existência desses dois modelos principais já impede que se
possa falar de um modelo único, que serviria de base para a
negociação de um acordo multilateral. Tratados europeus e
americanos pertencem a duas gerações convencionais que, tanto do
ponto de vista cronológico quanto do ponto de vista material, não
podem se confundir.
Além do confronto dessas duas concepções, o AMI não vingou
devido à pressão da sociedade civil. Para essa, tal acordo seria uma
carta dos direitos econômicos das empresas transnacionais e dos
deveres econômicos dos Estados, ou seja, um novo instrumento a
serviço da globalização. Pela primeira vez, um acordo de comércio
concebido para consolidar o império daquelas empresas foi derrotado.
Em face dessa derrota, pretende-se hoje a transferência das
negociações para a OMC que, aliás, já incorpora alguns acordos
relacionados a aspectos dos investimentos internacionais. Trata-se de
acordos que abordam de forma indireta aspectos importantes desses
investimentos.
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O principal exemplo de integração das questões relativas ao
comércio e ao investimento no âmbito da OMC é o Acordo Geral
sobre o Comércio de Serviços (GATS), que cobre várias situações
relacionadas a investimentos. O GATS visa ao investimento no setor
de serviços enquanto modalidade do comércio de serviços, sendo,
portanto, tanto um acordo sobre o comércio quanto um acordo sobre o
investimento. Do fato dessa importância acordada ao investimento
enquanto modo de fornecimento de serviços, o GATS não trata da
proteção do investimento da mesma forma que os TBIs, não
prevendo, por exemplo, dispositivos que tratam da expropriação e da
indenização, da proteção contra os conflitos, do repatriamento dos
lucros, ou do mecanismo de arbitragem internacional para as
controvérsias entre os investidores e o Estado hospedeiro.
Por sua vez, o Acordo sobre Medidas de Investimento
Relacionadas ao Comércio (TRIMS) trata de um tipo específico de
medida relativa ao investimento internacional, e proporciona um fórum
para o estudo dos requisitos de desempenho e medidas correlatas. O
TRIMS proscreve a aplicação de qualquer medida relativa aos
investimentos e ligada ao comércio considerada incompatível com o
tratamento nacional para os bens importados, ou com a proibição de
restrições quantitativas à importação previstos no GATT. O Acordo
visa unicamente às medidas que afetam o comércio de bens, não se
aplicando aos serviços. Pouco importa que essas medidas sejam
aplicadas no âmbito de políticas específicas relativas aos
investimentos internacionais, ou que elas o sejam de uma maneira
geral a todas as empresas em atividade no território de um país.
Ademais, ao contrário de outros acordos sobre investimentos, o
TRIMS não pretende tratar de forma detalhada as regras relativas aos
requisitos de desempenho impostos pelos governos às empresas,
visando tão somente àquelas contrárias às regras do GATT sobre o
comércio de bens. Por conseguinte, ele não trata de medidas relativas
a resultados de exportação ou à transferência de tecnologia. O TRIMS
não é propriamente um acordo sobre o investimento, mas prevê a
possibilidade de examinar a necessidade de dispositivos mais
detalhados sobre a política em matéria de investimento.
A proteção da propriedade intelectual, questão tratada no
Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual
Relacionados ao Comércio (TRIPS), é considerada como elemento
importante do ambiente jurídico dos investimentos internacionais. O
TRIPS cobre diversas situações relacionadas aos investimentos,
paralelamente às convenções existentes relativas à propriedade
intelectual.
Os outros acordos da OMC que interessam ao investimento são
o Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias, cujas
disciplinas em matéria de subsídios podem, até certo ponto, limitar o
uso de medidas de incitação para atrair os investimentos
internacionais, e o Acordo sobre Compras Governamentais, que
proscreve, notadamente, a discriminação quando da abertura dos
mercados a empresas locais filiais de empresas estrangeiras.
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A incorporação de dispositivos relativos ao investimento em
certos acordos da OMC, juntamente com a multiplicação dos TBIs,
conduz a indagar sobre a coerência institucional global do quadro que
se desenha para o comércio e o investimento, e sobre a oportunidade
de tratar de forma mais detalhada o investimento na OMC. As
transações comerciais internacionais são cada vez mais submetidas a
regulamentações que tratam dos mesmos temas, mas que diferem
entre si quanto aos objetivos gerais, aos conceitos, aos princípios
fundamentais e aos procedimentos de solução de controvérsias.
Assim, quando celebram TBIs, os Estados são cada vez mais
obrigados a levar em conta os vínculos entre as obrigações que eles
assumem em virtude desses acordos e aquelas contratadas na OMC.
Nesse sentido, convém ressaltar as atividades do Grupo de trabalho
OMC encarregado de examinar os vínculos entre comércio e
investimento. Esse Grupo foi estabelecido na primeira Conferência
ministerial da Organização, em dezembro de 1996, em Cingapura,
onde ficou claro que sua criação não prejudica a questão de saber se
as disciplinas multilaterais relativas ao investimento devem ser
tratadas no âmbito da OMC ou não. Segundo a declaração ministerial
de Cingapura, qualquer decisão de iniciar negociações na OMC sobre
disciplinas relativas ao investimento deverá ser objeto de uma decisão
expressa adotada por consenso. Assim, os trabalhos do Grupo não
constituem uma negociação, distinguindo-se das negociações
empreendidas na OCDE. Segundo um outro elemento importante de
seu mandato, o Grupo deve cooperar com a Conferência das Nações
Unidas para o Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) e outras
organizações internacionais apropriadas para melhor utilizar as
competências disponíveis e para tomar em conta a dimensão do
desenvolvimento. Aqui cabe questionar se a própria UNCTAD não
constituiria foro mais adequado do que a OMC para acolher
negociações desse porte.
De qualquer forma, as discussões que aconteceram no Grupo
de trabalho já demonstraram a ausência de consenso quanto à
necessidade de estabelecer na OMC regras multilaterais relativas ao
investimento. A maioria dos membros da OMC celebraram TBIs, e as
opiniões divergem sobre a necessidade de adotar um sistema global e
multilateral para os investimentos. Os partidários dessa visão
argumentam que essa concepção permitiria instaurar um ambiente
mais coerente, estável e previsível para o investimento internacional.
Os demais expressam temores em face da possibilidade de adoção
de um acordo multilateral que comprometa ainda mais a soberania
dos Estados e, sobretudo, quanto à maneira como tal acordo regeria a
questão da admissão do investimento estrangeiro. O estabelecimento
de regras multilaterais para os investimentos internacionais implicaria
na redução da esfera de competências estatais, resultante da
transferência de matéria de direito interno para o direito internacional.
Em nível regional, os acordos de integração econômica
constituem uma subcategoria importante. Os acordos de integração
econômica adquirem cada vez mais relevância. Como envolvem um
grau de unidade e cooperação mais elevado entre seus membros, o
leque de questões tratadas é mais amplo que em nível bilateral. A
Área de Livre Comércio Norte-Americana (Nafta), por exemplo,
abrange os investimentos internacionais. Seus dispositivos relativos a
investimentos já influenciaram outros acordos, e a UNCTAD já chegou
a afirmar que a inclusão de questões relativas ao investimento nas
áreas de livre comércio pode ser considerada como uma tendência
atual 4. Prova disso é a Minuta de Acordo da Área de Livre Comércio
das Américas (Alca)
investimentos.
5
, que também inclui um capítulo sobre
50
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2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A EVOLUÇÃO DO DIREITO DOS
INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS EM NÍVEL BILATERAL
De fato, ao menos por enquanto, o principal instrumento de
promoção e de proteção dos investimentos internacionais permanece
sendo o tratado bilateral. O crescimento extraordinário do número de
TBIs nas duas últimas décadas constitui um dos fenômenos mais
importantes na evolução do direito dos investimentos internacionais,
paralelamente à evolução dos direitos internos em matéria de
investimento. A grande maioria dos Estados optou por completar suas
legislações nacionais com tratados de promoção e proteção dos
investimentos estrangeiros. Prova disso é que no final de 1999, 155
dos 188 Estados-membros da Organização das Nações Unidas
haviam concluído ao menos um tratado bilateral desse tipo 6. Até
mesmo Cuba integrou esse processo na década de noventa, tendo
concluído nove tratados desse tipo até 1999 7.
Desde a década de sessenta até hoje, mais de 2.000 TBIs
foram concluídos, a maioria deles na década de noventa. Seu
principal foco tem sido, desde o início, a proteção dos investimentos,
no contexto mais amplo das políticas para a promoção dos
investimentos: a proteção dos investimentos contra nacionalização ou
expropriação e garantias de livre transferência de fundos e
dispositivos relativos a mecanismos de solução de controvérsias entre
investidores e Estados hospedeiros. A característica comum desses
acordos é que eles tratam exclusivamente do investimento. Sua forma
praticamente não mudou e as questões tratadas são primordiais para
os investidores. Os TBIs também cobrem outras áreas, como a não
discriminação no tratamento, e, em alguns casos, a entrada de
empresas controladas por capital estrangeiro, sub-rogação, no caso
de pagamento a título de seguro pela agência de garantia do país
exportador de capital, além de outros tópicos.
Uma característica importante da nova geração de TBIs é o
razoável grau de uniformidade dos princípios que informam os
acordos, combinados com inúmeras variações das fórmulas utilizadas.
Entretanto, muito embora esses tratados tenham atingido certo nível
de padronização, seus dispositivos refletem ao mesmo tempo as
diferentes posições adotadas pelos países partes desses acordos.
O primeiro TBI moderno foi concluído em 1959, entre a
Alemanha e o Paquistão. Desde então, um número crescente de
países desenvolvidos concluíram tratados desse tipo com países em
desenvolvimento e com outros países desenvolvidos, e mais
recentemente os países em desenvolvimento passaram a celebrar
acordos desse tipo entre si. Todavia, somente após o final da década
de oitenta os TBIs passaram a ser vistos como instrumentos de
promoção e de promoção dos investimentos internacionais aceitos
universalmente. Entre os 2.099 tratados existentes em 2001, mais de
800 foram concluídos após 1987 8.
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Atualmente, poucos Estados estão à margem desse
movimento. Tratam-se de microestados (ilhas do Pacífico, Mônaco,
Andorra, San Marino, Liechtenstein), Estados que enfrentam
problemas sérios (como Afeganistão, Angola, Iraque) ou Estados que
não celebraram tais tratados por razões ideológicas (Líbia e Coreia do
Norte). Além de Cuba, os demais países que proclamam o
comunismo, como a China, Vietnã e Laos, integraram o movimento na
década de noventa 9.
Diante desses dados, cabe indagar sobre as razões que
conduziram à conclusão de um grande número de acordos bilaterais
desse tipo, se tais iniciativas são verdadeiramente bilaterais, sem
ligação entre si ou se, ao contrário, derivam de uma pressão
coordenada dos países desenvolvidos, no sentido de condicionar os
investimentos em países em desenvolvimento às cláusulas constantes
em tais acordos. Uma pista nesse sentido é o fato que a maioria
desses acordos é firmada entre um país desenvolvido e um país em
desenvolvimento
10
. Por outro lado, há que se considerar que a
concorrência por investimentos internacionais entre países em
desenvolvimento acirrou-se nos últimos anos, já que estes recebem
parcela menor dos capitais investidos no planeta. Consequentemente,
esses países deixam de discutir com mais cuidado a redação das
cláusulas constantes dos TBIs, colocando as considerações sobre
oportunidade acima das exigências de legalidade 11.
Com o objetivo de investigar a relação entre a constituição de
uma rede tão importante de tratados bilaterais, o início da conclusão
de tratados multilaterais e a formação do costume internacional, faz-se
mister examinar se a existência de tais tratados pode conduzir a
verificação de uma "prática aceita como sendo de direito", no sentido
dado pelo art. 38, § 1º, b, do Estatuto da Corte Internacional de
Justiça, ao menos nos pontos retomados pela grande maioria dos
tratados.
Tal questão enseja consequências práticas de vultuoso
alcance. Imagine-se a situação de uma empresa de determinada
nacionalidade, que investiu em outro país. Este, por sua vez, concluiu
diversos TBIs, mas não com o país de nacionalidade da empresa.
Suponha-se ainda que o investidor tenha celebrado um contrato com
o Estado hospedeiro, prevendo uma cláusula compromissória. No
caso da superveniência de uma controvérsia que não pode ser
solucionada amigavelmente, a questão diz respeito à possibilidade
para o investidor de se valer, diante de um tribunal, das soluções
encontradas de forma geral nos TBIs, a título de regras
consuetudinárias.
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Considerando-se que a conclusão de tais tratados constitui a
manifestação de uma prática estatal, então necessariamente
constatar-se-á a existência de uma prática geral, ao menos no que diz
respeito aos dispositivos convencionais presentes em todos ou quase
todos os tratados. Resta saber se tal prática geral é "aceita como
sendo de direito", conforme a fórmula do Estatuto da Corte
Internacional de Justiça ou conforme a apresentação clássica do
fenômeno consuetudinário. Em outras palavras, a questão diz respeito
à presença ou não do elemento psicológico do costume, a opinio juris
sive necessitatis. Para se ter a certeza de que os TBIs não revelam
apenas a fragilidade econômica dos países em desenvolvimento nas
relações com os países desenvolvidos, é necessária uma análise
detalhada dos TBIs celebrados entre países desenvolvidos e países
em desenvolvimento, e, em um segundo momento, uma análise
comparativa desses últimos com os TBIs celebrados entre países em
desenvolvimento. Isso permitiria atestar ou não a existência de regras
consuetudinárias na matéria para alguns dos dispositivos
convencionais, ultrapassado o período de incerteza do período entre
as décadas de cinquenta a setenta. Há que se levar em conta que a
proliferação dos TBIs resultou de uma reação dos investidores e de
seus países de origem, os países desenvolvidos, à possibilidade dos
Estados de disciplinar, de acordo com o interesse público, os
investimentos estrangeiros. Essa possibilidade havia sido consagrada
em resoluções da Assembleia-Geral da ONU.
Constatando-se o fenômeno da internacionalização do direito
dos investimentos internacionais, cabe investigar e identificar os
dispositivos desse direito que foram efetivamente internacionalizados
pelos TBIs, e que, por conseguinte, foram subtraídos da ação
unilateral dos Estados hospedeiros, sob pena de sua responsabilidade
internacional. Trata-se do processo de formação do costume
internacional.
Com o intuito de investigar e identificar tais dispositivos, faz-se
mister separá-los em quatro áreas distintas, que constam da maioria
absoluta dos TBIs. Trata-se da recepção ou admissão dos
investimentos; do tratamento dos investimentos já constituídos; da
proteção e garantia desses investimentos e da solução de
controvérsias entre os Estados que fazem parte do tratado, e entre o
Estado hospedeiro e o próprio investidor.
3 A RECEPÇÃO DOS INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS
A primeira série de dispositivos, relativa à recepção dos
investimentos, é deixada pelos TBIs inspirados no modelo europeu à
competência discricionária do Estado hospedeiro, que terá inteira
liberdade para definir as condições nas quais deseja receber
investimentos, seja acolhendo a todos, seja reservando alguns setores
da economia nacional aos seus nacionais, ou até mesmo favorecendo
os investimentos internacionais em detrimento dos nacionais.
Ao contrário, a principal característica dos TBIs inspirados no
modelo americano é a proibição dos controles exercidos pelo país
hospedeiro por ocasião da admissão dos investimentos americanos,
assim como a proibição dos requisitos de desempenho. Isso equivale
à liberdade de acesso dos investidores estrangeiros, com exclusão de
alguns setores da economia nacional. Esse modelo de convenção
adquire relevância cada vez maior. Antes minoritário, pode significar o
indício de uma futura evolução, já que serviu de modelo ao tratado
constitutivo do Nafta, ao Protocolo de Colonia para a promoção e
proteção dos investimentos no contexto do Mercosul, ao tratado
constitutivo de uma área de livre comércio entre a Colômbia, a
Venezuela e o México, além de ter sido o modelo proposto para o
AMI. Por sua vez, o dispositivo proposto nas negociações para a
instituição da Alca, como se pode observar no capítulo sobre
investimentos que integra a minuta do acordo, prevê a aplicação do
tratamento de nação mais favorecida para o estabelecimento dos
investidores estrangeiros e seus investimentos, excluindo o tratamento
nacional.
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A grande novidade do projeto AMI foi justamente a extensão do
princípio do tratamento nacional à fase pré-investimento. Essa
extensão acompanha a solução dada pelos TBIs concluídos pelos
Estados Unidos, ou ainda pelo Nafta. É certo que o número de
tratados que preveem a aplicação do tratamento nacional às fases pré
e pós-investimento é ainda modesto, todavia, ainda é cedo para
afirmar que o fracasso do projeto AMI comprometeu essa tendência.
Entretanto, é necessário ficar alerta ao perigo que traz a
extensão do tratamento nacional à fase pré-investimento, pois
significa dar carta branca às empresas transnacionais, para que se
localizem ou se desloquem conforme seus interesses lucrativos, sem
nenhuma preocupação com os direitos dos trabalhadores. Por outro
lado, seria um atentado à soberania dos Estados, que estariam
impedidos de exercer um controle pleno sobre a admissão dos
investimentos estrangeiros em território nacional. É evidente que o
exercício pleno da soberania é necessário para que os Estados
possam fazer restrições à entrada de capitais em seu território, já que
os países em desenvolvimento necessitam de uma certa proteção.
Nessa perspectiva, não é possível prever a formação de um
costume internacional consolidando o direito de estabelecimento dos
investimentos internacionais. Mesmo no âmbito da OCDE, foram
necessários vinte e cinco anos a partir da adoção dos códigos de
liberação para que esse direito fosse confirmado. Nessa matéria, a
soberania dos Estados é muito importante. Ora, os acordos
internacionais, para que sejam eficazes e estáveis, devem conciliar os
interesses de todas as partes, sendo mutuamente vantajosos. Isso é
particularmente importante para os países em desenvolvimento e, de
forma mais geral, para os acordos concluídos entre países que não
têm o mesmo nível de desenvolvimento. Todo acordo entre países
desenvolvidos e países em desenvolvimento deve levar em conta a
importância particular dos objetivos e estratégias de desenvolvimento.
Não há como priorizar o desenvolvimento se o Estado não puder
exercer sua soberania no momento da entrada dos investimentos
internacionais em seu território.
4 O TRATAMENTO DOS INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS
No que diz respeito ao tratamento dos investimentos já
constituídos no país hospedeiro, conforme sua legislação interna,
alguns autores constatam uma internacionalização do regime
12
,
devido à grande uniformidade observada na redação das cláusulas
previstas nos TBIs sobre as obrigações de proteção dos investidores e
de seus investimentos. Os standards de tratamento normalmente
previstos nos TBIs dizem respeito à nação mais favorecida, ao
tratamento nacional e, em alguns casos, ao standard de tratamento
justo e equitativo.
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O tratamento nacional significa acordar aos investidores
estrangeiros um tratamento não menos favorável àquele acordado aos
investidores nacionais em circunstâncias comparáveis. Exige-se aqui
uma definição do que efetivamente constituam circunstâncias
comparáveis. Concebido nesses termos, o princípio não deve obstar
regulamentações adotadas em decorrência de motivos alheios à
nacionalidade do investidor, como a luta contra a evasão fiscal, a
proteção ambiental, a proteção social e a segurança dos
consumidores. O tratamento nacional exige também a existência de
critérios de definição da nacionalidade do investidor.
Quanto à extensão do princípio do tratamento nacional à fase
pré-investimento, como já foi mencionado, trata-se da solução dada
pelos TBIs concluídos pelos Estados Unidos. Todavia, o número de
tratados que preveem a aplicação do tratamento nacional às fases pré
e pós-investimento é ainda modesto, sem que se possa afirmar a
formação de um costume nesse sentido.
O tratamento de nação mais favorecida significa o
compromisso de não discriminar entre investidores estrangeiros. O
problema surge quando tal tratamento é visto como um obstáculo à
priorização das estratégias de desenvolvimento.
A questão que importa nessa matéria é saber se esse
tratamento, bem como o tratamento nacional, constituem normas
consuetudinárias ou se, ao contrário, são desprovidos de valor jurídico
fora do suporte convencional.
Esses dispositivos dificultam a implementação de políticas
diferenciadas de investimentos ou de desenvolvimento tecnológico em
setores econômicos que, de acordo com o interesse nacional, podem
ser considerados como estratégicos. Em outras palavras, impedem o
Estado de estabelecer prioridades de investimentos, de proteger
temporariamente setores estratégicos e de dar tratamento privilegiado
às empresas nacionais em setores relevantes. Por fim, colidem com o
princípio do tratamento diferenciado concedido aos países em
desenvolvimento, consagrado nas resoluções da ONU e nos acordos
da OMC, segundo o qual esses países têm o direito de isenção de
algumas obrigações convencionais, e de contar com períodos de
transição mais longos para a implementação dos compromissos
acordados.
Não é possível negar que o tratamento nacional só interessa
aos países de nível de desenvolvimento semelhantes, e que o
tratamento de nação mais favorecida só é conveniente para países
que possuem um nível de desenvolvimento suficiente para enfrentar e
sobreviver à competição internacional.
É importante observar que os dispositivos relativos ao
tratamento e aqueles relativos à proteção dos investimentos
internacionais estão intimamente ligados nos TBIs, visto que somente
quando o país hospedeiro assegura um tratamento justo e equitativo e
uma plena e inteira proteção e segurança, o país de nacionalidade do
investidor, como contrapartida, compromete-se a examinar
"favoravelmente" a outorga de sua garantia
13
. Por conseguinte, esses
dois standards encontram-se associados para informar toda a vida do
investimento. Por si só, são desprovidos de conteúdo jurídico, mas
permitem a apreciação da conformidade das regras nacionais de
tratamento e de proteção com o direito internacional. As relações de
investimento entre países do Norte e países do Sul, violentamente
abaladas nas décadas de sessenta e setenta, mostraram àqueles
países que não era possível impor a estes regras precisas em
matérias tão delicadas, mas tão somente enquadrar o direito nacional
aos limites dos standards impostos pelo direito internacional. Esses
dois standards, o de tratamento justo e equitativo e o de plena e
inteira segurança e proteção, aparecem então como a manifestação
da vontade de estabelecer ou restabelecer um clima favorável aos
investimentos Norte-Sul.
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No que diz respeito ao conteúdo do tratamento justo e
equitativo e/ou da plena e inteira proteção e segurança, para alguns
autores essas noções só serão determinadas progressivamente por
meio da obra pretoriana dos tribunais arbitrais, ou seja, quando um
tribunal delinear o significado de regras consuetudinárias imprecisas.
Aqui entra o conceito de conteúdo variável. Deve-se analisar se este
constitui um direito não escrito cujo conteúdo é incerto, mas que
impõe um standard mínimo de tratamento dos estrangeiros e de seus
bens. Nesta última hipótese, o tratamento dos investimentos
internacionais deverá ser elevado ao nível exigido pelo direito
internacional consuetudinário quando o tratamento nacional for inferior
àquele standard mínimo. Por sua vez, nos casos em que um Estado
adotar uma política de promoção do investimento nacional, a
assimilação do investimento estrangeiro a este conduz a uma situação
superior àquela do tratamento justo e equitativo, sem falar da hipótese
em que o regime aplicado em virtude do tratamento de nação mais
favorecida for mais favorável que o tratamento nacional.
5 A PROTEÇÃO E A GARANTIA DOS INVESTIMENTOS
INTERNACIONAIS
Com relação aos dispositivos sobre a proteção e a garantia, a
internacionalização do direito dos investimentos internacionais é mais
clara. Na verdade, como indica sua denominação mais comum, foi
justamente para assegurar a proteção dos investimentos que os TBIs
foram concebidos. O pano de fundo histórico dessa questão é a
famosa reivindicação de uma "Nova Ordem Econômica Internacional",
nos anos setenta, quando os países em desenvolvimento contestaram
as regras tradicionais do direito internacional público relativas à
indenização em caso de nacionalização de investimentos
internacionais. Nas grandes resoluções da Assembleia-Geral da ONU
sobre a Nova Ordem Econômica Internacional ou sobre a Carta dos
direitos e deveres dos Estados, a necessidade de uma indenização
"pronta, adequada e efetiva", assim como a referência às regras do
direito internacional na matéria, havia sido repudiada.
Nesse contexto, os TBIs simbolizam o resgate dessas regras
por meio de compromissos bilaterais concluídos pelos Estados
hospedeiros de investimentos, sobretudo os países em
desenvolvimento, com os países exportadores de investimentos. Em
outras palavras, aquilo que havia sido repudiado pelos países em
desenvolvimento nas instâncias multilaterais
contexto das relações bilaterais.
14
foi acordado no
56
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É fato que as fórmulas previstas nos mais de 2.000 TBIs variam
em seus detalhes. As Diretrizes para o tratamento do investimento
estrangeiro, redigidas em 1992 sob os auspícios do Banco Mundial e
do Centro Internacional para a Solução de Controvérsias relativas a
Investimentos (ICSID), cujo objetivo é refletir a prática estatal por meio
de uma codificação soft, prevê em seu Título IV que qualquer
expropriação deverá obedecer a uma meta de utilidade pública, não
deverá discriminar em razão da nacionalidade, e deverá ser
acompanhada de uma indenização apropriada. Quanto ao conteúdo
dessa indenização apropriada (art. IV, § 1º), as Diretrizes preveem a
fórmula "adequada, pronta e efetiva" (art. IV, § 2º), portanto
retomando os termos da Carta dos direitos e deveres econômicos dos
Estados. Ainda segundo as mesmas Diretrizes, a indenização será
adequada quando calculada a partir do valor de mercado do ativo
expropriado (art. IV, § 3º). Muitos autores identificam nessa fórmula as
condições gerais de legalidade internacional da nacionalização ou ao
menos da indenização em caso de nacionalização, tal como expostas
pelo secretário de Estado norte-americano Cordel Hull, em julho de
1938, por ocasião da nacionalização mexicana do setor petrolífero. A
fórmula Hull encontra-se em grande número de TBIs, servindo de
argumento para parte da doutrina que afirma a consolidação de um
costume internacional relativo a essa fórmula e seu respectivo
conteúdo.
Entretanto, duas críticas dirigem-se aos que afirmam a
existência de um costume internacional, ou de "uma prática geral
aceita como sendo de direito". A primeira foi desenvolvida por Samuel
K. B. Asante, que dirigiu, nos anos oitenta, o Centro das Nações
Unidas para as empresas transnacionais. Segundo ele, nas relações
entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento, não apenas
as resoluções sobre a nova ordem econômica internacional
arruinaram a regra relativa à indenização "pronta, adequada e efetiva"
em caso de nacionalização, mas também a prática dos Estados
confirmou o afastamento dessa regra. Examinando-se as
indenizações efetivamente pagas por ocasião das grandes ondas de
nacionalização dos anos cinquenta a setenta, percebe-se que não
foram nem adequadas quanto ao seu montante, nem prontas, já que
em
diversos
casos
os
pagamentos
foram
diferidos.
Consequentemente, Asante conclui que não é possível deduzir da
prática dos Estados nenhuma fórmula internacional geralmente
reconhecida no que diz respeito ao montante da indenização, mas tão
somente a obrigação de pagar uma indenização de boa fé. Para
reforçar sua conclusão, Asante alega que se a regra "pronta,
adequada e efetiva" pertencesse ao direito internacional geral, os TBIs
não seriam necessários, uma vez que os países desenvolvidos
poderiam apoiar-se na existência de uma regra consuetudinária. Para
ele, os dispositivos enunciados nesses tratados não traduzem uma
opinio juris dos países em desenvolvimento, mas tão somente sua
fragilidade econômica nas relações com os países desenvolvidos.
Todavia, sabe-se que atualmente os problemas de
expropriação e de nacionalização não mais ameaçam as relações de
investimento
entre
países
desenvolvidos
e
países
em
desenvolvimento. A questão atual é assegurar que as
regulamentações econômicas de caráter geral não sejam assimiladas
às medidas de expropriação ou de nacionalização. Os dispositivos
relativos a essas medidas não devem instituir uma nova prescrição
impondo às partes o dever de pagar uma indenização para as perdas
que um investidor ou investimento possa sofrer em seguida de uma
regulamentação, de um tributo obrigatório ou de qualquer outra
atividade normal de interesse geral de um país. Em outras palavras, é
necessário assegurar que nenhum dispositivo convencional relativo à
proteção dos investimentos atente contra a autoridade legislativa do
Estado hospedeiro, na medida em que esta seja exercida de forma
não discriminatória.
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Algumas controvérsias surgidas no Nafta demonstraram que os
dispositivos relativos à proteção do investimento podem ser utilizados
pelas empresas para contestar qualquer regulamentação de um
Estado que tenha uma incidência negativa no valor da empresa,
como, por exemplo, uma regulamentação introduzindo normas mais
elevadas em matéria de proteção à saúde pública e ao meio ambiente
15
. Isso já foi percebido durante as negociações do Projeto AMI, cuja
ambição era transplantar os dispositivos do Nafta relativos à proteção
dos investimentos.
6 A SOLUÇÃO DE CONTROVÉRSIAS RELATIVAS A
INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS
Por fim, a quarta série de dispositivos presentes nos TBIs visa a
assegurar a efetividade das cláusulas previstas, por meio de um
mecanismo compulsório de solução de controvérsias entre Estado
hospedeiro e investidores. O afastamento das concepções clássicas
de solução de controvérsias em matéria de investimento internacional
constitui uma das características mais marcantes do direito
internacional econômico. Até mesmo os TBIs concluídos a partir do
final da década de oitenta pelos países da América Latina contam com
cláusulas de solução de controvérsias desse tipo. Resta saber se esse
mecanismo entre Estado e investidor não foi concebido para
acomodar os interesses particulares das empresas transnacionais
face ao interesse geral representado pelos Estados.
Em matéria de solução de controvérsias, os Estados são
cautelosos quanto à sua liberdade de ação, como prova sua
desconfiança com relação à cláusula facultativa de jurisdição
obrigatória da Corte Internacional de Justiça. Ademais, as
controvérsias suscetíveis de surgir no contexto dos investimentos
internacionais não são exclusivamente comerciais; ao contrário,
muitas vezes dizem respeito a questões políticas do país hospedeiro,
envolvendo interesses públicos importantes e diversos. Assim, faz-se
necessário assegurar que o mecanismo de solução de controvérsias
entre Estado e investidor não constitua uma grave ameaça à
soberania nacional em matéria de regulamentação ambiental, social e
outras, servindo para acomodar os interesses particulares das
empresas transnacionais face ao interesse geral representado pelos
Estados.
Normalmente, o artigo destinado à solução de controvérsias
entre Estado e investidor dispõe que, em seguida de negociações
infrutíferas, as partes submeterão o litígio a um tribunal arbitral, seja
ad hoc, seja institucional. Nesse último caso, o ICSID desempenha
papel essencial. O ICSID deve seu papel à vontade do Banco Mundial
de promover os investimentos no Terceiro Mundo, controlando o
poder jurisdicional do Estado em relação aos investidores
internacionais.
58
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Ora, em primeiro lugar, essa cláusula contraria o princípio
consagrado no direito internacional desde o século XIX, relativo ao
esgotamento dos recursos internos
16
, e segundo o qual o Estado
deve ter a oportunidade de reparar o ato ilícito e o dano dele
decorrente, no âmbito de seu sistema jurídico nacional, antes que se
possa questionar sua responsabilidade no plano internacional. A
renúncia a essa prerrogativa pode resultar na internacionalização do
regime jurídico dos investimentos. Em segundo lugar, a possibilidade
do investidor estrangeiro de recorrer à arbitragem internacional contra
o Estado hospedeiro colocaria em condições de igualdade dois
sujeitos absolutamente desiguais: um Estado, dotado de
personalidade jurídica internacional e que visa ao interesse público, e
um sujeito de direito interno, que visa a um interesse lucrativo
particular. Em terceiro lugar, resta saber se esse privilégio concedido
ao investidor estrangeiro não vai de encontro ao tratamento nacional,
visto que o investidor nacional deverá recorrer sempre ao Poder
Judiciário interno. Por fim, não há como negar que a arbitragem
internacional, tal como prevista nos TBIs, contraria o princípio da
soberania, que inclui necessariamente o exercício da jurisdição no
território nacional.
Sabe-se que os tribunais arbitrais, de forma geral, podem
aplicar um direito que escapa à ação unilateral do Estado. A cláusula
que prevê o direito aplicável muitas vezes faz referência aos princípios
gerais do direito ou às regras do direito internacional. No momento da
negociação, a principal meta do investidor que celebra um contrato
com um Estado é encontrar fórmulas jurídicas que permitam
neutralizar o poder normativo do Estado cocontratante, por meio do
"deslocamento" ou "internacionalização" desse contrato por meio de
cláusulas compromissórias que evitarão a competência dos tribunais
nacionais do Estado hospedeiro.
Essa é a razão pela qual encontramos nos contratos de
investimento, que mediante algumas condições são chamados de
"contratos de Estado", cláusulas que visam a neutralizar o poder
normativo do Estado contratante
17
. Para esse fim, o investidor
tentará, por meio da cláusula de direito aplicável, retirar o contrato de
investimento da ordem jurídica do Estado hospedeiro. Isso será feito
por meio da previsão do direito nacional do Estado "congelado" em
uma determinada data, nas chamadas "cláusulas de estabilização do
direito", como direito aplicável, ou ainda por meio da combinação do
direito do Estado com princípios de direito internacional através de
fórmulas diversas, ou com princípios gerais do direito.
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Todavia, e embora muito já se tenha debatido em doutrina e
jurisprudência sobre a eficácia jurídica dessas cláusulas, inúmeras
divergências persistem sobre a matéria. Quando existe um TBI entre o
Estado hospedeiro e o Estado nacional do investidor, o respeito dos
compromissos contratuais pode ser objeto de um compromisso
específico do Estado hospedeiro no nível do direito internacional
convencional
18
. São as chamadas umbrella clauses. Alguns autores,
como Prosper Weil, consideram que diante da existência de tais
tratados, as obrigações contratuais entre o Estado hospedeiro e o
investidor
são
transformadas
em
verdadeiras
obrigações
internacionais, no sentido do direito internacional público. Pierre
Mayer, ao contrário, sustenta que a natureza das relações entre as
partes permanece subordinada à lex contractus, e que somente a
relação interestatal é subordinada ao direito internacional. Por sua
vez, Charles Leben sustenta que independentemente da teoria
adotada, a violação de suas obrigações contratuais pelo Estado
hospedeiro implica em uma violação, direta ou indireta, do direito
internacional
público
19
.
Segundo
ele,
está-se
diante
da
internacionalização dos compromissos contratuais assumidos pelo
Estado hospedeiro, por meio dos tratados bilaterais. A Sentença
ICSID AAPL/Sri Lanka, de 27 de junho de 1990, estabeleceu que um
investidor pode se prevalecer diretamente dos compromissos
assumidos pelo Estado hospedeiro vis-à-vis de seu Estado nacional
em um TBI, independentemente da existência de um contrato entre o
investidor e o Estado hospedeiro. Por conseguinte, se nesse tratado o
Estado hospedeiro comprometeu-se a aceitar o mecanismo arbitral
para resolver eventuais controvérsias com investidores, um contrato
entre esse Estado e o investidor incluindo uma cláusula
compromissória deixa de ser necessário. A situação seria a mesma se
o Estado receptor do investimento aceitou a competência do ICSID
em sua legislação nacional 20.
Considerando-se a existência de mais de 900 TBI prevendo o
recurso à arbitragem ICSID ou o mecanismo adicional ICSID
21
, ou
ainda arbitragens ad hoc segundo o regulamento Uncitral, percebe-se
um movimento em direção à internacionalização dos litígios relativos
aos contratos de investimento. A maioria dos casos subordinados ao
ICSID resulta da aceitação da arbitragem por um Estado, seja em um
TBI, seja em sua legislação nacional, e não em um contrato concluído
com o investidor 22. Por conseguinte, tudo indica que essa rede de TBI
será, em um futuro próximo, o fundamento mais importante do
contencioso entre Estado e investidor. Por outro lado, as questões
relativas à nacionalização darão lugar àquelas relativas a quebras de
contrato, mudanças de legislação, danos causados ao investidor por
desordem local, problemas oriundos da privatização das empresas ou
da legislação ambiental, entre outros 23.
60
RBAr Nº 24 - Out-Dez/2009 - DOUTRINA NACIONAL
Por fim, faz-se mister observar que alguns acordos plurilaterais
existentes também ensejam a possibilidade de um investidor procurar
uma instância arbitral, mais comumente o ICSID, para solucionar uma
controvérsia com o Estado hospedeiro com quem tenha ou não uma
relação contratual
24
. Disposições desse tipo estão presentes no
Nafta, no Protocolo de Colonia para a promoção e a proteção
recíproca dos investimentos no âmbito do Mercosul, no tratado
constitutivo de uma área de livre comércio entre a Colômbia, a
Venezuela e o México, na Carta da Energia, que entrou em vigor em
1998, além de tratar-se da fórmula prevista no Projeto AMI. Mais
recentemente, essa solução está presente na Minuta de Acordo da
Alca, no art. 15 do capítulo sobre investimentos.
Essa evolução traz sérios riscos para os Estados. Há que se
considerar que as cláusulas de arbitragem obrigatória normalmente
fazem com que as tentativas do Estado no sentido de impor uma
regulamentação aos investidores possam ser questionadas, como, por
exemplo, em matéria de transferência de tecnologia ou em matéria de
quotas de nacionais a serem recrutados pelos investidores. Segundo
Brigitte Stern, arrisca-se assistir a um fenômeno de "privatização" ou
até de uma "comercialização" do direito, pois a arbitragem prestada ao
encontro de um Estado será uma arbitragem comercial
25
. Por
conseguinte, conclui-se que a solução de controvérsias do tipo mista
ou transnacional constitui grave ameaça à soberania nacional, sendo
a melhor solução a retomada da concepção clássica relativa à solução
de controvérsias do tipo interestatal.
7 O DESENVOLVIMENTO PROGRESSIVO NO DIREITO DOS
INVESTIMENTOS INTERNACIONAIS
Por outro lado, além da dialética tratado-costume, há que se
falar também do fenômeno do desenvolvimento progressivo no direito
internacional dos investimentos, e notadamente com relação à
incidência da corrupção nas transações internacionais. Segundo a
UNCTAD, a incidência da corrupção reduz o fluxo de investimentos
internacionais, causando desvantagens competitivas entre as
empresas, principalmente entre as pequenas e médias, e criando
incertezas em relação a seus investimentos
26
. Esse fato não é sem
importância para os TBIs, cujo objetivo é justamente contribuir para
um ambiente estável aos investimentos internacionais.
Como já mencionado, os TBIs e alguns acordos de integração
econômica estendem suas matérias tradicionais para além das
questões relativas à liberalização do comércio e à proteção do
investimento, prevendo direitos e benefícios para as empresas
transnacionais, que podem inclusive ser reclamados em tribunais
internacionais. Em revanche, os Estados poderiam considerar
apropriado equilibrar os direitos e obrigações que tais instrumentos
preveem entre os países hospedeiros, as empresas transnacionais e
seus países de origem. A prevenção e a proibição da corrupção
transnacional poderiam ser vistas como um componente essencial dos
TBIs, ao menos em termos de medidas extrapenais aplicáveis às
empresas e destinadas a prevenir e a combater transações corruptas.
Tais dispositivos poderiam ser formulados em termos compulsórios ou
não, exigir a reciprocidade, a fim de torná-los mais flexíveis, além de
que os Estados poderiam optar por estender os benefícios relativos à
proteção do investimento apenas aos Estados que aceitassem tais
obrigações. Ademais, a condição de reciprocidade poderia ser
estendida às empresas por meio de uma cláusula de perda de
benefícios, prevendo para os Estados a possibilidade de negar os
benefícios decorrentes da proteção do investimento às empresas
envolvidas em corrupção. A inclusão de dispositivos específicos
proibindo a corrupção transnacional nos TBIs ajudaria a criar a
confiança pública no sentido de que os benefícios estendidos aos
investidores pela globalização seriam complementados pela
cooperação internacional na prevenção do abuso das liberdades no
mercado global 27.
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Segundo a UNCTAD
28
61
, existem várias opções que os
negociadores de TBI poderiam considerar para o problema da
corrupção transnacional.
A primeira opção e a mais comum consiste em não fazer
referência aos pagamentos ilícitos. Por sua vez, a segunda opção
consiste na inclusão de uma cláusula geral sobre pagamentos ilícitos
como a afirmação da importância da cooperação internacional na
prevenção e no combate do crime. A terceira opção consiste na
inclusão de cláusulas esclarecendo os efeitos das sanções contra
pagamentos ilícitos em obrigações cobertas pelos TBIs. Em
decorrência de vários instrumentos internacionais, entre os quais
estão a Convenção Interamericana contra a Corrupção da OEA e a
Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos
Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais da OCDE, os
Estados assumiram obrigações no sentido de implementar leis
proibindo o suborno transnacional, e de adotar medidas penais e
extrapenais contra os culpados. Algumas medidas dispõem sobre a
prisão dos envolvidos, incluindo investidores internacionais; outras
preveem o confisco de propriedades resultantes de atos de corrupção,
ou a anulação de quaisquer direitos ou vantagens adquiridos mediante
transações ilícitas. Ocorre que tais medidas poderiam ser
consideradas contrárias às obrigações assumidas pelo Estado em
virtude de um TBI. Por exemplo, a aplicação de uma legislação
anticorrupção poderia resultar na proibição de transferência de fundos
prevista em um contrato de Estado celebrado graças ao suborno de
um funcionário público. Haveria violação das obrigações assumidas no
TBI nesse caso? Cabe aos Estados partes de um TBI prever as
exceções à aplicação de suas legislações anticorrupção. Nesse
sentido, o capítulo sobre investimentos da minuta de acordo da Alca
prevê, no art. 9º, destinado às transferências, que as partes poderão
implementar sua legislação referente a infrações criminais.
Uma quarta opção consiste em estabelecer vínculos com
acordos internacionais destinados à prevenção e ao combate da
corrupção transnacional, como, por exemplo, a incorporação de
alguns dispositivos dirigidos à corrupção transnacional ou a indicação
desses dispositivos. Todavia, com o intuito de prevenir eventuais
conflitos de legislação, deveria haver uma previsão de hierarquia
jurídica entre esses acordos.
62
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Por fim, a quinta opção consiste na inclusão de cláusulas
substantivas sobre pagamentos ilícitos. Um exemplo desse tipo são as
Diretrizes da Comunidade Caribenha (Caricom) para uso na
negociação de tratados bilaterais. Outro exemplo de circunstâncias
nas quais as partes poderiam prever cláusulas substantivas
relacionadas à corrupção transnacional diz respeito à cooperação
internacional nas questões anticorrupção que podem surgir
especificamente no contexto dos TBIs. Tais dispositivos serviriam para
reforçar as obrigações resultantes dos acordos anticorrupção, quando
os países envolvidos fossem partes de ambos.
CONCLUSÕES
Brigitte Stern já salientou que por trás da noção de investimento
é possível abrigar tanto a noção de motor do desenvolvimento
econômico quanto um simples meio de geração de lucros
29
. Assim, a
questão relativa à existência de uma dialética tratado-costume no
domínio do direito internacional dos investimentos deve ser estudada
com muito cuidado, levando-se em conta que o costume internacional,
enquanto uma das fontes do direito internacional prevista no art. 38 do
Estatuto da Corte Internacional de Justiça, exige, além da prática
geral, o elemento psicológico ou a opinio juris sive necessitatis. Assim,
há que se verificar se os dispositivos enunciados nos TBIs
efetivamente traduzem a opinio juris dos países em desenvolvimento,
e não apenas sua fragilidade econômica nas relações com os países
desenvolvidos. Está presente nesse processo a dicotomia norte-sul, e,
muito embora o fenômeno da proliferação de tratados bilaterais de
promoção e proteção de investimentos, o conflito ideológico continua
presente. Não é possível ignorar a necessidade dos países em
desenvolvimento de atrair investimentos, que resulta na conclusão de
acordos cujas cláusulas não são discutidas com o cuidado merecido.
Um modelo de TBI que concilie os interesses de todas as
partes envolvidas em uma operação de investimento deveria
necessariamente incluir a dimensão ambiental e social, as obrigações
de transparência, a cooperação fiscal, a luta contra a corrupção e
outras formas de criminalidade nas transações internacionais. Deve
haver um equilíbrio entre as obrigações do Estado hospedeiro e
aquelas do investidor nos TBIs, incluindo a preocupação com as
práticas empresariais negativas.
A negociação interestatal deve ter como objetivo organizar as
relações de direito internacional entre países exportadores e países
importadores de investimentos, e não apenas criar obrigações para
uns e vantagens para outros, de forma a fazer com que, em matéria
de investimento, o intervencionismo dos Estados se apague diante de
um liberalismo planetário. O Projeto AMI demonstrou ser um
instrumento de globalização, destinado a favorecer o acesso das
grandes empresas transnacionais aos mercados nacionais, e seu
fracasso muito se deve à atuação da sociedade civil. A lição que se
deve aprender é que a elaboração das normas de direito internacional,
e particularmente das normas de direito internacional econômico,
deverá contar com a vigilância redobrada das organizações não
governamentais.
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63
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