Ética profissional e o debate internacional.

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Ética profissional e o debate internacional.
Ética profissional e Serviço Social. O debate internacional 1
Ana Maria de Vasconcelos2
[email protected]
Valquiria Helena dos Santos Coelho 3
[email protected]
Modalidad de trabajo:
Eje temático:
Palabras claves:
Resultados de Investigaciones
La dimensión ético-política de la práctica profesional y la
organización política del Trabajo Social
Serviço Social, Ética Profissional, Código de Ética Brasileiro;
Federação Internacional dos Assistentes Sociais; Exercício
Profissional
Introdução e Objetivos
Este trabalho é parte de uma pesquisa realizada na Faculdade de Serviço
Social/UERJ-Brasil que tem como objeto a prática do Serviço Social. Objetiva uma análise
comparativa entre o Código de Ética do Serviço Social Brasileiro e o documento: Ética do
Trabalho Social – Princípios e normas composto pela Declaração Internacional dos
Princípios éticos do Serviço Social da Federação Internacional dos Assistentes Sociais
(FIAS) e os Critérios Éticos Internacionais para os Assistentes Sociais.
Em âmbito internacional, observamos a aproximação do Conselho Federal de
Serviço Social (CFESS) e a FIAS4 de forma a fortalecer a organização e atuação política
da categoria dos assistentes sociais na Região da qual é parte e introduzir o debate do
projeto ético-político do serviço social brasileiro nas demais regiões. Atualmente o
Conselho Federal vem elaborando um documento a ser apresentado para Federação
expondo a definição do serviço social do Brasil (CFESS, Notícias do Pleno – de 19 a 22
de março de 2009). O código de ética do assistente social brasileiro, traduzido em vários
idiomas, é uma das referências no que tange a definição em questão.
A partir de um processo que teve início no final da década de 1970 - o marco é o
III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais/1979 - o Código de Ética do assistente
social expressa transformações no interior da profissão bem como na sociedade
1
Ponencia presentada en el XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. El Trabajo Social en la
coyuntura latinoamericana: desafíos para su formación, articulación y acción profesional. Universidad Católica
Santiago de Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
2
Doutora em Serviço Social. Professora da Faculdade de Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro –
Brasil. Resumo apresentado ao XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. Formação Profissional e
as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação. Universidad Católica Santiago de Guayaquil.
Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
3
Mestranda / Bolsista CAPES do Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade do Estado do Rio de
Janeiro – Brasil. Resumo apresentado ao XIX Seminario Latinoamericano de Escuelas de Trabajo Social. Formação
Profissional e as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação. Universidad Católica Santiago de
Guayaquil. Guayaquil, Ecuador. 4-8 de octubre 2009.
4
O CFESS vem acompanhando e participando das Conferências da FIAS desde 1998.
1
brasileira. Um processo que não resultou exclusivamente numa mudança normativa ou
mesmo de interesse corporativo, mas em um compromisso ético-político com a classe
trabalhadora do país.
A incorporação do marxismo para além das críticas às bases teóricometodológicas e ao posicionamento político assumidos, até então, procedeu à crítica da
ética tradicional: o tomismo e o pensamento conservador. Esse processo alçou a
categoria a um compromisso com a emancipação e plena expansão dos indivíduos
sociais e uma opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de
uma nova ordem societária, sem dominação-exploração de classe, etnia e gênero, como
afirmado no Código.
O documento Ética do Trabalho Social – Princípios e normas aprovado em
Assembléia Geral da FIAS em 1994, ao expor os princípios básicos da profissão, traz
recomendações para os “casos em que os dilemas se apresentam”; trata das relações
dos assistentes sociais entre si, com outros profissionais relacionados a esta área de
atuação e com os “clientes” /usuários. Considerando a atuação desta Federação em
diferentes países do mundo, entendemos que é de grande relevância a abordagem e o
debate das indicações colocadas pela mesma de forma a orientar a atuação dos
assistentes sociais/trabalhadores sociais tendo como parâmetro os interesses da classe
trabalhadora a nível mundial.
Desenvolvimento
Serviço Social no Brasil
Os assistentes sociais brasileiros, sujeitos na construção da profissão,
organizaram-se desde o fim dos anos de 1970 para a construção de um Projeto
Profissional no sentido de romper com o Serviço Social tradicional. Um Projeto que, em
constante debate, se consubstancia em um campo de disputas entre diferentes
segmentos da categoria em luta por projetos societários distintos (Netto, 2006).
Destarte, o Projeto ético-político do Serviço Social resulta de um processo histórico
de lutas pela redemocratização do país diante da ditadura militar. Momento este que
resultou na Constituição Federal de 1988 e impulsionou uma série de conquistas como os
direitos sociais, políticos, civis e o fim da ditadura.
A categoria dos assistentes sociais, neste contexto, se volta criticamente para sua
própria dinâmica e organização; a partir de uma leitura teórico-crítica da sociedade
brasileira, direciona a profissão de modo a se comprometer com os interesses das
classes trabalhadoras.
2
Assim, a dimensão política do Serviço Social tem seu alicerce na classe
trabalhadora da sociedade brasileira com vistas à hegemonia da mesma, o que torna
indissociável o projeto profissional do projeto societário, cuja abrangência política é maior.
Entendemos que as ações no dia-a-dia profissional supõem a consideração deste grande
cenário político ultrapassando as práticas institucionais que se dão em um espaço político
menor com ações conformistas ou propositivas transmitidas aos usuários de tais serviços
(Iamamoto, 2007, p.229).
Na busca pela hegemonia, o Serviço Social brasileiro que se norteia contra o
conservadorismo tem como alicerce a Lei de Regulamentação (8.662/93) da Profissão,
reconhecimento jurídico da profissão; o Código de Ética Profissional, que normatiza a
profissão e a proposta de formação da ABEPSS expressa nas Diretrizes Curriculares para
o Curso de Serviço Social da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço
Social (ABEPSS), que visa a formação de um assistente social com formação generalista
e crítica. Uma formação que reforçando os princípios ético-políticos expressos no Código
capacite o assistente social para uma análise teórico-crítica da realidade que medeie
ações propositivas, criativas e inovadoras no enfrentamento das demandas dos usuários
e das requisições institucionais.
O avanço do Projeto Profissional crítico depende da consideração e análise das
condições sociais e históricas nas quais se dá a prática do assistente social, enquanto
sujeito inserido na dinâmica social e técnica do trabalho. Iamamoto afirma que:
O que merece destaque é que o projeto profissional não foi construído
numa perspectiva meramente corporativa, voltada à autodefesa dos
interesses específicos e imediatos desse grupo profissional centrado em
si mesmo. Não está exclusivamente voltado para obtenção da
legitimidade e status da categoria na sociedade brasileira inclusiva – e no
mercado de trabalho em particular – de modo a obter vantagens
instrumentais (salários, prestígio reconhecimento de poder no conceito
das profissões). Ainda que abarque a defesa das prerrogativas
profissionais e dos trabalhadores especializados, o projeto os ultrapassa,
porque é dotado de “caráter ético-político”, que eleva esse projeto a uma
dimensão de universalidade, a qual subordina, ainda que não embace, a
dimensão técnico-profissional, porque estabelece um norte, quanto à
forma de operar o trabalho cotidiano, impregnando-se de interesses da
coletividade ou da “grande política”, como momento de afirmação da
teleologia e da liberdade na práxis social. (Idem, p.227)
A guinada no Serviço Social reflete mudanças que se gestavam na década de
1970 influenciadas pelo movimento de Reconceituação na América Latina. No interior da
profissão, essas mudanças se aprofundaram nos anos de 1980 e alguns marcos
sinalizam essas mudanças. Dentre eles destacamos:
3
• III Congresso Brasileiro de Assistentes Sociais conhecido como Congresso
da Virada que ocorreu em 1979 onde os representantes da ditadura foram
substituídos por representações dos movimentos dos trabalhadores;
• Currículo Mínimo de 1982/ABESS (no que tange a formação profissional);
• Código de Ética de 1986, no qual a profissão se coloca na defesa dos
interesses dos trabalhadores.
• O
movimento
político
da
categoria
representado
pelo
Conjunto
5
CFESS/CRESS, pela ABEPSS e pela ENESSO .
Outros aspectos importantes marcam este movimento de transformação do serviço
social nas últimas décadas: a produção científica reconhecida por órgãos de fomento e
com interlocução com outros intelectuais; a criação e desenvolvimento de cursos de pósgraduação; a significativa participação dos assistentes sociais e discentes nos eventos
nacionais e regionais da categoria e na busca de uma prática mediada pelo que é
denominado, desde início da década de 1990, de Projeto Ético Político do Serviço Social
brasileiro.
Observa-se diante disso que, a partir da década de 1980, a categoria dos
assistentes sociais vem construindo coletivamente um projeto que envolveu a
regulamentação da profissão, resguardando os direitos e deveres profissionais perante a
sociedade; a organização política da categoria – incluindo aí a aproximação tanto com
movimentos sociais quanto com outras categorias profissionais; modificações no ensino
universitário e na definição de um novo perfil para o assistente social cujo objeto de
atuação é a questão social e produção teórica como sustentação a esse projeto.
O Código de Ética do Serviço Social Brasileiro
O presente estudo toma o Código de Ética do Assistente brasileiro e o Código de
Ética da FIAS no sentido de que os mesmos são referência para o exercício da profissão
no Brasil e no mundo. O que tais Códigos indicam como diretrizes e asseguram para os
assistentes sociais/trabalhadores sociais representam valores assumidos e, diante da
sociedade, são referências do que a profissão tem como objetivos.
No Código de Ética do assistente social brasileiro, observamos que este seguiu a
dinâmica histórica de modificações no interior da profissão. Assim, desde o Código de
5
CFESS (Conselho Federal de Serviço Social); CRESS (Conselho Regional de Serviço Social); ABEPSS (Associação
Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social, antiga ABESS - Associação Brasileira de Ensino em Serviço Social) e
ENESSO ( Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social).
4
Ética de 1986, a profissão se coloca na defesa dos interesses dos trabalhadores. No
entanto, é com o Código de Ética de 1993 que este propósito se reafirma com a definição
dos princípios fundamentais da profissão expondo, sobretudo, que advoga a superação
da ordem capitalista vigente.
O Código de ética instituído em março de 1993 consta de onze princípios
fundamentais. Articulados de forma indissociável não podem ser fragmentados, com pena
de prejudicar o sentido de sua formulação.
Assim, vejamos:
Ú Reconhecimento da Liberdade como valor ético central e das demandas políticas
a ela inerentes – autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos
sociais;
Ú Defesa dos direitos humanos e recusa do arbítrio e do autoritarismo;
Ú Ampliação e consolidação da cidadania com vistas à garantia dos direitos civis,
SOCIAIS e políticos das classes trabalhadoras;
Ú Defesa e aprofundamento da democracia enquanto socialização da participação
política e da riqueza socialmente produzida;
Ú Posicionamento em favor da equidade e da justiça social, que assegure
universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas
sociais, bem como sua gestão democrática;
Ú Empenho na eliminação de todas as formas de preconceito;
Ú Garantia do pluralismo e compromisso com constante aprimoramento intelectual;
Ú Opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção de uma
nova ordem societária, sem dominação-exploração de classe, etnia e gênero;
Ú Articulação com os movimentos de outras categorias;
Ú Compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população;
Ú Exercício do Serviço Social sem ser discriminado e sem discriminar, por questões
de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual,
idade e condição física.
Tais princípios demonstram de maneira clara o comprometimento da categoria dos
assistentes sociais com a classe trabalhadora tomando como diretriz o reconhecimento da
liberdade como valor ético central e a construção de uma nova ordem societária, sem
dominação-exploração de classe, etnia e gênero
Em sintonia com esses princípios, em seus sete títulos e trinta e seis artigos, o
Código expõe disposições gerais; direitos e responsabilidades gerais do assistente social;
relações dos assistentes sociais com os usuários, com as instituições empregadoras e
com outros profissionais; relações das entidades da categoria com outras organizações
da sociedade civil; sigilo profissional; relações do assistente social com a justiça e
observância, penalidades, aplicação e cumprimento do Código. Tendo como referência o
ser social, compreende-se que os homens são determinados socialmente e, neste
sentido, “os valores [...] não são categorias abstratas, mas determinações da prática
5
social que o pensamento reconstrói e conceptualiza” (Paiva, Netto, Barroco, Silva e Sales,
p.164, 2006).
Destarte, a ética possui a característica de ser histórica e social; desta forma, pode
ser compreendida como determinada pela sociedade de classes. Como demonstram
Paiva e Sales (2006) o Código foi qualificado como referência ético-política expondo os
valores e compromissos profissionais bem como o estabelecimento de regras legais para
o exercício profissional.
A Federação Internacional dos Assistentes Sociais (FIAS)
A FIAS, fundada em 1956, resulta do chamado Secretariado Internacional de
trabalhadores sociais constituído entre 1928 e a segunda Guerra Mundial. Seus objetivos
são promover a profissão em nível mundial; promover a participação dos assistentes
sociais no planejamento das ações sociais e na efetivação de políticas públicas em
âmbitos nacionais e internacionais; estimular o intercâmbio entre os assistentes sociais de
diversos países e representar a profissão internacionalmente.
Atualmente, 80 países compõem a FIAS, o que corresponde a representação de
mais de 500 mil assistentes sociais (www.cfess.org.br). O organismo da Federação com
maior poder de decisão é a Assembléia Geral que ocorre a cada dois anos. Nesta há a
participação dos vice-presidentes regionais: da África, da Ásia e Pacífico, da Europa, da
América Latina e Caribe e da América do Norte (Estados Unidos e Canadá). Com relação
à participação dos países, é permitida a inserção de apenas uma entidade representativa
da profissão nesta organização. Sua sede encontra-se em Berne, na Suíça.
No que tange à definição do exercício profissional, a FIAS coloca que o
trabalhador social:
“promove a mudança social, a resolução de problemas no contexto das
relações humanas e a capacidade e empenhamento das pessoas na
melhoria do "bem – estar". Aplicando teorias de comportamento humano
e dos sistemas sociais, o trabalho social focaliza a sua intervenção no
relacionamento das pessoas com o meio que as rodeia.”
Para tanto, as ações se desenvolvem tomando como base o humanismo e a
democracia, bem como a missão de ajudar as pessoas no desenvolvimento de suas
potencialidades, melhorem suas vidas e prevenir disfunções. Neste sentido o trabalhador
social/assistente social toma como objeto de sua atuação os seres humanos e o meio no
qual está envolvido. Considera-se neste aspecto os fatores bio e psicossocial. A atenção
assim é voltada para o aspecto pessoal (a nível individual) e social (com relação ao
6
planejamento e desenvolvimento de políticas sociais).
Teixeira (2004: p.1-2), ao tratar do Projeto Ético-político do serviço social
brasileiro, aborda aspectos relativos ao exercício profissional em outros países do mundo,
em especial com relação aos países da América Latina enquanto região que compõe a
FIAS. A autora, tomando como base sua própria experiência nas entidades internacionais,
como representante do Brasil, e de Juan Manuel Latorre quando fora presidente Regional
da América Latina e do Caribe, mostra que o perfil dos assistentes sociais, assim como as
suas ações, vem respondendo aos interesses das classes dominantes; não há em grande
parte dos países desta região parâmetros legais para a profissão; as organizações
representativas dos profissionais encontram-se frágeis; a formação profissional padece
por não possuir currículos mínimos qualificados; há relações precárias entre meio
acadêmico e meio profissional; questões como o tecnicismo, o assistencialismo e a
filantropia
vigoram
na
intervenção
profissional.
(www.cfess.org.br,
consulta
em
23/06/2009).
No entanto, a mesma autora, tomando ainda como base Latorre, aponta como
possibilidade para ultrapassar o quadro em tela a defesa das políticas públicas, a
sensibilização profissional através do contato direto com a população atendida, o
processo investigativo na profissão, a visibilidade do trabalho social diante da articulação
com a FIAS e o meio virtual como espaço de troca (Idem, p.3).
Destacamos que o próprio processo histórico da América Latina, assim como a
própria dinâmica de reconceituação da profissão, pode propiciar um avanço para o
aprimoramento da profissão no sentido crítico. Se o neoliberalismo assolou a região
agravando o processo de desigualdade, é também verdade que os últimos
acontecimentos políticos em alguns países da região – a exemplo de Bolívia, Equador e
Venezuela – revelam um quadro de descontentamento por parte da população destes
países com as propostas neoliberais.
Com relação aos demais países que compõem a FIAS, a própria 19ª Conferência
Mundial de Serviço Social, realizada no Brasil em 2008, mostrou6 que existem diferentes
concepções acerca da profissão e que a perspectiva crítica, no sentido de desmistificar os
determinantes e condicionantes da desigualdade social e que toma como objeto de
atenção a questão social, nas suas diferentes expressões, não é considerada. Assim,
6
Essas observações partem tanto dos conteúdos das mesas quanto dos trabalhos apresentados na Conferência.
Informações sobre a 19ª Conferência Mundial de Serviço Social realizada em agosto de 2008 em Salvador ver:
http://www.cfess.org.br/conferencia_capa.html.
7
desconsidera-se que a questão social expressa as contradições do sistema regido pelo
capital cuja relação de exploração estabelecida impõe a apropriação privada do que é
coletivamente produzido pela humanidade.
Assim, o posicionamento oficial da FIAS com relação ao serviço social revela o
objetivo de apenas minimizar o sofrimento provocado aos “seres humanos”/trabalhadores
pelo capitalismo, sem tocar no ponto crucial que é o modelo de sociedade em vigor. As
ações profissionais focalizadas nos aspectos individuais, em detrimento coletivo,
individualizam “problemas” que são coletivos, considerando a questão coletiva apenas na
formulação e gestão de políticas e não no trabalho com a população de forma a fortalecer
estratégias políticas junto a mesma.
O Código de Ética da FIAS
A Declaração Internacional dos Princípios Éticos no Serviço Social expressa como
objetivo do trabalho do assistente social “o desenvolvimento dos seres humanos”. Para
tanto, recomenda-se que sejam vivenciados os seguintes princípios:
Ú Cada ser humano tem um valor único em si mesmo o que justifica o respeito moral
por essa Pessoa;
Ú Cada indivíduo tem direito à sua autodeterminação, até ao limite em que isso não
desrespeite os iguais direitos dos outros e tem a obrigação de contribuir para o
bem estar da sociedade;
Ú Cada sociedade, seja qual for a sua estrutura, deverá proporcionar o máximo de
condições favoráveis de vida aos seus membros;
Ú Os assistentes sociais têm o compromisso com os princípios de justiça social;
Ú Os assistentes sociais devem colocar os seus objetivos, conhecimentos e
experiência ao serviço dos indivíduos, dos grupos, das comunidades e da
sociedade, apoiando-os no seu desenvolvimento e na resolução dos seus conflitos
individuais ou coletivos e nas conseqüências que daí advém;
Ú Espera-se que os assistentes sociais providenciem o melhor apoio possível a toda
e qualquer pessoa que procure sua ajuda e conselho, sem discriminação com
base na deficiência, cor, raça, classe social, religião, língua, convicções políticas
ou opções sexuais;
Ú Os assistentes sociais respeitam os direitos humanos básicos, de indivíduos e
grupos, consignados na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações
Unidas e em outras convenções internacionais derivadas daquela Declaração;
Ú Os assistentes sociais salvaguardam os princípios de privacidade,
confidencialidade e uso responsável da informação no seu trabalho profissional.
Deverão ainda respeitar a confidencialidade mesmo quando a legislação do seu
país é contrária a esta exigência;
Ú Espera-se dos assistentes sociais um trabalho de estreita colaboração com os
seus utentes, na defesa do seu próprio interesse e no interesse dos outros com ele
envolvidos. Os utentes são encorajados a participar e devem ser informados dos
riscos e benefícios prováveis no seu decurso do processo;
Ú Os assistentes sociais, geralmente, esperam que os utentes assumam em
8
colaboração com eles a responsabilidade de decidir a orientação a dar aos seus
problemas que afetam suas vidas. A pressão que venha a ser necessário exercer
para resolver os problemas de uma parte à custa dos interesses das outras
envolvidas, só deveria acontecer depois de uma aprofundada avaliação das
reclamações das partes em conflito. Os assistentes sociais devem evitar o recurso
à coação jurídica;
Ú O serviço social é incompatível com o apoio direto ou indireto a grupos de
indivíduos, forças políticas ou sistemas de poder que dominem os Seres
Humanos, pelo uso da força, tais como: a tortura ou meios violentos;
Ú Os assistentes sociais tomam decisões e eticamente justificadas apoiando-se na
“Declaração Internacional dos Princípios Éticos” e nas “Normas Éticas
Internacionais para os Assistentes Sociais”, adaptadas pela Associação
Profissional Nacional.
No documento em questão, são definidas também as Áreas Problema e Zonas de
Conflito, bem como a Metodologia para a Solução das Situações Problema. No primeiro
caso, indicam-se questões éticas universais orientando que as específicas sejam tratadas
diante das particularidades de cada país. No segundo, sugere que as situações
problemas/éticos sejam tratadas em fóruns coletivos; orienta para produção e/ou
adaptação das “diretrizes éticas para os diversos campos de Ação Social” e que definidos
os princípios éticos, cabe às Associações membro da FIAS “ajudar os assistentes sociais
a analisar e refletir sobre as questões éticas das situações problema” e “promover o
debate, o ensino e a pesquisa relativas às questões éticas”.
No contexto mencionado, o conteúdo das indicações desconsidera as expressões
da Questão Social e as desigualdades existentes no mundo como fruto de uma sociedade
de classes. Assim, ao não se considerar o conflito entre massas trabalhadoras e
proprietários dos meios essenciais de produção, expresso nas demandas com as quais os
assistentes sociais se defrontam no seu cotidiano profissional, coloca-se a profissão entre
buscar a humanização do capitalismo ou de contribuir para sua perpetuação.
Conclusões
Sabemos que os Códigos de Ética profissionais refletem as respostas que os
segmentos
profissionais
assumem
em
determinados
momentos
históricos,
compreendendo que as forças em disputas comparecem internamente, influenciam e são
influenciadas pelas contradições externas, pelas determinações macro econômicas e
sociais, o que não se expressa na Declaração Internacional dos Princípios éticos do
Serviço Social da Federação Internacional dos Assistentes Social. Em contraste, o Código
de Ética Brasileiro é fruto de mobilização dos assistentes sociais que se puseram
9
criticamente diante da análise do contexto da realidade nacional, mas observando as
características históricas que tocam a classe trabalhadora em âmbito mundial.
Ora, as estratégias utilizadas pelos capitalistas para sair da crise do final do século
XX - reestruturação produtiva, financeirização e ideologia neoliberal - resultaram na crise
do início dos anos 2000. Assim, a flexibilização do processo produtivo (e, por
conseqüência das relações sociais de produção), o investimento em tecnologia e
informatização resultaram em alta redução da mão-de-obra empregada e no
desmantelamento de direitos sociais conquistados historicamente pelos trabalhadores; o
investimento no mercado financeiro resultou na retirada de capitais do setor produtivo.
Estava em vigência o legado neoliberal: situação de desemprego em massa, superexploração, baixa dos salários das classes trabalhadoras no mundo e, especialmente, na
América Latina, entre muitas das conseqüências nefastas para as massas trabalhadoras.
O cenário de outra crise do capital - um cenário catastrófico para vários autores
frente à crise do capitalismo financeiro - remete à reflexão de como os governos nacionais
vão se articular política e economicamente, para o enfretamento das demandas
apresentadas pelos trabalhadores, frente às perdas substanciais das últimas décadas.
Essa conjuntura desafia e determina de maneira ainda mais contundente a atuação dos
assistentes e exige uma tomada de posição frente a interesses antagônicos entre capital
e trabalho.
A análise dos documentos brasileiro e internacional revela a falta de um
posicionamento explicito por parte da organização internacional no que tange aos
determinantes macro-econômicos e sociais da desigualdade no mundo, ainda que revele
uma preocupação com as causas humanitárias. Por outro lado, o Código de Ética
brasileiro é nitidamente explícito em seu compromisso com a classe trabalhadora e
reconhece o modelo vigente de sociedade como determinante na produção das
desigualdades se posicionando contrário ao mesmo.
No entanto, destacamos que assim como ocorrido em meio às transformações da
sociedade brasileira – sobretudo nos anos 80 – e seus reflexos e conseqüências sobre a
organização da categoria dos assistentes sociais no Brasil, em outros países os
rebatimentos da crise capitalista demonstra os limites e a perversidade deste sistema
provocando posicionamentos políticos mais contundentes por parte das classes
trabalhadoras, o que pode vir a ser um condicionante para mudanças de projetos
profissionais e societários para tais sociedades.
10
Nessa direção, os espaços de representação de organizações profissionais, tanto
no nível nacional quanto internacional, envolvendo forças que se movimentam e disputam
hegemonia, configuram-se como um terreno importante de luta. É nesse sentido que cabe
aos órgãos de representação do Serviço Social do Brasil e da América Latina disputar
hegemonia nesses espaços, em busca de fortalecimento de projetos profissionais e
societários emancipatórios, no sentido de garantia de condições dignas de existência para
todos.
11
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