Boletim Janeiro Sabores e Saberes

Transcrição

Boletim Janeiro Sabores e Saberes
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região | Ano VI . N° LXIV. Janeiro de 2013
EDITORIAL
Acesse o Boletim online no site www.credivertentes.com.br
FARISIANISMO
Percebemos, por vezes – e quantas! – uma mentalidade
farisaica, falsa e falseadora por parte de setores da sociedade
ao avaliar comportamentos pessoais. Todos somos cúmplices
e invigilantes ao julgarmos, ao condenarmos, ao apontarmos
desvios, ao erguermos testemunhos contra o próximo, contra
nossos irmãos. “A maledicência é o pior de todos os crimes
sociais” (Dante Alighieri).
Pessoas há que são usinas tóxicas ao gerar e fomentar
críticas, boatos – verdadeiros ou não – sobre terceiros. São
caçadoras de escândalos, proclamando aos ventos – hoje até
pelas redes virtuais (internet, twitter, etc.) – quaisquer falhas e
eventuais pecados alheios. Usam microscópios, vasculhando,
aumentando – seja por maldade, por inveja, ciúme, vingança,
desocupação, imperfeição – as ações dos vizinhos ou
contemporâneos. Um embrutecimento, uma irracionalidade
em nossa espiritualidade. “Quanto mais frágil é o caluniador,
mais perigosas as suas ações. Não seja vulnerável aos espíritos
fracos que não suportam ver um espírito forte” (Paulo Coelho)
Hipocrisia pura, pois Deus, na Sua Suprema Misericórdia
e Longanimidade, nos ordena sempre termos compaixão,
exercermos permanentemente solidariedade e fraternidade,
estarmos vigilantes, não sermos ou darmos motivos a
escândalos, cuidarmos das travas e escamas que nos cobrem
os próprios olhos (nossas imperfeições e erros) ao invés de
apontarmos o cisco no olho alheio.
Fragilidade de nossa personalidade, pois, ao nos
entrincheirarmos e exteriorizarmos inveja, espinhos, cobranças,
incapacidade de perdoar, tornamo-nos blasfemos, nos
colocando acima da Divindade. Na verdade, enquanto estamos
nos queixando, reprovando, externando ressentimentos,
amarguras, presunções, orgulhos ou seja uma censura explícita
a Deus; achamo-nos superiores, maiores e melhores do que os
outros, que Deus nos é indiferente ou nos sonega algo de que,
ingênua ou soberbamente, nos consideramos donos.
AO PÉ DA FOGUEIRA
Fatos pitorescos, históricos, lendários, folclóricos etc...de São Tiago e região
1Ô2
Certo político, figura controversa, exótica, administrador e
curador de conhecida cidade da região - gestão marcada pelo
populismo, clientelismo, laivos de coronelismo, bizarrices
a gosto da massa,- é personagem de muitos e pitorescos
“causos” e que compõem o rico folclore político eleitoral de
nosso meio.
Nosso heroico homem público, remanescente, em pleno
século 21, de vigorosa e burlesca fauna da política nacional do
passado, é abordado na rua por um cidadão, como centenas
de tantos outros brasileiros transformados em “pedintes” alguns reconhecidamente aproveitadores ou espertalhões - o
qual solicita-lhe uma ajuda para reforma de casa.
O político, acostumado a essa cena de “cevar” eleitores, toma
de papel e caneta e garatuja, um bruto circunflexo sobre o O
- Entregar 1 Ô 2 saco de “simentu”...
Assina a improvisada autorização e orienta, a seguir, ao
“eleitor” que leve o bilhete até a loja X, fornecedora de material
de construção, (aliás, uma pergunta: de onde saem os recursos
para se custear tanta “bondade” e quanta “benevolência”?!)
para receber a mercadoria.
Algum tempo após, o político, ao fazer o acerto junto à loja,
dos tantos “favores” e benesses concedidos aos cabresteados
eleitores, assusta-se quando – ao ser-lhe apresentada a
conta – que um único beneficiado levara
102 sacos de
cimento.
Diz, agastado,
ao funcionário
responsável:
- cambada de
analfabeto,
não
sabem ler um
bilhete. Eu mandei
entregar 1 ou 2
sacos....
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAGO
1- Você sabe de que lado da casa as árvores
crescem melhor?
2- Nome de homem que lido de trás para frente
deixa a noite clara.
3- Está no poço, mas não é água; está na cabeça,
mas não é cabelo. O que é?
4- Nasci escondido, mas apareço para o mundo
quando estou contente. Quem sou?
Respostas: 1- Do lado de fora; 2-Raul; 3- cedilha; 4- Dente
Provérbios e Adágios
*A mordida não é, nem de longe, tão grande quanto o
latido (muito vento, pouca chuva)
*Mais risco corre o navio no porto do que em alto mar
*Quem tem medo de bichos não vá à floresta.
*Água remansosa, água perigosa.
*Tatu não sobe em árvore; se está lá alguém o
colocou.
Dia 05 de Dezembro pp., em marcante solenidade no Salão Roda viva (Albergue
Santo Antonio) de nossa cidade, sob a presidência da Profª Maria de Lourdes
Rezende, foram oficialmente empossados os membros do Instituto Histórico e
Geográfico de São Tiago-IHGST, presentes inúmeras e altas autoridades locais
(dentre elas o Prefeito atual, sr. Denilson Silva Reis e o prefeito eleito, sr. Irimar
José Mendes; presidente da Câmara Municipal, sr. Guaraci Vieira, vereadores,
professores) e dezenas de são-tiaguenses que abrilhantaram o evento.
Vários números musicais foram apresentados pelos alunos do Centro Cultural/
FOCEST e ainda pela música e cantora, srª Antonia Santiago ao violino e violão, sob
aplausos.
Foi apresentada, na oportunidade, por cada membro empossado do IHGST
uma resenha biográfica e enaltecedora dos patronos/patronesses de cada cadeira,
gerando reconhecimento e mesmo emotividade geral.
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAG
Cadeiras e respectivos ocupantes do
IHGST:
Fundado
em 28 de maio de 2.007 - CNPJ 09.304.431/0001-16
Rua São José, 55 | Centro | Cep. 36350-000 | São Tiago | MG
E-mail: [email protected] - www.portalsaotiago.com.br
___________________________________________________________________
CADEIRA, PATRONOS/PATRONESSES
E SÓCIO DO IHGST
CADEIRA, PATRONOS/PATRONESSES
E SÓCIO DO IHG
Para refletir:
•
•
A vida é bela; que as gerações futuras a limpem de todo o
mal (Leon Trotsky)
Ao pobre faltam muitas coisas; ao avarento, todas (Publilio
Siro)
•
O tempo é o móvel visível da eternidade (Platão)
EXPEDIENTE
EXPEDIENTE
QUEM SOMOS:
O boletim é uma iniciativa independente,
necessitando de apoio de todos os SãoTiaguenses, amigos de São Tiago e
pessoas comprometidas com o processo e
desenvolvimento de nossa região. Contribua
conosco, pois somos a soma de todos os
esforços e estamos contando com o seu.
Redação: João Pinto de Oliveira, Heloisa Helena
V. Reis Oliveira e Marcus Antonio Santiago
Apoio: Ana Clara de Paula e Angela Carolina
Ribeiro Costa
E-mail:
credivertentes@sicoobcredivertentes com.br
COMO FALAR CONOSCO:
BANCO DE DADOS CULTURAIS/INSTITUTO SÃO
TIAGO APÓSTOLO
Rua São José, nº 461/A - Centro - São Tiago/MG
CEP: 36.350-000 – telefone: (32) 3376-1107
Falar com Angela Carolina Ribeiro Costa
CADEIRA
01
02
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
PATRONO/PATRONESSE
Doutor José Gaudêncio Neto
(Sócio correspondente)
Maria dos Anjos de Melo
Maria Luíza Vivas
Joaquim Pinto Lara
Professor José Augusto de Resende
Henrique Pereira Santiago
Doutor Augusto Viegas
Brás Navarro
Joaquim Vivas da Mata
Luiz de Freitas
Benjamin Amadeu de Almeida
Doutor Júlio Ferreira de Carvalho
Maria Teófila Navarro
Octávio Leal Pacheco
Padre José Manuel da Rosa Ribeiro
Capitão João Pereira Santiago
Padre José Duque de Siqueira
Professora Maria José Lara
Padre Tiago de Almeida
Antônio de Andrade Reis
Monsenhor Francisco Eloi de Oliveira
Professora Rosália Alice de Carvalho
Maria José dos Reis
Domingos da Costa Afonso
Joaquim Aleluia Mendes
Vicente José Mendes
SÓCIOS
Adriana de Paula Sampaio Martins
Ailton Alexandre de Assis
Altair de Minas Caputo
Antônia Geralda Santiago
Décio Jonas Coelho
Delza Assis
Denílson Silva Reis
Elena Maria Campos
Flúvio Antônio Salomão Martins
Glêdes Maria Vivas Leão
Janete Aparecida Silva Vieira Costa
João Batista Silva Coelho
João Pinto de Oliveira
Jordana de Minas Caputo
José Alves de Oliveira
José Faria Santiago
Jucimara da Piedade Lara
Luciane Aparecida Lopes Silva
Lucy Lara de Andrade
Marcus Antônio Santiago
Maria da Conceição Silva Mata
Maria de Lourdes Rezende
Maria Ilza Mendes de Almeida Matta
Maria Inês Vieira de Almeida
Paulina Feliciana Viegas
Tiago do Rosário Mendes Santiago
Zely Rezende
ADMISSÃO REGIST
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.04.2.010
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
19.11.2.009
28.04.2.010
22.03.2.011
28.05.2.007
28.05.2.007
22.03.2.011
28.04.2.010
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.05.2.007
28.04.2.010
28.04.2.010
22.03.2.011
28.04.2.010
28.05.2.007
INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE SÃO TIAGO/MG
Fundado em 28 de maio de 2.007 - CNPJ 09.304.431/0001-16
Rua São José, 55 | Centro | Cep. 36350-000 | São Tiago | MG | E-mail: [email protected] - www.portalsaotiago.com.br
Patrocínio:
Realização:
Apoio Cultural:
2
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
010710020710030710050710071010080710090710120710140910151010411111170710180710421111211010220710230710240710250710270710300710310710341010351010371111391010401010-
“A POEIRA” E O RETRATO
Vicente Mendes foi, entre nós, o principal chefe político do antigo
Partido Social Democrata-PSD, agremiação que, juntamente com
a União Democrática Nacional-UDN, polarizaram o mundo políticoeleitoral brasileiro no período entre 1945 a 1964, ano esse em que
foram extintas pelo regime militar.
Vicente era praticamente imbatível nas eleições paroquiais.
Era o maior empresário são-tiaguense da época, a população
dele dependia para quase tudo: locomoções e viagens (era ele
proprietário de frotas de caminhões e ônibus, que se deslocavam
para todos os lugares e rincões); comerciante varejista e atacadista,
era ele quem abastecia quase todas as vendas, bitacas e portas
abertas – rurais e urbanas – de toda a região adjacente; homem
experiente, denodado, de iniciativas, correligionário e amigo
pessoal de figurões da República como Tancredo Neves, Juscelino
Kubitschek, Israel Pinheiro, frequentava palácios governamentais e
as mais finas rodas sociais e políticas do País; resolvia problemas
pessoais, funcionais e profissionais junto a repartições públicas e
instituições privadas das centenas de pessoas que o procuravam,
ao longo do ano. Homem carismático, porém senhorial.
Fazia política dia e noite. Ao pé do ouvido, noite adentro ou
ostensivamente, à luz do dia. Enquanto comprava e vendia
mercadorias, transitava em seus veículos pelas estradas
esburacadas do meio rural, prestava favores de toda ordem àquela
população sofrida, carente, esquecida e afrontada pelo Estado e os
poderosos: o transporte de um doente, uma carta de apresentação
para um moço ou pai de família em busca de emprego, o aviamento
de uma receita de medicamento raro ou caro na Capital do Estado
ou mesmo no Rio de Janeiro e São Paulo, onde Vicente mantinha
fortes negócios; solucionar um registro em cartórios; um sorriso,
uma mão sobre o ombro, um agrado para uma criança, tudo era
instrumento de captação de simpatia e de votos. Era, em suma, um
prestidigitador, um mágico político de cuja cartola só saíam votos...
A conta ou o resultado positivo disso vinha com as eleições. As
pessoas gratas ou mesmo impotentes e sem opção despejavam
votação cerrada nos candidatos indicados por Vicente. E alguns
deles, façam o favor...Mas era só abrirem-se as urnas e as burras
lá estavam cheias de cédulas pessedistas...
Precavido, tomava, ademais, outras medidas, não muito cristãs
e regulamentares. Munido de uma máquina Kodak dos anos
50, ele próprio deslocava-se para os cantos e recantos mais
distanciados do município e além fronteiras, alistando eleitores,
mesmo analfabetos ou semialfabetizados. À medida que parava
o caminhão num povoado, num boteco de beira caminho, por ele
abastecidos, Vicente oferecia seus préstimos de fotógrafo para
que todos tirassem o título de eleitor. Levava o interessado, ou
melhor, o cooptado, para detrás do caminhão, geralmente sujo
pela poeira ou lama daquelas verdadeiras trilhas, fazia-o sentar-se
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
num engradado de cervejas, abotoava-lhe o botão da camisa ou
paletó, corrigia-lhe rapidamente a postura e clicava. Mais uma foto
tirada e decerto, mais um voto a aumentar o seu redil eleitoral para
aquilo que os adversários esperneavam e chamavam de “curral
do Vicente”
Como não se anotavam os nomes de tantos eleitores fotografados,
ao longo de tantas semanas e tantos lugares, missão difícil ou
tida como desnecessária à época, dada a precariedade vigente, a
hora em que os retratos chegavam do laboratório (para onde eram
encaminhados os filmes a serem revelados), era quase impossível
saber quem era quem. Fotos chegavam misturadas e sem qualquer
identificação. Daí serem elas coladas, aleatoriamente, aos títulos
e esses, quando entregues aos portadores, a reclamação era
generalizada.
- Mas, sêo Vicente, esse da foto aqui no título não sou eu...
Vicente, maroto, tinha sempre uma resposta pronta, na ponta
da língua: ora punha a culpa na máquina, ora no fotógrafo, ora no
laboratório. Muitas vezes, dava-se um jeito de corrigir o problema,
colando a foto real do eleitor.
Certo dia, um cidadão de cor branca, tez muito clara, já quarentão,
queixou-se a Vicente, exibindo o título com a foto apensa e que
mostrava um rosto de um jovem e bem apessoado mulato. Vicente
foi rápido, não dando tempo para muita fala:
- É você mesmo. Foi a poeira, meu amigo. Deve ser que a lente
da máquina tava suja de pó na hora em que tirei sua foto e eu não
me apercebi...
Mas é você mesmo, olha que belezura...Até te remoçou...Um
galã de cinema, meu amigo, de fazer inveja a um Antony Quinn...
Outra artimanha de Vicente, dentre tantas jogadas e malabarismos,
era “importar” eleitores, arrebanhando-os em fazendas, povoados
e periferias dos municípios circunvizinhos. Com isso, engordava
o eleitorado são-tiaguense e por tabela o número de votos dos
candidatos por ele apoiados e indicados.
Em certo pleito, ano eleitoral, Vicente transferira, dentre outras
tantas maranhas e maquiavelices, uns 20 a 30 eleitores da povoação
dos Machados, no município de Bom Sucesso, habilitandoos a votarem em São Tiago. Um dos caminhões do Vicente, no
dia da eleição, buscara-os pela manhã e os reconduzira à tarde.
Cocoza, por sinal adversário político de Vicente, muito embora seu
funcionário, fora o motorista encarregado do transporte.
Encerrado o pleito, apurados os votos, o PSD, partido de
Vicente vencera por pequena margem. Os adversários UDN, então
derrotados, lembraram-se dos eleitores recambiados por Vicente
do povoado dos Machados. Uma comissão udenista, dentre
eles o sr. Antonio Alvim e o próprio Cocoza, desloca-se até lá,
buscando colher subsídios que comprovassem a irregularidade.
Os possíveis eleitores são abordados. Um nega que tenha votado
em São Tiago, afirmando ser eleitor em Bom Sucesso (era comum
alguns eleitores votarem em dois ou mais lugares diferentes, pois
não havia o sistema de controle hoje existente). Outro diz nunca
ter conhecido ou sequer sabia o rumo de São Tiago. Um terceiro
desconversa, dizendo estar pescando no dia da eleição. Mesmo
Cocoza reconhecendo vários deles, um a um se esquivavam, talvez
orientados previamente pelo Vicente. Uma “desconversação” e
uma escorregadela geral...
Cocoza olha para os companheiros de partido e conclui: - vamos
embora, estamos perdendo tempo: aqui não é só o voto, mas até a
boca está comprada...
3
PERNAS, CANELAS E OLHADELAS
JD foi um dos mais experientes motoristas que
trabalhou nas empresas e Organizações Mendes de
nossa cidade, de propriedade do Sr. Vicente José
Mendes (1910/1994), conglomerado que atingiu o seu
auge comercial e de negócios, em meados do século
passado,( até as décadas de 1980, 1990)..
JD. era natural de São Tiago, irmão do sr.
Trombone. Caminhões e ônibus da empresa Mendes
eram praticamente os únicos meios de transporte e
locomoção, para quem, naqueles tempos, desejava ou
necessitava se deslocar para outras cidades da região e
ainda capitais como Belo Horizonte, São Paulo e Rio de
Janeiro.
Pessoas mais abastadas, gestantes ou mães com
crianças de colo, enfermos tinham o costume de viajar –
pagando passagem ou por benesse do proprietário – na
boleia (cabine) junto ao motorista, minimizando-se os
traumas e desconfortos da viagem – estradas de terra
esburacadas, empoeiradas ou enlameadas conforme
a estação, repletas de curvas, crateras, mataburros e
pontes geralmente quebrados, itinerários cansativos e
longos. Uma verdadeira epopéia, principalmente para
quem viajasse na carroceria.
Mês de Janeiro. Inícios da década de 1950. Chuvas
torrenciais. Caminhos semi-intransitáveis. JD
ao
volante de possante Chevrolet sai de São Tiago, pela
manhã, rumo a São João Del-Rei.
Como passageira especial, uma senhora de tradicional
família local e frequentadora, ao lado do marido, da mais
alta sociedade da região, do Estado e de outras capitais
do País, em particular o Rio de Janeiro, então a capital
do País.. Culta, viajada, refinada. O esposo, um alto
empresário e executivo de renome e com trânsito livre
nas mais elevadas rodas políticas e empresariais do País.
4
Eram aqueles tempos ainda de muito recato. O
respeito social à mulher era uma praxe. Alterações da
moda feminina, como o uso de calças compridas ainda
demorariam alguns anos a surgir ou a serem aceitas
em nossa cultura.
A dama trajava longo e amplo vestido em tom bege, um
tailleur rodado, moderno, vistoso, como nos figurinos
e salões da high society de então. Como acessórios,
luvas, fina bolsa a tiracolo, joias distribuídas pelo corpo
em forma de colares, brincos, pulseiras, lenço de seda
pendente do pescoço, perfume inebriante trescalando
pelo ambiente. Já, ao adentrar a cabine, o movimento ou
o impulso de subir, alto o estribo do veículo, fizeram com
que tornozelos, panturrilha e até joelhos aparecessem.
Sobressalto, expectativas para o motorista. Olhadelas a
princípio , sutis., disfarçadas – de soslaio. Um frissom,
um deleite.
Dá-se início à viagem. Partida no motor. J.D., com
um olho na estrada e outro ao menor movimento da
senhora, direcionado às pernas da passageira.. Tornase repetitiva, ostensiva, visível a postura. Até que a
senhora, de forma elegante mas firme, percebendo o
fato, diz ao motorista: - “O que o senhor está procurando
?! Perdeu alguma coisa ?!” E com uma certa e maliciosa
ironia: “ O que o senhor tinha que ver, canelas, curvas, o
sr. já viu” Da forma como o senhor está se conduzindo,
estrada perigosa dessas, daqui a pouco teremos um
acidente! Concentre-se, pois, no seu serviço e... nas
curvas da estrada!”
Foi o bastante para que o atabalhoado e envergonhado
condutor fixasse bem os dois olhos e toda a sua atenção
na estrada, até chegar ao destino. E com extremo receio
de que a dama levasse o fato ao conhecimento do
patrão ou do marido, ambos poderosos. Estaria, sem
dúvida, em maus lençóis...
A MODA NAS DÉCADAS DE 1940/1950
A partir das décadas de 1940/1950, em especial
encerrada a II Guerra Mundial, a moda feminina evoluiu
significativamente. E com uma certa agitação, um
retumbante frenesi.
A mulher ocidental passou a se vestir de forma mais
glamourosa, principalmente após os lançamentos dos
modelos “New Look”, criados e lançados em 1947 pelo
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
estilista Christian Dior (1).
A silhueta feminina viu-se então mais jovial, solta e
com alguma – aliás, bastante – sofisticação, sempre
com enfoque na aparência, na estética.. Maquiagem
valorizando o olhar e realçando a intensidade e contorno
dos lábios, daí surgindo uma infinidade de lançamentos
de produtos para os olhos e também sucessivamente
para os lábios, cabelos, face e pele. (rímel, sombra,
lápis, cosméticos, tintas para cabelos, hidratantes etc.)
Penteados acompanhando o estilo “rabo-de-cavalo”,
inspirados na atriz Brigitte Bardot. Cabelos mais curtos,
com mechas caindo no rosto e franjas dando à sua
portadora um “ar de menina”.
Dois estilos de beleza feminina marcaram os anos 50
– o das “ingênuas chiques”, encarnados por Grace Kelly
e Audrey Hepburn, estilo natural, jovial; e o da mulher
sensual, fatal encarnado pelas atrizes Rita Hayworth
e Ava Gardner. Esses estilos viriam a ser confluídos e
fundidos posteriormente por dois grandes símbolos da
beleza da década de 1950: Marilyn Monroe e Brigitte
Bardot, numa devastadora combinação de sensualidade
e ingenuidade.
Os modelos e peças femininas de então tornaram-se
inconfundíveis como o famoso tailleur com guarnições
trançadas, a requintada bolsa a tiracolo em matelassê,
o escarpin bege com ponta escura, o lenço de seda, o
prêt-a-porter. Figurinos
da época incluíam paletas
de cores e tons quentes,
como o ocre, o café com
leite, o bege.
Os calçados tiveram
igualmente uma grande
evolução em termos de
modelos, sendo famosos
o “salto-agulha”, o “saltochique” (encurvado para
dentro), o “bico chato”,
o “quadrado” dentre
outros e que atraíam as
consumidoras.
1.
Outros grandes estilistas e mestres da costura
mundial desta época foram o espanhol Cristobal
Balenciaga, Hubert de Givenchy, Pierre Balmain, Chanel,
Madame Grés, Nini Ricci. Grandes lojas (maisons)
bem como costureiros da alta moda se sobressaíram,
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
como Jacques Fath, Jeanne Paquin, Robert Piguet
e Jean Desses tornaram a França o reino mundial da
moda. Merece ênfase ainda o surgimento de revistas
especializadas em moda feminina, como a Vogue e Elle.
No Brasil, o nome mais badalado da época (década de
1950) foi o estilista Gil Brandão.
OUTRO “CAUSO”
JD
tinha
fama
de
namorador, de conquistador.
Bom de conversa e de lábia.
Adoçava bocas e corações.
Daí o seu apelido, dizem.
Certa vez, de amores com
certa jovem local, buscava
uma forma de beijá-la. Era
ela uma bela morena, corpo
escultural, a atrair a atenção
e desejos de muitos jovens
e marmanjos.
Buscava
aproveitar uma folga ou um
descuido dos pais que, zelosos e dentro dos rígidos
costumes da época, tinham o hábito de vigiar o namoro
das filhas.
Ensaiou, ansiou por um desses momentos. A moça
parecia-lhe muito cândida, inocente, sorriso angelical.
Olhava-o, porém, com olhos perturbadores, intrigantes.
Até que certa noite,, luar exuberante nos céus, ao
despedir-se da jovem à porta da residência, vigilância
afrouxada dos familiares, JD, entre juras de amor,
apontou o firmamento, dizendo à enamorada: - Olha,
meu amor, quão bela a lua!...
Tão logo a jovem volveu o olhar e o rosto para o
alto, João aproveitou a oportunidade, beijando-lhe
meigamente os lábios...
A jovem acolheu o beijo, mas sem antes ponderar: “assim não vale....”
A versão diz que a moça, então, agarrou o namorado,
beijando-o freneticamente, compulsivamente e com
bastante técnica, sensualidade e um voluptuoso
repertório. Uma especialista na arte e nos encartes... O
donjuan levou um garro e um sarro daqueles!
Era ela muito mais viva e esperta do que parecia à
primeira vista ou aos olhos do namorado. O ingênuo da
história era o galanteador...
5
PRÁTICAS POPULARES DE CURA E REPRESSÕES
A prática de curas, magias e sortilégios
foi, em todos os tempos, uma constante
da humanidade e obviamente com
manifestações em nosso País e nossa região.
São crenças coletivas, transmissíveis com o
aval social e sancionadas milenarmente pela
opinião pública.
Via de regra, o curandeirismo – embora
presente em todas as culturas – encontrou
repressões por parte de algumas religiões
convencionais, de setores ditos científicos
e particularmente da legislação. O Código
Criminal republicano brasileiro de 1890
passou a criminalizar os curandeiros e
terapeutas populares. O artigo 158 desse Código proibia “ministrar ou simplesmente
prescrever, como meio curativo interno ou externo e sob qualquer forma preparada,
substâncias dos reinos da natureza, fazendo ou exercendo assim o ofício de
curandeiro”. Uma repressão generalizada e institucionalizada, vedando desde
terapia com ervas até práticas religiosas como espiritismo, cultos afroameríndios,
práticas evangélicas de cura e outras, que passaram, ao contumaz e policialesco
arbítrio do Estado, a serem perseguidas.
Os códigos repressivos e “científicos” não distinguiam simples raizeiros,
benzedores e sensitivos, receitadores de chás medicinais, ministros religiosos, que
nada cobravam por seus serviços terapêuticos, daqueles charlatães, exploradores
da crendice e credulidade popular, embusteiros e feiticeiros malignos. Todos
eram colocados indistintamente no mesmo saco, havendo nos arquivos da justiça
brasileira inúmeros processos contra humildes e honrados curadores., geralmente
pessoas incultas, de boa fé, agentes sociais que realizavam e ainda realizam suas
práticas curativas, de forma oral, por vezes ritualística. o que parece incomodar
ainda hoje a muitos “donos” da fé....
O médico e antropólogo Nina Rodrigues, em seu clássico “Os africanos no
Brasil”, afirma que o móvel da repressão e arbitrariedade legal “é o estúpido terror
do feitiço” (pág. 247), estranhando o autor, ademais, a incongruência da legislação
que punia o feiticeiro, mas não os que demandavam o feitiço. Provoca e ironiza o
autor: “E como poderiam (as autoridades) se todos aqui se curam com ervas do
mato?” (pág.78)
A repressão a simples raizeiros e benzedores era fruto, obviamente, de
preconceitos e resquícios inquisitoriais, por um lado, acrescido ao fato de que a
República brasileira – aliás produto de um canhestro golpe de Estado – mantinha
em seus primórdios larga influência positivista e cientificista.
Os curadores e curandeiros, apesar do respeito e até temor que geravam junto
à população, no mínimo foram vistos como uma ameaça à ordem religiosa, legal
e científica. Para essa ordem, a demanda das classes populares aos curadores
era algo condenável, censurável, atraso cultural, portanto não assimilado pelos
cânones, normas e valores morais, moralistas e religiosos oficiais da época. Daí
reivindicarem o monopólio da ciência e corporação médica, o que implicava
em discriminação contra práticas de cura popular, mesmo inofensivas, tidas
como crendices e superstições, incompatíveis, segundo tais próceres, com a
modernidade e a ciência.
O fato é que, dada a ânsia desmedida pela cura por parte das populações,
sempre houve e sempre haverá, o seu exercício e a convivência de terapias, sejam
amparadas cientificamente, sejam oriundas das tradições culturais e das práticas
populares, com raízes que se perdem na noite do tempo. Umas consubstanciando
as outras. O próprio Dr. Chernoviz, cujos livros eram de uso obrigatório legal nas
farmácias, flexibilizava o emprego de ervas, raízes e até benzeções no tratamento
de enfermidades. (1)
A POSIÇÃO RELIGIOSA
O preconceito tipicamente cristão contra o “sobrenatural”, a magia, a terapêutica
popular tem suas origens principalmente na Idade Média. Incapaz de entender
as causas das catástrofes (epidemias e doenças letais, como as pestes, que
provocavam grandes mortandades e atingiam a Europa), os religiosos – muitos
deles teólogos renomados, homens da mais elevada cultura e sabedoria, falando
e incriminando em nome de Deus – passaram a atribuir tais fatos às “bruxas” e
às religiões politeístas em especial a celta (druida), que foram barbaramente
exterminadas. (2)
6
As mulheres, acusadas de feitiçaria,
foram as grandes vítimas dessa sanha
ginecofóbica. Muitas, nada mais eram que
herbanárias, camponesas conhecedoras
de chás, parteiras, pessoas inofensivas,
essencialmente benéficas às comunidades de
sua época, herdeiras de milenares tradições
de cura, benzimento e aconselhamento. Uma
medicina à base de ervas e rituais campestres.
Fitoterapeutas, na linguagem de hoje.
Mas para a Igreja, para a Inquisição –
bruxas perversas que participavam de orgias,
bacanais. Voavam. Dai as perseguições
apavorantes praticadas e os estigmas que
se estenderam até os dias atuais. Para a cultura teológica da época e ainda de
alguns segmentos atuais (basta assistir a programas de alguns pregadores pela
TV e os cultos de alguns prelados e dignitários de nosso meio), o mundo se dividia
em duas forças indissociáveis: o bem e o mal. E quem ditava(m) as estruturas
sociais, políticas, individuais, a ordem hierárquica familiar, e até o próprio Estado
e o Universo? - Ora, a autoridade religiosa! Revestida do manto religioso e do
“poder divino”, alguns setores degenerados da Igreja atribuíam aos “hereges”,
“pecadores” e toda a “escória” o rótulo de “inimigos da fé e de Deus”, com a
irretocável condenação de Mal. Para estes, as masmorras, torturas inomináveis e
as fogueiras... E como complemento, o inferno escaldante e eterno!
Na obra “As bruxas e seu mundo”, o arguto pensador espanhol Julio Caro Baroja
relata processos contra mulheres acusadas, cruelmente ultrajadas e massacradas
pela Inquisição, muitas queimadas vivas. Cenários de horror, hediondez e loucura
religiosa. Escabrosos crimes de lesa-humanidade. Em um dos processos realizados
em Toulosse (França) no século XV, certa senhora de nome Catarina, da aldeia de
Delort, embora jurasse inocência, mas sob nefandas torturas, “Confessou a verdade
pressionada pelos meios que estão ao nosso alcance” (autos da Inquisição): “que
participava de sabás e orgias e em seus sortilégios e feitiços, fazia cair granizo sobre
as plantações e campos das “pessoas de quem não gostava”, “fazia apodrecer
trigais e vinhedos e matava animais”. Como sacerdotes eruditos, dominicanos em
sua maioria, na prática verdugos sanguinários, celerados e apóstatas, poderiam
acreditar em tais relatos, ainda que arrancados sob tétricos suplícios?! Como
acreditar que pessoas pudessem voar, destruir, à distância, plantações e rebanhos
?! Tempos loucos, barbaridades e atrocidades em nome do Cristo, o Imaculado
Cordeiro de Deus....
Alguns pensadores afirmam que o Cristianismo foi inicialmente uma doutrina
de cunho e culto urbanos, estendendo-se posteriormente pelo meio campesino.
Na Europa, deparou com crenças milenares, consideradas pagãs, que cultuavam
a natureza e que foram impiedosamente massacradas A palavra “pagão,” cuja
etimologia vem de “pagus” (aldeia), aliás, nomeava todos os não-adeptos da
religião oficial. E para os “pagãos” medievais europeus, sobrou todo o peso da
intolerância e da barbárie., o que viria ocorrer posteriormente com as civilizações
indígenas da América, dizimadas e trucidadas impiedosamente.
Vivemos hoje numa sociedade pluralista, laica, dita democrática. Cabe-nos ter e
manter o respeito a todas as formas organizadas de cultura, muitas delas milenares
como as indígenas e africanas, cultivadas e exercitadas ainda no interior do País.
(3) A cultura, o conhecimento não são propriedades exclusivistas de ninguém.
Muito menos, compete-nos ditar ou impor normas a outrem pela força, pelo terror,
pela pretensa superioridade de nosso conhecimento, seja ele político, teológico,
científico, econômico...
NOTAS
(1) Boticários, farmacêuticos e até médicos produziam extratos, elixires, poções,
cataplasmas, pomadas, a partir de compostos minerais e vegetais. Basta uma
leve consulta a jornais de final do século XIX e inícios do século XX. Época de
interiorização da medicina acadêmica e que, de forma gradual, sanava as demandas
de saúde da sociedade da época.
Apesar da intolerância de autoridades públicas administrativas e judiciais,
curandeiros e praticantes de formas alternativas de saúde e de cura (raizeiros,
benzedores, parteiras, etc.) exerceram um importante papel no passado e que
prossegue, de maneira geral, sob prismas mais modernos, até os diais atuais.
(2) Em 1292, o Papa Inocêncio IV publicou o documento “Ad Exstirpanda”, no
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
qual diz que “os hereges devem ser esmagados como serpentes venenosas”, dandose início às perseguições oficiais contra os “inimigos” de Deus e da Igreja. Este
documento foi renovado e confirmado por vários papas sucessores como Alexandre
IV (1254-1261), Clemente IV (1265-1268), Nicolau IV (1288-1292) e Bonifácio VIII
(1294-1303) Foi este último Papa quem em 1302 emitiu a súmula “Una sanctum”
que declara oficial, secular e regiamente a Igreja Católica romana como a única
e verdadeira Igreja, fora da qual ninguém se salva, ponto de vista cegamente
praticado ainda hoje por certos prelados.. Historiadores protestantes e mesmo
católicos classificam Bonifácio VIII como um homem iníquo, ambicioso, arrogante,
impiedoso e devasso. Outro pontífice polêmico, tido como licencioso e corrupto, foi
Roderigo Bórgia que administrou a Igreja sob o título de Alexandre VI (1492-1503).
Tamanhas as turbulências vividas pela Igreja, neste período, que o notável Papa
Júlio lll, em 1553, após estudos promovidos a seu pedido por brilhantes teólogos,
perplexo, declarara que a “Igreja estava cheia de doutrinas antibíblicas”.
(Fonte: “Babilônia, a religião dos mistérios” - Ralph Woodrow, págs, 99 a 103)
Em 1546, o ilustre e erudito Cardeal Reginaldo Pole descreveu “Nós mesmos
somos em grande parte, responsáveis pelo infortúnio ocorrido – pelo surgimento
da heresia e o colapso da moralidade cristã -, pois não conseguimos cultivar o
campo a nós confiado. Somos como o sal que perdeu o sabor. A menos que nos
penitenciemos, Deus não falará conosco” (apud N.S.Davidson, “A Contra Reforma”,
Ed. Martins Fontes, 1991, pág. 23)
Enganam-se os que pensam ou apregoam até injustamente que abusos e
atrocidades ocorreram apenas no seio da gloriosa Igreja Católica, perpetrados por
alguns grupos de maus seguidores e potentados. A denominada Igreja Reformada
(protestantismo) ou celerados em seu nome, igualmente cometeram desmandos
e nefandas excrescências. Um dos mais escleróticos e obscurantistas líderes
reformistas foi Calvino, cujos atos parecem ter sido copiados pelos retrógados,
sanguinolentos e truculentos aiatolás que hoje governam o Irã. (ver box).
Em 12/12/1532, Calvino determina que todo morador de Genebra declare sua
religião, sob pena de expatriamento, prisão e sequestro de bens.
(3) Tivemos, em nosso meio, no passado, célebres benzedores, raizeiros.
Dentre eles Emídio do Bengo (próximo a S.João del-Rei); Antonio Mariano (Ouro
Fino/Passa Tempo), José Machado de Souza (Córrego Fundo), Zé Licota ,(São
Tiago),personalidades que atraíam milhares de pessoas, provindas das mais
diversas localidades, em busca de cura.
Antonio Lara Resende em sua obra “Memórias I” faz menção ao conhecido
“médico” e boticário, Joaquim Leonel, tio do autor. “Muito ligado ao seu tio médico,
Dr. Gervásio Pinto Cândido de Góes Lara, irmão de minha avó, com ele adquiriu
Tio Joaquim longa prática e alguma teoria para ter na Lage a primeira botica.
Acompanhava o tio nas visitas aos doentes, lia-lhes os tratados, observava e o
auxiliava nas intervenções cirúrgicas que então se faziam nas próprias casas dos
doentes, salvo casos excepcionais, quando este podia transportar-se para ambiente
menos impróprio. Dizia-se que Tio Joaquim chegou a saber de cor o que, sobre
diagnóstico e tratamento de doenças mais comuns, traziam os tratados que herdou
do tio” (pág.375, op.cit.)
“Morto o tio médico em 1893, o sobrinho e auxiliar, já então dentista e boticário,
passou também a “surjão”, que era como o povo denominava os práticos no
exercício da medicina. Em natural reação irônica, os formandos passaram, mais
tarde, a chamá-los curandeiros, charlatães ou carimbambas...” (pág.376, id.)
O memorialista também faz referência em suas “Memórias” a conhecido raizeiro
da Lage (Resende Costa) de nome Chico Leopoldino (pags.150/153)
CURIOSIDADE HISTÓRICA:
Na secção “A pedidos” do jornal “O Arauto de Minas” de São João del-Rei edição
Maio de 1879, um cidadão que assina O. Langgaard, escreve uma carta indignada
à redação dirigida ao sr. Chernoviz, denunciando a abertura de uma farmácia no
arraial de São Tiago, onde tanto o proprietário quanto o empregado não eram
farmacêuticos. Trecho da carta: “”Sr. Chernoviz, Vossa Senhoria em certo tempo
mostrou-se tão interessado pela saúde pública; pergunto-lhe agora se isto não será
abuso e se não causará detrimento à saúde pública ? Primeiro: ter botica aberta
sem ser pharmacêutico ou licenciado ou sem, ao menos, ter prática? Segundo: o
mesmo empregado interessado da pharmácia receitar e manipula? V.Sª, como meu
colega e que o leitor usa como pseudônimo, deve concordar comigo que isso é
abuso demais!...”.
Os personagens mencionados são o Dr. Chernoviz, médico polonês cujos
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região
manuais, que incluía o uso de ervas e raízes e o autor da carta, o Dr. Otto Langgaard,
farmacêutico dinamarquês, proprietário da Pharmácia Imperial em Campinas (SP)
que vendia remédios importados alopáticos e homeopáticos e que diligentemente,
apontava farmacêuticos não licenciados para exercer as funções de cura no interior
do País. Esclareça-se que as atividades médicas e farmacêuticas, à época, eram
regidas por legislação datada de 1850 e gerenciadas/fiscalizadas pela Junta Central
de Higiene Pública. Esta Junta, por razões diversas (falta de profissionais habilitados
no interior, força e poder político, etc.) acabava por autorizar pessoas práticas ou
não habilitadas para o exercício das “funções de cura”.
CRISTO E A TOLERÂNCIA
“O Filho do homem não veio para perder as vidas dos homens, mas para
salvá-las (Lc 9,56)
“O que não é contra vós é a vosso favor” (Lc 9,50)
CALVINO
João Calvino (1509-1564), um religioso francês com
sólida formação em línguas clássicas e humanística e
depois convertido ao luteranismo, radicou-se em 1536
em Genebra (Suíça), onde impôs disciplinas rigorosas
à população, em termos de vestuário, costumes
sexuais, negócios temporais, frequência religiosa,
comparecimento à Igreja. Delimitava rigidamente
o que era certo e errado, até atos de cunho
meramente pessoal, e considerava que todo sistema
de vida embasava-se nas Escrituras Sagradas (obviamente, segundo a sua
interpretação e o seu ponto de vista). Assim, na sua acepção, as Escrituras
eram a única fonte de fé e sua interpretação guiada diretamente pelo Espírito
Santo. Segundo alguns biógrafos, Calvino era de uma personalidade inquieta,
irascível, conhecido desde a escola como “caso acusativo”, pois sempre
criticava e censurava as falhas dos colegas e até de superiores.
A religião passou a regular a vida política, social, e até a afetiva e íntima da
população. Calvino defendia a tese da predestinação, na qual o homem jamais
poderia conhecer sua sorte – salvação ou danação eterna – e em que a escolha
de uns e a rejeição de outros era um sinal de mistério de Deus. A salvação,
desta forma, é obra e virtude exclusivas da Livre Graça de Deus.
O trabalho era visto como uma vocação divina e o sucesso um sinal da
predestinação. A riqueza tornava-se assim um dos sinais exteriores da Graça
Divina, razão pela qual os calvinistas e grupos de protestantes em geral
adotaram uma severa disciplina moral em que todas as energias canalizavamse para o acúmulo de bens.
Calvino radicalizou a interpretação bíblica. O homem seria, por sua origem,
uma criatura miserável, corrompida, pecaminosa e somente a fé poderia salválo. E essa salvação era um atributo ou decisão exclusiva de Deus. Tornouse um ditador político, moral e religioso de Genebra. Formou um consistório
(assembleia de pastores e anciãos) que vigiava rigorosamente os costumes,
espionava e delatava a tudo e a todos e administrava a cidade inteiramente
submetida à “Lei do Evangelho”. Diz-se que até as relações sexuais eram
“controladas”. Eram proibidos qualquer tipo de jogo, danças, teatro. A vida
privada era levada à esfera pública, à exprobação e à violência moral ou física.
Qualquer pessoa tida como “herege” poderia ser excomungada, expatriada
ou conduzida à fogueira ou ao patíbulo. Intolerante, intocável, perseguiu com
rigor e terror todos aqueles a quem considerava “adversários” ou “libertinos”.
Entre as suas vítimas, Jacques Gruet e principalmente o cientista espanhol
Miguel Servet, que descobriu a dupla circulação do sangue, queimado por
Calvino em 1553.
O Calvinismo expandiu-se para outros países, como na Escócia, onde
comandado por: John Knox (1505-1572) tornou-se a religião oficial sob a
denominação de “presbiteriana”. Na França, os calvinistas foram denominados
“huguenotes” e se envolveram em sangrentas guerras religiosas e políticas. O
crescimento do Calvinismo deveu-se ao apoio que recebera de parte da nobreza,
da época - muitos inescrupulosos e rapinadores - interessados em negócios
(prática mercantilista) e ainda na pilhagem dos vastos bens da Igreja Católica.
7
Bolivar Silveira de Andrade
Bolivar nasceu em 04/10/1954 e faleceu em 10/10/2012.
Adoeceu desta forma:
Em 1998 apareceu com furúnculos pelo corpo. Eu José Machado da Silveira Neto, levei-o a muitos
tratamentos.
Em 2009 ele sarou deste terrível mal que o atormentava. Clamava que doía, ardia e queimava muito.
Passado algum tempo ele apareceu com terríveis dores de cabeça.
Levei-o a vários médicos. Em São João del-Rei, levei-o ao Dr. Jorge Diogo e contei que, apesar de vários
tratamentos, as dores de cabeça de meu irmão continuavam.
As dores de cabeça eram tão fortes que me faziam pavor, eu acordava com ele em gritos de tanta dor
dizendo: dor de cabeça gente, dor de cabeça gente ... depois dizia: dor de cabeça Senhora Aparecida, dor de
cabeça Senhora Aparecida.
O dr. pediu uns exames da cabeça e os resultados não acusaram problema nenhum. Ele receitou um remédio
e pediu que eu voltasse com meu irmão (retorno) daí a 30 dias.
Com a segunda receita o médico conseguiu curá-lo por mais de um ano e meio.
Passado mais de um ano e meio, as dores retornaram. Eu voltei com ele mais duas vezes ao Dr. Jorge Diogo,
mas não foi possível curá-lo, chagando ele a morte.
Olhem e vejam bem:
Morávamos na Florinda, eu José Machado da Silveira Neto, Nelson Silveira de Andrade e Bolivar Silveira de
Andrade. Na doença do Bolivar eu até deixei de ir às festas para cuidar dele. Tudo de bom eu escolhia primeiro
para eles.
Sempre falava com eles: somos três irmãos, o dia que faltar um de nós os outros dois vão sentir muito.
Quando chegar a faltar dois, o último vai ficar triste, passando da conta. E tudo isto veio cair em mim.
Como aconteceu a morte do meu irmão:
Saí de casa para a cidade para ver uns exames dele e chamei-o para vir comigo umas quatro ou cinco vezes,
mas ele me disse que estava desanimado. Então pedi a Deus e ao Senhor Jesus Cristo que tomasse conta dele
prá mim e saí tranquilamente.
Voltando da cidade, antes de acabar de chegar, avistei-o andando no terreiro. Cheguei, cerca de dez minutos
antes de acontecer a morte.
Fui pegar um cavalo para buscar as compras na estrada e ele falou: - vou com você. Fui na frente, quando
olhei para trás ele estava caído na estrada. Voltei correndo. Ele estava roxo, babando, sufocado. Puxei-o, fiz
massagem, virei-o , tornei a virar, coloquei os dedos na boca dele. Mas Deus o chamava e não fui capaz de
salvá-lo. Vou seguir então um dos melhores finais:
Peço a Deus todo poderoso, a Senhor Jesus, a São Pedro que abram as portas do céu para meu irmão.
Agradeço a todos que compareceram ao velório e ao sepultamento e a todos que não puderam comparecer.
Irmãos:
Noé Silveira de Andrade; Noeme Silveira de Andrade; Nivaldo Silveira de Andrade; Nair Nazaré de Andrade;
Nilton Silveira de Andrade; Nelson Silveira de Andrade; Nicanor Silveira de Andrade; Nara Silveira de Andrade;
José Machado da Silveira Neto; Bolivar Silveira de Andrade – filhos de Teodoro Gabriel de Andrade e Olímpia
Conceição de São José.
Um versinho em homenagem ao Bolivar e a todos vocês
A flor do maracujá era branca igual a neve
Hoje porém ela é roxa, mas não é da natureza
Foi o sangue de Cristo que nela pingou
E transformou sua beleza.
José Machado da Silveira Neto - Novembro/2012
8
Boletim Cultural e Memorialístico de São Tiago e Região

Documentos relacionados

PREÂMBULO AO PÉ DA FOGUEIRA GESTOR CULTURAL

PREÂMBULO AO PÉ DA FOGUEIRA GESTOR CULTURAL Histórico e Geográfico de São Tiago, Instituto Educ. São Tiago Apóstolo/Banco de Dados Culturais, Focest e demais incentivadores. O profundo agradecimento aos leitores, aos colaboradores anônimos q...

Leia mais