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(S~ ~ u • (17 'lOA. 310H VI )N JI) • zE o Alguns curiosos animals, embora existam em quase todos os ambientes, com ampla variedade de especies e grande niimero de indivfduos, passam despercebidos, em {un~ao do pequeno tamanho e dos hdbitos de vida. 1550 acontece, por exemplo, com os pseudo-escorplties, diminutos 'parentes' dos escorplties verdadeiros e das aranhas. Uma especie encontrada no cerrado brasileiro vive em sociedade, 0 que e raro entreesses animals, e aindaexibe surpreendentes com portamentos de cuidados com osfilhotes, entreeles osacri {fcio da maeparagarantir 0 alimento de suaprole. Everton Tizo-Pedroso Programa de Pos-qraduaciio em fcologia e Conservaciio de Recursos Naturals, Universidade Federal de Uberliindia Kleber Del-Claro Instituta de Bialagia, Universidade Federal de Uberl6ndia Quando viajamos em um ambiente como 0 cerrado, seja a passeio ~ I ou para estudos cientificos, urn aspecto que nos sur preende e a variedade de formas de vida ali existentes. Encontramos de pequenos arbustos a grandes e tortuo sas arvores, alem de uma impressionante riqueza de vertebrados e, especialmente, de invertebrados. No en tanto, poucas pessoas atentam para 0 que ocorre sob as cascas das arvores, urn dos muitos micro-habitats desse bioma. Embaixo da camada de cortica que reco bre os troncos vive urn pequeno animal, urn predador voraz que ataca, em grupo, outros invertebrados ate oito vezes maiores que ele, assim como matilhas de lobos cacam bis6es ou alces. Esses miudos cacadores sao os pseudo-escorpi6es sociais (figura 1). outubro de 2008' CIENCIA HOlE' 33 ECOLOGIA COMPORTAMfNTAI Figura 2 . Anatomia basicade um pseudo-escorpiao - no detalhe, um indivfduoadulto de P. nidi{icator Figura 3. Colonia do pseudo-escorplao social P. nidi{icator, comparte dos indivfduos abrigadosemcarna ras de seda Se esse n ome parece estran h o, e porque os ps eudo-escorpioes sao muito pouco conhecidos. Em geral, apenas os biolo gos estao famili ari zados com esse grupo . Como 0 nome sugere, os 'falsos escor pi6 es' sao aracn ideos, ou seja , perten cem a mesma c1asse qu e aranhas, escorpi6es e carra patos. Com 0 ,5 a 10 mm de comprimento, eles par ecem p equ e nos esc orpi6es, pois tern pincas sem elhantes as desses animais, ma s nao exibem, como eles, a cau da alongada e termi nada em urn Ferr ao. 0 corpo dos 34 • C I~NCI A HOlE· v o l. 4 3 • n Q 2 5 3 pse udo- escorpioes, dividido em cefalot 6rax (cabeca e t6ra x unidos) e abdomen, apresenta seis pares de apendices: as queliceras (associadas a carnara bucal), os pedipalpos ('bra gos' com pincas na extremidade) e quatro pa res de pern as usadas para a locomocao (figura 2). Tern glandulas produtoras de seda nas queliceras e glandulas de ven eno nas pincas, Embora sejam quase descon h ec idos , os pseudoQuelic era escorpi6es sao abundan tes e bern diversifi ca dos : existe m mais de 3,3 mil espec ies (0,2 % das es pecies an im ai s Perna descritas), distribuidas em 425 gene rcs e 24 familias . Eles ocorrem em todos os ambientes terrestres do mundo, exceto os mai s frios, e sao mu ito ma is comuns qu e os escorpi6es verda deiros , mas seu tamanho diminuto e seus habitos- furti vos fazem com qu e difici lm ente sejam vistos na natureza. A fauna de pseudo-escorpi6es da America do Su I e pouco estu dada, em espe cial no Brasil, mas estima-se qu e exista m mais de 200 especies (s6 na Amazonia sao conhe cidas 75). Esses animais ocu pam ampla vari ed ad e de ambientes, como as fo lhas caidas no chao das matas, troncos de arvores e galhos em decomposicao, espac os entre e sob as pedras, par ed es de cavernas, ninhos de aves , tocas ou refugios de mamiferos ou mesmo os excrem ent os (guano) de mor cegos. Na grande maio ria das espec ies, os pseudo-es corpi6es tern vida solitaria. Os individuos enc on tram-se ap enas para 0 acasalamento. As int eracoes com outros individuos da mesma especie podem in c1uir ainda 0 canibalismo ou a necrofagia. 0 com portamento socia l e raro entre os aracnideos. Estima se que meno s de 0,5% das espec ies conhecidas apresente alguma forma de vid a comunal. A expressao 'vida social' tern varios signifi cado s e graus de complexidade , mas esse termo e us ado aqui para se referir as especies que podem constituir colonies (permanentes ou sazonais) e apr esen tar ou nao form as de cooperaca o (traba lho conjunto). Em aracnideos , os caso s mais conhecidos e com pl exos de socialidad e ocorrem em algumas es pe cies de aranha s, qu e vivem em grandes colonias, coope ram na cons truc ao do ninho e atu am coleti vam ente na captura de pr esas (quas e sempre ou tros invert ebrados). Entre os ps eudo-escorpi6es, sao conhecidas hoje apenas duas especies qu e tern seus nu cleos estabelecidos sob ccoperacao. @ ~ ~ ~ ~ ~ ~ 2 ~ g COLON lAS DIVERslFICADAs As espe cies sociais Paratemn oides elongatus e Pa ratem noides nidificator sao encontradas desde a America do SuI ate 0 sul da America do Norte. Tais aracnideos ocorrem em varies biomas, entre eles 0 cerrado, considerado atua lmente urn dos ecossis te mas mais ameacados de extincao no mundo, ten do ape nas 8% de sua area total int ocados. Uma impo r tan te par cela da biodi versidade brasileira esta nesse bioma, incl us ive P. nidificator, qu e vive sob as cas cas de suas arvo res tortuosas. A cornposicao das colonias dessa especie de pseudo-escorpiao varia bastante. Sao obs ervados agrup am entos formados por uma femea e seus fi lhotes, por urn grupo pequeno de adultos com crias ou por ate 200 in dividu os. Estruturalmente, essas colon ies sao compostas por varias camaras de uso comunitario feitas de fios de seda. As ninfas [in dividuos jovens, sexualmente imaturos) cons troem camaras de 'muda', permanecendo abriga das em seu interior, e as femeas adultas cons troem camaras de incubacao das crias. Dispostas lado a lado, as carnaras formam urn tipo de labirinto in terconectado, com ate 20 camaras (figura 3). Os pseudo -escorpi6es ad u ltos tarnbem se ab ri gam nesses 'ninhos' e saem para buscar alimento (forrageio), para encontrar parceiros para a reprodu e para a disp ersao e forma cao de novas colonies, quando necessario . 0 tamanho excessivo da colonia, a baixa disponibilidade de alim ento e/ou a intensa comp eticao por este sao fator es que podem deses tabil izar a coop eracao no grupo. A fome as vezes causa can ibalismo. Essas condicoes podem defla grar os mecanismos de divisao de uma colonia. A primeira estrategia de divisao da colonia e cham ada de 'foresia multipla'. Nela, varies pseudo escorpi6es adu ltos agarra m-se simulta nea mente aos apend ices de algu m inse to maior que esteja na s proximidades e sao carregados por este para outra arvo re ou outro local apr opriado. Essa forma de dispersao permite a migracao desses pequenos ara c nid eos de forma rapida e eficiente para locais dis tantes (figura 4). No entanto, apenas urn pequ eno numero de pseudo-escorpioes (tres a cin co indivi du os) tera tempo suficiente e espa co para se agarrar ao ins eto vetor. No segu ndo metodo, a fissao da colonia, forma -se urn agregado pequ eno (cinco a 20 ind ividuos) que abandona 0 agrupamento de origem para buscar outro local e constituir nova colonia. Nesse meca nismo de disp ersao 0 deslocamento do grupo que sai e reduzido: muitas vezes a nova colon ia e esta belecida na arvor e ao lad o. Essa estrategia tamb em pode envolver urn mime ro maior de individuos, 0 que dara a nova colon ia cha nces melhores de su cesso na captura de presas. ~ ao Figura 4. Urn pseudo-escorpiao da farnflla Aternnidae aproveitando a 'carona' de urn besouro para procurarurnlocal paraforrnar nova colonia outubro de 2008 • CI£NCIA HOlE' 35 ECOLOGIA COMPORTAMENT Figura 5. Urn grupode Paratemnoides nidificator atacando cooperativamente umaoperaria de formiga do genera Camponotus EMBOSCADA COOPERATIVA Embor a sejam muito peq uenos (3 a 5 mm) , os pseu do-escorpioes das espec ies P. nidificator e P. elotiga tus sao capazes de cacar (forragear) em gru po. Ja foram observados, na America do Norte, grupos de P. elongatus captur ando formigas que superam em 50 vezes a massa corporal de urn desses aracnldeos , Na America do SuI, P. nidificator exibe h abilidade semelhant e para a captur a de grand es artropodes , como Iorm igas, besouro s e outros (figura 5). Quan do estao a espreita de uma presa, os adultos postam-se nas fendas de entrada das colonias, esten dem seus pedipalpos (com os 'dedos' abertos) para fora e esperam. Ao se aproximar de uma fenda, a presa - urn inseto, por exemplo - provoca minuscu las vibracces, na casca da arvore e no ar, que 0 pseu do-escorpiao e capaz de sent ir. Nesse mem ent o, 0 aracnideo agarra as pernas do inseto e, em segundos, outros adultos se langam sobre este, imp edindo sua fuga e inoculando veneno em suas articulacoes. Depoi s qu e 0 vene no age, paralisan do a presa, seu corpo e arra stado para a fenda na casca da ar Yore. a tempo necessario para subjugar e paralisar um a presa dep end e do tamanh o desta. Assim, cap tura r com su cesso um a presa de grande por te exige ]6· CI£NCIA HOlE· vo l. 43· n Q 253 urn trabalho de equipe bern coordenado. Apos a imobilizacao total da vitima, os pseudo-escorp ioes perfuram suas articulacoes e in trod uzem as quell ceras para injetar urn acid o digest ivo, que dissolve seus tecidos, transformados em uma especie de 'suco ' que e consumido coletiva mente. Essas estrategias de emboscada cooperativa ca pacitam P. ni dificator a cacar gran de vari edad e de animais qu e tambem vivem nas arvores, os quai s as frequ entam para buscar alimento ou as usam ape nas como local de descanso . E surpreendente saber que esses pequenos aracnideos sao capazes de captur ar mais de 50 especies diferent es de inv ertebr ados nos tron cos das sibipiru nas (Caesalpin ia peltopbo roides). As presas incl uem grandes artropo des (se comparados aos pseudo -escorpioes], como aranhas pap a-moscas, form igas, besouros , per cevejos e rara ment e ou tros tipos de animais . CUIDADO PARENTAL Alern de viver em grupo, cacar cooperativ amente e partilhar as presas, os pseudo-escorpioes apr esentam outra caracteristica mu ito interessan te e incomum em invertebrado s: 0 cuida do parental cooperativo, ou seja , proteger e alimentar nao so a propria prole, mas tamb em os filho tes de outros. De mod o geral, todo pseudo-escorpi ao cuida de alguma forma de ECOlOGIA Figura6. A matrifagia, uma forma extremade cuidado maternal,foi observada,no cerradobrasileiro, no pseudo-escorpiiio P. nidlficator. (A)Em sltuacoes de falta de alimento paraos filhotes, a femea de P. nidiiicator exibe urncomportamento surpreendente. (B) Elarompea camara de seda e a deixa, seguida pelos filhotes. (C) Em seguida,se deixa atacar, sem reslstencia, servindo de alimento parasua prole seus filhot es, mas a complexidade desse comporta mento varia segundo a espe cie. Ate recent emente, s as casas conhec idos mais elaborados de cuidado a ~ prole estavam descritos para repr esent ant es da fa ~ milia Atemnidae, na qual pode existir um a extensao ~ do periodo de permanen cia da mae (ate tres sema nas) com seus filh otes, como acontece na espe cie B Atemn us polistus. Entr etanto, os estudos de nosso gru po no cerra do brasileiro, com essa mesma familia -(que inclui 0 genera ParatemnoidesJ, revelam estrategias de vida social qu e vao muito alem do simples viver em gru po e de algum grau de cuidado maternal. Nesse biom a, os adultos de P. nidificator cuidam coopera tivam ent e de seu s filhot es ate que estes se torn em adultos , 0 que significa rnais de sete meses. As fe meas perm an ecem no interior do 'ninho' (a camara de in cub acao) prategendo seus filhot es em temp o qua se int egral. a s macho s e as femea s imaturas permanecem fora dos 'ninhos', capturam e paralisam as presas e oferecern 0 alimento aos filhotes da colonia . Todos os adultos cu idam de todos os filho tes , sem nitida discriminacao de paternidade. Essa esp ecie apresenta, portanto , uma verdadeira coope ragan social, semelhante a observ ad a ap en as em ins etos sociais das ordens Hymen opt era (formigas, abelh as e vespas) e Isopt era (cupins). Alern de todo s cuidarem da pr ole, existem outras comportamentos par ent ais complexos e surpreen dent es nessa espec ie. Qu and o um a mae na o conse gue obter alimento para os filhot es (ou quando as con dicoes de vida sao desfavoraveis), torna-se alta a ch ance de ocorrer canibalismo ou mort e da ninhao ~ ~ i COMPORTAMENTAl • da por in ani cao, Nessa situacao, observa-se uma forma extrema de cuidado parental, conheci da como matr ifagia (figura 6). A mae sai do 'ninho' abrin do 0 veu de seda com sua s pern as e. com movimentos de suas garras, atrai para fora os fi lhotes, que a ro deiam. A seguir, ela ergue seus pedipalpos e, tot alm ent e im6vel, oferece seu cor po, sem resisten cia, para que os filhot es se alimen tern. Depois disso os filhot es , agora sem a protecao mat erna, perm an ecem unidos e cornecam a cacar em grupo, torn ando-se 0 micleo basico de um a futura nov a colonia. a cuida do par ental coop erativo dessa espe cie de falso-escorp iao parece ser uma estrategia mui to importante para a sobrevivenc ia da colon ia. Todas as femeas adultas da colonia mostram -se capazes de gerar grande numero de filh otes e de se dedicar a cuidar destes por muito s meses. Assim , a cooperaca o entre machos adultos e machos e femeas imaturos e fun damental para a captur a do numero sufi ciente de pr esas par a 0 desenvolvi men to normal dos filhot es mais joven s. Alem disso, a cooperacao no cuida do parental aumenta a tolerancia entre os individuos, 0 qu e ben eficia a coesao interna do gru po . Da mesma forma, a matri fagia tambern pod e ser considerada um a estrategia importante para a evoluc ao da socialidade nessa espec ie de pseudo-escorpiao, ja qu e, ao evitar 0 canibalismo entre irrnaos, ou su a dispersao , 0 sacriffcio da mae cons titui urn passo inicial para esta belece r essa toleran cia - 0 inicio da vid a em socieda de. _ Sugestoes para leitura AD/S, V.M .j . 'Pseudoscorpiones', in ). Adis, Key to genera and species ofAmazonias Arachnidaand Myriapoda, Sofia e Moscou, Pensoft Publi chers, zoo z. TIZO -PEDROSO, E. & DEL-CLARO, K. ' Cooperation in the neotropical pseudoscorp ion Paratemnoides nidificator (Balzan, 1888) : feeding and dispersal behavior ', in InseetesSociaux, v. 54(Z), p. 1z4 , Z007. TIZO-PEDROSO, E. & DEL-CLARO, K_ 'Mat riphagy in the neotropical pseudoscorp ion Paratemnoides nidificator (Balzan 1888) (Atemnidae) ', in Journal of Arachnology, v. 33 (3), p. 873, zoos . outub ro de a o o s • CI£NCIA HOlE' 37
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