Projeto racional de propulsores por métodos
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Projeto racional de propulsores por métodos
23º Congresso Nacional de Transporte Aquaviário, Construção Naval e Offshore Rio de Janeiro, 25 a 29 de Outubro de 2010 Projeto racional de propulsores por métodos numéricos Felipe Ruggeri Giovani Diniz Claudio Mueller Prado Sampaio Resumo: No contexto do projeto otimizado de um navio com objetivo de reduzir o consumo de combustível, a seleção e adequação do propulsor para as condições de operação na popa assume grande importância. Nas primeiras etapas de projeto é usual a seleção de um propulsor de uma serie sistemática, cujos dados são obtidos através de ensaio de águas abertas, isto é, sujeitos a um campo homogêneo de velocidades. Considerando a capacidade computacional disponível, bem como o desenvolvimento de métodos numéricos, tornou-se possível o projeto e a avaliação do desempenho do hélice, já em etapas iniciais de projeto, considerando a esteira da embarcação. Esta facilidade permite estudar a influência dos diversos parâmetros geométricos do propulsor, podendo-se selecionar o mesmo em função de uma hierarquia de importância dos requisitos de projeto, que geralmente são eficiência (empuxo e torque), cavitação, vibração, etc. Os métodos disponíveis, embora não dispensem a necessidade de realização de ensaios, possibilitam explorar geometrias de propulsores adaptadas às condições do escoamento na popa do navio, permitindo reduções de custos de operação e emissão de poluentes. 1 – Introdução No contexto do projeto de embarcações, cada vez mais se buscam alternativas que permitam maior eficiência e disponibilidade, menores efeitos sobre o ambiente e, concomitantemente, maximizando lucros e respeitando as normas e legislações vigentes. A eficiência está diretamente ligada à economia de combustível, que por sua vez implica em menores emissões de poluentes, ponto esse bastante relevante em novos projetos de embarcações. Neste contexto, um projeto eficiente do propulsor da embarcação assume grande importância, pois mesmo economias percentualmente pequenas de eficiência são potencializadas pela longa vida útil da embarcação. Nesse trabalho é apresentada uma metodologia de escolha e análise de propulsores de embarcações aplicada ao procedimento de desenvolvimento de uma embarcação do tipo CNG (Compressed Natural Gas), cujas principais características podem ser vistas na Tabela 1. O presente artigo é iniciado com a descrição do processo “tradicional” de escolha inicial do propulsor através da integração casco-hélice e utilizando, como ferramenta, o software NavCAD®. Esta etapa corresponderia ao primeiro ciclo da espiral de projeto, quando as linhas do casco ainda não estão dispo-níveis, existindo somente uma estimativa dos coeficientes e dimensões principais. Portanto, selecionou-se o hélice da série B-Troost que apresentou maior eficiência na integração com o casco Tabela 1 - Características da embarcação Comprimento Total Comprimento entre Perpendiculares Pontal (meia nau) Boca Calado Coeficiente de Bloco Coeficiente de Meia Nau LOA Lpp D B T Csm 146.40 136.90 12.00 23.00 6.50 0.79 0.90 Coeficiente de Linha d’água Cw p V ∆ 16101,8 16504,4 Deslocamento em volume Deslocamento em peso CB m m m m m 0.80 m³ ton O passo seguinte deste estudo, incluiu a definição da geometria desse hélice, esta atividade incluída para possibilitar a avaliação do desempenho do propulsor através do software HSVA PPB® que, específico para esse tipo de aplicação, emprega uma discretização do propulsor em painéis. Os resultados dessa análise foram, então, comparados com os resultados experimentais obtidos da série. O trabalho tem continuidade com a estimativa da esteira, no plano do propulsor, 1 da embarcação obtidas através regressões, análises computacionais em CFD e, finalmente, de ensaio de reboque com a utilização de tubos de Pitot. A partir desse perfil de velocidades obteve-se a distribuição radial das componentes médias do campo de velocidades e que, por sua vez, permitiu o emprego da teoria da linha de sustentação para a obtenção da distribuição de circulação ótima do propulsor e a caracterização da eficiência máxima do propulsor. Finalmente, o efeito do campo de esteira radial nas curvas características do hélice é avaliado numericamente com o emprego do software HSVA PPB®, sendo seus resultados comparados com os valores obtidos anteriormente. 2 – Escolha do Propulsor da Série B-Troost Nas primeiras etapas de projeto, é usual a utilização de propulsores de séries sistemáticas devido à falta de informações para um projeto aprimorado do propulsor. No procedimento utilizado, inicialmente as curvas de resistência do casco foram obtidas a partir dos softwares NavCAD® e HullSpeed® ( método Holtrop e série Denmark Cargo), e comparadas, como mostrado na Figura 1 1 21 1 . (1) em que corresponde à margem de resistência utilizada para considerar condições médias de casco e mar, t e w são, respectivamente, o coeficiente de redução da força propulsora e o coeficiente de esteira e corresponde à velocidade de operação da embarcação. Os valores utilizados são apresentados na Tabela 2. Tabela 2 - Parâmetros para Análise de Resistência Especificando 4 diâmetros diferentes variando de 40 – 70% do calado da embarcação, foram obtidas as curvas KT do casco mostradas na Figura 2 que integradas às curvas características do propulsor B4-55 resultaram nos pontos de operação indicados na Tabela 3. 5,0 Kth - D=4,55 Kth - D=3,9 Kth - D=3,25 Kth - D=2,6 4,5 4,0 3,5 KTH 3,0 1,00E+06 NavCAD - Denmark HullSpeed - Holtrop NavCAD - Holtrop 9,00E+05 8,00E+05 7,00E+05 2,0 1,5 6,00E+05 Rt (kN) 2,5 1,0 5,00E+05 4,00E+05 0,5 3,00E+05 0,0 2,00E+05 0 1,00E+05 0,00E+00 7 9 11 13 15 17 Vel (kts) 0,5 1 1,5 2 2,5 J Figura 2 - Coeficientes de Empuxo do Casco Figura 1 - Curvas de Resistência Tabela 3 - Pontos de integração Com o objetivo de criar um melhor entendimentodo processo de integração casco-hélice e, assim, corroborar os resultados obtidos pelo software NavCAD®, desenvolveu-se uma planilha Excel® capaz de definir o ponto de operação da embarcação para um dado propulsor da série B-Troost e obter uma primeira estimativa de eficiência, rotação e potência requerida do motor. Assim, adotando-se a estratégia de especificar o diâmetro do propulsor, as curvas do coeficiente de empuxo do casco foram determinadas usando a Equação ( 1 ) Devido à grande importância que o fenômeno da cavitação exerce sobre o processo de seleção do propulsor, a planilha desenvolvida também incluiu uma avaliação dos pontos de operação através do diagrama de Burrill, como mostrado na Figura 3. 2 τ Burril - 5% D=2,6 D=3,25 D=3,9 D=4,55 Burrill - 10% mesmo nível de cavitação. Os respectivos parâmetros geométricos são mostrados na Tabela 6. Tabela 5 - Integração dos hélices ótimos 0,1 0,1 1 σ Figura 3 - Diagrama de Burrill Empregando-se o propulsor de maior diâmetro (D = 4,55m) e relação passo-diâmetro (P/D) igual a 1,4 foi feita a integração casco-hélice através do software NavCAD® com o objetivo de esclarecer os mecanismos de uso do software e verificar a coerência dos resultados, cujos pontos de operação são apresentados na Tabela 4. Tabela 4 - Comparações A comparação dos resultados obtidos através dos métodos (Excel® e NavCAD®) aponta para o correto equacionamento na planilha mostrando que os pontos de integração obtidos são coerentes em termos de torque e empuxo, bem como em termos de cavitação. Uma vez entendida a sistemática de emprego do software NavCAD®, a escolha do propulsor que fornece a maior eficiência para o casco em projeto foi feita utilizando unicamente o software. Para tanto definiu-se os parâmetros geométricos (diâmetro máximo e imersão do propulsor) e, devido a inexistência de restrições quanto à relação de área expandida por área do disco (AE/A0) ou na relação passo-diâmetro, esses parâmetros foram deixados livres nos limites estabelecidos pelo programa. Adicionalmente, estabeleceu-se o limite máximo de cavitação em 5%, de acordo com o critério de Burrill. Dessa forma, considerando duas possibilidades para o número de pás, isto é, hélices de 3 ou 4 pás, a otimização efetuada pelo software resultou nos pontos de operação indicados na Tabela 5, destes selecionando-se o de 4 pás, pois apresentou maior eficiência para um Tabela 6 - Dados do hélice selecionado 3 – Análise por Método de Painéis A utilização de métodos de painéis em engenharia naval é prática comum em análises hidrodinâmicas de cascos, lemes e propulsores sendo o corpo discretizado em painéis distribuidos sobre sua superfície e o escoamento resolvido através da teoria potencial. Para avaliar o desempenho de propulsores, recentemente, o Departamento de Engenharia Naval e Oceânica da EPUSP adquiriu os programas PPB® e PPB light® do tanque de provas de Hamburgo (“HSVA”) e que permitem a avaliação de ampla gama de condições de operação, entre as quais o levantamento das curvas características do propulsor. Este item, portanto, tem como objetivo verificar o procedimento de uso e comparar os resultados obtidos da aplicação do método numérico adotando como caso de estudo o hélice B-Troost selecionado. O primeiro passo deste processo foi caracterizar a geometria dos propulsores da série B-Troost para, somente então, analisar o desempenho do propulsor selecionado no item anterior. A especificação dos propulsores dessa série é definida por parâmetros globais como, o número de pá, a razão de área expandida por área do disco e a relação passo-diâmetro, no entanto, para o emprego do programa torna-se necessário a criação de três arquivos (de entrada) em que características geométricas específicas do hélice devem ser fornecidas. Estas características correspondem ao número de seções, às máximas espessuras e curvaturas de cada seção, à distribuição de caimento e de “skew” das pás e às distribuições de espessura e curvatura de cada seção. Assim, para facilitar o processo de preparação dos dados de entrada, foi desenvolvida uma rotina em MatLab® capaz 3 de automatizar a geração dos arquivos de entrada e também desenhar a geometria do propulsor. Utilizando as características geométricas dos propulsores B4-55 e B4-70 para teste foram elaborados os arquivos de entrada dos programas. Na Figura 4 é apresentada a interface gráfica principal disponibilizada pelo programa PPB® em que os dados gerais do propulsor são apresentados. A partir da caracterização da geometria, o programa gera a malha de elementos (painéis) da pá do propulsor, como mostrado na Figura 7 em que se pode notar a discretização tanto da face como do dorso da superfície da pá. Deve-se ressaltar que, como mostrado na Figura 8, a solução do problema de contorno inclui tanto os painéis sobre a superfície da pá, como também painéis na esteira, isto é, associados aos vórtices livres (“free vortex”) decorrentes da variação da circulação (carregamento) ao longo da envergadura. Figura 4 – Interface gráfica do software PPB® Na Figura 5, é apresentada a distribuição de espessuras das seções das pás enquanto que a Figura 6 mostra a distribuição de curvatura nas seções das pás. Figura 7 - Malha de elementos de contorno Figura 8 - Malha de elementos no escoamento Figura 5 - Distribuição de espessuras Figura 6 - Distribuição de curvaturas As curvas características de ambos os propulsores são apresentadas nas Figura 9 à Figura 14 em que também foram incluídas as curvas, geradas por regressão, obtidas do programa NavCAD® (regressões). Os resultados obtidos mostram que a análise do propulsor usando o método de painéis não é adequada em situações de alto carregamento (próximas à condição de “bollard pull”) e em condições aquém do pico de máxima eficiência. A primeira condição corresponde a uma situação em que existe uma contração significativa da esteira, situação na qual as hipóteses utilizadas nos métodos tradicionais não mais se aplicam. Por outro lado, no caso dos pontos aquém dos picos de máxima 4 KT(HSVA) 0,6 KT(Regression) KT KT(PPB Light) 0,4 0,2 0 0 0,5 1 J Figura 12 - Hélice B4-70: Curva KT KQ(HSVA) KQ(Regression) KQ(PPB Light) KQ 0,7 0,6 0,5 0,4 0,3 0,2 0,1 0 1,5 0,15 0,1 KT(HSVA) KT(PPB Light) 0,05 KT(Regression) 0 0 1 J Figura 13 - Hélice B4-70: Curva KQ 0 1 J Figura 9 - Hélice B4-55: Curva KT 0,14 0,5 KQ(Regression) eta(Regression) eta(PPB Light) 0,6 0,4 0,08 0,2 0,06 0 0,04 1,5 eta(HSVA) 0,8 KQ(PPB Light) 0,1 0,5 1 1,5 KQ(HSVA) 0,12 KQ 0,8 η KT eficiência pode-se inferir sobre a inerente dificuldade de caracterização do ponto de estolagem dos fólios devida à abordagem inexistente/simplificada de inclusão dos efeitos viscosos na estimativa dos carregamentos no método de painéis. É importante ressaltar que, estando os pontos de operação do propulsor (integração casco-hélice) usualmente afastados destas regiões extremas, o emprego de métodos de painéis oferece estimativas bastante adequadas e confiáveis e, adicionalmente, possibilitam uma grande flexibilidade na seleção e modificação das características geométricas do projeto racional do hélice integrado aos requisitos do casco. 0 1 1,5 J Figura 14 - Hélice B4-70: Curva de eficiência 0,02 0,5 0 0 0,5 1 1,5 J Figura 10 - Hélice B4-55: Curva KQ 1 0,8 η 0,6 0,4 eta(HSVA) eta(PPB Light) 0,2 eta(Regression) 0 0 0,5 1 1,5 J Figura 11 - Hélice B4-55: Curva de eficiência 4 – Esteira nominal Para o desenvolvimentodo de um projeto racional de propulsores é extremamente importante conhecer a esteira na qual o mesmo atua. Desta forma, a partir do casco projetado (plano de linhas) e utilizando diferentes softwares comerciais de CFD, procurou-se definir as caracteristicas desejadas da esteira. As esteiras derivadas da solução numérica incluindo os efeitos viscosos foram obtidas utilizando os softwares CFX®, StarCCM® e Shipflow®, para este último, também foi avaliada a esteira potencial. Adicionalmente, foi realizado ensaio, utilizando a técnica de tubos de Pitot, para obtenção da esteira experimental. O modelo testado, assim como os modelos numéricos encontram-se um uma escala de 1:50 em relação ao protótipo, para o qual a posição preliminar 5 estimada do centro do propulsor foi de 2.53m acima da linha de base, 4.06m avante do espelho de popa e 5.55m em relação ao plano de simetria (Figura 15). É importante salientar que como a embarcação emprega dois hélices não se pode adotar a condição de simetria, sendo necessário efe-tuar o cálculo para os 360 graus do plano do propulsor. em que M é o número de posições radiais igualmente espaçadas e N é o número de ângulos utilizados em cada raio. Um exemplo da distribuição de esteira pode ser vista na Figura 16, sendo que, por convenção, os ângulos foram medidos no sentido anti-horário, segundo a orientação definida na Figura 17. Figura 16 - Exemplo de esteira obtida Figura 15 - Posições dos propulsores O cálculo da esteira foi feito externamente aos programas acima mencionados a partir das velocidades axiais obtidas em alguns planos que contemplavam a região do propulsor. Os valores de esteira correspondentes às posições experimentais foram obtidos através de interpolação linear, isto é, em cada uma das 5 posições radiais do propulsor e para os 36 pontos angulares equiespaçados. Essas estimativas foram realizadas com auxílio de um sistema de coordenadas polares com origem no bosso e contido no plano normal. A esteira média global w0 foi calculada através de ( 2 ), em que w(r,θ) é a esteira num dado raio e ângulo, esta variável calculada pela expressão ( 3 ). % · , ". #"# & $ $ (2) % . #"# & , " (3) , " 1 As integrais da equação ( 2 ) são aproximadas pelo método dos trapézios, transformando-se em somatórios, como mostrados na equação ( 4 ), 4 0 ,12 .12 2 )* +, * -, , ". /35 · ' · ( (4) Figura 17 - Orientação de ângulos Com esse procedimento foram obtidas as esteiras para diversas posições radiais e angulares, como pode ser visto na Figura 18 para as posições extremas de 0.33R e 1.0R. Verifica-se que, em escoamento viscoso, os resultados obtidos dos programas Shipflow® e CFX® possuem boa concordância enquanto que aqueles derivados do software StarCCM+, apesar de mesma tendência, apresentam-se um pouco discrepantes. De maneira geral, todas as distribuições possuem comportamento semelhante àquela do ensaio, com exceção da esteira potencial (Shipflow®) que devido à própria natureza não consegue reproduzir o comportamento próximo ao casco. A distribuição da esteira média nominal; para cada posição radial, pode ser vista na Figura 19. O gráfico indica claramente que, para posições radiais próximas ao eixo, os valores médios são coincidentes, enquanto que, para posições mais afastadas, os desvios em relação ao valor experimental são significativos, com exceção do fornecido pelo programa CFX®. A boa concordância dos resultados próximos ao eixo, inclusive aquele obtido da estimativa potencial, permite concluir que os efeitos viscosos são pouco significativos nesta região. 6 Tabela 8 - Índice de ajuste das regressões de esteira 0,7 StarCCM+ - 0.33R StarCCM+ - 1.00R Coeficiente de determinação (R²) StarCCM+ 0,87 CFX 0,97 Shipflow (viscoso) 0,99 Shipflow (potencial) 0,97 Tubo de Pitot 0,91 CFX - 0.33R 0,6 CFX - 1.00R Shipflow - viscoso - 0.33R Shipflow - viscoso - 1.00R 0,5 Shipflow - potencial - 0.33R Shipflow - potencial - 1.00R Tubo de Pitot - 0.33R 0,4 w(r,θ) Tubo de Pitot - 1.00R 0,3 0,2 5 – Teoria da linha de sustentação (TLS) 0,1 0 0 50 100 150 200 250 300 350 Ângulo (graus) Figura 18 - Esteira angular para 0.33R e 1.0R 0,28 StarCCM+ 0,26 CFX Shipflow - viscoso 0,24 Shipflow - potencial Tubo de Pitot w(r/R) 0,22 0,2 0,18 0,16 0,14 0,12 0,1 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1 Posição radial (r/R) Figura 19 – Esteira média para cada posição radial O resultado da integração do campo de velocidades, isto é, a esteira nominal média w0, é mostrado na Tabela 7. Finalmente, em virtude da necessidade de se conhecer as esteiras radiais médias em posições específicas para a aplicação da teoria da linha de sustentação (TLS) e manter coerência com as estimativas experimentais, definiram-se regressões lineares em função das posições radiais experimentais que, embora baseadas em poucos pontos, mostraram-se representativas com coeficientes de determinação acima de 0.90 (Tabela 8). Tabela 7 - Esteiras nominais Método StarCCM+ CFX Shipflow (viscoso) Shipflow (potencial) Tubo de Pitot w0 0,14 0,18 0,21 0,14 0,18 O uso da teoria da linha de sustentação teve como objetivo avaliar a eficiência máxima para a esteira nominal obtida para o casco, utilizando para isso uma versão modificada do método de Lerbs(1952). A teoria de linha de sustentação (TLS) tem como idéia principal substituir as pás do propulsor por linhas de vórtice que geram sustentação (lei de Kutta-Joukowski) e que, portanto, possibilitam a obtenção do empuxo fornecido pelo propulsor, assim como do torque necessário. As suas principais limitações estão no fato de desprezar os efeitos de espessura, caimento e torção do perfil. A hipótese constitutiva básica utilizada é de fluido ideal, ou seja, incompressível, invíscido e isotrópico devendo-se acrescentar que, de acordo com a Lei de Helmoltz, linhas de vórtices não podem terminar abruptamente e, portanto, para propulsores, se estendem ao longo da esteira acompanhando as linhas de corrente. A linha de vórtice possui circulação variável ao longo das posições radiais do propulsor, gerando uma superfície de vórtices livres. É neste aspecto que reside a principal dificuldade da solução matemática da TLS uma vez que as linhas de vórtice livre seguem as linhas de corrente a ré do propulsor, estas dependentes do campo de velocidades. Por sua vez, o campo de velocidades é dependente da rotação do propulsor, da velocidade incidente e das velocidades induzidas (axial, tangencial e radial) pela própria folha de vórtices acarretando, consequentemente, uma interdependência entre velocidades induzidas e linhas de vórtices livres. No contexto de propulsores moderadamente carregados (como é o caso em estudo), considera-se que o efeito da velocidade induzida radial seja pequeno e, portanto, existe pouca contração da esteira. Para o pro-pulsor ótimo moderadamente carregado adaptado à esteira, demonstra-se que o passo hidrodinâmico e geométrico obedecem à equação ( 5 ), 7 tan 8 1 ; 9, · : tan 8, 1 (5) e que, adicionalmente, o rendimento ótimo possível do propulsor é dado pela expressão ( 6 ), na qual < é a razão entre a velocidade de serviço ( ) e o produto da velocidade angular pelo raio do propulsor, =; é a circulação adimensional e ;( é o raio adimensionalizado do bosso. 9, < · 2 ; ? ; B& =; · >< @ A #; B& =; · >1 ; 2 ? ; A #; (6) Na implementação do método TLS as velocidades induzidas são obtidas através da Lei de Biot-Savart, equação ( 7 ); #C EEEFD EF Γ dlF Λ R · M 4·π R (7) em que Γ é a circulação, dlF é vetor EF o vetor que infinitesimal da linha de vórtice e R une o ponto da linha de vórtice até o ponto no qual se deseja calcular a velocidade. A integração ao longo da linhas de vórtices é decomposta nas parcelas associadas aos vórtices vinculados (“bound vortex”), ao do bosso e à folha de vórtices livres (“free vortex”) da esteira. A influência da linha de vórtices coincidente com o bosso é nula, no caso de pequeno raio do bosso, N ; caso contrário haverá uma componente induzida tangencial dada pela equação ( 8 ), em que Z é o número de pás e r, a coordenada cilíndrica do ponto de referência. ?@O · P · =N 2· (8) O cálculo da integral ao longo da folha de vórtices livres é bastante complexo, requerendo o uso da técnica dos fatores de indução (Lerbs, 1952) para o cálculo das velocidades induzidas axial e tangencial, equações ( 9 ) e ( 10 ), em que as variáveis it e ia correspondem, respectivamente, aos fatores de indução tangencial e axial, estes obtidos a partir de funções de Bessel. 2 #=; S@ ;, ; ·R · #; ; ; 2 B& #; 2 #=; S ;, ; ·R · #; ; ; 2 B& #; ?@Q ?Q (9) ( 10 ) A solução numérica é representada pela expressão ( 11 ), que relaciona a velocidade induzida total com a circulação e com o ângulo hidrodinâmico de passo. Esta expressão foi obtida através de manipulações algébricas das equações ( 9 ) e ( 10 ); R 2 #= T;, ; ;·V· #; 2 Utan 8, ; · 1 ;X ; ; W B& #; ( 11 ) em que T;, ; é relacionado através da relação geométrica de velocidades, ou seja, S ;, ; S@ ;, ; · tan 8, ;. Para calcular os parâmetros globais do propulsor, a sustentação é obtida pela expressão de Kutta-Joukowski, equação ( 12 ); Y · · Γ ( 12 ) a partir da qual, por decomposicao na direção do movimento, tem-se o empuxo. Entretanto, torna-se necessário, mesmo que simplificadamente, incluir os efeitos viscosos (abandonando assim a hipótese de fluido ideal). Desta forma, adotando-se o adimensional Z (relação experimental entre arrasto e sustentação), é possível calcular o empuxo total produzido pelo propulsor, decompondo as parcelas na direção axial de avanço, expressão ( 13 ), assim como a potência requerida, calculada de forma análoga, através da equação ( 14 ). P · R Y · [1 Z · tan 8, \ %& · cos 8, # Z X tan 8, · sin 8, # ` P · V · R · Y · U1 %& ( 13 ) ( 14 ) É possível, assim, definir a eficiência do propulsor, como sendo a relação entre CT e C P. b 9 b bc 1 · · d · · 2 bc ` 1 · · d · · M 2 ( 15 ) ( 16 ) ( 17 ) Uma relação bastante importante é a fornecida pela equação ( 18 ), em que l(r) é o 8 comprimento da corda em cada raio e CL(r) o respectivo coeficiente de sustentação. Essa relação precisa ser satisfeita para cada raio e, portanto, particulariza um pouco a geometria do hélice através da caracterização das áreas de cada seção da pá do hélice. bY. e 2. d. = /W Tabela 9 - Eficiências obtida pelo TLS ( 18 ) Finalmente, o método pode ser resumidamente descrito através do diagrama mostrado na Figura 20. Utilizando os conceitos acima expostos foi possível implementar o código em Matlab® que possibilita a obtenção da distribuição ideal de circulação. È interessante ressaltar que, comparando-se com a esteira total estimada pelo programa NAVCAD®, a diferença de 3% é bastante pequena implicando que, embora o hélice da série não seja projetado especificamente para as condições de esteira, sua eficiência sob essas condições é bastante razoável. As distribuições de circulações podem ser vistas na Figura 21, mostrando que o mesmo possui maior carregamento próximo à 70% do raio. 0,03 0,025 Shipflow (viscoso) 0,02 Circulação Tubo de Pitot StarCCM Shipflow (potencial) 0,015 Águas abertas Figura 20 - Diagrama do método do TLS 0,01 O programa implementado foi utilizado para analisar o desempenho do hélice selecionado pelo programa NAVCAD® com as diferentes distribuições de esteiras apresentadas no item 4, adotando-se como requisito a máxima eficiência para a distribuição de cordas especificada. Os resultados obtidos são apresentados na Tabela 9 em que se pode observar uma eficiência em águas abertas de 0.74. Comparadas com este caso, todas as outras estima-tivas obtidas em campo de esteira não uniforme resultaram em eficiências menores, o menor valor associado ao maior coeficiente de esteira obtido a partir do software Shipflow®. 0,005 0 0,200 0,300 0,400 0,500 0,600 r/R 0,700 0,800 0,900 1,000 Figura 21 - Distribuições de circulações 6 – Conclusões O trabalho desenvolvido sugere uma metodologia de seleção e avaliação de hélices adaptados à esteira do navio. A partir do desenvolvimento das linhas do casco de um navio tanque tipo CNG, a seleção inicial do hélice é efetuada de maneira tradicional através do programa NAVCAD® e de um procedimento desenvolvido em planilha Excel®. Os resultados são comparados, a seleção, entretanto, gerada pelo programa. Devido à reduzida flexibilidade oferecida pelo uso exclusivo de series sistemáticas, o emprego de métodos numéricos como, por exemplo, o método de painéis vem aumentando e, com o objetivo de avaliar o programa recentemente adquirido, efetua-se uma comparação das curvas características, os resultados obtidos através do método de painéis mostrando-se bastante na faixa de operação usual dos propulsores. 9 O trabalho prossegue com a estimativa do campo de esteira através de métodos numéricos que comparados com resultados experimentais mostram adequada coerência. A partir da determinação das esteiras médias radiais, emprega-se a teoria da linha de sustentação para definir a eficiência máxima de um propulsor adaptado ao campo de esteira não homogêneo observando-se que, para o presente caso, a estimativa obtida através da metodologia tradicional fornece resultado bastante adequado. Finalmente, como próximos passos, espera-se obter resultados com o método de painéis para escoamento não-uniforme, aprimorar a estimativa da esteira a partir dos resultados de CFD e definir mudanças geométricas da pá em função de alterações na distribuição da curva de circulação. PADOVEZI, C. D.; GONÇALVES, A. L; UMEDA, C. H.; Projeto de hélices pela teoria da circulação, Relatório nº 31.221, IPT, 1993, 74 pags. 7 – Agradecimentos Os autores agradecem à FINEP e à PETROBRÁS pelo apoio fornecido através do projeto “Desenvolvimento de Sistemas Propulsivos de um Navio Tanque Ecológico”. 8 – Referências Bibliográficas ABBOT, I. H.; VON DOENHOFF, A. Theory of wing sections, Dover Publications, New York, 1959, 693 pags. CARLTON, J., Marine propellers and propulsion, Second edition, 2007, 525 pags. FERNANDES, A. C., Hélices pela teoria da circulação: um método de projeto, Dissertação de Mestado, Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, 1977, 128 pags. KERWIN, J. 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