Edição Atual - Faculdade de Educação

Transcrição

Edição Atual - Faculdade de Educação
Edição Atual
ANAIS
XXI SIMPÓSIO DE ESTUDOS E PESQUISAS DA
FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DE GOIÁS
Pedagogia e Psicologia: Formação e Identidade
Social
Volume I, NúmeroI. Goiânia: FE-UFG, 2013.
ANAI
S DO
SIMP
ÓSIO
DE
ESTU
DOS
E
PESQ
UISA
S DA
FACU
LDAD
E DE
EDUC
AÇÃ
O |1
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Goiânia – 2013
[Type text]
[Type text]
[Type text]
AUTORIZAMOS A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE
TRABALHO, POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA
FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
REFERÊNCIAS, REVISÃO GRAMATICAL E IDEIAS CONTIDAS NOS TRABALHOS
PUBLICADOS SÃO DE RESPONSABILIDADE DE SEUS AUTORES.
FICHA CATALOGRÁFICA
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
GPT/BC/UFG
XXI SIMPÓSIO DE ESTUDOS E PESQUISAS DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS – Pedagogia e Psicologia: formação e identidade
social, Goiânia, GO, 2013.
1011 p.
ANAIS – XXI SIMPÓSIO DE ESTUDOS E PESQUISAS DA FACULDADE DE EDUCAÇÃO.
Alessandra Oliveira Machado Vieira, Sheila Daniela Medeiros dos Santos, Wanderley J. Ferreira
Junior (orgs.)
1. Educação 2. Pedagogia 3. Psicologia 4. Formação 5. Identidade
REVISÃO PARCIAL
Dra. Orlinda Maria de Fátima Carrijo Melo
ARTE GRÁFICA
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Dra. Anna Rita Ferreira Araújo (colaboradora)
Dra. Alessandra Oliveira Machado Vieira
Dra. Sheila Daniela Medeiros dos Santos
Dr. Wanderley J. Ferreira Junior
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Reitor
Dr. Ed ward Madureira Brasil
Pró-Reitora de Pesquisa e Pós-Graduação
Dra. Divina das Dores de P. Cardoso
Pró-Reitora de Graduação
Dra. Sandramara Matias Chaves
Pró-Reitor de Extensão e Cultura
Dr. Anselmo Pessoa Neto
Diretora da Faculdade de Educação
Dra. Miriam Fábia Alves
V ice-diretora
Dra. Maria Margarida Machado
Coor d. do PPGE
Dra. Marília Gouvêa de Mir anda
V ice Coor d. PPGE
Dr. José Adelson Cr uz
[Type text]
[Type text]
[Type text]
COMISSÃO ORGANIZADORA
Alessandra Oliveir a Machado V ieira
Anna Rita Fer reira de Araújo
José Antunes Marques
Márcia Fer reira Tor res Pereira
Marilúcia Pereira do La go
Sheila Daniela Medeiros dos Santos
Sílvia Rosa da Silva Zanolla (Coor denadora)
Simei Araujo Silva
Vanessa Gabassa
Wander ley J. Fer reira Junior
Wander son Fer reira Alves
Colaborador: Fábio Lopes de Oliveira
Estagiária: Jakeline Elis Damacena Santos
(Acadêmica de Pedagogia)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
COMISSÃO CIENTÍFICA INTERNA
Dra. Alessandra O. M. Vieira
Dra. Marilúcia Pereira do Lago
Dra. Amone Inácia Alves
Dra. Miriam Bianca do Amaral
Dra. Angela C. B. Mascarenhas
Dra. Noêmia Lipovetsky
Dra. Anna Rita Ferreira Araújo
Dra. Nancy N. Lima Alves
Dra. Carime Rossi Elias
Da. Orlinda M. de F. Carrijo Melo
Dr. Cristovão Giovani Burgarelli
Dra. Rita Marcia M. Furtado
Dr. Domenico Uhng Hur
Dra. Sandra Valéria Limonta
Dr. Edmar A. Barra e Lopes
Dra. Sheila D. M. dos Santos
Dr. Fernando Lacerda Junior
Dra. Silvia Rosa da Silva Zanolla
Dr. Jadir de Morais Pessoa
Dra. Simei Araujo Silva
Dr. José Antunes Marques
Dra. Susie Amâncio G. de Roure
Dra. Karine Nunes de Moraes
Dra. Vanessa Gabassa
Dra. Lúcia Maria de Assis
Dra. Valdeniza Maria L. da Barra
Dra. Marcela Toledo F. de Almeida
Dr. Wanderley José F. Junior
Dr. Márcio Penna Corte Real
Dr. Wanderson Ferreira Alves
Dra. Maria de Fátima Teixeira
Barreto
Dra. Marília Gouvea de Miranda
COMISSÃO CIENTÍFICA EXTERNA
Dra. Alba Cristhiane Santana (UFG/FL)
Dra. Albertina Mitjáns Martinez (Unb)
Dr. Nelson Cardoso Amaral (IF/UFG)
Dra. Maria Claudia S. L. Oliveira (UnB)
Dr. Odair Sass (PUC/SP)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Dr. Sílvio D. O. Gallo (Unicamp)
Dr. Ulisses F. Araujo (USP – Leste)
Dra. Valéria A. Araújo (USP)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
SUMÁRIO
COMUNICAÇÕES ORAIS
GT 1 – CULTURA E PROCESSOS EDUCACIONAIS
A CIÊNCIA DIALOGANDO COM A ARTE
p. 28
Carina Diniz Rocha, Tula De Vito Franco, Sueli Teresinha de Abreu Bernardes
A COLONIALIDADE SOBRE O SURDO
p. 39
Karime Chaibue
A CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS EM ESCOLAS
PÚBLICAS
p. 49
Sonia Maria Rodrigues, Júlio Emílio Diniz Pereira
A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E A EDUCAÇÃO FÍSICA: LIMITES E
POSSIBILIDADES
p. 61
Marcos Jerônimo Dias Júnior
A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA EM SITUAÇÃO DE QUEIXA ESCOLAR: O
CONTEXTO DO SERVIÇO ESPECIALIZADO DE APOIO A APRENDIZAGEM
p. 71
Janaína Vieira Pinto, Diva Maria Moraes Albuquerque Maciel
A TRAJETÓRIA
CONHECIMENTO
DA
ARTE-EDUCAÇÃO
NO
BRASIL:
DA
TÉCNICA
AO
p. 83
“AS CRIANÇAS TEM DIREITO DE ESTUDAR, DE APRENDER, DE CANTAR E SONHAR
COM COISAS BOAS”: DIÁLOGO COM AS CRIANÇAS E SEUS DIREITOS
p. 95
Sueli Heloisa Doriguetto Ferreira, Marcelo Silva, Sueli Teresinha de Abreu Bernardes
Milna Martins Arantes, Acácia Aparecida Bringel
AVALIAÇÃO E CURRÍCULO: EM BUSCA DA REALIDADE COMO PRÁTICA DE
MEDIAÇÃO
p. 107
Adicélia Francisco Duarte Alves
DANÇA E EDUCAÇÃO INTEGRAL: DIÁLOGOS ENTRE ARTE E ENSINO NA
CONSTRUÇÃO DE SUJEITOS
p. 118
Paulo Henrique Alves de Souza, Renato Ribeiro Rodrigues
DANÇAS MIDIÁTICAS E ESCOLA: POSSIBILIDADES DE ENSINO E APRENDIZAGEM
PELA PEDAGOGIA HISTÓRICO CRÍTICA
p. 130
Renato Ribeiro Rodrigues, Paulo Henrique Alves de Souza
EDUCAÇÃO E GOVERNO DA INFÂNCIA: PROCEDIMENTOS ESTÉTICOS E ÉTICOS
NO CINEMA
p. 142
Yonara Karolliny Plácido Cintra, Jessica Carneiro Gonçalves, Luiza Pereira Monteiro
EDUCAÇÃO, CULTURA E TORCIDAS ORGANIZADAS: ANÁLISE DO POTENCIAL
(DE)FORMATIVO DO FUTEBOL CONTEMPORÂNEO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 151
Luís César de Souza, Sílvia Rosa da Silva Zanolla
EXPERIMENTO
DIDÁTICO
FORMATIVO:
INVESTIGANDO
POSSIBILIDADE PARA A APRENDIZAGEM DA ARTE NA ESCOLA
UMA
p. 161
Ana Rita da Silva, Beatriz Aparecida Zanatta
INFÂNCIA E ARTE
p. 172
André Barcellos Carlos de Souza
MUCAMBO DE BAIXO, UM QUILOMBO CONTEMPORÂNEO?
p. 182
Edson Carvalho de Souza Santana
O ESCOLAR SURDO E SUAS DIMENSÕES
MUSICOTERAPÊUTICA COMO INTEGRAÇÃO
CONSTITUTIVAS:
A
ESCUTA
p. 196
O FLORESCER DO IPÊ: A DIGNIDADE E CIDADANIA DOS VELHOS TRANSFORMADA
PELA EDUCAÇÃO NO ESTADO DO TOCANTINS
p. 207
Marcus Vinicius Alves Galvão, Sandra Rocha do Nascimento, Soraya Bianca Reis Duarte
Natália Belo Moreira, Luiz Sinésio Silva Neto, Jocyléia Santana dos Santos, Neila Barbosa Osório
O JOVEM E A FAMÍLIA: OS ESTUDANTES QUE INGRESSARAM POR MEIO DO
PROGRAMA UFGINCLUI
p. 218
Marylia Glenda Lopes de Sousa, Edna Mendonça Oliveira de Queiroz
PROPAGANDA: IMPLICAÇÕES DA PUBLICIDADE NA FORMAÇÃO DE VALORES NA
INFÂNCIA
p. 229
Humberto Rocha de Souza, Maria Nalva R de Araujo
REFORMULAÇÃO CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO NO ESTADO DE GOIÁS: ALÉM
DE TUDO, UM PROCESSO IDENTITÁRIO!
p. 239
Vinícius Duarte Ferreira, Sérgio Pereira da Silva
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS EM DIREITOS HUMANOS A PERCEPÇÃO DOS
PROFESSORES DE ANÁPOLIS-GOIÁS
Christiane de Holanda Camilo, Rosani Moreira Leitão
SEXUALIDADE: O TRABALHO DO EDUCADOR FRENTE À EDUCAÇÃO INFANTIL
p. 250
p. 262
Luana Jane Assis e Silva Martins, Renata Magalhães Naves, Halline Mariana Santos Silva
GT 2 – EDUCAÇÃO, TRABALHO E MOVIMENTOS SOCIAIS
A EDUCAÇÃO COMO FENÔMENO SOCIAL
p. 274
Nayara Lopes Botelho, Claudemir Figueiredo Pessoa
A EDUCAÇÃO DO BRASIL E DA ESCOLA BRASILEIRA NASCEM DA MAQUINAÇÃO:
TEORIA DA PRÁTICA DO SISTEMA DE ENSINO BRASILEIRO DE 1930 A 1980
p. 284
Álcio Crisóstomo Magalhães
A ESCOLA DA VIDA: MEMÓRIAS ESCOLARES DE ASSENTADAS RURAIS
Amone Inacia Alves
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 296
AVALIAÇÃO EM TURMAS MULTISSERIADAS: ONDE ESTÃO SUAS PROPOSTAS?
Fernanda Alves de Oliveira, José Paulo Pietrafesa
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 307
EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL OU CONSERVAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL:
UMA REFLEXÃO SOBRE A EDUCAÇÃO E O TRABALHO NO PROGRAMA MAIS
EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA BOURDIENIANA
p. 317
Núbia Martins Gonzaga, José Adelson da Cruz
IDENTIDADE POLÍTICA E A EDUCAÇÃO NO SISTEMA CAPITALISTA: TENSÕES E
CONFLITOS
p. 329
Kamylla Pereira Borges
MOVIMENTOS SOCIAIS: ORGANIZAÇÃO COLETIVA PARA A CONQUISTA DA
TERRA, PERMANÊNCIA E QUALIDADE DE VIDA NO CAMPO
Queina Lima da Silva, Cleonice Ferreira dos Santos, Nilza da Silva Martins
OS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO E SUA TRAJETÓRIA DE LUTA PELA
EDUCAÇÃO
p. 339
p. 350
Cleonice Ferreira dos Santos, Queina Lima da Silva, Nilza da Silva Martins
GT 3 – ESTADO E POLÍTICA EDUCACIONAL
AVALIAÇÃO NA DIMENSÃO ESCOLAR E O CURRÍCULO
p. 363
Caroline Araújo de Souza, Sheilla Martins Rosa e Lúcia Maria de Assis
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: PERFIL DOS ALUNOS ATENDIDOS PELA REDE
PÚBLICA ESTADUAL DE ENSINO DE URUAÇU – GO
p. 373
Camila Costa de Oliveira Teixeira Álvares, Irani Camilo de Souza Silva e Marcilene Dias Bruno de
Almeida
EDUCAÇÃO INFANTIL EM CATALÃO (GO): INDICADORES DE ACESSO E
CONDIÇÕES DE OFERTA
p. 385
Altina Abadia da Silva, Elma Valéria Lopes e Maisa Pires Pacheco
ENSINO SUPLETIVO EM GOIÁS
p. 395
Danielly Cardoso da Silva e Maria Margarida Machado
INFÂNCIA E EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES RACIAIS
p. 406
Neusani Oliveira Ives e Wilma de Nazaré Baía Coelho
O PROCESSO DE CRIAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO E EXPANSÃO DO CAMPUS JATAÍ DA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
p. 417
Aline Cristina Soares Pereira e Márcia Santos Anjo Reis
POLÍTICA DE IMPLEMENTAÇÃO DAS DIRETRIZES PARA EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO RACIAIS E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA AFRICANA E
AFRO-BRASILEIRA NA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE GOIÂNIA
p. 428
Marcilene Pelegrine Gomes, Warlúcia Pereira Guimarães e Adriane Camilo Costa
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS: DESAFIOS, DILEMAS E PERSPECTIVAS
Renata Ramos da Silva Carvalho e Nelson Cardoso Amaral
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 439
[Type text]
[Type text]
[Type text]
GT 4 – FORMAÇÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE
A CONCEPÇÃO DO SER PROFESSOR:
PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE
APORTES
DA
FORMAÇÃO
E
p. 453
Suelaynne Lima da Paz
A FORMAÇÃO DOS PROFESSORES EM LÍNGUA INGLESA: UM OLHAR REFLEXIVO
p. 465
Káritha Andrade Cavalcante, Bruno Augusto de Souza e Francisco Edilson de Souza
A IMPLEMENTAÇÃO DA LEI Nº 11.645/2008 NAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO DE
CRIXÁS-GO
p. 474
Lídia da Silva Cruz Ribeiro
A PÓS-GRADUAÇÃO LATO-SENSU NA UEG E A FORMAÇÃO PARA A DOCÊNCIA
UNIVERSITÁRIA
p. 484
Valdirene Alves de Oliveira
ABORDAGENS CONTEMPORÂNEAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES:
PESQUISA COMO PRINCÍPIO ARTICULADOR DA RELAÇÃO TEORIA E PRÁTICA
A
p. 497
Luelí Nogueira Duarte e Silva
CONCEPÇÃO DE LINGUAGEM PARA FORMAÇÃO DE LEITORES E ESCRITORES
p. 506
Wanessa Cristina Manhente Rocha, Keila Matida de Melo e Carime Rossi Elias.
CONTRIBUIÇÕES DA FENOMENOLOGIA DE HEIDEGGER À FORMAÇÃO DE
PEDAGOGOS- PROFESSORES - FORMAÇÃO PROFISSIONAL EM ESTÁGIO
p. 519
Patrícia Medina
DESAFIOS E PERSPECTIVAS DA FORMAÇÃO DOCENTE: UM OLHAR SOBRE O
PIBID
p. 530
Carmem Lucia Artioli Rolim
EDUCAÇÃO DA CRIANÇA NA ABORDAGEM ESCOLANOVISTA:
APROXIMAÇÕES AO PENSAMENTO DE LOURENÇO FILHO
PRIMEIRAS
p. 540
Ivone Garcia Barbosa, Nancy Nonato de Lima Alves e Telma Aparecida Teles Martins Silveira
EDUCAÇÃO INTEGRAL NA ESCOLA DE TEMPO INTEGRAL: DA PROPOSTA DE
ANÍSIO TEIXEIRA ATÉ OS DIAS ATUAIS
p. 551
Sandra Almeida Ferreira Camargo
ENSINO E APRENDIZAGEM NO TEMPO-ESPAÇO DAS ESCOLAS DE TEMPO
INTEGRAL
p. 562
Sandra Valéria Limonta
ESTÁGIO E PRÁTICA DOCENTE EM GEOGRAFIA: O INÍCIO DE UMA LONGA
JORNADA
p. 573
Bruno Augusto de Souza, Káritha Andrade Cavalcante e Janes Socorro da Luz
INTERVENÇÃO NA IDENTIDADE
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
PROFISSIONAL
DOCENTE
VISANDO
A
p. 582
O ENSINO DA CULTURA AFRO-BRASILEIRA NA ESCOLA PRESIDENTE TANCREDO
NEVES NO MUNICÍPIO DE BARROLÂNDIA/TOCANTINS
p. 594
Raquel Antunes Scartezini, Terezinha de Camargo Viana, Carles Monereo Font
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Marina Grigório Barbosa de Sousa e Jocyléia Santana dos Santos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O PROUCA – PROGRAMA UM COMPUTADOR POR ALUNO NO ESTADO DE GOIÁS
p. 605
Sebastião Pereira dos Santos e Mirza Seabra Toschi
PARADIGMAS
PROFESSORES
DE
CIÊNCIAS
NAS
PRODUÇÕES
ACADÊMICAS
SOBRE
p. 616
Dagmar Dnalva da Silva Bezerra e Ruth Catarina Cerqueira Ribeiro de Souza
POLITICAS PÚBLICAS E UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
p. 628
Vanessa Nunes da Silva e Isabel Cristina Auler Pereira
REFLEXÕES SOBRE AS TECNOLOGIAS DA COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO E
SUAS IMPLICAÇÕES NA EDUCAÇÃO A PARTIR DA TEORIA HISTÓRICO CULTURAL
p. 640
Maria Aparecida Candine de Brito e Beatriz Zanatta
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS
EM PROJETOS
INTERDISCIPLINARES: UM ESTUDO DE CASO NO CURSO DE PUBLICIDADE E
PROPAGANDA DA UNIUBE
Karla de Almeida Borges e Vania Maria de Oliveira Vieira
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS DOS ALUNOS DOS CURSOS DE PEDAGOGIA E
MATEMÁTICA, NA MODALIDADE PRESENCIAL E A DISTÂNCIA, SOBRE UMA “BOA
PRÁTICA PEDAGÓGICA”
p. 650
p. 661
Vania Maria de Oliveira Vieira, Camilla de Oliveira Vieira, Carmélia
GT 5 – FUNDAMENTOS DOS PROCESSOS EDUCATIVOS
A EDUCAÇÃO E A PEDAGOGIA NA TRANSIÇÃO DA MODERNIDADE PARA
CONTEMPORANEIDADE: DA ESCOLA CARTESIANA À ESCOLA CRIATIVA
p. 674
Edna Maria Cruz Pinho e Maria José de Pinho (orientadora)
A MITIFICAÇÃO DA RAZÃO E O ESCLARECIMENTO DO MITO: ENREDAMENTOS E
TESSITURAS DIALÉTICAS
p. 686
Cynthia Maria Jorge Viana
A SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO EM LUIZ PEREIRA – INTELECTUAIS E PADRÕES DE
CIENTIFICIDADE ENTRE AS DÉCADAS DOS ANOS DE 1950 E 1960.
p. 696
Núbia Ferreira Ribeiro
AÇÕES AFIRMATIVAS NO ENSINO SUPERIOR: APONTAMENTOS DE UM ESTUDO.
p. 710
Eduarda Assis Castro, Paula Fernandes de Assis Crivello Neves e Gina Glaydes Guimarães de Faria
EDUCAÇÃO E ESCOLA À LUZ DO PENSAMENTO ARISTOTÉLICO: A FINALIDADE
DA VIDA HUMANA, O PRAZER E O TEMPO LIVRE.
p. 720
Luciene Maria Bastos, Ildeu Moreira Coêlho
MODERNIDADE, TRABALHO E INDIVÍDUO: UM ESTUDO DA CONSTITUIÇÃO DO
SUJEITO ALIENADO.
p. 731
Sara Lilian de Queiroz Silva
MODOS DE PENSAMENTO DE ADULTOS EM PROCESSO DE ESCOLARIZAÇÃO NA
EJA: CONTRIBUIÇÕES DA PSICOLOGIA HISTÓRICO.
Ana Catharina Mesquita de Noronha, Leôncio José Gomes Soares e Maria de Fátima Cardoso
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 742
Gomes
O PROCESSO FORMATIVO EM ROUSSEAU.
p. 753
Kátia Braga Arruda Silva
SENTIDO DA FILOSOFIA NA FORMAÇÃO DOCENTE.
p. 761
Jéssica Nayara Silva Leite Tavares
SOBRE DOCÊNCIA E SERVIDÃO DAS PAIXÕES: MEDITAÇÕES ESPINOSANAS DO
AFETO À POTICA.
p. 770
Gisele Toassa
GT 6 – PROCESSOS PSICOSSOCIAIS
A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL NOS PLANOS DE CURSO DE FORMAÇÃO
DE PROFESSORES DA UFG
p. 781
Renata Linhares e Mona Bittar
AGRESSOR SEXUAL CONTRA CRIANÇA E ADOLESCENTE: PATOLOGIA OU
FENÔMENO SÓCIO
p. 790
Regina Magna Fonseca e Luiza Pereira Monteiro
ALMAS QUE SANGRAM. O SENTIDO DA CULPA
p. 801
Karina Mendonça Santos, Simone dos Santos Abadia e Luiza Pereira Monteiro (Orientadora)
ARTE E FORMAÇÃO: ELEMENTOS DE
UNIDIMENSIONAL EM HERBERT MARCUSE
RESISTÊNCIA
À
SOCIEDADE
p. 813
CRIANÇAS INSTITUCIONALIZADAS, FAMÍLIA E DIREITOS HUMANOS: UMA
TRÍADE A SER DEBATIDA.
p. 823
Daviane Rodrigues Ribeiro e Juliana de Castro Chaves (Orientadora)
Sheila Daniela Medeiros dos Santos
INDISCIPLINA, VIOLÊNCIA E MAL ESTAR NA EDUCAÇÃO
p. 834
Yara Magalhães dos Santos
INFÂNCIA: UM TEMPO SEM LUGAR
p. 845
Simone dos Santos Abadia, Luiza Pereira Monteiro e Karina Mendonça Santos
LINGUAGEM E DISCURSO: A CRIANÇA E A INFÂNCIA NO MOVIMENTO DOS
SENTIDOS
p. 856
Maria Aurora Neta
RELATO DE EXPERIÊNCIA EM PSICOLOGIA ESCOLAR
p. 868
Marcelo Marques Assis, Marina Magalhães David e Maria Betânia Gondim da Costa
GT 7 – PROCESSOS CLÍNICOS E ABORDAGENS DE ATENDIMENTO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A PSICOTERAPIA DIALÓGICA E SEUS BENEFÍCIOS À FORMAÇÃO HUMANA.
Denise Assis Fleury Curado e Ivana Orionte
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 882
PÔSTERES
GT 1 – CULTURA E PROCESSOS EDUCACIONAIS
A COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO SÓCIOCULTURAL DA CRIANÇA NA ARTE
INFANTIL
p. 895
Marconys Silva das Chagas, Alexandre Silva dos Santos Filho
EDUCAÇÃO ALÉM
APRENDIZAGEM
DOS
MUROS
ESCOLARES:
PALCO
DE
ENSINO
E
p. 902
Hugo de Carvalho Sobrinho, Denise Regina Costa da Silva Oliveira
EDUCAÇÃO ESTÉTICA DA INFÂNCIA
p. 908
Thais Gomes Silva, Francisca Queiroz de Paula Landim, Luiza Pereira Monteiro
EXPERIÊNCIAS NO PORTAL DO FÓRUM GOIANO DE EDUCAÇÃO DE JOVENS E
ADULTOS (EJA), NO GRUPO DE ESTUDOS DE EDUCAÇÃO DE ADOLESCENTES
JOVENS E ADULTOS (GEAJA) E NO FÓRUM DE EJA
p. 913
Maria do Rosário Teles de Farias, Maria Emilia de Castro Rodrigues
O TRATO DA PSICOMOTRICIDADE COM CRIANÇAS AUTISTAS: REFLEXÕES SOBRE
A PRÁTICA PEDAGÓGICA DO PROFESSOR DE EDUCAÇÃO FÍSICA
p. 919
Victor Hugo de Paiva Arantes, Álcio Crisóstomo Magalhães
GT 3 – ESTADO E POLÍTICA EDUCACIONAL
EVASÃO NO IFG CAMPUS URUAÇU A PARTIR DA PERSPECTIVA DOS DOCENTES
p. 926
Irani Camilo de Souza Silva
GT 4 – FORMAÇÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE
A EXPERIÊNCIA DE PARTICIPAÇÃO DE ESTUDANTES DE PEDAGOGIA EM GRUPOS
DE PESQUISA: A FORMAÇÃO DO PROFESSOR-PESQUISADOR
p. 932
Ana Claudia Santos Silva e Fátima Teresa B. Branquinho
ARTES VISUAIS E TECNOLOGIA: POSSIBILIDADES PEDAGÓGICAS PARA O ENSINO,
A CRIAÇÃO E A APRECIAÇÃO
p. 938
Jhon Maykel Fernandes
CONSTITUIR-SE PROFESSOR (A) DE QUÍMICA: UMA ANÁLISE DAS CONDIÇÕES E
DESAFIOS PARA PROFESSORES DA REDE ESTADUAL DE EDUCAÇÃO E ALUNOS
EGRESSOS DO IFG – LUZIÂNIA
Arcedino de Moura Lucas e Cleberson Pereira Arruda
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 945
LIMITES DA DISCUSSÃO SOBRE OS ESTATUTOS DO CONHECIMENTO BIOLÓGICO
EM AULAS DE BIOLOGIA NO ESTÀGIO DOCÊNCIA
p. 954
2Rosa Gonçalves
GT 5 – FUNDAMENTOS DOS PROCESSOS EDUCATIVOS
CAMINHOS E POSSIBILIDADES METODOLÓGICOS DA MÚSICA NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
p. 961
Cleicianne Barreira Araújo
FORMAÇÃO E ÉTICA NA PRÁTICA PEDAGÓGICA
p. 969
Icaraí Daiane Santana Mara Analu Bueno (Orientadora)
NÚCLEO DE APOIO PSICOPEDAGÓGICO – UFG/CAMPUS JATAÍ: UMA TRAJETÓRIA
EM CONSTRUÇÃO.
p. 976
Sinara Rosa Carvalho e Silva Aurélia Magalhães de Oliveira Souza e Ellen Kelúbia Gonçalves Silva
A PRODUÇÃO DE TEXTO NA SALA DE AULA
p. 980
Marly dos Santos Almeida
GT 6 – PROCESSOS PSICOSSOCIAIS
EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO EM LICENCIATURA DE PSICOLOGIA: REFLEXÕES E
DESAFIOS
p. 989
Amanda Cristina Fonseca Palla, Anna Karollina Silva Alencar, Margareth Nascimento de Sousa Lira
e Jordana de Castro Balduíno(Orientadora)
GRUPOS DE REFLEXÃO COM PAIS: UMA CONSTRUÇÃO COLETIVA MEDIADA PELA
PSICOLOGIA ESCOLAR
p. 995
Klênio Antônio Sousa, Liliane dos Guimarães Alvim Nunes, Cláudia Silva de Souza e Lucianna
Ribeiro de Lima
INTERVENÇÕES GRUPAIS COM ADOLESCENTES EM LIBERDADE ASSISTIDA.
Lucas Rossato, Ivan Duarte Brochado e Tatiana Machiavelli Carmo Souza
[Type text]
[Type text]
[Type text]
p. 1004
Apresentação
Apresentamos os Anais do XXI Simpósio da Faculdade de Educação da
Universidade Federal de Goiás, realizado entre os dias 18 e 21 de junho de
2013, em Goiânia, que se propôs a debater o tema Educação e Psicologia:
formação e identidade social. A proposta do Simpósio visou contribuir com o
esforço de estabelecer uma interlocução entre a Psicologia e a Pedagogia,
respeitando e explorando suas especificidades teóricas, epistemológicas e práticas.
Ao se considerar que os cursos de Pedagogia e Psicologia encontram-se abrigados
no interior da Faculdade de Educação e que a relação entre professores e alunos
reflete experiências específicas e interdisciplinares e, ainda, que esses sujeitos
convivem cotidianamente em um mesmo espaço de estudo e trabalho, torna-se
necessário incentivar reflexões e ações que visem enfrentar suas eventuais
contradições e estabelecer interlocuções de modo propositivo.
Um dos principais objetivos do evento foi envolver, de um modo intenso,
professores e alunos de ambas as áreas, para, em conjunto, materializarem o
princípio primeiro de estreitar um diálogo substantivo, cuja referência é o debate
acadêmico qualificado. Longe de propugnar por uma relação de caráter
conciliatória entre Pedagogia e Psicologia, a proposta da Comissão do Simpósio
de 2013 refletiu a tentativa de promover uma verdadeira experiência no sentido
amplo, ação efetivamente coletiva, considerando desafios específicos de cada
área; consistiu no objetivo de combater o esmorecimento acadêmico que não raras
vezes se manifesta pela intolerância ao debate crítico e ao diálogo.
A primeira edição do Simpósio ocorreu no ano de 2001, em substituição ao
evento científico intitulado Semana da Faculdade de Educação, que era
realizado desde 1991. A mudança de designação deveu-se à ampliação do
encontro, que passou a assumir uma dimensão nacional, ao reunir participantes e
conferencistas procedentes não apenas de Goiás, mas também do Distrito Federal,
Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Tocantins, Rio de
Janeiro e São Paulo.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em 2006, com a criação do curso de Psicologia na Faculdade de Educação,
as edições do Simpósio ganharam uma dimensão ainda maior aprofundando as
discussões no âmbito da Psicologia e da Educação, como áreas independentes,
mas que se relacionam. Os dados estatísticos contidos nos relatórios dos
Simpósios precedentes registram uma média de 1180 inscrições e mostram um
conjunto de participantes formado por professores do ensino básico das redes
municipal, estadual e privada; professores do ensino superior das universidades
públicas e particulares; estudantes de graduação e de pós-graduação,
pesquisadores e profissionais da Educação, da Psicologia e de outras áreas do
conhecimento.
Pesquisadores renomados já estiveram presentes nos eventos anteriores,
dentre os quais se destacam: Acácia Kuenzer, Bernard Charlot, Dalila A. Oliveira,
Gaudêncio Frigotto, Ignácio Dobles, Kazumi Munakata, José Leon Crochik,
Leandro de Lajonquière, Luiz Fernandes Dourado, Olgária Matos, Maria Inês
Assumpção Fernandes, Demerval Saviani, Miriam Warde, Ildeu M. Coelho,
Newton Duarte, José Carlos Libâneo, Odair Sass, Ricardo Antunes, Sônia Leite,
Valdemar Sguissardi, Vitor Paro, e outros.
Trata-se de um convite à reflexão em torno de temas que são da maior
relevância e para os quais a Faculdade de Educação, mais uma vez, teve o prazer
de acolher um público bastante diversificado: alunos das licenciaturas, professores
da educação básica e do ensino superior, pós-graduandos e profissionais de
diversas áreas. Este ano, o quadro de programação do evento contou com a
apresentação de 134 trabalhos entre conferências (3), minicursos (31), mesas
redondas (05), comunicações de pesquisas (78) e pôsteres (17).
Refletindo a dimensão da diversidade de reflexões sobre o tema proposto,
encontram-se reunidos nesses Anais, os trabalhos completos referentes às
Comunicações e aos Pôsteres, organizados e publicados conforme os sete eixos
temáticos: Cultura e Processos Educacionais; Educação, Trabalho e Movimentos
Sociais; Estado e Política Educacional; Formação e Profissionalização Docente;
Fundamentos dos Processos Educativos; Processos Psicossociais; Processos
Clínicos e Abordagens de Atendimento.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Consideramos que os conhecimentos veiculados no XXI Simpósio possam
contribuir com o debate e a compreensão das questões fundamentais que
envolvem pedagogos e psicólogos na sociedade contemporânea, para tanto,
contamos mais uma vez com a presença de destacados pesquisadores de algumas
das principais universidades do Brasil e do exterior.
Tendo em vista o constante desafio do debate critico diante dos problemas
fundamentais que emergem dessas duas áreas, permanece o nosso convite para
essa discussão, instigadora de novas reflexões acadêmicas e sociais.
Comissão Organizadora
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Programação
Dia 18/06/2013 (Terça - Feira)
16h - 19h – Credenciamento
18h30min. - 18h45min. – Apresentação Artística - Projeto Canções do
Bem
18h45min. - 19h15min. – Abertura Oficial
19h15min. - 22h – Conferência I
Pedagogia e Psicologia – formação e identidade social
Dr. José Leon Crochik (USP)
Dr. Antonio Joaquim Severino (USP)
Coord. Profa. Dra. Sílvia Rosa da Silva Zanolla
Local: Auditório da Faculdade de Educação
Dia 19/06/2013 (Quarta - Feira)
7h30min. - 13h30min. – Credenciamento
9h - 9h15min. – Apresentação Artística - Grupo Dona Flora
9h15min. - 12h – Conferência II
Pesquisa e Política de Pós-Graduação: Pedagogia e
Psicologia em debate
Dr. Oswaldo Yamamoto (UFRN)
Dr. João Ferreira Oliveira (UFG)
Coord. Profa. Dra. Marília Gouvêa de Miranda
Local: Auditório da Faculdade de Educação
Comunicações Orais
14h - 15h30min. – Sessão 1 Gt’s
[Type text]
[Type text]
[Type text]
16h - 17h30min. – Sessão 2 Gt’s
Local: Faculdade de Educação
19h - 22h – Conferência III
Educação, Pedagogia e Psicologia – formação e
identidade social
Dr. José Carlos Libâneo (PUC/GO)
Dra. Ana Mercês Bahia Bock (PUC/SP)
Coord. Profa. Dra. Sandra Valéria Limonta
Local: Auditório da Faculdade de Educação
Dia 20/06/2013 (Quinta – Feira)
8h - 9h – Sessão de Pôsteres
Local: Pátio da FE/UFG
Gt´s, Núcleos e Grupos de Pesquisas
Local: Faculdade de Educação
9h15min. - 12h – Mesa Redonda I
Identidade e formação profissional no campo da
Pedagogia
Dra. Marilene Proença R. De Souza (USP)
Dra. Iria Brzezinski (PUC/GO)
Coord. Prof. Dr. Wanderley J. Ferreira Júnior
Local: Auditório da Faculdade de Educação
14h - 17h – Minicursos
Local: Auditório da Faculdade de Educação
17h - 17h30min. – Apresentação Cultural - Uma vida em oito
tempos/APAE
17h - 19h – Lançamento de livros
Coord. Profa. Ms. Márcia Ferreira Torrres Pereira e Prof. Dr. Wanderley J.
Ferreira Júnior
Local: Pátio da FE/UFG
[Type text]
[Type text]
[Type text]
19h - 22h – Mesa Redonda II
Trabalho e Saúde
Dr. Sebastião B. Costa Neto (PUC/GO)
Dr. Paulo C. Zambroni de Souza (UFPB)
Coord. Prof. Dr. Wanderson Ferreira Alves
Local: Auditório da Faculdade de Direito
19h - 22h – Mesa Redonda III
O lugar da Faculdade de Educação na formação
docente da UFG
Dra. Maria Margarida Machado (UFG)
Dra. Sandramara Matias Chaves (PROGRAD/UFG)
Coordenador Prof. Dr. Márcio Penna Corte Real
Local: Auditório da Faculdade de Educação
Dia 21/06/2013 (Sexta – Feira )
8h - 11h – Minicursos
Local: Auditório da Faculdade de Educação
14h - 17h – Mesa Redonda IV
Cultura, infância e formação
Dra. Ivone Garcia Barbosa (UFG)
Dra. Angela M. C. Uchôa Abreu Branco (UnB)
Coord. Profa. Dra. Simei Araújo Silva
Local: Auditório da Faculdade de Educação
Mesa Redonda V
Trabalho docente e avaliação
Dr. Ildeu Moreira Coêlho (UFG)
Dr. Luiz Carlos de Freitas (UNICAMP)
Coord. Prof. Dr. Jadir de Morais Pessoa
Local: Auditório da Faculdade de Direito
17h - 18h – Avaliação e Encerramento
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Local: Auditório da Faculdade de Educação
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Minicursos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
MINICURSO ENCOMENDADO
CONVIDADO INTERNACIONAL
01
REFLEXÕES CRÍTICAS SOBRE A RECEPÇÃO DA
TEORIA DE VYGOTSKY PELAS COMUNIDADES
ACADÊMICAS INTERNACIONAIS
Emmanouil Dafermakis
Assistant Professor in
Epistemology of Psychology –
University of Crete – Greece
MINICURSOS APROVADOS
GT 1 – CULTURA E PROCESSOS EDUCACIONAIS
TÍTULO
MINICURSO
AUTOR
EMENTA
0
2
A TEORIA CRÍTICA
E AS
CONTRIBUIÇÕES
DE HERBERT
MARCUSE PARA A
EDUCAÇÃO
Paulo Sérgio
Gomes Soares
A Teoria Crítica na atualidade: racionalidade crítica e
racionalidade instrumental. Teoria Crítica e Educação:
contribuições de Herbert Marcuse para a Educação.
0
3
AS
REPRESENTAÇÕES
SOCIOCULTURAIS
DOS CERRADOS
NOS ESPAÇOS
ESCOLARES
Valney Dias
Rigonato
Caracterização geoecológica dos Cerrados. O processo de
modernização das áreas de Cerrados pela inserção dos mitos da
modernidade. Erosão da biodiversidade e dos saberes das
populações tradicionais. Iconografia das paisagens dos Cerrados.
O conceito de representações socioculturais a partir da
interpretação de desenhos temporais: ontem, hoje e amanhã. O
desenvolvimento de habilidades para o trabalho didático e
pedagógico nas áreas de ciências humanas escolares, em especial,
na Geografia Escolar.
0
4
AUTORIDADE E
FORMAÇÃO:
ENTRE A
PERFORMANCE
DO MITO E O
SUJEITO DO
Márcia Ferreira
Torres Pereira
Reflexões sobre as configurações do conhecimento como
expressão do sujeito coletivo. Sentido estético e político da
formação cultural. Especificidades da relação entre educação e
trabalho. Teoria crítica. Mitos gregos.
[Type text]
Liliane Barros
de Almeida
[Type text]
[Type text]
CONHECIMENTO
0
5
[Type text]
MÍDIAS, CULTURA
E FORMAÇÃO
Cleide
Aparecida
Carvalho
Rodrigues
[Type text]
Conceitos de mídias enquanto “meios de comunicação” e matriz
cultural. A cultura relacionada com sistema de significados, de
organização a imagem de uma organização e construção da
identidade. A formação humana envolve relações entre o formal e
informal, o visível e o invisível que se manifestam por meio das
linguagens do corpo, sejam elas intelectivas, físicas, emocionais
e/ou subjetivas.
[Type text]
06
07
CINEMA,
PSICANÀLISE E
EDUCAÇÃO: AS
VICISSITUDES DA
INFÂNCIA NO
FILME “O BALÃO
VERMELHO”
Sônia Maria
Rodrigues
DOCÊNCIA E
FORMAÇÃO EM
ADORNO
Estelamaris
Brant Scarel
Dispositivos estéticos do cinema. Procedimentos de análise
fílmica. Representação idealizada sobre a infância.
Glacy Q. de
Roure
Ana Carolina
Roure Malta de
Sá
Aproximação à história da Escola de Frankfurt bem como da
Teoria Crítica. Concepção de formação cultural em Adorno
com ênfase para a formação docente na sociedade capitalista.
Lívia Santos
Brisolla
08
EDUCAÇÃO E
BARBARIE:
DESAFIOS DA
EDUCAÇÃO DE
JOVENS E
ADULTOS NA
ESCOLA PÚBLICA
E NA EDUCAÇÃO
DAS PRISÕES
Nelson Carneiro
Júnior
A partir das reflexões realizadas por Theodor Adorno em seu
texto “Educação após Auschwitz”, minicurso pretende
apresentar discussões e metodologias pedagógicas a serem
usadas em turmas da educação de jovens e adultos em sala de
aula na tentativa de instigar a formação de seres humanos livres,
emancipados, esclarecidos e consciente dos direitos civis e
direitos sociais de toda a sociedade.
09
O TRATAMENTO
MORAL DOS
LOUCOS E A
EDUCAÇÃO:
PSIQUIATRIA E
PEDAGOGIA NO
NASCIMENTO DA
NOSSA
MODERNIDADE.
Eduardo
Sugizaki
Através de um confronto entre o projeto de educação de
Rousseau e a compreensão de educação no tratamento moral
dos loucos e sua explicitação filosófica em Kant, pretende-se
refletir sobre as diferenças entre o que se compreendia por
natureza humana, na Idade Clássica e o que se entende por
‘homem’, na nossa modernidade. Com base neste trabalho
histórico, pretende-se discutir a grande transformação que a
concepção de educação sofreu, na virada do século XVIII, para
mostrar em que sentido o projeto de educação de Rousseau não
tem mais como ser nosso.
10
SUBJETIVIDADE,
EXPERIÊNCIA E
(IN) AÇÃO NO
TEATRO DE
BECKETT E NA
TEORIA CRÍTICA
DE ADORNO E
MARCUSE
Yonara Dantas
de Oliveira
Drama moderno e realidade desumana. A falência da
linguagem. Existência pela inação. Teoria crítica: a revolução,
as guerras e a sociedade industrial. Inflexão em direção ao
sujeito. Formação cultural. Unidimensionalidade e aposta
política. O problema da violência e a irracionalidade do
coletivo. Crise da experiência e frieza. Educação, razão e
sensibilidade. Alternativas para a vida digna de ser vivida.
[Type text]
Maria Regina de
Silos Nakamura
[Type text]
[Type text]
GT 2 – EDUCAÇÃO, TRABALHO E MOVIMENTOS SOCIAIS
11
[Type text]
DIVERSIDADE
SEXUAL,
PRECONCEITO, OS
AVANÇOS DA
JUSTIÇA E SEUS
REFLEXOS SOCIAIS
Chyntia Aquino
da Costa
Barcellos
Milazzo
[Type text]
A proposta busca demonstrar aos docentes na área de Educação
os conceitos que norteiam a diversidade sexual, os avanços da
Justiça, o preconceito e os reflexos de tudo isso na atual
sociedade. Sobretudo, esta proposta visa capacitar o docente
para falar abertamente sobre o tema na construção de um mundo
mais justo, igualitário e livre de preconceito.
[Type text]
12
GRAMSCI E A
FORMAÇÃO DOS
TRABALHADORES:
A POSSIBILIDADE
DE UMA
CONSTRUÇÃO
CONTRA
HEGEMÔNICA
Cláudia Borges
Costa
A presente proposta traz o pensamento crítico pedagógico como
abordagem central, sua influência no campo acadêmico, bem
assim a contribuição na organização e luta dos movimentos
sociais que fizeram história no contexto brasileiro nas últimas
décadas do século XX, com repercussões até a atualidade. A
concepção de Antonio Gramsci foi escolhida como ferramenta
para pensar a formação escolar, sobretudo na modalidade da
Educação de Jovens e Adultos/EJA. Nessa ótica dialética, o
diálogo de Gramsci com Marx propõe reexaminar os espaços de
conhecimentos e práticas libertadoras para além da formação
escolar formal. A discussão dos intelectuais, a partir do
pensamento de Gramsci, revela-se como conceito fundamental
para a formação política dos trabalhadores jovens e adultos, isto
é, para a contribuição de uma proposta contra hegemônica na
construção do processo de transformação social.
13
TRABALHO E
EDUCAÇÃO
Caio Antunes
Este minicurso tratará das categorias trabalho e educação,
conforme concebidas no interior da tradição marxista, e
objetiva, a partir das formulações teóricas de Marx, Lukács e
Mészáros, apresentar didaticamente e discutir as relações
históricas e ontológicas que se estabelecem entre tais categorias,
uma vez que estas são, para esta vertente teórica, centrais no
processo de produção e reprodução social da humanidade e,
portanto, igualmente centrais em um processo emancipatório.
14
A FORMAÇÃO
SOCIAL DO
INDIVÍDUO
Nildo Silva
Viana
O indivíduo como ser social. A formação social do indivíduo. O
indivíduo na sociedade e a sociedade no indivíduo. A
socialização do indivíduo: família, escola, trabalho. A
ressocialização do indivíduo. A autonomia relativa e
singularidade psíquica do indivíduo. Identidade individual e
social. Indivíduo e classe social. Indivíduo e movimentos
sociais.
GT 3 – ESTADO E POLÍTICA EDUCACIONAL
15
[Type text]
CONTEMPORANEIDADE
E TEORIAS PÓSCRÍTICAS DO
CURRÍCULO
Cleberson Pereira
Arruda
[Type text]
Teorias Pós-Críticas do Currículo e as questões
contemporâneas da Educação: espaço de discussão
e propostas.
[Type text]
GT 4 – FORMAÇÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE
16
A GESTÃO NA ESCOLA
EM TEMPO INTEGRAL
Izabel Cristina Leal
Marta Maria da Silva
Anne Cristina Camilo de
Oliveira
17
18
19
A IMPORTÂNCIA DO
ESTÁGIO NA
FORMAÇÃO DA
IDENTIDADE
PROFISSIONAL
DOCENTE
Sylvana Oliveira
Bernardi Noleto
A ORGANIZAÇÃO DO
TRABALHO
PEDAGÓGICO E A
AVALIAÇÃO DA
APRENDIZAGEM NA
EDUCAÇÃO BÁSICA
Alcir Horácio da Silva
O minicurso tratará do exame e da crítica da
situação atual da escola brasileira, para que, a partir
das contradições presentes nela, possam ser
apresentadas propostas para alterar a cultura
pedagógica da seleção, classificação e exclusão da
escola capitalista.
CONTOS DE FADAS:
ENTRE O
TRADICIONAL E O
MODERNO
Keila Matida de Melo
Costa
Histórico e estudo sobre os contos de fadas.
Autores de contos de fadas folclóricos e artísticos.
Característica dos contos de fadas. Análise de
contos de fada modernos. Os contos de fada nos
processos formativos.
Simone Magalhães
Vieira Barcelos
Kethullin
Trindade
Rezende
Luzia Bel Rosário Braga
20
DISCUTINDO AS
POSSIBILIDADES PARA
AÇÃO DOCENTE: A
ATIVIDADE DE ENSINO
EM FOCO
Wérica Pricylla de
Oliveira Valeriano
Naysa Crystine Nogueira
Oliveira
Rosélia José da Silva
carvalho
21
Este minicurso tem como objetivo apresentar e
discutir o papel da gestão na escola de tempo
integral, as concepções de gestão escolar e suas
repercussões no processo de melhoria da qualidade
de ensino.
EDUCAÇÃO PARA AS
RELAÇÕES ÉTNICORACIAIS NEGRAS:
Lídia da Silva Cruz
Ribeiro
A contribuição do estágio curricular na formação
da identidade profissional docente. A constituição
do espaço-tempo do estágio curricular como lócus
da relação teórico-prática para a formação docente.
A prática pedagógica supervisionada como
fundamento para a prática do trabalho docente.
O minicurso tem a intencionalidade de apresentar
aos participantes a Atividade Orientadora de
Ensino (AOE) como uma possibilidade de
orientação para a ação docente, tal prática
possibilita ao educador uma formação pautada na
práxis educativa. Elegendo a ludicidade e a história
virtual, compreendemos que a AOE permite que a
apropriação do conhecimento matemático extrapole
o desenvolvimento do raciocínio lógico
operacional. A discussão teórica fundamenta-se na
Teoria Histórico-cultural e na Atividade
Orientadora de Ensino, defendida por Moura como
sendo a atividade que respeita os diferentes níveis
dos indivíduos e que define um objetivo de
formação como problema coletivo.
Conceituações; O negro e a educação; Questões
legais, epistemológicas e metodológicas.
Jorge Manoel Adão
[Type text]
[Type text]
[Type text]
PENSANDO E
FAZENDO
22
23
24
ESCOLA DE TEMPO
INTEGRAL NO BRASIL:
HISTÓRIA, POLÍTICA E
TRABALHO
PEDAGÓGICO
Sandra Valéria Limonta
Neide da Silva Paiva
FORMAÇÃO DE
PROFESSORES E A
ALERGIA ALIMENTAR:
UMA ABORDAGEM
INCLUSIVA NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Gisella de Souza
Almeida
LÍNGUA BRASILEIRA
DE SINAIS – LIBRAS
Leandro Andrade
Fernandes
Adriane Camilo Costa
Marise Helena Cardoso
Tofoli
Valdirene Alves de
Oliveira
Kelly Francisca da Silva
Brito
Lucas Eduardo Marques
Santos
[Type text]
A escola de tempo integral no Brasil na história e
na política educacional. Concepções e políticas de
educação integral e escola de tempo integral – o
projeto educativo brasileiro para o Século XXI.
Organização, gestão e trabalho pedagógico na
escola de tempo integral: a experiência da SME
Goiânia.
Discussão ampliada sobre a inclusão e a formação
de professores para a Educação Básica, em especial
para a Educação Infantil, mediante a presença de
crianças com Alergia Alimentar. Abordagem da
temática numa perspectiva multiprofissional.
[Type text]
A Libras foi reconhecida legalmente através da lei
10.436 e decreto 5.626 a regulamenta, apresenta
uma estrutura linguística que lhe dá o corpus de
língua. A formação profissional e a disciplina
obrigatória são algumas das providencias que
ajudaram na escolarização do surdo. A escrita de
sinais é uma forma de garantir ao surdo o acesso à
língua.
[Type text]
25
O DESENVOLVIMENTO
DOS CONCEITOS
MATEMÁTICOS
ATRAVÉS DO LÚDICO
NA EDUCAÇÃO
INFANTIL
Laudelina Braga
Icaraí Daiane Santana
Norivan L. L. Dutra
Discutir as possibilidades didático-pedagógicas de
desenvolvimento dos conceitos matemáticos na
educação infantil a partir das brincadeiras infantis.
Explorar algumas práticas de brincadeiras
analisando sua contribuição para o
desenvolvimento dos conceitos matemáticos.
GT 5 – FUNDAMENTOS DOS PROCESSOS EDUCATIVOS
26
ADORNO: INDÚSTRIA
CULTURAL,
EDUCAÇÃO, INFÂNCIA
Simei Araújo Silva
Conceitos de ideologia, indústria cultural, educação
e de infância em Adorno. Contribuição da Teoria
Crítica da Sociedade para discutir o consumo
infantil na sociedade capitalista. O papel da
educação escolar e familiar na formação e
orientação da criança quanto ao consumo e a
ocupação de seu tempo livre.
27
A “ARTE” DE ENSINAR
A MONOGRAFIA E A
EXPERIÊNCIA
PROFISSIONAL NA
ESTEIRA DO
PROCESSO
FORMATIVO EM
CURSOS DE
LICENCIATURA
Marta de Paiva Macêdo
Monografia de conclusão de curso superior.
Normas formais e estratégias de ensino da
monografia. A aprendizagem mediada da
monografia.
28
EDUCAÇÃO
INCLUSIVA:
RE/SIGNIFICAÇÃO E
OS NOVOS DESAFIOS
AO TRABALHO
DOCENTE
Raclene Ataide de Faria
Legislação brasileira referente à educação de
pessoas com deficiência. Origem do processo de
inclusão escolar. Definição de inclusão escolar.
Acordos internacionais para a educação na
perspectiva da diversidade. Definição de
deficiência. O trabalho docente na perspectiva
inclusiva, o planejamento, a avaliação, as técnicas
de ensino e os recursos pedagógicos. Possibilidades
para o trabalho pedagógico na perspectiva da
educação inclusiva. O trabalho docente com
enfoque na diversidade
29
FORMAÇÃO HUMANA
E SOCIEDADE DO
ESPETÁCULO EM GUY
DEBORD
Weligton Rodrigues da
Paz
Compreender as implicações do mercado da
tecnologia e da cultura numa sociedade em que os
homens são cada vez mais expectadores que
sujeitos ativos. Trabalhar os conceitos de alienação,
fetiche, reificação e sociedade do espetáculo.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
GT 6 – PROCESSOS PSICOSSOCIAIS
3
0
LINGUAGENS
ALTERNATIVAS CAMINHOS PARA
COMUNICAÇÃO,
LETRAMENTO E
INCLUSÃO
Ana Beatriz Machado
de Freitas
Importância da linguagem no desenvolvimento
humano. Relevância dos recursos de comunicação
alternativa e/ou ampliada para a autonomia e
inclusão social das pessoas com deficiência.
Conhecimento de sistemas e recursos alternativos de
comunicação. Propostas interventivas de cunho
pedagógico a partir dos recursos estudados.
GT 7 – PROCESSOS CLÍNICOS E ABORDAGENS DE ATENDIMENTO
31
[Type text]
TERAPIA
COMPORTAMENTAL:
O USO DE
METÁFORAS,
FANTASIAS E
SONHOS NA
PRÁTICA CLÍNICA.
Ruth do Prado Cabral
Hellen Ormond de
Abreu
[Type text]
Fundamentos históricos, filosóficos e teóricos da
Terapia Comportamental. Processo de avaliação
terapêutica na prática clínica comportamental.
Aspectos relacionados à Relação Terapêutica, FAP
(Análise Funcional do Comportamento) e ACT
(Terapia de Aceitação e Compromisso). Discussão das
técnicas utilizadas na prática clínica comportamental,
incluindo especialmente metáforas, sonhos e fantasias.
[Type text]
Sessão - Comunicações Orais
[Type text]
[Type text]
[Type text]
[Type text]
[Type text]
[Type text]
GT 1 – CULTURA E PROCESSOS EDUCACIONAIS
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
A CIÊNCIA DIALOGANDO COM A ARTE
Carina Diniz Rocha
PIBID/Universidade de Uberaba - UNIUBE
[email protected]
Tula De Vito Franco
PIBID/Universidade de Uberaba - UNIUBE
[email protected]
Sueli Teresinha de Abreu Bernardes
REDECENTRO/PIBID/ Universidade de Uberaba - UNIUBE
[email protected]
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES
RESUMO
O objetivo deste relato de experiência é compreender a reprodução humana, abordando aspectos
anatômicos e fisiológicos do sistema genital masculino e feminino, por meio da arte e do
artesanato. Interagindo os saberes oriundos de diversas áreas como ciências, história, língua
portuguesa, geografia, relaciona conceitos científicos e a imaginação para criar um conhecimento
fundamental para alunos do 9º ano da Escola Municipal Santa Maria, em Uberaba-MG. Ao mesmo
tempo, forma discentes dos cursos de Licenciatura para realizar atividades pedagógicas
interdisciplinares na educação básica. O referencial teórico utilizado abrange Fazenda (2002, 2003,
2008), entre outros. Para alcançar o objetivo proposto, recorre-se a procedimentos que incluem a
observação da escola e da sala de aula, a realização de oficinas com a presença e análise conjunta
dos professores da escola básica e a discussão dos resultados no grupo das Pibidianas e com o
corpo docente. A partir dos conceitos sobre a reprodução humana, os alunos criaram expressões
artesanais do conteúdo estudado, após análise de obras de arte da Grécia antiga, nas quais o corpo
era enaltecido. Os resultados iniciais expressam que os alunos mostraram-se muito interessados
pelo tema, participaram ativamente das discussões, expondo seus pontos de vista, exercitando coresponsabilidade para uma vida cultural individual e coletiva sem preconceitos, além de
desenvolver habilidades artísticas por meio da intuição, sensibilidade, imaginação, percepção e
comunicação em um trabalho em equipe. A arte o artesanato foram trabalhados por meio de
diversas linguagens e possibilidades contribuindo para a desconstrução do olhar fracionado e
limitado para a arte nas dinâmicas interdisciplinares. Para os alunos, a atividade foi inovadora,
facilitando o aprendizado teórico, de modo a articular a arte com outros saberes. A partir da arte o
conhecimento foi construído, integrando com as ciências, aliando a teoria ao devaneio.
Palavras-chave: interdisciplinaridade; arte e educação; ciências.
INTRODUÇÃO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A atividade aqui relatada é interdisciplinar, desenvolvida por alunas de
cursos de Licenciatura na modalidade à distância da Universidade de Uberaba,
integrantes do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (PIBID).
Sua realização recebe o apoio do Ministério da Educação (MEC), Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Diretoria de Educação
Básica Presencial (DEB) e da Universidade de Uberaba (UNIUBE).
A equipe é composta por cinco Pibidianas, uma supervisora de uma escola
de educação básica, da rede municipal e é coordenada por uma professora do
Programa de Pós-Graduação em Educação.
Segundo Fazenda (2003, p.41) a interdisciplinaridade vai além de uma
simples abrangência de disciplinas, é um grande encontro de pessoas que desejam
ir além deste território, caminhando para um conhecimento que possa fazer
sentido para a história da humanidade. Um perfil interdisciplinar é um perfil
flexível, democrático, solidário capaz de enfrentar uma sociedade intransigente a
mudanças. Não existe nada suficientemente conhecido, estamos em constante
aprendizado e precisamos estar abertos ao conhecimento, à crítica, ao diálogo, à
comunicação, à interdisciplinaridade.
De acordo com Ferreira (2009, p.22) “ser interdisciplinar é saber que o
universo é um todo [...]”; interdisciplinaridade é uma atitude, isto é, a
externalização de uma visão holística de mundo. Hoje, a unidade e a totalidade do
universo exigem o repensar da ciência fragmentada e o significado de
interdisciplinaridade, considerado o prefixo “inter” como “troca” e disciplina,
“ciência”: Daí o ato de troca, de reciprocidade entre as áreas do conhecimento.
Este relato abrange atividades realizadas durante quatro meses envolvendo
os 3º e 4º bimestres de agosto a dezembro de 2012, contemplando alunos do 9º
ano do ensino fundamental da Escola Municipal Santa Maria no município de
Uberaba no estado de Minas Gerais.
A Escola Municipal Santa Maria foi fundada em 27 de maio de 1977. A
escola funciona no turno matutino, com o ensino fundamental II, do 6º ao 9º ano,
no vespertino, o Ensino Fundamental I e no noturno com o Ensino de Jovens e
Adultos – EJA, além de um curso de tempo integral.
A filosofia da escola é “Educar Cidadãos Críticos, Conscientes e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Participativos para a Transformação Social de uma Cidadania Plena e Eficaz”.
Sua infra-estrutura contempla, além das salas de aula, um moderno e amplo
ginásio de esportes, uma sala de multimídia, um laboratório de informática, uma
sala de arte, um pátio de recreação e as salas administrativas e de convívio
docente.
Há inúmeras atividades complementares como teatro, dança, aulas de
recuperação, festas escolares e uma fanfarra escolar.
Observa-se a participação intensa das famílias dos alunos e uma
administração dinâmica e dialógica. Os professores expressam um grande
envolvimento, apesar de trabalhar em mais de um turno de docência.
Localizada em um bairro residencial com boa infra-estrutura e próxima ao
centro da cidade, usufrui de uma vizinhança que abrange desde um shopping, a
escola de idiomas, clube desportivo, estabelecimentos comerciais, caracterizando
um bairro de classe média de maior poder aquisitivo. No entanto, recebe também
alunos da periferia que chegam até ela em ônibus escolares.
OBJETIVOS
A atividade aqui relatada tem como objetivo geral: formar discentes dos
cursos de Licenciatura para realizar atividades pedagógicas interdisciplinares na
educação básica, neste caso, envolvendo Ciências, a arte e o artesanato, e
proporcionar a construção de um conhecimento em um enfoque interdisciplinar;
contribuir para a formação continuada do decente da rede municipal.
Como objetivos específicos, se propôs compreender a reprodução humana,
abordando aspectos anatômicos e fisiológicos do sistema genital masculino e
feminino, por meio da arte e do artesanato, interagindo os saberes oriundos de
diversas áreas como ciências e história da arte, relacionando os conceitos
científicos e a imaginação para criar um conhecimento fundamental para alunos
do 9º ano da Escola Municipal Santa Maria, município de Uberaba-MG.
REFERENCIAL TEÓRICO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Considerando a dimensão do problema proposto, descrevemos um
percurso bibliográfico, onde procuramos dialogar com diferentes autores e
especialistas em assuntos como as perspectivas históricas e contemporâneas do
ensino da arte, o currículo da disciplina no ensino fundamental, a
interdisciplinaridade na educação e formação de professores da educação básica.
Algumas questões como conceito de interdisciplinaridade, qual a contribuição do
ensino da arte para alunos do ensino fundamental, qual conceito de arte para
alunos e professores de outras áreas do currículo do ensino fundamental, precisam
estar esclarecidas para melhor compreensão da proposta do projeto.
A interdisciplinaridade é um movimento ininterrupto, criando e recriando vários
pontos de discussão. Trabalhar de forma interdisciplinar é garantir uma interação
entre as disciplinas, incluindo métodos e conteúdos, numa ação conjunta, com um
objetivo determinado (FAZENDA, 2002, p.77).
Segundo Fazenda (1993) um projeto interdisciplinar não é ensinado, mas
sim vivenciado, exige a responsabilidade individual e ao mesmo tempo um
envolvimento com o projeto propriamente dito, com as pessoas e com as
instituições que fazem parte desse projeto. É essa prática do diálogo com outras
áreas do conhecimento que nos leva às relações e às conexões de ideias, fazendonos perceber, sentir e pensar de forma interdisciplinar, exigindo a necessidade de
transpor barreiras e a ousadia para inovar, criar e principalmente passar da
subjetividade para a intersubjetividade.
Projetos interdisciplinares possibilitam um grande envolvimento de todos
os que estão inseridos no processo ensino-aprendizagem, na prática cotidiana.
Esse envolvimento de todos torna possível uma reflexão mais efetiva sobre a
prática pedagógica, articulando as experiências realizadas com o contexto que
vivenciam. Trabalhar interdisciplinarmente requer esforço e mudança de atitudes
(FAZENDA, 2002, p.70).
A arte caminha na interdisciplinaridade, ambas estão intimamente ligadas.
Desse modo, é importante que o professor mantenha uma postura interdisciplinar
no ato de ensinar, apesar de conviver com a realidade do currículo fragmentado.
Definir arte é algo bem complexo, uma vez que o universo da arte é
bastante subjetivo e indefinido, impossibilitando um conceito efetivo e preciso. A
[Type text]
[Type text]
[Type text]
arte é única, singular e está sempre carregada de significados, é a realidade
percebida por pontos de vista diferentes, podendo agregar os aspectos racionais e
criativos do ser humano em um único ato (CRISTIANO, 2010, p.13).
Conhecer a história da arte é fundamental para poder escolher o que
ensinar aos alunos, para que os alunos compreendam que os trabalhos de arte não
existem isoladamente, mas relacionam-se com as ideias e tendências de uma
determinada época e local.
A arte está presente em diversas manifestações culturais, desde quando o
homem começou a compreender a realidade em que o cerca. A arte foi uma das
maiores formas de registros nas sociedades ágrafas. Depois, na antiguidade
clássica oriental e ocidental foi o meio que as civilizações encontraram para
registrar os acontecimentos do seu cotidiano e também como arte decorativa e
com predomínio de outras expressões artísticas, como o teatro, a dança, a
escultura, a pintura, a música, da arte literária. Depois, na Idade Média, as obras
artísticas tiveram temática religiosa. A igreja católica exerceu o controle sobre as
produções artísticas e culturais. Somente na renascença houve a revalorização da
antiguidade clássica e com influências no racionalismo e nos princípios
matemáticos. A partir do século XX a arte se fundamenta em transformações
educacionais, artísticas, estéticas e culturais, manifestadas espontaneamente e
muitas vezes autoexpressiva, valorizando a livre expressão e a sensibilidade
(BRASIL, 1998, p.21).
Na sociedade, a arte tem muitas funções, dentre elas a de integrar o
homem a sua natureza, capacitá-lo a estruturar sua personalidade e a intervir na
sua realidade, aumentando assim o seu horizonte e superando as limitações do
conformismo.
Para construir estes conceitos de arte no ambiente escolar é necessário
pensá-la como um instrumento a favor da cultura, instrumento este fundamental
não apenas dentro, como também fora da sala de aula, é uma forma diferente de
interpretar o mundo, a realidade e o imaginário (BARBOSA, 1991, p.4).
A partir de dezembro de 1996, após a promulgação da nova LDB, nº 9.394
o ensino da arte passou a ser componente obrigatório em todos os níveis da
educação básica, como forma de “promover o desenvolvimento cultural dos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
alunos”. Com esta Lei, o Ministério da Educação e Desporto (MEC), reformulou
os Parâmetros Curriculares Nacionais. E em 1998, passa a entender que:
[...] é característica desse novo marco curricular a reivindicação de
identificar a área por Arte (e não mais por Educação Artística) e de
incluí-la na estrutura curricular como área com conteúdos próprios
ligados a cultura artísticas, e não apenas como atividade (BRASIL,
1998, p.30).
Ainda segundo o mesmo documento:
[...] a atual legislação educacional brasileira reconhece a importância
da arte na formação e desenvolvimento de crianças e jovens incluindoa como componente curricular obrigatório da educação básica. No
ensino fundamental a Arte passa a vigorar como área de conhecimento
e trabalho com as várias linguagens e visa à formação artística e
estética dos alunos. A área de Arte, assim constituída, refere-se às
linguagens artísticas, como as Artes Visuais, a Música, o Teatro e a
Dança. (BRASIL, 1998, p.19).
O ensino da arte tem objetivo de apresentar aos alunos diferentes
possibilidades de aperfeiçoamento de saberes teóricos e práticos sobre a criação
artística, os quais surgem a partir de várias linguagens artísticas como artes
visuais, teatro, música, artes audiovisuais e a dança. Por meio destas linguagens a
disciplina de Arte proporciona aproximação do aluno com a sua própria natureza,
considerando a sua identidade pessoal, sua história e sua cultura, fazendo com que
ele compreenda como estes elementos podem se integrar na sociedade
(CRISTIANO, 2010, p.19).
DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES
Inicialmente as alunas envolvidas no projeto do Pibid realizaram estudos e
discussões sobre o tema interdisciplinaridade, Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN) Artes, por meio da internet, de livros, de vídeos, de periódicos e do acervo
da biblioteca da escola e da UNIUBE. Os recursos da internet foram utilizados em
todo o processo para pesquisa, interações e criação de textos.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em seguida, durante duas semanas, as pibidianas fizeram observações na
escola como um todo e em sala de aula nas diferentes disciplinas como ciências,
história, geografia e língua portuguesa, com objetivo de conhecer a interação dos
alunos e destes com os professores.
Após observações em sala de aula, reunimos e elaboramos um plano de
aula com tema “O ser humano e a reprodução”, envolvendo as disciplinas
ciências, história, geografia e língua portuguesa. Foram elaborados materiais
didáticos específicos, com o suporte de atividades em diferentes mídias, como
slides com imagens de esculturas do corpo humano, sobre o sistema reprodutivo
masculino e feminino e a apresentação de um vídeo sobre o estilo musical
“kuduro”. Os alunos receberam os materiais: cartolinas, lápis de cor, caneta
hidrográfica, giz de cera, lápis e borracha para a realização de atividade artística.
Após a explicação sobre a valorização do corpo humano, através de slides
ilustrando Grécia Clássica exemplificando o culto ao corpo, relação dos esportes
com o corpo humano, houve um debate com os alunos a respeito do tema.
Em seguida a sala foi dividida em trios. Cada trio recebeu o material
(cartolinas, lápis de cor, caneta hidrográfica, giz de cera, lápis e borracha)
distribuídos para a realização da atividade artística, abordando o sistema
reprodutivo masculino e feminino.
Por meio das criações dos alunos, foi explicada a anatomia do sistema
genital masculino: pênis, escroto, testículo, vesículas seminais, ductos deferentes,
próstata, glândulas bulbouretrais e do sistema genital feminino: vulva, clitóris,
hímen, ovários, tubas uterinas, útero, vagina, glândulas vestibulares maiores e
fisiologia do sistema genital, bem como a importância do corpo humano
abordando o aspecto físico como um todo. Durante a explicação os alunos
identificavam estruturas anatômicas e suas, respectivas funções, a partir de suas
criações artesanais e com consulta aos livros.
Após a atividade, realizou-se um diálogo com os alunos sobre o que eles
conheciam sobre a dança do “kuduro”, devido à repercussão que houve na mídia
por meio de uma telenovela que passava na época da atividade proposta. Os
alunos deram sua contribuição ao tema. Foi esclarecido que a dança é de origem
angolana praticada na periferia.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em seguida exibimos o vídeo da dança do “kuduro”, para demonstrar a
expressão artística corporal.
A partir de conhecimentos prévios, expressos por meio da arte e do
artesanato, os alunos relataram suas experiências sobre tema, tais como: culto ao
corpo, esportes, dança, higiene, prevenção de doenças, fisiologia e anatomia. A
avaliação empregada durante a atividade foi formativa.
A atividade proposta proporcionou um diálogo sobre o tema “o ser
humano e a reprodução”, expresso por meio da arte e do artesanato. Os alunos
puderam expressar suas opiniões, experiências sobre o tema proposto, ao mesmo
tempo em que foi salientado a desmistificação de mitos relativos à saúde do
corpo, enfatizando a prevenção quanto às doenças sexualmente transmitidas e aos
relacionados à sexualidade.
O processo foi analisado e discutido pelo grupo de Pibidianas e com a
professora e supervisora da escola.
ANÁLISE DOS RESULTADOS
Os alunos mostraram-se muito interessados pelo tema, percebeu-se que os
mesmos participaram ativamente das discussões, expondo seus pontos de vista
livremente.
De acordo com PCN Artes (1998, p. 40) [...] este tipo de atividade
desenvolve reflexão de maneira responsável com o corpo e a sexualidade. As
imagens corporais que estão presentes nas mídias (televisão, rádio, imprensa,
internet) expressam a exaltação de corpos “fortes, jovens, vigorosos” associados
frequentemente às manifestações artísticas, como às danças e novelas televisivas.
Fruto de modismos, essas maneiras de ver o corpo passam pela vida e se instalam
nas mentes sem que realmente se tenha uma atitude reflexiva em relação a elas.
Artistas exibindo seus corpos em danças, representações, marcam gerações e
impõem padrões corporais de beleza e, consequentemente, estabelecem valores
em relação à sexualidade, saúde, convívio sociais, raça, etnia, gênero entre outros.
Durante a atividade houve debate sobre conceitos e preconceitos entre as
semelhanças e diferenças nas preferências e nas rejeições relativas ao gosto e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
escolhas pessoais, tais como: vestuários, embelezamentos, manifestações
corporais, presentes na arte e no cotidiano.
A atividade interdisciplinar despertou o saber, a pesquisa, a descoberta
através da arte e do artesanato, além de apresentar em sala de aula um ambiente
muito agradável e prazeroso.
O projeto interdisciplinar do PIBID propiciou a compreensão dos
conteúdos curriculares, sobretudo o espaço pedagógico, constituindo uma maneira
oportuna de proporcionar o aprendizado, além de auxiliar na formação
profissional, por meio da troca de experiências pedagógicas, uma vez que o
projeto é formado por alunas de licenciatura de diversas áreas, Ciências, História,
Geografia e Língua Portuguesa.
A Escola Municipal Santa Maria incentiva a participação dos professores,
diretores, coordenadores para melhor desenvolvimento educacional, é muito
respeitada e conceituada na cidade, formada por uma equipe de educadores,
interessados em proporcionar um ensino de qualidade, que prepare o aluno para
exercer sua cidadania, agindo e transformando a realidade em que vivem. A
comunidade participou ativamente da atividade proposta apoiando o projeto a
estabelecer vínculos entre os conhecimentos escolares integrados à arte e os
modos de produção e aplicação desses conhecimentos na sociedade.
Os alunos demonstraram disponibilidade e receptividade à oficina. No
entanto, é comum a existência uma dúvida inicial por parte do professor da
disciplina sobre os resultados da atividade proposta. O encontro com o “novo”
suscita muitos questionamentos, um deles seria se todas as nossas antigas
experiências serão descartadas. Mas isso seria contradizer toda a atitude
interdisciplinar, pois não há necessidade de ruptura com o “velho”, apenas
revisitá-lo sempre que for preciso para uma análise crítica das múltiplas
perspectivas que compõem as experiências pedagógicas.
De acordo com Fazenda (2002, p. 63) “a humildade é um ato de força, de
quem se priva de demonstrar sua superioridade, procurando valorizar o próximo
que necessita de valorização ou de brilho, o que não conseguiria se o primeiro
fizesse valer sua superioridade”.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Analisando humildade como um das categorias da teoria da
interdisciplinaridade, o professor deve manter uma postura de abertura para novas
ideias e parcerias. Diante de tudo compreender que a realidade pode ser
questionada, superada, ou mesmo reformulada, dessa forma, haverá um constante
aprendizado.
O professor interdisciplinar busca ousadia, diálogo, disposição de
aprender, quebra paradigmas e no ato de humildade exerce reflexão, capacidade
crítica, criação e transformação de suas práticas pedagógicas.
Embora sejam visíveis que arte e ciência são domínios de conhecimento
humano e que interagem entre si, sabe-se que há um longo caminho a ser
percorrido em direção à prática dessa interface entre arte e ciência.
Um pressuposto para análise é o de que todas as manifestações artísticas
dialogam com outras áreas do conhecimento na buscando de sentido, conexão,
criação. Nas sociedades primitivas a ciência não era dissociada da arte, na cultura
ocidental, após o Renascimento, houve distinção entre arte e ciência.
Ciência e arte são, assim, produtos que expressam as experiências e
representações imaginárias das distintas culturas, que se renovam
através dos tempos, construindo o percurso da história humana. A
própria ideia da ciência e da arte como disciplinas autônomas é
produto recente da cultura ocidental (PCN Artes, 1998, p.31).
Ciências é uma busca constante para uma nova consciência, dialogando
com diversas áreas do conhecimento, inclusive a arte.
Estudiosos do mundo todo vêm buscando, por meio da
interdisciplinaridade, propor o diálogo entre as disciplinas e uma conscientização
sobre a transformação da realidade.
A revisão contemporânea do conceito de ciência nos direciona para a
exigência de uma nova consciência, que não se apoia somente na
objetividade, mas que assume a subjetividade em todas as suas
contradições (FAZENDA, 2008, p. 81).
No universo da arte, os alunos exercitam suas corresponsabilidades pelos
destinos de uma vida cultural individual e coletiva mais digna, sem preconceitos,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
além de desenvolver habilidades artísticas como a intuição, reflexão, investigação,
sensibilidade, imaginação, percepção, flexibilidade, comunicação e o trabalho em
equipe.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O ensino da ciência foi trabalhado por meio de diversas linguagens
artísticas e possibilidades para que pudesse contribuir significativamente para a
desconstrução do olhar fracionado e limitado para a arte nas dinâmicas
interdisciplinares, de modo a favorecer o desenvolvimento cultural dos alunos.
Os discentes puderam perceber o quanto a atividade foi inovadora,
facilitando o aprendizado teórico, de modo a articular a arte com outros saberes. A
partir da arte o conhecimento foi construído, integrando a ciências, motivando a
curiosidade, aliando à teoria à prática.
A falta de entendimento sobre a disciplina arte em questão não é o único
fator que inviabiliza o trabalho interdisciplinar. No entanto, é possível dizer que
este fator contribui muito para isso, sobretudo porque um professor que
desconhece o significado da arte no contexto escolar, possivelmente também não
perceberá a relevância dos conhecimentos relativos a ela interagindo nos trabalhos
coletivos e favorecendo no processo de ensino- aprendizagem do aluno.
Trabalhar com a interdisciplinarmente requer pensar e repensar caminhos
metodológicos do planejamento educacional e também a relevância da formação
permanente do professor, pois uma está diretamente associada à outra.
O projeto do PIBID propiciou, ainda, uma maior colaboração nos eventos
da escola, na participação em reuniões pedagógicas, dos conselhos escolares e no
auxílio de problemas pedagógicos.
Para os alunos dos cursos de licenciatura, foi uma oportunidade de
formação e de compreensão de uma epistemologia da sala de aula que considera a
arte como conhecimento.
REFERÊNCIAS
[Type text]
[Type text]
[Type text]
BARBOSA, A. M. A imagem no ensino da arte. 4. ed. São Paulo: Perspectiva, 1991.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da União, 1996.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares nacionais:
Arte/Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998.
CRISTIANO, C. A. Ensino da arte e interdisciplinaridade: olhares e reflexões a partir da narrativa
de professores e alunos do ensino médio da E. E. B Professora Maria Garcia Pessi. 2010, 92f.
Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade do Extremo Sul Catarinense - UNIDESC,
Criciúma-SC, 2010.
FAZENDA, I. C. A. (Org.). Práticas interdisciplinares na escola. São Paulo: Cortez, 1993.
FAZENDA, I. C. A (Org.) Dicionário em construção: interdisciplinaridade. São Paulo, 2º Edição.
Editora Cortez, 2002.
FAZENDA, I.C. A. Interdisciplinaridade: qual o sentido? São Paulo, Editora Paulus, 2003.
FAZENDA, I. C. A (Org). O que é interdisciplinaridade? São Paulo: Cortez, 2008.
FERREIRA, M. E. de M. P. Ciência e interdisciplinaridade. In: FAZENDA, Ivani (Org.). Práticas
interdisciplinares na escola. 11. ed. São Paulo: Cortez, 2009.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
A COLONIALIDADE SOBRE O SURDO
Karime Chaibue
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Goiás –IFG
[email protected]
RESUMO
O objetivo deste trabalho é discutir sobre a colonialidade imposta sobre o surdo brasileiro, tendo
em vista a desvalorização da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) em sua legislação de
reconhecimento e em suas políticas educacionais inclusivas. É uma pesquisa bibliográfica
enquadrada numa abordagem qualitativa, buscando investigar dados históricos, culturais e
linguísticos da comunidade surda para realizarmos nossa discussão. Tomaremos por
fundamentação teórica sobre colonialidade, o trabalho de Quijano (2005). Como proposta para
uma possível contraposição à colonialidade, utilizaremos a interculturalidade funcional e a
interculturalidade crítica de Wash (2009). Acreditamos que para haver o rompimento da
colonialidade sobre o surdo deve acontecer a interculturalidade crítica apresentada por Wash
(2009), fazendo necessário repensar sobre a legislação e os modelos educacionais vigentes,
trazendo a participação da comunidade surda.
Palavras-chave: colonialidade; surdo; interculturalidade.
A língua portuguesa continua hegemônica, e o surdo, um
colonizado dentro da grande maioria das escolas
brasileiras.
(STUMPF, 2009, p. 437)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
O início da colonialidade do poder é narrado por Quijano (2005)
partindo do critério de classificação social que se baseava na raça. Nesta
classificação social, ocorre práticas de dominação, nas quais as novas identidades
formadas, como as de índios e negros são consideradas inferiores.
Apesar de não ser baseada em raça, a comunidade surda também
vive atualmente uma situação de colonialidade, pois seu processo histórico,
cultural e linguístico são desvalorizados mediante um discurso multicultural, que
[Type text]
[Type text]
[Type text]
de acordo com Walsh (2009) tal discurso é pertencente à interculturalidade
funcional.
Diante disso, pretendemos com este trabalho, discutir sobre a
colonialidade imposta sobre o surdo brasileiro, visto que a sua língua natural, a
Língua Brasileira de Sinais - LIBRAS1, é ainda desvalorizada na sua legislação de
reconhecimento e nas políticas educacionais inclusivas.
Para iniciar nossa discussão, partiremos de uma explanação básica sobre
colonialidade apresentada por Quijano (2005), posteriormente demonstraremos
um panorama histórico vivenciado pelo surdo, bem como da sua língua de sinais,
fazendo então uma reflexão da sua história com as interculturalidades
apresentadas por Walsh (2009): a interculturalidade funcional e a
interculturalidade crítica. Por fim, apresentaremos as considerações finais e as
referências utilizadas.
1 A COLONIALIDADE SOBRE O SURDO
A América foi o primeiro espaço de poder no mundo, desta forma tornouse a referência de modernidade. O processo histórico racial anterior à América é
ignorado e as relações sociais foram posteriormente construídas dependendo da
raça, sendo constituídas por práticas de dominação. As novas identidades
formadas, como índios, negros e mestiços ocupavam uma posição hierárquica de
inferioridade enquanto que portugueses e espanhóis ocupavam uma posição de
superioridade, sendo denominados de brancos (QUIJANO, 2005).
Quijano (2005) afirma que novas identidades, como amarelos ou
azeitonados foram construídas e somadas às de índios, negros e mestiços, havendo
para cada raça uma forma particular de dominação. Walsh (2009) ressalta que a
colonialidade do poder é ainda existente nos dias atuais e que índios e negros são
1
LIBRAS – é a sigla difundida pela Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos –
FENEIS, para referir-se à língua de sinais utilizada pela comunidade surda brasileira. Existe
também LSB – Língua de Sinais Brasileira, que segue os padrões internacionais de denominação
das línguas de sinais, porém LIBRAS é utilizada pelo MEC, nos documentos legais, e por vários
pesquisadores e especialistas (cf. QUADROS, 2007).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
considerados como grupos de identidades inferiores, sendo sua história, língua e
cultura desvalorizadas:
Essa colonialidade do poder – que ainda perdura – estabeleceu e fixou
uma hierarquia racializada: brancos (europeus), mestiços e, apagando
suas diferenças históricas, culturais e linguísticas, índios e negros
como identidade comuns e negativas. A suposta superioridade natural
se expressou como diz Quijano, em uma operação mental de
fundamental importância para todo o padrão de poder mundial,
principalmente com respeito às relações intersubjetivas. Assim, as
categorias binárias, oriente-ocidente, primitivo-civilizado, irracionalracional, mágico/mítico-científico e tradicional-moderno justificam a
superioridade e desumanização (colonialidade do ser)- e pressupõem o
eurocentrismo como perspectiva hegemônica (colonialidade do saber).
(WALSH, 2009, p. 14-15)
Seguindo a mesma ideia de Walsh (2009), Perlin (1998) apresenta uma
outra categoria binária: surdo-ouvinte e Stumpf (2009) menciona a hegemonia
imposta pela maioria ouvinte. Ambas autoras (PERLIN, 1998; STUMPF, 2009)
são surdas e fundamentam suas afirmações em decorrência da desvalorização da
LIBRAS.
A história do surdo, da mesma forma que a língua de sinais, sofreu vários
impasses devido à valorização extrema dada à oralidade, chegando ao ponto de
exercer sobre os surdos, atitudes de extrema violência e também proibi-los de
utilizarem uma comunicação gestual.
Lourenço e Barani (2011) mencionam que houve atitudes diferentes
exercidas sobre o surdo em cada sociedade, como exemplos citam: o abandono
em praças públicas ou campos em Atenas, em Esparta eram atirados de rochedos e
em Roma lançados sobre o Rio Tiger. Por mais que cada sociedade tenha uma
justificativa baseada na sua cultura, as atitudes demonstram uma forte violência
para com o surdo. Embora a introdução da filosofia suscite estudos relacionados à
mente e à consciência, o surdo continuou sem direito a exercer sua cidadania. A
privação social sofrida pelo surdo tinha embasamento na afirmação de Aristóteles:
“[...] de todas as sensações, é a audição que contribui mais para a inteligência e o
conhecimento, portanto, os nascidos surdos se tornam insensatos e naturalmente
incapazes de razão" (MAIA FILHO, 2009 apud LOURENÇO; BARANI, 2011).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Na Idade Média o surdo era considerado obra demoníaca e segundo
afirmam as autoras: "milhares de Surdos e demais pessoas com deficiência, por
não passarem pelo exorcismo, foram queimadas na 'fogueira da inquisição', para
purificar suas almas” (LOURENÇO; BARANI, 2011).
Strobel (2006) ao comentar sobre o livro "História da Loucura" de
Foucault declara que o modelo médico e valores éticos e morais, do século XIV
até o século XVII, tinham um poder de influência muito grande nas práticas
sociais, excluindo da sociedade as pessoas não desejadas. Assim como outros
sujeitos, o surdo vivia em situações de isolamento, ficando presos em celas,
cadeias, asilos, hospitais ou então tidos como escravos. Posteriormente, os surdos
foram vistos como merecedores de piedade e atitudes de exterminação ou
isolamento foram substituídas por atitudes de inclusão em atividades religiosas e
manuais, porém a exclusão em atividades intelectuais ainda prevalecia.
A preocupação com a educação de surdos começou a partir do século XVI.
Por várias partes do mundo, professores utilizavam comunicação gestual para
ensinar aos surdos. Em 1880 aconteceu em Milão um congresso internacional com
o objetivo de discutir qual a melhor forma de ensinar o surdo, vencendo o método
oralista, o qual foi predominante por aproximadamente 100 (cem) anos. Albres
(2005) declara que os avanços tecnológicos tiveram bastante contribuição para o
fortalecimento do método oralista. De acordo com Albres (2005, p. 21): "Método
'manualista', fazia uso das mãos para a produção dos sinais, por isso leva essa
denominação, enquanto o que se preocupava especificamente com o ensino da
fala é chamado de 'oralista'.
O avanço dos estudos sobre a surdez pela medicina trouxe uma
categorização dos surdos em graus de surdez: "de surdos leves a surdos
profundos". Em decorrência da dificuldade em ouvir e falar, os surdos foram
considerados doentes e deficientes. No século XIX, devido à visão assistencialista
da sociedade, os surdos eram entregues às instituições para viverem em regime de
internato.
No Brasil, foi fundado no ano de 1856 pelo surdo francês Ernest Huet, na
cidade do Rio de Janeiro, a primeira instituição para surdos, o atual Instituto
Nacional de Educação de Surdos (INES) (ROCHA, 2007). No século XX, a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sociedade começa a preocupar-se com a inclusão do surdo, trazendo-o para o
convívio social. Em 24 de maio de 1913, inicia a primeira associação de surdos no
Brasil, também sediada na cidade do Rio de Janeiro, existindo atualmente acima
de 100 (cem) associações (ou instituições afins) em nosso território (MACEDO,
2006).
As pesquisas linguísticas nas línguas de sinais foram iniciadas na década
de 60 pelo americano Willian C. Stokoe, comprovando então o atendimento
dessas línguas a todos os critérios linguísticos de uma língua natural. Após o
trabalho de Stokoe, pesquisas têm sido realizadas em diversos países, na tentativa
de descrever, analisar e demonstrar o status linguístico da língua de sinais,
desfazendo assim os mitos existentes com relação a esta modalidade de língua. De
acordo com Quadros e Karnop (2004), os mitos relativos às línguas de sinais
podem ser especificados da seguinte forma:
1- A língua de sinais seria uma mistura de pantomima e gesticulação
concreta, incapaz de expressar conceitos abstratos.
Os sinais das línguas de sinais possuem a mesma arbitrariedade que as
palavras e a mesma capacidade de expressar ideias abstratas, sendo possível
discutir sobre qualquer assunto, assim como nas línguas faladas.
2- Haveria uma única e universal língua de sinais usada por todas as pessoas
surdas.
Fatores geográficos e culturais influenciam na determinação e mudança
histórica do sinal, por isso cada país apresenta sua respectiva língua de sinais.
3- Haveria uma falha na comunicação gramatical da língua de sinais, sendo
um pidgin sem estrutura própria, subordinado e inferior às línguas orais.
As línguas de sinais são independentes das línguas faladas. A comprovação
dessa independência é percebida pelo fato de existir países que falam a mesma
língua e possuem língua de sinais diferentes, como por exemplo: Brasil e
Portugal.
A estrutura gramatical da língua de sinais não é subordinada às línguas
orais, pois pesquisas mostram que as línguas de sinais não são um apanhado de
gestos sem princípio organizacional, mas consistem em uma configuração
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sistêmica de uma modalidade de língua, tendo, portanto, estrutura gramatical
própria.
4- A língua de sinais seria um sistema de comunicação superficial, com
conteúdo restrito, sendo estética, expressiva e linguisticamente inferior ao
sistema de comunicação oral.
Pesquisas realizadas por Klima e Bellugi (1979 apud QUADROS;
KARNOPP, 2004) mostraram que fazem parte da cultura surda: poesias, piadas,
trocadilhos, jogos, entre outros, não havendo limitações práticas para uma
conversação em sinais decorrente da modalidade visual-espacial. Os fatores que
podem influenciar no nível da conversação em sinais são os mesmos das línguas
orais: memória, experiência, conhecimento de mundo e inteligência.
5- As línguas de sinais derivaram da comunicação gestual espontânea dos
ouvintes.
Este mito advém da concepção que perdurou por longos anos, e perdura
ainda hoje, de que a linguagem está associada à oralidade. Porém, como já visto
anteriormente, as línguas de sinais são independentes das línguas orais,
apresentam todos os elementos classificatórios identificáveis de uma língua, têm
estrutura gramatical própria, são reconhecidas linguisticamente como uma nova
modalidade da capacidade de linguagem, seu aprendizado demanda tempo e
prática, como em qualquer outra língua.
6- As línguas de sinais, por serem organizadas espacialmente, estariam
representadas no hemisfério direito do cérebro, uma vez que esse hemisfério
é responsável pelo processamento de informação espacial, enquanto que o
esquerdo, pela linguagem.
Bellugi e Klima (1990 apud QUADROS; KARNOPP, 2004) realizaram
pesquisas com surdos que tinham lesões cerebrais. Os resultados mostraram que
as línguas de sinais apresentam um processamento mais complexo do que as
línguas faladas. Além de ser constatado que as línguas de sinais são processadas
linguisticamente no hemisfério esquerdo da mesma forma que as línguas faladas,
devido sua especificidade espacial, são também processadas no hemisfério direito.
Apesar de pesquisas desmistificarem crenças errôneas a respeito das
línguas de sinais, os estudos ainda são muito recentes e com pouca abrangência,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
acontecendo ainda a colonialidade sobre o surdo, assim como Walsh (2009)
afirma ocorrer com índios e negros, “apagando suas diferenças históricas,
culturais e linguísticas” (p. 14).
No Brasil, a LIBRAS foi reconhecida legalmente como meio de
comunicação e expressão das comunidades surdas brasileiras há 10 (dez) anos,
através da Lei nº 10.436 de 24 de abril de 2002 (BRASIL, 2002), sendo
regulamentada pelo Decreto nº 5.626 de 22 de dezembro de 2005 (BRASIL,
2005), o qual apresenta ações a serem aplicadas às políticas linguísticas
educacionais para as pessoas surdas.
A colonialidade sobre o surdo é facilmente percebida na própria lei que
regulamenta a LIBRAS, pois em seu parágrafo único diz: “A Língua Brasileira de
Sinais - Libras não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa”
(BRASIL, 2002). O Decreto nº 5.626 prevê uma educação bilíngue para os
surdos, caracterizando como educação bilíngue as escolas ou classes “[...] em que
a Libras e a modalidade escrita da Língua Portuguesa sejam línguas de instrução
utilizadas no desenvolvimento de todo o processo educativo” (BRASIL, 2005).
Existe uma contradição na legislação citada, pois ao mesmo tempo, que reconhece
a Libras como forma de comunicação da comunidade surda e defende uma
educação bilíngue na qual, a Língua Portuguesa deve ser ensinada como segundo
língua, declara uma proibição da substituição da LIBRAS pela modalidade escrita
da Língua Portuguesa.
A partir das contradições apresentadas na legislação relacionadas à
LIBRAS formamos alguns questionamentos, como: O surdo é bilíngue por direito
ou por uma imposição? Como seria para nós ouvinte e nativos da Língua
Portuguesa, poder comunicar em Língua Portuguesa, mas escrever em outra
língua, como por exemplo, em Língua Inglesa? Quadros (2005, p.29) critica com
muita propriedade o status de bilíngue colocado sobre o surdo:
Se não fosse a diferença na modalidade, todos teriam tranquilidade em
reconhecer as pessoas surdas enquanto bilíngues. Elas nascem no
Brasil e, portanto, falariam a língua portuguesa. Convivem com
surdos, portanto, usam a língua de sinais brasileira. No entanto, não é
dessa forma que caracterizamos a situação bilíngue dos surdos
brasileiros, se é que podemos considerá-los genericamente com este
[Type text]
[Type text]
[Type text]
status. Vários aspectos devem ser considerados no caso específico dos
surdos:
1) A modalidade das línguas: visual-espacial e oral-auditiva;
2) Surdos filhos pais ouvintes: os pais não conhecem a língua de sinais
brasileira;
3) O contexto de aquisição da língua de sinais: um contexto atípico,
uma vez que a língua é adquirida tardiamente, mas, mesmo assim tem
status de L1;
4) A língua portuguesa representa uma ameaça para os surdos;
5) A idealização institucional do status bilíngue para os surdos: as
políticas públicas determinam que os surdos “devem” aprender
português;
6) Os surdos querem aprender na língua de sinais;
7) Revisão do status do português pelos próprios surdos: reconstrução
de um significado social a partir dos próprios surdos.
A situação educacional do surdo é um exemplo de um discurso (neo)
liberal multiculturalista, no qual a colonialidade está simplesmente sendo
reestruturada, de acordo com Walsh (2009). Para a autora, a partir dos anos 90, a
diversidade cultural passou a estar presente nas políticas públicas e reformas
educacionais, porém é uma “inclusão” de grupos historicamente excluídos que
não passa de uma atitude integracionista, pois é uma estratégia que atende um
modelo globalizado. Baseada em Tubino (2005), Walsh (2009) nomeia tais
práticas como interculturalidade funcional, onde não ocorre o questionamento e
sim a compatibilidade com um modelo vigente, certamente adequando a um grupo
majoritário.
Stumpf (2008) questiona como o surdo apropriará da sua cultura, sua
língua e sua história num ambiente inclusivo de maioria ouvinte, usuano de uma
língua oral? A autora aprofunda ainda mais a problemática da inserção do surdo
na escola regular alegando que:
As dinâmicas educacionais da sala de aula e da escola estão
focalizadas na língua oral e na escrita da mesma. O aluno surdo
inserido no espaço educacional de alunos ouvintes, sem os suportes
adequados, vai tentar se comportar como um deles. Sua Língua de
Sinais aparece pouco e desfigurada, de sua cultura não há sinais.
Como vai esse aluno ter acesso aos conhecimentos se sua questão
linguística não está sendo observada e menos ainda seu pertencimento
cultural? Como vai desenvolver conhecimentos se a escola apenas faz
[Type text]
[Type text]
[Type text]
mínimas concessões e em seu imaginário ainda vê o surdo como um
deficiente que, por força da lei, está obrigada a receber? (STUMPF,
2008, p. 23)
Outro fator bastante criticado por Stumpf (2008) na escola inclusiva foi a
avaliação. Para ela, falta ainda uma definição de critérios para a prática avaliativa,
pois esta apenas tenta mostrar um mau desempenho obtido pelo aluno surdo. A
culpa do fracasso escolar cai sobre o surdo, sendo este avaliado na Língua
Portuguesa, ignorando toda a sua especificidade linguística.
No contexto educacional inclusivo para alunos surdos, a interculturalidade
funcional apresentada por Walsh (2009) torna-se ainda mais intensa devido o
surdo não apresentar traços fenotípicos como o índio e o negro, a
incompatibilidade da modalidade oral-aditiva da Língua Portuguesa com sua
privação sonora, bem como o reflexo da modalidade gesto-visual de uma língua
de sinais na sua escrita na Língua Portuguesa são ignorados.
Walsh (2009) apresenta em oposição à interculturalidade funcional, a
interculturalidade crítica. O questionamento é relevante na interculturalidade
crítica, tendo como ponto de partida a diferença, pois esta não pode ser apagada. A
base para a interculturalidade crítica é a história, a ação e a tomada de decisão das
pessoas que sofreram a colonialidade e não os órgãos governamentais que falam
pelos grupos minoritários, mas que muitas vezes ignoram o clamor dos mesmos.
Assim sendo, ocorre um embate com a hegemonia que é imposta à minoria.
Um movimento recente de embate à hegemonia imposta à comunidade
surda é o movimento pela educação bilíngue para surdos2, mas uma educação
bilíngue traçada com a autoria da comunidade surda e não apenas de teóricos
representantes do Ministério da Educação (MEC). Tal movimento realizou
manifestações no Planalto Central e no MEC, tendo a participação da liderança
surda que lutava contra o fechamento da educação básica do INES, bem como as
políticas educacionais inclusivas do MEC. Numa entrevista, uma representante
das políticas educacionais do MEC deixa nítida a sua postura de desvalorização da
2
Para maiores detalhes sobre tal movimento, acesse :
http://www.feneis.org.br/page/imagens/noticias/noticias_2011/Revista%20Feneis_44.pdf
[Type text]
[Type text]
[Type text]
LIBRAS ao mesmo tempo que enfatiza a necessidade do aluno surdo aprender a
Língua Portuguesa:
É até positivo que o professor de uma criança surda não saiba libras,
porque ela tem que entender a língua portuguesa escrita. Ter
noções de libras facilita a comunicação, mas não é essencial para a
aula. No caso de ter um cego na turma, o professor não precisa
dominar o braile, porque quem escreve é o aluno. Ele pode até
aprender, se achar que precisa para corrigir textos, mas há a opção de
pedir ajuda ao especialista. Só não acho necessário ensinar libras e
braile na formação inicial do docente. (MANTOAN, 2005, p. 3,
grifo nosso)
Percebe-se pela fala de Mantoan (2005) que a proposta educacional de
surdos do MEC, dita como inclusiva e bilíngue, é uma proposta de
interculturalidade funcional, elaborada por representantes que apenas reforçam a
legitimidade de uma maioria ouvinte, descartando as diferenças. Faz-se necessário
uma interculturalidade crítica na qual atente para as reinvindicações dos próprios
surdos para que a colonialidade sobre eles seja rompida. É preciso dar abertura a
um questionamento que vá “além dos pressupostos e manifestações atuais da
educação intercultural bilíngue ou da filosofia intercultural” (WALSH, 2009, p.
24), mas que inclua os surdos sem ignorar sua história, cultura e principalmente
sua língua.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar da colonialidade do poder ter seu início com a classificação racial,
ou seja, de acordo com a raça obtinha-se uma hierarquia, é perceptível ainda nos
dias atuais a sua existência e no caso do surdo, o critério da raça é extrapolado,
pois ele compartilha do mesmo território dos ouvintes, mesmos traços fenotípicos,
a condição física de privação auditiva implica numa outra língua natural, fazendo
deste sujeito, um membro de um grupo minoritário.
A política educacional inclusiva apresenta um discurso de respeito à
diversidade, porém como apresentado por Walsh (2009), é na verdade uma prática
integracionista que visa submeter a cultura de uma minoria a uma cultura
[Type text]
[Type text]
[Type text]
majoritária. Tal prática é chamada pela autora de interculturalidade funcional, pois
apresenta uma desvalorização camuflada da história, língua e cultura, a qual busca
apenas legitimar uma homogeneização, descartando os possíveis questionamentos
que podem gerar uma reestruturação do sistema.
No modelo educacional inclusivo vigente, o surdo geralmente é
prejudicado, carregando um status de bilíngue que é bastante questionado. Para
que a colonialidade sobre o surdo seja abolida, acreditamos numa proposta de
interculturalidade crítica, a qual Walsh (2009) a diferencia da interculturalidade
funcional. Enquanto a interculturalidade funcional legitima uma homogeneização
de uma maioria, a interculturalidade crítica busca um questionamento a partir de
uma participação ativa dos próprios movimentos dos grupos minoritários. Para
que o surdo fique livre da colonialidade é preciso que as diretrizes educacionais
relativas à educação de surdos sejam refeitas não por representantes alheios, mas
com a participação ativa de representantes da comunidade surda.
REFERÊNCIAS
ALBRES, Neiva de Aquino. A educação de alunos surdos no Brasil do final da década de 1970 a
2005: análise dos documentos referenciadores. Campo Grande: UFMS, 2005. Dissertação de
Mestrado, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Matro Grosso do Sul, 2005.
BRASIL. Lei n.° 10.436, de 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais Libras e dá outras providências. Disponível em:
<http://planalto.gov.br/CCIVIL_03/LEIS/2002/L10436.htm>. Acesso em 12 set. 2010.
BRASIL. Decreto n.° 5626, de 22 de dezembro de 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de
abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras, e o art. 18 da Lei no 10.098,
de 19 de dezembro de 2000. <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato20042006/2005/decreto/d5626.htm>. Acesso em 12 set. 2010.
LOURENÇO, Kátia Regina Conrad; BARANI, Eleni. Educação e Surdez: Um resgate histórico
pela trajetória educacional dos surdos no Brasil e no mundo. Revista Virtual de Cultura Surda e
Diversidade, Petrópolis, n.8, set. 2011. Disponível em: <http://editora-araraazul.com.br/novoeaa/revista/?p=591>. Acesso em: 12 ago. 2012.
MACEDO, Éricka Viviene Faria. História dos Surdos no Brasil, Belo Horizonte, 2005. Disponível
em: <http://www.pucminas.br/nai/noticias.php?id=41>. Acesso em: 01 ago. 2012.
PERLIN, Gládis Teresinha Taschetto. Identidades surdas. In: SKLIAR, Carlos (Org.). A surdez:
um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre: Mediação, 1998. p. 51-73.
QUADROS, Ronice Müller de; KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira: estudos
linguísticos. Porto Alegre: Artes Médicas, 2004.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
QUADROS, Ronice Müller de. O "Bi" em bilinguismo na educação de surdos. In:
FERNANDES, Eulália. (Org.). Surdez e bilinguismo. Porto Alegre: Mediação, 2005. p. 27-37.
QUADROS, Ronice Müller de. O tradutor de língua brasileira de sinais e língua portuguesa. 2.
ed. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial, 2007.
QUIJANO, Anibal. Colonialidade do poder, eurocentrismo e América Latina. In: LANDER,
Edgardo (Org.). A colonialidade do saber: eurocentrismo e ciências sociais. Perspectivas latinoamericanas. Coleción Sur Sur, CLACSO, Ciudad Autônoma de Buenos Aires, Argentina, 2005, p.
227-278.
ROCHA, Solange Maria. História do INES – Instituto Nacional de Educação de Surdos, Rio de
Janeiro, 2007. Disponível em: <http://www.ines.gov.br/institucional/Paginas/historiadoines.aspx>.
Acesso em 30 jul. 2012.
STROBEL, Karin Lílian. A visão histórica da in(ex)clusão dos surdos nas escolas. Educação
Temática Digital, Campinas, v.7, n.2, p. 244-252, jun.2006.
STUMPF, Marianne Rossi. Mudanças estruturais para uma inclusão ética. In:
QUADROS, Ronice Müller de. (Org.). Estudos Surdos III – Série de pesquisas.
Rio de Janeiro: Arara Azul, 2008. p. 14-29. Disponível em: < http://www.editoraarara-azul.com.br/estudos3.pdf>. Acesso em: 06 ago. 2012.
STUMPF, Marianne Rossi. A educação bilíngue para surdos: relatos de
experiências e a realidade brasileira. In: QUADROS, Ronice Müller; STUMPF,
Marianne Rossi. (Org.). Estudos surdos IV. Petrópolis, RJ : Arara Azul, 2009. p.
425-450.
WALSH, Catherine. Interculturalidade Crítica e Pedagogia Decolonial: in-surgir,
resurgir e re-viver. In: CADAU, Vera Maria (Org.). Educação intercultural na
América Latina: entre concepções, tensões e propostas. Rio de Janeiro: 7 Letras,
2009, p. 12-42.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
A CONSTRUÇÃO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS INCLUSIVAS EM
ESCOLAS PÚBLICAS
Sonia Maria Rodrigues
Prof. Dr. Júlio Emílio Diniz Pereira (Orientador)
Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG
[email protected]
RESUMO
Este artigo é parte de uma pesquisa de doutorado, ainda não concluída, intitulada “EDUCAÇÃO
INCLUSIVA: a construção de práticas pedagógicas em escolas públicas” desenvolvida no
programa de pós-graduação da Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). A investigação teve como foco conhecer os limites e possibilidades de práticas
pedagógicas inclusivas em escolas públicas com alunos com necessidades educacionais especiais
(NEE) decorrentes de deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento. A prática pedagógica
inclusiva é aquela em que o professor ou professora considera a diversidade de seus alunos e tenta
atender suas necessidades educacionais flexibilizando as ações voltadas para o acesso à
participação social e ao conhecimento. Com uma abordagem qualitativa, a pesquisa pode ser
caracterizada como do tipo etnográfico e utilizou como instrumentos de coleta de dados a
observação participante da prática pedagógica de quatro professoras; entrevistas semi-estruturadas
com as quatro professoras, três coordenadoras, a diretora, duas auxiliares de apoio à inclusão e a
mãe de um aluno com NEE; análise documental do Projeto Político Pedagógico da escola e da
proposta política de Educação Inclusiva da rede municipal; também foi aplicado um questionário
aos docentes da escola. O período de inserção no campo foi o primeiro e segundo semestres de
2011. A instituição selecionada para a investigação foi uma escola da Rede Municipal de Educação
de Belo Horizonte, Minas Gerais, que trabalhava com Educação Infantil e Ensino Fundamental (1º
e 2º ciclo) e tinha um total de 760 alunos sendo que dentre estes, 18 apresentavam NEE. Das
quatro professoras selecionadas para a observação da prática pedagógica, uma se destacou por
apresentar planejamento aberto e flexível das aulas, organização do processo ensino/aprendizagem
considerando a interdisciplinaridade, valorização das diferenças e motivação dos alunos para
conseguir uma predisposição favorável para aprender. Considerando o contexto atual das escolas
públicas no Brasil com suas salas lotadas, pouca valorização dos profissionais da educação e
déficit na formação de professores para a educação inclusiva, é possível apontar que a escola
investigada, apesar das condições pouco favoráveis, apresenta uma prática de acolhimento e
tentativas de atendimento às necessidades especiais de seus alunos com NEE.
Palavras-chave: educação inclusiva, práticas pedagógicas, etnografia.
INTRODUÇÃO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
No Brasil, o Ministério da Educação (MEC), tem assumido a política
educacional de inclusão que defende que todas as crianças devem estar no ensino
comum desde o início de sua vida escolar e serem atendidas em suas
especificidades. O processo de inclusão tem como meta promover acesso,
permanência e percurso escolar, com sucesso, para os alunos com deficiência,
transtornos globais do desenvolvimento ou altas habilidades/superdotação, no
sistema regular de ensino, considerando-os, desde o início, membros da
comunidade, com igualdade de direitos.
A partir da aceitação da matrícula de pessoas que apresentam deficiência
nas redes de ensino, evidencia-se a realidade de muitos docentes que se sentem
confusos, despreparados e incapazes para acolher esses alunos e, sobretudo, para
trabalhar com propostas didático-pedagógicas e teórico-metodológicas que
atendam às necessidades, expectativas e demandas próprias de cada um desses
sujeitos da educação.
Pensando na necessidade de conhecer como está se efetivando o trabalho
docente com alunos com apresentam necessidades educacionais especiais (NEE)
decorrentes de deficiência e transtornos globais do desenvolvimento, o foco
central da investigação foi a seguinte questão: Quais os limites e possibilidades na
construção de práticas pedagógicas inclusivas nas escolas públicas de Minas
Gerais?
É preciso esclarecer o que são consideradas práticas pedagógicas
inclusivas para este trabalho. Visando uma educação mais democrática e baseada
no princípio de “educação para todos”, a proposta de Educação Inclusiva ganhou
força mundial na década de 1990. O Brasil aderiu às ideias internacionais
difundidas em declarações e construiu uma política educacional inclusiva que
ainda necessita de ajustes, mas que tem conseguido avanços significativos no que
diz respeito ao acesso de todos à educação. A Educação Inclusiva, de acordo com
Mittler (2003) requer um processo de reestruturação das escolas, “com o objetivo
de assegurar que todos os alunos possam ter acesso a todas as gamas de
oportunidades educacionais e sociais oferecidas pela escola (p. 25).
Considerando que a prática pedagógica é um elemento fundamental na
transformação da escola, Duk (2005, p. 65) destaca que “a atitude e o estilo de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
ensino do docente representam fatores primordiais para assegurar o êxito de
todos” e que “uma nova abordagem educacional pressupõe pensar o ensino a
partir de uma atitude aberta, flexível e, sobretudo, reflexiva em relação à própria
prática educacional”. Assim, a prática pedagógica inclusiva é aquela em que o
professor ou professora considera a diversidade de seus alunos e tenta atender
suas necessidades educacionais flexibilizando as ações voltadas para o acesso à
participação social e ao conhecimento.
As dificuldades na construção das escolas inclusivas têm sido objeto de
estudos (JESUS et al, 2009; GLAT, 2009; BAPTISTA, 2006; SANTOS e
PAULINO, 2006; MACHADO, 2005; RODRIGUES, 2005). Ao mesmo tempo
em que essas pesquisas são necessárias para se conhecer o que precisa ser mudado
na política pública e nas ações, surge uma preocupação com o foco no que não dá
certo, no que está sempre faltando. Mesmo diante de objeções e incertezas, as
políticas de educação inclusiva foram implantadas em todo o país, mas essa
implantação continua sendo objeto de discussões e investigações envolvendo,
entre outras dimensões, as próprias políticas, as práticas pedagógicas e a formação
docente.
Para enfrentar os mecanismos de exclusão presentes na sociedade e,
conseqüentemente, nas instituições escolares, leis garantem o acesso de todos à
educação e propostas de reformas educacionais foram implementadas. No início,
questionava-se a viabilidade de ações voltadas para uma “educação para todos”;
atualmente as questões focalizam como implementar um processo educacional
que considere a diversidade do alunado.
É importante ressaltar que a parte desse “todos”, que mais preocupa os
professores, é constituída pelos alunos que apresentam necessidades educacionais
especiais, decorrentes de deficiência ou transtornos globais do desenvolvimento.
Considerando que a educação destes alunos desafia a prática pedagógica, esta
pesquisa focalizou o fazer docente com este alunado. Mas a proposta focalizou a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
investigação de experiências positivas, consideradas práticas pedagógicas bemsucedidas3 de educação inclusiva.
Assim, acreditando que a mudança de perspectiva do olhar, da falta para a
presença, de experiências negativas para experiências positivas e bem-sucedidas
possa contribuir para reforçar a ideia da escola para todos, em tempos de
exclusão, é que esta pesquisa investigou as práticas pedagógicas com alunos com
deficiência e transtornos globais do desenvolvimento, inseridos em uma escola
regular da Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte.
OBJETIVOS
Objetivo geral: conhecer e analisar os fatores que possibilitam ou limitam a
construção de práticas pedagógicas inclusivas em escolas públicas de Minas
Gerais.
Objetivos específicos:
- observar e analisar como se desenvolvem as práticas pedagógicas com alunos
com necessidades educacionais especiais decorrentes de deficiência e transtornos
globais do desenvolvimento no contexto escolar;
- compreender os fatores condicionantes dessas práticas pedagógicas;
- investigar as interações docentes e discentes que perpassam a prática pedagógica
inclusiva;
- conhecer a formação dos educadores da instituição pesquisada.
REFERENCIAL TEÓRICO
A implantação da política de Educação Inclusiva no Brasil tem despertado
estudos e discussões no campo da Educação. Para além dos marcos legais que
surgem para organizar as ações relativas à inserção dos alunos com deficiência e
transtornos globais do desenvolvimento no cotidiano das escolas, existe uma
3
A utilização do termo “práticas pedagógicas bem-sucedidas” implica o destaque que se pretende
dar a ações e projetos de aceitação, valorização e atendimento das diferenças, no âmbito da
realidade escolar, em especial, voltados aos alunos com necessidades educacionais especiais
(NEE), alunos que apresentam, para o interesse deste trabalho, deficiências e transtornos globais
do desenvolvimento, que são sujeitos que desafiam o saber docente.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
complexa realidade que questiona a todos os envolvidos no processo: alunos, pais,
professores e gestores das instituições escolares.
A política de Educação Inclusiva vem propor novas formas de inserção e
de apoio ao percurso escolar do aluno com deficiência. Stainback e Stainback
falam a respeito desse momento de transição:
O fim gradual das práticas educacionais excludentes do passado
proporciona a todos os alunos uma oportunidade igual para terem
suas necessidades educacionais satisfeitas dentro da educação
regular. O distanciamento da segregação facilita a unificação da
educação regular e especial em um sistema único. Apesar dos
obstáculos, a expansão do movimento da inclusão, em direção a uma
reforma educacional mais ampla, é um sinal visível de que as escolas
e a sociedade vão continuar caminhando rumo a práticas cada vez
mais inclusivas (STAINBACK; STAINBACK, 1999, p. 44).
É importante destacar na fala dos autores, anteriormente citados, a
perspectiva de mudanças que o movimento de inclusão propõe: extinção de
práticas excludentes no ambiente escolar e oportunidade de atendimento às
necessidades de todos os alunos. Assim, a Educação Inclusiva visa uma
modificação substancial nos sistemas de ensino para atender a todos, não só os
alunos com deficiência, como tem sido erroneamente entendido no Brasil.
Desde o final dos anos 80, teve início, em âmbito mundial, um movimento
de discussão para que mudanças sociais acontecessem, garantindo o direito das
pessoas com deficiência a uma vida social com igualdade de condições. Essa nova
visão, de mudanças arquitetônicas e atitudinais para viabilizar a participação
dessas pessoas na sociedade deu origem ao conceito de inclusão. Esse conceito
avançou no seguinte sentido: no processo de integração, as pessoas com
deficiência é que precisam se modificar, normalizar, para que possam fazer parte
da sociedade; no processo de inclusão, a sociedade é que precisa se modificar
para que todos possam conviver.
A grande tarefa da escola passa a ser, então, aceitar o desafio de considerar
as desigualdades com o objetivo de atingir a igualdade de condições. Trata-se de
aceitar e trabalhar com a diversidade. Segundo Perrenoud (2000), a desigualdade
só se torna um problema social se for denunciada como um escândalo ou, no
mínimo, como uma injustiça social. Ele prossegue dizendo:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Para que a exigência de igualdade inspire políticas educativas, é
preciso que uma parte da sociedade – que não poderia limitar-se a
alguns especialistas ou a alguns militantes – compartilhe a idéia de
que o fracasso e as desigualdades dependem das estruturas, dos
programas e das pedagogias (PERRENOUD, 2000, p. 31).
A inclusão surgiu em consonância com a proposta de Educação para
Todos, de forma igualitária e de qualidade. A escola hoje, mais do que em
qualquer outra época, é vista como facilitadora do desenvolvimento sócioeconômico-cultural das pessoas, sendo, portanto, necessário estar aberta a todos,
inclusive às pessoas com deficiência, mas respeitando suas diferenças. Esse
princípio democrático de educação para todos, fundamento básico da educação
inclusiva, evidencia a necessidade de um ensino especializado em todos os alunos,
com respeito e aceitação da diversidade humana, visando a uma sociedade mais
justa com a participação de todos.
AS MUDANÇAS NECESSÁRIAS PARA A EDUCAÇÃO INCLUSIVA
Pressupõe-se, para o sucesso da escola inclusiva, a exigência de mudanças
radicais nas suas estruturas físicas, materiais e de pessoal, em seu projeto
pedagógico e na sua matriz curricular. Essas mudanças envolvem o movimento de
aceitar os educandos como eles são, com suas características e necessidades
educacionais, buscando ao mesmo tempo projetar, ajustar e desenvolver ações de
forma a atendê-los em suas especificidades.
Alguns autores apontam condições para que as escolas sejam inclusivas
(GLAT, 2009; MANTOAN, 2001; FONTAO, 2004; BEYER, 2005; CARVALHO,
2008). Para o desenvolvimento deste trabalho focalizou-se os aspectos que dizem
respeito às mudanças necessárias sugeridas por Glat (2009) e por Mantoan (2001):
estimular as escolas para que elaborem com autonomia e de forma participativa o
seu projeto político-pedagógico; implantar os ciclos de formação; mudar o
processo de avaliação; colocar a aprendizagem como centro; estimular o trabalho
coletivo e diversificado nas turmas; descentralizar a gestão administrativa; investir
na formação de professores.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Outra discussão fundamental quando falamos em mudanças na sociedade e
na prática pedagógica diz respeito ao currículo. Rodrigues (2006, p. 311) ao falar
a respeito do currículo na perspectiva da Educação Inclusiva destaca: “Podemos
assim dizer que uma escola que não diferencia seu currículo não usa modelos
inclusivos e forçosamente não promove a igualdade de oportunidades entre os
seus alunos”. Mas acrescenta que a tarefa de diferenciação do currículo não é
responsabilidade do professor, é uma tarefa da escola.
Como mencionei anteriormente, as discussões em relação à implantação da
educação inclusiva têm focalizado, atualmente, o como viabilizar uma educação
que respeite a diversidade do alunado. No processo de construção de experiências
de uma educação que atenda a todos, o professor tem um papel fundamental.
Como diz Salgado (2006, p.62):
Construir e cultivar políticas de inclusão pressupõe planejar novas
formas de atuação, com intencionalidade e ousadia, a fim de que os
aspectos criativos do trabalho docente possibilitem novas formas de
intervenção que garantam a participação de todos em diferentes
campos de atuação e em diferentes espaços. Aqui, mais uma vez, o
sujeito professor entra em cena, na medida em que planejar é pensar e
criar estratégias.
Nos trabalhos de Carvalho (2008) e Glat (2009), é possível encontrar
discussões e sugestões a respeito da prática pedagógica com alunos com
necessidades educacionais especiais. A atuação do professor deve se basear na
aprendizagem, na flexibilização do currículo e, consequentemente, dos métodos,
dos procedimentos e também da avaliação da aprendizagem. Mas, acima de tudo,
o planejamento das atividades é um ponto que precisa ser especialmente
considerado.
A professora e pesquisadora norte-americana Gloria Ladson-Billings
(2008) realizou uma pesquisa, de 1988 a 1991, a respeito do ensino bem-sucedido
de crianças afro-americanas. O estudo focalizou a prática pedagógica e a autora
defendeu a ideia de que “[...] é a maneira como ensinamos que afeta
profundamente a maneira como os alunos percebem o conteúdo daquele
currículo” (p. 31).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Assim, observar o trabalho docente é uma ferramenta importante no
conhecimento das estratégias para dinamização da educação inclusiva. A
dimensão da prática nas salas de aula constitui um sinalizador de como a política
está se transformando, ou não, em ações.
METODOLOGIA
Considerando os objetivos deste estudo, a escolha do tipo de pesquisa se
deu por uma abordagem etnográfica, com exploração de métodos etnográficos.
Esteban (2010, p. 163) ressalta que “os métodos etnográficos estão se
desenvolvendo profusamente no âmbito da educação com uma clara finalidade:
compreender ‘de dentro’ os fenômenos educacionais”. A ideia é explicar uma
realidade com base nas percepções, atribuição de significados e opiniões dos
atores que nela participam.
Mesmo considerando que o planejamento das pesquisas etnográficas é
aberto e flexível e que as ações vão se delineando à medida que a coleta dos dados
avança, as etapas do trabalho de campo foram divididas em fases.
1ª fase: Delimitação e entrada no campo
Para a escolha da escola foram considerados alguns aspectos: a indicação
dos gestores das redes municipais de educação da região metropolitana de Belo
Horizonte, bem como da rede estadual de Minas Gerais; verificação de
atendimento a alguns critérios que as classificassem como escolas inclusivas;
consentimento dos gestores das escolas para o desenvolvimento da pesquisa.
Após a definição da instituição, foi organizada uma apresentação dos
objetivos do trabalho para a comunidade escolar e elaborado um plano de visitas,
considerando o calendário e a disponibilidade da escola.
A inserção no campo durou dois semestres letivos, o primeiro e o segundo
semestre de 2011. As observações aconteceram em dias da semana alternados,
com o objetivo de apreender a rotina escolar como um todo.
2ª fase: Inserção no campo
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Este foi um momento importante, pois o pesquisador, neste tipo de
pesquisa, tem um papel fundamental por ser o sujeito principal na coleta e na
análise dos dados. Esse fato deixa implícito no trabalho o princípio da interação
uma vez que sempre, entre o pesquisador e o objeto pesquisado, os dados são
mediados pelo instrumento humano (OLIVEIRA; GOMES, 2005).
Nesta fase, a observação participante foi o instrumento de coleta de
dados de maior destaque. De acordo com Laville e Dionne (1999, p. 154), “a
riqueza da informação está ligada também ao fato de que se encontrem os
comportamentos reais, freqüentemente distantes dos comportamentos
verbalizados”. A observação participante se estendeu por todo o período de
permanência no campo.
Para registrar as observações feitas, utilizou-se um diário de campo com
informações descritivas e reflexivas. As observações focalizaram aspectos
relativos a: espaço físico da escola, adaptações necessárias ou realizadas para
atender as necessidades dos alunos com deficiências ou transtorno global do
desenvolvimento; tempo de permanência dos alunos com NEE na escola ou nas
salas de aulas; participação dos alunos com NEE nos rituais da escola (entrada,
saída, recreio, festas, reuniões, aulas especializadas, etc); prática pedagógica com
esses alunos (adaptações curriculares, apoio pedagógico, tipo de avaliação);
trabalho das auxiliares de apoio à inclusão; relações sociais com os alunos com
necessidades especiais (aluno/aluno; professor/aluno; administração/aluno).
Foram realizadas observações da prática pedagógica de quatro professoras
caracterizadas como “bem-sucedidas”, selecionadas após observações de todas as
professoras com alunos com necessidades educacionais em sala de aula. A escola
tinha um total de 18 alunos considerados com necessidades educacionais
especiais.
Neste trabalho, realizou-se também uma análise documental com o
objetivo de conhecer a legislação educacional relativa à educação inclusiva da
Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte, a que a escola pesquisada pertence.
Também foi objeto de estudo o Projeto Político Pedagógico (PPP) e o Regimento
Escolar da instituição visando conhecer sua adequação à proposta política de
educação inclusiva.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A formação docente tem sido preconizada como um dos pilares
responsáveis pela efetivação da educação inclusiva. Com o objetivo de conhecer a
formação, a experiência de trabalho dos profissionais da escola e suas percepções
a respeito do tema estudado, foram aplicados questionários aos professores da
instituição. Do universo de 50 professores 27 responderam ao questionário.
Outro instrumento de coleta de dados utilizado foi a entrevista semiestruturada “para recolher dados descritivos na linguagem do próprio sujeito,
permitindo ao investigador desenvolver intuitivamente uma idéia sobre como os
sujeitos interpretam aspectos do mundo” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 134). As
entrevistas com gestores, professoras, auxiliares de apoio à inclusão e a mãe de
um aluno com seqüelas de paralisia cerebral focalizaram as atitudes relativas aos
alunos com necessidades especiais no ambiente escolar. A seleção das pessoas
entrevistadas se deu após a inserção e o conhecimento dos atores principais da
instituição pesquisada. As entrevistas foram gravadas com o consentimento prévio
dos entrevistados e foi utilizado um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
(TCLE).
3ª fase: Análise dos dados
Após a etapa da coleta, os dados foram organizados para a análise e
interpretação, tendo como suporte o estudo teórico realizado. A partir da relação
entre os dados coletados e a revisão bibliográfica procurou-se atingir os objetivos
propostos.
Caracterização da escola investigada
A instituição selecionada para a pesquisa é uma escola da Rede Municipal
de Educação da cidade de Belo Horizonte, localizada em um bairro da regional
nordeste e que atende a uma população de classe baixa, filhos de trabalhadores do
setor de serviços, com Ensino Fundamental completo. A região não é considerada
de risco, mas a escola recebe alunos de bairros vizinhos avaliados como “áreas de
risco”.
A escola possui ao todo 16 salas de aulas dispostas em um bloco específico
[Type text]
[Type text]
[Type text]
de três andares, onde o acesso se dá por rampas. No outro bloco construído, o
acesso é por escadas ou rampas. A acessibilidade foi considerada na construção
dos prédios e existem acessos a todas as dependências da escola. Isto facilita a
locomoção dos alunos com deficiência física que usam cadeiras de rodas. No
período da investigação a escola tinha quatro alunos cadeirantes.
A instituição trabalha com Educação Infantil e Ensino Fundamental (1º e
2º ciclo), e tinha, no período de observação, um total de 760 alunos, sendo que no
Ensino Fundamental, 18 eram considerados com NEE.
CONSIDERAÇÕES PARCIAIS
A Rede Municipal de Ensino de Belo Horizonte apresenta uma proposta de
Educação Inclusiva condizente com a Política Nacional de Educação Especial na
Perspectiva da Educação Inclusiva (BRASIL, 2008).
Os dados do questionário evidenciaram que os profissionais têm formação
superior e das 27 respondentes, 21 têm pós-graduação. O curso mais procurado
pelas professoras é Psicopedagogia. Quanto ao tempo de trabalho na Educação as
respostas mostraram que varia de oito a trinta e um anos, com uma média de 19
anos de trabalho, evidenciando que os profissionais da escola são experientes na
prática pedagógica.
A maioria das professoras não considera ter um bom nível de
conhecimento a respeito da temática da inclusão. As observações da prática
pedagógica confirmam esta avaliação, pois as professoras verbalizavam suas
dúvidas e inseguranças no trabalho pedagógico com os alunos com NEE.
Das quatro professoras selecionadas para a observação da prática
pedagógica, uma se destacou por apresentar características no seu trabalho
preconizadas como positivas para atender alunos com NEE (DUK, 2005):
planejamento aberto e flexível das aulas, organização do processo
ensino/aprendizagem considerando a interdisciplinaridade, valorização das
diferenças e motivação dos alunos para conseguir uma predisposição favorável
para aprender.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Um fator que dificulta uma prática que atenda de forma mais adequada os alunos
que apresentam NEE está relacionado à falta de parceria entre as professoras que
têm em suas salas de aula alunos com deficiência e transtornos globais do
desenvolvimento e os professores especializados responsáveis pelo Atendimento
Educacional Especializado (AEE) oferecido pelas salas de recursos. Uma ação
conjunta com discussão dos casos, suporte especializado ao aluno e apoio ao
trabalho do professor poderia trazer resultados mais eficazes no processo de
aprendizagem.
Considerando o contexto atual das escolas públicas no Brasil com suas
salas lotadas, pouca valorização dos profissionais da educação e déficit na
formação de professores para a educação inclusiva, é possível apontar que a
escola investigada, apesar das condições pouco favoráveis, apresenta uma prática
de acolhimento e tentativas de atendimento às necessidades especiais de seus
alunos com NEE.
REFERÊNCIAS
BAPTISTA, Cláudio Roberto (Org.). Inclusão e escolarização: múltiplas perspectivas. Porto
Alegre: Mediação, 2006.
BEYER, Hugo Otto. Inclusão e avaliação na escola: de alunos com necessidades educacionais
especiais. Porto Alegre: Mediação, 2005.
BOGDAN, R; BIKLEN, S. Investigação Qualitativa em Educação. Porto: Porto Editora, 1994.
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Política Nacional de
Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva. Brasília: MEC/SEESP, 2008.
CARVALHO, Rosita Edler. Escola Inclusiva: a reorganização do trabalho pedagógico. Porto
Alegre: Mediação, 2008.
DUK, Cynthia. Educar na diversidade: material de formação docente. Brasília: Ministério da
Educação, Secretaria de Educação Especial, 2005.
ESTEBAN, Maria Paz Sandín. Pesquisa qualitativa em educação: fundamentos e tradições. Porto
Alegre: AMGH, 2010.
FONTAO, María Del Pilar González. Educação Especial na Espanha. In: Caminhos pedagógicos
da Educação Especial. GAIO, Roberta: MENEGHETTI, Rosa G. Krob (ORG.). Petrópolis, RJ:
Vozes, 2004.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
GLAT, Rosana (Org.). Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. 2.ed.Rio de Janeiro:
7Letras, 2009.
JESUS, Denise Meyrelles de. et al. Inclusão, práticas pedagógicas e trajetórias de pesquisa. Porto
Alegre, Mediação, 2009.
LADSON-BILLINGS, Gloria. Os guardiões de sonhos: o ensino bem-sucedido de crianças afroamericanas. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. (Coleção Cultura Negra e Diversidade).
LAVILLE, Christian; DIONNE, Jean. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa
em ciências humanas. Porto Alegre: ARTMED; Belo Horizonte: Editora UFMG, 1999.
OLIVEIRA, Sonia Cristina de; GOMES, Cleomar Ferreira. A abordagem de pesquisa etnográfica:
reflexões e contribuições. Psicopedagogia OnLine, 2005. <Disponível em
www.psicopedagogia.com.br > Acesso em: 18 set. 2010.
MACHADO, Kátia da Silva. A prática da inclusão de alunos com necessidades educativas
especiais em classe regular: um estudo de caso com abordagem etnográfica. 2005. 106 p.
Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade do Estado do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro.
MANTOAN, Maria Teresa Eglér (Org.). Pensando e fazendo educação de qualidade. São Paulo:
Moderna, 2001.
MITTLER, Peter. Educação Inclusiva: contextos sociais. Porto Alegre: Artmed, 2003.
PERRENOUD, Philippe. Formar professores em contextos sociais em mudança: prática reflexiva
e participação crítica. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n.12, set./dez.,1999.
RODRIGUES, David (Org.). Inclusão e Educação: doze olhares sobre a educação inclusiva. São
Paulo: Summus, 2006.
RODRIGUES, Sonia Maria. Educação Inclusiva: das políticas públicas às percepções docentes.
2005. 137 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade
Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
SALGADO, Simone da Silva. Inclusão e processos de formação. In: SANTOS, Mônica Pereira
dos; PAULINO, Marcos Moreira (Orgs.). Inclusão em Educação: culturas, políticas e práticas. São
Paulo, Cortez, 2006.
SANTOS, Mônica Pereira dos; PAULINO, Marcos Moreira (Orgs.). Inclusão em Educação:
culturas, políticas e práticas. São Paulo, Cortez, 2006.
STAINBACH, Susan; STAINBACH, William. Inclusão: um guia para educadores. São Paulo:
Companhia das Letras, 1999.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação oral
GT 1- Cultura e Processos Educacionais.
A EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E A EDUCAÇÃO FÍSICA:
LIMITES E POSSIBILIDADES.
Marcos Jerônimo Dias Júnior
Universidade Federal de Goiás
[email protected]
RESUMO
No contexto da sociedade atual e no seu processo de construção histórica, cultural e econômica, a
modalidade de educação de jovens e adultos no ensino noturno se tornou um desafio, diante a
inexistência de diagnósticos e reflexões mais claras presentes na educação básica e sua direta
relação com a visão capitalista. Constitui-se neste cenário, limites e possibilidades, na organização
do trabalho educacional, principalmente na relação com a educação física. Esta pesquisaintervenção se inseriu nesta discussão com o objetivo central de compreender os limites e as
possibilidades da organização do trabalho educacional na modalidade de educação de jovens e
adultos, relacionado ao ensino da educação física. O estudo objetivou aprofundar a análise da
construção e do contexto da E.J.A, dos seus sujeitos e as concepções à cerca da educação física
nesta modalidade nas suas interfaces com a força de produção capitalista, ajudando-nos a
construção de novas reflexões para uma práxis emancipatória. Utilizando-se do trabalho coletivo
através de uma investigação participante, o trabalho busca a construção e reflexão de uma
organização do trabalho pedagógico por parte do professor de educação física, na educação de
jovens e adultos. A análise tem como base inicialmente os princípios da problematização de Paulo
Freire, e a rica contribuição das reflexões de Marx e Gramnsci na relação sociedade e educação,
articulado com a visão crítico-superado de educação física. Os resultados da experiência foram
positivos e de grande importância, demonstrando que com base em um trabalho coletivo, com um
processo de conscientização e uma práxis pedagógica dentro dos interesses da classe trabalhadora,
com base na luta de classes, contra-hegemônica, pautada no materialismo histórico dialético.
Começam a construir possibilidades para a emancipação da atual realidade que forma o principal
limite, a dominação alienante dos princípios do capitalismo na educação. Tanto o discurso como a
ação deve ser embasado em uma visão macro de organização do trabalho educacional da educação
física, em busca da emancipação desta realidade que perpassam a sociedade, a educação, a
educação de jovens e adultos e a educação física.
Palavras-chave: educação de jovens e adultos, educação física e emancipação.
UM PONTO DE PARTIDA
O referente trabalho é construído pela continuidade de uma reflexão inicial
de um trabalho de graduação, com o interesse de aprofundar a pesquisa de uma
área de atuação que é pouca discutida e indagada no âmbito acadêmico e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
profissional, a educação de jovens e adultos. Ao defrontar com um problema onde
o objetivo primordial é à superação e emancipação, o contato direto com a
realidade e com o objeto em discussão, torna o estudo uma construção de várias
possibilidades de concretizações eficazes e benéficas do processo.
A pesquisa–ação entra no diálogo e na contribuição da construção de
conhecimentos na área da educação, de acordo com Thiollent (2002) como:
Um tipo de pesquisa social que é realizada em estreita associação com uma
ação ou com ação de um problema coletivo, no qual os pesquisadores e
participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de
modo cooperativos e participativos (p.14).
Neste sentido, a categoria trabalho coletivo torna-se um meio de ação
pedagógica e de pesquisa dentro do âmbito escolar voltado a uma ação deliberada
de mudança do contexto, defendendo a utilização de um triplo sentido, refletir e
transformar a realidade, produzir conhecimentos relativos a estas transformações e
flexibilidade à novas concepções e aprendizados. Pautado e baseado dentro de
determinados princípios, no caso específico, o materialismo histórico dialético.
O primeiro passo para uma prática pedagógica do professor de educação
física na E. J. A, é a delimitação de uma orientação pedagógica e política dentro
do âmbito teórico da educação. ´´A pedagogia é a teoria e método que constrói os
discursos, as explicações sobre a prática social e sobre a ação dos homens na
sociedade, onde se dá a educação´´. (COLETIVO DE AUTORES, 1992, p.24).
Porém, se mantivermos a visão que o objetivo principal é formar alunosobjetos para serem inclusos no mercado de trabalho, todas as práticas pedagógicas
na mais intituladas como emancipatória, terão uma tendência em alienar estes
sujeitos aos ditames da força de produção capitalista. Transformando o ser
humano em máquinas a serviço do sistema, com o comprometimento de uma
formação humana despolitizada em direção à transformação.
Não basta ensinar, não basta dominar o saber a ser ensinado e nem ser um
professor-pesquisador que tem como discurso a defesa dos interesses da classe
trabalhadora, se não damos voz aos alunos (sujeitos do processo educativo) para
[Type text]
[Type text]
[Type text]
que eles assumam a consciência e a responsabilidade de uma práxis dedicada às
mudanças da escola e da vida social autônoma.
A CONTRUÇÃO DA E.J.A À MARGEM ALIENANTE DO CAPITAL
A sociedade atual pautado nos interesses do capital vem marcando
influências marcantes em várias instâncias, principalmente na educação. No
Brasil, desde os jesuítas a educação esteve voltada aos interesses da classe
dominante. As consequências deste tipo de educação histórica e excludente vêm
gerando um processo de desistência dos alunos na vida escolar, uma baixa
qualidade de ensino e uma grande dívida do sistema educacional público com a
sociedade brasileira. Dentro da perspectiva histórica, a educação vem sendo
desenvolvida para atender a duplos interesses. Gadotti (2001) vai afirmar que:
Os jesuítas desprezaram a educação popular, por força das circunstâncias
tinham de atuar no mundo colonial em duas frentes: a formação burguesa
dos dirigentes e a formação catequética das populações indígenas. Isso
significa: a ciência do governo para uns e a catequese e a servidão para
outros, ou seja, para o povo sobrou apenas o ensino dos princípios da
religião cristã (p.65).
O cenário se agrava ainda mais ao se deparar com a grande influência
neoliberal advinda dos princípios da força de produção capitalista. A situação dos
sujeitos da classe trabalhadora dentro da luta de classes existente é alienante, pois
se apropriam da dominação burguesa e de seus princípios. (MARX e ENGELS,
1846, p.56) descreve que, ``todas as classes que no passado conquistaram o poder
procuraram consolidar a posição já adquirida submetendo toda a sociedade as suas
condições de apropriação``. Historicamente é construída no sentido neoliberal,
uma visão educacional apolitizada, descompromissada, conservadora, de
reprodução alienante do ser humano, a serviço do capitalismo.
Diante de tal contexto histórico, político, social e cultural, e agora
econômica emergia a necessidade de um tipo de educação que poderia suprir
diretamente os problemas e as dificuldades que afetavam a formação dos sujeitos
para o desenvolvimento da sociedade econômica. Um dos limites que afligiam e
afligem ainda hoje aos interesses do mercado de trabalho, era o número de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
analfabetos existentes no contexto social do Brasil e a alienação destes sujeitos
aos interesses do capital. Machado (1997) explicita que:
O sistema Educacional Brasileiro experimentou diversas modalidades de
atendimento a esta clientela, sendo mais conhecidas as campanhas de
erradicação ao analfabetismo até a década de 50;Mobral; o ensino
supletivo de 1º e 2º graus, principalmente nas décadas de 70 e 80, e
mesmo o ensino regular noturno dos últimos 17 anos, que não têm dado
respostas satisfatórias às necessidades destes alunos (p.13).
Com esta visão foram criadas ações e várias campanhas que auxiliassem
no caminho de diminuição da taxa de analfabetismo, mas cabe ressaltar todas com
interesses primordiais de atender aos interesses do mercado de trabalho alienante,
impregnada a uma visão neoliberal.
Após a lei (9394/96), esta modalidade começa a ser inserida em discussões
e debates não mais como um tipo de educação descompromissada, para suprir as
necessidades do mercado opressor, mas com uma visão progressista de
transformação do atual cenário. Uma educação problematizadora,
conscientizadora, em busca da autonomia e liberdade dos sujeitos, na apropriação
da cultura elaborada e na reflexão dialética entre sociedade e educação. Isto
pautada de vários desafios, principalmente para a escola e os sujeitos que
compõem este cenário, que ao ser analisados se desdobram em limites e
possibilidades.
A construção das características de uma escola unitária é um dos princípios
a serem refletidos, para que em um futuro próximo esta modalidade venha a
emancipar os princípios de sua criação.
O advento da escola unitária significa o início de novas relações entre
trabalho intelectural e trabalho industrial não apenas na escola, mas em
toda a vida social. O princípio unitário, por isso, refletir-se-á em todos os
organismos de cultura, transformando-os e emprestando-lhes um novo
conteúdo. (Gramnsci,1995, p.116).
Na perspectiva de RODRIGUES (2000), ``propondo um ensino público de
qualidade, entendemos que a escola cumprirá o seu papel de fato, reivindicado
numa constante conquista política.(p.234).``
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Neste contexto a educação física foi estabelecendo-se historicamente no
âmbito escolar, de acordo com as demandas e interesses da sociedade capitalista
uma determinada organização. Representada pela hegemonia burguesa, foi
constituído um determinado papel de conservação e reprodução do modo de
produção vigente.
Emerge dentro do contexto de consolidação da educação física uma crise,
que pode ser denominada de visões antagônicas, a do conflito e do consenso.
A partir dos anos de 1980 é inegável que as tendências de educação e da
educação física incorporam valores de uma pedagogia de conflito. Como afirma
Bracht (1997).
No início da década de 80, o modelo começa a ser questionado mais
radicalmente. As mudanças mais significativas que derivaram desta crítica
dizem respeito a um novo paradigma no entendimento do movimento
humano ou do corpo. O movimento não é mais entendido como o
deslocamento de um objeto no tempo e espaço, mas sim como um
movimento do homem em direção a transcendência (p.47)
Uma orientação pedagógica que se destacam neste período é a crítico–
superadora. Entre as características específicas mais importantes destacam-se
algumas fases da organização do trabalho educacional, na perspectiva do Coletivo
de Autores (1992).
A diagnóstica por que pretende ler os dados da realidade, interpretá-los e
emitir um juízo de valor sobre elas. Este juízo é dependente da
perspectiva de quem julga, por que os valores nos contornos de uma
sociedade capitalista são de classe. É judicativa porque julga os elementos
da sociedade a partir de uma ética que representa os interesses de uma
determinada classe social. Essa pedagogia é também considerada
teológica, pois busca uma direção, um alvo de onde se quer chegar,
dependendo de classe de quem reflete (p.25)
Derrubar as barreiras impostas pela legislação, às tendências e as práticas
pedagógicas alienantes e as influências do modo de produção capitalista é um
desafio para a educação física escolar. Todos que estão envolvidos no processo
devem estar dispostos a apoiar a transformação, e acreditar que a mudança é
possível, como ressalta Freire (1996).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Meu papel no mundo não é só o de quem constata o que ocorre, mas
também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não sou apenas
objeto da história, mas seu sujeito igualmente. No mundo da história, da
cultura, da política, constato não para me adaptar, mas para mudar (p.77).
OS SUJEITOS ENTRE OS LIMITES E AS POSSIBILIDADES
Ao caracterizar o aluno da E.J.A, na sua conjuntura de totalidade social,
econômica, familiar e cultural, (CARNEIRO,1998, p.115), separa os sujeitos que
se inserem nesta modalidade de ensino em grupos diferentes. ``Todos estes
carecem de uma política própria de atendimento, capaz de lhes conferir os meios
adequados para a superação ou da escolarização que não ocorreu ou que ocorreu
de forma inadequada``.
O trabalho na vida destes alunos-trabalhadores em vez de contribuir na sua
formação como ser humano no sentido de sua totalidade, considerado como uma
categoria de formação e transformação torna-se um problema ligado ao mundo da
sobrevivência imediata. O trabalho muda seu sentido e princípio ontológico, e
passa a ser uma forma de obter lucro a classe dominante e exploração da força
(energia) do trabalhador que se resume ao processo de alienação e a exclusão da
riqueza produzida socialmente, desencadeada na desigualdade social e suas
consequências.
Massas de operários, aglomerados nas fábricas, são organizadas
militarmente. Como simples soldados da indústria, são postos sob a
vigilância. Não são apenas servos da classe burguesa, do estado burguês
, mas são também, a cada dia e a cada hora, escravizados pela máquina,
pelo capataz e sobretudo pelo singular burguês fabricante em pessoa.
Tal despotismo é tão mais mesquinho, odioso e exasperador quanto
mais abertamente proclama ser o lucro seu objetivo último.(MARX e
ENGELS, 1848,p.52)
A escola como lócus de construção do conhecimento na relação entre
trabalho e a cultura, passa a ser substituída e insignificante por estes alunos, por
representar para eles nesta luta pela vida um afazer sem lucro na visão neoliberal,
ponto que não é discutido e questionado pela maioria dos professores na escola,
muito menos incorporados na organização do seu trabalho educacional.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Ao sentar-se na carteira, em face de discriminação e a sensação de
incapacidade, a maioria dos alunos durante as aulas mostram-se desanimados e
desgastados pelo cansaço físico e mental. Quando inseridos no mundo do
trabalho, os alunos não sentem prazer no exercício de sua atividade e aí buscam a
escola como lócus de idealizações. Olham para a EJA como meio de ascensão de
uma melhor perspectiva e qualidade de vida. Outra concepção percebida em
minoria é a visão de uma atividade somatória para o seu bem estar que contribui
na sua formação humana em sua totalidade.
Já em relação à educação física é mal compreendida, tanto pelos alunos,
escola e pelo estado que se torna um aparelho ideológico da visão capitalista. O
nível de desconhecimento dos alunos acerca de uma visão ampla e crítica sobre a
educação física é visível. O desafio posto é pensar dialeticamente com os alunos
no sentido de formar um conceito de corpo-sujeito. Capaz de ir além do conhecido
para desmitificar as dicotomias existentes na educação física escolar entre corpo e
mente e teoria/prática, através do estudo da cultura corporal como linguagem.
A ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO EDUCACIONAL DA EDUCAÇÃO
FÍSICA E A CONSTRUÇÃO DAS POSSIBILIDADES
Educação é um ato interessante e visa provocar mudanças nos seres
humanos e, consequentemente, em contextos sociais por meio de uma prática
efetivada de forma coletiva. A educação escolar é uma prática social que colabora
tanto para a manutenção do status dominante, quanto para encontrar brechas para
uma práxis pedagógica transformadora.
Ao reconhecer que, precisamente porque nos tornamos seres capazes de
observar, de comparar, de avaliar, de escolher, de decidir, de intervir, de
romper, de optar, nos fizemos seres éticos e se abriu para nós a
probabilidade de transgredir a ética, jamais poderia aceitar a transgreção
como um direito mas como uma possibilidade. Possibilidade contra que
devemos lutar e não diante da qual cruzar os braços.(PAULO
FREIRE,1996, p.100)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Se a escola é um lócus de produção do saber cujo objetivo maior é de educar,
transformação, produzir, cabe ao professor estar em constante reflexão de sua
práxis pedagógica, compatível com os sujeitos inseridos no contexto. Lutar para
que ocorra uma participação efetiva na construção de aprendizagens
significativas, além da simples reprodução de idéias capitalistas.
A organização do trabalho pedagógico deve partir de uma visão macro, ou
seja, a construção da escola e de sua proposta, articuladas com as relações sociais,
econômicas, políticas e culturais da sociedade. Dentro dos temas e conteúdos da
cultura corporal, a construção dos princípios e características dos conteúdos deve
partir da própria prática social dos alunos. Formalizado através do trabalho
coletivo (alunos-professores) nas aulas de educação física sob a forma de temas
geradores.
A problematização dos conteúdos e da própria aula de educação física
deve ser um ponto de partida sobre a prática educativa nesta modalidade em
questão. Mas antes de entrar em contato com os temas e conteúdos e durante o
próprio trabalho educacional, perguntas como “Qual a sua visão sobre a
disciplina?”, “O que significa educação física para você?”. “Quais as palavras que
estão relacionadas aos conteúdos?”, devem ser levantadas e discutidas.
O professor procurará criar condições para que juntamente com os alunos,
``a consciência ingênua seja superada e que estes possam perceber as contradições
da sociedade e grupos em que vivem, e primeiramente venham a ter uma autoreflexão de sujeitos da organização do trabalho educacional``.
(MIZUKAMI,1986,p.99). No primeiro contato com os alunos é importante
explicitar as propostas, os conteúdos, os seus objetivos gerais, os métodos, sua
visão de mundo e o tipo de sociedade que defende e almeja. Para que os sujeitos
ali inseridos comecem a construir uma consciência de como lidar com os temas e
desafios propostos pelo professor no sentido clarear a prática pedagógica em
função do processo de ensino-aprendizagem mais adequado.
Em um processo contínuo de produção, reflexão e sistematização dos
conhecimentos da cultura corporal, o professor deve estar pautado em uma
pedagogia que conteste a realidade e proponha caminhos para emancipação. Para
Luckezi (1998) os professores têm um papel importante neste contexto.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Se todos os professores deste país desenvolverem, com proficiência a sua
atividade profissional, estaremos dando um grande passo no sentido de
possibilitar as nossas crianças, jovens e adultos condições de crescimento,
terão pelo menos uma razão para ali permanecerem em função de um
trabalho que lhes demonstre o significado e o prazer do seu próprio
desenvolvimento (p.121).
No caso da educação física, parece que as falas estão denunciando aquele
professor que se orienta pela visão biológica de corpo sem levar em conta a
cultura e as diferentes expressões da sociedade. Sua prática acaba por torná-lo
vítima da tradição (saúde e competição) ou simples técnico reprodutor de
modismo (corpolatria).O coletivo de Autores (1992) oferece algumas dicas:
É necessária a pretensão de possibilitar ao aluno da escola pública
entender a realidade social interpretando-a e explicando-a a partir dos
seus interesses de classe social. Isso quer dizer que cabe a escola
promover a apreensão da pratica social. Portanto, os conteúdos devem ser
buscados dentro dela (p.63).
A prática pedagógica da educação física no ensino de jovens e adultos
precisa superar a perspectiva compensatória da educação corporal e do
movimento, e começar a ir além da perspectiva do capital. Segundo Gasparin
(2003).
O processo pedagógico deve possibilitar aos educandos, através do
processo de abstração, a compreensão da essência dos conteúdos a serem
estudados, a fim de que sejam estabelecidas as ligações internas
específicas desses conteúdos com a realidade global, com a totalidade da
prática social e histórica. Este é o caminho por meio do qual os educandos
passam do conhecimento empírico ao conhecimento teórico - cientifico,
desvelando os elementos essenciais da pratica imediata do conteúdo e
situando-o no contexto da totalidade social (p. 7).
DOS LIMITES ÀS POSSIBILIDADES
Ao pensar a educação (escola) como lócus e fonte de formação humana, de
sistematização dos conhecimentos historicamente construídos, do trabalho com a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
cultura elaborada e como umas das instâncias de transformação social, a reflexão
sobre a sociedade, seus princípios e suas características tornam-se um ponto
inicial na construção de possibilidades na organização do trabalho educacional. A
realidade nesta relação entre sociedade e educação necessita de uma análise
crítica, com objetivos bem traçados e visões estabelecidas de qual sociedade,
educação, escola e ser humano à organização do trabalho educacional irá se
direcionar.
A modalidade E.J.A e a prática da educação física inserida neste contexto,
têm como necessidade partir desta reflexão dialética. Já que é um tipo de
educação e um componente curricular que se legitimaram em sua origem, em
perspectivas diretamente relacionadas aos princípios dos interesses da classe
dominante, das características da sociedade e dos objetivos da força de produção
capitalista. Limites e possibilidades são construídos, e juntamente com estas
perspectivas novas orientações devem ser reoganizadas para que discursos e ações
se efetivem no processo de emancipação, da sociedade e da educação.
O professor de educação física nesta modalidade nos estudos realizados
poderá se deparar com uma visão por parte do sistema, do estado, da escola e dos
próprios alunos que caminham para uma organização do trabalho educacional
alienante, reprodutora ou conservadora aos interesses ao modo de produção
capitalista. Cabe ao professor, como sujeito ter uma ação política de intervenção,
que naquele lócus se trata de seres humanos e não objetos de uso para o sistema,
que pelas condições que advém estes alunos eles necessitam de um olhar e uma
prática diferenciada.
Para uma organização do trabalho educacional que venha estabelecer uma
lógica de emancipação, o trabalho coletivo como categoria, proporciona o
envolvimento dos sujeitos do fazer pedagógico, torna professor e alunos sujeitos
em um diálogo permanente de construção. Trás um ambiente que o professor não
é detentor dos únicos conhecimentos que devem ser trabalhados e os alunos meros
objetos de moldagem. No caso específico da educação física, além deste ponto
cabe ressaltar a importância do direcionamento claro e objetivo que o professor
deve ter na organização do seu trabalho educacional, tendo o objetivo e avaliação
e, o método e conteúdo, como pares dialéticos direcionando sua prática.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Ao discutir a relação da cultura corporal com a educação de jovens e
adultos, não é negar a sociedade que vivemos, mas primeiro levar em
consideração as pessoas e não a produção, combater teoricamente e politicamente
através de uma práxis, a lógica de formação do mercado e o uso da educação
física como modo de reprodução e instrumento deste sistema.
A organização do trabalho educacional da educação física na modalidade
de educação de jovens e adultos, neste sentido, deve ter como prática social inicial
e final uma reflexão, discurso e ação em uma visão macro de sociedade, de
educação e de educação física. O limite primordial é os ditames do mercado, mas
o homem ao ser instrumento do sistema se torna ao mesmo tempo sujeito de
possibilidades de transformação, já que o ser humano que constrói as relações
sociais e as próprias lutas de classe, que desencadeia em uma crise, que é o início
da possibilidade de emancipação.
Emancipar a base das concepções e da organização educacional das leis
do mercado, levam a escola e o trabalho da educação física a interromper e
transgredir nas funções e objetivos pautados no pragmatismo, instrumentalismo,
imediatista e as visões interesseiras do mercado. Tais ações levam a possibilidade
do sujeito a modificar o mundo, o meio em que esta inserida e por sua vez,
modificar a si mesmo.
REFERÊNCIAS
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. Rio de
Janeiro. Paz e Terra, 1997.
FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido, 17°ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987. SAVIANI,
Demerval. Escola e Democracia. 29 ed. Campinas SP. Autores Associados, 1995.
MARX E ENGELS. Manifesto do partido comunista. Tradução de Nassetti, Pietro. 2ª Ed. São
Paulo. Editora Martin Claret,(1848),2000. (Coleção a obra prima de cada autor).
GRAMSCI, Antônio. Os intelectuais e a organização da cultura. Tradução Carlos Nelson
Coutinho. Rio de Janeiro. Civilização Brasileira, 9ª edição, 1995.
FREITAS, Luiz Carlos. Crítica da organização do trabalho pedagógico e da didática. Campinas.
Papirus, 1995.
GASPARIN João L. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. Campinas, SP. Autores
Associados, 2002.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
MIZUKAMI, Maria Da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens do processo. Coleção temas
básicos de educação e ensino. Ed. E.P.U. 1986.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: Estudos e proposições, 08.Ed São Paulo: Cortez, 1998.
CARNEIRO, Moaci Alves. LDB fácil: leitura crítico-compreensiva: artigo a artigo. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1998.
COLETIVO DE AUTORES. Metodologia do ensino de educação física. São Paulo. Cortez, 1992.
CASTELLANI, Filho Lino. Política Educacional e Educação Física. Campinas, SP. Autores
Associados, 1998.
CASTELLANI, Filho Lino. Educação Física no Brasil: A História que não se conta . 14. ed.
Campinas-SP: Papirus, 1986.
SOARES, Carmem Lucia. Educação Física: raízes européias e Brasil. Campinas, SP. Autores
Associados, 1994.
BRACHT, Valter. Educação Física e aprendizagem social. 2.ed-Porto Alegre: Magister.1997.
OLIVEIRA,Vitor Marinho.Consenso e conflito da educação física.Ed.Shape, 2005. THIOLLENT,
M. Metodologia da Pesquisa- Ação. São Paulo: Cortez/Autores Associados. 1985.
DAVID, Nivaldo A N. Contribuições do método participativo para a capacitação de professores
de Educação Física escolar. Revista Pensar a Prática. Goiânia. FEF/UFG. CEGRAF, 1998.
MACHADO, Maria Margarida. Política Educacional para Jovens e Adultos: A Experiência do
PROJETO AJA (93/96) na Secretaria Municipal da Educação de Goiânia. Dissertação de
mestrado em educação -UFG.1997.
RODRIGUES, Maria Emilia de Castro. A prática do professor na educação de adolescentes,
jovens e adultos: A experiência do projeto AJA de Goiânia-Go.Dissertação de mestrado em
educação UFG. Goiânia-Go.2000. 2731
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA EM SITUAÇÃO DE QUEIXA
ESCOLAR: O CONTEXTO DO SERVIÇO ESPECIALIZADO DE APOIO
A APRENDIZAGEM.
Janaína Vieira Pinto
Profª. Drª. Diva Maria Moraes Albuquerque Maciel
Universidade de Brasília – UnB
Instituto de Psicologia - IP
Programa de Pós-Graduação em Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde
[email protected]
RESUMO
As escolas públicas do Distrito Federal, desde 1968, contam com o Serviço Especializado de
Apoio à Aprendizagem – SEAA. Trata-se de um o serviço de caráter multidisciplinar, que oferece
apoio educacional especializado à alunos em situação de queixas escolares e consequentemente
aos sujeitos que integram o ambiente educacional e familiar desses alunos. Nesse contexto, a partir
de uma perspectiva sociocultural construtivista do desenvolvimento humano, nosso trabalho visa
compreender de que maneira as interações sociais aliadas às estratégias de intervenção
psicopedagógica podem contribuir para a superação das queixas escolares. Considerando a
perspectiva sociocultural construtivista que valoriza o caráter ativo do indivíduo na construção dos
processos psicológicos, por meio das interações com seu contexto físico, simbólico e sociocultural,
buscamos descrever e analisar como ocorrem as interações entre psicopedagogas e alunos, a
necessidade desse atendimento e as possibilidades de co-construção da aprendizagem. Através de
uma abordagem qualitativa, utilizando procedimentos de registo videográfico, observações e
entrevistas, desenvolvemos a análise microgenética de episódios de intervenção psicopedagógica.
Conferindo uma ênfase ao estudo das interações sociais, e ao processo de co-construção de
significados e processos de canalização cultural. Apresentamos nossa compreensão das queixas
escolares e da aprendizagem na perspectiva do desenvolvimento humano. Em seguida faremos um
breve esclarecimento da nossa visão da psicopedagogia e da intervenção pedagógica, para
finalmente apresentar como esse fenômeno ocorre no contexto do Serviço Especializado de Apoio
à Aprendizagem. Desse modo, nosso estudo pretende na evolução da pesquisa empírica
compreender os processos de compartilhamento e a transferência gradual de responsabilidades e
conhecimentos, para a promoção da aprendizagem dos estudantes.
Palavras chave: intervenção psicopedagógica; queixa escolar; interações sociais.
APRESENTAÇÃO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em meio a diversas pesquisas feitas para a compreensão do fenômeno da
aprendizagem, encontramos um grande número de trabalhos que revelam como
surgem ou quais são as causas das dificuldades apresentadas pelos alunos, no
entanto, é urgente a necessidade de ver essa questão de outra perspectiva.
Partimos do pressuposto de que existem possibilidades de superar tais queixas e
buscamos investigar de que maneira as intervenções psicopedagógicas podem
contribuir nesse processo, e assim contribuir para a compreensão do processo de
intervenção psicopedagógica e para que o processo de aprendizagem seja
reconhecido como característico do desenvolvimento humano, ou seja, ocorre de
maneira diferente em cada sujeito.
Desse modo, o trabalho visa compreender de que maneira as interações
sociais aliadas às estratégias de intervenção psicopedagógica podem contribuir
para a superação das queixas escolares. Pretendendo não enfatizar a problemática,
mas reconhecendo propostas de ações interventivas que possam amenizá-la, senão
resolvê-la. E para tanto ao longo do presente trabalho apresentamos a nossa
compreensão a respeito das queixas escolares, esclarecendo nossa escolha pelo
termo, caracterizando e conceituando-as. Em sequência apresentamos a nossa
compreensão da aprendizagem e da queixa escolar na perspectiva do
desenvolvimento humano, seguida de um breve esclarecimento da nossa visão da
psicopedagogia e da intervenção psicopedagógica orientadas pela perspectiva
sociocultural construtivista e finalmente esclarecemos como esse fenômeno ocorre
no contexto do Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem e apresentando o
desenvolvimento da pesquisa.
A QUEIXA ESCOLAR NA PERSPECTIVA DO DESENVOLVIMENTO
HUMANO
O fenômeno da inadequação escolar é observado ao longo da história da
educação e ainda hoje são comuns observações em discursos no meio escolar de
que determinada criança não aprende, está atrasada em relação à turma, não se
comporta bem, atrapalha as aulas ou não tem rendimento. Na nossa visão, e em
consonância com as observações de Neves & Marinho-Araújo (2006), o insucesso
[Type text]
[Type text]
[Type text]
escolar recebe os mais variados títulos, entre eles fracasso escolar, distúrbios de
aprendizagem dentre outros, que trazem em si diferenciações e remetem a
culpabilidade do aluno, do professor ou do próprio sistema. Contudo, aprofundar
na discussão da responsabilidade ou estabelecer as causas da ocorrência desse
fenômeno não é nosso objetivo, pois está claro que condições biológicas,
psicológicas, sociológicas, pedagógicas e governamentais interagem de forma
dinâmica e produzem efeitos que se expressam na escola, em alunos das mais
diversas classes sociais, com predomínio, contudo, nas crianças das classes menos
favorecidas (Neves & Marinho-Araújo, 2006).
O conceito de aprendizagem escolar tem natureza histórica, cultural e
psicossocial, pois em cada época, em cada sociedade possui significados e
sentidos particulares. Em contraponto entendemos que o aluno é identificado com
dificuldades de aprendizagem quando não consegue atender aos objetivos
estabelecidos em relação aos conteúdos formalmente definidos como objetos de
aprendizagem (Rossato, 2009).
Em nossa opção pelo termo “queixas escolares” apresentado por Neves
(2011), compreendemos que a expressão traz consigo uma conotação mais ampla
e profunda. A autora esclarece que aquele não se constitui, apenas, em uma nova
nomenclatura em substituição às expressões anteriormente utilizadas, mas uma
nova compreensão a situação de inadequação, pois parte da noção de que uma
queixa pode ser entendida como uma demanda que se endereça a um outro e que,
mesmo amparada na realidade objetiva, é uma expressão da subjetividade de
quem se queixa. Ao observar a heterogeneidade do comportamento infantil, é
possível que o professor entenda que determinada criança apresenta alguma
incompatibilidade com aquilo que este espera. Esse estranhamento geralmente se
traduz em uma queixa: onde o professor se queixa do comportamento ou da
diversidade apresentada.
A ciência do desenvolvimento humano empenha-se em compreender a
natureza dinâmica das relações do homem e a diversidade dos contextos em que
esse está inserido. Desse modo, Dessen & Costa Junior (2005) afirmam que o
desenvolvimento humano ocorre por meio de um processo progressivo de
interações recíprocas e complexas entre um organismo biopsicológico ativo e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
outras pessoas, objetos e símbolos em seu ambiente imediato. O processo de
interação implica em reunir em um mesmo espaço as concepções de sujeitos
diferentes. Se considerarmos que a escola é um campo fértil para essas interações,
ela também será palco para inúmeros conflitos. Isso porque os sujeitos ali
reunidos sejam alunos, professores ou agentes de conservação e limpeza, são
provenientes de ambientes diversos e cada um traz impresso em si concepções
particulares de desenvolvimento.
É sabido ainda que as teorias da psicologia do desenvolvimento, até
meados da segunda metade do século XX, propunham “definir parâmetros ou
padrões normativos que pudessem explicar o que, como e por que as mudanças
ocorriam na infância e na adolescência, além dos possíveis desvios que poderiam
ocorrer nessa trajetória” (Dessen & Costa Junior, 2005, p. 20). E essas concepções
foram por muito tempo disseminadas e ainda hoje uma considerável parcela da
sociedade ainda acredita que existe um desenvolvimento humano padronizado.
Desse entendimento resultaram diversos aspectos preconceituosos que impedem a
aceitação das diferenças individuais.
Assim, ao tomar a queixa escolar na perspectiva do desenvolvimento
humano, percebe-se que por acreditar que determinada criança ou adolescente não
responde da maneira desejada às atividades fornecidas pela escola “algo está
errado”. E nesse sentido é que entendemos a queixa, que geralmente parte do
professor, que ao não reconhecer que o desenvolvimento diverso é aceitável,
queixa-se do aluno para que soluções ou problemas sejam encontrados a fim de
que seja justificada a diversidade presente. No entanto, não se pretende aqui
responsabilizar nenhum dos sujeitos, pois acreditamos que todos envolvidos no
processo devem ser auxiliados. A exemplo dessa pressão mútua podemos refletir
que
o aluno é pressionado pelo tempo do professor e o professor é
pressionado pelo tempo das variadas obrigações que tem que cumprir
junto à escola. Nessa pressão contínua, estamos perdendo o dom da
paciência para respeitar o tempo de aprender do outro e é justamente
por essa pressão que se podem produzir dificuldades de aprendizagem,
nesse caso, dificuldades relacionadas ao tempo necessário para
aprender. (Rossato, 2009, p.54)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
E neste momento educador está apresentando, na realidade, é uma situação
de dificuldades na compreensão mútua entre ele e o aluno (Bassedas, 1996).
Assim ao entender a queixa como algo subjetivo, que pode representar a
incompreensão de quem se queixa dos processos de desenvolvimento do outro
apontamos a intervenção psicopedagógica com uma importante contribuição para
a superação das queixas escolares.
A PSICOPEDAGOGIA E A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA
De acordo com Bossa (2011), acreditamos que a psicopedagogia traz em si
um compromisso de contribuir para a compreensão do processo de aprendizagem
e identificação dos fatores facilitadores e comprometedores desse processo, com
vistas a uma intervenção. A psicopedagogia apresenta-se como uma área de
estudos que pretende compreender o processo de aprendizagem por meio da visão
integral do sujeito que aprende. Cabe esclarecer que muito embora sua história
seja marcada por uma perspectiva clínica, onde o sujeito que “não aprendia” era
responsabilizado, e deveria ser reeducado ou tratado de modo terapêutico.
Trazemos para nossa pesquisa uma visão mais esclarecida dos aspectos do
desenvolvimento humano, compreendendo o sujeito de modo integral, sem
enfatizar um aspecto em detrimento do outro.
Afinal, a concepção de ser humano presente nas entre linhas das pesquisas
orientadas pela perspectiva sociocultural construtivista pressupõem uma
concepção dialética, em que o ser humano transforma e é transformado pela
natureza, sendo um construtor de si mesmo e do mundo em parceria com os
outros (Branco & Madureira, 2005). E particularmente nosso trabalho não busca
estratégias diagnósticas, ou mesmo apontar causas e consequências, nosso
objetivo é analisar possibilidades de superação e se possível a eliminação desse
desconforto por meio de identificação de estratégias interventivas.
Concebemos a intervenção em seu significado mais literal, ou seja, o ato
ou efeito de intervir, onde o psicopedagogo seria um terceiro assistindo e
conduzindo duas ou mais partes negociantes a identificarem os pontos de conflito
[Type text]
[Type text]
[Type text]
e, posteriormente, desenvolver de propostas que ponham fim ao conflito. No
nosso contexto a intervenção pode ainda ser entendida como uma mediação, o
conflito em questão seriam as queixas escolares e as partes podem ser
identificadas como o professor, o aluno e ainda o conteúdo escolar. Pois
percebemos os processos de ensino-aprendizagem como processos com interações
complexas e variadas, entre, pelo menos, três elementos: o aluno, os conteúdos de
aprendizagem e o professor. (Bassedas, 1996)
De modo que a atuação do psicopedagogo seria a de mediar esse conflito
interagindo com as partes visando a resolução do conflito. Contudo, cabe
explicitar aqui que a solução aqui não seria necessariamente a aprendizagem
imediata de um determinado conteúdo por um aluno do qual o professor tenha se
queixado. Pois acreditamos que a forma mais saudável de resolução desse conflito
seria possibilitar uma nova significação da aprendizagem para todos os sujeitos
envolvidos, de modo que os seres humanos são co-construtores do seu
desenvolvimento enquanto sujeitos singulares e simultaneamente, são coconstrutores dos contextos socioculturais nos quais se inserem (Branco &
Madureira, 2005).
Assim a intervenção do psicopedagogo segue na direção de possibilitar ao
aluno uma nova significação da aprendizagem e da sua capacidade para aprender,
bem como oferecer ao professor uma compreensão dos processos de
desenvolvimento humano envolvidos na aprendizagem. Pois não estamos aqui
trazendo esse profissional com um Cristo Salvador, mas alguém que pode
contribuir para uma ressignificação do processo de aprendizagem. Pois é sabido
que as condições para superação das dificuldades de aprendizagem passam pelas
crenças, representações e teorizações dos grupos relacionais desses sujeitos
(Rossato, 2009).
Observamos que ainda é pratica corrente, tentar “corrigir” o aluno para que
ele se adeque às exigências escolares e sociais. Em seus estudos Rossato (2009)
buscou compreender de que modo a subjetividade dos sujeitos envolvidos na
aprendizagem escolar se movimenta no sentido da superação de dificuldades de
aprendizagem e constatou que geralmente o trabalho feito pela escola pauta-se na
repetição e tais procedimentos podem reforçar a dificuldade no aluno. E é nesse
[Type text]
[Type text]
[Type text]
direcionamento, e em consonância com Bassedas (1996) que cabe a intervenção
psicopedagógica, pois o que nos parece mais relevante não é procurar a causa de
uma conduta determinada, mas compreender na forma em que estão organizadas
as sequências de interação que conduzem às situações problemáticas,
considerando que o aluno aprende construindo significados a partir de uma
interação constante com seu meio. Tendo em vista que nesse momento de
intervenção é possível negociar com as duas partes, a primeira que é o aluno pode
ser levado a compreender suas possibilidades de superação, sendo esta
conscientização fundamental para que possa ter uma participação ativa.
Bassedas (1996) ressalta que em muitos casos, não é necessário
estabelecer objetivos, conteúdos e atividades específicas e diferenciadas, mas sim
saber oferecer maior ajuda e apoio, para que o aluno consiga entender e relacionar
aquilo que já estão lhe ensinando com aquilo que ele já sabe. As atividades lúdicas
e descontraídas são sugestões para esses momentos, visto que a repetição da
situação na qual a queixa foi elaborada não modifica a significação daquela
aprendizagem e reforça a sensação de fracasso. Na intervenção a ênfase que se
busca são as possibilidades desse aluno, aquilo que ele apresenta que pode
auxiliar na superação das queixas. É preciso compreender que precisamos intervir
e tentar promover modificações nos processos de ensino-aprendizagem, de forma
a possibilitar que determinados alunos aprendam e melhorem o seu
desenvolvimento pessoal e social.
Retomando nossa compreensão de que são necessárias ações e programas
de longo prazo e alcance, sugerimos aos psicopedagogos que se inicie a
intervenção tão logo receba a queixa e aos professores, caso não tenham
compreensão suficiente para intervir, que encaminhem suas queixas tão logo as
perceba. Pois acreditamos que intervenções ainda que pontuais podem gerar
pequenas modificações dentro de um subsistema (uma instituição) que produzirão
um efeito ressonante em outros subsistemas, que provocam, ao longo do tempo,
outras modificações do sistema. Isso porque os fenômenos que agem na realidade
estão em contínua interação uns com os outros e as condutas de uns influem nos
outros de forma recíproca (Bassedas, 1996).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O CONTEXTO DO SERVIÇO ESPECIALIZADO DE APOIO A
APRENDIZAGEM – SEAA
No Distrito Federal, as instituições públicas que atendem a educação
infantil e as séries iniciais do ensino fundamental, contam com um Serviço
Especializado de Apoio à Aprendizagem (SEAA) que objetiva a superação das
dificuldades encontradas nos processos de ensino e de aprendizagem. Nesse
contexto, considera-se que a atuação conjunta de profissionais da Psicologia e da
Pedagogia contribui com conhecimentos complementares nos processos de
aprendizagem e desenvolvimento humano, enriquecendo a prática educativa
segundo conhecimentos específicos de cada área.
Assim, a Pedagogia, que será a atuação considerada nessa investigação,
estuda as práticas educativas a fim de revelar suas implicações sociais, políticas,
econômicas bem como formas de intervenção pedagógica propondo uma reflexão
geral da realidade da educação. A Psicologia Escolar busca ressignificar as
concepções, com a escuta e orientação aos atores da instituição. No entanto, o
recorte de análise a ser investigado neste trabalho é especificamente a interação
que ocorre em momentos de intervenções feitas por pedagogas/psicopedagogas do
SEAA aos alunos encaminhados por demandarem queixas escolares. Assim,
buscamos entrelaçar construtos teóricos que embasem, justifiquem e expliquem a
prática do profissional habilitado em pedagogia que incorpora o SEAA. Levando
a uma melhor compreensão dos fenômenos a serem investigados e possibilitando
melhorias à qualidade do atendimento oferecido a crianças que apresentem
queixas escolares.
METODOLOGIA
Através da abordagem qualitativa a presente pesquisa tem o intuito de
esclarecer e apontar soluções e sugestões que possam contribuir com a melhoria
da qualidade do ensino, intervindo e prevenindo as queixas escolares e
estimulando a intervenção psicopedagógica eficiente. E a partir da perspectiva
sociocultural construtivista compreendemos o processo de intervenção como
[Type text]
[Type text]
[Type text]
atividade bidirecional, superando a unidirecionalidade dos estudos psicológicos,
que oram ressaltam a importância do indivíduo e esquecem o contexto, ora
valorizam o contexto e colocam em segundo plano o papel ativo e intencional do
sujeito psicológico (Branco & Madureira, 2005).
Desenvolvemos a pesquisa com o olhar orientado pela análise
microgenética, que segundo Góes (2000) consiste no exame detalhado de
processos cognitivo-interacionais e na identificação de seus significados em
relação a atividade e situações específicas, ou seja, é uma forma de construção de
dados que requer a atenção a detalhes e o recorte de episódios interativos, sendo o
exame orientado para o funcionamento dos sujeitos focais, as relações
intersubjetivas e as condições sociais da situação, resultando num relato
minucioso dos acontecimentos. Nessa análise minuciosa do processo de
intervenção psicopedagógica buscamos configurar sua gênese social bem como as
transformações do curso dos episódios e assim, aprofundar nosso estudo nos
processos de co-construção que podem emergir nessas situações. Estudar os
processos de co-construção de significados, crenças e valores é, portanto, uma
estratégia teórica e metodológica importante para dar sentido à relação entre
desenvolvimento individual e contextos socioculturais (Branco e Madureira,
2005).
Góes (2000) esclarece que a análise microgenética pode ser o caminho
exclusivo de uma investigação ou articular-se a outros procedimentos. Em nossa
pesquisa são utilizadas estratégias de análise microgenética de episódios de
aprendizagem associadas à videografia. Meira (1994) observa que a videografia se
traduz em registros em vídeo de atividades humanas e mostra-se como uma
ferramenta ímpar para a investigação microgenética, ao resgatar a densidade de
ações comunicativas e gestuais. Portanto, a videografia aliada à análise
microgenética formam um modelo de coleta e análise de dados que possibilita
uma interpretação complexa e consistente dos mecanismos psicológicos
subjacentes à atividade humana.
Participam do estudo uma psicopedagoga do SEAA e dois alunos, com
idades de 7 e 8 anos que apresentam queixas escolares, e que no momento da
realização da pesquisa estavam em processo de intervenção psicopedagógica. E
[Type text]
[Type text]
[Type text]
os procedimentos para a construção das informações ocorrem em três etapas,
compostas de observação do contexto em que os participantes estão envolvidos,
registros em áudio e vídeo e entrevistas.
Na primeira realizamos a observação em sala de aula e do contexto escolar
visando a compreensão das crenças e valores institucionais em relação à
aprendizagem, queixa escolar e intervenção psicopedagógica bem como a
observação das crianças em atividades relacionadas às queixas escolares, descritas
no encaminhamento ao SEAA. Concomitante a essa primeira fase de observação
desenvolvemos a análise documental, para obtermos informações complementares
e relevantes à compreensão da situação apresentada. Assim são analisados
seguintes documentos: (a)Orientação Pedagógica – Serviço Especializado de
Apoio à Aprendizagem – SEAA, (b) Projeto Político Pedagógico da Instituição
Escolar, (c) Histórico escolar das crianças selecionadas, (d) Encaminhamento para
o SEAA, (e) Material Escolar das crianças (cadernos e atividades), e (f)
Parecer/Relatório do SEAA.
Na etapa seguinte realizamos as primeiras entrevistas. Sendo que a da
entrevista com os pais/responsáveis pela criança pretende: (a) conhecer a estrutura
familiar e história da criança na família, (b) conhecer o histórico escolar da
criança na visão/compreensão da família, (c) perceber como a família compreende
a aprendizagem e a queixa escolar apresentada pela criança. Com as crianças
realizamos as entrevistas com o intuito de (a) conhecer a estrutura familiar e a
história da pessoal na família pela ótica da criança, (b) conhecer o histórico
escolar da criança na visão/compreensão da criança, (c) buscar a compreensão que
a criança tem de aprendizagem e da queixa escolar. Nesse procedimento contamos
com recursos lúdicos (brinquedos, gravuras, pinturas, etc.) que pudessem mediar e
facilitar esse processo, considerando que cada criança tem uma maneira particular
de expressar-se.
As entrevistas com os profissionais que acompanham a
criança, ou seja, a professora atual e a psicopedagoga buscam conhecer (a) a
formação e trajetória acadêmica, (b) a trajetória Profissional, (c) a
visão/compreensão que essa profissional tem do aluno, (d) as concepções de
aprendizagem, de queixa escolar e de intervenção psicopedagógica e (e) a
compreensão da atuação do SEAA.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em seguida desenvolvemos o registro videgráfico de Sessões de
Atendimento, onde ocorrem as Intervenções Psicopedagógicas. Esses registos
pretendem nos auxiliar na observação de: (a) interações sociais (adulto-criança /
psicopedagoga-criança), (b) indicadores de co-construção de conhecimento, (c)
indicadores de superação parcial ou total da queixa escolar, e ainda (d) estratégias
utilizadas durante a intervenção.
Concluído o período de registro das intervenções psicopedagógicas,
retomamos com a segunda fase de entrevistas, onde visamos analisar com os
sujeitos participantes os efeitos e reflexos desse período de intervenção na vida
escolar e familiar da criança bem como na prática pedagógica/psicopedagógica e
nas concepções das profissionais que atendem essas crianças. Assim, a segunda
fase da Entrevista Familiar pretende realizar uma análise (a) do período de
intervenção psicopedagógica, (b) da superação da queixa escolar (superação
parcial ou total/ manutenção / agravo), (c) da ocorrência de reflexos, da
intervenção psicopedagógica, no ambiente familiar (se positivo ou negativo), (e)
da relação da criança com a aprendizagem escolar segundo a compreensão da
família.
Com as criança, essa segunda fase visa analisar da perspectiva da
criança: (a) o período de intervenção psicopedagógica, (b) a qualidade da
interação criança-psicopedagoga, (c) a superação da queixa escolar (superação
parcial ou total/ manutenção / agravo), (d) a ocorrência de reflexos, da intervenção
psicopedagógica, no ambiente familiar (se positivo ou negativo), (e) a ocorrência
de reflexos, da intervenção psicopedagógica, no ambiente escolar (se positivo ou
negativo), e ainda (f) a relação (atual) da criança com a aprendizagem escolar.
Nessa segunda fase, as entrevistas com as professoras das crianças
pretendemos analisar (a) o período de intervenção psicopedagógica, (b) a
superação da queixa escolar (superação parcial ou total/ manutenção / agravo), (c)
a ocorrência de reflexos, da intervenção psicopedagógica, no ambiente de sala de
aula, relacionados à criança (se positivo ou negativo) e (d) a ocorrência de
reflexos, da intervenção psicopedagógica, na prática pedagógica (se positivo ou
negativo). Nesse momento sugerimos a audição e atualização das concepções de
aprendizagem, queixa escolar, intervenção psicopedagógica e atuação do SEAA,
registradas na primeira fase das entrevistas. Desse modo, podemos juntamente
[Type text]
[Type text]
[Type text]
com a professora desenvolver uma análise de co-construções ocorridas e
percebidas nesse processo. E a segunda fase da entrevista com a
Pedagoga/Psicopedagoga, desenvolvemos a análise (a) do período de intervenção
psicopedagógica, (b) da superação da queixa escolar (superação parcial ou
total/manutenção /agravo), (c) da interação criança-psicopedagoga, (d) das
estratégias utilizadas durante as intervenções, (e) da intervenção da pesquisa na
atuação profissional (se positivo ou negativo) e (f) da ocorrência de reflexos, das
intervenções psicopedagógicas realizadas, na atuação profissional (se positivo ou
negativo). Assim como desenvolvido com a professora, sugerimos a audição e
atualização das concepções de aprendizagem, queixa escolar, intervenção
psicopedagógica e atuação do SEAA, registradas na primeira fase das entrevistas.
E juntamente com a pedagoga/psicopedagoga desenvolver uma análise de coconstruções ocorridas e percebidas nesse processo. E para concluir os
procedimentos de construção dos dados, realizamos um segundo momento de
observação em sala de aula e do contexto escolar. Com esse procedimento
pretendemos observar e analisar a ocorrência de reflexos da intervenção
psicopedagógica nas crenças e valores institucionais em relação à aprendizagem,
queixa escolar e intervenção psicopedagógica bem como a ocorrência de reflexos,
da intervenção psicopedagógica em atividades realizadas pelas crianças
(relacionadas às queixas escolares).
RESULTADOS E CONCLUSÕES
Estamos desenvolvendo nossas investigações na abordagem sociocultural
construtivista, focalizando os aspectos intersubjetivos e dialógicos, recortando o
material documentado em poucos ou vários episódios que sejam significativos
para o propósito do estudo, buscando traçar o curso de transformações. Nessa
perspectiva, analisamos de que modo as intervenções psicopedagógicas podem
contribuir para o sucesso escolar de crianças que apresentam queixas escolares.
No entanto, ressaltamos que não pretendemos desacreditar que sejam
necessárias políticas públicas e resoluções de longo prazo e alcance, melhorias na
formação de educadores, entre outras. Entendemos que é preciso considerar que
[Type text]
[Type text]
[Type text]
os dias não voltam e as dificuldades hoje observadas podem gerar grande prejuízo
na qualidade de vida do sujeito e de sua família. Assim nosso trabalho busca a
compreensão das queixas escolares sem que se esgotem ou se expliquem suas
razões, mas permitindo concebê-las como um indicador da necessidade de
intervenções psicopedagógicas, percebendo o aluno como um sujeito com
mobilidade permanente a partir do contexto sócio-histórico em que está inserido.
Acreditamos que o cotidiano escolar está repleto de diagnósticos, que em
sua maioria informais, são estereótipos preconceituosos baseados no senso
comum em “achismos” e são fortemente influenciados por reportagens
sensacionalistas e de pouco aprofundamento científico. Desse modo, estamos nos
movimentamos no sentido de caracterizar no contexto escolar, a intervenção
psicopedagógica a alunos que apresentem queixas escolares e, espera-se contribuir
com o atendimento prestado por esses profissionais gerando, por consequência,
melhoria na qualidade de vida dos sujeitos envolvidos, bem como prestação de
serviços educacionais mais eficazes. O entendimento deste processo pode
apresentar possibilidades de avanços na vida escolar, contribuindo para a diminuição
de fatores como a retenção, a evasão escolar, bem como a melhoria da autoestima e
do rendimento escolar.
REFERÊNCIAS
BASSEDAS, E. Intervenção educativa e diagnóstico psicopedagógico. Porto Alegre, RS: Artes
Médicas, 1996. 112 p.
BOSSA, N. A. A Psicopedagogia no Brasil: contribuições a partir da prática. Rio de Janeiro:
Wak Editora, 2011. 248p.
BRANCO, A.U.; MADUREIRA, A.F.A. Construindo com o outro: uma perspectiva sociocultural
construtivista do desenvolvimento humano. In: DESSEN, M.A.; COSTA JÚNIOR, A.L. A ciência
do desenvolvimento humano: tendências atuais e perspectivas futuras. Porto Alegre: ArtMed,
2005. p. 90-109.
DESSEN, M.A.; COSTA JÚNIOR, A.L. A ciência do desenvolvimento humano: tendências atuais
e perspectivas futuras. Porto Alegre: ArtMed, 2005. 278 p.
SECRETARIA DE ESTADO DE EDUCAÇÃO/SEE-DF, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL.
Orientação Pedagógica: Serviço Especializado de Apoio à Aprendizagem. Brasília. 2010
GÓES, M.C.R. A abordagem microgenética na matriz histórico-cultural: uma perspectiva para o
estudo da constituição da subjetividade. Cadernos CEDES, 20(50), 9-25. 2000.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
MEIRA, L. Análise microgenética e videografia: ferramentas de pesquisa em psicologia
cognitiva. Temas em psicologia, 2(3): 59-71. 1994.
NEVES, M.M.B.J. Queixas escolares. In: Guzzo, R.S.L. & Marinho-Araujo, C.M. Psicologia
Escolar: Identificando e Superando Barreiras. Campinas, SP: Alínea Editora. 2011. pp.175-192
ROGOFF, B. A natureza cultural do desenvolvimento humano. Porto Alegre: Artes Médicas, 2005.
335p.
ROSSATO, M.(2009). O movimento da subjetividade no processo de superação as dificuldades de
aprendizagem escolar. (Tese de Doutorado).Universidade de Brasília, Brasília.
VALSINER, J.; VASCONCELOS,V.M.R. Perspectiva co-construtivista na psicologia e na
educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. 102p.
VIGOTSKI, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes. 1984/2007
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
A TRAJETÓRIA DA ARTE- EDUCAÇÃO NO BRASIL: DA TÉCNICA AO
CONHECIMENTO
Sueli Heloisa Doriguetto Ferreira
Universidade de Uberaba- UNIUBE
[email protected]
Marcelo Silva
Universidade de Uberaba- UNIUBE
[email protected]
Sueli Teresinha de Abreu Bernardes
REDECENTRO/OBEDUC/CAPES/Universidade de Uberaba-UNIUBE
[email protected]
RESUMO
O presente trabalho refere-se a uma parte da pesquisa com fundamento na abordagem qualitativa,
em fase de levantamento bibliográfico e estudos teóricos, que estão sendo realizados sobre o fazer
artístico identificado no desvelar da sensibilidade dos aluno. O texto traz algumas reflexões acerca
do ensino da arte no Brasil, com o propósito de compreender sua importância no contexto escolar,
tendo como aportes sobretudo Ana Mae Barbosa e João Duarte Junior. Considera-se a criação
artística um dos eixos norteadores da formação humana, mas que, muitas vezes é vista apenas
como momentos artístico e culturais extracurriculares, um campo ainda considerado de pouca
utilidade em relação a outros saberes que a ideologia social julga mais necessários. Por meio de
estudos teóricos bibliográficos, inicialmente é feita uma retrospectiva histórica da trajetória do
ensino da arte no país, a sua inserção nos currículos escolares, buscando compreender qual o valor
dado a formação estética para, em seguida, buscar compreender o contexto dado a ela neste início
do século XXI. Leva-se em consideração a LDB 9394/96 e os PCN, em especial o de Arte por
serem documentos norteadores da educação escolar. Apesar de seguir uma cronologia, sabe-se que
todo fato histórico acontece num contexto sociopolítico e cultural de uma determinada época,
portanto não são apenas uma sucessão de acontecimentos isolados, nem acontecem de forma
linear. São acontecimentos que sofreram grande influência no contexto de seu tempo, da mesma
forma que muitos, ainda hoje, influenciam as práticas pedagógicas das escolas brasileiras. Por esse
motivo, abordam-se também esses aspectos.A concepção em análise distancia-se de arte como
adorno, como um campo separado e distinto da formação do aluno. Ao realizar essa retrospectiva,
são pesquisadas as discussões acerca desse ensino no contexto escolar brasileiro e, por meio da
historicidade percorrida, aponta a compreensão dos valores estabelecidos para este conteúdo nos
currículos escolares.
Palavras-chave: ensino da arte; formação humana; contexto escolar.
INTRODUÇÃO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Este estudo faz parte de uma proposta de mestrado, para a construção de
uma dissertação sobre o tema “Poéticas visuais na construção de portfólios: a
metamorfose na educação do sensível” desvelada por alunos da educação básica.
Essa pesquisa integra-se à linha de pesquisa Cultura e Processos Educativos e ao
Observatório da Educação Interdisciplinaridade na educação básica: estudo por
meio da arte e da cultura popular.
Neste texto apresento os resultados parciais de um estudo sobre o ensino
da arte no Brasil e, para isso, apoio-me em autores como Ana Mae Barbosa
(2011), João Francisco Duarte Jr (2000),Lelis (2004) e Canda e Batista (2009).
Parto de um questionamento sobre a relevância do ensino da arte nas
escolas e, como consequência, na formação integral dos alunos. Essas indagações
convergem para a pergunta norteadora: como historicamente o ensino da arte tem
sido desenvolvido na educação escolar brasileira? Esse estudo é realizado em
momentos significativos e, portanto, abrange recortes dessa historiografia.
OBJETIVO
Busco, por meio do estudo de recortes historiográficos, compreender qual
a importância dado ao ensino da arte no Brasil desde o processo de colonização
até os dias atuais.
METODOLOGIA
Esta pesquisa será realizada com fundamento na abordagem qualitativa, por meio
de um estudo bibliográfico com leituras cruzadas que abordam o historicidade do
ensino da arte brasileira. Para realizá-la, inicialmente fiz um levantamento de
livros, artigos, dissertações e teses sobre o tema para, então, selecionar as obras
que me ofereciam maior suporte para o conhecimento a ser construído.
RECORTES DO ENSINO DA ARTE NO BRASIL
A origem
A história do ensino da arte no Brasil teve início no século XVI, por volta
de 1550, pelos jesuítas utilizando-se como um dos instrumentos o ensino de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
técnicas artísticas da arte Barroca europeia. De acordo com Lelis (2004, p.17), os
artistas brasileiros, de maneira informal, criaram em oficinas por meio do trabalho
orientado pelos jesuítas, o barroco brasileiro. No entanto, prevalecia também a
arte indígena, representando elementos estéticos, valores, crenças, enfim, a
identidade desse povo nativo.
O ensino jesuíta tinha como princípio a separação ente a retórica e
trabalho manual. Sobre esse assunto, Lelis (2004, p.17), expressa a desvalorização
da arte enquanto trabalho manual, artesanato, habilidade ou técnica, advinda da
produção artística indígena e da mão de obra escrava, considerada sem grande
valor enquanto o conhecimento (retórica) era tido como um saber universal que
contemplava apenas uma pequena elite intelectual. Concepção que hoje, em pleno
século XXI, ainda está presente em nossa cultura.
Com a expulsão desses religiosos, por volta de 1800, a educação na
colônia passou a ser ministrada por leigos nas chamadas Aulas Régias. Após uma
década (1800-1810), iniciou-se a reconstrução de uma nova organização escolar,
cuja reforma metodológica contemplava as ciências, as artes manuais e a técnica.
Com a vinda da corte portuguesa para o Brasil em 1808, mudanças
significativas na política educacional brasileira começaram a acontecer, devido à
necessidade de mão de obra qualificada para as construções que iniciavam no
país. Criaram-se escolas com a finalidade de trabalhar tecnicamente a proposta de
ofícios artísticos e mecânicos.
Em 1816, os franceses trazem para o Brasil Colônia o modelo
neoclássico, com o objetivo de construir a Academia Imperial de Belas Artes.
Segundo Lelis, 2004, p.18, encontraram no Brasil a arte popular barroca no
interior das igrejas com esculturas em madeira, bronze, mármore e pedra realizada
pelos artesãos. Obras que contemplavam a expressividade e a sensualidade do
mestiço brasileiro e, sendo autêntica, conquistava a alma do artista mais pelo
sentimento e emoção do que pela reflexão intelectual. Essa arte era considerada
pela corte como simples trabalho artesão. Demorou-se uma década para construir
a academia. Periodicamente, os franceses ensinavam aos brasileiros técnicas de
desenho com gravuras, pinturas e construção de edifícios.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em 1826, sendo inaugurada a Academia Imperial de Belas Artes, começa
oficialmente o ensino da Arte no país, distanciando de seu objetivo inicial. O
nome da Academia Imperial de Belas Artes foi trocado para Escola Imperial das
Belas- Artes, passando a ser direcionada aos interesses da corte, perdendo sua
identidade como acontecia na Europa. A missão francesa foi na realidade uma
invasão cultural de cunho elitista, influenciando a arte em todos os contextos
culturais a partir desta época.
A Escola Imperial das Belas-Artes inaugurou a ambiguidade na qual
até hoje se debate a educação brasileira, isto é, o dilema entre
educação de elite e educação popular. Na área específica de educação
artística incorporou o dilema já instaurado na Europa entre arte como
criação e como técnica (BARBOSA e COUTINHO, 2011. p.6).
Portanto, ao término de sua construção, não mudou apenas o nome da
escola, mas a identidade e a clientela. Inicialmente, tinha como objetivo ser uma
escola de ciências, arte e ofício, com estudo do desenho industrial preparando para
o trabalho, uma educação popular. Mas, estudar na academia passou a ser
aspirações aristocráticas, símbolo de ascensão social. Começa ai o preconceito
contra o estudo da arte.Até hoje muitas pessoas acreditam que arte é um luxo de
interesse para poucos, portanto sem necessidade de ser estudada.
A República
No período 1870-1914, transformações políticas, econômicas e sociais
como a libertação dos escravos (1988) e Proclamação da República (1889),
intensificam o início da industrialização. Percebeu-se a necessidade da arte como
estudo do desenho nas diferentes categorias: gráfico, artístico, industrial,
decorativo, devido à necessidade de profissionais para a construção das ferrovias e
indústrias do ferro batido e da construção civil. “valorizadas como meio de
redenção econômica do país e da classe obreira, que engrossara suas fileiras com
os recém-libertos” (BARBOSA, 2002c, p. 30).
Rui Barbosa, em 1890, fez a primeira tentativa da introdução do ensino
[Type text]
[Type text]
[Type text]
do desenho nos cursos primários e secundários pela reforma denominada Reforma
Benjamin Constant (aprovada em 22/11/1890 pelo Decreto-Lei nº 1.075). Ele foi
o maior defensor para a introdução do ensino do desenho na escola, que aparece
com maior relevância no ensino educacional até hoje.
Nessa efervescência de acontecimentos que mudaram a característica do
país, foi introduzido, pelos liberais, o desenho como forma de arte. A influência às
ideias de Smith nos Estados Unidos sobre os exercícios geométricos progressivos,
a afirmação de que todos poderiam desenhar e a popularização do desenho por
meio da arte sendo adaptado para fins industriais, são fatos que colaboraram para
o crescimento da arte enquanto técnica para fins industriais, exercidos de forma
intensa até meados do século XX, deixando resquícios em livros didáticos e no
ideário educacional.
Em 1901, o Partido Republicano, a favor de uma arte antielitista,
contrapunha-se às ideias de reforma dos positivistas brasileiros, tendo Rui
Barbosa como seu principal mentor. Segundo Silva e Araujo (2011, p.5), "a arte
ensinada através do método positivo, contribuía para o estudo da ciência,
desenvolvimento do raciocínio e da racionalização da emoção desde que ensinada
através do método positivo, que subordinava a imaginação à observação".
O período de 1914-1927 contrapõe-se à tendência pré-modernista do
ensino de arte, como técnica, despontando a tendência modernista, influenciada
pela pedagogia experimental americana e europeia. Por meio desta proposta,
foram introduzidos laboratórios de arte nos cursos de formação de professores no
Estado de São Paulo, em seguida nas outras federações brasileiras com estudos
sobre as características do desenho infantil, inaugurando um novo olhar sobre a
arte, vista não mais apenas como técnica.
A Escola Nova
Em 1922, aconteceu a 1ª Semana de Arte Moderna no país. Um
movimento cultural manifestado por diferentes estilos: literatura, arquitetura,
design, pintura, escultura, teatro e música, liderado por artistas brasileiros, como
Mário de Andrade e Anita Malfatti. Apesar de grande importância, não houve
[Type text]
[Type text]
[Type text]
repercussões imediatas no ensino da arte, somente a partir de 1927, volta a ser
objeto de discussões educacionais.
Nesse período, o país vive uma grande crise político-econômica e social
pela tentativa de um regime mais democrático e o papel social da educação aflora
novamente. Novas mudanças são discutidas para a escola. Desta vez ganha
destaque a educação primária sob a ótica do Movimento ‘Escola Nova’. As ideias
de John Dewey fazem parte das reformas educacionais deste período. Adaptações
dos modelos de Decroly e Claparède também são incorporadas à educação.
Buscou-se a democratização do ensino, por meio das reformas estaduais, na
Escola Normal e Educação infantil. O ensino da arte passa a ser de grande
importância na educação: arte como expressão.
Em 1948, influenciado pelas ideias de Herbert Read, surgiu a primeira
Escolinha de Arte do Brasil no Rio de Janeiro, para os pequenos. Ampliava-se,
assim, o sentido de arte, considerada de grande relevância no ensino não formal
sendo a primeira instituição de ensino moderno, incluindo a participação das
mulheres. São criados os primeiros livros de desenho infantil brasileiros. Os
pressupostos teóricos para a valorização da arte na Escola Nova foram defendidos
por Anísio Teixeira com iniciativas pelo país, como: a Reforma Educacional de
Fernando de Azevedo, no Distrito Federal (1929), a Reforma Francisco Campos
(1927-1929) em Minas Gerais e a Reforma Carneiro Leão, em Pernambuco. Esses
ideais ainda hoje permanecem no ensino da arte.
Ainda de acordo com Barbosa e Coutinho (2011, p.16), em 1936,
enquanto exerceu a função equivalente a de Secretário de Cultura de São Paulo,
Mario de Andrade criou experiências significativas como os ateliês nos Parques
Infantis e na Biblioteca Infantil, as classes de arte de Anita Malfatti na Escola
Americana, hoje Mackenzie, a criação de Escolas de Arte para crianças bem
dotadas em arte pelo Jornal A Tarde. Todas essas experiências voltadas para a arte
foram interrompidas pelo golpe de Estado que instituiu a ditadura do Estado
Novo.
No período de 1938 a 1945, na Ditadura Vargas, o Brasil entra num
retrocesso e diluição das propostas educacionais da Escola Nova. O Estado Novo
interrompe toda a proposta educativa da arte como expressão. Os desenhos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
estereótipos,os trabalhos manuais, música e canto orfeônico, e o desenho
geométrico voltam como prioridade nas escolas primária e secundária. Neste
período, os seguidores da Escola Nova são afastados, perseguidos, poucos se
aliaram à ditadura, defendendo outros interesses, criando-se um entrave entre arte
e educação.
A arte como liberação
A partir de 1947, começou a surgir a ideia de Arte com enfoque para
liberação emocional, desenvolvida em ateliês, preocupados com a livre expressão
das crianças, sob a orientação de artistas com a criação artística sem interferência
do adulto. Segundo Barbosa e Coutinho (2011, p.23),"trata-se de uma espécie de
neoexpressionismo que dominou a Europa e os Estados Unidos no pós-guerra e se
revelou com muita pujança no Brasil que acabava de sair do sufoco ditatorial". No
período de 1948-1958, intensifica essa ideia, através de várias escolinhas de arte.
O MEA (Movimento das Escolinhas de Arte), usando principalmente argumentos
psicológicos, tentou convencer a escola comum da necessidade de deixar a criança
se expressar livremente usando lápis, pincel, tinta, argila entre outros materiais. Cursos
Intensivos de Arte/Educação direcionados ao desenvolvimento da criatividade, que
caracterizou o modernismo em Arte/Educação são criados buscando a exploração de
variadas técnicas de pintura, desenho, impressão, entre outras. O importante era
que no fim do ano letivo, o aluno tivesse tido contato e empregado variadas
técnicas.
Para compreender e respeitar como acontecia a evolução gráfica das
crianças, os professores utilizavam como referência teórica obras de Viktor
Lowenfeld e Herbert Read. Na educação, com a redemocratização do país,
voltaram alguns princípios da Escola Nova.
No período de 1958 a 1963, aumentaram os Cursos Intensivos de
Arte/Educação direcionados ao desenvolvimento da criatividade, que caracterizou
o modernismo através das classes experimentais com Arte. A Lei de Diretrizes e
Bases de (1961), eliminando a uniformização dos programas escolares, permitiu a
continuidade de muitas experiências iniciadas em 1958, mas as ideias de
introduzir arte na escola comum de maneira mais extensiva não frutificou.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Em 1962 foi inaugurada a Universidade de Brasília (UnB) com um
departamento de arte-educação, cujo objetivo era da sistematização da arte na
escola para crianças e adolescentes. Especialistas foram convocados para a
construção de uma proposta que permitisse estudos e pesquisas em arte-educação,
tendo como referência as ideias do filósofo inglês Herbert Read. A arte deveria ser
vista como parte integrante do processo educacional e não apenas como uma
meta.
O período militar
No período de 1964 a 1978 o Brasil entra no regime político de ditadura
militar. Escolas experimentais são fechadas e professores perseguidos. Com a
promulgação da LDB 1971, a expressão ensino da arte muda para Educação
Artística em forma de atividades e não como disciplina, tornando-se componente
obrigatório nos currículos de 1º e 2º graus. No ensino superior (1973) são criados
cursos de Educação Artística e licenciatura em artes plásticas. Nas escolas
públicas primárias e infantis como temas e desenhos alusivos a comemorações
cívicas, religiosas e festivas. Já nas grandes escolas particulares, o estudo da arte
prevaleceu com metodologia técnica. No entanto,essa prática continua presente na
prática pedagógica das escolas infantis nas atividades artísticas como: cantar
músicas da rotina escolar e/ou o canto pelo canto; apresentações artísticas ou datas
comemorativas; decoração da escola para as festas cívicas e religiosas. Nos cursos
técnicos de cunho tecnicista prioridade ao desenho geométrico.
Em 1977, o MEC cria o Programa de Desenvolvimento Integrado de Arte
Educação - PRODIARTE, com o objetivo de integrar a cultura da comunidade
com a escola, promovendo o encontro do artesão com os alunos e estabelecendo
convênios com órgãos estaduais e universidades.
Na década de 80, os educadores lutam por reformas educacionais, pela
livre expressão. A Semana de Arte e Ensino fortificou politicamente os arteeducadores e já em 1982/1983 foi criada na Pós-Graduação em Artes, a linha de
pesquisa em arte-educação na Universidade de São Paulo constando de doutorado,
mestrado e especialização, com a orientação de Ana Mae Barbosa. Arte-Educação
foi um Movimento do final da década de 70, inicialmente fora do contexto da
[Type text]
[Type text]
[Type text]
educação escolar, utilizando metodologias fundamentadas nos ideias da Escola
Nova e da Educação através da Arte.
A proposta triangular
No período de 87/93 é criada a Proposta Triangular: como fazer arte (ou
produção), leitura da obra de arte e contextualização, sistematizada no Museu de
Artes Contemporânea de São Paulo, tendo a sua frente Ana Mae Barbosa. Tal
proposta é uma derivação do DBAE e denomina como componentes curriculares
o fazer, a leitura e a contextualização do que seja arte. Ela surge da insatisfação de
perceber que apesar do indivíduo ter estudado artes no primário e secundário,
possui uma grande dificuldade de entender, de usufruir da arte ,de não visitar num
museu por não entender uma obra de arte. Portanto, a abordagem triangular é o
fazer, ver e contextualizar o que vê e faz.
Na nova LDBN 9.394/96, a concepção de ensino da arte baseava-se
exclusivamente no “fazer artístico” e como consequência, o ensino da Arte foi
retirado das versões iniciais da nova lei. Esses acontecimentos geraram novas
controvérsias no ensino da arte que passou a não ser básico ou obrigatório, mas
exigido pelo Conselho Federal de Educação, aumentando ainda mais a
desvalorização da arte no contexto educacional brasileiro pela supremacia da
classe dirigente. Reverter esta situação foi uma luta que mobilizou professores
arte- educadores de todo Brasil pela obrigatoriedade do ensino de Arte.
Durante esse período, informações sobre a abordagem de ensino do
DBAE (disciplined-based-art-education), chegam aos educadores em arte no
Brasil, traduzido aqui por “arte-educação como disciplina”. Uma proposta inglesa
e norte-americana concebida na década de 60 que reúne como componentes do
ensino da Arte: a produção, a crítica de artes, a estética e a história da Arte. De
acordo com Lelis (2004) esta proposta direciona os arte-educadores em seus
estudos de forma a tornar a arte reconhecida como componente curricular em que
deverão estar presentes: o fazer, a leitura e a contextualização e terem seu espaço
garantido pelas autoridades e pela sociedade educacional brasileira.
Após vários estudos, foram revogadas as disposições anteriores pela Lei
nº 9.394/96 (artigo 26, parágrafo 2º), o ensino de arte passa a ser considerado
[Type text]
[Type text]
[Type text]
obrigatório na educação básica: “O ensino de arte constituirá componente
curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a
promover o desenvolvimento cultural dos alunos”.
Neste período são realizados encontros nacionais e internacionais dos
professores de Arte, a Reformas dos cursos universitários e criação de cursos de
Pós-Graduação na USP. No final do século XX, o movimento de arte/educação em
sintonia com a pós- modernidade desenvolve pesquisas buscando uma maior
aproximação com variadas práticas artísticas.
A contemporaneidade
O estudo da Arte, no contexto Pós-Moderno, impulsiona as proposições
da educação vista como cultura visual e, ainda, a continuidade da Proposta
Triangular, implícito na LDB 9394/96 e nos documentos: RCNEI (1998) para a
Educação Infantil, PCN de Artes (1997) para o Ensino Fundamental e PCNEM
(1998) para o Ensino Médio, constituindo assim estudo em toda a educação
básica.
Na Educação Infantil, de acordo com o RCNEI (1998), o ensino de artes
deve ser desenvolvido em forma de Artes Visuais, como um eixo da área de
conhecimento que tem estrutura e características próprias cuja aprendizagem
acontece por meio dos seguintes aspectos: fazer artístico, apreciação e reflexão.
No Ensino Fundamental, o PCN de Artes (1997) traz, em sua
fundamentação, a importância do desenvolvimento das diferentes linguagens
artísticas que deverão estar presentes no currículo escolar: "A Produção - fazer
artístico; A Fruição - apreciação significativa de arte e do universo a ela
relacionado; e a Reflexão - construção de conhecimento sobre o trabalho artístico
pessoal".
No Ensino Médio, a Arte faz parte da área de Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias juntamente com os conteúdos de Língua Portuguesa, Língua
Estrangeira, Educação Física e Informática. O conteúdo de Arte deverá ser
desenvolvido como produção humana presente nas "manifestações artísticas, na
arquitetura, no urbanismo, nos meios de comunicação. Também é da natureza da
arte sua articulação com outras formas do saber: filosófica, histórica, social e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
científica" (PCN,p.179). O aluno deverá desenvolver competências e habilidades
de: representação e comunicação (realizar ou analisar produções artísticas nas
diferentes linguagens), investigação, compreensão e contextualização
sociocultural.
Com a tríade destes documentos, buscava-se fundamentar a prática
pedagógica que deveria ser desenvolvida pelo professor para ser o mediador dos
conhecimentos, de práticas e criações individuais e coletivas que muito
contribuam para a formação dos alunos, enfim, é o que se propõe como estudo
neste inicio de século.
No entanto, no decorrer deste estudo, percebeu-se que muitas vezes esta
discussão se torna vazia, diante das várias práticas já pesquisadas anteriormente e
que ainda estão arraigadas nas atividades de arte nas práticas escolares. Como nos
apontam Canda e Batista (2009, p.2), "colocar arte (desenho, colagem,
modelagem, dramatização, etc.) no final de uma experiência, ligando-se a ela
através do conteúdo, vem sendo utilizada ainda hoje na educação infantil e ensino
fundamental". Esta é uma atividade muito real nas práticas escolares, ou ainda
concepções que acreditam que o papel da arte nas escolas seja de libertar emoções
como nos afirma Barbosa (2003, p. 23), “não é tratada como conhecimento, mas
somente como um “grito da alma”. A arte neste contexto se descaracteriza de seu
real sentido, de que aconteça uma aprendizagem significativa.
Em algumas escolas, aulas de Arte são ministradas por professores
complementando carga horária, com pouco conhecimento sobre o conteúdo a ser
desenvolvido, por não ser sua especialidade.
É fundamental que o futuro profissional desse ramo das artes
saiba o que são e de onde provêm essas ferramentas e materiais
dos quais se utiliza, bem como aprenda a confeccioná-los a
partir dos elementos naturais presentes na realidade onde vive
(BRASIL, 1997. p. 29),
Para que isto ocorra os cursos de especialização e de formação contínua
deverão estar em parceria com esta proposta para alicerçar ação pedagógica,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
utilizando material adequado para as práticas artísticas e material didático de
qualidade para dar suporte às aulas.
As transformações ocorridas na própria Arte a partir do século XX
constituem o núcleo de todo pensamento e prática artística no âmbito escolar,
visando-se à ampliação da compreensão acerca da arte-educação. Busca-se a
reciprocidade entre a arte que se ensina na escola e a Arte no verdadeiro sentido,
através de diversas linguagens: plástica, musical, literária, cênica ou corporal,
desta forma distanciar da transmissão de técnicas, comemorações escolares, lazer
entre outras práticas comumente chamadas de "arte". Muitos estudos precisam ser
efetivados para que tal prática aconteça.
Canda e Batista (2009, p.111) buscam no currículo estas transformações
e apontam algumas interpretações da arte, enquanto atividade imprescindível para
a educação estética no currículo escolar. A educação estética do sensível dos
sentimentos, não se resumindo ao repasse de informações teóricas acerca da arte,
de artistas consagrados e de objetos estéticos, mas segundo (DUARTE JR, 2000.
p.15), “trata-se, antes, de um projeto radical: o de um retorno à raiz grega da
palavra “estética” — aisthesis, indicativa da primordial capacidade do ser humano
de sentir a si próprio e ao mundo num todo integrado”.
Na proposta de Artes, (BRASIL, 1988), lemos: “trata-se das tendências
que estabelecem as relações entre a educação estética e a educação artística dos
alunos. É uma educação estética que não propõe apenas o código hegemônico,
mas também a apreciação de cânones de valores de múltiplas culturas, do meio
ambiente imediato e do cotidiano" (PCN de Artes, 1997, p.28).
Buscar uma educação voltada para os sentidos, onde através da
descoberta das nossas variadas sensações de cores, formas, sabores, texturas,
odores, redescobrir prazeres que fazem parte de nossa vida, leva ao conhecimento.
O homem, enquanto sujeito humano, manifestou-se, construiu e evoluiu a partir
de sua concepção de vida sensível no contato com a natureza, aprimorando seu
conhecimento, observando, transformando em prol de sua sobrevivência,
tornando-se ser social.
Para Duarte Junior (2000, p.29) "a educação do sensível não prescinde da
arte — pelo contrário —, mas deve atuar num nível anterior ao da simbolização
[Type text]
[Type text]
[Type text]
estética" ganhando espaço e/ou complementando-se de acordo com os novos
paradigmas que emergem na educação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por meio dos recortes deste estudo, percebe-se que ainda temos um longo
caminho a percorrer para que o ensino da arte seja valorizado como campo do
conhecimento. Aprender arte significa o desenvolvimento de criação pessoal,
valorizando as diferentes experiências criativas do indivíduo na inserção
permanente com todos os meios que promovam o processo de aprendizagem.
Pensamos que o ensino de artes proporcionará o despertar das crianças e
jovens para a sensibilidade, o gosto pela natureza, à valorização da cultura,
desenvolvendo diferentes formas de ser, estar e conviver de forma criativa e mais
humanizada.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, A. M. COUTINHO, R. G. Ensino da Arte no Brasil: aspectos históricos e
metodológicos. Rede São Paulo de formação docente.2. ed São Paulo: UNESP/REDEFOR, 2011.
Disponível em:
<http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/40427/3/2ed_art_m1d2.pdf>
Acesso em 18/01/2012.
BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Secretaria de Educação Fundamental.
Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Ministério da Educação e do Desporto,
Secretaria de Educação Fundamental, v. III. Brasília: MEC/SFE, 1997.
_________. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais - Arte. Brasília: MEC/SFE, 1998.
_________. Secretaria de Educação Fundamental.Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Ensino Médio (PCNEM): Linguagens, Códigos e suas Tecnologias – Brasília: MEC/SFE, 2000.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
_________. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9.394. Brasília: Ministério da
Educação, 1996.
CANDA,S.N. BATISTA,C.M.P. Qual o lugar da arte no currículo escolar? R.cient./FAP, Curitiba,
v.4, n.2 p.107-119, jul./dez. 2009. Disponível em
<http://www.fap.pr.gov.br/arquivos/File/RevistaCientifica4vol2/07_artigo_Cilene_Canda_Carla_B
atista.pdf>. Acesso em: 23/12/2013.
DUARTE Jr. João Francisco O sentido dos sentidos: a educação (do) sensível. Programa de Pósgraduação em Educação _ Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 2000.
Universidade Estadual Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. Campinas, 2004.
Dissertação (Tese) Disponível em: <http://cutter.unicamp.br/document/?code=vtls000211363>
Acesso em: 04. nov. 2012.
LELIS, S. C. C. Poéticas visuais em construção: o fazer artístico e a educação (do) sensível no
contexto escolar. Programa de Pós-graduação em Educação _ Universidade Estadual de Campinas,
Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Artes. Campinas, Campinas-SP 2004. Dissertação
(Mestrado em Artes Plásticas) Disponível em:
<http://www.bibliotecadigital.unicamp.br/document/?code=vtls00033924>.Acesso em 30. out.
2012.
SILVA, E.M. A. ARAÚJO, C. M. Tendências e Concepções do Ensino de Arte na Educação.
Escolar Brasileira: um estudo a partir da trajetória histórica e sócio-epistemológica da
Arte/Educação. In: Reunião Anual, 30., 2007, Caxambu.MG. Anais Eletrônicos... ANPEd .
Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/30ra/grupo_estudos/ge01-3073--int.pdf>.
Acesso em: 12/01/2013.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
“AS CRIANÇAS TEM DIREITO DE ESTUDAR, DE APRENDER, DE
CANTAR E SONHAR COM COISAS BOAS”4: DIÁLOGO COM AS
CRIANÇAS E SEUS DIREITOS
Milna Martins Arantes5
Acácia Aparecida Bringel6
Conselho Municipal de Educação
[email protected]
[email protected]
RESUMO
Este artigo tem como objetivo contribuir com o debate sobre a “escuta das crianças”, seus
desafios e possibilidades. A escuta das crianças constitui-se um desafio, pois envolve a superação
de práticas adultocêntricas e nos possibilita uma aproximação com o universo infantil, suas ideias,
sentimentos, necessidade, interesses, entre outros. No campo teórico priorizam-se as contribuições
da Sociologia da Infância, seus princípios e elementos norteadores. Esse trabalho constitui-se
como uma etapa inicial, um processo de aproximação com uma metodologia de pesquisa cujo foco
é dar “voz as crianças”.
Palavras-chave: infância; criança; sociologia da infância; direitos.
APRESENTAÇÃO
Iniciamos este trabalho com algumas indagações, a saber: Como tem sido
o olhar para as infâncias e para as crianças pelos profissionais que atuam na
Educação Infantil? Temos considerado as ideias das crianças sobre o mundo,
sobre si mesmas e sobre nós (adultos) no trabalho realizado com elas? É possível
abandonar a visão adultocêntrica7 na relação com as crianças? Quais caminhos
apontam outro olhar sobre as infâncias e as crianças?
4
Direito retirado da produção escrita das crianças.
5
Graduada em Educação Física e Educação Artística, Mestre em Ed. Física/Unicamp – Conselho
Municipal de Educação.
6
[Type text]
Cientista Social, Mestre em Educação Brasileira/UFG – Conselho Municipal de Educação.
[Type text]
[Type text]
A partir dessas inquietações, iniciamos uma série de estudos e reflexões
que nos permitiram olhar a criança como um sujeito histórico-social, o que
implica, compreender as crianças e estudá-las como “um ser humano de pouca
idade que tem um modo todo particular, singular, de se inserir no seu meio, de ver
e olhar o mundo” (BARBOSA, 2009, p.27). Esse olhar afirma, portanto, a
condição da criança de ser sujeito de direitos, em sentido ampliado, ou seja, de
alguém “que tem a capacidade de construir uma narrativa de mundo e das coisas,
ressignificando o que já está instituído” (BARBOSA 2009, p.27).
Deste modo, o objetivo deste texto é apresentar as observações
preliminares de um trabalho realizado com um grupo de crianças, na faixa etária
de sete a oito anos, no qual o foco é a “voz das crianças” acerca de seus direitos.
Não é intencionalidade desse artigo avaliar ou julgar a produção das crianças, mas
conhecê-la, aproxima-nos de seus pensamentos, suas ideias e sentimentos e, com
elas, aprender e dialogar. Sabemos que são muitos os elementos que permeiam o
pensamento das crianças, o lugar que ocupam nessa sociedade, a impregnação do
mundo midiático, os valores familiares, a escola, e demais elementos da cultura
adquiridos pelas crianças enquanto membro da sociedade.
No primeiro momento, faremos algumas considerações acerca dos
pressupostos da Sociologia da Infância, um campo de estudo emergente, que
estuda as realidades da infância a partir das próprias crianças, por meio de um
conjunto de orientações metodológicos cujo foco é a “voz das crianças”.
No segundo momento, apresentaremos os resultados preliminares das
escutas realizadas com crianças que frequentam o 3º ano fundamental de uma
escola de classe média situada em Goiânia – Goiás, assim como algumas
observações a cerca dessa primeira escuta.
E, nas considerações finais, reafirma-se a importância do diálogo com as
crianças, a fim de superar a visão adultocêntrica ainda tão arraigada em nós.
7
Visão adultocêntrica: visão na qual prevalece a visão do adulto sobre as criança, nessa
perspectiva a criança não é considerada por si mesma, mas pela interpretação do adulto, ao longo
do tempo a criança foi percebida pelo adulto como um “vir a ser”, “tábula rasa”, “rastro
vergonhoso de nossa natureza corrupta e animal”, “inocência em forma humana”, incompletude,
etc.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
SOCIOLOGIA DA INFÂNCIA: APROXIMAÇÕES
A Sociologia da Infância8 propõe a “compreensão das crianças como
atores capazes de criar e modificar culturas, embora inseridas no mundo adulto”
(DELGADO e MULLER, 2005, p. 3). As crianças interagem no e com o mundo
dos adultos, compartilham ideias, questionam, interagem e criam culturas. Assim,
o desafio proposto aos estudiosos e pesquisadores é o de repensar a postura do
adulto para que se tenha como foco as vozes, as ideias, os olhares, as experiências
e os questionamentos das crianças.
Ao aproximarmos da Sociologia da Infância, compreendendo-a com uma
área de conhecimento, como campo teórico-metodológico emergente, destaca-se
dois pressupostos relevantes: 1) a concepção de criança não como uma etapa da
vida incompleta, por imaturidade biológica ou por características naturais e
universais, mas como um sujeito social que, a sua maneira, compreende e
interfere no mundo a sua volta, ou seja, como sujeitos completos que pensam e se
expressam de múltiplas formas; 2) a compreensão da criança como agente ativo
capaz de construir cultura, por meio de questionamentos, compartilhamento e
negociações que contribuem para a ressignificação e produção do mundo adulto.
Contudo, as crianças possuem um mundo particular, diferente do mundo
dos adultos. Suas atividades centram-se no brincar, na imaginação, na
interpretação da realidade, no faz-de-conta, na televisão, nos vídeos games, na
interação com seus pares, entre outros, e é nesse movimento que elas constroem
cultura.
Corsaro (1997), em seus estudos, apresenta o conceito de cultura de pares,
definindo-o como um conjunto de atividades, rotinas, artefatos, valores e
preocupações que as crianças produzem e partilham na interação com seus pares,
isto é, com as outras crianças. Esse conceito se faz importante para que possamos
entender que as crianças produzem cultura. Entretanto, é preciso destacar que as
crianças não produzem cultura de forma isolada, elas possuem uma autonomia
8
[Type text]
Sociologia da infância – vincula-se à corrente interpretativa.
[Type text]
[Type text]
relativa, ou seja, suas atividades – cultura de pares– são produtos das interações
com adultos e crianças.
Ainda para Corsaro (idem), é preciso considerar o conceito de reprodução
interpretativa, para melhor compreender a produção cultural infantil. Para esse
autor o termo reprodução refere-se ao fato de que as crianças, ao conviverem com
a cultura dos adultos, não estão simplesmente internalizando a sociedade e a
cultura, mas estão ativamente contribuindo para a produção e a mudança cultural.
Já o termo interpretativo está diretamente relacionado à percepção de que as
crianças ao elaborarem sua cultura – cultura de pares – apresentam elementos
inovadores e criativos.
No Brasil, Florestan Fernandes (2004) pesquisou o universo infantil. Em
seu estudo, As “trocinhas” de Bom Retiro, afirmou que existem culturas infantis
construídas por elementos quase exclusivos das crianças, caracterizados por sua
natureza lúdica. O estudo desse autor deixou claro que as crianças, ao reunirem-se
para brincar, criavam uma cultura própria, viva, mesmo quando buscavam e
utilizavam elementos da cultura dos adultos, pois elas reelaboravam esses
elementos a partir de seus interesses e necessidades.
Florestan Fernandes destacou ainda que as “trocinhas” exerceram uma
função integradora na reeducação dos imigrantes, tendo em vista que os filhos de
imigrantes integravam à cultura brasileira – apropriavam-se da linguagem, das
brincadeiras, dos costumes, entre outros – e, ao mesmo tempo, transmitiam-nas a
seus pais, exercendo assim um papel ativo na reeducação dos adultos.
A partir dessa compreensão, o que se deve problematizar não é se as
crianças criam e recriam cultura, mas se suas criações são ou não reconhecidas e
valorizadas pelos adultos.
Outro desafio proposto pela Sociologia da Infância é o de romper com as
velhas concepções, entre elas destaca-se a compreensão de socialização proposta
por Durkheim (1977), a qual se baseia na ação e transmissão de valores, normas e
atitudes dos adultos para os mais jovens, um modelo vertical e impositivo, uma
geração sobrepondo-se a outra. Nas palavras desse autor:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A educação é a ação exercida pelas gerações adultas sobre as gerações
que não se encontram ainda preparadas para a vida social, tem por
objeto suscitar e desenvolver, na criança, certo número de estados
físicos, intelectuais e morais, reclamados pela sociedade política no
seu conjunto e pelo meio especial a que a criança particularmente, se
destine (DURKHEIM, 1977, p. 42).
A Sociologia da Infância critica essa concepção e apresenta outra; esta
enfatiza que a criança também participa de sua própria socialização.
O pensamento da Sociologia sobre as crianças e a infância deriva do
trabalho teórico sobre a socialização, entendida pelas teorias
tradicionais como o processo pelo qual a criança se adapta para
internalizar a sociedade. Nessa perspectiva, entende-se a criança
somente como consumidora da cultura estabelecida pelos adultos.
Porém, as perspectivas teóricas interpretativas e construtivistas da
socialização argumentam que as crianças e os adultos, são
participantes igualmente ativos na construção social da infância e na
reprodução interpretativa de suas culturas (DELGADO e MULLER,
2005, P.3).
Para Plaisance (apud Delgado e Muller, 2005), a socialização deve ser
pensada como uma construção da criança, por meio de modelos interativos, nos
quais as múltiplas negociações, compartilhamentos, questionamentos,
experiências, embates com o Outro, constituem a identidade e a socialização do
sujeito. A socialização, nessa perspectiva, é compreendida como um processo no
qual o ator socializado experimenta, reproduz e transforma a realidade vivida e a
si mesmo.
É a partir dessa compreensão que Corsaro (1997/2005) propõe o estudo
com e não sobre as crianças, o que requer uma nova postura para com a criança,
com seu mundo e suas ideias. Uma postura que respeite a criança, o que implica,
sobretudo, uma postura ética por parte do adulto. Para tal, no diálogo com as
crianças, exige-se a descentralização da figura do adulto, com vistas a garantir os
direitos das crianças. Em especial, destaca-se a participação e envolvimento das
crianças nos estudos e pesquisas dos adultos, nos quais são as crianças que
deverão decidir por participar ou não de estudos, de entrevistas, de fotografias,
entre outros. Só assim pode-se superar a figura de poder, força, tanto no tamanho
físico, quanto na tomada de decisões geralmente centradas nos adultos.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Conforme Kramer (2002), devemos e podemos negociar com as crianças
todos os aspectos e etapas das investigações. Esta autora nos convida a entender
que as crianças são produtoras de ideias, visões de mundo, dados, e que, portanto,
cabe a elas decidirem o quê e de que maneira, as informações serão utilizadas,
tendo em vista que, ao adentrarmos na vida das crianças, somos intrusos, é
preciso, pois, pedir permissão.
No que se refere a essa questão é necessário proteger e respeitar àqueles
que nos confia seu tempo, uma parte de suas vidas e de sua história, bem como
entender as pessoas como elas são e evitar classificações e explicações simplistas.
Nessa perspectiva, aproximar do universo das crianças exige não apenas
colocar o Outro em evidência, mas possibilitar o encontro com esse Outro. Para
olhar e escutar a criança, torna-se imprescindível retomarmos o tema da
alteridade9, o qual nos leva a reconhecer a diferença no "Outro", e assim
reconhecer nossos limites, nossas falhas, possibilidades e incompletude
permanente. Tomar a criança enquanto o Outro nos possibilita não apenas
visualizá-las, mas compreender que, ao olharmos, somos interpelados.
Desse modo, reconhecer a criança como o Outro, a partir do conceito de
alteridade, desvela a necessidade emergente de pensarmos a criança de forma
diferenciada, como protagonista de sua história e partícipe da vida e da cultura dos
adultos. Colocar a criança na posição de protagonista nos remete a uma questão
ética e metodológica: Como ouvir as crianças? Como recolher suas vozes?
Barbosa (2009) argumenta que ainda precisamos avançar no que se refere
a uma metodologia para abordar a criança, tomando-a como protagonista e sujeito
da pesquisa. Para a referida autora,
O princípio de uma metodologia para a pesquisa que tenha a criança
como sujeito passa pela postura do pesquisador diante dessa criança,
da sua concepção de criança e infância. (...) tomar a criança como
referência e objeto de estudo não é algo novo. No entanto o que se
levava em conta não era a criança em si, sendo esta tomada apenas
9
Alteridade (ou outridade) é a concepção que parte do pressuposto básico de que todo o homem
social interage e interdepende de outros indivíduos. Assim, como muitos antropólogos e cientistas
sociais afirmam, a existência do "eu-individual" só é permitida mediante um contato com o outro
(que em uma visão expandida se torna o Outro - a própria sociedade diferente do indivíduo).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
como pretexto, referente ou destinatário de processos que, esses sim,
constituíam o verdadeiro objeto de estudo (idem, p.27)
Nesse sentido, Sarmento (2004) traz muitas contribuições para se pensar
metodologicamente a escuta das crianças. Para este autor, a cultura das crianças
possue traços/marcas que lhes são peculiares e se configuram como portas e
janelas nas quais podemos tentar entrar e olhar de mais perto o universo infantil, a
saber; a ludicidade, a fantasia, a interatividade e a reiteração.
A ludicidade, conforme Sarmento (2004), é um traço fundamental da
cultura das crianças, para elas o brincar e fazer coisas consideradas sérias pelos
adultos tem a mesma importância. Brincar constitui-se como uma atividade séria,
isto é, uma atividade humana. Para Vygotsky (1994), o brincar é uma atividade
humana criadora, na qual imaginação, fantasia e realidade interagem na produção
de novas possibilidades de interpretação, de expressão e de ação pelas crianças,
assim como de novas formas de construir relações sociais com outros sujeitos,
crianças e adultos. Afinal, ao brincar, a criança reproduz, representa, recria e
ressignifica, a seu modo, o mundo.
A fantasia – o mundo de faz-de-conta – também se constitui elemento
privilegiado. Segundo Sarmento (idem), as crianças fazem uso deliberado de
situações imaginárias e, por meio dela, constroem sua visão de mundo, e atribuem
significados às coisas. Pela imagianação, as crianças resistem a situações mais
adversas de sua existência. Assim como na arte, a fantasia e a utopia permitem ao
artista transpor a facticidade do mundo real e adentrar o campo do sonho, para as
crianças fantasiar será sempre mais do que viver.
Por fim, Sarmento (2004) destaca a importância de se compreender a
interatividade e a reiteração. Para este autor, é importante que se considerem os
espaços e os tempos das crianças, compreendendo os seus espaços de partilha – na
escola, na família, no parque, entre outros – como espaços em que as crianças
interagem, agem, representam, expressam emoções, aprendem e crescem. A
reiteração refere-se a não literalidade e não linearidade temporal; o tempo da
criança não pode ser mensurado, ele pode reiniciar-se a qualquer momento,
repetir-se, avançar e trazer novas possibilidades.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
DIALOGANDO COM AS CRIANÇAS E SEUS DIREITOS
Não é questão de querer
Nem questão de concordar
Os diretos das crianças
Todos têm de respeitar
Ruth Rocha
Para procedermos à escuta das crianças sobre seus direitos, optamos por
realizar a pesquisa no ambiente escolar, compreendendo-o como um lócus
privilegiado de partilha, do estabelecimento de cultura de pares. Selecionamos
uma escola com a qual já temos contato há quatro anos. Trata-se de uma escola
situada em um bairro considerado nobre da cidade de Goiânia, classe média, com
uma excelente infraestrutura e um trabalho pedagógico que vincula-se a uma
perspectiva mais interacionista, dialógica e afetuosa com as crianças, embora
ainda faça parte da sua prática educativa resquícios do método tradicional.
Foi utilizado como elemento mediador da escuta das crianças a literatura
infantil e os debates suscitados pela leitura e apreciação dessa literatura, assim
como a produção de desenhos feitos pelas crianças.
Para iniciarmos a escuta das crianças escolhemos o livro “O direito das
Crianças segundo Ruth Rocha”, um livro poético e instigante. A ideia surgiu a
partir da observação das atividades desenvolvidas pela professora dessa turma, a
qual já vinha desenvolvendo um trabalho sobre os direitos das crianças a partir do
texto “Declaração Universal do Moleque Invocado” de Bonassi Fernando.
O primeiro momento para a escuta das crianças foi um diálogo franco com
elas sobre a natureza do trabalho a ser realizado, o porquê de nossa presença na
escola, os objetivos desse trabalho – nosso interesse por conhecer mais sobre as
crianças, seus interesses, sua visão de mundo – e se elas se interessavam em
participar, se tinham sugestões, se permitiam a gravação dos nossos diálogos. As
crianças concordaram prontamente.
Optamos por exibir um vídeo sobre o livro da Ruth Rocha, no qual as
próprias crianças ilustravam as páginas do livro e liam os direitos. As crianças se
mostraram interessadas e animadas com a ideia de verem um vídeo na sala,
sugeriram que passássemos outros filmes para elas. No início estranharam os
[Type text]
[Type text]
[Type text]
desenhos feitos por outras crianças, comentavam-nos, depois iam fazendo
interpretações desses desenhos mesmos e, no final, liam o texto coletivamente.
Após o vídeo, distribuímos uma folha para que as crianças escrevessem os direitos
segundo elas mesmas.
Passamos agora a transcrição da produção escrita das crianças10. Com a
palavra/escrita as crianças.
Gabriel11
Direitos:
. Brincar
. Estudar
Eis alguns dos direitos universal do moleque invocado.
. O moleque invocado tem direito á comer muitos doces.
. O moleque invocado tem o direito de brincar a vontade.
. O moleque invocado tem o direito de passeios legais.
Acásio
1. estudar na escola.
Geovana
1. ter lazer
2. ter saúde
3. ter carinho
4. ter dever e diversão.
Manuela
1. As crianças tem que divertir e aprender ao mesmo tempo.
2. Ter lazer e carinho.
3. Ter respeito.
4. As criança não tem que trabalha tem que estudar.
10
Transcrição na integra dos textos das crianças.
11
Todos os nomes utilizados são fictícios.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Eu gostaria que o Brasil agisse com mais prudência, que todas as crianças tenham
diversão e tem que aprender também. Eu queria que todos aceitassem os direitos,
que não tratassem com preconceitos os cadeirantes e os deficientes.
Agnes
Direito de respeitar a professora, direito de respeitar as pessoas.
Toda criança devia poder pular na cama da mamãe e dormir um pouquinho na sala
de aula
Toda criança devia ter direito a tomar sorvete na hora que quiser.
Toda criança devia poder tirar férias 4 vezes por ano, devia poder também comer
chocolate o dia todo.
Luana
As criança de direito de sota pipa.
Toda menina tem direito de: comer na hora que quiser, se divertir pelo menos dois
dias, sair de casa 2 veze por semana.
Larissa
As crianças tem o direito de: Estudar, brincar, aprender, se divertir.
Toda criança tem direito de ter um pai, uma mãe uma família.
Toda criança tem direito de estudar, brincar e o que ter comer.
Maria
Respeitar ter educação lazer família saúde estudar, brincar, ter moradia.
As crianças deve teve ter escola, igualdade, obediência.
Toda criança tem direito de estudar, brincar, educação, lazer, família, respeito de
ter um lar, assistência medica, carinho, viajar, ir para a casa do amigo, igualdade.
Clara
As crianças tem direito de estudar
de aprender, de cantar e sonhar com
coisas boas.
Todo parque tem que ter uma montana-russa ter um palhaço e um escorregador
gigante toda criança ter direito a um tablete um computador e um piscina
exclusiva.
Antônio
Estudar e brincar
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Fazer educação física
Na escola poderia ter campeonato de futebol todo mês e também poderia ter a sal
de ciências com porções cientificas, na escola poderia ter um caixa de doces na
escola.
Gabriela
A criam tem direito de estudar brincar e ter um lar
Marco
1. Ser milhonário
2. Dirigir carro
Carlos
Poder fazer isportes para emagrecer e para ficar bem.
Toda criança pode ficar o dia inteiro no computador sem ir para escola. Também
não ia existir tarefa de casa para todo mundo. Toda criança tem direito de ir na
picina todo dia. E todo dia as crianças podem ir viajar para qualquer lugar. Todo
dia as crianças podem escolher a sobremesa.
Francisco
Todos os jogos grátis
Eu queria que tudo fosse grátis até uma mansão. E só tivesse aula de como passar
de fase no Play Station. E que de para domar todos animais incluindo leões.
Isa
1. Estudar o dia inteiro
2. Brincar bastante
Caio
Eu queria ter uma tornera de refrigerante e tudo de graça.
Toda criança deve ter o direito de brincar de comer. Toda criança tem o direito de
ter um lar e de estudar. Toda criança deve ter direito de ler revista e gibis. Toda
criança deve ter o direito de ver filmes no cinema e nos teatros.
Como já foi dito nossa intencionalidade não é avaliar, julgar a produção
das crianças, mas conhecer, nos aproximar de seus pensamentos, suas ideias e
sentimentos e com elas aprender e dialogar. As crianças não são passivas no
processo de socialização, pois elas reconstroem significados, ideias, sentimentos
por meio da cultura de pares, no contato com os outros. O diálogo com as crianças
[Type text]
[Type text]
[Type text]
nos possibilitou uma aproximação com seus desejos, com o valor que dão à
educação, suas preocupações, sua necessidade de carinho e atenção.
Nesse sentido é interessante perceber como a fantasia, o faz-de-conta, o
sonho interage com o real, o que permite às crianças a liberdade de expressão de
ideias, desejos e sentimentos. É interessante perceber como as crianças imaginam,
desejam o mundo: “tudo de graça; ser milionário, dirigir carro; aula de como
passar de fase no Play Station; ficar o dia inteiro no computador; não existir tarefa
de casa para todo mundo, ir na picina todo dia; viajar para qualquer lugar;
campeonato de futebol todo mês; porções científicas; tirar férias 4 vezes por ano;
ter uma tornera de refrigerante , enfim sonhar coisas boas”.
Outro aspecto significativo está no brincar, na ludicidade presente nas
falas/escrita das crianças, como já nos alertava vários autores, o brincar é o
caminho pelo qual as crianças conhecem o mundo, reelaboram a cultura dos
adultos, formam pares, produzem sua própria cultura. Fica evidenciado, nessas
falas como o brincar é desejado pelas crianças. Dessa escrita ficamos com uma
interrogação: Estamos possibilitando, favorecendo e respeitando o brincar das
crianças?
Para encerrar, é importante destacar que as crianças manifestam em sua
fala/escrita, preocupações que consideramos relevantes, preocupações com este
mundo cheio de problemas e possibilidades que herdaram e serão chamadas a
enfrentar.
E A HISTÓRIA CONTINUA...
Este foi apenas o início de uma longa escuta. Há muito que aprender, pois,
conforme Fernando Pessoa, “(...) o melhor do mundo são as crianças, (...)”. Nosso
desafio é ampliar o diálogo e a escuta, com vistas a conseguir compreendê-las
melhor e assim nos aproximar de suas reais necessidades, interesses, sentimentos,
entre outros. E diante dessa escuta sensível, contribuir com posturas mais éticas
em relação à infância e à criança, seja em âmbito familiar, seja em contextos
educacionais. Ouvir as crianças, aceitar seus pontos de vista implica a superação
[Type text]
[Type text]
[Type text]
de posturas adultocêntricas que, ao longo da história e do processo educacional
marcam, a relação adulto-criança.
REFERÊNCIAS
BARBOSA, Sílvia. “É tudo sorvete!” Enunciações e expressões das crianças na creche. In:
KRAMER, Sônia (Org.). Retratos de um desafio: crianças e adultos na educação Infantil. São
Paulo: Àtica, 2009.
CORSARO, W. The Sociology of Childhood. California: Pine Forge Press, 1997.
________.Entrada no campo, aceitação e natureza da participação nos estudos etnográficos com
crianças pequenas. Educ. Soc., Campinas, vol. 26, n. 91, p. 443-464, Maio/Ago. 2005. Disponível
em http://www.cedes.unicamp.br
DURKHEIM, Émile. A educação como processo socializador: função homogeneizadora e função
diferenciadora. In:FORACCHI, M. M., PEREIRA, L. Educação e Sociedade: leituras de
sociologia da educação. São Paulo: Companhia editora nacional, 1977.
FERNANDES, Florestan. As “trocinhas” do Bom Retiro: contribuições ao estudo folclórico e
sociológico da cultura e dos grupos infantis. Pro- Posições,2004. vol.15, n. 1 (43), jan.
GOUVEA, Maria Cristina Soares de; Sarmento, Manuel (orgs). Estudos da Infância: educação e
práticas sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008. (coleção Ciência Sociais da Educação).
SARMENTO, M. J. As Culturas da infância nas encruzilhadas da segunda modernidade.
In:SARMENTO, M. J.; CERISARA, A. B. Crianças e miúdos: perspectivas sóciopedagógicas da
infância e educação. Porto: Asa, 2004.
KRAMER, S. Autoria e autorização: questões éticas na pesquisa com crianças. Cadernos de
Pesquisa, São Paulo, n.116, p.41-59, jul. 2002.
VYGOTSKY, L.S. A Formação Social da Mente. São Paulo: Martins Fontes,1994.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
AVALIAÇÃO E CURRÍCULO: EM BUSCA DA REALIDADE COMO
PRÁTICA DE MEDIAÇÃO
Adicélia Francisco Duarte Alves
Faculdade de Educação - UFG
[email protected]
RESUMO
A finalidade desse artigo é, além de expor algumas observações feitas por mim durante minha
prática pedagógica, levantar uma discussão reflexiva que permeia o processo de ensino
aprendizagem, visto que a avaliação e o currículo têm sido motivo de discussões, debates, estudos
e pesquisas ao longo dos anos. Através da pesquisa bibliográfica de natureza qualitativa procurei
basear-me em autores que discutem a temática Avaliação e Currículo. A atenção que a avaliação e
o currículo têm recebido traz à tona a dificuldade que muitos profissionais da educação têm em
lidar com essa dicotomia. Esse problema surge quando lidamos com a prática e a dissociamos da
teoria devido aos vários fatores que nos englobam no universo escolar e que se torna mais
acentuado quando a teoria deixa de ter sua devida importância. Professores(as) que se negam a
associar a ciência à prática por meio de conhecimentos embasados pela pesquisa pecam em favor
da comodidade, se revestem de desculpas como falta de tempo, não haver necessidade, pois o que
sabe é suficiente. Profissionais capazes de fazer a diferença no processo político de ensino e
aprendizagem tornam-se insatisfeitos com seus exercícios no magistério e poucas providências são
tomadas para reverter o quadro. Alunos são sujeitados aos processos equivocados de avaliação e
sentem-se coagidos a demonstrar algo que não condiz com a realidade decorando respostas exatas
para perguntas exatas, mas que com o decorrer do tempo prova-se um processo educacional
deficiente. Professores(as) que no exercício de sua docência travam uma luta ética por liberdade e
autoria no disputado território do currículo, às vezes se desanimam devido as dificuldades
enfrentadas quando na ação de preparar e transmitir conhecimentos engessados, na tentativa de ser
o mediador de conhecimentos e formas de pensar e agir o real. Há uma necessidade latente de o
currículo ser atualizado. Mas há, também, a noção de que metodologias devem ser adaptadas para
suprir as necessidades dos discentes. Todos(as) os(as) profissionais envolvidos com a educação
precisam ter em suas mentes as especificidades do educando, de saber quem é o sujeito que
aprende, pois o processo de ensinar e avaliar não é isolado, muito pelo contrário, em nossa
profissão estamos comprometidos com a aprendizagem e essa aprendizagem é interdisciplinar.
Palavras-chave: avaliação; currículo; ensino; aprendizagem.
INTRODUÇÃO
Ao me propor escrever um artigo procurei fazer uma análise em meu
campo de experiência, a docência, de algumas dificuldades enfrentadas por mim
ao lidar com as ações de alguns colegas de trabalho na dinâmica do processo de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
ensino e aprendizagem, tais como o desânimo, a falta de iniciativas e de
pesquisas, a comodidade em transmitir o saber pronto tal como está nos livros
didáticos, traz-me incômodo e preocupação a formação da identidade do(a)
professor(a), principalmente se levarmos em consideração que,
A identidade do professor é construída ao longo de sua trajetória como
profissional do magistério. [...] A construção e o fortalecimento da
identidade e o desenvolvimento de convicções em relação à profissão
estão ligados às condições de trabalho e ao reconhecimento e
valorização conferida pela sociedade à categoria profissional
(PIMENTA, 2010, ps. 62, 66).
Creio que o motivo de minhas preocupações perpassa pela competência
do(a) professor(a) diante do processo de ensino e aprendizagem devido à sua
complexidade, ou o docente ter ou não capacidade de transmitir conteúdos, ou
faltar-lhe recursos materiais e humanos no exercício de sua profissão. Não é meu
interessante, ao escrever este artigo, ater-me ao discurso político das dificuldades
da educação básica brasileira e melhorias no ensino, Moysés (1994, ps. 15, 16).
Quando falo em competência, não é apenas a habilidade de saber ensinar Moysés
(1994, ps. 13, 14). O processo de educar é, além de complexo, mais amplo e inclui
situações especificas de treino. Pimenta (2010, p. 38). Precisamos reconhecer que
há uma disparidade no universo escolar entre a teoria e a prática pedagógica que
precisa ser reduzida, pois segundo Luckesi (2011, p. 215), “a prática no cotidiano
escolar permanece centrada nas formas tradicionais de conceber e conduzir a ação
pedagógica e o sistema de ensino configuradas ao longo dos anos da
modernidade, do século XVI ao presente”.
Com certeza é urgente a necessidade das(os) docentes reconhecerem o
papel da teoria como suporte profissional, pois:
Portanto, o papel da teoria é oferecer aos professores perspectivas de
analise para compreender os contextos históricos, sociais, culturais,
organizacionais e de si mesmos com profissionais, nos quais se dá sua
atividade docente, para neles intervir, transformando-os. Daí é
fundamental o permanente exercício da crítica às condições materiais
nas quais o ensino ocorre (PIMENTA, 2010, p. 49).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
É a partir da teoria, da busca pela práxis, que nós, profissionais da
educação conseguiremos, apesar das condições de trabalho, Patto (1990, apud
MOYSÉS, 1994, p. 16), fazer com que o aluno possa se apropriar do
conhecimento tendo ao seu lado um(a) profissional ativo, que aja como mediador
entre o processo de ensino e de aprendizagem.
A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM ESCOLAR: A BUSCA DA
REALIDADE DE UMA AVALIAÇÃO COMO PRÁTICA DE MEDIAÇÃO
Durante os anos em que trabalho como professora tenho observado os
conflitos existentes na prática pedagógica no que se refere à avaliação e ao exame.
Não são poucos as(os) profissionais da educação que não conseguem lidar com a
dicotomia examinar x avaliar, o que, Luckesi afirma:
Nos últimos 70 anos, fora do Brasil como dentro deste país,
vagarosamente, fomos transitando do uso da expressão examinar a
aprendizagem para o uso de avaliar a aprendizagem dos estudantes,
porém, na prática, continuamos a realizar exames – ou seja, mudamos
a denominação sem mudar a prática. Então, nos dias atuais, em nossas
escolas, efetivamente anunciamos uma coisa – avaliação – e fazemos
outra – exame -, o que revela um equívoco tanto no entendimento
quanto na prática (LUCKESI, 2011, p. 180).
Grande parte dos profissionais se formam e conseguem seu primeiro
emprego como professores(as) sonham em levar para a prática da sala de aula a
teoria não dissociada da prática, ou seja, quando estão na academia, estudam e
aprendem que a teoria e a prática precisam caminhar de mãos dadas. Em geral,
essa forma de agir e pensar está intrínseco no recém formado. Mas o que se vê,
salvo exceções, são profissionais se adaptando à teoria das escolas, tornando-se
resistentes à transição do ato de examinar para o de avaliar, quando o contrário é o
que deve ocorrer.
Muitos professores(as) altamente capacitados começam a agir de forma
contrária às suas concepções quando do mundo acadêmico, contrariando eles
mesmos e tornando-se insatisfeitos com sua atuação no que diz respeito ao campo
teórico. A teia escolar os englobam, sufocando-os a ponto de se conformarem e se
moldarem ao vicioso sistema vivido, onde o(a) professor(a) detém o
[Type text]
[Type text]
[Type text]
conhecimento, examina os alunos e seu aprendizado deixando para traz perdas e
se atendo apenas aos ganhos, não observando ou não conhecendo as
características dos atos de examinar e avaliar na escola:
[...] 1) temporalidade; 2) solução de problemas; 3) expectativa dos
resultados; 4) abrangência das variáveis consideradas; 5) momento do
desempenho do educando: 6) função do exame e da avaliação; 7)
consequência da função; 8) dimensão política do exame e da
avaliação; 9) ato pedagógico (LUCKESI, 2011, p. 181).
Considerado por pais e alunos como detentor do saber, o(a) professor(a)
raramente erra. E como o detentor do aprendizado, o aluno é mais suscetível ao
erro. Surgindo daí, creio eu, a teoria do fracasso escolar. O que na realidade ocorre
é a imensa dificuldade de um(a) profissional, seja qual for a área, reconhecer que
a forma utilizada para executar um determinado projeto não foi a adequada e que,
portanto, houve uma falha, em outras palavras houve erro.
Tenho visto uma grande parcela de professores e professoras se
“acomodarem” e passar ano após ano sem procurar embasamento teórico, apenas
os livros didáticos adotados, enquanto nossos alunos estão sendo inseridos cada
vez mais no mundo tecnológico e globalizado e são influenciados por todas as
relações capitalistas existentes:
O fenômeno globalizador não é novo. A criação do Império Romano,
as viagens de Marco Polo ou dos vikings, o Império Inca ou a cultura
ocidental, a adoção do sistema métrico e do horário de trens são
fenômenos e expressões de globalização. ... Também compreendemos
que na superfície esférica viveram e continuam vivendo povos e
culturas separadas, mas que se moveram, deslocaram, enfrentaram,
anularam, conviveram e fundiram umas com as outras. Talvez agora a
novidade do fenômeno resida no fato de se produzir em escala mais
ampla, de ser mais evidente em alguns aspectos, sobretudo, de ter se
acelerado graças às tecnologias da comunicação, porque ocorre em um
contexto que denominamos sociedade do conhecimento ou da
informação (SACRISTÁN, 2008, p. 52).
Já vi e ouvi também alguns observarem esse fato e dizer “quando eu me
formar e for para uma sala de aula, jamais farei isso”. E, quase sempre, fizeram a
mesma coisa alegando não ter tempo, que é necessário ser mais rígidos com os
[Type text]
[Type text]
[Type text]
alunos, ou não conseguirão dar suas aulas e nem fazer com que aprendam, se
esquecendo que “O foco do avaliador está centrado na busca do melhor resultado
do ensino e da aprendizagem”, Luckesi (2011, p. 191). Dessa forma, a avaliação
elucida dificuldades e facilidades tanto do aluno quanto do(a) professor(a) e
norteia formas de trabalhos em comum para chegarem aos resultados desejados,
mas:
Contudo, deve ficar estabelecido que ter em conta a complexidade
para proceder ao ato de avaliar não significa considerar qualquer
resultado como satisfatório: importa o melhor e o mais significativo
resultado. Não se pode contentar com a afirmação de que um
estudante aprendeu “alguma coisa” quando os resultados forem
insatisfatórios. O estudante precisa aprender todo o necessário, que
certamente é mais do que “alguma coisa”. Uma pedagogia
compensatória – que, por questões ideológicas, assume que um
estudante pobre, negro ou índio aprendeu, quando efetivamente não
aprendeu – exime o educador e o sistema de ensino de reconhecer as
fragilidades existentes, o que, por sua vez, suprime a necessidade de
novos investimentos para sanar os resultados negativos obtidos, enfim,
a pedagogia compensatória é um engano (LUCKESI, 2011, p. 192).
Ainda hoje, mentalidades precisam ser mudadas, reconhecimento de quem
são os sujeitos do processo de ensino e aprendizagem assimilados e realmente
entender na prática que exames e testes são diferentes do processo pelo qual
permeia a avaliação.
Quando nos propomos a avaliar a aprendizagem de um determinado aluno
não podemos nos esquecer que esse aluno será influenciado, de uma forma ou de
outra, por essa avaliação, daí termos cuidado na aplicação desse processo, posto
não haver, para Vieira (2003, p. 145), “valor absoluto nem definitivo”. Dessa
forma evitaremos prejuízos tanto para os(as) professores(as) como para os alunos.
Mesmo considerando que o conceito seja uma abstração, é necessário termos
noção do que seja avaliar, pois:
É preciso [...] que se tenha um fundamentado conhecimento daquilo
sobre o que interrogamos e atribuição de significados aos fatos, dados
e informações que colhemos. Para além dos fatos e a partir deles, a
produção dos juízos de valor. Avaliar é uma ação que não admite
neutralidade, Dias Sobrinho (1997 apud Vieira, 2003 p. 145).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Então, o fator presente durante o processo de avaliação não é apenas
avaliar, mas como avaliar conscientemente, como promover uma avaliação
mediadora buscando um diagnóstico norteador e não um instrumento de coerção,
que para Hoffmann, a postura da avaliação classificatória e da avaliação
mediadora se opõe, visto que:
Avaliação classificatória: Corrigir tarefas e provas do aluno para
verificar respostas certas e erradas e, com base nessa verificação
periódica, tomar decisões quanto ao seu aproveitamento escolar, sua
aprovação ou reprovação em cada série ou grau de ensino (prática
avaliativa tradicional).
Avaliação mediadora: Analisar teoricamente as várias manifestações
dos alunos em situação de aprendizagem (verbais ou escritas, outras
produções), para acompanhar as hipóteses que vêm formulando a
respeito de determinados assuntos, em diferentes áreas de
conhecimento, de forma a exercer uma ação educativa que lhes
favoreça a descoberta de melhores soluções ou a reformulação de
hipóteses preliminarmente formuladas. Acompanhamento esse que
visa ao acesso gradativo do aluno a um saber competente na escola e,
portanto, sua promoção a outras séries e graus de ensino
(HOFFMANN, 2009, p. 77).
É a partir da consciência da importância do processo avaliativo que nós,
profissionais da educação, conseguiremos formar cidadãos críticos e responsáveis
que o mundo atual exige de um lado e do outro, conseguirmos, segundo Hoffmann
(2009, p. 141), praticar a avaliação mediadora como uma postura de vida.
AS TEORIAS E ABORDAGENS DE CURRÍCULO: DA CIÊNCIA À PRÁTICA
NO ESPAÇO DA APRENDIZAGEM
Outro conflito que tenho observado é o existente entre o ser professor(ra) e
as exigências do currículo, pois, segundo Sacristán (2000, p. 26) “Toda prática
pedagógica gravita em torno do currículo”. Tive colegas de trabalho que, por se
envolverem tanto com o dar aulas e transmitir conhecimentos do livro didático,
não abriam espaço para embasarem-se teoricamente. Assim, o termo
aprendizagem torna-se reduzido apenas a uma reprodução de um saber dado,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Assim, a aprendizagem no cenário escolar está orientada mais pela
transmissão de conhecimentos verdadeiros, do que pela discussão e
reflexão dos conteúdos apresentados: aos alunos lhes é transmitido um
mundo feito, não um mundo em processo de construção e
representação, o que desmotiva a curiosidade e o interesse deles.
Nesse processo, desestima-se o pensamento em prol da reprodução e
da memória. Existe um conhecimento “certo” que já está pronto e que
o aluno tem que saber, mas nada existe de novo que possa ser
acrescentado por ele (REY, 2008, p. 31).
Foge de suas mentes a afirmação de Casseti (1999, p. 125) “Partindo-se
do princípio que o conhecimento é infinito. Uma vez que o movimento da matéria
não é repetitivo em sua essência, conclui-se que não existem verdades absolutas
ou definitivas”; passando a assimilar, e até mesmo criar, as dificuldades impostas
pelo currículo.
Não podemos esquecer que há interesses e,
Forças que gravitam sobre o sistema educativo num dado momento,
enquanto que através deles se realizam os fins da educação no ensino
escolarizado. [...] De alguma forma, o currículo reflete o conflito entre
interesses dentro de uma sociedade e os valores dominantes que regem
os processos educativos (SACRISTÁN, 2000, p. 17).
Esses interesses precisam ser satisfeitos de uma forma ou de outra,
refletindo conflitos impostos pelo mundo capitalista atual. Nós, professores(as),
precisamos ter em mente, quando no exercício de nossa profissão, as funções das
teorias sobre o currículo que, segundo Sacristán:
As teorias desempenham várias funções: são modelos que selecionam
temas e perspectivas; costumam influir nos formatos que o currículo
adota antes de ser consumido e interpretado pelos professores, tendo
assim um valor formativo profissional para eles; determinam o sentido
da profissionalidade do professorado ao ressaltar certas funções;
finalmente, oferecem uma cobertura de racionalidade às práticas
escolares (SACRISTÁN, 2000, p. 37).
Então, se duas das funções do currículo é ter um valor formativo
profissional ao professorado e oferecer uma cobertura de racionalidade às praticas
escolares, estariam esses(as) professores(as) fora do contexto que refletem,
segundo Moysés (1994, ps. 14 15), o professor competente? É um caso a
pesquisar e pensar.
O que está exposto neste artigo não é o (a) professor(a) ser competente ou
se é tradicional, mas sim a busca da mediação dentro do processo de ensino e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
aprendizagem na realidade escolar. Para atingir essa mediação de saberes é
necessário, gostemos ou não, se está defasado ou não, fazer uso do currículo e
suas teorias que, para Sacristán,
As teorias do currículo são metateorias sobre os códigos que o
estruturam e a forma de pensá-lo. As teorias curriculares se convertem
em mediadores ou em expressões da mediação entre o pensamento e a
ação em educação. As teorias sobre o currículo se convertem em
referenciais ordenadores das concepções sobre a realidade que
abrangem e passam a ser formas, ainda que só indiretas, de abordar os
problemas práticos da educação. As teorias sobre o currículo se
convertem em referenciais ordenadores das concepções sobre a
realidade que abrangem e passam a ser formas, ainda que só indiretas,
de abordar os problemas práticos da educação (SACRISTÁN, 2000,
ps. 37, 38).
Dessa forma, precisamos fazer do currículo nosso aliado e não nosso
inimigo, pois é ele que usamos para nortear o ensino e a aprendizagem brasileiros,
seja no planejamento de aulas, seja na elaboração do Projeto Político Pedagógico,
O processo e o exercício de planejar referem-se a uma antecipação da
prática, de modo a prever e programar as ações e os resultados
desejados, constituindo-se numa atividade necessária à tomada de
decisões. [...] O planejamento se concretiza em planos e projetos,
tanto da escola e do currículo quanto do ensino. Um plano ou m
projeto é um esboço, um esquema que representa uma ideia, um
objetivo, uma meta, uma sequencia de ações que irão orientar a
prática. [...] o projeto pedagógico curricular consolida-se num
documento que detalha objetivos, diretrizes e ações do processo
educativo a ser desenvolvido na escola, expressando a síntese das
exigências sociais e legais do sistema de ensino e os propósitos e
expectativas da comunidade escolar. De certo modo, o projeto
pedagógico curricular é tanto a expressão da cultura da escola (cultura
organizacional) como sua recriação e desenvolvimento. Expressa a
cultura da escola porque ele está assentado nas crenças, valores,
significados, modos de pensar e agir das pessoas que o elaboram. Ao
mesmo tempo, é um conjunto de princípios e praticas que reflete e
recria essa cultura, projetando a cultura organizacional que se deseja
visando à intervenção e transformação da realidade (LIBÂNEO, 2008,
ps. 149, 151).
São os planejamentos, que fazem de nós professoras(es) profissionais
capazes de formar cidadãos críticos e conscientes do seu papel na sociedade.
É no momento do planejamento que decidimos qual prática usaremos,
apesar de num sistema educativo burocrático surgir as ideias força do(a)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
professor(a) ativo(a), a independência profissional, a autonomia no exercício da
profissão, como diz Sacristán (2000, p. 45). Com certeza essas(es) professoras(es)
conhecem e fazem uso de embasamento teórico como o PNE, a LDB e o currículo
além de produções bibliográficas da área.
O CURRÍCULO NA CONTEMPORANEIDADE: A BUSCA PELA
AUTONOMIA NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
Os(As) poucas(os) profissionais que exercem sua autonomia no processo
de ensino e aprendizagem reclamam muito da rigidez do currículo, da defasagem
dos conteúdos por não se adequarem à atualidade e por podar a autonomia quanto
às atividades práticas que têm em torno dele, Sacristán (2000, ps. 45, 49). Já com
relação à falta de autonomia o mesmo autor afirma,
O questionamento da falta de autonomia afeta a todos aqueles que
participam nas práticas curriculares, especialmente os professores e os
alunos. É pouco crível que os professores possam contribuir para
estabelecer metodologias criadoras que emancipem os alunos quando
estes estão sobre um tipo de prática altamente controlada. É preciso
partir de um certo isomorfismo, necessário entre condições de
desenvolvimento profissional do docente e condições de
desenvolvimento dos alunos nas situações escolares planejadas, em
certa medida, pelos professores (SACRISTÁN, 2000, pg. 48).
Quando na sala de aula da rede privada, percebe-se que a autonomia é
relativa, mas o papel do professor é escolher como dará sua aula, já na rede
pública a autonomia é maior. Daí a importância da(o) profissional se qualificar,
pois quanto mais qualificada(o), mais ampla será sua automia, pois haverá mais
possibilidade de atuar dentro do sistema. Com relação à rigidez do currículo,
Arroyo considera que,
As relações entre os docentes e os ordenamentos curriculares
passaram a ser um dos campos de debates, de estudos, de encontros
nas escolas e nos cursos de formação. Defrontamo-nos com duas
tendências que se contrapõem. De um lado os docentes da educação
básica se tornaram mais autônomos como coletivos sociais,
acumularam níveis de formação, conquistaram tempos de estudo, de
planejamento, de atividades lutam por serem menos aulistas, menos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
transmissores mecânicos de conteúdos, de apostilas, do livro didático;
mais criativos mais autores e senhores de seu trabalho individual e,
sobretudo, coletivo. De outro lado, as diretrizes e normas, os
ordenamentos e as lógicas curriculares continuam fiéis a sua
tradicional rigidez, normatização, segmentação, sequênciação e
avaliação (ARROYO, 2011, p. 35).
Para Reid (1980, apud SACRISTÁN, 2000, p. 48), “A teoria do currículo
deve contribuir, assim, para uma melhora da compreensão dos fenômenos que se
produzem nos sistemas de educação, manifestando o compromisso com a
realidade”. Atualmente os fenômenos e a realidade acompanham o mundo
globalizado, que segundo Sacristán (2008, p. 65) “os processos de globalização
afetam a educação porque incidem sobre os sujeitos, os conteúdos do currículo e
as formas de aprender”.
O currículo deve satisfazer a necessidade do sujeito atual e não a do sujeito
passado. Talvez seja daí que surja parte das tensões existentes na escola. Segundo
Arroyo,
O currículo está aí com sua rigidez, se impondo sobre nossa
criatividade. Os conteúdos, as avaliações, o ordenamento dos
conhecimentos em disciplinas, níveis, sequencias caem sobre os
docentes e gestões como um peso. Como algo inevitável, indiscutível.
Como algo sagrado. Como está posta a relação entre os docentes e os
currículos? Uma relação tensa. [...] O campo do conhecimento sempre
foi tenso, dinâmico, aberto à dúvida, à revisão e superação de
concepções e teorias contestadas por novos conhecimentos. Os
currículos escolares mantêm conhecimentos superados, fora da
validade e resistem à incorporação de indagações e conhecimentos
vivos, que vêm da dinâmica social e da própria dinâmica do
conhecimento (ARROYO, 2011, ps. 34, 35, 37).
A sala de aula, sendo espaço de contradições, estuda os aspectos sociais,
pede profissionais que entendam que a prática ocorre no nível da consciência para
depois vir o fazer. E esse fazer terá mais êxito se for através da mediação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Todos(as) os(as) profissionais envolvidos com a educação precisam ter em
suas mentes as especificidades do educando, de saber quem é o sujeito que
aprende, pois o processo de ensinar e avaliar não é isolado, muito pelo contrário,
em nossa profissão estamos comprometidos com a aprendizagem e essa
aprendizagem é interdisciplinar. Precisamos evitar o uso equivocado da avaliação
no espaço escolar, pois eles selecionam e excluem os alunos, quando na realidade,
eles precisam aprender e serem incluídos. Luckesi (2011, p. 200).
As características da avaliação é ser democrática, inclusiva, diagnóstica
tanto para os docentes quanto para os discentes, somente assim ela contribuirá
com a formação dos educandos como sujeitos históricos e sociais, como cidadãos
críticos em condição de igualdade no mundo atual. É o processo de avaliar que à
luz o desempenho da aprendizagem através da coleta de dados qualificando-o.
Para Resende (2008, p. 16):
O educador, trabalhador intelectual, em uma realidade monitorada e
fortemente impregnada de princípios que não os da inclusão, do
respeito, do direito pelo saber e pelo viver dignamente, pode estar
reforçando a condição de objetos sociais e não de sujeitos históricos –
medializantes e mediatizados.
A ética e o respeito que permeia todo o processo de ensino e aprendizagem
se iniciam com a observação das regras básicas de uma nação democrática. Temos
consciência de que o currículo está defasado, ou seja, precisa ser atualizado. Mas
temos noção, também, de que metodologias devem ser adaptadas para suprir as
necessidades dos discentes. A teoria e a prática não são inimigas, se estão em
constantes conflitos é porque nós o alimentamos em prol de nossa comodidade.
Segundo Resende,
Alguns equívocos podem ser apontados nos mais diferentes campos,
quando a questão é buscar a unidade entre teoria e prática. No campo
educacional, por exemplo, um dos primeiros equívocos refere-se aos
processos de formação, nos quais encontramos, com alguma
frequência, currículos fragmentados e disciplinas estanques. De
maneira coerente, a organização do trabalho pedagógico acompanha a
mesma lógica, visto que os próprios professores dão um tratamento,
igualmente compartimentado, aos encaminhamentos das diferentes
[Type text]
[Type text]
[Type text]
atividades pedagógicas. É o perverso, comprometedor e reprodutor
efeito em cadeia, difícil de ser rompido (RESENDE, 2008 p. 19).
Se estamos reproduzindo um efeito em cadeia, quando no exercício da
organização do trabalho pedagógico, como sujeitos autônomos podemos fazer
uma articulação sólida e significativa entre a teoria e a prática, pois temos a
capacidade de decidirmos como iremos exercer nossa profissão.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel G. Currículo, território em disputa / Miguel G. Arroyo. – Petrópolis, RJ:
Vozes, 2011.
CASSETI, Valter. Contra a correnteza / Valter Casseti – Goiânia: Kelps, 1999.
HOFFMANN, Jussara. Avaliação mediadora: uma prática em construção da pré-escola à
universidade / Jussara Maria Lerch Hoffmann. – Porto Alegre: Edidtora Mediação, 2009. (29 ed,
atual.) 160 p.
LIBÂNEO, José Carlos. Organização e gestão da escola: teoria e prática / José Carlos Libâneo. 5.
ed. Revista e ampliada – Goiânia: MF Livros, 2008.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem componente do ato pedagógico /
Cipriano Carlos Luckesi – 1. Ed. – São Paulo: Cortez, 2011.
MOISÉS, Lúcia Maria. O desafio de saber ensinar/Lúcia Maria Moysés. – Campinas, SP: Papirus,
1994.
PIMENTA, Selma Garrido. Estágio e docência / Selma Garrido Pimenta / Maria Socorro Lucena
Lima; revisão técnica José Cerchi Fusari, - 5. Ed. – São Paulo: Cortez, 2010. – (Coleção docência
em formação. Série saberes pedagógicos).
RESENDE, Lúcia Gonçalves de. Paradigma e trabalho Pedagógico. Construindo a unidade
teórico-prática. In: TACCA, Maria Carmem V. R. (org). Aprendizagem e Trabalho pedagógico, 2ª
Ed. Ed – Campinas, São Paulo: Editora Alínea, 2008 – PP;9 – 27.
REY, Fernando L. González. O sujeito que aprende: desafios do desenvolvimento do tema da
aprendizagem na psicologia e prática pedagógica. In TACCA, Maria Carmen V. R. (org.).
Aprendizagem e Trabalho Pedagógico, 2ª Ed. Ed – Campinas, São Paulo: Editora Alínea, 2008 –
PP: 29 – 44.
SACRISTÁN, J. Gimeno. Currículo na contemporaneidade: incertezas e desafios / Regina Leite
Garcia, Antônio Flávio Barbosa Moreira (organizadores); [traduzido por Silvana Cobucci Leite,
Beth Honorato, Dinah de Abreu Azevedo]. – 3. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
SACRISTÁN, J. Gimeno. O Currículo: uma reflexão sobre a prática / J. Gimeno Sacristán; trad.
Ernani F. da F. Rosa – 3. ed. – Porto Alegre: ArtMed, 2000.
VIEIRA, Lúcia Maria de Assis. A Avaliação Discente sob Múltiplos Olhares: alguns referenciais
teóricos./ Revista da Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior. 2003.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT 1 – Educação Cultura e Processos Educacionais
DANÇA E EDUCAÇÃO INTEGRAL: DIÁLOGOS ENTRE ARTE E
ENSINO NA CONSTRUÇÃO DE SUJEITOS
Paulo Henrique Alves de Souza
Centro de Educação Profissional em Artes Basileu França – Secretaria de Ciência e Tecnologia do
Estado de Goiás
Grupo de Estudos e Pesquisas Educação, Ensino, Espaço e Tempo (GEPEEET), Faculdade de
Educação – Universidade Federal de Goiás
[email protected]
Renato Ribeiro Rodrigues
Centro de Estudo e Pesquisa Ciranda da Arte – Secretaria da Educação do Estado de Goiás
Grupo de Estudos e Pesquisas Educação, Ensino, Espaço e Tempo (GEPEEET), Faculdade de
Educação – Universidade Federal de Goiás
[email protected]
RESUMO
O presente estudo apresenta uma breve discussão geral sobre o ensino da Dança no contexto
escolar e as suas contribuições no processo de ensino-aprendizagem. Especificamente, no âmbito
da Educação Integral em Tempo Integral, pretende-se abordá-la enquanto possibilidade educativoformativa, evidenciando sua extrema relevância na construção de sujeitos em sua integralidade.
Como conhecimento sócio-histórico-cultural, comunicação não verbal, linguagem estética e
artística, a dança se tratada didático-pedagogicamente nesta perspectiva de ensino e aprendizagem,
passa a ser compreendida, vivenciada e produzida de forma contextualizada, crítica e significativa,
contribuindo assim para a formação de sujeitos em sua totalidade.
Palavras- chave: dança; educação integral; escola.
DANÇA, CULTURA E SOCIEDADE
Precisamos levar a arte, que hoje está circunscrita a um mundo
socialmente limitado, a se expandir, tornando-se patrimônio
cultural da maioria e elevando o nível de qualidade de vida da
população. (BARBOSA, 1994, p.06)
A elaboração, sistematização e apreensão racional dos conhecimentos
foram possíveis nas relações do homem consigo, com os outros e o mundo. Ao
[Type text]
[Type text]
[Type text]
longo dos séculos as sociedades puderam ser organizadas e desenvolvidas num
contexto estruturante e dependente de condicionantes múltiplos de ordem natural,
histórica, social, religiosa, política, econômica e/ou cultural.
Na condição de sujeito numa perspectiva ampliada, o homem é concebido
a partir de processos interacionistas dinâmicos e constantes. Estes acontecem
entre sua constituição bio-anátomo-fisiológica; o contexto, época ou momento
social vivido e às tarefas e/ou ações que são executadas nesse ambiente. Isso se dá
por aprendizagens, iniciadas ainda criança por meio da imitação e que prosseguem
até o final da fase adulta quando novas técnicas codificadas, de sentidos e
significados sócio-histórico-culturais são apreendidas12.
A partir de uma necessidade natural e/ou condicionada, o sujeito por sua
corporeidade age no mundo pelo uso de técnicas específicas. Sob o ponto de vista
da arte, isso acontece a partir da subjetividade entendida como parte da formação
humana.
A arte pode elevar o homem de um estado de fragmentação a
um estado de ser íntegro, total. A arte capacita o homem para
compreender a realidade e o ajuda não só a suportá-la como a
transformá-la, aumentando-lhe a determinação de torná-la mais
humana e mais hospitaleira para a humanidade. A arte, ela
própria, é uma realidade social. (FISCHER, 1987, p.57).
Como forma de linguagem e manifestação artística-cultural humana, a
dança se apresenta como uma possibilidade desse estado de vir a ser no mundo.
Ou uma existência social transposta e materializada em movimento, que acontece
pela corporeidade do sujeito culturalmente construído. O próprio corpo seria um
instrumento de trabalho e sua forma de ação comunicativa no mundo
(SIQUEIRA, 2006).
A dança pode ser concebida a partir de uma dinamicidade que lhe é
inerente. Por exemplo, Gehres (2005) entende-a partindo da ideia de tensões. Para
a autora, a dança seria um estado físico de tensão que, em níveis bio-anátomo12
Respectivamente, processos de inculturação e de aculturação. MAUSS, Marcel. As
técnicas corporais. In: ______. Sociologia e antropologia. São Paulo: EPU/EDUSP, 1974.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
fisiológicos se transformaria em outro estado de tensão sócio-histórico-políticocultural e/ou vice-versa.
Nesse sentido, a dança pode ser (re)pensada como uma prática social
eminentemente humana, manifesta pelo corpo por movimentos dotados de
representações, expressões e criações. Estes seriam construídos no conflito entre
classes, etnias, gêneros, religiosidades, racionalidades e subjetividades.
Algo similar à concepção de Garaudy (1980), quando discute
representações simbólicas expressas na intensidade das relações do sujeito que
vivencia e se exprime através de suas danças, sob as mais diversas formas e
finalidades. O que vem dialogar com Dantas (1999), ao compreender esse mesmo
corpo que dança num estado processual constante:
O corpo que dança é um corpo construído, elaborado,
trabalhado. Construído, na sua vida cotidiana, em processos de
socialização, de educação, de repressão, de transgressão.
Elaborado através de diferentes experiências e práticas de
movimento. Trabalhado por técnicas específicas de dança, que
imprimem no corpo tradições de movimento (DANTAS, 1999,
p.100).
Baseado nesses pressupostos, a dança ganha significância no surgimento
da necessidade expressiva e comunicativa do indivíduo com o mundo.
Independente de quaisquer finalidades, sentidos e/ou possibilidades, o simples ato
de dançar implica na manifestação do corpo em sua integralidade, embora seja
notória a preponderância de uma fisicalidade cênica.
Talvez por isso, Portinari (1989) sugira que a dança seja a mais antiga das
manifestações artísticas humanas. Pelo fato de existir a simples dependência do
corpo, tido como instrumento de trabalho e ação.
De todas as artes, a dança é a única que dispensa materiais e
ferramentas, dependendo só do corpo. Por isso diz-na a mais
antiga, aquela que o ser carrega dentro de si desde os tempos
imemoriais. Antes de polir a pedra, construir abrigo, produzir
utensílios, instrumentos e armas, o homem batia os pés e as
mãos ritmicamente para se aquecer e se comunicar. Assim, das
[Type text]
[Type text]
[Type text]
cavernas à era do computador, a dança fez e continua fazendo
história. (PORTINARI, 1989, p.11).
Nessa dinamicidade, observamos em Ossona (1988) um percurso histórico
de passagem da dança pela magia, rito, cerimônia e celebração popular, atingindo
mais tarde formas de simples divertimento. Da mesma vertente, Faro (1998)
apresenta um processo similar nos mostrando esse mesmo caminho adentrando o
templo, aldeia, igreja, praça e salão até chegar mais tarde aos palcos.
Numa releitura adequada à realidade nacional, Strazzacappa (2001)
também nos coloca essa possível origem da dança a partir da magia, adquirindo
posteriormente outras funções motivadas pela necessidade de expressão,
espetáculo e lazer. Mais tarde, juntar-se-iam outras possibilidades relacionadas à
étnica a terapêutica. Nesses autores, percebe-se o acompanhamento da dança em
processos, relações e construções sociais que se contrapõem e coexistem,
explicitando sua complexidade.
Portanto, a dança pode ser considerada uma forma de expressão humana
que, assim como seus sujeitos, constitui-se num complexo sistema sócio-históricocultural em movimento. Tradicionalmente transmitida pela observação e reprodução
do observado, materializada em técnicas específicas que, na medida em que vem
acontecendo nos mais diversos espaços e situações, desenvolve outros sentidos e
possibilidades.
EDUCAÇÃO INTEGRAL EM TEMPO INTEGRAL NO BRASIL
A ampliação de tempos e espaços na escola pública é alvo de discussões
que culminam com a proposta de Educação Integral em Tempo Integral. Desde a
promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394 de 1996
podemos perceber que a ampliação da jornada escolar já é citada. Em outro
momento essa discussão é incorporada e ganha ênfase maior, no caso o Plano
Nacional de Educação, Lei 10.172 de 2001, que após reformulações trata desta
ampliação do tempo de permanência do aluno na escola, coloca como meta para a
Educação Nacional a oferta de educação em tempo integral em 25% das escolas
públicas de educação básica.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Antecedendo essas discussões vinculadas a dispositivos legais, cabe
ressaltar que práticas de educação em tempo integral no Brasil já vinham
acontecendo desde a década de 80, quando ocorre a criação dos Centros
Integrados de Educação Pública (Cieps), projeto o qual foi concebido por Darcy
Ribeiro à luz das concepções de Anísio Teixeira (COELHO e CAVALIERE,
2003).
Além dos Cieps, outros projetos também foram concebidos entre a década
de 80 e 90, tais como o Programa de Formação Integral da Criança (Profic) e os
Centros de Educação Integral da Criança (Caics).
Atualmente se constituindo como política pública, o Programa Mais
Educação, uma iniciativa Inter-Ministerial que amplia a jornada escolar no intuito
de ofertar atividades diversificadas no contra turno das escolas, se constitui em
uma iniciativa de caráter nacional.
De acordo com Coelho e Portilho (2009), algo grave aconteceu nesta
trajetória histórica, o fato de a escola focar problemas sociais além de seus limites,
o que acabou por deixar para segundo plano aqueles que são de natureza
pedagógica.
Ao longo desta trajetória histórica da Educação no Brasil em que podemos
claramente perceber que a ampliação do tempo de permanência dos alunos na
escola vem se constituindo de ações pontuais a políticas públicas, cabe retomar
algumas discussões que se referem a este tema e que abarcam o conceito de uma
Educação Integral a partir de uma concepção holística e qualitativa.
Alguns autores apontam para o fato de que a ampliação do tempo escolar
(fator quantitativo) deve prioritariamente estar ancorada nos princípios de uma
Educação Integral (fator qualitativo). Percebemos que Educação Integral não se
refere à Educação em Tempo Integral, ou seja, ampliar tempos e espaços em que a
educação acontece não significa uma mudança qualitativa no que já vem sendo
feito em um Tempo Parcial.
Segundo Paro (2009), aumentar o período em que o aluno estará na escola
implica em fazer diferente, pois dar mais tempo para que sejam repetidas práticas
conteudistas pobres em valores sociais, estéticos e culturais, não é o caminho para
se efetivar uma Educação Integral em Tempo Integral. De acordo com o autor:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O que fazer com essa escola ruim? Ela precisa de mais tempo?
– Não, ela já possui todo o tempo do mundo, ela não precisa ser
estendida, não precisa de tempo integral. Se é para fazer essa
coisinha ruim que está fazendo, continue assim. Esta é uma
concepção de educação que não nos interessa. Afinal, se for pra
pensar uma educação de tempo integral, (mesmo sem colocar
ainda a importância da educação integral) não há necessidade
disso – multiplicar a ruindade que está aí não ajuda em nada.
(Paro, 2009, p.15)
Fica evidente que no âmbito das discussões acerca do que seja uma
Educação Integral em Tempo Integral, o pensamento e a reflexão em torno dos
elementos que constituem e são fundamentais para que este tema seja pensado e
sistematizado enquanto políticas públicas devem ser dilatados.
Ao aumentar o tempo e proporcionar novos espaços para que a educação
seja pensada em uma perspectiva de integralidade, faz-se necessário que a
concepção estanque e obsoleta presente no Sistema de Ensino no Brasil seja
superada, avançando assim para o que de fato seria uma Educação Integral, a qual
pensada numa perspectiva ampliada do ato de educar, necessariamente deverá
acontecer em Tempo Integral.
Segundo Maurício (2009), esta integralidade que tanto se fala em
Educação se constrói a partir de diferentes linguagens, situações e condições de
aprendizagens. Levar em consideração a formação a partir dos aspectos estéticos,
culturais, cognitivos, físicos, históricos e sociais se faz necessário, dialogando
entre as diferentes e variadas atividades, circunstâncias e linguagens utilizadas no
contexto educacional.
Neste sentido, é necessário que além de tempos e espaços, também seja
ampliada a função da escola, pois o compromisso com a Educação Integral
pressupõe, de acordo com Arroyo (2012), uma radicalidade, na medida em que
repensar e reorganizar toda uma lógica em que vem sendo planejado o tempoespaço, inclusive a própria estruturação e sequenciação de conteúdos,
aprendizagens e avaliações. O autor chama a atenção para:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Alargar a função da escola, da docência e dos currículos pra dar conta de um
projeto de educação integral em tempo integral que articule o
direito ao conhecimento, às ciências e tecnologias com o direito
às culturas, aos valores, ao universo simbólico, ao corpo e suas
linguagens, expressões ritmos, vivências, emoções, memórias e
identidades diversas. Essa função da escola mais integral da
formação humana exige mais tempos, mais espaços, mais
saberes, artes, compromissos profissionais, diversidade de
profissionais. (Arroyo, 2012, p. 44-45).
Diante do que foi exposto, nota-se que uma perspectiva ampliada e
significativa em Educação Integral, deve primar pela articulação entre os saberes,
práticas e linguagens que são/estão inseridas no ambiente escolar. Ao se pensar no
ensino da Dança neste contexto, a recíproca é verdadeira, pois chamamos a
atenção para uma relação dialógica entre os sujeitos envolvidos no processo de
ensino aprendizagem e o contexto sócio-histórico-cultural em que estão inseridos,
relação a qual é expandida aos outros conhecimentos, dentro de uma perspectiva
integral de educação.
DANÇA, ESCOLA E EDUCAÇÃO
Toda dança promove transformação, logo, toda dança é
educação. A dança em si já é educativa, expressiva e criativa,
dispensando adjetivos. Se não é constituída desses três fatores,
então simplesmente não é dança. (STRAZZACAPPA, 2001,
p.44)
Como forma de transmissão da cultura, a educação existe enquanto
possibilidade interventora no mundo. No sentido de (re)produção de práticas,
sejam elas de contestação e/ou desvelamento, propicia a formação de tipos de
sujeitos segundo necessidades e exigências sociais num momento da história e do
próprio desenvolvimento humano.
A educação não-intencional, acontece quando refere-se à possíveis
influências e/ou interferências do meio natural e social sobre o homem como nas
leis, religiões e práticas familiares. Intencionalmente e num caráter formal, é
[Type text]
[Type text]
[Type text]
institucionalizada, direcionada, estruturada, organizada e sistematizada com
objetivos explícitos, conteúdos, métodos de ensino e procedimentos didáticos
próprios.
Aqui a escola teria seu lugar privilegiado, conforme Saviani (2005). Como
um espaço estruturado para que aconteçam processos de ensino-aprendizagem
significativos, no qual a transmissão de saberes e conhecimentos historicamente
adquiridos, acumulados e sistematizados são pensados e (re)significados,
possibilitando a formação de sujeitos capazes de uma ação transformadora.
Nas obras de Laban (1981; 1990) percebemos que a dança numa
perspectiva educativa contribui para o desenvolvimento das capacidades humanas,
pois, o movimento concebido de forma expressiva e comunicativa, permite ao
sujeito compreender o mundo de maneira diferenciada. Na harmonia entre
movimento e dança, partindo da compreensão das qualidades desse movimento
nas diversas formas de expressão e subjetividade, proporcionar-se-ia a integração
entre conhecimentos cognitivos, habilidades criativas e a percepção de sensações.
Ao falamos do ambiente escolar formal, a dança pode propiciar a
construção de experiências estéticas que passam pelo envolvimento do sensível,
de sentimentos e opiniões. Na escola coexistiriam possibilidades de ensino,
transmissão e produção artística em níveis científicos e intelectuais e por isso, a
dança ganha espaço, importância e pode contribuir para uma educação
transformadora. (BRASIL, 2012).
Em Fanzoni e Gariba (2007), percebe-se um olhar semelhante. O ensino da
dança na escola iria para além do desenvolvimento de aspectos motores, sociais,
cognitivos, afetivos, culturais e artísticos. Passaria pelo seu entendimento como
atividade pedagógica, superando uma cultura corporal voltada estritamente para a
execução de movimentos preestabelecidos e/ou pré-determinados.
Da mesma forma, observamos esse pensamento em Marques (2010) no
qual percebemos a dança como forma de conhecimento, experiência estética e
expressão humana fundamental na educação social dos sujeitos. No entendimento
de que diferentes danças carregariam em si significados próprios de corpo,
indivíduo e sociedade e que sua discussão no contexto escolar é perfeitamente
possível desde que ocorra de forma crítica, fundamentada e significativa.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Para a autora, a partir da concepção de um ensino crítico-reflexivo, numa
abordagem metodológica que entende as relações existentes entre arte, ensino e
sociedade, seria possível o desenvolvimento das capacidades de leitura,
interpretação, percepção e análise em dança enquanto conhecimento e linguagem,
na condição de praticantes e/ou expectadores. Assim, conforme Marques (2010,
p.145):
A proposta metodológica de Dança no Contexto permite e
enfatiza a construção de redes de relações, de tessituras
múltiplas e abertas entre os saberes específicos da dança
(vértice da Arte) e as relações desses saberes com os atores
sociais (vértice do Ensino) que vivem no mundo e com ele
dialogam (vértice da Sociedade).
Isso possibilitaria uma discussão ampliada para longe da massificação de
valores, conceitos e/ou ideais pré-estabelecidos. Além dos aspectos pessoais,
emocionais e subjetivos ao problematizar a realidade social, tornar-se-ia o
processo pedagógico significativo ao articular conhecimentos artísticos, desde que
pautados num fazer, apreciar e contextualizar a realidade.
Ao se compreender que o sujeito possui vivências e experiências corporais
diversas e que a escola precisa estar sensível ao ensino de conteúdos de forma
significativa, a dança ganha importância na formação humana ao possibilitar
experiências que proporcionem novos olhares para o mundo, envolvendo a
sensibilização e conscientização de valores, atitudes e ações transformadoras na
sociedade.
Porém, conforme Strazzacappa (2001), esse caminho não tem sido fácil.
Existem problemas ainda não superados em relação à dança na escola. Dizem
respeito aos objetivos e finalidades de seu ensino, quando voltados à ocupação do
tempo ocioso ou seu caráter utilitarista, acessório e decorativo; sua sub-valoração,
se comparada aos demais saberes escolares; ao tipo de dança ministrada, quando
predomina-se apenas o ensino de uma técnica específica como balé; as
metodologias de ensino, bem como as formas de abordagem dos conteúdos; o tipo
de profissional responsável pelo ensino e sua formação técnica e/ou acadêmica; e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
por último, em relação ao trato com questões polêmicas que permeiam o universo
da dança13.
Marques (1999) aponta que a aprendizagem em dança acontece pela ação
prática de experimentação do movimento em treinamentos, atividades,
laboratórios de criação, aulas e/ou ensaios. Mas também ao se discutir história,
estilos, escolas, manifestações populares, tradições, rupturas, memórias,
inovações e interfaces da dança com outras áreas do conhecimento. As qualidades
em dança de se entender, interpretar, criar, dirigir e produzir artisticamente passam
por esses saberes.
É importante conhecer danças para se entender relações e ampliar o
universo artístico, não restringindo-se ao mundo de espetáculo. Por isso, o
professor de dança assumiria outras funções para além da reprodutibilidade de
passos sistematizados. Exige o exercício da capacidade de criação, devidamente
adaptada à diferentes situações, conteúdos, ambientes, alunos, públicos e/ou
expectativas. Uma possibilidade articulada entre papéis de artista e docente.
O artista-docente é aquele que, não abandonando suas possibilidades
de criar, interpretar, dirigir, tem também como função e busca
explícita a educação em seu sentido mais amplo. Ou seja, abre-se a
possibilidade de que processos de criação artística possam ser revistos
e repensados como processos também explicitamente educacionais.
[...] passa a ser a fonte do conhecimento em/através da arte e não
somente uma ponte entre o aluno e o mundo da arte. Em cena, ele tem
a possibilidade de criar e recriar e, principalmente, de propor desta
vez não somente um trabalho artístico eventualmente com fundo
educacional, mas um trabalho artístico-educativo. (MARQUES,
1999, p. 112-113).
Se atentarmos para a legitimidade da dança na escola, percebemos que nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN's) a dança aparece como disciplina a ser
tratada nas áreas da Arte e como conteúdo em Educação Física. Seja em uma ou
13
Como as que envolvem gênero e dança. Ainda a dança é vista culturalmente como
atividade não-masculina, indicada para mulheres por estarem relacionadas a características tidas
como femininas, como delicadeza e sensibilidade. Principalmente numa associação entre dança,
balé e mulher. HANNA, Judith Lynne. Dança, sexo e gênero: signos de identidade, dominação,
desafio e desejo. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1999.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
outra, ainda é comum observarmos um caráter reprodutivo, funcional e/ou
meramente recreativo, no cumprimento de demandas referente às datas,
comemorações e/ou eventos escolares (STRAZZACAPPA E MORANDI, 2006).
Mesmo assim, ainda há uma grande necessidade de aprofundamento,
principalmente nas relações da dança com outras áreas do conhecimento14. A
criatividade, sensibilidade, noções rítmicas, expressão corporal e a educação
estética acontecem na dança como nas demais linguagens artísticas, por exemplo.
Da mesma forma, o trato com o corpo e o movimento humano também acontece
na Educação Física, embora haja singularidades e competências de cada área.
A dança pode ser ensinada, aprendida e vivenciada na escola. Favorece o
desenvolvimento cognitivo, ético e estético humano. Contribui qualitativamente
na socialização, expressividade, comunicação e autonomia dos sujeitos.
Possibilita um primeiro contato artístico, num incentivo para que a criança se
torne futuramente um artista, caso seja sua vontade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como explicitado ao longo do texto, buscou-se compreender a dança de
maneira ampliada como forma de conhecimento sócio-histórico-cultural,
comunicação não-verbal, linguagem estética e artística passível de ser
compreendida, vivenciada e produzida de forma contextualizada, crítica e
significativa pelos sujeitos.
Num primeiro momento foram apresentados conceitos e interpretações
existentes acerca dela, procurando correlacionar diversos pensamentos e autores,
explicitando e evidenciando correlações existentes entre dança e sociedade. Em
seguida a discussão apresentada foi voltada especificamente para as relações entre
dança, escola e educação integral.
14
A partir dos anos 90 surgem escritos reflexivos nacionais em dança de suma importância.
Discute-se o corpo na dança sob diferentes perspectivas, técnicas corporais utilizadas, métodos e
metodologias de ensino, processos de criação e composição cênica, biografias e historicidade de
personalidades, grupos e/ou companhias, dança e mercado, formação profissional, políticas de
fomento artístico, dentre outros. STRAZZACAPPA, Márcia. Reflexões sobre a formação
profissional do artista da dança. In: Lições da dança, Rio de Janeiro, v. 4, p. 175-194, 2003.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Numa tentativa de se articular todo esse contexto a uma concepção de
sujeito que dança e que por ela tem possibilidades de ação concreta e
transformação social, procuramos traçar caminhos e possibilidades de seu ensino
no espaço formal institucionalizado, levando em consideração os pressupostos da
Educação Integral, apontando no espaço escolar para algumas questões que ainda
são emergentes e precisam ser aprofundadas em outras discussões.
Cabe ao sujeito fazer suas escolhas, mas a escola tem seu papel
fundamental na transmissão e mediação de saberes e conhecimentos. Na
promoção das capacidades de leitura de mundo, mudança de realidades e
potencialização de uma atitude reflexiva, consciente e ativa de seus alunos.
Portanto, isso não pode ser negado e/ou omitido, devendo ser articulado entre os
diferentes saberes, práticas e linguagens presentes no ambiente escolar,
colaborando assim para a formação dos sujeitos, onde a dança se constitui como
possibilidade a ser trabalhada na Educação Integral.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel G. O direito a tempos-espaços de um justo e digno viver. In: Caminhos da
Educação Integral no Brasil: direito a outros tempos e espaços educativos. MOLL, Jaqueline... [et
al.]. – Porto Alegre: Penso, 2012.
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos. São Paulo:
Perspectiva, 1994.
BRASIL. Dança na escola: arte e ensino. Boletim salto para o futuro da TV escola. Brasília:
Ministério da Educação. Ano XXII. Boletim 2. Abr. 2012.. Disponível em
<http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/18093102-Dancanaescola.pdf>. Acesso em: 20 de jun.
2012.
BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. 16. ed. São Paulo: Brasiliense, 1985.
COELHO, Ligia Martha Coimbra; CAVALIERE, Ana Maria Villela. Para onde caminham os
Cieps? Uma análise, após 15 anos. Cadernos de Pesquisa. São Paulo, Fundação Carlos Chagas, n.
119, p.147-174, jul./2003.
COELHO, Lígia Martha Coimbra; PORTILHO, Danielle Barbosa. Educação integral, tempo e
políticas públicas: reflexões sobre concepções e práticas. In: Educação Integral em tempo
integral: estudos e experiências em processo. COELHO, Lígia Martha Coimbra (Org.). Petrópolis,
Rio de Janeiro: FAPERJ, 2009.
DANTAS, Mônica. Dança: o enigma do movimento. Porto Alegre: UFRGS, 1999.
FANZONI, Ana; GARIBA, Chames Maria Stalliviere. Dança escolar: uma possibilidade na
Educação Física. In: Movimento, Porto Alegre, v.13, n.2, p.155-171, mai./ago. 2007. Disponível
[Type text]
[Type text]
[Type text]
em: <http://www.seer.ufrgs.br/index.php/Movimento/article/viewFile/3553/1952>. Acesso em: 28
abr. 2012.
FARO, Antônio José. Pequena história da dança. 4. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
FISCHER, Ernst. A necessidade da arte. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.
GARAUDY, Roger. Dançar a vida. 6. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.
GEHRES, Adriana de Faria. Dança. In: GONZALES, Fernando Jaime; FENSTERSEIFER, Paulo
Evaldo (Org.). Dicionário crítico de Educação Física. Ijuí: Unijuí, 2005.
LABAN, Rudolf. O domínio do movimento. São Paulo: Summus, 1981.
_____________. Dança educativa moderna. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1990.
MARQUES, Isabel A. Ensino de dança hoje: textos e contextos. São Paulo: Cortez, 1999.
____________.Metodologia para ensino da dança: luxo ou necessidade? In: PEREIRA, R. e
MAURÍCIO. Lúcia Velloso. Políticas Públicas, tempo, escola. In: Educação Integral em tempo
integral: estudos e experiências em processo. COELHO, Lígia Martha Coimbra (Org.). Petrópolis,
Rio de Janeiro: FAPERJ, 2009.
SOTER, S. (orgs.) Lições de dança 4, Rio de Janeiro: UniverCidade, 2004.
_____________. Linguagem da Dança: arte e ensino. 1ª Edição. São Paulo: Digitexto, 2010.
MINAYO, Marília Cecília de Souza (Org.). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 9. ed.
Petrópolis: Vozes, 1998.
OSSONA, Paulina. A educação pela dança. São Paulo: Summus, 1988.
PORTINARI, Maribel. História da dança. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
PARO, Vitor Henrique. Educação integral em tempo integral: uma concepção de educação para a
modernidade. In: Educação Integral em tempo integral: estudos e experiências em processo.
COELHO, Lígia Martha Coimbra (Org.). Petrópolis, Rio de Janeiro: FAPERJ, 2009.
SAVIANI, Demerval. Escola e democracia. Campinas: Autores Associados, 2005.
SIQUEIRA, Denise da Costa Oliveira. Corpo, comunicação e cultura: a dança contemporânea em
cena. Campinas, SP: Autores Associados, 2006.
STRAZZACAPPA, Márcia. Dançando na chuva e no chão de cimento. In: FERREIRA, Sueli
(Org.). O ensino das artes: construindo caminhos. Campinas: Papirus, 2001. p. 39-78.
STRAZZACAPPA, Márcia; MORANDI, Carla. Entre a arte e a docência: a formação do artista
da dança. Campinas: Papirus, 2006.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
GT 1 – Cultura e Processos Educacionais
Comunicação Oral
DANÇAS MIDIÁTICAS E ESCOLA: POSSIBILIDADES DE ENSINO E
APRENDIZAGEM PELA PEDAGOGIA HISTÓRICO CRÍTICA
Renato Ribeiro Rodrigues
Centro de Estudo e Pesquisa Ciranda da Arte – Secretaria da Educação do Estado de Goiás
Grupo de Estudos e Pesquisas Educação, Ensino, Espaço e Tempo (GEPEEET), Faculdade de
Educação – Universidade Federal de Goiás
[email protected]
Paulo Henrique Alves de Souza
Centro de Educação Profissional em Artes Basileu França – Secretaria de Ciência e Tecnologia do
Estado de Goiás
Grupo de Estudos e Pesquisas Educação, Ensino, Espaço e Tempo (GEPEEET), Faculdade de
Educação – Universidade Federal de Goiás
[email protected]
RESUMO:
O presente estudo foi elaborado enquanto revisão de literatura e objetivou discorrer sobre a
possibilidade do ensino da Dança no contexto escolar, tratando especificamente da presença das
danças veiculadas pela mídia nesse espaço formal e institucional de ensino. Ao entendê-las como
manifestações em Dança passíveis de serem consideradas e discutidas nas aulas, buscou-se
articular diversos estudos da área que abordam a temática com o trabalho de Gasparin (2002) em
relação à Pedagogia Histórico-Crítica. Compreendendo as danças midiáticas como práticas sociais
e/ou formas de conhecimento pré-existentes em Dança que se articula com os conteúdos próprios
dessa linguagem, o estudo aponta para avanços e transformações quando estas são problematizálas na escola. Nesse sentido, a Dança como conhecimento sócio-histórico-cultural, comunicação
não verbal, linguagem estética e artística tem um salto e passa a ser compreendida, vivenciada e
produzida de forma contextualizada, crítica e significativa.
Palavras-chave: dança; indústria cultural; escola.
INTRODUÇÃO
A dança acontece hoje sob as mais variadas formas, contextos, espaços e
finalidades. Como conhecimento sócio-histórico-cultural, comunicação não
verbal, linguagem estética e artística, participa ativamente da construção de tipos
de sujeitos e contribui para a concretização efetiva de projetos de sociedade. Na
educação básica, sobretudo no ensino regular formal, apresenta sentidos e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
significados próprios e por isso torna-se fundamental sua discussão de maneira
ampliada, fundamentada e significativa.
Das relações existentes, (re)correntes e emergentes entre formação
humana, dança e ensino, surgem necessidades dialógicas entre os pares
envolvidos no processo de ensino-aprendizagem. Ao observar os diversos espaços
e momentos da escola em que a dança acontece, é possível identificar a presença
de danças veiculadas pela mídia. Independentemente do caráter em que se
apresentam, seja ele reprodutivo ou desvelador, constituem-se como práticas
sociais que se articulam com conhecimentos próprios em dança.
Assim, o presente estudo buscou discorrer sobre o ensino da dança no
contexto escolar. Principalmente em relação a possibilidade de discussão dessas
danças midiatizadas nas aulas. Isso, ao entendê-las como conhecimentos préexistentes em dança oriundos da realidade dos alunos, possíveis de serem
trabalhadas de maneira didática e pedagógica, contribuindo para uma formação
crítica, participativa, autônoma e transformadora em dança e por ela mesma na
sociedade.
Para tal, escolheu-se como ponto de partida compreender as discussões
apresentadas em relação ao ensino da dança na escola por autores como
Strazzacappa & Morandi (2006) e Marques (2010). Também, entender a proposta
didático-metodológica desenvolvida por Gasparin (2002), a partir da Pedagogia
Histórico-Crítica - orientada por Demerval Saviani, na qual se propõe um ensino
significativo voltado para a participação ativa e consciente dos sujeitos,
considerando suas realidades. E ainda, dialogar com outros referenciais
apresentados ao longo do trabalho, também importantes e significativos para toda
a discussão apresentada.
DANÇAS MIDIÁTICAS E SUJEITOS DANÇANTES!
No início do capitalismo, a arte era vista como atividade não-lucrativa,
pois a sociedade dominante era extravagante em seus gastos para sua promoção e
divertimento. Posteriormente, o capital possibilitou-lhe desenvolvimento,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
principalmente quando esta passa a ser vista como “embelezamento de sua vida
privada ou apenas como um bom investimento” (FISCHER, 1987, p.61).
Se antes os artistas tinham seu reconhecimento dentro da organização
social, no decorrer das Idades Média e Moderna, as relações mercantis na arte
começaram a serem intensificadas, por meio da encomenda de obras, contratação
de artistas e/ou patrocínio de trabalhos. Isso trouxe, a partir do século XVII e
XIX, a figura de um profissional de arte com preocupações comerciais e artísticas.
Surgiriam relações entre mercado, arte, cultura e sociedade que, anos mais
tarde, seriam discutidos pela Teoria Crítica da Sociedade da Escola de Frankfurt,
nos estudos de pensadores como Max Horkheimer e Theodor W. Adorno.
Definindo conceitos como o de Indústria Cultural15, no qual os bens culturais
passam a serem adaptados ao consumo das massas num processo caracterizado
pela padronização, massificação, alienação, reprodução e passividade de sujeitos
entendidos como consumidores.
Para Benjamim (1992), a reprodutibilidade técnica das obras de arte traria
uma maior democratização de acesso à população ao mesmo tempo que poderia
ser utilizado na formulação de uma política artística revolucionária. Assim, a arte
perderia seu valor de culto e ganharia valor de exibição dando maior autonomia
ao artista.
Porém, apesar dessa liberdade na criação artística, o mercado passaria a
regulação da autonomia estética. Para vender suas obras e delas sobreviverem, os
artistas passariam a contar com a aceitação pública, quase sempre manipulada.
Para Adorno (1996), arte e mercado não coexistem uma vez que a padronização
de bens culturais geraria uma desvalorização e desqualificação dos trabalhos
artísticos.
Isso porque o que seria aceito como bom, passaria necessariamente pela
aprovação e veiculação dos meios de comunicação. Seria o mesmo que os artistas,
15
O termo também designa tanto uma modificação no sentido da arte, como a fusão do
popular e do erudito em formas de comercialização. Além disso, refere-se à racionalidade da
cultura com fins de dominação social no capitalismo. ADORNO, Theodor. A Indústria Cultural: O
Esclarecimento como Mistificação das Massas In: ______ Dialética do esclarecimento Rio de
Janeiro: Jorge Zahar, 1985.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
“...colocam-se a serviço do sucesso, renunciam ao impulso subordinado e rebelde
que lhes é próprio” (ADORNO, 1996, p.125).
A arte tornaria-se sujeita às determinações de um mercado pautado no
fetichismo e o artista sujeito ao gosto mensurado de um público controlado e
homogenizado. O autor também chama a atenção para o cuidado na padronização
de bens culturais, e sua influência direta na construção da subjetividade ou o
julgamento do gosto, no qual passaria necessariamente pelo reconhecimento ou
identificação pessoal com aquilo que se é confrontado.
Como afirma Barbosa (1994), a arte não estaria isolada da economia,
política e/ou padrões sociais que atuam na sociedade. Por isso, a preferência em
determinada sociedade, por formas e linguagens/técnicas estéticas e artísticas,
dependem de fatores que surgem e desenvolvem-se, condicionadas por seu
contexto sócio-histórico-cultural. Relacionando-se organicamente com a
sociedade em que se produz, distribui e consome.
Nesse sentido, a cultura encontrar-se-ia vinculada a relações de ordem
diversas e por isso, há de se considerar que as formas artísticas também
expressariam também ações políticas e sociais. A questão é que, a arte não se
apresenta inatingível das relações com o mercado, pois, qualquer prática humana
tem sido diretamente influenciada nesse contexto. Isso acabaria influenciando no
processo de legitimação.
Como nos aponta Guarato (2010),
Uma das grandes inquietações que permeia a vida artística em
dança é sua relação com o mercado. Existe forte resistência por
parte dos intelectuais, pesquisadores, intérpretes e da crítica
especializada em compreender e legitimar práticas dançantes
vinculadas aos meios de comunicação em massa e a indústria
cultural , a elas conferindo dignidade e respeito. Tal preconceito
se origina da não percepção histórica das relações,
extremamente variáveis, que envolvem produção de arte e
mercado de arte. A polarização maniqueísta entre dança feita
para as massas e a dança produzida para a crítica especializada
não permite perceber a recente reivindicação dos artistas por
“criar como lhe aprouver”: ela só surge após a instituição de
relações predominantes de mercado. (p.35)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Para o autor, quando se fala na vinculação entre arte, comércio e mercado,
há uma compreensão que não mais se luta contra a noção capitalista de
mercadoria, pois a mesma é (re)produzida hoje em quaisquer práticas humanas
condicionadas a valores e preços. Por exemplo, a legitimação sociocultural no
meio artístico acaba passando por relações de pensamento, organização,
movimentação e produção que envolvem o ganho e o gasto de dinheiro.
Isso não isentaria à dança que, notoriamente presente na cultura juvenil,
constitui-se como uma de suas principais formas de diversão, entretenimento e
socialização. Mesmo que por meio dela, o corpo tenha a possibilidade de se
expressar em suas dimensões social, cultural e política para além do
individualismo característico da sociedade atual. Nesse sentido e pensando-se
nessas questões, a dança também é influenciada por essas relações e passa a ser
veiculada em diferentes formatos.
Por exemplo, exibida dentro de um contexto midiatizado no quais danças
passam a serem veiculadas como produtos culturais de consumação rápida e
eficaz, já não estão restritos aos espaços de lazer, mas acontecem onde são
possíveis espaços de socialização e que, estes valores comerciais possam ser
massificados.
Para Bergero (2006), as danças veiculadas pela mídia acabam
caracterizadas como “danças da moda”, ou àquelas veiculadas e/ou reproduzidas
pelos meios de comunicação de massa. São facilmente identificadas por sua
origem estrangeira, sobretudo norte-americana, e/ou nacionais adaptadas com
referência nas primeiras, decorrentes de grupos oriundos do mercado fonográfico
que surgem e desaparecem num curto espaço de tempo.
Estas, geralmente são difundidas pela televisão através dos programas de
variedades e principalmente em videoclips. Esse tipo de comunicação imagética
expresso em tecnologias audiovisuais é típico da cultura pós-moderna, fruto das
sociedades industriais capitalistas avançadas, caracterizadas pelo notável
desenvolvimento em automação e cibernética, o que lhes ocasionou um acúmulo
de riquezas e mudanças na composição de classes sociais.
A presença da produção em série e a brevidade dos bens produzidos,
adentraria o cotidiano das pessoas e exerceria influência nas relações sociais e na
[Type text]
[Type text]
[Type text]
cultura. Por isso, as coreografias são estruturadas tendendo a certa padronização
de movimentos, em partes do corpo específicas para que aconteça uma fácil
assimilação.
Para a autora, nesse processo de massificação, a personalidade individual
tende a um nível de inconsciência. Ideias, sentimentos e ações convergem-se para
um único direcionamento e a vontade própria passa a significar parte de uma
vontade uniforme e coletiva. Na qual há certa tradição estabelecida. Por isso um
comportamento coletivo é assumido pelo indivíduo.
Quando observamos crianças, jovens e até adultos dançando ao ritmo
de algumas músicas comerciais, a Indústria Cultural parece legitimar
qualquer comportamento que poderia ser considerado como exagerado
ou fora dos parâmetros civilizatórios. Parece que se deixa escapar um
comportamento reprimido pelo processo de civilização, como é a
sexualidade, e ao ser sob uma forma coletiva, sob uma forma
legitimada pela Indústria Cultural, torna-se permitido, não julgado,
adquirindo, um caráter de certo, verdade, bom, belo, aceito e
legitimado por todos. Isso pode-se perceber como um espaço de
socialização, onde catalisam-se e dissipam-se, coletivamente, tensões,
repressões e inibições (p.53).
Como consequência, nas danças propostas pela mídia e por ela
legitimadas, as limitações e distâncias entre os corpos diminuem, a
individualidade característica das relações sociais tende a se dissipar e acontece
certa permissividade de sentimentos e emoções da natureza humana.
Sborquia e Gallardo (2002), também perpassam pelas relações existentes
entre a indústria cultural e a dança no contexto midiático. Para eles, as mensagens
veiculadas por essas danças não são passíveis de ressignificação, pois, seus
receptores são condicionados para uma absorção e consumo acrítico. Haveria
certa passividade entre o receptor e a mensagem veiculada, onde o sujeito não
teria condições de reflexão sobre as informações veiculadas. Apontam, por
exemplo, para um processo de erotização infantil nas danças veiculadas pela
televisão. Porém, sua análise tende a uma classificação de danças a partir de um
cunho ético-moral, determinando a priori o que deveria ou não ser ensinado na
escola, por exemplo.
Tomazzoni (2005), também ao propor uma análise das danças veiculadas
pela mídia para além do discurso determinista da indústria cultural, chama a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
atenção para outro fenômeno. Para ele, danças de caráter popular que
historicamente foram excluídas, apropriadas e/ou resignificadas dando lugar a
modelos e padrões de movimentos e corpos, a partir das tecnologias de
comunicação ganham espaço e outras possibilidades.
O público passaria a conhecer o que antes era restrito, subjugado e/ou
excluído, ganhando visibilidade para além do que socialmente seria aceito como
“boa dança”. Possibilitando ainda condições de hibridismo dessas danças com os
modelos hegemônicos pré-existentes, produzindo novas interpretações ou outras
danças. Isso de certa forma trouxe uma maior acessibilidade e democratização de
culturas, ao dar ao público outros olhares de diferentes danças.
Ao observar ou mesmo experimentar os passos dessas danças, o
espectador também constrói a sua própria rede de interpretações, tanto
ao deixar-se seduzir quanto ao estabelecer outro tipo de interação e até
mesmo contrapor-se a elas. (TOMAZZONI, 2005, p.48)
Guarato (2010) aponta que não são exclusivamente as mídias que
provocam nos sujeitos a vontade de dançar, copiar e consumir o que é veiculado.
Há uma aliança entre apelos mercadológicos e midiáticos, mas principalmente o
reconhecimento de valores compartilhados. Em dança, são de maior assimilação
porque se aproximam do conhecimento de mundo e do estilo de vida de
“audiência”.
Embora haja essa receptividade, o conteúdo veiculado nem sempre se faz
estanque já que temos implícito um processo que envolve a receptividade do
sujeito, os modos e significados de se dançar. Considerando a influências da mídia
sobre a dança, entendemos que esta acontece e se constitui como uma prática
social em diferentes espaços e momentos de socialização. Porém não caímos no
determinismo de uma absorção extremamente passiva, pois, tenderíamos a
discussão restrita do que é recebido e desconsideraríamos os sujeitos em suas
possibilidades.
A utilização desses produtos culturais teriam uma significância maior, se
envoltos processos de apropriação, incorporação e (re)elaboração. Por isso,
quando voltamos nossos olhares para essas danças, não buscamos analisá-las sob
um ponto de vista classificatório, categorizador e/ou moralista. Colocamo-las
[Type text]
[Type text]
[Type text]
como possibilidades, pois, não deixam de ser saberes pré-existentes em dança e
que dialogam com a realidade. Como produtos da cultura humana, nelas estão
implícitos sentidos e significados próprios que precisam ser trabalhados na escola,
a partir de um olhar analítico propositivo.
A PRÁXIS DA DANÇA NO CONTEXTO ESCOLAR
Proponho uma metodologia para o ensino de dança que indique e
construa caminhos para que os professores possam trabalhar com os
conteúdos específicos da dança, em consonância com os conceitos de
corpo, dança, educação, professor-aluno, relevantes e significativos
para o cidadão contemporâneo, para o sujeito que vive, dialoga e tem
possibilidades de (re) construir o mundo atual. (MARQUES, 2004, p.
147)
As tendências pedagógicas baseiam-se em movimentos sociais, filosóficos
e antropológicos e vão de encontro ao momento histórico em que estão inseridas,
influenciando diretamente nas práticas pedagógicas. A Pedagogia HistóricoCrítica discute a importância da escola e, de certa forma, traz uma reorganização
do processo educativo.
A educação interfere na sociedade contribuindo para a sua transformação e
por levar em consideração a historicidade dos sujeitos, essa concepção favorece o
diálogo entre os pares envolvidos no processo de ensino-aprendizagem, considera
os interesses de ambos, bem como os ritmos de aprendizagem e o
desenvolvimento de uma forma plena. Volta-se para uma educação transformadora
partindo da realidade social.
Filosoficamente embasada no materialismo histórico-dialético, busca a
interpretação da realidade a partir da práxis, superando o senso comum pelo
pensamento reflexivo. Nela, o homem é compreendido como um ser histórico,
construído através de suas relações com o mundo natural e social. O
conhecimento é construído a partir da prática social dos homens e dos processos
de transformação da natureza, além das interferências das organizações culturais,
artísticas, políticas, econômicas, religiosas, jurídicas etc.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Ao se compreender que o sujeito possui vivências e experiências corporais
diversas e que a escola precisa estar sensível ao ensino de conteúdos de forma
significativa, a dança ganha importância na formação humana ao possibilitar
experiências que proporcionem novos olhares para o mundo, envolvendo a
sensibilização e conscientização de valores, atitudes e ações transformadoras na
sociedade.
Porém, conforme Strazzacappa (2001), esse caminho não tem sido fácil.
Existem problemas ainda não superados em relação à dança na escola. Dizem respeito
aos objetivos e finalidades de seu ensino, quando voltados à ocupação do tempo
ocioso ou seu caráter utilitarista, acessório e decorativo; sua sub-valoração, se
comparada aos demais saberes escolares; ao tipo de dança ministrada, quando
predomina-se apenas o ensino de uma técnica específica como balé; às metodologias
de ensino, bem como as formas de abordagem dos conteúdos; o tipo de profissional
responsável pelo ensino e sua formação técnica e/ou acadêmica; e por último, em
relação ao trato com questões polêmicas que permeiam o universo da dança.
Nas obras de Laban (1981,1990) já percebemos a dança numa perspectiva
educativa que contribui para o desenvolvimento das capacidades humanas, pois, o
movimento concebido de forma expressiva e comunicativa, permite ao sujeito
compreender o mundo de maneira diferenciada. Na harmonia entre movimento e
dança, partindo da compreensão das qualidades desse movimento nas diversas formas
de expressão e subjetividade, proporcionar-se-ia a integração entre conhecimentos
cognitivos, habilidades criativas e a percepção de sensações.
A dança pode propiciar a construção de experiências estéticas que passam
pelo envolvimento do sensível, de sentimentos e opiniões. E na escola coexistiriam
possibilidades de ensino, transmissão e produção artística em níveis científicos e
intelectuais e por isso, a dança ganha espaço, importância e pode contribuir para uma
educação transformadora. (BRASIL, 2012).
Da mesma forma, observamos esse pensamento em Marques (2010). Para a
autora, a partir da concepção de um ensino crítico-reflexivo, numa abordagem
metodológica que entende as relações existentes entre arte, ensino e sociedade, seria
possível o desenvolvimento das capacidades de leitura, interpretação, percepção e
análise em dança enquanto conhecimento e linguagem, na condição de praticantes
e/ou expectadores. Assim, conforme Marques (2010, p.145):
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A proposta metodológica de Dança no Contexto permite e enfatiza a
construção de redes de relações, de tessituras múltiplas e abertas entre
os saberes específicos da dança (vértice da Arte) e as relações desses
saberes com os atores sociais (vértice do Ensino) que vivem no mundo
e com ele dialogam (vértice da Sociedade).
Em Gasparin (2005), observa-se que o conhecimento como fato histórico e
social supõe sempre continuidades, rupturas, (re)elaborações, (re)incorporações,
permanências e avanços. A partir de seus pressupostos, acreditamos num ensino
significativo em dança, pela possibilidade de se pensar conteúdos específicos de
maneira contextualizada, envolvendo os educandos em uma aprendizagem
significativa dos conhecimentos.
O primeiro passo, ou como prática social inicial, o ponto de partida seria o
conhecimento prévio dos educandos. Através do diálogo, o professor anunciaria
aos alunos os conteúdos que serão estudados e seus respectivos objetivos,
buscando perceber qual o nível de conhecimento prévio existente. Em se tratando
das danças mídiáticas, seria o momento de apresentação inicial dos alunos sobre o
conhecimento destes em dança. Aquilo que conhecem, vivenciam e experienciam
cotidianamente, dentro e fora da escola, sem quaisquer julgamentos e/ou
preconceitos sobre estilos e/ou vivências. Um mapeamento geral e/ou diagnose do
que concebem, concebem e executam nos mais diferentes espaços e momentos.
Em seguida, pela problematização, seriam elencados os principais
problemas apresentados na prática social, relacionados ao conteúdo proposto.
Esses questionamentos, tornam-se perguntas problematizadoras em diferentes
dimensões e sob múltiplos olhares. Traça-se uma breve discussão desses
problemas reais em suas relações com o conteúdo apresentado, buscando razões
pelas quais esse mesmo conteúdo deve e/ou precisa ser aprendido.
Seria a exposição e o levantamento dos principais problemas apresentados
em relação às danças da midia. Do próprio corpo na prática dessas danças em suas
representações, idéias e imaginários. Problemas estes não findados em interesses
imediatistas ou individuais dos sujeitos, mas elencados a partir de questões
emergentes de necessidades sociais e coletivas. Questionamentos que passam pelo
[Type text]
[Type text]
[Type text]
pensamento contemporâneo de gênero, sexualidade, padronização,
estandartização, culturas local e global, identidades, dentre outros.
O terceiro passo, ou a instrumentalização, seria propriamente o trabalho
docente e dos educandos nesse processo de ensino-aprendizagem. Nesse
momento, utiliza-se de todos os recursos disponíveis e necessários para o
exercício de mediação pedagógica. O professor apresenta ferramentas para que os
alunos consigam apropriar-se do mesmo conhecimento num outro patamar. Aqui,
tratar-se-ia de práticas, vivências e experimentações que perpassariam pelas
questões anteriormente elencadas. Fornecer elementos em dança a partir de seus
conteúdos específicos, utilizando-se dos mesmos na compreensão real de
problematização apresentada.
Pela catarse, entender-se-ia a teoria (re)aplicada à prática social. Uma
nova postura manifesta pelo pensamento, mas correlacionada ao que antes era
concebido. O sujeito é capaz de argumentar sobre o que foi aprendido, segundo as
dimensões do conteúdo estudado. Geralmente expressa como momento de
avaliação, traduzindo o que foi apreendido até o momento nas dimensões em que
se foi trabalhado.
No trato com as danças midiáticas, seria o momento de discorrer sobre
elas, tanto do ponto de vista verbal/conceitual como na forma de linguagem
comunicativa em movimento. Relacionando informações e estabelecendo relações
concretas, não caberia mais uma mera repetição mecânica em sua forma
puramente imitativa. Aqui já seria possível falar em uma releitura consciente, já
que o sujeito predispõe de condições para (re)significar sua prática social.
Ao final, como prática social final, refletiria um novo nível de
desenvolvimento atual do aluno, assumindo uma nova proposta de ação a partir do
que foi aprendido. Seria sua postura, compromisso, práticas, atitudes, disposições
e/ou intenções em sala de aula e fora dela, reelaborados a partir de todo
conhecimento apresentado e (re)significado.
O aluno é capaz de intervenção, ação e proposição e intervenção e o mais
importante é que nesse estágio consiga ser capaz de discernir e escolher
conscientemente o que de fato será significativo para sua realidade. Dessa forma,
consegue sozinho aplicar o conhecimento sem intervenção de outros, mesmo que
[Type text]
[Type text]
[Type text]
trabalhe num coletivo. Correlacionamos à possibilidade de pré-existência de um
bailarino-pesquisador-interprete.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para uma prática significativa da dança na escola, a partir do trato com as
danças veiculadas pela mídia, procurou-se apresentar um entendimento destas
como práticas sociais e formas de conhecimento pré-existentes em dança pelos
estudantes, passíveis de serem consideradas e discutidas nas aulas numa
perspectiva orientada pela Pedagogia Histórico-Crítica. Buscou-se ao final
apontar caminhos para um possível trato didático e pedagógico com as danças
midiáticas.
Levando em consideração realidades já vivenciadas e experienciadas pelos
estudantes, sem quaisquer julgamentos e/ou hierarquizações referentes ao
universo dancístico, mesmo que nele esteja presente as características de um
mercado elitizado de dança, massificado pelo contexto popular midiatizado,
acredita-se que por se fazerem presentes na sociedade, precisam ser discutidas e
problematizadas, no sentido de empoderamento do sujeito para que haja
transformação.
REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor W. O fetichismo na música e a regressão da audição. In: Os pensadores. São
Paulo: Nova Cultural, 1996.
BARBOSA, Ana Mae. A imagem no ensino da arte: anos oitenta e novos tempos. São Paulo:
Perspectiva, 1994.
BENJAMIN, Walter A obra de arte na era de sua reprodutividade técnica In: ______ Magia e
técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura São Paulo: Ed. Brasiliense,
1994.
BERGERO, V. A. Indústria cultural e dança: superando cisões e reinventando humanidades na
Educação Física. 2006. 110f. Dissertação (Mestrado em Educação Física) Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2006.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
BRASIL. Dança na escola: arte e ensino. Boletim salto para o futuro da TV escola. Brasília:
Ministério da Educação. Ano XXII. Boletim 2. Abr. 2012.. Disponível em
<http://tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/18093102-Dancanaescola.pdf>. Acesso em: 20 de jun.
2012.
FISCHER, Ernst. A necessidade da arte. 9. ed. Rio de Janeiro: Guanabara, 1987.
GASPARIN, João Luiz. Uma didática para a pedagogia histórico-critica. Campinas: Autores
Associados, 2002.
GUARATO, Rafael. História e dança: um olhar sobre a cultura popular urbana – Uberlândia
1990/2009. 2010. 226f. Dissertação (Mestrado em História) Universidade Federal de Uberlândia,
2010.
LABAN, Rudolf. O domínio do movimento. São Paulo: Summus, 1981.
_____________. Dança educativa moderna. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1990.
MARQUES, Isabel A. Metodologia para ensino da dança: luxo ou necessidade? In: PEREIRA, R.
e SOTER, S. (orgs.) Lições de dança 4, Rio de Janeiro: UniverCidade, 2004.
_____________. Linguagem da Dança: arte e ensino. 1ª Edição. São Paulo: Digitexto, 2010.
SBORQUIA, S. P. e GALLARDO, J. S. P. As Danças na Mídia e as Danças na Escola. In: Revista
Brasileira de Ciências do Esporte, Campinas, v.23, n.2, p.105-118, jan. 2002.
STRAZZACAPPA, Márcia. Dançando na chuva e no chão de cimento. In: FERREIRA, Sueli
(Org.). O ensino das artes: construindo caminhos. Campinas: Papirus, 2001. p. 39-78.
STRAZZACAPPA, Márcia; MORANDI, Carla. Entre a arte e a docência: a formação do artista
da dança. Campinas: Papirus, 2006.
TOMAZZONI, Airton. O zoológico dançante da TV: lacraias, cachorras, tigrões e outros bichos.
In: Lições de Dança 5, p.39-53, Rio de Janeiro: UniverCidade, 2005.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
EDUCAÇÃO E GOVERNO DA INFÂNCIA: PROCEDIMENTOS
ESTÉTICOS E ÉTICOS NO CINEMA
Yonara Karolliny Plácido Cintra
Jessica Carneiro Gonçalves
Bolsistas PIBIC-UEG
Drª. Luiza Pereira Monteiro (orientadora)
Universidade Estadual de Goiás, Unidade de São Luís de Montes Belos
[email protected]
[email protected]
[email protected]
RESUMO
O projeto de pesquisa de Iniciação Científica foi elaborado de modo a compreender a importância
que tem o cinema na escola, a contribuição que ele traz para a educação da infância visando
entender também o estético e o ético nos procedimentos do cinema. Seu objetivo enquanto
trabalho de iniciação cientifica é propiciar espaços de discussão sobre o objeto da pesquisa no
contexto da UEG SLMB, organizar eventos em que possam ser socializados dados parciais da
pesquisa, participar de eventos que divulguem a pesquisa, realização de mostras de filme com
debates sobre os mesmos. A metodologia usada é através de Levantamento bibliográfico, leitura e
fichamento, reuniões periódicas/semanais entre coordenação e os bolsistas de iniciação científica.
Participação semanal nos Encontros de Formação, junto com os Bolsistas do Projeto de iniciação à
docência (PIBID), que tem a mesma temática do projeto de pesquisa e é coordenado pela mesma
professora. Desse modo, a metodologia do trabalho de iniciação cientifica esta sendo desenvolvida
com a elaboração de relatórios parciais; produção de artigos científicos; organização e realização
de seminários para socialização dos resultados parciais e finais. Os temas estudados, fichados e
debatidos em seis meses de realização da pesquisa foram: História do Cinema no Mundo e no
Brasil, Cinema Docência e Educação Estética. A revisão filmográfica foi realizada de modo a
subsidiar e fortalecer a discussão teórica, com objetivo de desenvolver habilidades para análises de
filmes.
Palavras-chave: educação; cinema e infância.
INTRODUÇÃO
A Pesquisa Educação e Governo da Infância: procedimentos estéticos e
éticos no cinema, na qual desenvolvemos um Plano de Iniciação Científica visa
compreender a importância que tem o cinema na escola, a contribuição que ele
traz para a educação da infância visando entender também as dimensões estéticas
[Type text]
[Type text]
[Type text]
e éticas nos procedimentos do cinema. Objetiva desenvolver estudos e análises de
filmes na tentativa de se perceber as formas de governo da infância (Foucault,
2008) e suas vicissitudes presentes no cinema. Tratar as concepções de infância e
as práticas educativas presentes no discurso cinematográfico, a partir do conceito
de governo da conduta infância possibilita uma abordagem dos procedimentos
éticos e estéticos presente na filmografia, que dê conta de analisar tanto os
aspectos negativos como positivos das práticas educacionais recortadas pelo olhar
dos produtores e diretores das produções cinematográficas. Além de aprofundar a
crítica acerca da violência contra infância e a adolescência articulada aos
contextos sociais e culturais da contemporaneidade e apreender as contribuições
do cinema no sentido de possibilitar uma formação ética e estética da criança e do
adolescente, uma vez que o cinema pode ser entendido como um campo de
produção, reprodução e ressignificação de sujeitos, a partir da “técnica” dos
cortes, recortes e montagens das linguagens de representações sobre a realidade.
A categoria governo da infância é construída a partir dos fundamentos
teóricos de Michel Foucault, que após deslocar-se de um eixo analítico que
privilegia a “arqueologia do saber”, ou seja, análise das formações discursivas e
os tipos de discursos. Situa a sua nova problemática de pesquisa, a partir de 1972,
na compreensão de “como esses discursos puderam formar-se historicamente e
sobre quais realidades históricas eles se articulam, ou seja, em quais condições
históricas, econômicas e políticas eles emergiram” (AVELINO, 2011, p.25).
Desse modo, o objeto desta pesquisa compreende a análise das diferentes formas
de governo da infância a partir das narrativas cinematográficas. O mesmo aponta
para uma análise histórica dos discursos sobre a infância, na sociedade moderna,
bem como sua articulação com as linguagens e os discursos do cinema.
O governo da infância se constitui como uma problemática política
vinculada ao mercado, à população e à economia, cujas relações de poder são
indexadas pela racionalidade do contrato social, ou seja, o exercício do poder é
indexado sobre a racionalidade daqueles que são governados como sujeitos
econômicos, como indivíduos consumidores e potenciais produtores, que para
satisfazer seus interesses utilizam das regras e dos objetos disponíveis no
mercado. É nessa lógica que o projeto moderno de sociedade definiu as bases da
[Type text]
[Type text]
[Type text]
educação da infância, num encadeamento que Foucault (apud AVELINO, 2011)
denomina de governamentalidade. Esta se caracteriza pelo cruzamento das
técnicas de dominação exercidas sobre as crianças e adolescentes e as técnicas de
controle ou governo de si, a que elas submetidas. Em outras palavras, as formas
modernas de governo da infância se constituem por meio de relações de poder e
saber, que historicamente objetivam a criança e o adolescente como “anormais”,
como “delinquentes”, como “indisciplinados”, como risco social, como incapazes
de aprender, ou até mesmo como a criança idílica, angelical e pura. Ao mesmo
tempo, o seu processo de subjetivação é direcionado por uma racionalidade, uma
orientação e uma organização dispostas para a produção histórica da obediência
(FOUCAULT, 2011), em que o homem moderno vem sendo modulado de acordo
com as demandas do capital, em cada período histórico.
Este artigo tem a intenção de trazer um pouco da experiência vivida pelas
bolsistas de iniciação cientifica durante os primeiros seis meses de
desenvolvimento da pesquisa. De inicio iremos tratar a respeito da história do
cinema, a princípio o cinema como um todo, incluindo também a história do
cinema no Brasil, um assunto bastante complexo, pois existem inúmeras teorias e
abordagens a respeito deste. Logo após trataremos das ações da pesquisa de
maneira fundamentada.
FIOS DA HISTÓRIA DO CINEMA
É interessante entender o cinema, pois ele é hoje uma ferramenta
fundamental para o processo de aprendizagem. A história do cinema é bastante
complexa e exige muito estudo, desde sua formação como uma indústria
cinematográfica até os dias de hoje envolvem muitas particularidades que devem
ser levadas em conta, e, para entendê-la é preciso conhecer um pouco da realidade
de cada época: a história. Tentaremos mostrar um pouco deste cinema, de forma
prática e resumida.
A invenção dos franceses, os irmãos Lumière, foi um dos marcos
essenciais do cinema, pois através do cinematógrafo pode-se ter a captura da
imagem em movimento, porém, para esses cientistas, essa máquina servia
[Type text]
[Type text]
[Type text]
somente para pesquisas científicas. Até que um mágico ilusionista, Georges
Melliès, conheceu essa espetacular máquina.
No dia da primeira exibição pública de cinema [...] onde ele foi falar
com Lumière, um dos inventores do cinema; queria adquirir um
aparelho e Lumière o desencorajou, disse-lhe que o “cinematógrapho”
não tinha o menor futuro como espetáculo, era um instrumento
cientifico para reproduzir o movimento e só poderia servir para
pesquisas. (BERNARDET, 2006, p.11)
Melliès, não desistiu e criou sua própria máquina. Seus filmes eram cheio
de fantasias procurando expressar a realidade de forma lúdica sendo desta forma
ele, um dos precursores do cinema de ficção. Ele acreditava que o cinema poderia
interpretar os sonhos, a realidade e não ser somente um objeto de pesquisa como
previa os irmãos Lumière.
Essa ilusão de verdade trazida pelos filmes causava um efeito maravilhoso,
pois era como se vissem a própria realidade. Segundo Bernardet (2006) esta
ilusão de verdade ficou conhecida como impressão de realidade, que
provavelmente foi à base do grande sucesso do cinema, pois os espectadores
tinham a impressão de que se tratavam da própria vida, ali na tela. Mesmo quando
se trata de algo que sabemos não ser verdade, como as animações e fantasias –
como o Pica Pau Amarelo ou O Mágico de Oz - a imagem cinematográfica
permitia assistir a essas fantasias como se fossem verdadeiras, conferindo
impressão de realidade a elas.
Não só o cinema seria a reprodução da realidade, seria também a
reprodução da própria visão do homem. [...] A imagem
cinematográfica também nos mostra as cosias em perspectiva e por
isso ela corresponderia à percepção natural do homem
(BERNARDET, 2006, p. 17)
Isto significa que as imagens produzidas primordialmente traziam um
efeito da realidade vivida pelos espectadores. Entretanto, o cinema não era
somente uma forma de expressão do real, mas, antes de tudo, uma ideologia, por
isso a necessidade de “expressar” o real para disfarçar a manipulação trazida pelo
filme, tanto da sociedade da época quanto do produtor.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Desta forma o cinema foi se expandindo, e um fator inerente que o
instaurou no mercado foi o inicio da reprodução de cópias. Assim permitia que um
mesmo produto fosse apresentado simultaneamente, em vários locais. As películas
começaram a ser reproduzidas, vendidas e exibidas como uma mercadoria,
facilitando a divulgação das ideologias. Desta forma o cinema começa a se tornar
uma indústria cinematográfica, como descreve Leite (2005):
A indústria cinematográfica é um fenômeno historicamente novo com
um pouco mais de cem anos. [...] A primeira atividade comercial
ligada ao cinema restringiu-se a compra e à venda de equipamentos.
Em fins do século XIX vendiam-se projetores e rolos de filmes que
passaram a ser propriedade de seus compradores. Tal comércio foi
disputado principalmente por dois grandes fabricantes: os irmãos
Lumière, franceses inventores do cinematógrafo, e o eclético norteamericano Thomas Edison, com o seu aparelho vitascópio, mais
pesado e difícil de operar que o dos concorrentes europeus (p.07).
A partir desta disputa destes dois fabricantes, é que o cinema norteamericano se desenvolve. Pois Thomas Edison com a força dos grupos industriais
dos Estados Unidos possibilitou o registro do invento primeiro que os franceses.
Assim iniciou o sistema de astros e estrelas e celebridades de Hollywood,
formando os grandes estúdios de produção. Estúdios estes que foram se
fortalecendo primeiro que nos demais países, de acordo com Leite (2005).
É neste período que a linguagem cinematográfica vai se formando,
aproximadamente em 1915, Segundo Bernadet (2006). É aos cineastas americanos
que se deve a maior contribuição para formação desta linguagem. A linguagem
desenvolveu-se para tornar o cinema capaz de contar estórias, neste momento à
linguagem predominante foi à ficção. Mais com o passar dos anos a linguagem
foi se aperfeiçoando, tornando apta a uma linguagem cientifica e histórica, como
por exemplo, o documentário.
Os documentários foram uma das formas utilizadas para fortalecer o
cinema brasileiro no princípio da sua formação. Leite (2005) nos diz que o cinema
quando chegou ao Brasil enfrentou grandes dificuldades para se estabelecer e se
firmar no País. Um dos grandes empecilhos encontrado para poder se instaurar
como indústria cinematográfica foi, e ainda é, a grande e famosa concorrente: as
[Type text]
[Type text]
[Type text]
indústrias Hollywoodianas, as quais se fortaleceram após a Primeira Guerra
Mundial como a maior e mais influente “fábrica de sonhos”.
No Brasil, porém apesar do sucesso de filmes [...], o cinema nacional
parece não ter conseguido se consolidar como indústria, também pelo
fato de perder a competição pela preferência dos espectadores
brasileiros, que nitidamente optaram pelas produções norteamericanas [...], pois esse fator está presente em diferentes momentos
do cinema brasileiro. (LEITE, 2005, p.30)
Com essa instabilidade do cinema nacional são utilizados de vários meios
para fortalecer a indústria cinematográfica brasileira, afirma Leite (2005). Os
documentários e os cinejornais foram estabelecidos com o intuito de despertar na
população o interesse pelo cinema nacional, tornando-se fundamentais para
mantê-lo.
Porém, em algumas determinadas épocas o cinema era visto como o
destruidor da família, pois muitos saiam do seio familiar e iam para o cinema. Foi
com o tempo que muitos intelectuais começaram a ver no cinema outros aspectos:
A capacidade dos filmes de difundir valores agiu em tais grupos de
formas diferentes, pois o que mais despertou a atenção desses
segmentos da intelectualidade brasileira nas décadas de 1920 e 1930
foram as possibilidades de o cinema ser empregado como instrumento
pedagógico e como propaganda. (LEITE, 2005, p. 35)
Assim alguns educadores perceberam a enorme capacidade educacional
das produções cinematográficas, procurando métodos para introduzir os filmes
nas relações de ensino e aprendizagem. Eram usados filmes históricos ou películas
que falavam sobre conhecimentos restritos a física, química, história natural, entre
outros.
É inevitável citar que o cinema educativo teve além desta finalidade, ele
também foi um dos meios encontrados pra fortalecer a indústria cinematográfica
brasileira.
É importante destacar que o cinema educativo atuou como um dos
principais pilares de um projeto mais amplo, isto é, a tentativa de
organizar a produção, o mercado exibidor e o importante e,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
concomitantemente, servir aos propósitos do Estado, notadamente a
integração nacional, á centralização da ação governamental e á difusão
da ideologia nacionalista. (LEITE, 2005, p. 38)
Neste momento o Brasil está passando pela Ditadura Militar, contexto
marcado pela grande repressão e censura do governo, desta forma quando Leite
(2005) se refere “á centralização da ação governamental e á difusão da ideologia
nacionalista”, refere-se à prática alienante do governo com a sociedade
procurando acalmar e estabelecer o controle. Assim o cinema também foi um
meio de transmissão da propaganda política, quando o Estado entra em cena e
intervém em algumas películas.
No início século XX, tudo que possuía imagem era contestado pela
sociedade e não podiam adentrar o mundo da cultura, foi com a República
Soviética que o cinema foi reconhecido como sétima arte, por influência de
Eisenstein. Vai ser em 1960 por meio do grupo da Nouvelle Vague, que o cinema
passa a ser produtor de um discurso histórico, no entanto, neste mesmo ano, surge
a televisão que segundo Ferro (2010) “vampirizou” o cinema, mas que um não
vive sem o outro. Porém, o cinema brasileiro teve que se repensar, tanto do ponto
de vista da sua produção, como principalmente da política de incentivo cultural,
que fez com que na última década do século XX e inicio do século XXI, o cinema
brasileiro retomasse o caminho do crescimento, no qual ainda hoje tenta se
manter.
AÇÕES FUNDAMENTADAS
Um dos objetivos do trabalho de iniciação cientifica na pesquisa Educação
e Governo da Infância: procedimentos estéticos e éticos no cinema, é propiciar
espaços de discussão sobre o objeto da pesquisa no contexto da Universidade e
outros espaços, organizar eventos em que possam ser socializados dados parciais
da pesquisa, participar de eventos que divulguem a pesquisa, realizar mostras de
filme com debates sobre os mesmos. Assim, durante o segundo semestre de 2012,
foram realizadas algumas atividades integrando pesquisa, ensino e extensão.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A professora coordenadora da pesquisa é também coordenadora de um
projeto com a mesma temática - educação, cinema e infância - vinculada ao
Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência – PIBID da Capes/MEC.
O mesmo conta com seis bolsistas do curso de Pedagogia e uma supervisora da
escola campo, onde o projeto está sendo desenvolvido.
Desse modo, nós,
bolsistas de iniciação científica participamos ativamente de algumas atividades
realizadas em conjunto com os bolsistas de iniciação à docência tais como: a
realização de uma pesquisa diagnóstica com os alunos do 6º ao 9º ano na Escola
Municipal São Vicente, com o objetivo de compreender a diversidade de
problemas vivenciados pela comunidade escolar, tais como violência, conflitos
entre grupos rivais de jovens, gravidez na adolescência, prostituição infantojuvenil, entre outros.
A escola situa-se na periferia da cidade de São Luís de Montes Belos e
atende crianças e adolescentes pertencentes a famílias de camadas populares, que
moram tanto na zona urbana como na zona rural. A pesquisa diagnóstica foi
realizada com todos os alunos do 6º ao 9º ano do turno matutino. A metodologia
utilizada foi a aplicação de um questionário com questões abertas e fechadas, em
que abordavam as seguintes categorias: idade, sexo, o setor de moradia, o que eles
achavam da escola, a disciplina que mais gostavam, se já tinham sofrido ou
praticado algum tipo de violência, como gostariam que fosse sua escola, se
possuíam sonhos, se gostavam de filmes e que gênero achavam interessante, entre
outras questões. Nós ficamos responsáveis pela análise dos dados juntamente com
os outros bolsistas.
Participamos da primeira mostra de vídeo que aconteceu na escola São
Vicente, sendo a abertura do projeto do PIBID “Educação e Cinema: o governo da
infância e a educação estética da criança e do adolescente”. A mostra aconteceu
em três salas simultaneamente, por falta de espaço na escola, que coubesse todos
os alunos. O filme assistido foi “A Corrente do Bem”, direção de Mimi Lader e
produção de Peter Abrams, Paddy Carson e Robert L. Levy, EUA, 2000. Após a
exibição do filme houve a composição de uma mesa de debates, na qual
participamos junto com os alunos do 8º e do 5º ano. Fizemos uma breve discussão
a respeito do filme e da temática abordada por ele: amizade e solidariedade.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Destacamos a experiência ética e estética, que o mesmo nos proporcionou,
ouvindo os alunos sobre essa vivência. De acordo com Verástegui (2007) discutindo as Cartas Sobre a Educação Estética do Homem, de Friedrich Schiller
-,
a experiência artística nos permite uma experiência transdisciplinar. A
experiência estética através da beleza moderará a vida, permitindo a
passagem das sensações aos pensamentos e, proporcionando a forma
ao sensível, reconduzindo o conceito à intuição e a lei ao sentimento.
[...] A atividade estética ajuda ao homem a realizar-se [...].
(VERÁSTEGUI, 2007, p.3).
Outra experiência importante foi a realização da oficina: Educação e
Cinema, Contribuições para inclusão social no ENAPE16. A oficina foi realizada
pelos bolsistas de iniciação a pesquisa e de iniciação à docência. Foi exibido um
filme, o mesmo da amostra na E. M. São Vicente, “A corrente do Bem”. Após,
houve uma composição de mesa, a discussão aqui foi mais elevada, pois a
presença era somente de acadêmicos e professores da universidade.
No final do semestre participamos da organização e da realização da I
Mostra de Cinema: educação estética da infância, na UEG de São Luís de Montes
Belos. Ocorreu em três turnos, em cada turno foram exibidos três filmes curtas
metragens com composição de mesa e debates envolvendo os presentes. Os filmes
foram: “A Onça da Mão Torta”, “Dois em Um”, “O Trabalho dos Homens”, “Os
vegetais”, “A Menina que Vendia Fósforo”, “Sonhos de humanidade” e
Marimbondo Amarelo”. Esses dois últimos do Diretor e roteirista: professor,
filósofo e cineasta Amarildo Pessoa da PUC-Go. O mesmo fez uma belíssima
discussão sobre os procedimentos de realização de um filmes, dando destaque
para a pesquisa cultural, que embasa a sua narrativa e para os procedimentos
estéticos do filme.
Em fim, foi realizado a II Mostra de Cinema, com a mesma temática da
primeira, mas com exibição de três longas metragens em cada um dos três turnos
de acordo com o público presente. O objetivo se estendia para além das
16
[Type text]
Encontro dos Acadêmicos de Pedagogia que acontece todos os anos na UEG-SLMB.
[Type text]
[Type text]
possibilidades de reflexão sobre as temáticas trazidas pelos filmes. Pretendia-se
também desenvolver o gosto pelo cinema e propiciar uma experiência estética
mais intensa. Foram exibidos: “A Invenção de Hugo Cabret”, de Martin Scorsese,
EUA, 2011, “O Pequeno Urso”, de Maurice Sendak, EUA, 1995 e “Como Estrelas
na Terra”, de Aamir Khan, Índia, 2007. Privilegiamos nesta mostra filmes que nos
apresentasse diferentes modelos de governo da conduta da criança e do
adolescente e nos possibilitasse uma reflexão sobre o objeto da pesquisa.
REFERÊNCIAS
AVELINO, Nildo (Org.). Michel Foucault Do governo dos vivos. São Paulo: Achiamé, 2011.
BERNARDET, Jean C. O que é cinema. São Paulo: Brasiliense, 2006.
LEITE, Sidney F. Cinema brasileiro. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2005.
FERRO, Marc. Cinema e História. Trad. São Paulo: Paz e Terra, 2010.
VERÁSTEGUI, Rosa de Lurdes A. A Educação Estética do Ser Humano de Friedrich Schiller.
Disponível em: http://www.unioeste.br/cursos/cascavel/pedagogia/eventos/2007
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
EDUCAÇÃO, CULTURA E TORCIDAS ORGANIZADAS: ANÁLISE DO
POTENCIAL (DE)FORMATIVO DO FUTEBOL CONTEMPORÂNEO*
Luís César de Souza
Profa. Dra. Sílvia Rosa da Silva Zanolla
Programa de Pós-Graduação em Educação/Faculdade Educação/UFG
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás - Fapeg
[email protected]
RESUMO
Neste trabalho expomos o andamento de pesquisa em nível de doutorado, cursado no Programa de
Pós-Graduação em Educação/FE/UFG. O objetivo é investigar o potencial (de)formador das
torcidas organizadas e o sentido do futebol como mediação da cultura no espetáculo esportivo,
compreendendo possíveis relações entre as manifestações dessas torcidas organizadas, o modo de
produção da sociedade contemporânea e a violência e a barbárie. Para compreender as mediações
e contradições entre futebol, torcidas organizadas, sociedade contemporânea, violência e barbárie,
recorremos à teoria crítica da sociedade, da Escola de Frankfurt, especialmente às análises e
reflexões de T. Adorno, M. Horkheimer e H. Marcuse, acerca da racionalidade instrumental, da
barbárie, da educação e da cultura. A pesquisa contém investigação bibliográfica, por meio da qual
identificamos que as principais concepções de análise da problemática do futebol e das torcidas
organizadas são de cunho antropológico, sociológico e psicológico; e investigação empírica, em
que já foram realizadas observações de 7 jogos entre as 3 principais equipes de futebol de Goiás,
durante o segundo turno do Campeonato Goiano de 2012, entrevistas com presidentes das torcidas
organizadas, responsáveis pelo policiamento em dias de jogos e integrantes do telejornalismo
esportivo local, além de questionários aplicados a membros das torcidas organizadas.
Apresentamos aqui apenas uma tabulação inicial dos resultados da coleta de dados, sem análises
elaboradas porque o trabalho encontra-se na fase de sistematização inicial da tese. A pesquisa
contou com bolsa da Pro-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação/UFG, por meio do Programa
Institucional de Bolsas Pós-Graduação, no período de maio/2011 a abril/2012, e a partir de
maio/2012, conta com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás – Fapeg.
Palavras-chave: futebol e educação; futebol e barbárie; torcidas organizadas.
A universalização do futebol é facilmente reconhecida por conta da
força dos eventos locais, regionais, nacionais e internacionais (por exemplo o
**
A pesquisa contou com bolsa da Pro-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação/UFG, por meio do
Programa Institucional de Bolsas Pós-Graduação, no período de maio/2011 a abril/2012, e a partir
de maio/2012, conta com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás - FAPEG,
por meio das Bolsas de Formação de Mestrado e Doutorado no Estado de Goiás.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
campeonato brasileiro e a copa do mundo), além disso, dificilmente uma criança
pequena, especialmente do sexo masculino, cresce sem ter tido contato com uma
bola, mesmo antes de saber como chutá-la. Isso porque o futebol tornou-se um
fenômeno que mobiliza sentimentos de paixão e ódio, pobreza e riqueza,
malandragem e idoneidade, e nele as pessoas protagonizam diferentes papeis:
jogadores, comentadores, dirigentes, patrocinadores e torcedores, tendo esses
últimos protagonizado situações que têm chamado a atenção de diferentes
instituições sociais pela forma como se organizam dentro das chamadas torcidas
organizadas17, e pelos confrontos que, de acordo com Reis (2006), tem sido
marcados por um tipo de relação intrínseca entre o futebol e a violência.
Nos últimos 20 anos é possível contar um número razoável de jogos
que foram precedidos ou que acabaram em violência e tragédia em que grandes
torcidas em massa estiveram presentes. Como exemplo, podem ser citadas: a final
da Supercopa de Futebol Júnior de 1995 entre São Paulo e Palmeiras, em que,
depois de uma verdadeira batalha campal entre os torcedores dos dois times, os
quais utilizaram paus, pedras e outros objetos que encontravam à frente, como
armas para agredirem-se reciprocamente, o desfecho foi a morte de um torcedor e
mais de cem feridos; no final do campeonato brasileiro de 2009, em jogo decisivo
entre Coritiba e Fluminense em que um deles se livraria do rebaixamento para a
série B do campeonato brasileiro, ao término do jogo, em que o Coritiba foi
rebaixado, os torcedores desta equipe invadiram o campo na tentativa de
agredirem jogadores da equipe adversária, torcedores da equipe adversária, ou
mesmo quem encontrassem pelo campo, como foi o caso de numerosos policiais
feridos. E para finalizar os exemplos – limitando-se apenas aos exemplos
nacionais, pois a lista é extensa – nas semifinais do campeonato goiano de 2011,
17
De acordo com Toledo (1996), as torcidas organizadas se caracterizam pela organização de
pessoas que, por afinidade, formam grupos que se reúnem para torcer para um time de futebol,
diferentemente das agremiações de meados do século XX – as quais poderiam ser denominadas de
torcidas uniformizadas – pois a maior preocupação era, além da vestimenta uniforme, manifestar a
paixão pelo time. Segundo o autor, a partir da década de 1970 as torcidas organizadas tornaram-se
estruturas burocratizadas, registradas em cartórios, com um organograma administrativo muito
complexo que prevê diretores, presidentes e conselheiros, além de apresentarem relativa
autonomia dos clubes.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
em jogo entre Goiás e Vila Nova, houve confronto entre torcedores das duas
equipes, desta vez motivada por uma confusão que teve início dentro dos
gramados entre os próprios jogadores. Após muita violência praticada entre
integrantes das duas torcidas, o desfecho foi a morte de um jovem rapaz18.
A situação tem sido tratada por órgãos da administração pública,
polícia, políticos, além de emergirem pesquisas no âmbito acadêmico que
procuram analisar o fenômeno de diferentes ângulos. No âmbito das políticas,
podem ser citados: a Lei 10.671 que aprova, em 2003, o estatuto de defesa do
torcedor, e a criação, em 2006, da Comissão Paz no Esporte. No âmbito
acadêmico, a violência em relação ao futebol e às torcidas organizadas, são temas
pesquisados a partir dos enfoques antropológico, sociológico e psicológico.
Segundo Toledo (1996), as primeiras agremiações de torcedores datam
da década de 1940, se organizavam a partir de um torcedor-símbolo, uma espécie
de líder da torcida responsável por atrair simpatizantes a fim de formar um grupo
de torcedores uniformizados. No entanto, segundo o autor, a partir da década de
1970 tanto o futebol como os torcedores brasileiros protagonizam mudanças em
sua estrutura e organização, cenário que surgem as torcidas organizadas, como as
conhecemos hoje.
De uma perspectiva mais ampla, Reis (2006) considera que as
mudanças no modo de torcer acompanham as transformações que ocorrem no
universo do futebol, como o empresariamento, o profissionalismo e o futebolobjetividade, implicando uma nova forma de organização e disseminação: a do
espetáculo. Segundo a autora, “o futebol conquistou um grande número de
empresários nacionais e internacionais que viram nos produtos futebolísticos um
grande negócio” (REIS, 2006, p. 13). Nesse sentido, o futebol é absorvido como
mais uma mercadoria que entra no círculo de produção-distribuição-circulaçãoapropriação-produção, próprio do modo de produção social predominante desde a
Dupla Revolução ocorridas em França e Inglaterra (HOBSBAWM, 2001). A
absorção do futebol pela indústria transforma-o, como transforma a arte, a
18
Esses e outros confrontos entre torcidas organizadas podem ser (re)vistos no site:
www.youtube.com, por meio da combinação dos seguintes termos de busca “futebol”, “torcidas
organizadas” e “violência”.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
educação e a cultura, em objeto regido predominantemente como valor de troca.
Em um período em que a época tardia do capitalismo lança seus tentáculos a tudo
e a todos, o futebol transforma-se em uma das mercadorias mais prósperas e
rentáveis da indústria cultural19.
Consequência dessas transformações, um aspecto que tem
comparecido com certa frequência nos jogos de futebol, sobretudo entre os times
com maior estrutura financeira e maior número de torcedores, é a violência moral
e física, sobretudo quando os torcedores estão reunidos em grupo. Tanto a
psicologia como a sociologia buscam explicar que, em grupo, a pessoa se
comporta de modo diferente de quando está só. Diante disso, uma questão que se
põe é: por que, após a participação em um grupo que tenha participado de
momentos violentos, a pessoa se dispõe a voltar à organização para, havendo novo
ambiente de confronto, participar novamente?
Uma possível resposta ao problema exige reflexão sobre os elementos
objetivos e subjetivos que comparecem na violência e na barbárie20. Ao analisar
os motivos que teriam levado à barbárie de Auschwitz, Adorno (1995) contesta
todo tipo de coletividade cega, devido a sua propensão à violência. Nessa
19
O conceito de Indústria Cultural foi criado por Horkheimer e Adorno, em 1944, num estudo
em que se revela a absorção da cultura em todos os seus aspectos, seja na educação, na arte, na
diversão, etc., pela indústria, subordinando a cultura aos interesses da economia capitalista, além
de influenciar nas relações de produção pelo investimento na alienação subjetiva através dos meios
de comunicação, alimentando um mundo ilusório para os sujeitos que, por sua vez, mantêm-se
presos às relações de dominação social e política (cf. HORKHEIMER e ADORNO, 1985, p. 113156).
20
De acordo com Adorno (1995), a violência física é a manifestação mais explícita da barbárie,
no entanto conceitualmente é importante distingui-las. A violência física se caracteriza pela
agressão, de fato, entre pessoas, seja um pontapé ou o assassinato, e que esta violência não esteja
vinculada à objetivos racionais da sociedade. Por outro lado, a barbárie ocorre quando “estando na
civilização do mais alto desenvolvimento tecnológico, as pessoas se encontrem atrasadas de um
modo peculiarmente disforme em relação à sua própria civilização – e não apenas por não terem
em sua arrasadora maioria experimentado a formação nos termos correspondentes ao conceito de
civilização, mas também por se encontrarem tomadas por uma agressividade primitiva, um ódio
primitivo ou, na terminologia culta, um impulso de destruição que contribui para aumentar ainda
mais o perigo de que toda esta civilização venha a explodir, aliás uma tendência imanente que a
caracteriza” (ADORNO, 1995, p. 155).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
perspectiva, se as coletividades cegas são grupos formados a partir de
necessidades imediatas e instintuais, cujos objetivos não contemplam a reflexão
acerca de suas ações – as quais estão mais propensas à prática de condutas
violentas; e as torcidas organizadas, além de constituírem grupos, têm
protagonizado nas últimas décadas cenas de violência, isso sugere a necessidade
de tentar entender as ações dessas associações na relação com pelo menos dois
aspectos: o modo de produção social da vida e, consequentemente, o princípio
que, segundo Adorno (1995), motivou Auschwitz, a saber, a barbárie.
Quando Adorno elabora suas reflexões sobre Auschwitz, ele parte da
premissa freudiana acerca da civilização e da cultura: a de que lutar contra a
barbárie tem algo de desesperador, na medida em que a civilização se desenvolve
justamente a partir do sacrifício na relação com a natureza. Por outro lado, e é isto
que, de modo ambivalente, é fundante da civilização, é a luta contra a barbárie que
justifica a cultura e a educação. Referindo-se à personalidade das pessoas capazes
de promover Auschwitz, Adorno (1995) lembra que este geralmente apresenta um
“caráter manipulador” e uma “consciência coisificada”. Dialeticamente, no âmbito
das relações sociais o resultado é uma profunda incapacidade para realização de
experiências formativas na perspectiva da autonomia e da liberdade, e o desfecho
é a recaída e a perpetuação da barbárie.
Embora as reflexões de Adorno encontrem-se em um plano mais
abrangente, não tendo ele desenvolvido estudos específicos sobre o esporte, em
algumas passagens de sua obra é possível encontrar apontamentos sobre a
necessidade de compreender este fenômeno. Assim, por exemplo, ele afirma que o
espetáculo esportivo não pode reproduzir o cenário de guerra, caso pretendemos
que as relações entre as pessoas não reproduzam a barbárie. De acordo com o
autor,
o esporte é ambíguo: por um lado, ele pode ter um efeito contrário à
barbárie e ao sadismo, por intermédio do fairplay, do cavalheirismo e
do respeito pelo mais fraco. Por outro, em algumas de suas
modalidades e procedimentos ele pode promover a agressão, a
brutalidade e o sadismo, principalmente no caso de espectadores que
pessoalmente não estão submetidos ao esforço e à disciplina do
esporte; são aqueles que costumam gritar nos campos esportivos”
(ADORNO, 1995, p. 127, grifo nosso).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Embora a elaboração pareça indicar uma simples preocupação com o
modo como o esporte é desenvolvido, se relacionamos essa preocupação
específica com as aspirações do autor sobre a necessidade de experiências
humanas contra a barbárie, então a absorção do esporte pela indústria cultural –
apresentado-o como espetáculo ao grande público, dentro do modelo de alta
competitividade e de resultados – exige a concordância com o autor em não fazer
concessão à violência e à barbárie que permeia o esporte, sobretudo no caso das
torcidas organizadas, que têm manifestado atitudes explícitas de violência.
Para compreender as possíveis mediações e contradições do problema,
recorremos, então, a referencial teórico que permita entender as relações sociais e
interpessoais que se estabelecem no âmbito da sociedade em geral e no âmbito
dos eventos esportivos em particular. Nesse sentido, nossas análises estão sendo
balizadas pela teoria crítica da sociedade da Escola de Frankfurt, em especial as
análises de Adorno, Horkheimer e Marcuse, acerca das contradições imanentes ao
sujeito e a esta sociedade. A partir deste referencial, o desafio que se coloca é
analisar as contradições do futebol, da violência e das torcidas organizadas, com
destaque para a relação entre as manifestações das torcidas organizadas e a
barbárie que emana do modo de organização e produção da vida nesta sociedade.
Isso porque, segundo Adorno (1995), a tarefa a qual toda a sociedade deveria
priorizar é a desbarbarização do homem, a fim de eliminar sua disposição para a
violência, e a educação e o esclarecimento têm papéis indispensáveis nesse
processo. Segundo ele, é necessário transformar a estrutura social atual, e o
esclarecimento - condição de supressão da barbárie – é o que possibilita às novas
gerações se horrorizarem com a violência e a miséria humana.
O trabalho contém investigação bibliográfica e empírica. Em relação à
pesquisa bibliográfica, estamos realizando (re)leituras que marcam uma etapa de
transição entre a fundamentação teórico-metodológica do projeto e a primeira
estruturação da tese. Em relação à pesquisa empírica, foram realizadas as
entrevistas e a aplicação de questionários a duas das três torcidas organizadas
objeto desta pesquisa.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
As observações foram assistemáticas, sem roteiros ou perguntas
estruturadas aos sujeitos – em que os registros foram realizados por meio de
fotos, vídeos e anotações – e não participante, em que o contato com os sujeitos
foi realizado sem integrar-se a eles (LAKATOS; MARCONI, 2010).
Acompanhamos seis jogos entre as equipes do Atlético Clube Goianiense, Goiás
Esporte Clube e Vila Nova Futebol Clube, no estádio Serra Dourada, durante o
segundo turno do campeonato goiano de futebol de 2012, tendo o primeiro jogo
ocorrido no dia 11 de março e o último no dia 13 de maio. Durante as
observações, foi necessário estabelecer diálogos com torcedores, jornalistas,
membros da Federação Goiana de Futebol e policiais responsáveis pela segurança
nas imediações do estádio a fim de preparar a realização das entrevistas.
Até o momento, foram entrevistados: os presidentes das torcidas
organizadas: Força Jovem, Dragões Atleticanos e Esquadrão Vilanovense; o
Comandante do Batalhão de Choque da Polícia Militar de Goiás e o Comandante
da 37ª Companhia Independente da Polícia Militar de Goiás, responsáveis pelo
policiamento no estádio e em suas imediações; o Chefe de redação do
telejornalismo, o editor chefe do Esporte, e o narrador dos jogos do campeonato
goiano transmitidos para a TV fechada, todos integrantes da Organização Jaime
Câmara21. As entrevistas já estão transcritas e prontas para análise.
Em relação aos questionários, foram aplicados, até o momento, aos
membros das torcidas organizadas Esquadrão Vilanovense e Dragões Atleticanos,
e pretende-se finalizar esta tarefa até o primeiro trimestre de 2013. Para a
aplicação dos questionários, agendamos com os presidentes uma data em que as
torcidas teriam alguma atividade na qual estariam presentes um número
significativo de torcedores. Assim, em ambas as torcidas, os questionários foram
aplicados em dois dias que antecederam a festa de comemoração de aniversário, o
que permitiu aplicar 50 questionários à torcida Dragões Atleticanos e 45 à torcida
21
As entrevistas foram realizadas dentro do que Triviños (2008) denomina de semiestruturada,
por serem consideradas mais adequadas às pesquisas no âmbito das ciências sociais, de abordagem
qualitativa, porque além de valorizar a presença do pesquisador, permite aos sujeitos liberdade e
espontaneidade no fornecimento de dados para a investigação.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Esquadrão Vilanovence22. A escolha dos torcedores, os quais poderiam ser do sexo
masculino ou feminino, levou em consideração a participação assídua nas
atividades da torcida.
Mesmo considerando alguns dos limites que marcam o questionário
como instrumento de pesquisa, tentamos com ele colher dos torcedores
informações a partir de quatro aspectos: 1) o perfil econômico-social, 2) o
sentimento e envolvimento em relação às torcidas organizadas e os times, 3) a
relação com os meios de comunicação e 4) o consumo de produtos relacionados
ao futebol. Pelos dados tabulados até o momento, é possível indicar algumas
características dos 95 torcedores das duas torcidas, sem pretensão de análise,
porém características estas que podem indicar os rumos pelos quais se
desenvolverá a análise do objeto.
Em relação ao perfil econômico-social, a grande maioria dos
torcedores são do sexo masculino (81%) e a idade média é de 20 anos e meio,
sendo que o respondente mais jovem tem 14 anos e o mais velho 48 anos. A
maioria (56%) informou ter escolaridade de nível médio (completo ou
incompleto), 28% estão dentro da faixa do ensino fundamental e apenas 14%
afirmaram ter curso superior completo ou em andamento. Em relação à renda,
aproximadamente um quarto dos torcedores (23%) recebem entre 1 e 2 salários
mínimos e, curiosamente, 17% afirmaram não ter renda própria.
Sobre o sentimento e o envolvimento em relação às torcidas
organizadas e aos times, a maioria absoluta (94%) confirmam um sentimento
inabalável de amor ao time que torce. Quando perguntados sobre quem lhes teria
influenciado a se tornarem torcedores de futebol, a maioria (39%) afirma ter sido
por iniciativa própria, embora a família e os amigos também compareçam como
influentes, com 27% de respostas cada. Porém, quando se trata do envolvimento
com a torcida organizada de seu time, a maioria (48%) afirma ter sido
influenciada pelos amigos, embora um número significativo (44%) tenha
22
Durante a fase de observação dos jogos, percebemos que os torcedores encontravam-se
significativamente envolvidos com o clima do jogo ao ponto de dificultar a aplicação dos
questionários, o que nos levou a optar por aplicá-los em momento posterior. Até o momento, ainda
não foi possível aplicá-los à torcida Força Jovem do Goiás Esporte Clube.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
procurado as torcidas por conta própria. Já sobre o sentimento em relação ao time
e a torcida adversária, 41% revelam odiarem os adversários, 25% dizem cultivar
um sentimento de respeito e para 20% dos respondentes, o desprezo é o
sentimento que comparece. (Se somarmos os 41% que dizem odiar os adversários
com os 20% que os desprezam, teremos que aproximadamente dois terços dos
integrantes das torcidas organizadas guardam um sentimento de hostilidade de
maior ou menor grau em relação aos adversários).
Em relação aos meios de comunicação, 98% confirmam utilizá-los
para acompanhar os jogos e as notícias sobre o futebol. Os meios mais utilizados
são a televisão (39%) e a internet (38%), apenas 6% recorrem aos rádios e 5% aos
jornais impressos. Quando perguntados sobre a frequência com que acompanham
as notícias e os jogos, 80% afirmam não ficar um dia sequer sem ter acesso a
informações sobre o futebol. Como já era esperado, 81% revelam usar a internet
para tratar de assuntos relacionados ao futebol e à torcida, sendo que 34%
utilizam-na para bater papos com os amigos e 26% para postar mensagens,
imagens e vídeos relacionados ao time e à torcida. Apenas 4% afirmaram usar a
internet para provocar os torcedores adversários.
Por último, a maioria expressiva (97%) dos torcedores admitem que
consomem produtos relacionados ao futebol, e os produtos comprados por 89%
dos torcedores são vestimentas, como camisas, shorts, bonés, meias, calçados,
etc., sendo os acessórios, portanto, pouco procurados pelos integrantes das
torcidas organizadas. Perguntados sobre a frequência com que compram os
produtos, 45% afirmam comprar com muita frequência, enquanto praticamente a
mesma quantidade (44%) afirma comprar quase sempre. Se somarmos os dois
grupos, então 89% dos torcedores organizados compram produtos com a
frequência de sempre ou quase sempre. Sobre a quantidade, 63% afirmam
comprar muito, contra 26% que assumem comprar pouco.
Das observações, cabe destacar pelo menos um aspecto: o
deslocamento da violência – especialmente física – do estádio e de suas
imediações nos dias de jogos. Isto teria ocorrido em virtude da intensificação do
policiamento no dia dos eventos a fim de dar tranquilidade “especialmente aos
torcedores reunidos em família” – conforme um entrevistado. De fato, o que se
[Type text]
[Type text]
[Type text]
observou foi que, nos dias de jogos, não houve confronto em grande escala entre
as torcidas. Porém, foram registradas várias manifestações de agressão entre os
torcedores e as torcidas, tanto verbal, como xingamentos e provocações, quanto
físicas, como se verificou um pequeno grupo que, ao perceberem o afastamento da
polícia, se agrediram com pontapés e socos com o objetivo de arrancar a camisa
do torcedor adversário, uma espécie de conquista sobre o rival.
Adicione ainda o fato de que, mesmo diante da ausência de grandes
confrontos entre as torcidas nos estádios, as notícias sobre mortes atribuídas às
torcidas organizadas aumentaram nos meios de comunicação do Estado23. Esta
situação merecerá análise mais profunda, no entanto, de momento, é possível
formular uma reflexão: a ausência de confronto entre as torcidas organizadas, nos
dias de jogos, certamente não significa a supressão da violência – que se
manifesta em ações individuais no próprio estádio e em ações posteriores aos
eventos e fora das imediações da chamada praça esportiva. O que sugere que a
disposição à violência por parte de algumas pessoas continua existindo24, mesmo
que, conforme relatam pessoas responsáveis pela segurança em dias de jogos, se
23
O que se observa é que, após a desmobilização do policiamento, tem ocorrido um número
considerável de confrontos nas periferias e espaços públicos distantes da chamada praça esportiva,
levando em muitos casos a óbitos. Os números sobre ocorrências relacionadas às torcidas
organizadas foram solicitados ao Comando do Policiamento da Capital (CPC) da Polícia Militar de
Goiás e estamos aguardando o retorno.
24
De acordo com Zanolla (2010), a agressão se distingue da violência. A partir da psicanálise, a
autora entende que a agressividade extrapola o sentido da violência porque diz respeito a um
elemento primário, inerente ao ser humano, e é regida pela necessidade de satisfação imediata. Por
outro lado, “a violência é uma contingência da energia libidinal que retorna aos instintos
agressivos sob a forma de razão” (p.119). Significa que a violência pode ser considerada como o
termômetro da cultura, na medida em que o desafio posto à sociedade como um todo é a
necessidade de reprimir a agressividade inerente ao ser humano ao mesmo tempo em que essa
energia deveria ser destinada a alguma atividade socialmente aceita. Assim, a ausência de
violência explícita nos jogos não significa necessariamente que os torcedores passaram a canalizar
sua agressão para manifestações e condutas socialmente aceitas – como a manifestação da torcida
pelo time; o que se conseguiu foi evitar grandes confrontos. A perspectiva acima permite
compreender que os motivos que levam à violência permanecem, o que se exemplifica com os
confrontos fora da praça esportiva.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
tenha conseguido um pouco de paz no futebol durante a realização do campeonato
goiano de 2012.
Na sistematização final, num primeiro momento, far-se-á a
tabulação/mapeamento dos dados obtidos com os questionários, as entrevistas,
material jornalístico, documentos e observações; em seguida os dados serão
confrontados com a fundamentação teórica para identificação das informações
mais importantes do trabalho de campo e definição das categorias específicas do
estudo; na análise final, serão desenvolvidas as categorias específicas do estudo a
partir dos preceitos da teoria crítica da sociedade.
REFERÊNCIAS
ADORNO, T. W. Educação e emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995.
______. La personalidad autoritária (Prólogos I e II). Buenos Aires:
Proyección, 1965, p.3-8.
COSTA, J. F. Violência e psicanálise. Rio de Janeiro: Graal, 2003.
FREUD, S. Psicologia de grupo e análise do ego. In: _____. Edição Standard
Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. Vol 18. Rio de Janeiro:
Imago, 1996.
HORKHEIMER, M.; ADORNO, T. W. Dialética do esclarecimento. Rio de
Janeiro: Zahar, 1985.
LAKATOS, E. M.; MARCONI, M. de A. Fundamentos de metodologia científica.
São Paulo: Atlas, 2010.
REIS, H. H. B. Futebol e Violência. Campinas: Autores Associados, 2006.
TOLEDO, L. H. Torcidas organizadas de futebol. Campinas: Autores Associados,
1996.
TRIVIÑOS, A. N. S. Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
qualitativa em educação. São Paulo: Atlas, 2008.
ZANOLLA, S. R. Educação e barbárie: aspectos culturais da violência na
perspectiva da teoria crítica da sociedade. Sociedade e Cultura. v.13, Nº 1, jul/ago,
2010, p. 117-123.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
EXPERIMENTO DIDÁTICO FORMATIVO: INVESTIGANDO UMA
POSSIBILIDADE PARA A APRENDIZAGEM DA ARTE NA ESCOLA
Ana Rita da Silva
Profª Dra. Beatriz Aparecida Zanatta (Orientadora)
Pontifícia Universidade Católica de Goiás – PUC
hana.arte2gmail.com
RESUMO
O presente trabalho pretende comunicar uma pesquisa de mestrado que entrecruza arte e
educação, tendo como base a Teoria Histórico-Cultural de L. S. Vygotsky e a Teoria do Ensino
Desenvolvimental de V. V. Davydov, cujas teses apontam que o ensino escolar é a forma essencial
do desenvolvimento da mente da criança, de seu pensamento e de sua personalidade, e neste
sentido deve ser dada atenção especial ao modo pelo qual o ensino se efetiva na escola. Assim, as
seguintes questões nortearam a pesquisa: Como o ensino de arte pode ser organizado na
perspectiva histórico-cultural? O ensino desenvolvimental seria um método pertinente de abordar a
disciplina Arte? Quais seriam as contribuições dessa abordagem para a disciplina Arte? Quais
seriam as vantagens e as dificuldades na concretização desse tipo de ensino? O objetivo da
pesquisa foi organizar um conteúdo de artes visuais aplicando-o a uma turma dos anos finais do
ensino fundamental da rede municipal de Goiânia de acordo com o método Experimento DidáticoFormativo e analisar os limites e contradições desse tipo de organização do ensino no contexto
investigado. Ao partir de um conceito da leitura de imagem, a composição artística, procuramos
levar os estudantes a percorrer de forma consciente e investigativa os processos de construção e
percepção da imagem, fazendo um movimento de assimilação de seus significados historicamente
construídos para a apropriação do conceito. As conclusões a que chegamos apontam que o enfoque
teórico investigado pode ser uma forma aprofundada e consistente de abordar a arte na escola, ao
desenvolver no aluno formas qualitativas de se relacionar com um objeto de modo que ele possa se
apropriar dos seus conceitos essenciais e utilizá-los não somente nas questões estéticas, mas nas
atividades práticas de sua vida social. A pesquisa pode contribuir também para os professores que
se preocupam com a didática do ensino de arte.
Palavras-chave: Teoria Histórico-Cultural; Experimento Didático-Formativo; ensino de arte.
Só conseguimos ensinar aquilo que sabemos.
Anamelia Bueno Buoro
Esta epígrafe foi escolhida pela inquietude que nos causam estas palavras.
Essa inquietação tornou-se mais intensa a partir do curso de mestrado em
educação, quando buscamos maior aprofundamento na teoria histórico-cultural,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
interrogando a partir dessa teoria sobre o que significa “saber”. Esta perspectiva
teórica levou-nos a refletir sobre os caminhos já percorridos na prática docente
como professora de arte e verificar das memórias que emergiram que muitas vezes
o verdadeiro saber era ignorado em função de questões que deveriam ser
consideradas de fundo na escola, como o cronograma escolar, a realidade
socioeconômica dos alunos, os eventos, o nosso próprio tempo e tantas outras
razões que prejudicam os verdadeiros motivos do ensino: Promover a
internalização dos conhecimentos historicamente construídos para o
desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos estudantes. Estas assertivas não
surgiram por acaso, foram cunhadas mediante as exaustivas investigações que
constituem a teoria histórico-cultural e se tornaram uma referência para a nosso
entendimento sobre o que, afinal, significa “saber”.
Os questionamentos sobre a docência e em específico o ensino de arte se
intensificaram durante o curso de mestrado em educação, ganhando uma
dimensão mais ampla e complexa, apontando, contudo, um caminho teóricometodológico para possíveis respostas. Ao realizar uma revisão bibliográfica
sobre o tema de investigação, observamos que poucas pesquisas, até o momento,
foram construídas a partir da teoria histórico-cultural e seus desdobramentos,
como a teoria do ensino desenvolvimental. Em geral as pesquisas de mestrado e
doutorado revelam o potencial destas abordagens, mas não se referem a sua
aplicabilidade na educação básica ou superior. A partir desta constatação,
formulamos as problematizações para a pesquisa: Como o ensino de arte pode ser
organizado na perspectiva histórico-cultural? O ensino desenvolvimental seria
uma abordagem pertinente para a disciplina Arte? Quais seriam as contribuições
dessa abordagem para a disciplina Arte? Quais seriam as vantagens e as
dificuldades na concretização desse tipo de ensino?
Estas questões conduziram ao desafio teórico e prático de propor uma
pesquisa sobre o ensino de artes visuais na escola a partir do método Experimento
Didático-Formativo, aportado na teoria histórico-cultural e desenvolvimental. A
pesquisa consistiu na organização e aplicação de um conteúdo das artes visuais,
especificamente a leitura de imagens, a uma turma dos anos finais do ensino
fundamental na escola pública, para analisar o movimento de construção de um
[Type text]
[Type text]
[Type text]
conceito essencial desse conteúdo. Durante as atividades orientamos os alunos a
percorrer de forma consciente e investigativa os processos de leitura da imagem,
tendo como objetivo a formação do conceito. Nesse movimento foi possível
perceber as fragilidades, os avanços e as possíveis contribuições da abordagem
teórica investigada para o ensino de arte, cujo resultado pode contribuir na
formulação de novas pesquisas, em diferentes contextos educacionais e
investigativos.
O QUE PRETENDE O PROFESSOR AO LEVAR A IMAGEM PARA A SALA
DE AULA?
A arte foi reconhecida como disciplina escolar na LDB 5692/71. Antes
disso sua presença no currículo aparecia de diferentes formas, ora com ênfase na
livre expressão, ora no desenho técnico, mas sem a legitimidade de uma área de
conhecimento que movesse a busca de consistência teórico-metodológica por
parte dos professores. Sua história recente de legitimidade vem instigando,
especialmente a partir dos anos 1980, a intensificação de debates e pesquisas em
torno de seu objeto, e neste sentido a imagem tem sido considerada de
importância central para o desenvolvimento estético dos estudantes sob diversos
enfoques, destacando-se metodologias que propõem a sua análise, leitura,
alfabetização visual, recepção, fruição, apreciação, compreensão crítica, que,
segundo Rossi (2009), são denominações que apresentam basicamente o mesmo
sentido. O que se põe em relevo é a presença da imagem no ensino de arte como
portadora de significados culturais e simbólicos, construídos na história da
humanidade cujo conhecimento pelo estudante amplia suas percepções, visões de
mundo, modos de pensar, compreender e situar sua existência na história.
A teoria histórico-cultural define a arte como “uma técnica social do
sentimento, um instrumento da sociedade através do qual incorpora ao ciclo da
vida social os aspectos mais íntimos e pessoais do nosso ser” (VYGOTSKY,
1998, p.315). Essa compreensão leva a pensar a imagem artística como mediadora
na construção de sentidos pelas crianças, muito mais do que outros artefatos
culturais delimitados nos diversos campos do conhecimento. Veiculando sínteses
[Type text]
[Type text]
[Type text]
de sentimentos coletivos e individuais, a imagem artística chega até a sala de aula
para promover identificações. Muitas vezes presenciamos os olhos brilhantes de
alguns jovens ao mencionar que determinado artista, tornado reconhecido e
admirado em muitos contextos e gerações, foi um indivíduo que necessitou lutar
contra a miséria, a indiferença, a solidão e o preconceito; que determinado (a)
artista lutou contra a incompreensão e a inabilidade para se integrar à sociedade de
seu tempo, superando reveses para colocar acima dele ou dela suas ideias e
sentimentos, materializando-os no objeto de arte.
Contudo, a imagem promove não somente identificações de sentimentos e
ideias, mas também o conhecimento de culturas diversas, ideologias, crenças,
tipos de organização social, modos de representação da realidade humana.
Abordar a arte na escola como mera expressão de sentimentos é reduzi-la a um
dos aspectos de seu significado, perdendo oportunidades incomparáveis de
desenvolvimento cultural e cognitivo dos estudantes. Neste aspecto reside o
problema do método. O que pretende o professor ao levar a imagem para a sala de
aula? É suficiente um desfile de informações sobre a vida do artista, ou das
técnicas empregadas na construção da obra, ou ainda as interpretações dos alunos,
feitas a partir de suas experiências sociais e culturais? E que tipo de relação o
professor estabelece com os conhecimentos objetivados nas imagens artísticas, de
forma a mediar as relações dos alunos com estes conhecimentos?
É importante sublinhar que a obra artística, nesta perspectiva teórica, não é
tida como mera reprodução da realidade em suas implicações políticas, culturais,
sociológicas ou científicas, mas em sua forma peculiar de sintetizar as
experiências humanas, reelaboradas no labor da imaginação criativa. “A arte não é
uma complementação da vida, mas decorre no homem daquilo que é superior à
vida”. (VYGOTSKY, 2001, apud. DUARTE, 2012, p. 12). A soberania da arte,
segundo Fichtner (2010, p. 93) consiste na sua capacidade peculiar de representar
e materializar a realidade. “Uma obra de arte é no fundo uma metáfora peculiar,
quer dizer, um modo abrangente de ver esta realidade e de representar este modo
de ver”. Assim, na mediação das relações dos estudantes com as artes,
promovem-se processos cognitivos e expressivos e, por excelência, desenvolve-se
uma “competência metafórica” no núcleo da qual, segundo Fichtner, (idem, p. 89),
[Type text]
[Type text]
[Type text]
se encontra a capacidade de representar um aspecto da realidade num nível
simbólico.
Ao levar a imagem artística para a sala é necessário que o professor
considere o potencial estético, cultural, simbólico que nela está implícito, assim
como a sua capacidade de mobilizar nos alunos a apropriação de significados
construídos historicamente, mas, acima de tudo, a sua capacidade de produzir
sentidos para que os alunos desenvolvam sua forma própria de ver, interpretar e
produzir novas imagens.
A ORGANIZAÇÃO DO ENSINO COM BASE NO ENSINO
DESENVOLVIMENTAL
Encontramos, no trabalho do psicólogo e pedagogo russo Vasili V.
Davydov, explicações sobre as relações de ensino e aprendizagem baseadas na
teoria histórico-cultural. Esse pesquisador apresentou um tipo especial de
organização do ensino denominado Ensino Desenvolvimental, que aponta
caminhos para que a atividade de ensino contribua para a constituição da
subjetividade dos alunos, promovendo seu desenvolvimento integral, que
pressupõe a ampliação da “atividade de pensar” por meio da formação de
conceitos relacionados ao objeto científico ou cultural que ele aprende. Ao
explicitar a estrutura da atividade de aprendizagem, Davydov procurou também
sugerir um modo de organização do ensino em que a aprendizagem do aluno seja
consciente, resultando na formação de ações mentais com alto grau de abstração,
porém, orientadas à realidade concreta.
Freitas (2009) nos esclarece sobre a formação de um conceito por meio da
atividade de aprendizagem, explicando que, no processo de aprendizagem, os
alunos se apropriam do processo de pensamento investigativo utilizado
historicamente para a formulação dos conhecimentos científicos, ou seja, se
apropriam dos procedimentos lógicos e investigativos que historicamente foram
empregados na formulação do conhecimento de um objeto. Neste sentido
aprender um conceito significa “reproduzir o conhecimento teórico” vinculado a
determinado objeto, que tem sua origem no processo investigativo que lhe deu
[Type text]
[Type text]
[Type text]
origem. Freitas (idem, p. 03) afirma que nesta perspectiva “o aluno aprende
realmente um objeto quando aprende também as ações mentais ligadas ao objeto,
os modos mentais de proceder com esse objeto, de agir com ele por
procedimentos lógicos de pensamento”, assim, o procedimento de ensino deve
assemelhar-se ao procedimento de exposição dos conceitos científicos, do modo
como acontece a exposição realizada pelo pesquisador no processo de criação que
originou os conceitos.
Os alunos se apropriam e reproduzem em sua atividade pensante, os
objetos histórica e culturalmente produzidos por gerações e gerações
de cientistas e que foram sendo acumulados e tornados um
conhecimento coletivo. Aprendendo desse modo os alunos convertem,
ativamente, o conhecimento coletivo em um conhecimento individual.
Convertem em suas, as ações mentais humanas outrora criadas e
utilizadas por pesquisadores de todas as áreas, por artistas, poetas,
lingüistas etc.
Ao mencionar os conceitos científicos, estão incluídos não somente os
conceitos vinculados à ciência como tradicionalmente é entendida, mas o conceito
segundo a teoria histórico-cultural como descontextualização empírica da
realidade, ou seja, na dimensão em que o indivíduo é capaz de fazer abstrações
sobre os dados de sua experiência, assim como utilizá-las como generalizações em
situações concretas. O conteúdo de suas experiências é organizado de forma
abstrata, extrapolando o nível das impressões sensíveis ou imediatas.
Segundo Davydov (1988) os modos de relação estética nada mais são do
que modelos de atitudes do artista perante a realidade, historicamente confirmados
por meio das obras de arte, e, ao identificar e assimilar estes modelos, as crianças
passam a dominar a “linguagem” da arte, o que significa se apropriar dos
procedimentos que foram utilizados pelo artista para expressar sua atitude em
relação ao mundo. Se a capacidade de imaginação, segundo Davydov, é universal
em relação a qualquer tipo de atividade humana, ela se desenvolve com mais êxito
na atividade criativa no campo das artes. A criação de uma imagem artística
pressupõe uma imaginação altamente desenvolvida por parte de seu criador, e essa
capacidade pressupõe que o indivíduo seja capaz de perceber a realidade de forma
mais ampla, consciente, significativa, ou seja, as capacidades de criar e de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
perceber estão intrinsecamente articuladas e abrangem diversas capacidades que
não se limitam ao campo das artes, e, sim, o envolvem. Neste sentido Davydov
(idem, p. 121) entende que a percepção e a criação de imagens visuais estão
relacionadas à capacidade de abstração e generalização, como bem explicita
nestas palavras:
A criação de uma imagem imaginativa torna-se possível como parte
do processo pelo qual a pessoa efetua a transição na sua consciência
do todo para as partes, do geral para o particular. (...) esta transição é
unicamente inerente à generalização substantiva, que, evidentemente,
é própria tanto da criação de uma imagem da fantasia como da
construção de conceitos abstratos (isto indica a presença de uma
determinada ligação entre a imagem artística e o conceito científico).
Para Davydov o ato de compor artisticamente demanda um processo
mental semelhante ao que é empregado nas atividades científicas ou técnicas,
visto que também envolve o estabelecimento de relações e a assimilação de um
modo geral de percepção que orienta a atividade criadora, e, dentro da
especificidade da arte, a composição regula as transições do projeto à
concretização com diversificado material, técnicas e conteúdos. Pontua também a
necessidade de colocar os estudantes em contato com obras de arte, não somente
de pintores, mas, também de escultores, artistas gráficos, pois ao identificar o
modo de composição de cada obra ou objeto de arte, os alunos compreendem as
etapas de construção desse objeto, fazendo o caminho inverso ao do artista, ou
seja, indo da forma materializada para a ideia. Acrescentamos que neste
“percurso” de compreensão da obra ocorre a construção de sentidos: A ideia a que
chega o aluno não se prende a que teve o artista ao conceber a imagem, a ideia é a
do próprio aluno como receptor ativo da obra.
Por outro lado, a instrução pode dar ao desenvolvimento mais do que se
espera em termos de resultados imediatos. A influência do ensino sobre a
formação das funções psíquicas superiores excede os limites dos conteúdos de
uma matéria específica. Ao desenvolver os conceitos específicos de uma matéria,
o indivíduo torna-se capaz de aplicá-lo em diversos campos do conhecimento,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
assim como em suas atividades cotidianas, uma vez que as distintas matérias tem
segundo Vygotsky (2007, p.352), um fundamento psíquico comum.
O EXPERIMENTO DIDÁTICO FORMATIVO VOLTADO PARA A LEITURA
DE IMAGEM
Ao encontrar, nos estudos de Davydov, explicações sobre a estrutura da
atividade de aprendizagem e suas formulações sobre a organização do ensino e
aprendizagem com base na teoria histórico-cultural, encaminhamos nossa
pesquisa para o método Experimento Didático Formativo, formulado segundo
uma proposição materialista dialética, que concebe a experimentação como
“processo de captar, compreender e explicar o movimento que dá origem às
funções psicológicas humanas, ou seja, o movimento pelo qual o ser humano atua
na realidade criando-a e, ao mesmo tempo, recriando-a”. (FREITAS, 2007, p. 05).
O experimento didático é utilizado na pesquisa de cunho pedagógico e tem
como objetivo investigar mudanças qualitativas no pensamento do aluno a partir
de um conteúdo estudado, organizado e acompanhado passo a passo pelo
pesquisador. Configura-se num plano de ensino elaborado a partir de um conceito
científico (teórico, não empírico) a ser aprendido. Na atividade de aprendizagem o
professor vai conduzindo as tarefas no sentido de provocar avanços no
pensamento dos alunos para um grau de abstração e generalização crescentes,
mediante problematizações. Os alunos são motivados para as tarefas na medida
em que elas apresentam conexões com sua realidade e, ao mesmo tempo, na
medida em que são colocados como sujeitos ativos na apropriação do objeto. Este
é um processo consciente que envolve a autonomia do aluno e o controle, por
parte dele mesmo, de seu avanço gradual na apropriação dos conhecimentos.
no decorrer do experimento acontece aquisição de atos mentais, atos
esses que contribuem para reorganizar o pensamento, as operações
mentais realizadas pelo sujeito. Este acontecimento caracteriza-se
como uma reorganização interna provocada por signos externos. O
próprio experimento funciona como mediação, como um signo
externo. (FREITAS, 2007, p. 11)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O pesquisador deve fazer a análise do conteúdo a ser estudado, juntamente
com o professor da classe, a fim de verificar quais são os conceitos nucleares do
objeto de estudo para planejar o experimento. Captar o conceito nuclear significa
apropriar-se do objeto em sua concretude, ou seja, dentro de uma rede de
significações que envolvem a sua constituição sócio-histórico-cultural. Neste
sentido a aprendizagem por conceitos envolve não somente o domínio dos
conhecimentos relacionados ao objeto de estudo; o seu caráter generalizador
permite relacionar e aplicar esses conceitos nas demais experiências da vida
cotidiana.
A etapa inicial da organização do experimento envolveu, conforme já
mencionado, a análise do conteúdo a ser trabalhado com os estudantes. Ao fazer
essa análise percebemos que o conceito de composição pode ser considerado
central na leitura da imagem artística porque é ele que estrutura a imagem tanto
em seus aspectos formais como do ponto de vista do conteúdo, da significação. O
seu caráter generalizador passa pela percepção, análise, interpretação e produção
da imagem, seja ela fixa ou em movimento, bi ou tridimensional, dentro de
qualquer suporte, tradicional ou contemporâneo.
Para Davydov (1988, p. 121) o conteúdo básico do ensino de arte é a
assimilação de um modo geral de percepção, nesse caso, a composição, definida
por ele como “a conformação, a combinação, o estabelecimento de relações, o
ordenamento e a unificação das partes ou elementos de algo destinado a
converter-se num todo”.
a composição é o modo geral da materialização integral (objetivação)
(para o artista) ou entificação (desobjetivação) (para o espectador) de
um projeto artístico, um modo geral de transição do projeto à
concretização, ou ao contrário, da percepção da forma na qual o
projeto é concretizado para o conteúdo.
Ao produzir a imagem o artista agrega significados presentes na realidade e
os reelabora por meio de sua imaginação criativa, gerando o novo. Os elementos
visuais passam a compor um significado inédito ao serem estruturados na
constituição da imagem, materializando o objeto artístico que, ao passar pela
percepção do espectador, gera novos sentidos. Buoro (2002, p 42) faz uma relação
[Type text]
[Type text]
[Type text]
entre a leitura visual da imagem e a leitura do texto escrito, cuja compreensão
exige que o leitor “percorra visualmente as palavras e frases, feitas parágrafos,
feitas capítulos, ao mesmo tempo que constrói sentidos entre o que se conta no
livro e como isso é contado pelo autor”. Ela considera ser determinante para a
qualidade da leitura que “o sujeito-leitor perceba o conteúdo daquilo que lê bem
como a forma que o envolve, os quais, com sua colaboração, entretecem-se dando
existência à obra, fazendo dela um objeto significante”. A leitura da imagem
pressupõe que determinados conceitos sejam construídos via processo de
aprendizagem, mediante a intervenção competente do professor. Segundo essa
autora “só conseguimos ensinar aquilo que sabemos”. O professor que parte do
senso comum para a leitura de imagens na escola, nada acrescenta à competência
do estudante nesse domínio do saber; sua atitude, perante os significados das
imagens, ou se mantém na ordem do puro subjetivismo, ou procura juntar
fragmentos de outros conhecimentos históricos, sociológicos, antropológicos, ou
seja, dados externos à imagem em si e “extrínsecos ao conjunto da obra do artista
como um todo”. (idem, p. 39).
Diversos teóricos da arte enfatizam a composição como um processo de
organização dos elementos de uma imagem. Aumont (2011 p. 281) atribui a
composição “às funções do quadro, como superfície organizada, estruturada”, mas
sua análise da composição vai muito além desse tipo de superfície visual. Ele
coloca que a arte de compor foi tradicionalmente compreendida como a
disposição harmônica das figuras, objetos ou cenários em um quadro, e à medida
que pintura se afastou da imitação da realidade ela passou a englobar outros
elementos plásticos na composição, como linhas, ponto, cores, superfícies.
Neste trabalho optamos por abordar a composição na imagem fixa,
incluindo no plano de ensino não somente a imagem bidimensional, mas os
objetos tridimensionais, como as instalações artísticas, possibilitando que os
alunos percebessem a composição em suportes variados.
O plano de ensino foi aplicado a uma turma de oitavo ano do ensino
fundamental, denominado Agrupamento H2 na rede de educação municipal de
Goiânia, que funciona sob o sistema de Ciclo. O plano de ensino foi desenvolvido
em aproximadamente dezoito horas/aula. Inicialmente disponibilizamos vários
[Type text]
[Type text]
[Type text]
textos para o embasamento da professora em relação às teorias histórico-cultural e
desenvolvimental, que foram discutidos previamente e nos auxiliaram na
elaboração do plano. A organização do plano foi feita com base em
problematizações em todas as tarefas de aprendizagem, exigindo dos alunos uma
participação oral bastante intensa, e neste aspecto percebemos que estes alunos
apresentam Zonas de Desenvolvimento Proximal25 bem distintas, mas enxergamos
esse fator como positivo no aspecto em que houve uma colaboração entre os mais
avançados e os que apresentam uma compreensão estética menos desenvolvida.
Procuramos organizar o plano de acordo com a tese de Vygotsky de que “A
colaboração representa a origem das funções psíquicas superiores. O ambiente
social não é uma condição exterior do desenvolvimento psíquico da criança, e sim
a essencial condição interior”. (FICHTNER, 2011, p. 52). Em diversos momentos
os estudantes foram colocados em contato com as produções de seus colegas para
aprenderem de forma colaborativa. As tarefas incluíram a análise e interpretação
de diversas obras de arte, de estilos artísticos diversos para possibilitar a
comparação dos aspectos compositivos vinculados às respectivas condições
materiais, tecnológicas, culturais e ideológicas de cada contexto e tempo histórico,
assim como atividades de experimentação artística.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para tentar responder às questões de pesquisa, partimos do objetivo central
do Experimento, que foi a construção pelos alunos de um conceito generalizador
da imagem artística, a composição. Ao iniciarmos as atividades nos deparamos
com diversos aspectos envolvendo os sujeitos da pesquisa, cujo condicionamento
25
Para Vigotsky, há dois níveis articulados de desenvolvimento: o desenvolvimento real e o
desenvolvimento potencial. O desenvolvimento real indica o nível de desenvolvimento das funções
mentais em que a criança consegue realizar coisas por si própria, sem auxilio do adulto ou de
colegas. O desenvolvimento potencial é aquilo que uma criança ainda não consegue realizar de
forma independente, mas o faz com a colaboração de pessoas mais experientes. A zona de
desenvolvimento proximal é a distância entre o desenvolvimento real e o desenvolvimento
potencial.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sócio-histórico-cultural deve ser cuidadosamente considerado. Dentre estes
aspectos destacam-se a formação inicial da professora e sua relação com as teorias
educacionais; a realidade profissional em que se encontra inserida, dentro de uma
carga horária extensa que pouco lhe permite aprofundar-se nos estudos
necessários à compreensão dos aspectos teóricos da pesquisa; as peculiaridades da
turma investigada, cujas experiências com a arte são inexpressivas; a
heterogeneidade cognitiva e estética da turma, bem como a falta de familiaridade
com métodos de ensino problematizadores. Ao considerar estes pontos,
procuramos trazer para a análise não a perspectiva de responder se ocorreu a
construção do conceito pelos alunos, mas, em que medida houve avanço na
construção do conceito, e quais são as implicações do contexto investigado para
que os resultados sejam estes e não outros.
Em cada etapa da atividade percebemos nos alunos o movimento de
abstração sobre a leitura e interpretação da imagem e a percepção de sua estrutura
formal incluindo os aspectos simbólicos e culturais. Esse movimento foi
confrontado com a leitura feita na atividade inicial de verificação de
conhecimentos prévios dos alunos, em que a compreensão da imagem encontravase no nível empírico. Ao final do experimento, ao serem indagados sobre “o que
aprenderam sobre composição”, os alunos apresentaram respostas que
demonstram a compreensão da composição como estruturação dos elementos
visuais, apontando os princípios do equilíbrio e da harmonia e noções de
elaboração criativa e de intencionalidade do artista e do leitor.
Diante destas conclusões, acreditamos na pertinência da abordagem teórica
investigada para o ensino de arte, que tem como propósito desenvolver, no aluno,
formas qualitativas de pensamento e de relação com um objeto, a partir da
aprendizagem de seu conceito nuclear, para utilizá-lo como ferramenta mental ao
lidar com a realidade. Como experiência, concluímos que muitas ZDPs mudaram
com o experimento, não somente dos alunos, mas também da pesquisadora e da
professora, porque entendemos o papel do ensino no sentido de levar os alunos à
apropriação do conceito generalizador de um objeto para compreende-lo em seu
movimento sócio-histórico-cultural. Esta, para nós, se constitui em uma resposta
satisfatória para a pergunta sobre o que, enfim, significa “saber”.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
REFERÊNCIAS
AUMONT, J. A imagem. 16ª edição. Tradução ABREU, E. S. e SANTORO, C. C. Campinas/SP:
Papirus, 2011.
BUORO, B. B. Olhos que pintam: a leitura da imagem e o ensino de arte. 2. Ed. São Paulo:
Educ/Fapesp/Cortez, 2002.
DAVÍDOV, V. V. Problemas do ensino desenvolvimental – A experiência da pesquisa teórica e
experimental na psicologia. (DAVÍDOV, V. V. Problems of developmental Teaching – The
experience of theoretical and experimental psychological research. Soviet Education, Ago. 1988,
vol. XXX, nº. 8). Tradução LIBÂNEO, J. C. e FREITAS, R. A. M. M.
DUARTE, N. Arte e formação humana em Lukács e Vigotski. Disponível em:
http://www.anped.org.br/reunioes/31ra/1trabalho/GT17-4026--Int.pdf. Acesso em: 21 de
novembro de 2012.
FICHTNER, B. Introdução na abordagem histórico-cultural de Vygotsky e seus colaboradores.
Endereço eletrônico: http://www3.fe.usp.br/secoes/inst/novo/agenda_eventos/docente. Acesso em:
01 de dezembro de 2012.
FREITAS. R. A.M.M. O experimento didático-formativo. Texto digitado. 2007.
VIGOTSKI, L. S. Psicologia da Arte. Traduzido do original em russo por Paulo Bezerra. São
Paulo: Martins Fontes, 1998.
__________. Pensamiento y habla. Trad. Alejandro Ariel González. Buenos Aires: Colihue, 2007.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
INFÂNCIA E ARTE
André Barcellos Carlos De Souza
Universidade Federal de Goiás / Faculdade de Educação
[email protected]
RESUMO
A construção moderna do conceito de infância é concomitante ao surgimento e consolidação do
capitalismo. No desenvolvimento do capitalismo foram instrumentalizados os desejos e as
necessidades humanas, reduzindo-os a simples valores de troca, anulando o potencial crítico da
cultura. A industrialização da cultura oblitera a reflexão crítica, ocultando as condições de
existência em que vivem os homens para servir aos propósitos de perpetuação do capital,
resultando na “fetichização das relações sociais e a reificação das consciências” (Adorno).
Paradoxalmente a criança é dependente e independente do adulto, na medida em que não está
inserida no processo de produção, aliena-se da própria formação. A criança partícipe da indústria
cultural internaliza a aparência de estar só, consumidora independente, herdeira da cultura e não
produtora de cultura (Benjamin). Nos processos formativos as crianças produzem cultura,
exercendo sua condição de sujeito histórico, no processo de socialização em que particularidades e
universalidades não devem ser equalizadas, deve-se, sobretudo, estimular o exercício de uma
cultura política criando o sentimento e a prática da participação, do direito à criação, do direito à
cultura, da cidadania cultural (Chaui). A arte “não faz mais do que ocasionar um afastamento
passageiro das pressões das necessidades vitais, não sendo suficientemente forte para nos levar a
esquecer a aflição real” (Freud) mas pode problematizar a vida, produzir sentidos diferentes,
enriquecer a expressão, ampliar o universo interior, ao expor as contraditórias relações de
produção e consumo dos produtos infantis da indústria cultural. Nesse sentido a arte é educativa,
mas para ser educativa a arte precisa ser arte e não arte educativa. A criança, por ser considerada
incapaz de produzir cultura, um sujeito passivo, deve ser bombardeada por “coisas boas” feitas e
avaliadas por adultos competentes. A categoria de cinema infantil como experiência formativa,
escopo desse trabalho, repudia o cinema feito para crianças. O cinema como linguagem artística
não pode sucumbir ao canto da sereia e ser classificado, esquematizado e previamente concebido
ajustando-se ao público. Arbitrariamente delimitamos o cinema infantil apenas por limites de
nossas preocupações específicas. A categorização infantil, atribuída posteriormente à produção da
obra, procura apenas qualificar o seu uso não pragmático, formativo e crítico.
Palavras-chave: infância; cinema; indústria cultural.
A partir do século XIV, assistimos ao desenvolvimento da família
moderna. O poder monárquico sobre o indivíduo, outrora definido pelas
obrigações instituídas pelas relações de parentesco distantes, a linhagem, migra
para dentro da unidade familiar e passa a ser exercido pelo patriarca. Os
[Type text]
[Type text]
[Type text]
casamentos dos filhos, as posses e as sucessões no domínio das propriedades antes
determinados por influências externas, agora é organizada pelo chefe familiar. Ao
longo dos cinco séculos sequentes, o poder do patriarca é reforçado em razão do
deslocamento das famílias para a cidade, a concentração do espaço de vivência
favorece o controle das vidas que a ele se submetem, a arquitetura individualiza os
usos dos cômodos da casa, a urbanização das famílias torna-se a base para a
constituição dos Estados, e a privatização da vida do indivíduo se impõe
contrapondo as instituições coletivas.
A concepção e a representação que os adultos fazem sobre o período
inicial da vida é diferente dos tempos medievais; a nova realidade, isto é, a
modernidade, altera instituições, valores, conceitos, ideias e ideais. Na Idade
Média, as crianças aprendem no convívio com adultos apartados da sua família,
na modernidade, a educação passou a ser exercida cada vez mais pela escola, e, se
antes era reservada aos clérigos e monarcas, agora tornar-se o instrumento normal
de iniciação social, da passagem do estado da infância ao do adulto. As
instituições escolares alicerçadas por teorias e análises sobre o desenvolvimento
social e psíquico infantil se relacionam com a família, ora de forma
complementar, ora de maneira tensa, rivalizando com a autoridade paterna.
Entretanto a família não é, segundo Poster (1979, p.161), a instituição investida na
função de socialização da criança, ela é “o lugar onde se forma a estrutura
psíquica e onde a experiência se caracteriza, em primeiro lugar, por padrões
emocionais”. Nesse sentido, naturalmente a criança pertence a uma família, e essa
família integra uma sociedade, como bem afirma Adorno (1973, p.147): “a família
está indissoluvelmente ligada à sociedade, o seu destino dependerá do processo
social e não da sua própria essência como forma social auto-suficiente”.
Os padrões emocionais internalizados são estabelecidos nas relações
dinâmicas recíprocas entre seus integrantes. Confiança, subordinação, cuidado,
repressão são ações e sentimentos que formam a psique da criança. As crianças
identificam, objetiva e subjetivamente, nas relações de interdição os adultos
responsáveis pela não realização plena de seus desejos, e nessas relações com
esses adultos, se constitue o valor da autoridade. A internalização da autoridade,
mediante os sentimentos de amor e ódio, capacita ao indivíduo viver
[Type text]
[Type text]
[Type text]
autonomamente na sociedade, porque, consciente e inconsciente, elabora as
demandas internas e externas, psicológicas e socias. Segundo Poster (1979,
p.170), quanto maior o número de adultos, mais a identificação pode ficar difusa e
“quando as figuras de autoridade estão separadas das figuras de amor, as
identificações poderão ser menos ambivalentes e menos profundas”. Essa
pulverização da identificação pode favorecer ou não a formação de indivíduos
emocionalmente fortes, não se trata de quantidade, mas da qualidade de tais
relações, embora a ampliação das possibilidades de identificação seja a mais
aconselhável.
A ideia de infância constitui-se concomitante com o surgimento e a
consolidação do capitalismo, e com o seu desenvolvimento a liberdade e as
necessidades humanas são ressignificadas. A burguesia revoluciona a divisão
lógica e histórica entre os donos da produção e produtores ao instituir a
propriedade privada como sagrada, controla as relações econômicas mediante suas
propriedades e toma o poder político impondo hegemonicamente sua ideologia
calcada nas ideias iluministas, alega para si o uso da razão pregando o progresso e
a democracia dos direitos humanos fundamentais, igualdade perante a lei,
liberdade individual e fraternidade entre os homens. A nova sociedade exige que o
indivíduo se constitua livre, totalmente autônomo, dono de si, que busca a
felicidade absolutamente solitário no mundo, responsável único por seu sucesso
e/ou fracasso social. No outro da mesma moeda, a sociedade está cada vez mais
densa, todas esferas do indivíduo estão sob controle e administradas, a coerção do
modelo econômico-político único impele o indivíduo a seguir todas as regras
sociais, não há lugar, nem na família, para onde o sujeito possa fugir dessa
sociedade positiva, onde possa livremente experienciar o negativo dele próprio,
imaginar uma outra possibilidade para a sua vida, ser um outro dele mesmo.
O indivíduo da moderna cidade industrial é proprietário, produtor e
consumidor de mercadorias, tal como Marx (1985, p. 45) a define “um objeto
externo, uma coisa a qual, pelas suas propriedades, satisfaz necessidades humanas
de qualquer espécie”. A mercadoria é ponto de partida e de chegada da análise
empreendida por Marx para elucidar a sociedade capitalista. Produto do acúmulo
de trabalho humano objetivado, a mercadoria reflete a diferença do duplo caráter
[Type text]
[Type text]
[Type text]
do trabalho, sua forma material concreta e sua forma social abstrata, sob a forma
de valor de uso e valor de troca. Entre o imediato da mercadoria, sua forma
concreta, e as relações de troca, a circulação das mercadorias, o consumo delas, o
trabalho concreto particular é abstraído, e a forma fenomênica da mercadoria, na
medida em que se torna apenas valor de troca, apresenta o produto do trabalho
equalizado, todo trabalho particular objetivado na mercadoria específica toma o
caráter social da igualdade dos trabalhos. O trabalho imanente na mercadoria
desaparece como trabalho humano concreto, e mostra apenas sua face como
produto de trabalho geral, e nesse movimento o trabalho vira qualquer trabalho,
perde o valor do trabalho acumulado, vira trabalho qualquer, trabalho igual a
qualquer outro. Dessa forma desaparece o indivíduo como sujeito das
transformações e as mercadorias aparecem como dotadas de vida própria.
A família como lugar de formação da consciência do indivíduo constitui
para a consolidação do capitalismo uma parte essencial, pois é nela que se produz
e reproduz as noções de autoridade e liberdade. “Só a família podia causar nos
indivíduos uma identificação com a autoridade, idealizada como a ética do
trabalho, que substituiu funcionalmente o domínio imediato do senhor sobre os
servos da época medieval” (Adorno 1973, p.137). Mas, como vimos, a revolução
cultural do século XX é o triunfo do indivíduo sobre a sociedade, a autonomia
individual é cultuada, independência e autosuficiência se transformam em valores
absolutos, reificando a relação homem-mundo, contrapondo-se a instituição
coletiva familiar, contrapondo-se a qualquer sentimento ou instituição de caráter
coletivo.
A criança é dependente e independente do adulto, na medida em que não
está aparentemente inserida no processo de produção, aliena-se da própria
formação. Na racionalidade desse sistema econômico-cultural, todo aquele que
não produz mercadoria, não produz mais valia, deve ser aliciado, na sociedade
administrada até as crianças são improdutivas. Entretanto, a criança nasce e vive
na história, em um contexto cultural objetivado, forjado no tempo e no espaço, os
conteúdos concretos e simbólicos são reelaborados, metamorfoseados, mediados
subjetivamente de acordo com a formação cultural. Na grande maioria das vezes
não se produzem mercadorias, seus produtos têm apenas valor de uso, não têm
[Type text]
[Type text]
[Type text]
valor para outrem, não têm valor de troca, mas não produzir mercadoria não
significa não produzir. Elas produzem e reproduzem a moderna cultura.
Considerando a necessidade de educar as crianças em condições
determinadas e constituir possibilidades formativas importantes, mediadas pelos
processos de socialização que disponham de conteúdos a serem internalizados que
contribuam para a autonomia e emancipação, a arte é uma possibilidade. A arte
com seus textos, imagens e sons se torna legível, consegue uma poderosa
mobilização dos afetos e se afirma como instância de celebração de valores e
reconhecimentos ideológicos. Nesse sentido a arte é educativa, mas para ser
educativa a arte precisa ser arte, e não arte educativa.
A arte moderna prima pela rejeição epistemológica a todo e qualquer tipo
de imposição, seja ela temática, material, sintática, todas lhe são contingentes, a
universalização da arte é moderna. Uma coisa é arte, e outra coisa são as formas
que ela adquire em cada cultura ou época. O verdadeiro artista faz questão de ser
fiel à arte propriamente dita, mas não às aparências acidentais que ela assumiu e
assumirá, e que a contingência histórica terá posto à disposição dele. A
insurbordinação do artista às convenções e às tradições não implica em fazer o
novo, o original, mas relativizar as possibilidades antigas. Não é a renúncia, não é
destruir o passado e os seus clichês, é relativizar o passado, libertar o presente do
poder do passado e tornar o passado passado. Graças às vanguardas, não só a elas
mas sobretudo ao aspecto cognitivo advindo do seu irrestrito questionamento
sobre a arte, não podemos hoje decretar o que é arte e o que não é arte, o que a
arte pode e o que ela não pode, o que a arte deve e o que ela não deve, não
podemos estabelecer critérios a priori, nem sobre os seus aspectos formais e nem
sobre os seus conteúdos, a fim de julgar, classificar ou ordenar as obras.
Julgamos e hierarquizamos as obras, bem como os gêneros, os estilos, as
linguagens de acordo com critérios relativos mediados por considerações
ideológicas, pragmáticas, éticas, lógicas, estéticas. Kant, anterior no tempo às
vanguardas, construindo sua teoria estética sobre os juízos estéticos, não no
campo conceitual e nem no campo da lógica, mas se baseando numa investigação
a priori e transcendental reflexiva, estabelece a impossibilidade da universalidade
objetiva para julgamento das obras de arte; no máximo, segundo ele, pode-se
[Type text]
[Type text]
[Type text]
arrolar a “universalidade subjetiva”, pois algo considerado belo pode-se supor que
qualquer pessoa é capaz de considerá-lo, desinteressadamente, também belo. Não
obstante Kant ter distinguido o belo da natureza e o belo do objeto, a beleza se
revela por meio de uma forma, a qual não tem uma função definida no objeto, mas
é percebida nele mesmo inútil e desnecessária, indistintatemente por todos. Mas
Kant (1993, p.152) postula que natureza e arte devem ser apreciadas
indistitamente como finalidades sem fim, e as distingue pela consciência da
diferença “A natureza era bela se ela ao mesmo tempo parecia ser arte; e a arte
somente pode ser denominada bela se temos consciência de que é arte e de que ela
apesar disso nos parece ser natureza”. Entretanto a beleza não está nos olhos de
quem vê, a universalidade subjetiva é ilusória, assim como a objetivação estética
também. O juízo estético não é totalmente imanente, sendo constituído, objetiva e
subjetivamente, por determinantes externos à obra e ao espectador.
A arte não é o espelhamento da realidade, pura mimese, a essência da
figuração ou abstração artística é a violação, o estranhamento, ou melhor, a
negação da realidade. A negação da realidade, tanto do tempo quanto do espaço,
que lhe é externa. A obra de arte estabelece um domínio próprio, fechado em si
mesmo, relativo ao mundo real, mas mesmo essa relatividade não pode ser
manifestada, pois seu mundo se pretende absoluto, uma realidade incompleta com
pretensão de ser totalidade, mas fundamentalmente autônoma, por que universal.
“Enquanto expressão da totalidade, a arte reclama a dignidade do absoluto”
(Adorno, 1985, p. 29). A obra de arte como um construto humano expressa a
particularidade do seu autor, revela esse indivíduo no tempo e no espaço das
relações sociais dele. Todavia, a objetivação da subjetividade do autor na obra é
expressão da potencialidade humana de negar a si mesmo como sujeito,
produzindo e reproduzindo uma outra realidade social, um outro eu, uma outra
racionalidade. Uma realidade que transcende a realidade do autor. E nessa
realidade construída objetivamente e subjetivamente o tempo e o espaço são
absolutos, não imediatos, portanto perpetuando-se no tempo e no espaço,
universalizando-se como humanidade.
Nesse ponto é importante retomar a ideia da arte como possibilidade
educativa, a arte como potencialidade de esclarecimento. A arte em si não institui
[Type text]
[Type text]
[Type text]
a verdade, não esclarece, pois sendo história submete-se à realidade. “Não
obstante, a suave narcose a que a arte nos induz não faz mais do que ocasionar um
afastamento passageiro das pressões das necessidades vitais, não sendo
suficientemente forte para nos levar a esquecer a aflição real” (Freud, 1997, p.
30), mas pode problematizar a realidade, a vida, produzir sentidos diferentes,
enriquecer a expressão, ampliar o universo interior, qualificando a comunicação,
ao expor as contraditórias relações de produção e consumo na sociedade
contemporânea. A arte é produtora de realidade e não é reprodutora da realidade
imediata, na medida em que produz sempre uma realidade nova e autônoma, um
todo absoluto, livre de regras externas, e na produção dessa realidade, ela
reproduz a própria história, por que não há outra, já que ela é única, absoluta. É
esse o seu potencial formativo, esclarecedor. É na mediação social pela
constituição e elucidação da realidade nela fundada.
A arte é mediação importante no processo [de formação humana],
antes de tudo porque contrasta com a finitude, o contingencial, o
prescrito. Porque emana da autonomia do sujeito e a ela retorna.
Porque emana um conhecimento que se estabelece com base em um
procedimento racional oposto àquele que organiza e administra a
sociedade. Por isso e somente assim, a arte serve ao entendimento e é
possibilidade e condição de constituição de humanidade” (Resende,
2010, p. 91).
O cinema pode ser arte, e pode ser também mera mercadoria. Do ponto de
vista da reprodução, o cinema como arte é também mercadoria, como produto tem
valor de uso e de troca, mas esses valores não são equalizados no seu valor de
troca, pois o caráter de “finalidade sem fim” da arte impõe seu uso em si, “e se
efetiva no processo de consumo”.
O cinema como arte, apreendida como uma realidade fechada em si
mesma, uma totalidade absoluta, uma realidade incompleta, universal e particular,
desinteressada, autônoma, livre, exige do espectador uma experiência original
capaz de mobilizar profundas camadas de livre associação, rememoração de
memórias passadas, capacidade de entendimento diferentes do comum, por que
promove o estranhamento frente à realidade posta, e assim reclama a produção de
sentidos, sentimentos, valores e regras novas, uma racionalidade distinta. O
[Type text]
[Type text]
[Type text]
cinema como arte desvela ao expectador o trabalho humano vivo, expõe seu modo
próprio de produção no contexto social de trabalho humano, de sua materialidade
específica. O cinema como arte, “o grande cinema, ao contrário [da indústria
cultural], por mais que esteja encrustado no circuito do capital, mobiliza as
camadas mais profundas da experiência, e supõe, precisamente, que o espectador
mantenha intacta sua capacidade de pensar, de associar e de rememorar”
(Rouanet, 1981, p. 62).
Mas assim como o contexto da criança é a família e o contexto da família
é a sociedade, o contexto da arte é também a sociedade. É no contexto da
sociedade que se produz e se reproduz a arte, o cinema. Cinema como arte apanha
a produção, reprodução e circulação, se refere ao objeto e às relações objetivas e
subjetivas na interação com o objeto. Não basta o filme ser artístico, para ser arte
socialmente referenciada precisa da intermediação crítica do espectador.
Na moderna sociedade capitalista onde tudo e todos se relacionam como
mercadoria, a arte não está imune à fetichização, pois é também mercadoria. E
como nos alerta Duarte, se na mercadoria em geral há a ocultação do valor do
trabalho, no bem cultural
a suposta ausência de valor de uso (que, na verdade, é valor de uso
mediatizado) é hipostasiada no sentido de se transformar, ela própria,
uso: a presumida inutilidade como emblema, que, em vez de subverter
o caráter mercantil do produto, acaba por reforçar o caráter de valor de
troca que ele, em uma sociedade capitalista, necessariamente possui
(2003, p. 32).
A arte consumida no contexto da sociedade capitalista, no âmbito da
indústria cultural, equaliza sua contradição entre realidade mediada e a realidade
imediata, e torna a arte uma mercadoria qualquer, fetichizada. A transcêndencia da
experiência humana é hispostasiada e se torna mera vivência. A negação da
realidade imediata presente na arte vira positividade. A diferença entre a
experiência empírica da realidade, que é sempre relativa, e a negação desse
imediato próprio da arte, que é uma totalidade absoluta, desaparece ao ser
consumida como mercadoria, porque uma se identifica com a outra, e a
contradição entre o absoluto e o relativo, o universal e o particular, o mediado e o
[Type text]
[Type text]
[Type text]
imediato, a objetividade e a subjetividade extirpada de suas negatividades
promove a dominação de um tipo de racionalidade, a moderna racionalidade da
indústria cultural.
A categoria de cinema infantil como experiência formativa, escopo desse
trabalho, repudia o cinema feito para crianças. O cinema como linguagem artística
não pode sucumbir ao canto da sereia e ser classificado, esquematizado e
previamente concebido, ajustando-se ao público. Arbitrariamente delimitamos o
cinema infantil apenas por limites de nossas preocupações específicas. A
categorização infantil, atribuída posteriormente à produção da obra, procura
apenas qualificar o seu uso não pragmático, formativo e crítico.
A indústria cultural imiscui seu poder na família. Se outrora, no início da
consolidação do capitalismo, o patriarca, representante do antigo poder
monárquico, assume o direito de vida sobre seus subordinados, na atual fase do
capitalismo, que exige a liberdade absoluta, seu poder é relativizado. E a par de
que a descentralização do poder emanar de um único indivivíduo ser salutar, no
contexto da indústria cultural ao destituir o pátrio poder, eleger os bens de
consumo como encarnação desse poder, é temerário. Frente à racionalidade
individual do pai, calcada em relações afetivas e circunstanciais, portanto
irracionalidade, contrapõe-se a racionalidade fetichizada soberana do capital.
A total autonomia individual apregoada pelo mercado, contradiz a
autoridade paterna, e deposita símbolos de autoridade em personalidades efêmeras
da indústria, e a identificação da figura de autoridade, para o bem e para o mal, é
diluída. Adultos com ou sem parentesco, tendo ou não tendo intimidade com as
crianças são internalizados como figuras de poder. A autoridade como parâmetro
da liberdade se difunde na sociedade de desiguais, e a autoridade não se
constituindo como poder relativo da liberdade, concede à liberdade o poder
absoluto. A liberdade individual plena é irracionalidade, é desrazão humana,
barbárie, impossibilidade de humanidade e humanização. A crise da família é a
crise da humanidade.
Crise da autoridade, independente do grau de parentesco do adulto
responsável pelos cuidados físicos e psíquicos, se revela no tempo dedicado às
crianças, quantitativamente e qualitativamente falando. As relações afetivas entre
[Type text]
[Type text]
[Type text]
adultos e crianças nos ambientes familiares, capazes de interpor e mediar as
renúncias impostas pela realidade, são as instâncias mediadoras entre a totalidade
e o indivíduo, o absoluto e o relativo. A relação de autoridade é a relação de
alteridade, o reconhecimento do outro pelo eu. Na ausência dessas mediações o
fraco indivíduo tende a sucumbir à força autoritária da totalidade. A atomização
do indíviduo produzida pela carência de autoridade, impossibilita o
reconhecimento no outro como seu complemento necessário, e toma o outro como
inimigo ou pior indiferente. O princípio da alteridade é arruinado, a coletividade
está em risco.
O tempo de convívio com prazer e desprazer tem diminuído entre adultos
e crianças, e entre as crianças, a experiência coletiva mediada ou imediata tem
sido cada vez mais rara. Mas a questão não é simplesmente proporcionar ou
argumentar em favor de experiências coletivas, pois o grupo ou a massa, nos
moldes da explicação adorniana, “proporciona aos indivíduos uma ilusão de
proximidade e de união. Ora, essa ilusão pressupõe, justamente, a atomização, a
alienação e a impotência individual”. O mecanismo de ajustamento burocratizado
do indivíduo às exigências das demandas coletivas, foi denominado
apropriadamente de “ticket-denken”, ou pensamento de ticket, por Adorno.
Situação onde os indivíduos abdicam de suas opiniões e experiências pessoais em
razão da integração à sociedade. Nesse sentido, a socialização calcada neste tipo
de relação fortalece a atomização, contrapondo-se à humanização.
As relações imediatas entre adultos e crianças são mediadas por coisas,
mercadorias ou não, concretas ou abstratas. E as experências imediatas entre
indivíduos, são cada vez mais raras, o tempo das relações coletivas mediadas por
bens culturais tem sido cada vez maior, computador, televisão, brinquedo, celular,
carro, cinema, livro. A racionalidade capitalista, associada a maior possibilidade
de consumo, imposta pela indústria cultural, transforma as relações imediatas em
secundárias, o indivíduo é aquilo que possui, e se relaciona com os outros
mediante suas posses. A economia do tempo e do espaço, em geral, valoriza os
usos privados dos bens culturais.
O cinema infantil, sua produção e reprodução, como as demais
mercadorias voltadas para o público infantil, denota que os incentivos e
[Type text]
[Type text]
[Type text]
preocupações se direcionam para a produção da mercadoria. Uma falsa
justificativa para isso recai na ilusória concepção da criança, que incapaz de
produzir cultura, deve ser bombardeada por “coisas boas” feitas e avaliadas por
adultos competentes. A indústria cultural abastece o mercado de filmes, e seus
vários outros produtos associados, condicionados pela política industrial.
Benjamin em 1928 já nos alertava para esse perigo em um de seus aforismas,
intitulado Canteiro de obra:
Elucubrar pedantemente sobre a fabricação de objetos – material
educativo, brinquedos ou livros – que fossem apropriados para
crianças é tolice. Desde o Iluminismo essa é uma das mais bolorentas
especulações dos pedagogos. (…) Em produtos residuais reconhecem
o rosto que o mundo das coisas volta exatamente para elas, e para elas
unicamente. Neles, elas menos imitam as obras dos adultos do que
põem materiais de espécie muito diferente, através daquilo que com
eles aprontam no brinquedo, em uma nova, brusca relação entre si.
(1995, p.18).
Os espaços para o tempo livre das crianças devem ser pensados e
organizados no intuito de favorecer o brincar, as atividades lúdicas, o lazer, o
divertimento. A produção e reprodução da cultura deve ser realizada pelas
crianças, em ambientes onde elas possam ser crianças, fazer história, construir
histórias, nos moldes, por exemplo, dos parques infantis da década de 30 em São
Paulo, que, idealizados e realizados por Mário de Andrade, atendiam
prioritariamente aos filhos de operários desprivilegiados e relegados das políticas
públicas tradicionais. Antonio Candido apud Freitas (2003, p. 265) enfatiza o
significado “da tentativa da Mario de Andrade e Paulo Duarte para fazer da arte e
do saber um bem comum”.
Pensar a questão de se o cinema pode e como pode ser um mecanismo de
educação das crianças, é de suma importância, em um contexto quase sem limites
da publicidade, da mercantilização universal. Ter acesso aos bens culturais é
importante, sobretudo a bens artísticos, potencialmente críticos corrosivos e
cônscios da dor e da delícia da vida, da flor da náusea. A forma da obra de arte é
pessoal e intransferível. As obras de arte são necessárias, são finalidades sem fim,
e o cinema infantil deve se tornar necessário e essencial para a formação das
crianças, tal a importância da arte na formação humana.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
REFERENCIAS
ADORNO, T.W. Notas sobre o filme. In: Theodor W. Adorno. (Org.) Gabriel Cohn. 2a edição. São
Paulo: Ática, 1994. p. 100 – 107.
ADORNO, T.W. y HORKHEIMER, M. Temas básicos da sociologia. São Paulo: Cultrix, 1973.
ADORNO, T.W. y HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Zahar, 2006.
BENJAMIN, W. Rua de mão única; obras escolhidas, volume 2. 5a edição. São Paulo: Brasiliense,
1995.
DUARTE, R. Teoria crítica da Indústria Cultural. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2003.
FREITAS, M.C. História da infância no pensamento social brasileiro. Ou, fugindo de Gilberto
Freyre pelas mãos de Mário de Andrade. In: FREITAS, M.C. (Org.) História social da infância no
Brasil. 5a edição. São Paulo: Cortez, 2003.
FREUD, S. O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997.
HAUSER, A. História social da literatura e da arte. 2a edição. São Paulo: Editora Mestre Jou,
1972. 2 v.
KANT, I. Crítica da faculdade de juízo. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1993.
MARX, Karl, O capital. 2a edição. São Paulo: Abril Cultural, 1985. volume 1.
POSTER, M. Teoria Crítica da família. Rio de Janeiro: Zahar editores, 1979.
RESENDE, A. C. A. Arte e conhecimento. In: RESENDE, A. C. A. e CHAVES, J. C. (Org.)
Psicologia social; crítica socialmente orientada. Goiânia: Editora da PUC Goiás, 2010. p. 77 – 92
ROUANET, S. P. Édipo e o anjo; itinerários freudianos em Walter Benjamin. Rio de Janeiro:
Tempo Brasileiro, 1981.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
MUCAMBO DE BAIXO, UM QUILOMBO CONTEMPORÂNEO?26
Edson Carvalho de Souza Santana 27
Universidade do Estado da Bahia
RESUMO
Este trabalho é parte de uma pesquisa de mestrado, realizada no povoado do Mucambo localizado
no município de Barreiras no extremo oeste da Bahia. O estudo teve como objetivo compreender
que tessitura dá sustentação identitária étnico-racial à comunidade do Mucambo de Baixo.
Contribuíram como sujeitos da pesquisa especialmente a comunidade escolar e a comunidade
mucambense de baixo como um todo. Para a sua realização fiz opção pela abordagem
metodológica do estudo de caso qualitativo de cunho etnográfico. Como instrumentos
metodológicos, optei pelo uso das técnicas de entrevista aberta e semiestruturada, grupo focal,
conversas informais, observação participante com registro em caderno de campo, e questionário
fechado para levantamento de dados quantitativos. O estudo sinalizou que a comunidade do
Mucambo de Baixo vem constituindo a sua territorialidade, desde meados do século XIX, a partir
de um possível acoitamento de ex-escravizados(as) e escravizados(as) oriundos(as) das lavras de
diamantes da Chapada Diamantina. Apontou, também, a existência da prática da discriminação e
do preconceito raciais no povoado e na escola. Revelou, ainda, que a comunidade tem uma
maneira particular de cultivar e ressignificar os seus valores e expressões étnico-raciais e culturais.
Palavras-chave: Mucambo de Baixo; escolarização; identidade; territorialidade; festejos e
religiosidade.
Como dito na introdução, este trabalho é parte de uma pesquisa de
mestrado, realizada no povoado do Mucambo localizado no município de
Barreiras no extremo oeste da Bahia. A minha aproximação exploratória com o
26
Trabalho apresentado no III Congresso Baiano de Pesquisadores Negros – GT Cultura,
Comunidades Tradicionais e Religiões.
27
Professor Auxiliar lotado no Departamento de Educação do Campus IX da Universidade do
Estado da Bahia. Possui mestrado em Educação e Contemporaneidade pela Uneb, (2011),
especialização em Administração Educacional pela UNIVERSO, 2000, é graduação em
Licenciatura Plena em Pedagogia pela Uneb, (1996). Tem experiência na área de Educação, com
ênfase em Educação, atuando principalmente nas seguintes temáticas: educação, identidade,
cultura negra, e quilombo.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
objeto da pesquisa teve início a partir de 2005, durante a sua efetivação realizei
contatos, dialógos e ações reflexivas na escola e na comunidade sobre a tematica
étnico racial e quilombola. Concomitante a isso, entre outras iniciatvas,
organizamos um grupo de estudos no âmbito do Campus IX para apropriação
teórica da temática e do contexto histórico do Oeste da Bahia.
Nessa itinerância, um dos fatores que sempre me aguçou o interesse é o
perfil da microrregião Oeste da Bahia, onde o Município de Barreiras e a
Comunidade do Mucambo estão localizados – a denominada além São Francisco distando 870 km da Capital do Estado da Bahia – Salvador, e 650 de Brasília,
Capital Federal. Aqui, a cultura difere largamente da existente no Recôncavo e
porque não dizer do restante da Bahia. A região passa por uma fortíssima
expansão agrícola com predomínio absoluto do agronegócio e da cultura do
migrante do Sul do país, em detrimento da cultura nativa, principalmente pela
negação da história e cultura negra. Essa realidade salta aos olhos no campo e na
cidade, seja pelos vários flagrantes efetivados pela polícia federal na região,
coibindo a prática de trabalho degradante ou escravo, seja pelo explícito
afastamento, e por que não dizer, até desprezo do poder público e/ou da iniciativa
privada sobre as problemáticas dos afro-brasileiros, seja ainda pelo alheamento
das instituições de ensino de todos os níveis, públicas ou privadas. Nesse sentido é
relevante refletirmos sobre a afirmação de Queiroz (2004), “O espaço escolar
também institui um discurso e uma prática racista. O racismo presente no
cotidiano escolar se manifesta não apenas naquilo que diz, mas, sobretudo,
naquilo que se cala”. Quero entender que quando ela se refere ao espaço escolar,
inclui aí todos os níveis de ensino e de educação escolarizada.
No que tange às comunidades rurais tradicionais, embora saibamos que na
micro região Oeste da Bahia existam várias comunidades negras rurais,
praticamente inexistem pesquisas sobre elas, muito menos com elas, sobremaneira
no que diz respeito à questão educacional. Essa realidade também alimentou a
ncessidade da realização da pesquisa.
O Mucambo e uma comunidade negra rural e foi constituída por
descendentes de escravos fugitivos ou alforriados, vindo das Lavras de
Diamantes, da Chapada Diamantina e outras regiões do Estado da Bahia, está
[Type text]
[Type text]
[Type text]
localizado à margem esquerda do Rio Grande, a dezessete quilômetros da cidade
de Barreiras. No ano de 2007, a comunidade conseguiu junto à Fundação Cultural
Palmares, a certificação de Auto-Reconhecimento de Comunidade “Remanescente
Quilombola”. A sua economia é eminentemente agrícola (rural) de subsistência e
está atualmente organizada no formato de agrovila. Para a sua sobrevivência, os
mucambenses assim distribuem sua força de trabalho: prestam serviços menos
qualificados na cidade de Barreiras e serviços braçais nas fazendas do
agronegócio.
No que tange a identidade, apesar de todos os predicados que os
mucambenses de baixo possuem, a sua autoidentificação enquanto quilombola e
até mesmo como negros, é um tanto problemática. Contudo, isso não é de se
estranhar, em recente documentário etnográfico intitulado Quilombos da Bahia,
dirigido por Antonio Olavo retratando vários quilombos do Estado da Bahia,
verifica-se que se constitui um dilema as suas autoidentificações, conforme
escreve Pádua; Silva:
Nas narrativas dos moradores também percebemos um grande dilema:
Quem são eles? Como se vêem? Muitos não se reconhecem como
quilombos; outros mais politizados, já reivindicam essa condição.
Sobre ser negro, também vivem um dilema comum dos brasileiros:
são negros “puros” ou misturados? (PÁDUA; SILVA, 2007, p. 77.
Aspas do original).
Essa contemporânea abordagem sobre as comunidades negras rurais, entre
outros estudos, também contribuiu para a compreensão da realidade do Mucambo,
principalmente relacionada ao contexto que o insere. 28Mucambo de Baixo
convive historicamente em intersecção com o Mucambo de Cima, composto em
sua grande maioria por pessoas supostamente brancas que, em certa medida, são
lhes hostis étnicoracialmente.
Registros orais informam que a existência da escola no povoado remonta
aos anos 1930. Antes, porém, como defende alguns moradores, a escolarização era
28
O povoado do Mucambo é composto por dois núcleos habitacionais, a saber: Mucambo de
Baixo dos negros onde predomina dois troncos familiares – Catula e Mandu - e Mucambo de Cima
dos supostamente brancos(as) do tronco familiar dos Vieira.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
praticada por particulares, por isso, seu início é bem mais anterior. Um registro
interessante nesse sentido é o fato de que a maioria dos seus habitantes é
alfabetizada, incluindo os idosos.
Em 1992, o prédio escolar passa a ser identificado por Escola Dr. Abílio
Farias. Em 2003 foi construído o Anexo I da Escola Dr. Abílio Farias, também no
Mucambo de Baixo, distando 200 metros desta. Nesses espaços é oferecido o
Ensino Fundamental - da Educação Infantil à 8ª série/9º ano do Ensino
Fundamental – além da Educação de Jovens e Adultos.
De todas as professoras e professores entrevistas(os) apenas uma, afirmou
conhecer a Lei 10.639, o que representa apenas 9% das falas. 100% desconhecem
a existência da Lei 11.645. É evidente que o enfrentamento da prática do
preconceito e da discriminação raciais e a efetiva implantação das políticas
públicas no que diz respeito às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
das Relações Étnico-Raciais para o Ensino de História e Cultura Afrobrasileira e
Africana, extrapolam o âmbito da Escola Dr. Abílio Farias, embora não a isente.
Isso exige ações concretas dos entes públicos de todas as esferas, principalmente
dos segmentos educacionais, assim como da própria sociedade. Porém, no
contexto do estudo, as principais diretrizes e atribuições para a sua efetiva
concretização são do poder público municipal. Silva (2003), defende a
necessidade do estado, em cada uma de suas instâncias, agir de maneira
discriminadora positiva para uma efetiva reparação e inclusão do estrato étnico
racial negro na sociedade brasileira.
No município de Barreiras, mesmo tendo a sua Câmara Municipal de
vereadores colocado ao executivo municipal a Lei n. 676/2005, com a seguinte
Ementa: “Torna obrigatória a temática sobre a Cultura Popular e Cultura/História
Afro-Brasileira no sistema de ensino municipal tendo como base a lei 10. 639 de
09 de janeiro de 2003, e dá outras providências”. Anais da Câmara Municipal de
Vereadores, (2005 s/p.) apesar dos seus cinco anos e já estar sancionada, ela
ainda não saiu do papel. Pior que isso, na Secretaria de Educação do Município,
nem se quer encontrei quem soubesse de sua existência.
Os dados também revelaram que parte considerável do corpo docente tem
dificuldade para identificar o preconceito e a discriminação raciais explícitos ou
[Type text]
[Type text]
[Type text]
velados que permeiam o fazer da Escola. Algumas professoras e professores até
que o percebem, porém, muitas vezes de maneira distorcida, ingênua ou, até,
preconceituosa. Outras(os) por falta de embasamento ou quem sabe de
determinação para enfrentá-los, acomodam-se ou agem de maneira superficial ou
inadequada. Por exemplo:
Se tem preconceito na escola? Tem muito preconceito. A escola estava
tentando organizar uma peça composta por alunos negros, e os negros
não queriam se mostrar, aí eu falei: vocês não vão como escravos,
vocês vão como negros que venceram na sociedade. E eles mesmo
assim não queriam participar da peça por que tinham vergonha, eles
não vêem seu valor na sociedade. Por isso, eles mesmos têm
preconceito. (CATUMBELA)29.
É inegável que o longo histórico da escravização praticada no Brasil
impacta a todos(as), direta ou indiretamente. Por outro lado, é inaceitável admitir
que o estado de marginalização e guetificação em que ainda vive o estrato étnico
racial negro da sociedade brasileira, incluindo o Mucambo de Baixo, sejam
apenas resultados residuais do nosso longo período da escravização. Nesse
sentido, é gritante que uma escola como a do Mucambo, com as necessidades
impostas pelas suas particularidades ainda não consiga confrontar o estigma da
escravização, e continue abordando-o apenas de maneira pontual, distorcida ou
descontextualizada.
Por mais que se tente ocultar, o problema étnico aparece no espaço
escolar de modo bastante consistente. As profissionais da escola não
se sentem responsáveis pela manutenção, indução ou propagação do
preconceito. Mas, tendo em vista a realidade do problema, cria-se,
então, a necessidade de responsabilizar alguém pela sua ausência.
Nessa hora, as vítimas passam a ser as culpadas pela situação.
(CAVALLEIRO, 2000, p. 67).
29
Buscando preservar a identidade dos sujeitos da pesquisa identifiquei-os assim: adultos(as)
tiveram seus nomes substituídos por nomes de países africanos; os(as) jovens por nomes de
capitais de países africanos; os(as) estudantes por nomes de invenções africanas; professoras e o
professor foram nomeados por rios africanos; os membros da família Vieira, por sua vez, com
nomes de montanhas africanas.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Por outro lado, esses problemas têm sido agravados pelos estereótipos
criados e praticados historicamente pela sociedade brasileira e que, infelizmente
têm encontrado grande eco também, nas relações sociais e escolares do Mucambo.
O que tem contribuído para um sentimento de autorejeição, principalmente entre
as crianças, características assumidas por pessoas estigmatizadas.
“Os estereótipos, por sua vez, dão origem ao estigma que, imputado ao
indivíduo negro, dificulta sua aceitação no cotidiano da vida social, impondo-lhe a
característica de desacreditado” (CAVALLEIRO, 2000, p. 24). O estigma,
relacionado à negritude funciona como um traço, um carimbo que, na concepção
de Goffman, (1963), se torna em mecanismo que impede o(a) estigmatizado(a) de
perceber seus atributos, uma vez que as relações sociais fazem recair sobre ele(a)
uma visão de inferioridade pré-concebida e estigmatizante.
Entre os dados da pesquisa chama a atenção que a média de 16,6% das falas
dos jovens afirmam que a dificuldade da comunidade se assumir quilombola se
deve à vergonha por causa do racismo existente no povoado. Há uma fala dizendo
que a dificuldade está relacionada ao medo de ser quilombola, pois isso implica
em assumir a negritude. Talvez essa fala possa ser uma síntese da denúncia da
presença, nas suas visões de mundo, de estereótipos construídos a partir da
ideologia da elite branca dominante que persiste, desde alguns séculos atrás,
objetivados na equação: negro igual a escravo. Como escreve Silva (2002).
As falas acima, confirmam algumas informações, por exemplo, de que as
relações no povoado são permeadas pelo preconceito e a discriminação raciais,
que eles(as) próprios(as) denominam por racismo, sinaliza também que os(as)
mucambenses são capazes de identificar algumas práticas vinculadas ao tal
racismo, mesmo que, mais das vezes, tais práticas sejam veladas. Percebe-se,
também, que ao mesmo tempo em que (re)afirmam, têm dificuldades para
assumirem a identidade negra como também a quilombola. Isso pode também ser
o reflexo do cerceamento a que estão expostos na sua própria territorialidade, o
que é visivelmente um fator de constantes constrangimentos. Afinal, como afirma
Bandeira (1988, p. 299) “O preconceito racial vivido concretamente assume sua
feição violenta e dolorosa, impondo sofrimento moral à comunidade”. Por outro
[Type text]
[Type text]
[Type text]
lado, Poutignat (1998), ensina que os constrangimentos étnicos, reforçam nos
grupos discriminados a disposição de reafirmarem o seu pertencimento étnico.
Nesse sentido pode-se dizer que Gusmão, 1995, p. 231) afirma que eles têm
a “[...] ‘raça’, enquanto descendência, o elemento detonador da lógica social
constituída [...]”. (Aspas da autora). Contudo, ela denuncia também, que: “O
processo histórico e político, que transforma a diferença em desigualdade [...],
expõe os processos políticos de sua exclusão como camponês e negro”. Vê-se que
isso se assemelha ao que se observa no Mucambo, as circunstâncias sociais,
étnicas e históricas em que estão inseridos lhes colocam alguns dilemas,
percebem-se enquanto camponeses, negros e até quilombolas mas, concebem
também que a defesa da identidade fundamentada nesse tripé, tem mais
possibilidade de lhes ser ainda mais problemática do que lhes conferir alguma
vantagem. Continuando com as contribuições de Gusmão:
O processo de “tornar-se negro”, ou seja, o processo de politização da
“raça” passa pela exclusão, já que [...] a troca da pele, o
embranquecimento, resulta de muitas tentativas de “integração social
do negro no mundo dominado pelo branco” e o conduz à alienação.
(GUSMÃO 1995, 231. Aspas da autora).
Defende ainda a autora, que a violência histórica em que estiveram expostos
os afrobrasileiros “[...] tem feito com que a busca de um reconhecimento mínimo
de dignidade humana faça-se na negação da sua exterioridade [...].”
Posicionamento dos grupos de respondentes estudantes, jovens e adultos
sobre algo de que mais gostam no Mucambo.
É ótimo, o povo é cooperativo, amigo. O bom de morar aqui é que
sempre na hora assim de uma dificuldade todos ajuda, a comunidade
se une pra resolver o problema, além do rio. (GABORONE).
Pode-se afirmar que os conteúdos das falas sobre as preferências de
identificação étnico-culturais, e territoriais dos(as) mucambenses se constituem
um bom parâmetro para discutir os valores cultivados e cultuados internamente
pela comunidade. Embora existam algumas variações quanto à particularidade do
elemento da predileção de um ou de outro grupo de respondentes da pesquisa, nos
geral dão bem a dimensão do elevado grau de (re)afirmação do sentimento de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
pertencimento que alimentam. A amizade foi o item que mereceu o maior
percentual: 25,9%; a segunda predileção foi o rio com 22,4%; os festejos
ocuparam o terceiro lugar com 21,9%; a tranqüilidade do lugar, apesar dos
forasteiros, foi eleita em quarto lugar com 15,2%; destacaram a igreja em quinto
lugar com 10,3%, e a terra para plantar foi pontuda apenas, pelo grupo de
respondente adulto com 12,9%.
Posicionamento dos grupos de jovens e adultos sobre o que é capaz de unir
os mucambenses:
Assim, no momento do falecimento de alguém, as pessoas se juntam
pra dar solidariedade, porque acaba sendo sempre alguém da família.
(MONRÓVIA).
Acho que une a gente é a hora que morre alguém, aí todo mundo
esquece as desavença e procura ajudá. (MASERO).
Eu acho que o que une aqui e a dificuldade, pode até tá brigado, que
desavença sempre tem mesmo, mas quando alguém tá na dificuldade
aí se precisar, ajunta todo mundo pra ajudá porque aqui acaba sendo
sempre alguém da família. (BOTSWANA).
Nas falas deste bloco fica patente que as dificuldades enfrentadas pela
comunidade se constituem no elo entre os seus componentes. A soma das médias
das falas se referindo às dificuldades como fator de união ultrapassou a casa dos
90%.
CONSIDERAÇÕES E SINALIZAÇÕES
Com a realização da pesquisa é possível afirmar que o Mucambo embora
pareça uma comunidade de organização simples, ao primeiro olhar, carrega uma
complexa e contraditória história com toda a singularidade que lhe é peculiar.
Pode-se afirmar que não necessita que defendam a sua condição de “comunidade
negra rural” ou quilombola, pois ela mesma, a seu modo, assim se constitui. Se,
em várias oportunidades, dá a impressão de negar essa identidade, em tantas
outras se percebe que a (re)afirma. O que as suas palavras por vezes desdizem, as
suas práticas cotidianas falam. Por isso, só através do perscrutar mais aguçado das
[Type text]
[Type text]
[Type text]
ações e relações com que constituem seu processo civilizatório é que se pode
aproximar do entendimento da trama de sustentação da sua tessitura identitária.
Dessa forma, tenho consciência que os resultados apresentados pelo trabalho são
fruto de uma aproximação que fiz do que me foi possível interpretar.
Em resposta aos vários questionamentos se o Mucambo de Baixo se
constitui mesmo uma comunidade quilombola e até aos que rechaçam tal
possibilidade a partir de ideias preconcebidas pode-se afirmar, mas afinal, o que
sustenta o Mucambo como comunidade de quilombo, se comparado com outras
comunidades assim identificadas e reconhecidas? Se o marco teórico for a
etnografia contemporânea elaborada por estudiosos dessa temática, como por
exemplo: Messeder, (1991); Reis, (1996ª); Reis, (1996b); Reis, (1999); Silva,
(1988); Silva, 2000); Price, (2000); Funari (1996); Arruti, (1997), entre outros,
logo se compreenderá que a diferença se localiza apenas nas suas trajetórias de
constituições e nas organizações de seus processos civilizatórios.
Nessa perspectiva, o que é relevante ser considerado, no contexto da
comunidade do Mucambo, são os instrumentais sócio-culturais que foram capazes
de elaborar e lançar mão, em cada momento, para o enfrentamento e a
convivência da e com a sua realidade histórica endógena e exógena. Para isso, o
primeiro passo para se compreender a tessitura da sua constituição é o
conhecimento do contexto micro e macro em que esteve e está inserido.
A pesquisa indicou que ainda na segunda metade do século XIX, oriundos
das Lavras de Diamante da Chapada Diamantina, localizadas nas proximidades de
Macaúbas, integrantes de três troncos familiares, dois negros - Catula e Mandu e
um branco, o Vieira deslocaram-se rumo ao Oeste da Bahia e fundaram o povoado
do Mucambo. Possivelmente, o patriarca do grupo branco, coronel Vieira, tenha
sido um dos primeiros a se deslocar, ainda nos estertores do período escravista.
Ele teria se instalado às margens do Rio Grande e passou a organizar, ali, uma
forma particular de escravização estruturada nos moldes do acoitamento. A partir
daí, passou a explorar os(as) negros(as) vindos ou trazidos(as) da Chapada
Diamantina.
Desde então, foi travada uma luta entre negros e brancos, aqueles pela sua
plena liberdade e esses para coibi-la. Em busca de atingirem os seus objetivos de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
plena liberdade, os(as) moradores do Mucambo de Baixo passaram a se organizar
também em busca da aquisição de terras, pois desde cedo sabiam da importância
de possuí-las para o sustento de suas famílias. Também, logo compreenderam que
o “contrato” sob o qual estavam submetidos com os que se apregoavam
proprietários das terras e, de certa forma, deles próprios, lhes era adverso,
minados que eram pelo compadrio e pelo poder do coronelismo reinante na região
e particularmente naquele lugar. Por isso, trataram de empreender algumas
estratégias que pudessem assegurar a sobrevivência do grupo. Tudo leva a crer
que empreenderam uma estratégia de negociar e pressionar. Assim, com a
efetivação de difíceis economias adquiridas à custa de duras e longas jornadas de
trabalho, foram paulatinamente amealhando pequenos lotes de conotação
interfamiliar, impossibilitados que estavam de se organizarem para a produção
comunitária. Capitaneados pela amizade e o companheirismo, organizavam-se em
mutirões para plantar, colher e construir suas moradias.
Concomitante a isso, da forma que lhes foi possível, buscaram o
fortalecimento do grupo e a sua demarcação étnico-racial. Pode-se pensar que foi
dessa maneira, por exemplo, que se apropriaram de importantes expressões
culturais, como o reisado ou o Santo Reis, dominaram a técnica do fabrico de
instrumentos musicais para cultivá-lo de maneira própria e independente. Nessa
dinâmica de negociação e pressão é que conseguiram lograr a instalação de
importantes órgãos públicos nos seus domínios territoriais, como a igreja católica,
a escola e o posto de saúde.
Chegado o término formal da escravização, aprofundaram a política de
rompimento e aproximação historicamente praticada com o fazendeiro,
conquistando-lhe, finalmente, algumas porções de terras na margem esquerda do
Rio Grande, juntaram-nas com outras pequenas parcelas que já haviam de uma ou
de outra forma adquirido ou conquistado, e as vêm cultivando até a atualidade.
A valorização imobiliária, proporcionada pela construção do asfalto ligando
São Desidério a Barreiras, juntamente com a expansão da fronteira agrícola
efetivada pelo agronegócio, bem como a busca por espaços de lazer gerou certo
nível de intrusão de pessoas estranhas à comunidade. Essa intrusão forjou uma
visão de mundo pautada na mercantilização das terras. Com isso, essas pessoas
[Type text]
[Type text]
[Type text]
vão cada vez mais se apropriando de espaços vitais aos mucambenses, o que lhes
causa certa desterritorialização.
É visível que o principal elemento de sustentação identitária da comunidade
é a territorialidade, entendida no contexto da noção de multiterritorialidade
proposta por Haesbaert (2007), englobando os aspectos materiais e simbólicos.
Essa multiterritorialidade é materializada pela comunidade principalmente na
prática da amizade, sustentáculo na alegria e na dor, na união do grupo na hora de
enterrar os seus mortos, no apego à sua territorialidade simbolizada sobretudo nas
riquezas naturais que o compõe, como o rio, por exemplo, assim como no robusto
envolvimento com a religiosidade e as festividades.
Nesse sentido eles(as) têm sabido e conseguido reelaborar e ressignificar
expressões étnico-culturais dando-lhes um sentido próprio, como é o caso do
festejo religioso do Sagrado Coração de Maria, uma manifestação eminentemente
religiosa trazida de Goiás à qual deram contornos mais festivos. Introduziram-lhe
o samba de roda e uma divertida disputa entre solteiros(as), casados(as) e
viúvos(as) por intermédio da queima de fogos. Vence a disputa quem tiver o maior
poder de “fogo”. Os próprios festejos religiosos do Reisado e do Divino ganharam
na comunidade contornos próprios e novos sentidos. O festejo junino, tradicional
na região, no Mucambo tem a “cara” da comunidade, cujas quadrilhas são
marcadas com enredos da cultura local, além de nele se inserirem com
entusiasmo, desde as crianças até os idosos. Mesmo a Semana da Consciência
Negra, um evento criado a partir da escola para “resgatar” e trabalhar os valores e
as expressões étnico-raciais e culturais negras da e na comunidade vem
incorporando um forte sentido festivo.
Além da desterritorialização anteriormente mencionada, há outros
problemas por eles(as) vivenciados, a discriminação e o preconceito raciais
permeiam as relações no povoado e tem expressiva presença no âmbito escolar
onde é largamente reproduzido. Apesar disso, a escolarização existente a mais de
setenta anos no seio do povoado tem o legado de vir historicamente escolarizando
os(as) mucambenses. Todavia, não tem conseguido fazer uma relação dos seus
saberes/fazeres com a riqueza cultural daquela que é a sua razão de ser, a
comunidade. Também não tem conseguido se contrapor, nem no âmbito escolar, à
[Type text]
[Type text]
[Type text]
prática da discriminação e do preconceito raciais identificados e denunciados
tanto pelo corpo discente quanto pela comunidade.
Ressalvas nesse sentido foi a iniciativa do professor e pedagogo Júlio
Cesar Dias, a partir do ano 2007, na condição de gestor da Escola Dr. Abílio
Farias por dois anos, embora residisse em Barreiras, idealizou e, em uma parceria
da escola com a comunidade, principalmente a juventude, implantou o Projeto
Raízes, que talvez represente a iniciativa mais importante da escola nos últimos
tempos, principalmente pela proposta de fazer dele um instrumento de articulação
escola/comunidade, sobretudo no que tange a valorização da étno-cultura
mucambense e, também, pela adesão do(as) mucambenses a ele. Contudo, parece
que a escola ainda não se apercebeu da dimensão da sua potencialidade, pois não
tem conseguido concretamente efetivá-lo nem como um eixo temático do seu
fazer didático pedagógico. Além disso, o projeto vem perdendo fôlego até mesmo
como um evento da comunidade. Hoje, tem sido mais uma espécie de vitrine, de
troféu para ser exibido do que um instrumento político pedagógico da instituição.
Inclusive, em 2010, teve uma pífia realização. Serviu mais para propaganda
político partidária do que para o fim que se destina, ou seja, discutir a étno-cultura
da comunidade. O Projeto Raízes está tão distante dos seus propósitos ou do que
se apregoa sobre ele na escola que, durante o transcorrer da pesquisa, procurei por
diversas vezes analisá-lo, porém a escola sempre alegou que o estavam
reelaborando. Assim, conclui o estudo sem que ele me fosse disponibilizado.
Percebe-se que no Mucambo, como é próprio de todo grupo étnico, não
idealizado, mas de carne e osso, existem várias contradições. Um dos problemas é
a política partidária. Como franca e largamente denunciado pelos(as)
mucambenses, um dos maiores entraves para a organização da comunidade são as
ações enviesadas dos políticos que, em busca de tirar proveitos particulares,
acabam fomentando a dissensão e a divisão, o que contribui para minar as
tentativas de organização. Essas ações são alimentadas externamente, mas
materializadas internamente pelas facções que lhes são filiadas.
Da mesma forma avolumam-se denúncias de que esse mesmo caminho tem
sido trilhado pela associação dos moradores. As acusações apontam que ao invés
de exercer o importante papel de fomentar e encaminhar as várias demandas da
[Type text]
[Type text]
[Type text]
comunidade, incluindo a discussão dos encaminhamentos da sua organização
quilombola, tem servido mais a interesses particulares. Inclusive, os dados
apontam que os encaminhamentos para obtenção da certificação de
autorreconhecimento de comunidade “remanescente de quilombo”, pela Fundação
Cultural Palmares, foi pautada por essa perspectiva. Ou seja, seus trâmites
trilharam caminhos totalmente equivocados, pois os seus passos não foram
discutidos com a comunidade, pelo contrário, apesar de terem sido efetivados pela
cúpula da associação da época, foram à revelia dos moradores(as). Conclusão, a
posse da mencionada certificação, ao invés de ter contribuído para a união do
grupo em torno dela, tem conseguido estimular um clima de desconfiança,
desconforto e até de rejeição.
No contexto macro, percebe-se que os(as) mucambenses vivem
historicamente uma situação de gueto, pois convivem com o cerceamento do
direito de usufruir dos bens naturais e culturais dos seus domínios. Desde criança,
cotidianamente, rondam-lhes a discriminação e o preconceito raciais que
permeiam as relações no povoado como um todo. Já, na escola, são obrigados(as)
a conviver diariamente com insultos de seus(as) colegas e até de professores,
embora estes, de maneira isolada e mais focada no passado. É perceptível que a
invasão dos forasteiros ocupa os espaços, reprime a liberdade e faz recuar as
fronteiras geográficas, de lazer e mesmo as da convivência étnico-culturais,
afetando, dessa forma, todas as faixas etárias com danos imprevisíveis também
para as futuras gerações.
Nesse particular, ganham sentido os conteúdos de algumas falas sobre a
desterritorialização que lhes vêm impactando: na discriminação e no preconceito
raciais existentes no seio da escola como na denúncia, por exemplo, de que se é
obrigado(a) a sofrê-los calado(a) para não correr o risco de ser expulso(a) da
escola ou no contexto do povoado conforme largamente discutido no corpo deste
trabalho. No conteúdo da afirmação que os idosos se recusam a falar da sua
história para não reviverem dores remotas, ou para pouparem aos mais jovens de
conhecê-las e sofrê-las mesmo que indiretamente. No lamento do fato das pessoas
sentirem vergonha de se identificarem com seus antepassados, marcadas que são
pelos estigmas proporcionados por estereótipos. Ou, ainda, no depoimento sobre a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
dificuldade da identificação com a negritude por conta da existência do racismo
no povoado. Na revolta de só poderem desfrutar do rio durante a semana, porque
nos seus finais ele é invadido por forasteiros, com práticas e exemplos danosos
para as crianças e a juventude local. Ou mesmo presente na indignação com o fato
de as suas terras, às margens do Rio Grande, estarem sendo transformadas em
chácaras particulares, com altos muros e até instalações de câmeras filmadoras,
cerceando-os até do direito de ir e vir, no seio da sua própria comunidade.
É visível que toda essa problemática tem contribuído para alimentar o
conflito identitário no seio da comunidade. Nesse contexto de tantas contradições,
ganham relevância as suas manifestações festivo-religiosas, que bem podem
representar a necessidade e a capacidade da elaboração de uma identidade própria.
A realidade vivida pelos(as) mucambenses sinaliza para o não alinhamento com
uma identidade negra e quilombola idealizada, pois o que se percebe é que
cultivam um perfil identitário próprio. Nessa direção, o seu norte balizador e
universalizante é a negritude. Pois é por seu intermédio que são distinguidos e
também se distinguem. Porém, cultivam à sua identidade a sua maneira, ou seja,
se produzem identificados(as) com a africanidade por ocasião da realização da
Semana da Consciência Negra, ou dos eventos festivos religiosos voltados para a
própria comunidade, ou estilizados de acordo com a estética e a moda socialmente
referenciada pela sociedade, como nos eventos que tenham a participações de
pessoas externas.
Sem querer cair em um relativismo étnico-racial, olhada por esse ângulo, tal
possibilidade leva a algumas reflexões sobre o que é, na realidade, ser uma
comunidade negra, e quilombola. O que é ter identidade negra? Existe
estruturalmente, essencialmente uma identidade negra? Além do que, a riqueza da
diversidade de organização do povo negro é o reflexo da sua capacidade, não só
de fazer frente às inúmeras dificuldades que vem historicamente enfrentado, mas
principalmente da capacidade de defender e firmar a sua humanidade. Por outro
lado, o dado irrefutável é que os mucambenses são parte desse povo e, como tal,
ao seu modo, com as suas contradições, tem conseguido forjar, cultivar e
ressignificar o seu particular perfil quilombola, as suas tradições étnico-culturais,
enfim, o seu próprio processo civilizatório.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
É possível afirmar que os moradores do Mucambo são ciosos(as) da sua
territorialidade com particular identificação com as suas singularidades naturais,
éticas, estéticas e sociais, identificadas nas belezas do rio, por exemplo, e
explicitadas na solidariedade do convívio comunitário ou sentidas nas expressões
e práticas étnico-culturais. Percebe-se que são elementos constitutivos de suas
identidades, por exemplo, o contentamento por viverem em comunidade, apesar
de todas as desavenças, percalços e contradições. A preocupação em coibir não
deixando aflorar doloridas verdades do passado, principalmente na tentativa de
preservar do sofrimento os mais jovens. A contagiante alegria e fervorosa fé nas
suas realizações e cultuações festivo-religiosas. A certeza de que acima das
dificuldades e dos desencontros imperam a cooperação e a solidariedade. A
emoção expressada no sentimento de pertencimento à territorialidade ao afirmar
ser bom morar ali, pois na hora das dificuldades todos se unem para ajudar. A
tristeza e a felicidade exteriorizadas ao se referirem à beleza do lugar, sempre
destacando o Rio Grande como a principal. Enfim, apesar de toda a insegurança, a
sensação de tranquilidade que transmitem em saber que estão entre família. Essa
foi a tessitura identificada na pesquisa e interpretada como elemento de
sustentação identitária da comunidade.
REFERÊNCIAS
ARRUTI, José Maurício Andion. A emergência dos “remanescentes”: notas para o diálogo entre
indígenas e quilombolas. Mana. p. 07-38. 1997. Disponível em
www.scielo.br/pdf/mana/v3n2/2439.pdf - acessado em 27/10/2010.
BANDERIRA, Maria de Lourdes. Território negro em espaço branco. Estudo Antropológico de
Vila Bela. São Paulo. Brasiliense, 1988.
BRASIL, Ministério da Educação, Conselho Nacional de Educação. Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana. Parecer n. 003/2004, CNE. Brasília – DF, 2005.
CÂMARA DE VEREADORES. LEI n. 676/2005. Barreiras. Anais. Disponível em
www.camarabarreiras.ba.gov.br Acessado em 17/03/2011.
CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar: racismo, preconceito e
discriminação na educação infantil. São Paulo. Contexto, 2000.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
FUNARI, Pedro Paulo de Abreu. A arqueologia de Palmares – sua contribuição para o
conhecimento da história da cultura afro-americana. Liberdade por um fio : história dos
quilombos no Brasil. (Org.). REIS, João José; GOMES, Flávio Santos. São Paulo : Companhia das
Letras,1996.
GOFFMAN, Erving. Estigma: Notas sobre a Manipulação da Identidade Deteriorada. 4ª ed.
Tradução de NUNES, Maria Bandeira de Mello Leite. Rio de Janeiro: LTC, 1988.
GUSMÃO, Neusa Maria Mendes de. Terra de Pretos Terra de Mulheres. Terra mulher e raça num
bairro rural negro. São Paulo. Brasil. Ministério da Cultura, 1995.
HAESBAERT, Rogério da Costa. O Mito da Desterritorialização: “fim dos territórios” à
multiterritorialidade. 3ª ed. Rio de Janeiro. Bertrand Brasil, 2007.
MESSEDER, Marcos Luciano Lopes e MARTINS Marcos Antonio Matos. Arraias de Rio de
Contas: uma comunidade de cor. Cadernos CRH. Série Contos e Toques – Etnografias do Espaço
Negro na Bahia. Suplemento. Salvador : Fator. 1991.
PÁDUA, Karla Cunha; SILVA, Amorim Santusa. Quilombos da Bahia. Presença Pedagógica. v.
13. n. 73. jan./fev. 2007.
POUTIGNAT, Philippe. Teorias da etnicidade.seguido de Grupos étnicos e suas fronteiras de
Fredrik Barth / Philippe Poutignat, Jocelyne Streiff-Fenart. Tradução de Elcio Fernandes. São
Paulo. UNESP, 1998.
PRICE, Richard. Reinventando a história dos quilombos: rasuras e confabulações. Centro de
Estudos Afro-Orientais. ed. n. 23. Universidade Federal da Bahia. Salvador Bahia. 2000.
REIS, Elis; ALMEIDA, Maria Hermínia Tavares; FRY, Peter. (Org.). Política e Cultura. Visões do
Passado e Perspectivas Contemporâneas. São Paulo. ANPOCS. HUCITEC, 1996.
REIS, João José; SILVA, Eduardo. Negociação e conflito: a resistência negra no Brasil escravista.
Companhia das Letras. São Paulo, 1999.
REIS, João José. Escravos e coiteiros no quilombo do Oitizeiro. Bahia. 1806. Liberdade por um
fio : história dos quilombos no Brasil. (Orgs.). REIS, João José; GOMES Flávio dos Santos.
Companhia das Letras. São Paulo 1996.
REIS, João José. Palmares como poderia ter sido. Liberdade por um fio : história dos quilombos
no Brasil. (Orgs.). REIS, João José; GOMES Flávio dos Santos. Companhia das Letras. São Paulo
1996.
SILVA, Alberto da Costa e. A manilha e o libambo: África e a escravidão, de 1500 a 1700. Rio de
Janeiro. Nova fronteira, 2002.
SILVA, Valdélio Santos. Do Mucambo do Pau Preto à Rio das Rãs - liberdade e escravidão na
construção da identidade negra de um quilombo contemporâneo. Dissertação de
Mestrado.Universidade Federal da Bahia, UFBA, 1998.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
SILVA, Valdélio Santos. Rio das Rãs à luz de noção de quilombo. ed. n. 23: in REIS, João José;
SILVEIRA, Renato da. Afro-Ásia. Centro de Estudos Afro-Orientais. CEAO. Universidade
Federal da Bahia. Salvador Bahia. 2000.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
O ESCOLAR SURDO E SUAS DIMENSÕES CONSTITUTIVAS:
A ESCUTA MUSICOTERAPÊUTICA COMO INTEGRAÇÃO
Marcus Vinicius Alves Galvão
Escola de Música e Artes Cênicas – UFG
Profª Drª Sandra Rocha do Nascimento (Orientadora)
Escola de Música e Artes Cênicas – UFG
Soraya Bianca Reis Duarte
[email protected]
RESUMO
Este trabalho apresenta resultados de uma pesquisa bibliográfica sobre o sujeito surdo que
vivencia o processo inclusivo educacional. Teve como objetivo ampliar a compreensão sobre o
sujeito surdo e suas diversas dimensões constitutivas, a partir de uma escuta musicoterapêutica
direcionada à promoção da saúde do escolar surdo. Como procedimentos metodológicos foram
coletados dados em diversos estudos ligados às áreas da Educação, Educação Inclusiva,
Musicoterapia, Psicologia, Saúde do Surdo e no programa da Promoção da saúde do escolar/MECBrasil. Como resultados, verificou-se que os diversos estudos sobre a inclusão do surdo ainda
apresentam as dimensões constitutivas dos sujeitos surdos de forma fragmentada, dando ênfase na
dimensão biológica, médica e reabilitadora, verificada em várias especialidades terapêuticas entre
elas a atuação da musicoterapia. Centra-se na adaptação do surdo na cultura dos ouvintes e na
comunicação oralista, pouco considerando a cultura surda e suas especificidades. O processo de
inclusão aos surdos não abrange temáticas da promoção da saúde posta pelos mecanismos
governamentais, mantendo-os a parte dos processos de promoção da saúde e prevenção.
Apontando elementos da Musicoterapia numa perspectiva preventiva e psicossocial, verificou-se
que esta terapêutica possibilita integrar as diversas dimensões dos sujeitos junto ao processo
educacional inclusivo, considerando a perspectiva de prevenção de vulnerabilidades e promoção
da saúde integral dos indivíduos. Concluiu-se que se faz importante efetivar uma reflexão sobre os
aspectos no que envolvem o sujeito surdo partindo de uma consideração sobre suas dimensões
biopsicosociocognitiva e cultural, possibilitando favorecer e ampliar as propostas da inclusão
escolar e social desses sujeitos. A Musicoterapia, integrando o surdo escutando suas necessidade,
proporcionará momentos que o farão refletir sobre as suas escolhas e se as mesmas o resultará em
uma vida mais saudável.
Palavras-chave: musicoterapia; promoção da saúde do escolar; surdo.
INTRODUÇÃO
O ser humano, diferente de outros seres vivos, é constituído por várias
dimensões sendo elas: biológica, psicológica, social, cultural e a cognitiva.
Dimensões estas que são complexas. Em pessoas portadoras de alguma
[Type text]
[Type text]
[Type text]
deficiência estas dimensões são reduzidas a parte que lhes não é perfeita, no caso
de nosso estudo o Surdo a audição, ou melhor, a falta dela.
EU-SURDO: AS DIMENSÕES BIOPSICOCOGNITIVA
No surdo a dimensão biológica é percebida apenas considerando a sua
surdez, e esta é definida como a perda ou a diminuição considerável no sentido da
audição, podendo ser classificada quanto à origem, grau, e idade.
Para serem avaliados os limiares auditivos utiliza-se a audiometria tonal,
tanto por via aérea quanto por via óssea, possibilitando assim, a determinação do
grau, do tipo da perda auditiva e a configuração audiométrica, ou seja, se a perda é
simétrica (igual nas duas orelhas), se é bilateral ou unilateral (GAMA, 2001). De
acordo com Gama (2001) na avaliação por via aérea é possível identificar os
limiares para as freqüências de 250 a 8000 Hz, em caso de diferença acentuada
entre os limiares obtidos de frequências próximas pesquisamos os limiares
auditivos de freqüências intermediárias (750Hz e 1500Hz), que poderá ajudar na
adaptação do AASIs (Aparelho de Amplificação Sonora Individual). Após serem
identificados os limiares iguais ou maiores que 25dBNA, deve-se realizar por via
óssea qual utiliza da freqüência 500 a 4000Hz, determinando assim o local da
alteração, que pode ser na orelha externa, media ou interna. Podendo assim,
determinar os diferentes tipos de perda auditiva ― pode ser leve, moderado,
severo e profundo; com relação à idade de instalação ― distingue-se as pré-natais,
as perinatais e as pós-natais (pré-linguísticas e pós-linguísticas) (OLIVEIRA E
CRUZ, 2006).
Ao se pensar nesta deficiência sensorial e suas demandas especializadas,
Santana (2007, p. 13) afirma que o “tema surdez trás uma variedade de aspectos
tais como: ordem médica (implante coclear), linguística (se aprenderá língua de
sinais ou se será oralizado), ordem educacional (abordagem específica para o
surdo), terapeutica (fonoaudiologia), de ordem social (dificuldade de interação
com o ouvinte)”.
Boothroud (1982 apud COSTA; OLIVEIRA; CRUZ, 2006, p. 79), reforça
os aspectos citados por Santana (2007) e os enumera como geradores de
consequências, no desenvolvimento de crianças com deficiência auditiva, tais
como:1) problemas perceptuais: 2) problemas de fala; 3) problemas de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
comunicação; 4) problemas cognitivos; 5) problemas sociais; 6) problema
emocional; 7) problema educacional; 8) problema intelectual; 10) problemas dos
pais.
Considerando estes aspectos biológicos e suas influências, observamos
outra dimensão do EU-SURDO30, a dimensão psicológica. Na dimensão
psicológica, não se diferenciando do sujeito ouvinte, o EU-SURDO tem
dificuldade de lidar com suas emoções e sentimentos. De acordo com Costa,
Oliveira e Cruz (2006), a criança surda, pela incapacidade de comunicação, tornase introvertida e psicologicamente instável e acaba se isolando do mundo que a
rodeia. Segundo Gonçalves (s/d):
(...) poucos se dão conta da dimensão do sofrimento psicológico e moral do
surdo. A falta de comunicação, o isolamento, faz do surdo um ser dependente do
ouvinte, ainda que tenham conseguido avançar em sua educação e
desenvolvimento cognitivo. Essa dependência reduz sua auto-estima, produzindo
conflitos que muitas vezes são interpretados como comportamento típico do
surdo, como: agressividade, intolerância, individualismo e incapacidade
intelectual. (disponível em: <http://editora-arara-azul.com.br/novoeaa/revista/?
p=962>)
Quanto ao aspecto cognitivo, há várias teorias sobre a aprendizagem, quer
seja direcionadas a pessoas com deficiência ou não. Segundo a teoria cognitivista,
a aprendizagem é um processo de relação do sujeito com o mundo externo e esta
tem consequência no plano da organização interna.
Diversos estudos (BOCK, FURTADO e TEIXEIRA, 2002; GOLDFELD,
2002; PEDRIVA e TRISTÃO, 2006; BARBIZET e DUIZABO, 1985 apud
SANTANA, 2007) afirmam sobre a importância da linguagem no
desenvolvimento cognitivo e que este se dá por meio de interações. Pedriva e
Tristão (2006) afirmam que, a aprendizagem se dá por meio de experiências e
interações e estas são acompanhadas por mudanças; estão sempre em
30
A utilização dos pronomes EU-TU e EU-ISSO foi proposto por Martin Buber, teórico da
Fenomenologia, que utilizou destes pronomes para se referir às relações entre seres humanos. Para
o autor, o EU-TU refere-se a um relacionamento existencial, de humanização, e o EU-ISSO, é um
relacionamento epistemológico e utilitário. Ambas as relações são necessárias para
compreendermos a importância das relações humanas (MALAGUTH, s/d). Neste trabalho
utilizamos dos pronomes para se referir as dimensões e relações do surdo.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
desenvolvimento. Não é trabalho de um único módulo neural, mas ocorre
conjuntamente em uma grande estrutura.
No EU-SURDO o desenvolvimento cognitivo acontece com a aquisição da
linguagem, que embora seja diferente da criança ouvinte acontece com a mesma
importância. A diferença se apresenta devido ao EU-SURDO não ter contato com
uma língua estruturada, ficando a qualidade e a quantidade de informações
internalizadas de menor incidência e constituída por outras formas comunicativas
como a Língua de Sinais (QUADROS,2004).
Vista a aprendizagem de uma forma diferente da biofisiológica, Silva e
Pereira (2003) trazem a aprendizagem do EU-SURDO através de uma concepção
sócio-antropológica, pois constituem seu conhecimento de mundo a partir do
canal visio-gestual, adquirindo assim a língua de sinais facilmente e
consequentemente o desenvolvimento cognitivo, socio-emocional e lingüístico.
Contradito por Santana (2007), a linguagem se faz a partir das interações e
cumpre um papel importantíssimo, pois além de possibilitar / mediar funções
cognitivas, ela favorece com que o EU-SURDO tenha uma rotina social,
possibilitando assim uma formação simbólica, cognitiva e significativa
constituída a partir do visual.
Partindo para tal dimensão, Ribeiro (1999) afirma que ―o campo
psicológico é maior que a percepção que o indivíduo possa ter dele, pois o campo
se compõe das variáveis psicológicas, das não-psicológicas, como das biológicas,
das sociais, que podem incidir direta ou indiretamente no comportamento do
indivíduo (p.70).
EU-TU: A FAMÍLIA E AS PRIMEIRAS RELAÇÕES
A família é a primeira representação da sociedade em que o EU-SURDO
desenvolverá seus processos de identificação, construindo sua identidade pessoal
e cultural. A família possui um papel importantíssimo no desenvolvimento e
construção de funções psíquicas do seu filho, seja ele surdo ou não. Assim,
consideramos a dimensão social do EU-SURDO. Nesse sentido, Schaffer (1984
apud BRITO E DESSEN, 1999) afirma:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
o desenvolvimento da criança recém-nascida é um empreendimento conjunto
entre a criança e o adulto que dela cuida; o progresso no seu desenvolvimento
não é uma questão de acréscimos, mas sim de reorganizações seqüenciais que
periodicamente ocorrem na vida mental da criança; são as interações e as
relações com as pessoas e os sistemas sociais que têm um papel crucial para as
suas aquisições e para a construção de formações psicológicas cada vez mais
sofisticadas. Portanto, segundo essa autora, para compreender o desenvolvimento
da criança deve-se estudar o que acontece entre pessoas e não somente o que
acontece com os indivíduos tomados como unidades isoladas (p. 02).
Além das funções psíquicas, vale ressaltar aos pais ou pessoas cuidadoras
do EU-SURDO, que podem proporcionar ou não o desenvolvimento da(s)
linguagem(ens) do sujeito, visto que com a não aquisição ou aquisição tardia da
mesma (a linguagem), poderão ser instalados problemas de cunho emocional,
social e cognitivo.
De acordo com Marchesi (1996 apud GOLDFILD, 2002), a linguagem
abrange, além da função comunicativa também a função de organização de
pensamento, assumindo um papel essencial para o desenvolvimento cognitivo,
pois o adulto desempenha o papel principal, sendo o maior responsável pela
sintonia estabelecida com a criança e por facilitar as trocas comunicativas entre
ambos. Por exemplo, em se tratando do processo de aquisição da linguagem, a
adequação mútua nas "conversações"
As relações EU-TU, estabelecidas junto ao sujeito EU-SURDO, são as
mais variadas. Em trabalhos psicoterapêuticos com o EU-SURDO, Solé (2005
p.38) trás que o luto dos genitores refletem no filho levando o surdo a
―questionar a sua origem da surdez, a responsabilidade e a culpa, acusando os
pais por esta diferença.
Após a aceitação da condição do filho os genitores passam, ou deveriam
passar, por adaptações, que na maioria das vezes a mãe enfrenta sozinha,
causando assim um frequente aumento do nível de stress na mesma. Como uma
das formas de enfrentamento das especificidades das relações do EU-SURDO, os
pais tendem a se afastar do sofrimento diminuindo o seu contato com a família,
afirmam Lamb & Billings (1996 apud BRITO e DESSEN, 1999).
Brito e Dessen (1999, p.4) citam como exemplo o fato de que ―pais de
crianças surdas sentem-se constrangidos em participar de atividades sociais junto
[Type text]
[Type text]
[Type text]
com seus filhos, por acreditarem que o barulho causado por eles, principalmente
em supermercados e transportes coletivos, incomoda as outras pessoas.
Expostos às frustrações ou omissão dos pais, o EU-SURDO ainda enfrenta
barreiras quando filho de pais ouvintes. Estes, quando não informados das
possibilidades dos filhos surdos, não valorizam a LIBRAS e a cultura surda.
Procuram, assim, tardiamente aprender a LIBRAS, em geral quando esgotam as
possibilidades de oralizar os filhos, ocasionando demora à procura de tratamentos;
gerando consequências na criança, que se sente isolada no mundo dos ouvintes.
EU- ELES: O GRUPO SOCIAL
Denominamos a dimensão cultural relações sociais estabelecidas em
outros contextos externos à família, como a construção da identidade e a cultura
do sujeito surdo.
Apresentamos o conceito de identidade cultural, de Perlin (1998, p. 53),
que diz ser um ―conjunto de características que definem um grupo e que incidem
na construção do sujeito, sejam elas as que identificam ou as que excluem.
De acordo com Queiroz e Gonçalves (2010, p.25), o grupo ou grupo social
é um ―sistema de relações sociais, de interações recorrentes entre pessoas que
compartilham certas particularidades.
Cromack (2004, p.70) afirma que estas ―relações são dinâmicas e tem
como intermédio pressupostos identitários e interpsíquicos, tais como: as
experiências sociais e modos de comunicação. Ele reforça que ―somos seres
sociais e, por isso, precisamos identificar-nos com uma comunidade, precisamos
de uma identidade cultural e, para isso, não basta uma língua e uma forma de
alfabetização, mas, sim, um conjunto de crenças, conhecimentos comuns a todos.
Partido deste conceito, a cultura surda configura-se a partir da percepção
do EU-SURDO sobre o mundo, a fim de compreender as mudanças ao ponto de
torná-lo acessível e habitável. Strobel (2008b, p.22) afirma que a cultura surda
contribui ―ajustando-os com as suas percepções visuais, que contribuem para a
definição das identidades surdas e das ―almas das comunidades surdas. Isto
[Type text]
[Type text]
[Type text]
significa que abrange a língua, as idéias, as crenças, os costumes e os hábitos de
povo surdo".
No senso comum, a Cultura Surda se dá a partir da identificação com a sua
deficiência. Quadros (2004), discorre que ela apresenta múltiplas faces, mas com
características que são específicas, visto que elas são de outra ordem, uma ordem
com base visual e por isso têm características que podem ser ininteligíveis aos
ouvintes. Ela se manifesta mediante a coletividade que se constitui a partir dos
próprios surdos (p.86)
Quando se agrupam, os sujeitos surdos formam uma cultura, podendo
assim expressar-se de forma livre, sem se preocupar se está sendo entendido ou se
o outro entende a sua língua e produção artística (STROBEL, 2008a).
Dentre os espaços sociais à construção de identidade cultural das pessoas
encontramos a escola. Por muito tempo as escolas representavam um espaço, nas
quais os alunos surdos não eram aceitos e muito menos a sua língua poderia ser
utilizada. Suas produções artísticas não tinham nenhum valor. A partir de então, os
surdos, com seus movimentos de resistência a exclusão, criaram espaços nos quais
eles comandavam, sendo proibida a presença de ouvintes no corpo administrativo,
podendo assim constituir suas próprias regras e estabelecerem suas fronteiras
(QUADROS, 2003).
De acordo com Quadros (2004), a entrada do aluno surdo na rede de
ensino regular caracteriza uma forma de submissão/opressão por parte desse ao
processo educacional ouvinte, sustentando as seguintes características, tais como:
A pessoa surda enquanto parte da cultura surda é descoberta fora da escola
(quando isso acontece). Assim, os alunos surdos são constantemente expostos ao
fracasso tendo como causa a sua própria condição (não ouvir) e não as condições
reproduzidas pelo sistema. A conseqüência dessa tentativa de homogeneização é
o fracasso, não só acadêmico, mas na formação de pessoas com problemas sérios
de ordem pessoal, social, cultural e política. Até a sanidade mental desses alunos
é colocada em risco, uma vez que, a formação da identidade é constituída com
base em modelos completamente equivocados (p.87).
A partir de tais movimentos efetivados pelos surdos, em prol de sua
cultura/língua, sendo reforçada pelo reconhecimento da Lei 10.436 de 2002,
obrigando a inclusão da sua língua nos espaços sociais, não só ao sujeito surdo,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
mas a todos os portadores de alguma deficiência tornando assim visíveis a
sociedade.
O Programa de Saúde do Escolar (PSE) teve início no Brasil em 2007,
instituído por Decreto Presidencial nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, resulta do
trabalho integrado entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação, na
perspectiva de ampliar as ações específicas de saúde aos alunos da rede pública de
ensino: Ensino Fundamental, Ensino Médio, Rede Federal de Educação
Profissional e Tecnológica, Educação de Jovens e Adultos (BRASIL, 2008a). Seus
principais objetivos são:
I – Promover a saúde e a cultura de paz, reforçando a prevenção de agravos à
saúde; II – Articular as ações da rede pública de saúde com as ações da rede
pública de Educação Básica, de forma a ampliar o alcance e o impacto de suas
ações relativas aos estudantes e suas famílias, otimizando a utilização dos
espaços, equipamentos e recursos disponíveis; III – Contribuir para a
constituição de condições para a formação integral de educandos; IV –
Contribuir para a construção de sistema de atenção social, com foco na
promoção da cidadania e nos direitos humanos; V –Fortalecer o enfrentamento
das vulnerabilidades, no campo da saúde, que possam comprometer o pleno
desenvolvimento escolar;(BRASIL,2009 p.12).
Desta forma, as estratégias do PSE objetivam dar visibilidade aos fatores
que colocam a saúde em risco e desenvolver ações tais como oficinas com
diversas atividades direcionadas para os escolares e a comunidade escolar com
vistas a superar os problemas e as adversidades identificados e vivenciados pela
comunidade. Estas são as propostas de ações em saúde dentro do contexto
educacional. Qual o publico alvo do PSE? Há alguma ação específica que abarque
os alunos que estão em processo de inclusão? Como estratégias gerais de
operacionalização das ações de Promoção da Saúde Escolar (BRASIL, 2009)
afirma que ―Uma escola inclusiva deverá também considerar ambientes e
equipamentos que permitam acessibilidade e livre trânsito e apoio aos estudantes
com deficiência‖. Mas não especifica nada a respeito dos alunos surdos.
A MUSICOTERAPIA PREVENTIVA PSICOSSOCIAL JUNTO AOS SUJEITOS
SURDOS
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A prática do musicoterapeuta preventivo e musicoterapeuta comunitário,
diferencia-se daquela, devido estar centrada no conceito de saúde positiva, pois
parte da premissa de que muitos dos problemas das pessoas podem ser resolvidos
de uma melhor maneira no âmbito comunitário, quando os cidadãos e os grupos se
reúnem para enfrentar eficazmente um problema que afeta a comunidade se
produz um sentimento de realização, Pelizzari (2005). Podemos citar situações
tais como: problemas de ansiedade e stress; problemas que surgem no contexto
educacional-ocupacional (condutas agressivas, antissociais); problemas que
surgem pelo desajuste psicológico diante de doenças (hospitalizações, traumas,
intervenções cirúrgicas...); problemas que surgem como consequência das crises
vitais e socioeconômicas. Partindo de tais pressupostos a comunidade se torna um
objeto de intervenção para o musicoterapeuta, pois nesta dimensão o sujeito deixa
de ser UM paciente com determinada história, passando a ser um ―sujeito social
(PELLIZARI E RODRIGUEZ, 2005) que demanda uma resposta por parte dos
seus membros. O musicoterapeuta assume uma posição diferente da atuação
clínica tradicional buscando uma nova dimensão em sua atividade, como um
sujeito cultural o qual se verá imersa e desejará transformar, pois está diretamente
ligado à realidade do sujeito.
Mediante estes pressupostos, Pellizzari e Rodriguez (2005) apresentam a
proposta da Musicoterapia Preventiva Psicosocial, em uma união do
musicoterapeuta com a comunidade, buscando soluções, escutando a ―dor social
e potencializando a busca por mecanismos de enfrentamento que favorecem a
participação ativa da comunidade na solução de problemas para gerar uma
adaptação saudável e criativa.
Davis, Gfeller e Thaut (2000, p. 195) afirmam que é possível assumir que
a música seria um meio terapêutico inapropriado para pessoas surdas, já que a
música é considerada uma arte auditiva. Contudo, os autores sustentam que os
surdos podem sim apreciar música se tornando uma forma terapêutica excelente
na medida em que se identifique o tipo de perda auditiva e a forma de
comunicação do mesmo. Para os autores, o grau de perda auditiva determina a
diferença e a percepção das características musicais. Como por exemplo: pessoas
[Type text]
[Type text]
[Type text]
com perda auditiva sensorioneural, frequentemente ouvem as frequências mais
graves, as pulsações rítmicas fortes são mais perceptíveis; em pessoas com perdas
moderadas a leve, possuem um ouvido residual, estes podem desfrutar mais da
música e de seus elementos constitutivos como a harmonia e a melodia.
Galvão, Amui e Zanini (2012, p. 490) afirmam que a música ―pode
possibilitar e facilitar a percepção de alunos surdos, como uma função autorealizadora, contribuindo para a formação do ser.
A musicoterapia vem sendo utilizada como forma de tratamento junto aos
sujeitos surdos. Barcellos (1994) trás a hipótese de que a música e seus elementos
constitutivos é essencial para o tratamento de uma criança surda, contribuindo,
assim, para o desenvolvimento psíquico daquele que perdeu ou nasceu sem a
capacidade de ouvir. E como fonte estimuladora ou contextualizadora se tratando
de implantados cocleares a musicoterapia.
Por mais que haja algumas ações da musicoterapia em prol do sujeito
surdo, estas ainda trabalham na concepção clínico- biológica em prol da
habilitação do mesmo. Expandindo a compreensão da atuação da musicoterapia,
com vistas à promoção da saúde integral do sujeito surdo, valorizando sua cultura
surda e sua língua e o ser-surdo, avançamos para outras propostas do fazer
musicoterapêutico, que objetive uma melhor qualidade de vida e a prevenção de
possíveis intempéries que venham influencia na mesma.
CONCLUSÃO
Vê-se a necessidade da Conscioaceitação, categoria analítica, que se refere
à compreensão sobre o período em que os pais ou outras pessoas devem passar
para que haja a aceitação integral do sujeito independente de sua especificidade.
A não percepção das outras dimensões pode tornar o surdo um ser
vulnerável a várias coisas, tais como: uso de drogas, obesidade, gravidez. O não
tratamento ou a não percepção de tal situação provoca o adoecimento, e isto por
falta de conhecimento dos mesmos. O PSE tem como proposta a promoção da
saúde do escolar e o surdo, como um escolar, devia ser englobado pela ações do
Programa, mas não é o que acontece de forma explícita nos documentos
[Type text]
[Type text]
[Type text]
analisados. A forma de exposição (palestras) dos temas citados desperta pouco
interesse ao aluno surdo.
Pensar musicoterapeuticamente em ações que promovam a re-significação
dos sentimentos da família e dos sujeitos dos contextos de convivência do EUSURDO, poderá favorecer a minimização dos conflitos e a identificação dos
problemas que estão inseridos dentro dos grupos sociais.
Com a musicoterapia preventiva psicossocial, é possível pensarmos que se
a pessoa ampliar a compreensão sobre os aspectos constitutivos do EU-SURDO e
propor ações de promoção da saúde em ambientes, comunitários, e sociais, entre
eles a escola. Partindo do pressuposto que o musicoterapeuta desenvolve ações e
busca soluções em conjunto com a comunidade, verificamos correspondência
entre esta proposta e PSE.
O musicoterapeuta preventivo, que opta em trabalhar na área comunitária e
social, passará por um processo de re-significação de conceitos tanto culturais,
quanto teórico e praxiológico. Finalizando nossa discussão, sustentamos que, ao
discutirmos a fragmentação das dimensões do EU-SURDO, pretende-se
demonstrar a forma que esse sujeito tem sido percebido. Após tal percepção
propomos a saída, ou melhor, a ampliação da escuta para as necessidades desses
sujeitos. A musicoterapia na perspectiva preventiva psicossocial vem para
identificar as necessidades dos alunos surdos, acolhê-lo e integrá-los,
proporcionando momentos que o farão refletir sobre as suas escolhas e se as
mesmas o proporcionarão uma vida mais saudável.
REFERENCIAS
BRASIL. Ministério da Saúde; Ministério da Educação. Programa Saúde na Escola. Brasília:
Editora do Ministério da Saúde, 2008a.
________. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica.
Caderno de atenção básica: saúde na escola. Brasília: Ministério da Saúde, 2009.
BARCELLOS, Lia R. M. Cadernos de Musicoterapia.Vol. 3. Rio de Janeiro: Enelivros, 1994.
COSTA, Sady Selaimen da; OLIVEIRA, Antônio A.; CRUZ, Osvaldo Laercio M.
Otorrinolaringologia - Principios e Prática - 2ª Ed. editora: Artmed. 2006.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
CROMACK, Eliane Mª P. da Costa. Identidade, Cultura Surda e Produção de Subjetividades e
Educação: Atravessamentos e Implicações Sociais. Psicologia Ciência e Profissão, 24 (4), 68-77,
2004.
DAVIS, William B; GFELLER, Kate E.; THAUT. Introducion a la Nueva Musicoterapia: teoria e
pratica. Tradução Melissa Mercadal-Brotons. Barcelona: Editora de musica Boreau. 2000.
GALVÃO, Marcus V. A.; AMUI, Gustavo Araujo; ZANINI, Claudia R. O. Sequência Didática:
uma Proposta de Ensino da Música para Surdos. In: Anais do 8º Simpósio de Cognição e Artes
Musicais. Florianópolis-RS: CEART- UDESC, 2012.v. 1, p. 490-493, 2012.
GAMA, Marcia Regina. Interpretando uma Avaliação Audiológica Básica. In: Resolvendo casos
em Audiologia. Marcia Regina Gama (org.). São Paulo: Summus, 2001.
GONÇALVES, Paulo Cesar da Silva. Atendimento psicológico para surdos. s/d Disponível em :
<http://editora-arara-azul.com.br/novoeaa/revista/?p=962>, acessado em11/05/2012 as 23:02.
GOLDFELD, Marcia. A criança surda: linguagem e cognição numa perspectiva
sociointeracionista. São Paulo:Plexus Editora, 2002.
PELLIZZARI, Patricia. Crear Salud: Aportes de la Musicoterapia Preventiva- Comunitária.
Patricia Pellizzari Editora. Argentina, 2011.
QUADROS, Ronice Muller de. Situando as diferenças implicadas na educação de surdos:
inclusão/exclusão. Ponto de Vista: Revista de Educação e Processos Inclusivos nº 5, UFSC/
UP/CED. Florianópolis, 2003. p. 81-111.
________. O tradutor e intérprete de língua brasileira de sinais e língua portuguesa / Secretaria
de Educação Especial; Programa Nacional de Apoio à Educação de Surdos - Brasília : MEC ;
SEESP, 2004.
SANTANA, Ana Paula. Surdez e Linguagem: aspectos e implicações neurolinguisticas. São Paulo:
Plexus editora,2007.
SOLÉ, Maria Cristina Petrucci. O Sujeito Surdo e a Psicanálise: uma outra via de escuta. Porto
Alegre: Editora UFRGS, 2005.
STROBEL, Karin Lilian. As imagens do outro sobre a cultura surda. Florianópolis. Editora UFSC.
2008a.
STROBEL, Karin Lilian. Surdos: Vestígios Culturais não Registrados na História. Tese de
Doutorado em Educação – UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2008b.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
O FLORESCER DO IPÊ: A DIGNIDADE E CIDADANIA DOS VELHOS
TRANSFORMADA PELA EDUCAÇÃO NO ESTADO DO TOCANTINS
Natália Belo Moreira
Luiz Sinésio Silva Neto
Profa. Dra. Jocyléia Santana dos Santos (Co-Orientadora)
Profa. Dra. Neila Barbosa Osório (Orientadora)
Mestrado em Educação - UFT
[email protected]
RESUMO
Justifica-se o titulo devido aos acadêmicos da UMA (Universidade da Maturidade) consideraremse, como os Ipês Amarelos, que diante de desafios eles crescem e florescem como os ipês. O
objetivo do estudo foi analisar as mudanças de comportamento dos velhos por meio da educação.
É uma pesquisa descritiva, utilizamos o método da História Oral com abordagem qualitativa e as
análises das informações foram feitas fenologicamente. A questão que norteou a pesquisa foi:
Como os acadêmicos perceberam seus projetos de vida depois que ingressaram no Programa
Universidade da Maturidade? Não temos a intenção de resgatar na totalidade a memória destes
velhos. Apresentamos breves entrevistas com três ex-acadêmicos objetivando trazer a
compreensão da importância das transformações proporcionadas através da educação. Na analise
das informações coletados através das entrevistas e suas derivações, observamos que todos se
consideram acadêmicos perenes da UMA, sempre envolvidos com os propósitos e convicções da
missão da Universidade da Maturidade. Nota-se uma satisfação, autoconfiança e realização
pessoal após a conclusão do curso de Educador Político Social do Envelhecimento. O desejo de
continuar ativo no trabalho e nos estudando é uma característica comum aos três casos analisados.
As narrativas nos mostram que a satisfação por ser produtivo e o sentimento de reconhecimento
pelos trabalhos executados atualmente, traz mais sentido a esta jornada do que o salários que é
pago à eles. Deduz-se que o modo como o velho esta presente no mundo é que qualifica seu
existir, sua essência é sua existência. Há influencia diretamente na vida dos seus filhos, netos e
familiares da mesma forma que seus pais influenciaram a eles. A desconstrução destes paradigmas
por parte dos velhos é diretamente relacionados à instituição provedora destas inquietações do
saber, a escola emprestaria a sua medicação para a renovação das estruturas de personalidade que,
sozinhos, os mais velhos não alcançariam. Estes casos de sucesso são exemplos para todas as
gerações, entretanto devemos ressaltar que o caminho da educação no Brasil, principalmente
quando tratamos de educação para velhos, só começou. Há muito que ser realizado para a
população que mais cresce no planeta.
Palavras-chave: história oral; memória de velhos; educação de velhos.
ARANDO O TERRENO
[Type text]
[Type text]
[Type text]
“O senhor já notou que os Ipês florescem no inverno? Sabe por quê?
No inverno é frio e seco. As árvores ficam com medo de morrer. Por
isso produzem flores e ejaculam sementes ao vento. [...] Querem
plantar suas sementes no ventre da mãe-terra.”(Rubens Alves,
1999)
Assim os acadêmicos perenes da UMA (Universidade da Maturidade da
Universidade Federal do Tocantins) gostam de serem lembrados, como os Ipês
Amarelos, que diante de desafios eles crescem e florescem.
Ao passar dos anos é cada vez mais visível a incidência de pessoas
velhas. Estes fatos são confirmados com as projeções da Organização Mundial de
Saúde (OMS) para o ano de 2025, onde demonstram que o Brasil deverá possuir a
6ª maior população velha do mundo e a 1ª na América latina, com cerca de 32
milhões (15%) de pessoas com idade acima de 60 anos. Entre 1980 e 2000 a
população com 60 anos e mais cresceu 7,3%, totalizando mais de 14,5 bilhões em
2000 (FERRACINI, 2011). Diferentemente da OMS que considera velhos com
mais de 65 anos, o governo brasileiro considera o início da velice a partir dos 60
anos (BRASIL 2003).
A educação é responsável pelas mudanças nos sujeitos, alguns princípios
são comuns nas mudanças de concepções. Both (2001) afirma que não é difícil
avaliar o quanto a educação tem por fazer junto a todas as instituições e junto a
todos os espaços de formação cultural e científica para dizer sobre a necessidade
de conhecer o conhecido e sobretudo desvelar o desconhecido sobre a velhice em
todas as suas idades e em todos seus potencias e limites. Afirma Both (2001) a
seguir:
[...] autonomia intelectual é necessária porquanto busca suscitar as
operações mentais capazes de levar a explicações consistentes e
decisões moderadas pela argumentação e, sobremaneira, neste viés, é
advogado o exercício da cooperação intelectual.
É no mundo acadêmico que a formação é realizada o convívio social. A
possibilidade de aprender pode ocorrer em qualquer fase da vida humana, como
seres inclusos que somos, e assim, tornar sempre novo ou renovado o saber e o
próprio sentido da existência. (BOTH at. al., 2005)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Dessa forma, o objetivo deste estudo foi analisar as mudanças de
comportamento dos velhos por meio da educação. É uma pesquisa descritiva,
utilizamos o método da História Oral com abordagem qualitativa e as análises das
informações foram feitas fenologicamente.
Com o auxílio de uma filmadora, coletamos relatos orais de três exacadêmicos da Universidade da Maturidade da universidade Federal do Tocantins
– Sr. José Mamédio Oliveira nascido em 1952, Sr. Hely de Carvalho Marques
nascido em 1933 e a Sra. Maria Margarete Silva de Souza nascida em 1050. Estes
voluntários assinaram um termo de Consentimento Livre Esclarecido, contendo
informações sobre as entrevistas.
A questão que norteou a pesquisa foi: Como os acadêmicos perceberam
seus projetos de vida depois que ingressaram no Programa Universidade da
Maturidade? Realizamos a revisão bibliográfica sobre história oral, memória de
velhos e educação visando apresentar o assunto e dar fundamentação teórica
necessária à pesquisa.
Não tivemos a intenção de resgatar na totalidade a memória deste velhos.
Apresentamos breves entrevistas com estes ex-acadêmicos objetivando trazer a
compreensão da importância das transformações proporcionadas pela educação.
Foram entrevistas curtas que Meihy (2000) define como temática por se
basear em um assunto específico e previamente estabelecido, a objetividade é
direta. Nela pretende-se buscar a verdade de quem presenciou um acontecimento
ou que pelo menos dele tenha algumas versões que seja discutível ou contestória.
SEMEANDO O IPÊ
UNIVERSIDADE DA MATURIDADE DA UNIVERSIDADE FEDERAL
DO TOCANTINS: UMA POSSIBILIDADE DE VIVER COM MAIS
DIGNIDADE.
Diante dos dados demográficos que apontam para o rápido fenômeno de
envelhecimento populacional no Brasil, as Universidades assumem um papel
fundamental no compromisso científico, educacional e extensionista de
responsabilidade social, de acordo a Lei nº 10.741, de 2003 que dispõe o Estatuto
[Type text]
[Type text]
[Type text]
do Idoso artigo 3º VI- capacitação e reciclagem dos recusos humanos nas áreas de
geriatria e gerontologia e na prestação de serviços aos idosos; VIIestabelecimento de mecanismos que favoreçam a divulgação de informações de
caráter educativo sobre os aspectos biopsicossociais de envelhecimento.
O programa UMA-UFT com o objetivo de conhecer o processo de
envelhecimento do ser humano para oferecer na promoção do sujeito que
envelhece e provocar transformações sociais na conquista de uma velhice ativa e
digna embasado no Estatuto do Idoso.
O curso de especialização em Gerontologia já estava sendo executado
desde 2005, capacitando profissionais de diversas áreas, que hoje ja são mais de
300 monografias defendidas, estes tem como objetivo atuar no programa.
Assim a UMA-UFT nasce dia 26 de fevereiro de 2006, com 350 inscritos
e com 50 vagas apenas, atualmente conta com mais de 1.500 idosos, em 10
cidades do Estado do Tocantins (Arraias, Gurupi, Brejinho de Nazaré, Porto
Nacional, Palmas, Miracema, Miranorte, Tocantinia, Araguaína e Tocantinópolis).
É um projeto inovador horária com carga horária de 320 horas-aula e,
tem a duração de 18 meses dividido em três módulos, e carga s os quais o
acadêmicos tem que cumpri-los na integra para receber o título de: Educador
político social do Envelhecimento.
FERRAMENTAS DA COLHEITA
Apresentamos alguns comentários e definições sobre o termo “história
oral” e “memórias de velhos” que servirão para esclarecer o tema ora exposto.
Entendemos a educação não somente como processo de socialização mas
organização da personalidade e de grupos humanos pela interação consentida e
intencional, podemos dizer que, ao inserir a memória coletiva como mediação
educacional, teremos a solidariedade viva e a renovação de estoques
interpretativos de entendimentos e de relações humanas particularmente entre
gerações. (Both, 2001).
Assim a história oral transforma-se num instrumento de autoridade
compartilhada, revela-se como instrumento da educação, porquanto aperfeiçoa a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
consciência dos grupos sociais que refletem no seu interior as dores inconscientes.
Esta rompe com a história convencional uma vez que pretende educar pela
memória. (Both, 2001).
História oral é um recurso moderno usado para a elaboração de
documentos, arquivamento e estudos referentes à experiência social de pessoas e
de grupos. Ela é sempre uma história do tempo presente e também reconhecida
como história viva. Neste método o coletivo não corresponde à soma dos
particulares. Observância do indivíduo em sua unidade é básica para se formular o
respeito à experiência individual, que justifica o trabalho com o depoimento.
Nesse sentido a história oral é sempre social. (MEIHY, 2000).
Há dimensões da aculturação que, sem os velhos, a educação dos
adultos não alcança plenamente: o reviver do que se perdeu, de
histórias, tradições, o reviver dos que já participaram e participam
então de nossas conversas e esperanças; enfim, o poder que os velhos
têm de tornar presente na família os que se ausentaram, pois deles
ainda ficou alguma coisa em nosso hábito de sorrir, de andar. Não se
deixam para traz essas coisas, como desnecessárias. (BOSI, 2007, p.
74)
Segundo Both (2001), os conhecimentos dos mais velhos possuem
ingredientes que transcendem às informações do ensino tradicional, eles traduzem
para os alunos a possibilidade de olhar com outros olhos o mundo presente e ver a
relatividade de nossas preocupações.
No intuito de dar voz aos entrevistado optou-se por revelar os nomes dos
mesmo. Este fato é justificado por Meihy:
[...] a história oral se preocupa com as versões individuais sobre cada
fenômeno e que ela apenas se justifica em razão da soma de
argumentos que caracterizam a experiência em conjunto. Com isso
afirma-se que cada depoimento para a história oral individual tem
peso autônomo.
A transcrição dos relatos gravados foi feita de forma interpretativa por
parte dos pesquisadores, não fugindo a fidelidade das falas e em outros momentos
foram transcritos na íntegra os depoimentos dos entrevistados.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O DESABROCHAR DOS IPÊS – RESULTADOS
Na analise das informações coletados através das entrevistas e suas
derivações, observamos que todos se consideram acadêmicos perenes da UMA,
sempre envolvidos com os propósitos e convicções da missão da Universidade da
Maturidade. Nota-se uma satisfação, auto confiança e realização pessoal após a
conclusão do curso de Educador Político Social do Envelhecimento. O desejo de
continuar ativo no trabalho e nos estudos é uma característica comum aos três
casos analisados.
Notamos certas peculiaridades no decorrer dos percursos, pertinentes a
história de vida e contexto sócio-cultural, o que já esperávamos, e esse fato atende
as expectativas de dar voz aos participantes no método de história oral.
Na sequência, apresento as memórias contadas pelos ex-acadêmicos e a
análise das entrevistas, conforme explicitado no item anterior.
A primeira entrevista foi realizada com o Senhor José Mamedio Oliveira,
nascido em 1952 na cidade de Coelho Neto - Maranhão, atualmente residente no
Jardim Aureny III em Palmas – TO.
Foi alfabetizado aos 20 anos. Casado, pais de 6 filhos, sendo apenas um
biológico; orgulha-se em ser maranhense. Já Trabalhou com agrimensura,
topografia e líder comunitário. Hoje desenvolve o projeto da primeira Secretaria
de Inclusão Social e Direitos Humanos de Palmas no qual será o secretário a partir
de Janeiro de 2013. Formado na 1ª Tuma da UMA em 2008.
Ao ser questionado sobre sua vida antes de ingressar na Universidade
relata que tinha muita vontade de iniciar um curso superior e conviver com a
classe acadêmica, fato este que trazia um sentimento de curiosidade e ao mesmo
tempo preocupação e ansiedade. Sentia essa necessidade devido ao meio em que
estava inserido na sociedade, pela discriminação que sofria como demonstra na
fala:
Por eu viver num mundo social, porque eu tinha participação política,
partidária e envolvido no nível social de classe média alta da elite.
Que eu percebia o olhar das pessoas para mim. – Não Esse cara, o que
[Type text]
[Type text]
[Type text]
esse cara é? O nível de escolaridade dele, qual é o nível de
escolaridade dele?
Então eu percebia nos bastidores, havia comentários: - Ha! Ele é
topógrafo? O que é topógrafo? Não sabem nem... RISOS. Então
aquilo fazia com que eu pensasse de um dia fazer um curso em uma
universidade.
Entretanto, enfatiza nunca ter se sentido inferiorizado. É claro em sua
entrevista ser um homem determinado, disciplinado, estrategista, articulador e
visionário; otimista e persistente. A busca por conhecimento e informação esta
presente a todo o momento, durante entrevista, relata os cursos que fez e o porquê
fez, planejou ser comunitarista independente.
Então pergunto a ele como soube da UMA e ele diz: “Falar da UMA é
falar de uma grande realização, de um grande sonho. [...] Foi através da rede de
amigos que eu formei, dentro do 3º setor e dos movimentos comunitários. Foi a
gerente do posto de saúde Liberdade do Setor Aureny III que me ligou
informando e incentivando a entrar na UMA”.
Ele conta que não foi fazer a inscrição no primeiro momento e que surgiu
um segundo convite por outra pessoa da sua rede de amigos e que dessa vez
aproveitou a oportunidade. Relata: Percebi que eu tinha perdido uma oportunidade
de não ter entrado no inicío das aulas.
Após a formatura, Seu Mamedio, continuou os estudos, fez uma pós
graduação em Intermediação de Conflitos, Gestão do 3º Setor e atualmente esta
cursando a especialização em Gerontologia.
Ele fez longos relatos sobre seus feitos quanto acadêmico, sua criatividade
e orgulha-se do tema escolhido para o seu projeto de conclusão do curso da UMA:
Fui fazer minha apresentação. Foi a apresentação que mais deu
hibope, foi o que as pessoas mais se apaixonaram ... Daí que eu fui
divulgado, porque um casal de jornalistas do INCRA vieram assistir
minha apresentação e jogaram na mídia. E eu fiquei famoso. RISOS.
Resultado fui chamado para fazer palestras junto com o pessoal do
INCRA nos assentamentos INCRA que eu visitei RISOS. Isso levou a
outros projetos...
Neste momento torna-se claro as transformações na sua vida após a
formatura quando conta:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O que mais me enriqueceu na UMA foi ... me enriqueceu
conhecimento e me proporcionou a oportunidade de eu me expressar
melhor. Imagina bem. Eu numa Conferencia Nacional em Brasília,
falando para 30 mil pessoas. Chegou um momento que me soltei mais
um pouco e falei para 50 mil pessoas no Mané Garrincha ... Trouxe
mais segurança, mais convicto do que eu realmente estava falando, do
que eu estava querendo.
Quando pergunto a ele sobre sua influência em relação aos filhos e
familiares, diz cobrar deles a criatividade, sua esposa ingressou na UMA após ele
ter concluído e duas de suas filhas estão cursando o ensino superior. Recorda:
“Esse foi o ponto mais positivo que tive... Agora, estou cobrando dos homens,
esses pararam no tempo”.
Uma fala do Seu Mamedio surpreende e torna nítido sua característica de
estrategista:
... De 2000 a 2010, foram 10 anos, pontuando fazendo um amigo por
dia. Já Teve essa idéia? RISOS Você conhece 10 pessoas durante o
dia, 30, 40, 50 ou 100. Você conversa com 100 pessoas, que é o meu
caso, minha função... Ai vou selecionar 1 a noite. Eu anoto os nomes
de quem me interessa e tal. Ai de noite eu vejo quem vai ser. E esse
vai para outra página, a dos amigos. RISOS.
E ele termina dizendo que seus objetivos são: fazer o curso de direito,
psicologia e se tornar deputado federal e não é sonho, ele diz como e com quais
recursos alcançará seus objetivos
A UMA é meu alicerce. Eu estou na melhor fase da minha vida, não
tive a oportunidade de estudar novinho como você... Agora é como um
começo, é engraçado! Fiz 60 anos de idade em 12 de agosto passado.
E ai, agora pra mim é um pilar, um andaimezinho que eu tô andando
ai.
A segunda entrevistada foi o Senhor Hely de Carvalho Marques, nascido
em Minas Gerias no ano de 1933. Reside no centro de Palmas-TO com sua
segunda esposa à qual é 30 anos mais nova que ele, estão juntos há 7 anos. Deixa
explícita sua religiosidade em cada acontecimento narrado, romântico da vida e
dedicado nas suas responsabilidades com o trabalho e sua família.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Fala dos 8 filhos, 6 netos, 4 netas e de sua primeira esposa com muito
carinho. Trabalhou durante 40 anos em duas empresas no ramo de pedras de
revestimento. Foi casado durante 47 anos, conta a dura tarefa de superar a perda
dela, e após ficar viúvo veio para Palmas com seu filho, conta: “Já em Palmas
continuava com aquela vida triste, faltava um pedaço de mim”.
Aposentado desde 1998, recebeu o título de Educador Político Social do
Envelhecimento em 2010, 3º turma formada pela UMA. Hoje continua ativo
trabalhando na secretaria da Universidade pela manhã e de tarde faz um curso de
informática, na qual iniciou após fazer o estagio exigido para a graduação da
UMA.
Sobre suas memórias antes de ingressar na UMA ele narra, “Eu ficava só
em casa, fechado dentro de mim. Esperava em casa a Magda chegar do
trabalho”. Foi através de sua segunda esposa, Magda, que ele ficou sabendo da
UMA. Lembra sentir medo da ideia de ir para uma universidade, não tinha
vontade de conhecer o estado, não queria nem mudar do bairro onde morava: “Eu
achava que isso aqui era muito pra mim, um vestibular de 350 pessoas. O Cuíca
ficou cheio, sabe?”
Pergunto como ele se sentia depois que começou a frequentar as aulas, ele
relata sua enorme satisfação:
Minha vida mudou, encontrei velhos muito piores que eu... Comecei a
gostar, fazer amizade, conversar com as pessoas, achar interessante as
aulas... A UMA não tem porta de saída... Nos não entramos na UMA,
a UMA entra em nos, ela tomou conta de nós, entendeu? Nós
precisamos da UMA. Uma pessoa que tem consciência do que é isso
aqui ele precisa disso aqui, por que aqui nos leva uma maneira de
saber viver e conhecer a mim mesmo. Entendeu? Sabe? Ver o que eu
sou, com as aulas você vai despertando, tendo interesse.
Hely emociona-se ao lembrar o dia da formatura: “Na minha formatura eu
vi como a UMA é grande”. Na sequência deixa evidente sua influência com os
netos, dá uma pausa, respira fundo e com olhos marejados e voz embargada pela
emoção diz:
Como a UMA muda uma pessoa! A minha formatura entrou na
internet, foi visto no mundo inteirinho. Pausa novamente, se emociona
e retoma: Meu neto estava vendo, lá onde ele mora, vendo minha
[Type text]
[Type text]
[Type text]
formatura. Ele disse que eu, o vô, estava servindo de exemplo pra eles.
Sabe? Eu sou coruja. Esboça um discreto sorriso.
Finaliza seus relatos contando se sentir hoje respeitado, feliz e amado.
Continua estudando e enfatiza que amar é muito bom mas se sentir amado é um
reconhecimento pelo que ele faz.
A terceira entrevistada foi a Senhora Maria Margarete Silva de Souza
nascida e criada em Nova Friburgo, Rio de Janeiro em 1050. Nesta mesma cidade
casou-se e criou os seus 4 filhos, sendo uma sobrinha, a qual criou desde os 2
anos, vó de 5 netos. Apesar da distância, relata ser muito presente conversando
todos os dias por telefone ou pela internet, pois todos eles moram no estado do
Rio de Janeiro. Ficou 35 anos sem estudar, parou os estudo no 8º ano.
Veio para Palmas a convite do seu irmão e hoje mora com o marido, o
irmão e a cunhada, os quais ela refere ser a família dela aqui. Aposentada desde
os 50 anos começou a trabalhar aos 13 anos em uma fabrica na qual ficou durante
um ano trabalhando escondida da fiscalização até completar 14 anos.
Hoje trabalha na secretaria na Universidade da Maturidade do Tocantins.
Observamos em suas falas uma mulher “antenada” e moderna, dinâmica, proativa
e dedicada as suas responsabilidade atribuídas.
Solicito que me conte um pouco sobre suas lembranças antes de iniciar o
curso universitário, ela relata que 1 mês após mudar para Palmas se sentia
entediada e foi à uma escola infantil perto da sua casa se oferecer como
voluntária: “Meu sonho sempre foi ser professora mas nunca realizei”.
Relata que descobriu a UMA através de um cartaz que viu no SESC, onde
fazia hidroginástica. Ao vislumbrar a possibilidade de iniciar na UMA sentiu-se
envergonhada, pois sua escolaridade era até o ensino fundamental.
Em decorrência deste fez o EJA para finalizar o ensino médio, entretanto
fez apenas o primeiro ano, pois sua professora disse que ela estava muito
avançada para a turma e indicou que ela fizesse o “provão” para concluir o ensino
médio, atualmente este “provão” não existe. E complementa: dei mais um passo,
avancei muito.
Ao se retratar das lembranças do início no curso na UMA diz:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Começar na UMA foi um encantamento eu não imaginava o que fosse
um campus universitário. Eu achei isso aqui um local assim... uma
coisa diferente... não era o que eu imaginava de um campus
universitário. E me apaixonei pela UMA logo de cara... Um mundo
fascinate...
Abre muito horizontes, não só para mim. Na minha turma, tinha
pessoas com problemas de depressão e muitas outras coisas. Sabe? E
através da UMA você consegue aquela liberdade.
Liderei a comissão de formatura, por ter mais tempo disponível,
organizei a festa, as lembrancinhas... foi lindo!
Entretanto, ela é mais enfática nas lembranças após a conclusão do curso.
Conta que surgiu duas oportunidades de emprego, uma dentro da própria
universidade e outra para administrar um hotel na cidade de Xambioá –Tocantins.
Ela optou pelo hotel, trabalhou por 2 anos até o final do contrato de arrendamento
do hotel. Nota-se a importância da educação quando ela relata:
Antes de entrar na UMA eu só sabia ligar o computador e ficar
brincando na frente dele, hoje não. Tive que aprender na “marra” a
abrir um email, ver noticias na internet, fazer trabalhos. O hotel que eu
trabalhei era todo informatizado, ficha de clientes, controle de
estoque, eu fazia os relatórios e tinha que enviar para minha cunhada
que morava aqui em Palmas e que havia arrendado o hotel.
Eu me sinto superior aos meus filhos, entendeu? Já tem alguns
formados, eu senti que posso falar com eles “de cara a cara”.
Entendeu? Porque eu não tinha nada, tinha só ate o 8º ano, ai eu falei:
- Não tem que ir pra frente.
Foi um crescimento muito bom. Considero que tive duas fases na
minha vida. Uma antes da UMA e outra pós UMA.
Tive muita oportunidade de vivenciar coisas novas, lugares que nunca
pensei em conhecer...
Em seguida ela volta para a sua cidade natal em Nova Friburgo-RJ por
sugestão do marido onde ficaram por 9 meses, ela foi diagnosticada com
depressão a qual ela remete ao fato de ter que ficar apenas cuidando da casa,
fazendo comida e dormindo: Eu não tinha uma vida ativa. Por sugestão do
médico ela retorna a Palmas, onde imediatamente, procura a UMA para trabalhar.
Quanto as influências passadas para os filhos, ela diz: “nunca pude cobrar
muito dos meus filhos. Achava que o importante era estudar e arrumar um bom
emprego. Faz o ensino médio, vai trabalhar...era o que a gente achava porque foi
o que a gente recebeu a vida inteira. Hoje já tenho uma nova visão”.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Conta que seus pais eram analfabetos e que há 50 anos não era prioridade
colocar os filhos na escola: “ia porque tinha que ir”, conta Margarete. Narra que
hoje cobra dos seus filhos e quando se refere as duas netas que estão terminando o
ensino fundamental diz: “queremos o máximo de aproveitamento para eles né? A
chance que não tive, a oportunidade”. Ela retrata a sua influência com o marido:
Meu marido entrou na UMA, esta estagiando e fazendo as aulas. To
sentindo que agora ele vai começar a se soltar mais. Ele é muito
tímido, tinha vergonha, inibido, mais resistente. Porque a UMA da
essa oportunidade também, de ser mais livre, perder a vergonha,
entrosar com as pessoas. Também veio de pais muito antigos que
achava que estudo não precisava, que tinha que trabalhar para levar
sustento para casa.
Conclui contando seus planos para o futuro:
Meu sonho era ser professora de História, porque eu achava uma
matéria fascinante. Mas hoje eu já pensaria numa Assistente Social,
Comunicação, não sei. Vou pensar em fazer alguma coisa no próximo
ano... hoje me sinto realizada e produtiva.
OBSERVANDO AS FLORES DO IPÊ – CONCLUSÕES
As narrativas nos mostra que a satisfação por ser produtivo e o sentimento
de reconhecimento pelos trabalhos executados atualmente, traz mais sentido a esta
jornada do que o salários que é pago à eles. Para Both, deduz-se que o modo como
o velho está presente no mundo é que qualifica seu existir, sua essência é sua
existência.
Esses três casos influenciam diretamente na vida dos seus filhos, netos e
familiares da mesma forma que seus pais influenciaram a eles. A desconstrução
destes paradigmas por parte dos velhos é diretamente relacionados a instituição
provedoras destas inquietações do saber, utilizando as definições de Both, a escola
emprestaria a sua medicação para a renovação das estruturas de personalidade
que, sozinhos, os mais velhos não alcançariam.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Este três casos de sucesso são exemplos para todas as gerações, entretanto
devemos ressaltar que o caminho da educação no Brasil, principalmente quando
tratamos de educação para velhos, só começou.
Ainda há muito que ser realizado para a população que mais cresce no
planeta.
REFERÊNCIAS
ALVES, Rubem. Entre a ciência e a sapiência: O dilema da educação. Edições Loyola, São
Paulo, 1999.
BOSI, Ecléia. Memória e Sociedade: Lembranças dos Velhos. 14ºed. Companhia de Letras, São
Paulo, SP. 2007.
BOTH, Agostinho. Educação Gerontológica: posições e proposições. Erechim: São Cristóvão,
2001.
BOTH, Agostinho. et al. Envelhecer: estudos e vivências. Ed. Universidade de Passo Fundo. Passo
Fundo-RS, 2005.
BRASIL. Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003. Dispões sobre o Estatuto do Idoso e de outras
providências.
FERRACINI, Fábio Teixeira; FILHO, Wladmir Mendes Borges. Farmácia Clínica: Segurança na
pratica hospitalar. São Paulo: Editora Atheneu, 2011.
MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de História Oral. 3ºed.Edições Loyola, São Paulo, 2000.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
O JOVEM E A FAMÍLIA: OS ESTUDANTES QUE INGRESSARAM POR
MEIO DO PROGRAMA UFGINCLUI
Marylia Glenda Lopes de Sousa (PIBIC/CNPq)
Profª. Drª. Edna Mendonça Oliveira de Queiroz (orientadora)
Faculdade de Educação – UFG
[email protected]
RESUMO
O objetivo deste trabalho é discutir as mediações familiares formadoras de jovens ingressantes na
UFG pelo Programa UFGInclui, uma ação afirmativa implementada nesta universidade a partir de
2009. As ações afirmativas partem do reconhecimento de que determinados grupos que sofreram
processos de discriminação que interferem na definição de oportunidades, especialmente no campo
da educação e do trabalho, devem ser compensados por ações especialmente dirigidas a eles. São
apresentados os resultados parciais de uma pesquisa em andamento, que realiza um estudo
longitudinal com jovens que ingressaram por meio do programa UFGInclui no primeiro vestibular
de 2009. Trata-se de um estudo empírico, a partir de procedimentos predominantemente
qualitativos. As reflexões preliminares a serem apresentadas fundamentam-se nos dados obtidos
por meio do procedimento de grupo focal que serão discutidos a partir dos referenciais teóricos. A
análise dos dados possibilitou apreender o papel socializador da família na vida dos jovens, o que
pôde ser discutido a partir da importância atribuída pelo jovem à permanência dos vínculos
afetivos e da participação ativa da família antes e após o ingresso no ensino superior. Observou-se
que, para além do desejo por parte dos estudantes e de suas famílias no prosseguimento dos
estudos, as condições excludentes impostas pela sociedade configuram-se obstáculos tanto para a
entrada como para a permanência desses estudantes na universidade. Constatou-se que, ainda que
conte com o apoio afetivo e emocional da família no enfrentamento de questões envolvidas na
trajetória acadêmica, outras demandas, como as condições socioeconômicas, desafiam o ingresso e
a permanência do jovem na universidade.
Palavras-chave: jovens estudantes; mediações familiares; programa UFGInclui.
O programa UFGInclui, instituído na Universidade Federal de Goiás
(UFG) desde 2009, está inserido no quadro de políticas de ação afirmativa para o
ensino superior no Brasil. As políticas de ação afirmativa (também chamadas
“política de cotas”, “reserva de vagas” ou “ação compensatória”) são, segundo
Moehlecke (2002), uma das propostas que buscam reverter a situação de
discriminação e de desigualdade infringida a certos grupos, que interfere na
definição de oportunidades no campo do trabalho, da educação e da vida política.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
O sistema de cotas, que consiste em designar um percentual de vagas em alguma
área específica a ser ocupado por determinados grupos, tornou-se uma ação
afirmativa bastante difundida.
As propostas de ações afirmativas nas universidades brasileiras ocorreram
em meio a um contexto de expansão da escolarização em todos os níveis. No
ensino superior era grande a pressão para o aumento de vagas, especialmente a
partir do final década de 90, período em que foram intensificados os esforços para
garantir a universalização do ensino fundamental e quando ocorria progressiva
expansão do ensino médio. Há que se destacar, ainda, nesse momento, a
expressiva atuação dos movimentos sociais que reivindicavam igualdade de
oportunidades na área da educação. O aumento de estudantes que concluíam o
ensino médio, mas eram excluídos nos processos de seleção das universidades,
especialmente as públicas, concorreu para que fossem repensadas as formas de
ingresso (MOEHLECKE, 2002, 2004).
Piovesan (2008) ressalta que o debate sobre a instituição de cotas nas
universidades acentuou-se também após a participação do Brasil na Conferência
das Nações Unidas contra o Racismo, realizada em 2001 em Durban, na África do
Sul. A participação do país contribuiu também para adoção de ações afirmativas
em outras áreas – o documento oficial brasileiro apresentado à Conferência
defende a adoção de medidas nas áreas da educação e do trabalho.
As universidades estaduais do Rio de Janeiro31 foram pioneiras na
implementação das ações afirmativas no Brasil quando, em 2002, foi aprovada
uma lei estadual que estabelecia cotas raciais e sociais para a seleção de
estudantes nestas universidades. Gradualmente outras instituições de ensino
superior adotaram ações afirmativas em seus processos seletivos, em meio a
debates sobre sua legitimidade e possibilidades no que se refere à democratização
do acesso. Em agosto de 2012 foi sancionada pelo governo federal a Lei nº.
12.711/2012 estabelecendo que todas as universidades e institutos federais
destinem, em um período de até quatro anos, metade das vagas aos estudantes
31
As universidades foram: a Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e a Universidade
do Estado do Norte Fluminense (UENF).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
oriundos de escola pública – a lei contempla ainda especificidades com relação à
renda e à autodeclaração de pretos, pardos e indígenas32.
A emergência das ações afirmativas deve ser compreendida nos âmbitos
retrospectivo e prospectivo: como políticas de reparação de um passado
discriminatório e, também, de promoção da transformação social. Os jovens que
ingressam no ensino superior por meio dos programas de ação afirmativa são
aqueles que vivenciam processos de exclusão social produzidos historicamente,
sendo possível inferir que, por meio destas ações, objetiva-se promover as
possibilidades de ascensão social até o nível de equiparação com os demais
(PIOVESAN, 2008).
Ao tratar da exclusão, Wanderley (2006, p. 17) afirma que “sob esse rótulo
estão contidos [...] uma série de manifestações que aparecem como fraturas e
rupturas do vínculo social (pessoas idosas, deficientes, desadaptados sociais;
minorias étnicas ou de cor; desempregados de longa duração, jovens
impossibilitados de aceder ao mercado de trabalho; etc.)”, compreendendo todos
que têm negado o seu acesso aos bens materiais ou simbólicos da sociedade.
A adoção das ações afirmativas com vistas a amparar grupos que
vivenciam processos de exclusão tem suscitado diversos debates, sendo relevante
considerar os dilemas envolvidos. Pesquisas mostram que, embora os ingressantes
por meio das ações afirmativas apresentem percurso acadêmico satisfatório,
apresentando bom desempenho na universidade, há que se considerar que a sua
permanência é desafiadora, compreendendo-se que as trajetórias de vida, familiar
e de escolarização, bem como a situação socioeconômica destes jovens, são
marcadas por desigualdades que afetam sua trajetória acadêmica (HOLANDA,
2008; PENHA-LOPES, 2008).
Este artigo tem o objetivo de compreender os processos familiares
formadores dos jovens excluídos historicamente, seja por condição econômica ou
racial. É resultado parcial de uma pesquisa em andamento, que realiza um estudo
32
Por conta desta lei, alterou-se a ação afirmativa na UFG e a partir do vestibular 2013/1 o
estudante oriundo de escola pública deve optar pelo “sistema de Reserva de Vagas”, assegurado
pela lei federal. O programa UFGInclui permanece garantindo vagas direcionadas para candidatos
indígenas, quilombolas e surdos.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
longitudinal com jovens que ingressaram na UFG no primeiro vestibular de 2009,
por meio do programa UFGInclui, objetivando apreender a inserção da família
como instância de mediação na formação destes estudantes, antes e durante sua
trajetória na universidade. Trata-se de um estudo empírico, a partir de
procedimentos predominantemente qualitativos, como entrevistas e grupos focais.
Neste trabalho são apresentadas reflexões preliminares realizadas tendo
por base os dados obtidos por meio do procedimento de grupo focal, que serão
discutidos a partir dos referenciais teóricos. Os grupos focais realizados foram
organizados com base em dois conjuntos de cursos: um formado pelos cursos
mais concorridos no vestibular e que mobilizaram maior número de cotas, e outro
conjunto formado pelos cursos que utilizaram menor número de cotas. Esta
organização teve o propósito de buscar a apreensão dos processos de maior ou de
menor exclusão. Por meio dos dados apreendidos nos grupos foi possível discutir
aspectos relacionados ao desempenho escolar e acadêmico, à situação
socioeconômica, às relações interpessoais fora e dentro da universidade e às
mediações familiares dos estudantes. O presente trabalho tem por objetivo
discutir, principalmente, este último aspecto.
OS JOVENS ESTUDANTES E SUAS FAMÍLIAS
Ainda que a família tenha sofrido transformações ao longo do tempo, em
especial no último século, e alguns estudiosos defendam o seu declínio e
arrefecimento no papel socializador das novas gerações (SINGLY 2007; DUBET,
1994; WAUTIER, 2003), pesquisas no Brasil têm mostrado que ela se mostra
vigorosa (NOVAES, VANNUCHI, 2004; CANEZIN GUIMARÃES et al., 2003;
QUEIROZ, 2008). Todos os estudantes que participaram dos grupos focais
referiram-se aos vínculos afetivos com suas famílias, em especial com a mãe. A
família é compreendida pelos jovens como uma importante instância em suas
vidas, corroborando as pesquisas que afirmam que o jovem contemporâneo tem
atribuído confiança ao grupo familiar e o tem considerado como um espaço de
proteção e apoio.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Os jovens ingressantes pelo programa UFGInclui estudados, de modo
geral, valorizam os grupos familiares a que pertencem, colocando em destaque a
participação dos pais na realização do seu projeto escolar. Considerando a
perspectiva psicanalítica, os vínculos familiares formados por meio de
identificações que se iniciam na infância, gradativamente, vão constituindo a
estrutura psíquica dos sujeitos. A juventude é marcada por intenso processo de
identificações, internas e externas à família, que culminam em uma
“emancipação” de grande significado no desenvolvimento psíquico (FREUD,
2002). Esses processos podem ser observados nos relatos dos estudantes.
Um dos estudantes, ao falar sobre sua relação com a mãe, permite
apreender os mecanismos identificatórios que constituem essa relação: “minha
mãe pra mim é a melhor psicóloga do mundo, ela gosta do que eu gosto, essa
visão de achar que o estudo melhora as coisas, as pessoas, é por meio de estudar,
de conhecer as coisas, então ela sempre esteve junto comigo”. Este relato
expressa a forte presença da figura materna nos projetos de vida deste estudante e
revela a relevância da família como instância socializadora.
Neste sentido, a saída ou a permanência no lar, e as implicações
decorrentes, podem constituir elementos significativos para análise. A maioria dos
estudantes participantes dos grupos focais não são nascidos em Goiânia, cidade
onde funcionam os cursos que frequentam. Alguns mudaram com suas famílias
para a capital ou para a região metropolitana, outros moram sozinhos e ao
relatarem sobre a experiência de saída da casa dos pais expressaram como a
família é vista como um espaço de proteção, cujo distanciamento causa
insegurança. Um estudante de outro estado que se mudou com o irmão – ambos
em busca de acesso ao ensino superior – afirmou: “agora pra sair de casa aí foi o
problema, porque era muito apegado aos pais [...]. A vontade era muito grande,
por isso que a gente lutou pra sair de casa, mas tinha que sair [...], porque lá a
vida nossa ia ser capinando roça mesmo”.
Outro estudante apresentou dilema semelhante e relatou que o apoio da
mãe foi importante nesta nova etapa da sua vida, revelando que mesmo a
conquista de certo grau de autonomia, contou com o estímulo e a participação da
família. Segundo ele, a mãe “foi muito importante, assim, me incentivando,
[Type text]
[Type text]
[Type text]
porque no começo é ruim, primeira vez que você sai de casa [...], morando de
aluguel, cozinhar, ter que fazer várias coisas, então é difícil ficar. E ela: não,
fica.”
A juventude, constituindo-se como um momento de busca por autonomia e
emancipação familiar, é marcada por rupturas afetivas caracterizadas pela
ambivalência. Para Freud (2002, p 104), trata-se de uma “das realizações
psíquicas mais significativas, porém também mais dolorosas, do período da
puberdade: o desligamento da autoridade dos pais, unicamente através do qual se
cria a oposição, tão importante para o progresso da cultura, entre a nova e a velha
gerações”.
Trata-se de um processo complexo que suscita algumas questões no que
refere aos jovens que vivenciam processos de exclusão. Para Queiroz (2008), os
jovens oriundos de famílias de baixa renda expressam o projeto de emancipação
sob a justificativa de poderem alcançar uma melhor qualidade de vida. Neste caso,
a conquista da emancipação e de certa autonomia é, para estes jovens, uma
necessidade, produzida e alimentada pela sociedade capitalista. Assim, as famílias
investem na escolarização dos filhos com o objetivo de que tenham no futuro
melhores condições socioeconômicas, como indica a fala de um dos estudantes:
“minha mãe mais o meu pai sempre davam força pra gente terminar porque eles
não têm condições de pagar, então a gente assim, incentiva muito, muito mesmo
pra gente terminar, assim, apoio total assim, da família”.
Estudos sobre os jovens, a família e sua relação com a escola têm
discutido que o significado que a família atribui à escolarização dos filhos, bem
como a forma como ela se organiza para viabilizar este projeto de escolarização,
constituem fatores determinantes para o prolongamento dos estudos dos jovens
(SPOSITO, 2005; NOGUEIRA, ROMANELLI & ZAGO, 2003; QUEIROZ,
2008). As informações obtidas junto aos estudantes participantes do programa de
inclusão da UFG corroboram essa observação, pois revelam o reconhecimento de
que o apoio ou a participação da família em suas trajetórias escolares, desde o
ensino básico, afetou de modo significativo o percurso que tiveram. Destaca-se o
fato de que pelo menos um membro da família participou dessa trajetória de
forma mais ativa (incentivando, auxiliando nas atividades escolares e/ou
[Type text]
[Type text]
[Type text]
“cobrando” o bom desempenho). Em geral, a mãe desempenhou este papel, como
pode ser visto na fala de um estudante: “em relação a incentivo financeiro,
psicológico e tal eu sempre tive mais da minha mãe mesmo”. Outro estudante, de
maneira semelhante, afirma:
minha mãe fala muito de estudar, estudar, estudar. Na oitava série, eu
não era assim, não estudava muito, só que ela falava que eu tinha que
estudar.“O ENEM, a partir do primeiro ano você já pode fazer ENEM,
então, você já vai ter que estudar”. Aí já ficava falando na minha
cabeça, no primeiro ano eu, realmente, estudei muito.
Os dados sobre a participação da família na vida escolar dos estudantes
evidenciam que os valores e as atitudes dos pais com relação aos estudos
influíram no processo de escolarização dos filhos, tema investigado por Wills e
aprofundado por Boudon, que concluiu que a aspiração escolar do filho depende
da imagem que a família tem de si, que tem estreita relação com a história da
família e a trajetória escolar dos seus membros. Este histórico influenciaria a
decisão do sujeito em dar ou não continuidade ao projeto de escolarização
(GOMES, 1997).
Pelos dados analisados, foi possível constatar que a presença na família de
pessoas com nível superior ocorre com maior frequência nos cursos cuja
utilização de cotas foi maior, em geral cursos mais concorridos como direito,
medicina, engenharia ou odontologia. Grande parte dos estudantes tinha algum
membro da família que já havia ingressado ou concluído o ensino superior,
conforme relata alguns estudantes: “igual, por exemplo, minha mãe é professora
de história, é interessante”; “no meu caso, o meu pai é advogado”. Um dos
estudantes, além de mostrar esta realidade, discute outras influências que se
fizeram presentes na escolha profissional:
[...] eu escolhi já meio infantil, sonho mesmo de ser médico. Tem
aquela imagem de que o médico é idealizado, ajuda as outras pessoas,
um pouco de altruísmo [...]. Então tem um pouco de infância. Mas
também pode ter relação com meus pais, os dois são odontólogos,
uma coisa já meio semelhante, aí já meio direcionando.
Por outro lado, todos os estudantes dos cursos que utilizaram menor
número de cotas relataram que foram os primeiros em suas famílias a entrarem no
ensino superior. Um deles relatou, ainda, que o incentivo se relaciona à
[Type text]
[Type text]
[Type text]
possibilidade de que o ensino superior propicie ascensão social: “mas, assim,
desde antes eu já queria fazer faculdade, é uma questão também de você ter
ascensão social. Porque, na família ninguém tinha feito ainda, (...) o pessoal mal
chegava no ensino médio já parava”.
Também Penha-Lopes (2008), ao avaliar a trajetória acadêmica de
estudantes que ingressaram pelas ações afirmativas na UERJ, constatou que estes
universitários, oriundos das classes populares, são muitas vezes os primeiros da
família a cursarem a universidade. Este estudo mostra também que há, por parte
destes estudantes, a crença e a esperança de que, por meio do ensino superior,
possam alcançar a ascensão social.
Compreende-se, assim, que o ingresso no ensino superior – embora não
seja propriamente apenas uma decisão, pois se circunscreve a uma diversidade de
condições que podem obstacularizar este ingresso – expressa o prolongamento da
escolarização, impossibilitada à grande parcela dos jovens brasileiros. No entanto,
permanecer ou não na escola está para além de um processo que ocorre no âmbito
individual; os parâmetros que regularão essa permanência se relacionam às
posições sociais e de classe, as quais dão aos indivíduos e suas famílias uma
estimativa diferenciada de riscos e benefícios associados à determinada decisão.
No que se refere às condições socioeconômicas dos estudantes
pesquisados, aos recursos que detêm para sua manutenção dentro e fora da
universidade, observa-se que, em geral, os estudantes dos cursos que utilizaram
maior número de cotas recebem auxílio financeiro da família, ainda que alguns
trabalhem, como é o caso de um acadêmico de um destes cursos que após relatar
exercer atividade remunerada na universidade (monitoria), afirma: “mas mesmo
assim eu ainda sou sustentado, às vezes eu ainda faço alguma coisa ou outra...”.
Outro estudante complementa: “a minha mãe que me sustenta, minha família que
me sustenta, por causa daquela visão que eu falei, me deixar só por conta de
estudar, eu não tenho dificuldade alguma em me dar um suporte pra eu ficar por
conta de estudar.” Além disso, em suas trajetórias escolares estes estudantes
tiveram comparativamente aos estudantes dos cursos menos concorridos maior
investimento financeiro da família o que propiciou, por exemplo, a realização de
cursos pré-vestibulares.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Os estudantes que ingressaram para os cursos que utilizaram menor
número de cotas relatam que dependem de auxílio financeiro da universidade,
sendo esta a única fonte para subsistência. Alguns residem na Casa do Estudante
tendo que comprovar as precárias condições socioeconômicas e todos eles
trabalhavam antes do ingresso na UFG e auxiliavam financeiramente suas
famílias. Uma vez na universidade, tiveram que sair de seus respectivos empregos
e ingressaram em atividades remuneradas (bolsas), mas não puderam mais
auxiliar suas famílias. Nesse sentido, relata um estudante: “eu conversei com a
minha família, que eu tava (sic) prejudicado tanto no trabalho quanto na
faculdade, aí pra mim não ficar prejudicado nos dois é melhor ficar só em um, aí
fiquei só aqui”. Outro estudante afirma ainda: “Agora a gente parou de trabalhar
e tá (sic) só com essa bolsa aí [...] dá só pra gente mesmo, aí não dá pra mandar
mais...”, indicando não poder auxiliar financeiramente sua família.
Nessa perspectiva, é possível inferir que, ainda que as condições
socioeconômicas de todos os estudantes sejam desfavoráveis, há diferença entre
as condições daqueles que ingressaram nos cursos mais concorridos e os que
ingressaram em cursos menos concorridos. Conforme dados já divulgados da
pesquisa (RESENDE et. al., 2010), dentre os ingressantes pelo sistema universal
da UFG no primeiro vestibular de 2009, 58,4% tem renda familiar entre R$
1600,01 e R$ 8300. Já entre os que ingressaram pelo programa UFGInclui, 65%
têm renda de até R$ 1600,01. O percentual de estudantes que ingressaram por
meio das cotas com renda de até R$ 1600,01, cai para 42,4% quando são
considerados apenas os pertencentes aos cursos mais concorridos da universidade.
Pesquisas (PENHA-LOPES, 2008; HOLANDA, 2008) têm revelado que a
situação socioeconômica é considerada um fator relevante para a permanência dos
jovens ingressantes pelo sistema de cotas na universidade. Ao indicar a
necessidade dos jovens da UERJ, que ingressaram por meio de ações afirmativas,
de conciliar trabalho e estudo, Penha-Lopes (2008) discute o quanto as condições
socioeconômicas podem influenciar a permanência na universidade. Outro estudo
realizado na mesma instituição por Villardi (2007 apud HOLANDA, 2008, p. 4)
aponta que “os cotistas têm dificuldades, sim, mas não de aprendizagem. A
maioria dos estudantes tem dificuldades financeiras graves que, se não forem
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sanadas levarão ao fracasso da política”. Estes dados revelam que os processos de
exclusão social vivenciados por estes jovens não se encerram com o ingresso na
universidade.
Na UFG, os estudantes reconhecem que a condição socioeconômica de
suas famílias e a qualidade do ensino básico pode influenciar o acesso e a
permanência na universidade. Um estudante de um dos cursos que utilizaram
maior número de cotas afirmou que alunos oriundos de escola pública que
desejam ingressar no ensino superior encontrariam algumas dificuldades:
por exemplo, ele não vai ter o mesmo suporte que uma família com
renda maior teria; ele pode acabar tendo que trabalhar, a família pode
depender dele, e ele não vai ter suporte para ter tempo e dinheiro para
comprar livros; e ele não vai conseguir atingir a meta dele que são os
pontos pra passar no vestibular de um curso um pouco mais
concorrido, aí é justamente o que influencia.
Outro estudante acrescenta ainda preocupações relativas às possibilidades
que tais estudantes têm na saída da universidade:
[...] um aluno da escola pública, se ele não tiver uma carga já de
família pra prestar pra um curso tão concorrido, ele pensa: Nossa, será
que eu vou ser bem sucedido, vou ter capacidade de comprar livro...
Tem curso que é integral, eu vou ter que ficar sem poder trabalhar, e
também quando eu sair, eu vou fazer o que? Por exemplo, medicina,
odonto, tem também a questão de sair e fazer alguma coisa, montar
um consultório, montar um escritório, então quando eu sair, se eu
formar em direito, quando eu sair eu não vou ter dinheiro para montar
um escritório, então é melhor fazer um curso que eu não preciso disso,
então é melhor fazer um curso que eu não preciso disso, por exemplo,
eu vou virar professor.
As preocupações expressas pelos estudantes revelam os temores que
experienciam no enfrentamento aos desafios que constituem suas vidas. Os
comentários que fizeram sobre os colegas que ingressaram em cursos com menor
utilização das cotas, não os excluem das dificuldades que enfrentam no seu
cotidiano e que terão ainda que enfrentar no futuro. Evidencia o fato de que, em
diferentes proporções, a família se constitui como uma instituição socializadora
fundamental na vida dos estudantes.
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A análise dos dados possibilitou apreender que a família tem atuado como
uma instância fundamental na vida dos jovens estudantes que ingressaram na
UFG por meio das ações afirmativas. A observação dos vínculos afetivos
familiares constituindo o cotidiano dos estudantes, a dos processos de
identificação que se revelam em seus relatos, enfim, o reconhecimento da
“presença” da família em suas vidas são alguns dos aspectos que possibilitam
concluir que a família mantém seu papel socializador para o jovem.
O estudo mostrou, ainda, que os processos familiares foram determinantes
para a escolarização dos participantes da pesquisa, tanto no que se refere ao
ingresso no ensino superior, quanto nas etapas anteriores de ensino. As relações
constituídas na família, os valores e atitudes dos pais em relação aos estudos
constituíram mecanismos de adesão ao projeto de permanência na escola e, em
consequência, permitiu o prolongamento da escolarização, chegando à
universidade.
Assim, constatou-se que as condições socioeconômicas afetam
sobremaneira o acesso e a permanência dos estudantes na universidade, ainda que
ingressantes pelas políticas de ações afirmativas. Trata-se de um desafio a ser
enfrentado, pois obter um acesso à universidade pública, com todas as
dificuldades que isso implica, não significa que os problemas terminaram. Podese, na verdade, aventar que as dificuldades são acirradas, visto haver certa
expectativa, por parte das políticas e dos próprios estudantes e suas famílias, de
que, agora, pelo esforço próprio, eles devem obter êxito nesse projeto, já que
houve o ingresso antes obstaculizado.
A investigação constata que se trata de uma questão complexa, que não
pode ser entendida apartada das condições estruturais da sociedade, já que as
ações afirmativas na universidade buscam promover a inclusão de estudantes em
uma sociedade excludente. Assim, os estudantes e suas famílias experienciam
processos de exclusão que se reproduzem cotidianamente, ainda no interior de
propostas que prometem incluir.
REFERÊNCIAS
[Type text]
[Type text]
[Type text]
CANEZIN GUIMARÃES, Maria Tereza et al.. Juventude, educação e campo simbólico. Goiânia:
Ed. UCG, 2007.
DUBET, François. Sociologia da experiência. Lisboa: Instituto Piaget, 1994.
FREUD, S. Três ensaios sobre a teoria da sexualidade. Rio de Janeiro: Imago, 2002.
GOMES, J. Jovens urbanos pobres: anotações sobre escolaridade e emprego. Revista Brasileira de
Educação, n. 5, p. 53-62, 1997.
HOLANDA, M. A. de P. G. Trajetórias de vida de jovens negras da UNB no contexto das ações
afirmativas. Dissertação (Mestrado em Educação) Universidade de Brasília, Brasília, 2008.
MOEHLECKE, Sabrina. Ação afirmativa: história e debates no Brasil. Cadernos de Pesquisa, n.
117, p. 197-217, nov, 2002.
_____________. Fronteiras da Igualdade no ensino superior: excelência e justiça racial. Tese
(Doutorado em Educação) – Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008.
NOGUEIRA, Maria Alice; ROMANELLI, Geraldo; ZAGO, Nadir (orgs.). Família e escola:
trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Petrópolis: Vozes, 2000.
NOVAES, Regina; VANNUCHI, Paulo. Juventude e Sociedade: trabalho, educação, cultura e
participação. São Paulo: Ed. Fundação Perseu Abramo, 2004.
PIOVESAN, F. Ações Afirmativas no Brasil: Desafios e Perspectivas. Revista Estudos Feministas,
Florianópolis, vol. 16, n. 3, p. 887-893, set/dez, 2008.
PENHA-LOPES, Vânia. Universitários cotistas: de alunos a bacharéis. In: ZONINSEIN, Jonas;
FERES JUNIOR, João (orgs.). Ação afirmativa no ensino superior brasileiro. Belo Horizonte: Ed.
UFMG; Rio de Janeiro: IUPERJ, 2008.
QUEIROZ, Edna Mendonça O. de. Mediação familiar em processo: formação de jovens
estudantes do ensino superior. 2008. Tese (Doutorado). Universidade Federal de Goiás (UFG),
Goiânia.
RESENDE, Anita C. A. et al. Os processos de exclusão/inclusão do jovem no âmbito das ações
afirmativas na UFG. IV JUBRA. Anais. Belo Horizonte, 2010.
SINGLY, François de. Sociologia da família contemporânea. Rio de Janeiro: Ed. FGV, 2007.
SPOSITO, Marília P. Algumas reflexões e muitas indagações sobre as relações entre juventude e
escola no Brasil. In: ABRAMO, Helena W.; BRANCO, Paulo M.. Retratos da Juventude
Brasileira: análises de uma pesquisa nacional. São Paulo: Instituto Cidadania; Fundação Perseu
Abramo, 2005.
WAUTIER, Anne Marie. Para uma Sociologia da Experiência. Uma leitura contemporânea:
François Dubet . Sociologias. Ano 5. n. 9, Porto Alegre, jan./jun. 2003.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
PROPAGANDA: IMPLICAÇÕES DA PUBLICIDADE NA FORMAÇÃO
DE VALORES NA INFÂNCIA
Humberto Rocha de Souza
Dra. Maria Nalva R de Araujo: Orientadora
Universidade do Estado da Bahia-UNEB
[email protected]
RESUMO
O presente trabalho é resultado de uma revisão bibliográfica realizada acerca de propagandas
veiculadas na mídia, destinadas ao público infantil. Este estudo procura sintetizar as implicações
das diversas campanhas publicitárias na formação de valores da criança, considerando que no atual
momento histórico da TV brasileira, percebe-se muita publicidade destinada a este mercado que a
cada ano cresce. Vale ressaltar, que é nesse universo de consumo e propaganda que extrapola os
muros escolares, que a prática docente está inserida. Desta forma, são apresentadas ao longo do
texto algumas referências para a compreensão da problemática abordada, bem como dados
quantitativos que demonstram e ratificam uma formação educativa voltada para a compreensão
crítica da sociedade. Estas e outras indagações serão respondidas à luz de teóricos como:
Dermeval Saviani (2008), Newton Duarte (2004, 2006) e István Mészáros (2008), e outros que
deram suporte na apreensão e interpretação das esferas publicitárias como a ativista canadense
Naomi Klein (2002). Dessa constata-se que o aumento progressivo de tais campanhas, colabora de
forma expressiva para a internalização de valores e práticas ideológicas que contribuem para a
perpetuação da sociedade capitalista.
Palavras-chave: capitalismo; publicidade; infância; formação de valores; compreensão.
INTRODUÇÃO
A relação entre os processos de produção de mercadorias em escalas cada
vez maiores, estão intimamente ligado as funções de escoamento das mesmas no
mundo globalizado, isto é, a necessidade do consumo imediato daquilo que se
produz traz consigo os mecanismos e artifícios necessários para favorecer a
aquisição de tais mercadorias. Um desses mecanismos nesse caso, seriam as
campanhas publicitárias que tem por objetivo atrair e convencer a compra de um
determinado produto.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Dessa forma, o tema traz consigo não somente a ousadia, mas o risco de se
propor a debruçar-se sobre as conjunturas históricas que vivenciamos atualmente.
Onde decisões são tomadas em nome do capital, estruturas de relações são
desarticuladas em prol de um poder hegemônico que circunscreve todo um
processo histórico, não é de se surpreender que tal ação, em busca de um espaço
cada vez maior por um manancial de compra e venda fosse agora direcionada para
um público cada vez mais jovem. Segundo pesquisas realizadas pelo Instituto
brasileiro de geografia e estatística, (2000), crianças de 4 a 14 anos representam
37.245.906, quase 22% da população do país. Esta Parcela consideravelmente
grande de consumidores corresponde em números às expectativas de faturamento
dos grandes lojistas e fabricantes de produtos direcionados a esta esfera da
população.
Diante desse quadro que tangencia esta “aldeia global” de consumo,
devemos levar em consideração o processo de “adultização” da infância para um
arquétipo adulto. Nesse processo marcado por quebra de padrões de
comportamento e valores historicamente construídos ao longo do tempo, é visível,
sejam no vestuário ou na própria comunicação da criança as características que
são forjadas a partir das diferentes campanhas publicitárias reproduzidas nos
diferentes meios de comunicação. Assim o objetivo dessa pesquisa é explanar a
partir das análises dos teóricos pesquisados as implicações que tais campanhas
provocam na infância, traçando um panorama alinhado a prática pedagógica e
assim contribuir para o crescimento da comunidade acadêmica e os meios para os
quais o artigo possa ser destinado.
A INFÂNCIA E A PUBLICIDADE DESMEDIDA
Uma das características que demarcam a sociedade capitalista é a sua alta
necessidade de produção e consumo imediato. Um quadro que tange não somente
a economia, mas perpassa o cerne do existencial humano e funde-se nas ações que
cada um executa no meio social.
A formulação conjugada entre o binômio, produção e consumo, estão
indubitavelmente ligada as nossas necessidades. Todos nós temos necessidade de
[Type text]
[Type text]
[Type text]
algo para sobreviver. Mas como conceituar necessidade numa sociedade de
consumo na qual, a cada dia é invadida por diversos produtos e gêneros
diversificados voltados para diferentes faixas etárias? A resposta pode parecer
complexa, e desvendar o seu significado pode representar a chave para a
compreensão do caso. Segundo Barbosa (2004), apud: Pinto (2007):
O que impele a sociedade de consumo não é um conjunto fixo,
circunscrito e finito de necessidades, mas o desejo (desire) e agora na
época do capitalismo tardio o capricho (wish). Ambos são fenômenos
essencialmente evasivos e efêmeros, que prescindem da justificação
ou apologia em torno de um objetivo ou causa (p.46)
Barbosa, nos apresenta um painel expressivo do quanto as deturpações do
consumo proveniente dos desejos do sujeito, ocasionadas pelas campanhas
massificadoras do marketing, pode nos levar a valores evasivos e efêmeros,
fenômenos característicos da sociedade de consumo.
Nos últimos anos presenciamos uma forte tendência do mercado global, o
marketing cada vez mais sendo direcionado para o consumo infantil. A nova
conjuntura do mercado global não propiciou apenas o crescimento efetivo de
grandes marcas, bem como o desenvolvimento econômico de seus países de
origem, mas o entrelaçamento parcimonioso sistematizado pelo conjunto de
exportação e importação de bens de consumo, a nova ordem do mercado
globalizado concedeu o acesso direto a grandes marcas do comercio mundial bem
como o desenvolvimento do processo de aculturação e valores ideológicos que
ultrapassam as barreiras geográficas. Entender esta nova ordem comercial em seus
diferentes aspectos é condição sinequanon para compreender o mundo no qual a
criança esta inserida.
Como vimos, estas informações nos dão possibilidades de vislumbra o
território mercadológico que é apresentado e difundo no meio social, posto que a
criança sendo alvo favorável a ação conjunta entre o meio social no qual ela vive e
o sistema comercial, resulta na concordância direta aos estímulos desenvolvidos
pelas campanhas publicitárias. Note, que apesar da criança ser um ser socialmente
ativo e possuir a capacidade de interferi no ambiente onde se encontra, ela não
possui o mesmo grau critico de um adulto capaz de fazer separações entre o que é
[Type text]
[Type text]
[Type text]
presenciado no seu dia-dia e o que é observado em tais campanhas de marketing.
De acordo com Susan Linn (2006), educadora e ativista norte-americana, autora
de: crianças do consumo, a infância roubada:
Ate a idade de cerca dos oito anos, as crianças realmente não
conseguem entender o conceito de intenção persuasiva segundo o qual
cada detalhe de uma propaganda foi escolhido para torna o produto
mais atraente e para convencer as pessoas a comprá-lo. Crianças mais
velhas e adolescentes podem ser mais cínicas em relação à
propaganda, mas seu ceticismo parece não afetar a tendência de querer
ou compra os produtos que vêem retratados tão brilhantemente ao seu
redor (p.22).33
Dessa forma uma das grandes diferenças encontradas nessa relação,
compreendida entre adulto e criança é a capacidade da criança agir conforme os
desejos impulsionados pelos estímulos exterior, neste caso as campanhas de
estratégia de mercado. É relevante elucidar que a criança vai agregando tais
características de acordo a convivência mantida com outras pessoas, vejamos: a
cada dia o contexto escolar vai se modernizando, com o passar do tempo
percebemos um grande numero de crianças e adolescentes que vão aderindo novas
tecnologias com o intuito de favorecer o seu desenvolvimento escolar ou
simplesmente pelo fato de estar atualizado com os novos lançamentos do mercado
como tablets, smartphones que propicia uma maior acessibilidade as redes sociais
e compartilhamento de arquivos entre tantos outros produtos de mídia digital que
a cada dia vem ganhando mais espaço entre o publico em geral.
Segundo pesquisa realizada pela NPD Group (2011), nos Estados Unidos,
constatou que 91% das crianças jogam videogames isto, equiparado ao uso dos
smartphones que possuem esta tecnologia com gráficos cada vez melhores. O
resultado dessa pesquisa nos faz percebe que o universo da criança se altera a parti
do contato e da aquisição de novas informações. É importante exemplificar que o
meio televisivo, aliada incondicional das práticas publicitárias acaba por se torna
o principal fio condutor das informações que são transportadas ao consumidor,
neste caso, a criança. Ou seja, à medida que criança se propõe a empregar um
33
[Type text]
Ibidem
[Type text]
[Type text]
maior numero do seu tempo, a ficar de frente para a TV, mais exposta a mesma
estará às práticas dispendiosas dos anúncios publicitários que insistem
vertiginosamente em vender não somente produtos, mas imagens, padrões de
comportamento e valores. Nesse sentido, artifícios para dar vida a tais práticas
corporativas contam com a habilidade extraordinária de artistas do cinema ou
apresentadores de TV que utilizam dos seus atrativos fetichizados para compor
um ambiente sedutor, capaz de capitalizar o sujeito para um universo de consumo
desenfreado, (Klein, 2002, p. 75 e 76).
As campanhas massificadoras seja ela nos comerciais televisivos ou
incluídas de forma subjetivas nos desenhos animados, alertam quase sempre para
o estereótipo dos brinquedos, jogos ou um arquétipo adulto que é ofertado no
mercado para o consumo infantil. Dessa forma não é de se surpreender que cada
vez mais as crianças se rendem ao charme da televisão e aos seus atrativos.
Em tese, o veiculo televisivo se situa como o principal meio de informação
brasileiro, segundo pesquisa do Instituto brasileiro de geografia e estatística
(IBGE), nove entre dez casas no Brasil possuem televisor 34 este numero reflete
diretamente um quadro cada vez maior de pessoas que enxerga na televisão não só
um meio de entretenimento, mas um meio de se manter atualizado dos
acontecimentos diários. O que muitos não percebem é o alto grau de manipulação
oriundo de interesses particulares que se sobrepõem muitas vezes aos valores
éticos e morais da sociedade. Hora, nunca nos últimos anos os lares brasileiros
foram bombardeados com campanhas de marketing cada vez mais arrojadas que
comportam não somente as agencias do ramo, mas especialistas do ramo da
psicologia que contribuem diretamente para o êxito dessas campanhas. Assim o
que vemos não é somente o produto exposto nas prateleiras, vendido como
mercadoria, mas um estilo de vida:
“... nasceu um novo consenso: os produtos que florescerão no futuro
serão aqueles apresentados não como produtos, mas como conceitos: a
marca como experiência, como estilo de vida.
Desde então, um seleto grupo de corporações vem tentando se liberta
do mundo corpóreo dos produtos, passando fabricantes e produtos a
34
[Type text]
Dados coletado no portal terra publicado em 14 de setembro de 2007. 10h11min
[Type text]
[Type text]
existir em outro plano. Todo mundo pode fabrica um produto
raciocinam eles ( e como mostrou o sucesso das marcas privadas
durante a recessão, todo mundo fabricou). Essa tarefa ignóbil,
portanto, pode e deve ser delegada a terceiros cuja única preocupação
é atender as encomendas a tempo e dentro do orçamento (e o ideal é
que fiquem no terceiro mundo, onde a mão-de-obra é quase de graças,
as leis são frouxas e isenções fiscais são concedidas a rodo). “As
matrizes, em quanto isso, estão livres para se concentra em seu
verdadeiro negocio – criar uma mitologia corporativa poderosa o
bastante para infundir significado a esses toscos objetos apenas
assinalando-os com seu nome”. (KLEIN, Naomi. Sem logo: a tirania
das marcas em um planeta vendido. P.45).
Seguindo a analise da ativista canadense Naomi Klein o consumo infantil é
também constatado em números e, tem sua grande importância para a economia
brasileira, conforme Synésio Batista da Costa, presidente da associação brasileira
dos fabricantes de brinquedos:
...a indústria brasileira de brinquedos faturou R$ 3,1 bilhões em 2010,
um avanço de 11% sobre o exercício anterior. A meta para este ano,
com investimento de R$ 200 milhões em lançamentos de produtos e
modernização das fábricas, é crescer mais 15%, principalmente em
função dos novos produtos que estão sendo apresentados ao varejo
durante a ABRIN 2011.
Assim, de acordo com a pesquisa isto representaria 70% do mercado nos
próximos anos. Se por um lado estes dados favorecem a economia brasileira, por
outro ele interfere diretamente nas relações da criança, seja ela familiar ou de
caráter social, ou seja, é mais fácil se relacionar com a mercadoria, com o objeto
em si, do que com a outra pessoa que possa esta do seu lado, ocasionando um
fluxo cada vez maior de crianças consumistas que por sua vez se tornarão adultos
propícios a um índice maior de consumo. Duarte (2006), se referindo as relações
entre produção e consumo e, como este opera ideologicamente as ações humanas
ira dizer que:
Outro procedimento utilizado pelos economistas clássicos e criticado
por Marx é o de análise unilateral da relação entre produção e
consumo, isto é, entre oferta e demanda. Também esse procedimento
faz parte do processo de naturalização das relações capitalistas de
produção. Primeiramente afirma-se que toda a produção está
direcionada para a satisfação nas necessidades dos seres humanos. Em
[Type text]
[Type text]
[Type text]
seguida, quase que imperceptivelmente, essas necessidades são
reduzidas a necessidades imediatamente individuais. Por fim as
necessidades individuais são vistas como tendo uma origem natural,
não induzida. Na ótica dos economistas, a produção seria determinada
pelo consumo, isto é, pelas necessidades naturais do individuo.
(p.139).
Podemos notar ainda, que articulados os dados quantitativos acima
descritos com a análise do próprio Duarte, perceberemos que gradativamente o
sujeito é induzido ao consumo, não estritamente para atender as suas
necessidades, mas para satisfazer os padrões de consumo que o próprio sistema de
produção, insere ideologicamente pelas campanhas de estratégicas de mercado nas
pessoas, ou pela dispersão de valores capitalistas na sociedade.
Podemos notar ainda, que este quadro nos conduz a uma visão mais ampla
da problemática ao considerar a infância como processo de amadurecimento e
compreensão de mundo que vai se desenrola tanto na instituição de ensino
(escola) e nas relações interpessoais que ela manterá. Neste caso é valido salientar
a importância da escola enquanto instituição formal no que tangencia a
socialização do conhecimento acumulado, representada pela figura do mestre, o
professor, que traça e desempenha funções pedagógicas de âmbito educativo.
É interessante observar ainda, a inserção de valores imbuídos a um grau
materialista que condiciona a criança a uma esfera ideológica caracterizada pelo
apego a uma determinada grife, marca ou ate mesmo a um objeto eletrônico, que
esteja em evidencia no mercado, neste caso o sujeito vale mais pelo que possui e
não pelo que é. Predominando um conceito mais individualista no qual se
sobrepõe ao bem da coletividade.
O TRABALHO EDUCATIVO E O PROCESSO DE FORMAÇÃO HUMANA
A estruturação de um circulo de aprendizagem, elaborado pelo professor,
mais do que uma simples forma de socializar o conhecimento sistematizado já
produzido, é reconhecer com ele os elementos que possibilita a compreensão e a
produção de novos saberes.
A estrutura escolar no Brasil, continuamente esteve à margem de uma
qualidade de ensino-aprendizagem satisfatória, o foco na economia, o domínio da
[Type text]
[Type text]
[Type text]
ideologia burguesa corroborou de forma significativa para o comprometimento do
ensino. Dessa forma o que percebemos são séculos de descaso que deixou marcas
não somente nos próprios alunos, mas também naqueles que se propuseram ao
oficio ou a prática educativa.
Ao analisar o contexto educacional brasileiro em seus aspectos
econômicos e políticos, perceberemos que historicamente a educação fora forjada
para supri a demanda do mercado, desde um ensino tecnicista e políticas publicas
sobrepostas a uma educação emancipadora, que transformasse o individuo num
ser critico capaz de interferir e alterar aquilo que pudesse não estar de acordo com
seus ideais. Segundo Freire, (1997):
“O processo de aprendizagem é constituído por esses movimentos de
mudança. Aprender significa mudar, transformar. Ensinar significa
acompanhar e instrumentalizar com intervenções, devoluções e
encaminhamentos, esse processo de mudança de apropriação do
pensamento, dos desejos e sonhos de vida. Educador ensina, enquanto
ensina aprende apensar (melhor) e a construir seus sonhos de vida.”
(p.17).
Intervir requer antes de tudo conhecer, instrumentalizar-se, apropriar-se do
conhecimento já constituído. Porem é mister considerar que não basta apenas
apropriar-se do conhecimento já produzido se este não lhe conduz a produção de
novos. O delinear do processo de aprendizagem se revela sólido a parti do
momento que se consolida a absorção e a produção dos mesmos.
Moreira (2003), em seu artigo: “cultura midiática e educação infantil.”
Afirma que “antes de serem alfabetizadas pela escola, as crianças, sobretudo nos
grandes centros, já foram alfabetizadas pelas marcas e pelos logos.” Nesse sentido
vale reiterar a importância do educador ao desenvolver o trabalho pedagógico,
enquanto formador de opinião e condutor da aprendizagem do educando, cujo
trabalho deve ser desenvolvido não meramente como um facilitador da
aprendizagem, a revelia do lúdico em quanto um método de desenvolvimento
infantil, mas envolver-se de forma consciente, critica e acima de tudo político,
posto que o trabalho educativo segundo Saviani, pertencendo o âmbito do trabalho
não material cuja especificidade se dá através da aquisição do conhecimento
[Type text]
[Type text]
[Type text]
historicamente produzido pela humanidade bem como da produção do mesmo e
do ensino. Saviani (2008), afirma que:
A escola é uma instituição cujo papel consiste na socialização do saber
sistematizado... Não se trata, pois, de qualquer tipo de saber. Portanto
a escola diz respeito ao conhecimento elaborado e não ao
conhecimento espontâneo; ao saber sistematizado e não são saber
fragmentado (p.14).
É através desse mecanismo de captação e produção passando por um viés
interpretativo que sustentará as bases de uma educação que vai além de propostas
libertarias e escolanovistas, mas antes, uma educação pautada na criticidade, uma
educação que vai alem da reprodução ideológica e valorativa das concepções
burguesas. De fato, o comprometimento crítico e político são fundamental, capaz
de levar o educador a desenvolver um trabalho sólido voltado para o coletivo e
não para o individualismo que separa e restringe as relações, dessa forma a
educação terá possibilidades expressivas de transpor os muros que separam o
ambiente escolar e o espaço social onde o individuo se encontra.
Em seu livro, “o que é pesquisa em educação?” Potiguara nos trás um
panorama onde transcorre sobre a atitude pedagógica, a qual o educador deve se
submeter, onde a atividade pedagógica é voltada para o sujeito, para a concepção
de homem. (PEREIRA, 2005. Ed 2008, p. 22). Assim, pensar o humano enquanto
ser sociologicamente evolutivo e historicamente construtor de sua história é
pensar o existencial, pensar a totalidade das partes que o compõem dando
significado concreto a este sujeito.
Sem sombra de duvida, se parar-mos para analisar e refletir as
características educacionais existentes, principalmente nas escolas da rede
publica, constataremos além do despreparo de muitos professores, a falta de
comprometimento com uma postura critica o bastante para perceber a ideologia
que perpassa a educação, dessa forma o que vemos em muitas escolas é a mera
reprodução dessa mesma ideologia em responsabilizar os seus alunos pelo seu
próprio fracasso. Compreender o processo pedagógico e como ele se insere na
sociedade, também é compreender as contradições existentes tanto na escola e na
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sociedade, posto que seja a partir das contradições, ou seja, assumindo um
conceito dialético que podemos entender e contribui para melhorar os problemas
na área educativa. Segundo Mészáros (2008):
Tudo isso é uma parte integrante da sociedade capitalista pela qual os
indivíduos particulares são embebidos nos valores da sociedade de
mercadorias, como algo lógico e natural... Ademais, o que torna as
coisas ainda piores é que a educação contínua do sistema do capital
tem como cerne a asserção de que a própria ordem social estabelecida
não precisa de nenhuma mudança significativa. Precisa apenas de uma
“regulação mais exata” em suas margens, que se deve alcançar pela
metodologia idealizada do “pouco a pouco”. (p.82)
É, nesse arcabouço criado e constituído por uma sociedade que visando o
progresso se torno contraditória em suas diversas partes, que a criança não sendo
um coadjuvante, mas protagonista de suas ações se posiciona em meio a esta
problemática. Nesse sentido a figura do educador tem seu papel fundamentado na
estrutura que descortina toda ideologia que envolve o conceito midiático e
publicitário direcionado a criança.
Estes movimentos se dão justamente a partir do momento em que
educador e educando, pela busca e pela aquisição de novos saberes impelem a
sociedade, pela transformação da mesma a constituir-se como espaço inserido
dentro do ambiente escolar. Dessa forma o ambiente escolar constitui-se como
espaço de luta, de produção e, de transformação social que visa não somente
entender os fenômenos existentes, mas superá-los em suas múltiplas esferas
sociais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho procurei de forma sucinta estabelecer uma relação entre as
campanhas de marketing e como elas interferem de forma subjetiva a agregação
de valores capitalistas.
Nesse sentido, fica evidente que o processo pela qual a criança é envolvida
na agregação de informações midiáticas tem por objetivo central favorecer o
[Type text]
[Type text]
[Type text]
desenvolvimento da produção de mercadorias bem como o consumo imediato da
mesma.
Convém destacar, que as conseqüências oriundas de tais ações
mercadológicas, infere diretamente no desenvolvimento psíquico social da
criança, fazendo com que a mesma agregue para si, normas de conduta e valores
sociais que cooperam diretamente para a perpetuação da sociedade capitalista bem
como de suas praticas ideológicas. Nessa perspectiva faz-se ressaltar que “a
educação é um campo social no qual as várias ideologias que perpassam a nossa
sociedade se materializam de modo especial”. (DUARTE Newton, p.85). Nesse
sentido, é fundamental compreender como se da o processo educacional na
sociedade e, principalmente estabelecer o educador como sujeito profissional
qualificado, intelectual e crítico o bastante para descortina as artimanhas
capitalistas e contribuir para o desenvolvimento humano e social. Posto que o
profissional de ensino tenha como papel primordial a socialização do
conhecimento historicamente produzido pela humanidade e que, é através da
aquisição desses, que o sujeito se plenifica e tem possibilidades de mudança.
É de suma importância que esta reflexão não se esgote por aqui, mas, antes
de tudo sirvam de instrumento para fomentar outros debates, outras pesquisas que
possa colaborar para um melhor desenvolvimento educativo.
REFERENCIAS
DUARTE, Newton, Crítica ao fetichismo da individualidade. São Paulo, Autores Associados:
2004
______. Vigotski e o “aprender a aprender”: críticas as apropriações neoliberais e pó-modernas
da teoria vigotskiana. Campinas, Autores associados: 2006
JÚNIOR, Jose Ednilson Gomes de Souza, Propaganda Infantil: reflexões pós modernas sobre
consumo e mídia / orientadora: Msc. Camila Hildebrand Gazal Fortaleza / co-orientador: Dr.
Josemar de Campos Maciel. Campo Grande MS, 2007. Trabalho de conclusão de curso (graduação
em comunicação social) – Faculdade Estácio de Sá.
KLEIN, Naomi, Sem logo: A tirania das marcas em um planeta vendido. Rio de Janeiro, Record:
2002
Mészaros, István, Educação para além do capital. São Paulo, Boitempo Editorial: 2008
[Type text]
[Type text]
[Type text]
MOREIRA, Alberto da Silva, Cultura midiática e educação infantil. Campinas, Educ. Soc, vol.
24, n. 85, p. 1203-1235, dezembro 2003
PEREIRA, Potiguara Acácio, O que é pesquisa em educação? São Paulo, Paulus: 2008
PINTO, Alessandra Moína Martins de Souza, Pequenos Grandes Consumidores: Uma abordagem
sobre consumo infantil na sociedade contemporânea / orientadora: Fernanda Casagrande
Martineli. Rio de Janeiro, 2007. Trabalho de conclusão de curso (graduação em comunicação) –
UFRJ, Escola de Comunicação, Publicidade e Propaganda.
Portal ABRINQ publicado em 17 de maio de 2011. 12h 36min
Portal de jogos gamevicio publicado em 11 de outubro de 2011. 13h 45min
Portal terra publicado em 14 de setembro de 2007. 10h11min
SAVIANI, Dermeval, Pedagogia Histórico crítica. São Paulo, Autores Associados: 2008.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
REFORMULAÇÃO CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO NO ESTADO
DE GOIÁS: ALÉM DE TUDO, UM PROCESSO IDENTITÁRIO!
Vinícius Duarte Ferreira
Prof. Dr. Sérgio Pereira da Silva (orientador)
Programa de Pós-Graduação em Educação – UFG/CAC
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES
[email protected]
RESUMO
O objetivo geral desse trabalho é o de apresentar uma análise sobre o processo de reformulação
curricular ocorrido na rede pública do Estado de Goiás durante os anos de 2007 a 2011,
problematizando os alcances e limites de suas propostas. Para tanto, partimos da análise dos
documentos elaborados pela Coordenação de Ensino Médio da Secretaria de Estado da Educação
de Goiás, bem como da legislação Estadual e Federal que estabelecem parâmetros para essa etapa
da educação. Considerando que o ensino médio tem sido uma temática polêmica, sobretudo
quando observamos as discussões relativas à sua identidade, pretendemos contribuir para o debate
no campo de currículo em Goiás. Dentre as polêmicas levantadas, a questão que envolve o modelo
de formação dos jovens tem aparecido na literatura especializada de maneira incisiva, uma vez que
possui correlação com várias disputas políticas presentes na consolidação dessa etapa da educação
básica. As concepções de formação profissional e formação propedêutica postulam, através de
ações pedagógicas que lhes são peculiares, distintos modelos de sociedade, sobretudo, definem de
que modo a educação deve atuar no sentido de inserir os jovens no chamado “mundo do trabalho”.
No presente estudo, verificamos como, muitas vezes, as questões legais que envolvem o debate
sobre a identidade do ensino médio possuem relação direta com disputas políticas que vem
acompanhando a consolidação dos ideais democráticos presentes no debate educacional brasileiro.
Por outro lado, não objetivamos apenas compreender como a legislação educacional faz suas
adequações diante dos discursos que vem sendo historicamente construídos. Antes disso,
pretendemos fazer uma análise que procura ampliar nossa percepção com relação à maneira como
o mundo do trabalho se articula com as políticas educacionais e como podemos pensar tal
articulação dentro das concepções curriculares que estiveram presentes no processo identitário de
reformulação curricular em Goiás: em nível de orientações nacionais, através do Programa Ensino
Médio Inovador, e em nível de orientações estaduais, com o Programa Ressignificação do Ensino
Médio.
Palavras-chave: currículo; ensino médio; ressignificação.
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Este texto é resultado das reflexões e informações que obtivemos na
oportunidade de nossa pesquisa de mestrado, em andamento, provisoriamente
[Type text]
[Type text]
[Type text]
intitulada REFORMULAÇÃO CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO DO
ESTADO DE GOIÁS (2007-2011), desenvolvida junto ao Programa de PósGraduação em Educação, na Universidade Federal de Goiás/CAC, vinculado à
linha de pesquisa História e Culturas Educacionais. Especificamente,
analisaremos como o processo de reformulação do ensino médio que ocorreu em
Goiás entre os anos 2007-2011 se contextualiza dentro das análises que estão
sendo construídas no campo do currículo e do debate acerca da identidade do
ensino médio.
Trata-se de compreender como a formulação dos currículos escolares,
mesmo no contexto específico da reforma, não é algo que ocorre de maneira
imediata, ou seja, não nasce no curso dos acontecimentos do presente, antes disso,
corresponde a um processo cultural que se forja no ambiente escolar. Enquanto
processo dinâmico e coletivo, a cultura representa a forma como produzimos
nossas relações sociais. Nesse sentido, o cotidiano escolar representa um espaço
de possibilidades para diversas leituras sobre a educação (Apple, 1989). Os
sujeitos sociais presentes em cada unidade escolar produzem significados próprios
a partir das relações sociais que estabelecem entre si; cabe aos pesquisadores do
campo da educação buscar epistemologias que auxiliem no estudo desse cotidiano
a fim de apresentarem novas análises e possibilidades de investigação.
Quando propomos pensar o ensino médio a partir das políticas curriculares
a ele destinadas é porque visualizamos uma relação estreita e dialética entre a ação
pedagógica e as finalidades dos sistemas de ensino (Sacristã, 1998). No conjunto
do debate democrático existente, na educação brasileira, a identidade do ensino
médio aparece como tema que vem repercutindo, para não retrocedermos muito,
sobretudo a partir da legislação educacional da década de 1970 (Lei n°
5692/1071). Ora oscilando para uma formação estritamente profissionalizante, ora
se aproximando de um discurso que defende uma educação propedêutica, a
legislação educacional não sustenta claramente qual deve ser a finalidade do
ensino médio. Embora a Lei n° 9394/1996 tenha avançado no sentido de
configurá-lo como etapa final da educação básica (Art. 35), ainda não surgiram
políticas capazes de resolver o problema relativo às finalidades dessa etapa da
educação.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Apesar das dificuldades apontadas, acreditamos que a reformulação
curricular, ocorrida em Goiás, carece de aprofundamentos teóricos em termos de
análises, uma vez que seus pressupostos curriculares sinalizam, em tese, para a
superação do problema identitário que acompanha o debate sobre o ensino médio
no Brasil. Nesse sentido, no nosso referencial teórico, priorizamos o pensamento
de Michael Apple em suas análises sobre o cotidiano escolar, bem como as
contribuições de Saviani e Kuenzer que, em diferentes perspectivas marxistas,
analisam as relações existentes entre trabalho e educação. Na primeira parte,
apresentaremos o contexto de criação e implementação da reformulação curricular
em Goiás. Posteriormente, trataremos das questões centrais existentes no debate
acerca da identidade do ensino médio. Encerraremos com nossas considerações
sobre a abordagem teórica dessa pesquisa com relação à reforma curricular
problematizada.
1. SOBRE A REFORMULAÇÃO CURRICULAR DO ENSINO MÉDIO EM
GOIÁS
Entre os anos de 2007 e 2011, a Secretaria de Estado da Educação de
Goiás (SEDUC/GO), através da Superintendência de Ensino Médio (SEM/GO),
elaborou e implementou o “Programa de Ressignificação do Ensino Médio”
(GOIÁS, 2009). De acordo com os organizadores desse programa, era necessário
elaborar um novo currículo para o ensino médio com a finalidade de reorientar: “o
ato de ensinar e de aprender, o ato de gerir a instituição, o conhecimento e as
regras de convivência entre os sujeitos”, compreendendo que o espaço escolar se
constitui através da aprendizagem “cultural, cognitiva, socioambiental, emocional
e afetiva” (MOREIRA, 2009, p.7)35.
Para os organizadores do programa, o ensino médio que existia até então
não correspondia aos interesses imediatos da população goiana, tampouco dos
35
Marcos Elias Moreira foi Superintendente Estadual de Ensino Médio durante o processo de
reformulação que ocorreu em Goiás no período estudado. Organizou o livro “Ressignificação:
ensino médio em travessia” que contêm dados, depoimentos e artigos relacionados ao contexto de
implementação do Programa de Ressignificação do Ensino Médio.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
sujeitos diretamente interessados: professores, gestores, técnicos, pais e alunos.
Dentre as críticas, levantadas pela própria SEDUC, destacamos: o planejamento
muito burocrático, a falta de debates acerca do currículo, a falta de clareza quanto
à identidade do aluno de ensino médio, a baixa remuneração, a falta de estrutura
familiar, a indefinição dos jovens com relação às suas ações futuras, o currículo
preso e vinculado aos objetivos distantes da realidade local de cada instituição
escolar, o exercício inadequado da autoridade na relação aluno-professor, a
ausência de autonomia nas escolas, a falta de infraestrutura adequada, dentre
outros (MOREIRA, 2009).
Notemos que existiam diagnósticos muito complexos quanto ao problema
específico do ensino médio. Desde os apontamentos quanto à estrutura familiar
até a questões diretamente relacionadas com os problemas específicos da
educação, como a ausência de debates acerca do currículo, por exemplo. Mesmo
diante desse controverso diagnóstico, os organizadores do “Programa de
Ressignificação do Ensino Médio” (ProREM) partiram dessas constatações para
elaborarem um novo currículo visando a construção de uma nova identidade para
essa etapa da educação que estivesse em acordo com as transformações ocorridas
na sociedade e no mundo do trabalho, as quais demandavam, segundo o
documento orientador, um tipo de formação humana capaz de contemplar o
preparo para o mundo do trabalho e para a cidadania, o aperfeiçoamento da
pessoa humana e o prosseguimento dos estudos (GOIÁS, 2009, p.248), de
maneira não dissociada.
De fato, o ProREM ocorreu no Estado de Goiás. Durante o ano de 2007
houve vários debates envolvendo algumas comunidades escolares que resultaram
na implementação de seis projetos piloto no ano letivo de 2008; em 2009, 182
escolas da rede estadual aderiram ao programa num universo de 600 escolas. As
mudanças mais significativas que ocorreram nesse período contemplam a
elaboração de novos projetos políticos pedagógicos a partir das orientações do
programa, a construção de conteúdos curriculares obrigatórios e
opcionais/complementares e a semestralidade na oferta de disciplinas
(MOREIRA, 2009).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Esse programa de reformulação curricular goiano foi articulado em algumas
escolas juntamente com o Programa Ensino Médio Inovador (BRASIL, 2009),
pensado e elaborado pela Secretaria de Educação Básica do Ministério da
Educação (SEB/MEC). Em linhas gerais, os pressupostos curriculares presentes
no programa goiano estão presentes na implementação do Programa Ensino
Médio Inovador (ProEMI), uma vez que ambos possuíam amplas similaridades
em termos de novos referenciais curriculares para o ensino médio36. Entretanto,
após a implementação do ProEMI em algumas escolas estaduais, houve uma
separação entre aquelas que seguiram com o projeto específico do Estado de
Goiás e outras que aderiram, também, ao programa do MEC. Vale considerar,
como elemento importante, que as escolas que fizeram parceria com o MEC
passaram a receber recursos financeiros através do Programa Dinheiro Direto na
Escola (PDDE)37.
Em termos teóricos, ambos avançaram na discussão sobre a dualidade
existente entre a formação técnica e a propedêutica, ou seja, propunham maior
integração entre a formação para o trabalho e a formação para as etapas da vida. A
reformulação curricular que ocorreu em Goiás se insere, portanto, num conjunto
de reformas que vem se consolidando na educação básica desde a promulgação da
Lei n° 9394/1996 e os seus subseqüentes decretos, complementos e programas
relacionados ao ensino médio brasileiro38. Essa grande “movimentação”
demonstra que se trata de uma etapa da educação em constante transformação e de
36
Os textos de ambos os programas possuem consonâncias com a Resolução CEB Nº3/1998, que
institui as Diretrizes Nacionais para o Ensino Médio. Dentre as proximidades observadas,
podemos notar a divisão das disciplinas em grandes áreas do conhecimento e o foco na vinculação
entre o “mundo do trabalho” e a “prática social”, além daquilo que se denomina como exercício
pleno da “cidadania”.
37
Os valores depositados variavam de 50 mil reais, para uma escola com cerca de 700 alunos, até
120 mil reais para uma escola com mais 2800 alunos. (BRASIL, 2009)
38
Podemos citar como exemplo a Lei n° 9394/1996, o Decreto n° 2208/1997, o Decreto n°
5154/2004 e a Lei n° 11.741/2008.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
extrema importância para a nossa sociedade, o que fundamenta nossa pesquisa
sobre esse fato em Goiás.
2. ALTERIDADE E IDENTIDADE NO DEBATE CURRICULAR SOBRE
ENSINO MÉDIO
A palavra alteridade remonta ao que é específico de algo, talvez um sujeito,
quando, e somente quando, esse algo está comparado a outro, talvez a um objeto.
Em outras palavras, significa estar em relação com o outro, ou melhor, reconhecer
a importância de que o outro precisa ser compreendido dentro daquilo que ele
representa, e de que a existência do “eu” depende dessa relação de compreensão
mútua. Quando levantamos a possibilidade de pensarmos as alteridades do debate
curricular relacionados ao ensino médio brasileiro, avançamos num terreno
meticuloso e denso em termos de análise. As diferenças existentes no debate em
educação contribuem no sentido de repensarmos constantemente os caminhos que
vêm sendo adotados para definirmos a alteridade disso ou daquilo. Afinal,
poderíamos acreditar que existe um discurso capaz de reunir todos os esforços
para a elaboração de ações transformadoras da sociedade vigente?
Em se tratando de ensino médio, no Brasil, existem dois modelos de
formação em discussão: o profissional e o propedêutico. Esses modelos
constituem, aparentemente, seu problema identitário. Ora, se consideramos que há
uma relação direta na nossa sociedade entre o trabalho e a educação e este, em
qualquer nível de compreensão, corresponde a uma necessidade humana; se
aprendemos a sobreviver pelo trabalho e a produzir determinados tipos de
trabalho e o que realizamos hoje corresponde ao resultado histórico do processo
de consolidação do capitalismo, esse binarismo formação técnica para o trabalho
imediato e formação técnico-cultural para o ensino superior e trabalho posterior se
configura, no mínimo, num desafio teórico.
Para Saviani (2007), numa perspectiva marxista, a concepção ontológica da
palavra “trabalho” está relacionada com a potencialidade do homem em
transformar a natureza, que consiste na capacidade de produzir e reproduzir as
[Type text]
[Type text]
[Type text]
condições de sua existência. O trabalho, dessa maneira, é parte integrante da vida
e não pode ser dela dissociado. Dentro desse tipo de concepção, a ideia de
trabalho aparece na educação como um elemento curricular que não pode ser
dissociado da formação geral, muito menos do ensino médio.
Entretanto, essa não é a noção socialmente difundida. Na maior parte dos
casos, a palavra “trabalho” possui relação direta com aquilo que se faz de maneira
produtivista. Para elaborar os processos de trabalho atualmente, fazemos uso de
conhecimentos específicos na realização de determinada tarefa. Ao associarmos a
realização da tarefa ao ato de produzir dentro do sistema capitalista, na verdade,
estamos atribuindo um valor produtivo ao conhecimento. Esse sentido produtivo
associado ao conhecimento, conforme aponta Saviani (2003), representa a
apropriação dos conhecimentos humanos por uma pequena parcela da população e
deve ser superado pela introdução de uma educação politécnica nas escolas.
Essa perda de sentido presente nas concepções de trabalho está presente nas
discussões relativas às formulações das leis e dos currículos escolares. Como nos
coloca Saviani (2003), houve, historicamente, uma apropriação dos
conhecimentos praticados nas escolas por parte de uma minoria. A maneira como
os currículos estão organizados não pode garantir uma educação “politécnica”, ou
seja, uma educação que seja capaz de oferecer aos jovens oportunidades, e não
apenas prepará-los para consolidarem o sistema produtivo vigente.
Não estamos, com isso, defendendo a educação politécnica como uma
panaceia para os problemas da educação, tampouco negando a pertinência de tal
educação. Pretendemos, apenas, levantar questões teóricas relativas às atuais
reformas curriculares que vêm ocorrendo no ensino médio goiano.
Atendendo, possivelmente, aos interesses de práticas pedagógicas que
procuram o desenvolvimento de valores voltados para o contexto do atual mundo
do trabalho, a reformulação curricular goiana aproximou o currículo do ensino
médio do conjunto das “competências” e “práticas” que estão sendo buscados nos
trabalhadores de modo geral: produtividade, flexibilidade, articulação de
conhecimentos, domínio do conhecimento tecnológico, autonomia, cooperação,
iniciativa, polivalência, dentre outros. Contudo, não vincula a formação dos
jovens a uma formação estritamente profissionalizante. Podemos verificar isso
[Type text]
[Type text]
[Type text]
observando as reflexões dos próprios organizadores do programa ao considerarem
que a superação da dicotomia entre a formação para o trabalho e a formação
cidadã pressupõe:
(...) a construção de uma pluralidade identitária para o ensino médio o
que não é apenas um problema pedagógico. É muito mais uma questão
de políticas públicas e, especificamente, de política educacional a ser
assumida pelos organismos competentes como um todo. Se as
mudanças ocorridas no mundo do trabalho apontam para novas
relações entre ciência e trabalho, nas quais as formas de fazer – com
base em processos técnicos simplificados, restritos geralmente a uma
área do conhecimento, transparentes, facilmente identificáveis e
estáveis – foram substituídas por ações que articulam conhecimento
científico, capacidades cognitivas superiores e capacidade de
intervenção crítica e criativa perante situações imprevistas. Essas
ações exigem soluções rápidas, originais e teoricamente
fundamentadas, para responder ao caráter dinâmico, complexo,
interdisciplinar e opaco que caracteriza a tecnologia na
contemporaneidade. (Moreira, 2009, p.15)
Essa aparente dinâmica “flexível” da vida que é colocada em movimento
pelas novas relações entre o conhecimento, o mundo do trabalho e a escola carece
de melhor compreensão. Esse discurso aparece, também, no ProEMI:
O trabalho é um princípio educativo no currículo do ensino médio
também porque o processo social de produção coloca exigências
específicas para a educação, visando à participação direta dos
membros da sociedade no trabalho socialmente produtivo. Porém,
deve-se ter claro que essa perspectiva de formação que possibilita o
exercício produtivo não é o mesmo que fazer uma formação
estritamente profissionalizante. Ao contrário, essa participação, que
deve ser ativa, consciente e crítica, exige, antes, a compreensão dos
fundamentos da vida produtiva em geral. Somente atendido a esse
pressuposto é que o trabalho diretamente produtivo pode se constituir
no contexto de uma formação específica para o exercício de
profissões. (BRASIL, 2009, p. 7)
Como observamos, os projetos ProREM e ProEMI possuem discursos que
defendem a necessidade dos jovens se adequarem aos novos desafios colocados
pela organização social globalizada. Nesse contexto, a educação atual, que deve
ser reformulada, é percebida como algo preso a uma estrutura que não
corresponde aos conceitos de flexibilização e dinamismo presentes na sociedade,
sobretudo na “vida produtiva”. Poderíamos, a partir dessa constatação, indagar a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
respeito das estratégias de discurso adotadas nesses processos de reformulação:
estamos mesmo construindo uma nova identidade para o ensino médio?
Se considerarmos que são as relações entre o conhecimento e o mundo
produtivo que estabelecem as concepções de trabalho a serem incorporadas no
contexto de uma reformulação curricular, estaríamos concordando que a educação
deve adequar seus currículos à “vida produtiva em geral”, tal como foi afirmado
acima. Por outro lado, conforme nos alerta Saviani (2003), a compreensão do
trabalho como princípio educativo, numa perspectiva politécnica, não deve estar
próxima do valor produtivo que ele representa. Mesmo que os programas
ProREM e ProEMI não se vinculem a uma formação estritamente profissional, o
discurso presente na reformulação curricular goiana ainda é dúbio quanto aos seus
objetivos de estabelecer uma formação que vise à emancipação humana, ou seja,
que não esteja subordinada ao mundo produtivo.
Kuenzer (2001) aponta que o conceito de competências no âmbito das
políticas educacionais, formuladas a partir da Lei n° 9394/1996, assume papel
essencial, pois mesmo ausente nas diretrizes e parâmetros curriculares do ensino
fundamental, aparece como categoria central nas diretrizes curriculares para o
ensino médio, para a educação profissional e para a formação de professores. Por
outro lado, a autora analisa que, no contexto das novas formas de organização e
gestão do trabalho, influenciadas pelo toyotismo ou acumulação flexível (Harvey,
2005), o conceito de competência passa a supor o domínio do conhecimento
científico-tecnológico e sócio-histórico frente à complexificação dos processos de
trabalho, com impactos nas formas de vida social. Embora a tendência dos
processos mediados pela microeletrônica – justamente por serem mais complexos
– suponha uma relação do trabalhador com o conhecimento materializado nas
máquinas e equipamentos como “usuário”, existe a demanda pelo
desenvolvimento de capacidades cognitivas complexas, em particular as relativas
a todas as formas de comunicação, ao domínio de diferentes linguagens e ao
desenvolvimento do raciocínio lógico-formal. Trata-se de competências que, de
acordo com a autora, são desenvolvidas através de relações sistematizadas com o
conhecimento através de processos especificamente pedagógicos disponibilizados
por escolas ou por cursos de educação profissional (Kuenzer, 2001).
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A partir dessas considerações é que pensamos criticamente a escola
brasileira e as políticas públicas a ela destinadas através dos currículos. Desde a
Lei n° 9394/1996, e considerando ainda os decretos que tentaram regulamentar o
ensino médio no Brasil, o debate ainda não se encerrou. Não estamos muito
seguros do que vem a ser uma formação para o trabalho imediato ou uma
formação para a vida. As atividades a que denominamos de trabalho, sob a ótica
do senso comum, estão diretamente relacionadas ao sistema produtivo. O
problema é que as relações sociais de trabalho, sobretudo aquelas diretamente
vinculadas ao capital, estão dissociadas de uma qualidade de vida para a maior
parte da população, isso considerando as longas jornadas de trabalho, a baixa
remuneração e a péssima organização estrutural dos grandes centros urbanos.
Pensar a educação, portanto, compreende a tarefa de refletir sobre as
relações sociais diretamente relacionadas ao contexto escolar. Poderíamos então
voltar à velha pergunta: para que serve a educação? Ou avançarmos: como
construir um novo currículo para a educação? Em ambos os sentidos é preciso que
haja uma reflexão crítica para que não excluamos o que já foi conquistado
socialmente e para que construamos projetos políticos que respeitem a realidade e
os direitos dos sujeitos da comunidade educativa.
Consideramos que a escola deve primar por uma prática pedagógica
diferenciada e pela elaboração de um currículo capaz de promover a emancipação
da sociedade, superando as dificuldades históricas do ensino médio brasileiro.
Desse modo, é fundamental compreendermos a educação em suas estreitas
conexões com as “estruturas de desigualdades nesta sociedade quanto com suas
tentativas para superá-las” (Apple, 1999, p.15). Não se trata, portanto, de um
problema relativo apenas à identidade do ensino médio; esta, certamente, terá que
assumir um caráter pluridimensional, uma vez que incorporará a diversidade
cultural própria dos processos sociais humanos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A própria dinâmica escolar imprime uma identidade ao seu contexto
específico. Enquanto os governos constituem sua “Escola de Estado”, são as
[Type text]
[Type text]
[Type text]
comunidades escolares que executam, na prática, seus os programas. Por esse
motivo, e pela ausência de compreensão a respeito desses fatores, é que fracassam
muitas reformas curriculares. A ênfase demasiada nas propostas e nos discursos
desloca o foco dos agentes de sua transformação. Sendo assim, ao pensarmos a
identidade do ensino médio, precisamos, concomitantemente, aprofundar a nossa
compreensão relativa à maneira como as transformações ocorrem na nossa
sociedade.
Diante dessa compreensão, observamos que a consolidação das políticas
públicas em educação faz parte de um processo dinâmico, e dialético, ou seja, não
ocorre de forma unilateral. A educação, enquanto parte da formação do nosso
movimento histórico-cultural, deve ser compreendida através do cotidiano de suas
práticas pedagógicas, visto que as ideologias e discursos que constituem os
currículos não podem simplesmente ser impostos por um grupo a outro (Apple,
1989).
Portanto, é necessário estudarmos a realidade de maneira direta e
procurando perceber como a comunidade escolar organiza as maneiras de
reorientar suas práticas diante das contradições presentes na sociedade. Pensar os
fundamentos ideológicos e culturais presentes na consolidação de currículos
escolares e na constituição de suas respectivas identidades, corresponde, nessa
lógica, à necessidade de traduzirmos a escola enquanto uma instituição inserida
nas relações e tensões dialéticas entre as esferas econômica, política e cultural
(Apple, 1989).
Como colocado por Kuenzer (2010), é necessário que façamos avaliações
específicas do que vem sendo construído dentro da educação básica brasileira a
partir da promulgação da LDB 9394/1996. Findamos o PNE (2000-2011) e já se
estabeleceu o novo PND (2010-2020) sem que fosse possível perceber quais
mudanças seriam realmente necessárias dentro das propostas de democratização,
universalização e melhorias da educação. Nesse sentido, ao avançarmos sobre a
análise do processo de reformulação curricular que ocorreu em Goiás,
procuraremos aprofundar numa abordagem mais específica no qual se insere essa
reforma.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
REFERÊNCIAS
APPLE, Michel W. Educação e Poder. Artes Médicas: Porto Alegre, 1989.
APPLE, M. W. Conhecimento oficial: a educação democrática numa era conservadora. Ed.
Vozes: Petrópolis, 1999.
BRASIL. Lei n° 9394, de 20 de dezembro de 1996. Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 7ª
Ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Edições Câmara, 2012.
BRASIL. CNE/CEB. Resolução N°3, de 26 de Junho de 1998. Institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Médio. Disponível em www.portal.mec.gov.br, acesso em 19/10/2012.
BRASIL. Decreto n. 5.154 de 23 de julho de 2004. Regulamenta o § 2º do art. 36 e os art.39 a 41
da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Disponível em: www.portal.mec.gov.br, acesso em
18/10/2012.
BRASIL. Decreto n. 2.208, de 17 de abril de 1997. Educação profissional: legislação básica.
Brasília, DF: PROEP, 1998.
BRASIL. MEC/SEB. Programa Ensino Médio Inovador – Documento orientador / set. 2009.
Disponível em: www.portal.mec.gov.br, acesso em 09/05/2012.
GOIÁS. Superintendência de Ensino Médio/SEDUC. Referenciais Curriculares – Ensino Médio
(versão preliminar), 2009. Disponível em www.educacao.go.gov.br, acesso em 19/10/2012.
HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005.
MOREIRA, AF, SILVA TT, (organizadores). Currículo, cultura e sociedade. São Paulo: Cortez;
1994.
MOREIRA, Marcos E. (organizador). Ressignificação: ensino médio em travessia. Goiânia: Kelps,
2009.
SANCRISTÁN, J. C. O currículo: uma reflexão sobre a prática. Porto Alegre: ArtMed, 1998.
SAVIANI, Demerval. O choque Teórico da Politecnia. In: Revista Trabalho, Educação e Saúde,
volume 1, nº 1, EPSJV/Fiocruz; Rio de Janeiro, 2003.
SAVIANI, Dermeval. Trabalho e educação: fundamentos ontológicos e históricos. In: Revista
Brasileira de Educação, v.12, n.34, 2007.
KUENZER. Acácia Zeneida. As mudanças no mundo do trabalho e a educação: novos desafios
para a gestão. São Paulo: Cortez, 2001.
KUENZER. Acácia Zeneida. O ensino médio no plano nacional de educação 2011-2020:
superando a década perdida? In: Educação e Sociedade, Campinas, v. 31, n. 112, p. 851-873, jul.set. 2010.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
REPRESENTAÇÕES SOCIAIS EM DIREITOS HUMANOS
A PERCEPÇÃO DOS PROFESSORES DE ANÁPOLIS-GOIÁS
Christiane de Holanda Camilo
Profª. Drª. Rosani Moreira Leitão (Orientadora)
Mestranda em Direitos Humanos-UFG
[email protected]
RESUMO
Este artigo traz reflexões iniciais a cerca das representações sociais em direitos humanos
demonstrada por professores de uma escola pública localizada na cidade de Anápolis/GO. Esta é
uma pesquisa preliminar que vislumbra iniciar um diálogo sobre a percepção dos professores desta
localidade, com vistas a iniciar o debate sobre as Diretrizes Nacionais de Educação em Direitos
Humanos prevista na Resolução CNE/CP nº 1/2012 e propor no futuro um estudo mais amplo que
possa confluir em subsídios para a elaboração de políticas públicas educacionais sobre direitos
humanos.
Palavras-chave: representações sociais; direitos humanos; educação.
INTRODUÇÃO
O tema direitos humanos é atualmente debatido em diversos cenários
nacionais e internacionais, contudo, a sua real concreção merece maior destaque e
ampla discussão não apenas nos cenários acadêmicos, jurídicos, e sim, no
ambiente escolar locus primordial de formação de todo um povo.
Dissonantes vozes ecoam evocando conceitos, defesas e críticas sobre os
direitos humanos no Brasil dentre eles, a enraizada visão que até hoje permanece
desde a época da ditadura militar como sendo o conjunto de direitos para defesa
de “subversivos”, para a defesa de bandidos.
Apesar de textualmente a Constituição Federal brasileira de 1988 ter
eliminado formalmente as desigualdades políticas, contudo, ainda não foi efetiva,
e nem o seria, isoladamente, capaz de transformar a realidade do país, onde as
[Type text]
[Type text]
[Type text]
desigualdades, os direitos civis e políticos e os direitos sociais, culturais e
econômicos ainda persistem.
Os direitos humanos tratados na atual Constituição brasileira como direitos
fundamentais, como um direito em construção, por meio de seus agentes políticos
deve diuturnamente encontrar meios de materialização pois apesar de
considerados fundamentais a poucos é conferida a possiblidade de conhecer e
usufruir desses direitos, como ressalta Ingo Sarlet (2002, p. 62) “Se o indivíduo se
sabe como um ser humano com dignidade, irá viver de forma digna”, ou pelo
menos, ter consciência dos meios para exigir a garantia de sua dignidade.
Identificar as concepções de direitos humanos presentes na sociedade ou
ainda em um determinado segmento social é importante para compreender como
esses sujeitos percebem, reproduzem, reelaboram suas práticas sociais em
diversos momentos movendo-se a partir de uma determinada concepção de
direitos humanos onde estão subentendidas diversas concepções sobre o que é
“humano” ou sobre “os outros” seres humanos. É importante investigar quais
conceitos permeiam as representações sociais e como essas representações podem
orientar ações efetivas que promovem mudanças concretas na sociedade, imagine
esse raciocínio aplicado a diferentes sujeitos da sociedade, como, por exemplo, os
membros do poder público, do legislativo ou do judiciário, são muitas pessoas as
destinatárias das decisões tomadas por eles.
Todavia, maior importância e repercussão social encontra-se na observação
de um amplo grupo profissional presente em todas as sociedades, os professores.
A relevância desta pesquisa consiste na possibilidade de se perceber quais são as
representações sociais que os professores envolvidos diretamente no processo
educacional formal possuem a cerca dos direitos humanos, e assim perceber como
compreendem essa temática e a perpassam por meio de sua prática pedagógica
que atinge crianças de diversas faixas etárias em plena formação de seu
conhecimento científico e político sobre toda a sociedade.
O objetivo principal desta pesquisa foi conhecer as representações sociais
sobre direitos humanos dos professores de uma determinada escola pública
municipal de Anápolis, localizada na região central da cidade. Esta é uma prévia
análise sobre o assunto que pode ser estendida a todo o município anapolino visto
[Type text]
[Type text]
[Type text]
a sua importância e possibilidade de repercussão e relevância para a
implementação de políticas públicas educacionais e de formação continuada de
professores, no entanto, não se pretende nesse momento esgotar o assunto com
uma pesquisa extensiva da rede e sim iniciar um debate sobre o tema a partir do
que foi identificado.
1.0. REPRESENTAÇÕES SOCIAIS UMA ANÁLISE CONCEITUAL
As representações sociais são uma proposição teórica feita por Serge
Moscovici no campo da psicologia social baseada nos estudos de Durkheim sobre
as consciências para compreender os fenômenos mentais individuais e aqueles
compartilhados por uma coletividade. (LEME, 1995)
Para Moscovici (1978) as representações sociais são construções mentais
consubstanciadas em ideias que se materializam no cotidiano de ações dos
indivíduos e tendem a ser compartilhadas por indivíduos que convivem em um
mesmo contexto sóciohistórico. São compostas tanto pela razão, quanto pela
emoção e pelo desejo de compreender e explicar algo.
Em razão da forma como essas imagens ou “fotografias mentais”
Moscovici (1978) são registradas, compõem parte da maneira pela qual os sujeitos
de qualquer sociedade utilizam para explicar o mundo e tomar posse do
conhecimento, explicar e interagir com a realidade.
A sociologia de Drukheim aponta que o ser humano possui uma
consciência individual que consiste não apenas como informações, envolve
também a percepção sensorial e discernimento sobre qual informação se faz opção
em determinado momento da ação humana. Este é um processo de adequação que
está em consonância com a consciência coletiva que interfere e ele manifesta em
seus pensamentos e ações, por orientar as suas percepções. (Durkheim, 1978)
Existem em cada uma de nossas consciências [...] duas consciências:
uma é comum com o nosso grupo inteiro e, por conseguinte, não
somos nós mesmos, mas a sociedade vivendo e agindo dentro de nós.
A outra representa, ao contrário, o que temos de pessoal e distinto, o
que faz de nós um indivíduo. (DURKHEIM, 1978, p. 69)
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Serge Moscovici (1978, p. 25) ao discorrer sobre as representações sociais
afirma que as representações são elaboradas a partir de figuras sociais que criam
imagens mentais representativas, são “organizações de imagem e linguagem [...]
simbolizam atos e situações comuns”, são o “[...] reflexo, na consciência
individual ou coletiva, de um projeto, de um feixe de ideias que lhe são
exteriores”, estando assim imbuídas de percepções, conceitos e preconceitos.
É um recorte da imagem mental que uma pessoa faz sobre determinada
situação. Analogamente o autor a compreende como uma “fotografia” de
determinada ideia, pessoa ou assunto que um indivíduo possui e armazena em seu
cérebro, demonstrando assim, certo grau de clareza ou “nitidez óptica” que o
sujeito possui sobre aquela situação.
Em razão da forma como essas “fotografias” são registradas, elas podem
se apresentar como ideias totalmente estereotipadas da realidade ou não. Nas
reflexões de Wagner:
O que pode, então, ser explicado por uma representação? A resposta é
simples: enquanto relacionado a crenças, o comportamento manifesto
é parte e conteúdo da própria representação social, é a consequência
do comportamento no mundo social que se necessita explicar pelo
complexo representação/ação. O comportamento e a ação estão lógica
e necessariamente conectados a crenças representacionais, mas suas
consequências não estão. (WAGNER, 1994, p. 178).
A partir das ponderações destacadas acima pode-se perceber que as
representações também compõem o repertório simbólico que guia a compreensão
da realidade e a ação dos sujeitos, o seu estudo “[...] significa investigar como se
formam e como funciona o sistema de referências que são utilizados para
classificar pessoas e grupos e para interpretar os acontecimentos do cotidiano”.
(WAGNER, 1994, p. 178)
Em continuidade ao tema Leme (1995) depreende de seus estudos que as
representações sociais têm a função de “tornar familiar o não familiar numa
dinâmica em que objetos e eventos são reconhecidos e compreendidos com base
em encontros anteriores, em modelos”. Ressalta-se que:
[Type text]
[Type text]
[Type text]
No caso, a memória predomina sobre a lógica, o passado sobre o
presente, a resposta sobre o estímulo, perturbador do universo exterior
para o interior, coloca-o em uma categoria e contexto conhecidos.
Nesse universo consensual o veredicto precede o julgamento. (LEME,
1995, p. 48).
As representações sociais são fruto de uma construção cultural histórica,
não são construídas isoladamente, são apropriações de representações sociais
vindas da família, do trabalho, da escola, do dia a dia de cada pessoa. O ser
humano carrega em si a história de seu grupo, uma espécie de memória coletiva
construída pelos fatos e acontecimentos que fazem parte de sua história e também
influencia as suas ações. Ao se deparar com determinada situação, o indivíduo
busca nessa memória, imagens, emoções e valorações, referentes ao conhecimento
anteriormente adquirido, tentando compreender o novo.
2.0. OS DIREITOS HUMANOS E A ESCOLA
2.1. DIREITOS HUMANOS
Os direitos são fruto de conquistas históricas, todavia, a reunião sob a
égide de “direitos humanos” foi um fator derivado das atrocidades políticas,
jurídicas, sociais e culturais cometidas durante a Segunda Guerra Mundial quando
buscou-se encontrar no ser humano um fator indissociável que compusesse cada
ser e do qual não poderia ser destituído.
Nesse sentido, para impedir que novas atrocidades viessem a destituir o ser
humano de sua condição fundamental, buscou-se no pós-guerra estruturar-se um
organismo internacional que pudesse defender essa questão, assim foi formada a
Organização das Nações Unidas em 1945, e em 1948, proclamada a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, fruto de clara influência dos ideais liberais
advindos da Revolução Francesa, que reforçou o aspecto universal desses direitos.
A naturalidade e universalidade dos direitos humanos possui notória
inspiração judaico-cristã liberal e condiz com a existência de um aspecto inerente
e compartilhado por cada ser humano (dignidade) pelo fato de pertencer à espécie
[Type text]
[Type text]
[Type text]
humana. Dentre esses direitos pode-se destacar o direito à vida, à liberdade e à
igualdade. (MBAYA, 1997)
Após a Segunda Guerra Mundial, em uma época de descolonização e
constitucionalização dos países, os direitos humanos sob a égide do universalismo
se expandiu e internacionalizou, ganhando dimensões mundiais quando foram
também incorporados às constituições políticas dos países que se emancipavam
nesse momento histórico.
No Brasil esse momento ocorreu na década de 80 sob o processo de
redemocratização do país que culminou com a elaboração da Constituição Federal
de 1988. Ainda em luta contra a democratização os militares combatiam
avidamente qualquer manifestação em prol dos direitos humanos, ou em prol de
outros direitos como os civis e políticos em forte repressão extensiva a toda
sociedade civil. Dessa época advém a uma das representações presentes
atualmente sobre os direitos humanos a de que os direitos humanos estão à defesa
de bandidos.
No entanto, até hoje não há como afirmar que todas as pessoas possuem o
exercício pleno de sua cidadania nem que os direitos humanos acolhem de fato a
quem necessita de seu reconhecimento.
O aprendizado político se dá com a prática social e com educação pautada
no desenvolvimento do senso crítico. Os direitos humanos estão além de palavras
e leis. Eles são uma construção social a partir de lutas e reivindicações, portanto
são responsabilidade de todos e compõem as escolhas que toda pessoa faz
diariamente e compartilha com seus “iguais” e com os “desiguais” também, com o
intuito de proteger a vida, a dignidade humana, e o respeito à diversidade. Eles
podem começar em qualquer lugar onde se procure por justiça, igualdade e
oportunidades iguais para todos.
3.0. O DIREITO HUMANO/FUNDAMENTAL À EDUCAÇÃO E O PAPEL DA
ESCOLA
Adorno (1995, p. 11) atenta para a necessidade da escola manter
[Type text]
[Type text]
[Type text]
permanentemente uma postura crítica com o intuito de esclarecer aos educadores
sobre a prejudicialidade de um processo educacional que impeça ao aluno acessar
conhecimentos históricos e políticos inclusive referentes ao contexto em que a
escola está inserida pois, “quanto mais à educação procura se fechar ao seu
condicionamento social, tanto mais ela se converte em mera presa da situação
social” reproduzindo realidades e conceitos sem a devida reflexão crítica sobre
eles.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948) têm por prioridade
defender a vida e a dignidade humana, cabendo à educação o papel de maior
destaque por ser o direito fundamental humano que colabora com a efetivação de
todos os outros direitos.
Oliveira (1998) aponta que a escola seguindo os modelos impostos pelas
classes dominantes e diretamente influenciada pelo sistema produtivo neoliberal
alimenta a cultura do individualismo consumista, onde cuida-se apenas dos
interesses e valores particulares, organizando cartesianamente o ensino de forma
fragmentada. O sistema escolar muitas vezes serve apenas para consolidar as
relações de classes já existentes e colocar-se a serviço dos dominantes. O autor
elucida bem esse fato por meio da “modernização do ensino”:
Eis aí o ensino modernizado: grandes unidades para a produção do
conhecimento. Tudo segundo a ciência norte-americana pragmática e sistêmica: a
escola é a grande caixa preta industrial, seu input são os alunos ignorantes, seus
output são os alunos diplomados, ou melhor, alguns como produtos com o selo do
controle de qualidade, outros destinados ao sub mercado ou simplesmente
refugados. Estamos entrando no industrialismo moderno na mecânica do
fordismo. (OLIVEIRA, 1998, p. 21-22)
O educador possui a função de contribuir com o despertar do indivíduo
para o mundo que o cerca, para a consciência social e política. A escola pode ser
entendida como instrumento de transformação da sociedade dada à importância de
seu papel formativo, mediador de conceitos e culturas na sociedade.
Trabalhar com direitos humanos na escola, está previsto desde o
[Type text]
[Type text]
[Type text]
preâmbulo da Declaração Universal de Direitos Humanos de 1948, inclusive
como direito à liberdade de pensamento, consciência e crença. No Brasil o
terceiro e atual Plano Nacional de Educação (PNDH-3) datado de 2010, em seu
quinto eixo, trata Educação e Cultura em Direitos Humanos. Este eixo é
considerado prioritário e estratégico dentro da realidade nacional por expandir a
difusão dos princípios de direitos humanos como a dignidade, a solidariedade, o
respeito à vida, ao outro.
Previstos muito antes de forma conceitual na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB) e no Plano Nacional de Educação (PNE), somente em
30 de maio de 2012, foram publicadas as Diretrizes Nacionais de Educação em
Direitos Humanos por meio da Resolução nº 1 do CNE/CP.
Esta resolução prevê que:
Art. 2º A Educação em Direitos Humanos, um dos eixos
fundamentais do direito à educação, refere-se ao uso de concepções e
práticas educativas fundadas nos Direitos Humanos e em seus
processos de promoção, proteção, defesa e aplicação na vida
cotidiana e cidadã de sujeitos de direitos e de responsabilidades
individuais e coletivas.
§ 1º Os Direitos Humanos, internacionalmente reconhecidos como um
conjunto de direitos civis, políticos, sociais, econômicos, culturais e
ambientais, sejam eles individuais, coletivos, transindividuais ou
difusos, referem-se à necessidade de igualdade e de defesa da
dignidade humana.
§ 2º Aos sistemas de ensino e suas instituições cabe a efetivação da
Educação em Direitos Humanos, implicando a adoção sistemática
dessas diretrizes por todos(as) os(as) envolvidos(as) nos processos
educacionais. (grifos nossos, BRASIL, 2012)
As diretrizes trazem um documento pontual imbuído de uma série de
conceitos e concepções que devem ser compreendidas pelos educadores e como
diz a própria resolução, adotada sistematicamente por todos os envolvidos nos
processos educacionais.
A finalidade da Educação em Direitos Humanos é a promoção da educação
para a mudança e transformação social fundada nos seguintes princípios:
dignidade humana, igualdade de direitos, reconhecimento e valorização das
diferenças e das diversidades, laicidade do Estado, democracia na educação,
transversalidade, vivência e globalidade, sustentabilidade socioambiental.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
(BRASIL, 2012, art. 3º)
Em razão dessas determinações e de outras mais que constam da
construção histórica dos direitos humanos, a teoria das representações ajuda a
penetrar no mundo emblemático do senso comum e das ideias que transformam o
cotidiano, em que os saberes populares se constroem e se reproduzem, tanto para
a dominação como para emancipação.
4.0. AS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS SOBRE DIREITOS HUMANOS DOS
PROFESSORES DA ESCOLA MUNICIPAL “Q” DE ANÁPOLIS
Esta pesquisa teve como propósito identificar as representações sociais
sobre direitos humanos dos professores de uma escola pública municipal da
cidade de Anápolis/GO, aqui denominada como “Escola Q”, situada na região
central atende apenas alunos do ensino fundamental até o 9º ano de escolaridade.
A escola foi escolhida aleatoriamente e se mostrou disposta a participar da
pesquisa, pois ela permitiria conhecer uma pouco mais sobre as representações
que seus professores possuem sobre essa temática e que possivelmente, permeiam
as suas relações sociais como também as suas práticas pedagógicas.
Os dados foram coletados durante o mês de junho de 2012, com os
professores que se voluntarizaram a participar, mediante a aplicação de
questionários semiabertos, o que totalizou uma amostra de vinte e três professores
em um universo de quarenta e quatro.
A estrutura dos questionários está dividida em quatro partes, a primeira,
trata de identificar a escola e o bairro onde se localiza; a segunda, identifica
aspectos de formação geral da pessoa, a terceira, identifica a formação
profissional do professor.
Das pessoas pesquisadas, a maioria delas encontra-se na faixa etária de 40
a 49 anos.
Do grupo havia 22 mulheres e 1 homem. Em sua maioria são evangélicos
16 professores evangélicos, 6 professores católicos e 1 não declarou.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Quanto ao tempo de serviço prestado na educação, houve uma
coincidência entre aqueles que estão entre a faixa de 1 a 5 e de 6 a 10 anos de
serviço, representando cada grupo 43% da amostra.
Questionados sobre sua formação, quanto ao grau de escolaridade, 14
possuem curso superior e pós-graduação, 8 possuem apenas o curso superior e 1
ainda está cursando a graduação. Oitenta por cento dos entrevistados são
graduados em pedagogia. Situação que ponderada estatisticamente reverterá a
uma leitura com total especificidade dessa área.
A fim de compreender na representação dos professores, sobre quem são
os destinatários finais dos direitos humanos na escola: 90% dos sujeitos
pesquisados responderam que os direitos humanos se destinam a todos os seres
humanos, esse posicionamento pode ser bem representado e sintetizado pela
opinião do Sujeito nº 7 que assim se manifestou sobre a destinação dos direitos
humanos: “Todos pela construção de cidadãos e seres humanos conscientes dos
direitos e deveres”.
Todavia, percebe-se que 10% desses sujeitos não se manifestaram, ou
houve distorção da resposta, pois se perguntou “quem” é o destinatário dos
direitos humanos e não “para que” existem direitos humanos, nem qual é o
objetivo dos direitos humanos. Parte desses sujeitos assim respondeu: Sujeito nº 4
– “(...) possibilitar a inserção ativa dos estudantes no contexto social, contribuindo
[Type text]
[Type text]
[Type text]
assim para construção de uma sociedade mais humana justa e solidaria”, ou
Sujeito nº 2 – “(...) garantir a educação igualitária para todos independente de
raça, cor, etnia”. De um lado as observações são interessantes de outro o próprio
professor se exclui como destinatário dos direitos humanos no âmbito escolar.
Foi solicitado que a pessoa definisse direitos humanos, por meio de
palavras, em uma escala decrescente de importância. Dentre as resposta obtidas as
mais recorrentes foram: 1º)Respeito; 2º)Dignidade; 3º)Igualdade; 4º)Liberdade;
5º)Justiça; 6º)Democracia.
Quando perguntados sobre quais assuntos são tratados em Direitos
Humanos, maioria dos questionários ficaram em branco, de 23 pessoas apenas 10
responderam e suas respostas foram as seguintes:
“Educação de qualidade”.
“Trata dos direitos garantidos por lei para dar ao ser humano qualidade
de vida”.
“Liberdade de expressão, igualdade, cidadania, racismo, diversidade
cultural”.
“Necessidades essenciais, respeito às diferenças culturais, preservação da
dignidade”.
“Diversidade, igualdade, vida, saúde, moradia, respeito, educação e
afeto”.
“Trata do direito de todos os cidadãos”.
Arguidos sobre qual era a relação entre os direitos humanos e a sua prática
pedagógica os professores assim se posicionaram:
“Tratar todos com dignidade é respeito”.
“Respeito, ética com colegas de trabalho e aos alunos”.
“O estatuto da criança é do adolescente nos mostra os direitos das
crianças e como devemos cuidar delas. É nós também temos direitos aos quais
ainda não sei exatamente qual é”.
“Mútua. Deve estar constantemente presente.”
“Promover a autonomia e respeito ao meio escolar.”
Quando perguntados se acreditavam que os direitos humanos interfeririam
na sua forma de ver o mundo e as pessoas, e de que forma essa interferência se
manifestava, declararam:
“Quanto mais temos informações, fica mais fácil compreender, entender e
o mais importante a respeitar.”
[Type text]
[Type text]
[Type text]
“Com certeza, se as pessoas soubessem de fato quais são os seus direitos
o mundo mudaria. Há uma falsa democracia em nosso país, onde só são expostos
os deveres e ocultando os nossos reais direitos, creio que por medo de perder o
domínio sobre os cidadãos.”
“Não apenas numa mudança de mentalidade, mas principalmente uma
mudança de comportamento que incorpore na pratica o respeito mais profundo
pelo ser humano.”
Quando indagados se os direitos humanos estão previstos no Projeto
Político Pedagógico a maioria respondeu afirmativamente. Porém quando a
pergunta foi em qual parte do texto, a maioria desconhecia essa informação.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com o intuito de realizar um estudo preliminar sobre as representações
sociais dos docentes da cidade de Anápolis/GO sobre os direitos humanos, visto
que as representações sociais constituem-se em representações simbólicas sobre
determinado tema objetivou-se conhecer esta realidade e reunir pressupostos
teóricos para consubstanciar a elaboração de cursos formativos na área, identificar
e propor políticas públicas sobre o tema foi realizado este estudo.
Como este é um estudo primordialmente qualitativo cujos dados
quantitativos foram utilizados apenas para visualizar alguns detalhes da pesquisa,
observou-se a maioria dos professores participantes reconhecem os direitos
humanos como imprescindíveis à educação.
Identificam objetivamente os conceitos fundantes dentro dos previstos
como princípios de educação em direitos humanos como está previsto na
Resolução CNE/CP nº 1/2012, quais sejam, dignidade, igualdade, valorização das
diferenças e democracia de direitos, não abordaram a questão da laicidade do
Estado e a sustentabilidade. Contudo, esses princípios somente serão efetivados se
houver de fato a compreensão dos conceitos que os fundamentam como
reconhecimento, alteridade, cultura e multiculturalismo, diversidade, entre outros.
A dificuldade de contextualizar esses conceitos no discurso, no conteúdo
didático ou mesmo no Projeto Político Pedagógico da escola evidencia a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
dificuldade em compreender esses conceitos teoricamente para que se possa
materializá-los em ações concretas, em intervenções apropriadas na realidade.
O tema é tão interdisciplinar e transversal a princípio muitos transparecem
conhecer seus preceitos, mas concreta e em profundidade, não, e o domínio dos
conceitos é necessário para se fundamentar práticas pedagógicas, construir
conceitos e exemplos. Esta realidade particular demonstrada na pesquisa, pode e
deve ser expandida em outros horizontes escolares e não-escolares para se
fortalecer a proteção e defesa dos direitos humanos.
Para que aconteça a educação em direitos humanos torna-se evidente a
necessidade dessa temática compor a formação continuada do professor, e
também a formação profissional, com a discussão e implementação da disciplina
direitos humanos nos currículos escolares e das graduações, o que servirá para
além do acréscimo de uma disciplina a consolidação da solidariedade entre os
povos.
REFERÊNCIAS
ADORNO, Theodor. Educação e emancipação. Trad. de Wolfgang Leo Maar. São Paulo: Paz e
Terra, 1995.
BRASIL. Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos / Comitê Nacional de Educação em
Direitos Humanos. – Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Ministério da Educação,
Ministério da Justiça, UNESCO, 2007.
DURKHEIM, Émile. Sociologia e filosofia. Rio de Janeiro: Forense-Universitária, 1970.
GOMES, Maria Lúcia de Castro Metodologia do ensino de língua portuguesa/Maria Lúcia de
Castro Gomes. Curitiba: 1bpex. 2007.
LEME, Maria Alice S. V. O impacto da teoria das representações sociais. In: SPINK, Mary Jane P.
(org), O conhecimento do cotidiano: as representações sociais na perspectiva da psicologia
social. São Paulo: Brasiliense, 1995.
MOSCOVICI, Serge. A representação social e psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar,
1978.http://rbtur.org/ojs/index.php/hospitalidade/article/viewFile/155/180
MBAYA, Etienne-Richard. Gênese, evolução e universalidade dos direitos humanos frente à
diversidade de culturas. Disponível em: <www.scielo.br/pdf/ea/v11n30/v11n30a03.pdf> Acessado
em: 05.out.2012.
OLIVEIRA, Newton Ramos de. Reflexões sobre Educação danificada. In: A educação danifica:
Contribuições à teoria Crítica da Educação. Petrópolis: Vozes, 1998.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
SARLET, Wolfgang Ingo. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição
da República de 1988. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002, p. 62.
WAGNER, Wolfgang. Descrição, explicação e método na pesquisa das representações sociais. In:
GUARECHI, Pedrinho A e JOVCHELOVITCH, Sandra. Textos em representações sociais,
Petrópolis - RJ: Vozes, 1994.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Comunicação Oral
GT1- Cultura e Processos educacionais
SEXUALIDADE: O TRABALHO DO EDUCADOR FRENTE À
EDUCAÇÃO INFANTIL
Luana Jane Assis e Silva Martins 39
Renata Magalhães Naves 40
Halline Mariana Santos Silva41
RESUMO
A Educação Infantil é o patamar da construção dos primeiros saberes e conhecimentos adquiridos,
é a porta de entrada para vida em sociedade, nesse sentido existe uma grande importância de se
instruir e formar pessoas conscientes, informadas e preparadas para viver e conviver em sociedade
e este é o papel do educador. Desse modo, faz-se necessário trabalhar com as crianças a temática
sexualidade com o objetivo de conscientizá-la das diferenças de sexo, cor, raça, cultura e religião,
mas com o intuito de não inserir na criança valores pré-estabelecidos, ensinando-a a conviver com
o diferente, o real, e também mostrar que não existe diferença de trabalho, profissão, ou qualquer
outra atividade devido ao gênero masculino e feminino que ambos possuem os mesmos direitos.
Sendo assim, este trabalho teve como objetivos verificar por meio analise dos questionários
realizados com oito professoras (seis da rede publica e duas da rede privada), qual a compreensão
das mesmas sobre sexualidade, conhecer os métodos utilizados para trabalhar com a sexualidade
em sala de aula, perceber se elas se sentem preparadas para desenvolver este trabalho, quais as
dificuldades encontradas, quais são as principais curiosidades das crianças, como as educadoras
reagem perante estes acontecimentos, e se as instituições oferecem recursos ou materiais para que
estas profissionais da Educação Infantil possam desenvolver um bom trabalho. Neste sentido, para
que a temática abordada possuísse um aporte teórico rico, trouxemos os seguintes autores: Costa e
Oliveira (2011); Gambale; Vergueiro; Silva (2010); Brasil (1998b), dentre outros.
Palavras-chave: infância; educação; sexualidade.
1. INTRODUÇÃO
A Educação Infantil é muito importante para a formação do indivíduo,
pois possibilita o desenvolvimento das capacidades motoras, afetivas e de
39
40
41
[Type text]
Acadêmica de Pedagogia UFG/CAJ
Mestranda em Psicologia pela UFU e professora da UFG/CAJ
Doutora em Educação pela UNB e professora da UFG/CAJ
[Type text]
[Type text]
relacionamento social das crianças. Desta forma, torna-se imprescindível o papel
dos professores como mediadores do conhecimento, pois nesta fase se inicia as
primeiras intervenções, a construção de valores e aprendizagens no âmbito da
instituição escolar.
Nesse sentido, nesta pesquisa serão apresentados alguns autores como:
Costa; Oliveira (2011), Gambale; Vergueiro; Silva (2010); Brasil (1998b) e outros
que abordam a temática sexualidade, cujo trabalho é necessário, pois os
Parâmetros Curriculares Nacionais abordam a sexualidade como tema transversal,
portanto é um importante tema a ser trabalhado com crianças de todas as idades,
pois “a proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais para a Orientação Sexual
é que a escola trate da sexualidade como algo fundamental na vida das pessoas
[...]” (BRASIL, 1998b, p. 67). Sendo assim, torna-se necessário discutir e inserir a
sexualidade nos trabalhos desenvolvidos com as crianças, porque é algo que está
presente em todas as fases do desenvolvimento.
2. SEXUALIDADE INFANTIL
A sexualidade infantil é um tema complexo e de grande relevância para a
formação e construção educacional e social, se encontra presente desde que
nascemos. Percebe se que a sexualidade está associada à cultura e crença, neste
sentido sofrendo alterações ao longo dos anos. Para os antepassados a sexualidade
era algo intimo que não poderia ser discutido, e tão pouco, poderiam ser
transmitidas informações e ensinamentos para seus descendentes. Mas a realidade
atual vem se modificando fazendo-nos perceber a importância de se trabalhar a
sexualidade com as crianças. E é neste intuito que destacamos que esta temática
deverá ser trabalhada de forma a valorizar a realidade de cada individuo. Para
entendermos um pouco mais sobre sexualidade devemos diferenciar sexualidade e
sexo, segundo Costa e Oliveira (2011), o sexo se remete exclusivamente ao gênero
masculino ou feminino e a sexualidade por sua vez diz respeito à característica
cultural e histórica e cada pessoa. Desta forma o sexo se define apenas ao gênero e
a sexualidade é a característica de cada individuo culturalmente e historicamente.
[Type text]
[Type text]
[Type text]
Neste intuito Schindhelm (2011) nos trás que o gênero é um conjunto de
características de cada individuo e que a sexualidade está ligada ao social e a
influencia do poder. Ela nos trás ainda que, como a sexualidade também se
manifesta por meio de gestos, está poderá ser inserida como uma manifestação de
convivência social. Neste sentido manifesta a necessidade de se trabalhar à
sexualidade nas instituições, inclusive de educação infantil, pois, as crianças
devem ser ensinadas desde pequenas.
Nesta perspectiva percebe-se a importância de se estudar sobre a
temática, buscando formas de não transmitir nossas opiniões pessoais, mas
destacar com seriedade a importância da sexualidade, buscando mostrar aos
alunos que não existe uma divisão de sexual (gênero) em nossa sociedade, ao
qual, todos têm os mesmos direitos, independente do sexo. Mas vale ressaltar que
segundo Gambale; Vergeiro e Silva (2010), o trabalho da escola é apenas
complementar os ensinamentos dados pela família, neste caso, a instituição deverá
informar aos pais dos alunos sobre o conteúdo e a forma de ensino que será
utilizado para trabalhar a sexualidade junto à escola.
Por fim, percebe-se a importância de desenvolver trabalhos referentes
à orientação sexual nas instituições, tornando relevante o trabalho que o educador
desenvolve em sala de aula de modo que possa contribuir com os pais, para um
melhor entendimento, das crianças e uma melhor percepção sobre a temática
sexualidade.
3. COMPREENSÃO SOBRE SEXUALIDADE E AS NTERVENÇÕES NA
EDUCAÇÃO INFANTIL
Como forma de enriquecer a pesquisa, foram desenvolvidos
questionários com dezesseis professoras em duas instituição, oito na rede publica
e oito na rede privada de Educação Infantil da cidade de Jataí - GO, mais
obtivemos o retorno de apenas 6 participantes na instituição publica e 2
participantes na instituição privada. No questionário havia onze perguntas
pertinentes à pesquisa. Após recolhido o material foi observado como os
professores desenvolvem o trabalho em torno da sexualidade, qual era a
[Type text]
[Type text]
[Type text]
compreensão delas sobre a temática e quais eram as dificuldades encontradas para
trabalharem com as crianças de 0 a 6 anos.
Os procedimentos utilizados foram de pesquisa e bibliográficas, pois
foram utilizados livros de leitura corrente e segundo Gil (2002, p.44), “a pesquisa
bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado, construído
principalmente de livros e artigos científicos [...] boa parte dos estudos
exploratórios pode ser definida como pesquisas bibliográficas”. As instituições
tiveram um importante papel nesta pesquisa, pois por meio das coordenações foi
possível aplicar os questionários, os quais nos possibilitaram compreender um
pouco como são realizados os trabalhos referentes à sexualidade e se estes têm
sido desenvolvidos na prática cotidiana das crianças. Para assegurar a todos o
anonimato e para que os dados permaneçam confidenciais, por este motivo a
divulgação dos resultados dos questionários aplicados aos professores foi
identificada pelas letras: (P1, P2, P3, P4, P5 e P6 para as professoras da rede
pública e PR1 e PR2 para as da rede privada).
No desenvolvimento da pesquisa serão apresentados alguns gráficos para
melhor visualização das características das entrevistadas e alguns relatos para uma
melhor compreensão do contexto em que a pesquisa foi realizada.
GRÁFICO 1a – Idade dos entrevistados rede pública
Fonte: Pesquisa de campo
GRÁFICO 1b – Idade dos entrevistados
-rede privada
Fonte: Pesquisa de campo
[Type text]
[Type text]
[Type text]
A primeira questão pretendia saber a idade das professoras entrevistadas, por meio
dos resultados obtidos (Gráfico 1a e 1b) constatamos na rede pública a maioria das
entrevistadas possuí idades entre 30 e 49 anos e somente duas possui idade superior a 40
anos. Na rede privada uma professora com menos que 30 anos e a outra na faixa de 40
anos.
GRÁFICO 2a – Tempo de experiência na
educação – rede pública
Fonte: Pesquisa de campo
Fonte: Pesquisa de campo
GRÁFICO 2b – Tempo de experiência na
educação - rede privada
Para que pudéssemos perceber se as dificuldades encontradas eram por falta de
experiência na área de atuação profissional perguntamos quanto tempo trabalhavam na
educação, percebemos por meio dos gráficos (Gráfico 2a e 2b) que as professoras da rede
publica possuem mais tempo na área de educacional, sendo de 4 a 15 anos já na rede
privada as educadoras participantes tinham 4 anos na educação.
GRÁFICO 3a – Qualificação
GRÁFICO 3b – Qualificação
Profissional - rede pública Fonte:
Pesquisa de campo
Profissional - rede privada
Fonte: Pesquisa de campo
Com o intuito de perceber se a compreensão sobre a temática sexualidade estava
ligada a qualificação profissional, perguntamos qual era a formação acadêmica que
possuíam (Gráfico 3a e 3b). Percebemos que na rede publica apenas uma das professoras
tinha ensino médio, as demais possuem curso superior. Na rede privada as professoras
também têm curso superior, neste sentido perceberemos no decorrer das perguntas que
apesar da maior parte ter curso superior as compreensões sobre sexualidade são um tanto
divididas entre elas.
Na quarta questão foi perguntado às professoras, qual era o significado de
sexualidade? As professoras P2, P3, P6; PR1 e PR2 nos apontam que é uma manifestação
natural do individuo. Já as professoras P1 e P5 responderam
que nos remete uma questão de
GRÁFICO 4b – Se sente preparada para tratar
GRÁFICO
4a – do
Se sente
preparada
tratar
a sexualidade
em sala deA
aula
– rede
prazer
natural
individuo,
suaspara
necessidades
físicassobre
em busca
de afetividade:
professora
sobre a sexualidade em sala de aula- rede
privada Fonte: Pesquisa de campo
P4 nãopublica
respondeu
a pergunta, mas destacou que considera importante. Sendo assim, é
Fonte: Pesquisa de campo
possível analisar que algumas professoras concordam com Gambale; Vergueiro e Silva
(2010, p.142) quando as mesmas afirmam que, “sexualidade é um processo que nos
acompanha por toda a vida, o conjunto de tudo aquilo que recebemos de nossa família,
questão
seis, foi perguntado
se as
professoras
se asentiam
preparadas
para tratar
ouvimos,Na
vemos
e sentimos”.
Sendo assim,
percebemos
que
sexualidade
está presente
em
sobre
sexualidade
em sala de
aula
(Gráfico 4a e 4b). Apenas três educadoras responderam
nós e também
no ambiente
qual
pertencemos.
que sim, Foi
já asperguntado
demais responderam
nãoo se
sentem
preparadas.
na questão que
cinco,
que
é educação
sexual? As professoras
Neste
sentido
é importante
destacar
Gambale;
VergueiroAeprofessora
Silva (2010,
p.147)
responderam
que
é o dialogo,
informação
e troca
de experiência.
(P4)
nos
que,
“Ao
atuar
na pensado
área de orientação
infantil,
o professor
deve
aponta
que
estecomo
é um um
temaprofissional
que deve ser
em equipe sexual
para que
se possa
ampliar esta
ter
para não
pessoais,
crenças
e opiniões
comodestaca
verdades
áreadiscernimento
de conhecimento.
Já a transmitir
professoravalores
PR2 apesar
de não
responder
a pergunta
que
absolutas”.
Deste modo
devemos
inserir na
criança
informações
seguras sem
esta é importante,
pois traz
contribuições
para
o individuo.
A educadora
PR1 inserir
não nosso
ponto
de vista.
respondeu
de forma que pudéssemos perceber qual é a sua compreensão sobre a pergunta
proposta.
Na questão sete, foi perguntado qual era a reação das professoras diante de cenas
que envolvem a sexualidade, todas exceto a P5 responderam que eram de diálogo com as
crianças, pais ou coordenação. Deste modo a refletir se a forma com que ela fala com a
criança não seria imposição, pois a forma com que nos represamos, remete a diferentes
formas de compreensão. Sendo assim Gambale; Vergueiro e Silva (2010) nos destacam que,
para que ocorra um diálogo: “É necessário que se estabeleça uma relação de confiança entre
alunos e professor (p.148)”. Neste sentido estaremos possibilitando um vinculo de
confiança e de respeito com nossos alunos, no qual estes poderão confiar, construindo uma
relação saudável.
GRÁFICO 5a – Situações que ocorrem entre as
crianças – rede publica
Fonte: Pesquisa campo
GRÁFICO 5b – Situações que ocorrem entre as
crianças – rede privada
Fonte: Pesquisa campo
A questão oito foi feita para que pudéssemos compreender melhor as cenas
referentes à sexualidade que já ocorreram e que foram necessárias intervenções. Neste
intuito pedimos que citassem um exemplo, e de acordo com o gráfico (Gráfico 5a e 5b),
percebemos que na rede publica a maior incidência são os beijos e a curiosidade nos órgãos
sexuais, já na rede privada e a curiosidade nas partes intima (órgãos) e o tocar no colega,
sendo assim Camargo e Ribeiro (1999), nos diz que somos seres sexuados deste de
crianças, no qual a masturbação possibilita na compreensão de nosso corpo. Sendo assim
este faz parte do desenvolvimento dos pequenos e este possibilitará que a criança se
desenvolva de modo natural e saudável.
liberdade, autonomia e
GRÁFICO 6a – Recursos utilizados - rede
pública
Fone: Pesquisa de campo
respeito à intimidade devem
estar presentes em todo
trabalho educativo e,
principalmente, naqueles
que tratam da sexualidade
GRÁFICO 6b – Recursos utilizados – rede
privada
Fone: Pesquisa de campo
[...]”. Deste modo o trabalho
do educador irá contribuir
na formação das crianças,
mas este deve respeitar a
Para que possamos
compreender de que forma
as professoras vêem
trabalhando nestes
individualidade e a
diferença de cada criança,
mesmo naqueles que
envolve a sexualidade.
momentos de curiosidade e
descoberta por parte das
crianças, perguntamos na
questão nove de que forma
elas vêem trabalhando
questões inerentes a
sexualidade (Gráfico 6a e
6b), as professoras
destacaram o uso de
materiais ou métodos
pedagógicos, na rede
publica o mais utilizado era
o dialogo e os livros
literários e na rede privada o
dialogo. Para
compreendermos a
importância de se abordar a
sexualidade, destacarei
Camargo e Ribeiro (1999, p.
40): “[...] as relações entre
GRÁFICO
7a – O
trabalho
desenvolvid
o trouxe
mudanças –
rede
GRÁFICO
7b – O
trabalho
desenvolvid
o trouxe
mudanças –
rede
pública
Fonte:
Pesquisa de
campo
privada
Fonte:
Pesquisa de
campo
Na questão dez
perguntamos se o trabalho
nossa própria autonomia e
de nossos alunos.
desenvolvido com as
crianças para trabalhar a
sexualidade trouxe alguma
mudança de
comportamento, na rede
publica percebemos que as
repostas ficaram divididas,
no qual duas professoras
responderam que sim, duas
que acredita que esta
surgindo efeito e as outras
duas não responderam de
modo que pudéssemos
compreender sua resposta,
já na rede privada as
professoras que
participaram da pesquisa
foram unânimes e
responderam que sim. Neste
sentido, com tem-se como
base a construção da
autonomia, no qual estas
educadoras poderão
contribuir para a formação
de pessoas autônomas,
sendo assim, trazemos a
reflexão de Freire (1996
apud SCHINDHELM,
2011), no qual nos diz que
somos pessoas capazes de
aprender e ensinar, sendo
assim nos como educadores
podemos desenvolver a
GRÁFICO
8a –
Materiais
existentes
na
instituição
– rede
publica
Fonte:
Pesquisa de
campo
GRÁFICO
8b –
Materiais
existentes
na
instituição
– rede
privada
Fonte:
Pesquisa de
campo
Nesta perspectiva, para compreendermos se estas mudanças vêm sendo realizadas
devidos a contribuição da instituição em relação a recursos, matérias de pesquisa ou cursos,
perguntamos na questão onze, quais materiais existem na instituição que a bordam a temática
sexualidade (Gráfico 8a 8b). Quase todas as professoras foram unânimes e responderam que
havia livros literários, livros infantis, guia e curso oferecido pela secretaria de educação,
apenas a professora p2 que respondeu que não há material na instituição para trabalhar a
sexualidade com as crianças. Neste sentido trago Camargo e Ribeiro (1999, p.40): que “[...]
ausência de informações sobre a sexualidade podem ser claramente sentidas em nossa
sociedade, [...] a sexualidade mostrada na televisão e em folhetins de forma fragmentada e
freqüentemente deturpada”. Deste modo percebemos a importância de se trabalhar a
sexualidade em sala de aula, no qual irá contribuir com a formação de indivíduos conscientes.
É perceptível a importância de termos informações seguras para que sejam
transmitidas de forma clara e objetiva e este certamente é um papel não somente dos
professores, mas também faz parte de toda instituição escolar como um todo. É necessário
ressaltar que é de suma relevância incluir os pais neste processo no qual poderá ser
enriquecido, e possivelmente poderá contribuir para derrubar as barreiras do pré-conceito e
dos tabus existentes.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante dos textos estudados concluímos que a Educação Infantil, faz parte da
formação do individuo, no qual recebemos as primeiras intervenções de conduta e moral e a
criança possui o direito de gozá-la com todos os direitos a elas cabíveis. A sexualidade é
inerente ao indivíduo, pois está se encontra presentes em nossa vida deste que somos gerados
e a descoberta dos prazeres é natural, e faz parte do desenvolvimento da criança.
Destacamos que os questionários aplicados nas instituições contribuíram para o
enriquecimento deste, pois possibilitaram compreender que apesar da temática sexualidade ser
um tema bastante estudado, ainda assim precisa ser estudado com mais profundidade.
Mostrando-nos que apesar dos projetos e trabalhos desenvolvidos pelas instituições os
professores continuam encontrando dificuldade em desenvolver trabalhos nas escolas com
medo dos tabus impostos pela sociedade. Por meio deste trabalho podemos perceber também
que diante das cenas de descobertas das crianças, muitos educadores se vêem paralisados, sem
nenhuma reação, ou ainda tratam este ocorrido como invisível aos seus olhos, não mostrando
para a criança que isto faz parte dela, possibilitando o desenvolvimento infantil de forma
saudável, sem que os pequenos excluam-se por vergonha ou por medo de estar fazendo algo
errado.
Neste sentido destacamos que nós como educadoras devemos estar sempre em busca
que novos conhecimentos, não somente sobre a sexualidade, mais a toda a temática envolvida
em nosso trabalho, buscando desenvolver sempre um bom papel, contribuindo com a
formação de indivíduos conscientes e reflexivos. Sendo assim, consideramos que este
trabalho foi muito enriquecedor, no qual irá contribuir para reflexões em pesquisas
desenvolvidas nas instituições de Educação Infantil e que também surjam novos
questionamentos em torno deste tema sobre sexualidade que certamente é amplo.
REFERÊNCIAS
BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental Parâmetros Curriculares Nacionais: Brasília: MEC, 1998b.
CAMARGO, Ana Maria Faccioli de; RIBEIRO, CLÁUDIA – Sexualidade (s) e Infância (s): A sexualidade
como um tema transversal – São Paulo: Moderna; Campinas, SP: Editora da Universidade de Campinas, 1999.
COSTA, Elis Regina e OLIVEIRA, Kênia Eliane de – A sexualidade segundo a teoria psicanalítica freudiana e
o papel dos pais neste processo. Revista Eletrônica do curso de pedagogia do campus Jataí – UFG V.2 n. 11.
2011. ISSN: 18079342. Disponível: http://revistas.jatai.ufg.br/index.php/itinerarius/article/view/1239/672
GAMBALE; Carina Alvarez, VERGUEIRO; Francisca Vieitas; SILVA, Maria Cecília Pereira da. O trabalho de
sexualidade na escola e os pais, 2010. In. SILVA, Maria Cecília Pereira da. Sexualidade começa na infância –
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2010.
GIL, Antônio Carlos – Como elaborar projetos de pesquisa – 4 ed. São Paulo: Atlas, 2002.
SCHINDHELM, Virginia Georg – A construção da sexualidade infantil: Considerações sobre o papel do
educador – Universidade Federal Fluminense – UFF/RJ, 2011.
http://www.abrapee.psc.br/xconpe/trabalhos/1/8.pdf
GT 2 – EDUCAÇÃO, TRABALHO E MOVIMENTOS SOCIAIS
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
A EDUCAÇÃO COMO FENÔMENO SOCIAL
Nayara Lopes Botelho42
Claudemir FigueiredoPessoa43
RESUMO
Tendo como base diversos autores que anteriormente já estudaram as concepções de Marx em relação à
educação, este artigo visa fazer uma breve abordagem sobre a função social da escola na visão de Karl Marx.
Sendo a educação um fenômeno social e também objeto de estudo da Sociologia, este artigo irá ter como base a
discussão da educação sendo trabalhada em conjunto com a cidadania, tendo assim uma função política e social
da escola. Além de ter uma perspectiva da escola como espaço de construção de identidades sociais. Como a
Sociologia da Educação se constitui no conhecimento sociológico e na sua aplicação na educação, este trabalho
irá criticar o sistema educacional elitista e tecnicista que impede um ensino qualitativo e democrático à
população de baixa renda. Mesmo sabendo que o sistema educacional brasileiro está inserido no contexto do
sistema global capitalista, a educação não deve formar cidadãos alienados, a escola tem um papel
importantíssimo na atualidade, papel este que se consiste em dar uma educação de qualidade visando formar
cidadãos emancipados historicamente, libertos de ideologias e conscientes de suas raízes sociais, assim aptos a
gerar uma práxis revolucionária modificando o mundo. Este estudo entende, portanto, que para superar essa
sociedade capitalista e alienada só será por meio de uma educação que vise à mudança de mentalidade do
homem como um todo, proporcionando meios para que ele alcance a omnilateralidade.
Palavras-chave: educação; Karl Marx; sociedade.
INTRODUÇÃO
Por vivermos em uma sociedade capitalista, ocorrem com muita frequência
modificações no mundo do trabalho, e por isso as exigências são cada vez mais rígidas e
inflexíveis. Por isso, a educação escolar contemporânea foi e ainda é desenvolvida para
atender os interesses e as necessidades capitalistas, cuja ênfase está na individualidade.
Contudo, esse método tecnicista de ensino tem formado pessoas alienadas, totalmente
insatisfeitas com o que é e o que tem, pessoas que não conseguem ter embasamentos
suficientes para opinar a respeito de um fato ocorrido em seu meio social e nem conseguem
correlacionar com a sua realidade, muito menos fazer uma reflexão de como está inserido
42
Estudante do Curso Superior de Licenciatura em Artes Cênicas, IFTO – CAMPUS GURUPI.
Email: [email protected].
43
Professor Mestre (UFPR, 2008); IFTO – CAMPUS GURUPI. Coordenador do Núcleo de
Pesquisa em Educação, História e Diversidade Cultural - NUPEHDIC (Capes/CNPq). Email:
[email protected].
nisso tudo. Tudo isto foi antes mencionado por Karl Marx em sua concepção acerca da
educação.
Marx percebeu que o capitalismo além de alienar a classe dominada e fazê-la escrava
de ideologias que a classe dominante espalhava sem nenhum pudor para continuar em seus
bel-prazeres dominantes, assimilou que o mesmo – o capitalismo -, interferia na educação
sistemática, ou seja, na educação escolar.
Interferindo de forma a privilegiar a classe dominante, o capitalismo usa de meios
como um ensino precário aos alunos pobres e o contrário aos alunos ricos, assim empurrando
os pobres a marginalização para tornar-se apenas mão de obra à classe rica e dominante.
Formando assim um ensino elitista, onde poucos são os alunos que conseguem chegar à
escola e principalmente permanecer nela. Analisando os estudos e pensamentos de Marx,
podemos perceber que as concepções dele permanecem até hoje, mesmo depois de ter se
passado tanto tempo; podemos compará-lo a um “profeta social”, que simplesmente
influenciou grandes pensadores na área da educação e continua a influenciar.
No decorrer deste estudo serão citados pensadores/pesquisadores que se dedicaram a
refletir a democratização do ensino. Observando-se assim, a realidade social que tem sido de
grande importância para debater e procurar meios que possam solucionar as desigualdades
sociais que são extremamente latentes atualmente.
O importante mesmo é que a escola inove, assim possibilitando a seus alunos a
autonomia necessária para que alcancem a omnilateralidade que Marx havia dito há muito
tempo atrás. É certo que a escola eduque e instrua em conjunto para se formar cidadãos
conscientes e reflexivos, e não somente instrua como se faz, colaborando de forma bastante
empenhada em formar pessoas alienadas e alheias a sua capacidade de transformação pessoal
e social.
MARX E SUA CONCEPÇÃO EDUCATIVA
Marx procurava compreender o mundo através da ciência e tinha como concepção
sociológica o materialismo-histórico-dialético; Mas o que é isso? É um caminho
metodológico que procura explicar a realidade compreendendo-a pelo processo do movimento
do pensamento (a dialética entende o mundo como algo contraditório e dinâmico), entendendo
que os homens se organizam em sociedade para poder sobreviver, produzindo seus meios de
sobrevivência (materialidade), e refletindo que tal organização vem se modificando através
dos tempos (histórica).
Sabendo que Marx entendia que o desenvolvimento pleno (total, completo das
possibilidades do ser humano) de uma pessoa é “unilateral” (MARX; ENGELS, 1979;
MARX, 1993. Apud In: TOZONI-REIS, 2007) e que também o trabalho é a categoria central
na teoria de Marx, trabalho que ele entende como algo além do conceito econômico, é algo
filosófico, essencial, vital e extremamente humano, pois o homem se relaciona com o mundo
natural através do trabalho (vivência), trabalho esse que é a atividade de ação dos homens no
mundo. Então ele chama de “corpo inorgânico” ou “corpo complementar” o que se refere ao
mundo natural transformado pelo trabalho humano. Assim o homem estará sempre
dependente do seu eu complementar, o corpo “inorgânico”.
Então diante do pensamento marxista, a educação na sociedade capitalista terá como
principal objetivo a omnilateralidade. A omnilateralidade nos foi conceituada em Manuscritos
Econômicos Filosóficos (MARX, 1993. Apud In: TOZONI-REIS, 2007), assim sendo:
A omnilateralidade diz respeito ao desenvolvimento pleno humano, isto é, as
possibilidades, históricas e concretas de desenvolvimento pleno das capacidades
humanas que não se realiza no capitalismo porque, nesse, o trabalho humano é
explorado.
A omnilateralidade além de ser definida pelo trabalho na relação homem-natureza é a
apropriação plena do ser humano, resultado da atividade vital voluntária, é a concepção
filosófica da função unilateral.
A organização típica e original do modo de produção capitalista é a “divisão do
trabalho”, esta cuja missão é separar o intelectual do manual, e que tem desencadeado outro
fator que Marx identificou como alienação. Mas por que alienação?
Aliena porque, como atividade vital, ao separar aqueles que pensam o trabalho
daqueles que o executam, “rouba” do trabalhador a possibilidade de formação plena
pelo trabalho. Isto é, [...] impede que os trabalhadores se desenvolvam plenamente,
pois os afasta da realização do processo de trabalho total: pensamento e ação.
(TOZONI-REIS, 2007, p.8)
Sendo como parte do processo de produção, a alienação ocorre impedindo a
omnilateralidade, tudo baseado na divisão do trabalho.
O processo de trabalho que caracteriza o capitalismo implica na alienação do
produto do trabalho e da atividade do trabalho. [...] o trabalhador produz um produto
resultante de seu trabalho, mas não tem sobre ele controle algum, ele o produz não
para o seu próprio uso, mas para outro, que lhe confere valor de troca. [...] a
alienação do trabalhador na atividade do trabalho caracteriza-se, na organização do
processo de trabalho sob o modo de produção capitalista, pela impossibilidade dele
tomar decisões sobre essa atividade: [...] “Assim, o seu trabalho não é voluntário,
mas imposto, é trabalho forçado, explorado. Não constitui a satisfação de uma
necessidade, mas apenas um meio de satisfazer outras necessidades” (MARX,
1993, p.162). Em decorrência da organização social do trabalho no capitalismo
apresentar-se como trabalho imposto, alienado, temos a alienação das pessoas
humanas. (Idem. p.8)
Tendo a alienação a capacidade de impedir o homem de refletir sobre o que está
fazendo, perceber sua vida como fator de mudança e influência na sociedade a qual está
inserido e amputar do mesmo, a sublime competência criadora, que é fundamental para se
sentir realizado; Ela colabora para que o homem não se desenvolva, por causa de um dos
produtos da alienação que é a coisificação do homem, além das formulações ideológicas que
as classes dominantes produzem e dissemina na classe dominada. Como o homem não se
sente realizado e completo, através das ideologias, o homem começa a compreender suas
atividades como alheias à sua vontade e força, não conseguindo associá-las a sua produção,
assim atribuindo-as as condições e forças superiores ou independentes de sua própria
condição.
Por conseguinte, as classes dominantes acabam utilizando tais ideologias para
mascarar a realidade e dar falsas explicações das relações sociais às classes dominadas,
negando a existência de dominação das classes sociais. Ou seja, ela manipula o homem
alienado, pelo seu corpo de ideias que acaba sendo aceito como verdade universal para todos.
Assim, a mesma promove, controla e distribui condições e materiais para perpetuação desse
corpo de ideias, utilizando todos os meios educativos disponíveis, como a família, os meios
de comunicação e inclusive a escola.
A ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (ideias, e
valores) e de normas ou regras (de condutas) que indicam e prescrevem aos
membros da sociedade o que devem pensar, o que devem valorizar, o que devem
sentir, o que devem fazer e como devem fazer (CHAUÍ, 1981, p.113).
Como no dizer de Tozoni-Reis (2007), quanto mais o capitalismo produzir a coisificação
do homem, mais a alienação gerará a ideologia. A alienação não é superada sozinha, não basta
para o sujeito ter consciência da situação a qual está passando, isso só o ajudará em seu
processo de mudança, mas para uma verdadeira mudança é necessária a ação social coletiva,
que vem através da práxis (ação prática refletida, pensada concreta e historicamente).
Assim a práxis, segundo Marx não somente deve ser praticada, deve ser além de tudo
pensada e compreendida reflexivamente, tudo procurando superar a ideologia e a alienação o
que já proporciona a formação omnilateral do homem. Assim, a práxis (prática educativa ou
prática social) deve ter:
[...] como preocupação central a prática social transformadora, a construção de
relações sociais plenas de humanidade dirigidas para a superação da desigualdade
social. Trata-se, portanto, de educar para a transformação, não do sujeito individual,
mas das relações sociais de dominação que determinam relações sociais injustas e
desiguais. (TOZONI-REIS 2007, p.13)
Dessa forma a educação não somente transforma a realidade social, mas também
transforma e dá suporte necessário aos educandos para que, ao irem conquistando a
omnilateralidade, acabem modificando as condições sociais vigentes instaladas pelo
capitalismo.
CAPITALISMO X EDUCAÇÃO
Um dos desafios mais difíceis que a educação tem enfrentado atualmente é a chamada
degradação social. Ora, mas o que é degradação social?
A degradação social implica a perda parcial ou total do status social, a exclusão dos
direitos a que todo individuo tem na sociedade, em seus diferentes setores como
família, educação, economia, política social [...], levando as pessoas, quase sempre à
marginalidade e/ou marginalização. (LAKATOS e MARCONI, 2010, p.320)
Uma das áreas que a degradação social mais tem alcançado é a família, que sendo uma
instituição social básica que constitui a estrutura da sociedade, implica na sua principal função
educativa que é perpetuar valores, cultura e convivência. Nisso, muitos pais tem achado que a
escola deve dar o suporte informal educativo que é função da família dar.
Muitas famílias, hoje, estão deixando a educação formal e a informal por conta da
escola. Nem a educação de base é dada, pois os pais saem muito cedo de casa é só
voltam à noite, não tendo tempo para orientar seus filhos. (LAKATOS e MARCONI,
2010, p. 325).
Nesse contexto, KILPATRICK percebeu que “estamos em tempo de mudanças” (2011,
p.23). Assim em seu livro “Educação para uma sociedade em transformação”, Kilpatrick
defende a ideia de que a escola deve assumir a responsabilidade que ora era da família em
preparar as crianças para a convivência na sociedade. Tendo a escola que ser um lugar de
experiências reais, o lugar em que a vida se processa. LIBÂNEO (1994, p.17) diz
complementado este pensamento que:
A prática educativa não é apenas uma exigência da vida em sociedade, mas também
o processo de prover os indivíduos dos conhecimentos e experiências culturais que
os tornam aptos a atuar no meio social e a transformá-lo em função de necessidades
econômicas, sociais e políticas da coletividade.
É essa prática educativa que Marx defende, a chamada práxis, que proporciona ao
homem a omnilateralidade. Entretanto, tal prática tem sido amplamente prejudicada e
combatida pela modelo tecnicista de educação, que segundo Demerval Saviani:
[...] a pedagogia tecnicista advogou a reordenação do processo educativo de maneira
a torná-lo objetivo e operacional. [...] Buscou-se, então, com base em justificativas
teóricas derivadas da corrente filosófico-psicológica do behaviorismo, planejar a
educação de modo a dotá-la de uma organização racional capaz de minimizar as
interferências subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência. Se na pedagogia
tradicional a iniciativa cabia ao professor e se na pedagogia nova a iniciativa
deslocou-se para o aluno, na pedagogia tecnicista o elemento principal passou a ser a
organização racional dos meios, ocupando o professor e o aluno posição secundária.
A organização do processo converteu-se na garantia da eficiência [...]. (acesso em
23/02/13, às 19h00min)
Ora sendo o tecnicismo implantado no Brasil em meados de 1930 – fase essa que o
país estava se industrializando e em pleno regime ditatorial -; tinha como objetivo formar
indivíduos “competentes” para o mercado de trabalho, sendo de acordo com o modelo
capitalista. A escola não trabalhava a reflexão e criticidade nos alunos, pois o foco era formar
mão-de-obra para o mercado de trabalho. Ensinando-se apenas o necessário para que os
estudantes pudessem ser práticos em suas atividades, assim sendo aplicados reforços positivos
ou negativos, além de estímulos para ajustar o indivíduo a certo “comportamento aceitável”,
de forma a controlar a conduta individual. Ou seja, os alunos eram educados para o
capitalismo.
Tal modelo de educação é um meio de manipulação da classe dominante à classe
dominada, Saviani em seu livro “Escola e Democracia” diz que o tecnicismo define a
marginalidade como ineficiência ou improdutividade. Portanto, a função da escola passa a ser
de formação de pessoas eficientes para o aumento da produtividade social, ou seja, para o
rendimento da produção capitalista.
Além do fator de degradação social – que atua em várias áreas, não só da família -, a
educação tecnicista é um dos agravantes da alienação capitalista, sendo assim a
marginalização um produto incontestável da alienação.
O conceito de marginalidade passou por várias acepções: [...]; em 1996, Lewis
escreve sobre a “cultura da pobreza” [...], a mais completa é a de Quijano (1966),
que considera “a marginalidade como falta de integração.” (LAKATOS e
MARCONI, 2010, p.316)
Essa marginalidade também pode ser entendida como delinquência, isto é, são os
analfabetos ou os insuficientemente instruídos. Darcy Ribeiro diz assim: “dois fatos
impressionam na educação brasileira: a magnitude da rede escolar pública e sua precariedade”
(Educação no Brasil, 1986). Darcy Ribeiro entende que o analfabetismo é produto da
ineficiência da escola pública brasileira, assim formando cidadãos marginalizados, pois não
conseguem se integrar à sociedade. E diz mais acerca da escola ideológica, diz que ela é capaz
de convencê-los “de que são pobres porque são burros”, sendo também contra os professores
tecnicistas dizendo:
Aqui está o fulcro da questão: nossa escola fracassa por seu caráter cruelmente
elitista. Alguns educadores alienados, envoltos nas névoas da sua pedagogia
pervertida, estão dispostos a firmar que o fracasso escolar da criança pobre se deve a
deficiências que ela traz de casa. A escola não teria nada a ver com isso. Os
professores enfrentariam, neste caso, uma situação carência insuperável, em
consequência da qual a maioria da população brasileira seria ineducável. (Idem,
1986)
E completa mais:
Funcionando na base dessa falsa expectativa, ela é uma escola hostil à sua clientela
verdadeira, por que, sendo uma escola pública, a sua tarefa é educar as crianças
brasileiras, a partir da condição em que elas se encontrem. (Ibidem, 1986)
Assim, ele e também Saviani, seguem a mesma opinião de Kilpatrick, o qual defende
que a escola deve sim, assumir essa responsabilidade de educação e cidadania, ou seja, o
professor em si próprio deve compreender e suscitar em seus alunos os métodos
materialismo-histórico-dialético.
Essas considerações significam uma reorganização dos objetos e dos procedimentos
da escola. O currículo e os métodos devem trocar as bases estáticas por bases
dinâmicas. Em função do declínio no papel educativo da família e da comunidade e,
de acordo com uma melhor compreensão do processo de aprendizagem, a escola
deve ser tornar um lugar em que a vida, a experiência real, se processa. Somente
nessas bases nossas crianças poderão aprender o que realmente precisam.
(Kilpatrick, 2011 p. 81 e 82)
Saviani também afirma:
[...] a responsabilidade dos professores em transformar, não o mundo, mas sim cada
indivíduo que assiste sua aula, compreendendo melhor o mundo e seus
acontecimentos, assim como seu papel dentro do sistema, seus deveres e seus
direitos para a construção de um país melhor. (acesso em 22/02/13, às 08:45)
CONSIDERAÇÕES ACERCA DA TEMÁTICA
Sendo a educação “Processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e
moral da criança e do ser humano em geral, visando a sua melhor integração.” (LAKATOS E
MARCONI, 2010, p.323). Ela é efetuada de duas formas, a) formalmente, onde é a escola que
normalmente efetua tal processo “[...] para propiciar aprendizado do conhecimento –
organização sistemática das informações e conceitos [...].” (LAKATOS E MARCONI, 2010,
p.324) e b) informalmente, onde é a família que realiza perpetuando valores, passando
conceitos de moral, costumes e convivência. Contudo, não e isso o que tem acontecido
ultimamente. As famílias normalmente têm deixado sua responsabilidade a encargo da escola
por buscar melhores meios de sobreviver dentro da sociedade capitalista a qual está inserida.
O que nós temos encontrado por ai são pessoas totalmente alienadas e exploradas em
seu trabalho pela classe dominante da sociedade. Essas pessoas vêem divididos o seu trabalho
manual do intelectual, não alcançaram sua omnilateralidade, assim totalmente ao par de sua
consciência crítica e perceptiva da realidade social que faz parte.
Como citado anteriormente, Marx acreditava que o homem não podia sair da alienação
sozinho, mas ele sairia se realmente estivesse disposto a isso, e saísse com a sociedade,
através de uma nova práxis. Marx e outros autores - Kilpatrick, Saviani, Ribeiro e Libâneo -,
percebem que a escola está sendo utilizada como forma de manipulação da classe dominante à
dominada, assim a mesma não estava cumprindo seu papel formal. Sendo elitista, tem
formado indivíduos sem senso crítico e sem desenvolvimento pleno de sua capacidade
cognitiva e motora, assim muitos analfabetos são marginalizados da sociedade letrada e se
tornam mera massa de manobra.
Urge, portanto, que os diretores, coordenadores pedagógicos e professores, tomem
partido da função real da escola em seu sentido metodológico e social. É compreensível que o
sistema educacional atual tem atado fortemente os professores, assim os impossibilitando de
agirem de forma a levar seus alunos a um conhecimento prático e reflexivo da realidade
aplicada no conhecimento teórico. Muitos professores se encontram desmotivados e
desacreditados de uma educação transformadora, democrática e não partidária. Muitos até já
deixaram a profissão e muitos outros têm se preparado para deixá-la futuramente. Mas é
fundamental que os que ainda acreditam na educação como meio democrático e participativo
das pessoas na sociedade não perpetuem mais a educação tecnicista. Libâneo (1994, p. 18)
enfatizou em seu livro Didática que “... conforme dissemos a educação é um fenômeno social.
Isso significa que ela é parte integrante das relações sociais, econômicas, políticas e culturais
de uma determinada sociedade.”
Não adianta querermos desassociar a educação da vivência prática da sociedade, pois
uma influência diretamente na outra. Para realmente podermos chegar a uma revolução a qual
Marx acreditava que um dia chegaríamos, devemos apostar em uma educação integradora,
que visa a uma práxis reflexiva e democrática, utilizando-se de um processo de aprendizagem
cognitivista e humanístico e antes de tudo apostar em uma educação que significa a um
fenômeno social; Educação está que modificará a estrutura social em suas diversas áreas:
econômica, politica, ambiental, educacional, profissional, judiciária, entre outros.
Colaborando, portanto, para uma sociedade sem crises e liberta das grandes desigualdades
sociais.
Pois assim como Marx acreditava que “o fator econômico é determinante da estrutura
do desenvolvimento da sociedade” (LAKATOS e MARCONI, 2010, p.47), a educação se
levada a sério e com comprometimento também irá ser.
Ainda são necessárias muita reflexão e muita experimentação. Na verdade, o
processo é permanente. Assim, o que realmente queremos é oportunidade para
pensar e experimentar. Se a sociedade precisa da educação –e certamente precisa – o
esforço é digno de apoio e vale o custo. (Kilpatrick, 2011 p.119)
REFERÊNCIAS
FERREIRA, Fabiane Aparecida Rovina. Um toque de humanização numa educação tecnicista.
(www.unimep.br/phpg/mostraacademica/anais/4mostra/pdfs/224.pdf - acesso em 10/02/13).
KILPATRICK, William Heard. Educação para uma sociedade em transformação. Petrópolis, RJ: Vozes, 2011.
LAKATOS e MARCONI, Eva Maria, Marina de Andrade. Sociologia Geral. 7 ed. rev. e ampl. – São Paulo, SP:
Atlas, 2010.
LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo, SP: Cortez, 1994.
LOPES, Paula Cristina. Educação, Sociologia da Educação e Teorias Sociológicas Clássicas: Marx, Durkheim
e Weber. (http://www.bocc.ubi.pt/pag/lopes-paula-educacao-sociologia-da-educacao-e-teorias-sociologicas.pdf acesso em 11/02/13).
SALES, Helton. Marxismo e Educação. (www.midiaindependente.org/media/2009/08/451444.doc - acesso em
11/02/13).
TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. Sociologia: O estudo da Sociedade. São Paulo, SP: UNIVESP, 2007
(http://www.acervodigital.unesp.br/bitstream/123456789/168/3/01d09t02.pdf - acesso em 11/02/13).
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
A EDUCAÇÃO DO BRASIL E DA ESCOLA BRASILEIRA NASCEM DA
MAQUINAÇÃO: TEORIA DA PRÁTICA DO SISTEMA DE ENSINO BRASILEIRO
DE 1930 A 1980.
Álcio Crisóstomo Magalhães
Fac. de Educação da Universidade Federal de Goiás – FE/UFG
[email protected]
RESUMO
Esse trabalho persegue o fluxo das idéias no contexto de modernização e consolidação do Estado liberal
brasileiro. Especificamente, analisa como a materialidade das condições de produção fora apreendida
ideologicamente sob a forma de política pública e expressão do moderno sistema de ensino do país. Por assim
dizer, evidencia-se que parte-se da tese da Modernização Consevadora do Brasil elaborada por Florestan
Fernandes, para caracterizar sociologicamente o ciclo de ruptura politício-econômica que insere o país no
sistema produtivo capitalista. Esse processo envolve um duplo movimento, a transformação das condições
materiais de produção, bem como a inculcação de uma nova forma de pensar, sentir e agir, portanto, a adesão a
uma nova forma de educação moral. Para tanto, a criação de um sistema de ensino em sintonia com esses novos
valores seria fundamental. Não por acaso é nesse contexto que lançam-se as bases da escola brasileira. Tal
reflexão visa compreender como no Brasil o discurso em defesa do direito à escola vem sendo diretamente
influenciado pela cultura política forjada pelas engrenagens da matriz produtiva capitalista, nascida na década de
1930 e efetivada no correr das cinco décadas seguintes. De modo mais explícito, interroga-se por meio de uma
pesquisa bibliográfica como o ideal de educação moral de caráter assistencialista, bem como o pragmatismo e o
economicismo desenvolvimentista combinaram-se na consolidação do projeto de escolarização que vem
participando na educação do Brasil desde a ditadura do Estado Novo até o autoritarismo de Estado dos governos
militares. Nesse sentido, por meio de um estudo dissertativo revela-se como uma dada concepção de escola,
ganhou na sociedade civil, a dimensão de cultura escolar, traço de unidade cultural, instrumento de educação,
elemento de produção e/ou reprodução do consentimento ativo, portanto, de hegemonia. Dito dessa forma
evidencia-se que ao longo de toda a pesquisa lança-se mão de um referêncial teórico que além de fundamentar a
tese que se persege, permite o descortinamento da lógica de acumulação de capital. Esse, o grande objeto de
investigação da dialética materialista inaugurada por Marx e perseguida por uma corrente de pensamento
científico que vêm revelando a complexificação da contradição estrutural criada por essa matriz produtiva.
Palavras-chave: ideologia; escolarização; estado brasileiro.
A luta é material e cultural ao mesmo tempo: logo é
política. (...) O que nos interessa é perseguir o
movimento das idéias, não em si mesmas, mas na sua
conexão com os horizontes de vida de seus emissores
(...) (ALFREDO BOSI)
O final dos anos 1930 marca para o Brasil a inauguração de um novo ciclo produtivo e
por extensão, uma nova estrutura sócio-política. “Com a sua política econômica Vargas
enveredou pelo caminho de uma nova dinâmica na acumulação de capital: a industrialização”.
Nesse contexto histórico inaugura-se no país o ciclo de uma direta intervenção estatal na
esfera econômica.
A consolidação do domínio burguês no nível político, no entanto, ocorre a partir do
Estado Novo (1937-1945), quando se efetiva uma acentuada intervenção do Estado
na economia, a modernização do aparelhos estatal e a participação de profissionais
de classe média, militares e empresários no aparelho administrativo. (GERMANO,
1993, p. 43)
Se o otimismo pedagógico do movimento escolanovista inaugurou nos anos 1920 e
1930, o debate acerca da criação de um sistema nacional de ensino público, de qualidade, e
em plena conformidade com o ideário liberal conservador, no ciclo histórico seguinte, do final
dos 1930 a escolarização ganhou um caráter eminentemente economicista, condição de
filiação social44. Vinculou-se estreitamente à idéia de desenvolvimento, ao ideal de preparação
das novas gerações para a produção de uma espécie de “hipertrofia do organismo políticoeconômico nacional”. A garantia do direito de exploração do mercado educacional por grupos
econômicos e a conservação de um sistema de ensino fiel aos princípios cristãos acabaram por
dar materialidade à concepção de escola inaugurada pela ditadura Vargas. O conjunto de
reformas isoladas organizadas sob a denominação de Leis Orgânicas do Ensino45 expressa a
tônica do ensino formal nesse período.
A intenção de criar um aparelho jurídico administrativo nacional capaz de mediar os
interesses econômicos do grande capital não poderia negligenciar a tarefa de cunhar uma
escola triplamente eficaz. Capaz de responder à demanda dos movimentos sociais pelo direito
à educação pública, eficiente na tarefa de instrumentalizar mão-de-obra para a implementação
do projeto desenvolvimentista de nação, e, sobretudo, capaz de continuar resguardando às
elites a formação de nível superior gratuita e de qualidade. “Continuando uma tradição
acentuada com a reforma Francisco Campos, as Leis Orgânicas só permitiam o acesso ao
ensino superior no ramo profissional correspondente.” (ROMANELLI, 1978, p. 156)
O anseio nacional pelo direito ao ensino público foi satisfeito sob a forma de um
aparato de educação moral e de treinamento de mão-de-obra para a industrialização nascente.
44
Referência às categorias desenvolvidas por Robert Castel (2001). De acordo com o autor o
desequilíbrio entre o político e o econômico produz na Era moderna uma grande anomia social.
Como tamponamento dessa lacuna surge o Estado social, o ente que se coloca entre essas duas
esferas e, através da criação de mecanismos de filiação (direitos e deveres), cria um novo e
provisório equilíbrio para a sociedade burguesa.
45
Para uma melhor compreensão do significado prático e sentido desse conjunto de leis, o que
explica inclusive a criação do chamado Sistema “S” e das Escolas Técnicas Federais brasileiras
ver ROMANELLI (1978).
A escola, portanto, ganhou importância no processo de construção de unidade cultural para o
país. “A política educacional do Estado Novo não se limita à simples legislação e sua
implantação. Essa política visa, acima de tudo, transformar o sistema educacional em um
instrumento mais eficaz de manipulação das classes subalternas” (GERMANO, 1993, p. 52).
Além de instrumentalizar trabalhadores ganhou o status de instância de promoção dos valores
nacionais. É muito por isso, que “(...) de meados dos anos 40 a meados dos anos 60 os
esforços estão concentrados na difusão da escola primária nas cidades e principalmente no
campo e nas campanhas de educação de adultos”. (PAIVA, 2011, p. 40)
A partir da segunda metade dos anos 1940 até o início dos anos 1960 o Brasil alternou
crises de dominação e ciclos de restituição autoritária da ordem. Em ambos os momentos o
ideal de escolarização permaneceu fiel aos princípios da democracia liberal burguesa. “A
Constituição de 1946 é, pois, um documento de inspiração liberal-democrática”.
(ROMANELLI, 1978, p. 171) Sua concepção de sistema nacional de ensino retomou muitos
dos princípios ideológicos dos pioneiros do “Manifesto de 1932”. O fato de o professor
Lourenço Filho ter sido designado presidente da comissão encarregada da elaboração do
anteprojeto de diretrizes e bases da educação, prevista no Texto Constitucional de 46 é um
indício disso. O projeto final aprovado em 1961 recusava dos pioneiros, apenas aquilo que
eles tinham de menos liberal, ou seja, o ideal de escola pública.
Com a crise político-econômica do projeto populista do Estado Novo46 o discurso
ideológico da unidade nacional passou a encontrar grande dificuldade para reproduzir-se
como verdade incontestável no final dos anos 1950 e início dos anos 1960. Como não poderia
deixar de ser, essa instabilidade social refletia-se também no campo educacional. O início dos
1960 revelou que a promessa de uma escola capaz de integrar a todos independente da classe
social, bem como de criar uma nação potencia não se confirmava. O que se produzira de fato
fora, por um lado, um sistema de ensino privado que, fomentado pelo Estado, assegurava
privilégios aos herdeiros do capital, e, por outro, uma escola pública que conduzia uma
pequena parcela dos filhos da classe trabalhadora a uma formação profissionalizante e à
exploração precoce do mercado de trabalho. “(...) O período de 1958/1964 se caracteriza
sobretudo pelo ‘realismo em educação’. Os ‘entusiastas’ praticamente haviam desaparecido
46
Por um lado o grande capital encontrava-se limitado pela pressão do Estado contra as remessas
excessivas de lucros das grandes empresas ao exterior, por outro os trabalhadores, ainda que
empregados no grande parque industrial montado no país, encontravam-se sacrificados pelo
descompasso contínuo que se estabelecia entre o salário mensal e a remuneração necessária para o
custeio do orçamento doméstico.
(...)” (PAIVA, 1987, p. 206). Um diagnóstico elaborado pelos “pioneiros” e assinado por mais
de cem professores, escritores e pesquisadores dá uma noção da situação à época.
A educação primária, em dois, três ou quatro turnos, se reduziu a pouco mais do
que nada, (...) e baixou o nível do ensino secundário. (...) Se agravaram
desmedidamente os problemas de edificações e instalações escolares, (...) Se se
considerar ainda que ultrapassa de 50% da população geral o número de
analfabetos no país e que, de uma população em idade escolar (isto é, de 7 a 14
anos) de 12 milhões de crianças, não frequentam escola senão menos da metade ou,
mais precisamente, 5.775.246, nada será preciso acrescentar (...). (MANIFESTO
1959, In, HISTDBR, 2006)
É esse quadro de abandono que motivou, do início dos anos 1960, diversos grupos de
professores, estudantes progressistas, ligas camponesas e sindicatos rurais, reunidos em
centros e movimentos populares de cultura, a dedicarem-se a lutarem em defesa da escola
pública e ao trabalho de educação de adultos e jovens excluídos do sistema oficial de ensino.
Àquele período a escolarização em massa povoava o ideário da esquerda, que buscava aliados
na luta contra a estrutura político-econômica do país. “Tudo isso repercutia no campo da
educação e da cultura. Campanhas e movimentos de educação e cultura popular despontavam
em todos os pontos do país, notadamente no nordeste, com propostas de conscientização
política e social do povo.” (GERMANO, 1993, p. 50). Em 1962, por exemplo, Paulo Freire,
sistematiza seu método de educação de adultos.
Diante de tal realidade, perigosamente potencializada pela explosão de movimentos
sociais por quase toda a América Latina, e em especial pela revolução cubana que inspirava a
esquerda brasileira, a burguesia nacional financiada pelo grande capital mundial e respalda
por seus aliados internos (setores da classe média e igreja católica) produziram uma dura
reação. A dificuldade da política de Segurança Nacional implementada pela ditadura de 1930
em criar uma hegemonia no período pós Vargas, fez com que novamente a violência material
fosse utilizada a bem da restituição do controle.
A análise gramsciana acerca do conceito de hegemonia nos permite compreender esse
contexto brasileiro. Como no primeiro momento (ditadura civil) o domínio não conseguiu
converter-se em hegemonia, ou seja, como o discurso ideológico não conseguiu impregnar a
esfera cultural, (os anos de 1946 a 1963 revelam uma combinação, ou alternância entre
crescimento econômico e grande instabilidade política), a restauração do controle pela
violência (ditadura militar) foi a estratégia da burguesia oligárquica local para dar seqüência a
seu projeto de poder, ou ao ideal de submissão do Estado brasileiro ao ciclo de acumulação do
grande capital mundial.
Em meio a essa atmosfera de desequilíbrio os conflitos sociais são inevitáveis e o risco
de contestação da ordem, insubmissão, e até em situação limite, de revolução torna-se
possível no horizonte das idéias. É por isso que ao tentar retomar provisoriamente o equilíbrio
entre o político e o econômico e restaurar a dominação burguesa o Estado brasileiro recorre à
combinação de violência material e assistencialismo.
Assim, em 1964 o Estado brasileiro opta pelo autoritarismo e pelo centralismo político
administrativo. Um novo golpe deu início a um outro tipo de ditadura no país, promovida
diretamente pelos militares, mais longa e muito mais violenta que a primeira. O Congresso
Nacional fora mutilado em seu funcionamento, o Judiciário passou a funcionar como apêndice
do Executivo e a sociedade civil foi duramente reprimida e controlada. Daí, Cruz e Pessoa
serem incisivos na afirmação de que “as décadas de 1960 e 1970 foram marcadas pela
dispersão político-organizativa da esquerda brasileira”. (CRUZ e PESSOA, 2008, p. 221). A
Constituição de 1967 agrega ao ideário da segurança nacional do Estado Novo, o princípio do
combate aos chamados inimigos externos, materializados e aglutinados à época no fantasma
do comunismo. Portanto, mais que a conservação dos limites materiais o golpe visava a
preservação das fronteiras ideológicas. Conforme Chauí (1985) esse texto constitucional que
institucionalizou o regime de exceção, representou para o país uma ação de Estado baseada no
princípio do Nacionalismo Responsável, ou seja, sem os movimentos sociais e políticos,
organizada de modo pragmático (endividamento externo) e fundamentada na tese da
modernização ou do poder tecnocrático.
O controle promovido pela ditadura militar tinha pretensões hegemônicas. Nessa
tarefa o exército desempenhara um intenso papel educativo. A grande tônica desse ciclo fora
o discurso do nacionalismo-desenvolvimentista, da eliminação da grande política, ou seja, do
enfraquecimento da esfera pública como espaço de debate, e da hipertrofia da sociedade
política. O que significou um Estado autoritário, centralizador, intervencionista e regulador da
esfera econômica (acumulador), bem como organizador de uma espécie de vontade nacional.
O aparelho estatal, por meio da asfixia das ações políticas, passou a atuar duramente na
direção e repressão da sociedade civil. “(...) Cabia ao Estado organizar e dirigir o referido
projeto, e, segundo Góis Monteiro, o Exército deveria ter aí um papel de destaque inclusive
como educador” (GERMANO, 1999, p. 44). Segundo o próprio Germano o General Góis
Monteiro era o mais importante precursor da Ideologia da Segurança Nacional no Brasil.
Nesse contexto a estruturação ou reestruturação do sistema de ensino era tarefa de
primeira ordem. O fato de a escolarização ter sido incluída no Plano Nacional de
Desenvolvimento evidencia isso. A precariedade da escola pública brasileira da década de
1960 poderia constituir-se em fator de anomia social. “Os moradores dos bairros populares,
nas grandes cidades brasileiras, nos anos 1970, emergem como sujeitos importantes na luta
pelo acesso à escola, (...) reivindicando demandas diversas com destaque para a escola”.
(CRUZ, 2011, p. 103). Por esse motivo o Estado militar necessitava conter tal demanda.
O combustível ideológico que viria a nortear o sistema de ensino pós-golpe militar não
seria outro senão made in USA. Se até o final dos anos 1950 pode-se falar de um ideal de
escolarização baseado nos princípios escolanovistas tributários da combinação da tese de
educação moral de Durkheim47 e da escola ativa de John Dewey48, a partir de 1964 a escola
brasileira praticamente caracterizou-se pela submissão ao projeto de escolarização concebido
pela cultura política liberal burguesa sob forte influência norte-americana.
Sob a alegação de crise do sistema de ensino (precariedade das instalações, carência de
professores e insuficiência de vagas) o Estado autoritário do Governo Militar ancorou-se no
tripé ideológico substanciado pelos acordos MEC-Usaid, pela Comissão Meira Matos e pelo
Grupo de Trabalho da Reforma Universitária para responder aos anseios dos movimentos
sociais pelo direito à escola. Através do acordo MEC-Usaid49 (Ministério da Educação e
Cultura-Agência de fomento do governo norte-americano) grandes volumes de recursos foram
empenhados sob a forma de empréstimos internacionais para financiar a reforma da educação
escolar brasileira. A partir do trabalho da Comissão coordenada pelo Coronel Carlos Meira foi
produzido um relatório que propunha dar ao MEC um caráter empresarial, ou seja, uma
organicidade logística, e uma hierarquia burocrático-administrativa. Isso permitiria à
47
Para Durkheim (2008) a educação não seria outra coisa senão um ato moral, ou seja,
compromisso coletivo de inculcar nas crianças toda produção material e imaterial, todos os valores
consagrados como socialmente úteis e necessários para a manutenção do sujeito coletivo. Dever do
grupo de impregnar os mais jovens de uma conduta regular e de uma vontade de submeter-se a
uma autoridade, variáveis que em combinação correspondem a um espírito de disciplina.
48
Para Dewey, conforme (CUNHA, 2007) a escolarização deve corresponder à experimentação
científica visando à auto-realização e, por conseguinte o desenvolvimento econômico do grupo
social. Essa tarefa não seria mais que um processo de educação do indivíduo para o livre trânsito
no sistema liberal burguês da igualdade de oportunidades. Todos deveriam ser estimulados a
encontrar meios de se inserir na hierarquia das posições sociais existentes.
49
O acordo MEC-Usaid, corresponde a um tratado de cooperação entre o Governo Militar
Brasileiro e o Governo dos Estados Unidos em virtude da chamada ‘Aliança para o Progresso’.
Entre os anos de 1969 e 1977 a Usaid (Agência Norte-americana de Fomento ao
Desenvolvimento) emprestou ao MEC 82 milhões de dólares para serem gastos na reforma de
todos os níveis de ensino. Não é necessário dizer que além da devolução futura do dinheiro
acrescida de juros, o Ministério da Educação do Brasil como contrapartida deveria acomodar e
remunerar os técnicos norte-americanos que iriam participar diretamente na definição de onde e
como esses recursos deveriam serem empregados.
instituição remover obstáculos de ordem política, estruturar-se sob um modelo tecnocrático e,
por conseguinte, literalmente conter as reivindicações do movimento estudantil.
Não por coincidência, “diagnósticos” semelhantes também foram produzidos pelo
grupo encarregado de viabilizar uma reforma universitária para o país. As conclusões
apontavam para a necessidade de modernização do Ensino Superior no Brasil. Indicavam
como prioridade a construção de uma universidade eficaz na aplicação de recursos, eficiente
na educação técnico-científica, administrativamente flexível e capaz de produzir recursos
humanos de excelência para o desenvolvimento econômico em curso. Portanto, de modo a
tentar ser minimamente coerente com a propaganda nacionalista que justificara o golpe, sem,
no entanto, abrir mão da submissão ao projeto educacional (hegemônico) que o grande capital
internacional articulava com pretensões universalistas, a ditadura militar brasileira dos
meados dos anos 1960 combinou os princípios da cultura política liberal burguesa, àquele
momento em acelerado processo de americanização, e os interesses da classe dominante
nacional composta por grupos conservadores com motivações distintas (grandes industriais,
militares, ala reacionária da Igreja Católica).
A década de 1960 marcou o florescimento da chamada economia da educação nos
Estados Unidos. O professor Theodore Schultz, da Universidade de Chicago, berço da
produção de receituários economicistas para o mundo capitalista, percebeu que as crescentes
demandas por escolarização apesar de representarem um problema para o Estado poderiam
converter-se em uma válvula de escape para todo o mundo capitalista, em especial para a
economia dos Estados Unidos. Se, por um lado exigiam dos governos grandes esforços para
ampliar os níveis de ensino, por outro representavam para o grande capital a possibilidade de
concentração de renda. A venda de pacotes50 (consultorias) de reforma educacional para
países da América Latina além de intensificar a circulação de capital em nível mundial,
permitiria ao país uma participação direta, pela mediação da escola, na educação latinoamericana, bem como, a instrumentalização de uma mão-de-obra abundante e ávida por
exploração precoce. Partindo dessa equação Schultz, além de desenvolver a chamada Teoria
do Capital Humano, deu um sentido ideológico e restrito à tarefa formativa.
50
Através de uma curiosa equação o Governo Norte-americano passou a firmar acordos de
cooperação na área educacional com os países empobrecidos pela espoliação colonial. Por um lado
emprestavam-se vultosas somas de recursos financeiros que deveriam ser pagas com juros e
correção monetária, por outro, determinava-se o modo como esse dinheiro deveria ser gasto. Os
países credores deveriam importar dos Estados Unidos consultorias, equipamentos e tecnologias
para a implementação das reformas dos sistemas de ensino.
Assim, educar significa, etimologicamente, revelar ou extrair de uma pessoa algo
potencial e latente; significa aperfeiçoar uma pessoa, moral e mentalmente, de
maneira a torná-la suscetível de escolhas individuais e sociais, e capaz de agir em
consonância; significa prepará-la para uma profissão, por meio de instrução
sistemática; e por fim significa exercitar, disciplinar ou formar habilidades, como
por exemplo, aperfeiçoar o gosto de uma pessoa” (SCHULTZ, 1973, p. 18)
A escola passou a ser entendida como uma indústria, uma empresa especializada na
produção de mão de obra produtiva e contensão social. “Não é mais um processo de
transmissão de cultura geral de humanidades, de saber universal. A educação é
instrumentalização para o trabalho” (FREITAG, 1986, p. 108) Desse modo o que até então se
caracterizava como despesa educacional deveria passar a ser entendido como investimento
com alto potencial de retorno econômico (acúmulo de capital). Nesse sentido a escolarização
ganhou o status de um bem de consumo como qualquer outro. O que significa que a ação
pedagógica ganhou um caráter extremamente utilitário racional. Assim, quaisquer atividades
com fins educativos “desinteressados” se tornam desqualificadas. A escola então, deveria
inculcar nas crianças o maior volume possível de conteúdos.
As reformas universitárias e da educação básica (primeiro e segundo grau) em 1968 e
1971, respectivamente, são tributárias dessa concepção de formação. Essa foi a ideologia
fomentadora das grandes políticas educacionais do macro e do micro sistema escolar
brasileiro naquele período, abrangendo desde a estrutura organizativa até os conteúdos e
técnicas de ensino.
A institucionalização dessa concepção de educação (escolarização) além de participar
diretamente na inculcação da moral do Estado autoritário brasileiro pós 1964 e adestrar mãode-obra para consumo do grande capital, possibilitava a criação de uma espécie de espírito de
unidade, um imaginário coletivo em torno da promessa de ascensão social (salvação) pela
mediação da escola. Pela combinação da estratégia de repressão/exclusão dos “cérebros
indesejáveis” e condenação de qualquer princípio educativo que se pautasse pelo espírito
intelectualista ou de “aprendizagem desinteressada” deu-se início a um duro processo de
educação nacional51. Uma espécie de reforma que deveria necessariamente passar, por
exemplo, pela extinção do sistema de cátedras nas universidades, introdução do sistema
departamental, divisão dos currículos escolares em básico e profissionalizante, adesão a um
ideal de ciência aplicada ao desenvolvimento de máquinas, equipamentos e tecnologia, e
permissão de exploração comercial da educação escolar.
51
Processo caracterizado pela expulsão sumária de alunos, aposentadoria precoce de professores,
intervenção militar em campus universitários e repressão a qualquer tipo de movimento social que
sinalizasse com perspectivas de escolarização não instrumental.
Assim, enquanto parte do exército se dedicava à tarefa de reprimir e produzir o
consenso pela força, uma outra parte à frente da estrutura político-administrativa dedicava-se
à tarefa de institucionalizar ideologias, de criar uma hegemonia. O processo de implantação
de um movimento nacional de alfabetização de jovens e adultos, o MOBRAL, expressa bem
essa lógica. No ano de 1967 iniciou-se uma grande campanha nacional de alfabetização
baseada na inculcação de técnicas elementares de leitura, escrita e cálculo, bem como na
integração social mediada pela supervalorização da família, da comunidade local e da pátria.
Nessa tarefa foram gastos milhões para a estruturação de redes de comunicação de massa com
o objetivo de padronizar um modelo nacional de alfabetização de adultos. O projeto SACI,
por exemplo, representa o emblema desse intento. Mesmo sem ter energia elétrica, o Rio
Grande do Norte foi escolhido para a implantação de um projeto de educação à distância. As
aulas seriam planejadas, elaboradas e gravadas a milhares de kilômetros da cidade de Natal e
reproduzidas em inúmeras comunidades do interior do Estado por meio de aparelhos de
televisores movidos à bateria, adquiridos com recursos do MEC.
A escolha da capital potiguar não foi uma questão de acaso ou de ignorância dos
militares. Desde o início dos anos 1960 várias ações de alfabetização de adultos vinham
sendo desenvolvidas na região, inclusive com participação direta de Paulo Freire e seu
método. Em uma contra-ofensiva do Estado à concepção de formação dos movimentos de
cultura popular, impôs-se a todo o país a combinação de educação moral e instrumentalização
da classe trabalhadora. “Essa posição coincidia com a nova orientação da Unesco em favor
dos projetos experimentais de alfabetização funcional” (PAIVA, 1986, p. 291). Desse modo, a
cidadania tornou-se privilégio de classe, os direitos sociais adquiriram um caráter de
assistência e o aspecto educativo dos movimentos sociais foi neutralizado pela ação
autoritária do Estado.
A preservação do ensino religioso nos níveis primário e médio, a conservação e
ampliação dos princípios da privatividade em ambos, a obrigatoriedade do Estado em dar
amparo técnico e financeiro aos empresários que optassem por explorar tanto um como o
outro, bem como a vinculação entre o sistema educacional e o sistema produtivo dão uma
idéia do caráter da legislação de 1971. Pela lei 5692/71 reformou-se o ensino de primeiro e
segundo graus e criou-se para o Brasil uma estrutura educacional não pública, em perfeita
consonância com o bloco político-econômico que controlava a sociedade civil e, por
conseguinte, o Estado brasileiro à época.
Essa concepção de escolarização permitiu que se institucionalizasse no país um
Primário vocacional de iniciação profissional e de preparação para o Secundário dicotômico,
predominantemente profissionalizante. Ambos com caráter de continuidade e/ou
terminalidade, instrumentalizados para a execução de procedimentos práticos. De acordo com
o Parecer 339/72 do Conselho Federal de Educação, o Ensino de Primeiro Grau deveria
compreender uma escolarização geral com um gradual aumento, já a partir dos 11 anos de
idade de uma formação especial visando selecionar aqueles que deveriam prosseguir no nível
seguinte e aqueles que já deveriam ser absorvidos pelo mercado. O Segundo Grau deveria
abranger predominantemente uma Formação Especial voltada para a qualificação de
habilidades técnicas do setor produtivo (Primário, Secundário e Terciário) de acordo com as
características sócio-econômicas, ou com a vocação produtiva da região.
Partindo de uma clara confusão entre mercado de trabalho e formação mediada pelo
trabalho, idealizou-se uma estrutura de ensino secundário capaz de aproximar a escola e a
esfera da produção.
Sob a ideologia do desenvolvimento e do crescimento continuado da economia e
alegando ao mesmo tempo assegurar empregos duradouros à força de trabalho
disponível, defendem, em verdade, os interesses da maximização dos lucros da
empresa privada pois mantém em reserva um potencial de trabalhadores que
constantemente são reciclados em função das novas demandas geradas pela
irracionalidade do modo de produção. (FREITAG, 1986, p. 30)
Isso é claro em tese, pois a realidade mostrava outra coisa. Por exemplo, enquanto um curso
profissionalizante de segundo grau se preocupava em ensinar os jovens da escola pública a
preencher um cheque, o mercado já começava a apresentar a novidade das máquinas
registradoras capazes de executar com segurança e precisão tal tarefa.
Além de potencializar um mercado simultaneamente produtor e consumidor na
perspectiva fordista/taylorista, essa política limitou o fluxo de entrada no Ensino Superior,
bem como assegurou aos filhos das elites econômicas, condições privilegiadas na disputa pelo
restrito número de vagas na universidade pública. A instrução em escolas particulares e em
cursinhos preparatórios ou de treinamento para o processo vestibular dava aos alunos das
escolas particulares subsidiadas pelo Estado uma grande vantagem. Desenvolveu-se a idéia de
competição escolar e de competência ou incompetência para classificar os estudantes que
foram transformados em “jogadores”. Elaborou-se assim um sistema de disputas
completamente viciado, no qual a ideologia da igualdade de oportunidades criou a idéia de
que o mérito pela vitória ou a culpa pela derrota seriam de inteira responsabilidade do
indivíduo. Velando-se assim o fato de que nessa estrutura produtiva os dados dos “que têm”,
apresentam seis faces de sena, do mesmo que os dados dos “que não têm”, contém seis faces
nulas.
Portanto, nesse contexto identifica-se um projeto de escola que se sustentava sobre
três pilares, uma espécie de santíssima trindade para a educação institucionalizada brasileira
das décadas de 1960 a 1980: submissão à doutrina da Segurança Nacional (moralização), fé
cega na conversão da tarefa formativa em escolarização profissionalizante e crença no ideal
de escola como lócus de produção de desenvolvimento econômico. Desse modo, o país
consolidou no final dos anos 1980, através de uma educação dura e minuciosamente
arquitetada, um sistema de ensino extremamente eficaz. Capaz de participar diretamente na
produção de uma hegemonia nacional que permitisse com segurança o abrandamento da
violência, sem, contudo colocar em risco o projeto de nação liberal burguês que vinha sendo
efetivado no Brasil desde os anos 1930. À medida que cada um ia introjetando como seu os
valores de uma cultura política autoritária e conservadora os instrumentos de açoite poderiam
ser reunidos em um canto e ali permanecerem como uma espécie de moldura de um quadro,
que deixa muito claro os limites de uma paisagem concebida e pintada sem muitas nuances e
cores.
REFERÊNCIAS
BOSI, Alfredo, Dialética da Colonização, São paulo: Companhia das Letras; 1993
CASTEL, Robert, As metamorfoses da questão social: uma crônica do salário. Petrópolis: Vozes, 2001.
CHAUÍ, Marilena, Conformismo e resistência – Aspectos da cultura popular no Brasil – São Paulo: Brasiliense,
1985.
CUNHA, Marcus Vinicius da. John Dewey: democracia e educação. Capítulos essenciais, São Paulo: Ática,
2007.
CRUZ, José Adelson; PESSOA, Jadir de Morais. Cão de muitos donos: cultura política e gestão escolar.
Educativa (UCG), v.11, n. 2, p. 221-237, jun./dez.2008.
CRUZ, José Adelson, Notas sobre a sociedade civil e sua relação com a educação. Goiânia: Educativa (UCG),
v. 14, n 1 p. 101-121, jan./jun.2011
DURKHEIM, Emile, A educação moral, Petrópolis, RJ: Vozes, 2008
FERNANDES, Florestan. Sociedade de Classes e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1975.
FREITAG, Bárbara, Escola, Estado e sociedade – São Paulo: Morais, 1986.
GERMANO, Willington José. Estado Militar e Educação no Brasil (1964-1985). São Paulo: Cortez, 1993.
GRAMSCI, Antônio, Cadernos do Cárcere, Vol. 1. São Paulo: Civilização Brasileira, 2001.
PAIVA, Vanilda, Educação Popular: Educação de Adultos. São Paulo: Edições Loyola, 1987.
PAIVA, Vanilda, A instabilidade da instituição escolar, Goiânia: Educativa (UCG), v. 14, n. 1, p. 39-57, jan./jun.
2011.
REVISTA HISTEDBR On-line, Campinas, n. especial, p.205–220, ago2006 - ISSN: 1676-2584 206 Disponível
em: <wwwhttp://Revista HISTEDBR On-Line>. Acesso em: 24/08/2012.
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira F., História da Educação no Brasil (1930 – 1973) – Petrópolis: Vozes, 1994.
SCHULTZ, Theodore W, O valor econômico da educação, Rio de Janeiro: Zahar editores, 1973.
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
A ESCOLA DA VIDA: MEMÓRIAS ESCOLARES DE ASSENTADAS RURAIS
Amone Inacia Alves
[email protected]
RESUMO
A proposta que ora apresentamos, visa mostrar a possibilidade do uso da memória de trabalhadores rurais como
fonte de pesquisa para a História da Educação em Goiás, principalmente no que tange à perspectiva não-escolar.
Para esse fim, fomos ao Assentamento Rural São João do Bugre, em Goiás, entrevistar assentadas, buscando
apreender o sentido da escola para elas. Entendemos que, embora valorizem a escolarização, essa perspectiva
constitui um sonho distante da própria cultura vivenciada. Pautaremos-nos nesse texto a discutir as questões:
Como nos apropriamos da memória? Que recortes podem ser observados nas memórias não- escolares de
assentadas em São João do Bugre? Para um melhor aprofundamento das questões apresentadas, nos
apropriaremos de uma literatura específica que seja capaz de categorizar o conceito de memória.
Palavras-chave: história; memória; educação.
INTRODUÇÃO
Ao tratarmos da educação de trabalhadores – tanto urbanos como rurais, debruçamos
em vários compêndios de educação e nos damos conta de que grande parte das publicações
omitiu experiências que se davam fora do espaço escolar. Tendo em vista a preocupação
central dessas análises em privilegiar uma visão da escola como o lócus da produção do
conhecimento, isso fez com que os saberes produzidos pelos diferentes grupos sociais
tivessem pouco interesse, criando uma lamentável lacuna no que diz respeito à recuperação
dessas memórias.
No entanto, nos últimos anos, cada vez mais estudos sobre a educação de
trabalhadores vêm aparecendo, buscando reconstituir não só a trajetória de lutas, mas também
objetivando compreender como se dão esses espaços de sociabilidade ou como os saberes53
aprendidos constituirão uma nova forma de mobilização. O entendimento dessas dimensões
52
Professora Adjunta na área de Fundamentos Filosóficos e Sócio-Históricos da Educação da
Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás – UFG. Esse texto é oriundo da minha
pesquisa de Doutorado, cujo objeto é a formação de trabalhadores rurais em Goiás.
53
Por saberes, utilizaremos enquanto categoria apresentada por Grzybowski (1986: 48-49 ) como:
O conjunto de conhecimentos e habilidades, valores e atitudes que são produzidos pelas classes,
em uma situação histórica dada de relações, para dar conta de seus interesses.
educativas nos permite reconstruir uma história repleta de significados, que em vários
momentos, ainda não foi plenamente reconstituída.
Ao se tratar dessas práticas educativas de trabalhadores rurais, o silêncio é ainda mais
gritante. Quando nos propusemos a recuperar essas memórias subterrâneas (HALBWACHS,
1990) pretendemos fazer coro àqueles que querem reconstruir as lutas com um outro enfoque,
como diria Michelle Perrot, dando voz e vez aos excluídos da história.
O presente trabalho fez parte de uma pesquisa que diz respeito à formação de
trabalhadores rurais em Goiás. Neste intento, pretendemos resgatar e reconstituir as
experiências e práticas vivenciadas por assentadas, de modo a entendê-las, localizando-as em
um campo da história da educação, repleto de memórias, tomadas aqui como um espaço de
disputas, contradições, significados e representações.
É importante destacar que, a identificação das principais práticas formativas que
visaram orientar os trabalhadores rurais, feitas por diferentes agentes coletivos, significa um
recorte da memória, com a seleção do que constitui de mais significativo para os grupos em
questão. Não pretendemos com isso apontar marcos de ruptura, mas perceber como essas
práticas no presente contém e reproduzem novas práticas. Neste sentido, nos apoiaremos em
Lefèbvre, quando este diz “a história persiste e age sobre o atual” ao tentar reconstruir o
passado como âncora do presente.
Na primeira parte, mostraremos o “chão arenoso” da memória como fonte e uso da
história da educação. Na segunda parte, pretendemos identificar as principais práticas
educativas desenvolvidas por assentadas, bem como o sentido que a escola tem para o grupo
pesquisado.
1.
A MEMÓRIA COMO CAMPO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO
Com a finalidade de um direcionamento das questões aqui apresentadas, faremos uma
discussão sobre a dimensão que deve assumir a pesquisa, inaugurando um novo movimento
do conhecimento, com uma nova postura diante de novas realidades. José Vicente Tavares
chama esse novo olhar como:
Um novo espírito científico que se define pela criação e produção de
noções e conceitos capazes de construir verdades relativas, por um
procedimento de incessante aproximação da verdade dos processos,
dos detalhes,m dos sonhos que constroem o social. (LANG, 1985)
Isso significa dizer que toda pesquisa envolve escolhas, parcialidade do cientista,
envolvimento em questões que remetem sua relação com o mundo, com a vida na
comunidade, com reminiscências de infância que são, ao mesmo tempo, individuais, produtos
da sua vivência, e coletivas, parte do relacionamento com os outros. Já foi amplamente
discutido que a neutralidade, imparcialidade e objetividade pretendidas pelo Positivismo, são
colocadas à prova em um momento de verdades relativas.
Os trabalhos sobre memória têm sido bastante profícuos, de forma que visam, muitas
vezes, ir de encontro à história positivada, servindo de argumento para uma nova
historiografia composta pelos “excluídos potenciais”, portadores de uma nova versão sobre o
fato.
Sabe-se que o discurso historiográfico tem sido um espaço de combate, em que os
vencidos têm sido silenciados, em um processo contínuo de reconstrução da sua própria
história, em detrimento de uma versão dos vencedores. Encontram-se, nesse modo, esquecidos
não só os produtores de fato, mas as versões por eles produzidas. Se olharmos pelo viés da
educação, geralmente temos inúmeras produções que tratam da escola como a única
possibilidade educativa. Várias produções mostram os planos educacionais, as propostas, as
metodologias aplicadas, enfim, todo um discurso governamental aplicado. Ficam excluídas,
por exemplo, as histórias de professores e professoras, leigas ou não, de estudantes e daqueles
que não foram à escola.
Quando chamamos a atenção para outras formas de se pensar a educação, pensamos na
possibilidade de resgatar experiências da prática informal que envolve pessoas que
participaram ativamente da vida na comunidade local, com inferências educativas às vidas dos
habitantes do lugar.
Sobre os estudos de memória, vários autores dedicam há alguns anos, como por
exemplo: Halbwachs (1990), Bosi (2002), LeGoff (2002), Benjamin (1987), dentre outros.
Em linhas gerais, esses trabalhos descrevem a relação entre a memória e a identidade social,
destacando principalmente as histórias de vida presentes.
Halbwachs (1990) desde os anos 1920-1930 havia descrito a memória como um
fenômeno coletivo e social, ou seja, como um fenômeno construído coletivamente e
submetido a “flutuações, transformações e mudanças constantes”. (POLLAK, 1992) É
importante lembrar que a memória, tanto individual como coletiva, possui marcos ou pontos
relativamente invariáveis e imutáveis passíveis de serem apropriados pelo pesquisador. É
muito comum perceber, quando são realizadas entrevistas, que os entrevistados sempre
voltam a um ponto comum, aos mesmos acontecimentos que remetem à história da cidade, do
país ou do lugar em que vivem.
Percebe-se nessa questão que a história de vida, por mais que se pretenda dizer que é
individual, estabelece laços com a história coletiva, cuja interface feita é a memória. Pollak
diz que em certo sentido, quando determinado número de elementos tornam-se realidade,
estes passam a fazer parte da própria versão da pessoa, embora “outros tantos acontecimentos
e fatos possam ser modificados em função dos interlocutores, ou em função do momento da
fala”.
Então, cabe-nos inquirir: quais são os elementos constitutivos da memória, individual e
coletiva? Nessa questão Pollak diz:
Em primeiro lugar, são os acontecimentos vividos pessoalmente. Em segundo lugar,
são os acontecimentos que eu chamaria de ‘vividos por tabela’, ou seja,
acontecimentos vividos pelo grupo ou pela coletividade à qual a pessoa se sente
pertencer. São os acontecimentos dos quais a pessoa nem sempre participou mas
que, no imaginário, tomaram tamanho relevo que, no fim das contas, é quase
impossível que ela consiga saber se participou ou não. Se formos mais longe, a esses
acontecimentos vividos por tabela vêm se juntar todos os eventos que não se situam
dentro do espaço-tempo de uma pessoa ou grupo. (POLLAK, 1992)
Também ao descrever a importância dos estudos da memória, Bosi chama a atenção
para o modo pelo qual o sujeito mistura a sua narrativa memorialista e marcação dos fatos
com a “estilização das pessoas e situações e, aqui e ali, a crítica da própria ideologia”. (BOSI,
2002) Bosi diz ainda que muitas vezes, a ciência produz uma simplificação desastrosa quando
negligencia esses aspectos da complexidade real de seres concretos.
Em se tratando de trabalhadores rurais, a memória é um importante elo na formação do
grupo, seja na constituição da sua própria história, selecionando fatos marcantes, que muitas
contrariam à própria história escrita, aos documentos ligados e aos órgãos oficiais. Ainda que
não descrevam o processo de escolarização, é responsável pela apreensão das práticas
educativas.
Por práticas educativas designamos o conjunto de experiências que são compartilhadas
pelos grupos, de modo a apreender os significados da prática social. O objetivo dessas práticas
é a transmissão de saberes sociais54. Possuem um caráter educativo, pois os próprios
participantes assumem a tarefa de orientar, dirigir as lutas no cotidiano, assumindo postos de
direção desses movimentos, claro que em muitas vezes, sem qualquer treinamento para isso:
Não fui à escola, não. Tive pouco estudo. Na minha época não era fácil estudar. Ou
segurar a enxada ou a caneta. A senhora já ouviu a música? Pois é. A vida do pobre
do meu tempo. [ ] Hoje tudo é mais fácil. O governo paga pros pais mandá os filhos
pra escola. No meu tempo, escola era prá quem não lidava com o dia pesado da roça.
(Entrevistado 11)
54
Grzbowski diz que as praticas educacionais colocam como tarefas o aprendizado da classe sindical e política – e a busca de uma identidade ideológica que unifique os interesses dos colonos
e funcione como cimento de sua diversidade; Compõem, por sua especificidade, o que se chama
de educação popular.
Acabam se tornando práticas formativas, pois além de transmitir um aprendizado
prático do uso do dia-a-dia, engendram um saber informal adquirido no trabalho e na vida. O
trabalhador ao ter acesso com esse aprendizado modifica-se, transforma a sua visão de mundo.
A melhor escola é a da vida. Nóis aprende com os nossos companheiro de labuta.
Tem coisa que escola num ensina. Desde pequeno, aprende a olhar: ver a natureza, as
criação. O tempo de plantá e de colhê. Num é isso mesmo? (Entrevistado 8)
A análise da memória ultrapassa os limites do dito e escrito. Está presente no cotidiano
do assentamento. Histórias que não aparecem em livros de História da Educação. Uma dessas
memórias diz respeito à percepção dos sentimentos de orgulho pela posse e conquista da terra,
considerada como o início de uma série de outras conquistas, como o de renda para o núcleo
familiar.
Outra memória que aparece no exercício de rememoração refere-se às representações
afetivas construídas no convívio com outros assentados. Muitos, além de companheiros de
acampamento, tornaram-se compadres, representando no mundo camponês como a ampliação
da família. Sociologicamente significa o alargamento dos laços de sociabilidade, traços do
passado que aparecem vez e outra nas sociedades tradicionais.
A memória como capacidade de transmissão das práticas educativas, nos faz crer que
entre os camponeses, todo o conhecimento adquirido não tem um dono propriamente dito,
mas faz parte de toda a comunidade e é fruto de uma experiência transmitida pelos
antepassados. Conhecimento “sem dono” é apropriado coletivamente pela comunidade. Por
exemplo: “Como se fazia lá na Fazenda tal”. “Lá em Goiás se fazia assim”. Vimos uma
rezadeira que aprendeu com a família, também de rezadeiras, a benzer os filhos da
comunidade. Disse-nos que tentava ensinar à neta os segredos da benzeção para assim, deixar
os seus conhecimentos para outras gerações.
O simbolismo está presente nas paredes. O passado das fotos de famílias que adentram
no dia a dia da casa: pessoas que estão presente e outros que se foram. Nas casas, estão
emparelhados quadros de santos de devoção familiares, “folhinhas” com datas e fotos
familiares, de parentes que nem sempre estão mais presentes no núcleo da família.
Memórias que se ensinam e aprendem, como por exemplo, na própria relação com a
natureza, com a observação dos sinais de chuva, estiagem, friagem e seca. Ainda que os
trabalhadores rurais tenham sido afetados pela itinerância − a maioria dos moradores da zona
rural morou em diversos endereços, antes do assentamento−, esse modo de vida não destruiu
os traços culturais camponeses.
2.
MEMÓRIAS ESCOLARES E NÃO ESCOLARES DE ASSENTADAS RURAIS EM
SÃO JOÃO DO BUGRE – (GO)
Memórias reveladoras, que guardaram para si o embate, a busca pela terra. As
mulheres têm em comum o fato de que, na constituição de suas vidas como esposas e mães de
família, acompanharam os seus maridos na busca por terra para plantio e criação dos filhos.
As clivagens das suas histórias desvelam traços constitutivos da mentalidade camponesa, em
que o machismo predominante nas relações sociais, geralmente as exclui de toda participação
política mais ativa na comunidade55.
Segundo pesquisa sobre assentamentos rurais em diferentes áreas brasileiras, Leite
(2004, p. 73) mostrou que, no quesito referente a sexo, 85% dos responsáveis pelos lotes – os
chamados chefes de família− são homens, e apenas 15% são assumidos por mulheres. Mesmo
na situação de pleitear a terra, ainda que as mulheres fiquem de ‘guarda’ no assentamento
garantindo o lugar, quando há a redistribuição, as parcelas têm como titular os cônjuges, e não
elas.
Embora não pretendemos fazer uma discussão de gênero, reconhecendo que esse
aspecto não pode ser minimizado nas pesquisas envolvendo memórias sobre os assentamentos
rurais, ao abordar a história de resistência das mulheres que participaram ativamente em São
João do Bugre, chamou-nos a atenção a intensa mobilização que elas tiveram, reveladora em
vários sentidos. O primeiro, é que a sua participação não ficou restrita ao preparo da comida,
arrumação dos pertences, das roupas, do cuidado das crianças e dos doentes − próprios do
espaço doméstico−, mas das atividades de segurança durante a ocupação.
Como em outros assentamentos rurais, a estratégia de resistência coube, sobretudo, as
mulheres, que se revezam dia e noite em vigília, cuidando das crianças e morando nos lotes,
provisoriamente estruturados, não permitindo a entrada de estranhos. Como a estratégia do
grupo foi a de não sair de forma nenhuma, mesmo com o acirramento do conflito, cabia às
55
Embora na constituição do espaço doméstico, as relações de mando e de desmando das decisões
cotidianas fiquem a cargo da mulher. Como diz Pessoa da guarda da “lata de bolo”, à repartição do
alimento, são todas deliberações femininas, as quais o homem pouco participa ou retira a
autoridade. As mulheres entrevistadas disseram ter trabalhado a vida inteira no espaço doméstico,
ou ajudando o marido nas lavouras das fazendas arrendadas, confirmando essa tese.
mulheres cuidarem da casa provisória, enquanto os homens saíam para o plantio e para a
colheita.
Tempos difíceis, descritos como época de se alimentar de “mandioca com garapa”, pois
tudo era escasso, principalmente o alimento. Se não fosse a ajuda da igreja, das arrecadações
de roupas56 e comida, não teriam sobrevivido.
Com filhos pequenos, não viam perspectivas de escolas ou de qualquer atendimento a
saúde. Outro papel que passou a ser assumido pelas mulheres nos assentamentos foi o de
reivindicar do poder público garantias dos serviços de infra-estrutura, através de uma
organização interna que permitia a presença de uma delas nos órgãos, reivindicando até para
populações vizinhas dos assentamentos, esses bens públicos. (LEITE, 2004, p. 87)
Sim, aprendia. Num era essas coisas de escola, não. Era um saber necessário para
criar os filhos, cuidar da casa, das coisas do marido. Os nossos pais não deixava
agente estudar prá não fazer carta para namorado. O medo era esse. Afinal, que mal
aprender a ler pode fazer? Aqui, todo mundo ensina e aprende. Vira professor de uma
hora para a outra: ensinando as outras a matricular os filhos, a pedir transporte para ir
a escola, a marcar guia para o médico. (Entrevistada 13)
A perspectiva de sucesso das demandas deu outro sentido às suas próprias vidas.
Durante o auge do conflito, quem negociava diretamente com os ‘jagunços’, recebia as
intimações e demais autoridades que frequentavam o assentamento, eram as mulheres. Como
foi dito anteriormente, enquanto os homens cuidavam da roça, elas funcionavam como
verdadeiros escudos, protegendo as ‘crias’ de possíveis tiros e ameaças:
Teve um dia que a minha filha estava dando banho nos meninos e eu estava fazendo
o comer. Então chegaram os jagunços. Me chamaram. Eu fui lá falar com eles. Aí
um deles falou: ‘Por que vocês ainda estão aqui?’ Aí eu disse: ‘Nós não vamos sair
daqui’. Então um deles falou:’vocês tem que sair daqui’. Minha filha correu com os
meninos e escondeu em um buraco. Eu corri, recolhi um pouco do que podia e
também corri. Quando vi, tinha botado fogo em tudo. (Entrevistada 13)
A essa passagem que indica a violência sofrida, somam-se outras memórias do
acontecido:
Várias vezes, quando precisava voltar da cidade via todos os meus trem revirado.
Eles chegava aqui e destruía tudo, revirava tudo de lugar. [ ] Teve um dia que
botaram fora a panela de banha. Um dia jogaram fora a comida. Fiz o comer e fui
para a cidade. Quando voltei, não tinha nada. Tinha sumido a comida e tudo.
(Entrevistada 13)
56
A entrevistada teve em várias ocasiões todas as roupas queimadas pelos jagunços, chegando a
não salvar até os próprios documentos.
Ocorreram várias demonstrações de solidariedade. A destruição de todos os pertences
da entrevistada 13, fez com que as companheiras de assentamento se mobilizassem para
conseguir o mínimo de sobrevivência para a amiga. Então, a ocasião fez com que se fossem
criadas novas relações de sociabilidade, por compadecimento. Com a divulgação do ocorrido
na imprensa, várias pessoas foram atraídas para o assentamento, dando uma maior
visibilidade ao fato57.
A busca pela terra significou também a procura por uma série de benefícios, que até
então, as trabalhadoras não sabiam que era possível obter. Com a morte do cônjuge, como foi
o caso da entrevistada 15, a demanda pela posse prosseguiu, sendo que ela se cercou de
diversas informações sobre como poderia participar da partilha dos lotes, mesmo com a
ausência do marido.
Tive que aprender a lidar sozinha: pedir financiamento. Falar com o gerente sobre o
dinheiro para a plantação. Hoje não me envergonho de falar com qualquer
autoridade. [ ] Não, a escola não fui, não. Naquele tempo, escola era somente para
quem morava na cidade. Lá onde morava, perto de Rio Verde havia uma escolinha.
Eu não tinha jeito pros estudo. Então o jeito era trabalhá mesmo na roça.
(Entrevistada 15)
O fato é que, no caso de sua parcela, a titularidade na posse apareceu no seu nome.
Mesmo semi-alfabetizada, obteve conhecimento de todos os trâmites legais necessários para
financiamentos rurais, empréstimos e outros serviços, e com a imissão da posse, fez da sua
propriedade um núcleo de agricultura familiar, criando na terra, os quatro filhos58.
Ter recebido o lote significou total independência financeira para essa viúva assentada,
tomando sozinha, decisões sobre qualquer negociação. Perguntamos sobre as relações
comerciais, ao que falou com orgulho sobre a compra de animais, o plantio da roça e da
comercialização de produtos na cidade. “Tudo sozinha, sem ser necessária a presença de um
homem”.
Para essa entrevistada, receber o lote significou o fim de uma série de humilhações
impostas pelo mundo do trabalho. Então a terra apresenta um outro significado: Finalizar as
injustiças vividas ao longo da vida:
57
Exemplo da Radio Difusora AM que noticiou na época, em 1985, quando o grupo se formou e
ocupou a terra devoluta, em mãos de um dono de terras que dizia ter a escritura, a péssima
condição de sobrevivência de mulheres e crianças acampadas, chegando a entrevistar a acampada.
58
Atualmente os três filhos mudaram para a cidade em busca de estudo, restando apenas uma filha
que trabalha na lavoura e uma neta.
Quando nóis recebeu o lote, tudo mudou. Antes nóis vivia trabalhando pra os outros
nas fazendas de deo em deo. Um dia tinha serviço e o outro não. Com a posse nóis
sabe onde vai estar amanhã, plantando, colhendo e criando os nossos animais.
(Entrevistada 11)
Essa fala nos remete à outra dimensão do significado que a terra assume, na superação
da itinerância, própria do trabalhador rural brasileiro, que em face à precariedade dos
trabalhos e a provisoriedade dos serviços, continua se deslocando nas fazendas, perdendo
relações de sociabilidade, que no campo, tendem a ser permanentes, principalmente quanto às
relações de compadrio, cujos compadres e comadres fazem parte do cotidiano da família.
Então, a posse da terra significa manter intactos esses laços construídos, fixando-se no local.
Dar voz às mulheres que fizeram parte da resistência em São João do Bugre é trazer à
tona memórias silenciadas pelo próprio discurso masculino e pelo discurso escolar. Nenhuma
das entrevistadas teve acesso a escolas, tendo em vista a própria situação de pobreza absoluta.
No entanto, percebemos a importância que davam à escolarização de seus filhos:
Mandei todos os quatro prá escola. Escola é o que faz a pessoa ter uma vida melhor:
prá não trabalhar na roça. Nóis está aqui porque o estudo é pouco. [ ] A minha filha
chegou a estudar prá professora. Mas a senhora sabe como é: arrumou barriga, aí
teve que largar a escola. Deixou prá cuidar de menino, de casa, das coisas que agente
aqui mesmo, com pouco estudo, dá conta de ensinar e precisa pra viver. (Entrevistada
15)
Suas histórias de vida constituem a própria história do assentamento, que envolve
sentimentos, na maior parte das vezes de sofrimento experienciado, estresse e medo, mas
também de esperanças e simbolismos que a conquista da Terra traduziu. Mais do que um lugar
de trabalho, mudança de vida, em que a garantia da escola para os filhos significaria, no seu
imaginário, um futuro melhor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como vimos, faz-se necessário que a História da Educação aponte em novas direções,
apropriando-se do conceito de memória para entender o porquê da não-escolarização de
determinados grupos. As trajetórias das assentadas que entrevistamos tem em comum o fato
que, ainda que não frequentaram a escola, o aprendizado cotidiano das práticas educativas
possibilitou alterações na forma de atuação, de trabalhadora rural a militante política.
Memórias que recuperam o sentido da própria luta, dos embates travados em São João do
Bugre (GO).
Pode-se dizer que a apropriação dessas práticas, na fase de acampamento, foi
expressiva para a mudança de perspectiva de suas trajetórias. Isso porque, naquele momento
de visibilidade, houve a construção de uma consciência coletiva de sem terra, provocada pela
necessidade de efetivação do projeto de vida, o que tornou necessário a aquisição de uma
série de habilidades intrínsecas para participar do confronto e das negociações. Aprendizado
compartilhado e distribuído entre os pares, em que a escola aparece como um sonho distante
de quem trabalha na roça e não pode ir a cidade aprender um conhecimento não aplicado aos
afazeres do lugar.
Corroborando outras publicações, notamos que o papel da escola para alguns grupos
sociais não é inseri-los no trabalho na pequena propriedade, mas tirá-los da terra, almejada e
defendida, mas o espaço do atraso e da falta de alternativa. As assentadas expuseram que se
tivessem estudo, tudo seria diferente, não seriam trabalhadoras rurais.
Embora possa se constituir em falas isoladas e contexto peculiar, esse pensamento
observado em São João do Bugre denota a grande colcha de retalhos que se tornou pensar a
História da Educação. Como escrever a história, a partir dos recortes da memória? Como
pensar em um projeto escolar que insira pessoas do campo e da cidade?
REFERÊNCIAS
ALVES, Amone Inacia. A Comissão Pastoral da Terra – CPT – e a formação de trabalhadores rurais em Goiás.
Tese de Doutorado defendida em 2010 na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás - UFG,
2011.
BENJAMIN, W. Obras escolhidas I: Magia e Técnica, arte e política. Ensaios sobre literatura e história da
cultura. São Paulo: Brasiliense, 1987.
BOSI, Ecléa. Memória e sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: TA Queiroz, 2002.
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil,
1990.
DUBY, Georges e LARDREAU, Guy. Diálogos sobre a nova história. Lisboa: Dom Quixote, 1989.
GRZYBOWSKI, C. Movimentos populares rurais no Brasil: desafios e perspectivas. In STÈDILE, J. P. A
questão agrária hoje. Porto Alegre: Editora da Universidade. Universidade Federal do RS, 1994.
__________, Esboço de uma alternativa para a educação no meio rural. in Contexto & Educação, n. 4, Ijuí, FUI,
1984.
LE GOFF, Jaques. História e memória. Campinas: Editora da Unicamp, 1996.
LEITE, Sérgio et al. Impactos dos assentamentos. Brasília: Instituto Interamericano de Cooperação para a
agricultura: NEAD. São Paulo: Editora UNESP, 2004.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Vértice, 1990.
POLLAK, Michael. Memória e identidade social. In Revista de Estudos históricos. Rio de Janeiro, vol. 5, n. 10,
1992, p. 200-212.
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
AVALIAÇÃO EM TURMAS MULTISSERIADAS: ONDE ESTÃO SUAS
PROPOSTAS?
Fernanda Alves de Oliveira
Prof. Dr. José Paulo Pietrafesa
Universidade Federal de Goiás - Faculdade de Educação
RESUMO
Este trabalho vincula-se ao Núcleo de Estudos e Pesquisas da Infância e sua Educação em Diferentes Contextos
(NEPIEC), tem como abordagem a discussão sobre a avaliação em turmas multisseriadas na educação no e do
campo. Considerando que as práticas avaliativas estão presentes em todos os níveis de ensino, da Educação
infantil à Pós-graduação, no ambiente urbano e no rural, este estudo se justifica por entender a necessidade de
discutir os procedimentos e práticas avaliativas destinadas à Educação Básica e,sobretudo, por tentar perceber
como essas práticas repercutem nas turmas multisseriadas no espaço do campo. Ainda são poucos os estudos que
exploram essa problemática,mas é indiscutível a relevância de considerações aprofundadas em relação ao
trabalho educativo em turmas com crianças de diferentes idades. Na realização desse trabalho foi possível
perceber a necessidade emergencial de pensar em uma proposta de avaliação que leve em consideração as
especificidades das multisseries.
Palavras-chave: avaliação; turmas multisseriadas; infância; educação do/no campo.
1 TURMAS MULTISSERIADAS: QUE ESPAÇO EDUCACIONAL É ESSE?
Entende-se por multissérie classes com crianças de várias series e um único docente.
Muitos são os apontamentos para sua existência, como a falta de docentes, de espaço, de
recursos financeiros entre outras relevâncias como aponta Ferri (1994, p. 12),
Para alguns uma estranha, para outros a única possibilidade de escolarização nos
primeiros anos de vida. Considerada por alguns autores como “arremedo de escola
e não escola propriamente dita” (FONSECA, 1989:20), o “status” de difíceis em
todos os aspectos (acesso, transporte, condições físicas e materiais, alunos,
comunidade...) diz muito do que encontrei no contato sistemático com as escolas
multisseriadas. Uma escola, uma sala de aula, um professor, alunos, de 1ª a 4ª série.
Sem merendeira, diretora, orientadora, vigia, laboratório, sala de vídeo [...].
As classes multisseriadas estão presentes na realidade das escolas do campo.
Existem contrapontos entre autores que se mostram contrários à implantação do modelo
seriado urbano, no espaço do campo, como destaca Arroyo (1999, p. 17),
Não tragam para o campo a estrutura escolar seriada urbana. Estamos no momento
de acabar com a estrutura seriada urbana e não teria sentido que na hora que vocês
pensam numa escola básica do campo, pegassem um modelo que já está todo ele
quebrado, caindo aos pedaços, que é o sistema seriado.
Porém o objetivo deste trabalho não é aprofundar nas reflexões se é realizável ou não
as classes multisseriadas, e sim dialogar com os autores sobre os procedimentos e as práticas
avaliativas desenvolvidas neste panorama educacional. Para isso faz-se necessário conhecer
que espaço é este, que envolve as multisséries.
Percebe-se na literatura as multisseriada como diferentes espaços, o primeiro a ser
mencionado é um espaço de luta, sendo essa, sobretudo política, conforme destaca Toledo
(2005, p. 58) “Às políticas de Educação do Campo, ao longo da história republicana
brasileira, raras vezes foram oferecidas diretrizes específicas, configurando uma posição
marginal na agenda pública.” A luta das multisséries é por um espaço de direitos políticos, de
transição das margens para o centro, percebendo-a como um espaço educacional que
encontrasse aberto a discussões para proposta de melhoria na qualidade da educação do
Campo.
Conde e Farias (2011, p. 4) apontam que um dos fatores presentes na existência das
classes multisseriadas são as lógicas de investimentos feitas pelo poder público, que levam em
conta o custo aluno ao financiar as escolas. Contudo vale ressaltar que a educação do campo
tem suas especificidades, sendo assim não pode ser condizente ao mesmo valor custo aluno
das escolas urbanas.
Uma outra definição que compete ao espaço das turmas multisseriadas é o de
contrastes entre a realidade e a legislação, conforme apresenta Hage (2006) o confronto
estabelecido entre a realidade das escolas multisseriadas e os marcos legais existentes
sinalizam em duas questões, sendo elas: considerar o fator de localização da população como
elemento intensificador da desigualdade na oferta de oportunidades de escolarização e
perceber que a ampliação das oportunidades de ensino a partir da legislação vigente, não têm
sido capaz de provocar alterações significativas no atendimento à escolarização dos povos do
campo.
Hage (2006) aponta ainda, que os artigos 23 e 28 da LDBEN (9394/96) estabelecem
que cada sistema de ensino tem a liberdade de promover as adaptações necessárias para que a
educação básica seja ofertada com qualidade, indicando a possibilidade de definição do
currículo da organização escolar, do planejamento, do calendário, entre outros elementos.
Perceber essa possibilidade de adaptação significa entender as especificidades da educação do
campo, uma vez que deve-se pensar no ciclo agrícola, nas condições climáticas e no trabalho
no campo, sendo esses um dos elementos que corroboram para o fracasso escolar.
Considerar as multisséries ou turmas unidocentes como um espaço de contraste entre
a legislação e a realidade é perceber que muitos dos artigos presentes nas Diretrizes
Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo (RESOLUÇÃO CNE/CEB 1,
DE 3 DE ABRIL DE 2002) não fazem parte do cotidiano da educação camponesa. Hage
(2006, p. 2) menciona,
Nos Artigos 3°, 6° e 7°, respectivamente, a Resolução indica, que o Poder Público
deve garantir a universalização do acesso da população do campo à Educação
Básica e à Educação Profissional; proporcionar Educação infantil e Fundamental nas
comunidades rurais, inclusive para os que não concluíram na idade prevista; e que
os sistemas de ensino, através de seus órgãos normativos, devem regulamentar
estratégias específicas de atendimentos escolar do campo, salvaguardando, os
princípios da política da igualdade.
Outras características presente nas turmas unidocentes é ser tratada como um espaço
de exclusão e precariedades. Conte e Farias (2011, p. 5) denunciam fortes disparidades entre
as escolas do campo e da cidade, ressaltando a “[...] precariedade da realidade e a necessidade
de mais espaços adequados para a educação das crianças do campo, mais concursos públicos
para professores efetivos com formação apropriada e salários dignos.”
As situações de precariedade no trabalho docente, o difícil acesso, a inviabilização
em investimentos na formação de professores, associam a multissérie aos prejuízos na
aprendizagem, motivando os sujeitos do campo, a considerá-la “um mal necessário” e
perseguirem sua transformação em turmas seriadas, como alternativa para que o sucesso na
aprendizagem ocorra (HAGE, 2006)
Perceber as multisséries como um espaço de precariedade, faz-se necessário pensar
em mudança, mudança do olhar excludente, na legislação, na forma de luta dos movimentos
sociais, mudança de investimentos, entre outros elementos. Conforme descreve Ferri (1994, p.
12)
Tão somente quatro paredes, um armário com o mínimo de material, quadro de giz,
crianças tímidas, com o olhar atento, deslumbradas com a possibilidade de aprender
coisas novas, um professor com a tarefa de ensinar e a sensação de que o que saber
não serve para aquela realidade, de que não sabe trabalhar com a diversidade do
grupo [...]
Espaço de novas possibilidades, de estudos, pesquisas e iniciativas, essa deve ser a
definição para as turmas multisseriadas. Hage (2006, p. 5) afirma que:
As escolas multisseriadas, em que pese as mazelas explicitadas, têm assumido a
responsabilidade quanto à iniciação escolar da grande maioria dos sujeitos do
campo, e, por esse motivo, se faz urgente a necessidade de serem incluídas na
agenda das Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, do MEC, das
universidades e centros de pesquisa e dos movimentos sociais, como passo inicial
para se cumprir os preceitos legais existentes.
Arroyo (1999) aposta em perceber as escolas multisseriadas como um espaço de
novas possibilidades, de avanço e não retrocesso na transformação das mesmas em seriadas,
destaca que as multisséries se constituem como um espaço escolar estruturado de forma
inclusiva, já as seriadas urbanas menciona ser seletivas e excludentes, “Temos que acabar,
sobretudo, com a estrutura seletiva, peneiradora, excludente que é inerente ao sistema seriado
[...] a escola é peneiradora e seletiva.” ( ARROYO, 1999, p. 18)
A multissérie encontra-se como um espaço de luta, contrastes, exclusão,
precariedade, porém com um olhar de novas possibilidades, de desafios e mudanças, cuja
complexidade exige re estudos e aprofundamentos. (FERRI, 1994)
1.2 ESPECIFICIDADES DA EDUCAÇÃO DO/NO CAMPO
Como todas as crianças, a criança do campo brinca, imagina e fantasia, sente o
mundo por meio do corpo, constrói hipóteses e sentidos sobre sua vida, sobre seu
lugar e sobre si mesma. (SILVA, PASUCH, 2010, p. 01)
Faz se importante uma breve contextualização sobre a educação do/no campo, uma
vez que essa se constitui como espaço de luta, tendo como uma das especificidade a presença
das turmas multisseriadas.
A educação do campo é fruto do reconhecimento da necessidade de uma proposta
de educação de qualidade para as pessoas que vivem no ambiente rural. De acordo com os
cadernos SECAD59 / MEC 2007, “[...] esse reconhecimento extrapola a noção de espaço
geográfico e compreende as necessidades culturais, os direitos sociais e a formação integral
desses indivíduos.” (SECAD / MEC, 2007, p. 9).
Refletir sobre uma educação do/no campo é levar em consideração as necessidades e
especificidades de um ensino pensado para e pelos moradores do campo. Estes de acordo
com a Resolução 02/2008 do Conselho Nacional de Educação (CNE) abrange os
trabalhadores dos movimentos sociais, quilombolas, pescadores, extrativistas, ribeirinhos,
caiçaras, indígenas, assentados entre outros.
Vale diferenciar os conceitos de educação rural e educação do campo. Segundo
Gonçalves (2009, p. 51) a primeira ganhou forças no Brasil na década de 1920 com o
surgimento do termo ruralismo pedagógico, com o objetivo de aumentar a produção e conter o
êxodo rural, pela fixação do homem do campo no campo. Uma educação que segue os
59
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
interesses da burguesia. Diante dos conceitos rural e campo, Gonçalves (2009, p. 52)
esclarece:
A utilização do termo “campo” no lugar de “rural” é própria do movimento, que
para diferenciar suas exigências das políticas urbanocêntricas do passado feitas
“para o meio rural”, define o novo projeto de desenvolvimento “para o campo”, que
parte das necessidades e interesses do próprio campo.
Para o Ministério da Educação existem outros componentes que colaboram para a
mudança do paradigma da educação rural para o da educação do campo não sendo apenas a
análise crítica da escola rural, mas o surgimento das propostas desenvolvimentistas para o
campo, em geral centradas no agronegócio e na exploração indiscriminada dos recursos
naturais (BRASIL/MEC, 2007).
Já Caldart (2009, p. 39) afirma que “A Educação do campo nasceu como crítica à
realidade da educação brasileira, particularmente à situação educacional do povo brasileiro
que trabalha e vive no/do campo. Nasce da ‘experiência de classe’[...]”, da organização dos
camponeses em movimentos sociais, compostos por diferentes sujeitos, de diferentes classes
que lutam pelos seus direitos.
Diante do panorama histórico da Educação do Campo encontra-se os movimentos
sociais como protagonistas do seu processo de criação, sendo os principais atores os
movimentos sociais de luta pela reforma agrária e o Movimento dos trabalhadores sem terra
(MST). São frequentes as tensões e lutas por políticas públicas que garantam o acesso dos
camponeses à educação escolar em seu próprio território. (CALDART, 2009).
Os movimentos sociais são contrários a retirada dos povos do campo para estudar nas
escolas urbanas, contrários aos transportes escolares inapropriados sem condições mínimas
necessárias como cinto de segurança, cadeirinhas e acentos paras as crianças pequenas.
Velloso (2008, p. 41) aponta que os movimentos sociais “[...] buscam fixar o homem
no campo e assegurar a posse da terra para aqueles que a desejam cultivar.” Defendem a
permanência no campo com condições necessárias de sobrevivência como sujeitos de direitos.
Diante dos pressupostos legais somente a partir da CF/88 que a educação brasileira
passou a contemplar as especificidades e interesses das populações identificadas com o
campo. Anterior à essa legislação a educação para os moradores do espaço rural eram
mencionadas apenas como instrumental e assistencialista, ou conforme revelava LDBEN de
1961 ( Lei nº 4.024/61)
[...] preocupação quanto à promoção da educação nas áreas rurais para frear a onda
migratória que levava um grande contingente populacional do campo para as
cidades, gerando problemas habitacionais e estimulando o crescimento dos cinturões
de pobreza hoje existentes nos grandes centros urbanos. (MEC/BRASIL, 2007, p.
16).
A CF/88 tem como premissa a garantia do acesso de todos os brasileiros à educação
escolar, fortalecendo o discurso da democracia. Contudo somente em 1996 com a
revitalização da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9394/96) que foi
implementado o direito à igualdade e à diferença assim como a diversidade sociocultural. De
acordo com o Ministério da Educação (2007, p. 17) esta ultima lei “Permite, ainda, a
organização escolar própria, a adequação do calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às
condições climáticas.” Dessa forma contribui para o fortalecimento da luta por uma educação
de qualidade levando em consideração as especificidades dos povos do campo.
Para que as propostas de educação sejam a partir do campo e para o campo é
necessário que sejam quebrados muitos paradigmas e preconceitos historicamente construídos
entre campo e cidade. O campo visto como lugar de atraso, de precariedades, de necessidades
de investimentos.
Diante das divergências educacionais entre campo e cidade, os cadernos SICAD/
MEC (2007) afirmam que:
A visão urbanocêntrica, na qual o campo é encarado como lugar de atraso, meio
secundário e provisório, vem direcionando as políticas públicas de educação do
Estado brasileiro. Pensadas para suprir as demandas das cidades e das classes
dominantes, geralmente instaladas nas áreas urbanas, essas políticas têm se baseado
em conceitos pedagógicos que colocam a educação do campo prioritariamente a
serviço do desenvolvimento urbano-industrial. (BRASIL/MEC, 2007, p. 13)
Em virtude dos fatos mencionados, evidencia-se uma emergência na continuação de
pesquisas e estudos correspondentes a educação do/no campo, uma vez que existem ainda
impasses na garantia de uma educação de qualidade pensada a partir das especificidades
culturais dos povos camponeses.
1.3 AVALIAÇÃO EM TURMAS MULTISSERIADAS: ONDE ESTÃO SUAS
PROPOSTAS?
A educação do/no campo encontra-se como excludente ao que refere as ofertas e
oportunidades de direito à escola, sabe-se que um dos grandes desafios presentes no campo é
o conflito entre o trabalho e a escolarização, uma vez que “[...] a escola pode ser, para essas
crianças, tanto a esperança para livrar-se da enxada, deixar a vida no campo, quanto a de
permanecer e ver crescer a família, prosperar, adquirir e cultivar a própria terra. (PRADEM,
2004, p. 58). Trocar a enxada pelos livros, pode ser uma boa escolha, desde que a educação
aqui proposta seja pensada e articulada com as vivências e experiências das crianças do
campo.
Portanto faz-se necessário um olhar atento para a educação no ambiente rural,
sobretudo no que compete as formas de avaliação, precavendo-se para não ocorrer uma
reprodução do que é feito nas escolas seriadas urbanas.
Ao que se refere à avaliação da aprendizagem, os conceitos medir, testar e examinar,
estão implícitos desde os primórdios da inserção desta no processo de ensino. Arroyo (1999)
aponta que tais procedimentos não podem estar presentes nas práticas avaliativas propostas
para as escolas multisseriadas, criticando os atos de reprovação,
Não esqueçamos da condição da infância, adolescência e juventude do campo, ela já
é excluída da terra, excluída do conhecimento, da cultura, da dignidade, e ainda a
escola vai excluí-la da própria escola? Antes de reprovar pensem duas vezes ou
cinquenta vezes. E se perguntem a seguinte questão: Se a minha função como
educador é desenvolver plenamente esta criança, ou jovem, será que eu vou reprovar
alguém em seu desenvolvimento pleno, seu desenvolvimento humano? Que critérios
eu vou ter para reprovar alguém em desenvolvimento? Que normas nós temos na
Escola Plural, na Escola Candanga, na Escola sem Fronteiras? (ARROYO, 1999, p.
24)
Investigar quais são as práticas de avaliação da aprendizagem em turmas
multisseriadas e perceber se existe ou não uma propostas de avaliação que leva em
consideração as especificidades dessas turmas, as diferenças de idades e desenvolvimentos,
são questões presentes neste trabalho. De acordo com o programa Escola Ativa60 destinado às
escolas multisseriadas do/no campo, a avaliação se faz mediante as propostas encontradas na
LDBEN 9.394/96 conforme o artigo 24 desta lei:
Avaliação contínua e cumulativa do desempenho do educando, com prevalência
dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do
período sobre os de eventuais provas finais; possibilidade de aceleração de
estudos para educandos com atraso escolar; possibilidade de avanço nos cursos
e nas séries mediante verificação do aprendizado; aproveitamento de estudos
concluídos com êxito; obrigatoriedade de estudos de recuperação, de
preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento
60
Escola Ativa - A implantação da estratégia metodológica Escola Ativa no Brasil ocorreu no ano de
1997, com assistência técnica e financeira do Projeto Nordeste/MEC, tendo como objetivo aumentar o
nível de aprendizagem dos educandos, reduzir a repetência e a evasão e elevar as taxas de conclusão de
parte do Ensino Fundamental, ou seja, de 1ª. a 4ª. série. (SECAD/MEC, 2008)
escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos.
(BRASIL, 2008, p. 25)
Com base em tais reflexões evidencia-se a ausência de propostas especificas para a
avaliação nas turmas multisseriadas, não encontradas nas legislações vigentes que norteiam a
educação do/no campo.
Como demonstrado nesta pesquisa às propostas de avaliação para a Educação infantil
tem suas especificidades em relação às encontradas no Ensino Fundamental. Hage (2010) ao
conceituar o termo multisseriada como formato de varias séries destaca que em muitas salas
além de crianças de 1 a 4 serie encontrasse também crianças de Educação Infantil nesse
mesmo espaço.
Nesse sentido Pasuch e Silva (2010) expõe que por conta da escassez de instituições
e professores no espaço rural, encontra-se em muitas escolas multisseriadas crianças da
Educação Infantil, inseridas na mesma sala de crianças do Ensino Fundamental. Dessa forma
questiona-se sobre qual proposta de avaliação o educador dessas turmas deve-se fundamentar?
Em uma das duas propostas elaboradas para as instituições e escolas urbanas, ou se existe
uma proposta específica de avaliação que leva em consideração as especificidades das
multisseries.
A avaliação pensada para a educação do/no campo não pode ser excludente, uma vez
que os camponeses já são excluídos das políticas públicas, das condições adequadas de saúde
e bem estar. Quando superado todos os impasses do acesso à escola, devido às desigualdades
de oportunidades a escolarização, chega à escola as provas, testes, exames e os reprovam os
excluem em vez de incluí-los nesse universo da educação, para que as crianças camponesas
não estejam na escola apenas para livrar se da inchada, e sim por querer fazer cumprir seus
direitos a educação.
Em 2004 foi realizado um estudo sobre a avaliação em turmas multisseridas no
município de São Sebastião do Passé – BA. Este resultou em alguns parâmetros de avaliação
(PRADEN), ao qual resalta que deve se pensar em uma proposta de avaliação específica paras
as multisseries e essa deve ter uma diversidade de procedimentos como:
[...] relatórios, registros em fichas, correção de exercícios, organização das
atividades escritas, também podem ser feitos pelos alunos, individualmente ou em
pequenos grupos. Tudo isso, no entanto, não elimina o levantamento de dados para
acompanhamento desses alunos, principalmente o registro para acompanhamento
individual daqueles com maiores dificuldades, tendo em vista a intervenção
mediadora do professor ou do aluno mais experiente. (PRADEM, 2004, p. 59)
Uma avaliação que seja formativa e emancipatória, priorizando a auto-avaliação e a
avaliação em pequenos grupos, (sendo os trabalhos em grupos compostos por crianças/alunos
mais preparados que tem mais facilidade com os que revelam mais dificuldades) para que os
alunos trabalhem com mais criatividade e independência, ajudando-os a criar os próprios
indicadores de aprendizagem e os indicadores do grupo, esses podem ser mistos, alunos mais
preparados com os que revelam mais dificuldades. (PRADEM, 2004)
Ao que compete às notas estas podem ser “[...] substituídas por registros
apreciativos, definidos e organizados segundo critérios estabelecidos pelo professor com os
alunos.” (PRADEM, 2004, p. 59). Além das notas outro elemento a se discutir e repensar ao
que relaciona-se as turmas multisseries faz se a reprovação, uma vez que essa torna-se
desnecessária,
Se os alunos de todas as séries frequentam a mesma escola de classe única, têm
todos a mesma professora, que faz um trabalho integrado, não há sentido na
reprovação de um aluno, considerando que ele, no ano seguinte, irá permanecer na
mesma classe, com os mesmos colegas e a mesma professora. Assim considerando,
o aluno ficará na dependência de uma ou de todas as disciplinas. O importante é a
professora ter as anotações das dificuldades reveladas por ele em exercícios escritos
ou orais, para ajudá-lo a superar no período seguinte. (PRADEM, 2004, p. 59)
Portanto vale ressaltar que as avaliações da aprendizagem nas turmas multisseriadas,
não devem ser mera reprodução dos referenciais pensados para uma escola seriada urbana,
sem levar em consideração as especificidades das crianças, jovens e adultos que vencem
dificuldades como de transporte, divisão do tempo com o trabalho agrícola, falta de
professores com formações especificas, entre outros fatores para fazer uso do direito ao
acesso a no mínimo a educação básica.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel Gonzalez. FERNANDES, Bernardo Mançano. A educação básica e o movimento social do
campo. Brasília- DF. Ed. Por uma educação básica do campo, 1999. P. 17-24.
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases. Lei nº 9.394,de 20 de dezembro de 1996.
________. Resolução 02/2008. Estabelece Diretrizes para Educação do Campo.
CALDART, R. S. Por uma Educação do Campo:traços de uma identidade em construção. In: Por uma Educação
do Campo. 4.ªed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2009.
CONDE, S.F.;FARIAS, K.H. Desafios da educação do campo na atualidade: educação infantil e classes
multiseriadas na Serra Catarinense. Apresentação na 34.ª ANPED, 2011. Disponível:
http://www.anped.org.br/app/webroot/34reuniao/images/posteres/GT03/GT03-061%20int.pdfAcesso: 29/10/12.
FERRI, Cássia. Escola/classe multisseriada: que espaço escolar é esse? In: Classes multisseriadas: que espaço
escolar é esse? Dissertação de mestrado- UFSC. Florianópolis (SC), 1994.
GONÇALVES, G.B.B. Educação rural, educação do campo. In: Programa Escola Ativa: educação do Campo e
trabalho docente. Rio de Janeiro:2009.
HAGE, S. Mufarrej. (2006). A Realidade das Escolas Multisseridas frente às conquistas na Legislação
Educacional. In: Anais da 29ª Reunião Anual da ANPED: Educação, Cultura e Conhecimento na
Contemporaneidade: desafios e compromissos manifestos. Caxambu: ANPED. Disponivel em:
http://www.anped.org.br/reunioes/29ra/trabalhos/posteres/GT13-2031--Int.pdf
PROGRAMA DE APOIO AO DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO MUNICIPAL – PRADEM. Avaliando
para crescer - Parâmetros de Avaliação de São Sebastião do Passé - Ba. PRADEM - Salvador; UFBA, FCM,
Fundação FORD, abril de 2004.
SILVA, A.P.S; Pasuch, J. Orientações Curriculares Nacionais para a Educação Infantil do Campo. In: I
Seminário Nacional Currículo em Movimento: perspectivas atuais. Belo Horizonte: 2010. (CD ROM -Faculdade
de Educação –UFMG)
VELLOSO, R.M. O controle das políticas públicas para a infância no campo.192 f. Dissertação (Mestrado) –
Departamento de Educação, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2008.
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL OU CONSERVAÇÃO EM TEMPO
INTEGRAL: UMA REFLEXÃO SOBRE A EDUCAÇÃO E O TRABALHO NO
PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO NA PERSPECTIVA BOURDIENIANA
Núbia Martins Gonzaga
Prof. Dr. José Adelson da Cruz (Orientador)
PPGE/UFG
[email protected]
RESUMO
Este trabalho propôs-se a analisar à luz da teoria de Pierre Bourdieu a função social desempenhada no campo
escolar pela experiência de educação em tempo integral do Programa Mais Educação criado pela Portaria
Interministerial nº 17/2007 e executado em uma parceria do Ministério da Educação e da Cultura (MEC) com
escolas, escolhidas pelo baixo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), situadas na rede
estadual, municipal ou no Distrito Federal, pela Secretaria de Educação a Distância (Secad) que coordena o
programa. A crescente preocupação com a elevação da qualidade brasileira tem justificado programas em escolas
cujo IDEB é considerado baixo, no sentido que se considera este indicador um critério de qualidade educacional.
A relevância deste programa para as escolas está no fato de ser um modelo de educação em tempo integral
ampliado a cada ano, de maneira que tem se expandido nas escolas públicas brasileiras assim como postula o
Projeto de Lei do Plano Nacional de Educação (PL 8.035/2010) aprovado para o decênio 2011-2020 cuja meta 6
é oferecer educação em tempo integral para 50% das escolas públicas de educação básica. O programa é
investigado em aspectos como sua forma de organização, espaços, conhecimentos socializados, trabalhadores
integrados, público-alvo e objetivos educacionais. Por meio de estudo bibliográfico da teoria bourdieniena e dos
documentos de sistematização do Programa Mais Educação o estudo constatou que a relação entre educação e
trabalho no campo escolar e neste programa ampliação da jornada escolar tende à conservação das desigualdades
sociais vindas do campo do trabalho e à reprodução das condições de dominação que permeiam a apropriação de
capital.
Palavras-chave: Bourdieu; escola; Programa Mais Educação.
Na sociedade moderna a escola assumiu historicamente um vínculo com o preparo
profissional, se constituindo para essa sociedade imprescindível para fornecer trabalhadores.
Por constituir-se imprescindível a todos mediante universalização do acesso garantido por lei,
a escola abrange tanto aqueles oriundos de famílias dotadas de poder econômico e com ampla
herança cultural como aqueles vindos de famílias menos favorecidas na dinâmica social e
econômica e, consequentemente, com menor herança cultural. Tal universalização tornou a
escola em responsável por legitimar a ideia de que existe uma equalização das oportunidades
na sociedade.
Embora seja a escola universal como oportunidade, as possibilidades formativas se
efetivam no seu interior de forma desigual. Mantém-se por meio da escola a contradição de
haver oferta para todos, mas em seu interior mecanismos de dominação operam uma seleção
da qualidade da educação conforme o público atendido.
O presente artigo pretende analisar a partir do aporte teórico de Pierre Bourdieu (19302002) a função social desempenhada no campo escolar pelo Programa Mais Educação,
compreendendo-o como parte dos processos hierárquicos de desigualdade que acontecem na
escola.
Inicialmente, procurarei descrever a estrutura do programa ressaltando o sua criação,
objetivo, funcionamento, atendimento, público-alvo, profissionais da educação envolvidos,
tempos e espaços.
Depois, farei apontamentos sobre como Bourdieu analisou a escola em seu nexo com a
sociedade sendo instituição que legitima relações hierárquicas de dominação, para em seguida
refletir sobre como o Programa Mais Educação se relaciona com esse processo no interior da
escola.
1. A ESTRUTURA DO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO
O Programa Mais Educação foi criado pela Portaria Interministerial nº 17/2007 como
uma iniciativa de educação em tempo integral visando melhorar a qualidade da educação
pública ofertada no país. O público alvo são as crianças das famílias mais desfavorecidas,
como se vê no documento “Programa Mais Educação: Passo a Passo” (MEC; SECAD;
DEIDHuC, s.d., p. 8):
O Programa Mais Educação atende, prioritariamente, escolas de baixo IDEB,
situadas em capitais, regiões metropolitanas e grandes cidades em territórios
marcados por situações de vulnerabilidade social que requerem a convergência
prioritária de políticas públicas e educacional.
A coordenação do programa é feita pela Secretaria de Educação a Distância (Secad) que
firma parcerias entre o Governo Federal e as Secretarias de Educação (Estaduais, Municipais
e Distrital). O financiamento do programa é repassado diretamente às escolas cadastradas. Em
2011 o programa esteve presente em 15.018 escolas de educação básica em todo país,
(FILHA, 2011), numa parceria de 1.309 secretarias de educação.
Mais de 30 mil escolas brasileiras têm educação integral por meio do Programa Mais
Educação (SEB, 2012), o que está em conformidade com o Projeto de Lei do Plano Nacional
de Educação (PL 8.035/2010) aprovado para o decênio 2011-2020 cuja meta 6 é oferecer
educação em tempo integral para 50% das escolas públicas de educação básica.
No Programa Mais Educação, se concebe a educação em tempo integral como
ampliação da tarefa de educar em diferentes tempos e espaços, a partir de atividades optativas
no contra-turno escolar de maneira que seja oferecido um mínimo de 7 horas diárias aos
alunos. Tem coordenação local de um professor comunitário e o desenvolvimento das
atividades pode contar com diferentes profissionais da educação, inclusive com pessoas da
comunidade em caráter de voluntariado:
A Educação Integral abre espaço para o trabalho dos profissionais da educação, dos
educadores populares, estudantes e agentes culturais (monitores, estudantes
universitários com formação específica nos macrocampos), observando-se a Lei nº
9.608/1998, que dispõe sobre o serviço voluntário. (...) As atividades poderão ser
acompanhadas por estudantes universitários, em processo de formação específica
nos macrocampos e com habilidades reconhecidas pela comunidade, estes por
estudantes do ensino médio e estudantes do EJA. (MEC; SECAD; DEIDHuC, s.d.,
p.14)
As atividades fomentadas se organizam nos macrocampos de Acompanhamento
Pedagógico, Meio Ambiente, Esporte e Lazer, Direitos Humanos em Educação, Cultura e
Artes, Cultura Digital, Promoção da Saúde, Educomunicação, Investigação no Campo das
Ciências da Natureza e Educação Econômica. Para cada microcampo no Programa Mais
Educação há atividades definidas.
Cada escola elabora um Plano de Ação definindo os macrocampos que serão
contemplados naquele ano letivo, não necessitando abarcar todos, mas os que são coerentes às
necessidades educativas dos alunos e aos recursos e espaços pedagógicos disponíveis.
O público alvo do Programa Mais Educação deve ser definido pela escola,
considerando-se que o objetivo é reduzir as desigualdades educacionais pela ampliação da
jornada escolar, além de combater a fome pela oferta de mais uma refeição diária aos alunos
participantes do programa.
São recomendados para a escola observar indicadores como: estudantes em situação de
risco social e sem assistência; estudantes incentivadores com liderança positiva; alunos em
defasagem série/idade; estudantes das séries finais da 1ª e da 2ª fase do ensino fundamental ou
em outras séries onde se detecta índices de evasão e/ou repetência.
Quanto aos espaços físicos para o desenvolvimento da jornada de tempo integral,
sugere-se redistribuir os espaços na escola e formar parcerias com espaços públicos na
comunidade, se necessário.
O Programa Mais Educação, contudo, não se propõe a ser uma diferenciação da escola,
mas uma ampliação do processo de educar que dialogue com as atividades que a escola já
desenvolve.
Se a escola pública apresenta um baixo IDEB, isso demonstra por esse indicador que a
qualidade da educação ofertada está ruim. Aumentar mais horas de uma educação de má
qualidade pode não ser a solução para reduzir as desigualdades educacionais entre os
educandos.
Faz-se necessário uma reflexão pelas origens das desigualdades educacionais, de forma
a conhecer a gênese social desse problema. O sociólogo Pierre Bourdieu (1930-2002) auxilia
nesse sentido a refletir o sentido da escola e como a escola historicamente age em relação às
desigualdades.
2. A ESCOLA NA PERSPECTIVA BOURDIENIANA
Pierre Bourdieu desenvolveu um método próprio de analisar a realidade, para
compreender na estrutura social a relação estabelecida entre o indivíduo e a sociedade, sem
polarizar nem dos dois, como fizeram autores clássicos da sociologia.
A teoria de Bourdieu investiga a realidade a partir das relações que os indivíduos
estabelecem entre si, não se restringindo a observar como se dão as relações entre classes, por
compreender que esse conceito não explicita todos os fatores, mas abrangendo as diversas
relações que os homens estabelecem entre si.
As relações entre as classes são observadas perpassando diferentes campos sociais.
Bourdieu utiliza o conceito de campo para demonstrar como indivíduos – compreendidos pelo
autor como agentes sociais – estabelecem relações de dominação no interior desses campos e
de um campo sobre outro. É uma análise relacional, de modo que o agente no campo provoca
efeitos que podem modificar as ações de outro agente dentro do campo.
No interior do campo os agentes sociais se organizam numa hierarquia de dominação,
em que se exerce poder tanto mais capital se possua dentro do campo – não necessariamente
capital econômico, pois há, por exemplo, a produção na sociedade de capital político e capital
cultural, assim trata-se do capital significativo para aquele campo por seu poder simbólico
exerce uma força dentro do campo e capacita ao agente acumular capital, interferir no campo
por possuir capital e articular condições para manter capital.
Nesse sentido, o campo não se define como um espaço territorial, mas como espaço
social de relações, pois “(...) o limite de um campo é o limite dos seus efeitos ou, em outro
sentido, um agente ou uma instituição faz parte de um campo na medida em que nele sofre
efeitos ou que nele os produz”. (BOURDIEU, 2010, p. 31)
Na constituição da sociedade moderna, Bonnewwitz (2003) recorda que a escola foi
constituída como instrumento de realização do ideal igualitário defendido pelas sociedades
democráticas que se consolidavam, de maneira que “(...) a escola deveria fornecer a educação
para todos os indivíduos, proporcionando-lhes instrumentos que pudessem garantir não só sua
liberdade, mas também sua ascensão social” (p. 113).
Esse entremeio de campos é que possibilitou constituir-se na sociedade moderna a
crença na escola como fator de mobilidade social. Porém, a permanência e o sucesso escolar
dessas crianças, “(...) o desejo razoável de ascensão através da escola não pode existir
enquanto as chances objetivas de êxito forem ínfimas” (BOURDIEU, 1998, p, 48)
O trabalho pedagógico por sua vez, comprometido em apenas preparar para a vida
profissional, resulta em produção de “indivíduos modificados de forma durável (...), agentes
capazes de exercer uma ação transformadora reprodutora da formação que eles próprios
receberam” (idem, p.206), de maneira que essa formação durável é o habitus.
Pierre Bourdieu ao analisar o sistema de ensino antigo da França em 1966 apresenta um
conceito que desmistifica essa premissa difundida socialmente. Para o autor a escola não pode
ser fator de mobilidade social uma vez que o sistema escolar prossegue com a eliminação das
crianças desfavorecidas, reafirmando as mesmas dificuldades que elas enfrentam na vida
social.
Para explicar esse processo, Bourdieu (1998) apresenta o conceito de capital cultural.
Cada família transmite a seus filhos, de maneira indireta, um certo capital cultural e um ethos.
Por capital cultural entende-se todo o domínio do indivíduo acerca da cultura valorizada pela
sociedade, incluindo-se, por exemplo, o conhecimento de teatro, cinema, literatura, museus,
música, artes. O capital cultural tem uma transmissão familiar e pode ser ampliado ao longo
da vida. A acumulação do capital cultura se dá por meio da sua incorporação, que não ocorre
instantaneamente. O autor explica:
O capital cultural é um ter que se tornou ser, uma propriedade que se fez corpo e
tornou-se parte integrante da “pessoa”, um habitus. Aquele que o possui “pagou com
sua própria pessoa” e com aquilo que tem de mais pessoal, seu tempo.
(BOURDIEU, 1998, p.75)
Já o ethos de classe constitui-se como força vital, segundo o autor, um sistema de
valores implícitos e profundamente interiorizados. O capital cultural e o ethos de classe
influenciam a escolha das famílias acerca da vida escolar dos filhos, desde a escolha da
instituição à definição do prosseguimento dos estudos ou não. Tem-se a difusão de uma
ideologia que naturaliza essa escolha, como se naturalmente as crianças mais favorecidas
estivessem mais aptas que as crianças mais desfavorecidas a cursar os mais altos níveis
acadêmicos.
O autor critica essa perspectiva de que os filhos dos meios mais favorecidos teriam um
dom natural para prosseguir até o mais alto padrão de escolaridade, enquanto que os filhos de
operários, artesãos, agricultores e da classe média teriam menos tendência natural a
desenvolver os estudos. Para ele, a razão para essas escolhas consiste em uma questão de
oportunidades sociais e não de determinações naturais, muito menos a ideia de desigualdade
natural. As famílias já escolhem conforme um habitus de classe a escola a partir de aspirações
limitadas pelas oportunidades objetivas, pois “o habitus engendra representações práticas,
que, apesar das aparência, são sempre mais ajustadas às condições objetivas das quais elas são
o produto” (BOURDIEU, 2007, p. 228). As chances de ascensão através da escola acabam
sendo ínfimas, portanto, a escola não se converte em fator de mobilidade social, ao contrário
“a instituição escolar contribui [...] para reproduzir a distribuição do capital cultura e, assim, a
estrutura do espaço social.” (BOURDIEU, 2011, p. 35)
O que Bourdieu observou na França é que os indivíduos com maior nível de instrução
eram geralmente oriundos de um meio culto, não por resultado de uma transmissão natural,
mas por uma transmissão de capital cultural.
Uma vez que a escola foi criada na perspectiva das classes dominantes, ainda que
imbuída do ideal de igualização das oportunidades, ela se estruturou sobre uma cultura
arbitrária, que se apresenta conforme Bonnewitz (2003) como legítima, objetivável e
indiscutível. É uma cultura das classes dominantes, de maneira que quanto maior proximidade
têm o aluno e do domínio dessa cultura, maior seu êxito escolar e, também, quanto maior a
proximidade entre o capital cultural do aluno e do professor, maior seu êxito escolar.
É por esse mecanismo de aparente dom que a escola corrobora com a dominação dos
dominantes. De forma velada, sob o aspecto de um ensino neutro, esse mecanismo opera em
primeiro a desigualdade escolar promovendo ao sucesso escolar quem já detém o
conhecimento do arbitrário cultural dominante requerido pela escola, e o fracasso escolar de
quem não se apropriou desse capital na transmissão familiar. Depois, quanto mais se exclui as
classes dominadas, mais se reforça a legitimidade das classes dominantes, resultando que “a
ideologia do dom legitima as desigualdades escolares e consequentemente sociais”
(BONNEWITZ, 2003, p. 117)
Por não realizar o anseio de prestígio e mobilidade social, a instituição escolar vai cada
vez mais sendo considerada pelas famílias e pelos próprios alunos como fonte de uma imensa
decepção coletiva. A exclusão se dá de forma que não se alcança aquilo que o sistema escolar
inspira, sendo que muitos alunos são forçados a diminuir suas pretensões conforme vão sendo
excluídos.
Assim, escola conserva a hierarquia social e as estratégias políticas adotadas no sistema
escolar tendem a mudar para conservar, uma vez que “(...) a função mais dissimulada e mais
específica do sistema de ensino consiste em esconder sua função objetiva, isto é, dissimular a
verdade objetiva de sua relação com as estruturas de classe (BOURDIEU, 1982, p. 216).
Dessa maneira a escola se concretiza como instrumento de seleção e reclusão das classes
dominadas à formação durável de um habitus de classe que reproduza a ordem social
estabelecida e conserve as relações hierárquicas de dominação entre as classes.
Essa análise é para Catani (2007) uma das mais significativas contribuições do autor,
em suma, “(...) mostrar que, se a escola agrava, por assim dizer, as desigualdades que têm
origem nas posições ocupadas pelos indivíduos no espaço social, ela o faz justamente por
privilegiar a cultura dominante” (p. 17)
3. EDUCAÇÃO E TRABALHO NO PROGRAMA MAIS EDUCAÇÃO E SUA RELAÇÃO
COM A CONSERVAÇÃO NA ESCOLA
Incialmente o Programa Mais Educação acontece dentro da escola, para a escola e
porque a escola tem alcançado baixos índices de desenvolvimento. O objetivo é atenuar as
desigualdades educacionais entre os alunos. Contudo, Bourdieu (2011) ao caracterizar a
escola como conservadora, nos apontou que a gênese das desigualdades educacionais entre os
alunos é o capital cultural herdado de suas famílias, ao qual a escola só pode acrescentar a
quem já detém os princípios do arbitrário cultural dominante. A quem não o possui, constituise o próprio ato educativo em violência simbólica. Assim, o sistema escolar institui e legitima
a desigualdade educacional e consequentemente a desigualdade social. O Programa Mais
Educação demonstra claramente que não está comprometido com uma transformação no porte
de interferir na gênese da desigualdade educacional.
Ao se utilizar de monitores voluntários sem necessidade de uma formação adequada,
não pode ofertar mais do que a transmissão de um arbitrário cultural da mesma formação que
os monitores obtiveram em sua passagem pela escola, uma vez que não dispuseram de
momentos formativos adequados e propícios à reflexão e ao questionamento, como
proporcionam os cursos de formação pedagógica. É uma perspectiva de trabalho explorado
sob o rótulo do voluntariado e que promove tanto a desqualificação do trabalhador, uma vez
que qualquer voluntário é elevado à função do magistério, como a desqualificação do trabalho
pedagógico em si.
Se as instituições não conseguem firmar parcerias com a comunidade escolar para
utilizar espaços públicos, o programa acontece nos espaços alternativos da escola como pátios
e corredores, ele interfere na própria dinâmica e na qualidade do ensino ofertado naquele
turno, uma vez que os espaços como banheiros, cantina, pátios, quadra poliesportiva,
laboratórios de ciências, sala de computadores e outros espaços que a escola possui se tornam
compartilhados entre os alunos regulares daquele turno e os alunos em jornada ampliada no
contra-turno. Há uma limitação na dinâmica das aulas regulares, tornando-as mais reclusas à
sala de aula, uma vez que os espaços alternativos da escola se tornaram espaços de promover
educação em tempo integral. As condições do trabalho pedagógico ficam, portanto, longe de
serem ideais.
Não é possível diluir desigualdades educacionais sem profissionais de educação
qualificados e em condições improvisadas. Sem isso, a organização do Programa Mais
Educação incentiva a reprodução do arbitrário cultural dominante e sua conservação, uma vez
que amplia a jornada como continuidade do processo pedagógico em desenvolvimento na
escola.
Não é que a educação ofertada nas escolas de baixo IDEB seja de qualidade inferior,
como fazem crer os documentos oficiais e a normatização do Programa Mais Educação ao
enfatizarem iniciativas para promoção da qualidade. A questão é que na escola de baixo IDEB
estão crianças e adolescentes vivendo no que se denominou “situação de risco social e sem
assistência”, ou seja, alunos vindos de famílias das classes inferiores com um capital cultural
distante do arbitrário cultural exigido pela cultura escolar e pelas avaliações de sistemas como
a Prova Brasil, documento utilizado para gerar o índice IDEB.
Da mesma forma como a escola não acrescenta e não pode acrescentar capital cultural a
quem não o possui, o Programa Mais Educação também não pode fazê-lo. A ampliação da
jornada escolar feita a modos rústicos, sem necessidade de profissionais com formação
específica para docência e sem garantia de espaços adequados para estudo, apenas aumenta a
quantidade de tempo que o aluno é exposto à escola conservadora. Nesse sentido, cabe a
crítica de Bourdieu à reprodução na escola:
Quando a cultura que a Escola tem objetivamente por função conservar, inculcar e
consagras tende a reduzir-se à relação com a cultura que se encontra investida de
uma função social de distinção só pelo fato de que as condições de aquisição
monopolizadas pelas classes dominantes, o conservadorismo pedagógico que, em
sua forma extrema, não assinala outro fim ao sistema pedagógico senão o de
conservar-se idêntico a si mesmo, é o melhor aliado do conservadorismo social e
político, já que, sob aparência de defender os interesses de um corpo particular e de
autonomizar os fins de uma instituição particular, ele contribui, por seus efeitos
diretos e indiretos para a manutenção da “ordem social”. (BOURDIEU, 1982, p.
207)
O futuro trabalhador recebe por meio do Programa Mais Educação uma conformação à
estrutura societal do capital desigual e combinado. Ampliar a educação para que ela seja de
fato uma educação integral do indivíduo requer uma concepção de escola com objetivo de
formação integral do indivíduo, uma formação humana que tem sentido inverso ao da escola
conservadora que prepara mão-de-obra.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para a escola que se constituiu na e para a sociedade moderna, a finalidade magna é a
conservação dessa sociedade com todos os seus aparatos de funcionamento, por isso institui e
legitima a dominação social por meio da imposição do arbitrário cultural dominante e
manutenção das desigualdades sociais.
Uma outra escola requereria imediatamente uma outra sociedade. Não havendo ainda
condições objetivas que nos levem a tal, é preciso questionar o que está posto, no sentido de
não ser conveniente a ter simplesmente mais do mesmo.
Se a escola brasileira por séculos tem conseguido manter-se na função conservadora
com uma jornada de quatro horas e inculcar, corporificar como habitus o arbitrário cultural
dominante, numa jornada ampliada para sete horas esse potencial socializador de reprodução
da dominação social é também ampliado.
A violência simbólica contra as famílias das classes inferiores é ampliada nesse
conjunto, pelo contínuo velamento das operações de reprodução do arbitrário cultural, sob um
discurso de promoção da igualdade pela ampliação da oferta de horas escolares.
A igualdade de fato não se efetiva nessa sociedade e não pode se efetivar, uma vez que
essa sociedade está estabelecida sobre relações hierárquicas de dominação e poder em todos
os campos sociais.
O discurso de igualdade, esse sim, aparece cada vez mais em reformas educacionais,
ações, organizações e programas voltados para o atendimento de famílias das classes
inferiores, como é o caso específico do Programa Mais Educação.
A esse discurso tem sido cada vez mais conferido legitimidade pela oferta de
oportunidades para todos. Todavia, as oportunidades que estão postas na sociedade, estão
diferenciadas conforme a origem social do indivíduo. A sociedade está estabelecida de
maneira que as classes sociais estão em desigualdade, e essa desigualdade não se resolve por
meio da oferta de oportunidades como a de ampliar as horas de estudo no Programa Mais
Educação.
Do ideário de igualdade preconizado desde a origem das sociedades democráticas, se
mantém apenas a perspectiva de possibilidade, uma vez que a realidade é contraditória.
Bourdieu demonstra claramente que a efetivação das oportunidades acontecem com
frequência entre aqueles que já detém por transmissão familiar o capital cultural exigido na
cultura escolar, ficando as classes desfavorecidas à margem dessas oportunidades, pois, se não
enfrentam problemas ao acesso, enfrentam problemas em permanecer e em continuar a
formação acadêmica.
A tão difundida ideia de ser possível igualdade educacional e até mesmo igualdade
educacional denuncia a contradição de sua própria estrutura, pois ao mesmo tempo em que a
ideia de igualdade é difundida continuamente como possibilidade pela escola e pelo Programa
Mais Educação, a realidade a mantém como promessa denunciando sua condição irrealizável.
Não é possível pensar igualdade educacional apenas pelo aumento de horas/aula. Toda e
qualquer iniciativa de igualdade entre os indivíduos para a sociedade em que vivemos
prescinde de igualdade de renda, que consequentemente implica em igualdade entre as classes
sociais.
A escola foi eleita para ser a instituição que oportuniza a ascensão social e dilui a
desigualdade entre as classes porque disponibiliza o conhecimento necessário ao sucesso
profissional e social a todos. Contudo, como Bourdieu analisa, o conhecimento que está
disponibilizado foi previamente selecionado para corresponder a anseios classistas, portanto a
escola apenas legitima a aparência da igualdade por meio do discurso de se oferecer uma
educação para todos.
Nesse sentido, tanto a escola não pode se efetivar como instituição que promove
qualquer tipo de igualdade, como também os programas criados para complementar as ações
da escola também não podem realizar igualdade. É necessário desmistificar esse discurso no
sentido de explicitar que essa iniciativa realizada pelo Programa Mais Educação tem por
mérito apenas dar continuidade à conservação da dominação social que já acontece na escola,
porém agora, sob a forma de uma conservação muito mais ardilosa porque ocorre em tempo
integral.
REFERÊNCIAS
BOURDIEU, Pierre. A dinâmica dos campos. In: A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo/Porto
Alegre: Edusp/Zouk, 2007. p. 212-239.
______. Lições da aula. 2 ed. São Paulo: Ática, 1994.
______. A gênese dos conceitos de habitus e de campo. In: O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
2010. p. 59-73.
______.O novo capital. In: Razões Práticas. 11 ed. Campinas, SP: Papirus, 2011. p. 35-52.
BOURDIEU, Pierre. A Escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In: NOGUEIRA, Maria
Alice; CATANI, Afrânio. (orgs.). Escritos de Educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. p.39-64.
______. O capital social – notas provisórias. In: NOGUEIRA, Maria Alice; CATANI, Afrânio. (orgs.). Escritos
de Educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998. p. 65-79.
BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean-Claude. A função ideológica do sistema de ensino. In: A Reprodução.
Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982. p. 204-219
BRASIL. PL n.º 8.035, de 15 de dezembro de 2010. Aprova o Plano Nacional de Educação para o decênio 20112020, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.camara.gov.br/sileg/integras/831421.pdf>. Acesso
em 01 mar. 2013.
BONNEWITZ, Patrice. Vamos reproduzir-nos socialmente – O papel da escola. In: Primeiras lições sobre a
sociologia de P. Bourdieu. Petrópolis, RJ: Vozes, 2003. p. 113-130.
CATANI, Denise B. A educação como ela é. In: Revista Educação: Especial Bourdieu pensa a Educação. n. 5.
São Paulo: Segmento, 2007. p. 16-25.
FILHA, Maria. Programa Mais Educação conta com a adesão de 15 mil escolas. Portal do MEC, Educação,
Tempo Integral, 06 mai. 2011, 1p. Disponível em: < http://portal.mec.gov.br/index.php?
option=com_content&view=article&id=16601:programa-mais-educacao-conta-com-adesao-de-15-milescolas&catid=211>. Acesso em 01 mar. 2013.
MEC; SECAD; DEIDHuC. Programa Mais Educação - passo a passo. Brasília, DF: MEC, s.d. Disponível em:
<http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/passoapasso_maiseducacao.pdf>. Acesso em 01. Mar. 2013.
SEB. Prazo para adesão de 28,7 mil escolas é prorrogado até março. Portal do MEC, Educação, Mais Educação,
17 fev. 2012, 1p. Disponível em: <http://portal.mec.gov.br/
index.php?option=com_content&view=article&id=17523:prazo-para-adesao-de-287-mil-escolas-e-prorrogadoate-marco-&catid=211>. Acesso em 01 mar. 2013.
Comunicação Oral
GT 2: Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
IDENTIDADE POLÍTICA E A EDUCAÇÃO NO SISTEMA CAPITALISTA:
TENSÕES E CONFLITOS
Kamylla Pereira Borges
Universidade de Brasília
[email protected]
RESUMO
A relação entre trabalho e educação tem sido marcada pelos antagonismos das classes sociais. Dessa forma, as
demandas resultantes da reorganização do sistema capitalista trouxeram várias repercussões sobre as políticas
educacionais, que se fundamentaram na crença de que a educação é o elemento primordial no desenvolvimento
socioeconômico de uma nação. As ações educativas foram vinculadas aos princípios utilitaristas e pragmáticos
do mercado, deformando o conceito de educação que passou a ser tratada como mercadoria. Assim sendo, o
presente artigo busca discutir a questão da identidade política e de classe dos professores como elemento de
contraposição à ideologia educacional capitalista e reconstrução do conceito de educação. Para tanto, realizamos
uma pesquisa empírica por meio de entrevistas realizadas com 28 docentes do ensino básico da cidade de
Jaraguá-GO. Esses dados foram analisados a luz dos princípios do Materialismo Histórico Dialético,
fundamentados principalmente em Marx, Mészáros, Mascarenhas, Frigotto. Os docentes pertencem à classe
trabalhadora, mas não são uma classe em si, pois não se reconhecem como parte dos trabalhadores que são
explorados pelo capital. Há um forte preconceito contra o próprio termo “trabalhador” que é visto como algo que
desqualifica, empobrece o desenvolvimento do trabalho e desmerece todo o esforço empreendido para
aperfeiçoamento profissional. Na presente pesquisa, 79% dos docentes entrevistados rejeitaram sua inserção na
classe trabalhadora. O restante que se considerou parte dessa classe também não o fez devido à construção de
uma identidade política, mas devido à leitura deturpada de trabalho e trabalhador pela ótica da exploração do
capital. A falta de uma identidade política reflete na ausência de uma perspectiva crítica, que favoreça uma visão
completa dos múltiplos determinantes que afetam o trabalho docente. Os professores reconhecem suas condições
de trabalho, mas sua interpretação é reduzida apenas a situação imediata de trabalho. É uma crítica superficial,
pois desconsidera as contradições do sistema capitalista, os processos de alienação e os consequentes
antagonismos de classe por ele gestados. Ao analisar os dados, entendemos que a superação dos limites
existentes para construção de uma educação como fator de transformação social passa pela constituição de uma
identidade política e de classe por parte dos docentes, capaz de desvendar os processos ideológicos da classe
dominante e a alienação do modo de produção capitalista. Nesse processo, novas posturas poderão surgir
contribuindo para revelação do caráter ideológico dos elementos que constituem o trabalho docente, delineando
uma nova concepção educacional que traga autonomia, conscientização e realização para professores e alunos.
Palavras-Chave: identidade política; classes sociais; educação.
A relação entre trabalho e educação tem sido marcada pelos antagonismos das classes
sociais, de forma que as demandas econômicas resultantes da reorganização do sistema
capitalista, trouxeram várias repercussões sobre as políticas educacionais, que se
fundamentaram na crença de que a educação é o elemento primordial no desenvolvimento
econômico e social de uma nação. Essa premissa culminou por vincular as ações educativas
aos princípios utilitaristas e pragmáticos do mercado, deformando o conceito de educação que
passou a ser tratada como mercadoria, responsável pela qualificação da mão de obra para
inserção nos moldes produtivos voltados para acumulação e expansão do capital.
Dentro dessa lógica os processos educativos institucionalizados tem contribuído para
continuidade do sistema de exploração da sociedade capitalista. Dessa forma, o presente
artigo busca discutir a questão da identidade política e de classe dos professores como um
importante elemento de contraposição à ideologia educacional capitalista e construção de um
novo conceito de educação. Para tanto, buscamos apreender e compreender as concepções
acerca do trabalho de um grupo de professores de duas instituições públicas da cidade de
Jaraguá-Go, uma da rede estadual e outra da rede municipal.
Foram utilizados três critérios básicos para a escolha das instituições escolares: maior
abrangência das modalidades de ensino, maior número de professores concursados, maior
quantitativo de alunos matriculados. A amostra da pesquisa foi composta por uma seleção
aleatória que contemplou vinte e oito docentes ( quatorze da escola municipal e quatorze da
estadual ) que efetivamente estavam em exercício pedagógico em sala de aula e que possuíam
vínculo empregatício efetivo com o estado ou município
Utilizamos como instrumento de coleta de dados a entrevista semi-estruturada
organizada a partir das concepções e percepções dos docentes em relação a sua vinculação a
classe trabalhadora. Esses dados foram analisados a luz dos princípios do Materialismo
Histórico Dialético, fundamentados principalmente em Marx, Mészáros, Mascarenhas,
Frigotto, Saviani e Paro.
A EDUCAÇÃO-MERCADORIA, QUALIDADE DO SISTEMA PÚBLICO DE
ENSINO E IDENTIDADE POLÍTICA
Qualidade é um termo polissêmico, que traz em si uma complexa trama de fatores e
conceitos com múltiplas significações. Quando se trata de qualidade da educação temos um
fenômeno ainda mais complexo e abrangente, pois o sistema educacional está em constante
transformação e movimento, alterando-se de acordo com as novas demandas políticas, sociais,
econômicas e culturais da sociedade em que está inserido.
Mariano F Enguita (1994) alerta para as armadilhas que o consenso pela busca da
qualidade da educação pode trazer às instituições públicas de ensino. Segundo o autor, o
discurso da qualidade entra em cena sempre que se pretende justificar ou propor alguma
alteração nos sistemas educacionais. O uso desse termo polissêmico se torna a linguagem
comum quando se trata da questão do ensino público, desde o Estado, trabalhadores docentes
até pais e alunos. Enfim o discurso da qualidade é imbatível e aceito pela totalidade dos
sujeitos inseridos no contexto político e social, tanto no Brasil como no mundo.
Após a Conferência Internacional de Jontien, diversas medidas foram tomadas para
elevar o padrão de qualidade educacional brasileiro, medidas estas pautadas nas orientações
doutrinárias e as metas quantitativas definidas neste fórum internacional e posteriormente
reforçadas na Cúpula Mundial de Educação para Todos (ocorrido em Senegal, Dalcar, em
2000). Dentre estas, destacam-se a implantação de um amplo sistema de avaliação da
educação básica para quantificar a aprendizagem dos estudantes de forma contínua e
integrada ao planejamento e financiamento das reformas educacionais, conforme preconizado
pelos organismos multilaterais.(FONSECA, 2009)
Desde então, atribui-se os problemas dos sistemas públicos de ensino a simplesmente
o mau uso das verbas destinadas a esse setor. Relacionando a qualidade com a quantidade e
variedade dos insumos necessários ao processo ensino-aprendizagem, com um menor custo
possível. De forma que para melhorar a alocação dos recursos e insumos existentes era
preciso que a escola se pautasse nos modernos métodos de gerenciamento de produção das
empresas privadas para se obter maiores ganhos com a “produtividade”, incentivando a
descentralização administrativa e a competição para diminuir a burocracia e a inércia
supostamente inerentes ao sistema público. (FONSECA, 1998; FRIGOTTO E CIAVATTA,
2003; SILVA, AZZI E BOCK, 2008, CAMPOS, 2000)
Os novos métodos de gerenciamento introduzidos transformaram o sistema
burocrático educacional. Os pais e alunos passaram a ser equiparados aos consumidores de
mercadorias, pois a elevação dos padrões de qualidade são mais facilmente atingidos por meio
da lógica do mercado. Sendo que, os métodos descentralizados e participativos de gestão da
educação se ancoraram nas preferências e julgamentos individuais dos “consumidores”, da
mesma forma em que nas empresas privadas, a produção se adapta rapidamente as
preferências do mercado capitalista. (CAMPOS, 2000)
A educação escolar estaria assim ajustada à reestruturação produtiva do sistema
societal do capital e às mudanças organizacionais e a base técnico-científica à nova divisão
internacional do trabalho. Adotou-se o pensamento pedagógico empresarial, focado em uma
“perspectiva individualista, dualista e fragmentária coerente com o ideário da
desregulamentação, flexibilização, privatização e com o desmonte dos direitos sociais”
contidos na “cartilha” do neoliberalismo. (FRIGOTTO e CIAVATTA, 2003, p.108)
Dave Hill (2003) nos chama atenção para a não compatibilidade entre mercado e
educação, salientando que apesar da educação ser tratada atualmente como uma mercadoria
comum, ela não se encaixa nesses moldes, pois não pode ser comprada ou vendida, pode-se
sim comprar os meios para a educação, mas nunca o aprendizado em si. Sendo que educação
e o mercado capitalista são totalmente contraditórios, pois apresentam metas, métodos,
motivações e padrões de excelência opostos.
O enfoque utilitarista e pragmático, utilizado para criar padrões educacionais gestados
no bojo da lógica mercadológica, não são suficientes para orientar a qualidade da ação
educativa. A educação é muito mais do que apenas a preparação dos indivíduos para o
mercado de trabalho. É uma prática social que se legitima nos diversos espaços sociais,
articulando os fatores políticos, econômicos e culturais, interagindo com todas as esferas da
vida social. É a apropriação da cultura historicamente produzida pelos indivíduos,
humanizando e criando nos homens as condições necessárias para a vida em sociedade. É um
elemento crucial para construção de uma contra hegemonia e transformação da sociedade
excludente em que estamos inseridos. (GRAMSCI, 1978, FRIGOTTO, 2003)
A concepção de educação como uma mercadoria torna a relação custo/benefício o
principal determinante de sua qualidade, as demais categorias constituintes das ações
educacionais são desconsideradas ou relegadas ao segundo plano. O que interessa é o retorno
econômico, a educação como um direito, como constituinte da humanização e da consciência
política autônoma dos sujeitos, não é interessante. Assim sendo, a educação está entre as
políticas públicas cujo processo de mercantilização está ocorrendo de forma mais acelerada, o
que acarreta prejuízos para a sociedade como um todo, desde os trabalhadores docentes,
gestores educacionais até pais e alunos, que sem saber são submetidos a uma educação
alienante e desprovida de qualquer ética ou crítica.
Dentro dessa lógica, as condições objetivas do trabalho docente são desconsideradas
como fatores importantes no aumento da qualidade educacional. As pesquisas realizadas sobre
a qualidade do ensino brasileiro pelos técnicos do Banco Mundial enfatizam que o papel do
professor nos processos educativos não é determinante para melhoria dos padrões de
ensino/aprendizagem. Questiona-se também a relação entre o número de alunos por sala e a
atuação dos educadores. De acordo com os documentos do banco, a média de 40 a 50 alunos
por professor é considerada satisfatória, o que é totalmente inaceitável quando se analisa o
real contexto em que o trabalho pedagógico é realizado. Da mesma forma, o pressuposto de
que a melhora das condições de trabalho dos professores tem incidência na melhora da
qualidade educacional é combatido, enfatizando-se que a qualidade das instalações escolares
ou do material didático tem impacto muito maior sobre a qualidade do ensino que, por
exemplo, o aumento do nível salarial dos docentes. (SILVA, AZZI E BOCK, 2008;
FONSECA, 1998)
Na educação mercadoria o que é valorizado é a produtividade mediante menores
custos, no mais há um total desprezo em relação aos trabalhadores docentes inseridos nos
sistemas públicos de ensino. Sua atuação é menosprezada e suas condições de trabalho
relegadas a um segundo plano. O que está em jogo é a adequada combinação de insumos
escolares (materiais didáticos, recursos tecnológicos, infraestrutura) e uma gestão
administrativa capaz de utilizá-los de forma eficiente, de maneira a proporcionar a maior
economia possível ao estado.
Nesta perspectiva o que se oferece aos alunos é uma educação deformada, fetichizada
e alienada, que nem mesmo tem conseguido seu objetivo primeiro que é preparar para o tão
sonhado mercado de trabalho. Desconsidera-se a totalidade do contexto social, político,
cultural e econômico dos sujeitos inseridos na realidade das instituições públicas de ensino e a
ênfase recai sobre projetos orientados pelas necessidades de acumulação e expansão
capitalista, cuja qualidade se torna resultado de uma competitividade e uma boa avaliação nos
padrões que são considerados aceitáveis por grupos empresariais nacionais e internacionais e
agências multilaterais.
Essa concepção de educação não poderá jamais ser considerada realmente de
qualidade, pois na sua própria gênese já foi desqualificada, já que se ancora em padrões de
exclusão e exploração do sistema societal do capital. Nos quais a qualidade educacional, na
verdade torna-se sinônimo de diferença, pois se anteriormente se vinculava educação a
igualdade de oportunidades e desenvolvimento, hoje a educação mercadoria da sociedade
capitalista, está mais voltada para empregabilidade e competitividade. (ENGUITA, 1994).
A deturpação da educação deturpa a própria escola e os trabalhadores nela inseridos.
Os espaços para conscientização, desenvolvimento de uma autonomia intelectual, para crítica
e criação de uma identidade política e de classe estão cada vez mais se extinguindo. O que
tem sobrevivido no ambiente escolar, e de forma predatória tem caçado e tentado aniquilar
todas as outras concepções, sejam educacionais ou até mesmo visões de mundo, é a
reprodução acrítica e a-histórica dos discursos enfatizados e disseminados pelo estado e por
seus agentes. O que gera uma gama de multiplicadores de suas premissas, legitimando as
ações excludentes e exploratórias do poder público, transformando as escolas públicas em um
ambiente cada vez mais marcado pelas desigualdades, de raça, gênero e econômico-sociais,
pela competição e por diversos conflitos entre professores, gestores e alunos.
Nesse contexto, Meszáros (2004, p.50) salienta que outro mundo é sim possível e
também necessário. E para o sucesso dessa tarefa, o autor deixa claro que é necessário
compreender que não existe um sujeito da emancipação predefinido, mas abrange “a
totalidade dos grupos sociológicos capazes de se aglutinar em uma força transformadora
efetiva no âmbito de um quadro de orientação estratégica adequado”. Ou seja, os mais
diversos grupos sociais de trabalhadores devem desenvolver a consciência de que possuem
um interesse comum objetivo que é instituir a “alternativa hegemônica do trabalho à ordem
social do capital”. Nesse processo, os conflitos e interesse opostos desses grupos seriam
rearticulados, combinando essa variabilidade em um único sujeito social emancipador: a
abrangente gama de todos os trabalhadores do sistema societal do capital.
Por conseguinte, antes de lutar por melhores condições de vida e trabalho e por um
novo conceito de educação, os professores devem ter clareza da classe social a que pertencem,
se identifiquem com essa classe e construam uma identidade política. Pois a luta dos docentes
está contida em uma ação muito maior, que é a transformação da sociedade como um todo.
Nesse aspecto, Meszáros (2004, p.52) enfatiza que o papel da participação - como “exercício
criativo, em benefício de todos, dos poderes de tomada de decisão adquiridos” - e a
solidariedade são requisitos fundamentais para êxito da emancipação da sociedade. De acordo
com o autor:
[...] sem desenvolver e aprofundar a solidariedade entre as forças que lutam pela
concretização de uma ordem alternativa, seus esforços - por mais dedicadas que
sejam as pessoas que participam de lutas particulares, dispostas a sofrer privação e
fazer os sacrifícios necessários no caso de uma greve que durou um ano- não terão
sucesso. (MESZÁROS, 2004, p.53)
Ângela Mascarenhas (2002) salienta que os desafios impostos à classe trabalhadora
nesta sociedade exigem mais do que nunca o desenvolvimento de uma identidade política,
como elemento constitutivo da consciência de classe na contraposição ao processo de
expansão e acumulação do capital. De acordo com a autora (p.15), a identidade política pode
ser conceituada como:
Processo de configuração da auto-consciência de um grupo, em que ele elabora sua
posição e ação diante dos conflitos sociais e relações de poder. A identidade é um
modo específico de articulação do grupo. É um fato de consciência significando uma
auto-representação ou auto-definição, manifestada tanto no comportamento como no
discurso. É um jogo dialético entre o mesmo e o diverso. O conflito e a
heterogeneidade constituem terreno propício à formulação da autoconsciência.
A construção da identidade é um processo contínuo, fundamentado nas relações que o
sujeito estabelece com os outros, de acordo com um determinado projeto político. É o
reconhecimento e afirmação do papel do indivíduo como agente histórico, consciente e
atuante na elaboração de um novo projeto social, antagônico ao modelo existente. Constituir
uma identidade política é se posicionar, lutar, resistir as imposições do sistema
sociometábolico do capital, reconhecer-se permanentemente ligado a uma determinada classe
social e articular os interesses dessa classe.(SILVA, H.L.F, 2006)
Os docentes pertencem à classe trabalhadora, no entanto, não são uma classe em si,
pois não se reconhecem como parte da imensa gama de trabalhadores que são explorados
pelos ditames do capital. A caracterização de uma classe social não é algo simples, pois mais
que identificação das pessoas umas com as outras formando um grupo é necessário um
posicionamento político por parte desse grupo. Pois, à medida que, existe apenas uma ligação
local através de condições econômicas, modo de vida ou cultura sem uma organização
política não há efetivação da classe social (MARX, 1997).
A deficiência na percepção e consciência dos docentes em relação a sua classe social é um dos
fatores que contribui para a manutenção das relações de exploração em seu ambiente de
trabalho e consequentemente na manutenção e disseminação do conceito de educação como
mercadoria. Isso porque ser trabalhador é se reconhecer como sujeito histórico da mudança,
da transformação da sociedade, sem essa identidade e colaboração com os outros grupos
sociais de trabalhadores não há como transformar verdadeiramente a educação pública.
Assim sendo, na constituição de uma identidade política e de classe é necessário que
as contradições, conflitos e relações de poder existentes na relação entre educação e trabalho
sejam desvendados. É preciso que os educadores elucidem os processos de alienação do
sistema capitalista, compreendendo o porquê do trabalho, nessa sociedade, ser visto como
sinônimo de tortura, dor e sofrimento, ocasionando, muitas vezes, problemas de saúde nos
trabalhadores. E é somente através da articulação entre política, educação e trabalho que essas
questões podem ser descortinadas. (MASCARENHAS, A; 2005)
No entanto, o sentimento de pertencimento a classe trabalhadora tem se afastado cada vez
mais dos educadores. Há um forte preconceito e rejeição ao próprio termo “trabalhador” que é
visto como algo que desqualifica, que empobrece o desenvolvimento de seu trabalho e
desmerece todo o esforço empreendido para aperfeiçoamento de sua função pedagógica.
Na presente pesquisa, 79% dos trabalhadores docentes entrevistados se consideraram
profissionais, rejeitando sua inserção na classe trabalhadora. A busca incessante por
qualificação e aperfeiçoamento foram os motivos mais citados como justificativa para repudio
de sua identidade como trabalhador, seguido pelo “amor” e “dedicação” devotados à
profissão.
Quando você fala assim, eu sou uma profissional da educação ( ênfase em
profissional) então você executa seu trabalho bem, então se for nesse sentido aí, eu
prefiro ser chamada de profissional da educação porque a minha profissão é a
educação, você tem que ta trabalhando com amor, com dedicação e não deixando
esse princípio. (Professora 15- rede estadual)
Ah eu me considero uma profissional da educação né, e é o que eu quero ser, o que
eu pretendo ser, se ...quando eu escolhi essa profissão era porque eu queria ser uma
boa professora, senão não teria nem começado nessa área. Mas assim, trabalhadora é
quando você simplesmente ta lá pra receber o seu salário né, e você só trabalha em
prol disso, do seu sustento próprio, como profissional, eu vejo assim como forma de
procurar uma melhoria para minha vida e para vida dos meus alunos. ( Professora 17
– rede estadual)
O restante que se considerou parte da classe trabalhadora também não o fez devido à
construção de uma identidade política, mas devido à leitura deturpada de trabalho e
trabalhador pela ótica da exploração do capital. Isto é, os docentes se consideraram
trabalhadores, devido principalmente a falta de reconhecimento “profissional” e as péssimas
condições de trabalho como: baixos salários, descaso do estado, salas super lotadas, entre
outros.
Eu me considero uma trabalhadora da educação, porque não está sendo fácil. Acho
que o profissional é aquele que ta lá no trabalho e pronto, saiu do trabalho não pensa
em mais nada em relação a ele, e a gente não é assim. A gente vai pra casa, a gente
leva material, a gente sai com a vida dos alunos nas mãos, o tempo todo.
( Professora 17 – rede estadual)
Trabalhador porque eu trabalho além do que as vezes eu suporto. Né, eu acho assim
porque a carga horária do professor hoje ela é muito pesada. Tá porque não é só a
gente chegar na sala de aula e dar aula acaba as atividades na sala de aula, a gente tá
cansada, estressada, chega em casa e tem outras atividades além da documentação,
ainda tem a família em casa, então é uma carga horária muito pesada. ( Professora 1
– rede municipal)
A negação de sua classe social dificulta a elaboração de uma práxis que permita a
construção de um fazer pedagógico voltado para emancipação e desenvolvimento de uma
autonomia intelectual nos estudantes, pois os próprios docentes não conseguem realizar uma
leitura clara do verdadeiro contexto em que estão inseridos, o que dificulta sua opção política,
permanecendo presos a teia ideológica e alienante da educação-mercadoria. Além disso, na
perspectiva de serem profissionais competentes, os educadores passam a estranhar os próprios
companheiros de classe, passando enxergá-los como concorrentes, pautando suas relações
sociais em critérios competitivos e individualistas. Dessa forma, a falta de uma identidade
política reflete na ausência de uma perspectiva crítica, que favoreça uma visão completa dos
múltiplos determinantes que afetam o trabalho docente.
Uma educação pública de qualidade só se efetivará mediante a articulação de seus
trabalhadores em prol da apropriação e difusão dos conhecimentos escolares para
contraposição ao sistema societal do capital. Cultivando a consciência política e de
classe cotidianamente, educando a todos de forma criativa e criadora, tendo como
princípio educativo o trabalho. O trabalho como princípio educativo é aqui
entendido não como a preparação para inserção no mercado capitalista, mas sim de
uma formação que favoreça a inserção do indivíduo no mundo, de forma criativa,
realizadora e transformadora. (MASCARENHAS, A; 2005, p. 162)
Nessa perspectiva, a construção de uma identidade política poderá contribuir para
associação entre teoria e prática, entre ação política e ação pedagógica, culminando na
politização das questões cotidianas. Nesse processo, novas posturas e comportamentos
poderão surgir contribuindo para crítica e a revelação do caráter ideológico e alienante dos
vários elementos que constituem o trabalho docente, o que poderá trazer contundentes
contribuições para a desconstrução dessa educação-mercadoria doente e dessa escola pública
doente.
.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os professores reconhecem as condições indignas de trabalho a que são submetidos,
mas sua interpretação desses dados muitas vezes é reduzida apenas a sua situação imediata de
trabalho, eles não conseguem avançar para além das aparências imediatas. É uma crítica
superficial, pois desconsidera as contradições do modo de produção capitalista, os processos
de alienação e os conseqüentes antagonismos de classe por ele gestados.
Assim sendo, a organização política é um dos elementos fundamentais para
reconstrução da educação e da escola pública. Pois através da organização política pode se
construir uma crítica contundente a sociedade existente, apontando elementos que favoreçam
a transformação histórica da mesma, dado que a realidade é sempre um campo profícuo para
novas possibilidades.
Portanto, a luta em prol de uma educação pública de qualidade e contra a exploração
do trabalho docente, passa necessariamente pela constituição de um novo conceito da própria
qualidade educacional, um conceito pautado na construção da autonomia intelectual dos
alunos, contribuindo para formação onilateral do indivíduo. Uma qualidade que seja pautada
não apenas em aspectos técnicos, no saber-fazer, mas fundamentalmente na constituição de
uma identidade política, tanto por parte dos educadores como dos estudantes, capaz de
desvendar os processos de alienação do modo de produção capitalista, partindo da
compreensão de que o trabalho é fundante da própria humanização dos indivíduos. A partir de
então, os trabalhadores docentes poderão realmente contribuir para construção de uma nova
sociedade, assumindo seu papel de sujeito histórico, delineando uma nova concepção de
educação, que vá além dos limites impostos pelo capital e que traga autonomia,
conscientização e uma verdadeira realização para os professores.
REFERÊNCIAS
ENGUITA, Mariano Fernández. O discurso da qualidade e a qualidade do discurso. In: GENTILLI, Pablo A.A.;
SILVA, Tomaz Tadeu da (org). Neoliberalismo, qualidade total e educação. Petropólis, RJ: Vozes, 1994, p.93110.
FONSECA, Marília. Banco Mundial como referência para a justiça social no mundo: evidências do caso
brasileiro. In: Revista de Educação da USP, vol.24, jan/jun, 1998.
FONSECA, Marília. Políticas Públicas para a qualidade da educação brasileira: entre o utilitarismo econômico e
a responsabilidade social. Cad. Cedes, Campinas vol. 29, n. 78, p. 153-177, maio/ago. 2009.
FRIGOTTO, G; CIAVATTA, M. Educação Básica no Brasil na década de 1990: subordinação ativa e consentida
a lógica do mercado. Educ.soc., Campinas, v.24, n.82,p. 93-130, abril, 2003.
_______. Educação e a crise do capitalismo real. São Paulo: Cortez, 2003.
GRAMSCI, Antonio. Concepção dialética da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978.
HILL, Dave. O neoliberalismo Global, a Resistência e a Deformação da educação. Currículo sem Fronteiras,
v.3, n.2, p.24-59, Jul/Dez 2003.
______. O 18 brumário e cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997
MASCARENHAS, Angela.C.B. O trabalhador e a identidade política da classe trabalhadora. Goiânia:
Alternativa. 2002.
_______. Educação e trabalho na sociedade capitalista: reprodução e contraposição. Goiânia: Editora da UCG,
2005.
_________. O poder da ideologia. São Paulo: Boitempo, 2004.
SILVA, Camila C., AZZI, Diego, BOCK, Renato. Banco Mundial em foco: sua atuação na educação brasileira e
na dos países que integram a inciativa Via Rápida na América Latina. In: HADDAD, S. (org). Banco Mundial,
OMC e FMI: o impacto nas políticas educacionais. São Paulo: Cortez, 2008, p.15-75.
SILVA, H.L.F da. As trabalhadoras da educação infantil e a construção de uma identidade política. 2006.
Dissertação (Mestrado) Faculdade de Educação, Universidade Federal de Goiás.
Comunicação Oral
GT 2 – Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
MOVIMENTOS SOCIAIS: ORGANIZAÇÃO COLETIVA PARA A CONQUISTA DA
TERRA, PERMANÊNCIA E QUALIDADE DE VIDA NO CAMPO
Queina Lima da Silva
Cleonice Ferreira dos Santos
Prof Msc. Nilza da Silva Martins (Orientadora)
UNEB- campus –Barreiras- BA
[email protected]
RESUMO
Esta pesquisa foi realizada em um Assentamento de Reforma Agrária no município de Barreiras – BA.
Buscando uma compreensão acerca dos Movimentos Sociais, compreendidos como organização coletiva na luta
pela conquista da terra e sua permanência no campo com qualidade de vida. Para tal utilizamos como
metodologia o estudo de campo que permitiu um maior entendimento das questões que permeiam o cotidiano de
um assentamento. O instrumento utilizado para coleta de dados foi a entrevista semiestruturada, que possibilitou
ao entrevistado discorrer livremente a respeito do tema pesquisado. Tivemos como participantes dois sujeitos,
um ex-posseiro que atua como presidente da associação de moradores da comunidade e um assentado que veio
com o movimento social dos Trabalhadores Rurais Sem Terra. Os dados coletados revelaram o histórico da
ocupação até a posse da terra, expondo os desafios enfrentados no processo de conquista, construção de suas
moradias, cultivo e beneficiamento da terra, assim como a organização coletiva na luta por estradas para o
escoamento e comercialização dos produtos, a escolarização, saúde e acesso aos serviços primários, bem como
políticas de incentivo que oportunize uma vida digna no campo. Diante dos resultados observamos que a
conquista da terra não assegura sua permanência no campo, pois foi revelada a necessidade da mão-de-obra
assalariada em fazendas da região para complementar a renda familiar, garantindo o sustento de suas famílias e a
permanência no campo. Este fator contribui para o fortalecimento do agronegócio e o enfraquecimento da
agricultura familiar. Assim, torna-se urgente a necessidade de políticas públicas que assegurem aos assentados
viver na terra conquistada com qualidade de vida, atuando como sujeitos de mudança no contexto em que estão
inseridos.
Palavras-chave: movimentos sociais; assentamento; políticas públicas.
1. CONCEITUANDO OS MOVIMENTOS SOCIAIS
Em princípio é necessário ressaltar que não existe consenso entre diferentes estudiosos
quanto ao conceito de Movimentos Sociais, haja vista que este entendimento é dependente da
categoria de análise adotada pelo autor e, ainda, considerando, sobretudo, os períodos
históricos a que se referem. Os primeiros estudos surgiram no século XIX como organização
coletiva, de caráter não-formal desvinculado da esfera pública e privada, tencionando criar
seu próprio campo político e social, com o objetivo de garantir direitos que lhe foram
negados.
Desta feita, os Movimentos Sociais de caráter ideológico partem inicialmente de ideias
que surgem no bojo das organizações sociais, na defesa dos interesses coletivos que se
organizam e realizam ações em prol da conquista de seus direitos, podendo ser por terra,
moradia, direitos políticos, escola, saúde, liberdade sexual, étnica e religiosa.
Nesses termos, os Movimentos Sociais contribuem para a promoção de mudanças
sociais de um país, assim como para a ampla mobilização das transformações políticas dos
sujeitos que estão envolvidos no tecido do movimento, perseguindo uma visão de sociedade
mais justa e igualitária, mediante a organização de diferentes categorias sociais que passam a
ser respeitadas tanto no campo público quanto privado.
Nessa perspectiva, os movimentos surgem e ressurgem a partir da luta de classe,
contexto em que os oprimidos identificam seu opressor engajando-se na luta coletiva e
organizada por sua emancipação. Assim, os movimentos sociais aparecem na arena de luta
fazendo e refazendo “saberes,” em busca de construir uma sociedade economicamente justa e
solidária. Segundo Arroyo (2007, p. 5):
Os movimentos sociais como coletivo de interesses organizados colocam suas lutas
no campo do direito, não apenas de sua universalização, mas também de sua
redefinição. (...) reinvidicam ser beneficiários de direitos, mas ser sujeitos, agentes
históricos da construção de direitos.
Assim, a aprendizagem constituída nos movimentos sociais, tem sempre um caráter
coletivo formado pelo princípio da partilha de ideias entre os militantes, que lutam para que
todos possam gozar dos mesmos direitos, tornando-se sujeitos críticos, participativos e
emancipados. Essa premissa se ampara em Gohn (2008) quando expressa que há um longo
processo de aprendizado entre os atores envolvidos, até a construção do coletivo como uma
representação institucionalizada. Portanto, é no exercício contínuo da aprendizagem nos
espaços sociais que os grupos organizados constroem formas democráticas de participação na
arena política e nas relações sociais de trabalho.
2. ABORDAGEM HISTÓRICA DO MOVIMENTO DOS TRABALHADORES RURAIS
SEM TERRA
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra é o Movimento Social mais atuante
na América Latina. E tem inspirado outros movimentos , em prol da igualdade dos direitos
sexuais e de preservação ecológica, cujas ênfases ganharam grande visibilidade e têm
realizado diversas ações em todo o mundo, constituindo-se em um espaço comum com o
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Essa construção social mostra que as
organizações coletivas têm caráter prático, ou seja, é na ação ou luta que os atores sociais vão
aprendendo e conquistando seus direitos.
Com base no exposto resolvemos conhecer de maneira mais sistemática as lutas
empreendidas pelos Movimentos Sociais em um município do interior baiano, tomado como
organização coletiva na luta pela conquista da terra, permanência no campo com qualidade de
vida. Para tal utilizamos o estudo de campo como tipo de pesquisa, por permitir um maior
entendimento das questões que permeiam o cotidiano de um assentamento de Reforma
Agrária localizado no município de Barreiras-BA.
A coleta de dados utilizou-se da entrevista semiestruturada como instrumento de
levantamento de dados com a participação de dois sujeitos, um ex-posseiro que atua como
presidente da associação de moradores da comunidade e outro entrevistado, um assentado que
veio com o movimento social dos Trabalhadores Rurais.
Partindo desse pressuposto apresentaremos um panorama histórico sobre o MST,
iniciado no período de 1979 a 1984, e criado no Primeiro Encontro Nacional de Trabalhadores
Sem Terra- ENERA, que aconteceu de 21 a 24 de janeiro de 1984, em Cascavel, no estado do
Paraná.
Construído como uma questão agrária estrutural e histórica no Brasil, o MST nasceu
da articulação das lutas pela terra que foram retomadas a partir do final da década de 1970,
especialmente na região centro-sul do país e, aos poucos se expandiu pelo Brasil inteiro.
Atualmente, o MST está organizado em 22 estados e, ainda, conserva os mesmos objetivos
definidos no referido Encontro em Cascavel e ratificado no I Congresso Nacional realizado
em Curitiba, no ano de 1985. No Paraná o lema consistiu em lutar pela terra, pela Reforma
Agrária e pela construção de uma sociedade mais justa, sem explorados nem exploradores
Nos anos 2000, o MST completou 16 anos e contabilizou um número de,
aproximadamente, 250 mil famílias assentadas e de 70 mil famílias acampadas em todo o
Brasil. Esses dados sinalizam as conquistas fruto das lutas que deram a essas pessoas, terras
antes improdutivas que se tornaram lugares de vida, de trabalho e de produção de alimentos
para muitas famílias.
Entre as conquistas obtidas pelo MST é relevante mencionar que, mais de 100 mil
crianças e adolescentes estão estudando em escolas conquistadas em suas áreas de
assentamento e acampamento. São as cirandas infantis que, aos poucos, vão produzindo a
cultura da Educação Infantil no campo, um movimento massivo de alfabetização de jovens e
adultos sem-terra que envolve cerca de 20 mil educandos. Nessas condições, se promove a
formação de técnicos e educadores em cursos de nível médio e superior, além de uma série de
outras iniciativas de formação de sua militância, e do conjunto da família Sem Terra.
É assim que o MST vem ajudando a recolocar na agenda política brasileira a questão
da Reforma Agrária: fazendo a luta pela terra e afirmando em suas iniciativas, a possibilidade
de novas relações sociais, projeto inovador de desenvolvimento para o campo, e para o país.
Ademais, o MST tem se constituído uma ação política que adota uma proposta
educacional inovadora, que é a escola itinerante. E tão logo se ocupa uma terra, rapidamente é
construído um barraco que serve de escola, cuja intenção é assegurar condições para o
trabalho de ensinar e aprender das crianças e adolescentes que estão inseridos no
acampamento. Essa conscientização anuncia, sobretudo, o papel transformador da escola
implementada pelos militantes dos movimentos sociais que perceberam que lutar somente por
terra não lhes garante a efetivação dos outros direitos.
3. DIALOGANDO COM OS ACHADOS DA PESQUISA
Para entender um pouco mais acerca da história do assentamento lócus de nossa
pesquisa, tomaremos as informações apresentadas pelos dois moradores, um ex-posseiro que
será chamado de “Zeca”, e uma militante social que intitulamos de “Carmem”, ambos
autorizaram a divulgação de suas entrevistas
Nessa perspectiva, se posicionaram acerca da militância social e do processo de luta
e conquista da terra. De acordo com o seu Zeca: “movimento dos sem terra uns concordam
dizer sem terra e outros discordam dizer sem terra, porque quando se fala em sem terra como
vê passando na mídia, na televisão, ou informação pelo rádio, aí muitas das vezes a gente vê
a parte sem terra mal vista”.
Há duas premissas quanto à referência ao MST. A primeira questão mencionada é a
negação da identidade de sem terra. Esse fato se justifica porque o MST sempre aparece na
mídia desenvolvendo alguma ação (passeatas, protestos, manifestações). Geralmente, são mal
vistos pelos telespectadores, uma vez que a maioria das pessoas desconhece o histórico de
lutas dos movimentos sociais, e vê esse coletivo de pessoas como “transgressores da ordem
social vigente”.
No segundo caso, mostra-se que há um conhecimento de que o MST está lutando
pela redistribuição de terras do Brasil. Ressaltamos que nesse contexto, o país é um dos
poucos da América Latina que ainda não fizeram sua Reforma Agrária e mantém o sistema de
latifúndio, baseado nas capitanias hereditárias, no qual as terras passam de pai para filho.
No modelo supracitado há uma concentração de terras nas mãos de poucos, e os sem
terra representam a grande maioria do país que impera sob a desigualdade social, de acordo
com Gohn (2010, p.238): “o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra será uma das
mostras da exclusão e da desigualdade social no continente”.
Não obstante, ressaltamos que a negação de direitos sociais não oportuniza as
pessoas o acesso à áreas para residir e plantar. Por isso o MST surgiu para garantir que os
direitos sociopolíticos pudessem ser efetivados, uma vez que lutam pela distribuição de áreas
de terras improdutivas e torná-las produtivas é assegurar que o campo seja um espaço de vida
e luta coletiva.
Ainda falando do processo de luta pela terra Dona Carmem ainda mencionou que: “a
luta do movimento não é fácil, porque todo mundo sabe que eles são marcados, os
fazendeiros marcam muito eles. Eles são um herói porque eles enfrentam pra dar a terra aos
pobres pra morar e trabalhar, aqueles que querem trabalhar”.
Além de serem marginalizados pela sociedade civil como “baderneiros”, os sem terra
ainda são perseguidos pelos fazendeiros e grileiros de terra e, nessa luta, muitos embates
aconteceram. Segundo expressou Gohn (2010, p.305) a esse respeito: “centenas de
trabalhadores foram mortos em conflitos pela posse da terra, a maioria deles assassinados, um
fato marcante e triste na história do movimento foi o massacre dos sem-terra em Eldorado dos
Carajás que vitimou muitos companheiros de luta”.
Ao mencionar acerca do processo de ocupação da terra e a formação do
acampamento em que reside, o posicionamento de seu Zeca se referiu àquela terra como
“uma fazenda desapropriada, eu já morava aqui como posseiro, se não fosse o Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), essa desapropriação não teria acontecido,
ficaram aqui trinta famílias entre posseiros e acampados”.
Nessa questão há uma atribuição ao movimento social como uma conquista da terra,
pois os próprios posseiros não tiveram força para garantir o direito à posse da terra onde
moravam. Assim, entendemos que a coletividade das diferentes categorias de movimentos
sociais tem contribuído para grandes mudanças no campo político, econômico e social de um
país.
Já dona Carmem relata:
Quando viemos aqui para Fazenda Ilha da Liberdade, nós acampamos lá no Paulo
gaucho, depois de lá nós ficamos na beira do rio debaixo dos pés de manga,
passamos mais ou menos um ano lá, com a chuva o rio encheu e todos nós viemos
pra o barraco, alguns foram para o barraco, eu mesma fiquei num galpão que tinha
ali em cima, depois voltamos para o barraco aqui em cima onde hoje é minha casa.
Seu relato demonstra as dificuldades enfrentadas no processo de conquista da terra e,
ainda, reflete de acordo com Gohn (2010, p. 266), “as formas de resistência construídas pelos
excluídos, pode-se dizer que exclusão e resistência são categorias e ao mesmo tempo, códigos
culturais dos movimentos latino-americanos”.
A resistência torna-se um importante instrumento de luta que os sem-terra
conseguem utilizar para obter sua terra para viver e plantar. Dona Carmem menciona:
A vida era muito sofrida, debaixo de uma lona não poderia ser fácil, a chuva vinha, o
vento rasgava a lona e molhava tudo que a gente tinha enchente dando no meio da
canela, dando na cintura, rolando pau nas pernas, peixe cobra, isso tudo foi o nosso
sofrimento aqui, foi sofrido. Agora os moradores daqui (posseiros) não sofreram
porque nenhum foi pra debaixo da lona.
Os sem terra sofrem muito na fase em que estão morando em acampamentos, tendo
que morar em barracos de lona, situados as margens de rodovias, enfrentando calor, falta de
água, insegurança, diversos fatores negativos que os fariam desistir da luta. Ainda relatando
sobre o tempo em que os trabalhadores estiveram acampados seu Zeca expõe:
Foram dois anos vivendo em barracos foi sofrido porque pega chuva dentro da lona,
tinha muito carrapato quem vive hoje em sua casa própria, hoje a luta valeu a pena
pelo menos para conquistar a terra. A luta por essa terra começou há muito tempo a
mãe dele nasceu e casou lá e ele foi nascido e criado e permanece na terra até hoje.
A resistência dos militantes sociais se justifica pela vontade de conquistarem a terra e
assegurar a seus descendentes a herança não somente de uma área de terra, mas, também os
valores sociais, coletivos e políticos aprendidos ao longo da caminhada. De acordo com o
participante várias gerações de sua família viveram no pedaço de terra conquistado.
Ainda falando acerca da herança que os militantes sociais querem deixar para seus
filhos, constata-se que eles querem que seus filhos não sofram o mesmo que eles. Por isso
lutam por terra, por educação e acesso a saúde, moradia, enfim todos os direitos que
assegurem a dignidade humana. Com base no exposto, constatamos que foi necessária muita
luta, abdicação e embates, por parte dos militantes sociais, estas são descritas por seu Zeca:
Tinha que levantar uma casa de taipa e se fosse para a cidade e passasse oito dias
quando voltasse o fazendeiro já havia derrubado a casa, vivíamos quase de favor
trabalhando para os fazendeiros quase como escravos para ter o direito de
permanecer na terra, recebiam menos do que deveriam pelo serviço prestado e eram
obrigados a trabalhar se não seriam retirados no dia seguinte da terra.
Neste relato constatamos as dificuldades e, ainda, a repreensão sofrida pelos
trabalhadores sem terra, promovidas, em especial, pelos opositores que, segundo Gohn (2010,
p.262): “são sempre os sujeitos que detêm o poder sobre o bem demandado e por isso
oprimem os sujeitos não permitindo a estes terem acesso ao bem almejado, muitas vezes
tentam negociar, pretendendo sempre obter lucro sobre outrem”.
Essa questão é evidenciada no posicionado do entrevistado, os fazendeiros usavam a
propriedade que tinham para oprimir os posseiros e fazê-los trabalhar por uma remuneração
irrisória, que era aceita pela necessidade de sobrevivência dos trabalhadores.
O relatado acima acontecia quando as pessoas lutavam pela aquisição da terra, depois
da conquista o local deixa de ser um acampamento e ganha status de assentamento,
considerando isso, descreveram como é a vida neste espaço hoje em dia. Segundo dona
Carmem:
Pelo que nós vivíamos hoje estamos bem, cada um tem sua casa própria, trabalhando
o quanto pode só que nós nunca recebemos o recurso, pois a terra nunca foi medida.
Recebemos o crédito fomento e as casas, temos o documento da terra, só vamos
receber com vinte anos, tanto os que vieram com o movimento quanto os posseiros,
só com vinte anos que podemos dizer que a terra é nossa, mas governo nenhum pode
tirar a gente daqui.
De acordo com essa descrição, percebe-se que receberam o crédito de fomento para a
construção das casas do assentamento. Esse direito está assegurado na Instrução normativa nº
53/2009 que “garante aos beneficiários de Reforma Agrária os meios necessários para a
instalação e desenvolvimento inicial da terra”.
Esses recursos são divididos em modalidades de crédito: apoio inicial, apoio à
mulher, aquisição de materiais de construção, fomento, entre outros. A entrevistada revela
que receberam um fomento no valor de R$ 3.200,00 e incentivo para materiais de construção
no valor de R$ 5.000,00. Somando os incentivos receberam um total de R$ 8.200,00.
Quanto ao documento da terra, existe um equívoco no entendimento da participante
quando expõe já ter o documento da terra. Haja vista que a Constituição de 1988, em seu
artigo 189 estabelece que “os beneficiários da distribuição de móveis rurais pela Reforma
Agrária receberão título de domínio ou concessão de uso inegociável pelo prazo de 10 anos”.
Como o assentamento completará em 2013, 9 anos desde a sua fundação, eles ainda não
podem receber este documento de posse da terra.
Assim constata-se a necessidade de maiores esclarecimentos por parte dos
militantes sociais acerca dos tramites legais que lhes asseguram a posse da terra. É preciso
expor que hoje as condições de vida da população do assentamento melhoraram
significativamente, afinal de contas não moram mais em barracos de lona, todos têm sua
própria casa construída. De acordo com seu Zeca essa conquista se fez com um recurso que
“nós recebemos, foi um crédito fomento e crédito habitação que é dessas casas para
construir só que o valor dessas casas quando, recebemos foi 5.000 reais e aqui a maior parte
dessa casa é recurso próprio”.
Convém esclarecer que o crédito de construção, segundo o participante não tem sido
suficiente para a construção das residências, pois de acordo com ele, a maioria dos moradores
tem usado recursos próprios terminar suas casas.
Outro desafio enfrentado pelos assentados está relacionado ao cultivo e escoamento
da produção. Seu Zeca afirmou que: o agronegócio deixou que o pequeno agricultor ficasse
esquecido, os assentados não tem transporte para escoar a produção.
Esse depoimento fundamenta-se em uma realidade daqueles que vivem da
agricultura familiar nas áreas de assentamento na Região Oeste da Bahia, pois, a expansão do
agronegócio, a ausência ou implementação de políticas públicas para o incentivo do cultivo da
terra, o escoamento e comercialização do que é produzido pelo pequeno agricultor. Ademais,
os grandes entraves enfrentados pelos assentados são: o não cumprimento da política agrícola
e fundiária da Reforma Agrária, burocracia para aquisição dos créditos bancário pela ausência
de projetos.
Ainda falando do escoamento da produção, Dona Carmem menciona:
Vendemos na feira da cidade, ou vendemos aqui mesmo, tem os atravessadores que
vem comprar aqui, a vizinha tinha mais sessenta sacas do milho e vendeu. A estrada
é ruim, e agora que está chovendo está pior, mas tem promessa de passar um asfalto
aqui, acredito que vem porque os fazendeiros ricos estão aí pra cima. E nós seremos
beneficiados por causa eles.
Dessa forma, os assentados enfrentam dificuldades para escoar sua produção devido
às condições precárias das estradas no campo e a insuficiência de transporte, sendo obrigados
a venderem sua produção para os atravessadores por menor preço. Segundo o relato acima há
uma esperança de que haja melhoria nas condições das estradas advindas da existência dos
fazendeiros na região.
Outra questão por nós investigada foi a escola do assentamento, buscando conhecer
se está oportunizando a aprendizagem dos assentados. Segundo depoimento de seu Zeca:
O município tinha que investir mais, porque a própria qualidade desse colégio de
dentro de uma de assentamento de reforma agrária, eu acho a qualidade péssima,
tem quatro anos que nunca foi reformado, veio cinco computadores para cá, tem 2
anos e esses computadores estão aí, um menino desse que já é adolescente nunca
pegou no botão de um computador daqueles, nunca foi ligado, os órgãos públicos
que não oferece a estrutura adequada para sua instalação. Isso é muita falta de
responsabilidade dos poder públicos, os computadores nunca foram instalados, só
estão aí.
Evidencia-se nesse depoimento que a escola do assentamento ainda não tem
qualidade do almejada pela população local, uma vez que, faltam maiores incentivos do poder
público, no que tange à estrutura física, inserção das tecnologias e o acesso ao conhecimento
produzido na sociedade.
As declarações de dona Carmem contrapõem ao depoimento do entrevistado acima.
De acordo com ela, a escola funcionava em uma casa de farinha de um morador, e qualquer
morador podia ministrar as aulas, pois quem “soubesse ler e escrever e tivesse a 4ª série”. Isso
implica que já existe um grande avanço em relação ao atendimento educacional no
assentamento, pois o direito a escola já lhes são assegurados, porém é necessário melhorias da
estrutura física e pedagógicas da unidade escolar.
Sobre a fixação e permanência do homem na terra, seu Zeca afirma que:
Vai chegar o ponto de que as pessoas do local vão abandonar as terras para trabalhar
fora para poder comer e nós hoje estamos aqui para viver da terra, muito deles, já
saíram daqui para trabalhar fora, quando deve produzir aqui, levar pra o comércio e
vender, a gente tinha que viver da terra.
Em contraposição ao depoimento supracitado dona Carmem menciona:
Não existe ninguém aqui que fique sem trabalhar na terra por falta de recurso, pois
todos aqui trabalham como podem, mesmo não tendo recursos, todos queriam era a
terra para trabalhar e está dando pra sobreviver tanto faz o governo mandar dinheiro
pra a gente como não mandar, que a gente toca na marra.
Assim, entendemos que não basta apenas o acesso a terra, mas é preciso garantir ao
camponês sua permanência com qualidade de vida. Em síntese, para os assentados
desenvolver seu trabalho na terra conquistada é preciso incentivos financeiros para o plantio,
a colheita, o escoamento e a venda da produção. Para isso, deveriam lutar por outras políticas
públicas que lhes garantissem o acesso aos serviços primários para uma vida digna no campo
como: hospitais que assegurasse atendimento médico a população campesina, saneamento
básico, eletrificação rural, água potável, casas e escola com infra-estrutura adequada,
materiais didáticos, merenda escolar e profissionais com formação para atuar nas escolas do
campo.
PARA COMEÇAR A CONCLUIR...
Os Movimentos Sociais têm sido ao longo da história, coletivos organizados para a
conquista de direitos sociais negados as pessoas, grupos ou categorias, pela estrutura social
direcionada por uma base capitalista excludente. Esses movimentos acompanham as
mudanças sociais e lutam contra a hegemonia de poder nas esferas públicas e privadas de uma
dada sociedade.
Nessa perspectiva, o MST é reconhecido no Brasil e no mundo como uma das
organizações social e politicamente bem organizadas apresentando ao longo da história do
país resultados significativos na distribuição das terras para os cidadãos, dando a estes a
oportunidade de aprender com a luta diária do movimento social a se organizarem, resistirem
e lutaram não somente pela permanência na terra, mas também pela qualidade de vida no
campo, garantindo o acesso a saúde, educação, saneamento, dentre outros serviços essenciais
que garantam a qualidade de vida do homem do campo.
Considerando a investigação realizada em uma área de assentamento de Reforma
Agrária constatamos que a conquista da terra já representa um grande avanço para o
trabalhador rural, porém entendemos que muito ainda deve ser feito, principalmente, pelos
órgãos públicos no que diz respeito à educação, saúde, incentivos agrícolas, e outros direitos
sociais e políticos que garantam a fixação e permanência do homem no campo com dignidade
de vida.
Assim, defendemos que não basta somente à conquista da terra e a implementação de
escolas em áreas de assentamento, mas é preciso que a educação seja usada como uma
ferramenta de transformação social, que trabalhe o histórico de lutas do movimento social,
seus valores, cultura, identidade, para que este camponês seja sujeitos de suas próprias
escolhas e se reconheça como sujeito de direitos, empreendendo mudanças significativas no
contexto social no qual está inserido.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel Gonzalez. CALDART, Roseli Salete. Por uma Educação do Campo. Mônica Castagna
Molina, (organizadores). -Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988. Edições - Câmara
dos Deputados, Edições Câmara, 2009.
_______, Instrução Normativa nº 53, de 19 de janeiro de 2009.
GOHN. Maria da Glória. Teorias dos Movimentos Sociais: paradigmas clássicos e contemporâneos. São Paulo:
Edições Loyola, 2010.
Comunicação Oral
GT 2 – Educação, Trabalho e Movimentos Sociais
OS MOVIMENTOS SOCIAIS DO CAMPO E SUA TRAJETÓRIA DE LUTA PELA
EDUCAÇÃO
Cleonice Ferreira dos Santos
Queina Lima da Silva
Prof Msc. Nilza da Silva Martins (Orientadora)
UNEB- campus –Barreiras- BA
[email protected]
RESUMO
Este artigo é um recorte de um trabalho de Conclusão de Curso - TCC apresentado a Universidade do Estado da
Bahia-UNEB, na graduação em Pedagogia. A pesquisa usou a abordagem qualitativa tipo estudo de caso com
aproximação a etnografia. O cenário escolhido foi uma escola de um Assentamento de Reforma Agrária,
localizado no município de Barreiras no Estado da Bahia. A investigação teve como objetivo saber as
concepções de educação do campo e de Movimentos Sociais que perpassam o imaginário de professores, gestora
e auxiliares de serviços gerais, identificando o conhecimento do histórico de lutas dos movimentos sociais em
prol da educação e da conquista da terra. Os dados revelaram que há um desconhecimento por parte dos
entrevistados sobre a Educação do Campo e os Movimentos Sociais, bem como da trajetória de lutas
empreendidas pelo MST na busca de uma educação vinculada aos seus traços histórico-culturais, apresentando e
defendendo uma proposta de educação que contemple as especificidades das diversas populações campesinas.
Para tal, analisamos o projeto Político Pedagógico e os projetos educativos desenvolvidos na escola, fazendo
uma comparação com a proposta de educação pensada pelos movimentos sociais do campo. Os dados
comprovaram um distanciamento entre a proposta de educação defendida pelo MST e a desenvolvida na escola
investigada.
Palavras-chave: Educação do Campo; movimento sociais; formação de professor.
TRAJETÓRIA DA EDUCAÇÃO DO CAMPO
Atualmente a educação do campo vem conquistando espaço na agenda política nas instâncias
municipal, estadual e federal. Esse fenômeno é fruto dos movimentos sociais de trabalhadores rurais e
outras organizações que lutam por um novo modelo de educação que atenda as especificidades dos
camponeses que habitam ou trabalham no campo.
O campo por muito tempo foi relacionado ao arcaico, não necessitando de educação, haja
vista, que no meio rural a população não precisaria de muitas letras para desempenhar o trabalho na
terra. A visão de campo e de educação ganha terreno com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem
Terra (MST), objetivando mudar a realidade social, econômica e educacional de seus militantes e
consequentemente dos futuros herdeiros da terra conquistada.
Nesta trajetória reivindicam do estado iniciativas na oferta de educação pública de qualidade
e formação de profissionais para trabalhar nas escolas. Dessas demandas surgem as propostas e
diretrizes que atendam a formação integral dos sujeitos que habitam e trabalham no campo, assim
como uma formação inicial e continuada de professores objetivando valorizar a identidade cultural
destes povos.
Nessa perspectiva, Arroyo (2007) defende “políticas específicas de formação de
educadoras e educadores do campo”, com projetos de formação que preparem os docentes
para dialogarem com os saberes sociais e culturais das comunidades, problematizando-os a
fim de questionar os valores e práticas instituídas historicamente. O autor afirma ainda que os
professores devem estar preparados para desenvolver práticas educativas que valorizem o
conjunto de saberes e práticas culturais que há séculos são produzidos pelas comunidades
camponesas, mas que são silenciadas e negadas no currículo das escolas.
Para Batista e Costa (1010, p 254), “torna-se fundamental que o currículo da escola do
campo possa ser pensado e definido pelos sujeitos da ação educativa e da comunidade da qual a escola
faz parte.” Para tal, os movimentos sociais vêm propondo uma educação que atenda as especificidades
dos homens e das mulheres do campo, incluindo suas identidades, culturas, saberes, memória e
história.
Nesse sentido, Caldart (2002, p. 22) expressa:
O nome ou expressão educação do campo já identifica também uma reflexão
pedagógica que nasce das diversas práticas de educação desenvolvidas no campo e
ou pelos sujeitos do campo. É uma reflexão que reconhece o campo como lugar
onde não apenas se reproduz, mas também se produz pedagogia; reflexão que
desenha traços do que pode se constituir como um projeto de educação ou de
formação dos sujeitos do campo.
Esta abordagem vem reafirmar que o campo pode produzir sua própria educação, e
partindo deste pressuposto é preciso desenvolver projetos vinculados à realidade das
diferentes comunidades, assim como gerar discussões com a participação dos atores sociais do
campo. Para Arroyo (2004, p. 100), “falar em política pública da educação do campo é
equacionar novas posturas, novas estratégias, novas diretrizes, novas bases capazes de
alicerçar o que o velho tratamento nunca garantiu”, uma educação como direito dos povos do
campo assegurada na Constituição Federal e LDB/9394.
O direito à posse da terra consiste num dos meios de subsistir dignamente, logo, a
educação consiste numa estratégia política de luta pelos direitos sociais básicos. Identificando
as demandas vividas, os povos campo encontram na “Pedagogia Libertadora” Freiriana uma
das bases para a discussão dos processos de desumanização e empobrecimento crescente dos
trabalhadores. Processos estes que adentram a escola, nos aspectos pedagógicos, curricular,
formação dos educadores e calendário específico.
É relevante atentar para a educação que está sendo oferecida para os camponeses
neste século, visto que em nenhum momento da história educacional brasileira se discutiu
tanto as demandas relacionadas à educação do campo. O poder público, as universidades e
principalmente os camponeses através dos movimentos sociais têm participado das
discussões, bem como da construção e efetivação de uma educação que atenda as
especificidades dos diferentes povos.
O movimento por uma educação do campo tem procurado romper com a visão de
rural como lugar de atraso. É correto afirmar que o novo paradigma de campo se projeta pela
luta e resistências dos sujeitos do campo, pois como esclarece Molina (2004), “o campo é
espaço de vida e resistência, onde camponeses lutam por acesso e permanência na terra e para
edificar e garantir a natureza, o trabalho, a cultura e suas relações sociais”. Para tanto, a
educação oferecida aos camponeses precisa alcançar este propósito e sua contínua
movimentação.
Esse desafio ganha cada vez mais força devido às instâncias políticas que estão
diretamente ou indiretamente ligadas à educação que está sendo oferecida no campo. Neste
momento amplia-se a relevância para o ponto de vista de todos que lutam por uma educação
pensada do/no campo, visto que, o meio rural é um espaço plural e sua educação deve ser
diferenciada e de acordo com a realidade e cultura local.
A construção e implementação da educação do campo ganha força nas palavras de
Taffarel (2011, p. 66) ao referir-se a participação das diversas entidades:
A Educação do Campo foi e está sendo incorporada e/ou valorizada na agenda de
lutas e de trabalho de um número cada vez maior de movimentos sociais e sindicais
do campo, com o envolvimento de diferentes entidades e órgãos públicos. O que
pode ser conferido pelo conjunto de promotores e apoiadores das conferencias
estaduais e nacionais realizadas.
As lutas por melhoria na educação do campo têm ganhado repercussão nacional, pois
boa parte das escolas rurais vive situações degradantes, tanto em sua estrutura física, como na
estrutura pedagógica. Outro fator que também preocupa os movimentos sociais é a
inexistência de um projeto educacional que valorize a formação dos sujeitos que vivem e
trabalham no campo. Neste sentido, de luta por uma educação como práxis libertadora para os
povos do campo, afirma Caldart (2010, p. 83), que:
Não podemos esquecer que se nossa luta continua sendo para que “a escola seja
mais que uma escola”, no sentido de assumir-se como parte de uma totalidade
formadora mais ampla, a vida, a luta por ela não cabe dentro de uma escola (mesmo
que derrubadas suas paredes, suas cercas) e as lutas pedagógicas não substituem as
lutas sociais e políticas mais amplas. Ainda que na pedagogia a vida não seja
definida somente com palavras.
Os sujeitos sociais do campo lutam por uma educação de qualidade capaz de mudar
a realidade das diversidades socioculturais, políticas e econômicas, bem como, pelo
desenvolvimento de uma nova proposta pedagógica que possibilite aos estudantes uma
compreensão de campo como espaço de múltiplas possibilidades.
Com base no exposto, para conhecer mais a fundo acerca dos movimentos sociais e
suas lutas em prol da Educação do Campo, a temática escolhida para a realização do trabalho
de conclusão de curso é relevante, atual e apropriada para o momento presente.
COLHENDO OS FRUTOS DA PESQUISA
A opção pela metodologia de abordagem qualitativa do tipo estudo de caso com
aproximação a etnografia, permite ao pesquisador uma inserção no contexto da pesquisa, sem
interferência no comportamento dos sujeitos que povoam este ambiente, conseguindo captar
as ações, e como estes convivem com situações inusitadas do cotidiano, devido ao grande
período de permanência do pesquisador em lócus.
Nesta conjuntura escolhemos como contexto da pesquisa um Assentamento de
Reforma Agrária do Município de Barreiras-BA, que possui nove anos de existência passando
a fase de acampamento até chegar a assentamento. É relevante mencionar que a escola surgiu
como reivindicação do movimento para que as crianças tivessem acesso à educação no local
onde residem.
Atualmente atende 53 estudantes, do Ensino Fundamental anos finais e Educação
de Jovens e Adultos, divididos nos três turnos: matutino, vespertino e noturno. Quanto à
infraestrutura da escola, esta é precária, uma vez que comportam somente duas salas de aula,
que estão bastante deterioradas devido a ação do tempo, dispondo de um único banheiro
utilizado por meninos e meninas e uma pequena cantina.
Assim, constatamos que o espaço físico é inadequado para o desenvolvimento de
uma educação de qualidade, por não dispor de biblioteca, laboratório de informática, salas
arejadas, refeitório, quadra poliesportiva para o exercício de atividades corporais. O material
didático-pedagógico não atende as especificidades dos sujeitos do campo, devido à
perpetuação da cultura livresca e urbanocrática que não considera as particularidades dos
diversos atores sociais que compõem a Educação do Campo.
Nesta conjuntura escolhemos como participantes da pesquisa 15 sujeitos que
vivenciam a vida no assentamento, sendo eles: 5 professores sendo 2 da comunidade e os
demais da zona urbana, 1 gestor, 2 funcionárias de serviços gerais, 5 estudantes distribuídos
entre os turnos de funcionamento da instituição escolar e 2 famílias da referida localidade.
Para preservar a identidade dos participantes da investigação, utilizamos nomes
fictícios: os professores aparecem no decorrer do texto como Anita, Luis, Cristina, Luciana e
Mariana; a gestora recebeu o nome de Alice; as auxiliares de serviços gerais são chamadas
Jussara e Ana; os estudantes Pedro, Ester, Aline, Julia e Gabriel. Às famílias Souza e
Cardoso. Desta forma, seguiremos as orientações da ética na pesquisa para não adentrar em
questões que possam suprimir ou ferir a dignidade humana.
Desta feita, a primeira questão alvo de nossas inquietações foi a concepção dos
Movimentos Sociais e Educação do Campo, a trajetória de lutas, cultura e pedagogias
realizadas pelo Movimento que perpassam o imaginário dos sujeitos da pesquisa. Os dados
revelaram qual a concepção que os sujeitos entrevistados possuem acerca da Educação do
Campo e dos Movimentos Sociais.
No que se referem à Educação do Campo e Movimento Sociais do Campo, os
participantes apresentaram diferentes definições. Com relação à Educação do Campo, Cristina
assumiu não saber responder. Luis destaca que está voltada para a lida do campo a educação
do campo para que os alunos permaneçam no campo e a com a bagagem que eles têm e
agente só vai modelar. Isso implica que “vai além dos limites escolares, ela emerge da prática
social e o trabalho, gerando conteúdos da aprendizagem e possibilitando a “emancipação
sociopolítica” (SOUZA, 2006, p. 85). O docente destaca uma educação para “modelar” o
sujeito, numa relação contraditória do processo construtivo da formação humana. Outra
situação apontada pelo docente está vinculada a uma educação que venha contribuir para
“permanência do homem no campo”, concepção de educação também defendida pelo MST.
Mariana afirma não conhecer a concepção de educação do campo. E sobre os Movimentos
Sociais do Campo, relata alguns fragmentos sobre o MST apresentado pela mídia.
Quando indagados sobre a concepção de Movimentos sociais Luis e Cristina
apontam que desconhece o assunto. Constata-se que esses docentes não tiveram contato em
sua formação inicial e continuada com os conhecimentos teóricos e práticos do movimento
social. Como afirma Souza (2006, p. 38): “muitas vezes os professores não conhecem o
movimento social e não tinham preparo para agir de forma criadora no campo educacional”.
A gestora descreve a Educação do Campo como direitos essenciais para os povos do
campo, a escola aparece como espaço de coletividade capaz de promover conhecimentos aos
sujeitos campestres, explica que a função social da escola não é apenas transmitir
conhecimentos sistemáticos, apontando para uma educação capaz de dialogar com a
comunidade em que a escola está inserida. A resposta da gestora está em consonância com as
ideias de Souza (2006, p. 106): “A prática pedagógica é uma dimensão da prática social”, isso
implica que essa pratica social deve está implícita no fazer pedagógico do educador da escola
do campo. Sobre os Movimentos Sociais do Campo a gestora diz que: São movimentos que
visam à conquista de direito constitucionais de moradores do campo. Embora a gestora não
citando nome desses movimentos, aponta para a luta dos trabalhadores do campo para
conquista de direitos presentes na Constituição brasileira.
As duas auxiliares de serviços gerais demonstram desconhecimento a respeito da
Educação do Campo, mesmo trabalhando em uma escola do campo. Jussara afirma que a
Educação do campo é igual a da cidade, assim constatamos que na visão da auxiliar de
serviços gerais a educação oferecida no campo não diferencia da cidade. Entendemos que a
educação do campo em muitas comunidades ainda é vista como uma extensão da educação
urbana como expressa Arroyo (2007, p.14): “Ainda em casos frequentes, a educação do
campo, seus profissionais e sua formação são tratados nos estilos políticos mais primitivos,
longe dos avanços que conquistamos no trato dos profissionais das redes e escolas urbanas”.
Constata-se ainda que a outra auxiliar de serviços gerais mesmo vivenciando as demandas de
um assentamento não sabe opinar sobre a Educação do Campo e os movimentos sociais.
Podemos considerar que a ausência de conhecimento sobre os movimentos sociais
por parte dos sujeitos que vivenciam o cotidiano do assentamento se efetiva pelo não
envolvimento nas demandas presentes no tecido desse movimento. Morar e participar das
reuniões no assentamento não é garantia de aquisição e adoção de uma postura politicamente
consciente, Gohn (2008, p.103) considera que: “o conhecimento é gerado por meio da
vivencia de certas situações-problemas”. Para tal, entendemos que é preciso participação
efetiva desses sujeitos nas demandas cotidianas, assim como, a relevância da formação de
militantes, como meios para o fortalecimento do movimento.
Segunda a mesma autora “É a experiência das pessoas em trabalhos coletivos que
gera um aprendizado”. O engajamento no movimento pode proporcionar aprendizados
significativos para seus militantes, uma vez que uma quantidade considerável dos
entrevistados afirmou não possuir conhecimentos teóricos e práticos sobre os movimentos
sociais, revelando grande preocupação sobre o tipo de participação que estes sujeitos vêm
vivenciando no tecido dos movimentos que estão engajados.
Os Movimentos Sociais contribuíram para o processo de reeducação do pensamento
educacional brasileiro, a Educação do Campo nasceu das necessidades dos sujeitos ao
entenderem que apenas a conquista da terra não era suficiente para permanecer com qualidade
de vida no meio rural. Para concretizar a educação vista como “direito universal”, o coletivo
do campo passa lutar por uma proposta de educação comprometida com a transformação
social dos sujeitos campestres, considerando ainda a cultura, realidade, identidades da
diversidade dos povos do campo. Sobre a trajetória de luta, cultura e pedagogias”, realizadas
pelo Movimento social do Campo os participantes professores afirmaram que:
Segundo o professor Luis o MST sempre luta para que as pessoas tenham esse
benefício em suas moradias. Já Cristina diz que: Não, não tenho conhecimento de nenhuma
dessas práticas. Sobre a trajetória do movimento, Alice diz: conheço pouco, apenas de
poucas leituras realizadas, no que diz respeito à pedagogia conheço menos ainda, até
procurei a sede do MST para obtenção de material sobre educação, porém não consegui.
Esse dado revela a informação que os docentes e a gestora possuem acerca do MST,
assim como as pedagogias pensadas para as escolas do campo neste movimento e sua
trajetória de lutas por educação ao longo da historia. Dentre as lutas empreendidas pelo MST,
encontramos as ações voltadas para a dimensão da educação que segundo Souza (2006, p. 74)
compreende três fases: “a identificação das necessidades educacionais das crianças, jovens e
adolescentes dos acampamentos e assentamentos; a elaboração de materiais didáticos; o
desenvolvimento de parcerias”. Constatou-se a partir dos dados que os professores não tem o
apoio do MST para desenvolver sua prática educativa na escola do assentamento, as parcerias
tão valorizadas pelo movimento no que se refere à educação para os camponeses.
A gestora deixa claro que ao procurar a sede do MST, no município não teve sua
solicitação atendida, restando aos professores se basearem no modelo educacional oferecido
pelo poder público municipal. Na fala de Cristina e dos demais docentes entrevistados
podemos constatar o não conhecimento sobre as “lutas, culturas e pedagogias” do MST para
efetivação da educação no campo.
A pedagogia defendida pelo MST para atender as especificidades dos sujeitos do
campo está explicita nas palavras de Frigotto (2010, p. 36): “trata-se de uma pedagogia que
não começa na escola, mas na sociedade, e volta para a sociedade, sendo a escola um espaço
fundamental na relação entre saber produzido nas diferentes práticas sociais.” Assim
entendemos que o MST, vem ao longo da historia produzindo as matrizes pedagógicas
capazes de dialogar com a realidade dos povos do campo na sociedade em que estão
inseridos.
A Educação do Campo deve ser diferenciada da educação urbana, para tal se faz
necessário construir uma proposta educacional específica. Com base nesse entendimento,
perguntamos aos participantes da pesquisa o tipo de ensino que, segundo eles, atenderia as
características socioculturais dos educandos do campo. As respostas dadas pelos professores e
gestora confirmam a necessidade da construção do projeto educativo específico para os
educandos. Cristina diz que: essa é a única forma de ensino que a gente tem para atender
eles, uma vez que não temos parcerias, pois pra gente trabalhar a questão do MST deveria
ter acompanhamento deles, uma vez que aqui só tem reunião. A professora Luciana fez
referência à interdisciplinaridade, segundo a docente a disciplina que leciona é Filosofia que
exige trabalhar de forma interdisciplinar. Já Mariana afirmou não saber responder. Quanto aos
projetos desenvolvidos na escola a gestora afirma que sim, sempre pensamos em estar em
consonância educação e realidade. E no que se refere ao ensino contradiz argumentado que
precisa seguir o “calendário proposto pela SME61 e aprovado pelo conselho”.
Assim, é possível perceber a confusão feita durante a indicação da proposta de
ensino que a escola oferece as crianças, jovens e adultos do campo, uma vez que nenhum
aponta uma proposta de ensino que atenda as características socioculturais dos estudantes. A
gestora afirma que a escola segue a proposta da Secretaria Municipal de Educação,
confirmando que a escola está condicionada a uma realidade urbana, não levando em
consideração as especificidades dos camponeses.
Uma professora faz referência ao material pedagógico produzido pelo MST, ao
afirmar que não tem parceria nem acompanhamento do movimento e que sua presença se
restringe apenas as reuniões. O depoimento da professora se aproxima das ideias de Souza
(2006, p. 110):
Percebe – se que toda produção do MST no campo educacional não chega as escolas
e que há uma barreira a ser superada no âmbito da cultura, hierarquia e burocracia
escolar. As secretarias municipais de educação olham com ressalvas para a produção
do MST ou pouco conhece dela. Os professores não tiveram contato com tais
materiais nos cursos de magistério ou de educação superior.
Tomando como referência as angústias de uma professora e as ideias da autora, notase que é urgente a necessidade da divulgação e disponibilização do material pedagógico
produzido pelo MST, nas escolas de acampamento e assentamento, uma vez que este material
apresenta uma grande proximidade da realidade, cultura, luta e diversidade de saberes
presentes na história dos povos do campo.
As observações realizadas no contexto da pesquisa e a análise documental constaram
que o cotidiano escolar está voltado para o modelo urbano, uma vez que os professores
utilizam praticamente em todas as aulas o livro didático, as aulas desenvolvem através da
transmissão de conteúdos orais e escritos. Ao analisar o Projeto Político pedagógico e os
61
Secretaria Municipal de Educação
Projetos de ensino da escola constatamos que o método de ensino da escola descrito no PPP é
a linha Histórico-Crítica, pois entende ser inovadora, onde o objetivo é formar indivíduos
com liberdade para se expressar, tornando-se cidadãos autênticos, participativos e críticos.
Este método presente no PPP, não foi comprovado na prática dos professores durante a
observação do fazer pedagógico no cotidiano da escola.
Essa compreensão é reforçada nas palavras de Souza (2006, p. 87), quando menciona
que este trabalho pedagógico: “necessita de uma teoria da aprendizagem que leve em conta a
experiência da criança fora da sala de aula”. Para o MST, a criança aprende em outros espaços
sociais, a vida escolar deve estar relacionada com o mundo do trabalho, tendo em vista que a
aprendizagem acontece quando a criança está fazendo um trabalho prático, quando está
planejando e fazendo brincadeiras e quando está resolvendo seus problemas.
Os projetos de ensino da escola lócus da pesquisa analisados foram: “O Campo
Trabalhando o Social e Conquistando a Cidadania e o Subprojeto: Com horta também se
educa”. O projeto evidencia ser importado da cidade para o campo, uma vez que os objetivos
gerais não reverenciam a comunidade em que seus sujeitos estão inseridos. São eles:
• Proporcionar uma melhor formação, enquanto seres humanos aos educandos/comunidade,
inserindo-os na sociedade, através da inclusão por meio de atividades educativas no âmbito da
escola/comunidade. Proporcionando um melhoramento das relações interpessoais e socializá-los,
dentro dessa comunidade tão carente de recursos físicos, financeiros, educacionais, estruturais,
sociais e outros.
• Estabelecer uma relação de compromisso entre escola e comunidade, pela apresentação de
uma postura ética, clara de ação e interesse frente à sociedade que a sustenta.
• Favorecer o desenvolvimento de atividades que promovam reflexões e a construção do
conhecimento referente ao exercício da cidadania.
Os objetivos reproduzem a ideia do capital, na qual a escola é responsável pela
transformação social dos sujeitos quando menciona uma “melhor formação enquanto seres
humanos, das relações interpessoais e socializá-los, dentro dessa comunidade, e que esses
estudantes adquirirão uma postura ética, clara de ação e interesse frente à sociedade que a
sustenta e conhecimento referente ao exercício da cidadania”. Esses objetivos colocam a
escola como a única instituição capaz da transformação social do sujeito, não considerando os
conhecimentos que as crianças, jovens e adultos trazem de sua vida cotidiana.
O projeto “Com horta também se educa” não foi colocado em prática, pois segundo os
participantes não conseguiram parcerias da comunidade e nem do poder público municipal
para desenvolver o referido projeto, uma vez que para fazer uma horta envolve recursos que a
escola não dispõe. O Projeto Político Pedagógico faz menção que a escola não conta com o
“PDDE - Programa Dinheiro Direto na Escola, ainda não estar instituído na escola”, isso
evidencia que essa instituição não tem autonomia nem recursos financeiros para resolver as
questões relacionadas ao administrativo/pedagógico da unidade escolar.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A educação do campo ganha espaço considerável no cenário educacional brasileiro,
impulsionada pelos movimentos sociais campestres, entre eles destacam-se o Movimento dos
trabalhadores Rurais Sem Terra, que luta para colocar o campo na agenda política e
educacional e constituir seus moradores como sujeitos de direitos. Para tal usa como bandeira
a educação pensada com eles e a partir deles, considerando as matrizes culturais, identidade e
realidade dos homens, mulheres, jovens e crianças que moram e trabalham no campo.
No que se refere à concepção de educação de Educação do Campo, contatou-se que
existe um desconhecimento dos participantes, isso implica que é necessário maior
esclarecimento sobre os conteúdos curriculares, metodologias, avaliação, levando em
consideração as matrizes curriculares que sejam adequadas às diferentes populações do
campo.
Considerando que a escola lócus da pesquisa está situada em uma área de
assentamento de Reforma Agrária ficou evidenciado ser necessário conhecer os saberes que
permeiam esse espaço, bem como maior envolvimento por parte dos moradores nas demandas
defendidas pelos movimentos sociais.
E quanto à formação dos docentes que atuam na Educação do Campo, ficou
evidenciada a necessidade urgente de promover qualificação profissional para os educadores
que atuam com este segmento educacional. É urgente que a formação continuada aconteça,
pois esta oportuniza ao docente a construção de saberes e metodologias específicas para atuar
com as escolas do campo. Todos afirmaram que fizeram o curso num dado espaço/tempo,
entretanto, isso não foi percebido durante a observação, haja vista que a educação realizada
em sala de aula é livresca e descontextualizada com a realidade campesina. Para tanto, cabe à
Secretaria Municipal de Educação pensar e promover essa formação aos docentes,
acompanhar os resultados alcançados mediante as mudanças na prática do professor, assim
como procurar soluções para as demandas que permeiam o cotidiano da escola.
Outra constatação diz respeito aos Projetos educativos desenvolvidos na escola do
campo, por meio das falas dos participantes e das análises realizadas nos referidos
documentos. A partir disso, constatamos um distanciamento dos projetos com as orientações
estabelecidas pelas Diretrizes Operacionais para a educação Básica do Campo, que propõem
uma educação específica para as diferentes realidades campesinas. Devido a isso é urgente
construir um projeto educativo pensado conjuntamente com o corpo docente, discente e a
comunidade que contemple as necessidades dos sujeitos campesinos, que tenha um currículo
que considere a época de plantio e colheita evitando assim, a evasão escolar algo que também
foi constatado por nós como um aspecto negativo do projeto educativo vigente, uma
explicação para este fato é que a educação realizada nesta instituição escolar é pautada na
educação urbana, ou seja, totalmente desarticulado da realidade do campo.
Com base no exposto é relevante mencionar que apesar de todas as dificuldades
supracitadas, é possível superá-las. Para tal é preciso criar um projeto educativo para a escola
do/no campo, que traga as matrizes pedagógicas do movimento social, que tenha um
calendário diferenciado, que trabalhe os aspectos relacionados às atividades campesinas de
plantio, técnicas e que faça o sujeito se sentir pertencente ao contexto em que está inserido.
REFERÊNCIAS
ARROYO, Miguel Gonzalez. CALDART, Roseli Salete. Por uma Educação do Campo. Mônica Castagna
Molina, (organizadores). Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
BATISTA e COSTA etall ROCHA, Maria Isabel Antunes (org.). Escola de Direito: Reinventando a escola
multisseriada. Autentica Editora – Belo Horizonte, 2010.
CALDART, Roseli Salete. Caminho para transformação da escola: reflexões desde práticas da licenciatura em
educação do campo. Ed. Expressão Popular – São Paulo, 2010.
GOHN. Maria da Glória. Movimentos Sociais e educação. São Paulo: Cortez, 2009.
MOLINA, Mônica Castagna (org.). Educação do campo: Contribuições para a construção de um projeto de
educação do campo. Brasília, DF: Articulação Nacional “Por uma educação do campo, 2004.
_____________________ (org.) Licenciaturas em Educação do Campo: Registros e reflexões a partir das
experiências – piloto (UFMG; UnB; UFBA e UFS). Autentica Editora – Belo Horizonte, 2011.
FRIGOTO etall. MUNARIM, Antônia, Sônia Beltrame (org.). Educação do Campo: Reflexões e Perspectivas.
Insular – Florianópolis, 2010.
SOUZA, Maria Antônia. Educação do Campo: Propostas e Práticas Pedagógicas do MST. Vozes Editora –
Petrópolis, Rio de Janeiro, 2006.
TAFFAREL etall. MOLINA, Mônica Castagna (org.). Licenciaturas em Educação do Campo: Registros e
reflexões a partir das experiências – piloto (UFMG,
Horizonte: 2011.
UnB, UFBA e UFS). Autêntica Editora - Belo
GT 3 – ESTADO E POLÍTICA EDUCACIONAL
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
AVALIAÇÃO NA DIMENSÃO ESCOLAR E O CURRÍCULO
Caroline Araújo de Souza
Sheilla Martins Rosa
Profª. Dra. Lúcia Maria de Assis (Orientadora)
Faculdade de Educação - UFG
[email protected]
[email protected]
[email protected]
RESUMO
Esta comunicação consta de uma breve revisão de literatura realizada nos campos de estudos do Currículo e da
Avaliação, cujo resultado foi parte do processo de avaliação da disciplina que aborda estes temas no curso de
Pedagogia. O recorte teórico levou em conta a contribuição de autores que, nas últimas duas décadas, vêm
contribuindo de forma significativa para reflexões que se aplicam tanto no campo da Didática e das práticas de
ensino como no campo das Políticas Educacionais, considerando-se as inúmeras relações que podem ser
estabelecidas entre estas duas grandes áreas de pesquisa. A primeira parte trata da avaliação na dimensão escolar,
cujo suporte teórico baseia-se em obras de Luckesi (2011), Assis (2003), Fernandes e Freitas (2008), Afonso
(2000), Dalben (2011), além de alguns documentos do Ministério da Educação. Esses autores analisam o campo
da avaliação como sendo polissêmico e influenciado por múltiplas determinações sociais, culturais e políticas,
procurando compreender o papel dos processos avaliativos escolares e extraescolares nas práticas educativas,
não se furtando em propor algumas mudanças no modo como a avaliação vem sendo concebida e praticada nos
contextos escolares, fortemente influenciados pelas políticas de avaliação em larga escala, propostas pelos
governos. Os autores e obras analisadas propõem pensar a avaliação para além da aprovação e reprovação,
focando nos processos de ensino-aprendizagem e na apreensão de conhecimentos, habilidades, atitudes, valores e
saberes multiculturalmente orientados. Neste estudo são elencadas também três dimensões da avaliação no
ambiente educacional, com destaque para as implicações e repercussões das avaliações de larga escala e
sistêmicas no cotidiano escolar, consideradas como um dos instrumentos de regulação da qualidade do ensino
concebido e implementado pelo Estado Avaliador. A segunda parte trata do currículo entendido como um campo
de conhecimento polissêmico, cuja abordagem deve ser multiculturalmente orientada. Os autores e obras de
referência são Silva (2001), Moreira e Candau (2008), Moreira (2008) e alguns documentos do Ministério da
Educação. Destaca-se o entendimento e a abordagem presentes nas Diretrizes Curriculares, bem como algumas
repercussões do currículo oculto no cotidiano escolar, e por fim, realiza-se uma breve relação entre o currículo e
a avaliação, sobretudo das avaliações sistêmicas.
Palavras-chave: revisão; avaliação; currículo.
INTRODUÇÃO
Esta comunicação consta de uma breve revisão de literatura realizada nos campos de
estudos do Currículo e da Avaliação, cujo resultado foi parte do processo de avaliação da
disciplina que aborda estes temas no curso de Pedagogia. O recorte teórico levou em conta a
contribuição de autores que, nas últimas duas décadas, vêm contribuindo de forma
significativa para reflexões que se aplicam tanto no campo da Didática e das práticas de
ensino como no campo das Políticas Educacionais, considerando-se as inúmeras relações que
podem ser estabelecidas entre estas duas grandes áreas de pesquisa.
A primeira parte trata da avaliação na dimensão escolar, cujo suporte teórico baseia-se
em obras de Luckesi (2011), Assis (2003), Fernandes e Freitas (2008), Afonso (2000), Dalben
(2011), além de alguns documentos do Ministério da Educação. Esses autores analisam o
campo da avaliação como sendo polissêmico e influenciado por múltiplas determinações
sociais, culturais e políticas, procurando compreender o papel dos processos avaliativos
escolares e extraescolares nas práticas educativas, não se furtando em propor algumas
mudanças no modo como a avaliação vem sendo concebida e praticada nos contextos
escolares, fortemente influenciados pelas políticas de avaliação em larga escala, propostas
pelos governos. Tais influências vem se traduzindo em mecanismos de avaliação que
privilegiam o exame classificatório ao final de etapas em detrimento da valorização dos
processos educativos.
Neste sentido o foco recai na obtenção de notas com vistas ao estabelecimento de
hierarquias de excelência na escola. Os autores e obras analisadas propõem pensar a avaliação
para além da aprovação e reprovação, focando nos processos de ensino-aprendizagem e na
apreensão de conhecimentos, habilidades, atitudes, valores e saberes multiculturalmente
orientados. Para estes pesquisadores tais mudanças no pensamento e conduta dos educadores
se apresentam como um caminho árduo, mas possível. Neste estudo são elencadas também
três dimensões da avaliação no ambiente educacional, com destaque para as implicações e
repercussões das avaliações de larga escala e sistêmicas no cotidiano escolar, consideradas
como um dos instrumentos de regulação da qualidade do ensino concebido e implementado
pelo Estado Avaliador.
A segunda parte trata do currículo entendido como um campo de conhecimento
polissêmico, cuja abordagem deve ser multiculturalmente orientada. Os autores e obras de
referência são Silva (2001), Moreira e Candau (2008), Moreira (2008) e alguns documentos
do Ministério da Educação. Destaca-se o entendimento e a abordagem presentes nas
Diretrizes Curriculares, bem como algumas repercussões do currículo oculto no cotidiano
escolar, e por fim, realiza-se uma breve relação entre o currículo e a avaliação, sobretudo das
avaliações sistêmicas.
1.1. AVALIAÇÃO NA DIMENSÃO ESCOLAR
Para compreender a forma como a avaliação opera nas instituições educacionais hoje,
é preciso considerar o modo como ocorreu a implementação da educação no Brasil em um
contexto social e político marcado por influências de cunho liberal e conservador, com fortes
nuances patrimonialistas. A escola, inserida nesta sociedade, vem contribuindo tanto para
reproduzir como para superar estes modelos. No campo da avaliação Luckesi (2011) destaca
que os exames escolares que ainda vigoram nas instituições escolares não mudaram quase
nada durante cinco séculos. “Tais práticas já estavam inscritas nas pedagogias dos séculos
XVI e XVII, no processo de emergência e cristalização da sociedade burguesa, e perduram
ainda hoje” (p.40). Para este autor os exames nas escolas, da forma como se encontram na
contemporaneidade, tem como meta o disciplinamento dos educandos pelo medo, castigos e
ameaças, demonstrando que algumas práticas escolares, sobretudo no que tange à avaliação,
em quase nada mudaram no campo educacional ao longo da história.
A sociedade atual, caracterizada pelo capitalismo concorrencial é caracterizada por
Luckesi como burguesa e excludente, em que os mecanismos de aferição dos conhecimentos
apenas buscam classificar e selecionar educandos, professores e escolas, não possibilitando
intervenções qualitativas no ensino. Em relação à inconsciência dos atos reproduzidos por
educadores com o predomínio de exames, para o autor remetem ao modo como eles foram
examinados, a forma como o processo educativo vigente os determinou, levando-os a
reproduzirem tais práticas.
Ainda neste sentido, Fernandes e Freitas (ano) discorrem sobre a nossa participação
em uma cultura meritocrática, na qual o uso de notas foi naturalizado, desempenhando a
função de classificar, medir e selecionar os bons dos ruins, “os melhores e os piores
avaliados” (p.19). E assim como expôs Luckesi sobre os atos inconscientes, esta prática
meritocrática é tão “naturalmente” incorporada nas práticas cotidianas escolares que os
envolvidos no processo se esquecem que a avaliação não tem fim em si mesma e que o
ensino não deve voltar-se estritamente para ela. Quando isto ocorre a avaliação da
aprendizagem encontra-se fundamentada na “pedagogia do exame”, na qual a prática
pedagógica está intrinsecamente ligada a provas e exames Dessa forma os professores, pais e
alunos preocupam-se apenas com o resultado e com a aprovação, Luckesi afirma:
O sistema de ensino está interessado nos percentuais de aprovação/reprovação do
total dos educandos; os pais estão desejosos de que seus filhos avancem nas séries
de escolaridade; os professores se utilizam permanentemente dos procedimentos de
avaliação como elementos motivadores dos estudantes, por meio da ameaça; os
estudantes estão sempre na expectativa de virem a ser aprovados ou reprovados e,
para isso, servem-se dos mais variados expedientes (2011, p.36).
Em relação às consequências dessa prática Luckesi aponta elementos insatisfatórios
para o processo ensino-aprendizagem, destacando que, pedagogicamente, o ensino está
voltado apenas para os exames e não para aprendizagem. A finalidade principal dos
exames/provas seria auxiliar no processo de aprendizagem e não transformarem-se em
“vedete acadêmica”, passando-se a ensinar, predominantemente, os conhecimentos voltados
para o que será cobrado nestes instrumentos.. Psicologicamente o excesso de ênfase nas notas
transformam os produtos ou resultados quantificáveis em finalidade do processo educativo,
provocando tensões que reforçam mecanismos de punição (castigos),, tornando os sujeitos
submissos e conformados, dificultando o desenvolvimento de condutas maduras e autônomas.
Sociologicamente como expõem o autor:
No caso, a sociedade é estruturada em classes e, portanto, de modo desigual; a
avaliação da aprendizagem, então, pode ser posta, sem a menor dificuldade, a favor
do processo de seletividade, desde que utilizada independentemente da construção
da própria aprendizagem. No caso, a avaliação está muito mais articulada com a
reprovação do que com a aprovação e daí vem sua contribuição para a seletividade
social, que já existe independentemente dela. A seletividade social já está posta: a
avaliação colabora com a correnteza, acrescentando mais um “fio d’água” (2011,
p.43-44).
Fernandes e Freitas (ano) mostram que o conceito de avaliação, no senso comum, em
geral, está associado à ideia de mensuração, como sinônimo de medida, de imputação de um
valor, e que tais sinônimos se materializam em forma de notas ou conceitos. Entretanto, para
além do senso comum, o que vem a ser o ideal de avaliação da aprendizagem escolar? Em
primeiro lugar seria desvincular o conceito de avaliar do conceito de verificar/examinar, que,
segundo Assis:
[...] verificar – significa fazer verdadeiro: ver se algo é isso mesmo, investigar a
verdade. A verificação encerra-se no momento em que o objeto ou ato de
investigação é configurado; ela “congela o objeto”. O segundo – avaliar- significa
dar a valor a... atribuir valor ou qualidade a alguma coisa, ato ou curso de ação.
Ao contrário da verificação, a avaliação direciona o objeto numa trilha dinâmica de
ação (2003, p.147).
Nesta perspectiva a avaliação da aprendizagem escolar deve propiciar o diagnóstico
das aprendizagens e das não aprendizagens, por meio de um cuidadoso levantamento de dados
que propiciem a compreensão de como estão sendo encaminhados os processos de ensino e de
aprendizagem, levantando as dificuldades do educando e propiciando intervenções
propositivas do educador. Na avaliação os processos devem ser mais valorizados em relação
aos produtos que quase sempre representam uma radiografia parcial e fragmentada das
práticas de ensino. Provas, testes e exames, bem como conceitos e notas fazem parte do
processo avaliativo nas instituições escolares, mas é preciso que se configurem como uma
parte de um todo. Assim, a avaliação pode ser vista como um meio pelo qual passamos a
conhecer melhor os alunos e também para que os alunos consigam perceber as suas
dificuldades e assim possam lutar para superá-las. Ainda sobre as diferenças entre medir e
avaliar, Fernandes e Freitas (ano) consideram que
medir refere-se ao presente e ao passado e visa obter informações a respeito do
progresso efetuado pelos estudantes. Avaliar refere-se à reflexão sobre as
informações obtidas com vistas a planejar o futuro. Portanto, medir não é avaliar,
ainda que o medir faça parte do processo de avaliação. Avaliar a aprendizagem do
estudante não começa e muito menos termina quando atribuímos uma nota à
aprendizagem (p.19).
Observa-se, pelo exposto, que os desafios apresentados por Luckesi para que a
avaliação rompe com a cultura e com as práticas da coerção e do medo, defendendo a adoção
de novos hábitos que exigem, sobretudo, novas aprendizagens. Este princípio pressupõe
inúmeros desafios que vão desde a formação dos educadores e a luta histórica pela
valorização do trabalho docente por meio de melhores condições de trabalho, até a quebra dos
paradigmas educacionais vigentes, ancorados em uma visão disciplinar e fragmentada dos
conteúdos escolares.
1.2. AS TRÊS DIMENSÕES DA AVALIAÇÃO NO AMBIENTE EDUCACIONAL
Segundo os documentos “Parecer CNE/CEB Nº 7/2010” e “Resolução CNE/CEB Nº
4/2010” a avaliação no ambiente educacional compreende três dimensões básicas: I –
avaliação da aprendizagem; II – avaliação institucional interna e externa e III – avaliação de
redes de Educação Básica. De acordo com o Parecer essas três dimensões da avaliação
precisam estar inseridas no Projeto Político-Pedagógico (PPP), a fim de estabelecer “o elo
entre a gestão escolar, o professor, o estudante, o conhecimento e a sociedade em que a escola
se situa” (p.47).
Em relação à avaliação da aprendizagem, os documentos a colocam como sendo uma
reflexão do ato pedagógico, possibilitando questionamentos acerca do que seria educar. Trata,
portanto, da função diagnóstica da avaliação. Nesta perspectiva os documentos em análise
reafirmam que a sua função é permitir que o estudante avance e que também possibilite um
redirecionamento das práticas educativas, permitindo aos estudantes “recriar, refazer, criar,
propor” o que aprendeu,
A segunda dimensão trata da avaliação institucional interna que deve estar inserida no
projeto político pedagógico da instituição, ser realizada anualmente, bem como propiciar
elementos para saber se as metas e objetivos propostos foram alcançados. Esta avaliação é
importante por possibilitar mudanças e fundamentar as tomadas de decisão dos gestores,
visando a melhoria de todos os processos escolares, tanto pedagógicos como administrativos.
Já a avaliação institucional externa, de acordo com o Parecer, é realizada por órgãos
superiores dos sistemas educacionais, nos quais os instrumentos de aferição são:
[...] pesquisas, provas, tais como a do SAEB, Prova Brasil, ENEM e outras
promovidas por sistemas de ensino de diferentes entes federativos, dados
estatísticos, incluindo os resultados que compõem o Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica (IDEB) e/ou o que o complementem ou o substituem, e os
decorrentes da supervisão e verificação in loco (p.47).
A terceira dimensão, avaliação de redes de Educação Básica, deve ser realizada
periodicamente, por órgãos externos à escola, utilizam-se dos resultados da avaliação
institucional e expõem para a sociedade os parâmetros de qualidade da escola e se estes estão
de acordo para o seu funcionamento.
Em relação às avaliações institucionais externas, Dalben (2012) explicita que, no
Brasil, as avaliações sistêmicas ou de larga escala “fornecem” subsídios que induzem as
políticas públicas no campo educacional. No entanto não é possível pensar essas avaliações
sem entender o processo político do país, a partir da década de 1990, quando se intensificou a
implementação de políticas de influência neoliberal, sobretudo no que diz respeito às
privatizações e consequente criação de agências reguladoras dos produtos e serviços
oferecidos pela iniciativa privada. No campo educacional o Estado brasileiro criou
mecanismos para controlar e induzir a melhoria da qualidade da educação. Dentre estes
mecanismos o que mais ganhou visibilidade foi a avaliação sistêmica, cujos resultados vem
sendo utilizados mais para a prestação de contas à sociedade do que para induzir a melhoria
da qualidade do ensino no Brasil. Como nos esclarece Afonso (2000):
[...] alguns importantes líderes do mundo empresarial apoiaram a criação de normaspadrão e das provas de avaliação em nível nacional, de modo a viabilizar o que
consideram ser duas peças fundamentais para a reforma educativa: a prestação de
contas (accountability) e a competição entre escolas (p.68-69).
De acordo com Afonso (2000) “O Estado não pode deixar de ser integrado como um
elemento chave na análise das políticas educativas” (p.95). O Estado Avaliador busca um
controle central dos resultados da educação, mas todo o processo de ensino é descentralizado.
O Estado importa-se apenas com o produto final, com essa política de descentralização o
Estado diminui seu compromisso e suas responsabilidades perante a sociedade, culpabilizando
as instituições pelos seus fracassos. Um dos pressupostos do Estado Avaliador é a exigência
da competitividade internacional, buscando-se altos índices da educação para competir no
mercado. Entendemos aqui Estado Avaliador como nos descreve Afonso (2000)
A partir da década de oitenta o interesse demonstrado pela avaliação, sobretudo por
parte de governos neoconservadores e neoliberais começou a ser traduzido na
expressão “Estado Avaliador” (cf. Neave, 1998; Henkel, 1991 b; O’ Buachalla,
1992; Hartley, 1993). Esta expressão quer significar, em sentido amplo, que o Estado
vem apontando um ethos competitivo, neo-darwinista, passando a admitir a lógica
do mercado, através da importação para o domínio público de modelos de gestão
privada, com ênfase nos resultados ou produtos dos sistemas educativos (p.49).
O Parecer CNE/CEB Nº 7/2010 apresenta diversas indagações quanto aos métodos de
avaliação externa vigentes no país, fundamentado em críticas da Câmara de Educação Básica
do (CNE)62, dentre outras instâncias acadêmicas:
[...] O sistema de avaliação aplicado guardaria relação com o que efetivamente
acontece na concretude das escolas brasileiras? Como consequência desse método
de avaliação externa, os estudantes crianças não estariam sendo punidos com
resultados péssimos e reportagens terríveis? E mais, os estudantes das escolas
indígenas, entre outros de situações específicas, não estariam sendo afetados
negativamente por essas formas de avaliação?
O referido documento finaliza afirmando que infelizmente tais questionamentos não
têm promovido alternativas para o aperfeiçoamento das avaliações nacionais.
2 - O CURRÍCULO ESCOLAR EM AÇÃO
O currículo, como aponta Moureira e Candau (2008) tem demandado preocupações de
pessoas ligadas ao campo educacional “autoridades, professores, gestores, pais, estudantes,
membros da comunidade” (p.17). Mas o que vem a ser currículo? Os referidos autores assim
o interpretam:
[...] estamos entendendo currículo como as experiências escolares que se desdobram
em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a
construção das identidades de nossos/as estudantes. Currículo associa-se, assim, ao
conjunto de esforços pedagógicos desenvolvidos com intenções educativas (p.18).
Dessa forma não há como se conceber currículo sem se pensar em conhecimentos
escolares, tendo em vista a estreita relação entre o que se ensina e o que se aprende, bem
como as relações sociais que permeiam o campo educacional propiciando transformações
desejáveis em nossos alunos por meio da construção de valores e identidades sócio-culturais.
Ainda refletindo sobre relações sociais e currículo, o Silva (1999) ressalta que o currículo
constitui-se em um espaço em que se reúnem e se desdobram embates sobre os diferentes
significados do social e do político. “É por meio do currículo, concebido como elemento
discursivo da política educacional que os diferentes grupos sociais, especialmente os
dominantes, expressam sua visão de mundo, seu projeto social, sua “verdade”” (p.10).
Segundo o Parecer CNE/CEB Nº 7/2010, o entendimento do que é o currículo é
descrito como:
[...] é o conjunto de valores e práticas que proporcionam a produção e a socialização
de significados no espaço social e que contribuem, intensamente, para a construção
de identidades sociais e culturais dos estudantes. E reitera-se que deve difundir os
valores fundamentais do interesse social, dos direitos e deveres dos cidadãos, do
respeito ao bem comum e à ordem democrática, bem como considerar as condições
de escolaridades dos estudantes em cada estabelecimento, a orientação para o
trabalho, a promoção de práticas educativas formais e não formais (p.22).
62
(CNE) CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO.
Os autores Moreira e Candau (ano) assim como Silva (ano), tocam em um ponto sobre
o currículo que é relevante neste contexto que é o chamado “currículo oculto”, que, segundo
Silva (ano) diz respeito a aspectos do ambiente escolar apreendidos pelos educandos que não
estão explicitamente destacados no currículo oficial, como, por exemplo, “a forma como a
escola incentiva a criança a chamar a professora (tia, fulana, professora etc.); a maneira como
arrumamos as carteiras na sala de aula (em círculo ou alinhadas); as visões de família que
ainda se encontram em certos livros didáticos” (2008, p.19). O mesmo autor ainda enfatiza
que é necessária uma tomada de consciência dos educadores, de modo a possibilitar alguma
possibilidade de mudança, o que corresponderia a uma maneira de desarmá-lo ou de
desocultá-lo.
Outro elemento de grande relevância no debate sobre o currículo diz respeito aos
componentes curriculares. Com a finalidade de promover o desenvolvimento integral do
cidadão os componentes curriculares estão organizados em áreas de conhecimento, disciplinas
e eixos temáticos, visando o desenvolvimento de habilidades, valores e práticas nos
educandos.
Hoje não é possível falar em currículo sem levar em consideração as diversidades
culturais, nessa perspectiva os autores Moreira e Candau convidam os profissionais da
educação a “pensar e desenvolver currículos para essa escola” (p.30), bem como o resgate de
“manifestações culturais de determinados grupos cujas identidades se encontram ameaçadas,
para a participação de todos no esforço por tornar o mundo menos opressivo e injusto, para a
urgência de se reduzirem discriminações e preconceitos” (2008, p.30). O objetivo maior
citado pelos autores é que os currículos desenvolvidos levem o educando a criticidade da
realidade e do passado, promovendo assim “novas situações pedagógicas e novas relações
sociais” (p.30).
CONCLUSÃO
Para finalizar parece relevante destacar algumas articulações possíveis entre avaliação
na dimensão escolar e o currículo. Uma primeira conclusão que se pode chegar é que o foco
dos processos educativos escolares deve estar centrado no educando, pois dessa forma há que
se ter um “olhar” crítico tanto em relação aos pressupostos do que deve ser ensinado - o que
está no currículo - e se ele corresponde às necessidades daquele educando (cultura, classe
social, regionalidade, etnia, credo etc.), assim como o modo como se avalia a aprendizagem
dos estudantes com vistas a contribuir para que eles superem os seus limites. Para que a
avaliação cumpra esta função pedagógica ela precisa ser mais do que um amontoado de
exames realizados ao final de uma etapa, apenas para cumprir “tabelas” e preencher as
convenções exigidas pela burocracia, cuja principal função é mensurar a “execução”
adequada dos programas de ensino, quase sempre confundidos com o currículo escolar.
É por meio da avaliação entendida como caminho para a superação das dificuldades
que o currículo também deve ser avaliado. Neste sentido é preciso transformar os mecanismos
de avaliação em elementos capazes de contribuir para as reflexões sobre o currículo. Concluise que os desafios que se colocam são grandes e exigem um esforço sistemático e permanente
nos âmbitos epistemológicos, pedagógicos e políticos, bem como de todo o coletivo escolar,
que envolve, além de estudantes e educadores, os pais, os políticos e demais cidadãos
interessados na construção de uma educação de qualidade socialmente referenciada.
REFERÊNCIAS
AFONSO, Almerindo Janela. Avaliação Educacional: regulação e emancipação. São Paulo: Cortez, 2000.
ASSIS, Lúcia Maria de. Avaliação discente sob múltiplos olhares: alguns referenciais teóricos. Revista
AVALIAÇÃO/Rede de Avaliação Institucional da Educação Superior – RAIES – v.8, n.1 mar. 2003.
Campinas/SP.
BRASIL, Ministério da Educação. Resolução CNE/CEB nº 04, de 13 de julho de 2010. Define as Diretrizes
Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica.
______, Ministério da Educação. Parecer CNE/CEB nº 07, de 09 de julho de 2010.
DALBEN, Ângela Imaculada Loureiro de Freitas, Avaliação Sistêmica. Dicionário da Educação Biblioteca
Virtual. Disponível em:
pedagogiaonlineead.blogspot.com/2012/02/avaliação_sistemaica_15html. Acesso em 16/10/2012.
FERNANDES, Claudia de Oliveira, FREITAS, Luiz Carlos. Currículo e Avaliação. In: Indagações sobre
Currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.
LUCKESI, Cipriano Carlos. Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições. São Paulo: Cortez,
2011.
MOREIRA, Antônio Flávio Barbosa, CANDAU, Vera Maria. Currículo Conhecimento e Cultura. In: Indagações
sobre o Currículo. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Básica, 2008.
SILVA, Tomaz Tadeu. O currículo como prática e significação. In: O currículo como fetiche. Belo Horizonte:
Autêntica 1999.
_______Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Belo Horizonte: Autêntica 2001.
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: PERFIL DOS ALUNOS ATENDIDOS PELA
REDE PÚBLICA ESTADUAL DE ENSINO DE URUAÇU – GO
Camila Costa de Oliveira Teixeira Álvares
IFG / MIELT – UEG
Irani Camilo de Souza Silva
Marcilene Dias Bruno de Almeida
IFG / Campus Uruaçu
[email protected]
RESUMO
O trabalho propõe a apresentação dos dados parciais da pesquisa realizada na area da política educacional e
cadastrada ProPPG (Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós Graduação do Instituto Federal de Goiás) sobre o perfil dos
alunos da Educação de Jovens e Adultos atendidos pela rede de ensino da cidade de Uruaçu- GO. Esta procura
detectar as características gerais do grupo de alunos atendidos na modalidade de Educação de Jovens e Adultos
na rede pública estadual do ensino de Uruaçu-GO com objetivo de compreender melhor o perfil deste grupo e
colaborar com a adequação de políticas públicas e ações pedagógicas direcionadas para os mesmos nas escolas
estaduais e no campus do Instituto Federal de Goiás do município de Uruaçu. A pesquisa possibilitará a
construção de banco de dados com informações sobre este público tanto para os profissionais que os atendem
bem como para outros trabalhos de estudos e pesquisas sobre o grupo de jovens e adultos em Uruaçu. Para tanto,
foram aplicadas entrevistas com alunos voluntários de cada uma das turmas das escolas estaduais de Uruaçu-GO.
Até o momento a pesquisa alcançou quatro das cinco escolas que oferecem o curso de EJA (Educação de Jovens
e Adultos). As entrevistas foram aplicadas a partir de questões previamente formuladas e trata de elementos
básicos como gênero, faixa etária, estado civil, trabalho remunerado, renda média, participação no sustento da
família. Até agora, foi possível detectar que há uma predominância do sexo feminino, solteiros com idade média
entre 15 a 25 anos que colaboram com as despesas familiares e se mantêm com uma renda entre 01(um) e
02(dois) salários mínimos. Embora a pesquisa não esteja concluída, temos dados suficientes que nos permitem
algumas constatações para serem apresentadas em evento técnico-científico e corroborar com as discussões das
políticas públicas referentes à Educação de Jovens e Adultos.
Palavras-chave: perfil; jovens e adultos; Uruaçu.
INTRODUÇÃO
A pesquisa que ora desenvolvemos diz respeito às políticas educacionais, tendo como
recorte o perfil básico dos alunos atendidos pela rede pública estadual de Goiás, restringindo
nossa análise na cidade de Uruaçu-GO. Segundo relatório da UNESCO63, as estatísticas
mundiais comprovam que há no mundo cerca de 771 milhões de pessoas com mais de 15 anos
de idade que não sabem ler e escrever, das quais dois terços são de mulheres.
63
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO 2005
Os dados relativos ao atendimento escolar da população de jovens e adultos do Estado
de Goiás revelam um número elevado de pessoas, com 15 anos ou mais, fora da escola, o que
evidencia um quadro socioeducacional que precisa ser revertido.
Segundo dados do (IDH-M) 2000, a taxa de alfabetização de adultos em Uruaçu é
de 0,839 e o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal é de 0,738.
A população atendida pela EJA é, na maioria, jovens e adultos que necessitam
por questões sócio-econômicas e até mesmo pessoais concluirem a educação básica para
chegar aos cursos universitários e se ingressarem no mercado de trabalho. Os jovens fazem
parte da população incorporada à educação de adultos recentemente e que tiveram sucessivas
reprovações ou evasões.
A maioria desses estudantes, como trabalhadores que cumprem jornada de trabalho
integral, têm poucas possibilidades de ingresso e permanência em cursos de Educação de
Jovens e Adultos, que exigem frequência obrigatória, com carga horária diária de até três (3)
horas e meia.
Para essa modalidade de educação, é necessário o desenvolvimento de propostas
pedagógicas compatíveis com as necessidades e características dos vários grupos de estudos
atendidos, pois não basta, apenas, prover essa parcela da população de conteúdos previstos
para o nível de ensino em que ela retoma sua escolarização; ao contrário, torna-se
imprescindível oferecer lhe meios apropriados ao seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Apesar de todo o investimento empreendido pelos órgãos governamentais nos
Programas de Alfabetização de Adultos e ensino fundamental e médio de Educação de Jovens
e Adultos, sabe-se que o maior desafio à erradicação do analfabetismo não é apenas a oferta
de vagas, mas sim convencer o jovem e adulto da importância do processo de alfabetização e
dar condições de permanência na escola, bem como articular políticas públicas que
reconheçam a EJA como um direito dos sujeitos ao longo da vida.
Confirma Henriques,
A procura de jovens e adultos pela escola não se dá de forma simples. Ao
contrário, em muitos casos, trata-se de uma decisão que envolve as famílias,
os patrões, as condições de acesso e as distâncias entre casa e escola, as
possibilidades de custear os estudos e, muitas vezes, trata-se de um processo
contínuo de idas e vindas, de ingressos e desistências. Ir à escola, para um
jovem ou adulto, é antes de tudo, um desafio, um projeto de vida. (2006,
p.08)
Há muito por fazer na educação de Jovens e Adultos, por isso, torna-se fundamental
colocar essa discussão nos centros de debates dos acadêmicos, nas grades curriculares dos
cursos de licenciaturas, nos grupos de estudos dos professores, nos espaços de pesquisas, nos
eventos técnicos-científicos e na elaboração de novas propostas para essa modalidade de
ensino.
Os debates e pesquisas na área de EJA são de suma importância, visto que, tais debates
e pesquisa auxiliam em caminhos mais concretos para essa modalidade de ensino, inserindo a
dinâmica do trabalho e do conhecimento em contextos mais amplos e direcionados ao perfil
do público da EJA, em cada localidade.
Corroborando com essa perspectiva, fez-se a proposta desta pesquisa que consistiu em
detectar os aspectos característicos gerais do grupo de jovens e adultos atendidos pela rede
pública estadual de ensino de Uruaçu – GO possibilitando a compreensão do perfil deste
grupo e auxiliando na adequação de políticas e ações pedagógicas direcionadas a eles, nas
escolas estaduais e no câmpus do Instituto Federal de Goiás no município de Uruaçu .
A pesquisa esta sendo realizada com visitas às escolas da rede estadual. Dentre as 12
escolas constituintes desta rede, cinco oferecem o curso de EJA. A pesquisa aconteceu a partir
de entrevistas com alunos voluntários de cada uma das turmas. Os colaboradores responderam
a questões previamente formuladas. Trata-se de questões básicas (gênero, faixa etária, estado
civil, trabalho remunerado, renda média e participação no sustento da família), tendo em vista
a possível continuidade dos estudos, avançando para aspectos mais substanciais do grupo
pesquisado.
As abordagens foram feitas de forma reservada, com o consentimento do entrevistado
e garantia de não divulgação de seu nome. O registro manuscrito das respostas foi realizado
pelo pesquisador em formulário próprio, a fim de evitar constrangimento do entrevistado
quando este apresentou maiores dificuldades de leitura e escrita ou esteja em fase de
alfabetização.
Para trabalhar as informações coletadas serão seguidas as orientações de
Andrade (2009) que afirma:
A coleta de dados constitui uma etapa importantíssima da pesquisa de
campo, mas não deve ser confundida com a pesquisa propriamente dita. Os
dados coletados serão posteriormente elaborados, analisados, interpretados e
representados graficamente. Depois, será feita a discussão dos resultados da
pesquisa, com base na análise e interpretação dos dados. (p. 139-140)
Entende-se que a análise dos resultados e posterior organização de banco de dados
serão de grande valia tanto para os profissionais que atendem o público da EJA como para
outros trabalhos de estudos e pesquisas sobre o grupo de jovens e adultos em Uruaçu. Como
interesse social, contribui e amplia as pesquisas relacionadas com as políticas públicas
referentes à Educação de Jovens e Adultos.
2- EJA E SUAS BASES HISTÓRICAS, POLÍTICAS E CULTURAIS
O curso de EJA (Educação de Jovens e Adultos), configurado como modalidade de
ensino na atual LDBEN 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional), é
resultante de um processo histórico da luta contra o analfabetismo no Brasil. A primeira
organização formal para este grupo, na época nomeado como supletivo, é da década de 1940
com as primeiras grandes reformas do ensino no país (BEISIEGEL, 2002). A concepção de
suprimir consistia em aplicar ao adulto os mesmos instrumentos pedagógicos utilizados com
as crianças, na perspectiva de repor estudos não efetivados. Esta concepção permaneceu na
primeira LDB 4.024/61 (Lei de Diretrizes Bases) e também na Reforma de 1º e 2º Graus na
Lei 5.692/71.
A política educacional para o supletivo tão somente baseava-se na existência de
pouquíssimas vagas, muitas vezes sequer preenchidas. Não há registro de qualquer
preocupação com preparação específica de professores ou material didático. Além disso, a
política de financiamento para o supletivo – e também EJA - tem sido historicamente tímida,
se comparada com as destinadas a outras modalidades de ensino.
Entre as décadas de 1940 e 1950 o país assistiu a uma forte pressão pela
universalização do ensino fundamental (ROMANELLI,1999), na década de 1990 a expansão
de matrículas no ensino médio mais que dobrou (INEP, 2012) e, atualmente, temos uma
discussão acirrada pela expansão de vagas na educação infantil. Paralelamente a este
contexto, até meados dos anos de 1990, a educação ofertada a jovens e adultos permaneceu
praticamente inalterada.
No caso da educação de pessoas jovens e adultas, o caráter indutor do Estado
é essencial. Diferentemente da educação fundamental regular, onde há
grande consenso social (…) sobre a necessidade de as crianças irem à escola,
além uma forte pressão para que isto ocorra, no caso da educação de pessoas
jovens e adultas é a oferta que estimula a demanda. (HADDAD, 2008 p,
113)
Por outro lado, no contexto internacional, o Brasil compareceu para discussões
a respeito do alto índice de pessoas jovens e adultas fora da escola; analfabetos e
semianalfabetos, excluídos do sistema de ensino no mundo todo. A V Conferência
Internacional sobre Educação de Adultos realizada em Hamburgo (1997) expandiu o
entendimento de educação de adultos para além da ideia de direito social. As discussões e
encaminhamentos ultrapassaram o limite da alfabetização e alcançaram64 o ideal de educação
continuada por toda a vida, não restrita à escolarização e presente nos mais diversos
ambientes (PAIVA, 2009). A EJA passou a ser vislumbrada não mais unicamente como meio
de acesso a trabalho e renda, mas também como espaço de conscientização das pessoas
enquanto cidadãs, imbuídas de direitos e deveres, nos mais diversos espaços sociais, “A
educação ao longo da vida implica repensar o conteúdo que reflita certos fatores, como idade,
igualdade entre os sexos, necessidades especiais, idioma, cultura e disparidades econômicas”
(HAMBURGO, 1997).
Obviamente isso não exime o Poder Público de suas obrigações. Pelo contrário, recai
sobre ele maior responsabilidade porque a escolarização é pensada como o cerne dessa
educação continuada por toda a vida.
No centro dessa transformação, está o novo papel do Estado e a necessidade
de se expandirem as parcerias com a sociedade civil visando à educação de
adultos. O Estado ainda é o principal veículo para assegurar o direito de
educação para todos, particularmente, para os grupos menos privilegiados da
sociedade, tais como as minorias e os povos indígenas. (…) Ele não é apenas
um mero provedor de educação para adultos, mas também um consultor, um
agente financiador, que monitora e avalia ao mesmo tempo. (HAMBUGO,
1997) .
Da Sexta Conferência Internacional de Educação de Adultos (Confintea IV), sediada
no Brasil, em Belém (2009), brotou o documento Marco de Ação de Belém que reafirmou a
concepção de educação continuada por toda a vida e avançou para um comprometimento em
sete eixos fundamentais: alfabetização de adultos; políticas; governança; financiamento;
participação, inclusão e equidade; qualidade; monitoramento da implementação do Marco de
Ação.
Aliados a estes princípios – Declaração de Hamburgo e Marco de Ação de Belém – os
fóruns de EJA, criados em todos os Estados do Brasil a partir de meados da década de 1996,
têm promovido discussões que procuram fomentar a consolidação da EJA como política
pública. Nessa ótica, questões como garantia de financiamento, oferta com qualidade,
64
A Declaração Universal dos Direitos Humanos, proclamada em Paris pela Assembleia Geral da
Nações Unidas (…) grava a ideia de ser a educação necessidade premente, (…) o que até então se
traduzia como direito social passa a ser proclamado como direito humano, estendido a toda pessoa.
(PAIVA, 2009, p 62)
qualificação para os profissionais que atendem os sujeitos da educação de adultos, pesquisas,
entre outras implementações, são imprescindíveis.
O público em geral que busca a modalidade EJA (homens, mulheres, jovens, adultos
ou idosos), são pertencentes de uma mesma classe social. Pessoas de baixa renda, que de
modo geral, consomem apenas o básico para sua sobrevivência e da família. A compreensão
dessa realidade, fez com que Paulo Freie, em 1960, reconhecesse o analfabetismo como uma
questão não só pedagógica, mas também social e política.
Pesquisadoras como Maria Margarida e Jane Paiva65 (2009) insistem na necessidade
de realização de discussões em torno da política pública para a EJA. Para elas, esta política
ainda é muito instável. Um termômetro para percepção desta instabilidade é a questão do
financiamento para EJA, sempre controverso e, de certa forma, negado em alguns casos66.
Os fóruns de EJA procuram ampliar as discussões e alcançar os profissionais que
atendem sujeitos da EJA, estes profissionais enxergam o grupo com um misto de caridade,
preconceito e descrédito, como se a ele não fosse necessário designar o mesmo empenho e
compromisso que às demais pessoas atendidas pelo sistema público de ensino. No 1º EREJA
(Encontro Regional de Educação de Jovens e Adultos) realizado em Porto Alegre, Jane Paiva
afirmou:
As práticas pedagógicas cotidianas que fazem a EJA e a escola é que são o
foco do que eu chamo de meio. (. . .) não importa que nós tenhamos
excelentes populações, clareza de concepções, documentos norteadores
muito objetivos e muito bem definidos porque há um meio colocado da
prática do fazer que ainda nos assusta, porque ele tem sido produtor da
interdição ao direito. (2011)
Com isso, Paiva depõe sobre os contatos pessoais que teve com instituições e
profissionais que, inadvertidamente, guardam uma reserva com relação à EJA. A oferta quase
sempre ocorre em condições precárias e dependente da boa vontade de profissionais que
atuam nos períodos – noturnos em sua maioria – em que os cursos são ofertados. Neste
mesmo evento, Paiva indicou a necessidade de pesquisas sobre a EJA, sobretudo a respeito do
não preenchimento de vagas disponíveis.
Em suma, nota-se necessário projetar novas políticas públicas para a implementação
da Educação de Jovens e Adultos, tanto no que se refere à integração e permanência dessa
65
Membros dos fóruns de EJA de Goiás e Rio de Janeiro, respectivamente.
66
Tanto o Fundef quanto o Fundeb apresentam restrições quanto às verbas para EJA.
população pouco ou não escolarizada às instituições escolares, quanto à melhoria da qualidade
do ensino oferecido. Instrumentalizar as escolas para receber essa demanda a partir do perfil
específico de cada localidade, contratar profissionais qualificados que elaborem projetos
educativos que valorizem de fato essa especificidade e interesse desse público e que articulem
o ensino com o preparo para o mercado de trabalho, a qualidade de vida e a sua realização
enquanto ser humano.
PERFIS PARCIAIS DOS ALUNOS
De acordo com a SRE (Subsecretaria Regional de Educação de Uruaçu) a rede
estadual de ensino público da cidade é composta por 12 unidades. Dentre estas, cinco
oferecem o curso de EJA (Educação de Jovens e Adultos) e o Instituto de Educação, Ciência
e Tecnologia – IFGoiás oferece o PROEJA: Técnico em Informática, e Edificações. Até o
momento a pesquisa alcançou quatro das cinco escolas de Uruaçu que oferecem a modalidade
EJA.
Em um universo de 285 alunos presentes no momento das entrevistas, obteve-se
um total de 80 colaboradores, resultando numa amostra de 28%. Ao todo foram
visitadas 21 turmas de EJA das seguintes instituições.
Escola Estadual Aeroporto (o4 turmas)
ETI – 1º ao 5º ano do Ensino Fundamental/ 6º
ao 9º ano e 3ª Etapa da EJA
Colégio Estadual Bernardo Sayão (04
6º ao 9º ano do Ensino Fundamental e 3ª Etapa
turmas)
da EJA
Escola Estadual Filomeno Luiz de França
2º ao 5º ano do Ensino Fundamental/ 1ª e 2ª
(07 turms)
Etapas da EJA
Escola Estadual Luiz Carlos da Mota (06
2º ao 9º ano do Ensino Fundamental/ 2ª Etapa
turmas)
da EJA.
Dentre os entrevistados constatou-se que 47,5% são do sexo masculino e 52,5% do
sexo feminino.
Em relação à faixa etária dos entrevistados, de acordo com os dados levantados, 42,5%
estão entre 15 e 25 anos, 23,75% entre 26 e 36 anos, 25% entre 37 e 47 anos e 8,75% têm
mais de 48 anos de idade.
Aos alunos da EJA que foram entrevistados perguntamos sobre o estado civil e as
respostas mostram que 43,75% são solteiros, 33,75% casados, 16,25% mantêm um
relacionamento estável, 5% são divorciados e 1,25% são viúvos.
Em relação ao trabalho e a remuneração foram feitas três perguntas. A primeira teve o
intuito de saber quantos deles exercem atividade remunerada e os dados mostram que 76,25%
exercem e, portanto, 23,75% não.
A segunda pergunta foi sobre a participação no sustento familiar e as respostas
apontam que 52,5% colaboram com as despesas domiciliares, 28,75% assumem a maior parte
do que se refere ao sustento familiar e 18,75% não contribuem financeiramente.
A terceira pergunta relativa ao trabalho e remuneração dos entrevistados buscava
mensurar a renda mensal total familiar. De acordo com as respostas dadas a maioria, 45%, se
mantêm com uma renda que varia entre 1 e 2 salários mínimos, 30% de 3 ou mais salários e
25% com até um salários mínimo.
A tabulação das informações presentes nos formulários não foram inteiramente
terminada. Como foi dito anteriormente, a pesquisa alcançou quatro das cinco escolas cinco
escolas que oferecem a modalidade EJA no município de Uruaçu. Além disso, as três últimas
questões do formulário ainda não foram tabuladas, trata-se de questões mais subjetivas e de
múltipla escolha, pareceu mais prático e produtivo realizar esta etapa quando a última escola
for visitada e pudermos contar com todos os formulários dos colaboradores.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dos resultados tabulados até o momento, destacam-se os seguintes apontamentos: I.
Na questão do sexo, dentre os entrevistados notou-se que há uma porcentagem maior de
mulheres, 52,5% que comprova os dados do relatório da UNESCO67, das quais dois terços da
população que não sabem ler e escrever são mulheres. I. Na questão relacionada à faixa etária,
o maior índice é entre 15 e 25 anos, com 42,5% dos voluntários, dado que também remete as
estatísticas mundiais da UNESCO que diz que há no mundo cerca de 771 milhões de pessoas
com mais de 15 anos de idade analfabetas. III. Na questão referente ao trabalho e
remuneração 76,25 % trabalham e 45%b dos entrevistados se mantêm com uma renda que
varia entre 01 (um) e 02 (dois) salários mínimos, que comprova que o público da EJA são
pertencentes há uma classe social de baixa renda. IV. Na questão do estado civil 43,75% dos
entrevistados são solteiros, que pode ser uma nova fonte de informação para associar o perfil
dos alunos da EJA.
Entende-se que ao detectarmos os perfis destes alunos podemos contribuir para
o encaminhamento de reflexão, tanto das políticas, como das condutas pedagógico-didáticas
relacionadas a Educação de Jovens e Adultos. Para todos os Jovens e Adultos devem ser dada
a oportunidade de prosseguir seus estudos, para que se concretize o seu direito de aprender, a
fim de que exerçam, com responsabilidade, os seus deveres de cidadãos ativos e participativos
n mundo nos quais estão inseridos. Essa educação deve promover a compreensão entre
homens e mulheres, a paz e a tolerância entre todos os grupos étnicos e religiosos, o que se
considera essencial para a superação da pobreza e a melhoria da qualidade de vida das
famílias e das comunidades. Esta posição é sustentada pela análise do art. 4º da Lei 9.394/96
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), que consagra o dever do Estado e do
Município com a educação pública a ser efetivado mediante garantia de ensino fundamental,
obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria; oferta
de ensino noturno regular, adequado às condições do educando; oferta de educação escolar
para jovens e adultos, com características e modalidades adequadas às suas necessidades e
disponibilidades, garantindo-se aos que forem trabalhadores as condições de acesso e
permanência na escola.
REFERÊNCIAS
BEISIEGEL, Celso de Rui. A política de educação de jovens e adultos analfabetos no Brasil. OLIVEIRA, Dalila
Andrade (Org). Gestão Democrática da Educação: desafios contemporâneos – Petrópolis, 4ª ed. RJ: Vozes, 2002.
67
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura - UNESCO 2005.
BRASIL. Ministério da Educação. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos,
Parecer nº 11 de 10 de maio de 2000.
_______. Ministério da Educação. Trabalhando com a Educação de Jovens e Adultos: Alunos e Alunas da EJA.
Ricardo Henriques - Secretário da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade.
_______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394, de 24 de dezembro de 1996.
_______ Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 4.024 de 20 de dezembro de 1961.
_______ Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 5.692 de 11 de agosto de 1971.
_______ Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Sinopse Estatística da
Educação Básica (1991-1995 e 1998). Disponível em http://portal.inep.gov.br
DECLARAÇÃO de Hamburgo sobre Educação de Adultos. In. BRASIL. Ministério da Educação (MEC).
Brasília, janeiro/97; V Conferência Internacional sobre Educação de Adultos, Hamburgo, julho/1997.
HADDAD, Sérgio. A educação de pessoas jovens e adultas e a nova LDB. BRZEZINSKI (Org) LDB
interpretada: diversos olhares se entrecruzam. 2ª ed. Revisada – São Paulo: Cortez, 1998 p 111 a 127.
MARCO DE AÇÃO DE BELÉM. In Brasil. Ministério da Educação (MEC). Sexta Conferência Internacional
de Educação de Adultos 2009. Brasília; Resumo Executivo, fevereiro/2011.
PAIVA, Jane. A construção coletiva da política de educação de jovens e adultos no Brasil. Revista Em Aberto
Nº 82, Vol. 22. Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Novembro, 2009,
p 59 a 71.
MACHADO, Maria Margarida. A educação de jovens e adultos no Brasil pós-Lei nº 9.394/96: a possibilidade
de constituir-se como política pública. Revista Em Aberto Nº 82, Vol. 22. Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Novembro 2009 p 17 a 39
ROMANELLI, Otaíza de Oliveira. História da Educação no Brasil (1930/1973). Petrópolis, 22ª ed. RJ: Vozes,
1999.
Subsecretaria Regional de Uruaçu - Unidades Educacionais. Disponível em:
http://subsecretariauruacu.blogspot.com.br
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
EDUCAÇÃO INFANTIL EM CATALÃO (GO): INDICADORES DE ACESSO E
CONDIÇÕES DE OFERTA
Altina Abadia da Silva
Elma Valéria Lopes
Maisa Pires Pacheco
Campus Catalão/UFG
[email protected]
[email protected]
[email protected]
RESUMO
Considerando-se o atual olhar que a legislação vem lançando sobre a Educação Infantil, reflexo das lutas que
buscaram valorizá-la como momento fundamental da formação das crianças, é que entendemos ser pertinente
tomá-la como objeto de estudo. Afinal, se a Educação Infantil hoje é considerada a primeira etapa da educação
básica, estando sob a responsabilidade dos municípios, é importante produzir levantamentos sobre a sua real
situação estrutural e funcional. Com a tarefa de definir responsabilidades e competências para a oferta da
educação brasileira, a Constituição Federal (CF) de 1988 estabeleceu que a educação é um direito social e
definiu a família e o Estado como responsáveis pelo seu provimento. Visando assegurar o cumprimento desse
mandamento e assim garantir ao cidadão o acesso e a qualidade deste atendimento é que faz jus a existência
deste estudo, que visa subsidiar a discussão sobre o atendimento à infância e adolescência na microrregião de
Catalão. Para isso busca compreender e situar as competências e o financiamento das políticas, programas e
ações de âmbito federal, estadual e municipal dirigidos à criança e ao adolescente. Nossos objetivos: 1)
reconhecer as demandas manifesta e reprimida por acesso a partir do detalhamento do número de crianças
matriculadas nas redes pública e privada de Catalão; 2) identificar as responsabilidades e competências para a
oferta de políticas e serviços de educação; 3) relacionar os investimentos públicos realizados em favor da
educação infantil para o período compreendido entre 2000 e 2020; e 4) avaliar o investimento complementar das
famílias e empresas da região com a educação Infantil. Trata-se de um estudo de caráter descritivo e analítico,
centrado em pesquisa de campo e em análise documental. Como fontes de dados, estudos e levantamentos feitos
pelo Inep e pelo IBGE. Outra fonte documental o sitio da SME Catalão/GO. Utilizamos questionários
direcionados às instituições educativas e entidades de proteção dos diretos da criança. Usaremos as estimativas
de crescimento necessário das matrículas da educação infantil, para adequá-las às metas de atendimento
definidas pelo novo Plano Nacional de Educação (PNE, 2011/2020). Este estudo permitirá apontar sugestões de
políticas governamentais, bem como opções e estratégias para aumentar a capacidade de financiamento para a
Educação infantil.
Palavras-chave: Educação Infantil; financiamento; atendimento.
INTRODUÇÃO
Considerando-se o atual olhar que a legislação vem lançando sobre a Educação
Infantil, reflexo das lutas que buscaram valorizá-la como momento fundamental da formação
das crianças, é que entendemos ser pertinente tomá-la como objeto de estudo. Afinal, se a
Educação Infantil hoje é considerada a primeira etapa da educação básica, estando sob a
responsabilidade dos municípios, é importante produzir levantamentos sobre a sua real
situação estrutural e funcional. Com a tarefa de definir responsabilidades e competências para
a oferta da educação brasileira, a Constituição Federal (CF) de 1988 estabeleceu que a
educação é um direito social e definiu a família e o Estado como responsáveis pelo seu
provimento. Visando assegurar o cumprimento desse mandamento e assim garantir ao cidadão
o acesso e a qualidade deste atendimento é que faz jus a existência deste estudo.
O projeto de pesquisa: Perfil da educação infantil em Catalão (GO): indicadores de
acesso e condições de oferta é um subprojeto agregado a um projeto maior intitulado:
Políticas e serviços de atendimento a infância e adolescência na microrregião de Catalão (GO)
que congrega os pesquisadores do Núcleo de Estudos e Pesquisa Infância e Educação –
NEPIE – CAC/UFG, e visa subsidiar a discussão sobre o atendimento à infância e
adolescência na microrregião de Catalão. Para isso busca compreender e situar as
competências e o financiamento das políticas, programas e ações de âmbito federal, estadual e
municipal dirigidos à criança e ao adolescente, especialmente nas áreas da saúde, educação,
lazer e cuidados. A análise volta-se também para alguns desafios apontados pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA), sobretudo aqueles relativos a sugestões e estratégias de
atendimento e financiamento para a ampliação dos gastos destinados à infância e
adolescência.
Um dos objetivos específicos desse projeto 'guarda-chuva' se desdobrou no projeto de
pesquisa ora apresentado, cujos objetivos são: 1) reconhecer as demandas manifesta e
reprimida por acesso a partir do detalhamento do número de crianças matriculadas nas redes
pública e privada de Catalão; 2) identificar as responsabilidades e competências para a oferta
de políticas e serviços de educação; 3) relacionar os investimentos públicos realizados em
favor da educação infantil para o período compreendido entre 2000 e 2020; e 4) avaliar o
investimento complementar das famílias e empresas da região com a educação Infantil. Tratase de um estudo de caráter descritivo e analítico, centrado em pesquisa de campo e em análise
documental realizado por pesquisadores de iniciação científica junto de seus orientadores.
Como fontes de dados, nos valemos de estudos e levantamentos feitos pelo Inep e pelo IBGE.
Outra fonte documental será o sitio da Secretaria Municipal de Educação de Catalão/GO.
Quanto ao campo, utilizamos questionários direcionados à instituições educativas e entidades
de proteção dos diretos da criança. Pretende-se usar as estimativas de crescimento necessário
das matrículas da educação infantil, para adequá-las às metas de atendimento definidas pelo
novo Plano Nacional de Educação (PNE, 2011/2020).
Este estudo permitirá apontar sugestões de políticas governamentais, bem como
opções e estratégias para aumentar a capacidade de financiamento para a Educação infantil,
buscando responder à pergunta sobre a necessidade de revisão da política governamental de
atendimento à infância.
CONTEXTUALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE CATALÃO
O município de Catalão está localizado ao extremo sudeste do Estado de Goiás;
Situada ás margens da BR – 050, responsável pela ligação de Brasília ao Centro-sul; A
Rodovia GO – 352 liga o município á capital do Estado; A base mais forte da economia é a
Agricultura, seguida da Pecuária e nos últimos anos há um forte crescimento no número de
médias e grandes empresas Multinacionais do setor de Mineração, Beneficiamento e
Armazenamento de grãos, Automotiva e Máquinas Agrícolas. De acordo com dados do censo
referentes ao ano de 2010 a população total é de: 86.647 habitantes e seu PIB recenseado em
2008 é de mais de 4, 348 bilhões de reais. Os números referentes a demanda do atendimento
aos anos iniciais, são os seguintes:
- Nº Total de Crianças de 0 a 4 anos: 5.223-7 79% da população
- Nº Total de Crianças de 5 a 9 anos: 5.413
- Nº de Crianças Atendidas em Escolas Públicas Educação Infantil: 1.840
- Número de crianças em 2006: 5.455
DIAGNÓSTICO INICIAL DO CAMPO DA PESQUISA
Partindo da legislação que apontava a Educação Infantil sob responsabilidade dos
municípios, fizemos a partir de 2002 um levantamento da situação estrutural e funcional deste
nível de ensino. Deste modo, o objetivo central da pesquisa era analisar a estrutura e o
funcionamento da Educação Infantil na cidade de Catalão/GO. Seus objetivos específicos
foram assim definidos: a) caracterizar o espaço físico/material e organizacional das
instituições; b) identificar o número de profissionais que atuavam na Educação Infantil, bem
como sua formação e nível de escolaridade; c) levantar os indicadores que orientavam o
trabalho pedagógico nas instituições; d) criar um grupo de estudos. Para isso, foram
estipulados tais procedimentos metodológicos: a) levantamento de dados genéricos sobre
Secretaria Municipal de Educação, as instituições, alunos e profissionais; b) visitas e
aplicações de questionários aos diretores das instituições de Educação Infantil; c) aplicação de
questionário exploratório aos professores de Educação Infantil; d) aplicação de um
questionário específico a alguns professores para o levantamento de informações didáticopedagógicas.
Nos primeiros dois anos da pesquisa, foram sistematizados os dados referentes: a) á
estrutura a funcionamento das 16 instituições públicas de Educação Infantil de Catalão-GO;
b) á média de idade, formação e atuação de 65 professores. De posse destas informações,
procedemos ás devidas análises. Tendo como eixo central do trabalho o processo de
municipalização da Educação Infantil em Catalão-GO, foram apresentados e discutidos os
dados quantitativos referentes aos seguintes aspectos:
a)
Oferta de atendimento;
b)
formação/qualificação dos Professores.
Como naquela ocasião o principal objetivo da pesquisa era verificar o processo de
municipalização da Educação Infantil em Catalão, optou-se por delimitar a amostra a todas as
escolas da rede pública de atendimento, que totalizaram o número de dezesseis (16) escolas,
dentre as quais nove (9) eram municipais, quatro (4) estaduais e três (3) conveniadas68. A
partir desses dados, percebe-se que a maioria das instituições de atendimento às crianças de 0
a 6 anos era mantida pelo município, o que indicava que o processo de municipalização
previsto pela LDB estava em curso. Esse quadro é reforçado pelo número de crianças que é
atendido por mantenedora, já que as escolas do município atendiam 74% das 1.840 crianças
matriculadas em creches e pré-escolas de Catalão no período estudado.
Nos demonstrativos dos níveis de formação dos professores havia, apesar da
predominância da formação em Licenciatura em Pedagogia pelos professores, um outro
número significativo que corresponde às habilitações em outras áreas. A despeito das
preocupações iniciais que essa diversidade de formação que caracteriza em grande parte o
perfil profissional dos professores que trabalham nas instituições pesquisadas, se faz
necessário apontar para uma preocupação mais pontual, que é a ausência nos currículos dessas
licenciaturas, de um foco em elementos, contextos e teorias que juntos constituem aquilo que
chamamos de especificidades do trabalho educativo com as crianças menores de 06 anos. É
bem verdade que também os currículos dos cursos de Pedagogia que formaram os professores
investigados na pesquisa, não possuem seu foco na formação do professor especialista ou com
68
No Estado de Goiás, designa-se por Escolas conveniadas aqueles estabelecimentos de ensino
gerenciados por entidades filantrópicas e que se mantém, em parte, com recursos materiais ou
humanos provindos do poder público com base em um convênio instituído entre as partes.
uma habilitação específica para atuar na Educação Infantil, no entanto, é legítimo reconhecer
que se não há nesses currículos uma especificidade nos processos psicológicos e sociais das
crianças de zero a seis anos, foco também nas relações pedagógicas e saberes escolar,
entendendo-os como elementos que, junto com uma consistente formação teórica, criam as
bases para o trabalho educativo.
O momento que se iniciou com a publicação da LDB 9.394/96, de construir as
regulamentações para o funcionamento, gestão, financiamento e prioridades para a Educação
Infantil, é oportuno para pensarmos em que medida a questão da formação e das exigências
que lhe são pertinentes, estão mobilizando os profissionais e pesquisadores que refletem sobre
esse período escolar das crianças, no sentido de garantirmos uma formação mínima que tenha
uma preocupação com as especificidades dos processos característicos das crianças menores
de seis anos, mas que não se perca da consolidação de uma formação que se volta para os
saberes educativos, que perpasse por todas as áreas de fundamentos das diversas ciências,
pelas didáticas e que tenha, na prática refletida e sintetizada a partir dessa formação, seu
universo de trabalho docente comprometido com a elevação dos níveis psicológicos das
crianças atendidas pela instituição.
Apontamos aqui para a necessidade de regulamentação da formação que deve ter o
profissional que trabalha com a criança pequena no Brasil, entendendo que há um tipo de
conhecimento que é específico do professor, dos modos de organização e funcionamento da
escola e esse conhecimento tem, portanto, na escola seu lócus de apropriação pelas crianças,
impossível de se realizar em outro espaço social. O crescente esvaziamento da teoria, grande
responsável pelos altos índices de precariedade das formações iniciais e continuadas, tem
como consequência uma desvalorização, nas relações pedagógicas, dos processos de ensinoaprendizagem que tanto custam às crianças que acabam tendo nas instituições uma rotina
informal de produção dos conhecimentos das mais diversas ciências e os professores uma
perda de sua função e uma consequente negação da importância do conhecimento por ele
acumulado.
De acordo com a Meta 16 do PNE/2011-2020, é plano político garantir a formação
continuada a todos. Mas, como perceber essa efetivação na prática? Sabemos que capacitar
exige investimentos e gastos, e, como também é objetivo da maioria dos municípios e estados
brasileiros promover uma educação com baixo custo, percebe-se poucos esforços nos setores
de formação do profissional. Assim, o professor em pleno século XXI parece estagnar-se
quanto à formação continuada, e o órgão responsável (SME) também não cumpre seu dever.
Enquanto que os vários segmentos da sociedade priorizam o profissional “atualizado”, são
poucos os professores da Educação Infantil que buscam por si mesmos meios e recursos de se
aperfeiçoarem. Abicalil; Cury; Weber (2010) chama de responsabilidade Individual aquela
que compete não exclusivamente aos órgãos públicos, mas também aos professores, que
também têm parcela de responsabilidade de procurar, enquanto profissionais, fazer o melhor.
Nesse sentido, consideramos que muitas descobertas e reflexões ainda poderão ser
feitas a fim de atingirmos nossa proposta de pesquisa. Seguimos acreditando que mudanças
somente são possíveis a partir da reflexão sobre a prática. Portanto, esperamos juntos poder
pensar em alternativas que possam contribuir para a melhoria da qualidade do ensino na
cidade de Catalão/GO, através das trocas de experiências e das reflexões referentes às
políticas públicas na área da educação e no âmbito formação continuada.
As escolas já formaram a tempo, uma cultura colaborativa, em que o trabalho e a
atuação do professor se expressam em uma atitude auto-reflexiva e investigativa, em uma
relação aos resultados de suas ações em sala de aula.
Como consequência desse conjunto de características, intrínseca ao trabalho do
professor, temos verificado, mais acentuadamente nos últimos anos, um crescimento das
iniciativas daquilo que já foi chamado de reciclagem, posteriormente de capacitação e, mais
recentemente (de forma mais adequada) de educação ou formação continuada.
Conforme anuncia (SADALLA, 2008, p. 8), “a formação continuada é a possibilidade
constante de discutir, com interlocutores privilegiados, dimensões escolhidas do trabalho
docente”. Ressaltando as palavras-chaves desse processo: possibilidades constantes e
dimensões escolhidas do trabalho docente, entendendo que professor-interlocutor escolhe as
dimensões que deseja estudar constantemente.
Menezes (1996, p. 159) define a formação continuada como sendo aquela “formação
permanente em um processo continuo que começa nos estabelecimentos de formação inicial e
que prossegue através das diversas etapas da vida profissional dos professores.” Mas, se a
escolha, o desejo a vontade não partir dos professores poucos resultados obteremos nesses
processos.
Para pensarmos a importância da formação continuada nos dias atuais, precisamos
entender que a formação inicial como o próprio nome diz é o inicio da vida profissional
docente conforme nos aponta Lüdke (1996, p.37) na formação inicial é reconhecido
claramente o caráter introdutório, de uma preparação que não pretende ser total, nem abarcar
toda a carreira do professor...”. muitos autores concordam que o tempo de duração do curso
de formação inicial estipulado em média de quatro anos não dê conta de abranger todos os
conhecimentos filosóficos, epistemológicos, didáticos/práticos, sociológicos, econômicos e
políticos necessários à vida de um professor.
Além do pouco tempo de estudo inicial, acreditamos que o professor se faz professor
por meio da docência, entendida como práxis – síntese, teoria e pratica – a agir teoricamente
com base no pensamento teórico pratico, aprende na atividade da docência enquanto atividade
pratica humana que o desenvolve. Nesse sentido caracteriza um processo em longo prazo
impossível ser aprendido em apenas quatro anos.
Para Carrascosa (1996) a formação continuada deve ser entendida como parte da vida
ativa do professor, pois;
A formação de um professor é um processo alongo prazo que não se finaliza com a
obtenção de licenciado (nem mesmo quando a formação inicial recebida tiver sido
da melhor qualidade) isso porque em outra razões, a formação docente é um
processo complexo para o qual são necessário muitos conhecimento e habilidades,
impossíveis de ser todos adquiridos no curto espaço de tempo que dura a formação
inicial. (CARRASCOSA 1996, p. 10)
A Formação Continuada, por nós defendida, não tem o caráter de compensar ou
corrigir desvios de uma formação inicial insuficiente, ruim ou aligeirada acreditamos que ela
se dá no embate da pratica com o pensamento teórico, no confronto das ideias. Assim as
constantes e rápidas evoluções dos conhecimentos, nas diferentes áreas do saber, colocam a
formação do professor em uma posição de continuo, através de estudos e reflexões constantes.
Esse tipo de formação tem por objetivo auxiliar o professor a vencer e ultrapassar as
dificuldades oriundas das transformações culturais e sociais, na busca de melhoria do trabalho
docente.
O grande desafio da formação continuada esta no seu germe, na origem desses cursos
e o contexto em que surgiu, a forma que se constituíram ao longo da história. Elencamos três
fatores preponderantes que nessa questão.
O primeiro é que, a formação continuada não surgiu com o foco de estudo permanente
necessário a vida do professor como entendemos hoje, a formação continuada surgiu para
formar os professores que já atuavam e não tinha qualificação. Segundo, para atender uma
grande demanda de professores em curto tempo, projetados pelo governo cursos rápidos em
forma de pacotes, desencadeando o terceiro ponto caracterizado são cursos prontos, sem o
menor sentido/significado prático para o professor.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Compreender esse universo de desafios enfrentados pelos professores da Educação
Infantil junto às políticas públicas de educação não parece tarefa fácil ou agradável. Se de um
lado temos um professor oprimido pelos baixos salários, com carga horária abusiva, péssimas
condições públicas de trabalho e desacreditando no seu papel de agente transformador da
realidade; do outro temos uma política governamental que mede a qualidade do ensino, que
promove cursos de formação aligeirados, que desvaloriza o profissional da educação com um
“teto” salarial insuficiente e que, acima de tudo, não oferece as mínimas condições de
trabalho. Entendemos que tudo isso, de forma conjunta, tem causado um profundo incômodo
na categoria docente. Seja em qualquer nível de ensino: O Infantil, o Fundamental ou
Superior, vivemos à mercê dos caminhos econômicos e políticos trilhados pelo país.
Como bem sabemos, a educação é fruto dessa disputa por poder, interesses e valores
sociais da nossa cultura. Por isso, os caminhos e os rumos que apontamos a cada dia, seja na
pesquisa ou na criação de leis, também contribuem para formar o discurso próprio da
Educação.
O horizonte da cidadania, da soberania, da pluralidade política, da igualdade, da
liberdade, da autonomia pedagógica, da universalidade do direito à educação, da cooperação
federativa, da obrigatoriedade e da gratuidade do ensino público, com a ampliação da
vinculação de recursos obrigatórios para a manutenção e desenvolvimento do ensino, aliada à
valorização dos profissionais da educação, afirmam princípios importantes, nesse sentido,
consideramos que muitas descobertas e reflexões deverão ser realizadas a fim de atingirmos
maiores resultados no campo educacional. Desse modo, acreditamos que os primeiros passos
e talvez, os mais importantes foram dados, que são as reflexões, discussões, a inquietações e o
desconforto, pois, a partir deles algumas direções serão apontadas.
REFERÊNCIAS
ABICALIL, Carlos; CURY, Carlos Roberto Jamil; WEBER, Silke; entrevista. A Conae e o novo PNE Novos
marcos para a educação. In. Revista Retratos da Escola. Brasília, v. 4, n. 6, p. 11-24, jan./jun. 2010. Disponível
em: <http//www.esforce.org.br>
ANDRÉ, Marli. Pesquisa em educação: buscando rigor e qualidade. Cadernos de Pesquisa. N.113, p. 53. 2001
BAKTHIN, M. Marxismo e Filosofia da Linguagem. São Paulo, Hucitec, 1995.
BRASIL, Ministério da Educação. Plano Nacional de Educação PNE 2001-2010. Disponível em: //www.
Planalto. Gov. br/civil//Leis.2001. Acesso em out 2011.
BECCHI, E e BONDIOLI, A (Org). Avaliando a pré-escola: uma trajetória de formação de professoras. trad:
Fernanda Landucci Ortale e Ilse Carlos de Freitas. Campinas: Autores Associados, 2003.
BRASIL, Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Ministério da Educação e do Desporto,
Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/SEF, 1998. Vols. I, II e III.
CARRASCOSA, Jaime. Analise da formação continuada e permanente dos professores ibero-americanos, in
MENEZES, Luís Carlos de, (org.) Formação continuada de professores de ciências no âmbito ibero-americano.
Autores Associados, Campinas, São Paulo: NUPES: 1996.
CHARLOT, Bernad, A pesquisa educacional entre conhecimentos, políticas e práticas: especificidades e desafios
de uma área de saber. Revista Brasileira de Educação, v. 11, n.31. Jan./abr. 2006.
CRUZ, M. N. Palavras e Gestos no Jogo Interativo: um estudo dos processos de significação no cotidiano de um
berçário de creche. Dissertação de Mestrado. Campinas, UNICAMP, 1995.
FONTANA, R. A. C. Mediação Pedagógica na Sala de Aula. Campinas, Autores Associados, 2000.
FORMOSINHO, Júlia de O. (Org.). Modelos curriculares para a Educação da Infância. Portugal, Editora Porto:
1998.
GOES, Mª. C. R. A abordagem microgenética na matriz historico-cultural: uma perspectiva para o estudo da
constituição da subjetividade. Campinas, SP: Caderno Cedes, nº 50, abril, 2000, p.09 – 22.
JOBIM e SOUZA, S. Linguagem, consciência e ideologia: conversas com Bakhtin e Vygotsky. In: Oliveira, Z.
M. R. (org.) A criança e seu Desenvolvimento - perspectivas para discutir a educação infantil. SP: Cortez, 1995.
KRAMER, S. A política do Pré-escolar no Brasil: a arte do disfarce. São Paulo, Cortez, 2003.
LEITE, Mª., Isabel. Nem fase de grafismo, nem exercício psicomotor: o desenho como espaço de produção
cultural de crianças. In: MACHADO, Mª., L. de A. (org.) Encontros e Desencontros em Educação Infantil. São
Paulo: Cortez, 2002, p. 268-274.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. D. A. Pesquisa em Educação: Abordagens Qualitativas. Editora Pedagógica e
Universitária LTDA. São Paulo, EPU, 1986.
MACHADO, M. L. de A (Org). Encontros e desencontros em educação infantil. São Paulo: Cortez, 2002.
MENEZES, Luís Carlos de, (org.) Formação continuada de professores de ciências no âmbito ibero-americano.
Autores Associados, Campinas, São Paulo: NUPES: 1996.
MOSS, Peter. Reconceitualizando a infância: crianças, instituições e profissionais. In: MACHADO, Maria Lucia
de A. (org.). Encontros e desencontros em educação infantil. São Paulo: Cortez, 2002. p. 235-248.
NUNES PINTO, R. Civilidade, corpo e escolarização da criança: o legado de Descartes e Rousseau. In: Revista
Poiésis. Catalão/GO Vol. I Nº 1 jan./dez. 2003.
OLINDA, E. M. B. de. O conceito de formação integral no projeto formativo moderno: aprendendo com a
experiência cearense. In. ________. (Org.). Formação Humana: liberdade e historicidade. Fortaleza: Editora
UFC, 2004. p. 118-135.
OLIVEIRA, Z. M. R. de. (Org.) Educação Infantil: muitos olhares. São Paulo: Cortez, 2000.
OLIVEIRA, Zilma de Moraes R. Educação Infantil: fundamentos e métodos. São Paulo: Editora Cortez, 2002.
PINO, A. Editorial. Educação e Sociedade. Campinas, Cedes n. 71, 2000.
ROCHA, M. Sílvia P. M. L. da. O real e o imaginário no faz-de-conta: questões sobre o brincar no contexto da
pré-escola. In: GÓES, Mª. Cecília R. de & SMOLKA, Ana Luiza B. A Significação nos Espaços Educacionais:
interação social e subjetivação. Campinas. Papirus, 1997.
SADALLA, Ana Maria F. A. Apresentação. In Formação Continuada, Interdisciplinaridade e inclusão social.
MENDONÇA, M. R (Org.). Catalão: UFG-CAC, 2008.
VYGOTSKY, L. S. A Formação Social da Mente. São Paulo, Martins Fontes, 1994.
______ Pensamento e Linguagem. São Paulo, Martins Fontes, 1991.
______ Manuscrito de 1929. Educação e Sociedade. Campinas, Cedes n. 71, 2000.
VYGOTSKKY, L.S.; LURIA, A.R. e LEONTIEV, A.N. Linguagem, Desenvolvimento e Aprendizagem. São
Paulo: Ícone-Ed. USP, 1988.
WAJSKOP, Gisela. Brincar na Pré-escola. São Paulo: Cortez, 1999.
ZABALSA. A. Miguel. Qualidade em Educação Infantil. Porto Alegre: Artmed Editora, 1998.
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
ENSINO SUPLETIVO EM GOIÁS
Danielly Cardoso da Silva
Prof. Dra. Maria Margarida Machado (Orientadora)
Faculdade de Educação/UFG
Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq
[email protected]
RESUMO
A Educação de Jovens e Adultos é um direito constitucional assegurado pela Constituição Federal de 1988 e pela
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional LDBEN 9.394/96. Trata-se de um direito construído
historicamente num processo de lutas pela expansão da educação a todos independente de sua idade ou condição
econômica. Considerando essa lógica do direito adquirido, este trabalho apresenta os resultados da pesquisa de
iniciação científica intitulada Análise do Ensino Supletivo em Goiás no período de 1971 a 1996, com o objetivo
de localizar a documentação específica que registra o atendimento da população adulta pelo Ensino Supletivo em
Goiás na rede de ensino estadual. Esta pesquisa encontra-se vinculada ao Projeto Centro Memória Viva (CMV) –
Documentação e Referência em EJA, Educação Popular e Movimentos Sociais; que tem por objetivo localizar,
tratar, organizar e analisar a documentação que permite compreender a história da Educação de Jovens e Adultos
(EJA) no Estado e Goiás. Tendo em vista a dificuldade de acessar essa documentação, a pesquisa pretende
disponibilizar o que foi encontrado em ambientes virtuais, como o Banco de Dados do CMV, que possibilita o
acesso de outros pesquisadores às fontes localizadas. Inicialmente, foi realizado um estudo sobre o processo
histórico da EJA, apresentando uma contextualização histórica em âmbito nacional e estadual a fim de
compreender o processo de constituição desse modelo de educação, com um recorte específico para a proposta
do Ensino Supletivo da década de 1970. Utilizou-se como metodologia a pesquisa documental, analisando a
documentação nacional e estadual, estabelecendo relações entre os projetos educacionais nesses dois níveis. Para
complementar as informações presentes na documentação, procurou-se estabelecer contato com uma escola
averiguando como foi na prática o processo de implementação do Ensino Supletivo. Dentre os resultados
alcançados destaca-se a experiência do Centro de Estudos Supletivos do município de Aragarças, atual Centro de
Educação de Jovens e Adultos. Aspecto constatado na reprodução integral da legislação nacional no relatório de
atividades do Departamento Supletivo. A partir das experiências levantadas, percebe-se que o público que
buscava o Supletivo foi se diversificando no decorrer do tempo. Inicialmente eram pessoas mais velhas acima de
quarenta ou cinquenta anos, posteriormente passaram a buscar os exames e cursos pessoas mais jovens incluindo
adolescentes que evadiam da escola regular. Quanto ao perfil sócio econômico, este ia desde as classes
trabalhadoras às famílias com melhores condições, mas a principal motivação era a necessidade de qualificação
para o mercado de trabalho.
Palavras-chave: educação de jovens e adultos; ensino supletivo em Goiás; política educacional.
INTRODUÇÃO
Este texto apresenta as considerações da pesquisa intitulada Análise do Ensino
Supletivo em Goiás no período de 1971 a 1996, prevista para o período de agosto de 2012 a
julho de 2013. Esta pesquisa foi desenvolvida para dar continuidade ao projeto desenvolvido
no ano anterior (2011-2012) denominado Documentação da Educação de Jovens e Adultos na
Secretaria de Estado da Educação de Goiás no período de 1940 aos dias atuais, vinculada ao
Projeto Centro Memória Viva – Documentação e Referência em EJA, Educação Popular e
Movimentos Sociais. Este tinha por objetivo localizar, tratar, organizar e analisar a
documentação que continha a memoria e a história da Educação de Jovens e Adultos (EJA) no
Estado de Goiás, tendo em vista a dificuldade de acessar essa documentação e a possibilidade
de disponibilizar o que foi encontrado em ambientes virtuais, que se encontra em fase de
conclusão.
No primeiro ano de pesquisa (2011-2012), os resultados alcançados motivaram a
continuidade do projeto com destaque para a assinatura do termo de cooperação estabelecido
junto ao Conselho Estadual de Educação (CEE). Este termo possibilitou acesso a uma grande
quantidade de resoluções e pareceres do CEE, nas quais se identificou como tema central o
Ensino Supletivo, principalmente no material da década de 1970/80. O Supletivo tinha por
objetivo:
O Ensino Supletivo visa proporcionar ao aluno a possibilidade para “recuperar-se”
em estudos não realizados. Destina-se, portanto, aos que não iniciaram, ou não
completaram, em idade hábil, a escolarização regular, bem como àqueles que
necessitam de atualização de seus conhecimentos. (BOYNARD, GARCIA e
ROBERT 1975, p. 103)
No sentido de dar continuidade a pesquisa iniciada buscou-se identificar na
documentação os sentidos das ações desenvolvidas com a denominação de Ensino Supletivo.
A princípio apresentam-se as reflexões provenientes dos estudos de aprofundamento teórico
metodológico, seguido dos principais resultados alcançados e as considerações acerca do que
foi apreendido no período de trabalho indicado.
O ENSINO SUPLETIVO: REFLEXÕES ACERCA DA CONTEXTUALIZAÇÃO
HISTÓRICA
Para entender como o Ensino Supletivo se constituiu em seu contexto histórico
específico (década de 1970) foi necessário realizar leituras que abrangessem períodos
anteriores, a fim de compreender o contexto histórico na íntegra evitando concepções parciais.
Para isso, foram estudados e discutidos autores como Paiva (2003), Beisiegel (1974), Lemme
(2004) e Lourenço Filho (2000); esses autores fazem um histórico da educação de adultos em
âmbito nacional desde o período colonial. Para compreensão do contexto específico do Estado
de Goiás os estudos centraram-se sobre Machado (1997, 2002), Rodrigues (2000, 2008) e
Bretas (1991).
O Ensino Supletivo no Brasil surgiu, oficialmente como proposta educacional prevista
em Lei, no contexto da Ditadura Militar, no início da década de 1970. Anteriormente a
implantação desse modelo educacional, destinado ao atendimento educacional aos jovens e
adultos em situação de defasagem escolar, nota-se em todos os campos da sociedade brasileira
profundas transformações no período das décadas de 1940 a 1960. A nomenclatura suplência
já era utilizada desde o final da década de 1930 enquanto denominação destinada à função das
classes de educação de adultos, pois segundo Lourenço Filho (2000) era necessário suprir o
adulto do conhecimento ao qual este não teve acesso.
O termo Ensino Supletivo, enquanto denominação específica ao atendimento
educacional destinado aos adultos passa a ser utilizada a partir da Lei 5.692/71, referindo-se à
intencionalidade política, uma proposta duradora para além daquele contexto governamental
uma política pública nacional, que diz respeito a um atendimento com características próprias,
particulares que, neste caso, refere-se ao atendimento educacional da população jovem e
adulta.
É notório que a partir da década de 1970, predominou em âmbito educacional, a
perspectiva de desenvolvimento, pautada na formação aligeirada, com a finalidade de
fortalecer a economia industrial urbana, na medida em que educava os adultos que serviriam
de mão de obra a indústria nacional. O desenvolvimento industrial fez com que um grande
contingente populacional migrasse do campo para a cidade. No entanto, esse movimento
migratório não era uma preocupação dos governantes, muito menos lidar com os problemas
relativos a este, como a falta de escolas e trabalho a essa população. Percebe-se que as
alterações na vida econômica pós década de 1960 acarretam mudanças nos comportamentos
sociais e segundo Haddad (1991) acabam por criar novas necessidades. A vida na cidade
demanda algumas exigências, os governos que se instauram nesse período apresentam uma
tendência populista a fim de conquistar o eleitorado. Isso por que:
Em consequência das reformas educacionais e da incorporação do voto feminino,
os índices de participação eleitoral, em declínio desde fins do Império – quando os
analfabetos foram excluídos do direito de votar –, aumentaram sensivelmente. Por
volta de 1945, além de mais numerosos do que nunca, os eleitores brasileiros
também apresentam um perfil mais urbano. (PRIORE e VENANCIO, 2010, p. 262)
Em consonância com o modelo de desenvolvimento do Estado Militar, Rodrigues
(2000) afirma que, a partir da década de 1970 intensifica-se o investimento no Ensino
Supletivo, enquanto concepção de ensino voltado à educação de adultos. Essa valorização
pode ser evidenciada pela destinação de um capítulo exclusivo da Lei 5.692/71 de Reforma do
Ensino de 1º e 2º Graus, que dedicava a este um capítulo específico. Com essa nova legislação
a Supletividade passa a ser compreendida como proposta de educação para adultos. Acerca do
Ensino Supletivo, Haddad (1991) destaca que o supletivo tinha o propósito de contribuir com
o desenvolvimento nacional pelo viés da formação do trabalhador qualificado. De acordo com
a legislação nacional o supletivo visava:
a) suprimir a escolarização regular para os adolescentes e adultos que não a tenham
seguido ou concluído em idade própria;
b) proporcionar, mediante repetida volta à escola, estudos de aperfeiçoamento ou
atualização para os que tenham seguido o ensino regular no todo ou em parte.
(BRASIL, 1971, p.11)
Além dessa lei do ano de 1971, foi publicado em 1972 o Parecer CFE nº 699/72 de 1ºe
2º graus do Conselho Federal de Educação, que leva o nome de seu relator Valnir Chagas, que
estabelecia as funções e a forma de organização do supletivo em território nacional. Este
parecer do CFE introduz as características do Supletivo a partir da trajetória das leis
educacionais que culminaram nas mudanças da Lei 5.692/71. Desde a reforma de Campos e
de Capanema já havia a proposta de realização de exames preparatórios/ certificatórios.
Segundo o Parecer CFE 699/ 71 a procura pelos exames apresentava tendência ao crescimento
na medida em que a empregabilidade no mercado de trabalho exigisse mais qualificação.
Neste sentido, crescia continuamente a procura pelos exames de certificação.
Anterior ao supletivo, a forma de certificação via exames que existia era denominada
Exames de Madureza, que tinham por objetivo “apurar não apenas o conhecimento de
determinadas matérias, rigorosamente isoladas, como a madureza global dos alunos”
(BRASIL, 1972, p. 226). No decorrer do tempo os exames de madureza passaram por
representar uma forma de fugir a escola regular. O conselheiro Valnir Chagas (BRASIL,
1972) afirma neste parecer que a rigorosidade do sistema de seriação representava dificuldade
de acesso a outros níveis de ensino, o que evidenciava o problema da reprovação,
demonstrando a necessidade de possibilitar aos adultos outras formas de alcançar a
certificação exigida.
Era necessário propor uma nova forma de organização para a certificação que
atendesse a demanda da organização política e econômica do Brasil da década de 1970. Este
parecer 699/72 do Conselho Federal de Educação69, escrito em 1972 por Valnir Chagas
69
O Conselho Nacional de Educação, seguindo o modelo de gestão da ditadura militar foi
federalizado. Segundo Arreteche (2002, , apud, Castioni, 2009, p 03) os “Estados federados são
uma forma de dividir o governo verticalmente sobre a mesma população e o seu território”
(CASTIONI, 2009, p. 03), ou seja, a federalização era um instrumento de verticalização do poder,
uma intenção que combina com a proposta de governo do Regime Militar.
apresentava as funções e características do Ensino Supletivo para o território nacional, as
quatro funções básicas eram: suplência, suprimento, aprendizagem e qualificação. Os cursos
oferecidos nessa modalidade se organizariam como estudos sistemáticos, envolvendo relação
direta entre professor-aluno, ou seja, se realizariam na forma presencial. Alguns cursos
previam a formação assistemática via rádio, televisão e correspondência. Havia ainda os
cursos semipresenciais que combinavam a modalidade presencia e a distância. Os cursos
contemplavam as funções de Aprendizagem e de Qualificação.
A Qualificação apresentava como sentido “profissionalizante exigindo, portanto
orientação e acompanhamento sistemáticos” (BRASIL, 1972, p. 231), desse modo essa
função baseava-se obrigatoriamente em cursos não apenas em exames, seu foco era somente a
profissionalização dos sujeitos sem preocupar-se com a educação geral. Aliada a função de
Aprendizagem que compreendia “a formação metódica no trabalho” (BRASIL, 1972, p.203)
essas funções compreendiam a parte de formação profissionalizante muitas vezes feita em
parceria com o Sistema “S” (SENAI, SENAC) ou com outras empresas.
As funções de suplência e o suprimento de acordo com o Parecer CFE nº 699/72
(BRASIL 1972) apresentavam funções semelhantes. O objetivo da suplência era “suprir a
escolarização regular para adolescentes e adultos que não a tenham conseguido em idade
própria” (BRASIL, 1971). Já o suprimento visava “proporcionar, mediante repetida volta à
escola, estudos de aperfeiçoamento ou atualização”. Ambas as funções estavam ligadas a
compensação dos alunos pelo tempo em que ficaram afastados do ensino. Estavam ligadas ao
modelo de Ensino Supletivo, que se manifestava via exames e que apresentava um tempo
livre para a conclusão do estudo ao contrário dos cursos de qualificação e aprendizagem com
períodos letivos pré-estabelecidos. Sendo assim Rodrigues (2000) resumo a lógica do
Supletivo como:
[...] a doutrina de ensino supletivo que se assentava no trinômio: tempo (rapidez de
instalação), custo (aproveitando espaços ociosos), e efetividade (nas metodologias
adotadas sob influência do tecnicismo). (RODRIGUES, 2000 p.43-44)
O Supletivo, a fim de superar o fracasso de investimento do Mobral propunha a
formação aligeirada, aliada a formação profissional que visava alimentar a mão-de-obra da
indústria emergente no Brasil. Segundo Haddad e Di Pierro (2000), o Ensino Supletivo
apresentado nos documentos legais deveriam estruturar-se no Departamento de Ensino
Supletivo (Desu). Esse esquema de departamentalização se reproduziria nos Estados uma
forma de manter o controle do governo do contexto de implantação do Supletivo sobre as
ações desenvolvidas. Era função do Desu “coordenar o desenvolvimento de todas as
atividades de educação de adultos em nível nacional, visando, sobretudo, à sua expansão
integrada com outras agências” (HADDAD, 1991, p. 106).
Essa era uma forma de manter as ações dos Estados em consonância com as
intencionalidades definidas nacionalmente pelo Desu. Segundo Haddad (1991) as ações
relativas à educação de jovens e adultos ficou a cargo do Desu até meados de 1979 quando o
departamento foi transformado em Secretaria de Ensino Supletivo (SESU).
O ENSINO SUPLETIVO EM GOIÁS: O PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO DA
PROPOSTA
A partir das orientações nacionais o Ensino Supletivo foi implantado no Estado de
Goiás a partir do Ano de 1973. Para compreender como foi esse processo foram feitas análises
a partir das resoluções do Conselho Estadual de Educação (CEE GO), documentos
provenientes da pesquisa de Machado (2002) e entrevistas com profissionais do Centro de
Educação de Jovens e Adultos (CEJA) da Cidade de Aragarças, que foi criado com o nome de
Centro Supletivo de Aragarças ao final da década de 1980.
Com a promulgação da legislação nacional, levanta-se a hipótese que houve um
intervalo de tempo de dois anos para a preparação nos estados de modo que em Goiás o
primeiro documento que propõe as normativas para o Ensino Supletivo no Estado data de
1973, a resolução nº 993, de 20 de fevereiro do corrente ano, fixando as normas do supletivo a
partir da lei nº5.692/71, publicada pelo Conselho Estadual de Educação. A resolução previa
que o supletivo seria uma forma de dar prosseguimento aos estudos de 1º ou 2º grau, somente
para os maiores de 18 e 21 anos respectivamente.
Anterior a isso, segundo Machado (2002), o Departamento de Ensino Supletivo (Desu)
foi criado pelo Decreto nº 281/71 da Secretaria da Educação e Cultura do Estado de Goiás
para ser o órgão responsável por todas as atividades relativas à implantação do supletivo em
Goiás em conformidade com a legislação nacional do mesmo ano de criação do departamento.
Sendo assim, Machado (2002) declara que o recém-criado departamento passou a ser o
responsável por todas as funções antes coordenadas pelo Serviço de Educação de Adultos, que
desde a década de 1940 era o responsável pelos cursos noturnos, esse órgão encontrava-se
anteriormente vinculado ao Departamento de Ensino Primário.
O Ensino Supletivo era apregoado pelo Desu como uma forma de garantir aos que não
tiveram condições de prosseguir ou iniciar seus estudos o direito a uma formação. De acordo
com as proposições postas no Relatório do Primeiro ano de atividades do departamento
(GOIÁS, 1973), era prioridade estabelecer vínculo com a formação para o mercado trabalho,
alimentar as necessidades das indústrias. Essa perspectiva evidenciada visava formar em nível
técnico, profissionais capacitados para ocupar colocações específicas no mercado de trabalho,
geralmente sujeitos que já estivessem inseridos em um ambiente determinado, tendo em vista
que a grande maioria buscava qualificar-se para encontrar uma colocação mais rentável. Neste
sentido, a concepção de aluno presente na documentação era:
O tipo especial de aluno é, sem dúvida, o cidadão com mais de 14 anos que por
deficiência própria — física, mental ou econômica — ou por deficiência do sistema
de ensino ou do ambiente cultural, não esteve na escola de 1º grau, ou não
completou suas oito séries. (LIBÂNEO, 1976, p.38)
De modo geral, os documentos do Desu apresentavam como principal objetivo do
departamento “atender, de forma mais efetiva, a adolescentes e adultos com atraso ou
deficiência de escolarização regular” (GOIÁS, 1973, p. 129) expandindo assim as ações do
Departamento de Ensino Supletivo. Todas as ações realizadas pelo Desu previam
subordinação com Desu/MEC que era o órgão federal responsável, estava previsto, portanto a
instalação de Centros de Estudos Supletivos (CES), ou seja, centros especializados com
equipe destinada somente ao atendimento dos jovens e adultos que buscavam a qualificação
nesses centros.
Seguindo as normativas do CEE GO, os exames aconteceriam sempre no mesmo dia e
horário em todas as unidades designadas como locais de prova, estas seriam elaboradas por
uma equipe do Desu de acordo com o programa definido pela própria secretaria. Ainda
poderia ser cobrada uma taxa para a realização dos exames, que no ano de 1973 foi fixada no
valor de Cr$ 15,00 cruzeiros por disciplina. O pagamento deveria ser realizado pelo candidato
de modo que também deveria apresentar os seguintes documentos: carteira de identidade,
quitação de serviço militar (somente para os homens), comprovante de participação nas
eleições e duas fotos no tamanho 3X4. Sendo assim o candidato que naquele ano, por
exemplo, resolvesse realizar o exame para todas as disciplinas do primeiro grau deveria pagar
o equivalente a Cr$ 135,00, o que naquele ano representava o valor de quase a metade do
salário mínimo70. Essas taxas eram fixadas pelo Conselho Estadual de Educação (CEE) sendo
a primeira datada de 19 de janeiro de 1973.
Apesar dos objetivos postos na documentação nota-se que as propostas do Desu
apresentavam críticas. O Ensino Supletivo, segundo Rodrigues (2000), apresentava-se como
uma formação aligeirada, a aprovação nos exames estava pautada no sucesso individual dos
70
No ano de 1970 o salário mínimo apresentou o valor entre Cr$ 268,00 e Cr$ 312,00, fonte:
http://www5.jfpr.jus.br/ncont/salariomin.pdf (Acesso em 22/01/2013)
alunos nem sempre em condições de fazer uma boa prova e conseguir a aprovação. Em
síntese a prática pedagógica desenvolvida nos CES era da seguinte forma:
A Prática Pedagógica dos professores dos CES estava assentada nos módulos
instrucionais, com o atendimento individualizado pelo uso da auto-instrução, sendo
a freqüência não obrigatória. Cabia ao professor facilitar a aprendizagem,
orientando a clientela nas consultas marcadas. Ao término dos módulos o aluno era
avaliado pela instituição internamente e com exames especiais elaborados pelos
sistemas educacionais. Esta forma de conceber o ensino favoreceu o isolamento dos
alunos, contribuindo para a acentuação de uma perspectiva individualista na
formação. No projeto não havia como os educandos relacionarem-se coletivamente
– como um espaço socializador de trocas, de aprendizagens com outras pessoas,
além do professor e voltava-se apenas para “aprendizagem” de instruções
programadas, com vistas a “dar conta” das provas, como forma de obter um
certificado. É importante ressaltar que o próprio Conselheiro Valnir Chagas do
CFE, no Parecer 699, recomendava que progressivamente os exames fossem sendo
substituídos pelo atendimento através de cursos. (RODRIGUES, 2000 p.44)
A fim de conhecer experiências de implantação do Supletivo em Goiás, buscou-se no
decorrer da pesquisa identificar ações desenvolvidas no período da década de 1970 em escolas
que oferecessem cursos e exames supletivos. O objetivo era compreender em que condições
aconteceu essa implantação, as facilidades e desafios no processo. Nesta busca, estabeleceu-se
contato com equipe do Centro de Educação de Jovens e Adultos – CEJA, localizado na
Avenida Getúlio Vargas, n. º 826, Setor Centro Administrativo, na cidade de Aragarças – GO.
O histórico da instituição foi levantado a partir dos documentos cedidos ou
emprestados pela escola, somados as entrevistas realizadas com cinco profissionais da
instituição: professor José Nogueira de Morais (ex-diretor e fundador do CEJA Aragarças)
Professora H.71 (ex-diretora), professora Luzia Maria de Morais Nogueira Yrocha (exsecretária), professor Elmiro de Souza Luz (ex-coordenador) e professora Lourene Pereira
Rêgo (atual diretora). As entrevistas foram realizadas no dia onze de outubro do ano de 2012,
na cidade de Aragarças. Na ocasião foi possível conhecer as instalações da escola e conversar
para além dos entrevistados com o coletivo de professores que compõe o corpo docente da
instituição.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
71
Essa professora não enviou em tempo hábil a conclusão do trabalho o Termo de Cessão da
entrevista concedida, de modo que decidimos ocultar sua identidade a fim de evitar eventuais
constrangimentos justificados pela exposição da mesma.
Durante as leituras, análises e o acesso a documentação até o momento possibilitam
estabelecer algumas considerações acerca do Ensino Supletivo em Goiás. A documentação
acessada mostra que do ponto de vista das ações oficiais, dentre as propostas desenvolvidas
pelo Estado, o Ensino Supletivo uma política de atendimento mantida pela Secretaria de
Estado período de tempo considerado longo, manifestando-se em diferentes formas: cursos,
exames e a qualificação profissional. As entrevistas realizadas no CEJA de Aragarças apontam
para o fato de muitos adultos ainda buscarem na EJA um exame ou um curso de curta duração
que ofereça certificação. O público que buscava essa certificação era diversificado:
[...] nós tínhamos pessoas de mais idade e nível socioeconômico mais elevado, isso
com o tempo foi diminuindo, um dos grandes clientes do supletivo era a policia
civil e policia militar, nos tivemos uma época, tanto nos exames, quanto no estudo
que devido às mudanças, as foram transferidas, então elas vinham desse entorno
todo fazer aqui. (JOSÉ NOGUEIRA, ENTREVISTA, 11/10/2012)
O alunado do supletivo não foi o mesmo todo o tempo foi se diversificando no
decorrer do tempo de atendimento. Embora a existência de cursos semi-presenciais
apresentasse alta procura nota-se que o foco da população centrava-se na certificação via
exame. A alta procura por estes evidencia a carência de propostas destinadas não só ao
público adulto no período anterior como também a falta de acesso ao ensino primário, ou 1º
grau, que a princípio tinha duração mínima de quatro anos passando, a partir das Reformas do
Ensino de 1971, para oito anos. A dificuldade de acesso a educação escolar gerou um
contingente de analfabetos que ao adentrarem na década de 1970 viram nos exames a solução
para uma certificação em curto espaço de tempo.
Apesar dos esforços em divulgar resultados positivos e embora a procura por exames
fosse alta o Ensino Supletivo também apresenta suas críticas. O fato dos programas,
regimentos e exames serem elaborados pela secretaria denota a falta de autonomia das escolas
e professores que sequer tinham acesso ao conteúdo das provas. Na atualidade os exames de
certificação do Estado são realizados somente na Superintendência Regional de Iporá, no
entanto são muitos ainda que buscam na escola de Aragarças para fazer os antigos provões,
“[...] então são pessoas que vem realmente com a finalidade de estar aprendendo. As pessoas
até hoje tem muita confusão até com a denominação, supletivo ou EJA.” (LOURENE
PEREIRA, ENTREVISTA, 11/10/2012).
Devido aos limites postos ao tempo deste estudo é possível ainda apontar
questionamentos futuros como: quais seriam os resquícios do Ensino Supletivo ainda
presentes no contexto atual, bem como em que a EJA de hoje se assemelha as propostas da
década de 1970? Quem eram os que eram aprovados e que relações poder envolveu a
implantação das escolas. Cabe ressaltar que a experiência de Aragarças fica numa localidade
afastada da capital do Estado, de modo que vale a pena identificar outras experiências a fim
de estabelecer relações entres as semelhanças e diferenças encontradas no processo de
implantação do supletivo.
Esta pesquisa não se esgota com a conclusão do projeto, ainda é possível propor
continuidade de mais ações como: a conclusão da classificação e catalogação das resoluções
do Conselho Estadual de Educação de Goiás, entrevistar os sujeitos que não foram localizados
e analisar o que estes têm a dizer da implantação do Ensino Supletivo, principalmente na
Capital do Estado, que ao que parece, era referência para o restante do Estado. Ao fim de um
ano e meio de pesquisa no Projeto Institucional de Iniciação Científica, destaco o quanto as
leituras realizadas, as aprendizagens por meio da pesquisa, da análise de documentos, das
entrevistas realizadas contribuíram para minha formação, possibilitando aprender sobre o
campo da EJA e estabelecer contato com os sujeitos que atuam nesse campo. A experiência de
pesquisa foi motivadora, de modo que tenho interesse em continuar estudando não só a
temática histórica, mas também política e formativa dessa área da educação.
REFERÊNCIAS
BEISIEGEL, C. R. Estado e educação popular. São Paulo: Pioneira, 1974.
BRASIL. Assembléia Nacional Constituinte. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Fixa as Diretrizes e Bases
para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5692.htm>. Acesso em: 20/4/2012 23:40.
______. ______. Parecer nº 699, 6 de julho de 1972. Regulamenta o Ensino Supletivo. Conselho Federal de
Educação. Brasília, 1972.
BRETAS. G. F. História da instrução pública em Goiás. Goiânia, Cegraf/UFG, 1991.
CASTIONI, R. Federalização ou aprofundamento do pacto federativo em educação: os dilemas da não
regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal. Anais XXIV Simpósio Brasileiro de Política e
Administração da Educação e III Congresso Interamericano de Política e Administração da Educação –
ANPAE. Vitória – ES, Agosto 2009.
GOIÁS. Secretaria de Estado da Educação – SEE. 1973. Ensino Supletivo – Atividades do Departamento de
Ensino Supletivo. Goiânia. Cortez, 2005.
HADDAD, S. Estado e educação de adultos (1964-1985). Tese de doutorado, volume 1, apresentada à
Universidade de São Paulo – SP, 1991.
_____; DI PIERRO, M. C. Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, São Paulo,
Anped, n. 14, p. 108-130, mai.-ago, 2000a.
LIBÂNEO, J.C. Aceleração escolar: Estudos sobre educação de Adolescentes e Adultos. Goiânia, 1976.
LEMME, P. Educação Supletiva Educação de Adultos In: Memórias. v. 5 Estudos de educação e destaques da
correspondência . Brasília: Inep, 2004, p. 41-88.
LOURENÇO FILHO, M. B. O problema da educação de adultos. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos,
volume 81, n. 197, janeiro-abril 2000. p. 116-127.
MACHADO, M. M. Política Educacional para Jovens e Adultos: A experiência do PROJETO AJA (93/96) na
Secretaria Municipal da Educação de Goiânia. Dissertação de mestrado. Universidade Federal de Goiás
/Faculdade de Educação. Goiânia, 1997.
_____. A política de formação de professores que atuam na educação de jovens e adultos em Goiás na década
de 1990. Tese de Doutorado . Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, 2002.
PAIVA, V. História da educação popular no Brasil. 6ª. ed. São Paulo: Loyola. 2003.
RODRIGUES, M. E. de C. A prática do professor na educação de adolescentes, jovens e adultos: a experiência
do Projeto AJA de Goiânia-GO. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Educação, Universidade Federal de
Goiás. Goiânia, GO, 2000.
Comunicação Oral
GT 3 - Estado e Política Educacional
INFÂNCIA E EDUCAÇÃO PARA AS RELAÇÕES RACIAIS
Neusani Oliveira Ives
Profa. Dra. Wilma de Nazaré Baía Coelho (Orientadora)
Universidade Federal do Pará – UFPA
[email protected]
RESUMO
A educação infantil vem ganhando força legal no contexto da educação brasileira, como uma etapa da educação
básica que precisa ser valorizada e ofertada às crianças de 0 a 05 anos de idade de forma séria e comprometida.
Abordamos a necessidade da educação para as relações raciais já na primeira etapa da educação básica, na
educação infantil. Objetivo do trabalho é indicá-la como espaço de criação de subjetividades positivas em
relação ao outro e traçar um percurso histórico da educação infantil. O estudo constituiu-se de pesquisa
bibliográfica, consulta de documentos legais e levantamento (estado da arte) realizado junto ao banco de teses e
dissertações da CAPES, utilizamos como descritores: preconceito racial e infância; educação infantil e questão
racial; educação infantil e a Lei nº 10.639/03; pré-escola e questão racial; creche e discriminação racial, como
recorte temporal elegemos o período (2003 – 2013). Como resultado, indicamos que a produção científica em
torno da temática relações raciais e infância ainda é tímida e com ênfase nos processos de discriminação no
âmbito do processo de ensino e aprendizagem, relação de alunos negros e não negros no contexto escolar.
Reconhecimento pela legislação brasileira, da educação em creches e pré-escolas para crianças com menos de
seis anos idade, como direito instituído, inclusive para os negros, indígenas e pessoas com algum tipo de
deficiência. Assim, a pesquisa neste campo temático é necessária e instigante, e a infância é espaço - tempo
privilegiado para promover uma educação com vistas à redução do preconceito, racismo e discriminação. Como
também indicamos a necessidade da escola estar preparada para o trato da questão racial, de modo a contemplar
todas as etapas da educação básica, para que desde a mais tenra idade, já na educação infantil, as crianças
aprendam a lidar de forma positiva com as diferenças a partir do conhecimento e valorização dos povos que
constituem nossa sociedade.
Palavras-Chave: infância; educação; relações raciais.
INTRODUÇÃO
A educação infantil vem ganhando força legal no contexto da educação brasileira,
como uma etapa da educação básica que precisa ser valorizada e ofertada às crianças de 0 a 05
anos de idade de forma séria e comprometida.
A Declaração Universal dos Direitos da Criança, promulgada pela Organização das
Nações Unidas (ONU) em 1959, reconhece a criança como sujeito e com dignidade de
pessoa, instaurando uma concepção de infância como construção social.
No Brasil como marco legal para criação de políticas de valorização da infância
citamos: Constituição Federal (1988); Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (1996); Diretrizes Curriculares Nacionais da
Educação Básica (2010); o Plano Nacional de Educação (2011) e as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação Infantil (2009).
A partir da Constituição Federal de 1988, a educação infantil começa a ganhar
textualmente um novo tratamento, caminhando em direção à superação do assistencialismo
presente nos programas até então desenvolvidos em creches e pré-escolas, representando uma
vitória para a educação infantil, pois reconhece o atendimento em creches e pré-escolas para
crianças de 0 a 05 anos de idade como um direito e dever do Estado, além de dar às
instituições que atendem crianças desta faixa etária um caráter educativo. No entanto,
somente a partir da LDB de 1996 é que o sistema educacional começa a assumir esta
responsabilidade. Mais recentemente esse tratamento é reforçado no art. 5º das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Infantil72 institui que:
A Educação Infantil, primeira etapa da Educação Básica, é oferecida em
creches e pré-escolas, as quais se caracterizam como espaços institucionais
não domésticos que constituem estabelecimentos educacionais públicos ou
privados que educam e cuidam de crianças de 0 a 5 anos de idade no período
diurno, em jornada integral ou parcial, regulados e supervisionados por
órgãos competente do sistema de ensino e submetidos a controle social
(BRASIL, 2009).
A educação infantil brasileira é integrada ao sistema de ensino desde a década de
noventa com a Lei nº 9.394/96 - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, como
primeira etapa da educação básica, subdivida em creche e pré-escola, a primeira para crianças
de até 03 anos (não obrigatório) e a segunda, para crianças de 04 e 05 anos de idade
(obrigatório)73.
Há um descompasso entre o ‘Brasil legal e o Brasil real’, que por um lado a legislação
reconhece direito a todas as crianças; de outro, um panorama de intensas desigualdades entre
as idades e os diferentes segmentos raciais, forte desigualdade econômica e social, sugere
(ROSEMBERG, 2012)
Assim apesar da legislação brasileira assinalar para políticas de direito à educação na
infância, essas na maioria das vezes não contemplam as necessidades dessa modalidade de
72
Resolução CNE/CEB 5/2009. Diário Oficial da União, Brasília, 18 de dezembro de 2009, seção 1,
p. 18, fixando as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil, em que determina
obrigatoriedade de matrícula – frequência na pré-escola para crianças de 4 e 5 anos.
73
Com a criação do ensino fundamental de 9 anos em 2006, a idade prevista para término da préescola foi alterada, passando de seis anos para cinco anos.
ensino, negligenciando aspectos relacionados à qualidade de ensino, condições de trabalho, e
formação de professores.
Para (OLIVEIRA e ABRAMOWICZ, 2010) as pesquisas sobre as questões raciais
apresentam a escola de modo geral, como tendo base conservadora e excludente ao se
pautarem num modelo de currículo denominado “embranquecido” diante da ausência de
conteúdos que possam contribui para que os alunos negros se vejam contemplados, além do
silêncio da equipe pedagógica a respeito das questões raciais.
Tratar da temática relações raciais na infância se mostra promissor no campo da
pesquisa acadêmica. De acordo com os dados disponíveis da PNAD (2009)74 a partir do
campo cor - raça, identifica que nas regiões, Norte e Nordeste, a maioria das crianças e
dos(as) professores(as) de educação infantil são “pretos” e “pardos”. Todavia, a maioria dos
estudos que vêm sendo feitos no Brasil sobre as relações raciais na educação infantil são
provenientes do Sul e do Sudeste, em que as crianças e professoras negras são minoritárias em
determinadas redes de ensino (ROSEMBERG, 2012).
Desse ponto podemos inferir a necessidade da produção do conhecimento acerca dessa
questão, sobretudo nas regiões em que a população pobre e negra, tanto de maior idade,
quanto na fase da infância, é maioria.
O percurso metodológico realizado neste trabalho constituiu-se de pesquisa
bibliográfica, consulta de documentos legais e levantamento (estado da arte) junto ao banco
de teses e dissertações da CAPES75, tendo como descritores: preconceito racial e infância,
educação infantil e questão racial, educação infantil e a lei nº 10.639/03, pré-escola e questão
racial, creche e discriminação racial, tendo como recorte temporal o período 2003 – 2013.
Sendo possível, portanto, apresentar os primeiros resultados da pesquisa em andamento.
EDUCAÇÃO INFANTIL: HISTÓRIA E DIVERSIDADE EM PAUTA
Os estudos sobre a infância têm como pioneiro Philipe Ariés (1960), o qual infere
sobre a modernidade ocidental e a concepção de criança, tomando como referência o período
do final da Idade Média e o século XIX,
74
Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD/IBGE.
75
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior.
Progressivas modificações ocorriam nesse âmbito: a criança, à partida, é
destacada apenas por seu caráter incompleto; por um não ser-adulto. Pouco a
pouco, reconhecida em especificidades que são suas, passaria a ser
observada, paparicada, mimada e, finalmente, amada. Essa longa trajetória,
contudo, teria sido acompanhada por acentuadas mudanças na agremiação
familiar e pelo decréscimo nas taxas de mortalidade infantil, que, por si
mesmas, teriam acentuado o apego dos adultos por suas crianças. A tese de
Ariés consolidava, assim, a suposição de que, desde o século XVI até o
século XIX, teria sido firmada a subjetividade moderna com relação à
infância (BOTO, 2002, p.12).
Para a autora, contrário aos tempos medievais, o mundo moderno traz a preocupação
dos adultos com as crianças, resultando em concepções analíticas, teorias sobre o
desenvolvimento infantil e os colégios.76
Com o advento da construção de sociedade moderna constitui-se o pensamento da
escolarização da criança, denominada educação infantil, fortemente influenciada pela ordem
econômica, no contexto da consolidação da sociedade capitalista, da urbanização e
organização do trabalho industrial.
Mundialmente as pré-escolas serão difundidas a partir da segunda metade do século
XIX, tendo em sua composição: a infância, a maternidade e o trabalho feminino. Elas farão
parte de um conjunto de medidas que conforma uma nova concepção assistencial, assistência
científica, abarcando aspectos como a alimentação e habitação dos trabalhadores e pobres,
conotação de modernidade em vistas à exaltação do progresso e da indústria. (KUHLMANN
Jr, 2011).
A proteção da infância é o motor que, a partir do final do século XIX,
impulsiona em todo o mundo ocidental a criação de uma série de associações
e instituições para cuidar da criança sob diferentes aspectos: da sua saúde e
sobrevivência [...] com as propostas de legislação e de associações de
assistência; da sua educação e instrução– com o reconhecimento de que estas
podem ocorrer desde o nascimento, tanto no ambiente privado, como no
espaço público (KUHLMANN Jr, 2002, p. 464).
O autor sugere que no final do século XIX e início do século XX, a infância e sua
educação integram os discursos sobre a edificação da sociedade moderna. Dessa forma que os
cuidados com a infância tornam-se aspecto a ser considerado no modelo de nação moderna,
com suas políticas sociais e instituições, ganhando espaço privilegiado.
76
No que se refere à busca de compreensão da criança no contexto da modernidade faz-se referência
as ideias pedagógicas jesuíticas e dos clássicos Comenius e Rousseau.
No final do século XX as crianças nas sociedades urbanas, apesar de pequenas, se
mostravam ativas e menos dóceis, necessitando assim de espaços de sociabilidade,
instituições coletivas que complementassem o esforço parental no cuidado/educação da
criança pequena. Assim as instituições de educação infantil passam a ser consideradas
necessárias no processo de interação social entre criança e adulto, não se desvencilharam de
seu caráter histórico, de atividade vinculada à ‘produção humana’, considerada de gênero
feminino, tendo sido principalmente exercido por mulheres (ROSEMBERG, 2012).
No Brasil as primeiras propostas de instituições pré-escolares são datadas de 189977.
Todavia sua ampliação aconteceu a partir da década de 1970 pautada num modelo informal,
alicerçado em um público de professoras leigas, baixos salários, sobretudo na região nordeste,
em que os principais participantes foram e são crianças negras e pobres (ROSEMBERG,
2012).
No que se relaciona à temática relações raciais na infância (ROSEMBERG, 2012)
sugere que há um silêncio por parte dos movimentos sociais sobre a educação infantil no
contexto das relações raciais, evidenciando um desconhecimento dos pesquisadores acerca
dessa questão. Faz crítica à conotação que a legislação educacional tem dado a educação
infantil, deixando-a sem destaque. Ao discutir a identificação de cor/raça e identidade racial
na educação infantil observa até a Conferência de Durban, silenciaram sobre a educação
infantil (ROSEMBERG, 2012, p.33).
No Documento Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais,
lembra Santana78:
É com o outro, pelos gestos, pelas palavras, pelos toques e olhares, que a
criança construirá sua identidade e será capaz de representar o mundo
atribuindo significados a tudo que a cerca. Seus conceitos e valores sobre a
vida, o belo, o bom, o mal, o feio, entre outras coisas, começam a se
constituir nesse período (BRASIL, 2006, p. 31).
A partir dessa leitura confirmamos a necessidade de estudar história e cultura afrobrasileira, assim como a de outros povos, em todas as etapas da educação básica. Chamando a
77
No Brasil as propostas e iniciativas para a infância iniciara desde à década de 1870, ampliando no
regime republicando com o aparecimento de várias associações e instituições, com destaque, (IPAI
–RJ), (KUHLMANN JR, 2002).
78
SANTANA, Patrícia Maria de Sousa. Educação Infantil In: BRASIL. MINISTÉRIO DA
EDUCAÇÃO. Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade. Orientações e
Ações para Educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: SECAD, 2006. (Discussões do GT da
Educação Infantil - Coordenado por esta autora).
atenção para inclusão da educação infantil neste processo, pelo fato de que crianças nessa
faixa etária de 03 a 05 anos de idade, já demonstrarem preconceito, dentre eles o racial.
As crianças aos 04 anos de idade já passaram por processo de subjetivação
que as levaram a concepções já arraigadas no nosso imaginário e na
realidade social sobre o branco e o negro e, consequentemente, sobre as
positividades e negatividades atribuídas a um ou outro grupo social [...] e em
qualquer dimensão o negro tem sido representado de maneira inferior, menor
e subalternizado (ABRAMOWICZ; OLIVEIRA, 2012, p. 56).
As pesquisas dão visibilidade à dimensão racial, contudo numa perspectiva da
denúncia e da indicação, há pouca aproximação entre os campos de estudos sociais sobre a
infância e das relações raciais, resultando em carências neste campo do conhecimento que
devem ser superadas (ROSEMBERG, 2012).
RESULTADOS ALCANÇADOS: PRODUÇÕES ACERCA DAS RELAÇÕES RACIAIS E
INFÂNCIA
Para a realização deste estado do conhecimento selecionamos o portal da CAPES –
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, como sítio de busca.
Utilizamos como descritores: preconceito racial e infância; educação infantil e questão racial;
educação infantil e a Lei nº 10.639/03; pré-escola e questão racial; creche e discriminação
racial. Esses dois últimos não mostraram nenhum resultado, contudo a partir dos demais,
pudemos encontrar produções acerca da temática relações raciais e infância, como descritas a
seguir.
Oliveira (2011) realizou pesquisa participante em uma escola pública municipal de
Fortaleza – CE. Tratou-se de uma proposta de realização de oficinas com alunos e professores
de turmas de infantil ao 5º ano, sobre a Lei Federal nº 10.639/03 como mecanismos de
valorização da cultura negra nessa escola. A dissertação apontou que os alunos reagiram de
forma positiva à introdução de conteúdos sobre as populações africanas e afrodescendentes
em seus saberes escolares.
A dissertação de Silva (2010) que buscou perceber os caminhos que estavam sendo
trilhados para a implementação da Lei federal nº 10.639/03 nas escolas da rede municipal de
ensino de São João de Meriti, nas escolas de Educação Infantil e no primeiro segmento do
Ensino Fundamental. Objetiva identificar como era abordada a questão racial no cotidiano
escolar. Como resultado indicou que a rede de ensino do município pesquisado não
implementou efetivamente a Lei nº10.639/03.
Nestas duas pesquisas o objeto investigado fica em torno tanto da educação infantil
como também no primeiro segmento do ensino fundamental, percebemos uma mistura, a qual
nos faz questionar o que está sendo considerada educação infantil e como é interpretada.
Rosemberg (2012) chama a atenção para o cuidado que se deve ter ao se discutir
educação infantil, de forma que estejam inclusas tanto a creche como a pré-escola, ou seja, as
crianças de 0 a 03 e as de 04 e 05 anos de idade.
O trabalho de Pereira (2006) investigou a ética como conteúdo curricular e práxis de
ensino na educação infantil. A realização do trabalho aconteceu num centro de educação
infantil (CEI), em Campo Grande, Mato Grosso do Sul. Algumas inquietações motivaram a
pesquisa: Por que se ensina ética no CEI?; O que é ensinar ética para o grupo de educadoras?;
Como está estruturado o ensino de ética no CEI?; Como acontece na prática o ensino de
ética?; Quais são as dificuldades enfrentadas?; Como as educadoras resolvem essas
dificuldades?
O trabalho de Oliveira (2004) é um estudo de caso descritivo de natureza qualitativa
relacionada à creche, envolvendo a análise das práticas educativas e o tratamento da questão
racial na faixa etária entre 0 e 03 anos de idade.
A pesquisa de Teles (2010) buscou compreender como as crianças negras estavam
construindo sua identidade e consciência racial e como a prática pedagógica influenciava e/ou
se contribuía de modo positivo ou negativo para esse processo, articulando representações
sociais e relações raciais numa perspectiva da prática pedagógica desenvolvida na educação
infantil.
O trabalho apontou que, desde bem pequenas, as crianças negras vão construindo sua
identidade racial baseada em conceitos negativos sobre os negros, difundidos na escola e na
sociedade como um todo. De forma que as informações negativas a respeito da população
negra são difundidas nas relações sociais, nas conversas cotidianas, nos olhares e também na
falta de representatividade positiva dessa população no ambiente escolar, de tal modo que
desde muito cedo as crianças compreendem e internalizam o ideal de branqueamento.
A pesquisa de Venâncio (2009) se vincula aos estudos brasileiros que analisam de
forma crítica a criação e difusão de formas de hierarquização social (de idade, gênero, raça e
relativos à deficiência) por meio de discursos e imagens veiculadas pela literatura infantojuvenil. No plano teórico, a pesquisa é orientada por essa perspectiva crítica e por
contribuições do interacionismo simbólico, em especial pelos conceitos de identidade social e
de estigma.
A análise proposta operou com a hipótese de que o discurso midiático e o difundido
pelos livros infanto-juvenis e didáticos têm ficado em geral, alheios a apresentação da
diversidade. Venâncio problematizou as personagens apresentadas nas obras que compõem o
acervo do Programa Nacional Biblioteca da Escola - PNBE 2008. Sua pesquisa constatou
ligeira atenuação na frequência de personagens dominantes e subordinados, reiterando
resultado de pesquisas anteriores, verificou - se ainda, de forma aberta ou velada, relações de
subordinação nas tramas desenvolvidas, o predomínio de personagens humanos, do sexo
masculino, brancos, sem deficiência, com alteração somente no que se refere à idade.
Lopes (2008) estudou as relações étnico-raciais entre/para com crianças das séries
iniciais de uma escola de ensino básico no município de Aracruz/ES. Problematizou sobre o
mito da democracia racial, que persiste na sociedade brasileira. Indica que, na escola, as
crianças sentem as marcas deste “mascaramento” quando são submetidas às mazelas do
racismo, dentro de uma instituição que lhes é de direito. Afirma que a escuta das narrativas
dos pequenos atores produz e lapida formas representativas deste cenário. O silêncio dos
sujeitos discriminados se faz perceber ou camuflar, mas sutilmente demonstram o sofrimento
da exclusão. As crianças e as discriminações étnico-raciais como incidentes na violência
escolar, violência tornada invisível por conta da não-escuta dos adultos.
Alexandre (2006) investigou como ocorrem as interações entre alunos negros e não
negros na escola. Realizou um estudo sobre os processos implícitos nas interações escolares.
Constatou que as interações entre os alunos negros e não negros nos diferentes espaços
pedagógicos são permeadas por comportamentos e atitudes discriminatórias banalizadas no
cotidiano escolar, concluindo que as constantes situações discriminatórias a que são expostos
os alunos negros no ambiente escolar resultam tanto em relações tensas e conflituosas como
também comprometem a formação de uma identidade positiva.
Como percussores da discussão relações raciais na infância, indicamos pesquisadores
como Godoy (1996), Dias (1997) e Cavalleiro (1998) na década de 90. Para Cavalleiro (1998)
são questões silenciadas tanto na escola como no seio familiar, resultado do processo histórico
da crença da falsa democracia racial existente no país.
Percebemos que a produção do conhecimento em torno da temática relações raciais e
infância ainda é pouca, e a ênfase é dada aos processos de discriminação no âmbito do
processo de ensino e aprendizagem, relação de alunos negros e não negros no contexto
escolar.
CONCLUSÃO
Reconhecimento pela legislação brasileira, da educação em creches e pré-escolas para
crianças com menos de seis anos idade, como direito instituído, inclusive para os negros,
indígenas e pessoas com algum tipo de deficiência.
Entendimento de que a educação infantil é uma etapa da educação em que deve ser
vista como oportunidade de criação de subjetividades positivas em relação ao outro, tido
como diferente, considerando que os primeiros anos de vida da criança é espaço - tempo
privilegiado para promover uma educação com vistas à redução de preconceito, racismo e
discriminação, haja vista que crianças de faixa etária de 03 a 05 anos já demonstrarem
preconceito, dentre eles o racial.
Diante das discussões aqui privilegiadas entendemos que infância e relação raciais são
categorias instigantes, que carecem maior visibilidade no espaço acadêmico como campo do
conhecimento científico.
Como também indicamos a necessidade da escola estar preparada para o trato da
questão racial, de modo a contemplar todas as etapas da educação, para que desde a mais
tenra idade, já na educação infantil, as crianças aprendam a lidar de forma positiva com as
diferenças a partir do conhecimento e valorização dos povos que constituem nossa sociedade.
REFERÊNCIAS
ABRAMOWICZ, Anete; OLIVEIRA, Fabiana de. As relações raciais e a sociologia da infância no Brasil: alguns
aportes. In: BENTO. Maria Aparecida Silva (Org.). Educação Infantil, igualdade racial e diversidade: aspectos
políticos, jurídicos, conceituais. São Paulo: Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades –
CEERT, 2012.
ABRAMOWICZ; Anete; OLIVEIRA, Fabiana de; RODRIGUES, Tatiane Cosentino. A criança negra, uma
criança e negra. [S.l.: 20--] Disponível
em:<http://www2.cndp.fr/revueVEI/158/varia_en_ligne_A_CRIANCA_NEGRA.pdf>.Acessoem: 14/09/2012.
AFONSO, L. Gênero e processo de socialização em creches comunitárias. In Cadernos pesquisa, n. 93, [S,l.],
1995, p.12-21.
ALEXANDRE, I. J. Relações raciais: o explícito e o implícito nas interações entre alunos em uma escola
pública. 2006. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Cuiabá. 2006.
BENTO, Maria Aparecida Silva (Org.). Educação infantil, igualdade racial e diversidade: aspectos políticos,
jurídicos, conceituais. São Paulo: Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades - CEERT, 2012.
BOTO, Carlota. O desencantamento da criança: entre a Renascença e o Século das Luzes. In: FREITAS, Marcos
Cezar de Freitas; KUHLMANN Jr, Moysés (Org.). Os intelectuais na história da infância. São Paulo: Cortez,
2002.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: MEC, 1988.
BRASIL, Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Brasília, MEC, 2010.
BRASIL, Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de
história e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília: MEC, 2004.
BRASIL, Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil. Brasília: MEC, 2009.
BRASIL, Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Lei nº. 9.394/96. Brasília: MEC, 1996.
BRASIL, Lei n.º 10.172, de 09 de janeiro de 2001. Brasília: MEC, 2001.
BRASIL, Lei nº 10.639, de janeiro de 2003. Brasília: MEC, 2003.
BRASIL, Lei nº 11.645, de 10 de março de 2008. Brasília: MEC, 2008.
BRASIL, Lei nº 8.069 – Estatuto da Criança e do Adolescente, de 13 de julho de1990. Brasília: MEC, 1990.
BRASIL, Orientações e Ações para Educação das Relações Étnico-Raciais. Brasília: MEC/SECAD, 2006.
BRASIL, Parecer CNE/CP 3/2004, de 10 de março de 2004. Brasília: MEC, 2004.
BRASIL, Plano Decenal de Educação para todos. Brasília: MEC, 1994.
BRASIL, Portaria Interministerial MEC/MJ/SEPPIR nº 605 de 20 de maio de 2008. Brasília: MEC, 2008.
BRASIL, Portaria normativa nº 14, de 21 de maio de 2010. Brasília: MEC, 2010.
BRASIL, Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010. Brasília: MEC, 2010.
BRASIL. Resolução nº 1, de 17 de junho de 2004. Brasília: MEC, 2004.
CAVALLEIRO, Eliane dos Santos. Do silêncio do lar ao silêncio escolar: racismo, preconceito e discriminação
na educação infantil. São Paulo: Contexto, 2000
.Currículo, relações raciais e cultura afro-brasileira. Apresentado no programa Salto para o Futuro/TV Escola/
SEED/MEC de 23 a 27 de outubro de 2006. Disponível
em:<tvbrasil.org.br/fotos/salto/series/175527Relraciais.pdf>Acesso em: 12/08/2012.
DIAS, L. R. Diversidade étnico-racial e educação infantil: três escolas, uma questão, muitas respostas. 1997.
Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Cuiabá. 1997.
KUHLMANN JUNIOR, Moysés _. Infância e Educação Infantil: uma abordagem histórica. Porto Alegre:
Mediação, 2011.
KUHLMANN JUNIOR, Moysés. A circulação das idéias sobre a educação das crianças: Brasil, início do século
XX. In: FREITAS, Marcos Cezar de Freitas; KUHLMANN JUNIOR, Moysés (Org.). Os intelectuais na história
da infância. São Paulo: Cortez, 2002.
LOPES, M. L. S. O que as crianças falam e quando elas se calam: o preconceito e a discriminação étnico-racial
no espaço escolar. 2008. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal do Espírito Santo,Vitória. 2008.
OLIVEIRA, F. de. Um estudo sobre a creche: o que as práticas educativas produzem e revelam sobre a questão
racial? 2004. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal de São Carlos. São Carlos. 2004.
OLIVEIRA, Fabiana, ABRAMOWICZ;Anete. Infância, raça e “paparicação”. Educação em Revista. Belo
Horizonte, v.26, n.02, p.209-226, ago. 2010.
OLIVEIRA, L. B. de Sá. Cultura Afrocearense: um estudo sobre africanidades, educação e currículo em uma
escola pública de Fortaleza. 2011. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal do Ceará. Fortaleza. 2011.
OLIVEIRA, M. S. Representação dos negros nos livros didáticos de história: mudanças ou permanências após a
promulgação da Lei 10.639/03. 2009. Dissertação (Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.
Belo Horizonte. 2009.
PEREIRA, N. da S. A ética enquanto práxis na educação da infância: um ensino em questão. 2006. Dissertação
(Mestrado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. São Paulo. 2006.
ROSEMBERG, Fúlvia. A criança pequena e o direito à creche no contexto dos debates sobre a infância e
relações raciais. In: BENTO. Maria Aparecida Silva (Org.). Educação Infantil, igualdade racial e diversidade:
aspectos políticos, jurídicos, conceituais. São Paulo: Centro de Estudos das Relações de Trabalho e
Desigualdades – CEERT, 2012.
SILVA, K. V. da. A implementação da Lei 10.639/03 no Município de São João de Meriti: limites e
possibilidades. 2010. Dissertação (Mestrado). Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro Rio de Janeiro.
2010.
TELES, C. de P. Representações sociais sobre as crianças negras na educação infantil: mudanças e
permanências a partir da prática pedagógica de uma professora. 2010. Dissertação (Mestrado). Universidade de
São Paulo. São Paulo. 2010.
VENÂNCIO, A. C. L. Literatura infanto-juvenil e diversidade. 2009. Dissertação (Mestrado). Universidade
Federal do Paraná. Curitiba, 2009.
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
O PROCESSO DE CRIAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO E EXPANSÃO DO CAMPUS
JATAÍ DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
Aline Cristina Soares Pereira
Profa. Ms. Márcia Santos Anjo Reis (Orientadora)
Campus Jataí-UFG
[email protected]
[email protected]
RESUMO
Este trabalho tem o objetivo de compreender como se deu o processo de criação, consolidação e expansão do
Campus Jataí (CAJ) da Universidade Federal de Goiás (UFG), instalado na cidade de Jataí, em 1980. A pesquisa
está voltada para a criação e expansão dos cursos de graduação e pós-graduação (Lato Sensu e Strito Sensu)
presenciais do CAJ/UFG. Para o desenvolvimento do trabalho foi realizado pesquisa bibliográfica e documental.
Como referencial teórico utilizou-se Dourado (2001, 2002), Sguissardi (2005, 2008), Revista Afirmativa da UFG
(2008, 2009 e 2010), dentre outros. Os documentos analisados foram Projetos Pedagógicos dos Cursos do CAJ,
resoluções e convênios. Através da análise destes materiais foi possível estabelecer relações com as políticas de
expansão e interiorização da UFG. Dois projetos contribuíram para a expansão e interiorização da UFG, o
Centro Rural Universitário de Treinamento e Ação Comunitária (Crutac) em 1969 e o Projeto Rondon em 1975.
Através dos trabalhos e ações desenvolvidos nesses projetos pela UFG, viu-se a necessidade de expansão da
universidade, cuja sede se encontrava na cidade de Goiânia. Após vários convênios efetivou-se a criação de
novos campi da UFG, sendo o CAJ um deles. Contribuíram para a criação do CAJ, o programa de extensão da
UFG, o apoio das lideranças políticas de Jataí (principalmente do prefeito) e líderes e representantes de entidades
da comunidade; para sua consolidação, a criação da Fundação Educacional de Jataí (FEJ), o apoio do governo do
estado e o empenho conjunto de lideres políticos e comunidade; e para sua expansão os programas do governo
Lula, o de Expansão (2003) e o Reuni (2007). Hoje, em 2013, o CAJ oferece 24 cursos de graduação, cinco
cursos de especialização e cinco cursos de mestrado sendo que um deles foi aprovado pela CAPES para iniciar
suas atividades em 2013. A relevância da pesquisa é que ela apresenta um resgate de parte da história do CAJ,
que presta serviços à comunidade jataiense há trinta e três anos, e pouco se tem registrado.
Palavras-chave: interiorização da UFG; expansão da UFG; campus Jataí.
INTRODUÇÃO
Este trabalho teve como objetivo compreender como se deu o processo de criação,
expansão e consolidação do Câmpus Jataí (CAJ) da Universidade Federal de Goiás (UFG),
através da política de extensão e interiorização da universidade.
Para o desenvolvimento do trabalho foi realizada pesquisa bibliográfica e documental.
Na pesquisa bibliográfica foram consultados artigos, periódicos, teses e dissertações, e na
pesquisa bibliográfica, resoluções, documentos, leis e termos de convênios foram analisados,
com o objetivo de resgatar parte da história do CAJ e apreender a lógica da interiorização da
UFG.
Jataí é um município que se encontra localizado no sudoeste do Estado de Goiás, a 327
Km da capital Goiânia, na microrregião Sudeste de Goiás, que conta com aproximadamente
88 mil habitantes. Hoje sua principal atividade é a agropecuária, sendo considerada a capital
do grão, o maior produtor de milho e sorgo no Brasil de 2003 a 2009. Apresenta também área
de plantio de cana-de-açúcar que está em franco desenvolvimento graças à instalação de
usinas de álcool, açúcar e biodiesel.
No campo educacional superior, Jataí conta no âmbito federal com o Instituto Federal
de Goiás – Campus Jataí (IFG) com três cursos superiores e a Universidade Federal de
Goiás/Campus Jataí (UFG/CAJ) com 24 cursos; no domínio estadual, tem a Universidade
Estadual de Goiás – Unidade de Jataí (UEG/UnU Jataí) com dois cursos; na esfera privada,
tem duas faculdades particulares, o Centro de Ensino Superior (CESUT) com dois cursos e a
Faculdade Jataiense (FAJA) com um curso; todas essas instituições com cursos de graduação
presencial.
Além dessas IES o município conta com três faculdades que oferecem educação a
distância: a Universidade Norte do Paraná (UNOPAR), a Universidade Paulista (UNIP) e o
Instituto de Ensino Superior COC.
A opção por estudar o CAJ\UFG se deve em função de ser a primeira instituição de
ensino superior criada na cidade em 1980, oferecer o maior número de cursos e de vagas,
além de disponibilizar para a comunidade cursos de graduação e de pós-graduação (Lato
Sensu e Stricto Sensu).
BREVE HISTÓRICO DA CRIAÇÃO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS
O histórico aqui apresentado se fundamentou nos artigos da revista Afirmativa da UFG
(2008 e 2009) elaborados a partir de relatos de pessoas que fizeram parte da história da
construção da universidade e de Mendonça (2005).
Até o final da década de 1950, o estado de Goiás contava para a educação superior
com a Universidade Católica de Goiás (UCG), de caráter privado, e algumas poucas
faculdades particulares. Logo, o acesso à educação superior era restrito as famílias que tinham
condições financeiras para manter seus filhos estudando numa IES particular ou fora do
Estado, pois não havia na região nenhuma instituição desse nível de ensino, pública.
Nos últimos anos de 1950, movimentos liderados por professores, alunos e pela
sociedade civil reivindicavam a criação de uma universidade pública em Goiás e entravam em
confronto mediante as resistências de seus opositores. Professores e alunos não mediram
esforços, trabalhando arduamente, buscando apoio logístico, técnico e financeiro, para que a
universidade (UFG) fosse criada.
O professor Colemar Natal e Silva, diretor da Faculdade de Direito de Goiás na época,
assumiu o movimento estudantil que lutou pela construção de uma universidade que atendesse
de forma qualitativa a todas as classes sociais. Ele juntamente com outros professores, alunos,
sociedade goiana e também com o apoio do presidente Juscelino Kubitscheck, cujo mandato
estava chegando ao fim (e esperava ser reeleito, principalmente após este ato), conseguiram
alcançar o ideal, sendo criada a Universidade Federal de Goiás, em 14 de dezembro de 1960,
pelo decreto de Lei nº 3.834-C, a partir da união de cinco escolas superiores - a Faculdade de
Direito, a Faculdade de Farmácia e Odontologia, a Escola de Engenharia, o Conservatório de
Música e a Faculdade de Medicina (UFG, 2008). O primeiro reitor da UFG foi o professor
Colemar (1960-1964).
No período marcado pela ditadura militar, o ensino superior passou por
transformações e muito controle. No caso específico da UFG, o reitor Colemar foi afastado do
cargo sob a acusação de ideais comunistas, em função das publicações do jornal da
universidade chamado o 4º Poder.
Em 1970 foi criado o Planetário no Parque Mutirama e em 1971 surgiram as primeiras
instalações do Campus Samambaia (Campus II).
Influenciada e apoiada em projetos propostos pelo Ministério da Educação (MEC), a
UFG elaborou seu programa de expansão. O MEC implantou dois projetos, para que as
universidades se expandissem: os Centros Rurais Universitários de Treinamento e Ação
Comunitária (Crutacs) criados a partir do Decreto-Lei nº 916, de 7 de outubro de 1969 e o
Projeto Rondon implantado por meio da Lei nº 6.310, de 15 de dezembro de 1975 (UFG
2008). Os Crutacs e o Projeto Rondon tinham como objetivo dar suporte em caráter de
estágios supervisionados nas regiões menos desenvolvidas localizadas no interior do país,
incentivando alunos e funcionários públicos a participarem dos programas de extensões que
eram realizados em cidades do interior. A intenção era que o trabalho levado para estas
cidades, funcionasse como uma assistência, tanto médica quanto social as pessoas mais
carentes.
Como a necessidade de mão de obra qualificada era grande, os projetos (Rodon e
Crutacs) foram se intensificando em todo o país. Nesse clima de fazer crescer a educação e o
número de pessoas qualificadas para alguns serviços, a UFG criou cursos strito sensu
(mestrado) e lato sensu (especialização) sob a coordenação do Conselho de Ensino, Pesquisa,
Extensão e Cultura (CEPEC). Os cursos implantados foram: Mestrado em Ciências Humanas
e em Letras (Resolução CCEP nº 077/1974) com 30 (trinta) vagas; graduação em
Enfermagem e Nutrição (Resolução CCEP nº 090/1975), com 40 (quarenta) vagas para o
curso de Enfermagem e 15 (quinze) para o curso de Nutrição; e Especialização em Educação
(Resolução CCEP nº 106/1976)79.
Ainda com o objetivo de expandir o campo de atuação da UFG, além de novos cursos
de graduação e pós-graduação foram criados campi avançados em outras regiões, inclusive
fora do estado de Goiás. A pesquisa de Baldino (1991), citada por Mendonça (2005), diz que
foram criados
os Campus Avançados de Picos no Piauí, Firminópolis, em Goiás, e
atividades de extensão-estágio (ainda não campus avançados) em Porto
Nacional (base essencialmente de estágio para alunos de medicina), Jataí e
Catalão, todos estes últimos em território goiano (BALDINO, 1991 apud
MENDONÇA, 2005, s/p).
Vale ressaltar que a Universidade de Picos, no Estado do Piauí, foi instituída em 1972,
e mediante a permissão do MEC, em 1985, passou a chamar-se Universidade Federal do
Piauí. A UFG coloca em funcionamento em Porto Nacional um Câmpus Avançado, mas este
não oferece curso de graduação, servindo de base apenas para estágios, administração e
programas de ação comunitária.
Dos campi instalados em Goiás ainda permanece em atividades os Câmpus de Jataí
(1980), Catalão (1983) e o de Goiás (1990).
Como o objetivo deste artigo é compreender como se deu o processo de criação e
consolidação do CAJ, vamos nos restringir a este breve histórico da UFG.
A CRIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DO CÂMPUS JATAÍ
Para a criação e implantação de câmpus avançados, a UFG realizou um estudo
diagnóstico do estado de Goiás, das suas microrregiões, para ver quais os municípios eram
melhores para a instalação de campi. Vamos no ater aos dados relativos ao levantamento da
microrregião do Sudoeste Goiano, na qual se localiza a cidade de Jataí.
De acordo com diagnóstico feito para pró-reitoria de extensão da UFG, em 1979,
sobre a microrregião do Sudoeste Goiano, a região contava com 266 instituições de ensino,
sendo 258 do ensino de 1º grau (atualmente ensino fundamental) e oito do ensino de 2º (hoje
qualificado de ensino médio), perfazendo um total de “636 salas, 421 na zona urbana e 215 na
zona rural” (UFG, 1979, p.16).
Em relação à educação superior, na época da diagnose da microrregião, apenas a
cidade de Rio Verde, de acordo com Dourado (2001) possuía ensino superior, ofertada pela
79
A resolução não menciona o número de vagas disponíveis.
Fundação de Ensino Universitário (FESURV), a qual disponibilizava quatro cursos: Letras
Modernas–Inglês Licenciatura Plena; e os cursos de curta duração em Pedagogia, Ciências e
Estudos Sociais. Como Rio Verde já tinha ensino superior, a opção da UFG passou a ser a
segunda cidade com maiores chances de crescimento, que no caso era Jataí.
Paralelo a esse estudo da UFG, entidades de classe e os grupos de serviços da cidade
de Jataí, juntamente com as autoridades constituídas da época, no final da década de 1970,
desejavam e pensavam em trazer cursos de nível superior para o município. A possibilidade
de concretizar esse anseio surge quando empresários ouviram do reitor da UFG professor José
Cruciano80 em conversa informal, sobre o interesse que a UFG em ampliar suas ações para
além da capital do Estado, criando no interior, cursos de ensino superior que ajudasse a
comunidade em seu crescimento tanto físico quanto intelectual. Após essa conversa
visionária, empresários e líderes da comunidade realizaram reuniões para discutir sobre a
possibilidade de criação de cursos superiores na cidade e em seguida encaminharam oficio ao
Reitor da UFG, apresentando o município de Jataí interessado em participar do projeto de
extensão da UFG (CAJ, HISTÓRIA DOS 30 ANOS DA UFG, 2010, Entrevista Adelino).
Um grupo de pessoas da cidade foi ao gabinete do reitor em Goiânia para reafirmar o
interesse do município de Jataí em ser sede de um câmpus da UFG e aproveitaram para
indagar o que deveria ser feito para que a cidade pudesse se encaixar no perfil da extensão. O
reitor, convicto do interesse da comunidade e frente à disponibilidade de colaboração
apresentada pelo grupo, prontamente os encaminhou a Pró-Reitoria de Extensão, para que eles
conversassem com a professora responsável, Maria do Rosário Cassimiro81, que
atenciosamente os atendeu, explicando o que seria necessário. A conversa com a pró-reitora
deixou o grupo esperançoso e ao retornar a cidade foram ao gabinete do então prefeito Mauro
Antônio Bento82 para repassar as informações obtidas. O prefeito, com seu ideal inovador,
prontamente aceitou o desafio.
Começaram a acontecer reuniões para tratar de assuntos pertinentes a vinda do
campus, contando com a presença do prefeito Mauro Bento. Paralelamente, a Pró-Reitoria de
80
Professor José Cruciano foi Reitor da Universidade Federal de Goiás de 1978 a 1981, e tinha
ligação com Jataí por causa de laços familiares.
81
A Professora Maria o Rosário Cassimiro é Ex-Reitora da UFG, regendo de 1982 a 1985; ExPró-Reitora de Extensão da UFG, de 1978 a 1981, e primeira mulher a exercer a reitoria de uma
Universidade no País.
82
Mauro Antônio Bento foi prefeito na cidade de Jataí de 1977 a 1983 e de 1989 a 1992, faleceu
em dezembro de 2004.
Extensão da UFG designou uma comissão83 sob a presidência do professor Heldo Vítor
Mulatinho para fazer diagnose da cidade, que teve colaboração do Rotary Club de Jataí.
De acordo com o diagnóstico do município de Jataí realizado pelo professor Mulatinho
(1979), a necessidade de cursos baseava-se em três áreas: Agricultura e Pecuária, Saúde e
Educação. Na área de Agricultura e Pecuária a sugestão era cursos de duração plena em
Medicina Veterinária e Agronomia e de curta duração em Administração Rural; na área de
Saúde seria curso de curta duração em Nutrição e Saneamento Ambiental; e na área de
Educação seria curso de licenciatura plena para formação de professores de disciplinas de
núcleo comum de 1º e 2º graus (UFG, 1979).
Após os levantamentos feitos na cidade de Jataí e com os resultados encontrados, foi
possível a Pró-Reitoria de Extensão, autorizar a criação do câmpus na cidade de Jataí, a qual
se deu através de convênio provisório a ser renovado posteriormente. A Resolução nº. 145, de
10 de março de 1980, do CCEP, autorizou a criação do Campus Avançado de Jataí (hoje
denominado Campus Jataí).
Em 13 de março de 1980, foi autorizado pelo projeto de lei municipal nº 1.000, o
prefeito de Jataí Mauro Antônio Bento celebrar convênio com a UFG para a instalação do
câmpus nos padrões da interiorização da universidade. Nos artigos constava que a prefeitura
deveria contrair um espaço para a construção do prédio e mobiliar suas instalações.
O curso implantado no CAJ foi licenciatura em Ciências com habilitação em
Matemática, Química e Física. A justificativa para a implantação desse curso se deu em
função da carência de profissionais capacitados na área de educação e correspondia a um dos
campos apontados pela diagnose feita pela comissão do professor Mulatinho.
Ter um câmpus da UFG e o ensino superior ser público era motivo de grande alegria
para Jataí, pois atenderia não somente a comunidade local, mas também as regiões vizinhas.
Agora era possível para os estudantes que concluíam o 2º grau ter acesso à educação superior
pública e de qualidade.
Com a primeira etapa encaminhada, surgem novas dificuldades, relatadas por Pires84,
83
A Comissão era constituída pelos professores Heldo Vítor Mulatinho, Vera Maria Magalhães e
Marcolina Martins Garcia e pelos alunos Clovis Garcia Souza Filho estudante de Jornalismo,
Carlos - na época funcionário da Pró-Reitoria e aluno de Ciências Sociais, Dilamar Cândida
Martins, Leila Miguel e Cecília Bossois Mulatinho também estudantes de Ciências Sociais.
84
Luciene Lima de Assis Pires é socióloga, mestre em Educação Escolar Brasileira, doutora em
Educação pela UFG, atuou como professora do Campus Jataí e hoje atua como professora no
Instituto Federal de Goiás – Campus Jataí.
Para que o CAJ fosse instalado, a universidade não dispunha de recursos
para serem lá investidos. Surgida a primeira dificuldade, a estrutura física, a
Prefeitura negociou com o Instituto Samuel Graham a cessão da área e
construiu a primeira etapa do prédio, inaugurado em 1980. A segunda
dificuldade, equipar o prédio, a biblioteca, os laboratórios, para que os
cursos se iniciassem, é novamente solucionada pelo município, que,
subsidiado também por recursos oriundos do governo estadual, ‘equipa’ o
CAJ (UFG, 2009, p. 16).
O município de Jataí interessado em que a extensão desse certo, não mediu esforços
para a construção de um prédio em que pudesse funcionar o CAJ e também procurou equipar
o mesmo objetivando atender as especificações exigidas para o funcionamento das atividades
e cursos. O prédio foi construído em um espaço anteriormente pertencente ao Instituto Samuel
Graham (ISG)85, negociado pela prefeitura e doado para a universidade, e em parte adquirido
pela UFG em anos posteriores. A inauguração do prédio da UFG ocorreu em 10 de dezembro
de 1980.
Em 1981 ocorreu o primeiro vestibular para o curso de graduação em Ciências, sendo
disponibilizados 40 vagas para Matemática, 30 para Química e 20 para Física. Os cursos
foram criados para atender uma demanda local e do momento, não eram permanentes, por
isso foi realizado apenas dois vestibulares. O curso de Ciências foi “reconhecido pelo MEC,
mediante a portaria nº 938 de 26 de novembro de 1985” (DOURADO, 2001, p. 161).
Com as dificuldades de deslocamento dos professores, com o número reduzido de
concluintes do curso de Ciências em Jataí e sem o apoio orçamentário do Ministério de
Interiorização, a UFG estava repensando a continuação da oferta de cursos superiores para o
CAJ. É importante ressaltar que a comunidade jataiense insatisfeita com a possibilidade de
cancelamento de novos cursos e turmas no câmpus, não mediu esforços em proporcionar
condições para a permanência do câmpus na cidade. A princípio foram realizadas várias
reuniões entre a prefeitura, a comunidade e empresários da cidade sobre como seria impedido
esse fechamento, até que em 1984 a saída encontrada foi a criação da Fundação Educacional
de Jataí (FEJ).
A FEJ foi criada sob a Lei Municipal nº 1077, de 13 de março de 1984 e tinha como
objetivo dirigir em colaboração de entidades públicas e privadas da cidade, o
desenvolvimento do ensino superior no município.
Com a criação da FEJ, foi possível implantar no CAJ, novos cursos. Em 10 de outubro
de 1984, foi firmado o primeiro convênio nº 28/84, entre UFG/Prefeitura Municipal de
Jataí/FEJ para a implantação do curso de Pedagogia, que teve início em 1985, com 45 vagas.
85
Hoje denominado como Instituto Presbiteriano Samuel Graham (IPSG).
No primeiro ano de funcionamento desse curso, os professores concursados pela UFG para
atuarem no curso de Pedagogia foram contratados pela prefeitura, e no ano de 1986, passaram
a compor o quadro de professores contratados da FEJ.
O CAJ foi ampliando o número de cursos a partir de pedidos feitos pela comunidade
jataiense e possibilidades de oferta da UFG. Foram criados os cursos: de Letras Português
(1989), Geografia (1994), Educação Física (1994), Ciências Biológicas (1996) e Matemática
(1996), todos mantidos por meio de convênios firmados entre UFG/PMJ/FEJ, no qual a UFG
entrava com apoio pedagógico e a FEJ (com o total apoio financeiro da PMJ) era responsável
pelo pagamento de professores, aquisição de livros, liberação e/ou pagamento de pessoal
administrativo, de limpeza e segurança.
A cada novo curso criado, ampliava-se as despesas da FEJ, que não tinha receita
própria, dependia inteiramente do repasse de verbas de prefeitura, que estava tendo problemas
para cumprir com todas as cláusulas dos convênios. Na verdade a obrigação da prefeitura é
com ensino fundamental e não com o ensino superior. Para a manutenção do CAJ, foi
necessário que a FEJ solicitasse uma parceria com o governo do estado de Goiás, para ampliar
sua dotação orçamentária. Então foram firmados convênios de colaboração mútua entre a
UFG/Estado/PMJ/FEJ, onde o Estado liberava auxílio financeiro para subvencionar a
Fundação, tanto para criação de novos cursos quanto manutenção dos existentes, assegurando
a consolidação do CAJ.
No final de 2006, para a implantação dos novos cursos e manutenção dos antigos, o
Estado de Goiás passou a destinar uma dotação orçamentária para FEJ, para contribuir com
sua folha de pagamento.
Ao todo foram assinados 18 convênios entre a UFG/PMJ/FEJ e 14 convênios entre
UFG/Estado/PMJ/FEJ para a criação e consolidação do CAJ até 30 de dezembro de 2011,
quando foi firmado o último contrato.
Analisando as políticas públicas educacionais dos dois últimos governantes do Brasil,
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso86 e Luiz Inácio Lula da Silva87, observa-se que
essas influenciaram no processo de expansão do CAJ/UFG.
86
Durante o trabalho será utilizado à abreviatura FHC ao nos referirmos ao ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso.
87
Ao nos referirmos no trabalho ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o faremos usando
Lula. Ele assumiu a presidência do Brasil durante o período de 2002 a 2010, também durante dois
mandatos consecutivos.
A política educacional do governo FHC se pautou nos cortes de verbas para as
universidades públicas e apoiou o processo de privatização, sua prioridade era assegurar o
ensino básico de qualidade, o que acarretou uma queda no crescimento das IES públicas.
Analisando o caso específico do CAJ, durante o mandato de FHC (1995-2002), apesar dos
cortes do governo, ocorreu a criação de seis novos cursos, não dependendo de verbas do
governo e dos convênios firmados entre Fundação Educacional e a Prefeitura de Jataí.
O governo Lula estruturou programas que permitiram que mais pessoas tivessem uma
formação superior, criou, consolidou e estruturou universidades. Dois programas merecem
ser destacados: o Programa de Expansão das Universidades Federais, instituído em 2003 e o
Programa de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (Reuni) criado através do
Decreto nº 6.096, de 24/04/2007.
Para o CAJ, a adesão a esses programas (Expansão e Reuni) significou a possibilidade
de melhoria da infra-estrutura dos cursos existentes que serviram de base para a criação de
sete novos cursos nos anos de 2006 e 2007, além da possibilidade de contratação de pessoal
técnico-administrativo e de professores qualificados (REIS, 2010), e a criação de cinco novos
cursos entre 2007 e 2011 através do Reuni (2007). Assim, durante o período de 2003 a 2011
foram criados no CAJ treze novos cursos para atender a demanda local. Mas vale ressaltar que
o mérito não é somente do governo federal, o estado e a prefeitura municipal também
participaram.
Os cursos de Física (2006), Psicologia (2006), História (licenciatura) (2006),
Zootecnia (2006), Química (Licenciatura) (2006), Biomedicina (2006), Ciência da
Computação (2007) e Enfermagem (2007) foram implantados através do Programa de
Expansão das Universidades Federais (2003). Já os cursos de Fisioterapia (2007), Engenharia
Florestal (2009), Direito (2009), Educação Física (Bacharelado) (2010) e Química
(Bacharelado) (2011), foram implantados através do Programa de Reestruturação das
Universidades Federais (Reuni).
Além dos cursos de graduação o CAJ disponibiliza para sociedade cursos de pós
graduação (lato sensu e strictu sensu). Em 2013 o CAJ conta com cinco especializações:
Linguística Aplicada ao Ensino de Língua Materna e Estrangeira (Inglês); Especialização em
Políticas, Gestão e Financiamento da Educação; Produção de Suínos; Matemática Aplicada; e
História Cultural: Narrativas e Linguagens.
Os cursos de Pós-Graduação (Strictu Sensu) do CAJ são: mestrado em Agronomia
(Produção Vegetal); em Geografia; em Ciências Aplicada a Saúde; mestrado Profissional de
Matemática (Profmat). Em 2012 foi aprovado pela CAPES o mestrado em Educação com
previsão de início de suas atividades em 2013, segundo semestre.
Ao completar 30 anos de Campus na cidade de Jataí, foi inaugurada a Cidade
Universitária, onde hoje está denominada a unidade Jatobá localizada na Rodovia BR 364,
Km 192.
A intenção é que todos os cursos do CAJ estejam concentrados em apenas uma
unidade (na Cidade Universitária).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em Jataí, até o final da década de 1970, aqueles que desejassem cursar ensino
superior, tinham que ter condições financeiras para se deslocar para a capital do estado, a
cidade de Goiânia ou ir para outras as cidades que tinham esta modalidade de ensino.
O anseio da comunidade de Jataí por curso superior fez com que a união de forças,
entre líderes políticos, empresários, entidades de classe, representantes da comunidade
procurassem formas de materializar essa idéia.
A junção da ação da sociedade civil e política da cidade de Jataí com a política de
expansão e interiorização da UFG no final da década de 1970 deram início ao processo de
implantação de um campus em Jataí. Em 1980 foi criado o CAJ e em 1981 iniciou as aulas do
curso de Ciências de caráter provisório. Várias dificuldades apareceram ao longo do processo
de criação do câmpus, e a falta de estrutura física e de material, o problema de disponibilidade
de professores, o deslocamento dos docentes, assim como dificuldades para a manutenção do
câmpus, fizeram com que a UFG repensasse seu processo de interiorização na cidade de Jataí,
o que deixou a comunidade bastante aflita. Objetivando a permanência do CAJ e criação de
novos cursos a comunidade e as lideranças políticas locais, principalmente do prefeito, não
mediram esforços para atender todas as exigências feitas pela universidade.
A criação da FEJ foi decisiva para a consolidação do CAJ, que por meio de convênios
firmados entre a UFG/PMJ/FEJ e UFG/Estado/PMJ/FEJ possibilitou o câmpus expandir seus
cursos de graduação e de pós-graduação (Lato Sensu e Strictu Sensu), possibilitando tanto a
comunidade local, quanto as das cidades vizinhas, acesso a ensino superior público e de
qualidade. Os programas de do governo Lula, Expansão (2003) e Reuni (2007) contribuíram
para a expansão do CAJ, criando novos cursos e aumentando vagas em cursos já existentes.
Várias dificuldades foram enfrentadas, dentre elas, a de espaço físico, falta de material
e de pessoal, atraso salarial, não atualização do acervo da biblioteca, mas nada impediu que o
CAJ crescesse.
REFERÊNCIAS
CÂMPUS JATAÍ (CAJ). 30 anos do Câmpus UFG/Jataí: História e Memória. Jataí, 2010.
DOURADO, Luíz Fernandes. A interiorização do ensino superior e a privatização do publico. Goiânia: UFG,
2001.
MENDONÇA, Zilda Gonçalves de Carvalho. A universidade Federal de Goiás (UFG) como promotora da
expansão e da interiorização do ensino superior. 2005. Disponível
em:<http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:gL5BzQRbUlgJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em 03 mai. 2012.
REIS, Márcia Santos Anjo. Expansão do ensino superior: parâmetro de análise a cidade de Jataí/GO.
CONGRESSO DE HISTÓRIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS, 2010. Disponível
em:<http://www.congressohistoriajatai.org/2010/anais2010/doc%20(37).pdf>. Acesso em: 21 jan. 2012.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS. UFG Afirmativa nº 2. Goiânia: Ascom, novembro de 2008.
_______. UFG Afirmativa nº 3. Goiânia: Ascom, Setembro de 2009.
_______. Projeto de Implantação do Campus Avançado de Jataí – Diagnose do Município de Jataí. Goiânia,
1979.
Comunicação Oral
GT 3 – Estado e Política Educacional
POLÍTICA DE IMPLEMENTAÇÃO DAS DIRETRIZES PARA EDUCAÇÃO DAS
RELAÇÕES ÉTNICO RACIAIS E O ENSINO DE HISTÓRIA E CULTURA
AFRICANA E AFRO-BRASILEIRA NA REDE MUNICIPAL DE EDUCAÇÃO DE
GOIÂNIA
Marcilene Pelegrine Gomes
PRPPG - FE / UFG
Rede Municipal de Educação de Goiânia / Pontifícia Universidade Católica de Goiás
[email protected]
Warlúcia Pereira Guimarães
Rede Municipal de Educação de Goiânia / Pontifícia Universidade Católica de Goiás
[email protected]
Adriane Camilo Costa
Rede Municipal de Educação de Goiânia / Universidade Federal de Goiás
[email protected]
RESUMO
Este trabalho tem por objetivo apresentar e discutir as ações adotadas pela Secretaria Municipal de Educação de
Goiânia (SME) para implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana (Parecer CNE/CP3/2004), no período de
2005 a 2012. O referencial teórico que fundamenta este trabalho ancora-se em estudos (IANNI, 1996;
FERNANDES, 2008; MUNANGA, 2005) que nos permitem pensar, problematizar as relações entre Estado,
políticas públicas, currículo e formação de professores para educação das relações étnico-raciais no Brasil e em
Goiânia. Para sistematização do estudo utilizou-se de pesquisa bibliográfica e documental. Os resultados da
experiência de Goiânia apontam para necessidade da Rede Municipal (RME) implementar ações continuas e
sistemáticas que possibilitem de fato a materialização das Diretrizes no fazer pedagógico das instituições de
educação infantil e do ensino fundamental.
Palavras-chave: políticas públicas; educação para relações étnico-raciais; educação básica.
INTRODUÇÃO
Não se trata apenas de oferecer conteúdos “referentes à participação
do negro para o desenvolvimento da sociedade brasileira”. O Parecer
CNE/CP3/2004 esclarece com precisão que a obrigatoriedade do
ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Africana não visa
tornar os brasileiros mais eruditos, mas reeducar as relações étnicoraciais a fim de que todos – descendentes de europeus, asiáticos,
africanos e povos indígenas – valorizem a identidade, a cultura e a
história dos negros que constituem o segmento mais desrespeitado
da nossa sociedade.
(SILVA, Petronilha, 2012).
A discussão sobre educação para as relações étnico-raciais ganha força no Brasil,
sobretudo a partir de 2003 com a promulgação da lei 10.639/03, a qual determina a inserção
dos conteúdos de história e cultura afro-brasileira e africana no currículo da educação básica
e, em especial nas disciplinas de História, Arte e Literatura Brasileira. Essa lei altera as
Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9394/96) ao determinar novos conteúdos para o
currículo da escola básica. Para muitos estudiosos (SILVA, 2012; MUNANGA, Kabengele,
2005) a promulgação da lei 10.639/03 abre precedentes para discussão junto aos sistemas de
ensino de questões vinculadas ao combate ao preconceito étnico-racial, as quais permeiam a
sociedade brasileira, desde o período colonial, contribuindo para a marginalização e a
exclusão de um número significativo da população afrodescendente da escola, do trabalho, da
saúde, dentro outros.
Nesse sentido, a inserção de temas e conteúdos que afirmam positivamente a história e
a cultura da população afro-brasileira e africana tornou-se um referencial curricular para
educação das relações étnico-raciais no cotidiano escolar. Em meio à realidade instituída,
sobretudo pela lei 10.639/03, em 2004, foram estabelecidas, pelo Parecer do Conselho
Nacional de Educação /CP n.º 3/2004, as Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação
das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e
Africana, conforme os termos do Artigo 26 A da Lei 9394/1996.
Essas diretrizes apontam caminhos teóricos e metodológicos para o trabalho
pedagógico na educação básica, bem como sinaliza para os sistemas de ensino as ações que
podem ser desenvolvidas para efetivação da 10.639/03. Dentre estas ações podem ser citadas:
a reestruturação do currículo prescrito e vivido nas instituições educacionais; a aquisição de
material didático e formação de professores para desenvolvimento de um currículo com foco
na educação para relações étnico-raciais.
Frente a essa realidade é objetivo deste artigo apresentar e discutir as ações adotadas
pela Secretaria Municipal de Educação de Goiânia, no período de 2005 a 2012, com foco na
implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Para tanto, será
estabelecido um dialogo com autores que discutem as questões étnico-raciais no Brasil
(IANNI, 1996; FERNANDES, Florestan, 2008; MUNANGA, Kabengele, 2005), bem com a
legislação nacional que versa sobre a temática em pauta. Assim, além de apresentar a
experiência de uma rede de ensino procurar-se-á (re)pensar, problematizar as relações entre
Estado, políticas públicas, currículo e formação de professores no contexto da educação para
relações étnico-raciais no Brasil e em Goiânia.
MARCO LEGAL DA EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NO BRASIL
A necessidade de discutir e implementar políticas voltadas para uma educação
antirracista no Brasil remonta as primeiras décadas do século XX, cito em particular a Frente
Negra Brasileira fundada em São Paulo em 1931 e transformada em partido político em 1936,
que tinha na figura de seu presidente, Arlindo Veiga dos Santos, uma das primeiras pessoas
“a exigir da república políticas públicas em benefício da população negra, que pela
escravidão, sofria de entorpecimento cultural” (Domingues apud Velasco, 2009, p. 2397).
Nesse sentido, entende-se que a aprovação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
a Educação das Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira
e Africana, em 2004, é fruto de um lado, de anos, décadas e séculos de resistência e luta da
população negra brasileira contra a exploração, marginalização, preconceito e discriminação
racial. E de outro lado, da conjuntura político-econômica que possibilitou a composição
partidária de diferentes setores da sociedade brasileira, movimentos sociais e sindicais que
resultou na eleição em 2002 de Luís Inácio Lula da Silva que em seu programa de governo
afirmava
Não basta que sejam combatidas as causas econômicas das múltiplas formas
de desigualdade. São necessárias ações positivas para que se ponha fim às
formas de discriminação existentes contra mulheres, negros, índios,
portadores de deficiências e pessoas que possuam distintas orientações
sexuais, para só citar os casos mais notórios (Programa de Governo Brasil
para Todos – 2002, p, 3-4)
Observa-se que, a partir desse momento, a implantação por parte do Estado Brasileiro
de políticas públicas voltadas para a promoção da igualdade racial, isto não significa dizer que
estas ações não foram resultado de conflitos ideológicos e disputas políticas. Mas, que se
abriu historicamente a possibilidade de colocá-las na pauta das discussões.
Em 2003 é aprovada a Lei 10.639 que modifica a Lei 9.394, de 20 de dezembro de
1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para inserir no currículo da
educação básica a obrigatoriedade do ensino da temática história e cultura afro-brasileira e
africana. No ano posterior, o Conselho Nacional de Educação aprova o parecer da relatora
professora Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva que institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana nos estabelecimentos de ensino de diferentes níveis e modalidades
O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à
demanda da população afro-descendente, no sentido de políticas de ações
afirmativas, isto é, de políticas de reparações, e de reconhecimento e
valorização de sua história, cultura, identidade. Trata, ele, de política
curricular, fundada em dimensões históricas, sociais, antropológicas oriundas
da realidade brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que
atingem particularmente os negros. Nesta perspectiva, propõe à divulgação e
produção de conhecimentos, a formação de atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos orgulhosos de seu pertencimento étnico-racial descendentes de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de
asiáticos – para interagirem na construção de uma nação democrática, em
que todos, igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade
valorizada. (CNE/CP/10/03/2004, p. 2)
Com base nas Diretrizes aprovadas em 2004, o Estado brasileiro em consonância com
os movimentos sociais avançou nas discussões das ações afirmativas a ser desenvolvidas por
meio de práticas educativas desenvolvidas nas instituições escolares. Esse documento aponta
os princípios, os eixos orientadores e as ações pedagógicas que devem permeiam o projeto
político pedagógico e as práticas docentes com vias a garantia de posturas sistemáticas e
cotidianas que assegurem o combate ao racismo e a discriminação étnico-racial na escola e,
sobretudo na sociedade.
Em 2009, a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (SEPIR), em parceria com o
Ministério da Educação, elabora o Plano Nacional de Implementação das Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, com objetivo de “orientar e balizar os sistemas
de ensino e as instituições educacionais na implementação das Leis 10.639/03 e 11.645/08”.
(Plano Nacional de Educação, 2009, p.16).
Soma-se a esse conjunto de leis e normas de implementação de políticas públicas
voltadas para a reparação, reconhecimento e valorização de ações afirmativas os seguintes
documentos: as Orientações e Ações para a Educação das Relações Étnico-Raciais em 2006; a
Educação Escolar Indígena em 2007; as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Quilombola e as Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos ambas em 2012.
Entende-se que por meio dessas ações o Estado Brasileiro, como instituição
constituída e constituinte do povo brasileiro, assume por um lado, a dívida histórica para com
essas populações excluídas e marginalizadas da sociedade e, por outro expõe as contradições,
conflitos ideológicos e preconceitos raciais que ainda impregna os diferentes espaços que
compõe historicamente a sociedade brasileira. Nesse aspecto, a reeducação para as relações
étnico-raciais constitui-se uma necessidade imperiosa quando se defende a construção de uma
sociedade democrática e justa, mesmo reconhecendo os limites estruturais que impedem a
inclusão substancial de todos numa sociedade fundamentada nas relações de produção e
sociabilidade capitalista.
A DISCUSSÃO SOBRE EDUCAÇÃO PARA RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS NA RME
DE GOIÂNIA
A discussão acerca do papel de uma rede de ensino desenvolver ações que assegurem a
inclusão de todos os sujeitos na escola, na cidade, na sociedade é reiterada em todos os
documentos da SME de Goiânia, sobretudo a partir de 2002. Nesse movimento, a discussão
sobre educação para relações étnico-raciais no cotidiano da escola pública goianiense aparece,
mesmo que de forma tímida e incipiente, antes da promulgação da Lei 10.639/03. Essa
discussão foi materializada inicialmente por meio de ações esporádicas e pontuais de
formação continuada de professores em ocasiões específicas, tais como: na 1ª e 2ª Jornada
Pedagógica da SME88 e em cursos de curta duração oferecidos pelos movimentos negros da
Capital89.
Analisando as ações desenvolvidas, em 2002 e 2003, pela SME de Goiânia observouse que as mesmas, intencionalmente ou não, colocavam a formação de professores como um
único caminho para inserção das questões étnico-raciais nas práticas educativas das
instituições de educação infantil e ensino fundamental. Esse movimento característico das
políticas para inserção desta temática no currículo escolar, tal qual aparece em Goiânia, se
materializa em outros municípios e estados da federação.
A promulgação da Lei 10.639/03 não repercute de forma imediata nas ações
pedagógicas da SME, mesmo o Plano Municipal de Educação de Goiânia já explicitando a
importância desta temática para inclusão educacional e social da criança e do adolescente. A
educação para relações étnico-raciais ganham mais visibilidade na RME em 2005, após a
elaboração das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Esse movimento foi
impulsionado também pela parceria entre o Ministério da Educação (MEC) e FNDE para
liberação de recursos para secretarias de ensino desenvolver ações de formação de
professores e aquisição de material didático para instituições educacionais. Aliado as ações
dos órgãos oficiais do governo, a ação dos movimentos negros locais, solicitando o
88
Evento realizado semestralmente com objetivo de assegurar momentos de estudo, discussão,
formação continuada e socialização das práticas educativas desenvolvidas nas instituições
educacionais da RME de Goiânia.
89
Conforme documentos da Rede, no período de 2002 e 2004, foram oferecidos aos professores
cursos em parceria do Movimento Negro Goianiense “Pérola Negra”.
posicionamento da SME na oferta de curso de formação de professores para implementação
da lei, também impulsionou o posicionamento da secretaria no que se refere à implementação
de ações voltadas para educação das relações étnico-raciais nas instituições educacionais.
O movimento nacional e local, dos órgãos governamentais e dos movimentos sociais,
contribuiu para inserção dos conteúdos da história e da cultura afro-brasileira e africana
nas Diretrizes Curriculares para Educação Fundamental da Infância e da Adolescência na
SME (2008). Portanto, para além de pensar a formação dos professores o currículo da Rede já
expressava, em 2008, o que pese os limites do documento, a preocupação com a educação
para relações étnico-raciais por meio do estudo da história e da cultura de matriz africana e
afrodescendente.
O desenvolvimento da discussão acerca dos conteúdos e temas de ensino que
propiciariam por meio da educação formal a afirmação positiva da identidade negra no Brasil,
na perspectiva da educação para relações étnico-raciais, iniciada timidamente na Rede em
2002, atualmente está contemplada tanto no currículo do ensino fundamental como na
Proposta Político Pedagógica para Educação Infantil (2012). Todavia, garantir que a discussão
tenha destaque no currículo prescrito não garante, por si só, que nas práticas educativas
cotidianas vivenciadas pelos professores, alunos, funcionários, direção e comunidade estejam
em conformidade com as diretrizes para educação das relações étnico-raciais, uma vez que
estas pressupõem, sobretudo mudanças de mentalidade, de concepções acerca de currículo,
escola, história e cultura.
IMPLANTAÇÃO DAS DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS PARA A
EDUCAÇÃO DAS RELAÇÕES ÉTNICO-RACIAIS E PARA O ENSINO DE HISTÓRIA E
CULTURA AFRO-BRASILEIRA E AFRICANA NA RME DE GOIÂNIA
O processo de implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação
das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
na RME de Goiânia foi caracterizado por diferentes ações, pensadas em distintas gestões da
Cidade e da Secretaria. Ações que expressam etapas diferentes, mas complementares do
processo de implementação, avaliação e (re) organização das políticas desenvolvidas pela
SME.
A primeira etapa de implementação das Diretrizes (2005-2010) na RME tem como
eixo orientador a formação continuada de professores, a aquisição de material didático e
paradidático para instituições educacionais. Os documentos da Rede evidenciam que no
período analisado foi realizado pelo Centro de Formação dos Profissionais da Educação da
SME (CEFPE), em parceria com o MEC/FNDE, o Curso História e Cultura Africana e
Afrobrasileira, tendo como público 180 professores da RME em regência de sala. O curso foi
desenvolvido com a carga horária de 120 horas, sendo que no final deste os professores
participantes do Curso e as instituições em que estes professores estavam lotados receberam
um kit contendo livros de história, poesia, romances, contos de origem africana e
afrodescendentes.
Essa ação de formação continuada de professores foi estruturada em cinco módulos,
sendo: Introdução aos Estudos da África; História e Geografia da Africana; Cultura e
Religiosidade Africana; Dança, Ritmos e Percussão; Corpo, Movimento e Capoeira; Práticas
Educativas e o Ensino da História e Cultura Africana. Para atuar nesta ação formativa, a SME,
contratou com recursos próprios ou federais, professores pesquisadores da Universidade
Estadual de Goiás (UEG), Universidade Federal de Goiás (UFG) e Pontifícia Universidade
Católica de Goiás (PUC Goiás).
Verificou-se que, nesta primeira etapa de implementação, o foco de intervenção da
SME foi à formação de professores, seja com recursos próprios ou com recursos oriundos do
governo federal. Além das ações financiadas com recursos federais, a SME realizou dois
cursos com carga horária de 40 horas, um em parceria com o Movimento Negro e o outro com
a Faculdade de Letras da Universidade Federal de Goiás, para os professores tanto da
educação infantil como do ensino fundamental. Nessa linha de ação, foi organizado e
coordenado pelo Centro de Formação dos Profissionais da Educação da SME um Grupo de
Estudo e Trabalho (GTE) para os professores de História aprofundar os estudos acerca da
história, da geografia e da cultura africana.
Todas essas ações tiveram como eixo orientador a premissa que a formação continuada
de professores é um elemento fundamental para alteração das práticas curriculares centrados
em conteúdos e procedimentos que negam a história e a cultura dos povos africanos e
afrodescendentes e hegemonizam os saberes, a cultura e a história europeia. Currículo que
nega a diversidade cultural e étnico-racial que permeiam a sociedade brasileira.
Avaliou-se que, nessa etapa, foi atendida uma média de 520 professores em diferentes
ações formativas. Número pequeno para uma Rede que, nesse período de tempo, já contava
com mais de 6 mil professores e 5 mil funcionários administrativos, mas que indicava o
tamanho do desafio para implementação das Diretrizes nas instituições educacionais.
Com base nas ações desenvolvidas nos anos anteriores e na perspectiva de articular os
movimentos sociais, núcleos de pesquisas africanos e afro-brasileiros das instituições de
ensino superior de Goiás e órgãos da prefeitura de Goiânia, a SME, a partir de 2012, entra na
segunda etapa de implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das
Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
Dentre as instituições parceiras da SME, destacam-se a: Secretaria Municipal de Promoção de
Igualdade Racial (SMPIR), Universidade Federal de Goiás (UFG), Pontifícia Universidade
Católica de Goiás (PUC), Fórum Permanente da Diversidade Racial de Goiás, Sindicato dos
Trabalhadores em Educação do Estado de Goiás (SINTEGO).
A SME, por meio do CEFPE, promoveu no ano de 2012, em interface com as
instituições e órgãos citados anteriormente, ações intersetoriais e interdisciplinares de
formação de professores, gestores educacionais e aquisição de material didático. Essas ações
tiveram como eixo orientador a articulação política, pedagógica e acadêmica da formação
continuada dos profissionais com o estudo, pesquisas e linhas de atuação das instituições
parceiras.
O movimento de articulação de instituições da Cidade no processo de pensar e propor
ações de implementação das Diretrizes no cotidiano das escolas ampliou o sentido e a
natureza teórica e metodológica das discussões desenvolvidas na e pela SME. Nas discussões
com os parceiros possibilitou a realização de avaliação ampla e sistemática das ações até
então desenvolvidas. Com base nessa avaliação foi possível mapear os desafios a serem
superados para que de fato a formação oferecida aos professores se materializasse em ações e
intervenções concretas no cotidiano da escola e da sala de aula. Vale ressaltar que, por meio
da avaliação, ficou evidenciado que as ações isoladas de formação de professores não
revertiam em ações pedagógicas e administrativas para educação das relações étnico-raciais
nas instituições de educação infantil e ensino fundamental. Fato relacionado, principalmente,
a incompreensão/resistência do coletivo de professores e a falta de apoio do grupo diretivo
das instituições educacionais.
Frente a esse diagnóstico, a primeira ação desenvolvida pela SME, com auxilio das
instituições parceiras, foi a formação dos Apoios Técnicos Pedagógicos da SME, professores
responsáveis pelo acompanhamento in loco das instituições educacionais da RME. Optou-se
por formar os técnicos da SME com objetivo de subsidiá-los teórica e metodologicamente
para auxiliar os professores e as instituições no desenvolvimento de ações curriculares com
foco na educação para relações étnico-raciais. Para tanto, foi proporcionado aos 120 apoios
pedagógicos da SME a participação em um curso de extensão de 20 horas, promovido pelo
CEFPE e NEAAD/UFG, com participação do Proafro/PUC Goiás, Sintego, ASPIR e Fórum
Permanente da Diversidade Racial de Goiás.
Em 2012, foi realizada pela SME/CEFPE, com as instituições parceiras, o I Seminário
de Educação para as Relações Étnico-raciais da SME. O evento ocorreu nos dias 20, 21 e 22
de agosto de 2012, e contou com a participação de 350 profissionais da educação da Rede
entre gestores, coordenadores pedagógicos, professores e técnicos pedagógicos da SME.
Organizado com momentos para palestras, mesas-redondas e relatos de experiências, o
Seminário constituiu-se em um grande momento para a discussão de questões vinculadas ao
currículo, práticas educativas e relações étnico-raciais.
Foi realizada ainda, em 2012, para um público de aproximadamente 350 profissionais,
a I Mostra Étnico-Racial da SME, com exposição fotográfica de trabalhos realizados pelas
instituições educacionais; apresentação e debate de vídeos de curta e média metragem,
apresentações culturais e lançamento do livro “História da Vila Rosa” de autoria da professora
Siomar de Moura Vieira, que desde 2003, participa ativamente das ações desenvolvidas pela
SME, no que se refere à educação para relações étnico-raciais.
Com base nas ações desenvolvidas em 2012, a SME reafirma para 2013 a importância
da articulação e parceria com as instituições de ensino superior e com os movimentos sociais
para continuidade e ampliação de ações com foco ao combate ao racismo e a discriminação
racial por meio de ações educativas formais. Nesse sentido, pretende-se dar continuidade as
ações desenvolvidas em 2012, juntamente com a organização de Grupo de Estudo e Trabalho
(GET) com professores da RME com o propósito de ampliar nos estudos, analisar e construir
material didático para utilização nas instituições educacionais.
De 2002 a 2012, a SME, de forma isolada ou em parceria, vem desenvolvendo
diferentes ações com foco nas questões étnico-raciais. Em alguns momentos estas ações
focalizavam mais a formação de professores em outros ampliaram para questão do currículo e
da aquisição e produção de material didático. Nesse processo, a parceria com os movimentos
sociais, núcleos de pesquisas das instituições de ensino superior e órgãos da prefeitura de
Goiânia, representou a ampliação das ações e dos olhares sobre a educação para relações
étnico-raciais, aprofundando epistemologicamente as discussões com os professores e com a
escola.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
De forma geral, avalia-se que, apesar da política de continuidade (2002-2012) as ações
desenvolvidas pela SME ainda não materializam em práticas curriculares em todas as
instituições educacionais. Ainda há muitos desafios a serem superados quer seja: a
predominância de uma concepção de currículo e práticas educativas fundamentados numa
visão linear e eurocêntrica de conteúdos de ensino; os limites da formação inicial de
professores que prima pela ausência de discussões sobre racismo, currículo e práticas
educativas; a desarticulação e descontinuidade de políticas dentro da própria gestão do MEC e
da SME pela SME; ausência de recursos financeiros para aquisição de material didático e
formação sistemática dos profissionais da educação; a naturalização da ideia que o Brasil é
uma “democracia racial”, portanto, não há racismo.
O que pese os desafios ainda a serem superados em Goiânia e também no Brasil,
observa-se que a SME, num movimento continuo, vem proporcionando momentos de estudos
e reflexões acerca do combate ao racismo na perspectiva da educação para relações étnicoraciais. Movimento que exige, por um lado, compromisso político, mas por outro rigor
acadêmico para não cometer o equívoco de ideologizar uma questão tão seria que é a racial
para a identidade nacional do povo brasileiro (IANNI, 1996).
Nesse sentido, falar do papel da população negra e indígena, na perspectiva apontada
pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação das Relações Étnico-Raciais e para o
Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, nos cursos de formação de
professores ou no currículo da educação infantil, f

Documentos relacionados